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Sexta-feira, 3 de Fevereiro de 1989 I Série - Número 34
DIÁRIO
da Assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE FEVEREIRO DE 1989
Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Cláudio José dos Santos Percheiro
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às l5 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.ºs 340/V e 341/V e das ratificações n.ºs 52/V e 53/V.
Procedeu-se à discussão conjunta das ratificações n.ºs 21/V (PCP) e 24/V (PS), relativas ao Decreto-Lei n. º 157/88, de 14 de Maio, que reformula o sistema de comparticipação do Estado no custo dos medicamentos prescritos aos utentes no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e da ADSE, tendo sido rejeitado o projecto de resolução, apresentado pelo PS, de recusa da ratificação do diploma em apreço.
Intervieram no debate, a diverso título, além da Sr.ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza), os Srs. Deputados Fernando Gomes (PCP), Luís Filipe Meneses (PSD), Jorge Catarino (PS); António Bacelar (PSD), Nogueira de Brito (CDS), Nuno Delerue (PSD), Vidigal Amaro (PCP), Rui Silva (PRD), João Rui Almeida (PS), Natália Correia (PRD) e José Castel Branco (PS).
Foi igualmente apreciada a ratificação n. º 28/V, de 17 de Junho, que regulamenta a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Ar(¡unto do Ministro da Justiça (José Soeiro), os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Coelho dos Santos e Pais de Sousa (PSD), Narana Coissoró (CDS), Mário Raposo (PSD), Jorge Lacão (PS), Barbosa da Costa (PRD), Carlos Oliveira (PSD) e Vidigal Amaro (PCP).
Foram aprovados, na generalidade, a proposta de lei n. º 82/V - Lei de Bases do Sistema Desportivo - e o projecto de lei n. º 366/V (PCP) - Lei Quadro da Cultura Física e do Desporto.
A Assembleia autorizou dois Srs. Deputados a deporem como testemunhas em tribunal e um outro a prestar declarações num processo disciplinar.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José de Carvalho.
António Maria Ourique Mendes.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Gilberto Parca Madaíl.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mário Silva Coutinho Albuquerque.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel P. Chencerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins do Vale César.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
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Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu F. Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António Manuel Celorico Moreira.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.
Deputados Independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: Ratificações n.ºs 52/V, solicitada pelo Sr. Deputado Cláudio Percheiro e outros, do PCP, e 53/V, solicitada pela Sr.ª Deputada Elisa Damião e outros, do PS, ambas relativas ao Decreto-Lei n.º 497/88, de 30 de Dezembro, que estabelece o regime de férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da Administração Pública, que foram admitidas; Ratificação n.º 54/V, solicitada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira e outros, do PCP, relativa ao Decreto-Lei n.º 22/89, de 19 de Janeiro, que transforma a empresa pública Banco Borges & Irmão, E.P., em sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos, que foi admitida; Ratificação n.º 55/V também solicitada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira e outros, do PCP, relativa ao Decreto-Lei n.º 25/89, de 20 de Janeiro, que aprova a transformação da Quimigal, E.P., em Quimigal - Química de Portugal, S.A., que foi admitida; Projecto de Lei n.º 340/V, apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros, do PCP, sobre a lei quadro do ensino superior politécnico, que, tendo sido admitido, baixou à 8.ª Comissão; Projecto de Lei n.º 341/V, da iniciativa do Sr. Deputado João Poças, do PSD, que propõe a criação da freguesia da Carreira no concelho de Leiria, que, tendo sido admitido, baixou à 6.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de lembrar que começaremos os trabalhos de hoje com a apreciação das Ratificações n.ºs 21/V e 24/V, sobre o Decreto-Lei n.º 157/88, de 4 de Maio, que reformula o sistema de comparticipação do Estado no custo dos medicamentos prescritos aos utentes no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e da ADSE.
Passaremos, depois, ao debate da Ratificação n.º 28/V, sobre o Decreto-Lei n.º 214/88, de 17 de Junho, que regulamenta a lei orgânica dos tribunais judiciais.
Às 19 horas e 30 minutos procederemos à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 82/V (Lei de Bases do Sistema Desportivo) e do projecto de lei quadro da cultura física e do desporto que vêm da sessão anterior. Obviamente, incluiremos a votação dos diplomas cujos processos de discussão forem, entretanto terminados.
Informo a Câmara de que, para intervirem na discussão das duas primeiras ratificações, encontram-se já
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inscritos os Srs. Deputados Fernando Gomes, Jorge Catarino, António Bacelar, João Rui de Almeida e José Castel Branco.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os poderes de ratificação que a Assembleia da República possui são simultaneamente uma forma de esta exercer a sua acção fiscalizadora sobre os actos do Governo e de alterar os diplomas, de forma a melhorá-los, com a contribuição possível de todos os deputados.
O processo de ratificação é, pois, uma forma de clarificação e de enriquecimento legislativo próprio de um Estado democrático participado e transparente, não podendo nem devendo ser encarado como um processo secundário a que, de vez em quando, a maioria dá o seu acordo para subir a Plenário.
É com esta noção de responsabilidade que o PCP tem solicitado várias ratificações, foi com esta responsabilidade que o PCP solicitou a ratificação do Decreto-Lei n.º 157/88, de 4 de Maio, que se propõe regular o sistema de comparticipação do Estado no custo dos medicamentos prescritos aos utentes do Serviço Nacional de Saúde e aos beneficiários da ADSE.
Matéria de tal importância para a generalidade dos cidadãos, e que consubstancia um dos aspectos do direito à saúde, deve manter-se sob fiscalização da Assembleia da República.
E este é o primeiro reparo em relação ao decreto-lei em apreço.
O Governo, ao publicá-lo, introduziu uma alteração à anterior legislação, o Decreto-Lei n.º 68/84, de 27 de Fevereiro, que consiste em remeter para portaria do Ministro da Saúde a tabela de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, em vez de constar de anexo ao próprio diploma.
Com este estratagema legal pretendeu o Governo reservar, só para si, a possibilidade de definir a tabela a seu belo prazer, retirando a possibilidade da sua alteração pela Assembleia da República, em sede de ratificação.
Tal estratagema legal não pode passar com a concordância do PCP e, nesse sentido, apresentamos as propostas de alteração adequadas.
É um problema mundial a necessidade de os estados controlarem as suas despesas em medicamentos, colocando-as ao abrigo das modas, das promoções consumistas, dos interesses lucrativos das multinacionais farmacêuticas, contrapondo a defesa da saúde do cidadão consumidor através do crivo da relação custo/benefício terapêutico.
O consumismo do medicamento combate-se com medidas educativas e de esclarecimento do cidadão e medidas de formação e de informação dos médicos que os prescrevem, defendendo-os das técnicas de «Marketing», dos que querem vender mais para mais ganhar.
Não se pode deixar o médico abandonado à intoxicação publicitária e à sedução do mais variado tipo de ofertas, sem contraposição de uma informação oficial, séria e rigorosa, que o elucide cabal e atempadamente.
Tal missão poderia e deveria caber às universidades e à Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos que, neste campo, se tem limitado a umas fugazes e raras informações terapêuticas.
Não se limitam consumos criando o já chamado «top dos 50», que, por via administrativa e intimidatória, pretende limitar a prescrição medicamentosa com meros critérios economicistas, exigindo que os médicos justifiquem clinicamente porque receitaram este ou aquele medicamento.
O médico deve socorrer-se de todos os recursos das ciências médicas para os aplicar de uma maneira adequada ao seu doente, como consta do artigo 9.º dos princípios europeus da ética médica.
O médico deve executar os seus tratamentos segundo o estado dos conhecimentos e da experiência da medicina, de acordo com as legis artis, se não quiser cair sob a alçada do artigo 150.º do Código Penal.
Terá que ser, pois, através de uma informação adequada e atempada, que o Ministério da Saúde poderá e deverá contribuir, para uma mais correcta prescrição medicamentosa com a inerente defesa do cidadão em geral.
Por outro lado, o consumismo combate-se igualmente pela educação dos cidadãos e por preservá-los de campanhas publicitárias que visam o consumo livre de medicamentos, nomeadamente através da televisão.
O consumismo não se combate obrigando os cidadãos doentes a sobrecarregar o seu orçamento doméstico - e isto quando podem sobrecarregar... -, conduzindo, muitas vezes, a dramáticas situações.
Portugal é hoje o País da Europa onde as despesas com medicamentos mais sobrecarregam o orçamento doméstico: 3,07 em Portugal, contra 1,75 em Espanha, 1,68 em França e 0,84 na Holanda.
Portugal é hoje o País da Comunidade Europeia onde se pagam, em termos relativos, os medicamentos mais caros da Europa.
Se pensarmos em termos de como gastar menos com os melhores efeitos e simultaneamente defendermos a indústria nacional de medicamentos, o PCP já apresentou nesta Câmara medidas muito concretas e patrióticas para o fazer.
Elas são várias e muitas delas foram por nós enumeradas e relembradas numa intervenção neste Plenário, em 24 de Maio de 1988, durante uma interpelação sobre política de saúde solicitada pelo PCP.
O tempo disponível e o objectivo concreto desta ratificação não me permitem desenvolve-las aqui, pelo que me limitarei a focar a tentativa, de que o Governo PSD foi protagonista, de, com este decreto e portaria subsequente, procurar economias à custa do bolso do cidadão doente.
Afirma o Governo que pretendeu alterar o regime da comparticipação de medicamentos subordinando-o a critérios de lógica terapêutica e de economia de meios. Critérios economistas foram, de certeza!... Agora evocar lógica terapêutica é que nos parece mais tratar-se de ignorância ou de incompetência, ou, o que seria mais grave, de mistificação.
Senão vejamos alguns exemplos:
Depois de publicada a lista oficial de medicamentos comparticipáveis, em 9 de Maio de 88, já foi alterada em 12 de Julho de 88, em 26 de Agosto de 88, em 29 de Setembro de 88 e em 8 de Outubro de 88.
Protestos do PSD.
Quando em 24 de Maio aqui denunciámos o facto de, no escalão B, os de 80% de encontrarem quatro medicamentos como vasodilatadores coronários,
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quando, destes, alguns não o eram preferencialmente e outros já não eram utilizados, estando os utilizados na prática clínica no escalão C, comentámos então esta estranhíssima lógica terapêutica, que considerava, os verdadeiros vasodilatadores coronários como «medicamentos não prioritários» em vez de «imprescindíveis, destinados ao tratamento de doenças graves que, por vezes, obrigam a terapêuticas prolongadas» ouviram-se, então, protestos da banca do PSD, à semelhança do que foi feito agora.
No entanto, o Governo ouviu o recado e lá corrigiu parcialmente a situação com o Despacho n.º 2/88 seguindo a opinião do PCP. Esperamos que o continue a fazer!...
A tal equipa do Ministério da Saúde, que elaborou essa lista de medicamentos, continua a mostrar a sua ilógica terapêutica colocando os tuberculóstáticos uns no escalão dos 100% e outros no escalão dos 80%, por sinal os mais caros.
Mas, continuando no reino da ilógica, qual a lógica de num país da Europa com a maior incidência de bronquite crónica, só ultrapassado pela Inglaterra, se passar os anti-asmáticos, gratuitos anteriormente, para o escalão dos 80%.
Antecipo-me já, ao possível comentário de que as despesas do Estado diminuíram, mas convido a Sr.ª Ministra da Saúde a informar-se junto das empresas vendedoras se as vendas baixaram significativamente.
Só quem não conhece a lógica terapêutica do asmático é que pode avançar com tais medidas.
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Baixaram, baixaram! ...
O Orador: - E que lógica terapêutica existe em colocarem-se os desparasitantes no escalão dos 50%, quando é tão grave a situação das crianças e dos adultos deste país e são tão graves as respectivas consequências? Para o Governo, uns parasitas a mais ou a menos pouca importância têm, mesmo que vão sugando os alimentos às nossas crianças - as mais mal nutridas da Europa - e provocando-lhes inúmeras doenças.
Que lógica terapêutica levou à exclusão de qualquer comparticipação aos complexos vitamínicos considerados mais equilibrados para lactentes pelos serviços de pediatria deste país?
E os complexos vitamínicos mais adequados para as grávidas?
Temos as crianças mais mal nutridas da Europa!!! Temos uma saúde materno-infantil ainda claramente insuficiente!!!
Mas, na lógica do Governo, estes medicamentos são produtos de higiene ou de conforto.
Não se pode, é bem verdade, considerar que esta actuação não está na lógica de um Governo que propõe uma verba de 250 mil contos para um programa nacional de saúde materno-infantil, e gasta, ao que se diz, 650 mil contos em Renault para os gestores da saúde.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Também é verdade!
O Orador: - Para impedir, que, desta forma, se degrade a saúde dos portugueses, propomos hoje, aqui, alterações à tabela que permitirão uma lógica terapêutica mais adequada.
Permitam-nos, ainda, salientar uma última proposta de alteração, que conduzirá a economia de custos para o Estado e para o cidadão, e que assenta na possibilidade de os serviços hospitalares fornecerem os medicamentos aos doentes até à primeira consulta no médico da família. Tal proposta, além da economia subjacente, permitirá uma melhor adequação do tratamento e, consequentemente, uma melhoria para a saúde dos portugueses.
Esperamos, pois, que esta Câmara utilize uma terapêutica lógica deste decreto, de forma a que possamos todos dizer que o direito à saúde dos portugueses saiu, realmente, reforçado.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Deputado Fernando Gomes, quando VV. Ex.ªs pediram a ratificação do decreto-lei pensei que o fizessem para criticar as medidas que, pretensamente, o Governo estaria para tomar na área dos medicamentos, medidas que alguma comunicação social e alguns partidos da Oposição - que sabem mais do que o Governo e mais do que a maioria - ...
O Sr. José Castelo Branco (PS): - Não é difícil!...
O Orador: - ... já conhecem há bastante tempo!
Não foi, no entanto, sobre essa matéria que V. Ex.ª veio falar. Fico surpreendido!... Isso significa que VV. Ex.ª já atiraram para trás das costas a técnica de malidicência, a técnica de falar de coisas que não existem.
Sobre a matéria que hoje está sujeita à ratificação desta Câmara queria perguntar-lhe o seguinte: V. Ex.ª é médico e, por isso, conhece perfeitamente as especialidades farmacêuticas que estão em causa na lista da comparticipações, tanto aquelas que baixaram de escalão como as que deixaram de ser comparticipadas. O Sr. Deputado é capaz de negar que a esmagadora maioria dessas especialidades farmacêuticas ou são placebos ou são medicamentos manifestamente desactualizados e até prejudiciais à saúde? É esse o caso de grande parte das associações medicamentosas que foram retiradas das listas de comparticipações. No entanto, os casos em que esses medicamentos são necessários foram contemplados nas listas de comparticipação!... Foi o que aconteceu, por exemplo, com os complexos vitamínicos necessários a grupos etários específicos ou a situações particulares.
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Nada disso!...
O Orador: - Sim, Sr. Deputado!...
O Sr. Deputado falou da pediatria, V. Ex.ª sabe muito bem que as correntes da pediatria a nível mundial deixaram, há muito tempo, de utilizar polivitamínicos na criança!...
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Não seja ignorante! ...
O Orador: - Ignorante é V. Ex.ª!... Mostre-me dados!
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E deixaram de dá-los por uma razão: porque os riscos são superiores aos eventuais benefícios.
A dosagem de vitaminas, por exemplo, da vitamina A em polivitamínicos é impossível de fazer!... Os riscos são superiores aos benefícios. No entanto, as vitaminas D e C são comparticipadas... e essas são as únicas necessárias à criança nesse período da sua vida!
Dê-me, portanto, Sr. Deputado, exemplos concretos de medicamentos essenciais que tenham deixado de ser comparticipados. Não venha com grandes teorias filosóficas do Terceiro Mundo porque nós não estamos no Terceiro Mundo; estamos, felizmente, na Europa!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, em relação à maneira como se exprimiu, não vou tecer comentários, não vale a pena! As relações de amizade que tenho consigo...
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Amigos, amigos...
O Orador: - ... não deveriam levar a este tipo de situação.
No entanto, já que citou a qualidade profissional - embora pense que não estamos aqui num forum da especialidade - quero dizer - e digo-o para conhecimento de todos os Srs. Deputados - que personalidades na área da pediatria que reputo de extremamente competentes desmentem...
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Escreva!...
O Orador: - Fica transcrito no Diário. Como eu ia dizendo, desmentem aquilo que o Sr. Deputado aqui acabou de dizer.
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Prove!
O Orador: - Desculpe, mas tenho pouco tempo!...
Em relação a isso quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que V. Ex.ª não desmentiu o que quer que fosse daquilo que eu disse da tribuna. Nada!... E já que falou dos lactentes, devia ter falado também das grávidas. Esqueceu-se das grávidas!... As grávidas também têm esse problema!... Ou está a tentar escamotear as coisas? Ou esqueceu-se dos 250 mil contos para o programa materno-infantil e dos 650 mil para os Renault? Esqueceu-se disso? Pode ir por aí, se quiser!...
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Isso é publicidade!...
O Orador: - Pode ir para os antiasmáticos, pode ir para onde quiser, mas não pegue nisso, Sr. Deputado, porque não lhe fica bem, até como médico!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Catarino.
O Sr. Jorge Catarino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O pedido de ratificação do Decreto-Lei n.º 157/88, que reformula o sistema de comparticipação do Estado no custo dos medicamentos prescritos aos utentes no âmbito do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e na Assistência na Doença aos Servidores do Estado (ADSE), solicitado pelo Grupo Parlamentar do PS, constitui um imperativo de consciência daqueles que, como nós, defendem progresso, com solidariedade e modernidade, com justiça social.
De facto, a revogação do Decreto-Lei n.º 68/84, de 27 de Fevereiro, da autoria do IX Governo Constitucional, indicia, com clareza, a prossecução de uma política mercantilista que, pragmaticamente, aplica linhas orientadoras gerais de redução do deficit público, sem atentar que, nesta área tão sensível da vida dos portugueses, esta pretensa economia fomenta maiores desigualdades sociais, é geradora de infelicidade e contribui, gravemente, para a degradação da qualidade de vida dos portugueses!
Na realidade, o decreto-lei revogado já alterava decisivamente o sentido da intervenção do Estado nessa matéria iniciada pela Lei n.º 56/79 e regulamentado pela Portaria n.º 806/83.
Com efeito, aos objectivos meramente económicos que, antes dos referidos diplomas, visavam apenas a defesa da indústria nacional, substituíram-se normas que fixavam prioridades contempladas com aumento das comparticipações da responsabilidade do Estado, em particular quanto a medicamentos para tratamento de doenças crónicas, altamente traumatizantes do ponto de vista psíquico e social, graduando as comparticipações de acordo com a utilidade desses remédios.
Passaram então a ser gratuitos, em genérico, os antiepilépticos, os antiparkinsónicos, os antiasmáticos, os inaladores, os antidiabéticos, os citostáticos, imunossupressores e alguns medicamentos específicos para a hemodiálise.
É, pois, em coerência com princípios definidos que se estabeleceram escalões de comparticipação do Estado, que poderiam atingir o preço total do medicamento ou a quase totalidade desse preço, só diminuindo essa comparticipação naqueles medicamentos de utilização esporádica e de pouca duração ou nos de utilidade terapêutica reduzida ou ainda, naqueles que, por serem de utilização predominantemente hospitalar, não ficam a cargo dos utentes.
Esse novo regime de comparticipações pretendia, assim, atingir uma maior racionalidade e justiça na aplicação dos meios financeiros disponíveis ao fixá-las com base na prioridade terapêutica dos medicamentos.
A aplicação do Decreto-Lei n.º 157/88, da Ministra Leonor Beleza, que revogou o citado diploma do governo do bloco central, tem gerado um coro de protestos! De norte a sul do País, os portugueses interrogam-se: Num período de expansão económica, quando centenas de milhões de contos provenientes da CEE inundam o País, quando o petróleo está a «rastos de barato», o Governo de Cavaco Silva reduz, drasticamente, as comparticipações dos medicamentos.
Com que critérios? Com que intenções?
Com que preocupações? E, Srs. Deputados, com que ligeireza!...
A saúde e o futuro dos portugueses são, assim sacrificados no altar da redução do déficit público, quando se esbanjam recursos em anúncios como o «tomou a sua pílula hoje»? e se dispendem milhares de contos em contratos duvidosos, de que é lapidar exemplo o escândalo do Hospital da Prelada.
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Não haverá outros sectores da actuação do Estado em que faça mais sentido poupar? Por que não na frota de automóveis do Estado? E porque não cortar nos gastos supérfluos de tantas direcções gerais? Porque não na defesa?
Protestos do PSD.
O Orador: - O que é certo é que, a partir de agora...
Protestos do PSD.
Sr. Presidente, solicito a sua intervenção para que possa continuar a falar. Parece que estou a incomodar alguns Srs. Deputados!...
O Sr. Presidente: - Alguns apartes são regulamentares, Sr. Deputado. Agradeço, no entanto à Câmara que faça o silêncio possível.
O Orador: - Eu sei que incomodo, mas...
Como estava dizendo, o que é certo é que, a partir de agora, laxantes, antiasmáticos e anticancerosos são alguns dos medicamentos essenciais atingidos pela obsessão da Sr.ª Ministra em fazer cortes, quando, entretanto, não se esquece de premiar a sua clientela partidária com chorudos ordenados, como no caso dos novos administradores hospitalares.
Lactentes, crianças, grávidas, adolescentes e idosos têm que pagar as vitaminas essenciais ao desenvolvimento e ao stress da vida moderna.
Cancerosos e asmáticos têm que dispor de mais dinheiro a somar aos seus já tão graves problemas!
Que justiça social, Srs. Deputados do PSD?
Que é feito das promessas demagógicas do Verão de 86?
Da orgia fiscal, aos certificados de aforro, do acesso ao ensino superior até à compressão dos aumentos salariais, o povo português paga hoje caro o seu equívoco eleitoral!
Cumpre-nos a nós, Oposição assumir, nesta Câmara, a defesa dos princípios e dos valores que mereceram a confiança dos eleitores, inclusive dos que votaram PSD, e denunciar expressamente os atropelos do «Estado-laranja» que tudo espezinha numa tentação para o poder autoritário, vazio de ideias e repleto de ambições.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Autoritário é o Sr. Deputado!...
O Orador: - Os Srs. Deputados do PSD deviam erguer-se nesta Câmara e opor-se a tão iníquo decreto-lei!
Digam aos portugueses, perante a TV (assim o espero) e demais órgãos da comunicação social, que concordam com os cortes dos medicamentos! Srs. Deputados, a disciplina partidária tem limites!
A Sr.ª Ministra argumenta, agora, que consumimos quase o dobro dos medicamentos per capita que os demais países da Europa, isto em relação ao produto interno bruto.
Esta afirmação é simplista, por omitir que há causalidades da doença que estão já ultrapassadas nesses países, quer relativamente ao padrão alimentar quer quanto às condições de habitação, salubridade e trabalho.
De facto:
Mais de metade da população portuguesa não dispõe de distribuição de água.
Mais de metade da população não dispõe de saneamento.
A maioria da população consome alimentos sem garantias de controle de qualidade, daí as diarreias, as intoxicações alimentares frequentes e outras noxas.
E a sinistralidade no trabalho não é a maior da Europa?
E as pensões sociais não são as mais baixas da Europa?
E a medicina preventiva não é quase inexistente?
É em grande parte por isto, Sr.ª Ministra, que consumimos mais medicamentos!
Que fique claro. Nós não defendemos o consumismo medicamentoso. Conhecemos os seus inconvenientes. Mas pensamos que a estratégia para reduzir os excessos não deve privilegiar o corte nas comparticipações. Este tende a ser cego, penalizando, em última análise, os mais desfavorecidos. É mediante a alteração de todo o nosso sistema de vida, desde a educação alimentar à melhoria do sistema de saúde e através da mudança de mentalidades que se modera o consumo de medicamentos sem violência escusadas. Sr.ª Ministra prefere, porém, as soluções de prepotência e os métodos terapêuticos drásticos. O Ministro Cadilhe exige resultados!!!
