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I Série - Número 42

Quarta-feira, 22 de Fevereiro de 1989

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2.º SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE FEVEREIRO DE 1989

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Exmo. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Cláudio José dos Santos Percheiro
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ontem do dia. Deu-se conta da apresentação de requerimentos, da resposta a alguns outros e da entrada na Mesa do projecto de deliberação n.º 32/V.
Em declaração política, a Sr. Deputada Pauta Coelho (PCP) falou da situação estudantil, particularmente da aplicação do decreto-lei de acesso ao ensino superior, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Paulo (PSD). Narana Coissoró (CDS) e António Braga (PS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Silva Marques (PSD) teceu considerações sobre a actividade da oposição e, no fim, deu explicações a protestos e pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Basílio Horta (CDS), Carlos Brito (PCP), Natália Correia (PRD) e Raul Rego (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Jaime Gama (PS) abordou a problemática da defesa nacional e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Campilho (PSD) e João Amaral (PCP).
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Espada (PRD) glosou a variação dos valores da taxa de inflação, respondendo em seguida a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Vieira de Castro e Nuno Delerue (PSD).
Foi lido um voto de protesto, apresentado pelo PSD, relativo às ameaças de que está a ser vítima o escritor Salman Rushdie.
Entretanto, havia sido aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um Deputado do PCP.

Ontem do dia. - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 77/V - Lei de bases do estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações - e dos projectos de lei n.º 351/V (PS) e 352/V (PCP) - Lei de Bases das Comunicações.
Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Oliveira Martins), os Srs. Deputados Luís Roque (PCP), António Guterres, Amando Vara e António Esteves (PS), Ilda Figueiredo e Jorge Lemos (PCP), Rui Silva (PRD), Leonor Coutinho (PS), Sérgio Azevedo (PSD) e Narana Coissoró (CDS).
A Câmara autorizou ainda um deputado a depor em tribunal.

O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 20 horas.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Humberto Pires Lopes.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José de Vargas Bulcão.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chencerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.

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José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Gastei Branco.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe G. Rodrigues.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Deputados Independentes:

Raul Fernandes de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deu entrada na Mesa o Projecto de Deliberação n.º 32/V, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à criação de uma subcomissão permanente da cultura física e desporto, que foi admitido.
Deram também entrada na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos: ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Martinho; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Lilaia, António Campos e outros, e Guerreiro Norte; a diversos ministérios, formulados pelos Srs. Deputados lida Figueiredo, Barbosa da Costa e Luís Roque; a diversos ministérios e à Câmara Municipal de Cantanhede, formulado pela Sr.ª Deputada Lourdes Hespanhol e outros; aos Ministérios da Saúde e do Comércio e Turismo, formulados pelo Sr. Deputado João Salgado; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado José Reis; à Secretaria de Estado do Orçamento, formulado pelo Sr. Deputado Cláudio Percheiro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados António Mota e Gameiro dos Santos; aos Ministérios do Planeamento e da Administração do Território e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Afonso Abrantes; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelos Sr. Deputado José Lello; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado Luís Covas.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Herculano Pombo, nas sessões de 23 de Fevereiro e 19 de Janeiro e no dia 12 de Dezembro; Maria Santos, nas sessões de 15 de Abril e 3 de Janeiro; Jorge Lemos, na sessão de 21 de Junho; José Magalhães, na sessão de 14 de Dezembro; José Manuel Mendes, nas sessões de 15 de Dezembro e 6 de Janeiro; e José Apolinário, na sessão de 19 de Janeiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que a pergunta ao Governo que estava prevista para hoje foi transferida para a próxima sexta-feira.
Para intervirem no período de antes da ordem do dia, com declarações políticas, estão inscritos os Srs. Deputados Paula Coelho, Silva Marques, Jaime Gama e Isabel Espada.
Após estas declarações políticas - e o PAOD de hoje será preenchido apenas com declarações políticas -, que ocuparão uma hora, se necessária, o Plenário debaterá a Proposta de Lei n.º 77/V e os Projectos de Lei n.º 351 e 352/V, diplomas cujo conteúdo incide sobre comunicações.
Para uma» declaração política, tem pois, a palavra a Sr.ª Deputada Paula Coelho.

A Sr.ª Paula Coelho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O agravamento da situação social que abrange amplos sectores da sociedade portuguesa está também a tocar, profundamente, os interesses juvenis.
Tal agravamento, que tem conduzido a uma vigorosa resposta de protesto e de luta social, tem, como principal responsável, o Governo e a sua política.
O que hoje existe de mais marcante para os jovens são as dificuldades de acesso ao emprego e a sua manutenção, a precaridade de emprego sob as mais diversas

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formas, a falta de protecção aos jovens e desempregados e o trabalho infantil.
A precarização do emprego, associada ao desemprego, tem sido uma constante nos últimos anos.
Acentuaram-se as formas de exploração ao trabalho juvenil.
A aspiração e as perspectivas de uma carreira profissional foram sendo substituídas por um saltitar de emprego em emprego, sem perspectivas de continuidade, sem profissionalização, sem direitos sindicais nem laborais, sem a profissionalização com que um dia sonharam.
Por cada 110 mil postos de trabalho criados entre Outubro de 1985 e 1988, cerca de 70 mil corresponderam a formas de trabalho precário e 30 mil a trabalho por «conta própria» (forma disfarçada, por vezes mais brutal, de exploração de emprego precário).
É praticamente inexistente qualquer protecção social para os jovens desempregados, o subsídio de desemprego apenas cobre 20%» de desempregados existentes e, ao nível da juventude, não passa dos 3,5%.
Mas o Governo continua... e, como se não bastasse, cria, com uma enormíssima campanha publicitária, o chamado IJOVIP, canaliza milhões de contos para o patronato pondo-lhe à disposição, escandalosamente, mão-de-obra juvenil gratuita.
A péssima aplicação dos fundos comunitários, particularmente do Fundo Social Europeu, utilizado de forma caótica, descoordenada e tantas vezes fradulenta, com o desbaratamento de milhões de contos, exige uma clarificação de responsabilidades, a que o Governo não pode fugir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas as medidas e a política deste Governo não se limitam à área do emprego e desemprego.
Vamos espreitar a educação.
O actual sistema educativo, do qual dependerá, em larga medida, o desenvolvimento nacional e do qual depende a formação de toda uma geração, continua marcado pela elitização social, pelo estrangulamento dos acessos e saídas profissionais, pela selectividade, pelo insucesso.
Embora no início de cada ano lectivo ingressem no ensino superior mais de 200 mil estudantes, no termino de cada ano apenas concluem o ensino superior pouco mais de 10 mil estudantes.
Os níveis de insucesso escolar têm sido de cerca de 600 mil por ano (não incluindo o ensino superior).
A taxa de escolaridade do nosso país é, de longe, a mais baixa dos países da CEE - apenas 11% da população chega ao ensino superior.
Mas, Srs. Deputados, como para o Governo estes dados ainda eram insignificantes, aparece-nos, em Outubro de 1988, o já tão falado decreto-lei de acesso ao ensino superior.
De facto, já muito se tem dito sobre o novo regime mas, apesar disso, o Governo parece continuar a não querer ouvir ninguém, a dizer «que sim» e «que talvez» mas a deixar tudo na mesma, tapando os ouvidos aos protestos de todos os sectores directamente interessados.
O Governo até diz (aliás, os Srs. Deputados puderam ouvi-lo numa das sessões plenárias de perguntas ao Governo) que «os estudantes apoiam este diploma!». Com que autoridade?
Os estudantes demonstraram que o ministro não falou verdade.
Ontem desloquei-me à porta do Ministério da Educação e asseguro-vos, Srs. Deputados, que as acções e os protestos dos estudantes só não os ouvia quem não queria.
A greve dos estudantes atingiu cerca de 70%, tendo mesmo existido escolas onde essa percentagem se situou nos 100%.
Foi impressionante o número de estudantes que, durante horas, aguardaram uma resposta do Ministério da Educação.
Em Braga, mais de 1500 estudantes, vieram para a rua e a Assembleia Municipal aprovou, por unanimidade, a suspensão do decreto-lei. Em Aveiro, mais de 500 estudantes vieram para a rua, no Porto e no Alentejo, em Coimbra, na Covilhã as escolas pararam e os estudantes protestaram. Em Setúbal e em Lisboa os estudantes tiveram um dia de luta como há muitos anos não verificávamos no ensino secundário.
Mais de 70 associações de estudantes do distrito de Lisboa aderiram ao movimento.
Contudo, Srs. Deputados, não foram só os estudantes a exigirem a suspensão do decreto lei.
O Conselho Nacional de Educação já se pronunciou: suspender o diploma; o Conselho Nacional de Juventude já se pronunciou: suspender o diploma; a Associação Nacional de Pais já se pronunciou: suspender o diploma; os sindicatos dos professores já se pronunciaram: suspender o diploma; os estudantes aí estão: suspender o diploma.
É importante que se diga que não são só os comunistas a lutar contra a posição das suas direcções. São todos os sectores que o fazem, muitos deles também do PSD e da JSD. Ontem, na concentração, era curioso ver um ou outro jovem com um autocolante da JSD ao lado de outro com um autocolante a dizer: «greve dia 20 - suspensão do decreto-lei».
De referir também os comunicados que a JSD e a JC distribuíram ontem, em algumas escolas, para tentar desmobilizar os estudantes. Foi, aliás, caricato o que se passou na Escola Secundária de Carnide: dois jovens dirigiram-se à Direcção da Associação de Estudantes e disseram que lhes tinham pago para distribuir os comunicados mas que, como tinham de ir a outras escolas, entregavam à Associação de Estudantes os ditos comunicados para que esta fizesse deles o que entendesse.
Onde está a direcção da JSD a solidarizar-se com os estudantes numa questão tão importante para as suas vidas?
Srs. Deputados, os estudantes são os principais atingidos com este novo regime. Não o querem, nem desejam ser cobaias - como, aliás, o Sr. Ministro da Educação admitiu - de experiências educativas que colocarão em risco um ano de vida de muitos milhares de jovens.
Será que estas opiniões e protestos não chegam ao Governo? Na realidade, ou a informação não chega ao Sr. Ministro ou então ele tem, de facto, dificuldade em ouvir e em ler as opiniões e os pareceres que lhe são transmitidos. Ontem, o Sr. Ministro nem tempo teve para falar com os estudantes. Na audiência que teve lugar no Ministério de Educação fez-se representar por

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um membro do seu gabinete, que apenas deu a novidade de que o decreto-lei não seria suspenso.
Este Governo e este ministro demonstram uma inequívoca incapacidade para governar o Pais.
Como é possível, Srs. Deputados, que até o ministro da Educação admita que o diploma deve ser revisto e que afirme que, só porque este ano já se avançou demais, não o poderá parar?
Contrariando tudo e todos; contrariando a reforma do sistema educativo; contrariando os pareceres e as opiniões de pais, professores e estudantes...!
E até chega a ser humorística a afirmação que este Governo e este ministro fazem de que são os campeões do diálogo. Diálogo ou monólogo?
Onde estava o diálogo quando o Sr. Ministro da Juventude criou o Instituto da Juventude, calou as rádios locais, censurou programas da RTP?
Onde estava o diálogo na Secretaria de Estado da Cultura quando se quiseram calar as nossas orquestras sinfónicas?
Onde está o diálogo do Ministério da Saúde quando pratica uma política contra utentes e médicos?
Onde estava o diálogo do Ministério do Emprego e do Primeiro-Ministro quanto tentaram, a todo o custo, aplicar o pacote laboral e fazer o confronto nos processos de negociação da contratação colectiva para impor tectos salariais?
Onde estava o diálogo quando da implantação do tão publicitado IJOVIP, que criou novos métodos de exploração desenfreada dos jovens nas empresas?
Onde está o diálogo do Ministério da Educação?
Srs. Deputados, entendem-se agora, em todo o País, as razões do Governo para não ouvir as opiniões dos mais diversos sectores sobre o acesso ao ensino superior: é porque, ouvindo-os, nunca poderia aplicar este regime de insucesso escolar aos estudantes do 12.º ano. A prática deitará por terra a campanha promocional que se tem feito em torno do combate a esse insucesso.
A reforma do sistema educativo não pode ser feita de uma forma atabalhoada e, acima de tudo, não pode ser feita contra aqueles a quem se dirige.
Srs. Deputados, podemos, pois concluir que este Governo está contra a juventude. Serve-se dos jovens e utiliza-os como mero instrumento. É, de facto, bonito dizer que se faz tudo pela juventude, principalmente nas campanhas eleitorais.
Mas se as promessas enganaram muitos, por algum tempo, tempo de engano é coisa que os jovens já não aceitam!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A JCP ao reafirmar a sua solidariedade com a juventude, as suas reclamações e a sua luta - hoje, em particular -, aos milhares de estudantes do ensino secundário, entende que não aplicar, em 1989, o diploma de acesso ao ensino superior é, pelo menos, uma questão de bom senso e uma necessidade urgente e democrática.

Aplausos do PCP e do Deputado Independente Raul Castro.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Paula Coelho inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Paulo, Narana Coissoró e António Braga.
Sem pretender limitar os esclarecimentos que os Srs. Deputados pretendem obter, a Mesa apela, por razões de tempo, para que sejam concisos ao exprimirem os seus pensamentos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Paulo.

O Sr. Jorge Paulo (PSD): - Sr.ª Deputada Paula Coelho, percebo que V. Ex.ª, como deputada do PCP, tenha necessidade de apresentar algum trabalho no seu partido e, por isso, daqui saúdo essa sua tentativa.
Queria, no entanto, colocar-lhe duas questões.
Em primeiro lugar, quero congratular-me com a sua afirmação de que os jovens andam a saltar de emprego em emprego. Se o fazem é porque há hoje muitas ofertas de emprego, em virtude de o desenvolvimento económico ter criado novos postos de trabalho.
Como o PCP abordou essa questão - que nos dá a ideia de ser, para ele, um chavão -, gostava que me informasse, Sr.ª Deputada, se a situação do emprego em Portugal é hoje melhor ou pior do que a existente nos demais países da Comunidade Económica Europeia e se ela é também melhor ou pior do que aquela que havia há meia dúzia de anos - isto, naturalmente, em relação aos jovens.
A segunda questão que queria colocar-lhe tem a ver com o acesso ao ensino superior. Ouvir, com muita preocupação, a defesa que V. Ex.ª fez do anterior sistema de ingresso nas faculdades. Como deve estar recordada, o anterior sistema era extraordinariamente injusto. Nele, só 50% dos candidatos conseguiam enveredar pela sua primeira opção.
Então a Sr.ª Deputada acha que uma nova proposta de acesso ao ensino superior, susceptível de alterações pontuais, como foi dito pelo ministro da Educação, tem em vista melhorar o ingresso nesse tipo de ensino, tem logo de provocar uma greve?
Todos nós sabemos quem financiou a greve dos estudantes, todos nós sabemos quem é que dela tratou, como sabemos também que teve a adesão que teve.
Gostava de saber, Sr.ª Deputada, se posso ver na sua intervenção uma defesa do anterior regime de acesso ao ensino superior.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada pretende responder já ou responde no fim?

A Sr.ª Paula Coelho (PCP): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Deputada Paula Coelho, «era fatal como o destino» que o PCP fizesse, rapidamente, o aproveitamento político de um movimento que não lhe diz respeito, que não lhe pertence. O movimento pertence a uma juventude que, provavelmente, ainda nem sequer escolheu os partidos em quem, mais tarde, votará. É uma reivindicação normal, natural e pontual em assuntos que dizem respeito a essa juventude e não ao PCP, muito menos quando com esta colagem procura fazer uma declaração política.
Em primeiro lugar, gostava de saber por que é que a Sr. Deputada do PCP se julga porta-voz desse movimento. Alguém lhe passou procuração nesse sentido?

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Julga que foi a bandeira do PCP que a juventude levou à frente de todo este movimento? A Sr.ª Deputada acha que o problema de acesso ao ensino superior diz apenas respeito ao PCP e que nada tem a ver com os outros partidos? Porquê esta corrida para tomar a dianteira do movimento, para procurar dar-lhe uma conotação partidária e assim estragá-lo aos olhos da opinião pública?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, gostava que me informasse, Sr.ª Deputada, quem é que financiou a greve dos estudantes, de onde é que veio o dinheiro para todo o material que os jovens apresentaram, assunto que o PCP quis aqui mostrar conhecer. Se conhece a origem do apoio monetário, Sr.º Deputada, faça favor de dizer qual é.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr.º Deputada Paula Coelho, gostaria de, em primeiro lugar, manifestar a preocupação do PS em relação a este novo diploma, onde o ingresso no ensino superior é salvaguardado de forma diferente e contrária àquela que está no espírito do meu partido.
Como publicamente divulgámos, a suspensão desse documento foi, em devido tempo, por nós solicitada, o que, aliás, não foi um acto inédito uma vez que já antes se tinham manifestado contra o diploma alguns organismos, nomeadamente o Conselho Nacional de Educação.
Quanto à pergunta que quero fazer-lhe, Sr.ª Deputada, ela relaciona-se com o facto de ter referido, na sua intervenção, a falência de algumas soluções que o Ministério da Educação e o Governo vêm apresentado para a educação, sobretudo o programa interministerial de promoção do sucesso escolar.
A esse respeito gostaria que me dissesse, Sr.ª Deputada, a sua opinião relativamente ao facto de o PS ter publicado em devido tempo - e reiterado nesta Assembleia - uma análise exaustiva sobre os resultados da primeira fase do programa e de, até hoje, o Ministério da Educação não ter sobre ela produzido qualquer resposta.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Coelho.

A Sr.ª Paula Coelho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por responder ao Sr. Deputado Jorge Paulo dizendo-lhe que acho positivo que a JCP e o Grupo Parlamentar do PCP tragam a este Parlamento questões que os preocupam no âmbito da política da juventude, coisa que a JSD não tem feito. Pelo menos, não a temos visto apresentar medidas legislativas nessa área.
De qualquer modo, nada mais fiz do que emitir a minha opinião sobre problemas que afectam os jovens.
Relativamente à questão que me colocou sobre o emprego lembro-lhe que existem, como V. Ex.ª deve saber, estatísticas elaboradas de muitas maneiras. Uma dessas maneiras, por exemplo, é aquela que o Governo utiliza quando considera como empregados os jovens que trabalham uma hora ou uma semana por mês. Claro que, assim, não há estatística que nos valha.
Em nosso opinião, a actual política de emprego do Governo não é aquela que resolverá o problema do emprego no nosso país. A sua resolução passa, necessariamente, pela criação de empregos estáveis para os jovens.
Quanto à questão do acesso ao ensino superior lembro que, como deputada da Assembleia da República tenho o direito e o dever de nela defender os interesses dos estudantes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Lamento, também, que os Srs. Deputados não tivessem prestado alguma atenção à minha intervenção. O facto de eu vir aqui transmitir as opiniões que ontem foram manifestadas durante uma concentração de estudantes não quer dizer que a JCP esteja a pagar os materiais utilizados nessa concentração.
A este propósito, aproveito a oportunidade para esclarecer todos aqueles que não têm acompanhado o movimento dos estudantes - o que me parece englobar a generalidade dos deputados desta casa - que, ontem, foi dada uma conferência de imprensa pela comissão de luta do movimento dos estudantes, transmitida pela Rádio Renascença - pelo menos foi este o posto emissor em que eu a ouvi - na qual um membro dessa comissão de luta esclareceu quem é que tinha apoiado financeiramente a elaboração dos cartazes e dos autocolantes. Segundo esse jovem, o apoio foi dado pelo Sindicato dos Professores e pelas autarquias.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Que autarquias?

A Oradora: - Se, sobre a matéria, os Srs. Deputados tiverem algumas dúvidas será fácil esclarecê-las junto da Associação de Estudantes da Escola Secundária Gil Vicente, a qual dispõe de documentação sobre o assunto.
Por outro lado, gostaria de dizer que acho lamentável que venhamos aqui defender uma reivindicação de milhares de estudantes, de professores e de País e que a única coisa que os Srs. Deputados tenham para dizer é que a JCP quer monopolizar este processo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Acho também lamentável que os senhores não venham para aqui defender o que é hoje o interesse dos estudantes.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É uma questão de partidarização!

A Oradora: - Não! Não é uma questão de partidarização, mas, sim, uma questão de conhecer e defender, também aqui os interesses dos estudantes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Partidariza e estraga!

A Oradora: - Por outro lado, gostaria de agradecer a intervenção do Sr. Deputado António Braga em

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relação às preocupações que tem transmitido quanto ao problema do acesso ao ensino superior e, para finalizar, de dizer que tanto a JCP como o Grupo Parlamentar do PCP continuam a solidarizar-se com a luta que não é só dos estudantes do ensino secundário mas de todos os jovens que se manifestam, de facto, contra as medidas que este Governo tem tomado em relação à juventude, medidas essas que não são só em relação ao ensino como em relação ao emprego, à situação do desemprego, ao Instituto da Juventude, ao IJOVIP...

Vozes do PSD: - IJOVIP!?

A Oradora: - ..., como em relação à situação que hoje o Governo criou aos jovens portugueses.

Aplausos do PCP.

Uma voz do PSD: - Sabem estragar tudo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à leitura e apreciação de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimentos e Mandatos

Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia 21 de Fevereiro de 1989, pelas 15 horas, foi observada a seguinte substituição de deputado:

1 - Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Barreirinhas Cunhal (Circulo Eleitoral de Lisboa), por António Filipe Gaião Rodrigues. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º, da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período de 6 (seis) meses, a partir do dia 13 de Fevereiro corrente, inclusive.

2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não deito que deve ser chamado ao exercício de funções considernado a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.

3 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

4 - Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Vice-Presidente: Alberto Marques de O. e Silva (PS); O Secretário: José Manuel de Melo A. Mendes (PCP) - Álvaro José Rodrigues de Carvalho (PSD) - Daniel Abulo Ferreira Bastos (PSD) - Domingos da Silva e Sousa (PSD) - José Alberto Puig dos Santos Costa (PSD) - José Augusto Santos da S. Marques (PSD) - José Guilherme Pereira C. dos Reis (PSD) - José Luís Bonifácio Ramos (PSD) - Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD) - Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Herculano da Silva Pombo M. Sequeira (PV).

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.

Pausa.

Como não há objecções, vamos passar à sua votação.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados Independentes.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Deputados da Oposição...

Risos gerais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Diga, «Srs. Deputados da situação!».

Risos do CDS.

O Orador: - Os senhores existem e, portanto, merecem uma referência.
Srs. Deputados da Oposição, diversos acontecimentos aqui por todos nós presenciados, diversas declarações nestes dias proferidas por altos dirigentes políticos são de tal modo surpreendentes e vão aparentemente de tal modo contra os mais elementares valores da democracia e do Portugal moderno que todos dizemos desejar construir que nos impõem um momento de reflexão e de interrogação, com algumas perguntas incómodas, mas muito directas, porque o tempo urge e o País está atento às nossas e às vossas respostas.
A semana passada, aqui mesmo, neste Hemiciclo, um deputado comunista insultou da forma mais grosseira todos os deputados da maioria. É um caso que se vai tornando frequente. Os senhores reagiram? Não! Não reagiram. Acaso consideram que tal tipo de incidentes é apenas assunto entre nós e eles? Acaso entendem que a agressão torpe à dignidade dos 148 deputados da maioria nada tem a ver com a própria dignidade deste Parlamento e com a vossa própria dignidade? Uma fixa obsessão antimaioria e antigoverno leva-vos a que tudo sirva, desde que seja contra. Será possível? Não posso crer!
No dia imediato, travou-se aqui um debate encarniçado sobre a proposta de lei apresentada pelo Governo de benefícios e isenções fiscais. Tão contundente foi a crítica da Oposição desenvolvida ao longo de horas que se dava como certo o seu voto contra. Afinal, votaram a favor! Criticou-se ferozmente, porque era coisa do Governo. Votou-se a favor, porque, tratando-se de benefícios e isenções fiscais, o povo não perdoaria outro voto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Mas acaso os senhores não constatarão que tal comportamento constitui simultaneamente um afrontoso desrespeito à inteligência e patriotismo dos portugueses e a degradação mais flagrante da dignidade da política, transformada desta forma em malabarismo de oratória desgarrada e inconsequente?
Que estamos nós, Srs. Deputados, que estão os nossos partidos a fazer de Portugal? Que valores temos para lhes oferecer? Que soluções de governo lhes propomos? Será, Srs. Deputados, que vos move uma tal obsessão antimaioria e antigoverno que tudo serve desde que seja contra?
Freitas do Amaral, depois de uma infrene investida de crítica radical - esquerdizante ao PSD...

Risos do PSD, do PS e do CDS.

... limita-se hoje a pedir aos portugueses que lhes dêem amanhã os votos suficientes que obriguem Cavaco Silva a metê-lo no Governo. Acaso não compreenderá que o que lhes está a pedir é que votem contra os governos de estabilidade, que coloquem de novo na governação do País a conflitualidade interna, a rivalidade interpartidária, numa palavra, que coloquem de novo no governo de Portugal a desgovernação do País?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Freitas do Amaral, no fim de contas, pede aos portugueses que votem, não para que Portugal ande para a frente mas para trás.
À parte tão bizarra proposta para fraccionar e fracturar o poder governativo do País, nenhuma outra ideia sólida de política de governo e de projecto para Portugal resulta das suas palavras. Como é possível Srs. Deputados? Como é possível que uma pessoa de tão grandes responsabilidades, cívicas e políticas, possa propor tão desvairado caminho aos portugueses? Que profunda e inconsolável frustração o move, que cego pretensionismo lhe tolda os valores supremos da necessidade de um bom e eficaz sistema de governação para Portugal?
O novo PS! O novo PS não faz hoje outra coisa que não seja acusar. Escasseia-lhe a razão, a solidez de um projecto alternativo, mas sobram-lhe as palavras. E, senão, vejamos: acusa o governo de incapacidade para assegurar a modernização de Portugal, mas, através de um salto malabar, passou a repetir - mal, muito mal, porque sem consistência nem credibilidade - as ideias do PSD e discursa como se fosse a nossa própria direita. Arvora-se em campeão da defesa das classes médias, mas a sua prioridade são - e cito o último comunicado da Comissão Directiva do PS: «as iniciativas de luta contra a política social do Governo». Opõe-se à revisão das leis laborais, que considera injustas e gravosas, parecendo lembrar-se dos trabalhadores, mas tudo fez para que o novo sistema fiscal não estivesse já em vigor e com ele uma maior justiça fiscal e mesmo - e está agora demonstrado - o desagravamento tributário dos trabalhadores por conta de outrem.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Está demonstrado o contrário!

