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l Série - Número 84
Sexta-feira, 8 de Junho da 1990
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1989-1990)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 7 DE JUNHO DE 1990
Presidente: Exmo. Sr. António Alves Marques Júnior
Secretários: Exmos Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Calo Roque
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta dos requerimentos entrados na Mesa.
O Sr. Deputado Antunes da Silva (PSD) abordou a problemática dos incêndios florestais e prestou esclarecimentos aos Srs. Deputados Rui Silva (PRD), António Campos (PS) e Lino de Carvalho (PCP).
O Sr. Deputado Osório Comes (PS) falou sobre a aplicação da Lei n.º 9/89, de 23 de Fevereiro (Lei de Bases de Prevenção e da Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência), e das conclusões do 4.º Congresso de Deficientes, realizado em 14 e 15 de Outubro de 1989, no fim do que respondeu a pedidos de esclarecimentos do Sr. Deputado Manuel Filipe (PCP).
O Sr. Deputado Lalanda Ribeiro (PSD), a propósito da abertura formal das Termas das Caldas da Rainha realizada no passado dia 15 de Maio, referiu-se à Importância cultural daquela cidade.
O Sr. Deputado Sérgio Ribeiro (PCP) trouxe à colação alguns dos problemas que afectam o distrito de Santarém, em particular o concelho de Ourem.
O Sr. Deputado Rui Silva (PRD) congratulou-se com a realização do Festival Amador de Ginástica (GIMNOESTE), realizado em Torres Vedras entre os dias 27 de Abril e l de Maio.
Ordem do dia. - Câmara não concedeu autorização a uma Sr.ª Deputada para depor em tribunal.
A proposta de lei n. º 151/V, que dá nova redacção à Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (Lei Eleitoral para a Assembleia da República), foi aprovada, na generalidade, tendo, na especialidade e em votação final global, sido aprovado o artigo 13.º, n.º 1, os n.ºs 2 e 3 com alterações e os n.ºs 4, 5 e 6 (n.º 4 da actual lei).
Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna Manuel Pereira), dos Srs. Secretariai de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação) e da Presidência do Conselho de Ministros (Marques Mendes), os Srs. Deputados Basílio Horta (CDS), João Amaral (PCP), Jorge Lacão (PS), Herculano Pombo (Os Verdes), Duarte Lima (PSD), Alberto Martins e Almeida Santos (PS), Pacheco Pereira (PSD), Carlos Brito (PCP), Carlos Lilaia e Hermínio Martinho (PRD), Silva Marques e Pacheco Pereira (PSD) e Manuel Alegre (PS).
A Câmara aprovou, na generalidade, as propostas de lei n.ºs 134/V (Assembleia Regional da Madeira) - Estabelece o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira e 142/V (Assembleia Regional dos Açores) - Segunda revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Foi aprovada na generalidade, na especialidade e em votação final global a proposta de lei n.º 119/V, sobre cooperação judiciária Internacional em matéria penal.
Foram ainda aprovados, em votação final global, o texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 115/V- Autoriza o Governo a legislar sobre processamento e julgamento de contravenções e transgressões e a proposto de lei n.º 124/V - Altera as bases gerais das empresas públicas no sentido de afastar a necessidade de autorização e aprovação tutelar para as aquisições e vendas de montante superior a 50 000 contos realizadas por aquelas empresas, segundo alteração ao Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril.
Finalmente, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 23 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio dos Anjos Gomes.
António Abílio Costa.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José Caciro da Mota Veiga.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimira Gomes Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcínco António Campos Rebelo.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maças.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barros.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Antónia Pinho e. Melo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rosa Maria Tomé e Costa.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Henriques de Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
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Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Henrique do Carmo Carmine.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Cosia Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria do Céu Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Pedro Machado Ávila.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Camilo Carvalhal Gonçalves.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Júlio José Antunes.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Sérgio José Ferreira Ribeiro.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Centro Democrático Social (CDS):
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PEV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Manuel Gonçalves Valente Fernandes.
Deputados independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa na última reunião plenária os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Guerreiro Norte; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Governo, formulados pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pela Sr.ª Deputada Dinah Alhandra, e ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Oliveira Martins.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrámos há pouco no período de antes da ordem do dia, o qual não comporta prolongamento e que, portanto, irá terminar às 16 horas e 30 minutos.
Encontram-se ainda inscritos Srs. Deputados do antecedente período de antes da ordem do dia, pelo que dou a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Antunes da Silva.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decidi trazer a esta nossa Casa um assunto que, desde há muito, para mim e para tantos outros, tem constituído motivo de profunda preocupação.
Ano após ano, e cada vez em maior número, o nosso País vive situações de horror, de miséria, de destruição e morte, assistindo, ao mesmo tempo, a graves desequilíbrios ecológicos e ambientais.
Refiro-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, aos fogos florestais, que, como uma praga devastadora, cada Verão que passa nos deixam mais pobres e menos confiantes no futuro.
Disponho de insuficiente tempo para desenvolver, com o necessário pormenor, uma matéria cuja complexidade ninguém deve ignorar. Tentarei, apesar disso, sensibilizar as entidades competentes para os graves problemas sociais, económicos e ecológicos que advêm dos fogos florestais.
Para tanto, valer-me-ei de alguns números, usarei algumas referências, procurarei lançar algumas pistas e não deixarei, também, de formular algumas interrogações de forma mais ou menos explícita.
Conto com a vossa paciência, não pela valia da minha intervenção mas pela atenção que a questão merece.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abordar a temática dos fogos florestais, dadas as suas envolventes, implica a
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análise das condições em que ocorrem, dos meios destinados ao seu combate, da forma de articulação desses meios e, finalmente, das acções que lhe devem suceder quando, infelizmente, eles acontecem.
São esses diferentes aspectos que tratarei seguidamente, não sem que, antes, evidencie alguns números que, só por si, retraiam bem a situação de catástrofe em que se tom traduzido os fogos florestais.
Assim, no decénio de 1970 a 1979, segundo números fornecidos pela Direcção-Geral das Florestas, a média anual das áreas ardidas, incluindo povoamentos florestais e matos, foi de 43 929 ha. No decénio de 1980 a 1989, ainda segundo valores daquela Direcção-Geral, excepção feita aos valores relativos a 1989, tal média subiu para 74 645 ha. Nos últimos cinco anos, de acordo com valores indicados pelo Serviço Nacional de Bombeiros, a média anual das áreas queimadas atingiu 108 950 ha. Em 1980, para não recuar mais no tempo, registaram-se 2349 incêndios florestais, enquanto em 1989 ocorreram 44908 fogos. Isto é: em 10 anos, o número de fogos florestais aumentou 19 vezes!
Creio que este era um motivo suficiente para nós próprios, Srs. Deputados, prestarmos um pouco mais de atenção a este assunto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só neste ano, 1989, arderam 126 237 ha, o que representa 4% da área florestal total!
Sr. Presidente, Srs. Deputados:. À frieza destes números teremos, generalizadamente, de responder com indignação, mas também com forte determinação na busca de soluções que eliminem este flagelo ou que, pelo menos, o atenuem.
São conhecidas e indesmentíveis as faltas de racionalização, de adequado ordenamento e limpeza e de acessos fáceis da maioria das nossas florestas. Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, essas faltas ou insuficiências não eram menores há 10, 15 ou 20 anos atrás! Pelo contrário! - e afirmo-o sem hesitação e com inteiro conhecimento de causa!
Os meios de detecção, de prevenção e de vigilância, não sendo os desejáveis, tom sido intensificados. Disso. são exemplo a instalação de postos de vigia, a abertura de estradões e outros acessos e a criação dos grupos especiais de intervenção em inúmeras corporações de bombeiros.
No entanto, interroguemo-nos sobre esta questão.
Em 1989, nos distritos mais populosos no nosso País - a saber, Aveiro, Braga, Lisboa e Porto-ocorreram 24 864 fogos florestais, ou seja, 56,5% do total dos incêndios registados. Só nó distrito do Porto ocorreram 11 021 incêndios, o que corresponde a 25% do total dos fogos!
Poderá, na circunstancia e com rigor, afirmar-se que este número de incêndios se ficou a dever às insuficiências a que nos referimos? Responda quem souber...
Não pretendo, com estas afirmações, afastar aquelas insuficiências como causa de incêndios, ou melhor, como causa da sua propagação, o que não é, obviamente, a mesma coisa. Permita-se-me a insistência: não confundamos a causa do incêndio com as causas da sua propagação.
Quanto a esta, faz sentido apontar aquelas situações e defender a adopção de medidas tendentes a corrigi-las, designadamente a criação de incentivos específicos para limpeza e ordenamento dos povoamentos, florestais existentes, em condições a que os pequenos proprietários florestais possam ter fácil acesso.
A parte dos custos que o Estado, necessariamente, teria de suportar com essa acção, seria compensada, a curto prazo, com a consequente diminuição das verbas que despende com a inevitável aquisição de bens e serviços destinados ao combate aos fogos. Acresceriam a essa compensação a melhoria da produção florestal e a salvaguarda dos interesses sociais e ecológicos correlativos, que cumpre acautelar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito se tem falado relativamente aos meios disponíveis para combate aos incêndios e não são raras as vozes de acusação de falta desses meios.
Em muitos casos, não questiono a legitimidade dessas acusações. Só que este problema não pode ser visto desligado das condições em que actuam as entidades a que esses meios são afectos e do número de solicitações a que estão sujeitas essas mesmas entidades.
Portanto, se se mantiveram as condições em que, designadamente, as nossas corporações de bombeiros têm de actuar e se o número de fogos florestais continuar a aumentar, ou até mesmo se se mantiver, jamais haverá meios considerados suficientes.
As verbas disponíveis para bens de equipamento e serviços de combate a incêndios atingem já montantes elevados e os fundos não são inesgotáveis.
De acordo com fonte da comunicação social, o Serviço Nacional de Bombeiros vai dispor, no corrente ano, de cerca de l 700 000 contos para fazer face aos encargos com o combate a incêndios, particularmente com meios aéreos.
A propósito, aqui fica uma interrogação: não seria possível dotar a Força Aérea de mais aeronaves e pessoal preparado para este fim? É que, tanto quanto sabemos, a Força Aérea Portuguesa disponibiliza apenas dois helicópteros e um avião C-130, pelo que o Serviço Nacional de Bombeiros vai recorrer à contratação de mais 13 helicópteros a empresas privadas, com custos certamente superiores aos que a Força Aérea poderia praticar - recordo que cada minuto de voo de um helicóptero custa ao erário público cerca de quatro contos e nem sempre, infelizmente, os resultados pretendidos são alcançados. Estamos, no entanto, confiantes de que as entidades competentes não deixarão de analisar esta situação e de actuar em conformidade com o interesse geral...
O elevado número de fogos que têm assolado o País e a grande dimensão de alguns deles exigiram a conjugação de vários meios e corporações de bombeiros, tendo-se revelado uma deficiente articulação entre eles.
Face a situações de autêntica catástrofe, são compreensíveis algumas dessas falhas, as quais só poderão ser colmatadas se, pelo menos em relação às zonas de maior risco, forem definidos planos prévios de coordenação, fazendo-se intervir neles o Serviço Nacional de Bombeiros, a Direcção-Geral das Florestas, através da circunscrição ou administração florestal respectiva, e as corporações de bombeiros locais, em ligação com as comissões especializadas de fogos florestais (CEFFs) respectivas.
Em nossa opinião, a existência desses planos assume agora maior acuidade, dada a intervenção do Exército, recentemente determinada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma outra questão intimamente ligada aos incêndios prende-se com a actuação
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das forças policiais e das autoridades judiciais, uma vez que se discute - se é que é discutível... - a origem da maior parte dos incêndios. Qualquer estatística, mesmo a mais optimista, não atribui mais de 3% dos incêndios a causas naturais. Porque assim é, há aqui um vasto campo para a investigação e subsequente procedimento judicial.
Mesmo aqueles que mais se interessam por este assunto só muito raramente tomam conhecimento de resultados concretos dessas investigações.
Três conclusões se podem tirar: ou não há resultados porque não há investigação - o que é mau! - ou há investigação, mas não há resultados - o que não é menos mau!; -ou há investigação e resultados, mas estes não são conhecidos - o que é pedagogicamente errado!
A sociedade exige, com inteira legitimidade, uma actuação pronta e eficiente das forças policiais e das entidades judiciais, sempre que a ela houver lugar. E não se duvide, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que uma pronta e eficiente actuação dessas entidades constituiria o mais eficaz meio de combate aos incêndios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria, finalmente, de abordar o problema do repovoamento das zonas queimadas.
Das extensas áreas ardidas, apenas uma pequena parte está a ser reflorestada, o que significa que o País, cada ano que passa, está a diminuir as suas potencialidades.
Com efeito, grandes extensões de terrenos aptos para floresta revestir-se-ão apenas de matos, cuja rapidez de crescimento anula o normal desenvolvimento das espécies florestais que aí nasçam espontaneamente.
Isto acontece, em muitos casos, por falia de meios para uma racional reflorestação dos terrenos. E quando não é a falta de meios, as vítimas interrogam-se se valerá a pena, porque receiam voltar a ser vítimas...
Existe uma terceira razão, quanto a nós a mais importante, ou seja, o regime fundiário dominante nas zonas de maior incidência dos fogos.
A pequena dimensão das propriedades não permite uma reflorestação economicamente viável e, além disso, não assegura uma probabilidade mínima de salvar essa reflorestação em caso de ocorrência de novo incêndio, pelo simples facto de as propriedades contíguas não terem sido também devidamente reflorestadas.
Sem paternalismos, o Estado, através dos serviços competentes, tem aqui uma importante acção a desenvolver: em primeiro lugar, tem de suprir a falta de técnicos naquelas zonas, mobilizando os seus quadros especializados e, em segundo lugar, deve estimular e incentivar os pequenos proprietários a associarem-se, concedendo-lhes apoios técnicos e materiais, especificamente criados para este fim, reembolsáveis e, eventualmente, não remunerados.
Este é, em nossa opinião, o caminho a seguir, o qual só aparentemente representa um maior encargo para o Estado, porque fica circunscrito no tempo, enquanto os custos com prevenção, vigilância, combate e outros, sempre crescentes, não o estão. Tudo isto sem contabilizar as vantagens económicas, sociais e ambientais daí decorrentes. Os vindouros julgar-nos-ão pelo que fizermos e pelo que não fizermos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui terminava a minha intervenção, mas não o faço sem uma nota de lamento: pelo barulho de fundo que se ouvia na Sala, verifiquei que os Srs. Deputados, incluindo a Mesa, não prestaram a devida atenção a este assunto. Não se trata de prestarem atenção à minha intervenção, mas de o fazerem relativamente a um evento, que, na verdade, merece a atenção de todos e que está, de facto, a flagelar o nosso país cada Verão que passa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Rui Silva, António Campos e Lino de Carvalho.
No entanto, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Rui Silva, gostaria de fazer um breve comentário à observação feita pelo Sr. Deputado Antunes da Silva relativamente ao ruído de fundo que se registou na Sala durante a sua intervenção.
Na verdade, através dos sinais habituais, a Mesa teve a oportunidade de chamar a atenção para o facto de haver demasiado ruído. Porém, tal nada teve que ver com intervenção do Sr. Deputado Antunes da Silva, na medida em que, como o Sr. Deputado sabe, isto traduz um acontecimento vulgar em termos das várias intervenções.
Penso que, apesar de tudo, se justificava que a Mesa lhe desse esta explicação, considerando que, de facto, se defrontou com um ruído ambiente demasiado acentuado, mas reconhecendo que, noutras circunstâncias e a propósito de outras intervenções, a situação se tem repetido.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Deputado Antunes da Silva, permita-me que inicie este meu pedido de esclarecimento - que não o será exactamente, embora seja sobre essa figura que irei intervir - dando-lhe um conselho. Na verdade, perdeu, no passado dia 29 de Maio - quando aqui se debateu, sob iniciativa do PRD, o problema das catástrofes em Portugal-, uma óptima oportunidade para proferir aqui, perante os membros do Governo responsáveis, essa sua intervenção.
Assim, Sr. Deputado Antunes da Silva, usando da mesma coragem com que hoje abordou aqui essa matéria, aconselhá-lo-ia a enviar essa intervenção ao Sr. Ministro da Administração Interna, pois parece-me que foram precisamente algumas das coisas que aqui referiu hoje que o seu grupo parlamentar deveria ter dito aquando do mencionado debate do passado dia 29 de Maio.
Vozes do PS e do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Permita-me que lhe diga ainda, Sr. Deputado, que algumas das afirmações que produziu não pecam por excesso, mas até por defeito!...
Na realidade, isso não acontece só em relação ao número de incêndios - adveniente de informações que lhe foram fornecidas pela Direcção-Geral das Florestas e pelo Serviço Nacional de Bombeiros -, que é superior ao que V. Ex.ª referiu, mus também relativamente às verbas que irão ser este ano disponibilizadas para os meios aéreos, pois não se trata de l 700 000 contos. Com efeito, poder-lhe-ei dizer que, segundo informações da semana passada, tais verbas consubstanciam uma importância de 2 milhões de contos, mais um reforço de 500 000 contos que o Governo disponibilizou.
Também me preocupo com essa situação, pois parece-me que são verbas que, eventualmente, poderiam vir a ser aplicadas de outra forma, nomeadamente na aquisição de meios aéreos.
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É pena que não possamos combater os incêndios com fragatas, pois teríamos neste momento uma óptima oportunidade para fazê-lo. Na verdade, quando suo precisos meios aéreos para combater incêndios, compram-se fragatas para andar no mar! Enfim, é uma estratégia...
Sr. Deputado Antunes da Silva, referiu V. Ex.ª os incentivos para a limpeza das matas, a compensação nas verbas a atribuir pelo Estado, as faltas de meios, a prevenção, a vigilância... No entanto, se V. Ex.ª se quiser dar ao trabalho de ler as minhas intervenções produzidas nesta Câmara em 1985, verá que fui um dos percursores desses conselhos ao Governo.
Infelizmente, fui semiouvido (não posso dizer que não fosse totalmente ouvido) e hoje - como disse e muito bem! - continuamos a não ter um reforço de verbas 19 vezes superior, de modo a que possa ser equivalente ao número de incêndios ocorridos no nosso país.
Sr. Deputado, vamos amanhã votar dois projectos de resolução, sendo um da nossa iniciativa e para o qual tive o cuidado de solicitar aos membros dos outros grupos parlamentares a respectiva subscrição. Um outro será apenas apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, parecendo-me que vem ao encontro das suas preocupações.
Sr. Deputado Antunes da Silva, não lhe colocarei a questão. Apenas levanto esse problema para que amanha não corramos o risco de ver esse bancada, só porque a iniciativa parte deste lado, «chumbar» esse diploma, que me parece ser muito importante para o combate aos incêndios em tempos futuros.
Vozes do PRD, do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): - Sr. Deputado Antunes da Silva, estou de acordo com a intervenção feita por V. Ex.ª, mas penso que se têm discutido muito mais os fogos e muito menos a sua origem. Assim, qualquer dia temos os deputados todos armados em bombeiros, embora ninguém queira discutir o fundo da questão: o ordenamento florestal.
O Sr. Deputado sabe que a Comunidade ajuda o Estado Português - já está a ajudar os outros Estados - com cerca de 30 000$ por hectare, com vista à plantação de espécies de crescimento lento, acima de tudo folhosas, que seriam talvez o melhor «bombeiro» para preservar as suas preocupações.
Assim, gostaria de saber o que é que o Sr. Deputado acha de o Governo não implementar a medida de pagar aos produtores que queiram plantar espécies de crescimento lento os 30 000$ que podem ir buscar através dos fundos de apoio da Comunidade. Eu gostaria igualmente de saber se V. Ex.ª me acompanha na opinião de que tal atitude se destina somente a proteger a plantação de espécies de crescimento rápido, com vista a permitir resolver alguns problemas que o Governo não é capaz de ultrapassar.
Por exemplo, o Governo não cuidou da questão no Alentejo, pelo que, neste momento, os preços dos cereais vão entrar em queda. Assim, o Governo vai permitir que uma fábrica de celulose triplique a sua produção para ir povoar o Alentejo com eucaliptos, já que não foi capaz de criar uma alternativa credível aos cercais alentejanos.
Portanto, eu perguntaria ao Sr. Deputado se está de acordo com isto.
Referiu também o Sr. Deputado Antunes da Silva o associativismo dos pequenos produtores, pelo que lhe perguntaria se está de acordo com o facto de as fábricas de celulose já terem hoje na mão mais de 250 000 ha, se preparem para ir para o auto-abastecimento e abandonem iodos os pequenos produtores com os eucaliptos, sem terem a quem vendê-lo. É que há já empresas que ultrapassam, em termos de auto-abastecimento, os 70%.
Por conseguinte, visto ser o Sr. Deputado de uma zona florestal produtora, gostava de saber qual é a sua atitude perante os pequenos produtores que estão a ser enganados pelas fábricas de celulose e pelo Governo e qual a medida que V. Ex.ª preconiza para avisar imediatamente essas pessoas que vivem na sua zona de que, a curto prazo, as fábricas de celulose não precisarão dos seus eucaliptos, pois procedem já a um auto-abastecimento, indo tais pequenos produtores ficar sem quaisquer rendimentos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado Antunes da Silva, na sequência do debate que fizemos aqui na semana passada, onde a problemática dos incêndios foi largamente discutida - embora o Sr. Deputado não tenha tido, certamente, oportunidade de intervir... -, a questão que me ficou após ouvir a sua intervenção foi a de que o seu grupo parlamentar, amanhã, no momento da votação dos projectos de resolução já referidos pelo Sr. Deputado Rui Silva, não deixará de votá-los favoravelmente.
De facto, Sr. Deputado, no projecto de resolução apresentado pelo meu grupo parlamentar, que esteve presente no debate aqui realizado na semana passada, entendemos que o problema dos incêndios florestais não deve limitar-se ao ataque às suas consequências, ou seja, é importante combatê-los, é importante dar os meios, sobretudo aos bombeiros, para evitar a sua propagação. Mas, em nossa opinião, tilo ou mais importante do que isso e combater as suas causas.
Nessa medida, Sr. Deputado, perguntar-lhe-ia se entende ou não que uma parte substancial das verbas que hoje estão à disposição do Governo Português, sobretudo no quadro do PAF (Programa de Acção Florestal) deveriam ser canalizadas para o ordenamento do espaço florestal e nesse âmbito para uma política de arborização, que não privilegie as grandes manchas monoculturais mas, sim, a floresta de uso múltiplo.
É porque só uma política florestal que, por um lado, não seja promotora da desertificação e do despovoa mento das zonas serranas - contribuindo, portanto, para a fixação das populações e, através delas, também para a prevenção dos incêndios - e que, por outro, faça o ordenamento do espaço florestal, privilegiando a instalação de espécies florestais de crescimento lento, como, por exemplo, as folhosas, nas encostas sobre as linhas de água, só uma política dessas, dizia, poderá evitar a propagação dos incêndios.
Esta é uma das medidas que propomos, independentemente de outras que já tivemos ocasião de apresentar,
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nomeadamente aquelas que dizem respeito ao campo da formação profissional, de combate às causas e à propagação de incêndios.
Pergunto, Sr. Deputado, se o seu grupo parlamentar não está de acordo com estas medidas e com este entendimento. Sc assim for, esperamos que amanhã o seu grupo parlamentar vote favoravelmente o nosso projecto de resolução.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Antes de responder às questões que me foram colocadas, gostaria de agradecer ao Sr. Presidente o cuidado que teve ao dar-me uma explicação, que nas circunstâncias se justifica perfeitamente. Muito obrigado por isso!
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Rui Silva, eu gostaria de dizer o seguinte: reconheço que o Sr. Deputado é uma pessoa que tem interesse por esta matéria e gostaria de felicitá-lo, sinceramente, por isso.
V. Ex.ª começou por perguntar-me por que é que eu na terça-feira, aquando da discussão do assunto que o PRD aqui nos trouxe, não fiz esta intervenção. Não fiz, Sr. Deputado, esta intervenção por uma questão de articulação das intervenções do meu grupo parlamentar. Mas, independentemente disso, há ainda uma outra justificação: o que a matéria que nos trouxe aqui - e muito bem, como, aliás, tive oportunidade de dizer-lho ao colocar-lhe uma questão - tinha um carácter mais geral, linha a ver com a protecção civil no seu todo e não especificamente com os fogos florestais. Portanto, essa é uma das razões por que só hoje eu trouxe a esta Câmara a questão dos incêndios florestais.
Relativamente à sugestão que me dá, terei o cuidado de mandar ao Sr. Ministro uma cópia da minha intervenção.
Acredito na observação que fez, segundo a qual os números que utilizei pecam por defeito. Não desminto nem confirmo! Posso é garantir-lhe que esses números são aqueles que se encontram nos documentos que me foram fornecidos pela Direcção-Geral das Florestas relativamente a todos os anos e até 1989 e que são relativos ao Serviço Nacional de Bombeiros.
As verbas que referi são superiores. É natural que haja aqui um desfasamento... A verba que o Sr. Deputado referiu pode ser para outros fins, mas esta é essencialmente para combate aos incêndios florestais, designadamente através de meios aéreos. Mas aqui pode haver, de facto, uma grande divergência de posições.
Quanto à votação, amanhã, do projecto de resolução - e aproveito para responder já à questão concreta que outros Srs. Deputados tiveram a gentileza de me colocar-, nem sequer conheço o texto desse projecto de resolução, por isso não posso pronunciar-me relativamente a essa matéria. Pessoalmente, creio que se o projecto contiver medidas da natureza daquelas que eu defendo deve merecer a votação favorável do meu grupo parlamentar.
O Sr. Deputado António Campos fez uma afirmação inicial com a qual estou inteiramente de acordo. É que têm-se discutido muito mais os fogos em si do que as causas que os determinam e esse é o mal!... Talvez seja por isso que, em 10 anos, os fogos aumentaram 19 vezes!
Srs. Deputados, é, de facto, uma calamidade; é, de facto, uma catástrofe e parece que as pessoas não estão sensibilizadas para esta situação. Repito: só durante o ano passado ardeu 4% da área total da nossa mancha florestal!... Seria bom que os Srs. Deputados e as entidades competentes tivessem consciência disto.
Quanto à verba que referiu, aos 30 contos com origem nos fundos comunitários, penso - e não quero garantir isso - que ela ainda não está em vigor, mas creio que poderá a vir a ser concedida aquando da renegociação do Regulamento (CEE) n.º 797.
No entanto, Sr. Deputado Amónio Campos, penso que essa não é a questão mais importante. Estou de acordo consigo quando diz que devem ser canalizadas verbas. independentemente da sua origem... Portanto, não vale a pena entrarmos nessa discussão. Foi por essa razão que propus, concretamente, duas acções a desenvolver quer no campo da prevenção dos fogos quer no campo do repovoamento florestal.
Quanto à questão do associativismo entre os produtores florestais, essa foi uma das propostas que fiz e ó um dos meus «cavalos de batalha». De facto, com o regime fundiário que temos, designadamente na minha zona, só é possível reflorestar racional e economicamente!... E quando digo racional já estou a fazer uma valoração das espécies a utilizar na reflorestação, portanto, já estou a considerar que não é racional se a espécie a usar for só o eucalipto ou só o pinheiro! Portanto, tem de haver a utilização de folhosas! É indispensável que assim seja - aliás, foi por isso que fiz essa proposta concreta.
Deixe-me dizer-lhe publicamente, Sr. Deputado, que a mim também preocupa o tendencial auto-abastecimento das empresas florestais do nosso País... Isto, de facto, pode vir a repercutir-se na vida do amanha e dos vindouros desses produtores, dos pequenos proprietários florestais. Digo isto sem hesitação e publicamente!
Sr. Deputado Lino de Carvalho, relativamente à questão que levantou, acerca do debate de terça-feira passada, eu já disse que esta minha intervenção de hoje teve um carácter mais especializado do que a outra, que teve um carácter mais lato do que aquele que hoje aqui se discutiu.
Quanto à votação, repito, não conheço sequer o projecto de resolução que vai ser apreciado amanhã, portanto não sei qual vai ser a orientação de voto do meu grupo parlamentar. Mas, tal como já disse, se esse projecto tiver medidas da natureza idênticas àquelas que eu defendi, parece-me poder merecer a nossa aquiescência.
Quanto à disponibilização das verbas para os efeitos que apontou, designadamente quanto ao PAF, gostaria de dizer o seguinte: não podemos condenar - eu não o faço - um programa como o PAF, que tem resolvido alguns problemas, quer em termos de ordenamento dos povoamentos florestais existentes quer relativamente a alguns repovoamentos. Só que, infelizmente, as verbas do PAF, face às zonas que têm sido destruídas pelos fogos, tornam-se insuficientes. Daí, Sr. Deputado, eu ter falado em apoios específicos especialmente criados para estes dois efeitos, ou seja, de prevenção dos fogos e de repovoamento das áreas ardidas.
Com isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, penso que respondi a todas as questões que me foram colocadas.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osório Gomes.
O Sr. Osório Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma sociedade de homens livres não pode ser insensível, não pode perder a capacidade de indignação, não pode ser conformista face à dor e à doença, à carência e frustração de expectativas.
Uma sociedade de homens livres não pode deixar ao acaso o apoio aos concidadãos que vivem situações de crise, não pode deixar ao acaso a prevenção de calamidades, não pode deixar ao acaso a resolução das situações de marginalização.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Uma sociedade de homens livres tem de ser vitalizada pelo exercício da solidariedade e pela garantia da justiça social.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!.
O Orador: - A concretização destes valores essenciais não é apenas função do Estado, mas passa necessariamente por ele.
O Estado também neste domínio não pode ser abstencionista! Deve suscitar e estimular respostas da sociedade civil, na medida em que só lhe é lícito retirar-se quando tais respostas sejam satisfatórias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com os dados disponíveis, limitados físicos ou mentais, deficientes motores, invisuais e surdos-mudos são no nosso País cerca de um milhão, de entre os quais 300 000 crianças, o que representa aproximadamente 10% da população.
