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Quarta-feira 13 de Julho de 1988 I Série - Número 115

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JULHO DE 1988

Presidente: Ex.mo Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Ex.mos Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Cláudio José dos Santos Percheiro
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada no Mesa do projecto de lei n.º 279/V e do projecto de resolução n.º 19/V.
Foram aprovados os n.ºs 100 a 102 do Diário.
Procedeu-se à discussão das ratificações n.ºs 16/V (PCP) e 18/V (PS), relativas ao Decreto-Lei n.º 91/88, de 12 de Março, que cria o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho) e Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais (Macário Correia), os Srs. Deputados Helena Roseta (Indep.), Vieira de Castro (PSD), João Amaral (PCP), Carlos Lilaia (PRD), Narana Coissoró (CDS) e Herculano Pombo (Os Verdes).
A Câmara rejeitou o recurso, interposto pelo PCP, do despacho do Presidente da Assembleia da República que indeferiu o requerimento do mesmo Grupo Parlamentar para que fosse submetido à consulta publica das organizações de trabalhadores o Decreto n.º 81/V, intervindo no debate os Srs. Deputados Jerónimo de Sousa (PCP) - que apresentou o recurso -, Vera Jardim (PS), Correia Afonso (PSD), Nogueira de Brito (CDS) e Miguel Galvão Teles (PRD).
O Decreto n.º 81/V - autoriza o Governo a rever o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e do contrato de trabalho a termo e o regime processual de suspensão e redução da prestação de trabalho - foi reapreciado, na generalidade, pela Assembleia, após veto do Presidente da República, por inconstitucionalidade de várias normas dele constantes, cujo expurgo ou sanação foi aprovado por proposta do PSD. Ainda a requerimento do mesmo partido o decreto baixou à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família para apreciação e votação, na especialidade, das propostas de alteração e de eliminação existentes.
No debate intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministros do Emprego e da Segurança Social (Silva Penedo) e dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), Vera Jardim (PS), Joaquim Marques (PSD), Narana Coissoró (CDS), Jerónimo de Sousa e Odeie Santos (PCP), Sá Fernandes e José Puig (PSD), Herculano Pombo (Os Verdes), Miguel Galvão Teles (PRD), Correia Afonso (PSD). Carlos Brito (PCP) e Seiça Neves (ID).
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 527/V - introduz alterações à Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu) -, que baixou à 1.ª Comissão, a requerimento do PSD, para apreciação e votação na especialidade.

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, polo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António José de Carvalho.
António Maria Oliveira de Matos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Paulo Veloso Bento.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Armando Manuel Pedroso Militão.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lelis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos da Silva e Sousa.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Gilberto Parca Madaíl.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mendes Bota.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimiro Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Natalina Pessoa Milhano Pintão.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rosa Maria Ferreira Tomé e Costa.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.

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António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Edmundo Pedro.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Fernando Ribeiro Moniz.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helder Oliveira dos Santos Filipe.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Vera Jardim.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Bordalo Junqueiro.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Favas Brasileiro.
Álvaro Manuel Balseiro Amaro.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo Brito.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luis Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Luisa Amorim.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Natália de Oliveira Correia.
Rui José dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Agrupamento Intervenção Democrática (ID):

João Manuel Seiça Neves.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deu entrada na Mesa o Projecto de Lei n.º 279/V, apresentado pelo Sr. Deputado Fernando Gomes e outros, do PCP. que propõe a criação da Escola de Saúde Pública de Coimbra. Foi admitido e baixou à 2.ª comissão. Deu igualmente entrada na Mesa o Projecto de Resolução n.º 19/V, da iniciativa do PS, que pretende que seja chamada a atenção do Governo para diversos aspectos gerais da sua política, que foi também admitido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 100 a 102 do Diário da Assembleia da República.
Há alguma objecção?

Pausa.

Não havendo, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, o primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos diz respeito à apreciação das ratificações n.ºs 16/V (PCP) e 18/V (PS)- Decreto-Lei n.º 91/88, de 12 de Março, que cria o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Pedimos a ratificação do Decreto-Lei n.º 91/88, de 12 de Março, que cria o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril porque este diploma foi publicado sem previamente terem sido ouvidos os municípios envolvidos pela matéria.
Na verdade, há alguns meses que suscitámos nesta Assembleia a questão do saneamento básico da Costa do Estoril. Porém, meses volvidos, eis que nos encontramos numa situação em que nada se adiantou, nada se apurou e o processo, estando paralisado em termos de averiguamento dos factos que aqui foram suscitados, não se encontra em franca evolução por falta da intervenção e diálogo entre o Governo e os municípios envolvidos.
O que é que se passa, Sr. Presidente e Srs. Deputados? Como sabem, foi criado um esquema de comparticipação financeira das verbas do jogo no saneamento básico da Costa do Estoril, através do qual seria possível financiar uma obra na altura avaliada em cinco milhões de contos o que seria financiada pelo Orçamento do Estado e pelas verbas do jogo provenientes do fundo de turismo.
No ano passado, o Governo na altura em exercício resolveu adiar o pagamento das comparticipações das verbas do jogo provenientes das obrigações decorrentes da concessionária do Casino, invocando que isso não iria prejudicar o andamento das obras, uma vez que havia verba suficiente e que nada ia ser atrasado com essa decisão.
Em Fevereiro, quando aqui levantámos o problema, verificámos que ele estava a ser discutido no interior do Conselho de Ministros e não houve, nem por parte dos Membros do Governo, nem dos Chefes de Gabinete dos Membros do Governo, a simples atenção

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pura com esta Câmara no sentido de prestar esclarecimentos sobre uma matéria que, estando aqui a ser discutida na Assembleia da República, estava, simultaneamente, a ser alvo de deliberação no Conselho de Ministros, deliberação essa da qual não nos foi prestada qualquer informação ou esclarecimento.
E qual foi a deliberação? A deliberação foi criar, à pressa, uma entidade provisória de gestão do problema de saneamento básico do Estoril, porque o Governo se estava a aperceber que era necessário constituir um gabinete que tivesse uma certa operacionalidade, a fim de não incorrer no risco que estávamos aqui a denunciar, que era o de não estarem a ser aproveitadas devidamente as verbas por falta de operacionalidade de decisão.
Ora, o Governo, ao criar esta entidade à pressa, teve o descuido de não se munir com a opinião prévia dos municípios envolvidos. Assim, cria uma entidade de saneamento básico para a Costa do Estoril em que, em dez elementos que fazem parte do Conselho Consultivo, apenas quatro são representantes dos municípios, sendo os restantes seis nomeados pelo Governo. Além disso, cria esta entidade em que os municípios estão em minoria no Conselho Consultivo, de tal forma que o Conselho Directivo nem sequer tem nenhum representante dos municípios envolvidos. E o Governo fez isto precisamente no mesmo momento em que eu, como Deputada, aqui suscitei o problema do saneamento básico da Costa do Estoril, em que fui insultada pelo Sr. Primeiro-Ministro, pois, na opinião dele, estava aqui a dizer coisas que não me competiria e em que não recebi nenhum esclarecimento nem por parte deste nem do Governo, nem do sr. Secretário de Estado do Turismo, nem sequer de nenhum funcionário dos gabinetes interessados. Ora, considero tal atitude absolutamente chocante e indigna das relações que devem existir entre um Governo e um Parlamento democrático.
Mas também considero chocante e indigno das relações que devem existir entre um Governo e os municípios o facto de se fazer uma entidade desta natureza para gerir os interesses do saneamento básico de uma região sem, tal como já disse, ter o cuidado de ouvir os municípios interessados nesta entidade.
É evidente que isto gerou um grande pandemónio na região, houve uma troca de Telexes, de cartas, de circulares e de telefonemas dos gabinetes ministeriais para as câmaras municipais e chegou-se a uma espécie de consenso segundo o qual as câmaras municipais não iriam objectar a que todo o processo seguisse os seus trâmites, desde que tivessem garantias de que, de futuro, voltariam a ser ouvidas, ou melhor, que seriam ouvidas, quando não o tinham sido nesta fase.
Não tenho garantias nenhumas de que o Governo cumpra com este procedimento, quando no passado não quis cumprir. Por isso mesmo, solicitamos a ratificação do Decreto-Lei n.º 91/88 porque, em princípio, o saneamento básico é da competência municipal, nos termos da legislação vigente. É evidente que o Governo, por legislação posterior, pode alterar isto, mas é andar em sentido contrário a tudo o que se fez desde o 25 de Abril, a tudo o que se fez desde a conquista da autonomia pelo Poder Local.
Pedimos a ratificação deste decreto-lei porque as câmaras não foram ouvidas, por razões processuais, mas também porque as competências anteriores das câmaras não foram salvaguardadas e também porque se diz neste decreto-lei que a fixação de tarifas, no futuro, será da competência desta entidade, sem terem, necessariamente, que ser ouvidas as assembleias municipais que, à face da legislação actual, são as únicas entidades competentes para se pronunciarem sobre tarifas de bens e serviços prestados pelo município.
Srs. Deputados, não vamos cair outra vez no problema absolutamente negativo para a imagem do Estado e das repartições, que foi a tarifa de saneamento de Lisboa. Na verdade, ela foi posta pela EPAL sem ter sido votada na Assembleia Municipal, foi declarada inconstitucional e agora as pessoas, sabendo, que pagaram uma coisa que não deviam, não conseguem reaver o dinheiro daquilo que pagaram indevidamente. Não vamos, pois, cair na mesma solução!
O Governo, ao criar, precipitadamente, um gabinete para pôr de pé aquilo que se reconhecia que estava a ser atrasado, ao tê-lo feito sem ouvir as câmaras e sem submeter o projecto às Assembleias Municipais, como deveria, cometeu um erro político e um erro de gestão ao anunciar que procedia deste modo porque era urgente conseguir uma entidade que negociasse empréstimos exteriores, designadamente com o Banco Europeu de Investimentos. Ora, esta situação aflige-me muito porque, afinal de contas, no ano passado não era urgente receber o dinheiro da concessionária de jogo para o saneamento básico, mas agora já é urgente que uma entidade negoceie empréstimos para o saneamento básico do Estoril.
Não sei a quantas andamos, Srs. Deputados! Se o dinheiro que pode entrar nos cofres do Estado a fundo perdido pára determinados efeitos não é urgente, porque é que é urgente negociar empréstimos exteriores com individamento para o mesmo efeito e com uma situação em que nem sequer os municípios interessados são chamados a participar?!
Por todas estas razões, apelo a todos os Deputados, particularmente aos da maioria, que sei que sempre foram sensíveis aos problemas do Poder Local, para que não deixem que este tipo de procedimento se consuma.
Aquilo que vamos propor não é uma alteração da legislação nas costas dos municípios, mas sim que sejam ouvidas as assembleias municipais, que o não foram devidamente, que se pronunciem sobre a matéria e que o processo reentre na normalidade do diálogo entre o Poder Local e o Poder Central.
Neste caso, que é tão importante em termos de respeito das competências do Poder Local, espero, sinceramente, que a bancada da maioria não faça ouvidos de mercador ou não pense que eu venho a esta tribuna, tal como fui acusada no passado, apenas para fazer propaganda pessoal.
O saneamento básico da Costa do Estoril importa a uma quantidade enorme de pessoas que lá residem e que se servem daquelas praias. Não podemos estar a brincar com estas questões, não podemos permitir que aconteça aquilo que se está a verificar e que a mi m muito me entristece: é que se levantem aqui os problemas em Fevereiro, tal como eu fiz, e em Julho não só não tenha acontecido nada como ainda parece que para o Governo a melhor forma de actuar é deixar cair uma pedra em cima das questões.
Pela nossa parte, não deixaremos cair nenhuma pedra em cima dessas questões e, por isso, levantamos

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o problema, para que ele seja discutido nos seus aspectos técnicos e políticos e para que seja reposta a normalidade do diálogo entre esta Assembleia e o Governo, entre o Governo e o Poder Local.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr.ª Deputada Helena Roseta, na intervenção que fez, V. Ex.ª começou por aludir a uma questão que, salvo melhor entendimento, não tem rigorosamente nada a ver com o assunto que aqui estamos a discutir.
Recordo-lhe que do que hoje se trata é tão-somente de ratificar ou não um decreto-lei do Governo que cria o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril. Mas já que V. Ex.ª levantou a questão que aqui suscitou em Fevereiro, dizendo que nada até agora foi inquirido, quero recordar que só há muito pouco tempo foi empossada a comissão de inquérito.
Acresce que a conferência de líderes demorou algum tempo, com justificação, por certo, para determinar a que partido cabia a presidência dessa comissão. A comissão já funcionou, reunirá na próxima quinta-feira pelas 16 horas e 30 minutos - tal como reuniu na semana passada, embora se não tivesse verificado o quorum - para proceder à aprovação do Regimento e à definição da metodologia do inquérito.
Não adianto mais sobre esta questão por uma razão bem simples: o país tem vindo a habituar-se mal, em nosso entender, a que se avancem conclusões de inquéritos. Sobre as afirmações de V. Ex.ª foi decidido levantar um inquérito, vamos aguardar todos, com serenidade, que a comissão elabore o seu relatório e que depois lhe dê a publicidade adequada.
Relativamente à questão que aqui estamos a tratar - e, repito, é apenas a ratificação ou não do decreto-lei que cria o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril -, V. Ex.ª disse várias coisas, entre elas que se tinha criado um gabinete à pressa, que não tinham sido ouvidos os municípios e que se tinham aproveitado mal as verbas do fundo de turismo.
V. Ex.ª sabe, desde que foi decidido executar aquela obra, que as verbas do Fundo de Turismo sempre seriam insuficientes para a financiar. Ela teria que ser financiada pelo Orçamento de Estado, pelas verbas do jogo, isto é, por verbas que depois seriam aplicadas pelo Fundo de Turismo, e também por um financiamento externo.
Sendo necessária à contratação desse financiamento externo a criação de uma entidade com personalidade jurídica própria, foi isso o que fez, e bem, em nosso entender, o Governo. Não há aqui demasiadas celeridades na criação de algum organismo, mas tão-somente uma necessidade que decorre da contracção de um empréstimo junto de uma instituição internacional.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Deputado Vieira de Castro, agradeço o pedido de esclarecimento que formulou - tanto quanto sei V. Ex.ª é, neste momento, o Presidente da Comissão de Inquérito sobre esta questão do jogo da Costa do Estoril - porque me permite aqui tornar claros dois pontos: em primeiro lugar - e não é seguramente da responsabilidade do actual presidente desta comissão que ela não tenha funcionado até à data -, gostaria de tornar claro perante o Plenário e a opinião pública que não faço parto desta comissão de inquérito como inquiridora, porque me disponho a ser ouvida pela comissão de inquérito. Portanto, não posso ser ao mesmo tempo parte e juiz na mesma causa.
Aproveito trazer o assunto à baila para que isto fique claro, porque muitas e muitas pessoas me têm perguntado o que é que se passa com a comissão de inquérito. Sendo eu apenas uma Deputada exterior à comissão não posso responder por uma comissão da qual não faço parte e na qual não tenho responsabilidade?». Porém, já coloquei à disposição dessa mesma comissão todo o trabalho que realizei e o Sr. Deputado sabe, porque eu lho disse na semana passada, que toda a documentação que angariei sobre esta matéria está à disposição de V. Ex.ª como Presidente da Comissão e à disposição de todos os Deputados da comissão de inquérito. Tudo o que pude obter relativamente a esta matéria está, pois, à disposição, para consulta, de todos os Srs. Deputados! Assim V. Ex.ªs queiram consultar a documentação que entretanto foi coligida!
Mas a questão que aqui suscitei só tem a ver com a comissão de inquérito pelo absurdo do processamento em que tudo isto se envolve, porque se o Governo, no dia 4 de Fevereiro, aprova em Conselho de Ministros a criação de um Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril, como é que no dia 11 de Fevereiro, quando eu vim aqui suscitar o problema do saneamento básico da Costa do Estoril, não foi capaz de nos informar que tinha criado esse gabinete, que o mesmo estava já a trabalhar e que tinha uma série de competências! Porque é que estivemos à espera que a deliberação saísse em Diário da Republica para depois, ainda por cima, ter de se pedir a sua ratificação, por nela não estar consagrada a possibilidade dos municípios terem uma audição mínima sobre a matéria?
É tudo isto que me faz trazer aqui as duas questões juntas. Não faz sentido que a Assembleia esteja a discutir um assunto estando o Governo com o assunto em mãos e que o Governo não se dê sequer ao cuidado de informar a Assembleia que nele está a mexer!
Sobre toda esta matéria não recebi nenhuma informação do Governo, a quem apresentei uma série de requerimentos todos eles sem resposta. Aliás, relativamente a um deles foi-me respondido que, como estava tudo sujeito a inquérito teria a resposta!
É este tipo de procedimento que constesto e que como Deputada, aqui venho verberar e é este procedimento que não pode continuar, sob pena de nem a Assembleia da República ter a eficácia que deve ter. nem o Governo ter a dignidade que merece. O Parlamento e o Governo têm de entrar noutro tipo de relacionamento senão andamos aqui a perder tempo com processos de ratificação, que reconheço que são processos morosos mas que acabam por ser a única via para nós, Deputados, pormos em causa comportamentos duvidosos do Governo. Por tudo isto suscitei as duas questões ao mesmo tempo.
Quanto à questão que está em causa - a da ratificação deste decreto-lei-aquilo que aqui critico, Sr. Deputado, é que haja tanta urgência em criar um Gabinete

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de Saneamento Básico sob o pretexto de um pedido de empréstimo ao Banco Europeu de Investimento, quando no ano passado, o Governo não teve urgência nenhuma em receber o dinheiro que devia receber da empresa concessionária do jogo do Casino do Estoril e disse, nessa altura, que o dinheiro não era preciso. Acho que é uma má gestão o Governo tentar, por empréstimo, obter aquilo que podia ter obtido a fundo perdido e que, nos termos da lei, devia ter obtido a fundo perdido. É isso que ponho em causa e é por isso lambem que trago aqui esta questão.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Chamámos à apreciação da Assembleia da República este decreto-lei por razões que têm estritamente a ver com a autonomia do Poder Local, com a esfera de competência própria das autarquias locais e, nomeadamente, dos municípios envolvidos.
Trata-se, no caso deste gabinete, de saber se o Governo tem competência para criar uma estrutura que apropria atribuições da competência das autarquias locais e dos seus órgãos e trata-se também de saber se esta situação se pode manter por forma a que não seja posta em questão a autonomia do Poder Local.
Entendemos que é necessário e urgente alterar profundamente a filosofia que presidiu à criação deste Gabinete; mesmo que ele correspondesse a uma conjuntura financeira que obrigasse a encontrar uma situação técnico/jurídica, somos de opinião que é necessário alterar profundamente este Gabinete e a filosofia que lhe preside e encontrar, rapidamente, uma estrutura substitutiva que nasça da vontade dos órgãos do Poder Local dos municípios envolvidos, os quais, através de modos próprios, deverão definir a forma jurídica da estrutura adequada à gestão e à exploração do sistema. Entendemos, finalmente, que devem ser estabelecidas, de forma rigorosa, as delimitações das responsabilidades financeiras que decorrem de toda a operação.
O sentido concreto e directo com que fazemos este pedido de apreciação à Assembleia não pode, naturalmente, ser isolado de muitos outros casos em que, por formas enviesadas, a autonomia do Poder Local está a ser atacada.
É bom que se diga que a autonomia do Poder Local não é uma questão que resulte do papel, em termos directos. Ela resultará, sim, se o exercício das competências definidas nos diplomas estruturadores do Poder Local e atribuídas às autarquias locais for respeitado depois no conjunto de normativos que, a propósito de isto e daquilo, o Governo possa ir fazendo.
Só um exemplo: cria-se uma área de paisagem protegida e isso faz-se respeitando o princípio de autonomia do Poder Local? Pode não fazer-se! É possível, através, da instituição de um sistema que terá a ver - e legitimamente - com o interesse público de protecção do ambiente, criar-se todo um conjunto de mecanismos que acabam por afectar tanto as responsabilidades próprias das autarquias como o exercício autónomo das suas competências e, assim, de forma directa, lesar a própria autonomia do Poder Local.
O que será em questão neste gabinete, vocacionado para a gestão e exploração de saneamento básico da Costa do Estoril, são os princípios básicos da autonomia do Poder Local.
Estamos convencidos que será do interesse de todas as partes envolvidas no problema que esta questão seja resolvida a contento. Não vale a pena aqui dizer que as câmaras municipais envolvidas têm composições políticas partidárias muitíssimo diferenciadas e que todas elas são igualmente afectadas. Quero eu dizer que me parece que, caso esta estrutura permaneça inalterada, é necessário que a própria Assembleia da República lidere, provavelmente através da comissão adequada, um processo de consulta às autarquias sobre a matéria e que, entretanto, lhes possibilite a constituição da necessária estrutura, como é da sua vontade, em termos aceitáveis para todas as partes.
Foi com este espírito que chamámos à apreciação da Assembleia o Decreto-Lei n.º 91/88 de 12 de Março. Estamos convictos de que todos os Srs. Deputados terão em atenção os interesses que estão em jogo nesta questão.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, a propósito da autonomia do Poder Local, como V. Ex.ª deve calcular, embora o PSD não pretenda dar lições sobre essa matéria, se o pretendesse, estaria em muito boa posição para o fazer. Basta atentar na implantação que o PSD tem ao nível do Poder Local!...
Não compreendemos que se possa dizer que foi ferida a autonomia do Poder Local, até porque, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 91/88, V. Ex.ª poderá ler que o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril tem um carácter meramente transitório.
A sua criação deu-se por duas razões fundamentais. uma das quais já aqui foi anunciada, que se refere à necessidade de ser criada uma entidade, com personalidade jurídica própria, capaz de contratar empréstimos com instituições internacionais.
Por outro lado, havia a necessidade da existência de um organismo que, com a operacionalidade adequada - e não esqueçamos este aspecto - fosse capaz de coordenar e de acompanhar uma obra que e de grande dimensão. Talvez que não fosse despiciendo conhecer primeiro a dimensão da obra para depois nos pronunciarmos sobre o modelo adequado a adoptar para o organismo que deve coordená-la e acompanhar os trabalhos desde o seu início até à sua conclusão.
Concluída que esteja a obra, não restam dúvidas - e isso também se afirma no Decreto-Lei n.º 91/88 - que ela será devolvida a uma associação, constituída porventura entre municípios que têm directamente a ver com o saneamento básico da Costa do Estoril.

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Vieira de Castro, ainda bem que referiu, de forma clara, que não queria dar lições pois, de facto, está demonstrado

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que não as dá. Avisando, à partida, que as não queria dar, ficou tudo mais tranquilo. Aliás, ninguém as esperava!
O Sr. Deputado considera legítimo afrontar princípios constitucionais, criar uma espécie de estado de emergência constitucional, para contratar um empréstimo externo. No entanto, a questão que se coloca é muito simples: Serão as câmaras surdas a esse tipo de interesses? Participando elas em todo este processo não estariam à altura, não teriam capacidade para criarem, elas próprias, as estruturas necessárias para contratarem internacionalmente? Toda a questão do fundo reside nisto e está confirmada pelo Sr. Deputado. É que o Sr. Deputado fala da dimensão da obra e do tipo de estrutura que lhe deve corresponder para insinuar que as autarquias não estão à altura de responderem a desafios dessa dimensão.
Devo dizer-lhe que confio na capacidade das autarquias e, concretamente, na das quatro autarquias que estão envolvidas neste processo, que penso estarem à altura de gerir o empreendimento.
O Sr. Deputado afirmou, ainda, que o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril era uma estrutura transitória. Mas essa estrutura é transitória para a construção? Não, Sr. Deputado, não é! Conforme está definido, não no preâmbulo do decreto-lei mas no seu articulado, o Gabinete é uma estrutura transitória para a exploração e conservação do sistema. Isto quer dizer que ele é uma estrutura transitória para o seu funcionamento normal.
Isto é perfeitamente inteligível face ao que diz o artigo 11.º do decreto-lei em apreço, onde se previne que o passivo vai ser transferido - ou seria transferido - para a futura associação de utilizadores.
O que se pretende com isto, para além de tudo mais, é não só criar uma situação de facto consumada como ainda inviabilizar a possibilidade de as autarquias intervirem no processo ou colocá-las perante encargos que elas não podem suportar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Farei uma intervenção muito curta relativamente à apreciação do Decreto-Lei n.º 91/88, cuja ratificação esta Câmara decidirá.
A minha primeira observação vai directamente para aquilo que tradicionalmente têm sido as atribuições das autarquias locais em matéria de saneamento básico.
Tem sido, de facto, uma das atribuições normais e radicionais das autarquias locais a questão do saneamento básico, entendida praticamente desde o chamado ano de esgoto até às grandes obras, entre as quais se pode inserir o projecto de um Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Por isso não entendemos bem - e causa-nos alguma reocupação - o facto de as quatro autarquias directamente interessadas neste projecto e, consequentemente, neste gabinete, terem sido, por um lado, arredadas do órgão deliberativo e executivo - a Comissão Directiva - do Gabinete de Saneamento Básico e, por outro, nem sequer terem, no seu conjunto, a maioria no Conselho Consultivo desse Gabinete.
Desejamos que a intenção do Governo não tenha sido, de facto, arredar as autarquias locais da zona de um projecto que lhes diz directamente respeito, mas. na prática, convenhamos que o resultado é exactamente o mesmo.
Gostaria ainda de falar sobre a composição do Conselho Consultivo do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril, onde parece ter havido a intenção de. na sua composição, as autarquias ficarem em minoria. Só assim se percebe que, por exemplo, o conselho consultivo em causa integre, entre outros, um membro da Comissão de Coordenação Regional de Lisboa e Vale do Tejo.
É evidente que, para tal, podem existir todas as razões justificativas ao nível de um organismo que tem como atribuição fazer a coordenação de todas as acções desconcentradas do Governo central a nível de uma determinada área. Mas, assim sendo, convirá também perguntar o que faz então, ao nível da Comissão Directiva do mesmo Gabinete, o Director-Geral dos Recursos Naturais. É que aqui, pelo menos ao nível das intenções, poderá existir uma dupla atribuição de funções e uma dupla representação de interesses do Estado, do Governo Central, ao nível deste Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril, feita por via da Comissão Directiva e feita por via da Comissão Consultiva. Esta a primeira observação que merecia a pena fazer.
A segunda observação, uma observação já de algum pormenor, pode revelar o menor cuidado posto na composição da Comissão Directiva.
Relembrava que a Comissão Directiva do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril e composta pelo Director-Geral dos Recursos Naturais, por um vogal nomeado por despacho conjunto do Ministro das Finanças, e do Ministro do Planeamento e da Administração do Território e pelo Chefe da Estrutura de Projecto a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 91/88. Há aqui uma nítida entrada, por inerência, deste Chefe de Estrutura do Projecto.
Só que na altura em que é constituído este Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril esta Estrutura de Projecto extingue-se por si própria.
Procurou-se talvez com isto encontrar lugar de encaixe para um Chefe de Estrutura de Projecto. No entanto, será mais conveniente incluir aqui o seu nome e não procurar fazê-lo por intermédio de uma estrutura que cessou no preciso momento em que foi criado o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Finalmente, gostaria de dizer - e isto como resposta a algumas questões e pedidos de esclarecimento que já foram colocados nesta Câmara - que não pode ser utilizado como argumento a dimensão da obra, a sua qualidade, a necessidade de representação do Estado português perante instituições de crédito internacionais (e inclusivamente instituições de crédito comunitárias) quanto é sabido que a importância, a dimensão, o peso político até, destas quatro autarquias, no seu conjunto e até mesmo isoladamente, justificaria o recurso a esse crédito e lhes daria credibilidade, em termos negociais, junto de qualquer instituição de crédito.
Já agora gostaria de dizer também que ao nível ate da própria banca privada internacional haveria todo o interesse em financiar autarquias como estas quatro que se encontram referenciadas no decreto-lei em apreço.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra do Sr. Deputado Narana Coissoró.

