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Sexta-feira, 23 de Junho de 1989 I Série - Número 95

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2." SESSÃO LEGISLATIVA (1988.1989)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE JUNHO DE 1989

Presidente: Ex.mª Sr.ª Maria Manuela Aguiar Moreira

Secretários: Ex.mºs Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos P. Basto da Mota Torres
Cláudio José dos Santos Perchelro
Daniel Abílio Ferreira Bastos.

SUMÁRIO

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Ordem do dia (1.• parte). - Procedeu-se à apreciação do relatório anual sobre a situação do País em matéria de segurança interna e a actividade desenvolvida pelas forças e serviços de segurança (ano de 1988), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Silveira Godinho), os Srs, Deputados Herculano Pombo (Os Verdes), José Manuel Mendes (PCP). Jorge Lacão (PS), Carlos Encarnação e Mário Raposo (PSD), Narana Coissoró (CDS), Pais de Sousa (PSD) e Marques Júnior (PRD).
Antes de ordem do dia. - Deu-se conta dos requerimentos, das respostas a alguns outros e do projecto de deliberação n. º 49/V entrados na Mesa.
O Sr. Deputado Lemos Damião (PSD), a propósito do papel da cidade de Guimarães na fundação de Portugal, elogiou a população da cidade e a acção do Governo naquela região.
O Sr. Deputado Carlos César (PS) congratulou-se com a visita do Sr. Presidente da República aos Açores, no âmbito da presidência aberta. No final respondeu a pedidos de esclarecimento e deu explicações ao Sr. Deputado Ourique Mendes (PSD), que também exerceu o direito de defesa da honra.
A Sr. º Deputada Ilda Figueiredo (PCP) abordou questões relativas à zona metropolitana do Porto, ao que se associou o Sr. Deputado Barbosa da Costa (PRD).
O Sr. Deputado Barbosa da Costa (PRD) teceu considerações acerca da extracção de caulino em Barqueiros, ao que se associou o Sr. Deputado José Manuel Mendes (PCP).
O Sr. Deputado Herculano Pombo (Os Verdes) chamou. a atenção para os prejuízos que sofreram os agricultores dos concelhos de Chaves e Valpaços, devido a fortes trovoadas, ao que se associou o Sr. Deputado João Teixeira (PSD).

O Sr. Deputado José Mota (PS) abordou a problemática do comércio de têxteis, tendo em conta o mercado único: No fim respondeu a pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Basílio Horta (CDS) e deu explicações ao Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD). que usou da palavra para exercer o direito de defesa da consideração. .
O Sr. Deputado António Filipe (PCP) referiu-se aos resultados da prova geral de acesso ao ensino superior e criticou a política de educação do Governo.
Ordem do dia (2.º parte). - Sob. a forma de interpelação à Mesa, os Srs. Deputados Raul Brito (PS), Carlos Encarnação (PSD), Rui Silva (PRD). Jorge Lemos (PCP) e Narana Coissoró (CDS) solicitaram. que a Mesa diligenciasse no sentido de obter informações sobre a situação de estudantes de Timor Leste refugiados nas embaixadas de alguns Estados em Jacarta.
Após apreciação. do Decreto-Lei n. º 139/89, de 28 de Abril, que altera o Decreto-Lei n. º 357/75, de 8 de Julho, relativo à protecção ao relevo natural, solo arável e revestimento vegetal - ratificação n.º' 72 (Os Verdes, -PRD e independentes) e 73 (PCP) -, foram rejeitados projectos de resolução de recusa de ratificação do diploma em debate, apresentados por Os Verdes e pelo PCP. Intervieram no debate, a diverso, título, além do Sr. Secretário de Estado da Agricultura (Álvaro Amaro), os Srs. Deputados Herculano Pombo (Os Verdes), Natália Correia (PRD), Luís Capoulas (PSD), Rogério Brito (PCP), João Maçãs (PSD), Barbosa da Costa (PRD). João Soares e António Campos (PS) e Vasco Miguel (PSD).
A proposta de lei n. º 91/V, que concede ao Governo autorização legislativa para aprovar o regime jurídico das infracções fiscais, foi aprovada em votação final global.
A Sr. º Presidente encerrou a sessão eram 10 horas e 35 minutos.

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A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando Carvalho Guerreiro Cunha.
Armando Lopes Correia Costa.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Tato Diogo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Pereira Batista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos da Silva e Sousa.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Gilberto Parca Madaíl.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Humberto Pires Lopes.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montai vão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

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Partido. Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto 'Marques de Oliveira e Silva.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António' Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins dó Vaie César.
Edite Fátima Marréiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helder Oliveira dos Santos Filipe.
Jaime José Matos da Gama
João Barroso Soares.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia: .
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Cosia Catarino.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos
Júlio Francisco Mirarida Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria tio Céu F. Oliveira Esteves.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Rúi 'do Nascimento Rabaça Vieira.

Partido Comunista Português (PCP): '

Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe Gaião, Rodrigues.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota:
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves. do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Júlio José Antunes:
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Maria Odete Santos.

Partido Renovador. Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Deputados Independentes:

Carlos Mattos Chaves Macedo.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

A Sr.ª Presidente:- Srs. Deputados; vamos iniciar os nossos trabalhos com a apreciação do relatório anual sobre a situação do Pais em matéria' de segurança interna e a actividade desenvolvida pelas forças e serviços de segurança (ano de 1988).
Está inscrito, para pedir esclarecimentos - ao Sr. Ministro da Administração Interna, o Sr. Deputado Herculano Pombo.
Tem à palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.º Presidente, se me permitisse aguardava que houvesse condições na Sala que permitissem o exercício audível do meu direito ao uso da palavra.

A Sr. e Presidente: - Sr. Deputado, há realmente alguns Srs. Deputados que ainda não se sentaram más julgo que o ruído 'não ,é maior do que o habitual.
Solicito, no entanto, aos Srs. Deputados que façam o favor de se sentar.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Obrigado, Sr.ª Presidente.
Sr.ª Presidente, Sr.ºs Deputadas, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Apresentou V. Ex.º à Assembleia da República aquilo que poderíamos denominar como o relatório genérico sobre segurança interna. .
Digo genérico porque V.Ex.ª apresentou-o por escrito e na intervenção que fez permitiu-se ler partes do relatório mas não teve o cuidado de aportar novos dados; novos pormenores, para além daqueles que dele constam e que são manifestamente poucos. Teve, por outro lado, o cuidado de dizer que, não se esperasse

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deste relatório histórias obscuras sobre espionagem e relatos mais ou menos empolgantes, sobre perseguições policiais e outros filmes do género.
Não era, obviamente, essa a parte que esperávamos ver aqui exposta durante a sua intervenção, mas devo confessar que não esperávamos também tanta generalidade, tão poucos dados concretos de forma a impedir-nos de fazer uma avaliação mais profunda de uma questão que tem a ver com a segurança de todos nós.
De qualquer modo, uma das afirmações constantes do relatório é a de que, felizmente, ao que parece, a criminalidade em Portugal não tem subido, facto com que o Governo se congratula.
É claro que todos nos congratulamos com o facto de a criminalidade não ter subido desmesuradamente. No entanto, isso é apresentado como uma grande conquista, uma conquista que fica a dever-se à capacidade de acção do Governo. É como se disséssemos: enfim, temos a nossa pequena criminalidade de estimação e é assim que a vamos manter durante os próximos anos.
Contesto este conceito porque penso que o interesse em mantermos forças de segurança reside na procura da diminuição, até à eliminação, se possível, dos índices de criminalidade e não na sua congelação ad eternum, ou seja, em manter este tipo de criminalidade à portuguesa que, apesar de tudo, vai matando, vai ferindo, vai roubando e vai criando insegurança, que não é tão pouca assim.
Se analisarmos detalhadamente os dados que constam das diversas alíneas do relatório vemos que, frequentemente, fala-se em subidas - as percentagens são pequenas - mas quando chegamos a questões como a do fogo posto - questão que lhe quero colocar muito concretamente -, sobretudo a do fogo posto em matas e florestas, constatam, V. Ex.ª e o Governo, através do relatório que nos entregam, que, no ano anterior, se verificou um decréscimo acentuado dos incêndios criminosos em florestas e em searas.
É este dado, Sr. Ministro, que quero contestar frontalmente. Em primeiro lugar, não foi fornecido aos deputados, nem ao país, qualquer estatística sobre incêndios florestais ocorridos no ano passado. Os dados que temos - e temos o direito, como o Sr. Ministro sabe, de os termos o mais actualizados possível - são de 1986, obtidos com muito custo, e de 1987, conseguidos com redobrado custo.
Empenhámo-nos, pessoalmente, em ter esses dados, através de requerimentos, através de consultas aos responsáveis. Foram-nos fornecidos, recentemente, os dados de 1987 e verificamos, pasme-se,...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado lembro-lhe que já excedeu os três minutos de que dispunha para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna. Peco-lhe que termine.

O Orador: -- Sr.ª Presidente, solicitava-lhe...

A Sr.ª Presidente: - Há, no entanto, como sabe, uma tolerância de dois minutos.

O Orador: - Terminarei dentro dessa tolerância, Sr.ª Presidente.
Como dizia, verificamos que, nesses dados, apresenta-se uma descida na criminalidade em fogos postos, que baixa de valores de quatro para dois, mas
as causas desconhecidas dos incêndios florestais sobem drasticamente até aos 927o do total.
Disto outra coisa não se pode inferir senão que as forças policiais não têm agido com a ligeireza e o discernimento necessário à obtenção de dados que permitam responder às insinuações que são feitas em cada caso de incêndio, nomeadamente as que comandantes dos bombeiros fazem a incêndios criminosos. No entanto, segundo os dados fornecidos, os incêndios criminosos representam apenas 2% do total, enquanto as causas desconhecidas representam 92% do total.
Isto não prova qualquer diminuição dos incêndios, a única diminuição que isto prova é a da actuação policial e a da actuação da justiça, o que lamentamos e gostaríamos de ver contestado.
Outra questão que aqui quero levantar é a da actuação da autoridade marítima. Sabemos todos que a autoridade marítima não tem tido meios - disso se queixa - para a protecção dos nosso recursos, da nossa Zona Económica Exclusiva.
Diz-se no relatório que a autoridade marítima fez no ano passado 539 inspecções a navios mercantes. Se tivermos em consideração que este número é semelhante ao número de navios mercantes que passa, por dia, nas nossas costas - nela passam, por dia, entre 400 a 500 navios mercantes - verificamos que o número de inspecções realizadas durante o ano de 1988 - 1 para 300 - é um número perfeitamente ridículo.
Vemos também que as ocorrências de poluição detectadas - apenas 88 - ficam imensamente aquém das poluições que todos conhecemos pois são divulgadas pela comunicação social todos os dias, e, mesmo assim, não o são todas...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª esgotou o tempo de que dispunha para pedir esclarecimentos. Poderá intervir posteriormente no debate.

O Orador: - Termino, Sr.ª Presidente, pedindo ao Sr. Ministro que, se tiver tempo, esclareça algumas questões relacionadas com o Serviço de Estrangeiros e de Fronteiras, tal como a que aqui foi referida, em tempo oportuno, do enclausuramento injustificado de três cidadãos a bordo de um navio, durante vários dias, em condições infra-humanas, em território português, bem como a injustificada demora na resolução do problema.
Para terminar, Sr. Ministro, peco-lhe que esclareça esta Câmara em que condições, com que efectivos, a pedido de quem e com que objectivos é que a Guarda Nacional Republicana cercou a população de Barqueiros nos dias que passaram, embora a situação esteja ultrapassada, felizmente, com a tolerância da população..

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Silveira Godinho): - Sr. Deputado Herculano Pombo, começarei por responder à última pergunta que teve a amabilidade de me fazer.
Como sabe, não foi feito qualquer cerco à população de Barqueiros na medida em que as patrulhas que estiveram em Barqueiros anteontem e ontem se limitavam a uma patrulha de quatro membros da GNR, num jeep. Não considero que isso seja um cerco a nada nem a ninguém.

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Como teve ocasião , de referir, a situação está ultrapassada pelo que tanto. o início da sua pergunta, relativamente à qual não há qualquer razão para a afirmação que fez, como, a , sua parte final, em que reconhece estar ultrapassada uma situação que não, chegou a existir, tornam desnecessária,. em minha opinião, qualquer resposta mais concreta.
Quanto ao problema relacionado. com o Serviço de Estrangeiros e de Fronteiras penso que o Sr. Deputado está também enganado. Os três cidadãos não estiveram enclausurados em território nacional visto que se encontravam no navio e não entraram mesmo em território nacional no .primeiro episódio que ocorreu ...
. Houve um segundo. episódio, de que provavelmente, também tem conhecimento, em que o tratamento foi idêntico na medida em :que as pessoas não chegaram a sair do navio e foram devolvidas, nesse mesmo navio, ao porto onde tinham embarcado.
Não houve qualquer actuação deselegante, ilegal ou
contra a regulamentação. existente por parte do Serviço de Estrangeiros e de Fronteiras.
Relativamente à questão do fogo posto tenho a dizer-lhe que as estatísticas que referiu são da Direcção-Geral de Florestas que, como, sabe, não depende do Ministério da Justiça nem do Ministério da Administração Interna. No entanto, as estatísticas de que dispomos corroboram essas afirmações. O número. de casos de queixas de fogos postos ou de- suspeitas, de fogos postos, por parte da GNR, entidade que tem a seu cargo o patrulhamento das zonas florestais, sobretudo no período do Verão; tem vindo a. Diminuir e, nos últimos nove anos, a sua média foi de 11 % . No ano passado, repito, esse número, em relação aos casos totais, foi de 6,4%: Estes- dados- confirmam os dados da Policia Judiciária, que estão referidos no relatório, por comparação com o ano anterior.
Devo dizer-lhe que a preocupação de evitar os casos de incêndios com origem criminosa tem sido,.desde.há dois anos, uma:, preocupação grande do Governo de tal maneira que, nas acções .de planeamento das, campanhas contra os fogos florestais, que .se fazem antes da- chamada época de início dos fogos florestais; tem havido uma colaboração não apenas da- Polícia Judiciária e da GNR mas também dos magistrados do Ministério Público. O mesmo aconteceu este ano nas reuniões de preparação dessa campanha e esperamos que, por força desse planeamento e dessa acção de coordenação; o número de casos de suspeita de fogo posto venha a diminuir de novo.
De qualquer maneira, esses casos são encaminhados para a Polícia Judiciária, depois para os Tribunais e, portanto, têm uma sequência normal.. Discordo, pois, da afirmação que o. Sr. Deputado fez de que .tem havido- incúria, por parte do Governo,- no tratamento dessa causa preocupante de fogos florestais.
Quanto à sua referência inicial de que estamos satisfeitos com a nossa criminalidade, digamos estrutural, não corresponde à realidade. Na parte final, das afirmações que aqui fiz ontem, referi que temos um optimismo moderado, mas prudente, quanto, ao futuro. Claro que o nosso objectivo é anular a criminalidade e as suas causas. Por isso mesmo referi 'também que o Governo tomou a: decisão de criar uma comissão para analisar as causas da delinquência, na tentativa de prevenir essa origem de criminalidade. Querermos; no entanto;. anular totalmente a criminalidade e as suas causas é, infelizmente, um desejo irreal. Não estamos

contentes com, a nossa criminalidade de estimação; o .nosso desejo- é baixa-la: :Temos, .porém, de ser realistas- è de ver também ' o que .se passa à nossa volta pois não vivemos num mundo isolado. Infelizmente, não será, pois, possível anular totalmente a criminalidade.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr., Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): _ Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dá Administração Interna; Sr. Secretário de Estado da Agricultura: A intervenção que o Sr. Ministro produziu ontem, na abertura do presente debate, mantém-se em consonância com o relatório que nós qualificamos devago, impreciso, incaracterístico e, a vários níveis, insuficiente.
O que não deverá ser um relatório? Certamente que não deverá ser uma mera colagem de estatísticas desconexas, de apreciações parcelares, de auto-elogios, de afirmações- superficiais, de descrições de legislação.
Contrapontualmente, questiono: o que deverá ser um relatório? Penso que, .seguramente, se deverá responder: uma apreciação fundamentada. da situação do País em matéria de segurança interna; com. indicadores precisos sobre a evolução dos segmentos de criminalidade, com apreciação rigorosa do dispositivo existente para .dar resposta aos perigos vindo do exterior . e do território com apreciação da situação das forças de segurança, com alusão aos factos relevantes decorrentes da crescente internacionalização a que se assiste.
A nosso ver, o relatório, em análise paira alhures, não se detém em nenhum destes elementos determinantes, e se dele alguma coisa, se pode extrair é a conclusão de que procede a um diagnóstico que, em nosso entender, não corresponde à situação efectiva; real, do País.
Por um lado substima os factores decorrentes da evolução externa e reproduz, sobre eles, uma, postura de secretismo. Nada ou quase fiada conhecemos, na Câmara, mesmo em sede de comissão, mesmo' no grupo muito restrito de deputados que, 'de alguma maneira, são especialistas na matéria, sobre a evolução real daqueles que são ,os factores condicionantes de natureza externa.
Por outro lado, também o relatório não avalia, como séria desejável, de desagregadamente, os factores dos diversos tipos de criminalidade. Substima, por exemplo - e corri particular gravidade, `com particular distância -, tudo quanto se prende com a criminalidade económica; em 'relação à qual o Sr. Ministro pôde, ontem, tecer algumas considerações de carácter extremamente genérico mas sobre a qual ignoramos as acções de facto empreendidas e o resultado delas emergente.
Cresce a privatização da segurança dos cidadãos; sem o controlo devido. É inquietante verificar que a psicose securitária tem levado à formação,' tantas vezes, à margem da lei, outras tantas coincidindo apenas parcelarmente com a lei, de grupos de segurança privada que, seguramente; não deixam de ser, no contexto do Estado democrático, uma aberração, sobretudo se entendidos nos termos exactos em que têm estado a operar.

O Governo desestabiliza a situação das forças de segurança .e não apetrecha as :suas missões. Temos, por exemplo; a informação de que se volta agora a nomear

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oficiais do Exército para funções no interior da Polícia, à revelia da corrente claramente civilista que se impunha desde a Lei de Segurança Interna e mesmo em face do preconizado Estatuto da PSP, o que não pode deixar de merecer, da nossa parte, um veemente protesto.
Das duas, uma: ou se continua a proclamar que os agentes da PSP não estão preparados para se autogerirem, o que é grave porque por exemplo, nós também poderíamos dizer, mutatis mutandis, que o Executivo não está preparado para se autogerir nem para governar o País e que o Ministério da Administração Interna ainda é inepto para o que dele se exige, ou então, se aceitamos que o caminho é aquele que está previsto na legislação existente, não faz sentido regredir desta forma, com estas características, a uma situação que, de todo em todo, se entendeu não ser desejável nem correcta.
O Governo escamoteia ainda as consequências negativas - e tantas, tantas são - da aplicação de certas soluções concretas do Código de Processo Penal, adiando as reformas necessárias.
A formulação do relatório numa óptica claramente securitista, ignorando, por inteiro, as vertentes que têm a ver com o panorama da justiça, não pode deixar de merecer desta bancada não apenas completo distanciamento, não apenas surpresa - apesar de tudo há razões para surpresa - mas, naturalmente, uma crítica severa.
A equipa governativa deixa agravar as crises dos tribunais e da justiça, coisa que também se não vê referida e importaria conhecer, porque, sem ela, não é possível ter uma visão global e informada sobre qual é a realidade em que nos inserimos.
A evolução do País, entre a data da apresentação do relatório e este momento exacto em que aqui o discutimos perante a Câmara, confirma as observações pesadas que acabo sumariamente de enunciar e que são, no essencial, aquelas que o PCP vem fazendo, desde há tempo, sem encontrar qualquer adequado som de retorno.
Qual é a situação real do País em matéria de segurança interna? A que deflui do relatório insípido apresentado a todos nós, da intervenção tecnocratizante, fluida, vaga, do Sr. Ministro da Administração Interna, Dr. Silveira Godinho? Ou aquela que se extrai da alocução enervada do Sr. Primeiro-Ministro ao país...

Uma voz do PCP: - Bem perguntado!...

O Orador: - ... a propósito dos acontecimentos ocorridos na Praça do Comércio com os agentes da PSP? Seguramente mais na segunda do que nas primeiras, ou não fora o Sr. Primeiro-Ministro o chefe de um Governo e, como tal, a primeira e principal das faces da sua política, má e desastrosa.
Qual é, efectivamente, a situação real? É Portugal o paraíso róseo para que apontam as palavras que acabámos de ouvir por parte do Executivo? É Portugal um país que, de escalada em escalada, vê enegrecidas as tintas do seu próprio escuro quadro nesta matéria?
Importará que o Governo dê uma resposta. A nossa opinião é clara, temo-la dito. O Estado não está desarmado, mas urge que ponha todos os seus mecanismos em funcionamento desobstruído para dar réplica pronta
àquelas que forem ameaças sensíveis, reais, e não imaginárias ou hipotéticas, que possam dirigir-se aos cidadãos e ao país no seu conjunto.
Neste quadro, Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, não faz sentido discutir, à revelia da consideração do que consideramos elementar, ou seja, de que a garantia da segurança interna tornou nevrálgica a questão do sindicalismo policial.
Ao contrário do que afirma o Sr. Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, entendemos dever combater as concepções militarizadas das forças de segurança, todas aquelas que apontem para uma PSP sob mão militar e que intentem a progressão de uma visão da problemática que a prática vem revelando incomportável e que os aquisitivos processos de conhecimento, à escala europeia, vão revelando não ser coonestável.
Da nossa parte, os agentes da PSP devem ter garantidos os exercícios sindicais na mais ampla grelha possível, de acordo com o quadro constitucional e com os interesses legítimos de defesa dos cidadãos e do Estado; não pode conceber-se um elenco de agentes da PSP manietados de instrumentos essenciais de defesa do seu estatuto de trabalhadores, do seu estatuto de classe; não pode afagar-se uma situação tão anómala como aquela em que vivemos, que já faz pairar a ameaça, que o Sr. Ministro decerto não ignora, de uma qualquer tomada de posição internacional, em Lisboa, organizada e congregada, para clamar: Meus Senhores, nesses países da CEE que tanto louvam, aquilo que acontece não tem nada a ver com o que está a acontecer em Portugal, que é muito pior.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A garantia do sindicalismo policial entendemo-la como um factor indispensável ao exercício de uma democracia plena e, também, como uma componente inarredável da segurança interna.
Não basta, Sr. Ministro, a propósito dos agentes da PSP, onde quer que se situem na escala hierárquica, produzir discursos que redundem em elogios ou distribuir medalhas.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ah! Ainda bem!

O Orador: - Naturalmente que poderá haver lugar a distribuição de medalhas, mas entendemos, sobretudo, que há lugar à consideração das bases remuneratórias e das condições de trabalho de cidadãos portugueses que não devem ser feridos por uma qualquer capitis deminuto desproporcionada e que devem exercer, quanto possível na plenitude, os seus direitos.
Menos medalhas, pois, Sr. Ministro! Menos discurso flatulento e, sem ambiguidades, mais acções no sentido de criar quadros conscientes, capazes de defender a democracia em todas as suas múltiplas faces quotidianas.
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: De tudo quanto acabamos de advogar decorre uma consideração que não pode deixar de ser claramente negativa do relatório apresentado pelo Governo em matéria de segurança interna.
Concluimos dizendo que, em face do juízo enunciado, uma vez mais, na Câmara, pelo PCP, se justifica por inteiro que, de imediato, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

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encete um ciclo de diligências tendentes a aprofundar o conhecimento em duas áreas: A primeira, relativamente aos compromissos assumidos pelo Estado português no plano externo, designadamente no âmbito do grupo TREVI - conheço uma notícia, publicada nos jornais do dia 12 de Maio, que nos lança várias interrogações às quais importaria contrapor esclarecimento cabal, por parte de quem tem direito e dever de o prestar, o Governo; a segunda, quanto à diagnose que importa empreender, até ao fim, em torno da situação e das carências da PSP, da GNR, 'da Guarda Fiscal, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, ou seja, das forças de segurança no seu conjunto, porque, sem a atenção devida aos problemas internos de cada um destes núcleos; é óbvio que a segurança interna em Portugal não será aquilo para que constitucionalmente está destinada e poderá ser uma entorce extremamente. grave na anatomia - que pretendemos saudável - do Estado democrático.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A apreciação, pela segunda vez, nesta Câmara, de um relatório relativo à actividade do Ministério da Administração Interna e, portanto, ao cerne dos problemas de segurança interna no País, deveria poder ser considerado como um momento, mais dó que um simples ritual, para cumprir uma determinada disposição legal.
.Mas para que assim pudesse ser, para que não estivéssemos aqui, eventualmente, a cumprir um mero ritual, seria necessário, desde logo, que o relatório apresentado à Assembleia da República procurasse ser, mais do que um simples texto descritivo, um texto que problematizasse as questões essenciais no domínio da segurança interna e, com isso, suscitasse a reflexão da Câmara e, portanto, a própria atenção do País para os problemas essenciais, que uma sociedade seguramente sempre tem em domínio tão sensível, como aqueles. que afectam a vida normal dos cidadãos e a paz no interior. da comunidade:
Porém, nem o relatório, nem o próprio discurso aqui ontem formulado pelo Sr. Ministro da Administração Interna, mostraram dever ser esse o caminho. Aliás, o discurso do Sr. Ministro não passou de ser uma simples reprodução do conteúdo do relatório sem avançar, significativamente, qualquer elemento novo ou qualquer visão prospectiva dos problemas da segurança interna.
Dir-se-á, numa visão estreita das coisas, que apreciar o relatório não passaria de um balanço acerca de um 'conjunto de elementos nele consignados num determinado limite temporal.
Não entendemos assim. Um relatório deve ter por base, naturalmente, a descrição de elementos essenciais à compreensão de uma determinada situação, mas, para além disso, deve reflectir as linhas de força de uma determinada estratégia de actuação. E o que ora se verifica, e designadamente se verificou na intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna, é que essas linhas de força estiveram ausentes e, portanto, a base para Ema reflexão profunda também está muito
mitigada.

Gostaria, todavia, de procurar formular algumas considerações: em primeiro lugar, de reconhecer que vivendo; como vivemos, numa sociedade democrática, natural é que os limites, ou melhor, os níveis de consensualidade no âmbito de uma sociedade como a nossa, tendam a prevalecer sobre os factores de tensão e de contradição interna no interior da comunidade. E, neste sentido também, sendo desejável, há que registar a existência de um clima =podemos dizer razoavelmente tranquilo na sociedade portuguesa, o que é motivo' para todos nos podermos congratular, na medida em que princípios essenciais do Estado democrático, estando presentes na vivência de todos os dias, que é aquela que afecta os cidadãos do nosso país, correspondem e contribuem para este relativo clima de concórdia nacional, que não poderá deixar de ter reflexos positivos rio ambiente da segurança interna.

Mas reconhecendo isto como um valor, relativamente ao, qual todos devemos poder e saber, partilhar, não ficamos a olhar para os problemas de segurança interna como se estivéssemos a olhar. para um lago de águas tranquilas,. satisfeitos como nada de preocupante pudesse passar-se sob essa superfície aparentemente lisa.

Efectivamente, muitos são os problemas, alguns com dimensão verdadeiramente institucional para os quais não sé conhece, com segurança, o ponto de vista do Governo, a começar pelo facto de, sendo dever governamental ouvir todos os ' partidos da Oposição, não apenas ao. abrigo dos dispositivos consignados no estatuto da Oposição, mas também ao abrigo .de um comando específico situado ao nível da Lei de Segurança Interna,. o Governo - tem de dizer-se - não tem dado cumprimento. a esta disposição e, portanto, aquilo que deveria ser um diálogo constante e profundo com todos os partidos da oposição sobre os domínios mais diversificados que afectam a problemática da segurança interna, não tem sido feito. E não pode escamotear-se este facto apenas porque, num determinado momento, houve os contactos conhecidos entre o Governo è o Partido Socialista para uma questão específica- relativa ao estatuto da PSP. Com efeito, essa é uma questão diferente e apenas assim se verificou porque o Governo e o partido que o apoia sabem que não podem prescindir de um consenso com maioria qualificada nesta Câmara para resolver a questão dos direitos associativos dos agentes policiais.

Porém, não basta que o Governo procure ouvir o partido A ou o partido B apenas quando é necessária a formação de maiorias qualificadas para determinados efeitos. Muito para além disso, é necessário que o Governo estabeleça, como regra da sua própria conduta, uma audição regular a todas as formações políticas com assento parlamentar com a condição da criação de consensos essenciais para que o tal clima de concórdia à volta, de um tema tão essencial para o Estado democrático, como o da segurança interna, possa coexistir num clima - como sublinhei - de relativa consensualidade entre todos os portugueses e, portanto, também, desejavelmente, entre todas as formações políticas.

Mas porque o Governo. não adoptou este critério, nem aprofundou, como já referi, suficientemente o relatório, nem. foi, também, suficientemente problematizante na intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna terei agora que levantar algumas questões para que possam ainda ter resposta neste debate.

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Assim, em matéria que respeita à situação das Polícias, o relatório refere o alto nível de complexidade das formações policiais em Portugal: umas dependem do Ministério da Administração Interna, outras do Ministério da Justiça, outras, ainda, do Ministério das Finanças e, portanto, um grau de complexidade evidente nas formas de coordenação das diversas forças policiais em Portugal.
E porque assim é de facto, há que registar, desde logo, uma ausência, do nosso ponto de vista preocupante, quanto ao plano de coordenação das forças e serviços de segurança.
Com efeito, o Governo anuncia para breve a aprovação do plano de coordenação das forças e serviços, mas efectivamente, tal plano ainda não existe e, volto a sublinhar, acerca dele nunca o Governo entendeu oportuno trocar impressões com os partidos políticos com assento parlamentar, o que é em si mesmo, também, uma omissão cuja gravidade aqui registo.
Mas, se esse nível de complexidade e essa inexistência, ainda, do plano de coordenação nos levantam preocupações, elas também subsistem quando sabemos que certas reformas institucionais deveriam estar em posição de muito maior adiantamento e, todavia, elas parecem subsistir num relativo marasmo.
Concretizando: o Sr. Ministro da Administração Interna e o próprio relatório referem-se à existência, no que diz respeito às relações entre a Guarda Fiscal e o Serviço de Estrangeiros, de um protocolo que visa fazer a transferência das atribuições da Guarda Fiscal para o Serviço de Estrangeiros em matéria de fiscalização e controlo de fronteiras, e tudo deveria estar concluído justamente na data limite que é a da plena confirmação do Mercado Interno comunitário. Mas quando o Serviço de Estrangeiros já leva quatro ou cinco anos de vida e este processo de transferência se afigura ser tão lento, tão lento (tendo podido já estar há muito concluído, ainda está por concluir e, pelos vistos, por um prazo ainda relativamente distante) era talvez oportuno que o Sr. Ministro aqui fizesse considerações sobre as razões desta relativa inércia na passagem de competências da Guarda Fiscal para o Serviço de Estrangeiros.
E porque estamos a falar do problema das fronteiras portuguesas e porque a este título se tem falado na questão do défice de segurança que resultará do alargamento do espaço comunitário, é também necessário que o Sr. Ministro da Administração Interna nos diga quais são os reforços que estão a ser previstos para dar maior eficácia ao controlo das fronteiras externas da Comunidade no que diz respeito às fronteiras portuguesas que estabelecem essa própria vertente externa comunitária para que não aconteça que Portugal se transforme, como muitas e respeitáveis autoridades se preocupam com o facto, numa espécie de plataforma giratória de movimentos cuja ilicitude é patente, designadamente, por exemplo, no que se refere ao tráfico da droga.
É absolutamente necessário que Portugal tome todas as medidas cautelares para que se não transforme numa placa giratória da circulação da droga entre outros Continentes e o Continente Europeu.
Mas, para o efeito, talvez as fronteiras externas portuguesas devessem estar a ser equipadas, designadamente ao nível de equipamento de civis, para controlo bem mais eficaz do que aquele que actualmente é possível.
Esta questão do equipamento das fronteiras portuguesas há muito tempo que está suscitada ao Governo, designadamente há muito tempo que foi levantada aqui, na Assembleia da República, pelo Director da Polícia Judiciária e, todavia, não parece, até ao momento também, ter havido resposta positiva para esta questão.
E já que invoquei a Polícia Judiciária, permita-se--me também, a este propósito, fazer uma crítica frontal ao Governo pelo facto - eu diria verdadeiramente escandaloso - de há quatro anos, Sr. Ministro da Administração Interna, o Governo ter prometido a apresentação da lei orgânica da Polícia Judiciária e continuarmos à espera da proposta de lei. Dir-me-á que não é do foro do seu ministério, mas, sim, do Ministério da Justiça. Isso, todavia, não desculpabilizará o Governo de que faz parte sobre esta grave omissão porque a lei orgânica da Polícia Judiciária traz consigo a resposta para problemas importantíssimos no domínio da especialização das acções de polícia.
Com efeito, nós precisamos saber qual a especialização efectiva que no combate à criminalidade, designadamente à criminalidade organizada, vai ter a Polícia Judiciária em Portugal para podermos avaliar se é correcto ou incorrecto o plano de expansão territorial dessa mesma Polícia e com isto sabermos como se vai adequar o próprio grau de especialização das outras polícias relativamente à actividade da própria Polícia Judiciária. E como ocorre que todas elas, após a aprovação do novo Código do Processo Penal, têm participação activa nos domínios da investigação criminal, não responder com um plano global e coerente a estas dúvidas é continuar a deixar em situação de omissão problemas importantíssimos como são os da participação policial ao nível da investigação criminal em Portugal.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, V. Ex.ª acaba de esgotar o tempo global do seu partido. Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou procurar terminar, Sr.ª Presidente.
E por isso também lhe direi, Sr. Ministro, que esta questão tem de ser, aqui, muito mais profundamente tratada, como profundamente tratada deveria ter sido da sua parte, e infelizmente não o foi, a questão que se refere ao problema da Polícia de Segurança Pública.
Não basta dizer que estamos agora a reflectir exclusivamente sobre o relatório...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa tem de cumprir os tempos que foram atribuídos a cada partido e, portanto, terá de lhe retirar a palavra se V. Ex.ª não terminar rapidamente.

