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27 DE ABRIL DE 1988 3221

que estipulavam o uso dos bens comunitários, bens esses que são rigorosamente delimitados e conhecidos por todos os habitantes de cada uma das povoações.
No entanto, a criação de novas unidades administrativas trouxe, em alguns casos, problemas de delimitação, cuja solução se encontrou na demarcação de áreas, aspecto que vem acentuar o sentimento de exclusividade do direito do uso e bens comunitários como elemento fundamental de coesão entre todos os membros da comunidade.
São estas relações que, fazendo interagir direitos, uso e benefícios dos bens, organização social do trabalho, relações sociais de igualdade e hierarquia, tom consolidado, ao longo dos séculos, uma postura cultural única, ancestralmente inovadora.
Tentar legislar traços identificadores de uma consciência comunitária é desvirtuar a essência que caracteriza as comunidades agro-pastorais; legislar sobre um direito factual adquirido é alimentar um processo que vai, paulatinamente, contribuir para a destruição de laços da nossa identidade como povo e introduz um rude golpe no comunitarismo, que ainda subsiste e é materialização de matriz cultural e solidária dos povos serranos.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Muito bem!

A Oradora: - É através destas acções pontuais que se caminha para a destruição do que nos é próprio e identifica como povo; estas acções pontuais são prova de um certo imediatismo político, revelador de falta de conhecimentos da importância que assumem os baldios na estrutura fundiária, nas relações sociais e na cultura portuguesa.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Muito bem!

A Oradora: - A avaliação que o Partido Os Verdes faz dos projectos de lei em debate é geralmente negativa, posição que tomámos no anterior debate, na passada legislatura. E é negativa porque consideramos que o modo existente de gestão dos baldios é original e corresponde ao sentir ancestral das comunidades e porque a lei deve corresponder aos anseios legítimos das populações e não contrariá-los.
Formas legislativas como estas, estranhas ao pulsar vivo, enraizado em séculos de cultura, não terão qualquer viabilidade de se implantar, pois serão os próprios povos a negá-las.
Ao longo da história, a dinâmica popular provou que é possível e socialmente justa a organização e gestão colectiva do património comum. Para quê modificar essa perspectiva eminentemente criativa, que permite encarar o desenvolvimento sócio-económico de extensas regiões das áreas mais deprimidas do País? Para quê mexer no que tem sido secularmente defendido pela participação directa das populações, que assim souberam afirmar com originalidade a sua gestão e usufruto, que não se deve perder, sob pena de contrariar a sua própria vontade?
Estes projectos de lei vão claramente ao arrepio de uma organização comunitária, que privilegia o direito de todos para o bem de cada um.
«Não mexam na lei», dizem os compartes e nós também, com a certeza de expressarmos uma profunda preocupação, porque se esboçam grandes interesses económicos para a utilização dos baldios para projectos distantes das necessidades reais dos povos serranos e que pronunciam já uma tendência desenfreada para a sua eucaliptação.
Alterar a lei dos baldios é um acto anticultural, é o desrespeito pela gente de trabalho que, em serras, desbravaram caminhos, esses, sim, caminhos de
desenvolvimento, porque fazem parte concreta da nossa realidade, construídos pelos próprios povos que constróem não só o seu próprio bem-estar, como também o da população portuguesa.
Não é estranho, nos tempos que correm, dizerem-nos que é necessário o progresso, que temos de nos adaptar à Europa. Mas neste caso dos baldios, que assenta fundamentalmente em questões do comunitarismo, dizemos que se deve estranhar o que não é estranho, que não deve aceitar-se o que é normal e que não deve seguir-se uma regra que está mal.

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS e da deputada Natália Correia (PRD).

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Oliveira e Silva e Rui Silva. Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Silva.

O Sr. Oliveira e Silva (PS): - A Sr.ª Deputada Maria Santos faz, pelos vistos, um juízo negativo do projecto de lei do Partido Socialista. Não sei se a Sr.ª Deputada ignora esta realidade: há baldios que, não obstante a promulgação dos Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76, não vieram a ser ocupados pelos compartes. Ninguém tomou conta deles, encontrando-se abandonados.
Nestas situações - e só nestas situações - em que os baldios não são reivindicados pelos compartes é que entendemos que eles devem ser entregues às juntas de freguesia e criámos mais aquelas soluções que se encontram no nosso projecto de lei.
Pergunto: qual a solução que dá em relação a baldios que não são reivindicados pelos compartes e que se encontram abandonados? .

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, depois do pedido de esclarecimento feito pelo Sr. Deputado Oliveira e Silva, teria pouca justificação eu intervir; no entanto, gostaria de corroborar o que já foi dito, porque também me pareceu que, pelas palavras da Sr.ª Deputada, genericamente está contra todos os projectos de lei, sem excepção, e um Sr. Deputado, que interveio da tribuna, fez uma distinção clara entre os projectos de lei do PSD e do CDS e os do PRD e do PS.
Logicamente, não me compete defender outro projecto de lei que não seja o que subscrevo, ou seja, o do PRD, e para tal gostaria de lhe recordar, Sr.ª Deputada, que incidimos, basicamente, no articulado do nosso projecto de lei para aquilo que, sendo ou não utilizado, estará, eventual e paralelamente, a ser indevidamente utilizado.
Se ler atentamente o nosso projecto de lei, verá que não intentamos contra aquilo que está feito - e que está bem feito -, apenas regularizamos situações ilícitas e ilegais, tentamos repor a verdade e a justiça. Logicamente que será muito difícil, a bem da razão, tentar passar os baldios, que hoje estão a ser utilizados indevidamente, para as assembleias de compartes. Não nos restará qualquer outra alternativa que não seja - e isto servirá para todos aqueles que já hoje disseram ser atestados de incompetência que passamos às juntas de freguesia, não assumindo a responsabilidade de os virem a usufruir - passar esses baldios para as juntas de freguesia, com o que estamos perfeitamente de acordo, pois as entidades que neste momento estarão em melhores condições para os gerir são as juntas de freguesia.

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