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Quarta-feira, 26 de Abril de 1989
I Série - Número 69
DIÁRIO da assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
REUNIÃO SOLENE COMEMORATIVA DO 25 DE ABRIL
Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio
Apolónia Maria Pereira Teixeira
João Domingos F. de Abreu Salgado
SUMÁRIO
Às 12 horas e 20 minutos deu entrada na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Sr. Presidente da República, o Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, os secretários da Mesa, a comitiva do Presidente da República, o secretário-geral da Assembleia da República e o chefe-adjunto e os secretários do protocolo do Estado.
No hemiciclo encontravam-se já os Ministros, o Procurador--Geral da República, o Chefe do Estado-Mator-General das Forças Armadas, o Presidente do Supremo Tribunal Militar, o Provedor de Justiça, o alto-comissário contra a Corrupção, os Chefes dos Estados-Maiores dos três ramos das forças armadas, o presidente do Conselho Nacional do Plano, o presidente da Assembleia Regional da Madeira e o presidente do Governo Regional da Madeira, os conselheiros de Estado, o governador civil de Lisboa, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o comandante Naval do Continente, o comandante do Comando Operacional da Força Aérea e os comandantes-gerais da Guarda Nacional Republicana, da Guarda Fiscal e da Polícia de Segurança Pública.
Encontravam-se presentes nas tribunas e galenas o marechal António de Spínola, membros do Governo, o corpo diplomático, membros da direcção da Associação 25 de Abril e ex-conselheiros da Revolução, S. Ex.ª o Cardeal-Patriarca de Lisboa, acompanhado do seu secretário particular, e demais convidados.
Constituída a Mesa, na qual o Sr. Presidente da República tomou lugar à direita do Sr. Presidente da Assembleia da República, a Banda Nacional da Guarda Republicana, postada na Sala dos Passos Perdidos, executou o Hino Nacional.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro aberta a sessão.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Maria Pereira.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Basta.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Gilberto Parca Madail.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomei.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chencerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
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Partido Socialista (PS):
Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu F. Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Luísa Amorim.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa, da Costa.
Herminio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
Rui dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.
Deputados Independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Sr. Presidente da República, Sr.ª Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Excelências, Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: O XV aniversário da Revolução de Abril, que hoje celebramos, assume características próprias. Enaltecer hoje e sempre esta data é um dever de cidadania.
O 25 de Abril abriu as portas escancaradas, para uma vivência democrática. O que não admite ser esquecido. Lembrar este momento alto da nossa história constitui, para os Portugueses, mais do que um dever: é uma exigência consciente.
A Revolução de Abril foi um acto de democratização. Foi a expressão do desejo profundo, da vontade enraizada da Nação, de que todos os homens têm direito a dispor dos seus próprios destinos, a usufruir, por igual e em paz, dos frutos do desenvolvimento e o acesso aos bens prodigalizados pelo engenho humano.
Foi o grito da consciência e da forma de estar na vida dos Portugueses; foi o grito dos Portugueses à liberdade, à justiça e à solidariedade.
Queremos para cada ser humano as condições de realização pessoal, sem sujeições, no respeito pela sua cultura profunda, sem peias ou enquadramentos artificiais.
Sr.ª e Srs.: Passados quinze anos, continua a ser justamente merecida uma palavra de reconhecimento e de louvor aos que assumiram a iniciativa de tomar nas suas mãos a tarefa de varrer, para sempre, um regime sem alma. Entre eles, queremos particularmente realçar os Militares, que souberam realizar os anseios da Nação e que, com dignidade, quiseram integrar-se nos lugares que lhe cabem no regime democrático.
Aplausos gerais.
As comemorações do dia da Liberdade têm este ano, na Assembleia da República, uma forma diferente: para
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lhe dar uma frescura acrescida, para fugirmos à rotina que, inevitavelmente, iria dessensibilizando o seu significado; para evitar formas ritualizadas e vazias.
A Revolução de Abril pôs fim às guerras coloniais. Ressurgiram os países de língua oficial portuguesa do continente africano: livres, para trilharem os caminhos que desejam; para afirmarem a sua identidade; livres ainda, para a procura dos seus destinos.
Estamos na véspera de ver enterrados os restos do colonialismo em toda a África. E temos a esperança que a discriminação racial e o apartheid se encontrem no seu estertor final.
