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Quarta-feira, 9 de Maio de 1990 I série - Número 79
DIÁRIO Da Assembleia da República
V LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1989-1990)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE MAIO DE 1990
Presidente: Exmo. Sr. José Manuel Mala Nunes de Almeida
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a alguns outros que deram entrada na Mesa.
Em declaração política, o Sr. Deputado Pacheco Pereira (PSD) teceu considerações acerca das propostas de alteração à Lei Eleitoral anunciadas pelo Sr. Primeiro-Ministro. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Guterres (PS), Hermínio Martinho (PRD), João Amaral (PCP) e Basílio Horta (CDS) e deu explicações a propósito do direito de defesa da honra e consideraçâo exercido pelos Srs. Deputados António Guterres (PS) e Basílio Horta (CDS).
Em declaração política, o Sr. Deputado João Amaral refutou as anunciadas alterações à Lei Eleitoral.
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Espada (PRD), a propósito de notas de despedimento a cinco jornalistas, condenou a política de pessoal do Conselho de Gerência da RTP, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Natália Correia (PRD), José Manuel Mendes (PCP), João Corregedor da Fonseca (Indep.), Herculano Pombo (Os Verdes) e Helena Roseta (Indep.).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira (PS), após uma retrospectiva do comportamento político do PSD nos últimos anos, criticou a sua acção governativa e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Moreira (PSD).
Entretanto, foi aprovado um parecer da Comissão de Regimentos e Mandatos relativo à substituição de um deputado do PSD.
A Câmara autorizou um deputado a depor como testemunha em tribunal, não se pronunciando sobre um outro pedido por se referir a um deputado que se encontra em exercício de funções no Parlamento Europeu.
Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 61 a 63 do Diário.
Os projectos de lei n.ºs 417/V (regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento), da iniciativa do PCP, 494/V (atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos - alteração do Decreto-Lei n. º 100/84, de 20 de Março, e da Lei n. º 25/85, de 12 de Agosto), da Iniciativa do PS e da deputada Independente Helena Roseta, e 496/V (altera a Lei n. º 1/87, de 6 de Janeiro), também da iniciativa do PS e da deputada independente Helena Roseta, foram rejeitados. No debate Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados fida Figueiredo (PCP), Gameiro dos Santos (PS), Manuel Moreira (PSD), André Martins (Os Verdes), João Teixeira (PSD), Barbosa da Costa (PRD), Nogueira de Brito (CDS), Jorge Lacão (PS) e João Amaral e Lourdes Hespanhol (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Américo de Sequeira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Fernandes Ribeiro.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Maria Ourique Mendes.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcíneo António Campos Rebelo.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Pereira Lopes.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barros.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Walter Lopes Teixeira.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António Manuel Henriques de Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Miguel de Morais Barreto.
Carlos Manuel Luís.
Edite Fátima Matreiros Estrela.
Edmundo Pedro.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helena de Melo Torres Marques.
Henrique do Carmo Carmine.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
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José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luis Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl d'Assunção Pimenta Rogo.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui Pedro Machado Ávila.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mola.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Camilo Carvalhal Gonçalves.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Júlio José Antunes.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Luís Maria Bartolomeu Afonso Palma.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Luísa Amorim.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Sérgio José Ferreira Ribeiro.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Rui José dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PEV):
André Valente Martins.
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Deputados independentes:
Carlos Matos Chaves de Macedo.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena Salema Roseta.
ANTES DA ORDEM DO DIA
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos diplomas, requerimentos e respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e foram admitidos, os seguintes diplomas: projecto de resolução n.º 53/V, apresentado pelo PCP, que recomenda ao Governo a adopção de medidas urgentes no sentido de assegurar que estudos em curso sobre o regime de prestação do regime militar obrigatório sejam acompanhados pelas organizações de juventude; proposta de resolução n.º 25/V, que aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 7 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que baixou à competente comissão; projecto de lei n.º 533/V, apresentado pelo Sr. Deputado Jaime Gama e outros, do PS, propondo a alteração da Lei n.º 30/87, de 7 de Julho - Lei do Serviço Militar, que baixou à
5.ª Comissão; projecto de lei n.º 534/V, apresentado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo e outros, do PCP, sobre a Lei Quadro das Áreas Protegidas, que baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 535/V, apresentado pelo Sr. Deputado Montalvão Machado e outros, do PSD, sobre a Lei do Segredo de Estado, que baixou à 3.ª Comissão.
Foram ainda apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Caio Roque, Hermínio Martinho, Sérgio Ribeiro, Carlos Brito e Lourdes Hespanhol; ao Ministério da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães e Daniel Bastos; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães, Silva Carvalho e Ilda Figueiredo; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Luís Bartolomeu, António Barreto, Apolónia Teixeira e Lourdes Hespanhol; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados João Salgado, Carlos Brito, Barbosa da Costa e Cristóvão Norte; à Secretaria de Estado do Turismo, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Filipe; à Secretaria de Estado das Vias de Comunicação, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Viegas; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Edite Estrela; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Neves Rodrigues.
Por sua vez, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Cláudio Percheiro, na sessão de 14 de Fevereiro; Edite Estrela, na sessão de 14 de Novembro; António Filipe, na sessão de 7 de Dezembro; Júlio Antunes, na sessão de 11 de Janeiro; Herculano Pombo, na sessão de 18 de Janeiro; Cerqueira de Oliveira, na sessão de 30 de Janeiro; Raúl Rogo, na sessão de l de Fevereiro; Luís Roque, na sessão de 13 de Fevereiro; Sérgio Ribeiro, na sessão de 20 de Fevereiro; João Rui de Almeida, na sessão de 8 de Março; Lino de Carvalho, nas sessões de 22 de Março e 5 de Abril; Arons de Carvalho, na sessão de 29 de Março.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na sequência da nossa ordem de trabalhos, tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
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O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados: O anúncio público, pelo Primeiro-Ministro, de uma proposta de alteração à Lei Eleitoral é uma iniciativa de grande alcance político e um ponto de viragem na história do sistema político e eleitoral português.
Trata-se de uma iniciativa que traduz não só uma crescente exigência do sentimento popular face ao sistema político como uma resposta a críticas feitas em todas as áreas da opinião pública, indiferentemente dos sectores partidários, àquilo que são notórias disfunções do sistema de representação e efeitos perversos de soluções que tiveram o seu tempo e que hoje estão desfasadas em relação a novas realidades.
Entrámos, assim, num período novo da vida política e partidária, que tem em conta as características de uma democracia estabilizada, num país no qual as instituições criadas depois do .25 de Abril atingiram a sua maturidade.
A construção do sistema político-partidário no período imediatamente posterior ao 25 de Abril traduziu, inevitavelmente, as características e as necessidades do processo de consolidação da democracia. Na verdade, em todas as áreas ideológicas e grupos de influência, que viriam a tornar-se genéticos do sistema de partidos posteriores ao 25 de Abril - o socialismo, o comunismo, a social-democracia reformista, a democracia cristã-, apenas a área do comunismo detinha uma organização significativa através do Partido Comunista. Essa circunstância foi crucial para que o PCP se lançasse na aventura revolucionária de 1975 e permitiu-lhe obter uma força muito para aquém da representatividade e da influência do partido na sociedade portuguesa, como todos os processos eleitorais desde 1975 vieram a revelar.
Foi, pois, essencial para consolidar a democracia e contrariar a acção revolucionária do Partido Comunista criar condições para fortalecer, rapidamente, os partidos democráticos e dar-lhes, na sociedade portuguesa, uma capacidade de intervenção que superasse as suas frágeis e recentes estruturas e a sua inferioridade organizacional face ao aparelho Comunista.
Por outro lado, iam no mesmo sentido e produziam os mesmos resultados as preocupações dos fundadores do regime democrático com a sobrevivência de formas tradicionais de poder político - como o caciquismo -, que se considerava terem tido um papel no regime autoritário derrubado em 25 de Abril e poderem continuar a constituir focos de resistência à democratização.
Por último, o novo regime não queria repetir os erros da I República e pretendia afastar-se, ao mesmo tempo, da experiência passada de puro parlamentarismo e da tentação de um forte poder presidencial que pudesse estar na origem de manifestações de autoridade pessoal.
Toda a legislação constitucional e paraconstitucional produzida desde 1974 traduziu estas, preocupações. Havia, pois, por sob um fundo estrutural democrático, muitos elementos conjunturais que acentuavam características e tendências que se explicavam por razões de época e de circunstância e que, a prazo, vieram mostrar ter efeitos perversos.
Daqui resultou um sistema político com difíceis maiorias de governo e consequente instabilidade governativa, com um considerável défice de decisão em iodas as matérias que implicavam um fone sentido de mudança e, portanto, sem grande capacidade reformista. Tudo isto assentava num quase monopólio da representação democrática pelos partidos e por uma presença hegemónica destes na vida política.
Na verdade, tudo aquilo que nos primeiros anos do regime significou vantagens de um sistema eleitoral que favorecia justamente os partidos para defender a democracia ameaça hoje tornar-se um obstáculo para a participação e a representação democrática.
Os efeitos perversos do actual sistema eleitoral são evidentes: excessiva presença dos partidos, partidocracia, distanciação entre os eleitos e eleitores e consequente desprestígio da acção parlamentar, círculos gigantescos, nos quais se perde a relação e o sentido da escolha eleitoral, número excessivo de deputados em relação às necessidades e às funções da Assembleia, ingovernabilidade potencial pela dificuldade de obter maiorias, instabilidade governativa com 15 governos, em 13 anos, até 1987. A falta de racionalização do sistema político começa a ter custos em todos os planos da vida nacional.
Ora, não há hoje razões políticas para não rever um sistema eleitoral cuja crítica é generalizada e cujas disfunções são patentes.
A evolução da situação política portuguesa na segunda metade da década de 70 e até à revisão de 1982, ultrapassada a tentativa revolucionária comunista e afastado um poder militar de génese revolucionária e sem legitimidade eleitoral, deu origem a um sistema de partidos estabilizado, no qual as regras de competitividade eleitoral são aquelas que, essencialmente, definem o lugar respectivo. Os fenómenos políticos tradicionais, assentes no clientelismo e no caciquismo, tem vindo a perder importância em relação ao peso, cada vez maior, dos órgãos de comunicação social na formação da opinião pública e das escolhas eleitorais.
Simultaneamente, perderam terreno na vida política ideias e correntes que contestavam o sistema de partidos a favor de vagas ideologias do «aprofundamento da democracia» ou da criação de partidos de «renovação democrática», no qual modelos de cesarismo castrense encontraram expressão histórica.
O duplo processo eleitoral das eleições presidenciais de 1986 e legislativas de 1987 terminou, politicamente, com esses movimentos, estabilizando a vida política e as instituições que lhe servem de suporte.
Está, pois, na altura de se darem passos em frente na adequação da nossa vida política às realidades e às necessidades de uma nova época. E se há partido que tem legitimidade para propor mudanças na lei eleitoral, esse partido é o PSD.
O Sr. Duarte Lima (PSD):- Muito bem!
O Orador: - Primeiro, porque sempre o propôs desde há muito tempo. Fê-lo, explicitamente, no seu manifesto eleitoral, sufragado pelos eleitores em 1987. E saliente-se que, em reacção às posições do PSD sobre matéria eleitoral, durante o próprio período eleitoral de 1987 o Partido Socialista sempre afirmou que a condição sine qua non para a alteração da lei eleitoral era a de se ganhar as eleições na base da configuração eleitoral anterior. Foi também o que aconteceu.
Segundo, porque tendo proposto a quase totalidade das alterações introduzidas na Constituição sobre esta matéria (ainda que o PS lhe tivesse dado unia forma mitigada, como é o caso do número de deputados), o PSD viu reforçada a sua posição. Hoje já não se iram apenas de falar de propostas do PSD, mas também de imperativos constitucionais.
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Terceiro, porque todas as disfunções do sistema eleitoral foram, de um modo ou de outro, apontadas em todos os partidos e em todas as áreas de opinião, com excepção do Partido Comunista. Dirigentes e deputados do Partido Socialista, dirigentes do CDS, o Presidente da República, muitas figuras de relevo da opinião pública, tom vindo, nos últimos anos, a chamar a atenção para estas disfunções e a propor alterações no sentido daquelas que o PSD agora anuncia.
Quarto - e talvez o mais importante-, porque as alterações que propomos representam significativas melhorias na correcção dos efeitos perversos do sistema eleitoral sem, por outro lado, pôr em causa os princípios basilares da proporcionalidade nem introduzirem mudanças drásticas na representação partidária.
Os efeitos destas alterações serão, pois, a prazo, muito significativas. Levarão, dentro dos partidos, a uma maior competitividade política, implicarão uma diferenciação das carreiras políticas, darão ao eleitor uma maior pluralidade de escolha no seu voto, permitirão uma maior regionalização da acção política em conjugação com o aparecimento de figuras nacionais partidárias, poderão dar origem a fenómenos locais de concentração de voto e a uma diferenciação nos resultados eleitorais. O eleitor poderá escolher melhor e mais precisamente e o eleito terá mais representatividade e mais poder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As alterações eleitorais dizem respeito aos fundamentos do Estado e do regime político. Elas devem ser tratadas com a máxima seriedade e sem demagogia,
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não é isso que tem feito o secretário-geral do Partido Socialista, que tem respondido ao diálogo necessário em tom de comício e de má-educação. Compreende-se que esteja incomodado por ter de sair da nuvem de generalidades e banalidades que constitui o seu discurso para ter de dizer que sim ou que não a alguma coisa.
Aplausos do PSD.
São particularmente graves as acusações feitas ao PSD de querer tirar proveitos eleitorais com as modificações da lei.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Que ideia!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Coitadinho do PSD!
O Orador: - Se o PSD quisesse manipular a Lei Eleitoral a seu favor podia tê-lo feito antes da revisão constitucional, quando uma maioria simples bastava. Podia, inclusive, tê-lo feito no período imediatamente a seguir às eleições, legitimado pela circunstância de ter incluído estas mesmas alterações no seu manifesto eleitoral. Não o fez mas fá-lo agora, sabendo que necessita do acordo do Partido Socialista e crente quo o Partido Socialista honrará os seus compromissos constitucionais.
Na verdade, tudo aquilo que o PSD anunciou emana, directamente, do texto constitucional, revisto na base de um acordo com o Partido Socialista. Não teria, aliás, qualquer sentido introduzir alterações ao texto constitucional e, depois, continuar a realizar eleições na base de versões anteriores da Constituição.
Aliás, a imposição constitucional da diminuição do número de deputados implicaria, por si própria, a necessidade de rectificar o sistema de representação. É para nós claro que as eleições a efectuar depois da alteração da Constituição tem de se realizar no quadro dessas mesmas alterações, sob pena de se defraudar a vontade constituinte.
Aplausos do PSD.
O Orador: - Seria o mesmo que ter alterado o artigo 83.º da Constituição e não ter realizado as privatizações.
Também é demagogia criticar-se a altura em que estas alterações são apresentadas. O tempo para as fazer é agora e o mais cedo possível. Que outro tempo haveria entre a Constituição revista em 1989 e as eleições em 1991 senão o ano de 1990? O PS, que tem antecipado toda a legislação que materialize as alterações do texto constitucional, também o poderia ter feito para a Lei Eleitoral, em particular se o preocupava a proximidade das eleições. Não o fez, permitindo pôr em dúvida a sua vontade política de, neste caso, dar seguimento à revisão constitucional. Depois, há o falso argumento conjuntural do secretário-geral do Partido Socialista de que o PSD quereria ganhar no «gabinete» aquilo que estaria a perder nas umas. Este pscudoargumento tem, aliás, o traço freudiano de dizer aquilo que não se quer dizer. Dizendo o que disse, o secretário-geral do Partido Socialista acabou por proclamar, publicamente, que as afirmações de vitória antecipada e uma imaginária conquista de «maioria absoluta» pelo PS não são críveis nem para os seus próprios autores. Pois não admitiu o Dr. Jorge Sampaio, nos seus comentários apressados sobre a Lei Eleitoral, que o objectivo do PSD «era chegar mais facilmente à maioria absoluta»? Que significa isto senão dizer que o PSD vai ganhar as próximas eleições?
Que significa senão confirmar que a verdadeira estratégia do Partido Socialista passa pela aceitação de acordos, pelo menos parlamentares, com o Partido Comunista?
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Deixe de dizer disparates!
O Orador: -Por último, o único argumento sério que poderia ter fundamento era a acusação ao PSD de que desejava «manipular» os círculos eleitorais. Também aqui os socialistas estão a enganar quem os ouve, porque sabem muito bem que não há possibilidade de qualquer desenho ou engenharia eleitoral dos círculos sem o seu acordo. Mesmo que o PSD, na versão socialista de incarnação do mal, desejasse fazê-lo, a isso seria impedido pela bondade socialista. Podem descansar, pois, porque sobre esta matéria o PSD terá em conta, na sua proposta, não só as unidades administrativas existentes como a necessidade de preservar a homogeneidade geográfica, cultural e social dos círculos eleitorais.
Na verdade, o que se passa é que o PS não está, efectivamente, preocupado com eventuais efeitos eleitoralistas da proposta do PSD. O que se passa e que a última coisa que o Partido Socialista quer ouvir é falar de reforma do sistema político, em particular de reformas que o tornem mais moderno e eficaz e que melhorem o controlo por parte dos cidadãos da coisa pública.
O seu entendimento jacobino do Estado, o seu modelo organizacional de partido social e de classe, os mecanismos que desenvolveu na sua acção política, tornam-no num dos partidos mais conservadores do sistema político português, desprovido de vontade reformista.
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Esperemos que, também sobre esta matéria, o PS não faça pagar ao País o preço da sua inércia ideológica e do seu conservadorismo político.
Esperemos também que, sobre esta matéria, o PS não se comporte do mesmo modo como procedeu com a parte económica da Constituição, atrasando de quase sete anos a tomada de medidas de fundo e prejudicando gravemente o País.
Os sinais de que o sistema eleitoral precisa de ser renovado e de que os mecanismos de representação necessitam de ser revitalizados estão à vista de quem os quer ver.
A partir de agora, o PSD discutirá tudo o que for preciso e com toda a gente. Mas discutirá para mudar e não para que tudo fique na mesma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Guterres, Hermínio Martinho, João Amaral e Basílio Horta.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, aparentemente, a única coisa que o PSD quis com a apresentação das suas ideias sobre a revisão do sistema eleitoral - e digo ideias visto que projecto de lei não conhecemos nenhum - foi apenas criar uma nova ofensiva política contra o PS. Daí o conteúdo substancial da sua intervenção de hoje, daí o conteúdo das declarações ontem proferidas na televisão pelo Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não, Sr. Deputado!...
O Orador: - Mas nós não vamos cair nessa armadilha! Achamos que vale a pena discutir as questões eleitorais pelo seu valor próprio, visto que não estamos interessados em fazer das questões eleitorais um instrumento de luta política contra o PSD. Estamos antes interessados em fazer das questões eleitorais um instrumento de aperfeiçoamento do nosso sistema político.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Tanto quanto ouvimos do Sr. Primeiro-Ministro- tanto quanto ouvimos, porque lermos ainda não lemos nada, pois o projecto de lei ainda não entrou nesta Casa, repito -, estão em causa duas questões, sendo a primeira delas a redução do número de deputados, o que é uma imposição constitucional que teve o nosso acordo, é uma evolução positiva do sistema e não nos levanta qualquer problema.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Óptimo!
O Orador: - A segunda questão tem a ver com um conjunto de operações de engenharia eleitoral, alterando os círculos quer com a criação de um círculo nacional - que, tanto quanto supomos, não é um círculo eleitoral para absorver os restos não produtivos dos outros círculos mas sim um círculo de repetição de voto -, quer com a diminuição da dimensão de vários círculos existentes neste momento em Portugal.
Quero dizer-lhe, com toda a clareza, que essa operação de engenharia eleitoral nos parecer ter um objectivo evidente: o de beneficiar dois partidos, o PSD e o PS, e prejudicar os restantes partidos representados nesta Câmara, nomeadamente o CDS, o PCP e o PRD.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Mas que bom samaritano!...
O Orador: - Se entendemos bem o Sr. Primeiro-Ministro- e dando o exemplo mais chocante de todos, o do CDS -, caso estas ideias sobre legislação eleitoral tivessem sido aplicadas às últimas eleições, o CDS estaria hoje aqui com um deputado apenas.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sim, sim!
O Orador: - Digo-o eu e confirma-o o Sr. Deputado Basílio Horta!
Queremos dizer ao PSD, com toda a clareza, que percebemos perfeitamente o que está em jogo, que não tem nada a ver com a aproximação entre os deputados e o seu círculo eleitoral, porque isso tanto se faz com um círculo de 20 como com um de 10 deputados! A questão é, como sabe, haver ou não círculos uninominais e isso levanta todo um problema de outro tipo de reforma do sistema eleitoral.
Mas a questão não é essa. A questão é que esta é uma tentativa do. PSD para aliciar o PS para uma operação, a dois, de esmagamento dos outros partidos, ou para o atacar com o pretexto de que o PS não está disponível para aperfeiçoar o sistema eleitoral a fim de modernizar o sistema político e para outras das coisas que o Sr. Deputado aqui referiu e que nada têm a ver com a proposta verbal do Primeiro-Ministro.
E quero dizer ao Sr. Deputado Pacheco Pereira o seguinte: temos plena consciência de que a proposta do Sr. Primeiro-Ministro beneficiaria o PS na mesma medida em que beneficia o PSD, mas nós não estamos interessados em ganhar eleições na secretaria, ao contrário do PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Que cavaleiro andante!
O Orador: - Não queremos construir uma vitória eleitoral do PS à custa do esmagamento de partidos que, nesta Câmara, representam sectores de opinião que são importantes na vida política portuguesa, que devem ter uma expressão política correspondente à força que têm e que, portanto, não devem ser aniquilados por mecanismos de engenharia eleitoral.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - O PSD não pode contar com o PS para fazer batota em matéria de eleições!
Aplausos do PS, PCP e do CDS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pacheco Pereira, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Martinho.
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O Sr. Hermínio Martinho (PRD): -Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira: Ò Sr. Deputado António Guterres, de certa forma, levantou algumas das questões que eu pretendia abordar e por isso não o farei com a mesma profundidade para não desperdiçar tempo.