O Orador: - Vou procurar concluir o meu pensamento, tentando evitar que a Sr.ª Presidente tenha de chegar a esse limite.
Sr. Ministro da Administração Interna, dir-lhe-ei, muito brevemente, que é exigível da sua parte que nos dê aqui uma explicação cabal sobre o que foi feito já e o que não foi feito em matéria de preparação das condições estatutárias de autonomização integral da Polícia de Segurança Pública relativamente às Forças Armadas. É uma questão essencial, como é uma questão essencial que o Sr. Ministro também responda pela forma como estão a decorrer o aproveitamento e as

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formas de recrutamento ao nível da Escola Superior de Polícia. Com efeito, tem sido. alvo de muitas criticas da nossa parte ó facto da não utilização adequada da Escola Superior de Policia para a preparação dos quadros policiais com muito maior celeridade e aproveitamento para todos os envolvidos nesta questão.

Finalmente, com a tolerância da Sr. B Presidente e com isto me calarei - desejamos chamar a atenção do Sr. Ministro da Administração Interna para mais
uma grave omissão. É que o Governo não demonstrou, afinal de contas, prioridade no agendamento da proposta relativa, ao regime disciplinar da Polícia. de Segu
rança Pública, e porque ainda o não fez é muito. difícil admitir que ainda nesta sessão legislativa possamos fazer a aprovação definitiva desse diploma. Mais uma
grave omissão governamental para a qual o Sr. Ministro terá de dar aqui explicações, ou seja, explicar-nos porque não fez desta questão uma questão politicamente prioritária e, ainda hoje, neste momento, estamos sem poder agendá-la devido à inércia governamental.

Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: - O PS já não dispõe de tempo para responder. No entanto, a Mesa foi informada de que tanto o PSD como o CDS cedem dois minutos do tempo de que dispõem para que o Sr. Deputado Jorge Lacão possa responder aos pedidos de. esclarecimento que lhe irão ser formulados.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, não resisto a fazer um. comentário- breve à intervenção que produziu. E isto pela simples razão de que a intervenção do Sr. Deputado é emblemática no sentido de que o PS não sabe gerir o seu tempo.

Vozes do PS: - Não diga!

O Orador: - Ora, o Sr. Deputado Jorge Lacão, como sempre costuma fazer, fala, fala, mas no fundo diz muito pouco em relação à matéria que está a tratar. Isto não é propriamente um vicio do PS mas sim um vício mais localizado no Sr. Deputado Jorge Lacão, que tem feito perder muito tempo a muita gente, designadamente ao ministro da Administração Interna no sentido de se procurarem consensos, sem resposta dele, para se resolverem algumas questões essenciais.

O que também gostaria de sobrelevar em relação a esta intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão e isso é importante e positivo, aliás, como é evidente, nem ,tudo é negativo - é que o Sr. Deputado acabou por conseguir ver uma série de coisas positivas, importantes, no relatório que o Governo apresenta, o que lhe permite- dar uma visão. consonante com a realidade cor-de-rosa que, segundo disse o meu amigo Sr. Deputado José Manuel Mendes, não existe neste pais, mas de que o PS comunga. Isto é, para o PS, a visão da sociedade portuguesa no domínio da segurança interna é, realmente, uma visão cor-de-rosa: tudo está bem, tudo está a correr bem, o que é verdade, e nós corroboramos isso.

Porém, para o PCP, pela voz do Sr. Deputado José Manuel Mendes infelizmente está tudo negro, difícil, impreciso, não se pode concluir nada de bom nem deste
relatório de segurança interna, nem da situação do País. Aliás, isso é normal e natural: ao PCP cumpre dizer isto; ao PS cumpre dizer aquilo que o Sr. Deputado Jorge Lacão acabou de dizer! São papéis diferentes que tem na sociedade portuguesa e têm de se conhecer também nas suas intervenções.

Gostaria de dirigir uma pergunta ao Sr. Deputado Jorge, Lacão; - homem tão profundamente preocupado com os consensos em relação a várias matérias, designadamente no que se refere ao associativismo da PSP. O Sr. Deputado fez nesta Assembleia um apelo veemente a que se encontrassem consensos entre todas as forças, políticas :..em .relação a esta matéria. Ora, o Sr. Deputado pensa ou não que o projecto do PCP é susceptível de despertar alguma ideia de consenso entre as forças representadas nesta Assembleia? Se assim não é - e devo dizer que creio que não é -, V. Ex. a verá reduzida a hipótese de consenso entre os outros partidos.
Contudo, gostaria de saber - e devo dizer que nesta altura é importante saber isso - qual a posição do PS perante esta questão concreta. Em termos de diálogo democrático, é relevantíssimo saber se podemos ou não concordar ou entender que do ponto de vista do PS se parte de uma base de concordância com o projecto do PCP, ou se o diálogo democrático em relação a questões verdadeiramente. importantes neste domínio se resumirá aos outros partidos.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, havendo mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - No fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª e Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, apesar de conterrâneo, amigo e companheiro de bancada do Sr. Deputado Carlos Encarnação, não estou inteiramente de acordo com ele.
O Sr. Deputado Jorge Lacão abordou problemas pertinentes. Só que não tem pertinência absolutamente alguma em relação à matéria que aqui se está a tratar neste momento. Portanto, são pertinentes noutra sede e não nesta! Houve, pois um erro de direcção, de colocação da problemática que o Sr. Deputado Jorge Lacão, por assim dizer, compendiou na sua intervenção.
Tal como. os generosos constituintes de 1822 preconizaram que todos. os portugueses deveriam ser bons, o Sr. Deputado, numa situação, homóloga preconizou que. todas as policias deveriam ser boas. evidente que . se está a tentar que tal seja conseguido!

Entretanto, não vejo que para uma política de segurança interna, operativa, eficaz e realmente rentável em termos de segurança interna seja indispensável a aprovação sofrega e imediata do estatuto disciplinar da Poli: cia de Segurança Pública ou da Lei Estatutária Funcional da Policia judiciária. Acredito que seja útil uma nova filosofia quanto à Policia Judiciária, designadamente, através da destrinça entre a Policia Judiciária

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afecta à pequena criminalidade, como sempre preconizei, e uma Polícia Judiciária afecta à criminalidade organizada, violenta, ou, por assim dizer, à criminalidade mais sofisticada.
Entretanto, o Sr. Deputado Jorge Lacão, que teve já imensas oportunidades de dialogar com o Sr. Ministro da Administração Interna e com o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Administração Interna em sede de comissão, e que obteve da parte deles total receptividade a todas as questões colocadas e uma abertura total a qualquer problemática que, porventura, quisesse abordar, reservou-se o direito - aliás, plenamente seu - de exteriorizar aqui no Hemiciclo algumas questões que são de tese e não propriamente de análise concreta do relatório.
O Sr. Deputado Jorge Lacão, que é sempre um interventor brilhante em qualquer debate, esqueceu-se que estamos a analisar um relatório e não a definir uma política genérica, abstracta, em matéria de polícias. E deve dizer, uma vez mais - aliás, o Sr. Deputado sabe isso perfeitamente -, que o problema da coordenação das polícias vem a ser equacionado desde 1978 e a verdade é que só nos últimos tempos é que começou a encontrar concretização. Isso deve-se não apenas a este Governo, mas também a outros inclusivamente, ao IX Governo Constitucional - reconhecimento lhe seja prestado!
Para terminar, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Jorge Lacão - é este o objecto da minha questão - que pertinência real existe entre o que V. Ex.ª disse e o relatório que o Sr. Ministro da Administração Interna apresentou a esta Câmara.

A Sr.ª Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lacão, ao contrário do que entende o Sr. Deputado Mário Raposo, creio que a intervenção que V. Ex.ª produziu teve pertinência. E teve pertinência não por causa do relatório que aqui estamos a discutir, mas por causa de outros aspectos que preocupam o PS sobre os problemas da polícia.
Disse o Sr. Deputado que o Governo não cumpre o estatuto da Oposição, que não informa a Câmara sobre os aspectos relevantes que devia tratar, e depois fez uma distinção entre aquilo que depende da maioria qualificada e aquilo que não interessa à maioria qualificada. Na verdade, o Sr. Deputado pareceu defender que naquilo que o Governo pode obter através da maioria qualificada, o estatuto da Oposição pode não ser rigorosamente cumprido desde que o Governo mantenha conversações clandestinas e secretas com o PS. O Sr. Deputado disse que o Governo tinha tratado convosco dos problemas do sindicato da polícia porque era matéria de maioria qualificada e, portanto, estava cumprido o estatuto da Oposição!
Pergunto, pois, ao PS o seguinte: é esta a postura do PS sobre a informação à Câmara acerca do cumprimento do estatuto da Oposição, sobre os grandes consensos parlamentares que interessam ao país e às questões do Estado? Isto é, desde que o PSD, formal, informal, pública ou clandestinamente, procure o PS para obter o seu consenso, este partido não quer saber se os outros partidos foram ou não consultados, qual o consenso parlamentar sobre questões do Estado. Quer
dizer, o PS fica satisfeitíssimo, fica babado, ao tratar com o partido da maioria questões de Estado através dos seus «fios» clandestinos, e diz nada a ninguém. Só quando há desastre vem exigir condições, dizendo em público que agora não fala, que daí para futuro apenas falará se houver a, b, e, d, e como contrapartidas do PSD. Antes disso, enquanto tudo era «rebuçados», tudo era doce, o PS não dizia nada a ninguém!
Qual é a postura do PS? É obter consensos clandestinos com o PSD sobre questões de Estado e não dizer nada a ninguém, ou dizer que só trata destes assuntos juntamente com os partidos parlamentares a «céu aberto» e não através de conversações secretas entre o seu partido e o PSD?

A Sr.ª Presidente: - Para responder se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Carlos Encarnação, V. Ex.ª começou por sublinhar - está no seu direito - que a minha intervenção não tinha conteúdo. Felizmente - e isso agradeço -, o Sr. Deputado Mário Raposo contrapôs que, afinal de contas, algum conteúdo haveria nas minhas palavras, só que, porventura, um conteúdo intempestivo: estaríamos em sede de apreciação de um relatório relativo ao ano de 1988 e eu teria colocado questões institucionais que extravasariam do limite desse relatório.
Porém, esse é que é o ponto, Sr s. Deputados! Creio que não deveremos fazer de um relatório um simples acto formal para uma mera visão retrospectiva. Um relatório tem que ser um pretexto sério também para uma visão prospectiva e verificar em que linha de continuidade vai ou não uma certa coerência reformadora e em linha de continuidade vão ou não as medidas que implementam, algumas reformas legislativas entretanto ocorridas no passado.
Ora, o que na intervenção que produzi tentei demonstrar é que várias das medidas reformadoras tomadas nos anos de 1983 e 1984 estão a ser deficientemente implementadas por este Governo, por um lado, e que, por outro lado, outras soluções institucionais urgentes deveriam poder ter sido tomadas já há muito tempo, e a verdade é que continuamos a viver em omissão relativamente ao anúncio sequer dessas iniciativas governamentais.
Portanto, não estranhem os Srs. Deputados que algumas das questões que aqui suscitei há um ano, como a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, como o apetrechamento das fronteiras portuguesas, como o problema da especialização das polícias no domínio do procedimento criminal, tudo isso continue a ser, a meus olhos, questões essenciais e institucionais no domínio da segurança interna para as quais entendo que o Governo deve dar respostas detalhadas.
Por outro lado, quando o Sr. Deputado Carlos Encarnação perguntou se o projecto de lei apresentado pelo PCP pode ou não ser, no que diz respeito ao estatuto disciplinar da Polícia de Segurança Pública, uma base para diálogo, certamente que o Sr. Deputado não pretenderá que eu faça aqui uma exclusão liminar antes de se ter iniciado o debate na generalidade acerca de uma iniciativa legislativa.
O que eu gostaria era que o PSD, tal como o PS, estivesse em estado de espírito suficientemente aberto para procurar avaliar dos méritos possíveis de todas

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as iniciativas legislativas e que, com esses estados de espirito, fosse capaz de fazer uma crítica; serena, por um lado, e com descernimento, por outro lado, para. Que a conclusão disto seja no sentido de absorvermos por parte de todas as bancadas as melhores contribuições a fim de realizarmos um objectivo que me parece desejável; que é o de criar condições associativas com o mínimo de dignidade para os agentes da Policia de Segurança Pública.

A Sr.ª Presidente: -Sr. Deputado - Jorge Lacão, esgotou o tempo de que dispunha para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, o CDS cede mais um minuto para que o Sr. Deputado Jorge Lacão possa terminar de responder.

A Sr.-ª Presidente: - Certamente, Sr. Deputado.
Queira continuar, Sr. Deputado Jorge Lacão.

Orador: - Relativamente ao Sr. Deputado. Mário Raposo, gostaria de dizer que a minha preocupação é no: sentido de' se criarem contribuições por parte de todos nós para reflectirmos sobre as reformas institucionais em curso:
Já agora gostaria de dizer o seguinte: não tenho que agradecer quando o Sr. Ministro da Administração Interna vai à Comissão de Regimento e - Mandatos a solicitação dos deputados. Isso não se agradece : ao Governo porque é um dever elementar deste na sua relação com a Assembleia da República. `
O que tenho que reconhecer é outra coisa: é que ao. abrigo das disposições consignadas ria Lei de Segurança Interna, o Governo tem o dever de ouvir, com regularidade, todos os partidos da Oposição relativamente à política geral de segurança interna e não apenas quando se trata' de obter deste ou daquele partido contribuição para formar uma determinada maioria qualificada. Neste ponto passo ã explicitar o meu pensamento face à pergunta do Sr. Deputado Narana Coissoró.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, esgotou, de novo, o tempo de que dispunha.

O Orador: - Sr.ª Presidente, verifico que V. Ex.ª aliás, não posso contestai o exercício dá sua função - está hoje especialmente rígida...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, acabo de ser informada que o CDS lhe cedeu mais algum tempo, pelo que faça favor de continuar.
No entanto, devo dizer que não creio que hoje esteja mais rígida do que o habitual! Julgo que estou muito igual a mim própria...

O' Orador: -- Sr.º Presidente, isto é paca corripen- sar á sessãõ que aqui tivemos na passada terça=feira!

A Sr.º Presidente: - Sr. Deputado, o que se passou
na-terça-feira não-foi por decisão da Mesa, mas, pelo
'contrário, por decisão dos deputados de todas as- bân
cadas. - , - _ . . -
Faça o favor " de continuar, Sr. Deputado.
O Orador: = Sr. Deputado Narana Coissoró; ainda no tempo do governo minoritário PSD, portanto,' na

legislatura--passada, todos os partidos não representados no governo foram ouvidós por esse mesmo governo relativamente á questão do regulamento disciplinar. da Polícia de Segurança Pública. Ora, quando nessa altura o PS foi ouvido pelo" governo, manifestou a sua disponibilidade apara procurar uma .solução consensual sobre w matéria. Nãò posso pronuncíar-me; porque não seio que é :que o: CDSvdisse acerca da mesma questão e, por outro lado; não posso conhecer, porque também .não sei, quais os, passos 'que, eventualmente, tenham sido dados nas eventuais relações que o CDS possa 'ou não ter estabelecido com -o' governo . sobre este ponto.
.. Porém, com o devido respeito, creio que a questão não é essa! A questão, a meu ver, é a seguinte: se o Governo, num determinado momento, tiver a necessidade . institucional . - ' e sublinho isto = de procurar contribuir para a formação de maiorias qualificadas, o' PS, como partido democraticamente responsável que é, .não sonegará, em principio, a. sua disponibilidade para o efeito. Isto nada tem 'que ver com o facto de, simultaneamente, reconhecermos que, ao abrigo das disposições .legais em vigor, é dever do Governo ouvir, de uma maneira geral, todos .os partidos, sem excepção, acerca de matéria relativa à segurança interna...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Posso interrompê-lo, Sr: Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - .Sr. Deputado, apenas gostaria de dizer que V. Ex. e continua a reincidir na confusão entre .alternância e a alternativa. O que o PS quer com estes, consensos clandestinos é a alternância no poder: e não a alternativa! E isto, porque a alternativa seria fazer consensos a. "céu aberto", em vez de fazer consensos clandestinos! Portanto, o que o PS pretende é procurar alternância no poder para manter as mesmas políticas!

O Orador: - Sr. Deputado Narana Coissoró, como naturalmente compreenderá; não vou fazer uma filosofia geral sobre essa matéria até porque me recordo e desculpará que invoque este facto - que, a propósito das negociações. estabelecidas entre o PS e o PSD em matéria de Revisão Constitucional, o CDS, e o Sr. Deputado sabe que. a- metodologia . foi muito, essa, - única as criticou e, pelo contrário, coisa que; creio que - ficou muito bem ao CDS, se congratulou com o bom resultado.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, V: Ex.ª está a utilizar o tempo que o CDS lhe concedeu, não dispõe de outro...

O Orador: - Como está a ver, Sr.ª Presidente, a generosidade do CDS hoje é abundante!
Sr. Deputado Narana Coissoró vou concluir dizendo que creio que não há uma grande divergência entre as suas preocupações e as minhas!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Há. sim!...

O Orador: - Creio, pois, que a segurança interna, sobretudo num Estado democrático, deve ser matéria de uma grande, congregação de pontos de vista entre

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todos os partidos políticos. E o que procuro aqui sublinhar é que é um dever elementar da parte do Governo contribuir com as diligências para fomentar um espírito de coesão nacional à volta dos problemas da segurança interna. Quando o Governo o fizer e sempre que o fizer, apesar de estarmos na oposição, terá o nosso aplauso! Quando o Governo o não souber fazer e sempre que o não fizer, evidentemente terá a nossa crítica. É este o ponto de vista que sustentei e continuo a sustentar! Aliás, devo dizer que estou convencido de que o Sr. Deputado Narana Coissoró acabará por reconhecer o bem fundado das minhas preocupações!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, apenas gostaria de dizer que naturalmente que o Sr. Deputado Jorge Lacão entendeu que eu tinha cedido dez minutos do tempo atribuído ao CDS para ele continuar a usar da palavra. Na verdade, apenas lhe concedi um minuto para acabar de me responder e não para o Sr. Deputado aproveitar para uma nova intervenção.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa foi perguntando se o CDS continuava a ceder tempo ao Sr. Deputado Jorge Lacão.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pais de Sousa.

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Antes de começar a intervenção propriamente dita, uma primeira nota meramente preambular. Em relação ao agendamento da proposta de lei e dos projectos de lei referentes ao associativismo na PSP e face à intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão, porque o Partido Socialista não suscitou, até hoje, o agendamento desses diplomas...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não é verdade!

O Orador: - ..., o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata anuncia à Câmara que o vai fazer, por óbvias razões institucionais.
Entrando agora na intervenção de fundo, direi que a Assembleia da República procede hoje ao exame de mais um relatório sobre a situação do País em matéria de segurança interna e a actividade desenvolvida pelas forças e serviços de segurança.
Trata-se de uma problemática que constitui uma vertente fundamental da política de segurança nacional, sendo um pressuposto básico para a realização da democracia em Portugal.
Há, assim, que, à luz da Constituição compatibilizar os direitos e as liberdades fundamentais dos cidadãos com o exercício da autoridade democrática do Estado, garantindo a tranquilidade pública e a estabilidade das instituições.
Do ponto de vista jurídico-político, a Lei n.º 20/87, de 12 de Junho - Lei de Segurança Interna -, decorre de princípios consagrados na Lei Fundamental e veio dar resposta à preocupação de instituir um sistema de segurança interna, enquanto função do Estado. Do que se trata é de criar as condições para, a todo o momento, garantir a ordem e a tranquilidade públicas, proteger pessoas e bens, prevenir a criminalidade, contribuir para o exercício regular dos direitos e liberdades dos cidadãos e ainda para assegurar o normal funcionamento das instituições.
Dito isto, declaramos que a responsabilidade primeira do Governo nos que concerne a tarefas regulamentares ou de natureza executiva, e em particular às questões de organização e operacionalidade das forcas e serviços de segurança co-envolvidos, não dispensa, antes impõe, a reflexão da Assembleia da República e o seu permanente exame crítico.
Sabe-se que a temática da segurança interna é indissociável de factores, como a estabilidade do regime democrático e as suas instituições, grau de cultura e civismo da população, capacidade económica e tecnológica do País e ainda a organização das polícias e sua coordenação.
Por outro lado, no terreno das causas do crime, pré-figuram-se, no plano social, os riscos derivados da sociedade de consumo e ainda as situações de anonimidade e alienação do indivíduo.
Mais, a chamada crise económica dos nossos dias só se ultrapassa se se conseguir no fundo resolver os problemas do mercado de trabalho e as situações de desemprego e subemprego, e bem como corresponder às perspectivas da juventude.
Por último, na área cultural, requerem particular atenção todas as situações de conflito, a proliferação de subculturas e, sobretudo, o abuso das drogas e do álcool, sendo certo que o crime internacional - e desde logo a violência organizada e o terrorismo - não conhece fronteiras e dispõe de sofisticados meios de concepção e acção. É evidente que, quanto maior for o grau de vulnerabilidade de um país, quanto mais se encontrar desarmado em termos de meios de resposta eficaz, mais ele será procurado como patamar preferencial do crime político.
Todavia, reafirmamos que, perante as chamadas situações de excepção e ainda na contínua prevenção geral e especial que tem de ser prosseguida, o exercício da autoridade do Estado tem de atender às liberdades públicas e aos direitos dos cidadãos.
Passando agora à análise do relatório que foi submetido à Câmara, entendemos, em primeiro lugar, que se está perante um documento de trabalho coerente e sistematizado sobre o problema da segurança interna.
No plano da criminalidade organizada, internacional, o relatório do Governo refere que a contínua mutação das sociedades abertas e pluralistas, a mobilidade crescente das pessoas e da transmissão de ideias, constituem potenciais factores de risco ao nível da segurança do Estado.
A esta luz, tem sido dada singular atenção à cooperação com organismos e serviços de outros Estados (como Espanha e Marrocos) e à cooperação multilateral no âmbito de organismos internacionais que Portugal integra (Conselho da Europa, Grupo Trevi, Interpol e Grupo Ad Hoc Imigração).
Por seu lado e na perspectiva do Mercado Único (1992) - com tudo o que implicará o funcionamento do princípio da livre circulação de pessoas, bens e serviços -, muito há ainda a fazer no que diz respeito à adaptação de procedimentos e à preparação das instituições portuguesas competentes na área da segurança interna.

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Com efeito, a abolição de fronteiras gerará, previsivelmente, um "défice de segurança", no que se impõe um reforço da cooperação externa também nesta
óptica, dado que, a um controlo cabal das fronteiras externas da Comunidade, devera acrescer um reforço interdisciplinar da segurança- interior de cada pais
membro.

No capítulo da situação interna, o relatório sublinha o facto de a criminalidade violenta em Portugal se ter mantido, em 1988, a níveis considerados baixos, inexistindo afloramentos de terrorismo internacional.
Por outro lado, a chamada criminalidade comum acompanhou, em geral, os valores registados nos últimos anos.
A análise quantitativa e qualitativa dá criminalidade em 1988 evidencia, com efeito, e tomando como referência comparativa o' ano de 1987, uma certa estabilização dos índices.
Para nós, cabe uma nota especial para o problema da sinistralidade rodoviária, onde se verifica um inquietante aumento dó número de acidentes,, bem, como da gravidade das suas sequelas; ao que não será alheio o crescimento do parque automóvel e das taxas de circulação.
Também se nós afigura preocupante a delinquência juvenil, já que, não obstante o relatório em apreço registar um acréscimo' global (que se cifra em 21 % nas áreas urbanas), continua a verificar-se um aumento de situações de natureza criminal em determinadas cidades, pelo que esta matéria' continua, obviamente, a reclamar uma profunda reflexão. Dada a sua ligação à' temática da droga e seu combate, deverá merecer um especial tratamento por parte das instâncias formais de controlo, isto para lá da fundamentalíssima implementação do Projecto Vida.
O . Executivo considera globalmente , satisfatória a situação em, matéria de segurança interna no ano de 1988, - ao que acresce que, num plano comparado, Portugal apresenta índices de criminalidade inferiores 'à generalidade dos países que, geográfica e 'culturalmente, nos são mais próximos, designadamente no que concerne à criminalidade violenta, mantendo-se obviamente á neçessidade de implementação de acções preventivas.
Srª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: os portugueses sublinham preocupações de segurança do. seu pais e de si próprios, . bem como de defesa da ordem pública e do Estado de direito democrático. Aqueles a quem, num dado momento histórico, cabem responsabilidades políticas e institucionais, incumbe verificar até que ponto ó Estado carece de autodefesa,. acautelando, o futuro da Comunidade.
Constitui tarefa dos órgãos de soberania, e. como tal da Assembleia da República, afirmar 'ó império da lei e o sentido da realidade democrática, numa perspectiva de protecção da vida e integridade das pessoas e de defesa da ordem pública e da paz.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.º Presidente, peço a palavra para exercer, do direito de defesa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, e informo-o de que dispõe de três minutos.

O Sr. Jorge Lacâo (PS): - Não gastarei tanto tempo, Sr.ª Presidente.
Pedi a palavra apenas para sublinhar uma inverdade dita pelo Sr. Deputado Pais de Sousa, na medida em que. ele. afirmou, no inicio da sua intervenção, que o Partido Socialista não tomou qualquer impulso para o agendamento dos diplomas relativos ao regulamento disciplinar da Policia de Segurança Pública.
Gostava que o Sr. Deputado consultasse - e certamente ser-lhe-á fácil - o dossier da sua bancada relativo aos documentos da conferência de lideres, porque aí 'encontrará, um oficio do Partido Socialista solicitando ao Presidente da Assembleia da República o agendamento desta matéria, através de um consenso nessa conferência, porque, dada a importância e o melindre de que a matéria se reveste, esse consenso parecia-nos essencial e necessário para um bom pressuposto para o debate parlamentar. Em todas as conferencias de .lideres que entretanto se realizaram, esta questão tem sido suscitada, pelo que a acusação que nos foi dirigida não tem sentido.
Uso, pois, da palavra apenas para que fique relevada esta atitude da parte do Partido Socialista e penso que o Sr. Deputado Pais de Sousa irá corrigir este lapso da sua intervenção.

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pais de Sousa.

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr." Presidente, apenas direi ao Sr. Deputado Jorge Lacão que ninguém pite em causa que o Partido Socialista não quisesse, consensualmente, agendar esta matéria. Só que não foi o Partido Socialista que exerceu o direito, mas o Partido Social-Democrata. -
O que importa relevar é que a matéria em apreço, face ao seu alcance. institucional e à sua dimensão, foi agendada pelo meu grupo parlamentar para a sessão da próxima. quinta-feira. Não se trata de constatar meros consensos, mas de exercer direitos parlamentares, e esse direito foi exercido pelo meu grupo parlamentar.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

0 Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente; muito rapidamente, até porque não disponho de muito tempo, vou usar. da palavra com o estrito sentido de repor, não- direi a verdade mas o outro lado das coisas, porque parece haver dois lados.
Na resposta que o Sr. Ministro me deu e principalmente na que não me quis dar, deixou perceber que teria havido, em Barqueiros, um caso sem importância: apenas urri jeep com quatro guardas e pouco mais, nada de relevante. As informações de que eu e o Pais dispomos, através da comunicação social, dizem outra coisa bem diferente, ou seja, que, em Barqueiros, estiveram, ao. que parece - e era isto que gostava de ver confirmado ou desmentido.-, a pedido de ninguém, uma vez que o Governo ou os seus representantes não teriam solicitado . a presença . da Guarda, não quatro praças mas cerca de vinte agentes em vários jeeps.
Esta questão é agravada pelo- facto de sabermos que não foram desmentidas afirmações graves produzidas pelo presidente demissionário da Junta de Freguesia de Barqueiros, no sentido de- que há, da parte de alguns ministros e secretários de Estado, interesses económicos na exploração de caulinos e, basicamente, é por isso

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que a situação não é resolvida. Como todos sabemos, a população de Barqueiros, que, frequentemente, tem recusado essa situação, sofre uma exploração de caulinos em pleno centro da povoação. Gostaria de ver esta informação confirmada, desmentida, desmistificada ou qualquer outra coisa, para termos uma informação fidedigna e correcta sobre este caso.
Quanto ao caso lamentável dos três cidadãos que estiveram reclusos em condições infra-humanas (e que, a seu tempo, aqui debatemos e que teve um final feliz, infelizmente passado muito tempo, por incúria - diria eu - dos Serviços Estrangeiros, que demoraram demasiado tempo, uma vez fecharam às 18 horas, o que levou a que o processo não pudesse se acelerado), o Sr. Ministro disse que eles não entraram em território português. Lembro-lhe que o barco era português, o capitão era português, o barco aportou em Leixões, veio de Leixões a Lisboa, e enquanto tudo isto se passou, decorreu o cativeiro penoso, extremamente penoso, daqueles três cidadãos, estando um dos quais em risco manifesto de vida.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Outra vez?

O Orador: - Um outro aspecto que aqui foi referido foi o dos fogos florestais. O Sr. Ministro tem uns dados e eu tenho outros, os do Sr. Ministro são do seu ministério e os meus não são do meu ministério, obviamente, mas do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação e esses dados que tenho e dos quais forneci ao Sr. Ministro são muito claros. O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação diz que as causas naturais de incêndios florestais foram, em 198S, de 0,4%; em 1986, de 0,1%; em 1987, de 0,5%. As causas criminosas de incêndios florestais, em 1985, foram de 9%; em 1986, de 8,7% e, em 1987, de 4%. Pasme-se, as causas desconhecidas de incêndios florestais foram, em 1985, de 82,8%; em 1986, de 84,7%; em 1987, de 92,8%. Não disponho dos dados de 1988, mas como sabemos, esse ano foi anormal devido às condições climatéricas e ocorreram menos incêndios.
Mais importante do que discutir os dados do Ministério da Administração e confrontá-los com os do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação referentes a anos passados, é que o Sr. Ministro nos garanta que no ano de 1989 e futuros, o Governo vai tomar em mãos a prevenção, a protecção, a perseguição e a condenação, se for caso disso, dos inúmeros criminosos que continuam à solta, uns dementes mentais e outros dementes de outra doença, que é pior e que a doença do economicismo, fomentada, suportada, alimentada por quem todos sabemos.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Essa agora!