Como causas da sua enfermidade apontam-se, entre outras, os acidentes de trabalho, que anualmente vitimam milhares de trabalhadores, a insuficiente assistência materno-infantil, o alcoolismo, os acidentes rodoviários, que, de forma alarmante, se vêm multiplicando de ano para ano e - não o esqueçamos - a guerra colonial, que deixou marcas profundas na juventude da década de 60 e princípios da de 70.
Não obstante o reconhecimento dos direitos humanos ser uma das notas características do mundo contemporâneo, paradoxalmente esses mesmos direitos são em larga medida ignorados.
É assim que pessoas com deficiências sofrem as consequências da sua limitação numa sociedade que se mostra incapaz de considerá-los iguais aos outros cidadãos.
A pessoa deficiente é um ser humano que deve ser membro pleno da sociedade. Por isso, à pessoa deficiente devem ser asseguradas a integração, a normalização e a personalização a que tem direito.
Em face destes princípios, que são, como creio, indiscutíveis, a ninguém é lícito considerar-se dispensado de prestar aos deficientes os mecanismos necessários e suficientes à sua plena integração na comunidade onde vivem. Mas se os cidadãos tem a obrigação de assumir para com eles uma solidariedade real e operante, respondendo de maneira adequada ao sofrimento que os aflige, não é menos verdade que a luta pela integração dos deficientes na sociedade moderna tem de passar necessariamente pela intervenção do Estado:
Numa primeira linha, criando os mecanismos de intervenção no campo da saúde, quer no âmbito da saúde e assistência materno-infantil quer no campo da medicina de reabilitação;
Numa segunda linha, criando os mecanismos jurídicos que dinamizem a obrigatoriedade de integração das pessoas com deficiências na vida comunitária e produtiva, de modo que com elas se prossiga a conquista da igualdade possível;
Por último e num outro plano, criando os mecanismos que possibilitem a ultrapassagem do problema fundamental dos deficientes, isto é, a da sua própria sobrevivência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sociedade de homens livres, uma pessoa deficiente não pode significar por si só desprotecção, insegurança, marginalidade ou miséria.
A pessoa deficiente carrega consigo traumas muito acentuados, o maior dos quais é provocado pela reacção do corpo social, reacção de quase recusa, por erradamente se julgarem os deficientes como incapazes, negando-se-lhes os meios que permitiriam a sua reintegração social e a subsequente recuperação, se não total pelo menos parcial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No ano transacto a Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família debateu, em sede de especialidade, o projecto de lei n.º 294/V, intitulado «Carta dos Direitos dos Cidadãos Deficientes», e a proposta de lei n.º 7l/V (Lei de Bases de Reabilitação). Da discussão travada foi possível ,estabelecer-se um consenso entre todos os grupos parlamentares em torno de um documento alternativo - «Lei de Bases de Prevenção e da Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência» -, aprovado, por unanimidade, em sessão plenária da Assembleia da República em 23 de Fevereiro de 1989 (Lei n.º 9/89).
Não sendo o diploma desejado, porque não contempla grande parte das reivindicações das diversas associações de deficientes, a aprovação daquela lei foi um passo importante para a tentativa de resolução de problemas que afectam as pessoas com deficiência.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a existência da lei só por si não é suficiente; precisa de regulamentação e, sobretudo, de completa aplicação.
Se nos recordarmos de que as Leis n.ºs 6/71 e 66/79 nunca foram regulamentadas nem aplicadas, é plausível a apreensão expressa por diversos intervenientes e associações no 4.º Congresso de Deficientes, realizado em 14 e 15 de Outubro de 1989 pela União Coordenadora Nacional dos Organismos de Deficientes (UCNOD). Ora, a pergunta que se coloca é esta: será que esta lei vai ter o mesmo destino das outras?
Os deputados do Grupo Parlamentar do PS, com clareza militante, e, estou certo, todos os restantes Srs. Deputados, estarão, pelo menos no interior das suas consciências, com a UCNOD e com todas as associações de deficientes, na reclamação e exigência pela aplicação da Lei n.º 9/89, unanimemente aprovada nesta Câmara.
Por outro lado, no mencionado Congresso foi igualmente aprovada a «Plataforma para a resolução dos problemas dos deficientes em Portugal», que estabelece um conjunto de 40 medidas prioritárias.
Trata-se, inquestionavelmente, de um valioso contributo para ultrapassar as barreiras à integração do cidadão deficiente actualmente ainda existentes no nosso país.
Havendo vontade política e espírito dialogante do Governo com a UCNOD e associações constituídas, passos significativos podem ser dados para a prossecução daqueles objectivos.
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De muitas outras propostas aprovadas apenas me irei referir a uma que considero de inegável importância na defesa dos direitos do cidadão deficiente e que se relaciona com o crédito de horas aos dirigentes associativos nos mesmos moldes que estão estabelecidos para os delegados sindicais. Esta proposta foi debatida na Comissão de Trabalho, não tendo sido acolhida por dificuldades de enquadramento jurídico desta matéria.
Mas na verdade, Srs. Deputados, não é possível pensar-se que os dirigentes das associações de deficientes possam desenvolver as enormes e absorventes actividades das suas instituições apenas e durante os tempos livres!...
Só com grande força de vontade e extraordinária dedicação à causa das pessoas com deficiência os dirigentes associativos conseguirão manter o fulgor que nós reconhecemos às associações de deficientes.
Há que pensar e reflectir profundamente sobre esta questão procurando encontrar uma solução mais justa e eficaz quer para o normal desempenho das respectivas funções e actividades quer para o melhor e mais adequado funcionamento das associações.
Aqui fica, pois, este desafio a todos os Srs. Deputados membros da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família. Estou convicto de que o aceitarão sem qualquer relutância. Na certeza, porém, de que, ao mantermos a soberana indiferença sobre estes problemas, estaremos a entravar os princípios da igualdade, da solidariedade e da fraternidade, ainda alicerces de uma realidade quotidiana.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Filipe.
O Sr. Manuel Filipe (PCP): - Sr. Deputado Osório Gomes, devo dizer-lhe que subscrevo inteiramente a intervenção que V. Ex.ª acaba de produzir. Aliás, mais não seria de esperar depois do que ambos fizemos e tentámos em sede de discussão na especialidade da Lei de Bases da Reabilitação.
De qualquer maneira, gostaria que V. Ex.ª comentasse o facto de essa lei, que já tem mais de um ano, não ter sido até agora regulamentada e ainda o facto de o Plano Orientador de Reabilitação, que tem um suporte por parte do Governo que lhe permitiria implementar os planos insertos na Resolução n.º 5/88 do Conselho de Ministros, não ter sido aplicado.
Peço-lhe, então, que V. Ex.ª comente estes dois grandes aspectos: a não regulamentação da Lei de Bases da Reabilitação e a não implementação do Plano Orientador de Reabilitação.
O Sr. Presidente: - Para responder à questão colocada, tem a palavra o Sr. Deputado Osório Gomes.
O Sr. Osório Gomes (PS): - Sr. Deputado Manuel Filipe, efectivamente, tivemos na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família um trabalho que considero altamente positivo, dado que, não sendo, como há pouco referi na minha intervenção, uma lei de bases como todos gostaríamos que fosse, de qualquer modo, sempre foi nosso entendimento que seria um passo muito importante, uma vez que através da aprovação dessa lei de bases o Governo estaria devidamente apetrechado com os meios legais para poder fazer a devida, necessária e desejável regulamentação. Mas não só isso: também a sua aplicação!
Tem sido um hábito do actual Governo deixar várias leis de bases sem regulamentação!... E muito menos procede à sua aplicação!
Mas esse é um trabalho e uma atenção que devemos continuar a manter, quer na Comissão de Trabalho quer no Plenário, denunciando sempre que o Governo não tem interesse algum em resolver estes problemas. E neste aspecto o Grupo Parlamentar do Partido Socialista está efectivamente atento a estas situações, que, como é timbre da sua actividade e sobejamente conhecido, irá sempre denunciando.
Por outro lado, sei também que se têm constituído alguns grupos de trabalho no âmbito do Secretariado Nacional de Reabilitação que tom, de facto, tentado apresentar essas propostas ao Governo mas que cias não tem sido implementadas. Daí que nas audiências que lenho concedido a várias associações de deficientes, a nível do Secretariado Nacional de Reabilitação, a nível da UCNOD e também a nível de outras associações, aquilo que mais se tem mantido e colocado é que a falta de regulamentação tem sido um momento decisivo para que estes problemas de pessoas com deficiências, altamente capazes e potencialmente de exercer grandes actividades, possam dar também a sua utilidade à sociedade civil como têm demonstrado. Portanto, há aqui um conjunto enorme da população que merece uma grande atenção de todos nós e exactamente por isso é que a minha intervenção foi aqui proferida.
Embora pense não ter feito um comentário como desejaria que fosse feito relativamente às duas questões que me colocou, estou de acordo consigo relativamente a esta indefinição, a esta incerteza. Também tenho uma grande preocupação pelo facto de este Governo não ter a mínima atenção relativamente aos problemas que afectam as pessoas com deficiências. Por isso concordo consigo e na Comissão de Trabalho espero ter a sua colaboração no sentido de virmos a resolver algumas dessas questões.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Lalanda Ribeiro.
O Sr. Lalanda Ribeiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ocorreu no passado dia 15 de Maio mais um dia festivo para a cidade de Caldas da Rainha, dia dedicado a homenagens à rainha D. Leonor e à abertura (simbólica) do Hospital Termal, único do género pertencente ao Estado.
Noutros tempos, em que as Termas só funcionavam de Maio a Outubro, abriam-se as suas portas neste dia, perante as autoridades concelhias e a população, que, em grande número e de todo o concelho, acorria a esta cerimónia, para a tradicional visita ao «seu» hospital.
Hoje, que as Termas funcionam todo o ano, o acto repete-se, no mesmo dia, com o mesmo cerimonial e com enorme afluência de pessoas, que não querem deixar de manifestar o seu carinho pela dávida que a rainha nos deixou.
O desenvolvimento das Caldas da Rainha deve-se, sem dúvida, à edificação do hospital, lendo a povoação crescido rapidamente a sua volta, bem como do templo que lhe está anexo, ambos dedicados a Nossa Senhora do Pópulo.
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Três anos após o início das obras, há pouco mais de 500 anos, começaram a ser recebidos doentes nas novas instalações daquele que era o primeiro no seu género no mundo.
O movimento passou a ser de tal forma elevado que D. João II, em 4 de Dezembro de 1488, por «Carta de privilégio», concedeu aos moradores que tivessem câmara e vereação, a par de atractivos para fixar habitantes na nova povoação, criando-se assim um novo concelho, no termo do de Óbidos e com área dele retirada. Vem já a ser o Rei D. Manuel I, irmão da rainha, e a sua solicitação, que concedeu o título de vila às Caldas, no início do século XVI.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas a doação da rainha não se limita ao Hospital Termal. Marcou profundamente a nova povoação o amor de D. Leonor às artes e às letras, de que era protectora. Muitas manifestações artísticas unham lugar durante as estadas frequentes que fazia às Caldas.
Gil Vicente aí se deslocou, em 6 de Janeiro de 1504, para, na Igreja de Nossa Senhora do Pópulo e perante a rainha, representar o Auto de S. Martinho.
O pouco divulgado «bordado das Caldas», manifestação artística inspirada em trabalhos indo-chineses, terá sido criado por D. Leonor, para ocupação do seu tempo, bem como do das damas da corte, durante os intervalos dos tratamentos.
Não terá nascido nas Caldas o estilo Manuelino? Cito o ilustre caldense, professor jubilado da ESBAL mestre João Fragoso, referindo-se à equipa dos mestres de pedrarias que a rainha mandou vir de Beja para a edificação do Hospital e da Igreja, possivelmente chefiados por Boitaca: «Boitaca vai iniciar nas Caldas a construção e decoração dos elementos que irão caracterizar um novo estilo - o Manuelino - [...], estilo engendrado junto às sulfurosas águas e que se irá expandir gloriosamente por toda a parte.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A tradição artística das Caldas da Rainha tem uma vertente muito importante: a cerâmica. Segundo parece, remonta ao Neolítico a origem da olaria nesta região, mas o seu desenvolvimento dá-se com a fundação do Hospital Termal, que os oleiros locais forneciam, bem como o Convento da Madre de Deus, em Lisboa. Mas será só nos finais do século XIX, devido à acção de Rafael Bordalo Pinheiro, que terá um impulso notável.
As frequentes estadas da família real e da corte nas Termas, ao longo destes cinco séculos, transformaram as Caldas, durante largos períodos, no centro político e cultural do País. Os artistas que por lá passaram ou viveram, nomeadamente pintores, deixaram ficar assinalada a sua estada, pelas obras de arte que então executaram.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Numa terra com a tradição artística das Caldas da Rainha, não se poderia deixar de, na actualidade, ser digno dela.
Existem nesta cidade dois museus dependentes da Secretaria de Estado da Cultura: o Museu de José Malhoa e o Museu de Cerâmica, este a necessitar que sejam feitas as obras de ampliação necessárias ao seu funcionamento. A própria Fábrica de Faianças Artísticas Bordalo Pinheiro possui um museu, dedicado, como não podia deixar de ser, ao seu fundador.
Um outro espaço muscológico, o Atelier-Museu António Duarte, pertencente à Câmara Municipal e por ela integralmente construído e já a necessitar de ser alargado, alberga parte da obra das colecções de arte do insigne caldense que lhe deu o nome, professor jubilado da ESBAL, e que doou à cidade que o viu nascer. No seu programa de actividades têm-se salientado a realização, em anos alternados, das Bienais de Escultura e Desenho e dos Simpósios de Escultura em Pedra. Estes simpósios tom tido a presença de artistas portugueses e de vários países, nomeadamente dos Estados Unidos, Inglaterra, Brasil, Áustria, Holanda, Alemanha, França. Graças a estas realizações, vários escultores, tanto nacionais como estrangeiros, têm-se fixado na região das Caldas e contribuído para a animação daquele espaço.
Junto a este atelier, outro já começou a ser construído, também a expensas unicamente da Câmara Municipal, e destinado a albergar a obra de outro artista caldense e já há pouco citado, o escultor João Fragoso.
A animação que podemos imaginar, tendo por base estes dois espaços contíguos, feita a partir de uma boa divulgação, tanto no País como no estrangeiro, das potencialidades das Caldas neste domínio faz-nos crer que a tradição artística não se perderá, antes se consolidará. Com as obras existentes, produto dos simpósios já realizados e as que vierem a ser executadas, poderá ser criado o maior museu de escultura de ar livre do País.
O Sr. Lemos Damião (PSD):-Muito bem!
O Orador: - Vivendo nesta cidade um dos maiores, se não o maior, coleccionador de cerâmica, o Dr. Artur Maldonado Freitas, resolveu a Câmara preparar um espaço para que a sua colecção possa vir a ser exposta: será o Museu Maldonado Freitas.
A criação nas margens da lagoa de Óbidos de uma Galeria Ecológica de Arte está a ser estudada pela Câmara das Caldas, por proposta do mestre Martins Correia, professor jubilado da ESBAL, e que gostaria de deixar a sua obra associada a esta terra.
Novas perspectivas se abrem para as artes neste importante centro cultural, com a criação, por decreto de Dezembro de 1988, da Escola Superior de Arte e Design das Caldas da Rainha, que se espera comece a funcionar no próximo ano lectivo. A tradição artística desta cidade terá pesado, com certeza, na decisão louvável do Governo de aí fixar um estabelecimento de ensino superior dedicado às artes.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será tendo em consideração estas realidades que o Sr. Primeiro-Ministro se apercebeu, quando em Setembro do ano passado encerrou a III Bienal, que o Governo deverá encarar esta cidade, ajudando a Câmara Municipal, que tem tido uma acção louvável neste campo.
Caldas da Rainha já conquistou o direito de ser chamada a «Cidade das Artes».
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Ribeiro.
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O Sr. Silva Marques (PSD): - Não vai falar contra o Sr. Primeiro-Ministro, pois não, Sr. Deputado? Espero que vá fazer elogios!
O Sr. Sérgio Ribeiro (PCP): - Dá-me licença, que comece a intervenção, Sr. Deputado?!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por vezes, em ocasiões menos formais que esta, costumo dizer que «quem é ou vive em Ourem mio sabe de que terra é». Por que não vir dizê-lo aqui?
Começa-se por dar a referência de que se é de perto de Fátima, ou dela se vive cerca, quando se devia dizer Cova da Iria, e quando é Fátima que é perto de Ourem, até porque é Ourem (por enquanto!...) a sede do concelho, de que Fátima é vila e freguesia...
Muito mais significativo é que se alguém que ali nasceu ou vive tem assuntos a tratar relativos à Segurança Social, às estradas ou outros que respeitem ao distrito é a Santarém que se deve dirigir, mas se o problema é do foro religioso (e bem importantes eles ali são) é com Leiria, como é em Leiria a sede da região de turismo dita da Rota do Sol, em que se inclui Ourém, embora uma boa parte do concelho seja evidentemente da zona dos Templários com centro e sede de região de turismo assim chamada em Tomar, e em Tomar está outro centro, o de emprego do IEFP, e está o hospital que serve o concelho... mas só parte (e não se sabe bem qual), porque é mais de Torres Novas o hospital a que recorre a população de Ourem, o que não quer dizer que não tenhamos já lido de visitar familiares e vizinhos em Coimbra (Covões), enquanto se não consegue aliciar doentes para o «elefante branco» do Hospital de Abramos, que desesperadamente os procura para se justificar.
Por outro lado, é a Coimbra que se deve dirigir quem do IAPMEI quiser impressos, informações, conselho. Isto, claro, sem falar de ser Lisboa a sede da dita Região de Lisboa e Vale do Tejo, onde o concelho de Ourem se inclui.
Mas há mais e melhor, Srs. Deputados: quando fiz um requerimento, dirigido à Câmara Municipal de Ourem, sobre uma pestilenta lixeira a céu aberto na fronteira das freguesias de Atouguia e Fátima, a Câmara respondeu-me «estar em desenvolvimento, conjuntamente com os municípios que integram a Associações dos Municípios da Alta Estremadura, o projecto de uma lixeira intermunicipal». Tendo insistido, mais tarde e com outro endereço, informou-me a Direcção-Geral do Desenvolvimento Regional que «no âmbito do Programa Operacional do Vale do Tejo, incluído no eixo 6 do Quadro Comunitário de Apoio a Portugal para o período 1990-1993, e englobando 23 municípios pertencentes às sub-regiões da Lezíria do Tejo e do Médio Tejo - onde se integra o município de Ourem - está prevista a implementação de um subprograma de infra-estruturas de saneamento básico e tratamento de resíduos sólidos de âmbito local...»!
Oureense, baralhado, me confesso, sem saber para onde me voltar com o lixo. Se para a Alta Estremadura ou para o Tejo, seja ele médio ou da lezíria. Mas não vim aqui contar o que mais parece uma história de ridículos quotidianos, ou uma anedota, mas, sim, clamar por uma definição regional que faculte coordenadas que me/nos limitem e localizem; não fronteiras mas coordenadas para cuja delimitação nós, oureenses e não só, participemos, e fiquemos sabendo a que região pertencemos. Região que represente o complemento do poder local existente, que traduza uma perspectiva regional, descentralizada, a que correspondam funções e órgãos efectivos, transferidos do poder central; órgãos e funções para a saúde, para a educação, para o turismo, para o ambiente (e se há problemas de âmbito regional...); políticas descentralizadas e integradas, sem prejuízo de uma necessária articulação, de uma indispensável dimensão global, nacional.
Haverá, decerto, quem, por esse País dentro, sinta ou pressinta a falta das regiões. Talvez Ourem seja das terras que dessa falta pode tomar mais aguda consciência, como será das que mais beneficiará com a criação do que a Constituição exige.
O distrito de Santarém será realidade administrativa discutível. Aliás, como todos os distritos, mesmo aqueles que, com toda a naturalidade, façam a passagem a região sem alteração das suas actuais fronteiras. Em qualquer caso, haverá, sempre, a questão central das funções, dos órgãos, do poder local a completar. Mas o distrito de Santarém, não obstante identidades que nele se encontrem - porque as há e fundas -, será tão-só um ponto de partida para a definição física das regiões.
Tão errado é acirrar rivalidades que, em relação a um dado concelho, oponha opções por distritos como ardilosa é a imposição governamental de regiões como factos consumados sem se criarem por construção democrática, participada, vazias de órgãos e funções resultado de uma real descentralização.
O Agroal é centro ecológico vital dos concelhos de Ourem, Tomar e Ferreira de Zêzere. Só uma abordagem regional, que é bem mais que intermunicipal, cumprirá uma política de ambiente. Só uma política de saúde regionalizada, inserida numa política nacional de saúde, servirá as populações que hoje fazem parte do distrito de Santarém, uma política regionalizada que encare as instalações existentes - hospitais de Santarém, Torres Novas, Tomar, Abrantes e respectivas valências - numa óptica de serviço de saúde e não de estrita rendibilidade do capital mal investido.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez quem viva em Campo de Ourique, perto da Comes Teixeira ou deste São Bento não esteja sensibilizado para a questão das regiões. Quem viva no distrito de Santarém, ou no concelho de Ourem, está-o com certeza, pelo menos, à míngua da informação que leva à tomada de consciência, está-o potencialmente. Só falta vontade política, para não dizer coragem política, para que o processo de regionalização continue e se concretize, mobilizador e democrático.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Rui Silva.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há precisamente seis anos consecutivos que na cidade de Torres Vedras se realiza o maior festival de ginástica a nível nacional.
Foi em 1985 que o professor Joseph Sammer, cidadão alemão e residente em Portugal há 39 anos, leve a brilhante ideia de chamar a si várias colectividades e dar corpo a um projecto, que hoje tem um impacte ímpar na prática desportiva no nosso país.
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Foi em 1985, com a participação de oito clubes e a presença de cerca de 100 atletas que este projecto ambicioso ganhou raízes para se transformar num ex libris da prática desportiva em Portugal.
E o sucesso este ano uma vez mais aconteceu. De 27 de Abril a l de Maio a Associação Física e Desportiva de Torres Vedras recebeu a maior participação de sempre: 2200 atletas representando 82 clubes nacionais e um número de visitantes estimado em 5000 participaram e puderam observar durante cinco dias uma das mais belas e salutares manifestações desportivas vividas na zona oeste do distrito de Lisboa. Integrando as modalidades de ginástica de grupo, rítmica, dança e agrupamento, jovens de todas as idades deliciaram os milhares de visitantes que ali acorreram nos seis dias do sarau.
O GIMNOESTE, assim é denominado este festival, 6 considerado modelarmente organizado, com uma estrutura e modo de funcionamento que tom vindo a servir de matriz para muitas outras iniciativas idênticas realizadas no território nacional e no estrangeiro. Possui o apoio da Câmara Municipal local, da Região de Turismo do Oeste e de várias empresas da região - e é de inteira justiça saudar e elogiar todos os que de uma forma desinteressada põem o seu melhor ao serviço do desporto nacional. E porque, além de este festival constituir uma montra das diversas especialidades de ginástica de grupo ou de classe, todos os seus clubes apresentam os seus melhores conjuntos.
É uma manifestação de puro amadorismo e amor à prática da modalidade, porque todos os clubes se deslocam a Torres Vedras às suas próprias expensas e dos mais variados pontos do País, somente pela satisfação que lhes é dada de poderem participar num festival, que, só sendo possível realizar com a sua presença, a Associação Física de Torres Vedras procura, e tem conseguido, que se sintam também como sendo deles.
Embora o apoio exista, infelizmente o potencial turístico que esta iniciativa encerra não está ainda a ser convenientemente explorado e a comissão organizadora aguarda a integração do GIMNOESTE num conjunto mais amplo e variado de manifestações desportivas a apoiar, promover e dinamizar de uma forma coordenada em toda a Região de Turismo do Oeste. Este é um dos projectos que tem sido mais defendido pela Comissão Organizadora e cujo êxito agora avançado bem merecia este estatuto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A região oeste de Lisboa, Torres Vedras e a sua Associação Física, bem podem estar orgulhosas dos êxitos alcançados. A zona «saloia» deste distrito uma vez mais provou e comprovou as suas potencial idades e capacidades humanas de realização. Torres Vedras está de parabéns. Foi uma vez mais um berço de ginastas ávidos da sua prática desportiva favorita, contribuindo para a dignificação da modalidade e o engradecimento de uma região que todos desejamos cada vez mais forte e integrada no contexto europeu.
Aplausos do PRD e do PS.
ORDEM DO DIA
O Sr, Presidente: -Srs. Deputados, entrando no período da ordem do dia, peço ao Sr. Secretário o favor de ler um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com o solicitado através de ofício do 2.º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, acerca da Sr.ª Deputada Maria Leonor Couceiro Beleza Tavares, a Comissão de Regimento e Mandatos emitiu um parecer no sentido de não autorizar a referida Sr.ª Deputada a depor como testemunha no processo em causa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar este relatório e parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, ao abrigo do Regimento, solicito a interrupção dos trabalhos durante 30 minutos.
O Sr. Presidente: - O pedido é regimental, pelo que está concedida a interrupção dos trabalhos.
Antes, porém, permito-me informar os Srs. Deputados, para que não fiquem quaisquer dúvidas, sobre as inscrições que, relativamente ao debate que vai ter início, estão na Mesa e a sua ordem.
Assim, em primeiro lugar, está inscrito o Governo, seguindo-se os Srs. Deputados Duarte Lima, Hermínio Maninho, Carlos Brito, Jorge Lacão e Basílio Horta.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.
Eram 16 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, como sabem, vamos analisar a proposta de lei n.º 151/V -Dá nova redação à Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (Lei Eleitoral para a Assembleia da República), sendo os tempos disponíveis os que constam do «Boletim Informativo», que são tempos globais destinados à discussão na generalidade e na especialidade.
A Mesa gostaria de confrontar a Câmara, nomeadamente os líderes parlamentares, com um problema, que não é novo, que tem a ver com a ordem das inscrições, uma vez que, embora tenhamos feito todas as diligências nesse sentido, não foi possível encontrar uma solução.
Há dificuldades de interpretação relativamente à ordem das inscrições, na medida em que umas foram feitas directamente na Mesa, a partir das 15 horas, outras junto dos Secretários da Mesa, antes das 15 horas, e outras, ainda, foram oficialmente dirigidas, como manifestação de vontade para inscrição no período da ordem do dia, ao Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República.
Esta questão não conseguiu ser resolvida junto dos líderes parlamentares, portanto a Mesa vai ter de tomar
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uma decisão, na medida em que não existem regras e normas que, de um ponto de vista muito claro, prescrevam este tipo de inscrição. Ou seja, não se sabe, concretamente, a partir de que horas é que a Mesa aceita as inscrições para o período da ordem do dia.
Este problema surgiu porque ao anunciar a ordem das inscrições, antes do intervalo, o PS estava em quinto lugar. Ora, posteriormente, o PS informou a Mesa de que fez um ofício dirigido ao Gabinete do Sr. Presidente, que chegou cerca das 12 horas, em que manifestava o seu desejo de inscrição no período da ordem do dia, dizendo quais eram os deputados que gostaria de inscrever.
Srs. Deputados, como sabem, a praxe estabelecida não tem sido - tanto quanto nos foi possível apurar - a de se fazerem as inscrições para o período da ordem do dia através do Gabinete do Sr. Presidente. Aliás, temos dúvidas sobre se alguma vez isso aconteceu!
Na verdade, as inscrições costumam ser feitas junto dos diferentes Secretários da Mesa, o que, por vezes, também cria algumas dificuldades de coordenação relativamente à ordem de entrada das intervenções, sendo, geralmente, o Sr. Secretário Reinaldo Gomes quem costuma orientar as inscrições.
Dentro dessa orientação a Mesa indicou uma ordem que foi a seguinte: em primeiro lugar, o Governo, seguindo-se os Srs. Deputados Duarte Lima, Hermínio Martinho, Carlos Brito, Jorge Lacão e Basílio Horta. É evidente que esta ordem não tem em conta a inscrição que deu entrada no Gabinete do Sr. Presidente, isto é, a inscrição do PS, que, do ponto de vista deste partido, deve também ser considerada em tempo útil de inscrição.
Nestas circunstâncias, a Mesa, embora com prejuízo evidente para o PRD, que está inscrito em terceiro lugar, propõe que as inscrições sejam ordenadas por ordem de representatividade dos partidos na Camará, face à dificuldade de encontrar outra solução. No entanto, esta solução apenas cria problemas, do ponto de vista formal, ao Sr. Deputado Hermínio Maninho que passará, caso a proposta da Mesa seja aceite, a intervir em quinto e não em terceiro lugar, ficando as restantes intervenções na mesma ordem.
Ao que julgo para interpelar a Mesa, no sentido de ajudar a solucionar esta questão, pediram a palavra os Srs. Deputados Cardoso Ferreira, Carlos Lilaia. António Guterres, Carlos Brito e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, sem que isso constitua um precedente, estamos de acordo com a proposta que V. Ex.ª formulou. Ou seja, que, nesta situação especial, as inscrições sejam consideradas por ordem de representatividade dos partidos nesta Câmara.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): -Sr. Presidente, compreendo a sua posição e o seu gesto ao tentar resolver este problema, mas o PRD não pode estar de acordo com uma solução desse tipo, porque vai contra aquilo que tom sido as regras habituais de funcionamento desta Casa. Aliás, como o Sr. Presidente sabe, não houve qualquer decisão, a nível da conferência de líderes, que fosse contra aquilo que tom sido as regras habituais nesta Casa.
De facto, o PRD compreende a posição do Sr. Presidente, mas gostaríamos de vincar, de forma muito clara, que não estamos de acordo com ela.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, fizemos o envio da nossa inscrição por escrito para o Gabinete do Sr. Presidente, por forma que não se levantassem quaisquer dúvidas, No entanto, quero dizer que, considerando a importância do debate, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista aceitará a decisão da Mesa, seja ela qual for, isto é, pela nossa pane, não criaremos qualquer incidente processual.