Este ano, e pela primeira vez, temos o prazer e a grande honra de associar às nossas comemorações a presença e a voz altamente qualificada de um representante dos países de expressão oficial portuguesa. Estados e Povos que têm a sua história, também ela, ligada à gesta lusitana e cuja independência está indesmentivelmente associada às raízes da Revolução portuguesa de 1974.
A distinta Presidente Carmen Pereira é o mais alto responsável da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, país com quem mantemos e cultivamos excelentes relações de cooperação e amizade, que ainda muito recentemente alcançaram, ao nível do Estado, pública consagração.
A Guiné-Bissau preside ao Grupo dos Cinco, pelo que, e com toda a propriedade, podemos também afirmar que temos igualmente connosco os presidentes das Assembleias representativas dos países que se exprimem na língua oficial portuguesa.
A Assembleia da República, ao cumprimentar V. Ex.ª, deseja fazer uma saudação fraterna ao povo da Guiné-Bissau. Ao mesmo tempo que lhe pedimos que seja intérprete do nosso sentimento de amizade junto dos Povos e Estados de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Angola e Moçambique...
Aplausos gerais.
..., assim como da nossa vontade de incrementar com eles as mais estreitas relações. A esta lista gostaria de poder acrescentar Timor-Leste. Empenhamo-nos para que seja possível dar ao povo de Timor a capacidade de se autodeterminar, de afirmar a sua identidade e de fazer a escolha dos seus destinos.
E com que alegria sabemos que este é, também, o entendimento dos países de língua oficial portuguesa.
Consciente de que é nos Parlamentos que se manifesta a expressão representativa do todo o País, a Assembleia da República, em consonância com o Sr. Presidente da República e com o Governo, está empenhada numa solução para Timor, de acordo com o Direito, as Normas Internacionais, e as decisões relevantes das Nações Unidas, e no respeito pelos direitos humanos.
Continuamos a trabalhar na possibilidade de uma delegação parlamentar se deslocar a Timor-Leste na convicção, e nas condições, de que uma tal iniciativa contribua para a resolução do problema.
Na raiz cultural comum, traduzida pela língua em que todos nos exprimimos, não podemos deixar de evocar também o Brasil, a grande Nação da América do Sul, a quem estamos ligados por longos e velhos laços de amizade e respeito.
Existem agora todas as condições para que uma Comunidade dos povos de expressão portuguesa vá tomando forma.
As boas relações políticas que hoje existem, o conhecimento aprofundado de uns e outros, os interesses recíprocos dentro do respeito mútuo, vão-nos inevitavelmente aproximando, com realismo, inteligência e determinação.
O desenvolvimento das relações de amizade e colaboração em todos os campos conduzirão a formas cada vez mais organizadas de contactos.
As potencialidades e virtualidades deste grande espaço cultural arrastam o estreitar da colaboração económica e social, a permuta de quadros e de especialistas, de experiências, técnicas e tecnologias, factores que, como sempre, são causas de engrandecimento.
É neste contexto que a Assembleia da República deseja promover um intercâmbio regular com os países de expressão oficial portuguesa.
Sr.ªs e Srs. Deputados, Excelências: Todos temos presente que o 25 de Abril, em liberdade, criou a democracia pluralista, que está consolidada.
Apeou mitos e esboroou falsos ídolos.
Constituímos um verdadeiro Estado Democrático, sustentado no imperativo da lei.
E agora, pelas várias partidas do Mundo, os caminhos da democratização impõem-se com uma força imparável. Não parece mais possível manter situações artificiais, voluntaristas, impostas, que não recolham a adesão da maioria dos cidadãos.
Foram ou vão caindo as teses dos que queriam fazer «homens novos», impor o progresso somente alicerçado na força das ideologias, ou no exclusivo primado das soluções e esquemas tecnocráticos ou pseudo-científicos.
Os que assim pensavam esqueciam-se que o Homem e as sociedades são bem mais complexos. Para os galvanizar não se podem desrespeitar ou distorcer os desejos e o querer dos indivíduos. O mesmo é dizer, privados da liberdade das suas vontades e dos seus quadros fundamentais de valores.
Esquecer a dimensão total do Homem, mesmo sob o pretexto de lhe trazer a felicidade, cedo ou tarde acabará por se mostrar empreitada vã.
As sociedades modernas são compostas de uma variedade de interesses e concepções diversas quanto à forma de encarar a solução dos seus problemas. São, pela sua própria natureza, pluralistas.
