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Sexta-feira, 17 de Fevereiro de 1989 I Série - Número 40

DIÁRIO da Assemblea da República

V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE FEVEREIRO DE 1989

Presidente: Ex.mo Sr. António Alves Marques Júnior

Secretários: Exmos Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinho Basto da Mota Torres
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ontem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e das respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado Ferraz de Abreu (PS) saudou S. Ex.ª o Presidente da República pela passagem do 3. ° aniversário da sua eleição, no que foi secundado pêlos Srs. Deputados Pacheco Pereira (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Maria Santos (Os Verdes) e Basílio Horta (CDS).
O Sr. Deputado Carlos Coelho (PSD) falou acerca da criação do Instituto da Juventude e, no fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Apolinário (PS) - que também protestou -, Basílio Horta (CDS) e Isabel Espada (PRD).
O Sr. Deputado Cláudio Percheiro (PCP) abordou alguns problemas resultantes da extinção do Gabinete da Área de Sines, opas o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Mendes Costa (PSD).
O Sr. Deputado Adriano Moreira (CDS) referiu a importância da criação de institutos tendentes à defesa da Língua Portuguesa, respondendo depois a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Lélis (PSD), Jorge Lemos (PCP) - que
deu também explicações ao Sr. Deputado António Coimbra (PSD) - e Edite Estrela (PS).

Ordem do dia. - Foi aprovada uma proposta de resolução, apresentada pela Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, dando assentimento à viagem oficial de S. Ex.' o Presidente da República ao Japão e ao Território de Macau entre os dias 22 de Fevereiro e 4 de Março.
A Câmara aprovou também, na generalidade, a proposta de lei n. ° 83/V - Autoriza o Governo a aprovar diplomas reguladores dos benefícios fiscais em sede de Imposto sobre Pessoas Singulares (IRS), de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas (IRC), da Contribuição Autárquica (CA) e de Imposto sobre Sucessões e Doações, bem como dos respectivos diplomas complementares. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa), os Srs. Deputados Carlos Lilaia (PRD), Octávio Teixeira (PCP), Carneiro dos Santos (PS), Nogueira de Brito (CDS), Domingues Azevedo (PS), Vieira de Castro, Gilberto Madail e António Martins (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.

rlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos da Silva e Sousa.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Gilberto Parca Madail.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel P. Chencerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.

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António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Martins do Vale César.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu F. Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Deputados Independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos requerimentos e das respostas a requerimentos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério da Educação e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulados pêlos Srs. Deputados Carvalho Martins e Cardoso Ferreira; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado Baptista Cardoso; ao Governo, formulados pêlos Srs. Deputados Silva Carvalho, Miranda Calha e Caio Roque; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes; ao Governo, formulados pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Magalhães; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Lage; ao Ministério da Educação, formulados pêlos Srs. Deputados Roleira Marinho e Julieta Sampaio; ao Governo, formulados por vários Srs. Deputados do PCP; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Cláudio Percheiro; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Raul Rego; ao Ministério da Educação e ao Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira, formulado pelo Sr. Deputado Mota Torres; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Casimira de Almeida; aos Ministérios do Planeamento e da Administração do Território e da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Marques Júnior; ao Governo e à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, formulados pela Sr.* Deputada Maria Santos; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira.
Por seu lado, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pêlos Srs. Deputados: Miranda Calha, na sessão de 28 de Janeiro; Fernando Gomes, na sessão de 23 de Março; Adão e Silva, na sessão de 26 de Maio; José Magalhães, nas sessões de 16 de Junho e 23 de Novembro; Jaime Gama e António Barreto, na sessão de 30 de Julho; António Mota, nas sessões de 23 de Junho, 21 de Julho, 14 de Dezembro e 5 de Janeiro; Gaspar de Almeida, na sessão de 5 de Julho; Caio Roque, nas sessões de 10 de Novembro e 3 de Janeiro; Mendes Bota, na reunião da Comissão Permanente do dia 15 de Setembro e nas sessões de 18 de

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Outubro e 18 de Novembro; Herculano Pombo, na reunião da Comissão Permanente do dia 22 de Setembro e na sessão de 23 de Novembro; João Salgado, na reunião da Comissão Permanente do dia 29 de Setembro e nas sessões de 14 de Dezembro e 3 de Janeiro; Filipe Abreu, na sessão de 27 de Outubro; Jorge Lemos, na sessão de 2 de Novembro; Octávio Teixeira, na sessão de 11 de Novembro; lida Figueiredo, na sessão de 17 de Novembro; Rogério Moreira, na sessão de 23 de Novembro; Maria Santos, na sessão de 24 de Novembro e 3 de Janeiro; Jaime Marta Soares, na sessão de 24 de Novembro; António Braga, nas sessões de 7 e 15 de Dezembro; Rui Silva, Carlos Brito e Marques Júnior, na sessão de 14 de Dezembro; Manuel Filipe, nas sessões de 14 e 20 de Dezembro e 3 de Fevereiro; José Manuel Mendes e João Corregedor da Fonseca, na sessão de 15 de Dezembro; Álvaro Brasileiro, na sessão de 15 de Dezembro; Roleira Marinho, na sessão de 6 de Janeiro; António Vairinhos, na sessão de 12 de Janeiro; e José Apolinário, nas sessões de 19 de Janeiro e 2 de Fevereiro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A vida das nações é constituída por uma sucessão de factos que caracterizam o seu quotidiano. Mas a história das nações é feita apenas por alguns desses factos que, pelo seu relevo, pelo seu significado e pêlos efeitos que produzem são verdadeiros marcos na vida social e política dos povos.
Em 16 de Fevereiro de 1986, com a eleição para a Presidência da República, produziu-se um desses factos. Já à partida tudo indicava para que assim fosse. É que não se tratava de uma eleição qualquer. Ia eleger-se pela primeira vez, após um largo interregno de várias dezenas de anos, um presidente civil, reatando-se assim uma tradição da República e dando forma à supremacia do poder civil. Mas quando, pelas 22 horas dessa noite, se tornou evidente para todos os socialistas, os apoiantes e os eleitores de Mário Soares, a sua vitória, o facto histórico estava produzido. E isto porque também o candidato eleito não era um homem qualquer.
Conhecíamos o personagem, o seu passado de lutador em prol da democracia, da liberdade e da solidariedade; conhecíamos a sua actuação antes e depois do 25 de Abril, o prestígio internacional com que surpreendeu o País e que utilizou na defesa e consolidação da revolução e tínhamos admirado a coragem e a determinação que pôs na luta para reconduzir ao trilho democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Conhecíamos o seu ânimo para enfrentar os momentos difíceis vividos pelo país, nunca virando a cara e assumindo sempre as mais altas responsabilidades com um sentido de verdadeiro homem de Estado, mesmo quando daí resultava o sacrifício da sua imagem e da sua popularidade.
Sabíamos do seu comprometimento e permanente disponibilidade para se bater contra os atropelos à legalidade democrática, contra a discriminação, a injustiça social, a desigualdade de oportunidades e conhecíamos a sua natural e excepcional capacidade para o diálogo e a atracção que exercia sobre quem dele se aproximasse. Por tudo isto, naquela noite, era nossa profunda e sincera convicção que os portugueses acabavam de eleger o melhor candidato para seu presidente, convicção logo fortalecida pelo primeiro gesto público de Mário Soares já eleito, ao anunciar que a partir daquele momento se recusava a ser o presidente dos seus eleitores e se assumia como o presidente de todos os portugueses...
Aplausos do PSD do CDS e de Os Verdes.

... confiando, para que não restassem dúvidas, o seu cartão de militante e fundador do Partido Socialista à guarda do seu companheiro de lutas António Macedo.
Naturalmente que ninguém terá estranhado e todos terão compreendido que naquela noite tenham sido os socialistas, entre todos os portugueses, os que mais vibraram e que mais se emocionaram com a vitória de Mário Soares. E que todos nós nos tenhamos sentido orgulhosos por ver um dos nossos, sair das nossas fileiras para ir ocupar o cargo de supremo magistrado da nação! Mas o nosso júbilo tinha ainda outras razões que assentavam na certeza do que representava a vitória de Mário Soares para a consolidação, reforço e defesa das instituições democráticas e para a continuação da política de integração na Comunidade Económica Europeia, em que nos encontrávamos todos empenhados e de que ele fora o principal artífice, vencendo as oposições vindas então de vários quadrantes.
E se nessa noite os outros portugueses, os que tinham escolhido outro candidato, conheceram a amargura da derrota e da frustração, a verdade é que não demorou muito que começassem a sentir que o compromisso de Mário Soares, de que iria actuar como presidente de todos os portugueses, não era apenas uma figura de retórica, mas significava um firme propósito, próprio das suas convicções democráticas e socialistas. E se de início este sentimento foi tímido, ele rapidamente se fortaleceu face à actuação responsável, isenta, inteligente e criativa do presidente, no seu relacionamento com o País e com os restantes órgãos de soberania (permitindo o regular funcionamento das instituições, como jamais se tinha observado), na defesa dos interesses culturais, económicos e sociais das várias regiões, com relevo para as mais esquecidas, e ainda no seu permanente esforço para melhorar a imagem do País na cena internacional com o sucesso que só o seu prestígio, as suas qualidades e as suas excepcionais relações têm permitido.
Foi assim confirmada a nossa convicção de que naquela noite fora eleito o melhor candidato para os portugueses. Basta ver agora, em qualquer local ou região por ele visitada, a espontaneidade e o entusiasmo com que é acolhido pela população e ouvir as expressões de admiração e simpatia onde nem sequer falta o slogan que faz época, mas agora enriquecido do significado de «Soares é mesmo fixe».
E só continuam a não aceitar esta evidência, a recusar ver nele o político mais experimentado e prestigiado do País, aqueles que viram na sua eleição um obstáculo intransponível para os seus desígnios de derrubarem as conquistas democráticas do 25 de Abril, saudosos que

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são de uma sociedade autoritária, defensora de privilégios e inimiga do pluralismo democrático.
Não é nossa intenção estarmos aqui a fazer o panegírico do Sr. Presidente da República, nem o inventário da sua actuação, o que seria temporalmente uma pretensão despropositada.
Também não estamos aqui a tentar justificar e a apresentar as razões que nos levaram a lembrar à Câmara e ao país que se comemoram hoje três anos sobre a data da sua eleição, por nos parecer desnecessário e não ser essa a nossa única intenção.
As considerações que tecemos têm, isso sim, a finalidade de servirem de suporte às homenagens que, como cidadãos, entendemos dever prestar-lhe pela maneira como tem sabido exercer o seu alto cargo no rigoroso cumprimento do compromisso assumido naquela noite de Fevereiro de 1986 de ser o presidente de todos os portugueses.
E também queremos, agora como deputados, prestar-lhe as nossas homenagens e demonstrar-lhe o nosso respeito e admiração pela maneira como tem defendido, respeitado e privilegiado as relações com a Assembleia da República «o coração da democracia e o órgão que melhor a representa e simboliza», como várias vezes Mário Soares tem proclamado numa pedagogia bem necessária.
Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria afirmar que nós socialistas estamos certos que não somos os únicos a respeitar, a apreciar e a aplaudir a forma como o Sr. Presidente da República tem prestigiado o alto cargo que desempenha; que somos acompanhados nesta manifestação de apreço, por todos os deputados de todos os partidos e que ninguém se recusará a juntar-se a nós para considerarmos a data de 16 de Fevereiro de 1986 como uma data histórica da nossa democracia e para endereçarmos a S. Ex.ª o Sr. Presidente da Republica as nossas homenagens e as nossas calorosas saudações.
Aplausos do PS, do CDS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento inscreveram-se os Srs. Deputados Pacheco Pereira, Octávio Teixeira, Maria Santos e Basílio Horta.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, sob a forma de pedido de esclarecimento, eu gostaria de dizer alguma coisa sobre o conteúdo da intervenção que V. Ex.ª produziu.
Ultrapassadas as circunstâncias que deram origem à eleição do Sr. Presidente da República e que, de imediato, nada têm a ver com a forma e o modo como tem exercido o seu mandato, e ultrapassando a possibilidade e a redução que um aproveitamento partidário possa tirar da comemoração da sua eleição, nós, social-democratas, também aproveitamos esta oportunidade para nos congratularmos e apresentarmos, por esta via, ao Sr. Presidente da República as nossas saudações pela forma como tem exercido o seu mandato, servido os altos interesses da nação e dignificado as suas próprias funções.
Aplausos do PSD, do PS, do PRD, do CDS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, gostaria de usar da palavra para, em nome do meu grupo parlamentar, nos associarmos à saudação pela passagem do terceiro aniversário da eleição do Sr. Presidente da República. Aproveitamos, pois, esta oportunidade para lhe desejar os melhores sucessos no exercício do seu mandato.
Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (Os Verdes): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, em nome do Partido Ecologista Os Verdes, gostaria de expressar os nossos votos de satisfação pela passagem de mais um aniversário da eleição do Sr. presidente da República Portuguesa.
Na verdade, o Sr. Presidente da República, como teve oportunidade de manifestar num dos seus brilhantes discursos, dedicou muita atenção a uma área tão fundamental como é a da problemática ecológica em Portugal.
Nesse sentido, expressamos ao Partido Socialista e a todos os deputados desta Câmara a nossa real satisfação pela passagem de mais um ano de mandato do Sr. Presidente da República Portuguesa.
Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, a bancada do CDS associa-se ao reconhecimento generalizado da forma como S. Ex.ª o Sr. Presidente da República tem exercido o seu mandato. Na realidade, tem-no feito com rara isenção, representando com grande dignidade e independência o Estado português.
Por outro lado, o CDS entende frisar neste momento a particular importância política do cargo que S. Ex.ª exerce: numa altura em que há um Governo apoiado por um só partido, numa altura em que neste Parlamento um só partido tem maioria absoluta, o Sr. Presidente da República é, sem dúvida, um símbolo de isenção, um sinal de independência. Como tal o CDS o considera.
Aplausos do CDS, do PSD, do PS, do PRD e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Srs. Deputados, permitam-me que responda a todas V. Ex.ª em simultâneo.

Quando na intervenção que produzi afirmei que tinha a certeza de ser acompanhado por todos os deputados desta Assembleia não me equivoquei. Tinha mesmo a certeza de que iria ser acompanhado nas saudações que desejava que todos nós enviássemos ao Sr. Presidente da República.

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Peço-vos que não estranhem que tenha sido o Partido Socialista a tomar esta iniciativa: estou certo de que se eu a não tivesse tomado outro deputado de uma outra bancada teria subido à Tribuna para o fazer.
Ao produzirmos esta intervenção não houve da nossa parte qualquer intenção de nos «assenhorearmos» do Sr. Presidente da República ou de termos qualquer ganho partidário.
Certamente que todos compreenderão o justo orgulho que temos de das nossas fileiras ter saído o Presidente Mário Soares. Isso não o escondemos; afirmamo-lo publicamente e espero que assim continuemos para o bem do País e da democracia portuguesa.
Aplausos do PS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu companheiro de bancada e de partido Sr. Deputado Duarte Lima escreveu há cerca de três semanas no órgão oficial do partido (Povo Livre») que «A democracia portuguesa precisa de uma oposição séria e responsável, que seja credível e que seja alternativa».

Esta oposição precisa de se afirmar com credibilidade em todos os momentos da vida política nacional e tem que tornar claro perante a Câmara e os portugueses qual é o fulcro essencial e justificado das críticas que faz ao Governo.
Gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados para uma das maiores reformas da política global e integrada da juventude, que se traduziu na criação do Instituto da Juventude.
Depois de termos ouvido todos os partidos representados na Assembleia da República, requeremos a presença do Sr. Ministro-Adjunto e da Juventude na comissão parlamentar, o que sucedeu ontem da parte da manhã, por forma a que o Governo, perante o Parlamento, pudesse tornar claras as intenções que presidiram a esta reforma das suas estruturas.
Mas vamos ver quais são as críticas que a Oposição tem dirigido ao Governo sobre esta matéria. Era primeiro lugar, diz-se que o Governo só sabe criar organismos; não faz políticas mas cria serviços. E a primeira pergunta que se deve colocar é .a de saber se os serviços que agora são criados traduzem ou não inovação na maneira como o Estado se organiza e tenta dar resposta aos problemas dos cidadãos. É importante saber se os serviços agora criados se traduzem ou não no plano da administração por acentuada economia de meios e se há ou não efectiva desburocratização.
A crítica de que o Governo só sabe criar organismos é falaciosa e a afirmação de que com isso se cria mais burocracia é um disparate. Na prática, o Governo funde dois serviços distintos, alivia peso administrativo e burocrático, dispensando pessoal administrativo para o quadro geral de excedentes da função pública. E, mais importante do que tudo isso, o Governo, ao acentuar a ligação entre a antiga Direcção-Geral da Juventude e o Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis, garante coerência na implementação de uma política global e integrada de juventude, como há muito vimos exigindo.
A segunda crítica é a de que o instituto se fez contra e sem a participação juvenil. Sr. Presidente e Srs. Deputados: Nada é rigorosamente mais falso!
Pela primeira vez os planos de actividade dos organismos da Administração Central são elaborados com a participação dos jovens e a avaliação anual das actividades deste organismo vai ser submetida ao Conselho Consultivo da Juventude. E este conselho fica, pela primeira vez, dotado da capacidade de, sob proposta do conselho directivo, se pronunciar sobre todas as questões que digam respeito ao funcionamento do Instituto da Juventude.
E, mais importante do que tudo isto, não se trata apenas de dar capacidade de consulta a um órgão criado pelo Governo, onde têm assento todas as organizações partidárias de juventude e as principais organizações não partidárias de juventude mas, sim, a capacidade de, por sua iniciativa, dirigir recomendações aos serviços da Administração Pública. Nunca em Portugal foi dado aos mecanismos e às instituições da sociedade civil a capacidade de, por sua iniciativa, dirigirem ao Governo recomendações no sentido de melhorarem o funcionamento das instituições do Estado.
A terceira crítica que a Oposição dirige é a de que se asfixia o movimento juvenil. Como é isso possível se o Instituto da Juventude criado se traduz numa aposta acentuada nas delegações regionais do instituto, antigas delegações regionais do FAOJ?
Como é isso possível se na filosofia dos centros de juventude e com a possibilidade de eles serem coogeridos pêlos jovens e pelas suas organizações locais, se dá, pela primeira e, a possibilidade de efectiva cogestão das infra-estruturas regionais dos serviços de juventude da Administração Central?
Como é isso possível se pela primeira vez se cria a figura dos Conselhos Consultivos Regionais onde têm assento representantes das associações de estudantes dos ensinos secundário e superior, os representantes das associações nacionais de juventude e das organizações locais de juventude, que vão funcionar como verdadeiros mecanismos de fiscalização dos delegados regionais do instituto?
A Oposição critica o instituto porque, em sua opinião, esta é mais uma decisão que governamentaliza a política de juventude, no contexto de um discurso global sobre o «Estado laranja» que de algum tempo a esta parte tem vindo a ser feito pela Oposição. Como pode ser isto possível, Sr. Presidente e Srs. Deputados se, pela primeira vez, a nomeação do Director-Geral e dos Subdirectores-Gerais, chamados presidente e vogais do Conselho Directivo de Juventude, é subordinada ao parecer do interlocutor do Estado, que é o Conselho Nacional de Juventude, composto por livre vontade organizativa das principais organizações nacionais da juventude portuguesa. Como pode isso ser possível se através do mecanismo do Conselho Consultivo da Juventude se irá processar uma fiscalização permanente do instituto, de forma a que, pela primeira vez, haja efectivo controlo por parte da sociedade civil do funcionamento das organizações do Estado por parte da sociedade civil?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fica demonstrado à sociedade que estas quatro principais críticas com que a Oposição brindou o Instituto da Juventude são falaciosas e não têm fundamento.

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Contudo, não quero deixar de recordar aqui a opinião da JSD sobre a matéria, na sequência das deliberações da última reunião da Comissão Política Nacional.
A JSD, no manifesto eleitoral de 19 de Julho, recordou aquilo que definia como Instituto da Juventude; uma instituição onde se concebesse e executasse a política global e integrada da juventude, com a participação dos jovens e para os jovens.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, há aqui uma questão de legitimidade política: é que só pode afirmar o que este instituto deveria ser quem primeiro tentou definir o que é um Instituto de Juventude em Portugal. Nada vale a um conjunto de organizações da juventude da Oposição vir agora dizer que este não é o instituto que defendiam se antes não souberam criticar a estrutura que o Estado tinha do FAOJ e da Direcção-Geral da Juventude e definir com precisão aquilo que em sua opinião deveria constituir a máquina do Estado nesta área. Só têm legitimidade para aferir da razoabilidade da decisão que o Governo agora tomou aqueles que antes souberam definir os caminhos da mudança que defendiam nesta área e nesta estrutura.

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - Agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a única coisa que podem fazer é avaliar as vantagens e ou os inconvenientes que decorrem da comparação da estrutura que existia com a que agora é criada.
A Juventude Social-Democrata não foge a esta comparação. Provavelmente que muitos não compreenderão a nossa postura, mas ela é coerente e é a nossa. Queríamos um instituto mais participado, e dissemo-lo antes. Mas não podemos deixar de reconhecer que o que se fez representa um progresso assinalável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há sempre quem ganha e quem perde com as mudanças. Pelo que vimos ganharam os jovens, que aumentaram as suas possibilidades de intervenção e de participação, e perdeu a Oposição porque, uma vez mais, demonstrou não ter razão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados José Apolinário, Basílio Horta e Isabel Espada.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, falemos claro: O Sr. Ministro-Adjunto e da Juventude criou o instituto tirando da «cartola um novo coelho»...

Risos do PS.

... atendendo à impopularidade que gozava no País, e o Sr. Deputado Carlos Coelho veio aqui defender esta fórmula chamada Instituto da Juventude.
Mas, para além de um discurso laudatório da estratégia de marketing do Governo, o Sr. Deputado Carlos Coelho nada disse em relação àquilo que são os problemas concretos dos jovens portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que a JSD e o Sr. Deputado estão a favor do regime, profundamente injusto, de acesso ao ensino superior que o Governo do PSD pretende impor aos jovens portugueses? Por que é a JSD e o Sr. Deputado estão mudos perante as limitações do acesso à habitação, nomeadamente no que respeita ao acesso ao crédito por parte dos jovens portugueses?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que a JSD e o Sr. Deputado estiveram calados perante o brutal encerramento das rádios locais?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que a JSD e o Sr. Deputado têm mantido uma posição de defesa de um ministro que é responsável pela comunicação social e, como prémio, pela censura do programa de Herman José, acto que reconduziu o novo conselho de gerência da RTP?
Protestos do PSD.