Duas questões se levantam: uma relativa ao número de deputados e quanto a essa o meu partido sempre defendeu que esse número fosse reduzido, embora gostássemos mais de ver, neste momento, o Governo do PSD...
Uma voz do PSD: - Queria aumentar esse número?!
O Orador: - Não, não queríamos aumentá-lo; não estamos preocupados com o seu aumento, porque, de facto, queremos reduzi-lo, estamos de acordo com a sua redução.
Como estava a dizer, neste momento gostaríamos mais de ver o Governo do PSD preocupado - como gostaríamos de ter visto anteriormente o do PS - com as centenas de quadros superiores de altíssima qualidade que estão na prateleira por motivos políticos e com a existência, em Portugal, de mais de 400 coronéis para um quadro de 160! Se se quer remodelar, se se quer fazer uma Administração moderna, é por aqui que temos de começar e não por reduzir em 10, 15 ou 20 o número de deputados!
O Sr. Deputado Pacheco Pereira falou em partidocracia, na valorização das ideias das diferentes pessoas e sobre isso faço-lhe a seguinte pergunta: acha justo que, de acordo com aquilo que foi a proposta apresentada, a qual ainda não conhecemos, num acto eleitoral em que o PRD teve 4,9%, o CDS 4,4% e em que centenas de milhares de portugueses nos deram o seu voto, a expressão democrática desses votos fosse um deputado para cada partido? Essa seria, de acordo com o que o PSD neste momento nos propõe, a situação, porque elegeríamos um deputado no círculo nacional de 30, pois com círculos de 10 deputados é preciso ter cerca de 10% dos votos para eleger um deputado em cada círculo.
Será esta a melhor forma de defender a democracia? Será este o caminho indicado para a democracia caminhar em Portugal? Será esta a melhor forma de, como V. Ex.ª disse, credibilizar o sistema?
Deixava-lhe estas questões, aguardando a sua resposta.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Pacheco Pereira: Suponho que já aqui foi dita uma coisa que é essencial na caracterização da proposta tal como foi anunciada publicamente, visto que ainda não foi concretizada na Assembleia, que é o facto de ela visar um efeito de distorção da realidade eleitoral portuguesa através da criação artificial, na secretaria, de um mecanismo de imposição administrativa da bipolarização.
Mas eu diria mais: a proposta, tal como foi anunciada nos seus contornos e alcance completo, deve visar a criação um sistema bipolar de dois pólos que são iguais, mas em que um dos pólos, o PSD, o é mais do que o outro. Dito de outra forma, este sistema bipolar está em tais termos que um dos pólos tem a sua posição de maioria garantida e o outro pólo tem garantido e garantido está, que há-de ser e há-de ser sempre, o maior partido da oposição!
É isto que, no fundo e no essencial, o PSD quer! E quer fazê-lo esmagando à sua direita, aproveitando os benefícios dos desequilíbrios de expressão eleitoral que ele próprio tem, quando comparados com o outro pólo, pois mantém uma regularidade eleitoral em todo o País e não pode, por isso, ter os benefícios ou as majorações de ser primeiro partido nestes e naqueles círculos, como sucede com o PSD.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Os senhores é que querem ser mantidos artificialmente!
O Orador: - O PSD fez contas face aos resultados de 17 de Dezembro. O PSD visa, em concreto, autobeneficiar-se, viciando as regras do jogo democrático! Esta é uma operação antidemocrática e inadmissível!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em boa verdade, nunca pensámos que o PSD tivesse a coragem de ir tão longe! Sabíamos que havia pânico no partido...
Risos do PSD.
... em virtude das sucessivas descidas que as sondagens apresentavam. Sabíamos que as várias declarações que foram feitas de que o PSD iria reconquistar a maioria absoluta soavam, cada vez mais, a falso. Penso que ninguém, dentro e muito menos fora do partido, acreditava nelas. E é por isso que, com o pretexto de ter que adaptar a lei eleitoral à nova Constituição, o PSD anuncia uma nova lei eleitoral e diz que essa lei eleitoral visa razões de Estado - aperfeiçoar o sistema político, julgo ter sido a expressão utilizada.
Mas, obviamente, não é isso de que se trata! Se fosse disso de que se tratava nenhum anúncio deveria ter sido feito sem que previamente todos os partidos tivessem sido ouvidos e consultados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Antes disso, teria de haver um profundo debate, que passasse por todas as forças políticas, que merecesse um consenso amplíssimo de todas as forças políticas e com particular cuidado das forças que mais afectadas seriam pela lei.
No entanto, nada disso foi feito. O que importou imediatamente foi dar a ideia de que ontem eram precisos 43% dos votos para ter a maioria absoluta e hoje quaisquer 35 % a 38 % duo a maioria absoluta.
O Sr. Duarte Lima (PSD):-É falso!
O Orador: - O que é importante é conseguir, através desta lei, o que o PSD não conseguiu nas eleições autárquicas. O PSD tentou esmagar o CDS, tentou aniquilar o CDS, mas não o conseguiu.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - O Prof. Freitas do Amaral é que o tentou!...
O Orador: - Aquilo que o PSD não conseguiu no campo das eleições vem agora tentar através desta lei!
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É evidente que esta lei não prejudica todos os partidos da mesma forma. O que aconteceria, se esta lei fosse aprovada, era que o PSD teria, quase seguramente, uma maioria absoluta quase eterna, quase permanente, porque, à direita do PSD, o CDS desapareceria, mas, à esquerda do PS, o PCP manter-se-ia, talvez com menor força, mas dado o voto homogéneo que tem em certas zonas do País, seria muito difícil diminuir drasticamente a representação do PCP. Teríamos, então, o PSD a representar toda a direita e, à esquerda, o PS sempre dividido com PCP.
É isto que o PSD deseja! É isto, no fundo, que está em causa e para isso alicia o Partido Socialista. Obviamente, tínhamos a consciência da situação e por isso dissemos que, em termos de democracia, estamos mais próximos do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
Risos do PSD.
VV. Ex.ªs vieram, com esta lei, confirmar que tínhamos toda a razão em nos aproximarmos do PS em termos de conceitos democráticos, em termos de respeito pela liberdade, em termos de respeito pelas minorias, que 6 uma linguagem que VV. Ex.ªs não entendem nem compreendem no radicalismo permanente das vossas posições.
Aplausos do PS.
Os senhores, com esta lei, mostram a vossa cara: «Se não chegam os votos, vá-se à lei, faça-se funcionar a maioria!» Felizmente que esta lei necessita de ser aprovada por maioria de dois terços e felizmente também que, pela voz do Sr. Deputado António Guterres, o PS não está disposto nem disponível a vender uma luta e uma luta de ioda uma vida partidária, por um saco de lentilhas do poder. Ainda bem que assim é pois, de outra forma, teríamos um grave e profundo golpe na concepção democrática, no regime democrático, e o CDS teria de extrair daí todas, mas todas, as conclusões.
Aplausos do CDS, do PS, do PCP e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Que noivado tão cândido!
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer que me pareceu muito pobre e bastante demagógica a resposta que deram à iniciativa destas transformações da lei eleitoral.
Primeiro, porque se trata de uma proposta moderada...
Risos do PS, do PCP, do PRD e do CDS.
O Sr. José Magalhães (PCP):- Moderada?!
O Orador: - Sim, muito mais moderada do que propostas publicamente feitas, no mesmo sentido, por deputados do PS, como, por exemplo, o meu amigo João Soares, que fez propostas muito mais radicais de transformação do sistema eleitoral; muito mais moderada do que propostas feitas pelo Prof. Freitas do Amaral no
mesmo sentido; muito mais moderada do que propostas feitas por muitos dos senhores que aqui estão, em debates, em posições públicas sobre esta matéria e em que foram muito mais longe na mudança do sistema eleitoral. .
A nossa proposta é, efectivamente, uma proposta moderada.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Essa é uma boa anedota!
O Orador: - E mais: há uma coisa que VV. Ex.ªs estão a esconder e que é o facto de esta proposta derivar directamente da aplicação do texto constitucional.
O Sr. José Magalhães (PCP): -Só numa parte!
O Orador: - Quer VV. Ex.ªs queiram quer não, esta discussão foi tida na revisão constitucional. Será que VV. Ex.ªs querem realizai as próximas eleições no quadro da anterior Constituição, e não no quadro da actual? Esse problema tem, evidentemente, que ser colocado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas o que é mais interessante no plano político - e quem analisar objectivamente a proposta, mesmo nos seus termos genéricos, verá é que ela não introduz as drásticas alterações que VV. Ex.ªs apontam na representação partidária, que ela diminui apenas pouco...
O Sr. Carlos Brito (PCP):- Já tem as contas todas feitas!
O Orador: - Sr. Deputado, estas contas são conhecidas. Todos os parados conhecem as projecções que é possível fazer e mais, toda a gente que conhece esta matéria sabe que a projecção dos resultados eleitorais obtidos pelo sistema proporcional para um novo sistema é ilusória, porque o eleitorado tem opções de voto diferentes e não se comporta sempre da mesma maneira. Portanto, VV. Ex.ªs estão a utilizar os argumentos mais fáceis e mais demagógicos.
Para terminar digo-vos o seguinte: o que é interessante nesta discussão é a maneira como cada partido vê o seu estado e o seu futuro político... .
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PS, apesar de nos estar a dizer que está a subir nas sondagens e que vai ter a maioria nas eleições de 1991, não acredita que isso se vá passar.
Aplausos do PSD.
O Orador: - O PCP sabe que vai descer, e muito, nas próximas eleições. E o CDS sabe que corre o risco, se as eleições forem bipolarizadas; e a bipolarização não é hoje uma realidade eleitoral é uma realidade social e política, de ter resultados residuais.
Portanto, a lição que nós tiramos deste debate, no plano político, é o modo como cada partido se vê ao espelho relativamente aos resultados eleitorais de 1991, porque, se fosse verdade o que VV. Ex.ªs estão a dizer, então nós estávamos a fazer um acto de suicídio político. Se estivéssemos a actuar em função do mero interesse eleitora-
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lista, numa altura em que o PS está aparentemente à frente nas sondagens, estávamos a dar-lhe a maioria absoluta e não é isso que o PS diz. O problema não é que o PS recuse esta fórmula, é que o PS sabe que não vai ser o maior partido e, portanto, sabe que não há fórmula eleitoral que lhe permita ganhar as eleições em 1991.
Aplausos do PSD.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Essa estratégia vai falhar!
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra e consideraçâo da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, em matéria do que vão ser os resultados das próximas eleições, o que sabemos de mais seguro é o que foi o resultado das últimas!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O resultado das últimas eleições autárquicas confirmou o PS como primeiro partido, o PSD como segundo e o Sr. Deputado Pacheco Pereira como terceiro, no concelho de Loures.
Risos do PS e do PCP.
O Orador: - Mas não é isso que nos preocupa agora! Temos plena consciência de que o projecto, teoricamente, apresentado- pois, não o temos - pelo Sr. Primeiro-Ministro beneficiaria o PSD e o PS, mas não vamos votar a favor de todas as disposições que beneficiem o PS. Não pretendemos ganhar as eleições de qualquer maneira! Para o PS só há uma maneira de ganhar as eleições: é pela expressão da vontade livre dos Portugueses, através do voto, e não através de engenharia eleitoral.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isto é claríssimo para nós! Nada nos fará demover desta posição de princípio, que sempre foi a nossa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Antes de mais, agradeço ao Partido Socialista a oportunidade que me dá de continuar a falar sobre esta matéria.
Sr. Deputado António Guterres, devo dizer-lhe que, em meu entender, não há sistema eleitoral ou de representação que seja absoluto. Convém não esquecer que o sistema em que vivemos também introduz distorções na representação eleitoral, como o Sr. Deputado sabe muito bem. Aliás, é mais que evidente que essas distorções tom implicado disfunções no sistema. Toda a gente diz que os deputados estão desprestigiados, que há uma distanciação entre os eleitos e os eleitores e toda a gente sabe quais são as soluções, até porque não há muitas.
De facto, num sistema de democracia representativa, não há muitas soluções, mas uma delas visa diminuir os círculos eleitorais e aumentar a relação entre o eleito e o eleitor, através de um maior controlo entre quem elege e quem é eleito. O sistema já é conhecido, não há outro processo.
Como sabem, o sistema anterior gerou defeitos, pois sempre que os senhores participam em debates académicos, fora desta Assembleia, enunciam todos esses defeitos. Sempre que querem fazer brilharetes intelectuais dizem-se a favor destas alterações, mas quando o problema se coloca no concreto e quando, de forma moderada, se pretende fazer essas alterações ninguém é capaz de dizer que a proposta do PSD vai introduzir radicais transformações no sistema político.
Os senhores tem de dizer o que é que querem! Não querem alterar nada e as alterações que aceitaram incluir na Constituição são para ficar no papel?
O Sr. João Salgado (PSD): - Muito bem!
O Sr. António Guterres (PS):- Não!
O Orador: - Se, por exemplo, a admissão do círculo único é para ficar no papel, então, temos toda a razão em dizer que os senhores, aquando da revisão constitucional, procederam de má-fé.
Com efeito, todos os sistemas de representação são de gabinete e se os senhores querem fazer essa discussão demagógica, devo dizer-lhes que o sistema que é usado desde 1975 é tão de gabinete como qualquer outro sistema eleitoral, pois cada um deles introduz determinados resultados.
Em nossa opinião, na do Sr. Presidente da República, na de muitos deputados do Partido Socialista e na de muitas pessoas do CDS, que a têm expresso publicamente, esse sistema gera uma distanciação entre o eleito e o eleitor, uma dificuldade de governabilidade, um excessivo número de deputados na Assembleia, que não tem condições para mobilizar o conjunto dos deputados no trabalho parlamentar.
Todos esses efeitos são conhecidos e os senhores, no plano político e no plano académico, aceitam discuti-los, mas quando se trato de tomar decisões comportam-se puramente como conservadores e eu até compreendo porquê! De facto, nenhum partido beneficiou tanto destes efeitos perversos, na primeira fase do nosso sistema político, como o Partido Socialista. Ora, esse sistema político, que teve as suas virtualidades, gera hoje defeitos.
O Sr. José Lello (PS): - São os defeitos da segunda fase!
O Orador: - Podemos defrontar todos esses defeitos e os senhores tom a última palavra. Não compreendo a vossa preocupação, uma vez que, mesmo em relação aos círculos eleitorais, são os senhores que tem de tomar uma posição. Aquilo a que chamam ofensiva política do PSD é o mérito de os ter obrigado a dizer alguma coisa, sim ou não, pois de generalidades estamos fartos!
Aplausos do PSD.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Para citar a proposta do Prof. Freitas do Amaral, em matéria de revisão da legislação eleitoral!
O Sr. Basílio Horta (CDS):-Para defesa da consideração da minha bancada, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Nem mesmo com a ajuda do Sr. Deputado Silva Marques a missão do Sr. Deputado Pacheco Pereira é, hoje, menos ingrata, porque o que o Sr. Deputado diz, nomeadamente a respeito da proposta do Sr. Prof. Freitas do Amaral - de que já iremos tratar-, não tem nada a ver com a realidade, não é nada disto que se está a discutir e até parece que estamos a discutir uma lei diferente.
O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Primeiro ponto: o que a Constituição diz e impõe é apenas que o número de deputados seja reduzido para 230 ou, no máximo, para 235. Mais nada, ponto final! O círculo nacional é, pura e simplesmente, uma possibilidade, não é uma imposição.
Na proposta de lei, cujo esboço geral se conhece, não há aproximação alguma do deputado ao eleitor, não há nada disto! Salvo o devido respeito, isso é tudo mentira, ou seja, não é verdade, não há rigorosamente nenhuma aproximação, o sistema é exactamente o mesmo.
Defendemos a criação de um círculo nacional, mas noutras condições, numa outra perspectiva, com outro número de deputados e não um círculo nacional com 30 deputados. É verdade que, há já alguns anos atrás, o CDS falou nisso e admitiu essa hipótese, mas considerou um mínimo de 70 deputados.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - 60!
O Orador: - Um mínimo de 70 deputados e até havia quem, no partido, defendesse a hipótese de 80 deputados no círculo nacional. Nunca se considerou a hipótese de um círculo nacional com 30 deputados, que até pode proporcionar a um partido com 10% eleger dois deputados. Sc os senhores fizeram contas, nós também já as fizemos!
Por isso, pensamos que esta lei não tem rigorosamente nada a ver com a aproximação do eleitor ao representante. Se, neste momento, tivéssemos a intenção de mudar o sistema eleitoral e se estivéssemos a discutir as diferenças entre um sistema maioritário ou de duas voltas, o problema já era outro. Sc pretendêssemos mudar toda a estrutura do sistema, como a intervenção do Sr. Deputado Pacheco Pereira parecia antever, então os argumentos que teriam razão de ser; mas eles não se dirigem a esta proposta de lei, porque ela apenas tem a ver com aquilo a que chamou dificuldade de governabilidade e ela quer facilitar a governabilidade que, para o Sr. Deputado Pacheco Pereira, é manter a hegemonia e a maioria absoluta do PSD.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - É o problema das democracias!
O Orador: -Esta é a ratio legis desta proposta de lei, pelo que, como é evidente, não podemos concordar com ela. Isto não tem nada a ver com o problema da bipolarização.
De facto, somos contra a bipolarização, é verdade! Mas teremos de a aceitar se o povo português livremente a votar, de acordo com uma lei séria e justa. Porém, o que não queremos nem podemos aceitar são as vitórias de secretaria que, com esta proposta de lei, o PSD agora parece procurar.
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Estou a ter muito gosto em dar este tipo de explicações.
Na verdade, o CDS acabou de dizer que as suas propostas eram muito mais radicais do que as que, actualmente, o PSD apresenta.
Vozes do PSD:- Exacto!
O Orador: - Se fossem aprovadas teriam um efeito de potenciação ainda maior do que aquele que o CDS pretendeu atacar.
O Sr. Luís Filipe Meneses (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Assim, não é difícil de compreender os elogios que, muitas vezes, o CDS tem feito ao sistema inglês. E não compreendo, por exemplo, o que é feito da coerência política, quando chegam estes momentos de decisão.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Mas uma coisa não tem nada a ver com a outra!...
O Orador: - Em várias circunstâncias, é possível indicar declarações explícitas e claríssimas, todas num sentido muito mais radical do que as propostas agora apresentadas pelo PSD, mas chegados ao momento crucial, em que se propõem alterações moderadas de transformação do sistema político, verifica-se um levantamento nacional dos partidos da oposição, que, em minha opinião, tem apenas uma razão: a sua insegurança eleitoral neste, no outro ou em qualquer outro sistema.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas há mais: o Sr. Deputado Basílio Horta disse que estávamos preocupados com a governabilidade. Estamos sim, senhor!
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Os senhores também deviam estar!
O Orador: - E não percebo por que razão é que essa preocupação não deva ser generalizada se, até 1987, tivemos 15 governos, em 13 anos. Não me digam que o problema da governabilidade, em Portugal, não se coloca com o actual sistema político, porque isso é, pura e simplesmente, deitar areia para os olhos! E também não me digam que se os círculos forem diminuídos, se o eleitor, na votação nacional, tiver a possibilidade de votar pelo partido e, a nível local, escolher o número de deputados, a sua escolha não ganha qualificação, o seu
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controlo sobre quem elege não é maior e o poder de quem é eleito a nível local não é também maior! Se disserem isso, estão a ir contra toda a razoabilidade!
Aplausos do PSD.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, tal como está previsto no «Boletim Informativo», a Comissão Parlamentar de Juventude vai dar uma conferência de imprensa às 16 horas. Neste sentido, o Partido Social-Democrata solicita à Mesa a suspensão dos trabalhos por cinco minutos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, se é por apenas cinco minutos, ou seja, se a interrupção é por tempo tão breve, solicitaria que fossem à conferência apenas os deputados que pertencem à Comissão Parlamentar de Juventude, permanecendo todos os outros no Plenário.
Está suspensa a sessão por cinco minutos.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Após a interrupção, assumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.
Eram 16 horas e 35 minutos.
Srs. Deputados, vamos agora apreciar e votar um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos, realizada no dia 8 de Maio de 1990, pelas 15 horas, foi observada a seguinte substituição de deputado:
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD):
Gilberto Parca Madaíl (círculo eleitoral de Aveiro) por Maria Antónia Corga de Vasconcelos Dias Pinho e Melo [esta substituição é pedida nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), a partir do dia 7 de Maio corrente, inclusive].
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
João F. de Abreu Salgado (PSD), presidente - Manuel António Sá Fernandes (PSD), secretário - Alberto Monteiro de Araújo (PSD) - Arlindo da Silva André Moreira (PSD) - Carlos Manuel Pereira Batista (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) -Domingos da Silva e Sousa (PSD) -José Augusto Ferreira de Campos (PSD) - José Augusto Santos da Silva Marques (PSD) - José Manuel da Silva Torres (PSD)-Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD) -Júlio da Piedade Nunes Henriques (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS)-José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Francisco Barbosa da Costa (PRD) - Herculano da Silva Pombo M. Sequeira (Os Verdes).
Srs. Deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS e dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta e Raul Castro.
Srs. Deputados, está em discussão um outro parecer da Comissão de Regimento e Mandatos no sentido de não se pronunciar quanto ao Sr. Deputado José Manuel Torres Couto, por aquele exercer presentemente as funções de deputado do Parlamento Europeu e não da Assembleia da República, e de autorizar o Sr. Deputado João António Gomes Proença a depor como testemunha nos autos que correm sob o n.º 1205/90 pela 1.ª Secção do 5.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS e dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após a interrupção dos nossos trabalhos, por cinco minutos, requerida pelo PSD, iria agora proferir uma declaração política, retomando o tema da revisão da legislação eleitoral.
Começaria por dizer, em primeiro lugar, que é necessário que fique transparente e clara a razão do timing escolhido pelo Sr. Primeiro-Ministro, diria até melhor, o presidente do PSD, para elaborar a proposta. Aguardou, de facto, o tempo suficiente que lhe permitisse fazer as contas, todas as contas, face aos resultados eleitorais de 17 de Dezembro.
E contas para quê? É o mesmo que perguntar o que visa efectivamente a proposta nos seus contornos. Esta é uma discussão que vale a pena fazer agora, depois do debate que já aqui foi travado.