Apesar disso, pensamos que numa próxima conferência de líderes esta questão deve ser esclarecida para o futuro, visto que o sistema que, aparentemente, existe, não tem lógica, «não tem rei nem roque!»...
Portanto, repito, mantemos a afirmação daquilo que entendemos serem os nossos direitos, mas disponibilizamo-nos, desde já, para aceitar a decisão da Mesa seja ela qual for, isto é, seja ela favorável ou desfavorável à nossa pretensão.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, compreendo a dificuldade em que se encontra. Na verdade, posso testemunhar pela minha experiência que nunca foi hábito fazerem-se inscrições para o período da ordem do dia dirigidas ao Gabinete do Sr. Presidente... Na verdade, cias foram sempre feitas na Mesa!
Entendemos que esta questão tem de ser esclarecida, isto é, teremos de saber a partir de quando e em que circunstâncias é que as inscrições devem ser feitas.
Finalmente, Sr. Presidente, eu gostaria de dizer que, pela nossa parte, não queremos complicar as coisas, daí que nos sujeitemos ao critério que a Mesa entender ser o mais justo para que possamos de imediato iniciar a discussão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, desde ontem verificam-se certas «entorses» nas inscrições... Levantou-se a dúvida sobre se se podia ou não fazer a inscrição pelo intercomunicador, etc.
Em relação à proposta feita pela Mesa, relativamente à ordem de uso da palavra atendendo à representatividade parlamentar, devo dizer que tem sido sempre prática desta Assembleia decidir sobre isso em conferência de líderes e só para determinados assuntos é que esta fixa essa ordem. Não tendo sido feito isso neste caso, terá de seguir-se o que está disposto no Regimento.
Assim sendo, aquele que se inscreveu primeiro terá direito a usar da palavra em primeiro lugar, o que se inscreveu depois terá de usar da palavra de seguida, etc.
Quanto à questão de se poderem ou não fazer inscrições através do Gabinete do Sr. Presidente, através dos grupos parlamentares, dos chefes de gabinete, etc., isso suo regras novas que vamos aprendendo, de modo a introduzir, digamos, praxes novas que até agora não tinham sido possíveis, mas agora parece que o são!... De facto, até aqui apenas havia a possibilidade de inscrição através do Gabinete do Sr. Presidente para se usar da palavra para uma declaração política...
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De qualquer forma, como estamos em sexto lugar na ordem de representatividade, quer de uma maneira quer de outra, pela nossa parte não há motivos para alarme... No entanto, chamamos a atenção da Mesa para que não venha a adoptar qualquer solução que crie um precedente que atropele as normas regimentais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, de facto, esta situação é concreta e objectiva relativamente a uma interpretação que não está claramente definida, mas que a Mesa entende que deve ser objectivamente definida. E porque só conjunturalmente é que estes problemas se levantam - de resto, não é a primeira vez que eles surgem.
A Mesa, ao propor uma solução para este problema, não está a criar um precendente ou, sequer, a criar regras novas!...
Bem, mas a questão que a Mesa gostaria de colocar é tão simplesmente esta: se da parte do Sr. Deputado Hermínio Martinho não houver qualquer objecção relativamente à precedência que a Mesa indiciou, será essa a que seguiremos; caso contrário a Mesa continuará com a ordem das inscrições que, inicialmente, anunciou.
Gostaria, pois, de ouvir a opinião do Sr. Deputado Hermínio Maninho, para o que lhe concedo a palavra.
O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, desloquei-me à Mesa, pessoalmente, para fazer a minha inscrição para o debate e fui informado de que, até essa altura, não havia ninguém inscrito para o debate, mas que, naturalmente, o Governo teria precedência por tratar-se de uma proposta de lei.
Portanto, fiquei inscrito! Depois, quando, antes do intervalo, o Sr. Presidente anunciou a ordem das inscrições, constatei que estava em terceiro lugar. Aliás, devo, desde já, dizer que penso não ser muito natural, numa discussão deste tipo, que fale o Governo e logo a seguir o PSD.
Portanto, se não for respeitada a praxe, é a primeira vez que tal decisão - inédita até hoje... e estou aqui há cerca de cinco anos - se toma no Plenário.
De qualquer forma, o importante é que o debate comece, sendo certo que respeitarei a decisão que a Mesa tomar em relação à questão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, face às dúvidas suscitadas, a Mesa vai considerar que a ordem de inscrições foi a que chegou à Mesa, pelo que o PS fica inscrito em quinto lugar, sendo a ordem de inscrições a que anunciámos, uma vez que consideramos que a observação do Sr. Deputado Hermínio Martinho poderia levantar problemas.
Assim sendo, a inscrição feita pelo PS através do Gabinete do Sr. Presidente cerca das 12 horas, do ponto de vista formal, não será considerada, só o sendo quando chegou à Mesa.
Srs. Deputados, ultrapassada que está a questão, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Manuel Pereira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei visando a reforma do processo eleitoral. Fê-lo, tendo em conta os princípios consagrados na revisão constitucional, nomeadamente os artigos 151.º e 152.º A proposta do Governo visa dar expressão ao acordo a que o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata chegaram, em virtude da necessidade de obtenção dos dois terços indispensáveis à sua votação. Trata-se, por isso, do exercício de um direito que cabe ao Governo, como poderia ter cabido a qualquer grupo parlamentar ou a qualquer deputado.
A Constituição não foi revista para servir de exercício académico, ou, muito menos, para mostrar aos estrangeiros a excelência na nossa capacidade de reflexão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Estudou-se, negociou-se e aprovou-se porque as condições anteriores - quer de 1976, quer de 1982 - se tinham alterado.
Modificou-se o seu texto, para dar satisfação a interesses nacionais muito concretos, para contemplar e aproveitar experiências passadas e corrigir erros que tiveram. elevados custos e que foram pagos pelos cidadãos portugueses.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É dever do Governo, que obteve a confiança da esmagadora maioria do povo português, do partido e do grupo parlamentar que lhe servem de suporte desenvolver os preceitos constitucionais, dar-lhes a forma mais adequada aos interesses dos cidadãos e apresentar o resultado da sua análise. É, mais que uma atitude normal, um dever político e uma obrigação nacional.
Aplausos do PSD.
Tal como é dever dos demais partidos debater com elevação e serenidade a proposta que lhes é apresentada, levar ate à opinião pública as suas críticas fundamentadas, procurar a melhoria do diploma e, se quiser, rejeitá-lo, formular as alternativas que considere adequadas. O que não pode é limitar-se a uma atitude de obstrução, escondendo a sua recusa por detrás de meias palavras, avançando com juízos de intenções que não correspondem à realidade, confundindo a opinião pública ou procurando no debate desta proposta matérias sem qualquer relação visível.
O Sr. João Salgado (PSD): -Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como e do conhecimento de VV. Ex.ªs, a Constituição consagra, em matéria de interesse para a revisão da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, preceitos de ordem imperativa e preceitos de natureza facultativa.
Para uns e para outros consagra também a Constituição da República Portuguesa exigências diferentes na votação para a sua alteração.
As alterações constantes na proposta distribuída a VV. Ex.ªs não esgotaram a vontade do Governo em fazer acolher, em sede própria, uma mais ampla e aprofundada reforma no sistema eleitoral, aberta à modernidade, à personalização, à eficácia e à eficiência e, sobretudo, capaz de integrar com oportunidade as mutações da dinâmica social.
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O Orador: - A proposta que hoje apresentamos, rigorosamente contida na moldura constitucional, dá, portanto, cumprimento ao preceito imperativo da redução do número de deputados e dá conteúdo à faculdade, que se presume não gratuita, da criação de um círculo nacional, ao mesmo tempo que introduz algumas alterações aos actuais círculos eleitorais.
Esta proposta apoia-se num conjunto de princípios que vimos defendendo e que, em síntese, se recordam:
Garantir a proporcionalidade e a representatividade do sistema eleitoral consagrado na Constituição;
Garantir uma maior personalização e uma maior identificação do eleito com o eleitor;
Assegurar condições de maior eficácia parlamentar;
Integrar, com sentido de oportunidade e de dimensão de Estado, as alterações sociais de uma democracia em forte processo de amadurecimento;
Criar melhores condições que assegurem um desenvolvimento económico sustentado e uma integração comunitária com efectivo interesse para os Portugueses.
Estes princípios de mútua interdependência apoiam as regras que obtenham a nossa proposta:
O círculo nacional teve de situar-se a um nível que não reduzisse alguns dos actuais círculos eleitorais com menos número de eleitores a menos de 3 mandatos, como seriam os casos de Bragança, Évora e Portalegre;
A divisão dos círculos actuais com maior número de mandatos concretiza-se no respeito pelas unidades administrativas existentes e ainda:
Na contiguidade dos concelhos e na preservação da homogeneidade geográfica, cultural e social dos círculos eleitorais:
No limitar do número de mandatos a um máximo de dez por cada círculo eleitoral, salvo se correspondente a um só concelho, como o que se verifica em Lisboa.
As modificações que apresentámos consubstanciam, em síntese: redução de 250 para 230 deputados; l círculo eleitoral nacional com 30 mandatos; 30 círculos locais no território nacional com um total de 196 mandatos; l círculo da Europa com 2 mandatos; l círculo fora da Europa com 2 mandatos.
Torna-se pois evidente que aos princípios, às regras e aos elementos integradores da nossa proposta de lei não importavam estudos sobre resultados eleitorais passados. Não os fizemos nem lhe sentimos a falta.
Preparámos uma lei para o futuro, movidos apenas pelo desajustamento dos quadros normativos eleitorais. Fomos até onde nos permite a Constituição.
O Governo não apresenta esta proposta contra os partidos que também aqui se recusa a qualificar de grandes ou pequenos. Para nós não há partidos grandes nem pequenos - há partidos que se apresentam aos eleitores, com um programa, e são estes que lhe conferem a dimensão representativa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A proposta que apresentámos respeita, de acordo com os próprios méritos do sistema eleitoral que a Constituição consagra, a regra da porporcionalidade.
A representatividade, essa só os eleitores a podem garantir. E é assim para qualquer dos círculos como é assim em qualquer sistema de representação proporcional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O círculo nacional é, pensamos, uma inovação que se não pode minimizar, pois que, entre muitos outros aspectos igualmente importantes, tem o mérito de poder reconfirmar e de rectificar a representatividade dos partidos.
Ao dividir grandes círculos eleitorais como Lisboa, Porto, Braga Setúbal e Aveiro, com a correlativa redução de mandatos, estamos a facilitar a personalização de escolha dos deputados.
Ao criar um círculo nacional estamos a alargar as possibilidades de escolha do mesmo eleitor mas por razões que tom fundamentalmente a ver com o juízo de cada formula dos diferentes programas em sufrágio e das personalidades mais destacadas de cada partido para os concretizar. E é preciso não ter receio desse juízo, mais ainda, é preciso desejá-lo. O povo português tem sabido, com particular sentido pragmático, decidir pelo voto as oportunidades de escolha que lhe são facultadas.
Saberá, também agora, muito provavelmente com surpresa para os especialistas em ensaios sobre resultados passados, fazer o melhor uso dos dois votos de que passará a dispor.
Esta inovação reforçará a dimensão representativa da democracia pela nova dimensão participativa dos cidadãos no momento da opção política, sem que aí se esgote o contributo que pretendemos dos cidadãos.
Um outro aspecto que gostaria de sublinhar é o da oportunidade temporal da proposta do Governo. Estamos a mais de um ano das eleições para a Assembleia da República, o que nos parece tempo bastante para a adaptação às alterações.
Mas, para além disso, haveria que aguardar-se o momento em que uma alteração de tanta monta pudesse fazer-se com toda a serenidade.
Não faria sentido que, operada a revisão constitucional, se não atendesse à proximidade das eleições autárquicas e se introduzisse, com inevitável perturbação das mesmas, a presente proposta de alteração. Por isso só agora o fazemos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: -Temos, por tudo isto, alguma dificuldade em aceitar as críticas de falta de oportunidade e entendermos mal a dependência desta lei das questões da regionalização, como se tem procurado fazer acreditar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Será que se pretendem círculos regionais? Será que se pretende uma segunda câmara? Não se vê, pois, a relação entre esta lei e a regionalização. Mas isso também não foi explicado. Talvez o decurso do debate o esclareça.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vivemos um momento em que o processo de plena integração na comunidade económica europeia se aproxima e em que o final do século e do milénio permitem já antever os diferentes cenários que o mundo enfrentará na época que vai seguir-se.
Não poderemos continuar tranquilamente a viver como se nada estivesse a acontecer; como se a legislação saída de um período e de uma vivência revolucionários representasse obra acabada e definitiva, sem ter em conta todas as vicissitudes políticas e socais que vivemos e que iremos suportar.
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Srs. Deputados, o nosso sistema eleitoral tem 14 anos.
O que aqui me ocupa e preocupa todo o Governo 6 a sua clara inadaptação a um sistema democrático aberto e às suas exigências de um maior diálogo com os eleitores.
Quando defendemos uma maior personalização, estamos naturalmente preocupados com uma nova relação entre eleitor e eleito, como estamos preocupados com os novos desafios que a reclamam, as novas soluções que se impõem, os novos direitos com novas formas de expressão. Somos reformistas por opção e programa e não conservadores estaticamente amarrados a soluções que o tempo desconforma.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Aceitamos que o Partido Socialista tenha alguma dificuldade em acompanhar-nos nesta nossa inquietante busca de novos caminhos de aproximação e de serviço aos homens. Mas sabemos também que o Partido Socialista tem quadros suficientemente qualificados para compreender a justeza e a oportunidade da nossa proposta de aperfeiçoamento do sistema eleitoral que temos.
O sistema não serve porque nos divorcia do eleitorado e porque não tem acompanhado o esforço de adaptação que se verifica por todos os países.
Há momentos da história política em que não podemos, por razões que nem tão-pouco servem os interesses partidários, ficar indiferentes às oportunidades de mudança.
Esta é uma dessas oportunidades que não pode perder-se. E porque a matéria é importante, não nos quedaremos enquanto não forem introduzidas as modificações necessárias. Se vencidos agora por razões de teimosias pessoais voltaremos amanha e sempre porque é mais forte a nossa vontade de servir do que as razões dos desejos de acomodação.
Temos consciência de que a proposta que apresentamos, embora intrinsecamente boa, poderia, com o empenho desapaixonado das diferentes bancadas, ir um pouco mais longe. Seria uma boa oportunidade para demonstrarmos que, ao ritmo de consolidação da democracia, em que demos lições que outros aproveitaram, somos igualmente capazes de preparar os instrumentos normativos que a sustentam.
Hoje, e decerto ainda mais no futuro, a eleição de deputados não se limita à repartição proporcional dos candidatos entre os diversos partidos concorrentes nos vários círculos eleitorais. Já não se trata apenas de colocar os eleitores perante diferentes programas ideológicos e dar voz às diferentes sensibilidades que buscam a sua afirmação no xadrez político. Já não se procura apenas consolidar a democracia através do direito à diversidade de opiniões, permitindo aos eleitores a sua escolha. Com as eleições legislativas, o povo procura também encontrar o programa económico e social mais conveniente, bem como as pessoas que, a nível nacional ou local, lhe inspiram maior confiança para o executar.
As eleições legislativas são simultaneamente o momento de escolha de um programa ideológico, de um programa político, económico e social e de um juízo - positivo ou negativo - sobre o mérito daqueles que foram escolhidos para a actividade parlamentar e governativa.
Daí que os cidadãos procurem a coerência dos programas e a responsabilidade dos agentes políticos, para saberem avaliar com justeza o cumprimento das promessas eleitorais e o empenhamento que os cidadãos escolhidos dedicaram à causa pública. E neste domínio não lhes falta matéria. Em doze anos de vida política viveram uma multiplicidade de experiências que outros países levaram décadas a ensaiar. Governos minoritários, de matriz presidencial, coligações anómalas ou aparentemente coerentes, alianças pré ou pós-eleitorais, tudo foi ensaiado com resultados que mais que ninguém o povo experimentou no quotidiano da sua vida.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Nessa altura, responsáveis políticos de vários quadrantes da oposição propuseram a reforma do sistema eleitoral português em termos e com objectivos muito semelhantes aos que agora apresentamos à consideração desta Assembleia. E fizeram-no com sentido de responsabilidade, sem que alguém se lembrasse de os acusar de manobrismo político, de golpismo ou de apropriação do poder.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador:- É-nos por isso difícil compreender as reações a que assistimos, provenientes dos mesmos partidos que, desde 1984, vêm reconhecendo que a reforma do Estado pressupõe a configuração de um novo sistema eleitoral capaz de ter em conta os anseios do povo português e a sua inserção nas realidades do mundo que se nos perspectiva.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a apresentar o nosso projecto convencidos de que é o melhor que pode fazer-se dentro dos limites constitucionais. E não será legítimo tentar imputar à conta de obscuras intenções do Governo as deficiências do sistema eleitoral que temos. Creio mesmo que isso não acontecerá nesta Assembleia, que tem plena consciência de que não há sistemas perfeitos.
Admitimos que a proposta possa ser melhorada, mas temos muita dificuldade em vislumbrar que a mesma possa ser rejeitada, com base no interesse nacional. Se esta proposta é insuficiente, será boa altura para que aqui receba os aperfeiçoamentos necessários. Mas se é boa, como de resto estamos convencidos, e mesmo assim for rejeitada, caberá aos que contribuem para a sua recusa esclarecer o povo português de como é possível sacrificar o interesse nacional no altar dos incenses partidários.
Aplausos do PSD.
Recusar a proposta é, na matéria, recusar o cumprimento da Constituição.
A apresentação desta proposta de lei na Assembleia da República obteve já resultados altamente positivos: antes de mais, serviu para criar na opinião pública em geral e na classe política em particular uma consciência mais sólida acerca da importância do sistema eleitoral na estrutura do regime português. Permitiu igualmente mostrar que o sistema criado em 1976, para corresponder a exigências que tinham sobretudo em vista a estabilização da democracia face a novas tentativas totalitárias, não é ajustado às realidades do regime consolidado e de um Estado que procura recuperar o tempo perdido e assim atingir melhores níveis de desenvolvimento.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
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O Orador: - Permitiu ainda identificar melhor as mudanças de atitude, as inconstâncias de certos comportamentos políticos, sobrepondo razões partidárias às razões de Estado.
Cumprimos hoje a nossa parte do acordo de revisão constitucional sobre esta importantíssima matéria.
Vozes do PSD: -Muito bem!
O Orador: - A proposta de lei que ora submetemos a discussão desta Assembleia visa apenas permitir que, no futuro, o povo português escolha o partido político que lhe proporcione maiores garantias de defender os seus interesses e, bem assim, de facilitar a escolha do representantes que considere mais aptos, mais dinâmicos e competentes.
Nada nos move contra qualquer partido, nada nos motiva a favorecer seja quem for.
Sabemos que não existe em nenhuma parte do mundo legislação eleitoral que possa considerar-se isenta de críticas ou que agrade a todos os sectores político-sociais. Entendemos que cada país deve permanentemente repensar as suas estruturas, adaptando-as às realidades da sua própria evolução, aproveitando a sua experiência, no que ela comporta de êxitos e de fracassos.
Eis a nossa proposta; com ela assumimos a crítica construtiva e os riscos da insinuação malevolamente desviante ou de reserva mental. Gostaríamos que as críticas correspondessem a um desejo de melhorar o seu texto ou mesmo de o substituir por outro que corresponda melhor ao interesse nacional.
Todos ficaríamos a ganhar e, de um modo especial, o povo português.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Pela nossa parte, assumimos a responsabilidade da mudança. O futuro dirá se tínhamos ou não razão.
Aplausos do PSD, de pé.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Basílio Horta pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Basílio Horta (CDS): -Sr. Presidente, para defesa da honra e consideração da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Srs. Deputados, pedimos a palavra para defesa da honra e consideração da bancada, mas melhor e mais apropriado seria dizer que pedimos a palavra para a defesa da vida da minha bancada.
Risos e protestos do PSD.
Sc puder continuar, continuo!
Sr. Presidente, queria dizer que essa defesa baseia-se, fundamentalmente, em três pontos. E tem a ver com uma confissão pública que o Sr. Ministro, na sua intervenção, acabou de fazer.
Em primeiro lugar, o Sr. Ministro da Administração Interna confessou, nesta Assembleia, publicamente e perante os Portugueses,...
O Sr. Silva Marques (PSD):-Ponha esse problema aos Portugueses!
O Orador: -... que as bases do sistema eleitoral, ainda em sede de revisão constitucional, foram apenas acordadas com o Partido Socialista, esquecendo-se completamente da existência de outros partidos que tinham todo o direito democrático de aceder a essas conversações e de se exprimirem nessa sede.
Em segundo lugar, protesto, Sr. Presidente, porque esta lei é uma tentativa de assassinato político do meu partido, ...
Vozes do PSD: - Não é verdade!
O Orador: -... como iremos demonstrar na nossa intervenção. Protesto pela confissão do Sr. Ministro da Administração Interna, no sentido de que essa tentativa foi combinada ou, pelo menos, aliciada com o Partido Socialista em negociações que não foram públicas, de que nós não temos conhecimento e, consequentemente, que já foram ato mesmo negadas, uma e outra vez, pelo próprio Partido Socialista.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, protestamos porque não contente com esta situação, o Sr. Ministro anuncia de que se esta proposta for rejeitada, o Governo não se conforma e insistirá em novas tentativas que, seguramente, não terão carácter diferente nem terão menor benevolência do que esta que agora acabou de apresentar.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado Basílio Horta, lenho alguma dificuldade em dar-lhe explicações, porque, como V. Ex.ª sabe, não é meu hábito nesta Assembleia, há muitos anos, ofender a honra seja de quem for. O meu discurso foi exclusivamente político. Não tentei ferir a honra de ninguém, de nenhum partido em situação alguma.
V. Ex.ª quis fazer um protesto, quis aproveitar o tempo com base na defesa da sua honra, mas eu sinto-me inibido para dar-lhe uma resposta, para dizer-lhe que peço desculpa, porque, efectivamente, eu nunca feri a honra de Sr. Deputado de qualquer partido, por quem tenho a máxima consideração.
Tenho história parlamentar bastante e, neste momento, preferia falar como deputado do que como membro do Governo. Portanto, não feri a sua honra, Sr. Deputado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna os Srs. Deputados João Amaral, Jorge Lacão e Herculano Pombo.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Ministro da Administração Interna, a proposta, tal como a apresenta, sejamos francos, é uma proposta que serve exclusivamente para o PSD manter a maioria que com os votos iria inexoravelmente perder. E é esse o único objectivo da proposta, mas eu não quero adiantar razões que vamos expor com pormenor e com rigor na intervenção que faremos através do meu camarada Carlos Brito.
Queria referir-me a uma questão muito concreta que o Sr. Ministro adiantou. Trata-se da questão da inconstitucionalidade. Para dizer o seguinte: eu entendo que deve ficar claro, neste debate, que a proposta de lei, tal como foi apresentada, é claramente inconstitucional.
A revisão da Constituição permitiu - e mal - a criação do círculo nacional. Mas não o impõe, Sr. Ministro! E mais, há uma questão que é central, ou seja, a Consumição mantém como princípio constitucional, como regra que não pode ser violada, o princípio da representação proporcional. É este princípio - e essa é a primeira e flagrante inconstitucionalidade - que a proposta apresentada pelo Governo, através do Sr. Ministro, viola grosseiramente.
A proposta de lei tem o efeito automático e imediato de conduzir a que, com o mesmo número de votos, com uma percentagem de votos semelhante, certos partidos diminuam, drasticamente, a sua representação parlamentar.
Sr. Ministro, isto viola ou não o princípio da representação proporcional? Esse princípio não tem nenhum conteúdo? Se tem um conteúdo, como é possível, por exemplo, o que se passa no círculo de Braga, onde o sistema de divisão conduz a que o PSD mantenha os seus deputados divididos em dois círculos mas faz com que os deputados da CDU e do CDS desapareçam e que o PS passe de cinco para três deputados? Sr. Ministro, isto não é uma grande falcatrua? Isto não é, claramente, uma falcatrua?!...
Risos do PCP e do CDS.
A proposta é ainda inconstitucional por duas outras razões. Em primeiro lugar, ao estabelecer a barreira alta, ao estabelecer um limiar de mais de 5% para a generalidade cios círculos geograficamente limitados, para acesso à possibilidade de ter deputados, estabelece aquilo que a Constituição não permite nem prevê: a possibilidade de estabelecimento de um limiar.
Na prática, o limiar é conseguido. Os números aí estão a demonstrar que, em qualquer dos círculos delimitados geograficamente, nenhuma força política poderá, com uma votação inferior a 5%, ter um deputado. A Constituição não o permite. Isso é inconstitucional!
Em segundo lugar, é também inconstitucional, Sr. Ministro, manipular os círculos eleitorais através da implantação do sistema da sua delimitação geográfica, que abandona um critério objectivo. Hoje os círculos e os resultados são determinados por um critério objectivo, ou seja, os distritos, tal como cies se configuraram em Portugal.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Há 100 anos!
O Orador: - Ao abandonar um critério objectivo, ao introduzir critérios de subjectividade, o Sr. Ministro pode servir o PSD mas não serve o sistema proporcional, nem serve a Constituição.
São estas as questões essenciais da proposta de lei que precisam de ficar claras.
A proposta é inconstitucional e não vai ser aprovada. Está anunciado que, na parte que interessa, não obterá a maioria de dois terços. Assim sendo, não será necessário discutir, não será necessário invocar, não será necessário colocar na sede adequada a questão da inconstitucionalidade.
Mas, já que o Sr. Ministro aqui afirmou, como foi sublinhado pelo Sr. Deputado Basílio Horta, que quer voltar à carga, dir-lhe-emos, com franqueza e de frente, que a questão da inconstitucionalidade, essa, o Governo nunca conseguirá resolver.
Aplausos do PCP e do deputado independente Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Administração Interna, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Respondo no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Ministro da Administração Interna, não me levará a mal que comece por dizer ao Sr. Deputado Basílio Horta que pode o CDS ficar tranquilo, pois, na verdade, jamais existiu qualquer entendimento entre o PS e o PSD que não fosse aquele que publicamente foi divulgado, que os Portugueses conheceram e que hoje está vertido no texto da Constituição.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Já sabíamos que eram mentirosos!
O Orador: - Por isso digo ao Sr. Ministro da Administração Interna que retivemos como um bom conselho a sugestão que fez no sentido de que o debate decorra com elevação. Pena é que não tivesse lido a ocasião de fazer essa sugestão à sua própria bancada, para que não fôssemos obrigados a assistir, como nos últimos dias tem acontecido, a uma campanha baseada na calúnia, em vez de o ser na discussão serena dos problemas que estão colocados.
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não é exacto!
O Orador: - Sr. Ministro, o seu discurso, permita-me que o diga, foi moderado quanto à forma, mas razoavelmente contraditório quanto aos argumentos que expendeu. Por um lado, afirmou a sua adesão ao princípio da proporcionalidade e da representatividade do sistema eleitoral, mas, logo à frente, afirmou que o sistema não serve.
Protestos do PSD.
Então, Sr. Ministro da Administração Interna, o discurso serve ou não serve? No mesmo discurso não se pode defender duas ideias contraditórias!
Vozes do PS: - Muito bem! Vozes de protesto do PSD.
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O Orador: - Por outro lado, o Sr. Ministro afirma que é necessário superar a existência de um divórcio entre os eleitores e o eleitorado, que é necessário mais diálogo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, então, o Sr. Ministro acredita que a criação do vosso círculo nacional, tal como está concebido, garantia mais diálogo com os eleitores no conjunto dos deputados que por esse círculo fossem eleitos? Ou seja, não ficariam tais deputados claramente mais dependentes das direcções centralizadas dos respectivos partidos e, por isso mais afastados da ligação concreta com os eleitores, em todas as regiões do País?
Por outro lado, com a diminuição da distribuição do número de deputados pelo conjunto dos círculos regionais a constituir, reparou o Sr. Ministro da Administração Interna que se agora a relação entre o deputado eleito e o eleitor é da ordem dos 30000, passaria, então, a ser superior a mais de 40000 eleitores por cada deputado eleito? É assim que favoreceria os mecanismos do diálogo?
Como é possível, Sr. Ministro da Administração Interna, que fale do problema do diálogo com o eleitorado?! Não faz V. Ex.ª parte do mesmo partido que não há ainda muito tempo aqui recusava sequer a possibilidade de abrir gabinetes de ligação entre os deputados e os eleitores nas sedes dos círculos, na sede dos governos civis, justamente em nome desse diálogo! Então, em nome dessa mínima coisa que os senhores não aceitaram, têm agora a possibilidade de alterar e inverter completamente a lógica do vosso discurso!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Os senhores querem é funcionários!
O Orador: - Sr. Ministro, a questão, afinal, é outra, permita-me que lhe diga. É a de «gato escondido com o rabo de fora». Isto porque, a páginas tantas, o Sr. Ministro disse, no seu discurso, que o problema era o da estabilidade governativa, ou seja, para o PSD, o verdadeiro problema é o de conseguir eleger mais deputados ainda que tenha menos votos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Para o Governo, a Lei Eleitoral não é, afinal, uma verdadeira questão de Estado. O que ela representa para o PSD é tão só um problema de sobrevivência do Estado «laranja».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PSD limita-se a querer ganhar mais deputados com menos votos. Quer recuperar, na secretaria, os apoios que está a perder entre os Portugueses.
Os círculos eleitorais não podem, seguramente, ser retalhados numa espécie de fato pronto-a-vestir, à medida das ambições do PSD. Eles deverão ter em conta a reforma orgânica do Estado, pois só assim poderão ser definidos com a devida adequação.
