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Quarta-feira, 14 de Março de 1990
I Série - Número 5
V LEGISLATURA
3ª SESSÃO LEGISLATIVA (1989.1990)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 13 DE MARÇO DE 1990
Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
VItor Manuel Calo Roque
Júlio José Antunes
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
0 Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 135/V.
foram aprovados os n.ºs 40 a 42 do Diário.
A Assembleia ratificou o Protocolo Relativo à Adesão de Portugal à Unido da Europa Ocidental (UEO) (proposta de resolução n.º 21/V). Intervieram no debate, a diverso titulo, além do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (João de Deus Pinheiro), os Srs. Deputados João Amaral e Maia Nunes de Almeida (PCP), Adriano Moreira (CDS). Angelo Correia (PSD), Herculano Pombo (Os Verdes), Miranda Calha (PS), Rui Silva (PRD), Eduardo Pereira (PS), Fernando Condesso (PSD) e José Lello (PS).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 87/V- Alteração, no que respeita à Região Autónoma da Madeira, dos valores de incidência das taxas da sisa,e do projecto de lei nº 113/V - Alteração, no que respeita à Região Autónoma dos
Açores, dos valores de Incidência das taxas da sisa e do projecto de lei n.º 446/V (PS) - Reforma da siso e do Imposto sobre as sucessões e doações.
Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Cosia), os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Manuel dos Santos (PS), Rui Carp e Mário Maciel (PSD), Carlos Lilaia (PRD), Octávio Teixeira (PCP), Domingues Azevedo (PS), Belarmino Correia (PSD), Gameiro dos Santos e Rui Ávila (PS).
Foram aprovados, na generalidade, a proposta de lei n.º 130/V - Aprova o regime de actividade da radiolelevisão no território nacional e o projecto de lei n.º 457/V (PS) - Sobre o exercício da actividade da radiotelevisão, tendo sido depois rejeitado um requerimento, apresentado pelo PCP, de baixa dos dois diplomas à 3.ª Comisão para audição de diversas entidades.
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 35 minutos.
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0 Sr. Presidente: -Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPQ/PSD):
Adérito Manuel Soares Campos. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Alexandre Azevedo Monteiro. Álvaro Cordeiro Dâmaso. Amândio dos Anjos Gomes. António Abilio Costa. António Augusto Lacerda Queirós. António de Carvalho Martins. António Costa de A. Sousa Lara. António Fernandes Ribeiro. António Jorge Santos Pereira. António José Caeiro da Mota Veiga. António José de Carvalho. António Manuel Lopes Tavares. António Maria Oliveira de Matos. António Maria Ourique Mendes. António da Silva Bacelar. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Arlindo da Silva André Moreira. Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha. Armando.Lopcs Correia Costa. Arnaldo Angelo Brito Lhamas. Belarmino Henriques Correia. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel Oliveira da Silva. Carios Manuel P. Baptista. Carios Sacramento Esmeraldo. Casimiro Gomes Pereira. Cristóvão Guerreiro Norte. Daniel Abílio Fcrreira Bastos. Domingos Duarte Lima. Domingos da Silva e Sousa. Duicínco António C. Rebelo. Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva. Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva. Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira. Femando Barata Rocha. Fernando José Antunes Gomes Pereira. Fernando José R. Roque Correia Afonso. Femando Monteiro do Amaral. Fernando dos Reis Condesso. Francisco Antunes da Silva. Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva. Henrique Nascimento Rodrigues. Hilário Torres Azevedo Marques. João Domingos F. de Abreu Salgado. João José da Silva Maçãs. João Soares Pinto Montenegro. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Fernandes Marques. Joaquim Vilcla de Araújo. Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha. José Álvaro Machado Pachcco Pereira. José Ângelo Ferreira Correia. José Assunção Marques. José Augusto Fcrreira de Campos. José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral. José Guilherme Pereira Coelho dos Reis. José Lapa Pessoa Paiva. José Leite Machado. José Luís Bonifácio Ramos. José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro. José Manuel da Silva Torres. Licínio Moreira da Silva. Luís António Martins. Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Luís Manuel Costa Geraldes. Luís Manuel Neves Rodrigues. Luís da Silva Carvalho. Manuel António Sã Fernandes. Manuel Augusto Pinto Barros. Manuel Coelho dos Santos. Manuel Ferreira Martins. Manuel João Vaz Freixo. Manuel José Dias Soares Costa. Manuel Maria Morcira. Maria Antónia Pinho e Meio. Maria da Conceição U. de Castro Pereira. Maria Luísa Lourenço Ferreira. Maria Leonor Beleza M. Tavares. Maria Teresa Pinto Basto Gouveia. Mary Patrícia Pinheiro e Lança. Mário Jorge Belo Maciei. Mário de Oliveira Mendes dos Santos. Mateus Manuel Lopes de Brito. Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos. Pedro Augusto Cunha Pinto. Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho. Pedro Manuel Cruz Roseta. Rui Alfredo Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp. Valdemar Cardoso Alves. Vasco Francisco Aguiar Miguci. Virgílio de Oliveira Carneiro. Walter Lopes Teixeira.
Partido Socialista (PS):
Albcrto Manuel Avelino. Alberto de Sousa Martins. António de Almeida Santos. António Carios Ribeiro Campos. António Domingues de Azevedo. António Fernandcs Silva Braga. António José Sanches Esteves. António Manuel Henriques de Oliveira. António Manuel de Oliveira Guterres. António Miguel de Morais Barreto. António Poppe Lopes Cardoso. Carios Manuel Luís. Edite Fátima Marreiros Estrela. Edinundo Pedro. Eduardo Ribeiro Pereira. Elisa Maria Ramos Damião Vieira. Francisco Fernando Osório Gornes. Helena de Meio Torres Marques. Henrique do Carmo Carminé. Jaime José Matos da Gama. João António Gomes Proença. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Rosado Correia. João Rui Gaspar de Almeida.
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Jorge Lacão Costa. Jorge Luís Costa Catarino. José Apolinário Nunes Portada. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Júlio Francisco Míranda Calha. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Leonor Coutinho dos Santos. Luís Filipe Nascimento Madeira. Luís Geordano dos Santos Covas. Manuel Alegre de Melo Duarte. Maria do Céu Oliveira Esteves. Maria Teresa Santa Clara Gomes. Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia. Mário Manuel Cal Brandão. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Rui António Ferreira Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Rui Pedro Machado Ávila. Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues. António da Silva Moia. Carios Alfredo Brito. Carlos Vítor e Baptista Costa. Jerónimo Carvalho de Sousa. João António Gonçalves do Amara]. João Camilo Carvalhal Gonçalves. Joaquim António Rebocho Teixeira. José Manuel Antunes Mendes. José Manuel Maia Nunes de Almeida. José Manuel Santos Magalhães. Júlio José Antunes. Lino António Marques de Carvalho, Luís Maria Bartolorneu Afonso Palma. Manuel Anastácio Filipe. Maria de Lourdes Hespanhol. Maria Luísa Amorim. Maria Odete Santos. Octávio Augusto Teixeira. Sérgio José Ferreira Ribeiro.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Alexandre Manuel da Fonseca Leite. Hermínio Paiva Fernandes Martinho. José Carios Pereira Lilaia. Natália de Oliveira Correia. Rui José dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira. Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PEV):
André Valente Martins. Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Deputados independentes:
Carlos Maios Chaves de Macedo. João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do diploma que deu entrada na Mesa.
0 Sr. Secretário (Reinaldo Gomes):- Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deu entrada na Mesa a proposta de lei n.º 135/V, sobre a protecção de dados pessoais face à informática, que, tendo sido admitida, baixou à 3.ª Comíssâo.
0 Sr. Presidente: -Srs. Deputados, estão em aprovação os n.º 40 a 42 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 6, 8 e 9 de Fevereiro passado.
Pausa.
Como não há objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, como sabem, o primeiro ponto da ordem de trabalhos de hoje é a apreciação da proposta de resolução n.º 21/V, que aprova, para ratificação, o Protocolo Relativo à Adesão de Portugal e Espanha à União da Europa Ocidental.
0 Sr. José Lello (PS): -Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
0 Sr. Presidente: Faça favor, Sr. Deputado.
0 Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de recordar a V. Ex.ª que seria determinante, num debate desta natureza, que a questão fosse introduzida pelo competente membro do Governo.
Parece-nos, pois, estranho que esta discussão seja travada sem que o Governo traga a esta Câmara a sua posição relativamente a esta questão, tanto mais que o debate decorre em virtude de uma proposta apresentada por ele.
0 Sr. Presidente: -Como o Sr. Deputado sabe, é hábito da Mesa anunciar a ordem de trabalhos para que iodos estejamos preparados para dar início ao debate.
AiRda não dei a palavra a ninguém, apenas anunciei qual era o primeiro ponto da ordem dos trabalhos, e, já agora, anuncio também que do segundo ponto consta a discussão de três diplomas, sendo dois deles relativos à alteração dos valores de incidência das taxas de sisa, um dos quais proveniente da Região Autónoma da Madeira e o outro da Região Autónoma dos Açores. 0 terceiro diploma em debate será o que foi apresentado pelo Grupo Parlamentar do PS, sobre reforma da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações.
Informo ainda que nesta sessão iremos proceder a votações.
Pausa.
Srs. . Deputados, vamos dar início à apreciação da proposta de resolução n.º 21/V. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
0 Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (João de Deus Pinheiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao decidir por uma participação activa na construção de uma Europa progressivamente mais unida, mais solidária, mais democrática e mais aberta, Portugal traçou para si mesmo um rumo fundamental para o seu futuro. Rumo fundamcntal que se traduziu, nos últimos 14 anos, numa adeção plena a duas organizações europeias de importância
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relevante: o Conselho da Europa e as Comunidades Europeias.
Portugal está, assim, presente e actuante, no seio das organizações que se ocupam, na.Europa, por um lado, dos conceitos fundamentais de direitos humanos, de Estado de direito e de democracia pluralista e, por outro, da integração económica, do desenvolvimento social. e da cooperação política com vista à construção de uma identidade europeia coesa, una e próspera.
Os acontecimentos verificados nos últimos, meses nos países da Europa Central e Oriental e a atracção evidente neles exercida pelos princípios e instituições existentes na Europa Ocidental vêm provar a justeza das nossas opções' e anunciar os caminhos a trilhar na construção da «nova Europa», agora liberta das divisões e opressões das últimas quatro décadas.
A participação de Portugal em todos os fora onde se discute e prepara a nova realidade europeia é, obviamente, essencial.
Encontra-se, assim, plenamente justificada e reforçada a decisão deste Governo, em Novembro de 1988, de assinar o Protocolo de Adesão de Portugal ao Tratado de Bruxelas Modificado, agora submetido à ratificação pela Assembleia da República, como justificado foi do passado, em 1984, o início do processo de adesão.
Com efeito, os aspectos da defesa e segurança do espaço europeu, essenciais para a construção da enfidade europeia que desejamos, não são abrangidos pelas compctências das organizações que atrás mencionei.
A única instituição existente para tal vocacionada e, por esse motivo, revitalizada a partir de 1983 é a União da Europa Ocidental. A manifestação do nosso desejo de vir a aderir à UEO teve lugar, aliás, antes da nossa entrada para a CEE, inserindo-se, por conseguinte, nuia política largamente consensual de participação em todas as frentes onde se prepara o futuro do continente.
Não há nesta orientação um desígnio de renunciar ou enfraquecer os laços que decorrem da nossa presença na OTAN como membro fundador. Pelo contrário, a nossa visão atlantista das realidades estratégicas que influenciam a segurança de Portugal reforça-se com a nossa eritrada para a UEO. Ao aceitarmos plenamente os princípios de orientação política contidos na Plataforma da Haia, de 1987, dissemos aos outros Estados membros que partilhávamos a noção de que aligação &ansatlâniica com os Estados Unidos e o Canadá era um elo insubstituível para a paz e estabilidade na Europa. As modificações que estão a decorrer no nosso continente não alteram, antes confirmam, essa análise.
Por outro lado, a própria instituição da UEO está plenamente consciente, tanio a nível do seu orgão executivo, o Conselho, como do seu órgão parlamentàr, a Assembleia, da urgente necessidade de se proceder, com realismo mas com igual espírito de inovação, à revisão das próprias disposições do Tratado de Bruxelas Modificado, por forma a tornar a organização melhor adaptada, tanto na sua estrutura interna como nas suas potencialidades e meios de acção, aos desafios que se põem a todos os responsáveis pela política externa, particularmente na área da defesa e segurança,. devido às mutações em curso.
Vozes do PSD: -Muito bem!
0 Orador: - Portugal, com a sua longa experiencia histórica e conhecimento das realidades de Muitas partes do Globo, tem o seu papel a desempenhar numa UEO
aberta ao futuro. Não poderemos ignorar a importância que terá a procura de soluções satisfatórias para todas as partes envolvidas dos problemas que se põem no domínio da segurança europeia. Tanto os órgãos dependentes do Conselho da UEO como as comissões da Assembleia terão relevantes tarefas a desempenhar para tal fim.
Estão em marcha acontecimentos de significado transcendente. Não podemos protelar a nossa participação no seu desenvolvimento. A adesão à UEO será mais um inequívoco sinal do empenho de Portugal em contribuir plenamente para a construção da Europa de paz, em liberdade, em democracia, em segurança e para todos.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento inscreveram-se os Srs. Deputados João Amaral, Maia Nunes de Almeida e Adriano Moreira.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
0 Sr. João Amara] (PCP): -Sr. Ministro, entende o PCP, nesta fase inicial do debate, que o Governo deve esclarecer, cabalmente, alguns dos contornos controversos do Tratado de Bruxelas e das circunstâncias relativas ao processo de adesão de Portugal à União da Europa Ocidental. Desafiamos o Governo a responder, sem evasivas nem eufemismos, ao conjunto de perguntas que vamos colocar.
A primeira pergunta incide sobre as obrigações militares que decorrem para Portugal em consequência da assinatura do Tratado.
0 artigo 5.º do Protocolo que modifica e completa o Tratado de Bruxelas, assinado em Paris em 23 de Outubro de 1954, refere explicitamente que «se qualquer das altas partes contratantes vier a ser vítima de agressão armada na Europa, as outras Partes Contratantes prestar-lhe-ão auxilio e assistência com todos os meios ao seu alcance, militares e outros».
Significa ou não isto, Sr. Ministro, que Portugal fica completamente vinculado a intervir em conflitos estranhos a um nível quantitativamente maior e qualitativamente reforçado do que aquele que lhe resulta da integração na NATO, em que Portugal se obriga apenas à acção que julgar necessária?
A segunda pergunta tem a ver com a ampliação geográfica das obrigações militares que decorrem para Portugl em virtude do Tratado.
E sabido que o Protocolo de Adesão incorpora, nos considerandos, a Declaração de Roma. No n.º 8 desta Declaração admite-se, expressamente, «intervenções militares concertadas no seio da Organização, em qualquer ponto do Globo».
Esta posição é igualmente reforçada na Plataforma da Haia, também ela acolhida nos considerandos do Protocolo de Adesão, onde se refere, expressamente, «a concertação das políticas relativas às crises surgidas fora da Europa, na medida em que possam afectar os interesses europeus».
Aliás, devo sublinhar que no escasso património de realizações da União da Europa Ocidental figura, precisamente, a sua intervenção no conflito do golfo Pérsico.
A pergunta que faço é a seguinte: significa ou não isto, Sr. Ministro, que a adesão à União da Europa Ocidental implica para Portugal a eventual intervenção em conflitos de que estaria excluído no quadro da integração na NATO?
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A terceira pergunta relaciona-se com a questão nuclear. A Plataforma da Haia, elaborada já no quadro negocial do Tratado INF (Intermediate Range Nuclear Forces), vai ao arrepio da sua filosofia ao preconizar explicitamente a manutenção de forças nucleares, incluindo as forças independentes de França e de Inglaterra, e ao reforçar a obrigação de todas as Partes Contratantes de assumirem encargos militares não só de natureza convencional mas também nuclear.
Não sendo questionável, Sr. Ministro -até porque foi esse o seu objectivo-, que este sublinhado das obrigações nucleares significa o seu reforço e o seu alargamento às citadas forças nucleares independentes de França e de Inglaterra, a pergunta que coloco é a seguinte: que compromissos visualiza, assumiu ou aceita assumir o Governo quanto a encargos e armamento nuclear? Que compromissos e para quando? Ou, de outra forma: fica claro que o Governo admite aceitar compromissos ou encargos relativos a armamento nuclear?
0 Protocolo n.º 2, assinado em Paris em 23 de Outubro de 1954, regulamenta a contribuiçÃo das Partes para as forças terrestes, aéreas e navais da União da Europa Ocidental, bem como as condições do seu comando.
Neste aspecto é importante acentuar que se encontra assim explicitamente definida a existência de forças militares da União da Europa Ocidental.
Pode dizer-se, entretanto, que essa vertente da UEO é deferida à NATO e que o tem sido desde a sua fundação.
Porém, isso não é verdade e a prova disso é a sua intervenção no golfo Pérsico.
Assim, existindo nesse Protocolo-e tendo ele eficácia jurídica - essa obrigação de participação nas chamadas forças da União da Europa Ocidental, a pergunta que faço é a seguinte: como avaliou o Governo Português as decorrências deste Protocolo para as forças armadas portuguesas e para a sua juridicamente possível afectação e dependência das forças da União da Europa Ocidental?
0 Sr. Presidente: - Sr. Ministro, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex a deseja responder já ou no fim?
0 Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: -Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente: -Então, tem a palavra o Sr. Deputado Maia Nunes de Almeida.
0 Sr. Maia Nunes de Almeida (PCP): -Sr. Ministro, permitia-me continuar com as perguntas que o Grupo Parlamentar do PCP anunciou que iria colocar, começando pela questão relativa às forças necessárias á defesa das fronteiras.
0 ponto 3.4 da Plataforma da Haia contém, entre outras, graves questões, numa ambíguidade que deve ser aqui esclarecida. Efectivamente, as partes entenderem «assegurar a sua determinação em defender, nas suas fronteiras, todos os Estados membros é claramente manifestada pelas disposições apropriadas». Se é certo que, ainda de acordo com esse, ponto 3.4, «o nível de contribuiçao de cada país para a defesa comum deve reflectir as suas capacidades de maneira adequada», então que significa o citado ponto no que respeita à questão da defesa das fronteiras no caso português, considerando, obviamente, a complexidade da posição geográfica de
Portugal e as suas implicações no plano do sistema de forças acro-navais? Significa que o UEO pode impor esse determinado nível de capacidade de defesa a Portugal (mais meios e mais custos!) ou que, em alternativa, se Portugal não assegurar esses meios, outros países da UEO os vêm aqui colocar? Significa que ficamos na alternativa «mais gastos ou mais dependência»?
A sexta pergunta é relativa à natureza da UEO. Por vezes escreve-se e defende-se para a UEO a natureza de «mero fórum de debate europeu sobre as questões da defesa e segurança». Se o Governo partilha este ponto de vista, como o compatibiliza com as funções militares da UEO e as decisões político-militares tomadas no seu quadro, tal como resultam e estão implícitas nas cinco anteriores perguntas do Grupo Parlamentar do PCP?
A sétima pergunta é sobre a UEO e a denominada construção europeia. Trata-se de uma questão nodal e será sobre ela que versará, no essencial, a intervenção que o PCP vai produzir no debate.
Entretanto, mesmo no quadro das questões de defesa, é relevante perguntar ao Governo o seguinte: a UEO é actualmente constituída por sete países e com a adesão de Espanha e de Portugal ficará com nove. A UEO exclui-se, em princípio, aos países que não pertencem à NATO e, mesmo quanto a estes, pôs a Grécia em corripasso de espera e, quanto à Dinamarca, não lhe reconhece «intenção de cooperar militarmente»,
Tudo isto é minuciosamente comentado no relatório apresentado por Van der Sandem à Assembleia da UEO, em 3 de Maio de 1989. Assim, sendo a UEO apenas uma parcela na área da defesa e da segurança, menor que outras parcelas existentes e em funcionamento (como o Eurogrupo, que só exclui dos países europeus da NATO a França e a 15lândia; ou o JEPG -Grupo Europeu Independente de Programas, que desses países europeus da NATO só exclui a 15lândia), sendo, assim, a UEO minoritária, por que motivo entende o Governo privilegiá-Ia para a tal «construção europeia», se é que, entende privilegiá-la? Será porque, como a caracterizou em 4 de Dezembro de 1989, na Secção da Assembleia da UEO, o seu Presidente, M. Goerens, ela é o «núcleo duro» de uma certa concepção da política de defesa, isto é, uma instituição que se caracteriza não por ser abrangente da Europa mas precisamente por a reduzir a uma certa concepção, a uma certa política e a um certo núcleo de países?
A oitava pergunta é de carácter técnico-jurídico. Portugal não adere só aos documentos que estão anexos ao Protocolo de Adesão. Nos considerandos desse Protocolo fica claro que Portugal «aceita, sem reservas e na íntegra, a Declaração de Roma de 27 de Outubro de 1984 e a Plataforma sobre os Interesses Europeus em Matéria de Segurança, adoptada na Haia a 27 de Outubro de 1987», e que «se mostra disposto a participar inteiramente na sua implementação».
Assim, pretendem as partes que esses dois documentos, na sua letra e no seu espírito, vinculem o Estado Português. 0 que se pergunta ao Governo é isto: se se pretende dar eficácia jurídica a esses documentos, como é que eles podem deixar de figurar, explicitamente, em texto completo e tradução oficial portuguesa no conjunto dos documentos que a Assembleia aprove para ratificação? Fica claro: não figuram, não vinculam!
Nona e última pergunta: está o Governo de acordo que é um absurdo e um escândalo manter na denominação desse Tratado, de natureza político-militar, as referências
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a uma colaboração em matéria económica, social e cultural, que dele estião completamente excluídas? Não é mais bonito-e o Sr. Ministro perdoar-me-á a expressão - «chamar o boi pelo próprio nome»?
0 Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
0 Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em primeiro lugar julgo que V. Ex.ª talvez pudesse ajudar esta Câmara se lhe dissesse alguma coisa sobre o que se encontra previsto para um diálogo institucionalizado entre a União da Europa Ocidental e a Aliança Atlântica. Essa é, certamente, uma das dúvidas que paira no espírito das pessoas que se preocupam com este problema.
Em segundo lugar gostaria que me informasse se, nesta adesão que se anuncia, está prevista alguma política (ou políticas) que faça coincidir os participantes na União da Europa Ocidental com os participantes na Comunidade Europeia, etc., tendo em vista uma coincidência de participações aos responsáveis, com vista a uma política coordenada das várias instituições.
0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
0 Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª parte do princípio -e isso está subjacente a todas as suas perguntas -que a UEO tem uma estrutura militar quiçá semelhante à da NATO, o que é objectivamente falso. A UEO não tem qualquer tipo de estrutura militar e daí que toda a função da UEO no momento que passa seja, sobretudo, de natureza política, razão pela qual tem sido designada como um fórum.
A UEO cometeu, explicitamente, à OTAN as responsabilidades pela infonnação e pela concertação no seio da Aliança Atlântica.
Referiu o Sr. Deputado o artigo 5.º do Protocolo Que Modifica e Completa o Tratado de Bruxelas, assinado em Paris em 23 de Outubro de 1954, referindo que, com a adesão de Portugal àquele organismo europeu, surgirão novos níveis qualitativos de obrigações.
É possível que assim seja!... Já lhe disse na respectiva comissão que se tratava da situação de «um por todos e todos por um», a qual aceitamos sempre que se relacione com ofensas a um Estado participante na União da Europa Ocidental.
Quanto à matéria dita out of area é bom que se explicite tratar-se de admitir uma possibilidade quando inLeresses vitais da Organização estejam em jogo. Não há qualquer compromisso por parte dos Estados signatários no sentido de concorrer, contra a sua vontade, numa emergência desse tipo.
Quanto questão nuclear, a UEO não tem quaisquer encargos, uma vez que essa matéria, tal como referi, é tratada na NATO.
Em relação aos compromissos que referiu, posso dizer-lhe que eles não são superiores àqueles que temos na NATO. Repetindo aquilo que disse na comissão, não se vislumbra no futuro, nem há qualquer intenção, tanto quanto sei, de ser instalado em Portugal qualquer tipo de equipamento nuclear em tempo de paz. Assim sendo, também não há razão para qualquer afectação de forças militares à UEO.
A propósito, e para que não fique qualquer dúvida, gostava de sublinhar que a nossa participação na UEO é importante do ponto de vista político, mas do ponto de vista material corresponde, apenas, a 2% do orçamento da Organização.
0 Sr. Deputado Maia Nunes de Almeida perguntou se a UEO poderia impor um nível de defesa ou um nível de forças armadas a Portugal que, no caso de não ser correspondido, poderia provocar a instalação, entre nós, de forças estrangeiras. 0 Sr. Deputado sabe que não!... Toda a parte de distribuição das forças armadas é feita na NATO através de um mecanismo consensual, por vezes, até, com planeamento plurianual, quer no que diz respeito à fase de aumento e modernização de equipamento, quer àquela que vai seguir-se dentro em breve e que é a chamada phasing out ou fase do cascading para a diminuição dos níveis de armamento.