O Orador: - Termino com a referência à conclusão que o Sr. Ministro tirou do relatório, que é esta: «O Governo considera que a situação (...)» - da segurança interna, obviamente - «(...) pode e deve ser classificada como francamente satisfatória». Ora bem, contestamos isto, uma vez que esta não é uma situação francamente diferente da de alguns países onde a criminalidade parece ser um modo de vida mais corrente. Mas isto não se deve nem à acção concertada das Polícias nem à sua dignificação mas, isso sim, ao esforço que muitos dos seus agentes põem na prestação destes serviços à comunidade, que o Estado não
tem sabido retribuir nem dignificar. Isto não se deve ao esforço que o PSD terá feito, com este agendamento para conceder novos direitos cívicos associativos à Polícia, porque o projecto do PSD, como todos sabemos, a ponta para uma associação com «control», uma vez que vai permitir, nomeadamente, o exercício de direito de greve que deve assistir a todos os cidadãos que prestam serviços públicos ou privados. Portanto, não se deve a mais nada que não seja ao facto de Portugal ser, se facto, um pais tolerante e aos agentes de segurança se empenharem pessoalmente nas acções e na missão que a comunidade lhes cometeu.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia da República é hoje chamada a apreciar, no âmbito das suas competências, o Relatório Anual de Segurança Interna referente ao ano de 1988.
Do ponto de vista formal, está cumprida esta obrigação, ou seja, a apresentação de um relatório anual. Mas corresponderá este relatório ao que dispõe a Lei da Segurança Interna? Ficará satisfeita a Assembleia da República, no cumprimento das suas competências, em especial no campo da política da segurança interna e da fiscalização da sua execução? Esgota-se neste relatório a capacidade da Assembleia da República? Se não, que outras diligências foram feitas pelo Governo, nomeadamente no que diz respeito à audição e informação dos partidos da Oposição sobre o andamento dos principais assuntos da política de segurança, como impõe o n.º 2 do artigo 7.º da Lei de Segurança Interna.
Estas questões que estamos a apresentar não são novas, na medida em que foram colocadas quando a Assembleia da República apreciou o 1.º relatório elaborado no âmbito da Lei de Segurança Interna. Se não são novas, por que se repetem? Será só para a Oposição dizer mal ou será um imperativo de consciência, de que a Oposição não pode abdicar?
As perguntas são um imperativo de consciência e justificam-se, tanto mais quanto se repetem exactamente as mesmas condições, hoje ainda com menos justificação porque já não se trata de um 1.º relatório nem é, sequer, uma «questão de estilo» relativamente a uma certa metodologia do relatório. São lacunas graves que podem pôr em causa as competências da Assembleia da República no que a lei lhe impõe e exige.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O relatório que estamos a analisar não diz nada de importante que permita à Assembleia da República apreciar a situação do País no que toca à segurança interna, podendo admitir-se alguma informação desconexa e sem grande sentido interpretativo relativamente à actividade das forças e dos serviços de segurança.
Mais, grave do que isto, é que não é do conhecimento dos partidos da Oposição representados na Assembleia da República, pelo menos no que se refere ao PRD, nada mais do que aquilo que vem expresso no respectivo relatório, o que pode levar a concluir-se que não havendo nada de revelante no relatório, não existe nada que mereça uma referência especial no âmbito da segurança interna, o que, a avaliar só pelo que a comunicação social permanentemente refere, não

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podemos aceitar, ou pelo menos temos dúvidas em aceitar como é verdade.

Qual é verdadeiramente a política de segurança interna?, Quais são os principais assuntos da política de segurança, cuja competência está definida na lei .e que deviam ser dadas a conhecer aos partidos da Oposição? Não existe nada de relevante que deva ser do nosso conhecimento ou existe e dele não temos conhecimento?

O primeiro caso não pode ser admitido, ou seja; não é possível considerar que em Portugal, atendendo à sua situação geográfica e à sua integração no espaço comunitário e em véspera do Mercado Único; que não haja preocupações especiais no âmbito da política de segurança.

Relativamente à segunda hipótese; ou seja, o não informar os partidos da Oposição, é inaceitável, viola a lei e pode lançar legítimas dúvidas; neste e noutros' campos, sobre o integral cumprimento de uma lei que, por ser tão polémica, impõe o seu cumprimento rigoroso no máximo de transparência, pois o seu objectivo principal é, e tem de ser, o contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas; o regular exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática".
Será que perante esta dúvida vamos ter a mesma resposta que tivemos aquando dá discussão do 1.º relatório, ou seja, que o Sr. Ministro da Administração Interna nos vem dizer que o Governo cumpriu a sua obrigação de ouvir os partidos da Oposição, quando esteve presente na Assembleia da República aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1989 e que também esteve presente na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, precisamente na apreciação deste mesmo relatório? Esperamos que não seja esta a resposta.

Poderá o Governo argumentar que do que se trata, neste momento, não é da política de segurança interna mas, tão só, do relatório no que toca à segurança interna, bem como sobre a actividade das forças e ser viços de segurança desenvolvida nó ano anterior"? Também pensarmos que não pode ser esta a resposta, não só por imposição da lei como também pelo facto de não haver outro momento para que a Assembleia da República se pronuncie sobre estas questões.

No que diz respeito ao relatório., poderíamos abordar outras questões, que também não são novas, mas precisamente por isso. nos causam uma grande, preocupação.

O relatório mais não é do que um mero enunciado estatístico apresentado e individualizado por cada serviço e força de segurança. Não apresentam um mínimo
de integração, que é um elemento fundamental para se poder, não só aferir da sua evolução mas também permitir uma análise mais realista nó que respeita à sua
verdadeira função.

Pode ser irrelevante conhecer-se se foram x quilos de droga apreendidos por este ou aquele serviço e saber se isso representa um acréscimo y relativamente ao ano, anterior. É necessário saber se os meios disponíveis são os suficientes e necessários e se a coordenação dos vários serviços permite potenciar, e em que medida, a eficiência da sua acção. É fundamental saber se a coordenação permite impedir ou não o desenvolvimento da criminalidade ou se, pelo contrário, as várias acções são mais orientadas tendo. em conta o seu mérito relativo do: que o mérito absoluto de uma acção coordenadas.

Por outro: lado, há elementos que, de quando em quando, vêm a público nos órgãos de comunicação social e que podem levantar legítimas interrogações cidadãos para quem os direitos, liberdades e garantias são valores: que nenhuma circunstância pode pôr em causa e aos quais nenhuma referênçia é feita neste relatório.

Admitimos que haja informações que pudessem ter um tratamento mais adequado à margem. deste relatório, mas não temos conhecimento de que tal aconteça. . Uma outra questão que reputamos de muito importante resulta da própria aplicação da Lei de Segurança Interna. O relatório não faz qualquer referência, nem positiva nem negativa, às dificuldades resultantes da sua aplicação, para além do que deixa entender relativo ao facto de as forças e serviços de segurança dependerem organicamente de quatro ministérios e implicitamente isto pode indiciar uma dificuldade de planeamento e coordenação, o que levou ao accionamento do Gabinete Coordenador de Segurança.
Está, pois, subjacente uma dificuldade, que é natural, mas que não é explicitado a que nível ela se verifica, qual- a sua dimensão e quais as suas consequências:
Outra dificuldade implícita é a dificuldade na utilização de todas as informações disponíveis, assim como a optimização na utilização, dos meios disponíveis e o eventual emprego combinado de efectivos. Que dificuldades reais têm sido detectadas? As missões têm sido prejudicadas? Em que dimensão? Que correcções necessárias e possíveis? - .
A certa altura, refere o relatório que < numa sociedade democrática a boa imagem e o prestígio das instituições policiais . só podem reforçar-se através da melhoria dos processos de actuação, do conhecimento profundo- da comunidade pelos agentes. policiais, da forma, do acolhimento das pessoas e também da eficácia com que aqueles exercem a sua acção".

É depois enumerado um conjunto de objectivos, não se fazendo nenhuma referência àquilo que são verdadeiros problemas ao nível das forças de segurança e tiveram uma expressão pública irreversível com os acontecimentos de 21 de Abril passado com a PSP.

No entanto, não pode ter constituído surpresa para o Governo, os acontecimentos .que deram a volta ao mundo para: o desprestígio de Portugal.
Aquando da. discussão do .1. º relatório de segurança interna nesta Assembleia, em 18 de Março de 1988, o Governo foi questionado sobre os problemas latentes na PSP, com referência expressa ao regulamento disciplinar da PSP, que data de 1953, e com as associações na PSP, apesar de o referido relatório não lhes fazer, qualquer referência. Nessa oportunidade, exigia-se um novo regulamento onde ficassem consignadas algumas das legítimas preocupações que, de uma forma sistemática, têm sido apresentadas pelos profissionais da PSP. Não houve, na altura, qualquer resposta às questões colocadas.
Sabemos agora que, paralelamente, e não de uma forma 'institucional - 'aqui refiro o que disse o Sr. Deputado Narana Coissoró -, _ havia alguns contactos com o Partido Socialista, o que não impediu os referidos acontecimentos que tiveram, pelo menos, a

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vantagem (mas a que preço!) de acelerar todo este processo, embora tendo como contrapartida, e em face das declarações dos responsáveis, procurar virar a opinião pública contra a PSP quando tinha havido até agora um esforço grande, que começou a seguir ao 25 de Abril, no sentido de uma «progressiva melhoria da imagem das forças de segurança perante o público, em resultado de acções com sentido predominante pedagógico, visando melhorar o relacionamento cívico entre os agentes das forças de segurança e os cidadãos».
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como é possível a Assembleia da República e/ou os partidos da Oposição não serem informados pelo Governo, na altura própria, do que se estava a passar? Não era grave? Não é grave? Ou será que os partidos da Oposição não têm nada com isso? Ou é necessário haver problemas para o Governo começar a dar provas de alguma preocupação e, inclusive, fazer um apelo aos partidos da Oposição para o seu sentido de Estado e de responsabilidade? Quem é o culpado? Por que é que só agora se perspectivam as propostas concretas? Por que é que só agora se amite o diálogo? Haverá potencialmente outros problemas ou áreas críticas para os quais terá de haver uma atenção especial?
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Será este o relatório que se esperava relativamente à «situação do País no que toca a segurança interna»? Só com grande dificuldade e talvez uma fértil imaginação será possível descortinar algo de relevante, quando foram e são tão grandes as preocupações que a Lei de Segurança Interna suscitou e suscita e são tão «irrelevantes» as questões abordadas neste relatório que, como dizíamos há um ano a propósito do 1.º relatório, que não podem ser só interpretados como uma «questão de estilo», nem sequer o facto de este ser só o segundo relatório pode justificar.
Uma coisa, no entanto, é de assinalar neste relatório relativamente ao anterior: enquanto no anterior os méritos da «atenuação dos factores potencialmente geradores de tensões sociais e de perturbação da ordem e da tranquilidade pública» eram atitudes ou resultados das políticas governamentais, em especial na área económica, financeira e social, com especial relevância para a redução da inflação, neste relatório todos estes factores estão omissos, levantando-nos uma grande interrogação: se, no ano de 1987, os resultados positivos eram os resultados da redução da inflação, como é possível manter resultados referidos como igualmente positivos com um tão grande aumento de inflação no ano de 1988?

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Muito bem!

O Orador: - Aguardamos que o Sr. Ministro nos esclareça como é que compatibiliza estes dois factores, que é o mesmo que dizer que resolva este enigma que o próprio Governo criou.
Por último, e sublinhando as palavras ontem proferidas pelo Sr. Ministro da Administração Interna, com as quais concordamos, uma palavra de homenagem para quantos, com sentido de missão e de serviço a Portugal faleceram ou se incapacitaram no cumprimento dos seus deveres.

Aplausos do PRD.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado José Manuel Mendes pediu a palavra para formular esclarecimentos. Contudo, tanto o PCP como o PRD quase não dispõem, de tempo, pelo que solicito o favor de serem muito rápidos.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Presidente, de facto, cinco segundos não dão sequer para eu dizer o que acabo de já ter dito, isto é, não chegaram a ser aquilo que eu desejaria que tivesse sido.
Como necessito de algum tempo mais, tenho a complacência da Mesa ou tenho de renunciar ao pedido de esclarecimento que desejava fazer ao Sr. Deputado Marques Júnior.

A Sr.ª Presidente: - Julgo que a Mesa não poderá conceder tempos, uma vez que também não concedeu em situações anteriores.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS); - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O que temos a dizer em relação ao relatório sobre a situação do País em matéria de segurança interna é simples. Trata-se de uma fotografia do que se passou atrás, uma fotografia já amarelecida, que pouco tem a ver com os problemas de segurança interna, que neste momento devem preocupar esta Câmara e os cidadãos.
Toda a gente fala dos problemas de segurança interna e quer fazer críticas ao relatório mas, ao mesmo tempo, não repara que, com essa atitude, continuam a desarmar o Estado contra a criminalidade violenta. Dizer nos jornais, fazer visitas, fazer propaganda, criar estados de opinião para que sejam admnistiados e tratados benevolamente, ou que sejam compreendidos os problemas dos autênticos terroristas não é, com certeza, contribuir para a solução dos problemas de segurança interna do Estado português.
Não podemos ter dois pesos e duas medidas, não se pode vir aqui tratar dos problemas que não interessam a este relatório, como, por exemplo, o da sindicalização da Polícia, e calar problemas que neste momento preocupam a sociedade portuguesa, como os terroristas que por aí continuam a dar conferências de imprensa.
Não se pode falar de droga sem falar do grande julgamento que está a decorrer em Lisboa, de uma das maiores redes de tráfico de droga que existiram em Portugal, a chamada rede da índia e do Paquistão, onde estão a ser julgados cerca de 70 ou 80 traficantes com os seus patrões.
Não se pode falar do relatório sobre a segurança interna sem que se refira que todos os dias a criminalidade aumenta sob as mais diversas formas e a nossa juventude está a ser arrastada constantemente para novas formas de insegurança para as suas famílias.
Penso que estes assuntos deveriam ser tratados aqui por todos os partidos se realmente quisessem discutir o problema da segurança interna e não deitar areia para os olhos - que é também uma das formas de colaborar com este Governo - calando aquilo que não deviam calar.
Por isso, Sr. Ministro, não vamos criticar nem positiva nem negativamente, o seu relatório sobre a segurança interna, porque se trata realmente, de um documento antigo, já histórico como qualquer outro e que

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ficará no artigo. Tudo o que se disser sobre ele não tem hoje importância para esta Câmara, porque o que é importante para esta Assembleia é a criminalidade e a falta de segurança interna que neste momento estamos a viver, e mão consta dos relatórios do Governo.
Entendemos que o Estado português ainda não está suficientemente equipado para fazer face a todas as formas de criminalidade e lamentamos que existam no Pais vozes responsáveis que, em vez de atacarem o terrorismo com todas as suas forças, com a sua complacência e até com as suas palavras meigas podem concorrer para que este terrorismo se alastre. Isto não podemos admitir nem permitir:

A Sr.º Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: Sn a Presidente, gostaria de, usando a figura regimental da intervenção, responder a algumas das perguntas que foram formuladas pelos Srs. Deputados nas intervenções que produziram. Acrescento desde já que, em relação àquelas que não forem respondidas, estou ao vosso dispor, com todo o prazer, para noutra sede lhes responder - como, aliás, tenho feito nas idas à comissão, sem nunca me eximir de debater convosco estas questões.
Começando pelo Sr. Deputado Marques Júnior, devo dizer que é pena que tenha feito uma leitura parcial do.. relatório do ano passado para tentar tirar uma correlação entre a inflação e o nível de segurança interna. O Relatório de 1987, discutido nesta Câmara nó ano passado, diz a certa altura, o seguinte: "As políticas, nas áreas económica, financeira e social, têm conduzido à redução da inflação, à descida da taxa de desemprego e. ao crescimento da economia, determinando assim uma melhoria sólida do nível de vida das populações é, em consequência; uma atenuação dos factores potencialmente geradores das tensões sociais (... )".
Portanto, Sr. Deputado, há vários factores, e não apenas a inflação, que foram invocados e, , assim, penso ...

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Mas eu disse isso!

O Orador: - O Sr. Deputado tirou a seguinte ilação: Bom tendo havido maior inflação no ano seguinte, porque é que não há maior criminalidade?
Portanto, fez uma análise parcial.
O Sr. Deputado referiu também que no relatório seguinte de 1988 não se fazia menção a qualquer dificuldade de aplicação da Lei da Segurança Interna. Mas eu nunca disse que havia dificuldades na aplicação desta lei, nem disse que se tratava de uma dificuldade implícita a referência que é feita nesse relatório bem como no de 1987, da existência de quatro ministérios dos quais dependem as forças de segurança - aliás, isso resulta da Lei de Segurança Interna. Isso é uma realidade, pelo que não se trata de uma dificuldade implícita nem ostensiva.
Em relação à política de segurança interna, o 'Sr. Deputado perguntou se, de facto, existe coordenação e cooperação entre os serviços e se esta permite ou não aumentar a eficiência de actuação global do sistema.º Ora, Sr. Deputado, se leu o relatório e se, ontem, teve a paciência de ouvira intervenção que produzi, com certeza que verificou que uma parte substancial
dessa intervenção e do relatório é centrada na necessidade de coordenação e naquilo que tem sido feito para reforçar a coordenação e cooperação entre as várias forças e serviços de segurança. Esta é, pois, uma das nossas preocupações e atenções principais e em relação a este assunto devo lembrar-lhe que o funcionamento do Gabinete Coordenador de Segurança - que não é uma invenção nossa, pois resulta da Lei de Segurança Interna = é um exemplo concreto dessa necessidade e daquilo que se tem conseguido em matéria de coordenação. .
Quanto ao Sr. Deputado Herculano Pombo gostaria de referir aquilo que particularmente já lhe disse, ou seja, segundo as informações de que disponho não havia nenhum cerco a Barqueiros. Portanto, .não têm qualquer razão de ser as suas afirmações alarmistas de que. o Estado estava, ao contrário do que dizem outros deputados, sobrearmado no caso concreto de Barqueiros.
Quanto às suas preocupações em relação ao fogo posto, devo dizer-lhe, nós também as temos e lamento não poder levar à prática a sua última sugestão; ou seja, que o Governo condene mais fortemente as questões do fogo posto, pois, como sabe, isso depende dos tribunais.. Os processos são encaminhados para o tribunal e, portanto, isso é uma área onde não podemos nem queremos intervir. .
Sr. Deputado José Manuel Mendes, a sua intervenção não me causou surpresa; na medida em que repetiu as questões que o Sr. Deputado José Magalhães teve a .amabilidade , dê colocar-me na comissão e às quais, na altura; respondi da forma que entendi adequada, pelo que evito repetir as respostas que então dei.
No entanto, não queria deixar de dizer que algumas das afirmações que fez não correspondem à realidade. O senhor disse: que no relatório não havia referências a preocupações quanto às consequências da crescente internacionalização da nossa vida. Contudo, se viu o relatório e, se ouviu o meu discurso de ontem terá notado, com certeza, que há várias referências à nossa preocupação e actuação num âmbito mais alargado que não o nacional - como aliás, se refere também nas Grandes Opções do Plano - para tentar adequar a nossa política de segurança interna a nossa realidade que resultará-"da nossa integração num espaço ainda mais amplo do que aquele em que vivemos agora e que, por força do Acto único, a partir do ano de 1992 terá consequências concretas.
O Sr. Deputado referiu que há uma postura de secretismo do Governo sobre os factores externos. Quanto a esta questão, o senhor contradiz o seu colega e amigo deputado José Magalhães que, na comissão referiu que o ministro sempre que ia a Bruxelas fazia exuberantes afirmações sobre esta matéria. Portanto, nem tanto ao mar nem tanto à terra!
Como já tive oportunidade de explicar, não fiz afirmações nem - à ida nem à vinda de Bruxelas, nem de outras localidades; porém, na Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, - Liberdades e Garantias tive oportunidade de explicar o que se passava em matéria da nossa intervenção no grupo Trevi e no grupo ad hoc de emigração . ....
1 O senhor. referiu que leu, em alguns jornais, noticias a este respeito é em relação a isso apenas lhe digo que esses jornais não são o jornal oficial da República Portuguesa e;. portanto, não têm qualquer valor essas notícias.

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Quanto à questão do estatuto disciplinar da PSP - aliás, abordada por outros deputados -, penso que esta não é a sede, em termos de oportunidade, para fazermos aqui essa discussão, visto que ela será debatida na próxima semana.
Queria apenas referir, e para esclarecer, que a prestação de serviço dos oficiais do exército na PSP vem contemplada no Estatuto, que não foi aprovado por este Governo nem pelo anterior. O estatuto que está em vigor, e com o qual concordamos, diz expressamente que enquanto não houver oficiais de polícia ter-se-á de recorrer a oficiais do exército em regime de prestação de serviço. Como sabe, os oficiais de polícia só agora começaram a ser formados, é uma carreira longa e, portanto, não há qualquer colisão entre os interesses dos oficiais que saem da Escola Superior de Polícia e os que vêm do exército temporariamente e em comissão de serviço. Não há, repito, qualquer colisão, ou seja, não é pelo facto de haver oficiais do exército a prestar serviço na PSP que a carreira dos oficiais de polícia fica cortada, visto que estes ainda não chegaram ao nível equivalente aos que vêm do exército e que para lá regressam ao fim de quatro anos de prestação de serviço, em comissão de serviço.
Ainda em relação a este tema, embora ele volte a ser abordado na quinta-feira, penso que não vale a pena invocar os exemplos da CEE, porque, de facto, há países na CEE onde não existem sindicatos de polícia, contrariamente àquilo que o Sr. Deputado disse. Porque razão é que o Sr. Deputado não invoca os exemplos resultantes das convenções da OIT? Portanto, aí é claro que a nossa posição não é nada daquilo que resulta das suas afirmações.
Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lacão, devo dizer que fiquei um pouco preocupado quando, no início da sua intervenção, fez uma série de críticas em relação àquela que produzi; porém, depois constatei que não a deve ter ouvido, porque fez uma série de referências a coisas que na minha intervenção têm precisamente o sentido contrário. Disse, por exemplo: «É grave que, na complexidade das múltiplas dependências entre as forças de segurança, não haja um plano de coordenação e cooperação das forças de segurança.» Ora, Sr. Deputado, já ontem referi que esse plano já existe, porém o senhor não ouviu, não estava cá, ou então eu omiti a palavra «não», mas o que é certo é que existe o plano e eu disse-o ontem.
O Sr. Deputado também disse que o serviço de estrangeiros e fronteiras já tem quatro ou cinco anos de vida, mas devo lembrar-lhe que ele tem cerca de dois anos e meio, ou seja, metade. Pode ser que metade nesta matéria não tenha muito resultado mas,...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - A lei, a lei!

O Orador: - A lei é do último dia de 1986 e desde essa data até hoje penso que não passaram cinco anos, são dois e meio, como acabei de dizer-lhe.
O Sr. Deputado disse também que havia inércia, porém, isso não é verdade, pois o Sr. Deputado foi o próprio a dizer que havia um protocolo entre a Guarda Fiscal e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, tal como a própria lei refere, no sentido de gradualmente as funções de uma delas, da Guarda Fiscal, serem transferidas para o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Disse também, além de outras aleivosias, que o relatório não tem nada de prospectivo. Ora, na parte final
do relatório refere-se quais são as preocupações do Governo, actuais e do futuro, e se isto não é prospectivo não sei o que é que o Sr. Deputado entende quando disse que havia falta de análise prospectiva desta matéria por parte do Governo.
Em relação à outra questão que me colocou, sobre a PSP e a sua autonomização, digo-lhe que não sei como é que pode acelerar-se a formação de oficiais de polícia se, de acordo com o estatuto aprovado pelo governo do bloco central, há um curso de quatro anos e quatros anos não se podem comprimir em dois!
A Escola Superior de Polícia começou a funcionar há cinco anos e este ano sai o segundo curso completo. Não se pode acelerar este processo, transformando quatro anos em dois ou em um. Não vejo, pois, quais as críticas que o Sr. Deputado invoca quanto à falta de celeridade no recrutamento e no aproveitamento das potencialidades da Escola Superior de Polícia.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Com certeza, Sr. Deputado, até lhe cedo tempo se o tiver.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, desculpe-me mas ia justamente dizer-lhe que o tempo do Governo se esgotou.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma intervenção.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado só dispõe de 36 segundos, mas mesmo assim dou-lhe a palavra.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Ministro, gostaria de agradecer-lhe as respostas, embora poucas, que teve a amabilidade de dirigir às perguntas que lhe coloquei e que foram muitas.
Penso que este assunto é um pouco irrevelante mas, uma vez que o senhor começou por aí, gostaria de dizer-lhe que, de entre os factores que são considerados no relatório, aquele que, do ponto de vista do Governo e em relação aos outros factores referidos, tem uma alteração brusca é a inflação. Portanto, apenas fiz referência a este aspecto, uma vez que ele é completamente omitido neste relatório quando foi potenciado no primeiro, razão pela qual fiz referência a este factor.
A outra questão tem a ver com o problema da coordenação e cooperação. Devo dizer-lhe que li com bastante atenção o seu discurso de ontem e ele revela uma linha de força e uma preocupação legítima e natural da cooperação e da coordenação. A questão que coloquei foi no sentido de saber em que medida é que essa coordenação e cooperação estava potenciada ao máximo possível para dela se retirar o máximo de rendimento.

A Sr.ª Presidente: - Embora o Sr. Ministro já não disponha de tempo, a Mesa cede-lhe um minuto para responder ao Sr. Deputado Marques Júnior, se assim o entender.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, como certamente compreenderá, não podia falar do plano de cooperação e coordenação

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no relatório, na medida em que ele foi aprovado, posteriormente à data de referência limite do relatório, já no corrente ano, razão pela qual me referi . a ele apenas no discurso.

Quanto à questão da inflação, penso que não vale a pena voltarmos a ela. Contudo, devo lembrar que há vários factores que contribuiram é um deles é a inflação, que não se manteve no ano passado mas os outros factores mantiveram-se e até se reforçaram no seu efeito.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lacão (PS):. - Sr.º Presidente, para exercer o direito de defesa. Como certamente terá verificado, eu pensava que seria possível dialogar com o Sr. Ministro- na sua intervenção de há pouco. Como não foi possível e. não tendo outra forma regimental de o fazer, tenho de, recorrer a esta figura, que permitirá ao Sr. Ministro dar explicações.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, , Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito obrigado, Sr.º Presidente. O pretexto formal seriam as "aleivosias", mas vou passar por cima disso.

A questão que se refere ao plano de coordenação das forças e serviços de segurança, a meu ver,' é mesmo uma questão nevrálgica e quando eu aqui falei da não aprovação de um plana de coordenação de forças e serviços de segurança e, designadamante, da não auscultação dos partidos representados na Assembleia da República, o que deveriam ser para a política geral de segurança interna, ao abrigo da Lei de Segurança Interna, e, portanto, desejavelmente o deveriam, ter sido à este pretexto, era para exprimir uma preocupação que se mantêm e que é a da especialização. funcional das polícias, tendo em vista a sua participação ria área da investigação criminal. Também a pretexto desta preocupação, invoquei a -ausência do novo estatuto orgânico ' da Polícia Judiciária que, a meu ver, poderia contribuir, com uma parte significativa para a resposta à este problema.

Como o Sr. Ministro sabe, está patente no .relatório que apresentou, e diz que esta é outra questão que vos preocupa, é a excessiva ocupação dos agentes policiais em acções do foro judicial, anunciando a esse propósito uma intenção de revisão de algumas cláusulas nó actual Código de Processo Penal.

Estas são questões institucionais sérias, que coloco em termos de necessidade de abordagem prospectiva a propósito do relatório. O Sr., Ministro desculpar-me-á, e não vou devolver-lhe a acusação de aleivosia, mas o que penso ,é que os temas são, institucionalmente, suficientemente sérios para merecerem uma ponderação até às últimas consequências:. Foi isso que pretendi suscitar com a minha intervenção .e é- isso que desejo .que o Sr. Ministro também possa fazer.

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: =- O Sr. Deputado afirmou, carrément: "Não existe plano de coordenação e cooperação." Eu disse-lhe que sim, que existe, e afirmei-o.

Quanto à questão das dificuldades que o Código de Processo Penal entrado em vigor recentemente causa às forças de segurança e também à Polícia Judiciária, já na comissão tivemos ocasião de trocar impressões sobre este assunto e eu afirmei que o Governo estava, e ainda está, a tentar atenuar, sem diminuir a eficácia do Código de Processo Penal, o impacto negativo que algumas dessas disposições, como o senhor muito bem salientou, têm na operacionalidade de algumas forças e serviços de segurança. Aí não há nada de novo! O senhor não quereria, com certeza, que eu viesse referir aquilo já disse na comissão, porque certamente acusar-me-ia, como o fez inicialmente em relação ao meu discurso, dizendo que ele era a repetição do relatório e do que eu disse na comissão.

Não. .há, pois, nada de novo em relação a essa matéria. Queremos e estamos a estudar .alterações e ajustamentos à legislação em vigor para, repito, sem diminuir . a eficácia e o valor dessa legislação, atenuar o impacto negativo que tem sobre a actuação das forças e serviços de segurança.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, está terminado debate sobre o relatório.

Vamos entrar no período de antes da ordem do dia.

ANTES DA ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, chamo á vossa atenção para o facto de havei, por lapso dos serviços um desfasamento entre ó boletim informativo e á agenda da Mesa.

Assim sendo, o primeiro ponto do período de antes da ordem do dia é a discussão da proposta de lei n. º 106/V - Autoriza o Governo a legislar em matéria de isenções fiscais e deficientes motores ria importação de triciclos, cadeira de rodas e automóveis ligeiros -, e não a proposta de lei n.º 102/V, como consta do 'boletim informativo. A decisão de proceder e esta alteração foi tomada em "mini-Conferência" de líderes que se realizou ontem à tarde.

O Sr.º Herculano Pombo (Os Verdes):' = Sr.º Presidente, peço a palavra.

A Sr.º Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr.. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, para interpelar a Mesa:

A Sr.º Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. .

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, depreendi das suas palavras que a proposta de lei n.º 102/V não vai ser discutida hoje, mas, sim, a proposta de lei n.º 106/V. Gostaria, pois, de saber se a discussão dessa proposta de lei é antes ou depois da discussão das ratificações n.º, 72/V .e 73/V,.que também estão agendadas para hoje.

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A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, vamos, em primeiro lugar, discutir a proposta de lei n.º 106/V e depois seguir-se-ão as ratificações.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, no boletim informativo consta, em primeiro lugar, a discussão das ratificações e só depois a da proposta de lei n.º 102/V, que agora passaria a ser a proposta de lei n.º 106/V.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, exactamente por isso é que eu fiz a rectificação ao boletim informativo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sendo assim, Sr.ª Presidente, confirma-se que a proposta de lei n.º 106/V é p primeiro tema de debate no período da ordem do dia.

A Sr.ª Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, o relatório anual sobre a situação do País em matéria de segurança interna e a actividade desenvolvida pelas forças e serviços de segurança - ano 1988, bem como outras matérias, serão votadas às 19 horas e 30 minutos.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, na última reunião plenária, foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Barbosa da Costa; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; a diversos ministérios e às Câmaras Municipais de Santo Tirso e Gondomar, formulados pelo Sr. Deputado Herculano Pombo; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado António Mota, e ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado José Apo-linário.
Deu ainda entrada na Mesa o projecto de deliberação n.º 49/V, propondo a constituição de uma subcomissão permanente de justiça e assuntos prisionais.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Falar de portugalidade, em Guimarães, é como desdobrar um velho pergaminho a que nem o tempo nem as sucessivas repetições tiraram valor ou interesse.
Estamos no local onde, a 24 de Junho de 1128, se abriu o último período da história do Condado Portucalense e, a distância de três lustros, a independência de Portugal se vislumbrou.
Não posso esconder a admiração que me merece a figura de Dona Teresa cuja acção, marcada pela valentia e pela astúcia, contribuiu para anexar o Condado do Reino de Leão. Deixemos mesmo em julgado, a orientação galiciana que deu ao seu Governo. Aqui, talvez os ditames do coração, conjugados com a força militar que encontrou no Conde de Trava e no Arcebispo Gelmires, tivessem ditado opções políticas e estratégicas que, analisadas ao longo de todos estes séculos que nos separam, surgem como que embuídas de um, isto de amor-engenho e astúcia governativas. Portugal tem, no entanto, raízes mais longínquas do que as lançadas pela Bela Tereja.
Não, no que diz respeito às fronteiras geográficas ou no que concerne ao desejo de autonomia relativamente a Leão e Castela, mas na sua identidade cultural que se pode encontrar nos legados que nos deixaram os vários povos que por aqui passaram. Neste contexto, Guimarães emerge da penumbra dos séculos como um marco histórico e decisivo, como marca indelével de portugalidade, como reflexo vivo e inequívoco de autonomia como Estado, a partir da primeira metade do século XII.
Indo mais longe vamos encontrar esse desejo no papel histórico de Vímara Peres na presúria de Portucale. Relembremos que embora ainda não houvesse o sentido da independência das terras, nem a nobreza do ocidente peninsular a cultivasse em relação aos reis de Leão, havia por parte destes e, sobretudo, daquela, a necessidade de prosseguir a reconquista que impunha às partes necessidade de alianças para ocorrer a estas e outras frentes de batalha. Ora tudo leva a crer que aquele presor estava ligado à colina de vima, que foi o berço de vimaranes, o futuro Castelo de Guimarães. Manteve-se o vínculo nos sucessores de Vímara Peres; seu filho Lucídio Vimaranes, que juntamente com Hermenegildo Guterres, presor de Coimbra, foi governador de Portucale e viria mais tarde a dominar a comarca de Tui. Importante também é o caso da Mumadona Dias, neta de Lucídio e mulher do Conde Mendo Gonçalves, que fundou o Mosteiro e o Castelo de São Mamede que veio a ser o berço da cidade de Guimarães. Mas, D. Afonso Henriques é aquela imagem e símbolo que dá forma e traduz a vontade de um povo que quis ser Nação livre e soberana.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Pergunto-me muitas vezes que fazemos nós, Vimarenenses actuais, para sermos merecedores deste passado. Interrogo-me, com certa veemência sobre que poderes nós vimarenenses fazer para continuarmos na senda dos nossos antepassados.
Aqui nasceu Portugal! Aqui foi sempre o maior e o mais importante centro político e económico da Nação que estão nascia para a portugalidade. Este património histórico acarreta e traz até nós responsabilidades acrescidas, porque não haveremos de querer legar aos vindouros apenas a imagem de que vivemos nesse passado histórico-heróico. Guimarães não pode nem deve contentar-se com as glórias de um passado que, de longínquas, se escondem na poeira dos séculos. Os nossos filhos exigem mais de nós; os nossos contemporâneos olham para nós com um misto de desconfiança e desespero por ainda não souberam dar-lhes a satisfação e o orgulho necessários de serem vimarenenses. Não bastará durante sempre dizermos: aqui nasceu Portugal.
É imperioso dizer também: aqui continua Portugal. Foi essa talvez a mensagem que o Sr. Presidente da República quis transmitir quando, em Setembro de 1986, aqui assentou a sede da sua presidência aberta. Se S. Ex.ª quis começar aquela prática no local que foi berço de portugalidade, não podemos ficar apenas contentes ou saciados por esse evento. Torna-se ir mais além, penetrar na consciência dos vimarenenses, colocar em cada um a inquietação e o desejo de regressarem ao esplendor e desenvolvimento dos séculos passados.