Em primeiro lugar, o PSD visa aumentar artificialmente o seu número de deputados, face ao número de votos que venha a obter nas próximas eleições legislativas. De outra forma, o PSD irá, inexoravelmente, baixar a percentagem de voto. A proposta visa conseguir que, mesmo com votos insuficientes, o PSD continue maioritário.
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Em segundo lugar, a proposta visa «varrer» da Assembleia da República, ou, pelo menos, diminuir drasticamente, as representações dos partidos minoritários. De outra forma, a proposta visa conseguir a bipolarização parlamentar e, consequentemente, governamental da vida política portuguesa, através de uma imposição administrativa tomada contra a real expressão ,do voto dos Portugueses. Tendencialmente, a filosofia é a seguinte: só é bom, só é legítimo, só é eficaz o voto dado aos partidos A e B, aos dois pólos; o resto são votos «rascas», para o lixo.
Em terceiro lugar, e finalmente, a proposta visa conseguir que ao segundo «pólo» da bipolarização, no caso ao Partido Socialista, fique garantido o lugar eterno de maior partido da oposição, sublinho, da oposição!
Dito de outro modo, o PSD quer uma bipolarização construída de tal forma que, sendo os dois pólos iguais (disse-o, há pouco), um, o PSD, o seja mais do que o outro... E o PSD quer conseguir isso, beneficiando dos inconvenientes da posição eleitoral do outro pólo, do PS, que, tendo votação média por todo o País, nunca seria beneficiado na distribuição de deputados, como sucede normalmente ao partido mais votado em cada círculo e, por isso, sucede em vários círculos ao PSD.
Esclarecido o que o PSD quer, fica a nu a hipocrisia das razões que adiantou.
O PSD não quer aproximar os deputados dos eleitores. Por um lado, as alterações propostas (e isso já foi dito aqui) não tem nada a ver com essa problemática, continuando o voto a ser confiado aos partidos e às listas que estes propõem. Por outro lado, e isso é o mais importante, distorcendo a representação eleitoral, a proposta do PSD conduz a afastar a composição da Assembleia da vontade real dos eleitores. Ao contrário do que diz o PSD, a proposta não aproxima os eleitores da Assembleia, afasta-os.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, o PSD não está a cumprir a revisão constitucional - não é isso que quer. E por uma razão óbvia, como aqui também foi salientado: porque a revisão constitucional não obriga a criar o círculo nacional, apenas o permite, e muito menos obriga a manipular os círculos eleitorais através de operações de «corte e costura», de que o PSD quer naturalmente beneficiar e quer que sejam feitas à sua medida.
A menos que o PSD, quando fala em revisão constitucional, esteja a falar do seu próprio projecto de revisão constitucional. E então verifica-se que o que é certo é que era o PSD, e só o PSD, que propunha existência (e a existência obrigatória) do círculo nacional; era o PSD que propunha que a Assembleia da República tivesse entre 180 a 200 deputados. E o facto é que, sem os 30 deputados do círculo nacional, o que fica para distribuir pelos círculos territoriais é exactamente o número de 200 deputados.
Conclusão: a proposta do PSD de Lei Eleitoral está à medida da proposta do PSD de revisão constitucional. Quanto à revisão constitucional que foi feita, para mal, já basta a descida para 230 a 235 deputados - e não deixa de ser significativo que o PSD opte pelo mínimo!
O resto dos males são os do PSD. E não são poucos males, Sr. Deputado Pacheco Pereira. É a tentativa de fabricação artificial de maiorias, ou melhor, da maioria do PSD. E a violação de um princípio que deveria ser intocável, o princípio da definição de um critério universal para a divisão territorial dos círculos, critério que deve coincidir com uma das divisões administrativas do País. Usando o distrito, ou o agrupamento de concelhos, ou até mesmo divisões de concelhos, conforme queira e de acordo com as suas próprias conveniências, o PSD quer introduzir o arbítrio nesta divisão dos círculos eleitorais e o arbítrio marca a democraticidade do processo eleitoral - com arbítrio não há democraticidade do processo eleitoral. É ainda a violação do princípio da correspondência territorial dos votos com os mandatos distribuídos. A ser concretizada, a proposta do Governo do PSD traduzir-se-ia numa operação de conteúdo e objectivo antidemocrático, numa grosseira operação de engenharia eleitoral, numa manipulação genética destinada a produzir uma mexicanização à portuguesa, indesejada e monstruosa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O que é mais espantoso é que esta operação apareça precisamente num momento da história da humanidade em que está mais claro o valor da multipolaridade, em que são arredados os maniqueísmos e em que são postos de lado os processos redutores da riqueza e complexidade da vida humana, em todas as suas componentes.
Vozes do PCP:- Muito bem!
O Orador: - O PSD, como as eleições o demonstraram, vê substancialmente reduzida a sua base de apoio. Isto «magoa» o PSD? Assim será! Que lenha dificuldade em conformar-se por já não ser, e nunca mais ser, o que conjunturalmente foi em 19 de Julho de 1987, pode o PSD sentir dificuldades em aceitá-lo. Mas o PSD não pode é querer impor, por decreto, aquilo que perdeu no combate político.
Esta operação deve conhecer o insucesso. É necessário que a opinião pública se mobilize na defesa dos valores e regras democráticas. É necessário (e isso vai verificar-se) que, em quem se situa no campo da defesa dessas regras e dispõe de um número de deputados suficiente para constituir com o PSD os dois terços exigidos para aprovação das leis eleitorais, prevaleçam as opções democráticas.
O PSD não quer dar eficácia ao sistema político; quer dar ao sistema eleitoral a eficácia de o manter artificialmente no poder. E essa é a «deseficácia» máxima de um sistema político, a de artificializar maiorias, impedindo a criação de diferentes alternativas, de reais alternativas políticas à direita.
Aplausos do PCP e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado dia 3 de Janeiro, o conselho de gerência da RTP publicou a ordem de serviço n.º 5, proibindo aos trabalhadores daquela empresa pública a prestação de «serviços a outras empresas de comunicação social» ou «serviços da mesma natureza dos prestados à RTP a qualquer outra empresa que potencialmente possam configurar situações de concorrência». Na sequência desta nota, vários trabalhadores da RTP receberam cartas de intimidação e quatro jornalistas já tem notas de culpa.
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Maria Elisa, Margarida Marante, Diana Andringa e Maria Antónia Palia estão à beira do despedimento.
Na última sexta-feira, o PSD defendeu, na sessão plenária, o projecto de lei que permitiu ao Dr. Coelho Ribeiro acumular, em compensatório pluriemprego, as funções de presidente da RTP com a profissão de advogado. Freitas Cruz, administrador da RTP, não recebeu nota de culpa por ser sócio de uma empresa de comunicação social e, ao que sabemos, nem José Eduardo Moniz nem Adriano Cerqueira foram acusados de violar o Estatuto dos Jornalistas, sendo sócios em comum de uma empresa de publicidade.
O Sr. José Magalhães (PCP):- É óbvio!
A Oradora: - No entanto, a ordem de serviço era clara. Todo e qualquer órgão de comunicação social está vedado à expressão e colaboração de todos os profissionais da RTP, estando estes igualmente impedidos de exercer qualquer actividade afim daquela que cumprem nos serviços da RTP. Implica isto que todos os órgãos de comunicação social são concorrenciais da Radiotelevisão Portuguesa, significando igualmente que não são susceptíveis de ser consideradas no combate ao pluriemprego actividades não directamente ligadas à comunicação social, mesmo que estas interfiram ou se interliguem com o exercício normal das tarefas dos trabalhadores da RTP.
É óbvio que o que se constitui como mais significativo desta ordem de serviço não são tanto as proibições indevidas que vem criar, mas sim a possibilidade que o conselho de gerência abriu a si próprio para decidir, em cada caso, da existência ou não de incompatibilidades, autorizando, caso a caso, o exercício de outras actividades. Nada garante que as autorizações concedidas pelo conselho de gerência da RTP se não façam através de critérios discricionários, colocando os jornalistas numa situação de total dependência em relação às chefias. De resto, parece ser este o objectivo último. O conselho de gerência da RTP decidiu que, em 1991, lerá de assegurar o controlo sobre os jornalistas, colocando-os a todos numa atitude servil.
É nesta perspectiva que se justifica que as notas de culpa tenham sido, até agora, apenas enviadas a quatro jornalistas mulheres, as quais, usufruindo de grande prestígio junto da opinião pública, têm seguramente uma coluna vertebral dificilmente moldável. Docilizar os jornalistas, nomeando os chefes por critérios políticos, permite fechar o cerco. A liberdade de expressão e de informação estão seriamente ameaçadas. Criar situações de dependência aos jornalistas é notoriamente retirar-lhes os estatuto de independência, fundamental ao exercício, dentro dos limites éticos, da sua profissão.
De resto, já hoje 60% da informação que recebemos em casa é feita por tarefeiros, pagos ao dia, em situação de insuibilidade e de flagrante violação da lei laboral, sem usufruir de quaisquer regalias sociais, trabalhando para além dos tempos limite e sendo utilizados pela RTP para poupar o pagamento de horas extraordinárias aos funcionários do quadro. Na RTP, diz-se que ser tarefeiro é ser escravo, calando com medo de perder o emprego e esperando, em alguns casos há mais de cinco anos, a integração nos quadros da empresa e, em geral, acabando por ser preteridos por outros que erram por critérios suspeitos.
Todos os dias, os dois principais serviços noticiosos da RTP são editados por tarefeiros. No entanto, esta situação não se verifica apenas ao nível dos jornalistas. Na verdade, 90% dos assistentes de câmara são pagos ao dia, trabalhando muito para além das sete horas normais, numa situação de clara ilegalidade. Para explicar estas situações e outras igualmente gravosas, o conselho de gerência da RTP foi convocado pela Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República. Até hoje, o conselho de gerência da RTP não deu qualquer resposta à solicitação que lhe foi feita.
Assim, na RTP, há dois tipos de jornalistas: os primeiros que, estando em situação de indigna dependência, não têm condições para exercer alguns dos seus mais básicos direitos nem exercer algumas das mais importantes obrigações. Para estes, ir aos plenários dos trabalhadores, fazer greve, perguntas inconvenientes ou contestar as ordens do chefe pode significar a dispensa no dia seguinte. Os segundos, porque menos instáveis e não cedendo ao clima de censura e em consequência da sua atitude crítica, recebem carias intimidatórias e notas de culpa.
O argumento do combate ao pluriemprego é hipócrita de mais para que não o refutemos aqui. E verdade que muitos jornalistas recorrem a um emprego para além daquele que têm na RTP. Fazem-no, em geral e em primeiro lugar, porque são mal pagos. O salário médio dos jornalistas é de 100 contos mensais, desajustado em relação à imprensa em geral e, em especial, desajustado em relação às chefias dentro da própria empresa. José Eduardo Moniz recebe, entre vencimento, utilização de viatura, gasolina, cartões de crédito e demais regalias, cerca de um l milhão de escudos, dez vezes mais do que o salário médio dos jornalistas acima referido.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - É escandaloso!
A Oradora: - Por outro lado, os critérios de promoção, dentro da RTP, são naturalmente desmotivantes, se tivermos em conta que se baseiam em ligações pessoais, de amizade e outras, e apenas ocasionalmente relacionados com a competência profissional.
Por último, o duplo emprego é, em muitas situações, para os jornalistas, a única forma de se realizarem profissionalmente. Maria Antónia Palia, antes deste conselho de gerência entrar em funções, produziu, em dois anos, 30 programas, com 30 minutos cada. Nos últimos cinco anos, com este conselho de gerência, Maria Antónia produziu apenas três programas, de 50 minutos cada. Jornalista há 40 anos, encontra-se afastada da informação, subaproveitada nos serviços de arquivo da RTP.
Também Diana Andringa não se encontra colocada, não tendo neste momento quaisquer funções definidas. E muitos outros, a quem a RTP não tem dado qualquer trabalho, procuram, noutros órgãos de comunicação social, a oportunidade de exercer a sua profissão.
Assim, a questão do pluriemprego continua a ser falsa, quando a própria RTP o incentiva através da contratação de profissionais de outros órgãos de comunicação social. Joaquim Furtado e Raul Durão já estavam na RDP e a televisão sabia disso quando lá os foi buscar. A RTP incentiva o pluriemprego e a concorrência desleal de sinal contrário quando convida jornalistas de outros órgãos de comunicação social para editar programas na RTP, gastando com esses contratos indiscutivelmente mais do que
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aquilo que despenderia se utilizasse os profissionais do seu próprio quadro. Tratar-se-á ou não de concorrência desleal da RTP para com os seus trabalhadores, quando paga regiamente a comentadores especializados, desprezando o potencial humano desaproveitado que tem nas suas próprias fileiras?
À luz destes factos, como pode a RTP dar-se ao luxo de dispensar, através de despedimento imediato, jornalistas de prestígio e de qualidade como Margarida Marante e Maria Elisa?
Muito do que disse é compreensível se percebermos que se trata de uma política conduzida no sentido de dotar a RTP de jornalistas dóceis e de tal modo dependentes que se não atrevam a contrariar medidas que ponham em causa a ética e o rigor da informação.
Igualmente se torna compreensível que Veiga de Macedo se tenha demitido do conselho de administração da RTP legando um relatório onde são denunciados processos menos limpos e situações irregulares na empresa. Contra isto e contra a concentração de poderes quase ilimitados nas mãos de um director esteve também o Sr. Condorcet, que, tendo sido convidado para reestruturar a empresa, acabou por se demitir da administração.
É costume dizer-se que há males que vêm por bem: Estes processos disciplinares foram a gota que transbordou do copo, permitindo trazer à luz aquilo que a administração da RTP tem procurado esconder. Manipulação de informação, censura e clientelismo já não surpreendem nem constituem dúvida para ninguém. Na RTP estão criadas as condições para que os jornalistas não possam exercer, de uma forma independente, a liberdade de imprensa. Quanto mais os valores da ética, da independência e da liberdade são enaltecidos nesta tribuna, mais se difama a comunicação social, mais os jornalistas são tratados com desrespeito pelas chefias, mais se amesquinha todo o processo.
O clima de medo e controlo sente-se logo à entrada da 5 de Outubro, onde os seguranças fiscalizam relógios de ponto que os funcionários picam e repicam, ao longo do dia, seja para buscar a notícia na rua ou o envelope deixado na recepção. A discricionariedade dos critérios nas promoções e admissões para os quadros passa de boca em boca, dando origem a histórias sórdidas que não abonam a favor da imagem desta empresa pública.
Os processos de despedimento, não tendo mérito nenhum em si mesmos, vão seguramente valer pelo aprofundamento de um conhecimento a que temos direito, denúncia que se requer, urgente e indispensável, das situações de imoralidade, falia de ética e negócios privados, a cujos rumores já não podemos ser indiferentes.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O 25 de Abril foi também feito por uma informação livre e independente. A empresa pública que constitui a Radiotelevisão Portuguesa deve assegurar o cumprimento destes valores e desenvolver todas as condições para a igualdade de oportunidades no combate a todas as formas de discriminação, transmitindo os princípios que assumimos como fundamentais e indispensáveis ao regime democrático.
Não temos uma, temos todas as palavras a dizer em relação à forma como este serviço público desempenha as suas funções. Lamentamos afirmar que consideramos que não as tem cumprido bem.
De uma coisa estamos certos: não aceitamos que, sob nenhuma forma ou a qualquer pretexto, impenda sobre os nossos jornalistas uma mão duríssima que os prive da sua capacidade de criar, da liberdade de informar com dignidade e isenção, como é sua obrigação e seu objectivo último. Não queremos que os nossos profissionais de comunicação social sejam convocados à mansidão, domados com as rédeas do poder. Queremo-los irreverentes, críticos e questionadores, mesmo que seja contra nós. Precisamos deles como factores da mudança qualitativa da sociedade e não como instrumentos para a manutenção do status quo. Para isto, contarão com o nosso apoio, mesmo que seja contra o conselho de gerência da RTP.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Helena Roseta.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Lacão,. Natália Correia, José Manuel Mendes, João Corregedor da Fonseca, Helena Roseta, que utilizará tempo cedido pelo Partido Os Verdes, e Herculano Pombo.
Os tempos das perguntas e das respostas que ultrapassem os 10 minutos da declaração política serão descontados - como tem sido sempre a regra - nos tempos atribuídos a cada grupo parlamentar nos períodos de antes da ordem do dia. E assim que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca vai fazer uma pergunta, utilizando tempo concedido pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes, do seu tempo do PAOD.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - A Sr.ª Deputada Isabel Espada traçou um quadro extremamente preocupante da situação do serviço público de televisão em Portugal, onde jornalistas credenciados e com provas dadas ao nível da sua capacidade profissional se encontram «na prateleira», impedidos de desenvolver, todavia, outras actividades profissionais, no âmbito do direito a exercer a actividade informativa.
Por outro lado, esta mesma actividade informativa, no essencial, acaba por ser exercida, nalguns casos, por um conjunto de candidatos a profissionais de informação, o que, em termos globais, estabelece um critério de dependência e um ambiente político, em que, esse mesmo critério de dependência, pela via hierárquica típica do serviço e da estrutura empresarial existente, acaba sempre por terminar onde sabemos: na própria tutela governamental.
Era pois altura de, em nome da liberdade de imprensa e da autonomia dos jornalistas, procurarmos, em definitivo, quebrar este ciclo vicioso. Ora, isso só se fará, em nosso entender, no dia em que conseguirmos aprovar, na Assembleia da República, um estatuto que garanta uma verdadeira independência para o serviço público de televisão e de rádio no nosso País. Esse é um debate que, por parle do PS, estará sempre na ordem do dia, até que, finalmente, possa ser concretizado.
No entanto, gostaria de sublinhar que parece existir aqui uma dualidade de critérios, dois pesos e duas medidas: por um lado, o Governo apresenta uma proposta de lei visando a possibilidade do pluriemprego entre altos cargos da Administração Pública e outras funções privadas, embora na televisão pareça estar conformado com essa regra de rigidez; por outro lado, curiosa e contradi-
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toriamente, no domínio da televisão pública, não aceita a adopção do princípio da exclusividade, que era aquele que justamente permitiria garantir um estatuto remuneratório adequado para todo aquele conjunto de profissionais de informação que, por esse regime, optassem por exercer as suas funções no quadro próprio da televisão.
Existe, portanto, uma contradição própria nesta dualidade de critérios e urge, por isso mesmo, a necessidade de irmos até ao fim. E irmos até ao fim, como sublinhei, para além das denúncias conjunturais - certamente relevantes e importantes -, até ao problema de fundo, que é o de podermos implementar uma solução institucional que acabe definitivamente com todas as tutelas abusivas e, assim, com toda a diminuição, cada vez mais preocupante, do estatuto dos jornalistas na sociedade portuguesa.
Aplausos do PS e do PRD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.
A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada: Considerando que existem na televisão funcionários do sexo masculino, e altos funcionários, que praticam o pluriemprego, surge naturalmente a estranheza de que só mulheres tenham sido penalizadas por se encontrarem nessa circunstância.
A pergunta a fazer é, coerentemente, se a Sr.ª Deputada acha que terá sido realmente a obrigação da exclusividade que determinou terem essas jornalistas recebido a nota de culpa, visando um processo disciplinar. Mas como e por que não também os homens que se encontram nessas circunstâncias? Ou será a fatalidade biológica de perpetuarem a figura feminina, o estigma da mãe Eva que deu a conhecer a Adão o prazer que um certo puritanismo bíblico haveria de classificar de pecado? A ser assim, trata-se de uma residual ingratidão «adâmica» que, tendo hoje o nome de misogínia, só não é uma anedota porque assume aspectos intoleráveis no tratamento que atingiu as quatro referidas jornalistas.
Vozes do PS, do PRD e de Os Verdes: - Muito bem!
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - O Sr. Deputado Silva Marques ficou preocupado!
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, para pedir esclarecimentos, quero informar de que o Partido Ecologista Os Verdes cedeu algum do seu tempo disponível à Sr.ª Deputada Helena Roseta, para formular o seu pedido esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Enquanto a Sr.ª Deputada Isabel Espada traçava o retrato deveras impressionante de uma situação podre, o PSD, ciente do poder que detém nos media, bocejava. E a bocejar continua... É significativo!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ou rindo!...
O Orador: - Acontece que aquilo que estamos a discutir é de uma extrema seriedade. Impõe-se saber se uma operação que pretende ser moralizadora efectivamente o é, ou se, pelo contrário, encobre uma prática que a níveis superiores e a uma determinada escala 6 bem mais grave e bem mais merecedora de uma intervenção atenta e eficaz dos órgãos de tutela, desde logo daqueles que têm especiais responsabilidades na matéria.
Sabemos que este súbito protagonismo ético, agora liderado pelo conselho de gerência da RTP, e ainda menos credível justamente porque actua de forniu selectiva e à revelia dos próprios princípios em nome dos quais parece agir. Permeabilizando a hipótese de um jornalista que trabalhe na RTP poder vir a escrever duas laudas num periódico da imprensa escrita ou a produzir crónicas numa qualquer rádio privada desde que para tal esteja autorizado pelo conselho de gerência, como parece, estar-se-á, ao cabo e ao resto, perante uma situação em que esse órgão escolhe quem pode ou não acumular, enquanto todo ele, ou uma parte dele, pelo que se sabe, acumula e acumula bem. Isto é, acumula «forte e grosso». Portanto, acumula mal!...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto!
O Orador:-Trata-se, logo à partida, de todo um projecto de amordaçamento, de domesacação, de inabilitação ou de interdição dos profissionais da comunicação social, independentemente das simpatias que, em concreto, mereçam ou deixem de merecer a cada um de nós, que, pelo simples facto de o serem, têm o direito não apenas ao trabalho mas ao desenvolvimento livre e consciente das suas faculdades no quadro das funções que lhes competem.
Pergunto, Sr.ª Deputada Isabel Espada: pensa que a Alta Autoridade para a Comunicação Social, cuja reapreciação terá lugar nesta Câmara no próximo dia 15, na qual como se configura e como o PSD se prepara para reiterar, poderá ter algum papel interventor positivo neste domínio, como deveria ter, se, embora verdade, de uma Alta Autoridade se tratasse? Do seu ponto de vista, o que é que esta Câmara terá de fazer para se esclarecer e actuar por forma a não permitir que situações como estas, de que nos deu notícia, se prolonguem no tempo e no espaço?