A construção europeia não privilegia a UEO mas, é evidente, dentro de um conceito global não é possível falar numa construção plena da Europa, de unia entidade europeia, se esquecermos a vertente da defesa e segurança. E mais: hoje em dia não é possível conceber o conceito de defesa e o de segurança sem que isso tenha implicações directas sobro toda a problemática económica e social. Daí a importância de haver um fórum, como a UEO, que pode ter alguma coincidência, designadamente, com as Comunidades.
A propósito deste assunto, e respondendo de seguida ao Sr. Deputado Adriano Moreira, gostaria de dizer que fiz referência a um «núcleo duro», mas não no sentido económico do termo; trata-se de um núcleo dentro de uma área mais vasta que é a Aliança Atlântica, e é curioso salientar que nunca entrou em conflito em relação a ela.
Quanto às razões pelas quais três países membros da CEE não participam na UEO, devo dizer que elas são claras e conhecidas do público: no caso da Irlanda, porque se trata de um país neutro; no caso da Grécia, porque na altura em que se colocou a questão do alargamento da organização este país não quis aderir; quanto à Dinamarca, porque teve problemas internos no que diz respeito à discussão destas políticas e preferiu adiar a sua adesão para ser considerada mais tarde em consonancia com a adesão da Noruega.
Quanto à vinculação jurídica, temos de distinguir duas coisas, ou seja, aquilo que hoje estamos a ratificar e os outros documentos que não têm, obviamente, vinculação jurídica, mas, sim, política, e não os enjeitamos como tal.
Em relação à cooperação em matéria económico-social, já comecei por tecer algumas considerações. Porém, gostaria de acrescentar alguns aspectos: hoje em dia, e especialmente depois das mudanças verificadas no Leste, sente-se a necessidade de um diálogo pan-europeu ao nível do Leste e do Oeste, e um diálogo que seja em conffinto.
Existe, felizmente, uma instituição, a CECE, que, curiosamente, tem três valências: a defesa e segurança, a cooperação económica e os direitos humanos e liberdades fundamentais, isto é, a chamada dimensão humana. Aliás, é curioso referir que esse sistema pan-europeu faz intervir os Estados Unidos da América e o Canadá, que têm interesses vitais na Europa, e que nenhum país a leste e a oeste, bem como os dois países que não são estritamente europeus, querem excluir as partes económica e social da discussão sobre a segurança.
0 diálogo institucionalizado entre a UEO e a NATO, a que o Sr. Deputado Adríano Moreira se refe-
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riu, é mínimo e tem acontecido pontual e fundamentalmente através das presidências da UEO e da NATO -presidência honorária-e dos secretariados. Porquê? Porque a UEO procura vincular-se apenas a um debate político e não procura ter qualquer tipo de incidência sobre as decisões do foro militar, da mesma maneira que não quer criar estruturas, nem de secretariado, que possam, de alguma maneira, ser uma duplicata daquilo que a NATO dispõe.
De início houve alguma controvérsia quanto a este conceito de defesa europeia. Contudo, hoje em dia ela está ultrapassada, na medida em que existe a consciência de que a discussão no seio da UEO veio reforçar a consciência do pilar europeu na NATO.
Quanto à coincidência da UEO com a CEE, posso dizer que se trata de uma velha aspiração de vários europeístas. Aliás, devo lembrar que, no início da década de 5O, houve uma tentativa de criar uma entidade europeia de defesa, que fracassou porque um dos países fundamentais para que essa entidade se constituísse não esteve disposto a sublinhar este processo.
Porém, hoje há a consciência de que a cooperação na Europa não se pode dividir em sectores, isto é, compartimentando a parte económica da parte de defesa e de segurança, ou mesmo da parte política, da mesma maneira que se tem a consciência de que a geografia de defesa e de segurança muito dificilmente não poderá coincidir com a geografia política. Aliás, como o Sr. Deputado sabe, esta é uma das grandes e difíceis questões que irão ser discutidas durante os meses que se avizinham, pois, de facto, com as mudanças no Leste, a geografia política da Europa deixou de coincidir com a geografia de segurança.
Finalmente, gostaria de acrescentar que a UEO tem como ambição promover o debate de uma política de relações externas, política essa entrosada no conceito de defesa alargado. Nessa medida, penso que a UE0 é um fórum importante, muito mais de futuro do que de presente.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
0 Sr. Ângelo Correia (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A UEO nasceu em 1948 por razões de debilidade das Nações Unidas, por razões de política da União Soviética, altamente pressionante sobre países que queriam ser livres na Europa, e por razões que se filiavam já na necessidade de uma política de segurança europeia.
A fase de nascimento da UEO, anterior à do nascimento da NATO, significou uma primeira fase na história das relações externas o internacionais no seio da Europa e do Atlântico Norte. Esta fase foi marcada pelo crescimento da importância da Aliança Atlântica e sobretudo, marcada politicamente por um período de nsã0 Leste/Oeste versus Pacto de Varsóvia, relativamente à Aliança Atlântica. Tratou-se de uma primeira fase que se esgotou, fundamentalmente num período que teve o seu nascimento aproximadamente em meados da década de 80.
Nesta altura, e com o final do período Brejneviano na União Soviética, aconteceu uma reacção europeia de dois sentidos: uma, na necessidade lançada pelo chanceler
Helmut Schmidt em 1977, no sentido de os Estados Unidos da América virem em defesa da Europa perante a emergência daquilo que era considerado uma agressão soviética pela implantação dos mísseis SS-20 nas fronteiras da Europa Ocidental e, paralelamente, em todo um conjunto de reacções pacifistas, neutratistas, nacionalistas, que, pouco a pouco, fizeram despertar um certo tipo de consciência na Europa e um desejo, cada vez mais aprofundado, da celebração de uma paz duradoura no nosso universo e, em particular, no nosso continente.
Por essa mesma altura são visíveis alguns fenômenos que legitimam o despertar, em 1984, da UEO. 0 primeiro facto prende-se com uma hegemonia clara, no equipamento, na tecnologia, na parte financeira, na parte do trânsito de emergência, por parte dos Estados Unidos da América relativamente à Europa em termos de eventual tensão.
Em segundo lugar, manifesta-se o falhanço daquilo que foi designada a política do two way street, isto é, da ideia do intercâmbio de fornecimento, de procura de equipamentos de um lado e do outro do Atlântico. Esse intercâmbio não era compensado, não era visível, não era sentido, e daí uma prevalência norte-americana em excesso, que levou grande parte dos países europeus a encontrar fórmulas alternativas de maior coesão interna e, com isto, evitar um hegemonismo excessivo, que alguns sentiam, por parte dos Estados Unidos da América.
Por último, a questão que emergiu com o estabelecimento dos mísseis intermédios na Europa e toda a crise política, toda a cpiderme política, digamos assim, na Europa, que teve afluxos de crise durante o início da década de 80. Assim sendo, os Europeus sentiram uma forte necessidade de acentuar um pilar europeu que fosse substantivamente forte no diálogo com os Estados Unidos da América do Norte e com o Canadá. Daí o reviver da UEO a partir de 1984.
Curiosamente, nessa altura, a UEO é concebida como um fórum de discussão, exactamente nos termos em que o Prof. João de Deus Pinheiro, Ministro dos Negócios Estrangeiros, o classificou -e não mais do que isso!-; um fórum de debate, uma tentativa de construção e de edificação de um pilar europeu que teria um parceiro com o qual dialogaria numa relação difícil e até, por vezes, equívoca, como referiu o Prof. Adriano Moreira -e com justeza! -, na relação interatlântica entre os Estados Unidos e a Europa.
Este período de transição foi curtíssimo porque com ele criou-se uma terceira fase consubstanciada na visível alteração política no Leste europeu. Mas visível tanto no conjunto de sistemas de forças, como nos aparelhos militares, como na lógica armamentisla que se vinha sentindo!
Com efeito, são seis as circunstâncias visíveis, hoje em dia, na relação Pacto de Varsóvia/NATO ou, se quisermos, no âmbito puramente estratégico na relação Estados Unidos da América/União Soviética.
Em primeiro lugar, o desmantelamento de todos os mísseis intermédios na Europa, SS-20, Pershing-2A e os mísseis cruzeiro, de um lado e de outro.
Em segundo lugar, o início de um processo de desarmamento convencional que, em escala e na desproporção de afectação, face às posições iniciais de ambos os blocos, é positivo, é correcto e que as conversações de Viena têm vindo a traduzir.
Em terceiro lugar, a potencial negociação, no âmbito Start, da redução para 50% de todos os potenciais estra-
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tégicos da União Soviética e dos Estados Unidos da América.
Em quarto lugar, o abandono claro e possível, a muito curto prazo, de qualquer tentativa de existência de uma guerra química, o que é um facto extremamente importante e que a curto prazo já foi anunciado quer pelo Presidente Bush quer pelo secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, -Gorbatchev como eventuais cenários a praticar ainda este ano e a consolidar nos próximos três anos.
Em quinto lugar-e isto é importante e fundamental-, um sério desarmamento ideológico. Muita vezes falamos de guerra, de agressão, de armamentos, mas, mais importante do que falar dessas realidades é a questão prévia a tudo isso, ou seja, a «armadura» ideológica que legitima a luta, a violência e a guerra. É um facto que hoje em dia, no dealbar desta década, sentimos que o desarmamento ideológico tem sido um factor extremamente contributivo para os restante desarmamentos efectivos.
Em sexto e último lugar, fériómeno importante é a expressão política, visível, de diálogo sentida,nas várias instituições, ou seja, no diálogo NATO/Pacto de Varsóvia, Estados Unidos da América/União Soviética, nas várias instâncias, em Viena e em HeLsínquia, em que claramente caminhamos para uma situação destcnsionalizada.
São seis os factores que levam a conceber o início de uma terceira fase nas relações no seio europeu e nas relações entre os Estados Unidos e a Europa: Daí há um mundo prenho de consequências, há um mundo fértil de consequências no âmbito político, económico e militar.
Em primeiro lugar, uma forte distensão: a lógica da confrontação, da oposição o do belicismo cedeu lugar à lógica do diálogo, da harmonia e da obtenção de uma paz verdadeira e estável.
Em segundo lugar, a potencial adesão de muitos dos países do Leste europeu ao Conselho da Europa. Não posso deixar de recordar a presença, como Presidente do Conselho da Europa em exercício, do Ministro dos Negócíos Estrangeiros português e a sua recente estada nos países do Leste, onde foi bem visível uma posição clara, que ele próprio protagonizou e trouxe para Portugal, de muitos países do Leste europeu aderindo ao Conselho da Europa.
Em terceiro lugar, o pedido de adesão à CEE de muitos países que eram de economia planificada.: É obvio que, numa primeira fase, a Hungria e a Checoslováquia estão em posição muito mais favorecida do que países como a Bulgária, a Roménia e a própria Polónia.
Em quarto e último lugar, o fenómeno da reunificação alemã e as consequências que isto traz na distensão europeia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O mundo, a década que estamos a iniciar, não tem a ver já com a décadade 50, de 60, de 70 e dos princípios da década de 80. Estamos numa fase em que a palavra «diálogo» se sobrepôs à palavra «confrontação»; estamos numa fase em que o conceito de cooperação se sobrepôs ao de oposição bélica.
Participámos sempre neste debate, nesta postura, e, por isso, desejamos hoje reafirmá-la com todo o ênfase. É por, isso que aprovamos esta proposta que hoje nos é trazida, porque ela consubstancia uma ideia de participação e
colaboração portuguesa num processo de edificação de paz e harmonia, eventualmente numa grande «casa europeia».
E aí poderiam colocar-se duas questões básicas, duas opções que estão um pouco nas dúvidas que o Sr. Deputado Adriano Moreira referiu e, indirectamente, um deputado do PCP. Qual a instância, qual a sede em que se pode estabelecer o fórum da política de diálogo europeu? A UEO ou a CEE? Muitos de nós preferimos a CEE. Mas razões decorrentes do Tratado de Roma, concretamente dos artigos 223º e 284º, o próprio Acto único Europeu no seu artigo 3º, têm inibições fortes para colocar a CEE como base e como plataforma justificável para a discussão de uma política de defesa.
Em primeiro lugar, a CEE foi concebida numa lógica de política económica, financeira, social, tecnológica, até de política externa, mas não de política de defesa.
Em segundo lugar, isso inibiria não só países que têm uma tradição de neutralidade militar na Europa, vide Austria, sobretudo, países que saíram do bloco Leste, do Pacto de Varsóvia, como a Checoslováquia e a Hungria, que querem aproximar-se da CEE, países que têm um comencioso relativamente à Plataforma da Haia, como seja a Dinamarca e a Noruega. Por essas razões, não faz grande sentido que seja lícito solicitar à CEE que se assuma como algo que no Tratado de Roma não está previsto e que desmotivaria países a cederem a uma «casa, europeia» em vários âmbitos sem poder chegar ao âmbito final.
Apesar de a lógica da CEE poder ser o embrião, a configuração jurídica da política não justifica que se faça no âmbito da UEO. Por quanto tempo? É imprevisível, Sr. Deputado . Adriano Moreira, pensar-se hoje, com a dinâmica da história e com a aceleração da evolução das próprias instituições europeias, poder dizer-se quando.
Eventualmente, um dia chegará a revisão do Tratado de Roma. Porém, até lá o que é necessário é que exista uma plataforma de discussão da política de segurança europeia, e essa é a UEO.
E a pergunta última que se faz - e a que respondo hoje - é a de saber por que motivo é que se refere política de segurança e de defesa. Política de segurança e de defesa no sentido afrontativo, belicista, ampliador das tensões? Pelo contrário, no sentido de favorecer posições unitárias europeias, como, por exemplo, na Conferência de Viena, posições unitárias da Europa no contexto a terceiros.
Relembro aos Srs. Deputados que a acção conduzida no golfo Pérsico para desminagem de vários meios que dificultavam e até impediam o tráfico marítimo nessa zona foi feita no âmbito da UEO e não da NATO, pois isso está proibido pelo próprio Tratado. Por isso, estou convicto de que a UEO é a instância de coordenação.
Se me perguntarem: mas porquê coordenação militar? Pela simples razão de que é impossível falar-se em soberania nacional ou supranacional sem ela ter também um conteúdo de defesa e de segurança. Portugal deve, por isso, participar, pois, caso contrário, seria mais atlantísta do que europeu. De facto, se Portugal não participasse, recusaria a sua posição de membro da CEE, diminuí-la-ia e faria com que essa participação não tivesse todo o seu significado pleno.
Portugal não vai armar-se em termos nucleares. A pergunta que o Sr. Deputado João Amaral fez não é correcta. A Plataforma da Haia apenas confirma toda a postura que vem desde 1967 da política do relatório Hamell e que foi cofisubstanciada na doutrina de resposta
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flexível da NATO. Portugal não teve de variar nada, não teve de alterar nada da sua posição, apenas a confirmou.
Significa que Portugal vai ter armas nucleares? Não. Portugal não é uma potência estratégica para ter armas estratégicas, não está na frente do teatro para ter armas nucleares de teatro. Portugal não tem, pois, necessidade de armas nucleares para uma defesa imediata; é uma política que é um vínculo jurídico-moral, não é um vínculo factual de pretensa a!...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa posição na UEO é no sentido de defender a paz, a harmonia e o diálogo europeu; é para esbater fronteiras, blocos, para provocar a criação de uma «casa comum europeia». Portugal não poderia, pois, ficar insensível aos apelos de ser um país europeu! Se o não o fizéssemos, diminuiriamos a nossa capacidade no mundo.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: -Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano
Pombo.
0 Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): -Sr. Deputado Ângelo Correia, gostaria de colocar uma questão muito breve.
V. Ex.ª referiu que Portugal, na decorrência desta nova adesão a mais uma estrutura de natureza político-militar, não virá a ter, no seu território, armamento nuclear. Ora, creio que isso contraria recentes afirmações proferidas pelo anterior Ministro da Defesa Nacional. Concretamente, o Sr. Engenheiro Eurico de Melo afirmou que Portugal poderia vir a ter -e por que não? - em seu território armamento nuclear no âmbito dos acordos de natureza internacional que vinculam o nosso país.
Gostaria de colocar uma outra questão a propósito da referência que o Sr. Ministro fez -de 2 % do Orçamento total- quanto às contrapartidas de natureza económica que Portugal terá para com a UEO. Será que também aqui vamos pagar em géneros, será que vamos pagar com a alienação da nossa soberania, de aspectos da nossa independência, da nossa segurança enquanto cidadãos?
Quanto à questão do fórum, as suas palavras são de rara beleza e se há coisas de que a Europa hoje necessita é de um Fórum alargado onde as questões se discutam com profundidade e seriedade. Mas, Sr. Deputado, nós sabemos o que é um fórum! Sabemos também, a respeito desta ressurreição tardia da UEO, que esteve congelada durante largos anos, que há quem a queira como fórum e há quem a queira como um grupo de choque preparado para as eventualidades que aí vierem. 15to é, por pertencerem ou não a outros grupos de choque há diferenças quanto às opiniões dos países que revitalizaram esta opinião da Europa Ocidental.
Gostaria que explicitasse um pouco mais como é que o Sr. Deputado vai conseguir fazer um fórum para debater os problemas da segurança europeia - toda ela, Europa Ocidental ou Oriental - com 9 países apenas, quando a Europa tem para cima de 30. Será apenas um embrião? E ele irá ou não alargar-se a outros?
0 Sr. Deputado fez vastas e repetidas referências à «casa comum europeia». Ora, a construir casas assim o projecto final da construção desta «casa» não será uma «caserna comum europeia»? Pretende-se uma «casa» ou uma «caserna»? Penso que o Sr. Deputado me terá entendido!
0 Sr. Presidente: -Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
0 Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação às armas nucleares, Portugal não tem complexos. Aliás, qualquer país que as tem sabe que elas não são para utilizar; são dissuasores, não são para utilização! Todas as pessoas sabem isso! Se se inicia uma guerra nuclear, morremos todos! Portanto, são armas dissuasoras e não de intervenção.
Portugal não tem legitimidade geográfica para ter armas nucleares de teatro, não tem legitimidade tecnológica e financeira para ter armas estratégicas. Portugal apenas tem o vínculo moral de ligação ao uso de armas nucleares. Portanto, trata-se de um vínculo moral, o que é mais que um vínculo geográfico ou de necessidade.
Portugal não vai gastar mais dinheiro com a UEO, até porque as despesas são mínimas! E se a UEO, nesta instância, tem sentido é porque a construção de uma casa europeia faz-se por patamares, por culturas idênticas, por plataformas democráticas análogas, por políticas económicas, financeiras e comerciais consequentes, por políticas sociais o fiscais consequentos, por política externa análoga e, por último -para fechar 0 telhado da casa-, por uma política de segurança e de defesa comum,
A Europa está a caminhar bem no sentido de caminhar por várias instâncias institucionais, por aproximações às várias fases da construção da «casa», reservando-se a última, que é mais modelar, é mais do âmbito da soberania, para a instância que no momento próprio possa abarcar o maior número possível potencial de membros.
Mas isso significa que tem de ser preparada, a «casa europeia» que desejamos não é uma «caserna», é uma «casa»! Mas, para isso, é preciso também ter telhados e paredes fortes para resistir a eventuais agressões.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quando em 1984 o Governo Português, através do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, manifestava vontade numa adesão à União da Europa Ocidental, estava-se, certamente, longe de supor que viessem a ter lugar acontecimentos tão surpreendentes como aqueles a que assistimos ainda no ano transacto e que trouxeram mais para a ribalta grandes questões relacionadas com a Europa e o papel de diversas instituições nela inscridas, entre as quais se destaca a própria União da Europa Ocidental,
No entanto, é precisamente em 1984 que se assiste à reactivação da UEO através da Declaração de Roma. Nascida em 1947, num primeiro passo, através da constituição de uma Aliança Defensiva assinada entre a França e o Reino Unido, ainda receosos de uma eventual ameaça alemã, e, num segundo passo, já com a participação dos países do Benelux, firmada em Tratado na cidade de Bruxelas no ano de 1948, a UEO veio, através dos Acordos de Paris, em 1954, a integrar a Alemanha e a Itália e a definir objectivos em virtude da constatação crescente do desenvolvimento da «guerra fria» e do deterioramento das relações Este-Oeste.
De 1954 a 1973, a UEO preenche diversas iniciativas -refira-se que é o único fórum onde participa o Reino
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Unido, ainda ausente da CEE - e até 1984 cai nalgum apagamento. Nesta data, e mercê da Europa dar sinais de desejar um papel mais importante na Aliança e nas questões das relações Este-Oeste, criam-se condições para a assinatura da Declaração de Roma, que marca o processo. de reactivação de UEO. As opiniões públicas europeias mostravam também mais interesse pela defesa da Europa. Em 1987 é adoptada a Plataforma da Haia sobre os interesses de segurança europeia. Constitui este documento, porventura, a primeira tentativa de definição de unia identidade de segurança europeia -objectivo diversas vezes tentado pelos Europeus e que nunca foi efectivamente atingido- e a afirmação, neste documento, do que se convencionou denominar «pilar europeu da Aliança Atlântica».
É, pois, um facto que grandes mutações s.e dão na Europa desde o nosso pedido de adesão. Mas, se a situação na Europa se alterou, a razão de ser da nossa adesão não se alterou, antes se firmou.
Portugal, membro fundador da OTAN, aderiu, em 1976, ao Conselho da Europa e integra, a partir de 1986, a Comunidade Europeia. A participação de Portugal na UEO era um corolário lógico e sequencial à nossa participação naquelas instituições. Mas hoje assume ainda outra dimensão à luz dos acontecimentos que moldam uma nova Europa. Perfila-se, em primeiro lugar, o processo de construção europeia.
0 Tratado de Bruxelas já assinala um princípio de colaboração económica, social, cultural e de autodefesa. E se, entretanto, se concretizavam na Europa o Tratado de Organização para a Cooperação Económica Europeia, o Conselho da Europa, a Comunidade Europeia do Carvão e de Aço, é importante assinalar que em paralelo a ideia de uma comunidade de defesa europeia foi também um objectivo prosseguido mas nunca concretizado. A própria Comissão das Comunidades Europeias introduziu a ideia de colaboração europeia em matéria de produção de equipamentos militares, tendo, deste modo, originado a cooperação política europeia, que, no entanto, não conseguiu competências em matéria de segurança.
É, pois, neste contexto de iniciativas em termos de construção europeia que sobressai a UEO, como a única instituição que reflecte sobre a problemática de segurança e da defesa na Europa.
Portugal tem, pois, o seu espaço na construção europeia e, sendo membro integrante quer da CEE quer de outras instituições de âmbito europeu, seria elemento negativo o isolamento de Portugal neste matéria, tanto mais, aliás, que outros Estados europeus desejam integrar a organização a breve trecho.
Ainda no âmbito da construção europeia, sublinha-se também a componente da cooperação, cooperação essa que já se desenvolve no âmbito do Eurogrupo, a do IEPG.
No entanto, estas duas últimas organizações não têm competência em matéria de segurança e do Eurogrupo não fazem parte a 15lândia e a França.
E, pois, na UEO que se reúnem as condições para a cooperação e debate de questões de segurança.
0 Sr. António Guterres (PS): -Muito bem!
0 Orador: - Em segundo lugar, verifica-se o reforço da ideia do pilar europeu da Aliança Atlântica.
A Declaração de Roma já enfatiza a indivisibilidade da segurança dentro da área do Tratado do Atlântico Norte e afirma a contribuição da Europa para o fortalecimento da Aliança Atlântica. A mesma ideia é reposta na Plata-
forma da Haia e o próprio Protocolo de Adesão de Portugal e Espanha à UEO refere a determinação das Partes em desenvolver uma Europa mais coesa em termos de identidade de defesa e que traduza mais efectivamente a solidariedade contida no Tratado de Bruxelas e no Tratado do Atlântico Norte.
Recorde-se ainda que a UEO transferiu as suas responsabilidades de defesa para a OTAN, muito embora esteja investida de autoridade para actuar fora da sua zona geográfica europeia.
A solidariedade atlântica é, pois, repetidas vezes reafirmada. Mas, no momento em que na Europa se desenvolvem as negociações sobre o controlo de armamentos, se elimina o nuclear de médio e curto alcance, se preparam reduções de armamento convencional e se prevê uma diminuição da presença americana na Europa, ganha mais significado a construção de identidade de segurança europeia e, nesta óptica, o único fórum que sobre esta matéria se debruça é a União da Europa Ocidental.
A UEO pode assim desempenhar um.papel de renovação de ideias e pode constituir-se como elemento indispensável na perspectiva de uma identidade mais sólida e conjunta de segurança europeia.
0 reforço da UEO é, no essencial e assim, o reforço da própria solidariedade atlântica.
Em terceiro lugar, é necessário referir a importância da Conferência de Segurança e Cooperação Europeia.
É a própria Plataforma da Haia que refere a Acta Final de Helsínquia e adianta a necessidade de se fazer uma utilização completa do processo da CSCE, de molde que se promova uma cooperação efectiva entro os Estados participantes.
Podemos hoje constatar a evolução positiva que se tem dado quer no processo de redução de forças convencionais, quer sobre a criação de medidas de confiança, quer ainda na prossecução de objectivos na área dos direitos humanos.
A responsabilidade comum de todos os europeus é não só preservar a paz mas moIdá-la construtivamente.
