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I Série - Número 90 - Sexta-feira, 20 de Maio de 1988

DIÁRIO da ASSEMBLEIA da REPÍNBLICA

V LEGISLATURA - 1.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE MAIO DE 1988

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Exmos. Srs. Daniel Abílio Ferreira Bastos
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Apolónia Maria Pereira Teixeira
João Domingos F. de Abreu Salgado

SUMARIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.

Ordem do dia (1.ª parte). - Foi concedida autorização a um deputado para depor como testemunha em tribunal.
Prosseguiu a discussão conjunta dos projectos de resolução n.ºs 5/V (PSD), 9/V (PCP) e 10/V (PS), sobre alterações ao Regimento da Assembleia, tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP), Silva Marques (PSD), Guilherme Pinto (PS), Rui Gomes da Silva (PSD), José Manuel Mendes (PCP), Herculano Pombo (Os Verdes), Lopes Cardoso (PS), Marques Júnior (PRD) e Narana Coissoró (CDS) [artigos 80.0-A, 133.º, 285.º (n.011 e 2) e 288.ºJ.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta dos requerimentos, das respostas a alguns outros e dos diplomas entrados na Mesa.
O Sr. Deputado Baptista Cardoso (PSD), a propósito das conclusões das primeiras jornadas de estudo sobre as Terras de Santa Maria, promovidas pela Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, apontou alguns dos problemas com que se debate o concelho. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Barbosa da Costa (PRD), Vidigal Amaro (PCP), Lemos Damião (PSD) e José Mota (PS).
O Sr. Deputado Barbosa da Costa (PRD) solicitou a aplicação plena da Lei de Bases da Reforma Educativa como forma de resolver algumas questões que se levantam neste sector, ao que se associou o Sr. Deputado Fernando Conceição (PSD).
O Sr. Deputado João Amaral (PCP) criticou o Governo pela forma como pretende revogar o regime vigente de arrendamento rural.
O Sr. Deputado José Lello (PS) referiu algumas carências que afectam o sector da construção naval em madeira e sugeriu formas de as colmatar.
O Sr. Deputado Roleira Marinho (PSD) deu conta das potencialidades do porto de Viana do Castelo e da necessidade de o desenvolver, dada a sua importância para a região e para o País.
O Sr. Deputado Rogério Moreira (PCP) condenou o projecto de decreto-lei que visa regulamentar o poder disciplinar nas universidades.

Ordem do dia (2.ª parte). - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 133/V (PCP) - Garante a membros das juntas de freguesia, em certos casos e condições, o exercício do mandato em regime de permanência, com vista ao reforço dos meios de actuação dos órgãos da freguesia -, 237/V (PS) - Regime aplicável ao exercício do mandato dos membros das juntas de freguesia -, que foram rejeitados, e 245/V (PSD) - Garante aos presidentes de junta de freguesia, em certos casos, a possibilidade do exercício do mandato em regime de permanência -, que foi aprovado e baixou à 10.ª Comissão. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Cláudio Percheiro (PCP), Casimira Pereira e João Teixeira (PSD), lida Figueiredo (PCP), António Magalhães (PS), Manuel Moreira (PSD), Barbosa da Costa (PRD), Lopes Cardoso (PS), Herculano Pombo (Os Verdes) e Narana Coissoró (CDS).
Foram rejeitados dois requerimentos de avocação pelo Plenário, apresentados pelo PCP, relativos a alguns artigos da proposta de lei n. º 33/V, que foi, de seguida, aprovada em votação final global.
A Câmara aprovou um requerimento de baixa à 7.ª Comissão antes da votação na generalidade da proposta de lei n. º 37/V - Autoriza o Governo a legislar sobre a alteração à Lei n. º 6/85, de 4 de Maio, referente ao regime dos objectares de consciência -, que havia sido debatida em anterior sessão.
O projecto de resolução, apresentado pelo PS, de recusa da ratificação do Decreto-Lei n. º 90/88, de 10 de Março - Estabelece para o internato complementar o regime de dedicação exclusiva -, foi rejeitado.

O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 19 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos. Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Fernandes Ribeiro.
António José de Carvalho.
António Maria Oliveira de Matos.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Armando Manuel Pedroso Milhão.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Casimira Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Costa Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Ascenção Belém.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José António Coito Pita.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira de Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Antónia Pinho e Melo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Rosa Maria Ferreira Tomé e Costa.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
António Fernandes Silva Braga.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Fernando Ribeiro Moniz.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Guilherme Manuel Lopes Pinto.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Luís Manuel Geordano dos Santos Covas.
Ricardo Manuel Rodrigues Barros.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.

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Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Rui José dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Agrupamento Intervenção Democrática (ID):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

ORDEM DO DIA (1.º parte)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem, o expediente e o período de antes da ordem do dia terão lugar após o almoço.
Vamos continuar a discussão das alterações ao Regimento da Assembleia da República.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, chamo a atenção da Mesa para a não existência de quorum de funcionamento e menos ainda de votação.
Como, pelos meus apontamentos, vamos agora proceder a uma votação, peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que aguarde uns minutos, a fim de que estejam reunidas as condições necessárias para que a Assembleia possa votar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vamos apenas aguardar que haja condições de funcionamento, porque quanto à votação que referiu ela poderá ser feita noutro momento.
Entretanto, vai ser lido um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 2821 - Processo n.º 363/85 - 2.º Secção, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, de 5 de Abril último, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Jorge Lacão Costa, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo em causa.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vai ser lida uma proposta de alteração, apresentada pelo PSD, ao artigo 285.º

Foi lida. É a seguinte:

1 - Noartigo 285.º, alínea a), o texto é substituído por:
a) O prazo para exame em comissão é no máximo de cinco dias.

2 - No artigo 285.º, são eliminadas as alíneas b), c), d) e e).
está em discussão.

Pausa.

Para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do nosso ponto de vista, a proposta que é apresentada pelo PSD carece de alguma fundamentação.
Ao eliminarem-se as alíneas b), c), d) e e), que têm a ver com a regra supletiva, ou seja, ao deixar de se referir como se processa o debate na generalidade, qual o quadro para apresentação das propostas de alteração e como se organiza o debate na especialidade, dizendo apenas que há cinco dias para exame em comissão, creio que se irão criar mais problemas processuais quando formos confrontados como a discussão de uma matéria em sede de processo de urgência. Por tudo isto gostaria de ver fundamentada a proposta apresentada pelo PSD.
Estaríamos disponíveis para considerar alterações a este artigo, mas creio que a pura e simples eliminação das alíneas ô), c), d} e e) não vem ajudar os trabalhos parlamentares; antes pelo contrário, pode vir dificultá-los.

O Sr. Presidente: - Como não há inscrições ...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Se começa assim, começa mal!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para manifestar a V. Ex.ª que, perante o silêncio da bancada do PSD, não podemos deixar de votar contra a proposta apresentada; no entanto, estaríamos dispostos a considerar as sugestões apresentadas, se das fossem explicitadas.
Levantámos questões concretas em relação às quais não nos foram dadas repostas, pelo que não podemos fazer outra coisa que não seja votarmos contra a proposta, por ausência de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para dizer a V. Ex.ª que, ao abrigo das disposições do artigo 152.º do Regimento, solitamos que as propostas de alteração relativas ao artigo 285.º baixem à comissão. E fazemo-lo uma vez que pensamos que esta é uma das matérias que, do ponto de vista técnico, deveria ser clarificada. Não está aqui em causa algo que tenha a ver com diferente opção de ordem política sobre regras de funcionamento da Assembleia da República; está em causa, isso sim, uma questão técnica, que devia ser devidamente clarificada. Daí a nossa solicitação no sentido de que este artigo 285.º e a respectiva proposta de alteração apresentada pelo PSD sejam analisados em comissão.

O Sr. Presidente: - Para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, é para dizer que as razões da nossa proposta de alteração nos parecem evidentes.
De certa forma, o articulado actual torna mais complicado o debate de um diploma que seja objecto de processo de urgência do que propriamente o debate de um diploma com um processo legislativo normal. Por isso, resolveu-se eliminar toda a tramitação relativa a um diploma que seja objecto de processo de urgência, sendo certo que, havendo urgência, a conferência de líderes e o Plenário tratarão de fixar um tempo e um desenvolvimento do debate que seja mesmo de urgência e não, como actualmente as vezes acontece, um debate mais lento do que o próprio debate normal.

O Sr. Presidente: - Para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Silva Marques tentou, na intervenção que fez, abordar apenas a problemática da duração do debate. Creio que não é essa a questão essencial que está em causa; o que está em causa, isso sim, são regras processuais, designadamente saber se podem ou não ser apresentadas propostas de alteração sobre artigos que não tenham sido objecto de alteração, aquando do debate na generalidade; se há ou não debate de especialidade em relação aos artigos que não tenham sofrido propostas de alteração; quantos deputados podem intervir na discussão na especialidade. Estas questões não podem ser resolvidas caso a caso. O actual Regimento tem regras definidas (que podem ser melhores ou piores) - mas, com a sua pura e simples eliminação, vamos confundir o debate de um diploma que seja objecto de processo de urgência com um debate de um diploma que seja objecto de um processo normal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vai ser lida uma proposta de alteração, apresentada pelo PSD, ao artigo 288.º

Foi lido. É o seguinte.

1 - No artigo 288.º, n.º 3, o texto é substituído por:

3 - Admitida qualquer proposta de alteração, o Presidente envia o seu texto à Comissão de Regimento e Mandatos para discussão e votação.
2 - No artigo 288.º, n.º 4, o texto é substituído por:
4 - As alterações do Regimento devem ser aprovadas por maioria absoluta dos deputados presentes.

3 - No artigo 288.º, n.º 5, o texto é substituído por:
5 - A resolução de alterações ao Regimento, integrando as que hajam sido aprovadas em Comissão, é sujeita a votação final global, a qual deve obter o voto favorável da maioria absoluta dos deputados presentes.

Está em discussão.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Intervenho apenas para dizer a V. Ex.ª e aos colegas que vamos votar contra a proposta apresentada pelo PSD, porque ela viola o disposto no artigo 171.º da Constituição, que diz, nos seus n.º 2 e 3, o seguinte:

2 - A votação compreende uma votação na generalidade, uma votação na especialidade e uma votação final global.

3 - Se a Assembleia assim o deliberar, os textos aprovados na generalidade serão votados na especialidade pelas comissões [...]
Assim sendo, não podemos retirar, em sede regimental, o direito à Assembleia da República de, em cada caso, deliberar ou não a baixa à comissão respectiva.
Ao aprovar-se uma proposta destas, está a violar-se o artigo 171.º da Constituição. Para isso alertamos este Plenário. A não correcção deste erro levará a que na altura própria ela seja objecto de fiscalização da constitucionalidade.

O Sr. Presidente: - Não havendo inscrições, vai ser lida uma proposta de um artigo novo - o artigo 133.º

Foi lida. É a seguinte:

O ordenamento dos artigos, números e alíneas, assim como as respectivas remissões, do Regimento da Assembleia da República são os resultantes das alterações aprovadas, devendo ter, na redacção do novo texto do Regimento, com as alterações inscritas no lugar próprio, a correspondente expressão, nos termos do artigo 288.º, n.º 6.

Está em discussão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora não vá debruçar-me especificamente sobre a proposta que vai ser analisada, intervenho para dizer que relativamente à discussão da proposta anterior, e tendo em conta a intenção do Sr. Deputado Jorge Lemos, que invocou a natureza inconstitucional dessa nossa proposta, pensamos que assim não é, uma vez que a Assembleia pode perfeitamente deliberar que as alterações ao Regimento sejam discutidas e votadas em comissão. São duas teses, e o Sr. Deputado Jorge Lemos tem razão quando diz que quem de direito decidirá se a nossa proposta é ou não inconstitucional!

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De qualquer modo, fica claro que quem tem imposto que as alterações ao Regimento sejam discutidas e votadas em Plenário não temos sido nós. Já vários colegas meus, até da oposição, e jornalistas me têm procurado para perguntar por que é que impomos que as alterações ao Regimento sejam discutidas e votadas em Plenário, e eu digo que não somos nós que impomos, que é uma disposição do actual Regimento que não está expressa. Uma interpretação minimamente fiel ao texto leva a concluir que as alterações ao Regimento devem ser discutidas e votadas em Plenário e só por isso é que, nos trabalhos preparatórios desta revisão do Regimento, não procurámos que a discussão e votação das diferentes propostas tivessem lugar na comissão. A tal ponto assim é que o Sr. Deputado Jorge Lemos disse mesmo que se não for assim será inconstitucional.
Pensamos que esta revisão do Regimento ainda tem de ter lugar em Plenário - embora com todas as consequências negativas que, espero, todos reconhecerão -, porque assim impunha, numa interpretação minimamente fiel, repito, o actual Regimento. É por isso que o vamos rever neste ponto, esperando que seja esta a última vez que fazemos a revisão do Regimento em Plenário. É um processo que, por vezes, atinge o absurdo, porque não tem sentido que as alterações ao Regimento, pela sua especificidade, sejam discutidas em Plenário. A tal ponto assim é que colegas meus, não só de bancada como da oposição, e jornalistas, com frequência, me têm procurado para perguntar por que é que estamos a fazer a discussão das alterações ao Regimento em Plenário, uma vez que se criou a ideia de que a maioria é que decide tudo, a maioria é que viola todas as regras, como se fossemos nós que tivéssemos este capricho. Não! Fazemo-lo porque, a nosso ver, o actual Regimento assim o exige, mas vamos alterá-lo neste ponto.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Pinto.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectivamente, as opiniões acerca da constitucionalidade da proposta apresentada pelo PSD podem ser controversas. Na nossa opinião, aplicar uma regra geral de debate na especialidade é, de alguma forma, violar o texto constitucional que quis pôr, em cada caso, à disposição do Plenário a remissão desse debate para as comissões respectivas. O Sr. Deputado Silva Marques não pode confundir aquilo que os preceitos constitucionais, ou outros, podem impor ao Plenário e aquilo que, eventualmente, uma maioria pode fazer num determinado momento. É que há aqui várias questões a distanciar: uma, é, eventualmente, a discussão do Regimento em Plenário; outra, é a forma como essa discussão tem vindo a ser feita - e não vou tecer mais comentários sobre isso, uma vez que todos recordamos a forma como ela tem vindo a ser feita e já tivemos aqui uma sessão até às 10 horas da madrugada) - ; uma outra, ainda, é a procura de um consenso prévio que evite o prolongamento destes debates no Plenário. Tudo isso poderíamos ter feito, mas não o fizemos por ausência de vontade política do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Deputado Guilherme Pinto, o n.º 3 do artigo 171.º da Constituição diz:
Se a Assembleia assim o deliberar, os textos aprovados na generalidade serão votados na especialidade pelas comissões [...]
Pergunto-lhe se esta deliberação da Assembleia de decidir que todas as alterações ao Regimento serão feitas na comissão viola ou não o disposto na Constituição. É evidente que não! A Assembleia, em qualquer momento, pode deliberar que, em termos genéricos, todos os textos serão votados na comissão, sem prejuízo, como diz a própria Constituição, do poder de avocação pela Assembleia e do voto final desta para aprovação global.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto relativamente à intervenção do Sr. Deputado Guilherme Pinto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - O Sr. Deputado Guilherme Pinto não assistiu às outras revisões do Regimento e por isso julga que elas foram feitas por consenso. Sr. Deputado, nenhuma revisão foi feita por consenso, pois seria necessário que os partidos democráticos se pusessem de acordo com o Partido Comunista e, quando eles se puserem de acordo, de duas uma: ou os partidos democráticos estão a deixar de p ser ou p Partido Comunista está a deixar de ser comunista. Por isso, nunca revisão alguma foi feita por consenso, nem sequer a última - que foi feita irmamente por nós e pelos senhores, ou seja, pelo PSD e pelo PS - o foi. Os senhores, ainda não se libertaram completamente dos complexos de esquerda e, quando as coisas são feitas pelos senhores, estão bem feitas, mesmo que se trate das maiores barbaridades, e peco-lhe desculpa por este termo. Não se esqueça que o bloco central fez o célebre imposto retroactivo, que nem sequer o Salazar teve a ousadia de fazer; no entanto, como foi feito pelos senhores, estava bem feito e, quanto às alterações ao Regimento, passa-se o mesmo.
Não estão, mas, se estivessem a fazer connosco as alterações ao Regimento, elas estariam bem feitas, mesmo que não houvesse consenso, porque consenso, Sr. Deputado, nunca houve. E, repito, ainda bem que nunca houve e espero que não venha a haver, a não ser que o Partido Comunista acabe a sua renovação e se insira na lógica dos partidos democráticos. Enquanto tivermos um problema de relacionamento sobre estas questões institucionais com o Partido Comunista, é muito difícil haver consenso. Por vezes, os senhores têm dificultado estas questões institucionais, na medida em que têm pecado por excesso de radicalismo parlamentarista, o que não é benéfico nos dias de hoje, não é benéfico para afirmar o Parlamento ou a democracia. Há aí uma divergência entre vocês e nós que, apesar de tudo, parece-me mais atenuada, uma vez que os senhores, quanto às propostas que apresentam sobre as alterações ao Regimento, evoluíram bastante, porque aceitam o imperativo da afirmação da democracia que é o da eficácia. Não há democracia que se afirme com a vertente verbalista, é necessário que também seja eficaz, e aí os senhores evoluíram bastante - permita-me que lhe assinale esse aspecto positivo.
Agora, quanto às outras revisões terem sido feitas por consenso, devo dizer-lhe que nunca houve...

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O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Eu não disse isso!

O Orador: - Disse então que era melhor fazer uma revisão por consenso. Isso não é possível relativamente a questões institucionais que dizem respeito à afirmação e à consolidação da democracia. E compreende-se bem porquê: é que uns querem que a democracia se afirme pelo verbo, pela parole» porque têm uma diferente concepção da democracia; para eles é uma coisa transitória, é uma coisa para fazer agitação, enquanto outros, os democratas, não têm uma visão transitória da democracia e querem que ela dure e, por isso mesmo, não podem privilegiar apenas o aspecto verbalista das instituições democráticas, têm de se preocupar com outra vertente, igualmente decisiva, que é a da eficácia, para responder às situações, para responder àquilo que o País espera dela. Portanto, Sr. Deputado, quanto ao consenso, estamos esclarecidos.
A diferença é esta: quando são os senhores a fazer a revisão do Regimento, mesmo que façam determinadas coisas semelhantes às que propomos, está bem feito, porque são vocês que o fazem; quando são feitas por nós, está mal feito. Sr. Deputado, isso é consequência de uma falta de evolução da vossa parte, mas qualquer dia os senhores compreenderão as coisas tal como nós, e espero que se modernizem suficientemente para isso.

O Sr. Presidente: - Informo que o Sr. Deputado Silva Marques gastou quatro minutos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Pinto.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Sr. Presidente, em matéria de constitucionalidade, o que eu disse foi que tinha dúvidas, não fiz uma afirmação peremptória. Apesar da intervenção do Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, continuo com as mesmas dúvidas sobre a constitucionalidade em estabelecer uma regra geral para o debate na especialidade em comissão.
Ao Sr. Deputado Silva Marques, gostaria de dizer o seguinte: vejo que a sua costela anticomunista acordou hoje mais cedo. Costuma manifestar-se às 4 horas da manhã ou às 10 da madrugada, mas hoje o Sr. Deputado resolveu antecipar-se e fazer o número anticomunista logo no início da sessão. Não o acompanho nisso como não o acompanho no geral.
Sr. Deputado, não há consenso apenas porque, se calhar, o PSD tem nesta matéria uma maneira de ver diferente não só do Partido Comunista mas da generalidade dos partidos. Lembro-lhe que todos os partidos já tomaram aqui posição quanto à forma como o PSD vem liderando este debate das alterações ao Regimento.
Quanto à questão do «palavrismo», para mim a palavra ainda é o meio mais nobre de expressão do pensamento humano. Agora, o que de certeza absoluta não quero, Sr. Deputado, é substituir a palavra por bandeiras, cores e braços no ar.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - De facto, precisávamos de um histrião para animar esta sessão matinal...!
Olhando para a intervenção do Sr. Deputado Silva Marques, quase diria que ela foi feita para entreter as crianças que vieram assistir aos nossos trabalhos. É normal, pois o Sr. Deputado Silva Marques já nos vem habituando a intervenções com esse cariz.
Também é normal que o PSD, sabendo-se que tem o cutelo e que pretende atingir-nos a todos, queira, de algum modo, dividir as forcas que estão contra ele. O Sr. Deputado Silva Marques tem uma má consciência que o leva a fazer certas intervenções como aquela que agora fez.
Mas isso é um problema seu, Sr. Deputado Silva Marques. Deixe lá os seus fantasmas e discuta o Regimento! Não fale tanto do Partido Comunista; pense mais no seu próprio partido! Afirme-se, mas não pelas críticas sobre o que pensa o PCP! Justifique as suas soluções!
Era isso que esperávamos de si e não estes números de alguma pândega com que nos vem habituando, seja de manhã seja à noite.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Jorge Lemos não tinha direito a fazer um protesto, porque não fiz nenhuma intervenção, mas sim um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado Guilherme Pinto.
Ao que parece, as regras do Regimento merecem pouca cerimónia da parte de certos Srs. Deputados e de certos grupos parlamentares, o que, no fundo, confirma a tese política que acabei de expender.
Os Srs. Deputados não são capazes ou não querem discutir e analisar politicamente as questões; querem só o Regimento. Estão a tratar disto como burocratas.
É uma atitude possível!...
Pela minha parte, fiz uma análise política e até ideológica das questões relacionadas com o Regimento. Ou será que os senhores acham que o Regimento não está relacionado com as questões políticas e ideológicas gerais? Não me digam que os Srs. Deputados estão a tratar do Regimento como se fossem electricistas, como se estivessem desligados das vossas opções ideológicas e políticas?! É muito interessante, mas então devíamos ter começado mais cedo, porque, como sabem, os electricistas começam a trabalhar às 8 horas da manhã.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Muito mal!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isso hoje está muito fraquinho, ó Silva Marques.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Sr. Presidente, não percebi bem a que título é que

O Sr. Deputado Silva Marques interveio, porque, se V. Ex.ª bem reparou, depois de ter dado aquele contributo brilhante para o debate sobre as alterações ao Regimento - e, aliás, depois da sua penúltima intervenção, todos nós enten-

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demos qual é o sentido útil da proposta do PSD -, de levantou-se dizendo que não sabia a que título tinha intervindo o Sr. Deputado Jorge Lemos e acabou por responder ao protesto daquele, fazendo um contra-contraprotesto, o que, obviamente, em matéria de Regimento, é manifestamente abusivo.
Quanto à questão da electricidade, Sr Deputado Silva Marques, deixe-me só que lhe diga o seguinte: estivemos aqui uma noite inteira, desde as 22 horas até às 10 horas da manhã, e o PSD não explicitou uma única das suas propostas. Gastou apenas dois minutos, que contabilizei, apesar de não ter o «cronometro» que V. Ex.ª teve aqui toda a noite. Portanto, em matéria de electricidade, temo bem que seja o PSD que quer fundir alguma luz do Pais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de esclarecer a Câmara de que o que a Mesa tem estado a fazer e o que é óbvio que se faça nesta discussão é não ligar excessivamente às figuras regimentais e deixar o debate fluir com a maior celeridade e ligeireza possíveis, desde que todos os tempos contem.
Tem a palavra o Dr. José Manuel Mendes, para uma intervenção.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que vale a pena ainda voltar à questão que estava pendente antes deste episódio e que é a de saber s e, sim ou não, é arrematável a proposta do PSD no sentido de que as votações de especialidade sobre as alterações ao Regimento se façam exclusivamente em comissão.
Supondo que não podemos esquecer que as normas constitucionais constantes do artigo 171.º visam estabelecer um princípio que é completamente inflectido pela lógica agora ensejada. Lembro que não se trata aqui de matéria inteiramente nova, pois ela vem na linha - há que reconhecê-lo - de muitas das posições que têm sido assumidas pelo PSD durante a discussão que temos vindo a fazer. Elas reflectem, entre outras coisas e para além do que aqui já foi dito, uma concepção do Parlamento, que não poderemos aceitar, segundo a qual aquilo que prevalece é a opinião de um núcleo diligente dentro de cada grupo parlamentar e dele isolado e não a opinião de cada deputado, enquanto tal, face a matérias nobres, designadamente e desde logo aquela que contém as regras fundamentais da vida, do funcionamento, do quotidiano da Assembleia da República. Isto é, vamos estimular até às últimas consequências a regra da ignorância sistemática do back-bencher, do tipo que se senta na quinta, sexta ou sétima fila, que não sabe de nada e que se limita apenas a votar conformemente com a direcção de partido, ou vamos disponibilizar a cada parlamentar o máximo de informações, por forma a viabilizar que ele, de uma maneira lúcida e útil, intervenha, sobretudo, repito, em áreas que particularmente com ele atinem?
Creio que é bom termos a noção destas realidades antes de procedermos a qualquer votação, porque a óptica partidarista levada ao extremo nega a democracia julgando que a favorece e que a estimula.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, consultando aquilo que tem sido o guia desta discussão, embora não oficial, vejo que há um artigo 133.º, que presumo seja um artigo novo, mas que não tem numeração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o artigo em questão foi lido e penso que todos os Srs. Deputados reconheceram o texto.

O Orador - De qualquer modo, pergunto se ele se deve incluir no Regimento como sendo o artigo 288.º-A.
Penso haver necessidade de precisar esta questão, porquanto depois podemos vir a ter alguma dificuldade em introduzi-lo num sítio onde talvez já não haja espaço.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é óbvio que no termo do debate teremos de fazer uma remuneração dos artigos de acordo com aquilo que for aprovado durante o mesmo.
Foi dito que este era um artigo novo, foi lido e foi-lhe dado provisoriamente um número, que era o que se seguia ao último.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não temos nada contra o novo artigo 133.º, pensamos é que ele repete aquilo que já consta do n.º 6 do artigo 288.º, uma vez que aí já se diz que «o Regimento, com as alterações inscritas no lugar próprio, é objecto de nova publicação».
Não vemos, pois, necessidade de incluir mais um artigo com estas características. Quem ler isto considerará que o legislador não sabe o que está a fazer.
Nestas circunstâncias, iremos abster-nos na votação, porque pensamos que este artigo não se justifica, está a mais e, como tal, é um acrescento inútil.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bastante verdade
aquilo que o Sr. Deputado Jorge Lemos acabou de dizer.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Não acredito!...

O Orador: - Simplesmente, na última revisão do Regimento aprovou-se um artigo semelhante, que, aliás, praticamente copiei.
Mas, nestas coisas, à cautela, prefiro seguir um pouco a experiência dos outros

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A má experiência!

O Orador: - ... do que inovar excessivamente. É por isso que, com frequência, faço referência aos outros Regimentos das outras democracias.
O Sr. Deputado Jorge Lemos tem bastante razão, mas acontece que na última revisão do Regimento foi aprovada uma disposição desta mesma natureza. Fizemo-la com o Partido Socialista tranquilamente, pareceu-nos boa e agora, quando preparei esta revisão do Regimento, fui inspirar-me na experiência do bloco central e acolhi esta disposição que ele fez aprovar.

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O Sr. Deputado tem, de facto, razão mas, de qualquer modo, à cautela, não vejo que seja necessário retirá-la, até porque ela é mais explicativa, mais ordenativa do processo, é como que uma instrução.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Silva Marques, se fizemos mal no passado, ainda estamos a tempo de emendar a mão. De qualquer modo, creio que na altura alertámos para o mal fundado desta situação. Já na altura considerávamos que era uma repetição incluirmos um artigo com estas características.
Estamos ainda perfeitamente a tempo de não voltar a cometer este erro. Chamo-lhe a atenção que o texto vai ser objecto de publicação no Diário da Assembleia da República e no Diário da República, que vai ser lido por muita gente, pelo que é bom que uma resolução com estas características ...

O Orador: - Sr. Deputado, se a aprovarmos, a democracia não pára por causa disso. Quanto a retirá-la, peco-lhe desculpa mas gosto de ponderar os assuntos com um mínimo de tempo.
Inspirei-me, repito, nas obras do bloco central em matéria de revisão do Regimento, onde estava esta disposição que me pareceu útil, na medida em que, repetindo embora o espírito do n.º 6 do artigo 288.º do Regimento, o torna mais explícito. Diria que é uma instrução de trabalho para a execução das alterações ao Regimento e daí que me pareça que não se perde nada, não há mal nenhum se esta disposição for aprovada.
Por isso, à cautela, mantemo-la, de resto, se ela não tem nenhuma consequência, por que é que os senhores hão-de fazer tanta força e votar contra ela? No fundo, a última revisão do Regimento adoptou uma disposição idêntica ...

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Onde é que está?

O Orador: - Não está aí, Sr. Deputado, está na resolução! Ó Sr. Deputado, é claro que no Regimento não está! Então isso ia ficar no Regimento?! Era despropositado! Está é na resolução das alterações do Regimento que o Sr. Deputado aprovou ... Pode continuar a rir até às horas que quiser porque ela está, de facto, na resolução, e se houve algum despropósito, foi um despropósito generalizado, já que ninguém levantou a questão.
Agora, se o vosso problema está em que esta disposição fique consagrada no Regimento, é claro que não fica, porque o que estamos a aprovar é uma resolução de alterações ao Regimento, a qual tem diversas disposições, como a que vem a seguir.
O Regimento e a resolução são duas coisas diferentes e devo dizer-lhes que até nem estou a compreender por que é que os Srs. Deputados estão a levantar estas objecções.
Em todo o caso, à cautela, mantemos o nosso texto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado Silva Marques, quando há pouco, sob a figura de interpelação à Mesa, levantei a questão de saber que
numeração atribuir a este novo artigo, fi-lo na presunção de que ele diz exactamente o mesmo que o n.º 6 do artigo 288.º
Neste sentido, gostaria que explicasse o seguinte: a ser admitida esta nova alteração, ela substitui o n.º 6 do artigo 288.º ou vem dizer que, nos termos daquele artigo, se deve fazer exactamente aquilo que ele manda fazer?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques, a quem informo que ao PSD resta apenas um minuto.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Herculano Pombo, a partir do momento em que o texto base para os trabalhos de revisão do Regimento foi posto de lado, é óbvio que esta página numerada com o n.º 126 onde se encontra este artigo 133.º, que era o do antigo texto base, passa a ser uma proposta própria, que não diz respeito ao articulado do Regimento. Trata-se de uma proposta de resolução que faz parte do processo de revisão do Regimento mas que não tem nada a ver com o articulado deste.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Permite-me que o interrompa?