O Sr. Ministro da Administração Interna - e saliento-lhe isso - disse que a proposta do Governo respeitava as actuais circunscrições administrativas. Mas então, agora, o Sr. Ministro está em condições de perceber porque 6 que o PS colocou na ordem do dia o problema da criação das regiões administrativas! Elas são exigidas pela Constituição, elas lerão de ser criadas no futuro, e quanto mais depressa melhor.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se o Sr. Ministro admite que a Lei Eleitoral deve respeitar as circunscrições administrativas, que deve respeitá-las no presente mas igualmente o deve fazer no futuro, isso quer dizer que não podemos «pôr o carro à frente dos bois» e primeiro leremos de criar as regiões administrativas para, depois, a elas adaptarmos os círculos eleitorais.
Daí, portanto, a minha pergunta: estão o Sr. Ministro e o seu Governo verdadeiramente empenhados em cumprir a Constituição? Sabem que a Constituição exige - aí sim - a criação das regiões administrativas?
Não fuja à pergunta, Sr. Ministro. O Governo e o PSD vão criar as regiões administrativas em Portugal?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - O Sr. Ministro da Administração Interna começou o seu discurso tentando, candidamente, justificar o motivo que levou o Governo a apresentar uma proposta que visa alterar a Lei Eleitoral, e não deixou essa iniciativa a um grupo parlamentar, nomeadamente ao do PSD, através de uma proposta de lei.
Esta não é uma questão menor, dado que o Governo, ao apresentar uma proposta onde subjaz a sua intenção de aproximar os eleitos dos eleitores, e argumenta querer dar eficácia à Assembleia, configura-se, no nosso horizonte político, como o grande educador da classe política. Não já o grande educador da classe operária mas lerá, eventualmente, recebido algumas influências de outros educadores e de outros tempos, que agora param por essas áreas.
Aplausos do PS e do deputado Narana Coissoró, do CDS.
O Governo pretende, eventualmente, dignificar a Assembleia; o Governo pretende aproximar os deputados dos seus eleitores; o Governo pretende dar eficácia aos deputados.
Cabe-me perguntar-lhe, Sr. Ministro, onde é que está o cerne e o coração da democracia, quem é que, de facto, representa o povo português: é a Assembleia da República ou é o Governo?
Esta pergunta tem de ser feita aqui porque eu, como deputado eleito, constitucionalmente representando todo o povo português, não me sinto na obrigação de ser educado na escola deste Governo ou de outro governo qualquer.
Seria, pois, bastante melhor que tivesse sido o partido que suporta e apoia o Governo a apresentar um projecto de lei que alterasse o sistema eleitoral, já que não está de acordo com ele.
Ainda assim, Sr. Ministro, pretende o Governo criar um círculo nacional para «30 vacas sagradas» da política portuguesa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sagradas mas não loucas!
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O Orador: - É, pena que o Governo não considere a hipótese da criação do círculo nacional como um círculo que recupere os votos estéreis, os votos que, de facto, não dão eleitos. Aí, sim, poderíamos entender-nos. Aí, sim, poderíamos todos dar um contributo para melhorar o nosso sistema eleitoral que, não sendo perfeito, é, dos que conhecemos, talvez o menos mau.
E a propósito de ser o menos mau dos que conhecemos e a respeito, também, da sua idade, que o Sr. Ministro aqui referiu como sendo «a provecta idade de 14 anos» - portanto, completamente desactualizado - pergunto-lhe, Sr. Ministro, se teve o cuidado de comparar a idade do nosso sistema eleitoral com a do sistema eleitoral inglês e a representatividade do nosso sistema eleitoral com a do sistema eleitoral inglês.
É que estou a recordar que, nas últimas eleições realizadas em Inglaterra para o Parlamento Europeu, o Partido Os Verdes teve 14% dos votos e não elegeu nenhum deputado. É absolutamente espantoso que o sistema de representatividade inglês conduza a uma situação destas!
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não há democracia em Inglaterra!
O Orador: - Sc é para isso que o Sr. Ministro quer caminhar, então terei de perguntar-lhe se meditou bem quando aqui disse não haver, para si, pequenos ou grande partidos. Para mim também não há pequenos ou grandes partidos e sinto, sinceramente, que o partido que aqui represento, sendo pequeno em representatividade, é um partido de grande, grandíssimo, futuro. Por isso, não estou preocupado com as próximas eleições.
Mas há uma coisa que me preocupa, Sr. Ministro! É a diversidade da democracia, é a diversidade das vozes do povo português, aqui representadas nesta Assembleia. Tomar esta Casa numa voz monolítica ou dividida em duas partes, pouco diferentes ou pouco afastadas ideologicamente uma da outra, é dar um golpe mortal na nossa jovem democracia.
Outra questão que quero colocar-lhe, Sr. Ministro, é a da eficácia e a da aproximação dos eleitores aos eleitos. O Sr. Deputado Jorge Lacão já leve ocasião de aqui nos lembrar que, através do sistema eleitoral que o Governo pretende implementar, cada um dos deputados que viesse aqui a sentar-se representaria, em média, 40 000 eleitores. Ora, se hoje temos já dificuldade em conhecer e em contactar os nossos 30 000 eleitores, como é que íamos ter mais facilidade de contactá-los se fossem 40000? O problema da ligação dos deputados aos seus eleitores não está, Sr. Ministro, no sistema eleitoral. O problema está no facto de os deputados terem vindo a perder a consciência de serem eleitos do povo para se irem funcionalizando, tornarem-se funcionários dos partidos e representarem agora os partidos e não o povo.
O Sr. Silva Marques ((PSD): - Isso é convosco! Fale por si.
O Orador: - A Constituição ainda diz que o deputado representa o povo, o todo nacional. Não o seu partido ou o seu círculo, mas o todo nacional. Aqui é que reside o cerne da questão.
Lembrassem-se os 250 deputados que aqui se sentam dos eleitores que neles votaram e não haveria qualquer problema. Não é por sermos 250 que a Assembleia funciona melhor ou pior. Com 230 não vai haver qualquer modificação! Haveria, eventualmente, se fossemos reduzidos para 25. Talvez houvesse mais eficácia!
Já agora, proponham-no. Eu não o faço. Defendi aqui, quando da revisão constitucional, a manutenção dos 250 deputados. Todos não somos demais para aqui fazer ouvir a grande diversidade das vozes que conformam a democracia portuguesa, mas não é esse o lema que está hoje em discussão.
A Constituição permite a redução do número de deputados... Que reduzidos sejam! Não queira agora o Governo reduzir os deputados, por um lado, a uma casta de dignitários que suo eleitos pelo círculo nacional e têm uma representatividade para além daquilo que é normal e, por outro lado, limitar todos os outros a pequenas intervenções de cinco minutos, nos períodos de antes da ordem do dia, para falarem da fonte que secou, da inauguração do fontanário ou da capela que não tem luz.
Não aceitamos esse sistema, Sr. Ministro. Votaremos contra ele.
O Sr. Presidente: - Para responder às questões que lhe foram colocadas, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as questões que me foram colocadas. Dado que em alguns momentos foi aqui posto o problema de que o Governo, com esta proposta de lei, apenas pretendia manter a maioria de que dispõe, quero lembrar a todos VV. Ex.ªs que se o PSD ou o Governo tivessem querido, em 1987, alterar a actual. Lei Eleitoral podiam tê-lo feito porque a Constituição lho permitia.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - E ninguém duvidaria que esse momento era de total legitimidade porque quem obteve do povo português mais de 50% dos votos, quem obteve uma tal legitimidade podia perfeitamente, nessa altura, ter apresentado nesta Assembleia esta mesma lei, salvo no que diz respeito ao número de deputados.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Nessa altura era perfeitamente ilógico!
O Sr. João Amaral (PCP): - Não podia alterar nem o número de deputados nem os círculos! Então, o que poderia alterar?!...
O Orador: - Não o fez, mas...
V. Ex.ª pode intervir novamente daqui a momentos, por isso agora permita-me que continue a minha intervenção.
O Sr. João Amaral (PCP): - Posso explicar-lhe...
O Orador: - Não, Sr. Deputado, porque está a passar o meu tempo.
O Sr. João Amaral (PCP): - Explico-lhe lá fora!
Protestos do PSD.
O Orador: -Também lhe posso explicar lá fora, não preciso que outros lho expliquem...
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O Sr. Presidente: - Agradecia aos Srs Deputados que mantivessem o silêncio necessário para que o Sr. Ministro possa prosseguir a sua intervenção.
Queira continuar, Sr. Ministro.
O Orador: - Srs. Deputados, todos nós temos tempo bastante...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Nós não! Só temos 15 minutos!
O Orador: -... para debatermos esta maioria e iremos ouvir todas as críticas que entenderem formular, mas no momento adequado.
Quanto à inconstitucionalidade, que referiu, do círculo nacional, V. Ex.ª parece só considerar possível que da Constituição apenas se aplica aquilo que ela impõe, mas não é assim, porque aquilo que ela faculta é um dever que pode exercitar-se e, neste caso, a Constituição claramente faculta a existência de um círculo nacional.
Por conseguinte, se a Constituição faculta essa possibilidade isso não foi unicamente para que dela constasse um bom exercício académico. Daí que nós não cometamos nenhuma inconstitucionalidade, porque estamos unicamente a dar conteúdo a uma faculdade que a Constituição nos dá.
V. Ex.ª falou ainda em inconstitucionalidade quando referiu que esta lei iria limitar até 5% a existência, ou não, de deputados no círculo, mas eu não sei onde é que V. Ex.ª viu esse preceito. De qualquer maneira, mesmo que assim fosse...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - É só fazer contas!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O que não é o forte do Governo!
O Orador: - Eu sei que V. Ex.ª faz muitas contas, que é um bom matemático!
O Sr. João Amaral (PCP): - O Governo também fez!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia que os apartes fossem de tal modo que não prejudicassem a intervenção do Sr. Ministro.
Uma voz do PCP: - O Sr. Ministro é que se perturba!
O Sr. Presidente: - Queira continuar, Sr. Ministro.
O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, relativamente aos dois aspectos fundamentais, que foram colocados quer por V. Ex.ª quer pelo Sr. Deputado Herculano Pombo, devo dizer o seguinte: quando nós pretendemos aproximar o eleitor do eleito não é unicamente para criarmos escritórios de procuradoria relativamente aos deputados ou que haja um conhecimento mais directo e pessoal dos deputados pelos eleitores, mas, pelo contrário, é porque procuramos que os deputados sejam pessoas em quem os eleitores confiem...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Nestes não confiam!?
O Orador: - Pretendemos que o eleitorado possa fiscalizar a sua acção, possa exigir-lhes responsabilizados e que o deputado, no momento em que sente essa fiscalização mais intensa por parte dos cidadãos, possa sentir-se obrigado a ler uma actuação diferente da que eventualmente teria se não houvesse essa participação. Ora, este objectivo é conseguido quer pela diminuição dos círculos locais, quer pela criação do próprio círculo nacional, pois, quando o eleitor tem em seu poder dois votos, duas possibilidades de escolha, pode mais facilmente julgar no círculo local ou no círculo nacional aquilo que pretende. Com tudo isto o que se alarga ó o aprofundamento da democracia e não qualquer redução dos direitos dos cidadãos.
Quanto à outra questão que levantou na sua intervenção, Sr. Deputado Jorge Lacão,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Quanto ao acordo?...
O Orador: -... isto é, quanto a criação das regiões administrativas ligadas a esta matéria, devo dizer que continuo a não perceber qual é a relação que foi aí encontrada. E muito mais quando são colegas seus, que não irei citar porque não gosto de citar nomes, que vêm dizer que deviam ser salvaguardadas as estruturas administrativas existentes, que não deveriam ser divididos concelhos, o que, através de um processo de regionalização que desconhecemos, pode vir a acontecer e portanto continuo a não perceber qual é a relação que V. Ex.ª criou.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
Protestos do PSD.
O Orador: - De qualquer maneira, e isto é válido para todas as bancadas, afirmámos que nos limitámos a apresentar uma proposta, acerca da qual esperávamos sugestões, e nesse sentido contactámos todos os punidos representados nesta Assembleia para nos darem sugestões no sentido de melhorarmos a lei.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não parece!
O Orador: - O nosso propósito foi e continua a ser este e daí que, relativamente u todas as posições que aqui foram tomadas, u todas as sugestões que aqui foram postas, tenhamos o máximo prazer em vê-las vertidas num texto de alteração para que as discutamos convenientemente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Então e o acordo?...
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A presente iniciativa legislativa do Governo, para lá do mérito específico das soluções que consagra, teve o mérito adicional de abrir em Portugal um interessante e até apaixonado debate sobre uma matéria que constitui hoje uma das pedras de loque das democracias contemporâneas: o aperfeiçoamento dos sistemas eleitorais como pressuposto de modernização e fortalecimento dos regimes democráticos, na tripla perspectiva da garantia da justiça representativa, da maior autenticidade da vida política - traduzida na necessidade
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crescente de aprofundar a possibilidade da responsabilização dos eleitos perante os eleitores - e finalmente na obtenção de um grau mais elevado de eficácia no funcionamento do sistema político.
É pena que esta discussão, na perspectiva atrás assinalada, tenha sido travada com mais intensidade no seio da denominada «sociedade civil», através de interessantes contributos e reflexões provenientes daqueles a que já se vulgarizou chamar opinion makers. do que no interior da maioria dos partidos representados nesta Assembleia, que privilegiaram injustificadamente o debate passional em detrimento da discussão de carácter mais argumentativo e racional que seria legítimo antever.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que pode ser perturbante, porque começamos a correr o risco de deixar que outros façam, de forma correcta e responsável, a discussão que a nós compete fazer em primeira linha.
Não devemos deixar de assumir a necessidade de regeneração dos mecanismos do sistema político, aí onde eles se afigurem ineficientes e desajustados da realidade que devem servir, por mais que isso ponha em causa os nossos próprios interesses ou vantagens.
E cabe, antes de mais, perguntar, Sr. Presidente e Srs. Deputados: será que Portugal tem um sistema eleitoral eficaz, moderno, que não necessita de reformas?
Será que ao longo destes últimos 14 anos, estabilizada que está a democracia portuguesa, não foi possível identificar os principais defeitos e deficiências desse sistema?
Será que ninguém antes do PSD, no exercício de responsabilidades governativas ou no próprio papel de oposição, as reconheceu, as analisou, as repudiou e diagnosticou o seu remédio, em alguns casos ate através de soluções em tudo semelhantes às que hoje propomos?
Será, finalmente, que os limitados termos em que a Constituição nos permite actuar, não nos permite introduzir melhorias no sistema?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Conheceis, como eu, Srs. Deputados, a resposta para estas perguntas.
Muitos que hoje fazem oposição ao PSD criticaram de forma cáustica e veemente a Lei Eleitoral que nos rege, chegando a qualificá-la, como fez Freitas do Amaral, de «cancro da democracia portuguesa», por não garantir a «autenticidade da nossa vida política»; «por afastar eleitos de eleitores»; por não permitir que o eleitorado escolhesse com clareza «os governos antes das eleições, assistindo passivamente à profusão das coligações de conveniência, sempre constituídas ao arrepio da vontade do povo soberano e ditadas pela livre alvedrio dos estados maiores dos partidos»; por não permitir, na expressiva linguagem do actual líder do CDS, a constituição daquilo que ele chamava «governos homogéneos e monocolores».
A inoperância do sistema era tal que, em nome das melhorias que hoje lhe pretendemos introduzir, e adicionalmente em nome da necessidade da «estabilidade governativa», o governo do bloco central, presidido pelo Dr. Mário Soares,' lançou mesmo as bases, seis meses antes das eleições, para uma reforma do sistema eleitoral norteada pelos mesmos princípios hoje defendidos pelo PSD, em Comissão Interministerial presidida pelo distinto político e legislador Dr. António de Almeida Santos, à data Ministro de Estado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Encontramo-nos hoje neste debate com o à vontade de quem não teve preconceitos de defender idêntica reforma mesmo quando era minoritário no País.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Interessa-nos debater o seu mérito ou demérito pela discussão das soluções que esta iniciativa efectivamente contém, e não pelos fantasmas que assaltam alguns espíritos mais exaltados.
O PSD entende que a proposta do Governo é meritória a diversos títulos e que pode ser substancialmente melhorada se todos nisso nos empenharmos. Enumerarei os seus méritos e procurarei de seguida responder às principais críticas que lhe têm sido dirigidas.
Assinalo, desde logo, a redução do número de deputados para o quantitativo mínimo - e não para o quantitativo máximo - fixado na Constituição e que, na nossa opinião, corresponde, com maior equilíbrio, à dimensão populacional do País. Pensamos, no momento da revisão constitucional, que teria sido vantajoso reduzir mais esse número - para 200 - no que fomos acompanhados pelo CDS. Infelizmente, o Partido Socialista, renitente inclusive em mexer no número anterior de 250 deputados, não deu o seu consenso para esta redução mais substancial.
Mas assinalo, igualmente, a proposta de criação de um círculo nacional, ao lado de círculos mais reduzidos. A dualidade de círculos assim concebida confere aos eleitores uma vantagem inequívoca, que não tem sido devidamente assinalada. Aumenta a opção das escolhas e enriquece o campo da participação democrática.
O eleitor pode votar no círculo nacional movido mais por razões de carácter ideológico e votar no seu círculo de residência movido pelo juízo que faz quanto à pessoa do candidato e quanto à forma como este o representa. Pode votar no partido contra o candidato, pode votar no candidato contra o partido e pode votar em ambos, se assim o entender.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Até pode não votar!
O Orador: - Exactamente, Sr. Deputado Herculano Pombo, também pode não votar.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - É o que vai acontecer!
O Orador: - Quando, no contexto do actual sistema, os eleitores puderam usar a opção do duplo voto - e fizeram-no em Julho de 1987, quando votaram simultaneamente para a Assembleia da República e para o Parlamento Europeu - mostraram que sabiam conferir um uso útil à faculdade proporcionada por uma gama variada de escolhas, dando aos diversos partidos resultados substancialmente diferentes nos dois escrutínios em causa.
E assinalo, em conexão com o argumento anterior, a redução da dimensão dos círculos. Essa medida é um passo - modesto embora, reconhecemo-lo - que permite tornar mais autentica a relação entre o deputado e o seu eleitor. Pela simples razão de que esta autenticidade, bem como a susceptibilidade de responsabilização do deputado perante quem o elege, aumenta na proporção inversa da
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dimensão dos círculos, sendo maior, como 6 óbvio, no contexto de um sistema que conceba a existência de círculos uninominais.
A oposição dirigiu contra esta proposta de lei do Governo a barragem de fogo de todos os seus arcabuzes. As principais críticas bem podem reconduzir-se a duas. Pela primeira, diz-se que ela redundará numa penalização excessiva dos pequenos partidos, que não garantirá de forma justa a sua representação parlamentar; pela segunda diz-se que a iniciativa é extemporânea e que a criação do círculo nacional, com a consequente redução dos círculos grandes, deve ser precedida pela regionalização.
Vale a pena determo-nos um pouco nestes dois argumentos, para demonstrar como eles são infundados. Comecemos pelo primeiro.
Quanto a ele, é oportuno enunciar desde já, e digo isto em particular para o PRD e para o CDS, uma verdade que é do conhecimento de todos, embora ultimamente pareça um pouco esquecida: é que todos os sistemas eleitorais conhecidos - uns mais do que outros - tendem para a sobre-representação dos grandes partidos e para a sub-representação dos pequenos. E de igual forma nenhum sistema eleitoral consegue repor de forma justa a representação numérica, em termos dos votos dos diversos partidos, porque há factos aleatórios que a lei jamais pode prever à exaustão, o principal dos quais não pode deixar de ser a distribuição geográfica do eleitorado por partidos.
E assim ó que podemos encontrar, ao abrigo da actual Lei Eleitoral, injustiças gritantes de representação parlamentar. Com praticamente o mesmo número de votos e a mesma percentagem (uma diferença de 0,6%) o PRD possui mais 75% de deputados que o CDS (7 contra 4), quando o CDS tem praticamente o mesmo número de votos. É, de um ponto de vista aritmético, uma injustiça. Duvidamos, porém, que haja lei ou sistema eleitoral que a corrija, porque a sua génese está na concentração geográfica de votos, sempre incerta e sempre mutável de eleição para eleição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sujeitamos igualmente à prova dos factos a acusação de que o sistema proposto pelo Governo é aquele que mais penaliza os pequenos partidos com assento parlamentar.
Convido-vos para este exercício, Srs. Deputados, analisando os três últimos resultados eleitorais nacionais - legislativas de 1985, legislativas de 1987, europeias de 1989. Façamos a esses resultados, como fez no passado sábado o semanário Expresso - em trabalho que anexo a esta intervenção - a aplicação dos diversos modelos propostos: aquele que o Governo aqui traz, com um círculo nacional de 30 deputados; o mesmo modelo mas com o círculo nacional alargado para 50 deputados; dois modelos já defendidos pelo Prof. Freitas do Amaral: o maioritário à inglesa e o misto com dois votos; um modelo já defendido por altos responsáveis do Partido Socialista, o misto com aproveitamento de restos.
As conclusões a que se chega, Sr. Presidente e Srs. Deputados, desmentem categoricamente a acusação de que seja a actual proposta do Governo a que mais prejudica os pequenos partidos.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Pelas seguintes razões:
1.º Em 1985, o CDS teria sempre menos deputados com o sistema maioritário (1), com o sistema misto com dois votos (12) ou com o sistema misto com restos (15), do que aqueles que de lacto obteve (22) ou que obteria com a aplicação do sistema que hoje o Governo propõe (19). Este, era o que lhe provocaria menos perdas.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Contas todas «galadas».
O Orador: - 2.º Nessa eleição, o mesmo se passava com o PRD, que então não podia ser considerado um pequeno partido (tinha 45 deputados). Todos os outros sistemas o penalizariam de forma mais excessiva do que o sistema actualmente proposto pelo Governo.
3.º Ainda em 1985, em contrapartida, a aplicação da actual proposta do Governo levaria a que o PSD descesse dos 88 deputados que obteve para 84; pelo contrário, os outros sistemas, que, continuo a lembrar, foram defendidos pela oposição, favoreceriam de forma generosa o PSD: de 88 deputados passaria para 107 no sistema misto com restos; para 120 no sistema misto com 2 votos; e para 155 no sistema maioritário à inglesa.
4.º Nos sistemas até hoje propostos pela oposição agravavam-se as injustiças de representação. Com menos percentagem de votos, era possível obter sempre maior percentagem de lugares.
Assim, em 1985, 29,8% de votos no PSD deram-lhe 35% dos deputados; no sistema hoje proposto pelo Governo, os mesmos votos dar-lhe-iam 36,5% dos deputados. Mas no sistema misto com restos, valer-lhe-iam 46,5% dos deputados; no sistema misto com 2 votos 52,2% dos deputados; e no sistema maioritário à inglesa 67,4% dos deputados.
5.º O que acabo de referir para os resultados de 1985 teria idênticas consequências no resultado das europeias de 1989. Também aí os sistemas até hoje propostos pela oposição prejudicam muito mais os pequenos partidos do que o proposto hoje pelo Governo. Sempre, igualmente, o PSD seria mais favorecido do que agora.
6.º Tais conclusões são, tendencialmente, aplicáveis nas eleições legislativas de 1987. É a única situação em que um partido como o CDS seria prejudicado com este sistema actualmente proposto, mas desapareceria do mapa com o sistema maioritário à inglesa, mesmo em 1987. Contudo, não deixo de lembrar - e não fomos nós que defendemos o sistema maioritário à inglesa, Srs. Deputados, nem o defendemos agora - que todos consideram esses resultados de 1987 excepcionais e até irrepetíveis, e as excepções não são o melhor terreno de comparação e análise.
7.º Finalmente, verifica-se em todos os sistemas um valor constante na representação parlamentar comunista, ligeiramente alterado apenas em 1987, o que demonstra que não é a solução proposta pelo Governo que reforça este partido. Quem o reforça é a forte concentração geográfica dos seus votos, mas isso depende dos eleitores e não dos sistemas eleitorais.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Isso vai acabar!
O Orador: - De facto, os eleitores determinam sempre, em termos finais, quanto vale cada força partidária. O ensinamento velho da experiência e da ciência política é que o eleitorado, contrariamente aos dirigentes partida-
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rios, reage sempre às alterações ao sistema eleitoral, conformando o seu voto aos novos condicionamentos e às novas opções que se lhe oferecem.
Debrucemo-nos agora sobre a segunda objecção, esta formulada pelo PS, que afirmou a sua oposição à lei dizendo que aceita dividir os círculos mas só depois da regionalização do País.
Temos de denunciar, neste argumento, uma contradição e um sofisma. Contradição, porque aquilo que os socialistas começaram por dizer, logo que o Primeiro-Ministro anunciou esta iniciativa ao País, era precisamente o inverso do que dizem hoje. O porta-voz do partido, Dr. Marques da Costa, afirmou, expressamente, que os socialistas aceitavam reduzir os círculos eleitorais desde que tal não implicasse mexer nas unidades administrativas existentes, ou seja, nos distritos, nos concelhos e nas freguesias.
Vozes do PS: - Exacto!
O Orador: - De facto, foi isso que aconteceu, já que o Governo, na sua proposta, respeitou escrupulosamente o princípio da continuidade geográfica, deixando intocáveis as actuais unidades administrativas.
Desaparecida essa desculpa vem o PS arranjar outra, a da regionalização, mas com tanto infortúnio que entra em contradição porque exigir primeiro a criação de regiões é obrigar, isso sim, a alterar as unidades administrativas actuais.
Vozes do PSD: - Exacto!
O Orador: - Mas a contradição não se fica por aqui! Este passo de recuo, quer queiram quer não, põe em causa aquilo que resulta da revisão constitucional.
De facto, o PSD, que podia até à revisão introduzir alterações à Lei Eleitoral por maioria simples, aceitou - e de bom grado - que tal pudesse ser feito, a partir dela, apenas por maioria qualificada de dois terços, desde que se consagrasse a imposição da diminuição do número de deputados e a faculdade da criação de um círculo nacional, com a redução dos círculos restantes. Faculdade esta, claro, a ser exercida no futuro, no sentido que a dita maioria qualificada lhe quisesse imprimir, e não para ficar como um mero ornamento na Constituição, a simbolizar as lucubrações académicas dos operadores da revisão.
Aplausos do PSD.
Implicitamente, não podemos deixar de considerar que foi esse o entendimento do PS, lapidarmente expresso na declaração final do Sr. Deputado Almeida Santos, que respirou fundo e tranquilo com a consagração da maioria qualificada. Dizia então o Sr. Deputado Almeida Santos ao proferir a sua intervenção final, nesta Câmara: «Neste domínio, eram justificados alguns receios. Deixam agora de sê-lo. A Lei Eleitoral passa a ser um condomínio de vontades. Que para conseguir este desfecho tenha sido necessário admitir a possibilidade» ...
Vozes do PS:-Possibilidade!
O Orador: -... «da criação, no futuro, de um círculo eleitoral nacional - sujeita à mesma regra de dois terços -, bem como aceitar uma redução de 6% do número de deputados, eis o que se afigura um preço razoável para tão tranquilizante resultado.»
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - «Admitir a possibilidade da criação, no futuro, de um círculo eleitoral nacional» - estou a citar claramente e não tenho, sequer, a intenção de desvirtuar as declarações do Sr. Deputado Almeida Santos - era o «preço» que o Sr. Deputado Almeida Santos, em nome do PS, achava «razoável».
Hoje, é o futuro de 1989 - claro que para o ano, assim como daqui por 10 ou 100 anos também é, Sr. Deputado, reconheço isso e VV. Ex.ªs poderão «fugir» em frente, dizendo sempre isso - e perante a proposta do PSD, o PS diz agora que o preço é proibitivo e que mexer na Lei Eleitoral, nem por sombras!...
Não vale a pena esgrimir com palavras: em política, o nome que isto tem é má-fé!
Aplausos do PSD.
Mas argumentar com a necessidade prévia da criação das regiões é também um sofisma ...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: -... porque a representação regional, quando existir, não se confunde, não se mistura, não se sobrepõe à representação nacional. Ora, hoje do que tratamos com esta proposta de lei é da representação nacional e não da regional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quando se criarem as regiões elas terão os seus órgãos executivos nas juntas regionais, e os seus órgãos representativos nas assembleias regionais.
O Sr. António Guterres (PS): - Como é que sabe isso?
O Orador: - Fazer depender a configuração da representação nacional ao Parlamento da República da configuração da representação regional é uma desculpa que cobre de ridículo quem a invoca. Não é um argumento, Srs. Deputados do PS, é um álibi!
Aplausos do PSD.
Pela lógica deste raciocínio, segundo o qual não deve haver círculos ou divisão de círculos sem regiões, como ainda não temos regiões não deveríamos também ter os actuais círculos distritais, mas apenas um círculo nacional único. Seria o raciocínio pelo absurdo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País merecia que se aproveitasse esta iniciativa do Governo - moderada pela sua natureza e pelos limites que tem que respeitar - para que se pudesse debater, com alguma serenidade e ale com mais elevação, uma questão que é nuclear para a modernização e o reforço do sistema político português.
A isto não é lícito responder com alcivosias, com suspeições sem fundamento, com o pranto histriónico dos que invocam o risco do apocalipse como desculpa para encobrirem a sua própria ineficácia política.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em particular, o Partido Socialista já nos habituou a vir defender, em desespero de causa, princípios e medidas que bloqueou e recusou anos a fio.
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Foi assim com a revisão constitucional de 1982! Poderíamos, nessa data, ler obtido para Portugal um texto constitucional moderno e desempoeirado. Porém, o PS não o consentiu e foi preciso que a pressão dos acontecimentos, em 1989, não lhe deixasse opção de escolha.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto!