É que a Assembleia - e quero lembrá-lo, para finalizar!- se apresta a votar uma lei de incompatibilidades de cargos políticos e altos cargos públicos que, longe de ser um acto de moralização, é um acto de permissividade a todos os procedimentos inaceitáveis que na sua declaração condenou e que esta bancada, de uma maneira sistemática, tem combatido.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O que admite que esta Casa responsável e soberana venha a empreender?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente:- Para pedir esclarecimentos, em tempo cedido por Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - A Sr.ª Deputada Isabel Espada trouxe um quadro rigoroso do que se passa na Radiotelevisão Portuguesa. É evidente que, para o conselho de gerência da Radiotelevisão Portuguesa, na minha opinião, o jornalismo se mede pela bitola da mercearia a retalho.
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O conselho de gerência da Radiotelevisão Portuguesa, que desrespeitou o Sr. Presidente da Assembleia da República e esta Assembleia da República por, ao ser solicitado por uma comissão parlamentar para uma audiência, a fim de tratar deste problema, não ter, ao fim de várias semanas, dado qualquer resposta, não entende que os jornalistas, antes de mais, devem ser competentes, como é evidente, livres e independentes. Prefere colocar na «prateleira» os jornalistas competentes, livres e independentes que não se subordinem aos seus interesses, ou seja, aos interesses do poder, aos interesses da maioria.
O que se passa na Radiotelevisão Portuguesa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é imoral, todos nós o sabemos, e mais imoral é o que se passa no sector da informação, que culmina - pasme-se!-com o facto de a maior ou grande parte de jornalistas, nomeadamente jovens, que aparecem nas pantalhas e fazem noticiários serem tarefeiros, tentando ter dessa maneira, o conselho de gerência e os dois directores de informação jornalistas mais dóceis e mais domesticáveis.
A atitude do conselho de gerência não é, na minha opinião, moralizadora, ao contrário do que ele quer fazer crer. Aliás, já foi aqui citado o problema das incompatibilidades, em que o Primeiro-Ministro, ministros, secretários de Estado, chefes de gabinetes ministeriais, etc., podem ter pluriemprego, em resultado de uma proposta de alteração que o PSD aqui apresentou.
A verdade é que muito do que se passa na Radiotelevisão Portuguesa, Sr.ª Deputada, é imoral. Não vamos defender determinado tipo de situações, mas vou colocar-lhe apenas uma questão: perante esta situação, estará o Grupo Parlamentar do PRD interessado em apoiar ou em tomar a iniciativa de criar uma comissão de inquérito parlamentar, a exemplo de outras que já existiram nesta Assembleia da República, para se efectuar um inquérito rigoroso a toda a Radiotelevisão Portuguesa, nomeadamente desde a altura em que este conselho de gerência tomou posse, de forma a abranger todos os níveis- desde a porta até ao conselho de gerência, sem esquecer o que se passa com o secretário-geral da Radiotelevisão Portuguesa, com os directores de pessoal, de informação, etc. -, enfim, para que tenhamos um quadro ainda mais rigoroso do que se passa, a fim de preparar qualquer directiva, no sentido de conseguir moralizar a Radiotelevisão Portuguesa?
Sr.ª Deputada Isabel Espada, gostaria de saber se, perante o quadro inquietante que traçou, estará ou mio V. Ex.ª interessada em encimar uma proposta de deliberação desta Câmara no sentido de se efectuar, no mais curto espaço de tempo, um inquérito, a todos os níveis, à Radiotelevisão Portuguesa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr.ª Deputada Isabel Espada, pedir esclarecimentos, perante a clareza da sua intervenção, é uma figura de retórica regimental, como não poderia deixar de ser, pois a sua intervenção foi suficientemente clara para que não tenhamos de pedir qualquer esclarecimento, aliás, na linha do que tem sido feito pelos anteriores oradores.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Herculano Pombo, a tratar-se de uma figura retórica regimental, como não podia deixar de ser, não sei qual é o sentido do pedido de esclarecimento.
O Sr. Luís Roque (PCP): - Essa agora!
O Orador: - É exactamente o mesmo que tem vindo a ser seguido, Sr. Presidente, desde o início da utilização dessa figura.
Como o Sr. Presidente sabe, bastante melhor do que eu, até por razões de permanência mais demorada nesta Assembleia, a figura regimental do pedido de esclarecimento serve não só para nos esclarecermos mais como para nos associarmos à clareza das intervenções produzidas e, neste momento, é esta a intenção da minha intervenção. Se o Sr. Presidente me permitir usar esta figura regimental, fá-lo-ei; caso contrário terei de recorrer a outra figura regimental ao meu alcance, enfim...
O Sr. Presidente:- Sr. Deputado Herculano Pombo, permito-lhe a utilização dessa figura regimental, mas não posso deixar, como é óbvio, de o chamar a atenção, pois como o Sr. Deputado sabe, uma vez que até tem assento na conferência de líderes, essa não é a interpretação regimental correcta.
Faça o favor de fazer o seu pedido de esclarecimento, mas sejamos tão regimentais quanto o necessário.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Serei regimental ao ponto de não invocar, por exemplo, uma outra figura regimental, como a defesa da honra e consideração, como bastas vezes tenho visto aqui fazer, para me associai' à declaração da Sr.ª Deputada Isabel Espada, mas, com a licença de V. Ex.ª, invocarei apenas a figura regimental do pedido de esclarecimento.
Sr.ª Deputada Isabel Espada, ficou suficientemente claro, para nós, aliás já eslava, que sendo a Televisão uma entidade de serviço público, com a importância que tem, é cia que hoje, enfim, já não detentora da «tesoura» da censura, passa, por assim dizer, os certificados de existência dos próprios factos, que não existem enquanto não passam na televisão. E é isto o que se passa hoje na sociedade portuguesa, como se passa noutras.
Portanto, ser detentor deste poder obriga a que a opinião pública, e nomeadamente a Assembleia da República, mantenha um acompanhamento de tudo o que se passa no interior deste serviço público.
O que aqui foi denunciado é de extrema gravidade e fica-nos a mágoa de saber que pessoas, a quem V. Ex.ª pós nome, porque o tem, nomeadamente os jornalistas José Eduardo Moniz e Adriano Cerqueira, entre duas encenações noticiosas e duas corridas de automóveis, ainda tem tempo para tecer os fios da mordaça com que tentam amordaçar os jornalistas com anos de profissão e que nada devem h dignidade e à ética da sua profissão.
É lamentável que assim seja e a única coisa que me resta fazer neste momento,, para alem de manifestar a minha revolta e o meu desespero, por assim ser, é associar-me ao desassombro e à clareza da sua intervenção.
É bom que os deputados tenham a noção de que as coisas devem ser ditas na altura própria, com os nomes próprios, não devem ter medo de pôr nome às coisas ou às pessoas nem de adjectivar as coisas. É de facto um assombro aquilo que nos entra diariamente pela casa dentro. Quando esperamos ver o País passar na nossa
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casa, vemos uma agência de venda de automóveis, que tem dificuldades em vendê-los. Enfim, de vez em quando, somos presenteados, mas somos quem paga a taxa. Eu não a pago e aqui o declaro solenemente; só pagarei um serviço público quando de facto o receber como tal, mas como não o recebo não o pago.
O que é lamentável que aconteça no nosso país é que, numa altura em que se aproximam momentos importantes para a nossa democracia, tudo esteja a concorrer para que os actos mais importantes não sejam enformados pela liberdade de informar, como consta da lei e da Constituição, mas pela mordaça, que é, como eu disse, já não a da «tesoura» da censura, já não a do carimbo do visto da censura, mas tecida com fios mais difusos e bastante mais eficazes.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, em tempo cedido pelo Partido Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.
A Sr.ª Helena Roseta (Indep.): - Muito obrigado, Sr. Presidente, se for insuficiente, creio que o Partido Socialista também pode ceder algum do seu tempo, segundo informação que me foi dada.
Sr.ª Deputada Isabel Espada, em primeiro lugar, quero felicitá-la pela coragem que demonstrou na intervenção com que denunciou aqui um processo de manipulação evidente e por ter dito uma frase, bastante rara, e que não quero deixar de sublinhar, que foi a de que queremos jornalistas independentes, mesmo que sejam contra nós. Esta frase, na boca de um político, merece ser aplaudida, porque a independência é isso mesmo, mesmo que seja contra nós!
Gostaria agora de colocar-lhe duas questões.
Já foi aqui abordado, tanto pela deputada Natália Correia, e sublinho, como por outros deputados, que o conceito de moralização passa pela ideia de que só pode haver um peso e uma medida e que qualquer atitude moralizadora perde esse sentido se passar a haver dois pesos e duas medidas, consoante.
Ora, o que verificamos nesta medida é que ela atingiu quatro mulheres e, por acaso, não atingiu qualquer homem, por enquanto.
Pensa a Sr.ª Deputada que há alguma razão para isto, em particular, que tenha a ver com a menor docilidade dessas quatro jornalistas ou com qualquer outra razão? A pergunta não é destituída de sentido, porque já tenho visto, muitas vezes, propostas de política empresarial e de emprego, no sentido de dizer que, quando há falta de emprego, o melhor é as mulheres irem para casa. Pode ser que haja qualquer ligação, não sei se há...
Certamente, a Sr.ª Deputada tem consciência - disse-o na sua intervenção - de que esta é uma gota de água de um processo que se arrasta há muito tempo. É importante salientar que algumas destas jornalistas, que foram agora afectadas por esta absurda medida, provavelmente encontraram alternativas profissionais prestigiantes, precisamente depois de terem sido postas na «prateleira» da RTP.
Pergunto: que medidas, que sugestões ou que actuações devem ser tomadas para evitar que profissionais de qualidade sejam postos na «prateleira» e que, ainda por cima, sejam castigados por, após terem sido postos na «prateleira», terem encontrado, pela sua qualidade profissional, alternativas de trabalho. Isto é que 6 um absurdo total! Esta política de colocar os melhores na «prateleira» é que deve ser igualmente denunciada.
A Sr.ª Deputada referiu-se a essa política, mas o meu pedido de esclarecimento é no sentido de saber se se pode acrescentar alguma coisa a esta questão.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Presidente, antes de mais gostaria de agradecer as perguntas que me foram colocadas, às quais me proponho responder de uma forma global porque na minha intervenção houve muita coisa que ficou por dizer... É que eu apenas dispunha de oito minutos e tinha inúmeros factos para relatar.
Como devem calcular, antes de fazer esta intervenção, falei com vários jornalistas, que me relataram factos, muitos dos quais mais graves do que aqueles que aqui documentei. E, é espantoso!..., muitos desses jornalistas pediram-me encarecidamente para não revelar os seus nomes, o que me parece extremamente grave! Eles tiveram medo que eu referisse os seus nomes na minha intervenção porque sabiam que no dia a seguir, no mês a seguir ou em qualquer outra altura poder-lhes-ia acontecer algo semelhante àquilo que sucedeu à Diana Andringa e às outras três jornalistas que neste momento estão com notas de culpa, e, eventualmente, a outros jornalistas que estão nessa mesma situação de risco.
Essas situações existem de facto e os jornalistas sabem disso, especialmente os da RTP.
Em geral, e não me refiro a nenhum partido em especial- neste momento temos este Governo, mas qualquer outro pode ter essa tentação-, todos os governos têm a tentação de manter o poder, de o perpetuar. Como sabem, a comunicação social, especialmente a RTP, é uma das formas mais rápidas e mais directas de conseguir perpetuar o poder. E por esta razão que a RTP tem situações mais graves de censura, de manipulação da informação do que qualquer outro órgão de comunicação social. Há, de facto, censura, medo e uma forte tentativa de criar situações de dependência aos jornalistas.
Ora, com jornalistas em situação de dependência ó totalmente impossível haver independência na informação. Esta é uma questão que tem de ser interiorizada por todos, à qual não se pode responder com leis, com estatutos ou com projectos. E digo que é uma questão que tem de ser interiorizada porque é necessário que aqueles que exercem o poder tenham consciência de que a comunicação social tem de ser independente para poder cumprir devidamente o seu papel, pois, a não ser assim, não faz sentido que exista!
É neste sentido que gostaria de responder à pergunta que me foi formulada, e que ia no sentido de saber se o estatuto dos jornalistas consagra...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Posso interrompê-la, Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Deputada Isabel Espada, estou de acordo com a ideia de que boa parte disto tem a ver com o caldo de cultura em que nos movemos e que os apelos, as chamadas de atenção, os alertas - como este que hoje aqui nos trouxe - são absolutamente essenciais.
Gostaria, no entanto, de lhe perguntar o seguinte: sem prejuízo dessa tomada de consciência - ou mesmo até por
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causa dela -, não nos deveríamos empenhar em ir mais longe? É que o ir mais longe é garantir um estatuto institucional de autêntica independência para os órgãos do serviço público de comunicação social. A meu ver esse é um contributo indispensável para o Estado de direito democrático e que até hoje, por razões várias, ainda não lográmos concretizar.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Como é óbvio, Sr. Deputado, concordo consigo. Apenas quis dizer que não é suficiente e que esta questão tem de ser intimamente assumida por todos nós.
Há outra questão importante, e que foi aqui abordada de um modo directo pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca e de um modo indirecto pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes, à qual gostaria de me referir.
Quando comecei a fazer a minha intervenção disse que havia factos bastante mais graves que estes que seria bom relatar, factos esses que provavam, de uma forma muito clara, que havia situações extremamente graves na Radiotelevisão Portuguesa. Nessa altura pensei fazer uma referência explícita ao seguinte: seria extremamente importante que o Parlamento, que a Assembleia da Republica assumisse um papel mais determinante e de fiscalização. Estou totalmente disponível - e penso que o meu grupo parlamentar também estará - caso a Assembleia da República se decida a criar uma comissão de inquérito que possa acompanhar, explicar e denunciar, de uma forma muito clara, estas situações, que são verdadeiras, que não são boatos, que estão a acontecer e a agravar-se de dia para dia.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Muito bem!
A Oradora: - Nesse sentido, gostaria de dizer que o meu grupo parlamentar está totalmente disponível para uma iniciativa desse tipo. De resto, penso que esta é uma daquelas coisas que o Parlamento pode, neste momento, fazer com mais eficácia.
Em relação à questão colocada pelas Sr.ªs Deputadas Natália Correia e Helena Roseta, creio que realmente se trata de uma coincidência extremamente complicada. No fundo, foram quatro mulheres que receberam as primeiras notas de culpa. Não sei se, eventualmente, pensaram que as mulheres tinham a espinha dorsal mais maleável e que, portanto, se dobravam com mais, facilidade a uma intimidação desse tipo. Não gostaria de tirar conclusões em relação a esta matéria porque não há provas rigorosamente nenhumas. Pode ter sido apenas uma coincidência...! Não obstante poder ser uma coincidência, não deixa de ser um facto!
Todos nós sabemos que se preparam mais situações do tipo daquelas que estão configuradas para estas quatro jornalistas. Outros jornalistas estão na calha para passarem pela mesma situação, não só mulheres mas também homens. No fundo, creio que o que está em causa não é o sexo ou o partido a que esses jornalistas pertencem; em geral, o que é atacada é a capacidade que cada um tem de ser independente e crítico, logo a capacidade crítica.
Provavelmente, essas quatro mulheres, que têm uma forte capacidade crítica, uma forte isenção em relação ao poder, são atacadas não por serem mulheres mas, sim, porque são isentas e tem características de independência, sendo por isso pessoas a quem convém criar algumas situações de instabilidade.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: É função constitucional da Assembleia da República apreciar os actos do Governo e da Administração.
Ao PS, como principal partido da oposição, cabe, pois, também, e com particular legitimidade, emitir regularmente juízos sobre a forma como o Governo leva a cabo as tarefas que democraticamente lhe foram confiadas. Com vista a esse fim, afigura-se-nos conveniente fazer uma rápida digressão retrospectiva pelo passado recente. Além de avivar as memórias, torna mais clara e compreensível a situação presente.
O PPD/PSD assumiu o Governo por inteiro na sequência das eleições legislativas de 1985, após participar durante cerca de dois anos no Governo do bloco central, cujo Primeiro-Ministro foi o actual Presidente da República e então secretário-geral do PS, Dr. Mário Soares.
O dito Governo do bloco central foi constituído na base da proclamada necessidade de um consenso nacional alargado que permitisse desencadear as medidas impopulares, mas indispensáveis, para recuperar o País, destroçado por três anos de governo da Aliança Democrática, onde preponderava o PPD/PSD. Desde a sua posse o Governo do bloco central, em consonância com a campanha eleitoral de onde saiu, e pela voz do PS, informou, leal e corajosamente, os Portugueses de que seriam necessários dois anos de fortes; sacrifícios para restaurar a economia e preparar o País para a adesão à CEE. Ficava implícita - e foi por vezes explícita - a promessa de que após esses dois anos iniciais o País poderia aspirar a melhorias sensíveis na qualidade de vida dos Portugueses.
Foi esta a estratégia que o PPD/PSD não pôde tolerar, sob pena de suportar o perigo de uma duradoura subalternização ao concorrente que, desde sempre, definiu como seu adversário principal - o PS.
Daí que dobrado o cabo das tormentas dos sacrifícios, com os principais indicadores a melhorarem substancialmente, sob a influencia do controlo das (mancas públicas, com a reanimação da economia, com a baixa contínua da inflação, restabelecido o crédito externo, com a balança de pagamentos a apresentar saldos tranquilizadores, consumada a adesão à CEE, os que desde sempre sabotaram e instabilizaram, a partir do interior do PPD/PSD, a política governamental saltaram e, empunhando o estandarte da candidatura presidencial, então por eles considerada decisiva para o futuro do País, tomaram o poder no partido para denunciar a coligação e provocar eleições enquanto era tempo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O ultimato então dirigido ao PS e as exigências respectivas eram apenas teatro para uma ruptura já conspirada.
Vieram as eleições e com elas a imoral imputação pelo PPD/PSD ao PS da responsabilidade exclusiva pelos sacrifícios suportados pela população em geral, pelos trabalhadores e reformados em particular nos dois anos de governo do bloco central.
Essa campainha pavloviana e o aparecimento de um novo partido, anunciado como portador de todas as vir-
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tudos, conduziram um eleitorado cansado de sacrifícios a penalizar fortemente o PS, erigindo o PSD em partido mais votado com os seus 29% de sufrágios.
Finalmente, aproveitando-se de ingénuas cumplicidades, o PPD/PSD era governo sozinho, com um futuro atapetado de facilidades, profetizando um governo de 100 anos.
De facto, a conjuntura não podia ser melhor. Na OCDE talvez nenhum País fosse mais beneficiado por ela do que Portugal. Além da situação de franca recuperação herdada do governo anterior, o novo executivo beneficiou da acentuada baixa dos preços do petróleo, da baixa do dólar, da baixa dos preços da carne e dos cereais, da baixa das taxas de juro, das remessas da CEE, da melhoria dos fluxos turísticos, da espectacular recuperação do comércio mundial, enfim de uma variação na relação dos termos de troca internacionais tilo favorável a Portugal como há décadas não havia memória.
Vozes do PS: -Muito bem!
O Orador: - Deslumbrado, o PPD/PSD, com a modéstia que caracteriza os seus responsáveis, invocou a genial infalibilidade governativa como causa de tão benéfica conjuntura internacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
E, mais uma vez, outros lhe facilitaram a vida, provocando, imponderadamente, a sua queda e abrindo caminho a novas eleições. Aproveitando as eleições, o PPD/PSD carregou nas tintas da demagogia, utilizou a numerosa clientela que entretanto arregimentara e, sem problemas de tesouraria - pois até nas despesas da perdida campanha presidencial poupara -, investiu a fundo numa campanha em que prometeu aos Portugueses que, se tivessem juízo, se fossem obedientes e se votassem PPD/PSD, todos seriam ricos a curto prazo. Começou aqui o descalabro. Não se pode prometer tanto a tantos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É certo que alguns ficaram ricos. Outros estarão ficando. Porém, o seu número, que talvez chegue para eleger meia dúzia de assembleias de freguesia, é insuficiente para eleger maiorias parlamentares.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador:-Entretanto, o Governo, perdido o álibi da falta de apoio maioritário, com um Presidente da República de que se não pode queixar, obtida em negociação leal, por parte do PS, a revisão constitucional, não consegue mais mascarar a sua incompetência, a sua falta de estratégia, a sua incapacidade para responder aos desafios postos pela necessidade de uma Administração moderna, democrática, transparente.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Na CEE é o falhanço da tarefa de mobilizar o País para, durante o período de transição, levar a cabo as alterações estruturais que lhe permitam libertar-se da situação deprimente de ser o primo pobre e afastado de uma família rica. Longo é o rol. São as fraudes grosseiras e suspeitas nos dinheiros do FSE.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É a oportunidade perdida na agricultura, onde o combate «revanchista» a um colectivismo agrário em decadência, numa zona restrita do País, sublima a inexistência de um programa urgente de reforma agrícola, onde o emparcelamento aparece nos discursos mas não na acção, onde o rejuvenescimento dos agricultores é excepção e não regra, onde, em suma, o mundo agrícola permanece desarmado para enfrentar a dura competitividade imposta pela política agrícola comum.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É a apatia nas pescas e na agricultura derivada de uma burocracia estiolante e desorientada.
São as promessas não cumpridas na educação, é o retrocesso na saúde, é a paralisação da justiça, o mal-estar nas forças armadas e no corpo diplomático, é a imprevidência, a arrogância e a ineptidão tecnocrática na política dos eixos rodoviários, é o esbracejar penoso da política do ambiente, entalada entre o eucalipto, os campos de Alcochete e o crude de Porto Santo, de Sines.
Aplausos do PS.
É o apego ao centralismo burocrático, a recusar a prometida e devida regionalização. O trabalho infantil, as injustiças sociais agravadas, a expropriação de centenas de milhões de contos à classe média, que o Governo empurrou para a bolsa e onde, friamente, lhe preparou uma emboscada a favor de meia dúzia de novas grandes fortunas, é o descalabro na inflação e na balança comercial.
A par de todos esses fracassos, confiado na sua obediente maioria e no controlo da RTP, o Governo vai apimentando a política do dia-a-dia com uns quantos casos exemplares, sejam eles as habilidades fiscais de um ministro das Finanças, seja o peculiar modo de contratar do Ministério da Saúde, seja ainda a explicação do insólito caso Drexel.