O Orador: - Sr. Deputado, tenho tão pouco tempo, só um minuto ... Os Srs. Deputados dizem que não intervimos, mas já interviemos até demais. Agora vamo-nos calar porque às vezes o silêncio é muito bom para a democracia.

O Sr. Presidente: - Para um intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não concordamos que este artigo fique no Regimento porque ele deve é ter lugar na resolução que irá dizer que alterações foram feitas para que estas sejam introduzidas no Regimento. O mesmo acontece, por exemplo, na revisão constitucional em que existe uma resolução que diz que foram alterados tais, tais e tais artigos e que essas alterações devem ser incluídas no lugar próprio na Constituição.
Ora, este artigo é paralelo ao que vai constar dessa resolução e não é propriamente um artigo do próprio Regimento. Por isso, havendo uma resolução que é paralela à lei de revisão, que é a que diz quais são os artigos que foram modificados e que essas alterações devem ser inseridas no lugar próprio, este artigo deve ficar na resolução e não no Regimento.

O Sr. Silva Marques (PSD): - É evidente!

O Orador: - O Sr. Deputado Silva Marques sabe disso, explicou-o muito bem, mas não sei por que é que agora tira um preceito que deve ficar na resolução (e só aí) para o pôr no Regimento onde ele não tem lugar.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não, é ao contrário!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se nas galerias a assistir à sessão alunos da Escola Primária n.º 28, de Lisboa, e do Colégio Horizonte, do Porto, acompanhados dos respectivos professores, a quem saudamos.
Aplausos gerais, de pé.

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O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, se bem entendi, o PSD já não dispõe de tempo neste momento para intervir no debate, não é verdade?

O Sr. Presidente: - Dispõe de meio minuto, Sr. Deputado.

O Orador: - Certo, mas, apesar do poder de síntese do Sr. Deputado Silva Marques que todos nós conhecemos, meio minuto é nitidamente insuficiente para continuarmos a debater a matéria que ainda está em aberto.
O que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se atreveria a propor aos outros grupos parlamentares, para que o PSD possa continuar a participar neste debate, era que fosse concedido ao PSD o mesmo tempo do grupo parlamentar que mais tempo disponível tenha. Sem isso, este debate perde todo o sentido e interesse.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o que aceitamos, isso sim, é que os partidos que tenham neste momento um excesso de tempo nos dêem metade cada um.
Começámos este debate dispondo de catorze minutos e já gastámos esse tempo. Ô PS começou com vinte e tal minutos e se calhar ainda tem perto de vinte minutos. Sendo assim, pedimos-lhe que nos dê dez minutos - o que, a meu ver, seria um acto patriótico - ao invés de enveredarmos por uma solução de «défice orçamental», isto é «como já gastámos tudo agora vamos aumentar o défice». Não pode ser, somos contra o défice! Estou convencido de que o PS não nos vai negar esses dez minutos e que o CDS também nos vai dar três ou quatro...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Um!

O Orador: - Bom, um minuto do CDS com mais dez do PS somam onze minutos. Se o PCP nos der mais cinco ou seis minutos, rapidamente recompomos o nosso stock de minutos.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente. É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, pelo menos desta vez o Sr. Deputado Silva Marques está redondamente enganado, porque o Partido Socialista não está disposto a ceder ao PSD um único minuto de tempo de que dispõe. Nós não temos tempo a mais, quem tem tempo a menos é o PSD, o que até é compreensível e só vem demonstrar que tínhamos razão quando dizíamos que tudo isto estava errado. Pela nossa parte, não vamos aceitar que o debate prossiga
nestes termos e com o silêncio do PSD, pelo que se o PSD não aceitar a nossa proposta ou se outros grupos parlamentares não estiverem de acordo com ela - e era isso que queria saber - o Partido Socialista pedirá, imediatamente após se esclarecer este quiproquó, meia hora de interrupção dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, em face da falta de tempo do PSD para intervir neste debate, gostaria de exprimir a posição do PCP, que é a seguinte: somos contra toda a óptica do abyssus abyssum, o défice do PSD não pode gerar o débito dos outros partidos que estão interessados em debater, até à última alínea e com toda a profundidade e rigor, as alterações ao Regimento.
Por outro lado, não queremos ficar privados da intervenção regular, brilhante, extremamente capaz de nos confundir, dos deputados da primeira fila da bancada do PSD e, em particular, do Sr. Deputado Silva Marques, cujo fulgurante hiper-regimentalismo já sai para fora das fronteiras do Parlamento. E, exactamente porque não desejamos condoer-nos com essa ausência de palavra, vamos ao ponto de sugerir ao Sr. Presidente da Assembleia da República que, num acto de doação, que é também um acto de generosidade e igualmente de compreensão democrática, faça com que o PSD seja prendado com mais vinte minutos e, assim, nos faculte a possibilidade de continuarmos a ouvir as vozes que vêm da sua bancada em apoio e em defesa da malfeitoria brutal contra o Regimento como, até ao momento, se tem verificado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós queremos concluir a revisão do Regimento e por isso aceitamos a sugestão agora dada pelos Srs. Deputados do PS e do PCP. Se os Srs. Deputados nos colocam perante a situação de que vão pedir a interrupção dos trabalhos, caso não seja aceite por nós a proposta de V. Ex.ª no sentido de nos ser concedido mais tempo para intervir no debate, desde já afirmo que aceitamos o tempo suplementar que nos quiserem dar, aceitamos 10, 20 ou 30 minutos, aquilo que nos quiserem dar. O Sr. Deputado Lopes Cardoso propôs dez ou quinze minutos?... Nós aceitamos vinte minutos.
Sr. Deputado José Manuel Mendes, não faça ironia comigo!, o Sr. Deputado no outro dia chamou-me réptil, mas o senhor devia ter vergonha de na intervenção que fez agora se ter referido à minha pessoa. Mas vergonha o Sr. Deputado não tem!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de esclarecer que, por uma elementaríssima precisão histórica, me limitei a dizer, no passado recente, que se o Sr. Deputado Silva Marques continuasse no caminho que vinha trilhando em relação à bancada do PCP e a mim pessoalmente, eu o trataria

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como um réptil. Foi o que afirmei, é o que mantenho, e, apesar desta boutade do Sr. Deputado Silva Marques, continuo ainda a ser suficientemente sereno para não o tratar como um réptil.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de esclarecer uma má interpretação do Sr. Deputado Silva Marques.
Quando eu disse que o Partido Socialista pedia meia hora para o PSD, não foi no sentido de fazer qualquer chantagem ou pressão sobre o PSD. Na verdade, consideramos que se, num debate desta natureza, o PSD, que tem nele um papel principal, não pudesse intervir, seria, para nós, um debate totalmente destituído de sentido.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Qual foi a proposta? O Orador: - Qual proposta, Sr. Deputado?

O Sr. Silva Marques (PSD): - A do Sr. Deputado em termos de tempo?

O Orador: - Sr. Deputado, a minha proposta foi no sentido de o PSD ter o tempo correspondente ao maior tempo disponível. Penso que os vinte minutos estão certos, o Sr. Deputado já os aceitou, vamos para a frente.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Nós aceitamos!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos prosseguir com o debate. A partir deste momento, o PSD dispõe de vinte minutos e meio.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, solicito à Mesa a informação sobre os tempos disponíveis dos grupos e agrupamentos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a informação sobre os tempos, gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados no sentido de evitarem cair em sistemas de círculo fechado, de quadratura do círculo do tipo «pescadinha de rabo na boca», facilitando assim o prosseguimento dos trabalhos.
Os tempos ainda disponíveis pelos grupos e agrupamentos parlamentares são os seguintes: PSD - 20 minutos e meio; PS - 24 minutos; PCP - 21 minutos; PRD - 26 minutos; CDS - 4 minutos; Os Verdes - 17 minutos, e ID - 8 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, o agrupamento parlamentar em que me integro não tem feito intervenções durante este debate porque só dispõe de oito minutos e já fez várias intervenções nas sessões anteriores em que foi debatida
esta matéria relativa à revisão do Regimento.
No entanto, foi com profunda admiração que assisti, agora, à cedência de vinte minutos ao PSD por parte da Mesa, quando há relativamente pouco tempo ocorreram nesta Assembleia problemas graves motivados por esta questão dos tempos.
Neste momento, a ID dispõe de oito minutos para intervir na discussão de dezenas de artigos que dizem directamente respeito aos agrupamentos parlamentares. Como é evidente, vai acontecer que a ID não vai dispor de tempo para debater coisa alguma e por isso pensamos que antes de ter sido cedido o tempo ao PSD, teria sido conveniente que todos os grupos e agrupamentos parlamentares tivessem participado numa reunião com a finalidade de se recomporem os tempos adequados até ao final do debate.
Porque assim não foi entendido pela Mesa, gostaria de saber, Sr. Presidente, pois V. Ex.ª tem a última palavra nesta questão, se quando a ID esgotar o tempo de que neste momento dispõe - e saberemos gerir estes oito minutos - também vai poder dispor de vinte minutos para participar no debate desta sessão sobre a revisão do Regimento, uma vez que vão ser discutidos artigos respeitantes aos agrupamentos parlamentares e a ID é um deles.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, certamente não estava presente na Câmara quando tive oportunidade de me referir à conferência de líderes em que V. Ex.ª também participou a na qual ficou decidido que depois da sessão de hoje e antes da sessão da próxima quarta--feira terá lugar uma reunião dos líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares.
Informo também o Sr. Deputado de que foi distribuído à Câmara um folheto discriminativo dos artigos já discutidos e dos que ainda não foram discutidos relativos aos agrupamentos parlamentares e a outras matérias.
É ainda intenção da Mesa, depois da discussão deste artigo 134.º (novo), iniciar a discussão do artigo 5.º, alínea y), dando assim início à discussão dos artigos relativos às matérias ainda não discutidas.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, participei na conferência de líderes a que V. Ex.ª se referiu e sei que vai ter lugar uma reunião para preparar o debate do próximo dia 25, mas isso não obsta a que a ID se sinta prejudicada em relação ao tempo concedido ao PSD. Ao PSD foram concedidos vinte minutos para participar no debate de hoje e a ID tem apenas oito minutos e dentro de relativamente pouco tempo vai ficar sem tempo disponível para debater assuntos que lhe dizem directamente respeito.
A minha pergunta é muito clara: independentemente da reunião que vai ter lugar para preparar o debate do próximo dia 25, pergunto: a Mesa vai conceder também à ID vinte minutos para debater os artigos que vão ser discutidos na sessão de hoje? Se assim não acontecer, dentro de oito minutos estaremos calados e o PSD poderá continuar a discutir as alterações ao Regimento até às 13 horas, mantendo-se o Agrupa-

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mento Parlamentar da ID perfeitamente calado, quando se discutem matérias que lhe dizem directamente respeito e isto porque não dispõe de tempo.
Considero que estamos perante uma dualidade de critérios, o que não tem nada a ver com a reunião preparatória da sessão do próximo dia 25 mas, sim, com a sessão de hoje.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, a Mesa, independentemente dos Presidentes ou Vice-Presidentes que tenham ocupado estes lugares, tem procurado reger as questões com senso.
A questão relativa ao tempo do PSD surgiu quando apenas lhe restava um minuto para intervir. A ID dispõe, neste momento, de oito minutos, quando não tiver tempo disponível para intervir no debate, a Mesa reagirá com bom senso.
Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que passamos, agora, ao artigo 134.º (novo), proposto pelo PSD, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Artigo 134.º

l - O Regimento da Assembleia da República no seu novo texto, com as alterações aprovadas pela presente resolução, entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o n.º l do artigo 134.º (novo).

Sr. Silva Marques (PSD): - Então e o n.º 2 do mesmo artigo?

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, o n.º 2 diz respeito aos agrupamentos parlamentares, que se considerou ser discutido mais tarde e por essa razão não foi lido.

Está em discussão o n.º l do artigo 134.º (novo).

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, julgo que é preferível deixarmos a discussão do texto integral deste artigo para a parte final do debate.

A Sr.ª Presidente: - Como há consenso nesta matéria, vamos prosseguir com o artigo 5.º, alínea j).
O Sr. Deputado Herculano Pombo pede a palavra para que efeito?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - É para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, solicito à Mesa a interrupção dos trabalhos por quinze minutos, para que os grupos e agrupamento parlamentares possam trocar algumas impressões acerca da maneira como irá decorrer o debate a partir deste momento em que se vai proceder à discussão de artigos novos.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, o pedido é regimental, pelo que vamos interromper agora os trabalhos, que se reiniciarão às 11 horas e 30 minutos.
Está suspensa a sessão.

Eram 11 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 11 horas e 35 minutos.

Vamos passar à discussão do artigo 5.º, que já foi lido.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Aproveitámos a interrupção oportunamente solicitada pelo Partido Os Verdes para, no meu grupo parlamentar, fazermos uma reflexão em torno desta matéria.
Terminámos esta primeira leitura do Regimento e esta apreciação daqueles pontos aparentemente mais fáceis, embora a experiência nos tenha demonstrado que não eram tão fáceis como isso.
O Sr. Presidente da Assembleia anunciou, há pouco, que iria promover uma reunião entre os diferentes grupos e agrupamento parlamentares para apreciar a matéria ainda em aberto e que estava prevista uma nova reunião da Assembleia para a discussão das alterações ao Regimento. Nestes termos, parece-nos mais lógico que, antes de prosseguirmos este debate, tivesse lugar essa reunião sugerida e promovida pelo Sr. Presidente e no período que, na próxima semana, se prevê reservar para a discussão das alterações ao Regimento se procedesse à discussão da matéria em aberto. Pensamos que, se esse caminho fosse seguido, a discussão seria muito mais profícua, mais útil e mais rápida.
Assim, a sugestão que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresenta à Câmara é a de se suspender, neste momento, o debate relativo às alterações ao Regimento e aguardar-se a reunião proposta pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, após o qual deverá o debate prosseguir e, porventura, ser concluído no quadro e no calendário já oportunamente anunciado pela Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, o Sr. Presidente da Assembleia da República, quando se fez substituir por mim na presidência da Mesa, não me deu qualquer indicação no sentido de se interromper a sessão para se proceder a uma conferência de líderes. Segundo o entendimento dos outros elementos da Mesa, a ideia do Sr. Presidente da Assembleia será a de se proceder a essa reunião antes da próxima sessão plenária; nestes termos, penso que devemos continuar os trabalhos.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, a questão que coloco é em relação a todos os grupos parlamentares, pois, se houver consenso quanto à sugestão apresentada pelo PS e tendo em conta o programa previsto pelo Sr. Presidente no sentido de se proceder a uma conferência de líderes antes da próxima sessão plenária destinada ao debate das alterações ao Regimento, parece-nos muito mais útil que não se prossiga com esta discussão até que essa conferência se realize. Trata-se de uma sugestão do PS e, se houver consenso dos restantes grupos parlamentares, nada impede que ela seja aceite pela Câmara.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, se houver consenso da Câmara, a Mesa interromperá a sessão.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Nós não estamos de acordo, Sr.ª Presidente!

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, como não há consenso quanto à sugestão apresentada pelo PS, vamos prosseguir os trabalhos.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr.ª Presidente, a nova proposta, apresentada pelo PSD, que dá uma nova redacção ao artigo 134.º e lhe introduz uma nova alínea, cria uma situação também nova e que por isso não podia ter sido antecipadamente prevista pela Mesa.
Foi certamente a constatação da importância e da gravidade desta proposta, que se reporta à matéria dos agrupamentos parlamentares e que surge, pela primeira vez, formalizada por parte do PSD como matéria nova, que esteve na base da sugestão do PS já apresentada à Câmara.
Pela nossa parte, pensamos ser inteiramente fundamentada a necessidade da realização de uma conferência de líderes para preparar os futuros trabalhos, tendo em atenção a gravidade da matéria que resta apreciar e a nova alínea agora apresentada pelo PSD.
Com efeito, o Sr. Presidente da Assembleia não podia prever esta situação que agora surgiu e daí que o requerimento apresentado pelo PS tenha razão de ser e por isso o secundamos. Assim, entendemos que, antes de se entrar no campo de decisões tão importantes, deve haver, previamente, por parte da conferência de líderes uma consideração desta matéria nova e da restante.

A Sr.ª Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr.ª Presidente, gostaria de dar a conhecer a nossa posição em relação à proposta adiantada pelo PS.
Estamos de acordo com a proposta que o PS acaba de fazer e na nossa opinião ela vem ao encontro das trocas de impressões que na conferência de líderes se têm verificado a propósito das matérias cuja discussão se vai iniciar.
Estou certo de que o Sr. Presidente não deixou qualquer indicação à Mesa nesse sentido porque não se apercebeu que íamos entrar na discussão deste conjunto de matérias, mas os Srs. Deputados Correia Afonso, Soares Costa e Joaquim Marques podem testemunhar que existiu este entendimento na conferência, isto é, a sessão final sobre as alterações ao Regimento será antecedida de uma troca de impressões a terem lugar na conferência alargada, na qual será também feita a avaliação de várias matérias.
Creio que chegou o momento de se proceder a essa troca de impressões e, nesse sentido, sugiro à Sr.1 Presidente em exercício o contacto com o Sr. Presidente da Assembleia da República, para que ele possa confirmar ou não o que acabo de expor. Considero que a última sessão plenária acerca das alterações ao Regimento deve ser precedida de uma ponderação sobre as graves matérias a decidir, a qual deve ter lugar numa conferência alargada. Assim, não dispensamos a concretização desta ideia e por isso pensamos que a Sr.ª Presidente em exercício deverá contactar o Sr. Presidente e informá-lo da situação criada.

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, tendo em atenção a sugestão do Sr. Deputado Carlos Brito, gostaria de conhecer a resposta da Mesa à sugestão feita, porque em função dessa resposta a interpelação que me propunha fazer pode deixar de ter sentido.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, repito o que disse há pouco, ou seja, na falta de consenso para alterar a ordem de trabalhos continuaremos o debate. O Sr. Deputado Lopes Cardoso quer continuar a sua interpelação?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, prescindo, neste momento, da minha interpelação, reservado-me o direito de, posteriormente, interpelar a Mesa, se houver razões para isso.

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, apresentámos esta nova proposta de alteração que consiste em prorrogar para o fim da sessão legislativa a extinção dos agrupamentos parlamentares, julgando que estávamos a ter uma atitude que merecia a compreensão da oposição. No entanto, verifico que esta proposta está a ser transformada em mais um incidente para discutirmos mais coisas - que não estou a ver quais - e, portanto, não damos o nosso consenso para se pôr termo a esta sessão sobre as alterações ao Regimento.
Os senhores têm direitos potestativos!... Peçam a interrupção da reunião - aliás, já foi feita uma interrupção para reflectir -, façam como entenderem, mas nós não damos o nosso acordo a que se ponha termo a esta sessão de trabalho, pois queremos trabalhar e acabar a revisão do Regimento!, coisa que não sei se os senhores querem ou não... Portanto, não há motivo nenhum para terminarmos os nossos trabalhos neste momento.
Sr.ª Presidente, já estamos há cerca de dez minutos em interpelações sucessivas e nós queremos continuar a sessão. No entanto, repito, se algum grupo parlamentar entender que deve interrompê-la, socorrendo-se dos seus direitos potestativos, ninguém lho pode negar, mas nós não estamos de acordo em pôr termo a esta sés-

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são de trabalho porque o que precisamos é de continuar a trabalhar para ver se acabamos a revisão do Regimento, porque, de facto, isso está a ser difícil.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, é óbvio que não há consenso para que a sessão seja interrompida. Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, para interpelar a Mesa.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, nós também queremos trabalhar...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Então trabalhem!

O Orador: - ... mas temos de saber com que meios e em que termos vamos trabalhar.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ontem, na conferência de líderes, foi distribuída uma lista dos artigos não discutidos em relação à questão dos agrupamentos parlamentares, artigos não discutidos em relação a outras matérias, artigos que foram discutidos mas não votados e artigos discutidos, votados e aprovados. Este trabalho foi feito para que toda esta matéria fosse tratada numa sessão especial que se realizará no próximo dia 25.
O que está agendado para hoje é, desculpem-me a expressão, fazer o 1.º round do Regimento, isto é, chegar até ao fim e ver se acrescenta ou não alguma disposição; no final da sessão haverá uma conferência de líderes para fixar novos tempos e modos para tratar o novo documento. Portanto, a ordem do dia acabou,...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não acabou, nada!

O Orador: - ... segundo a nossa concepção e aquilo que ouvimos na conferência. Não é o Sr. Deputado Silva Marques - que, aliás, não esteve presente na conferência de líderes - que vem dizer o que é e o que não é. Ele quer trabalhar à maneira dele e eu quero trabalhar à maneira do Parlamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Só em interpelações já estamos há quase meia hora! Isto, realmente, não tem conserto!

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, retomando o sentido das palavras do Sr. Deputado Narana Coissoró, lembraria que, hoje, antes de ter aberto a sessão, o Sr. Presidente, em intervenção que não está registada mas que foi ouvida por todas as bancadas, informou a Câmara da referida decisão da conferência de líderes. Mais, informou da necessidade reconhecida consensualmente de, ainda hoje ou em data oportuna, antes da próxima quarta-feira se realizar uma conferência de líderes sobre a matéria em debate. Penso que esse encontro se justifica. Se entrarmos agora na discussão dos aspectos mais controversos do Regimento, estamos a pôr em causa o objecto da referida reunião de líderes alargada.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Evidente!

O Orador: - Não de trata de haver ou não consenso no Plenário, mas sim de respeitarmos ou não um compromisso assumido em conferência de líderes - que, do nosso ponto de vista, não pode ter outra leitura. Trata-se, por outro lado, de respeitarmos a vontade do próprio Presidente que, obviamente, não pode estar sujeita às vontades mais ou menos histriónicas do Sr. Deputado Silva Marques. A Assembleia da República é dirigida pelo Sr. Presidente de acordo com as suas decisões e não de acordo com as suas decisões de um qualquer deputado!...
É apenas neste sentido que fazemos a nossa interpelação à Mesa, tentanto repor a razão onde ela deve estar, ou seja, nas palavras proferidas pelo Sr. Presidente no início desta sessão e no quadro do seu verdadeiro conteúdo. Temos de encontrar um modus faciendi que permita a todos superar a questão da revisão do Regimento.
Penso que não valerá a pena estarmos a criar incidentes processuais. Pela nossa parte, é possível verificar que hoje já nada se vai adiantar com a discussão do Regimento. Tentemos, por acordo, aproveitar este tempo uma hora e dez minutos para nos sentarmos em conferência de líderes alargada e começarmos, na sede própria, permita-se-me a expressão, a «partir a pedra» que falta partir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Marques.

O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, queria dar o meu contributo em termos do que se passou ontem na conferência de líderes relativamente a esta questão.
Com toda a franqueza, a ideia com que fiquei a respeito desta questão foi a de que hoje esgotar-se-iam os termos disponíveis para cada grupo e agrupamento parlamentares até às 13 horas e depois de esgotado esse tempo, dado que já está agenciada para a próxima quarta-feira a discussão e votação final global do Regimento, então, teria de haver, antes de quarta-feira, uma conferência de líderes para se definirem os tempos que seriam atribuídos a cada partido para essa discussão. Mas - e, peço desculpa de o dizer, mas não ouvi - relativamente às matérias que estavam ou não para discutir nada se falou e os tempos ainda disponíveis serão gastos hoje, pois, de acordo com a agenda, temos duas horas de debate. Ora, começando a sessão cerca das 10 horas seria natural que até às 13 horas se esgotassem os tempos; depois, haveria necessidade de se fazer uma reunião da conferência de líderes para fixar os tempos, que seriam tempos de acréscimo em relação ao tempo global atribuído. Este foi o meu entendimento.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, suponho que esta interrupção ajudará a esclarecer esta situação.

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Sr. Deputado Joaquim Marques, a última reunião para discussão e aprovação do Regimento foi pensada só em função das matérias e desde logo para um exame das figuras de fiscalização, ou seja, a questão das interpelações, as interpelações mais ligeiras, etc., assunto que, aliás, foi tratado em conferências de lideres anteriores. Creio que ontem na conferência de líderes houve referências a esta questão embora não tão explícitas, visto que a questão já estava adquirida. Mas, repito, esta questão foi só pensada em função das matérias e não em função dos tempos. É claro que depois chegou--se à conclusão de que era necessário, digamos, prolongar a discussão e, então, considerou-se um aumento dos tempos, mas nessa base. Portanto, a questão dos tempos que o Sr. Deputado invoca foi realmente referida ontem no sentido de se esgotarem hoje os tempos existentes, mas na presunção de que não se entraria na discussão das matérias decisivas, que, naturalmente, deverão ser objecto de reflexão final.

O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr. Deputado, como lhe disse, a ideia com que fiquei da nossa troca de impressões de ontem foi a de que, por um lado, hoje se esgotariam os tempos disponíveis - e podem esgotar-se das formas mais diversas - e, por outro, que a próxima reunião da conferência de líderes, a realizar necessariamente antes de quarta-feira, seria para acertar os tempos finais atribuídos para a discussão final do Regimento. Aliás, está presente o Sr. Deputado Jorge Sampaio, que esteve presente ontem nas reuniões da conferência de líderes e que talvez, em relação a este assunto, queira dar algum contributo útil.

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Meu Deus, há meia hora que estamos em interpelações!!...

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - V. Ex.ª não invoque o nome de Deus em vão, porque a respeitabilidade é muito grande, portanto, não vale a pena invocar o nome de Deus em vão.
Sr.ª Presidente, a minha visão dos factos é a de que há dois problemas que me parecem completamente distintos e peço, desde já, desculpa por ter de ser um bocadinho mais detalhado.

O primeiro problema é o de saber o que se vai fazer na última reunião para discussão do Regimento, que está marcada para o próxima quarta-feira. Quando ontem, em conferência de líderes, se pretendeu saber qual a distribuição de tempos para essa reunião, levantei o problema de que isso era totalmente impraticável, visto não se poder estabelecer tempos sem saber qual a matéria sobrante para esse último dia. Penso que isto foi aceite por todos e, então, ficou determinado que haveria uma reunião de representantes dos grupos parlamentares para o estrito objecto de definir os tempos em função do que acontecesse hoje e perante a necessidade do que deveria então acontecer nesse último dia. Isso é o elemento «tempo» e o elemento «último dia».
Questão diversa desta é a seguinte: quando discutimos na passada sessão as matérias relativas á fiscalização do Governo e outras correlacionadas como interpelações e matérias afins, entendeu-se que esta matéria
deveria ser ponderada fora do Plenário, por todos os representantes dos grupos e agrupamento parlamentares que a têm estado a discutir, com vista a atingir possíveis equilíbrios entre a utilização destas figuras, no sentido de ser ou não possível chegar a um consenso diferente daquele que não é consenso nenhum e que está aqui a acontecer.
O Sr. Presidente da Assembleia da República indagou sobre se tinha ou não havido alguma discussão sobre essa matéria e foi-lhe dito, por mim, que o simples contacto bilateral não tinha levado a nenhuma conclusão que pudesse ser relatada, mas que esses contactos continuariam. No final da reunião, o Sr. Presidente, digamos assim, estimulou os grupos parlamentares no sentido de terem uma reunião relativa à matéria que ainda estava pendente, e curiosamente hoje, antes de iniciar esta sessão, anunciou e estimulou, mais uma vez, a necessidade de se fazer essa reunião - que não tem nada a ver com os tempos, e nisso o Sr. Deputado Joaquim Marques tem razão - para ver se haveria ou não outras saídas para esta questão. Portanto, aqui há dois problemas completamente distintos.
É inteiramente correcto dizer que tem de haver uma reunião de representantes dos grupos parlamentares para se fixar o tempo para a próxima sessão de quarta--feira. Continua, pois, de pé o desejo formulado pelo Sr. Presidente, e que eu subscrevo inteiramente, de que seria útil os vários grupos parlamentares terem uma reunião, que poderia ser hoje, dada a matéria que se está a aproximar, e, se calhar, haveria toda a vantagem em se fazer já para que as pessoas que têm estado a trabalhar nesta matéria possam fazer um balanço final e, possivelmente, chegarem a plataformas diferentes ou até não chegarem a plataforma nenhuma, e então isto depois é muito rápido... Obviamente que se tirarão as conclusões que há que tirar, porque nós ainda estamos na esperança, por mais ingénua que ela possa parecer, de que é possível ter uma meditação institucional, digamos assim, sobre a questão do Regimento da Assembleia da República.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa entrou em contacto com o Sr. Presidente da Assembleia da República e, por sua sugestão, que nós inteiramente apoiamos, cremos que se pode continuar o trabalho com matérias que não são muito controversas, pois há ainda artigos a discutir que podem considerar-se dos menos controversos, e reservar-se-ia a matéria mais controversa para a reunião posterior à conferência de líderes.
Portanto, penso que podemos continuar os nossos trabalhos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, para podermos continuar os nossos trabalhos gostaria de saber qual é, no entender do Sr. Presidente, a matéria controvertida e a não controvertida.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, não se trata de saber qual a posição do Sr. Presidente mas, sim, a que resulta da última conferência de líderes e do entendimento que se lhe dá.

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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não é esse o nosso entendimento, mas, se é o entendimento que a Mesa sufraga, pelo menos precisamos de saber -repito- o que é que a Mesa entende por matéria controvertida e não controvertida.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faca Favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, é verdade que é muito subjectivo saber quais as alterações que são controversas e as que não o são, pois aparentemente todas o são. O que interessa é aproveitar esta sessão de trabalho, e estou convencido de que os Srs. Deputados da oposição não põem em causa este ponto, ou seja, o interesse em continuar esta sessão. Sendo assim, a minha sugestão é a de que se abordem todos os artigos, salvo os que concernem aos agrupamentos parlamentares, utilizando o documento preparado pela Mesa.
Julgo que esta proposta de certo merece a vossa concordância, a não ser que os meus amigos não queiram continuar a sessão, mas então digam-no, porque nós queremos. Se o vosso problema é esse, então digam-no! Podem até pedir interrupções da reunião, pois todas somadas fazem com que os trabalhos estejam interrompidos até à hora do almoço. Nós queremos aproveitar a sessão e, se os meus amigos não querem, então digam-no. Mas, se querem trabalhar, então utilizemos o documento proposto pela Mesa, de que, aliás, dispõem há vários dias.
Queremos, pois, continuar o debate e fazemos um apelo aos partidos para que aproveitemos a sessão de hoje, porque não faz sentido que a Assembleia reúna para, repentinamente, se chegar à conclusão de que, afinal de contas, a sessão não deve continuar. Isso significa que não temos reflectido o suficiente e que não temos utilizado os dias anteriores a esta reunião para reflectir convenientemente. Ora, todos nós reflectimos e, se há necessidade de novas conversas, teremos tempo para elas depois de terminar esta sessão. Aproveitemos esse tempo, pois às vezes não o aproveitamos convenientemente! Essa é a verdade!