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4632 I SÉRIE - NÚMERO 11

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado: A nossa posição quanto a este pedido de ratificação é talvez diferente da dos oradores que nos precederam.
O CDS não está contra a criação do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril, está contra o modo como ele foi criado e a maneira como são relegadas para um plano secundário as competências e o próprio funcionamento do Poder Local, principalmente das câmaras municipais, que têm o direito de intervir neste processo.
Em primeiro lugar, queixam-se as câmaras - e fizeram-no já constar ao Governo, através do envio de uma acta da reunião realizada na Câmara Municipal de Oeiras - que se sentem ultrapassadas pelo Governo quando elas próprias estavam a criar uma estrutura capaz de desempenhar as mesmas actividades que foram remetidas para a competência do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Em segundo lugar, não foram ouvidos, quando da criação do Gabinete, os detentores do Poder Local da zona, a quem não foi dada qualquer satisfação posterior sobre o assunto, excepção feita para um telex que receberam, já no fim do processo de constituição do Gabinete, proveniente do gabinete do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, informando, muito apressadamente, do que se estava a passar, depois desses órgãos de Poder Local terem feito constar que gostavam de saber como tudo aquilo tinha sucedido.
Em terceiro lugar, somos de opinião que, neste novo organismo criado, o papel das câmaras não deve ser secundarizado, antes pelo contrário.
O Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril é um órgão transitório, como aliás é referido no artigo 11.º do diploma, até ser criada a associação dos utilizadores. Mas, aqui surge um outro problema, é que as câmaras não querem a criação de uma associação de utilizadores, querem sim a criação de uma associação de municípios utilizadores.
Penso que esta pretensão é justa, na medida em que se elas próprias podem organizar-se em associação, se podem representar todos os interesses dos utilizadores, não vejo por que razão se há-de criar uma nova associação, sobrepondo-se aos municípios, para tratar directamente com o poder Central.
Naturalmente, isto é o vezo do actual Governo, é o vezo de fazer tudo contra o Poder Local, fazer tudo sem diálogo, fazer tudo criando novos serviços, criando zonas concentradas ou desconcentradas do poder em vez de descentralização e autonomia a favor do Poder Local, como está consagrado na Constituição.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Que nós respeitamos!

O Orador: - Em todo o caso, o Governo ainda está a tempo de rever o Decreto-Lei n.º 91/88 através desta ratificação. É tempo de, como aqui já foi referido Sr. Deputado Carlos Lilaia, mudar a composição do Conselho Consultivo e ver a quem deve pertencer a própria presidência deste concelho. Entendemos que, democraticamente, o Presidente deve ser eleito de entre os membros do Conselho Consultivo pensamos que o Presidente do Conselho Directivo não deve acumular as suas funções com as de Presidente do Conselho Consultivo, que se devem ampliar as funções deste Conselho deixando este de ser meramente um órgão de
consulta e de emissões de pareceres para passar a ter intervenção na regulamentação e constituir uma voz forte na gestão do Gabinete; finalmente, pensamos que se deve dar aos municípios a maioria dentro deste Conselho Consultivo.
Quanto à associação dos utilizadores, a nossa posição é, como já disse, a de que ela deve ser uma associação dos municípios utilizadores e não uma entidade estranha representando os utilizadores individualmente considerados, porque estes serão melhor representado pelos seus municípios.
Neste sentido, já enviámos para a Mesa, com manda o Regimento, as propostas de alteração emenda que gostaríamos de ver introduzidas no texto do decreto-lei sob censura neste debate. Creio que Governo não se furtará ao debate na comissão especializada e poderemos ouvir as câmaras e as assembleias municipais através dos seus representantes próprios, de forma a haver uma concertação e um diálogo triangular entre o Governo, a Assembleia da República e Poder Local, para chegarmos às conclusões que ma interessam para a zona da Costa do Estoril.
É neste sentido que votaremos favoravelmente a ratificação, com emendas, deste decreto-lei.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (INDEP): - Sr. Deputada Narana Coissoró, uso a figura regimental do pedido e esclarecimento para lhe dizer que, também do nosso ponto de vista, não há objecções quanto à criação do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril e de uma empresa pública de saneamento básico para Costa do Estoril.
Direi, a título individual, que, em 1982, quando a apresentei como candidata à Câmara Municipal de Cascais, a criação de uma empresa pública de saneamento básico para a Costa do Estoril era, na altura, uma das propostas do programa eleitoral do PSD e eu estava consciente de que essa seria a fórmula mais operacional para gerir todo este sistema. Mas isto não significa que se criem gabinetes provisórios, que aparecem desaparecem sem ninguém saber como, e também não significa que os municípios não tenham uma palavra muito mais importante a dizer.
A pergunta que lhe faço é a seguinte: não pensa Sr. Deputado que antes desta Assembleia votar na especialidade as propostas de alteração a este diploma deveriam ser formalmente ouvidas as assembleias municipais?

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Deputada, Helena Roseta, folgo em saber que estamos de acordo quanto à criação deste organismo, embora quanto à sua natureza o mesmo já não se possa dizer, pois, pelo que vejo, a sua posição é favorável à criação de uma empresa pública e nós que somos contra muitas das empresas existentes, não podemos aceitar criar ainda outras...
Quanto à audição formal, já alvitrei que a Assembleia seria o lugar privilegiado para ouvir as assembleias municipais, os presidentes das câmaras e para haver diálogo. Portanto concordamos com isso.

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13 DE JULHO DE 1988 4633

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD respeita a autonomia do Poder Local e a atestá-lo está, como dizia há pouco, a implantação que o PSD tem ao nível local...

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... implantação essa que, certamente, não se obteria através da ofensa ao Poder Local. Mas, deixemos estas questões e vamos aos pedidos de ratificação do PS e do PCP hoje em discussão.
A obra do saneamento básico do Estoril foi uma obra que pecou apenas por ser tardia e a não se ter executado, dentro de poucos anos, nenhuma das praias da linha do Estoril poderia ser utilizada, tal era já o elevado nível de poluição das suas águas.
É uma obra grandiosa, extremamente complexa, que vai beneficiar as populações de quatro municípios, que vai custar cerca de dez milhões de contos e que verá a sua conclusão no ano de 1991.
Com o objectivo de conferir operacionalidade à coordenação e execução da obra, por um lado, e de obter o financiamento necessário, por outro, decidiu o Governo - e, a nosso ver, bem - criar um gabinete que terá a função de acompanhar a obra desde o seu início até à sua conclusão, para depois a devolver a uma associação de utilizadores.
Se o Governo não tivesse tomado esta iniciativa, que permitiu já atingir o objectivo de contrair um empréstimo de cerca de três milhões de contos, certamente, que a conclusão da obra, prevista para o ano de 1991, operar-se-ia muito mais tarde.
As câmaras municipais interessadas na obra são ouvidas em tudo quanto à obra respeita, porque estão representadas num órgão que é designado, no decreto-lei cuja ratificação foi pedida, por «Conselho Consultivo».
Sabemos que após a publicação do decreto-lei tem havido reuniões entre os representantes das câmaras municipais interessadas e os membros do Governo que tutelam esta matéria. Portanto, em nosso entender, não foi violado nenhum princípio. Tem-se conseguido uma operacionalidade notável e a demonstrá-lo está o progresso que a obra regista dia-a-dia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (INDEP): - Sr. Deputado Vieira de Castro, compreendo a dificuldade da sua posição, mas não deixaria de registar uma pequena contradição. O Sr. Deputado acabou de dizer, há pouco, que nós não podíamos estar aqui a adiantar conclusões de inquérito e o senhor, como Presidente da Comissão de Inquérito, acaba por tirar a conclusão que não deve, isto é, que a obra está a decorrer a um ritmo apreciável, ou qualquer coisa como isso.
Sabe o Sr. Presidente da Comissão de Inquérito que uma das matérias sujeitas a inquérito é, precisamente, apreciar o ritmo das obras? Se consultar os relatórios do Gabinete coordenador verificará que, tal como eles
sustentam, há aspectos da obra que estão atrasados por razões diversas, designadamente meteorológicas e técnicas.
Portanto, Sr. Deputado, na sua qualidade de Presidente da Comissão de Inquérito, peco-lhe que não adiante aqui conclusões.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - A Sr.ª Deputada Helena Roseta desculpar-me-á que lhe diga mas, não tem a menor razão no que referiu. V. Ex.ª disse que eu, como Presidente da Comissão de Inquérito, estava a adiantar conclusões; no entanto, V. Ex.ª disse que o que se ia inquirir era o estado de avanço ou de atraso da obra.
Vou passar a ler aquilo que constitui o objecto do Inquérito Parlamentar n.º 7/V: «Apreciação das condições em que pelo anterior Governo foi autorizado o adiamento do pagamento de duas prestações de contrapartidas à concessionária do jogo no Casino do Estoril, à luz do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 56/84, de 9 de Agosto, e despachos governamentais subsequentes».

A Sr.ª Helena Roseta (INDEP): - Leia a alínea II)!

O Orador: - Portanto, V. Ex.ª não pode dizer que aquilo que se vai inquirir é o estado de avanço ou de atraso da obra. Não é isso! É apenas uma questão de adiamento, isso sim, do pagamento de duas prestações e não mais do que isso!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Helena Roseta (INDEP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Helena Roseta (INDEP): - Sr. Presidente, acaba de ser lida uma parte do objecto do Inquérito Parlamentar e não a outra.
Sr. Deputado, por favor, não troque as voltas! Leia a alínea II) e verá que não é isso que lá consta!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta minha brevíssima intervenção não tem a ver com a questão de fundo aqui em debate - sobre isso intervirá seguidamente o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais - mas sim com afirmações da Sra. Deputada Helena Roseta no início da apresentação desta ratificação, quando entendeu insinuar que o Governo não se teria comportado correctamente ao não informar a Câmara a propósito da aprovação, em sede de Conselho de Ministros, de um decreto-lei sobre o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril.
Sei que esta é uma questão perfeitamente lateral mas, é importante deixar aqui o esclarecimento, tanto mais que sendo eu o responsável pelo relacionamento entre

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o Governo e a Assembleia mal ficaria se este esclarecimento não fosse dado.
Quero dizer que não foi dado esclarecimento a propósito da discussão deste problema, como referiu a Sr.ª Deputada Helena Roseta, pura e simplesmente porque esse problema, do nosso ponto de vista, não estava em debate na Assembleia da República.
O que estava em debate era outra questão completamente diferente, para o qual o Governo nem sequer aqui tinha presença, porque, como sabem, de acordo com a praxe parlamentar, o Governo não toma assento nas discussões no período de antes da ordem do dia, mesmo quando sou previamente avisado sobre aquilo que os Srs. Deputados entendem, nesse período, trazer aqui à colação (e são livres de o fazer).
Apenas posso acrescentar que - não sei se estranhamente mas talvez naturalmente - o Governo daria esse esclarecimento não nessa sede, porque não tinha que o fazer, nem era normal que o fizesse, mas sim em sede da comissão responsável pelo acompanhamento dos assuntos relacionados com o ambiente e recursos naturais. Porém, tanto quanto me é dado saber, a propósito da intervenção feita em período de antes da ordem do dia pela Sr.ª Deputada Helena Roseta - e que todos conhecem -, nunca a comissão que respeita ao ambiente e recursos naturais solicitou a presença de membros do Governo para, de algum modo, poderem esclarecer esta situação. Ora, se isto tivesse sido feito, porventura, tinha sido trazido à colação a questão do diploma hoje submetido a ratificação. É este o esclarecimento que tinha para dar.

Aplausos do PSD.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais (Macário Correia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente a esta questão, devo dizer que estou aqui tão-somente para esclarecer sobre o pedido de ratificação referente ao diploma sobre o saneamento básico da Costa do Estoril e não sobre quaisquer outras questões que aqui foram abordadas, que têm outro entendimento, que se enquadram no âmbito da comissão de inquérito e que não me cabe a mim comentar neste momento, como é óbvio.
Em relação ao diploma em apreço, gostaria de explicar, de forma breve, alguns antecedentes para que se compreenda claramente o enquadramento que levou à sua aprovação e publicação.
Este Governo e o anterior, claramente nos seus programas, apostaram na reformulação do modelo institucional de gestão de recursos hídricos. Assim, no anterior Governo extinguiram-se duas direcções-gerais tradicionais, a Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos e a Direcção-Geral do Saneamento Básico, e em sua substituição foi criada uma Direcção-Geral de Recursos Naturais, vocacionada, em particular, para a gestão da água e do domínio público hídrico, mas que não tem personalidade jurídica nem autonomia financeira, tendo apenas autonomia administrativa.
Muitas obras de saneamento básico estavam já em curso, mas como estavam na mão do Estado, encontravam-se paradas há muitos anos, porque os Governos anteriores não tiveram condições, não souberam ou não quiseram levá-las por diante. Sentimos que era importante que algumas delas se acelerassem e outras se lançassem, por forma a resolver problemas graves, como era o da Costa do Estoril - aliás, ainda o é, embora hoje a solução seja clara e as obras estejam a decorrer ao ritmo previsto.
Foi assim que, em Abril de 1987, as obras, que estiveram paradas durante muitos anos, recomeçaram a bom ritmo, embora, nesse ano, não tivesse sido possível consumir todas as verbas que lhe estavam afectadas. Desde essa data, as obras têm decorrido a bom ritmo e este ano tem-se cumprido tudo o que estava previsto, ao ponto de a contribuição do Fundo de Turismo, ou seja, os dinheiros do jogo, estar, neste momento, 90% investido. Seguidamente, vem a comparticipação do Banco Europeu de Investimentos., que foi aqui referido, e depois a comparticipação das autarquias.
Devo explicar que a Direcção-Geral dos Recursos Naturais, que não tem personalidade jurídica nem autonomia financeira, como referi, não estava em condições de negociar este empréstimo (na medida em que não tem receitas próprias, não tem personalidade jurídica), e, portanto, era preciso criar um organismo para esse efeito. Foi assim que, para que as obras não sofressem qualquer atraso, se criou o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril com a figura de instituto público, dotado de autonomia administrativa e financeira, personalidade jurídica e associado à Direcção-Geral dos Recursos Naturais. Só assim foi possível continuar a bom ritmo as negociações com o Banco Europeu de Investimentos e na semana passada foi celebrado entre a República Portuguesa, através do Tesouro, e o Banco Europeu de Investimentos um contrato de empréstimo. Apenas falta, agora, fazer o repasse para este gabinete, cuja comissão directiva vai entrar em funções nos próximos dias.
Ao longo de todo este processo tem havido um perfeito diálogo e acompanhamento pelo Poder Local - que respeito, como, de resto, tenho dado provas não apenas pelo discurso mas pela prática - e quinzenalmente as autarquias e a estrutura de projecto do Gabinete têm reunido para acompanhamento e apreciação crítica do andamento deste processo delicado, com expropriações de vária ordem, com o atravessamento de uma zona de 20 Km e com outras complicações, como podem imaginar.
As autarquias tinham conhecimento disso, no entanto não houve uma reunião a nível político de algum membro do Governo com os presidentes das autarquias para discutir o diploma, dado que isso não é prática corrente, mas é certo que havia conhecimento por parte das autarquias desta intenção.
Logo após a publicação do diploma verificou-se que alguns partidos políticos manifestaram certas preocupações em torno do seu conteúdo - penso que não havia grandes razões para o fazerem, de qualquer modo compreendo as motivações que os levaram a isso - e nas semanas seguintes, eu próprio tive reuniões com as autarquias, a nível dos seus presidentes, e através dos meus serviços tiveram lugar várias reuniões com os serviços técnicos das autarquias. Portanto, houve um perfeito acompanhamento deste processo por parte do Poder Local.

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Para lembrar alguns dos Srs. Deputados, devo dizer que há um investimento da ordem dos dez milhões de contos, a preços actuais, repartidos em partes iguais pelo Orçamento de Estado, através do PIDDAC, pelo empréstimo ao Banco Europeu de Investimento e pelos dinheiros do Fundo de Turismo, que têm sido investidos à cabeça - tal como já disse mais de 90% desse montante já está investido - e quem passa na marginal vê, pelo menos, umas grandes condutas a flutuar entre a Cruz Quebrada e Algés, assim como, em Oeiras, em Cascais e em Carcavelos, vê em curso obras vultuosas e só não vê o túnel porque este não é visível para aqueles que circulam de comboio ou de carro na marginal.
Devo dizer que houve diálogo com as autarquias e sobre o que aqui foi referido quanto à troca de algum telex apressado entre o meu gabinete e as autarquias não é assim. Esclareço que, em dado momento, uma das autarquias, discordando do que algumas vereações estavam a fazer, solicitou-me que eu, para clarificar as coisas numa reunião que estava em curso, apresentasse uma nota com a interpretação clara de alguns artigos do diploma. Foi o que fiz, sem pressa mas com isenção e com espirito de esclarecimento que o momento exigia.
Daí para cá é facto que tive reuniões com os municípios; aliás, isso é do conhecimento público e daqueles que quiseram obter informações a fim de poderem intervir nesta sessão.
Devo dizer ainda que as autarquias em nada foram lesadas nos seus poderes e o facto é que, tendo elas nas suas competências as obras do domínio do orçamento básico, tem sido, neste caso, a Administração Central que tem feito essas obras, recorrendo às figuras que referi, não tendo sido as autarquias a fazerem os investimentos, consoante a lei a que aludiram claramente estipula.
Acrescento também que a estrutura que foi criada é transitória e eu sou um daqueles que deseja que ela desapareça o mais depressa possível, sinal de que apareceu uma associação de municípios utilizadores, sinal de que há condições para que esse empreendimento seja gerido a nível local, sinal de que se chegou a um tarifário claro para que o investimento seja recuperado, tornando-se, assim, desnecessária a intervenção do Estado, que se deseja que seja cada vez menor, porque há obras em zonas de igual acuidade e de importância social por vezes mais importante do que aquilo que está em jogo na Costa do Estoril.
Informo ainda que os municípios têm tido comigo e com os serviços várias reuniões de trabalho no sentido de criarem - em prazo que, espero, seja curto - uma associação de municípios que possa, por si, liderar este processo, não sendo o Estado a fazê-lo, o que nem eu nem as autarquias desejamos.
Foi contraído um empréstimo de 3 milhões de contos, que ficam emprestados à República Portuguesa durante 25 anos. É, pois, graças a esse empréstimo que cerca de 600 mil pessoas, ocupando uma área de 20 Km, vão ver os seus efluentes tratados. É isso que queremos e que esperamos.
É óbvio que faz todo o sentido que sejam os utilizadores, esses 600 mil habitantes da zona, a pagar essa infra-estrutura, porque é do mais elementar direito que assim seja. O Estado deve ficar liberto desse encargo para investir o montante que investiria nessa zona, eventualmente, noutras zonas degradadas, em zonas com complicações sociais e de saneamento básico bem mais gritantes.
Seria injusto, em termos políticos, que os contribuintes, que somos nós todos, ficassem a pagar, durante 25 anos, custos de saneamento básico numa zona que tem poder económico para pagar - e bem - essas obras. Seria injusto que classes que, de algum modo. não são as mais desfavorecidas do país, não suportassem esses investimentos, quando há zonas muito mais desfavorecidas do nosso país que precisam de ajuda.
Assim, faz todo o sentido que as autarquias da zona assumam esse investimento, que assumam, o mais depressa possível, as rédeas do assunto, consoante é meu desejo.
O gabinete foi criado por razões transitórias, como já expliquei e não por quaisquer outras, razões essas que vão, em primeiro lugar, ao encontro do desejo dos municípios, daqueles que querem ver o saneamento básico da Costa do Estoril resolvido. Certamente que quem quer isso, quem quer ver desaparecer a poluição, assim como um certo número de elementos que põem em causa a saúde pública na Costa do Estoril, não pode estar mais de acordo com este diploma.
Acrescento também que a Comissão Directiva vai ser empossada nos próximos dias e que o Conselho Consultivo e demais órgãos previstos no diploma vão entrar em pleno funcionamento. Tal não aconteceu ainda porque se arrastou o processo de escolha de um dos vogais da Comissão Directiva, dado que queríamos alguém com muita experiência nesta matéria. Mas a pessoa está escolhida, a nomeação está em curso, pelo que o Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril vai entrar em funções.
Até ao momento, não há razão alguma que me leve a acreditar que a estrutura que foi criada enferme de algum grave prejuízo para as autarquias, para a democracia ou para o Poder Local, e que há alguma razão de fundo para que se altere o diploma.
Depois da entrada em funcionamento do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril, todos nós estaremos abertos a críticas, a sugestões, a qualquer contributo que venha melhorar o funcionamento do Gabinete, enfim estaremos abertos a discutir e a aceitar as boas sugestões. Neste momento, as razões que aludi são claras: o Gabinete vai entrar em funcionamento pleno, com os seus órgãos claramente empossados dentro de dias e não vejo razão alguma para que agora alteremos o diploma.
Penso que o pedido de ratificação feito deve ter o acolhimento que aqui deixo expresso nas minhas palavras, ou seja, o saneamento básico da Costa do Estoril não deve ser empatado por qualquer razão, ainda que legítima do ponto de vista político-partidário, mas que não vai ao encontro dos interesses daqueles que querem ver resolvidos os problemas de saneamento básico da Costa do Estoril.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Narana Coissoró, Helena Roseta, Herculano Pombo e João Amaral.

Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, fui eu que aqui falei do telex. O adjectivo apressado talvez seja seu...

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O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Não, não, Sr. Deputado, desculpe-me mas é seu!

O Orador: - Mas V. Ex.ª também o sublinhou.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Citei a fonte, apenas!

O Orador: - Como eu estava a dizer, tomei conhecimento de uma fotocópia da acta da Câmara Municipal de Oeiras que, sobre o telex, diz textualmente o seguinte: «Quanto à visita do Ministro e Secretário de Estado, deu entrada ontem nesta autarquia um telex, às 10 horas e 39 minutos, com o programa da mesma». E continua, quanto ao texto do telex: «Encarrega-me S. Ex.ª o Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais de confirmar a V. Ex.ª que, na sequência do acordado na visita que hoje teve lugar, na reunião de trabalho, com a presença das autarquias, Direcção-Geral dos Recursos Naturais e do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, com vista à criação de futura entidade gestora do sistema, terá lugar neste gabinete, Rua do Século (...). Expressou, de seguida, a sua opinião quanto à necessidade de criação do Gabinete de Saneamento Básico da Costa do Estoril», etc.
Ora bem, está aqui! V. Ex.ª, depois de uma visita que fez, não justificou nada, naturalmente ouviu que as Câmaras pretendiam conhecer o que era essa nova estrutura e apressou-se a mandar um telex. É o que consta da acta. Li-a e posso dá-la a V. Ex.ª. É a acta da reunião ordinária, realizada em 6 de Abril de 1988. Se está aqui qualquer falsidade, V. Ex.ª poderá mandar investigar; apenas estou a proceder a uma mera leitura.
Que houve um telex para explicar o que era essa estrutura, isso é verdade, e isto aconteceu porque V. Ex.ª, até essa altura, não tinha explicado coisa alguma, às câmara interessadas.
Mas como acabou de dizer, V. Ex.ª não tem dúvidas e raras vezes erra. Por isso mesmo, tudo o que aqui foi dito, naturalmente, caiu em saco roto, inclusive as críticas construtivas que aqui fizemos.
O Governo queixa-se que não apresentámos alternativas, que temos uma língua comprida e o raciocínio curto; no entanto, mostrámos-lhe o que é que queremos, ou seja, queremos que seja revisto o Conselho Consultivo, a sua competência e o modo de designar a Presidência. Mas o Governo quer ser surdo e cego perante a oposição.
V. Ex.ª referiu-se duas vezes à associação dos municípios utilizadores, e eu não percebi bem qual é a sua ideia. Não sei se a associação de utilizadores de que fala o diploma é afinal a associação dos municípios utilizadores, como o CDS pretende, ou se é uma associação que nada tem a ver com os municípios. Repito: V. Ex.ª referiu-se duas vezes à associação dos municípios utilizadores, e eu gostaria de conhecer bem o que é que queria dizer pelo que agradecia que me desse um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado deseja responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, pergunto à Mesa, antes do meu pedido de esclarecimento, se é possível ler o requerimento que deu entrada na Mesa. Isto porque eu admitiria que talvez essa leitura trouxesse alguma luz à discussão.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o requerimento vai ser distribuído em tempo.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
Então, se não é possível a Mesa lê-lo, diria muito rapidamente que o objectivo da discussão aqui feita hoje não é a de inviabilizar a ratificação do decreto-lei mas, sim, introduzir-lhe emendas, pelo que se encontra na Mesa um requerimento no sentido de o diploma baixar à Comissão para aí, com a audição das assembleias municipais, lhe serem introduzidas algumas emendas.
Faço um apelo ao Governo e à sua bancada para serem sensíveis a isto, o que me parece o mínimo de bom senso. Se, quanto a isto, estamos todos de acordo, não há dúvida alguma; se estamos em desacordo, então quem tem problemas político-partidários é o Governo e não eu. Isto porque é sensato e razoável o que estamos a propor, isto é, que se oiçam as assembleias municipais, antes de introduzir emendas a um diploma que, ao que parece, levantou dúvidas.
A pergunta que lhe queria fazer não e de natureza processual, mas de conteúdo orçamental. Não posso estar mais de acordo consigo quando diz que não devem ser os contribuintes a pagar esta obra, razão pela qual me bati para que fosse o jogo a pagá-la, em grande parte. Contudo, tenho uma dúvida crucial, que é a seguinte: Em 1985, nos termos da legislação então aplicável, o Governo fez sair uma resolução perante a qual esta obra - avaliada, na altura, em 5 milhões e meio de contos -, seria, numa parte, financiada pelo Orçamento de Estado (2 milhões de contos) e noutra parte (2 milhões e 900 mil contos) pelas contrapartidas do jogo, o que dava um valor de 5 milhões e qualquer coisa. No final do. ano passado, a obra já estava avaliada em 10 milhões de contos, que foi o número agora citado, e isso é normal uma vez que os preços evoluíram. Só que a parte do jogo, que em 1985 estava estimada em 2 milhões e 900 mil contos, em 1987 continua a ter o mesmo valor. Ora, o mecanismo da contrapartida do jogo tinha precisamente uma actualização anual.
Pergunto: por que é que os senhores se esqueceram de actualizar a parte que diz respeito ao jogo? Porque querem que seja o BEI e o Orçamento do Estado a financiarem mais ou por outra razão? Não entendo por que é que a parcela que corresponde ao jogo não foi também actualizada a preços 1987.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, estava eu aqui posto em sossego a ouvir, com algum deleite, a sua intervenção - e longe de mim fazer-lhe qualquer pergunta -, mas eis senão quando o Sr. Secretário de Estado faz a defesa empolgada do

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princípio do poluidor-pagador sobre o qual já tivemos, e continuaremos certamente a ter, algumas discussões.
A pergunta que quero fazer-lhe é muito simples: visto que na Costa do Estoril são os 600 mil poluidores que terão de pagar a despoluição - o que não constesto -, por que é que, em situações análogas, tal como na Bacia do Ave, na Ria de Aveiro, em Alviela, na Ria Formosa, em Estarreja, no Barreiro, não são os poluidores a pagar a despoluição? Porque é que o Estado, por exemplo, no Rio Alviela tem de pagar as primeiras, as segundas, as terceiras custas, até que se saiba quem são os verdadeiros poluidores e estes se assumam como tais para num futuro, que nunca mais chegará, assumirem a sua quota-parte do pagamento? Por que é que os pobres contribuintes de menores recursos não são obrigados a pagar aquilo que os da Costa do Estoril poluem, mas já são obrigados a pagar o que os da Bacia do Ave, de Alviela, etc., poluem?
Porquê dois critérios para um só princípio?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, V. Ex.ª disse, a certa altura da sua intervenção, que não houve uma reunião formal com todas as câmaras porque não era prática corrente do Governo. Suponho que entendi mal...