Em linguagem médica, combate os sintomas e não a etiologia da doença.
Pelo exposto, o Grupo Parlamentar do PS votará contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 157/88.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Sr. Deputado António Bacelar, Nogueira de Brito e Nuno Delerue.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Bacelar.
O Sr. António Bacelar (PSD): - Sr. Deputado Jorge Catarino, eu quase estou de acordo com a parte final da sua intervenção. Na verdade, é preciso tomar muitas iniciativas no sentido de evitar muitas das situações que o Sr. Deputado referiu.
Queria, no entanto, fazer-lhe três perguntas, que, em parte, já foram até respondidas.
Em primeiro lugar, acha V. Ex.ª que tomar mais medicamentos é ter mais saúde?
Gostaria também de saber se V. Ex.ª não considera normal que o ministério responsável pela saúde defenda a compra dos medicamentos que, sendo de qualidade, têm um preço mais baixo. Acha que essa atitude é grave ao ponto de prejudicar os doentes e os portugueses em geral?
Falou também o Sr. Deputado em acidentes de trabalho e em complexos vitamínicos. Acha ou não V. Ex.ª que existem vitaminas que, tomadas indiscriminadamente, são perigosas?
Recordo-me de que um professor de Pediatria da nossa velha Faculdade de Medicina, sempre que as
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mães lhe apareciam com os filhos dizendo que os meninos não tinham apetite, que estavam fraquinhos, respondia: «Não lhes dêem vitaminas, dêem-lhes bifes».
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - O que é preciso é o dinheiro para o bife!...
O Orador: - Para se ter o dinheiro para o bife há que poupar noutras coisas, entre elas nos medicamentos, que, muitas vezes, não são essenciais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Para o bife, para a fruta, para a casa...
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Jorge Catarino, o CDS acompanha os deputados que pediram a ratificação do Decreto-Lei n.º 157/88 na sua preocupação com as consequências do novo sistema de comparticipação aos medicamentos constante desse diploma.
Isso está fora da dúvida!
Mas não deixaremos de evidenciar perante a Câmara - aliás, estranhar-se-ia que o não fizéssemos - a nossa preocupação com o problema mais vasto dos gastos neste domínio. É claro que o Governo não tem chamado a atenção razoável e explicitamente, de modo claro, para a resolução deste problema perante a Assembleia. Temos de ser nós, deputados, a acatar disposições do Orçamento, predisposições expressas nesta e naquela medida para ir desenhando um quadro global de dificuldades, que o Ministério da Saúde sem dúvida atravessa nesta matéria.
Perante isto, coloco-lhe a seguinte questão, Sr. Deputado: o que é que o Partido Socialista vai fazer? Será que, pura e simplesmente, se propõe represtinar o diploma que, sobre a mesma matéria, foi publicado no tempo do ministro Maldonado Gonelha? E se assim é Sr. Deputado Jorge Catarino, V. Ex.ª reconhece ou não que os fundamentais princípios enformadores do actual diploma se continham já no «diploma Gonelha»?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Delerue.
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Sr. Deputado Jorge Catarino, vou prender-me só ao essencial do seu discurso. E o essencial do seu discurso para mim é o que alto e bom som, V. Ex.ª disse aqui, isto é, que uma das formas de resolver o problema da comparticipação do Estado nos medicamentos era diminuir os gastos na área da defesa. A minha pergunta visa saber se essa posição que expressou aqui é sua ou do Partido Socialista. No caso de esta ser a sua opinião pessoal ou a opinião do seu partido como é que V. Ex.ª fazia a contabilidade? Posso dar-lhe alguns exemplos: será que um capitão «vale» cem embalagens de vitaminas? ...
Risos.
E um brigadeiro «vale» quinhentas embalagens de antibióticos? V. Ex.ª já tem alguma tabela de conversão para nos poder dar umas noções em função do número de dispensas que fizer em termos de efectivos - não será com certeza em termos do equipamento... - no que diz respeito ao Orçamento da defesa? Como é que isso se traduz na política da comparticipação de medicamentos que estamos aqui a discutir?
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Catarino.
O Sr. Jorge Catarino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser telegráfico nas respostas porque não posso consumir o tempo de que os meus camaradas precisam para as intervenções que preparam.
Assim, direi que concordo em absoluto com o que disse o Sr. Deputado António Bacelar. Estamos de acordo, agora, tal como, aliás, acontece desde há muitos anos. De facto, sabemos perfeitamente aquilo que cada um de nós pensa.
No que respeita à preocupação com estes gastos de que falou o Sr. Deputado Nogueira de Brito, as respostas devem ser dadas pelo Governo!
Para já propomo-nos repor o diploma que estava em vigor e em relação ao qual temos sugestões a apresentar, através do meu camarada Castel Branco, com vista à sua melhoria.
Ao Sr. Deputado Nuno Delerue, limitar-me-ei a dizer que com a sua pergunta procura fazer chicana relativamente às dispensas de efectivos. Este tipo de linguagem é habitual nas suas intervenções!...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ele não sabe disso!
O Orador: - De qualquer forma, sempre lhe digo, por exemplo, que as questões ligadas à defesa nacional se colocam em termos de melhorar a utilização do laboratório militar. Essa será uma das formas, porventura haverá outras. De resto, devo dizer-lhe também que esta é uma posição meramente pessoal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Bacelar.
O Sr. António Bacelar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A promoção do bem-estar dos portugueses e o reforço da solidariedade constituem objectivos superiores de uma política inspirada na defesa dos direitos fundamentais do homem.
O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por isso mesmo, uma das preocupações do Governo e do Ministério da Saúde é ponderar o que cada um de nós portugueses tem de pagar para um outro usufruir de um benefício.
Um sistema que vise racionalizar este princípio é sempre polémico e ao mesmo tempo susceptível de ajustamentos periódicos e futuros.
Isso tem sido feito com verdade e firmeza.
O Decreto-Lei n.º 157/88 mantém praticamente inalterado o que já se verificava, mantém-se os três escalões de comparticipação.
No escalão A, os custos são inteiramente suportados pelo Estado pois abrange medicamentos imprescindíveis a situações definidas e de gravidade extrema.
No escalão B, o Estado paga 80% do valor.
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No escalão C, o Estado paga 50% do valor pois inclui medicamentos com interesse terapêutico confirmado. E todos os restantes, não prioritários e de reduzido interesse terapêutico não são obviamente, comparticipados.
Sito «as medidas agora consagradas conferem ao sistema de comparticipação de medicamentos um carácter dinâmico no futuro.
Face a um processo de avaliação permanente, introduzindo os ajustamentos necessários à consecução de melhores resultados do domínio da protecção da saúde».
Parece-nos uma medida acertada e perfeitamente justificada.
Num Estado de direito, o primeiro princípio válido é que o medicamento seja eficaz e exista uma verdadeira necessidade médica e social.
Noutros Estados, nomeadamente socialistas, não há concorrência na indústria farmacêutica e o mercado não é inundado de produtos com denominações diferentes embora com efeitos iguais.
Nesses Estados o número de medicamentos são igual e criteriosamente colocados no mercado e quer os médicos quer os doentes são chamados a gerir com inteligência e em conjunto o Orçamento do Estado para a saúde.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não se pretende em Portugal impedir que o médico receite o que muito bem entende e muito menos se pretende que o doente não tenha acesso ao medicamento necessário.
Pretendemos que, quer uns quer outros saibam utilizar e gerir de acordo com a sua consciência profissional e de utente, os medicamentos que têm ao dispor no mercado.
Os portugueses, os profissionais de saúde e os laboratórios farmacêuticos saberão compreender as causas e encontrar o melhor caminho que sirva o País e principalmente o doente.
Pelo que ficou dito, continuaremos a apoiar o Decreto-Lei n. º 157/88 nos princípios e na dinâmica de que está imbuído.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Vidigal Amaro, Fernando Gomes e Nogueira de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Deputado António Bacelar, é necessário que esta Câmara perceba que o que hoje se está a discutir é a comparticipação dos medicamentos. Se uma pessoa chegar à farmácia e quiser comprar «50 toneladas» de vitaminas é livre de fazê-lo embora seja certo que tomadas em excesso fazem mal. Mas o que se está aqui a discutir é a comparticipação dos utentes em medicamentos receitados por médicos em serviços públicos de saúde. O médico é que receita e o utente limita-se a ir aviar a receita; não é o utente que escolhe os seus medicamentos.
Sr. Deputado, o que é que cabe ao médico receitar? Então vai culpar-se o utente por causa de um medicamento que é prescrito pelo médico?
Falou-se aqui muito em vitaminas e disse-se que tomadas em excesso fazem mal. Todos sabemos que os medicamentos tomados em excesso fazem mal...
Também a água faz mal, depende só da quantidade em que for administrada... Até o oxigénio, se for administrado na veia, mata uma pessoa. O problema que se coloca é o do modo e da quantidade com que os medicamentos são administrados.
O Sr. Deputado António Bacelar está a culpabilizar o utente que necessita de um medicamento em vez de culpabilizar os serviços de saúde e os médicos que prescrevem da maneira como prescrevem. Sr. Deputado, porque é que o utente, porque é que uma pessoa de idade, que tem um baixo rendimento, tem de pagar mais medicamentos segundo esta tabela?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Sr. Deputado António Bacelar, é evidente que na minha intervenção partilhei das preocupações que todos os Estados têm em assegurar as despesas e em controlar as despesas e em controlar a qualidade...
A Sr.ª Carla Diogo (PSD): - Ah, afinal tem!?
O Orador: - Estou perfeitamente de acordo com essas intenções, tal como estou de acordo quando V. Ex.ª refere que a definição das comparticipações dos medicamentos é um assunto complexo que levanta vários tipos de problemas. Com certeza, ninguém iria defender que numa área deste tipo aparecesse uma lista de medicamentos publicada em decreto-lei ou numa lei da Assembleia da República... Com as modificações que têm de fazer-se todos os dias, isso é evidente!
No entanto, há uma questão que quero colocar-lhe e que, de resto, é a mesma que coloquei na minha intervenção. Neste caso concreto, qual é o comportamento do PSD perante a possibilidade de uma situação complexa, como a que definiu, impedir o que o Decreto-Lei n. º 61/84 permitia, isto é, que a tabela anexa dos medicamentos fosse publicada sob a forma de decreto-lei? Se se mantivesse nessa forma, pensa que a Assembleia da República, tivesse a maioria que tivesse, em qualquer ocasião e não numa ocasião conjuntural - e penso que a política não deve ser vista em termos conjunturais - poderia ajudar a melhorar esse tipo de redacção? Gostava que o Sr. Deputado António Bacelar se pronunciasse sobre isso.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado António Bacelar, notei que pelo seu discurso, com algum espanto da minha parte, perpassou uma certa «nostalgia socialista» e no meu modesto entender, do pior socialismo, do socialismo realista que está a acabar - nós vemo-lo aí a desmoronar-se todos os dias, está em crise, está a desfazer-se.
V. Ex.ª diz que há uma certa racionalidade, «a inteligência do médico combinada com o Estado» - suponho que foi isto que ouvi de V. Ex.ª - «nos países de leste produz um sistema magnífico de distribuição de medicamentos».
Embora repudie inteiramente todas essas nostalgias...
Risos do PSD.
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... devo dizer a V. Ex.ª que estes diplomas, de facto, comungam um pouco dessa sua nostalgia e é precisamente aí que situo a questão que vou colocar-lhe.
Sendo certo que há outros sistemas, alguns deles tão caluniados na altura - mas lá voltaremos - e que no fundo eram profundamente «inocentes» comparados com o que está a passar-se neste momento, o Sr. Deputado não acha que este sistema, para além de implicar uma ingerência acrescida na actividade do médico, de que V. Ex.ª é um ilustre representante, também tem consequências de enorme injustiça por não ter em devida conta (porque deste modo não pode ter!...) as situações concretas tal como se desenham e aparecem e que são de uma riqueza extrema e variada que não se compadece com estes desenhos abstractos que são feitos através deste diploma.
Não acha V. Ex.ª que isto constitui críticas que se podem fazer a este sistema e que no fundo correspondem às que neste momento andam na voz do povo? Não acha que em vez de facilidade está a haver cada vez mais dificuldades?
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Bacelar.
O Sr. António Bacelar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por limitações de tempo vou ter de ser muito telegráfico. Em todo o caso, quero agradecer aos Srs. Deputados que me pediram esclarecimentos a amabilidade de o terem feito.
Sr. Deputado Vidigal Amaro, qualquer médico - e nós somos médicos - é livre de receitar o que muito bem entender. V. Ex.ª sabe muito bem como eu, que pode existir um produto, uma substância activa que é comparticipada e pode haver uma mesma substância activa que não é comparticipada, cabendo ao médico escolher o melhor produto e ajudar o seu doente a utilizar aquele que é mais barato e que lhe faz o mesmo efeito.
Em relação à pergunta do Sr. Deputado Fernando Gomes, que muito agradeço, sobre se estava de acordo com o que conta no diploma que estamos a analisar tenho a dizer-lhe que sim. Não tenho qualquer reserva mental e não acredito, muito sinceramente não acredito que quem está à frente do Ministério da Saúde...
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Não é este, é qualquer Ministério da Saúde!
O Orador: - O ministério este ano já aceitou que cem novos produtos fossem comparticipados. A mim preocupar-me-ia, isso sim, que esta lista de medicamentos fosse estática, quer dizer, que fosse esta e mais nenhuma. Se tenho a certeza de ser verdade aquilo que nós dizemos hoje amanhã não é mentira só porque já apareceu outra coisa melhor. Para evitar isso existe um Ministério da Saúde...
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Não é isso, é a tabela!
O Orador: - É uma questão de critério, Sr. Deputado temos conceitos diferentes, obviamente que sim!
Parece-me que grande parte dos medicamentos essenciais são comparticipados praticamente a 100%. Não quer dizer que não possa haver um outro medicamento que também tivesse necessidade de estar incluído no tal grupo A, mas como se trata de uma lista «dinâmica» estou convencido de que os erros existentes serão contemplados em futuras alterações. Por isso é que acredito que aquilo que está feito está bem!
Sr. Deputado Nogueira de Brito, ao cumprimentar V. Ex.ª queria dizer-lhe que não tenho qualquer «nostalgia» em relação ao socialismo. Muitas vezes, aqui nesta Câmara temos de fazer comparações. Também quero dizer-lhe que nem tudo o que se passa nos países socialistas é mau.
A Sr.ª Carla Diogo (PSD): - Como é evidente!
O Orador: - Há coisas que são melhores, há coisas que são piores, há coisas que se adaptam mais a Portugal e outras não. De qualquer forma, penso que podemos ir buscar coisas positivas aos países socialistas.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Já me estava a parecer isso!
O Orador: - Nesse aspecto estou tranquilo, estou «limpo», como se costuma dizer, não tenho esses pruridos, não tenho «urticária» em relação a isso.
Sr. Deputado comparando o que existe entre nós com outros países - que muitos defendem, lá têm as suas razões as quais eu não contesto -, nós temos uma situação muitíssimo melhor. Tomáramos nós, e com certeza tomaria o Ministério da Saúde, comparticipar todos os medicamentos a 100%. Obviamente não vai comparticipar os sabonetes ou o pó de talco, ou qualquer outra coisa, mas essa nostalgia socialista de que o Sr. Deputado falou não a tenho nem me preocupo com ela.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, repetindo o que já disse, acredito na dinâmica das tabelas tal como acredito que o Ministério da Saúde tem competência suficiente e técnicos suficientemente capazes para modificar as tabelas de acordo com as necessidades.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permito-me assinalar a presença nas galerias de um grupo de alunos da Escola Secundária n.º 2, de São João da Madeira, a quem cumprimentamos e saudamos.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 157/88, de 4 de Maio, reformulando o sistema de comparticipação do Estado no custo de medicamentos prescritos aos utentes no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e da ADSE, enferma, em nossa opinião, de uma tentação irreprimível deste Ministério da Saúde em fazer prevalecer uma filosofia de gestão dos recursos disponíveis do (SNS) Serviço Nacional da Saúde, meramente economicista, privilegiando dimensioná-la em funções dos meios em detrimento dos fins, encarados como objectivos de promoção continua da prestação de cuidados de saúde primários, secundários e terciários.
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Pretendendo-se racionalizar o consumo, restringe-se os direitos dos utentes e limita-se, nos termos constitucionais, a execução dos deveres do Estado em matéria de Saúde. A economia de Saúde, exigindo gestão participada, abrangente e responsabilizada, não se pode nem deve confundir com critérios economicistas, representando, em nosso entender, uma errónea sobreposição de conceitos, que poderão trazer à sociedade graves e penosas consequências.
O decreto-lei em análise obedece a esta linha orientadora de pensamentos, integra-se na política adoptada, adequa-se às pretensões de poupança - com as quais teremos de concordar -, esquecendo-se, no entanto, das realidades sócio-económicas em que se inserem a maioria dos utentes, destinatários e principais lesados pela sua execução prática.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com este documento não sai melhorado o esquema de acesso às prestações medicamentosas, na medida em que a preocupação primordial, que lhe está subjacente, é de carácter quantitativo, através da limitação de ordem económica à aquisição das especialidades farmacêuticas, por parte dos doentes, e da imposição da prescrição das mesmas aos médicos, retirando-lhe a possibilidade de, em liberdade, escolher o medicamento mais adequado em função da situação clínica e dos hábitos adquiridos pelo doente, em caso de tratamentos prolongados.
Com esta legislação é omitido, flagrantemente, o valor placebo de determinados medicamentos, que deve ser respeitado implicitamente em situações particulares em que da sua utilização depende o sucesso do acto médico na sua componente terapêutica.
Quando, em determinado passo, se cita como argumento condicionante da necessidade de moderação e racionalização dos consumos os limitados recursos financeiros do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e da ADSE, impõe-se recordar que é da exclusiva responsabilidade do Governo a atribuição de uma dotação orçamental escassa para o capítulo da saúde, reflexo do nível de priorização que o mesmo tem vindo a dedicar a estes problemas, colocando o nosso país na cauda da Europa em termos de valor percentual do Orçamento do Estado para a saúde, atribuído anualmente.
Ao se manterem os três escalões de comparticipação não significa a inalteração da intervenção pessoal dos utentes no acesso às prestações medicamentosas. Isso depende, fundamentalmente, do tipo de medicamentos que constituirão os escalões e consequentes transferências a registar com todas as implicações que daí advirão, designadamente no tocante às doenças crónicas que maiores custos representam para os doentes e mais graves repercussões podem acarretar, em termos individuais e sociais, de maiores custos para o País.
Daí, ser discutível a prometida garantia de «maior acessibilidade aos medicamentos imprescindíveis em termos de protecção da saúde».
Ao se referir que «a racionalização do consumo dos medicamentos reclama a sensibilização do clínico que os prescreve», o que é necessário pela sua veracidade, não se pode no entanto, aceitar a transferência dessa responsabilidade para o papel exercido pela propaganda médica.
Tal questão deverá envolver factores múltiplos que vão desde a formação ministrada nas Escolas Superiores de Medicina até à criação de incentivos, pessoais e colectivos, a implementar nas instituições prestadoras de cuidados de saúde, que não cabem, assim, em medidas exclusivamente administrativas ou técnico-jurídicas, como é o caso do presente decreto-lei.
No último parágrafo da introdução deixam-se soltar confessadas esperanças no êxito das medidas agora preconizadas.
Para que isso aconteça é necessário registar-se a anuência de todos os agentes envolvidos.
Espera-se que o «processo de avaliação permanente» e a prometida introdução dos «ajustamentos necessários à consecução de melhores resultados no domínio da protecção da saúde» não excluam a análise de eventuais fracassos, que possam existir, e a coragem política de aceitar e assumir críticas, erros ou insuficiências lacunares neles contidas, incutindo-lhe verdadeiramente um efectivo carácter dinâmico.
Julgo oportuno reproduzir despretensiosamente, algumas ideias de Santos Cardoso, por ocasião do Seminário realizado em 1987 e organizado pela SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) tendo por tema: «Que política de saúde para Portugal?» E passo a citar: «A inflação necessária para a optimização da relação custos/benefícios tem de atender à especificidade dos nossos serviços de saúde serem os próprios prestadores de cuidados que têm de decidir a maior parte das despesas, ou seja, no nível operacional.
Se compararmos esta realidade com as regras da Administração Pública propriamente dita, as quais condicionam o complicado controlo burocrático à autorização de todos os gastos, teremos de concluir que a gestão dos serviços de saúde tem de seguir normas próprias.
Porque o prestador de cuidados ao decidir aplicar uma determinada técnica ou tratamento com a despesa consequente, não deve ser cerceado por via administrativa, antes de estar motivado para critérios de eficiência, com a consciência clara da diferença de critérios simples de eficácia. A confirmação de que não há doenças mas sim doentes é normalmente utilizada para fundamentar a imperatividade da humanização dos cuidados. Em nosso entender, deve ter um alcance mais vasto: o mesmo doente, com a mesma patologia pode reagir amanhã de forma diferente à terapêutica que hoje lhe foi aplicada com bom resultado. O diagnóstico, o prognóstico, a terapêutica nunca têm probabilidades absolutas de êxito. Se não há «standards na prestação de cuidados da saúde, essa realidade tem forçosamente reflexos nos critérios a adoptar na gestão dos serviços. Significa que tem de ser salvaguardada a autonomia da decisão técnica operacional, mesmo quando esta implica maiores dispêndios».
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como já tivemos oportunidade de expressar nesta Câmara, numa sessão anterior, não estamos contra a racionalização do consumo de medicamentos, só estamos frontalmente em desacordo com a forma como o Governo o fez, isto é, penalizando o consumidor ao eliminar os produtos dos escalões de participação. Uma medida já por nós preconizada poderia e deveria ser tomada em consideração, bastaria distribuir todos os medicamentos pelos diversos escalões de comparticipação, salvaguardando os medicamentos para doenças prolongadas cuja comparticipação a 100% se manteria, mesmo com o prejuízo de abaixamento de escalão de alguns medicamentos nos escalões B e C.
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Paralela a esta situação verifica-se que não constam na lista quaisquer medicamentos para tratamentos dermatológicos, otorrino, polivitamínicos, laxantes, obstipantes e tónicos. A atender a exposição de motivos, teríamos que concluir que todos estes medicamentos são no conceito do Governo produtos de higiene e conforto, e, em nosso entender, não há justificação nenhuma para tal critério.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Facilmente se depreende que a insatisfação é generalizada. Este diploma não agrada aos médicos e penaliza substancialmente os consumidores. O PRD já em 18 de Junho do ano passado, através de uma sessão de perguntas ao Governo e no caso vertente à Sr.ª Ministra aqui presente, alertou a Câmara para este problema. Um ano quase passado a situação mantém--se inalterável.
Por estas razões, votaremos contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 157/88.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavras o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A XXX Assembleia Mundial de Saúde decidiu em Maio de 1977, que «O principal objectivo social dos governos e da OMS (Organização Mundial de Saúde) nos próximos decénios deveria ser o de facultar a todos os habitantes do mundo, até ao ano 2000, um nível de saúde que lhes permitisse levar uma vida social e economicamente produtivo».
Por sua vez, o Bureau regional da OMS para a Europa, de que Portugal faz parte com mais 32 Estados Membros, traçou directrizes para a Estratégia Regional Europeia da saúde, a fim de se poder atingir «Saúde para todos na Europa no ano 2000».
Em Portugal, o Ministério da Saúde insensível a esta grande onda de solidariedade humana, reduz as verbas para o sector da saúde, estrangula financeiramente os hospitais do sector público, encerra serviços de urgência hospitalar, fecha serviços de especialidade em hospitais, descuida a importância dos cuidados primários de saúde, dificulta o acesso aos serviços de saúde, elege como inimigos principais os profissionais de saúde, e considera os doentes «uma chatice» que só dão despesas.