A instituição onde se pode e deve exprimir essa pluralidade de interesses e anseios é o Parlamento, sede da Representação Nacional.
É aí que se retratam as forças políticas significativas do País. Aí se exprimem, ora convergentes ora divergentes. É um lugar de diálogo, diálogo feito de vozes e sensibilidades diferentes, mas que, no entanto, tendem a conciliar-se quando estão em jogo questões de interesse fundamental.
Assim tem acontecido, entre nós, nos grandes quadros, designadamente na política relativa à colaboração de expressão portuguesa.
Assim também tem de ser no caminho do desenvolvimento dentro da Europa Comunitária.
Importa neste momento eticamente afirmar, que a conciliação é um fim a atingir por ser preferível à criação de tensões desnecessárias, sendo certo que nunca podem ser anuladas integralmente todas as divergências.
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Na ética da conciliação não podem ficar de lado a dimensão do interesse colectivo e o respeito supremo da vontade do Povo.
Cabe também ao Parlamento, uma- vez arejadas e discutidas as diferenças, colaborar na pedagogia das soluções encontradas.
É que viver em democracia é compreender o calor dos debates, necessário à expressão das diversas convicções. Porém; se do trabalho do Parlamento, ficasse- apenas o enunciado das diferenças; ter-se-ía dele uma ideia redutora e falseada.
A discussão é salutar; é o primeiro momento na construção das soluções.
Mas são estas o que importa reter e dar público conhecimento. Porque são elas que vão ditar os caminhos da sociedade.
Sr.ªs e Srs. Abril trouxe consigo a possibilidade do desenvolvimento e da integração nas Comunidades.
Celebramos este aniversário no meio de um, processo de Revisão Constitucional, que tem como objectivo primeiro, adequar a Lei Fundamental do País às necessidades do presente e, acima de tudo, às exigências do futuro. Não pode haver progresso quando se está tolhido por obstáculos insanáveis.
Impunha-se que a Constituição não fosse, ela própria, entrave ao desenvolvimento do Portugal Comunitário. Desenvolvimento que é o grande desafio de hoje exige uma modernização que nos coloque a um nível semelhante ao dos demais países europeus.
Galgar as disparidades substanciais que ainda persistem vai impor determinação e apego, o abandono de rotinas, alguns sacrifícios e obriga a uma educação para o futuro.
É um grande desafio. Está ao nosso alcance.
O Povo Português conta com um passado em que soube responder às grandes exigências. Sejamos, mais uma vez iguais a nós próprios.
0 desafio de hoje nem sequer tem comparação com outros, como os Descobrimentos, cujos quinhentos anos agora também comemoramos.
Mas aproveitemos os exemplos do passado para transportar para os dias de hoje a força de vontade, a clarividência, uma inteligente e consciente audácia,
a capacidade, de conjuntamente arquitectar e dar forma a um projecto,
isto é possível, hoje, em Democracia.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Vai dirigir-se à Câmara a Sr.ª Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau Sr.ª D. Carmem Pereira.
A Sr.ª Presidente da Assembleia Nacional Popular de Guiné-Bissau (Carmen Pereira): - S. Ex.ª Sr. Presidente da República Portuguesa, S. Ex.ª Sr. Presidente, da Assembleia da República; S. Ex.ª Sr. Primeiro-Ministro, S. Ex.ª Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: É com elevada honra e prazer que tomo hoje á palavra nesta Assembleia da República, símbolo da democracia reconquistada com o 25 de Abril, para em nome da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau vos transmitir a mensagem de amizade e de solidariedade do povo guineense e quero ainda aproveitar para agradecer a amabilidade do convite que me foi dirigido.
Que me seja permitido aproveitar o ensejo, para apresentar a S, Ex.ª o Sr. Dr. Mário Soares, Presidente da República Portuguesa, os melhores votos e as saudações amigas da S. Ex.ª o General João Bernardo Vieira, Presidente do Conselho de Estado da República da Guiné-Bissau.
A nossa presença nas comemorações do 15. º Aniversário da Revolução dos Cravos, oferece uma ocasião particular para prestar uma singela e profunda homenagem ao povo português, nosso aliado de todos os e de todos os sacrifícios.
Dizia Amílcar Cabral, líder imortal do povo guineense e grande amigo de Portugal que:
O nosso inimigo, não é o Povo Português, para nós, combatentes da liberdade das colónias portuguesas, este inimigo é o colonialismo português... 15to não é culpa do povo português que, em certo momento da história, soube mostrar o seu valor, a sua coragem, a sua capacidade e que, hoje mesmo, possui filhos capazes; filhos justos, filhos que querem também: reconquistar, as liberdades e a felicidade do seu Povo.