O Orador: - Foi assim com as privatizações! O PS demorou, igualmente, sete anos a perceber que a sua obstinação não era, sobretudo, nociva para os seus adversários, era antes nociva para o País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Hoje, quem ouve o discurso de alguns socialistas, que desmaiam de excitação enquanto enunciam as excelências da liberalização, não compreende como foi possível esperar tanto. Face à vossa intransigência não nos admiraremos que o mesmo venha a suceder à Lei Eleitoral, se a vossa recusa e obstinação se mantiver.
Esperamos que, pelo menos desta vez, não demorem VV. Ex.ªs sete anos a mudar de ideias!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Aguardamos do PS aquilo que compete a uma oposição responsável perante questões de Estado: que corrija, que melhore, que argumente, que mostre o que é, de facto, ser alternativa. O vosso primeiro contributo até agora ainda não chegou, encerrado que está na imensa «gaveta» em que guardais as coisas incómodas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para o PSD não conta, excessivamente, perder esta causa no interior desta Assembleia, de um ponto de vista formal.
Conta, isso sim, que seja uma causa justa e que os Portugueses acreditem nela.
Quanto a isso não temos dúvidas!
Aplausos do PSD.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Vai pedir a defesa da vida! Isso é com o eleitorado!
O Sr. Basílio Horta (CDS): - O Sr. Deputado Silva Marques está muito empolgado na defesa do CDS. Agradeço-lhe essa sua atitude!
Sr. Presidente, face às citações que foram feitas do presidente do meu partido, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Duarte Lima, antes de mais, gostaria de dizer que, em minha opinião, o senhor não se deve sentir muito à vontade neste debate, a defender o indefensável. Talvez por isso o brilhantismo habitual das suas intervenções tenha diminuído!
Risos do PSD.
De qualquer forma, meu querido amigo, Sr. Deputado Duarte Lima, quero dizer-lhe que não se deve limitar - agora que é um estudioso da obra do Prof. Freitas do Amaral, o que, efectivamente, nos dá muita alegria - ao estudo do sistema eleitoral. Leia ainda as matérias de Ciência Política e de Direito Administrativo, ambas do mesmo autor, e irá, por certo, aprender alguma coisa que será útil para o meu querido amigo poder enquadrar as reflexões do Prof. Freitas do Amaral nesse enquadramento mais amplo.
O Prof. Freitas do Amaral diz, fundamentalmente, três coisas: em primeiro lugar, que este sistema eleitoral possibilitará uma ditadura dos directórios partidários, isto é, possibilitará uma ditadura por parte dos directórios partidários na escolha dos deputados. E que bem o Sr. Deputado deve saber isso!
Pois bem, até reconhecemos que assim é, mas como é que esta proposta de lei muda isso se ela nem sequer prevê a apresentação de candidaturas fora dos partidos?
Em segundo lugar, o que o Prof. Freitas do Amaral diz é que há um sistema que aproxima e responsabiliza mais os eleitos dos eleitores, que é o sistema maioritário em duas voltas. Toda a gente sabe que ele é adepto do sistema francos, porque ele já expressou isso várias vezes. Mas onde é que esta proposta de lei acolhe essa solução? Nem a pode acolher porque se o fizesse eslava a ferir gravemente a Constituição.
Portanto, onde é que está o suporte da dita contradição do Prof. Freitas do Amaral?
No entanto, V. Ex.ª tem razão apenas num ponto. De facto, o Prof. Freitas do Amaral afirmou que esta legislação dificulta a formação de maiorias absolutas, e aí, infelizmente, errou - ele não previu o que iria acontecer em 1987. Enfim, errou para mal dos Portugueses, pois verificou-se, realmente, a formação de uma maioria absoluta do seu partido, Sr. Deputado.
Por esta razão, penso que o Prof. Freitas do Amaral errou. Confessamos esse erro lamentável! De facto, nenhum de nós poderia prever que os Portugueses tivessem essa opção da qual, seguramente, já estarão arrependidos.
Risos do PSD.
Para terminar, Sr. Deputado Duarte Lima, gostaria de, formalmente, transmitir a V. Ex.ª e ao seu partido que o Prof. Freitas do Amaral não é responsável por esta proposta de lei. De facto, não tem nada a ver com ela!
A V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, que me parece estar aqui em representação do Sr. Primeiro-Ministro, a assumir esta posição em nome do Governo,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Pelo menos, está sentado na cadeira que está destinada ao Sr. Primeiro-Ministro!
O Orador: -... solicito que transmita ao Sr. Primeiro-Ministro - uma vez que esta iniciativa é do Governo- a discordância profunda do Prof. Freitas do Amaral e também o seu lamento por nenhuma das suas opções críticas (e que bem que o Prof. Cavaco Silva as conhece) ter sido adoptada pela presente proposta de lei.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dirija-se ao eleitorado, Sr. Deputado!
Risos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, quando o meu caro amigo pediu a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração, pensei que iria - como, entretanto, já fez quando se dirigiu ao Sr. Ministro - falar outra vez na questão do assassinato. Ainda bem que não o fez, pois iria fazer-me pensar que estava em rigor mortis.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Essa não teve graça!
O Orador: - Portanto, ainda bem que V. Ex.ª não fez isso!
Sr. Deputado Basílio Horta, começaria por dizer-lhe que conheço a obra do Prof. Freitas do Amaral.
O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Tem obrigação disso!
O Orador: - Exactamente, tenho obrigação disso porque, entre outras coisas, participei na elaboração do primeiro manual de Direito Administrativo, de que ele é autor, o que, de resto, me valeu, na introdução dessa obra, um elogio por parte do Prof. Freitas do Amaral. Conceder-me-á, portanto, Sr. Deputado Basílio Horta, o benefício de conhecer, com suficiência, o que ele escreveu.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Vê-se!...
O Orador: - Permita-me, no entanto, que lhe diga que agora quem não está à vontade nesta matéria é o Prof. Freitas do Amaral. Por isso, o Sr. Deputado Basílio Horta tem de se socorrer deste tipo de figuras regimentais!
E não está à vontade porquê? Nunca neguei que o Prof. Freitas do Amaral tivesse defendido esse sistema. De facto, defendeu-o, deixou-o «cair» e agora tornou a «pegar» nele, porque é o sistema que agora lhe convém mais.
O Prof. Freitas do Amaral está pouco à vontade nesta matéria porque defendeu quase todos os sistemas eleitorais. Aliás, numa conferencia a que presidiu, em Maio de 1985 no Grémio Literário, a convite do Clube de Imprensa, e onde exaurou todas as deficiências do sistema eleitoral português, afirmou, a certa altura, que defendia dois modelos diferentes: o modelo francês e o modelo alemão. Ora, como V. Ex.ª sabe, o modelo alemão não é, rigorosamente, igual ao modelo francês. Como vê, tem aqui uma duplicidade de opções do Prof: Freitas do Amaral!
O Sr. Silva Marques (PSD): - É uma opção muito forte!
O Orador: - Mas, historicamente, esse não foi o último sistema que ele defendeu; o último foi no ano de 1986.
Antes de defender agora o sistema francês defendeu o sistema eleitoral britânico, aquando da deslocação que fez à Madeira, no fim da campanha eleitoral para a Presidência da República. Já, em tempos, tive oportunidade de explicar isso aqui e até forneci os elementos à Câmara...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Explicou mal!
O Orador: - Não! Expliquei bem, e até posso dizer-lhe, em concreto, quando é que isso ocorreu! Com efeito, foi no dia,... vou citar...
O Sr. Narana Coissoró (CDS):-Já vimos isso!
O Orador: - Mas vou citar para que conste do Diário!
Assim, passo a citar as afirmações - que nunca foram desmentidas - do Prof. Freitas do Amaral publicadas no jornal Diário de Notícias: «Seria do interesse do País, quer para reforçar as condições de estabilidade governativa, quer para tornar mais autêntica a relação entre o eleitorado e o deputado, que se evoluísse para um sistema eleitoral como o existente nos países mais democráticos, como a Grã-Bretanha e os Estados Unidos.»
E acrescenta a seguir: «É uma proposta honesta, séria.»
- claro que é honesta porque a democracia inglesa é uma democracia forte, não e verdade, Sr. Deputado Herculano Pombo? Há pouco, o senhor esqueceu-se disso, pois Os Verdes ingleses tinham 14% e não tinham lugares ... se calhar quer inferir que a democracia inglesa não é forte - «e transparente, que visa organizar a vida democrática em termos de alternância.»
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E essa é a vossa proposta?
O Orador: - Isto foi aquilo que defendeu o Prof. Freitas do Amaral e que agora vos incomoda!
Vozes do PSD: - É verdade!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Mas essa é a vossa proposta? O que é que a vossa proposta tem a ver com isso?
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, solicito que se faça silêncio na Câmara!
Aproveito também para lembrar o Sr. Deputado Duarte Lima que esgotou o tempo de que dispunha para dar explicações.
O Orador: - Sr. Deputado Narana Coissoró, de facto isto não tem nada a ver com a proposta, mas tem a ver com a invocação que o Sr. Deputado Basílio Horta fez sobre os modelos eleitorais que o Prof. Freitas do Amaral defendeu.
Gostaria, pois, de dizer-lhe que ele defendeu mais do que um modelo eleitoral e, inclusive, defendeu este.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso foi antes da revisão constitucional e antes de a lei francesa ser alterada!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mais uma vez, solicito que se faça silêncio na Câmara.
O Orador: - Sr. Presidente, a Mesa tem de me conceder um benefício em termos de tempo, porque fui interrompido e não me deixaram falar.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa procedeu aos respectivos descontos de tempo. Assim, solicito-lhe que termine, porque já excedeu o seu tempo.
O Orador:-Termino já, Sr. Presidente!
O Sr. Deputado Basílio Horta disse que o Prof. Freitas do Amaral se linha enganado em 1987 porque não conseguiu prever a maioria absoluta do PSD. Acho que cie previu, Sr. Deputado!
Aplausos e risos do PSD.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Acha que sim?
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação h Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, tendo em conta a interpretação que, notoriamente, o PS, com o acordo da Mesa, dá a figura da defesa da honra e consideração, gostaria de informar que nós, PSD, também temos aqui 147 deputados que têm o mesmo tipo de razões para defender a honra e consideração, à semelhança do que fez o Sr. Deputado Basílio Horta. Ora, iremos também exercer esse direito de forma abundante, visto que o cone do precedente aberto nos iria limitar da notória duplicação de tempo que o CDS tem vindo a ter ao servir-se deste tipo de expediente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pacheco Pereira, na qualidade de presidente da Mesa, gostaria de salientar a grande dificuldade que esta sentiria se tivesse de avaliar- o que não fará - quando é que qualquer dos deputados desta Câmara se sente ofendido na sua honra e consideração, pelo que não pode a Mesa recusar o uso da palavra para esse efeito.
Quanto à gestão dos trabalhos, agora anunciada pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira, penso que é um critério que a bancada do PSD tem todo o direito em seguir, pelo que não tenho quaisquer comentários a fazer.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Alberto Martins (PS): - É para exercer o direito de defesa da honra e consideração da minha bancada.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Alberto Martins (PS): - A minha bancada foi acusada de má-fé pelo Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Para o PSD isso não é ofensa, é um hábito coloquial!
O Orador: - Em nosso entender, a má-fé é uma acusação grave! Devo dizer ao Sr. Deputado Duarte Lima que a primeira condição para um partido e um político responsáveis é a credibilidade e falar a verdade.
O Sr. Deputado Duarte Lima não fala a verdade, quando tenta, de forma inadequada, abusiva e falsa, desvirtuar as palavras do meu camarada Almeida Santos.
Devo lembrar-lhe que quem tem ficheiros pessoais sobre as declarações dos deputados deve tê-los completos e quando os pretende usar deve fazê-lo com isenção, rigor e propósito e não como forma de desvirtuar essas declarações. Deste modo, se o PSD tem ficheiros, deve tê-los completos!
Nesse sentido, para completar os seus ficheiros, ou para lhe chamar a atenção para uma «peça» do seu ficheiro, que o Sr. Deputado escamoteou, vou ler-lhe a declaração do meu colega António Vitorino aquando da votação deste mesmo artigo na CERC - Comissão Eventual de Revisão Constitucional, em que ele disse, claramente - e peco-lhe que me ouça com entendimento-, o seguinte: «Fomos contrários a que houvesse um círculo nacional único e também fomos contrários a que a Constituição obrigasse a existência de um círculo nacional a par com os círculos regionais. Agora, não e isso que está aqui expresso. O que está consagrado no texto comum é uma mera faculdade, uma mera possibilidade dependente da decisão da lei ordinária.»
Além disso, a eventual criação de um círculo nacional terá sempre de estar sujeita à regra dos dois terços.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto!
O Orador: - Devo dizer que nós não temos uma grande simpatia pela ideia do círculo nacional, mas há várias soluções para ele. Há, por exemplo, uma solução de um círculo nacional de aproveitamento de restos, a qual é uma solução de maior benefício para os pequenos partidos do que para os grandes partidos e é, aliás, uma solução susceptível de reforçar o pluralismo da expressão parlamentar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este é um mero exemplo. Portanto a solução fica em aberto para a lei ordinária e ela determinará se é de criar ou não esse círculo, e com que contornos, por uma decisão de maioria qualificada de dois terços, o que sempre pressuporá um consenso alargado.»
Os Srs. Deputados agora percebem!...
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado António Martins, tive o cuidado ...
O Sr. Alberto Martins (PS): - O Sr. Deputado está tão nervoso que até troca o meu nome!
O Orador:-Perdão, Sr. Deputado Alberto Martins. Como eslava a dizer, tive o cuidado de citar, com todo o rigor, o Sr. Deputado Almeida Santos - não desvirtuei nada daquilo que ele disse. Na interpretação que fiz, tive o cuidado de dizer: «implicitamente, nesta afirmação, está incluído isto». E, como parlamentar, tenho o direito de tirar essa conclusão, sem que V. Ex.ª me acuse por o estar a ofender. Também disse que isto, politicamente (não pessoalmente), é má-fé. Aliás, este é um qualificativo brando em relação àquilo que costuma ser utilizado pela sua bancada.
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Sr. Deputado Alberto Martins, V. Ex.ª e os deputados da sua bancada não podem vir aqui arrogar-se em Petrónios, sempre que alguém utiliza um qualificativo como este, que é brando e fica muito aquém daqueles que VV Ex.ªs utilizam. É que VV. Ex.ªs dizem muito pior do que isso! Ontem, um colega seu chamou mentiroso a um colega meu. Portanto, penso que, nesse campo, será melhor que VV. Ex.ªs se moderem.
Vozes do PSD: -Muito bem!
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas não dou licença a que me interrompa porque o tempo de que disponho está quase a esgotar-se.
Depois, Sr. Deputado Alberto Martins, o exemplo que dá é a confirmação daquilo que eu disse. O Sr. Deputado António Vitorino fez algo com muito mais sentido de responsabilidade do que aquilo que está a fazer agora o vosso partido. É que ele disse: «Isto não é do nosso agrado mas, não sendo, consentimos em consagrá-lo. No entanto, há soluções para melhorar o sistema».
Agora, aquilo que os senhores não apontaram até hoje foi uma única solução para melhorar o mesmo sistema. Até agora, os senhores «fecharam-se» e disseram: «Não, não, não!», não tendo dado uma única solução, enquanto que o Sr. Deputado António Vitorino deu e bem! Aliás, além daquela que o Sr. Deputado António Vitorino deu, há outras, como sabe, há muitas!
O Governo apresentou. uma proposta de lei a esta Camará e tem dito, reiteradamente - disse-o à oposição e nós confirmamo-lo como grupo parlamentar-, que essa lei, a partir de agora, «abandona» o Governo e passa a «fazer pane» desta Guinara. Assim, neste momento estamos abertos para a discutir. Como? Vamos ver aquilo que os senhores propõem e em que sentido é que poderemos aproveitar as vossas soluções.
É óbvio que há muitas formas de aperfeiçoar um sistema que, como disse, é moderado e dá passos que, em alguns casos, podem ser considerados tímidos. Mas, VV. Ex.ªs «fecharam-se» - como fez o líder do seu partido, em contradição com o que disse ao Sr. Dr. Marques da Costa que deu uma abertura inicial para a discussão desta matéria - sem alternativas, dizendo apenas que o sistema é injusto. Ora, injustos suo todos os sistemas, Srs. Deputados! Torno a dizer que o sistema actual é injusto! O PRD, com apenas mais 0,6% de votos, tem mais 75% de deputados que o CDS! Esse sistema, actualmente, também é injusto! Os senhores não se revoltam contra isso?!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pacheco Pereira, a Mesa está informada de que aquando da intervenção do Sr. Deputado Alberto Martins V. Ex.ª pediu a palavra. Presumo que é também para defesa da honra e consideração...
Um outro orador que já estava inscrito é o Sr. Deputado Almeida Santos, a quem pergunto para que efeito deseja usar da palavra.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, no meu caso, é mesmo para a defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Fui informado de que, na minha ausência, foi relendo o facto de eu ter sido nomeado, no governo do Bloco Central, para presidir a uma comissão que teria sido encarregada de elaborar um texto semelhante à proposta do Governo. Suponho que alguém terá informado o Sr. Deputado Duarte Lima, uma vez que nessa altura ele não fazia parte do governo.
Quero, pois, informá-lo, Sr. Deputado, de que «bateu à pior das portas», pela simples razão de que, tendo o Dr. Capucho apresentado um estudo conducente à criação de círculos uninominais, à criação de um círculo nacional e à redução dos grandes círculos a pequenos círculos, eu fiz um contra-estudo em que demonstrei a inconstitucionalidade dos círculos uninominais, a inconveniência da criação do círculo nacional e também a tendencial inconstitucionalidade da divisão, abaixo de três deputados, dos círculos grandes em círculos pequenos. Morreu ali a intenção do Sr. Deputado Capucho, porque não foi nomeada nenhuma comissão nem foi feito nenhum projecto - eu fui o «coveiro» dessa intenção do Dr. António Capucho. Como vê, não podia ter «batido a pior porta»!
Por outro lado, volta novamente a ofender a minha honra quando diz que eu defendo agora posições que não defendi no passado e, portanto, sou um «troca-tintas» - essa é uma maneira de se ofender a honra das pessoas. Penso, portanto, que se justifica a invocação da figura regimental de defesa da honra.
Ainda há pouco disse: «Admiti a possibilidade e considerei que a admissão dessa possibilidade era um bom preço para os dois terços». Portanto, continuo a dizer que admitimos a possibilidade, e não mais do que isso, admitimos uma norma, facultativa, como há dezenas na Constituição, e não uma norma imperativa não vamos transformar todas as normas facultativas em imperativas. Na verdade, o vosso desespero colérico significa que se nós não temos conseguido esse resultado e pago esse preço os senhores estavam agora a fazer aqui a lei que queriam, de esmagamento dos pequenos partidos, e não podem fazê-lo, porque nós não deixamos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): -Sr. Deputado Almeida Santos, foi mal informado acerca da forma como o citei, porque se tivesse sido bem informado teria visto que não o citei mal nem com o intuito de o ofender; sabe bem que é grande o respeito e a consideração que tenho por V. Ex.ª e jamais o faria voluntariamente.
A citação reproduzia a sua intervenção e chamava a atenção para aquilo que V. Ex.ª dizia: «Admitir a possibilidade da criação, no futuro, de um círculo eleitoral nacional é o preço razoável que se paga para que haja a possibilidade de se rever por dois terços.»
O Sr. Almeida Santos (PS): -É antes!
O Orador: - Não, era aqui.
E eu digo o seguinte: hoje é o futuro a que V. Ex.ª se referia, Sr. Deputado Almeida Santos. V. Ex.ª dizia: «Admitir, no futuro.» É claro que um deputado da sua
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bancada poder-me-á responder que, no ano que vem, daqui por 10 ou 100 anos também é no futuro. Mas penso que não seria de boa-fé - e daí a minha invocação da má-fé - o Sr. Deputado Almeida Santos vir dizer-me que tinham mencionado isso para ser feito daqui por 100 anos! Penso, pois, Sr. Deputado que não era isso que estava no seu espirito!
Quero ainda dizer ao Sr. Deputado Almeida Santos o seguinte: é pena que esse seu estudo não tenha sido publicado...
O Sr. Almeida Santos (PS): - Vou tentar encontrá-lo entre os meus muitos papéis e mandar-lho, Sr. Deputado Duarte Lima. Espero que, nessa altura, não fale em má-fé! Também não falei em mentira, porque sei que o Sr. Deputado não mentiu - alguém lhe mentiu a si. Espero que seja o senhor a qualificar o acto!
O Orador: - Sr. Deputado, vou-lhe fazer a prova com a veracidade que tem o Diário da República. Seguramente não ponho em causa o que está nas suas gavetas, mas a veracidade deste documento é superior àquela que o Sr. Deputado, eventualmente, me possa dar. Quando falei em má-fé não foi no contexto da comissão interministerial. Disse que houve uma comissão interministerial não para fazer uma lei igual a esta, mas para estudar uma reforma do sistema eleitoral baseada nos mesmos princípios. E passo a ler o que diz a Resolução n.º 3/85, publicada em 18 de Janeiro de 1985 no Diário da República: «É criada uma comissão interministerial para a revisão da legislação eleitoral, abreviadamente CIRLE, composta pelo Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, que assegurará a sua coordenação, e pelos Ministros da Administração Interna e da Justiça.» Ora, não diga, Sr. Deputado, que nunca pertenceu a comissão nenhuma, ou então houve alguém que falsificou o Diário da República! E, no n.º 2 da mesma resolução, diz-se o seguinte: «A CIRLE é incumbida de elaborar e apresentar ao Conselho de Ministros, até 31 de Março de 1985, um projecto de proposta de lei eleitoral para a Assembleia da República, tendo em vista, designadamente: a redução tendencial do número de deputados, o estabelecimento de uma ligação mais estreita entre eleitores e eleitos» - sei que isto se faz de muitas formas e que esta pode não ser a única - «e o reforço da estabilidade dos governos.» Isto que li vai para o Diário da Assembleia da República e para o Sr. Deputado Almeida Santos.
Sr. Deputado Almeida Santos, não invoque a defesa dos pequenos partidos - esse é um discurso que não é franco-, porque VV. Ex.ªs fizeram, no ano passado, um acordo para as eleições do Parlamento Europeu com um pequeno partido e o vosso desígnio, quando fizeram esse acordo - desígnio esse confessado, por diversas vezes, em entrevistas -, foi o de «engolir vivo» o PRD nas eleições europeias, coisa que conseguiram!
Aplausos do PSD.
o Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Duarte Lima o seguinte: quando eu trouxer o meu trabalho -com o qual destruí
o trabalho do Dr. Capucho -, peço-lhe que se assegure, junto dos ministros do PSD do governo do bloco central, da fidedignidade desse documento.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a figura da defesa da honra está a ser utilizada de forma excessiva relativamente àquilo que é normal em termos de debates na Assembleia da República. É evidente que os Srs. Deputados tom todo o direito de utilizar a figura regimental da defesa da honra. Só que, assim, a continuação dos nossos trabalhos vai ler que ser reformulada em função do agendamento inicialmente previsto, em termos de tempo dos nossos trabalhos.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa relativamente à ordem das inscrições.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Duarte Lima fez a sua intervenção, em relação à qual se seguiram inscrições para formular pedidos de esclarecimento - eu fui, seguramente, um dos primeiros a inscrever-me. Ora, o Sr. Presidente tem estado a dar a palavra a vários deputados que a pediram para a defesa da honra - o que, até certo ponto, é compreensível em relação àqueles que querem defender a honra relativamente às alegações iniciais do Sr. Deputado Duarte Lima-, mas as defesas da honra que se seguem entrar na ordem das inscrições e ficar para o fim, senão nunca mais saímos daqui e estão a ser preteridas pela Mesa as inscrições feitas em devido tempo. Chamava, por isso, a atenção da Mesa para a forma de dirigir os trabalhos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, de facto, V. Ex.ª foi o primeiro orador a inscrever-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Duarte Lima.
Embora a Mesa não saiba o que é que os Srs. Deputados pretendem dizer quando solicitam a palavra para defesa da honra, a verdade é que essa figura regimental tem prioridade sobre qualquer outro tipo de intervenção.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Se o Plenário da Assembleia da República decidir que os pedidos de palavra para exercer o direito de defesa da honra terão todos lugar no fim da sessão, muito bem. Façam essa proposta! Porém, enquanto assim não for, quanto muito a Mesa pode apelar pura a boa consciência dos Srs. Deputados, mais nada!
Para exercer o direito de defesa da honra e consideração da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, compreendo que no meu caso o PCP sinta alguns pruridos que não teve em relação à defesa da honra feita pelo Sr. Deputado Basílio Horta.
Em relação à intervenção do Sr. Deputado Alberto Martins gostaria de dizer que ainda bem que voltámos à célebre frase - e ainda bem que se encontra presente o Sr. Deputado Almeida Santos - que se insere num discurso que descreve como o Partido Socialista viu a nego-
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ciação do processo do acordo de revisão constitucional. Trata-se de uma exposição à Assembleia desse processo de negociação em que o Sr. Deputado Almeida Santos fala do que obteve o Partido Socialista e do que deu o PSD. Claríssimo como água natural!
O Sr. Presidente: - Sr. .Deputado Pacheco Pereira, peço desculpa por o interromper, mas gostaria de saber se V. Ex.ª está realmente a defender a honra e consideração da sua bancada relativamente às palavras do Sr. Deputado Alberto Martins.
O Orador: - Exacto, Sr. Presidente. Estou a dirigir-me ao conteúdo da intervenção do Sr. Deputado Alberto Martins, que se referiu a esta frase do Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O debate já perdeu o pé! Agora vale tudo!
O Orador: - Portanto, na descrição dessa negociação, do que se recebeu e do que se deu, os Srs. Deputados do Partido Socialista querem convencer-nos, à revelia da própria frase, que o PSD lhes deu um palácio e eles deram-nos uma caixa de fósforos... .
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!
O Orador: - Objectivamente, é essa a descrição que os Srs. Deputados hoje consideram ser o entendimento da frase do Sr. Deputado Almeida Santos. Porém, o que a frase diz não é isso, mas o seguinte: «Nós, Partido Socialista» - e utilizo a linguagem do Partido Socialista, que não é a nossa nesta matéria - «recebemos talvez aquilo que tenha sido a mais importante concessão do Partido Social-Democrata no processo de revisão constitucional, a maioria de dois terços para a lei eleitoral, e, em troca, demos duas coisas: a redução do número de deputados e uma possibilidade.» Porém, essa possibilidade não era, no entender actual do Partido Socialista, para garantir. Ora, isto não e má-fé negocial? Num acordo político não é má-fé trocar algo de vital no plano político por algo que é completamente vazio e fica adiado para um futuro sine die? Se na interpretação actual do Partido Socialista isto não é, objectivamente, enganar e ludibriar o outro, então não sei qual é o significado das palavras.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, devo dizer que a sua defesa da honra e um «tiro de pólvora seca».
V. Ex.ª não tinha honra para defender; tinha apenas uma interpretação subjectiva para justificar! Aliás, trata-se de uma interpretação subjectiva inconsistente; não é uma questão de direito constitucional, mas sim de gramática.
Aplausos do PS.
A possibilidade de um círculo nacional...
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Não permito que me interrompa. Sr. Deputado, pois estou a responder-lhe de forma idêntica à da sua bancada.
Como estava a dizer, a possibilidade de um círculo nacional é uma mera faculdade. Não há dúvidas a esse respeito! E se dúvidas houvesse cito-lhe, para as dissipar, a declaração que a sua colega de bancada e ex-juiz do Tribunal Constitucional, Assunção Esteves, fez a respeito deste preceito, que é inspirado no preceito originário do PSD. Como sei que o Sr. Deputado tem esses ficheiros, fará o favor de os consultar.
Vozes do PSD: - Toda a gente sabe isso!
O Orador: - No entanto, vou citar essa declaração: «Aqui não há uma imposição originariamente constitucional - círculo eleitoral. Há uma remissão para a lei e há uma facultação operada pela Constituição para que a lei possa ou não instituir esse círculo.»
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Que novidade!
O Orador: - Portanto, com base nisto foi votado o preceito constitucional, que e uma mera faculdade que não tem carácter imperativo. O Sr. Deputado não iluda as questões porque a discussão do acordo de revisão constitucional não foi apenas na base das vantagens relativas de um artigo dentro dele próprio.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isso é música celestial!
O Orador: - O acordo de revisão constitucional foi feito globalmente e há artigos onde o PS, mais do que o PSD, abriu mão de algumas posições e outros em que se passou o contrário. Naturalmente que neste, e por boas razões que agora se provam, foi o PSD que abriu mais mão.
Aplausos do PS.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Com esses argumentos vai direitinho para o céu!
O Sr. Presidente: - A Mesa informa que se encontram inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Duarte Lima os Srs. Deputados Carlos Brito, João Amaral e Carlos Lilaia.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - No início da sua intervenção o Sr. Deputado Duarte Lima começou por fazer um apelo para que se travasse um debate sereno. Chamo, no entanto, a sua atenção para o facto de não ter sido isso o que os senhores tem feito nos últimos dias. No entanto, gostaria que pudéssemos trocar algumas impressões acerca desta importante matéria sem o dramatismo das defesas da honra.
O Sr. Deputado elogiou muito o sentido inovador da proposta de lei -que, em tora seja do Governo, o senhor a defende com tanto calor como sendo lambem sua e da bancada do PSD-, a modernização, os aperfeiçoamentos...
O Sr. Deputado deu conta - porque acompanhou com interesse, o que, aliás, também se passou comigo - das projecções que foram amplamente publicadas na imprensa a este respeito. Bom, é a esse propósito que lhe coloco
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a primeira pergunta: não acha curioso que em múltiplas projecções, vindas das mais diversas proveniências e obtidos os mais diversos resultados eleitorais dos últimos anos, a aplicação das vossa proposta de lei nunca prejudique o vosso partido e quase sempre o bonifique com grandes vantagens na transformação de votos em mandatos?
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - Não acha que há nisto qualquer mistério, Sr. Deputado? Portanto, se é possível que um partido, em repetidas projecções, com os mesmos votos tenha mais deputados e possa até ter mais deputados com menos votos, não acha que há qualquer mistério nisto?