Qual é a posição irreverente, concreta e que vai ao encontro aos interesses dos jovens portugueses que o Sr. Deputado e a JSD aqui vêm defender?
Do que precisamos não é apenas de um discurso laudatório da estratégia de marketing do Governo. Do que precisamos é de uma organização de juventude do partido do Governo que seja séria e protagonista dos reais interesses e dos legítimos anseios dos jovens portugueses...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, precisamos de uma organização de juventude que não se limite a um discurso laudatório, pretensamente irreverente, e que, a propósito da questão do Instituto de Juventude não a venha aqui transformar em questão central dos problemas da juventude portuguesa.
Na verdade, o discurso do Sr. Deputado Carlos Coelho pareceu-me mais um certo redimir perante algumas declarações públicas que ultimamente fez e que criaram alguns problemas na bancada de que faz parte.
Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, pretende responder já ou no final a todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Curiós Coelho (PSD): - Respondo no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, a questão que vou colocar-lhe é rápida e simples.
Ultimamente, o Sr. Deputado fez-se notar por declarações feitas em seu nome e penso que no da juventude do seu partido, declarações que iam um pouco

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contra a corrente monocórdica e cinzenta a que a situação nos tem habituado.

Vozes do PSD: - Cinzenta, não: laranja!

Risos.

O Orador: - Sim, laranja - como preferem esse nome, não vou recusar-me a usá-lo.
O que é um facto é que eu estava realmente à espera que V. Ex.ª amargasse essa «laranja»...

Risos do CDS.

... assim como estava à espera sempre do discurso laudatório, que veio hoje.
A propósito do Instituto da Juventude, teve de fazer a sua «Via Sacra» de arrependimento e de penitência.

Risos do CDS.

Compreendo que seja assim. Era apenas para confirmar essa regra de que «quem dá uma no cravo tem de dar logo duas na ferradura». Compreendo que seja assim!...
A pergunta simples que quero fazer-lhe é esta: Sr. Deputado Carlos Coelho, no seu «governo sombra» - melhor do que este que está ao sol! - mantinha o Ministro da Juventude e Desportos?

Risos do CDS, do PS, do PCP e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.

A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Deputado Carlos Coelho, antes de colocar-lhe as perguntas, devo dizer-lhe que considero que V. Ex.ª tem todo o direito de fazer os exercícios de redenção que achar necessários.

Protestos do PSD.

É natural que o Sr. Deputado tenha aproveitado esta oportunidade exímia para, depois da presença do Sr. Ministro-Adjunto e da Juventude em sede de comissão fazer no Plenário uma intervenção no período de antes da ordem do dia.
Ao dizer isto, não quero que pense que estou a chamá-lo oportunista, mas o que é facto é que foi uma oportunidade bem aproveitada.
Em relação ao Instituto da Juventude, há um aspecto que só por si indica uma enorme contradição. Enquanto que o Sr. Ministro-Adjunto e da Juventude começou por dizer que a proposta de criação do Instituto da Juventude era um acto meramente administrativo e que, por esse facto, nem era preciso levá-la ao Conselho Consultivo da Juventude para que este desse o seu parecer, o Sr. Deputado Carlos Coelho transfere este acto, pura e simplesmente administrativo, para a grande reforma da política global de juventude.
Gostava que V. Ex.ª me explicasse esta contradição entre as suas palavras e as do Sr. Ministro e que me dissesse por que razão este diploma, se é a grande reforma da política global de juventude, não foi levado ao Conselho Consultivo da Juventude.
Em relação aos Conselhos Consultivos Regionais de que falou, sabe bem que na altura em que esta matéria foi discutida chegámos à conclusão de que estes conselhos não tinham rigorosamente quaisquer poderes.
São, pois, uma falsidade, uma vez que não têm acção em área alguma; apenas dão parecer sobre matérias em relação às quais o Governo, neste caso o Instituto da Juventude, lhe apetece remeter.
Aquando da presença aqui do Sr. Ministro-Adjunto e da Juventude, tive ocasião de dizer que, na minha opinião, o Instituto da Juventude esvazia as competências do Ministério da Juventude, mas pode ser uma vantagem para o Sr. Ministro, uma vez que tem outras tarefas a cumprir, nomeadamente noutras áreas. Portanto, todas as funções que o ministério tinha são remetidas para o Instituto da Juventude. Neste momento - até se vê nos anúncios da televisão -, aquilo que era da responsabilidade do ministério passou a ser da responsabilidade do Instituto da Juventude!...
A última questão que eu gostaria de colocar-lhe é esta: o Sr. Deputado acabou a sua intervenção dizendo que os jovens tinham ganho com este instituto. Sr. Deputado, no último ano, o que é que os jovens têm ganho em áreas como a da educação, a da habitação, a do ensino, a do trabalho? Concretamente, gostava que me indicasse quantos postos de trabalho foram criados para os jovens...

Vozes do PRD: - Muito bem!

Protestos do PSD.

A Oradora: - ... e o que é que se conseguiu de bom em teremos educacionais, porque, isso sim, é que é importante, Sr. Deputado.
Para além do Instituto da Juventude - a grande reforma da política de juventude! -, quais foram as outras grandes reformas noutras áreas?

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Srs. Deputados, é sempre com muito regozijo que o presidente da JSD constata que a atenção generalizada com que a Câmara acompanha as posições que a JSD torna públicas, aqui e lá fora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Vou responder a cinco questões concretas que me foram colocadas e, por uma questão de cavalheirismo, começo por responder à Sr.ª Deputada Isabel Espada que me colocou duas questões diferentes e que me ajudam a identificar a irrazoabilidade das posições que a Oposição tem divulgado a este respeito.
Diz a Sr.ª Deputada Isabel Espada, com um ar indignado, o seguinte: «Se é assim tão importante, por que é que o Governo não submeteu a reforma dos serviços ao Conselho Consultivo da Juventude? Se é assim tão importante, por que é que o Governo não suscitou a participação do parceiro social ou dos jovens?»
Bem, Srs. Deputados, desafio a que me digam qual o governo, que, depois do 25 de Abril, naturalmente, que tenha procedido à reforma dos serviços dependentes dos membros do Governo dialogando com os parceiros sociais. Os parceiros sociais são ouvidos para a discussão das políticas e, naturalmente, o Sr. Ministro Couto dos Santos tem de desafiar as organizações de juventude a pronunciarem-se sobre aquelas questões a

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que os Srs. Deputados Isabel Espada e José Apolinário fizeram referência, tem de propor às organizações de juventude as políticas que o seu ministério e o Governo, todo ele, no âmbito da política global e integrada, pretendem executar.
Desde quando é que o Ministro da Agricultura discute com a CAP se cria uma direcção de serviços, uma direcção-geral ou se extingue um outro qualquer serviço.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Ele não discute, impõe!

O Orador: - Desde quando é que o ministro da Indústria discute com a CIP se cria ou não uma direcção-geral para gerir o PEDIP? Desde quando é que o ministro do Emprego e da Segurança Social discute com a UGT ou com a CGTP/Intersindical se cria ou se funde serviços no âmbito do ministério? Isso não faz sentido! O que é lícito que as organizações de juventude exijam não é que o Estado discuta com elas a reforma dos seus serviços, mas que o Estado discuta com elas o âmbito, a forma de implementação e os objectivos da política de juventude.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Tudo o resto é mistificar não só o conceito de participação como o próprio exercício das competências do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, diz a Sr.ª Deputada Isabel Espada que os Conselhos Consultivos Regionais não têm poder. A senhora consegue vir à Assembleia dizer que esses conselhos não têm poder? Não pode! É óbvio que eles não têm capacidade de condicionar a decisão, mas têm acesso à informação. A senhora, que também tem engrossado o discurso do «Estado laranja»...

Risos do PS e do PCP.

Srs. Deputados, não se riam. Deixem ouvir!
Como eu estava a dizer, tanto a Sr.ª Deputada Isabel Espada como muitos de VV. Ex.ªs que têm engrossado o discurso sobre o «Estado laranja» nunca tiveram a coragem de vir aqui denunciar, por exemplo, a situação que todos os governos depois do 25 de Abril tinham em relação ao FAOJ. Qualquer organização de juventude ia ao delegado do FAOJ pedir um subsídio e contentava-se com aquilo que o Estado dava, uma vez que desconhecia qual era a percentagem que isso representava no «bolo», se uma organização congénere era melhor ou pior tratada, quais eram os critérios que estavam fixados - e algumas vezes nem sequer estavam! - para a atribuição desses subsídios. Era, pois, permitido todo o tipo de manipulação e de instrumentalização.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pela primeira vez, quando um membro do Governo tem a coragem de pôr em lei que as organizações de juventude, ao terem assento nesse conselho, passam a ter acesso a todas as verbas, passam a ter acesso à possibilidade de opinar sobre os critérios da sua atribuição e a conhecer não só aquilo que a sua organização recebe mas também aquilo que as outras organizações recebem, num plano de transparência e de fiscalização efectiva, os senhores acham que este conselho não serve para nada.
Então os senhores, que têm atacado o «Estado laranja», os senhores que têm atacado os outros Estados - e não atacam alguns porque não vos convém! -, ao menos reconheçam que, nesta área, pela primeira vez, um membro do Governo tem a coragem de tornar transparente os mecanismos de decisão, particularmente naquilo que diz respeito ao apoio às organizações de juventude e naquilo que é mais sensível a muitas organizações da sociedade civil, que é o campo dos subsídios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O tempo escasseia, no entanto não queria deixar de fazer três referências ligeiras.
A primeira tem a ver com a intervenção do Sr. Deputado José Apolinário quando se refere à redenção. Srs. Deputados, não tenho que me redimir para vosso contentamento. Compreendo que alguns Srs. Deputados não gostem das posições da JSD. Uns não gostam quando elas são «laranjas» escuras; outros, não gostam quando são «laranjas» claras. Contudo aconselham-nos esta capacidade: a de dizermos aquilo que queremos com coragem e frontalidade nos momentos que decidirmos e com os nossos próprios critérios. Felizmente, não são os outros deputados quem avaliam da pertinência das posições da JSD. Temos os nossos próprios órgãos e somos responsáveis perante os jovens que representamos e que continuamos, orgulhosamente...

Vozes do PS: - Sós!

O Orador: - ..., a entender que são a maioria dos jovens portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Apolinário (PS): - Isso é uma mistificação!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado Basílio Horta fez uma referência ao Governo e perguntou-me se eu, no meu Governo, mantinha o ministro da Juventude e dos Desportos. Sr. Deputado Basílio Horta, não sei qual é o ministro da Juventude e dos Desportos. Conheço o Ministro-Adjunto e da Juventude.

Protestos do CDS.

Presumo que estaria a referir-se a este Governo e não a outros.

Protestos do CDS.

Quero dizer-lhe, Sr. Deputado Basílio Horta, que o meu Governo é o seu Governo. É o Governo de Portugal, a partir do momento em que foi viabilizado por esta Câmara e que tem a confiança institucional do Sr. Presidente da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, gostaria de dizer que fiz uma acusação não a propósito do Instituto da Juventude, mas da maneira como a Oposição entende a sua participação na democracia portuguesa.
Fiz uma acusação política dirigida à Oposição, particularmente à Juventude Socialista, pela maneira como, demagogicamente, tem criticado o Instituto da Juventude e o Sr. Deputado José Apolinário, em vez de desmentir tudo aquilo que eu disse da Tribuna, pretendeu fugir para outros campos.
O Sr. Deputado José Apolinário falou da minha prestação de serviço e deixe-me retribuir-lhe a gentileza. Se calhar, depois do congresso do Partido Socialista, é o senhor quem tem de apresentar serviço à sua bancada.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Apolinário (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, peço a palavra para defesa da honra e da consideração.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, para defesa da consideração, gostava de esclarecer, em primeiro lugar, que é certo que é necessário fazer, em Portugal, uma reflexão e um debate sobre a participação juvenil.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - O Sr. Deputado não está a defender a honra!

O Orador: - Se me permite, Sr. Deputado, já vai ver, a seguir.
Não colocamos esta questão como sendo partidária ou de menor importância.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não parece!

O Orador: - A intervenção do Sr. Deputado Carlos Coelho, na parte que diz respeito as «redenções», é que merece, necessita, implica, necessariamente, esta intervenção.
O Sr. Deputado Carlos Coelho não pode, em rigor, acusar-nos de não colocarmos os interesses dos jovens portugueses como primeira prioridade da nossa intervenção.
O Sr. Deputado Carlos Coelho não pode confundir as questões de índole partidária nem a dimensão da intervenção partidária na actividade política com um instrumento secundaríssimo, acessório, que corresponde ao Instituto da Juventude.
O Sr. Deputado Carlos Coelho não pode confundir os interesses partidários da organização de juventude a que preside com os interesses da juventude portuguesa. Essa é a tentação hegemónica que perpassa pelo «Estado laranja» e que, pêlos vistos, também perpassa pela mente do Sr. Deputado Carlos Coelho em relação à perspectiva da participação juvenil, que é a perspectiva em que se fala da participação da sociedade civil, para, a todo o momento, estar a condicionar essa participação em função dós cânones, dos princípios e do domínio do aparelho de Estado.
Foi isto que fizeram quando afastaram alguns delegados do FAOJ, foi isto que fizeram e têm feito em relação ao controlo dos subsídios para as organizações de estudantes e juvenis, é isto que os senhores, repetidamente, fazem em relação à participação juvenil.
Sr. Deputado Carlos Coelho, as nossas posições podem ser mais ou menos ouvidas, mas são posições que partem de uma base séria, de uma base em que os interesses dos jovens portugueses estão em primeiro lugar. Confundir isso com questões no plano interno - como, pêlos vistos, o Sr. Deputado terá colocado depois de certas intervenções públicas - é querer confundir a árvore com a floresta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo confessar o meu embaraço...

Vozes do PS: - É natural!

O Orador: - Pensava que o Sr. Deputado José Apolinário tinha ficado ofendido com a minha intervenção e queria dar-lhe explicações, mas não vislumbrei num único momento desta última intervenção do Sr. Deputado José Apolinário um único ponto que permitisse recorrer à figura regimental que usou.
Pensava eu que o Sr. Deputado iria dizer que estava ofendido comigo, porque quando eu disse que ele não tinha razão, quando desmontei a acusação de que este Governo...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Amontuou!

O Orador: - ... Não tem política e só cria organismos quando procede à racionalização de serviços e à fusão de dois organismos num só, pensei que o Sr. Deputado José Apolinário tinha uma resposta a dar.
Pensei que o Sr. Deputado José Apolinário me viesse dizer que tinha ficado ofendido quando eu disse que não tinha razão quando acusou o Instituto da Juventude de não permitir a participação juvenil quando ela é viabilizada ao nível da fiscalização da actividade do instituto, ao nível da participação no Conselho Consultivo da Juventude e ao nível da participação nos Conselhos Consultivos Regionais.
Pensei que o Sr. Deputado José Apolinário tivesse ficado ofendido comigo quando desmontei a acusação política...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Amontuou!

O Orador: - ... de que com o instituto se pretende asfixiar o movimento juvenil e apontei as áreas de inovação objectiva e de maior transparência nos serviços públicos.
Pensei que o Sr. Deputado José Apolinário tivesse ficado ofendido comigo quando desmontei a actuação de governamentalização...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Amontuou!

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O Orador: - ... e tornei claro que, pela primeira vez, o Estado, ao nível das direcções-gerais, exerce o seu poder de nomeação condicionado ao parecer de organismos representativos de interesses válidos da sociedade civil.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Sr. Deputado José Apolinário não se redimiu de todas as acusações que fiz à fundamentação objectiva das críticas da oposição e não se redimiu dessa acusação maior que tentei trazer aqui à Câmara e que pronunciei da Tribuna: para que a oposição, particularmente a do Partido Socialista, seja uma oposição credível e responsável, que se afirme como uma alternativa tem de afirmar as suas posições com bastante mais razoabilidade e com argumentos bem mais justificados do que aqueles que agora usou.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão passados mais de três anos sobre a resolução do Conselho de Ministros, de 7 de Fevereiro de 1986, que tinha em vista a extinção do gabinete da área de Sines, sem que até hoje tenham sido resolvidos todos os problemas que afectam as populações e as autarquias de Santiago do Cacem e Sines.
É caso para se perguntar onde está a eficácia do «bom governo» do Sr. Ministro Valente de Oliveira.
As justas reclamações das autarquias têm sido, ao longo destes anos, varíadissimas e unânimes no seu objecto e revestido formas tão diversas, como as das discussões com as populações, com o Governo e com a Assembleia da República.
São igualmente conhecidas as posições públicas dos representantes locais das várias correntes políticas.
Mas esta unanimidade de objectivos responde o Governo não legislando para um adequado enquadramento legal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O complexo de Sines, que tem o seu nascimento em 19 de Junho de 1971, no consulado marcelista e no Portugal colonialista, parido de ideias megalómanas e centralistas, visava a construção de um complexo industrial, de um terminal oceânico, de uma cidade satélite, qual capital da indústria europeia.
Tudo isto se fazia a «bem da nação», ofendendo os direitos das populações e, assim, expropriaram-se terrenos a baixos preços, impediu-se a venda na zona de intervenção do GÁS e retiraram-se competências às autarquias em todas as vertentes, limitando os seus direitos e diminuindo as suas receitas.
Têm sido mais de quinze anos consecutivos de denegação de direitos às populações e ao poder local democrático, nascido com o 25 de Abril.
Só em 30 de Março de 1987 é que as atribuições e competências, definidas pela Lei n.° 79/77, foram em pane restituídas àquelas autarquias.
Para que tal acontecesse foi determinante a apresentação de um projecto de Lei do PCP durante a IV Legislatura, que contribuiu para o diálogo com o conselho de gestão do GÁS e com o Governo, que se viu constrangido a implementar o cumprimento da lei, de acordo com as justas reclamações das autarquias.
Foi, sem dúvida, um passo decisivo e importante que permitiu trazer ao conhecimento da Assembleia da República e aos deputados tal aleijão da actuação governamental.
Ao longo destes anos, varíadissimas têm sido as tentativas dos eleitos locais para se chegar a um acordo que dê uma solução positiva e resolva a situação vivida nestes concelhos, inédita no País.
A solução exigia e exige equilíbrio de forma a que a Administração Central assuma as suas responsabilidades, sem a asfixia da Administração Local, quando for tomada a anunciada decisão de extinção do GÁS.
Esta questão central passa pela publicação de legislação que enquadre a transferência de competências e património para as autarquias de Santiago do Cacem e de Sines.
Tal legislação foi anunciada em 29 de Dezembro de 1988 pelo porta-voz do Conselho de Ministros, tendo, na terça-feira passada, aqui neste mesmo Plenário, sido afirmado pelo Sr. Ministro Valente de Oliveira que o atraso na publicação do diploma não resultava de qualquer problema especial.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, levantam-se rumores de que tal diploma não cumprirá os acordos previamente estabelecidos com as autarquias: fala-se, no caso da Câmara Municipal de Santiago do Cacem, que a rede de distribuição eléctrica em baixa tensão do centro urbano de Santo André não irá ser transferida para a autarquia, conforme constava do projecto de decreto-lei e que tinha obtido a anuência da câmara e assembleia municipais; fala-se, que os encargos com trabalhadores que transitarão do GÁS para a Câmara de Santiago do Cacem só serão suportados pela Administração Central durante e somente por um ano. Os trabalhadores que a câmara não integrar nos seus quadros durante esse ano passarão para o quadro de excedentes; fala-se que a Administração Central não assumirá a celebração de contratos-programa, financiamentos especiais em obras e investimentos que deveria ter executado, fugindo assim às suas responsabilidades e compromissos assumidos.
Se tudo isto for verdade, cabe aqui perguntar de que serviram as reuniões dos responsáveis autárquicos com o conselho de gestão do GÁS, a anuência na generalidade ao projecto do decreto-lei dado pelo executivo camarário, por unanimidade, em 29 de Julho de 1988 e pela assembleia municipal em S de Agosto de 1988, também por unanimidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O atraso na publicação do referido diploma, bem como os rumores atrás referidos, preocupam as populações e os seus eleitos, uma vez que continua a ser possível a existência de negócios pouco transparentes.
A título de exemplo, vejamos um caso paradigmático de transacção imobiliária.
O gabinete da área de Sines vendeu um prédio urbano, situado no Largo Almeida Garrett, n.ºs 1 e 2, na Vila de Santiago do Cacem, mais propriamente no seu coração, prédio esse com três frentes, r/c e 1.° andar. Imaginem, Srs. Deputados, quanto custou ao feliz comprador tal prédio? A ridícula quantia de 180 contos...!
Por mero acaso, o feliz beneficiado foi o PSD...!

Vozes do PCP: - É uma vergonha!

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O Orador: - Entretanto, pasme-se quanto aos critérios: a alguns comerciantes de pequenas lojas, o gabinete está a pedir milhares de contos. É mais um escândalo e uma injustiça, a somar às muitas que têm envolvido o complexo de Sines.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.

O Sr. Mendes Costa (PSD): - Sr. Deputado Cláudio Percheiro, ouvi, com alguma atenção, a sua intervenção sobre os problemas que afligem a zona do gabinete da área de Sines.
Como o Sr. Deputado sabe, esse problema tem sido seguido com muita atenção por todos os deputados eleitos pelo círculo de Setúbal. Temos tido, sobre o assunto, muitas reuniões, tanto com o gabinete da área de Sines como com alguns membros do Governo.
Parece-me, no entanto, que a intervenção do Sr. Deputado Cláudio Percheiro foi feita fora de tempo pois só deveria ser produzida após a publicação do decreto-lei que anunciou. Talvez por isso o Sr. Deputado só tenha colocado hipóteses e nenhumas certezas.
Francamente, não entendo a preocupação do Sr. Deputado! ... Se a matéria contida no futuro decreto-lei não servir os interesses do poder local na zona, o PCP pode, em conformidade com a lei, usar os mecanismos de ratificação que se encontram ao seu alcance. Portanto, é melhor esperar para ver do que falar em hipóteses ou referir aquilo que vai acontecer e que, certamente, não acontecerá.
Penso que, relativamente à repartição justa do património que era gerido pelo gabinete da área de Sines, estamos todos do mesmo lado.
Quanto ao imóvel de que falou, o Sr. Deputado esqueceu-se de referir que o PSD era inquilino do prédio há já bastante tempo e que, nessa qualidade, teve sobre ele uma opção de compra.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Por 180 contos?

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Deputado Mendes Costa, relativamente à questão que me pôs sobre se não seria melhor esperar pela publicação do decreto-lei, lembro-lhe que, normalmente, onde há rumores desta natureza alguma coisa existe de verdade.
Se o Sr. Deputado conseguir demonstrar que não é verdade aquilo que abordei com base nos rumores que correm nos concelhos de Santiago de Cacem e de Sines, faça o favor de me desmentir.
Quanto à referência de que, tal como aconteceu com o PSD, também o PCP poderia vir a exercer o direito de opção sobre um imóvel que ocupasse, o que eu referi na minha intervenção foi que, por «mero acaso», o feliz contemplado foi o PSD!... E que, numa área urbana situada no coração de Santiago de Cacem, onde o preço de venda do metro quadrado de área coberta está avaliado em 60 contos, o PSD conseguiu comprar 70 metros quadrados por 180 contos!...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E pagou sisa?