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa entende, por unanimidade, que os trabalhos podem continuar, pois há matérias que não são controversas, nomeadamente as que não se referem a grupos e agrupamentos parlamentares. Penso, pois, que podemos continuar a discussão da alínea j) do artigo 5.º

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Silva Marques, desde há cerca de uma hora, adoptou um novo disco: «Nós queremos trabalhar e a oposição não deixa!»

O Sr. Silva Marques (PSD): - E não deixa!

O Orador: - Todos estamos aqui a tratar exactamente o que vamos discutir. Porque o Sr. Deputado Silva Marques tem atrás de si colegas que o apoiam, que o aplaudem, que dizem «ah, eh, ih, oh, uh»,...

Risos.

... todas as vezes que ele abre a boca, e também porque vê aqui uma câmara de televisão a filmá-lo (naturalmente, logo à noite vai dar isto para toda a gente ouvir que o Sr. Deputado Silva Marques do PSD quer trabalhar e os outros, deputados da oposição, não querem), se julga com à vontade para dizer tudo quanto lhe vem à cabeça. É realmente lastimável que no Parlamento, onde estão deputados eleitos e responsáveis, no meio de um debate, o Sr. Deputado Silva Marques se permita dizer «eu quero trabalhar e os outros não deixam».
Não percebo como é que V. Ex.ª, Sr.ª Presidente, deixa girar esta disco roufenho que, manifestamente, também é um insulto a V. Ex.ª, porque dá a impressão de que também esta a colaborar no jogo em que todos os partidos aqui representados não querem trabalhar e só o deputado Silva Marques, com os seus rapazes à volta, quer trabalhar.

O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Dobre a língua, Sr. Deputado!

A Sr.ª Presidente: - A decisão da Mesa é a de continuar os trabalhos.

O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que fim?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr." Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Começaria por dizer, Sr.ª Presidente, que o PS quer trabalhar e não «atamancar» os trabalhos, o que são coisas diferentes. E o PS não quer continuar a reunião! Já fizemos essa sugestão. Não precisamos das injunções do Sr. Deputado Silva Marques, que pretende arvorar-se em dono desta Assembleia.
Entendemos que se deveria interromper a sessão para preparar convenientemente a reunião, dentro do espírito da proposta do Sr. Presidente. E, nesse sentido, apresentamos essa sugestão com a ingenuidade suficiente de admitir que ela mereceria o consenso da Assembleia. Não mereceu e, perante a situação criada, precisamos de reflectir. Por isso, o Grupo Parlamentar do PS pede meia hora de interrupção dos trabalhos.

A Sr.ª Presidente: - É regimental. Está concedida. Os nossos trabalhos são interrompidos e retomados às 12 horas e 37 minutos.

Eram 12 horas e 7 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 12 horas e 45 minutos.

Informo os Srs. Deputados de que está convocada um conferência de líderes para amanhã, às 15 horas e 30 minutos, na antiga sala do Conselho de Ministros,

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a que assistirão, também, os Srs. Deputados que têm tido maior intervenção na discussão do Regimento.
Srs. Deputados, vamos iniciar os trabalhos com a discussão do artigo 5.º, alínea j).
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, julgo que valeria a pena, para se dar algum conteúdo útil aos trabalhos da manhã e correspondendo também ao espírito que presidiu à marcação da conferência para amanhã, à tarde, tentarmos encetar a discussão de um artigo menos controverso.
De acordo com as notas que tenho, há um artigo proposto pelo PSD, que é o n.º 80.º-A - Ordem no uso da palavra, em relação ao qual as objecções se situam ao nível da redacção. Talvez pudéssemos analisá-lo agora, pois parece não ser daquele s que reúnem grandes oposições, dado que todos -creio- estamos de acordo quanto ao essencial do que é proposto.
E, sendo assim, talvez pudéssemos t ratar desse problema agora, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, se há consenso a Mesa não se opõe a que se passe à discussão do artigo 80.º - A, muito embora entenda que se pode proceder á discussão de artigos que são controversos. O que estaria excluído seria a matéria relativa a grupos e agrupamentos parlamentares, que é a mais controversa desde o início.
Porém, se há consenso - e presumo que sim - a Mesa não se opõe à sugestão e peço ao Sr. Secretário que proceda à leitura do artigo 80.º-A.

Foi lido. É o seguinte:

A palavra é dada pela ordem das inscrições, mas o Presidente promoverá de modo que não intervenham seguidamente, havendo outros inscritos, deputados do mesmo grupo parlamentar ou membros do Governo.

Srs. Deputados, está em discussão.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, quando trocámos as primeiras opiniões sobre este artigo, tivemos oportunidade de lembrar ao PSD que o sentido geral da proposta nos parecia positivo em virtude de garantir a consagração da regra da alternância nas intervenções.
Sucede que a inscrição deste artigo 80.º - A se prende com outras disposições do Regimento, designadamente com o artigo 73.º, n.º 5, em que a questão já estava parcialmente contemplada.
Pondo de parte, neste momento, a questão de saber se vamos deixar o problema no n.º 5 do artigo 73.º ou se vamos tratá-lo no artigo 80.º-A, sugeria ao PSD o seguinte: estariam os senhores de acordo em que a redacção do actual n.º 5 do artigo 73.º pudesse ser a do n.º l do artigo 80.º-A sem, nesta sede, estarmos a questionar o problema dos grupos e agrupamentos parlamentares.
A ser assim, poderíamos optar pela seguinte redacção:

A palavra é dada pela ordem das inscrições, mas o Presidente procederá de modo que não intervenham seguidamente dois deputados do mesmo partido havendo outros inscritos ou membros do Governo.

Deixaríamos, por conseguinte, a questão dos grupos e agrupamentos parlamentares na medida em que quem se inscreve não são os grupos mas os deputados individualmente.
Penso que, desse modo, o objectivo que o PSD pretenderia ver consagrado -suprir a lacuna de uma disposição específ1ica do Regimento quanto à necessidade de também prever, em relação ao Governo, o esquema de alternância- estaria ultrapassado e creio que, a ser assim, nós estaríamos em condições de dar o nosso consenso sobre a aprovação deste n.º 1.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Pinto.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Prescindo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: - Para o mesmo efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não pode, ainda que com as alterações propostas pelo Partido Comunista, dar o acordo à proposta do PSD, porquanto ela altera radicalmente o regime do uso do direito de defesa, o que, para nós, é inaceitável.
O Regimento actual diz que «a palavra é dada pela ordem das inscrições ou no caso do exercício do direito de defesa».
A eliminação dá-se em concordância com a disposição de um outro artigo -de que agora me não recordo- que diz, taxativamente, que é ao Presidente que compete dar a palavra para o exercício do direito de defesa quando muito bem o entender.
Pensamos que há ausência de nexo, porquanto o direito de defesa, se se justifica, deve ser exercido imediatamente e não é pela introdução deste dispositivo que se vai obviar a um certo abuso da figura do «direito de defesa» que tem sido praticada na Assembleia e que radica noutras razões como, por exemplo, na supressão do direito de protesto, como várias vezes já o afirmámos aqui.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, creio que talvez não tenha sido suficientemente claro.
A questão do direito de defesa encontra-se devidamente regulamentada nos artigos 2.º e 4.º Ou seja, quando está em causa a perda do mandato é que se coloca o problema do direito de defesa.
Abusivamente - creio eu - temos usado a palavra «direito de defesa» quando, na verdade, nos estamos a reportar à figura de «reacção a ofensas à honra e consideração» prevista no artigo 89.º

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O direito de defesa é um direito específico, que tem a ver com situações estatutárias dos deputados - a perda do mandato, por exemplo -, prevendo o modo de o deputado se defender perante o Plenário.
Portanto, o artigo 89.º não é tocado, Sr. Deputado.
Penso que a redacção do PSD pode ter outro objectivo, embora o não alcance, porquanto, se o artigo 89.º se mantém, fica claro que igualmente se mantêm os artigos 2.º e 4.º e as disposições relativas ao modo como é exercido o direito de defesa, designadamente o n.º 4 deste artigo, que concede ao deputado posto em causa o direito de ser ouvido e de recorrer para o Plenário nos dez dias subsequentes, mantendo-se em funções até à deliberação.
Por sua vez, o n.º 4 do artigo 2.º permite ao deputado cujo mandato seja impugnado usar o seu direito de defesa perante a Comissão e perante o Plenário.
Portanto, é neste sentido que o direito de defesa deve ser entendido e não - provavelmente por questão terminológica - no sentido previsto no artigo 89.º

O Orador: - O Sr. Deputado tem, literalmente, razão. Mas a verdade é que é com uma interpretação distorcida da figura do «direito de defesa» que tem sido dada a palavra imediatamente para a reacção contra as ofensas à honra e à consideração, que o artigo 89.º prevê mas não fixa o momento da sua utilização.
Até agora tem-se admitido, por uma interpretação lata do direito de defesa, não apenas o direito de defesa stricto sensu mas também o direito de defesa quanto às ofensas à honra e à consideração incluído no disposto no artigo 79,º, que obriga no uso imediato da palavra.
Se esta precaução não for tomada, nada nos garante que não venha a vingar a interpretação dada pelo PSD e que o exercício do direito de resposta em relação a ofensas à honra e à consideração possa ser protelado, segundo o critério da presidência da Mesa, para data e momento que nada garante, à partida, qual seja.
E se estas reacções se têm sentido e devem figurar no Regimento, então têm, também, uma oportunidade que não deve ser dissociada do momento em que forem proferidas as declarações que lhe estiverem na origem.
Não era, seguramente, a pensar no direito de defesa stricto sensu que o PSD propôs esta alteração.
Não me recordo - e já sou deputado há alguns anos - de ter sido exercido aqui tal direito em defesa do mandato quando este é posto em causa.
Não era, portanto, esta a preocupação subjacente à proposta de alteração do PSD, mas sim a de continuar a interpretar o direito de defesa num sentido mais lato do que aquele que tem em termos literais no quadro do Regimento.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para um pedido de esclarecimento ou para uma intervenção?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Pode ser para uma ou outra coisa, Sr.ª Presidente. Só para clarificar dois ou três aspectos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O modo e os objectivos do PSD todos os conhecemos. O PSD tinha apresentado uma proposta para o artigo 89.º, que não chegou a ser considerada porque se esqueceram dela no texto inicial, a qual visava colocar na mão do Presidente a possibilidade de ser ele a decidir o momento do exercício do direito relativo às reacções sempre que se verificassem ofensas à honra e à consideração de qualquer deputado.
O facto de esta proposta não ter sido considerada vem confirmar o que se tem passado.
Nós não estamos, Sr. Deputado Lopes Cardoso - e peco-lhe que compreenda isto -, a defender a proposta do PSD. Pensamos, contudo, que, dentro de um espírito de abertura e para não estarmos sistematicamente a votar contra, podemos tentar algumas aproximações. E este era um dos tais artigos em que consideraríamos que, com algumas rectificações, seria possível uma certa aproximação.
É óbvio que também vemos os perigos que aqui referiu, mas o facto de a citada proposta do PSD não ter sido sequer aceite para discussão e de se ter confirmado a praxe de que a reacção a ofensas à honra e à consideração é exercida no momento seguinte à sua concretização e ainda o facto de ser claro, em termos de Regimento, que o direito de defesa dos deputados se encontra regulamentado nos artigos 2.º e 4.º parecer-nos-iam defesas suficientes.
É nesta conformidade que fizemos algumas considerações e manifestámos abertura, sem estarmos a defender o PSD. Se o PSD não aceitar as nossas sugestões, obviamente votaremos contra.

A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso pediu a palavra também para um pedido de esclarecimento?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, eu julgava que o Sr. Deputado Jorge Lemos me tinha feito um pedido de esclarecimento, por isso preparava-me para responder.

A Sr.ª Presidente: - É para interpelar a Mesa que pede a palavra, Sr. Deputado Jorge Lemos?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente. De facto, coloquei na disponibilidade de V. Ex.ª a qualificação da minha intervenção.
A Sr.ª Presidente: - Eu perguntei e pareceu-me ouvir que o Sr. Deputado iria fazer uma intervenção.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O que para mim é importante, Sr.ª Presidente, é que se possa clarificar esta questão. E, se afirmei à Mesa que era uma intervenção, reconverto-a em pedido de esclarecimento para permitir que o Sr. Deputado Lopes Cardoso possa tecer as considerações que lhe aprouver sobre a matéria.

A Sr.ª Presidente: - A Mesa entendeu que o Sr. Deputado estava a fazer uma intervenção e, nesta conformidade, inscreveu os Srs. Deputados Marques Júnior e Lopes Cardoso para pedidos de esclarecimento.
Faça favor, Sr. Deputado Marques Júnior.

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O Sr. Marques Júnior (PRD): - Muito obrigada, Sr.ª Presidente. Apenas desejaria que o Sr. Deputado Jorge Lemos dissesse onde pode existir um perigo real para o artigo 80.º - A, proposto pelo PSD, porquanto, do nosso ponto de vista, parece-nos conter um texto adequado, se bem que possa, efectivamente, em termos de uma certa sistemática do enquadramento do artigo, dizer-se que a epígrafe do artigo 80.º- A - e o pedido de esclarecimento é no sentido de saber se é esta a sua preocupação - quando diz «ordem no uso da palavra» tem a ver, de facto, com a eventual defesa da honra e, nesse caso, se tal aspecto podia eliminar, ou remeter para plano secundário, aquilo que neste momento é usual quando se trata de defesa da honra, que é dar--se imediatamente a palavra ao deputado ofendido. Devo declarar que não concebo que alguém possa defender tese contrária ao que se tem praticado nesta Assembleia.
Aliás, a proposta de artigo 89.º do PSD, que iria nesse sentido, creio que, neste momento, não está em discussão.
Mas, se não está em discussão a proposta de alteração do PSD relativamente ao artigo 89.º - e esta é a minha questão -, que considera que o momento da defesa da honra é decidido pelo Presidente e dessa decisão não havia recurso, o Sr. Deputado acha que, apesar de tudo, o facto de a epígrafe deste artigo ser a «ordem do uso de palavra» poderá, eventualmente, prejudicar a ordem natural de defesa da honra?

O Sr. Silva Marques (PSD): Quem vê o perigo é o Sr. Deputado!

O Orador: - Se efectivamente tal se verificasse, consideraria inaceitável a proposta. Caso contrário, devo dizer que este artigo me parece perfeitamente natural ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não diga uma coisa dessas, Sr. Deputado! Este artigo é horrível!

O Orador: - ... e até clarifica - no bom sentido -, nomeadamente o n.º 5 do artigo 73.º, cuja eliminação é proposta pelo PSD.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso para pedir esclarecimentos.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Deputado, antes de mais e porque a experiência mo demonstrou, devo dizer, em relação ao PSD, que «cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém».

Risos.

Por outro lado, ainda que interpretando o direito de defesa no seu sentido estrito, não se concebe que não seja dada prioridade ao deputado que o exerce, ainda que em tal sentido e, portanto, se suprima esta disposição. E o mesmo se pode dizer quanto, numa interpretação extensiva, se usa o mesmo dispositivo para defesa da honra.
Esta é a posição do Partido Socialista. Obviamente que o Partido Comunista tem o direito de ter posição diferente.
O Sr. Deputado Silva Marques, depois das declarações que fez esta manhã, terá de explicar «coincidências de votação». A nós não nos afligem tais coincidências, sejam elas com o PCP, com o PSD ou com o CDS. O problema com a votação do PCP é apenas do Sr. Deputado Silva Marques. Nós não temos esse problema e mantemo-nos na posição de recusar esta proposta do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, a não ser que deseje responder no fim, dado que há mais dois pedidos de esclarecimento.
Para um pedido de esclarecimento, tem então a palavra o Sr. Deputado Guilherme Pinto.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Sr. Deputado Jorge Lemos das duas perguntas que tinha para lhe fazer uma delas já foi mais ou menos enunciada pelo meu colega de bancada, deputado Lopes Cardoso.
A primeira é a seguinte: no artigo 4.º, onde se refere a «perda de mandato do deputado», diz-se que ele terá direito de usar da palavra nos termos do artigo 83.º
Acontece, porém, que com a alteração proposta peto PSD deixa de haver a ressalva, em relação aos tempos em que pode intervir o deputado, de o mesmo poder intervir em qualquer momento do debate para sua defesa, isto é, de poder, eventualmente, repetir a intervenção.
A outra questão é a seguinte: o PSD propôs, de facto, uma alteração ao artigo 89.º, em que, no seu n.º l, aditava a expressão «no momento que o Presidente determinar, sendo a sua decisão irrecorrível quanto às questões da defesa da honra».
Tendo-se chegado à conclusão de que esse artigo não era aceite na discussão porque não fazia parte do projecto original, gostaria de saber qual o significado que o Sr. Deputado dá ao debate, no sentido de com ele se clarificar a questão de o PSD não poder, amanhã, argumentar com as alterações que ora propõe, e que estão em discussão, em favor da ideia inicial que tinha de as defesas da honra serem quando o Presidente o determinar.
Com isto quero dizer que, fazendo a Assembleia doutrina com os seus debates, se não aceitou uma alteração no sentido de colocar «as defesas da honra quando o Presidente o determinar», não pode aproveitar, agora, a alteração a este artigo para o fazer.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, vamos ter de nos entender!
Quando eu sugeri, há pouco, que discutíssemos este artigo 80.º-A foi precisamente por considerar que ele era um dos menos controversos.
Nós também somos adeptos da regra das cautelas e consideramos, à partida, que o que vem do PSD é perigoso até nos demonstrarem o contrário.
O que está em causa, do nosso ponto de vista, é que este artigo está escrito de uma forma absolutamente inaceitável. O modo como está redigido até ofende a língua portuguesa. A questão de «promover as inscrições», «promover o ordenamento», são expressões que ofendem a nossa língua.

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Mas eu responderia aos Srs. Deputados Lopes Cardoso e Guilherme Pinto desta forma: quanto ao artigo 89.º, eu já disse há pouco que o que se passou neste Plenário, designadamente a não admissão da proposta do PSD, clarificou que, quanto a este artigo, se deve seguir o que sempre se fez, ou seja, se alguém se considera ofendido na sua honra e consideração, de imediato, o Presidente dá a palavra para sua defesa. É o que resulta do Regimento e deste debate.
Segunda questão: o direito de defesa stricto sensu está previsto nos artigos 2.º e 4.º do Regimento e não há propostas de alteração para o artigo 83.º, que para eles remete.
Há uma proposta de alteração para o artigo 80.º e depois passa-se para o artigo 86.º Logo, o artigo 83.º, que diz que «o deputado que exercer o direito de defesa nos termos dos artigos 2.º e 4.º não pode exceder quinze minutos no uso da palavra», mantém-se rigorosamente e é bem claro quanto ao tempo. O momento em que o usa está definido no artigo 2.º Chamo, para isto, a atenção do Sr. Deputado Guilherme Pinto.
O n. º 5 do artigo 2.º diz que «o prazo para a instrução no caso de ter havido impugnação não pode exceder 30 dias» e anteriormente dizia-se como é que o deputado se defende.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Se me permite interrompê-lo, Sr. Deputado Jorge Lemos, quero dizer-lhe que percebi, só que a questão não é essa, mas sim a de que, anteriormente, nós votámos a eliminação dos n.º* 2 e 3. Permito-me chamar-lhe a atenção para o n.º 2, onde dizia: «A palavra é dada pela ordem das inscrições, salvo no período de antes da ordem do dia, em que se observa o disposto no artigo 63.º, ou no caso do exercício do direito de defesa.»
Ora, como já eliminámos esta excepção à regra que se verificava no artigo, e não a incluímos agora na proposta do PSD, fica precludido que a pessoa que se sentiu obrigada a usar o direito de defesa não o possa fazer duas vezes seguidas. Esta é a questão. A excepção à regra contida no n.º 2 do artigo 79.º desaparece.

O Orador - Afinal, Sr. Deputado Guilherme Pinto, parece que estamos de acordo.
Consideramos que o artigo 89.º não foi tocado e, como tal, não há razão para ver nesta alteração qualquer referência a este artigo.
Se o PSD pensava isso, só a ele diz respeito. Mas a prova que o não pensava é que se viu forcado a apresentar, à última hora, uma alteração ao artigo 89.º, que não foi aceite. Isto tem de ser interpretado nestes termos.
Por outro lado, acerca do direito de defesa, creio já ter falado o suficiente. Não queiram os Srs. Deputados do PS pôr agora o PCP a defender uma proposta do PSD.
Tentei uma questão de consenso, com espírito construtivo, mas não me obriguem a defender uma coisa, que é um aborto, apresentada pelo Sr. Deputado Silva Marques!
A sugestão de redacção que fiz destinava-se a melhorar a proposta. Não me obriguem agora a sofrer as consequências desta «abortalhada» que é aqui metida.

A Sr.ª Presidente: - Há uma hora, chamei a atenção para o facto de serem 13 horas e sugeri que continuássemos os trabalhos até terminar a discussão deste artigo e não houve qualquer reacção negativa por parte das bancadas, pelo que vamos terminar a discussão do artigo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Acho que o Sr. Deputado Lopes Cardoso levantou um problema extremamente importante.
À primeira vista, poderia parecer que o artigo que estávamos a discutir era linear, estava absolutamente isento de qualquer dúvida, mas pode não ser assim. Isto porque o que está escrito é que durante o debate as inscrições devem ser registadas segundo os pedidos dos deputados e depois arranjadas de forma que um grupo ou agrupamento parlamentares não utilizem dois deputados um a seguir ao outro.
Aqui põe-se um problema quanto às figuras adjectivas, qual seja o de saber se, no meio de um debate, quando um deputado pede a palavra para defender a honra ou para protestar, se deve imediatamente interromper a ordem que estava já feita para enxertar nesse debate as figuras adjectivas da defesa da honra ou do protesto, etc., ou se o Sr. Presidente dá a palavra para estes efeitos quando quiser: isto é, pode seguir, por exemplo, os métodos francês, inglês ou italiano, em que todas essas figuras adjectivas são utilizadas no final do debate, como é também da praxe. Em França, os protestos, as defesas da honra, etc, não se enxertam no meio do debate, mas vão para o final do mesmo.
Diz o Sr. Deputado Jorge Lemos que aqui não há problemas desses porque isto está adquirido, ninguém quis mudar o artigo 89.º, há uma praxe e, segundo essa praxe parlamentar portuguesa, o Sr. Presidente dá imediatamente a palavra para defesa da honra ou outra qualquer figura regimental.
Como jurista, posso pensar de duas maneiras e pergunto: com a entrada em vigor do novo Regimento, subsistirão as praxes anteriores? É que algumas praxes foram reduzidas a escrito, quer dizer, o costume passou a ser lei escrita, como, por exemplo, o próprio artigo que estamos a debater. O artigo que neste momento estamos a debater era uma norma de praxe neste Parlamento, isto é, dois deputados do mesmo grupo ou agrupamento parlamentares não podiam usar da palavra um a seguir ao outro.
Mas entendeu o PSD - e bem - passar esta disposição costumeira para o Regimento e, amanhã, pode vir dizer «as praxes já acabaram», porque todas aquelas que queríamos manter reduzimos a escrito, aquelas praxes que não foram reduzidas a escrito não podem subsistir. Por isso, a defesa da honra, os protestos, etc., seguirão a interpretação que o Presidente der ao artigo 89.º, isto é, ou dá imediatamente a palavra, como agora, ou dá no decurso do debate ou no fim do mesmo, ou seja, dá-a quando quiser.
Por isso, desde já, é necessário também fixar por norma, ou pelo menos nas actas - e é o que aqui estamos a fazer-, se, para futura interpretação, as figuras adjectivas são imediatamente intercaladas, como actualmente sucede, ou se esta praxe vai acabar, para depois se adoptar a uma nova interpretação do

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artigo 89.º É bom que isto fique claro, é bom que fique no Diário, para que amanhã não haja tergiversações sobre este problema.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, volto a dizer que não estou a defender a proposta do PSD, mas o que creio é que não se pode tentar, com base neste artigo, fixar um conceito limitativo. Isto por uma razão: se fosse colocada, como o Sr. Deputado Narana Coissoró agora colocou, a questão das figuras adjectivas no anterior artigo 79.º, n.º 2, e no actual artigo 80.º-A -e também aí não estão as figuras do protesto, do pedido de esclarecimento, etc.- poder-se-ia sempre entender que, já à luz do actual Regimento, os pedidos de esclarecimento, etc., teriam de ficar para o fim do debate.
Ora bem, entendo que está adquirido no actual Regimento que as figuras adjectivas, designadamente os pedidos de esclarecimento, os protestos e a reacção contra ofensas, à honra ou à consideração, serão produzidas a seguir à intervenção que as motivou. Não pode ser de outra maneira, excepto se houver uma disposição, como a que o PSD queria, no sentido de disponibilizar o direito para ser o Presidente a fixá-lo na altura que entendesse. Esse preceito não foi aceite, ou seja, o Plenário confirmou a interpretação sempre utilizada, sobre isso não pode haver qualquer dúvida. O PSD pode votar o que entender, mas não pode é pôr em causa que os pedidos de esclarecimento, os protestos, os contraprotestos e as reacções contra ofensas à honra ou à consideração são produzidos imediatamente a seguir às intervenções que os motivaram.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Os pedidos de esclarecimentos não.

O Orador: - Isso está adquirido, Sr. Deputado Narana Coissoró.
Em segundo lugar, pensamos que a redacção proposta para o artigo é má. Fizemos uma sugestão para a melhorar e vamos ver o que é que o PSD diz sobre isso.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, não tenho as certezas que V. Ex.ª tem.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Eu tenho!

O Orador: - Não tenho nenhuma dúvida quanto aos pedidos de esclarecimento, até pela própria natureza das coisas. É óbvio que se peco um esclarecimento é para ele ser dado imediatamente e não no fim do debate, porque nessa altura já não tem interesse nenhum. Agora, quanto aos protestos, contraprotestos, defesas da honra e explicações, tenho as maiores dúvidas ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Eu não tenho!

O Orador: - ... se, pela própria natureza das coisas, têm de ser feitas imediatamente. Aliás, comparando as legislações de vários parlamentos, verificamos que na sua grande maioria deixam o exercício destas figuras regimentais para o fim dos debates, razão pela qual não tenho nesta questão, tantas certezas como o Sr. Deputado. Muitas vezes também me aborreço quando um debate é constantemente interrompido em virtude de falsas defesas da honra, explicações, protestos e contraprotestos, mas outras vezes pode haver razão para se usar essas figuras regimentais imediatamente.
É por isso que me parece melhor deixar essas questões ao critério do Presidente da Assembleia da República. V. Ex.ª diz que está adquirido, o que não vou rebater. Agora, eu é que não julgo que esteja adquirido. Se V. Ex.ª entende que está adquirido, é consigo, mas, repito, eu não entendo assim. Amanhã não poderei argumentar que está adquirido porque não tenho nenhuma base legal no Regimento que o diga. Se está adquirido em virtude das praxes, então o novo Regimento poderá revogá-las e passá-las a escrito.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: De facto, esta discussão das alterações ao Regimento tem sido uma sucessão de surpresas, tão surpreendentes que tocam as raias do absurdo.
No entanto, não quero deixar de fazer uma pequena observação, porque, embora demos às coisas a importância que elas devem ter, apesar de tudo, ouvimos e vemos e não há motivo nenhum para tingirmos o contrário.
Gostaria de dizer aos Srs. Deputados do Partido Comunista que estão em acção que durante toda a sessão de hoje a vossa linguagem, dirigida directamente à minha pessoa, tem sido de uma baixeza tal que não me merece comentários. Os senhores não têm vergonha política -o que já se sabia-, mas também não têm vergonha moral, porque se a tivessem não procediam dessa forma.
De qualquer modo, continuem, porque também não acredito que haja para vós qualquer hipótese de emenda.
Relativamente ao assunto em si para quem o quiser discutir seriamente, os dados do problema são estes: nunca nos passou pela cabeça que pudesse ter lugar a discussão que os Srs. Deputados estão a travar entre vós há mais de meia hora. A interpretação autêntica, a boa, a natural, foi a que foi dada em primeiro lugar pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, e nem podia ser outra.
Só vos quero chamar a atenção para o seguinte: se isto acontece com um artigo de consenso, que foi escolhido por vós mesmos, imaginem o que não acontecerá com o resto.
Por isso, Srs. Deputados, não temos ilusões sobre o que se está a passar.
O Sr. Deputado Narana Coissoró acabou de nos dar uma lição europeia, que, devo dizê-lo, não esperava, e, de facto, é como ele diz. Também eu já aqui tinha dito - ele é que não devia estar presente- que até no próprio Parlamento italiano, exemplo que escolhi por os italianos serem muito parecidos connosco, a defesa da consideração faz-se no fim do debate, que pode decorrer em mais do que uma sessão.

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Mas, pelos vistos, somos mesmo diferentes dos italianos e o Sr. Deputado Marques Júnior até dizia há pouco que não lhe passava pela cabeça que a pessoa ofendida não pudesse responder logo. Claro, nós temos o coração na boca! É assim mesmo!
É por isso que o nosso Parlamento funciona tão devagar, como se constata.
Penso que a lição europeia do Sr. Deputado Narana Coissoró deve inspirar-nos a todos. Creio que temos de começar a preparar uma nova revisão do Regimento, e essa a sério.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Ah, esta não foi a sério!...

O Orador: - É uma revisão à europeia, Sr. Deputado! Quer que faça um pequeno comentário político? É que todos nós ainda estamos a sair do PREC (processo revolucionário em curso).

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - O senhor é que está!

O Orador: - Nesse período, Sr. Deputado, uns com preconceitos, outros com ...

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Complexos!

O Orador: - ... falsos conceitos, outros sem nada, pura e simplesmente atribulados, íamos deixando a democracia ir por água abaixo.
Ainda hoje estamos a sair desse período. O próprio PSD está a sair desse período!

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Tenha humildade, Sr. Deputado!