Risos do PS.
Paralelamente, por coincidência, enquanto os restantes partidos parlamentares sofrem penúria financeira, o PPD/PSD prospera: o partido apoiante do Governo exibe largueza de meios nas suas campanhas, constrói em Lisboa e em outras localidades do País caríssimas e apetrechadíssimas sedes e ainda se orgulha de acumular centenas de milhares de contos em contas bancárias.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No dizer de insuspeito cronista, entre a politique d'abord e a politique d'affaires o Governo PSD optou pela segunda. No meio dos seus novos barões muitos são os capazes - salvo seja - de matar pai e mãe para pragmaticamente poderem ir ao baile dos órfãos.
Aplausos do PS.
Perante este quadro modesto, e longe de ser exaustivo, compreende-se o pânico do PPD/PSD.
As eleições de 1989 para o Parlamento Europeu e para as autarquias demonstram que a composição actual desta Assembleia já não corresponde à vontade do País. Um número crescente de portugueses constata diariamente que o Governo vai nu.
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O PPD/PSD teme as eleições. Daí que optasse, irreversivelmente, por apoiar, com o maior desapego que lhe for possível, o eventual, mas provável, candidato à presidência da República, Dr. Mário Soares. É a fuga em frente, mas uma fuga que precipita o desastre. Pela primeira vez desde 1976 o PPD/PSD vai ser dilacerado à esquerda e à direita pelas tempestades cujos ventos semeou. O mundo vive uma época de clarificação política em que os grandes equívocos dos tempos modernos passaram ou estão a passar à história.
Nos últimos meses assistimos, com fraterno e solidário júbilo, aos decisivos avanços na luta pela liberdade, pela dignidade cívica e pela justiça social em que desde sempre se empenham os socialistas democráticos de todo o mundo. Referimo-nos ao processamento final das derrotas do marxismo teológico, do apartheid e de outras formas de opressão.
De nada vale ao PPD encostar-se a essa árvore, entoando salinos tartufos na procura de ganhar em dois tabuleiros e acusar, por um lado, o PS do que ele se orgulha de ser, isto é, socialista, e, por outro, numa oitava abaixo e piscando o olho aos seus Miguelistas, lembrar que se diz social-democrata. Bem pode o PSD berrar que o PS de Sampaio já não d o PS de Constâncio, como antes berrava que o PS de Constâncio já não era o de Mário Soares e no tempo de Soares pinchava que o PS era igual ao PCP. Isso já deu!
Risos do PS.
Afinal o PS tem ligações históricas, institucionais e doutrinais com todos os partidos socialistas e sociais-democratas na União Europeia e na Internacional Socialista. O PS contribuiu e esteve associado às acções da IS e do grupo socialista do PE que activamente auxiliaram as mudanças já verificadas no mundo comunista e na África do Sul. O PS está confiante no seu futuro e orgulha-se do seu passado de grandes serviços prestados ao País.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Bem pode, pois, o PPD apelar ao seu nome de crisma para beneficiar das vitórias do socialismo democrático. Na Europa política o PPD, que também assina PSD, é visto como uma clara «Branca das Neves».
Reduzido pelos seus próprios erros e vícios, a oposição à oposição, devorado pelo medo, consta que o partido do Governo foi ao psicólogo ou fez vir o psicólogo a si, como se os seus pesadelos fossem causa e não efeito dos seus males. Só que o mal do PPD/PSD e do seu governo tem outra origem, que é pecado capital - a gula. Comeu demais, engordou e a sua coluna vertebral, provadamente cartilaginosa, não suporia o peso de tamanho tecido adiposo. Daí que o povo português já lhe tenha prescrito o tratamento - uma longa e rigorosa dieta de poder.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD):-Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, já há muito que não o ouvíamos falar nesta Câmara. Regressou finalmente de Estrasburgo e resolveu inaugurar a sua intervenção parlamentar na Assembleia da República com este discurso. Melhor: este discurso foi apresentado como uma declaração política, mas, dado o estilo e o ênfase que colocou na sua intervenção, mais parecia uma declamação política perante os deputados à Assembleia da República.
Devo dizer que tenho pena que não tenha trazido novos argumentos. Todo o discurso foi, no fundo, requentado, feito de argumentos estafados e que, efectivamente, têm sido aqui repetidamente aduzidos - mas não demonstrados - por parte do Partido Socialista, por parte da sua bancada. Fez um discurso prolixo, tentou tirar efeitos políticos de algumas das palavras que produziu, mas não disse nada de concreto. Fez a crítica fácil, mas não apresentou soluções.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Pergunto ao Sr. Deputado concretamente o seguinte: o que é que V. Ex.ª tem a apresentar, em concreto, como alternativa, a cada uma das críticas que fez às mais diversas áreas da acção governativa? O que é que o Sr. Deputado tem a apresentar a esta Câmara? Qual é a sua solução? Quais suo as propostas alternativas do Partido Socialista?
O Sr. Deputado não apresentou nenhuma proposta alternativa: só fez crítica fácil e foi muito hipercrítico. Já sabemos que o Partido Socialista quer ganhar pela crítica cada vez mais acentuada ao Partido Social-Democrata e ao seu Governo. Agora, de concreto não apresentou nada!... O PSD, o Governo, que apoiamos com convicção - e cada vez mais, continua a governar no dia-a-dia, realizando o seu programa de governo, as obras, procurando contrapor ao discurso, às palavras ocas e sem sentido do Partido Socialista, a acção. Estamos a realizar reformas múltiplas nos diversos sectores da sociedade, no sentido de mudar o País, modernizando-o e desenvolvendo-o.
Aplausos do PSD.
E o povo português, em 1991, vai saber, com bom senso e inteligência, como sempre o fez, dar resposta ao discurso demagógico do PS, dando-nos de novo a maioria, porque penso que bem a merecemos!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): -Sr. Deputado Manuel Moreira, antes de mais, quero agradecer-lhe o facto de estar atento às minhas intervenções, na Assembleia da República...
O Sr. Manuel Moreira (PSD):-Por acaso, foi só uma!
O Orador: - É pena que o Sr. Deputado tenha faltado algumas vezes, porque já fiz outras intervenções nesta Assembleia. Mas V. Ex.ª estava com tarefas mais nobres..., andava a mobilizar o seu partido para as eleições autárquicas...
Risos do PS.
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Enfim, foi o que se viu...! Não posso dar-lhe os parabéns. Teria sido melhor ficar aqui, ouvindo-me! Teria aprendido mais! Assim, aprendeu uma lição que foi muito dolorosa.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Devo dizer que não!
O Orador: - Quanto à sua intervenção, retive dois pontos fundamentais. Primeiro, disse que fui «requintado» e «prolixo», não falando já na «declaração» e na «declamação», pois, como sabe, o «ciar» e o «ciam» não são coisas muitos diferentes. Aliás, qualquer dicionário explicar-lhe-á isso.
Quanto ao «requintado» e ao «prolixo», a culpa não é minha, Sr. Deputado. É que, de facto, não é fácil inovar perante um Governo que repete os mesmos vícios, os mesmos erros e os mesmos abusos, há tanto tempo.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Falta de ideias da sua parte!
O Orador: - O Governo é que não tem imaginação. A oposição bem se esforça, mas o Governo não dá mais do que isto. Já deu o que Unha a dar!...
Risos do PS.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado disse que nada apontei de concreto.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Exacto!
O Orador: - Aí é que se engana! Apontei!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - O quê?
O Orador: - Apontei concretamente que este país já não quer este Governo e que, em próximas eleições, não há psicólogo, direi mesmo, psiquiatra, que vos valha!
Aplausos do PS e protestos do PSD.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o período de antes da ordem do dia. Vamos entrar agora no período da ordem do dia.
Estão em apreciação os n.ºs 61, 62 e 63 do Diário.
Pausa.
Visto não haver objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, passemos, então, à apreciação conjunta dos projectos de lei n.ºs 417/V (regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento), da iniciativa do PCP, 494/V (atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos - alteração do Decreto-Lei n.º 100/84, de 20 de Março, e da Lei n.º 25/85, de 12 de Agosto), da iniciativa do PS e da deputada independente Helena Roseta, e 496/V (altera a Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro), também da iniciativa do PS e da deputada independente Helena Roseta.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: E da maior importância para a descentralização e democratização das estruturas do Estado e da vida política, a favor dos interesses locais e do direito de participação das populações, o debate sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias com vista à sua dignificação e fortalecimento, com base nos termos propostos no projecto de lei n.º 417/V, que está hoje na ordem do dia por marcação do Grupo Parlamentar do PCP.
É que é premente ter em conta a realidade do poder local, da experiência adquiriria pelos autarcas, da acção que boa parte das juntas de freguesia tem vindo a desenvolver na resolução de problemas locais, dos resultados positivos das experiências da descentralização de competências e meios financeiros com base em acordos realizados entre várias câmaras municipais e freguesias dos respectivos municípios.
O projecto de lei que está hoje em debate procura dar resposta a esta rica experiência do poder local, propondo a introdução no regime jurídico das freguesias de uma solução altamente inovatória que representa uma verdadeira alteração qualitativa desse regime. No essencial, define-se um elenco equilibrado de competências próprias, consagra-se a existência de protocolos de transferência de competências dos municípios para as freguesias, eleva-se significativamente o financiamento das freguesias e cria-se a possibilidade legal de estas se associarem em associações públicas.
Com base neste projecto de lei, a Assembleia da República pode hoje dar um passo importante no fortalecimento do poder local.
Como consta das conclusões do II Congresso da ANAFRE, realizado no passado fim-de-semana em Braga, «o reforço da capacidade financeira e administrativa cias freguesias, a dignificação do seu papel e das condições de exercício do mandato dos respectivos eleitos são condições indispensáveis à satisfação dos interesses das populações que representam e constitui exigência de um Estado democrático que se pretende eficaz».
A esta mesma conclusão chegaram várias personalidades de praticamente todas as correntes e sensibilidades do nosso universo político-partidário e de reconhecido mérito intelectual que participaram num debate, promovido há cerca de um ano pela ANAFRE, sobre «o papel das freguesias na administração portuguesa».
Por exemplo, o Prof. Sérvulo Correia concluiu «que a autonomia das freguesias, garantida pela Constituição, pressupõe a titularidade por estas de um mínimo incomprimível de atribuições nas quais se institucionalize, com certeza jurídica, uma margem de livre decisão das populações dos territórios mais restritos sobre interesses que lhes respeitam». E acrescenta: «A definição legislativa desse «núcleo duro» de tarefas inadaptáveis é ainda hoje muito imperfeita e importaria colher da prática uma noção objectiva do seu perfil desejável e possível.»
Ora, foi da prática dos próprios autarcas, fundamentalmente dos autarcas das freguesias, mas também de muitas câmaras e assembleias municipais, que procurámos colher as opiniões para definir o elenco das competências próprias que devem ser introduzidas no regime jurídico das freguesias, para que, de uma forma equilibrada, fique finalmente consagrado na lei um conjunto de competências mínimas atribuídas a todas as freguesias com carácter geral e universal e tornando o seu exercício obrigatório. É o caso da conservação, limpeza e gestão
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de balneários, lavadouros e sanitários, a manutenção e gestão de parques infantis, a conservação, limpeza e gestão de cemitérios, a reparação e conservação de chafarizes e infantários, a conservação de abrigos de passageiros e o material de limpeza e de expediente das escolas primárias e pré-primárias.
Por outro lado, considera-se que a freguesia participa no desenvolvimento das actividades culturais, desportivas e recreativas da sua área, competindo-lhe a definição de medidas de apoio, dinamização e incentivo que sejam da sua esfera.
O debate que entretanto realizámos com centenas de autarcas e as conclusões do II Congresso da ANAFRE mostram que é possível ir um pouco mais além em relação ao que propõe o artigo 3.º do projecto de lei n.º 417/V, entregue pelo PCP em Junho do ano passado.
Por exemplo, é possível também incluir nas competências próprias das freguesias a passagem de licenças de canídeos, bicicletas e veículos de tracção animal. São actualmente competências das câmaras municipais que, em certas zonas, sobretudo no interior do País, obrigam os cidadãos a deslocar-se, por vezes, dezenas de quilómetros, a perder um ou dois dias de trabalho quando a junta de freguesia que fica perto da residência pode facilmente desempenhar a mesma função.
Em sede de debate na especialidade esperamos encontrar os consensos necessários para a consagração legal do núcleo central das competências próprias das freguesias.
Mas outras competências podem vir a ser transferidas para as freguesias por acordo entre estas e os respectivos municípios através de protocolos, cuja existência se consagra legalmente e que permitirão o exercício de quaisquer outras competências municipais, o que implica obrigatoriamente a transferencia dos meios financeiros necessários e suficientes.
A questão da necessidade da elevação significativa do financiamento das freguesias é um problema central da autonomia da autarquia freguesia. A Lei n.º 1/87 (Lei das Finanças Locais) estabelece que não pode ser inferior a 10% do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF) para as despesas correntes a transferência de verbas dos municípios para as freguesias.
Este montante mínimo foi já ultrapassado em muitos municípios com êxito, como, por exemplo, em Loures, Vila. Franca de Xira, Almada, Montemor-o-Novo e Seixal. Mas em Vila Nova de Gaia, há vários anos que as 24 freguesias recebem no total cerca de 30% do FEF em benefício claro das populações. Há, pois, neste momento, uma base de experiências que demonstra haver condições para duplicar a verba mínima a transferir para as freguesias, passando de 10% para 20% do FEF, com a ideia clara de que esta verba mínima não é caridade municipal. É um direito das freguesias como autarquias com identidade própria, dotadas de órgãos democraticamente eleitos e que prosseguem a satisfação das necessidades das populações da respectiva área, completando a acção dos municípios. A este aumento da transferência de verbas provenientes do FEF há que acrescer a afectação de novas receitas provenientes dos preços, tarifas, taxas ou licenças que resultem das novas actividades das freguesias, decorrentes exactamente da transferencia das competências. Das competências que, como há pouco disse, resultem, por exemplo, do pagamento das licenças que referi e que devem ser transferidas para as autarquias freguesias.
E para, nalguns casos, rentabilizar e melhorar os meios ao serviço das populações, as freguesias sentem a necessidade de poderem colaborar entre si, de se associarem nos mesmos termos em que o fazem os municípios, criando associações públicas de freguesias. Daí, a proposta que se faz no artigo 8.º do projecto de lei em debate.
Esperamos que o debate de hoje dê respostas concretas a alguns dos bloqueios que persistem na concretização prática dos princípios constitucionalmente consagrados, bloqueios esses que têm frustrado as expectativas das populações que esperam das juntas de freguesia que elegeram a resposta para muitos dos seus problemas e desesperam os autarcas eleitos por não terem meios para realizar o que as populações precisam.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Quanto à iniciativa que o PS veio a apresentar e na mesma área, embora seja uma proposta parcial em relação ao problema geral, consideramo-la como um contributo positivo para o debate que hoje realizamos.
Esperamos que da parte do PSD haja a abertura necessária para fazer justiça às freguesias e não continuar o protelamento de decisões fundamentais para a dignificação e o fortalecimento do poder local.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Carta Europeia da Autonomia Local consagra o princípio de que «o exercício das responsabilidades públicas deve caber de uma forma geral e de preferência às autoridades mais próximas dos cidadãos» sem esquecer que «a atribuição de uma responsabilidade a uma autoridade deve ter em conta a amplitude e a natureza do cargo e as exigências de eficácia e economia».
No respeito por este princípio da autonomia local, o PS apresentou na Assembleia da República dois projectos de lei, um relativo à alteração da lei das competências e outro relativo à alteração da Lei das Finanças Locais.
Quando na Europa, onde estamos integrados, se verifica uma ampla descentralização de poderes, em Portugal urgia reforçar a capacidade de iniciativa das freguesias na prossecução do bem-estar das populações.
Deste modo, em estreita cooperação com os municípios, as freguesias estão em condições de exercerem novas competências, designadamente no domínio da cultura, desporto, tempos livres, associativismo, turismo, direitos do consumidor, defesa e protecção do ambiente e ordenamento do território.
O contacto permanente com as comunidades locais, o conhecimento aprofundado dos seus hábitos, costumes, tradições, etc., colocam a freguesia na posição privilegiada de agente para o desenvolvimento.
A freguesia, exercendo o poder muito próximo dos cidadãos, permite a estes uma acção de controlo e fiscalização dos actos públicos mais estreita, responsável e transparente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será que o esforço de descentralização pode ser feito sem limites?
Claro que não, sob pena de negarmos a eficácia e a economia na gestão pública!
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Por tudo isto, o PS considera que o reforço das competências das freguesias deve ser feita em consonância com os municípios, a fim de evitar o desperdício de meios e contribuir para a optimização da gestão do grande espaço municipal e regional.
Mas a capacidade de intervenção das freguesias não se esgota no alargamento das suas competências.
A realidade local pode justificar até a celebração de protocolos de delegação de poderes mais amplos com as correspondentes contrapartidas de meios financeiros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O aumento das competências das freguesias exige o reforço dos meios financeiros a colocar à sua disposição.
Para tanto, considera-se essencial que as receitas das freguesias sejam reforçadas, designadamente através do aumento das transferencias dos municípios para as freguesias - actualmente de 10%, para, pelo menos, 15% do Fundo de Equilíbrio Financeiro (receitas correntes) (FEF); do valor das cobranças de taxas ou licenças provenientes das novas competências e de outras transferências dos municípios associadas à celebração de protocolos de delegação de poderes.
Mas não basta aumentar as competências e reforçar os orçamentos das freguesias. É necessário também dignificar a função de presidente de Junta de Freguesia, proporcionando-lhes a possibilidade de exercer o mandato a tempo inteiro ou parcial.
Se com as actuais competências já se justifica a existência de tal estatuto, o seu reforço torna-o imprescindível. Sabemos que não é uma questão simples. Mas, através do diálogo e concertação, será possível definir um estatuto de regime de permanência digno.
Infelizmente, o PSD, nesta como em muitas outras matérias, furta-se ao diálogo e, com a arrogância que lhe é peculiar, trata os autarcas das freguesias como cidadãos de segunda.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade! Não apoiado!
O Orador: - O Conselho da Europa, ao considerar as colectividades locais como «um dos principais fundamentos de todo o regime democrático» onde «o direito dos cidadãos de participar na gestão dos assuntos públicos pode ser exercido mais directamente», mais não faz do que apelar aos Estados membros para que adoptem uma política de defesa e reforço de autonomia local, fundamental para a construção de uma Europa alicerçada nos princípios da democracia e da descentralização do poder.
Apesar de, em regra, o Governo e o PSD não fazerem em Portugal o que vão apregoando pela Europa, estamos esperançados que, nesta matéria, os deputados do PSD não vão ficar insensíveis aos legítimos anseios dos autarcas das freguesias, cabalmente enunciadas no último congresso da sua associação nacional.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.º Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, tal como tive ocasião de referir na intervenção que fiz há pouco, considero que da parte do PS há um aspecto positivo na apresentação das propostas que fez, no sentido de criar competências próprias para as freguesias e de elevar os seus meios financeiros.
Em todo o caso, não vai tão longe como, em minha opinião, seria desejável, na elaboração de uma proposta que permita também contemplar na lei e ficar consagrado juridicamente a existência de protocolos e a obrigatoriedade de esses protocolos serem acompanhados não só da transferência de competências mas também da transferência dos respectivos meios financeiros, para que a relação entre os municípios e as freguesias seja perfeitamente clara e seja uma relação de complementaridade e não de concorrência.
Mas o que me parece mais importante é o problema do financiamento das freguesias. Não pode haver autonomia das freguesias, não pode dar-se cabal resposta ao preceito constitucional que define as freguesias como órgãos de poder local, com órgãos eleitos directamente pelas populações, se não se lhes der uma autonomia financeira efectiva.
Ora, a verdade é que hoje os 10% que são transferidos do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as freguesias são claramente insuficientes para algumas delas, não chegando sequer para pagar aos funcionários nem as senhas de presença dos autarcas.
É uma situação deveras caricata que urge alterar, para que a freguesia possa ser algo mais do que passar simples atestados.
No projecto de lei que o Sr. Deputado apresentou apenas propõe um aumento de 15% e não prevê a transferência de meios financeiros para as freguesias, nos termos necessários e suficientes, de forma a acompanhar a respectiva transferência de competências.
Esta é uma questão que me parece muito séria, pelo que interessaria aclará-la mais.
Por isso, não acha que é insuficiente a forma como este problema está tratado no vosso projecto de lei? Não acha que, em sede de debate na especialidade, esta questão merece uma reconsideração, tendo em conta, inclusivamente, as próprias conclusões do II Congresso da ANAFRE, realizado em Braga, no passado fim-de-semana?
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Em primeiro lugar, quero dizer à Sr." Deputada Ilda Figueiredo que o projecto do PS até é bastante amplo. Julgo que teve o cuidado de lê-lo e, certamente, verificou que o PS prevê o alargamento das competências das freguesias...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mas o problema é o dos meios financeiros!
O Orador:- Já lá vou, Sr.ª Deputada.
Como estava a dizer, o PS prevê o alargamento das competências das freguesias aos níveis, por exemplo, da preservação e defesa do meio ambiente, da defesa dos direitos do consumidor, da preservação do património artístico cultural, participação activa na elaboração dos planos directores municipais, portanto, relacionados com questões de ordenamento do território. De facto, o nosso projecto, em termos de atribuição de novas competências, é extremamente amplo.
Quanto aos meios financeiros, consideramos que, de acordo com a experiência que tivemos oportunidade de recolher junto dos municípios, passar dos 10% para os 15% do Fundo de Equilíbrio Financeiro (receitas corren-
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tes) é uma primeira medida, uma primeira aproximação. Se depois, no futuro, se vier a verificar que a transferência de competências exige um nível de transferências superior, então cá estaremos para, nessa altura, se fazer uma nova proposta.