Por exemplo, se aplicarmos a vossa lei aos resultados eleitorais das eleições para o Parlamento Europeu e se reduzirmos, como propõe a vossa proposta, o número de deputados em 20, o que se verifica é que o PSD não perde praticamente nenhum deputado ou, melhor, perde apenas um -portanto, ganha objectivamente-, enquanto que o PS perde oito, a CDU quatro, o CDS cinco deputados... Bem, os pequenos partidos, que teriam lugar pelo sistema vigente, desaparecem. Não acha que isto é estranho? Não lhe ocorre que isto pode inculcar qualquer batota, Sr. Deputado?
As projecções também mostram que acima dos 30% a vossa lei favorece extraordinariamente os partidos que têm essa votação. Portanto, isto não terá a ver com a ideia de baixar a fasquia da maioria absoluta?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É só isso!
O Orador: - No vosso congresso os senhores propuseram-se o objectivo de repetirem em 1991 a maioria absoluta. Mas uma coisa é repetir a maioria absoluta com 44% ou com 45% e outra coisa é fazê-lo com 38% ou com 39%! O objectivo da vossa lei não será exactamente o de baixar a fasquia da maioria absoluta para que o PSD se possa eternizar no Governo?
Bom, creio que estas suas inovações que decorrem da análise aprofundada da vossa proposta. Esta é que é a verdadeira modernização e que se pode decompor em cinco aspectos essenciais: primeiro, o da eternização do PSD no Governo. Não é, como tem querido demonstrar o Sr. Deputado Pacheco Pereira, uma alteração da lei que facilite as maiorias do Governo abstractamente. Não! E a facilitação da maioria absoluta feita à medida, feita ao corpo eleitoral do PSD para atingir esse objectivo.
A segunda é a bipolarização, mas uma bipolarização que faz com que um dos pólos se mantenha eternamente no poder e que o outro seja eternamente o primeiro partido da oposição. A drástica redução dos deputados do PCP, o esmagamento dos partidos de menor expressão parlamentar, portanto a hegemonização pelo PSD de todo o campo da direita.
E, finalmente, uma barreira de facto ao acesso de novos partidos à Assembleia da República, pois nos círculos regionais essa barreira vai de 5% a 21%, e no círculo nacional é de 3% quando actualmente em Lisboa se pode eleger apenas com l,2%. Tal é a modernização, tais são os aperfeiçoamentos da vossa proposta. O Sr. Deputado não acha que se pode chamar a isto, com legitimidade, uma proposta de batota eleitoral?
Era esta a pergunta que queria formular e na medida em que ela não visa dar mais rigor à vontade popular nem exprimir melhor o voto do eleitorado, porque é antidemocrática pelas razões que demonstrei, o PCP vai, naturalmente e com todo o vigor, votar contra a vossa proposta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Duarte Lima, deseja responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?
O Sr. Duarte Lima (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, se há inscrições de outros partidos terá de se cumprir a regra da alternância. Caso contrário, posso formular desde já o meu pedido de esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Tem razão, Deputado. De facto, está inscrito também para formular pedidos de esclarecimento o Sr. Deputado Carlos Lilaia, a quem dou a palavra.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Deputado Duarte Lima, em várias ocasiões tenho notado aqui a qualidade de algumas das suas intervenções e disso tenho dado público testemunho.
Porém, acontece que hoje - lamento dizer-lhe - encontrei a sua intervenção demasiado enfadonha, cheia de retórica e por vezes vi em si mesmo grandes dificuldades e tive, digamos, alguma pena de o ver neste papel, que é, de facto, defender o indefensável, defender aquilo que não tem defesa possível.
Neste seu carácter enfadonho da intervenção que fez gostaria de adicionar aqui alguma coisa, se quisermos alguma matemática eleitoral, que esteve em grande parte ausente da sua intervenção.
Como o Sr. Deputado Duarte Lima provavelmente não desconhece, é hoje possível, com recurso aos modelos de optimização matemática e também ao uso já hoje banalizado da informática, fazer vários ensaios, encontrar várias soluções, partir os círculos de diferentes formas, e tudo isto se consegue fazer no espaço de uma tarde, de uma manha, de algumas horas!
A questão é efectivamente esta: nós, no gabinete de estudos do nosso partido, tentámos fazer estes ensaios, fizemos várias aplicações, mas não conseguimos resolver uma questão, que, embora académica, é importante. Isto é, não conseguimos, com o recurso aos nossos modelos matemáticos, eliminar, de uma só vez, ou proceder ao esmagamento, de uma só vez, dos partidos que tom uma expressão eleitoral inferior a 10% e dos partidos que tem uma expressão compreendida entre os 10 % e os 30 %. - Conseguimos, porém, compatibilizar aquilo que está presente nesta proposta, ou seja, o esmagamento dos pequenos e o reforço dos que têm mais de 30%, mas não conseguimos, ao mesmo tempo, eliminar aqueles que estuo entre os 10% e os 30%.
A questão, em concreto, que queria colocar-lhe era se o PSD, através dos estudos que fez, ou dos ensaios que o Governo lhe forneceu, também chegou à mesma conclusão do que nós, ou seja, de que não é possível esmagar, ao mesmo tempo, partidos cuja representatividade
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se situa entre os 10% e os 30% e inferior aos 10%, ou se, pelo contrário, foi uma decisão tomada em consciência pelo PSD de, por agora, não se preocupar com aqueles partidos que estuo entre os 10% e os 30%, deixando-os para uma segunda fase.
Portanto, com o recurso aos métodos que, com certeza, no seu partido também é possível utilizar em termos de análise eleitoral, agradecia que me respondesse a esta questão.
Porém, tenho uma segunda questão que se prende com aquela outra que o Sr. Deputado Carlos Brito há pouco colocou e que tinha a ver com um eventual desejo do PSD de baixar artificialmente a percentagem de obtenção das maiorias. Nós também chegámos a essa conclusão e o PSD, provavelmente também chegou. Não é difícil! É, com efeito, possível vir a obter maiorias na ordem da percentagem de 38% ou 39% dos votos expressos.
Mas, mais grave do que isso - e a minha pergunta é exatamente esta-, e saber se o PSD e o Governo têm a consciência de que, com esta proposta eleitoral, aumentam drasticamente a probabilidade de um partido vir a ter uma expressão maioritária ao nível da Assembleia, em termos de deputados, não tendo obtido a maioria dos votos expressos.
Esta questão é de grande importância e há que saber se o PSD tem consciência de que, com esta proposta eleitoral, aumentou drasticamente a probabilidade de isto vir a acontecer. Ou seja, um partido que não tem a maioria percentual dos votos expressos pode vir a ter a maioria dos deputados na Assembleia.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral prescindiu do pedido de esclarecimento.
Não havendo, portanto, mais pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima para responder, se desejar, às perguntas que lhe foram feitas.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Brito: Disse V. Ex.ª, Sr. Deputado Carlos Brito, que nas projecções que eu vi - e V. Ex.ª também viu - não havia uma capaz de prejudicar o PSD e que, por norma, até havia um favorecimento dos grandes partidos. Isto é, V. Ex.ª declarou que nunca viu qualquer aplicação que prejudicasse o PSD e que, portanto, todas elas, de uma maneira geral, prejudicam os pequenos partidos.
O Sr. Deputado Carlos Brito sabe perfeitamente que todos os sistemas eleitorais tendem a sobre-representar os grandes partidos e a sub-representar os pequenos. Ora, aquilo que mostrei foi que, perante outras alternativas sugeridas - poderia falar do modelo mais extremo que é o britânico, mas vou pô-lo de parte-tomando o modelo misto com restos, ou o modelo misto com dois votos...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Posso interrompê-lo. Sr. Deputado.
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado, mas peço-lhe que seja rápido porque disponho de pouco tempo.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Obrigado, Sr. Deputado Duarte Lima, pela possibilidade de o interromper, mas e assim que as coisas se podem aprofundar.
Sr. Deputado dei-lhe uma projecção da aplicação da vossa lei aos resultados das eleições para o Parlamento Europeu. E apesar da diferença de percentagem relativamente pequena entre o vosso partido e o PS, este perdia oito deputados e o PSD perdia apenas um. Como vê, o favorecimento dos partidos não é igual. Peço-lhe, pois, que explique esta questão.
O Orador: - Eu ia explicar, Sr. Deputado.
Portanto, como eu dizia - para não interromper a minha linha de raciocínio -todos os sistemas tendem a sobre-representar os grandes partidos e a sub-representar (a minorar) os pequenos partidos. E repare: o exemplo que referiu pode ser verdade, mas também pode não ser verdade!
Então, de que é que tudo depende, Sr. Deputado Carlos Brito? Não é do sistema. E já aí o vosso equívoco. Depende, sim, da distribuição regional e da concentração dos votos. Porque isso que o senhor diz que pode acontecer com o novo sistema no Parlamento Europeu -e é verdade! -, pode acontecer com o sistema actual. Aliás, fiz a demonstração de que, neste sistema, é possível ter uma proximidade grande de votos como acontece com o PRD e como acontece com o CDS - uma diferença só de 0,6% (4,3%, 4,9% de votos, respectivamente) - e, no entanto, o PRD ler mais 75% de deputados. Contudo, V. Ex.ª não mudou de lei! E quer saber mais. Sr. Deputado Carlos Brito, para ver que não é automática, dessa maneira, a repercussão do sistema eleitoral nos partidos?
Para haver cataclismos dentro de um partido não foi preciso mudar de sistema eleitoral. Por exemplo, o PRD surgiu de repente como grande partido e nas eleições seguintes apareceu, apenas, com sete deputados... E não houve mudança de sistema eleitoral! O que é que aconteceu aqui? Houve apenas mudança do sentido dos votos dos eleitores porque e este o condicionamento último e principal da dimensão dos partidos! E a isto ninguém foge!
Aplausos do PSD.
Depois, quero dizer-lhe, Sr. Deputado Carlos Brito, que não tenho conhecimento, através de qualquer estudo que se tenha realizado, que seja possível com 38% obter a maioria de deputados. Isso é uma situação totalmente ilusória! Se o Sr. Deputado me disser que um partido, teoricamente, concentra os votos todos no círculo de Lisboa e não tem nenhuns em Bragança, tem todos os do círculo do Porto e não tem nenhuns na Guarda, etc., poderá ser... Isso é diferente, Sr. Deputado, mas suo situações que só suo concebíveis...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Mas é concebível num cenário de 38,5%!
O Orador: - Srs. Deputados, no que respeita a cenários, VV. Ex.ªs podem traçar todos quantos quiserem! Mas eu acho que aquilo que é realista é fazer projecções com base em resultados de eleições conhecidas. Foi isso que eu fiz. Este é o principal argumento! Além de que também isso tem os seus limites porque nós não lemos conhecimento, no passado, que algum resultado se repita de eleição para eleição. E quando se faz a aplicação dos modelos - e é por isso que a aplicação dos modelos, depois das eleições, nunca corresponde àquilo que efectivamente acontece porque os resultados são sempre diferentes - as coisas variam radicalmente. E os Srs. Deputados estuo a subvalorizar uma coisa: a capacidade demonstrada na prática que o eleitorado sempre tem de
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reagir, de se conformar aos novos sistemas eleitorais, às novas opções de voto que os sistemas eleitorais lhe conferem. Isto é um facto que os senhores estilo a descurar porque estão a partir do princípio da cristalização das opções do eleitorado. São, afinal, os próprios Srs. Deputados que reconhecem que estilo a partir do princípio de que o vosso próprio eleitorado não mudará! De facto, não percebo qual a vossa preocupação! Os senhores passam a vida a dizer que o PSD já perdeu a maioria, que o PSD já perdeu o apoio popular, que o PSD já nunca mais repete os mesmos resultados de 1987. Então, se nós perdemos a maioria, se a maioria está no Partido Socialista, qual é o vosso problema? Os Srs. Deputados não tem que ter problemas!
O Sr. Narana Coissoró (CDS):-É que chega aos 38% e tem a maioria absoluta!
O Orador: - Ó Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex.ª não me deixa falar!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Fale, fale!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Duarte Lima, queira continuar porque está a contar o seu tempo.
O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Brito fala também na batota eleitoral. Ora, esse é um argumento que ciclicamente é adiantado quando se fala na redução dos círculos. Portanto, reduzir círculos é uma forma de fazer batota eleitoral!
Lembro a VV. Ex.ªs que alguns dos paradigmas democráticos, aqui invocados, são dos países que tem o círculo mais reduzido de todos, que é o círculo uninominal. E, apesar de esse ser o círculo mais pequeno de todos, aí ninguém fala em batota eleitoral!
Na Grã-Bretanha, lemos círculos uninominais de uma volta; na França, temos círculos uninominais com duas voltas! E o círculo eleitoral nesses países é mais reduzido que aqui. Os senhores estarão a chamar batoteiros aos Ingleses? Ou aos vossos amigos do Partido Socialista francês? Ou aos Alemães? Por amor de Deus! Isso não é um argumento sério, não é um argumento racional.
Sr. Deputado Carlos Lilaia, muito obrigado pelo seu cumprimento sobre a qualidade das minhas intervenções. Eu também aprecio muito as suas, mas normalmente digo-o na própria sessão. Porém, o Sr. Carlos Lilaia, normalmente gosta da minha intervenção na sessão seguinte e nunca na própria sessão! Mas eu já estou habituado a isso e, portanto, não levo a mal o carácter enfadonho que encontrou nela.
Risos.
Como disse, parte das coisas que respondi ao Sr. Deputado Carlos Brito são também passíveis de lhe ser respondidas a si.
Há muitos ensaios que podem ser feitos. A vossa preocupação, Sr. Deputado Carlos Lilaia, resume-se a fazer ensaios. Contudo, este problema dos ensaios põe-se para qualquer sistema. E eu demonstrei aqui que, perante outros sistemas adiantados pela oposição, as consequências seriam mais benéficas para o PSD e mais gravosas para os pequenos partidos, seja no sistema misto com restos seja no sistema misto com dois votos.
Agora, o fundamental que nós temos hoje que discutir são os princípios, Sr. Deputado Carlos Lilaia! E em relação aos princípios os Srs. Deputados não dizem o que quer que seja! Discutam se os princípios estão ou não em causa!
O Sr. Carlos Lilaia (PRD):-Permite-me que o interrompa?
O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas agora não dou licença porque não tenho tempo.
Mas virem-me, agora, dizer que se fizeram ensaios!...
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - A maioria com 38%! Responda à questão!
O Orador: - Respondo à questão. É impossível, Sr. Deputado Carlos Lilaia, ter a maioria absoluta com este modelo, com 38%. Provo-lhe matematicamente.
Essa é uma das perguntas que os senhores fazem.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Mas responda à pergunta!
O Orador: -Ó Sr. Deputado Carlos Lilaia, esse é um problema que se coloca aos partidos: terem ou não eleitorado. Eu já lhe fiz ver que os Srs. Deputados não precisam de mudar a lei eleitoral para desaparecerem. Não vai ser por causa desta lei que vão desaparecer, porque o Partido Socialista já diz, publicamente, que vos quer fazer desaparecer nas próximas eleições.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Mas, responda à pergunta!
O Orador: - Estou a responder à pergunta, Sr. Deputado! Isto é uma forma de responder à pergunta, Sr. Deputado Carlos Lilaia.
Os Srs. Deputados, com o actual sistema, tom uma sobre-representação em relação ao CDS.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Ainda não respondeu à pergunta!
O Orador: - Estou a responder-lhe. O senhor não ouve, não percebe ou não quer perceber! O seu partido está a ser beneficiado com o actual sistema, em relação ao CDS, porque o CDS devia ter mais três deputados do que aqueles que tem. Como é que o senhor considera não haver injustiça?
O Sr. Carlos Lilaia (PRD):-Esse é que é o problema da Lei Eleitoral!
O Orador: - Não. Esse é o problema de todas as leis eleitorais.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - São os dados do computador!
O Orador: - Não, Sr. Deputado Carlos Lilaia. O vosso computador engana-vos. O computador do Sr. Deputado Carlos Lilaia tem feito muito mal ao PRD, como se viu nas últimas eleições! O problema é que não há nenhum sistema eleitoral perfeito. O senhor queria um sistema eleitoral à medida do PRD. Ora, não é possível fazer um sistema eleitoral à medida do PRD, nem do PSD nem de nenhum partido.
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Portanto, Sr. Deputados, VV. Ex.ªs têm que definir os princípios que querem indicar como passíveis de melhorar esta lei e não ficar pelos ensaios porque, assim, não vamos a lado nenhum.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio ter chegado a altura de fazer um ponto da situação relativamente à condução dos nossos trabalhos.
São 19 horas e 40 minutos e, em termos úteis de debate, temos mais de hora e meia, provavelmente cerca de duas horas.
Temos votações para fazer às 19 horas e 30 minutos, que seria agora. Portanto, estou a fazer a auscultação junto dos líderes das várias bancadas no sentido de ter uma ideia relativamente à continuação dos nossos trabalhos: ou continuar ou, eventualmente, interromper para jantar e recomeçar depois.
No entanto, enquanto se está a fazer essa auscultação, proponho pôr à votação...
Srs. Deputados, estou a dar algumas indicações que, acho, são úteis a todos os Srs. Deputados. Mas, pelos vistos, é muito difícil, hoje, fazermo-nos entender e ouvir.
No entanto, repito, enquanto se está a fazer uma auscultação aos líderes, das bancadas, no sentido de saber como reprogramar a continuação dos nossos trabalhos, que só tem duas hipóteses: ou continuar eventualmente até ao fim ou interromper para jantar.
Entretanto, enquanto se faz a auscultação, sugeria que se fizesse a votação dos vários diplomas que estão agendados para o efeito.
O Sr. Deputado António Guterres está a fazer sinal no sentido negativo e a Mesa presume, que o Sr. Deputado provavelmente quer sugerir à Mesa que as votações sejam feitas no fim da discussão deste diploma..
Creio que, se não houver objecções, é isso que vai acontecer.
Entretanto, dou a palavra ao Sr. Deputado Hermínio Martinho, para uma intervenção.
Pausa.
Sr. Deputado Hermínio Maninho, agradeço que não inicie a sua intervenção enquanto não estiverem reunidas as condições necessárias ria Sala.
Srs. Deputados, a Mesa aguarda que se faça o devido silêncio, a fim de prosseguirmos os trabalhos.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Sr. Presidente,- a minha interpelação e no sentido de solicitar ao Sr. Deputado António Guterres uma justificação para o adiamento das votações, uma vez que estilo em causa diplomas bastante importantes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Pereira, provavelmente não terá entendido bem: Não se vai proceder à anulação das votações. Elas terão lugar hoje, mas só no momento em que se puder votar também a lei que ainda está em apreciação.
Sr. Deputado Hermínio Maninho, pode, finalmente, iniciar a sua intervenção.
O Sr. Hermínio Martinho (PRD):-Sr. Presidente, admito que alguns Srs. Deputados tenham mais vontade de jantar do que escutar-me!... Nada os impede disso!...
Risos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta apresentada pelo Governo não e uma simples alteração à Lei Eleitoral, mas uma nova Lei Eleitoral que subverte o que está estabelecido na letra e na alma da Constituição Portuguesa.
Revela o Governo, logo na exposição de motivos da proposta de lei, «uma constante preocupação de modernidade, orientada no sentido da compatibilização do sistema proporcional com a garantia de uma maior proximidade na relação do eleitor com o seu eleito».
Em primeiro lugar, a modernidade não tem a ver ou, pelo menos, não tem exclusivamente a ver com essa compatibilização, ate porque ninguém pode assacar ao sistema proporcional a responsabilidade pela inexistente ou deficiente relação entre o eleitor e os eleitos.
Por outro lado, não é criando um círculo nacional de figuras distintas, quais futuros deputados de primeira categoria, qual segunda câmara dentro de uma mesma câmara, que tal proximidade se consegue, já que a eles e destinado o voto de todos os portugueses, ainda por cima divorciando 30 representantes dos seus eleitores directos de uma representação directamente conformada com os seus desejos e interesses.
O que o Governo dá com uma mão-uma pretensa maior proximidade entre os eleitores e os eleitos-, com a redução do número de deputados e com a criação de novos círculos eleitorais, tira com a outra através da criação do círculo nacional e da consagração do sistema de duplo voto.
A proximidade, entre eleitores e eleitos e, pois, um argumento claramente falacioso contra o sistema de representação proporcional, precisamente aquele que, apesar de todos os defeitos conhecidos, melhor traduz a vontade colectiva.
Aliás, a própria justificação de motivos da proposta de lei encerra, em si mesma, monumentais contradições, que denotam o pouco cuidado de quem, em termos de retórica, leve a espinhosa missão de justificar o que não e passível de qualquer justificação.
Diz-se, falando para os incautos, que «importa introduzir no nosso sistema eleitoral um instrumento facilitador da estabilidade e, ao mesmo tempo, factor de afinação e representatividade dos partidos concorrentes».
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas não estão reunidas na Sala as condições necessárias para que possa continuar a sua intervenção.
Srs. Deputados, a Mesa aguarda que se criem as condições ou, então, ver-se-á na obrigação de interromper os trabalhos.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não exageremos!
Pausa.
O Sr. Presidente: - Pode continuar, Sr. Deputado Hermínio Martinho.
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O Orador: - A primeira parte não nos merece grandes comentários, trata-se de um isco necessário para atrair o Partido Socialista, também cie disponível e hesitante para o banquete político da alternância governativa à inglesa. Veremos quem vai morder o isco...
Risos do PSD.
...e, sobretudo, verificar se fica ou não preso ao anzol.
A segunda parte é bem mais complicada, ou seja, mantendo o sistema proporcional, pelo menos na sua forma conceptual, na prática conjungando-o com a configuração dos círculos eleitorais, procura-se distorcer significativamente a representação eleitoral e, pasme-se, aproximando o sistema eleitoral português, em termos de resultados, aos conseguidos pelo sistema maioritário inglês, onde, nas eleições legislativas de 1987, o Partido Social-Democrata, obtendo 9,8% dos votos, elegeu apenas 0,8% dos deputados.
O golpe não podia ser mais perfeito; mantendo o sistema proporcional, conseguem-se resultados idênticos ao do próprio sistema maioritário inglês, já que é seguro que determinado partido viria a conseguir, em Portugal, maioria absoluta com menos de 40% dos votos a nível nacional.
Qual é o conceito de representatividade do Governo quando resulta claro que, da aplicação da sua proposta de lei, são os partidos que hoje já tom uma representação parlamentar superior à sua expressão eleitoral aqueles que mais beneficiam com a presente proposta, reforçando, pois, esta distorção? Que conceito mais enviesado de representatividade dos partidos concorrentes...
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O sistema eleitoral proposto beneficia, na generalidade, os grandes partidos e asfixia os pequenos. A distribuição geográfica das votações, mais ou menos concentrada em determinadas áreas, potencializa a vantagem ou o prejuízo mas não os determina. Um partido com uma votação de 5%, uniformemente distribuída por todo o território nacional, não elegeria, segundo o sistema proposto, nenhum deputado nos círculos locais, obteria apenas um mandato no círculo nacional e mesmo que a votação atingisse os 8% só elegeria um deputado na cidade de Lisboa.
Se a votação for concentrada nos círculos menos populosos, a situação é obviamente ainda mais desfavorável, sendo necessário ultrapassar os 15% para obter 11 mandatos nos 30 círculos propostos. A hipótese de ser reconstituído um círculo nacional que contabilizasse os restos de cada partido 6 obviamente bastante defensável, na medida em que introduziria um mecanismo corrector da desproporcionalidade entre expressão eleitoral e representação parlamentar gerada pela divisão dos actuais círculos.
Que «afinamento» é, então, este em que um partido com 200 000 votos se arrisca a não ver eleito qualquer deputado? Que «afinamento» é este quando dois partidos com a mesma votação se arriscam a eleger um número díspar de deputados?
No fundo, trata-se de uma afinação para beneficiar os partidos com mais de 30% e prejudicar nitidamente os partidos com menos de 10%, como está provado, sem causar grandes problemas naqueles que tenham uma expressão eleitoral entre os 10% e os 30%.
Ao nível da configuração dos novos círculos eleitorais, nacional e locais, aliás, nenhum outro critério foi utilizado que não, seguramente, o da implantação dos partidos em geral e do PSD em particular.
Se o sistema proporcional e o método da média mais alta de llondi, por si só e, ainda por cima, associados à eleição, não por um círculo nacional único mas por 22 círculos eleitorais, já criam distorções na representatividade - e vou lembrar o exemplo há pouco recordado pelo Sr. Deputado Duarte Lima, que é o facto de o CDS, com apenas menos 0,6% de votos que o meu partido, nas últimas eleições, ter menos três deputados -, este distorce 75%.
Mas também não é menos verdade, Sr. Deputado Duarte Lima, que o meu partido, apenas com 5%, elegeu sete deputados e o seu, com 50%- 10 vezes mais votos -, elegeu 21 vezes mais deputados. Esta e a situação mais distorcida e também fica bem citar!.
O Sr. Duarte Lima (PSD):-Com o mesmo sistema actual!
O Orador: - Exactamente! Imagine-se, pois, os efeitos que produziria no mapa eleitoral e no nosso sistema político este projecto!...
O Partido Socialista tem criticado a proposta do Governo como autêntica «engenharia eleitoral» mas, sabendo todos nós que, em regra - e, infelizmente, nem sempre respeitada-, antes dos engenheiros devem ter a palavra os arquitectos, não será descabida a questão de saber se, hoje, o PS pretende referir-se a algumas «fachadas» arquitectadas na revisão constitucional. O certo e que o desenho (bonito e agradável à vista, como se quer) saído das réguas, dos esquadros e dos compassos do Governo e do PSD é completamente alheio às características sócio-económico-culturais das diversas regiões do País.
A proposta do Governo é nesta óptica destruída pela simples observação da vivência diária no espaço dos pretendidos novos círculos, a começar com o facto de estes não corresponderem a unidades regionais (baseadas no sentimento de co-territorialidade das populações), mas apenas a circunscrições com um menor número de eleitores.
Em especial no distrito de Lisboa, a pretensão de criar tais unidades é manifestamente utópica num quadro legislativo (eleitoral) como o português. Não existe qualquer identidade regional entre concelhos como Cascais e Sintra ou como Loures e Vila Franca de Xira, uma vez que as características destas áreas têm sido delineadas em função da cidade de Lisboa e da expansão da área metropolitana e não das restantes unidades administrativas limítrofes, o que determina ligações (transportes, migrações, actividades laborais e de lazer) polarizadas por Lisboa.
Basta lembrar, a título de exemplo, que para ir de Vila Franca de Xira a Loures é muito mais fácil vir primeiro a Lisboa. Mesmo no interior da cidade de Lisboa a territorialidade é compartimentada: dificilmente se encontrariam candidatos que fossem igualmente identificados com os habitantes de Telheiras, da Mouraria, de Cheias, da Lapa, do Restelo ou da Musgueira.
Os círculos distritais ganharam a credibilidade que a História confere, quaisquer outros suo arbitrários, na medida em que não decorrem de um processo de alteração da actual divisão administrativa do País.
É sabido, por outro lado, que a estrutura organizativa dos diferentes partidos tem uma base geográfica que recorre ao actual distrito, por razões que suo mais de ordem eleitoral do que administrativa e muito menos por qualquer outra motivação.
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Não temos dúvidas de que os novos círculos eleitorais propostos viriam a determinar alterações substanciais na base geográfica organizativa das principais forças políticas, levando, necessariamente, à formação de novas «distritais». Ou seja, ao mesmo tempo que procuravam atender-se os desejos de perpetuação de maiorias artificiais e de bipartidarismo, ajudavam-se a resolver alguns problemas organizativos do partido do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em todo este processo há algo de muito contraditório e chocante. Ao mesmo tempo que se avança com um álibi politicamente inquestionável como justificação para procedimentos ético e politicamente reprováveis, o Governo e o partido que o apoia cria mais sérias dificuldades e os maiores obstáculos ao avanço do processo de regionalização do País e à criação das regiões administrativas, constitucionalmente previstas.
A regionalização traria consigo e como consequência política natural o aprofundamento da democracia ao propiciar o maior contacto, a maior proximidade e, sobretudo, o maior controlo político dos eleitores sobre a acção dos eleitos. Sobre tais questões o Governo continua nada dizendo e tudo entravando, ao contrário, prefere fazer aquilo que, na sua óptica, lhe é mais fácil e muito mais rentável, menosprezando os desejos e os interesses dos eleitores de vastas regiões ao mesmo tempo que prejudica o País como um todo, não deixando criar e implementar a orgânica administrativa não tutelada que, como a experiência demonstra, é factor inquestionável de progresso e bem-estar social.
As consequências políticas de um sistema eleitoral como o que foi proposto são múltiplas e vão desde alterações imprevisíveis nos critérios de decisão de voto até a questões que se prendem com a ética política.
A legislação proposta pelo Governo favoreceria a consolidação de um espectro partidário bipolarizado no que respeita ao acesso ao executivo e tripolarizado na representação parlamentar.
A «asfixia» do PRD e do CDS e a impossibilidade de outros partidos chegarem ao Parlamento permitiria ao PSD e ao PS deslocações conjunturais mais à direita ou mais à esquerda, sem que corressem o risco de perder parcelas significativas do seu eleitorado que, na pior das hipóteses e na falta de alternativas, só teriam a abstenção como recurso.
A produção de legislação eleitoral em vésperas, mais ou menos próximas, de eleições cria precedentes que poderão vir a pôr em causa, no futuro, a democraticidade dos actos eleitorais e, consequentemente, a sua inteira legitimidade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PRD votará, naturalmente, contra a proposta do Governo.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Que desgosto!