A Sr.ª Carla Diogo (PSD): - É o sr. Deputado que o diz!
O Orador: - Duas realidades diametralmente opostas; de um lado, as organizações internacionais de saúde, com uma perspectiva humana e solidária para com os problemas da saúde, do outro lado, o Ministério da Saúde Português com uma perspectiva desumana e não solidária e para quem os cifrões contam mais do que os doentes.
O Ministério da Saúde transformou-se assim numa grande mercearia, «onde só é bom o que dá lucro e só é bom se o der».
Sra. Ministra da Saúde, Dr.ª Leonor Beleza, V. Ex.ª é insensível ao facto de existirem em Portugal doentes que não têm dinheiro suficiente para comprar os medicamentos de que necessitam, e que existem muitos outros que gastam mensalmente nas farmácias quase toda a sua pequena reforma.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Na reunião plenária de 17 de Junho de 1988, sessão de perguntas ao Governo sobre a comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, V. Ex.ª afirmou: «em que medida é que é legítimo e razoável ir ao bolso do contribuinte, que são todos os cidadãos, para pagar o que cada um toma». Sr.ª Ministra, seguindo a sua lógica absurda, então feche os hospitais e os centros de saúde, mande encerrar as universidades e as escolas, acabe com os transportes públicos, acabe mesmo com todos os serviços que existem para servir o bem público.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - E o resultado dos exageros economicistas de quem tem uma visão errada dos problemas da saúde traduz-se em: primeiro, o grupo dos antiasmáticos simples, que eram comparticipados a 100%, passaram agora a ser comparticipados somente a 80%, afirmando V. Ex.ª que «fizemos isso por entendermos que a gravidade da doença em causa (asma) não é semelhante à gravidade das doenças que estavam, e estão, colocadas nos medicamentos comparticipados a 100%. É caso para perguntar em que faculdade de medicina se aprendem enormidades como esta? Na verdade, a asma é tão grave, ou mais, do que a diabetes, a epilepsia, a doença de Parkinson e outras.
Segundo, a psoríase, que em Portugal atinge 2 a 3% da população, deixou também agora de ter qualquer comparticipação na sua medicação mais eficaz. Dir-se-á que restaram os corticosteróides de aplicação tópica, mas estes estão hoje internacionalmente contra-indicados em situações de cronicidade, como é o caso da psoríase.
Terceiro, já que estamos na área das doenças dermatológicas, constatamos também que agora muitos medicamentos essenciais para o seu tratamento, como é o caso do peróxido de benzoilo, do sulfureto de selénio, e de outros produtos, deixaram de ter qualquer comparticipação, e ao mesmo tempo mantém-se a comparticipação de associações medicamentosas praticamente anárquicas e de duvidosa acção terapêutica.
E porque o tempo escasseia, abordarei apenas mais um grupo de medicamentos, o das vitaminas. Vários trabalhos internacionais apontam para a necessidade dos idosos tomarem suportes vitamínicos, dado que apresentam uma acentuada diminuição da absorção intestinal das vitaminas alimentares, situação esta que assume particular gravidade no caso português, pois, são conhecidas as carências vitamínicas na nossa alimentação.
Sr.ª Ministra da Saúde, e os lactentes? E o caso dos doentes cancerosos que à anorexia se associam graves perturbações metabólicas, e que necessitam, para além da alimentação normal, de substanciais suportes polivitamínicos? E as mulheres que sofrem de cancro da mama, e cujo tratamento exige forte suporte polivitamínico? Aliás, de acordo com trabalhos publicados pelo Instituto Gustav Rossi, em França, instituição que nesta matéria tem desenvolvido importantes trabalhos de investigação.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As listagens de medicamentos comparticipados, que tem vindo a ser publicadas pelo Ministério da Saúde, indiciam também preocupantes sinais de desactualização em matéria de eficácia terapêutica, pois, constatamos que: deixaram de ser comparticipados medicamentos considerados importantes e mesmo imprescindíveis para o tratamento de graves doenças da pele, e no entanto mantém-se a comparticipação de outros, constituídos por várias associações contra-indicadas, como é o exemplo do medicamento X que contém, nem mais nem menos, do que quatro fármacos diferentes: um antibiótico, um antimicótico, um anti-histamínico, e como se já não fosse suficiente, tem também um corticosteróide; Continuam também a comparticipar-se a 100% medicamentos que foram já retirados do mercado, há mais de 10 anos, em vários países da Europa, dado que apresentam efeitos secundários graves (acidose láctica), como é o caso dos anti-diabéticos orais derivados da fenformina.
Finalmente, continuam a figurar na listagem de medicamentos comparticipados algumas especialidades farmacêuticas já ultrapassadas, como é o caso de alguns citostáticos (Leucoverina, Masteran).
Sr.ª Ministra da Saúde, peço escusa pelo que lhe ocupei com problemas que dizem respeito aos doentes. V. Ex.ª preferiria, certamente que se discutissem os milhares de contos que o Ministério da Saúde ganhou com estes cortes na comparticipação dos medicamentos, mas, infelizmente, já nos habituámos a constatar que quando V. Ex.ª ganha, os doentes perdem e a saúde em Portugal diminui.
Aplausos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados António Bacelar e Luís Filipe Menezes.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, utilizando a figura da interpelação à Mesa gostaria de fazer um protesto.
Sr. Presidente, estamos aqui a encarar este problema com toda a seriedade e demonstramos a nossa preocupação nesta matéria. Lamentamos, por isso, que o Sr. Secretário de Estado-Adjunto da Sr.ª Ministra durante a intervenção do deputado da minha bancada, tenha adoptado um comportamento que não é muito próprio para a Câmara, fazendo gestos e «tocando violino». É contra essas atitudes que nós protestamos.
Aplausos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, a Mesa não faz qualquer comentário à matéria do protesto apresentado porque até ao momento não se apercebeu de qualquer atitude menos adequada ou menos correcta por parte do Sr. Secretário de Estado.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, que dispõe de três minutos.
O Sr. Luis Filipe Menezes (PSD): - Sr. Deputado João Rui de Almeida, o interesse da sua intervenção é evidente, mas, antes de me referir a ela, gostaria de, na primeira parte deste pedido de esclarecimento, utilizando, portanto, esta figura que me é permitida pelo Regimento, responder ao Sr. Deputado Fernando Gomes, porque há pouco não o fiz.
Assim, Sr. Deputado, passo a citar: «No lactente as necessidades vitamínicas são satisfeitas pelo regime alimentar normal, salvo no que se refere à vitamina D e em certos casos à vitamina C.
O hábito corrente de ministrar gotas de outros solutos polivitamínicos, embora criticável, não tem inconvenientes desde que se tomem cuidados rigorosos à sobredosagem de outras vitaminas como, por exemplo, a vitamina A.
A utilização da própria vitamina C é dispensável, à luz de novos conceitos, desde que haja um regime alimentar normal».
Estas «enormidades» foram escritas há poucos meses pelo Sr. Nicolau Fonseca, pelo Prof. Carmona da Mata e pela Dr.ª Celsa Afonso.
Sr. Deputado João Rui de Almeida, na sua intervenção V. Ex.ª escamoteou algumas questões importantes, entre as quais por exemplo a de que este regime de comparticipações definido pelo Governo está de acordo com aquilo que são os padrões de comparticipação europeia e, inclusivamente vai muito além daquilo que se faz em alguns países europeus. Lembro por exemplo, que os tranquilizantes, onde o Estado gasta cerca de 5 a 6 milhões de contos por ano, não são comparticipados em grande parte dos países europeus como, por exemplo, a Itália, onde há cerca de dois meses saíram da lista de comparticipações.
Esta medida do Governo é uma clara medida realista e de justiça social. E porquê? Porque visa cortar com gastos supérfluos ou relativamente dispensáveis para subsidiar a 100, a 50 ou a 80% medicamentos essenciais a todos nós. É uma medida que visa viabilizar um sistema de saúde em que os mais desfavorecidos tenham a saúde, tanto quanto possível gratuita.
Mas isto VV. Ex.ªs não querem, o que os Srs. Deputados pretendem é o que o sistema «rebente»!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Bacelar.
O Sr. António Bacelar (PSD): - Sr. Deputado João Rui de Almeida, devo dizer-lhe que, como já é hábito, não gostei mesmo nada do seu discurso.
O Sr. José Lello (PS): - Os discursos não se fazem para o Sr. Deputado gostar!
O Orador: - Bem sei que VV. Ex.ªs não fazem os discursos para eu gostar!...
Sr. Deputado, na verdade, chocou-me um pouco que V. Ex.ª dissesse que os doentes são uma «chatice» e, nesse sentido, gostaria de salientar que não considero os doentes dessa maneira.
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Será por isso que V. Ex.ª convida o Ministério da Saúde a fechar os hospitais, os centros de saúde e todas as outras estruturas de saúde?
E gostaria ainda de saber se o Sr. Deputado com esta lista de medicamentos ou com outra é capaz descurar a psoríase.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - É para interpelar a Mesa, Sr. Deputado?
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Não, Sr. Presidente! O Sr. Deputado Luis Filipe Menezes, na intervenção que fez há pouco, referiu o meu camarada Fernando Gomes, mas a referência era-me dirigida, porque fui eu que disse: «santa ignorância» quando o Sr. Deputado se referia às vitaminas.
Por esta razão, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, na intervenção do Sr. Deputado Luís Filipe Menezes podem considerar-se dois momentos: no primeiro, o Sr. Deputado disse que toda a gente desaconselhava as vitaminas às crianças - até os pediatras não as aconselhavam. E a propósito disso manifestei a expressão: «santa ignorância».
Posteriormente, o Sr. Deputado referiu também que, as vitaminas C e D eram necessárias.
Assim, conclui-se que as vitaminas sempre são necessárias para a profilaxia de determinadas doenças!
Eis a razão que me levou-a dizer: «santa ignorância».
No entanto, retiro a expressão, pois se a referi não foi com intenção de chamar ignorante ao Sr. Deputado, foi apenas uma maneira de dizer.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Luis Filipe Menezes.
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Deputado Vidigal Amaro, devo dizer-lhe que V. Ex.ª ouviu mal.
Com efeito, na intervenção que fiz há pouco disse que os polivitamínicos não eram necessários e V. Ex.ª, porque ouviu mal, chamou-me ignorante, e com toda a razão, pois se, de facto, eu tivesse referido a palavra vitaminas era ignorante.
No entanto, V. Ex.ª, no seguimento da minha intervenção, poderia ter constatado que hão se tratava de ignorância, uma vez que referi quê as vitaminas C e D eram indispensáveis, e essas, casualmente, são comparticipadas pelo Estado a 100%.
Risos do PSD.
A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Natália Correia pede a palavra para interpelar a Mesa?
A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Não, Sr: Presidente, é para. pedir esclarecimentos ao Sr:. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. Presidente: - Não pode, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Porquê, Sr. Presidente?
Risos gerais:
O Sr. Presidente: - Porquê a Sr.ª Deputada não se inscreveu há altura devida, que seja, durante ou logo após a intervenção do Sr. Deputado João Rui de Almeida. Entretanto, outras figuras regimentais foram utilizadas pelos Srs. Deputados e, neste momento, a Mesa só poderia conceder a palavra à Sr.ª Deputada para uma intervenção.
À Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, é para uma intervenção muito breve.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo forçada a fazer uma intervenção, ela vai ter que ser muito breve, pois é apenas para manifestar, mais uma vez, a minha estranheza ao verificar que a questão da Europa se está a transformar num cómodo «nariz de cera», para justificar muitas injustiças sociais, que se praticam no nosso país.
A verdade é que no caso vertente - e a propósito do que disse um Sr. Deputado do PSD - não podemos comparar a indigência económica de grande parte da população portuguesa, com o nível de vida que têm os reformados que precisam de ter acesso a esses medicamentos, com os salários das pessoas dessa Europa que nos está a servir, sistematicamente, de exemplo para praticar: as piores injustiças sociais.
Vozes do PRD, do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Rui de Almeida, a Mesa apresenta-lhe desculpas por não lhe ter concedido a palavra na altura devida no sentido de V. Ex.ª dar resposta aos pedidos de esclarecimento formulado?
Com efeito, verificou-se uma precipitação da Mesa ao dar a palavra em primeiro lugar à Sr.ª Deputada Natália Correia.
Mas tudo começou com um pedido de. defesa da honra intercalado entre pedidos de esclarecimento, que, nos termos regimentais, tem prioridade.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de salientar que, há pouco, enquanto eu falava o Sr. Secretário de Estado «tocava violino».
A partir deste momento, ficamos com mais um dado acerca do Sr. Secretário de Estado o de que tem jeito para muita coisa e também para tocar violino.
Risos.
Em relação aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Bacelar e Luís Filipe Menezes, gostaria de dizer que os Srs. Deputados mais uma vez demonstraram que o importante são os cifrões, pois os doentes. São uma «chatice».
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A Sr.ª Carla Diogo (PSD): - É o Sr. Deputado que o diz!
O Orador: - ... que só dão despesa!
Chamaram-me também os Srs. Deputados a atenção para os padrões europeus.
Tenho aqui um livro de 1988, uma publicação da CEE, onde se diz que em gastos per capita em ECUS's Portugal é o País que tem menos gastos per capita em produtos farmacêuticos, ou seja, gasta apenas 45 ECU's.
A Sr.ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza): - Não é verdade!
O Orador: - Sr. Deputado António Bacelar, V. Ex.ª disse que não gostou do meu discurso. Fico-lhe grato, porque consegui alcançar os meus objectivos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Castel Branco.
O Sr. José Castel Branco (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É sempre com preocupação e com sentimento de profundo desgosto que vemos o Governo e a maioria parlamentar que o apoia, reduzir os benefícios sociais a que a população tem legitimamente direito, quanto mais não seja, por imperativo da Constituição da República.
Com preocupação e desgosto, todavia sem espanto, já que, Governo e maioria, apostados numa acção puramente tecnocrática e economicista, vêm esquecendo os valores da solidariedade social e humana, sem lhes passar pelo espírito que não pode ser contabilizado o sofrimento da pessoa humana, quando atingida pelo padecimento físico ou psíquico gerado pela doença, pelo desgaste dos anos ou pela agressão do meio ambiente.
Só nesta perspectiva se compreende o Decreto-Lei n.º 157/80 e significativa parte do seu preâmbulo: a ladainha de lamúrias que contém, e que não são mais do que falsos pretextos utilizados para tentar diminuir o deficit, metendo a mão no bolso dos contribuintes, daí arrancando os parcos recursos que, com sacrifício da sua alimentação, da educação dos filhos, da qualidade da habitação e do vestuário, do prescindir dos auxílios mecânicos para a actividade doméstica, da utilização de meios de formação cultural, os poucos recursos - dizia - para que com eles tenham de pagar os medicamentos que aliviem os seus sofrimentos e melhorem a sua qualidade de vida, já tão degradada. Digamos desde já que as maiores vítimas são porventura as crianças e os idosos, muito possivelmente reformados para quem os tão propagandeados aumentos das pensões não chegam para fazer face ao aumento das despesas com os medicamentos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A argumentação utilizada pelo Governo no texto do Decreto-Lei n.º 157/88 peca desde logo por um pequeno defeito, o qual é de ser falacioso e falso.
Tentaremos demonstrá-lo com um pequeno exercício.
A Comissão de Saúde desta Câmara visitou o Hospital de Santo António, no Porto. Pelo seu director lhe foi gentilmente oferecido um volume intitulado «Relatório Anual de 1986 - Plano de Actividades para 1988».
É com base nos elementos fornecidos nesse documento, no que respeita ao movimento de doentes e diagnósticos mais frequentes que baseamos o exercício que proponha a VV. Ex.ªs. Os cálculos serão feitos por defeito, por razões cautelares, já que o Ministério da Saúde não torna públicas as contas do Serviço Nacional de Saúde (SNS) desde 1985.
A título introdutório diremos que os hospitais utilizam medicamentos adquiridos na base de um concurso da responsabilidade da Secretaria Geral do Ministério da Saúde, menos frequentemente, em concursos locais, especialmente no que respeita aos hospitais distritais, neste caso, aliás, com desvantagem dos preços conseguidos.
Tomemos como exemplo três serviços hospitalares: Medicina Interna, Cardiologia e Urologia.
Tomemos alguns medicamentos com grande probabilidade de serem utilizados nesses Serviços Hospitalares e que seriam:
Na Cardiologia:
Amiloride mais a tiazida - Custa ao Hospital 9.30 esc. Custo na farmácia 27.00 esc. A que corresponde uma diferença para mais de 290%.
O Propanolol - Custa ao Hospital 3.48 esc./Custo na farmácia 8.16 esc. O que corresponde uma diferença para mais de 242%.
O Dinitrato de isossorbido - Custa ao Hospital 3.90 esc./Custa na farmácia 7.03 esc. O que é uma diferença para mais de 182%.
A Nefedipina - Custa ao Hospital 15.18 esc./Custa na farmácia 24.10 esc. O que é uma diferença para mais de 152%.
Na Urologia por exemplo, o Trimetoprim mais o Sul-fametoxasol - Custa ao Hospital 3.88 esc./Custa na farmácia 18.55 esc., a diferença para mais é de 478%.
Na Medicina Interna, por exemplo, a Vincamina - Custa ao Hospital 10.70 esc./Custa na farmácia 18.75 esc., a que corresponde uma diferença para mais de 175,2%.
O Piracetam - Custa ao Hospital 8.21 esc./Custa na farmácia 18.55 esc., a que corresponde uma diferença para mais de 285%.
Se considerarmos, o que não é absurdo, que o doente quanto tem alta do hospital vai medicado e com receita passada, para continuar o tratamento até ser controlado pelo seu médico no Centro de Saúde; se considerarmos que é razoável um período de 15 dias entre a alta hospitalar e a consulta no Centro de Saúde; se considerarmos que o doente, ao ter alta do hospital, poderia levar consigo a medicação para esse intervalo de tempo, com medicamentos fornecidos pelo hospital, beneficiando das diferenças de preço atrás referidas; se considerarmos que com a patologia atrás referida, têm alta, anualmente, no Hospital de Santo António em Cardiologia 722 doentes, em Urologia 721, em Medicina Interna 2162 doentes poderemos ter uma ideia do que representa a poupança, em termos financeiros, entre fornecer aos doentes os medicamentos e fornecer as receitas: são dezenas de milhares de contos.
Se considerarmos não apenas o Hospital de Santo António mas todos os outros hospitais centrais e todos os hospitais distritais, compreenderão VV. Ex.as o volume das verbas que estão em jogo.
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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primário (DGCSP) gere um laboratório de produtos farmacêuticos que, comprando a matéria-prima em «barricas», passo o termo fabrica os comprimidos que em pequenos sacos de plástico são entregues aos doentes portadores de tuberculose. Esse laboratório trabalha a 20% da sua capacidade de utilização, como sabe, Sr. Secretário de Estado. Imaginem VV. Ex.ªs que esse laboratório estendia a sua actividade aos Hospitais Psiquiátricos, que resultaria daí em termos de poupança do ponto de vista financeiro?
Imaginem VV. Ex.ªs que esse laboratório estendia a sua acção às instituições de solidariedade social, quer em regime de alojamento total quer em alojamento de dia, para certos tipos de medicamentos e adicionando a vantagem da toma directa, fortemente poupadora de desperdício, como é bem sabido.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por estes singelos exemplos se vê que com alguma imaginação e trabalho se diminuiriam custos e se criariam fundos que permitiriam acrescentar benefícios e não diminui-los.
Assim sendo, como poderia o PS deixar de propor que se mantenha a comparticipação a 100% à medicação que já estava nessas condições?
Propor que aumente a comparticipação do Estado em certos grupos de medicamentos como os anti--reumáticos, os anti-hipertensores, os destinados à cardiopatia isquémica, por exemplo, para os carentes económicos, entendidos no sentido dos que, reformados, possuem uma reforma de valor inferior ao salário mínimo nacional, desde que isentos do IRS.
A nossa posição e propostas aí estão.
À maioria cabe assumir, para a História, as suas responsabilidades, perante aqueles que, minados pela doença e pelo sofrimento, para ela dirigem um olhar de esperança.
Aplausos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - A Mesa informa o Sr. Deputado Nogueira de Brito, que está inscrito a seguir para pedir esclarecimentos, de que o PS já não dispõe de tempo.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Nesse caso, prescindo da palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Delerue, que dispõe de meio minuto.
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Telegraficamente, pois a seguir aos números vêm mais números.
Há pouco foi dito nesta Câmara que Portugal tinha o índice per capita de gastos de medicamentos mais baixo da Europa. Isto é uma mistificação. E por quê? Porque Portugal tem também a população mais jovem da Europa e o Sr. Deputado sabe-o, pois referiu-o aqui, assim como também sabe que em termos de consumo de medicamentos os números sobem exponencialmente a partir dos 55 anos de idade e significativamente a partir dos 35 anos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Já é mais realista e sério - e convém dizê-lo aqui - referir o número do consumo de medicamentos em relação ao PIB. E em relação a isso ou o Sr. Deputado Vidigal Amaro ou o Sr. Deputado Fernando Gomes, no início deste debate, já referiram os números relativos ao consumo de medicamentos, que são de facto assustadores, nomeadamente porque não podemos esquecer que fazemos comparações, na maior parte dos casos, em relação ao Orçamento do Estado, ou melhor, aos gastos públicos, entrando com dados que não são iguais em todos os países da Europa Ocidental. Portugal tem uma dívida pública muitíssimo grande e se as comparações foram feitas sem entrar com a contabilização dessa dívida ou se a nivelarmos em relação à dívida média dos países da Europa Ocidental, os números serão extraordinariamente mais significativos.
Penso que a seriedade com que esta questão foi aqui colocada obrigaria todos os deputados a não mistificarem as questões e a não deturparem alguns dados que podem eventualmente ter algum eco, em termos de comunicação social, mas que são perfeitas, claras e inequívocas mistificações.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jorge Catarino (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Jorge Catarino (PS): - Para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - É regimental, pois o Sr. Deputado Nuno Delerue acaba de fazer uma intervenção.
Tem a palavra, dispondo para o efeito de dois minutos.
O Sr. Jorge Catarino (PS): - Penso que toda a Câmara ficou...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Perdão, Sr. Deputado. O Sr. Deputado Jorge Catarino tinha direito a fazer um protesto dentro de um tempo que lhe esta atribuído globalmente. Uma vez que o PS já não dispõe de tempo, não poderá fazer o seu protesto.
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Não tem tempo, nem matéria!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peça a palavra para exercer o direito de defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Peço imensa desculpa, Sr. Deputado Jorge Catarino, mas não pode fazer o seu protesto. O PS já não dispõe de tempo. A Mesa está com algumas dificuldades em gerir este debate, na medida em que os tempos estão muito limitados, portanto não pode admitir regras que não sejam as estritamente regimentais.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
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A Sr.ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É hoje submetido a processo de ratificação parlamentar o Decreto-Lei n.º 157/88, de 4 de Maio, que reformulou o sistema de comparticipação no custo dos medicamentos.
Nunca é demais relembrar qual é a verdadeira natureza da questão que ora nos ocupa, bem como traçar-lhe as fronteiras com questões comuns, mas distintas, com que vezes demais é confundida.
Esta questão, sobre a qual basicamente centrarei a minha intervenção, consiste em saber, em primeiro lugar, que medicamentos devem ser pagos pelo Estado em benefício do cidadão que os compra e presumivelmente os tomará; e em saber, em segundo lugar, e em relação aos medicamentos a serem pagos pelo Estado, a medida em que o deverá fazer, se na totalidade, se em parte, e neste caso em que parte.
Quando o Estado paga, através do Serviço Nacional de Saúde, usa o dinheiro dos impostos que todos pagamos.