A liberdade dos nossos povos reencontrada, aliada à utilização da mesma língua, permite-nos hoje, mergulhar, ás raízes no passado, que apesar de algumas
vezes marcado por contradições, e conflitos, nos é comum, e aí buscar o húmus que alimente e fortaleça os laços de amizade que nos unem traduzindo-os numa
cooperação bilateral exemplar e mutuamente vantajosa.
Significa isto que o relacionamento entre, os nossos países deverá assumir uma, nova dimensão e obedecer à vontade política já manifesta de promovermos uma cooperação que corresponda ao grau de afinidade forjada ao longo de séculos de convívio comum.
Como exemplo disso lembramos as recentes comemorações do 4.º centenário da Cidade de Cacheu, marco histórico do primeiro encontro e de interpenetração das culturas guineense e portuguesa.
É igualmente prova dessa vontade, a visita ao nosso país de S.Ex.ª o Primeiro-Ministro de Portugal, Professor Dr. Aníbal Cavaco Silva, durante a qual foram assinados vários acordos que cobrem diversas áreas de grande importância para os vossos países, com particular realce, para o arranjo monetário e que testemunham da. mudança qualitativa que se operou na nossa cooperação- bilateral.
Esperamos que com a nova filosofia de cooperação que se instaurou entre os nossos países, Portugal irá contribuir de forma relevante, na presente conjuntura, para o desenvolvimento sócio-económico da Guiné-Bissau.
Sr. Presidente; Excelências; Srs. Deputados: A cooperação, entre os nossos países não se pode realizar à revelia, da actual conjuntura económica internacional.
Com efeito, a economia dos países em desenvolvimento; sobretudo dos menos avançados, caso da Guiné-Bissau, vem sendo afectada; pelos efeitos nocivos da actual ordem económica internacional.
Esta conjuntura internacional desfavorável, caracterizada por factores tais como a deterioração continua dos termos de troca; o peso crescente do endividamento e a diminuição da ajuda pública ao desenvolvimento, atada a uma estratégia de desenvolvimento inadequada, na década do pós-independência conduziram à degradação crescente da nossa economia.
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Perante esta difícil situação, o nosso governo iniciou a implementação de um programa de ajustamento estrutural com o objectivo de minorar o impacto negativo dos referidos factores, corrigir os desequilíbrios macroeconómicos e criar assim as condições que conduzam ao crescimento auto-sustentato da economia.
Esta política tem vindo a dar resultados positivos, particularmente no que respeita ao aumento da produção e das exportações, o abastecimento do mercado interno, o aumento do produto interno bruto e a redução do défice da balança de pagamentos.
Srs. Presidentes, Minhas Senhoras, Meus Senhores: É com viva satisfação que constatamos o surgimento de um consenso universal quanto aos efeitos positivos das mudanças qualitativas que se operam actualmente nas relações internacionais.
A racionalidade, o bom senso e as aspirações profundas do Homem a uma vida de paz, justiça e progresso não são certamente estranhos a estas tendências que transmitem um cunho peculiar a este fim de milénio.
O amplo e exaltante clamor de alegria que tem feito eco aos progressos que se vêm registando no campo do desarmamento, da resolução dos conflitos regionais e, de um modo geral, no clima político mundial, é a expressão clara da esperança que anima os Homens e Mulheres de todas as latitudes e fundamenta a consciência e a firmeza dos esforços colectivos tendentes a definir um mundo melhor.
O culminar em Dezembro último do processo negociai entre Angola, Cuba e a África do Sul, sob a medição dos Estados Unidos da América, com a assinatura dos acordos de Nova Iorque sobre o Sudoeste Africano foi, neste contexto, unanimemente aplaudido pela comunidade das Nações como ilustração eloquente do prevalecimento da razão e do diálogo sobre os radicalismos e as intransigências de outrora.
Foi assim que a Humanidade também saudou o desencadeamento, em l de Abril deste ano, do processo de implementação do plano das Nações Unidas para a independência da Namíbia.
Embora acontecimentos preocupantes tenham desde então ensombrado de certo modo o cenário político daquela região, suscitando interrogações sobre as possibilidades reais de salvaguarda dos frágeis equilíbrios conseguidos através dos vários compromissos que balizaram as negociações quadripartidas ao longo do ano de 1988, continuamos confiantes no êxito final das justas reivindicações do povo namíbio à autodeterminação e independência.