O Orador: - Tenho plena consciência das deficiências do nosso Regimento e do buraco de verbalismo parlamentarista onde ainda hoje estamos. A revisão que estamos a fazer não nos tira ainda desse buraco, como se prova pela intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró.
Sr. Deputado, aqui os nossos vizinhos espanhóis, que também são latinos como nós, apesar de tudo, estão muito mais fora do buraco do que nós. Dou-lhe um exemplo: no Parlamento espanhol, um projecto de lei, vindo do Governo - porque lá é ao contrário, isto é, chama-se projecto de lei às iniciativas legislativas vindas do Governo e propostas de lei às iniciativas vindas dos deputados -, salvo se for requerido, tem a aprovação tácita na generalidade e a discussão na especialidade passa imediatamente a ser feita na comissão. É necessário que um deputado requeira para que o diploma seja sujeito previamente à discussão na generalidade, porque se não for requerido e decidido dá-se como tendo sido aceite genericamente e passa-se à discussão, na especialidade na comissão.
E ainda, Sr. Deputado, se a iniciativa legislativa vem do deputado, o diploma antes de ser apreciado na generalidade, porque esse diploma ao contrário daquele que provém do Governo não vai ser discutido na especialidade sem primeiro ser aprovado na generalidade, tem de vir acompanhado de um parecer ao Governo. Repare a diferença, Sr. Deputado.
Este exemplo que acabo de dar não tem nada a ver com o pessoalismo, nem com a circunstância de se estar com o coração na boca, de se estar ofendido e de se ter de falar já.
Imagine, Sr. Deputado, que estávamos a discutir a invasão do País e repentinamente nos começávamos a ofender uns aos outros. Deixávamos de discutir a defesa do País e passávamos a discutir a honra de todos nós.
O que o Sr. Deputado Narana Coissoró disse é exacto. Há coisas que se sobrepõem a todos nós e sobretudo à nossa, subjectividade, que, como sabe, por vezes é mais fruto das circunstâncias do que propriamente de razões profundas.
Por isso, Sr. Deputado, o debate no Parlamento de um país, de uma República soberana, não pode nem deve parar por razões estritamente pessoais, mas, infelizmente, aqui pára por razões de consideração e por interpelações. O nosso Parlamento está numa situação difícil, é preciso reconhecê-lo e isso torna-se evidente quando os erros regimentais não são corrigidos ou superados pela colaboração de todos nós.
Enquanto a oposição se aproveitar das debilidades da nossa arquitectura regimental, o parlamento português terá muita dificuldade em afirmar-se, mas nós, dentro das nossas possibilidade - e temos obrigações políticas e morais face aos eleitores que confiaram em nós e face ao País -, iremos a pouco e pouco fazer o que consideramos ser a nossa obrigação democrática, patriótica e de portugueses, ...

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Com essa abundância só faz é perder tempo!

O Orador: - ... porque queremos que o nosso país seja um país livre, democrático e onde nos orgulhemos de viver.
Sr. Deputado, isto não é fácil e o senhor não se deve rir, porque isto é muito a sério.
Sr. Deputado, sabe que o nosso país bateu o record das ditaduras mundiais? Sabe, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Não, Sr. Deputado, não sei!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe que o nosso país viveu sobre um regime de ditadura mais tempo do que qualquer outro país?

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Não sabia, Sr. Deputado! ...

O Orador: - Não se esqueça disso, Sr. Deputado!

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - O que é que isso tem a ver com o Regimento?

O Orador: - Essa é a questão decisiva para nós. Faremos o que for necessário para que o nosso país não volte a bater esse record, que nos deveria fazer pensar seriamente.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Isso que está a dizer é para nós ou é para as câmaras de televisão que estão ali atrás?

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O Orador: - O Sr. Deputado sabe por que é que os espanhóis não estão nesta situação perante questões regimentais e institucionais?

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Não sei! ...

O Orador - Sabe, Sr. Deputado, os espanhóis tiveram uma guerra civil, sofreram muito, mataram-se uns aos outros e aprenderam, não se esqueceram disso, não fizeram o folclore em que nos envolvemos no pós 25 de Abril, ...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - É um requiem completo!

O Orador: - ... de que, felizmente, saímos com a nossa ajuda, do PSD, com a do PS, do CDS e de todos aqueles que foram capazes de resistir a essa avalancha estúpida.

Risos do PS e da ID.

Não se riam, Srs. Deputados!
O Sr. Deputado Guilherme Pinto pode rir-se porque não estava aqui quando se deu o cerco da Assembleia da República, o senhor não estava cá, mas os deputados democráticos estavam e esses foram cercados.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Não estava cá, mas sabia o que se passava!

O Orador: - Srs. Deputados, se querem discutir as questões da democracia portuguesa - e as do Regimento são questões dessa natureza - discutam-nas frontalmente, comparem com a experiência das outras democracias, porque essa comparação não é apenas um direito, mas uma obrigação. Mas eu não tenho ilusões! ... Se perante um simples artigo escolhido por vós, os senhores têm estado numa discussão sem sentido e sem se entenderem há mais de meia hora - sobre um artigo de consenso! ... -, agora imaginem, Srs. Deputados, que os senhores se tinham de entender para governar o País ...

Risos do PS.

Que tragédia, Srs. Deputados! Mas, repito, não tenho ilusões, Srs. Deputados.

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - A gente sabe!

O Orador: - E mais: estou convencido de que mesmo esta pequena revisão do Regimento ...

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Que não é séria!

O Orador. - É séria mas é pequena, Sr. Deputado! Esta pequena revisão do Regimento, dizia, só terminará - esta é a minha convicção, mas os senhores terão oportunidade de demonstrá-lo - se fizermos outra noitada, e julgo que a teremos de fazer.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Ah! Ameaça de noitada! ... A noite, uma alma nova do PSD.

Risos.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa tinha proposto, e obteve consenso, continuar a reunião até ao final da discussão deste artigo na pressuposição de que ela estava a terminar, o que não acontece.
Sendo assim, julgo que poderíamos deixar fazer os pedidos de esclarecimento, dar a palavra ao Sr. Deputado Silva Marques para responder, e seguidamente fazermos o intervalo para o almoço.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, creio que esta matéria ainda vai levar algum tempo a discutir e já são 13 horas e 30 minutos. Já demonstrámos que há vontade, por parte dos parlamentares das diferentes bancadas, de discutir a sério o Regimento, ir ao fundo das questões, discutir e limpar o que há para limpar. Sugiro que, e para mais agora com esta ameaça de noitada, guardemos tudo o que temos para dizer para essa célebre noitada, uma vez que o PSD só é capaz de trabalhar em noitadas e em empreitadas. Não é com argumentos, mas sim com empreitadas! E a democracia não se faz assim, Sr.ª Presidente! A minha interpelação é no sentido de que a sessão seja suspensa neste momento, porque já passa meia hora para além da hora regimental do intervalo para almoço.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a minha intervenção foi exactamente no sentido de dar por finda a sessão antes do termo da discussão deste artigo, mas uma vez que são 13 horas e 30 minutos penso que será melhor encerrar a sessão, ficando inscritos para formular pedidos de esclarecimento na próxima sessão sobre alterações ao Regimento os Srs. Deputados Lopes Cardoso, Jorge Lemos e Guilherme Pinto.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr.ª Presidente, também me inscrevi para um intervenção.

A Sr.ª Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Fica registado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Presidente, não posso deixar de lamentar que se corte o debate a meio, mas o PS também não pode deixar de ser sensível ao adiantado da hora e dar o seu acordo para a interrupção dos trabalhos, sobretudo depois de o Sr. Deputado Silva Marques nos ter demonstrado, de forma tão veemente, que tinha razão quando dizia que «por vezes, o debate atinge as raias do absurdo». Ele estava a fazer o seu auto-retrato e sublinhou-o a traço grosso nesta sua última intervenção.

Aplausos do PS, do PCP e da ID.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, a proposta da Mesa era no sentido de continuar o debate até ao fim da discussão deste artigo, dando a palavra aos Srs. Deputados que se tinham inscrito para

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formular pedidos de esclarecimento. No entanto, atendendo ao adiantado da hora, julgo que será razoável interromper a sessão, embora cortando o debate, o que lamento, pois a Mesa propôs exactamente o contrário, embora aceite, pelas razões expostas, que se faça o intervalo para o almoço.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas nós aceitamos continuar a sessão!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ele quer trabalhar!...

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.1 Presidente, peco a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, tenho todo o interesse em que o debate deste artigo prossiga, porque gostaria de fazer alguns pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Silva Marques e também fazer uma intervenção. No entanto, penso que não devo sacrificar os meus colegas a esta minha exigência que tem por justificação o facto de não poder participar no debate deste artigo no reinicio da sessão.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O debate é só para a semana!

O Sr. Guilherme Pinto (PS): - Trabalhar sim, mas devagar!

O Orador: - Sendo assim, a minha interpelação não tem sentido e peço desculpa à Mesa, pois pensava que o debate continuava depois do almoço.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, relembro que a conferência de líderes terá lugar sexta-feira, às 15 horas e 30 minutos, na antiga sala do Conselho de Ministros, e que será alargada aos Srs. Deputados que têm participação mais activamente na discussão das alterações ao Regimento.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai anunciar os requerimentos e as respostas a alguns outros entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Américo de Sequeira e outros, Roque da Cunha e José Apolinário; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Maninho; à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Brito; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Neves Rodrigues; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (3), formulados pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro; ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado Rui Silva; ao Governo, formulados pelos Deputados Arons de Carvalho e Rogério Moreira; a diversos ministérios (7), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, e ao Ministério da Justiça, formulado 'pelo Sr. Deputado José Magalhães.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Maria Santos e Herculano Pombo, na sessão de 16 de Outubro; Linhares de Castro, na sessão de 29 de Dezembro; Gáudio Percheiro e outros, na sessão de 12 de Fevereiro; Luís Meneses e outros, na sessão de 18 de Fevereiro; José Reis, na sessão de l de Março; Fernando Gomes, na sessão de 15 de Março; Silva Pinto, na sessão de 17 de Março; José Magalhães e José Manuel Mendes, na sessão de 23 de Março; Vidigal Amaro, na sessão de 5 de Abril, e Roque da Cunha, na sessão de 6 de Abril.
Deram ainda entrada na Mesa os seguintes diplomas: projectos de lei n.ºs 246/V, apresentado pelos Srs. Deputados Joaquim Marques e outros, do PSD - Lei de bases da política familiar; 247/V, apresentado pelo Sr. Deputado Casimiro Pereira e outros, do PSD - Criação da freguesia da Ribeira do Fárcio, do concelho de Vila Nova de Ourem, e 248/V, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Lage e outros, do PS - Criação das áreas metropolitanas; propostas de lei n.º* 56/V - Autoriza o Governo a alterar a redacção de um artigo do Código de Processo das Contribuições e Impostos; 57/V, apresentada pela Região Autónoma da Madeira - Alteração do artigo 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 318-B/76, de 30 de Abril, referente ao sistema eleitoral para a Assembleia Regional da Madeira, e 58/V, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira - Aditamento ao artigo 77.º do Decreto-Lei n.º 318-B/76, de 30 de Abril.
Todos estes diplomas foram admitidos, baixando às competentes comissões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para intervir no período de antes da ordem do dia estão inscritos os Srs. Deputados Baptista Cardoso, Barbosa da Costa, João Amaral, Roleira Marinho e Rogério Moreira.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Baptista Cardoso.

O Sr. Baptista Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª* e Srs. Deputados: Sendo esta a primeira vez que tenho a honra de usar da palavra neste Plenário da Assembleia da República, quero aproveitar a oportunidade para saudar solenemente o Sr. Presidente, os restantes membros da Mesa e todos os Srs. Deputados e para a todos desejar trabalhos muito profícuos para bem do povo português, que representamos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Câmara Municipal de Santa Maria da Feira promoveu - em boa hora, diga-se! - nos passados dias 7, 8 e 9 de Abril as Primeiras Jornadas de Estudo sobre as Terras de Santa Maria, para o que contou com o alto patrocínio de distintos professores da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e a que aderiram outras figuras nacionais ligadas à cultura e muitos cidadãos oriundos das terras de Santa Maria da Feira que, espalhados pelos quatro cantos do nosso país, acorreram ao apelo da sua terra mãe para reviverem o seu passado.

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O êxito desta feliz iniciativa foi tal que os próprios participantes/convidados fizeram eles próprios apelos à Câmara promotora para que, num futuro tão próximo quanto possível, fosse dada sequência a estas Jornadas, então com menos temas, para poderem ser estudados com mais profundidade e poderem conduzir a conclusões mais precisas.
Ali foi dito pelo santa-mariano Prof. Doutor Eugênio dos Santos (passo a citar):

Um povo sem história é como um adulto sem memória. E, sem memória, nenhum de nós pode ter consciência plena da sua trajectória: do que foi, do que é, do que quer ser. [Fim de citação.]
Mas, afinal, o que foi? O que é? O que quer ser ... esse vastíssimo concelho de Santa Maria da Feira?
Primeiro: o que foi?
O primeiro documento que se refere a terras de Santa Maria tem a data de 977 e a primeira identificação de Feira com Santa Maria aparece em 1117, surgindo a designação de «concelho de Santa Maria» em 1284 e recebendo foral de D. Manuel I em 10 de Fevereiro de 1514.
Durante séculos foi «vila da Feira» e com a promoção a cidade, pela Lei n.º 39/85, de 14 de Agosto, retomou a designação de «Santa Maria da Feira».
Como prova da sua ancestralidade e riqueza histórica perduram inúmeros testemunhos monumentais, de entre os quais emerge altaneiro o majestoso Castelo da Feira, donde se diz terem partido soldados para combaterem ao lado de D. Afonso Henriques contra os exércitos de sua mãe, D. Teresa. A ser assim - e há bons historiadores a sustentarem esta tese -, ali teria nascido e dali teria partido o primeiro movimento libertador deste Portugal que amamos.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Segundo: o que é?
O concelho de Santa Maria da Feira é a maior potência social, económica, cultural e política do distrito de Aveiro e é o 15.º município no ranking nacional.
Tem uma área de 212 km, espalhados por 31 freguesias, entre as quais há uma cidade e seis vilas.
Tem mais de 120 000 habitantes e 93 941 eleitores, pelos censos de 1987.
O seu peso eleitoral faz com que dos quinze deputados eleitos pelo distrito de Aveiro três resultem dos votos dos eleitores santa-marianos.
As 174 agremiações, disseminadas por todas as freguesias, movimentam o concelho com acções de arte, cultura, desporto e recreio.
A densidade demográfica de 560 habitantes por quilómetro quadrado constitui uma média dupla da distrital e quíntupla da nacional.
Além disso, o concelho de Santa Maria da Feira é o maior centro mundial de transformação de cortiça, sendo também pujantes e representando considerável peso na economia nacional as suas indústrias de calçado, de metalurgia e metalomecânica, de brinquedos e outros artigos para bebés, de ferragens, de madeiras, de abrasivos, de papel, de lacticínios e outras, num total de 1269 empresas, que exportam cerca de 55 milhões de contos/ano e fazem entrar nos cofres do Estado cerca de 4 milhões de contos em impostos (apesar das isenções fiscais para incentivo à exportação e produção de bens de equipamento).
A esta dinâmica empresarial associa-se agora o investimento estrangeiro, atraído pela posição geográfica do Município e pela qualidade e capacidade de trabalho dos feirenses.
E este dinamismo não se limita ao crescimento do parque industrial. O mesmo se verifica também noutros sectores, nomeadamente no desenvolvimento urbano.
Ora, este disparar contínuo da indústria e da habitação, com índices de crescimento que ultrapassam os valores nacionais, provoca enormes problemas e, como diz o nosso povo: «Grande nau, grande tormenta!»
E a grande tormenta daquela grande nau é que, apesar de um tão valioso espólio e do enorme contributo para o que foi e o que é o nosso país, o concelho de Santa Maria da Feira não viu ainda tornarem-se realidades as contrapartidas que o seu passado faria supor e o seu presente plenamente justifica.
Alguns governos votaram aquelas gentes ao esquecimento, senão mesmo ao desprezo!...
O IX Governo (presidido, como é sabido, pelo Sr. Dr. Mário Soares), pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 47/85, reconheceu:
Que «o concelho se debate com graves problemas de saneamento básico» [...];
Que «há apenas uma reduzida percentagem de alojamentos e um menor número ainda com aparelhos sanitários ligados à rede pública de esgotos» [...];
Que «a coexistência de habitações e fábricas provocou uma forte desorganização da ocupação do solo, com evidentes prejuízos para a saúde pública» [...];
E concluiu que «esta situação, pela gravidade de que se reveste, não pode ser resolvida apenas pela autarquia».
Ora, o Governo, perante a constatação desta autêntica «calamidade pública», o que fez de concreto? Criou uma comissão, deu-lhe o nome pomposo de Comissão para o Saneamento Básico do Concelho da Feira, determinou que seria presidida por um representante do Sr. Primeiro-Ministro, estabeleceu o número de dez elementos para comporem essa Comissão, mas ... esqueceu-se de nomear as pessoas que integrariam a dita Comissão, pelo que esta nunca chegou a reunir.
O X Governo, do Sr. Prof. Cavaco Silva, concedeu ao Município de Santa Maria da Feira 150 000 contos «para acções urgentes no domínio do saneamento básico», o que permitiu o arranque das obras e incentivou a cooperação técnica e financeira entre as Câmaras Municipais de Santa Maria da Feira e de Vila Nova de Gaia.
O Governo, também presidido pelo Sr. Prof. Cavaco Silva, tem inscrita no PIDDAC/88 uma verba de 70 000 contos para continuação das ditas obras.
Terceiro: o que quer, então, este concelho ser ... ter?
Quer apenas aquilo a que tem direito e que ainda não conseguiu ser nem ter, ou seja, ser, efectivamente, reconhecido como «área em situação de calamidade pública», como se depreendia do preâmbulo da citada

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Resolução do Conselho de Ministros n.º 47/85, e ter a justa compensação pelo que tem dado ao todo nacional, à custa da degradação do seu ambiente e das suas águas e à custa da constante degradação das condições de vida dos seus habitantes - o que configura uma autêntica «calamidade pública».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quem nega aos mais de 120 000 habitantes do concelho de Santa Maria da Feira o direito à saúde? Ora, a fruição desse direito só será possível após a urgente construção do há muito previsto, mas sempre adiado, hospital regional de Santa Maria da Feira e com a garantia de acesso, também urgente, a esse precioso bem que é a água potável e que a grande maioria dos habitantes não tem! ...
Também o legítimo direito à educação, por parte dos filhos dos habitantes do concelho de Santa Maria da Feira, só pode ser exercido se o Governo - ao menos este Governo! - encetar a urgente construção de duas escolas preparatórias e secundárias, por anteriores governos prometidas e até anunciadas para breve, mas efectivamente nunca criadas.
Recordo aqui que há neste laborioso concelho muitas centenas de crianças que, em virtude de terem de ir assistir às aulas muito longe dos seus domicílios, nomeadamente nos diversos concelhos vizinhos, têm de abandonar os seus lares ao raiar da aurora, têm de passar todo o dia fora de casa e só podem regressar aos seus lares já de noite. E isto apesar do louvável esforço da Câmara que, só no último ano, despendeu cerca de 30 000 contos em subsídios de «transportes escolares».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No princípio, perguntava: «O que quer ser este concelho?»
A terminar, interrogo-me: este concelho, pelo que foi e pelo que é, não merecerá o que quer ser? E não deverá ter o que quer e precisa?
O povo do concelho de Santa Maria da Feira tem história e tem memória, tanto colectiva como individual. E tem a noção de quanto o seu passado e o seu presente representam para o futuro do País.
Aquele povo trabalhador, preocupado com o que tem para fazer em cada dia, quase não tem tempo para reivindicar e, por temperamento, ignora os que lhe fazem mal ou não fazem o que deviam, mas nunca esquece quem algum dia lhes fez algum bem.
Por isso, é grande a expectativa perante o actual governo do Prof. Cavaco Silva, em face da sua promessa de «cumprir a esperança» de melhores condições de vida.
Para o nosso povo, «o prometido ... é devido! ...» E a grande esperança da laboriosa população do concelho de Santa Maria da Feira é que ao menos este Governo - já que outros o não fizeram! ... - lhe reconheça finalmente os méritos passados e presentes e, no futuro próximo, lhe faça justiça ...

Aplausos do PSD e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, increveram-se os Srs. Deputados Barbosa da Costa, Vidigal Amaro, Lemos Damião e José Mota.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de me associar a boa parte da intervenção feita pelo Sr. Deputado do PSD, designadamente ...

Uma voz do PSD: - Só?

O Orador: - Tenham calma!

Como estava a dizer, associo-me a boa parte da intervenção do Sr. Deputado, sobretudo no que se refere às jornadas sobre a história de Santa Sana da Feira, nas quais tive a honra de participar, que foram uma iniciativa do mais profundo alcance, onde se trataram questões que têm a ver com as raízes da nossa nacionalidade, que tiveram uma primorosa organização e que, decerto, não deixarão de dar frutos proveitosos para toda a região e para o País.
Espero que da realização dessas jornadas tenham resultado uma colaboração maior entre as populações das chamadas terras de Santa Maria - que abrangem não só o actual concelho de Santa Maria da Feira mas também parte dos concelhos de Vila Nova de Gaia, Oliveira de Azeméis, Vale de Cambra e outros - para aprofundarem as suas raízes, discutirem a história que os liga e unirem esforços com vista ao aproveitamento das potencialidades que têm em comum.
Essa questão está a ser desde já implementada, através do abastecimento de água a Santa Maria da Feira a partir de Vila Nova de Gaia, concelho de onde sou oriundo.
Queria dizer ainda que comungo também das suas preocupações quanto às dificuldades do concelho, aqui apresentadas, no domínio da educação, pois é verdade que Santa Maria da Feira, apesar de ser um concelho dos mais desenvolvidos no País, ainda hoje tem de mandar alunos para outros concelhos, designadamente para Vila Nova de Gaia.
Espero que os futuros governos e este, se possível, resolvam os problemas que outros governos, em que também o PSD participou, não foram capazes de resolver.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Baptista Cardoso, quer responder já ou responde no fim dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Baptista Cardoso (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Queria começar por agradecer os cumprimentos que o Sr. Deputado apresentou à Câmara e muito especialmente também a mim, como deputado eleito.
Depois queria perguntar ao Sr. Deputado se sabe quem é que constituiu o IX Governo.
O Sr. Deputado teceu aqui algumas considerações contra o IX Governo e eu queria perguntar ao Sr. Deputado se o seu partido não participou nesse Governo, se não foi na altura do bloco central que o PSD fez parte do Governo juntamente com o PS. Esta a primeira questão.
A segunda questão, Sr. Deputado, refere-se ao hospital de vila da Feira. O problema arrasta-se há algum tempo e eu queria perguntar concretamente por que é que o Sr. Deputado, eleito por aquele ciclo eleitoral, não votou este ano verbas para serem inscritas no PID-DAC a fim de se construir esse hospital.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Deputado Baptista Cardoso, meu amigo e meu colega: interrogar V. Ex.ª não será protocolar, na medida em que não é muito comum, nesta Câmara, deputados da mesma bancada interrogarem-se entre si no hemiciclo. Fazem-no em outra sede.
No entanto, a sua intervenção suscita-me alguns pedidos de esclarecimento ou, pelo menos, leva-me a pedir-lhe que clarifique algumas das suas posições.
Referiu a certa altura V. Ex.ª uma coisa que me é muito sensível. Quando tocam na Pátria, tocam em num, e por isso mesmo eu não podia ficar calado.
Disse V. Ex.ª que parece ter sido na vila da Feira que começaram os movimentos libertadores da Pátria, ...

Risos do PCP.

... mas nessa altura não havia Pátria. Libertadores de quê, Sr. Deputado?
Quando V. Ex.ª diz que alguns historiadores até fundamentam que foi ali que nasceu, porventura, Portugal, não posso de maneira alguma ficar calado, porque para mim a Pátria não se discute. A Pátria respeita-se, Sr. Deputado, os santos é que se veneram!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O PSD está dividido!

O Orador: - A sua intervenção foi, de facto, de veneração a Santa Maria da Feira. Mas não venha pôr em causa a Pátria, nem a fundação da Pátria, por que isso é inquestionável, Sr. Deputado!
Para mim um povo sem convicções é um fraco povo e os nossos antepassados deram provas de que sabiam o que queriam e o que pretendiam.
Por outro lado, Sr. Deputado, quero deixar-lhe a seguinte recomendação: devemos orgulhar-nos de ser portugueses - e sei, porque o conheço bem e porque sou seu amigo, que o senhor também se orgulha disso -, mas queria pedir-lhe, concretamente, que se orgulhasse de ser português e de ter em Guimarães a terra berço da Pátria e ainda que visse nessa terra, em Guimarães, e disso se orgulhasse, o bastião do portuguesismo.

Risos do PS, do PCP, do PRD e da ID.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Agora os portugueses de primeira são os de Guimarães e os de segunda são os outros todos...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Mota.

O Sr. José Mota (PS): - Sr. Deputado Baptista Cardoso, ouvi com muita atenção a sua intervenção e congratulo-me pelo facto de vir aqui salientar algumas daquelas que são as maiores carências do concelho de Santa Maria da Feira, um concelho de facto importante para a economia nacional e que, pelos vistos, não tem tido do Poder a atenção que tanto justifica e que a sua gente merece.
Queria congratular-me essencialmente, pela sua coragem. De facto, o Sr. Deputado veio aqui fazer uma crítica violentíssima ao governo do seu partido e penso que isso é um acto de coragem que não acontece todos os dias.
Na verdade, não é possível esconder que o seu partido é aquele que em Portugal tem estado mais tempo no Governo. Também em Santa Maria, temos de concordar, há uma câmara que vem sendo presidida pelo PSD desde 1977. Por isso, o PSD não está, de facto, isento de responsabilidades em todas as carências que afectam aquelas gentes, ou melhor dizendo, que afectam as nossas gentes.
Gostaria de lhe pôr algumas perguntas, sendo a primeira a seguinte: o que pensa relativamente ao facto de em 1987 ter sido atribuída a Santa Maria da Feira um verba de 155 000 contos para saneamento básico e em 1988 essa verba ter sido reduzida para 70 000 contos?
Penso que o Sr. Deputado enalteceu esta situação, mas, em minha opinião, ela deve ser vista com uma certa tristeza. As carências são tantas que justificariam um aumento de verbas, e não a sua diminuição.
Já agora uma outra questão: que é feito dos 3 milhões de contos que o Sr. Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, e o Sr. Ministro Valente de Oliveira foram oferecer aos Paços do Concelho de Santa Maria da Feira e dos quais até ao momento não se vislumbrou sequer um tostão?
Penso que estas questões são extremamente importantes e não podemos, de facto, «sacudir a água do capote» quando as organizações de que fazemos parte são exactamente aquelas que mais responsabilidades têm pela falta de água potável, pela falta de saneamento básico, pela falta de estradas, pela falta de escolas, escolas essas que têm sido prometidas por alguns Srs. Ministros e Secretários de Estado, mas que até agora não foram construídas, necessidades que, apesar do estoicismo e da vontade do Sr. Presidente da Câmara de Santa Maria da Feira, até ao momento não foi possível satisfazer. E a culpa temos de concordar, é de facto do Governo!
De qualquer modo, não quero deixar de enaltecer aqui o trabalho feito por muitas das autarquias de Santa Maria da Feira, independentemente do partido a que pertencem. Há bons autarcas no concelho, só que esses bons autarcas não têm ouvidos em Lisboa e, nomeadamente, em São Bento.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Baptista Cardoso.

O Sr. Baptista Cardoso (PSD): - Srs. Deputados, começaria pelo fim, dado que o Sr. Deputado José Mota é, como se sabe, um conterrâneo meu, também ele um residente no concelho de Santa Maria da Feira.
O Sr. Deputado José Mota é, como se sabe também, muito mais antigo do que eu nesta Casa. No entanto, não são conhecidas, pelo menos por mim, iniciativas suas no sentido de apresentar nesta Câmara levantamentos das carências do concelho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Lello (PS): - Essa foi boa!

O Orador: - Fala o Sr. Deputado em coragem da minha parte. Efectivamente, tive algum arrojo, tive alguma coragem. Como deputado iniciado nestas andanças, procurei, na primeira oportunidade, fazer o levantamento da situação do nosso concelho, coisa que o Sr. Deputado não fez, que eu saiba.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Fala o Sr. Deputado em coragem relativamente ao meu partido. Efectivamente, o meu partido teve a coragem de romper com o bloco central exactamente porque o bloco central não estava a governar de acordo com aquilo que o meu partido advogava.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Uma Voz do PS: - Isso é mentira!

O Orador: - O Sr. Deputado pergunta-me onde estão os 3 milhões de contos que o Sr. Prof. Cavaco Silva prometeu ao concelho de Santa Maria da Feira. Sr. Deputado José Mota, o que o Sr. Prof. Cavaco Silva prometeu, em sessão solene realizada no concelho de Santa Maria da Feira, foi que, a breve trecho - não disse que seria amanhã ou depois de amanhã -, seriam gastos nesse concelho 3 milhões de contos. E devo dizer-lhe, se não sabe - certamente não sabe, pois tem andado um pouco arredado das questões do concelho -, que está em elaboração um contrato de programa que contemple, exactamente, obras que absorvam estes 3 milhões de contos a curto prazo.

Protestos do PCP.

Meu bom amigo e colega Lemos Damião, V. Ex.ª fala no movimento libertador e diz que eu teria dito que «Portugal nasceu em Santa Maria da Feira». Mas, se bem se lembra, eu não disse tal, ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Mas poderia ter dito!

O Orador: - ... o que eu disse foi o seguinte: «Como prova da sua ancestralidade e riqueza histórica, perduram inúmeros testemunhos monumentais, de entre os quais emerge, altaneiro, o majestoso Castelo da Feira, donde se diz terem partido soldados para combaterem ao lado de D. Afonso Henriques contra os exércitos de sua mãe, D. Teresa. A ser assim - e há bons historiadores a sustentá-lo -, ali teria nascido e dali teria partido o primeiro movimento libertador de Portugal ...». Isto é ligeiramente diferente do que V. Ex.ª disse, Sr. Deputado ... Aliás, devo dizer-lhe que ninguém nasce no berço!

Risos gerais.

Sr. Deputado Vidigal Amaro, efectivamente, o meu partido fazia parte do IX Governo, o governo do bloco central, como foi apelidado, e uma das razões por que ele rompeu com este Governo - e já o disse ao Sr. Deputado José Mota - foi porque o Governo não estava a caminhar com as «pernas» que queríamos.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): - E o hospital?