Quanto à questão dos protocolos, gostaria de dizer que não os previmos textualmente no nosso projecto de lei porque, como se sabe, a lei já o permite fazer. Já há imensas câmaras municipais por este País fora que celebraram protocolos de transferência de competências, protocolos esses que contemplam a transferência de meios financeiros e, em alguns casos, até de meios humanos necessários à prossecução dessas novas competências. Assim, não nos pareceu necessário, nesta fase, apresentar isto no texto da lei porque actualmente a lei das competências e a Lei das Finanças Locais, tal como existem, são suficientes para que, por um lado, os protocolos se possam realizar e, por outro lado, os meios financeiros sejam colocados à disposição das freguesias.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O problema é que nem sempre os municípios o fazem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estilo hoje em discussão nesta Câmara os projectos de lei n.ºs 417/V (PCP), sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento, 494/V (PS e deputada independente Helena Roseta), sobre as atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos- alteração do Decreto-Lei n.º 100/84, de 20 de Março, e da Lei n.º 25/85, de 12 de Agosto, e 496/V (PS e deputada independente Helena Roseta), que altera a Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, sobre finanças locais.
Considera o Partido Social-Democrata que não fará muito sentido discutirmos de uma forma isolada o reforço das competências e atribuições das freguesias e, naturalmente, os seus meios financeiros. Consideramos que seria muito mais correcto - até em termos de técnica legislativa- fazer uma apreciação global em matéria de alteração do Decreto-Lei n.º 100/84 e que o PCP e o PS apresentassem aqui uma proposta de revisão global ao mesmo decreto-lei, do que estar agora a fazer alguns remendos e alterações pontuais para reforçar as atribuições de competência das freguesias.
Também não fará sentido alterarmos a Lei das Finanças Locais, ou seja, a Lei n.º 1/87, na medida em que, neste momento, não existe nenhum projecto de alteração global a essa lei, que até resulta da própria reforma fiscal, da nova legislação fiscal introduzida há mais de um ano no nosso País. Por isso, seria bom a apresentação de um projecto global de alteração. Aliás, é essa a intenção do Partido Social-Democrata através do seu Governo, pois, a muito breve trecho, estará para discussão em Conselho de Ministros uma nova Lei das Finanças Locais através de uma proposta de lei a ser submetida à apreciação e votação da Assembleia da República.
O Partido Social-Democrata considera que as competências e as atribuições das autarquias locais, nomeadamente das freguesias, consagradas no Decreto-Lei n.º 100/84 são suficientes, são gerais e, por isso, entendemos que não é necessário haver consagração de novas atribuições de competências. Além disso devemos
ter em consideração a experiência positiva e inovadora iniciada no anterior mandato das autarquias locais com o estabelecimento de protocolos celebrados entre os municípios, nomeadamente entre as câmaras municipais e as freguesias, para delegações de mais competências nestas últimas que, a meu ver e de um modo geral, têm tido sucesso.
Assim, é desejo do Partido Social-Democrata que esse sistema inovador e cheio de virtualidades deve ser generalizado a todos os municípios e freguesias do nosso País. Deve generalizar-se esse sistema, usando uma política casuística, de caso a caso, conforme as capacidades e a vontade política dos municípios e das freguesias. Deve, pois, haver por parte das câmaras municipais essa delegação de competências e atribuição de meios financeiros para que as freguesias possam assumir novas competências e atribuições. Aliás, penso que isso está a ser feito, e de uma forma correcta! É uma experiência que está longe de estar concluída e de termos uma opinião final sobre cia. Como tal, pensamos que devemos caminhar por aí!
Nesse sentido, podemos e devemos dignificar a função e o prestígio das freguesias, que são aqueles órgãos que estuo mais directamente em contacto com as populações e que podem dar uma resposta mais directa e rápida e até mais eficaz às populações locais.
Por isso, pensamos que, neste momento, não há necessidade de se fazer uma alteração ao Decreto-Lei n.º 100/84, muito menos de se fazer uma alteração de forma incorrecta, enviesada e avulsa, como propõem as iniciativas legislativas do PS e do PCP.
Em relação às propostas de alteração que são aqui apresentadas por parte do PS e do PCP à Lei das Finanças Locais, consideramos que elas devem ser discutidas em sede de uma nova revisão global da Lei das Finanças Locais. O Partido Social Democrata está disponível para isso!
Devo dizer que o próprio Governo, como já atrás referi, dentro de semanas, irá apresentar a sua proposta de alteração à Lei das Finanças Locais. Nessa altura deverão ser ponderadas as verbas a atribuir às freguesias, designadamente a percentagem do Fundo de Equilíbrio Financeiro, no sentido de um eventual aumento. Aliás, somos sensíveis a isso, pois, apesar de a actual legislação não impedir que as câmaras atribuam uma verba superior, como a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo referiu, esse aumento já se está a verificar, por exemplo, no concelho de Vila Nova de Gaia, onde as freguesias já recebem cerca de 30%, isto é, recebem uma verba muito superior aos 10% que estão estabelecidos na lei. Assim, de acordo com a capacidade financeira de cada município devem fazer o aumento dessas transferências para as freguesias.
O Governo e o próprio Partido Social-Democrata estão, neste momento, a estudar a possibilidade de uma transferência directa do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as freguesias, pois consideramos que se trata de uma matéria que deve ser analisada e ponderada. Admitimos assim estudar a solução de vir a fazer-se transferência directa do FEF do Orçamento do Estado para as próprias freguesias sem passar pelo orçamento do município.
No entanto, consideramos demagógica e talvez excessiva a proposta do Partido Comunista Português, que apresenta e procura consagrar em lei uma transferência de 20% do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as freguesias. Ora, isso iria ter implicações negativas em alguns
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municípios que talvez não tenham capacidade financeira para poder atribuir essa transferência. Por isso, pensamos que esta matéria deve ser analisada com muito cuidado, com mais ponderação, de acordo com estudos técnicos aprofundados, coisa que não é aqui apresentada em qualquer dos projectos, nem do PCP nem do PS, que também apresenta uma proposta de uma subida de 10% para 15%.
Ora, tudo isto deve ser fundamentado em estudos técnicos - coisa que neste momento desconhecemos -para ver se é possível ou não fazer-se esse aumento. Repito que pela nossa parte existe também vontade política de haver algum aumento que seja realista - aliás, creio que isso irá ser consagrado na proposta de lei do Governo sobre a nova Lei das Finanças Locais - e estamos, repito, a estudar seriamente a própria transferencia directa desta verba.
Não tenho mais nada de concreto a referir em relação a estes dois diplomas a não ser a questão que é abordada no projecto de lei do PCP sobre a institucionalização das associações de freguesias. Penso que não deve fazer-se uma analogia, como pretende o projecto de lei do PCP, entre associações de municípios, que são associações de direito público, com associações de freguesias. É vantajoso e desejável que haja uma colaboração e uma cooperação inter freguesias no âmbito de cada município e com o apoio do próprio município. Aliás, isso já se está a verificar.
Não há, pois, necessidade de se fazer uma institucionalização concreta das associações de freguesias até porque, como os Srs. Deputados sabem, as freguesias tom assento na assembleia municipal, onde podem e devem tratar dos seus assuntos - aliás, muitos deles serão coincidentes, pois os problemas são comuns. De facto, os presidentes das juntas de freguesia tom assento na assembleia municipal, coisa que não acontece no caso dos municípios, num órgão autárquico supramunicipal uma vez que não está ainda institucionalizada a regionalização do País.
Mas, como disse, neste momento somos favoráveis a que a cooperação entre freguesias pode e deve existir de uma forma informal porque a actual legislação das autarquias locais não o impede e até pode dar uma resposta mais cabal às necessidades, aos anseios e às aspirações das populações locais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Deputado Manuel Moreira, em relação à crítica que fez ao Partido Socialista por ter apresentado uma proposta de âmbito reduzido, isto é, abrangendo unicamente as freguesias, gostaria de lhe lembrar que isto não aparece por acaso. V. Ex.ª tem andado desatento!...
De facto, os dois projectos de lei do Partido Socialista aparecem na sequência de um outro que foi apresentado em tempo oportuno e que se debruçava sobre o regime de permanência dos autarcas das juntas de freguesia. Assim, se com esse projecto de lei iam surgir novos encargos para as freguesias para além de estar associado também o aparecimento de novas competências, como é evidente, a Lei das Finanças Locais tinha de ser minimamente alterada.
No entanto, também é curioso ouvir por parte do Sr. Deputado que o PSD está disponível para o diálogo num momento em que o Governo parece que se presta a apresentar...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador:- Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - O Sr. Deputado referiu que estes dois projectos de lei apresentados pelo PS vêm na sequência dos diplomas que aqui estiveram em discussão há mais de um ano sobre o regime de permanência dos presidentes de junta de freguesia.
Ora, creio que isso não corresponde à verdade, na medida em que os projectos de lei do PS que hoje aqui estamos a discutir foram apresentados no dia 15 de Março deste ano na Assembleia da República. Isto é, foram apresentados muito tempo depois da discussão e, inclusivamente, da decisão final desta Câmara, designadamente de o PSD retirar esse projecto de lei sobre o regime dos presidentes de junta de freguesia. Portanto, não vejo qualquer sequência em relação a esses diplomas que aqui foram discutidos há mais de um ano!
Penso, sim, é que isso veio na sequência do projecto de lei do Partido Comunista Português.
O Orador: - De facto, como referi, o Sr. Deputado continua desatento!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Estou atento, Sr. Deputado! Aliás, tenho estado sempre atento!
O Orador: - V. Ex.ª critica o Partido Socialista por apresentar projectos. Ora, eu não sei o que dizer do Partido Social Democrata que, em vez de os apresentar, retira-os! Quer dizer, o Partido Socialista apresenta-os; o PSD retira-os! De facto, não há dúvida de que se trata de posições completamento diferentes.
No entanto, no que se refere à Lei das Finanças Locais não deixa de ser curioso que o Governo, com a reforma fiscal a funcionar há quase dois anos, ainda não tenha apresentado uma proposta de alteração a essa mesma lei.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Vai aparecer dentro de breves semanas!
O Orador: - Onde é que está a tão apregoada eficiência?
Não sei se podemos acreditar nas palavras que o Sr. Deputado Manuel Moreira aqui proferiu no sentido de que está aberto ao diálogo. Infelizmente, a experiência do passado não nos leva a pensar dessa forma. Todos sabemos o que se está a passar, por exemplo, com o processo de regionalização, que se arrasta sucessivamente, porque é essa, exactamente, a intenção nítida do PSD. Todos sabemos também o que aconteceu com o regime de permanência dos autarcas das juntas de freguesia, uma atitude lamentável que o PSD ainda não conseguiu justificar: apresenta um projecto que, depois de discutido e aprovado na generalidade, é retirado por ele próprio na altura da discussão na especialidade. Nunca ninguém explicou este facto, pelo que, se porventura o Sr. Deputado achar conveniente dizer alguma coisa sobre ele, gostaria muito de o ouvir.
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Não deixa igualmente de ser curiosa a forma como o PSD vem tratando os autarcas das juntas de freguesia. Gostaria, pois, de saber se o Sr. Deputado não acha curioso ou até sintomático que no último Congresso da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) todos os partidos políticos tenham estado representados mas não tenha aparecido, ao que se sabe, nenhuma representação do PSD. Será que isto tem alguma coisa a ver com a atitude que o PSD vem tomando em matéria autárquica?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Manuel Moreira, não deixa de ser lamentável a posição que sistematicamente o PSD tem vindo a tomar nesta Câmara quando se discutem projectos de lei da iniciativa dos partidos da oposição relativos ao poder local ou à regionalização. É vulgar o PSD dizer que não estão criadas as condições para a aprovação de tais diplomas, como aconteceu, por exemplo, com o projecto de lei respeitante ao regime de permanência dos eleitos das autarquias, por ainda não estarem discutidas as alterações ao regime jurídico das freguesias. Aliás, ouvimos essa resposta várias vezes durante o debate do regime de permanência dos eleitos das freguesias.
Hoje, estamos aqui a debater exactamente projectos de lei que tem a ver com a alteração do regime jurídico das freguesias. Trata-se de uma alteração fundamental que decorre do texto constitucional e da experiência, que aliás o Sr. Deputado Manuel Moreira reconheceu existir e ser positiva, de descentralização de competências e meios financeiros de alguns municípios para as freguesias, como são os casos de Vila Nova de Gaia, Vila Franca de Xira, Loures e Montemor-o-Novo e de tantas outras autarquias deste País.
O Sr. Deputado Manuel Moreira, porém, vem aqui dizer que agora se trata apenas de uma alteração pontual e que o que é preciso é alterar a Lei das Finanças Locais e o Decreto-Lei n.º 100/84. O Sr. Deputado pode arranjar as justificações que quiser, mas o facto de o PSD tomar sistematicamente a posição que tem vindo a tomar em relação ao fortalecimento do poder local, à criação das regiões administrativas e ao aprofundamento do texto constitucional no fortalecimento da descentralização do País e do reforço da democracia só tem uma justificação: é que o PSD não tem vontade política, não quer descentralizar nem fortalecer o poder local, não quer perder da mão o poder centralizador que julga ter indefinidamente. Esse é o grande erro do PSD, essa é a verdadeira resposta à posição que o PSD sistematicamente assume na Assembleia da República: quer manter-se como força centralizadora e única e quer impedir a participação das populações e das autarquias numa descentralização efectiva do poder e, portanto, numa melhoria das respostas aos problemas das populações.
Outra questão que gostaria de abordar refere-se ao facto de o Sr. Deputado Manuel Moreira ter reconhecido que é necessário aumentar as verbas que são transferidas para as freguesias. É importante que tenha reconhecido isso, mas é lamentável que hoje, quando estamos a discutir projectos de lei que comem no seu seio propostas nesse sentido, o PSD assuma a posição de não votar favoravelmente estes diplomas por o Governo estar a preparar legislação que eventualmente irá nesse sentido.
Não acha, Sr. Deputado Manuel Moreira, que este comportamento de não se considerarem as propostas dos outros partidos, só por serem da autoria dos partidos da oposição, é inadmissível para um partido, mesmo maioritário, com assento na Assembleia da República?
Por outro lado, reconheceu o Sr. Deputado que há protocolos realizados entre as câmaras municipais e as freguesias e que esses protocolos têm tido, em muitos casos, uma aplicação correcta. Foi exactamente com base nessa rica experiência, dando voz às reivindicações dos autarcas, e depois de uma discussão prolongada com centenas de autarcas, nomeadamente numa reunião realizada na Assembleia da República, mas também por ouvir, ler e estar presente em iniciativas realizadas pela ANAFRE, que o Grupo Parlamentar do PCP considerou da maior importância o agendamento para hoje desta iniciativa legislativa, o seu debate e a sua aprovação. Se o Sr. Deputado tiver em conta as conclusões do II Congresso da ANAFRE - e, se não as conhecer, poderei fornecer-lhe uma cópia-, verificará que aí é clara esta posição das freguesias portuguesas: a necessidade de descentralizar competências e meios financeiros para melhor responder aos problemas das populações.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Deputado Gameiro dos Santos, e evidente que o Partido Social-Democrata está e estará sempre aberto ao diálogo. Mais do que isso, o PSD pratica um diálogo sério e no sentido de procurar as melhores soluções para os problemas que se colocam ao nosso País e, em concreto, a cada uma das suas instituições, neste caso do poder local.
Eu disse - e mantenho - que não faz sentido discutir isoladamente o reforço das atribuições e dos meios financeiros das freguesias. Faz, sim, sentido - é um desafio que lanço ao Partido Socialista e ao Partido Comunista Português - apresentar nesta Câmara propostas de alteração global à Lei das Finanças Locais, até para serem discutidas em simultâneo com a proposta de lei de alteração da Lei das Finanças Locais, que o Governo irá apresentar a muito curto prazo. Tal alteração é natural, resulta da reforma fiscal e só não foi feita há mais tempo porque, como devem calcular, apesar de o Governo ter vindo a ter uma boa iniciativa legislativa nesta Câmara, não é possível dar resposta a tudo tão rapidamente quanto desejaria.
Porém, a muito breve trecho será aqui apresentada essa proposta de lei. Seria bom que o Partido Socialista também apresentasse a sua proposta de alteração (certamente que o irá fazer) e é nessa altura que deverá apresentar as propostas pontuais que agora consagra neste projecto de lei avulso de alteração da Lei n.º 1/87.
O mesmo se pode dizer em relação ao Decreto-Lei n.º 100/84. Se pensam que é importante fixar mais competências para as freguesias do nosso País, devem, então, apresentar uma alteração ao Decreto-Lei n.º 100/84 e não fazê-lo desta forma avulsa, mas sim de uma forma mais global, coerente e sistemática do que a que estão a fazer agora.
O nosso entendimento em relação a essa matéria-já o afirmei e reafirmo agora - é o de que não faz sentido deixar de explorar ao máximo esta experiência nova, iniciada no anterior mandato, da celebração de protocolos, caso a caso, entre os municípios e as freguesias, até
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porque a lei vigente - o Decreto-Lei n.º 100/84 - não o impede; pelo contrário, até o permite. Isso está a fazer--se de uma forma cada vez mais generalizada, e o ideal seria que se generalizassem ao maior número de municípios e freguesias do País a delegação e a atribuição de novas competências e dos meios financeiros para que as freguesias possam assumir e assim dar uma resposta mais eficaz aos anseios das populações locais. É por aí que devemos caminhar, devemos explorar ao máximo esse novo sistema.
Se porventura depois chegarmos à conclusão de que tal sistema não serve e é insuficiente, então, sim, talvez o PSD esteja disponível para ponderar uma alteração global ao Decreto-Lei n.º 100/84, no sentido de fixar mais atribuições e competências. Penso até que as competências genéricas consagradas no Decreto-Lei n.º 100/84 para os órgãos autárquicos em geral - municípios e freguesias - são mais vastas e amplas do que as que estão consagradas nos projectos de lei agora apresentados pelo PS e pelo PCP, pois, se analisarmos estas propostas com algum rigor, são mais restritivas do que as que constam do Decreto-Lei n.º 100/84. Estamos disponíveis para esse diálogo, mas em sede própria, ou seja, de alterações globais aos decretos-leis ou leis vigentes e não apenas através de meras cosméticas, meros diplomas avulsos com a finalidade de se pôr um remendo nos diplomas actuais.
Quanto à questão da regionalização, que, aliás, não vem a propósito mas à qual vou responder, o Sr. Deputado sabe tão bem como eu, porque também faz parte da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, que neste momento o processo de regionalização segue o seu curso normal, no cumprimento de um calendário aprovado pela maioria dos partidos no seio da Comissão, no sentido de se auscultar as experiências de regionalização da Europa Ocidental. Nessa matéria, não estamos parados mas, sim, a trabalhar.
Quanto à questão de o PSD não ter estado no Congresso da Associação Nacional de Freguesias, penso que não é esta a sede própria para dar essa explicação. Seja como for, o meu partido disse já claramente, aquando da fundação da ANAFRE, que mio lhe parecia oportuna a criação de uma associação nacional de freguesias por considerar que é mais importante em termos de defesa do poder local, tido até como parceiro social que tem de dialogar com o governo central, haver uma instituição representativa de todos os autarcas portugueses, desde a freguesia ao município, e não duas associações representativas do poder local, uma dos municípios e outra das freguesias, porque, naturalmente, isso divide a força, quando o que há necessidade é de congregar forças numa única associação.
Por isso, apostamos vivamente e com toda a dignidade e força na Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que é e deve ser cada vez mais representativa de todo o poder local. Sou igualmente a favor de que a Associação Nacional dos Municípios Portugueses defenda mais e, se possível, de uma forma mais regular também os autarcas das freguesias e tome posições sobre os mesmos, na dignificação das próprias freguesias e não apenas dos municípios, dos presidentes de câmara ou dos vereadores em regime de permanência. É por aí que temos de caminhar e é na luta e na defesa internas, no âmbito da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que os autarcas das freguesias devem estar e defender os seus pontos de vista e não através da criação de uma nova associação de freguesias.
Diz a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo que nós rejeitamos sempre os projectos provenientes da oposição, nomeadamente do PCP e do PS. Não é verdade, Sr.ª Deputada. Ainda muito recentemente discutimos aqui diplomas tendentes à criação das empresas públicas municipais e intermunicipais, tendo o Partido Social-Democrata solicitado a baixa de tais diplomas à comissão competente, pelo prazo de 60 dias, apenas para permitir que o PSD ou o Governo apresentassem iniciativas com o mesmo objecto, o que irá acontecer, até porque já temos a proposta pronta e será brevemente apresentada a esta Câmara. Não temos, por isso, o objectivo obstrucionista de rejeitar tudo o que vem da oposição. Estamos disponíveis para dialogar e considerar todas as iniciativas legislativas que sejam equilibradas, sensatas e exequíveis e dêem resposta cabal e eficaz aos problemas da Nação portuguesa e em particular ao das autarquias locais.
Para iniciativas demagógicas, com o intuito de extrair efeitos eleitoralistas fáceis junto das autarquias, não estamos disponíveis, na medida em que - e penso que temos autoridade moral para o dizer - continuamos a ser uma força muito representativa do poder local em Portugal, mormente a força liderante das freguesias portuguesas.
É por via desta acção e de uma iniciativa legislativa sensata e equilibrada que deveremos fortalecer o poder local. Penso que aquilo que neste momento se está a passar em termos de delegação de competências dos municípios nas freguesias é uma forma de fortalecer as freguesias e dignificar a sua acção e o seu poder. Não estamos contra isso. Estamos, pelo contrário, a favor de que essa prática continue e, se possível, se generalize a todas as freguesias e municípios de Portugal.
Evidentemente que não somos a favor da divisão, o que parece deduzir-se e subentender-se das declarações públicas de muitos autarcas das freguesias. Aliás, devo dizer que mesmo a Associação Nacional de Freguesias está longe de ser representativa de todas as freguesias ou mesmo da maioria das freguesias portuguesas. Na verdade, e que eu saiba, o número de freguesias portuguesas ainda não se alterou, pois existem em Portugal 4200 freguesias, e, segundo os números que apareceram na imprensa, estiveram presentes no Congresso da Associação Nacional de Freguesias apenas 1500!
No entanto, também não podemos - o PSD não está disponível para isso, como não o deve estar qualquer partido responsável, designadamente o PS - transformar os 305 municípios portugueses em 4500, o que será o resultado de tentar atribuir às freguesias novas competências e novos meios financeiros, excessivos, como defendem alguns autarcas das freguesias, a fim de fazer das mesmas autênticos minimunicípios! Com efeito, e como já referi, deixaríamos então de ter 305 municípios, como temos actualmente, para ter 305 municípios mais 4200 freguesias, as quais passariam a deter um estatuto idêntico ao dos municípios!