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Pode repetir, Sr. Deputado.

O Orador: - Disse que, no caso concreto, para a preparação deste diploma, não chegou a haver uma reunião formal com todas as câmaras.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Houve uma reunião entre técnicos!

O Orador: - Exactamente. Então, está confirmado que não houve uma reunião com os responsáveis políticos.
A questão que lhe coloco é muito simples: já que ninguém propõe que o decreto-lei seja revogado mas, isso sim, que seja alterado em sede de comissão, vê o Sr. Secretário de Estado algum inconveniente em se sentar, formalmente, na Comissão e discutir o decreto-lei, artigo a artigo, com representantes das Câmaras, das assembleias municipais e das diferentes forças políticas desta Assembleia aí representadas?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, que dispõe de 6 minutos, tendo sido 3 minutos cedidos pelo PSD.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procurarei ser rápido ao responder às várias questões que me foram colocadas.
Em primeiro lugar, devo clarificar que o telex adjectivado de «apressado» pelo Sr. Deputado Narana Coissoró se deve ao facto de, nesse dia, 6 de Abril, eu e o Sr. Ministro termos estado em visita às obras na zona e termos combinado com as autarquias que deveria haver uma reunião, tendo eu ficado, na tarde desse dia,
de confirmar a todos a data e a hora da reunião. Foi isso que fiz. Esse telex é apenas uma confirmação de uma reunião combinada nesse próprio dia e com os próprios, no local.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Até aí nada tinha havido!

O Orador: - Até essa altura houve reuniões.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E o telex?

O Orador: - Foi para confirmar mais uma reunião.
Em relação às críticas construtivas que disse fazer, Sr. Deputado Narana Coissoró, farei uma reflexão sobre elas; de resto, estou a reflectir sobre as sugestões das autarquias, mas de momento, não vejo razões para se fazerem alterações ao diploma.
Quanto às associações de municípios utilizadores, devo dizer para clarificar - aliás, já o disse em documento assinado por mim, verbalmente às Câmaras municipais e digo-o aqui - que o que se pretende é que as quatro autarquias se constituam em associação, com a personalidade jurídica que entenderem, para gerirem este sistema. É isso que se pretende. Naturalmente que se tratará de uma associação de utilizadores, composta por quatro municípios. É essa a solução que preconizo.
Relativamente ao que a Sr.ª Deputada Helena Roseta sugeriu, devo dizer que tomo em boa atenção as sugestões que fez; de qualquer modo, o Governo, para dialogar com as autarquias, sejam elas quais forem e em particular estas, tomará em boa conta as sugestões do Parlamento, mas não precisa delas para que o diálogo tenha lugar, o que já acontece há muito tempo. Para o caso em apreço, conforme deu provas, o diálogo já teve lugar, mesmo antes de aqui estarmos. Naturalmente que outros tomarão mais atenção, consoante o interesse que têm por aquilo que estou a dizer.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - A Sr.ª Deputada tem tanto interesse que nem está sentada na bancada!

O Orador: - Em relação a outros aspectos que a Sr.ª Deputada referiu, dispenso-me de as comentar, dado que, neste momento, me parece inoportuno fazê-lo.
Quanto ao que o Sr. Deputado Herculano Pombo referiu, estou de acordo com o que disse; de resto, há pouco deixei transparecer isso das minhas palavras quando disse, e sublinho, que não é justo que sejam os outros contribuintes a pagar a uma zona favorecida os custos da despoluição dessa mesma zona, têm de ser eles a pagar com um tarifário adequado. O dinheiro que o Estado vai ali comprometer tem de ser utilizado noutras áreas, onde há classes mais pobres e gente em situações delicadas, do ponto de vista da poluição, e que, naturalmente, carecem dessas obras e desse empurrão do Estado.
Defendo que o princípio do poluidor-pagador tem de ser aplicado, mas não ponho de parte que, em situações delicadas, não tenha de haver um contributo forte, um empurrão da parte do Estado para que essa situação seja desbloqueada. A filosofia é a de que, muitas vezes, essa contribuição pública é um fermento que Ia/despoletar um processo e que contribui para a sua resolução. É isso que pretendo e é isso que desejo venha a acontecer.

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Quanto à sugestão feita pelo Sr. Deputado João Amaral, ela é boa, no entanto, penso que seria uma duplicação de trabalho em relação àquilo que posso fazer de viva voz e directamente com as autarquias ao longo do processo que referi. Certamente que o Parlamento pode ficar dispensado para outros trabalhos.
Penso que o seu contributo pode ser importante e poderei toma-lo noutra altura; contudo, neste momento, o Governo dispensa essa sugestão, porque entende que, de viva voz com as autarquias, pode chegar a esse resultado, dispensando e agradecendo a boa sugestão que me fez e que, certamente, viria ao encontro da solução que preconizo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrada a discussão das ratificações n.ºs 16/V e 18/V.
informo que deram entrada na Mesa várias propostas de alteração e um requerimento de baixa à Comissão, que serão apreciados na altura própria, ou seja, às 19 horas e 30 minutos.
Informo ainda que se encontra a assistir ao Plenário, numa das galerias, um grupo de alunos da «People to People High School Studant Program».

Aplausos gerais.

Dentro de segundos, vamos entrar na reapreciação do Decreto n.º 81/V, que autoriza o Governo a rever o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho, do contrato de trabalho a termo e o regime processual da suspensão e redução da prestação do trabalho.
Como é do conhecimento da Câmara, foi interposto recurso, pelo Partido Comunista Português, da decisão do Presidente de agendar este diploma.

Pausa.

Srs. Deputados, como tive ocasião de dizer, dentro de alguns segundos, vamos entrar na apreciação do recurso do despacho do Presidente da Assembleia da República, apresentado pelo PCP, que foi oportunamente distribuído.
Srs. Deputados, enquanto organizamos os trabalhos, suspendemos a sessão por cinco minutos.

Está, então, interrompida a sessão.

Eram 16 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o recurso, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decidiu Sua Excelência o Sr. Presidente indeferir o requerimento do Grupo Parlamentar do PCP que visava submeter à consulta pública das organizações de trabalhadores o Decreto n.º 81/V.
O núcleo de decisão assenta no pressuposto do conhecimento pela Assembleia da República do resultado da apreciação pública desencadeada pelo Governo através da Separata do Boletim de Trabalho e Emprego de 17 de Dezembro de 1987, depois da discussão no Conselho de Concertação Social, concluindo assim que «segundo o Acórdão n.º 107/88 do Tribunal Constitucional parece ser bastante para suprir a inconstitucionalidade formal detectada».
É nosso entendimento que a argumentação do despacho é frágil e não ultrapassa nem preenche o comando constitucional e legal da participação das organizações dos trabalhadores na legislação laboral.
Convém clarificar o seguinte:

1.º - O Tribunal Constitucional no Acórdão referido, a páginas 26, de facto levanta a questão de saber se o direito de participação dos trabalhadores exigia, no caso concreto, que a respectiva audição fosse desencadeada directamente pela Assembleia da República ou se bastava que a ela fossem fornecidas as opiniões emitidas pela consulta efectuada pelo Governo antes ainda da apresentação da proposta de lei.
Mas a conclusão do Tribunal Constitucional, que não é a mesma da que se pode extrair do despacho de V. Ex.ª, diz o seguinte: «estas questões ficam em aberto».
2.º - O argumento da discussão havida no Conselho de Concertação Social tem o valor que tem, já que sendo legítima, não preenche o direito constitucional e legal da participação inscrito nos artigos 55.º e 57.º da Constituição e na Lei n.º 16/79, tendo em consideração que as Comissões de Trabalhadores e Coordenadoras, bem como os sindicatos não filiados em nenhuma central sindical não estão representados naquele órgão.
3.º - A consulta desencadeada pelo Governo através da Separata do Boletim de Trabalho e Emprego (BTE) de 17 de Dezembro foi, quanto muito, (como afirmam em relevante trabalho Gomes Canotilho e Jorge Leite) um acto de pré-procedimento legislativo já que o iterprocedimental se inicia com o impulso legiferante do Governo através de propostas de lei de autorização, apresentadas na Assembleia da República.

Assim tinha de ser já que a Assembleia da República como órgão autorizante de uma proposta material que define a matriz, do sentido e extensão do futuro decreto, não poderia ser transformada em simples «caixa de ressonância do Governo», a Lei de autorização não pode revestir um carácter de lei meramente formal, mero expediente ou instância de trânsito para o exercício de funções legislativas delegadas. Será aqui a sede própria para dar sentido, dimensão e oportunidade ao direito de participação. Aliás, na segunda separata, publicada em 29 de Abril, a esmagadora maioria das organizações de trabalhadores foram claras: exigiram que tal consulta fosse feita pela Assembleia da República. O órgão parlamentar - porque a legislação em causa é uma legislação de trabalho, porque na elaboração da legislação de trabalho têm o direito constitucional de participar as Comissões de Trabalhadores e as Associações Sindicais - tinha e tem de promover, através da Comissão ou Comissões, a obrigação constitucional de assegurar consultas o audiências cognoscitivas aos representantes dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante uma matéria que diz respeito a milhões de trabalhadores, a milhares de empregadores que justificaria, mesmo só

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numa visão política, que a Assembleia da República, sujeito legiferante por excelência, pluralisticamente representativa e aberta à publicidade crítica, assumisse o seu papel soberano e pleno à luz da Constituição. Mas acrescem ainda as razões constitucionais.
Não foi esse o entendimento de V. Ex.ª, quando recusou o nosso requerimento. O PSD quer repetir o vício originário da inconstitucionalidade formal, escolhendo o confronto institucional e social.
Deixo esta última reflexão: sem nada que aparentemente o justifique o PSD apresenta uma proposta de alteração nova onde se alarga de 90 para 180 dias, repito 180 dias, o prazo da autorização para o Governo legislar. A Constituição não seria respeitada mas o Governo, esse, ficaria com margem de manobra alargada. Porquê este comportamento?
Por tudo isto, recorremos da decisão de Sua Excelência.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Galvão Teles.

O Sr. Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, prescindo da palavra por agora, retomá-la-ei mais tarde.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos, efectivamente, de concordar com as razões aduzidas pelo PCP, no que diz respeito à fundamentação do recurso interposto na parte referente à falta de audição prévia dos representantes dos trabalhadores.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, V. Ex.ª não tem razão ao invocar o Tribunal Constitucional, visto que este, claramente, não se pronuncia sobre esta questão, pelo contrário, diz que é uma questão duvidosa o saber o momento exacto da respectiva audição: se antes de apresentada a proposta na Assembleia, se depois, sendo, neste caso, a Assembleia da República a fazê-lo directamente. Estas duas hipóteses são postas em dúvida pelo Tribunal Constitucional. Mas o Tribunal Constitucional ainda diz mais, diz que não tendo sido feita qualquer dessas audições -, nem a directa, pela Assembleia da República, nem tendo sido presentes à Assembleia os resultados de uma audição que teria sido efectuada eventualmente pelo Governo -, esse problema não é objecto de decisão por parte deste tribunal.
É que este processo legislativo das autorizações legislativas pedidas pelo Governo e um processo complexo, que verdadeiramente se inicia com a apresentação à Assembleia da República da proposta de autorização legislativa. O que ficou para trás - e o Governo poderá ter procedido, melhor ou pior, à audição dos representantes dos trabalhadores - é neste caso pouco importante, mas não há dúvida de que o núcleo duro do processo de autorização legislativa está no trabalho da Assembleia da República, no decreto da Assembleia da República, que concede a autorização legislativa.
Aliás, o próprio Tribunal Constitucional dá indicações neste sentido, chamando a tudo aquilo que é acção
do Governo o processo pré-legislativo. É um processo de preparação da proposta a apresentar à Assembleia da República. Há assim indicações seguras, no próprio texto do acórdão, no sentido de que, a ter alguma opinião - e aqui já nos deitamos a adivinhar, mas por outras coisas que o texto diz nomeadamente, ao situar, numa fase de processo pré-legislativo, essas eventuais audições que o Governo possa ter feito -, poderemos arriscarmo-nos a dizer que se o Tribunal Constitucional tivesse de se pronunciar sobre esta questão, pronunciar-se-ia pela audição directa, a efectuar pela Assembleia da República, às organizações representativas dos trabalhadores.
Por isso mesmo, daremos o nosso voto favorável ao recurso interposto pelo PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O PSD vai votar contra este recurso, interposto pelo Partido Comunista Português, do despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República que indeferiu o requerimento, também do PCP, para que o Decreto n.º 81/V desta Assembleia fosse submetido a discussão pública.
O PSD vai votar contra e fá-lo com grande serenidade, porque o Partido Comunista Português não tem razão.
A Constituição, entre os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores reconhece-se o direito de criarem comissões de trabalhadores e a liberdade de constituírem associações sindicais.
O PSD defende o direito dos trabalhadores de se pronunciarem ou de participarem na elaboração da legislação do trabalho através dos seus organismos representativos.
Mas a questão posta neste recurso não é essa. Estamos perante uma autorização legislativa cuja iniciativa pertenceu, por definição, ao Governo.
Não interessa agora aprofundar se a chamada autorização legislativa é uma delegação ou transferência de poderes, se envolve um mandato ou uma substituição, se traduz uma autorização ou uma participação. Só valeria a pena fazê-lo numa perspectiva voltada para jusante, que claramente não é a adequada neste caso. A iniciativa da autorização pertenceu ao Governo, que também facultou à Assembleia da República todos os elementos que constituíram a participação das organizações representativas dos trabalhadores.
A audição dos trabalhadores já foi portanto feita e contribuiu para a iniciativa e conteúdo da proposta do Governo. Essa audição irá também influenciar a lei cio autorização que este Parlamento é chamado a produzir.
Quer material, quer formalmente, ficou assim assegurada uma participação real das comissões de trabalhadores e das associações sindicais.
A autorização legislativa que respeita à legislação de trabalho, pode, portanto, ser discutida e votada pela Assembleia da República porque as organizações de trabalhadores já puderam pronunciar-se sobre ela.
Aliás, a tradição desta Câmara mostra que, no passado, nas diversas autorizações legislativas concedidas ao Governo na área do trabalho nunca se procedeu, nesta sede, à audição das organizações representativas

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dos trabalhadores. Em termos jurídico-constitucionais o recurso do PCP não tem portanto fundamento.
Mas para o Partido Comunista o problema não é técnico; é político.
É do conhecimento geral que a modernização da legislação laborai com vista a implementar a criação de postos de trabalho tem sido considerada pelo Governo como uma reforma estrutural, defendida no seu programa. E o PCP já anunciou que usará, ou abusará, de todos os meios regimentais para impedir que o Governo execute o seu programa.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Por isso muda o prazo de 90 dias para 180 dias!

Uma Voz do PSD: - Quer intervir, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É um à parte, Sr. Deputado?

O Orador: - O Partido Comunista quer evitar, portanto, a todo o custo, a aprovação desta autorização legislativa; isto para impedir que possam ser revistos o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho, do contrato de trabalho a termo e o regime processual da suspensão e redução da prestação de trabalho.
Isto para impedir que a legislação laboral se modernize e acompanhe o passo dos restantes países comunitários.

Vozes do PCP: - Não apoiado!

O Orador: - Este recurso é assim uma tentativa de obstrução, ainda que regimental, mas nasceu morto. Falta-lhe a força da razão para poder triunfar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos os Srs. Deputados Nogueira de Brito, para produzir uma intervenção e Miguel Galvão Teles, para interpelar a Mesa.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, primeiro, pretendo fazer uma intervenção e, depois, a interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Se é para uma intervenção tem de se seguir a ordem de inscrições.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, fica inscrito para produzir a intervenção a seguir ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, e para interpelar a Mesa, tem, desde já, a palavra.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas quero interpelar a Mesa só depois de fazer a intervenção se assim mo permitir.

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Então, terá de o requerer na devida altura, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Fá-lo-ei na devida altura, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apraz-me começar por cumprimentar o meu colega e amigo, Sr. Deputado Galvão Teles, que enriquece, sem dúvida, esta Assembleia com o seu saber e a quem, com muito gosto e até com graça, desculpamos estas ignorâncias de normas do Regimento - não fazem mal nenhum -, pois com certeza até vamos lucrar com o seu contributo dado ao fundo da questão. É isso que importa!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente a esta matéria, do recurso do PCP, já tomámos posição aquando da sua primeira discussão. Considerámos, então, que era uma questão formal a de saber qual a iniciativa que deveria ter sido objecto de consulta às organizações dos trabalhadores e consideramos ainda que estas deviam considerar-se suficientemente ouvidas.
Votámos, então, contra!
Entretanto, «muita água passou pelas pontes», Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Pronunciou-se o Tribunal Constitucional sobre a matéria e entendeu que não valia a pena saber se estava cumprido o requisito de ouvir os órgãos representativos dos trabalhadores sobre a autorização legislativa ou de os ouvir sobre o diploma que se pretendia publicar no uso da autorização, porque, de momento, ninguém tinha sido ouvido.
Pronunciou-se, há dias, esta Assembleia, curiosamente com os votos manifestados em grande alegria e consonância pelo antigo bloco central, PS e PSD, aceitando a tese aqui defendida pelo Sr. Deputado António Vitorino, nos termos da qual um expurgo com alteração implicava uma alteração completa do diploma e justificava ou exigia uma votação final global nova.
Tudo isto são dados novos que não alteram, com certeza, o fundo do nosso pensamento mas abalam a forma e fazem surgir as dúvidas. As dúvidas estão lá e nós, como democratas-cristãos que somos, apraz-nos dizer: queira Deus que não venham a afectar mais gravemente todo o processo.
Como as dúvidas estão lá, pensamos da mesma maneira quanto à questão de fundo, à duplicação de audiências e audições, mas vamos, desta vez, votar na abstenção.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, peço desculpa pela minha relativa ignorância regimental, mas foi não só ignorância como também uma certa descoordenação inerente ao grupo - relativa ou total!
Terá havido ignorância regimental, mas não ignorância constitucional. E aí creio que tenho esse privilégio de não a ter, ao contrário, porventura, de outras bancadas.
Devo confessar que me parece que a questão do recurso, apresentado pelo Partido Comunista Português, está mal formulada.

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Nos termos do artigo 279.º da Constituição, em caso de veto pelo Presidente da República, por haver previamente uma decisão do Tribunal Constitucional no sentido da inconstitucionalidade de um diploma, a Assembleia tem duas hipóteses e só duas: uma é expurgar a norma inconstitucional e não expurgar a inconstitucionalidade como se diz aí num papel que li, outra, é confirmar o decreto por votação de dois terços.
Ora, é óbvio, e entra pelos olhos dentro, que a expurgação da norma julgada inconstitucional só pode verificar-se quando a inconstitucionalidade, seja de que natureza for, for uma inconstitucionalidade parcial. Porque a expurgação da norma julgada inconstitucional quando a inconstitucionalidade é total, é a expurgação de todo o diploma, como é evidente!
No caso concreto, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional, por vício de forma, o decreto da Assembleia da República que pretendia conceder uma autorização legislativa para o Governo legislar em matéria de trabalho.
A Assembleia não tem poderes para declarar uma inconstitucionalidade sanada, mas tem poderes para expurgar normas julgadas inconstitucionais.
No caso concreto, repito, no que toca à inconstitucionalidade do procedimento, a expurgação não é possível.
De modo que, a meu ver, o que está em causa não é o problema do recurso, mas o de esta Assembleia só poder confirmar o decreto e só poder superar o veto do Presidente da República por votação de dois terços dos Deputados presentes.
Por essa razão, em primeiro lugar, quanto ao recurso, o PRD votará na abstenção. Em segundo lugar, gostaria de interpelar a Mesa no sentido de saber qual o critério que a Mesa irá seguir, no caso de não ter provimento o recurso apresentado pelo PCP quanto ao apuramento do resultado da votação. Exigirá ou não os dois terços para a confirmação do decreto da Assembleia da República?
Tenhamos a certeza de que, se esses dois terços não forem exigidos, o Presidente da República estará constitucionalmente proibido de promulgar e, ainda que promulgue, a promulgação é nula e o diploma será considerado inexistente, pelo que teremos dois ou três anos de caos jurídico.
Se isto é o renascimento da confiança na economia, peço desculpa e diria ao Governo que ouvisse melhor os seus juristas em vez de impor a sua teimosia.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do CDS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos os Srs. Deputados Nogueira de Brito e Correia Afonso. Gostaria de sabei qual a figura regimental para a qual pretendem usar a palavra.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Presidente: - Não pode, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Ah!...

Risos gerais.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Também não sabe o Regimento!

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa encontra-se, muitas vezes, confrontada com a própria confissão dos Srs. Deputados para utilizarem uma figura regimental ad hoc no sentido de serem ultrapassadas certas dificuldades regimentais.
No entanto, dou a palavra ao Sr. Deputado Correia Afonso e, se o Sr. Deputado Nogueira de Brito persistir no seu pedido também lha darei a seguir.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, ouvi o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles e, com o muito respeito que lhe devo, confesso que fiquei um pouco perplexo.

Uma voz do PCP: - Não é de admirar!

O Orador: - Fiquei um pouco perplexo e a primeira pergunta que faço à Mesa é no sentido de saber se foi distribuído aos grupos parlamentares o texto do Acórdão do Tribunal Constitucional que se pronunciou sobre o Decreto 81/V, porque o Sr. Deputado Galvão Teles acabou de dizer que o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional todo o diploma, quando o Acórdão diz apenas: «Nesta conformidade, o Tribunal Constitucional decide pronunciar-se pela inconstitucionalidade: 1 - Da norma do artigo 1.º, n.º 2;2 - Da norma do artigo 2.º, alínea a); 3 - Da norma do artigo 2.º, alínea d); 4 - Da norma do artigo 2.º, alínea f); 5 - Da norma do artigo 2.º, alínea s)».
Como se vê, aquela decisão que o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles referiu não está aqui.
Pergunto, portanto, à Mesa se o Acórdão do Tribunal Constitucional é este que referi ou existe outro que desconheça.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa já tem duas interpelações e como presume que vai ter mais uma, responderá no fim.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito deseja fazer a interpelação que solicitou.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, dado que sou rigoroso nas minhas intervenções, e a título de interpelação apenas, desejaria perguntar se, como eu, a Mesa também está convencida de que o Sr. Deputado Galvão Teles tinha feito uma intervenção. Isto porque o Sr. Deputado Galvão Teles disse que ia fazer uma intervenção seguida de uma interpelação à Mesa.
Ora, eu inscrevi-me para fazer um pedido de esclarecimento à intervenção do Sr. Deputado Galvão Teles.

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado sabe, trata-se de um processo sui generis e estão bem expressas no Regimento as regras por que se rege, ou seja, o Partido que recorre dispõe de três minutos para o apresentar e os outros grupos ou agrupamentos parlamentares têm a possibilidade de se pronunciarem durante três minutos sobre a mesma matéria.
É, portanto, uma matéria sui generis e o Sr. Deputado não tem, na interpretação da Mesa, direito a fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Galvão Teles.

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O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, nessa altura não a faço e guardar-me-ei para o momento em que fizer a minha intervenção sobre o fundo da questão.

O Sr. Presidente: - Em resposta às duas interpelações à Mesa, se os Srs. Deputados me permitem, vou começar pela segunda por ser mais simples e factual, embora a primeira também seja factual.
Efectivamente, o Acórdão foi distribuído pelos grupos parlamentares. Julgo, até, que nem havia necessidade disso, mas a verdade é que foi distribuído logo que chegou à Assembleia da República. Além disso, ele foi publicado igualmente no Diário da República e, portanto, é do conhecimento geral de todos os Srs. Deputados.
Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Galvão Teles, devo dizer que o caminho a seguir será o que ficou acordado na conferência de líderes, onde, aliás, estava presente o representante do PRD.
Votado o recurso, se o mesmo for rejeitado, entraremos na discussão na generalidade, da reapreciação para expurgo do diploma vetado, ou seja, do Decreto n.º 81/V.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, a minha intervenção é simples: É que, por mais esforços que faça para ver nas palavras de V. Ex.ª uma resposta ao Sr. Deputado Galvão Teles, não a encontro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é natural que não me tenha feito entender e, por isso, repito: «Vamos primeiro votar o recurso e, se o mesmo rejeitado, começaremos a reapreciação do Decreto n.º 81/V, de acordo com o que foi acordado na Conferência.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vera Jardim deseja fazer uma nova interpelação?

O Sr. Vera Jardim (PS): - Não. É só para esclarecer V. Ex.ª que agora já vejo alguma resposta, o que não sucedia naquilo que o Sr. Presidente tinha dito antes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, admito não ter sido suficientemente explícito, mas foi isso que pretendi dizer e julgo que o disse.
Srs. Deputados, vamos passar à votação do recurso da decisão do Presidente da Assembleia da República, apresentado pelo Partido Comunista Português.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, porque é uma matéria importante, solicito a contagem de quórum.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, há muitos deputados reunidos em Comissão, pelo que peço o favor de os mandar chamar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a campainha já está accionada. De resto, há uma comunicação interna e a Mesa tem conhecimento de que, pelo menos, uma Comissão está reunida, como foi indicado no boletim informativo: é a Comissão de Economia, Finanças e Plano. Pedia, por isso, aos serviços que solicitassem aos Srs. Deputados que se encontram nesta Comissão a sua comparência no Plenário.

Pausa.