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Guimarães está a ficar espectante, anseia retomar a carreira do desenvolvimento; quer, no, fundo das suas aspirações mais que legítimas, ser cabeça de leão e não cauda de rato.
Mas que falta a esta gente e a esta terra para alcançar os seus desígnios? Falta-lhes por acaso, virtualidades como povo? Falta-lhes poder económico ou força inventiva para acelerar a passada? Os filhos desta terra, por acaso, deixaram cair os braços ou furtam-se à batalha do progresso e do desenvolvimento? Não temos, como vimaranenses, o secreto orgulho de vencermos o futuro com os olhos postos no legado .histórico do passado?
Tudo isto o bom povo desta terra, que é por adopção e convicção também, a minha, tem em demasia então, que lhe falta?
Alguém que sinta na alma e no corpo este constante anseio e transforme em acções concretas o sonho vimaranense.
Alguém que sinta na alma è no corpo este constante anseio e transforme em acções concretas o sonho vimaranense.
Alguém que faça ' mais do que, falar: alguém que queira pôr-se em mangas de camisa, que arregace as mangas e diga, alto é convicto: Vimaranenses, vamos a isto.
E como se pode fazer. sentir na alma e no querer profundos dos vimaranenses este constante apelo?
Entendemos que não é com "doutrinações" partidárias, venham elas donde vierem, que se chega lá, mas com acções concretas e motivadoras que os despertem para os desafios da. actualidade. Nesta perspectiva,
entendemos que ao povo de Guimarães, há duas dividas a pagar imediatamente:
Uma relaciona-se com o reconhecimento nacional de que, em Guimarães, continua a existir o alto. sentido da portugalidade. , .
Não podemos. concordar que o dia 24 de Junho, dia da portugalidade, se afirme de maneira tão` insipiente e envergonhada como tem ultimamente sido comemorado...
Guimarães tem o direito, eu diria o dever sagrado, de restaurar o seu cortejo histórico do dia 24 de Junho. Custe o que ele custar, porque sempre entendemos que esta manifestação histórica, para lá dos, aspectos educativos como lição viva e ao vivo que é para todos quantos nela possam participar, para lá do seu aspecto turístico de que eventualmente se reveste e tem outra
importância que transende tudo isto: é o orgulho vimaranense de fazer acordar em todos nós a consciência da nacionalidade.
É que Srs. Deputados, a consciência de um povo não se contabiliza: é um serviço que vai buscar ao fundo do ser a satisfação que não se encontra nos cofres nem na adição de Superávites.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A outra divida a pagar aos vimaranenses é a que se prende directamente com a identificação .das gentes com os grandes projectos de desenvolvimento de que o concelho carece.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Basta de Pedagogia!

O Orador: - O povo de Guimarães quer e tem o direito de tomar nas suas mãos os destinos desta terra que é sua tão encarecidamente ama. É conhecido o bairrismo de Guimarães, tantas e tantas vezes tem demonstrado em circunstâncias adversas, mas não podemos permitir que este bairrismo e este acalorado incentivo e apetência vimaranense se dilua no futebol. Temos que chamar a nós todos os que querem ver crescer harmónicamente esta terra: temos que os fazer "confidentes e cúmplices" dos nossos sonhos e quereres. Não acreditamos em desenvolvimento que não tenha a participação de todos os filhos da terra. Estão aqui os industriais, os trabalhadores por conta própria ou de outrem, estão aqui os comerciantes, os estudantes, os professores, os trabalhadores rurais, em suma, todos aqueles que, sem olhar a cores ou credos, acreditam que poderemos restaurar a imagem de Guimarães dinâmica e dar-lhe novamente a vida, a alegria e o dinamismo que a tornaram a primeira capital da Nação.

Vozes do PSD: - Muito- bem!

O Orador: -- Não escondemos o orgulho que sentimos quando em Guimarães se realizam obras; não escondemos a nossa enorme satisfação pessoal quando verificamos que há gente que nos contacta, aqui e ali por toda a parte a dizer: vamos mudar de agulha; vamos deixar as palavras para os que nada querem fazer; não queremos promessas, queremos obras e tantas quantas não caibam na nossa imaginação.
Esta divida temos de pagá-la todos nós caso contrário; um dia, que já espreita na soleira da porta, o povo cansado, triste e aborrecido, virar-nos-á as costas... e tem razão.
Por isso entendo que o povo de Guimarães tem de participar em tudo quanto se realiza ou irá realizar-se em Guimarães. É aquilo a que eu chamo política participativa; ao contrário dos que pensam que os destinos dos povos e das gentes, se riscam no papel dos gabinetes, nas antecâmaras da intriga e dos mesquinhos ou através de benesses ou compromissos políticos.
Não posso deixar daqui salientar a satisfação e o orgulho que. os vimaranenses sentem pelo que no seu concelho o Governo do PSD tem feito. É justo que queiram. mais, cada vez mais, até à plena satisfação dos seus anseios e, .por isso, é compreensível que os vimaranenses repudiem os discursos balofos...
Risos do PS.

O Sr. Calo Roque (PS): - Tanta demagogia.

O Orador: - ... os escritos bafientos, os conceitos
radicais, o atabalhoamento das oposições, os slogans
gastos de sentido, o predomínio do interesse pessoal
sobre o interesse geral. -
Este estado de espirito traduz um querer bem mais significativo do que muito boa gente pensa e cuida.
-Por isso, não se surpreende que os vimaranenses olhem com agrado e com orgulho para as realizações concretas levadas a cabo pelo Governo do PSD.
Não se pode negar aquilo que os nossos olhos vêm com clareza; não se -pode esconder a ninguém ou tentar fazer dos outros cegos, quando se pretende afirmar que não foi o Governo do PSD quem mandou fazer a central de camionagem, o hospital, a circular urbana,

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o centro tecnológico têxtil, o Instituto do comércio externo português, a Universidade do Minho que reputo de capital importância para Guimarães, a Escola da Cantaria de São Torcato, os quartéis dos Bombeiros das Taipas, para Vizela e Guimarães, o Centro de Saúde, etc.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): — O pior é que os de Vizela também querem.
O Orador: — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Sei que toda esta obra não chega nem é tudo, mas deixem--nos continuar esta caminhada. Permitam que continuemos a pugnar e a lutar pelo bem da nossa terra, evitando que outros, a troco de falsas promessas, ou com a demagogia da promessa nunca cumprida, venham dizer e prometer mundos e fundos sem contudo, esclarecerem, donde vem o dinheiro, como vem e quando vem. Prometer é fácil, fazer é bem mais difícil. Ao Governo se exige que compreenda e respeite os anseios de cada terra ou de cada cidadão, cumpre-lhe estar atento às necessidades, hierarquizar propriedades, estimulares acções, de forma a manter o desenvolvimento harmonioso e equilibrado do todo nacional, tendo em consideração valores históricos, interesses culturais e a própria produtividade. E neste ponto, o da produtividade, sejamos claros: O País não pode distribuir riqueza e não a produzir. Ora Guimarães é um concelho rico de História, rico de inteligência, rico de trabalho, rico de iniciativa, rico de realizações. Mas a sua maior riqueza, o seu maior tesouro consiste no orgulho que os seus filhos sentem de serem vimaranenses. É esse o tesouro que queremos preservar e aumentar porque falar de Guimarães é ter presente o sentido sagrado da Pátria que ali nasceu.
Num momento histórico em que o sentimento de nacionalidade tende a diluir-se no conceito de espaços transnacionais. Não é inócuo que aqui afirme a necessidade de institucionalizarmos o dia 24 de Junho como marco importante no progresso que conduziu ao nascimento e existência da Pátria portuguesa que três séculos depois daria «novos mundos ao mundo».
Hoje ainda e, como então, Guimarães pretende estar na primeira fila e os seus filhos unidos numa vontade tornada crença, tudo farão para, ao lado de todos os portugueses, contribuir para o desenvolvimento de Portugal no contexto europeu. É este o nosso propósito, esta a nossa certeza.
Aplausos do PSD.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): — Com Vizela ou
sem Vizela?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Se o Esteves Cardoso tivesse ouvido esta intervenção, convidava-o para o tempo de antena.
Risos do PCP.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presi-dente, Maia Nunes de Almeida.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos César.
O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A vida política, social e cultural nos
Açores atravessou recentemente momentos de grande elevação e, simultaneamente, de grande euforia, com a realização, naquela região autónoma, durante cartoze dias, de mais uma «presidência aberta» de Mário Soares.
Num momento em que a temática descentralizadora em Portugal permanece na ordem do dia do debate político, com os esforços e contra-esforços que suscitam os projectos de regionalização do território continental, o estabelecimento da presidência da república nos Açores veio legitimar as características de projecto nacional das autonomias insulares e, mais do que isso, associá-las pública e formalmente ao nível institucional mais elevado do Estado.
As autonomias político-administrativas dos Açores e da Madeira, que se diferenciam das soluções propostas para a regionalização do continente, que se referenciam numa ordem de causas e efeitos dissemelhantes, têm, porém, em comum, a percepção das inconveniências para o seu desenvolvimento integrado de uma subordinação integral a um poder longínquo, narcisico e centralizado, cujo espelho actual — o «cava-quismo» — se revela como um redobrado factor perturbador da unidade nacional, entendida como a unidade política e a solidariedade social entre os portugueses.
Os açorianos testemunham um passado, amplamente comprovado por este mundo fora, em que o desenvolvimento de regiões pobres sustentado num papel dominante ou exclusivo dos poderes centrais não é bem sucedido e por vezes não é seriamente tentado. Mas testemunham também, no momento que passa, que um poder regional que seja julgado como um núcleo marginal de competências e afogado por um poder político «nacional-maioritário» que se designa na primeira pessoa do singular, não se afirma, não se tranquiliza, não aproveita a região não aproveita para o País.
Importa, pois, cada vez mais, exigir do poder executivo a nível nacional uma nova compreensão para as regiões insulares, cuja afirmação e êxito já não se centra fundamentalmente nos seus modelos organizacionais, mas sim na solidariedade e maior disponibiliza-ção de recursos exógenos para o seu completo exercício.
Afirmo-o, com a carga de insuspeição de quem até não deseja insucessos ao partido que é maioritário em ambas as regiões autónomas.
Importa, pois, alertar o País e certos responsáveis políticos, que a reflexão sobre os designados «custos da insularidade» não é figura de retórica oportunista, nem é uma invenção parasitária dos portugueses dos Açores e da Madeira.
Nos Açores, as onerações dos bens de consumo corrente e de equipamento em consequência do transporte marítimo ou aéreo; pela mesma razão, a penalização das exportações; os custos na educação e na saúde multiplicados por nove pela descontinuidade territorial; todas as envolventes da comunicabilidade interna da Região e da sua cadeia económica; a pequena dimensão da terra e o exíguo mercado local do País; o seu distanciamento em relação ao centro do País; as carências energéticas; a rotina do processo produtivo e a sua inevitável especialização cíclica e altamente dependente, sempre determinaram essa percepção de sobrecustos e relevaram essa desvantagem comparativa, que ainda hoje coloca os açorianos 407o abaixo do rendimento per capita nacional.

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Agora, com a integração política e económica no velho continente, do qual quase só conheciamos esta língua de terra que Fernando Pessoa chamou "o rosto e a cara da Europa", do qual havíamos conhecido as consequências, de uma ditadura centralizadora vinda dessa Lisboa que Antero dizia que "patusca, chatina, intriga, goza, explora, compra e é comprada, vende e é vendida", agora, dizia, podemos ganhar a dimensão tornada privilégio do ultra-periférico, augurando um centro menos parco e menos avarento.

Dessa nova solidariedade europeia só aspiramos a que o governo da república seja mais intérprete e mais veículo; que o poder regional proceda ao seu mais racional aproveitamento; fazendo dos problemas da integração um impulso para a resolução dos nossos próprios problemas.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presença do Sr. Presidente da República nos Açores, trilhando o caminho açoriano, da Ilha de Colombo. ao ponto mais ocidental da Europa onde está a dupla-insularidade (na Ilha das Flores e não no Cabo da Roca como afirmou em tempo de antena o euro-deputado Capucho)...

Risos do PS:

... trouxe ao arquipélago as mensagens que tardavam: dali, advertiu para' ,cá, que a solidariedade nacional tinha que, chegar; lá, disse, talvez não só para lá, que a liberdade e o- diálogo são a seiva da autonomia, que o diálogo "começa no quadro da assembleia *regional, depois entre os poderes regional e local, entre estes e a sociedade civil". Depois, ainda, o outro diálogo, entre o governo da república e o governo regional, entre a Assembleia da República e a assembleia regional.

Mário Soares interpretou o poeta açoriano, não fosse "a liberdade a aspiração secreta das coisas". Não, precisou,. como Carmona, de gritar: "Aqui é Portugal", bastou-lhe protagonizar a açorianidade como qualquer português, bastou-lhe ser açoriano em terra portuguesa.

Do Primeiro-Ministro ouvimos também falar: esse nem viu,- nem ouviu: Foi ao despacho das "quintas" com escolta e segurança nunca vistas, fugidio, encarnando aquele capitão-general dos Açores dos finais do século XVIII que invocava São. Paulo para dizer "que nos apartemos -e fujamos dos insulanos".

Risos do PS:

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desta "presidência aberta" ficou-nos a esperança da solidariedade.

Desta "presidência aberta" ficou-nos o desejo: que o Presidente da República volte sempre, que outro Primeiro-Ministro lá vá.

Aplausos do. PS e. de. Os Verdes.

O Sr: Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ourique Mendes...

O Sr. Ourique Mendes (PSD): - Sr. Deputado Carlos César, ouvi com atenção a sua intervenção e gostaria de me, congratular inteiramente na parte que refere, com grande relevo. e. com justiça, a importância da permanência nos Açores que teve a permanência do Sr. Presidente da República nos Açores' entre 29
de Maio a 11 de Junho. `.

. Foi honroso para nós, açorianos, e sobretudo para todos os portugueses, pois os açorianos são tão portugueses como os. cidadãos do- continente e dos melhores. Isto é universalmente sabido.
O Sr. Presidente da República teve a ocasião, a todos os níveis e com o maior à-vontade, aliás, com a desplicência que lhe é peculiar, de visitar todas as ilhas, de contactar todas as gentes de apreciar todas as realidades e de tecer toda a ordem de comentários 'a nível oficial ou não oficial caindo efectivamente no coração dos açorianos.

Quando se visita os Açores, que são Portugal, de forma descomplexada; tal como os açoreanos visitam *o continente; sentindo-se- portugueses de parte inteira, naturalmente não poderá existir, da parte de ninguém, nem desconfianças nem malcrenças.

Foi isso que o Sr. Presidente da República soube protagonizar è é esse o facto de que todos nós nos associamos e com o qual nos congratulamos. , .
O Sr. Presidente da República veio reforçar, pondo-o em evidência, a importância extrema das autonomias regionais, que não ' são meras.º descentralizações, . chamando a atenção para a possibilidade direi mesmo para a necessidade do aprofundamento dessa autonomia. Isto foi dito em diversas ocasiões e circunstâncias pelo Sr. Presidente dá República.
Veio, assim nem mais nem menos, confirmar àquilo que tantas vezes os Srs. Deputados. do PSD e certamente também ás Srs. Deputados dó PS - com assento nesta Câmara têm reclamado. E pena é não ter sido possível ir mais longe na recente Revisão Constitucional - aproveito para o dizer.

Efectivamente, algumas votações cruzadas entre os nossos dois -.partidos não permitiram ir. tão longe quanto,, no fundo e impecto, certamente. todos nós, açorianos, desejávamos., A Revisão Constitucional virá novamente daqui a algum tempo, daqui a cinco anos é salvo erro, e nós não desistiremos; estamos prontos para formular de novo as mesmas, propostas que apresentámos, como também outras certamente. As opiniões regionais 'são dinâmicas, não são estáticas, não estão anquilosadas, têm virtualidades e certamente que a própria prática da autonomia revelará a maior ou menor operância de alguns preceitos. Ora, é com base nesta presunção que nós, açorianos de todos os credos e de todas as filiações político-partidárias, queremos actuar:

O Sr. Presidente da República proclamou e demonstrou ao país que as autonomias regionais são património político-cultural do nosso país, que urge desenvolver, não são apenas processos ' políticos e administrativos, são também meros processos culturais que urge desenvolver.

Outro facto de grande importância e extrema revelância foi, a oportunidade acentuada; repetida, constante, que o Sr. Presidente- da República teve de se admirar, de louvar e de pôr em evidência. o progresso levado a cabo ao longo de treze ou quatorze anos de governação efectuada por órgãos de governo próprios da região. Nesta matéria congratulo-me extremamente com a . sinceridade e a sereniedade do Sr. Deputado Carlos César, pois toda a gente sabe que os Açores são governados desde esse tempo a esta parte por social-democratas, por um. governo social-democrata que tem conduzido e, conduzirá os Açores a vias de um maior desenvolvimento e progresso:

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Naturalmente, que o Sr. Presidente da República não se poupou e o Sr. Deputado Carlos César, - tal como eu testemunhou-o - a louvar e reconhecer o grande desenvolvimento que se verifica nos Açores quando comparado com os tempos pré-25 de Abril.
A folhas tantas na sua intervenção, ele formula o voto de que o poder executivo a nível nacional tenha mais compreensão para com as autonomias regionais, acudindo a todo o processo e mecanismo de desenvolvimento.
Pergunto ao Sr. Deputado, concordando aliás, com esta afirmação, se não podemos ir mais longe e já estamos aqui nesta Câmara, formulo um voto muito sincero de que os nossos colegas deputados possam também eles visitar os Açores e contactar as nossas realidades, porque sem o auxílio e compreensão desta Câmara, que é o órgão de soberania por excelência, e sem o contributo dos seus 245 deputados naturalmente que não poderemos continuar a desenvolver como queremos as autonomias regionais.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos César tem a palavra para responder se assim o desejar.

O Sr. Carlos César (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Para não consumir muito tempo direi apenas o seguinte: estamos empenhados em melhorar todos os mecanismos constitucionais e institucionais em cooperação com os órgãos de soberania nacionais e regionais que façam ir mais longe a autonomia no sentido do seu aperfeiçoamento.
Gostaria no entanto de chamar à atenção V. Ex.ª, para o facto de nunca ter elogiado os benefícios da governação dos Açores. Não confunda isso com os benefícios institucionais decorrentes da auto-governação dos Açores. São dois planos diferentes e coloquei--me naturalmente no segundo.
Desejaria, para finalizar, registar com alegria a congratulação de V. Ex.ª por quase todo o teor da minha intervenção, registando também com apreço, o silêncio que teve sobre as minhas considerações em relação ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Governo da República.

Aplausos do PS.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Ourique Mendes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e da dignidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ourique Mendes (PSD): - Sr. Deputado Carlos César, eu nunca diria que o Sr. Deputado tinha louvado a governação regional - o pasmoso seria o contrário! Não o fez o Sr. Deputado Carlos César, mas fê-lo o Sr. Presidente da República o que para nós é mais honroso e satisfeito desculpe-me que o diga.
Por outro lado, a sua intervenção tratava fundamentalmente da presidência aberta e dos benefícios daí colhidos; exaltava mas penso que não confrontava nem punha no mesmo plano o Sr. Presidente da República e o Sr. Primeiro-Ministro.
Tratava-se de pôr aqui em relevo uma situação que se viveu há bem pouco tempo nos Açores e portanto, foi só a isso que me limitei e cingi sendo certo que
teria capacidade, vontade e interesse em responder-lhe também na outra parte, o que poderei fazer noutra ocasião.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos César tem a palavra para dar explicações.

O Sr. Carlos César (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Registo a continuação do silêncio do Sr. Deputado Ourique Mendes, a que adicionou, com alguma naturalidade, alguma atrapalhação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, aproveito para levar ao vosso conhecimento que se encontra entre nós um grupo de alunos, acompanhado dos seus professores, do Colégio Teresiano de Braga, a quem saudamos.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje vamos falar-lhes da Área Metropolitana do Porto, zona de grande crescimento urbanístico mais ou menos ordenado, de forte concentração demográfica, com graves carências habitacionais, incluindo nos núcleos históricos do Porto e de Gaia, de deficiente rede viária, que impõe condições difíceis de acessibilidade e de circulação de trânsito, de crescente degradação ambiental, de arrastamento sistemático dos projectos de construção das infra-estruturas fundamentais para o bem-estar, progresso e desenvolvimento, apenas alvo de eloquentes promessas em vésperas de eleições, logo esquecidas rio virar da esquina do tempo eleitoral.
É a nova ponte ferroviária e os seus acessos, que deviam ter sido concluídos em 1988 mas cuja inauguração se deve aproximar das eleições de 1991...
É a nova ponte rodoviária sobre o Douro e os seus acessos, cuja construção foi anunciada na campanha de 1987, com sorte, talvez se inicie nos primeiros meses de 1991...
São os crescentes atrasos na construção das vias da cintura interna do Porto e Gaia, dos lanços das auto-estradas Porto-Braga e Porto-Vila Real-Bragança, da variante à Estrada Nacional 109 na zona de Espinho e Granja e da ligação de Espinho à Auto-Estrada 1...
É a falta de apoio à recuperação das zonas históricas do Porto e Vila Nova de Gaia, onde milhares de famílias vivem em precárias condições de habitabilidade e segurança, abundando situações de emergência e de ruína de facto, a exigir medidas urgentes para prevenir eventuais tragédias...
É todo um drama do quotidiano de uma em cada três famílias a viver em bairros clandestinos, de barracas, de partilha de habitações em fogos sobreocupados, na maior parte dos casos sem rede de esgotos e/ou de abastecimento de água, sem adequados equipamentos colectivos, com escassez de creches e de jardins infantis...
São as horas perdidas diariamente nos percursos realizados entre a habitação e o local de trabalho, nos insuficientes transportes públicos urbanos e suburbanos, que se movem com dificuldade no trânsito caótico de toda a Área Metropolitana do Porto, que, no entanto, atinge o máximo de saturação na ligação entre

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a zona central de Vila Nova de Gaia e o centro do Porto, como sabem os Srs. Deputados que por lá vivem e por lá passam...
É o acumular dos problemas ambientais resultantes de um crescimento desordenado, da destruição de importantes zonas verdes, da escassez de infra-estruturas de saneamento básico, do não tratamento dos efluentes industriais e domésticos e da descarga directa no Rio Douro e nos seus afluentes, pondo em risco uma bacia hidrográfica fundamental para toda a região, a acrescer aos sérios problemas que envolvem grande parte do litoral da Área Metropolitana do Porto, cuja conservação é fundamental, não só para assegurar a necessária qualidade de vida à população ai residente, como também, para garantir a sua função como local de recreio e lazer às centenas de milhar de pessoas da região que aí recorrem em busca da praia.
A Área Metropolitana do Porto é também' uma população de cerca de um milhão de habitantes que mantém uma intensa' actividade associativa em centenas e centenas de colectividades culturais, artísticas, desportivas e de recreio, onde o teatro, a música, o bailado, a pintura, o cinema, o folclore e o desporto atingem, em muitos casos,' elevada qualidade, apesar da falta de adequados apoios governamentais de deficientes ,equipamentos culturais e de escassos meios materiais è técnicos.
São conhecidas em todo o Pais iniciativas como o Fitei, o Fantasporto, e actividades de instituições como o Círculo Portuense de ópera, a Orquestra Sinfónica do Porto, várias companhias de teatro sobretudo 'do Porto e Gaia, a Cooperativa Árvore entre muitas outras, etc.
No quadro de uma política global de dinamização e democracia das actividades culturais, impõe-se o adequado apoio às instituições exigentes e ao associativismo cultural. Mas impõe-se igualmente a criação e instalação de novas instituições culturais públicas, tais como o Museu do Trabalho do Porto, o Museu de São Pedro da Cova, o Museu de Cerâmica de Gaia, a Cinemateca, o Centro Nacional de Música, Companhias de ópera e Bailado e o Museu de Arte Moderna, a revoltando o espaço exigente na Casa de Serralves. É igualmente necessário proteger, recuperar e conservar instalações que pertencem ao património cultural, garantindo a rápida conclusão das obras em curso no Convento de São Bento da Vitória, no Palácio. do Freixo e no edifício da antiga Cadeia de Relação, promovendo a sua utilização como instrumentos de cultura.
Termino, fazendo votos para que a Secretaria de Estado da Cultura 'se decida finalmente a adquirir o Teatro São João, seguindo o recente exemplo positivo do Município do Porto ao adquirir o Teatro Rivoli. O Porto bem o merece!

Aplausos do PCP, do PRD e Os Verdes.

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente, Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Barbosa da Costa, que tem a palavra.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr.º: Presidente, Sr. a Deputada Ilda Figueiredo: Queria referir, a titulo de pedido de esclarecimento, que estou de acordo com as afirmações, produzidas, as quais também já foram matéria de uma intervenção que em tempos produzi nesta Assembleia.
Por outro lado, quero também lembrar que o Porto parece estar cada vez mais perto pelas ligações rodoviárias mas está cada vez mais longe do pensamento dos governantes apesar de muitos serem oriundos de lá; o que é pena. Depressa se esquece a terra, quando se vem para esta; onde, de facto, há um esquecimento notável 'ds origens que se tiveram.
Gostaria de lembrar também que se torna necessário olhar,: não só para os aspectos infra-estruturais de vias e outros domínios, mas também para as grandes realidades culturais que lembrou, e bem, e é importante que o Estado, nos seus diversos níveis, tome isso em atenção, porque há realidades culturais na zona metropolitana do Porto .e no Norte em geral que têm validade suficiente para merecer apoios estatais.

A Sr.ª Presidente:- - Para dar esclarecimentos, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueredo.

A Sr. a Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Barbosa dá Costa, muito obrigada pelas suas palavras.
De facto; há aqui um número elevado de deputados da Área Metropolitana do Porto que sabem como todas as questões que aqui levantámos são rigorosas e verdadeiras e como a população da Área Metropolitana do Porto necessita e exige que todos se empenhem, independentemente das suas posições político-partidárias, na resolução urgente destes problemas. Não basta andar a fazer promessas no período eleitoral, é necessário que no dia a seguir nos dias que se seguem, no tempo que se segue, se dê continuidade às promessas que §e fizeram e sé lute pela concretização dessas promessas.

É- disso que se trata e urge que o Governo tenha em conta a riqueza e a importância desta zona e desta região e resolva' aspectos fundamentais e urgentes para a .melhoria da qualidade de vida, progresso e desenvolvimento desta rica região da Área Metropolitana do Porto. '

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito bem!

A Sr. e Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr., Deputado Barbosa da Costa.

OS r. Barbosa da Costa (PRD): - Sr.ª Presidente, -Srs. Deputados:, Repetem-se, com preocupante regularidade, os conflitos entre as populações e o Poder Central, tendo como origem situações anómalas, consideradas como afrontosas pelas comunidades que se sentem ofendidas nos seus interesses e direitos.

Os quadros são os- mais variados, mas a base dos confrontos- reside, quase sempre, na ausência de diálogo ou no seu desenvolvimento defeituoso, que não é naturalmente o caminho mais ajustado ao bom relacionamento entre as partes.
Umas vezes, é o traçado de vias de comunicação que não, tem em conta a realidade envolvente, outras é a alteração da paisagem, quer pela permissão de edificações que ofendem a paisagem, quer pela plantação de espécies que têm pouco a ver com a nossa ancestral cultura.. Nem sempre se ponderam, como se devia, as

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posições respeitáveis das pessoas que serão fortemente penalizadas com as substanciais alterações que tais iniciativas provocam.
Uma pretensa necessidade de extracção de caulino para a economia nacional, como matéria prima para a indústria de cerâmica, papel, vidro e especialidades farmacêuticas, está na raiz de mais um problema dividindo a população de Barqueiros, no concelho de Barcelos, entre a agricultura e o caulino.
A população local opõe-se à firma interessada na sua tentativa de exploração, porque considera que tal actividade terá nocivos efeitos no impacto ambiental.
De facto, a exploração em causa situa-se no local mais central da povoação, muito próxima da igreja, cemitério, escola e aglomerado habitacional mais significativo e os habitantes locais baseiam a sua contestação na real implantação de uma nuvem de pó permanente, que trará graves consequências.
Embora esteja prometido que, feita a exploração, o terreno será reposto na sua orografia inicial, ponto é, que os interessados têm razão para desconfiar de tais propósitos, já que a extracção de caulino feita noutros locais há mais de vinte anos, deixou os terrenos abandonados, tal qual como quando se encontravam no fim da exploração, formando perigosas lagoas na época das chuvas, não se fazendo obviamente a rearborização prometida.
Para além destes nefastos efeitos constata-se que os poços, sitos em propriedades agrícolas, vão secando progressivamente, e as águas subterrâneas vão-se tornando leitosas.
Por outro lado a empresa concessionária não tomou quaisquer providências para evitar os prejuízos verificados no ambiente.
Tudo isto cria um natural clima de desconfiança entre as populações que vêem, com muita apreensão, o futuro da terra.
Daí, que se compreenda a atitude da população de não participar nas eleições para o Parlamento Europeu, bem como a atitude dos membros da junta e da assembleia de freguesia de se demitirem em bloco. Estas medidas, são, certamente, discutíveis, mas serão também a única forma de chamar a atenção, de forma eficaz, dos responsáveis pela situação.
Não pretendem os habitantes de Barqueiros negar a necessidade de obtenção desta matéria prima, o que não aceitam é que se passe por cima de tudo, num afrontoso desprezo pelos seus elementares desejos.
Perante este quadro que devia merecer uma séria reflexão, o poder instituído responde com o envio da Guarda Nacional Republicana, que constitui mais uma provocação e não o desejável diálogo que poderia conduzir à resolução do problema.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Não é impunemente que se risca do mapa o tradicional aspecto de uma povoação que não tem só uma dimensão meramente estética e ecológica, mas que assume uma autêntica vivência humana, acumulada ao longo de séculos, à volta de realidades estruturais que fazem parte já do imaginário local.
Na igreja e no seu adro, na escola e no seu logradouro, sucessivas gerações desenvolveram os seus projectos e anseios comuns que não merecem ver destruídos de forma abrupta e definitiva.
Apelamos, assim, para a reflexão necessária por parte do Governo para que, também neste caso, tente ultrapassar a restritiva e limitada visão do cifrão, por mais significativo que seja, e respeite o Homem que vale mais que todos os bens, por mais respeitáveis que se considerem.