Na linha do papel que vem desempenhando, estamos convictos que a ONU - eixo fundamental em torno do qual se articula o plano sobre a Namíbia, aliás concebido e adoptado sob os seus auspícios - saberá velar, utilizando para o efeito todos os meios políticos e jurídicos ao seu alcance, pelo cumprimento integral das medidas que visam assegurar a transição pacífica daquele território para a independência.
Não poderíamos deixar de salientar neste contexto a acção de primeira ordem desempenhada neste processo pela República Popular de Angola e saudar a sua coragem, lucidez e compreensão clara dos grandes desafios colocados à África Austral, ao continente africano e ao mundo.
O empenho e a abnegação do povo angolano irmão não terão sido vãos, porquanto permitem hoje vislumbrar novas e animadoras perspectivas de paz naquela região.
Gostaríamos também de manifestar a nossa firme solidariedade ao povo irmão de Moçambique no seu esforço de Reconstrução Nacional e no seu combate aos actos de desestabilização e destruição levados a cabo pelos bandidos armados apoiados pelo regime racista de Pretória.
Estamos convictos de que a eliminação definitiva do apartheid a que, em última instância, cabe a responsabilidade da situação de guerra, tensão e instabilidade que reina no cone sul do continente africano será brevemente uma realidade e que vencerão na África do Sul as forças da liberdade, democracia e justiça social.
Pairando ainda sobre ele uma cortina de silêncio Timor Leste continua afastado da corrente positiva de diálogo e concertação que levou, nos últimos anos, a progressos substanciais na via da afirmação dos direitos dos povos a dispor livre e soberanamente do seu destino.
Das vozes que se têm levantado em condenação à violação dos direitos mais elementares do povo daquele território, figura a do Portugal democrático empenhado a assumir a plenitude das suas responsabilidades de potência administrante legal de Timor Leste.
Os cinco países africanos de língua oficial portuguesa, reunidos em Bissau na Cimeira de 1988, manifestaram o seu apreço pela firme posição de Portugal em relação a este território, encorajando-o a prosseguir na busca de soluções que garantam a salvaguarda dos interesses legítimos e a integridade do povo de Timor Leste.
Saudamos esta atitude de Portugal que honra e dignifica este país amigo e a que este aerópago - a Assembleia da República - tem servido de palco privilegiado.
Srs. Deputados, por ocasião da cimeira de Bissau deixámos inequivocamente expressa a vontade dos nossos povos de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe em estreitar as relações com o povo português que aqui tão dignamente representais.
Permitam-me que expresse o meu reconhecimento pelo modo como há bem pouco tempo vós, os representantes do povo amigo de Portugal, destes a vossa confirmação a um acordo assinado entre os governos de Portugal, e do meu país, prova do apoio unânime de todas as forças políticas em aprofundar o relacionamento entre os nossos povos.
Sr. Presidente da Assembleia da República, neste lugar, onde estão reunidos os eleitos das forças políticas que representam todo o povo português, queremos em nome do povo guineense, render uma profunda homenagem ao povo português que compreendendo a evolução irreversível da História, decidiu percorrer com os nossos povos, um novo caminho de paz, liberdade e amizade.
Que seja longa e firme a amizade entre os nossos povos.
Aplausos gerais de pé.
O Sr. Presidente: - Por direito próprio, vai usar da palavra S. Ex.ª o Sr. Presidente da República.
O Sr. Presidente da República: - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.ª Presidente da Assembleia
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Nacional Popular da Guiné-Bissau, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Membros do Governo, Srs.- Embaixadores, Srs. Deputados, Sr. Cardeal Patriarca, Eminência: Comemoramos hoje o XV Aniversário do 25 de Abril, com a plena consciência e o legítimo orgulho de pertencermos a uma Pátria de homens livres; de vivermos num país que se rege pelos princípios da democracia pluralista e da eminente dignidade da pessoa humana; de constituirmos uma Nação prestigiada e respeitada no mundo; de sermos um Povo colectivamente empenhado na construção de um futuro melhor, que desejamos seja de progresso e bem-estar em que a solidariedade e a justiça social, a cooperação internacional e a paz permitam, a todos, beneficiar das espantosas descobertas científicas e das inovações tecnológicas que estão a transformar profundamente a vida, à escala do planeta, nesta etapa final do século XX.