Construção europeia, reforço da Aliança Atlântica e Conferência de Segurança e Cooperação Europela constituem, só por si, elementos importantes que sublinham o interesse da entrada de Portugal para a União da Europa Ocidental.
Tal facto pressupõe, no entanto, um posicionamento
claro do nosso país na sua projecção e a participação
internacional. E tarda, em Portugal, um debate aprofun
dado quer sobre a construção europeia quer sobre a de
fesa nacional. E se a construção europeia se relaciona com
a Comunidade Económica Europeia, e naturalmente aqui
se insere o Acto Unico Europeu e as respectivas impli
cações, com um papel acrescido do Conselho da Europa,
com a nossa participação na Conferência de Segurança e
Cooperação Europeia, também é por demais evidente a
necessidade de um debate sobre a defesa nacional, como
já foi reconhecido pela própria Comissão de Defesa
Nacional desta Assembicia e, mais recentemente, pelo
Sr. Presidente da República aquando da visita desta
Comissão ao Conselho Superior de Defesa Nacional.
A discussão da nossa inserção na UEO relacionando-se com os itens atrás referidos coloca-nos ainda a necessidade de reflexão sobre questões tão relevantes como seja a actualização dos conceitos estratégicos da defesa nacional e militar.
A integração de Portugal na UEO, que o PS defende e apoia, implica, deste modo, uma visão dinâmica e ágil
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da nossa acção diplomática, da nossa política externa de defesa, e decorre da nossa situação atlântica. Não se trata, assim, de sermos espectadores de acontecimentos, como parece que se insiste em ser.
0 PS considera que temos a obrigação de sermos intervenientes, com realismo, no processo de paz e segurança na Europa.
A UEO vai ter de redefinir objectivos centrados essencialmenfe na concertação de pontos de vista nas questões de segurança e controlo de armamentos, de molde a garantir-se uma posição europeia mais coerente no âmbito das discussões dentro da Aliança, na elaboração de metas baseadas na Plataforma da Haia, como meio de encorajar um melhor contributo para a defesa comum, e, finalmente, enraizar a questão da componente de segurana no processo da construção europeia.
É, pois, neste contexto que temos de potencial a nossa participação e intervenção.
Não têm lugar hesitações como aquela que o Sr. Primeiro Ministro demonstrou em 1987 ao colocar dúvidas sobre a participação de Portugal na UEO. Atitudes deste tipo só relevam de falta de informação ou de posições estáticas de políticas externas anacrónicas.
0 que desponta hoje é uma «nova Europa e um novo atletismo», expressões de um dirigente ocidental que simbolizam bem as evoluções que se vão dando no mundo.
0 PS dá o seu apoio à ratificação do Protocolo de Adesão de Portugal à UNO e considera que é uma exigência nacional responder com vigor, dinamismo e imaginação aos desafios que este fim de século nos coloca.
Aplausos do PS.
0 Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos inscreveram-se o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Deputado Ângelo Correia.
Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
0 Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: Sr. Deputado Miranda Calha, gostaria de saber se leu as intervenções que foram feitas pelo Governo em 1987, na medida em que foi dito -e devo dizer que pensava que o Sr. Deputado ia aplaudir- que este não deveria decidir nada sobre a adesão de Portugal à UNO antes de estarem concluídas as discussões que levaram à Plataforma da Haia. E isto numa altura em que a organização se debatia entre dois conceitos completamente distintos.
Este era o esclarecimento que gostaria de deixar aqui, dado que esta foi uma medida de bom senso
No entanto, a partir do momento em que a Plataforma foi reconhecida nós voltámos a reiterar o pedido de adesão.
0 Sr. Presidente: -Sr. Deputado Miranda Calha pretende responder já ou no fim de todos os pedidos dê, esclarecimento?
0 Sr. Miranda Calha (PS): -Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
0 Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, não peço esclarecimentos porque a pergunta que gostaria de
formular foi colocada pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
0 Sr. Presidente: -Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
0 Sr. Miranda Calha (PS): -Sr. Ministro, agradeço o comentário feito por V. Ex.ª No entanto, devo dizer_lhe que na altura em que foi produzida esta declaração do Sr. Primeiro Ministro, em 1987, tive oportunidade, nesta Assembleia, de referir esta matéria, sendo, aliás, testemunha deste facto o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, precisamente porque o entendimento que tivemos foi o de que a declaração do Sr. Primeiro Ministro era uma hesitação mediante dúvidas que havia sobre a interpretaçâo dos Estados Unidos em termos de uma certa evolução no crescimento e na implantação da própria União da Europa Ocidental.
Penso, pois, que essa atitude - que, em certa medida, talvez tenha tido um significado de subserviência - foi emendada em devido tempo, de modo a propiciar que em 1988 pudesse ter sido assinado o Protocolo de Adesão.
Aliás, devo dizer que este aspecto foi considerado não só por mim, mas por outros elementos nesta Assembleia da República. Não há, pois, duas interpretações para aquilo que então foi dito e, se dúvidas houver, podemos consultar os jornais dessa época.
0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As nove perguntas que formulámos ao Governo no início do debate identificavam as questões principais que, ponto por ponto, criticámos na filosofia e objectivos da UEO. Por si, jus
tificam a consideração que o PCP faz da proposta de adesão à UEO.
Nada deve justificar a adesão, em 1990, de Portugal a uma organização de natureza político-militar -e não disse que tinha uma estrutura político-militar- que acrescenta novas obrigações militares ao País, reforça as que já tem e alarga o seu campo geográfico de intervenção militar.
Tem de ser sublinhado particularmente: a obrigação decorrente do artigo 5.º de, em caso de conflito na Europa que envolva um dos países signatários, Portugal envolver no conflito todos os meios ao seu alcance, militares e outros; a vertente nuclear sublinhada, reforçada, tal como decorre da Plataforma da Haia e constitui, pela época em que Portugal, agora, subscreve o Protocolo, uma hipótese antinacional (e até absurda!) de envolvimento no dispositivo nuclear apontado à Europa Central e Oriental; e uma abertura, expressa numa vinculação a concertação de políticas, a intervenções «fora da área», em qualquer ponto do globo em que interesses alegadamente europeus - é uma hipótese mas é assim que está possam ser entendidos como «beliscados», como, aliás, já sucedeu no golfo Pérsico.
Estas seriam por si razões suficientes para que não se aceitasse esta adesão. Estas sao as razões que subsistem desde que em 1988 se iniciaram as conversações tendentes à elaboração do Protocolo de Adesão que veio a ser assinado em Londres, em 14 de Dezembro de 1988, ou seja, há 16 meses.
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Foram razões como estas que, de resto, levaram, há cerca de um ano, os deputados comunistas de Espanha, os deputados da Esquierda Unida a votarem contra o Protocolo de Adesão e a invocarem, legitimamente, o texto da Constituição Espanhola contra o Tratado. Aliás, nos mesmos termos em que a questão se pode pôr face à Constituição Portuguesa, já que o citado artigo 5º do Tratado, nas circunstâncias aí previstas (de agressão armada a qualquer dos outros países europeus partes do Tratado), obriga Portugal a entrar, automática e obrigatoriamente, em estado de guerra, à revelia dos mecanismos que a Constituição define para a respectiva declaração, e esta não é uma questão de somenos!
Essas são razões de há um ano. A elas contraporiam os que defendem a adesão à UEO as «necessidades» e «aspirações» da denominada «construção europeia». Assim seria, para esses, há um ano! Só que neste ano que passou tantas e tão profundas são as mudanças na Europa que, da nossa parte, consideramos serem precisamente as necessidades da construção europeia que imporiam que a adesão não se consumasse e que a própria UEO regressasse ao frigorífico onde hibernou quase- 30 anos.
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não vamos fazer este debate como se em 1989 não se tivesse passado nada. 15to não é definitivamente possível! 0 processo da construção europeia foi subvertido pelo último ano. Os relatórios das Comissões Parlamentares de Negócios Estrangeiros e de Defesa Nacional, pese a sua qualidade, estão cheios de história (e de histórias), de nomes, de planos, de relatórios, de projectos, de quesilias e de pilares. Cheios de tudo isto, mas com o mesmo estilo, as mesmas ideias e a mesma postura que há um ano, antes das alterações na Polónia, na Hungria, na Checoslováquia, na Roménia e na RDA, antes da Cimeira de Malta, antes do processo de unificação da RFA e RDÁ, antes das últimas propostas da NATO de desarmamento convencional na Europa, antes dos progressos nas negociações de Viena sobre forças convencionais na Europa, antes dos progressos, das convenções, também em Viena, sobre medidas de confiança e segurança, antes das propostas de Helsínquia , antes do reforço e revitalização -aí sim do Conselho da Europa, com a concessão do estatuto de observador e pedidos de adesão de diferentes países de matriz diferente.
Não é possível, Srs. Deputados, passar por cima disto tudo, agarrar na postura que se desenhou em 1984 (há seis anos!) de revitalização da UEO e transportá-la, sem mais nem menos, para os tempos de hoje. Não é possível porque se o processo de revitalização da UEO, como aqui sublinhou, e muito bem, o Sr. Deputado Ângelo Correia, tem a ver com pretensões hegemónicas francesas (pretensões, aliás, completamente frustradas na Plataforma da Haia, que reflecte, sem contemplações, os pontos de vista do Presidente Reagan e da Sr.ª Thatcher) e se é verdade que tem alguma coisa a ver com este processo francês, está fundamentalmente ligado ao processo conflitual de instalação dos SS-20 e dos Pershing II e às tensões que esses processos provocaram na opinião pública europeia, está indissoluvelmente ligado a necessidades de actuação out of area que não encontravam acolhimento no Tratado de Washington, Tratado NATO, e está indissociavelmente ligado à questão da partilha dos encargos, que é uma questão interna da NATO.
A UEO, neste quadro e neste momento, não é uma contribuição para a «construção europeia», é um empecilho!
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
0 Orador: - A rota da construção europeia na óptica política e da segurança está na Conferência de Segurança e Cooperação Europeia - que, ao contrário daquilo que o Sr. Ministro aqui disse, a UEO não acolhe; pelo contrário, a Comissão Política da Assembleia da UEO ainda há poucos dias afirmou, explicitamente, a condenação da Conferência de Segurança Europeia a que chamou «um grupo de burocratas» e que não se subordinava à sua actuação -, no Conselho da Europa, na reformulação doutrinal da NATO e do Pacto de Varsóvia, na aceleração dos processos de desarmamento, no reforço das medidas de confiança numa Helsinquia 2 que possa, até, refundar e refundamentar a convivência europeia.
Pensam os Srs. Deputados que tirar a palavra «ocidental» à União Europeia Ocidental lhe altera a natureza? Não! Rotundamente não lhe altera a natureza! E isso por uma razão evidente: porque quem anima a UEO não lhe quer retirar a natureza, não quer construir, quer anexar!
Finalmente, o terceiro núcleo de razões para considerar negativamente o processo de adesão, que se prende, aliás, também, com a vertiginosa evolução da situação europeia, tem a ver com uma questão que está colocada na ordem do dia em Portugal a todos os níveis institucionais, questão essa que, aliás, foi tema forte na reunião do Presidente da República com a Comissão de Defesa Nacional. A questão é esta: Portugal vive com uma panóplia conccptual nas áreas da política externa, defesa e estratégia completamente desactualizada! Há frases ditas por aí em jornais e em debates travados aqui na Assembleia nos últimos dois meses que o demonstram, como, por exemplo, o actual conceito estratégico de defesa nacional que deixou de ter interesse prático, etc.
Estas formulações provêm de cidadãos de elevada responsabilidade cívica, intelectual e política e colocam em evidência uma das tarefas mais urgentes que as instituições. têm pela frente, que é a de reformular e actualizar os conceitos e objectivos no quadro de um debate institucional aberto.
Tarefa urgente a ser feita já, pois o cenário internacional não espera e não há relatórios que se possam tirar da gaveta para responder a este desafio.
Mas, se a situação é esta, então é a própria decisão de adesão à UEO, neste momento e nestas circunstâncias, que carece de fundamento suficiente. Não há sofisma que resolva esta evidência, aqui agravada quando, expressamente, uma bancada preconizou a «redefinição de objectivos para a UEO». 0 que é que isto quer dizer?
Então, Portugal, sem objectivos definidos e actualizados, um Portugal em trânsito de reflexão, parte para uma instituição de objectivos a redefinir, uma UEO em trânsito?
Não, Srs. Deputados!
Nem mais encargos político-militares, nem empecilhos no processo de desarmamento e de construção de uma Europa nova, nem decisões tomadas à revelia da reflexão conceptual que o País tem de fazer em matéria de defesa nacional.
Três razões para a não adesão!
Aplausos do PCP.
0 Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado António Guterres pede a palavra para que efeito?
0 Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, ao abrigo do Regimento, para solicitar uma interrupção de
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30 minutos, de forma que o meu grupo parlamentar possa dar uma conferência de imprensa destinada à apresentação do projecto de lei sobre o exercício do direito de petição.
0 Sr. Presidente: - É regimental, está concedida.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.
Eram 16 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 25 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
0 Sr. Adriano Moreira (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Todas as esperanças nascidas da evolução em curso da balança de poderes, com os também fundados receios derivados da certeza de que, frequentemente, no processo político acontece outra coisa que não tenha sido prevista, não fizeram desaparecer alguns factos essenciais: por exemplo, que a hierarquia das potências não desapareceu nem se alterou significativamente, que o realismo do interesse nacional permanente continua em vasto exercício, que o discurso internacional de todos não é o discurso do poder que só pertence a alguns.
Um dos factos já visíveis no processo em curso tem a ver com o tantas vezes proclamado fim da história, Das cinzas renasce o desmentido.
É agora visível que a guerra deixou vincado, nos dois lados do que viria a ser chamado «Cortina de Ferro», o medo do rearmamento alemão e, portanto, do renascimento de um germanisino de Estado com uma qualquer outra semântica e heráldica.
Recorde-se que no Tratado de Dunquerque, de 4 de Março de 1947, assinado entre a Inglaterra e a França, se declara, no artigo 1º, que os dois países se unem «a fim de impedir a Alemanha de violar a sua obrigação de desarmamento e de desmilitarização e de evitar, de maneira geral, que volte a ser um perigo para a paz»,
Nessa data, o preâmbulo do Tratado de Dunquerque mencionava ainda expressamente os «tratados de aliança e assistência mútua concluídos com a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas pela França e pelo Reino Unido, respectivamente».
Não foi necessário mais que um ano para que a Rússia fosse apontada como caalisador da defesa e a Alemanha incluída no grupo dos que se consideravam ameaçados. 0 Tratado de Bruxelas, de 17 de Março de 1948, documenta a rápida evolução. Além da França e da Inglaterra, obrigadas em Dunquerque, apareceram a Holanda, o Luxemburgo a Bélgica, os países do Benelux. No preâmbulo fala-se, expressamente, no «perigo do renascimento de uma política de agressão por parte da Alemanha», mas já se menciona o dever de consulta «sobre qualquer situação que possa constituir uma ameaça con[ra a paz, em qualquer lugar que se produza».
A preocupação demonstrada neste Tratado tem referôncia a três vectores constantes na defesa europeia: a definição do espaço envolvido, a identificação do catalisador e a relação com um ponto exterior de apoio. 0 espaço ia a caminho de se identificar com o que seria recolhido na NATO; o catalisador estava a mudar da Alemanha para a URSS; o ponto de apoio exterior eram os EUA.
Quando foram assinados os Protocolos de 1954, depois de a Itália e a Alemanha Federal serem convidadas a aderir ao Tratado de Bruxelas, de 17 de Março de 1948, foi escrito no artigo 2º do Protocolo n.º 1
A alínea a seguir indicada do preâmbulo do Tratado, «a tomar medidas julgadas necessárias no caso do renascimento de uma política de agressão por parte da Alemanha», será modificada como segue: «a tomar as medidas necessárias a fim de promover a unidade e encorajar a integração progressiva da Europa».
A desigualdade da Alemanha está na proibição de fabricar armas atómicas, biológicas e químicas, ficando os outros Estados sujeitos a um limite por maioria de votos do Conselho.
0 papel da União foi diminuto em vista de a NATO e o Pacto de Varsóvia ocuparem a cena toda neste meio século, e, por exemplo, a sua agência para o controlo dos armamentos nem sequer se sentiu habilitada a intervir no caso da Force de Frappe francesa anunciada como operacional em Fevereiro de 1962, tendo o Conselho respondido, a uma pergunta expressa, que não recebera notificação.
15to poderia inclinar no sentido de considerar inútil reanimar a União e dispensável enfrentar os esforços e energias necessários para ir mais além de ter um escritório algures num ponto agradável da Europa Ocidental para reunião periódica dos representantes dos Estados.
De facto, e ao contrário, as circunstâncias parecem aconselhar que se encare a necessidade de ter uma organização daquele tipo, e não se vê nesse caso maneira mais rápida, e com mais economia de esforços, que repor a União em funcionamento.
Em primeiro lugar, porque, para além da defesa, de que pouco se ocupou, a União afirma-se assente na comunidade cultural de povos ligados pela mesma concepção do mundo e da vida e preocupa-se, desde início, com a reconstrução económica e a imposição das políticas sociais, que as comunidades assumiriam melhor.
Mas a rápida evolução da conjuntura mostra que estão em causa, pelo menos, dois pontos das tradicionais referências da segurança europeia: a revisão da co-responsabilidade mundial dos EUA/URSS e a reestruturação do Império Soviético, que colocam no primeiro plano a reunificação da Alemanha e fazem ressuscitar as memórias passadas dos inimigos íntimos e colocam em discussão a identidade eventual do catalisador, pelo que tudo parece aconselhar que uma instância de mediação para a mudança, vinculada à integração europeia, seja fortalecida no sentido de evitar perturbações nesta área.
Por outro lado, se o processo em curso for pelo caminho mais desejado do desarmamento das tropas e das cóleras, também se acentuará, previsivelmente, a política americana da europeização da defesa, o que aponta para a redefinição da estrutura de ligação ao referido ponto de apoio exterior.
Como é sabido, a política dos dois pilares não tem, de facto, apoio na estrutura da Aliança do Tratado do Atlântico Norte, sobretudo desde o Presidente Kennedy, o qual pronunciou o discurso maximalista dos comprometimentos e encargos americanos, pois também ele não deixou de inspirar as filosofias de revisão dos encargos e dos comprometimentos.
Não parece muito ousado considerar necessário admitir que o Pacífico volte, rapidamente, à dignidade de
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oceano nacional do destino manifesto da União, e a europeização da defesa terá de coffespondcr a essa mudança de centro de gravidade. Nesta data, o alerta geral das instituições europeias, que não pode ignorar que o mercado não absorve a Europa toda e que o Conselho da Europa a quer toda sem a poder reconduzir, rapidamente, aos seus padrões fundamentais, não pode prescindir de um foro onde se processe a substituição do conceito de defesa pelo mais ambicionado conceito de segurança: extrema, porque se espera que a ameaça continue a diminuir a ponto de não parecer um catalisador, e as esperanças navegarem sem naufrágio; interna, para que as percepções europeias convirjam, as memórias nefastas não ressuscitem e a paz pelo direito aprofunde os seus alicerces.
Falamos de segurança porque queremos tornar clara a convicção da necessidade de aproximar o conceito de defesa da União do conceito de segurança da cooperação política europeia. Inscritas em tratados distanciados no tempo, parece que uma interpretação actualista não pode deixar de doutrinar uma coincidência desejável de conteúdos.
Uma das organizações, a União, mais preocupada com o braço militar, sem descurar os outros objectivos integradores; as comunidades mais ocupadas com-os outros vectores de segurança, onde a agressão também tem curso e em cujo desenvolvimento não existe braço militar.
Por outro lado, é neste último domínio militar que as soberanias são mais sensíveis à coordenação ou renúncia das liberdades tradicionais, pelo que um foro privativo parece aconselhável.
Vamos votar a favor da ratificação do Acordo de Adesão à UEO.
Aplausos do CDS.
0 Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
0 Sr. Rui Silva (PRD): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A ratificação hoje em discussão na Assembleia da República é de grande importância e tem implicações relevantes na política externa, com especial incidência em questões de segurança e de defesa. Deveria, por esse facto, ser objecto de uma discussão que, para além de informar os cidadãos das opções em presença, pudesse ser um elemento importante a ter em conta nas opções que vierem a ser consideradas.
Pensamos mesmo que a matéria agora em apreciação, ao não estar, expressamente, contemplada ao nível legislativo da defesa, nomeadamente no «conceito estratégico de defesa nacional», e por poder ter uma tão grande incidência no campo da política externa e nos compromissos que ela implica, justifica um grande debate nacional, de modo que os Portugueses se possam consciencializar do sentido e do alcance que este compromisso representa.
Na verdade, para além de algumas tentativas esporádicas, nomeadamente iniciativas no âmbito da comunicação social, e, mais especificamente, por iniciativa de alguns elementos mais sensibilizados para estas questões, poderá dizer-se que, ao nível governamental, tem havido um razoável formalismo no tratamento destes assuntos.
0 debate que hoje tem lugar, e atendendo às características da iniciativa, não pode, pois, ser considerado como substitutivo de um debate nacional sobre esta questão, sem prejuízo de se entender que é na Assembicia da Repú-
blica que csse debate deve culminar, por ser esta a sede própria para a tomada de decisão adequada. 0 que pensamos é que vamos hoje terminar um debate que, em nosso entender, não teve início, porque nem sequer existiu. Por isso mesmo, deixamos ao Governo a sugestão de, oportunamente, promover um debate parlamentar que pcrmita a formulação de um balanço e das perspectivas de evolução da adesão de Portugal a organizações internacionais ligadas à defesa e à segurança, tendo, obviamente, em devida conta as profundas transformações sócio-políticas recentemente ocorridas, em particular, na Europa.
Feitas estas considerações prévias, que nos parecem adequadas e justificadas, passaríamos a abordar a questão da ratificação do Tratado de Adesão à UEO.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: E por demais conhecido que a defesa de um país é um produto de vários factores em que o elemento anímico de um povo é o elemento fundamental. Neste sentido, a informação é o elemento a ter em conta na formação da própria vontade e a opinião pública, «a dimensão social da estratégia», como alguém já afirmou, é um factor relevante, desde há muito, na formulação das grandes decisões políticas. Hoje, o referido elemento, dadas as características das sociedades modernas nas democracias ocidentais, assume uma importância cada vez mais significativa.
Por outro lado, o facto de na Europa não se viverem situações de guerra - apesar de esta estar sempre presente, todos os dias, através da comunicação social, embora, felizmente, localizada noutros lugares- faz com que as pessoas não sintam a necessidade de um sistema de defesa que seja um instrumento efectivo da sua própría segurança. 0 fenómeno de «não guerra» cria a sensação de que é possível desfrutar de paz e liberdade e daí o sentimento da desnecessidade de um sistema de defesa. É, porém, necessário, como bem diz o Professor Adriano Moreira, que as soluções instrumentais, por exemplo o desarmamento, não comprometam um valor essencial como é a segurança.
Em Portugal, as questões de defesa nacional são normalmente reportadas, exclusivamente, à sua componente inicial, não são normalmcnLc discutidas, pelo menos ao nível da discussão objectiva, sendo que, frequentemente e pelo contrário, as discussões com repercussão na defesa nacional são feitas superficialmente, sem que disso se tenha uma consciência clara.
As questões de defesa nacional deveriam ser analisadas com serenidade, de modo a proporcionar os consensos indispensáveis a potenciar a força anímica necessária à vontade de defesa. Há, realmente, ameaças à nossa segurança? Como nos defendermos? Qual a melhor maneira de nos defendermos? São perguntas importantes, que têm subjacente a ideia da necessidade e importância da defesa. Mas para se chegar a este ponto é necessário formar e informar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A questão que se coloca, hoje, relativamente à ratificação da adesão de Portugal à UEO verifica-se num quadro muito diferente quer daquele que levou à reanimação do próprio projecto quer mesmo relativamente ao quadro que conduziu à institucionalização do estatuto de observador de Portugal e que, ulteriormente, culminou na adesão do País à UEO.
A evolução dos acontecimentos, em especial os que se verificam na Europa, é de molde a levantar um conjunto
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de interrogações para as quais não parece possível obter-se uma resposta íncontroversa.
Tem-se falado da reactivação da UEO num quadro de reforço do «pilar europeu» da NATO, no pressuposto de que o reforço da organização se justificava ou, no mínimo, não haveria posições, pública e oficialmente, assumidas relativamente à desnecessidade do seu esforço. Hoje, altos responsáveis questionam-se, fundadamente, sobre o papel da UEO, quando perspectivado à luz e no quadro da sua criação, indo o debate ao ponto de questionar se a NATO deve ser uma organização mais política e menos militar, aparecendo como um dado do problema praticamente indiscutível a não necessidade do seu reforço militar, restando, apenas, a correcta determinação da sua orientação preferencial, relativamente ao tipo de meios e sistemas de força prioritários.
Neste sentido, a UEO, como pilar europeu da NATO, surge, naturalmente, enfraquecida.