Aplausos do PRD, do PCP, de Os Verdes e de alguns deputados do PS.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Barbosa da Costa: Conheço extremamente bem o problema de que acaba de falar.
Em nome do Grupo Parlamentar do PCP e enquanto deputado eleito pelo Círculo Eleitoral de Braga, pude, nos últimos tempos, proceder a várias intervenções sobre a matéria e, por isso, como compreenderá, sintonizo-me por inteiro com as preocupações que expendeu e com as críticas que formulou.
Parece-me que, a nenhum nível, se pode continuar a admitir que, reiteradamente, sejam postas em causa instâncias elementares de acesso a uma melhor qualidade de vida por parte do povo de Barqueiros e, ao mesmo tempo, se assista impassivelmente a sistemáticas violações da lei, porque a empresa que alega legitimidade para extrair os caulinos persiste em não respeitar, sequer, uma portaria governamental, bem como muito do que se encontra disposto em lei como matéria mínima para que se possa proceder, sem degradação ambiental, a explorações deste jaez.
Além do mais, nós conhecemos a profunda indignação das populações e sabemos que elas têm levado a que, independentemente da militância em qualquer partido, a generalidade das forças políticas tenham dado apoio à luta do povo de Barqueiros. Quando digo «generalidade das forças políticas» é para dizer que há também, no partido do poder, no PSD, quem de forma alguma subscreva o comportamento do Governo e o comportamento das autoridades, para assim envolver tanto as forças policiais como aquelas que têm funções administrativas relevantes.
Por outro lado, sabemos - e com isto concluo - que têm vindo a público rumores e imputações claras de que existem ligações, por parte de membros do actual Executivo, a interesses, que são obscuros e estarão na base da manutenção de um verdadeiro estado de calamidade ou, pelo menos, de grande conflitualidade na zona de Barqueiros.
Há pouco pudemos verificar que o Sr. Ministro Silveira Godinho, em réplica ao Sr. Deputado Herculano Pombo, não foi capaz de desmentir, de maneira categórica, as insinuações que vêm veiculadas pela comunicação social e que têm sido produzidas pelos autarcas de Barqueiros e pelas populações locais.
A pergunta que lhe deixo no ar é a seguinte: acha que é esta a verdadeira razão pela qual a inércia do Governo subsiste ou, pelo contrário, entende que haverá outras razões? Em qualquer caso, o que lhe parece que, de imediato e com carácter de urgência, deve ser feito?

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

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O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Manuel Mendes: Agradeço os esclarecimentos fornecidos. De qualquer forma, entendo que a razão obrigaria o Governo a repensar a sua estratégia para aquilo que pretende fazer.

Não gostaria de acreditar que, mais uma vez, haja dúvidas quanto à honorabilidade de gente ligada ao poder, nesta matéria. E, sobretudo, não gostaria que as razões que levaram Aquilino Ribeiro a escrever -"Quando os lobos uivam" levassem a pena brilhante de José Manuel Mendes a escrever alguma coisa sobre Barqueiros.
Gostaria que o problema se resolvesse antes.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito bem!

A Sr.` Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o_ Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.º. Presidente, Sr.- Deputadas, Srs. Deputados: É este período da ordem do dia o momento indicado para aqui trazermos as questões de índole local, mas nem por isso menos importantes ou menos .preocupantes. '

A questão que aqui vos quero hoje trazer brevemente; é uma. questão que é de extrema preocupação para as gentes do norte, nomeadamente, para os habitantes e os agricultores em especial, dos concelhos de Chaves e de Valpaços.
Como é do vosso conhecimento o ano agrícola passado foi um ano tenebroso, que deixou na miséria aqueles que dedicam. a sua vida à produção do vinho.

Esperava-se que este ano pudesse, de alguma forma, compensar, e havia promessas já, em termos da primavera que se adivinhava e das modificações climatéricas, com os seus frutos e corrigir as situações de extrema miséria em que os agricultores do norte ficaram o ano passado.

Infelizmente houve súbitas e localizadas alterações climatéricas, com trovoadas de extrema violência e aquilo que aconteceu nas últimas semanas, e especialmente já nesta semana, em grande parte do concelho de Chaves, é de extrema preocupação para todos nós, especialmente aqueles de nós que somos oriundos daquela região.

É um facto que os agricultores de Chaves perderam 80% das suas culturas de primavera e no mínimo 50% da produção de vinho que se anunciava para este ano. Mas. os agricultores de Valpaços ainda perderam mais em termos de vinho...

O nosso ex-colega deputado do Partido Socialista Chaves Medeiros, hoje presidente da Cooperativa- Agrícola de Chaves lançou. o alerta a todo o País. Nós recolhêmo-lo aqui e queremos que esta Câmara faça eco deste alerta.

Gostaríamos que a Comissão da Agricultura desenvolvesse esforços no sentido de solicitar ao Governo medidas imediatas que minorassem, se possível, a situação dos agricultores, visto alguns deles terem perdido absolutamente tudo e não terem qualquer recurso mais

que lhes permita aguentar ou sobreviver durante este ano que se aproxima.

Foram dois maus anos agrícolas seguidos e hão há agricultor. que baseia a sua sobrevivência numa agricultura de subsistência, que consiga aguentar, se não houver um plano de emergência que faça face a estas carências graves que as intempéries trouxeram aos dois concelhos.

Estima-se que o concelho de Chaves tenha perdido só em culturas' dé primavera cerca de um milhão de contos, o que, não, sendo muito na economia total do País, é demasiado e seguramente quase tudo na economia local.

Temos que . atender também às economias locais, mormente, aquelas que estão mais debilitadas e aquelas, que são mais periféricas, que são -aquelas que precisam de ser mais discutidas aqui e mais apoiadas pelo Governo.

Faço daqui um apelo ao Governo, ao ministro da Agricultura 'é Pescas para que tome medidas imediatas e não faça como, infelizmente, no ano passado, que não avançou com- qualquer medida concreta no sentido de minorar os problemas causados pelas intempéries, nomeadamente, ao nível da produção vitivinícola.

A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira.

O Sr. - João Teixeira (PSD): - Sr.º Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Herculano Pombo: Uso esta figura do pedido de esclarecimento, para dizer que também nós, nesta bancada, e muito especialmente os que foram eleitos pelo Circulo de Vila Real e são naturais. da, zona de Chaves, temos . as mesmas preocupações manifestadas .pelo Sr. Deputado relativamente ao que aconteceu na passada semana.

Queria acrescentar que eu próprio já fiz um requerimento ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, solicitando a intervenção dos serviços regionais, atempada e eficazmente, porquanto se tratou de uma trovoada com um nível de destruição que não é vulgar e que ultrapassa de longe toda a capacidade, quer dos agricultores, quer das autarquias, para recuperar os prejuízos, já que destruiu caminhos e pontes, não se tratando apenas da destruição das culturas actuais, o que vai ter reflexos no futuro, porquanto há zonas em que a própria camada arável das terras foi arrastada.

É nesse sentido que me solidarizo com a intervenção do Sr. Deputado, certo como estou de que quando se trata de problemas regionais como aqui tem sido feito, normalmente estamos de acordo e a "puxar" para o mesmo lado, porque os agricultores daquela região - que é uma região muito carenciada que não tem alternativas económicas imediatas para além da agricultura ficam neste momento numa situação que eu considero, sem dramatismo, a situação mais grave que até. agora aconteceu ,naquela região.

A Sr.ª .Presidente: - Para responder, se o desejar,
tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

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O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Vou responder, obviamente, à solidariedade manifestada pelo Sr. Deputado João Teixeira que, como eu, é natural e residente na zona de Chaves, na zona em causa e se me permitissem, a Sr.ª Presidente e a Câmara, eu ia dizer apenas só mais uma palavra sobre esta situação. Aliás, o meu colega e amigo João Teixeira compôs bastante bem a minha intervenção no sentido de que ficasse claro que não foi uma trovoada vulgar e, infelizmente, muitas situações calamitosas por esse país ocorrem e nós vimos aqui denunciá-las.
Na realidade, há estragos e prejuízos importantes. Há uma estrada, que é uma estrada nacional e f az a ligação entre Chaves e Bragança, que está coitada porque a ponte foi levada pela enxurrada. Esta não é uma situação vulgar, é uma situação de extrema penosidade a que nem a autarquia de Chaves nem a autarquia de Valpaços terão condições económicas ou técnicas para fazer face em toda a sua magnitude.
Portanto, renovo o meu apelo e o apelo do Sr. Deputado João Teixeira ao Governo, nomeadamente ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação para que tomem medidas imediatas e concretas no sentido de auxiliar estas já tão carenciadas regiões.

A Sr.ª Presidente: - Estão inscritos para fazerem intervenções os Srs. Deputados do PSD, Guerra de Oliveira, Manuel Martins, Assunção Marques e Luís Rodrigues, mas neste momento não se encontram presentes.

O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.º Presidente, é para sugerir que, uma vez que esses Srs. Deputados se encontram momentaneamente ausentes da Sala, pudessem intervir desde já oradores de outros partidos que estejam inscritos, ficando os Srs. Deputados do PSD para o fim.

A Sr.ª Presidente: - É exactamente isso que vamos fazer, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado Carlos Encarnação inscreveu-se para que efeito?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É justamente para fazer uma interpelação no sentido de dar o meu acordo acerca da intervenção do líder do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

A Sr.ª Presidente: - Exacto, Sr. Deputado.
Seguindo a ordem de inscrições de que dispomos, dou agora a palavra ao Sr. Deputado José Mota, para uma intervenção.

O Sr. José Mota (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O AMF - Acordo Multifibras (em curso na sua quarta versão) - estará definitivamente condenado? E depois de 1991 será possível a imediata integração do comércio internacional de têxteis nas regras gerais do GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio)?
Estas as duas principais interrogações que se colocam numa altura em que importantes e provavelmente decisivas discussões se travam ao nível mundial no quadro das negociações do GATT, sobretudo depois da última reunião de Genéve, onde se debateu a sequência a dar à tão falada declaração de Punta del Este.
O que está naturalmente em causa é a liberalização total do comércio mundial de têxteis ou a manutenção de regras específicas para este sector (com um «AMFV» ou qualquer outro) que, atendendo às particularidades e enorme importância que essas indústrias detêm nos países industrializados, maxime na CEE, as proteja de uma concorrência desleal, porque baseada em custos e condições gerais flagrantemente distintas, de outros grandes produtores e potenciais fornecedores do mercado mundial - os chamados países terceiros, essencialmente asiáticos, mas também sul-americanos.
O espectro da eliminação imediata e unilateral do acordo específico para o comércio de têxteis foi arredado, o que é significativo e muito positivo, pese embora a pouca consistência ou mesmo dubiedade da declaração final de 8 de Abril em Genéve não ser o garante que se desejava para o futuro da regulamentação daquele comércio.
De facto, diz-se na aludida declaração que: «Os participantes nas negociações esforçar-se-ão por melhorar a situação do comércio, abrindo uma via à integração do sector de têxteis e do vestuário no quadro do GATT.»
É, ainda assim, mais significativa a declaração do representante da CEE para o Comité das Negociações Comerciais feita no final daquela reunião, particularmente quando refere que «(...) só a redução progressiva e a eliminação das distorções que caracterizam actualmente o sector têxtil permitirá o processo de integração gradual».
Importantes serão, também, as conclusões da reunião do Conselho de Ministros da CEE de 24 de Abril no que concerne a estes aspectos, ao referirem que a integração «(...) deve fazer-se progressivamente e na base do reforço das regras e disciplinas. Os objectivos da negociação, na base do processo de integração, devem ser os seguintes: abertura generalizada dos mercados de todos os países participantes no comércio têxtil/vestuário; igualização das condições de concorrência (subvenções, dumping, contrafacção (...)); entrada em funcionamento de um mecanismo transitória de salvaguarda adaptado ao comércio têxtil/vestuário».
Mas dentro da CEE as posições dividem-se.
Na actual fase do processo, os «liberalizantes», encabeçados pelo Reino Unido da Sr.ª Tatcher, que incluem, também, a RFA, a Dinamarca e a Holanda, parecem pretender sacrificar o sector têxtil europeu a outros interesses, para si mais lucrativos, na senda de uma política de total liberalização em que «as regras do mercado» tudo resolverão...
Não se estranham, pois, as posições do Governo britânico, como se compreendem os objectivos dos seus correspondentes dos Países Baixos e da Dinamarca, para quem é bem mais importante o comércio do que a indústria de têxteis. E é claro que a Alemanha, para além do seu posicionamento político, surge no «grupo» a defender a total abertura do mercado de têxteis como grande potência que é em vários domínios, ao mesmo tempo que, como se sabe, tem vindo a fazer deslocar

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enormes investimentos, na área têxtil, para os países terceiros - "dar" a têxtil como moeda de troça,,,nunca seria mau negócio!...
E Portugal?.

Agora integrado no grupo maioritário (essencialmente os países do sul da Europa), Portugal terá assumido papel de relevo nesta fase do processo contestando o eventual - e pretendido por países terceiros - desmantelamento prematuro do AMF. IV e defendendo a manutenção de regras especificas para o comércio internacional de têxteis.

Não foi sempre assim. E Portugal - o Governo português, perdeu em 1986 - alguma "razão" quando aceitou a posição da CEE aquando das negociações- que conduziram ao AMF IV e que se traduziu em maiores facilidades às exportações para a CEE, com resultados hoje já bem visíveis, ao mesmo tempo que para o nosso país, como membro da CEE, se continuavam a impor restrições às suas exportações, não obstante declarações de "boas intenções",- de que agora se v8 o resultado:
Não foi nada que não vissemos e para que não tivessemos chamado à atenção do Governo, e eu próprio vim sesta Câmara falar do problema, em Fevereiro de 1986 (bem a tempo), secundando os alertas e as críticas então já feitas nomeadamente por estruturas sindicais.

Talvez valha a pena recordar alguns enxertos dessa intervenção, não para reclamar para mim ou para o PS o estatuto de "videntes", mas para que se note que afinal tudo se poderia ter acautelado se as nossas palavras, ao invés de nos falecem epítetos de: "visionários" da parte. da infalível maioria e seu governo; tivessem merecido a devida ponderação 'de quem de direito.

Disse em 6 de Fevereiro de 1986 que'" a 'abolição do Acordo Multifibras, com w consequente inserção do comércio internacional de têxteis nas regras do GATT, teria para rios consequências incalculáveis a médio prazo e certamente no imediato impediria a modernização da nossa indústria, ponto obrigatório de passagem para a defesa do sector e a melhoria sensível. das condições do que nele ' trabalham". "Será inaceitável que, à partida, se entenda a próxima renovação do acordo AMF' IV como sendo à última". Foi o repto que lançámos, sem que tenha, na prática, encontrado eco na. seguinte actuação do Governo do. Professor Cavaco Silva.
Ao tempo, como referi nessa intervenção, Portugal tinha acrescidas razões ,para travar qualquer liberalização face aos países terceiros. no âmbito do AMF,
quando foi a própria Comunidade que impôs contingentes às nossas exporttações de têxteis mesmo para o período post-adesão".

Isso não se fez, por razões ainda não explicadas, com as consequências que, hoje, mesmo os empresários não escondem, não obstante na altura alguns seus dirigentes associativos me ,terem considerado, pelo menos, alarmista.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As dificuldades que se colocam às nossas exportações para a CEE são claras e cada vez maiores e os resultados dos compromissos de 1986 estão bem patentes no confronto entre as taxas de crescimento das importações da CEE provindas dos países terceiros e. as de Portugal. Bastaria atentar que, só para citar dois exemplos, as, importações provenientes da índia e do. Paquistão cresceram, em
1986 e 1987, respectivamente 140%, e 75%!

Sujeito a. concorrer com países como esses, ou a China a Coreia do Sul ou a também europeia Turquia, com custos de produção ainda inferiores aos nossos, multas vezes com matérias-primas, quando não (como é o caso da Coreia) com unidades com nível tecnológico superior ao normal no nosso País, Portugal, face às aberturas concedidas a esses países exteriores à Comunidade, tinha de perder.

Não se garantindo sequer um apoio firme e substancial para a modernização tecnológica - o alegado < medo" dós nossos parceiros em relação à têxtil nacional nunca fez sentido - em sequência e como consequência da liberalização que AMF IV já significou, comprometeu-se o futuro imediato de muitas empresas dependentes do mercado comunitário e pode ser tarde para defender o sector, com a importância e peso absoluto que hoje ainda tem em Portugal.

A recente declaração de Genéve assenta "na via da integração do sector têxtil e do vestuário no quadro do GATT".

É claro que se trata de um compromisso que permite diferentes interrogações, quase contraditórias. E se á Sr.º Tatcher diz que isso significa abolição pura e simples do' ÃMF e a Integração dos nossos sectores nas regras gerais do GATT já a partir de 1991, podemos entender - devemos defender - que nenhuma data foi estabelecida nem se aceita que o venha a ser, e por, isso- nada obsta à negociação de um AMF V e de outros mais, conquanto seja claro que o seguinte será sempre mais aberto que o anterior e que tendencialmente o comércio de têxteis e de vestuário virá a integrar-se no GATT.

Na sua sensibilidade e atenção às questões sociais e sindicais; que não,, infelizmente, pelo Governo, o Partido Socialista sabe que até 30 de Junho os vários participantes nas negociações do GATT deverão apresentar as suas propostas sobre aquela matéria.
Sabemos, também, que as confederações empresariais europeias do sector dos têxteis e vestuário defendem a eliminação progressiva e faseada do AMF, tendo mesmo apresentado um projecto que apontava para o seu desmantelamento apenas a partir do ano 2003, sujeito a várias condições e novas regras.

Entretanto, entre nós, a confiança e serenidade do presidente da PORTEX, em 1986, parece ter dado lugar, preocupação, quase ao desespero. Num documento recente do Sr. Alexandre Pinheiro dirigido à CIP a que pude ter acesso -.esse dirigente associativo referindo a existência de numerosas empresas em situação insuportável, confessa preverem-se ainda maiores dificuldades para este ano. E vou citar: "Se o acordo multifibras acabasse e ficassemos em comércio livre, dentro do GATT, isto significaria, para Portugal, uma autentica catástrofe neste sector,. pois penso que 60% das empresas .existentes não resistiriam."
. --Palavras do presidente do Conselho do Sector Têxtil, Vestuário e Calçado da CIP, preocupantes, ainda que seguramente tardias,. certo como é que teria sido bem mais fácil começar. a defender, em 1986 o que o Sr. Alexandre Pinheiro diz querer em 1989, isto é, e, volto a citar o seu escrito: "Não podemos de forma alguma e a nenhum preço concordar com o desmantelamento do multifibras (...)".

As organizações sindicais do sector, quer europeias quer. nacionais; pugnam. coerente e insistentemente pela continuidade de uma regulamentação especifica para

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o comércio internacional de têxteis que, por um lado, salvaguarde a indústria europeia e, por outro, obrigue à melhoria das condições sociais em todos os países que pretendam competir em pé de igualdade no mercado mundial.
Mas até agora, pelo menos nesta Câmara, desconhece-se em absoluto qual será - se é que já se definiu - a posição que a CEE vai defender.
Não se sabe, nomeadamente, qual a posição e que propostas terá o Governo português. Contudo, foi para nós extremamente preocupante ter ouvido o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros afirmar, no final de uma reunião com as associações empresariais do sector, que Portugal tem de se preparar para o embate que significará o fim do AMF em 1991.
Quererá isto dizer, que o Governo português tem uma posição em Bruxelas e outra em Portugal? Será, então, que este Governo está, por obrigação, com os outros países do sul da Europa, mas, pelo coração está com a Sr.ª Tatcher?
E depois de declarações públicas deste tipo, que são naturalmente ouvidas (embora desejássemos que o não tenham sido) por aqueles países que queriam o fim do AMF já, que força negociai terá o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou qualquer outro, dentro da CEE e, para mais, que consistência é dada a uma (desejável e esperada) posição de força da Comunidade perante os países terceiros no próximo futuro deste processo negocial?
Não nos espantaria ver em breve a Indonésia (o primeiro país a apelar ao fim imediato do AMF IV) a elogiar Portugal, pois que seria suposto ser o nosso país um dos principais e mais intransigentes defensores de novas e mais renovações do Acordo Multifibras...
Os problemas são problemas nacionais em que todos têm de se empenhar, mas onde as posições têm de ficar muito claras para que se saiba com o que e com quem contamos e o que nos pode esperar no futuro mais ou menos imediato.
Como já outras vezes temos dito - e, infelizmente, parece não ser por demais repeti-lo - o sector têxtil português é demasiado importante para que se brinque com ele.
Como poderemos jamais aceitar que as nossas empresas e os muitos milhares de postos de trabalho delas dependentes, possam ser postos em causa a troco de jogos políticos de bastidores, interesses nebulosos e duvidosos para o País, pois está em causa o sustento de mais de meio milhão de portugueses.
Para terminar, um apelo a todas as forças sociais e ao Governo, para que sejam capazes de encontrar soluções que permitam levar à prática as palavras do vice-presidente da Comissão Europeia, Sr. Frans Andriessen, de visita a Portugal actualmente quando afirmava que: «Faltará ainda muito tempo até quer termine o AMF»!...
Se assim não for, o sector têxtil português sofrerá no futuro imediato horas bem amargas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.
Inscreveu-se para pedir esclarecimentos o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, há pouco foi-nos solicitado o acordo para que fosse possível a realização de duas rondas de intervenções no período de antes da ordem do dia. Não obstaculizámos a que em relação aos outros partidos tal se verifique, como acaba de suceder com o Partido Socialista, e pensamos que as expectativas criadas em relação aos demais partidos deveriam ser cumpridas.
Contudo, como não fomos, entretanto, informados se tinha havido qualquer alteração a esta sugestão, gostaria de ver isso clarificado e, pelo nosso lado, não objectamos a que se prolongue o período de antes da ordem do dia por mais uns quinze a vinte minutos de forma a que o PSD e nós possamos igualmente fazer intervenções.

O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.ª Presidente, sendo naturalmente beneficiário avançado do consenso, não ficaria de bem com a minha consciência se não confirmasse que efectivamente tinha sido esse o entendimento que procurei conseguir nas bancadas - e que na altura consegui. Penso, portanto, que o PSD e o PCP deverão ter o mesmo direito que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Suponho que o Sr. Deputado Carlos Encarnação pede a palavra para o mesmo efeito.
.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É sim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr.ª Presidente, o PSD já brindou os partidos da Oposição com a oportunidade - que não usou - da intervenção do deputado do PSD que não estava presente para a fazer. Mas, de qualquer das maneiras, o PSD não quer deixar de dizer que estará eventualmente de acordo com uma prorrogação do período de antes da ordem do dia de quinze minutos e não mais.

A Sr.ª Presidente: - Portanto, será uma prorrogação de mais quinze minutos para além da hora a que nos encontramos e que já ultrapassou em dez minutos o período de antes da ordem do dia inicial.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Quero manifestar o meu inteiro acordo e aplauso à intervenção que acabou de ser feita pelo Sr. Deputado do Partido Socialista.

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O Sr. Deputado José Mota traz a esta Assembleia um dos problemas mais candentes que pode vir a afectar a indústria portuguesa e fundamentalmente um sector primordial de uma região do Pais.
Se nada se fizer nesse domínio o vale do Ave, pode vir a ser uma segunda península de Setúbal. Devemos ter a clara consciência disso! Uma e outra vez se alertaram os poderes públicos para a forma como estava a ser negociada a adesão ao Mercado Comum em termos de têxteis. Não nos ouviram ou de nós discordaram. Neste momento era importante ouvir a bancada do PSD, era importante ouvir o que é que a bancada do Governo tinha a dizer relativamente às modificações que tenciona introduzir em termos de acordos firmados e sobre aquilo que há a fazer para que este estado de coisas ainda pudesse ser inflectido.
Porque se as negociações ficarem apenas com a óptica do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que é perfeitamente taxista em relação aos problemas dos têxteis, e se não for rapidamente chamado o Ministério da Indústria e Energia e a Secretaria de Estado da Indústria, se não foram ouvidos rapidamente os industriais através das suas associações. e as forças representativas do sector, nós vemos com a maior das preocupações, para não dizer com uma angústia certa, o futuro de uma larga camada do sector têxtil fundamentalmente da fiação nacional.
Por isso é que lhe faço-a pergunta a si, embora a resposta obviamente devesse ser dada pelo partido do Governo e muito particularmente pelo Governo.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Mota.

O Sr. José Mota (PS): - Sr. Deputado Basílio Horta, naturalmente que quero agradecer-lhe a forma simpática como se referiu à minha intervenção e dizer-lhe que comungo das suas preocupações - aliás, elas fazem parte da minha intervenção - e que também eu estranho que o partido maioritário nesta Câmara, que o partido responsável pelo Governo de há três anos a esta parte nada tenha a dizer sobre um assunto tão importante para o País, tão importante para uma grande parte da população.
Também estranho que isso aconteça, isso significa que o PSD às vezes tem pouca preocupação com alguns dos problemas que mais afectam os portugueses e que mais dificuldades poderão trazer para o nosso país.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da consideração.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É só para dizer ao Sr. Deputado do Partido Socialista, que tão açodadamente veio a terreiro neste período de antes da ordem do dia focar um assunto tão nobre, que o PSD está perfeitamente consciente e seguro de que o Governo deste país saberá defender em absoluto , os interesses nacionais nesse como noutros pontos e está, portanto, perfeitamente seguro e certo de que assim acontecerá.
É natural que V. Ex.ª esteja nervoso, como membro de um partido da Oposição está continuamente em sobressalto, continuamente desconfiará da acção. do Governo, continuamente esperará outras coisas, mais, melhor, porventura, mas por isso V. Ex.ª pode estar descansado não que eu queira minimizar, repare, a sua intervenção, que teve com certeza toda a razão de ser porque o assunto é grave e exige ponderação, mas o que lhe quero dizer é que esta bancada está solidária e confiante na acção do Governo.
A este propósito, chamo a atenção de V. Ex. a para a entrevista, hoje mesmo publicada pelo Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia num jornal diário, que, a nosso ver, desfaz por completo as dúvidas e as preocupações que V. Ex. e trazia já na bagagem da sua intervenção..

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Mota.

O Sr. José Mota (PS): - Se não fosse esta última referência do Sr. Deputado Carlos Encarnação, eu ia perguntar-lhe se sabia do assunto que tínhamos estado a tratar, mas pela referência que fez à entrevista do Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia, Dr. Vítor Martins, verifiquei que conseguiu perceber minimamente o que se estava a tratar.
O que o Sr. Secretário de Estado diz hoje ao jornal "O* Comércio do Porto" é exactamente aquilo que ele dizia em 1986; só que aquilo que os empresários diziam em 1986, depois de ouvirem o Sr. Secretário de Estado Vítor Martins, é exactamente o contrário daquilo que dizem agora. Este é que é o problema.
Se o Sr. Deputado Carlos Encarnação quiser e tiver oportunidade de ler - algumas das entrevistas, que vêm no jornal "Primeiro de Janeiro", de alguns responsáveis associativos de hoje e se quiser ter a maçada de ler um documento que eu tenho aqui e que foi entregue pelo- presidente da PORTEX à CIP verifica que o Governo não está tão atento e que não se pode confiar' tanto nele como diz o Sr. Deputado.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP):.- Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Foram; finalmente, publicadas as classificações da Prova Geral de Acesso ao Ensino Superior. No mesmo dia, fontes ministeriais garantiram aos órgãos de comunicação social, com evidente satisfação, que as notas tinham sido boas, que não havia por isso motivo para pessimismos ou receios infundados, tendo alguns órgãos de comunicação social feito eco desta ideia referindo que a média das classificações rondaria os 58%.
Não compartilhamos, infelizmente, dessa satisfação .governamental; sabemos, com pesar, que a maioria dos candidatos ao ensino superior não tem motivos para ela. Por várias razões.
. A primeira é óbvia: as notas não são boas. A confirmar-se a média de 58% nas classificações, há que fazer notar que um estudante que se limite a manter esse nível nas restantes fases do sistema terá hipóteses diminutas de acesso ao ensino superior. Conhecendo os níveis de classificação que têm sido exigidos nos anos anteriores facilmente se verifica que 58% é uma média baixíssima, inviabilizadora de quaisquer expectativas de ingresso.
Consideramos, porém, que nem sequer. é esta a questão. mais importante. Porque, fosse a média de 20% ou fosse a média de 90%, seria rigorosamente igual

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o número de estudantes com acesso ao ensino superior. Porque a Prova Geral de Acesso não se destinou a avaliar conhecimentos nem capacidades. Serviu apenas como peça de uma engrenagem destinada a escolher, mediante uma difícil prova de obstáculos, quem serão, de entre os 90 mil concorrentes à partida, os 20 mil contemplados com o acesso ao ensino superior.
Prova de obstáculos que não se reduz, tão-só, à Prova Geral de Acesso, embora esse seja, pela sua aleatoriedade e desnecessidade, um dos obstáculos sem dúvida mais contestados.
O Governo PSD inventou durante as férias do Verão de 1988 (altura normalmente escolhida para as medidas mais contestáveis) um novo sistema de acesso ao ensino superior, com o qual só o próprio Governo concordou e para o qual só o próprio Governo foi ouvido.
Com válidas, ponderosas e fundamentadas razões se lhe opuseram as associações de estudantes, as organizações juvenis (com excepção óbvia da JSD), o Conselho Nacional de Juventude, as associações de pais, os sindicatos de professores, o próprio Conselho Nacional de Educação.
Verificou-se um amplo debate nacional, debateram-se alternativas, propuseram-se soluções no quadro de um alargamento necessário e urgente da capacidade de resposta do ensino superior.
Só o Governo se alheou do debate, permaneceu surdo. Furtou-se a encará-lo na própria Assembleia da República. Importará recordar que o Governo ainda não deu resposta a uma solicitação do PCP para discussão da matéria ao nível da Comissão Parlamentar de Educação, formulada em 1 de Março do corrente, ou seja, há quase quatro meses.
O Governo insistiu em abordar o problema tão-só na estreita óptica do seu decreto-lei, numa atitude autista com a qual os estudantes, o sistema educativo e o País estão a ficar seriamente prejudicados.
Furtando-se a um debate sério sobre o problema do acesso ao ensino superior, o Governo pretendeu alhear-se da sua conclusão principal: a de que o problema só se resolve alargando as próprias possibilidades de acesso ao ensino superior; a de que os níveis de frequência do ensino superior, em Portugal, são ridícula e alarmantemente baixos quando comparados com os de outros países desenvolvidos, incluindo todos os nossos parceiros das Comunidades Europeias; a de que o problema do acesso não se resolve criando sistemas de retrocesso como o actual, sistemas que não têm outro objectivo que não seja o de gerir, através de mecanismos mais ou menos sofisticados, um número de vagas inalterável e escandalosamente baixo.
Nisto se traduziu o procedimento do Governo. Instaurou um novo sistema, de forma prepotente, com violação de mecanismos de participação legalmente existentes, em clara violação da Lei de Bases do Sistema Educativo, contra todas as opiniões, e insistiu em mante-lo, com o pobre e farisaico argumento de que o novo sistema seria melhor que o anterior.
É bom que se diga que se o actual sistema aumentou em sofisticação, manteve o espírito e a natureza do numerus clausus. Não avalia conhecimentos, limita-se a gerir vagas por uma forma que acentua a influência das desigualdades económicas e sociais nas possibilidades de acesso ao ensino superior. O novo sistema aperfeiçoa o anterior, acentua-lhe as deficiências de base, pelo que merece ser acrescidamente criticado.
Podemos dizer que a procissão ainda vai no adro. Dentro de pouco tempo, a prestação de provas específicas vai chocar-se com a prestação de provas do 11.º e 12.º ano. Apenas por estes dias, os candidatos tiveram conhecimento das provas que, em concreto, terão de prestar, não se sabe bem como, nem em que circunstâncias, nem em que condições.
Aproxima-se o auge da confusão, que teria sido perfeitamente evitável. No fim de contas, tudo se resumirá a escolher numa roleta diabólica os vinte e tal mil bafejados pela sorte que terão acesso ao ensino superior público, dado que, relativamente a certos estabelecimentos universitários privados, meninas dos olhos do Ministro Roberto Carneiro, os critérios de selecção no acesso são completamente diversos. Sem Prova Geral de Acesso nem provas específicas. Apenas com o assentimento das próprias escolas e com a capacidade económica que é determinante da possibilidade de as frequentar.
Aquilo que estamos a viver é dramático para os jovens que se encontram este ano no limiar do ensino superior. É angustiante para os restantes jovens dos anos terminais do ensino secundário. É profundamente lesivo do progresso urgente do sistema educativo. É negativo para o País e comprometedor do seu desenvolvimento. O Governo PSD tem de ser responsabilizado por isto. Porque as alternativas virão, só que o mal hoje feito paga-se no presente e pagar-se-á no futuro quando para os erros cometidos já não houver remédio.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Cesário, Lemos Damião e Jorge Paulo. Se neste momento a Mesa desse a palavra a iodos estes Srs. Deputados poderíamos prolongar o período de antes da ordem do dia - nunca se sabe - por vinte minutos ou mais. No entanto, para cumprirmos o que havia sido estabelecido, penso que será preferível passarmos estes pedidos de esclarecimento para o período de antes da ordem do dia da próxima sessão plenária.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr.ª Presidente, se houvesse possibilidade de o meu companheiro José Cesário fazer o seu pedido de esclarecimento, certamente que, só com ela, o PSD resolveria o problema.

ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, houve um consenso no sentido de prolongarmos o período de antes da ordem do dia por mais quinze minutos, mas como esse tempo já terminou vamos entrar no período da ordem do dia. Como os Srs. Deputados sabem, estabeleceu-se um acordo no sentido de se discutir, como primeiro ponto, as ratificações n.ºs 72/V e 73/V ficando para o final a proposta de lei n.º 106/V.

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O Sr. Raul Brito (PS): - Peço a palavra para interpelar artesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Raul Brito (PS): - Sr.ª Presidente, certamente é do seu conhecimento que, nestes últimos dias, graves acontecimentos têm ocorrido em Timor-Leste e Jacarta. Têm sido presos centenas de timorenses é alguns estudantes que estudavam em Jacarta tiveram de. sé refugiar na Nunciatura Apostólica e na Embaixada do Japão.
Temos vindo a constatar, pela imprensa nacional quotidiana, que, quero governo da Indonésia, quer os corpos diplomáticos da Nunciatura do Vaticano e do Japão vão explicando a evolução da- situação. Entretanto, ainda ontem tivemos uma reunião da Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor-Leste e a verdade é que não temos qualquer informação oficial do Governo português sobre a situação.
Ora, os quatro estudantes timorenses são, para todos os efeitos, cidadãos nacionais e, ao abrigo do artigo 14.º da Constituição da República Portuguesa, têm o direito de ser protegidos.
Como esta comissão eventual, que tem responsabilidade de acompanhar esta situação, não dispõe de qualquer informação sobre a matéria e dada a gravidade da situação, pergunto à Sr.º Presidente se, junto da Mesa e da presidência, chegou alguma noticia, alguma informação, alguma posição do Governo português sobre estas ocorrências.
Estamos extremamente preocupados e queremos mostrar a nossa solidariedade para com esses cidadãos nacionais que atravessam um momento particularmente difícil, pelo que solicitamos que V. Ex.º tente obter alguma informação que esclareça os portugueses sobre esta matéria.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Raul Brito, neste momento a Mesa não dispõe dos elementos que solicitou, mas vamos procurar colher essas informações.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.º Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr.ª Presidente, ouvindo a interpelação que agora foi produzida pelo Sr. Deputado do Partido Socialista, gostaria de dizer que se é certo que as noticias que temos ainda são altamente controversas, contraditórias e pouco fundamentadas, o que não nos permite tomar, como desejaríamos, uma posição de fundo em relação a este assunto, de qualquer modo, os factos ocorridos são suficientemente graves, ou melhor, indiciam-se como suficientemente graves, para acompanharmos a preocupação da bancada do Partido Socialista.
Assim, queríamos pedir que V. Ex. º, em nome desta Assembleia da República, solicite as informações necessárias sobre o assunto, para' que a Câmara fique devidamente informada.

A Sr. º Presidente: - Sr. Deputado Carlos Encarnação; como já havia dito, é exactamente isso o que a Mesa irá fazer.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Rui Silva (PRD): - É apenas para afirmar que acompanhamos as preocupações já expendidas pelos deputados que intervieram em nome das bancadas do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata.
Deste modo, desejavamos reforçar, em nome da nossa bancada, o pedido que foi feito, no sentido de que V. Ex. º diligencie para que, no mais curto espaço de tempo, possamos ser informados de qual é a actual situação, quer dos seis estudantes que neste momento estão nas Embaixadas do Japão e do Vaticano, quer das centenas de estudantes que, segundo a informação que recebemos, foram feitos prisioneiros em Dili e em Baucau.

A Sr.ª Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Jorge Lemos também pediu a palavra, , penso que para interpelar a Mesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Exactamente, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Presidente, como compreende, colocada a questão, tal como foi pelo Sr. Deputado Raul Brito, quanto à situação de desrespeito claro de direitos humanos, quer em Timor-Leste, quer no próprio território da Indonésia; também o meu grupo parlamentar gostaria de se associar à preocupação, já aqui manifestada, solicitando á Mesa que promovesse à's diligências já referenciadas.
Creio ainda que, tendo a conferência de líderes parlamentares acompanhado o problema da questão de Timor, em colaboração com a comissão eventual, se justificaria que, no mais curto prazo possível, essa mesma conferência ou a comissão eventual pudessem reunir com a presença do responsável governamental, para que se pudesse fazer o ponto da situação quanto às noticias que tem sido divulgadas e tornarmos conhecimento também das medidas que o Governo português tenciona adoptar face ao agravamento da situação nesse território; ainda sobre a administração portuguesa.

A Sr.ª Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado. As suas sugestões serão transmitidas ao Sr. Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Natana Coissoró (CDS): - Sr.ª Presidente, queremos também associar-nos à preocupação já manifestada por outras bancadas, relativamente a este problema no sentido de realmente a Assembleia da República ser: informada do verdadeiro estado da questão e das noticias que têm vindo na imprensa.

ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

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Srs. Deputados, vamos passar ao primeiro ponto da ordem do dia, que é a apreciação das ratificações n.º- 72/V (Os Verdes, PRD e Independentes) e 73/V (PCP), relativas ao Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, que altera o Decreto-Lei n.º 357/75, de 8 de Julho, relativo à protecção ao relevo natural, solo arável e revestimento vegetal.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A eucaliptação em Portugal avança silenciosa e implacável como um cancro!
As leis de desenvolvimento suicida substituem-se às leis e aos ritmos naturais, condição sine qua non da sobrevivência e do desenvolvimento seguro. A desertificação deixou de ser preocupação académica e tornou-se conquistadora impiedosa dos últimos baluartes da mata mediterrânica. Inúmeras comunidades humanas viram, impotentes, como o eucalipto assentava arraiais em torno dos seus povos e aldeias, alterando paisagens, impedindo modos de vida, destruindo fontes e culturas, condenando à emigração e à inactividade dos seus membros. Alguns povos reagiram com violência ao assalto não anunciado e os lobos uivaram de novo contra o colonialismo e o centralismo de uma administração central aliada e serviçal de um poder económico impessoal e devorador de valores e interesses não competitivos na escala economista.
Perante isto, o País acordou, a comunidade internacional revelou-se curiosa, o Presidente da República sensibilizou-se, a Assembleia debateu, o Governo decretou, a GNR bateu, o povo arrancou, os autarcas embargaram, os ecologistas insistiram e o eucalipto teimou, arranjou argumentos, perverteu consciências, prometeu o paraíso, criou raízes no Ministério da Agricultura, investigou nos laboratórios, utilizou fundos comunitários, congelou as estatísticas, equiparou-se ao petróleo, insinuou-se nas escolas e nos meios culturais, engendrou ecologistas pró-governamentais e promete agora ocupar dois milhões de hectares de terras, duplicando assim a área do seu reino absolutos.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A questão da floresta de produção, assente apenas nas leis de «um mercado tão acentuadamente cíclico como é o das pastas papeleiras» e alheia a quaisquer normas de ordenamento e salvaguarda de valores ambientais, sociais e económicos de longo prazo, passa por ser hoje a maior emergência ecológica com que se debate Portugal e a nossa geração. Nenhuma outra violência, das muitas que se praticam diariamente no nosso país contra o ambiente e a qualidade de vida, terá por certo consequências tão gravosas nos anos mais próximos, e nenhuma como a da eucaliptação rouba já hoje aos jovens e às gerações de portugueses que aí vêm, os recursos que lhes serão imprescindíveis à sobrevivência com independência, com equilíbrio e com dignidade.
Num momento em que toda a Comunidade se deverá empenhar num debate sério e responsável sobre a temática da utilização abusiva de espécies florestais de rápido crescimento e os efeitos que daí podem advir, entende o Governo português que o caminho é abrir as portas à voracidade sem limites daqueles que, no dizer do Dr. Mário Baptista, administrador da Portucel, «interna ou externamente procuram o lucro fácil ou desejam assegurar, pelo domínio das fontes de uma matéria-prima escassa e de óptima qualidade, os seus próprios - mas não necessariamente os nossos - interesses fundamentais numa perspectiva de médio e longo prazo». Estas são palavras do administrador da Portucel.
Não se trata de «um papão agitado por ecologistas ao serviço de interesses inconfessáveis», ou de «angústias existenciais dos ambientalistas urbanos», ou do «fomento da subversão contra a ordem e a lei, ou de mera provocação às forças de segurança», ou ainda de «um falso problema, apenas existente nas cabeças de uns pobres ignorantes sem qualquer preparação técnica ou científica». A questão é grave, é complexa, é determinante, é urgente e reveste carácter nacional. Mas posto perante a urgência da definição de regras claras, o Governo responde com evasivas, alimenta falsos debates com falsos ecologistas, vicia as regras do jogo, fecha os olhos à «batota», enfraquece os normativos legais, estimula e premeia o «assalto» aos terrenos agrícolas, ignora os incendiários, confunde interesses pessoais com interesse nacional e cobre tudo isto com o discurso da responsabilidade, da eficácia, da preservação dos recursos e chega mesmo ao desplante de anunciar que não vai permitir mais abusos por parte das empresas de celulose - seria caricato se não fosse tão trágico!
O Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, que revoga o Decreto n.º 357/75, e cuja apreciação promovemos hoje na Assembleia da República, é apenas uma peça da maquiavélica engrenagem legislativa que o Governo vem arquitectando sobre o problema da eucaliptação.
Todas as peças legislativas ultimamente produzidas pelo Governo neste particular têm características comuns: começam por considerar e admitir sintomas evidentes e preocupantes de sobrexploração florestal, a existência de práticas incorrectas desde a instalação até ao abate de árvores, a necessidade de proteger o relevo natural, o revestimento vegetal, as espécies autóctones e a fauna, garantem, por outro lado, a debilidade da legislação anterior face à agressividade dos agentes em presença, etc - e como devem calcular, Srs. Deputados, tenho estado a fazer citações de diversos preâmbulos de vários decretos-lei. Passam depois ao desenvolvimento normativo e no artigo 1.º é ainda possível encontrar as intenções manifestadas no preâmbulo. A partir do artigo 2.º abrem-se tantas e tamanhas excepções que se inverte totalmente a orientação normativa antes indiciada. Veja-se, a título de exemplo, o Decreto-Lei n.º 172/88, de 16 de Maio, que visa, segundo o preâmbulo, «proteger eficazmente» o sobreiro.
No artigo 1.º proíbe-se: «O corte ou arranque de sobreiros, em criação ou adultos, que não se encontrem secos, doentes, decrépitos ou dominados.» A partir do artigo 2.º começam as excepções com a brilhante redacção que passo a citar: «Os coités rasos em montados de sobre só podem efectuar-se quando visem a posterior ocupação do solo com obras imprescindíveis de utilidade ou a conversão de cultura de comprovada vantagem para a economia nacional (...).» Adivinhem os Srs. Deputados: qual é a cultura, qual é ela, que dá mais dinheiro do que o sobreiro?
Vergonhoso é o termo que me ocorre para qualificar a profunda hipocrisia deste decreto!
Mas voltemos ao decreto que hoje motiva o debate que agora realizamos. Visa, como sabemos, substituir

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um dos poucos instrumentos legais de que os nossos autarcas se vêm servindo para defender o relevo e o coberto vegetal dos seus municípios, e que têm sido a cobertura legal para muitas e corajosas acções de embargo, de crimes anunciados ou ,perpetrados contra o ambiente e os interesses locais.
Porém, o Governo considera agora que, e cito, " a redacção dá parte dispositiva do diploma não objectivou correctamente a finalidade que lhe está subjacente, (...) traduzindo-se numa duplicação injustificada da intervenção pública sendo ainda susceptível de criar situações gravemente lesivas dos direitos e legítimos interesses dos particulares (...)". Ou seja, o Governo resolveu tresler a realidade, invocar o interesse particular versus o interesse público, subtrair às autarquias competências, que vinha exercendo com legitimidade e com responsabilidade, cometendo-lhes, ainda por cima, uma competência completamente imprópria da natureza do poder autárquico, como seja a da fiscalização, em exclusivo ou em especial, de todas as acções abrangidas pela legislação em apreço bem, como a. da instrução dos respectivos processos.
Na óptica do Governo, as câmaras deixam de ter competências activas, em matérias de ordenamento do seu espaço municipal e passem a meros agentes vigilantes das pequenas infracções, já que nada poderão fazer contra os autênticos crimes que . A Administração Central vier a licenciar nos seus concelhos. É certo que, poderão dar parecer, queixar-se, lamentar-se. Mas não parte o decreto-lei do princípio, de que a generalidade das câmaras não possui organismos capazes de dar pareceres "consistente" em matéria florestal?
Mais uma vez, a hipocrisia pretende esconder o verdadeiro objecto das intenções do legislador governamental, neste caso o titular da pasta, da, agricultura, que, como é público, se encontra pessoalmente ligado à interesses económicos no sector.
Considera o decreto que se mantêm ás competências das câmaras pára responder ao licenciamento que envolva áreas inferiores a 50,hectáres. Mas deveremos entender esta norma como fruto da ignorância de um país composto por regiões com solos, característicos edafo-climáticos e regimes de propriedade completamente opostos. Deveremos entendê-la como um critério abstracto, tão longe da realidade do norte como da do centro e do sul, completamente pateta è impotente para impedir a ardilosa conjugação de estratégicas, de sucesso .e de grande poderio económico, que são factores chave na intervenção de diversas empresas deste sector.
Os autarcas portugueses, despojados das suas sérias competências, vêem-se agora relegados para a função de caçadores de coimas, numa floresta de enganos e em luta desigual contra uma Administração Central orientada no sentido da defesa de interesses diferentes e opostos aos interesses- legítimos das comunidades locais, contra o poder esmagador dos, argumentos de natureza económica que as empresas esgrimem, contra o desespero, á impotência è ,á resignação dos seús munícipes, contra uma justiça tarda e cega na defesa de valores sagrados mas não quantificáveis.
Perante este quadro, em nome dó interesse nacional, dos. interesses legítimos' das comunidades locais, em nome do bom senso e da razão, em nome dá .dignidade histórica da nossa geração e em nome dos direitos sagrados dos nossos filhos, não pode esta Assembleia ficar indiferente, pelo que propomos a recusa da
Ratificação do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, e solicitamos o andamento célere- do processo em curso na Comissão de Agricultura e Pescas com vista á elaboração de nova e sensata legislação sobre a utilização de espécies florestais de rápido crescimento em florestas de produção.
Srs. Deputados, , milhões de vozes nos exigem, hoje uma posição digna, milhões de vidas nos apelam do futuro! Só pode haver uma resposta e vamos, ser nós a
dá-la!

Aplausos do PCP e do PRD.

A Sr.ª Presidente: - Encontra-se inscrita; para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Natália Correia, porém o Sr. Deputado Herculano Pombo já não
dispõe de tempo.

O Sr. Rui Silva (PRD): -Sr.ª Presidente, o PRD cede um minuto para que seja possível ao Sr. Deputado Herculano Pombo dar a, resposta ao pedido , de
esclarecimento.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - O Sr. Deputado Herculano Pombo deu-nos justamente a imagem arrepiante da política " naturicida" que está a roubar aos portugueses os recursos da sua sobrevivência. Mas detenho-me num ponto que V. Ex. abordou e que me deixou verdadeiramente assustada.
Não sou ingénua e não me quero armar. em advogada. do Sr. Ministro da Agricultura, mas as acusações que o Sr. Deputado. dirigiu, contra ele excedeu tudo quanto eu podia imaginar sobre o uso do poder movido por interesses pessoais.
O Sr. Deputado tem a certeza do gire afirma?
Ao colocar-lhe esta questão estou a pô-lo, perante uma grande responsabilidade, porque, a ser verdade õ que o Sr. Deputado diz, á imagem que, nos pintou do Sr. Ministro da Agricultura, de modo nenhum, se afeiçoa ao perfil de um membro do Governo.
Por isso, chamo a sua atenção, pedindo-lhe que reveja as suas palavras. Não dúvido de si, mas poderão as suas informações estar inquinadas por dados menos correctos. Porque, nó caso de serem mesmo correctas; o Sr. Deputado está a criar um problema de consciência nesta Assembleia que, na sua função moralizadora, não pode ficar indiferente a esta aberração: a de um ministro 'que usa ó poder para defender os seus interesses pessoais. E que interesses?! Interesses que dão cabo da natureza e do património português.
Sr. Deputado, tenha muita atenção com o que disse e exijo realmente que se explique, porque, como deputada, me cria um problema nesta Assembleia.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo, que dispõe de um minuto.

O Sr. Herculano Pombo (Os :Verdes): - Sr.ª Deputada Natália Correia, começo por agradecer-lhe o facto de ter colocado esta Câmara perante a evidência .de termos de, mais uma vez, despir a verdade até á sua nudez total.
Já aqui o afirmei várias vezes, e não fui só eu.

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Vozes do PSD: - O ministro já aqui esteve muitas vezes e o Sr. Deputado nunca o disse!

O Orador: - O Sr. Ministro da Agricultura esteve aqui quando o afirmei.

Vozes do PSD: - Mas nunca nestes termos!

O Orador: - É indigno e imoral que um membro do Governo legisle em proveito próprio! Reafirmo as palavras que proferi aquando da minha intervenção e que venho, há alguns meses, a repetir na Assembleia.
O Sr. Ministro da Agricultura, eng. Álvaro Barreto, foi, antes de ser membro do Governo, administrador de uma das principais empresas de celulose. Quando entrou para o Governo suspendeu o seu mandato como administrador. Desde que está no Governo, já referiu por várias vezes, e é público, que deseja voltar para o lugar que abandonou. É sabido que esse lugar é ocupado por um seu familiar directo. E sabido que ele ocupará esse lugar quando sair do Governo, o que estará, eventualmente, para breve. É sabido, pois - e daqui não se poderá concluir outra coisa -, que o Sr. Ministro Álvaro Barreto, responsável máximo pela política agrícola em Portugal, legislador no caso presente, está a legislar em benefício próprio.
É sabido que isto é imoral em qualquer país do mundo, muito mais numa democracia como a nossa!
Assuma, pois, o Sr. Ministro as suas responsabilidades, porque eu assumirei as minhas. As palavras que disse tenho-as por certas e acredito que o Sr. Ministro, quando referiu que queria voltar à empresa, quer fazê-lo para, obviamente, beneficiar economicamente, o mais que puder, da legislação de que agora é autor. Tem ao seu dispor uma legislação que ele próprio produziu, com a qual não estou de acordo, contra a qual, tanto eu como a Sr.ª Deputada, nos temos batido, porque ambos sabemos que esta legislação não está ao serviço do País, mas sim ao serviço de interesses económicos muito particulares e particularizados, está a desertificar o País e a roubar o futuro a nós e aos nossos filhos. O que é grave! São eles que nos obrigam a dizer estas palavras!

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Eu ignorava que o Sr. Ministro da Agricultura estivesse metido nesta embrulhada!

O Sr. Luís Capoulas (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Luís Capoulas (PSD): - Para exercer o direito da defesa da honra e da consideração.

Vozes do PCP: - Mas a honra de quem?! O Governo está presente!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Capoulas (PSD): - O Sr. Ministro da Agricultura é militante do Partido Social-Democrata, é membro desta maioria, embora com mandato suspenso porque desempenha as funções de ministro.
Foram aqui produzidas afirmações não provadas, portanto, infundadas e que ofendem a honra e a dignidade de um representante deste Governo. Penso que não é digno desta Câmara que estas afirmações sejam aqui proferidas, particularmente se tivermos em conta que foram produzidas na ausência do visado.
Esta instituição, a Assembleia da República, deve, além de proporcionar um debate político sério, ser também um espelho de princípios éticos, pelos quais a sociedade portuguesa se pauta. Daí, o meu veemente protesto e a defesa da consideração e da honra da minha bancada, na pessoa do Sr. Eng. Álvaro Barreto.
Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado Luís Capoulas, finalmente, alguém se levanta para defender a honra do ministro. Louvo o seu acto, embora o tenha feito, na minha opinião, sem consistência. Apenas por solidariedade, eu teria feito o mesmo no caso de um ministro que tivesse algo que ver com os princípios que defendo.
No entanto, Sr. Deputado Luís Capoulas, contesto que não o fiz na ausência do Sr. Ministro Álvaro Barreto. Já o fiz outras vezes em que ele estava presente. Se hoje o não faço na presença do Sr. Ministro Álvaro Barreto é porque o Sr. Ministro, responsável máximo pelo assunto que estamos aqui a discutir, hoje se fez representar e não veio directamente a este Plenário, como seria de esperar.
Escrevi a minha intervenção antes de vir para aqui, na suposição óbvia de que o ministro da Agricultura viria defender os princípios que tem feito transitar para legislação. Não o fez, não me pode assacar culpas de falar na ausência do Sr. Ministro, pois não posso prever que os Srs. Ministros não venham aqui defender as suas políticas e mandem o Sr. Secretário de Estado, que o fará com brilhantismo que esperamos ver. Não está em causa, obviamente, a presença do Sr. Secretário de Estado, mas, sim, o facto de se dizer que fiz essas afirmações na ausência do Sr. Ministro da Agricultura. Já anteriormente tive o cuidado de dizer aqui ao Sr. Ministro que «o seu problema era o de que o eucalipto é uma fruta com muito 'caroço'. Se o eucalipto não tivesse tanto 'caroço', o Sr. Ministro não faria legislação deste tipo».

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tive ocasião de dizer isto aqui na presença do Sr. Ministro que não o pode desmentir.
Não pus em causa a dignidade do Sr. Ministro, pois apenas afirmei que o Sr. Ministro foi antes gestor de uma empresa de celulose e regressará a esse lugar por vontade própria, pois assim o tem afirmado. Não fui eu que o inventei e isto não questiona nada. Só afirmo que o Sr. Ministro está a legislar em causa própria e não pode fazê-lo. Existe legislação no Estado português que o proíbe. Cumpra-se!

Aplausos do PCP.

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O Sr. João Maçãs (PSD): - O Sr. Ministro - tem mais que fazer do, que vir aqui para ouvir baboseiras!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares -(António Capucho): - Não é o Sr. Ministro que legisla, é o Governo!

,O Orador: - Então o Governo que se defenda!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Já lá vamos! É quando nós quisermos e não quando o Sr. Deputado quer!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Numa breve síntese, tão breve quanto no-lo impõe o escasso tempo disponível para apreciarmos, o Decreto-Lei n. º.139/89, poder-se-á afirmar que este diploma reflecte dois dos maiores vícios deste Governo. Primeiro, a concepção centralizadora da política de quem teima em fazer do exercício do poder uma afirmação sistemática do "quero, posso e .mando". Segundo; .ª oposição a tudo o que possa significar ou reforçar a gestão económica, social e ambiental do, espaço e dos recursos de forma integrada; regionalizada e , participada.
Os conceitos que, integram o diploma em, apreciação, que revoga o Decreto-Lei n.º 357/_75 relativo à protecção do relevo natural, solo arável, e revestimento vegetal, explicam, ao fim e ao cabo, porque se vive hoje no País uma situação generalizada de contestação à política florestal e a uma política ambiental que se desenvolve nesta área entre a timidez e a cedência ou comprometimento com interesses nada ambientais. Valpaços, Abrantes, Chamusca, Cercal e tantos outros vivem e dão expressão á esta contestação através das manifestações de repúdio e ristência das suas populações.
O Decreto-Lei n.º 139!89 constitui a mais completa demonstração da incapacidade e falta de vontade política, para entender que o uso e gestão dos recursos não é apenas uma questão técnica da competência do poder central; porque é também e muito uma ,questão de impacto nas economias locais, nos sistemas
económico-produtivos, no tecido humano-social das regiões, o que justifica e legitima a intervenção eficaz do podei local.

O diploma em apreço mais não pretende que retirar às autarquias locais a capacidade para intervir em defesa do património e dos interesses das populações perante uma política florestal muito mais orientada pela pressão dos interesses, sobretudo das celuloses, que pela racionalidade do uso e gestão dos recursos e pelas necessidades e exigências do desenvolvimento económico e social das regiões.
Afiguram-se totalmente falaciosas as justificações avançadas pelo Governo, para a publicação dó presente decreto-lei e a consequente revogação do `Decreto-Lei n.º 357/75.
Pôr em causa á eficácia deste decreto, quando :as autarquias vêm ganhando sistematicamente os recursos de anulação de autorizações indevidas de florestação e outros maus usos, é pura hipocrisia. Aquilo que o Governo. pretende é exactamente retirar na prática, a eficácia e a capacidade de qualquer intervenção das autarquias nas acções de florestação e no ordenamento do território. É aliás evidente de igual modo a conflitualidade do disposto no decreto-lei em apreço e a Lei de Bases do Ambiente..
Quanto à alegada conflitualidade de competências entre órgãos da Administração Pública e os órgãos autárquicos; esta não passa de uma falsa questão só susceptível de se verificar em consequência de um governo e de uma política que se mostram incapazes de descentralizar, de. reconhecer, as potencialidades do poder local no que respeita à interpretação e defesa dos direitos legítimos interesses das populações e da economia e gestão das regiões e dos seus recursos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Maçãs.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Sr. Deputado Rogério Brito, compreendo que defenda acerrimamente o Decreto-Lei n.º 357/75, pois trata-se de um diploma da época do "gonçalvismo" e, portanto, já, esperava esta defesa por parte do Partido Comunista. No entanto, gostaria de lhe pôr uma pergunta muito concreta.
Não estando as autarquias locais apetrechadas com meios técnicos adequados, o Sr. Deputado acha natural que, em relação à apreciação de 'projectos, o contributo das autarquias, possa ser outro que não o de apenas fornecerem um. parecer?
O Sr. Deputado acha natural que as câmaras municipais, não apetrechadas tecnicamente para o efeito, possam inviabilizar projectos?

O Sr. Herculano Pombo, (Os Verdes): - Isso já estava contemplado no Decreto-Lei n.º 357/751

A Si.ª - Presidente: - Para responder, tem a palavra o Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Deputado João Maçãs, quanto à sua afirmação de que a minha defesa do Decreto-4 lei n.º 357/75 se deve ao facto de se tratar de um diploma "gonçalvista", não lhe responderei por considerar que .é 'um tipo de argumentação tão patético, que, efectivamente, não _ tem . resposta. De facto, é patético que não encontre mais, nenhum argumento contra aquele decreto-lei que não seja o de dizer que é da época. "gonçalvista".
Assim passo a responder à questão que me, pôs sobre se entendo que as autarquias deveriam emitir algo mais do que um parecer, embora não se encontrando tecnicamente aptas.
Se as autarquias não estão. tecnicamente apetrechadas, então, porque se pede que emitam um parecer no prazo de 30 dias? É apenas para cumprir uma formalidade? A não ser assim, parte-se do pressuposto de que têm condições para emitirem um parecer útil.
O que o Sr. Deputado está no, fundo a querer dizer é que o parecer pedido às autarquias é solicitado por mera formalidade, sem que se espere que dai resulte qualquer utilidade, o que é grave.
Em segundo lugar, como o Sr. Deputado poderá verificar pelas propostas de alteração que o PCP tem prontas para apresentação, a questão está em que há que possibilitar que no plano director de cada município seja integrado o ordenamento do território e dos

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seus recursos. É isto que defendemos, mas enquanto não existir essa possibilidade haverá que encontrar mecanismos alternativos. Entre esses mecanismos não poderá constar o de, pura e simplesmente, se retirar às autarquias a sua capacidade de intervenção nesta matéria. E explicarei porquê.
É que, se o Sr. Deputado tivesse ouvido com atenção a minha intervenção, teria verificado que eu disse que é um erro pensarmos que é meramente técnica esta questão de uso e da gestão dos recursos. Também o é, mas, mais do que técnica, é uma questão de incidência social, económica e regional que intervém nos próprios sistemas produtivos e põe em equação toda uma estrutura integrada de desenvolvimento de uma região. Ora, o poder local tem a obrigação e o direito de intervir nesta matéria.
Posto isto, se não forem capazes de entender o que vos transmito, diria que, então por todo o lado, continuarão a assistir à generalização da contestação à política e às medidas do Governo e, mais do que isso, inevitavelmente, assistirão à vitória das pressões dos interesses económicos sobre os interesses das populações e das regiões, o que é grave.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. João Maçãs (PSD): - Isso é treta!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por iniciativa de Os Verdes, do PRD, dos Deputados Independentes e do PCP é questionado o Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, que altera o Decreto-Lei n.º 357/75, de 8 de Julho, relativo à protecção do relevo natural, solo arável e revestimento vegetal.
Pretendia o Decreto-Lei n.º 357/75 proteger os solos de mais elevada capacidade de uso agrícola, evitando as transformações gratuitas do relevo, tendo como único objectivo a especulação imobiliária, modificando-lhe o uso, antes do licenciamento de qualquer forma de utilização.
Ainda segundo o mesmo diploma, tais alterações conduziam a transformações do ambiente, prejudicando o equilíbrio biofísico, provocando inundações e destruição do solo arável, comprometendo o equilíbrio ecológico, contribuindo para o desaparecimento do revestimento vegetal e alterando o aspecto estético da paisagem, contribuindo para a sua progressiva degradação.
Pretendia o diploma em causa proibir todas as práticas de destruição do revestimento vegetal que não tivessem fins agrícolas bem como as operações de aterro ou escavações.
A autorização só podia ser concedida pelas câmaras municipais das áreas afectadas, verificando-se, de facto, importante lacuna, na medida em que não se cominava quaisquer penas nem coimas, limitando-se à mera proibição, o que não reforçava a necessidade imperativa das suas prescrições nem atribuía aos órgãos autárquicos poderes de autoridade que lhes permitissem uma intervenção eficaz perante a ilegalidade. Neste aspecto, estamos de acordo com preâmbulo do Decreto-Lei n.º 139/89. Neste diploma pretende-se, segundo o legislador, dar resposta à preocupação de protecção do relevo natural, terminar com a destruição sistemática e injustificada do revestimento e do relevo natural, reafirmando-se o princípio de evitar a criação de situações de facto, susceptíveis de serem ulteriormente apresentadas pelos interessados como argumento a favor do seu deferimento.
Estamos de acordo com estas boas intenções, mas acrescentaríamos que de boas intenções está o inferno cheio.
Assim, discordamos do princípio de que se pretende excepcionar da autorização camarária os terrenos em que a correcta prossecução do interesse público já se encontre assegurada pela prévia intervenção de um órgão administrativo especialmente vocacionado para o efeito.
O problema maior reside na conjugação que se pretende fazer com o Decreto-Lei n.º 175/88, de 18 Maio, que veio introduzir, injustamente, na nossa perspectiva, um regime legal específico para acções de arborização com recurso a espécies florestais de lapido crescimento.
Outro problema reside na restrição da competência de intervenção das câmaras para proceder ao licenciamento das acções que envolvam áreas inferiores a 50 hectares.
Estamos em manifesto desacordo com estes postulados. Não podíamos deixar de salientar que, infelizmente, nem todas as câmaras municipais têm tido um comportamento responsável nesta matéria, sancionando situações que, de todo, não deviam ser permitidas.
Vale a pena lembrar que, qualquer que seja a parcela de poder que se exerça deve ter-se em conta o interesse geral, não se ultrapassando as prerrogativas legais com justificações inaceitáveis que desfigurem a paisagem do País de forma irremediável.
Não se aproveite, contudo, das fraquezas alheias para se encetarem políticas discutíveis.
Achamos bem que se criem diplomas normativos que tentem prever todas as situações anormais, que se cominem penas adequadas, que se definem competências e formas de actuação. Contudo, não se retire da competência dos representantes das populações interessadas uma audição vinculativa a que deverá corresponder uma maior responsabilização na sua decisão.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estas foram algumas das razões que nos levaram a trazer a esta Assembleia a ratificação do diploma em análise.
Julgamos que tem alguns elementos positivos, nomeadamente na definição dos quantitativos da coima e outros aspectos.
Contudo, a perspectiva que se abre de retirar às câmaras competências para o licenciamento das acções que envolvam áreas superiores a 50 hectares para, a coberto desta situação, se perspectivar a arborização e rearborização com recurso a espécies florestais de rápido crescimento, o que, por razões óbvias, consideramos extremamente perigoso para o equilíbrio ecológico e ambiental do País, leva-nos a considerar que este diploma não deve ser ratificado. Quando muito, daremos o nosso acordo à sua reformulação em sede de comissão, tendo em atenção os pressupostos considerados.

Aplausos do PRD.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

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O Sr. Secretário de Estado. da Agricultura (Álvaro Amaro): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em, primeiro lugar, gostaria de chamar a atenção desta Câmara para o duplo contributo - certamente muito valioso - dado pelo Sr. Deputado Herculano Pombo quanto a duas importantes vertentes. Uma, relativamente ao debate, sério e profundo que tanto reclama, outra manifestando a sua profunda ignorância, já que não é obrigado a saber o que é isso de legislar.