Srs. Deputados, a Mesa fez a contagem das presenças e temos quórum de votação. Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, penso que a contagem das presenças foi solicitada pelo PCP contudo, se esta se faz desta maneira, eu posso assegurar a V. Ex.ª que, do Partido Socialista, estão, pelo menos, 5 pessoas na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Portanto, temos de nos habituar a que, quando há contagens, se chamem, por exemplo, as pessoas que estão naquela Comissão, caso contrário, isto não tem sentido, porque em grupos mais pequenos a presença na Comissão Eventual, para a Revisão Constitucional é significativa, enquanto que em grupos grandes não é. Ora, tenho a certeza de que esta Comissão está reunida e que nela se encontram 3 ou 4 elementos do Partido Socialista, no mínimo.
Logo, ou V. Ex.ª manda interromper para se proceder à contagem solicitada, ou isto segue, mas com a noção de que não estão cá essas pessoas e outras Comissões, também, a funcionar.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Mas há quórum, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Sampaio, há pouco referi que a Mesa tinha conhecimento - bastava ler o boletim informativo - de que estava reunida a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e solicitei, através do microfone, urbi et orbi a presença dos membros dessa Comissão. Pedi também, aos Srs. funcionários que informassem a Mesa da chegada ao Plenário dos membros da Comissão. Entretanto, fui informado pela Mesa de que já havia quórum de votação e, nessas circunstâncias, estavam satisfeitas as condições para se proceder à votação.
Julgo que estamos suficientemente esclarecidos.
Vamos pois passar à votação do recurso apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, e votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e abstenções do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na reapreciação do Decreto n.º 81/V.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.

Pausa.

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A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Realmente inscrevi-me para usar da palavra neste debate, embora achasse mais curial que começássemos por ouvir a palavra dos autores da proposta de expurgo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ..., mas isso ficará para seu tempo, tanto mais que a proposta, no seu conjunto, foi questionada e suponho que a questão se mantém. Bom, ficará para seu tempo e honro-me muito com a circunstância de abrir o debate.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Considerados como uma espécie de excrescência incómoda e pouco útil do regime democrático, conjunto de mal-dizentes sem razão a quem urge «cortar o pio», colecção de discursadores insensíveis aos benefícios dos acréscimos da produtividade política, estamos, nós deputados - incluindo obviamente os colegas do PSD...

Risos.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não, não! Só do CDS!

O Orador: - ... e V. Ex.ª também, Sr. Deputado Silva Marques, e todos os seus colegas... como dizia, estamos transformados, ao fim e ao cabo, em autêntica câmara de expurgo, espécie de purgatório purificador dos pecados cometidos por uma proposta do Governo contra a Constituição da República. Foi, há poucos dias ainda, a impropriamente chamada lei das privatizações, está a ser hoje o vulgarmente designado pacote laboral e veremos se não vai seguir-se, a prazo mais ou menos curto, a revisão da lei da acesso à actividade económica - vulgo, lei dos sectores - e na sua versão final, a criação dos dois novos impostos sobre rendimento - reforma fiscal, no dizer pomposo do Governo.
Aliás e em relação ao tema que hoje nos ocupa, veremos, também, se não acabaremos por vir a ser confrontados com a necessidade de expurgar o expurgo.

Risos.

Seguindo, com efeito, na esteira do PCP, que, aliás, é um grande vitorioso neste processo, o PSD enveredou agora pelo esquema do expurgo complexo. Em vez da simples eliminação dos normativos declarados inconstitucionais, como aconteceu no diploma respeitante à transformação das empresas públicas nacionalizadas em sociedades anónimas, a maioria aparece agora a propor para este caso uni autêntico bombardeamento com várias ogivas do diploma afectado.
Expurgam-se normas inconstitucionais e expurga-se mesmo, em jeito de exorcismo, a própria inconstitucionalidade. Expurga-se por eliminação, expurga-se por alteração e expurga-se - ou pretende expurgar-se por simples constatação certificada, o que ao menos constitui verdadeira novidade de catálogo.
Com tudo isto, com todo este arsenal, objecto de várias missivas com variados anexos do Grupo Parlamentar do PSD, não sei porém se o texto do Decreto n.º 81/V ficará devida e convenientemente
expurgado, pronto a ser finalmente promulgado por quem de direito.
Quem fica, não expurgado, mas carecido de ser purgado, face a tal indigestão, seremos, com certeza, nós deputados...
E para quê todo este aparato bélico? Por que não seguiu antes o Governo o conselho dos que - representantes de patrões e trabalhadores - manifestaram já o entendimento de que o mais acertado, neste ponto do processo, seria nada fazer, a benefício de uma mais calma e ponderada reflexão de todo o assunto.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Querias!
O que é que vai ficar, ao cabo de todo o processo das primitivas intenções anunciadas em matéria de revisão da legislação laboral?
Em que medida vai realmente contribuir-se para eliminar este obstáculo - o maior como o chegou a classificar o Primeiro-Ministro - ao alinhamento do País pela velocidade da economia europeia?
O que fica pouco mais é do que o simples e magro cumprimento formal da promessa de mais uma reforma estrutural, antes do Verão.
Tão pouco que, em termos de balanço final e global, pode dizer-se, como já se tem dito, que o resultado da operação acabará por ser negativo, não apenas em relação ao que se pretendia - o obstáculo ao invés de ser eliminado vai crescer - como também em relação ao que, com certeza se não previu, que pudessem vir a ser as consequências de todo o processo desencadeado com a consulta do Conselho Permanente da Concertação Social. Estou a referir-me, como é já óbvio para todos, à deterioração dificilmente reversível do clima de concertação ligado ao funcionamento do Conselho e de que o Governo, com razão, se gabava, e ao risco que corremos todos e que ainda não pode considerar-se afastado de destruição do sistema de equilíbrio sindical tão laboriosamente conseguido ao longo dos idos 1975 e 1976.
Para já não falar nas observações gravosas feitas ao Tribunal Constitucional e ao pré-desencadeamento duma crise institucional, afectando também as relações Governo-Presidente da República.
E convenhamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que será difícil fazer apreciação diferente quando se confronta a proposta de expurgo agora apresentada pelo PSD com o texto do decreto a expurgar, para não falar já do texto da proposta apresentada ao Conselho de Concertação Social, ou mesmo do texto submetido a discussão pública, ou até da própria proposta de autorização legislativa feita a esta Assembleia.
Se há casos em que o Governo revelou as suas qualidades digestivas, este foi com certeza, um deles. É claro que não em proveito de um diálogo sereno e frutuoso com a Assembleia... Isso não, que poderia parecer derrota da maioria. Mas em benefício de outros parceiros que tiveram a suprema habilidade de criar as ilusões suficientes para justificar toda uma série de cedências em troco de coisa nenhuma...
Com efeito, uma vez aprovado o expurgo e promulgado o decreto expurgado, as novidade ficam reduzidas ao alargamento das causas justificativas do despedimento colectivo - que já podia ser apenas de dois trabalhadores - ao despedimento individual, com substituição do controlo prévio administrativo por um

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sistema de controlo posterior judicial e à subordinação dos dirigentes sindicais e membros das comissões de trabalhadores ao regime universal do despedimento.
Pelo caminho - o último lanço entenda-se - ficam o alargamento do conceito de justa causa, das possibilidades de despedimento por inaptidão superveniente e de substituição da reintegração por simples indemnização a pagar ao trabalhador mal despedido, mesmo contra sua vontade, bem como aquilo a que podia chamar-se a possibilidade de suspender a suspensão do despedimento.
Mantêm-se, no entanto, as restrições introduzidas no regime dos contratos a prazo que, como é sabido e foi publicamente anunciado pelo Primeiro Ministro de 1976, funcionam como uma espécie de válvula de escape para a rigidez do regime dos contratos por tempo indeterminado, é certo que como uma prática em muitos casos assinalada por aproveitamentos abusivos a que nem a jurisprudência dos tribunais de trabalho e muito menos a fiscalização administrativa conseguem por cobro.
Sem eles, porém, ou melhor, sem a possibilidade que a contratação a prazo representa, não teríamos tido o mínimo de flexibilidade indispensável à motivação do investimento produtivo e por essa via à criação de novos postos de trabalho.
O que agora vai acontecer é que vai ser mais difícil contratar a prazo, enquanto que no domínio do contrato por tempo indeterminado quase nada vai mudar.
Quer dizer, não ficarão satisfeitos os dirigentes sindicais, na exacta medida em que lhes é difícil aceitar qualquer mudança, não ficam satisfeitas as entidades patronais porque o saldo das mudanças lhes é desfavorável e não resulta satisfeito o interesse geral, tal como o definiu o Governo no decurso do processo, na medida em que a confusão gerada será não motivadora, mas desmotivadora em relação à criação de novos empregos.
Finalmente - como ainda hoje aqui ouvimos - é muito provável que não se considerem satisfeitos o Presidente da República e os Juizes do Tribunal Constitucional, uma vez que nos encontramos aqui a discutir o «expurgo» sem conhecer ainda os resultados das consultas feitas às organizações de trabalhadores exigidas pela Constituição, enquanto que a porta aberta no Acórdão sobre a licitude constitucional da previsão dos despedimentos fundados em causas objectivas é de tal modo estreita que não sabemos se por ela passará a nova versão da alínea a) do artigo 2.º da proposta de lei de autorização.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não, passa, não!

O Orador: - Mas, então, que alternativa (?), perguntará com certeza o Governo que passa a vida a acusar as oposições de falta de programa, embora acabe quase sempre por mostrar um maior desdém por aquilo que, em bom espírito, lhe é proposto.
Está o CDS, neste como em muitos outros casos, completamente tranquilo, com a tranquilidade que lhe vem de ter ideias precisas e coerentes para atacar os problemas que se prendem com a actual situação das relações de trabalho, no quadro mais vasto das relações sociais em Portugal.
Ideias que assentam antes de mais, na determinação tão rigorosa quanto possível das causas possíveis da rigidez e dos bloqueios que, sem dúvida, afectam o
panorama das relações sociais no nosso país e que, em nosso entender, se situam nos seguintes domínios fundamentais: Primeiro, no excesso de regulamentação legal, através de normas imperativas absolutas, em prejuízo da autonomia normativa traduzida nas convenções colectivas de trabalho.
Segundo, no predomínio de uma concepção estática da segurança do emprego sobre a ideia dinâmica e desenvolvimentista da promoção do emprego, com os reflexos conhecidos no regime da cessação do contrato de trabalho.
Terceiro, no predomínio tão claro como o anterior de uma filosofia distributiva sobre as preocupações com a produção, com reflexos nítidos no regime das férias, feriados e faltas e do horário de trabalho.
Quarto, na concepção da greve como instrumento de luta ao serviço da construção de um Estado socialista e não como último recurso para defesa dos direitos dos trabalhadores.
Finalmente, num regime de segurança no desemprego que pouco adianta em relação ao velho sistema do subsídio, não chegando a constituir sequer um simulacro de seguro, dotado de um esquema de prestações minimamente substitutivas dos salários perdidos pelo trabalhador desempregado.

Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, este conjunto de causas, de certo modo ligadas entre si e com repercussões negativas em vários domínios cobertos pela política social, só poderá ser combatido por conjunto de actuações coordenadas e dotadas de coerência, a primeira das quais se situa no domínio da revisão constitucional. Aí deveriam, na verdade, ter sido apresentadas propostas que pudessem constituir matriz adequada aos desenvolvimentos legislativos considerada indispensáveis.
Foi o que o CDS fez, designadamente com a proposta de aditamento de um novo normativo a acrescentar ao artigo 53.º, com vista a tornar claro o entendimento que temos - sublinho, que temos no CDS - do texto actual do artigo e acautelar em todas as hipóteses os interesses dos trabalhadores.
Em seguida e uma vez revista a Constituição, optaríamos por pôr termo ao actual caos e confusão que dominam a legislação laborai, propondo a revisão do regime do contrato individual de trabalho, ainda com base num diploma de 1969, de modo a nele integrar o que hoje constitui objecto de variadíssima legislação avulsa e algumas vezes contraditória, com prejuízo manifesto para todos os interessados, que muitas vezes não sabem sequer qual a lei que se lhes aplica.
Procuraríamos orientar tal revisão pela preocupação de diminuir a carga das normas imperativas, confiando maior espaço de manobra à autonomia normativa dos parceiros sociais, e de fazer com que a legislação laborai, sem deixar de consagrar mínimos de justiça, pudesse deixar de constituir um obstáculo ao investimento e ao desenvolvimento da produtividade.

Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, reestruturaríamos o esquema de prestações da segurança social em caso de desemprego, de modo a que pudessem substituir, em condições razoáveis de montante e de tempo, as remunerações perdidas, afectando-lhe para o efeito toda a

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parte da taxa social única correspondente às antigas quotizações para o Fundo de Desemprego e transferindo para o Orçamento do Estado os encargos com a formação profissional. Do que faríamos em sede de Orçamento do Estado falaremos noutra altura, mas também aí faríamos algumas coisas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não entendeu assim o Governo optando por atacar parcialmente o problema e prescindindo de intervir na revisão constitucional nesta matéria, o que é em si mesmo negativo, assim como o é o processo que utilizou, que se tivesse sido levado a bom termo, na prática, acabaria por transformar o Conselho Permanente de Concertação Social numa autêntica câmara política com diminuição paralela dos poderes desta Assembleia.
Fez mal o Governo, sendo certo que em relação ao mal que fez nada corrige com o expurgo que agora nos propõe.

Aplausos do CDS.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, a certa altura da sua intervenção pareceu-me que V. Ex.ª manifestou um entendimento um pouco diverso do meu sobre a manutenção no actual «pacote laborai» expurgado da norma relativa à inaptidão do trabalhador como uma causa objectiva de despedimento.
Comparando os dois textos, isto é, o «pacote» inexpurgado e o expurgado, parece poder concluir-se que as causas objectivas só podem ser por motivos relativos à empresa e não ao trabalhador. Ora, pareceu-me que V. Ex.ª disse entender que, embora numa perspectiva diferente, embora já não qualificado como justa causa, continuaria a ser causa de cessação do contrato individual de trabalho a inaptidão do trabalhador.
Gostaria que V. Ex.ª me esclarecesse este ponto.
Por outro lado, tendo certamente V. Ex.ª lido com atenção a proposta que está agora em discussão, isto é a proposta de expurgo, com novas redacções, eliminações, etc., pergunto-lhe se entende ou não que estamos face a uma nova proposta e não face ao anterior decreto simplesmente expurgado.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Vera Jardim, V. Ex.ª ouviu mal o que eu disse, que foi claramente o seguinte: «Pelo caminho (...) ficara o alargamento do conceito de justa causa, das possibilidades de despedimento por inaptidão superveniente» do trabalhador. Portanto, isso desapareceu e o que há é o alargamento das causas relativas à empresa - causas de ordem económica ou tecnológica que eram próprias do despedimento colectivo (que, aliás, como salientei, em certas circunstâncias poderá ser apenas de dois trabalhadores -, ao despedimento individual, com a substituição de um controlo prévio administrativo por um controlo posterior judicial nessa matéria.
Portanto, em matéria de causas objectivas, é a única coisa que ficou neste diploma.
Quanto ao mais, há dias, quando tratámos do expurgo do diploma respeitante à transformação das empresas públicas, entendi que não era preciso fazer
uma nova votação final global porque a hipótese levantada pelo PCP, ao propor uma alteração do normativo declarado inconstitucional, era apenas uma hipótese de confirmação, isto é não acrescentava nada de novo em relação ao que seria a eliminação. Era, pois, um sublinhar da eliminação pela via da transformação do normativo, pelo que entendi que não havia razão para nova votação final global. Aliás, em termos gerais, considerei que não haveria essa necessidade, mas no caso de hoje obviamente que estamos perante um diploma novo. Estamos perante um diploma completamente transformado que justificará, como sustentava no outro dia o Sr. Deputado António Vitorino, que haja até, porventura, votações diferentes em relação ao que é proposto.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Marques.

Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Está hoje em reapreciação nesta Assembleia o Decreto n.º 81/V, de autorização ao Governo para rever o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho, do contrato de trabalho a termo e o regime processual da suspensão e redução da prestação de trabalho.
É pacífica e generalizada a opinião de que a legislação em causa carece de ser revista de forma a que, tanto quanto possível, se evite a precaridade do emprego e, igualmente, se eliminem entraves à modernização das empresas. Durante o debate aqui travado em meados de Abril, quer o Governo, quer o PSD demonstraram sobejamente que as propostas então apresentadas eram aquelas que mais se adequavam à necessária evolução da legislação em causa, porque representavam o ponto de equilíbrio entre as posições sustentadas pelas organizações de trabalhadores e de empregadores.
Ó Tribunal Constitucional, porém, entendeu, por maioria, decidir pronunciar-se pela inconstitucionalidade de algumas das normas do decreto em reapreciação. Respeitamos o Acórdão do Tribunal, na medida em que o mesmo resulta do exercício legítimo de uma competência constitucionalmente consagrada. Temos, no entanto, toda a legitimidade para dele discordarmos frontalmente, porque tem na sua génese uma leitura imobilista do nosso texto fundamental, que não contribui, seguramente, para que, no respeito pelos princípios constitucionais, a Assembleia da República e o Governo aprovem as medidas legislativas que o progresso e o desenvolvimento de Portugal exigem. Aliás, esta afirmação está amplamente comprovada pela declaração de voto de vencidos dos Conselheiros Cardoso da Costa e Messias Bento. Não vou, por isso, desenvolver o tema, aqui e agora.
Não obstante esta dificuldade de percurso, o PSD entendeu que uma lei, que fora em grande parte o resultado de um diálogo vivo e persistente com os parceiros sociais, não deveria ser pura e simplesmente abandonada.
Por isso, apresentou a esta Câmara as propostas de alteração capazes de sanar as «inconstitucionalidades» referenciadas no Acórdão do Tribunal Constitucional, de modo a que, finalmente, se quebre o tabu da inalterabilidade da legislação laboral.
A volumosa documentação recentemente remetida pelo Governo à Assembleia da República é a prova

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mais provada de que todas as organizações de trabalhadores que quiseram participar na elaboração da legislação sub judice o puderam fazer. Aliás, não é despiciendo referir todo o diálogo e esforço de consensualização que, durante alguns meses, foi realizado no âmbito do Conselho Permanente de Concertação Social.
Também sobre o assunto, quer comissões de trabalhadores, quer associações sindicais fizeram chegar à Assembleia da República inúmeras tomadas de posição sobre os projectos legislativos em causa. Houve mesmo uma central sindical a quem, a seu pedido, a Comissão Parlamentar de Trabalho concedeu uma audiência. Pode, pois, afirmar-se que os direitos consagrados nos artigos 55.º, alínea d) e 57.º, n.º 2, alínea a) da Constituição da República foram ampla e substancialmente exercidos pelos seus titulares.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social Democrata e o Governo pretendem, inequivocamente, promover o bem-estar dos portugueses. Para que tal se concretize é indispensável que, em cada momento, se garanta a todos uma efectiva igualdade de oportunidades, dos mais diversos domínios, e se reforce a solidariedade. Estes são objectivos de sempre do PSD. Encontram, também uma inegável tradução no Programa do XI Governo Constitucional liderado pelo Prof. Cavaco Silva. Pensamos que a concretização da igualdade de oportunidades é exigida pela justiça social e quanto mais justa for a sociedade portuguesa, maior será a coesão nacional, tanto mais necessária quanto é certo que, os desafios que o Mercado Único Europeu nos vai lançar já em 1992, não se compadecerão com quaisquer tipos de complexos ou imobilismos. Estamos em condições de reforçar a democracia política e aprofundar as suas vertentes económica, social e cultural. Mas não podemos parar se, efectivamente, quisermos para o nosso país níveis de bem-estar equivalentes aos dos países mais desenvolvidos das Comunidades Europeias.
É neste ponto que entronca, mais uma vez, a questão da legislação laborai. Em 1992, as empresas e os trabalhadores fixar-se-ão, livremente, nos países em que as condições de exercício das suas actividades sejam mais favoráveis. É um dado objectivo que a legislação laborai portuguesa - e não só aquela que está a ser objecto de revisão - é das mais rígidas, desincentivando, futuramente, o investimento de nacionais e estrangeiros no nosso país. Sem investimento, é obvio que não haverá nem criação de mais riqueza, nem de mais emprego. Poderão alguns, no entanto, objectar que, apesar da legislação actual, o desemprego em Portugal tem diminuído nos últimos três anos. E um facto e felizmente que assim tem acontecido. Cremos, porém, que os índices seriam ainda mais favoráveis se, oportunamente, já se tivessem operado na legislação as alterações adequadas. E certamente seriam em muito menor número os jovens desempregados à procura do primeiro emprego. Mas aqueles que minimizam a necessidade das alterações propostas esquecem-se que, em 1992, o Mercado Único encarregar-se-á, inelutavelmente, de demonstrar o que terá, em cada momento, de ser feito para que os seus objectivos se atinjam de forma a garantir-se a coesão económica e social das Comunidades. São poucos os que desejam o falhanço do Mercado Único. Outros, que contribuíram significativamente para a adesão de Portugal à CEE, e que nos momentos próprios também trabalharam para que
esse futuro próximo seja de prosperidade e paz social, ainda vivem complexados pela leitura de velhos romances neo-realistas ou pela memória de velhas fitas dos anos 50. É forçoso, todavia, e sem ambiguidades, avançarmos no caminho da adequação da legislação portuguesa à legislação vigente nos países da Europa Comunitária. Só assim será possível, igualmente, garantir aos trabalhadores portugueses esquemas de segurança social semelhantes àqueles de que já beneficiam os trabalhadores dos países das Comunidades.
O PSD pretende também que, progressivamente, e tendo em conta a especificidade e sazonalidade das actividades económicas, se diminua a precaridade do emprego e, bem assim, todos os fenómenos que lhe estão subjacentes e que criam graves problemas sociais. Pensamos que é indispensável que, cada vez mais, os empresários e os trabalhadores tenham consciência de que é através de uma permanente e adequada formação profissional que se podem aumentar os índices de produtividade e a qualidade dos bens e dos serviços. Esta é uma batalha que teremos de vencer. E que, de certa forma, é indissociável da criação de condições legais que contribuam para a promoção da estabilidade do emprego e, simultaneamente, não impeçam a necessária mobilidade profissional, acautelados que estejam os legítimos interesses dos que efectivamente queiram ocupar um posto de trabalho produtivo.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A concertação social já deu, em Portugal, frutos muito positivos. È natural que nem todas questões encontrem junto dos parceiros sociais o desejável consenso e que, por vezes, alguns escolhos constituam acidentes de percurso. Não é somente em Portugal que isso acontece. Olhe-se para a vizinha Espanha, por exemplo. Vejam-se as dificuldades que, nesta matéria, amiudadas vezes se deparam aos parceiros sociais e aos Governos dos Países Comunitários. É normal que assim seja, porque também nestes países os conflitos não são escamoteados e os legítimos representantes de trabalhadores e empregadores agem em completa liberdade.
No entanto, parece oportuno referir que a Comissão das Comunidades, no relatório económico de 1986/87, sublinhava que se «um diálogo frutuoso tinha sido alcançado com e entre os parceiros sociais», não deixava da aleitar para o facto de que «a vontade de cooperação» manifestada pelos parceiros sociais a nível Europeu, «não é plenamente utilizada a nível nacional».
O PSD, consciente deste facto, não pode deixar de, nesta Assembleia, assumir a responsabilidade de dirimir conflitos que, se não fossem ultrapassados pelo poder legislativo, se eternizariam. Deste modo, as propostas apresentadas pelo PSD estão devidamente fundamentadas, de fornia a que a sua aprovação permita, futuramente, a existência de uma legislação mais justa e mais adequada às necessidades do nosso País.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O ciclo de progresso que começou em 1985 com o X Governo Constitucional não vai ser interrompido.
O PSD e o Governo vão continuar a trabalhar no sentido de que haja mais e melhor emprego; o PSD e o Governo vão continuar a trabalhar para que, como tem acontecido desde 1985, os trabalhadores e as suas famílias tenham aumentos reais de rendimentos; o PSD e o Governo vão continuar a trabalhar para que a inflação - inegavelmente um dos maiores inimigos da justiça social - continue a baixar para níveis razoáveis e europeus.

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O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Então, é preciso baixar muito!

O Orador: - O PSD e o Governo vão continuar a manter a esperança e a desenvolver a confiança que os portugueses, desde 1985, depositam no Governo do Prof. Cavaco Silva e em Portugal.

Aplausos do PSD

A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Narana Coissoró, Jerónimo de Sousa e Nogueira de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Joaquim Marques, dado que dispomos de muito pouco tempo e temos de geri-lo, vou colocar-lhe apenas duas questões sobre a alínea a) do artigo 2.º
Diz-se aí que a legislação que o Governo irá estabelecer assentará na «previsão de formas de cessação do contrato de trabalho com base em causas objectivas...», etc. Aquilo que lhe pergunto, em primeiro lugar, é a que formas de cessação do contrato de trabalho V. Ex.ªs se referem. É que, se afastam à partida a hipótese de culpa do trabalhador, não pode ser obviamente um despedimento fundado em justa causa.
Por outro lado, tratando-se de um único trabalhador, não pode ser também despedimento colectivo. Também creio não se tratará do caso de caducidade, nem do de rescisão por vontade do trabalhador.
Portanto, de entre todas as formas de cessação do contrato de trabalho que temos no nosso direito constituído, não conheço nenhuma que se possa aplicar a esta alínea...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente!