O Orador: - Tem o PS - agora, Sr. Deputado, é a vez do PS...

Risos.

... um projecto próprio e novo para o Portugal novo que queremos construir?
Ainda há pouco, a propósito da lei eleitoral para o Parlamento Europeu, nos demonstrou que apenas tinha uma ideia velha, muito velha, que a nossa profunda universalidade sempre rejeitou: a de uma nação encolhida nos limites das suas pequenas fronteiras.
O PS, em esforços desajeitados de marcar a sua diferença e de se afirmar alternativamente, desfralda hoje a sua grande bandeira: é o partido do diálogo e do consenso. Como se nós próprios também não o fôssemos! Mas o consenso, Srs. Deputados do novo PS, transformado em mito, constitui a mais paralisante e pantanosa das ideias.
Consenso entre quem, Srs. Deputados do novo PS? Entre quem? Entre os que nada querem mudar, entre os que se sentem satisfeitos com o País corporativista, salazarista, gonçalvista que se recusa a desaparecer, 15 anos depois do 25 de Abril? Com que tranquilidade de consciência os senhores vão comemorar o próximo 25 de Abril? Consenso entre esses e os que apostam na mudança e na modernização de Portugal para que sejamos de novo um país livre, próspero e orgulho de todos os portugueses no mundo?
Consenso entre quem, Srs. Deputados do novo PS? Consenso entre o País produtivo, laborioso - não se esqueçam que os senhores se reclamam de um partido de trabalhadores - e inovador e os núcleos parasitários que sugam as energias e as forças de Portugal?
Consenso entre quem Srs. Deputados do novo PS? Consenso entre os que querem continuar abanquetados à mesa do Orçamento do Estado e das pesadas contribuições fiscais e os que têm o direito de esperar que os dinheiros públicos sejam rigorosamente utilizados, combatendo desperdícios e criando melhores serviços públicos, melhores vias de comunicação, melhores e mais meios de desenvolvimento e de progresso? Consenso entre quem, Srs. Deputados do novo PS?
Consenso com os inimigos da liberdade e da democracia? O PS, o novo PS, pretende incluir nas suas listas eleitorais comunistas dissidentes ou, pelo contrário, os que representam um partido visceralmente antidemocrático e totalitário?

Protestos do PS.

O PS, o novo PS, pretende quebrar a cortina de ferro do PCP ou dar-lhe um novo fôlego emprestando-lhe, quiçá hipotecando-lhe, a sua própria credibilidade de partido democrático, campeão da luta pela liberdade? Será que vos move, Srs. Deputados, uma tal obssesão antimaioria e antigoverno que tudo serve, desde que seja contra? Não posso acreditar! Srs. Deputados da Oposição, o facto de serdes oposição não poderá impedir-vos, não posso crer, de connosco travarem um combate comum pelos valores da liberdade, desmascarando e combatendo todos aqueles que a ela se opõem.
Não poderá impedir-vos - não posso crer! - de connosco travarem um combate pela dignificação da política e pela credibilidade e solidez das instituições do estado democrático.
Srs. Deputados da Oposição, não vos pedimos tréguas, antes pelo contrário, pedimo-vos que connosco travem os combates que a todos nós dizem respeito, sem prejuízo da legítima oposição que vos cabe conduzir.

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Nenhuma obra humana deixa de ter vários caminhos e suficientes defeitos para, com fundamento, poder ser criticada. Mas perguntamo-vos, Srs. Deputados, se há razão para essa vossa fixa obsessão, que vos leva a que tudo é bom desde que seja contra nós.
A pergunta esperamo-la nós, mas, mais do que nós, esperam-na os portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa que se encontram inscritos, ao que crê, para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Manuel Alegre, Basílio Horta, António Guterres, Carlos Brito, Natália Correia e Raul Rego.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, na verdade, eu tinha pedido a palavra, logo no início, para interpelar a Mesa, mas, dado não ter sido possível, tenho de intervir agora, porque o Sr. Deputado Silva Marques introduziu, no início da sua intervenção, uma originalidade formal que, mais do que isso, é algo que tem uma substância política que entra em conflito com o estatuto e a natureza dos deputados.
Quem fala daquela Tribuna não se dirige aos deputados do Governo ou da Oposição mas aos deputados em geral. Porque os deputados que aqui estão, antes de serem do Governo ou da Oposição, são representantes do povo, representam o País.

Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, é perigoso ou inconveniente o uso de habilidades ou novidades formais que possam alterar a substância política, a natureza ou o Estatuto do deputado.
Houve um tempo em que existiam deputados de primeira e de segunda. Porém, a biografia democrática do Sr. Deputado Silva Marques devia acautelá-lo quanto a ousadias formais dessa natureza... Penso, no entanto, que isso decorre da postura política do partido do Governo, da sua própria filosofia política de governamentalização geral do País e da própria filosofia do «Estado laranja». Talvez, para os deputados do Governo, o Governo esteja antes e acima do País, mas para, nós, deputados do Partido Socialista o País continua a estar primeiro e o Estatuto do deputado que representa o País está antes de tudo o mais.

Aplausos do PS, do PCP, do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Manuel Alegre não fez qualquer pedido de esclarecimento, mas uma interpelação à Mesa, pelo que entendo dever responder-lhe.
Sr. Deputado, o n.º 1 do artigo 96.º do Regimento diz: «No uso da palavra, os oradores dirigem-se ao Presidente e à Assembleia e devem manter-se de pé».
Porém, devo dizer que a regra regimental nem sempre é seguida e temos muitas vezes chamado a atenção para isso.
Tem havido variações na forma como os deputados se dirigem à Câmara quer ignorando o Presidente ou a Assembleia, quer tomando outras formas, e por isso, a Mesa não interpretou que tivesse havido uma discriminação por parte do Sr. Deputado Silva Marques ou dos Srs. Deputados A ou B, pois é apenas uma forma de expressão como tantas outras que têm sido seguidas. O Sr. Deputado Manuel Alegre apresentou o seu pensamento, mas penso que já estamos todos esclarecidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de pedir esclarecimentos, gostaria de fazer uma pequena reflexão.
Penso que o Governo deve estar muito mal e muito aflito para escolher o Sr. Deputado Silva Marques...

Risos.

..., para o representar neste período de antes da ordem do dia.

Aplausos do CDS.

Estivesse o Governo mais à vontade, mais sereno da sua razão, mais confiante da sua maioria, e não seria certamente o Sr. Deputado Silva Marques, pelo menos num dia tão azarento como o de hoje, a fazer uma intervenção tão negativa como aquela que acabámos de ouvir e que, aliás, nem sequer foi aplaudida pela direcção da sua bancada, honra lhe seja feita!!
Quanto ao conteúdo da sua intervenção, quero fazer-lhe, Sr. Deputado Silva Marques, algumas observações, embora com alguma dificuldade e algum desgosto, porque para mim o tempo é sempre alguma coisa que deixa resíduos positivos, aos quais temos de aderir até pessoalmente, e no meu caso, porque tive uma experiência de Governo com o seu partido, não posso esquecer-me dela.
O Sr. Deputado Silva Marques veio aqui dizer que o Sr. Professor Freitas do Amaral pretende ou pede um pequeno lugar no futuro governo..., qualquer coisa deste estilo! Sr. Deputado Silva Marques, neste momento, um partido como o CDS não tem qualquer interesse nem qualquer dever para com o País em aliar-se a um partido como o seu. O Sr. Deputado pertence a um partido que é cada vez menos um partido e cada vez mais uma frente de interesses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado pertence a um partido que está a fazer muito mal a Portugal, que está a usar muito mal os votos que lhe foram confiados. Nada temos a ver com o seu actual partido...

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Felizmente!

O Orador: - ..., mas, sim, com algumas pessoas que se sentam na vossa bancada.
Colaborámos num projecto liderado pelo Dr. Sá Carneiro, tendo sido o Dr. Feitas do Amaral seu Vice-Primeiro-Ministro e o engenheiro Amaro da Costa seu ministro da Defesa, que morreu juntamente com ele. Ora isso devia fazer com que o Sr. Deputado, em nome da sua bancada, tivesse mais discrição, mais ética, mais pudor naquilo que acaba de referir.

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Não atacámos - e é bom que se diga isto - nada de ético em relação ao PSD. Hoje, somos um partido de Oposição e, como tal, temos feito claramente uma crítica de oposição que não é, obviamente, sistemática e permanente. Temos todo o direito de fazê-lo e o senhor não deve estranhar que apareçamos como oposição.
Agora, o Sr. Deputado não pode dizer - e esse é um aspecto importante - que essa oposição se reduz a um pedido de um lugar no futuro Governo.
Devo dizer-lhe que não temos interesse, nem sequer era bom serviço prestado ao país, em qualquer coligação que fizesse permanecer o estilo de governação que o seu partido está a imprimir.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado perguntou com quem é que se faz consensos. Eu digo-lhe: com efeito, o seu Governo, ao contrário do que pode dizer-se, não é um Governo que só faz divergências na sociedade portuguesa. Não é verdade! As divergências fá-las com quem trabalha, com quem produz, sejam eles magistrados, advogados, autarcas, trabalhadores indiferenciados. Com esses há divergências, mas não há divergências com os outros.
Com esse núcleo fundamental do grande «Estado laranja», com esse núcleo fundamental que leva a que as pessoas já temam que alguns assuntos sejam aqui levantados pela sua própria segurança, com esses não há divergências, com esses há um profundo consenso. Mas é contra esse consenso que o CDS está e é contra esse consenso que o CDS se ergue, diga o Sr. Deputado, em seu nome ou em nome da sua bancada, as aleivosias que entender.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não desejo pedir esclarecimentos mas, muito rapidamente e em nome do PCP, fazer um protesto contra os insultos dirigidos ao meu partido pelo Sr. Deputado Silva Marques. Faço-o para que fique registado no Diário e não para responder ao Sr. Deputado Silva Marques. O Sr. Deputado Silva Marques «respondeu-se»; não fez uma intervenção, fez a sua demolição.

Risos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, uma vez que o Sr. Deputado Carlos Brito usou a figura regimental do protesto, pergunto-lhe se pretende dar explicações já ou no final dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Silva Marques (PSD): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Silva Marques mostrou-se favorável à modernização do País. Óptimo! Estamos todos de acordo. Mas não acha que esse cliché do «papão comunista», que usou a propósito do eventual entendimento entre o PS e o PCP, é uma imagem que já nada diz ao tal país novo pelo qual V. Ex.ª se bate, ao tal país novo que a juventude espera, que tem como motor essa juventude e para quem «tais narizes de cera» não têm qualquer significado?
Muito objectivamente, pergunto ao Sr. Deputado o seguinte: será que reconhece, no actual PCP, energias que sirvam a intenção de imolar a democracia a um Estado totalitário? Será que tem essa ingenuidade, Sr. Deputado?
V. Ex.ª sabe que, formalmente, nada tenho a ver com o PCP; para além das simpatias que alguns dos seus membros me inspiram, nada tenho a ver com a sua ideologia, mas causa-me tédio que a antiga cassette do PCP se tenha convertido na cassette de um antigo comunismo, do qual o mínimo que se espera, esteticamente, é que, pelo menos, se modernize, porque essa cassette anticomunista está a tornar-se perfeitamente esclerótica.

Risos.

O Sr. Presidente: - Por último, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Deputado Silva Marques, a sua intervenção podia ter sido feita na Assembleia Nacional...

Risos do PSD.

... separatista, isolacionista, de portugueses de primeira e de segunda.
É lamentável que, 15 anos após a conquista da democracia em Portugal, haja intervenções destas de um deputado que tem convivido com outros deputados.
Em determinada altura, o Sr. Deputado diz: «a pergunta esperamo-la nós». Mas, Sr. Deputado, mais do que nós, esperam-na os portugueses. Por isso, pergunto ao Sr. Deputado Silva Marques se também se considera português.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Raul Rego, evidentemente que me considero português.
Por outro lado, não era possível ter feito a minha intervenção na Assembleia Nacional porque ela não era livre, mas sobretudo, Sr. Deputado Raul Rego, porque ela era a cúpula de um Estado, por definição, corporativista e salazarista. E o meu discurso, como V. Ex.ª reparou, foi um discurso essencialmente anticorporativista, antisalazarista e, mais, antigonçalvista.
O Sr. Deputado sabe muito bem que o gonçalvismo, do ponto de vista sócio-político ou se quisermos histórico-cultural, poderá ser definido - permitam-me a definição - como o agravamento dos vícios corpórativistas-salazaristas, só que, com beneficiários diferentes. Portanto, hoje, a nossa tarefa não é só a de «descorporativizar» ou a de «dessalarizar» o País; é também a de «desgonçalvizar» o País.

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Por isso, Sr. Deputado Raul Rego, o meu discurso não podia ter lugar na Assembleia Nacional nem mesmo como uma nuance do campo político que, nessa altura, constituía o regime.
Sr. Deputado Manuel Alegre, há uma coisa que tem de ficar definitivamente assente: V.V. Ex.ª têm os mesmos direitos e deveres que nós. Aliás, esse é um princípio elementar anticorporativista e espero que esta Assembleia recuse, de forma vigorosa, o corporativismo, o que não é fácil, Sr. Deputado, porque todos os dias afloram aqui - e com que força - laivos de corporativismo.
Já vi aqui colóquios e diálogos entre Exmo. professores, já vi aqui colóquios, diálogos e deferências entre Exmo. colegas de profissão e sou contra isso. Fico arrelampado, fico sem saber como é possível que, com tal força, ainda hoje, nesta Assembleia, que é por definição a Assembleia que acabou com o Estado corporativista ele venha todos os dias tão acima. Compreendo, é um pouco também o que se passou com o ancien regime: embora abolidos os títulos nobiliárquicos, apesar de tudo, as «altezas», pelo menos nas suas referências privadas, continuaram a cultivar as estruturas antigas.
Mas, Sr. Deputado, repare no contexto em que me dirigi aos deputados da Oposição: era claramente uma figura literária, uma figura do discurso, de oratória, não era um acinte.
Repare, Sr. Deputado, quem é que passou aqui, todos os dias, a referir-se e aí, sim, com laivos de acinte...

O Sr. Luís Filipe (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... - aos «deputados da maioria» ou, pior, ao «Estado laranja», o Estado que é de todos nós, nosso e vosso, tanto nosso como vosso... Ou será que o Estado, que tem à cabeça um Governo do PSD, não é também vosso enquanto portugueses e democratas!? Respondam.

Aplausos do PSD e protestos do CDS.

Por isso, Srs. Deputados da Oposição, não se esqueçam que têm os mesmos direitos e os mesmos deveres que nós, de respeito cívico e um outro, que é igualmente importante: o da frontalidade. Não há democracia sólida e vigorosa sem frontalidade, sem sermos capazes de manter os nossos afrontamentos ao nível estrito das ideias e de resistirmos à tentação da referência pessoal, do acinte, da mesquinhez e do rebaixamento. É isso que temos obrigação de fazer - os senhores e nós, nós e os senhores!
E desafio quem quer que seja a contabilizar quantas vezes há mais referências de acinte e de onde vêm elas, se da minha bancada ou das vossas. Desafio-vos! Façam essa contabilidade...!
Srs. Deputados, as ideias não bastam, são fundamentais os factos e estou a referir-me a factos que todos podemos testemunhar. Desmintam-me, V.V. Ex.ª, ou demonstrem-me o contrário.
Sr. Deputado Carlos Brito, V. Ex.ª falou em insultos. Referi-me, no meu discurso ao seu partido classificando-o de antidemocrático, no sentido de não ser um partido a favor da democracia parlamentar. É uma referência estritamente política, evidentemente contestável e, de certo, recusada por V. Ex." mas, repito, é uma referência estritamente política. Não tive a ousadia ou, se quiser, Sr. Deputado, a inconveniência, o mau gosto - e não quero utilizar outros termos - de referir-me à sua bancada ou a qualquer outra como sendo «estrume». No entanto, Sr. Deputado, referências dessas já vieram da sua bancada e nada têm a ver com discussão política. É isto que lhe digo frontalmente e peco-lhe que me desminta, com factos, porque são esses que contam.
Como o Sr. Deputado sabe, a teoria é importante mas a prática é que é fundamental!

O Sr. Paulo Jorge (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Deputada Natália Correia, a questão política que lhe coloquei - e tenho a legitimidade de colocar-lhe questões políticas, de ir buscar o significado de determinados comportamentos políticos - foi esta: qual é o significado político do facto de o PS, a que eu chamava - e espero não tenham tomado isso como acinte - «o novo PS», como estratégia política, como opções políticas de fundo ter privilegiado a inclusão nas suas listas de candidatos autárquicos - porque foi essa a proposta oficial - representantes do PCP e ter-se esquecido - era uma outra hipótese com um significado diferente - dos dissidentes comunistas?
Sr.ª Deputada, a minha questão é pertinente, tão pertinente que, depois de um certo reboliço feito aqui há meses à volta dos dissidentes, repentinamente, Sr." Deputada, o silêncio abateu-se sobre os dissidentes. Porquê? Repentinamente aqueles que eram os heróis da liberdade, da ruptura com aquilo a que chamei «a cortina de ferro do PCP» se transformaram em «leprosos», de tal forma que ninguém hoje, se permite falar deles, muito menos dos partidos da Oposição, pelo menos, da oposição de esquerda. Porquê?
A minha questão é ou não pertinente, Sr.ª Deputada? Tenho ou não o direito de fazê-la? Eu avisei, no início do meu discurso, que ia colocar questões incómodas.
Mas pergunto, Sr.ª Deputada: colocar questões incómodas pode ser motivo de escândalo num Estado livre, numa democracia e, sobretudo, motivo de escândalo, face aos olhos dos representantes da esquerda? Então, onde é que está a esquerda se ela se escandaliza com a incomodidade?

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Basílio Horta, V. Ex.ª ficou para o fim porque «os últimos são os primeiros».
Sr. Deputado, dou-lhe a minha palavra de honra que as suas declarações em nada tocam a minha postura pessoal relativamente ao Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Vai chorar?!

O Orador: - Mas digo-lhe que tomo as suas declarações, mesmo naquilo que tiveram de estritamente pessoal, de tentativa de achincalhamento, de rebaixamento, pura e simplesmente, como declarações políticas.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - O quê??

O Orador - Sr. Deputado, posso transcrever alguns dos seus termos...!

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O Sr. Deputado está pior - e estou a referir-me a si politicamente, porque jamais ousaria ferir a minha relação pessoal consigo que é a melhor, eu seria o último a transpor para o plano das relações pessoais o meu combate político. Jamais, Sr. Deputado! Por isso, jamais da minha boca sairá uma referência pessoal, seja a quem for, seja o meu maior adversário político. Nunca direi que V. Ex.ª profere «aleivosias». E o Sr. Deputado - devo dizer-lhe -, embalado por aquilo que coloquei no meu discurso...
Daquela Tribuna, a minha pergunta foi esta: que ideia fixa vos moverá, que fixa obsessão vos leva a tomar como bom tudo o que seja contra? Foi esta a questão profunda que levantei. Inclusive, quanto às referências pessoais, há dias, um deputado comunista teve o desplante de me chamar «estrume» e ninguém, aqui pestanejou; acharam natural porque, no fundo, V.V. Ex.ª não respeitam, de forma incondicional, o facto de sermos maioria, uma maioria absoluta.
Não basta dizer que respeitam o voto dos portugueses, precisam de demonstrá-lo nas vossas palavras e nos vossos actos. E o facto de sermos insultados, Srs. Deputados, é um insulto a todos vós se, por acaso, fosse outro o vosso ponto de vista.
Já assisti aqui a um momento que, para mim, foi um dos momentos mais elevados do tempo que levo de deputado. A dada altura, a bancada comunista agredia, de forma moral, despropositamente, um deputado que está aqui sentado, o Sr. Deputado Adriano Moreira, e era escutada, em parte, com palmas e, em parte, com um regozijado silêncio por parte da bancada socialista. E houve um homem que se levantou, na última bancada, de voz ténue mas persistente, e tomou a palavra para se opor a semelhante actuação da parte da bancada comunista. Isto foi, Srs. Deputados, o momento mais elevado a que assisti na minha vida parlamentar...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - .... porque nada há de mais elevado do que respeitar o nosso próprio adversário! Nada há de mais elevado do que, para além do afrontamento político, legítimo e inevitável pelo facto de pertencermos a diferentes correntes políticas, não deixarmos espezinhar a dignidade humana.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neguem o que estou a dizer, Srs. Deputados.
Sr. Deputado Basílio Horta, a questão que coloquei, relativamente ao líder do seu partido, foi uma questão política. A sua entrevista ao «Diário de Notícias», um destes dias - e é a minha tese -, tinha apenas como conteúdo substancial o seguinte: «Portugueses, é preciso que o CDS partilhe da maioria do País». E eu chamo a isso uma proposta de fraccionamento ou fractura do poder governativo. É uma discussão política, Sr. Deputado! Nada tem de baixo, nada tem de acinte pessoal nem relativamente ao Sr. Professor Freitas do Amaral nem a qualquer de vós, Srs. Deputados do CDS.
Srs. Deputados, quando podemos discutir ideias que são susceptíveis de confronto imediato com os factos que nós mesmos presenciamos, penso que não há melhor ocasião para discutir, sem cerimónias. Foi o que fiz!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa encontra-se confrontada com o seguinte problema: em conferência de líderes parlamentares foi estabelecido que no período de antes da ordem do dia de hoje só haveria lugar a declarações políticas, não ultrapassando este uma hora, embora regimentalmente o tempo destinado às declarações políticas seja de 1 hora e 30 minutos.
Ora, já ultrapassámos em cinco minutos esse tempo e estão ainda inscritos os Srs. Deputados Carlos Brito, Natália Correia, Basílio Horta e Raul Rego. Assim pergunto a esses Srs. Deputados para que efeito é que pretendem usar da palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pretendo usar da palavra ao abrigo da figura regimental de defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. E a Sr.ª Deputada Natália Correia?

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, pedi a palavra porque o Sr. Deputado Silva Marques dirigiu-me perguntas às quais, logicamente, terei de responder.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, V. Ex.ª não pode responder ao Sr. Deputado Silva Marques.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Então a que figura regimental devo recorrer, Sr. Presidente, para sobrepor o regimento à lógica?

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, somos uma Câmara política. É certo que tem de haver equilíbrios políticos, mas não podemos ir in extremis...

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Não digo que não, Sr. Presidente. Porém, acontece que não gosto de deixar as pessoas sem resposta. Fui educada assim!...

O Sr. Presidente: - Em qualquer outro dia a Sr.º Deputada tem a possibilidade de se inscrever para fazer uma intervenção ou uma declaração política; tem n formas de fazê-lo. Mas agora, na verdade, não podemos continuar nesta situação com discussões sucessivas.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, então pretendo usar da palavra ao abrigo da defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito é que o Sr. Deputado Basílio Horta pretende usar da palavra?

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de usar da palavra para defesa da honra e da consideração.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. E o Sr. Deputado Raul Rego?

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Presidente, pretendo usar da palavra ao abrigo da defesa da consideração.

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O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. Tem então a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para exercer o direito de defesa de honra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Silva Marques, visivelmente V. Ex.ª «faz o mal e a caramunha».
Neste momento uso da palavra para repelir a acusação que o Sr. Deputado fez em relação ao meu partido quando referiu que ele é contra a democracia e a democracia parlamentar.
Há acusações políticas que se transformam em insultos pessoais. Sinto-me ofendido na minha honra por um deputado me atacar por fazer de um partido que, segundo a acusação e o insulto, está contra a democracia. A minha vida não foi outra coisa se não a luta pela democracia, pela liberdade. Essa tem sido a minha vida e essa é também a vida do meu partido!

Aplausos do PCP e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª pretende dar já explicações ou no fim a todos os Srs. Deputados que se inscreveram para exercer o direito de defesa da honra?

O Sr. Silva Marques (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª perguntou-me por que é que não se convidou o PS. É evidente que não sou advogada do PS, nem de defesa nem de acusação. Estamos a discutir um princípio de ordem geral!
Em relação ao facto de o PS não ter convidado dissidentes para figurarem nas suas listas, devo dizer que tal me parece muito bem. Tenho a maior simpatia pelos dissidentes; aliás, eu próprio fui uma dissidente do partido a que o Sr. Deputado Silva Marques pertence, o que não me impede de manter ligações de amizade com o PSD.
Portanto, sendo eu uma simpatizante natural dos dissidentes, não vejo razões - pelo contrário, vejo razões positivas - para que entre esses dissidentes não figurem pessoas de alto gabarito intelectual para serem convidados pelo PS. Contudo, também não vejo razões para que se considere execrável a opção do PS de convidar elementos comunistas para as suas listas. Quer uma, quer outra hipótese me parecem perfeitamente razoáveis, Sr. Deputado.
Portanto, pronunciei-me com toda a simpatia que o Sr. Deputado Silva Marques me merece. Aliás, V. Ex.ª sabe que uma das fraquezas que tenho em relação ao PSD é a simpatia que o Sr. Deputado me merece. Nem todos a compreendem, mas enfim...

Risos.

Sendo a veemência do Sr. Deputado uma vedeta desta Assembleia, receio que ela fique antiquada se tiver como persistente tópico preocupar-se obsessivamente pelo PCP. Simpatizo muito com o Sr. Deputado e não quero que lhe aconteça esse desaire.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Silva Marques, o meu pedido de palavra ao abrigo do direito de defesa da honra justifica-se porque me sinto ofendido na minha consideração pelo facto de V. Ex.ª ter posto a hipótese de eu o ofender pessoalmente.
Desde 1975 que sou deputado, fui sempre eleito pelo mesmo partido e a verdade é que nunca ofendi ninguém nesta Assembleia, nem nunca ninguém se sentiu pessoalmente ofendido com alguma intervenção que eu aqui tenha produzido. Assim, Sr. Deputado Silva Marques, devo dizer que não era minha intenção ofendê-lo pessoalmente ou sequer macular as relações pessoais que nos unem ao longo dos anos e que eu quero manter e aprofundar. O Sr. Deputado produziu uma declaração política e eu respondi politicamente.
Quando falei em «aleivosias» fi-lo no sentido de haver uma grande desconexão e diferença entre a realidade dos factos e as injuncões do Sr. Deputado. Isto quer dizer que um partido como o meu, aquele a que me honro de pertencer, embora tenha 4% ou 3,5% dos votos dos eleitores, tem princípios.