Por um lado, Sr: Deputado, nunca é a um ministro que compete legislar, mas ao Governo: Ora, ao ter dito que foi o mininstro da Agricultura que legislou, o senhor ofendeu. não apenas aquele mas todo o Governo.

Por outro lado, Sr. Deputado, o seu contributo. para o debate da florestação em Portugal foi o de ter dito que "os eucaliptos são muito maus, porque quem tutela Ministério da Agricultura é o eng. Álvaro Barreto, o que tem algo que ver com a indústria da celulose..." Para que todo o País fique a saber, acabei de referir o argumento usado por si Sr. Deputado Herculano Pombo, que tem grandes responsabilidades nesta matéria e que bem poderia ter ajudado ao tal diálogo franco, aberto e construtivo que todos reclamamos.

Assim, espero que o País tenha entendido bem qual é o seu cotributo nesta matéria.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A minha presença nesta Assembleia, por ocasião do debate sobre a ratificação de um decreto-lei que estabelece formas claras de intervenção dos municípios nos processos de licenciamento, autorização ou aprovação de "acções de destruição dó revestimento vegetal que não tenham fins agrícolas" poderia parecer absurda, já que as acções promovidas no âmbito das actividades tuteladas pela Secretaria de. Estado da Agricultura têm, obviamente, fins agrícolas e, por isso, em rigor; não devem relacionar-se com. este decreto-lei que se refere, como disse, às acções que não tenham fins agrícolas.
Mas seria sofisma não reconhecer que a Oposição, particularmente o PCP, desenterrou em 1988, pura e literalmente, o Decreto-Lei n.º 357/75, de 17 de Maio - pois que eu saiba - nunca foi invocado ou aplicado nas operações de florestação durante treze anos (e lembro que nesse período se devem ter florestado cerca de 100 mil hectares!) para afirmar, então, que a preparação do terreno para as florestações com eucalipto eram acções de destruição do coberto .vegetal que tenham fins agrícolas.

Pergunto: e as ripagens e preparações de terreno para plantar pinheiros e carvalhos? E as ripagens para instalar novas vinhas, pomares ou olivais?

Aparentemente, todas estas acções poderiam cair na alçada do morto-vivo decreto-lei do general Vasco Gonçalves; tanto mais quanto alguns sábios confundiram deliberadamente aterros e escavações com lavouras.
Mas não... estranhamente, pois só a preparação do solo para a plantação de eucaliptos parecia cair no âmbito dos zelosos defensores do dito Decreto-Lei
n.º 357/75.

Como, igualmente por coincidência, este espírito revi' valista do decreto do "PREC" só começou a estar na moda depois da publicação dó pacote- florestal -= em Maio de 1988 - onde, pela primeira vez em Portugal, se estabeleceu uma legislação específica (que está a ser cumprida 'escrupulosamente) relativa ao condiciona-
mento da plantação de eucaliptos.

Efectivamente; não é correcto que se procure estabelecer a confusão jurídica e o alarmismo injustificado.
Confusão jurídica, porque se pretendeu empurrar as câmaras municipais para a
proibição abusiva aos: cidadãos e aos agentes económicos de acções legítimas e
previamente autorizadas em conformidade com a legislação da República; alarmismo injustificado, porque se pretendeu afirmar que Portugal estava a ser invadido
pelos eucaliptos rejeitados pelo norte da Europa já que, entre nós, a "plantação indiscriminada de eucaliptos ameaçava as terras e as águas, prenunciando o
apocalipse e a desertificação".
Importa de novo que fique aqui dito que desde Maio de 1988, existe um
decreto-lei (o n.º175/88, de 17 de Maio) que é um documento pioneiro. Em
Portugal na Europa quanto ao condicionamento da plantação das espécies de rápido crescimento, onde o eucalipto se situa.
Acresce, ainda, que o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, decidiu. publicar uma--portaria onde se condensam todos os aspectos legislativos já existentes é onde se inserem todos os critérios técnicos e administrativos que devem presidir à elaboração dos projectos de florestação com eucaliptos, os quais já hoje presidem à. análise prévia dós mesmos, e onde se estabelece uma macro-zonagem orientadora para todas as acções.
Não se continue, pois, a propalar o "plantio indiscriminado dos eucaliptos" nem a falta das chamadas "regras do jogo", porque tudo está claro e cada vez será mais difícil fazer este tipo de batota.
A desculpa de se dizer que se é contra os eucaliptos porque "não há regras" ou porque se assiste a um "plantio indiscriminado" vai ser cada vez mais. uma
Desculpa de mau pagador.
Tudo isto afinal, para garantir, perante esta Assembleia que o Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril, que o Governo aprovou, revogando o ressuscitado decreto de 1975, se resume, pura e simplesmente, ao que passo a enunciara.
Primeiro, todas as acções de florestação carecem ou de aprovação prévia do projecto por parte da Direcção-Geral de Florestas (DGF) ou do Serviço Nacional de Parques (consoante se trate ou não de' áreas protegidas), ou de licenciamento prévio da câmara municipal, no caso de não existir legislação específica aplicável às acções de florestação a desenvolver.
Para que a DGF ou o Serviço Nacional de Parques possam apreciar e, eventualmente, aprovar os casos da sua competência, deve o interessado obter (ou provar que pediu) um parecer da respectiva câmara municipal quanto à oportunidade social e ao local do empreendimento.
Segundo, as acções ilegais serão punidas através da aplicação de coimas cujos valores revertem para as autarquias locais.
Terceiro, as câmaras municipais podem, sem necessidade de recurso aos tribunais como anteriormente sucedia, ordenar a cessação das acções ilegais, constituindo crime de desobediência a seu não acatamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mesmo as medidas óbvias e as decisões técnicas e juridicamente acertadas podem ser vítimas de processos de intenção.
É o que passa no caso vertente quando alguns (que não a esmagadora maioria dos autarcas portugueses nem a sua associação nacional) insistem em ver neste decreto-lei um qualquer conflito de competências com

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as câmaras municipais ou uma qualquer tentativa de poder discricionário por parte do poder central.
Não tenho a pretensão de convencer aqui os que assumem, por obrigação ou disciplina, o papel de profissionais da negativa. Mas tenho obrigação de afirmar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, que a crescente e íntima ligação entre os técnicos florestais do Estado e os autarcas não pára de incomodar muita gente.
E não é, decerto, por causa dos conflitos de competências...
Todos os que continuarem a não querer entender a verdade e a transparência de atitudes da administração que quisemos consagrar num conjunto harmónico de regras a fim de se evitar a florestação onde se queria, o que se queria e como se queria, estarão a teimar numa causa que em nada contribui para ajudar os muitos agentes florestais - privados, públicos e associativos - a olharem a floresta à dimensão nacional que já hoje ocupa.
Aos ecologistas, defensores de princípios nobres e altruístas, aqui tributo a minha homenagem.
Aos que, escondidos com essa capa, pretendem impor, em particular no interior do País, modelos de subsistência, para, nas suas horas de lazer, terem o escape da descoberta, aqui apelo para a sua consciência cívica de ajudarem o País que, certamente, também amam e por isso o hão-de querer com árvores, com sombra, mas também com riqueza.
Ao Estado cabe garantir que a intervenção do homem não destrói ou perturba irreversivelmente os recursos naturais, água, solo e ar.
É isso que o Governo garante com a política florestal, com a legislação florestal vigente em Portugal, sem que isso sirva de pretexto para trepar em busca de um qualquer poder gratuito, conflitual ou discricionário. Sejamos construtivos e ajudemos Portugal e os portugueses a trilhar caminho equilibrado de desenvolvimento harmónico e sustentado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Herculano Pombo, Rogério Brito...

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, se me permite, é para esclarecer V. Ex.ª e a Mesa de que me inscrevi para defesa da honra e da consideração.

A Sr.ª Presidente: - Então, anunciarei primeiro os nomes dos Srs. Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado e dar-lhe-ei a palavra em seguida, Sr. Deputado.
Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Rogério Brito, Ilda Figueiredo e António Campos.
Para defesa da honra e da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Secretário de Estado da Agricultura, sinceramente, pensei que iria aclarar algumas das dúvidas que levantei quanto à legitimidade de determinadas «ligações perigosas, escorregadias» e menos claras entre o titular da pasta da agricultura e os interesses económicos em causa.
Outrossim, o Sr. Secretário de Estado aproveitou para me chamar ignorante por eu não saber - pasme-se! - que quem faz os decretos-lei é o Governo e não o Sr. Ministro da Agricultura.
É claro que posso não saber muitas coisas mas como lido com o Diário da República, há já alguns anos, já tinha «reparado» que a publicação da legislação é dividida por ministérios... Também já tinha «reparado» que o Governo legisla em bloco, mas sob proposta do titular de cada pasta, o que é óbvio e que, aliás, presumo que já aconteceria no tempo do governo do General Vasco Gonçalves que produziu este decreto-lei «gonçalvista» que, agora, revogamos... Portanto, terá sido um desses governos, mas não sei qual, porque, na altura, era ainda muito novo. Assim, em matéria de ignorância parece que estamos esclarecidos... poderá haver outras...
O Sr. Secretário de Estado disse que eu faria melhor se me dedicasse a ajudar a construir um país com árvores e sombras, etc, e não a propalar «aos sete ventos» que o eucalipto é uma árvore muito má.
Veja lá que eu nunca disse que o eucalipto é uma árvore satânica e até tenho dito que é uma árvore balsâmica. .. veja lá que até gastei o único agendamento anual de que dispunha para a apresentação de um projecto de lei sobre a plantação de eucaliptos!
Será isto dizer mal dos eucaliptos? Os senhores é que não me deixaram proceder ao enquadramento legal da correcta plantação dos eucaliptos!
Será este o mal que tenho feito ao país em termos de desenvolvimento florestal?
Quanto à minha ajuda para o diálogo, digo-lhe que todos temos feito o possível.
Já agora, permitir-me-ia ler aqui uma pequena lista de autarcas que, por escrito, me manifestaram a sua solidariedade para com o projecto de lei que apresentei, revoltando-se contra a intenção do Governo, agora conseguida, de lhes serem retirados aqueles poderes. Trata-se dos presidentes das Câmaras Municipais de Santarém, Alter do Chão, Viana do Alentejo, Vila Franca de Xira, Oliveira de Azeméis, São João da Pesqueira, Ponte de Lima, Palmeia, Figueira da Foz, Alcanena, Coruche, Fafe e de Vila do Conde. Como vêem, são autarquias que cobrem todas as tendências políticas, pelo que, obviamente, não estamos a «vender o nosso produto».
Por fim, chamaria a atenção do Sr. Secretário de Estado para um relatório que tenho em meu poder.
É sabido que, nas 1.ªs Jornadas sobre desertificação, esteve no nosso país o Sr. Nychas, funcionário da Direcção-Geral do Ambiente, Defesa do Consumidor e Segurança Nuclear que está integrada na Comissão das Comunidades Europeias, que, alarmado, pediu que fosse elaborado um relatório sobre a florestação em Portugal.
Esse relatório foi produzido pela Comissão de Coordenação da Região do Alentejo e enviado ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Macário Correia, porque as respectivas conclusões eram tão escandalosas que, tal como escreveu o Sr. Presidente daquela Comissão de Coordenação, «... não se sabe muito bem se

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deverá ou não ser enviado para Bruxelas..." Ecologista como é, o Sr. Secretário de Estado Macário Correia respondeu que não via objecções nesse envio.
Claro que este relatório, que está ao dispor dos Srs. Deputados se o desejarem, revela qual o papel da eucaliptização indiscrimida na desertificação do nosso pais. Ora, não fui eu que o elaborei mas a Comissão de Coordenação que já referi, tendo sido sancionado pela Secretaria de Estado do Ambiente e enviado para Bruxelas, para a Comissão das Comunidades Europeias.
Assim, Sr. Secretário de Estado, estaremos a falar a mesma linguagem, viveremos no mesmo pais, queremos o mesmo futuro?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura : Sr. Deputado, como é que queria que me tivesse preocupado com as ajudas que terá dado ou que se propunha dar ao debate sobre florestação se começou por dizer que o ministro da Agricultura quer é pôr mais 2 milhões de floresta... o Governo ignora os incendiários... o Governo quer substituir um dos instrumentos legais das autarquias... o Governo transforma os autarcas em caçadores de coimas..."? De facto, perante o que disse, não consigo perceber qual é o seu contributo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Já hoje o provei aqui!

O Orador: - Então o Sr. Deputado acha que com o Decreto-Lei n.º 139/89 o Governo pretende transformar os autarcas em "caçadores de coimas"? Ou não será que o que se pretende é dar aos autarcas um instrumento que, sem recurso aos tribunais, lhes permita agir de uma maneira mais célere para punição dos infractores?
Então o Sr. Deputado não acha que, entre ã agricultura "marginal" e os incultos que há no Pais, o recurso à floresta é um dos elementos para o desenvolvimento do interior?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Quem afirma isso é que é inculto!

O Orador: - Então o Sr. Deputado acha legítimo afirmar que o Governo "ignora os incendiários" quando, de entre o "pacote florestal", foi promulgado um diploma - o do Ministério do Planeamento sobre elementos dissuasores quanto às áreas percorridas por incêncidos, proibindo outra utilização?
O Sr. Deputado desculpará, mas tem que se localizar no tempo! Na minha intervenção, referi um marco temporal: Abril de 1988 e o tempo anterior!
Por exemplo, o Sr.. Deputado sabe que, desde Abril de 1988 até hoje, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 175/88 - o tal que estabelece as regras, sem complexos -, para plantação de eucaliptos, foram pedidos 19 mil e 600 hectares? E sabe quantos foram aprovados? Apenas dois terços!

Sr. Deputado, qual foi a sua preocupação antes de Abril, de 1988 quando foram plantados mais de 100 mil hectares de eucaliptos? Onde é que o senhor estava?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Estava aqui!

O Orador: - Então, qual foi a sua preocupação e o seu contributo?
Sr. Deputado, acredita ou não que, se não houvesse regras, porventura não haveria a possibilidade de afirmarmos que só pouco mais de um terço dos projectos foi aprovado?
Ora, desde que eles sejam regidos por regras técnicas previamente estabelecidas e enquadradas num projecto perfeitamente elaborado e aprovado, o Sr. Deputado acabou de dizer que não é contra! Então, é ou não é?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Não sou!

O Orador: - Então, entende ou não que os agentes económicos podem elaborar projectos, desde que obedeçam a regras transparentes?
Sr. Deputado, deixar-lhe-ei o texto completo da portaria para a qual obtive a colaboração de toda a gente. Nela estão todas as regras, contemplando-se mesmo as que eram propostas num documento entregue por várias associações de ecologistas.
Portanto, peço-lhe que se situe no tempo a fim de fazer uma análise correcta: até Abril de 1988, quando alguém queria fazer plantações de eucaliptos - em relação às quais o Sr. Deputado não esteve contra -, o que é que podia fazer?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Avançar!

O Orador: - Sr. Deputado, foi isso mesmo que quisemos travar! Foi por isso que quisemos estabelecer regras! Diga o senhor quais serão outras melhores, sem ser em termos de intervenção do Estado.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Então, quem é que ordena o território?

O Orador: - É que, como dizia o Sr. Deputado Rogério Brito, em termos do ordenamento do território, há algo que nos separa e sempre nos separará. Porventura, o seu diploma foi bem explicado, mas mal compreendido ou, então, o que nos separa é uma questão politicamente diferente.
Com efeito, quando o Sr. Deputado diz "eucaliptos sim, mas mediante tabelas percentuais", tenho de dizer, Sr. Deputado, que não pode ser. Temos de dar a possibilidade aos agentes económicos de criar riqueza em Portugal, desde que isso não colida com o interesse da colectividade e desde que cumpram as regras técnicas previamente estabelecidas. Foi exactamente o que fizemos! Se ó Sr. Deputado assim o entender, pode propor outras medidas melhores.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, neste momento, são 19 horas e 30 minutos, hora destinada a votações. Entretanto, como se inscreveram, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da

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Agricultura quatro Srs. Deputados, a Mesa entende, se não houver objecção da Câmara, que se deve passar, de imediato, aos pedidos de esclarecimento e depois procederíamos às votações.

Pausa.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Secretário de Estado da Agricultura, quer-me parecer que VV. Ex.ªs alinham, como uma orquestra certinha, pela mesma batuta: de um lado dizem que é do gonçalvismo, do outro que é do gonçalvismo e o PREC. Enfim!... E dizem tudo isso apenas para í alar sobre um decreto-lei que se limita a conferir às autarquias poderes de licenciamento sobre o uso e a gestão de recursos. Sr. Secretário de Estado, quanto a isto, o que é que V. Ex.ª quer que eu diga?! Que é patético?! Com toda a delicadeza, Sr. Secretário de Estado, devo dizer: de facto, é patético!
Mas, passando aos aspectos substantivos, penso que é preciso não ter olhos para ignorar o que se está a passar na Veiga da Vilariça e em Vale de Figueira e não ver que estão a ocupar-se solos agrícolas, solos de boa exposição e aptidão, por exemplo, para a implantação de vinha com zonas demarcadas com eucaliptos. Todos nós vemos o que se está a passar. O Sr. Secretário de Estado não pode negar esta realidade.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Foi uma UCP que fez isso!

O Orador: - V. Ex.ª diz: «Mas pretendemos agora criar leis para obstar a tudo quanto se passava anteriormente.»

Pausa.

Estava no uso da palavra, dirigia-me ao Sr. Secretário de Estado e fui interrompido, gostava que o Sr. Secretário de Estado pudesse ouvir as minhas palavras.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Peço desculpa, Sr. Deputado!

O Orador: - Muito agradecido pela gentileza! Este mau hábito dos recadinhos e das cunhas tem de acabar!

Protestos do PSD.

Bom, mas continuando, o que está aqui, tão-somente, em causa é este decreto-lei que, nesta matéria, não reforça, quer a capacidade, quer a eficácia de intervenção das autarquias, porque, em primeiro lugar, remete o licenciamento apenas para as áreas inferiores a 50 hectares.
Em segundo lugar, porque os problemas de ordenamento do território, de gestão dos recursos e de impacto social e económico se fazem sentir, como é evidente, em áreas superiores a 50 hectares.
Em terceiro lugar, porque o problema dos 50 hectares se coloca em tais termos que acabam por se transformar, por somatório, em 500 e em 5000 hectares.
Portanto, quando se diz que as autarquias intervêm até 50 hectares, está a colocar-se uma falsa questão,
pois não se resolve o problema, uma vez que o problema do ordenamento se coloca ao nível de 50, a 100 ou de 150 hectares.
Por que é que as autarquias não têm poder de licenciamento acima dos 50 hectares? Bom, não têm porque a esse nível «toca outra música», outros interesses, outras aplicações. O que dizemos é que as autarquias devem intervir e devem poder ter uma acção de licenciamento, sem colidir com a legislação em vigor ou, objectivamente, com a participação dos serviços oficiais, mas devem intervir no licenciamento das autorizações da plantação da floresta, quando estão em causa interesses objectivos, económicos, sociais e de expectativa de desenvolvimento.
É esta a questão que coloco, pois o tempo é escasso e não me permite dizer mais.
Finalmente, gostaria ainda de salientar que o que V. Ex.ª tem estado a fazer é apenas um exercício de hipocrisia política. Melhor seria que assumissem com coragem a vossa posição e dissessem: pretendemos retirar o escolho que as autarquias vêm constituindo aos tribunais e têm conseguido ver aprovados os recursos de anulação de autorizações da Direcção-Geral das Florestas para a plantação do eucalipto. Digam-no abertamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Ora aí está!

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que fim, Sr. Deputado?

O Sr. Correia Afonso (PSD): - É para a defesa da consideração, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Há pouco, quando me sentei, fui avisado, por colegas de bancada, de que nas minhas costas, porque não foi na minha frente, o Sr. Deputado Rogério Brito teria feito algumas considerações acerca da minha deslocação junto da bancada do Governo para cumprimentar o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
Lamento que o eucalipto tenha, de tal forma, transformado o Sr. Deputado Rogério Brito. Mas quando eu defendo a minha consideração, não é mais do que para lhe dar a oportunidade de dizer que não tinha a intenção de me injuriar.

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Deputado Correia Afonso, sinceramente, estou um pouco encavacado. Que resposta lhe posso dar?
Em primeiro lugar, não disse nada nas costas de V. Ex.ª O Sr. Deputado é que tratava aqui à minha frente e eu disse «obrigado pela sua gentileza», quando decidiu interromper o diálogo que eu estava com o Sr. Secretário de Estado, tendo, depois, acrescentado: «Bom, temos de acabar com esta história de se aproveitar certas alturas para recados e cunhas.» Se não estou em erro, foi, mais ou menos, isto que eu disse.

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Ora, penso que o Sr. Deputado não terá ficado melindrado com este aparte,...

O Sr. Coreia Afonso (PSD): - Fiquei!

O Orador: - Bem, se ficou, permita-me que lhe diga, Sr. Deputado, que certamente mais razão tenho eu para ficar, direi melindrado, mas, pelo menos, para admitir que poderia merecer um pouco mais de consideração do Sr. Deputado. É que, estando eu no uso da palavra e dirigindo-me, directamente; ao Sr' de Estado, V. Ex.ª, a meio do meu pedido de esclarecimento, interrompa, interpondo-se entre mim e o Sr. Secretárìo de Estado, desviando assim a atenção deste. Foi essa atitude incorrecta que me azo às considerações que fiz.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Soares.

O Sr. João Soares (PS): - Sr. Secretário de Estado da Agricultura, gostaria de começar por esclarecê-lo de que não somos profissionais da negativa. Os senhores, do vosso afã de diminuir o papel positivo da Oposição, nesta Câmara e fora dela lançam-nos, permanentemente, esse labéu.
Gostaria de esclarecê-lo que o nosso contributo se faz sempre pela positiva, tanto nesta Câmara. como fora dela, desde que há democracia neste país, e é pela positiva que lhe dirijo uma pergunta muito:- simples: onde está a Secretaria de Estado do Ambiente, em todo este dispositivo legislativo? Não a vemos?
Uma vez que esta questão tem muito a ver com as questões do ambiente, por que é que a Secretaria de Estado do Ambiente não tem uma palavra a dizer nesta matéria? Por que é que não se exige um parecer vinculativo e decisivo à Secretaria de Estado do Ambiente ou aos serviços que nesta matéria, dela dependem?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr: Secretário de Estado da Agricultura, V. Ex. º disse duas coisas que gostaria que explicitasse melhor.
Em primeiro lugar, que na Europa este Governo é pioneiro na elaboração de legislação sobre a defesa de espécies de crescimento rápido. Deve compreender que o resto da Europa está a viver a bagunça que- se vive em Portugal sobre estas espécies e, por isso, não tem necessidade de vir em socorro da defesa dos recursos dó ambiente. Portanto, quando V. Ex.º diz que é pioneiro nessa matéria, penso que não é, pois deixou de' instalar uma bagunça de tal natureza que agora tem de tomar algumas iniciativas para que ele não continue. E depois diz que "tudo está claro e que tudo está limpo"!
Há dias, um colega de V. Ex.º que, por acaso, foi agora eleito para o Parlamento Europeu; o Sr. Eng. Carlos Pimenta, ao ser entrevistado na televisão dizia que a questão do eucalipto era um caos.

Não sei se. o disse só para fazer a campanha eleitoral - pode ter sido -- e; desse modo, atacavam o Sr. Secretário de Estado e o Ministério da Agricultura, com alguma violência, pelo desordenamento que existe e pelo, clima que se criou 'com. toda esta amálgama de legislação que não tem sentido. Isto porque o Decreto-Lei n.º 175/88 não tem qualquer sentido e não serve para nada, pois não defende nada e o Sr. Secretário de Estado sabe, perfeitamente, que não tem legislação alguma que defenda os recursos naturais e a qualidade de vida em relação ao eucalipto.
Neste sentido, pergunto por que é que ó Sr. Secretário de Estado da Agricultura não aceita, já que retira esse poder às câmaras - e insisto na pergunta do meu colega de bancada, João Soares -, que haja um parecer vinculativo da Secretaria de Estado do Ambiente? Então, se as câmaras não têm capacidade técnica para poderem responder, a Secretaria de Estado do Ambiente, de certeza absoluta, tem.
V. Ex.º se assim procedesse, demonstrava que, pelo menos, estava, de boa fé e, apesar de, nesta matéria, não haver legislação de qualidade, poderíamos começar, hoje aqui uma forma de trabalhar diferente evitando que o eucalipto seja penalizado pela incapacidade do Governo, pelo crescimento permanente das fábricas de celulose, pelo crescimento desordenado das plantações e pór novos negócios que visam mais ìnstalações de novas celuloses em Portugal, como já está a ser, referido pela imprensa portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura: Respondendo ao Sr. Deputado Rogério Brito, e lembrando o que o Sr. Deputado António Campos referiu, isto é, que havia bagunça, gostaria de salientar que, em primeiro lugar, e de acordo com o meu raciocínio, ambas as bancadas disseram que existem muitos eucaliptos em Portugal. $ assim, não é?

O Sr. Rogério Brito (PCP): - É!

O Orador: - Ambos dizem isso!
Em segundo lugar, disseram -. Mal! - que se retirou competências às autarquias. Então, concluo, porventura, mal, mas corrigir-me-ão, que ambas as bancadas culpam os autarcas de não aplicarem as suas competências. Ou seja, descobrimos agora que o Partido Comunista e o Partido Socialista acabam de culpar as autarquias portuguesas de serem as grandes causadoras da eucaliptização em Portugal.

Aplausos do PSD.

Risos do PS e do PCP.

O Sr: Herculano Pombo, (Os' Verdes):. - Esta cabeça!...

O Orador: - Sr. Deputado Rogério Brito, quanto à grande questão que V. Ex. e coloca sobre o ordenamento, também.º nessa matéria se aplica o que há pouco lhe disse. Não há hipótese possível' de aproximação, enquanto V. Ex.ª pensar que o ordenamento florestal

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é um planeamento dirigista, ou seja, é, por exemplo, dizermos que em cada metro quadrado deve haver esta árvore. Recusamos isso! Apelamos para as autarquias para fazerem os planos directores municipais e, dessa forma, elas vão definir as zonas de expansão urbanística, de floresta e de agricultura. Quando definirem a zona para a floresta, então vamos indicar que para um determinado tipo de floresta temos instrumentos financeiros poderosos, para outro tipo temos instrumentos financeiros menos poderosos.
Em nosso entender, deve dar-se apoio aos agentes de desenvolvimento económico com regras, com ordenamento, mas não com um ordenamento dirigista, porque em Portugal esse tipo de ordenamento não é bem aceite, assim como também não é em outros lados.
Quanto aos Srs. Deputados João Soares e António Campos, que me perguntam por que razão não aceito o parecer da Secretaria de Estado do Ambiente e qual o papel que ela tem em toda esta matéria, devo dizer que tudo está definido no Decreto-Lei n.º 175/88, onde se diz que todos os projectos de florestação nas áreas dos parques são da sua competência, consistindo o seu papel na elaboração de estudos de impacte ambiental.
Por último, gostaria de dizer que a qualidade de vida e do ambiente não é monopólio da Secretaria de Estado do Ambiente. Poderia já ter sido em governos anteriores, mas neste Governo não é, porque já foram definidos os termos em que a Secretaria de Estado do Ambiente deve colaborar nessa matéria e já foram aprovadas pelo Governo, sem qualquer protesto, as normas para esse efeito.
É neste âmbito que a Secretaria de Estado do Ambiente colabora. Agora, não queiram, Srs. Deputados, que um departamento do Estado emita pareceres obrigatórios, já que não é só ele que directamente tem a ver com a qualidade de vida ou com a floresta de produção, pois, indirectamente, todos temos a ver.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Essa agora?! O que é que o eng. Macário estará lá a fazer?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado da Agricultura, V. Ex.ª utilizou dois minutos do tempo que lhe foi cedido pelo Partido Social-Democrata.

O Sr. António Campos (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Campos (PS): - É para a defesa da consideração, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Campos (PS): - O Sr. Secretário de Estado da Agricultura levantou-se e com um ar... - aliás, penso que ninguém acreditou nesse ar e também ele não acreditou - e disse: «Bem, o Sr. Deputado está a culpar as autarquias.»
Então V. Ex.ª tira o poder às autarquias para ficar com ele todo, esvazia-as desse poder, porque não tem confiança nelas, porque elas estão a dificultar a sua vida e o impedem de pôr no tal metro de que V. Ex.ª há pouco falava, não as outras árvores de crescimento lento, mas, sempre que puder, eucalipto, e depois afirma que eu é que não tenho confiança nas autarquias? Então, é o Sr. Secretário de Estado que as esvazia de poderes que tem confiança nelas?!

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Ora aí está!

O Orador: - Ora, isto não pode ser, Sr. Secretário de Estado! Essa forma de raciocinar sobre esta matéria não a pode utilizar, pelo menos, comigo.
Que V. Ex.ª possa divergir de mim, quando quiser e quando lhe apetecer, e que não esteja de acordo, tenho de aceitar, mas a demagogia tem um limite que é o da seriedade. Ora, o que afirmou não é sério, porque V. Ex.ª esvazia as autarquias de poderes e ainda vem dizer que os outros é que não acreditam nelas. Não pode ser!

Vozes do PS, do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

O Sr. Secretário dde Estado da Agricultura: - Em primeiro lugar, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado António Campos se, com o ar com que se levantou, acredita no que disse.

Risos do PSD.

Sr. Deputado, como é que pode acreditar no que disse? Limitei-me a fazer um raciocínio lógico, em face do que V. Ex.ª disse que «era a bagunça» e que se «retiram competências às autarquias». Então até aí que é que tinha essa competência? Eram os autarcas. Se há muitos eucaliptos, a dedução é fácil, é uma dedução lógica.
Sr. Deputado António Campos, acredito no que disse e não estou a ser demagogo.
Agora, quanto a esvaziar competências - se houver tempo -, terei muito gosto em tentar demonstrar-lhe, mesmo juridicamente, o que é isso de retirar competências às autarquias. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que - e consulte a Lei n.º 100/84 - as autarquias locais, neste país, têm competências genéricas. A Lei n.º 100/84 diz que compete às autarquias tudo o que é desenvolvimento do território municipal, elencando várias coisas: uma delas é a política de saúde, outra é a política do ambiente. Então o senhor acha que quem deve definir a política de saúde, por exemplo, é uma autarquia?! Por isso, Sr. Deputado, segundo o princípio da generalidade, que é aquilo que lhe está afecto pela lei - a lei que foi feita por esta Casa -, nunca há o retirar de competências.
O que fizemos neste decreto - e eu acredito no que estou a dizer - foi, tão-só, dizer que aquelas acções de florestação e todas as outras que já tenham sido licenciadas pela Administração Central - mas todas e não apenas as de florestação - não têm de o ser pela Administração Local. Sabe para quê? Tão-só para isto: para evitar aquilo que se chama, no nosso país - e contra o qual combatemos e o senhor, com certeza, também -, o conflito de competências. Queremos que haja transparência na administração e razão

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para os administradores. Tão-só isto, Sr. Deputado!
Não posso, agora, dar mais lições sobre esta parte de
Direito Administrativo, mas dá-lás-ei mais tarde, se
assim quiser.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Rogério Brito pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Para exercer o direito da defesa da consideração, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - A que propósito é que o Sr. Ministro está à falai para a Mesa?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Estava a pedir a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): Sr.ª Presidente estava só à espera que os ânimos acalmassem:

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, solicito que se faça o silêncio necessário para prosseguirmos o debate.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Brito. (PCP)- - Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado; - Srs. Deputados Começo-a ter dificuldade de intervir neste debate e vou dizer porquê: É que eu costumo fazer das minhas intervenções; neste Plenário, um exercício de seriedade e quando se entra na chicana política e no jogo de palavras sem conteúdo, meramente para fazer a campanha galhofeira, começo a ter- dificuldade de participar nesse tipo de debate. Não sou capaz e perco-me, porque tenho uma noção de seriedade do debate neste Parlamento e tenho o direito de a exigir também ao membro do Governo.
Por outro lado, a questão que se está a discutir, que é do interesse, do Pais, não se discute em termos de "para este lado", "para aquele lado", e outras, coisas do género.
Passemos agora ao aspecto sério da questão.
Quando se fala no problema do ordenamento florestal, confundir este conceito de ordenamento com o planeamento, dirigista, bom, das duas unia: ou é. não
saber do- que é que se está a falar ou é ter. efectivamente uma concepção altamente centralizadora, que é incapaz de entender o que é ordenar os recursos do Pais. É este o:caso1-Tenho a impressão que o Sr. Secretário de Estado tem uma concepção de tal forma centralizadora do exercício do poder que, a determinada altura, perde a noção do que é o conceito de ordenamento dos recursos. Não o tem) De certeza que, em lado nenhum, terá estudado a hipótese de confundir ordenamento dos recursos com planeamento dirigista.
Segundo ponto, quando ouvimos neste pais, entidades competentes ao nível das universidades técnicas, ao nível dos cientistas e ao nível dos biólogos, abordar este problema, suscitando por diversas vezes a necessidade de se ordenar os recursos em termos de solos, em termos de aptidão e da vocação dos mesmos, em termos do espaço florestal, o Governo insiste sistematicamente em confundir isto com dirigismo. Isto é uma teimosia que não leva a lado algum, não tem racionalidade, não tem base técnica de argumento, é uma mera teimosia para - não aceitar qualquer pressuposto que parta da Oposição.
Porém, tenho disto uma visão muito mais construtiva. Quando falo no ordenamento dos recursos, é isso mesmo, há .um espaço, temos de equacionar a capacidade dos solos, temos de equacionar a relação entre as pluviometrias e o consumo dos povoamentos florestais. Tudo isto está em causar.
Devo dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que o Governo, através da
Direcção-Geral das Florestas, já se deu ao, luxo de aprovar plantações de eucalipto, exactamente em cima dos recursos hídricos que abastecem, por exemplo, toda uma vila com milhares e milhares de habitantes. Para não dizerem que estou a falar num elemento sem fundamento, vou dar-lhes o exemplo do caso do Cercal do Alentejo, em que a Direcção-Geral das Florestas aprovou a plantação de eucaliptos em cima do lençol freático que alimenta o abastecimento de águas àquela vila, embora tenha sido recusado por todas as entidades. Como é que isto pode ser: aprovado? Ora, neste .caso, se. não fosse a autarquia, . a plantação tinha avançado! Foi exactamente ã existência do recurso anulatório dessa plantação que possibilitou que esse crime não. se cometesse.
Vamos, pois, discutir as coisas com seriedade)

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.