O Orador: - ..., pelo que gostaria que me dissesse qual é essa forma nova de rescisão do contrato individual de trabalho que o PSD inventou.
Diz-se ainda aqui que são causas objectivas as que «tornem praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho». Que relação de trabalho é esta, Sr. Deputado? É a relação individual de trabalho ou será a relação de trabalho respeitante a uma pluralidade e, portanto, estaremos caídos no despedimento colectivo?
Mais adiante diz-se que se estabelece uma regulamentação adequada «rodeada de um particular quadro de garantias substantivas dos direitos dos trabalhadores». O Sr. Deputado é capaz de «trocar isto por miúdos» e dizer o que é este quadro de garantias substantivas dos direitos dos trabalhadores? São os direitos relativos à segurança social que sempre pedimos, mas que não podem fazer parte da lei dos despedimentos? E porque é que não apontou já hoje qual é o articulado referente a estas decantadas garantias substantivas?
Penso que era importante que estes três pontos ficassem na acta para eventual exame pelo Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Deputado Joaquim Marques, gostaria de tecer algumas considerações gerais relativamente à Constituição, que foi tão
arredada do seu discurso, e às propostas apresentadas pelo PSD, na medida em que, descontando a propaganda governamental, pouco fica claro sobre o seu conteúdo e os objectivos concretos que o PSD referiu. Aliás, o Sr. Deputado Narana Coissoró já levantou duas questões pertinentes, a que gostaria que o Sr. Deputado respondesse.
No entanto, há uma outra questão que me desperta particular interesse. O PSD está de acordo com o Governo em que este decreto, com as alterações agora propostas não seja colocado à discussão pública, arriscando-se, a nosso ver, que mais uma vez seja declarada a sua inconstitucionalidade formal.
Ora, o que gostava de saber era por que é que o PSD apresenta uma proposta nova, no sentido de, caso a autorização legislativa seja aprovada, o Governo dispor de, em vez de 90 dias como está no decreto, 180 dias. Para quem tinha tanta pressa e se lamentava de que não era capaz de alterar a legislação laborai, é estranho que apareça de repente o PSD a propor um prazo de 180 dias para a autorização legislativa. Não acredito que o PSD esteja contra o Governo, nem que seja por ir de férias. Por isso, gostaria que nos explicasse o porquê desta alteração do prazo de 90 dias para outro tão grande, quando tinham tanta pressa ou pelo menos pareciam tê-la.
A outra questão que quero colocar-lhe tem a ver com o diálogo vivo com os parceiros sociais, que foi a frase bombástica que o Sr. Deputado utilizou no seu discurso.
Porque o diálogo é uma coisa importante e porque não é por acaso que a Constituição define os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores como sendo fundamentais - e por isso mesmo é da competência da Assembleia da República legislar sobre os direitos dos trabalhadores - pergunto-lhe que papel é que o Sr. Deputado reserva à Assembleia da República. Penso que esta é uma questão importante quando se fala em diálogo e em participação - aliás, as organizações de trabalhadores pronunciaram-se às centenas, o que, como é evidente, o PSD omitiu, em relação à proposta legislativa contida na segunda separata -, no sentido de se discutir na Assembleia e se contar com a participação e a opinião das organizações de trabalhadores.
É evidente que o PSD não quer isso, mas então pergunto-lhe que papel é que afinal reserva a esta Câmara e aos seus membros? Será que se sente no papel de Deputado ou de notário? É apenas para pôr o carimbo? Então, numa questão que tem a ver com o direito à vida, de que é expressão fundamental a segurança no emprego, numa questão que é vital para o futuro dos trabalhadores não acha o Sr. Deputado que é pouco vir aqui dizer que se concedeu uma audiência a uma central sindical? O Sr. Deputado sabe que isso depende do critério estabelecido pela Comissão de Trabalho e não explicou a recusa por parte da comissão a dezenas e dezenas de pedidos de audiência com o argumento (verdadeiro) de que o processo não decorria pela Comissão de Trabalho.
Importa clarificar que espécie de diálogo é que o Sr. Deputado quer.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Joaquim Marques, confrontando o n.º 2 do artigo 1.º

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do decreto com a vossa proposta de expurgo, verifico que a única diferença consiste em retirar a expressão «simultaneamente» da redacção do decreto.
Por outro lado, V. Ex.ªs pedem uma certidão das respostas e com ela pensam expurgar a inconstitucionalidade.
Sr. Deputado Joaquim Marques, pode concretizar qual é o vosso método para eliminar a inconstitucionalidade, declarada pelo Tribunal Constitucional, do n.º 2 do artigo 1.º: é retirar a expressão «simultaneamente» ou é juntar certidão comprovativa das respostas das organizações de trabalhadores e, portanto, essa modalidade nova que é a expurgação da inconstitucionalidade?

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Marques.

Sr. Joaquim Marques (PSD): - O Sr. Deputado Narana Coissoró pediu-me um esclarecimento relativamente à questão da nova redacção proposta para a alínea a) do artigo 2.º Tanto quanto nos apercebemos da leitura do Acórdão do Tribunal Constitucional e da perspectiva dos juizes que votaram o Acórdão, foi que aquela previsão da eventual inaptidão do trabalhador para o posto de trabalho poderia ser uma justa causa de despedimento. Pensamos até que, nomeadamente, na legislação que está em vigor a inaptidão absoluta ou, pelo menos, uma inaptidão perfeitamente manifesta do trabalhador para um posto de trabalho pode determinar através, eventualmente, de um processo disciplinar ou através da caducidade, o termo da relação de trabalho.
Portanto, aquilo que se pretende com esta nova formulação é dizer que não será através de eventuais comportamentos subjectivos que não se integrem nos termos da justa causa disciplinar que poderá haver a possibilidade de rescisão de contrato de trabalho.
Relativamente às garantias substantivas, é evidente que, da parte do PSD, sempre houve a preocupação de que mesmo que haja cessação da relação de trabalho, ao trabalhador estejam asseguradas condições mínimas de sobrevivência. Eu próprio na minha intervenção tive o cuidado de dizer que é indispensável que no nosso país a avancemos com esquemas de protecção social a trabalhadores que possam ser vítimas do desemprego, para esquemas semelhantes àqueles que já beneficiam os trabalhadores dos países das Comunidades Europeias.
Daí que pensemos que estas coisas têm de ser feitas tanto quanto possível em simultâneo, tem de haver uma evolução simultânea da alteração da legislação laborai não só no domínio das relações propriamente ditas de trabalho mas também na evolução da protecção social aos trabalhadores, quer em períodos de desemprego sazonal, quer em períodos de desemprego efectivo.
Em relação ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, quero dizer que este prazo que propomos que o Governo possa dispor para a execução desta autorização legislativa é, de facto, de 180 dias. Poderá parecer muito para alguns e porventura, poderá parecer pouco para outros. O que pensamos é que este é um processo legislativo que, tanto quanto possível, deve ser feito de forma não precipitada.
Não sabemos se o Governo vai necessitar ou não dos 180 dias, tendo em conta estas alterações que foram suscitadas pelo Acórdão do Tribunal Constitucional - poderá não ser necessário esse prazo para a execução desta autorização legislativa -, mas, porventura, os 90 dias inicialmente previstos poderiam ser insuficientes. Assim sendo, pensamos que este prazo é perfeitamente razoável e se a Assembleia o aprovar cabe ao Governo, naturalmente, geri-lo.
O diálogo com os parceiros sociais, como o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa sabe, foi efectivamente muito vivo e processou-se ao longo de muitos meses no âmbito do Conselho Permanente da Concertação Social, processou-se também no âmbito das consultas públicas que o Ministério do Emprego promoveu, de que é prova de certa forma, a documentação que recentemente o Governo nos enviou e a própria Assembleia da República quando discutiu, em 14 e 15 de Abril, a proposta de lei do Governo também o fez. Os grupos parlamentares discutiram, naturalmente, aquela proposta de lei, tendo em conta os contributos que os parceiros sociais, nomeadamente, as organizações sindicais e as comissões de trabalhadores, fizeram confluir para junto dos grupos parlamentares e para junto da Assembleia da República em geral.
Por isso, é natural que num processo de autorização legislativa, o diálogo que se verificou e que se realizou com os parceiros sociais, tenha sido feito fundamentalmente não na base da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, nem na base, digamos, da Assembleia da República, mas foi-o com certeza. Não foi pelo facto de este processo ter sido feito através de uma autorização legislativa e, portanto, não ter tido uma discussão como teria se fosse um projecto de lei, que poderemos dizer ou tirar a conclusão de que não houve diálogo com os parceiros sociais.
Não! Aquilo que pensamos é que, efectivamente, os direitos consagrados na Constituição, quer relativamente ao direito de participação das comissões de trabalhadores, quer ao direito de participação das organizações sindicais, foram amplamente exercidos por ambos.

Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não é verdade!

O Orador: - Todas as comissões de trabalhadores e todas as organizações sindicais que quiseram participar na elaboração desta legislação do trabalho tiveram possibilidade de o fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito colocou-me uma questão relativamente ao n.º 2 do artigo 1.º do Decreto n.º 81/V. O Tribunal Constitucional a este respeito não referiu qualquer espécie de inconstitucionalidade material, referiu-me exclusivamente ao facto de, eventualmente, existir aquela questão ainda não totalmente resolvida. Creio que o Sr. Deputado Nogueira de Brito se referiu...

Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado, então qual é a razão da alteração formal? Porque é que o PSD entendeu necessário, de qualquer maneira, tirar

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a palavra «simultaneamente» da redacção do texto? Será que estava mal redigido? Se não vai ser simultaneamente, irá ser noutra altura? Qual é a razão de ser disso?

O Orador: - Sr. Deputado, já compreendi a sua pergunta. A expressão «simultaneamente» poderia estar ou poderia não estar. Trata-se de uma questão que não é substancial.

Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Boa resposta!

O Orador: - Tendo em conta o desenvolvimento deste processo, pensamos que esta expressão não teria virtualidades para se manter no texto final.

Aplausos do PSD.

Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - É uma questão adverbial!

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Vera Jardim, pede a palavra para que efeito?

Sr. Vera Jardim (PS): - É para fazer uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

Sr. Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, depois de V. Ex.ª ter anunciado que tinham pedido a palavra para esclarecimentos vários Srs. Deputados, também pedi a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Joaquim Marques. Como não me foi concedida a palavra, poderia V. Ex.ª informar-me com que critério?

A Sr.ª Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado, com todo o gosto. A razão por que a Mesa anuncia os pedidos de inscrição e pergunta se há mais inscritos é justamente para fechar o processo de inscrições, uma vez que os Srs. Deputados se devem inscrever logo a seguir às intervenções. A Mesa tem de ter um critério seguro e que seja conhecido de todos os Srs. Deputados.
Foi por essa razão, Sr. Deputado, que, com muita pena, a Mesa, por decisão unânime, não lhe concedeu a palavra, uma vez que o Sr. Deputado Vera Jardim se inscreveu depois de anunciadas as inscrições e de não ter havido, da parte do Sr. Deputado, qualquer reclamação.

Sr. Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, muito obrigado, fico esclarecido.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate de hoje, do qual previsivelmente virá a resultar um novo decreto desta Assembleia - é bom que isto fique sublinhado - pelos votos do PSD, não pode deixar de cifrar-se na avaliação global da derrota do Governo na sua investida contra os direitos fundamentais dos trabalhadores, nomeadamente no que concerne ao direito ao trabalho e à segurança no emprego.
Este debate prova, mais uma vez, que nada neste país se pode fazer contra os interesses dos trabalhadores, contra a sua força, organizada nos termos constitucionais.

Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo e o PSD chegam ao dia de hoje como perdedores, mas com a sua arrogância peculiar nem por isso se mostram conformados ou capazes de reconsiderar e a incapacidade é tão manifesta que até o Sr. Ministro do Emprego abandona o debate para não ouvir as razões de alguns partidos.

Aplausos do PCP.

O PSD e o Governo antes investem de novo, tentando contrabandear o nosso sistema jurídico-constitucional, engolindo, mal, afirmações feitas, disfarçando muito mal o seu mau perder.
O PSD afirmou aqui nesta Assembleia que não podia considerar-se legislação laborai a proposta de lei de autorização legislativa. O Tribunal Constitucional afirmou que assim não era.
O Governo, pela voz do Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social afirmou nesta Assembleia que a consulta pública às organizações de trabalhadores já tinha sido feita em Dezembro de 1987. E que era assunto encerrado.
Mas logo a seguir, duvidando de si mesmo e dando o dito por não dito, colocou o projecto de decreto-lei à discussão pública. E isto mesmo inutiliza, por completo, as razões do Sr. Deputado Joaquim Marques porque, de facto, o Governo ao fazer isto já desconfiava que a consulta efectuada em Dezembro de 1987 não poderia ser considerada como tal. É que, Sr. Deputado Joaquim Marques, não basta dizer uma mentira muitas vezes para ela se tornar verdade - e essa nem é daquelas que António Aleixo refere como tendo o seu fundo de verdade e, portanto, não é uma mentira segura.
O Governo e o PSD afirmaram nesta Assembleia que o conceito de justa causa de despedimento, contido na Constituição, abrangia razões objectivas, do interesse do empregador. O Tribunal Constitucional disse-lhes que não.
O Governo e o PSD afirmaram, em resumo, que podiam subverter por via legislativa o nosso sistema constitucional. A subversão foi impedida porque as instituições funcionaram. Porque apesar de ter sido negada aos trabalhadores a sua intervenção no processo legislativo, eles puderam intervir usando o recurso à greve, para mostrar o seu repúdio generalizado à lei que completaria o processo de precarização do vínculo laboral.
Apesar de tudo isso, o PSD não desiste de procurar nas malhas da lei, as malhas que o Império tece.
Querendo vender gato por lebre, O PSD vem apresentar propostas de expurgo do Decreto-Lei n.º 81/V, quando a verdade é que deveria começar por expurgar de si mesmo os sentimentos viciosos perante os mais elementares direitos dos trabalhadores que se reconduzem, no seu fundamental, do direito à vida.
As propostas de alteração do PSD não retiram ao decreto as suas mais profundas feridas abertas pela violação de preceitos constitucionais.
Em primeiro lugar, a inconstitucionalidade formal não se apresenta sanada neste processo legislativo.

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Retomando uma velha argumentação, o PSD pretende que a Assembleia da República faça sua a consulta pública organizada pelo Governo em Dezembro de 1987 sobre um anteprojecto de um diploma legal. Quando nem sequer estava em curso um processo legislativo.
É mesmo de perguntar o que quer o PSD com esta proposta - que é de expurgo - de a Assembleia da República «fazer sua» uma consulta ao Governo, proposta relativamente à alínea f) - sobre a protecção dos representantes eleitos dos trabalhadores.
É isto expurgar um vício ou uma forma camuflada de tentar confirmar por 2/3 uma grosseira inconstitucionalidade, encobrindo, dissimulando e contrabandeando esse propósito?
É isto que o PSD tem de clarificar!
A verdade é que quanto à consulta pública a Constituição não permite este procedimento. A Constituição não permite qualquer delegação da Assembleia da República, nem admite a figura de sub-rogação no Governo.
A participação das organizações de trabalhadores na elaboração de trabalho não é uma participação meramente formal, não é uma conversa de amigos.
Ela visa, de facto, influenciar a decisão do órgão que tem poderes decisórios.
Sem dúvida que estes poderes cabem à Assembleia da República que é quem legisla.
Acresce que, para que verdadeiramente se possa influenciar a decisão da Assembleia da República, esta tem de ter das posições dos representantes dos trabalhadores, um conhecimento actual e directo.
Isto quer dizer que era a Assembleia da República quem devia ter organizado a consulta pública às organizações de trabalhadores, de nada servindo o caminho ínvio trilhado pelo PSD na mira de defender o indefensável, de nada servindo porque estamos perante um novo decreto-lei em perspectiva.
A consulta pública não foi organizada pela Assembleia, logo o decreto continua a padecer do vício da inconstitucionalidade formal.
Um vício originário que o PSD não admite sanar, como vimos claramente durante o debate do recurso.
Em segundo lugar, as propostas de expurgo e de alteração apresentadas não saneiam o diploma de inconstitucionalidades materiais.
Comecemos, resumidamente pela alínea a) do artigo 2.º
Com a nova redacção dada pelo PSD deixa de falar-se em alargamento do conceito de justa causa - parece - porque afinal se retoma em linguagem rebuscada o mesmo conceito de alargamento de justa causa, chamando-se-lhe apenas cessação do contrato de trabalho. Mas será que os termos desta nova modalidade de cessação do contrato de trabalho - e isto já foi objecto de perguntas pertinentes do Sr. Deputado Narana Coissoró -, não significam o alargamento das condições de licitude do despedimento individual?
A operação semântica efectuada pelo PSD não evita que se chegue à conclusão de que, de facto, se continua a pretender alargar o conceito de justa causa a causas objectivas ligadas ao empregador, fundadas em motivos económicos, tecnológicos, estruturais ou de..., o quadro normativo imposto pela Constituição da República, quanto ao despedimento individual, determinada, apenas, a existência de despedimentos com ou sem justa causa, para além dos despedimentos colectivos, é evidente.
Mas há um tertium genus, uma terceira opção, que o PSD busca desesperadamente.
O afastamento do texto constitucional, dos despedimentos por motivo atendível (figura a cujos contornos poderia parecer reconduzir-se) a versão ora apresentada pelo PSD leva-nos à conclusão de que a proposta não cabe no texto constitucional como forma lícita de despedir individualmente.
Pelo que a operação cosmética do PSD não consegue esconder que de novo estamos perante o alargamento das condições de licitude do despedimento, perante o alargamento do conceito de justa causa.
Neste corpo velho deste requentado pacote laborai, a operação estética não produziu efeitos, e as rugas caíram de novo deixando patentes as repelentes costuras de uma operação mal sucedida.
Há de novo violação do direito à segurança no emprego, do direito ao trabalho.
Relativamente à protecção dos representantes eleitos dos trabalhadores, propõe-se o expurgo da alínea f) do artigo 2.º, com a ratificação pela Assembleia da República do processo de consulta pública, organizada pelo Governo, em pré-procedimento legislativo.
Sobre isto já nos pronunciamos mas acrescentaremos que ratificar esta gestão de negócios, seria, um mau negócio para a Assembleia da República que daria de si, para o país, um triste exemplo de um poder legislativo nas mãos daqueles que lá fora correriam o risco de ser caricaturados como uns quantos palavrosos morgados de Fafe.
Acresce concretamente à alínea f), do artigo 2.º, que cedo se irá revelar que as garantias substantivas de protecção aos representantes eleitos dos trabalhadores, referidas na alínea, não vão preencher o mínimo que a Constituição exige em defesa do direito fundamental ao exercício da actividade sindical, ao exercício das funções de membro de comissões de trabalhadores.
Pois se o PSD revela em sede de Revisão Constitucional o seu objectivo de reduzir direitos sindicais, de diminuir o papel das comissões de trabalhadores, destruindo as próprias comissões coordenadoras, pode antever-se como o Governo, de costas viradas à Constituição, irá simular as protecções aos representantes eleitos dos trabalhadores.
Cabe agora, e por fim, partindo nomeadamente da proposta de alteração à alínea d) do artigo 2.º, caracterizar globalmente o diploma que sairá, porventura, desta assembleia.
Retoma-se uma concepção civilista do direito de trabalho, uma concepção que parte do pressuposto falso de que no contrato de trabalho as partes em presença estão em situação de plena igualdade.
É o que acontece também na nova redacção da referida alínea d) do artigo 2.º permite-se a substituição da reintegração por indemnização quando o trabalhador der o seu acordo ao pedido apresentado pelo empregador.
Nós sabemos, os senhores sabem, todos sabem, em que condições é que esse acordo é dado «livre e espontaneamente».

Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Seria também necessário que o PSD explicasse, e isto já foi perguntado mas não foi respondido pelo Sr. Deputado Joaquim Marques, por que razão apresentou uma proposta para aumentar o

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período de duracção da autorização legislativa de 90 para 180 dias, quando foi o Primeiro-Ministro que disse que tinha pressa em legislar. Além disso, todos sabemos que o Governo tem um projecto de decreto-lei que poderá aperfeiçoar e talvez não precise de muitas penteadelas para o pôr de acordo com a autorização legislativa que pretende.
Uma coisa é certa: não será seguramente este alargamento do prazo para benefício dos trabalhadores.
Resumidamente diremos ainda: o diploma prevê a própria renúncia ao direito ao salário contra o que dispõe no artigo 60.º da Constituição; nele se aponta para o enfraquecimento das garantias de defesa dos trabalhadores perante o poder disciplinar do empregador; o diploma permite a precarização do trabalho através do recurso normal à contratação a prazo - e isto é patente no diploma material com os jovens à procura do primeiro emprego, só por isso, a serem contratados a prazo, com os desempregados de longa duração, só por isso, a serem contratados a prazo - postergando-se também decreto às garantias do processo criminal no processo penal do trabalho.
É, enfim, um mau diploma, um diploma perverso a fazer jus aos seus autores.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A história deste pacote antilaborial pretende ser a história de uma morte repetidamente e previamente anunciada.
A história da morte dos direitos dos trabalhadores, dos seus direitos mais elementares.
Mas quanto a nós, ela é, de facto, a história soluçante do desespero de quem legisla de olhos fechados.
É uma história que há-de ter o seu epitáfio!

Aplausos do PCP.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Deputada Odete Santos, inscreveram-se os Srs. Deputados Sá Fernandes, Vera Jardim, Joaquim Marques e José Puig.

Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Peço-lhes desculpa por usar a figura do protesto para uma questão lateral, mas não a posso deixar passar em claro.
Com efeito, a Sr.ª Deputada Odete Santos insinuou que, para não ouvir as razões do PCP, o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social se teria ausentado do debate.
Dir-lhe-ia apenas, Sr.ª Deputada, que o Sr. Ministro conhece bem as posições do PCP, mas, como é óbvio, V. Ex.ª não se deve preocupar com a ausência temporária de um Membro do Governo desta bancada. Isto porque também não me preocupo minimamente, Sr.ª Deputada, com a ausência de 17 deputados da sua bancada - certamente por razões ponderosas -, que não assistiram à sua douta intervenção.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso é que foi contar!

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, começo por agradecer a V. Ex.ª o facto de não se ter retirado do Plenário quando realizei a minha intervenção.

Aplausos do PCP.

Aliás, não esperava outra coisa de V. Ex.ª, porque, de facto, considero-o uma pessoa delicada e que, na realidade, ouve as razões aduzidas pelos outros partidos. É que ouvimos muito falar em diálogo vivo, mas parece que esse mesmo diálogo, chegada uma certa altura, se encontra encerrado tanto por parte do PSD, como por parte do Governo, não havendo então novas razões a aduzir - permita-me que lhe faça esta crítica.
Por outro lado, notei que V. Ex.ª esteve a contabilizar as faltas da minha bancada.
É capaz de lhe ter dado um pouco de trabalho. Com certeza, ter-lhe-á fugido uma parte da minha intervenção enquanto esteve a contar os deputados da bancada do PCP que se encontram a trabalhar em várias comissões - Comissão da Economia, Finanças e Plano, Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e outras - e que, por isso mesmo, não estão no Plenário a ouvir, não só a minha intervenção, como todas as intervenções que sobre tão importante debate se fazem hoje nesta Assembleia da República.
De qualquer maneira, Sr. Ministro, poderá ter sido uma coincidência o facto de o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social se ter retirado. Porém, tantas vezes acontecem as coincidências que é caso para desconfiar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Fernandes.

Sr. Sá Fernandes (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, começou V. Ex.ª por referir que se trata aqui de um novo processo. Será o seu entendimento. Nós entendemos o contrário. Com efeito, entendemos que este é um processo iniciado pelo Governo e evocado por esta Assembleia, por intermédio do PSD.
Por outro lado, considerou que houve uma grande derrota do Governo, pelo facto de serem declarados inconstitucionais dois ou três vícios que o PSD pretende agora corrigir.
No entanto, é bom que repare que são 17 as alíneas propostas pelo Governo e que apenas duas ou três não foram consideradas conformes com a Constituição, em resultado de uma interpretação do Tribunal Constitucional que, aliás, entendemos ser demasiado restritiva.
Quanto à alínea a) da proposta, colocou V. Ex.ª a questão da substituição do termo «alargamento» pelo termo «cessação das razões», começando já por levantar problemas quanto às causas objectivas de despedimento.
É evidente que este será um problema que não se pode suscitar agora, embora se possa eventualmente colocar um dia, em função do decreto-lei que o Governo vier a publicar.
Não se trata, pois, de uma questão de momento, embora, como é óbvio, o possa ser no futuro. Contudo, nessa altura, o Governo já terá, naturalmente, tomado em consideração as posições do Tribunal Constitucional.

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Um outro aspecto que me parece merecer uma certa análise é o problema dos representantes dos trabalhadores. O PCP insiste em que deverá ser o tribunal a despedir os representantes sindicais.
Não acha a Sr.ª Deputada que o poder de despedir o poder disciplinar é inerente ao poder da entidade patronal?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - É uma visão social-democrata!

O Orador: - Será o tribunal a entidade competente para despedir os representantes dos trabalhadores?!
Repare a Sr.ª Deputada que não estou a falar em sancionar, mas em despedir. Portanto, repito: não é o poder de despedir inerente ao poder disciplinar da entidade patronal, embora, como é evidente, seja sempre o tribunal a entidade competente para sancionar ou não cada despedimento?
Por conseguinte, a primeira pergunta que lhe queria fazer ia no sentido de saber se não acha V. Ex.ª que é uma aberração jurídica o facto de se transferir para os tribunais o poder de despedir ou não.
Uma segunda questão diz respeito aos jovens, já que V. Ex.ª entende que o contrato a prazo é para eles lesivo.
Sabemos perfeitamente que, no momento presente, os jovens têm extrema dificuldade em serem admitidos por qualquer entidade patronal, já que não possuem experiência, embora já comecem a auferir algum vencimento, ainda que, como é evidente, não seja igual ao dos outros trabalhadores. Por outro lado, tal obriga a que um trabalhador mais experiente os esteja a orientar, reduzindo, consequentemente, o seu próprio trabalho.
Portanto, perante essa dificuldade, não acha a Sr.ª Deputada razoável que se dê à entidade patronal a possibilidade de celebrar contratos a prazo, com vista a facultar alguma experiência a esses jovens e até, quem sabe, para serem eventualmente aproveitados, de forma a passarem de trabalhadores a prazo para um regime por tempo indeterminado?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

Sr. Vera Jardim (PS): - Sr.ª Deputada Odete Santos, disse V. Ex.ª - e concordo consigo - que nesta matéria o Governo (e agora o PSD) legislava de olhos fechados. Percebi isso: de olhos fechados ou a dormir, o que é quase a mesma coisa ou é muito parecido...
Entendo que um dos casos desta nova proposta, que nos é presente com os tais expurgos e eliminações e em que se demonstra que, desta vez, o PSD - não o Governo, mas o seu mandatário, o PSD - está a legislar de olhos fechados, é precisamente o da alínea d) do artigo 2.º
Contudo, aí não posso estar em consonância com V. Ex.ª Porque a alínea d) do artigo 2.º vem é dar poderes ao Governo para legislar num sentido exactamente idêntico ao regime que hoje já temos. Portanto, se hoje o trabalhador pode, por sua vontade, fazer substituir a reintegração por uma indemnização, o que é que acrescenta este remendo que o PSD aqui introduz, no sentido de tal também poder acontecer se o empregador o pedir e o trabalhador der o seu acordo?
Isto não é nada, pois trata-se de reproduzir o mesmo sistema que hoje existe! Por conseguinte, o PSD está a pedir autorizações legislativas para o Governo legislar no mesmo sentido de um regime que já hoje vigora!
Realmente, penso que isto é a prova bem provada de que alguém anda a dormir no meio de toda esta questão.

Sr. Narana Coissoró (CDS): - Só pode prejudicar!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Marques.

Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos gostaria de lhe colocar apenas uma questão, já que, porventura, V. Ex.ª esquece o que neste momento existe e esquece também (ou não leu tudo) aquilo que o Governo se propõe fazer após dispor da autorização legislativa. Refiro-me, muito concretamente, aos contratos a prazo.
Todos nós sabemos que, neste momento e com a legislação existente, não há qualquer dificuldade na celebração de contratos a prazo, seja para jovens à procura do primeiro emprego, seja para trabalhadores adultos desempregados - para homens, para mulheres, para jovens, enfim...
Sabemos que, neste aspecto, a legislação em vigor não consagra qualquer penalização para as entidades patronais que, abusivamente, utilizem a contratação a prazo.
Assim, aquilo que neste momento se pretende realizar com a revisão desta legislação é, exactamente, restringir-se a possibilidade da contratação a prazo para situações que, objectivamente, justifiquem um contrato a prazo, nomeadamente no caso de actividades económicas de carácter sazonal ou para substituição ocasional de um trabalhador temporariamente impedido de prestar trabalho, quer seja por doença, quer pelo cumprimento de alguma obrigação legal, quer ainda por outras circunstâncias.
Contudo, quando estamos a fazer isto, a Sr.ª Deputada Odete Santos vem dizer, exactamente, que queremos manter as pessoas contratadas a prazo.
É exactamente o contrário, Sr.ª Deputada! Se assim não fosse, não estava nomeadamente previsto que, nos contratos a prazo que eventualmente caduquem pelo decurso do prazo, os trabalhadores afectados teriam direito a uma espécie de indemnização, correspondente ao tempo de duração desse mesmo contrato.
Pergunto, portanto, à Sr.ª Deputada se considera que a legislação neste momento em vigor relativamente aos contratos a prazo é uma boa legislação?