Assim, neste momento o meu partido não se pretende juntar a um partido e a uma forma de Governo e de Estado ao qual politicamente - e sem que isso constitua ofensa seja para quem for - entendemos que não tem princípios compatíveis com qualquer tipo de aliança.
Neste momento e quando o Sr. Primeiro-Ministro diz que «já não há soberania, há co-gestão...» (vide «Diário de Notícias», nós perguntamos: com quem? Não temos nada a ver com o PSD.
Dê tempo ao tempo, Sr. Deputado, porque não há-de tardar muito para que mesmo dentro do partido a que V. Ex.ª pertence haja mais pessoas do que aquelas que pensa a darem-nos razão.

Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Deputado Silva Marques, quanto a mim o que lhe falta é mentalidade democrática.
Estamos numa Assembleia democrática. O Sr. Deputado foi tão ferozmente antigonçalvista que é perfeitamente um gonçalvista.

Risos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Raul Rego, se ser gonçalvista activo e enérgico como eu fui...

O Sr. Raul Rego (PS): - Eu não fui!

O Orador: - Não foi? Lastimo! Mas o partido de que o Sr. Deputado faz parte foi antigonçalvista no sentido de ter...

O Sr. Raul Rego (PS): - Nem gonçalvista, nem antigonçalvista!

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O Orador: - Então, estava em minoria, Sr. Deputado! Espero que não tenha votado com o Manuel Serra naquele célebre congresso onde tão fortemente se jugulou o futuro de um dos pilares da democracia. Sr. Deputado, sobre isto sou capaz de ironizar porque nesse congresso decidiu-se o futuro da democracia em Portugal. O mesmo aconteceu noutras situações, mas essa foi uma delas!
De qualquer modo, devo dizer que sou antigonçalvista do gonçalvismo, o que não me parece mau como resultado dialéctico.
Sr.ª Deputada Natália Correia, não tenho nada contra os dissidentes; antes pelo contrário, acho isso um fenómeno interessantíssimo, histórico...; aconteceu, acontece, há-de acontecer; é salutar! Porém, tenho o direito de me interrogar sobre o significado das acções, das opções e das posturas dos diferentes agentes políticos, entre eles o PS. Uma coisa é o PS dar prioridade aos dissidentes comunistas e dizer-lhes: «Nós apoiamo-vos, continuem o vosso combate; nós acolhemo-vos nas nossas listas, no nosso campo político, caminhemos juntos...» e outra coisa é o PS distrair-se, não reparar e privilegiar as relações com um partido que embora o Sr. Deputado Carlos Brito não esteja de acordo, até hoje nunca fez uma declaração incondicional a favor da democracia parlamentar - para já não dizer as declarações positivas no sentido contrário.
Recordo a célebre «canção» do Secretário-Geral do PCP no sentido de que jamais haveria democracia parlamentar no nosso país e as últimas conclusões do congresso dos comunistas que estabeleceram como grande objectivo da sua luta a «democracia avançada». Avançada para onde, Srs. Deputados? Os Srs. Deputados julgam que não tenho direito a discutir o significado desse objectivo? Avançada para onde? Qual é o destino dessa «democracia avançada», Srs. Deputados? Ainda não disseram!
Por isso, Sr. Deputado Carlos Brito, as vossas declarações programáticas não podem ser tabu! Tenho direito a discuti-las, enquanto não estivermos na «democracia avançada».

Risos do PSD.

Sr. Deputado Carlos Brito, respeito V. Ex.ª como deputado, como cidadão e, mesmo que não acredite, como comunista. Porém, tenha cautela, não se entusiasme nos seus voos épicos! Há pouco o Sr. Deputado disse: «senti-me ofendido porque pertenço a um partido democrático; eu sempre lutei pela democracia...». Isso não é exacto, Sr. Deputado Carlos Brito. Pelo menos há 44 anos o Sr. Deputado batia-se pela ditadura do proletariado. Não se recorda?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tem essa parte do seu arquivo já perdida. Porém, Sr. Deputado, convém conservar os arquivos!

Risos do PSD.

Sr. Deputado Basílio Horta, V. Ex.ª é um cidadão civilizado e civil, felizmente - trava-se muito melhor um diálogo com um civil, sobretudo desarmado. Porém, o Sr. Deputado tem que convir que é excessivo dizer que o que estou a proferir é uma série de «aleivosias», mesmo que diga a palavra entre aspas. Sr. Deputado, nas relações entre os homens, os deputados e mesmo os amigos não há aspas. Comigo não há aspas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Eu não insulto com aspas. Se tiver que insultar, Sr. Deputado, faço-o sem aspas. Contudo, jamais o insultarei!

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Responde também sem aspas?!

O Orador: - Não ponha aspas nas palavras, Sr. Deputado. V. Ex.ª aprendeu excessivamente depressa com alguns deputados comunistas que insultam entre aspas e depois dizem que não insultaram nem repararam em tal.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - O Sr. Deputado é que esteve lá!

O Orador: - Sr. Deputado, a crise está passada. Assim, vou voltar ao debate político.

O Sr. Deputado disse que o PSD era uma «frente de interesses»...

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Cada vez mais!

O Orador: - Também presumo que sim, no sentido metafórico; creio que crescemos politicamente. É por isso que suspeito que o CDS será cada vez menos uma «frente de interesse», tão minguado está.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ultrapassámos em cerca de quinze minutos o período de antes da ordem do dia.
Contudo, ainda se encontram inscritos os Srs. Deputados Jaime Gama e Isabel Espada para produzir declarações políticas. Assim, gostaria de saber se há alguma oposição por parte da Câmara a que se prolongue o período de antes da ordem do dia a fim de estas declarações políticas se poderem produzir.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, não estamos de acordo em que se prolongue o período de antes da ordem do dia.
Na conferência de líderes parlamentares acordou-se que o período de antes da ordem do dia seria de uma hora e quando chegámos a este entendimento todos nós tínhamos em conta que alguns destes incidentes, que são normais, poderiam ocorrer. Na verdade, temos determinado tipo de compromissos que não nos permitem estabelecer consensos nesta matéria.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, na conferência de líderes parlamentares, aliás por proposta do PS, ficou claro que hoje haveria lugar à apresentação de declarações políticas.

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Ora, uma vez que o PS teve o cuidado de, com vários dias de antecedência, anunciar a declaração política do Sr. Deputado Jaime Gama, não nos parece curial que o PSD tenha vindo para aqui, com uma polémica exacerbada, lançar uma manobra que não parece ter outro objectivo que não seja o de impedir o PS de colocar questões importantes para o funcionamento do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar quero dizer que o que na conferência de líderes parlamentares ficou acordado foi que o período de antes da ordem do dia de hoje seria destinado a declarações políticas.
Em segundo lugar, há muito que existe um compromisso entre os presidentes dos grupos parlamentares no sentido de as declarações políticas terem sempre lugar desde que o partido que as deseja produzir tenha direito a tal, isto é, dentro dos prazos que estão previstos.
De forma alguma entenderia que não fosse dada a palavra ao Sr. Deputado Jaime Gama, quando é certo que na própria conferência de líderes parlamentares acordámos que o período de antes da ordem do dia de hoje era dedicado a declarações políticas. Na verdade, não compreenderia que tal acontecesse depois de o PSD ter prolongado as suas alegações por mais de 40 ou 45 minutos após a declaração política que produziu.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para reiterar a posição inicial que o PSD tomou.
Infelizmente, este tipo de incidentes ocorrem nesta Câmara de forma excessivamente repetida.
Quando em conferência de líderes se estabeleceu um critério para a utilização do tempo no período de antes da ordem do dia estipulada para hoje, à partida todos sabíamos que esta situação podia surgir.
A título excepcional e por consideração para com o maior partido da Oposição e para com o Sr. Deputado Jaime Gama, manifestámos consenso para que, excepcionalmente, não se cumpra o que ficou estabelecido na conferência de líderes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, aquilo que ficou estabelecido na conferência de líderes foi o tempo de 60 minutos para se produzirem as declarações políticas, no pressuposto de que não haveria pedidos de esclarecimento e, assim, todos os Srs. Deputados que se inscrevessem usariam da palavra.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Portanto, é razoável que sejam produzidas todas as declarações políticas que estavam agendadas. Porém, a única coisa que solicito aos Srs. Deputados é que se contenham, particularmente nos pedidos de esclarecimento, para que não prolonguemos excessivamente o período de antes da ordem do dia. Tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Maninho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, há pouco inscrevi-me para fazer uma interpelação à Mesa. Porém, depois das declarações de V. Ex.ª, que vão no sentido de conceder a palavra ao PS e ao PRD para produzirem declarações políticas, não tenho mais nada a acrescentar.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Peco a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, de facto, o Governo estranha o que está a passar-se, na justa medida em que a conferência de líderes nem sequer tinha de decidir, porque o Regimento é claro ao dizer que o período de antes da ordem do dia tem a duração de uma hora, salvo prolongamento decidido por requerimento apresentado por quem tiver interessado no prolongamento desse período.
Pela nossa parte, estamos perfeitamente disponíveis para adiar o início do período da ordem do dia; apenas gostaria de saber quantas declarações políticas estão previstas, para podermos programar os nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, como já anunciei estão previstas declarações políticas dos Srs. Deputados Jaime Gama e Isabel Espada.
Se não forem pedidos esclarecimentos e partindo do princípio que cada orador vai gastar os dez minutos a que tem direito, o período da ordem do dia começará daqui a vinte minutos.

O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pede a palavra, Sr. Deputado?

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, é só para dizer que em nosso entender, o artigo 74.º do Regimento é perfeitamente claro quanto ao direito de exercício das declarações políticas, tal como vinham sendo anunciadas, e, por isso, a nossa congratulação com a decisão do Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um conjunto de declarações contraditórias proferidas por altos responsáveis, e que culminou com a entrevista do Primeiro-Ministro ao «Diário de Notícias», veio de novo chamar a atenção para a situação pouco rigorosa em que se encontra o sector da defesa nacional.
A existência de fortes elementos de crise em área tão sensível justifica uma reflexão ponderada sobre a matéria. Reflexão que exige serenidade e espírito construtivo e não se compadece com a ligeireza e a mentalidade recriminatória. Reflexão que não deve ficar pelas

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frases feitas, pelas justificações de superfície, pela culpabilização injusta de terceiros ou pela manipulação dos dados do problema. Reflexão que a natureza do assunto exige seja efectuada sem a lógica da propaganda mas com a dignidade do interesse de Estado.
A democracia portuguesa actuará sempre levianamente se não der à defesa nacional e às forcas armadas o enquadramento necessário. Em nenhum Estado moderno se assistiu ao definhamento por inanição das estruturas que constituem o suporte material da defesa. Muito pelo contrário, a evolução do contexto internacional e o aperfeiçoamento das técnicas tom vindo a colocar a prevenção da guerra, a limitação de armamentos, a discussão e a defesa, isto é, o núcleo central de uma política de segurança, na primeira linha das preocupações dos poderes públicos. Constitui, por isso, grave vulnerabilidade nacional a circunstância de em Portugal ainda não terem sido ultrapassadas as modalidades empíricas de abordagem da questão da defesa e da sua componente militar. A crise actual tem precisamente a ver com o esgotamento desse modelo flutuante e postula a urgência de profundas mutações e reformas.
As insuficiências que hoje caracterizam o sector podem ser agrupadas em quatro grande áreas.
Primeiro, a ausência de organização institucional e administrativa.
Apesar da respectiva viabilização legal e orçamental, o nosso continuar a ser o caso ímpar de um país sem Ministério da Defesa Nacional, com todas as consequências daí decorrentes para a distorção do sistema de funcionamento do Estado. Não só a produção legislativa do executivo carece do suficiente aperfeiçoamento técnico como a definição e execução de uma política de defesa se encontra em absoluto inviabilizada. Estes factos, pelo encargo adicional que representam para as Forças Armadas, distorcem níveis de responsabilidade e funcionalidade que limitam ainda mais a sua operacionalidade. O atraso no cumprimento de prazos para a aprovação da legislação complementar da lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas tem aqui a sua principal razão de ser. Como igualmente radica na inexistência de Ministério da Defesa a descoordenação por mais de uma vez evidenciada na formulação das posições nacionais a assumir em sede de relações externas de defesa. Chegaremos à revisão constitucional de 1989, sem que, neste campo, tivéssemos sido capazes de tirar as consequências mínimas da revisão de 1982.
Segundo, o atraso e a casuística da modernização.
Da incapacidade para gerar uma política de defesa resulta naturalmente um adiamento das opções modernizadoras e o recurso a soluções de contingência alheias a um inventário de prioridades. O progresso feito com a introdução da programação militar é mitigado por uma excessiva dependência da ajuda externa, cuja fluidez e características deslizantes obrigam a verdadeiros terramotos em matéria de planificação. É mais a disponibilidade de material excedentário do que a caracterização nacional das necessidades que comanda a aquisição de equipamentos e, dessa forma, determina a natureza das omissões, o sistema de forças e o dispositivo. Os equipamentos transferidos - e a obsolescência de alguns - introduzem factores adicionais de despesa que, quando não encontram cobertura orçamental, geram a sua inoperabilidade efectiva. A este cenário pouco clarificado veio somar-se a declaração do Primeiro-Ministro que há - com o seu Governo - um sobredimensionamento da estrutura face à efectividade da ameaça que impende sobre o País. A modernização era lenta e aleatória. Com a volatilização da ameaça, o que passará a ser?
Terceiro, a indefinição e o congestionamento das carreiras dos quadros permanentes.
Problema sempre adiado desde o final dos conflitos em África, os excedentes e as consequências do seu peso na pirâmide tornaram-se hoje um travão ao normal percurso nas carreiras. O não aproveitamento pleno das potencialidades abertas pela legislação do serviço militar ao doseamento entre quadros permanentes, voluntários e de cumprimento obrigatório, bem como a falta de porosidade entre a estrutura curricular dos cursos das academias e a das universidades e do ensino superior, vão reproduzir a prazo novos fenómenos de congestionamento e estrangulamento de carreiras. A não adopção de medidas de fundo em matéria de políticas de pessoal dos quadros permanentes é também o factor decisivo da erosão relativa da carreira militar face a outros segmentos da administração e da vida nacional. E quanta margem para decisões ad-hoc não resulta da inexistência dos regimes estatutários para oficiais, sargentos e praças, da não revisão dos diplomas respeitantes ao tribunais militares, à justiça e à disciplina militares e ao acesso ao provedor de Justiça? Para já não falar nesse vazio completo em que se encontra face ao Estado de direito a situação do pessoal civil das forças armadas e dos estabelecimentos fabris militares. Carreiras definidas, formação contínua, promoções adequadas, retribuição, vencimentos e segurança social condignos, mobilidade e rejuvenescimento são requisitos indispensáveis da profissão militar nas modernas sociedades. Um desafio para o qual não houve ainda resposta adequada.
Quarto, a decomposição do parque nacional de indústrias de defesa.
Tendo perdido as vantagens de um mercado fechado resultante de uma especial situação de guerra e de isolamento diplomático, as indústrias de defesa não operaram em devido tempo a sua reconversão estrutural, tendo até enveredado por políticas de admissão de pessoal aparentemente justificadas por encomendas ultra-precárias oriundas de compradores voláteis. Sem uma direcção de armamento com a dimensão ajustada e com um enquadramento legal desordenado, simultaneamente ultrapermissivo e ultra-restritivo, o sector das indústrias de defesa - para o qual sempre se fala de um plano director que não é apresentado nunca - aguarda a necessária reconversão e os efeitos práticos da cooperação aliada no âmbito do IEPG (Grupo Europeu Independente de Programa) e do auxílio às LDDI (Indústrias menos desenvolvidas), não devendo assentar o seu futuro em operações meramente comerciais de embalagens e reexportação. Aqui, como em tantos outros domínios, quando se passará da expectativa às realizações?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A defesa nacional é um ponto em que o Governo não deve exibir excesso de triunfalismo. Um país sem Ministério da Defesa e sem os meios para definir uma política de defesa na verdadeira acepção do termo; uma modernização que é mais casuística do que programada e que é lenta e insuficiente; a indefinição do quadro geral de uma

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moderna carreira militar com motivação ética e profissional; a desagregação do parque nacional das indústrias de defesa e a inexistência de uma verdadeira direcção integrada do armamento, desde a aquisição, ao fabrico e à exportação, eis, em traços gerais, o cenário de lacunas que está por detrás da crise da defesa nacional que urge debelar com a maior rapidez.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista, que, sobre este assunto, tem dialogado activamente com as demais forças políticas e, em sede própria desta Assembleia, com o Governo, sente ser o seu dever - e numa óptica de interesse nacional - chamar, uma vez mais, a atenção dos órgãos de soberania e do País para as pesadas incidências que resultam da debilidade estrutural em que se encontra a defesa nacional. Área onde é desejável o estabelecimento de consensos tão alargados quanto possível, a defesa nacional é, por isso mesmo, sector de grande exigência quanto à elaboração de conceitos, à apresentação de propostas, à formulação de políticas, à organização de estruturas, à justificação face à opinião pública, ao incremento de um diálogo responsabilizador entre todos os portugueses, militares e civis. A adesão às Comunidades Europeias, o ingresso na UEO e a nova equação da nossa participação na Aliança Atlântica, bem como a importância do relacionamento militar com países africanos, justificam uma grande e profunda atenção à defesa nacional. Só ideias claras nesse domínio é o que o País poderá criar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as bases para uma participação responsável na procura da estabilidade regional, da segurança europeia, do controlo de armamentos, da melhoria das relações Leste-Oeste e de uma comunidade internacional fundada no direito, na cooperação e na paz.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Pedro Campilho e João Amaral.

O Sr. Pedro Campilho (PSD): - Sr. Deputado Jaime Gama, ouvi com a maior atenção a sua intervenção, tanto mais que se trata de uma área onde também nos parece que o consenso entre as forças políticas do País é extremamente importante.
Também não deixo de saudar o seu discurso ainda por uma outra razão: é que há pouco tempo, neste Hemiciclo, ouvimos um colega da sua bancada dizer que era preciso cortar no Orçamento da Defesa Nacional para aumentar no dos medicamentos. Há, de facto, alguma contradição entre as duas intervenções!
Por outro lado, penso que não podemos deixar de encarar que o Ministério da Defesa Nacional tem, finalmente, a lei orgânica e que o actual Governo, desde 1982, tem feito um grande esforço no sentido de levar para a frente a legislação complementar.
V. Ex.ª sabe, tão bem como nós, que o estatuto da condição militar está praticamente feito e que, aquando da sua discussão, houve um amplo consenso por parte de todas as forças políticas. Houve uma tentativa, entre o Sr. Ministro, o Sr. Secretário de Estado e todas as forças políticas, de chegarmos a um texto consensual.
V. Ex.ª também sabe que, em relação ao rearmamento das forças armadas, têm-se dado passos e apoios seguros, sem, todavia, deixar de haver limitações orçamentais - e já referi o que há dias ouvimos aqui da parte de um seu colega de bancada.
Devo ainda dizer-lhe, Sr. Deputado, que foram dados passos seguros na Marinha, na Força Aérea, nomeadamente com os interceptores, que, parece, estão a chegar.
V. Ex.ª sabe que o Governo está a fazer um grande esforço no sentido de implementar a reconversão - que nunca se fez - das indústrias de defesa.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado Jaime Gama, se não acha que o Sr. Ministro da Defesa Nacional e respectivo secretário de Estado, o Governo e a Comissão de Defesa têm feito um grande esforço comum no sentido de uma política comum nesta área.

Vozes do PDS: - Muito bem!

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Jaime Gama, a saliência que deu à ideia da existência de uma crise na política de defesa nacional é um facto significativo das diferentes coisas que se vão passando e que o Sr. Deputado desenvolveu parcialmente. Contudo, parece-me que podia ter avançado noutros pontos.
Pergunto-lhe concretamente, Sr. Deputado Jaime Gama, se não é também um sinal dessa crise a indefinição de posicionamento, que publicamente tem sido demonstrada, no que toca às negociações de acordos externos, como o acordo com a República Federal Alemã.
O quadro de indefinição e de estranho prolongamento do sistema de encontros que têm aparecido na opinião pública não pode contribuir para enfraquecer a posição nacional?
Neste mesmo quadro, Sr. Deputado Jaime Gama, pergunto-lhe se não é também de salientar a falta de cumprimento, por parte do Governo, de obrigações legais, nomeadamente da obrigação de informar a Assembleia da República - obrigação que decorre da lei de programação militar - acerca do estado de execução dessa mesma lei. Essa obrigação devia ter sido cumprida, sensivelmente, há quase um ano e ainda o não foi. Não é este também um sistema da crise e da indefinição que percorre a política governamental nesta área?
O Sr. Deputado Jaime Gama referiu também a situação dos trabalhadores dos estabelecimentos fabris e civis das forças armadas. Significa isso que o Sr. Deputado está de acordo em que é necessário alterar a situação até ao ponto de cumprir normas e imperativos da Constituição e da lei, dando publicação aos estatutos do Sindicato dos Trabalhadores dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as perguntas que me foram colocadas, porque permitem-me dar alguns esclarecimentos.

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Em primeiro lugar, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Pedro Campilho que o Partido Socialista reconhece e saúda o espírito de diálogo que tem sido revelado na Comissão de Defesa Nacional pelo ministro da Defesa Nacional e pelo secretário de Estado-Adjunto do ministro da Defesa Nacional em relação à procura de consensos alargados em legislação básica sobra a área da defesa nacional, opção que o Governo toma por razões que derivam da sua própria responsabilidade e que qualquer Governo deveria, nessa matéria, usar, à semelhança do que acontece em todos os países estabilizados.
A circunstância de esse diálogo ser positivo não nos deve, porém, inibir, em matéria substantiva, de constatar que, desde 1982, em relação àquilo que era um vastíssimo quadro legal complementar da lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, foi realizado um escassíssimo progresso de complemento legislativo. E aqui também o Partido Social-Democrata - que é responsável, há seis anos, pela área da defesa nacional - tem a realizar um particular exame de consciência, não porque esta matéria constitua matéria de grande turbulência em termos eleitorais mas porque dela resulta uma lacuna grave para a ordenação do Estado democrático e do sistema constitucional português e para a própria defesa nacional.
Em áreas tão importantes, como a da estruturação do Ministério da Defesa Nacional, não basta a lei. A lei orgânica foi aprovada, mas pergunto aos Srs. Deputados se, neste momento, está a funcionar uma única direcção-geral ou uma direcção de serviços do Ministério da Defesa Nacional, apesar de já ter havido em dois Orçamentos do Estado a inclusão de verbas para materializar essa realização.
Também as leis referentes à Direcção Nacional de Armamento, à Autoridade Nacional de Segurança, ao Instituto de Defesa Nacional, que deviam ter sido revistos nos prazos de um ano, um ano e meio, não o foram.
A lei de programação militar - que, aliás, não tem sido objecto da informação anual à Assembleia, como a própria lei-quadro da lei de programação militar estipula - encontra-se em atraso, atraso esse que podemos compreender, atendendo à necessidade de ajustada com novas negociações com países aliados, mas que urge, depois de completadas essas negociações, que o Governo a apresente, porque o prazo para fazê-la terminava em Dezembro de 1988.
A estruturação das carreiras militares não tem apenas a ver com o estatuto da condição militar e com os subsequentes estatutos dos oficiais, sargentos e praças, mas também com a definição de uma política de pessoal, política essa que, de certa forma, tem estado entregue a si própria e que não tem produzido os melhores efeitos. Esta é matéria sobre a qual o Governo não pode nem deve, como fez o Primeiro-Ministro na entrevista que deu ao «Diário de Notícias», responsabilizar as forças armadas como se se tratasse de áreas separadas de influência ou de gestão. Isto porque o Governo, de acordo com o sistema constitucional, sendo o responsável pela coordenação da administração, é o responsável pela coordenação da administração civil e militar do País. Esse é que é o significado da revisão constitucional de 1982, cujas consequências práticas todos temos de extrair.
O mesmo se passa em relação às indústrias de defesa onde, perante um problema difícil, tem havido soluções pontuais, mas ainda não se viu apresentado o quadro geral de uma acção para reestruturar as indústrias em crise e erguer um parque de indústrias nacionais de defesa, um parque alternativo, moderno, viável e integrado nas novas exigências internacionais de uma indústria de defesa.
Sr. Deputado Pedro Campilho, agradeço-lhe a sua intervenção, mas devo dizer-lhe que esta questão é aqui chamada pelo Partido Socialista não tanto na dinâmica de uma conflitualidade ou de uma oposição ao Governo, - que também existe nesta matéria - mas, sim, porque das lacunas que o Governo, da responsabilidade de W. Ex.ª, possa demonstrar em área tão sensível é todo o sistema constitucional e democrático que sofre as consequências.

O Sr. Presidente: - Queria concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - E, em termos nacionais, o Partido Socialista também chama a si próprio essa preocupação por se sentir co-responsável no delineamento de soluções institucionais claras para essa área.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado João Amaral, já respondi a uma delas. Penso também que é necessário que o Governo preste esclarecimentos sobre o ponto em que se encontram as negociações com a República Federal da Alemanha em relação às facilidades em Beja. Aliás, o meu partido lançou essa questão na última ronda de perguntas ao Governo, mas essa não foi uma das perguntas seleccionadas. Espera-se, que, sobre essa matéria, seja prestado um esclarecimento, até para que não sejam autoridades ou responsáveis da República Federal da Alemanha a reproduzir, em termos não apropriados para o nosso país, as modalidades que visualizam para as soluções sobre essa matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à legislação respeitante aos trabalhadores civis das forças armadas e dos estabelecimentos fabris militares, tive hoje oportunidade de chamar a atenção da Câmara para a grande lacuna que existe nessa área face ao Estado de direito, lacuna que é necessário colmatar não só para proteger e acautelar os direitos legítimos e constitucionais dos trabalhadores que se encontram nessa situação nas também para, com uma resolução correcta desse problema, contribuir para o prestígio das forcas armadas na sociedade portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão alunos da «Escola Secundária n.º 2», de Abrantes, e a «Anselmo de Andrade», de Almada, acompanhados dos seus professores, para os quais peco a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais.

Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.

A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em entrevista recentemente concedida

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a um órgão de comunicação social, o Sr. Primeiro-Ministro respondendo a uma questão colocada pelo entrevistador segundo a qual o desvio verificado entre a taxa de inflação prevista e a real acabara por ser benéfico, afirmou o seguinte: «Se o Governo quisesse manter o objectivo inicial da inflação tinha que fazer uma política restritiva, de aperto ao crédito e mais impostos (...) Resolveu não fazê-lo para que a economia continue a crescer».
Desta posição do Sr. Primeiro-Ministro podem extrair-se pelo menos duas conclusões.
A primeira respeita à seriedade das projecções macroeconómicas do Governo. Para o Executivo estas são um mero exercício académico sem qualquer interferência real na regulação da evolução das principais variáveis macroeconómicas. De facto, os objectivos e metas definidas não são para cumprir, ou procurar cumprir, visto que, se a conjuntura se modifica, o Governo pode perfeitamente, a bem do crescimento económico do País, inflectir esses mesmos objectivos alterando, consequentemente, a política económica.
Fica agora a saber-se por que razão o Governo ainda não se deu ao trabalho de rever as projecções que integram o chamado PCEDED.
É que, afinal, elas não servem para nada, sendo que não é o facto de as mesmas estarem manisfestamente erradas que condiciona a correcção das respostas que, intuitiva e atempadamente, o Governo dá às modificações conjunturais.
A segunda conclusão tem a ver com o interesse económico e utilidade social de prever o andamento dos preços. Diz-nos o Sr. Primeiro-Ministro que o desvio verificado entre a inflação prevista e a efectivamente realizada acabou por ser propiciado pela política do Governo, orientado para não apertar o crédito e não aumentar a carga fiscal.
Temos, pois, que agradecer ao Governo que, inteligentemente, viu a tempo, que a consecução de uma taxa de inflação mais comparável com a registada nos países europeus seria, na verdade, nefasta para os portugueses. No final do transacto ano, o Sr. Primeiro-Ministro, certamente por má avaliação, ou melhor menos rigorosa avaliação da situação, tinha declarado que em Março deste ano a inflação baixaria para os níveis previstos pelo Governo. Ainda bem que corrigiu o seu pensamento! De resto, a economia já está habituada a funcionar e a crescer com a taxa de inflação a dois dígitos. Para quê alterar o que está a funcionar tão bem?
Aliás, a formulação de previsões da subida dos preços são pura perda de tempo. Não vale, com efeito, a pena fazê-las. Veja-se: como é que o Governo ia adivinhar que o ano agrícola seria tão mau em Portugal e na Califórnia? E que o preço do vinho iria aumentar tanto? O Sr. Primeiro-Ministro explicou que sem esse aumento a inflação se situaria, desde logo, um ponto percentual abaixo do nível efectivamente registado.
Ora, o Governo não pode fazer previsões das condições meteorológicas e não tem culpa que a procura do vinho seja tão rígida...
É claro que o Executivo poderia ter controlado melhor a evolução das variáveis monetárias, privilegiar o investimento produtivo ou conter o crescimento desproporcionado da procura interna. Mas convém não mexer na economia - se as pessoas querem gastar, que gastem; se os agentes económicos aplicam mal os dinheiros de que dispõem, que o façam.
Aliás, só aqueles países que adoptam políticas rígidas de controlo da inflação conseguem, de facto, reduzi-la. Mas com quantos sofrimentos para os seus cidadãos e para o seu crescimento económico?
Há quem sustente que é indispensável ter-se uma ideia de um andamento da inflação para se definir e aplicar uma política adequada de preços e rendimentos.
Pura ilusão! Veja-se: muito embora a própria Comunidade Europeia preveja que, em 1989, a inflação se deverá quedar em torno dos 12%, o Governo está a bater-se, com firmeza e determinação, no sentido de que os aumentos salariais não excedam os 8%. É claro que alguns parceiros sociais não perceberam ainda os erros em que incorrem quando reivindicam a não redução do poder de compra real dos trabalhadores mas, com calma e diálogo, acabarão por lá chegar.
Há também quem diga que a parte do trabalho no rendimento nacional é baixa e tem vindo a diminuir. Mas será isso importante? Não será evidente que, apesar disso, o investimento e o produto têm crescido como há muito tempo não sucedia?
Muitos portugueses estão preocupados com as consequências, em matéria de inflação, da formação do Mercado Único. Dizem que haverá propensão para o aumento dos preços dos produtos agrícolas e receiam que não possam funcionar os mecanismos administrativos de contenção dos preços.
Esquecem-se, porém, de que o Governo existe e, portanto, pensa e que, a seu tempo, saberá tomar as medidas que mais convém aos portugueses e ao crescimento económico do País.
É por isso que o grande perigo da formação do Mercado Único, com a liberdade de circulação de pessoas, pode vir a ser o da entrada em Portugal de muitos e muitos milhares de estrangeiros não apenas porque sabem que é «bom viver em Portugal» mas, também, porque não querem desperdiçar o ensejo de viver sob a judiciosa tutela de um Governo tão bom.

Aplausos do PRD e do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Vieira de Castro e Nuno Delerue.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - A Sr.ª Deputada Isabel Espada veio aqui repetir o discurso que a Oposição vem fazendo há muito tempo: restringir a evolução da situação económica do País à evolução da taxa de inflação.
Esta apreciação é, pelo menos, grosseira, restritiva e denota, perdoar-me-à que lhe diga, uma menor familiarização da Sr.ª Deputada com essas matérias.
Se me permite uma sugestão, aconselho-a a consultar uma publicação existente na biblioteca da Assembleia da República denominada «Perspectivas Económicas da OCDE para 1988», onde poderá constatar que entre um numeroso grupo de países da OCDE, Portugal tem, sem dúvida, a melhor evolução da situação económica, que é medida, por exemplo, pela taxa de formação bruta de capital fixo, pela taxa de crescimento do produto interno bruto e pela taxa de desemprego.
Se V. Ex.ª consultasse esta publicação passaria a ter um conhecimento mais adequado acerca das questões económicas e, certamente, não teria vindo aqui fazer um discurso que não teve qualquer sentido.

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O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Pois, e qual é a taxa de inflação para 1989?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Delerue.

O Sr. Nano Delerue (PSD): - A Sr.ª Deputada Isabel Espada acusou o Governo de, no que respeita ao índice de inflação do ano passado, não ter actuado conforme poderia para reduzir ou travar a inflação - que era, na altura, diferente da meta inicialmente prevista - e de p ter feito premeditadamente.
Gostaria que V. Ex.ª comentasse uma afirmação que resulta de uma extrapolação que faço ao seu raciocínio e que é esta: na sua opinião, é muito fácil reduzir a inflação a zero, basta reduzir o consumo a zero.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.

A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Deputado Vieira de Castro, a Câmara, os deputados, o Sr. Presidente, os jornalistas e os funcionários que aqui estão presentes, felizmente, tiveram a «sorte» de, durante a minha intervenção, ter a sua presença no Plenário, porque assim puderam disfrutar da opinião, «perfeitamente esclarecida», de um economista brilhante, como é V. Ex.ª, e, portanto, corrigir as «eventuais lacunas» - e já vou dizer que isso não é verdade - abordadas por uma pessoa não economista mas que se preocupa com estas questões. Aliás devo dizer-lhe que a economia não é nem deve ser só para os economistas...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - ..., pois é demasiadamente importante para ser só tratada em termos numéricos e econométricos. Penso que esta matéria tem um aspecto social e é esse que trago aqui. Nesse sentido, devo dizer que a Câmara beneficiou da sua presença.
De qualquer modo, tive oportunidade de referir na minha intervenção uma série de acções globais por parte do Governo relativamente ao produto interno bruto, ao desemprego, etc.
Mas nós estamos a falar de inflação e a atitude que o Governo tem tomado em relação a esta matéria tem sido uma brincadeira do princípio ao fim: o Governo tem feito chacota das suas próprias afirmações, que produz e que depois desmente; o Governo tem brincado com esta questão, que é extremamente importante, como sabe!
Ora, Sr. Deputado, o sentido da minha intervenção foi o de responder da mesma forma, mas como o Sr. Deputado não o entendeu vou explicar-lho: foi o de tentar falar de inflação com riso, porque o Governo nesta matéria apenas nos provoca riso e absolutamente mais nada! Temos que rir com as atitudes que o Governo tem tomado em relação a esta matéria! O Governo tem brincado com os portugueses que o elegeram e nós temos de brincar e rir com esta matéria, não podemos fazer mais nada!
Sr. Deputado Nuno Delerue, sinceramente não compreendi a sua pergunta, portanto dou-lhe licença para me interromper e colocar-me de novo a questão.

O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Sr.ª Deputada, apenas fiz um comentário do mesmo tom usado por V. Ex.ª
A Sr.ª Deputada acusou o Governo de não ter actuado na altura em que tinha mecanismos para o fazer e deu alguns exemplos que vinham referenciados na entrevista que o Sr. Primeiro-Ministro concedeu ao «Diário de Notícias».
Sr.ª Deputada, por redução ao absurdo e se fizermos uma extrapolação das suas afirmações, é muito fácil termos uma inflação de 0%. Porém, o problema que se coloca e que tem de ser discutido com alguma seriedade é o seguinte: a Sr.ª Deputada não pode querer atingir um nível de inflação a qualquer preço. Portanto, alguns dos aspectos dá sua intervenção - e peco desculpa do que vou dizer - foram perfeita e inequivocamente demagógicos.

A Oradora: - Sr. Deputado, o Governo perante esta questão tem vindo sistematicamente a alterar o seu pensamento e, portanto, perante esta atitude a única coisa que posso dizer-lhe é que o Governo não tem qualquer política relativamente a esta matéria. Fixa metas de inflação e, depois, a meio do ano, quando vê que a sua política falha, vem justificar-se dizendo que é assim mesmo, porque de outra forma teria de prejudicar a vida dos portugueses.
Ora, Sr. Deputado, isto é perfeitamente ridículo e não tem discussão!
O Sr. Deputado sabe que o Governo se enganou em relação a esta matéria mas como não quer assumir os erros que cometeu vem justificar a não redução da inflação como forma de os portugueses manterem o seu poder de compra. O Sr. Deputado sabe quão ridícula é esta afirmação...!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vamos passar à votação de um voto de protesto subscrito por deputados do PSD.
Este voto já foi distribuído e, portanto, penso que os Srs. Deputados dispensarão a sua leitura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Presidente, penso que é melhor proceder à leitura deste voto, uma vez que ele só foi distribuído às direcções de bancada.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, o Sr. Secretário vai proceder à sua leitura.

Foi lido. É o seguinte:

Voto do Protesto

Na última quinzena o mundo civilizado ficou consternado com a notícia da «sentença de morte» pronunciada pelo Aiatola Khomeini contra o escritor Salman Rushdie por ter escrito «Os Versos Satânicos», romance que ofendeu os fundamentalistas islâmicos. Ainda mais consternados ficámos quando soubemos que, cedendo às ameaças, alguns livreiros britânicos tinham retirado o livro do mercado e que o Canadá proibira a importação da «obra maldita».
O que se passa com o escritor indiano Salman Rushdie nunca aconteceu a nenhum homem de letras desde a Inquisição. Mesmo no auge das perseguições estalinianas os escritores proibidos não

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eram condenados à morte. Viram-se os livros proibidos e denunciados como foi o caso de Pasternak; mas nem o estalinismo ousaria condenar à morte um escritor. A mesma coisa passou-se com o nazismo. Os livros foram queimados em praça pública, arrancados das prateleiras das bibliotecas e proibida a sua venda, mas os seus autores nunca eram explicitamente condenados à morte por os terem escrito. Na maioria das vezes até conseguiram, os escritores alemães e soviéticos, atravessar as fronteiras e alcançar refúgio noutros países.
Mas para Salman Rushdie não existe lugar seguro na face da terra. Os fundamentalistas muçulmanos pronunciaram o veredicto: «O autor maldito terá de ser procurado e executado onde quer que esteja». E acrescentaram: «Mesmo que peca desculpa pelo seu pecado, não será perdoado». Assim, ficamos avisados: Os «aiatolas» serão impiedosos! A sua lei vigorará em qualquer parte do mundo.
Um aspecto trágico desta situação reside no profundo contraste entre esta forma moderna do islamismo e a tolerante herança medieval que o islamismo hispânico legou ao mundo ocidental. Estamos todos, especialmente em Portugal e Espanha, habituados a olhar a época muçulmana na península como um período de cultura, de estudo, do florescer das artes e das ciências que veio a influenciar profundamente o processo que culminou na Renascença. Aprendemos na escola que foi devido aos estudiosos árabes e judeus que tivemos conhecimento renovado de Aristóteles e da filosofia grega. Os muçulmanos tiveram sempre a fama de olhar os adeptos das três grandes religiões da bacia mediterrânica - os judeus, os cristãos e os islâmicos - como os «povos do livro»: a Bíblia. Nos nossos dias, devido aos «aiatolas», alguns muçulmanos correm o risco de ser conhecidos como os «perseguidores do livro».
É contra esta perseguição que esta Assembleia manifesta o seu mais vivo protesto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto de protesto que acabou de ser lido.

O Sr. Jerónimo de Sonsa (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jerónimo de Sonsa (PCP): - Sr. Presidente, como é sabido, não houve por parte do PSD a tentativa de procurar consenso em relação a um objectivo que, desde já adiantamos, nos parece ser justo, independentemente deste ou daquele considerando.
Neste sentido, não damos consenso a que este voto seja votado hoje, pois preferimos dialogar, inclusive com o PSD, procurando um texto mais simples que consiga reunir o consenso, e não uma medida avulsa do PSD.

p Sr. Presidente: - Sendo assim, a votação fica adiada para a próxima sessão.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando agora no período da ordem do dia, passamos à discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 77/V - Lei de bases do estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações - e dos Projectos de Lei n.ºs 351/V, apresentado pelo PS, e 352/V, apresentado pelo PCP, ambos relativos à lei de bases das comunicações.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Oliveira Martins): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Proposta de Lei n.º 77/V, relativa às bases do estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações, corresponde ao propósito declarado pelo Governo de estabelecer um enquadramento legislativo que não seja um factor restritivo ou espartilhante à evolução de um sector da actividade económica onde o progresso técnico é muito acelerado ca. sua importância social e política, não pára de crescer.
As contas nacionais revelam que, actualmente, em Portugal, a participação das Comunicações no PIB terá já ultrapassado, os 2% (média comunitária).
As previsões da CEE para o final do século são, porém, de um crescimento vertiginoso, devendo aquela participação atingir 7% no conjunto dos 12 países.
A importância do sector revela-se, porém, melhor por aquilo que ele possibilita as demais actividades económicas.
As estimativas comunitárias dizem que, desse ponto de vista, 60% dos empregos globais, dependerão das telecomunicações.
A sociedade de informação abundante - que é já dos nossos dias - segura, útil e oportuna para as múltiplas decisões do Homem, assenta na disponibilidade de redes e serviços de telecomunicações adequadas a essas grandes finalidades individuais e colectivas.
A vaga de inovações tecnológicas resultantes da convergência das tecnologias das telecomunicações e da informática, obriga os países a repensarem a organização do sector das telecomunicações e a estudarem as modificações regulamentares que são indispensáveis ao seu desenvolvimento e modernização.
Um tal enquadramento legislativo, inteiramente novo, para regular as telecomunicações em Portugal, é inadiável.
Antes de mais, porque já não é possível ir muito mais longe na revisão e na actualização das normas regulamentares específicas de cada um dos aspectos em que as telecomunicações se desdobram.
O Governo actualizou, nos últimos tempos, a legislação das radiocomunicações, das instalações telefónicas de assinante, do serviço público telefónico, das antenas parabólicas para recepção de emissões de radio-televisão via satélite, da homologação de alguns tipos de equipamento terminal, dos preços dos serviços e alguns regulamentos relativos a novos serviços de telecomunicações. No campo da radiodifusão, reviu-se a lei do licenciamento da radiodifusão sonora.
Foi, assim, publicada uma série de diplomas relativos a estas matérias, quebrando o imobilismo legislativo que caracterizou o longo período decorrido entre

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1969 e 1986 no qual, o Decreto-Lei n.º 188/81, de 2 de Julho, foi uma notória e salutar excepção.
Mas, o muito que há ainda a fazer, já não dispensa uma nova matriz referenciadora. E essa é a lei de bases proposta pelo Governo à aprovação desta Câmara. Esta aprovação é inadiável ainda por outras razões.
Há necessidade de harmonizar a nossa legislação com a de outros países comunitários, tendo em conta as decisões tomadas pelos órgãos próprios da CEE.
Teremos, também, de antecipar alguns acontecimentos, não correndo atrás deles, como tem acontecido, por exemplo, no campo da teledifusão (radiodifusão sonora e radiotelevisão).
Os próprios operadores existentes (CTT, TLP e CPRM) também já não dispensam certas reformulações legais para dar resposta adequada às solicitações do mercado.
Desde Novembro de 1984 que se vêm acelerando as medidas tomadas no âmbito da CE relativas à política das telecomunicações.
Mas foi com a publicação, em 1987, do livro verde sobre o Desenvolvimento do Mercado Comum dos Serviços e Equipamentos de Telecomunicações que se processou o salto qualitativo de maior importância, com o estabelecimento das reuniões regulares do Conselho de Ministros das Telecomunicações e da resolução desse conselho, tomada em Bruxelas em 30 de Julho de 1988 relativa ao desenvolvimento, até 1992, do mercado comum dos serviços e equipamentos de telecomunicações.
Face a uma tal resolução há um certo número de medidas de política de maior relevo que terão de ser tomadas nestes quatro anos, dentre as quais destaco: garantir a integridade de uma rede de dimensão comunitária, como elemento essencial de um mercado de serviços e equipamentos de telecomunicações com base no princípio de uma interconectibilidade de todas as redes públicas de cada país; criar progressivamente um mercado aberto para os serviços de telecomunicações, considerando as regras da concorrência estabelecidas no Tratado de Roma; criar serviços à escala europeia em correspondência com as solicitações do mercado, obtendo melhores padrões de qualidade e menores custos com princípios de tarifícação eficazes para o conjunto dos 12 países; prosseguir no desenvolvimento de um mercado aberto para os equipamentos terminais, com reconhecimento mútuo total das homologações e rápido aceito das especificações técnicas; reforçar a cooperação europeia a todos os níveis no domínio da investigação e desenvolvimento; desenvolver um consenso social sobre a transformação das condições de trabalho e de modos de vida resultantes das novas tecnologias de telecomunicações.
As medidas de política estendem-se a vários outros aspectos, mas seria demasiado longo referi-los todos aqui. Estes bastam para demonstrar a amplitude do reforço de adaptação que teremos de fazer em Portugal nos quatro anos que nos restam.
A Proposta de Lei n.º 77/V, reportando-se às bases gerais de um determinado regime jurídico, concentrou-se no essencial, através dos seus vinte e dois artigos.
Houve que cuidar especialmente de quatro domínios inovatórios: a distinção entre os serviços de telecomunicações que deverão continuar a ser explorados em regime de monopólio e os serviços que o podem ser em regime de concorrência; a definição das infra-estruturas de telecomunicações que devem estar sob controlo do Estado, através de EP's ou de empresas de capital maioritariamente público, nos termos da lei de delimitação dos sectores recentemente alterada; a defesa da concorrência nos segmentos da produção que a ela vão ser abertos, mantendo uma igualdade de tratamento entre as empresas operadoras; o âmbito e as condições de elaboração de um «plano director» das infra-estruturas de telecomunicações, que tenha em conta os imperativos da defesa nacional, da segurança interna, da protecção civil, da indústria, do ordenamento do território e de outras políticas que não podem deixar de ser tidas em conta quando estamos a legislar sobre telecomunicações.
Como não podia deixar de ser, para que estes problemas sejam resolvidos e as soluções sejam correctas houve que definir e clarificar vários conceitos, como por exemplo: o que são telecomunicações de uso público, o que é a teledifusão; o que são as infra-estruturas e a rede básica de telecomunicações; o que são os serviços de telecomunicações fundamentais e o que são serviços de telecomunicações complementares; o que são serviços de valor acrescentado.
Estes são alguns dos novos conceitos que passarão para a legislação portuguesa. Mas sem se assentar neles, não se podem alcançar os objectivos que os nos propomos estabelecer nos próximos anos.
Abrem-se à concorrência entre múltiplos operadores, os serviços de telecomunicações de valor acrescentado e os serviços de telecomunicações complementares dos serviços fundamentais. A própria lei define os atributos essenciais de uns e de outros.
O número dos serviços ditos «fundamentais» das telecomunicações era de início (1847), um só: a telegrafia. Um século depois, o número de serviços quer «fundamentais» quer «complementares» era de seis: a telegrafia, o telex, o fac-simile, a telefonia, a rádio e a televisão. Hoje, são dezoito os serviços de telecomunicações.
Mas já se perfilam no horizonte do fim do século, cerca de 31 serviços. Quantos mais aparecerão até lá?
Daí a necessidade imperiosa da lei ser flexível no enquadramento desta evolução rápida.
Que diz a proposta de lei em apreciação? Os serviços considerados fundamentais - o telefone fixo, o telex e uma rede de dados - esses, manter-se-ão no regime de monopólio, bem como as infra-estruturas que permitem a sua produção.
Amplia-se o regime concorrencial já existente, no campo dos terminais de assinante pois, para além da aquisição será aberta à concorrência a sua instalação e conservação, desde que efectuadas por pessoas singulares e colectivas devidamente credenciadas.
A introdução do regime concorrencional em novos segmentos de produção dos serviços de telecomunicações, não destrói a missão tradicional do serviço público a cargo de operadores especialmente qualificados para o efeito (CTT, TLP e CPRM) e que devem manter as suas capacidades de instalar a rede e produzir, não só os serviços fundamentais (em regime de monopólio, como se disse) como também os complementares e de valor acrescentado (estes em concorrência, entre si, e com operadores que se instalem no mercado).

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A proposta de lei aponta inequivocamente quais as infra-estruturas de telecomunicações que devem constituir a rede básica, exclusivo dos operadores de serviço público que explorando os serviços fundamentais em regime de monopólio, a lei de delimitação dos sectores manteve no âmbito da gestão indirecta do Estado, através de empresas que, pelo menos, tinham de ser maioritariamente públicas.
Esta categoria de operadores de serviço público, pela vastidão do âmbito da sua actuação e pelos meios de que dispõe, terá de respeitar algumas regras da igualdade de condições de concorrência. A rede básica não pode funcionar fechada sobre si própria, ao serviço desses únicos operadores tem de ser uma rede aberta, através da qual possa circular o trafego dos operadores das telecomunicações complementares e dos serviços acrescentados e, mais, é necessário que todos esses operadores, repito, sejam tratados em igualdade de condições de concorrência.
Constituindo as infra-estruturas de telecomunicações praticamente um monopólio, embora repartido pelos operadores de serviço público, no futuro exeptuar-se-ão apenas algumas infra-estruturas de âmbito limitado e ligado à produção dos serviços de telecomunicações complementares. Então poder-se-á concretizar um dos grandes objectivos da política da CEE ou seja, a rede de dimensão comunitária interconectada entre todos os países e que constituirá, seguramente, na rede de banda larga para as telecomunicações avançadas um pouco à imagem da rede dos comboios de alta velocidade ou da rede de auto-estradas de que, muitas vezes já temos falado nesta Assembleia. Mas é ainda mais importante salientar que tais infra-estruturas contemplarão, também, necessidades no âmbito da defesa e segurança nacionais e revestirão carácter estratégico do ponto de vista industrial, da investigação e desenvolvimento, da protecção civil e outros aspectos igualmente importantes para a nossa vida colectiva.
Daí a ideia de se trabalhar na elaboração de um plano director desta rede de infra-estruturas, como disse, que tenha em conta todos esses aspectos.
A lei contempla tudo isto e no conselho superior de telecomunicações espera o Governo encontrar o meio mais idóneo para dar o seu parecer com vista a tomar deliberações sobre uma questão de tamanha relevância pública.
A proposta em discussão aborda outros aspectos da política de telecomunicações, que não me demorarei a assinalar, apesar da sua relevância: o uso público dos serviços e a audição das organizações representativas dos consumidores; os princípios gerais de fixação das tarifas e dos preços; as limitações ao capital estrangeiro, uma vez que estamos num domínio estratégico e de segurança nacionais.
O tempo de que disponho é limitado, mas como a proposta taxativamente refere, o corpo das suas disposições normativas é destinado às telecomunicações de uso público.
A Teledifusão, as telecomunicações de uso privativo, a especificação exaustiva dos serviços de telecomunicações ou a própria organização empresarial dos operadores de serviço público não fazem parte das normas em apreciação.
Julga-se que são matérias a merecerem desenvolvimentos autónomos. O Governo quis assim, através desta proposta, para além da clarificação de conceitos, propor à Assembleia da República que se concentrasse sobre uma questão de fundo: onde e como deve haver concorrência e onde e como deve haver monopólio na produção dos serviços de telecomunicações.
Mas isso não significa, obviamente, que este seja um diploma isolado.
Ao apreciar esta proposta, a Assembleia da República, estou certo, terá presentes outras medidas em curso que o Governo tem anunciado publicamente e tem em execução, tais como: a série de recentes diplomas publicados sobre os aspectos das telecomunicações que comecei por anunciar; a lei do licenciamento da rádio, já aprovada por esta Assembleia; a alteração recentemente aprovada da lei de delimitação dos sectores, com incidência qualitativamente muito importantes sobre as telecomunicações; a prorrogação do contrato de concessão da CPRM; a entrada em funcionamento do Instituto das Comunicações de Portugal; a transformação em curso dos TLP em SÁ, com a reposição da sua automonia de gestão relativamente aos CTT, através da nomeação dos órgãos sociais distintos; autonomia empresarial das Telecomunicações - CTT e dos Correios - CTT, com a criação simultânea de uma empresa de gestão das partes de capital do Estado nas empresas de telecomunicações. Os futuros desenvolvimentos das condições técnicas da transmissão de sinais de televisão e do licenciamento das actividades de Radiotelevisão, na sequência da revisão constitucional.
Este conjunto de decisões constitui uma profunda reforma do sector das telecomunicações em Portugal, sem paralelo com o ocorrido em decénios anteriores.
Os objectivos valem os meios.
Produzir serviços em quantidade e qualidade adequados às necessidades, gostos e preferências dos consumidores, em permanente evolução; incorporar nessa produção as inovações tecnológicas consentidas pelo progresso técnico; diminuir o preço relativo dos serviços oferecidos dada a necessidade de informações que a vida individual e colectiva das pessoas cada vez mais revela; fazer tudo isto, aumentando o bem-estar dos que trabalham nas telecomunicações - eis a grande tarefa do próximo futuro.
Só não é possível alcançar estes grandes objectivos, - tenhamos ilusões - rejeitando o conservadorismo e o imobilismo, fazendo as coisas de modo diferente daquele em que as temos feito no passado, substituindo ou reestruturando as organizações, ampliando a qualificação dos homens e motivando-os para a aventura calculada do futuro.
O Governo, com a iniciativa desta proposta de lei cumpre, mais uma vez, a sua missão reformista ao serviço da colectividade nacional e dos superiores interesses do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Luís Roque, António Guterres, Armando Vara, António Esteves, Ilda Figueiredo, Jorge Lemos e Rui Silva.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. Luís Roque (PCP): - Disse V. Ex.ª, Sr. Ministro, que era necessário harmonizar a legislação com os países comunitários e eu pergunto se vamos harmonizar por alto ou por baixo.