O Sr. Secretário de Estado da Agricultura: - Sr. Deputado Rogério Brito; de facto não vou fazer chicana política porque quem a quer fazer é o senhor.
Em relação a ter dificuldade na discussão, com certeza quê o senhor é - capaz de ter dificuldade - e aqui chame-lhe, o que quiser- em conseguir participar na discussão, quando as coisas- começam a ficar claras neste pais: Sr. Deputado, há um ano que começaram a existir essas regras. Falou-me em projectos, disse que se fez, que aconteceu... Mas quando? Demonstre-o!

Por outro lado, afirmou que quero confundir o ordenamento com o planeamento dirigista, porque tenho uma visão centralista do poder. Sr. Deputado posso ter pouco, mas já tenho algumas coisas escritas e publicadas que-terei muito gosto em oferecer-lhe para demonstrar que- não é assim. Além disso, como me pode acusar, a mim, de querer ter uma visão centralista quando os senhores são defensores do centralismo democrático! Como é que posso ser acusado de ter uma visão centralista? . ' '
Gostava que o Sr. Deputado me dissesse, na "discussão séria" que referiu - aliás já lhe tinha colocado essa pergunta - o que é, afinal, o seu ordenamento florestal? Eu já lhe disse o que quero e o senhor chama a isto uma visão centralista. Eu disse-lhe que as autarquias, locais, agrupadas em planos
supra-municipais, façam os planos de ordenamento intermunicipais, devendo nós incentiva-las a fazê-lo, para que nos digam nesses planos - ou acha que os planos de ordenamento

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municipal são centralistas? -, qual é a área para uma coisa e qual é a área para a outra. No momento em que se definir qual é a área para a floresta, é nessa altura que vamos dizer aos agentes económicos o que é que eles têm à disposição. Acha que isto é uma visão centralista ou, ao invés, o que o senhor gostaria era que disséssemos, olhando paia Portugal, em cada metro quadrado - disse-lhe e repito -, que aí deve estar esta árvore, aquela e aqueloutra. É isto que recusamos, porque queremos que as autarquias exerçam o seu papel. Sr. Deputado, isto não é confundível. Isto é um debate sério!
Gostaria de ouvi-lo dizer, nesta Câmara tendo em conta o grau de descentralização a que tanto apela, o que é que pretende fazer em termos de ordenamento florestal. É isto que queremos.
Sr. Deputado Rogério Brito, isto não é querer um debate sério? Sinceramente, se isto não é um debate sério, então, é a chicana política que o Sr. Deputado quis fazer.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Rogério Brito pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr.ª Presidente, para um protesto. Se não puder, para uma intervenção.

A Sr.ª Presidente: - Fica inscrito para uma intervenção, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Soares.

O Sr. João Soares (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na nossa opinião o Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril traduz, em termos legais, aquilo que parece ser, cada vez mais, um objectivo fundamental deste Governo: a eucaliptização sem controlo, a eucaliptização desenfreada do nosso país.
Para demonstrá-lo basta-me analisar os artigos 1.º e 2.º do referido diploma. O artigo 1.º é aparentemente semelhante ao artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 397/75. Trata-se, no entanto, de mera aparência. As expressões utilizadas são diferentes e traduzem alterações substanciais.
Enquanto no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 375/75 se determinava que: «São proibidas, sem prévia autorização das câmaras municipais das áreas afectadas, todas as práticas de destruição do revestimento vegetal que não tenham fim agrícola, bem como as operações de aterro ou escavação que conduzam à alteração do relevo natural e das camadas de solo arável.» No artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 139/89, a fórmula utilizada é bem mais tímida e ambígua: «Carecem de licença das câmaras municipais...»
Para além disso, o n.º 2 do artigo 1.º substitui a referência que era feita pelo Decreto-Lei n.º 375/75 «aos serviços competentes do Ministério do Equipamento Social e do Ambiente (e sublinho ambiente) e do Ministério da Agricultura e Pescas» por uma referência vaga e ambígua «aos serviços centrais, regionais ou locais dos ministérios competentes». Isto significa, do nosso ponto de vista, que não se quer considerar a Secretaria de Estado do Ambiente como competente para se pronunciar sobre esta matéria.
A leitura atenta do artigo 2.º permite reforçar ainda mais este entendimento. Convirá talvez recordar que o Decreto-Lei n.º 175/88, de 17 de Maio, com o pretexto da criação de um regime legal específico para as espécies florestais de rápido crescimento - leia-se eucaliptos - veio retirar às câmaras, relativamente a estas espécies, o poder de decidir no que se referia às áreas superiores a 50 hectares. Embora o pretexto invocado fosse o acompanhamento pela Administração Central das acções de florestação, nomeadamente quanto ao seu impacto ambiental, não se previa no diploma a intervenção vinculativa da Secretaria de Estado do Ambiente.
Previa-se e prevê-se apenas a autorização, que pode ser meramente tácita, da Direcção-Geral das Florestas.
As câmaras, nos termos do disposto no referido Decreto-Lei n.º 175/88, são apenas ouvidas, sem parecer vinculativo, nos projectos de arborização que incidam sobre as áreas superiores a 35 hectares ou de que resultem áreas de idêntica ordem de grandeza, na continuidade de povoamentos pré-existentes das mesmas espécies.
O diploma em ratificação introduz, é certo, a audição não vinculativa, sublinhe-se, das câmaras no que se refere a acções que envolvam áreas superiores a 50 hectares. Este dispositivo, que aparentemente reforça as competências das autarquias nesta matéria, não permite, como é óbvio, que as Câmaras se oponham eficazmente à eucaliptização desenfreada.
Mas a alínea b) do artigo 2.º do referido decreto-lei introduz a excepção, em termos de licenciamento das Câmaras: «Das acções preparatórias de outras que se encontrem na situação descrita na alínea anterior.»
Qual é o sentido útil desta alínea b) do artigo 2.º?
Estamos em crer que se trata de alargar ainda mais a margem de manobra dos que estão empanhados na eucaliptização descontrolada, na eucaliptização desenfreada, que podem começar por destruir o anterior revestimento florestal para depois apresentarem os seus projectos de eucaliptização ao abrigo do regime estabelecido no Decreto-Lei n.º 175/88, como aliás tem sido prática relativamente corrente. Para nós, socialistas, o que é mais significativo é a reiterada exclusão de todo este processo, como óbvias incidências ambientais, da Secretaria de Estado do Ambiente.
O Governo continua, desta forma, a limitar expressa, assumida claramente a capacidade de intervenção da Secretaria de Estado do Ambiente.
Nós, socialistas, na posição moderada e responsável que sempre foi a nossa na sociedade portuguesa, na vida política portuguesa, temos consciência da dificuldade de articular os imperativos do crescimento com a necessidade de preservação dos valores ambientais. Não temos uma visão maniqueísta das coisas em matéria de ambiente.
Não temos uma posição radical contra o eucalipto.
No entanto, parece-nos essencial preservar de forma eficaz, de forma efectiva, valores ambientais, valores que têm que ver de forma directa com a qualidade de vida das populações.
Tal desiderato só será possível, só será atingível, estabelecendo mecanismos eficazes de contra poder fazer face à pressão ameaçadora dos interesses que estão por detrás da eucaliptização descontrolada, da eucaliptização desenfreada dos nossos campos, dos nossos melhores solos florestais.

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Para nós é essencial desenvolver as, espécies florestais de crescimento lento è de uso múltiplo; as espécies que não degradam os solos.
Por isso nos parece essencial, nesta matéria, sujeitar imperativamente a parecer vinculativo dá Secretaria de Estado do Ambiente todas as acções sujeitas ao regime legal, específico previsto no Decreto-Lei nº 175/88.
Por isso, recusamos a ratificação do Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de Abril.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas.

O Sr. Luís Capoulas (PSD): = Sr. Deputado João Soares, o que está em causa neste decreto-lei, cuja ratificação o PS recusa, é o excepcionai do regime geral; isto é, do regime que faz carecer de licença das câmaras municipais a destruição do renovo florestal pára operações culturais, as áreas ou as espécies, de crescimento rápido que já tinham um regime legal específico.
Portanto, o que se visa é substituir um regime legal que não funcionava, que era o dó Decreto-Lei n.º 357/75, e que não- impediu aquilo que, no dizer da Oposição, é proliferação da eucaliptização indiscriminada do País. Isto é, visa substituir-se um regime ineficiente por um regime, porventura, mais centralizado, na medida em que transfere para a Administração Central competências que no Decreto-Lei n.º 357/75 competiam às autarquias locais, por um mais eficiente.
Pergunto, pois, ao Sr. Deputado João Soares até que ponto é que se pode considerar esta legislação, cuja ratificação recusa, mais permissiva do que a anterior que, embora mais exigente, não funcionava: Isto é, quando se substitui uma legislação, porventura, mais restritiva se aplicada, por outra que de facto pode funcionar, estamos a aumentar a permissividade ou, pelo contrário, estamos a estabelecer balizas mais eficientes para o controlo da eucaliptização?

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Soares.

O Sr. João Soares (PS): - Sr. Deputado, penso que o debate que travámos e em que tivemos ambos a oportunidade de participar já foi suficientemente esclarecedor nesta matéria.
Quanto à pergunta que me faz, não lhe coloco a questão em termos de eficácia da legislação, mas em termos de não existir, numa perspectiva pela positiva, qualquer espécie de contrapoder em relação ao domínio absoluto com que fica; nesta matéria, a Secretaria de Estado das Florestas e a Direcção-Geral das Florestas.
Ora, o que nos parece é que os senhores acentuam a duplicidade com que funcionam em termos de ambiente, isto é, a Secretaria de Estado do Ambiente tem funções meramente decorativas para fazer uns números- agradáveis para certos sectores da população e não tem um real poder de intervenção. Isso permite-nos assistir a espectáculos como aquele que referiu o meu camarada António Campos,. ainda há bem pouco tempo, na televisão, quando o Sr. Eng. Carlos Pimenta, que teve responsabilidades ao nível da Secretaria de Estado do Ambiente; apareceu a falar como se fosse um membro da Oposição. Aí, sim, haveria lugar a falar, em profissionais da negativa, de tal forma foi a intervenção. do Sr. Eng. Carlos Pimenta.
Julgo que isto, Sr. Deputado, responde suficientemente à questão que me colocou.

Vozes do PS:.- Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Os dois pedidos de ratificação que estão a ser apreciados têm, como facilmente se entende, uma vertente muito mais política do. que técnica, não trazem rótulo como convém; mas o produto é sobejamente conhecido.
Fazer um, recuo até 1975 seria o pretendido, para que, agora sim, as câmaras, municipais, que sempre se esqueceram da existência deste diploma, viessem, de pronto interferir sempre que pudessem na dinâmica florestal, na reestruturação e modernização da agricultura. Até 1988, só havia um instrumento legal para controlar a articulação dó revestimento vegetal ou do relevo natural - o Decreto-Lei n.º 357/75, que remetia às câmaras municipais a competência para licenciar ou embargar qualquer pretenção nesse sentido.
Sabendo-se, porém, que durante 1975/85 a área de eucaliptos aumentou extraordinariamente, era bom que dissessem se houve algum embargo ou algum licenciamento municipal das variadíssimas pretenções de alteração do revestimento vegetal. Julgamos que. não, porque as- câmaras municipais 'não tinham um quadro técnico- habilitado para apreciar as candidaturas e para poder avaliar o benefício ou o prejuízo ao nível do impacte ambiental ou social de qualquer uma delas.
Consciente desta situação, o Governo fez promulgar o Decreto-Lei n.º 175/88, que regulamenta a forma de intervenção da Administração Central e Local, de forma à que fossem controlados os excessos que no passado tinham existido, simultaneamente para que houvesse uma articulação na fiscalização e controlo por parte da administração. Foi necessário adaptar o Decreto-Lei n.º 357/75 de forma a evitar o choque de competências das diferentes tutelas.
O Decreto-Lei n.º 139/89 tem por finalidade a articulação entre outra peça legislativa que raramente foi citada mas que, quanto a nós, não tem peçonha o Decreto-Lei n.º 175/88. De resto, nenhuma competência é tirada ao poder autárquico. O que se passa, isso sim, é não deixar interferir nas decisões porventura já devidamente equacionadas e aprovadas pelos órgãos ou tutelas específicas, as quais se prendem com as grandes medidas de desenvolvimento local ou regional ou programas específicos que são apoiados pela CEE.
A, grande dor de cabeça é o artigo 2.º, que contempla justamente o que acabei de referir, com o que concordamos perfeitamente. Sem fazer comentários ao que se tem passado nestes anos, porque entendemos que estas matérias são demasiado importantes e não devem constituir motivo de intervenção negativa nesta sede, porquanto os mais directamente ligados, agricultores e autarcas, estão. absolutamente calmos em relação a este assunto, dando-nos, desta forma, certeza de que o Decreto-Lei n.º 139/89 deve continuar a vigorar tal como está.

Aplausos do PSD.

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A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Herculano Pombo. Dispõe de um minuto cedido pelo PRD.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, o PRD teve a amabilidade de me dispensar a totalidade do seu tempo, que é de dois minutos e pouco.
Sr. Deputado Vasco Miguel, como se deve recordar, fiz referência a um relatório, cuja cópia tenho em meu poder, que foi solicitado pelo tal membro das Comissões da Comunidade Europeia, o qual, poder ser um relatório tão fidedigno, elaborado pela Comissão de Coordenação do Alentejo, em papel timbrado, assinado pelo seu presidente, etc, podia provocar alguns embaraços ao Governo português. Foi solicitada a sua apreciação pelo Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, Macário Correia, que despachou - tenho aqui o fac símile do seu despacho - no sentido de que, sim senhor, é assim mesmo, envie-se.
O relatório refere que o grande aumento das áreas de eucaliptal é um problema que preocupa todos e pergunta, entre outras coisas, à custa do que é que o eucalipto apresenta taxas de crescimento muito superiores às das outras espécies, que consequências sócio-económicas é que isso tem em termos de mão-de-obra, a que consequências de alterações de hábito isso leva, etc. Estas perguntas são, todas elas, pertinentes.
Diz, depois, que a situação tem a ver com uma opção de desenvolvimento e chega a certa altura que analisa, detalhadamente, o tal Decreto-Lei n.º 357/75. Refere, nomeadamente, as competências que ele cometia às autarquias e diz que, neste âmbito, a CCR do Alentejo, através da DRARN, tem prestado apoio técnico aos municípios de Mértola, Portalegre e Portei, quer através da emissão de pareceres quer na tentativa de encontrar consensos, alternativas e soluções com empresas ou proprietários.
A certa altura o relatório diz: «Caso a revogação deste decreto se concretize fica, assim, comprometida a actuação das autarquias, dos serviços regionais, no que respeita a alterações da paisagem»,...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, esgotou o tempo de que dispunha. Queira terminar.

O Orador: - ... «este problema é agravado por um vazio jurídico que se verifica...», «o desaparecimento de valores florísticos e faunísticos...», «está na origem de acções de conservação...», «poderá comprometer os processos de classificação...» etc.
Este documento foi produzido pela administração portuguesa, sancionado pelo Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais e levado ao conhecimento da Comissão das Comunidades Europeias. No entanto, ele põe em causa tudo aquilo que o Sr. Deputado vem aqui afirmando em defesa da tal revogação.
Não me pronunciarei mais sobre o assunto mas não deixo de lhe perguntar quantos pesos e quantas medidas tem este Governo.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar. Já ultrapassou em um minuto o tempo que lhe foi cedido.

O Orador: - Sr.8 Presidente, estou ainda no tempo do PRD pois foi-nos cedida a disponibilidade total do tempo.

A Sr.ª Presidente: - Se assim é pode prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - Perguntava, Sr. Deputado Vasco Miguel, se tem este Governo dois pesos e duas medidas, se tem este Governo orientações políticas absolutamente contrárias e opostas, se há coisas no Governo que nós não saibamos, se o eucalipto é bom para uns e mau para outros.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se a totalidade do tempo que lhe foi cedido pelo PRD. Queira terminar.

O Orador: - Sabemos que, a este propósito...
Sr.ª Presidente, o CDS disponibiliza-me algum tempo que, para já, não irei utilizar. Muito obrigado.
De qualquer modo, vimos todos - o assunto foi aqui referido - como o Sr. Secretário de Estado Carlos Pimenta, hoje eurodeputado reeleito, se pôs em bicos de pés na televisão exigindo, na presença do director-geral das Florestas, um ordenamento florestal sério e dizendo que o Estado é que tem de ordenar. Ao que o Sr. Director-Geral das Florestas...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

O Orador: - Sr.ª Presidente, o CDS tinha-me disponibilizado algum tempo...

A Sr.ª Presidente: - Se o CDS cede tempo pode prosseguir, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Cedemos um minuto, Sr.ª Presidente.
O Orador: - Referia eu que o ex-secretário de Estado do Ambiente baseou toda a sua campanha na luta contra a eucaliptação desenfreada, selvagem, etc e exigia da administração-Governo, que não tinha nada a ver com a política que ele defendia, a correcção dessas disfunções dizendo - até apresentou relatórios - eu, quando fui secretário de Estado, até assinei protocolos que, por acaso, são muito maus mas que foram aqueles que se conseguiram.
O que é que o Sr. Deputado tem a dizer a isto? Que Governo temos nós? Para o que é que serve a Secretaria de Estado do Ambiente?
Já pedi a demissão do Secretário de Estado Macário Correia. Não por ele ser mau ou feio!... Não é isso que está em causa!... Pedi-a porque ele é um luxo desnecessário neste Governo.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Deputado Herculano Pombo, relativamente à participação ou não da Secretaria de Estado do Ambiente neste processo, a resposta já foi dada pelo Sr. Secretário de Estado. Não sei se o Sr. Deputado percebeu.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Percebi!... Já tinha mesmo percebido antes

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O Orador: - Então podia ter evitado a segunda pergunta!
O Governo não quer, julgo eu e julga toda a nossa bancada, eucaliptizar o País. Ninguém quer! ... O Sr. Deputado nunca ouviu dizer isso dentro desta Câmara, em qualquer debate relacionado com o eucalipto.
Por outro lado, não compreendo a sua acusação de vazio legislativo quando sabemos que foi exactamente para preencher o vazio legislativo que o Sr. Herculano Pombo referiu que o Governo, em 1988, através do Decreto n.º 175/78 criou algumas normas para evitar a eucaliptação desenfreada.
Peço-lhe mesmo, Sr. Deputado, que coloque a pergunta de maneira diferente porque, sinceramente, não a compreendi. O que entendi foi que o Sr. Deputado Herculano Pombo acabou por dar razão ao Governo por ter preenchido o tal vazio legislativo. Afinal, Sr. Deputado, V. Ex.ª não fez pergunta nenhuma. Limitou-se apenas a confirmar o que ó Governo preencheu o espaço de vazio legislativo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado Vasco Miguel, não quero que o Sr. Deputado se esteja a esforçar para me responder a uma coisa que não lhe perguntei.
O que fiz foi a leitura do tal relatório que lhe apresentei, onde se diz que este problema, o problema da revogação, é agravado em zonas em via de classificação - o Sr. Deputado não tem culpa de não ter entendido já que fiz reticências - já que se verifica um vazio jurídico antes da existência da .legislação própria ao abrigo do Decreto-Lei n.º 613/76, de 27 de Junho.
Referia-me, portanto, às zonas em via de classificação, tema que faz parte deste relatório, não se punha, pois, essa questão do vazio legislativo. Não digo que haja um vazio legislativo .quanto à regulamentação desta matéria. O que eu digo é que há um exagero, um tendencialismo jurídico no sentido de orientar para a eucaliptação, para o facilitar.
Interroguei-o, se quer que o lembre, sobre os pesos e as medidas, sobre
ex-Secretário de Estado Pimenta, sobre o actual Secretário de Estado Macário Correia.
Há tempos vi publicada num jornal uma sua fotografia pedalando, com um eucalipto preso à bicicleta. A legenda que acompanhava a fotografia dizia: "Com este eucalipto atrás de mim nunca mais consigo ganhar esta cicloturística." Enfim! ...
Era isso que pedia que comentasse, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado Herculano Pombo, o senhor ia monopolizando todo o tempo de que dispomos a falar numa coisa tão vaga que acabámos por não compreender.
O Sr. Deputado tem um relatório na sua frente e concorda com o relatório. Trata-se de um relatório que, provavelmente, lhe foi até fornecido por um dos Srs. Secretários de Estado. Foi?

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Não lhe vou contar! ...

O Orador: - Concorda, então, que, afinal o Governo tem secretários de Estado que se preocupam com a problemática do eucalipto!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, em tempo cedido pelo CDS - três minutos - tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.

O Sr. Rogério Brito (PCP): - Muito obrigado ao CDS.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Desejo fazer dois ou três considerandos, em termos de conclusão deste debate, na expectativa de que eles possam ser úteis.

Uma primeira coisa que gostaria de deixar aqui vincada é a de que estamos inteiramente de acordo com a questão que aqui foi colocada de que às autarquias não cabe o papel de legislar em termos de política nacional. Mas cabe certamente às autarquias o direito de intervir e de gerir o que há de margem de indefinição e de arbítrio na lei, quando essa mesma lei afecta interesses próprios locais.
É esta capacidade de intervir, de gerir este quadro, logicamente inevitável de indefinição, de arbítrio da própria lei, que se advoga como um poder para as autarquias.

Em segundo lugar, legislou-se para evitar que se repetissem situações que até chegou a dizer-se serem da responsabilidade das autarquias ou que haveria implícita uma acusação nossa. Chamo a atenção para o facto de o quadro legislativo que permite ao Governo intervir e condicionar a plantação designadamente dos eucaliptos, já estar em vigor desde meados do ano passado, sendo que a lei que estabelece o condicionamento da arborização sobretudo com as espécies florestais de rápido crescimento, é de 17 de Maio de 1988. E não é agora este decreto-lei que vem alterar substancialmente os poderes de intervenção do próprio Estado nesta matéria. Ora bem, a verdade é que casos como o de Valpaços, como o de Vale Figueira, como o da Veiga da Vilariça, etc, têm acontecido, exactamente, com o Governo dispondo de todos estes instrumentos legais para intervir! Não podemos esquecer do caso de Valpaços, que é recentíssimo!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Então se os acontecimentos estão à vista, se vemos as manifestações e temos exemplos como o caso da Serra da Aboboreira, como é que não é verdade?!
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado levantou aqui uma questão, como sua intenção, que não aceito e acho positiva, mas que não está contemplada na lei e, assim, penso que, nesta medida, correspondendo, no fim de contas, ao próprio conceito do Sr. Secretário de Estado, estaremos em condições de aprovar - ou melhor, o Governo poderá avaliar e o PSD aprovar uma proposta que foi entregue logo no início deste debate e que diz o seguinte, que rapidamente transcrevo:

Os planos directores municipais aprovados após a entrada em vigor da presente lei, conterão obrigatoriamente as disposições relativas à arborização e exploração florestal das áreas incluídas nos respectivos munícipios, no quadro das normas mínimas gerais cuja aplicação seja legalmente obrigatória.

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1 As disposições referidas no número anterior estabelecerão, pelo menos:
a) As áreas em que não é permitida a utilização, de certas espécies florestais nomeadamente os eucaliptos.
b) A percentagem da área do concelho que não pode ser excedida por ocupação florestal com uma ou várias espécies.
E, concluindo, transcreve-se a outra proposta, que complementa esta:
A Câmara Municipal embarcará as operações de arborização ou exploração florestal que:
a) Não constem de projecto aprovado;
b) Não respeitem as condições de aprovação do respectivo projecto;
c) Não observem no todo ou em parte o disposto nos artigos anteriores.
Ao embargo em operações de arborização ou exploração florestal, aplicam-se com as devidas adaptações, as disposições legais relativas ao embargo de obus.
Penso que, depois do que o Sr. Secretário de Estado disse, poderá estar de acordo com estas propostas e, portanto, elas poderão ser aprovadas ou, então, há contradição entre o que se diz e o compromisso que fica a constar da lei.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições considero encerrado o debate.
Seguidamente, vamos proceder à votação da proposta de lei n.º 91/V. Suponho que podemos proceder, também às votações dos pedidos de sujeição a ratificação que acabamos de debater.
O Sr. Deputado Montalvão Machado pede a palavra para que fim?

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. a Presidente, para pedir a V. Ex.ª e à Câmara o prolongamento dos trabalhos por um período que, suponho, será muito curto, para apreciação da matéria da proposta de lei nº 106/V. Dado o seu conteúdo, pedia a boa vontade de todos os grupos parlamentares. Embora estejam marcados dez minutos para cada grupo, pedia que reduzíssemos o tempo para cinco minutos pôr cada grupo e discutíssemos essa matéria hoje.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, pergunto se há consenso.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr.ª Presidente, nós temos, naturalmente, programada a actividade do nosso grupo parlamentar de acordo com o horário que estava estabelecido e não temos condições, agora, às 20 horas e 25 minutos, de prosseguir os nossos trabalhos por um tempo que não era previsível inicialmente.
Tinhamos, sim, dado o nosso consenso a que continuasse o debate deste pedido de ratificação e que, no final, se seguissem as votações. Para isso, que damos o nosso consenso, mas só para isso, Sr. Deputado Montalvão Machado.

A Sr. a Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.ª Presidente, a minha intervenção está um pouco prejudicada. Era só para dizer que, pela nossa parte, não nos oponhamos ao prolongamento da sessão.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não há. consenso e, embora eu não tenha estado presente na conferência de líderes parlamentares, suponho que estaria marcado para as 20 horas o limite do debate. Efectivamente, não sei se assim era e, por isso, pergunto, porque, em caso afirmativo, necessitaríamos de consenso para prolongar os trabalhos. Peço a ajuda dos Srs. Deputados no que respeita a esta questão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

0 Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr.ª Presidente, com efeito, na conferência de líderes não se tinham resolvido que os trabalhos se prolongassem para além das 20 horas; mas, dada a especificidade desta proposta, a matéria em causa e a brevidade do tempo que solicitamos, não compreendo até muito bem - e, a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo perdoar-me-á - como é que seria possível a aceitação do pedido de prolongamento se ele tivesse sido feito antes das 20 horas -e não esteja disposta a conceder o mesmo prolongamento só porque foi feito depois das 20 horas! Contudo, isso é um problema com o grupo parlamentar da Sr. a Deputada e não com o meu.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não há consenso, pelo que vamos proceder às votações, começando pela votação final global da proposta de lei n.º 91/V, que concede ao Governo autorização legislativa para aprovar o regime jurídico das infrações fiscais.

Submetida a votação, foi aprovada, .com votos a favor do PSD, votos contra do PCP e abstenções do PS, do PRD, do CDS e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução, apresentado por Os Verdes, de recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 139/89.

Submetida a votação, foi rejeitado com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD e de Os Verdes e a abstenção do CDS.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, seguidamente, vamos proceder à votação do projecto de resolução, de recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 139/89, apresentado pelo Partido Comunista Português.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos .contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do PRD e de Os Verdes e a abstenção do CDS.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, o Decreto-Lei n.º 139/89, cuja recusa de ratificação acaba de ser rejeitada, baixa à comissão porque tem propostas de alteração.

Srs. Deputados, não havendo mais nada a votar, nem se procedendo, tão-pouco, ao debate da proposta de lei n.º 106/V .

O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres pede a palavra para que efeito?

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23 DE JUNHO DE 1989 4731

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.ª Presidente, parecia-me útil que assentássemos numa metodologia que permitisse que esta proposta de lei, que hoje não pode ser discutida e votada, o fosse.
A nossa sugestão, porque amanhã é um dia mau para estas coisas e já tem ordem de trabalhos relativamente sobrecarregada, é de que ela fosse' incluída na ordem de trabalhos de terça-feira, mas havendo, desde já, o consenso sobre o prolongamento da sessão pelo tempo necessário para que toda a ordem de trabalhos fosse cumprida.

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr.º Presidente, só pedia uns minutos para fazer chegar um requerimento à Mesa para o efeito do prolongamento dos trabalhos.
Não é necessário haver consenso. Faz-se o requerimento e a Mesa defere ou indefere.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa aguarda o requerimento mas esclarece que não altera a decisão já tomada de que, por não haver consenso, os trabalhos deveram terminar após a votação. No entanto, como é óbvio, pode haver recurso da decisão da Mesa.
Para uma interpelação, tem a palavra a Sr.º Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Srs. Deputados, quero dizer o seguinte: há pouco, não havia quórum de votação e nós, no entanto, não levantámos esse problema, não quisemos criar quaisquer dificuldades, até porque tínhamos dado o nosso consenso até ao final do debate das ratificações e respectivas votações, já agendadas. Quisemos, portanto, manter a posição de consenso, que tinhamos dado, independentemente de haver quórum ou não de votação na Assembleia da República.
Neste momento e depois de á Mesa ter já tomado uma posição quanto à conclusão dos trabalhos para os quais tinhamos obtido consenso, é, de facto, despropositado que o PSD venha anunciar um requerimento para prolongamento dos trabalhos. Nós, Sr. Deputado, já dissemos que, por razões de trabalho partidário, não tinhamos, neste momento, condições de prolongamento dos nossos trabalhos para além daquilo que está previsto, ou seja, até às 8 horas e 30 minutos. Quanto ao resto, tinhamos dado o nosso consenso e mantivemo-lo até ao fim.

A Sr.ª Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr.ª Presidente, por respeito para com a Mesa e dada a acostumada boa vontade do PCP, nós desistimos do requerimento.

A Sr.ª Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: Sr.º Presidente, era sobre o agendamento desta matéria. O Governo sugeria que fosse na terça-feira, jeque o Sn Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais tem outra matéria em discussão também nesse dia e desde

que ficasse implícito o prolongamento dos trabalhos, conforme sugestão do Sr. Deputado António Guterres, para evitar a vinda do Sr. Secretário de Estado em vão.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.º Presidente, é apenas para dizer que só o prazer que temos em ver aqui o Sr. Secretário de Estado, faz com que ele nunca venha cá em vão.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, amanhã reuniremos às 10 horas, com o seguinte período da ordem do dia: primeiro ponto, perguntas ao Governo; segundo ponto, proposta de lei n.º 110/V, que autoriza o Governo a legislar em matéria de segurança rodoviária.
Não havendo mais nada a tratar, declaro encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 35 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António José Caeiro da Motta Veiga.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Domingos Duarte Lima.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José de Vargas Bulcão. Luís da Silva Carvalho.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Margarida Borges de Carvalho.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Rui Gomes da Silva.

Partido Socialista (PS):

António Miguel de Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
José Apolinário Nunes Portada.
Manuel António dos Santos. Vitor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alfredo Brito.
Maria Luísa Amorim.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Maria Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.

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4732 I SÉRIE - NÚMERO 95

Henrique Nascimento Rodrigues.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
Licínio Moreira da Silva.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.

Partido Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Helena de Melo Torres Marques.
João Cardona Gomes Cravinho.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.

Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.

Deputados Independentes:
Maria Helena Salema Roseta.

Os REDACTORES: Ana Maria Marques da Cruz Maria Amélia Martins - José Diogo.

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