Sr. Narana Coissoró (CDS): - Era má, mas agora ficou péssima!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.

Sr. José Puig (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, ouvi a sua intervenção com a maior atenção e retive três ou quatro aspectos da mesma.
O primeiro foi o de que se voltou aqui a repetir uma série de argumentos que alegam a inconstitucionalidade formal, agora da nossa proposta de expurgo, com os

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quais gastou a maior parte do tempo da sua intervenção, o que deu a entender alguma ausência de argumentos no tocante a eventuais inconstitucionalidades de ordem material no mesmo diploma.
Outro aspecto que na sua intervenção me chamou a atenção foi a referência que fez à questão da reintegração. Com efeito, afirmou a Sr.ª Deputada que, quanto ao acordo do trabalhador com o empregador, já sabemos como é que isso acontece, sugerindo, parece-me, alguma coacção por parte do empregador.
Assim sendo, fazia-lhe a seguinte pergunta, muito concreta: quando o trabalhador pretende e pede a indemnização em vez da reintegração, então, por essas suspeitas de coacção, entenderá V. Ex.ª que não se deve satisfazer tal pedido? É que me parece que as suspeitas sobre eventuais coacções são aí exactamente as mesmas!
Notei também que, quanto à alínea f) da proposta da lei, V. Ex.ª não fez já, ao contrário do sucedido na discussão da anterior proposta, qualquer consideração a favor da inconstitucionalidade desse preceito, na medida em que nele se violavam os direitos dos representantes eleitos dos trabalhadores.
Agora dizia apenas, fazendo-se eco de certos poderes premunitórios, que as garantias substantivas não iam ser suficientes para acautelar esses direitos.
Em face do texto que agora apreciamos, é ou não, Sr.ª Deputada, na sua opinião, inconstitucional aquela alínea da proposta de lei?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr. Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, antes de começar a responder aos pedidos de esclarecimento que me foram formulados, gostaria que V. Ex.ª me informasse de quanto tempo dispõe ainda o meu grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu grupo parlamentar dispõe de 11 minutos.

A Sr. Odete Santos (PCP): - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Sá Fernnado, creio que é indefensável a afirmação de V. Ex.ª no sentido de que este diploma não se trataria de um decreto novo. É que para além de outras razões, há uma extremamente evidente: é o PSD que vem apresentar uma alteração a um artigo no qual o Tribunal Constitucional não tocou e que estava no decreto, que é o alargamento do pedido de autorização legislativa de 90 para 180 dias.
Por outro lado, sabendo que V. Ex.ªs, muitas vezes ou quase sempre, também usam a Constituição Anotada de Vital Moreira e Gomes Canotilho, gostaria de lhe recomendar que lesse a anotação toda. Por amor de Deus peco-lhe que não fique pelo meio!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Deus?!...

A Oradora: - Refiro-me à nota VIII do artigo 279.º, que trata precisamente desta matéria de expurgos e reformulações de diplomas e que acaba com o seguinte trecho: «para todos os efeitos, o decreto reformulado é um novo decreto, sujeito aos trâmites normais do processo de promulgação e assinatura, incluindo a fiscalização preventiva».
Sr. Deputado, não sou constitucionalista. No entanto, parece-me ser esta a boa doutrina. Admito, porém, que, perante os problemas de ordem constitucional formal e material que continuo a levantar a estas propostas do PSD, lhe custe aceitar que se trata de um novo decreto. Contudo, ele é, efectivamente, um novo decreto.
Quanto à questão das propostas do PSD, V. Ex.ª referiu ainda que o Tribunal Constitucional apenas tinha tocado em duas ou três coisitas.
Ó Sr. Deputado, o alargamento do conceito de justa causa de despedimento, com vista à liberalização total deste, é uma coisita?! Nisso tocou o Tribunal Constitucional! É uma coisa sem importância os trabalhadores terem o direito de serem ouvidos através das suas organizações?! Considera que, de facto, é um pormenor insignificante?!
Sr. Deputado, quando voltar a pedir esclarecimentos, mesmo que pense isso, não o diga porque lhe fica muito mal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Sá Fernandes (PCP): - Não foi isso que eu disse, Sr.ª Deputada! Dá-me licença que a interrompa?

A Oradora: - Sr. Deputado, só no seu tempo, pois no meu não pode ser, já que disponho efectivamente de pouco tempo.
Além disso, se me esquecesse de responder a alguma coisa, gostava que qualquer um dos Srs. Deputados me fizesse sinal, já que, se isso acontecer, será por mero esquecimento.
Em relação à questão levantada pelo Sr. Deputado Vera Jardim sobre a alínea d), englobarei já, na resposta que vou dar, uma parte do esclarecimento a prestar ao Sr. Deputado José Puig.
Efectivamente, todos sabemos hoje que a prática é esta: o trabalhador quer a reintegração, só que opta pela indemnização porque sabe que, se voltar para a empresa, a sua vida se tornará num inferno! Esta é a verdade! Aliás, já houve até casos de «balúrdios» de indemnizações pagas apenas porque o empregador quer ser o senhor absoluto do seu altar, do seu santuário, da sua empresa e não quer qualquer intromissão lá dentro!
Ora, segundo as modernas correntes do Direito do Trabalho, isto não é assim! Aliás, tal aconteceu por muitas lutas, retratadas nos filmes dos anos 50, que o Sr. Deputado Joaquim Marques já não gosta de ver, mas nos quais também podia colher lições muito úteis, como todos nós colhemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Agora, o que esta alínea d) introduz aqui de novo é apenas um aspecto que penso ter, de qualquer modo, algum significado. É que isto de permitir que o empregador faça um requerimento no processo, dizendo que pretende pagar a indemnização e colocando o trabalhador na perspectiva de ter de responder àquilo, poderá alargar um pouco os casos de trabalhadores que aceitam as indemnizações.
De qualquer forma, sob o ponto de vista dos princípios que norteiam o Direito do Trabalho, isto é inadmissível. Na verdade, daqui se partirá depois para alargar estes princípios a muitas outras questões. E é por isso que, de facto, não o admitimos.

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Relativamente às questões levantadas pelo Sr. Deputado José Puig sobre a inconstitucionalidade formal, já disse o que tinha a dizer.
Sobre a inconstitucionalidade material, já me referi a ela, mas como o Sr. Deputado tem dificuldade em pegar no assunto omitiu que eu me tinha referido à apreciação da questão da cessação do contrato individual de trabalho, que o Governo agora configura de uma outra forma, para não lhe chamar justa causa.
Sobre a ideia de justa causa aconselhava-o a ler a obra «O Despedimento» do Sr. Prof. Mário Pinto que trata do conceito pré-constitucional de justa causa, que vem nas leis anteriores à Constituição. Leia essa obra e veja o que diz quanto aos despedimentos individuais por causas objectivas, pois ele refere que o nosso quadro jurídico não admite os despedimentos individuais por causas objectivas.
Quanto à questão da coacção, Sr. Deputado José Puig, digo-lhe que qualquer trabalhador, quando parte para um processo de tribunal, vai já coagido. Mas vai porque a Inspecção de Trabalho não funciona por falta de meios, porque se deixa contratar a prazo sem se sancionar e porque não há qualquer intervenção nas empresas - quando há é por iniciativa sindical e normalmente dá resultado.
Sobre isso posso dar-lhe exemplos muito concretos, como o de trabalhadores contratados com o recibo verde ou qualquer coisa desse género que picavam o cartão de ponto. Ora, se não fosse o sindicato chamar a Inspecção de Trabalho, continuariam nessa situação e hoje, Sr. Deputado José Puig, são trabalhadores efectivos e é assim que as leis podem funcionar!
Em relação à pergunta que me foi feita sobre a contratação a prazo, a resposta é muito simples: nunca dissemos que concordávamos com o Decreto-Lei n.º 781/76 e apresentámos nesta Assembleia, mais do que uma vez, diplomas sobre a contratação a prazo que contêm a nossa perspectiva.
Sr. Deputado Joaquim Marques, ainda em relação à contratação a prazo, a penalização para que o decreto aponta é apenas relativamente à questão da nulidade, ou seja, de ser nula a cláusula do prazo e é, eventualmente, a questão das multas. Só que quanto a isso nada tem sido feito!
Não pode omitir, Sr. Deputado Joaquim Marques, que no projecto de decreto-lei - V. Ex.ª garante que o Governo vai retirar isso? -, vem lá que um jovem à procura do primeiro emprego, um desempregado de longa duração, pode ser contratado a prazo. Ora isto não é efectivamente um motivo extraordinário que justifique a contratação a prazo.
O Sr. Deputado Sá Fernandes, veio a dizer que o contrato a prazo poderia servir para o jovem adquirir formação.
Então, Sr. Deputado, V. Ex.ªs que vêm para aqui falar de formação profissional para os jovens e dizem que está tudo bem onde é que está a formação profissional?

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: A Assembleia da República é hoje
chamada a pronunciar-se, não sobre a constitucionalidade de um decreto (que dessa já nem os seus autores estão convencidos), mas sobre a profundidade e o alcance do expurgo a que foi sujeito o Decreto n.º 81/V em razão de sua manifesta inconstitucionalidade formal e material.
Mas será que o bisturi cortou tão fundo que se possa falar com propriedade de verdadeiro expurgo ou sanação? Ou tratar-se-á apenas de uma leve cirurgia plástica com vista à criação de um rosto simpático num corpo monstruoso? Ou como diria o Sr. Deputado Armando Cunha, se estivesse presente, a transformação de um Quasímodo num Quasímodo?
Será que quem entendia que a simples alteração de uma vírgula no projecto o tornaria incapaz de flexibilizar as relações laborais, aceitaria agora alterá-lo profundamente?
Será que o grupo parlamentar do PSD entende que as normas anteriormente propostas pelo Governo eram de facto imorais e, por isso, aceita agora retirá-las? Ou pensa que estavam apenas mal redigidas e o que há a fazer é encomendar a sua redacção a um estilista profissional?
Afinal que feitiço ou magia conseguiriam transformar um decreto formal e materialmente inconstitucional num lei de despedimentos, que respeitasse o artigo 53.º da Constituição e ao mesmo tempo visasse a «flexibilidade das relações laborais», o que em português corrente significa precarização do trabalho?
Perpassa em todo este processo a esperteza do saloio que afirma que «todo o burro come palha, o que é preciso é saber dar-lha!»
Em nosso entender, o que hoje se nos propõe, é que apreciemos um travesti mal disfarçado, uma lebre com rabo de gato ou um pacote envolto em papel de fantasia. Qualquer das imagens serve para caracterizar o produto final de um processo que denota pouca habilidade nos métodos e menos confiança nos resultados.
Como se ilude a inconstitucionalidade formal resultante da falta da discussão pública? Lançando a partir da Assembleia da República um verdadeiro debate público nos termos da lei? Não! Simplesmente entregando ao Presidente da Assembleia uma colectânea de opiniões, reacções e protestos de vários sectores da sociedade que espontaneamente os produziram face ao anúncio da proposta de alteração legislativa.
E quanto às inconstitucionalidades materiais que conformam toda a estrutura do Decreto n.º 81/V?
Elas mantêm-se no essencial, embora redigidas de uma forma linguisticamente mais rebuscada, o que debilita a clareza e o rigor técnico que, como normas jurídicas que são, deveriam assegurar.
Há, no entanto, uma modificação substantiva - aumenta-se o prazo da autorização legislativa de 90 para 180 dias. Fica-nos porém a dúvida se a alteração visa assegurar ao Governo umas férias mais tranquilas ou se responde a um impulso filantrópico com o sentido de não obrigar os trabalhadores a passarem o próximo Natal sob o espectro real de desemprego.
Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas e Srs. Deputados: A nova redacção, tal como a anterior, passará na Assembleia da República com os votos do costume. E no seu muito provável trajecto até ao Palácio Ratton o povo

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a não poderá gritar que a inconstitucionalidade vai nua, mas não faltará quem se ria das suas vestes constitucionais tão toscamente remendadas!

Aplausos do PCP, do PS e do PRD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Volta a esta Assembleia o decreto que aqui foi aprovado há tempos e sobre o qual incidiu um veto por inconstitucionalidade da parte do Presidente da República. Não vale a pena repetir, neste momento, as razões pelas quais o partido a que pertenço se opõe hoje à substância do diploma, porque são essencialmente as mesmas pelas quais se opôs, há tempos, na votação do decreto ora em apreciação.
Isto sem prejuízo de haver de se reconhecer que até por força ou essencialmente por força da decisão do Tribunal Constitucional, alguma coisa se melhorou. Na nossa perspectiva, em todo o caso, não o suficiente.
De qualquer forma, preocupa-me particularmente um ponto. Creio que todos estaremos de acordo em que, de um modo ou de outro, a legislação do trabalho necessita de revisão. A nosso ver, não precisamente do modo que foi seguido pelo Governo.
Mas creio que todos estaremos de acordo em mais alguma coisa e que é a do requisito que uma legislação de trabalho tem: a de estabelecer segurança. O Governo, de resto, justificou a sua proposta de lei pela necessidade ou pela conveniência de estimular os investidores, de criar confiança.
Ora, a maior fonte de desconfiança será, com certeza, a de irmos viver, como receio que iremos, durante largo tempo, com uma legislação que ninguém saberá se será ou não válida e que a todo o momento poderá ser contestada pelo empregador ou pelo trabalhador a quem deveria ser aplicada.
Creio que era este, independentemente de questões de face, o primeiro objectivo que o Governo deveria ter prosseguido: o de tentar produzir uma legislação tanto quanto possível consensual e com um razoável grau de indiscutibilidade jurídica.
Ora, exactamente ao contrário - e verifico com prazer que o meu colega, Deputado Correia Afonso, já está na sala, porque me queria referir a uma intervenção que há pouco produziu -, temo que a legislação que porventura for dada como aprovada - se o for! -, será uma legislação que estabelecerá a incerteza e o caos jurídico durante alguns anos no nosso país.
Nós, advogados, conhecemos uma coisa que se chama a jurisprudência das cautelas. É que quando há dúvidas jurídicas relativamente a actos de grandes repercussões, não arriscamos soluções duvidosas, pois se é preciso voltar atrás, volta-se, pois se há um jurista que diz que talvez possa ser assim, mas enfim, ou dirá também que é contestável, não se arrisca!
Creio sinceramente que o Governo, ao utilizar o processo que utilizou quanto à confirmação deste decreto, está a correr enormes riscos. E digo-o, não por querer proteger o Governo, porque não é essa a minha missão, mas querer dar-lhe conselhos, porque também não é essa minha missão, mas para que amanhã não assistamos novamente, se o diploma for contestado nos órgãos jurisdicionais próprios, a uma cruzada contra os tribunais, que são órgãos, sejam os tribunais comuns, seja o Tribunal Constitucional, que se têm sabido honrar e que têm sabido honrar o nosso País.
Do que gostaria de ver repetida era a situação de alguém que segue por um sentido proibido, para depois ficar indignado porque foi multado. É neste sentido, portanto, que insisto, em que, a meu ver, qualquer deliberação de aprovação ou de confirmação do decreto nesta Casa tem de ser tomada por dois terços dos Deputados presentes.
Não deixo de reconhecer alguma razão - nestas coisas não gosto de o esconder - ao que disse o Sr. Deputado Correia Afonso - e por isso me prezo que esteja presente -, como também ele não deixou de me reconhecer alguma quando o seu grupo parlamentar alterou o título das propostas que entraram nesta Casa.
Sr. Deputado Correia Afonso disse, no essencial, que não era verdade que o Tribunal Constitucional tivesse declarado a inconstitucionalidade total do diploma, mas o que esse tribunal tinha declarado era, somente, a inconstitucionalidade de alguns dos seus preceitos.
É preciso explicar o que sucedeu exactamente e quais são os problemas jurídicos que estão implicados.
O que aconteceu, como sabem, foi que o Presidente da República, quando requereu a fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional, decidiu não levantar, ele próprio, a questão da inconstitucionalidade formal, cingindo-se, portanto, a inconstitucionalidades materiais de alguns preceitos, em relação a cuja constitucionalidade o Presidente da República tinha dúvidas.
Em todo o caso, o Tribunal Constitucional entendeu, de acordo com uma jurisprudência antiga, que podia conhecer de outros fundamentos de inconstitucionalidade, além daqueles que tinham sido invocados pelo Sr. Presidente da República. Embora, também de acordo com uma jurisprudência antiga, considerasse que, ainda que esses fundamentos de inconstitucionalidade substancialmente pudessem afectar todo o diploma, ele, Tribunal, na parte conclusiva da decisão, apenas os poderia declarar quanto às disposições, relativamente às quais o Presidente da República houvesse tomado a iniciativa de fiscalização preventiva.
Foi isso que o Tribunal Constitucional fez; nos fundamentos do Acórdão, nos considerandos do Acórdão, o diploma é julgado ou é tido por inconstitucional na sua integralidade, por violação formal das regras constitucionais quanto à audiência dos trabalhadores. Na conclusão, o Tribunal só extrai, por virtude da limitação do princípio do pedido, consequências dessa inconstitucionalidade geral que reconheceu quanto a certos preceitos.
Ora bem, isto desde logo coloca um problema jurídico que não vou aqui com certeza discutir, que é o problema da eficácia das decisões quanto aos seus fundamentos. Em qualquer caso, certo é que na substância do raciocínio feito pelo Tribunal, inconstitucional foi declarado todo o diploma e o Governo não pode agora espantar-se ou surpreender-se que venha a sê-lo novamente.
De qualquer modo, em relação aos concretos preceitos a que se refere a parte conclusiva do Acórdão, portanto, ao n.º 2 do artigo 1.º, às alíneas a), d), e), f) e s) do artigo 2.º, temos além de uma inconstitucionalidade material declarada pelo Tribunal, em relação a

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alguns dos casos, não em todos, uma inconstitucionalidade formal que afecta os preceitos nessa redacção ou em qualquer outra.
Por outro lado, o artigo 279.º da Constituição apenas permite a esta Assembleia, não que declare a sanação de vícios, que é uma coisa - aliás, não é da competência desta Assembleia declarar se os vícios estão ou não sanados -, mas o eliminar - e eliminar, inteiramente! - as normas inconstitucionais naquilo que estão afectadas de inconstitucionalidade, e a essa eliminação chama-se expurgo, ou confirmar o diploma por dois terços.
Ora, o PSD não propõe o expurgo puro e simples, a eliminação pura e simples, das diversas normas que foram declaradas inconstitucionais; o que faz, quanto a algumas delas, é mudar-lhes a redacção, é alterá-las, é substituí-las, em linguagem regimental. Mas a inconstitucionalidade formal que afectava o preceito na versão originária continuará a afectá-lo em qualquer versão e, por isso, será sempre precisa uma deliberação da Assembleia que se sobreponha à decisão do Tribunal Constitucional - e essa deliberação, nos termos do artigo 279.º da Constituição, não pode ser tomada senão por dois terços dos Deputados presentes.
A meu ver, se não se proceder desta forma, o Presidente da República, qualquer que seja o resultado aqui proclamado, não poderá promulgar o diploma. Se o promulgar, a promulgação é nula e o diploma inexistente. O que significa que, quer se requeira ou não a fiscalização abstracta ao Tribunal Constitucional, passaremos anos a discutir nos tribunais - eu não, porque não advogo nessas matérias -, mas passarão anos a discutir nos tribunais sobre se o diploma é constitucional ou inconstitucional.
Independentemente da substância do diploma, por uma razão de face que, neste caso, não devia prevalecer, para não lhe chamar de teimosia, o Governo e a bancada que o apoia, por sua culpa, e isto por falta de cautela, vão, provavelmente, criar uma insustentável situação de insegurança jurídica.
O futuro dirá se tenho ou não razão.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do CDS, e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Deputado Miguel Galvão Teles, toda a intervenção que acabou de produzir teve - reconheço-lhe esse carácter e cumprimento-o por isso - a natureza opinativa que é usada por um professor de Direito Constitucional.
Mas, como o Sr. Deputado sabe, nestas matérias complexas do Direito não existe apenas a doutrina, que é aquela que sai da boca e da pena dos professores. Existe, também, a jurisprudência, que será feita pelo Tribunal Constitucional e existe, também, a interpretação autêntica que, no caso do Parlamento, será a decisão parlamentar.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Não será autêntico!

O Orador: - Se não for autêntico, pelo menos, procuraremos que seja clara.
Quero dizer ao Sr. Deputado que não conheço outra lição anterior à sua que se tenha baseado nesta matéria. Esse mérito reconheço-lho, mas, em termos parlamentares, também não temos tradição - este é o segundo caso - de expurgo de inconstitucionalidades.
Trata-se, portanto, de uma matéria em que todos nos estamos a iniciar, embora o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles tenha alguma vantagem pela sua experiência constitucional.
Simplesmente, Sr. Deputado - julgo que são principalmente estes os casos que mais interessam -, temos casos de inconstitucionalidade formal apontados pelo Tribunal Constitucional.
Já que há pouco referiu uma conversa que tivemos, também tomo a liberdade de o citar para dizer que o artigo 279.º da Constituição se refere fundamentalmente à inconstitucionalidade material.
No fundo, todos apontamos para que se retire o vício da inconstitucionalidade do sítio onde ele estiver. Se for a própria norma, pois é a norma que tem de desaparecer. Mas, Sr. Deputado, se a inconstitucionalidade for formal, isto é, se o vício for exterior, exógeno, à própria norma, como é que se retira esse vício se ele não está na própria norma?
Isto é, com a sanação - aqui está a feliz expressão que há pouco empregou, que utilizei na proposta que apresentámos e que julgo, em termos para que peço tolerância, ser semelhante à de «expurgo» - da irregularidade que é exterior à norma, ela não fica efectivamente, sanada da inconstitucionalidade?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Deputado Correia Afonso, em primeiro lugar, quero agradecer as suas palavras.
Não sou professor de Direito Constitucional - neste momento não ensino -, mas sei alguma coisa sobre a matéria.
É evidente que tenho as minhas opiniões e o Sr. Deputado terá dito que fiz uma intervenção opinativa, mas devo dizer que não a fiz inconscientemente. Não quero dizer com isto que outros, alguns ou todos, partilhem desse meu ponto de vista.
Será, naturalmente, uma matéria sujeita a controvérsia e admito que se amanhã me sentar a uma mesa com um conjunto de colegas possa haver um debate natural. Pessoalmente, estou firmemente convencido do que disse.
Em qualquer caso, e não me querendo dar muita importância, direi que isso é o suficiente para ter de admitir que possa vir a entender-se assim. Isto é quanto basta. Não quero estar aqui a fazer doutrina constitucional nem a impor o meu ponto de vista, mas parece-me que nem a Assembleia nem o país podem arriscar numa matéria destas, seguindo interpretações controversas.
O Governo disse, na altura em que apresentou a sua primeira proposta, que tinha obtido parecer de vários professores de Direito e tenho a certeza de que se trata de pessoas competentíssimas e sérias - aliás, os nomes de dois desses professores vieram até publicados num jornal.
Não ponho em dúvida que fosse esse o ponto de vista dessas pessoas, mas também sabemos que há pontos de vista divergentes.