E assim, a questão resume-se ao seguinte: quando a um cidadão é prescrito pelo médico que tome um medicamento, e esse cidadão se dirige a uma farmácia e o compra, deve esse cidadão sozinho pagar o preço desse medicamento do seu bolso ou devem todos os cidadãos do País ajudá-lo a pagar ou até aliviá-lo totalmente da despesa?
A saúde dos cidadãos é um bem preciso que qualquer Estado civilizado assume como coisa pública em grande medida a seu cargo. Por isso, emprega o dinheiro dos contribuintes, de todos nós, no financiamento da prestação de cuidados de saúde.
E financia, nomeadamente, o custo dos medicamentos de que os cidadãos precisam. Mas é bom que sempre tenhamos presentes que esse Estado que paga não é qualquer entidade estranha a todos nós, que tenha recursos inesgotáveis, mas somos todos nós, todos nós com a totalidade e a insuficiência de recursos de que dispomos.
E assim, Srs. Deputados, quando o Ministro da Saúde toma uma decisão de incluir um medicamento na lista dos medicamentos comparticipados, está a determinar que todos os cidadãos pagarão aquilo que apenas um compra e que, esperamos, tome.
Com a mesma legitimidade com que me é perguntado porque é que um medicamento não é comparticipado, em nome de quem tem de o tomar, poderia ser-me perguntado porque é que um outro é comparticipado, em nome de todos os cidadãos que o têm de pagar.
Posto isto, que novidade traz o Decreto-Lei n.º 157/88?
Basicamente, mantém os escalões de comparticipação, que já anteriormente existiam: pagamento a 100, a 80 ou a 50% pelo Estado, consoante o efeito terapêutico da categoria de medicamentos em causa.
Esse sistema, que, aliás, na altura aumentou largamente a factura de medicamentos, entrou em vigor por decisão do governo do bloco central no dia 1 de Outubro de 1985 - lembro que no dia 6 seguinte tinham lugar as eleições, que, aliás, conduziram ao primeiro governo de Cavaco Silva.
As modificações que tiveram lugar quanto à inclusão ou não nos escalões foram tomadas com base em critérios rigorosos aplicados por uma equipa de farmacologistas e outros especialistas e não constam do decreto-lei em apreço, cujo texto dispositivo não as
impõe. Mas ninguém tocou, nem podia tocar, no poder de ratificação ou no poder legislativo em geral da Assembleia da República. Aliás, as modificações são amplamente compensadas pelo sucessivo alargamento com mais frequência do que até à nova legislação da comparticipação, a novas especialidades farmacêuticas, incluindo, nomeadamente, diversos citostáticos, de preço muito elevado e pagos pelo Estado a 100%. É espantoso que agora se critique o alargamento mais rápido da lista de medicamentos comparticipados, a menos que, finalmente, se estejam a preocupar com os contribuintes. Aliás, acabo ainda de assinar despachos que determinam o pagamento, também integral, pelo Estado de medicamentos para certos doentes crónicos, com quem se justifica um tratamento especial: os insuficientes renais crónicos e os que sofrem de paramiloidose e de fibrose quística.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - A grande novidade que, essa sim, consta no texto do decreto-lei tem a ver com a consideração, expressamente consagrada, do preço do medicamento como elemento a ter sempre em conta quando se decide comparticipá-lo ou não. É do n.º 2 do artigo 2.º que isto resulta quando ao primeiro, e até então único critério da eficácia terapêutica, se junta o segundo e novo critério: entre medicamentos similares e de qualidade semelhante são comparticipados os que proporcionem maior economia de meios.
E claro que cada um está no seu pleno direito se quiser escusadamente pagar mais para tomar um medicamento de uma certa marca em detrimento de outro mais barato que tenha o mesmo efeito. É claro também que só regras de carácter não jurídico poderão levar o médico a não prescrever o tal medicamento escusadamente mais caro. Mas é igualmente claro que não deve o Estado obrigar todos os outros cidadãos a pagar a eventual preferência do médico ou do doente, com isso desbaratando sem vantagem para este último os impostos que todos pagamos.
Trata-se, Srs. Deputados, não de violar a liberdade de prescrição do médico - que a mantém - não de violar a liberdade de compra e ingestão de medicamentos pelo doente - que não a perde -, mas de defender a liberdade de todos os cidadãos não pagarem mais impostos do que aqueles que são necessários ao preenchimento pelo Estado com equidade da função de promover a saúde de cada um.
E, já que estamos a falar de preços convém acrescentar três coisas.
Primeiro, quando o preço é mais baixo lucram todos os cidadãos. Lucra o doente que compra e toma o medicamento, porque paga menos. Lucram todos os outros, porque pagam também menos. É claro que não cometo a ingenuidade de pensar que não há quem lucre menos com os preços mais baixos, mas não são os interesses desses que me cabe defender.
Segundo, aprovou o Governo em Agosto do ano passado uma nova metodologia de fixação de preços, que substituiu o sistema que vinha do governo do bloco central. Este último determinou que o preço do medicamento era fixado com base na média dos dois preços mais elevados em três países de referência; resultado, os preços dos medicamentos são em Portugal mais elevados em 1% em média do que em Espanha. A nova metodologia que aprovámos refere o preço em
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Portugal ao mais baixo preço dos três países de referência.
Terceiro, o novo sistema de comparticipação dos medicamentos mostrou já amplamente a sua eficácia. Com efeito, em relação às novas especialidades farmacêuticas que têm vindo a ser comparticipadas, desceu em média 21% o preço inicialmente proposto até ao preço finalmente fixado. Isto é, em virtude das novas regras, as entidades que comercializam os medicamentos aceitaram baixar o preço para que ele fosse comparticipado. Por cada embalagem, o cidadão que o compra e o Estado que o comparticipa, pagam menos 21% do que pagariam com o anterior sistema.
Algumas considerações são ainda de fazer.
A factura em medicamentos do Serviço Nacional de Saúde vinha sucessivamente crescendo em termos absolutos e em termos relativos, constituindo uma percentagem da factura em global sem paralelo em outros países e o dobro sensivelmente em percentagem sobre o PIB, como há momentos foi referido. Não eram manifestamente os doentes quem lucrava com tal situação. É claro que o que se gasta em medicamentos não pode ir para construir e equipar hospitais, para os manter, para fazer prevenção da doença e promoção da saúde ou para pagar aos profissionais.
O nível do consumo dos medicamentos não constitui, aliás, um índice minimamente seguro das reais condições de saúde. Por exemplo, nos Estados Unidos e no Japão o consumo per capita é três vezes superior ao do Reino Unido e os índices assistenciais são piores.
Finalmente, e para quem julgue que somos comparativamente pouco generosos na forma como obrigamos todos os cidadãos a pagar o que cada um de nós toma, um dado tranquilizador: o Estado paga, em Portugal, 67,2% da factura total dos medicamentos contra uma média nas Comunidades Europeias de 61,%. Repito, em Portugal o Estado paga do total da factura de medicamentos 67,% contra uma média nas Comunidades Europeias de 61,2%.
Estamos perante um sistema equilibrado e equitativo, generoso quanto possível, realista na medida do necessário.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.
O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Sr.ª Ministra da Saúde, ouvi com atenção a sua intervenção, há, no entanto, um aspecto em que, sinceramente, fiquei com dúvidas.
Quando a Sr.ª Ministra disse que o Governo não tocou na capacidade nem no poder de ratificação fiquei sem saber se se referia à intervenção que proferi. E a minha dúvida é esta: é que o Governo ao retirar, comparativamente ao Decreto-Lei n.º 68/84, a tabela anexa que classifica os medicamentos e não a lista - é evidente que era impensável que isso pudesse ser feito por decreto-lei ou por lei da Assembleia - vai impedir que ela possa efectivamente ser apreciada em sede de ratificação. Está em portaria e como tal não pode efectivamente ser referida. Pode ser referida aos escalões e aos conceitos que lá estão. Penso que este é um conceito jurídico pacífico, no entanto a Sr.ª Ministra o dirá.
Em relação à questão da comissão que referiu, dos técnicos, ouvi falar em «mundo farmacêutico», mas provavelmente não têm só farmacêuticos terá também outros especialistas. No entanto, já tivemos oportunidade de dizer-lhe que, na prática, essa comissão, pelos resultados que têm vindo nas listas, não tem efectivamente mostrado ter conhecimentos adequados à prática clínica diária.
Em relação ao aspecto de informação - e a Sr.ª Ministra só pode responder por aquilo que efectivamente é responsável em termos de Ministério da Saúde -, gostaria que a Sr.ª Ministra nos dissesse se concorda com a actual política da Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos, da sua responsabilidade, em termos de informação e formação aos profissionais de saúde no que diz respeito aos medicamentos em causa.
Por último, sugiro que a Sr.ª Ministra me diga se efectivamente o seu ministério, o seu Governo, neste momento, tem capacidade para controlar a qualidade dos medicamentos.
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Deputado Fernando Gomes, quando eu disse que o Governo não tocou nem devia tocar no poder ou na capacidade de ratificação, referia-me ao seguinte: consta do decreto-lei - como o Sr. Deputado sabe - que o Ministro da Saúde fixa os escalões de comparticipação. Cabe, pois, à Assembleia da República, em processo de ratificação, saber se deixa que o decreto-lei fique ou não com essa configuração. Logo, é óbvio que a Assembleia da República tem o poder de negar a ratificação ou de alterar o diploma, se for caso disso. Portanto, em relação a isso, não vejo que haja qualquer espécie de dúvida.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, a questão da formação e da informação dos profissionais de saúde é obviamente uma questão extremamente importante e presumo que o Sr. Deputado se esteja a referir à possibilidade de informação dos profissionais de saúde, em relação ao custo real dos medicamentos, aos respectivos efeitos, e a esse tipo de questões.
Já uma vez tive ocasião de dizer na Assembleia - e hoje posso confirmar isso - que nos estamos a preparar para introduzir em Portugal, pela primeira vez, instrumentos que designamos por fichas de transparência. Embora presuma que o Sr. Deputado saiba do que se trata, em todo o caso, permito-me dizer que se trata de documentos que contêm dados sobre os efeitos terapêuticos dos medicamentos e a relação custo/benefício entre as várias alternativas possíveis. Do nosso ponto de vista, é um instrumento precioso de trabalho que permite aos profissionais, no momento em que têm de tomar uma decisão conhecerem com grande rigor as alternativas possíveis e os respectivos custos.
Quanto à questão do controlo de qualidade, posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que estamos neste momento numa situação diferente daquela em que estávamos até há algum tempo, na medida em que passou para o Ministério da Saúde um laboratório que existia e que tem potencialidades que estamos agora a começar a explorar. Trata-se do laboratório da ex-Comissão Reguladora de Produtos Químicos e Farmacêuticos. Com base naquilo que este laboratório e o do INSA contêm, vamos montar um novo organismo - que ainda não foi publicamente anunciado, mas estou a fazê-lo
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neste momento -, cuja missão fundamental vai ser o controlo de qualidade dos
dos medicamentos.
Tem o Sr. Deputado razão quando deixa implícito que até hoje não temos disposto de instrumentos suficientes para avaliar a qualidade dos medicamentos. Essa é obviamente uma função extremamente importante que vamos, dentro de muito pouco tempo, com essa nova instituição que estamos a preparar, ser capazes de assegurar plenamente.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Benefício, obviamente, ao fazer esta intervenção, do facto de ter ouvido as palavras da Sr.ª Ministra da Saúde, palavras que me confirmam uma ideia que tinha há muito: a de que V. Ex.ª introduz normalmente um vício lógico nas suas intervenções, isto é, invoca em favor das soluções que vem aqui defender, razões de valor absoluto quando essas soluções têm obviamente um valor apenas relativo.
Assim, a Sr.ª Ministra abriu hoje o seu debate com considerações gerais de justiça social relacionadas com o problema da comparticipação nos medicamentos e colocou esta Câmara perante a seguinte questão: «Temos de decidir, de uma ver por todas o que é justo. Quando um cidadão vai a uma farmácia deve ou não pagar o seu medicamento? E que medicamento?» E esta é uma questão geral, absoluta, digamos assim.
E depois disse que o dinheiro que vai para a comparticipação de medicamentos não pode ir para construir ou equipar hospitais.
Sr.ª Ministra, pena é que esses critérios de natureza geral, os critérios absolutos do pensamento de V. Ex.ª, que suponho serem os do Governo, e que nos traz periodicamente à Câmara, apenas aflorem em soluções parcelares e circunstâncias e não em soluções verdadeiramente gerais para os problemas.
Porque, Sr.ª Ministra, o que está realmente em causa e desperta a atenção das pessoas neste aspecto da comparticipação é o facto de V. Ex.ª querer resolver por este meio um problema que se coloca ao seu ministério e que é o da escassez de meios. Temos tido ocasião de tratar este problema na oportunidade correcta, que é a da discussão do Orçamento, mas na qual V. Ex.ª - honra lhe seja feita - tem posto sempre em primeiro lugar a solidariedade governamental que deve à equipa em que está inserida, de tal modo que não nos permite e não nos beneficia com a discussão franca desse problema.
A questão, Sr.ª Ministra, é a de saber até que ponto é que podemos gastar em saúde a percentagem actual do produto interno bruto. Até que ponto, em termos absolutos, e até quando podemos continuar com o sistema que temos?
A Sr.ª Ministra sabe que a maioria desta Câmara tem sensibilidade para esse problema: tem sensibilidade o seu partido, que até já tem a nostalgia de soluções mais rigorosas e - como disse há pouco - mais colectivizantes para o poder resolver; tem sensibilidade o Partido Socialista, apesar de tudo o que, correctamente, disse hoje aqui - e demonstra-o a posição que tomou em sede de revisão constitucional; tem sensibilidade o meu partido; só não sei se tem sensibilidade o Partido Comunista, que é, nesta matéria, um partido sempre mais preocupado com a distribuição do que com a produção, com o gasto do que com a angariação dos meios para gastar... E peco-lhe desculpa, Sr.ª Ministra de não ter possibilidade de discutirmos mais largamente este problema!...
A questão, Sr.ª Ministra, é que todos nós somos sensíveis a este problema, mas gostávamos de discuti-lo amplamente, sem sermos confrontados com ele através de soluções mais ou menos disfarçadas como as que têm sido aqui trazidas por V. Ex.ª De facto, V. Ex.ª trouxe-nos sempre e apenas pequenas alterações como foi o caso do regime das carreiras médicas, logo no início do seu consulado - lembra-se bem disso!... - o mesmo acontecendo agora em sede de comparticipação de medicamentos. E são soluções de tal maneira disfarçadas que um deputado do seu partido até disse que este diploma era igual ao que visava substituir...! Por isso, perante esta simplicidade de afirmação, seríamos levados a concluir: então para quê substituir? Mas não é bem assim, pois a estrutura do diploma cuja ratificação estamos a apreciar é efectivamente a mesma. Vão longe, na verdade, os tempos em que o País se irritava com o sistema das taxas moderadoras tão mais benéfico para os doentes do que este sistema agora apresentado da alteração das listas de medicamentos comparticipados.
Sr.ª Ministra, não olhe para mim com esse ar de espanto, porque é verdade o que estou a dizer-lhe!...
Risos.
V. Ex.ª poderá interrogar os doentes que se viram privados de qualquer comparticipação em relação a medicamentos que lhes fazem falta e perguntar-lhes se não preferiam pagar uma taxa única no valor de 25$ em relação a esses mesmos medicamentos. A resposta será, com certeza, aquela que está de acordo com o que acabo de afirmar.
No entanto, outra foi a solução que V. Ex.ª adoptou e que é realmente uma solução que parte da mesma estrutura da do «diploma Gonelha». A preocupação começou realmente aquando do «consulado Gonelha» e do bloco central, isto é, a preocupação economicista, como se diz nos preâmbulos dos últimos diplomas publicados e é apontado num acórdão, do Tribunal Constitucional.
Essa preocupação vem, de facto, desse tempo; bem aflorada no diploma de 1984, com mais timidez ou, porventura, com mais pudor e com menos timidez no seu diploma. E, realmente, é nisto que ele é diferente. Diferença que, desde logo, consiste em tirar a tabela anexa para uma portaria. Sem prejuízo de tudo o que V. Ex.ª disse sobre isso, essa é uma diferença fundamental! ... Trata-se, por outro lado da introdução, no seu diploma, de um critério abertamente economicista através do concurso e dos contratos-programa. Isto são apenas os primeiros passos, porque os segundos passos virão com os «medicamentos genéricos» de que já todos falamos, que se discutem nos jornais e que constituirão um segundo passo em relação a este.
Sr.ª Ministra, não diga que com este sistema não mexe na liberdade de prescrição porque mexe na liberdade de prescrição dos médicos e mexe na liberdade dos doentes mais do que mexia o sistema da taxa moderadora. Não tenha, V. Ex.a, ilusões sobre isso!
É isso que consideramos errado neste sistema, porque, não o considerando inteiramente despropositado,
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como afloramento de uma preocupação que partilhamos, entendemos, o CDS entende, que outros sistemas deviam ser ponderados para moderar o gasto, por vezes exagerado, com medicamentos. E esses sistemas, Sr.ª Ministra, podiam ser realmente ponderados por todos nós, beneficiando de uma discussão ampla que tivesse em conta os problemas genéricos da saúde e as tais alternativas que V. Ex.ª refere: medicamentos ou equipamento para os hospitais ou novas construções hospitalares.
O que não há dúvida é que este sistema tem como inconveniente o que acabo de dizer, ou seja, afecta a liberdade de prescrição dos médicos e, nesse sentido, justifica as tais «nostalgias colectivizantes» que hoje foram afloradas nesta Câmara. Por outro lado, não tem em conta as situações concretas de certas doenças e de certos doentes que sistemas diferentes poderiam efectivamente ter em conta.
Por isso, Sr.ª Ministra, não estaremos a favor da ratificação deste diploma.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vidigal Amaro está inscrito para pedir esclarecimentos, mas o Sr. Deputado Nogueira de Brito já não dispõe de tempo para responder. No entanto, uma vez que o PCP ainda dispõe de dois minutos, o Sr. Deputado Vidigal Amaro propôs a divisão desses dois minutos por cada um.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, só lhe quero lembrar que os 251 de que falou eram pagos pelo papel...
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Claro!
O Orador: - ... e depois continuava-se a pagar o medicamento... Vamos repor as coisas como eram, porque não se pagavam 25$ e ficava o resto como comparticipação. Pagava-se duas vezes!
Em segundo lugar, o Sr. Deputado veio agora falar em sistemas de saúde e Serviço Nacional de Saúde. Quero recordar-lhe que a lei do Serviço Nacional de Saúde que temos nunca foi cumprida e recorda-se, Sr. Deputado, que a primeira medida do governo «AD» - do sr. ministro Barbosa - foi revogar toda a legislação que os decretos regulamentares lhe permitiam para que o Serviço Nacional de Saúde funcionasse.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E bem!
O Orador: - Por isso, não é culpa da lei do Serviço Nacional de Saúde, porque essa ainda hoje não é cumprida.
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado falou na revisão constitucional e no que tinha sido aprovado na comissão.
Sr. Deputado, com aquela alteração «ligeira» - disse o Partido Socialista - em que o Serviço Nacional de Saúde deixa de ser gratuito e passa a ser «tendencialmente» gratuito conforme as condições sócio-económicas da população..., V. Ex.ª acredita que com essa - repito - «ligeira» modificação se pode permitir modificar o sistema de saúde em Portugal?
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Radicalmente!
O Orador: - Permitirá isso que os doentes comecem a pagar conforme cheguem aos serviços de saúde?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva - recordo-lhe que também só dispõe de um minuto.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, a certa altura V. Ex.ª mencionou aquele que era o posicionamento de todos os partidos face a esta preocupação nacional. Focou o sentir do seu partido, o do PSD e também o do PS e focou o facto de o PCP estar mais preocupado com os gastos do que com as receitas, mas, não sei se foi por lapso ou se foi por esquecimento, que V. Ex.ª não focou o posicionamento do PRD.
O Sr. Deputado esteve com certeza desatento, porque eu foquei estritamente essa questão durante a minha intervenção e disse, como já tivemos oportunidade de expressar nesta Câmara, que não estamos contra a racionalização dos medicamentes. O que, de facto, nos preocupa é como é que este Governo o faz.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, a minha pergunta é a seguinte: já se esqueceu de que, por enquanto, há o dobro dos consumidores renovadores democráticos em relação aos do seu partido?
Risos gerais.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito que dispõe de um minuto e meio.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Rui Silva, quero pedir-lhe desculpa por não ter referido o posicionamento do PRD. Foi, efectivamente lapso, como V. Ex.ª disse.
Mas quanto ao dobro..., Sr. Deputado Rui Silva, direi que é o dobro de deputados consumidores e não de eleitores, número que, naturalmente será maior se os deputados forem grandes consumidores de medicamentos.
Risos.
Sr. Deputado Vidigal Amaro, se tivéssemos tempo para dialogar um pouco mais, perguntar-lhe-ia o que é que defendia. Se a V. Ex.ª assumisse efectivamente a preocupação da moderação dos gastos com medicamentos, o que é que V. Ex.ª preferia: o sistema da taxa moderadora ou o sistema da eliminação sistemática de medicamentos das listas de comparticipação? O que é que é preferível...
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Não foi nada disso que eu disse!
O Orador: - ..., não preferia nada. Risos.
É essa a questão que lhe coloco. Eu sei como é que funcionava a taxa moderadora e defendo que, mesmo assim, a taxa moderadora, que tão caluniada foi na altura, era preferível ao sistema da eliminação dos medicamentos das tabelas de comparticipação.
Por outro lado, Sr. Deputado, falei em sistema de comparticipação, não falei em sistemas de saúde. Não
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estava a referir-me a contrapor sistema a serviço. Eu sei que temos um Serviço Nacional de Saúde aprovado na Constituição, um serviço que V. Ex.ª diz não ter sido posto em prática. Portanto, há uma inconstitucionalidade por omissão que V. Ex.ª ainda não tratou mas deveria tratar.
Risos.
Em tempos, tentámos alterar profundamente essa estrutura mas não o conseguimos fazer por razões de ordem constitucional.
Por último, Sr. Deputado, entendo que a alteração que foi introduzida na Constituição não vai ter essas virtualidades de alterar profundamente a estrutura e a orgânica do Serviço Nacional de Saúde. E não foi essa a intenção que tiveram, com certeza - e já estou a ver ali o Sr. Deputado Ferraz de Abreu a gritar, porque ele é um defensor...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, queira terminar, porque já excedeu o tempo de que dispunha.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
É evidente que de outro modo isso não aconteceria...! Simplesmente em relação a esta questão, Sr. Deputado Vidigal Amaro, vai permitir introduzir a preocupação com os gastos. Vai permitir isso e espero que as soluções que vierem a ser encontradas sejam efectivamente justas e que não sejam soluções discutíveis como as que, parece-me estão consagradas neste diploma, cuja ratificação não concederemos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições, considero encerrado o debate relativo às Ratificações n.ºs 21 e 24/V, procedendo-se à sua votação às 19 horas e 30 minutos.
Passaremos de seguida à apreciação da Ratificação n.º 28/V, apresentada pelo PCP e relativa ao Decreto-Lei n.º 214/88, de 17 de Junho, que regulamenta a lei Orgânica dos tribunais judiciais.
Entretanto, Srs. Deputados, para conseguirmos reunir as condições necessárias à continuação dos trabalhos, a Mesa interrompe a sessão por cinco minutos.
Está interrompida a sessão.
Eram 17 horas e 17 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Agora que acabámos de analisar a estranha doença que assola o Ministério da Saúde, fica bem e é altura de passarmos a analisar as enfermidades numa outra área - a da justiça.
O Sr. Ministro da Justiça não quer reconhecer o que é evidente: com a reestruturação judiciária já em parte aplicada, tornou mais difícil e, por vezes, impossível o acesso dos cidadãos à justiça e à efectivação dos seus direitos, atingiu todo o meio forense que por várias formas reclama, semeou a instabilidade, atingiu a própria vida de muitas comarcas.