A todos os que tomaram possível o Portugal de hoje, livre e democrático, dirijo, como Presidente da República, uma saudação calorosa e sentida.
Aplausos gerais.
A todos eles é devida homenagem: aos jovens e corajosos «capitães de Abril», que derrubaram a mais velha ditadura da Europa.
Aplausos gerais de pé.
Aos resistentes, que nunca vacilaram perante a repressão e sempre acreditaram no restabelecimento da Democracia; ao Povo anónimo, que nunca aceitou a ditadura e que durante tantos anos sofreu a opressão, na sombra e no silêncio, mas sempre inconformado, e que na Primavera de 1974, _ veio espontaneamente para `a rua aclamar, de cravos na mão, a liberdade reconquistada; a todos aqueles, enfim; que ato longo destes quinze anos, que hoje se completam, contribuição para a construção e consolidação da sociedade democrática, aberta, aberta, tolerante e pluralista, em que hoje vivemos. Uma palavra de solidariedade e de respeito é devida, igualmente, aos nosso irmãos africanos - aqui representados, simbolicamente, pela Ilustre Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, país que preside, neste momento, ao grupo dos cinco que, na sua luta contra o colonialismo, sempre souberam distinguir o regime ditatorial, que combatiam, do povo português, que sempre consideraram aliado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O 25 de Abril terá sido, porventura, das derradeiras revoluções europeias de um ciclo iniciado há duzentos anos com a grande Revolução Francesa. Também ele foi feito em nome da liberdade, da igualdade, da fraternidade e do inalienável direito dos homens a tornarem-se cidadãos e a decidirem sobre o seu destino colectivo, como Nação.
Também ele conheceu desvios ao espírito original e sofreu os impulsos contraditórios da tentação restauracionista e da tentação totalitária. Finalmente, porém, foi o ideal democrático pluralista que prevaleceu - e
venceu - na fidelidade ao espirito inicial do 25 de Abril.
Quinze anos constituem um período curto numa História multissecular como é a nossa. Mas se é verdade que a História - como ensinou alguém - «é um processo em constante movimento com o horizonte em expansão, caracterizado pela novidade e pela criação incessante», haveremos de reconhecer que o 25 de Abril - foi fértil- em movimento, inovação e criatividade, e imprimiu já as suas marcas indeléveis, que hão-se perdurar no futuro, rasgando novos e fecundos horizontes a Portugal e aos portugueses.
O balanço, necessariamente sintético, que podemos fazer, com objectividade, destes quinze anos tão intensos de vida democrática é, sem contestação possível, amplamente positivo: a democratização da sociedade portuguesa e a consolidação das suas instituições políticas; a descolonização dos territórios africanos e o advento de cinco novas nações de língua oficial portuguesa; o fim do isolamento internacional e a reconquista do prestígio de Portugal no Mundo; o processo de adesão à Comunidade Europeia; a constituição e consolidação do poder local democrático e das autonomias regionais; o desenvolvimento progressivo da cooperação com os novos países africanos de língua portuguesa, baseada na igualdade, no respeito mútuo e na reciprocidade de vantagens; a emergência de uma vida cultural intensa, original, criativa e como tal reconhecida no estrangeiro; a afirmação de uma comunidade cientifica muito activa e consciente das responsabilidades que lhe cabem na modernização e transformação que o progresso do País exige enfim, o aparecimento de uma juventude reivindicativa do papel que lhe compete como, principal, protagonista da mudança em que a sociedade portuguesa está empenhada.
Aplausos gerais.
Não se trata, naturalmente, de fazer um balanço exaustivo nem, muito menos, idílico. Mas tão só de afirmar, com objectividade, repito, uma linha de rumo, indiscutível, apesar dos acertos e desacertos inevitáveis de uma tão complexa caminhada. Basta percorrer Portugal de lés a lés, com olhos abertos, para compreender até que ponto a face do Pais sé transformou profundamente com o 25 de Abril, e para melhor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vivemos, hoje, um tempo de renovadas, esperanças e de estimulantes apostas. Temos razões pára confiar no futuro. Contudo, a democracia, que nos rasgou os horizontes, é um regime de transparência e de verdade. Não devemos, por isso mesmo ignorar a outra face da realidade nem escamotear os problemas concretos que continuam a preocupar-nos e que precisamos de saber enfrentar e resolver com urgência e determinação.