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Mas creio que aquilo que o Governo deveria ter perguntado aos seus juristas, era sobre qual o grau de probabilidade de o diploma passar no Tribunal Constitucional. Se me perguntassem a mim, diria que essa probabilidade era de 10%. Hoje não sei qual é essa probabilidade e não arrisco no prognóstico.
Portanto, o que penso é que não vale a pena arriscar. Se o Governo assumir a responsabilidade de arriscar, não venha, depois, é lançar culpas sobre outros.
No que se refere àquela conversa que tivemos lá fora - há pouco não me referia a ela mas, sim, à nossa intervenção -, é evidente que, a meu ver, se estava a pensar na inconstitucionalidade material quando se redigiu o artigo 279.º da Constituição.
O que é preciso é que na segunda leitura do diploma, as inconstitucionalidades que existem sejam eliminadas ou superadas.
Uma inconstitucionalidade formal não pode ser eliminada sem se regressar ao início do processo - esse é o meu ponto de vista - e, sobretudo, a Assembleia não tem competência para declarar a inconstitucionalidade sanada, mesmo que o faça.
Isto quer dizer, portanto, que se não se expurgar, se não se retirar, a norma na íntegra, tem de se confirmar o decreto com votação favorável de dois terços dos Deputados para vencer a decisão do Tribunal Constitucional.
Este é um ponto de vista como outro qualquer.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Convirá, ao iniciar esta minha intervenção, recordar muito sucintamente as posições que o PS deixou expressas aquando dos debates na generalidade e especialidade do chamado pacote laborai, e que aqui tiveram lugar em Abril passado. Isto porque não mudámos de opinião em relação ao que expressámos na altura.
A nosso ver, nem os expurgos, nem as sanações, nem as eliminações vieram sanar alguns dos gravíssimos defeitos de que enfermava a anterior proposta e de que continua a enfermar esta nova proposta, apresentada pelo PSD. Digo «nova proposta», porque ela é realmente nova a vários títulos, como procurarei demonstrar. Não se trata já do inicial pacote laborai. Trata-se, sim, de um travesti apresentado por mandatário, não sabemos se com ou sem representação.
Quais foram, então, as posições que o PS quis deixar bem expressas no debate inicial sobre o pacote laborai?
Em primeiro lugar, entendíamos e continuamos a entender que não é a autorização legislativa o meio mais próprio para fazer reformas de fundo do tipo das do pacote laborai. Já o dissemos a propósito de outros sectores e de outras «reformas de fundo» e, obviamente, também o dizemos para o pacote laborai.
Em segundo lugar, dissemos, na altura, que o projecto continha vários aspectos que, claramente, violavam disposições constitucionais. A essas foi feito - é disso de que aqui estamos a tratar - algum expurgo, alguma sanação, alguma eliminação. É evidente que estamos de acordo com muitos dos expurgos que aqui foram feitos, pois eliminaram as inconstitucionalidades detectadas nalguns dos casos.
Em terceiro lugar, dissemos que o pacote laborai surgia desenquadrado de uma política face ao mundo laborai, no sentido de o aproximar dos esquemas da Europa comunitária. Efectivamente, insistimos no facto de que não chegava uma lei de despedimentos, de cessação do contrato individual de trabalho, mas que era necessário apresentar um pacote muito mais amplo rodeado das alterações legislativas relativamente ao sistema de protecção do emprego, à reforma, à doença, etc. Portanto, não chega apresentar o pacote laborai como uma regulamentação da lei do despedimento e de outros aspectos parcelares do contrato individual de trabalho, mas é necessário ir mais além nessas reformas que se pretendem que sejam de fundo.
Finalmente, dissemos, continuamos a dizê-lo, que muitas da soluções concretas que são apresentadas para os problemas concretos de que temos a consciência que existem, são soluções más, desadequadas à nossa realidade, ilógicas e muitas vezes contraditórias consigo próprias.
Mas também dissemos - e, mais uma vez, queremos afirmá-lo aqui - que somos pela necessidade de introduzir alterações nas leis do trabalho, de uma forma muito ampla e genérica, mas no quadro constitucional, com a salvaguarda de todas as garantias e direitos dos trabalhadores.
Portanto, como demonstrámos na altura, ao apresentar 16 propostas de alteração ao pacote laborai, não temos uma posição imobilista. Temos, sim, quanto às questões de fundo, opiniões bem diversas das do Governo e das da bancada da maioria.
A tudo isto que dissemos, o Governo e o PSD responderam com a inaceitação de qualquer das propostas de substituição por nós formuladas, com a rejeição da afirmação por nós feita quanto à possibilidade de existirem inconstitucionalidades na proposta do Governo. Todos os avisos que, então, lançámos, quer quanto à inconstitucionalidade formal, quer quanto à inconstitucionalidade material, foram afastadas in limine pelo Governo e pelo PSD.
O resultado conhecemo-lo todos nós. O Tribunal Constitucional declarou como inconstitucional um conjunto amplo de medidas do pacote e declarou formalmente inconstitucional o próprio pacote, como já foi explicado pelo Sr. Deputado Miguel Galvão Teles. Já aqui foi dito, mas a meu ver mal, que da formulação final do Acórdão se pode depreender que a inconstitucionalidade formal atinge apenas aquelas disposições.
O que é certo é que da fundamentação do Acórdão se percebe que essa inconstitucionalidade formal abrange todas as disposições, porque todas elas têm características de pertencerem ao mundo do sistema laborai, ao mundo das leis do trabalho e é para esse domínio que existe um dispositivo constitucional que obriga à participação das organizações de trabalhadores na elaboração dessa legislação.
Penso que temos, hoje, uma nova situação a vários títulos, porque este pacote que aparece «travestido» pelas mãos da bancada da maioria e já não pelas mãos da bancada do Governo é, em muitos aspectos, um diploma novo e é-o em aspectos que, de certo modo, causam a nossa admiração, sobre os quais irei debruçar-me em seguida.
O primeiro aspecto que queríamos salientar - e que supomos que ainda não foi salientado por qualquer dos oradores antecedentes - é relativo ao facto de o Governo ter desistido, pela mão do seu mandatário

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PSD, de estabelecer um novo regime jurídico da cessação de contrato individual de trabalho. Esta era a fórmula da proposta inicial do Governo que hoje aparece «travestida» no seguinte: «É o Governo autorizado a legislar em matéria de cessação do contrato individual de trabalho».
O Governo, de uma penada só, abriu mão deste grande projecto de alteração do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho com revogação - em consequência, como se dizia - de nada mais nada menos do que seis diplomas legislativos, para agora passar a preocupar-se apenas, na versão do PSD, em legislar em matéria de cessação do contrato individual de trabalho e «em consequência, revogando disposições dos seguintes diplomas...». Não se trata já da tarefa inicial de apresentar ao país um regime total, global, lógico e coerente da matéria de cessação do contrato individual de trabalho, mas, sim, de remendos nessa manta de retalhos que hoje já é a nossa legislação laborai.
Assim, o que teremos é, pelo menos, mais um decreto a somar aos seis que faziam parte do artigo 1.º da proposta inicial do pacote e que seriam revogados e que hoje não o são, pois apenas algumas disposições desses decretos serão revogadas. Aos seis decretos já existentes somar-se-á um sétimo, para que a manta fique ainda mais completa. Quem pinta a manta que pagou o preço! Mas esta é exactamente a situação que vamos ter.
Referia-me eu a um sétimo decreto, mas talvez não seja só mais um decreto. Na proposta inicial o Governo queria fazer tudo de uma só vez, tocar todos os problemas de uma só vez, nessa tal visão global de alteração do regime e, por isso mesmo, dizia no n.º 2 do artigo 1.º: «O Governo é igualmente autorizado a...» e, depois «... simultaneamente, proceder à revisão do regime processual de suspensão e redução da prestação de trabalho». Agora, o Governo pretende apenas, pela mão dócil do PSD, «ser autorizado a proceder», mas não simultaneamente, a proceder à revisão do regime processual da suspensão e redução da prestação de trabalho. Ao sétimo decreto somar-se-ão, naturalmente, vários outros decretos ou, pelo menos, um decreto que dirá respeito à suspensão e redução da prestação de trabalho.
O terceiro ponto que queria acentuar é o de que, para legislar estabelecendo um novo regime jurídico - toda essa reforma global que teria alguma lógica, assim o pensamos, dentro da sua óptica -, o Governo pedia à Assembleia 90 dias. Para revogar algumas disposições dos seis decretos em vigor, pretende agora o PSD dar-lhe tempo sobejo, nada mais nada menos do que 180 dias, isto é seis meses. Quanto às explicações que foram dadas, salvo o devido respeito, penso que elas são atabalhoadas e nada explicam.
Certamente, o Sr. Ministro, que nos está a ouvir com toda a atenção, vai explicar-nos que ingente tarefa é essa de revogar meia dúzia de disposições de meia dúzia de decretos, para a qual o Governo precisa agora, na versão do PSD, de seis meses, quando, anteriormente, precisava apenas de 90 dias para construir todo um regime novo em matéria de cessação de contrato individual de trabalho.
No meu entender, esta é a tónica geral do diploma que, hoje estamos a discutir: Um projecto «travestido» que já não é um projecto, é uma manta de retalhos, constituído por uma série de remendos da legislação
avulsa. O Governo claudicou na sua intenção inicial e as grandes reformas que anunciou, estão agora reduzidas, como alguns Srs. Deputados já afirmaram, a meia dúzia de disposições que, no actual regime, vão ser revogados. Para além de tudo isto, o diploma que estamos a analisar é algo atabalhoado, algo contraditório e até pouco cuidado.
Já, há pouco, tive ocasião de chamar a atenção da Câmara, através de uma pergunta que formulei na sequência da intervenção de uma Deputada do PCP, para o facto de o Governo estar agora a pedir autorização legislativa para modificar um regime num sentido que é exactamente idêntico àquele que existe no regime actualmente em vigor. E o que é que o Governo faz? Introduz apenas uma pequena coisa a que a Sr.ª Deputada Odete Santos se referiu dizendo: «não, mas agora também o empregado pode pedir a reintegração». Ora, apesar deste aspecto, o regime é o mesmo, porque é o trabalhador que vai decidir se pretende ou não a sua reintegração.
No entanto, gostaria que o PSD ou o Sr. Ministro se pronunciassem sobre alguns aspectos que, no meu entender, constituem contradições internas do diploma.
O PSD pretende manter a protecção especial dos delegados sindicais, no que diz respeito ao despedimento. Simplesmente, no anterior pacote laborai percebíamos perfeitamente o que é que o Governo entendia por essa protecção especial dos representantes sindicais. É que como não havia o direito à reintegração e o empregador podia sempre substituí-la por indemnização, fazia sentido haver essa protecção especial, consignada na alínea J) da proposta anterior. Isto porque era esse direito que era dado aos representantes sindicais: de pedirem a sua reintegração e de esta não lhes poder ser negada. Obviamente que este direito faz mais sentido em relação a um delegado sindical do que em relação a um trabalhador normal.
Mas, agora, o PSD esqueceu-se disto, pois na actual versão do pacote laborai a reintegração é um direito de qualquer trabalhador, pelo que pergunto: qual é o entendimento do Governo, se é que o pode declarar, quanto à adequada salvaguarda dos direitos dos representantes sindicais em caso de despedimento declarado ilícito ou nulo? Fica esta pergunta a pairar.
Gostaria também que alguém da bancada do PSD ou, de preferência, o Sr. Ministro me esclarecesse o seguinte: já afirmei que o Governo desistiu de tocar na questão de justa causa de despedimento; desistiu, por completo, de rever o regime jurídico do contrato de trabalho, mas não desistiu de, através do PSD, introduzir na proposta de autorização legislativa a possibilidade de haver causas objectivas de despedimento. Embora a proposta diga que essas causas objectivas só podem estar ligadas a causas da empresa, gostaria que agora fosse aqui dito e redito, mais uma vez, para obstaculizar a qualquer dúvida de interpretação (pelo menos, que os trabalhos desta Assembleia sirvam para isso) que desapareceu deste diploma, por completo, a expressão: «por falta de aptidão do trabalhador». O diploma refere apenas «razões objectivas da empresa» que, de forma alguma, se podem traduzir em falta de aptidão do trabalhador pelo facto de a empresa ter mudado os seus processos tecnológicos.
Esta questão é importante, não está clara no meu espírito e julgo que também não está clara no espírito de muitos outros Srs. Deputados.

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Deste modo, devo concluir que estamos perante um diploma novo que é um travesti do diploma inicial e que, precisamente, por isso, revela alguma contradições. e também pouco claro em alguns aspectos e, em nosso entender, continua a ser formalmente inconstitucional. Com efeito, a todas as razões já aduzidas em favor da audição prévia dos trabalhadores, e em relação ao pedido de autorização legislativa, aduzo mais uma: a que se liga ao facto de estarmos perante um diploma novo. Portanto, de modo algum se pode vir chamar em auxílio da sua discussão prévia um diploma anterior que não tinha que ver com este, que é novo.
De facto, com todos os expurgos, eliminações e sanações, estamos perante algo de novo. E porque não é admissível que o Governo actue como comissário da Assembleia - comissário no sentido jurídico, obviamente - para ouvir os representantes dos trabalhadores e, depois, transmitir à Assembleia a «papa feita», pois a Assembleia sabe ouvir e deve ouvir, lançamos este último aviso à bancada do PSD: não deixem de recuar neste aspecto da audição prévia dos trabalhadores, porque, dentro de pouco tempo, teremos novamente aqui mais expurgos, mais sanações, se não ouvirem este nosso último aviso que incide sobre o pacote laborai na generalidade.

Aplausos do PS, do PCP e da ID.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Carlos Brito e Correia Afonso.
Entretanto, a Mesa solicita aos Srs. Deputados que desejam ainda intervir neste debate que façam a sua inscrição e indiquem os tempos que vão utilizar, a fim de possibilitar a organização dos trabalhos.
Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Vera Jardim, gostaria de manifestar o meu apreço pela sua intervenção e dizer que concordo com a generalidade das questões abordadas.
Atendendo ao pouco tempo de que disponho, gostaria apenas de lhe colocar uma questão.
O Sr. Deputado, a certa altura da sua intervenção - e indo ao encontro da importante contribuição que o Sr. Deputado Miguel Cal vão Teles trouxe ao nosso debate - afirmou que a declaração de inconstitucionalidade formal atinge todo o diploma.
O Sr. Deputado Miguel Galvão Teles na intervenção que produziu afirmou que a partir desta conclusão apenas uma de duas hipóteses é possível: ou o decreto é confirmado por maioria de dois terços ou tem de regressar ao ponto de partida. Não há obras, nem remendo que lhe valham.
O Sr. Deputado Vera Jardim é também desta opinião?
Srs. Deputados, creio que a clarificação deste aspecto daria um enorme significado a este debate que, hoje, estamos aqui a travar. Neste sentido, penso que é muito importante que este aspecto seja aclarado, pois poderá poupar muitos esforços à Assembleia da República e pode contribuir para o aumento do seu prestígio perante a opinião pública e perante o país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Deputado Vera Jardim, gostaria de lhe colocar várias questões porque a sua intervenção foi interessante, mas como o tempo não é muito, vou limitar-me apenas a dois aspectos.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado, por diversas vezes referiu o PSD e o respectivo grupo parlamentar como mandatários do Governo. Gostaria de lhe dizer - se por acaso ainda não percebeu - que não somos mandatários, nem mandantes.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): - São mandados!

O Orador: - O nosso relacionamento não é esse. Existe autonomia entre o Governo, o PSD e o Grupo Parlamentar e o ponto de encontro das nossas decisões é o Programa do Governo em que, quer o Governo, quer o PSD, quer o Grupo Parlamentar, estão empenhados na sua execução.
O Sr. Deputado Vera Jardim referiu, há pouco, que as inconstitucionalidades formais atacam ou viciam todo o Decreto n.º 81/V. Pensei ter ouvido mal, mas vejo-o agora a acenar com a cabeça dando assentimento ao que acabo de referir e isso surpreende-me. A propósito desta afirmação, gostaria de perguntar-lhe se o Sr. Deputado conhece inconstitucionalidades tácitas ou implícitas. Se o Sr. Deputado não sabe que na teoria geral judicial e, concretamente no Tribunal Constitucional, em referência ao artigo 279.º da Constituição, a inconstitucionalidade não tem que ser declarada expressamente.
Uma última questão que gostaria de colocar-lhe e que já coloquei ao Sr. Deputado Miguel Galvão Teles é no sentido de saber se o Tribunal Constitucional declarou todo o diploma inconstitucional ou referiu apenas alguns dos preceitos nele incitos.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.
O Sr. Vera Jardim (PS): - Começo por responder ao Sr. Deputado Correia Afonso, meu caro colega e amigo. É com muito prazer que o faço, até para desfazer qualquer equívoco que a minha intervenção possa ter causado, no que diz respeito à expressão «mandatário» que utilizei.
Em primeiro lugar, somos os primeiros a não dar um sentido pejorativo à palavra mandatário. Na verdade, não disse que o PSD exercia o mandato, habitualmente por profissão do Governo, mas suponho até que o qualifiquei como comissário no sentido - que penso não é pejorativo - de o PSD ter vindo dar uma ajuda ao Governo com a apresentação desta nova proposta que estamos aqui a analisar, visto que não foi o Governo mas o PSD que veio à Assembleia reformular a proposta inicial.
Suponho que o Sr. Deputado compreende que com isto não tive qualquer intenção menos elegante e, se assim o entendeu, apresento as minhas desculpas, pois não foi essa a minha intenção.
Quanto ao problema de fundo que se refere à inconstitucionalidade formal - e que o Sr. Deputado Carlos Brito também levantou - devo dizer, correndo o risco

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de repetir aquilo que o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles há pouco disse, que é uma matéria de opinião. Não afirmo e suponho que nunca afirmei que o mais certo é que por essa razão o Tribunal Constitucional viesse a declarar a inconstitucionalidade formal de uma nova disposição que saísse desta Assembleia.
Trata-se de uma matéria controversa, mas devo explicar ao Sr. Deputado que, embora, o Tribunal Constitucional na parte final e decisória do Acórdão apenas indique as inconstitucionalidades respeitantes aos vários números e alíneas da proposta de lei do Governo, a verdade é que uma leitura do Acórdão nos faz chegar à conclusão que o Tribunal Constitucional entende - porque várias vezes o diz - que toda a matéria proposta visa a legislação laborai e, várias vezes, reafirma o princípio da necessária audição dos representantes dos trabalhadores, terminando por atribuir apenas a inconstitucionalidade formal às alíneas cuja apreciação de inconstitucionalidade lhe foi solicitada pelo Sr. Presidente da República.
Ressalta daí uma dúvida.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Deputado, mas na técnica de apreciação de uma sentença ou de uma decisão não é na última parte, a decisória, que é a própria sentença, que devemos apoiar as conclusões que retiramos de uma peça judicial como esta?

O Orador: - É óbvio que sim. É a parte decisória que conta, mas até onde vão os poderes de cognição do Tribunal Constitucional? Vão para além daquilo que lhe é sugerido pelo Presidente da República? Irão? Penso que não! Não sou constitucionalista, os meus conhecimentos provêm da doutrina do processo civil, mas entendo que o Tribunal Constitucional não tem, por si só, poderes para declarar a inconstitucionalidade para além daquilo que declarou.
No entanto, da leitura dos considerandos do Acórdão e, não obviamente, da sua parte decisória, fica-nos a dúvida. Mas do que tenho a certeza é que o Tribunal Constitucional considera que em relação a todas as alíneas da proposta de alteração legislativa se deu essa falta de audição prévia dos trabalhadores. Sobre isto não podemos ter dúvidas, porque o Tribunal várias vezes o diz claramente. Além da dúvida, considero haver ainda um risco e, neste aspecto, admito que o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles possa ter razão. Já discuti com ele, em privado, este problema e, embora, tenha ficado surpreendido com a sua interpretação inicial, a pouco e pouco deixei-me convencer de que pode haver algum risco, o de surgir uma declaração de inconstitucionalidade, que a admitir teria de ser táctica. É esse o grande argumento contra esta tese. No entanto, considero que há algum risco, embora o julgue mais diminuto do que, eventualmente, o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.
Suponho que com esta resposta tenha esclarecido também o Sr. Deputado Carlos Brito. A opinião é esta, tenho dúvidas e continuo a mante-las. E o facto de as haver poderia levar esta Assembleia a sanar, em tom de princípio, toda e qualquer dúvida para que não pudesse se levantada em qualquer estádio do processo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, após consulta aos grupos e agrupamentos parlamentares, a Mesa informa que estão ainda inscritos para intervir neste debate dois Deputados.
Como estamos em hora de votações, duas hipóteses se colocam: ou procedemos agora às votações, após o que continuamos com o debate, sem interrupção; ou continuamos o debate até às 20 horas e 30 minutos e no seu termo procedemos às votações, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 82/V, em relação à qual há um requerimento de baixa à Comissão, das ratificações n.ºs 16/V, e 18/V, em relação às quais há um requerimento e da Proposta de Expurgo ou sanação apresentada pelo PSD.
Não havendo objecções, a Mesa propõe que se continue com o debate e se procedam às votações no seu termo.
Deixo a proposta à consideração da Câmara. O silêncio interpreta-se como concordância com a proposta feita pela Mesa?

Pausa.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, dado que faltam apenas duas intervenções para encerrar este debate, devo dizer, pela nossa parte que preferimos que o debate se encerre e depois que se proceda, de imediato, a todas as votações, quer as respeitantes às matérias que V. Ex.ª enunciou na abertura da sessão, quer as que têm a ver com a matéria que está em discussão.

O Sr. Presidente: - Não há objecções, há um assentimento expresso, pelo que vamos continuar o debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (ID): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: A perseverança e a teimosia com que o Governo reincide na máscara de uma inconstitucionalidade, que conhece, revela bem o interesse político que o Governo tem na aprovação desta lei. Um Governo cujo objectivo é mais o da satisfação das suas clientelas do que o dever patriótico de assegurar uma estabilidade de emprego e uma boa sanidade das relações laborais neste país.
Esta lei não é uma garantia da estabilidade de trabalho, mas sim uma garantia da possibilidade de desempregar com ou sem justa causa.
O Governo teve o cuidado de subtrair os trabalhadores do princípio do contraditório, e lembro a V. Ex.ª, Srs. Deputados, que o processo de despedimento é em si mesmo uma sanção. O despedimento tem o carácter de sanção e, por isso, mais nenhum processo se aproxima das normas do processo penal do que o da averiguação de justa causa de despedimento. E isso que se vem subtraindo e é isso que se pretende esvaziar. Ou seja, pretende-se esvaziar a capacidade de o trabalhador, em igualdade de circunstâncias com o patronato, poder defender-se, poder arguir com as suas razões contra o patronato.

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E mais, não compreendo que em assuntos de melindre, tais como o do despedimento colectivo, se transfira uma verdadeira função jurisdicional para o Ministro do Emprego e da Segurança Social que, inclusivamente, liga tão pouco. O Governo atribui tão pouca importância a esta questão do despedimento colectivo que permite que o Sr. Ministro faça competência delegada em matéria de despedimento colectivo. Isto não é só ilegal, como também inconstitucional, porque a jurisdição é aquela que vem prevista na Constituição. Quem pode exercer a jurisdição...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - O Sr. Ministro não está a ouvir!
O. Orador: - Creio que o Sr. Ministro está a ouvir, mas se for preciso interrompo.

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social (Silva Peneda): - Estou a ouvir. Pode continuar.

O Orador: - Tem bom ouvido.

O Sr. Filipe Abreu (PSD): - É sempre a mesma coisa!

O Orador: - É sempre a mesma coisa, porque os Ministros nunca ouvem o que a oposição diz. De facto é assim. Tem toda a razão.
Mas dizia eu que, efectivamente, a jurisdição é exercida ou só pode ser exercida pelos tribunais e por aqueles órgãos que a lei cria especialmente para o efeito.
Ora, que eu saiba, não há qualquer lei - nem a lei constitucional fala nisso nem mesmo a lei ordinária o refere - que diga que o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social tem competência jurisdicional.
Porém, outras razões nos levariam a nunca aprovar e a apoiar este diploma. Por exemplo, o artigo 6.º, que se refere à morte da entidade empregadora - e sabemos que a norte do rio Tejo há uma grande percentagem, talvez superior a 507o, de empresários em nome individual - quando por morte desta cessa o contrato de trabalho, diz que será o património da empresa que responderá pela indemnização a pagar ao trabalhador. Sabemos muito bem como é fácil descapitalizar uma pequena empresa em nome individual, como é simples transferir contas bancárias e fundas e como é simples fazer com que as máquinas resultem de qualquer penhor mercantil.
Ora, não diviso razão alguma para que se não prolongue o direito de indemnização do trabalhador sobre o património do próprio empregador, como é evidente e como resulta de tudo o resto.
Qualquer comerciante que mantenha como empregador em nome individual relações de comércio, o de executar o património do empregador, isto é, do seu comparsa.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Isso é uma barbaridade!

O Orador: - Por que não? Por que se tira isto? Por que se retira esta faculdade ao trabalhador?
Por outro lado, este diploma, ao falar também de direitos indisponíveis, vem, inclusivamente, tentar regulamentá-los.
Pelo que deixámos dito e sem querer levar a nossa intervenção mais longe, não apoiaremos este diploma.

Aplausos da ID e do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sra. Vice-Presidente Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Presidente, Srs. Deputados; O Governo apoia as propostas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PSD.
Perante os fundamentos da decisão do Tribunal Constitucional, no que respeita aos pontos declarados de inconstitucionalidade, pensa o Governo que as sugestões agora apresentadas eliminaram os vícios que no entender do Tribunal Constitucional, prejudicaram a bondade da solução.
O cumprimento do Programa do Governo, relativamente à área do Emprego e Formação Profissional, não deixará de ter expressão, através da presente iniciativa legislativa, porquanto os grandes princípios básicos enunciados no sentido da modernização da legislação laborai e consequentemente a sua flexibilização e harmonização com a legislação dos países da CEE, continuam subjacentes a todo o projecto de diploma.
Gostaria de, mais uma vez, reafirmar, perante esta Câmara, o que o projecto em apreciação mantém de inovador, relativamente à lei vigente, o seguinte:
1. A flexibilização controlada da cessação do contrato individual de trabalho, nos casos determinados por factos de natureza objectiva, fundado em motivos económicos, tecnológicos, estruturais ou de mercado, relativos à empresa, estabelecimento ou serviço, de acordo com o preceito constante da proposta de alteração do artigo 2.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 81/V, constitui uma das grandes soluções inovadoras e necessárias, atendendo ao mercado altamente competitivo a que as empresas portuguesas se terão de adaptar a muito curto prazo, isto, apenas, tendo em mente o ano de 1992 com a entrada no Mercado Único.
2. A simplificação do processo disciplinar nas pequenas empresas também vinha carecendo de expressão legal.
A fórmula encontrada para a redacção final deste preceito demonstra bem a eficácia da consulta pública e do diálogo empreendidos pelo Governo, na medida em que explicita, de forma precisa, as garantias de defesa do trabalhador na fase instrutória do processo. A comunicação, por escrito, ao trabalhador, da decisão do despedimento, com discriminação dos factos que lhe são imputados, implicará também a garantia de que, nestas circunstâncias, não se deixa margem à arbitrariedade.
3. A uniformização do processo de despedimento dos representantes dos trabalhadores, com recondução da competência para o despedimento à entidade empregadora, no pressuposto de um quadro prospectivo adequado, vem pôr termo à grande questão que está na origem de determinada

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linha jurisprudencial e que se assume à exigibilidade ou não exigibilidade, face à Constituição, de uma reserva de acção e decisão judicial nesta matéria.
A solução prevista no projecto teve, ainda, em conta a Convenção n.º 135 da OIT e articula-se com o actual sistema de relações profissionais, na medida em que não colide com quaisquer das formas de protecção dos representantes dos trabalhadores consignadas na Lei Sindical ou na Lei das Comissões de Trabalhadores.
4. No que respeita ao âmbito de participação dos representantes dos trabalhadores, foi clarificada a intervenção, nas formas de cessação do contrato de trabalho previstas, da estrutura mais vocacionada de acordo com a Constituição. Garantindo-se também supletivamente, a intervenção de estruturas sindicais de base na empresa.
5. O alargamento do período experimental tem ampla justificação, tendo em conta a finalidade de apreciação da aptidão do trabalhador.
6. A revisão do regime jurídico da contratação a termo, de acordo com a sistematização adoptada, também é uma solução imposta pela necessária interdependência de implicações sociais e económicas resultantes da conjugação deste regime com o da cessão do contrato individual de trabalho.
Neste domínio, pretende-se, de forma inovadora, pôr fim a um dos aspectos mais gravosos do regime actual e que se traduz na ausência de explicitação do carácter rigorosamente excepcional da contratação a prazo.
O regime que o Governo pretende propor, parte da ideia de que a regulamentação, em termos restritivos, das condições de admissibilidade do contrato a termo e a previsão legal de garantias adequadas para os trabalhadores a eles sujeitos, reduz a instabilidade que caracteriza esta forma de contratação sem diminuir as suas virtualidades, enquanto instrumento de dinamização do mercado de emprego.
7. É ainda significativamente relevante a possibilidade de flexibilização do regime através da previsão de fórmulas negociais, em matéria de indemnizações, período experimental e prazos de pré-aviso na revogação do contrato por iniciativa do trabalhador.
8. As necessárias alterações ao regime vigente decorrem ainda de outras soluções igualmente previstas, designadamente:

- A eliminação da possibilidade de revogação unilateral do acordo revogatório, por parte do trabalhador;
- O estabelecimento de uma compensação, de natureza global, no caso da cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo, disposição esta que se fundamenta no grau de certeza que deve rodear a celebração de quaisquer acordos;
- O aumento dos prazos de que dispõem o trabalhador e a comissão de trabalhadores para exercerem os seus direitos, no processo disciplinar.
9. No que respeita à alteração das regras processuais dos regimes do despedimento colectivo e da suspensão e redução da prestação de trabalho,
está em causa a clarificação das finalidades dos respectivos institutos.
Assim a celeridade que se impõe no caso do regime de «Lay-Off», visa reconduzir esta figura jurídica à prossecução dos seus reais objectivos, individualizando--a como medida cautelar do despedimento colectivo.
Em relação a algumas questões que o Sr. Deputado Vera Jardim teve a amabilidade de colocar, começo por responder à que dizia respeito, se bem entendi, à não necessidade de uma explicitação sobre a protecção dos trabalhadores, relacionando isto com o problema da reintegração versus indemnização.
Queria dizer-lhe que, do nosso ponto de vista, o problema da protecção dos representantes dos trabalhadores não tem a ver apenas com as questões da reintegração versus indemnização. Tem a ver com a natureza urgente concedida às acções de declaração de ilicitude dos despedimentos intentados pelos representantes dos trabalhadores; tem a ver com o regime especial previsto para a providência cautelar da suspensão despedimento - a suspensão só não deve ser decretada se o tribunal concluir pela existência de séria probabilidade de haver justificação de justa causa para o despedimento; tem a ver com a obrigatoriedade da entidade patronal facultar ao trabalhador o acesso aos locais de trabalho destinados ao exercício das suas actividades específicas, no caso da suspensão preventiva; tem a ver com a proibição do afastamento dos critérios de preferência na manutenção do emprego, em caso de despedimento por causas objectivas; enfim, e toda uma série de explicitações que poderia enunciar.
Alguns Srs. Deputados puseram em questão o problema da queda do termo «simultaneamente» e o Sr. Deputado Vera Jardim glosou ainda com o elenco de uma série de decretos-leis. Quanto a este último problema não é realmente intenção do Governo, por agora, elaborar o 8.º, o 9.º, o 10.º e o 11.º, tal como o Sr. Deputado referiu.
A proposta apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD serve perfeitamente para os objectivos do Governo. O Governo poderá ou não utilizar a autorização legislativa, revogando totalmente ou parcialmente os decretos-lei. Portanto, estamos totalmente de acordo com a proposta apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD que serve, de facto, os propósitos e as intenções que temos relativamente a toda esta matéria.