Risos do CDS.

O Orador: - Francamente, Sr. Deputado! Há aqui qualquer coisa de anormal!...
Por outro lado, Sr. Deputado, pensei que fosse colocar-me também questões que envolvem toda esta zona do gabinete da área de Sines.
Como sabe, ao longo destes quinze anos, o assunto tem sido um caso inédito no País pois o gabinete tem subvertido todas as competências que os municípios tinham naquela área.
Embora conheça a sua preocupação sobre esta matéria, por o Sr. Deputado a ter manifestado na subcomissão quando dela fez parte, lembro-lhe que há uma questão central a ponderar, a de que o Governo nunca respondeu aos relatórios produzidos pela subcomissão. Por que é que o Governo não nos diz claramente o que é que quer fazer em relação a esta situação?
Aquilo que se sabe, Sr. Deputado, é que são graves as intenções do Governo quando ocorrer a extinção do gabinete da área de Sines.
O que se passa na área do centro urbano de Santo André é ainda mais grave e existem aí situações pouco transparentes, Sr. Deputado. Refiro-me, nomeadamente, à venda das habitações do centro urbano de Santo André. Por acaso o Sr. Deputado sabe o que lá se passa? Não sabe mas devia saber!... Era bom que se inteirasse desse problema porque os habitantes do centro urbano não estão nada satisfeitos com aquilo que por lá se está a passar, sobretudo em termos da venda das lojas aí existentes pelas quais estão a pedir às pessoas que construíram essas mesmas lojas, nas zonas chamadas de módulos vazados, milhares de contos! ... Milhares de contos, Sr. Deputado, para ficarem com aquilo que elas mesmo construíram!... Isto é lamentável, Sr. Deputado!...
No entanto, o critério para o PSD foi diferente!...

O Sr. Fernando Gomes (PCP): - 180 contos!...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mendes Costa pede a palavra para que efeito?

O Sr. Mendes Costa (PSD): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Mendes Costa (PSD): - O Sr. Deputado Cláudio Percheiro afirmou ter eu dito que o PCP não usava os mesmos «carimbos» que o PSD. Eu não disse isso!... O Sr. Deputado confundiu a minha pergunta! ... O que eu disse foi que o PCP podia usar o mecanismo da ratificação do futuro decreto-lei. Foi apenas isto que eu disse e que nada tem a ver com o imóvel.
Relativamente a este quero esclarecer, mais uma vez, tanto o Sr. Deputado como a bancada do PCP, de que o PSD era arrendatário de um prédio no centro urbano de Santiago de Cacem - aliás, um prédio em ruína, quase a desmoronar-se -, imóvel esse que realmente comprou pelo preço que o Sr. Deputado referiu e onde está a realizar obras, que importarão em 5 mil contos.
O PSD não fez como o PCP, que ocupou ali uma escola primária indevidamente, em 197S!... E não

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pagou!... Era melhor que o PCP tivesse em atenção aquilo que faz antes de produzir afirmações do teor das que produziu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Orador: - Nós não ocupamos, nós arrendamos! ... o PCP ocupa!...

Aplausos do PSD.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): - Por corrupção. Por 180 contos?... Bom negócio!...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sem sisa!... Risos do CDS.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Quem é desconfiado não é sério!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Deputado Mendes Costa, em relação à figura regimental que utilizou, a de defesa da honra, parece-me que não ofendi o Sr. Deputado, de maneira nenhuma! A carapuça só enfia em quem ela servir...!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao imóvel, Sr. Deputado, V. Ex.ª sabe muito bem que o preço por metro quadrado de terreno, naquela área, está a ser vendido a 60 mil escudos. Não lhe parece, Sr. Deputado, que há qualquer coisa de estranho na compra de 70 m2 de área coberta por 180 contos?
No entanto, se o Sr. Deputado acha que o processo foi perfeitamente transparente em todas as suas vertentes, convido-o a subscrever, imediatamente, a abertura de um inquérito a este caso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir aos nossos trabalhos alunos das seguintes Escolas Secundárias: da Amadora, de Macedo de Cavaleiros, «Emídio Navarro», de Viseu, «D. Maria», de Coimbra, e «António Aleixo», de Portimão. Peco, para eles, a habitual saudação.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem-nos parecido - e por isso o temos sustentado - que, desaparecido o histórico modelo imperial, com ele não desapareceu a área cultural que se desenvolveu durante séculos e que tem, na língua portuguesa, o seu principal elemento de identificação, ligação e dinamização. Pusemos, para tal fim, esperanças fundadas na interligação das universidades, com exercício da autonomia, que se implantaram ao serviço dessa área, mas também julgamos que deveria a defesa da língua ser confiada a um organismo específico, no qual participassem, em pé de igualdade, todos os países cujas populações têm o português como língua geral ou como língua oficial. Esta proposta foi, há anos, por nós apresentada na Academia Brasileira de Letras, foi repetida em Outubro passado no Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, do Recife, em reunião de representantes de todos os países de expressão oficial portuguesa; tem sido divulgada em conferências e artigos; em Janeiro de este ano foi reeditada na Sociedade de Língua Portuguesa. Mas - e é o que desejamos recordar -, quando o Presidente José Sarney visitou esta Câmara, disse expressamente quando o saudei: «Encerrado o ciclo imperial, a mesma área é hoje sede de estados que falam a mesma língua e é necessário que encontremos forma de se reencontrarem, com novos modelos de cooperação e solidariedade - e pela língua podíamos começar -porque é um património comum não isento de perigos, como nos observam que se passa com o espanhol em Angola e o francês na Guiné... Para defesa de um património comum seria apropriado uma instituição comum, e, por isso, insistimos no projecto de um Instituto Internacional da Língua Portuguesa, que em tempos lembramos à Academia Brasileira de Letras e que, supomos, deveria merecer o interesse dos governos; a presença igual dos países na mesma instituição é remédio contra quaisquer perigos de neocolonialismo, que o Brasil sempre ajudaria a eliminar». O dinâmico Dr. Fernando Freyre, dirigente do Instituto Joaquim Nabuco, tornou-se defensor da ideia e lemos na imprensa portuguesa, de IS de Fevereiro, o seguinte: «Portugal, juntamente com os países africanos de língua oficial portuguesa, tem de criar um mecanismo de acção comum para a defesa do português como língua de cultura - sublinhou o ministro da Cultura do Brasil, José Aparício de Oliveira, actualmente em visita ao nosso país, depois de um périplo que o levou a Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Angola e Moçambique». E acrescenta a imprensa: «Esses projectos incluem a criação de um Instituto Internacional de Língua Portuguesa (proposto pelo Presidente José Sarney) e um Fundo Bibliográfico da Língua Portuguesa (proposta pela ministro da Cultura de Moçambique)». E reconfortante verificar que nem todas as sugestões feitas nesta Câmara pela Oposição são inúteis porque, algumas vezes, há quem escute - e neste caso foi o Presidente José Sarney, do Brasil. Não há inconveniente, talvez antes pelo contrário, em que a iniciativa seja tomada por um governo que não é o português. E parece indiscutível que pelo menos o Governo português deve dar todo o apoio à iniciativa, que vai abranger pontos importantes do Oriente, designadamente Goa, Malaca e Macau. Embora, como disse uma vez o padre Dr. Manuel Rocha, o português seja uma língua em que Nossa Senhora falou ao mundo, é avisado saber que se trata de um domínio em que é conveniente correr em vez de confiar apenas na protecção celestial, porque são interesses nacionais importantes que estão em causa. O facto de ser o Brasil a tomar a iniciativa deve ser encarado como demonstração, ao mesmo tempo, da importância do caso e de que, na área cultural lusófona, existe a vontade política, sem a qual nenhum projecto desta natureza é possível. Temos a convicção de que a Secretaria de Estado da Cultura, que a imprensa noticia estar em contacto com o ministro brasileiro, não deixará de canalizar, para apoio do projecto, todos os meios ao seu alcance, para o que contará, certamente,

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com a colaboração de todas as instituições responsáveis. Desejo, para terminar e aproveitando esta oportunidade, prestar homenagem ao Professor Agostinho da Silva, o mestre desta portugalidade para além das fronteiras que ainda não recebeu a consagração que merece.

Aplausos do CDS, do PSD, do PS, do PCP e do PRD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Léus, Jorge Lemos e Edite Estrela.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Professor Adriano Moreira, feliz ou infelizmente, segundo o Regimento e a praxe desta Casa, quando um deputado de qualquer bancada se levanta para responder a uma intervenção de um deputado de outro partido, fá-lo normalmente para um protesto, muitas vezes sob a figura falaciosa do pedido de esclarecimento.
Creio que, desta vez - e pelo entendimento que tenho dos meus colegas de bancada -, não há lugar a qualquer protesto ou a qualquer pedido de esclarecimento escorregando da proposta e da intervenção de V. Ex.ª mas, sim, a um agradecimento e à manifestação de convergência das nossas opiniões.
Se algum «pecado» houve na sua intervenção, Sr. Deputado, ele foi, talvez, ocasionado pela omissão. Isto porque o actual ministro dos Negócios Estrangeiros deu já publicidade ao interesse que tem na criação de um Instituto Português, de que o actual Instituto da Cultura e da Língua Portuguesa (ICALP) seria a base, caso não fosse englobado nesse novo instituto.
Creio que, embora não estejam ainda publicitadas todas as intenções relativamente a esse instituto, nem mesmo a sua lei orgânica, o contributo que V. Ex.ª hoje aqui deu - com a sua autoridade, com o seu interesse, com o seu empenhamento -, os nomes que citou, quer internacionais quer nacionais, vêm reforçar esse empenhamento.
Apraz-me intervir no curto espaço de tempo destinado aos pedidos de esclarecimento para sublinhar a receptividade da minha bancada e até do Governo - um âmbito diferente do nosso e que, por vezes, se fica no plano das intenções - ao acrescimento que aqui trouxe.
Referi, há pouco, o Ministério dos Negócios Estrangeiros - o Sr. Deputado referiu, na sua intervenção a Secretaria de Estado da Cultura - mas, na realidade, há que ver - e, muitas vezes, o nosso referencial confunde-se - qual o departamento que deve fazer concitar todos esses esforços, congregá-los e fazer progredir uma política.
Diria ainda ao Sr. Deputado que se alguém referiu que o século XXI ou será religioso ou não o será, no meu entendimento e no entendimento de muitos dos nossos companheiros, o século XXI ou será cultural ou não o será. E esta afirmação, transportada para Portugal, também o é.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Adriano Moreira, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Adriano Moreira queria, em primeiro lugar, saudar a sua intervenção.
Penso que trouxe a esta Casa uma reflexão interessante, que tem a ver com a nossa afirmação, como povo, no contexto das nações.
Face às questões colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Lélis gostaria de comentar que as intenções manifestadas devem transcrever-se em números. Nesse sentido, lembraria ao Sr. Deputado Carlos Lélis que o Instituto da Cultura e da Língua Portuguesa viu o seu orçamento reduzido no Orçamento do Estado para 1989, comparativamente ao Orçamento para 1988. Do nosso ponto de vista, uma tal redução orçamental não dá a entender grande avanço no desenvolvimento deste instituto.
Por outro lado, parece-me extremamente interessante verificar que um deputado do PSD, ao fim de três anos de governo desse partido, nos venha dizer que ainda não há um entendimento, dentro do próprio Governo, sobre o departamento que deverá tratar desta matéria. Isto é extremamente preocupante!...
Penso que esta questão, Sr. Deputado Adriano Moreira, se prende também com outras formas de valorização da cultura portuguesa. Refiro, a propósito, o que ocorreu há dias com a atrofia de uma das nossas expressões culturais, a música, bem como o que está preparado para as orquestras sinfónicas.
Mas o meu pedido de esclarecimento incide sobre uma matéria concreta. Recebi, há dias, um relatório da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e foi com enorme tristeza que verifiquei, enquanto português, que Portugal se esqueceu de enviar a essa assembleia parlamentar o trabalho que estava a desenvolver em favor dos filhos dos nossos emigrantes. Foi com mágoa, Sr. Deputado Adriano Moreira - e gostava que comentasse isto - que constatei terem os espanhóis referido que, para além da defesa dos interesses dos filhos dos trabalhadores espanhóis, estavam também a desenvolver cursos de língua e cultura portuguesa para os filhos dos emigrantes portugueses.
Deixo-lhe esta interrogação, Sr. Deputado Adriano Moreira: será que nos poderemos afirmar, sobretudo quando se adivinha o grande embate de 1993, procedendo desta maneira? Será que é com um governo que se esquece de enviar à Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa o mínimo de informação, para ser considerada em termos de relatório internacional, sobre o trabalho que está a desenvolver relativamente aos filhos dos seus emigrantes, que permite que sejam eles a dizer o que estão a fazer pêlos filhos dos nossos emigrantes, será com um governo como este que defendemos os interesses nacionais, a nossa cultura e a nossa língua?

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

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A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Começaria por saudar a intervenção do Sr. Deputado Adriano Moreira e por me congratular pelo facto de as questões da língua portuguesa gerarem a unanimidade que, tão raramente, acontece nesta Câmara.
É bom que tenhamos o entendimento de que a língua portuguesa é uma vertente importante da nacionalidade.
Penso que a intervenção do Sr. Deputado foi tanto mais pertinente quanto, muito brevemente, nos dias 1, 2 e 3 de Março, se realiza em Lisboa o I Congresso de Escritores de Língua Portuguesa. Aí serão certamente debatidas estas questões que nos preocupam e que parecem preocupar todos os intervenientes no debate que fazemos neste momento, sejam eles das bancadas da Oposição, sejam eles da bancada da maioria.
Aproveitaria para aqui recordar a interessante polémica suscitada pelo recente Projecto de Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro, que mexeu com as pessoas, que trouxe ao de cima questões tão importantes e que, nomeadamente, fez sentir aos portugueses que a língua materna a todos diz respeito e não só a meia dúzia de intelectuais e de linguistas.
Era intenção dos negociadores dos diferentes países de língua portuguesa criar um Instituto Internacional de Lusofonia, que teria como função fundamental a elaboração do vocabulário técnico e científico - que tanto se faz esperar! - e a promoção da edição conjunto de obras de grande vulto para todos os países Lusófonos.
Também estava prevista a criação de uma base de dados acessível a esses sete países.
É verdade que o Brasil tem chefiado, em algumas áreas, as questões da língua portuguesa. Nós, portugueses, temos-lhes deixado vasto espaço de intervenção. Por demissão e negligência nossa, eles sentem-se com o direito e até o dever de tomar a iniciativa.
É verdade que nós não somos donos da língua portuguesa, que dela somos condóminos juntamente com o Brasil e com os países africanos que a adoptaram como língua oficial portuguesa. Sublinho a expressão «língua oficial portuguesa», que é a que deve ser usada em vez de países de expressão portuguesa porque esses países têm a sua própria expressão.
O Brasil tem, realmente, tomado algumas iniciativas no âmbito da língua portuguesa e, muito provavelmente, continuará a toma-las se nós não formos capazes de ocupar o espaço que nos pertence. Veja-se o que acontece nos países de língua oficial portuguesa, nomeadamente em Angola, onde nem sequer centros de cultura portuguesa existem. São professores de todas as nacionalidades, ironicamente quase com excepção das nacionalidades portuguesa e brasileira, que aí estão a ensinar a língua portuguesa.
Queria também referir a imagem de Portugal no Mundo, de que tanto agora se fala. Penso que é necessário, urgente mesmo, que repensemos a imagem que queremos dar de nós ao mundo. Se queremos enveredar pela via comercial - como tudo até agora indicia, o que eu lamento - ou se queremos valorizar a vertente cultural. Parece-me ser esta a via mais adequada à divulgação da imagem de um povo que tem tantos séculos de história e que é portador de um legado histórico-cultural que urge dar a conhecer aos outros povos, aproveitando a receptividade que a adesão às Comunidades motivou.
Saibamos nós aproveitar esta grande oportunidade, saibamos nós dignificar a imagem de Portugal no Mundo!

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se também, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado António Coimbra. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Coimbra (PSD): - Gostaria apenas de rectificar uma questão colocada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Deputado desconhece que a educação dos filhos dos portugueses no espaço comunitário, designadamente em Espanha, é da responsabilidade dos países de acolhimento?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não tem nada a ver com isso!

O Orador: - Desculpe, mas foi dessa questão que falou.
É da responsabilidade do Governo português a educação dos filhos dos emigrantes mas também é da responsabilidade do Governo espanhol - aliás, se houvesse fortes comunidades estrangeiras no nosso país, essa seria também uma das responsabilidades do nosso Governo. Portanto, o que o Sr. Deputado disse é profundamente errado e demonstra uma grande ignorância nesta matéria, desculpar-me-à que lhe diga.

O Sr. Luis Roque (PCP): - O Sr. Deputado, não sabe o que diz, nem diz o que sabe!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não compreendi bem a que título é que o Sr. Deputado que acabou de falar interveio, mas como o meu nome foi citado gostaria de, ao abrigo da figura que o Sr. Presidente considerar mais adequada, responder. Na verdade, o Sr. Deputado inscreveu-se para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Adriano Moreira mas acabou por se dirigir a mim.
Portanto, se for necessário, utilizarei a figura da defesa da honra.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, ponha este rapaz na ordem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, a Mesa foi informada de que o Sr. Deputado António Coimbra tinha pedido a palavra para fazer um pedido de esclarecimento. Como o Sr. Deputado sabe, não é norma da Mesa referir-se ao tipo de esclarecimentos que são feitos. Aliás, em termos regimentais, o Sr. Deputado Jorge Lemos sabe qual é a única figura possível para intervir...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É ao abrigo dessa figura que estou a solicitar que V. Ex.ª me conceda a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é a figura regimental que quer utilizar?

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O Sr. Jorge Lemos (PCP) - É a figura do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, vou ser extremamente rápido e tenho pena que o Sr. Deputado que me antecedeu não tenha lido o relatório a que aludi.
O Conselho da Europa realizou um estudo sobre o trabalho desenvolvido pêlos diferentes países relativamente aos filhos dos trabalhadores emigrantes, no seu interior e em acções externas quanto a emigrantes seus no estrangeiro.
Assim sendo, perguntei ao Sr. Deputado Adriano Moreira se achava bem que, por um lado, Portugal não tivesse respondido a este inquérito e, por outro lado, que, em relação a uma questão concreta como a das acções em favor dos filhos dos nossos emigrantes, se omitisse por completo.
Há ou não acções? Por que razão não houve resposta? Foram só estas as questões que coloquei! Será esta a melhor política para servir os interesses nacionais? É essa a política do PSD?
Eu não estou a pôr em causa que os espanhóis façam acções para os emigrantes portugueses ou que os suecos ou os franceses as façam; que as façam nos termos comunitários, muito bem! O que pergunto é como é que, numa matéria desta natureza, Portugal tem o desleixo de nem sequer responder a um inquérito destes.
Se o senhor não percebeu a pergunta que, aliás, não lhe era dirigida mas, sim, ao Sr. Deputado Adriano Moreira, o problema é do PSD e não meu.
Aguardo a resposta do Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Presidente: - Em termos regimentais, o Sr. Deputado António Coimbra tem o direito de dar explicações, pelo que tem a palavra para esse efeito, se assim o entender.

O Sr. António Coimbra (PSD): - Sr. Deputado, peco-lhe apenas que não fuja à questão que é a de saber se o Governo português tem responsabilidade na educação dos filhos dos emigrantes portugueses, em Espanha.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Leia a lei de bases do sistema educativo!

O Orador: - Depois V. Ex.ª terá oportunidade de falar!
Como sabe, ao abrigo da legislação comunitária, a educação dos filhos dos emigrantes no espaço europeu é da obrigação, diria quase exclusiva, dos países de acolhimento. É tão simples como isso!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É assim que defende os interesses dos emigrantes? O senhor não sabe o que diz!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira que dispõe de dois minutos.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, verifico mais uma vez que é possível a unanimidade em Portugal, de vez em quando, por exemplo, à volta da língua portuguesa. Mas à volta do Governo não há maneira...

Aplausos de CDS e do PS.

... não conseguem a unanimidade que procuram!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - É uma democracia pluralista!

O Orador: - Sr. Deputado, já que tem a amabilidade de me dar essa informação em termos tão correctos vou dizer-lhe como é que a interpreto: o seu pluralismo existe deste que na oposição esteja apenas uma pessoa.

Risos.

É isto que vejo constantemente nessas declarações absorventes.
Gostaria de não ter que entrar nessas novas concepções de democracia, mas, já agora, gostaria de dizer-lhe que conheço um pequeno livro da Universidade de Oslo - e isto para sua informação - que tem, apenas, cerca de 120 definições e se começo a acrescentar as que vou ouvindo nos apartes o livro fica ilegível e não há mais ninguém que lhe pegue.

Risos do CDS.

De maneira que calculo que esse livro já chega e vamos ficar com ele!
Gostaria ainda de dizer, como deputado, como cidadão e como falante da língua portuguesa, que não posso deixar de exprimir um profundo desgosto ao ver perturbado o momento em que a Câmara se debruça sobre um problema de tal transcendência, como é o problema que aproxima os deputados representantes dos seus eleitores, com questões que dizem respeito à infalibilidade da Administração Pública.

Aplausos do CDS e do PS.

Devo dizer que nunca vi isto na minha vida! Nós não estamos a tratar da infalibilidade da Administração Pública; estamos a tratar de um património português que é de todos os portugueses, seja qual for o partido a que pertencem, que são falantes da língua portuguesa e que é instrumento da nossa cultura e trave-mestra da possível reconstrução de um convívio entre territórios por onde essa cultura se expandir.
Francamente, não me sinto feliz quando vejo que esta questão tem de ser misturada com a eficácia ou ineficácia dos serviços.
O problema levantado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos - e vou responder-lhe imediatamente - é inteiramente pertinente, pois se a questão está demonstrada e fundamentada alguém ter de responder por ela. Não é de impecabilidades que se trata mas, sim, de saber se uma tamanha omissão foi ou não cometida. E se o foi alguém é responsável e para isso há regulamentações na vida jurídica portuguesa e no Estado português. É disso que se trata e não de defender a priori a impecabilidade de todos os mecanismos.