E tudo tendo em vista, segundo dizia o Sr. Ministro da Justiça nesta Assembleia, aquando do debate da lei orgânica, garantir às populações melhores condições de acesso aos tribunais.
Ora, o que está a acontecer é precisamente o contrário. A justiça vai-se tornando difícil e mesmo inacessível para muitos.
Ainda agora a procissão vai no adro, no que toca à aplicação da nova lei orgânica dos tribunais judiciais e as reclamações já chovem de todos os lados.
É a autarquia de Amarante que protesta pelos prejuízos que para os seus munícipes resultam da integração no Círculo de Penafiel.
Reclamam os autarcas de Marco de Canavezes, de Lagos, de Grândola, da Marinha Grande, da Chamusca, de Aljustrel, de Paços de Ferreira e de Miranda do Corvo. A Assembleia Distrital do Fundão exige a revogação imediata do decreto-lei que regulamenta a lei orgânica e a Assembleia Municipal manifestou-se contra a integração do Fundão no Círculo da Covilhã. Tudo, conforme ofícios que a Assembleia da República tem em seu poder.
As populações, essas, começam agora a sentir nos sítios onde os círculos se instalaram, as consequências da nova orgânica judiciária.
Correm já, de horários de transportes públicos na mãos, aos escritórios dos advogados.
Lamenta-se porque o seu julgamento já marcado, no Tribunal de Comarca, foi adiado para data a marcar (sabe-se lá quando) pelo tribunal de círculo. Afligem--se porque as testemunhas afirmam já não poder deslocar-se a quilómetros e quilómetros de distância, perdendo todo um dia e às vezes mais, por necessidade absoluta de ir de véspera ou de regressar só no outro dia.
E para remediar isto não basta que nos respondam que a lei garante o pagamento das despesas de deslocação e não basta às populações.
É que a perda incomensurável de tempo nos tribunais longe de casa tem repercussão para além das próprias despesas. É a ausência dos locais de trabalho determinando consequências graves: a rescisão de um contrato a prazo no seu termo por falta de assiduidade, a perda de prémios de presença e de produtividade. E a impossibilidade de garantir durante a presença no tribunal longínquo a resolução de problemas da vida familiar.
Todo este quadro aponta no sentido do afastamento da justiça em relação aos cidadãos, tornando-a cada vez mais reservada e reservosa, um negócio só para alguns e um negócio chorudo com o agravamento das custas judiciais. E ao mesmo tempo aponta no sentido da justiça formal, aquela que se faz simplesmente com respostas negativas a quesitos por falta de comparência de testemunhas, aquela que dificultará tanto aos arguidos como às vítimas a verdadeira aplicação da justiça.
A tudo isto se junta a seguinte constatação: os tribunais de círculo nasceram num estado de semi-mortos, à partida afundados pelo número de processos que receberam no próprio dia de instalação, pelos processos que têm de preparar desde a propositura da acção, desde a entrada dos processos no tribunal.
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Como é possível que os juízes privativos dos tribunais de círculo com a vastidão da sua competência configurada pela lei orgânica possam passar os dias (que os vão passar) a fazer julgamentos e ao mesmo tempo despachar, preparar para o julgamento todos os processos?
É evidente que com tudo isto não teremos uma justiça célere. Bem pelo contrário. No que, mais uma vez, todos saiem prejudicados - os cidadãos, todos os que trabalham no foro, em suma, a justiça.
Talvez por isso mesmo, se viu o Conselho Superior da Magistratura em dificuldades com a instalação dos novos tribunais de círculo.
É que, para além da falta de instalações, minguaram os pretendentes, nas condições previstas na lei orgânica, dos lugares de juízes dos tribunais de círculo.
E chegamos à constatação de que há neste momento juízes de tribunais de círculos que acabaram de fazer o seu estágio no CEJ (Centro de Estudos Judiciários).
Então onde está a aplicação do artigo 100.º da lei orgânica reafirmado pelo artigo 61.º do seu regulamento?
A badalada pretensão de uma exigência de qualidade já comprovada através de uma antiguidade de 10 anos e da classificação de bom com distinção? Onde está essa pretensão?
É evidente que tudo isto acontece porque aos juízes não basta acenar com uma retribuição superior para ciclópicas tarefas.
É evidente que os juízes querem, acima de tudo, condições de trabalho e sabem que as não terão nos tribunais de círculo.
Todas estas dificuldades na aplicação da regulamentação da lei orgânica, nascem do facto de o Ministério da Justiça ser surdo ao diálogo aquando do debate da lei orgânica.
Foi surdo às críticas dos magistrados, dos funcionários, da Ordem dos Advogados, das Assembleias de Advogados.
Obstinado, nem sequer quis repensar a competência dos tribunais de círculo que, tal como se apresenta, esvazia os Tribunais de Comarca, identificando-os quase completamente com os tribunais de pequenas causas, provocando com tal sistema, uma alteração substancial no própria dia a dia da vida das comarcas que não foram presenteadas com um tribunal de círculo.,
Desconhece-se mesmo qual o critério que presidiu à criação dos círculos, à definição das comarcas, ao dimensionamento dos próprios círculos.
Mas é evidente que há casos escandalosos.
É o que acontece, por exemplo, com as freguesias do concelho de Aljustrel, retalhadas por três comarcas, sendo certo que por exemplo entre uma das suas freguesias, Messajana, e a sede da comarca (Ourique) há uma distância de 40 kms, onde não circulam transportes públicos.
Sendo certo que o Ministério da Justiça tem em mãos, já desde 1978, um dossier que aponta na criação da Comarca de Aljustrel.
É o que acontece, por exemplo - e é outro escândalo -, com a vastidão do círculo de Bragança entre outros.
Ou com a atribuição de competências as Varas Cíveis e aos Juízes Criminais de Lisboa para certos processos (e são muitos) das Comarcas do Seixal, Almada, Loures, Oeiras. Já pensou, Sr. Secretário de Estado, que tem experiência disto, no que vai acontecer quanto ao volume de trabalho, àqueles tribunais?
Um dos aspectos graves desta organização judiciária reside na situação dos direitos dos trabalhadores perante a nova máquina judiciária.
Tomemos, como exemplo, o Tribunal de Trabalho de Bragança. A sua área de jurisdição é a dos círculos judiciais de Bragança e Mirandela. Uma vastíssima área.
Já se pensou que o Ministério Público nestes tribunais assegura a defesa dos direitos dos trabalhadores?
Já se pensou de que forma é que se garante ao trabalhador o direito à informação jurídica, sendo certo que, por exemplo, para se ir de Carrazeda ao Tribunal de Trabalho de Bragança se tem de ir de véspera?
Isto, esta limitação do direito à informação jurídica e à defesa dos direitos dos trabalhadores, ocorre por outros locais desse país fora com o corte e costura à toa retratado nos mapas anexos ao decreto-lei.
Na altura do debate da lei orgânica afirmámos que se desvirtuava o poder legislativo ao colocar em apreciação um diploma que exigia, para uma correcta decisão, o conhecimento daqueles mapas.
Os resultados da aprovação cega da lei estão aí.
Os advogados exigem a revogação imediata do diploma, ou, pelo menos, a sua suspensão. Os magistrados mostram-se alarmados e apreensivos. Os funcionários judiciais sabem que o sistema não vai funcionar.
Tudo isto, porém, em vão.
O Ministério da Justiça continua a afirmar-se orgulhoso de diplomas que sobressaltam a justiça, e mostra-se incapaz de um diálogo sério mesmo que este seja para tentar endireitar um pouco a sombra da vara torta, que é o caso presente.
Mostra-se orgulhoso de um anteprojecto de Código de Processo Civil que nada tem de inovador, antes se revela como uma cópia do burocratizante e formalista código em vigor.
Orgulha-se de um Código de Processo Penal, que aponta no sentido da policialização da instrução criminal, no que poderá vir a ser complementado, aliás, com a lei orgânica da Polícia Judiciária, dizendo-o objecto de estudo dos nossos vizinhos espanhóis, quando, tanto quanto se sabe já por eles foi abandonado.
Que nos reservará mais o Ministério da Justiça?
No meio da imensa crise que assola o mundo forense, e que fervilha, dia a dia, nos corredores dos tribunais, o Grupo Parlamentar do PCP sempre se tem declarado disposto a representar toda a Administração da Justiça, numa óptica inovadora desburocratizante, numa perspectiva de obtenção da justiça material, da garantia do direito à justiça.
É nessa óptica que, embora limitados pela lei orgânica, apresentamos, em sede de ratificação do regulamento da lei, propostas destinadas a mitigar, tanto quanto possível, os maléficos efeitos da nova organização judiciária.
Continuaremos dispostos a estudar soluções para que aí, onde o regime democrático é sujeito ao teste final - nos tribunais - se instale a estabilidade e a segurança, a certeza de obter justiça.
Aplausos do PCP e do Deputado Independente Raul Castro.
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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Coelho dos Santos e Pais de Sousa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Coelho dos Santos.
O Sr. Coelho dos Santos (PSD): - Sr.» Deputada Odete Santos, eu escrevi aqui «visão catastrófica» e «visão alarmista». Esta é realmente a classificação que a sua intervenção merece.
De resto, Sr.ª Deputada, os argumentos que traz aqui, como, por exemplo, o da autarquias, algumas delas do PSD que estão contra...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - São bastantes, até!
O Orador: - Exacto!
Pela primeira vez, Sr.ª Deputada, há uma política para o País e era assim que devia ter sido sempre. Além disso, não se pensa se a Comarca de Amarante é do PSD ou se deixa de ser.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A Sr.ª Deputada levantou, com alarmismo, o problema das deslocações. Aliás, o problema que se põe aqui é o problema dos tribunais de círculo e focou a região de Trás-os-Montes. Se pensar bem e se leu bem a lei, até sabe que, em Trás-os-Montes, uma grande parte das comarcas - as que estão perto de raia - estão todas a mais de 50 kms e que o julgamento é feito obrigatoriamente nessas comarcas por causa deste regulamento que aqui está em discussão.
A Sr.ª Deputada sabe que já anteriormente, na lei orgânica dos tribunais judiciais, os tribunais, por razões ponderosas, podiam deslocar-se às comarcas, tem conhecimento de quais são essas razões ponderosas e calculará ainda que eles vão actuar correctamente e interpretar essas razões ponderosas homologando testemunhas, tendo em conta a dificuldade de deslocação destas através dos transportes públicos.
Fundamentalmente, gostaria de saber, Sr.ª Deputada, para que é que serve esta iniciativa do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Para alterar o decreto, Sr. Deputado!
O Orador: - Está em marcha uma reforma que está no início, pelo que não está provado que seja boa ou má; a experiência irá dizê-lo! Portanto, nenhuma maioria consciente seria capaz de alterar este diploma; nenhuma maioria o faria neste momento! Assim, pergunto para que é esta iniciativa. Para que se possa dizer que se inviabilizou mais uma iniciativa que, à, partida, é inviável e para que amanhã se possa dizer que há uma hegemonização?
São estas as questões que gostaria de ver esclarecidas.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Odete Santos prefere responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Pais de Sousa.
O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, ninguém se pode iludir de que as grandes questões do sistema de justiça português estão aí e que têm que ser resolvidas. Mas também ninguém tem hoje dúvidas de que não é só no terreno restrito da organização judiciaria que os problemas podem ser ultrapassados.
Aliás, a Sr.ª Deputada ventilou igualmente questões relativas à formação e à qualidade dos magistrados, número de funcionários e, salvo erro, também se referiu às condições de trabalho nos tribunais e à necessidade de ultrapassar questões ao nível de instalações físicas ou de espaços, o que já foi resolvido pelo Governo ou pela acção meritória do Ministério da Justiça.
Todavia, do que se trata - e isto é importante - é de compatibilizar o princípio da celeridade com o da segurança jurídica. E se todos estamos de acordo em que o actual estado de coisas no sistema de justiça português não é o melhor, temos também de convir que, confrontada com outros sistemas, designadamente em países da Europa Ocidental, a justiça portuguesa não é, de facto, a mais morosa nem a que funciona pior. É a esta luz que tem que ser ponderada a política do Ministério da Justiça e a sua acção.
O problema de fundo é, de facto, o dos tribunais de círculo. Aliás, eu próprio devo confessar que tenho algumas reservas quanto ao problema da aplicação prática desta mecânica dos tribunais de círculo. Como poderá verificar, Sr.ª Deputada, na minha bancada não há monocordismo!
Porém, este juízo, que é meramente pessoal e que assumo, nada tem a ver com a precipitação do juízo que a Sr.ª Deputada formulou. Esperem pela aplicação destas medidas no terreno judiciário! Quem garantirá melhor a necessária segurança jurídica e psicológica que um sistema de justiça necessariamente reclama: os tribunais de círculo enquanto tribunais qualificados ou o actual estado de coisas? A questão fica...
Decorrentes da lei orgânica dos tribunais e do decreto-lei em apreciação que, de alguma forma, a regulamenta, coloco as seguintes questões: será negativa a criação de assessores do Supremo Tribunal de Justiça? Será negativa a autonomização dos Tribunais de Trabalho? Será negativa a criação de tribunais de pequenas causas, ou estaremos em presença de um contributo globalmente válido para uma melhor administração da justiça em Portugal?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Srs. Deputados do PSD, em primeiro lugar, não quero deixar de registar que o tom dos pedidos de esclarecimento de VV. Ex.ªs são diferentes e até contraditórios. Se é verdade que o Sr. Deputado Pais de Sousa tem reservas em relação à aplicação prática da lei, isto está em contradição com a afirmação do Sr. Deputado Coelho dos Santos de que a minha intervenção contém uma visão catastrófica e alarmista. Não é tal, Sr. Deputado Coelho dos Santos!
Não sei se os Srs. Deputados já tiveram ocasião de ter alguma experiência em tribunais de círculo. Eu já, e sei que, neste momento, estão afundados em trabalho, pois os processos que atingem mais de 500 contos foram todos transferidos para estes tribunais, os julgamentos que estavam marcados foram adiados e não
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se sabe para quando. É que nuns sítios não há funcionários e noutros há mas nem sequer está instalado o tribunal de círculo, como é o caso de Mirandela, que já tem funcionários mas nem sequer tem tribunal. De facto, isto é uma perfeita «bagunça» e uma catástrofe! Por outro lado, os juízes dos tribunais de círculo vão passar todo o seu tempo na sala do tribunal a fazer os julgamentos. Os Srs. Deputados do PSD não pensaram com certeza que, pelo menos em relação à competência dos tribunais de círculo, havia que repensar na organização dos tribunais na medida em que se os juízes têm competência para julgar as acções que atingem mais de 500 contos então têm uma competência vastíssima e, efectivamente, os tribunais de comarca ficam reduzidos a quase nada.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Aos processos sumários e sumaríssimos!
A Oradora: - Exactamente, aos processos sumários e sumaríssimos! E então quando é que os juízes que estão a fazer julgamentos vão agarrar no processo, fazer o despacho saneador, a especificação e o questionário? É depois das dez da noite, da meia noite ou das seis da manhã?
Creio que, na verdade, os Srs. Deputados não querem reconhecer que a este respeito a situação dos tribunais de círculo é grave.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Talvez o Sr. Deputado Coelho dos Santos não se tivesse apercebido da questão que coloquei em relação a Trás-os-Montes, questão essa que é grave e que tem que ver com um problema que o Sr. Deputado Pais de Sousa levantou, ou seja, a autonomização dos tribunais de trabalho. Não vou aqui discutir se o sistema melhor é o da autonomização dos tribunais ou outro.
Creio que se os juízes estagiários tivessem possibilidade de estagiar em tribunais de trabalho que não estão a ter, salvo raríssimas excepções, os tribunais de comarca podiam desempenhar as funções que tinham até agora. Mas a questão que neste momento me preocupa é a de saber que, por exemplo, em Trás-os-Montes, se um trabalhador quiser que o delegado do tribunal de trabalho lhe proponha a acção, tem que deslocar-se porque o delegado do Ministério Público não vai atender o trabalhador à comarca. Portanto, o trabalhador em questão tem que se deslocar a Bragança e em alguns casos tem que o fazer no dia anterior para ser atendido.
Já disponho de pouco tempo para responder e naturalmente terei que fazer uma intervenção onde abordarei esta questão mais pormenorizadamente, mas, em resumo, devo dizer que nos parece que, apesar de tudo, é possível introduzir alterações neste regulamento da lei orgânica dos tribunais judiciais e que, para o efeito, deve haver diálogo com as pessoas interessadas - autarquias e profissionais do mundo forense -, a fim de se encontrarem soluções rápidas para uma lei que nasceu muito «torta».
Em relação à questão que o Sr. Deputado Pais de Sousa colocou sobre a autonomização dos tribunais de trabalho já respondi. Na verdade, creio que se trata de um assunto que deve ser discutido. Porém, gostaria ainda de acrescentar que o regulamento já está a ser aplicado em alguns sítios e que os resultados são graves.
É claro que sabemos que a justiça em Portugal é morosa - aliás, como o é também em relação a outros países -, mas não é com soluções destas que se resolve o problema, antes se vai agravar a morosidade da justiça.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (José Soeiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante um pedido de ratificação de um decreto-lei que tem como único escopo regulamentar a lei orgânica dos tribunais judiciais.
Esta lei foi aprovada nesta Assembleia por maioria, contando apenas com os votos contra do partido ora requerente.
Isto significa, em nosso entender, face à estreita dependência e conexão do decreto regulamentar e da lei orgânica dos tribunais judiciais, que o PCP apenas vem reincidir, agora duma forma enviezada, na atitude que então tomou e na declaração de voto que proferiu.
Trata-se, pois, de um pedido de ratificação inútil, porquanto os grandes princípios contidos na lei orgânica dos tribunais judiciais estão e teriam de estar no seu regulamento e são já conhecidas - bem conhecidas - as teses do PCP sobre a matéria.
O ponto mais polémico, porque inovador, na estrutura da nossa organização judiciária, refere-se à criação dos tribunais de círculo.
O Governo já defendeu por diversas vezes, a bondade da criação destes tribunais.
Contudo, vemo-nos também forçados, pelo peso das circunstâncias, a reincidir neste tema.
Visa, em primeira linha, pôr fim a uma indiferenciação orgânica entre os tribunais colectivos e do júri e os tribunais singulares.
Visa, ainda, numa perspectiva organizativa, aliás, como acontece em praticamente todos os países da Europa Ocidental, em colocar dois degraus na jurisdição de 1.º instância.
Os tribunais de círculo, como segundo degrau, terão juízes privativos mais experientes - com mais de 10 anos de serviço - e melhor qualificados - deterão uma classificação não inferior a Bom com distinção - e, consequentemente julgarão as acções mais complexas.
E, considerando esta questão numa perspectiva de carreira, não vemos, porque isso nunca esteve no nosso horizonte, que haja qualquer inconveniente.
Ao invés, é salutar para os juízes de 1.º instância em vez de, como juízes de comarca, verem-se forçados a aguardar entre 25 a 30 anos a sua promoção ao Tribunal de Relação terem, no meio do seu longo percurso, a possibilidade de serem chamados a preencher lugares de maior responsabilidade e em que se exige, para além duma manifesta experiência, graus de conhecimento mais apurados.
Efectivamente, sendo-lhes só distribuídos processos dos mais complexos que correm, termos nos nossos tribunais de 1.ª instância contribui este facto para que haja uma natural e desejável adaptação à situação de,
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no futuro, virem a ser promovidos a 2.ª instância e, consequentemente, terem a seu cargo o julgamento dos processos de recurso.
Mas, os tribunais de círculo, sob o aspecto da orgânica judiciária, detém uma virtualidade muito marcante.
Com efeito, é sabido que o Direito cada vez mais necessita do contributo das ciências sociais, sendo já lugar comum falar da interdisciplinaridade, já que a realidade que cerca o homem é multifacetada e a sua compreensão e análise tornam necessário o recurso a outros ramos do saber.
O juiz, como aplicador da lei mas inserido na sociedade de hoje, já não pode ser o «João Semana» que dita sentenças de porta em porta.
Tem de estar devidamente envolto de instrumentos e estruturas que auxiliem na difícil tarefa de julgar o seu semelhante.
Por isso, estamos já a dotar - e continuaremos a fazê-lo duma forma gradual - os tribunais de círculo de equipas de reinserção social com técnicos de psicologia, sociologia e serviços sociais, de gabinetes de medicina-legal, de apoio técnico-contabilístico, de meios informáticos, de veículos automóveis, etc.
Ora, esta concentração de recursos só poderá operar--se numa média estrutura judiciária.
Era, na verdade, manifestamente inviável dotar as 220 comarcas dos meios que lides e causas complexas hoje exigem, designadamente o processo penal, no atinente à prática e ao julgamento dos crimes mais graves.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sabemos, no entanto, que a solução encontrada traz em si alguns inconvenientes designadamente o facto de as populações terem de se deslocar à sede do círculo.
Contudo, quer a lei orgânica dos tribunais judiciais, quer o seu regulamento superam essa dificuldade, já que se torna obrigatória a deslocação do tribunal de círculo à comarca respectiva quando diste mais de 50 kms da sua sede.
Por outro lado, está assegurado o pagamento das despesas de deslocação às pessoas residentes fora da comarca em que se encontra sediado aquele tribunal.
De qualquer forma, cumpre salientar que só 18% das comarcas existentes distam da sede do círculo mais de 50 kms e são precisamente aquelas, sediadas no norte, centro e sul interior, em que, normalmente, pendem um número reduzido de acções em que intervenha o tribunal colectivo.
Não está, assim, dificultado o acesso das populações à justiça. Muito pelo contrário. Com efeito, uma verdadeira política de acesso ao direito e à justiça passa não tanto pela distância em que se encontram implantados os tribunais, mas sim pelo grau de eficácia, eficiência e prontidão com que as diversas circunscrições judiciais respondem às legítimas solicitações dos cidadãos.
Com a nova organização judiciária e com novas leis de processo, que institucionalizem mecanismos expeditos na marcha dos pleitos, como aliás já sucede com o Código do Processo Penal e proximamente com o Código de Processo Civil, teremos a nossa estrutura judiciária pronta a praticar, no seu quotidiano, uma verdadeira política de acesso à justiça.
Aliás, este sentimento não sofreu objecções de fundo em inúmeras reuniões e encontros em que o tema foi abordado por parte do Conselho Superior da Magistratura, da Procuradoria-Geral da República, da Associação Sindical dos Magistrados Judiciais Portugueses,
do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, dos Sindicatos dos Trabalhadores Judiciais e da Associação dos Oficiais de Justiça.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso não é verdade!
O Orador: - É verdade, sim! É óbvio que, tratando--se de uma reforma e de uma reforma que introduz alterações de fundo, é compreensível que sofra algumas críticas e reparos, por parte de alguns profissionais do foro, mas as suas apreensões e receios cessarão quando afinal constatarem que se deu um passo positivo e firme na reestruturação judiciária do País.
Para isso o Ministério da Justiça está a rodear-se de extremos cuidados na instalação dos tribunais de círculo criados, só o fazendo quando, de todo, estejam asseguradas as condições que permitam um adequado funcionamento desses tribunais.
Foi, aliás, criada uma Comissão de Acompanhamento, constituída, para além de técnicos do Ministério da Justiça, por representantes do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, que, no terreno, constatam, orientam e coordenam tudo aquilo que tem atinência com a instalação e funcionamento dos referidos tribunais de círculo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos convictos, como estamos, que a reforma judiciária em curso é francamente positiva, pois que, para além de tudo o que já foi referido, constitui ainda um marco importante no rendimento de todas as circunscrições judiciárias, não podemos deixar de considerar este pedido de ratificação como uma iniciativa de quem, de tanto se habituar a ter uma postura estática, não compreende a mudança, o vivo pulsar da sociedade, a modernidade que, finalmente, também bate às portas da justiça.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Narana Coissoró, Odete Santos, Mário Raposo e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça, as minhas perguntas são de natureza prática, isto é, aquilo que vimos nos tribunais, e não a filosofia, com a qual até concordamos e votámos a favor, da lei orgânica dos tribunais judiciais.