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É que no Reino Unido, por exemplo, uma lei semelhante a esta deu origem a 15 mil despedimentos em dois anos, e a subida de taxas tendo ficado, ainda, ameaçados 6 mil postos de trabalho nos anos seguintes; em França, fez-se a experiência e recuou-se; em Itália - e eu pergunto se iremos harmonizar como ali se fez - havia três empresas distintas e foram fundidas numa só. Portanto, em que é que ficamos, Sr. Ministro?
Em relação à proposta de lei propriamente dita e aos investimentos modestos e necessários às novas formas de comunicação, o Sr. Ministro, neste ponto, esquece que estas se vão apoiar nos investimentos vultuosos que foram feitos para as velhas formas de comunicação, dos quais, no fundo, ficarão a depender e que é a rede suporte.
É estranho também que se diga no preâmbulo da proposta de lei que os CTT têm desempenhado, com elevado nível de eficácia no meio empresarial português, numa multiplicidade de funções nas áreas de telecomunicações e correios. Afinal, privatizar para quê, Sr. Ministro?
Em quarto lugar, relativamente à situação dos trabalhadores - no que nós colocamos um certo ênfase, pois já não basta a existência de cinco a seis mil trabalhadores com contratos a prazo - perguntamos qual será o seu futuro depois da privatização das telecomunicações.
Por outro lado, temos uma certa dificuldade em ver como vão ficar os utentes - que o Sr. Ministro diz que vão ficar melhor servidos - quando for aberto ao sector privado o mercado do equipamento terminal. Não sei se isso será benéfico ou prejudicial, dado que hoje a assistência é gratuita e depois passará a ser paga.
Igualmente, não vejo de que maneira privatizar é defender a segurança nacional e seja benéfico para ela! Isso não se «passa» em nenhum país do mundo, antes pelo contrário: em face da defesa e da segurança nacionais não se permite, sequer, privatizar, pelo menos certos ramos de telecomunicações.
E já agora faço outra pergunta, Sr. Ministro: por que é que o telefone móvel não está no regime do monopólio? É um equipamento que, embora esteja no início da implantação, há-de banalizar-se mais tarde, com a sua utilização. Trata-se, com efeito, de um equipamento que vai ter muita utilização, por exemplo nos táxis, etc.
Por último, perguntava, Sr. Ministro, uma vez que se ouvem as organizações de consumidores, por que se não procede de igual maneira em relação às organizações de trabalhadores?

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro deseja responder já ou, no fim, após os restantes pedidos de esclarecimento?

O Sr. Ministro da Obras Públicas, Transportes e Comunicações: - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro: Estamos perante um dos mais importantes debates que neste ano se travou nesta Assembleia.
Nesta matéria, penso, há três divisões possíveis: uma visão estatista, conservadora, que entende que todo este sector deve ser directamente gerido e explorado pelo Estado ou por entidades dele directamente dependentes, que nós consideramos ultrapassada e que não se adequa à evolução tecnológica e às sociedade modernas; uma visão privatizadora a outrance, que aposta na subordinação progressiva de tudo isto aos interesses privados e que corresponde à visão da lei-quadro do Governo, uma vez que a única limitação, que o Sr. Ministro, aliás, referiu na sua intervenção, não decorre desta lei mas sim da lei dos sectores, a qual, provavelmente, a maioria prentenderá alterar, entretanto, dado que não transpôs para aqui os princípios limitadores que essa lei introduziu; por último, a nossa visão, que entende que deve haver máxima competição e máxima liberalização em tudo o que diz respeito ao acesso directo ao consumidor - equipamento terminal, serviço de valor acrescentado, etc. - mas que deve ser respeitado o carácter estratégico e vital para o Estado, quer no plano de desenvolvimento tecnológico, quer no plano do serviço público, daquilo que é a rede básica de telecomunicações. Nesse sentido, gostaríamos de dizer, com clareza, que essa é uma área que deve ser reservada aos operadores de capitais públicos e não deve ser subordinada a interesses privados e muito menos a interesses estrangeiros, que, mesmo detendo 25%, não deixariam de ter o respectivo controlo tecnológico.
Quero dizer, com toda a clareza, que tendo o próprio Sr. Ministro reconhecido a importância dessa rede de infra-estruturas para a defesa e segurança nacionais, é para nós totalmente impensável que 25% da empresa operadora respectiva pudesse vir a ser, amanhã, detido, por exemplo, pela telefónica espanhola, assim como é, para nós, totalmente inaceitável que 25% do Banco de Portugal passe a ser detido pelo Banco de Espanha.
Com esta lei, porém, tudo fica em aberto para que assim possa ser, não havendo sequer a possibilidade de, depois, exercer discriminações na escolha dos respectivos parceiros.
É por isso, Sr. Ministro, que estando de acordo com a necessidade de liberalizar e de privatizar o que é liberalizável e privatizável, entendemos que, neste caso, se vai longe demais e se põe em causa, o interesse nacional, abrindo-se riscos para o futuro, que o País não pode nem deve comportar nesta fase de desenvolvimento, em que as telecomunicações representam o mesmo papel que a siderurgia ou os cimentes representavam na década de sessenta.

Aplausos do PS. Aplausos das galerias.

O Sr. Presidente: - Pedia aos senhores assistentes que se encontram nas galerias para não se manifestarem, senão terei que mandar evacuar as galerias. Assistem mas não podem intervir no debate nem podem manifestar-se.
Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Ministro, desejo, apenas fazer-lhe duas ou três perguntas, muito breves, na medida em que o tempo também não é muito. Começaria por pedir ao Sr. Ministro que nos dissesse,

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com o máximo de clareza possível, o que vai acontecer aos actuais operadores de telecomunicações do nosso país.
E isto porque, ao propor uma lei de bases das telecomunicações, o Governo rejeita, de certa forma, uma visão global das comunicações e, de alguma forma, também inviabiliza manutenção dos serviços que os correios vêm prestando.
Gostaria ainda de saber como é que se pretende, no futuro, superar os efeitos dos défices dos correios e que estudos suportam as decisões em relação a estas leis.
Com efeito, desde a anterior legislatura e, nalguns casos desde há mais tempo, temos vindo a defender que, sempre que há aprovação de uma lei de bases, deveriam ser dadas aos grupos parlamentares e a todos os deputados possibilidades de ter em conta e perspectivar aquilo que é o impacto dessa lei. Seria para nós razoável e penso que também para a opinião pública e para o País, que, juntamente com uma lei desta importância, fosse apresentado um estudo, tão rigoroso quanto possível, do impacto económico, financeiro, social, de emprego, de mercado, de segurança, de defesa e, enfim, das várias implicações que decorrem da sua aprovação.
Gostaria, portanto, de saber se existem esses estudos e se o Governo pode dar a conhecer à Assembleia as entidades que colaboraram e os elaboraram.
Há ainda uma outra questão que também desejava colocar e que é a de saber se é possível o Governo definir, já que na lei o não faz, aquilo que considera «serviços complementares de telecomunicações».
Outra questão que me parece igualmente importante tem a ver com um conjunto de novos serviços que usam novos suportes tecnológicos, e que também não são referidos na lei, nomeadamente com a questão da televisão por cabo; o que poderá acontecer no futuro em relação a esta possibilidade e também com as telecomunicações por satélite, que não são referidas na proposta de lei?

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Ministro, desejo, apenas, fazer-lhe duas perguntas muito breves, que julgo serem aquelas que centenas de milhar de consumidores, se tivessem a possibilidade de estar aqui a ouvi-lo, lhe fariam também.
O Sr. Ministro disse - e é visível, é verdade - que o peso das telecomunicações no produto nacional é importante e que este se assemelha aos crescimentos da CEE. O facto é que, para além é para desse crescimento, que é visível, notamos também um extraordinário crescimento ao nível dos preços. Hoje temos preços que, em termos absolutos, são muito próximos ou equiparáveis aos preços europeus e a tal ponto isto chegou que foi o próprio Governo que reconheceu, recentemente, que tinha de baixar os preços das chamadas internacionais.
O problema apresentado é sentido por toda a gente e, portanto, perguntava, Sr. Ministro, se no entender de V. Ex.ª estas modificações vão conduzir o País a um crescimento grande no sector das telecomunicações, mas à custa do aumento de serviços e não à custa de um contínuo aumento de preços.
Por último, gostaria ainda de perguntar se esta nova lei também irá prever algum controlo por parte dos cidadãos nas medições que as empresas de telecomunicações fazem dos seus consumos e sobre os quais não há qualquer controlo.
Aparece, no fim do mês, uma conta de 30 mil escudos, e o cidadão não tem qualquer espécie de controlo, até porque os aparelhos com que as telecomunicações e as empresas medem esse consumo não são aferidos, que eu saiba, por nenhuma entidade que mereça a confiança dos consumidores, como acontece com a maioria dos aparelhos de medida e pesagem utilizados no comércio em geral.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro: De facto, hoje estão em debate questões fundamentais, porque envolvem o desenvolvimento de um sector estratégico nacional como é o sector das comunicações. Por isso, assumem particular importância não só a proposta de lei que o Governo apresentou e os outros diplomas (projectos de lei do Partido Socialista e do Partido Comunista) mas também, e sobretudo, algumas afirmações que o Sr. Ministro acaba de fazer, a propósito das quais gostaria de colocar algumas questões.
Em primeiro lugar, perguntava ao Sr. Ministro com concilia o que chama «regime de monopólio ou de exclusivo» de serviços que considera básicos - o que, aliás, todos consideramos, mas no caso do Governo de uma forma muito restrita, abrangendo, apenas, os serviços fixos de telefone, de telex e o serviço comutado de transmissão de dados - com o que está expresso no artigo 8% da proposta de lei, que diz: «Compete ao Estado assegurar existência e disponibilidade de um serviço público de telecomunicações de uso público».
Sr. Ministro, trata-se de uma questão fundamental que este debate tem de esclarecer e por isso perguntava o que é que está certo: o que o Sr. Ministro disse ou o que consta do articulado da proposta de lei, nomeadamente no seu artigo 8.º?
Uma outra questão que, de facto, precisa de ser devidamente clarificada tem a ver com o conceito de «serviços completamentares». O Governo, através da proposta de lei, apenas define «serviços complementares» através da definição de «rede» e não directamente «serviços completamentares». Claro que se pode subentender, mas, então, se articularmos esta questão de «serviços complementares» com o que parece dizer o artigo 8.º, o que são «serviços complementares»? Poderão ser, afinal, todos os serviços de telecomunicações? É isso, Sr. Ministro? Se sim, é muitíssimo grave. Esta é, portanto, uma questão que também interessa clarificar.
Por outro lado, Sr. Ministro, não acha que serviços que hoje são considerados secundários poderão ser amanhã serviços fundamentais? Não acha que o Governo se está, afinal, a colocar numa posição profundamente estática, ao arrepio da revolução científica e tecnológica que diz querer acompanhar?
Uma outra questão que desejava colocar tem a ver com o «livro verde». Sr. Ministro, todos conhecemos os princípios fundamentais do «livro verde» e V. Ex.ª sabe que é possível conciliar algumas afirmações ou os princípios que aí aparecem expressos com a defesa do interesse nacional por parte dos países da CEE. Aliás

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V. Ex.ª também sabe que o próprio Comité Económico e Social chama a atenção para aspectos importantes que o Governo português não teve em conta na proposta de lei. É o caso, entre outros, da questão do primeiro telefone e da necessidade de manter como exclusivo esse importante equipamento terminal, até para defesa da própria indústria nacional, dos utentes e dos trabalhadores, naturalmente.
Outro caso, a apontar como exemplo - e o Comité Económico e Social também chama a atenção para isso -, é o próprio conceito de «estruturas básicas» que na proposta de lei tem um conceito demasiado estrito e não contempla, de facto, a defesa das empresas actuais, nem o interesse dos trabalhadores, nem o interesse dos utentes e muito menos os interesses da economia nacional.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, depois do que já está dito, convém esclarecer a metologia que o Governo seguiu na apresentação desta proposta.
O Sr. Ministro disse que era importante fazer as coisas de um modo diferente e não é por essa afirmação que o questionamos. Porém, gostaríamos de saber por que é que não trouxe à Assembleia o regime geral de sistema de comunicações, traz-nos apenas o problema das telecomunicações e nós perguntamos: e as restantes comunicações? A Assembleia não tem de se pronunciar sobre isso? Tenciona o Governo tratar as questões desarticuladamente? Não considera o Governo que uma visão integrada de um sistema de comunicações, como sector estratégico nacional, deve articular as telecomunicações e outros tipos de comunicações?
O Sr. Ministro referiu também que a mutação neste sector é evidente. Isso é óbvio, todos estamos de acordo! O Sr. Ministro referiu-nos que para 1995 seriam 31 tipos de serviços, mas também teve o cuidado de referir que para o sector público reservava apenas três e em condições indefinidas, como já aqui foi dito pela minha camarada lida Figueiredo. Sr. Ministro, V. Ex.ª considera ou não que o que não é básico hoje pode vir a ser básico amanhã? Serviços que hoje não assumem ainda uma importância fundamental - há uma margem ainda reduzida de cidadãos que a eles tem acesso - podem a vir, num futuro muito curto, a serem serviços básicos.
Lembro-lhe a esse propósito um relatório que foi elaborado no quadro do Parlamento Europeu - relatório em que, creio eu, trabalhou um representante português - no qual se aleita para a possibilidade de em 1995 já estarem (não sei se em Portugal, mas na generalidade de países da Europa) em condições de utilização, por uma vasta gama de cidadãos, um conjunto de serviços alargado. Sr. Ministro, esses serviços poderão ou não vir a ser considerados básicos e como tal abrangidos pelo serviço público?
Finalmente, Sr. Ministro, V. Ex.ª falou aqui em defesa do interesse nacional, falou em sector estratégico. Onde é que na proposta de lei há uma medida, uma que seja, que acautele a defesa do interesse nacional? A questão também já foi colocada mas eu tentarei colocá-la novamente para a reforçar. Por exemplo um serviço estratégico, um serviço de importância estratégica para o País no qual um país estrangeiro pode vir a participar no capital. Como é que isto se pode «casar», Sr. Ministro?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Ministro, eu começaria por salientar uma frase que ouvi durante a sua intervenção, no sentido de que o diploma hoje posto à discussão e que vai ser sufragado por esta Câmara, não era um diploma estático, mas era um diploma flexível. Ora, isto leva-nos a supor que durante a discussão na especialidade, depois da baixa à comissão respectiva do diploma, poderemos, de algum modo, discutir algumas alterações que, quanto a nós, são fundamentais para que ele possa ter a aplicabilidade prática que pretendemos que venha a ter.
Durante a intervenção que irei fazer terei oportunidade de explicitar aquela que é a opinião do meu partido sobre a problemática das telecomunicações e das comunicações. De facto, já temos anunciado, inclusivamente no próprio programa eleitoral, que, para nós, as telecomunicações não são exclusivas do Estado ou monopólio do Governo. Estamos abertos, convencidos e conscientes de que até 1993 há necessidade de se modernizar e introduzir novas tecnologias, novas medidas e inclusivamente de se aperfeiçoar e aprofundar a formação profissional em Portugal, que neste momento está praticamente estagnada a nível de quase todas as operadoras.
Não vou fazer uma declaração exaustiva, pois teremos oportunidade de nos pronunciarmos durante a discussão na especialidade. No entanto, Sr. Ministro, relativamente a alguns dos artigos que constam do diploma do Governo, eu gostaria, se possível, que me fossem dados alguns esclarecimentos.
Na exposição de motivos, precisamente no último parágrafo do artigo 4.º, a proposta diz concretamente: «Este diploma reforçará os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, nomeadamente através da consagração do princípio da audição prévia das organizações que os representam». Salvo erro e omissão, Sr. Ministro não encontro no articulado algo que justifique esta exposição de motivos. A dada altura refere-se que serão ouvidas representações dos utilizadores, mas não vejo nada que se refira aos trabalhadores.
No artigo 7.º, ponto 5, diz-se concretamente: «Em caso de comprovada insuficiência de capacidade por parte dos operadores de serviço público que operam a rede básica de comunicações para facultarem circuitos etc, etc.» Sr. Ministro, como e quem é que vai comprovar a insuficiência de capacidade por parte das operadoras de serviço público? Não vemos neste diploma qualquer coisa que nos possa responder concretamente a esta matéria.
O artigo 16.º refere-se à fiscalização. Sr. Ministro, esta questão é muito importante e todos nós sabemos o granel, passe o termo, que hoje se verifica por parte da fiscalização, que praticamente não existe. Também sabemos que as várias operadoras são quase clandestinas, instalam» sem eira nem beira, toda a espécie de telefones, não só nas residências mas também em organismos e até à data não se prevê absolutamente nada que possa acabar com esta situação. Sr. Ministro,

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vamos continuar com esta situação e com a consequente introdução de prejuízos na rede básica de telecomunicações? O Governo vai ou não, através de uma fiscalização adequada, actuar de forma eficaz?
Finalmente, Sr. Ministro, é sabido que é intenção do Governo separar nos CTT a área de telecomunicações da área postal, por forma a formar duas empresas distintas, os TLP e os CTT. Supomos que já está para apreciação junto das organizações dos trabalhadores um diploma que visa esse objectivo. Sr. Ministro, como é que o Governo pensa resolver a partilha dos títulos de participação dos CTT que recentemente foram emitidos?

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: - Vou procurar responder de forma precisa, às questões que me foram colocadas.
Sr. Deputado Luís Roque, falei na harmonização com a legislação europeia - uma legislação que, segundo o Sr. Deputado, aí está a dar despedimentos, a Itália fez a fusão de três empresas numa só, a França recuou...

O Sr. Luís Roque (PCP): - É verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, esta lei de bases, como procurei explicar na minha intervenção e como resulta do próprio texto, é uma lei que tem um objectivo específico e fundamental, que é o de saber onde e como devemos organizar a concorrência e onde e como devemos manter o monopólio. São estas as duas grandes questões de uma lei, que não é a lei de bases das telecomunicações em geral mas sim do estabelecimento, da gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações, o que é um pouco diferente.
A Inglaterra, a Itália e a França têm criado imensos postos de trabalho no sector das telecomunicações.
Na Europa, num período de 15 anos, foram destruídos três milhões de empregos, enquanto que nos Estados Unidos foram criados catorze milhões de empregos no mesmo período; ora, esses três milhões de empregos destruídos na Europa seriam muito mais se não tivessem sido criados à volta do mundo das telecomunicações uma quantidade enorme de empregos. Agora, esses empregos não surgem, obviamente, nos sítios tradicionais, onde surgiram no começo deste século.
Os empregos nas telecomunicações surgem à volta do escritório electrónico, na difusão das centrais privadas nas empresas, em todo o mundo que anda à volta das telecomunicações e que vai permitir aumentar, em muito, a eficácia do trabalho das empresas e do trabalho intelectual; como sabe, muitas invenções da humanidade simplificaram o trabalho braçal no começo deste século e, do mesmo modo, os empregos são criados mas nos sítios em que o foram no começo do século.
Se há nível de eficácia dos CTT, por que é que se vai privatizar e modificar? Obviamente que, quando fazemos uma legislação destas, estamos a pensar no futuro e estamos a tentar antecipar-nos a algumas coisas onde seja possível antecipar o futuro. Não queremos aqui a repetição daquilo que se passou com a Teledifusão, é que mantivemos e congelámos, dizendo «televisão privada não pode ser» e depois fomos inundados por sinais televisivos propagados por satélite e recebidos por antenas!
Sr. Deputado Luís Roque, o nosso sistema legal tem de ser aberto, não adianta fechá-lo. Agora, para comandar essa evolução temos é de saber quais as condições essenciais, onde vamos mexer e deixar o acessório de lado e aqui, repito, é onde há monopólio.
Os CTT funcionaram eficazmente durante muitos anos, têm na sua frente actividades do maior alcance para o futuro e é preciso que as leis se adaptem, que as organizações se reformulem para que continuem a prestar esses serviços com mesma eficácia com que o fizeram no passado.
O Sr. Deputado refere os trabalhadores no âmbito das privatizacões. Quando se discutiu aqui a lei de delimitação dos sectores fui claro nas intervenções que fiz e disse que a privatização no sector das telecomunicações é, no essencial, uma privatização mitigada.
A rede básica das telecomunicações por onde hão-de passar todos os serviços fundamentais, acessórios ou de valor acrescentado, mantém-se sob o controlo do Estado e para o Estado ter esse controlo não é preciso ter os 100% de capital. A Companhia Rádio Marconi é um exemplo disso, Srs. Deputados - e o seu contrato de concessão foi estabelecido, em boa hora, na I República, com a intervenção pessoal do Dr. António José de Almeida - tem cumprido, ao longo destes anos todos, funções essenciais do ponto de vista político e da gestão dos interesses públicos em Portugal. O facto de ter lá uma «dose» de capital privado não afectou isso, pois quando os interesses públicos impõem objectivos a companhia cumpre. Porque é que este há-de ser mau exemplo? Porque é que nos outros sectores isso vai dar resultados diferentes, Sr. Deputado? Não se inquiete com isso, pode inquietar-se com outras coisas mas com isso não.
O Sr. Deputado pergunta porque é que o telefone móvel não está no regime de monopólio. Partimos da noção de que a actual rede telefónica e a sua evolução tecnológica futura, é o essencial da rede de telecomunicações. Os estudos que há sobre esta questão dizem-nos isto: actualmente, com a digitalização da rede, com a criação de uma rede de banda larga, por onde passa o telefone fixo também vai passar um conjunto de serviços e quem tiver na mão essa rede, comanda as telecomunicações; por isso ela está repartida por três operadores e por isso cada um desses operadores tem a participação maioritária do Estado. Não quisemos abdicar disso, apesar de outros terem pedido que também aí fossemos para a concorrência e para a privatização total; neste caso não fomos por esse caminho, fomos, sim, para os serviços complementares.
E porque é que o telefone móvel é um serviço complementar? Todos os estudos feitos até agora dizem-nos que, actualmente o telefone móvel é um complemento do telefone fixo. Todo o assinante de um telefone móvel é necessariamente, um assinante até de muitas linhas de telefone fixo e, assim, ele é um serviço complementar.
Sr. Deputado dir-me-à que no futuro a quantidade de impulsos que vêm do telefone móvel pode ser maior do que aquela que vem do telefone fixo. Mas lá está, repito e insisto, a rede básica a conduzir esses impulsos e controlar como deve ser controlada.

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Passo a responder ao Sr. Deputado António Guterres, que menciona três soluções possíveis sendo uma delas a via estatizante total, a via do ancien regime, daquilo que se fez pelo menos até 1981, que tem um marco isolado na mudança do sistema das telecomunicações em Portugal. Na verdade, até essa data existia um de monopólio, um operador único, com o Estado a abranger todos os domínios das comunicações em Portugal. Ora, nós não passamos para uma liberdade tout court, uma liberdade em todos os sectores. É necessário repetir o que disse sobre a rede básica? Dir-me-ão os Srs. Deputados que há serviços que hoje são complementares e que, de hoje para amanhã, poderão vir a ser serviços básicos. Mas eu pergunto: e quem tem a rede para o fazer? O Estado, indirectamente, é que tem essa rede, através de empresas de maioria de capital público! Esta é a resposta flexível, em termos de capitais, sem perder o controlo.
Dirá o Sr. Deputado António Guterres e os 25%? O que a lei propõe é que nos serviços básicos e nos serviços complementares o capital estrangeiro não possa ir além de 25%, mas também se sabe - porque a isso estamos amarrados pela lei aprovada nesta Câmara - que uma empresa pública, para se transformar em sociedade anónima de maioria de capital público, não pode ceder mais de 5% do seu capital a estrangeiros.
Não esqueçamos, quando estamos a discutir esta lei, que esta Câmara aprovou, e bem recentemente, um conjunto de leis que estão presentes...

O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - No final o Sr. Deputado dirá o que entender.
Assim, na passagem para os operadores de serviço público, a maioria do capital estrangeiro será, no máximo, de 5%. Poderá perguntar: então para que são os 25%? São para os serviços complementares, Sr. Deputado, para os serviços de valor acrescentado, para os serviços que não são considerados serviços fundamentais.

O Sr. António Guterres (PS): - Não é o que cá está!

O Orador: - Se não está claro, Sr. Deputado - com franqueza lhe digo - , é para isso que há a análise na especialidade e cá estamos para retocar o que for necessário retocar; de qualquer modo, julgo que isso está claro, Sr. Deputado!

Vozes do PCP: - É o artigo 19.º.