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Ninguém pode invocar para si próprio e para as instituições que serve essa impecabilidade total! Temos de admitir, uma vez por outra, que não somos só filhos do Céu mas também da Terra e que, como tal, vamos cometendo alguns pecados na nossa vida.
É esta a resposta que dou ao Sr. Deputado Jorge Lemos..., que, pelo que vejo, ficou satisfeito com ela.
Sr.ª Deputada Edite Estrela, gostaria de agradecer-lhe o facto de ter enriquecido e complementado a modesta intervenção que vim trazer à Câmara. Penso que a minha intervenção ficou enriquecida não apenas pela forma mas também pelo conteúdo e pelas informações que nos prestou. Estou grato por esse acréscimo que veio trazer ao debate.
Finalmente, Sr. Deputado Carlos Lélis, agradeço-lhe a manifestação pública da sua comunhão nestas preocupações e soluções mas, em todo o caso, devo dizer o seguinte: não é muito relevante para a importância do problema que seja competente o ministro dos Negócios Estrangeiros ou a Secretaria de Estado da Cultura. O que é relevante para o problema é que ninguém se assuma como competente: isso é que é relevante!
Também não é relevante para as nossas intervenções sermos informados de que, eventualmente, o Ministério dos Negócios Estrangeiros anda a pensar nalgumas modificações nesta matéria. A Câmara não o sabe e o Presidente Sarney também não o sabia porque criou o Instituto Internacional da Língua Portuguesa.
Aquilo que tentei acentuar na minha intervenção foi o seguinte: em primeiro lugar, este assunto ocupa-me há muito tempo e, portanto, eu defendo a criação deste órgão; em segundo lugar, trata-se de um problema de nacionalidade cultural e, por consequência, não é sem agrado que registamos a intervenção do Governo brasileiro nesta matéria. Portanto, neste momento, a nossa atitude terá de ser, penso eu, a de colaborar, sermos solidários e procurar que uma iniciativa tão oportuna e fecunda se desenvolva.
Penso que as palavras do Sr. Deputado foram nesse sentido e que, atendendo a este sentimento geral da Câmara, elas estimularão o Governo a tornar públicos os pensamentos e acções que nos anunciaram neste domínio.

Aplausos do CDS e do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques, tinha pedido a palavra para que efeito?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, embora esta interpelação esteja relacionada com a intervenção do Sr. Deputado Jorge Lemos só a fazemos agora para não perturbar os esclarecimentos do Sr. Deputado Adriano Moreira.
Gostaria de pronunciar-me sobre as afirmações que o Sr. Deputado Jorge Lemos fez e que considero da maior gravidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lilaia, desejo ver a sua intervenção como uma interpelação à Mesa, portanto faça o favor de se resumir a essa figura.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - O Sr. Presidente irá ver isso no seguimento da minha interpelação.
Sr. Presidente, considero mau demais para ser verdadeiro aquilo que o Sr. Deputado Jorge Lemos aqui veio dizer. Não quero «fazer de S. Tomé» e «ver para crer», porém peço ao Sr. Presidente que solicite ao Sr. Deputado Jorge Lemos o favor de divulgar os trechos que leu, através de fotocópia, junto dos grupos parlamentares que não têm acesso a essa informação directamente do Conselho da Europa (e penso ser o caso do Grupo Parlamentar do CDS, do PRD e de Os Verdes), no sentido de tomarmos as iniciativas que julgarmos convenientes.
No que diz respeito ao PRD iremos, através de um requerimento dirigido ao Governo, solicitar esclarecimentos sobre esta matéria e estamos, naturalmente, abertos a que o nosso requerimento seja subscrito por outras bancadas.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, apenas para dizer que, na sequência do pedido do Sr. Deputado Carlos Lilaia, vou fazer chegar à Mesa o relatório que citei, datado de 17 de Janeiro de 1989, sobre a educação dos filhos de emigrantes.
Posso referir que entre os vários países que enviaram contribuições se encontra a Espanha, França, etc....

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não estamos a analisar o relatório, pelo que lhe agradeço que faça a sua entrega na Mesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço-lhe que faça a distribuição do relatório pelas diferentes bancadas, pois a gravidade da matéria justifica-o. Agradeço ao Sr. Deputado Carlos Lilaia a intervenção que fez.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o que o Sr. Deputado Carlos Lilaia pediu não foi apenas a cópia do relatório - que, aliás, foi distribuído - mas, sim as passagens do relatório ou de outro documento que comprovem a afirmação gravíssima que o Sr. Deputado Jorge Lemos fez. E desse documento também queremos fotocópia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu pedia, para não estarmos agora aqui...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, apenas para referir...

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu estava no uso da palavra e não lhe dei autorização para me interromper.
Srs. Deputados, como estava a dizer, agradecia-lhes que esta questão não se tornasse num debate, porque não é sobre esta matéria que hoje nos iremos debruçar.

Sr. Jorge Lemos (PCP) - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, uma vez que foram solicitadas informações acessórias diria ao Sr. Deputado Silva Marques que terá oportunidade de verificar que o que referi na intervenção que produzi consta do relatório. Limitei-me a transcrever algumas parcelas desse relatório...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa agradece que faça a entrega desse relatório na Mesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - ..., pelo que o Sr. Deputado poderá ler integralmente aquilo que citei parcialmente.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação e votação do parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação que vai ser lido pelo Sr. Secretário.

Foi lido. É o seguinte:

Comissão de Negócios Estrangeiros Comunidades Portuguesas e Cooperação

Parecer e proposta de resolução

A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar, em viagem de carácter oficial, entre os próximos dias 22 e 28 de Fevereiro, ao Japão e de regresso, também em viagem de carácter oficial, entre os dias 28 e 4 de Março, ao território de Macau, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:

Nos termos do n.° 1 do artigo 132.° da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento às viagens de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República ao Japão, entre os dias 22 e 28 de Fevereiro e ao território de Macau, entre os dias 28 e 4 de Março.

Palácio de São Bento, 13 de Fevereiro de 1989

O Presidente da comissão, Manuel Joaquim Dias Loureiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votar.

Submetidos a votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados Independentes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, votada que está a proposta de resolução apresentada pela Comissão de Negócios Estrangeiros dando assentimento à viagem oficial do Sr. Presidente da República, comunico-vos ainda que, nos termos constitucionais, o Sr. Presidente da República informava também - e passo a ler - do seguinte: «Entretanto, por razões de carácter familiar, tenciono deslocar-me a Paris, entre os próximos dias 18 e 22 de Fevereiro, em viagem de carácter particular, da qual venho dar prévio conhecimento à Assembleia da República, nos termos do artigo 132.°, n.° 2 da Constituição».
Fica, pois registado este complemento, relativamente à mensagem do Sr. Presidente da República.
Srs. Deputados, entrando agora na matéria constante da ordem do dia, vamos passar à apreciação da Proposta de Lei n.° 83/V - Autoriza o Governo a aprovar diplomas reguladores dos benefícios fiscais em sede de IRS, IRC e CA.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente proposta de lei constitui uma das derradeiras peças fundamentais da reforma fiscal na parte do imposto sobre rendimento, o IRS e o IRC, e na pane da contribuição autárquica.
Devemos reconhecer que, sobretudo na parte dos impostos sobre o rendimento, se trata de matéria, que está em construção na própria Europa comunitária com o horizonte do Mercado Único Europeu.
A harmonização fiscal directa sobre os rendimentos de capitais, por exemplo, é um domínio que ainda está a ser objecto de profunda análise por parte da Comissão das Comunidades Europeias e de preparação da decisão por parte dos 12 Estados membros.
Ainda recentemente, na reunião dos ministros das Finanças da passada segunda-feira, foi apreciada uma proposta de directiva que apenas aborda os juros de depósitos a prazo e de obrigações ao nível da Comunidade Económica Europeia, propondo, entre outros aspectos, uma taxa não liberatória mínima de 157o, uma taxa de retenção na fonte, para os rendimentos do tipo juros, obrigações e depósitos a prazo cujos titulares sejam não residentes no País onde essas aplicações de capitais estejam feitas e o conceito de «residente comunitário».
E se trago esta notícia ao Parlamento português é apenas para dar uma ideia do que é a mudança que, gradualmente, está a ser levada a cabo no domínio da tributação directa sobre o rendimento e que, aliás, é uma condição prévia para a livre circulação de capitais a nível da Comunidade Económica Europeia.
Neste momento, a Comunidade está a assumir uma atitude de gradualismo. Começou apenas com os juros, abandonando uma hipótese maximalista que chegou a ter, para neste momento ter uma atitude de gradualismo e, de certo modo, minimalista.
Como estava a dizer, esta atitude gradualista começou pêlos juros, passará mais adiante noutra directiva aos dividendos, noutra, provavelmente, às mais-valias e só muito mais tarde passará ao imposto sucessório, tudo isto para que haja harmonização fiscal no quadro tributário da poupança a nível de toda a Comunidade Económica Europeia, o que, como disse, é condição fundamental e necessária para a integração

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monetária e financeira, que é uma das vertentes mais difíceis do Mercado Único Europeu.
Srs. Deputados, já estive com o Sr. Secretário de Estado na Comissão de Economia, Finanças e Plano, onde fizemos a apreciação, em detalhe, de alguns aspectos mais importantes desta proposta de lei. Procurando responder, então, a algumas perguntas, hoje, na apresentação no Plenário desta proposta de lei, limitar-me--ia a focar alguns dos aspectos mais salientes que, penso, devem ser trazidos à consideração dos Srs. Deputados.
Desde logo, a lei propõe-se produzir efeitos desde 1 de Janeiro deste ano, isto, naturalmente, em benefício do contribuinte porque se trata de introduzir benefícios fiscais em sede de IRS, de IRC e de contribuição autárquica (CA), cujos códigos estão em vigor desde 1 de Janeiro e não têm benefícios fiscais para além daqueles que são considerados permanentes, quer reduções ou deduções quer tratamentos especiais de certos factos ou certos contribuintes.
Para além dessas situações já previstas nos códigos, é agora através desta proposta de lei que nós vimos introduzir, se for caso disso, benefícios fiscais com uma amplitude maior do que aquilo que já está previsto - repito - com carácter de permanência, nos códigos dos três novos impostos. Entretanto, os benefícios fiscais que, em 31 de Dezembro de 1988, possam ser considerados direitos adquiridos na vigência dos impostos que foram extintos, esses serão salvaguardados através de tabelas de equivalência ou tabelas de conversão, de tal modo que o contribuinte não possa ser prejudicado pelo facto de haver uma mudança de impostos antigos para impostos novos. Um exemplo que, aliás, aparece explicitado na proposta de lei diz respeito, precisamente, aos juros das obrigações que estivessem em circulação em 31 de Dezembro de 1988. Esses juros das obrigações que continuem em circulação terão uma carga fiscal perfeitamente equivalente àquela que tinham em 31 de Dezembro de 1988. Outra coisa não seria justa porque os obrigacionistas e as entidades emitentes contrataram, nas obrigações, uma taxa de juro que pressupunha, precisamente, certa carga fiscal relativamente mais leve do que aquela que resultaria do IRS ou do IRC.
Uma outra mudança, não já referente aos direitos adquiridos - chamemos-lhe assim - de benefícios fiscais em sede de impostos extintos, em a ver com a nova dívida pública que seja emitida a partir da publicação do diploma que introduza os benefícios fiscais. A nova dívida pública terá uma carga fiscal normal em IRS ou IRC, conforme a natureza do titular da dívida pública, mas o seu rendimento contará, apenas, por 807o, ou seja, há 20% de redução no rendimento para fins da matéria colectável do IRS ou do IRC.
As acções cotadas - outro aspecto importante - terão tratamento privilegiado, porque só 80% do seu rendimento contará para fins de IRS ou IRC, conforme o accionista for pessoa singular ou pessoa colectiva. E as acções que decorram da privatização de empresas públicas terão um benefício fiscal maior ainda durante um prazo que poderá ir até cinco anos e que é o seguinte: conta para fins de IRS e de IRC apenas 60% dos dividendos distribuídos.
Quanto às mais-valias de acções, se o accionista for uma pessoa colectiva, em IRC não haverá tributação desde que as mais-valias realizadas e pelo valor total
da realização sejam reinvestidas, quer em activo imobilizado corpóreo quer em imobilizado financeiro e desde que esse reinvestimento seja feito até ao fim do segundo exercício posterior à realização da mais-valia. Ou seja: com esta proposta de lei estendemos ao imobilizado financeiro aquilo que o artigo 44.° do Código do IRC já determina para o imobilizado corpóreo.
Já em IRS, as mais-valias de acções terão isenção desde que as acções sejam detidas por um tempo superior a 12 meses - isto para as acções adquiridas já na vigência da reforma fiscal porque, como os Srs. Deputados sabem, as acções que estivesses em carteira em 31 de Dezembro de 1988 não relevam absolutamente nada quanto às suas mais-valias para fins de IRS. Isso já figura no código. Se as acções compradas em 1989, e anos seguintes, foram vendidas antes de 12 meses, a taxa de tributação é de 10% e é liberatória. Este regime especial vigorará até 1992.
Quanto aos estrangeiros e às suas mais-valias de acções, a proposta que fazemos, quer sejam pessoas singulares quer colectivas, é de uma taxa liberatória de 10%, apenas. Trata-se de uma taxa baixa. Aliás, olhando para os países da Comunidade Económica Europeia, na sua generalidade, o que predomina é a taxa zero por cento. A taxa de 10% não sendo elevada, continua, todavia, a levantar alguns reparos da parte das instituições que lidam com investidores estrangeiros, não já por causa da carga fiscal mas mais por causa do empapelamento que sempre decorre de uma situação de carga fiscal activa e efectiva. Mas este é um dos assuntos que nós trazemos, aliás, à ponderação da Assembleia da República.
Num outro domínio, os fundos de investimentos mobiliário e imobiliário têm, também, um regime especial nesta proposta de lei. As mais-valias são isentas desde que reinvestidas pelo próprio fundo e os lucros, não contando portanto as mais-valias reinvestidas, são sujeitos ao IRC a taxa reduzida. Os participantes dos fundos estão isentos no rendimento distribuído pêlos fundos, quer em IRS quer em IRC, conforme a natureza singular ou colectiva das pessoas participantes no fundo.
Quanto aos fundos de pensões, muito importantes para a poupança e para o mercado de capitais, têm isenção em IRC, uma vez que os pensionistas pagam IRS. Ainda em referência a estes fundos, a sua isenção de IRC, segundo a nossa proposta, não abrange os rendimentos de capitais, os quais serão sujeitos às taxas de retenção na fonte que foram aplicáveis. Mas é também um dos regimes que, consideramos, vale a pena ponderar muito detidamente.
As sociedades de capital de risco, as sociedades de fomento empresarial, as sociedades de desenvolvimento regional, as Caixas de Crédito Agrícola Mútuo são sociedades para as quais propomos regimes fiscais especiais, o mesmo acontecendo aliás, com os bancos de investimento, sociedades de investimento e sociedades financeiras de corretagem - estas quando actuem por conta própria. A proposta que fazemos é a de que o IRC não tribute rendimentos das participações que estas sociedades (bancos de investimento, as sociedades de investimentos e as sociedades financeiras de corretagem) tenham, ou seja, o artigo 45.° do Código do IRC, que já prevê um regime especial para os rendimentos de participações de qualquer sociedade, exige dois requisitos: um, quanto ao valor da participação, que deve ser maior do que 25% e outro quanto ao tempo de dois

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anos, pelo menos. Esses dois requisitos não vigorarão para aqueles três tipos de sociedades que referi e que são importantes para o investimento financeiro.
Noutro domínio, as associações desportivas estão sujeitas a IRC na parte dos rendimentos que não decorram directamente da actividade desportiva. Por exemplo: se uma associação desportiva tiver uma empresa comercial, naturalmente que os rendimentos que retira dessa empresa comercial, como de rendimentos de capitais ou de outra natureza, como é natural, estão sujeitos a IRC, embora a uma taxa reduzida - em vez de ser a taxa normal de 36,5% é, apenas, de 207o. Esta é a nossa proposta. Porém, os pequenos clubes e as pequenas associações desportivas ficam totalmente isentos de IRC, qualquer que seja a natureza dos seus rendimentos.
Quanto à contribuição autárquica que incida sobre prédios que estejam directamente afectos à actividade desportiva, naturalmente que segundo a nossa proposta de lei eles ficarão isentos.
Noutro domínio ainda, as casas próprias e as habitações para arrendamento estarão isentas de contribuição autárquica por um período de vários anos, sendo essa isenção uma função contínua e progressiva em função do valor do prédio em causa.
Os prédios de relevante interesse público, segundo a proposta, ficarão isentos de contribuição autárquica, considerando neste universo as seguintes instituições: de segurança social, partidos políticos, associações religiosas, sindicatos, associações empresariais e profissionais, escolas, instituições particulares de solidariedade social, pessoas colectivas de utilidade pública, etc.
Também, naturalmente, estarão isentos de contribuição autárquica estações de caminhos de ferro, estações de correios, barragens, etc., ou seja, prédios que tenham uma clara e notória utilização para o bem comum.
E, finalmente, os prédios que pertençam a empreendimentos classificados de utilidade turística, também poderão vir a ter isenção de contribuição autárquica.
Do mesmo modo, os prédios que sirvam de instalação de empresas em zonas francas da Madeira ou dos Açores poderão ter isenção de contribuição autárquica.
Por último, os prédios de famílias de baixos rendimentos terão, também, isenção de contribuição autárquica. Assim, por exemplo, uma família de baixo rendimento que tenha um prédio urbano ou um prédio rústico arrendado ou de habitação própria (que tenham conseguido de arrendamento ou que estejam a habitar), não pagará contribuição autárquica.
Os deficientes também terão um tratamento especial em IRS. Segundo a proposta de lei, 50% do rendimento do trabalho dependente ou independente não contará para fins de IRS e as suas despesas em educação e em prémios de seguros contarão pela totalidade para abatimento ao IRS; além disso, os deficientes que sejam activos terão acesso à contas poupança-reformados.
Finalmente, os emigrantes vêem os juros de depósito a prazo em Portugal tratados com uma taxa liberatória em IRS muito reduzida relativamente à taxa normal, podendo ter isenção ou redução da contribuição autárquica relativamente aos prédios de que sejam proprietários.
Aproveitámos a proposta de lei que trazemos à consideração dos Srs. Deputados para introduzir, não já em sede de IRS, de IRC ou de contribuição autárquica
mas em sede de imposto sucessório, um benefício fiscal ou uma alteração do regime fiscal, que tem, aliás, afinidade com alguns dos domínios tratados nesta proposta de lei em IRS e em IRC e que dizem respeito ao mercado de capitais. É o regime, precisamente, das acções nominativas e acções ao portador registadas. Propomos que tenham o mesmo regime que as acções ao portador puras, ou seja, o regime de pagamento do imposto sucessório por avenca de 5% sobre os dividendos em cada ano.
Aproveitamos, também, para introduzir no Código do IRC a tributação sobre os rendimentos de capitais de entidades do sector público administrativo, tributação que, aliás, tínhamos introduzido em 1988, como os Srs. Deputados bem se recordam, através do imposto de capitais que vigorou desde Janeiro de 1988, mas que agora, ao fazer-se a reforma fiscal e ao introduzir o Código do IRC voltava-se atrás e novamente deixar-se-ia deixar de tributar os rendimentos de capitais, o que, pelas razões que apresentámos aquando da apreciação da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1988, não nos parece razoável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aguardamos com o maior interesse a apreciação que esta Câmara faça da nossa proposta de lei, que contém matéria da maior importância para o País, pois a reforma fiscal é, de facto, da maior importância e temos fundadas expectativas de que as contribuições dos Srs. Deputados possam enriquecer a nossa proposta de lei. Temos, aliás, razões para esperar que haja alguns contributos muito positivos para a melhoria de todo o quadro fiscal nesta parte dos benefícios.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram--se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Lilaia, Octávio Teixeira, Carneiro dos Santos, Nogueira de Brito e Domingos Azevedo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Ministro da Finanças, naturalmente estive atento às explicações que V. Ex.ª produziu na apresentação desta proposta de lei de autorização legislativa.
Terei oportunidade também de, em intervenção própria, fazer alguns comentários sobre este pedido de autorização legislativa mas queria pôr-lhe uma questão muito concreta.
Como o Sr. Ministro sabe, através da lei do Orçamento do Estado para 1988, foi concedida uma autorização legislativa ao Governo para proceder à revogação de todo um conjunto de incentivos que têm a ver exactamente com parte dos incentivos que neste momento estamos a tratar.
Acontece que, durante todo o ano de 1988, o Governo não utilizou este pedido de autorização legislativa, ou melhor fê-lo apenas através de uma publicação no Diário da República, de 19 de Janeiro, reportando-se naturalmente a um suplemento de 31 de Dezembro, onde constava a revogação destes mesmos incentivos. Efectivamente, por esse decreto-lei, os incentivos em causa foram revogados e, portanto, estávamos numa situação em que poderíamos dizer que havia um vazio legislativo relativamente a esses incentivos que agora se trata de recuperar em sede de IRS, de IRC e de imposto complementar.

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Posteriormente o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, através de um seu despacho, tentou repor em vigor alguns deste incentivos, dado o vazio existente.
Sr. Ministro, por que é que decorreu tanto tempo entre o pedido de autorização legislativa que efectivamente foi dado por esta Câmara e a altura em que o Ministério das Finanças, através do Governo, apresenta à Câmara este novo pedido de autorização legislativa? Porque é que decorreu tanto tempo? Porque é que o Governo ainda precisa de mais seis meses - que é o prazo que se pede nesta autorização legislativa - para legislar sobre esta matéria? Será que o anterior pedido de autorização legislativa foi extemporâneo? Será que o Governo não tinha esta matéria suficientemente estudada? Sr. Ministro pode dizer-nos o que é que efectivamente se passou?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, eu começaria por concordar consigo em que a reforma fiscal é uma matéria da máxima importância. Do nosso ponto de vista é assim e lamentamos que, pelo menos até ao momento actual, em todo o processo da reforma fiscal o Governo não tenha procurado obter os consensos que seriam exigíveis a matéria de tamanha importância.
Mas em relação à matéria que aqui nos traz hoje e exclusivamente em sede de generalidade, eu gostava de colocar-lhe algumas questões.
Em primeiro lugar, uma questão um pouco relacionada com o que o Sr. Deputado Carlos Lilaia acabou de colocar. Como é que se pode compreender e justificar a situação criada pelo Governo em relação aos novos impostos, em relação à situação fiscal neste momento em termos de impostos sobre o rendimento? Como é que pode existir a situação de haver novos códigos em vigor há um mês e meio e não haver estatuto de benefícios fiscais? Quais são os benefícios fiscais contemplados para além daqueles que já constavam dos códigos, para além de não existir nada sobre as penalidades às infracções, etc, etc? É uma situação, eu não diria de vazio mas mais de atabalhoamento, que foi criado e que não se justifica, ou pelo menos eu não consigo arranjar uma justificação!
Para códigos que foram publicados há cerca de dois meses, que razões levarão o Governo a sentir já necessidade de os alterar, em matérias que não são de pormenor? Como é que os códigos foram feitos se, passado um mês após o início da sua aplicação - a sua aplicação entre aspas, pois boa parte dos códigos não estão a ser aplicados por que não podem sê-lo -, o Governo já sente necessidade de fazer alterações?
Sr. Ministro, vou colocar-lhe uma pergunta muito seca. O Governo não tem medo que com esta proposta de lei, com estes benefícios fiscais, possa suceder ao mercado financeiro aquilo que sucedeu ao sapo na história, isto é, que rebente de tanto encher? Isto é de facto um exagero!
E relacionado com esta questão a pergunta: quais foram os critérios utilizados pelo Governo para, com esta proposta de lei, - se ela for aprovada como está - estar a proceder à distorção do mercado exclusivamente através da via fiscal? Quais são os critérios seguidos pelo Governo?
Qual é o critério do Governo para que, ele próprio, à partida, conceda isenções de derramas, quando estas são um direito que as autarquias locais têm de tributar ou não nos seus territórios? Qual é o critério do Governo para, à partida, proibir derramas para determinadas situações?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira queira terminar, pois esgotou o seu tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

Ao fim e ao cabo não se trata de um benefício fiscal, trata-se de repor pela inversa situação de justiça fiscal. Quando é que o Governo prevê substituir - e eu julgo que esta previsão seja a muito curto prazo, praticamente imediata - as tabelas práticas do IRS que estão a conduzir a que os portugueses, os contribuintes, estejam sujeitos a um autêntico empréstimo público forçado, que ainda por cima nem sequer tem direito a juros?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Ministro, em matéria de reforma fiscal este Governo e o próprio Primeiro-Ministro têm tido de facto uma imaginação prodigiosa.