Dissemos então, aquando da discussão dessa lei orgânica, que tudo dependeria da aplicação prática dos princípios com os quais comungamos e que pelos frutos saberíamos do valor da árvore.
Ora, os frutos que o decreto regulamentar exibe são secos e pecos. E não sou eu quem o diz. Um distinto juiz de um círculo diz o seguinte: «Há mais de 8 anos que presido a um círculo judicial» e continua: «Ante um quadro que se antolha, os juízes com mais de 10 anos de serviço e classificação de igual ou superior a Bom, com distinção não concorreram para os lugares dos tribunais de círculo.
Pelo contrário, muitos dos juízes com estas qualificações que presidiam já aos círculos trataram rapidamente de requerer a transferência para outros tribunais.
Com efeito, todos os tribunais de círculo ficarão ab initio saturados de serviço e sem condições mínimas de funcionamento.
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Em Caldas da Rainha penderão cerca de 700 processos para 2 juízes é 4 funcionários: Consta-me que em Santarém os processos serão mais de 2000.
Mas agora chegamos à melhor parte desta disparatada comédia: como os juízes mais antigos e competentes «fogem» dos tribunais de círculo, o Conselho Superior da Magistratura viu-se obrigado a nomear para esses tribunais juízes recém-saídos do GEJ, com apenas alguns meses de serviço!!! E lá se vai por água abaixo toda a filosofia que subjaz ao sistema.
As causas mais complexas passam a ser julgadas pelos juízes melhor experientes (...)» - de que V. Ex.ª fez hoje eco - (...) enquanto que os mais qualificados, passarão a julgar, transgressões, acções sumaríssimas, etc.».
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É exactamente isso!
O Orador: - Sr. Secretário ide Estado, esta é a realidade e não uma invenção da Oposição. É um juiz de círculo experimentado que grita perante esta enormidade que está a suceder nos tribunais.
Quanto ao «João Semana» da justiça que andava dê porta em porta, V. Ex.ª acabou por se contradizer ao querer saqueies juízes de alta «valia» que não há, como vimos, e que não; são «João Semana», porque hoje já andam de carro, naturalmente de «Lancia» ou outra marca visto que tem de percorrer rapidamente 100 kms.
A relação será também «João Semana»_e o próprio tribunal de círculo, por mais de 50 km, tem de se deslocar às comarcas.;
Não vamos, pois falar de «João Semana» ou de tribunais ambulantes. Naturalmente que a justiça ambulante tinha os seus defeitos e as suas virtudes. Não estou a dizer que era melhor, pois julgo até que a criação de tribunais de círculo é um bom princípio. Também não me afadigo a ler as cartas que chegam desta ou daquela câmara, desta ou daquela freguesia. Todas as câmaras querem um tribunal de círculo, todas as freguesias querem um tribunal de comarca, todo o lugar quer um tribunal de pequenas causas. Mas isto é natural, na medida em que querem mostrar aos seus eleitores que se bateram, mandaram cartas, escreveram par a o ministro da justiça, para os grupos parlamentares, fizeram o melhor que podiam.
Compreendemos perfeitamente que não se podem criar tribunais de círculo em todos os sítios que as câmaras querem.
No entanto, criar um tribunal de círculo já viciado à nascença, nomear para lá juízes completamente inexperientes e sem funcionários, mandar para lá causas que se sabe de antemão que vão durar anos não é fazer boa execução das leis e o decreto regulamentar é para isso mesmo e não para mostrar serviço.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça, quanto ao facto de V. Ex.ª configurar esta ratificação como inútil; Uma vez que já nada pode ser alterado pergunto-lhe se já leu, porquê creio que já foram distribuídas, às propostas de alteração do PCP e em que é querelas contrariam a lei orgânica dos tribunais judiciais.
A segunda questão já foi focada pelo Sr. Deputado Narana Coissoró. Pode V. Ex.ª elucidar esta Câmara sobre quantos juízes é quê, tendo terminado o estágio, foram imediatamente colocados em tribunais de círculo, uma vez que pelo movimento não é muito fácil detectar esses casos. É ou não verdade que isso acontece? Quanto à questão dos quilómetros, lembro-me de o Sr. Secretário de Estado ter dito aqui, na Assembleia, que tudo tinha sido calculado, inclusive com os horários das camionetas na mão tinha sido tudo muito bem calculadinho.
Sr. Secretário de Estado, o Tribunal de Círculo de Fronteira, por exemplo, fica a menos de 50 km e tem péssimos transportes e o do torrão fica a menos de 50 km e é preciso as pessoas levantarem-se às 5 horas da manhã para chegarem entre as 9 horas e as 9 horas e 30 minutos ao tribunal de S. Tiago do Cacém. Sr. Secretário de Estado, como é que isto foi feito? O Sr. Secretário de Estado, que também já foi juiz, pensa que um juiz pode passar o dia a fazer julgamentos eu depois então proceder aos despachos? Onde é que está a eficácia e à prontidão, desta justiça?
Finalmente, o Sr. Secretário de Estado disse coisas que não correspondem à verdade sobre as afirmações dos magistrados do Ministério Público relativamente à lei orgânica.
Tenho comigo um ofício dá Associação dos Oficiais de Justiça que, em relação aos tribunais de círculo, diz o seguinte: «É impraticável não só por onerar os encargos dás partes como ainda por não existirem transportes públicos regulares». E os juízes, por esse país fora, realizaram várias assembleias em que se manifestaram contra esse sistema».
Sr. Secretário de Estado, agradecia quê repusesse a verdade.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça. Antes de mais, queria perguntar ao Sr. Secretário de Estado, pois parece que alguns dos Srs. Deputados ignoram esta trivial realidade, quem é que coloca, quem é que movimenta os juízes neste país. É o Ministério da Justiça ou é o Conselheiro Superior da Magistratura?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é essa a questão! Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Com certeza. É sempre bem acolhida.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Mário Raposo por quem tenho uma extrema consideração, devo dizer-lhe que a questão que tanto o Sr. Deputado Narana Coissoró como eu colocámos nada tem a ver com o que referiu. Se foram colocados juízes que terminaram o estágio é porque não houve concorrentes. Os juízes com 10 anos de antiguidade e com classificação de Bom com distinção não quiseram sequer ir para os tribunais de círculo.
O Orador: - Muito obrigada.
Vou prosseguir com a minha pergunta, Sr. Secretário de Estado.
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Evidentemente, não irei sujeitar o Sr. Secretário de Estado a ter de fazer pedagogia sobre a lei aplicável. Aliás, todos os Srs. Deputados a conhecem, mas, às vezes, é bom que a realidade venha ao de cima, o que nem sempre acontece -, mas perguntaria ao Sr. Secretário de Estado se todo esse sistema não foi criado exactamente para promover a desconcentração da administração da justiça e para, ao invés do que aqui foi dito, promover uma justiça mais eficaz, mais célere, mais conforme aos interesses das populações, que não estão distanciadas da justiça apenas pelos transportes públicos ou privados que possam utilizar, mas pelo seu eficaz acesso à justiça no sentido de poderem aceder, recorrer efectivamente aos tribunais.
Disse o Sr. Deputado Narana Coissoró que os tribunais de círculo estão saturados e leu um relato feito por um Sr. Juiz. Atendendo à circunstância de que os tribunais de círculo têm a competência para as causas de maior volume, de maior montante, de maior complexidade, pergunto por que razão é que os tribunais de círculo não foram criados anteriormente. Eles teriam de ser criados e foram-no exactamente...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Esta é uma conversa tripartida. É a chamada tripartição, é uma coligação tripartidária.
Faça favor, Sr. Deputado, se o Sr. Presidente autorizar.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Vou perguntar ao ilustre deputado, ilustre ex-bastonário e ilustre ex-ministro da Justiça e, mais do que isso tudo, meu ilustre amigo, deputado Mário Raposo, V. Ex.ª sabe perfeitamente que, bem ou mal, havia tribunais cujas competências passaram para os tribunais de círculo e que os juízes iam para várias comarcas. Não estou contra o facto de se tirarem processos de algumas comarcas; agora, já estou contra o facto de se meterem processos num tribunal que não funciona.
Quanto a saber se os tribunais de círculo deviam ou não ser criados antes é um problema que devia ser resolvido...
O Orador: - Pergunto ao Sr. Presidente se a intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró está a ser descontada no tempo do meu partido.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O tempo que estou a utilizar pode ser descontado no do meu partido.
Sr. Deputado, estou mais preocupado em saber a sua resposta à minha pergunta do que propriamente no tempo.
V. Ex.ª, Sr. Deputado Mário Raposo, foi ministro da Justiça. Ora, se os tribunais de círculo eram uma coisa tão boa e premente, por que é que não os criou na altura em que foi ministro? É porque também achava que os tribunais colectivos, da altura, não eram tão maus, como quer agora mostrar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Narana Coissoró e Mário Raposo, peço desculpa por fazer uma espécie de ponto de ordem.
E evidente que estes tipos de diálogo não são permitidos. Do ponto de vista regimental, são permitidas breves interrupções, que são descontadas no tempo do orador que permitiu a interrupção.
Agradecia, pois, que tomassem isso em devida conta e que este incidente não se repetisse.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Mário Raposo.
O Orador: - Sr. Presidente, como é óbvio eu é que não podia interromper o «interruptor», neste caso «interruptor» hoc sensu, no sentido de que estava a tentar fazer luz e não fez.
Na verdade, Srs. Deputados, tudo continua exactamente tal como o Sr. Secretário de Estado pôs o problema, ou seja, os tribunais de círculo eram uma necessidade.
O Sr. Deputado Narana Coissoró perguntou por que razão, quando fui ministro da Justiça - e fui-o por quatro vezes -, não criei os tribunais de círculo. Devo dizer-lhe que a ideia é da minha responsabilidade e assumo-a inteiramente perante esta Câmara.
Para além de tudo o que, no último ano e meio, tem sido feito no Ministério da Justiça, designadamente nos domínios da informática e da intensificação e da melhoria do equipamento judiciário, considero que este é um dos actos mais positivos que tem sido praticado e acredito que, depois de passada esta fase em que há uma compreensível reticência por parte das pessoas que estão instaladas em determinadas situações e que não se querem ver assoberbadas com mais trabalho...
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.
A Sr.ª Presidente: - Peco-lhe o favor de terminar, Sr. Deputado. Informo-o de que já gastou seis minutos.
O Orador: - Gastei seis minutos, dos quais três ou quatro é que foram gastos por mim.
Vou terminar, de qualquer forma, Sr.ª Presidente.
Gostaria apenas de dizer que não há dúvida alguma de que se trata de uma medida que, apesar de não se ter necessariamente que invocar exemplos de além fronteiras, corresponde ao que se passa em todos os países. Nós só por imobilismo, só por apegos a realidades ultrapassadas, só por apego ao atendimento de conveniências que não devem ser atendidas, é que não podemos sufragar concreta e completamente esta medida assumida pelo Ministério da Justiça ao propor a lei que esta Assembleia votou.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe o favor de terminar.
O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Gostaria apenas de perguntar se, na realidade, o Sr. Secretário de Estado, ilustre juiz que é e com quem eu tive o prazer de nessa qualidade trabalhar muitas vezes, se sentiria melhor como juiz de um tribunal de círculo ou como juiz de pequenas causas.
A resposta a esta pergunta dará, certamente, completa satisfação, ou melhor, completa insatisfação, à Sr.ª Deputada, minha querida amiga Odete Santos, e ao Sr. Deputado, meu querido amigo Narana Coissoró.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Secretário de Estado -Adjunto do Ministro da Justiça, na medida em que vão oito meses volvidos sobre a entrada em vigor do decreto regulamentar da lei orgânica dos tribunais judiciais, creio que é possível fazer alguns balanços.
Em primeiro lugar, gostaria de saber, relativamente ao número de tribunais de círculo previsto na lei, quantos é que já estão instalados e em funcionamento e quantos é que ainda falta instalar e entrar em funcionamento.
A resposta a esta questão permitirá a resposta a uma outra que gostaria de lhe fazer e que tem a ver com o problema dos juízes no tribunal de círculo, questão já aqui referida.
Nos termos da lei orgânica dos tribunais judiciais, esses juízes são privativos, com o mínimo de 10 anos de carreira e aproveitamento de Bom com distinção. Assim se explicaria a especial cautela na preparação e experiência desses juízes relativamente à importância e à complexidade das causas que têm para julgar.
O que importa agora saber é se o que está em prática é a regra do artigo 100.º da lei orgânica ou se, afinal de contas, é a excepção do regime relativo aos juízes interinos.
Gostaria, pois, que o Sr. Secretário de Estado nos dissesse qual o número de juízes efectivamente colocado com a regra dos 10 anos de serviço e o Bom com distinção e qual o número de juízes entretanto colocados com a natureza de juízes interinos.
Passarei a uma outra questão que tem outra natureza.
A ideia da estrutura judicial com a constituição dos círculos judiciais é, na lógica do Governo, uma ideia que permite sustentar melhor o conjunto dos meios humanos e das infra-estruturas necessárias para apoiarem o processo judicial e a natureza complexa desse mesmo processo.
Há, portanto, que fazer um acervo de reformas integradas e é acerca dessas reformas integradas que lhe pergunto qual a lógica do programa de informática para a sua extensão aos círculos judiciais, qual a lógica de extensão territorial das equipas do Instituto da Reinserção Social em funcionamento nos círculos judiciais, qual a lógica a dar através da sempre anunciada e sempre adiada lei orgânica da Polícia Judiciária no que diz respeito aos critérios da sua extensão territorial, sabendo, em concreto, se esses critérios de extensão foram revistos com base nos novos critérios dos círculos judiciais ou se mantêm as antigas programações, portanto sem ter em conta esta nova realidade judiciária.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Muito bem!
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça: - Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, devo dizer que conheço o artigo que referiu. Aliás, conheço o juiz que citou há quase 15 anos. É uma pessoa estimável e estimada, mas tem revelado, nalguns meios de informação onde normalmente publica os seus artigos, informações muito originais. O Sr. Deputado deve, com certeza, ter acompanhado, como homem do foro que é, as posições que ele tem sustentado que, no meu entender, são, no mínimo, maximalistas, e essa que o Sr. Deputado referiu é uma delas.
Aliás, esse artigo «pega» numa realidade que ainda não existe, que é o Tribunal de Círculo das Caldas da Rainha, para a partir daí extrapolar com grandes especulações.
Mesmo assim, posso acrescentar que a pessoa em causa me merece o maior respeito, mas produz inverdades flagrantes porque, inclusivamente, ainda nem sequer existe o Tribunal de Círculo das Caldas da Rainha nem o de Santarém, uma vez que ainda não estão instalados.
O Sr. Deputado referiu também uma questão que é de grande importância - que, aliás, foi focada por outros Srs. Deputados - e que tem a ver com o problema do recrutamento e da nomeação dos juízes para os tribunais de círculo à qual vou responder frontalmente.
Como sabem, e tal como recordou o Sr. Deputado Mário Raposo, a nomeação dos magistrados é feita pelo Conselho Superior da Magistratura e, portanto, o Ministério da Justiça é parte alheia a esse processo de nomeação. Mas respondamos ao fundo e não à forma!
Desde 1 de Janeiro deste ano foram instalados quinze tribunais de círculo que têm prevista, nos seus quadros, a existência de 31 juízes, 26 dos quais reúnem os requisitos legais - e reporto-me a informações dadas pelo Conselho Superior da Magistratura - e os restantes ainda não reúnem os requisitos legais mas estão muito longe de serem juízes saídos do Centro de Estudos Judiciários.
Estes cinco juízes não reúnem os requisitos legais porque não tiveram, embora isso possa estar pendente nalguns casos, o processo de classificação de Bom com distinção ou estão, perdoem-me a expressão, à vista de fazer os 10 anos. Portanto, dizer-se que há nos tribunais de círculo que foram instalados juízes saídos do CEJ é uma profunda inverdade, para não lhe chamar outra coisa...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É capaz de não ser! Faremos um requerimento nesse sentido!
O Orador: - Sr.ª Deputada, pode fazer esse requerimento ao Conselho Superior da Magistratura, porque foi de lá que eu obtive estas informações.
Relativamente à questão de os tribunais de círculo nascerem já com uma acumulação de serviço, julgo que se está a tomar a nuvem por Juno. Reconheço que pode haver comarcas que fazem parte de tribunais de círculo que, por não terem magistrados ou por qualquer razão de acumulação de serviço, tenham remetido para os tribunais de círculo um número elevado de processos, mas, de acordo com as informações de que dispomos, a esmagadora maioria dos quinze tribunais de círculo que já estão instalados estão a funcionar devidamente.
A Sr.ª Deputada Odete Santos disse que a posição dos magistrados oficiais, os do Magistério Público e a Associação dos Oficiais de Justiça era contrária à
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institucionalização do tribunal de círculo. Ora, Sr.ª Deputada, desde o momento em que a Assembleia da República aprovou a lei orgânica dos tribunais judiciais até ter sido aprovado o decreto regulamentar da lei orgânica houve, no Ministério da Justiça, inúmeras reuniões com estas entidades, para além de outras que referi à pouco, e não ouve qualquer oposição de princípio à existência de tribunais de círculo tal como foram gisados. Reafirmo, pois, que não houve nenhuma oposição em relação à criação de tribunais de círculo, tal como foram pensados!
O Sr. Deputado Mário Raposo perguntou se a existência, a criação e a filosofia dos tribunais de círculo não servem para uma desconcentração da administração da justiça e para promover uma justiça mais eficaz. É óbvio que sim! A existência de tribunais de círculo, para além de permitir uma especialização - e toda a especialização é positiva -, permite que as causas mais complexas sejam julgadas por juízes com mais experiência e com mais saber e que as causas que não tenham a dignidade de ter o tratamento a nível de julgamento do tribunal colectivo sejam julgadas nos tribunais singulares por juízes singulares.
Portanto, a grande «imagem de marca» dos tribunais de círculo é, precisamente, utilizando juízes experientes, fazer com que a justiça seja mais célere, mais rápida e ainda mais eficaz.
Tal como disse na minha intervenção inicial, não temos uma verdadeira política de acesso à justiça ou ao direito pelo facto de termos tribunais a 50 metros da nossa residência... Teremos uma verdadeira política de acesso à justiça e ao direito quando os tribunais responderem com brevidade e eficiência às solicitações dos cidadãos. Aí é que está uma verdadeira política de justiça!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso que estamos a pôr em causa!
O Orador: - O Sr. Deputado Jorge Lacão questionou acerca dos meios e dos recursos humanos que vão envolver os tribunais de círculo!
Lembro-lhe que, e antevendo a existência e a criação de tribunais de círculo, só no ano de 1988 foram criadas 18 novas equipas de reinserção social em 18 novos círculos judiciais; que, neste momento, temos 55% dos círculos judiciais cobertos com equipas de resinserção social; que no ano de 1988 foram admitidos 110 técnicos de reinserção social e que durante este ano prevemos que continue o crescimento das equipas que irão dar cobertura aos tribunais de círculo, uma vez que são a sede nata dessas equipas.
Relativamente à pergunta que me fez quanto à informática, é óbvio que os tribunais de círculo serão o centro polarizador do sistema informático. Por isso, e embora o Governo tenha apontado como prioridade a informatização do processo penal (aliás, já está feito um estudo prévio e entra-se, agora, na análise funcional de circuitos, do processo penal como processo vertical), para não perder a imagem da globalidade de um tribunal de competência genérica, como é o tribunal de círculo, vai arrancar em Sesimbra, proximamente, uma experiência piloto para informatizar todo o tribunal, quer a jurisdição cível, a laboral, menores, crime, etc. Portanto, se esta experiência no Tribunal de Sesimbra tiver êxito - como esperamos - obviamente que será alargada ao resto do País e aos tribunais de círculo.
Quanto ao anteprojecto de lei orgânica da Polícia Judiciária, posso dizer-lhe que ainda não há um texto final mas, e julgo que a preocupação do Sr. Deputado é precisamente essa, tendencialmente, as inspecções e as subinspecções da Polícia Judiciária vêm a coincidir com as sedes de círculo. Julgo que se prosseguirá no mesmo caminho se bem que ainda não haja um texto final e, portanto, não posso, em consciência, responder ao Sr. Deputado Jorge Lacão sobre a matéria atinente à Polícia Judiciária.
Finalmente, devo dizer que ainda é muito cedo para fazer um balanço, pois os tribunais de círculo só estão a funcionar desde 1 de Janeiro. Não posso fazer um balanço em termos qualitativos de como é que está a justiça face à introdução do novo sistema organizativo, mas posso dizer-lhe que dos 45 tribunais, 15 foram instalados em l de Janeiro de 1989 e esperamos que no fim deste ano, com a excepção de cerca de meia dúzia de tribunais - e não será mais -, onde está a haver problemas relacionados com as instalações, teremos os tribunais de círculo instalados. Portanto, posso dizer-lhe que no total de 45 círculos andaremos muito próximos dos 40 instalados no fim do ano.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.
O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As reformas, por traduzirem mudanças ou rupturas com o passado, suscitam pela sua própria vocação, resistências, desconfianças e incompreensões. É natural que assim seja!
O que não é natural é o que os objectivos que se pretendem atingir, com tais reformas, não visem aperfeiçoar o aparelho de administração judiciária, no sentido da sua aproximação aos destinatários - os utentes das justiças -, antes se determina por motivações de carácter estritamente económico e financeiro, à custa de direitos fundamentais dos cidadãos.
Não deverá, por tal motivo estranhar-se que seja a própria sociedade civil a sentir-se directamente atingida com tais medidas.
Não admira também que os profissionais de foro, que colhem a sua razão de ser na representação dos interesses em jogo, se insurjam contra a violação de valores de justiça que emprestam verdadeira dimensão e dignidade à sua função.
Não poderá, finalmente, espantar que a reforma pretendida acabe por vir a revelar-se como verdadeira contra-reforma abortada à nascença.
O Estado está ainda longe de ser agente de reconhecimento e estímulo dos mecanismos da democracia participativa, quando o propulsor de tais reformas - o Governo e a sua maioria, a atropelam e bloqueiam.
E sem participação, sem diálogo, sem consensos, não é possível operar as mudanças que a modernização e o desenvolvimento do País exigem.
A autoridade e legitimidade do poder legislativo afirma-se na capacidade que os seus detentores tenham no acolhimento aos contributos vários de quem para tanto os promove.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O «pacote da justiça» apresentado pelo Governo a esta Assembleia da República está prenhe de vícios e deficiências que emergem da visão tecnocrática que enforma a actuação do Executivo, sem preocupações de ordem social e de justiça.
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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Não basta legislar, sendo necessário fazê-lo bem e, no respeito pelos princípios basilares do acesso ao direito e aos tribunais.
Cercear drasticamente o direito de acesso aos tribunais, transformando a justiça num entreposto comercial quando, - ainda mais grave - aquilo que se oferece é de má qualidade, prestado a más horas e excessivamente oneroso, não é a melhor via, antes é um mau serviço que se presta à sociedade e à democracia.
A resolução dos problemas da justiça não pode reduzir-se à mera contabilização e saldo positivo das contas.
Não é dificultando o acesso à justiça, provocando deliberadamente a diminuição dos processos que se promove a paz social.
Não é fortalecendo a possibilidade do arbítrio dos juízes e da impunidade dos funcionários, pela dificultação do uso da reclamação e do recurso contra as decisões judiciais, assim como da aquisição de nulidade dos actos processuais, através de elevados montantes de custas e preparos que a justiça se redime da crise em que se encontra mergulhada.
Não é emprestando uma aparência de normalização, resultante dessa diminuição de movimentos de processo, que a mesma justiça se torna mais célere e eficaz e em que o Estado Português surja menos comprometido e mais dignificado perante as instâncias internacionais e comunitárias.