O Orador: - Sr. Deputado Armando Vara, relativamente ao défice dos correios no futuro, de facto, dentro do programa do Governo, está prevista a separação das actividades postal e de telecomunicações.
Como é que se vai compensar o défice postal? Nada obriga a que o défice postal seja uma situação que a empresa vai viver pelos tempos fora, pois o sector postal tem capacidades, em Portugal, para se reequilibrar financeiramente, como aconteceu noutros países.
Há países, por exemplo a Inglaterra, em que o serviço postal tem rentabilidade financeira. E nós até sabemos, Sr. Deputado, que há um tipo de serviços que os correios podem praticar, se no momento próprio tivermos imaginação para lho entregar, que é o serviço dos cheques postais, dos serviços financeiros postais. Sabemos que há serviços complementares do correio - também ele com serviços complementares - que podem ajudar a equilibrá-lo. Mas, não vá o diabo tecê-las, nós prevemos também que a empresa de participações do Estado no sector possa, numa fase inicial, processar transferências de recursos entre o sector das telecomunicações e o sector postal.
O sector postal não fica aí «pendurado», amarrado com um défice às costas; isso não era andar para a frente, Sr. Deputado, isso era andar para trás e isso não queremos. Queremos que os correios concentrem a sua actividade melhorando a sua exploração; queremos que aos correios seja dada a possibilidade de novos serviços para melhorar a sua rentabilidade, mas não queremos que eles fiquem pendurados a um défice. Se é preciso apoia-los na fase inicial, as telecomunicações vão continuar a apoiá-los, através da empresa que na altura será criada e que vai gerir as respectivas participações do Estado.
Em relação à televisão por cabo, Sr. Deputado Armando Vara, todos os problemas da Teledifusão, como eu esclareci na minha intervenção e como a lei diz taxativamente, serão objecto de uma legislação especial, como tem sido para a radiodifusão sonora e será também para a Radiotelevisão. Não me quero adiantar nessa matéria, pois, como sabe, há normas que vão depender da própria Revisão Constitucional e, portanto, esperemos pelo momento adequado para fazer cada coisa no seu tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, terminou o seu tempo, mas como há tempo cedido pode continuar.

O Orador: - Sr. Deputado António Esteves, quanto à questão do crescimento do nível de preços, solicito-lhe que consulte os serviços do Instituto Nacional de Estatística e depois diga-me quais foram os anos, desde 1974 até este momento, em que os preços aumentaram menos no sector das comunicações. Consulte os serviços do INE e terá de concluir que foram os anos de 1986, 87 e 88.
Na realidade, houve serviços de telecomunicações que mantiveram os preços fixos e outros que os baixaram. Não cresceram 20% como acontecia em 1983/84, nem 18 e 20%, como em 1976, 77 e 78. Consulte os «canhanhos» e cite os factos; não tenha a memória curta, Sr. Deputado!
Quanto à questão do controlo da facturação, dou-lhe razão, Sr. Deputado, pois o sistema existente em Portugal, como em todos os países da Europa, não permite ao consumidor fazer, neste âmbito, o que faz quando compra produtos que são serviços, isto é, não pode saber para onde fez as chamadas, quanto tempo demorou cada chamada e em quanto importa o custo detalhado das chamadas que fez.
Tenho conhecimento de que os CTT têm desenvolvido um projecto relativo a alguns equipamentos a instalar nas centrais electromecãnicas e que vão permitir - se é que já não o estão a fazer - esta facturação detalhada. Trata-se de um bom caminho, que tencionamos restaurar em Portugal, porque no tempo - e passo a expressão - das «meninas do telefone», que nos perguntavam de que número fala e para que

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número quer falar, a facturação era detalhada. Mais tarde, com a automatização, em consequência da evolução técnica, esse tipo de facturação desapareceu.
Mas agora esse sistema vai voltar, através da instalação de dispositivos especiais nas centrais electromecânicas, ao nível do digital, uma vez que as centrais digitais possibilitam a facturação detalhada.
O Governo tem bem presente a necessidade sentida pelos consumidores em disporem desses elementos. De facto, é o regulamento do serviço telefónico e não a lei que se refere a essa matéria.
Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo, no sentido de saber como é que o Estado pode assegurar um serviço público se só o telefone, o telex e uma rede de dados constituem um serviço fundamental, repito novamente que quem vai comandar o progresso não é quem faz os serviços, quem vai comandar o progresso é quem tem nas mãos a rede. E quem vai ter nas mãos a rede são os três operadores de serviço público. Não digo mais nada!
Vou ter de abreviar as minhas respostas ao Sr. Deputado Jorge Lemos, que me pergunta por que é que não se discute aqui o regime geral das comunicações.
O Governo considera que a actividade postal tem, cada vez mais, um caminho de per si, um caminho específico a percorrer no futuro. Já há pouco o esbocei, quando referi que as actividades da distribuição postal e dos serviços financeiros postais serão muito mais desenvolvidos no futuro.
Mas a evolução das telecomunicações é completamente separada. Na verdade, não podemos continuar como se estivéssemos na década de 40, mas vejo que há partidos aqui representados que nos apresentam uma lei que cheira a bafio, à década de 40 e ao tempo da antiga administração dos correios, telégrafos e telefones.
Com efeito, Sr. Deputado, essa lei foi apresentada e choca-me, porque sei que esse partido dispõe de pessoas competentes para tratar esta matéria.
Apesar disso, apresentaram-nos uma lei da década de 40. No entanto, devo salientar que hoje a evolução das telecomunicações é completamente diferente da evolução postal. Examine atentamente essa questão e verificará que tenho razão.
Quanto ao Sr. Deputado Rui Silva, que coloca a questão da representação dos interesses dos trabalhadores, devo salientar que em cada lei que é publicada não vamos estar sempre a repetir que temos de ouvir os trabalhadores deste ou daquele sector, pois a representação dos trabalhadores está definida em lei, na Constituição e respeitamo-la, quer seja no sector dos transportes, quer no das comunicações ou em qualquer outro sector da actividade económica.
Mas quando se trata dos consumidores, não podemos actuar desta forma, devemos ter um certo cuidado e estabelecer o apoio legal que nos permita ouvir as associações de consumidores. É esta e não outra a razão da nossa atitude. Não invente teias de aranha onde elas não existem!
Quanto à questão dos CTT e dos TLP, devo dizer-lhe que estes serviços foram e ainda são empresas totalmente independentes.
De facto, existiu uma lei que decepou os TLP dos seus órgãos de gestão, ou seja, do conselho de administração e do conselho fiscal, entregando a empresa aos CTT.
O que fazemos agora é repor a autonomia dessa gestão, porque os TLP têm um caminho a percorrer no futuro, no âmbito de um sector que se quer coordenado.
Com efeito, trata-se de um caminho muito próprio, com uma cultura própria, pois, como os próprios trabalhadores sabem, trata-se de empresas onde as culturas empresariais são diferentes.
Srs. Deputados, gostaria de continuar, com todo o gosto, a dar-lhes todas as explicações que solicitassem, mas alertam-me de que o tempo está esgotado.

Aplausos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro, utilizou oito minutos do tempo atribuído ao PSD.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A proprosta de lei de bases das telecomunicações apresentada pelo Governo tem subjacente conceitos de «liberalização» e «desregulamentação», chavões mistificadores que o Governo tem vindo a utilizar de forma demagógica nos diversos sectores da economia, designadamente nos dos transportes e das comunicações, onde a importância estratégica e social é por todos reconhecida.
Parece-nos oportuno perguntar se esta liberalização e desregulamentação não visarão «oferecer», a grupos de interesses privados, as partes mais rentáveis deste sector, visto que se pretende criar condições para privatizar partes importantes da actividade económica nacional, sem a preocupação mínima com os reflexos altamente negativos que daí resultarão.
Salienta-se que, a nível europeu, excepção feita para a neoliberal Inglaterra, todos os países têm sido extremamente cautelosos na abertura do sector das comunicações aos interesses privados, o que tem motivado o avanço ponderado da política comunitária neste domínio.
Mesmo no caso da Inglaterra tratou-se mais de privatizar do que liberalizar. Hoje existe, de facto, um regime de duopólio, um público, a British Telecom, e outro privado, a Mercury. Apesar disso, o governo inglês tem poderes para controlar a British Telecom e pô-la ao serviço dos interesses do Estado, situação para a qual em Portugal não estão previstos os necessários órgãos de controlo e o correspondente corpo de normas reguladoras.
Para supervisar a liberalização, o governo inglês teve de distribuir as funções de controlo por cinco entidades, as quais foram obrigadas a criar uma estrutura regulamentar extremamente complexa, de que se salienta a OFTEL (office of Telecom), cujo director é independente do Secretário de Estado e responde perante o parlamento.
Portugal, pela sua pequena dimensão, pelo atraso da sua economia e do seu sistema de telecomunicações, pelo acentuado desequilíbrio que se regista entre as regiões do interior e do litoral em meios de comunicação, pelo estado incipiente do seu tecido industrial ligado a este sector, pelos enormes esforços de investimento que vem fazendo, e que necessariamente tem de

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continuar a fazer, para modernizar e expandir as suas redes e pela posição marginal relativamente à Europa, deve ter uma cautela redobrada em abrir mão de instrumentos estratégicos de intervenção como é o caso das comunicações.
Por isso, não compreende o Partido Socialista quais as razões que levaram o Governo a apresentar a esta Assembleia propostas de lei de bases gerais, primeiro a dos transportes terrestres e agora a das telecomunicações, que visam acima de tudo a abertura de caminhos incontroláveis de privatização da exploração de serviços públicos.
O Partido Socialista não é contra o sector privado, mas não pode tolerar que o Governo, por razões demagógicas e na ânsia incontrolável de ultraliberalização, se disponha a ceder a grupos privados partes importantes de actividades estratégicas para o País.
Aliás, é em defesa dessa intenção que, no preâmbulo da proposta de lei de bases em apreciação, se faz, implicitamente, uma certa apologia da figura da empresa privada como eficaz e rentável e, consequentemente, a de empresa pública como ineficaz e deficitária.
Só que, no caso concreto das telecomunicações, o Governo teve dificuldade em sustentar de forma explícita essa sua teoria, dado que os três operadores actualmente existentes, CTT, TLP e Marconi, são todos altamente rentáveis, pelo que a argumentação utilizada foi enviesada no sentido de fazer crer aos menos atentos que o modelo da Marconi, empresa privada de capitais maioritariamente públicos, é o que tem dado melhores resultados.
A argumentação do Governo ignora as diferentes realidades de mercado, de volume de investimentos, de obrigações de serviço público e de responsabilidades sociais existentes nos três operadores nacionais.
De facto, a Marconi explora a parte mais rentável do mercado, as telecomunicações intercontinentais por cabo e por satélite, e está sujeita a um programa de investimentos anuais relativamente pequeno (em 1988 investiu cerca de 2,7 milhões de contos). Os dois operadores públicos, além de explorarem mercados economicamente menos interessantes, sobretudo os TLP, encontram-se em fase de grande expansão e modernização de serviços que os obriga a enormes investimentos anuais. No ano passado, os TLP investiram 21 milhões de contos e os CTT 39 milhões de contos, o que acarreta necessariamente um elevado peso de encargos financeiros nas suas contas de exploração, apesar dos níveis de autofinanciamento atingirem taxas da ordem dos 65%, o que deve ser situação quase única no tecido empresarial português, quer público quer privado.
É impossível que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações desconheça estas realidades empresariais, dado ter sido presidente dos CTT e TLP durante vários anos. Por isso, interrogamo-nos sobre as razões que o levaram a propor um modelo empresarial do tipo da Marconi. Será para justificar a implementação da única medida concreta que consta no programa do Governo para o sector, e que se prende com a separação dos correios das telecomunicações por divisão dos CTT em duas empresas?
A este propósito, seria o momento oportuno para V. Ex.ª, Sr. Ministro, informar esta Assembleia das medidas que o Governo tem programadas para viabilizar financeiramente a empresa que fique apenas com a exploração das comunicações postais. Sabendo-se que o crescimento do mercado dos correios em Portugal e a implementação de novos negócios, designadamente no campo dos serviços financeiros postais, não são suficientes para nos próximos anos equilibrarem o enorme défice de exploração desta actividade de serviço público, gostaria de saber se o Governo se prepara para reduzir efectivos e ou fechar balcões nas zonas do interior do País.

O Sr. Luis Roque (PCP): - Já fechou alguns!

A Oradora: - Em qualquer país democrático não se tocaria num problema tão importante e estratégico como este fora dum quadro de consenso das forças políticas, pelo menos quanto aos princípios fundamentais a observar. Mas mais uma vez o Governo dá uma prova de arrogância, uma prova de que prefere o «orgulhosamente só» a uma discussão pública e a um consenso alargado que seria possível e necessário.
Caso esta Assembleia não tome providência, será o País a pagar caro esta teimosa e precipitação do Governo.
Apreciando mais pormenorizadamente o articulado da proposta de lei, podemos dizer que esta se caracteriza da seguinte forma: é uma proposta parcelar e incompleta; está formalmente mal concebida; é tendenciosa e atentatória dos interesses dos utilizadores nacionais de telecomunicações e, consequentemente, do País.

uma proposta parcelar e, portanto, incompleta, na medida em que apenas trata as telecomunicações de uso público, ou seja, telefone, telex e transmissão de dados, nada regulando sobre as comunicações públicas de difusão ou sobre as comunicações postais.
Está formalmente mal concebida na medida em que uma lei de bases gerais deve contemplar os princípios fundamentais que se definam os direitos e os deveres dos cidadãos, o acesso e o funcionamento do mercado, as funções que competem às comunicações na salvaguarda da soberania nacional e no processo de desenvolvimento económico e social do País, os direitos e obrigações dos operadores, as suas relações com os poderes públicos e as responsabilidades do Estado nesta matéria.
A presente proposta de lei é uma mescla de definições e intenções, pouco adiantando quanto aos princípios e objectivos que devem enformar uma política sectorial a médio e longo prazo.
É tendenciosa, visto ter sido elaborada única e exclusivamente para abrir à iniciativa privada segmentos rentáveis das redes públicas de telecomunicações, opção esta para a qual não encontramos justificações válidas, quer sob o ponto de vista técnico, quer sob o ponto de vista económico, e, muito menos, sob o ponto de vista social.
Para a liberalização dos segmentos que se podem justificar numa perspectiva de política comunitária de telecomunicações, como são os casos da aquisição e aplicação dos equipamentos terminais de assinantes e dos chamados serviços de valor acrescentado, não é necessária qualquer lei de bases visto que a legislação em vigor já o permite fazer.
É atentatória dos interesses dos utilizadores nacionais de telecomunicações e, consequentemente, dos interesses do País, ao permitir que interesses privados, quer nacionais quer estrangeiros, passem a poder controlar a totalidade ou grande parte da exploração das redes

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de telecomunicações de uso público, designadamente as suas competentes mais rentáveis, reduzindo fortemente o poder de intervenção do estado num sector altamente estratégico para o País. Mesmo que só viessem a ser retiradas dos actuais operadores públicos a parcelas mais rentáveis, tal decisão provocaria necessariamente uma acentuada redução dos investimentos necessários à expansão e modernização das redes de telecomunicações.
As regiões mais desfavorecidas em matéria de telecomunicações, como são as zonas do interior continuariam a suportar estes acentuados desequilíbrios e a ver reduzidas as suas hipóteses de desenvolvimento.
Por outro lado, os grupos económicos privados procurariam no mercado externo os fornecedores de equipamentos que melhores vantagens lhes oferecessem na óptica dos seus interesses pessoais imediatos e abandonariam qualquer apoio à política nacional de investigação e desenvolvimento do sector, para a qual os actuais operadores públicos têm contribuído de forma exemplar.
Estão em causa valores fundamentais da comunidade nacional que não podem ser alienados por meras razões ideológicas de ultraliberalismo inaceitável ou por pressões de grupos económicos privados, nacionais ou estrangeiros.
Portanto, a única explicação que encontramos para o Governo submeter à Assembleia da República esta proposta de lei é obter aval político para as seguintes acções: poder alienar em favor de grupos económicos privados a totalidade ou grande parte do capital dos operadores públicos rentáveis de telecomunicações (art.º 8.º); permitir que o capital estrangeiro possa controlar 25% do capital dos operadores de telecomunicações (art.º 19.º); retirar dos serviços reservados ao Estado o serviço telefónico móvel terrestre e os «serviços complementares» (art.º 8.º, 9.º e 10.º).
Estas questões constituem o fulcro desta proposta de lei e é sobre elas que, em nosso entender, se deve concentrar a discussão desta Assembleia, deixando para análise na especialidade alguns outros pontos controversos de menor importância.
Com efeito, o art.º 8.º dá a empresas de capitais privados a abertura em poder explorar, em regime de concessão, os serviços de telecomunicações de uso público.
Aliás, o próprio preâmbulo da proposta de lei contradiz a justificação da necessidade desta medida, ao reconhecer, de forma explícita, a eficácia dos actuais operadores públicos CTT e TLP e o grande esforço que têm feito para modernizar e expandir o sistema nacional de telecomunicações.
É completamente inaceitável para o Partido Socialista que um sector desta natureza possa vir a ser explorado exclusiva ou predominantemente por grupos privados.
O Partido Socialista admite que os serviços públicos de telecomunicações possam ser explorados por pessoas colectivas de direito privado, mas de capitais exclusivamente públicos. Pelas razões já apontadas anteriormente e atendendo à rápida evolução tecnológica que se verifica neste domínio e ao desenvolvimento da política comunitária de telecomunicações, julgamos ser mais prudente não permitir, a médio prazo, qualquer abertura a capitais privados da exploração dos serviços de telecomunicações de uso público, para além da situação da Marconi.
Por maioria de razão não pode o Partido Socialista aceitar que os estrangeiros possam ter uma participação até 25% no capital dos operadores de telecomunicações de uso público. Tal montante de participação é suficiente para controlar ou pelo menos influenciar de forma sensível as decisões desses operadores, designadamente no que respeita à política de aquisição de equipamentos de telecomunicações.
Quais os países comunitários que dão tal abertura?
Não será mais cauteloso, na óptica da defesa dos interesses nacionais, contribuirmos activamente com outros estados membros para a definição de uma política equilibrada para o sector, ou será que o Governo pretende liderar na Europa um novo movimento neo-liberal no sentido de apagar para sempre os tímidos laivos de social-democracia que o PSD de início dizia defender?
Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Quem vai beneficiar com tal política? Os utilizadores nacionais de telecomunicações? Os industriais portugueses? Ou, fundamentalmente, grupos estrangeiros ávidos de vender equipamentos sem se preocuparem com as necessidades do País em matéria de telecomunicações para o desenvolvimento?
Sinceramente, o Partido Socialista não vislumbra as razões que podem justificar tal política de alienação de interesses nacionais.
Também relativamente à privatizacão dos «serviços e redes complementares» e exclusão do telefone móvel terrestre da rede pública, não encontramos argumentos técnicos, económicos e mesmo de política sectorial que possam fundamentar a proposta do Governo.
De facto, no que respeita às denominadas «infra-estruturas complementares», definidas na proposta de lei pela negativa, como as «que não integram a rede básica de telecomunicações», está a abrir-se uma porta altamente perigosa ao domínio reservado do Estado em matéria de telecomunicações, que servirá de base à entrada de interesses privados neste sector.
Estarão esses investidores privados interessados em solucionar os graves problemas que o País ainda possui no domínio das telecomunicações rurais, ou apenas em explorar os segmentos mais rentáveis das redes internacionais e interurbanas?
Também a exclusão da rede pública telefónica dos sistemas móveis de acesso aos assinantes só se poderá explicar pela pressão de grupos privados interessados em explorar este tipo de serviço.
A rápida evolução tecnológica que se vem registando no mundo das telecomunicações leva a antever que, dentro de poucos anos grande parte dos terminais telefónicos sejam móveis.
Gostaríamos de conhecer quais os fundamentos técnicos e económicos que levaram o Governo a excluí-lo do âmbito dos serviços prestados pela rede pública.
É ou não um terminal telefónico que utiliza fundamentalmente a rede existente?
Estando o mercado dos respectivos equipamentos terminais já liberalizado, porquê abrir uma excepção na unidade da rede telefónica pública?
Por tudo o que foi dito anteriormente, o Partido Socialista considera que a proposta de lei de bases gerais de telecomunicações apresentada pelo Governo não está em condições de merecer aprovação por parte desta Assembleia.

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Cientes das suas responsabilidade na defesa dos interesses nacionais, o Partido Socialista apresentou à consideração desta Assembleia um projecto de lei da bases de comunicações que deve ser entendido como alternativa à proposta governamental.
O nosso projecto contempla dois princípios fundamentais, pelos quais o desenvolvimento do sistema nacional de comunicações se deve pautar a médio e a longo prazo.
Primeiro, o direito à comunicação, como valor intrínseco do modo de vida de qualquer cidadão numa sociedade moderna.
Segundo, a importância estratégica do sistema de comunicações no processo de desenvolvimento económico e social do País e de melhoria de qualidade de vida, tendo em conta, nomeadamente: as necessidades de defesa e de segurança nacional; os imperativos de redistríbuição social; a necessidade de incremento da indústria nacional e de apoio à política de investigação e desenvolvimento do sector; os objectivos de maior equilíbrio regional; os imperativos de maior competitividade das actividades económicas nacionais, qualquer que seja o local em que se situem; e a melhor integração de Portugal no mercado europeu e no mercado mundial em geral.
O nosso projecto reconhece o sistema nacional de comunicações como um serviço público que tem de ser assegurado pelo Estado, directamente ou por intermédio de pessoa colectiva de direito público, ou de pessoa colectiva de direito privado mas de capitais exclusivamente públicos. Separa as funções normativas e físcalizadoras, que devem ser apenas prerrogativas do Estado, das funções operativas que competem às entidades responsáveis pela exploração das redes e serviços; responsabiliza o Estado e os operadores pela garantia de níveis aceitáveis de qualidade e de fiabilidade dos serviços prestados e assegura a participação dos utilizadores na política do sector através de um conselho consultivo junto ICP; garante a privacidade e o sigilo da comunicação; contribui para a coesão económica e social do País, e integra a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores do sector, assegurando os actuais e novos postos de trabalho e o regime de segurança social em vigor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo o que acabamos de referir, propomos a esta Assembleia que a proposta do Governo seja recusada.
O Partido Socialista declara-se disponível para discutir, aberta e aprofundadamente, o seu projecto alternativo, no sentido de encontrarmos, em conjunto, o maior consenso possível sobre tão importante matéria para o futuro do País.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência, o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, a questão que gostaria de lhe colocar tem a ver com uma afirmação que a Sr.ª Deputada fez, com a qual até estou de acordo, em que referiu que o objectivo do Governo consiste na privatização ou liberalização deste importante sector das telecomunicações.
Neste sentido, e porque não entendo bem neste ponto o projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, gostaria de saber qual é o entendimento do seu partido quanto aos serviços e estruturas não reservados, ou seja, em concreto, quais são ou o que é que podem ser para o Partido Socialista, os serviços de valor acrescentado ou os serviços complementares?
Gostaria ainda de saber se V.V. Ex.ª estão a considerar como não reservados alguns serviços e até algumas estruturas que, no futuro, poderão vir a ser considerados massificados e fundamentais.
Um outro aspecto que, embora, não perceba, admito, no entanto, que esteja incluído na perspectiva do vosso projecto, diz respeito à posição do Partido Socialista em relação à questão do equipamento terminal, primeiro telefone, uma vez que a Sr.ª Deputada refere que todo o equipamento terminal pode ser liberalizado e não sei se está ou não a incluir o primevo telefone.
Aliás, coloco esta questão numa tripla perspectiva de defesa: dos utentes, da indústria nacional e dos próprios operadores públicos de telecomunicações.
Deste modo, gostaria que estas questões fossem clarificadas para podermos entender melhor o projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, há mais um Sr. Deputado inscrito para pedir esclarecimentos; deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, começarei por afirmar que o PRD está basicamente de acordo com toda a filosofia subjacente ao projecto apresentado pelo PS. Nesse sentido, anunciarei que, de facto, não inviabilizaremos - pelo contrário, apoiaremos - o projecto que o Grupo Parlamentar do PS apresentou hoje para discussão.
No entanto, para além da questão da primeira instalação de telefone, já colocada pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo e que também estava no âmbito das perguntas que lhe queria colocar, gostaria de solicitar a V. Ex.ª que me esclarecesse apenas sobre dois pontos, quase que de mera curiosidade.
O primeiro ponto tem a ver com a referência que faz, no âmbito do artigo 10.º, à exploração dos serviços financeiros postais. Isto porque, concretamente, Sr.ª Deputada, caberá também a implementação do chamado cheque postal como medida que vem já sendo reivindicada há tantos anos e não posta em prática, o que implica graves prejuízos, nomeadamente para as populações do interior, com enormes dificuldades de acesso a essa medida.
Em segundo lugar, admito que seja eu que não consigo interpretar o articulado, quando, a certa altura, refere - a Sr.ª Deputada focou isso na sua intervenção - que se «encontra reservado ao Estado, directamente ou através de entidades de direito público ou entidades de direito privado de capitais exclusivamente públicos, a exploração de serviços que permita (...)» etc, etc.

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Sr.ª Deputada, quer isto dizer que o PS não concorda, por exemplo, com a transformação dos CTT/TLP em pessoas colectivas de direito privado com capitais maioritariamente públicos?
Admito que seja um erro de interpretação meu. Não tive, de facto, oportunidade de esclarecer esta situação com a Sr.ª Deputada antes do inicio da discussão e, por isso, agradecia-lhe que me esclarecesse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr.ª Deputada lida Figueiredo, em relação aos serviços reservados ao Estado, eles estão definidos no artigo 18.º como aqueles que actualmente constituem a base da rede pública de telecomunicações. Porém, existe um n.º 2 que nos permite precaver o facto de esses mesmos serviços poderem evoluir no futuro, pelo que incluímos também no seu âmbito os serviços que venham a ser definidos pelos organismos internacionais de telecomunicações competentes como para serem prestados com um carácter universal, ou aqueles que, no âmbito da CEE, venham a ser estabelecidos de forma coordenada em todos os países membros. Por conseguinte, reconhecemos, de resto como a própria CEE, que é muito difícil construir uma definição a priori, dada a grande evolução existente no sector com o desenvolvimento tecnológico que se tem vindo a observar.
No que diz respeito aos serviços de valor acrescentado, a definição encontra-se artigo 20.º Trata-se, de resto, da mesma definição que é, penso, entendida em todos os textos sobre o assunto e que configura tais serviços com aqueles que não exigem infra-estruturas de telecomunicações próprias, utilizando a rede pública que lhes serve de suporte, mas não interferindo nela e sendo diferenciados em relação a essa rede. Em suma, são todos os serviços susceptíveis de ser conectados à rede mas que não interferem nela.
No que concerne ao primeiro telefone, não definimos que este seja, obrigatoriamente e para todo o sempre, um exclusivo das empresas operadoras, o que não quer dizer que o utente não possa também escolher que o telefone seja fornecido pelas empresas operadoras. Aliás, tal não quer também dizer que seja, neste momento, oportuno retirar essa obrigatoriedade a nível de política do Governo. Porém, não nos parece ser um princípio fundamental a reter numa lei de bases.
No que diz respeito aos serviços financeiros postais e à intervenção do PRD, estamos inteiramente de acordo com este partido...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Até que enfim!