O Sr. Ministro das Finanças: - Muito obrigado!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado, em entrevista a um jornal, há pouco tempo, veio referir que todos os portugueses iam pagar menos impostos. O próprio Primeiro-Ministro, porventura um pouco mais comedido, veio dizer que afinal não são todos, são só 957o que vão pagar menos impostos. Coitados dos 5% restantes!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Deve ser o seu caso!

O Orador: - Mas perante esta situação o que é que aconteceu com a aplicação das tabelas práticas já em Janeiro de 1989? O que a maioria dos portugueses veio a verificar foi que, ao contrário da demagogia que o Governo vinha fazendo, viu agravada a sua carga fiscal, com particular destaque para os rendimentos da classe média. É lamentável que muitos contribuintes se vejam em dificuldades até para solver compromissos com a habitação própria, com a educação dos filhos, com seguros, etc..

Vozes do PSD: - É falso!

O Sr. Domingos Azevedo (PS): - Façam as contas!

O Orador: - O Governo, de facto, não se limitou unicamente a agravar a carga fiscal dos portugueses, fê-lo não só aos rendimentos do trabalho dependente, vai fazê-lo em relação aos trabalhadores em situação de pré-reforma, o que é uma situação verdadeiramente lamentável, vai fazê-lo aos pequenos senhorios, às

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pequenas e médias empresas, aos profissionais liberais. E aqui pasme-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Governo, não contente com o agravamento da carga fiscal, ainda vai obrigar estes contribuintes a fazer um autêntico empréstimo forçado ao Estado, só vindo a receber, se vierem a receber, o reembolso passado mais de um ano e meio. É verdadeiramente lamentável que isto aconteça!
Quanto ao estatuto dos benefícios fiscais, o que é que o Governo nos traz? Bem, nós consideramos que isto é uma proposta pouco assada, parece-nos que há muitas críticas a fazer e vamos já fazer algumas.
Esta é uma proposta que privilegia sistematicamente os rendimentos de capitais e das mais-valias em detrimento do investimento produtivo; é uma proposta que, em relação à sisa, nada diz, pondo em causa o acesso à habitação, inclusivamente à habitação social; é uma proposta que retira um benefício fiscal consagrado no passado relativo à aplicação das reservas em novos investimentos, que era extremamente utilizada pelas pequenas e médias empresas; é uma proposta que limita a utilização do crédito fiscal ao investimento; é uma proposta que, inclusivamente não tem em conta a necessidade das empresas se consolidarem em termos da entrada no Mercado Único, não prevendo benefícios para os processos de concentração e de cisão de empresas; é uma proposta que retira à cooperativas agrícolas, que também necessitam de se adaptar ao Mercado Único Europeu, os incentivos que tinham; é uma proposta que nada diz em relação ao comércio e aos serviços, o que é verdadeiramente lamentável; é uma proposta que até, inclusivamente, vem prejudicar, e mais uma vez, as autarquias locais, não só pela questão da derrama, que o Sr. Deputado Octávio Teixeira já referiu, mas também porque atribui determinados benefícios fiscais sem estabelecer as correspondentes compensações para as autarquias...

O Sr. Presidente: - Já determinou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou já acabar, Sr. presidente.
Dissemos oportunamente, desde o início do debate relativo à reforma fiscal, que esta tinha começado mal. De facto, a reforma fiscal começou mal, neste momento os portugueses já o estão a sentir no bolso e com certeza, no ano de 1990, vai acabar ainda pior.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Sr. Ministro da Finanças, não farei mais considerações sobre a questão do tempo da entrada em vigor do estatuto dos benefícios fiscais, mas sublinharei a pergunta que foi feita a V. Ex.ª pelo Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Governo tenciona esgotar o prazo de seis meses que pede nesta autorização legislativa, sendo certo que ela é pedida já fora do prazo de 90 dias a que o Governo estava obrigado na própria lei da reforma fiscal?
Suponho que este esclarecimento será importante para os contribuintes que têm de definir o seu próprio planeamento fiscal, a quem falta este elemento decisivo.
A segunda questão, Sr. Ministro, é relacionada com um princípio que o Sr. Ministro enunciou em matéria de regime transitório dos benefícios fiscais.
Relativamente aos benefícios adquiridos em 31 de Dezembro de 1988, V. Ex.ª disse que o Governo se preocupava em mante-los, digamos assim, no património dos contribuintes. Suponho, no entanto, que o regime que aqui está consagrado para o crédito fiscal ao investimento, o duplo crédito fiscal ao investimento e a dedução de reservas de lucros retidos e reinvestidos não se compagina inteiramente com este princípio, reduzindo a possibilidade de dedução à matéria colectável apenas ao ano de 1989. Gostaria que V. Ex.ª me explicasse esta solução.
A terceira questão, Sr. Ministro, respeita aos fundos de pensões. No contexto dos benefícios respeitantes a entidades que têm funções de investimento ou que, na sua actividade, exercem funções de investimento, os fundos de pensões são nitidamente tratados com prejuízo em relação por exemplo aos de fundo de investimento. Sr. Ministro, qual é a razão deste tratamento diferente? Porque é que se excluem as isenções a rendimentos provenientes da aplicação de capitais pelos fundos de pensões? Suponho que esta solução não é compaginável com uma estratégia de política social que possa beneficiar o aparecimento de instituições particulares de segurança social.
Por último, Sr. Ministro, concordo com a circunstância que foi apontada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira de este diploma procurar recuperar o mercado de capitais. Porém, ao contrário do que acontece com a bancada comunista, a bancada do CDS está de acordo com esta recuperação.

Uma voz do PCP: - Não é para admirar!

O Orador: - Agora, eu pergunto: que constatações é que o Governo fez no período de aplicação dos novos impostos, já decorrido desde o dia l de Janeiro, que o levaram a fazer estas alterações? Qual foi a extensão, eu diria do desastre, da entrada em vigor dos novos códigos em relação ao mercado de capitais? Que influência negativa é que esta entrada em vigor, desacompanhada dos benefícios fiscais, teve sobre esse mercado para que o Governo agora o tente recuperar com o estatuto dos benefícios fiscais?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Domingos Azevedo.

O Sr. Domingos Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Partido Socialista compartilha do entendimento de que a matéria em debate é de uma importância capital para o País e lamenta que, efectivamente, sendo esta matéria de uma importância tão capital para o País, o Governo a esteja a tratar com uma certa leviandade, ou pelo menos que não esteja a dar a importância à Assembleia que, em sede de debate e em sede de enriquecimento da proposta, esta deveria ter, desempenhado um papel muito mais activo e enriquecedor do projecto. Mas não nos espantemos muito com esta pressa, com este afogadilho do Governo em matéria de uma capital importância no domínio fiscal.
Vou fazer apenas algumas perguntas, muito rápidas, porque numa intervenção de fundo que meu partido irá fazer abordará mais pormenorizadamente o diploma que nos é presente. No entanto, gostaria de pôr ao Sr. Ministro das Finanças algumas questões práticas relativas à aplicação da lei, que não estão previstas neste

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projecto, e sobre o que é que o Governo pensa fazer nesta matéria.

O primeiro aspecto que vou focar refere-se ao fazer recorrigir a lei de 1 de Janeiro de 1989. Os nossos reformados vêem já hoje ser-lhes retido na fonte, nos termos do artigo 74.º do Código do IRS, se a memória não atraiçoa, as taxas liberatórias das contas poupança-reformados. Pergunto: quanto tempo é que estas pessoas vão estar à espera que o Estado proceda aos títulos de anulação
face do interesse que a intervenção do Sr. Ministro das Finanças suscitou.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, a Mesa vai ponderar a hipótese de extensão do tempo a atribuir ao Governo.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - É para o ano! o Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Orador: - Está o Governo na disposição de, ao reembolsar essas pessoas das importâncias que indevidamente lhes foram retidas, lhes pagar o juro compensatório que o Estado exige aos cidadãos que lhe são devedores? Nada nos dizem sobre este processo, nada nos dizem sobre o mecanismo da retroactividade.
Outro aspecto que eu gostaria de referir ao Sr. Ministro tem a ver com a opção de fundo em termos de estratégia de benefícios fiscais. O nosso entendimento é o de que o benefício é sempre uma excepção e terá de ter no seu pressuposto, na sua base de suporte, duas questões de fundo: ou razões de natureza humanitária ou razões ponderosas de interesse nacional.
Regista-se forte pendor para beneficiar os rendimentos provenientes dos capitais, com particular realce para os rendimentos de natureza especulativa da bolsa em detrimento do esforço que as nossas empresas terão necessidade de fazer particularmente até 1992, altura em que se fará a plena integração, com menosprezo pelo esforço de investimento nas nossas empresas, pela sua necessidade de renovação tecnológica. Entende o Governo que é prioridade nacional eleger, em termos de benefícios, em termos de excepção de tributação, os rendimentos provenientes de uma actividade de natureza especulativa como são os rendimentos provenientes das bolsas?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

Sr. Ministro das Finanças, gostaria que me respondesse a estas questões. Adiante terei oportunidade de abordar mais aprofundadamente estes temas.

O Sr. Presidente: - Para responder se o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças, que dispõe de três minutos apenas.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, faço notar à Mesa que a profusão e a extensão de cada uma das questões colocadas pelos Srs. Deputados impedem o Sr. Ministro das Finanças de responder com o mínimo de precisão nos três minutos que dispõe.
Neste sentido, gostaria de saber se a Mesa não quer ponderar o alargamento do tempo que atribuiu.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, uma vez que notei alguma agitação na bancada do Partido Comunista, gostaria de tornar claro que, em nosso entender, bastava que a Mesa atribuísse ao Governo o tempo que a luz encarnada esteve em funcionamento enquanto as perguntas foram formuladas.

Risos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, a Mesa vai ponderar a proposta apresentada por V. Ex.ª, mas gostaria de informar que os tempos em que a luz vermelha esteve acessa contam, tanto quanto é possível, no nosso cronometro, para efeitos do cômputo dos tempos globais.
Aliás, esgotados os três minutos de intervenção, informei os Srs. Deputados, com espaços de segundos. De qualquer modo, todo o tempo foi descontado nos tempos globais atribuídos aos vários partidos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Mas esse tempo alargou as perguntas!

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - O Sr. Ministro não gosta do vermelho!

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de solicitar à Mesa que poder a conveniência de atender à sugestão do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, porque suponho que o Sr. Ministro das Finanças deverá ter muito a responder e a Câmara ficará mais elucidada se for dada ao Sr. Ministro a possibilidade de prestar os esclarecimentos, pela forma que entender ser conveniente.
No entanto, em meu entender, o tempo que lhe for concedido deverá ser considerado no tempo global atribuído ao Governo, pelo que tudo ficará bem.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - O Governo já não dispõe de tempo.

O Orador: - Ah não?!

De qualquer modo, Sr. presidente, é sempre conveniente conceder tempo ao Governo para falar, já que fala tão pouco!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira pede a palavra para interpelar a Mesa?

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de sossegar o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, na medida em que a agitação que viu nesta bancada não se deve a qualquer falta de disponibilidade da nossa parte para encarar a questão dos tempos, mas foi motivada pela última frase proferida pelo Sr. Ministro, com a qual não concordamos.
Deste modo, não pomos em causa o interesse suscitado pela intervenção do Sr. Ministro e gostaria que ficasse claro, que, pela nossa parte, julgamos que o Governo deve ter o tempo necessário para responder e, se tiver necessidade de tempo, poderá haver cedência por parte de qualquer partido, verificando-se ainda um tratamento equitativo para todas as bancadas.
Com efeito, os tempos atribuídos foram demasiado curtos para uma matéria desta importância.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa que o PSD cede cinco minutos ao Governo, pelo que neste momento o Governo dispõe de oito minutos para responder aos pedidos de esclarecimento formulados.
Posteriormente, a Mesa irá ponderar outras situações em relação às faltas de tempo que venham a verificar-se, no intuito de encontrar eventuais soluções.
Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, estou perante um conjunto relativamente extenso de perguntas, não sei se conseguirei responder a todas, mas vou tentar.
O Sr. Deputado Carlos Lilaia, do PRD, questiona-me sobre a execução que o Governo entendeu dar à autorização legislativa consignada no artigo 50.º da Lei n.º 2/88 - Lei do Orçamento do Estado.
O Governo, quando propôs o Orçamento para 1988, incluiu um extenso artigo 50. º, onde se considerava a autorização para reduzir ou eliminar os benefícios fiscais que estavam dispersos por vários diplomas relativos aos diferentes sectores da economia portuguesa.
Tratou-se de uma longa negociação, porque muitos desses benefícios diziam respeito a entidades concretas. Eram benefícios subjectivos na acepção técnica da expressão. Assim, houve necessidade de encetar uma longa negociação com essas entidades: empresas públicas e outras instituições, vindo esse esforço a «desaguar» num projecto que ficou concluído em meados de 1988.
Posteriormente, esse projecto foi reanalisado em todos os gabinetes ministeriais, tendo sido muito bem ponderado.
No entanto, gostaria de dizer que, em meu entender, a execução do artigo 50.º, que em boa hora o Governo propôs à Assembleia da República, integrado na Lei do Orçamento para 1988, tinha e tem a ver, fundamentalmente, com a preparação do campo para a entrada em vigor da reforma fiscal.
Por esta razão, consideramos o artigo 50.º da lei do Orçamento do Estado para 1988 uma antecâmara da reforma fiscal.
Quanto aos outros impostos - também considerados nesse artigo 50.º e no decreto-lei que lhe deu execução - que não foram extintos pela reforma fiscal, poderiam ter tido execução mais cedo, mas ponderámos e decidimos que deveríamos consagrar todas as disposições no mesmo decreto-lei.
Contudo, devo salientar que este diploma teve, essencialmente, um valor emblemático relativamente aos impostos extintos, porque se ele não fosse publicado teríamos o mesmo efeito prático, que resultaria da publicação dos Códigos do IRS, do IRC, da contribuição autárquica, na medida em que não contemplámos nesses códigos os benefícios fiscais que foram extintos pelo decreto-lei publicado no final de 1988.
Assim, na longa preparação do já referido decreto-lei, as entidades e as instituições que gozavam de benefícios fiscais de longa data foram preparadas para a eliminação ou redução desses benefícios.
Este trabalho foi muito importante e até hoje não tivemos conhecimentos de qualquer reacção negativa e saliente das entidades que perderam esses benefícios fiscais, porque, de facto, existiu realmente um processo de negociação.
Devo salientar que, contrariamente à ideia que o Sr. Deputado transmitiu, não há vazio algum e penso até que deve haver um equívoco da sua parte. De facto, repito, não há vazio algum!
Quanto à questão «porquê tanto tempo», já respondi.

Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.ª questiona-me sobre as necessidades de alteração aos códigos já publicados.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que mais uma vez há um equívoco, porque não há qualquer necessidade de alteração.
Aliás, já referi o caso típico e expressivo - que é considerado como quase caso único - dos rendimentos de capitais das aplicações de poupanças feitas por entidades do sector público administrativo.
Com efeito, em 1988, o Governo acabou, e muito bem, com a isenção do imposto de capitais.
No entanto, na elaboração das disposições consagradas no Código do IRC verificou-se uma omissão, pois deveríamos ter mantido a mesma regra de forma expressa. Por que não a explicitámos no Código do IRC, essas entidades voltaram a ter isenção, no âmbito do IRC, relativamente aos rendimentos de capitais.
Perante esta situação, considerámos - e, em meu entender, muito bem - que deveríamos incluir o artigo em causa no sentido de fazer ressuscitar o regime que foi iniciado em 1988.
Com efeito, não considero que seja razoável que o Orçamento do Estado esteja a pagar juros passivos para fazer transferências orçamentais para essas entidades públicas do sector público administrativo, que não as do Orçamento do Estado, e estas entidades, tendo excessos de tesouraria, vão fazer aplicações financeiras, obtendo juros activos. Ou seja, teríamos o Orçamento do Estado a pagar juros passivos para aquelas entidades terem juros activos, sem que, pelo menos, tivessem de pagar imposto sobre esses juros.
Entre outras, foi por esta razão que, em 1988, esta Câmara, por proposta do Governo, introduziu o imposto de capitais sobre os rendimentos dessas entidades, princípio que deve vigorar agora no âmbito do IRC.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas há outros casos, Sr. Ministro!

O Orador - Sr. Deputado, se existem outros casos, são escassíssimos e, desculpar-me-á, mas não permitem o seu erro de generalização.
Mas, Sr. Deputado, o que o move é dizer mal daquilo que vai bem, ou seja, a profundíssima reforma fiscal que há vinte e cinco anos o País aguardava.

Aplausos do PSD. Risos do PS.

Eu bem sei que houve uma reforma intercalar, que não foi uma reforma fiscal mas uma reforma, da responsabilidade do seu partido, de confiscação, realizada em 1974/75.
Todavia, teve efeitos degenerados na economia e na sociedade portuguesa, cujos custos ainda estamos a pagar a elevados preços.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Ministro tem sempre de tentar uma distorção! Não consegue dizer uma coisa séria!

O Orador: - Sr. Deputado, devo lembrar que não interrompi a sua intervenção.
De qualquer modo, deve concordar que dizer-lhe uma coisa mais séria do que esta que disse agora, é difícil, muito difícil!
Na realidade, chamo à colação a responsabilidade grave que o seu partido tem nos acontecimentos históricos de 1974/75.
Falei-lhe de uma pseudo-reforma intercalar que tem a ver com o confisco, não com o fisco e que, como o Sr. Deputado sabe, foi muito gravosa para a sociedade portuguesa.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Agora, o Sr. Ministro está a confiscar o fisco!

O Orador: - Finalmente, o Sr. Deputado ainda referiu a questão da derrama.
Na verdade, há uma isenção do imposto de derrama para os fundos de investimento, que são importantíssimos na economia portuguesa e no mercado de capitais e que, aliás, tem a ver fundamentalmente com as pequenas e médias poupanças, cujo sentido de risco e conhecimento do mercado são, de facto, tão reduzidos que é justo que os fundos de investimento sejam apoiados para que eles próprios possam apoiar as pequenas e médias poupanças.
Aliás, não teria sentido que um fundo de investimento mobiliário, por exemplo, que tem vocação para estar presente em todo o País, só porque tem a sede num determinado concelho, fique sujeito ao imposto de derrama.
O Sr. Deputado Carneiro dos Santos teceu muitas considerações, a maior parte delas desajustadas - vai desculpar-me que lhe diga -, não me fez nenhuma pergunta e, por isso, não tenho nada a responder-lhe.
Teria a lamentar, se tivesse tempo!
O Sr. Deputado Nogueira de Brito perguntou «porquê o prazo de seis meses considerado nesta proposta de lei»?
Não vamos esgotar o prazo de seis meses, mas quero dizer-lhe que algumas das alterações legislativas agora apresentadas vão gerar vários decretos-lei e não um só.
Por exemplo, podemos avançar, de imediato, com um decreto-lei na parte do IRS e do IRC sobre os fundos de investimento e tudo o que diga respeito ao mercado de capitais, ou seja, acções cotadas, acções de privatização e outras.
Em relação ao imposto sucessório, por exemplo, podemos aguardar um pouco mais.
Portanto, haverá dois, três ou quatro decretos-lei que dão execução a esta proposta de lei.
Quanto ao prazo de 90 dias que referiu e que está expresso na Lei n.º 106/88, o Sr. Deputado está enganado, pois o Governo não está obrigado a este prazo. Trata-se de um prazo meramente indicativo, porque não vincula o Governo.
Com efeito, o Governo não pode, através de uma lei, ser vinculado a apresentar em determinado prazo uma proposta de lei que depende da sua vontade e da sua iniciativa.
Quanto aos fundos de pensões versus de investimento mobiliário, trata-se de uma matéria que vale a pena ponderar, aliás, já o disse na minha intervenção inicial. Convido esta Câmara a ponderar este assunto, que é dos mais difíceis.
No entanto, já agora lembraria que enquanto os participantes no fundo de investimento mobiliário não podem deduzir absolutamente nada no seu IRS ou no seu IRC, já os contribuintes para o fundo de pensões podem deduzir quer no IRS, quer no IRC.
Aliás, como o Sr. Deputado sabe, as empresas podem deduzir no IRC até 157o da massa salarial as contribuições para o fundo de pensões.
Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Domingues Azevedo sobre a poupança-reformados, devo dizer-lhe: faça justiça ao Governo, pois fomos nós que configurámos esta conta, já lá vão quase três anos, e apresentámos à Assembleia da República a proposta de isenção fiscal desta conta poupança-reformados que, aliás, teve um sucesso espectacular.
Com efeito, tem crescido a um ritmo impressionante de mês para mês.
É evidente que não vamos deixar de devolver a alguns reformados que tenham sido objecto de aplicação do IRS sem isenção fiscal - porque a lei ainda não o permite - o dinheiro relativo à obrigação fiscal.
Sr. Deputado, quando V. Ex.ª diz que a bolsa em Portugal é um investimento especulativo, não acredito que esse seja o pensamento de toda a bancada do Partido Socialista, pois tenho ouvido e lido em documentos desse partido considerações sobre a importância vital do mercado de capitais e da bolsa em Portugal.
Aliás, como o Sr. Deputado sabe, na Comunidade Económica Europeia estão representados vários governos socialistas e todos eles consideram que o mercado de capitais é da maior importância para a construção do Mercado Único Europeu. E, por exemplo, todos eles consideram que a matéria da harmonização fiscal, por razões do Mercado de Capitais da Integração Monetária e Financeira, é dos dossiers mais importantes que iremos tratar.