Justificar-se-ia a UEO como organização tendencialmente autónoma relativamente à NATO? A esta questão pode contrapor-se uma outra: a defesa da Europa poderá dispensar, e, nesse caso, em que medida, a participação, nomeadamente, dos Estados Unidos na sua defesa? Não será credível a resposta de que a defesa europeia não pode dispensar o apoio americano?
Por outro lado, a UEO, como organização no âmbito da defesa, levanta também outras interrogações.
Nem todos os países da CEE estão na UEO e nem todos os países europeus da NATO estão na UEO. Surge, assim, inevitavelmente, outra questão: que defesa para a Europa no âmbito da UEO?
E, mais ainda, de que Europa? E de que Europa dentro da Europa da UEO? A UE0 só com a Alemanha Ocidental, com as duas Alemanhas ou com uma Alemanha reunificada, com uma Alemanha que nos faz pensar contra a Europa ou uma Alemanha a favor da Europa? Permito-me, a este propósito, recordar o peso da população de uma Alemanha reunificada na população europeia.
Com efeito, penso que não é de ignorar, sem que sobre isso se tome, forçosamente, posição, que o papel da Alemanha, no quadro da UEO, está hoje na ordem do dia e não estava quando Portugal pediu a sua adesão à UEO. Os receios que, um pouco por todo o lado, se fazem ouvir e outros que um certo pudor político impõe não abordar abertamente não devem estar fora deste debate como se o problema não existisse. É um facto, hoje indesmentível, para os países aliados europeus, que a RFA, através dos seus dirigentes máximos, é ambígua em relação a questões fundamentais que têm a ver com uma certa estabilidade que teve origem no fim da Segunda Guerra Mundial e, por outro lado, têm iniciativas importantes à revelia dos seus parceiros europeus da CEE.
Não é, portanto, fácil encontrar a resultante do poder que hoje se confronta na Europa e, nesta conformidade, é praticamente impossível determinar quer a direcção quer o sentido da evolução do movimento europeu.
Como disse o comandante Baptista Comprido, se é difícil encontrar essa resultante, «talvez, não seja tão difícil marcar o ponto de aplicação do impulso principal. Situa-se na Alemanha.»
Do nosso ponto de vista, se a UEO tem razão de ser, tem na perspectiva de complementar a CEE, agora no campo da segurança e da defesa, e isto sempre no quadro da prossecução da integração completa.
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Procurei mostrar que a ratificação, hoje em apreço, é neutra em matéria de política externa e de política de defesa e segurança.
Apesar de tudo, vamos votar a favor da ratificação do Acordo de Adesão à UEO, mas, como já deixámos antever, o pelas ra7ôcs aduzidas, é nosso entendimento que deveria ser tomada a iniciativa de realização de um desenvolvido debate parlamentar sobre as questões da defesa, incluindo a que se refere à eventual actualização do conceito estratégico de defesa nacional.
Aplausos do PRD.
0 Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
0 Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que é a quarta vez que a UEO é evocada na Assembleia da República.
Em Março de 1986, falou-se aqui sobre a conveniência de uma delegação portuguesa participar nos trabalhos da UEO. Em Outubro de 1987, o meu camarada Jaime Gama criticou o Sr. Primeiro-Ministro perante o silêncio do PSD e do Governo após as infelizes declarações proferidas em Roma de que o aprofundamento da UEO poderia criar uma ideia de separação entre a Europa e os Estados Unidos da América, em matéria de defesa, pelo que a adesão ainda não fora decidida, 0 meu camarada Miranda Calha, em Novembro de 1988, referiu-se à assinatura deste protocolo pelo Governo Português.
Excepto na primeira vez, a maioria não esteve interessada no debate. Em todas elas deu mostras de não querer ir ao fundo das questões. Hoje mesmo as suas preocupações passam apenas pela ratificação, a que todos os outros oito parlamentos já procederam, para cujo atraso não encontro razões.
É lamentável que ao debate relativo h ratificação de um protocolo com esta importância, no qual Portugal assume tais obrigações na construção da defesa europeia, perante toda da ameaça exterior à zona não coberta pelo Tratado do Atlântico Norte, na limitação de forças e de armamentos, num novo processo de desenvolvimento tecnológico concertado e no estabelecimento das bases de uma indústria europeia de armamentos, sejam destinados ao meu grupo parlamentar uns escassos 18 minutos, que, se não nos impede de manifestar o nosso interesse na adesão, impossibilita-nos, no entanto, de manifestar, com o devido relevo, as nossas preocupações quanto aos diversos caminhos que se nos deparam para percorrer, às nossas indefinições que, após ela, subsistem e de proceder portanto, a uma longa troca de ideias entre as divers bancadas e entre estas e o Governo.
0 que devia estar, hoje, aqui, em debate não era tanto a adesão à UEO mas as questões mais gerais da segurança o da cooperação entre todos os países europeus e de como ela deve ser conseguida em estreita colaboração com os Estados Unidos, o Canadá e a União Soviética.
Já foram invocadas razões suficientes quanto à necessidade e conveniência da adesão. Não me alongarei nessa defesa.
0 Conselho Superior de Defesa Nacional, emitindo parecer favorável à proposta de resolução, aponta o caminho da ratificação. Favoráveis à ratificação são também os pareceres votados, favoravelmente, nas Comissões Parlamentares de Defesa e dos Negócios Estrangeiros.
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Do que a UEO foi até 1984, das decisões sobre a sua revitalização e o actual alargamento, do maior contributo para a paz no mundo, da necessidade de Portugal participar, o mais possível, como membro de pleno direito da UEO, nas decisões deste fórum, não me restam dúvidas. Já o mesmo não posso dizer quanto às hipóteses de construção europeia que se encontram sobre a mesa das negociações,quanto às indefinições e dúvidas com que se debatem as nações da Europa, de quem'mais depende qualquer solução do papel da CEE, do Conselho da Europa, da Aliança Atlântica e da UEO, nas suas relações entre si e com a CSCE, e, sobretudo, como entidades de base da Comunidade de Defesa Europeia, quanto ao número de parceiros de cada uma destas instituições, quanto aos seus órgãos, à sua representatividade junto dos povos dos respectivos países e quanto aos seus objectivos.
Seria, portanto, sobre o futuro da Europa, sobre a sua segurança e, sobretudo, sobre a cooperação entre os vários países, sobre o que nesse futuro se reserva a Portugal e sobre a forma como devemos reagir a tudo o que possa ferir os nossos superiores interesses de país soberano e independente que gostaria de ter ouvido, hoje, o Governo.
Na falta veriricada, permitam-me que coloque ao Sr. Ministro algumas questões que me preocupam.
Consideramos que a CSCE, Conferência da Segurança e da Cooperação da Europa, reunindo, periodicamente, os presidentes e os primeiros-ministros de todos os países europeus, dos EUA, do Canadá e da União Soviética, poderá, através das instituições existentes, responsáveis pela paz nos últimos 40 anos, a OCDE, a CEE, a NATO, o Conselho da Europa, a UEO, actuando cada uma na sua área específica, ter uma contribuição decisiva para a paz na Europa e no mundo.
Qual é a posição do Governo a este respeito, uma vez que a adesão à UEO não faria sentido sem uma posição clara a esse respeito?
A Comissão Política da Assembleia da UEO constatava, em Junho de 1989, que o relatório anual desta Assembleia acrescentava pouco sobre a disposição tomada quanto à adesão da Espanha e de Portugal. Se bem que Portugal se tivesse comprometido quanto à disposição de uma brigada pronta a ser deslocada para o Norte de Itália, em caso de necessidade, para participar na defesa dos nossos aliados nas suas fronteiras, o Conselho nunca informou a Assembleia das medidas que a Espanha tomou, se é que tinha tomado, para assistir os seus aliados nas suas próprias fronteiras.
Sabe o Sr. Ministro se esta exigência, colocada pelo artigo 5º do Tratado e pela Plataforma da Haia, já foi satisfeita, na medida em que, ainda ontem, esta necessidade geral foi retomada pela Comissão Política dá Assembleia da UEO a respeito de um compromisso a tornar na defesa da Alemanha unificada?
Depois da adesão da Espanha e de Portugal, a questão de um novo alargamento da UEO foi novamente posta, de forma oficial, pelos actos de candidatura da Grécia e da Turquia. Pode, igualmente, vir a ser evocada pela Noruega e pela Dinamarca, Pode, igualmente, vir a ser posta por países que até agora tiveram mais difícil aproximação, como a Irlanda e a 15lândia. Pode vir, inclusivamente, a ser posta pela Áustria ou por países da Europa Oriental.
Pode o Sr. Ministro esclarecer a Assembleia da República sobre as bases de apreciação destas candidaturas?
Prevalecerá a concepção europeia, isto é, pertencer à CEE, ou a concepção atlântica, isto é, pertencer à NATO?
A adesão da Espanha e de Portugal à UEO toma indispensável uma revisão do Tratado de Bruxelas Modificado.
É mesmo convicção da Comissão Política da Assembleia da UEO que estas adesões se fizeram mais na base da Plataforma da Haia que do Tratado, uma vez que os dois novos membros da UEO subscreveram um tratado que, por um lado, não lhes é, directamente, aplicável em todos os seus capítulos e, por outro lado, vai ser revisto a breve prazo.
Que garantias obteve o Governo Português sobre o sentido da revisão do Tratado? Consta mesmo que a revisão será mínima e apenas para dar lugar ao aparecimento do Instituto Europeu dos Altos Estudos de Segurança.
Será que o Tratado de Bruxelas, de novo modificado pela nossa adesão, nos servirá melhor do que o actual?
Sr. Ministro, este instituto que mencionei e que terá funções extremamente importantes, após as supressões das agências de segurança da UEO, terá como principais funções criar um espírito europeu de defesa, permitir UEO melhor encontrar a sua via, desenvolver um pensamento comum e colaborar na formação, através de seninários e conferências. Será o figurino que se desenha? Será o mais adequado aos interesses da UEO, ou as suas missões e estrutura continuam em debate no Conselho?
Finalmente, as peças que foram remetidas pelo Governo à Assembleia da República, para apreciação do Protocolo, não contêm todos os elementos que a Assembicia da UEO remeteu aos membros das suas comissões.
Quando da assinatura do Protocolo, foi também assinado um anexo, contendo acordos concluídos entre os Estados membros em aplicação do Tratado. Foram trocadas cartas sobre o artigo 10º do Tratado de Bruxelas Modificado entre o Governo Espanhol e os outros governos, bem como a resposta dos vários governos a essa carta. Foi ainda entregue uma declaração política relativa ao alargamento a Espanha e a Portugal.
Lamento que o Governo não tenha mandado distribuir pelas várias bancadas os elementos em falta para melhor juízo do acto de ratificação.
0 Sr. João Amaral (PCP): -Muito bem!
0 Orador: - Estamos conscientes da impossibilidade de fixar, nesta data, de forma precisa, os limites geográficos e as estruturas institucionais de uma futura União Európeia. As suas competências nos domínios da segurança e económico não'têm, contudo, de ser idênticas, não devendo as iniciativas tomadas, nesta data, prefixarem a solução que venha, a seu tempo, a ser encontrada para estas questões.
15to não invalida, contudo, a necessidade de o Governo Português acompanhar a situação e saber, em cada momento, optar de acordo com os nossos interesses.
Reafirmando a convicção do meu partido no acerto do pedido de adesão e no interesse que o seu protocolo seja, hoje, aqui, ratificado, chamamos a atenção: do Governo e da Assembleia da República para a necessidade de um futuro debate, alargado e profundo, envolvendo as modificações a introduzir no Tratado antes, e não depois, que qualquer assinatura venha a vincular a posição de Portugal e os acordos que venham a ser estabelecidos com o fim de contribuir para a construção de defesa europeia.
Aplausos do PS.
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Entretanto, assumniu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.
0 Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.
0 Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se a construção europeia é para os diferentes povos europeus um dos maiores desafios dos tempos modernos, a adesão à UEO é um momento nacional clarificador do sentido que continuamos a dar ao projecto europeu.
Para um repto global, a adesão à CEE e ao seu Acto único e à UEO inserem-nos em instituições que podem dar uma resposta global, pois visam contribuir para uma Europa simultaneamente unida, desenvolvida e em paz.
Com efeito, unimo-nos para salvaguardar a prospcridade e a paz.
A construção europeia já não é um subproduto do idealismo nem do misticismo, mas um empreendimento necessário, de um ponto de vista dos grandes desafios económicos mundiais.
E. por isso, nos organizamos economicamente na CEE.
0 comércio diplomático entre os Estados tem de ser perspectivado no seu contexto global. Se a opção exterior de um Estado é uma das expressões da totalidade nacional, a verdade é que o diálogo das diplomacias se insere no mercado mundial em tempo de paz. E reporta-se permanentemente aos riscos de guerra, com as relações internacionais evoluindo sempre entre dois trilhos, o da economia mundial e o dos conflitos.
No fundo e em geral, o que está em causa é a preparação, ou não, para defender, na zona da OTAN ou «fora da zona», os valores e interesses globais, económicos ou não, da Europa.
E, por isso, nos organizamos diplomaticamente, na cooperação política europeia, formalizada no AUE.
E, por isso, organizamos a defesa dos nossos regimes político-económicos, da nossa civilização comum e das nossas culturas, também na UEO.
A estabilidade económica é importante para a segurança. E os responsáveis europeus não podem, por isso, ignorar as ameaças que pesam sobre o bem-estar económico do Ocidente, o qual esteve na base da paz e prosperidade no pós-guerra.
Os grandes desafios que se colocam aos Europeus, designadamente fora da zona da OTAN, modificarão profundamente as necessidades da segurança mundial nos próximos anos e ditarão novos esquemas de análise das relações de segurança, independentemente da continuação ou não da ameaça soviética ou apesar dela.
De qualquer modo, por paradoxal que pareça, nunca, no pós-guerra, o Leste, eivado de nacionalismos oprimidos mas irresolúveis, ou pelo menos irresolutos, foi tão instável e potencialmente explosivo como hoje; nunca a Europa, depois do bloqueio de Berlim, esteve ião próxima da revolução e da guerra como hoje.
Os Ocidentais fizeram face, durante 40 anos, com a OTAN e a UEO à ameaça soviética, gerindo bem os grandes problemas mundiais da segurança. Esta ameaça, enquanto tal, diminuiu fortemente, mas os Europeus devem servir-se da sua experiência de entendimento colectivo, no campo da segurança, para enfrentar no futuro os maiores desafios mundiais neste domínio, embora com uma nova abordagem, fortemente cooperativa.
0 nosso trajecto nacional ínsere-se no âmbito de um projecto comum europeu, o único capaz de responder aos reptos da evolução mundial.
No mundo de hoje, um mundo diferente, naturalmente multipolar pela sua demografia e economia, a Europa procura aceleradamente o seu novo lugar, ultrapassando a curva do declínio que alguns vaticinaram durante muito tempo como definitivo.
No século XXI, ela aumentará o seu papel no mundo, um papel à altura do seu desenvolvimento económico e social, da sua tradição humanista, da sua experiência convivencial multirracial e planetária, da sua situação geostratégica e da riqueza da sua história, das suas culturas e da sua maternidade de toda a revolução moderna.
0 programa da CEE, visando criar, até fins de 1992, um verdadeiro mercado interior; é um desafio para os homens de negócios e para os responsáveis das políticas económicas em todo o mundo,.pois a incidência da sua concretízação não se limita à CEE, nem mesmo só ao continente europeu, além de que trará consequências profundas quanto ao papel político e económico que a Europa Ocidental jogará na cena mundial.
Portugal, nesta evolução, tem todas as condições para ter um papel próprio que valorize as suas gentes.
Portugal é um país da periferia europeia, mas não da periferia mundial. 0 reforço do papel da Europa num contexto em mundialização crescente é-lhe favorável. É que Portugal é também um país de extremidade europeia, de um canto que comunica com outros mundos, de um canto onde se tocam dois mares e se avistam dois continentes. Este canto é, na Europa, o único que mais se aproxima simultaneamente das Américas e da África, a que o liga, como a nenhum outro, directamente, não só o mar mas também uma língua comum a espaços significativos destes três continentes.
A nossa ligação à Europa nno é contra as nossas ligações tradicionais. Pelo contrário, ela pode favorecer o seu desenvolvimento concreto e eficaz. 0 Acordo de Lomé, só porque é de âmbito europeu e, portanto, alargado, não nos afasta dos Estados africanos de língua portuguesa. Pelo contrário, aumenta os meios de cooperação. Além de que nos abre outras portas no continente de que temos vivido afastados, mas podem responder, no futuro, a oportunidades de proveito mútuo.
Enquanto Portugal aproveitou a década de 80 para se reenquadrar no seu continente, as suas antigas colónias poderão estar a terminar um período de reenquadramentos africano e interno, o que tudo permitirá que, redefinidos e acompanhados, possamos voltar a conviver de uma maneira muito mais forte e útil no século que se aproxima.
A nossa adesão à UEO fecha um cicio de integração em instituições europeias existentes que se insere no desenvolvimento da nossa opção europeia e, desde logo, europeía ocidental.
Ela cimenta as relações com os nossos parceiros privilegiados. Mostra que continuamos a privilegiar claramente o espaço comunitário. Portugal privilegia a relação a doze, embora como país não só europeu mas também atlântico privilegie depois, entre os países desenvolvidos do mundo, a relação com os EUA, tal como, em relação aos países em vias de desenvolvimento, privilegia a relação com os países africanos de língua portuguesa e ainda o Brasil.
Quanto às relações com a União Soviética, e sem pôr em causa a ideia de uma casa de cooperação europeia,
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temos que dizer um não à casa éomum europeia, se ela, mais do que um espaço de cooperação pan-europeu, significar uma tentativa de diluição do desafio comunitário que não só serve os interesses dos europeus ocidentais como do nosso próprio país.
No entanto, do mesmo modo, quanto às relações da Europa com os EUA temos de dizer não a um qualquer novo atlantismo que, mais do que reformular a cooperação no âmbito da segurança e regular colaboração necessária no plano económico, que afaste os receios da pretensa fortaleza de 1993 e supere as dificuldades actuais ao nível do Uruguay Round do GATT, pretefida pôr a CEE, ainda construção frágil, a suportar a solução de problemas económicos americanos ou do contencioso comercial EUA-Japão ou que vise ampliações comunitárias que descaracterizem o projecto europeu e ponha em causa a defesa das especificidades culturais dos nossos povos.
Claro que o processo de integração europeia terá impacte nas relações entre a Europa e a América. E dado que a CEE e os EUA têm um papel crucial nas negociações comerciais multilaterais, terão de se entender para acabar com a desintegração do sistema comercial internacional, através da elaboração de uma política comercial internacional global a vários níveis, integrando as iniciativas mundiais, regionais e bilaterias.
Mas a Europa comunitária não pode apoiar. nada, a ocidente ou a oriente, que vá contra os interesses europeus e nós não podemos apoiar nada que vá contra os interesses portugueses.
Por isso, aceitamos um novo adantismo sim, mas entendido como um reenquadramento do relacionamento euro-americano, tendo em conta os interesses comuns na dimensão, segurança e economia.
Um novo europeísmo, sim, mas entendido como um
reenquadramento do relacionamento pan-europeu propi
ciado pela democratização em curso na Europa do Leste
e, possivelmente, pela própria democratização russa, tendo
em conta a comunhão do espaço geográfico, de , culturas
e um acréscimo desejável das interpretações de ordem
económica.
Como disse recentemente uma importante personalidade política francesa, não se trata de substituir a garantia nuclear americana pela da França, nem de substituir a Europa à OTAN, nem de afastar este ou aquele país da CEE, nem de pôr em causa o actual quadro em que os nossos países estão comprometidos, nem de enfraquecer as relações da RFA com a RDA e, podíamos dizer em geral, da Europa Ocidental com os países do Leste.
No fundo, o desafio da revitalização e do alargamento da UEO, a que Portugal agora responde, insere-se numa evolução que pretende aumentar, juntar, fortalecer, e não cortar, diminuir, enfraquecer.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Sr.º Deputado João Amaral, pede a palavra para que efeito?
Sr. João Amaral (PCP): -Para uma interpelação, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra.
0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa porque, há pouco, na intervenção do
Sr. Deputado Eduardo Pereira foi feita referência a um documento que interessaria saber se existe e, no caso de existir, se o interpelado, neste caso o Sr. Ministro, o fornece à Assembleia.
Aproveitava, ainda, para perguntar à Mesa, num quadro diferente, se é verdade que o PSD gastou mais sete minutos que o seu tempo e se foi verdade que, na conferência de líderes, o PSD se opôs à proposta formulada, por unanimidade, na Comissão de Defesa Nacional, de os tempos serem alargados. 15to é, qual é a coerência do PSD?
Considerando que esta parte da minha interpelação é secundária, retomo a questão principal que é a de perguntar ao Sr. Ministro, por intermédio da Mesa, se existe essa declaração política, subscrita pelo Governo Português ou em seu nome, esse tal documento, e porque é que, se ele existe, não foi presente à Assembleia da República neste debate ou antes dele.
0 Sr. Narana Coissoró (CDS): É segredo de Estado!...
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Lello, também pretende interpelar a Mesa?
0 Sr. José Lello (PS): -Não, Sr. Presidente. Se o Sr. Presidente me permite, em três décimos de minuto, queria fazer um breve pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Fernando Condesso.
0 Sr. Presidente: -Tem que ser em décimo e meio, porque o Sr. Deputado Eduardo Pereira inscreveu-se primeiro e penso que está na disposição de lhe dar a outra metade.
0 Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, cedo o meu décimo e meio de minuto ao Sr. Deputado Eduardo Pereira.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Joaquim Marques, é para interpelar a Mesa?
0 Sr. Joaquim Marques (PSD):- Sr. Presidente, utilizando também a figura -da interpelação à Mesa, que é, de facto, a mais adequada na circunstância, gostaria de dizer ( e a Mesa comprovará aquilo que vou afirmar) que o PSD utilizou, de facto, mais alguns minutos por cedêncía expressa do PRD que aqui estava presente.
Relativamente à afirmação do Sr. . Deputado João Amaral de que o PSD, em conferência de líderes, se teria oposto a que houvesse um aumento dos tempos deste debate, isso não é verdade.
0 Sr. João Arnaral (PCP): - É verdade, sim!
0 Orador: - Sr. Deputado João Amaral, pergunte ao seu líder partidário, ao Sr. Deputado Carios Brito se ele próprio não reconheceu que a grelha escolhida para este debate era a adequada, tendo em conta, nomeadamente, que havia outras matérias agendadas para hoje. Além disso, o tempo atribuído para o debate em causa já tinha sido aumentado relativamente ao inicialmente previsto.
Quero deixar claro, Sr. Presidente, que o PSD não se opôs a que houvesse um aumento de grelha. 0 que houve, sim, na última conferência de líderes em que esta matéria foi analisada, foi um consenso de todos os líderes presentes de que não era possível nem se justificava que houvesse um alargamento da grelha que estava prevista.
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O Sr. João Amaral (PCP): - Dizer umas «mentirolas» nas costas é muito fácil!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Para interpelar a Mesa, no seguimento das considerações que o Sr. Deputado Joaquim Marques acaba de produzir.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Estava a acompanhar a sessão - não na Sala, mas no meu gabinete - e ouvi distintamente o que o Sr. Deputado Joaquim Marques acabou de dizer. Lamento dizer que, quando o Sr. Deputado Joaquim Marques vai à conferência de líderes, há sempre complicações.
O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Complicações?!...
O Orador: - Creio que fui muito claro - e o Sr. Secretário de Estado pode testemunhar isso - quando defendi que fosse alargado o tempo para este debate. Defendi esta posição, primeiro, numa conferência em que o tempo foi efectivamente alargado e, depois, no gabinete do Sr. Presidente, em que a questão foi de novo suscitada.
Portanto, defendi-o porque me parecia que era justo, acabando até por dizer que seria melhor alargarmos, logo aí, o tempo, do que sermos confrontados com uma situação no Plenário que nos levaria a utilizar mais tempo do que aquele que necessitaríamos agora. Foi sempre esta a minha posição.
Sr. Deputado Joaquim Marques, tenha paciência, mas não invoque coisas que não são verdadeiras, como mais uma vez acaba de fazer.
A minha posição foi, pois, a de insistir para que o tempo fosse alargado, como o solicitado pela Comissão de Defesa Nacional. Mais: até invoquei o argumento de ser uma solicitação feita por essa Comissão.
É esta a posição do PCP e a que defendi na conferência.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - Penso que não há motivo para tanto alarme. O que aconteceu foi que o tempo, em relação a esta matéria, foi, de facto, alterado.
Numa primeira conferência de lideres foi estabelecido; numa segunda conferência foi acordado um aumento de tempo. Se não estou em erro, ontem ou anteontem (o Sr. Deputado Carlos Brito ajudar-me-á, se assim não foi), foi recebido um pedido da Comissão no sentido de que fosse estabelecido um novo aumento de tempo, com o qual não estivemos de acordo, porque se entendia que, com os temas que hoje estariam em debate, não haveria qualquer razoabilidade em alargar os tempos. Foi exactamente assim que aconteceu.
O Sr. João Amaral (PCP): - É exactamente assim, mas gastam mais seis minutos que o tempo!...
O Orador: - Aliás, eu próprio, na conferência de líderes - nesta última que, como sabem, até foi feita em pé e em conversa entre nós-adiantei esta noção.