A visão centralizante do aparelho judiciário que perpassa pelo Decreto-Lei n.º 214/88, que não cura de ponderar cuidadosamente sobre a existência e localização dos tribunais e sobre as necessidades dos seus utentes, constitui o percurso inverso do que seria desejável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O acesso aos tribunais para defesa dos direitos dos cidadãos e a proibição de negação da justiça por insuficiência de meios económicos, que constituem princípios constitucionais, são a reprovação das medias do Governo em matéria de custos judiciais.
As preocupações sobre o alcance negativo dos efeitos do Decreto-Lei n.º 214/88 que atrás referimos, leva--nos a manifestar grandes reservas quanto à sua eficácia.
Aplausos do PRD e da deputada Odete Santos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - O Sr. Deputado Barbosa da Costa falou na crise da justiça gerada pela criação dos tribunais de círculo. Falou uma vez mais na crise da justiça e no receio que temos de ser alvo de críticas ou de censuras por parte de organizações internacionais, no caso, por parte do Tribunal dos Direitos do Homem por inobservância do n.º 1 do artigo 6.º da Convenção Europeia.
Gostaria de lhe perguntar se sabe quantas queixas é que há junto da comissão, que depois transmitam daí para o Tribunal Europeu, por parte da República Federal da Alemanha ou qualquer outro país que integre o Conselho da Europa. Devo dizer-lhe, embora seja eu a pedir o esclarecimento que Portugal é o País que percentualmente tem menos queixas junto das instâncias do Conselho da Europa.
Pergunto-lhe, ainda, se sabe qual é a duração média de um processo (é evidente que sabe!) em França, em Espanha ou em qualquer país da Europa. Posso também adiantar-lhe que basta ler qualquer revista técnica para ver que entre a decisão da Cour de Cassation a decisão da Cour d'Appel, por exemplo, e a decisão do Tribunal de Comércio, medeia um intervalo pendular de, pelo menos, cinco anos.
Sr. Deputado, Portugal é um dos países do mundo onde a justiça, apesar de tudo, é mais célere! Ainda há pouco referi um conhecido autor francês, antigo presidente da Cour de Cassation, segundo o qual «a justiça não pode ser como a Sociedade Nacional dos Caminhos de Ferro». A justiça é necessariamente lenta! Nós, em Portugal, temos e queremos uma justiça, tanto quanto possível, rápida.
É evidente que há a inelutabilidade da diferença, pois uns juízes são melhores que outros e trabalham mais depressa do que outros. Posso dizer-lhe que à processos, por hipótese, num juízo de qualquer tribunal e outros noutro juízo e que um anda dez vezes mais depressa que o outro... Portanto, a culpa não é do sistema. E da precaridade e da diferença entre as pessoas que estão interessadas num determinado sistema.
Finalmente, pergunto ao Sr. Deputado se considera que todas as causas devem ser submetidas a juízos que não têm tempo nem possibilidade de as encarar especializadamente, com cuidado e com eficácia. E, ainda, se considera que o acesso à justiça e ao direito (e creio estar à vontade para falar em qualquer destas vertentes dos direitos do homem) é medido, como há pouco o Sr. Secretário de Estado disse, pela distância quilométrica ou pela distância real, pessoal e exacta entre as pessoas e a administração da justiça.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.
O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Deputado Mário Raposo, pela forma como apresentou os dados, certamente está ciente dos dados que me pediu e, portanto, libertar-me-á da função de os repetir.
O Sr. Deputado referiu países onde os processos judiciais são menos céleres que em Portugal, contudo, devo dizer-lhe que não devemos copiar os maus exemplos que vêm de fora. Tentaremos acompanhar o que vem de bom dos países com os quais podemos fazer comparações.
O Sr. Deputado disse que Portugal era dos países do mundo onde os processos são mais céleres e eu atrevo-me a dizer que, com este diploma, Portugal poderá passar a ser dos países onde era mais célere, isto é, poderá acontecer que o processo comece a ser menos rápido do que tem sido até agora.
Relativamente à última questão que colocou, devo dizer que não é o problema da distância quilométrica que afasta as pessoas. Mas o Sr. Deputado, que foi governante deste país, sabe muito bem que as distâncias quilométricas pesam muito na possibilidade que as pessoas têm no acesso a todos os bens, designadamente o bem da justiça.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Coelho dos Santos.
O Sr. Coelho dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não se percebe que sentido útil poderá ter esta iniciativa do PCP! Está em marcha a execução da nova lei orgânica dos tribunais judiciais, com a instalação dos primeiros tribunais de círculo.
Não decorreu ainda o tempo suficiente para que se possam detectar erros ou lacunas nesta lei e respectivo decreto-lei regulamentar.
É este um momento totalmente inoportuno para pôr em causa diplomas que estão em começo de execução, mas que, por isso mesmo, não estão testados pela experiência.
Pergunta-se: o que levou o PCP a provocar este incidente de ratificação? O pessimismo e o medo em relação a quaisquer reformas, a traduzir um estado de espírito que é apanágio da direita? Ou antes o propósito de desgastar uma reforma antecipadamente, quando se presume que a mesma é positiva?
De qualquer modo, e pelas razões atrás aduzidas, uma maioria responsável não pode aceitar que nesta fase temporal seja posto em causa o regulamento da lei orgânica dos tribunais judiciais, que, aliás, foi elaborado cautelosamente, com a colaboração e as sugestões do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República.
E mesmo em relação ao ponto mais polémico desta lei orgânica - a deslocação das populações no interior do País às sedes dos tribunais de círculo -, veio o regulamento estabelecer que é obrigatória a deslocação do colectivo às comarcas que distem mais de 50 kms da sede do círculo, desde que tal seja requerido oportunamente.
Mas já antes, na própria lei orgânica, os inconvenientes da fixidez do tribunal de círculo estavam mitigados pelo disposto no seu artigo 8.º; o colectivo pode reunir fora da sua sede quando o apuramento da verdade dos factos o exija, sendo ainda circunstâncias ponderosas a aconselhar a deslocação do tribunal; o elevado número de intervenientes no processo ou a dificuldade de transportes por parte destes.
Não temos assim quaisquer dúvidas de que os tribunais responsáveis - e nessa classificação queremos incluir a generalidade dos nossos tribunais - hão-de saber evitar deslocações que se traduzam em injustificável gravame para as já desfavorecidas populações do interior do País.
Por outro lado, é de prever que os tribunais de círculo fixos - e nessa medida mais operacionais -, constituídos por juízes experimentados e com provas dadas de competência, venham a poder inverter a tendência para a degradação da nossa justiça.
Que uma reforma dos tribunais se impunha, sabem--no todos os que do Direito fazem profissão por uma dolorosa experiência.
Que havia que dar relevo à experiência e à melhor preparação profissional, contra um igualitarismo que já fez época, também o sabemos todos, e mais vincadamente os que conhecemos o funcionamento dos tribunais antes e depois do 25 de Abril.
A reforma em curso, certa nas suas linhas mestras e na filosofia que lhe subjaz, vai depender mais dos meios técnicos e humanos que forem postos ao seu serviço.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não temos dúvidas de que a experiência lhe virá a detectar erros e insuficiências, mas teremos a humildade suficiente para, oportunamente, arrepiar caminho, se for caso disso. Fazemos votos para que tal não suceda!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveu-se para formular pedidos de esclarecimento a Sr.ª Deputada Odete Santos. Quero informar a Câmara de que neste momento dispomos ainda das inscrições dos Srs. Deputados Jorge Lacão, que dispõe de quinze minutos, e Narana Coissoró.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Coelho dos Santos, gostaria de colocar-lhe duas brevíssimas perguntas, uma vez que a sua intervenção já foi previamente contrariada com os argumentos que o Grupo Parlamentar do PCP produziu e, portanto, penso que não vale a pena estar a reformular perguntas no mesmo sentido.
O Sr. Deputado pensa que a ratificação é inútil, é surdo ao diálogo e crê que não pode haver melhorias no regulamento da lei orgânica. Das suas palavras é esta a conclusão que tiramos!
Em relação aos julgamentos que se realizam longe dos locais, quais são, no seu entender - e esta é a minha segunda pergunta -, os efeitos que as sentenças, por exemplo, no processo penal, têm sobre as populações. Quais são os efeitos pedagógicos dessas sentenças no aspecto preventivo e repressivo? Será que este efeito é o mesmo do que se o julgamento tivesse lugar próximo do local onde a infracção se praticou?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Coelho dos Santos.
O Sr. Coelho dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, vou ser muito rápido porque não tenho tempo. Eu não sou surdo ao diálogo, Sr. Deputado, o que sou é surdo ao diálogo inútil.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É inútil para quem não tem ouvidos!
O Orador: - Quanto à segunda pergunta, sobre o aspecto pedagógico do julgamento no local, os tribunais podem deslocar-se ao local. Isto já constava do artigo 8.º da lei orgânica. Os tribunais podem ir ao local sempre que, para o esclarecimento da verdade, tal se imponha.
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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Está a confundir as questões! Essa não é a deslocação de que eu falei, mas sim à comarca!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A primeira reflexão que me ocorre fazer neste momento é a do próprio regime das ratificações, consideração, a meu ver, tanto mais necessária quanto as últimas palavras do Sr. Deputado Coelho dos Santos, que me chamaram a atenção para a circunstância de estarmos, aqui, a travar o que classificou de um «diálogo inútil».
Face a isto, pergunto: que regime é este das ratificações, nos termos do qual uma ratificação suscitada em Junho de 1988 só vem a poder ser agendada em Fevereiro de 1989? Onde estará a inutilidade do processo? Na legitimidade da iniciativa ou, virtualmente, na ineficácia do sistema das ratificações tal como está a ser concebido? Se uma ratificação pressupõe que ela é ainda uma parte do próprio processo legislativo então o que todos deveríamos convir é que o processo legislativo deveria, com a maior urgência, ser complementado com as ratificações suscitadas.
Ora, não podemos, de modo algum, estar de acordo com esta dupla posição: por um lado, adiar ad nausean o momento de agendamento das ratificações e, por outro, vir criticar os grupos parlamentares que suscitaram essas mesmas ratificações. Fazer o mal e, simultaneamente, a caramunha é um hábito a que o Grupo Parlamentar do PSD já nos habituou, mas com o qual não desejamos continuar a pactuar.
Gostaria agora, Srs. Deputados, de fazer algumas considerações sobre o decreto-lei regulamentador da lei orgânica dos tribunais.
A primeira dessas considerações vai no sentido de entender que a organização territorial da administração da justiça, que se manifesta através deste decreto--lei regulamentar da lei orgânica dos tribunais, é reveladora de como os vários departamentos da Administração Pública continuam de costas voltadas uns para os outros, sem qualquer critério lógico ou lógica coerente, no que diz respeito à institucionalização de um programa de regionalização mínima dos serviços desconcentrados e descentralizados do Estado.
As situações são cada vez mais graves e mais caricatas no nosso país. Um qualquer cidadão, de um qualquer ponto do território nacional, para tratar de um interesse particular, mas que tem a ver com uma contrapartida de serviços públicos, encontra totalmente dispersas as sedes dos serviços desconcentrados da Administração Pública. E as situações repetem-se e complicam-se. Por exemplo: um habitante de Tomar faz parte do distrito administrativo de Santarém; por sua vez, Santarém faz parte do distrito judicial de Évora; Tomar faz parte do distrito judicial de Coimbra. E tudo isto com uma complexidade ainda pior no que diz respeito aos cruzamentos com vários outros serviços de outros departamentos do Estado.
A continuarmos por esta lógica, sem rei nem roque, estamos a prestar o pior serviço a qualquer ideia futura de uma descentralização coerente e de uma regionalização capaz para o nosso país.
Portanto, neste ponto, temos que criticar o Governo por não ter sabido utilizar os factores de estabilidade política e institucional de que disfruta para poder ponderar melhor estas exigências que são, também, exigências do ordenamento do território, do próprio ordenamento urbano e, em última análise, do próprio ordenamento dos serviços públicos.
Por outro lado, perante esta situação, é de lamentar que o Governo não tenha tido a ousadia de criar novos distritos judiciais porque, para além da temática dos círculos judiciais, se imporia, seguramente, num processo de descentralização da administração da justiça, aproveitar esta oportunidade para criar novos distritos judiciais, o que, infelizmente, não foi feito. E quanto aos círculos judiciais - e aproveito a oportunidade para corrigir, pontualmente, o Sr. Secretário de Estado, de que não são 45 mas 47 círculos criados pelo decreto--lei que regulamenta a lei orgânica dos tribunais -, verificamos que apenas 15 dos 47 tribunais do círculo estão, actualmente, instituídos e em condições de funcionamento.
Dir-se-á que não poderia ser doutro modo, na medida em que este decreto-lei regulamentar só deu entrada a partir de Junho do ano passado. Não creio que seja assim porque a lei orgânica tinha sido aprovada nos finais do ano de 1987 e o Governo dispunha de um prazo de 90 dias para regulamentar essa lei. Não o fez em três meses, levou seis meses a regulamentá-la e, portanto, entre o momento da entrada em vigor da lei orgânica e este preciso momento, em que estamos a apreciar o decreto-lei regulamentar, vai mais de um ano, tempo mais que suficiente para o Governo ter podido implementar, com mais eficácia, os tribunais de círculo, já que eles são a espinha dorsal desta reforma, no domínio de estrutura judiciária.
Por outro lado, se na perspectiva e no discurso governamental, os tribunais do círculo correspondem a uma lógica de descentralização da justiça, como já hoje aqui se verificou, eles estão, sim a corresponder a uma centralização da administração judicial. E isto é preocupante, porque essa centralização está a revelar graves distorções, sendo uma delas a do próprio regime de colocação dos juízes. Não há dúvida que, quando se pretendia ter juízes privativos nos tribunais de círculo e se acaba por ter juízes interinos, alguma coisa está, profundamente, errada em todo este processo. De igual modo, quando se pretendia dar aos juízes privativos um regime de comissão de serviço de três anos prorrogáveis desde que o juiz continuasse a manter o aproveitamento de bom com distinção, o que significa uma intenção de manter o juiz sediado no tribunal de círculo, o regime de interinidade vem pôr tudo isto em causa.
Há, porém, ainda uma outra questão legal, a meu ver preocupante, quanto ao problema da interinidade. É que este regime não foi previsto na lei orgânica dos tribunais. Trata-se, apenas, de uma previsão, por excepção, do decreto-lei que regulamenta aquela lei.
Ora, como se sabe, toda a matéria de organização dos tribunais e do estatuto dos juízes é da competência reservada da Assembleia da República e não tendo sido aprovada nenhuma norma, em sede da lei orgânica dos tribunais, visando a criação daquele regime, mas, apenas, no decreto-lei que a regulamenta, isso significa que o Governo procedeu a uma medida legislativa por violação das regras da competência reservada à Assembleia, no domínio da organização dos tribunais e do estatuto dos juízes.
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Estaremos, portanto, perante uma situação da inconstitucionalidade ainda que pontual, mas que pode vir a ferir todo o processo de colocação dos juízes interinos no tribunal de círculo.
Por outro lado, esta questão prende-se com a que há pouco tive oportunidade de colocar ao Sr. Secretário de Estado, ou seja, a de que, a haver uma lógica de globalização dos meios humanos e das infra--estruturas necessárias para o suporte da actividade dos tribunais de círculo, o sistema de interinidade vai colocar em radical crise todo esse programa de sustentação interdisciplinar. Porque os juízes que hoje estão num tribunal poderão amanhã estar noutro e, por isso, nenhum investimento quanto à própria formação dos juízes, designadamente no domínio em marcha da informática, terá sentido, terá validade, se esses não forem os juízes que, em previsão minimamente razoável, venham a exercer a sua função no tribunal em que a cada momento se encontram colocados.
Gostaria, também, de chamar a atenção para a situação em que se encontram as partes e as testemunhas relativamente a todos os processos - e tantos são - que vão correr nos tribunais do círculo. O custo que representam as deslocações não pode ser apenas, visto como o problema estrito de circulação das pessoas, mas tem também de ser visto tendo em conta o tempo que essa circulação e essa deslocação vai implicar em perda de dias úteis de trabalho. E quando, no decreto-lei regulamentar se propõe um sistema de compensação financeira para as deslocações em transportes, é caso para perguntar o que pode ocorrer com os dias de trabalho perdidos em função da necessidade de deslocação de partes e testemunhas para os julgamentos a ocorrer nos tribunais de círculo. Esta questão, creio, não está prevista no normativo e, portanto, deverá merecer da parte do Governo uma especial atenção.
Por outro lado, gostaria de chamar a atenção do Sr. Secretário de Estado e do Grupo Parlamentar do PSD para o facto de algumas promessas continuarem, por demasiado tempo, a ser promessas e, como tal, já não poderem, minimamente, receber qualquer posição tolerante desta Câmara. Refiro-me, em concreto, à questão, com esta conexa, da lei orgânica da Polícia Judiciária. Há três anos que se anda, de mês para mês, a prometer a apresentação da lei orgânica da Polícia Judiciária e continuamos nesse ponto. Ora, o problema da Polícia Judiciária, quer no que diz respeito à sua especialização no domínio do processo penal e da investigação criminal quer no que diz respeito à sua extensão territorial, são questões essenciais, a serem discutidas e decididas em complementaridade com qualquer reforma da estrutura judiciária.
Por tudo isto cremos que o Governo anda muito mal quando não consegue globalizar as medidas que se impunham nestes vários domínios.
Em conclusão, Sr. Presidente e Sr. Secretário de Estado, estamos disponíveis para continuar este diálogo e este debate, que julgamos deve ser aprofundado em sede de Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para podermos reflectir melhor sobre todas as implicações da reforma judiciária em curso. O Governo pode estar ciente de que, da parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, poderá contar com a sua crítica, mas uma crítica empenhada no sentido de que a solução final seja aquela que possa servir os interesses dos portugueses.
Aplausos do PS e da deputada Odete Santos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Mário Raposo e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.
O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria sublinhar um ponto que me parece muito importante. Todo este tipo de debates é, na minha perspectiva, muito útil e devo saudar os Srs. deputados dos demais partidos - neste caso a Sr.ª Deputada Odete Santos e os Srs. Deputados Jorge Lacão e Narana Coissoró - pelas contribuições que sempre, aqui e na 1.ª Comissão, têm dado, um diálogo a que o Governo tem correspondido com inteira abertura, para a melhoria das condições da administração da Justiça neste país. Deram hoje e têm dado sempre.
É evidente que, como é óbvio, as oposições são oposições, a política é política, e, por vezes, este diálogo descamba num aproveitamento partidário, o que é natural. Agora, não podemos, também, subestimar o que há, realmente, de procedente e de produtivo nos estímulos, nas aportações, nas perspectivas que têm dimanado dos partidos da Oposição. Este é, portanto, um ponto prévio que eu entendo dever sublinhar.
O segundo ponto, que é a razão da minha curta intervenção, refere-se a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Jorge Lacão, que acusa o Governo - acusa em sentido lato e entre aspas - de não alterar ainda mais a geografia judiciária do País e de não ter aproveitado este ensejo, esta janela legislativa aberta, para alterar também a geografia judiciária quanto aos distritos judiciais.
Ora, se todos nós já sabemos os problemas, as polémicas político-partidárias a que tem dado ensejo a criação dos tribunais de círculo, podemos, com facilidade, figurar o que teria ocorrido se se começasse a alterar a geografia judiciária quanto aos distritos judiciais, que não têm nada a ver com a proximidade das populações em relação aos locais onde se ministra a justiça. E um problema que, salvo o devido e muito sincero respeito, neste caso é totalmente irrelevante.
Finalmente, o Sr. Deputado pergunta e eu pergunto-lhe o que está errado no que o Governo tem falado sobre a Polícia Judiciária. É evidente que só quem está no Governo - e alguns dos que aqui estão já estiveram - sabe a dificuldade que há em poder encontrar uma nova orgânica para uma política tão complexa e de tantas dificuldades, nomeadamente logísticas, personalizadas e de funções, como é a Polícia Judiciária.
A meu ver, Sr. Deputado, e é essa a pergunta que lhe faço, não há uma interacção necessária entre esta lei e a projectada reformulação da lei orgânica da Polícia Judiciária.
Por fim, quanto a saber-se se há juízes interinos ou juízes privativos, é evidente que se algo está errado o Governo não tem culpa disso. A culpa estará noutra sede que não no Governo. Estará evidentemente, nos próprios juízes.
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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão: Apenas duas perguntas brevíssimas por falta de tempo.
Em primeiro lugar, não fiquei a saber bem, certamente porque não tenho o mesmo conceito de V. Ex.ª quanto a descentralização e desconcentração em matéria judicial. Sei, apenas, que há o Supremo Tribunal de Justiça, as relações, os tribunais de círculo e os tribunais da comarca. Além disso, pergunto o que entende V. Ex.ª por descentralizar e desconcentrar a justiça. Acha que o conceito administrativo se aplica à organização judiciária?
Quanto ao atlas judiciário já vimos que, realmente, não se pode fazer assim, aproveitando cada programa do Governo para baralhar as relações ou os círculos, etc.
A terceira pergunta, muito concreta, que desejava fazer é a seguinte: Tem V. Ex.ª, em nome do Partido Socialista, depositado na Mesa quaisquer propostas de alteração, como manda o Regimento, antes do fim do debate na generalidade?
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Em primeiro lugar, Sr. Presidente, para agradecer ao Sr. Deputado Mário Raposo o tom, de resto sempre cordial, com que suscita os diálogos que, quer no Plenário quer nas comissões, temos ocasião de travar e para lhe manifestar o meu apoio à suas considerações. Pena é - e nisto vai o meu tom crítico, não directamente ao Sr. Deputado Mário Raposo, mas à sua bancada - que esse tom de disponibilidade para o diálogo não seja, manifesta e patentemente, a posição do Grupo Parlamentar do PSD. E, portanto, enquanto me regozijo com a postura do Sr. Deputado Mário Raposo, critico, simultaneamente, o tom de auto-suficientes tradicionalmente revelado pelos deputados do PSD em tantos debates e também neste, como já se viu.
Quanto à pergunta que me formulou sobre a eventual conveniência de aumentar o número de distritos judiciais, penso que essa não tem que ser uma questão tabu porque, já prevendo dificuldades nessa matéria, a lei orgânica dos tribunais tem uma norma que prevê, por razões de política judicial, a criação de secções dos tribunais da relação, sem dar qualquer outra indicação sobre a oportunidade e a localização dessas secções. Mas, a convicção normativa em si mesma é de que algum desdobramento se revelará necessário. E, neste caso, a minha pergunta é: então não seria mais adequada uma ponderação da conveniência e da criação ex-novo de outros distritos judiciais para que pudéssemos viver não com secções, tão criticadas como foram pelos magistrados na previsão da sua criação, mas antes na clarificação e na emergência de novos distritos judiciais? Esta é a interrogação que faço, julgando que a questão é, em si mesma, pertinente.
Permita-me, por outro lado, discordar da sua asserção de que não há uma interacção necessária entre a reforma orgânica da Polícia Judiciária e a reforma, em curso, da estrutura da administração judiciária, na medida em que penso que o papel cada vez mais reforçado que a Polícia Judiciária tem no domínio da investigação criminal e a especialização que urge ser feita entre a especialização da Polícia Judiciária e as demais polícias e a dependência que todas têm relativamente ao Ministério Público, na lógica da última reforma do processo penal, tudo são questões que se relacionam com o modo de funcionamento dos tribunais e, por maioria de razão, com o modo de funcionamento dos novos tribunais do círculo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, terminou o seu tempo.
O Orador: - Concluirei rapidamente, Sr. Presidente.
Portanto, eu vejo esta conexão necessária e desejaria que o Governo a tratasse de forma interdisciplinar.