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Quando o Sr. Deputado diz que o investimento das empresas seria penalizado pelas propostas do Governo, devo dizer-lhe que essa afirmação revela falta de pudor, porque considerar que este Governo está a penalizar o investimento produtivo, ou seja, a formação bruta do capital fixo por parte das empresas, quando esta variável macro e micro económica tem crescido como nunca aconteceu na jovem democracia portuguesa e como não aconteceu nos 15 ou 20 anos anteriores à jovem democracia portuguesa, só pode revelar falta de pudor.
Na verdade, a formação bruta de capital fixo cresceu nestes três últimos anos, ano a ano, e continua a crescer a um ritmo que impressiona a própria Comunidade Económica Europeia, entre 15 a 20% ou entre 10 a 15% em termos reais.
Sr. Deputado, dizer que isto acontece apesar de o Governo castigar e penalizar quem investe e quem arrisca, ou é falta de atenção ou de senso. Como não acredito na segunda hipótese da parte do Sr. Deputado e dos seus colegas de bancada, penso que neste caso terá havido falta de atenção.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo. O que torto nasce, tarde ou nunca se endireitará. Di-lo o povo, e aplica-se como uma luva à chamada reforma fiscal.
Primeiro foi a via seguida pelo Governo e pelo PSD no processo de elaboração e aprovação dos diplomas legais que concretizam a reforma fiscal. Em matéria que deveria exigir um consenso alargado, o Governo optou pela imposição da sua exclusiva vontade. Contra tudo e contra todos, inclusivamente, convém não o esquecer, contra a própria Comissão da Reforma Fiscal, cujo trabalho sério de alguns anos foi completamente desfigurado em questões fulcrais de um imposto único sobre o rendimento. O resultado é conhecido. Uma reforma pejada de injustiças e outras tantas inconstitucionalidades.
Recordem-se, designadamente: a recusa de globalização dos rendimentos e ganhos de capital, para os quais o Governo adoptou regimes de favor; o tratamento discriminatório contra as famílias que auferem um só rendimento; os por demais insuficientes abatimentos permitidos ao agregados familiares e aos rendimentos do trabalho. Ao fim e ao cabo, o IRS que aí está é mais «um prolongamento do imposto profissional e não uma consagração efectiva de um imposto pessoal e globalizante».
Situações de injustiça que vieram a ser agravadas com a publicação das «tabelas práticas» pelo Governo, e que estão a impor, à grande maioria dos trabalhadores por conta de outrem, uma retenção na fonte superior ao imposto que efectivamente têm de pagar. Isto é, e concretamente para os agregados familiares com dois rendimentos, os trabalhadores, os contribuintes, estão a ser administrativamente sujeitos a um autêntico empréstimo público forçado. Os trabalhadores - e mesmo os deputados do PSD, embora aqui não o digam - já tiveram a oportunidade de sentir, em Janeiro, em quanto o Governo lhes está a «ir ao bolso».

Vozes do PSD: - É falso! Não é verdade!

O Orador: - É uma situação inaceitável que tem gerado a repulsa generalizada dos contribuintes. A que se somam outras situações igualmente revoltantes, como a tributação das remunerações respeitantes a anos findos (designadamente a título de salários em atraso ou indemnizações), a dos prémios de carácter ocasional que o fisco trata como se fossem remunerações variáveis mas com carácter regular. Ou o valor dos subsídios de refeição que está isento. Ou, ainda, as situações criadas com a retenção na fonte, à taxa de 16%, de remunerações do trabalho liquidadas através dos «recibos verdes» e de alguns arrendamentos, sem ter em conta as situações concretas dos contribuintes e o valor anual dos seus rendimentos.
Em segundo lugar, e mais uma vez se mostrando surdo a todos os avisos e recomendações, o Governo impôs a precipitada entrada em vigor dos impostos sobre o rendimento. Do que resultam as manifestas dificuldades e atabalhoamento de que a administração dá provas. A tal ponto que, numa atitude de duvidosa legalidade, a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais veio, pelo Despacho n.º 128/88-XI, a manter em vigor a tributação dos Códigos dos Impostos de Capitais e Complementar já depois da sua revogação expressa. Ao mesmo tempo que as mais-valias de títulos continuam a não ser tributados, nem sequer com os parcos 10% aprovados pelo Governo e a sua maioria parlamentar.
Em terceiro lugar, o Governo, por sua exclusiva responsabilidade, criou uma situação aberrante: os novos códigos dos impostos sobre o rendimento e da contribuição autárquica começaram a vigorar sem alguns elementos essenciais da respectiva estrutura, nomeadamente sem estarem definidos os respectivos benefícios fiscais e, bem assim, as penalidades a aplicar às infracções fiscais.
Isto é, com as suas atitudes prepotentes e irresponsáveis, o Governo criou uma situação fiscal injusta para a grande maioria dos contribuintes, conturbada e incerta.
A quarta fase deste processo, que nasceu torto e torto há-de acabar, tem a ver com a Proposta de Lei n.º 83/V que hoje está à apreciação da Assembleia da República.
Proposta de lei que, importa frisá-lo e já aqui o foi feito, o Governo apresentou com um mês e meio de atraso em relação ao prazo estabelecido na Lei n.º 106/88.
Sr. Presidente, Srs Deputados: A definição de uma política de benefícios fiscais é indubitavelmente inspirada por concepções políticas e sociais de quem a concebe. E não restam dúvidas de que as concepções do Governo se reflectem bem nesta proposta.
Por um lado o primado do capital sobre o trabalho, pois que para os rendimentos do trabalho não há benefícios fiscais. Por outro lado, e dentro do capital, o primado da esfera financeira sobre a esfera produtiva, a sobreposição da especulação à criação de riqueza.
Na verdade, os benefícios fiscais propostos pelo Governo em sede de IRS e IRC concentram-se nas instituições financeiras parabancárias e nos rendimentos e mais-valias obtidas em activos financeiros. É um facto

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incontroverso e facilínente demonstrável-I designadamente; desaparecern os benefícios às cooperativas de produção, tal como desaparecem e isto independentemènte da posição qué sobre eles tehhamos, os benefícios fiscáis a:o investimento das empresas(designadamente o crédito fiscal - por invdstimento - e a dedução dos lucros retidos e reinvestidos), ao mesmo tempo que se mantém e aumentam'os benefícios -fiscais à especulação. Nem todo- o mercado de capitais é especulação, mas a'grande componente do -mercado de capitais que temos em Porugal é efectivamente especulativo. É a imagem clara das prioridades do Governo.

Vozes do PCP - Muito bem!

S 0 Orador: - Mais. 0 confronto da proposta de lei agora em ' apr eciação e o anteprojecto de estatuto de benefícios fiscais que em Dezembro o Governo apresentou aos parceiros sociais, é bem'de'monstrati.vo das cedências, da submissão do Governo ' aos grúpos de pressão da esfera es-peculativa. Apenas três exemplo%.Q para o mostrar.
Por um lado, o prazo de titularidade das acções,
para a concessão-da isenção às mais-valias obtidas na
sua alienação, que na Lei,n.I l06/88 tinha sido fixado
em 24 rneses, e que era mantido no anteproj'e-cto, é
agora reduzido para apena - s l2 meses. A aproximação
tendencial ao tal mercado especulativo.
Por outro lado, os fundos de investimento mobiliário, cujas mais-valias, no aníeprojecto, eram tributadas por metade em IRC, sãó -nesta proposta totalmente ientas.
O térceiro exemplo é, se ossível, airida mais escandaloso. 0 artigo 44.1 do IRC previa a'exclusão da tributação'das mais-valias obtidas em imobili:kadocorpóreo, desde que fossem reinvestidas, no prazo de dois anos~, em novb imobilizado 'corpóreo. Pois bem, o Governo propõe agorá a ' exiensão dessã - exclusâo :tributária às mais-valias de títúlos, deáignadamente de acções, ainda que essasmai-valías sejam aplicadas em novas acçõés. Mas não contente com isto, cdncede ~esse
.
benefício mesmo que essas apliéações financeiras sejam
meramente contabilistas através da aquisição de acções
próprias ou acções dé outras empresas do mesmo grupo
económico ou, ainda, através de transniissão entre as
empresas e os seus sócios. -
Em suma, no que concerne às mais-valias bolsistas a situação. passa a ser a seguinte: as obtidas por s.ºciedades -estáo legglmente -isentas; as obtidas por p,rticulares também não são tributadas porque não há qualquer controlo por parte do fisco, como o poderá confirmar o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fis~cais.
É demais!! Razão têm ols amantes da especulação. financeira para exclamarem, como já:o fizeram: «0 projecto final de benefícios fiscais trouxe surpresas agradáveis... »
Mas não se quedam por aqui as espúrias propostas do Governo. Aprovadas que sejam pela sua maioria governamental, Portugál passará a ser, -provavelmente, o único país em que os rendimentos das: acções ficarâo sujeitos á três regimes diferenciados: os rendimen.tos das acções não cotadas ficam sujeitos a uma taxa liberatória de 25%; os das acções cotadas nas bolsas serão tributadas a 200lo; por último, os rendimentos das

acções de empresas que -venhará a ser privatizadas só pagarão 15% de irriposto. Quem~, dá mais? Convenhamos que isto é um despudor!

Vozes do PCP: - Muito bem!

. 0 Orador: - Mas, Srs. Deputados, estas inacreditáveis propostas do Governo não têm por efeito, apenas, beneficiar suculentamente alguns grupos de pressão. Elas prejudicam a economia nacional, porque ao incentivarem excessivamente as aplicações financeiras desincentivani o investimento produtivo de que o País tanto carece. Tal cómo prejudicam o próprio mercado financeiro, distorcendo-o, pois favorece as aplicações em determinados activos financeiros, não pela sua rentabilidade ou pelos -seus graus de risco e liquidez, mas, fundamentalmente, por efeito-do regime tributário. E é oportuno lembrar o facto de a distorção crescente contra o sistema bancário agravar, áinda mais as dificuldades do sistema bancário nacional para fazer face ao mercado único firianceiro que se aproxima. O Governo. parece.manifèstamente apostado em impedir que num futuro próximo possa existir em Portugal um núcleo bancário de raiz nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em sede de apreciaçao na generalidade, a Proposta de Lei n.I 83/V exige-nos'mais dois comentários.
. Em primeiro lugar, o que se refere à proposta do Governo de.alterar o regime de isenção para habitação, em sede de contribuição autárquica, que, aliás, só vigora há mês e meio - e já precisa de ser alterado.
Pela nossa pare, não está em causa o alargamento da isenção às habitações para arrendamento. Mas está em causa, isso sim, a isenção para as segundas e terceiras residências, que nada justifica sejam isentas. Quem, por exemploi quiser (e puder) ter uma habitação no Porto,_outra em Lisboa e outra no Algarve, que fique isento da contribuição autárquica pela residencia permanente, «ainda vá que não vá». Mas que pague pelas outras duas é o mínimo _que a moral e a justiça exigem.

Vozes do PCP: --Muito bem!

' 0 Orador: --- Tal como contestamos que, para beneficiar ashabitações de valor entre l 0 e 15 mil contos, se reduza a isenção que eátava prevista para as habitações- até l0 000 contos. Consideramos isto errado.
Em segundo lugar, as propostas do Governo para o imposto sobre sucessões e doações. Ao pretender estender a todas ás acções o regime de -pagamento -por avença, actualméntesó aplicável às acções ao porador não depositadas nem registadas, o Governo prossegue -aceleradamente o desfigurar do impostá sucessório-1 que de ~ um imposto sobre a transmissão de património se toma, cada vez mais, num imposto sobre' o rendimento. Se é isso que o Governo quer, então que 'tenha a franqueza de ò dizer, e proponha a sua extinçao e integração do IRS e IRC. Seria, pelo menos; uma atitude mais transparente. _
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Proposta de Lei n. 1 83/V, sobre benefícios fiscais, é mais um -enorme aleijão introduzido nos já demasiadamente desfigurados impostos sobre o rendimento, que de únicos apenas têm o nomè. Por isso não teremos a mínima hesitação eni votar contra a sua aprovação. 0 que não

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impedirá, logicamente, a nossa participação activa e construtiva, em sede de especialidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa que se encontram inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Vieira de Castro e Nogueira de Brito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, devo dizer que não pretendia fazer qualquer pedido de esclarecimento, mas interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr. Deputado, mas a Mesa tinha a informação de que o uso da palavra seria para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de pedir a V. Ex.ª a amabilidade de me informar sobre o tempo disponível pelo meu grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - A Mesa informa que os tempos disponíveis são os seguintes: o PSD dispõe de dezassete minutos; o PS de dez minutos; o PCP de dois minutos; o PRD de doze minutos; o CDS de nove minutos; Os Verdes de dez minutos e o Governo já utilizou mais três minutos do que o tempo que lhe estava atribuído.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.ª já há pouco referiu que um dos objectivos centrais desta proposta é, sem dúvida, em relação ao mercado de capitais, a recuperação da situação. Estou de acordo! Nota-se! É óbvio! Foi aqui explicado e sublinhado que isso é assim.
Pergunto: que efeitos é que o Sr. Deputado Octávio Teixeira considera que a reforma, tal como foi publicada, sem a lista dos benefícios fiscais, teve sobre o mercado de capitais? Isto é, a circunstância de se ter passado, no que respeita a mais-valias conseguidas com a alienação de activos financeiros, de uma situação de tributação de 7% para uma tributação de 107o teve ou não influência no mercado de capitais?
A circunstância da inexistência do mercado de capitais, do mercado bolsista, ou a situação em que ele se encontra neste momento no nosso país, é ou não um handicap seríssimo colocado ao próprio esforço produtivo, à capacidade de investimento e de dinamização de projectos dos empresários, tanto mais quando se tem de ter em consideração a circunstância, também importante, de o crédito disponível para estas entidades ter estado e continuar a prever-se que esteja sujeito a fortes limitações em relação à política monetária?

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira. Dispõe de dois minutos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Os dois minutos chegarão certamente para responder ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, como há pouco disse, ou pelo menos tentei referi-lo na minha intervenção, o que fundamentalmente me preocupa nesta proposta de lei é a concentração de todos os benefícios apenas no mercado financeiro, em termos de instituições financeiras não bancárias e de instrumentos financeiros, visando, este conjunto de propostas, favorecer tendencialmente as aplicações de curto prazo. E, Sr. Deputado Nogueira de Brito, terá de convir que, quando as aplicações de curto prazo passam a ser - e são-no neste momento na bolsa portuguesa - o essencial do mercado de capitais, têm fundamentalmente uma componente especulativa.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, julgo que o problema que está a passar-se, em termos de mercado de capitais, já vem detrás; contudo, perante a questão concreta que colocou, o problema não é tanto da tributação de 107o, mas mais o da indefinição. E repare que tiveram razão aqueles que duvidaram que não conseguiriam mais benefícios. Isto porque, em termos desta proposta de lei, obtiveram-nos.
Quanto ao problema de estarem ou não a pagar 107o, Sr. Deputado, penso que neste momento ninguém terá pago um tostão de mais-valias. Experimente ir hoje ou esta semana comprar acções e vendê-las na próxima semana com alguma mais-valia e verá se alguém lhe cobra um tostão.
Quanto à terceira e última questão, o problema da ligação do mercado de capitais com o investimento produtivo, Sr. Deputado, eu poderia estar de acordo com o que há pouco referiu se os incentivos propostos apontassem tendencialmente - repito, tendencialmente, o que não quer dizer exclusivamente - para um favorecimento das emissões do mercado primário. Mas não, antes pelo contrário, são cada vez mais e apenas para o mercado secundário! Por isso é que eu há pouco dizia que estes benefícios excessivos tendem a desincentivar o investimento produtivo, porque vão fundamentalmente, diria mesmo quase que exclusivamente, favorecer o mercado secundário e não o mercado primário.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Já se sabe. Começa por aí!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com a criação do denominado imposto único foi radicalmente alterado o quadro fiscal em que se desenrolava a actividade dos sujeitos passivos.
Já foi dito que o bom-senso recomendaria que tal alteração se processasse de forma progressiva e adaptaria. O Governo porém, parecendo querer corresponder a desafios que ele próprio, a despropósito, se colocou, deliberou implementar, de uma só vez e de uma vez por todas, a reforma dos impostos sem que, contudo, tenha concedido idêntica prioridade a uma outra vertente, também fundamental, da reforma fiscal - refiro-me, naturalmente, à reforma da administração fiscal.

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' Neste ontexto"-ós ageiites -eonómicoá forarn força
dos a adaptat-se, subitamenté, a um quadro fiscal-intei;.
ramente novo, amplamente controverso, e profunda
mente exigente em termos de prazos, = circuitos e
procedimentos. - .

A partir de - 1 de Janeiro do -corrente ano, os sujeitos passivos - e, erh particular, os',agentes económicos , ficaram a conhecer, aihda que com-largas franjas de indefinição, as suas obrigãções fiscais, inas, em contrapartida, continuam- a - desconhecer,- co!npletamente, quàis os benefícios fiscais. inerentes à-'reforma dos impostos incidentes sobre o rendimento.

Trata-se de uma situação 'condenável não apemas põrqúe traduz o èxercício discricionário'de um poder- que, por ser sóbéraüo-, não deve ser unilàteral e arbitrário mas, também porque, no plano estritamente téc-nico inviabiliza a formulação de atitudes prospectiv s nu domínio que, crescentemente, assume relevâmcia significativa na gestão empresarial.

Acresce que, mesmo que- o Governo cumpra o'prazo que solicita no pedido de autorização legi.slativa em apreço, ~s na parte final do ano ~se
f , poderá conhecer com o detalhe necessário, quem beneficia de quê e em que condições. Esta situação é, repií6, manifestamente inaceitáel.

. Como vem suceden'do, infelizmente com cad-a -ve - z-,
ríiais frequência, quando o'Gloverno legisla., verifica-se
.
que à celer-idade qua . nto à fixação de deveres não cor
responde igual disponibilidad'e e Urgência mo que se
refere'-à concessão:.dos réspectivos direitos. -

- No ca-so vertente,-face ao tempo que Governo con
sumiu para apresentar uma proposta de estatuto.ºde
benefícios fiscais e perante a expectativa entretanto sus
citadá junto dos'oniribuintes, tudo-indicáva 4ue á'pr . o.
posta de texto legislativo errí análise reflectisse já. um
elevado grau de amadurecimento da complexas ques
tões técnica& levantadas pela concessão de-um regime
de benefícios fiscais determinado pela emergência de
novos impostos e que se sobrepõe a outros regirmes pré
-existéntes.
-

,Na èxposiçâo -de motivos da Proposta de Lei
n.I 83/V, o Governo reconhece que a existência de uma
multiplicidàde de benefícios fiscais dispersos-cóní duvi
dosa justificação em termós de-eficácia económica - e
social é-um,aspecto particularmente criticável dos sis
temas fiscais, por ser indutor de instabildade e de apro-?
fundamento - das -desigualdades fiscais ....
Apesar dissó, o Governo parece não ter feito um -
estudo - pelo menos, se o fez, a Assenibleia da Repú
blica, que detém as maiores responsabilidades ern-maté
ria de fis . calidade, não o recebeu -- qu.e, b.alanceando
o passado dos regimes de benefícios fiscais aplicados
em termos- de análise custos/vantagens esclarecçsse as
opções a tomar por forma a imprimir aos incentivos
fiscais a eficácia e o mérito social que . dós mesmos deve.
exigir-se. Por outro lado, não obstante o peso absor
vente que, ao nível do discurso teórico, a realizaão
do Mercado único veni assumindo para o G . overno,
'deração que
prevalecem dúvidas - fundadas sobre a po'n foi concedida, na propóàta ora apresentada, às.iúiplicações emergentes, nómeadamente em termos de harmonização fiscal, da formação d0 Mercado Interno

Europeu.

Quer dizer: - o Governo reconhece as vulnerabilidades do sistema de incentivação- fiscal pré-exitente um sistema disperso, avulso, divorciado- das realidades

produtivas, refrattário às novas solicitações dà actividade ec'onóinica é m.arcàdo-por fortes sobreposições e conflitualidades - mas, tanto quanto se pode, desde já, avafiat;- prescinde de corrigir o sistema e, sobretudo, d.e o adaptar à nova envolvente que fortificará em 1992.
i Casoá páradigmáticos do que afirmo são, designa
damente, o disposto-no n.º> 6 do artigo 2.1, cuja lei
tura,deixa prenúnciar que o contr'olo sistemático da efi
cácia do -sistemá . de incentivação'~fiscal nào = constitui
preocupação -do Governo, admitindo-se que possá ser
feito -facultativaménte, e, bem assim, a circunstância de
na Ptoposta h..º 83/V não se prever a criação~ de uma
instância: incumbida de gerir - e, portanto, de fisc~ali
zar os resultados esperados - a concessão de benefí
cios- fiscais. . -
A atestar a -abundante confusão que caracteriza a acção governamental iiamatéria em ápreço, não- pode déixar de'fazer--se expressa meríção de uffi despacho recente do- Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, no nosso entender ilegal, através do qual,; se -repõe em vigor, para algumas situações concretas e bem definidas, o sistema de incentivaçãó : existente à 'data de entrada em vigor dos novos impostos sobre o -rendimento-e que fora, entretanto, revogado. E fez bern o Sr. Secretário"de Estado só que, não é esta a forma correcta-'de se ' proceder.
Eis uma. situação -'mais uma - que patenteia -cla
ramente os elevados'níveis de hesitação, de precipita
ção e, mesmo, de incapacidade, que caracterizam um'
processo decisório que revela . dúvidas, incorre em erros
frequentes e induz'acentuada ineficácia na acção gover
namental. . - -
'Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, - Srs. 'Deputados: Uma das principais vulnerabilidades do pedido de autorização, legislativa- veiculado pela proposta'em apj'eço, radica na leviandade com que é apresentada a questão - obviamente fundamental - das garantias e salvaguardas a conferir aos benefícios existentes- à data da entrada em vigor dos novos impostos sobre o rendimento. 0 Governo remete-nos, simplesmente, para «tabelas de conversão», a publicar por decreto-lei. Quer dizer: o Governo formula um.pedido de autorização legislativa que, em parte substantiva, remete para, a conversão de benefícios fiscais limitando-se. sem qualqi;er esclarecimento sobre a . metodologia que irá adoptar para a elaboração das tabelas competentes, a assumir que as publicará à revelia da Assembleia'da República.
Como é óbvio, seria particularmente importante que, juntamente com a proposta de lei se apyesentassem as fórmuls..de 'cálculo de conversão dos benefícios fiscais ou, no mínimo, qpe se dessem a conhecer as orientações, priorida'des e critérios tomados em comsideração. Mas - o Governo optou por nada revelar.
Seria manifestamente despropositado pretender face à indefiniço patenteada pela Propos-ta de Lei n." 83/V. e perante-a escassa informação disponível comentar 'e, debater, em pormenor, o conteúdo das numerosas e herméticas alíneas que corporizam- os arti-

gos 4. 11 e `5. 1 - do texto -legislativo. que nos ocupa. . H á, no entanto, -variadíssimas ques-tões que, à par
tida, prométem suscitar viva controvérsia.
Na alínea a) 4o árigo 4.1 a proposta não define o sentidó--da auto'rização solicitada. Tendo em atençào a discriminàção positiva do sector cooperativo, parece que o regime de benefícios aplicáveis deve restar aquém do concedido às cooperativas. De qualquer módo, deve

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ser explicitado e se o não for a proposta não é constitucional já que não define o sentido de autorização solicitada.
A alínea b) do artigo 4.º não parece de acordo com objectivos de igualdade na distribuição da riqueza.
A alínea d) do artigo 4.º oferece dúvidas quanto à sua compatibilidade com o direito comunitário.
A alínea e) do artigo 4.º privilegia jogos na bolsa relativamente a rendimentos de trabalho. O mesmo se aplica às alíneas n), o) e x) do mesmo artigo.
Somos ainda da opinião de que nos termos da Concordata se deverão manter os benefícios fiscais para a Igreja Católica e suas instituições que deverão ser extensivas a outras confissões ou credos religiosos exceptuando-se as actividades exercidas com finalidade lucrativa.
E por fim sustentarmos que em relação ao artigo 5.º: deverá ser alterada a redacção da alínea d) de modo a passar a ler-se «e de profissionais independentes».
Deverá acrescentar-se a possiblidade de redução temporária: dos rendimentos dos prédios rústicos emparcelados; dos rendimentos dos prédios rústicos reconvertidos; dos rendimentos dos prédios rústicos cultivados em exploração familiar ou por jovens agricultores.
Mas a questão porventura mais criticável na proposta apresentada pelo Governo, refere-se à panóplia de incentivos a conceder a instituições financeiras não monetárias.
Não - não poderia estar - minimamente em causa a conveniência de ser estimulada a liberalização do sector financeiro, embora tal incentivação deva ser extremamente ponderada por forma a precaverem-se consequências negativas, que já se fazem sentir, decorrentes do processo descontrolado de desintermediacão bancária e, bem assim, do advento de mercados paralelos. Mas está, naturalmente, em causa que se conceda um a prioridade, quase absorvente a um só sector em detrimento de outras importantes áreas de actividade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PRD considera que a importância da matéria objecto da proposta de lei em análise justificaria, plenamente, o agendamento por parte do Governo, de um debate parlamentar sobre o estatuto dos benefícios fiscais. O tempo que, alegadamente se perderia nessa realização - que, obviamente, teria carácter de urgência - pouco significaria face ao tempo já injustificavelmente perdido pelo Governo sendo que, de tal realização, resultariam, decerto, ideais e contributos positivos para erradicar, de vez, o caduco regime de incentivos fiscais que temos.
Além do mais, o Governo teria a possibilidade de fazer aquilo que mais uma vez não fez, ou seja, facultar à Assembleia da República as sugestões e críticas, chegadas ao Ministério das Finanças por parte de «parceiros sociais» e de outros organismos a quem foi solicitado opinião como é o caso do sistema bancário, incluindo o Banco de Portugal, sociedades financeiras, bolsas de valores, pessoas individuais e especialistas na matéria.
Difundir a informação que se tem, em exclusividade, sobre a matéria de que se pede autorização legislativa à Assembleia da República é algo que nos parece elementar, sem precisar de enunciar as regras do jogo democrático.
Nestas circunstâncias aqui fica o desafio e a certeza do nosso contributo para a consecução da referida finalidade.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues de Azevedo.