Penso que isso não é correcto nem traduz uma forma séria de abordar a temática do poder local, de o defender, dignificar e prestigiar, como foi sempre apanágio do PSD, contribuindo para que as autarquias - freguesias e municípios - dêem respostas aos anseios das populações locais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
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O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria apenas de fazer uma pequena intervenção tendente à apreciação dos projectos aqui apresentados pelo PCP e pelo PS, desde já dizendo que o Partido Ecologista «Os Verdes» os irá votar favoravelmente.
Entendemos que o aumento das competências e a transferência de poderes financeiros e técnicos para as freguesias configura uma forma de resolver problemas de zonas residenciais, envolvendo directamente os moradores na Administração Pública. Na verdade, como entidades de administração mais próximas das populações, são as freguesias que detêm melhores condições para proceder à análise dos respectivos problemas, para os resolver, dando assim satisfação às aspirações dos seus residentes. Por essa razão, todas as propostas que forem feitas nesse sentido serão por nós apoiadas.
Lamentavelmente, e uma vez mais, o PSD veio aqui fazer um discurso essencialmente demagógico. De facto, contrariamente ao que afirmou relativamente aos partidos que apresentaram os projectos em análise, mais uma vez tivemos oportunidade de nos aperceber da demagogia que reina neste partido, pois mesmo os autarcas do PSD representados neste Parlamento apresentam-se individualmente favoráveis à atribuição de maiores competências às juntas de freguesia - aliás, isto é precisamente demonstrado através da representação que o PSD tem na Associação Nacional de Freguesias.
No entanto, como já por várias vezes foi afirmado, temos aqui um grupo parlamentar que se limita a apoiar, acriticamente, um Governo que continua a insistir numa política de centralismo e de afastamento das populações da participação na vida pública. É isto que o PSD tem feito!
A regionalização tem sido posta de parte ao longo dos anos. Porém, veio agora o Sr. Deputado dizer que a questão da regionalização se encontra a decorrer normalmente na comissão própria...
Penso ser do conhecimento desta Assembleia que foi este ano criada uma subcomissão para a regionalização, tendo o PSD apresentado, nessa sede, um plano para que se cumprisse a subida ao Parlamento dos projectos de regionalização. Ora, a proposta que foi apresentada - que é, pelo menos, do conhecimento dos membros da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente - aponta, de facto, para um programa cujo cumprimento demorará, no mínimo, um ano e meio. Um ano e meio de deslocações pelo País e pelo estrangeiro!
E diz o Sr. Deputado Manuel Moreira que a questão da regionalização está a decorrer normalmente...!
Com efeito, é assim que o PSD entende que as coisas correm normalmente, quando todos sabemos e admitimos - foi, aliás, reconhecido na comissão que assim deveria ser - que deveria haver um empenhamento de todos os deputados, designadamente membros daquela comissão, no sentido de um maior aprofundamento e conhecimento dos problemas da regionalização e até das experiências existentes noutros países. No entanto, o plano que foi apresentado não aponta à verificação desse aprofundamento e conhecimento, destinando-se a deixar correr o tempo e a chegar às eleições de 1991 sem que a regionalização esteja realizada!
É este o projecto político do PSD; é este o projecto político deste Governo centralista e centralizador!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade! Isso são só palavras sem fundamento!
O Orador:- É por isso que as populações são cada vez mais afastadas da participação na vida pública! É isso que o PSD pretende e é por isso que agora veio aqui dizer-nos que está disposto a um diálogo sério! Até parece que na Assembleia se fazem diálogos ou debates menos sérios...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Às vezes até parece...
O Orador: - Mais uma vez, é esta a forma de o PSD se posicionar perante questões que dizem respeito a todo o País!
Tenho dito.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Vozes do PSD:- E disse muito mal!
O Sr. João Teixeira (PSD): - Peço a palavra para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Teixeira (PSD): -Sr. Deputado André Martins, não teria pedido a palavra se V. Ex.ª não tivesse falado num ponto que me parece importante. Contudo, antes de fazer a consideração que pretendo tecer, gostaria de deixar aqui uma nota prévia. É que penso que em democracia as pessoas são livres de tomar as posições que entenderem. Devem é assumi-las! E se o Sr. Deputado tem dúvidas, vou lá dentro buscar - embora V. Ex.ª a deva também possuir - uma cópia da acta pela qual se pode ver que o programa de actividades do grupo de trabalho da regionalização foi aprovado por unanimidade!
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - Com efeito, verificaram-se apenas divergências quando se tratou da calendarização.
Já não é a primeira vez que V. Ex.ª esgrime com esse argumento, tentando deitar para cima do PSD o odioso de ter imposto um programa ao grupo de trabalho sobre a regionalização. No entanto, isso não é verdade, uma vez que, repito-o, encontra-se lavrado em acta - o Sr. Deputado possui a cópia dessa acta, como eu a possuo - a aprovação do programa por unanimidade!
Houve, na realidade, divergências, mas no aspecto da calendarização, relativamente ao qual se tentou chegar a um acordo. Não foi possível um acordo global, mas houve cedências de ambas as partes - as que pretendiam uma maior aceleração e as que preferiam um maior aprofundamento- e eliminaram-se visitas a alguns países inicialmente previstos, não sendo, portanto, possível um maior aceleramento.
Convém assim que, de uma vez por todas, fique claro o que se passou quanto a esta questão da regionalização.
Por outro lado, agora acerca destes projectos de diplomas que estamos a discutir, o Sr. Deputado falou no alargamento das competências das juntas de freguesia e da dignificação do poder local.
Em primeiro lugar, gostaria de lhe perguntar que competências novas poderão, na prática, as freguesias exercer - aquelas que o pretendam fazer - que não exerçam neste momento.
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Em segundo lugar, gostaria lambem de saber se não acha que o Decreto-Lei n.º 100/84, não só na definição das competências genéricas das freguesias, como, sobretudo, na alínea s) do n.º 2 do seu artigo 39.º (competências dos municípios), não confere uma elasticidade e uma amplitude muito maiores.
Na verdade, penso que é muito mais democrático deixar ao poder local, encarado em ambos os níveis, a liberdade de negociação, no sentido de fazer protocolos com o entendimento de receber competências, transferindo outras, do que impor de cima tais transferências.
Vozes do PSD:- Muito bem!
O Orador: - Repare, Sr. Deputado, que isto não é utopia. De facto, encontramos casos reais na transferência de competências em que o orgão de nível inferior recusa essas competências, sendo que, seja por que razões forem, está no seu direito de o fazer. Na realidade, se ambos são órgãos eleitos, por que razão se há-de impor? Nilo será muito melhor e muito mais democrático manter o actual sistema, através do qual existe a liberdade de assinar protocolos sobre todas as matérias da competência da câmara?
Penso que sim! No entanto, esta é a nossa posição - não pensamos que somos detentores da verdade única, pois respeitamos as outras - e entendemos que o actual sistema é o mais prático!
O Sr. Deputado, que, certamente como eu, conhece as freguesias do interior, sabe que, na prática, a sua grande maioria já exerce estas atribuições, já sendo, por exemplo, as freguesias e não as câmaras que detêm o encargo da manutenção dos cemitérios ou da limpeza dos balneários e lavadouros.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Algumas...!
O Orador: - Nas freguesias que conheço todas estas competências são exercidas, à excepção da consagrada na alínea f) (conservação dos abrigos de passageiros). Portanto, tudo isto que aqui está vertido é realizado pelas juntas de freguesia, pelo que não vejo que haja nestes projectos uma novidade extraordinária no campo do exercício de competências.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado João Teixeira, muito obrigado por me permitir a interrupção.
A questão, Sr. Deputado, não é a de algumas freguesias exercerem, como de facto exercem, essas competências, aliás como tive ocasião de dizer na minha intervenção e como o Sr. Deputado Manuel Moreira teve de reconhecer. O problema é que as exercem quase como sendo uma dádiva da câmara municipal!
Ora, o exercício de tais competências não tem de constituir uma dádiva; tem de resultar de um direito próprio! As freguesias não podem continuar a ser autarquias de segunda, lendo, pelo contrário, de ser encaradas como autarquias de primeira, aliás tal como se encontra consagrado na Constituição! Por isso tem eleições próprias; por isso há eleições para as assembleias de freguesia!
Nesse sentido, é necessário criar as condições para que a freguesia possa exercer não apenas as competências que a câmara lhe dá mas igualmente as competências próprias que a lei lhe deve reconhecer!
O Orador: - Sr.ª Deputada, nós também sabemos que não são autarquias de segunda e que são eleitas directamente. No entanto, são eleitas num nível diferente daquele em que o é o município. Aliás, falou-se aqui há pouco no exemplo europeu e V. Ex.ª sabe muito bem, pois teve oportunidade de o ver, que o nível municipal na Europa não tem nada a ver com o peso e a autonomia que possui em Portugal. Na realidade, o nível autárquico espelha-se aí praticamente com o nosso nível de freguesia, sendo muito mais baixo! Portanto, não vamos fazer comparações dessas!
Assim, Sr.ª Deputada, repito que a opinião do PSD vai no sentido de que, em relação ao que já existia, estes diplomas não trazem nada de novo em matéria de competências.
Vozes do PSD:- Muito bem!
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.
O Sr. Presidente:- Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): -Sr. Deputado João Teixeira, referi-me à questão da regionalização porque entendo que se trata de um processo que tem de ser perspectivado de uma forma global. A própria Constituição da República prevê a estruturação do Estado democrático de uma forma descentralizada, considerando as regiões administrativas como um nível da Administração do Estado democrático, bem como as freguesias, que são um outro nível da Administração.
Mas, já que levantou a questão, não poderei deixar de referir, aqui, o que, de facto, se passou nessa reunião: nela, aprovei, na generalidade, a proposta que foi apresentada pelo Sr. Deputado coordenador dessa comissão. No entanto, se bem se lembra, eu próprio apresentei uma proposta de aliteração à que foi apresentada e que foi votada, na altura, na presidência do Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD):- Como?!...
O Orador:- Peço desculpa, se eslava distraído, Sr. Deputado, mas estou a falar com o Sr. Deputado João Teixeira.
Se bem se lembra, foi assim que se passou. Portanto, essa unanimidade tem alguns caminhos que não foram bem claros na sua intervenção.
Em relação aquilo que há de novo nestas propostas, a questão que coloco, Sr. Deputado, é a seguinte: a falta de delimitação de competências entre a administração central e os municípios já deu bastante que falar; a falta de definição de competências próprias para as juntas de freguesia é, em nosso entender, fundamental.
O Sr. João Teixeira (PSD): - Mas existe uma lei!
O Orador: - Não se podem misturar ou dar aso a que se criem conflitos entre o poder e as competências dos municípios ou as competências das juntas de freguesia.
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Esta é que é a questão. E, por isso, Sr. Deputado, não estou de acordo com o que diz no sentido de deixar isto ao cuidado destes dois níveis de administração porque isso e desprezar o conhecimento da realidade das competências e da capacidade de intervenção dos vários níveis, ou seja, dos municípios e das juntas de freguesia.
Lembro-lhe, no entanto, Sr. Deputado, que estes projectos apontam, de facto, para o aumento das competências em várias áreas e, também, para o aumento da capacidade financeira das juntas de freguesia. Esta é uma questão extremamente importante e, como é natural, os dois projectos apresentados só podem ser executados se o projecto que o PSD tem congelado for agendado e subir ao Plenário para debate e para ser aprovado, porque, de facto, para que as juntas de freguesia possam exercer com maior dignidade e capacidade as suas funções e as suas competências, é necessário, em primeiro lugar, que tenham eleitos a tempo inteiro.
Mais, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que muitas das juntas de freguesia exercem competências - e isto já foi referido mas é bom que se repita - muito maiores do que aquelas que estão prevísseis até nestas mesmas propostas.
O Sr. João Teixeira (PSD): -Nós já frisámos isso!
O Orador: - São iniciativas de algumas forças políticas, fundamentalmente da área da CDU, que revelam experiências extremamente ricas, que os senhores não são capazes de reconhecer. Esta e a grande questão, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.
O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Questões conexas com o poder local preenchem hoje o agendamento desta Assembleia.
Vivemos, num passado recente, sob uma política fortemente centralista que, de formas diversas e em momentos distintos, foi contestada pelas diferentes formações partidárias.
Todavia, apesar de boa parte delas ter tido funções governativas, com evidente poder de decisão, tarda a efectivar-se uma clara descentralização que aproxime, inequivocamente, as populações dos centros do poder.
Por razões que se compreendem, mas que não se aceitam, todos contestam o centralismo ainda reinante, quando se está na oposição, mas, quando se ascende ao poder, o discurso e sobretudo a prática política modificam-se substancialmente.
Não é, pois, por acaso, que a primeira lei das finanças locais ocorreu quando um Governo de independentes dirigia os destinos do País, volvido já cerca de um lustro após o reinicio da vida democrática.
De qualquer forma, e porque apostamos fortemente no reforço do poder local, das suas competências, dos meios financeiros e dos recursos humanos indispensáveis à sua consecução, saudamos as iniciativas legislativas hoje postas à nossa consideração porque entendemos que, mau grado as lacunas, deficiências ou incorrecções que possam conter, constituem um saudável contributo para a consolidação e desenvolvimento do poder local.
Debruçar-nos-emos, em primeiro lugar, sobre o projecto de lei n.º 417/V, da iniciativa do PCP, que tem como objecto o regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento.
Consideramos que a filosofia a ele subjacente se nos afigura correcta, já que, não repetindo percursos passados, coloca os «bois à frente do carro», isto é, procura definir competências próprias e delegadas das freguesias e os necessários regimes financeiros, não procurando, para já, legislar sobre regimes de permanência dos eleitos locais, embora se anuncie que está no desejo dos proponentes retomar uma iniciativa nesse sentido.
Julgamos que é por aqui que se deve começar, em termos legais, pois a experiência vivida já em algumas zonas do País, e a progressiva descentralização de poderes do município para a freguesia, acompanhado da transferência dos necessários meios financeiros, tem-se revelado muito estimulante e com resultados práticos encorajadores.
Sabemos bem que nem todos demonstram capacidade, competência e vontade para assumir novas responsabilidades. Mas não pode ser uma minoria insignificante, que existe em todos os patamares do poder, a dissuadir os detentores do poder da iniciativa legislativa a consagrar formalmente o que a prática já experimentou nos mais diversificados locais.
Não nos debruçaremos sobre questões de especialidade que, nalguns casos, poderão ter uma maior ou menor latitude e enquadramento e que deverão ser analisadas em comissão com o contributo alargado das diferentes forças partidárias que, esperamos, possam permitir a sua discussão nessa sede, através do voto maioritário neste debate de generalidade.
A recente eleição de um autarca do PSD para presidir aos destinos da ANAFRE poderá ser um saudável indício de que a maioria que apoia o Governo veja, de forma diferente, o fortalecimento do poder local, que, exercido correcta e eficazmente, constitui uma forma de reforço da vida democrática que cremos todos desejarem, pelo menos a nível das intenções, embora a prática, muitas vezes, o desminta.
Contudo, queremos deixar bem claro que estamos de acordo com a necessidade de uma lei que institucionalize o princípio do regime de permanência de funções dos eleitos das freguesias.
É evidente que a assunção de novas competências e novas tarefas exige maior disponibilidade de tempo e de espírito dos autarcas a quem elas vierem a ser cometidas.
Pensamos também que é hoje inquestionável o papel e a importância das freguesias na prestação de serviços à comunidade local e mesmo como agente motor do desenvolvimento económico e social. O grau dessa importância é que e variável, segundo a vontade mais ou menos descentralizador do concelho ou até da capacidade da própria autarquia freguesia para interpretar e dar o melhor encaminhamento a essa vontade ou responder até positivamente aos justos anseios das populações.
O movimento de fazer passar para as freguesias algumas das competências e atribuições outrora desempenhadas na base do município é algo que foi imposto por uma vontade política das colectividades locais de assim proceder e teve lugar à margem de qualquer desejo expresso na legislação existente. Se é nosso entendimento que a passagem de novas atribuições e competências para as freguesias não necessita, como condição imprescindível, de qualquer suporte legal, já o mesmo se não passa no que concerne aos meios financeiros indispensáveis para o seu cabal desempenho. E, em boa verdade, torna-se necessário proceder ao encontro das soluções que habilitem as freguesias a desempenhar as funções que delas as populações esperam.
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Os projectos de lei em apreciação não suo particularmente inovadores relativamente a esta matéria, aumentando de 10% para 15% e 20% o mínimo da verba proveniente do Fundo de Equilíbrio Financeiro para despesas correntes a transferir para as freguesias, consoante as competências delegadas.
Para o PRD parece evidente que é necessário fundamentar convenientemente as verbas a transferir através dos estudos realizados, sendo ainda de admitir que a questão das transferências financeiras para as freguesias não consiste apenas em encontrar um montante global mas, sim, considerá-la num ambiente mais envolvente que a futura revisão da Lei das Finanças Locais impõe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reafirmamos a nossa opinião quanto ao interesse da apresentação das iniciativas em debate do PCP e do PS, quer pelos objectivos que prosseguem quer pela oportunidade de debate sobre o poder local, que importa aprofundar para a sua progressiva valorização e desenvolvimento.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há dúvida de que, no momento em que se processa a acentuação clara das formas de democracia participativa/democracia directa, é evidente a simpatia que desperta um movimento destinado a engrossar as competências e os meios financeiros da autarquia mais próxima das populações que é, sem dúvida, a freguesia.
Os projectos em exame, um do Partido Comunista Português e dois do Partido Socialista, merecem-nos alguns reparos. Em primeiro lugar, notamos a imperfeição jurídica dos dois conjuntos,...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Só imperfeição?!
O Orador: -... confundindo conceitos que suo substancialmente distintos, confusão que se faz, mais acentuadamente, nos projectos do Partido Socialista.
Em nosso entender, haveria, antes, que reformular a lista de atribuições das freguesias enquanto autarquias locais, tal como consta ainda hoje, embora de forma truncada e parcialmente revogada, no artigo 253.º do Código Administrativo, para, em seguida, dar nova redacção aos dispositivos legais que tom como objecto a definição das competências dos vários órgãos da autarquia local freguesia, isto é, da assembleia de freguesia e das juntas de freguesia.
Esse parecia-nos ser o método adequado para atacar este problema, método que escapava a uma ficção que tem prejudicado a discussão. Isto é: tem-se dito que não há competências próprias da freguesia. Bom, até nem há competências da próprias da freguesia, mas, sim, da assembleia e das juntas de freguesia, e atribuições da freguesia. E essas atribuições são-lhe conferidas por uma via predominantemente indirecta e haveria, porventura, que reformular a redacção do artigo 253.º
Mas, quanto à tarefa legislativa, deixo aqui uma palavra para o PSD que, na sua crítica às iniciativas, diz que «haveria que tratar de coisas mais vastas, mais importantes, de reformulações mais complicadas», mas nós entendemos que as reformulações que havia a tratar nesta matéria eram muito mais complicadas porque temos entre mãos, ainda, a compaginação do Código Administrativo com os diplomas que depois do 25 de Abril o vieram alterar parcelarmente, tudo isso dando um conjunto que merecia, efectivamente, ser tratado.
Quanto ao PCP - e não devemos esquecer que esta é uma iniciativa generosa -, em nosso entender, está mais próximo do que será uma iniciativa perfeita, porque, embora chamando-lhe competências, realmente fala de competências da freguesia e não da junta ou da assembleia e, apenas, de um núcleo restrito. Mas nós não nos esquecemos que o PCP tem, aqui, em várias oportunidades, combatido uma competência ou uma atribuição importante das freguesias, qual seja a da gestão autónoma dos baldios, que, realmente, por um lado, são um meio importante de afirmação da personalidade e identidade das freguesias e, por outro, um meio angariador de importantes receitas.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador:- Muito obrigado, Sr. Deputado João Amaral.
De qualquer modo, o CDS entende que, nesta matéria, haverá que fazer predominar um são realismo, optando por soluções flexíveis, adaptáveis à capacidade real e às necessidades das freguesias e à exiguidade, apesar de tudo, das receitas das câmaras municipais. Haverá que ter em atenção todo este conjunto, não esquecendo que o óptimo, que seria realmente engrossar a competência de organismos que estão em contacto mais directo com as populações, pode ser inimigo do bom, que é, efectivamente, o fortalecimento da câmara municipal, que, na realidade, é quem tem mais capacidade de desenvolver competências efectivas.
Por isso, entendemos que, com vantagem, os diplomas devem passar à análise na especialidade porque são susceptíveis de provocar um debate útil, que é este debate do poder local, e podem ser melhorados em sede de comissão, misturando a maior perfeição técnica e jurídica do diploma do PCP com o maior realismo e maior modéstia do diploma do PS e os contributos, porventura válidos, que venham, também, da área do PSD.
Nesse sentido, se fará a nossa votação.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, como sabem, dado que foi distribuído, entrou na Mesa um requerimento subscrito pelos Srs. Deputados do Partido Comunista Português, em que, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais em vigor, solicitam a votação do projecto de lei n.º 417/V.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estarão, certamente, recordados de que, não ainda há muito tempo, quando se apreciou aqui, no Plenário da Assembleia, um projecto de lei do PS e outro do PCP sobre empresas municipais e intermunicipais, o PSD suscitou a baixa desses diplomas à comissão, sem votação, para adequada ponderação da sua parte e para que o Governo tivesse tempo de, entretanto, apresentar uma proposta sobre a matéria.
Porém, o Governo não apresentou qualquer proposta; não se conhece o resultado das reflexões que o PSD, entretanto, possa ter feito e, nesta matéria, como em [antes
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outras, o PSD limitou-se a utilizar a técnica da «baixa à comissão» para congelar uma iniciativa legislativa cujos méritos nem sequer pode criticar, credivelmente, nesta Câmara.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, sabe-se que o PSD anunciou, também nessa altura, e fê-lo, em concreto, pela voz do Sr. Deputado Manuel Moreira, que o PSD e o Governo pensavam vir a celebrar, da melhor maneira, o Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses, apresentando nessa ocasião - assim nos prometeu - um pacote autárquico com soluções vastas e globais para múltiplos problemas que afectam as autarquias locais no nosso País.
A promessa ficou feita, mas ficou por cumprir, pois passou o Congresso da Associação Nacional de Municípios e nenhum pacote apareceu, quer por iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD quer por iniciativa do Governo.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS):- É normal!