O Orador: - Já lá vamos!

O Sr. Deputado perguntou-me ainda por que é que não interferi para que fossem inscritas verbas no PID-DAC para o hospital. Sr. Deputado, não intervim para esse efeito, mas houve diligências nesse sentido e posso dizer que o problema relacionado com os terrenos está em vias de resolução - aliás, apenas uma pequena faixa apresenta ainda problemas e não o está.
Quanto ao resto, posso dizer-lhe que ainda recentemente a Sr.ª Ministra da Saúde garantiu que, muito brevemente, após o lançamento do projecto de concepção e execução do hospital será o de Leiria, o próximo hospital será o do concelho de Santa Maria da Feira.
Sr. Deputado, foi dito expressamente que antes do fim do ano haverá um projecto de concepção e execução para o hospital de Santa Maria da Feira.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Há oito anos que andam a dizer a mesma coisa!

O Orador: - Sr. Deputado Barbosa da Costa, como amigo das terras de Santa Maria da Feira, agradeço-lhe muito que tenha referido as Primeiras Jornadas de Estudo e Reflexão sobre as Terras de Santa Maria, V. Ex.ª deu também um contributo - aliás, importante - nessas jornadas, fazendo a sua comunicação.
Por outro lado, V. Ex.ª é vereador da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, com quem a Câmara de Santa Maria da Feira tem um protocolo para a bombagem de água e saneamento básico para este concelho e essa é a principal obra, no imediato, para o povo da nossa terra. Como V. Ex.ª sabe, há esforços conjugados neste sentido do saneamento básico e da água, assim como na área da cultura, a que V. Ex.ª está mais ligado.
Quanto a este assunto, devo deixar aqui expresso o agradecimento das terras de Santa Maria da Feira, em especial pelo seu empenhamento no esforço de se tentar encontrar o fundamento das suas raízes, de se tentar fazer o afloramento das raízes culturais, estudadas em conjunto, e a cooperação técnica que, naturalmente, vamos continuar a ter no domínio da água e do saneamento.
Creio ter respondido a todos os Srs. Deputados.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O processo educativo, já de si complexo, atinge mais relevante dimensão quando a prometida e ansiada reforma dá passos prometedores.
Certamente que nenhum partido, por mais maioritário que seja, pode ter a veleidade de assumir sozinho a condução das mudanças nacionais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ai não?

O Orador: - Por outro lado, devem todas as forcas políticas contribuir desapaixonadamente no processo em causa para que o resultado final consagre um vasto consenso nacional.
É nesta perspectiva que pretendo dar o contributo possível num domínio restrito, de forma a rentabilizar melhor os recursos disponíveis.
Decorrendo da Lei de Bases da Reforma Educativa uma nova arrumação dos diferentes níveis de aprendizagem, importa daí extrair as decorrências possíveis, nomeadamente as resultantes da integração no ensino básico dos antigos ensinos primários, preparatório e secundário.

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Se é verdade que vão funcionando, com alguma eficácia, as chamadas escolas C + S, correspondendo aos pressupostos da Lei de Bases nesse domínio, o mesmo não acontece relativamente à possibilidade de funcionamento, em espaços comuns, dos níveis i e H do ensino básico, isto é, os antigos ensino primário e preparatório.
Várias razões, de ordem diversa, levam-me a pôr à consideração do ministério da tutela a hipótese de edificação de escolas onde pudessem funcionar, lado a lado, os referidos níveis de aprendizagem.
Antes de mais, julgo que era possível edificar escolas com salas de aulas distintas, mas com fruição comum de áreas polivalentes, serviços de cantina e acção social escolar, entre outros.
Tais aspectos permitiriam evitar transições bruscas e traumatizantes do ensino primário para o preparatório e onde o aluno, que teve durante quatro anos, em muitos casos, o mesmo professor, não visse agravados os riscos da mudança para um nível de ensino com vários professores e onde, não raras vezes, deixa de ser tratado pelo nome próprio para ser um impessoal número de uma qualquer turma.
Certamente que tais escolas estariam mais próximas das populações, evitando-se gastos desnecessários em transporte às autarquias e às famílias.
Far-se-ia também um aproveitamento mais rentável dos recursos, que não abundam, permitindo que as instalações possam ser mais correctamente ocupadas e fruídas.
Outras vantagens de ordem económica e pedagógica poderiam ser referidas, mas creio que os aspectos aduzidos são suficientes para se fazer o necessário estudo.
Uma questão importante deve ser ponderada. Como é sabido, cabe ao poder local a construção dos edifícios destinados ao nível i do ensino básico, enquanto é da responsabilidade do poder central a edificação de escolas do nível n.
Na hipótese de ser aceite tal proposta, seria indispensável uma definição clara das competências de ambos os poderes, de forma a evitar prejuízos inconvenientes, que importaria evitar.
Seria possível uma saudável colaboração entre o Governo e as autarquias, de forma a melhorar as condições de aprendizagem das crianças portuguesas. Houve experiências já neste domínio, designadamente em Portalegre, que poderão ser retomadas, melhorando-se os aspectos positivos e erradicando o que de negativo elas revelaram.
Finalmente, creio que o caminho está facilitado, na medida em que cabe ao Ministério da Educação o planeamento das construções escolares, bem como a sua edificação, através da Direcção-Geral dos Equipamentos Educativos, o que anteriormente não acontecia, já que as competências referidas se distribuíam por dois ministérios, o que, obviamente, dificultava a concretização deste tipo de projectos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, procurei contribuir da forma possível, com base na minha já longa experiência de autarca municipal com a responsabilidade do ensino, bem como pela actividade docente que exerci no ensino primário e agora no ensino secundário.
Espero que esta questão seja acolhida pelo Ministério da Educação e que seja estudada pelos seus técnicos, de forma a responder aos desafios do futuro, sem esquecer as condições específicas das diferentes comunidades, de forma que o progresso e a mudança que se desejam respeitem o homem, qualquer que seja a sua idade e condição.

Aplausos do PRD, do PS, do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Conceição.

O Sr. Fernando Conceição (PSD): - Sr. Presidente, não é verdadeiramente para pedir esclarecimentos, mas, de certa maneira, para me associar às palavras que acabaram de ser proferidas e que vêm ao encontro de algo que é fundamental: a necessidade de uma colaboração de todas as forças partidárias para resolver definitivamente o problema grave que é a educação das novas gerações.
Agradeço sobretudo ao Sr. Deputado o ter trazido à colação desta Câmara a necessidade de implementar a Lei de Bases do Sistema Educativo, de acordo com a própria lei, dado que ela prevê a possibilidade de juntar no mesmo espaço, para aproveitamento de recursos humanos e materiais, os diversos níveis de ensino.
Neste sentido, o governo do Prof. Cavaco Silva, como, aliás, todos os ministros da Educação que têm passado pelo Ministério da Educação, são unânimes na necessidade de rentabilizar ao máximo os recursos.
É certo que se dizemos que estamos num país carecido de meios materiais para resolver certos problemas, a racionalização dos mesmos - que passa pela experiência que acaba de citar - parece-me ser indispensável para o bom êxito da reforma do sistema educativo, e, por isso, quis agradecer a sua contribuição.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Deputado, quero congratular-me pela sua associação às questões que coloquei, que tem ainda maior relevância, pois V. Ex.ª é não só um docente brilhante, mas também o presidente da Comissão de Educação, e certamente irá fazer tudo quanto for possível para que esta questão seja resolvida.
Creio que neste domínio da vida nacional, como noutros, é possível que os partidos se entendam e dêem exemplos de que, quando há vastos consensos, as questões são resolvidas a contento de toda a população.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com esta intervenção pretendo chamar a atenção - dos Srs. Deputados, do País, da opinião pública e das instituições no seu conjunto - para o que se passa com o processo legislativo através do qual o Governo (e, em particular, o responsável pelo Ministério da Agricultura, engenheiro Álvaro Barreto) pretende revogar o regime vigente de arrendamento rural e substituí-lo por outro.
Como é sabido, a Assembleia da República aprovou no passado dia 10 de Maio o decreto que autorizaria o Governo a elaborar, por decreto-lei, esse novo regime de arrendamento rural.

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O facto é de especial gravidade - e corre-se hoje o risco (com a concentração num curto período e multiplicação pelo Governo e pelo PSD de frentes de ataque contra a Constituição, contra os direitos e interesses de camadas laboriosas e produtivas e contra a própria configuração democrática do regime) de que medidas como essa, de tão funda repercussão, possam passar despercebidas.
Tal não pode suceder com o processo relativo à Lei do Arrendamento Rural.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Importa salientar três notas: primeira: de tudo o que se conhece das intenções do Governo (expressas aqui pelo Ministro da Agricultura), o Governo visa aprovar um regime de arrendamento rural fortemente lesivo dos interesses dos rendeiros, diminuindo drasticamente as garantias e direitos de que devem gozar para poderem, com estabilidade, trabalhar a terra, investir na produção, contribuir para o desenvolvimento da economia. Isto é, do que se conhece, o Governo pretende exactamente o contrário do que está prescrito no artigo 101.º, n.º 1, da Constituição, que vale a pena transcrever: «Os regimes de arrendamento e de outras formas de exploração de terra alheia serão regulados por lei de modo a garantir a estabilidade e os legítimos interesses do cultivador.»; segunda nota: neste processo legislativo (como, aliás, vem sucedendo com regularidade) mais uma vez o PSD ficou isolado, votando sozinho a autorização legislativa.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isolado, mas maior!

O Orador: - Terceiro: e é para este facto que pretendo chamar particularmente a atenção, a autorização legislativa, tal como foi aprovada e tal como é o seu conteúdo, é ela mesmo inconstitucional, por violação dos artigos 168.º, n.º 2, e 104.º da Constituição da República.
O primeiro desses artigos (168.º, n.º 2) é o que define as condições de forma e de fundo a que devem obedecer as autorizações legislativas, e entre essa está a da definição do sentido e extensão da autorização legislativa.
O segundo (o artigo 104.º) é o que garante aos interessados (trabalhadores da terra, pequenos e médios agricultores, Cooperativas agrícolas, unidades de exploração colectiva de terra) o direito de participarem na elaboração de legislação que adopte medidas de reforma, de restruturação agrária.
A gravidade desses factos, dessas violações da Constituição, tem de ser salientada.
A autorização legislativa, tal como foi proposta pelo Governo e aprovada apenas pelo PSD, pretende rever todo o regime do arrendamento rural. Na alínea a) do seu artigo 1.º descrevem-se (sublinho: descrevem-se) dezoito pontos em que o Governo pretende legislar (âmbito do contrato, forma, mora, subarrendamento, benfeitorias, caducidade, parceria agrícola, regime processual, etc.).
Mas, quanto ao sentido, ao conteúdo que deveria ser o decreto-lei, a autorização legislativa é escandalosamente omissa.
Mais, o aditamento em sede de especialidade de três alíneas, referindo o conteúdo de três aspectos muito específicos e circunscritos do regime do arrendamento rural (tudo o que será, quando muito, um centésimo do decreto-lei que o Governo se propõe aprovar), torna ainda mais evidente a inconstitucionalidade.
É bom que se sublinhe que, além do mais, o que está em questão é o sistema de repartição de competências constitucionalmente garantido para os órgãos de soberania, em concreto para a Assembleia da República.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É a Assembleia da República que detêm competência reservada para legislar sobre o arrendamento rural. Se delega no Governo esse poder, só o pode fazer nas condições constitucionalmente previstas.
Recordo o que diz a doutrina: «actualmente [depois da revisão constitucional, que aditou a expressão sentido à norma sobre autorizações legislativas'] a AR está obrigada a indicar os princípios gerais que deverão presidir à utilização da autorização legislativa pelo Governo» (citei António Vitorino, Nadais e Canas, nas anotações à Lei da Revisão Constitucional, p. 195).
Ou: «Dos requisitos do artigo 168.º, n.º 2, decorre directamente o princípio da especialidade das autorizações legislativas, estando claramente proibidas as autorizações genéricas», como seria esta, se passasse (citei Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, n vol., p. 204).
A segunda grave inconstitucionalidade de que enferma insanavelmente o decreto aprovado pelo PSD decorre do facto de não ter sido posto à discussão pública, como impõe o artigo 104.º da Constituição.
Que este artigo é aplicável à situação, legislação sobre arrendamento rural, decorre claramente do que a doutrina vem afirmando repetidamente, de que é exemplo o parecer da Comissão Constitucional n.º 8/77, onde se expressa o conceito alargado de reforma agrária, abrangendo o «complexo heterogéneo de medidas» previstas na Constituição da República Portuguesa para atingir os objectivos definidos no artigo 96.º e, também por isso, o arrendamento rural.
Que a Assembleia sempre o aplicou nos dois momentos em que legislou, em 1977 e 1979, sobre arrendamento rural é também evidente (v. separatas n.ºs 5, 7 e 12 do Diário da Assembleia da República, I Legislatura, separatas que contêm os projectos e propostas de lei sobre arrendamento rural para efeitos da discussão pública, no cumprimento do artigo 104.º, discussão pública realizada antes do debate e aprovação na generalidade das leis respectivas).

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O debate público não se realizou e ele era essencial, mesmo sobre a autorização legislativa, para se determinar o que entendiam os interessados sobre, em primeiro lugar, a oportunidade e, depois, sobre a extensão e o sentido da autorização legislativa requerida.
Srs. Deputados: o PSD foi confrontado, através de impugnação e de requerimento discutidos na Assembleia da República (conferir Diário da Assembleia da República de 6 e 7 de Abril), com as inconstitucionalidades existentes.

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Voltou a ser confrontado antes da votação final global através das avocações requeridas pelo PCP (conforme Diário da Assembleia da República» de 10 de Maio).
O PSD mostrou-se surdo ou, então, obediente ao plano governamental.
Mas o processo legislativo referente à autorização legislativa não terminou, o decreto de autorização legislativa carece de promulgação e pode ser sujeito à fiscalização preventiva pelo Tribunal Constitucional.
Da nossa parte, PCP, continuaremos com os interessados, com os rendeiros, a luta em defesa dos seus direitos e interesses, a luta em defesa dos interesses da produção nacional, contra uma política de destruição e liquidação das transformações democráticas e libertadoras configuradas na Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se entre nós alunos e professores da Escola Secundária n.º 3 de São João da Madeira, da Escola Secundária n.º l de Loures, da Escola Secundária de Ferreira de Castro, de Oliveira de Azeméis, e da Escola Secundária de Mem Martins, para quem peço a saudação habitual.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, a Assembleia da República aprovou uma proposta de resolução, vinda da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, que autorizava o Sr. Presidente da República a deslocar-se à República das Filipinas e aos Estados Unidos da América entre os dias l a 9 de Junho. No entanto, há um pequeno lapso, que se corrige desde já; esta visita terá lugar entre 31 de Maio (portanto, um dia mais cedo do que o indicado na referida resolução) e 9 de Junho.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com embarcações em madeira que os Portugueses descobriram novas paragens e novos mundos. Mas foi também com barcos de madeira que pescámos bacalhau na Terra Nova e baleias nos Açores, fazendo-se ainda hoje a maioria da faina pesqueira em águas nacionais em embarcações de madeira.
A construção naval portuguesa em madeira tem, pois, grandes tradições entre nós, designadamente em Vila do Conde e outros portos da nossa costa. E, mau-grado a evolução tecnológica a que assistimos nos dias de hoje, com o recurso a novos materiais, novas soluções e a novos equipamentos, apesar do deslumbramento que a técnica induz nos centros de decisão, paralelamente a outras opções, como o aço e a fibra de vidro com poliéster, a construção naval em madeira continua a manter uma grande actualidade e uma procura crescente. Com efeito, a inovação no que se refere às pescas dá-se, hoje em dia, não tanto ao nível dos cascos, mas, essencialmente, no âmbito dos equipamentos, sensores e no domínio da electrónica e comunicações.
O debate aqui tem, pois, a ver com a propulsão, o tipo de aladores, de redes de frio, sondas, etc., porque o casco de madeira é, por natureza, o mais adequado a certo tipo de artes de pesca.
Aliás, a confirmar estas considerações, está aí patente a crescente procura dos nossos estaleiros de construção naval em madeira por parte de armadores estrangeiros de países como Marrocos, Argélia, Franca e outros.
Também internamente as perspectivas que se prefiguram para o sector serão as melhores, em face da necessidade de se prover à reconversão da nossa frota pesqueira com embarcações dotadas de melhores condições de segurança e habitabilidade, de uma mais ampla autonomia e de uma maior capacidade de conservação do pescado, bem como de um equipamento global moderno e ajustado aos desafios que a médio prazo se colocam ao sector das pescas.
Assim, se as perspectivas são, potencialmente, tão boas, tudo indicaria que a construção naval em madeira seria uma indústria com um futuro assegurado e risonho. Contudo, nada será menos certo do que isso.
Com efeito, o sector debate-se com inúmeras dificuldades, que lhe inviabilizam uma reconversão empresarial ajustada e uma racionalização da gestão e dos processos tecnológicos de construção.
São, pois, razões de ordem financeira e, acima de tudo, a falta de incentivos à exportação, a ausência de subsídios adequados às potencialidades do sector e as insuficiências no capítulo da formação profissional que mais cerceiam o desenvolvimento desta indústria tão directamente ligada a uma área estratégica para o desenvolvimento nacional como são as pescas.
A indústria naval de construção em madeira, não tendo beneficiado dos esquemas que antecederam a adesão à CEE, designadamente através do Decreto-Lei n.º 345/80, tão-pouco lucrou, posteriormente, com os esquemas de ajuda comunitária, que não prevêem apoios a este sector.
Aliás, o que se revela, no mínimo, paradoxal, tanto mais que a 5.º e a 6.ª Directivas da Comunidade falam em apoios comunitários à indústria naval.
Por outro lado, relevando critérios de clara injustiça, esse apoio é dado à construção em fibra de vidro com poliéster, alegadamente, por esta empregar novas tecnologias.
Quererá, assim, dizer que a construção naval em madeira parece estar entregue à sua sorte, pese embora o prestigio granjeado, tanto interna como externamente, pelos estaleiros portugueses, cuja construção é de qualidade tão reconhecida que são utilizados para outros fins que não apenas o das pescas, como foi o caso da recente construção da caravela Bartolomeu Dias em Vila do Conde.
Urge, pois, desburocratizar os licenciamentos e as etapas de financiamento das construções pesqueiras, bem como importará adequar os sistemas impostos pelo quadro dos apoios comunitários e pelo IFADAP às limitações de um sector com estruturas empresariais pouco consolidadas e com grandes limitações de ordem financeira.
Tudo isto é importante, pois a construção naval portuguesa em madeira, que tanto nos honrou no passado, continua a prestigiar-nos agora, no presente. Assim a apoiemos.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

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O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sn. Deputados: Viana do Castelo nasceu ligada ao mar e às actividades marítimas, o seu futuro está-lhe ainda intimamente ligado, pelo que os habitantes da região seguem com o maior interesse tudo quanto se liga ao porto de mar de Viana do Castelo, em franca explosão no tráfego de mercadorias.
É verdade que o estuário do rio Lima desde tempos muito recuados serviu como abrigo e apoio à navegação, quer da actividade piscatória, quer do domínio comercial; porém, a insuficiência de fundos e a falta de órgãos de apoio impediram o seu desenvolvimento natural, pelo que, numa perspectiva de promover o desenvolvimento regional, foi em boa hora tomada a decisão de construir o novo porto de mar de Viana do Castelo, que, pesem embora as boas vontades e apesar do esforço que localmente se vem fazendo para o potenciar, ainda está longe de atingir o seu ponto de pleno funcionamento, pois apresenta diversas carências e limitações, nomeadamente no que se refere a infra-estruturas e equipamentos complementares, e até algumas dificuldades de acesso.
Mas existem na região elementos potenciadoras da actividade portuária, dados os recursos naturais existentes, tais como a floresta, os produtos minerais e a pesca, acrescidos da construção e reparação naval, e ainda a indústria, aqui quase remetida à acção da PORTUCEL, mas que já representa a maior ocupação nos movimentos de carga, devendo ainda considerar-se todo o HINTERLAND, que estará em condições de recorrer aos serviços deste porto logo que as condições de acesso (rodovias) se encontrem capazes.
O porto de mar de Viana do Castelo serve, basicamente, a cabotagem europeia, representando, de momento, as exportações cerca de 85% do movimento total, correspondendo 15% às importações, destacando-se nos movimentos a exportação de papel, madeira serrada, quartzo e feldspato e granitos.
As previsões de tráfego de mercadorias em 1990 rondarão as 450 0001, o que representa um aumento, em relação a 1986, de 72%.
Temos ainda a considerar o tráfego roll-on/roll-off, há pouco tempo iniciado e que tem proporcionado uma procura francamente positiva, tudo levando a crer que, a breve prazo, este movimento semanal venha a ser reforçado.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para que os objectivos previstos e desejáveis sejam atingidos torna-se imperioso concretizar os investimentos programados, a par de um sério esforço na implementação de uma política portuária agressiva, a cargo de todos os agentes envolvidos, dado que a consolidação e desenvolvimento do porto de Viana do Castelo contribuirá para a atracção de actividades dinamizadoras da economia da região, das quais destacamos a viabilização da instalação de um verdadeiro pólo industrial, incluindo as indústrias transformadoras de madeiras importadas e de serração de madeiras, os granitos, a indústria cerâmica, os têxteis e outras.
Devemos realçar que o porto de mar de Viana do Castelo representa ainda a possibilidade de os Estaleiros Navais de Viana do Castelo alargarem o seu campo de actuação, dado os estaleiros não possuírem espaço de cais bastante para a sua actividade, tendo o porto permitido que se tenham lançado na reparação naval,
o que em determinado momento representou a possibilidade da garantia de trabalho para centenas e centenas de trabalhadores, que são o sustento de um número muito significativo de famílias do Alto Minho.
Já que falamos dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, seja-nos permitido destacar a recente assinatura de um contrato entre esta empresa e a PORTLINE para a construção de três navios de carga geral e contentores, num valor global de 2 milhões de contos, facto tanto mais de assinalar, porque desde há muito tempo se não assistia à encomenda a estaleiros nacionais de navios encomendados por armadores portugueses, o que mais força dá às reivindicações das gentes do meu distrito para que as obras do porto de mar de Viana do Castelo sejam incrementadas e concluídas em favor do desenvolvimento regional e da economia do nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta obra, que consideramos fundamental para que as actividades económicas se possam expandir e que ajudará a transformar, significativamente, a qualidade de vida das gentes do meu distrito, tem sofrido alguns atropelos e obscuras tentativas para emperrar o seu funcionamento, e damos como exemplo o artigo publicado em finais de 1987 numa revista da especialidade, em inglês, onde se descreve o porto como era há cerca de vinte anos atrás, e não com as possibilidades e os equipamentos actuais, facto que a população e as entidades locais veementemente repudiaram.
Sabemos e defendemos que é necessário mobilizar, conjuntamente, recursos financeiros de várias origens, da administração central, do sector público e do sector privado, das autarquias e dos agentes económicos para se encontrarem as soluções que rentabilizem os investimentos. Ora, quanto ao porto de Viana do Castelo, existe essa possibilidade de actuação, dada a proposta da PORTUCEL para co-financiar o alargamento do cais acostável, que se torna necessário, dado o previsível aumento de laboração daquela empresa e do seu recurso ao transporte marítimo, pelo que aqui deixamos o nosso apelo ao Governo para que não se perca esta oportunidade, que poderá representar o passo decisivo para que o porto de mar de Viana do Castelo entre nas grandes rotas do tráfego marítimo.
Ao trazermos este assunto à Assembleia da República tivemos por finalidade deixar claro o apoio e o louvor do Partido Social-Democrata àqueles que ousaram lançar tal empreendimento, que, já no presente, mas mais num futuro próximo, ajudará a mudar para melhor a vida da cidade e da região.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para a última intervenção no período de antes da ordem do dia de hoje, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O bom comportamento sempre foi um valor fundamental a preservar nas nossas escolas! Quando os alunos são insubordinados, quando maltratam os seus professores, quando se insurgem contra as naturais autoridades académicas, existem fundadas razões para todos nós, que nos importamos com o estado da educação nacional, nos sintamos deveras preocupados. Mais ainda, quando isso sucede (e com que

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frequência, Srs. Deputados, com que requintes, Sr. Presidente ...) com estudantes universitários - exactamente aqueles que deviam dar o exemplo aos seus colegas mais novos. A questão é ainda mais grave. Não imaginam os senhores a cadência, o ritmo verdadeiramente alucinante com que os nossos mestres são grosseiramente interpelados por indivíduos de barba ainda mal semeada incapazes de se subordinar à evidência da autoridade. São múltiplos os exemplos, são inúmeras as queixas que nos chegam de indefesos cidadãos, e só aqui delas não faço eco, ipsis verbis, porque muitas fariam certamente corar de vergonha muitos dos Srs. Deputados ...
Admitindo que se não têm V. Ex.ª apercebido da gravidade da situação, contemporizando até com a indiferença com que os órgãos de gestão das escolas têm deixado alastrar este surto de indisciplina, consideram os Srs. Deputados que devia o Governo permanecer impávido e ficar de braços cruzados, assistindo, assim, de forma cúmplice, ao desmoronar de tão nobres valores da Pátria? Certamente que não; por isso, entenderam os nossos governantes lançar, de imediato, uma cruzada para devolver uma sã «disciplina académica» às nossas universidades.
Para tal se fez um projecto de decreto-lei de que, por não ser ainda do conhecimento desta Assembleia, me permito ir levantando a ponta do véu para melhor vos aguçar as curiosidades. Aí se define que a repressão pode ser dada particularmente ou com direito a assistência, que o poder disciplinar se exercerá sempre de forma presidencial, que as sanções a aplicar devem ser devidamente publicitadas e afixadas para todos verem, só faltando dizer que a elas se juntaria uma fotocópia tipo filmes do Oeste com a expressão «Wanted dead or alive - procura-se vivo ou morto».
Do muito que se pensou sobre o assunto entendeu--se que se não devia mexer muito nas mui dignas leis que em 1932 adquiriram letra de forma para regular estes assuntos.
Se antes as sanções possíveis eram seis, hoje serão cinco, se antes as entidades que aplicaram as medidas disciplinares eram umas, por que diabo hão-de elas hoje ser outras? Têm os universitários de hoje, porventura, menos a aprender do que tinham os seus pais e avós? Sendo certo que não, por que deveriam ser então eles hoje tratados de maneira diferente no projecto de decreto-lei que o Governo elaborou?
Não faltarão certamente más línguas, dizendo que se não esperou pela aprovação da lei da autonomia universitária e que se está assim a atropelar a autonomia dos estabelecimentos de ensino superior em matéria disciplinar. Mas que pode o Governo fazer senão debelar o mal enquanto é tempo? Não será também caso para admiração vislumbrar quem entenda que se procuram adulterar poderes hoje conferidos a órgãos de gestão democrática das escolas, mas que opção nos resta senão passar por cima dos conselhos disciplinares hoje adormecidos por alegada falta de assuntos para tratar? Não nos espantaremos igualmente se alguém, agitador, pela certa, seguir as pisadas da Juventude Comunista e vier a terreno reclamar que, deliberadamente, não foram até ao momento consultadas as Associações de Estudantes, como manda a Lei n.º 33/87, em má hora aprovada nesta Casa. É certo que o Ministro da Juventude ainda há semanas participou num Encontro Nacional de Direcções Associativas do Ensino Superior;
que o Ministro da Educação conversou com Associações no Dia do Estudante; que existem representantes destas estruturas no Conselho Consultivo de Juventude, mas, sejamos compreensivos, nem tudo pode ser falado. E analisemos com atenção. Mesmo que pudesse, acham os Srs. Deputados que tal seria aconselhável num momento dessa perigosa euforia, como o que nestas semanas recentes se viveu, com cortejos académicos pelas ruas, serenatas, debates e garraiadas, verdadeiros exemplos desse clima indisciplinado que os caloiros e outros estudantes impõem nas nossas universidades?
E para que se não pense que estamos a utilizar de demasiada brandura não há nada como informar que procurámos em tempo oportuno saber quem são os «cabecilhas» do movimento dos ISCAs, que até hoje pouco nos importámos com a agressão policial a estudantes em Coimbra, seguida, dias depois, da sua dispersão com gases lacrimogéneos. De tudo isto pouco se falou! Mas não receiem. Não se trata apenas de intenções para um futuro distante. Há já alguns casos para exemplificar!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendi, deste modo, alertar-vos para o carácter caricato, mas simultaneamente persecutório, de um projecto de decreto--lei, intitulado «disciplina académica», recentemente apresentado pelo Ministério da Educação ao Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
A margem das competências disciplinares já hoje atribuída legalmente a órgãos das escolas, o Governo desenterra, de forma que é, no mínimo, desastrada, legislação que remonta aos anos trinta, há cinquenta anos, portanto! Como há dias afirmou a JCP, «o carácter vago daquilo que aí se designa como deveres gerais dos discentes daria cobertura legal a todo o tipo de atitudes repressivas, persecutórias, intimidatórias e discriminatórias que tivessem lugar em relação aos estudantes».
Além disso, é grave que o Governo venha escondendo o projecto de diploma dos estudantes e das suas associações. Já aqui tive oportunidade de referir e hoje reafirmo: o Governo tem de ouvir os estudantes e deve, por princípio, respeitar as suas opiniões.
Mas o Governo insiste em legislar à sua margem, como aconteceu no caso dos ISCAs, dos ISE's, das Faculdades de Letras, e parece estar agora em vias de se verificar de novo quanto ao anunciado aumento brutal das propinas; esqueceu-se de aplicar em devido tempo a lei sobre o Dia do Estudante e só recentemente regulamentou, muitos meses depois, mesmo assim mal e parcialmente, a própria Lei das Associações de Estudantes aprovada aqui pela Assembleia da República. Este projecto sobre «disciplina académica» é profundamente discriminatório e injusto e, por isso mesmo, está a merecer a natural reprovação liminar das direcções associativas e dos estudantes.
É urgente que o Governo as consulte, tal como a lei obriga, e retire esta proposta, que cheira profundamente a naftalina, sinal de tempos de má memória que o 25 de Abril definitivamente arredou.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lemos Damião está inscrito para pedir esclarecimentos, mas, como sobejam apenas 55 segundos do período de antes da ordem do dia, transferiremos o pedido de esclarecimentos e a sua resposta para a próxima sessão.

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Assim sendo, passamos agora ao período da ordem do dia.