O Sr. Domingues de Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No âmbito da discussão desta matéria e por um determinado número de afirmações que já foram aqui produzidas consideramos que, há despudor e má f é por parte do Sr. Ministro das Finanças quando faz uma interpretação no sentido de que a supressão, a caducidade do crédito fiscal do investimento e do DLRR constitui um incentivo ao investimento. Só um incauto, Sr. Ministro, é que lhe pode perdoar isto! Estamos perante uma Câmara política e deverá ter o cuidado de falar um pouco mais de verdade e não tentar ludibriar as pessoas.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esta proposta de lei parece ter sido feita sobretudo para proteger a especulação bolsista em vez de procurar incentivar os investimentos produtivos e as actividades de interesse nacional.
As isenções e benefícios fiscais em Portugal têm-se caracterizado, até hoje, por uma série de iniciativas legislativas avulsas, num grande número de vezes com um suporte mais de natureza política e cada vez menos subordinadas a uma estratégia de interesse nacional.
Tal situação tem gerado uma complexa gama de legislação avulsa que pelo seu elevado número e alcance tem suscitado verdadeiras dificuldades na gestão dos diversos sistemas de isenção e não raras vezes, particularmente no que concerne aos contribuintes de menor dimensão, tem-se manifestado inexequível e ineficaz muita da legislação, neste domínio, em vigor.
O Partido Socialista defende que urge modificar este estado de coisas e apoia todo o esforço no sentido de subordinar as isenções e benefícios fiscais a uma estratégia previamente definida, que tenha em vista a realidade nacional, que perspective o futuro de Portugal como país de vocação europeia e clarifique, em termos de estabilidade, o enquadramento das situações que beneficiem de um regime de excepção.
É nosso entendimento que qualquer regime de isenção ou de benefícios fiscais é sempre uma excepção à regra geral consagrada de tributação, só se justificando esta mesma medida de excepção quando imperiosos interesses nacionais ou humanitários devam ser excepcionados.
Nesta linha de entendimento não entendemos os critérios opcionais do Governo em matéria de benefícios fiscais no pedido de autorização legislativa em apreço.
O forte pendor patente em todo o projecto de beneficiar fiscalmente ganhos de natureza especulativa, com particular realce para os ganhos provenientes das transacções na bolsa, em preterição das opções do investimento produtivo nas empresas, não pode merecer nunca a nossa aprovação, porque pensamos que esses benefícios são socialmente injustos e não estão subordinados a um interesse de natureza nacional.
É do conhecimento geral que o nosso tecido empresarial tem necessidade urgente de proceder a uma verdadeira revolução tecnológica, com vista a enfrentar os desafios da integração plena na Comunidade Europeia,

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1-7 DE FEVEREIRÓ DE 1989

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adesão que-colocará~em planos de igualdade competitiva a nossa indústria em muitos domínios ainda artesanal, com a indústria europeia detentora das mais evo-luídas técnicas de fabrico, o que possibilita um difèrencial de custos de produção neste moínentó verdadeiramente abissal entre Portugal e os restantes países membros da comunidade.

Não obstante-este estado'de facto -cáótico' ~do setor produtivo português, o Governo ignora- totalment'nõ seu projecto esta realidade e não prevê qualquer incentivo de -natureza fiscal para quem façá investimentos nas empresas a exeniplci'do qúe vinh-a acontecendo com a 'aplicação do CFI e do DLRR. Em contraparida benefícia os in-vestiinen-tos n-a bálsa,- desviando conse-quentemente as opções de investimento para áreas que,de maneira nenhuma, pens-amos ser de mais interesse nacional.

Por outro lado, pensamos que as -expectátivás das
empresas portuguesas se encontram defrau - dadas com
esie pojec.to. d-o Gov -erno,- pois não são respeitadoi os
pressupostós patlent.es no-Decretó-Lei n.I 197.-C/86, de.
18 -d-e- Julho, na medida em que o regime de tranlsiçao
nada nós r,éfere- quan'to ao que va.i --acontece-r com os
lucros retidos e reinvestido pelas empresas, -factos que
foiam de certeza relevant,e$ aquando da opção de inves
tim-'e~ ntos por parte das mesma!s. Aexpectati-Va'criada
nos pressúpostos -dest -decreio-lei enèonira-se~ a-qui
defraud-a- da.

Refere o Governo, no pedido de autorização- legislativa, que fará ectroagir os efeitos dos benefíéios nele consagrados a 31 de Janeiro de 1989, não prevendo, no entanto, nenhum mecanismo de compensação para as situações de tributação no espaço que intermedeia entre a caducidade de isenções no anterior-regime e a aplicação da nova lei. E quando formul-ámos.a'pergunta directamente, o Sr. Ministro nao respondeu.

Pensamos, pois, ser de elementar justiçá, Sr. Mirlistro dás -Finanças, que o,Governo se -situe num plano de igualdade para com os cidadãos, no que concerne ao cumprimento da lei. Se o Governo, e muito bem, tem,o direito de exigir juros compensatórios acis.cidadãos que por qualquer motivo, não efectuáffi o paga-mento das suas obrigações fiscais por facto que lhe sejaimputável, pensamos também que é de toda a'justiça que o -Governo, quando é indevidamente embolsado por -importâncias. que estão, isentas, faça também a compensação aos contribuintes do juro compensatório que se arvora o 'direito de receber.

"'0 Sr.º-Gáiúèiro dos Sant'os (PS): = Muitó bem!'

0 Oradór: = Infelizmente, mais uma vez o Gbvemo não revê .- esta situação.

. 0 'Sr. 4initro . das Finanças sabe,, como sabem todos
os cidadãos, que a megalómáiia m áquina do sector fis
cal leva muito tempp a produzir os seu e-feitos e- daqui
a três,, quatro ou cinco anos as pessoas a quem-,hoje'
lhes foi -'retido- na f6nte estas importâ-ncias talvez
tenham os titulos de anulação.
. ,_ . ,

.-0 Sr. MI nistro dos Assuntos Parlamentares: - 15so era antes!

O Orad or: - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, desculpe mas não era intes, ainda é hóje'.
-

.0 Sr. 'Miúistro dos, Assuntós . Piriamentares: Agora é rápido -com os'computadores!

-- 0 Orador: '-Entendemos ue não faz qualquer sentido o excepcional reginie de benefícios que são pedidos pelo Governo para os rendimentos das acções das empresas a privatizar. Esta medida, do nosso ponto de vista,'é a prova dé que o Governo anda'enganado, ou se engaría quando pretende fazer crer que o sector público empresarial do Estado é a fonte de todos os males nacionais e que, uma vez gerido pelos particulares, se acaba totalme-nte',o mal, ou se engana ao fazer a-pr.ºposta de redução, de,tributação daqueles rendimentos.
.
Pelos vistos, o Ministério das Finanças está cheio de medo quanto à reacção dos investidores em relação às acções_ das empresas a desprivatizar. .
Por outro. lado, o Governo prepra-se para.alargar o ãmbito das isençõs.da -contribuição autárquica, sem que, no entanto, compense as aut . arquias, conforme foi anu,nci-ado- pelo Sr. Ministro.das Finanças na Comissão de Economia, Finanças e Plano, aliás, nos termos da lei "dás fifianças locais, das imporâncias que as mesmas autarquias deixarão de recèbe'r por efeito da apli-cação das isenções constantes no projçcto' Em nosso entender, tal procedimenfo não deixa de consubstanciar- um autêntico -atentado ao, poder local em Portu-, gal, controlando o Governo, or um processo expedito,, as autarquias,no que,concerne à,sua vida económica.
4ão podemos. deixar de denunciar que, no presente pedido de autorização legislativa, o Governo preverte, por'mais de,uma vez, o espírito do próprio, projecto. Estamos- a discutir um pédido de autorização legislativa de.isenções fiscais, onde o,Governo intercala indisciminadame-nte autênticas alterações aos códigos do IRS e do IRC. .
É co imens-a mágoa qpç, mais uma vez, ve.rifica
mos, no proje-cto do Govern'o, serem autenticamente
ignoradas as.actividades agr.ícolas e a injustiça que aí
exite. 0 iéódi,go do Imposto.~ sobre a-Indústria Agrí
cola foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 5/86, onde se
previa uma isençâo de dez anos para os jovens agri
cultores que efectuassem a sua instalação nos termos
da legislação em vigor. O Govern o menospreza auten
ticamente este diploma. Nenhuma situação de benefí
cio est á'prevista para a.juventude, fazendo o Governo
caducar . íodo. um e'sforço . que. se vinha fazendo sentir
de inserção -dos jpvéns na vida pr'ofissional e na vida
a-ctiva.
.
Em síntese, o que se poderá dizer deste pedido de autorização legislativa e da lnhas de força que o suportam é que o Governo considera prioridade nacional os rendimentos gerados na especulaçro da bolsa. É esta a prioridade 4ue o Governo considera como -nacional para lhe aplicar o regime-de excepçao, o refflme da isenção, diniinuindô sem critério certo os benefícios fiscais que são receita do Governo e aumentando os benefícios fisèais que são receitas das autarquias. D,á muito dinheiro a alguns seri se saber como nem porquê.
Não custa ser popular, Sr. Ministro _ das Finanças, quando os'outros 'pagam o - reço da popularidíde!
Finalmente, Sr. Preside ~ nte e Srs. Deputados, o Par
tido Socialistá, consciente-da i~mportânéia e da respon
sa6ilidade'que-. em a discussão séria, honesta e a'pro
fuiidada de um projecto desta dimensão, reiteta a sua
disponibilidade parà colaborar com ânimo e cónvicção
num projecto sério, que respeite as regras da equidade

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e da justiça fiscal, subordinando as medidas da excepção ao interesse nacional e não ao sabor de conjunturas de natureza acidental. Neste sentido, faremos propostas que muito poderão beneficiar a economia nacional e as empresas dinâmicas deste país.
Esperamos, em sede própria, que o Governo e o grupo parlamentar que o suporta estejam abertos a estas alterações de profundidade e que este projecto seja enriquecido para bem do País e dos cidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e os Srs. Deputados Vieira de Castro e Gilberto Madaíl.
Quanto aos tempos remanescentes, uma vez que é uma questão que preocupa todos os grupos parlamentares, devo dizer que o Governo já gastou três minutos do tempo que lhe foi cedido pelo PSD e o PS já gastou mais um minuto.
De acordo com o que deduzi das próprias posições dos grupos parlamentares, tendo em conta a matéria em questão e uma vez que o Governo manifestou interesse em dispor de mais algum tempo, a Mesa fará o rateio normal pelos grupos parlamentares para saber da necessidade de cada um - aliás, isso já está a ser feito -, isto é, da necessidade real e objectiva da discussão deste debate.
Neste pressuposto, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para solicitar à Mesa o favor de indicar os tempos disponíveis dos outros grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado.

Os tempos são os seguintes: PSD tem quinze minutos; o PS já gastou mais um minuto; o PCP já não tem tempo; o PRD tem um minuto; o CDS tem oito minutos; Os Verdes têm dez minutos e o Governo, tal como disse, já gastou três minutos do tempo que lhe foi cedido pelo PSD.
Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): - Sr. Deputado Domingues de Azevedo, V. Ex.ª aludiu à «megalómana máquina» da Administração Fiscal e devo dizer-lhe que não é megalómana, é modesta mas eficaz.

Risos do PCP.

E posso dizer-lhe Sr. Deputado - e talvez vá sofrer uma grande decepção, assim como outros Srs. Deputados que insistem na tecla do agravamento fiscal -, que vamos mandar, em Março do ano que vem, ou seja, um mês depois de fechar as contas, uma carta personalizada a todos os contribuintes...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ..., dizendo-lhes o seguinte: «O senhor, em função dos rendimentos declarados, pagou x de imposto. Se não tivesse havido reforma fiscal teria pago x. A diferença é x.» Julgue quem criticou!...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Domingues Azevedo deseja responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - No final, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, começo por tranquilizá-lo porque não vou utilizar a linguagem que V. Ex.ª utilizou para com o Sr. Ministro, acusando-o de despudor e de má fé.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Foi ele que me acusou primeiro!

O Orador: - Durante os debates aqui travados aquando da discussão dos diplomas que vieram originar a reforma fiscal, V. Ex.ª distinguiu-se no anúncio da catástrofe. Era, então, o agravamento da carga fiscal. Isto passou-se em meados de Dezembro.
Hoje estamos a debater os benefícios fiscais em sede de IRS, de IRC e de contribuição autárquica. Continuamos a discutir a reforma fiscal mas V. Ex.ª emudeceu completamente quanto à questão do agravamento fiscal.
Sr. Deputado Domingues Azevedo, foi por pudor e má fé que, hoje, V. Ex.ª não se referiu a esse aspecto?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madaíl.

O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Deputado Domingues de Azevedo, ouvi com atenção a sua intervenção e, francamente, não me surpreende que o tom das críticas que V. Ex.ª endereça à proposta de lei dos benefícios fiscais seja similar, ou quase igual, àquela que o Partido Comunista Português acabou de endereçar. Mas penso que o Partido Socialista, pelo menos pelas suas declarações, terá obrigações relativamente à sociedade portuguesa e muito particularmente aos agentes económicos, muito diferente daquelas que o Partido Comunista tem.
V. Ex.ª mencionou que dever-se-ia discutir amplamente no sentido de se subordinar as isenções em termos de estratégia nacional. O que constatamos, de facto, Sr. Deputado, é que a estratégia nacional do Partido Social-Democrata, no sentido do avanço para a verdadeira social democracia, parece aparentemente diferente daquela que o Partido Socialista defende. E é-o com certeza, na medida em que as posições aqui defendidas pelo PS, nos ataques sistemáticos à reforma fiscal e muito particularmente agora nesta intervenção relativamente aos benefícios fiscais, têm demonstrado aos agentes económicos que o Partido Socialista não pretende dinamizar a economia portuguesa com o incentivo daquilo que é considerado por todos, e já aqui foi dito, como prioritário, isto é, mercado de capitais.
Disse ainda V. Ex.ª que a primeira preocupação do Governo era dinamizar ou favorecer a especulação. Sr. Deputado, perante esta proposta de lei não vale a pena

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17 DE FEVEREIRO DE 1989

estar a citar-lhe os casos -nem o que- está expresso, pois julgo que é uma afirmação que demostra claramente, em termos de agentes econ6mic'os particularmente dos empresários, qual é a verdadeira posiçào do Partido Socialista.
Gostaria de perguntar ao Sr. Deputado, uma vez que
referiu que o Governo não promove os incentivos
financeiros erm termos das empresas, se, face aos ins
trumentos que nesta altura a economia portuguesa dis
põe -- nomeadamente, através dos -fundos comunitá
rios, com tdo o dinheiro que está a entrar para as
empresas, para os agentes - económicos -,, de facto,
acharia l6gico que se mantivesse ainda todo um con
junto de benefícios fiscais, que, ao fim e ao cabo,
foram dinamízados por este. Governo E é bom não
esquecermos isso, na medida em que o Sr. Deputado,
em sede ãe comissão especializada em que o Sr. Minis
tro teve a amabilidade de apesentar esta'propost-a de
lei, elogiou mesmo alguns desses benefícios físcais.
Quanto à reacção dos investidores, Sr. Deputado, penso que não é preocupante, se atendermos aos índices do nível de crescimento e, muito particulariinente-, aos índices- de formação de novas erhpresas que se vêm verificando no nosso país.
,

Vozes do PSD: - Muito bem!

Entrétanto, assumiu a pre$idência o - Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Aevedo, que dispõe de três minutos.

0 Sr. Domingues Azevedo.(PS): - Sr--- Presidente, eti tinha ficado com a impressão de que- o meu partido'-disporia de mais tempo, mas, sendo assim, responderei muito rapidamente.
Quanto ao Sr. Secretário de Estado, talvez eu o tenha entendido mal: disse-- «modesta» ou «mblestá»'?

O Sr. Secretário de Estado dos Assúntos Fiscais,; -

Modesta.

0 Orador: - Então, de'cereza que o Sr. Secretário de Estado- nunca teve um título - de anulação de qualquer imposto que t-enha págo indevidamente pois, se assim fosse, não teria falado dessa m'aneira em relação à questão que levantei. -

O Sr. Secretário de Estado do Aísuntos Fiscais: 15so é passado e estamos a falar do futurol

O Orador: - Outra questão que lhe queria pr é a de saber se a carta qúe referiu que vai enviar aos contribuintes será igual a uma que recebemos do Sr. Primeiro-Ministro.
Se' assim for, poupe o dinheirá, Sr. Secretárib de Estadol .

Risos do PS.

0. Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Não, esta será personalizada. .

0 Orador: - Quanto ao Sr. Deputado Vieira de Castro, V. EX. º tem um compromisso conúgo no que respeita ao desagravernento fiscal e esperemos que o cumpra.

Poranto,. Sr. Deputado, quanto a essa matéria, uma vez mais me recuso a entrar numa discussão- sem sentido e sem significado. _ -

De certeza que VV. Ex.," não ouvem o que dizem os portugueses porque, de contrário, não faria este tipo dé afirmações. . - .

Quanto à reforma fiscal, não me referi a ela e afirmo que, quando -V. Ex.1 quiser, estou pronto para fazer um debate sério quanto ao impacto da reforma fiscal, quanto à forma; como está a ser~ levada a efeito e quanto à questões que lhe são inerentes.

0 Sr. Deputado Gilberto Madail disse que a crítica feita pelo Partido Socialista é igual à que o PCP faz.

Ora, parece-ine que,-nesta Câmara,'o que há a criticar é a inexistência de crítica por parie do PSD, o que é extteinamente grave-. 15to é, no fundo, perante um projecto coffi a impiortância deste, ó PSD não tem nenhuma crítica a fazer. Para o PSD está tudo bem, este diploma é uma coisá extraordinária e os outros partidos, por critícarem, é que estão errados.

Sr. Deputadó Gilberto Madail, não somos nós que temos que nos questionar por fazermos críticas mas, sim, VV. -Ex.81, pela vossa incapacidade de criticar, o que é muito mais grave.

Aplausos do -PS.

Quanto à etrat.égia do PSD, Sr. Deputado, digo-lhe
que não tenho preterisões a convencê-lo a ter uma estra
tégia diferente, nem tão pouco o senhor terá preten
sões d ' e me convencer a mim a mudar de estratégia.

De facto, o povo português já está a perceber qual
é a vossa estratégia e o que ela representa para o País
e de certeza que não esquecerá tão rapidamente como V. Ex.a

Quanto a esta proposta de lei e perante um instrumento de imporân.cia capital para o País, o PSD disse nada! .

Quanto à questãq que consideramos gravíssima e que
é a do core ao incentivo fiscal e ao investimento, o
PSD disse nada! _

Protestos do PSD.º

Em último lugar, Sr. Deputado Gilberto Madail, não lhe falei em incentivos financeiros e V. Ex." está a fazer uma-confusão muito grande. Uma coisa é um incentivo financeiro e outra é um incentivo fiscal. Poranto, não confunda. Repito que falei em incentivo fiscal e não financeiro.
Finalmente, queria dizer que concordo com os números avançados quanto ao índice de crescimento do investimeri.to. 'Mas, Sr. 'Deputado Gilberto Madaíl, já pensóu que os índices . de crescimento das empresas se verificaram devido -à existêiicia de mecanismos de isenção'fiscal que se aplicaram a'esses mesmos investimento§? Pelo facio de . o Góverno fazer caducar aquela, necessariamente que o investimento vai baixar!