O Orador: - Veio agora o Congresso da Associação Nacional de Freguesias e deu-se esta coisa singular: no respeito integral pelo resultado da vontade do eleitorado, os autarcas dos diversos partidos foram capazes de, consensualmente, se congregarem numa lista única, valorizando aquilo que os une e, portanto, pondo de parte aquilo que politicamente os separa, para procurarem também, por essa via, reforçar o poder local no nosso país.
E que fez o PSD? Apesar de essa lista de consenso, elaborada a partir dos resultados eleitorais, reconhecer a posição do PSD e, nesse domínio, aceitar que a presidência da Associação Nacional de Freguesias competisse, como compeliu, a um autarca do PSD, nem por isso esse partido entendeu valorizar esta circunstância e dar o mínimo de solidariedade aos autarcas das suas freguesias. Ao primar pela ausência, o PSD explicou-nos hoje que ela não foi por mera negligência de calendário mas, sim, por uma atitude assumida, divulgada agora pelo Sr. Deputado Manuel Moreira, e que teve a ver com o facto de o PSD estar em desacordo frontal quanto à possibilidade de as freguesias poderem congregar-se através de uma associação própria.
Ora, esta circunstância coloca-nos perante o cerne do problema, que é o de saber se uma freguesia é ou não uma verdadeira instituição autónoma do poder local e creio que ninguém do PSD se atreverá a negar a evidência de que a freguesia é autenticamente uma instituição autónoma do poder local. Ora, se o é, então não compete aos partidos políticos avalizarem se o movimento associativo das instituições autónomas do poder local contribui melhor ou pior para o que quer que seja, uma vez que quando elas próprias, autonomamente, e em seu critério, entendem associar-se, o papel dos partidos políticos é o de reconhecer este facto e, como tal, dar o seu contributo para o próprio fortalecimento dessas instituições do poder local.
Vozes do PS:-Muito bem!
O Orador: - Mas, de facto, não é esta a posição do PSD! Este partido tem uma atitude paternalista que determina quais são as boas e as más associações das autarquias- aliás, já o declarou, dizendo que as associações de freguesia suo más associações e, como tal, não lhes dá a sua solidariedade nem o seu empenhamento político.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Com isto, naturalmente, não vamos longo! Resulta claro que o PSD não só se revela contrário a qualquer movimento de fortalecimento das freguesias como também não se revela favorável a qualquer movimento de fortalecimento dos municípios e é aqui que se coloca a outra questão. Na verdade, cada vez que se coloca o problema da descentralização, o PSD foge-lhe e vai ao ponto de procurar, sistematicamente, mecanismos de dilação e de adiamento para ter de confrontar-se com o essencial da questão.
Quando o Sr. Deputado Manuel Moreira nos diz, aqui, como há pouco referiu, que vem aí uma proposta governamental de revisão da Lei das Finanças Locais ... Bem, então, nós esperamos!... Aliás, admitíamos em tese que talvez o Governo tivesse reflectido o suficiente para vir agora, por esta via, contribuir para fortalecer as atribuições municipais e, em consequência disto, fortalecer os mecanismos de financiamento às autarquias. Mas nada disso foi dito!
O Sr. Deputado Manuel Moreira acrescentou que, na realidade, trata-se de adequar o novo regime das finanças locais ao regime fiscal, entretanto aprovado, ou seja, no essencial, trata-se de uma mera adaptação dos instrumentos legais ao regime fiscal actualmente vigente que nada tem a ver com um compromisso autentico para com o movimento de descentralização dos municípios.
E quanto às regiões? Bem, quanto a estas já se ouviu dizer neste debate que há um calendário aprovado em sede de Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, aprovado por consenso e unanimidade dos partidos e que, portanto, vai tudo bem...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): -Isso não é verdade!
O Orador: - Porém, isso não é verdade, Srs. Deputados do PSD! Basta ver, na última tomada de posse de um dos governadores civis que, recentemente, saiu das vossas bancadas, como é que o governador civil de Aveiro interpretou autenticamente, suponho eu, o pensamento do PSD para dizer «nada de regionalização», o que é uma total e absoluta crítica a qualquer aspiração à regionalização do País. Assim, ele tomou um compromisso, na qualidade de representante do Governo, no senado de que a regionalização não se fará. Esta é verdadeiramente a substância da posição oficial do PSD e do Governo em matéria de regionalização.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador:- Ora, como estamos habituados a que o Grupo Parlamentar do PSD nunca, por nunca, vá à frente do seu Governo, então o que ficamos a saber é que, nunca por nunca, este grupo parlamentar quererá comprometer-se no movimento autêntico da criação das regiões administrativas no nosso País.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Conclusão, Srs. Deputados: O PSD é contra tudo o que tem a ver com uma efectiva descentralização em matéria administrativa, donde resulta que a sua propaganda eleitoral do «menos Estado, melhor Estado» não passou, verdadeiramente, de uma falácia! O que o PSD, a todos os títulos, nos tem dado é mais Estado e pior Estado, mais burocracia e mais clientelismo, mais complicações na Administração Pública. Com isto, o PSD impediu, verdadeiramente, os factores genuínos do desenvolvimento no nosso país! Aliás, não somos nós apenas que o dizemos!...
Basta ver o parecer das Comunidades Europeias que, observando o que é o chamado «Plano de Desenvolvimento Regional» para o nosso país, chegou a esta conclusão simples: o Plano de Desenvolvimento Regional tem objectivos de desenvolvimento nacional, de desenvolvimento sectorial, mas não tem, verdadeiramente, objectivos de desenvolvimento regional. Portanto, esta é a maior contradição com a própria designação desse mesmo plano.
Em conclusão: não é possível perceber-se como é que se fala em democracia participativa, em procurar cimentar com os agentes económicos, culturais e associativos da sociedade civil uma verdadeira dinâmica de desenvolvimento. De facto, o PSD está contra a descentralização, contra o protagonismo social!
Em suma, Srs. Deputados, os projectos de lei agora em apreciação são apenas mais um dos muitos afloramentos do espírito centralizador e burocrático deste partido do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimentos os Srs. Deputados Manuel Moreira, Nogueira de Brito e João Amaral.
Como o PSD e o PS já não dispõem de tempo, houve algumas cedências por parte do PRD e do CDS, por forma que os Srs. Deputados possam usar da palavra.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira, com tempo cedido pelo PRD.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero agradecer ao PRD a cedência de tempo.
O Sr. Deputado Jorge Lacão fez uma intervenção e abordou várias questões, algumas das quais nada tem a ver com aquilo que está aqui em discussão, designadamente a regionalização. Por isso, não vou perder muito tempo com essa matéria e vou apenas abordar questões que estuo hoje em discussão.
Gostaria de dizer que o meu partido vai cumprir aquilo que afirmou, ou seja, vai apresentar, muito oportunamente, nesta Assembleia da República, um conjunto de diplomas que vão contribuir para o aperfeiçoamento do ordenamento jurídico das autarquias locais, designadamente a proposta de lei para a consagração das empresas públicas municipais e intermunicipais, o que, aliás, justificou o nosso pedido de baixa à comissão dos diplomas apresentados pelo PS e pelo PCP sobre esta matéria e que subirão, de novo, a Plenário para serem discutidos em conjunto com a proposta de lei do Governo. Juntamente com este diploma esperamos apresentar outros que se prendem directamente com as autarquias locais. Assim sendo, o Sr. Deputado não perderá pela demora!...
Quanto à questão das alterações em concreto constantes dos diplomas que o PS e o PCP hoje aqui apresentam, quero recordar ao Sr. Deputado Jorge Lacão, que, por vezes, tem memória curta, dado as grandes inflexões que faz aqui Assembleia sobre as mais diversas matérias- aliás, já nos habituou a isso, pelo que não estranhamos!...-, que o Decreto-Lei n.º 100/84, sobre as atribuições e competências das autarquias locais, foi da autoria do então Ministro Eduardo Pereira, hoje deputado do PS, e da ex-Secretária de Estado da Administração Local, hoje deputada do PS, Helena Torres Marques...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É bom não esquecer este pormenor! Se porventura o PS desejasse assim tanto o reforço da competência das autarquias locais, nomeadamente das freguesias, talvez tivesse tido, nessa altura, uma grande oportunidade de fazê-lo, uma vez que tinha membros do Governo nessa área. Como não o fez, convém sermos menos demagógicos, mais ponderados, sensatos e, acima de tudo, não esquecermos a realidade dos factos.
Quanto à questão da associação de municípios, devo dizer que, há pouco, apenas me limitei a recordar qual foi a postura do PSD na fundação da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que é representativa de todos os autarcas portugueses, desde a freguesia ao município, onde tem assento todos os autarcas, e não apenas os órgãos autárquicos dos municípios, isto é, a câmara e a assembleia municipais, mas também as juntas de freguesia. Sendo certo que os presidentes de junta de freguesia estuo representados em menor número nos órgãos sociais dessa Associação.
Na altura em que foi criada a ANAFRE o PSD analisou, ponderou e considerou que não era vantajoso criar uma associação de freguesias porque isso seria uma duplicação, isto é, haveria duas associações para tratar dos assuntos das autarquias locais e da defesa dos autarcas portugueses, designadamente a dos municípios e a das freguesias. Ora, isso não fazia nem faz sentido! Repito, pois, que, por estes motivos, consideramos que não faz sentido haver duas associações representativas, uma dos municípios e outra das freguesias.
Quanto ao facto de apresentarmos só agora uma alteração à Lei das Finanças Locais, é evidente que a razão primeira, e isso nós não escondemos, foi resultante da reforma fiscal que fizemos. Porém, há outras razões e a seu tempo os Srs. Deputados vão ter conhecimento delas.
Assim iremos apresentar uma proposta de alteração global no sentido de ajustar, corrigir, tentar simplificar e, se possível, melhorar algumas das disposições constantes na Lei das Finanças Locais, procurando mesmo fazer uma maior transferência de verbas para as próprias freguesias. Aliás, há pouco disse que estamos a estudar seriamente a hipótese da transferência directa do FEF do Orçamento do Estado para as próprias freguesias. Portanto, não foram só os motivos da reforma fiscal mas também outros.
O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira cie Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS):- O Sr. Deputado Jorge Lacão iniciou a sua intervenção defendendo as associações de freguesia. Mas essa ideia surgiu-lhe agora, depois do Congresso do PS, pois no projecto de lei essa
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ideia não vem consagrada. Ou estarei enganado? É que o projecto de lei n.º 494/V, da iniciativa do PS, é bem deficiente, percebe-se mal, vê-se ato que há um lapso óbvio, pois falta aqui um artigo...
Para além de no projecto de lei apresentado pelo PS não haver nada sobre as associações de freguesia, será que o Sr. Deputado Jorge Lacão pensa que com este projecto se «engrossam» verdadeiramente as competências ou se atribuem competências próprias às freguesias? Será a questão do licenciamento dos canídeos? Ou os pareceres sobre a abertura de discotecas?
Risos do PSD.
Será, realmente, esse o cerne daquilo que VV. Ex.ªs pretendem atribuir às freguesias, como um espaço próprio?
Suponho que todas essas suo também competências puramente derivadas, que, aliás, VV. Ex.ªs atribuem à junta e à assembleia municipal, pois em relação à freguesia propriamente dita VV. Ex.ªs «guardam de Cobrado o prudente silêncio».
Suponho que, no fundo, a vossa modéstia nessa matéria e de elogiar, porventura, porque é cautelosa, mas, digamos, não justifica o entusiasmo do Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Jorge Lacão definiu com bastante rigor uma política centralística e centralizadora que o PSD tem prosseguido...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade!
O Orador: -... e referiu-se, concretamente, a um caso que foi bom ter sido aqui sublinhado, isto e, o de um governador civil que, no exercício oficial das suas funções e no acto de posse, apela publicamente ao, incumprimento da lei fundamental do País - a Constituição.
Protestos do PSD.
O Orador: - A questão que se coloca é esta: que situação vivemos neste país, em que um representante do Estado apela ao incumprimento das leis e em que é da parte do próprio poder político e no exercício da Administração Pública que vem um apelo para as leis não serem cumpridas?
Muito concretamente, Sr. Deputado Jorge Lacão, não será altura de nós, aqui na Assembleia, fazermos avançar o processo? Por que se espera pelo agendamento? Por que não forçamos o agendamento do debate desta matéria, na especialidade, que e a lei-quadro das regiões administrativas?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Julgo ler entendido que o CDS cedia tempo ao PS para a sua resposta e, assim, para responder, no tempo do CDS, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Manuel Moreira, o que pretendi significar na minha intervenção foi uma filosofia geral sobre valor da descentralização administrativa. Há quem acredite nisso e quem não acredite.
O Sr. Manuel Moreira (PSD):- Eu acredito!
O Orador: - Se acredita, devia praticar, porque, justamente, não há nada pior do que alguém que professa uma religião e não a pratica.
Nesse sentido, portanto, a minha sugestão é que o Sr. Deputado Manuel Moreira pratique, não em termos de promessas - voltou a prometer-nos que daqui a algum tempo virão aí umas propostas -, mas que rapidamente introduza o conteúdo útil dessas propostas no debate, para que assim possamos debater; não na base das promessas do Sr. Deputado Manuel Moreira, mas na base da crença efectivamente materializada em solução de leis relativamente aos passos que estão disponíveis a dar no caminho da descentralização.
Veremos, então, nesse momento, qual a descentralização do nível do município para a freguesia que o PSD está disponível para fazer e qual a descentralização do nível do Governo central para o município que o Governo está disponível para fazer.
Quanto à crítica que o Sr. Deputado Manuel Moreira fez à circunstância de alguns documentos essenciais para as autarquias terem sido objecto de votação em governos do PS e por responsáveis governamentais do PS, o Sr. Deputado aludia à Lei das Finanças Locais,...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Atribuições de competências...
O. Orador: -... que foi na altura considerada uma inovação extremamente positiva; no entanto, esquece-se que não há nenhum ordenamento legislativo que possa ser estático relativamente à dinâmica da vida.
Portanto aquilo que se trata, neste momento,- é de procurar saber se essa dinâmica impõe que o esforço global de modernização do nosso país e a dinâmica participativa a que queremos ligar os agentes locais deve propugnar, ou não, um maior nível de descentralização para os órgãos das autarquias locais. A esta questão o PS diz sim e, até este momento, o PSD diz talvez sim, talvez não. Só nos falta saber se o talvez é para o sim ou é para o não... lá chegaremos!
Sr. Deputado Nogueira de Brito, há algumas atribuições que procuramos transferir para as freguesias, que não são apenas essas que o Sr. Deputado citou e não vale a pena ler o diploma. Há outras no domínio da cultura e do desporto, dos direitos dos consumidores, da defesa e protecção do ambiente, da preservação do património artístico e cultural, da própria participação na organização e aprovação dos planos directores municipais que são também atribuições que queremos transferir para o domínio das freguesias.
Naturalmente que ao nível das freguesias existem dois órgãos: o órgão executivo e junta - e o órgão deliberativo- assembleia de freguesia. Procuramos, também aí, que haja uma participação equilibrada entre o orgão deliberativo e o órgão executivo e é para isso que chamo a atenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Mas o essencial é saber se queremos, de maneira mais ou menos certa ou até, porventura, mais ou menos desastrosa, dar, apesar de tudo, uma contribuição autêntica para o essencial. Para isso precisamos de saber se há consenso ou não quanto ao essencial.
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O essencial para o PS é caminhar no sentido de um reforço dos órgãos autárquicos e da descentralização administrativa e estou em crer que também é a posição do CDS. Sc assim for, está convidado para participar no nosso debate e para melhorar o nosso projecto.
Quanto à posição do Sr. Deputado João Amaral, quero dizer-lhe que o problema da regionalização, como é sabido, é um problema que o PS julga estar inevitavelmente na ordem do dia e temos provas de que, enquanto a regionalização se não fizer, é cada vez mais difícil potenciar positivamente os factores endógenos do desenvolvimento local e regional no nosso País e é, por outro lado, cada vez mais difícil tornar transparentes os mecanismos da Administração Pública, porque eles não se aproximam suficientemente das áreas a que se referem e dos sujeitos a que se destinam.
Lutar pelos critérios de igualdade no nosso País implica também uma visão de igualdade espacial no todo do território nacional, o que implica mais participação, mais aprofundamento dessas condições e por isso somos favoráveis à criação das regiões administrativas. Espero que sobre isso não fiquem dúvidas no espírito de ninguém.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Estuo inscritos os Srs. Deputados Lourdes Espanhol e Nogueira de Brito.
Há um requerimento do Partido Comunista Português solicitando a votação no final do debate do seu projecto de lei, mas como há dois projectos do Partido Socialista, presumo que este partido também pretende que os seus projectos sejam votados. Se o PS o confirmar isso fica registado, não sendo necessário, portanto, apresentar o requerimento por escrito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - O Sr. Presidente interpretou bem o ponto de vista do Partido Socialista.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, não temos objecções a que sejam votados os três projectos de lei, mas, em bom rigor, não há razão para outra votação para além da do projecto de lei do Partido Comunista Português, porque aceitar a votação de todos os projectos de lei significa que, em rigor regimental, não estamos perante um requerimento potestativo de votação.
Mas, uma vez que se põe de lado o cumprimento das disposições regimentais, por parte dos agentes dos grupos parlamentares, é evidente que não vamos impedir ou criar um incidente que prolongue os trabalhos. No entanto, não podíamos deixar de aclarar que, de facto, a partir do momento em que outros diplomas são votados, deixamos de estar perante um requerimento potestativo de votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa tinha perfeita consciência disso e também linha perfeita consciência de que era lógica a votação, pois tinha feito algumas sondagens, por isso mesmo fez essa pergunta, sabendo o que estava a fazer e qual era a resposta do Sr. Deputado Jorge Lacão, para que ficasse registado.
Julgo, portanto, que o incidente está esclarecido.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lourdes Espanhol.
A Sr.ª Lourdes Espanhol (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate foi importante e veio ao encontro das necessidades reais do País, mais concretamente, de necessidades reais das populações e do poder local.
A autarquia freguesia - poder mais próximo das populações - não pode continuar a ser o parente pobre do poder local e, como dizia o presidente da Junta de Freguesia de Mondim da Beira, no debate realizado na Sala do Senado, «a junta de freguesia deve deixar de ser o pobrezinho que pede ao Sr. Presidente da Câmara».
A freguesia tem todo o direito de exercer competências que vêm de encontro às exigências e necessidades das populações. A resposta pronta e rápida das necessidades locais deve poder ser dada pelo poder mais próximo - a freguesia.
A freguesia não pode ser a ponte para levar a outros poderes as necessidades e anseios das populações, tem de ser, efectivamente, um parceiro de pleno direito na construção de uma vida melhor e esta construção passa pela necessidade de descentralizar competências, de descentralizar os meios financeiros e pela necessidade de fazer justiça, a qual passa por uma votação, no sentido positivo, dos projectos de lei, hoje, em debate.
É urgente pôr fim à forma como o PSD trata as questões do poder local, que vai desde o retirar de projectos próprios até aos sucessivos protelamentos da discussão e votação de problemas essenciais.
É importante que cada força política, incluindo o PSD, clarifique, pela votação, qual o seu posicionamento face às questões do poder local, ao reforço de competências e meios financeiros das freguesias, à descentralização da vida política e à aproximação do Poder às populações.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito ainda pretende usar da palavra?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não posso deixar de me pronunciar, depois da intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer que, efectivamente, estamos dispostos a colaborar no aperfeiçoamento, o que V. Ex.ª já reconheceu, porque tudo o que disse realmente não contribui ou não vai no sentido de conferir uma esfera própria de actuação às freguesias, mas nós sabemos como é que isso se pode fazer e VV. Ex.ªs também sabem. É isso que iremos fazer.
Quanto ao mais e à referência que fez ao problema da descentralização, não podemos deixar de comungar da sua preocupação perante as declarações de um governador
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civil, que não e um deputado que possa manifestar na Assembleia a sua opinião, mas, sim, um magistrado que se revela contra directrizes fundamentais da nossa Constituição. Isso é grave e aconselha a que caminhemos rapidamente para nova discussão da lei quadro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está terminada a discussão.
Vamos proceder às votações, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 417/V, 494/V e 496/V.
Em primeiro lugar, vamos votar o projecto de lei n.º 417/V, do PCP, sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias, com vista à sua dignificação e fortalecimento.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e de Os Verdes.
Vamos passar à votação do projecto de lei n.º 494/V, do PS e da deputada independente Helena Roseta, sobre as atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos - alteração do Decreto-Lei n.º 100/84, de 20 de Março, e da Lei n.º 25/85, de 12 de Agosto.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e de Os Verdes
Vamos passar à votação do projecto de lei n.º 496/V, igualmente do PS e da deputada independente Helena Roseta que altera a Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro - Finanças Locais.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS e de Os Verdes.
Srs. Deputados, reunimos na próxima quinta-feira, às 15 horas, com a agenda que já é de todos conhecida. Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Pereira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Dinah Serrão Alhandra.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando dos Reis Condesso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Mendes Costa.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Álvaro Poças Santos.
João José da Silva Maçãs.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Mário Lemos Damião.
José de Vargas Bulcão.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Maria Antónia Pinho e Melo.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Gomes da Silva. Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Carlos Cardoso Laje.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
João António Gomes Proença.
Jorge Luís Cosia Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
Maria do Céu Oliveira Esteves.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Maria Oliveira de Matos.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Monteiro do Amaral.
Flausino José Ferreira da Silva.
Henrique Nascimento Rodrigues.
Joaquim Fernandes Marques.
João Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Leonardo Eugénio Ribeiro de Almeida.
Licinio Moreira da Silva.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel José Dias Soares Costa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Partido Socialista (PS):
António José Sanches Esteves.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
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José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Paula da Silva Coelho.
Domingos Abrantes Ferreira.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Octávio Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
Narana Sinai Coissoró.
Deputado independente:
Raul Fernandes de Morais e Castro.
Os REDACTORES: Maria Amélia Martins -José Diogo-Anita Pinto da Cruz - Cacilda Nordeste.
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DIÁRIO
Da Assembleia da República
Depósito legal n. º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA PA MOEDA, E. P.
AVISO
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3 - Os prazos de reclamação de faltas do Diário da República para o continente e regiões autónomas e estrangeiro são, respectivamente, de 30 e 90 dias à data da sua publicação.
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