ORDEM DO DIA (2.ª parte)

Srs. Deputados, entrando no período da ordem do dia, vamos dar início ao debate dos projectos de lei n.º 133/V (PCP), 237/V (PS) e 245/V (PSD), referindo-se todos ao mandato em regime de permanência dos membros das juntas de freguesia.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos hoje finalmente debater uma questão que há muito devia estar resolvida.
Trata-se da necessidade de garantir aos membros das juntas de freguesia, em certos casos e condições, o exercício do mandato em regime de permanência com vista ao reforço dos meios de actuação dos órgãos de freguesia.
É que, de facto, tanto a Lei com a prática administrativa não têm dado o merecido relevo à autarquia--freguesia e ao importante papel que os eleitos desempenham.
Sucessivamente, têm sido adiadas medidas de reforço da competência da freguesia, de uma maior disponibilidade de meios financeiros e da mais intensa capacidade de intervenção. Urge, pois, mudar esta situação.
Pela nossa parte, por diversas vezes e em momentos diferentes, temos vindo a propor o reforço dos meios financeiros para as freguesias e a descentralização das competências.
Fizemo-lo, por exemplo, no debate da Lei de Finanças Locais, em que propusemos que a verba mínima a transferir para as freguesias fosse de 20% das receitas correntes do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Fazemo-lo sempre que nas autarquias conseguimos concretizar significativas transferências de competências e de meios financeiros para as freguesias, permitindo, assim, uma maior intervenção.
Mas o facto de a lei impedir que membros das juntas possam exercer a tempo inteiro as suas funções não só é um efectivo obstáculo a este processo de maior responsabilidade das freguesias como conduz a situações inconcebíveis.
Há grandes freguesias, em zonas urbanas, com dezenas de funcionários, mas que não podem ter em permanência quem tem a responsabilidade da sua gestão, desde logo o presidente da junta, mas também em freguesias suburbanas e rurais o problema existe. As inúmeras respostas que recebemos exemplificam-no.
Por exemplo: a Junta de Freguesia do Prado (Santa Maria, Vila Verde) afirma: «Devido ao acumular de muito trabalho, esta Junta, para além do atendimento diário das populações, que procuram os seus membros nas suas residências, reúne duas vezes por semana, das 21 horas sempre para além da meia-noite, e, mesmo assim, não se conseguem resolver todos os assuntos. Havendo um membro a tempo inteiro, tal situação seria minimizada e as populações beneficiadas.» É necessário alterar esta situação!
Sabíamos de conhecimento directo que a possibilidade do regime de permanência era uma real aspiração das freguesia e dos seus eleitos.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Já na IV Legislatura apresentámos um projecto de lei que tinha em vista dar satisfação ao desejo manifestado por imensos membros de juntas de freguesia para que se tivesse dado mais um passo significativo no reconhecimento do poder local em todas as vertentes.
Quando da elaboração do Estatuto do Eleito Local, Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (que actualizou os abonos devidos aos membros das juntas), propusemos que o exercício do mandato em regime de permanência a membros das juntas de freguesia fosse contemplado e em 15 de Dezembro de 1987 retomámos o projecto de lei agora em discussão.
Usámos o direito de marcação da ordem do dia para pôr fim ao arrastar de um problema que urge resolver.
Entretanto, Srs. Deputados, enviámos o projecto às freguesias com mais de 1000 eleitores (cerca de 1600).
Os resultados da consulta confirmam a justeza do nosso projecto. Recebemos respostas de 330 freguesias, representando mais de l 800 000 eleitores, e 20 assembleias municipais, representando cerca de 950 000 eleitores.
Recebemos respostas de todos os partidos políticos, incluindo dezenas e dezenas de freguesias de presidência do PSD, a apoiarem o nosso projecto. Apenas quatro freguesias e um assembleia se pronunciaram contra.
Mas a todo o momento continuam a chegar adesões e propostas de alteração, no geral, insistindo no reforço das competências e meios das freguesias, visando o benefício das populações.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este significativo movimento de opinião favorável ao projecto de lei do PCP não podia deixar de ter repercussões aqui na Assembleia da República.
Congratulamo-nos com o facto. Hoje estão também em debate os projectos de lei recentemente apresentados pelo PS e pelo PSD visando instituir o regime de permanência. Uma certeza já temos. Vai passar a haver eleitos das juntas de freguesia em regime de tempo completo!
Mas, Srs. Deputados, não basta ficarmos por aqui. É necessário garantir que um número apreciável de juntas de freguesia venha a beneficiar deste princípio, e não apenas umas dezenas, como propõe o PSD. Ao fim e ao cabo, o projecto do PSD, tão restritivo como é, só mostra que o PSD, pela pressão das freguesias, não teve outro remédio senão apanhar o comboio, mas o que quer fazer é travá-lo. Veremos como é que o PSD se vai justificar perante os eleitos de todos os partidos, incluindo os do PSD ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - No projecto de lei que apresentámos propomos, em concreto, as seguintes soluções para as freguesias:

De 500 a 1000 eleitos, um membro em regime de
meio tempo; De mais de 1000 e até 5000 eleitores, um membro
em tempo completo; Com mais de 5000 eleitores, dois membros em
tempo completo.

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As propostas que apresentámos permitem que 1179 freguesias passem a ter um membro a meio tempo, 1305 freguesias passem a ter um membro a tempo inteiro e 307 freguesias passem a ter dois membros a tempo inteiro.
A solução que preconizamos respeita sempre a posição dos órgãos da freguesia. Por um lado, sempre poderão optar por repartir o tempo inteiro por meios tempos; por outro lado, o projecto prevê que sejam os órgãos a deliberar se pretendem que haja ou não «regime de permanência». Ninguém é obrigado a seguir este princípio!
Um outro aspecto que importa considerar neste debate é o pagamento dos encargos resultantes da aplicação do «regime de permanência».
Na solução que preconizamos repartem-se os encargos segundo um princípio que nos parece justo e responsável nas decisões a tomar: 50% serão assegurados pelo respectivo município (acrescendo à participação das freguesias nas receitas municipais) e os restantes 50% serão suportados pelo orçamento da freguesia.
Já agora só uma observação: Nas respostas que recebemos das freguesias, a posição mais defendida é a de que deviam ser os municípios a suportar integralmente estes encargos, que, por sua vez, deveriam ser compensados através do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Naturalmente, consideramos que toda esta questão merece uma reflexão mais aprofundada, nomeadamente em sede de debate na especialidade na Comissão de Poder Local.
Desde já, no entanto, é bom que se clarifique uma questão central. A aplicação do «regime de permanência» nas juntas de freguesia, nos termos que propomos, significa um aumento de centenas de milhares de horas de trabalho por pane dos eleitos em dedicação exclusiva à autarquia, permitindo uma gestão mais eficaz, uma maior rentabilidade dos serviços e dos meios financeiros e técnicos disponíveis, o que necessariamente se traduzirá numa substancial melhoria dos serviços prestados às populações.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Contabilizar os resultados desta dedicação e empenhamento não é coisa fácil!
Não basta fazer contas apenas ao custo do projecto, como certamente já fizeram alguns Srs. Deputados de espírito mais contabilístico! É necessário, é fundamental, ter em conta a realidade das autarquias, a necessidade de criar as condições necessárias para que seja possível a maior capacidade de resposta da freguesia aos problemas das populações e a sua crescente dignificação, através do reforço das competências, acompanhada naturalmente dos adequados meios financeiros e da correspondente descentralização, numa perspectiva de reforço do poder local democrático ao serviço das populações.
Por ultimo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reafirmamos que não somos fixistas. Naturalmente encaramos com abertura todas as contribuições em relação às soluções concretas. No entanto, consideramos que o texto final que vier a ser aprovado pela Assembleia da República não pode ser tão restritivo que permita apenas a sua aplicação a poucas dezenas de freguesias.
Esperamos que o bom senso impere e que o poder local democrático saia vencedor.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pereira.

O Sr. Casimiro Pereira (PSD): - Sr. Deputado Cláudio Percheiro, ouvi com atenção a sua exposição e não posso deixar de manifestar aqui alguma estranheza em relação a alguns aspectos do conteúdo da mesma.
Sendo o PSD o maior partido nas autarquias, naturalmente que os senhores não vão pensar que não analisámos cuidadosamente esta situação, que não ponderámos todos os aspectos das questões e que iríamos ser desagradáveis por masoquismo, pelo prazer de ser desagradáveis em relação a alguns autarcas que nas juntas de freguesia têm dado o melhor do seu esforço no sentido de que os problemas locais possam ter uma solução conveniente.
Por outro lado, gostava de perguntar ao Partido Comunista se nesta fase, em que o processo de institucionalização das regiões administrativas está em curso, em que decorre igualmente a revisão constitucional, em que se prevê que o quadro da divisão administrativa possa ser alterado a médio prazo e em que vão ser chamados a participar muitos outros cidadãos - esperamos que assim aconteça -, dizia eu que gostava de perguntar se o PCP não considera precipitada a apresentação deste projecto nesta altura e neste contexto.
Uma outra questão que me suscitou alguma perplexidade é o facto de o Partido Comunista - zeloso como é em procurar ser a vanguarda em questões de que não tem responsabilidade directa, nomeadamente quanto aos encargos que uma situação destas poderia vir a envolver - só ter consultado as freguesias com mais de 1000 eleitores, quando propõe presidentes de junta em permanência, ou em quem eles delegarem, em freguesias que tenham mais de 500 eleitores?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira.

O Sr. João Teixeira (PSD): - Sr. Deputado Cláudio Percheiro, queria fazer-lhe duas perguntas muito concretas sobre este tema. A primeira é se acha que, por uma questão de opção por parte das autarquias, está correcto ter-lhes enviado apenas um projecto, quando na realidade existem mais dois sobre a mesma matéria.
Mas, independentemente disso, sobre o projecto do PCP propriamente dito, também gostava de lhe fazer mais duas perguntas muito concretas. A primeira é se pensa que é correcto ou que se enquadra na actual filosofia do poder que o tempo inteiro ou tempo parcial possa ser exercido pelo presidente da junta ou por qualquer dos outros membros; ou seja, o presidente da junta não é obrigatoriamente, ou não é prioritariamente aquele que estará a tempo inteiro, e poderemos chegar a uma situação concreta em que o presidente da junta não está a tempo inteiro, nem a tempo parcial sequer, havendo um ou dois vogais, conforme o caso, a tempo parcial.

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Á segunda questão é esta: não duvido de que esteja no espírito que presidiu à elaboração do vosso projecto, mas a verdade é que na letra não está o facto de por parte do presidente da junta, não haver uma manifestação de vontade anterior à resolução da assembleia de freguesia. Ora, isto poderá querer dizer - pelo menos segundo a letra do projecto, não direi que no seu espírito mas o senhor me dirá se é isso ou não - que a assembleia de freguesia poderá decidir mesmo contra a vontade do próprio titular do cargo, que nesse caso não é ouvido anteriormente. Isto é o que efectivamente podemos constatar numa leitura muito simples do projecto.
A pergunta concreta é se o espírito do projecto é exactamente este, ou seja, que a assembleia decida sem ouvir ou contra a vontade do próprio presidente ou de algum dos membros da junta, ou se prevêem, se está no vosso espírito, que essa proposta seja feita, ou que essa decisão seja tomada, mediante a proposta dos próprios interessados, daqueles que serão atingidos pela decisão.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em nome do meu grupo parlamentar, quero entregar na mesa o dossier da consulta que efectuámos relativa a este projecto de lei, onde poderão verificar as centenas de respostas e os resultados obtidos, os quais são altamente positivos e favoráveis ao projecto de lei que apresentámos em defesa do poder local democrático.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Per cheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à pergunta que o Sr. Deputado João Teixeira colocou, achamos que o projecto que está em discussão é oportuno, que foi apresentado na hora certa e que não tem nada a ver com a regionalização ou com a revisão constitucional.
Entendemos, no entanto, que esse é um direito que assiste aos membros- das juntas de freguesia e há muito tempo que por eles é reclamado. Por isso, no decorrer de IV Legislatura apresentámos um projecto que só não foi consignado no estatuto do eleito local porque na altura o PSD pretendeu que nele não fosse integrado o direito de os membros das juntas de freguesia poderem funcionar a tempo inteiro. Portanto, achamos que a sua apresentação é agora oportuna e que ele não tem nada a ver nem com revisão constitucional nem com a regionalização.
Quanto às questões que o Sr. Deputado João Teixeira me colocou... Sr. Deputado... se as vossas dúvidas são só essas, então vamos trabalhar, vamos para o debate na especialidade melhorar o projecto! Se há questões que não estão aqui devidamente tratadas, faça
também um esforço para dar uma resposta à imensidão de companheiros vossos que nos responderam, pois, como sabem, temos aqui um dossier, que todos os Srs. Deputados poderão consultar, com centenas e centenas de cartas de apoio ao projecto, com propostas de alteração muito concretas e que estamos dispostos a assumir em comissão, aquando do debate na especialidade.
Os senhores estão dispostos a isso? Esta é a pergunta que vos deixamos, porque, de facto, nós estamos dispostos a introduzir as alterações necessárias. Agora o que duvidamos é de que o PSD, com a questão que nos coloca da revisão constitucional e da regionalização, queira apanhar este comboio. Sobre isso temos dúvidas, porque temos a sensação de que os senhores querem, efectivamente, travar a instituição do regime de tempo inteiro alargado, que não queremos ver aplicado apenas a um grupo muito reduzido de freguesias, mas sim num sentido mais amplo, porque é preciso dignificar a função de eleito local da autarquia freguesia e é isso que pretendemos com o nosso projecto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Magalhães.

O Sr. António Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação de projectos de lei com o objectivo de permitir a remuneração aos membros das juntas de freguesia vem colmatar uma lacuna da Lei n.º 29/87, que já na altura da sua elaboração foi sentida -podemos afirmá-lo sem margem de erro- por todos quantos se empenharam directamente na discussão do diploma legal atrás referido. As hesitações que então se manifestaram não passaram disso, na tentativa de se arranjar um texto, tanto quando possível, consensual, e fizeram com que a questão ora em apreço tivesse apenas uma abordagem apressada. Todavia, a premência e o reconhecimento que tem de se fazer ao trabalho de quantos dão o seu melhor nas autarquias de base levaram a que os três maiores partidos se sentissem motivados a apresentar projectos de lei que, embora de incidências diferentes, têm de comum o fazer--se justiça aos autarcas que mais de perto convivem com as populações e são, por isso mesmo, os primeiros a ter a noção exacta das suas carências e a diligenciar para que as mesmas sejam superadas. Está, pois, ultrapassada a primeira barreira. Quanto ao mais, o tempo será o principal juiz de uma causa que há-de merecer-nos outros reparos se hoje não tivermos a coragem política de irmos até onde o razoável se impõe.
Ninguém duvida do importante papel que já hoje está cometido às juntas de freguesia. O Decreto-Lei n.º 100/84 permite que o município delegue na junta um conjunto de tarefas, que, em múltiplos casos, não podem ser assumidas por manifesta falta de tempo dos eleitos nas freguesias.
Nos concelhos com elevado número de freguesias a descentralização do poder autárquico traduz-se num benefício efectivo para as populações, sendo o acompanhamento dos problemas destas muito mais assumido pelos membros das juntas do que pelos eleitos das câmaras, assoberbados que estão com mil e um problemas que o quotidiano da vida municipal lhes impõe. Temos, pois, de reconhecer esta necessidade e não nos ficarmos por peregrinas intenções quando de repartir

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o poder local se trata. O já consagrado em diploma legal não mereceu reparos especiais de ninguém; porém, aqueles que necessitam de uma maior dedicação e disponibilidade para arcarem com as responsabilidade que de algum modo já lhes cometeram sentem que o podem fazer em muito melhores condições através da consagração do regime de permanência para os presidentes de juntas de freguesia e outros membros eleitos.
A Associação Nacional de Municípios é constituída por autarcas insuspeitos, que conhecem como ninguém a importância dos membros das juntas de freguesia no vigor que o poder local demonstrou após o 25 de Abril. É essa Associação que no relatório final do seu IV Congresso aponta para a necessidade da ocupação total ou parcial de alguns membros das juntas de freguesia. Se dúvidas houvesse acerca da legitimidade do principal objectivo dos três diplomas em apreço, elas seriam desfeitas face ao conhecimento real de quem emitiu esta opinião sobre a matéria e ainda porque a ampla diversidade político-partidária dos que se manifestaram traduz um consenso fundamental que abate quaisquer outros aproveitamentos que se pretendam fazer.
Depois destas breves considerações de âmbito geral impõe-se fazer algumas referências mais pormenorizadas aos projectos em apreço.
O projecto apresentado pelo Partido Socialista contempla um conjunto de soluções que reputamos de equilibrado, atendendo àquilo que podem ser as necessidades fundamentais para que haja condições de executar um trabalho responsável numa autarquia, qualquer que seja a sua dimensão ou volume de problemas a ter em conta.
O exercício do mandato em regime de meio tempo nas freguesias até 5000 eleitores parece-nos suficiente para que haja um acompanhamento dos assuntos da freguesia sem lesar grandemente a actividade particular dos autarcas eleitos. Do mesmo modo, parece-nos que uma freguesia com mais de 5000 eleitores exige já um conjunto de obrigações que agora são satisfeitas à custa de muito esforço e abnegação dos seus membros. Não nos pareceu fundamental uma maior subdivisão nas freguesias com mais de 5000 eleitores por partilharmos do entendimento de que as freguesias com grande número de eleitores (situadas nos grandes centros urbanos ou na sua periferia) têm um acompanhamento permanente dos respectivos executivos municipais nas tarefas que normalmente mais trabalho dão aos membros das juntas de freguesia.
A remuneração proposta é razoável, como razoável nos parece que a mesma seja assumida pelo município e pela freguesia. Salvo raras excepções, os municípios não transferem verbas significativas para as freguesias. Com um ombrear de responsabilidades deste tipo, os cofres das juntas, de uma maneira geral já depauperados, ficariam sem recursos para atenderem às despesas do dia-a-dia, indispensáveis ao bom funcionamento da vida destas comunidades de base.
Em nossa opinião, o projecto do PSD é um projecto envergonhado e não atende à questão fundamental que se pretende ver resolvida. De facto, é nossa convicção fundamental que as freguesias entre 1000 e 10 000 eleitores são as que necessitam, regra geral, de uma maior disponibilidade de tempo na condução dos seus destinos. Deixar de contemplar esse naipe de freguesias é
não ter uma visão do conjunto dos problemas que às mesmas se põem e adiar por mais algum tempo a resolução de um problema que exige resposta a partir de hoje mesmo.
O facto de ser o orçamento da freguesia a suportar as remunerações previstas nos presentes diplomas, pelas razões atrás apontadas, parece-nos uma exigência que violenta os seus já parcos recursos.
O projecto apresentado pelo PCP parece-nos que vai um pouco longe de mais no que à distribuição de tempos se refere. A nosso ver, esqueceu a realidade existente nos concelhos do Norte, onde a pulverização das freguesias, a ser levada em conta a proposta de tempos que faz, conjugada com o modo como serão pagas as remunerações, abalaria um pouco os cofres de algumas câmaras municipais.
O partido Socialista, ponderadas as questões mais prementes que os diplomas em apreço levantam, congratula-se com o facto de ter sido abatida uma barreira até há pouco considerada de difícil transposição. Um diploma legal resultante dos três projectos em discussão, depois de consideradas todas as observações que o debate permitirá, há-de ser considerado como uma boa lei. Será uma boa lei aquela que não trave uma descentralização efectiva dos poderes cometidos aos municípios sem ferir grandemente a vida particular dos que empenhadamente se entregam à tarefa de pugnar pela satisfação das carências básicas das populações nos mais díspares lugares do nosso país. As populações já reconheceram o trabalho devotado dos eleitos das freguesias. Os representantes das câmaras municipais no seio da sua estrutura mais representativa fizeram o mesmo. Cabe agora à Assembleia da República aproximar-se do país real, votando favoravelmente os diplomas em discussão, para que em sede de comissão especializada se possa chegar a um texto comum, no seguimento de uma prática salutar que sobre estas matérias tem existido. É o que o Partido Socialista se propõe fazer, na convicção de que, assim, se defenderão efectivamente os interesses das populações, contribuindo para um mais rápido progresso das mais pequenas comunidades locais, tão esquecidas ao longo de tantos e tantos anos.

Aplausos do PS, do PCP e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República, desde a institucionalização do poder local pela Assembleia Constituinte na Constituição da República Portuguesa, tem vindo, progressivamente, a construir o seu quadro jurídico.
Durante estes últimos doze anos os deputados e o Governo, através das respectiva autorizações legislativas da Assembleia da República, aprovaram um conjunto de diplomas que regulam o funcionamento das autarquias locais e que contribuíram de forma decisiva para a sua afirmação e consolidação em Portugal e permitiu-lhes igualmente dar respostas positivas às exigências das populações locais.
O PSD, como o maior partido do poder local, tem tido como principal objectivo afirmar, dignificar e prestigiar cada vez mais as autarquias locais, os seus órgãos e os seus titulares.

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Por isso, nós, sociais-democratas, temo-nos empenhado na transferência para as autarquias locais de novas atribuições e competências e vamos continuar a fazê-lo de forma progressiva e selectiva, como consta do Programa do XI Governo Constitucional, presidido pelo Prof. Cavaco Silva.
Com igual objectivo elaborámos e aprovámos em 1987 nesta Câmara, por larga maioria, com base num anteprojecto do PSD, o Estatuto dos Eleitos Locais, que deu resposta globalmente positiva a um justo e pertinente anseio dos autarcas portugueses. Este Estatuto, que naturalmente não é o ideal, mas é o possível, dignificou mais a função e a acção dos eleitos locais, melhorou as suas remunerações e proporcionou uma maior segurança em relação ao seu futuro, designadamente após a cessação dos seus mandatos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, como sempre temos afirmado, o poder local é um poder dinâmico, e não estático, deve procurar permanentemente afirmar-se e aperfeiçoar-se no dia-a-dia para melhor corresponder às aspirações das múltiplas comunidades locais existentes no nosso país.
Compete-nos a nós, deputados, acompanhar no plano legislativo essa dinâmica de forma gradual e sensata.
É neste quadro evolutivo do poder local que o PSD, depois de uma aprofundada e ponderada reflexão, decidiu apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 245/V, no qual se garante aos presidentes de junta de freguesia, em certos casos, a possibilidade do exercício do mandato em regime de permanência.
O nosso projecto de lei é alternativo aos projectos de lei do PS e do PCP com idêntico objecto.
O PSD considera no preâmbulo do seu projecto de lei que, a nível da autarquia freguesia, deve manter-se o princípio geral do voluntarismo e de serviço às populações locais, não se profissionalizando os respectivos cargos autárquicos.
No entanto, fazemos uma pequena excepção a este princípio geral para as maiores freguesias do nosso país, devido à sua elevada população e às múltiplas e crescentes tarefas que as juntas de freguesia têm e que têm vindo a adquirir, através da delegação de competências efectuadas pelos respectivos municípios, as quais obrigam e exigem uma maior responsabilização e disponibilidade para uma gestão eficiente e eficaz dessas autarquias, que já têm orçamentos substanciais.
Por isso, o nosso projecto prevê a possibilidade de nas freguesias com 20 000 ou mais eleitores os presidentes das juntas de freguesia exercerem o mandato em regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo.
Trata-se, portanto, de uma faculdade conferida a um restrito número de freguesias.
De qualquer modo, trata-se ainda de uma faculdade de exercício condicionado pela autorização da assembleia de freguesia. O que significa que este órgão pode impedir a aplicação dos princípios contidos neste projecto se não se justificar a sua aplicação.
No que diz respeito à remuneração a atribuir aos presidentes de junta em regime de permanência e a tempo inteiro, consagra-se no nosso projecto 90% do valor da remuneração atribuída aos vereadores dos municípios com 10 000 ou menos eleitores. Afigura-se-nos
uma remuneração equilibrada e que mantém a distinção que deve existir entre titulares em regime de permanência das câmaras municipais e das juntas de freguesia.
Consideramos que os encargos resultantes das remunerações dos presidentes das juntas contemplados neste projecto de diploma, ao contrário dos projectos do PS e do PCP, devem ser suportados exclusivamente pelos orçamentos das freguesias, dentro do princípio da independência e da autonomia dos órgãos autárquicos.
Parece-nos também razoável que esta lei só entre em vigor a partir do próximo mandato das autarquias locais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, lamentamos que o PCP e, em particular, o PS não queiram pautar a sua actuação e as suas iniciativas legislativas nesta matéria pelo equilíbrio, pelo bom senso e pela razoabilidade, preferindo antes caminhar por via altamente demagógica e excessiva.
O PCP e o PS querem, através dos seus projectos, generalizar desde já a quase todas as freguesias do País a profissionalização de vários membros de cada junta de freguesia; convenhamos, Srs. Deputados do PCP e do PS, que são excessivas e irresponsáveis as vossas propostas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado! Risos do PS.

O Orador: - O projecto de lei do PS chega ao ponto de propor no seu projecto a revisão de todo o quadro de abonos dos eleitos das juntas de freguesia. Pelo seu âmbito, esta matéria só deve ser encarada, se for caso disso, em sede de revisão do Estatuto dos Eleitos Locais.
Por aquilo que acabámos de afirmar, o PSD não pode dar o seu voto favorável aos projectos do PS e do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, com esta iniciativa legislativa que apresentamos, o PSD dá mais um passo...

Uma voz do PCP: - Um passo atrás!

O Orador: - ... equilibrado e positivo para a dignificação do poder local e dos eleitos locais, a fim de que estes cumpram bem com os seus mandatos e proporcionem, cada vez mais, uma melhor qualidade de vida às populações locais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Barbosa da Costa, Lopes Cardoso, Cláudio Percheiro e Herculano Pombo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Deputado Manuel Moreira, o PRD considera que nalguns projectos apresentados há excesso de mandatos a atribuir em regime de permanência, mas, por outro lado, considera também que no projecto do PSD há um defeito excessivo na possibilidade de assunção de mandatos em regime de permanência.
E esse defeito é tanto mais flagrante quanto se verifica que a partir de 20 000 eleitores uma boa parte das juntas de freguesia funcionam como locais burocrá-

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ticos, onde normalmente os Srs. Presidentes de Junta se limitam a passar atestados, na medida em que boa parte das questões que preocupam os autarcas das zonas suburbanas e das zonas rurais, designadamente problemas ligados à electricidade, aos lixos, ao saneamento básico, ao aspecto de jardinagem, etc., são assumidos pelas câmaras municipais. Daí que se considere que o projecto de lei do PSD já é alguma coisa, mas é uma coisa tão mitigada que penso que importaria rever e alargar o seu âmbito, pelo menos, às freguesias com um número de leitores mais baixo.
Gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Manuel Moreira se estará aberto, se o PSD estará aberto, a reconsiderar o número apresentado para que, de facto, juntas de freguesia com mais dificuldades de resolução dos seus problemas possam usufruir das decorrências próprias desta lei que estamos a criar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O Sr. Deputado Manuel Moreira, aliás como o PSD, tem cada vez mais tendência a arvorar-se em juiz, em juiz da responsabilidade, da competência, da oportunidade... Tudo quanto não sai dessa bancada, em geral, e do Sr. Deputado, em particular, é irresponsável, ou é inoportuno, ou é ineficaz! Os tempos dirão e pode estar seguro, Sr. Deputado, de que não tardará muito a ter de se arrepender de ter classificado o projecto do PS de irresponsável! ...
Viemos para este debate com uma total abertura, e o meu camarada, na sua intervenção, acabou por dizer que a nossa posição, à partida, era a de viabilizarmos todos os projectos, independentemente das críticas que tenhamos a fazer ao projecto do PSD e ao projecto do PCP, e também com a consciência de que o nosso projecto certamente merecerá críticas, para que, em comissão, ponderadamente, pudéssemos encontrar as melhores soluções.
O PSD já avisou, de forma categórica, que inviabilizará qualquer outro projecto. É natural, pois o PSD tem a verdade agarrada por uma perna e não vai perder tempo com os disparates dos outros partidos, como o Sr. Deputado já classificou os outros projectos de lei.
Deixe-me acrescentar-lhe que, a partir deste momento, a posição do PS não pode ser de maneira nenhuma a de votar favoravelmente o projecto do PSD, que é, como já aqui foi dito, um projecto envergonhado, um faz que anda, mas não anda. Não nos oporemos, abster-nos-emos, porque, enfim, pelo menos, ficará o princípio, e não temos, nesta matéria, uma posição de obstrução, mas os interessados ajuizarão das diferentes posições e daquilo que sair do trabalho em comissão.
A questão que lhe punha, Sr. Deputado, muito concretamente, é esta: o Sr. Deputado já fez contas, já viu, na prática - não tenho os números certos -, em relação as cerca de 4400 ou 4500 freguesias que existem neste país,...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Tire-lhe 300 freguesias!

O Orador: - ... quais serão as contempladas pelo projecto do PSD? Já ponderou na realidade para que o Sr. Deputado do PRD chamou a atenção, ou seja, no facto de muitas vezes a responsabilidade que cabe às juntas de freguesias não ser proporcional à dimensão dessa freguesia, em termos de eleitores, antes pelo contrário, ser inversamente proporcional, havendo freguesias com menos eleitores que acabam por ter mais responsabilidades do que aquelas que têm grande número de eleitores?
O Sr. Deputado Manuel Moreira já ponderou estes dois aspectos para medir, efectivamente, qual o alcance real do projecto do PSD?

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - O Sr. Deputado Manuel Moreira afirmou, na sua intervenção, que faz parte do programa do PSD e do Governo prestigiar e dignificar o poder local. É desta forma que o faz, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Gradualmente!

O Orador: - Segunda questão: por que razão o Sr. Deputado não tem a coragem de dizer publicamente quais são os casos que o projecto do PSD vai contemplar, quais as freguesias que vai abranger?
Terceira questão: como vai o PSD, com o seu projecto, resolver casos de freguesias como as de Castelo Branco, Sé, Faro, Alcabideche, Penha de França, São João de Brito, Pontinha, Damaia, Lordelo do Douro, Póvoa de Varzim, Alto do Seixalinho, Montijo, onde faltam poucos cidadãos para atingir os 20 000 eleitores? Como vai o Sr. Deputado resolver estas situações?
Disse também o Sr. Deputado que - e é uma verdade - o seu projecto obrigará as juntas de freguesia a suportar encargos, caso os autarcas venham a exercer as suas funções em regime de permanência.
Mas, Sr. Deputado, o que é facto evidente e claro é que, quando se trata de reforçar o poder local com verbas substanciais, que permitam fazer frente, de facto, a todas as despesas que possam advir por qualquer razão, os senhores recusam sempre esse reforço. Prova evidente disso foi a Lei das Finanças Locais, foi o Orçamento do Estado, onde o recusaram.
Portanto, o que o PSD mantém é uma política de asfixia do poder local e esta é disso uma prova evidente, ...