Assim sendo, não queria deixar de dar aqui o meu testemunho, dizendo que, se houve alguém a quem poderiam ou deveriam censurar, em relação a esta matéria, deveria ser a mim e não ao Sr. Deputado Joaquim Marques.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, embora a situação esteja esclarecida, não lhe quero tirar a palavra, mas peco-lhe que seja muito sucinto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não sei se o Sr. Deputado Joaquim Marques assistiu a toda a conversa que, sobre esta questão, foi feita, mas, ao Sr. Secretário de Estado, lembro-me perfeitamente, advoguei o alargamento do tempo, até com este argumento: «vamos gastar mais tempo, se não o alargarmos agora».
Portanto, esta foi, desde sempre, a nossa posição: primeiro, quando de facto foi alargado e, depois, quando, a solicitação da Comissão de Defesa Nacional, a maioria dos presentes entendeu que, tendo o (empo já sido aumentado, não seria de fazer um novo alargamento.
O Sr. Presidente: - Quanto à interpelação feita à Mesa, confirmo que houve uma transferência de tempo do PRD para o PSD, com o consentimento do PRD.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, tenho três décimos de minuto - não sei se me vão chegar -, mas pedia a sua benevolência só para colocar estas questões.
Fiz vários lamentos durante a minha intervenção e, agora, lamento mais uma vez que, em debates desta importância, não seja tida em consideração a opinião de uma comissão parlamentar, que poderá julgar muito melhor do interesse dos tempos para o debate do que a própria conferência de líderes. Mas esse é um problema da conferência de líderes e do Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Deputado João Amaral, na sua intervenção, fez uma alusão ao facto de que, se era compreensível que pudesse ter havido uma adesão de Portugal à UEO em determinada data, depois dos últimos acontecimentos na Europa Oriental isso não fazia tanto sentido.
Discordo totalmente desta opinião, na medida em que acho que a adesão à UEO e a sua reactivação fazem hoje sentido, sobretudo porque se deram e continuam a dar acontecimentos na Europa Oriental para a resolução dos quais penso que a UEO será a forma adequada.
Mas queria, sobretudo, pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Fernando Condesso.
Durante a minha intervenção procurei interpretar o pensamento do Governo, pois não consegui compreender o do PSD aquando da intervenção do Sr. Deputado Angelo Correia.
No entanto, através da intervenção do Sr. Deputado fiquei com a sensação de que V. Ex.ª quer que a UEO seja não só uma organização de defesa com preocupações para com a União Soviética mas agora também para com os Estados Unidos da América. Isto é, seria uma organização de defesa, digamos, a lutar contra os dois lados e contra tudo o que contrarie os interesses europeus.
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Bem, penso que, sobre esta matéria, esta não pode ser a opinião do PSD nem a do Governo. Gostaria, por isso, de ser esclarecido.
Para nós, a UEO, a União Soviética, os Estados Unidos e a CEE devem dar as mãos para a consolidação da paz na Europa e no mundo. Por isso, a UEO não pode ser manipulada para criar conflitos com a União Soviética ou com os Estados Unidos, como parece ter sido preconizado na sua intervenção.
Gostava que este ponto fosse esclarecido.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Lello pediu a palavra para, em 20 segundos, formular pedidos de esclarecimento. Como a Mesa tem por objectivo ajudar e não prejudicar o debate está na disposição de facultar esse tempo.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da consideração, que não gostaria de ter de fazer. Mas, de qualquer maneira, penso que, como o Sr. Deputado Eduardo Pereira se referiu à minha pessoa e à forma como foram atribuídos os tempos, se justifica esta figura regimental.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Eduardo Pereira, quanto à questão dos tempos, devo dizer que não é costume pedir-se o parecer às comissões. No entanto, devo dizer-lhe que se fosse pedido um parecer às comissões sobre o tempo a atribuir, seria, como é evidente, não só à Comissão de Defesa Nacional mas, com toda a certeza, à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação. Mas nunca foi assim. Nunca houve uma interferência das comissões nesses termos, em relação à atribuição de tempos. A atribuição de tempos para a discussão em Plenário dos pontos agendados é feita em conferencia de líderes.
Repito, mais uma vez, Sr. Deputado Eduardo Pereira, a atribuição de tempos para esta matéria foi feita na primeira conferência de líderes e foi aumentada numa segunda conferência.
Portanto, penso que V. Ex.ª, com todo o respeito que tenho pela Comissão de Defesa Nacional, pelo seu presidente e pelos seus membros, não tem razão naquilo que afirmou.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Secretário de Estado, a última pessoa que eu gostaria ou que procuraria ofender ou desconsiderar seria o senhor.
No entanto, quero, também, com a mesma sinceridade com que digo isto, dizer que, desde 1984, o PSD e o Governo têm dado mostras de temerem este debate e de o porem à consideração do povo português.
Portanto, não me espanta, não me admira, que tenha havido a escolha de uma grelha que não permitisse o debate mais alargado.
Não o quero ofender pessoalmente. É um problema político - o de um partido e de um Governo se negarem a um debate - e, como tal, ninguém tem de se sentir ofendido.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello. Dispõe de 20 segundos.
O Sr. José Lello (PS): - Sr. Deputado Fernando Condesso, aproveito estes 20 segundos para lhe pedir que me explique melhor o cenário tenebroso de conflitos, generalizado e global, que expressou e exprimiu na sua hermética intervenção.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Deputado Eduardo Pereira, devo dizer que, enfim, por razões de tempo não fiz grandes considerações sobre a UEO, especificamente.
O Sr. João Amaral (PCP): - Razões de tempo não tem!
O Orador: - Digamos que o relatório que apresentei à comissão, embora elaborado em fins de Dezembro, continua, no fundo, a manter o meu pensamento sobre esta questão.
Na minha intervenção procurei demonstrar que a nossa adesão à UEO se insere coerentemente, em termos das nossas opções de política externa. Foi isto o que tentei demonstrar.
Fiz considerações, sem dúvida, sobre a cooperação pan-europeia, a cooperação a nível da Europa/América do Norte, mas de modo a avalizar enquadramentos, uma vez que tudo isto está em reflexão - esse novo europeísmo ou esse novo atlantismo -, enfim, tudo opções que me parecem perfeitamente conciliáveis.
Portanto, é óbvio que haja conflitos, e ninguém poderá desconhecê-los, entre a Europa e entre a América, sobretudo a nível de questões económicas, mas não pretendi fazer uma defesa extremada, pelo contrário, apenas pretendi dizer que o espírito terá de ser no sentido de os tentar resolver de uma maneira cooperativa.
Sr. Deputado José Lello, não indiquei qualquer cenário de conflitos generalizado e global. O que pretendi dizer na intervenção - e agradeço que a leia mais detalhadamente - é que tudo aquilo que tem acontecido hoje no mundo não reduz a necessidade de nos preocuparmos com a segurança europeia.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que esteve subjacente a algumas intervenções, em particular a do Sr. Deputado Eduardo Pereira, uma ampliação do debate sobre a UEO a outras instituições europeias e à situação que se vive hoje na Europa.
No meu discurso limitei-me a dizer que a actual situação reforçava o pedido de adesão à UEO de 1984 e a rubrica de 1988. Isto por uma razão simples: é que o pedido e a ratificação ocorrem em contextos diferentes, e a sua validade não só se mantém como se reforça na actualidade, como vou tentar explicar.
Penso que todos têm consciência de que o cenário europeu se está a transformar e que o futuro, que se antevê já num horizonte próximo, carece de novas insti-
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tuições. E porquê? Porque aquilo a que estamos a assistir é ao fim da «guerra fria» e, tal como no fim de qualquer guerra, há que sedimentar as novas resultantes políticas, económicas e institucionais, tal como numa «guerra quente».
É assim que tem de se interpretar o auxílio do «Grupo dos 24» ao Leste; 6 um novo tipo de Plano Marshall; é assim que tem de se interpretar a ideia de uma «casa comum europeia» ou da extensão do Conselho de Europa ao Leste, assim como de outras instituições; é assim que tem de se interpretar o fim da divisão da Alemanha, símbolo dos símbolos da ordem da última Guerra Mundial; 6 assim que, finalmente, tem de se interpretar a equação das fronteiras e a remissão a Helsínquia.
Neste processo de transformação na Europa, a única instituição verdadeiramente pan-europeia, em que iodos os principais países interessados da Europa, com excepção da Albânia, e com o acréscimo do Canadá e dos Estados Unidos, estão presentes, é o chamado processo CSCE.
Portanto, a referência de todos os Estados a uma nova ordem europeia e à sua discussão é remetida para a CSCE, porque é o único fórum que existe e dela fazem parte três vertentes.
A primeira é a dimensão humana orientada, fundamentalmente, para o estabelecimento de uma democracia pluralista, do Estado de direito e do respeito dos Direitos do Homem. É um triplo pilar que, digamos, conforma a dimensão humana da CSCE. Pois bem, a coincidência entre este pilar e os princípios fundamentais do Conselho de Europa existem e estão reforçados pelo facto de, quer a leste quer a oeste, se pensar que é possível criar um espaço jurídico europeu que emanaria dos princípios do Conselho da Europa.
A segunda vertente tem a ver com a recuperação económica. Todos sabem que os países do Leste em transformação, sem excepção, querem seguir a via da economia de mercado. Mas, ao contrário da democracia política, que pode ser decretada e implementada num espaço comparativamente curto, a chamada economia de mercado tem leis a que o tempo não é estranho, especialmente quando o ponto de partida é o desses países, em que não há praticamente propriedade nem empresários privados. Mais, os problemas derivados da unificação alemã, designadamente da moeda, o problema da entrada de uma moeda convertível no espaço do COMECON, são demasiado grandes e pesados para poderem ser discutidos apenas pelos políticos, daí a necessidade da participação dos técnicos.
Essa cooperação económica que se quer na Europa não é, à partida, equilibrada. Isto porque há, de um lado, um Ocidente rico, que tem a sua âncora na chamada Comunidade Económica Europeia dos 12, que em breve será alargada à EFTA, passando a ser dos 18, e, do outro, um Este comparativamente mais pobre. Essa cooperação tem de ser feita através de mecanismos de transição que permitam adaptar a interacção de ambos os espaços económicos às diferentes realidades das leis de mercado que existem dos dois lados.
Por isso, é necessário o espaço de transição e alguém que possa actuar como «motor» dessa cooperação. Daí o «Grupo dos 24», que é, como se sabe, coincidente com os países da OCDE e que pode, de algum modo, ser o «motor» dessa cooperação económica dilatada no tempo.
Finalmente, a segurança é, sem dúvida, a vertente em que não há pontos de referência. É uma questão em que, havendo acordo sobre alguns princípios, isto é, todos os Estados têm de ter direito à sua segurança, exige uma grande consciência entre o que há pouco chamei a geografia política e a geografia da segurança, já que hoje a situação é completamente distinta.
Daí que se tenha avançado para os chamados CSFE, acordos relativos à redução do armamento, que foram equacionados com base numa realidade anterior e que têm de ser rapidamente concluídos, porque conduzem a um abaixamento global do armamento, embora não sirvam para estabelecer a nova ordem europeia.
Deste modo, nas novas discussões sobre armamento já se está à procura do formato que pode permitir a continuação da redução dos armamentos, sem se entrar num processo de discussão a 35, que teria um conjunto de interacções tão grande que seria difícil de arranjar consenso.
Para isso, tem havido algumas sugestões, como, por exemplo, um conselho de segurança na Europa, um centro para detecção de potenciais conflitos.
E uma matéria sobre a qual se está a iniciar o debate e não é previsível, neste momento, saber qual vai ser o seu fim. A posição de Portugal é clara: pensamos que a NATO, que é uma instituição eminentemente defensiva, juntamente com a OCDE e com o Conselho da Europa, poderá ajudar à estabilidade da Europa. Não enjeitamos, até, a hipótese de a NATO poder vir a ter um papel muito mais político do que actualmente tem, desde que também diminua a possibilidade de agressão militar.
Só uma última palavra sobre a posição de Portugal e sobre a questão do atlanticismo.
É evidente que se estamos na Europa à procura de criar princípios, com base no respeito dos direitos humanos, da democracia pluralista, do estabelecimento de um Estado de direito, se queremos estabelecer em toda a Europa uma economia de mercado, aquilo que efectivamente nos separa dos Estados Unidos é o Atlântico, porque tudo o resto coincide, até a interacção económica entre os Estados Unidos e a Europa. Basta pensar que o volume de investimentos recíproco é superior a 140 biliões de dólares, para já não falar noutros valores colaterais nesta matéria.
Daí que faça todo o sentido dizer que a cooperação, ao nível da segurança, tal como a nível económico e da dimensão humana, no Conselho da Europa, tenha também a presença associada dos Estados Unidos. É este o sentido da cooperação-e não, obviamente, da integração- do chamado atlanticismo ou, na perspectiva do Governo, do novo atlanticismo.
Para não gastar muito mais tempo, diria que a posição estratégica de Portugal na nova Europa pode ser, de facto, uma posição de periferia ou de maior centro em relação aos problemas mundiais, o que depende de a Europa acabar nos Açores ou de se prolongar, através dos seus valores e das suas relações económicas, para o outro lado do Atlântico. Ora, eu entendo que esta segunda opção é a desejável.
Quanto às perguntas que me fez, e numa resposta muito rápida, diria que o sentido do tratado é desconhecido. Na altura própria, tão cedo quanto possível e assim que se tiverem algumas orientações nessa matéria, a Assembleia da República será informada.
Quanto ao Instituto Estratégico de Defesa, creio que é uma instituição necessária. Não existindo outro na Europa, ele elimina e substitui as estruturas actuais da AÇA e do SAC, porque, entre outras razões, caíram em desuso. Esperamos que este Instituto Estratégico de Defesa possa
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vir a ter essencialmente um papel de estudo sobre as novas condições que existem neste momento na Europa e sobre os mecanismos de defesa global que possa servir a todos e a cada um.
O Sr. Eduardo Pereira (PS)- Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, gostaria de me congratular com a intervenção do Sr. Ministro. Penso que as questões que coloquei serviram para o desenvolvimento que agora fez. Lamento que não tenha começado a sua intervenção desta tarde por aí porque agora é que deveria começar o debate.
Fica, pois, aqui a ideia de que quando as coisas amadurecerem um pouco mais este debate tem de ser refeito nesta Assembleia e antes das tais assinaturas para que chamei a atenção.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate sobre a proposta de resolução n.º 21/V. A sua votação far-se-á na altura oportuna.
Vamos agora passar à discussão conjunta da proposta de lei n.º 87/V, da Assembleia Regional da Madeira, sobre a alteração, na Região Autónoma da Madeira, dos valores de incidência das taxas de sisa, da proposta de lei n.º 113/V, da Assembleia Regional dos Açores, sobre a alteração, na Região Autónoma dos Açores, dos valores de incidência das taxas de sisa e do projecto de lei n.º 446/V, da iniciativa do Partido Socialista, sobre a reforma da sisa e do imposto sobre as sucessões e doacções.
A discussão destes diplomas é conjunta.
Estão inscritos os Srs. Deputados Guilherme Silva, Manuel dos Santos, Mário Maciel, Carlos Lilaia, Domingues Azevedo e Octávio Teixeira.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Embora já venha constituindo facto normal, no âmbito da actividade legislativa da Assembleia da República, a apreciação de propostas de lei das assembleias legislativas dos Açores e da Madeira, não 6 demais salientar quanto tal revela a vitalidade institucional dos parlamentos das regiões autónomas e o seu papel na consolidação quotidiana das autonomias. Limitados nos seus poderes legislativos, designadamente por força da competência reservada da Assembleia da República, não deixou, porém, a Constituição, nos seus artigos 229.º, n.º 1, alínea f), e 170.º, n.º 1, de consagrar os mecanismos necessários a que as assembleias legislativas regionais, através de propostas de lei a apresentar à Assembleia da República, pudessem obter providências legislativas na área da sua competência reservada que interessam às regiões.
É, pois, neste domínio que se inserem as iniciativas legislativas agora em discussão provenientes das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores relativas à alteração dos valores de incidência das taxas de sisa.
Efectivamente, é sabido que, por força do artigo 168.º, alínea O, da Constituição, a matéria em causa, por dizer respeito a impostos e sistema fiscal, está incluída na reserva relativa da competência da Assembleia da República.
Era, pois, esta a via adequada à alteração a introduzir no Código da Sisa, que tenha em consideração a circunstância de os custos de construção por metro quadrado nas regiões autónomas terem um agravamento em relação ao Continente na ordem dos 40%.
As dificuldades com que por vezes se deparam as iniciativas das assembleias legislativas regionais junto da Assembleia da República têm a ver com a necessidade de abertura e compreensão dos fenómenos e condicionalismos insulares, sem o que não é possível, em cada caso, concretizar os desígnios constitucionais de solidariedade, fortalecendo a unidade nacional.
Tenha-se presente que a alteração pretendida pela proposta de lei n.º 87/V, da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, a que se seguiu idêntica proposta, da Assembleia Legislativa Regional dos Açores - proposta de lei n.º 103/V -, que também se encontra aqui em discussão, não visa uma qualquer insignificante alteração em matéria fiscal. Pretende-se uma alteração com directa incidência no âmbito do direito à habitação, que o artigo 65.º da Constituição consagra, referindo que incumbe ao Estado assegurar, designadamente «estimulando a construção com subordinação ao interesse geral e o acesso à habitação própria».
Prevendo o Código da Sisa isenções e taxas em função de um determinado escalão de preços de transacção de prédios urbanos ou fracções destinadas à habitação nas regiões autónomas para que as mesmas camadas sociais destinatárias de tais medidas pudessem delas beneficiar, impunha-se a sua correcção por valores mais elevados.
Com efeito, dado o custo dos transportes, os materiais de construção são mais caros nas regiões autónomas, tal como é mais cara a mão-de-obra, o que se agrava ainda com uma orografia acidentada e o elevado custo dos terrenos. É gratificante registar, espero, pelo menos uma vez, que o artigo 231.º da Constituição não seja letra-morta.
E contra correntes de opinião que deturpadamente se vão criando, Deus sabe com que fins e intenções, não é demais repetir que não queremos privilégios nem situações de vantagem em relação ao todo nacional. O que queremos é apenas e tão-só o que a Constituição nos garante: a correcção das desigualdades derivadas da insularidade. O princípio é, aliás, simples: quando se está por razões estruturais em situação desigual só se atinge a igualdade, que deve ser um bem e uma garantia de todos, com a adopção de medidas adequadas à correcção de tais distorções.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei agora em discussão suscita, aliás, a questão mais vasta, que é a da inconformidade com o artigo 229.º, alínea O, da Constituição vir a ser aprovada a lei-quadro por esta Assembleia da República nos termos da qual as regiões autónomas possam, para além de situações pontuais, adaptarem globalmente o sistema fiscal nacional às especificidades regionais.
O consenso que, estou em crer, as propostas de lei provenientes da Assembleia Legislativa Regional da Madeira e da Assembleia Legislativa Regional dos Açores ora em discussão virão a merecer parece poder constituir um bom prenúncio relativamente à proposta de lei do estatuto definitivo da Região Autónoma da Madeira, de que o presidente da Assembleia Legislativa Regional, mercê da importância daquele diploma, fez pessoalmente
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entrega na última quinta-feira ao Sr. Presidente da Assembleia da República e aos presidentes dos grupos parlamentares, muito nos tendo honrado com a sua vinda a este Parlamento, de que, aliás, já foi membro.
Se assim for, como esperamos, muito se contribuirá para o aprofundamento da autonomia regional, em recíproca solidariedade, com o que, ao contrário do que por vezes parece ser entendimento de alguns, só se reforça a unidade nacional e engrandece a dimensão atlântica de Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A propósito da «excelência» da reforma fiscal do Governo, afirmou V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, oportunamente, que, em Março, os Portugueses iriam ter uma grande surpresa.
Referia-se o Sr. Secretário de Estado à possibilidade - certeza- de que seriam devolvidos 28 milhões de contos, cobrados a mais a título de IRS, aumentando consequentemente o rendimento disponível dos cidadãos contribuintes.
Soubemos recentemente que a surpresa que o Sr. Secretário de Estado nos anunciava se traduz, afinal, num agravamento líquido de cobranças da ordem de 1 ou 2 milhões de contos.
O Governo apresentou - recordar-se-ão os Srs. Deputados-, em Novembro de 1989, um orçamento suplementar, a que chamou rectificativo, onde se inscrevia uma previsão actualizada de cobrança do IRS de 310,9 milhões de contos.
A oposição, e particularmente o Partido Socialista, argumentou, então, que este valor se encontrava, apesar de corrigido, subavaliado e chegou mesmo a avançar valores concretos.
Soubemos agora que, afinal, o valor da cobrança deste imposto ultrapassou os 330 milhões de contos.
Relativamente ao ano de 1990, o Governo prevê 313 milhões de contos de cobrança do IRS, o PS propôs uma correcção para 328 milhões de contos e o resultado final só o saberemos mais tarde, mas será seguramente a concretização de um significativo desvio relativamente ao valor inicial.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Todos estes factos, facilmente comprováveis face às notícias da comunicação social, aos documentos de índole orçamental oficiais e à transcrição dos debates parlamentares, demonstram claramente a verdadeira natureza da «reforma fiscal do Governo».
Onde seria de esperar a apresentação de um conjunto de opções encarada com a maior abertura de espírito, independência, humildade e rigor, suportada por uma discussão prévia e integradora de algumas opiniões divergentes, encontramos uma reforma fiscal imprevisível, mais do que o aceitável, quanto ao seu resultado, falha de rigor, violadora do princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei e financeiramente com elevado grau de ineficácia.
Apesar disto, a reforma fiscal do Governo tem sido apresentada como uma bandeira da modernidade e um instrumento de propaganda.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É neste contexto que o PS apresentou na Assembleia da República um conjunto de três projectos de lei visando: a defesa dos direitos dos contribuintes; a reforma do IRS e do IRC; a reforma da sisa e do imposto sucessório.
Não compete ao Partido Socialista, nem isso teria sentido, face ao elevado volume de meios técnicos que seria preciso mobilizar (o que só está ao alcance do Governo), apresentar uma nova reforma fiscal.
Contudo, compete ao Partido Socialista e constitui, mesmo, seu dever democrático, contribuir para o aperfeiçoamento do sistema visando desagravar fiscalmente as classes médias e as classes de mais baixos rendimentos, reduzir a carga fiscal sobre as pequenas poupanças, criar sistemas transparentes e eficazes que diminuam a evasão fiscal e reduzir ao mínimo aceitável os efeitos perversos da fiscalidade.
É o que mais uma vez se faz com a apresentação do projecto de lei n.º 446/V.
A actual situação no que respeita à sisa e ao imposto sucessório caracteriza-se por uma subida galopante da fiscalidade, a que corresponde, como é habitual no fenómeno fiscal e em sistemas de transparência e equidade limitados, como o português, uma igualdade galopante da subida da fraude e da evasão fiscais.
O efeito conjugado destes dois fenómenos traduz uma queda de tributação arrecadada e, mais importante do que isso, o completo descrédito do Estado e do sistema.
Quer quanto à sisa, quer quanto ao imposto sucessório, o peso relativo destes impostos, no conjunto das receitas fiscais, tem vindo a ser sucessivamente diminuído, o que, só por si, revela até que ponto têm crescido a fraude e a evasão fiscais.
A diferenciação fiscal dos valores que constituem o património transmissível é uma das principais perversões existentes no domínio do imposto sucessório.
Se um cidadão recebe uma fortuna sob a forma de títulos, não paga nada; se, em contrapartida, receber um terreno, por pequeno que seja, cerca de metade do seu valor reverte para o Estado.
A reforma fiscal do Governo, ou melhor, um conjunto de medidas avulsas não resolveu nenhum dos problemas existentes neste domínio e, nalguns casos, agravou-os mesmo.
A reforma fiscal da sisa e do imposto sucessório, da autoria do Governo, é um autêntico aborto jurídico falho de qualquer espírito de racionalidade e justiça, que, por isso mesmo, cumpre modificar.
Para o PS, o modelo aceitável deve assentar nos seguintes quatro vectores:
Descida substancial das taxas aplicáveis em matéria de sisa e do imposto sucessório, tornando o sistema mais justo, mais transparente e menos sujeito à evasão fiscal;
Substituição do preço declarado dos prédios urbanos e mistos, como base de incidência, por um valor padrão fixado anualmente, o que só por si eliminaria o escândalo dos actuais valores oficiais das transacções;
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Substituição do actual sistema de imposto sobre os dividendos das acções, através de avença, por um sistema com uma taxa progressiva ligada ao valor patrimonial das empresas;
Penalização fiscal das sociedades de simples administração de bens, que são, na maioria dos casos, constituídas com um único objectivo de fuga ao fisco.
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Todos estes aspectos serão detalhados na intervenção subsequente da minha bancada.
O que importa agora e aqui 6 lançar um desafio, para que a actual maioria tome uma atitude responsável que permita a reforma destes impostos.
Exige-o a modernidade do sistema, a justiça tributária e a função eminentemente redistributiva dos impostos sobre o património.