A Oradora: - ... em que os serviços referidos deveriam ser desenvolvidos como factor de rentabilização dos correios.
De qualquer modo, o que nos parece é que, mesmo com o desenvolvimento desses serviços financeiros postais e dado o estado em que actualmente nos encontramos, isso não chegará para manter um serviço de correios vivo em todo o País, suportando o défice que actualmente esse sector comporta.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: Estão hoje em debate questões fundamentais de um sector estratégico como são as comunicações que se tornaram um elemento integrante das forças produtivas e cujo desenvolvimento é gerador de novas e mais regulares necessidades de comunicações.
E como a resolução científica e técnica acelera o crescimento e o desenvolvimento, a chamada revolução telemática, nascida da associação íntima das telecomunicações à informática, pode vir a colocar as comunicações mais acessíveis e baratas, dependendo tal das opções políticas que sejam tomadas. É, pois, de particular importância o debate que hoje se inicia na Assembleia da República, num momento em que se multiplicam as pressões de lobbies nacionais e internacionais, visando o controlo deste sector estratégico.
É que hoje é mais fácil os países desenvolvidos dominarem técnica, económica e culturalmente os países mais atrasados, utilizando para isso a forca das comunicações. Torna-se, por isso, vital encarar de frente este desafio, na defesa de soluções que tenham em conta a defesa dos interesses nacionais, dos trabalhadores e utentes.
Estão hoje em debate três projectos legislativos e embora todos abordem estas questões, têm, no entanto, objectivos bem diferentes. Vejamos, em detalhe, as principais diferenças.
Começando com a Proposta de Lei n.º 77/V, fica claro que o Governo prevê, desde logo, a separação das comunicações, ignorando os correios, logo à partida definindo que não interessam os sectores não rentáveis para o capital propondo o desmantelamento da actual estrutura empresarial do sector, a privatização do capital social das empresas operadoras de serviço público de telecomunicações, a reorganização do sector de acordo com soluções empresariais, assentes no jogo de interesses de grupos económicos nacionais e estrangeiros, de que os órgãos de comunicação social vão aliás, dando abundante notícia. É também definida na proposta de lei a obrigatoriedade dos operadores de serviço público de telecomunicações, incluindo os actuais CTT/TLP, de assegurar a utilização das suas redes por todos os operadores de telecomunicações e a abertura total aos privados do estabelecimento, exploração e gestão das infra-estruturas de telecomunicações, artificialmente consideradas complementares, como o serviço telefónico móvel terrestre, aliás, como já aqui foi dito, a proposta de lei nem sequer define serviços complementares, a não ser através da infra-estrutura utilizada para a sua realização.
E é desta forma enviesada que se conclui que o serviço telefónico móvel terrestre é considerado serviço complementar, mas porque é que não deve ser público, Sr. Ministro? Porque agora interessa apenas a um grupo restrito de utilizadores dado o seu elevado custo? Mas então p Governo esquece a esperada evolução neste domínio que, em breve, será a alternativa às frequências limitadas para a rádio táxis e outras entidades, banalizando-se, estendendo o seu campo de utilização e tornando-se necessariamente um serviço público. Aliás, a proposta de lei perfilha uma visão estática da realidade e não tem em conta a evolução natural de um serviço que pode começar por ser complementar, mas, com a revolução tecnológica, rapidamente se pode transformar num serviço fundamental para a generalidade da população.

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E, embora o preâmbulo da proposta de lei afirme que «a partir das noções de rede básica de telecomunicações e de serviços fundamentais prestados através dessa rede, se atribui a esses o carácter de serviço público, devendo o seu estabelecimento e exploração ser efectuados em regime de monopólio», a verdade Sr. Ministro - gostaria que, uma vez mais, tentasse esclarecer esta questão -, é que o articulado não o garante, e, pelo contrário, até o contraria.
De facto, no artigo 8.º é dito, claramente que «compete ao Estado assegurar a existência de disponibilidade de um serviço público de telecomunicações de uso público que pode ser explorado por empresas públicas ou privadas, mediante contrato de concessão, apenas para os serviços fixos de telefone, telex e uma rede de dados. Não significa este artigo, Sr. Ministro, que afinal nem para os três serviços considerados fundamentais haverá regime de exclusividade?
De qualquer modo, a rede básica de telecomunicações tem de funcionar como rede aberta, referindo expressamente o artigo 9.º que «a rede básica deverá funcionar como rede aberta, servindo de suporte a transmissão da generalidade dos serviços, independentemente de o respectivo prestador ser ou não titular da própria rede». Isto significa que os grupos económicos de capital nacional e ou estrangeiro poderão utilizar a rede básica para a generalidade dos serviços que queiram prestar, ou seja, todos os que derem lucro.
As consequências desta proposta de lei são claras: para os mais de 40 mil trabalhadores do sector dos correios e telecomunicações, é o agravamento da precarização do emprego no sector, a insegurança, a incerteza quanto ao futuro, a ameaça de desemprego para os utentes dos serviços é a insegurança no serviço prestado, o aumento certo de tarifas e preços de serviços fundamentais e maiores dificuldades na obtenção de um serviço público em zonas e regiões do interior do País onde dê prejuízo a sua exploração.
Penso que era importante que o Sr. Ministro tentasse ouvir as questões que lhe estou a colocar para que, eventualmente, ainda pudesse dar algumas respostas que permitissem a clarificação do que pensa o Governo a propósito destas questões fundamentais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É que se já hoje há protestos de populações e autarquias do interior do País contra o encerramento de postos dos CTT e a falta de distribuição domiciliária da correspondência, a implementação do conteúdo desta proposta de lei tenderá a agravar as assimetrias regionais, com graves consequências para as populações das zonas carenciadas.
Com a proposta de lei do Governo, é o próprio interesse nacional posto em causa, num momento em que era necessário reforçar os CTT/TLP, aproveitando totalmente as suas potencialidades para fazer frente ao Mercado Único, dando continuidade à importante acção desenvolvida nos últimos anos por estas empresas e de que se destaca: a automatização integral da rede telefónica nacional; a digitalização de transmissão telefónica em adiantado estado de implementação; a introdução de centrais electrónicas digitais na rede de telex; o estudo e desenvolvimento de um projecto de centrais digitais pelo CET de Aveiro; a introdução de teleimpressores electrónicos no serviço de telex; a automatização do serviço postal; o estudo e acompanhamento do processo de introdução das fibras ópticas, aliás, já introduzidas com carácter experimental e até, nalguns casos como definitivas.
Aliás, cabe referir que, no último decénio, o parque telefónico duplicou, o telex quintuplicou, as listas de espera e o tempo médio de espera foram drasticamente reduzidas. E se persistem aldeias sem telefone público, se há atrasos na implementação de certos serviços como o móvel terrestre, as organizações representativas dos trabalhadores afirmam que isso se deve mais à preca-rídade e indefinição reinantes na organização do sector e na política do actual Governo, do que às potencialidades reais dos CTT/TLP.
Um segundo aspecto que nos merece aqui algumas considerações é o Projecto de Lei n.º 351/V, do PS.
Pensamos que há que clarificar questões que, por omissão ou indefinição, não permitem um juízo claro sobre as soluções preconizadas.
O PS certamente não ignora o plano dos que, numa primeira fase, prevêem a flexibilização das estruturas empresariais do sector, para, numa segunda fase, após a cisão das sociedades dos correios e das telecomunicações, criar um grupo de sociedades com a participação de capital privado na área dos serviços complementares e de valor acrescentado, ficando na empresa originária, de capitais exclusivamente públicos, a responsabilidade dos serviços que dêem lucro. Ao capital privado ficaria facilitado todo o acesso não só às infra--estruturas, como à estrutura organizativa do sector, arrecadando os lucros dos serviços rentáveis.
É pois, neste quadro que o PS deve clarificar os seus conceitos e as suas posições.
Por último, faria uma referência ao Projecto de Lei n.º 352/V que o PCP apresentou e em que são considerados os seguintes princípios fundamentais.
Um primeiro princípio é o de que são explorados pelo Estado ou outras pessoas colectivas de direito público em regime de exclusivo os serviços de comunicações de uso público, ou seja, os correios e telecomunicações públicas, incluindo as telecomunicações com endereçamento e Teledifusão, embora se remeta para legislação especial todo o regime de comunicações desenvolvido por órgãos de comunicação social.
Um segundo princípio está em que o Estado, através das empresas (CTT e TLP) explora em regime de exclusivo todos os serviços de base considerados no sentido amplo, nomeadamente o telefone fixo ou móvel, o telégrafo, o telex, a transmissão digital de dados e todos os sistemas de transmissão bidireccional; o serviço público de telecópia; todo o processo das correspondências e encomendas postais; a emissão e a venda de selos e outros valores postais e todos os serviços financeiros postais.
Um terceiro princípio do projecto de lei do PCP é o de que aos CTT/TLP compete, em exclusivo, o estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas de telecomunicações, incluindo os sistemas de transmissão e, nomeadamente, os novos sistemas, como as estações de base rádio móvel terrestre ou marítima.
Um outro princípio é o de que os CTT/TLP têm o exclusivo de todos os serviços complementares e de parte do equipamento terminal, já que é obrigatório o fornecimento, instalação e conservação do primeiro telefone e se insiste na necessidade de dar condições a estas empresas públicas para o desenvolvimento de

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todas as actividades que constituam aproveitamento das infra-estruturas das comunicações, nomeadamente serviços de valor acrescentado.
Embora mantenha a actual estrutura do sector (através das empresas públicas CTT/TLP e da única concessão à CP Rádio Marconi), o projecto de lei do PCP insiste na necessidade de uma democratização das decisões e de um planeamento do sector. Por isso, propomos a criação do conselho nacional de comunicações, onde estão representados, entre outros, a Assembleia da República, as regiões autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses as organizações representativas dos trabalhadores do sector e dos utentes dos serviços prestados, a quem competirá, nomeadamente, emitir parecer sobre o Plano Nacional de Desenvolvimento das Comunicações cujas grande opções devem ser aprovados pela Assembleia da República e que deverá ter em conta o combate às assimetrias regionais, articulando as necessidades das comunicações com outras políticas, nomeadamente industrial, investigação científica, de desenvolvimento tecnológico, protecção civil e desenvolvimento do País, numa perspectiva de defesa do interesse nacional.
Pensamos que é reforçando a actividade das actuais empresas do sector, de uma maior coordenação de todo o sector das comunicações, que é possível uma gestão integrada, uma economia de meios e uma preparação do País para o impacto do Mercado Único numa perspectiva de defesa dos interesses nacionais.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Aliás, já aqui foi referido que preocupações também deste teor estão contidas num parecer da secção dos transportes e comunicações do comité económico e social sobre o livro verde, ao referir a necessidade da manutenção do princípio de exclusividade na exploração de infra-estruturas e na prestação de serviços de base, ao referir-se ao desejo da maioria dos Estados-membros da CEE de manter o monopólio sobre o primeiro telefone e todo um sistema de transmissão bidireccional, alertando para o perigo da concretização dos princípios liberalizantes contidos no livro verde, nomeadamente para as consequências da progressão da concorrência das multinacionais sobre as empresas mais frágeis e do impacto negativo, principalmente no emprego, nos métodos de trabalho, nas qualificações e na formação profissional, defendendo um profundo diálogo com os parceiros sociais.
Também aqui, em Portugal os trabalhadores do sector, através das suas organizações representativas, já se pronunciaram contra a proposta de lei do Governo e dos seus objectivos de desmantelamento da actual estrutura do sector e de abertura ao capital privado nacional e estrangeiro, demonstrando que as experiências a nível nacional e internacional (RFA, Itália, França, Holanda, etc.), aconselham a manter as empresas no sector público, pois a competitividade e a agressividade do mercado internacional a nível da electrónica e das telecomunicações aconselha a um poder forte como medida de salvaguarda dos interesses nacionais. Impõe-se, pois Srs. Deputados, um diálogo com todos os interessados, incluindo os trabalhadores, para encontrar a melhor solução.
Com o projecto de lei que apresentámos pretendemos contribuir para esse diálogo. Esperemos que todos, incluindo o PSD, estejam disponíveis para esse diálogo e para uma nova reconsideração, em sede de Comissão de Equipamento Social, de todos os diplomas apresentados, antes ainda de qualquer votação na generalidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Discute hoje a Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 77/V - Lei de bases do estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações.
Importa, desde já, verificar a conformidade da proposta em apreço com a vontade do Governo, expressa no seu programa, que foi, em devido tempo, aprovado nesta Assembleia.
Da sua leitura, na pane relativa às comunicações, fácil é verificar que, com apresentação desta proposta de lei, o Governo está a cumprir - neste como em todos os outros sectores - o seu programa, bastando para tanto recordar citando: «além das instalações terminais de assinante já liberadas, a prestação de serviços de valor acrescentado, bem como a instalação e exportação de equipamentos e serviços considerados como complementares e acessórios das redes básicas de telecomunicações, serão objecto de liberalização, desde que tal se mostre recomendável por razões tecnológicas e pelo interesse económico geral. Em qualquer caso, serão abertas à iniciativa privada, através das adequadas fórmulas de licenciamento ou concessão».
É politicamente relevante para o Partido Social-Democrata e para o Governo que apoia, verificar, a cada momento, que as promessas feitas em campanha eleitoral, depois apoiadas pela maioria do povo português, são para constar do programa do Governo e são mesmo para serem cumpridas, como prova a presente proposta de lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por maiores que sejam os obstáculos que alguns nos querem colocar, é bom que se desiludam, porque maioria e Governo não deixarão de assumir, em todas as situações, as suas responsabilidades para com o mandato que nos foi confiado pelos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estão também em discussão os Projectos de Lei n.º 351/V - da iniciativa do PS, e 352/V - da iniciativa do PCP, que só na semana passada deram entrada na Mesa da Assembleia da República.
Mas ainda bem que o fizeram. Ficamos nós e os portugueses a saber que, no essencial, para algumas forças políticas, o melhor é deixar tudo ou quase tudo na mesma, ficando também claro qual o sue verdadeiro empenhamento na preparação do País para os novos desafios da modernidade e do progresso.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O cidadão de hoje, a indústria, o comércio, a universidade, as instituições em geral, estão num

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mundo cada vez mais dependente da comunicação e da informação, dizendo-se até que somos uma sociedade de informação.
A comunicação que hoje nos preocupa neste debate e que constitui a Proposta de Lei n.º 77/V, refere-se ao sector das telecomunicações, cuja importância no mundo actual é de tal modo importante que não dispensa a nossa reflexão sobre esta problemática hoje, com vista ao futuro, que, estou certo, todos desejamos seja cada vez melhor.
De facto, conforme consta da exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 77/V, as telecomunicações detêm um conjunto de infra-estruturas fundamentais ao funcionamento da sociedade, bem como asseguram serviços indispensáveis à qualidade de vida dos cidadãos e ao progresso e desenvolvimento das actividades económicas, não esquecendo a sua importância estratégica nos sectores da defesa, da segurança, da indústria, da investigação e da comunicação social.
Todos sentimos esta realidade no nosso dia-a-dia e, quantas vezes, só lhe reconhecemos a verdadeira importância e valor quando sentimos dificuldade nos contactos que desejamos estabelecer ou nas mensagens que aguardamos.
Não duvidamos que mesmo os mais distraídos se apercebem dos rápidos progressos tecnológicos, especialmente nos domínios da electrónica e das telecomunicações, e que este ritmo de progresso exige imediata transformação no quadro legislativo vigente.
Portugal dispõe de uma legislação para o sector que, na sua maioria, está totalmente desajustada à realidade.
Se nos últimos anos foi feito um significativo esforço no sentido de actualizar alguma legislação de que são exemplos os Decretos-Lei n.º 188/81, 147/87, 176/88 e 199/87, é bom ter presente que a legislação fundamental sobre o sector é dos anos 60 e está, por força dos progressos tecnológicos e transformações sociais ocorridos, totalmente desactualizada.
No entanto, não podemos deixar sem uma palavra de louvor os operadores públicos a quem tem estado confiado o sector, em Portugal, e que constitui um enorme capital com que o País conta para desafios maiores.
Nesta linha a empresa pública CTT tem desempenhado, com aceitáveis níveis de eficácia, tarefas nas áreas dos correios em todo o território nacional e telecomunicações em todo o território nacional, excepto Lisboa e Porto, e nas ligações com os países europeus.
Seria, por isso, uma injustiça que não queremos cometer, não reconhecer a capacidade e dedicação postos ao serviço da empresa por todos os que ali exercem a sua actividade, desde a administração ao mais humilde dos seus colaboradores, que, não obstante todas as dificuldades, conseguiram servir a sociedade portuguesa. Mas importa igualmente referir, sem ambiguidades e duma forma responsável, que, perante os novos desafios, os resultados futuros não seriam igualmente dignificantes se, entretanto, não se introduzirem as necessárias alterações na sua estrutura administrativa.
Os Telefones de Lisboa e Porto (TLP), até agora com uma administração comum com os CTT opera o sector das telecomunicações em Lisboa e Porto.
A Companhia Portuguesa Rádio Marconi opera o sector das telecomunicações nas ligações intercontinentais, e é bem o exemplo, para os maiores adversários da privatização, de como uma empresa, com significativa parte do seu capital privado, pode respeitar integralmente os interesses públicos.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, se é sempre importante considerar o que temos internamente e partir daí ao encontro das soluções mais convenientes para o interesse nacional, não o será menos especialmente em matéria de telecomunicações, deixar de deitar um olhar, ainda que breve, ao que se passa no mundo que nos rodeia, especialmente no espaço a que aderimos em 1986 (CEE).
O sector das telecomunicações está a ser revolucionado por toda a Europa e fora dela, especialmente nos Estados Unidos da América e no Japão, onde se assiste a uma grande liberalização e reestruturação.
Hoje fazem-se várias experiências em redes classificadas de «banda larga», verdadeira auto-estrada das telecomunicações, que com a instalação de um único cabo de fibra óptica, permitirá dispor de toda a multiplicidade de serviços, incluindo a televisão.
A comissão europeia, atenta a esta evolução, está fortemente empenhada numa política comunitária de telecomunicações, o que significa rápidas e profundas transformações, com vista a uma harmonização de procedimentos e uma conjugação de esforços para a realização de objectivos comuns. Pretende, assim, a comissão europeia, uma rede de telecomunicações forte e integrada e um mercado de telecomunicações único e competitivo.
Com esse objectivo, elaborou um relatório sobre o sector conhecido por «livro verde - sobre o Desenvolvimento do Mercado Comum dos Serviços e Equipamentos de Telecomunicações».
Esse «livro verde» está em discussão desde 30 de Junho de 1987 no interior das estruturas da CEE e em todos os Estados-membros, aguardando o maior número possível de contribuições, com vista a encontrar a desejada política comunitária de telecomunicações.
Recordarei que o «livro verde» contém algumas sugestões para reflexão, nomeadamente: aceitação de manter o princípio da exclusividade ou de direitos especiais em benefício das administrações das telecomunicações, no que se refere à oferta e exploração de infra-estruturas da rede; aceitação de manter o princípio da exclusividade ou de direitos especiais em benefício das administrações das telecomunicações para prestação de um número limitado de serviços de base; livre oferta (sem restrições) de todos os outros serviços («serviços concorrenciais», incluindo, nomeadamente, os «serviços de valor acrescentado»), dentro dos Estados-membros e entre Estados-membros (em concorrência com as administrações das telecomunicações) - os «serviços concorrenciais» incluem todos os serviços, à excepção dos serviços de base reservados explicitamente às administrações das telecomunicações; livre oferta (sem restrições) de equipamentos terminais nos Estados-membros e entre Estados-membros, em concorrência com as administrações das telecomunicações; separação das actividades de regulamentação e de exploração das administrações das telecomunicações.
Das considerações e referências feitas, resulta clara a evolução no sentido da liberalização progressiva dos mercados de equipamentos e serviços de telecomunicações, bem como da separação entre as funções de exploração e as de fiscalização e normalização.

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Assim, bem andou o Governo ao apresentar à Assembleia da República a presente proposta de lei, que, definindo as bases gerais das telecomunicações, não impõe nenhum modelo rígido de organização do sector, mas pelo contrário, pretende não inviabilizar soluções alternativas consentâneas com a organização dos mercados e com as obrigações de serviço público.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Neste quadro, é tempo de, muito rapidamente, confrontar algumas das disposições constantes dos diplomas em discussão.
Desde já, convém lembrar que, enquanto a Proposta de Lei n.º 77/V se refere só às telecomunicações - porque em matéria de correios a situação está perfeitamente definida - os Projectos de Lei n.º 351/V e 352/V pretendem alargar o seu âmbito aos correios utilizando as disposições já em vigor, o que nos parece um acto inútil.
Se em alguns aspectos como definições gerais, classificação das telecomunicações, competência em matéria de superintendência e fiscalização das telecomunicações e da actividade dos operadores, separação entre as funções de normalização e fiscalização das de exploração e garantias de sigilo e protecção dos direitos dos cidadãos as soluções propostas são próximas e algumas vezes até coincidentes, noutras essencialmente técnicas, talvez seja possível uma aproximação, outras há a que atribuímos grande importância e em que a conflitualidade é total.
Trata-se da verdadeira opção política de fundo - abertura à iniciativa privada de alguns serviços.
Porém, enquanto para o PCP, em matéria de telecomunicações, tudo deve ser serviço público, para o PS deve ser quase tudo, para o Governo e o PSD e o Estado deve limitar as suas obrigações de serviço público às infra-estruturas e serviços considerados essenciais.
Na proposta do Governo é garantido um serviço público de telecomunicações, explorado em regime de monopólio pelo Estado, por pessoa colectiva de direito público ou por pessoa colectiva de direito privado.
Em regime de monopólio ficam a rede básica de telecomunicações e os serviços fundamentais, que compreendem os serviços fixos de telefone e telex e um serviço comutado de transmissões de dados, e abrem-se à iniciativa privada os serviços considerados complementares e os serviços de valor acrescentado. Esta é, de facto, a maior inovação num sector que, por todo o mundo moderno, caminha nesse sentido.
A exploração do serviço de telecomunicações complementares pode ser feito pelos operadores do serviço público ou por empresas de telecomunicações complementares devidamente licenciadas. Estas empresas terão que satisfazer requisitos de idoneidade e capacidade técnica e económico-financeira, a definir em regulamento de acesso à actividade. Nos títulos de licenciamento serão definidas as condições em que ficam autorizadas a actuar, bem como as infra-estruturas próprias que poderão instalar.
A prestação de serviços de valor acrescentado poderá ser feita pelos operadores de serviço público, pelo operadores de serviços complementares e ainda por qualquer pessoa singular ou colectiva, devidamente licenciadas em conformidade com o regulamento de acesso à actividade.
Porque estão o Governo e o Grupo Parlementar do PSD profundamente convencidos da evolução positiva que o sector experimentará com as soluções propostas, rejeitamos posições que nada têm a ver com a realidade de hoje, mas tão só com aspectos ideológicos ou de estratégia partidária.
Aproveitando o reconhecido dinamismo da iniciativa privada, mas reservando, ao mesmo tempo, para o Estado as infra-estruturas básicas e os serviços considerados fundamentais, justificados até por razões de segurança e de estratégia de desenvolvimento, cremos ter encontrado a situação de equilíbrio de que todos certamente beneficiarão.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo com a apresentação desta proposta de lei e o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata com a sua aprovação, dão mais um grande passo no sentido de preparar o País para o grande desafio de 1992.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Todos os que são sensíveis aos desafios da modernidade e do progresso devem, connosco, dar-lhe conteúdo útil.
O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata manifesta a sua disponibilidade para, em sede de especilidade, considerar os diferentes contributos e acolhê-los se daí resultarem benefícios para aquele texto legislativo, mas recordamos que o Governo e a maioria têm um único programa a cumprir....

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E que se chama Cavaco!

O Orador: - ... e ele estão obrigados por mandato do povo português, o que impede o nosso voto favorável aos Projectos de Lei n.ºs 351/V e 352/V.

Aplausos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para pedir pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Deputado Sérgio de Azevedo, começo por notar que, embora em jeito de declaração final, tenha referido a disponibilidade em aceitar aquilo que eventualmente considerem ser uma melhoria. No entanto, termina dizendo que não votará favoravelmente qualquer dos projectos alternativos apresentados, o que, à partida, inviabilizará logo, em grande parte, os conceitos que cada um enforma.

Vozes do PSD: - Façam melhor

O Orador: - De qualquer das formas, devo dizer, Sr. Deputado, que hesitei alguns segundos, embora só, em pedir-lhe qualquer tipo de esclarecimento e que só o faço porque me pareceu que o Sr. Deputado não estava a discutir o mesmo que nós ou, pelo menos, não estava dentro do espírito do documento inicial nem de acordo com a intervenção feita pelo Sr. Ministro.
O Sr. Deputado disse, várias vezes, que veio aqui discutir uma lei de bases das telecomunicações. Porém,

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o Sr. Ministro disse, em resposta a uma questão colocada por mim, que o que aqui se estava a discutir não era uma lei de bases das telecomunicações, mas sim - como então referiu e, aliás, aparece no texto que temos em nosso poder -, uma lei de bases de estabelecimento, gestão e exploração das infra-estruturas e serviços de telecomunicações.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Exactamente!

O Orador: - Uma vez que o Sr. Deputado veio aqui discutir a lei de bases das telecomunicações, talvez me possa responder à questão que coloquei ao Sr. Ministro e que não me foi respondida, a qual tinha a ver com algumas preocupações especialmente sentidas por mim e pelo meu grupo parlamentar em relação àquilo que poderá ser o futuro em termos de telecomunicações por satélite e televisão por cabo.
Por outro lado, uma vez que também o Sr. Deputado esteve, em termos do seu discurso, muito voltado para o futuro, para a investigação, para o desenvolvimento e para toda a problemática das novas tecnologias, queria que me dissesse como é que o Governo pretende garantir no futuro nomeadamente as verbas para a investigação e desenvolvimento, que actualmente são despendidas pelo sector e exclusivamente no âmbito da I & D e qual vai ser, também no futuro e no seu ponto de vista, a política de ligação dos operadores de telecomunicações às universidades e a outras instituições portuguesas vocacionadas para a área de investigação.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio de Azevedo.