O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - ... dado que entrega mais um encargo às autarquias, cujos meios de que dispõem já não dão para fazer quase nada, e agora os senhores ainda lhes atiram com este encargo, que, ainda assim, é substancial!
Outra questão: o Sr. Deputado falou aqui - ou, pelo menos, levantou essa hipótese - que era possível integrar isto no Estatuto do Eleito Local e meter mais algumas freguesias.

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O Sr. Manuel Moreira (PSD): Não foi isso que eu disse!

O Orador: - Por que não o fez então na altura própria, Sr. Deputado, aquando da elaboração do Estatuto do Eleito Local? Por que razão o seu partido recusou então aceitar que se contemplasse a permanência de membros das juntas de freguesia a tempo inteiro? Estas e outras questões mais foram-nos apresentadas por vários autarcas e até mesmo pela Associação Nacional de Municípios Portugueses - órgão representativo, a nível nacional, de todos os municípios -, a quem os senhores fizeram frente, tendo recusado as suas propostas!

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado Manuel Moreira, a primeira questão, embora um pouco prejudicada pelos oradores que intervieram antes de mim, é a seguinte: quantas e quais são, de facto, as freguesias com mais de 20 000 eleitores?
A segunda questão prende-se com o princípio geral que o Sr. Deputado aqui afirmou. Não quero pôr em causa o espírito de serviço que em Portugal tem demonstrado a grande maioria dos autarcas, nem, obviamente, quero pôr em causa aquilo que está feito, os enormes sacrifícios que têm sido feitos. Mas penso que continuar a apostar no voluntarismo e no espírito de serviço em inúmeras situações, nomeadamente em situações que o Sr. Deputado tem obrigação de conhecer, como no Norte do País, em que não é o número de eleitores que mais conta, mas sim a pulverização e o número de aldeias que compõe cada freguesia, não é a melhor solução.
As assembleias de freguesia muitas vezes nem sequer são dotadas de orçamento próprio - e isto acontece em inúmeros concelhos do Norte, onde o presidente da junta de freguesia é o faz-tudo daquela junta -, não reúnem, porque não têm que fazer, não têm um orçamento para aprovar, não têm um plano para executar. Aí continua a política do chapéu na mão, em que o responsável pela freguesia, que é o presidente eleito e que, como disse, faz tudo, até anda de chapéu na mão a determinado dia da semana pedindo ao Sr. Presidente da Câmara uma obrinha pela alminha de quem lá tem.
Continuar com este espírito de voluntarismo, com este espírito de serviço, de entregar a um homem só, àquele que não tiver grande coisa que fazer e que tiver mais disponibilidade, que tiver a sua vida um pouco mais liberta, e não àquele que sinta verdadeira responsabilização, àquele que seja compensado economicamente pelo esforço que faz, não lhe parece que é continuar a não termos autarquias a funcionar? Não lhe parece que nestes casos, em que juntas de freguesia têm dez, onze e doze aldeias, que requerem um esforço permanente por parte do executivo da junta para conhecimento dos problemas e contacto com as pessoas, tal trabalho requer tempo a uma ou duas pessoas, que terão de deixar os seus afazeres profissionais, muitas vezes de agricultura, outras vezes de comércio e outros? E, sendo assim, estas pessoas não deveriam ser compensadas de alguma forma pelo esforço e pelas horas
que perdem? Ou será que só as freguesias agora classificadas, digamos, de 1.ª classe, pelo facto de terem 20 000 eleitores, é que merecem ter um elemento da junta a tempo inteiro? É que muitas vezes são essas as que já têm este problema resolvido, porquanto, por serem grandes freguesias, têm grandes problemas, mas têm uma grande aproximação às câmaras municipais e, como tal, já há da parte destas um esforço no sentido de atender essas freguesias, pelo facto de terem muitos eleitores e, portanto, serem sítios onde se deve dar um atendimento preferencial?
Em resumo, a questão que lhe deixo é a seguinte: de facto, o Sr. Deputado continua a acreditar que o voluntarismo e o espírito de sacrifício chegam para garantir que a democracia ao nível autárquico funcione em Portugal?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Dado que ainda vai haver mais uma intervenção da minha bancada e como tenho pouco tempo, vou responder globalmente a todos os Srs. Deputados que me questionaram.
Começaria por dizer ou reafirmar aquilo que já disse na minha intervenção: o PSD considera que desde 1976 estamos a construir o quadro jurídico do funcionamento das autarquias locais. E temos vindo a dar, gradualmente, passos importantes e seguros no sentido de consolidar o poder local.
Julgo que o projecto que apresentámos é sensato, equilibrado, devidamente reflectido e dá mais um passo nesse sentido - naturalmente que para os Srs. Deputados da oposição o nosso projecto é tímido, mas para nós é suficiente para já -, no sentido de atribuir ou de possibilitar que titulares de um outro órgão autárquico, que é a freguesia, possam começar a estar em regime de permanência.
Penso que é assim que devemos caminhar, e daqui a alguns anos poderemos dar outros passos, conforme a própria experiência e a própria acção das autarquias freguesias nos ditarem. Foi nessa perspectiva que o PSD apresentou o seu projecto de lei.
O PSD não se arvora de maneira alguma em detentor da verdade. O PSD assume-se claramente como maioria, quer do País, quer desta Câmara, e, por isso, lidera o governo do País. Naturalmente, compete mais ao PSD do que a qualquer outro partido da oposição zelar pelos interesses do Estado, e quando se zela por estes também se está a zelar pelo próprio poder local. E é nessa postura política que o Partido Social-Democrata se coloca, não resvalando, nas suas posições, para atitudes claramente demagógicas e irresponsáveis que estão contidas e estão subjacentes ao projecto do PCP e também, com uma ligeira moderação em relação a este, ao projecto do Partido Socialista.

O Sr. José Lello (PS): - Muito ligeira!

O Orador: - Devo dizer que, lamentavelmente, é muito ligeira.
Os Srs. Deputados perguntam-me quais as freguesias que são contempladas pelo nosso projecto. Devo dizer que fizemos as contas, tivemos isso em consideração para elaborarmos o projecto, e das 4200 freguesias contemplam-se 46 freguesias.

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O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Isso é obra!

O Orador: - Julgamos que são aquelas que neste momento, pela sua dimensão em termos de aglomerado populacional, pelo volume de trabalho, pelas competências que neste momento lhes estão a ser concedidas por parte dos municípios, através de protocolos, de delegação de competências, acho que se justifica começarmos por essas freguesias, ao permitir-se que o presidente da junta possa estar a tempo inteiro ou a meio tempo, conforme a sua própria possibilidade.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Isso nem dá percentagem!

O Orador: - Dá percentagem, sim, Sr. Deputado!

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Dá percentagem!
O Orador: - Segundo o inquérito feito pelo Partido Comunista Português, a meu ver, as freguesias que foram consultadas não tiveram oportunidade de poder fazer uma análise, uma avaliação, um juízo global, em relação aos três projectos que hoje estão em discussão. Há 4200 freguesias no País, responderam apenas 330 freguesias, o que corresponde a 7,8% do total. Isto é a resposta cabal de que o projecto do PCP não tem o apoio da maioria das freguesias do País. Que eu saiba, 7,8% estão longe de corresponder à vontade maioritária deste país.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Veja o número de eleitores que têm!

O Orador: - Penso que a melhor resposta foi-nos dada e facultada pelo Partido Comunista Português ao entregar-nos este dossier da consulta efectuada para que hoje possamos votar negativamente, com toda a convicção e consciência, o projecto do PCP e, por analogia, o projecto do Partido Socialista, uma vez que segue muito de perto o projecto do PCP.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Os senhores não são a favor do poder local, querem é asfixiá-lo!

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Dá-me licença que interrompa?

O Orador: - Vou conceder-lha, mas, se me permite, deixe-me só concluir este raciocínio.
Julgo que é importante que os titulares das autarquias locais estejam num espírito de voluntarismo ao serviço pleno das comunidades locais, assim como existem muitos outros cidadãos portugueses que estão em muitas instituições de diversa índole ao serviço pleno, gracioso e voluntarista das comunidades locais e têm feito obras tão válidas como as que têm sido feitas por muitas autarquias, muitas freguesias do nosso país.
Por isso, considero que o princípio a que deve obedecer o serviço às comunidades locais deve ser o princípio do voluntarismo, e não o da profissionalização. Naturalmente que o Partido Comunista Português quereria, com certeza, com o seu projecto, funcionalizar ou profissionalizar muitas autarquias, pôr funcionários
políticos, não para servir as comunidades locais, não para servir as freguesias, mas talvez para fazer acção político-partidária. É evidente que o Partido Social-Democrata não embarca nisso e é pena que outros partidos democráticos embarquem nesse objectivo. Pensamos que não é esse o objectivo, não deve ser essa a função das autarquias locais, das freguesias, e, por isso, consideramos que são irresponsáveis e bastante levianos os projectos do PCP e do PS.

Aplausos do PSD.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Então muito obrigado por me ter concedido a interrupção!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa da Costa, tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa da Costa, faça favor de aguardar um momento.
Sr. Deputado Manuel Moreira, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, embora sem intenção, esqueci-me de conceder a interrupção que me foi pedida pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso. Assim, agradecia que o Sr. Presidente lhe desse agora a palavra, caso o Sr. Deputado ainda o deseje.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, dado que o Sr. Deputado Manuel Moreira lhe concedeu a interrupção, se desejar, tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, tal como por vezes me sucede, compreendi que se tratou de um lapso do Sr. Deputado Manuel Moreira. Portanto, agradeço ao Sr. Deputado, mas agora já não vale a pena, pois certamente terei oportunidade de voltar a este assunto.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Questões ligadas ao exercício do poder local estão de novo nesta Assembleia.
Três projectos de lei pretendem hoje desenvolver e dar conteúdo alargado a disposições já contempladas numa lei específica e mais tarde integradas no Estatuto dos Eleitos Locais.
Desta vez procura-se garantir aos membros das juntas de freguesia, em certos casos, a possibilidade do exercício do mandato em regime de permanência.
As múltiplas solicitações e diversidade de trabalhos em que devem estar empenhados obrigam muitas vezes os eleitos locais, a nível de freguesia, a um conjunto de dificuldades que não permitem exercer, correcta e atempadamente, o seu múnus autárquico e põem em constante risco a sua actividade profissional, seja ela própria ou por conta de outrem.

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Por outro lado, as limitações actualmente impostas não permitem o acesso aos cargos dos melhores, que, muitas vezes e legitimamente ponderam os prejuízos advenientes da função para que são convidados. A crescente e saudável descentralização e desconcentração de funções e actividades autárquicas colocam sob a responsabilidade das juntas de freguesia competências delegadas, que, em boa verdade, não têm condições de exercer cabalmente, face às limitações actualmente existentes.
Urge, por isso, encontrar um estatuto capaz que minimize as dificuldades actuais. Contudo, importa usar de prudência para que um louvável objectivo não desemboque na criação de mais uns quantos lugares sem a correspondente contrapartida em benefícios comunitários.
Daí que, dando o acordo de princípio a tais iniciativas, como deixou antever na sua declaração de voto aquando da primeira medida legislativa contemplativa da matéria, não deseja o PRD que se abra uma nova suspeição da população contra os que exercem funções públicas e que delas auferem vencimentos.
Pensamos, pois, que não se deve avançar para soluções alargadas, mas necessariamente para uma lei que minimize injustiças, mas que não crie problemas maiores.
Entendemos ainda que a tais vencimentos devam corresponder transferências de responsabilidade e delegação de funções que também facilitem aos cidadãos a solução rápida e eficaz dos seus problemas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, procuremos, pela via legislativa e pelo exercício das funções, criar um clima de solidária confiança entre eleitos e eleitores para que da conjugação do esforço mútuo resulte uma vivência democrática mais participada e confiante.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei uma intervenção bastante breve, pois que, do que havia a dizer sobre esta matéria, já tudo foi dito. Por isso mesmo, mais do que uma incursão na matéria, será uma justificação de voto.
Em primeiro lugar, apesar de não lhe darmos o nosso acordo, desejamos saudar a iniciativa legislativa do Partido Comunista Português, porque, na sua falta, nem sequer teria sido possível o passo tímido que o PSD diz querer dar,...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - ... e, assim, pelo menos 46 freguesias do País ficariam sem um único funcionário trabalhando em regime de permanência para prestarem serviço à comunidade em melhores condições do que até agora.
Em segundo lugar, apesar de sermos um partido de oposição e com a representação autárquica que todos conhecem, consideramos que o Estado também é nosso. Isto é, não é só à maioria parlamentar que pertence zelar pelos interesses do Estado Português, porque ele é de todos nós, cidadãos, mesmo daqueles que estão representados na Assembleia da República por um, dois, três ou quatro deputados. Mesmo que o PSD tenha a maioria de deputados, os motivos da sua defesa dos interesses do Estado são idênticos aos de qualquer outro partido representado nesta Assembleia.
Simplesmente, estamos perante uma concepção própria do PSD. O PSD arroga-se como detentor e proprietário do Estado, e, por isso, dizemos que esta não é apenas uma maioria parlamentar absoluta, mas que é também a concepção do «Estado-PSD» que está em marcha. Isto porque, tal como acaba de dizer o Sr. Deputado Manuel Moreira, só ao PSD é que cumpre zelar pelos interesses do Estado e que considerou não ser este um dever também da oposição!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Está à vista o «Estado-PSD», ou «Estado-laranja», e daí todo este espectáculo a que assistimos!

O Sr. António Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ainda bem que o Sr. Deputado concorda, porque é preciso que esta Câmara, a opinião pública e, principalmente, a comunicação social tomem consciência do que acabei de afirmar. Assim, chamo a atenção da opinião pública para que tome conhecimento de que nesta Câmara, num órgão de soberania, o PSD se arvora em dono do Estado, dizendo que à oposição não compete zelar pelos interesses do Estado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, queria dizer que não possuímos quaisquer estatísticas que expliquem por que razão apenas as juntas de freguesia com mais de 20 000 habitantes devem ter um funcionário em regime de permanência, enquanto outras não.
Entendemos que há freguesias e freguesias: numas o movimento é muito maior do que noutras. Há algumas onde, realmente, não se justifica a existência de funcionários em regime de permanência. Por isso mesmo, em muitos casos, concordamos com o PSD, que temos que dar passos pontuais e pragmáticos e que não podemos desde já instituir regras gerais.
Nesta matéria estamos perante dois princípios diferentes. Assim, de acordo com o PCP, o regime de permanência seria regra geral, pois que o projecto de lei daquele partido estabelece que nas juntas de freguesia com mais de SOO habitantes haveria sempre um funcionário remunerado. Por outro lado, segundo a tese do PSD, a regra geral de prestação de serviços seria a do voluntariado e somente existiria o regime de permanência em 46 juntas de freguesia.
Por isto mesmo, temos que ver qual é o princípio geral mais conveniente: se é o do Partido Comunista, que estabelece o regime de permanência, ou se é o do PSD, que quer o regime de voluntariado.
Neste capítulo, entendemos que devemos alinhar com o PSD. Isto é, o regime de permanência deve ser, não o princípio geral, mas sim uma excepção. No entanto, consideramos que não deverá ser uma excepção tão restrita quanto o PSD pretende, mas uma excepção algo mais alargada. Ou seja, concordamos com que o princípio geral seja o do voluntariado e que, como excepção, haja juntas de freguesia que este ano comecem a ter membros funcionando em regime de permanên-

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cia e remunerados. Mais tarde, a experiência nos dirá quais destas juntas de freguesia terão de aumentar o número de funcionários, até porque estas últimas servirão de exemplo para outras, e, assim, serão as próprias juntas de freguesia que, justificadamente, tomarão a iniciativa de solicitarem o regime de permanência para os respectivos membros.
Daí que, não tendo o CDS nenhuma estatística e tendo apenas «a intuição» - digamos assim - de que é muito pequeno o número de 46 juntas de freguesia avançado pelo PSD, enquanto que o que é proposto pelo PCP é muito grande, e, dado não pretendermos ser juizes nesta matéria, seguindo dogmaticamente um ou outro destes dois partidos, não iremos votar o projecto de lei do Partido Comunista, por nos parecer exageradamente gravoso para as possibilidades financeiras do país.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Deputado, o nosso projecto de lei não obriga ninguém!

O Orador: - Como disse, não aceitamos como princípio geral o pagamento de um funcionário permanente em todas ou quase todas as juntas de freguesia do País.
Mas apoiamos o PS, na medida em que, ultrapassando este número muito restrito de 46 juntas de freguesia, pretende encontrar um termo que satisfaça as necessidades locais e as reivindicações que em sede de comissão nos parecerem que são de considerar.
Por isso mesmo, vamos votar favoravelmente os projectos de lei do PS e do PSD, na esperança de que em sede de comissão possam vir a ser trabalhados para se chegar a uma solução de consenso, porque também zelamos pelos interesses do Estado e também queremos participar na felicidade das comunidades locais.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Deputado Narana Coissoró, queria apenas esclarecer o meu pensamento, dado que o Sr. Deputado foi muito hábil em o deturpar.
De facto, há pouco, o que eu disse foi que, na sua qualidade de maior partido no País e ao nível de poder local, compete ao PSD, por maioria de razão, zelar pelos interesses do Estado e, naturalmente, pelos do poder local.
Foi apenas isto que quis dizer e, por isso, tudo o que o Sr. Deputado referiu na sua intervenção foram fantasias, que nada têm a ver com o meu pensamento nem com o do PSD.

Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, se desejar, tem a palavra para responder.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Manuel Moreira, queria apenas agradecer-lhe mais um adjectivo com que o PSD classifica as oposições: já eram irresponsáveis, já eram inoportunas e agora são deturpadoras e fantasiosas.
Agradeço-lhe estes mimos, porque, assim, a verdade só está com o PSD, como V. Ex.ª procura defender.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O PSD é um dicionário de sinónimos!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Deputado Narana Coissoró, chamou a atenção para algumas das dúvidas que se colocam nesta matéria, na qual, de facto, estamos confrontados com algumas posições de certo modo extremas, sendo difícil conhecer-se o ponto de equilíbrio. Assim, o Sr. Deputado não considera que esta matéria mereceria uma análise ponderada em sede de comissão?
Aliás, congratulo-me com o anúncio do sentido de voto do CDS, na medida em que demonstra já uma grande abertura por parte do seu partido. Então, desde que a maioria não continuasse a ter uma posição fechada e sectária de recusa de tudo quanto vem da oposição, o Sr. Deputado não considera que seria sensata a admissão de que todos os projectos de lei em apreciação pudessem ser alvo de discussão na comissão? De facto, face às dúvidas da oposição, que não possui, nem a «virtude» de ter as mesmas certezas da maioria, nem a de acreditar que as tem - que sejam felizes com essa crença que têm neles próprios! -, não crê o Sr. Deputado que seria mais sensata a baixa à comissão de todos estes projectos de lei, emergindo depois aquele que, numa perspectiva consensual ou maioritária, melhor correspondesse aos interesses dos autarcas e, concretamente, aos das juntas de freguesia?
Não considera ainda o Sr. Deputado que o PSD, ao anunciar liminarmente, na abertura deste debate, a recusa de qualquer projecto de lei, à excepção do seu próprio, denunciou, mais uma vez, um posicionamento sectário e de permanente fuga ao diálogo com a oposição, de fuga a uma procura de soluções minimamente consensuais?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada lida Figueiredo, tem a palavra para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, neste pedido de esclarecimento que lhe pretendo fazer começo por clarificar algo sobre o nosso projecto de lei e que se refere a uma questão que o Sr. Deputado abordou na sua intervenção, nomeadamente quanto ao aspecto da obrigatoriedade ou não dos órgãos da junta de freguesia deliberarem sobre o regime de permanência.
Quero clarificar que o projecto de lei que apresentámos não obriga aqueles órgãos a optarem pelo regime de permanência, permitindo-o apenas. Portanto, o diploma permite aos órgãos das juntas de freguesia que tomem essa decisão, mas não os obriga. Cabe-lhes decidir se pretendem ou não optar pelo regime de permanência.
Portanto, o diploma é claramente optativo e, simplesmente, cria as condições para que os órgãos das juntas de freguesia possam deliberar positivamente sobre algo que hoje, como o Sr. Deputado sabe, a lei não permite.
Face ao debate aqui em curso e as posições que têm sido assumidas pelo poder local e pelos autarcas - quer as transmitidas pela consulta que realizámos e já referimos, quer as da Associação Nacional de Muni-

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cípios, quer as de dezenas e dezenas de associações municipais, e não apenas das juntas de freguesia -, o Sr. Deputado não considera que tudo isto deveria levar o PSD a rever a sua atitude, não tomando nesta Assembleia uma posição fechada, assim impedindo, de facto, a aprovação de um projecto de lei, pelo menos na generalidade?
Evidentemente que lhe faço esta pergunta tendo em atenção que, depois, na especialidade, poderíamos encontrar soluções consensuais que permitissem aos eleitos das maiores juntas de freguesia optarem pelo regime de permanência.
O PSD já afirmou que o seu projecto de lei apenas contempla 46 freguesias. Ora, o Sr. Deputado, que conhece o poder local, sabe que este é um número muito restrito e que existem dezenas ou centenas de outras freguesias que também tinham direito a terem membros seus trabalhando em regime de permanência.
Não considera o Sr. Deputado que a posição mais correcta do PSD seria a de permitir que os três projectos de lei baixassem à Comissão Parlamentar de Administração Interna e Poder Local para que nessa sede, ouvidos os interessados e seus representantes, fosse encontrada a solução que melhor correspondesse aos interesses do poder local?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, tem a palavra para responder.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Srs. Deputados, em primeiro lugar, queria dizer que os debates na generalidade se destinam à escolha da filosofia de base que anima um dado diploma, enquanto em sede de especialidade o debate tem por fim a escolha de soluções melhores, respeitando a filosofia adoptada.
Sr.ª Deputada lida Figueiredo, como já disse, não podemos aceitar a filosofia que anima o projecto de lei do PCP porque, segundo informei, de entre as 4000 juntas de freguesia do País só deve haver cerca de 1120 com menos de SOO habitantes, de modo que a grandessíssima maioria - quase 70% ou 80% - seria abrangida pelo projecto de lei do vosso partido. Daí que seja só uma maneira de «doirar a pílula» o facto de dizerem que não é obrigatória a tomada de decisão dos órgãos das juntas de freguesia quanto ao mandato em regime de permanência dos seus membros. De facto, uma vez lançado o processo, será muito difícil dizer-lhes que não - basta olharmos para as cartas escritas ao vosso partido sobre esta matéria. Quanto às cartas, deixe-me que lhe diga que, se perguntarmos a alguém se quer ou não ganhar dinheiro pelo exercício das suas funções, essa pessoa tem de ter muita coragem para escrever ao Partido Comunista a dizer que não quer ganhar dinheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Não é questão de ganhar dinheiro, Sr. Deputado.

O Orador: - De modo que se podem arranjar cartas de resposta em que se defende que «o vosso projecto é muito digno, é muitíssimo bom, está muitíssimo bem feito, 'defendam-no com unhas e dentes* e ... venha o cheque no fim do mês!».
Ora bem, não é isto que interessa. E exactamente por não concordarmos com esta filosofia é que dizemos que vamos votar contra o projecto de lei do PCP e a favor dos restantes, dado que têm uma filosofia diferente.
Agora, se me perguntarem se o PSD podia fazer o mesmo que faz o CDS, responderei que o CDS é diferente do PSD exactamente porque tem soluções diferentes.
Em segundo lugar, quando querem saber se o CDS entende que o PSD deveria ou não dar mais atenção ao poder local, respondo que isso é lá com eles! Isto é, a responsabilidade política define-se mediante o voto. Vêm aí as eleições para as autarquias locais e naturalmente que nestas cada partido será julgado, pois é para isso que existem eleições nos países democráticos.
Portanto, não é ao CDS que compete dizer ao PSD que se mantenha aberto ou que se mantenha fechado. A única coisa que temos que fazer é, mais uma vez, registar o «completo fechar de portas» por parte do PSD a toda a espécie de diálogo e de concertação com os partidos da oposição sobre um importante problema ...

O Sr. Manoel Moreira (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - ... nos momentos e nos assuntos que a todos dizem respeito, e isso é que é lamentável.
Isto é, à «boleia» da iniciativa legislativa do PCP, o PSD quer fazer uma lei só dele, restritiva, excepcional e só dele próprio - repito - para daí tirar efeitos demagógicos, que depois são anunciados no jornal Povo Livre e no Telejornal como uma dádiva ao País.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Demagógico é o que o senhor está a dizer!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Casimiro Pereira, tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. Casimiro Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa do PCP de agendar o projecto de lei n.º 133/V, que levou a que o PS apresentasse o seu próprio projecto de âmbito semelhante embora um pouco mais moderado, não pode deixar de suscitar ao PSD profundas reservas.
Com efeito, o PCP, ao generalizar a todas as juntas de freguesia com mais de SOO eleitores a possibilidade de um ou mais dos seus membros, a meio tempo ou a tempo inteiro, poderem exercer os seus cargos em permanência, prevendo, inclusive, que nas freguesias com mais de 5000 eleitores pudessem vir a exercer quatro elementos em meio tempo, como alternativa a dois a tempo inteiro, tal propósito não pode deixar de se nos afigurar destituído do mais elementar bom senso.
Trata-se, a nosso ver, de iniciativas completamente desenquadradas de um certo equilíbrio administrativo em que as juntas de freguesia têm estado inseridas e que lhes tem permitido, em espírito de voluntariado e de serviço das respectivas populações, contribuir de forma extraordinariamente meritória para a resolução de muitos e importantes problemas que afectam as suas comunidades.
O PSD faz questão em que fique bem claro que reconhecemos às juntas de freguesia um contributo importantíssimo na institucionalização de um poder local verdadeiro, autónomo e forte, que tem sabido e continuará a saber, estamos certos, praticar a democracia de maneira essencialmente participativa e em que os assuntos se resolvem ao nível máximo de vizinhança.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados, nesta fase da vida nacional, em que o processo de institucionalização das regiões administrativas está em curso, com a revisão da Constituição a decorrer, processos que seguramente terão a sua evolução para novas realidades técnico-administrativas, o PSD não pode deixar de considerar inoportunas as presentes iniciativas legislativas.
Tenha-se em conta que o Estatuto dos Eleitos Locais entrou em vigor há menos de um ano, com o apoio de praticamente todos os partidos.
Entretanto, como será do conhecimento, pelo menos, dos membros da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, são muitas as petições provenientes de diversos sectores autárquicos, tais como ex-presidentes de câmara com um só mandato, vereadores em não permanência, membros de assembleias municipais e, naturalmente, membros de juntas de freguesia a reclamar por não terem sido contemplados no referido Estatuto no que respeita a benefícios vários ...

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - O PSD não deixou!

O Orador: - ... que vão desde a contagem de tempo de serviço a remunerações que entendem convenientes e quiçá justas.
E, se concordamos, sem esforço, que todas estas questões são discutíveis, não podemos deixar de manifestar o nosso desacordo aos Srs. Deputados do Partido Comunista e do Partido Socialista pelo descuido com que apresentam estas questões, sem se preocuparem com as dimensões que poderia vir a atingir a «bola de neve», que pretendem por a rolar, ao fazerem as propostas constantes dos vossos projectos.
Já ponderaram os Srs. Deputados que efeitos poderia vir a ter uma pouco ponderada decisão nesta área em tantos e tantos cidadãos que por todo o País se dedicam graciosamente e em espírito de serviço à gestão de instituições e colectividades de todo o género, de que talvez seja justo e conveniente sublinhar como exemplo misericórdias, bombeiros e tantas outras instituições de solidariedade social?
É neste contexto, e após ponderação serena e aprofundada, que o PSD considerou conveniente e oportuno apresentar o projecto de lei n.º 245/V, que consagra desde já a possibilidade de, em certos casos, os presidentes de juntas poderem exercer os respectivos mandatos em permanência.
São os casos em que as freguesias têm 20000 ou mais eleitores em que o PSD considera justificada a possibilidade de a partir do próximo mandato os presidentes poderem exercer a tempo inteiro ou a meio tempo, desde que a assembleia de freguesia delibere nesse sentido.
Sem embargo, o PSD contínua a achar conveniente e desejável que continue a prevalecer o princípio de não profissionalização dos cargos autárquicos, exercidos essencialmente no espírito de voluntariado e de serviço das populações, como atrás já foi dito.
Não podemos, no entanto, deixar de considerar as situações de freguesias muito populosas, que, além de uma grande sobrecarga de serviços burocráticos, em muitos casos, vêm desenvolvendo intensa actividade nas áreas sociais, desportivas, recreativas e culturais.
Nos casos previstos, o projecto que apresentamos tem em conta o princípio da autonomia das respectivas autarquias, pelo que deixa ao critério de cada assembleia de freguesia abrangida pelo diploma a decisão que achar conveniente, sublinhando-se que os encargos financeiros com as remunerações serão integralmente suportadas pelo seu orçamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PSD irá votar contra os projectos de lei do Partido Comunista e do Partido Socialista por considerar desajustados os respectivos conteúdos, tanto no aspecto material como filosófico, declarando, no entanto e desde já, que consideramos possível rever esta situação num outro contexto, ou seja, logo que a evolução da situação técnico-administrativa do País o venha a recomendar.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - O Sr. Deputado Casimiro Pereira iniciou a sua intervenção dizendo que foi o agenciamento do Partido Comunista Português que levou o Partido Socialista a apresentar o seu próprio projecto. Não nego! No entanto, o Sr. Deputado não se deveria ter esquecido de ir mais longe e dizer aqui que também foi na sequência da apresentação do projecto de lei do PS que o PSD se viu obrigado a apresentar o seu próprio projecto.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É o costume!