Provavelmente não o comportará o habitual espirito de incompreensão e a cega disciplina que o PSD jurou ao Governo mesmo quando estão em causa os interesses mais imediatos dos Portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A substância pode ser a mesma, mas o discurso é bom.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - O Sr. Presidente terá, com certeza, notado que nós enxertámos aqui uma discussão de um tema noutro, ou seja, os tempos que estavam divididos e os que estavam a ser utilizados...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É conjunto!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Não é conjunto, Sr. Deputado. Há duas grelhas definidas: uma para a discussão sobre as propostas das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores e uma outra para a matéria a seguir.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, a discussão 6 conjunta. Há apenas uma grelha, que é aquela que foi fixada nos quadros. Essa é a informação de que a Mesa dispõe.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas não é essa a informação correcta que vem da conferência de líderes.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, na súmula da reunião n.º 20, realizada no dia 7 de Março de 1990, entre as IS horas e 10 minutos e as 16 horas e 55 minutos, vem na agenda para o dia 13 de Março, terça-feira, o seguinte: propostas de lei n.ºs 87/V e 113/V, respectivamente das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores, e o projecto de lei n.º 446/V, apresentado pelo PS.
Para este debate dispomos dos seguintes tempos: Governo, PSD e PS, 15 minutos cada; PCP, 13 minutos; PRD, 12 minutos; CDS, 11 minutos, e o Partido Ecologista Os Verdes. 10 minutos. É, pois, isto que faz parte da súmula.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel dos Santos fez uma introdução mais ampla do que a matéria. Não poderia perder a oportunidade para, no curto espaço de tempo que temos para discutir esta matéria, lhe fazer umas perguntas, enquanto o meu colega Belarmino Correia fará a intervenção de crítica apontando as contradições do projecto de lei, apresentado pelo PS, no que diz respeito aos impostos de sisa e das sucessões e doações.
Mas a questão que agora quero colocar é, em primeiro lugar, no sentido de saber se considera que quando os impostos dão uma receita maior do que a prevista criam uma situação pior em termos de equilíbrio das finanças públicas do que quando a receita é menor, o que, naturalmente, dá origem a orçamentos suplementares.
Sei que o seu partido teve uma experiência amarga quando apresentou previsões de receita que depois deram origem a orçamentos suplementares. Com os governos sociais-democratas tem sido o contrário. Ou seja, devido ao combate à evasão fiscal, à eficácia que o Sr. Deputado Manuel dos Santos critica e ao rigor na gestão tributária, as receitas acabam sempre por ser superiores às previsões.
Pergunto-lhe, concretamente, o que é que é pior. ter eficácia na gestão da administração tributária ou ter orçamentos suplementares por falta de receita?
Em segundo lugar, a proposta que o Sr. Deputado coloca de valores padrão em vez dos valores reais, sujeitos porventura a debates com júris e com comissões de avaliação, não porá em causa um princípio sagrado da nossa sociedade e da democracia, que é o respeito pela propriedade privada?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): - O Sr. Deputado fez várias considerações, dizendo, entre elas, que a receita respeitante ao imposto de sisa, no Orçamento de Estado, estava em queda. Tem razão! Depois disse que a reforma fiscal era um sucesso. Tem razão, Sr. Deputado. Financeiramente é um sucesso! Mas depois disso veio dizer, afinal, que a reforma fiscal se traduz num agravamento da situação fiscal dos cidadãos, exactamente porque foi um sucesso financeiro.
Ora, eu já tive oportunidade de dizer ao Sr. Deputado e ao povo português, demonstrando-o - e tenho uma carta já pronta...
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Outra?!
O Orador: -... e até ao dia 25 vão sair 300 000,...
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - É bom para os CTT!
O Orador: -... eu sei que o Sr. Deputado não gosta! Mas isto é para as pessoas saberem aquilo que pagaram e aquilo que teriam pago se não houvesse reforma fiscal.
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Deve ser antes da privatização dos CTT!
O Orador: - O Sr. Deputado quer deixar-me falar?
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O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Faça favor, Sr. Secretário de Estado!
O Orador: - Logo, o que parece sair e fluir claramente das suas palavras, é que há uma incongruência total naquilo que disse, porque prova-se que há desagravamento e há-o senhor di-lo-sucesso financeiro. Então, como 6 que alude a uma fuga maciça de capitais?
Mais, quando diz que há uma queda da receita no Orçamento de Estado quanto à sisa, tem toda a razão. Há, porventura, uns valores, uns centos de contos... certamente, não tem presente que a sisa, agora, é uma receita das autarquias!...
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, Sr. Secretário de Estado: Considero que é muito fácil responder às vossas questões, aliás, é com muito prazer que o faço.
É óbvio que eu não disse que cobrar mais é mau. Lamento é que, à luz de um rigorismo formal, que sabíamos que não existia - e de resto, vou continuar, ao longo deste ano, a trazer sempre aqui todas as coisas, mesmo quando me forem desfavoráveis, porque acho que isso é que 6 rigor, é comparar aquilo que cada um diz em cada momento com aquilo que vai fazendo ao longo do tempo-e que aparentemente vingou em matéria de Orçamento do Estado, tendo-o dito aquando da votação final global do Orçamento do Estado para 1990, se escondia uma política pretensamente escudada num determinado défice menor, com o qual aliás estamos de acordo. Deste modo se impossibilitava que fossem feitas outras previsões, ainda que elas fossem perfeitamente realistas, porque não podia dar-se o argumento à oposição de que assim haveria possibilidades de reforçar algumas despesas sociais.
Nesse sentido apresentámos aqui concretamente vários tipos de despesas que, em nosso entender, deviam ser reforçadas: as do Ministro da Saúde, da Educação e outras, como é o caso da Cultura.
Portanto, toda a lógica e todo o debate orçamental esteve, à partida, viciado, voluntariamente viciado, porque o Governo sabia, e sabe muito bem -pelo menos os deputados da maioria que discutiram na especialidade esta matéria-, que as receitas fiscais que constam do Orçamento do Estado estão subavaliadas e, portanto, não quis partir desta realidade para um equilíbrio orçamental diferente.
Foi apenas isto que critiquei e não a questão de mais ou menos receita ser mau ou bom ou de corresponder ou não a um agravamento fiscal, pois, como é evidente, são coisas completamente diferentes - e começo já de algum modo a responder ao Sr. Secretário de Estado. O agravamento fiscal não se mede em termos absolutos, mas em termos relativos, entre outras coisas; mede-se em termos de distribuição nas diversas classes de rendimento e pelas diversas classes sociais e, por isso, não existe uma tão grande correspondência entre as duas coisas.
Com toda a franqueza, julgo que a questão dos valores padrão não se coloca exactamente nos termos em que a referiu, pelo contrário, retirando discricionaridade à administração fiscal e ao Estado até aumenta ou reforça aquilo que os senhores chamam-e eu não gosto nada- sociedade civil. Portanto, reforça exactamente a componente da propriedade privada que o Sr. Deputado aqui quis realçar.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais referiu, confirmando o que eu disse, que a sisa está em queda. É verdade! Más talvez isso não seja o mais importante daquilo que referi.
Por outro lado, acrescentou que eu disse que a reforma fiscal é um sucesso. Eu julgo que não disse isso, se o disse foi por ironia, mas julgo que nem por ironia o disse.
Também não disse que há um agravamento fiscal, porque ainda não sei se há ou não! Já o disse em vários debates que ainda não há suficiente experiência nem suficientes dados, a não ser que V. Ex.ª os tenha aí, que me permitam concluir se há ou não agravamento ou desagravamento fiscal. Agora, o que afirmei - e também sou um cidadão contribuinte e cumpridor - é que o Sr. Secretário de Estado tinha dito que ia fazer-nos uma surpresa. Isso vem em todos os jornais. V. Ex.ª disse que nos ia dar 28 milhões de contos para gastarmos a mais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Surpresa não é isso! É antecipar os pagamentos!
O Orador: - E o que sucede é que se não dá os 28 milhões de contos ao conjunto dos cidadãos contribuintes - e há alguns que vão receber alguma coisa-, o senhor retira mais um milhão de contos. Portanto, foi esse aspecto que referi para, de algum modo, entre outros, sublinhar também a fragilidade da sua reforma fiscal.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - O que significa que eu tinha razão!
O Orador: - De qualquer maneira, as questões de pormenor, que não são aliás menos importantes -não estou, de maneira alguma, a minimizá-las-, serão objecto de intervenções subsequentes da minha bancada.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Mário Maciel, quero informar, embora já saibam, que às 19 horas e 30 minutos vai passar-se ao período das votações, na generalidade, da proposta de lei do Governo e do projecto de lei do PS sobre a televisão privada, a votação global da proposta de resolução n.º 21/V, que foi hoje discutida, e ainda os diplomas que estamos a discutir se terminarmos a sua discussão até essa hora, o que não creio.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia Legislativa Regional dos Açores, trilhando os direitos constitucionais e estatutários conformes, submete à apreciação deste órgão de soberania a proposta de lei n.º 113/V, que altera os valores de incidência das taxas de sisa naquela região autónoma.
Por unanimidade, os representantes directos do povo açoreano entenderam, por esta via, interferir na urdidura de um esforço nacional solidário para com problemática não despicienda para os insulares.
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A construção de prédios urbanos numa região geograficamente isolada, descontínua e periférica da Europa acarreta sobrecustos e encargos extra. Efectivamente, a imprescindível aquisição de materiais provenientes do exterior faz-se à custa de fretes marítimos e operações de estiva com preços nada suaves.
Imperativos de justiça social tomam imprescindível a adopção de medidas específicas adequadas e razoáveis de nivelamento ao território continental em matéria de acesso à habitação nos Açore?, por forma que os obstáculos advenientes da nossa geografia sejam minimizados.
A aplicação, na Região Autónoma dos Açores, do imposto da sisa com a mesma base de incidência que vigora no continente acarreta tratamento desigual para cidadãos portugueses com iguais direitos a uma qualidade de vida socialmente digna.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na Assembleia Legislativa Regional dos Açores esta proposta de lei mereceu o voto favorável dos quatro grupos parlamentares, que também, nesta Câmara, estão representados. É chegada a hora de decidirmos o bom destino desta proposta de lei, acrescentando o nosso apoio.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Longe vão os tempos em que por essa Europa fora se pretendiam atenuar ou eliminar as disparidades regionais entre vários espaços geográficos, através de medidas de simples cariz administrativo e regulador, sempre incidentes nas consequências que não nas verdadeiras causas dessas disparidades.
Eram os primórdios da política regional europeia onde campeava um natural desconhecimento das motivações dos agentes económicos actuando no espaço e a avaliação ex ante dos instrumentos de política regional era ainda uma miragem.
Mas, felizmente, a experiência e os enormes erros cometidos foram bons conselheiros e hoje a política regional é quase uma ciência e, sobretudo, procura actuar sobre as causas como, de resto, se prova à evidência com as últimas directrizes comunitárias em matéria de política regional.
É uma pequena e ligeira introdução apenas pára posicionar o problema que hoje se encontra em debate.
Estamos perante duas iniciativas gémeas das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores, propondo à Assembleia da República uma efectiva redução dos valores da sisa a pagar por todos aqueles que comprem prédio ou fracção urbana de prédio destinado exclusivamente à habitação.
Pretendem, assim, como se costuma dizer, eliminar de uma «penada» o suposto diferencial de custos de construção entre as regiões autónomas e o continente, que seriam nunca inferiores a 35%.
É bem evidente que não iremos invocar para as assembleias regionais o desconhecimento da «ciência regional» moderna e da política regional comunitária. Já percebemos que esta questão é essencialmente política e como tal iremos tratá-la, partindo até da existência simultânea das ditas propostas gémeas no tempo, na forma e no conteúdo.
A matéria para reflexão é abundante e começaremos por perguntar onde se encontram os estudos que provam que os custos de construção de habitação acrescidos na Madeira e nos Açores são exactamente iguais para as duas regiões autónomas e nunca inferiores a 35%. Para decidir é necessário conhecer.
Caso a Assembleia da República venha a legislar sobre a questão tão concreta, os diferenciais dos custos de construção entre o continente e as regiões autónomas, abre-se, no mínimo, o precedente político para que outras áreas do país também reivindiquem para si descontos consideráveis no pagamento do imposto de sisa devido na compra de habitação. Tal afigura-se-nos inteiramente legítimo, para o que poderão invocar, ainda que porventura com diferente amplitude, os argumentos utilizados pelas assembleias regionais das regiões autónomas.
Todavia, existe uma questão que parece esquecida na fundamentação da proposta: trata-se da análise de uma estrutura de custos, ou seja, o preço final de venda da habitação é composto pelo preço do terreno e demais infra-estruturas gerais, pelo custo dos materiais, impostos, mão-de-obra e lucros.
Seria importante conhecer o comportamento destas variáveis e a sua variabilidade ao longo do espaço do conjunto do nosso país.
Só a título de exemplo se poderia referir que o custo do terreno pode variar entre 10 % e 25 % do preço de vencia das habitações.
Pensemos, agora, que em áreas saturadas, como é o caso de grandes espaços na área metropolitana de Lisboa, o preço do terreno assuma valores astronómicos que não podem deixar de repercutir-se no preço final. É necessário reflectir sobre este exemplo e outros, que facilmente se encontrarão se olharmos para o nosso País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como por certo se evidencia esta questão é complexa. Pensamos ter o dever de chamar a atenção para ela, na modesta convicção de que se não resolve de uma «penada».
Ao terminar, chamamos ainda a atenção de que uma medida, como a que se encontra proposta pode significar importantes reduções nas receitas municipais. Cabe-nos perguntar se as autarquias dos Açores e da Madeira foram ouvidas sobre esta matéria e se as assembleias regionais já encontraram algum mecanismo de compensação para essas reduções.
Parece-nos que estas propostas necessitam de uma análise e de um trabalho profundo em sede de comissão, caso esta Câmara opte por lhes dar acolhimento.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado Carlos Lilaia, se bem percebi da sua intervenção, V. Ex.ª manifestou alguma discordância em relação às propostas de lei provindas das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, designadamente porque elas poderiam constituir um precedente relativamente a outras regiões do País onde pudessem registar-se alterações de custos de construção.
Quero perguntar-lhe concretamente, em primeiro lugar, se essa circunstância ê impeditiva de um começo de correcção de desigualdade? Em segundo lugar, há comparação possível entre os factores que determinam o agravamento da construção nas regiões autónomas, que, como sabe. são variadíssimos e vão desde os custos de
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transporte, que não têm qualquer comparação com os das regiões mais do interior do País, designadamente em matéria de terrenos, pois as ilhas são reduzidas nos seus espaços e altamente povoadas, uma vez que têm uma densidade populacional bastante elevada?
Gostaria, pois, que explicasse se estas razões não são suficientes para a justeza destas propostas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Deputado Guilherme Silva, obviamente que como princípio geral e também como norma constitucional não tenho grandes dúvidas sobre a necessidade de se equacionar esta possibilidade de redução das taxas da sisa nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Aquilo que procurei fazer na minha intervenção foi, com grande humildade, manifestar o meu desconhecimento. e penso que também o de toda a Câmara, sobre as razões que levam a que, em simultâneo, se aplique o mesmo factor (1,35) à Madeira e aos Açores - pode ser uma coincidência, mas não sabemos se é ou não.
Por outro lado, gostaria de saber se a amplitude do factor de redução é esse ou outro. Procurei informar-me, mas não consegui encontrar nenhum estudo que estabeleça uma relação estreita entre os custos de construção nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores e os custos de construção noutras áreas do Continente. Por aquilo que se conhece relativamente a questões de índole particular, existem também espaços do território continental que sofrem bastante o problema dos custos agravados do preço final da habitação, seja por razões que têm a ver com os custos de construção específicos, seja por razões que têm a ver com custos agravados ao nível das infra-estruturas gerais e do próprio preço do terreno, como acontece no caso, que referi, das áreas metropolitanas e, provavelmente, de outras áreas congestionadas.
O alerta que lancei foi justamente no sentido de lermos presente que razões de justiça, relativamente a todo o território nacional, levam a que esta questão seja ponderada não apenas em relação às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, como parece ser de justiça, como também abrindo a possibilidade de esta questão ser equacionada quanto a outras zonas do território nacional. As observações que fiz não são, pois, no sentido de tornar impeditiva a aprovação de uma medida desta natureza. O meu partido, inclusivamente, vai votar favoravelmente estas propostas apresentadas pelas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Chamamos, porém, a atenção para a necessidade de esta questão ser convenientemente estudada. Como eu disse, estas questões não podem ser resolvidas de uma penada, afirmando-se categoricamente que o factor é de e não de 1,40 ou de 1,50.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em relação às duas propostas de lei em apreço, da iniciativa das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, gostaríamos apenas de explicitar a nossa posição de forma muita sintética, até porque a matéria já por várias vezes foi aflorada nesta Câmara.
Consideramos que as propostas apresentadas na Mesa são uma questão de justiça, já mais do que uma vez colocada nesta Assembleia. Para nós, o problema que se coloca é o de compensar em termos de insularidade, devido aos custos acrescidos da generalidade dos materiais e, em boa parte, da própria mão-de-obra, o que faz com que habitações com a mesma tipologia fiquem mais caras nas regiões autónomas do que no continente.
É evidente que se poderá colocar a questão: que valor? Porquê 35 %? Parece-nos que, devido à impossibilidade de se arranjar um número exacto e perfeito, os 35 % que foram utilizados são correctos, por terem pelo menos um ponto de referência, ponto de referência que é dado pelo Diário da República e que são os diferenciais dos preços de construção entre o continente e as regiões autónomas. Como já mais de uma vez tivemos oportunidade de referir -e, aliás, já o defendemos e propusemos noutras alturas-, parecem-nos correctas estas propostas. Nesse sentido, votá-las-emos favoravelmente.
O que não se compreende é o tempo que o Governo levou a concordar com estas propostas, peto menos até hoje-e esperemos que só ato hoje. Não se compreende, porque há uma razão de justiça, e não, do nosso ponto de vista, um privilégio, pelo que já há muito deveria ter sido feito o que agora se propõe.
Recordo, aliás, que a proposta da Assembleia Regional da Madeira entrou nesta Assembleia há um ano e cinco dias. É tempo demais, e foi tempo em que nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores se esteve, em termos relativos, a tributar em sisa mais os insulares do que os continentais (não gosto muito de utilizar estas expressões, mas neste momento elas tornam a questão mais clara).
Quanto ao projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, é matéria nova, à qual, embora também de forma breve, me gostaria de referir, dividindo o projecto em duas partes.
No que se refere ao imposto sobre sucessões e doações, é para nós claro que a simples análise da evolução dos valores cobrados em imposto sucessório mostra que cada vez mais a excepção neste imposto não é a evasão fiscal, mas sim o pagamento. Só excepcionalmente se paga imposto sobre sucessões e doações em Portugal. Na prática, só as pequenas heranças pagam efectivamente o imposto. As grandes heranças e transmissões gratuitas, aquelas que a justiça fiscal pretenderia fundamentalmente tributar, essas passam pelas grandes malhas da lei, pelos buracos, que a vontade política do Governo não pretende tapar, antes vai alargando.
Assim, o projecto de lei do Partido Socialista contém, em nosso entender, um conjunto de soluções que podem remediar de forma positiva a actual e inaceitável situação. É o que sucede, designadamente, com as propostas avançadas para a determinação do valor das partes sociais e dos créditos dos sócios e para obviar à prática corrente de fuga ao fisco pela transferência de patrimónios para sociedades anónimas familiares ou de simples administração de bens. Como refere o próprio projecto de lei, as soluções propostas não são perfeitas, mas, do nosso ponto de vista, valem mais soluções imperfeitas e com boa dose de eficácia do que a inexistência de quaisquer soluções, que caracteriza a situação actual.
Já no que concerne às propostas relativas ao imposto de sisa, as soluções preconizadas pelo Partido Socialista não nos parecem as mais adequadas. Temos dúvidas de que elas pudessem obviar aos inconvenientes ou às difi-
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culdades que hoje surgem no que respeita aos valores de tributação. A fixação de valores padrão de cada metro quadrado de área coberta, aos quais seriam aplicados coeficientes em função das áreas de localização, poderia simplificar o sistema actual, mas, em nosso entender, só aparentemente, porque as majorações ou minerações do valor padrão em função de parâmetros de qualidade de habitação implicam que cada prédio quase seja considerado um caso especial, sob risco de se cometerem profundas injustiças fiscais.
Nesta matéria, julgamos que o que se impõe, para além da urgente aceleração do processo do Código das Avaliações, é o rigor dos critérios e a aceleração dos processos de avaliação, que há muito tempo o Governo nos prometeu mas que até hoje ainda não deu sinais de vida. Estão à espera os milhares e milhares de trabalhadores da função pública ligados ao sistema fiscal, que seriam libertados do IRS, para virem reforçar o âmbito do Código da Sisa para as avaliações. Até hoje, nada disso, pelo menos em termos concretos, é visível.
De qualquer modo, a iniciativa e as intenções contidas no projecto do Partido Socialista são, do nosso ponto de vista, de apoiar. E julgamos que em sede de especialidade, se para tanto houver vontade política por parte dos outros grupos parlamentares, poderão obter-se consensos que melhorem a situação actual.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O estado de degradação e de injustiça a que se chegou na tributação sobre o património no ordenamento jurídico-fiscal português é algo gerador de injustiças, perante as quais os nossos governantes têm manifestado uma inexplicável passividade.
O imposto que, em Portugal, atinge o património é a sisa e o imposto sobre as sucessões e doações, imposto que, se fosse aplicado na sua plenitude, cumpriria cabalmente a função redistributiva de qualquer sistema fiscal numa sociedade civilizada, não desrespeitando os princípios constitucionais consagrados na nossa lei fundamental.
Infelizmente, a realidade é bem diferente das intenções, e hoje deparamos com uma situação de injustiça fiscal que nenhum português de boa-fé e com um mínimo de sentido de justiça pode calar por mais tempo.
No domínio da sisa, e depois do escândalo, de todos conhecido, que constitui o denominado «processo Cadilhe», com a aquisição do apartamento das Amoreiras, que o PSD foi célere na vontade de encerrar e que o Governo apadrinhou,...
Protestos do PSD.
... qualquer cidadão português tem o direito de se questionar quanto à sua lealdade e sinceridade para o cumprimento das suas obrigações perante este imposto. Estamos no ano de 1990 e já lá vai o tempo da «política do Frei Tomás», em que vale mais o que ele diz e menos o que ele faz.
Aliás, com naturalidade nos interrogamos: que moralidade tem um Governo para pedir a um cidadão que cumpra as suas obrigações no domínio da sisa, se é esse mesmo Governo que apadrinha processos ínvios de interpretação dos seus ministros que lhes permitem, sob uma aparência de legalidade, eximir-se do cumprimento das suas obrigações fiscais? Que moralidade tem um Governo para pedir aos cidadãos, que lutam por ter uma casa própria, que a partir de 6000 contos paguem sisa por essa habitação, se esse mesmo Governo antes permitiu que os seus próprios ministros adquirissem-e por que preço! - as suas habitações?
Gerou-se, pelas razões expostas e por muitas outras, uma situação deplorável em que se caiu num estado permanente de fraude, que o Governo, com a sua inércia, vem consentindo.
Os mecanismos existentes no domínio da sisa são, eles mesmos, um convite à evasão e, noutros casos, geradores de injustiças que urge, no mais curto espaço de tempo, colmatar.
É o que se passa com o funcionamento das comissões permanentes de avaliações existentes nas repartições de finanças, que em muitos casos se têm consubstanciado em serem objectos de pressão, ora dos contribuintes, ora da própria Fazenda Nacional.
No momento próprio formulámos a nossa crítica. Hoje mais do que nunca, pensamos que foi uma medida sem qualquer justificação a revogação do mecanismo da isenção para a aquisição de habitação, quer própria, quer para outros fins.
Desde há muito que o Partido Socialista vem manifestando, dentro desta Câmara e fora dela, uma atenção especial pelos assuntos fiscais, pois sabe quão de perto eles afectam a vida dos Portugueses. Dando corpo a essa preocupação, apresentou o Partido Socialista um conjunto de diplomas que visam, fundamentalmente, alterar as situações que, em nosso entender, estão manifestamente mal.
É nesse contexto que se integra o projecto de lei n.º 446/V, hoje em apreciação.
Permitam-me que de entre as diversas alterações por nós propostas saliente, em especial, o funcionamento do mecanismo da isenção para as habitações de valor até 8000 contos e a instituição de escalões fixos, muito mais suaves, para quem tem necessidade de adquirir habitação.
Comparando o sistema proposto com o sistema do Governo, para uma habitação de 15 000 contos haverá um desagravamento, na nossa proposta, da ordem dos 52 %.
Por outro lado, pensamos que é injusta e carece de justificação de estratégia económica a desprotecção que até hoje tem imperado para quem adquire qualquer imóvel com o objectivo de nele instalar uma actividade produtiva. No sistema actual, quando se adquire um prédio rústico paga-se 8% de sisa, independentemente de esse prédio se destinar à especulação imobiliária ou ao cultivo agrícola. Pensamos que é justo e se justifica proteger fiscalmente as aquisições de imóveis ou terrenos com destino a um processo produtivo. Daí o projecto de lei da partido Socialista prever, para essas aquisições, uma laxa reduzida de 2%, independentemente do seu valor.