O Orador: - Fazemo-lo por duas ordens de razões: a de que os princípios da proporcionalidade e da representatividade não podem ser postos mais em causa do que, aliás, já são com o método da média mais alta de Hondt e com o actual número e configuração dos círculos eleitorais, como, penso, já ficou provado; e a de que o princípio da maior proximidade entre os eleitores e os eleitos num sistema proporcional como o nosso e que deverá manter-se só poderá ser conseguido dando aos eleitores a possibilidade de escolha entre os vários candidatos de uma lista.
Tomamos esta posição por imperativo moral, mais do que político. O que está verdadeiramente em causa. Sr. Presidente e Srs. Deputados, e o futuro da democracia em Portugal!
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Brito, quero informar que, pela auscultação que a Mesa fez às várias bancadas, não vamos interromper os trabalhos.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quando no dia 4 de Maio o Primeiro-Ministro Cavaco Silva anunciou, de supetão, que o Governo tinha uma proposta para a Assembleia da República, promovendo uma profunda reconversão dos círculos e da distribuição dos deputados por círculo, logo se percebeu que não se tratava de uma proposta politicamente séria.
O Primeiro-Ministro falava, enfaticamente, de «melhorar a eficácia do nosso sistema político», de promover a aproximação entre os deputados e os eleitores» e até generosa e inesperada preocupação em «criar melhores condições de trabalho para os próprios parlamentos». Tudo palavras, só palavras, como veremos!
A realidade é outra completamente diversa. A realidade e que o PSD, depois de ter claudicado seriamente nas eleições para o Parlamento Europeu, registou uma severa derrota nas eleições para as autarquias locais, deixando de ser o partido mais votado e ficando com menos 36 presidências de câmara, algumas das quais nas cidades mais importantes do País.
A realidade são as dificuldades experimentadas desde então pelo Governo, a remodelação inconsistente, a demissão de ministros e secretários de Estado, a perda de credibilidade em áreas significativas da população, a redução da base social e política de apoio.
A realidade e que tudo isto acontece quando estamos a cerca de um ano de novas eleições para a Assembleia da República, onde o Governo e o PSD tudo apostam e tudo jogam, uma vez que em relação as presidenciais não encontraram ate agora melhor estratégia do que desistir de apresentar candidato.
É nesta realidade especialmente inóspita para quem contava ter o império do Governo por muitas décadas que a lei eleitoral de Cavaco Silva foi urdida ao computador para compensar o assustador declínio eleitoral do PSD. Faz parte do grande plano «laranja» para as legislativas de 1991, tal e qual como o sumptuoso programa de inaugurações de obras públicas, as promessas demagógicas e a satisfação de algumas justíssimas reivindicações sociais a que o Governo, friamente, voltou-as costas nestes últimos anos.
O Sr. João Amaral (PCP): - É isso! É isso!
O Orador:-Um mês decorrido sobre as revelações do Primeiro-Ministro acerca da sua miracolosa proposta de revisão da lei eleitoral, esta está virada do avesso e as contas secretas do PSD postas a descoberto através de um intenso e louvável debate, promovido e participado não só pelos partidos da oposição mas também por diversos órgãos de comunicação social e diferentes movi-
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mentos de opinião pública. Confirma-se, em conclusão, que não se trais apenas de uma proposta pouco séria, mas de uma verdadeira burla eleitoral por via legislativa.
Vozes do PC P: - Muito bem!
O Orador: - As diversas projecções vindas a público, da mais diversa proveniência e feitas com base em diversas eleições, mostram que o PSD nunca é prejudicado e é quase sempre generosamente bonificado pela sua lei no processo de transformação dos votos em mandatos, enquanto os partidos de menor representação parlamentar são sempre severamente penalizados, praticamente banidos de São Bento, e o próprio PCP 6 duramente atingido. Isto é tão flagrantemente assim que a proposta «laranja» tem sido justamente designada como a arte de obter mais deputados com os mesmos votos. Pode até dizer-se, sem exagero, que é a arte de obter mais deputados com menos votos. Algum mistério tem que haver para que isto aconteça.
A grande finalidade da proposta do Governo é, no entanto, a de permitir que o PSD alcance uma maioria para governar, mesmo sofrendo uma severa redução da sua votação.
O objectivo fixado pelo congresso do PSD de repetir a maioria absoluta em 1991 não tem qualquer espécie de credibilidade, nem mesmo para os mais fogosos cavaquistas do comité de estratégia, se essa maioria implicar uma votação de 44% ou 45% dos sufrágios. Mas os estrategas e mesmo cavaquistas mais moderados, já pensarão de modo diferente se a exigência para a maioria baixar para 38% ou 39%.
O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Desta forma e procedendo como aquele campeão olímpico de salto em altura que, ao verificar, no declínio da idade, que não conseguia atingir antigas marcas, propôs a alteração do sistema métrico,...
Risos do PS.
... os estrategas do PSD lançaram-se à elaboração de uma proposta para alterar o sistema eleitoral. A proposta representa, neste sentido, uma confissão de derrota em relação ao anunciado propósito de Cavaco Silva, que era, como nos lembramos, «transformar num planalto o pico eleitoral de 1987».
O que o Governo faz agora é aproveitar a redução do número de deputados, feita pela segunda revisão da Constituição, que, já por si, prejudica a proporcionalidade na transformação de votos em mandatos e o pretexto que ela confere de pôr as mãos na lei eleitoral para promover uma operação de engenharia eleitoral muito mais profunda. De caminho, pretende consagrar o círculo nacional com a fisionomia e o tamanho que melhor se adaptam às conveniências eleitorais do PSD.
Os mais perversos mecanismos da batota residem, no entanto, na manipulação dos círculos eleitorais (e da distribuição dos deputados por círculo) com a tentativa de acabar com o critério objectivo da divisão de os círculos corresponderem aos distritos do continente e às regiões autónomas e substituí-lo pelo critério subjectivo de corresponderem às conveniências eleitorais do PSD: nuns casos, manutenção dos distritos, noutros, a criação arbitrária de aglomeração de concelhos.
Os escandalosos resultados desta técnica podem ser claramente demonstrados com u evidência dos números. Tomemos as eleições para o Parlamento Europeu de 1989, para que o deputado Duarte Lima não diga que só falamos dos resultados de 1987, que jamais voltarão a repetir-se, e consideremos apenas os deputados eleitos no território nacional. Teríamos com a lei em vigor e sem redução do número de deputados o seguinte resultado: CDU -35; PS -81; PSD -93; CDS - 34; PPM -2 e MDP -1.
Com a proposta de lei do Governo, incluindo a redução para 230 deputados, o resultado seria: CDU - 31 (-4); PS -73 (-8); PSD -92, (-1); CDS-30 (- 4), os outros desapareciam. Isto é, apesar da redução de 20 deputados, o PSD manteria os seus (perdia apenas um, isto é, ganhava objectivamente) à custa de todos os outros partidos. O milagre reside na manipulação dos círculos, pois, se o cálculo for feito com a redução do número de deputados mas não alterando os círculos eleitorais, o resultado já seria: CDU - 33; PS - 73; PSD - 86 (só); CDS - 32; PPM- 1; MDP- 1.
O Sr. Silva Marques (PSD): -O MDP, outra vez?!
O Orador:-Tais suo os mecanismos da batota!
A proposta governamental de alteração da lei eleitoral, apresentada agora, a cerca de um ano das eleições, está concebida não para dar expressão à vontade do eleitorado mas para ludribiá-la; é uma proposta urdida não para corresponder ao sentido da votação popular mas para contrariá-lo; é uma proposta claramente inconstitucional por violar, por múltiplas formas, a regra da representação proporcional; é uma proposta flagrantemente antidemocrática, que terá, da parte do PCP, um decidido voto de rejeição.
Aplausos do PCP.
Chegados a este ponto está completamente desvendado o sentido que o Governo/PSD atribuí ao alegado propósito de «melhorar a eficácia do nosso sistema político», através desta proposta de batota eleitoral.
Nas suas linhas essenciais seria:
1) A «perpetuação do PSD no Governo; não seria tão-pouco a facilitação abstracta da formação de maiorias de Governo, o que já seria eticamente antidemocrático com os métodos denunciados; seria um fato feito por medida e adaptado ao corpo eleitoral do PSD;
2) A acentuação da bipolarização com a característica singular de um dos pólos ser «eternamente» Poder e o outro «eternamente» o primeiro partido de oposição;
3) A drástica redução da representação parlamentar do PCP;
4) O esmagamento dos partidos de menor expressão parlamentar, com a ameaça de exclusão definitiva de São Bento e a hegemonização de toda a direita pelo PSD;
5) O impedimento prático do acesso de novos partidos à Assembleia da República, com a criação, de facto, de barreiras de entre mais de 5 % e 21% nos círculos regionais e de cerca de 3% no círculo nacional, abaixo das quais se não elege, enquanto até agora era possível eleger no círculo de Lisboa apenas com 1,2%.
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É evidente que esta rigidificação artificial do quadro partidário-parlamentar não favorece de maneira' nenhuma e contraria fortemente a aproximação entre o deputado e os eleitores. Alargaria consideravelmente, desde logo, a faixa da população que não se reconhece representada na Assembleia da República, o que numa jovem democracia como a nossa e num País onde os preceitos antiparla-mentares são reconhecidamente fortes é absolutamente indesejável.
A maior aproximação entre os deputados e os eleitores não se opera, ao contrário do que certa propaganda procura inculcar, nem pela redução do número de deputados nem, tão-pouco, pela existência de círculos uninominais: As figuras de ridículos deputados carreiristas, clientelistas, caciquistas, recriados por alguns dos nossos maiores escritores do século passado, como Eça, Camilo/Júlio Dinis, eram precisamente de produtos de círculos, uninominais. Este sistema vigorou também na I República e sabe-se que o resultado não foi brilhante.
Assembleia aproxima-se do eleitorado do deputado dos eleitores através do seu trabalho positivo, no que a Assembleia respeita pela capacidade de dar resposta aos grandes problemas nacionais; no que respeita aos deputados pela capacidade de darem voz às aspirações, reclamações e justas reivindicações daqueles que os elegeram. Em ambos dos casos pela capacidade de fazer justiça.
A propósito de tudo isto muito teríamos de nos interrogar; a propósito, por exemplo, do diálogo das comissões parlamentares com as populações ou a propósito do funcionamento da Comissão de Petições.
Da parte do Grupo Parlamentar do PCP, temos feito múltiplas propostas visando o objectivo de aproximar os deputados dos eleitores. Lembro, entre outras, a da criação de delegações da Assembleia da República nos círculos eleitorais, como um ponto de encontro permanente entre os deputados e os eleitores. A sorte de muitas destas propostas tem sido a de serem chumbadas pela maioria do PSD.
A Lei Eleitoral para a Assembleia da República não pode ser responsabilizada -e não o foi aqui hoje -com fundamento credível pelos males que afectam o País ou as dificuldades com que se tem confrontado o nosso sistema político. A lei tem correspondido com flexibilidade e rigor aos grandes movimentos do eleitorado e às soluções que decorrem da sua vontade expressa. Os que procuram responsabilizar a lei eleitoral e impor-lhe drásticas alterações encontram-se, em geral, em dificuldades e procuram atingir fins inconfessáveis, como agora acontece. O PSD só acordou para a necessidade de alterar a lei eleitoral depois da clamorosa derrota nas eleições autárquicas e quando estamos a um ano das novas legislativas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Isto é reconhecido, por exemplo, num artigo da autoria do Sr. Deputado Pacheco Pereira e confirma plenamente as nossas afirmações.
Salientamos lambem que não havia nenhuma boa razão que justificasse a redução do número de deputados, feito na revisão da Constituição, de 250 para 230 ou 235. O direito eleitoral comparado mostra que somos, de entre os países da Europa com dimensões e população idênticas ao nosso, um daqueles em que é maior o número de habitantes por representante parlamentar. Tudo recomendaria, depois de umaa ditadura de meio século, que esta proporção fosse reduzida. Ao contrário disso, o Governo e o PSD, neste caso com a colaboração do PS, cedendo às preconceituosas campanhas da direita antiparlamentar, resolveram agravá-la.
Na proposta de lei em apreciação o Governo vai mais longe: escolhe o limite mínimo, ou seja, os 230 e não os 235 deputados. Votaremos contra a disposição que o propõe. O objectivo único é adulterar o sistema de representação parlamentar. Recusamos, a este propósito, as insinuações das campanhas governamentais no sentido de que se trata de diminuir as despesas com a máquina do Estado. Quem se aumentou e aumentou recentemente todos os titulares dos cargos políticos em 56 % e comete diariamente grandes liberalidades com as suas clientelas não está preocupado com as despesas.
Vozes do PCP:-Muito bem!
O Orador: - Não podem passar sem registo a arrogância e a truculência com que membros do Governo e líderes do PSD tem defendido a proposta governamental, o que indica nervosismo e consciência pouco tranquila, nem os apelos que fazem agora, uma vez desvendadas as motivações, as maquinações e os truques que cia comporta, a que os partidos da oposição apresentem alternativas, particularmente em relação à composição dos círculos. Quanto a nós, o que o Governo pretende como resultado mínimo é que haja um consenso para pôr em causa o critério objectivo que na lei em vigor preside à divisão dos círculos - a sua correspondência com os distritos do continente e as regiões autónomas.
Pela nossa parte, dizemos não às alternativas. Além disso, como afirmámos, o Governo não produziu uma única razão séria para alterar a lei eleitoral e o texto que apresentou é uma burla.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O PS, pelo seu lado, afirmou a sua indisponibilidade para discutir qualquer alteração dos círculos eleitorais antes que a regionalização avance e estejam constituídas as regiões administrativas. Pelo nosso lado, não estabelecemos uma ligação entre a regionalização e a lei eleitoral. Mas, se a posição do PS significa que só encara discutir a substituição dos círculos actuais que estão vinculados a uma unidade administrativo-territorial quando os distritos desaparecerem e for criada a possibilidade de os vincular a outra unidade da mesma natureza - as regiões administrativas-, tem o nosso acordo nesse ponto.
Não temos dúvidas de que o Governo e o PSD-já o declararam - vão querer fazer da sua derrota um capital de queixa, como é típico do cavaquismo. Não temos dúvidas de que este é apenas um primeiro round.
É extremamente positivo para o País e o regime democrático que este primeiro round termine com o chumbo da tentativa de alteração batoteira da lei eleitoral.
Aplausos do PCP e do deputado independente Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): -Sr. Deputado Carlos Brito, disse o Sr. Deputado que a proposta do Governo
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pretende remodelar profundamente os círculos eleitorais, tendo também afirmado que ela não é uma proposto séria. O que não é sério é a sua afirmação, Sr. Deputado, porque a proposta do Governo não pretende, até porque nem pode, remodelar profundamente os círculos eleitorais.
Por outro lado, o raciocínio do Sr. Deputado, decerto completamente perdido no seu verbalismo oposicionista, ao ponto de considerar que o deputado que mais trabalha é aquele que mais próximo está do eleitorado - e já nem falo dos deputados do Partido Comunista, que sei serem obreiros incansáveis -, levaria a que tivéssemos hoje entre nós o Sr. Deputado Magalhães Mota, que, como sabe, era o campeão dos requerimentos, mas que já cá não está, nem sequer integrado no PRD.
Como vê, os seus argumentos não têm nada a ver com o que estamos a discutir.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Relativamente à matéria em apreço, só para demonstrar que o Sr. Deputado não tem qualquer razão e que, no fundo, o que está subjacente e é determinante para a representação política parlamentar é o voto do eleitorado e a forma como ele se comporta, quero fazer-lhe uma demonstração que se relaciona com a tal comissão encarregada pelo então Primeiro-Ministro Mário Soares de alterar a lei. O Sr. Deputado Almeida Santos veio hoje aqui dizer que essa comissão não tinha trabalhado, mas a verdade é que trabalhou e muito bem. Os seus colegas socialistas irão relatar-lhe o que estou a dizer e ele virá aqui novamente defender a consideração, mas o que é certo é que essa comissão trabalhou. De outra forma, teria com certeza aceite o mandato com a reserva mental de não ter trabalhado. Mas trabalhou e tenho aqui alguns documentos desses trabalhos relativos a propostas quer da parte do meu colega António Capucho quer da parte dos socialistas.
As nossas propostas baseavam-se em dois modelos: a hipótese Aça hipótese B. Os socialistas trabalharam na base de três hipóteses: a A, a B e a C.
Com base nos resultados eleitorais de 1983, em que a APU obteve 18,2% e 44 deputados, verifica-se que, a aplicar-se a hipótese A dos socialistas, que previa círculos que elegessem um máximo de três a sete deputados, mantendo a composição da Assembleia nos 250 deputados, o PCP manteria 43 deputados e 17,2 % da composição parlamentar e que se fosse utilizada a hipótese B dos socialistas, mais drástica, que previa um máximo de dois a quatro deputados por círculo, mesmo assim o PCP manteria 31 deputados e 15,6% do universo parlamentar.
O Sr. José Lello (PS): -Essa não é a B!
Vozes do PS:- É a C!
O Orador: - É a hipótese B então avançada pelos socialistas.
Nós sempre fomos muito mais moderados do que os senhores, porque a vossa terceira hipótese baseava-se em círculos uninominais, onde o PCP, de facto, seria relativamente esmagado: passaria para 28 deputados e 14,1 % do universo parlamentar.
Como vê, Sr. Deputado Carlos Brito, é na base destas questões que o assunto em apreço deve ser tratado. O Sr. Deputado deveria utilizar os trabalhos preparatórios feitos pelos socialistas, porque eles elucidariam esta questão e fariam com que o Sr. Deputado tivesse menos medo dos próximos resultados eleitorais e, sobretudo, do Alentejo, que vai modificar-se mas provavelmente não tão depressa como o Sr. Deputado receia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP) : -Sr. Deputado Silva Marques, o que neste momento nos preocupa não são as hipóteses de 1985, porque essas já lá vão...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Refiro-me aos estudos feitos por nós e pelos socialistas!
O Orador: - O que me preocupa não suo esses estudos nem essas hipóteses mas, sim, a proposta apresentada pelo Governo, que os senhores tão calorosamente defendem. Em relação a essa proposta de lei e às acusações que lhe fiz, pondo em causa a seriedade política dos seus critérios, o Sr. Deputado Silva Marques responde nada, quando há pouco o Sr. Deputado Duarte Lima respondeu quase nada.
osso dizer-vos, falando francamente, que o único argumento serio produzido pela bancada do PSD e pelo Governo no decorrer do debate de hoje foi o de considerar a injustiça decorrente da actual Lei Eleitoral, que penaliza o CDS em relação ao PRD.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Isso é profundamente verdade!
O Orador: - Foi a única coisa séria que os senhores conseguiram dizer. O resto é fantasia, não tem nada a ver com o que estamos a discutir.
Em relação à questão central que aqui está colocada, nós dizemos que esta proposta de lei não é uma proposta séria mas uma proposta que altera os círculos eleitorais com vista a beneficiar apenas o PSD, a conservar o PSD no governo, a fazer baixar a fasquia da maioria absoluta para que o PSD, com 38 ou 39%, possa atingi-la e cativar o eleitorado com essa perspectiva.
O Sr. Duarte Lima (PSD): Isso não é possível, é uma ilusão!
O Orador: - É disso que estamos aqui a acusar o PSD e os senhores não dão nenhuma resposta à nossa acusação, o que a confirma plenamente. É certo que não é uma proposta séria, mas uma burla!
Vozes do PCP: -Muito bem!
O Orador: - Quanto à questão da aproximação dos deputados ao eleitorado, creio que essa é uma preocupação de todos nós. Não disse que é aquele deputado que trabalha e faz 600 requerimentos por sessão legislativa que mais se aproxima do eleitor. Mas decerto não é com a governamentalização da Assembleia da República, nos termos em que os senhores a tem feito e com o impedimento de que a Assembleia da República tome medidas, como propusemos, por exemplo, com as tais delegações da Assembleia nos círculos eleitorais, que os
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deputados se aproximam do eleitorado, para que possam viver mais directamente e estar mais abertos aos problemas do País. Essa nossa proposta, que foi chumbada pelos senhores, ia no sentido daquilo que alegadamente defendem ao apresentar esta proposta de lei eleitoral mas que realmente não está nas vossas preocupações. Esse é um mero slogan para fazer passar por debaixo da mesa uma proposta que tem objectivos completamente opostos àqueles!
O objectivo desta proposta é o da «eternização» do PSD no Governo. Ponho, naturalmente, eternização entre aspas porque o Governo cairá porventura nas próximas eleições.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - E o que é que pensa daquilo que estava a ser preparado por Almeida Santos e António Vitorino?
O Orador:-Já lá vamos, Sr. Deputado!...
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, lamento ter de invocar a figura regimental da defesa da consideração, mas não posso deixar de referir um facto que deve ser aqui bem explicado.
O Sr. Deputado Silva Marques resolveu invocar também a figura da defesa da consideração em relação à sua bancada e, paradoxalmente, não se coibiu de, durante essa defesa, lançar um conjunto de impropérios e mentiras relativamente ao meu partido.
Quero aqui dizer que não é verdade aquilo que o Sr. Deputado Silva Marques referiu em relação a um militante do meu partido, que esteve durante muitos anos na Assembleia da República e que entendeu, de uma forma que o meu partido considera perfeitamente salutar, interromper a sua actividade política e desenvolver a sua própria actividade profissional, que é também uma forma de ele poder contactar com o País real. E naturalmente que isso faria muito bem ao Sr. Deputado Silva Marques, para muitas vezes não cometer os erros e as incorrecções que aqui comete.
Está feito o reparo, Sr. Presidente, e dou este incidente por encerrado.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD) : - Sr. Deputado Carlos Lilaia, eu quis fazer tão só uma referencia inofensiva a um caso paradigmático de «papelada», sendo certo que por vezes se confunde ligação política com produção de papéis, sem desprimor para a qualidade cívica e parlamentar do Sr. Deputado Magalhães Mota. Quis apenas pôr em evidência que o eleitorado não se deixa enganar e que não e pelo facto de se esbracejar ou fazer papeis que o eleitorado vai a correr atrás das pessoas.
O que eu quis dizer foi, isso sim, que quando os socialistas prepararam...
O Sr. Presidente: - Desculpar-me-á que o interrompa, mas o Sr. Deputado está a afastar-se da figura regimental ao abrigo da qual se encontra no uso da palavra.
O Orador: - Certo, Sr. Presidente.
O que eu quis dizer, isso sim, foi que noutro momento histórico se fizeram trabalhos preparatórios - porque se fizeram, contrariamente ao que hoje foi afirmado aqui - com vista à remodelação do sistema eleitoral e se previram hipóteses incomparavelmente mais drásticas do que aquela que a proposta do Governo prevê...
Protestos do PS, do PCP, do PRD e do CDS.
Sobre isso, quer os seus autores quer aqueles que hoje criticam a proposta do Governo, nada dizem! Foi isso o que eu quis trazer à colação, foi essa questão que apresentei ao Sr. Deputado Carlos Brito, com vista a suscitar...
O Sr. Presidente: - Peço mais uma vez desculpa por o interromper, mas ou o Sr. Deputado regressa as explicações que se propôs dar ao Sr. Deputado Carlos Lilaia ou serei obrigado a retirar-lhe a palavra.
O Orador: - O Sr. Presidente decidirá como entender. Se tivermos em consideração tudo o que já se passou, até ao momento, durante esta sessão, devo dizer que, em termos comparativos, estou no âmago da matéria.
Vozes do CDS: - Não está!
O Orador: - Se V. Ex.ª mo permitir, continuarei; se não, retire-me a palavra.
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado desejar continuar a dar explicações ao Sr. Deputado Carlos Lilaia, dar-lhe-ei a palavra.
O Orador: - Desejo sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.
O Orador: - Foi no contexto daquilo que acabei de dizer que fiz uma referência, sem qualquer intuito ofensivo, ao Sr. ex-Deputado Magalhães Mota. Foi tão só no contexto que acabei de definir que fiz tal referência.
Como vê, Sr. Presidente, estou a dar explicações. O que pretendi foi trazer ao cerne da questão o Sr. Deputado Carlos Brito, que a ele fugia, privilegiando um repositório de acusações...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Deputado Silva Marques, para simplificarmos as questões, peço-lhe o favor de me mandar os papéis a que aludiu, para os podermos analisar.
O Orador: - Estes não, Sr. Deputado, porque não os quero perder. Mas terei todo o gosto em lhe remeter fotocópias.
Risos do PSD e do PCP.
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Como vê, é muito bom guardar os papéis. Quem diria que os papéis seriam necessários hoje, nesta sessão, até porque já hoje aqui foi dito que eles nunca existiram?!... Mas existem! Tenho-os aqui e tirarei fotocópias deles, com muito prazer.
Sr. Presidente, terminei as explicações que tinha a dar. Como vê, mantive-me dentro dos parâmetros da figura regimental que estava a utilizar, porque precisei de enquadrar a minha referência ao Sr. Deputado Magalhães Mota. Agradeço-lhe a condescendência que teve para comigo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A iniciativa de revisão da Lei Eleitoral foi, desde o início - todos, agora, já o perceberam -, defendida pelo Primeiro-Ministro e pelo PSD em manifesta atitude de reserva mental.
Não se tratava de adequar os preceitos da Lei Eleitoral à exigência constitucional da redução do número de deputados, com o que, evidentemente, estamos de acordo.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Custou mas foi!
O Orador: - Tratava-se de procurar seduzir o Partido Socialista para uma operação de engenharia eleitoral destinada a mitigar os efeitos da aplicação da proporcionalidade e, portanto, a consagrar, na secretaria, a posição dos maiores partidos à custa dos mais pequenos.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Para o PSD tratava-se, ainda, de alcançar esse objectivo, fundamentalmente à custa da eliminação eleitoral do CDS, já que não logragra essa eliminação nas últimas eleições autárquicas, apesar de toda a sedução e chantagem então efectuadas sobre os autarcas centristas.
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - São, como se sabe, contos largos de contas antigas e, pelos vistos, não saldadas por parte do Prof. Cavaco Silva ao Prof. Freitas do Amaral.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas não será à custa da eliminação política do credor que o PSD deverá resolver o seu défice de credibilidade perante os Portugueses.
Aplausos do PS e do CDS.
O Primeiro-Ministro e o PSD tudo fazem para não ter de revelar a situação de pânico em que se encontram, na sequência dos resultados eleitorais autárquicos e das sondagens que vêm sendo conhecidas.
Face à oposição, limitam-se a ser oposição, no Governo, transformaram-no em comissão técnica eleitoral do PSD.
Aplausos do PS.
E ao fazerem, agora, da revisão da Lei Eleitoral uma dramatização de tal modo forçada, não escondem, antes realçam, o que verdadeiramente está em causa.
Para o PSD, a lei eleitoral não é uma questão de Estado. É, mais prosaicamente, uma questão do Estado «laranja», da sua sobrevivência e da sobrevivência do clientelismo que lhe anda de volta.
Aplausos do PS.
E essa, Srs. Deputados, é a verdadeira motivação do Governo - a da sua permanência no Poder.
Repudiada a proposta de lei por parte de todos os partidos da oposição, os deputados do PSD iniciaram, de imediato, um ataque desabrido contra o PS. E, mais uma vez, não olharam a meios para atingir os fins e, de novo, recorreram aos argumentos «requentados» da suposta violação de compromissos decorrentes da revisão constitucional. Umas vezes acusam o PS de pactos com os comunistas, outras, como agora, de pactos com o próprio PSD - sempre secretos, afinal, e bem guardados, até ao dia em que o PSD resolve tirá-los da gaveta, na silenciosa tumba dos mais inconfessáveis desígnios partidários.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Serão delírios, Srs. Deputados do PSD, ou serão pesadelos?
Srs. Deputados do PSD: quem não se respeita a si próprio não merece o respeito de ninguém.
Aplausos do PS, do deputado do CDS Basílio Horta e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Falem, pois, com verdade, rejeitem a mentira e aceitem discutir, de forma autêntica, os problemas políticos. Não façam da política uma mera técnica de poder. Em Portugal, em 1990, em democracia, tal atitude não passa de uma demonstração de falta de sentido ético, de desrespeito pelas instituições, de desconsideração pelos Portugueses.
Aplausos do PS.
Ora, justamente, o que está em causa é a necessidade de respeitar os Portugueses e a sua vontade, livremente expressa nos termos do sufrágio popular.
Arredar ou comprometer artificialmente a representação política do conjunto das famílias ideológicas presentes na sociedade portuguesa não é forma de garantir um adequado relacionamento entre os deputados e os eleitores, em primeiro lugar porque muitos seriam os milhares de eleitores despojados de representação, porta aberta para o indiferentismo face à vida política, para o absentismo eleitoral e, no limite, para a formação de grupos de pressão, à margem do funcionamento regular das instituições democráticas.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, porque a criação do círculo nacional -nunca defendido pelo PS como solução sua, como sublinhou o deputado António Vitorino neste Plenário, durante a revisão constitucional -, na concepção do PSD, mais afastaria os deputados do contacto com os eleitores e mais incorreria no perigo de subordinação ao domínio centralizado das direcções partidárias.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Em terceiro lugar, porque a diminuição do número global de deputados, acrescida à diminuição da sua distribuição pelo conjunto dos círculos regionais, aumentaria drasticamente o coeficiente entre cada deputado e o correspondente número de eleitores. Se, actualmente, tal coeficiente é da ordem dos 30 000 eleitores por cada deputado eleito, passaria para mais de 40 000 na proposta do Governo. Falar-se ainda, nestas condições, em aproximar os eleitos dos eleitores soa, inevitavelmente, a mero exercício de retórica.
Por tudo isto, todos perceberam que os argumentos do PSD para mais não servem do que para sustentar um facto político inconsequente. Como inconsequente 6 a alegada vontade de modernização parlamentar, já que reformas parlamentares verdadeiramente modernizadores, essas, por parte do PSD, têm sido sempre contrariadas e rejeitadas.