O Orador: - Para que tudo ficasse correcto, deveria ter ido até ao fim. Mais: disse que as iniciativas do PCP e do PS eram inoportunas. Sr. Deputado, se as iniciativas são inoportunas, isto é, se é inoportuno legislar sobre esta matéria, o PSD deveria ter tido a coragem, em benefício dos interesses do País, de não ser cúmplice de uma iniciativa inoportuna e, pura e simplesmente, ter recusado e rejeitado os dois projectos. Ou será que só a iniciativa do PSD é oportuna?
O PSD deve ter a coragem de reconhecer que as iniciativas do PCP e do PS deram pelo menos a possibilidade ao PSD de ter uma iniciativa oportuna, coisa de que ele até agora se tinha esquecido.
Das duas uma, Sr. Deputado, ou eram de todo em todo inoportunas - e o PSD devia ter tido a coragem de as recusar porque, sendo inoportunas, não serviam os interesses do País -, ou então o PSD devia ter tido a humildade de reconhecer, pelo menos, a oportunidade das iniciativas do PCP e do PS, uma vez que os obrigou a assumir uma iniciativa que, suponho, não classificarão de inoportuna, senão seriam obrigados a votar contra a vossa própria iniciativa, tal como vão votar contra as nossas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Magalhães.

O Sr. António Magalhães (PS): - Sr. Deputado Casimiro Pereira, quero congratular-me com a linguagem que V. Ex.ª utilizou no seu discurso e que, comparada com a que, como porta-voz, o Sr. Deputado Manuel Moreira utilizou, está mais próxima da realidade.

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Por outro lado, na resposta do Sr. Deputado Manuel Moreira aos pedidos de esclarecimento que lhe foram feitos, se bem entendi, percebi que a linguagem utilizada para classificar quer o nosso projecto quer o do PCP não correspondia exactamente àquilo que era o seu pensamento. E porquê? Porque apodou os nossos projectos de excessivos e irresponsáveis - o que é violento, como certamente compreenderá -, mas, a certa altura, numa resposta a um pedido de esclarecimento, disse que o projecto do PSD era suficiente para já, admitindo, contudo, a hipótese de ir mais longe.
Ora, pareceu-me também que o Sr. Deputado Casimira Pereira, na intervenção que acabou de proferir, teve algum cuidado na maneira como tratou ou como considerou os nossos projectos ao referir que talvez tivesse havido algum descuido da nossa parte - o que não é a mesma coisa que o Sr. Deputado Manuel Moreira disse - deixando perceber que o PSD teve, de facto, de travar uma «bola de neve».
Pergunto: o PSD não terá sido obrigado, com o seu projecto de lei, embora tão restritivo, a pôr a funcionar essa «bola de neve»?
Sr. Deputado Casimiro Pereira, também me pareceu entender, do conteúdo da sua intervenção, que o PSD tem a certeza absoluta de que o seu projecto não chega para as encomendas daquilo que são as necessidades de muitas juntas de freguesia.
Quanto tempo teremos de esperar para que se faça justiça a um grande número de juntas de freguesia que precisam de um membro a tempo inteiro ou a meio tempo para poderem assumir com responsabilidade as medidas que algumas câmaras municipais podem ou até já cometeram a essas autarquias de base.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Casimiro Pereira, viu-se naturalmente a diferença que existe entre as linguagens utilizadas sobre o mesmíssimo problema que estamos aqui a tratar: uma acessível e responsável e a outra «casseteira», que foi utilizada pelo Sr. Deputado Manuel Moreira.
Isto porque chamar irresponsáveis, inoportunas, de fantasiosas, deturpado rãs, etc., às iniciativas da oposição não deixa de ser uma linguagem «casseteira», é assim que o nosso povo a designa, porque é a cassetete do Sr. Deputado Manuel Moreira. Realmente, tratar as oposições, tratar as iniciativas legislativas desta maneira só pode ser classificado desta forma, tendo-se visto a maneira elegante como o mesmo pensamento, a mesma doutrina foi defendida pelo seu colega de bancada, Sr. Deputado Casimiro Pereira, aquando da sua intervenção, que nem demos pela mesma música.
Pergunto ao Sr. Deputado Casimiro Pereira: pensa que a «bola de neve» que o projecto do PS vai lançar é diferente da que o seu próprio partido lança? Isto é, a «bola de neve» tanto pode começar por uma bolinha pequenininha como por uma grande e, portanto, isso não interessa. Com efeito, pode começar com 46 freguesias e terminar com um tamanho incomensurável, como também pode começar com uma bola relativamente maior e durante o caminho não crescer muito mais do que essa.
O que é que leva o PSD a dizer que a «bola de neve» que o PS ia lançar com o seu projecto é muito mais perigosa do que a de V.ª Pergunto isto no pressuposto de que se trata de «bola de neve», embora eu entenda que pode não ser.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Para exercer o direito de defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento, naturalmente, o excesso de linguagem a que o Sr. Deputado Narana Coissoró há longos anos nos habituou. Não quero, de maneira nenhuma, comparar a minha linguagem à linguagem, essa sim, «casseteira» do Sr. Deputado, e é por isso que lamento profundamente que V. Ex.ª, de quando em vez e à falta de argumentos, procure atingir os deputados na sua própria dignidade.
Penso que isso não o dignifica, assim como não dignifica a Câmara nem os deputados que nela se encontram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não vou dar explicações porque, mais uma vez, a intervenção que acabámos de ouvir cai no mesmíssimo pecado que anteriormente referi, de não compreender o sentido das palavras da oposição.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pereira.

O Sr. Casimiro Pereira (PSD): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso colocou a questão de saber se não foi inoportuna a posição do PSD ao apresentar o seu projecto no contexto em que o fez.
Quero dizer ao Sr. Deputado e a toda a Câmara que o PSD, no que se refere aos problemas nacionais, se reclama de tanta sensibilidade como todos os outros deputados e todas as outras gentes. Daí que, neste caso, como em muitos outros - aliás, o mesmo aconteceu recentemente com a lei quadro da regionalização -, os diplomas baixem à Comissão para, em conjunto, serem apreciados e melhorados.
Com o sentido de responsabilidade de que nos reclamamos e com o mandato que o povo português nos deu, sempre entendemos dever zelar pelos interesses nacionais, sem recusar, naturalmente, a qualquer outro a legitimidade para o fazer à sua maneira por esses mesmos interesses. Foi isso que sempre aqui se quis dizer e só pessoas com segundas intenções ou má fé é que podem julgar que se quer dizer outra coisa. Não era necessário que eu ou o meu colega Manuel Moreira estivéssemos a referir esta situação, pois o que dize-

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mós é que esta questão posta nesta altura não nos parece excessiva, pelo contrário, parece-nos desde já equilibrado dar este passo.
Se nos perguntassem, não havendo neste momento estas iniciativas, se seria hoje que o PSD apresentaria o projecto de lei, eu responderia - e não me custava dizê-lo - que não. Podia apresentá-lo daqui a seis meses, seis semanas ou seis dias. Agora, na altura em que a questão se põe - e o facto de se saber quem teve a iniciativa não é muito importante para este caso -, considerámos que esta medida, aliás, com o sentido de responsabilidade que temos para dar determinados passos, não é aquela que os partidos da oposição nos querem impor de forma a darmos os passos que eles querem que demos. A resposta é esta.
Os Srs. Deputados Magalhães da Silva e Narana Coissoró colocaram o problema da «bola de neve». Devo dizer que ou não me expliquei bem ou os senhores não estiveram com a devida atenção. O que quero dizer é que determinados estratos de agentes da população terão, naturalmente - como, aliás, já foi aqui sublinhado -, uma certa apetência para procurar aproveitar os precedentes que se foram criando no sentido de tentar forcar o Estado ou, se quiserem, o Governo ou o PSD (porque é o mais responsável e sem o voto do PSD estas coisas não avançarão) ...

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - É o mais responsável porquê?

O Orador: - ... a tomar determinadas atitudes que se podem transformar numa «bola de neve».
Citei aqui o caso de muitos dirigentes de várias associações e instituições que, em espírito de serviço e graciosamente, por vocação, se quisermos, perdem muito tempo e fazem grandes sacrifícios na sua vida para desempenharem funções que são altamente meritórias. Se sacrificamos os nossos fins-de-semana, os nossos serões, todo o nosso tempo, a nossa família, nas organizações de bombeiros, nas misericórdias, em centros de recuperação infantil, em centros de dia, em lares de terceira idade, enfim, em tantas outras actividades, pergunto se um presidente de junta de freguesia que tenha mais de 500 ou de 1000 eleitores não pode estar em permanência. Por isso, entendemos que deveriam ser eles, como profissionais, a tratar destes assuntos.
Quando falo na «bola de neve» refiro-me, realmente, a um certo fenómeno que se pode desencadear, se não for devidamente enquadrado com quem tem a principal responsabilidade de procurar que os interesses em conjunto não se desequilibrem.
O sentido da «bola de neve» é este e não outro.
Não sei se me consegui fazer entender, mas penso que isto é o suficiente.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - É difícil perceber isso!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste momento do debate é possível tirar algumas conclusões.
A primeira conclusão é a justeza da iniciativa que hoje aqui trouxemos, pretendendo pôr cobro à injustiça da actual situação, que impede que membros das juntas de freguesia, designadamente o seu presidente, possam exercer a tempo inteiro as suas funções.
Uma segunda conclusão deste debate é que está consagrado o princípio do regime de permanência dos membros das juntas de freguesia.
O PSD foi obrigado a ter de reconhecer, com o movimento de opinião criado no País, nomeadamente junto dos autarcas de todos os partidos, incluindo os do PSD, este princípio do regime de permanência dos membros das juntas de freguesia. Demonstrou-o claramente a consulta que realizámos, pesem embora as confusões que o Sr. Deputado Manuel Moreira aqui predendeu criar.
Mas, volto a repetir, os resultados da consulta que realizámos - e, como todos sabem, é um processo de amostragem. Enviámos o nosso projecto de lei a 1600 freguesias e não a 4000, Sr. Deputado, e, até ao momento, recebemos respostas de mais de 330, envolvendo cerca de 2 milhões de eleitores, e ainda de 29 assembleias municipais, envolvendo cerca de l milhão de eleitores. É, portanto, uma amostragem clara e importante, que não pode ser ignorada, Sr. Deputado.
Por outro lado, lamentamos a posição fechada do PSD, que, correndo a apanhar o comboio, apenas fez travar o seu andamento, ao não permitir que hoje se criem as condições para que as juntas de freguesia possam ter uma maior capacidade de resposta para os problemas das suas populações.
Estamos inteiramente de acordo com o facto de 46 freguesia poderem vir a ter um membro a tempo inteiro. Este princípio estava também consagrado no nosso projecto, por isso, concordamos com essa proposta. No entanto, estamos inteiramente em desacordo com a posição do PSD, que elimina a possibilidade de as freguesias com mais de 500, 1000 ou 5000 eleitores poderem vir a ter, pelo menos, um membro da junta a meio tempo ou a tempo inteiro, conforme os casos. Temos, naturalmente, uma posição clara de voto, iremos votar favoravelmente o nosso projecto de lei e o do PS e abster-nos-emos no projecto de lei do PSD.
Por último, quero registar aqui um aspecto preocupante. O PSD demonstrou hoje a sua intransigência, a sua incapacidade de diálogo com os interessados e com as outras forças políticas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Naturalmente que as freguesias não ficarão caladas perante esta intransigência do PSD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Pela nossa parte, continuaremos a desenvolver todos os esforços - tal como temos feito até agora - para que seja feita justiça e consagrado este direito dos membros das juntas de freguesia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

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O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Deputada lida Figueiredo, o projecto de lei apresentado pelo PSD teve como primeiro objectivo o de dar resposta ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Travar o processo!

O Orador: - ... às exigências de um conjunto de freguesias que, pela sua dimensão em termos de agregado populacional e pela complexidade dos seus problemas, merecem ter o seu presidente a tempo inteiro ou meio tempo, se assim o entender, uma vez que no nosso projecto essa possibilidade é facultativa. Em segundo lugar, teve o objectivo de evitar os excessos - tentando moderar os excessos encontrados nos projectos de lei apresentados pelo PCP e pelo PS - para que não se resvalasse para aquilo que consideraríamos de irresponsável.
A posição do PSD foi devidamente analisada e ponderada ao longo de vários anos; não se trata de uma decisão tomada há última da hora, dado que fomos reflectindo e auscultando opiniões ao longo de todo o País nos contactos que fomos tendo os nossos responsáveis locais que consideraram o disposto no nosso projecto o primeiro passo positivo para se instituir, a nível de algumas das freguesias, a possibilidade de os presidentes de junta estarem em regime de permanência. Por isso, creio que a nossa iniciativa dá resposta suficiente para as exigências mais importantes.
Da auscultação que fez a 1600 freguesias - o que, a meu ver, foi insuficiente e até creio que foi uma atitude um pouco abusiva, uma vez que o PCP tomou a iniciativa de auscultar de per si as autarquias locais e a verdade é que as freguesias também não tiveram oportunidade de analisar outros projectos alternativos, designadamente o do próprio PSD, porque se assim fosse, certamente que as respostas seriam diferentes - o PCP só obteve 325 respostas favoráveis ...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O senhor não sabe o que é uma amostragem?!...

O Orador: - A Sr.ª Deputada desculpe! Estou a analisar objectivamente as respostas: se as freguesias foram auscultadas, elas deviam ter respondido; se a maior parte das freguesias não respondeu, é porque nem sequer quiseram emitir opinião acerca do projecto de lei do PCP porque se calhar discordam frontalmente dele, porque nem sequer lhe reconheceram validade para emitirem uma opinião, para emitirem um parecer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em suma, as respostas foram apenas 325, que são a minoria das freguesias deste País.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Não é deste País. Não faça confusões!

O Orador: - Esta é a prova cabal de que o diploma do PCP não tem a adesão nem o apoio da maioria das freguesias de Portugal.

Vozes do PCP: - A ver vamos!

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, como não posso formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Manuel Moreira, gostaria de o fazer à Sr.ª Deputada lida Figueiredo para ver se ela me ajuda a entender o que aqui se passa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr.ª Deputada lida Figueiredo, de facto, o Sr. Deputado Manuel Moreira fez um raciocínio espantoso, que, a ser válido, jogará em favor do PS: isto é, o PCP fez uma consulta e obteve 7,8% de respostas, o que demonstra que a maioria está contra aquele projecto de lei; o PSD não fez consulta nenhuma, ninguém respondeu e, como quem cala consente, a maioria está a favor do projecto de lei do PSD!

Risos do PCP.

Ora, se este raciocínio está certo, a Sr.ª Deputada ajudar-me-á a esclarecer o seguinte: como o PS também não fez nenhuma consulta, ninguém respondeu, e como nos temos de basear no provérbio «quem cala consente», o PS tem tanta legitimidade como o PSD para dizer que tem o apoio de 100% dos autarcas das freguesias deste País.

Uma voz do PSD: - A questão não é essa!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Já há pouco dei a resposta, Sr. Deputado! A resposta está dada por analogia! O projecto do PS é idêntico ao do PCP!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr." Deputada lida Figueiredo.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Manuel Moreira, V. Ex.ª tem andado muito distraído e bastante longe do país real, daquilo que pensam e dizem os autarcas!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não tenho não, Sr.ª Deputada!
A Oradora: - O Sr. Deputado Manuel Moreira, que, tal como eu, ainda recentemente fez parte de uma delegação da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, que visitou municípios da área do Grande Porto, por exemplo, esteve na Câmara Municipal de Gaia e ouviu o Sr. Presidente da Câmara, que por acaso é do PSD, defender o princípio da aplicação deste projecto aos membros eleitos das juntas de freguesia ...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso não é verdade! Não minta, Sr." Deputada!

Vozes do PCP: - Está escrito!

A Oradora: - Está escrito, Sr. Deputado! Eu tenho o discurso escrito e depois
remeto-lho!
Mas, independentemente disso, o Sr. Deputado deve responder à questão de fundo, que é a seguinte: sabe ou não que a reivindicação sentida pela generalidade

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dos autarcas das juntas de freguesia provém da necessidade de, a meio tempo ou a tempo inteiro, verem consagrado este regime de permanência?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): Onde é que isso está escrito?

A Oradora: - O Sr. Deputado não conhece essas reivindicações? O Sr. Deputado não ouve os autarcas? Então aconselho-o a ir até lá fora ouvi-los - e até creio que nas galerias se encontram alguns a assistir à sessão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à opinião que aqui manifestou relativamente à amostragem que realizámos, o Sr. Deputado, além de desconhecer o significado científico de uma amostragem em termos estatísticos, ...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não desconheço, não!

A Oradora: - ... devia ler as respostas e ouvir melhor o que dizem lá fora os autarcas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Pela nossa parte procuraremos dar-lhe a conhecer as opiniões que o Sr. Deputado aqui manifestou.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, naturalmente que o raciocínio e as conclusões que retirou da intervenção do Sr. Deputado Manuel Moreira são correctos. Então, por que não votar, ao menos favoravelmente, o projecto de lei apresentado pelo PS?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Porque é idêntico, embora um pouco mais moderado. Se fosse bem mais moderado, poderia ser votado favoravelmente!

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Leia a sua intervenção. Ela não diz o mesmo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto que mais ninguém pretender usar da palavra, dou por encerrado o debate destes três projectos de lei.
Está suspensa a sessão até às 19 horas e 15 minutos, hora a que iremos proceder às votações que constam da ordem de trabalhos, assim como às destes três diplomas cujo debate terminámos agora.

Eram 18 horas e 5 minutos.

No reinicio da sessão assumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de lei n.º 33/V - Autoriza o Governo a aprovar as bases gerais do emparcelamento e fraccionamento de prédios rústicos e de explorações agrícolas.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a questão que desejo colocar é no sentido de saber a razão pela qual não fazemos de imediato a votação que decorre do debate, na generalidade, que estivemos a fazer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa foi informada de que estava a haver uma troca de impressões entre todos os grupos parlamentares e não sabemos se essa mesma troca de impressões vai nesse sentido ou se já se chegou a alguma conclusão.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a nossa ideia é a de que, uma vez que se procedeu a um debate na generalidade, se deveria fazer agora a respectiva votação, e as votações finais globais previstas seriam realizadas posteriormente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com efeito, estamos já em condições de passar à votação dos projectos de lei n.º 133/V, 237/V e 245/V, todos relativos ao mandato dos membros das juntas de freguesia.

Srs. Deputados, vai ser submetido à votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 133/V - garante a membros de juntas de freguesia, em certos casos e condições, o exercício do mandato em regime de permanência, com vista ao reforço dos meios de actuação dos órgãos da freguesia, apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS e votos a favor do PSD do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID.
Votamos, de seguida, o projecto de lei n.º 237/V - regime aplicável ao exercício do mandato dos membros das juntas de freguesia, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID.

Srs. Deputados, vai ser submetido à votação o projecto de lei n.º 245/V - garante aos presidentes de junta de freguesia, em certos casos, a possibilidade do exercício do mandato em regime de permanência, apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS e abstenções do PS, do PCP, de Os Verdes e da ID.

Srs. Deputados, deram entrada na Mesa dois requerimentos de idêntico teor. O primeiro a ter dado entrada na Mesa é subscrito pelo PS, PCP, PRD, CDS, Os Verdes e ID e requer a baixa à Comissão de Admi-

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nistração do Território, Poder Local e Ambiente do projecto de lei n.º 245/V, para preparação do debate e votação na especialidade por um prazo de 30 dias. Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, fica, portanto, prejudicado o segundo requerimento apresentado na Mesa e que foi subscrito pelo PSD.

Srs. Deputados, há dois requerimentos de avocação a Plenário, subscritos pelo Grupo Parlamentar do PCP, que estão já a ser distribuídos.
Sou informado de que o PCP deseja apresentar os seus requerimentos, pelo que concedo a palavra ao Sr. Deputado Rogério de Brito, para proceder à apresentação do primeiro desses requerimentos.

O Sr. Rogério de Brito (PCP) - Na sua proposta de lei n.º 33/V o Governo pede à Assembleia da República que o autorize a aprovar as bases gerais do emparcelamento e fraccionamento de prédios rústicos e de explorações agrícolas.
Com tal objectivo pretende o Governo legislar sobre as formas de emparcelamento e fraccionamento, constituição de reservas de terra, redimensionamento de explorações, direitos de preferência e, ainda, sobre a criação de um regime especial de apoio financeiro aplicável à execução das operações de emparcelamento e fraccionamento.
As medidas e as formas de execução sobre as quais o Governo pretende legislar visam, pela sua natureza, intervir e alterar a estrutura física e económico-agrícola das explorações. Este é o seu objecto.
Mas quanto ao sentido e à extensão destas medidas, quanto aos conceitos e critérios no que respeita a direitos de propriedade, de posse e uso da terra, bem como às opções de natureza económico-social, nada é definido. Ou seja, tudo o que é essencial para definir o sentido e a extensão desta autorização legislativa é omitido.
Assim, considerando a necessidade de introduzir nesta autorização legislativa normas concretas que, de acordo com o imperativo constitucional, acautelem o direito de propriedade dos pequenos e médios agricultores e contribuam para a transformação, valorização e melhoria da estrutura produtiva das pequenas e médias explorações agrícolas.
Os Deputados do PCP requerem a avocação pelo Plenário das propostas de aditamento de artigos novos apresentados na Comissão de Agricultura (propostas A e B), que se anexam ao presente requerimento e dele fazem parte integrante.

São as seguintes:

Proposta de aditamento à proposta de lei n.º 33/V

Artigo A

l - Todas as operações de emparcelamento, designadamente de recomposição e concentração de prédios rústicos ou suas parcelas, de reajustamento predial, de redimensionamento e de troca de exploração de terrenos, deverão dar preferência, pela ordem indicada, às pessoas físicas ou colectivas que se encontrem nas seguintes condições:

1.º Que explorem, por conta própria ou por arrendamento, unidades com área agrícola de dimensão inferior à unidade de cultura fixada para a região;

2.º Que explorem, por conta própria ou por arrendamento, unidades de área agrícola de menor dimensão, quando esta for superior à unidade de cultura fixada para a região.

2 - Na aquisição ou arrendamento de prédios ou suas parcelas em áreas sujeitas a emparcelamento rural aplica-se o disposto no número anterior.
3 - À cedência por parte do Estado de prédios rústicos ou suas parcelas que constituam reserva de terras e que se destinem a operação de emparcelamento é aplicável o disposto no n.º 1.

Artigo B

Salvo em casos de expropriação por utilidade pública, e sem prejuízo do disposto no Código Civil, não são permitidas expropriações no âmbito das acções previstas na presente lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do requerimento que foi agora lido e apresentado.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID e a abstenção do CDS.
Para apresentar o segundo requerimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - O Grupo Parlamentar do PCP requereu
atempadamente que esta proposta de lei de autorização legislativa sobre emparcelamento e fraccionamento de prédios rústicos e de exploração agrícola fosse submetida à consulta pública determinada pelo artigo 104.º da Constituição. O requerimento do PCP foi rejeitado pela maioria de apoio do Governo, com dois argumentos fundamentais: primeiro, de que o artigo 104.º careceria de regulamentação legal e, segundo, de que ele seria inaplicável às autorizações legislativas.
O PCP continua a contestar esta argumentação, já que não só o artigo 104.º é de aplicação directa (por força da segunda parte do artigo 17.º da Constituição), como ele deverá ser aplicado às autorizações legislativas, visto nestas se decidir, em processo legislativo, sobre a oportunidade, a extensão e o sentido de alterações na ordem jurídica sobre matérias incluídas na previsão desse artigo 104.º
Entretanto, sem prescindir desse entendimento, o PCP apresentou na Comissão uma proposta de aditamento tendente a, por forma declarativa, regular os termos da consulta pública que, em qualquer caso, o Governo sempre terá de fazer ao projecto de decreto sobre emparcelamento rural (sob pena de inconstitucionalidade formal).

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Importa que fique claro perante o Plenário e perante todas as outras instituições com intervenção no processo legislativo que o Governo e o PSD foram confrontados com a chamada de atenção para a necessidade de o Governo proceder à consulta pública e com propostas de normas, com valor legal, que a regulavam.
É por estas razões que os deputados do PCP requerem a avocação pelo Plenário da proposta de aditamento apresentada pelo PCP na Comissão de Agricultura, que se anexa ao presente requerimento e dele faz parte integrante.

É a seguinte:

Nestes termos, os deputados abaixo assinados, do PCP, requerem a V. Ex.ª se digne:

1) Determinar a publicação de separata contendo a proposta de lei n.º 33/V e respectivos anexos;
2) Fixar o prazo de 30 dias para a consulta pública, encarregando a comissão parlamentar respectiva do expediente adequado e da elaboração do relatório sobre a consulta;
3) Submeter a questão do agenciamento da proposta de lei n.º 33/V para dia posterior ao do termo da consulta pública.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser submetido à votação o requerimento agora lido.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID e a abstenção do CDS.
Srs. Deputados, vamos então passar à votação final global da proposta de lei n.º 33/V - Autoriza o Governo a aprovar as bases gerais do emparcelamento e fraccionamento de prédios rústicos e de explorações agrícolas.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para informar a Mesa de que iremos apresentar uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Pausa.
Srs. Deputados, passando agora ao âmbito da proposta de lei n.º 37/V, que autoriza o Governo a legislar sobre a alteração à Lei n.º 6/85, de 4 de Maio, referente ao regime dos objectares de consciência, incide sobre ela um requerimento de baixa à comissão, subscrito por todos os grupos e agrupamentos parlamentares, o qual irá ser lido de imediato.

Foi lido. É o seguinte:

Requerimento

Nos termos regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados requerem a baixa à Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, antes da votação, da proposta de lei n.º 37/V, por um período de oito dias.
Sr. Deputado, vamos passar à votação do requerimento que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs: Deputados, vamos agora passar ao processo concernente às ratificações n.ºs 15/V (PCP) e 17/V (PS), relativas ao Decreto-Lei n.º 90/88, de 10 de Marco, que estabelece para o internato complementar o regime de dedicação exclusiva.
Sobre esta matéria há um projecto de resolução subscrito por deputados do PS, que é do seguinte teor:

A Assembleia da República recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 90/88, de 10 de Março, com reprístinação da legislação anterior.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, é que existe um projecto de resolução do PCP, o qual tem exactamente o mesmo conteúdo que o do PS.
Portanto, se o Sr. Presidente assim o entender, podemos votar os dois projectos de resolução conjuntamente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, precisamente porque o projecto de resolução do PCP tem exactamente o mesmo teor que o do PS e porque houve uma solicitação do PS nesse sentido é que iria colocar à votação o do PS, considerando prejudicado o do PCP. Aliás, iria mesmo proceder posteriormente a esse esclarecimento.
Srs. Deputados, vamos, pois, submeter à votação este projecto de resolução subscrito por deputados do PS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID e a abstenção do Sr. Deputado Jorge Paulo Cunha (PSD).
Srs. Deputados, como afirmei há pouco e por via da votação que acabámos de efectuar, considera-se prejudicado o projecto de resolução apresentado pelo PCP.

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para anunciar que farei entregar na Mesa uma declaração de voto por escrito.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado que terminámos o processo de votação agendado para hoje, resta-me anunciar a ordem de trabalhos para amanhã, que será a seguinte: proposta de resolução n.º 4/V, que aprova a adesão de Portugal à Convenção que cria a Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos (MIGA); projecto de lei n.º 86/V (CDS) - Lei das consultas directas aos cidadãos eleitores; projecto de lei n.º 200/V (PSD) - Lei das consultas directas aos cidadãos eleitores a nível local; projecto de lei n.º 231/V (PS) - Consultas directas aos cidadãos eleitores a nível local.
Por outro lado, chamava a atenção da Câmara para o facto de a sessão da próxima terça-feira, dia 24, ter o seu início marcado para as 10 horas.
Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar por hoje, declaro encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adriano Silva Pinto.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Pereira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Gilberto Parca Madaíl.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Vasco Francisco Aguiar Miguel. Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Manuel Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Orlando Moreira de Campos Cruz.
Manuel António dos Santos.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Manuel Balseiro Amaro.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
João Camilo Vieira Gonçalves.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria Odete Santos.
Rogério Paulo S. de Sousa Moreira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Costa Ferreira Espada.
Natália de Oliveira Correia.

Centro Democrático Social (CDS):

Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Carlos Lelis da Câmara Gonçalves.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Luís Amadeu Barradas Amaral.
Maria Natalina Pessoa Milhano Pintão.
Mário Jorge Belo Maciel.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.

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Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Miguel Morais Barreto.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Bordalo Junqueira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação sobre as ratificações n.ºs 15/V (PCP) e 17/V (PS)

O sistema de saúde e as carreiras médicas estão em Portugal, em 1988, completamente desenquadrados da realidade, não cumprindo os objectivos para os quais foram criados no sentido de dotar a população portuguesa de cuidados de saúde de qualidade, ao mesmo tempo que têm conduzido a uma progressiva desmotivação dos profissionais de saúde.
Urge, portanto, repensar o sistema de saúde no quadro da revisão constitucional e no plano legislativo de forma a assegurar aos Portugueses verdadeiro acesso aos cuidados de saúde.
A revisão das carreiras médicas, bem como do estatuto remuneratório dos profissionais de saúde, são pecas importantes nessa mudança.
Não pretendendo pôr em causa o princípio da exclusividade para os médicos; tenho como certa que a verdadeira mudança tem de ser encarada de uma forma global, com participação efectiva e empenhamento dos profissionais de saúde, sem a qual muito dificilmente qualquer alteração estrutural terá efectivação prática.
Não me parece igualmente correcto que uma lei aprovada em Março possa ter aplicação em Janeiro anterior, já que alterou de forma substancial os parâmetros segundo os quais as escolhas no último concurso para o internato complementar foram feitas, até porque não prevê qualquer possibilidade de opção entre outro regime.
Para além disso, cria situações de desigualdade evidentes entre médicos em formação, não se antevendo qualquer possibilidade de realização profissional logo após a conclusão do internato, já que a transição entre a exclusividade hospitalar e a prática privada será extraordinariamente brusca.
Pelo atrás referido o meu sentido de voto é o da abstenção no pedido de ratificação do Decreto-Lei n.º 90/88.

Lisboa, 17 de Maio de 1988. - O Deputado do PSD, Paulo Cunha.

Rectificação

Nos n.ºs 67, de 26 de Março de 1988, 72, de 14 de Abril de 1988, 75, de 20 de Abril de 1988, e 75, de 20 de Abril de 1988, onde se lê «O Sr. Rui Gomes (PSD)», «O Sr. Rui Silva (PSD)» e «O Sr. Gomes da Silva (PSD)» deve ler-se «O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD)».

As REDACTORAS, Maria Leonor Ferreira - Maria Amélia Martins - Cacilda Nordeste.

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DIÁRIO da Assembleia da República

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