VV. Ex." caem em 'contradição e nem sequer dão por isso-.
.

0 Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, peço

a palavra para defesa da consideraçã.º. 0, Sr. Presidente: ~- É regimental, portanto, tem a palavra, Sr. Deputado. -

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1438 I SÉRIE - NÚMERO 40

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, estranhei que, há dois meses atrás, V. Ex.ª tivesse «inindado o País» com protestos contra o pseudo-agravamento da carga fiscal e que hoje tenha emudecido! Foi apenas isso o que eu disse!
Ora, conheço os seus motivos: é que hoje, um mês e meio depois da entrada em vigor do IRS, V. Ex.ª sabe, tal como eu próprio, que muitas centenas de milhar de contribuintes já tiveram oportunidade de fazer cálculos. Agora, contra a força dos números, VV. Ex.ªs não podem ter o discurso das palavras ocas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, primeiro darei a palavra ao seu colega de bancada, deputado Domingues Azevedo, que a tinha solicitado antes.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Vieira de Castro, a explicação é muito simples. Não me referi a esse tema porque não era o que estávamos a debater e, portanto, não tinha nada que me referir a isso. É muito simples!

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - V. Ex.ª tem razão: é muito simples, mas pelos motivos que eu disse!

O Orador: - Bem, se o Sr. Deputado quer responder por mim, então calar-me-ei e deixá-lo-ei falar...
Repito que a razão é muito simples: é que o deputado Domingues Azevedo não dispõe do dinheiro que tem o Governo para gastar em propaganda sobre coisas que não correspondem à verdade!

Protestos do PSD.

É que a propaganda está feita! Aplausos do PS.
O Sr. Deputado Vieira de Castro pode dirigir-se à televisão e respondem-lhe que «vamos resolver o seu caso» e se for aos jornais também lhe dizem que «vamos resolver o seu caso». Mas nós não temos o dinheiro para pagar a publicidade como tem o Governo!...

Protestos do PSD.

O Governo que venha dizer a esta Assembleia quanto é que já gastou em publicidade sobre o IRS!
Mas, Sr. Deputado, há ainda outro pormenor: o Partido Socialista disse que está pronto a fazer um debate sério sobre a reforma fiscal mas VV. Ex.ªs, ao determinarem que o Partido Socialista só pode dispor de dezoito minutos para intervir nesta matéria, mostram que não o desejam. Portanto, VV. Ex.ªs querem é aprovar as matérias sem as discutir.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, se bem entendi, há pouco o Sr. Deputado Vieira de Castro pediu a palavra para a defesa da consideração, mas, pelo que ouvimos, verificámos que o Sr. Deputado defendeu a consideração devida à Assembleia como um todo e não a consideração própria, visto que esta nunca esteve em causa.
É que a discussão de uma matéria de tão excepcional importância - muito bem sublinhada pelo Sr. Ministro-é aqui «espartilhada» num tempo tal que, para trazer à colação um tema que entendeu fundamental, o Sr. Deputado Vieira de Castro teve que recorrer à figura regimental da defesa da consideração.
Ora, são 18 horas e 45 minutos e, pelos vistos, a Assembleia dispõe-se a «ir para férias» até às 20 horas, porque todos os partidos já esgotaram os seus tempos regimentais. O País ficou sem saber quais são as respostas que o Sr. Ministro das Finanças tem a dar em relação a certos assuntos, porque, de facto, não respondeu e não direi que* o debate ficou a meio mas quase.
Assim, pela consideração devida à Assembleia, parece-me que esta Câmara não pode ser «despachada para casa» às 18 horas e 45 minutos quando ainda estão por responder inúmeras questões.
Portanto, solicitaria ao Sr. Presidente que considerasse a hipótese de prolongar este debate concedendo mais alguns minutos a cada partido e, evidentemente, também ao Governo.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, em primeiro lugar, esclareço V. Ex.ª de que ainda estão inscritos mais dois Srs. Deputados, que, de resto, dispõem de tempo regimental; portanto, não terminaremos às 18 horas e 45 minutos.
Em segundo lugar, a Mesa tem procurado sempre fazer uma gestão de tempos tão razoável quanto possível, para que os debates se processem da melhor maneira, nem sempre com a compreensão de todos os deputados - normalmente manifestam compreensão quando se trata de membros dos grupos parlamentares respectivos e não quando é o caso de outros.
Posso afirmar que hoje tem sido este o procedimento da Mesa. Por exemplo, o Grupo Parlamentar do PS já gastou 22 minutos em vez dos 18 minutos regimentais. No entanto, quer nesta sede quer em sede da conferência de líderes, a Mesa insiste em que sejam respeitados os tempos regimentais previamente acordados, até porque a autodisciplina é também uma grande virtude.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente - Devo dizer que citei o caso do Partido Socialista por ter sido o interpelante, mas o Governo, tal como os outros grupos parlamentares, também já excedeu o tempo de que dispunha. Dentro de certos limites, esta é a regra da Casa. No entanto, se esses limites passarem além do razoável, é evidente que terá que haver uma intervenção por parte da Mesa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Martins.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Cravinho, tem a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. António Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com a

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afirmação plena do lberalsmo e muito particularmente com a- Revolução Francesa-, surgiram as primeiras tentativas de instauração de igualdade tributária, riscando as isenções fiscais do mapa dos privilégios da nobreza e do clero. Aparece a ideia de generalidade tributária. Todos deveriam pagar impostos, não se jvstificando por isso que, em virtude da pertença a uma determinada classe social, houvesse um tratamento fiscal preferencial.

É de facto contra a existência de privilégios fiscais, que -se faz a afirmação! do princípio da generalidade tributária, ou seja, a cobertura da despesa pública passa a ser considerada.-como uma obrigação geral de todos os cidadâos.

Obviamente que há e>cepções à 'áenerálidade tribu
tária, sendo a mais significativa a ideia de benefício fis
ca ~ 1 - situação especial mais favorável, em que se
encontra certo -cidadão perante a lei do imposto, pois
coiicorreu na sua pessoá ou situação, determinadas cir
cunstâncias ~genericamente previstas na lei. -

- Efii Portugal existia uma roliferação~de legislaçãó sobre incentivos fiscais pondo em causa os princípios que justificam a sua existêücia como, por'exemplo, a justiça fiscal e a proteéão ou estímulos de natuteza económica, social ou cultural.

Eram benefícios que foram criados èm determinadas
conjun ~ turas, desajustado poi isso da realidade actual,
provocando perdas de receitas sem cabal justificação
ècon'6micosocial. Muitos incentivbs fiscais nada incen
tivaram, antes pelo contrário, contribuiram até para
uma gestão pouco cuidado-sá é conseqentemen . te ao
desperdício.

Além disso convém recordar que existe hoje em Portugal, um'variado sistema de incentivos financeiros, produzindo efeitos ánálogos aos benefícios iscais ~como o SIBR, SIFIT, PEDAP, PEDIP, para falar -só nos mais significativos. '

'Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs-. Deputados: A Proposta de Lei n.I 83/V v-isa sistematizar num só diploma'os benefícios que o Est ado concede, trazendo por isso vantagens ope-racionais no seu uso e uma maior clareza e transparência de pocessos, articulando-:se com as isenções claramente defi-nidas nos códigos do IRS, IRC e CA.
Algumas notas imggrtantes referentes a esta proposta de lei: ,

Primeiro, salvaguarda-se os direitos adquiridos -(fonte internacional, contratual e os benefícios temporários condicionados) até à entrada em vigor do IRS, IRC e CA, prevendo-se a criação de tabelas de conversão com o objectivo de reflectir nos novos impostos, benefícios que se reportavam aos impostos extintos. É o que acontece com o CPI e o DLRR, dois instrumentos que conseguiram claramente os seus objectivos'- Dinamizar o investimento produtivo e que em boa hora o Govemo actual os lançou. .

Segundo, os fundos de investimento mobiliário e imobiliário beneficiam de tratamento favorável, quer os rendimentos distribuídos aos participantes quer os rendimentos auferidos pelos próprios fundos. Tratamento favorável também para os fundos de pensões e para'as mais-valas de acções detidas por particulares. São medidas imporantes que visam dinamizar o mercado de capitais, pois os incentivos fiscais devem fomentar, por um lado, a oferta pública de valores e a procura dos mesmos pelos detentores de liquidez e,

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por outro lado, as operações das bolsas, condição indis
pensável para a criação de um verdadeiro mercado
financeiro. ..
Terceiro, no domínio bancário merecem tratamento favorável as contas poupança-habitação, poupança-refórmados e poupança-emigrantes.
Em quarto lugar, os prédios destinados a habitação
própria poderão beneficiar de um regime de isenção em
contribuição autárquica por um período de dez anos.
Além dis ' so o projecto prevê que possa haver desagra
vamento em CA para famílias de baixo nível de rendi
mento.
Em quinto lugar, o tratamento favorável quer em

IRS quer em CA para deficientes. Em,sexto lugar,as medidas prevendo isenções, dis
pensas, deduções ou reduções de impostos e outras van
tagens.fiscais são,, na realidade, meios de concessão de
ajuda financeira por parte do Governo. São claramente
despesas públicas, similares mesmo quanto ao seu
objectivo, às despesas, directas previstas no orçamento.
Daí a necessidade de quantificar a.despesa fiscal. Este é, aliás, um aspecto relevante neste projecto pois só assim será possível fazer uma análise custo-eficácia dos benefícios fiscais.

,-Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:.ªmatéria de impostos exige um elevado grau de certeza e segurança, nomeadamente de estabilidade da regulamentação jurídica. Esta é uma condição fundamental para as famílias e as empresas poderem gerir racionalmente às suas economias e, de um modo geral a sua própria existência.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Présidente-: - 0 Sr. Deputado Gameiro dos Santos, pediu,a palavra ara um pedido de esclarecimentos emboa já não disponha de tempo. -No entanto-, a Mesa concede-lhe a oala'vra mas pede-lhe que o faça o mais brevemente possível.
Tem a palavra, Sr. Deputado. .

0 . Sr., Gamei . ro dos Santos (PS): - Sr. Deputado
António Marins, gostaria que me respondesse às ques
tões que tive oportunidade de colocar ao Sr. Ministro
das Finanças e às qtais ele não. quis responder e, para
que não h-aja dúvidas, vou repetir. as perguntas já
feitas. , .
1 '
Porque é que, -nesta proposta de lei de benefícios fiscais, o Governo privilegia os rendimentos de. capitais e de mais-valias em detrimento dos investimentos produtivos?
Porque é que, nesta proposta de lei de incentivos fiss, o Goverho acaba com um incentivó extremamente importante que existia em sede de contribuição industrial, rio'arigó 44.º, e que era o da possibilidade de haver deduções à matéria colectável desde que se verificasse o reinvestimento de reservas?
Porque é que o Governo limita a aplicação de crédito fiscal ao investimento em curso em 3l de Dezembro de 1.988 e não à totalidade do investimento?
Porque é que, num período em que as empresas portuguesas têm que se adaptar à entrada em vigor do Nercado -único Europeu, o- Governo. nada diz sobre os processos- de concentração -e 'cisão de empresas em matéria de benefícios fiscais? .
Porque é que o Qoverno nada diz em.relação ao comércio e aos serviços?.

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Se o Sr. Ministro não quis dar resposta a estas perguntas, essa será a sua posição, mas gostaria que o Sr. Deputado António Martins lhes respondesse porque são importantes, até para o enriquecimento do debate.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Martins.

O Sr. António Martins (PSD): - Sr. Deputado Carneiro dos Santos, obviamente que essas perguntas deveriam ser dirigidas ao Sr. Ministro mas não quero deixar de esclarecer algumas das questões que V. Ex.ª levantou.
O primeiro ponto é que, para nós, Partido Social-Democrata, é fundamental a dinamização do mercado de capitais. Portanto, é óbvio que nesta proposta de lei se privilegia o mercado de capitais - ainda bem para o País! -, pois será a maneira de as empresas poderem financiar-se, não utilizando o crédito bancário.
Quanto ao artigo 44.º do Código da Contribuição Industrial, convém referir que tinha um carácter extremamente burocrático. Aliás, na reunião com o Sr. Ministro das Finanças, um seu colega de bancada disse que a vantagem do crédito fiscal ao investimento e da dedução dos lucros retidos e reinvestidos eram instrumentos privilegiados, exactamente porque conseguiam inverter a situação do artigo 44.º, uma vez que simplificavam e davam resposta imediata.

O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Simplicíssimo, Sr. Deputado!

O Orador: - Quanto ao crédito fiscal ao investimento, em boa hora o Governo o lançou.
Com efeito, os resultados foram óptimos, já que o investimento cresceu em Portugal como nunca. Daí que a resposta do Sr. Ministro fosse também clara quanto a esse ponto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, começaria por desejar as melhoras do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que suponho que, talvez com alguma indigestão de fisco, não está muito bem de saúde.

Risos.

Além disso, queria agradecer-lhe esse grande sacrifício que vai fazer ao mandar essa carta personalizada a todos os contribuintes, que, porventura, lhe agradecerão que não faça mais essa despesa para que não tenham de a pagar...

Risos.

Elemento decisivo na avaliação das finalidades extra-fiscais do imposto, a matéria dos benefícios - isenção, redução de taxas e outros - é também importante enquanto factor de avaliação do grau de cumprimento que o sistema dá ao princípio da igualdade, não apenas na sua tradução igualitária do artigo 106.º da Constituição, mas, sobretudo, enquanto princípio geral informador dos direitos fundamentais.
Certamente por isso é que a Constituição considera os benefícios em pé de igualdade com a incidência, a taxa e as garantias, como elementos definidores dos impostos, nessa medida reservados à competência da Assembleia e razão primeira do seu aparecimento na estrutura política.
Por isso, também, é que o povo contribuinte é tão sensível à matéria dos benefícios nas suas diversas manifestações, fazendo julgamento severo acerca do modo como são atribuídos e aproveitados.
Em suma, o quadro do imposto não é um quadro completo sem o regime dos benefícios, isto sem prejuízo de se aceitar que estes podem ter carácter conjuntural e, em boa medida, ser alterados na oportunidade oferecida pela aprovação das leis do orçamento.
O que já se entende mal é que, num momento de mudança, que se pretende de grande viragem e que por isso mesmo se baptizou de reforma fiscal, as matérias da incidência e das taxas, bem como da regulamentação dos processos burocráticos de cobrança e fiscalização, tenham sido separados da matéria dos benefícios.
O que não se compreende ou compreende mal, é que os cidadãos tenham sido obrigados a pagar os novos impostos sem conhecer o quadro completo dos benefícios que podiam invocar.
Quer isto dizer que um sistema de tributação do rendimento, que, em comparação com o anterior se caracteriza por uma invasão sistemática do quotidiano dos contribuintes, lhes recusou, ao menos nos primeiros tempos de vida, a possibilidade de planear, com maior cuidado, a sua vida fiscal.
Inconveniente particularmente grave para as empresas, mas que afecta também os cidadãos e que terá tido já consequências porventura irrecuperáveis ou de difícil recuperação.
Irrecuperável é, por exemplo, o dinheiro gasto nas centenas de escrituras de transformação de sociedades que tiveram lugar no fim do ano passado de 1988, empastelando completamente os nossos serviços notariais e que teriam sido dispensadas se estivesse em vigor a norma que vai, com certeza, resultar do dispositivo correspondente à alínea g) do artigo 4.º da proposta de autorização.
É esta, pois, a primeira crítica que fazemos a esta iniciativa do Governo, crítica que nós, CDS, fazíamos já ao normativo que veio a transformar-se no n.º 8 do artigo 27.º da Lei n.º 106/88, de 17 de Setembro. Trata-se, com efeito, de uma proposta que aparece tarde, que vem atrasada, inserida naquilo que poderá, com propriedade, designar-se como reforma fiscal a conta gotas: tivemos primeiro os códigos, temos agora a autorização para os benefícios e falta-nos ainda o código da avaliação predial e a revisão da lei das finanças locais consonante.
Mas dito isto, que reputamos importante, mas que respeita mais ao processo do que ao conteúdo da proposta, passaremos a dar nota do que sobre este se nos oferece dizer e anotar em síntese.
Ora, a primeira observação suscitada pela leitura e ponderação da proposta vai no sentido de que esta, mais do que num quadro normal ou fisiológico de benefícios, assenta nos princípios fixados no artigo 27.º da lei de reforma e agora reproduzidos no artigo 2.º da proposta, pretende desempenhar um papel corrector em relação a alguns aspectos da mesma.

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E isso talvez explique os tempos ou, como -agora se
diz, o timing do processo: carregado de dúvidas sobre
algumas das consequências dos, novos impostos -
apesar dos milhares de simulações informticas -que diz
ter feito -, o Governo optou pelo esper - ar'para vêr,
transformando o povo contribuinte numa gigantescà
cobaia. E agora vem, corti os benefíciós, -corrigir -o tito!

Que é assim, demonstra-o, por exemplo<_ com='com' que='que' foi='foi' de='de' mais-valias-='mais-valias-' do-='do-' tinha='tinha' legislador..-..='legislador..-..' imobilizações='imobilizações' previsto='previsto' de.='de.' mais='mais' se='se' às='às' código.do='código.do' para='para' apenas='apenas' das='das' dúvida='dúvida' acçóes='acçóes' tag1:mos='ter:mos' não='não' irc='irc' tag0:_='empr.esas:_' leia-se='leia-se' a='a' financeiras='financeiras' alienaçks='alienaçks' em='em' passa='passa' alienação='alienação' imobilizado='imobilizado' ao='ao' _-='_-' alargado='alargado' esquecido='esquecido' o='o' p='p' tributação='tributação' favoráveis.='favoráveis.' elementos='elementos' inicialmente='inicialmente' provenièntes='provenièntes' há='há' corpóreo='corpóreo' da='da' agora='agora' xmlns:tag0='urn:x-prefix:empr.esas' xmlns:tag1='urn:x-prefix:ter'>

Serve-nos isto para concluir què o principal objec
tivo deste pedido se reporta à necessidade de reparar
os estragos que a publicação e a entrada ebi 'Vigor dos
novos impostos provocaram, nas intenções de poupança
e no mercado bolsista, este - último- vítima já de tão
variadas e desastrosas- actuações do Governo. - _ , -.,
No decurso da discussão da reforma, o Governo não
conseguiu, com efeito, escapar ao clim a instalado, 'tam
bém na Assembleia, 4ue, em nome da recupgraçqo'do
princípio da unidade do imposto, espalhou a ideia- de
que estariam a ser beneficiadas as actividades especu-

lativas e o investimento, esquecendo os ue tal afirma- Pausa.
vam que a realidade era, antes, a de ter passado a
tributar-se o que até agora o não era e que a instala--

ção de um ambiente proício à existência normalizada
de um mercado de capitais devidamente saneado'sé
apresenta, hoje, como a primeira prioridade para a
política econónlico-financeira, terreno sobre õ qual'eitá
a fazer-se o julgamento deste Governo. Portanto, ten
tativa de recuperação da bolsa e da'inclnação pela pou
pança, o que, em si, está certo e merece a nossa apro
vaçâo, sem prejuízo da dificuldade que temos em
entender alguma das soluções encontradas.
Não -vemos, por exemplo, qpal a razão que leva a
tratar pior os fundos de pensões do que o siriiples' tun
dos de investimento, solução que, além do mais, revela
a falta de estratégia social de um Governo que, depois
de ter levantado o véu que encobria a crise potencial
do sistema público de segurança social, persiste em
tomar medidas isoladas e a pôr em causa as alternati
vas privadas para esse sistema.
Em paralelo e diríamós que em conexão com o
objectivo apontado de recuperação do mercado de capi
tais, é também visível, apesar de tudo, a preoc.upação
com o investimento, apesar do muito que se tem
falado, ultimamente, nas ajudas financeiras de oiigeryi
comunitária alternativas aos. auxfiios fiscais a' esse
mesmo investimento. .
Também aí, porém, se entende mal a diferença niti ' -
díssima de tratamento entre as simples sociedades dffl
gestão de imvestimento imobiliàrio e as sqciedades,de
simples investimento, do mesmo modo que se não
entende bem o regime transitório consagrado lpara as
reservas detidas e reinvestidas, o crédito fiscal de inves
timento e o duplo crédito fiscal de investimento, onde
se não respeitam, ao menos, os prazos com que ini-

cialmente contavam os contribuintes.
Por sua vez 1 e no 4ue respeita à contribuição autár
quica, os benefícios agora consagradds apresentam, ào
invés do que acontecia com o IRS e o IRC, uma estru
tura'norinalizada,- o,que significa que o Governo .é'-

mantém firme no seu intuito de manter este impoáto,

,

sobre o património. Veremos que malefícios - que já não esperamos benefícios - que nos vai trazer o código das avaliações...

Em paralelo, porém, com tudo isto, ou seja, com a consagração de'um quadro completo de isenções e de reduções de taxas, seria bom que o Governo pensasse também em beneficiar os processos que pôs em prática, com destaque para as famigeradas tabelas práticas, transformadas, à-revelia dos contribuintes e dos seus representantes - que -somos nós -, em instrumentos de Enanciamento forçado'do Estado e das suas despesas.

Não reprovaremos, pois, estes benefícios que hoje apreciamos, reservando-nos, porém, -o direito de tentar beneficiá-los na especialidade e aproveitando a oportunidade para deixar o voto de que as beneficiaçôes aos novos impostos se não fiquem por estes benefícios.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Razoável...

0 Sr. Presidente: = Srs. Deputados, nâo -havendo mais inscriçõe§,'dou por encetrado este debate, pedindo aos serviços de apoio ao Plenário e aos grupos parlamentares o favor de solicitarem a presença dos Srs. Deputados reunidos em comissões, para efeito de processo de votação.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.I 83/V - Auoriza o Governo a apro.var diplomas reguladores dos benefícios fiscais em sede de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), do IMposto sobre o Rendimento . das Pessoas Colectivas - (IRC),. de Contribuição Autárquica (CA) e de Imposto sobre as Sucessões e Doações, bem como dos respectivos diplomas complementares.

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS, votos contra do PCP e do Sr. Deputado Independente Raul Castro e a abstenção do PRD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, reunimos amanhK às l0 horas para unia sessão de perguntas ao Governo, já. oporunamente distribuídas pelos grupos -Darlamentares.

Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a sessão.

Eram 19-horas e 15 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António José Caeiro -da Motta Veiga. An't6niõ'Maria Péreira. Carlos,Mánuel Oliveir-a -da Silva. Cecília: Pita -Cat'arino.
.

Domingos Duarte-Lima.
Eduardo Alfredo.de Carvalho P. da Silva.
Fernando José Antune s Gomes Pereira.
Flausino José Pereira da Silva.
Guidõ O.tlándo de'Fteitãs Rodrigues.~

.

José Ângelo Ferreira Correia. .

Página 1442

1442 I SÉRIE - NÚMERO 40

José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Carlos Cardoso Lage.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Apolinário Nunes Portada.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

Partido Comunista Português (PCP):

Ana Paula da Silva Coelho.
António Silva Mota.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Maria Odete Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

José Carlos Pereira Lilaia.

Deputados Independentes:

Maria Helena Salema Roseta.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PPD/PSD):

Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Henrique Nascimento Rodrigues.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
José Mendes Bota.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Manuel da Costa Andrade.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Gomes da Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Carlos Manuel Natividade Costa Caudal.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
José Manuel Antunes Mendes.
Lino António Marques de Carvalho.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.

As REDACTORAS: Maria Leonor Ferreira - Maria Amélia Martins.

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