O Sr. Sérgio de Azevedo (PSD): - Sr. Deputado Armando Vara, estranho que diga o que eu estava a discutir não era o mesmo que o senhor. Se assim pensou, pensou mal, o que acontece, frequentemente no Partido Socialista.

O Sr. Armando Vara (PS): - Não tanto como o senhor quer!

O Orador: - Normalmente o Partido Socialista tem um discurso de progresso, de desenvolvimento quando aparece em público e perante várias organizações da nossa sociedade e da actividade económica, e depois, na prática, sempre que há necessidade de o PS contribuir para soluções que ponham o Pais no trilho, digamos assim, abandona tudo isso. Ora foi isto que o PS fez hoje...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., não só através da intervenção da Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, como também do projecto que apresentou e das criticas que fez em relação à proposta de lei do Governo.
O Sr. Deputado estranhou que eu tivesse dito ou manifestado a disponibilidade total do nosso grupo parlamentar para, em sede de especialidade, aceitarmos em participar activamente nas discussões das propostas que queiram apresentar. Dizemos muito claramente que estamos dispostos a que elas constem da lei, desde que isso melhore o texto.
Agora, naturalmente, vocês, partidos da Oposição não podem exigir ao Partido Social-Democrata - que assumiu um compromisso com o povo português e que está contemplado no programa do Governo aprovado pela Assembleia da República - que vá abdicar que prometeu e aprovou quando discutiu o programa do Governo. É certo que estamos aqui para implementar o nosso programa e não os que foram apresentados ao povo português pelos partidos da Oposição, uma vez que este os rejeitou.

Aplausos do PS.

Quanto àquela pequena discrepância, àquele assunto menor relativo à diferença de designação que dei e à que deu o Sr. Ministro, devo dizer-lhe que se refugiou em aspectos que realmente revelam o tipo de preocupações que o PS tem acerca desta matéria.
Conforme pode verificar-se na proposta de lei o título é o que dela consta e não sou eu que o vou alterar. A linguagem que utilizei não foi talvez a mais conveniente, mas o Sr. Deputado, que está habituado a estas regras da Assembleia da República, sabe que a designação oficial está publicada no Diário da Assembleia da República.

Uma voz do PSD: - Pois claro!

O Orador: - Quanto à questão das verbas para a investigação, penso que a deve colocar - e perdeu uma grande oportunidade de o não ter feito - ao Sr. Ministro, que é o responsável pelo sector. Contudo, estamos convencidos de que, efectivamente, esta disponibilização vai acontecer de facto, porque este Governo tem manifestado, nesta como noutras áreas, um apoio muito grande à investigação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Como se viu na educação por exemplo!...

O Orador: - O Governo tem promovido a investigação e aumentou as verbas para o efeito.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Apreciamos hoje três diplomas que visam estabelecer as bases legais para a normalização e rentabilidade dos serviços de telecomunicações e comunicações.
Hoje são visíveis os progressos tecnológicos, nomeadamente na electrónica e nas telecomunicações, indústrias do futuro, e ao redor das quais se começaram a efectuar as reestruturações das diferentes actividades.
Para o PRD é urgente que se inicie o processo que contrarie a paralização interna na gestão das empresas, empresas estas que aguardam há cerca de dois anos a reformulação do sector, com especial incidência nos recursos humanos, onde a falta de formação profissional tem vindo a criar um visível mal-estar nos seus quadros e executivos, por não se vislumbrar hipóteses sérias e credíveis de valorização profissional.

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Interessa aqui recordar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, hoje, a nível da gestão de pessoal nos CTT e nos TLP é uma gestão mais de manutenção do que de operacionalidade.
Há quatro anos que os representantes da classe vêm propondo, face à necessidade verificada, a revisão de carreiras desde a parte executiva à parte de quadros das empresas e estas têm negado qualquer tipo de negociação por manifesta incapacidade de gestão, consequência de uma paralização interna.
Na parte de formação profissional a situação é idêntica. Não se tem em conta a evolução do sector e só funcionam cursos já existentes. Não há objectivos a curto prazo e a formação é o resultado de uma gestão corrente. Esta vertente é mais visível nos TLP do que nos CTT. Ninguém pode, a bem da verdade, estar de acordo com este quadro de paralisia.
A nível europeu, na Comunidade que hoje somos de facto e de direito integramos, também a importância deste sector é visível, e estudos recentemente publicados, tendo como base o conteúdo do «livro verde», publicado pela Comissão das Comunidades Europeias, apontam para que no final do século três quintos do emprego nos países da Comunidade se relacionarão de alguma forma com as telecomunicações e com as tecnologias de informação.
O espectro actual português contempla três operadores neste sector: os CTT, intervindo na área de correios e telecomunicações empregam cerca de 29 000 trabalhadores dos quais 11 000 se ocupam exclusivamente na área de telecomunicações.
Os TLP, representados por cerca de 12 000 trabalhadores, pelo seu volume de tráfego e equipamento são no espectro nacional a principal operadora, incidindo exclusivamente a sua acção na área da grande Lisboa e grande Porto, abrangendo respectivamente raios de 30 e 15 kms de acção.
A rádio Marconi, com apenas 1500 trabalhadores apresentam-se como a estrutura mais leve, mas não menos importante, face ao papel desempenhado nas ligações internacionais por cabo submarino e via satélite.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O número de trabalhadores, cerca de 43 000, exemplifica bem a importância e grandiosidade do sector, merecendo assim a atenção e responsabilidade dos órgãos governamentais.
A evolução verificada nos últimos anos, terá que necessariamente catapultar as nossas empresas para um mercado aberto e eficaz, sob pena de em 1993 ao nos vermos confrontados com um mercado europeu desenvolvido e modernizado, termos apenas como resposta empresas obsoletas de tecnologia e envelhecidas de recursos humanos. Seria, em nosso entendimento, fatal para o sector e para o País, que as empresas operadoras de telecomunicações continuem agarradas à preservação de um suposto monopólio, mantendo, no entanto, como obrigatória a estrutura básica da rede na posse exclusiva do Estado, mas incentivando os operadores à agressividade comercial, à sã concorrência de mercado, transformando o actual quadro de incapacidade e até de invontade, num quadro de eficácia, modernização e resposta imediata aos desafios europeus. É urgente que as empresas operadoras de telecomunicações se preparem para o mercado concorrencial, servindo melhor e mais barato e dando resposta eficaz às necessidades actuais do sector.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É assim que entendemos e defendemos a urgente reestruturacão do sector das telecomunicações, incidindo nesta acção a reconversão e modernização da tecnologia e a aproximação tão rápida quanto possível aos parâmetros europeus.
O aparecimento de um modelo menos rígido que permita a sua própria evolução, mais adaptada às diferentes situações e às diferentes épocas.
A liberalização dos serviços de telecomunicações não básicos ou de valor acrescentado, mantendo como afirmámos a estrutura básica na posse e domínio exclusivamente maioritário do Estado, a liberalização dos equipamentos terminais, com a necessária garantia de que nestas áreas, as operadoras devem continuar a prestar os seus serviços, ainda que concorrencialmente, mas de forma comercialmente agressiva.
Defenderemos, no entanto, a necessidade e importância da participação quer dos representantes dos trabalhadores, das operadoras, quer dos representantes dos utilizadores, que permita uma fiscalização activa e actuante integrados num órgão a formar, que analise propostas de medidas que tenham a ver com os mesmos e de uma forma geral e com o próprio sector.
É nesta área que não poderemos deixar de sublinhar e condenar a total ausência de preceitos específicos contidos nas propostas em apreço. Em nosso entendimento não se acautelam regalias e direitos dos trabalhadores anteriormente já consagrados. As regalias sociais já existentes poderão vir a ser postas em causa. À reestruturacão do sector e à introdução de novas e modernas tecnologias não é apresentado qualquer plano de reconversão dos trabalhadores que eventualmente venham a ser considerados excedentários, o que colocaria em grave risco grande número de profissionais que, impossibilitados de se promoverem com simultânea formação profissional, se veriam relegados para segundo plano e possivelmente impossibilitados de manter o seu posto de trabalho ou, pelo menos, verem valorizada a sua ascensão profissional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pelo que fica exposto estamos conscientes de que em sede de especialidade, várias serão as emendas ou alterações necessárias a introduzir para que, em definitivo, se encontre um texto abrangendo a problemática das telecomunicações, e comunicações, que vise melhorar o sector e reflicta a justa preocupação e necessidade de modernizar esta área de intervenção do País novo que somos e desejamos, a bem de Portugal e dos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD tudo fará, estará disponível e contribuirá para que, em sede de especialidade, esse objectivo seja atingido.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A presente proposta de lei, ao contrário do projecto do PS e do PCP, também hoje em debate, restringe-se ao sector das telecomunicações, abstraindo-se totalmente da actividade postal, facto tanto mais estranho quanto o programa do actual Governo escolheu como prioridade sectorial a constituição de uma empresa de capitais exclusivamente públicos que têm como objectivo a

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exploração da actividade postal em todo o território nacional em regime de monopólio.
O Governo no jeito da avestruz, procura não ver a realidade quer no citado Decreto-lei n.º 449/88 quer agora na apresentação desta proposta de lei, o que nos leva a concluir que no domínio da liberalização o Governo se restringe a alterações parcelares, furtando-se a inovações de carácter estrutural e geral, mesmo quando impostas pelas necessidades do mercado. Neste sector de actividade corre-se o risco, por omissão legislativa do Governo, de cair numa situação idêntica aquela que foi criada às «rádios locais», pelo que se impõe, com a maior urgência, um enquadramento legal no sentido de maior liberdade de acesso à actividade postal por parte dos operadores privados que proliferam no terreno. Seria estultícia pensar que as empresas privadas vão desaparecer só porque a lei as quer ignorar.
Na exposição de motivos da presente proposta de lei fala-se da Companhia Portuguesa Rádio Marconi como exemplo de uma empresa «com forte dose de capitais privados que respeita integralmente os interesses públicos, porque vinculado a um contrato de concessão». Referência particular infeliz, sobretudo porque consideramos precisamente que o caso da Marconi é juridicamente um equívoco e traduz uma política de mentalidade estatizante de que o actual Governo não se consegue libertar. Na realidade, o Estado, não obstante à composição do capital, reserva-se o direito de nomear o presidente e dois administradores, pela mão do Governo, por disposições estatutárias e das normas de concessão. Por outro lado, como accionista maioritário, através do IPE, nomeia os restantes dois administradores, o que é muito elucidativo de como uma empresa «com forte dose de capitais privados» é totalmente gerida e controlada pelo Estado, melhor dito, governamentalizada, situação aberrante face à lei comercial, aos legítimos interesses dos accionistas privados e à pretensa política de privatizações todos os dias alardeada pelo Primeiro-Ministro Cavaco Silva. Trata-se, com efeito, de uma propositada confusão entre a titularidade do capital e o regime de concessão quanto é reconhecido que este funciona de acordo com o interesse público independentemente da posição estatal no capital das empresas.
Aliás, seria bom saber desde já quais as verdadeiras intenções do Governo quanto ao futuro desta empresa. Para nós é absolutamente indispensável transferir a gestão pública actual da Marconi para uma verdadeira gestão privada, o que significa também a real privatização da empresa, mesmo que para tanto e uma vez mais seja necessário alterar o Decreto-Lei n.º 449/88 (delimitação dos sectores). Por outro lado, também é confusa a orientação governamental quanto ao futuro da empresa Marconi uma vez que recentemente o Sr. Ministro das Comunicações manifestou a intenção de «redefinir as fronteiras geográficas e tecnológicas entre a Marconi e os CTT no que se refere à prestação de serviços de telecomunicações no âmbito internacional».
Concordamos que o relacionamento entre a Marconi e o resto do sector das telecomunicações necessita de ser clarificado, para além do mais no interesse dos direitos dos accionistas privados. Os acordos actuais sobre a repartição das receitas deverão ser revistos com base em estudos globais do sector, por forma a garantir a viabilidade económica e financeira dos vários operadores sem penalizar os contribuintes e utentes. Registe-se que este aspecto é condição imprescindível para a garantia de resultados efectivos, sendo que na actual situação e naquela que é proposta na proposta de lei que estamos a debater tudo fica dependente das decisões do Governo.
No que se refere a infra-estruturas de telecomunicações (artigo 7.º) o projecto de lei manifesta uma clara intenção de definir pormenorizadamente o que compete em exclusivo aos operadores de serviço público de telecomunicações que, de acordo com o Decreto-Lei n.º 449/88, terão obrigatoriamente maioria de capitais públicos, ou seja, que se manterá obrigatoriamente estatizado. Por outro lado, no mesmo artigo 7.º permite-se uma grande discricionaridade quanto a autorizações excepcionais e a título precário de instalações de infra-estruturas por parte de empresas privadas. Não nos parece correcta esta solução, na medida em que não é motivadora da confiança do investidor privado no sector das telecomunicações que, aliás, em discursos de circunstância é apresentado como uma das preocupações do próprio Governo.
No conjunto do articulado, pese embora uma excessiva preocupação de definições tecnicistas da especialidade de engenharia de telecomunicações, não ficam claros os conceitos decisivos na economia do diploma. O que é a rede básica de telecomunicações? E o que são os serviços fundamentais? São os referidos no artigo 8.º n.º 2 e 3? Se assim é, ficamos sem saber o que é a rede básica, mas apenas algumas coisas que dela fazem parte.
Pasme-se: todo o edifício jurídico em que se desenvolverá o sistema de telecomunicações de Portugal será definido na lei - qual? - ou nos contratos de concessão!
Aliás, um aspecto importante é o de se saber se as definições técnicas baseadas no determinado estádio de evolução tecnológica, em mutação acelerada, serão suficientemente correctas e flexíveis para não se tornarem rapidamente obsoletas e ultrapassadas. Para uma lei de bases das telecomunicações que se pretende liberalizante, flexível a animada de um espírito de maiores níveis de concorrência e liberdade de mercado seria preferível ter optado por soluções de carácter mais definidoras de um quadro jurídico global sem preciosismos técnicos que só poderão redundar em polémica de interpretação tecnocrática dos conceitos que se pretendem definir e que poderão ser solucionados pela via administrativa e mais uma vez da discricionaridade governamental, como, aliás, reconheceu o Sr. Ministro Oliveira Martins na alocução inicial que hoje produziu.
Um outro aspecto negativo, para nós, CDS, nesta proposta de lei é o excessivo «planeamento do Estado» numa actividade que se pretende mais aberta ao mercado. Com efeito, no artigo 4.º relativo à tutela refere-se como atribuição do Estado (como sucede nos regimes socialistas) não só a definição das políticas gerais mas a imposição do «planeamento global do sector».
Este conceito de plano estatal obrigatório é retomado no artigo 5.º quando se estabelece a existência de um plano director das infra-estruturas de telecomunicações da exclusiva responsabilidade do Governo que também os operadores públicos ou privados de sistemas de radiodifusão. É manifestamente exagerado este intervencionismo estatal, tanto mais que no artigo 7.º se, define as infra-estruturas de telecomunicações de forma

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pormenorizada e exaustiva retirando às empresas qualquer autonomia do seu próprio desenvolvimento.
O artigo 20.º da proposta de lei é um autêntico disparate jurídico. Não só se afirma o que é óbvio - o título II - telecomunicações de uso público só se aplica às telecomunicações de uso público! - como naquilo em que pode ter qualquer sentido - título III - não tem alcance prático. Tem de ser, pois, extirpado para medida de saneamento do diploma.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como já referimos, a presente proposta de lei está intimamente ligada com o recente Decreto-Lei n.º 449/88, que continua a vedar à iniciativa privada o acesso a largos sectores da actividade económica, com particular destaque para o sector das comunicações. Aliás tem sido faseada a forma de intervenção por parte do Governo no sector das comunicações: lei dos sectores, lei de bases, alterações estatutárias e separação dos actuais operadores. Registe-se que nunca foi referida, como componente deste desenvolvimento, a questão da revisão constitucional, o que desde logo revela a intenção de manter a preponderância do papel do Estado na sociedade e em particular neste sector. É curioso notar que na anterior Lei n.º 46/77, de delimitação dos sectores, apenas se vedava o acesso de empresas privadas a comunicações por via postal, telefónica e telegráfica, conceito que nos parece menos limitativo da iniciativa privada.
Por outro lado, também é aparente a referência à possibilidade de associações de entidades públicas com empresas privadas, uma vez que se remete estas para meras prestadoras de meios financeiros necessários ao desenvolvimento das comunicações, não lhes concedendo quaisquer direitos de intervir na organização e gestão do sector, o qual continua, efectivamente, a ser dominado pelo Estado.
Será aceitável que uma lei de bases se abstenha de traçar qualquer modelo, ainda que tendencial, para a organização empresarial do sector que, conforme se disse, continuará a ser maioritariamente controlado pelo Estado? É importante para a compreensão dos objectivos visados pela presente proposta de lei que o Governo explicite as linhas essenciais de tão proclamada reforma estrutural do sector que pretende executar.
Concretamente, Sr. Ministro é indispensável esclarecer o seguinte:

a) Não reconhece o Governo que quanto maior for a concentração empresarial - independentemente da titularidade do capital dos operadores que desejamos privados -, maior será o nosso poder negociai para a modernização estratégica das telecomunicações em Portugal, tanto mais que se verifica a montante do sector uma tendência europeia para a concentração das indústrias de tecnologia avançada no sentido de uma redução de custos e conquistas de mercados globais?
b) Que vantagens advirão de uma proliferação de empresas de telecomunicações totalmente controladas pelo Estado (CTT, TLP, Marconi) quando nem sequer irão concorrer no mercado, pois cada uma detém o monopólio nas áreas de actuação? Assim, qual o objectivo visado com a separação das administrações dos CTT e dos TLP?
Significa essa opção o abandono da projectada criação de uma holding sectorial? Em caso negativo, como se explica que a proposta comece precisamente por se acabar com uma solução que, embora insuficiente, corresponde já a uma aproximação à ideia de holding, que é a existência de uma administração comum? Não será isto contraditório?
c) Tencionando o Governo, de acordo com o seu programa, autonomizar os serviços postais criando um operador público autónomo, e como pretende financiar os prejuízos elevadíssimos dos serviços postais? Existem estudos ou planos de acção para que se acautelem a eliminação destes prejuízos do sector postal ou pensa-se sobrecarregar o Orçamento do Estado com mais uma empresa pública à partida deficitária, mau grado o optimismo do Sr. Ministro hoje aqui manifestado?
d) Foi estudado o financiamento adequado das obrigações dos CTT quanto a pensões de reforma? Como pensa o Governo assegurar o financiamento das obrigações dos CTT quanto a pensões de reforma? Como pensa o Governo assegurar o financiamento das obrigações dos CTT quanto a pensões de reforma do seu pessoal? Existem cálculos actuariais actualizados?
e) Como pensa o Governo privatizar parte do capital dos TLP - se é que tem essa intenção... - sem definir previamente toda a problemática da organização dos operadores de serviço público de telecomunicações e das suas relações, designadamente financeiras, baseadas em sistemas mais ou menos arbitrários de repartição de receitas?
Toda esta problemática dos acordos actualmente existentes entre os CTT e os TLP, designadamente ao nível da repartição das receitas, é um aspecto fundamental para o desenvolvimento das telecomunicações em Portugal, designadamente nas regiões mais carenciadas, sendo necessário encontrar com urgência uma solução, pois sem ela muito dificilmente se poderá verificar a introdução de capital privado de risco em qualquer uma das empresas.
Por último, relativamente à anunciada estruturação do sector com base numa holding, há que questionar o Governo, antes de iniciar a reestruturaçâo e antes da introdução do capital privado, sobre as verdadeiras tarefas do domínio do planeamento que ficariam retidas nesta empresa holding e aquelas que seriam exercidas pelo Instituto das Comunicações de Portugal em nome do Estado e que constam do projecto de lei em apreço.
Neste domínio também não estamos esclarecidos como é que o Governo pretende ultrapassar os aspectos da concorrência, do abuso de posições dominantes de mercado e defesa dos legítimos interesses dos accionistas privados face à pretensa política de privatização do Governo.
A proposta de lei nada nos elucida sobre estas questões fulcrais para as telecomunicações. As respostas serão decisivas para a orientação do voto do nosso partido.
A manifesta falta de tempo impede-nos de entrar na apreciação dos projectos de lei do PS e do PCP, mas pela orientação que aqui ficou definida não será difícil descortinar qual a nossa posição sobre eles.
Termino, Sr. Ministro, recordando as suas próprias palavras: temos que tentar comandar os acontecimentos, de preferência a correr atrás deles. Não é boa prática que os estrangulamentos se produzam e as desadaptações se tornem gritantes para de seguida, as eliminar, disse V. Ex.ª hoje, e é o nosso lema.

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1500 I SÉRIE - NÚMERO 42

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o excesso de tempo utilizado pelo CDS foi por transferência.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao último orador, o Sr. Deputado Luís Roque, informo a Câmara de que foram votados na especialidade, nas respectivas comissões, as ratificações n.º 28/V, relativa ao Decreto-Lei n.º 214/88, de 17 de Junho, que regulamenta a lei orgânica dos Tribunais Judiciais, da iniciativa da Sr.ª Deputada Odete Santos e outros, do PCP, e n.ºs 36 e 38/V, relativas ao Decreto-Lei n.º 338/88, de 28 de Setembro, sobre a atribuição de alvarás e licenciamento de estações emissoras de radiodifusão sonora, respectivamente da iniciativa do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa e outros, do PCP, e do Sr. Deputado Jorge Lacão e outros, do PS.
Vai ainda ser lido um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Comissão de regimento e mandatos

De acordo com o solicitado no Ofício n.º 128 - Proc.º 1525 - 3.º Secção, do 10.º Juízo do Tribunal Civil da Comarca de Lisboa, de 20 de Janeiro de 1989, enviado à Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Mário Júlio Montalvão Machado, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar depoimento como testemunho no processo em causa.

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. Luis Roque (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Chegados a este momento do debate, é já possível tirar algumas conclusões.
A proposta de lei do Governo não considera o interesse nacional, limitando-se a considerar o sector das telecomunicações. Com tal atitude, demonstra o Governo a falta de vontade ou de capacidade de ver integralmente o sector, designadamente na sua componente de correios e serviços postais.
Mas o erro não é técnico, é uma opção claramente política.
A proposta de lei do Governo trata apenas dos sectores mais rentáveis e com mais apetência para o sector capitalista parasitário.
O sector das telecomunicações, muito rentável, esse sim, terá clientes certos, pois, como se vão servir das infra-estruturas já montadas pelas empresas públicas, infra-estruturas essas que são a parte mais onerosa do sistema de telecomunicações, ficam, de uma forma parasitária, a explorar um sector estratégico que devia ser preservado, no mínimo, por questões de independência e de defesa nacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como já aqui foi salientado, a proposta de lei vai contribuir para agravar as assimetrias litoral/interior, na medida em que o sector privado, tal como fizeram os ingleses nos TLP, vai investir em zonas rentáveis e não nas do interior, que, à partida, são zonas que não dão lucros.
Por outro lado, serviços como o telefone móvel terrestre, que hoje serve poucos utentes, é tratado como serviço complementar na proposta de lei do Governo, embora as perspectivas de futuro o considerem como um meio de comunicação de massas.
Além do mais, este meio, como o telefone marítimo e aeronáutico, vão servir-se da rede básica já implantada como suporte.
Acresce que, quer o projecto de lei do PS - que é bastante diferente do nosso, Sr. Deputado Rui Silva, não confunda uma coisa com a outra -, quer a proposta de lei do Governo, liberalizam a instalação do equipamento terminal, o que vai trazer como consequência o prejuízo do utente, que terá de pagar a assistência que hoje é gratuita.
Daí que o projecto de lei do PCP, no seu artigo 20.º, torne obrigatório o fornecimento, instalação e conservação pelos operadores de serviço público do primeiro telefone.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pensamos, finalmente, que é reforçando as actuais empresas, com uma gestão integrada do sector, dado o impacto da integração do Mercado Único e com vista à defesa dos interesses nacionais, que se prepara o futuro.
Assim, o PCP considera que as iniciativas em debate deviam ser objecto de uma apreciação mais atenta e aprofundada em sede de comissão, mesmo antes da votação na generalidade, viabilizando, desse modo, uma lei que corresponda à defesa deste importante sector estratégico, ou seja, que tenha em conta os interesses dos trabalhadores, dos utentes e do País.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo inscrições, está encerrado o debate da Proposta de Lei n.º 77/V e dos Projectos de Lei n.ºs 351/V (PS) e 352/V (PCP).
A próxima reunião terá lugar quinta-feira, dia 23, às 15 horas, com período de antes da ordem do dia e do período da ordem do dia constará a discussão dos Projectos de Lei n.º 303/V (PS), n.º 309/V (PCP), n.º 31 l/V (PCP) e n.º 320/V (PRD), que dizem respeito a pensões de velhice, invalidez e idade da reforma. Às 19 horas e 20 minutos terão lugar votações entre outras, as dos diplomas que hoje foram discutidos.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adriano Silva Pinto.
Amândio dos Santos Gomes.
António de Carvalho Martins.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Maria Ourique Mendes.
António Maria Pereira.

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António Mário Santos Coimbra.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
José de Almeida Cesário.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Rui Gomes da Silva.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António José Sanches Esteves.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
João Barroso Soares.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu Fernandes Esteves.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António José Monteiro Vidigal Amaro.
António Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Maria Luisa Amorim.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Armando de Carvalho Guerreiro Cunha.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Flausino José Pereira da Silva.
Gilberto Parca Madail.
Henrique Nascimento Rodrigues.
João Costa da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís da Silva Carvalho.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Alberto de Sousa Martins.
António Domingues Azevedo.
Carlos Manuel Martins Vale César.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Maria de Lourdes Hespanhol.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

Deputados Independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena Salema Roseta.

As REDACTORAS: Maria Leonor Ferreira - Maria Amélia Martins.

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DIÁRIO da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

AVISO

Por ordem superior e para constar, comunica-se que não serão aceites quaisquer originais destinados ao Diário da República desde que não tragam aposta a competente ordem de publicação, assinada e autenticada com selo branco.

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