É verdade que subsistem, em Portugal, - como todos os responsáveis políticos reconhecem - enormes desigualdades e ainda significativas manchas de pobreza. É essencial, portanto, que nos punhamos de acordo quanto a um projecto nacional para erradiar, emprazo razoável, umas e outras.
Aplausos gerais.
É verdade que, tal como em muitas outras zonas do globo, conhecemos as ameaças de um desenvolvimento urbano e industrial não controlado, da perigosa degradação do meio ambiente em que vivemos nas grandes cidades e da exploração, por vezes irracional, de alguns dos nossos recursos vitais. Uma estratégia nacional de desenvolvimento - como tantas vezes tenho referido - deve levar em conta as exigências ecológicas e ser inspirada por uma preocupação clara de justiça social.
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E verdade, também, que a economia portuguesa sofre ainda de uma grande vulnerabilidade estrutural, longe de estar vencida, e que pode pôr em causa o êxito da nossa plena integração no processo de internacionalização em curso, a nível europeu e a nível mundial. Ainda há poucos anos tivemos de impor pesados sacrifícios para corrigir desequilíbrios económicos insustentáveis. Será agora, nos próximos anos, que o desafio essencial da modernização económica terá de ser ganho. Importa, por isso, pôr-mo-nos de acordo - agentes económicos e Estado - por forma a defender da melhor maneira os interesses portugueses, contribuindo nomeadamente para a formação de grupos económicos nacionais, sólidos e competitivos.
É verdade, finalmente, que ainda não conseguimos vencer, apesar dos esforços desenvolvidos, a decisiva batalha da educação, da investigação científica e da cultura, lato sensu, que constitui, em todas as sociedades democráticas modernas, o caminho privilegiado de acesso à liberdade, à emancipação e à autonomia dos indivíduos e dos povos.
A constatação realista de tais factos - ou de outros, menos agradáveis - não deve, porém, desencorajarmos nem justificar atitudes de descrença, de resignação ou de pessimismo.
Temos hoje, em Portugal, condições, capacidades e recursos para vencer os desafios do progresso e do desenvolvimento. A qualidade humana dos portugueses é, reconhecidamente, excelente. Somos uma Nação livre e responsável, um Estado de Direito, dotado de instituições democráticas que, quando postas à prova, têm funcionado. A democracia é uma construção permanente e o poder político democrático é sempre, por definição, limitado. Temos, por isso, com serenidade, de saber confiar em nós próprios e no futuro da nossa Pátria, de cuja vocação e destino nos devemos sentir orgulhosos.
Para tanto, precisamos de aprofundar a nossa vivência democrática - designadamente através da defesa de uma comunicação social livre e responsável - e de enraizar...
Aplausos gerais.
.. na sociedade portuguesa uma cultura de diálogo, de tolerância e de concertação, que amplie e consolide, com a flexibilidade necessária, as áreas de consenso, sempre que esteja em causa a prossecução e realização de grandes objectivos nacionais.
Aplausos gerais.
Assim, importa incentivar e aperfeiçoar, por todos os meios, as condições que assegurem uma participação crescente e alargada dos cidadãos na vida política, social e cultural, tornando-os cada vez mais conscientes da necessidade de exercerem um controlo democrático efectivo sobre as grandes transformações que se estão a operar, em todos os domínios da vida colectiva, à escala nacional e à escala europeia.
Temos de saber retirar os maiores benefícios - e evitar, quanto possível, os aspectos negativos, que são previsíveis - do grande movimento internacional em que estamos activamente a participar no quadro da Comunidade Europeia. Reside aqui um desafio imenso em relação ao qual é urgente consciencializar os portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Liberdade, igualdade, segurança, prosperidade, concórdia nacional e bem-estar, são princípios e objectivos que só poderemos salvaguardar e alcançar no quadro de uma democracia desenvolvida - política, económica, social e cultural - na qual todos se sintam cidadãos, sujeitos e participantes, não apenas no plano nacional, consolidando os alicerces da República moderna em que Portugal tem por meta transformar-se, mas também à escala internacional, contribuindo activa e empenhadamente pára a construção da Europa Comunitária que se prepara para a grande viragem de 1993, com a aplicação efectiva do Acto Único Europeu.
É uma meta que tem de ser atingida com pleno êxito e para a qual temos, diante de nós, um curto prazo de preparação. Não devemos, por isso, perder tempo nem desperdiçar energias. O objectivo é claro e pode ser resumido numa simples frase: um Portugal seguro da sua identidade, activo e competitivo numa Europa Unida.