Uma outra inovação no projecto do Partido Socialista prende-se com o mecanismo da determinação da matéria colectável. Abandona-se o princípio do valor patrimonial e, consequentemente, as avaliações a posteriori pelas comissões respectivas, optando-se por um sistema uniformizado e universal da fixação anual por parte do Governo de um valor padrão nacional, majorado ou minorado, de acordo com a qualidade da propriedade a transmitir.
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Pensamos que este processo se revelará mais justo e equilibrado, porque através do mesmo consegue-se sanear do processo de determinação da matéria colectável factores endógenos e exógenos que muito têm pervertido o sentido deste imposto, tendo sido, do nosso ponto de vista, os principais responsáveis quer de evasão e fraude, quer de abusos por parte das comissões de avaliações.
No que concerne ao imposto sobre sucessões e doações, a situação é muito mais grave. A situação actual é de flagrante injustiça. É o que acontece, por exemplo, com um humilde trabalhador que toda a sua vida poupou para construir, por exemplo, uma habitação para os seus, ou que tenha um pequeno campo que cultiva para alimentar a sua família; à sua morte, os herdeiros ver-se-ão a braços com um processo de imposto sucessório altamente penalizador, mesmo para pequenos valores, quando, em contrapartida, todos os dias fortunas fabulosas são transmitidas sem que paguem qualquer tostão de imposto.
A gravosidade das taxas e a irrealidade dos escalões do imposto sucessório são, elas mesmas, um convite para que se arranjem os mais sofisticados e perversos sistemas de fuga ao fisco.
Não pode, de maneira nenhuma, o Governo invocar desconhecimento de causa para justificar a sua inércia neste domínio. A leitura da capacidade económica deste imposto é tão evidente que não deixa qualquer margem para dúvidas. Entre 1971 e 1982, a arrecadação do imposto sucessório caiu de 1,61 % para 0,28 % das receitas fiscais arrecadadas, depois de haver representado 11,1 % em 1966.
Só o factor da inflação que se instalou na economia portuguesa, depois das datas invocadas, aliado à estagnação dos escalões, era motivo suficientemente justificativo para que se assistisse a um aumento e não a uma diminuição do peso deste imposto.
Pensamos que o mal não reside na má vontade do cidadão para cumprir, mas no sistema altamente penalizador para quem receba algo dos seus, por muito pouco que seja. Daí a criação dos mais diversos mecanismos de
O projecto de lei ora em apreço pretende acabar com este estado de coisas. Para tanto, começa por instituir escalões e taxas próximos da realidade e suportáveis para quem tem de cumprir as suas obrigações fiscais neste domínio.
Por outro lado, institui um mecanismo de determinação da matéria colectável para as acções, quotas ou partes sociais para efeitos de imposto sucessório que, do nosso ponto de vista, se revela capaz de alterar a evasão neste domínio actualmente em vigor.
Pensamos que, com a introdução deste mecanismo, se atenuará a injustiça fiscal existente e se consagra o princípio de «quem mais recebe mais deve pagar».
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não colhe mais, junto dos Portugueses, o malfadado argumento de que o Partido Socialista não tem ideias.
Apresentámos a esta Câmara um conjunto de novas ideias no domínio da fiscalidade. Algumas, que já aqui foram discutidas, tiveram o destino da força dos números, que foi a sua derrota.
As nossas ideias foram derrotadas, mas a nossa razão e a nossa luta não.
Possivelmente, uma vez mais os números vão valer mais do que a razão; no entanto, o País fica. uma vez mais, a saber que o PSD se enclausurou na sua própria verdade, em que já ninguém acredita e que já não serve a ninguém, a não ser ao próprio PSD.
Pela nossa parte, como sempre, estamos abertos e disponíveis para aceitar todas as propostas ou ideias que concorram para alterar a situação deplorável a que se chegou, porque entendemos que chegou o momento, em Portugal, em que os Portugueses nos conhecerão mais pelos actos e menos pelas palavras.
Aplausos do PS.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, as matérias fiscais são o cerne das democracias parlamentares como nós as conhecemos e este Parlamento e este Plenário são exemplo disso.
É devido à necessidade do cidadão controlar o que o Estado e o poder público fazem em matéria de impostos e como os aplica que nascem as democracias parlamentares e os parlamentos modernos com a pujança que nós conhecemos. Daí que é um direito e um dever de todos os membros dos parlamentos apresentarem as suas propostas nesta matéria, quer elas sejam boas ou más, e, neste caso, até estamos perante uma má proposta.
O que consideramos grave, Sr. Presidente, é que, a pretexto do debate deste projecto de lei do Partido Socialista, o Sr. Deputado Domingues Azevedo venha invocar com a expressão «escândalo da aquisição de apartamentos das Amoreiras», uma matéria que é sensível e que esta Assembleia já debateu, já discutiu, já analisou e sobre a qual já reflectiu à saciedade, tendo declarado não ter havido qualquer situação ilegal nem ilegítima nos factos que o Sr. Deputado Domingues Azevedo aqui, muito infelizmente, pretendeu invocar.
Sr. Presidente, de facto, consideramos que esta intervenção inicial do Sr. Deputado Domingues Azevedo em que invocou a imoralidade reflecte e repercute-se sobre ele próprio, porque, no fundo, a partir do momento em que a Assembleia deliberou sobre a matéria, é esta que está em causa nas insinuações que o Sr. Deputado acabou de referir.
Aplausos do PSD.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Domingues Azevedo pede a palavra para que efeito?
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, não percebi qual foi a figura regimental usada pelo Sr. Deputado Rui Carp para reagir à minha intervenção. De qualquer forma, desejaria usar a figura da defesa da honra depois da intervenção do Sr. Deputado...
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Carp fez uma interpelação à Mesa, pelo que agora não faz sentido um pedido de defesa da honra.
Contudo, o Sr. Deputado Domingues Azevedo, se assim o entender, pode inscrever-se para uma intervenção, efeito para o qual ainda dispõe de tempo.
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O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Nesse caso teria de gastar o tempo que foi distribuído ao meu partido!... E, na verdade, o que o Sr. Deputado Rui Carp fez foi uma intervenção!...
O Sr. Presidente: - Foi uma interpelação à Mesa e assim foi declarada... É óbvio que não foi uma... grande interpelação à Mesa, mas não vou estar a relançar uma questão que, aliás, é velha nesta Casa.
Srs. Deputados, são horas de procedermos às votações, pelo que continuaremos o debate desta matéria após as votações.
O Sr. José Lello (PS): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, compreendo as preocupações de V. Ex.ª no sentido de cumprir o horário, mas o que se verificou, e toda a gente se apercebeu disso, é que a interpelação à Mesa, que não foi muito «grande», como V. Ex.ª referiu, produzida pelo Sr. Deputado Rui Carp, foi claramente ofensiva. Ora, como o meu camarada de bancada se considera ofendido, tem todo o direito de defender a honra.
O Sr. Presidente: - Regimentalmente, não tem esse direito. Tem tempo para, se assim o desejar, fazer uma intervenção e fá-la-á depois de fazermos as votações.
Srs. Deputados, vamos passar ao período de votações.
Votaremos, em primeiro lugar, na generalidade, a proposta de lei n.º 130/V, que aprova o regime da actividade de radiotelevisão no território nacional.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: -Faz favor, Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, sem querer invocar aqui a precedência, penso que é óbvio que o projecto de lei do Partido Socialista é anterior à proposta de lei do Governo e, por isso mesmo, devia ser votado em primeiro lugar.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, neste caso não tem razão e, para isso, basta ver a maneira como as coisas se passaram na conferencia de líderes e até como foram atribuídos os tempos, para verificar que não tem razão sobre essa matéria. De resto, havia um pedido de baixa à comissão sem votação, por 30 dias, e entendeu-se trazer novamente o processo do Partido Socialista, que será votado a seguir. Esta é, portanto, a regra normal.
O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - É apenas para dizer que não concordamos com a opção da Mesa, mas, em defesa do bom andamento dos trabalhos, não vamos recorrer dessa decisão.
O Sr. Presidente: - Vamos votar, como disse, a proposta de lei n.º 130/V. na generalidade.
Submetida â votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP, de Os Verdes e do deputado independente Raul Castro e abstenções do PS, do PRD e do CDS.
Vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 457/V, do Partido Socialista, sobre o exercício da actividade da radiotelevisão.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e do deputado independente Raul Castro, votos contra do CDS e abstenções do PSD.
Há um requerimento apresentado pelo Partido Comunista Português, que já foi distribuído, relativo à baixa à comissão para apreciação das iniciativas legislativas relativas à radiotelevisão privada.
Todos os Srs. Deputados têm conhecimento do requerimento?
Pausa.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD. votos a favor do PS, do PCP. do PRD, de Os Verdes e do deputado independente Raul Castro e abstenções do CDS.
O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Da indicação que o Sr. Presidente deu sobre a natureza da proposta apresentada pelo PCP apenas se depreendeu que a mesma era no sentido da baixa à comissão. Penso que se tratava de um requerimento com outros pontos e penso, aliás, que o resultado da votação tem, sobretudo, a ver com esses outros pontos, na medida em que a baixa à comissão dos dois diplomas é, do meu ponto de vista, regimental e, portanto, não valeria a pena que houvesse, digamos, uma errada interpretação a este respeito.
O Sr. Presidente: - Julgo que não há interpretação errada sobre a matéria, pois se nós só fizemos a votação na generalidade!...
O Sr. António Filipe (PCP): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Filipe (PCP): - Depois da intervenção do Sr. Deputado António Guterres, quero precisar, enquanto proponente deste requerimento e dado que a baixa à comissão se pedia por os dois diplomas terem sido aprovados na generalidade, que este requerimento incidia sobre os termos em que se deveria processar essa apreciação, sendo precedida, naturalmente, da audição das várias entidades que são aqui propostas...
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o requerimento foi distribuído. É evidente que o projecto de lei e a proposta de lei baixam à comissão. Simplesmente, a metodologia proposta pelo requerimento 6 que foi rejeitada.
Srs. Deputados, vamos passar à votação na generalidade, especialidade e final global da proposta de resolução n.º 21/V, discutida no inicio da sessão de hoje, que aprova, para ratificação, o Protocolo Relativo à Adesão de Portugal e Espanha à União da Europa Ocidental.
Submetida â votação, foi aprovada, com votas a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e dos votas contra do PCP, de Os Verdes e do deputado independente Raul Castro.
Vamos continuar - e já não levará muito tempo- o debate que vínhamos a fazer sobre a discussão, conjunta e na generalidade, das propostas de lei n.º 87/V e 113/V e do projecto de lei n.º 4467V.
Embora seguindo uma ordem diferente, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, solicitei a palavra para formular duas interpelações à Mesa.
A primeira tem a ver com o Cacto de, há pouco, lhe ter pedido a palavra, igualmente para interpelar a Mesa, e V. Ex.ª não ma ter concedido, embora a tenha dado ao meu camarada de bancada José Lello. Provavelmente a Mesa não terá visto - é a única explicação que encontro...
A segunda interpelação que lhe pretendia fazer vai no sentido de que V. Ex.ª, visto que há pouco invocou o Regimento, me indique qual o dispositivo regimental que impede o meu camarada Domingues Azevedo de defender a sua honra, uma vez que se sentiu ofendido com uma intervenção, que o Sr. Deputado Rui Carp chamou interpelação à Mesa, onde o seu nome foi, além disso, invocado. Note-se, aliás, que não estou a tomar qualquer partido em relação a isso mesmo, mas apenas a dizer que o Deputado Domingues Azevedo se sentiu ofendido com a intervenção do Sr. Deputado Rui Carp.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, relativamente à sua primeira interpelação, é óbvio que a Mesa não viu o seu pedido de palavra, pois, de contrário, eu próprio lhe teria perguntado para que efeito a pretendia. De resto, se existisse aqui alguma discriminação, não teria concedido a sua palavra a dois colegas seus de bancada.
No que concerne à segunda interpelação, queria dizer ao Sr. Deputado que quanto ao uso da palavra para interpelações e a defesas de honra, essa é uma velha questão desta Casa que terá de ser resolvida.
Na realidade, o Sr. Deputado Rui Carp não fez. efectivamente, uma interpelação. No entanto, foi assim que ele lhe chamou e foi nesse pressuposto que lhe concedi a palavra. Por isso mesmo, para justificar um pouco toda esta situação, porque quem foi interpelada foi a Mesa (embora o não tivesse sido...), afirmei, ao reabrir os trabalhos, que alterava a ordem das inscrições, dando a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, por esse sistema e por essa sua interpretação, qualquer deputado podia obrigar uma bancada que não a sua a gastar o seu tempo. Na verdade, na interpretação de V. Ex.ª, o meu camarada só terá possibilidade de responder ao Deputado Rui Carp utilizando o tempo dele. Porém, o Deputado Rui Carp não utilizou o seu tempo, uma vez que fez uma interpelação!
Por conseguinte, não me parece que essa seja uma solução justa. A solução justa é a de que V. Ex.ª dê a palavra ao Sr. Deputado Domingues Azevedo para que possa defender a sua honra, seguindo depois o processo normal.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apesar de todas as considerações feitas, a Mesa tem sido sempre bastante razoável na gestão dos tempos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Rui Carp, disse V. Ex.ª que fui infeliz na intervenção que fiz, mas penso que V. Ex.ª foi mais infeliz na interpelação que fez.
Estou de acordo em que algumas sombras que VV. Ex.ªs carreiem constituam um peso. Porém, assumam-no! O que se passou ao nível da interpretação das leis sobre a sisa foi um autêntico escândalo! Denunciámo-lo na altura própria! Quer queira quer não, Sr. Deputado Rui Carp, a interpretação que vingou teve o apadrinhamento do Governo - não há dúvidas quanto a isso! Não fiz outras afirmações a não ser essa e uma outra: que o PSD foi célere em querer encerrar esta comissão.
Qualquer uma destas afirmações é verdadeira, e não vejo onde a sua honra possa ser ferida. Se V. Ex.ª entende que são um peso muito elevado para o Grupo Parlamentar do PSD, pois terão de suportá-lo, uma vez que foi o seu próprio Governo que o apadrinhou.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Rui Carp (PSD): - Para exercer o direito de resposta. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Carp. eu dei a palavra ao Sr. Deputado Domingues Azevedo para uma intervenção. Assim, pergunto-lhe, mais uma vez, para que fim é que pretende usar da palavra...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Domingues Azevedo referiu-se à minha pessoa, insistindo, de forma extremamente infeliz, com as graves acusações a companheiros meus de partido e ex-colegas de Governo. Portanto, era neste âmbito que queria responder ao Sr. Deputado Domingues Azevedo, se possível utilizando a figura do direito de resposta ou, então, a da defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem duas alternativas: ou pede esclarecimentos ao Sr. Deputado Domingues Azevedo ou pede a palavra para defesa da honra e da consideração...
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O Sr. Rui Carp (PSD): - Peço então a palavra para a defesa da consideração, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, os factos são aqueles que conhecemos e que se encontram registados no Diário desta Assembleia!...
Na verdade, a Assembleia apreciou e deliberou; a Assembleia foi, sobre essa matéria, completamente elucidada e exerceu o direito democrático de considerar ilibada a pessoa em causa.
Por conseguinte, o Sr. Deputado não tem o direito de pôr em causa essa pessoa e muito menos o Grupo Parlamentar do PSD. E que o Sr. Deputado esquece-se de que, quando uma assembleia delibera, todos ficam vinculados a essa deliberação.
Fale de imoralidade, Sr. Deputado, mas não se refira a isso! Na verdade, há outras coisas que sucederam em administrações passadas e, portanto, não fale muito de impostos, pois, em matéria de evasão fiscal, conhece-se o que sucedeu no passado...!
Vozes do PSD: - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, apesar de pensar que o que se está a passar neste momento começa a perder algum sentido, gostaria de dizer que não afirmei nenhuma inverdade. Com efeito, o que disse foram coisas verdadeiras, pois tive oportunidade de pertencer a esta comissão...
Vozes do PSD: - É a sua verdade! Não é a do Parlamento!
O Orador: - Não digo que é a vossa! É a minha verdade!
O Sr. Deputado Rui Carp falou no passado. No entanto, lembrava-lhe apenas uma coisa no domínio do que V. Ex.ª utilizou para defender a honra: desde a reforma do sistema fiscal levada a cabo por Teixeira Ribeiro que não há, no País, tradição histórica daquilo que se passou com a questão em apreço! Daí tire V. Ex.ª a resposta!...
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, penso que todos comungamos da opinião de que, efectivamente, os momentos que antecederam a sua presença na Mesa não foram regimentalmente os mais correctos. Assim, gostaria de dizer que a bancada do PS, tendo aceite o desenrolar prático das coisas como ocorreram, não fica, porém, comprometida com a interpretação que resultou da intervenção do Sr. Presidente, uma vez que a mesma teria um efeito altamente perverso.
Na verdade, qualquer pessoa que pretendesse insultar alguém de outra bancada sem estar sujeita ao direito de resposta ou à defesa da honra por parte da pessoa que insultava, limitar-se-ia a utilizar a figura da interpelação, podendo assim dizer as maiores diatribes. Note-se, contudo, que não estou a fazer esta interpretação relativamente à intervenção do Sr. Deputado Rui Carp. Com efeito, estou a falar em termos genéricos, sendo possível que sucedesse este tipo de situação perversa.
Penso que toda a gente percebeu que desta vez houve um mau uso do Regimento. Portanto, repito, o facto de termos aceitado agora esta situação não significa que dela comunguemos e que a ela fiquemos amarrados.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apenas lhe devo dizer que é frequente neste hemiciclo fazer-se um mau uso da figura da interpelação à Mesa, o que coloca muitas vezes a Mesa em situações difíceis. Foi o que se passou neste momento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Belarmino Correia.
O Sr. Belarmino Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Em 28 de Julho de 1988 deu entrada na Comissão de Economia, Finanças e Plano um projecto de lei do Partido Socialista a que foi dado o n.º 296/V - Reforma da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.
Em 9 de Agosto de 1989 é publicado, no Diário da República, o Decreto-Lei n.º 252/89, que trata daquela matéria.
Em 18 de Novembro de 1989 é publicado no Diário da Assembleia da República o projecto de lei que hoje discutimos e a que foi dado o n.º 446/V.
O Partido Socialista retoma, portanto, neste novo projecto, a matéria contida no seu projecto inicial e no decreto-lei citado.
Fazemos esta apreciação cronológica para frisar que, entre o primeiro e o segundo documentos apresentados pelo Partido Socialista, detectámos algumas, embora significativas, alterações, coincidentes, por via de regra, com matérias que foram objecto da recente revisão do regime da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações, operada através do supracitado decreto-lei. A título de exemplo: o artigo 26.º não existia no projecto inicial e, bem assim, as alterações aos escalões e às taxas do imposto sobre as sucessões e doações (artigo 40.º).
O Partido Socialista, num curto espaço de tempo, mostra assim a instabilidade e insegurança de pensamento que lhe são peculiares, com a agravante de se tratar de matérias importantes como as que hoje discutimos e sobre as quais seria de esperar, como é óbvio, entendimentos isentos de dúvidas ou, o que é o mesmo, devidamente ponderados.
Como resulta da leitura do preâmbulo do projecto de lei do Partido Socialista, notamos que são feitas grandes críticas e são referidas grandes soluções. Só que, da análise do articulado, verificamos que ele se limita, no essencial, a alterar os limites base da isenção, a baixar as taxas e, finalmente, a propor algumas alterações na quantificação do valor dos imóveis e das partes sociais. Convenhamos que, para tão grandes propósitos, é muito pouca a matéria de fundo sobre a qual se debruça o conteúdo do projecto.
No que respeita concretamente à matéria não objecto das recentes alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 252/89, de 9 de Agosto, afirma-se que há «simulação generalizada e escandalosa dos preços para efeito de sisa».
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Para combater esta simulação é proposto um agravamento de 20% a 50% da sisa que for devida (artigo 158.º-B), nos casos da indicação inexacta dos elementos relativos aos prédios.
Porquê este agravamento? Será que o objectivo que esteve na base da propositura dessa metodologia foi o de sancionar mais duramente a prática da simulação? A ser assim, surge então oportuno questionar se, em boa técnica legislativa, não seria mais adequado ajustar as multas já aplicáveis, no pressuposto adquirido (pelo menos para os subscritores do projecto) de que essa adequação não existe já-opinião de que obviamente não partilhamos.
Por outro lado, como os preços são simulados, propõe-se a tributação do valor sem ter em conta o preço. E para determinar o valor, estabelece-se um regime de avaliação, perfeitamente desfasado do valor patrimonial, para efeitos de contribuição autárquica e do imposto sobre os rendimentos.
Ataca-se ainda «a fuga incontrolada do imposto sobre o dinheiro e depósitos bancários». Como solução, propõe-se a isenção.
Ataca-se o facto de o imposto sucessório não tributar as médias e as grandes fortunas. No entanto, aponta-se para a utilização de mecanismos de despersonalização da tributação em situações similares, nomeadamente no caso das participações sociais.
Ataca-se a complexidade dos processos e o tempo de demora para os resolver. Como solução, institui-se um regime casuístico de determinação do valor dos imóveis, processo ainda mais moroso e complexo.
Entendemos que não será de boa técnica prever mecanismos de determinação do valor dos imóveis no Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, quando está em fase de aprovação o Código das Avaliações, instrumento ideal e necessário para uniformizar as regras de avaliação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - No artigo 30.º não se faz qualquer distinção entre a sisa e o imposto sobre as sucessões e doações. Contudo, esquece-se que a sisa é, em regra, paga antes da transmissão (princípio da liquidação prévia, consagrado no artigo 47.º), ao que acresce que um conhecimento de sisa pode valer pelo prazo de um ano, durante o qual pode ser feita a escritura.
É essa a razão pela qual a redacção em vigor do referido artigo 30.º prevê que deva ser tomado o valor da data de liquidação. Aliás, só assim é possível comparar o preço declarado com o valor patrimonial dos imóveis.
A alteração dessa regra implicaria um mecanismo de actualização das liquidações nos casos em que houvesse variação dos valores, o que tornaria ainda mais pesada, senão mesmo impraticável, a administração do imposto.
Propõe-se ainda no projecto que os imóveis destinados a actividades produtivas de natureza comercial, industrial, de prestação de serviços, agrícola, silvícola ou pecuária sejam tributadas à taxa de 2% (artigo 33.º, n.º 2). Convenhamos que para um projecto que ataca a falta de progressividade e a circunstância de as maiores fortunas não serem adequadamente tributadas é totalmente contraditório propor uma taxa proporcional que, por princípio, tanto abrange as pequenas como as grandes propriedades.
Estabelece-se ainda que os imóveis desviados dos fins referenciados no prazo de cinco anos serão tributados pelas taxas normais (artigo 33.º, § único). E o que é que acontece se o adquirente, que bem beneficiou daquela taxa, vender o prédio antes dos cinco anos e for o novo adquirente que altera o seu destino?
Importava então prever a regulamentação adequada para as situações que pudessem ocorrer, o que não foi feito.
Também consideramos que o artigo 49.º, § 6.º, além de violento, é bastante indefinido. Na realidade, fica por saber o que são prédios total ou parcialmente desabitados. E se estivessem afectos a outras actividades?
Incluem-se os prédios demolidos. Mas, é evidente que os prédios demolidos são já considerados como terrenos para construção.
Por outro lado, se alguma medida houver a tomar, ela prende-se com a exclusão da tributação dos terrenos para construção, com vista a desonerar a construção de casas para habitação. Ao contrário, propõe-se aqui um agravamento dessa situação.
A evasão fiscal que, eventualmente, se verifica nestas áreas é também comum a outros impostos.
A recente entrada em vigor da lei referente às infracções fiscais não aduaneiras e o anunciado Código de Processo Tributário inserem-se no objectivo geral de combate à evasão nas vertentes que pode assumir, a par de um reforço das garantias dos contribuintes.
Pelo que ficou dito e pela análise que fizemos do documento apresentado, poderíamos apontar muitos mais casos que evidenciassem a fragilidade e as deficiências do projecto de lei em apreço. Aliás, este projecto parece ter em vista corporizar, no que tem de fundamental, uma crítica ao Decreto-Lei n.º 252/89, de 9 de Agosto. No entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este decreto-lei traduz tão-só, como é evidente, uma mera actualização de alguns aspectos do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.
A administração fiscal deve, é certo, proceder ao aperfeiçoamento constante de toda a disciplina fiscal, tendo em vista a existência de um ordenamento jurídico fiscal, harmonioso e equilibrado. Nessa linha de entendimento, é sabido que o Governo se prepara para proceder a uma revisão mais profunda do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações que - é lícito esperar - não se atenha, como o presente projecto, ao enunciado de críticas, ao estabelecimento de mais benefícios e, ainda, à definição de princípios desprovidos de qualquer conteúdo útil.
Finalmente, no que respeita às alterações de vários preceitos do diploma, ditadas pela pretendida conveniência de não esperar mais pelo Código das Avaliações, consideramos que, a benefício da desejável harmonia do sistema, elas deverão ser ajustadas, em termos de filosofia e de oportunidade, com os trabalhos que neste domínio o Governo tem vindo a desenvolver.