Finalmente, apenas para dizer ao Sr. Deputado Narana Coissoró que, efectivamente, não tomámos iniciativas de propostas na especialidade, nem foi o Grupo Parlamentar do PS que teve a iniciativa de suscitar esta ratificação, o que manifestei, isso sim, foi a minha disponibilidade para podermos todos, porque penso que outros Srs. Deputados estarão no mesmo estado de espírito, continuar a debater esta temática com o Governo e essa disponibilidade é, efectivamente, construtiva como o foi aqui, aquando do debate da lei orgânica, para encontrar a melhor solução.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Porque o Sr. Presidente já me avisou duas vezes de que o meu tempo tinha terminado, terei oportunidade de, em melhor momento, tratar com o Sr. Deputado Narana Coissoró a matéria da descentralização e desconcentração, numa perspectiva global e mais coerente relativamente ao ponto de vista que sustento quanto à descentralização da função pública lato sensu.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção e dispondo de cinco minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A posição do CDS nesta matéria é bastante simples, pois o CDS não requereu qualquer ratificação deste decreto-lei, não apresentou qualquer proposta de alteração à Mesa e não é obrigado a correr atrás das ratificações requeridas por outros partidos, quando se não convença de que a iniciativa legislativa do Governo merece qualquer reparo.
Se assim entendesse, ou teria procurado saber da existência de partidos que tivessem tomado esta iniciativa ou tomá-la-ia ele próprio.
Se o não fez, foi porque não sentiu a necessidade de, por enquanto, fazer qualquer reparo substancial ao decreto-lei sob censura.
Em primeiro lugar, este só poderia ser um momento para reabrir aqui o debate sobre os grandes princípios constantes da lei orgânica dos tribunais judiciais, se esse mesmo debate não tivesse sido exaustivo e cada um dos partidos não tivesse tomado posição sobre os seus princípios nucleares.
Na verdade, o debate sobre a organização judiciária foi exaustivo, o CDS teve ampla oportunidade de referir
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quais os princípios com que concordava e quais aqueles com que não concordava e não tem assim de vir outra vez repetir hoje estas mesmas posições, uma vez que elas constam do Diário da Assembleia da República e não passou o decurso do tempo suficiente para as modificar.
O diploma que ora apreciamos é, em sentido material, um instrumento adjectivo, na medida em que vem concretizar os grandes princípios da organização judiciária.
Se esta concretização merece alguns reparos, naturalmente que não podemos ir atrás de reivindicações de prestígio, isto é, como já afirmei, uma Câmara que, por exemplo, quer um tribunal de círculo na sua capital ou uma freguesia que quer um tribunal de comarca no seu território. Portanto há-de haver sempre pessoas que não concordam e outras que concordam com a legislação emitida.
Esta escolha é extremamente difícil. Assim, desde o momento em que há uma opção governamental, ela só poderia ser combatida se, em alternativa, se pudesse mostrar qual a solução melhor para os círculos.
Agora, dizer-se que vamos reabrir um amplo debate, chamando aqui à Assembleia os profissionais do foro, as autarquias locais, as freguesias e todos os restantes interessados na modificação de atlas judiciário português, parece-me, na realidade, uma posição de mero adiamento dos problemas, em vez de se tomar, naturalmente com reservas, esta distribuição instituída, averiguando dos resultados que ela vai produzir.
Em terceiro lugar, passo agora às propostas de alteração apresentadas pelo PCP, que chegaram ao conhecimento e que são cinco: três delas dizem respeito ao favor lavoratoris, uma ao tal grande debate e a última à deslocação do tribunal.
Quanto ao favor lavoratoris na jurisdição do trabalho, devo dizer que cada vez sou menos propenso a levar os tribunais junto dos trabalhadores, nomeadamente quando o trabalhador utiliza a sua opção de litigar no tribunal do local da sua residência, em vez de o fazer no tribunal do seu local de trabalho se for diferente. Isto porque então prejudica grandemente a entidade patronal, que tem o igual direito de ter o acesso às provas e ao tribunal do local que lhe seja mais benéfico, tal como o tem o trabalhador. De contrário, ficaria o empregador prejudicado, lesando-se o princípio das iguais armas de que dispõem ambas as partes, se se adoptasse o favor lavoratoris em prejuízo da posição da entidade patronal.
Quanto à questão das distâncias - passar de 50 para 25 e de 100 para 50 quilómetros -, ela é, na verdade, uma questão de modificar só por modificar.
Porque não 20?! Porque não 150?! Porque não 70?!
De modo que não vejo, assim, razão para se adoptar esta posição - se o Governo diz 50, eu digo 25, se o Governo diz 100, eu digo 50. Não é assim que se procede à facilitação e ao acesso à justiça!
Na realidade, como afirmaram o Sr. Secretário de Estado e o Sr. Deputado Mário Raposo, o acesso à justiça é coisa diversa do transporte de justiça, seja ele na camioneta, no comboio ou no carro de luxo. São aspectos diferentes e não vemos razão para modificar as distâncias estabelecidas.
Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não acompanharemos o PCP na recusa da ratificação deste diploma.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, e dispondo de cinco minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Oliveira.
O Sr. Carlos Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Está aqui em causa o efectivo exercício do direito na sociedade e a salvaguarda das liberdades e garantias dos cidadãos. Por tal, e embora não convencidos das efectivas razões que levaram, isoladamente, sublinhe-se, o PCP a apresentar esta ratificação, porque estendemos que a justiça neste país interessa a todos, como já tiveram oportunidade de ouvir, não nos limitamos a oferecer o mérito dos autos.
Com efeito, a justiça, o poder judicial, os tribunais, constituem temas aliciantes, mas devem ser tratados com superioridade. Interessa-nos o debate de ideias e aqui estamos se de ideias se tratarem. Mas, por tal, impõem-se conclusões, soluções e porque não reconhecer a sua justeza quando tais soluções efectivamente são justas, nasceram de trabalho, disponibilidade, empenhamento e, mesmo, coragem.
Da nossa parte e do debate já nesta Casa produzido, aquando da discussão da lei orgânica dos tribunais judiciais, soubemos ouvir sugestões sérias e razoáveis. Nessa altura, e em consequência, aceitámos soluções alternativas. Dessa forma prestigiámo-nos a nós próprios. Demonstrámos, no fundo, ter compreendido a verdade da nossa função.
Não rejeitamos combater o bom combate, concretamente o combate da justiça, da verdade, mas reconhecemos que, por vezes, tal combate se desenvolve de forma bastante sinuosa.
Pelo que já hoje aqui ouvimos, mas sobretudo pelo que aqui não ouvimos, mas é verdade, Srs. Deputados, não façamos profissão de fé baseada em interesses mesquinhos, egoístas, grosseiramente individualista.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso é António Gedeão!
O Orador: - Valoremos, sr.ª Deputada, efectivamente, a nossa função: servir, sem conveniências seja de que espécie for.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas vejamos, como se poderá, neste preciso momento, em que o tempo ainda não ditou a sua sentença, derrotar o que constituiu uma inovação: a nova organização judiciária e de cuja execução prática, sublinho, ainda ninguém, com verdade, poderá tirar qualquer conclusão.
Talvez por tal, hoje e aqui, como já referi, apenas o PCP se levante, aliás como lhe é peculiar, contra a inovação.
Será que, como legítimo representante do povo português, pelo menos aqui, não posso deixar este dado para reflexão? Que não possa tirar ilações políticas, nesta Casa, centro por excelência de reflexão política, deste comportamento da Oposição considerada no seu conjunto?
Sr. Presidente, Srs. Deputados, particularmente os Srs. Deputados do PCP: Desafio quem quer que seja a negar o que vou dizer a seguir e que traduz o que na área da justiça se tem feito.
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É ou não verdade que, no que se refere à aquisição de equipamento para os tribunais, 1988 revelou um investimento, relativamente ao ano anterior, superior em 193,2%
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Em Setúbal não dei por isso!
O Orador: - É ou não verdade que, quanto aos funcionários judiciais em funções, se verificou um acréscimo real de 11% de lugares, de 1987 para 1988 e que, em 1988, se decidiu a admissão de 750 novos funcionários?
É ou não verdade que, quanto a verbas dispendidas para aquisição de mobiliário para os tribunais, no ano de 1988, se verificou um crescimento na ordem dos 72%?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Até há ratos!
O Orador: - É ou não verdade que só no ano de 1988, se iniciou a construção de 15 novos palácios da justiça, quando, por exemplo, no período compreendido entre 1975 e 1987, apenas se concluíram 33.
Mas mais: também no ano de 1988 se formalizaram contratos para a elaboração de 19 projectos de construção de outros tantos novos tribunais.
Quando, em 1987 - ouçam bem, Sra. Deputados do PCP -, se despenderam cerca de 400 mil contos nesta área, em 1988 tal dispêndio foi na ordem dos 3 milhões de contos.
No presente ano, sendo certo que a actividade a desenvolver incluirá a continuação das obras e projectos iniciados em 1988, cujo volume de investimentos conheceu, nesse ano, uma subida de cerca de 650% relativamente a 1987, prevê-se que, contudo, possa atingir um acréscimo de 10% relativamente a 1988.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Aí, propagandista! ...
O Orador: - Vai proceder-se à contratação da construção de onze novos tribunais; à contratação da elaboração do respectivo projecto para mais vinte novos tribunais; a obras de adaptação em dezassete tribunais; iniciam-se as diligências necessárias para a aquisição de instalações para os Serviços de Registo e Notariado em dez localidades; a diligências para instalação de oito novos tribunais do trabalho; a grandes obras de beneficiação em sete palácios da justiça; à aquisição de instalações para o Tribunal de Família de Lisboa e para o Tribunal do Trabalho do Porto.
Srs. Deputados, designadamente do PCP, contrariem, se puderem, o que acabo de dizer, assumam, digam que não é verdade! Fica aqui o desafio, lançado com humildade, mas também com a certeza de que VV. Ex.ªs, porque apenas criticam porque têm de criticar, que condenam porque têm de condenar, ainda não demonstraram, e deviam-no, que são capazes de fazer melhor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos para nós que a justiça é um dos valores mais profundos da humanidade. A construção da justiça é obrigação de todos nós. Daí que privilegiemos o investimento nos tribunais.
Pretende-se dar ao poder judicial as condições essenciais para o seu correcto exercício. Damos à justiça o seu lugar cimeiro no conjunto das tarefas que lhe competem.
Por tudo isto, pelo que já aqui foi dito pelos meus colegas de bancada e, fundamentalmente, pela exposição pormenorizada e objectiva que o Sr. Secretário de Estado aqui nos deixou sobre o diploma em discussão, que por tal me dispensei de repetir, o Partido Social-Democrata votará por forma a não satisfazer as pretensões do Partido Comunista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tendo em conta os tempos disponíveis e o número de inscrições, vamos terminar este debate, procedendo depois às votações, o que deverá acontecer cerca das 19 horas e 45 minutos.
Para um pedido de esclarecimento, iria dar a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro. Porém, o Sr. Deputado Carlos Oliveira não dispõe já de tempo para responder.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, a minha pergunta é muito curta e concedo ao Sr. Deputado Carlos Oliveira quinze segundos para me responder.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Deputado Carlos Oliveira, ouvi com a máxima atenção essa sua listagem. Assim, a pergunta que lhe queria fazer é a seguinte: essa listagem é o Programa do Governo, tendo em vista a justiça para todos no ano 2000?
O Sr. Presidente: - Com quinze segundos cedidos pelo PCP, tem a palavra, para responder, Sr. Deputado Carlos Oliveira.
O Sr. Carlos Oliveira (PSD): - Sr. Deputado Vidigal Amaro, a sua pergunta não merece qualquer tipo de resposta, pelo que não vou utilizar os quinze segundos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Dispondo o Grupo Parlamentar do PCP de quatro minutos, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em primeiro lugar, queria dizer que o Sr. Deputado Carlos Oliveira começou por um debate no Orçamento do Estado, veio por aí sonhando e, às cegas, aterrou hoje no debate sobre o regulamento da lei orgânica dos tribunais judiciais. Não sabia, efectivamente, o que se estava a discutir.
A sua intervenção, Sr. Deputado, foi mesmo «aos costumes disse nada». Isto porque sobre a questão concreta que hoje se está a discutir, disse, efectivamente, nada.
Não temos hoje tempo de desfazer toda essa trama...
O Sr. Carlos Oliveira (PCP): - Fica o desafio!
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A Oradora: - ..., mas, se calhar, se o Sr. Deputado fosse a alguns tribunais e lhe caísse o tecto em cima, como, há muito pouco tempo, aconteceu em Setúbal, V. Ex.ª saberia que esse quadro idílico que pintou não corresponde à verdade.
No entanto, há um aspecto na sua intervenção que gostaria de corrigir, porque, obviamente, V. Ex.ª foi ler a minha intervenção aquando do debate da lei orgânica dos tribunais judiciais, retirando a expressão de um poeta e, ainda por cima, mal, sem as palavras certas. Neste termos, quero dizer-lhe que a expressão correcta de António Gedeão é a seguinte: «Enquanto tudo isto acontecer e o mais que não se diz, por ser verdade».
Enquanto acontecer neste país o que se está a verificar na área da justiça, nós, aqui na Assembleia da República, proporemos as medidas que entendermos necessárias, para que os efeitos maléficos do que se passa nessa área se atenuem e vão ao lugar certo.
Na altura do debate relativo à lei orgânica dos tribunais judiciais, repetidamente, quisemos saber quais as linhas essenciais da nova organização judiciária, não tendo o Governo revelado minimamente nada sobre essa questão. Porém, critica-se agora o PCP porque, depois de concretamente conhecer essas linhas relativas à dimensão e localização dos círculos, requereu ratificação do respectivo diploma, em face de o Governo nada ter respondido aquando do debate da lei orgânica dos tribunais judiciais.
Foi aqui dito hoje que se tratava de uma ratificação inútil, uma vez que a reforma se presumia positiva. No entanto, tudo o que se conhece não deriva já de uma presunção, mas da certeza de que esta reforma é negativa.
Não o é apenas para as autarquias que se manifestam contra, mas também para as populações, sendo em defesa dos interesses destas que as autarquias, mesmo do PSD, vêm reclamar contra esta reforma, dizendo que as deslocações dos seus munícipes vão agravar os custos da justiça, vão tornar-lhes mais difícil o acesso ao direito e aos tribunais.
Os Srs. Deputados têm na pasta da comissão abundante documentação sobre este aspecto e deveriam ter o trabalho de a ler.
Este regulamento pode ser melhorado. É o mesmo que endireitar, como foquei na intervenção, a sombra da vara torta, mas pode ser melhorado.
A questão, Srs. Deputados, não é vir aqui dizer que é obrigatória a deslocação do tribunal quando a distância das sedes é de 50 quilómetros. Isto não quer dizer nada!
Se apresentámos uma proposta no sentido da diminuição do número de quilómetros, foi para que pudéssemos discutir e pensar qual era o melhor critério.
A questão da distância inferior a 50 quilómetros não passa pelo aspecto de ter melhores transportes. Não é a mesma coisa a distância de Setúbal a Lisboa ou da Guarda ao Sabugal, que é mais pequena que a primeira! É por isso mesmo que estes critérios têm de ser repensados!
Não dizemos que o que apresentámos é o melhor. No entanto, temos a certeza que esta questão tem de ser discutida, com vista a obter a melhor solução na pior das soluções da lei orgânica dos tribunais judiciais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Iria terminar, dizendo que é óbvio que não estou de acordo com o Sr. Deputado Narana Coissoró quanto aos tribunais de trabalho.
Chamaria assim a atenção, nesta parte final da minha intervenção, para as graves consequências resultantes para os trabalhadores desta dimensão de alguns tribunais do trabalho e para o que se passará em consequência disto.
Não apresentámos nenhuma recusa de ratificação, Sr. Deputado Narana Coissoró. Entendemos sim que deve haver uma reflexão e que se devem ouvir todas as partes interessadas. É que, ao contrário do que Sr. Secretário de Estado referiu, os magistrados judiciais, mesmo antes da lei orgânica, estiveram contra esse sistema e os advogados de todas as partes do País também.
Será assim escamotear a questão o facto de vir aqui dizer que entre a lei orgânica e o regulamento não levantaram objecções. Pois se o mal já estava feito, eles terão pensado que já valeria a pena continuar a chamar a atenção para o mesmo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Efectivamente, tudo faremos para que sejam feitas reformas, já que não temos medo delas. Porém, devem ser reformas inovadoras, justas e nunca contra os interesses dos utentes da justiça.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Dispondo de três minutos, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por responder a uma pergunta feita pelo Sr. Deputado Vidigal Amaro, no sentido de saber se o referido pelo Sr. Deputado Carlos Oliveira era o Programa do Governo para o ano 2000.
Assim, respondo ao Sr. Deputado Vidigal Amaro dizendo que tal faz parte não só do Programa do Governo, mas também do Plano relativamente ao biénio 1989/90. Portanto, vamos com dez anos de avanço!
Relativamente à questão de novo colocada pela Sr.ª Deputada Odete Santos, remeto-a, se me der licença, para o próprio Diário da Assembleia da República, que insere uma declaração remetida em tempo a esta Assembleia pela Associação dos Magistrados Judiciais onde não há qualquer asserção aos tribunais de círculo.
A intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão leva-me a precisar um pouco certos conceitos que foram utilizados.
É óbvio que tudo o que tem a ver com a organização judiciária terá de ser visto com alguma especificidade, sobretudo do ponto de vista da regionalização e do próprio Direito Administrativo.
É evidente que não podemos agrupar comarcas que se agrupam em círculos judiciais e círculos judiciais que se agrupam em distritos judiciais, por forma diversa daquela que está desenhada na lei.
Com certeza que o Sr. Deputado não concebe que existindo uma comarca pertencente a um determinado círculo judicial, este seja fraccionado e dividido por dois distritos judiciais. Com efeito, era absurdo que as relações do Porto e de Coimbra estivessem a decidir de acções provenientes de comarcas relativas ao mesmo círculo judicial.
Portanto, toda a visão judiciaria tem em mente a realidade judiciária do País, nomeadamente para fins de
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jurisprudência. Não podemos assim fugir ao esquema que foi traçado.
O Sr. Deputado corrigiu-me afirmando que eu falei em 45 círculos judiciais e que são 47. Sr. Deputado, é óbvio que não considerei os casos de Lisboa e do Porto, círculos que, como sabe, consubstanciam uma realidade diferente.
Quero ainda referir que todos os serviços do Ministério da Justiça tiveram uma mobilização extraordinária para se conseguir, em tempo útil, avançar com os tribunais de círculo e para a sua instalação.
Conseguimos que um terço fossem instalados praticamente no prazo de seis meses. Vamos conseguir quase a totalidade até ao fim do ano - julgo que já não é trabalhar mal.
Por conseguinte, quando o Sr. Deputado refere que esta é uma reforma que está a ser implementada de forma muito demorada, não estou, de modo algum, de acordo consigo.
O Sr. Deputado Jorge Lacão abordou a questão dos juízes interinos, de uma forma que me pareceu invocar a sua inconstitucionalidade.
Pergunto ao Sr. Deputado se, considerando o facto de a lei orgânica destes tribunais prever a existência de juízes auxiliares, porque não a de juízes interinos, o que é, aliás, menos grave do ponto de vista de um estatuto de magistrado.
Não vejo assim qualquer inconstitucionalidade neste aspecto.
Por fim - estou a falar obviamente de forma telegráfica -, gostaria de referir a questão levantada, quer pela Sr.ª Deputada Odete Santos, quer pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, e relativa ao problema da comissão de serviço e dos juízes saídos do CE J poderem ir para os tribunais de círculo.
Não é verdade, Srs. Deputados. Basta olharem para o regulamento da lei orgânica em que se prevê a nomeação interina, pois aí se refere que os juízes têm de estar em comarcas de acesso final e isso significa que têm de ter já uns anos muito consideráveis de serviço.
Finalmente, e conforme disse há pouco, quero referir que julgo estarmos perante uma reforma positiva, a qual irá depender, fundamentalmente, dos magistrados, dos oficiais de justiça e dos advogados.
logisticamente, o Ministério da Justiça está e irá dar todo o apoio para que esta reforma seja positiva, estando ainda na disposição, face ao clima de abertura e diálogo que tem tido, nomeadamente com 1.ª Comissão, de nesta sede dar conta aos Srs. Deputados do evoluir no terreno da reforma judiciária, sempre que VV. Ex.ªs o desejarem. É com o máximo gosto que o faremos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate relativo à Ratificação n.º 28/V e vamos passar ao período de votações.
Queria informar a Câmara de que votaremos, em primeiro lugar, o projecto da resolução apresentado pelos Srs. Deputados do PS e relativo às Ratificações n.º 21/V e 24/V. Votaremos, de seguida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 82/V (Lei de Bases do Sistema Desportivo) e o Projecto da Lei n.º 336/V do PCP (Lei-Quadro da Cultura Física e do Desporto). Por fim, votaremos três pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do projecto de resolução, apresentado pelo PS, relativo às Ratificações n.ºs 21/V e 24/V.
Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD e do CDS.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa no sentido de dizer que em relação a este projecto de resolução há propostas de substituição e de emenda, pelo que ele deverá baixar à comissão.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é evidente que este diploma seguirá as tramitações previstas no Regimento e esclarecidas na Comissão de Regimento e Mandatos. Daí que a interpretação que o Sr. Deputado fez está correcta.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Certamente, Sr. Presidente. Apenas gostaria que ficasse registado que havia propostas de alteração.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 28/V - Lei de bases do sistema desportivo.
Submetido a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS e abstenções do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do Projecto de Lei n.º 336/V, apresentado pelo PCP - Lei-Quadro da cultura física e do desporto.
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP e do PRD e abstenções do PSD, do PS e do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na Mesa três relatórios da Comissão de Regimento e Mandatos, para apreciação. O Sr. Secretário vai proceder à leitura do primeiro relatório.
Foi lido o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 854 - Processo n.º 583/87 - 3.ª Secção, da Procuradoria da República do Círculo Judicial de Santo Tirso, de 26 de Setembro de 1988, enviado à Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Carlos Manuel Oliveira da Silva tendo a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações, como testemunha, no processo em referência.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Pausa.
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Visto ninguém pretender usar da palavra, vamos votar.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados Independentes Raul Castro e João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um segundo relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício s/n.º - Processo Disciplinar 1/87, da Auditoria Jurídica do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, de 18 de Janeiro de 1989, enviado à Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Mário Ferreira Bastos Raposo, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações por escrito no processo referenciado.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Visto ninguém pretender usar da palavra, vamos votar.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados Indepedentes Raul Castro e João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido o terceiro relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 2674 - Processo n.º 2313/88-OP, do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, de 14 de Novembro de 1988, enviado à Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado José Manuel da Silva Torres, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha, no âmbito do processo em referência.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Pausa.
Visto ninguém pretender usar da palavra, vamos votar.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados Indepedentes Raul Castro e João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima reunião terá lugar amanhã às 10 horas e o período da ordem do dia será preenchido com perguntas ao Governo, tendo já sido distribuídas pelos diversos grupos parlamentares a designação das perguntas que serão objecto da nossa apreciação. Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 50 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adriano Silva Pinto.
António Jorge Santos Pereira.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Pereira.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Jaime Gomes Milhomens.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Luís Bonifácio Ramos.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugénio Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
José Barbosa Mota.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Centro Social Democrata (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António José Caeiro da Motta Veiga.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Monteiro do Amaral.
Flausino José Pereira da Silva.
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Henrique Nascimento Rodrigues.
Joaquim Fernandes Marques.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Mendes Bota. José Pereira Lopes.
Licinio Moreira da Silva.
Manuel João de Vaz Freixo.
Manuel José Dias Soares da Costa.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Partido Socialista (PS):
António José Sanches Esteves.
Manuel António C. Ferreira Vitorino.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
Raul Fernando Sousela da Costa Pinto.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alfredo Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Maria Luísa Amorim.
As REDACTORAS: Maria Leonor Ferreira - Cacilda Nordeste.
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Depósito legal n.º 8818/85
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