Parafraseando um grande estadista americano - o Presidente Kennedy - diria aos portugueses: não perguntem o que o vosso país pode fazer por vós, perguntem o que todos vós podeis fazer pelo vosso país; não perguntem o que a Europa vai fazer por nós, perguntem o que nós, cidadãos portugueses e europeus, poderemos fazer por Portugal integrado numa Europa, capaz de se tornar, cada vez mais, a vanguarda da liberdade, do progresso e do bem-estar.
Aplausos gerais.
Não desejo significar com isto, que o Estado deva abdicar das suas obrigações inalienáveis. Bem pelo contrário: deve estar atento, activo e interveniente na definição dos grandes objectivos do desenvolvimento, na selecção e aproveitamento dos novos instrumentos postos à nossa disposição pela Comunidade, na identificação, estímulo e reforço dos agentes da mudança, na viabilização interna das condições de aceleração do processo de abertura da economia e da sociedade para o exterior.
Significa, isso sim, que, a par da reorganização do Estado e das responsabilidades que lhe incumbem, e à sociedade civil, às suas organizações, associações e aos seus agentes, que compete, igualmente, dar os, impulsos vitais no sentido do progresso e da mudança, com imaginação, criatividade e capacidade de iniciativa, em suma, com o espírito aberto à inovação, à transformação gradual e às profundas reformas necessárias.
É preciso, entretanto, que nos entendamos sobre a Europa que estamos a construir. O Acto Único Europeu não reclama apenas dos seus signatários a definição e a dinamização de estratégias económicas. A Europa sem barreiras do grande Mercado Único não pode circunscrever-se à liberdade de comprar e de vender, de investir e de consumir. Tem de ir mais longe: tem de ser também uma Europa política e uma Europa social - a Europa dos cidadãos e um espaço de solidariedade - capaz de encontrar, na diversidade e interpenetração das suas diferentes culturas, a coesão e a força que hão-de projectar no mundo a sua unidade.
É nessa Europa do futuro que o Portugal de Abril está vitalmente empenhado, no reforço da sua identidade própria e procurando, ao mesmo tempo, estreitar os laços que cada vez mais o ligam a uma vasta
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comunidade linguística, dispersa pelos cinco continentes, da qual fazem parte o Brasil e os novos países africanos de expressão portuguesa - também eles interessados em que a aposta europeia seja vencida por Portugal e possa vir a beneficiar o seu desenvolvimento e a sua inserção nos processos de transformação social, económica, tecnológica e política que o Mundo está a viver, rumo ao século XXI.
É esse capital precioso, que se traduz numa multiplicidade de relações e numa pluralidade de interesses que importa tornar compatíveis, que faz de Portugal - Nação multissecular pioneira na descoberta do vasto Mundo - um interlocutor hoje indispensável, respeitado e prestigiado, na cena internacional.
Também isso ficámos a dever ao 25 de Abril, que hoje comemoramos, voltados essencialmente para o
futuro e confiantes de que teremos a capacidade e a vontade política necessárias para não perder a grande
e histórica oportunidade que de novo nos bate à porta, como Nação.
Aplausos gerais, de pé.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro encerrada a sessão.
A Banda da Guarda Nacional Republicana executou de novo o Hino Nacional.
Realizou-se então o cortejo de saída, composto pelas mesmas individualidades da entrada, tendo o Sr. Presidente da República saudado o corpo diplomático com uma vénia ao passar diante da respectiva tribuna.
Eram 13 horas e 10 minutos.
Faltaram a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Américo de Sequeira. António Fernandes Ribeiro.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Carlos Alberto Pinto.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Ercília Domingues MP. Ribeiro da Silva.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Flausino José Pereira da Silva.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Bota.
Leonardo Eugénio Ribeiro de Almeida.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Rui Gomes da Silva.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António Domingues Azevedo.
António Miguel de Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins Vale César.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
João Rui Gaspar de Almeida.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Maria Ilda Costa Figueiredo. Maria de Lourdes Hespanhol.
Partido Renovador Democrático (PRD):
José Carlos Pereira Lilaia. Natália de Oliveira Correia.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Deputados Independentes:
Carlos Mattos Chaves de Macedo.
Maria Helena Salema Roseta.
A REDACTORA: Cacilda Nordeste.
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DIÁRIO da Assembleia da República
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