Por tudo isto, consideramos que o presente projecto de lei, desenquadrado da reforma fiscal global em curso, é contrário aos princípios definidos por ela, pelo que entendemos dever votar contra o projecto de lei n.º 446/V.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Carneiro dos Santos e Domingues Azevedo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Deputado Belarmino Correia, quero colocar-lhe as seguintes quês-
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toes: disse V. Ex.ª que o projecto de lei do Partido Socialista, em matéria de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, é um projecto que vem trazer o casuísmo à tributação.
Creio que V. Ex.ª não leu bem o nosso projecto, porque, de facto, se há casuísmo é na lei actualmente em vigor, pois, como V. Ex.ª sabe, no nosso projecto, prevemos, inclusivamente, a definição de valores padrão para a construção e outras situações. Portanto, nós queremos, de facto, acabar com a discricionariedade do Estado e da administração fiscal e, de maneira nenhuma, o nosso projecto vem beneficiar o casuísmo.
E curioso - e esta era uma questão que lhe queria colocar também - que defendemos esta posição porque ainda não há Código de Avaliações. E o Sr. Deputado sabe muito bem - e o Sr. Secretário de Estado também sabe porque está presente-, que quando discutimos a reforma fiscal o Sr. Secretário de Estado dizia: «Bem, os trabalhos para a elaboração do Código de Avaliações vão em muito bom ritmo e muito brevemente teremos um Código de Avaliações». O que é facto é que já passou ano e meio após a reforma fiscal e ainda não temos Código de Avaliações. E é evidente que a sua existência constituía a situação ideal!...
Mas para quando o Código de Avaliações? Será que o Sr. Deputado já poderá dar essa informação?
Quanto à outra questão que colocou, parece ter ficado um bocadinho admirado com a proposta que fazemos em relação ao artigo 158.º-B do actual Código. Então o Sr. Deputado considera que se um contribuinte presta falsas declarações, para efeitos de alienação de um bem, não deve ser penalizado?
O Sr. Vilela de Araújo (PSD): - As penalizações já constam do Código!
O Orador: - Considera que ainda deve ser beneficiado por prestar falsas declarações? Não consigo perceber, sinceramente, a crítica que quis fazer ao nosso projecto!...
Por último, quanto ao imposto sucessório, V. Ex.ª disse coisas curiosas. Na primeira - não sei se entendi bem - parece-me que defendeu as sociedades de administração de bens.
Ora bem, para V. Ex.ª o importante é, realmente, constituírem-se essas sociedades de administração de bens e, por essa via, fugir, autenticamente, ao imposto da sisa. Isto é: por essa via morremos na paz do Senhor e não se paga qualquer imposto. Porém, o desgraçado que tem uma pequena courela, ou um edifício, ou um depósito a prazo, que não foi capaz de desmobilizar, vai pagar. Não entendo o seu critério de justiça!...
Por último, gostava que me esclarecesse sobre o sentido da expressão «a evasão é comum a outros impostos», que acabou de proferir, tendo em vista que o Sr. Secretário de Estado vem, aqui, dizer que não há evasão, que há uma grande eficiência da máquina da administração fiscal. Ora, V. Ex.ª vem dizer que a evasão é comum a outros impostos! Quais? Explique, porque eu gostava de saber.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Belarmino Correia deseja responder já ou no final?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Belarmino Correia, ouvimos V. Ex.ª arrolar todas as deficiências que encontrou no nosso projecto de lei, tendo, contudo, omitido as da situação actual. Tenhamos, pois, a coragem de compará-las.
Sobre a determinação da matéria colectável no domínio da sisa, V. Ex.ª sabe como se determina o seu valor? Actualmente, como sabe, o valor rendimento colectável não existe mas, sim, o valor patrimonial a partir das matrizes, actualizado pelo trabalho das comissões de avaliação, comissões de avaliação essas que, por vezes, são alvo fácil de pressões escandalosas, quer por parte de quem adquire quer, em algumas situações, por parte da própria Administração.
O Sr. Vilela de Araújo (PSD): - Para evitar isso, é que as comissões são constituídas por representantes das partes!
O Orador: - Sr. Deputado Vilela Araújo, também sei como se determina o valor e é, exactamente, como acabo de dizer.
A segunda questão refere-se à desactualização das matrizes dos nossos prédios, pois, como V. Ex.ª sabe, os valores constantes das matrizes são perfeitamente irreais e, no entanto, estamos a servir-nos desses valores para fazer a liquidação para os prédios rústicos porque, neste caso, não há comissões de avaliação que cheguem, dada a sua ocupação nos terrenos para construção e para algumas situações de prédios urbanos, que constituem inscrições novas nas matrizes.
Não digo que o valor padrão, no domínio da gestão deste imposto, seja a melhor fórmula encontrada, mas quando comparamos o funcionamento deste imposto e remetemos para o documento base de regulação desta matéria, que é o Orçamento do Estado, quando remetemos para o Governo, que tem obrigação de conhecer a situação económica, porque fundada no próprio Orçamento do Estado, e lhe pedimos que fixe estes valores padrão, e que os majore ou que os minore em função da qualidade da habitação, e que os aumente ou que os diminua em função da localização do prédio, pensamos que este processo é muito mais isento de quaisquer pressões e que, na verdade, tem a virtude de ir, sistematicamente, acompanhando a evolução do próprio valor.
Por isso, em termos de comparação, V. Ex.ª fez nada; comparação estou a fazê-la eu, agora! Os «negativos» que V. Ex.ª encontrou, quando comparados com a situação actual, são muito menores do que os desta minha comparação.
Diz, ainda, V. Ex.ª que este processo aparece desenquadrado da reforma fiscal em curso. Lembro-lhe que a reforma fiscal começou, em Portugal, em 1986, com a tributação indirecta do IV A, e completou-se, em 1989, com o imposto sobre o rendimento de pessoas singulares. Pergunto, portanto, onde está a reforma do imposto sobre o património. É que esta não existe e, por isso, é que nós queremos reformar os processos e os preceitos.
Tenho pena de não dispor de mais tempo porque, com certeza, V. Ex.ª, no fim, teria pensar diferente daquilo que expôs.
O Sr. Belarmino Correia (PSD): - No final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Belarmino Correia.
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O Sr. Belarmino Correia (PSD): - Passarei a responder, de imediato, aos dois Srs. Deputados que me interpelaram.
Srs. Deputados, na minha intervenção tive, somente, a intenção de apontar as deficiências que achei mais importantes para justificar que, de facto, o vosso projecto de lei, neste momento, não é oportuno porque a publicação do Código de Avaliações -e o Sr. Deputado Carneiro dos Santos admitiu até «que se esperava com grande ansiedade o Código de Avaliações»- vem resolver, em princípio, muito assuntos que estão a ser debatidos, que constam do projecto de lei e que, inclusivamente, constam do decreto-lei em vigor.
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - E é verdade!
O Orador: - E, por informação colhida junto da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, sei que os trabalhos estão bastante adiantados e em vias de se iniciar a sua redacção.
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Para o ano 2000!
O Orador: - Quanto ao artigo 158.º-B e sobre as taxas que foram apontadas pelo Sr. Deputado Carneiro dos Santos, devo dizer que, de facto, não concordo com os limites de 20 %-50 % de taxa, o que até me parece inconstitucional. Embora ainda não tenha feito averiguação neste sentido, deixo, contudo, este alerta.
Quanto à evasão fiscal, é evidente que ela é notória em todos os impostos. Considero, porém, que há dois tipos de evasão: a que se pode conseguir através da interpretação da lei e, portanto, enquadrar-se no texto legal, e a fraude. Esta é que, de facto, devemos combater!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não evasão, mas lei de malhas largas!
O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira sabe que juridicamente é assim!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pôr ser a primeira vez que intervenho nesta Assembleia, seja-me permitida uma saudação cordata a todos os Srs. Deputados e, igualmente, uma saudação efusiva da Região Autónoma dos Açores.
Vou, numa brevíssima intervenção, dar a conhecer a posição do meu partido acerca das propostas de lei n.ºs 113/V, da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, e 87/V, da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.
Srs. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nas jornadas parlamentares que o Partido Socialista realizou em Ponta Delgada, Região Autónoma dos Açores, em Março de 1989, tomou o PS a iniciativa de propor uma redução da incidência das taxas da sisa sobre a transacção de prédios urbanos.
Tal proposta foi no sentido de adaptar o imposto da sisa à realidade, quer dos Açores quer da Madeira, onde os custos de construção são superiores em, pelo menos, 35%. Aliás, esta ideia já hoje foi, aqui, bastas vezes referida e acho que com unanimidade.
As Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira vieram, mais tarde e por unanimidade, tomar idêntica posição, pelo que se encontram em discussão, no Plenário da Assembleia da República as supracitadas propostas.
Serenamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esperamos que estas propostas venham a merecer a aprovação da maioria parlamentar, dado serem de inteira justiça e, desde já, adiantamos que, pela nossa parte, votá-las-emos favoravelmente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A reforma do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações é um dos aspectos mais complexos do actual sistema fiscal, em que tais impostos constituem uma das bases da tributação patrimonial.
A louvável iniciativa de, com celeridade, obviar à presente iniquidade do sistema de tributação do património não deve, porém, deixar de basear-se em estudos e análises que, com cuidada ponderação, possam conduzir a uma situação de maior justiça e rigor técnico.
No projecto de lei n.º 446/V, apresentado pelo PS, encontra-se, com bastante clareza e rigor, diagnosticada a presente situação na área de tributação do património.
O preâmbulo do documento evidencia bem a situação a que se chegou numa área que, por definição, deveria contribuir para a melhoria da progressividade do sistema fiscal português, excessivamente centrado - e nisso se afastando das tendências europeias comunitárias - na tribulação de bens e nos rendimentos do trabalho dependente, e em que a tributação do capital é, fundamentalmente, efectuada a taxas proporcionais, quando o é!
As soluções propostas, algumas das quais apresentam um «radicalismo)» em termos técnicos de que não se possui experiência adquirida, colocam a problema de, ao, louvavelmente, se pretender melhorar, se chegar a situações de menos ponderação, de excesso de doseamento no tratamento do mal e de incoerência, tanto do ponto de vista formal como técnico, cujos efeitos económicos a prazo se desconhecem ou subalternizam.
Neste caso estão, por exemplo, medidas propostas na determinação do valor dos imóveis - artigo 19.º -, das partes sociais, das acções das sociedades de simples administração de bens, etc., cujos estudos e análises, que lhe estão subjacentes, se desconhecem numa área, muitas vezes, tão delicada e em que os agentes económicos são particularmente sensíveis.
Nessa medida, não será mais ponderado encontrar apoios na legislação e opções dos nossos parceiros comunitários que, salvaguardando os interesses e opções nacionais, possam aproximar-nos, também na área de tributação patrimonial e no combate à evasão e fraude fiscal, daquilo que de melhor se vai fazendo nesses países?
É que, não o esqueçamos, num mundo cada vez mais interpendente, a mobilidade do capital é crescente e medidas expeditas, mas pouco ponderadas, podem conduzir a efeitos contrários aos pretendidos.
Não se deverá esquecer, igualmente, que tais impostos constituem fonte de receita autárquica e que, como tal,
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também deverá ser equacionado o impacte financeiro da medida.
Aspectos há em que, igualmente, o projecto de lei se terá deixado levar por um excesso de zelo prossecutório, já presente em anteriores projectos do PS relativos aos direitos e garantias dos contribuintes - referimo-nos, por exemplo, ao disposto no artigo 56.º do projecto, em que se permite o agravamento até 50% do montante de sisa devida, quando se mostrarem improcedentes, total ou parcialmente, as razões invocadas pelo contribuinte, que será fixado pelo respectivo director de finanças. Aqui, não só se põe em causa a própria utilização do direito de recurso por parte do contribuinte como, embora se compreenda a intenção de aliviar a administração fiscal do expediente do contribuinte ao recurso sistemático, como se penaliza, de modo excessivo, o contribuinte e se aumenta a discricionariedade do director de finanças.
A proposta do artigo 188.º é das que merece análise e estudo mais cuidado, o que, pela complexidade e transformação que dela deriva face à situação vigente, se toma quase impossível fazer de forma apressada, o mesmo acontecendo com a do artigo 180.º, sobre o tratamento das sociedades de simples administração de bens.
Em resumo, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, estamos em presença de uma iniciativa que merece a nossa simpatia, mas que requer, ainda, em nosso entender, um trabalho ponderado e profundo em sede de Comissão.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando o projecto de lei apresentado pelo PS chegou ao meu Gabinete determinei que o mesmo fosse examinado por três especialistas.
Um dos pareceres termina assim: «Em suma, este projecto tem propostas boas e propostas originais, só que as originais não são boas e as boas não são originais,...
Risos do PSD.
... com a agravante de serem de difícil exequibilidade por falta de sentido prático.»
O Sr. António Guterres (PS): - Essa citação é do Professor Marcello Caetano, e não é boa!
O Orador: - Há pouco, o Sr. Deputado Domingues Azevedo disse que o PS era acusado de não ter imaginação, ora eu penso que isso é uma pura mentira: o PS tem larga imaginação, tem ideias, simplesmente o que não tem são ideias boas, consistentes, que sirvam os interesses do País.
Achei graça a este remate, que, sendo, apesar de tudo, uma nota quase de humor, ameniza a falta de valia técnica do projecto.
Mas, Srs. Deputados, devo confessar que como cidadão fiquei preocupado! É que se trata de um projecto de lei apresentado por um partido que pretende posicionar-se na cena política portuguesa como alternativa ao Governo. Ora, por um lado, tal desejo é compreensível e saudável em democracia, mas, por outro, é já lamentável que se manifeste uma tal ansiedade e se apresente, numa área tão delicada, um trabalho tão falho de substância.
Quando se lê, descuidadamente - e sublinho esta expressão -, o preâmbulo fica-se com a ideia de que algo vai surgir com sentido inovador e consistente. Sublinhei, com intenção!, a expressão «descuidadamente», porque, na verdade, o preâmbulo é um rosário de críticas e quando assim se procede num projecto é porque de seguida se preconizam soluções bem fundadas e dirigidas a ultrapassar os problemas levantados.
Srs. Deputados subscritores do projecto de lei, isto de mexer em qualquer normativo fiscal não é trabalho de part-time, nem pode ser desenvolvido com amadorismo. O projecto de lei apresentado limita-se, no essencial, a alterar os limites da base de isenção, a baixar as taxas, obviamente!, e a propor alterações na quantificação do valor dos móveis e das partes sociais. Em suma, é isto: este projecto de lei não é dirigido à resolução da maioria dos problemas subjacentes às críticas que se fazem no preâmbulo e promove outras em cadeia.
Vejamos a incongruência de algumas das soluções, com o seguinte exemplo: afirma-se, a dada altura, no texto do projecto de lei que há uma «simulação generalizada e escandalosa dos preços para efeitos de sisa». Ora, para combater esta simulação é proposto um agravamento de 20 % a 50 % do montante da sisa nos casos de indicação inexacta dos elementos relativos aos prédios.
Qual a natureza deste agravamento? É uma multa pela infracção por não terem declarado correctamente o valor? Se o é - e não vejo que possa ser outra coisa -, então, verifica-se uma duplicação com a multa que a lei geral prevê no capítulo das penalidades. Ou será que este agravamento reveste, afinal, uma natureza indemnizatória? Neste caso deve seguir obrigatoriamente as regras do imposto. Será que alguém conhece um regime fiscal que permita a fixação de uma taxa entra limites? Não!, mas, independentemente de qualquer recurso ao direito comparado, isto seria uma inconstitucionalidade monumental, Srs. Deputados!
Em todo o caso, a incoerência e os atropelos da legalidade não ficam por aqui! Como os preços são simulados (é isso que se diz), a solução é fácil: deixa de ter-se em conta o preço e tributa-se o valor. Mas que valor? Para determinar o valor recorre-se a um regime de avaliação mas esquece-se que o valor patrimonial é a base da contribuição autárquica e dos impostos sobre o rendimento (categoria G - mais-valias). Ora, se o valor é diferente, então o que é que está errado? É o valor patrimonial para aqueles impostos ou para a sisa nas transacções? Em que ficamos? Como actuamos?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Gostaria de referir um outro exemplo: no projecto de lei apresentado pelo PS ataca-se a fuga do imposto sobre os dinheiros dos depósitos bancários. A solução apresentada também é fácil e assenta na «isenção dos dinheiros dos respectivos depósitos em instituições de crédito», sem cuidar de dissecar a confusão que se faz entre isenção e não sujeição, pelo que temos de reconhecer que não se trata de solução fácil, mas, sim, primária.
Mais um exemplo: ataca-se a falta de progressividade, dando-se como situação típica a tributação proporcional por avença, considerada completamente errada e até inconstitucional. No entanto, propõe-se que os imóveis destinados a actividades produtivas de natureza comercial, industrial, de prestação de serviços, agrícola, silvícola ou pecuária sejam tributados à taxa de 2%, pouco importante que se trate de uma pequena courela de uma aldeia do
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interior ou de uma grande herdade do sul ou das terras ricas da lezíria do Tejo.
Srs. Deputados, este projecto de lei, à semelhança de outros que o PS tem apresentado, tem muito pouco por onde se lhe pegue, muito poucas virtualidades!
Reconhecemos que o Código da Sisa e o do Imposto sobre as Sucessões e Doações precisa de ser revisto e que o pequeno toque que se lhes deu, através do Decreto-Lei n.º 252/89, foi mais no sentido de aliviar a carga fiscal do que no sentido da sua revisão. A este propósito, gostaria de referir que está em curso uma revisão profunda desse Código e, logo que concluídos os trabalhos necessários, o Governo dar-lhe-á sequência, solicitando a esta Câmara a adequada autorização legislativa para, então sim, rever profundamente o referido Código, que é, ainda hoje, uma «peça» jurídica de grande envergadura, embora desajustada no plano prático -e reconhecemo-lo! - face à evolução acelerada da sociedade nos tempos de hoje.
Quanto ao Código das Avaliações, Sr. Deputado Domingues Azevedo, Código que resolve os problemas com soluções rebuscadas mas sem aderência à realidade, já está pronto e em fase de testes intensivos e, a seu tempo, seguirá a tramitação que conduzirá à sua aprovação.
Gostaria de referir, Sr. Deputado, que fazer um Código de Avaliações não é tarefa fácil; é, sim, extremamente penosa e árdua, pois é preciso ensaiar profundamente todo o sistema-e não se esqueça, Sr. Deputado, que há 20 milhões de matrizes que têm de ser ensaiadas!
O Sr. Rui Carp (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Nós não vamos fazer um trabalho desta envergadura sobre o joelho mas, sim, testar caso por caso, concelho por concelho, para verificar se a solução é ou não justa em termos sociais.
Aplausos do PSD.
O novo edifício fiscal está em marcha, em boa marcha, que não é exagerada como temos vindo a demonstrar pela forma eficaz da sua aplicação prática. O que falta deverá, muito provavelmente, ultimar-se até ao fim do corrente ano, sem prejuízo de, continuadamente, nos esforçarmos pelo seu aperfeiçoamento constante.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, começo por dizer-lhe que V. Ex.ª é uma pessoa cheia de sorte, porque fez uma afirmação, no início da sua intervenção, de extrema gravidade, só que tem a sorte de nesta altura já não estar na Sala grande parte dos órgãos de comunicação social que costumam acompanhar os nossos trabalhos.
É que V. Ex.ª deu o maior testemunho da fragilidade dos seus consultores quando não foi capaz de encontrar nos pareceres que lhe deram algo mais importante do que a simples citação de uma frase que, aliás, já foi utilizada pelo Professor Marcello Caetano, em devido tempo, que nada diz e é vazia de conteúdo...
Vozes do PSD: - Essa afirmação não era do Marcello Caetano!
O Orador: - Portanto, se são estes os consultores que tem, é melhor mudá-los!...
Risos do PS.
De qualquer modo, penso que essa citação foi utilizada por Marcello Caetano, embora não saiba se era ou não originariamente sua... Provavelmente era de Petrarca, Dante ou de outro qualquer, mas posso garantir-lhe que ela foi citada por Marcello Caetano.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Arquimedes é que utilizou pela primeira vez essa expressão!
Risos do PSD.
O Orador: - A segunda observação que quero fazer-lhe é a de que, e isto é do conhecimento da opinião pública, o projecto de lei apresentado pelo PS, ou melhor o conjunto de projectos de lei apresentados pelo PS foram elaborados pelo Sr. Dr. Medina Carreira - e tenho a certeza de que V. Ex.ª não cometerá a injustiça de considerá-lo incapaz e mal informado sobre questões de fiscalidade...
Se o senhor cometesse essa injustiça estava, de algum modo, a contrariar o que o ex-Ministro das Finanças, Dr. Miguel Cadilhe, fez - numa altura em que não posso detalhar, pois tenho esse apontamento no meu gabinete e não aqui - quando convidou o Sr. Dr. Medina Carreira para intervir de uma forma mais activa e apresentar uma reforma fiscal.
Portanto, como V. Ex.ª vê, se o nosso projecto é tão mau como acabou de referir, ele foi feito pela pessoa que acabei de referir e essa pessoa teve a validação técnica e política que lambem acabei de citar.
Isto não tem, obviamente, nada a ver consigo, porque o Código da Sisa e o do Imposto sobre Sucessões e Doações já vêm do passado, mas o que é certo é que V. Ex.ª se vê confrontado com um sistema fiscal que é a maior fraude da administração fiscal europeia. De facto, o que hoje se passa em matéria de sisa e de imposto sobre sucessões e doações é, realmente, a maior fraude em termos de administração fiscal europeia,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ...pelo que é importante pôr rapidamente cobro a essa fraude. Ora, a trabalharmos com o ritmo com que V. Ex.ª está a trabalhar, e embora reconheçamos a complexidade do Código das Avaliações, provavelmente nem daqui a 10 anos teremos este problema resolvido...
Portanto, o apelo que lhe faço é no sentido de que não veja nos nossos projectos sempre algo derrotista e de negativo, porque - aliás, até parece que contêm algumas coisas positivas, embora não originais, como lhe terá dito o seu próprio consultor - há da nossa parte alguns apports que são positivos e que podem contribuir para resolver esta grave situação que se vive em matéria de administração fiscal.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Disse o Sr. Deputado que devo estar mal informado acerca do autor. Bem, não tenho de saber quem é o autor, mas... devo dizer-lhe que agora ainda fiquei mais preocupado, porque este projecto tem tantas incongruências que, direi mesmo, ainda bem que, se, porventura, foi convidado, não aceitou porque senão tínhamos um sistema fiscal desgraçado!...
Risos do PSD.
Quanto a essa história da fraude no domínio fiscal, não vamos ter a pretensão de dizer que não é assumida em parte alguma do mundo. Nenhum sistema fiscal tem a veleidade de dizer que é hermético à fraude,... nenhum!
Portanto, sabemos, efectivamente todos sabem, que se pratica um certo grau de fraude, o que é preciso é contê-la dentro dos limites do razoável. E que a partir de certo momento as implicações que tem em termos de custos e de incomodar a própria sociedade por aqueles bons agentes económicos, no fundo, são tais que não compensa, em termos de Estado, ir-se demasiado longe. Aliás, foi nesse sentido que, de resto, o Sr. Deputado do PSD há pouco falou na existência de fraude. É nesse sentido e não noutro. De resto, tive oportunidade de fazer uma referência directa sobre um aspecto técnico daquilo que foi referido.
Mas acho graça a uma outra das suas notas, Sr. Deputado: quando diz que é preciso combater a fraude, com o projecto que aqui nos apresenta, com outro tipo de comissões qualquer,... quando diz que com determinados coeficientes resolveria esse problema, é óbvio que não é assim que se resolvem os problemas! Isso, de facto, é feito mas é com aquele que estamos a seguir e a com trajectória que estamos a impor no domínio fiscal em Portugal.
E quando o senhor diz que, ao ritmo que levo, nem daqui a 10 anos temos o problema resolvido, dá-me vontade de rir. É que fui sempre acusado de «andar a 200 à hora»... e que só tinha acelerador. Agora, aparece-me o Sr. Deputado a dizer que nem daqui a 10 anos isto está pronto! Esta é boa, eu registo!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o debate, informo que a próxima sessão será quinta-feira, às 15 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 35 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António Augusto Ramos.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Cecília Pita Catarino.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Gilberto Parca Madaíl.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Margarida Borges de Carvalho.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel Chancerelle de Macheie.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Carlos Cardoso Laje.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
José Barbosa Mota.
Laurentino José Castro Dias.
Manuel António dos Santos.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Partido Comunista Português (PCP):
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Centro Democrático Social (CDS):
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Deputados independentes
Maria Helena Salema Roseta.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Maria Pereira.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Dinah Serrão Alhandra.
Página 1879
14 DE MARÇO DE 1990 1879
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Francisco João Bernardino da Silva.
Jaime Carlos Marta Soares.
Jaime Gomes Mil-Homens.
José Júlio Vieira Mesquita.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Partido Socialista (PS):
Armando António Martins Vara.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Paula da Silva Coelho.
Domingos Abrantes Ferreira.
Octávio Rodrigues Pato.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Os REDACTORES: Anita Pinto da Cruz-José Diogo- Cacilda Nordeste - Maria Leonor Ferreira.
Página 1880
DIÁRIO da Assembleia da República
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