Aplausos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa que estão inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nogueira de Brito, Vera Jardim e Odete Santos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, que dispõe de 1 minuto.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social recordou nesta sua intervenção final o discurso que fez aquando da votação aqui da autorização legislativa. Não sei se foi com a intenção de «mergulhar» o que hoje aconteceu no contexto das várias alíneas, com mais ou menos sentidos, que desdobravam o artigo 2.º do decreto-lei e cujo expurgo estamos hoje aqui a apreciar, ou se foi com

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o sentido de tentar valorizar ainda esta iniciativa do Governo.
O que pretendíamos, Sr. Ministro, é que V. Ex.ª, se centrasse naquilo que fica depois do expurgo. Isto é, V. Ex.ª, muito concretamente, entende que há ainda alguma flexibilização, no sentido da que o Governo apontava, das relações de trabalho, depois daquilo que desaparece do diploma, porque foi expurgado da autorização legislativa?
Sr. Ministro, a questão da substituição da reintegração pela indemnização que V. Ex.ªs consideravam central desapareceu. Não faz mal? Quer isto dizer que continua tudo flexível? A possibilidade de flexibilizar continua?
A questão da possibilidade de despedimento por ineptidão superveniente desaparece. Então, e continua tudo na mesma?
Sr. Ministro, o que queria era conhecer a valorização que o Governo dá àquilo que desaparece. Isto porque me dá a ideia de que o que fica, Sr. Ministro, conjugado com aquilo que não é flexibilizado, ao contrário, são introduzidos factores de rigidez, acaba, efectivamente, por se traduzir num saldo negativo, no que respeita à flexibilização.
Era a sua opinião sobre esta matéria que queria conhecer.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, começo por agradecer o esclarecimento que prestou em relação às dúvidas que coloquei durante a minha intervenção. No entanto, restam-me ainda algumas relacionadas com o ponto que focou e que gostaria de as expor.
O Sr. Ministro diz que o que está ainda serve - e tem de ser mesmo um «ainda». Sedo este o entendimento que tive da sua intervenção, pergunto: o senhor entende que este diploma tem, mesmo que seja aprovado, a mesma extensão que tinha o anterior quando se dizia no artigo 1.º «É o Governo autorizado a legislar...» e hoje diz-se «É o Governo autorizado a legislar em matéria de cessação do contrato individual do trabalho e em consequência revogando disposição dos seguintes diplomas...».
Como V. Ex.ª muito bem sabe dizia-se «É o Governo autorizado a legislar estabelecendo um novo regime jurídico» e, depois, acrescentava-se com revogação do decreto, A,B,C,D,E etc. Entende V. Ex.ª estar tudo na mesma?
Já aqui coloquei uma outra questão, para a qual obtive, em parte, o esclarecimento necessário, mas gostaria de a colocar também a V. Ex.ª depois da intervenção que fez. Entende ou não o Sr. Ministro que depois de eventualmente aprovada esta proposta do PSD continua ou não a ser causa objectiva de cessação do contrato da inaptidão do trabalhador? Devo dizer, como já disse várias vezes, que a mim me parece claro que não, tanto pela redacção da anterior como da actual cláusula. Em todo o caso, gostaria que V. Ex.ª me elucidasse sobre esta questão.
Finalmente, em relação à explicação que V. Ex.ª me deu, devo dizer que aceito que haja algumas diferenças entre o problema do despedimento de um dirigente sindical e o dos trabalhadores em geral. Em todo o caso, penso que V. Ex.ª terá de me dar razão, por que a grande diferença quanto à norma do anterior pedido de autorização legislativa - até se percebia pelo artigo 15.º do decreto-lei que lhe vinha anexo, embora não fizesse parte, mas, de qualquer modo, era um elemento de interpretação da vontade do Governo -, era precisamente entre o direito à reintegração do dirigente sindical e o não direito à reintegração dos trabalhadores normais. Penso que a minha interpretação continua - apesar de haver outras coisas, não nego - a ter algum cabimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, nos brevíssimos minutos de que ainda disponho, gostaria de colocar-lhe três questões.
Primeiro, no anterior pedido de autorização legislativa, depois de aprovado por esta Assembleia, V. Ex.ª colocou à discussão pública o projecto de decreto-lei. Pergunto: ao fazer isso considerou que, afinal, estava errado e que a consulta pública anteriormente feita não tinha validade jurídico-constitucional?
Segundo, V. Ex.a, na sua intervenção, enumerou com algum detalhe questões de especialidade, nomeadamente - e recordo-me -, a questão da suspensão judicial de despedimento, a providência cautelar, que, aliás, não traz novidades em relação ao regime, e outras questões.
Portanto, pelas palavras de V. Ex.ª concluímos que o Governo tem preparadíssimo o projecto de diploma a publicar depois deste pedido de autorização legislativa. Nesse caso, Sr. Ministro, e isto não foi respondido até à data, por que a razão, se o Decreto n.º 81/V fixava o prazo de noventa dias para a autorização legislativa, o PSD pretende agora alargar este prazo para cento e oitenta dias? Não tem, de facto, qualquer justificação, e gostaria que o Sr. Ministro respondesse.
Terceira e última questão. O Sr. Ministro falou na história de o trabalhador fazer um acordo e não poder depois exigir salários, créditos não incluídos nesse acordo e o recebimento das importâncias equivalerem à renúncia a créditos. Pergunto: pensa que isso é conforme com um direito irrenunciável do trabalhador, que é o direito ao salário? Se o trabalhador não tiver recebido salários nesse acordo, e isto está jurisprudencialmente estabelecido, é, de facto, admissível que ele possa renunciar a esse salário?
Chamo a atenção, Sr. Ministro, que mesmo antes do 25 de Abril já os tribunais portugueses decidiam que o direito ao salário era irrenunciável e que a cláusula que o trabalhador subscrevia «(...) nada mais tendo a exigir(...)» não dava nestas questões salariais, o direito a férias e a subsídio de férias e de Natal, qualquer relevância jurídica. Por que razão se regressa a um sistema que eu, na minha vida de advogada, já não conheci?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Começo por responder ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.

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4664 I SÉRIE - NÚMERO 115

É óbvio que uma decisão, um facto novo, entre a apresentação da proposta de lei do Governo, e o motivo que aqui nos reúne tem a ver com o Acórdão do Tribunal Constitucional.
É evidente que - e todos sabemos que o Acórdão não é pacífico, carece de várias leituras como consta, enfim, da declaração dos vários membros do Tribunal Constitucional - não posso deixar de reconhecer que havia na proposto do Governo pontos que ficaram prejudicados. Mesmo assim, no entender do Governo, vale a pena insistir porque há pontos que podem avançar dentro do quadro jurídico proposta agora pelo Grupo Parlamentar do PSD e que vão ao encontro de alguns elementos de flexibilidade no mercado do trabalho, tal como enumerei na minha intervenção inicial.
Sr. Deputado Vera Jardim, esclareço-o de que a inaptidão não consta, e tem toda a razão quando faz essa interpretação. A inaptidão não figura na proposta.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Não figura...

O Orador: - Aliás, parece-me bem claro, da distinção que fez e da forma como está redigido, o artigo respectivo.
Sr. Deputado Vera Jardim, no fim do seu pedido de esclarecimento apercebi-me que V. Ex.ª queria colocar outra questão. Assim, se ainda o desejar, faça favor...
O Sr. Vera Jardim (PS) - Muito obrigado, Sr. Ministro. Aquilo que pretendia colocar era, ao fim ao cabo, a questão dos 180 dias, o que também é um mistério! Talvez V. Ex.ª o não saiba explicar... não faço ideia!

O Orador: - Sr.ª Deputada Odete Santos, quanto a saber se quando o Governo colocou à discussão pública o decreto-lei reconhecia automaticamente se tinha ou não validade a discussão anterior, tive oportunidade de explicar que a posição do Governo é propícia à validade da discussão anterior. Mas, porque se suscitavam dúvidas de interpretações diversas, para deixar tudo claro e sem qualquer tipo de problema, fez--se uma segunda auscultação pública relativamente ao decreto, a qual não teve outra intenção senão a de clarificar definitivamente o problema porque, em nossa opinião, da segunda discussão não resultaram elementos muito inovadores relativamente ao que se tinha dito aquando da primeira discussão pública.
Quanto à discussão dos 180 dias, devo dizer que se tratou de uma sugestão apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD. O Governo tem possibilidade de utilizar ou não esse prazo, de acordo também com outro tipo de alterações. Não vejo nisto nenhum mistério especial nem nada de complicado! Temos vontade de andar depressa e de, rapidamente, fazer as adaptações necessárias que resultam deste tipo de alterações na parte de competências próprias do Governo. Espero bem não ter necessidade de utilizar este período de tempo, mas aceito perfeitamente esta proposta.
Quanto a saber se os salários devem ou não constar da parte final do acordo que é celebrado, devo dizer que a óptica do Governo é global nesse sentido. Aliás, sou o primeiro a reconhecer claramente que não concebo que se faça um acordo final onde a parte dos salários não esteja bem expressa. A nossa óptica é de simplificação do processo e, portanto, o que pretendemos
é que nesse acordo final conste mais alguma coisa do que os próprios salários; a ideia inicial, que depois em sede de discussão do diploma pode ser explicitada, é no sentido de que constem os salários e mais qualquer coisa. Foi esse o espírito que presidiu ao legislador e, do nosso ponto de vista, nunca houve qualquer hipótese de pensar que no nosso país se poderiam celebrar acordos deste género, tirando parte aos salários que são devidos aos trabalhadores.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Agora fico mais descansada, mas era melhor
clarificar isso!

O Sr. Vera Jardim (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Ministro, V. Ex.ª esqueceu-se de responder à primeira questão que coloquei e que, porventura, era a mais importante.
Gostaria de saber se em relação à antiga e à nova redacção do artigo 1.º V. Ex.ª encontra nelas - tal como eu encontro - uma enorme diferença de âmbito: uma para rever o regime e outra para pontuais alterações; a última mantendo em vigor uma séria legislação e a primeira revogando toda essa legislação para lhe ser substituído um regime totalmente novo.

O Orador: - Sr. Deputado, em relação a essa matéria não veja uma diferença tão abissal como V. Ex.ª quer ver. Tudo depende do conceito de natureza qualitativa que se possa utilizar porque quando se diz «(...) derrogando disposições dos seguintes diplomas(...)» isso pode aplicar-se até a todo o diploma. Portanto, não vejo que isso seja uma questão tão fundamental! Julgo que em sede de decreto se poderá então analisar se, de facto, se trata de um regimento novo. Penso que é um conceito de natureza qualitativa e não vejo que, com a alteração da redacção, se altere substancialmente o espírito inicial da parte do Governo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais oradores inscritos, dou por encerrado o debate.
Vamos passar para o período de votações, pelo que peço aos serviços que informem os Srs. Deputados que se encontrem presentes nas comissões que porventura estejam reunidas, nomeadamente a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 52/V - Introduz alterações à Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu).
Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS e votos contra do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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13 DE JULHO DE 1988 4665

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, o requerimento apresentado pelo PSD prevê um prazo de baixa à comissão por oito dias. Como nas intervenções feitas a propósito desta matéria foram colocadas algumas questões políticas ao PSD, que também têm repercussão institucional no processo de revisão da Constituição, pois exigiriam ponderação não só em sede de legislação ordinária mas igualmente em sede de revisão constitucional, afigura-se-nos que o prazo de oito dias é manifestamente escasso para a ponderação dos problemas que foram suscitados. Sendo assim, através da Mesa, pergunto se seria possível apelar ao PSD para que o prazo de oito dias fosse dilatado para trinta dias.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa não tem competência para apelar em relação à questão que coloca.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, gostaríamos de ter uma abertura e aceitar a sugestão que o Sr. Deputado Jorge Lacão acabou de fazer, simplesmente não nos parece que os problemas sejam tão complexos. Temos à vista o termo da sessão legislativa e entendemos que, embora tivéssemos vontade, não podemos mudar o requerimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o requerimento é do vosso conhecimento e, portanto, vamos passar à sua votação.

Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS e votos contra do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação às Ratificações n.º 16/V e 18/V existe um requerimento subscrito por Deputados do PS, do PCP, do PRD, do CDS e pelas Deputadas Independentes Helena Roseta e Natália Correia, que é do seguinte teor: «Nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 198.º do Regimento, os deputados abaixo-assinados requerem a baixa à Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, pelo prazo de trinta dias, do Decreto-lei n.º 91/88 e das propostas de alteração entradas na mesa, tendo em vista proceder à sua votação e discussão na especialidade, após consulta às Assembleias Municipais de Cascais, Oeiras, Sintra e Amadora a quem compete, nos termos dos artos 2.º-1-d) e 39.º-2 h) e 1), do Decreto-lei n.º 100/84 e demais legislação aplicável, pronunciar-se sobre a matéria em apreço.
Vamos votar.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS de Os Verdes e da ID.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, gostaríamos de ter 10 segundos para entregar na Mesa um requerimento, ao abrigo do artigo 152.º do Regimento, para fazer o adiamento da votação na parte subsequente deste processo de ratificação.

O Sr. Presidente: - Julgo que enquanto o Sr. Deputado prepara o requerimento podemos proceder à sua votação.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, peço um segundo, que não é de mais, para reflectirmos sobre o processo de votação que se está a processar.
Julgo que alguns dos Srs. Deputados não estarão a compreender o sentido das votações e, na parte que me toca, alguns aspectos são obscuros. Entendi o requerimento que acabou de ser votado - e a Mesa deu-me o esclarecimento - num sentido diferente.
Sempre pensei que era para baixar à Comissão, mas só depois da votação, na generalidade. Com surpresa, verifiquei que era antes, o que evidentemente determinou o voto contra.
Por outro lado, verifico que está agendada a votação e, com surpresa, constato que é usado um direito potestativo, que não é aplicável ao caso concreto, visto que esta votação foi agendada mas não foi até ao momento terminada.
Há qualquer coisa que se está a processar que não está de acordo com o Regimento nem com a praxe parlamentar, pelo que peço ao Sr. Presidente para reflectirmos um pouco sobre todo este processo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já se tem chegado muitas vezes a consensos...

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Não há consenso!

O Sr. Presidente: - Não há direito potestativo senão para a votação.
Por isso, poderíamos, neste momento, passar ou não à discussão do requerimento.
No entanto, há uma solicitação do Partido Socialista no sentido de repontaremos esta questão - no fundo, é isso - na conferência de líderes a efectuar amanhã, e será nesse sentido que irei pôr à votação o requerimento oral do Partido Socialista, caso haja consenso.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, de uma fornia muito breve, pretendo perguntar à Mesa se, estando agendada a votação, na generalidade, prevista no artigo 195.º do Regimento, por que é que se não faz essa votação?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa só pode fazer a votação de um documento, que neste momento não possui.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, isto é um processo de apreciação de um decreto-lei. Ora, é sobre esse processo, sobre essa petição que vamos

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votar, ou seja, se é ou não concedida a recusa de ratificação.
O processo é muito fácil, dado que há uma votação, na generalidade, que está agendada. Este é, pois, um processo relativamente simples, ainda que especial, mas está tudo previsto no Regimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa tem tido informações sobre este processo, informações certamente fluidas e cada vez me convenço mais que muitas vezes estas informações, obtidas dessa maneira, não produzem efeitos muito significativos.
As informações que fomos colhendo davam-nos a entender que o processo que estávamos a utilizar era o processo mais correcto.
Estão inscritos, para usar da palavra, a Sr.ª Deputada Helena Roseta e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (Indep): - Sr. Presidente, realmente não consigo compreender qual é o problema da Mesa e deste Parlamento. Foram apresentadas propostas de alteração, na especialidade, a um decreto-lei cuja ratificação foi pedida, mas ninguém propôs a sua recusa nem a suspensão da sua vigência. Logo, não temos de votar nem contra o decreto nem contra a suspensão da vigência, temos de votar apenas as propostas de alteração.
Como o PSD acaba de recusar que essa votação se faça em comissão, ela vai ter de ser feita aqui.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Orador: - Ora, para ela ser feita aqui, apenas pedimos vinte e quatro horas para apreciar as propostas na especialidade, propostas essas que dão entrada até ao termo da discussão, ou seja, ainda hoje.
Não percebo por que é que nos querem obrigar a votar agora, a correr, coisas que nem sequer ainda tivemos tempo para consultar e estudar com um pouco de cuidado.
Parece-me sensato - já que não querem que esta matéria seja discutida aqui, porque é regimental, mas que não o seja agora. Dêem-nos, pelo menos, vinte e quatro horas!
Sr. Presidente, parece que isto é simples!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, se me permite intervir, já que os decretos-leis são do Governo, penso que a dificuldade que se está a verificar neste momento resulta do facto de não haver votação na generalidade, excepto quando há recusa de ratificação.
Portanto, não havendo votação na generalidade, apenas se tem de votar o requerimento e nada mais. E então, só se passará à discussão aqui consoante o resultado da votação do requerimento.
Parece-me que a dúvida e a perplexidade surgiram aquando da votação do requerimento!

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Quem sabe, sabe!

O Sr. Presidente: - Foi nesse sentido, e ouvindo alguns grupos parlamentares, que a Mesa estava - digamos - a «empurrar» para amanhã, na conferência de líderes, a decisão do agendamento da discussão e votação na especialidade desta matéria. Era isto que a Mesa estava a propor.
Nessas circunstâncias e visto não haver objecções, na conferência de líderes apreciaremos quando é que esta questão será analisada na especialidade.
Srs. Deputados, vamos passar ao terceiro processo de votação, que tem a ver com a reapreciação do Decreto n.º 81/V.
Informo que foi distribuída, em devido tempo, uma proposta de expurgo ou sanação, apresentada pelo PSD, do seguinte teor:
«Propõe-se o expurgo das inconstitucionalidades nos termos das propostas na generalidade oportunamente apresentadas e distribuídas».
Vamos votar.

Submetida à votação» foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP, de Os Verdes e da ID e abstenções do PS, do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na Mesa várias propostas de expurgo, sendo uma referente ao artigo 1.º, n.º 2, e ao artigo 2.º, alíneas a) e d).

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, julgo que V. Ex.ª não tem de pôr agora à votação todas as propostas de expurgo, porque aquela que há pouco votámos e que tem como título «Proposta de expurgo ou sanação», pela sua redacção, abrange todas as outras.
Nessa proposta que acabámos de votar propõe-se o expurgo das inconstitucionalidades, nos termos das propostas na generalidade oportunamente apresentadas e distribuídas. Portanto, a redacção desta proposta inclui todas as outras, salvo no que se refere à especialidade - e agora passaríamos à especialidade - quanto à alteração, eliminação, aditamento, enfim todas as figuras normais de alteração dos textos.
Na generalidade, tudo estaria incluído na proposta já votada.

O Sr. Presidente: - Era isso que a Mesa estava a dizer, ou pelo menos assim pensou. Eu estava a anunciar as propostas de expurgo para chamar a atenção da sua existência.
Portanto, Srs. Deputados, vamos passar à votação na especialidade.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, peço a contagem nas votações subsequentes.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado é capaz de especificar claramente o que entende por contagem, para não haver dúvidas?

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, peço que sejam contados os votos a favor, contra e abstenções.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado requer, portanto, a contagem dos votos por bancada.
Srs. Deputados, para não haver muitas dúvidas, vamos lendo...

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para fazer uma interpelação à Mesa sobre o desenrolar dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, se não estou em erro, foi anunciado pelo PSD, na Conferência dos Presidentes dos Grupos Parlamentares, que, após a votação na generalidade, iria propor a baixa das propostas à Comissão para votação na especialidade.
Não sei se há alguma razão especial para o PSD mudar de opinião, não sei se as alegações hoje aqui produzidas durante a reunião, de que o processo, não sendo confirmado por maioria de 2/3 dos deputados, tinha de voltar ao ponto de partida, levaram o PSD a mudar de posição.
Gostaria, pois, de saber a posição do PSD e se vamos votar, na especialidade, as propostas em Plenário ou se as vamos votar na Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tecnicamente temos sempre que as votar em Plenário, na especialidade.
Em todo caso, na conferência de líderes foi posta a hipótese de a Comissão se debruçar, durante algum tempo, sobre as propostas, a fim de, eventualmente na próxima quinta-feira, em Plenário, serem votadas na especialidade. Por isso a Mesa fez alguns hiatos para ver se era ou não apresentado algum requerimento, mas não foi apresentado nenhum.
Nestas circunstâncias, a Mesa está confrontada com o seguinte problema: ou votam-se já, na especialidade, as propostas ou aguarda-se um dia e as propostas serão votadas, na especialidade, na reunião da próxima quinta-feira.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, nós não mudámos efectivamente de opinião. Simplesmente, entendemos que esta matéria pode ser debatida em comissão. Parece-nos, no entanto, que a votação na especialidade terá que ser feita sempre em plenário.

O Sr. Presidente: - Isso foi o que acabei de dizer, Sr. Deputado.
Assim, entende-se que, amanhã, na conferência de líderes, definiremos quando se fará a votação na especialidade em plenário.

O Orador: - Não mudámos de opinião. O que nos pareceu foi que o nosso entendimento - no aspecto só da votação, não no aspecto do debate - estaria ligeiramente distorcido.

O Sr. Presidente: - Face a este entendimento, que é consensual, na conferência de líderes, como de costume, decidiremos sobre isto...

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Dois passos para a frente, dois passos para trás!

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pretende usar da palavra?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Pretendo sim, Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, gostaria de ser informado qual o artigo regimental que obriga a votação, em sede de plenário, deste dispositivo.

O Sr. Presidente: - Em trocas de impressões, embora não tenha ficado muito claro, chegou-se maioritariamente à conclusão que teria que haver uma votação em plenário.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, pedi um dispositivo regimental. Não pedi consensos!

O Sr. Presidente: - Enquanto a Mesa procura o número do artigo que o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pretende, dou a palavra ao Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, reconheço que é controverso o entendimento que há pouco expendi. No entanto, não tenho a mais pequena dúvida em formular um requerimento para baixa à comissão. Aliás, a nossa posição, que tomámos na última conferência de líderes, não foi alterada.
Pareceu-nos questionável esse processo, mas se a Assembleia e os Srs. Deputados entenderem que não o é, estamos perfeitamente abertos para requerer a baixa à comissão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Jorge Sampaio pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, seguindo a explanação que, há algumas horas já, fez o Sr. Deputado Nogueira de Brito - e com toda a razão, aproveitando, aliás, para criticar uma posição nossa, com toda a justeza -, perante as alterações propostas pelo PSD, depois da votação na generalidade e do expurgo, caminharemos para a especialidade e terminaremos sempre com uma votação final global, que é inevitável.
Portanto, faça-se onde se fizer a votação na especialidade, uma coisa é certa: até ao dia 21 de Julho - se o Governo entender que é até ao dia 21 e se o pretender - há uma votação final global sobre esta legislação que temos entre mãos.
Por nós, faça-se onde se quiser a votação na especialidade. Agora a votação final global tem de se fazer aqui em plenário como é óbvio.

O Sr. Presidente: - Queria informar, para que não ficassem dúvidas, que este processo, que é o segundo que nos aparece este ano...

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4668 I SÉRIE - NÚMERO 115

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E ainda vão aparecer mais!

O Sr. Presidente: - ... tem sido muito debatido entre nós, tem sido esclarecido de diversas maneiras, tem sido objecto de alguns consensos, tem sido objecto de algumas discussões, mas uma coisa é certa: ele terá de voltar a plenário para votação.
Tem a palavra, o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, há pouco, numa interpelação, referi que aceitaria apresentar um requerimento para baixa à comissão se se verificasse que isso não colidia com a letra ou com o espírito do Regimento. Perante o silêncio, vou apresentar na Mesa o requerimento para baixa à comissão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, era precisamente para quebrar o silêncio e para dizer, em resposta à questão posta pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que me parece que o dispositivo correspondente ao artigo n.º 279, n.º 2, da Constituição, como alternativa que fornece, aponta claramente para a votação desta matéria do expurgo em plenário. Portanto, parece-me que não têm grande razão de ser as dúvidas que, na sequência da intervenção do Sr. Ministro, acabam de ser levantadas e que grassam na Assembleia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento, que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:

Nos termos regimentais aplicáveis, os deputados abaixo-assinados requerem a baixa à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, por cinco dias e para discussão e votação na especialidade, das propostas de alteração e eliminação respeitantes ao Decreto n.º 81/V.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acabam de ouvir a leitura do requerimento, que, de seguida, vai ser distribuído.
Sr. Deputado Vera Jardim, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Vera Jardim (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, desejava saber quantos dias é que foram referidos.

O Sr. Presidente: - Cinco dias, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, em coerência com o que disse há pouco relativamente à baixa à Comissão, estamos inteiramente de acordo com ela, mas não concordamos com o prazo de cinco dias.
Por isso, vamos votar contra o requerimento, anunciando-o desde já à Assembleia para que não haja surpresas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do requerimento, que foi lido.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do PS, votos contra do PCP e da ID e as abstenções do PRD, do CDS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminamos assim os trabalhos de hoje. A próxima reunião terá lugar na quinta-feira, sendo a agenda já conhecida.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 35 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António José Coelho Araújo.
António Maria Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Domingos Duarte Lima.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João Manuel Ascensão Belém.
Joaquim Eduardo Gomes.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Angelo Ferreira Correia.
José António Coito Pita.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mário Lemos Damião.
Licínio Moreira da Silva.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.

Partido Socialista (PS):

António Manuel Azevedo Gomes.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Jaime José Matos da Gama.
José Barbosa Mota.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Ricardo Manuel Rodrigues Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Ribeiro Constâncio.

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13 DE JULHO DE 1988 4669

Partido Comunista Português (PCP):

Jorge Manuel Abreu Lemos.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo S. de Sousa Moreira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.
Miguel António Galvão Teles.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

António Mário Santos Coimbra.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
José Pereira Lopes.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.

Partido Socialista (PS):

Helena de Melo Torres Marques.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Luís Costa Catarino.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Campos Rodrigues Costa.
José Manuel Antunes Mendes.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.

As REDACTORAS: Maria Amélia Martins - José Diogo.

Página 4670

DIÁRIO da Assembleia da República

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