Contrariadas na revisão constitucional, quando o PSD recusou admitir a moção de censura construtiva e, com isso, impediu aperfeiçoar as condições institucionais de estabilidade governativa, sem quebra, aliás, do pluralismo da representação nacional; quando o PSD rejeitou, igualmente, inúmeras propostas de valorização do papel fiscalizador da Assembleia da República; contrariadas, também, pela imposição de procedimentos regimentais, em tudo pensados para obstruir o papel das oposições,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: -... contrariadas pessoalmente pelo Primeiro-Ministro, desde o tempo em que entendeu notificar os deputados do seu próprio partido, nas suas Jornadas Parlamentares - mas de forma pública, para que o País o testemunhasse - de que lhes era vedado conceber estratégias ou prosseguir iniciativas próprias.
É, então, este o PSD que aceitou a «lei da rolha» e ainda fala de valorização parlamentar? Puro equívoco, Srs. Deputados. Em tudo, até hoje, este é o PSD da subalternização parlamentar.
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Orador:- Como, apropriadamente, já foi sublinhado nesta Câmara, o perigo de corruptela do nosso sistema político é o do presidencialismo praticado pelo Primeiro-Ministro.
Isso explica a incapacidade do PSD para se situar, com responsabilidade, perante o significado nacional da eleição do Presidente da República. E mais explica que a Assembleia da República seja lida, pelo Prof. Cavaco Silva, acima de tudo, como trampolim de poder - o que de essencial lhe parece interessar, no Parlamento, é o funcionamento de um bloco automático de apoio e de uma câmara de eco, o que menos lhe interessa e a existência de deputados com mandato personalizado e capazes de iniciativa própria.
A prática de sistema político corresponderia, se tudo estivesse nas mãos do PSD, ao mais oficioso dos modelos, caso a vontade de resistir è de marcar as diferenças não fosse um imperativo constantemente praticado pelo PS, o que nos confere autoridade para chamar a atenção dos Portugueses para os seguintes pontos:
Primeiro, suo agora mais perceptíveis as razões que levaram o PS, na revisão constitucional, a consagrar as leis eleitorais como leis orgânicas e a fazer depender a aprovação dos círculos eleitorais de maiorias qualificadas.
Como afirmou, na oportunidade, o deputado Almeida Santos, a possibilidade - possibilidade, portanto, não vinculatividade - do círculo nacional foi o preço razoável, na revisão constitucional, pago pelo PS, para garantir a estabilidade do sistema eleitoral, pondo-o a recaio dos desígnios de qualquer maioria de conjuntura. E o futuro, que e hoje presente, bem nos demonstra, o. bom aviso dessa posição. Não tivesse o, PS procedido assim e teríamos, hoje, o PSD a retalhar as leis eleitorais, num fato à medida das suas ambições e dos seus interesses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Segundo, é, efectivamente, necessário valorizar o papel institucional da Assembleia da República, valorizando o mandato parlamentar do deputado, pela fixação do regime da permanência, pelo aprofundamento do regime das incompatibilidades, pela atribuição de direitos pessoais de iniciativa parlamentar, pela garantia de condições de ligação efectiva entre os deputados e os eleitores em todos os círculos eleitorais. Não fuja o PSD à questão e diga, destes pontos, quais apoia e quais rejeita.
Terceiro, qualquer reponderação da configuração geográfica dos círculos eleitorais, actualmente coincidentes com os distritos, só deve ler lugar na sequência da criação das regiões administrativas, para que a reforma orgânica do Estado seja consequente e não feita a retalho. O PSD que não fuja também a esta questão e diga, sem mais delongas, se concorda em cumprir a Consumição, num ponto tão essencial em que a Constituição exige ser cumprida.
Aplausos do PS.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Apresente um projecto!
O Orador: - Em conclusão, Sr. Presidente, Srs. Deputados: o PS está, como sempre esteve, disponível para discutir, a sério e aprofundadamente, as soluções que melhor contribuam para conferir credibilidade e eficácia às instituições democráticas.
O Sr. Duarte- Lima (PSD): - Não fuja: discuta lá, então!
O Orador: - Mas o PS não será cúmplice do desvario do PSD, sempre apostado em inventar álibis e bodes expiatórios para as suas próprias insuficiências.
Até à última revisão constitucional, era a Constituição que não o deixava governar, agora, ao que parece, é a lei eleitoral que não o deixa governar com horizontes de eternidade.
Amanhã, sabe-se lá o que virá, nesta escalada desconcertada de inventar factos políticos para marcar os calendários do Estado-espectáculo.
O PS não se eximirá a dar ao PSD, em cada momento, a resposta adequada. Mas o PS chama a atenção para o facto de os verdadeiros desafios nacionais e as imprescindíveis reformas de Estado não se resolverem com manobras de diversão.
Por isso, desde já, anunciamos a iniciativa de apresentação, na Assembleia da República, de uma interpelação sobre política geral, visando o balanço e a apreciação política da actividade global do Governo.
Aplausos do PS.
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O Orador: - O Estado, Srs. Deputados, não é um trofeu de governantes. Também não é um palco de vaidades. É, verdadeiramente, uma instituição de serviço público. Como tal o assumimos e o queremos preservar. Neste, como noutros momentos, recusando a tentação das soluções fáceis, preferindo os princípios, em nome dos quais - só em nome dos quais - vale a pena o combate democrático.
Aplausos do PS, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedirem esclarecimentos, o Sr. Deputado Pacheco Pereira, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e o Sr. Deputado Silva Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, hoje, o Partido Socialista está a dar-nos uma excelente licito de política...
Aplausos do PS, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
Sr. Presidente, espero que estes aplausos não sejam contados no meu tempo...
Como dizia, o PS está a dar-nos uma excelente lição de política que, tão cedo, não esqueceremos porque, hoje...
Aplausos do PS, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
Sr. Presidente, compreendo que o Partido Socialista esteja preocupado com o que vou dizer...,
Vozes do PS e do CDS: - Oh!
O Orador: -... mas pedir-lhe-ia que actuasse no sentido de garantir que haja condições para eu poder continuar este pedido de esclarecimentos.
A lição que mencionei é muito simples. Hoje, por um dia, o PSD está na oposição, enquanto, também hoje, os senhores, igualmente por um dia, silo Poder...
Aplausos do PS, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Orador: -... e estuo a ensinar-nos como o exercem, até pela maneira como estilo a comportar-se agora: com arrogância, com jactância, com autoritarismo, com a mais completa desonestidade intelectual e com completa ausência de diálogo e de vontade de discutirem as questões que aqui vos trazemos. É deste modo que os senhores nos estuo a mostrar o uso que fazem dos vossos breves momentos de poder!
Vejamos: que propostas de alteração é que os senhores apresentaram relativamente a esta proposta de lei sobre a Lei Eleitoral? Nenhuma! Que diálogo tiveram sobre as propostas que apresentámos? Nenhum! Que vontade de consenso mostraram? Nenhuma!
E não venham dizer-nos que, desta vossa atitude, não podemos extrair a conclusão de qual é o vosso procedimento, mal se apanham com um fragmento de poder! Os senhores demonstraram que, quando têm o Poder, não dialogam, não discutem as questões e mostram a mais completa desonestidade intelectual. Aliás, dar-vos-ei vários exemplos.
Protestos do PS.
Quando nós apresentámos a proposta de lei, os senhores colocaram-nos condições, que recebemos muito bem.
Quais eram essas condições, há um mês? Eram várias. Em declaração oficial do porta-voz do Partido Socialista, por ocasião de uma conferência de imprensa na sua sede, os senhores fizeram várias afirmações.
Primeiro, disseram que não recusavam a criação de um círculo eleitoral nacional - isto é verdade, pelo que terão de explicar-nos por que razão, agora, querem esquecer-se desta declaração.
Segundo, afirmaram que admitiam a divisão dos círculos eleitorais, nos casos dos de Lisboa e Porto. Passado um mês, terão de explicar-me por que razão mudaram de posição.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: -Terceiro, disseram que admitiam discutir o desenho dos círculos. Um mês depois, tem de explicar-me por que razão mudaram de posição e porque nunca discutiram esta matéria.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mais: afirmaram que aquele desenho não poderia alterar - era uma condição sine qua non - a divisão administrativa do País já existente. Assim, vão explicar-me porque é que, agora, dizem que querem a regionalização, a qual implica a alteração da divisão administrativa, o que constitui uma contradição completa relativamente à vossa condição inicialmente posta.
Finalmente, vão explicar-me qual a vossa coerência e qual a credibilidade que pode ter um partido que, num mês, sobre a mesma matéria, altera radicalmente a sua posição.
Meus senhores, não gostam que vos lembremos o que está escrito, mas está-o. Poderia citar-vos muitas outras afirmações vossas mais antigas, mas estas não o sito, datam de há um mês, são do Dr. Marques da Costa, proferidas em conferência de imprensa sobre a posição do Partido Socialista relativamente às alterações da Lei Eleitoral.
Os senhores não gostam que digamos que o vosso partido não tem credibilidade, só que esta vossa atitude não demonstra a ausência de qualquer espécie de credibilidade, mas má-fé da vossa parte no tratamento desta questão!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mais: o Dr. Marques da Costa - a quem os senhores gostam de chamar secretário nacional, quando se traia destas matérias - disse que o Partido Socialista iria discutir esta proposta de lei, que iria propor alterações e, ainda, um texto alternativo. Digam-me, então, onde estão as alterações que iam propor e onde está o tal texto alternativo?!
É por isto, meus senhores, que, neste vosso breve momento de poder, no meio de um longo período na oposição, mostraram como actuam quando têm o Poder! Pela nossa parte, consideramo-nos esclarecidos.
Mas ainda há mais: agora, vêm com o argumento da defesa dos pequenos partidos - os senhores são um partido altruísta!... Porém, ao mesmo tempo que invocam este
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argumento, propõem uma lei de financiamento partidário que acaba com as fontes de financiamento dos pequenos partidos, tem uma atitude em relação ao PRD...
Protestos do PS.
Gostaria de vos ouvir falar sobre os pequenos partidos, lendo o que escreveram, o que disseram sobre a vossa disposição relativamente ao PRD. Aliás, o PRD terá muito para vos contar acerca da vossa preocupação com os pequenos partidos...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - E a vossa com os agrupamentos parlamentares?!
O Orador: - Mas não nos venham com lições! A maioria dos vossos argumentos são pura desonestidade intelectual - e eu próprio utilizo poucas vezes estas expressões e devo dizer-vos que são estritamente conjunturais.
O que todos os senhores - o PS, o PCP, o CDS - estão a dizer-nos é muito simples e é que o Partido Social-Democrata vai ser o mais votado nas eleições de 1991.
Risos do PS e do CDS.
Toda a vossa argumentação tem esse fundamento, mas ainda nos dizem mais. De facto, estão a dizer-nos que esse primeiro partido, o PSD, vai obter uma votação próxima de 40 %.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que seria, artificialmente, a maioria absoluta!
O Orador: - Reparem que não sou eu que digo isto, mas é o que os senhores estão a dizer com toda esta vossa argumentação!
Vejo que, mais uma vez, os Srs. Deputados do CDS repetem exactamente o que já unham dito!
Esta vossa atitude é puramente conjuntural e é por isso que o Partido Socialista não gosta de ser confrontado com afirmações suas passadas e que se ressente sobre esta matéria.
O vosso breve momento de poder termina com a votação desta proposta de lei. Tão cedo, não tornarão a ter idêntica oportunidade, mas nós, PSD, não nos esqueceremos.
Aplausos do PSD.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - Sr. Deputado Jorge Lacão, gostaria de lhe fazer algumas perguntas, mas, antes disso, gostaria também de fazer algumas considerações para as justificar e enquadrar.
Pensei que V. Ex.ª fizesse aqui um discurso diferente e que tivesse repensado aquelas suas primeiras declarações- e estou a referir-me às declarações que V. Ex.ª prestou à Televisão -, nas quais confundiu uma série de argumentos e deu um triste espectáculo daquilo que V. Ex.ª não é normalmente, isto é, quando foi à Televisão via-se que ia nitidamente impreparado para discutir aquele assunto e, então, falou de regionalização, da moção de censura construtiva e da impossibilidade de serem substituídos os deputados.
Felizmente que hoje, e não por acaso, V. Ex.ª já se esqueceu de grande parte dos argumentos que então produziu, alguns deles por manifesta irrazoabilidade, outros porque têm alguma razão fundada naquilo que V. Ex.ª nesta altura pensa, e até naquilo que o meu ex-colega de bancada Pacheco Pereira afirmou.
V. Ex.ª esqueceu-se do argumento da moção de censura construtiva exactamente por causa, daquilo que o Sr. Deputado Pacheco Pereira disse.
Vozes do PS:- O Sr. Secretário de Estado é que não ouviu!
O Orador: - Porque V. Ex.ª antecipa o resultados não quis fazer ou não quis continuar nesta manobra de secretaria que imaginou e que, porventura, lhe poderia ser prejudicial também.
V. Ex.ª admitiu, embora por um momento breve, que houvesse uma outra manobra que não resultasse da própria eleição, mas que resultasse depois da conformação do Poder, não prosseguindo o seu raciocínio no sentido de forçar um governo minoritário a manter-se no poder contra os resultados eleitorais.
V. Ex.ª, aliás, tem mesmo alguma dificuldade em convencer os seus camaradas de partido da veracidade e da bondade das suas afirmações - leia-se, por exemplo, o que disse hoje o ex-secretário-geral do PS Vítor Constâncio, em relação aos seus argumentos.
O Sr. Dr. Vítor Constando diz - e passo a citar...
O Sr. António Guterres (PS): - Desmentiu as calúnias do PSD!
O Orador: - O Sr. Dr. Vítor Constando disse hoje ao jornal Público...
Protestos do PS.
Sr. Presidente, se V. Ex.ª me der licença eu passaria a citar as declarações do ex-deputado Vítor Constado ao jornal Público, publicado hoje: «Não teria utilizado alguns dos argumentos usados pela direcção do Partido Socialista para responder ao PSD»...
O Sr. António Guterres (PS): - Leia tudo! Leia tudo!
O Orador: -... «pois teria sido mais flexível e julgo que nesta matéria não se deve fazer doutrina em termos absolutos.. Acresce que os elementos conjunturais, que justificam que agora não se mexa na lei eleitoral, poderão ser outros durante os anos 90.»
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Leia a primeira parte!
O Orador: - O argumento de protecção aos pequenos partidos, utilizado pelo PS, é um dos que, na opinião do Dr. Vítor Constâncio, devia ter sido utilizado com mais cautela.
Quanto à defesa da regionalização, igualmente feita, pelo seu partido, como uma reforma prioritária à revisão do sistema eleitoral, o ex-líder socialista é claro quando diz: «Não vejo ligação entre as duas coisas.»
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Vozes do PS:- E o resto?!...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Pergunte ao Dr. Pinto Balsemão o que é que ele acha sobre a lei eleitoral!
O Orador: - O Sr. Deputado Vítor Constâncio mostrou, à evidência, a falibilidade e a falta de densidade dos argumentos invocados,
É por isso que, destes todos, só resta um argumento e, mesmo este, é contraditório, porque V. Ex.ª, por um lado, diz uma coisa e o Dr. Marques da Costa, por outro lado, diz outra.
Isto significa que VV. Ex.ªs não querem fazer uma discussão séria do sistema eleitoral; significa que VV. Ex.ªs não querem fazer uma reflexão profunda sobre o sistema eleitoral português e significa que VV. Ex.ªs estão completamente alheados de tudo quanto se passa no mundo inteiro, pois a preocupação fundamental é, neste momento, tentar aperfeiçoar os sistemas eleitorais.
VV. Ex.ªs podiam, por exemplo, ter pegado nesta proposta do PSD e tentado ver nela alguma coisa de bom, alguma coisa de positivo e alguma coisa daquilo que se pratica na maior parte dos países europeus.
VV. Ex.ªs dizem que não, que desconfiam da honorabilidade desta proposta do Governo, porque entendem, se calhar, que nos outros países europeus, onde sistemas idênticos são praticados, não se pratica democracia.
Isto significa que VV. Ex.ªs não têm sequer respeito pelo esforço intelectual que a maioria das pessoas e que os especialistas fazem em relação a esta matéria.
Mas mais, VV. Ex.ªs não têm respeito pelo esforço intelectual dos vossos próprios especialistas em matéria eleitoral, como, por exemplo, Nunes de Almeida e António Vitorino, que, em outros momentos, fizeram raciocínios que iam desembocar em propostas idênticas às que agora suo apresentadas pelo PSD.
Dizia V. Ex.ª, Sr. Deputado Jorge Lacão, que a primeira coisa que havia a fazer, quando se queria o respeito de todos, era respeitar-se a si próprio. O grande problema é que VV. Ex.ªs começam por não se respeitarem a vós próprios, pois a grande demonstração do respeito por si próprio é a pessoa ser coerente com o que pensa, é ser coerente com o que afirma e VV. Ex.ªs não suo coerentes, não sabem o que querem, mudam frequentemente de opinião, não mantêm as convicções e ignoram o respeito devido aos vossos próprios especialistas, como acabei de dizer.
VV. Ex.ªs quiseram fazer deste assunto, que é um assunto sério, um assunto de chicana.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - VV. Ex.ªs quiseram fazer mais, quiseram impedir os Portugueses de pensar melhor e quiseram impor a linguagem do machado à linguagem da discussão de raiz do pensamento político. VV. Ex.ªs pensam que alterar ou pensar em alterar a lei eleitoral é crime,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O povo já sabe!
O Orador: -... que melhorar o sistema político é uma ofensa, mas, ao mesmo tempo, entendem que poupar o CDS é um acto de misericórdia e absorver o PRD é um acto de homenagem à República.
O Sr. Narana Coissoró (CDS):-Vocês foram derrotados nas autárquicas, e com razão!
O Orador: - VV. Ex.ªs acabam por se contradizer a vós próprios de uma maneira tão flagrante e tão intensa que agradeço, do fundo do coração, aquilo que V. Ex.ª acaba de dizer e que vos dará oportunidade de provar ao povo português aquilo que VV. Ex.ªs gostarão de lhe esconder.
Agradeço ao Sr. Deputado Jorge Lacão o anúncio que fez da interpelação sobre política geral. A amostra que os senhores deixaram aqui sobre este tema tão concreto e tão pequeno é, de facto, muito importante para podermos, depois, nessa interpelação sobre política geral, dizer aquilo que fizemos e o que VV. Ex.ªs não fizeram, nem são capazes de fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda há um outro pedido de esclarecimento, mas, entretanto, o Sr. Deputado Basílio Horta pediu a palavra para?
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Para defender a honra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Queria dizer ao Sr. Secretário de Estado que a sua intervenção feriu profundamente a minha bancada. O Sr. Secretário de Estado disse, com o maior dos à-vontades e em tom crítico ao Partido Socialista, «poupar o CDS».
Quero dizer ao Sr. Secretário de Estado que, ao dizer isso, não ofende esta bancada, mas, sim, todos os democratas-cristãos que votaram em nós. O Sr. Secretário de Estado talvez não perceba isso, porque a sua relação é apenas uma relação de poder, mas nós temos de lhe explicar que, em democracia, os partidos não se poupam, existem pela vontade eleitoral.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Muito bem!
O Orador: - Sr. Secretário de Estado, isso já é um tique preocupante e que revela bem o mau entendimento que o seu Governo tem do funcionamento dos mecanismos democráticos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A intenção inconfessada da lei e do Governo!
Aplausos do PS, do PCP, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Sr. Presidente: -Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Era apenas para dizer que o Sr. Deputado Basílio Horta colocou a questão exactamente no sítio onde a devia ter colocado.
Quem ofendeu o CDS foi o Partido Socialista e quem continuamente tem ofendido o CDS tem sido o Partido
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Socialista, porque tem falado em vosso nome e V. Ex.ª não teve a coragem nem a hombridade de se levantar nessa altura.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não precisamos disso!
O Orador: - Aquilo que dizemos e que desde sempre dissemos é, justamente, a súmula do que V. Ex.ª acabou de repetir: o único juiz do qual depende ou não a existência dos partidos e a sua representação no Parlamento é, justamente, o eleitorado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Vimos isso nas autárquicas... Por isso andaram à procura!
O Orador: - V. Ex.ª não conseguirá nunca provar que a nossa intenção é outra. É o eleitorado que vos há-de julgar, foi o eleitorado que vos reduziu e, provavelmente, será o eleitorado que vos continuará a reduzir por vossa própria culpa e não por nossa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, quando anunciou uma iniciativa, fiquei numa grande expectativa, mas acabou por anunciar uma interpelação que é, por natureza, um debate inconclusivo.
De facto, é também a vossa situação actual, porque são inconclusivos para além do fervor do vosso verbalismo.
Apresentou também uma outra proposta de reforma - a criação do gabinete do deputado, e aí justifica-se a despesa.
Sr. Deputado Jorge Lacão, o gabinete do deputado e específico e, sobretudo, próprio do círculo uninominal. De outra forma, Sr. Deputado, já imaginou todos nós no mesmo gabinete? Eu com o Sr. Deputado João Amaral? O Sr. Deputado Carlos Brito a atender o eleitorado e a dizer faça assim e eu a dizer faça assado?
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Não era a primeira vez!...
O Orador: - É um absurdo, Sr. Deputado, e 6 nisso que está o vosso grande pecado.
Risos do PS, do PCP e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Orador: - Os senhores julgam que a democracia se resolve fazendo mais despesa, mas não é, Sr. Deputado! A democracia resolve-se se formos capazes de discutir com seriedade e elevação as questões da Nação e da sua governação.
Peço-lhe que abandone um pouco o imediatismo em que está envolvido e que discutamos esta questão tão fundamental e que tem sido, ao longo dos anos, uma questão viva de todos os debates, porque diz respeito, no cerne, à governação das nações e, por isso, também de Portugal.
Peço-lhe também, Sr. Deputado, que sobre esta questão ouça um homem que julgo insuspeito e que, perante esta questão, dizia o seguinte: «É perfeitamente legítimo que o objectivo de introduzir maior maleabilidade ao sistema eleitoral, de forma que ele exprima a realidade das opções do nosso país»...
O Sr. José Lello (PS):- Grande cabeça, está a traduzir directamente do francês!
O Orador:-... «e a complexidade das mesmas, tenha lugar, mas cada um de nós sabe, hoje, que a França está confrontada com um dos maiores desafios da sua história e que para responder a esse desafio, eu cheguei à conclusão de que o nosso país tem necessidade de firmeza e continuidade na sua governação, que pode não ser suficiente, mas que, sem dúvida, e necessária.» E, depois, ainda a propósito do mesmo debate. «O Poder precisa de estabilidade, pois sem ela não há qualquer hipótese de eficácia» e, mais adiante, «Se se regressa ao sistema proporcional o povo, desde logo ele, deixa de ser senhor das escolhas decisivas.»
Esta declaração foi feita na noite de 3 para 4 de Abril de 1985, por parte de um ministro socialista que se demitiu por não querer estar solidário com o regresso ao método proporcional na França. Este homem, nessa mesma noite, foi acusado pelo porta-voz do seu grupo parlamentar de ter dado uma punhalada nas costas do seu partido e do seu país e ele defendia-se dizendo: «Hoje acusam-me»...
Protestos do PS e do CDS.
... «de traição e de imbecilidade...» No entanto, Srs. Deputados, este homem, que fez um combate prolongado, sem medo e falando verdade, como ele disse, ao longo de dez anos, governa hoje a França...
O Sr. José Lello (PS):- Eu não disse!?
O Orador: -... em nome dos socialistas franceses. Aqueles que nessa altura, não grosseiramente, o insultaram, hoje, rendem-lhe homenagem e os senhores também.
Srs. Deputados, os senhores estão agarrados a arcaísmos. Cegamente agarrados!
O Partido Socialista tem hoje a cabeça encerrada na areia, incapaz de compreender a modernidade como este homem. O Partido Socialista está hoje mais interessado na guerra política do que na governação de Portugal. O Partido Socialista está a andar para trás, Srs. Deputados.
O Partido Socialista, pelos vistos, está mais fossilizado e agarrado a tabus arcaicos do que o próprio PCP, que, apesar de tudo, faz esforços.
Risos do PS, do PCP, do PRD, do CDS e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Isto é que e um autentico fóssil!
O Orador: - Srs. Deputados do PS, se têm uma réstea de frontalidade intelectual e política, e se tem, no vosso próprio íntimo, amor a Portugal e respeito poios Portugueses, discutam a questão que temos na ordem do dia, com frontalidade e com argumentos - não com insultos nem com chicana!
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Para responder às perguntas colocadas, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados do PSD e Srs. Secretários de Estado: Permitam-me que vos envolva numa única e mesma resposta.
Não sei se o PS, hoje, deu aqui uma excelente lição de política; o que sei é que não há bons professores que resistam à má qualidade destes alunos.
Risos.
Quero dizer-vos, francamente, que, quando a opinião pública portuguesa estava centrada na vossa iniciativa de rever a lei das incompatibilidades dos titulares de altos cargos públicos, fomos surpreendidos pelo Sr. Primeiro-Ministro, anunciando ao País uma proposta de lei que não apresentou e estabelecendo um debate sobre coisa nenhuma. Em matéria estruturante para o regime democrático, o mais extraordinário foi ver o chefe de um governo trazer a debate público uma matéria que não existia e que ninguém, verdadeiramente, conhecia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Dizem agora os senhores que terão ouvido declarações menos consonantes, e estuo extremamente motivados para exigir os estudos que poderiam ter sido feitos na altura do governo do bloco central, mas não vos ouço exigir nenhum tipo de estudos que fundamentasse a credibilidade e a razão de ser da proposta apresentada pelo Governo! Mais, o próprio Governo revelou que não tinha feito estudos nenhuns - obviamente que ninguém acredita nisso! -, mas tal facto não escandaliza a bancada do PSD, que está retroactivamente escandalizada com o que se passou há três anos atrás, sem se preocupar nada com a incidência concreta desse problema no presente debate.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, Srs. Deputados do PSD, Sr. Secretário de Estado, o que este debate prova é uma verdadeira diferença de natureza entre os nossos dois partidos.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Isso é verdade!
O Orador: - O PS é um partido democrático, assume o pluralismo das opiniões dos seus membros e sustenta-as de cabeça levantada, as vozes até aqui, na primeira fila desta bancada. O PSD, por seu lado, tem uma vocação inquisitória!: quando os seus militantes estuo em desacordo, expulsa-os; aos dos outros partidos, anda agora a fazer-lhes fichas!
Aplausos do PS e do CDS.
Falaram os Srs. Deputados em falta de honestidade intelectual. Depois das declarações públicas que os Srs. Deputados do PSD ontem fizeram, depois do desmentido formal ontem feito pelo ex-secretário-geral do meu partido, em matéria de desonestidade intelectual, estamos conversados. Os deputados que ontem disseram o que disseram, não deveriam voltar mais a utilizar argumentos dessa natureza!
Aplausos do PS.
Por outro lado, quando aqui é referido que a nossa preocupação com a regionalização ou com a institucionalização das regiões administrativas visará alterar, no futuro, a divisão das circunscrições administrativas no País, quando finalmente os senhores compreenderam isso, compreenderam o essencial. Se os círculos eleitorais, actualmente, se compatibilizam com as circunscrições administrativas no plano distrital, devem amanha poder compatibilizar-se com as circunscrições administrativas no âmbito das regiões administrativas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que é extraordinário, Srs. Deputados, é que VV. Ex.ªs põem na ordem do dia o cumprimento de uma mera faculdade constitucional, que era a criação do círculo eleitoral e recusam pôr na ordem do dia a expressa exigência constitucional de criar as regiões administrativas em Portugal.
Aplausos do PS.
Estamos, por isso, fundamentalmente entendidos. A nossa boa lição pode continuar a qualquer tempo - os Srs. Deputados terão sempre a nossa disponibilidade para esse efeito.
Aplausos do PS.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Estamos desconsiderados por uma razão muito simples: é que, tal como eu esperava, o Sr. Deputado Jorge Lacão não respondeu a uma única das questões concretas que colocámos, e compreendemos muito bem porquê!
Sr. Deputado Jorge Lacão, talvez pudesse explicar-nos por que razão é que, há um mês, o porta-voz do PS dizia que não recusava o círculo nacional e, agora, VV. Ex.ªs recusam-no, sem propor nem discutir nenhuma alteração à proposta de círculo nacional do PSD. Talvez V. Ex.ª possa explicar-me claramente, sem fugir à questão como fugiu - isso é que ofende a nossa consideração, que V. Ex." fuja às questões que se lhe colocam -, por que ra/ao é que o porta-voz do PS dizia que admitia a divisão dos círculos de Lisboa e Porto, e VV. Ex.ªs não discutiram a divisão dos círculos propostos na lei do Governo? Mais, por que razão é que cie dizia que o PS iria discutir e apresentar alternativas à proposta do Governo, e VV. Ex.ªs vão recusar a proposta do Governo?
Isso é que, em nome da credibilidade dos partidos, VV. Ex.ªs tem de explicar: porque è que o PS anda a fugir de argumento para argumento! Primeiro, disse isso; depois, fugiu para a moção de censura construtiva; depois, fugiu para a regionalização; e, se tivéssemos mais quinze dias de debate, fugia, com certeza, para outra questão qualquer.
O problema, Sr. Deputado Jorge Lacão, é que os dirigentes do PS acordam de manha como a rainha má da fábula, dirigem-se ao espelho e perguntam: «Espelho meu, quem é que vai ganhar as eleições de 1991?» E o espelho responde: «O PSD!» Aquilo que VV. Ex.ªs querem é matar a «Branca de Neve»!
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente:-Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, sinceramente lhe digo que há um aspecto em que não sou capaz de o acompanhar: é no exercício escolástico de comparação de textos, em que o senhor é exímio e em que eu não sou, pela simples razão de que não tenho paciência para isso!
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Mas ele disse ou não disse?
O Orador: - O Sr. Deputado Pacheco Pereira diz que o PS tem posições não coincidentes sobre a questão do círculo nacional. Se VV. Ex.ªs estivessem aqui para, inteligentemente, ponderar os argumentos, quando, há pouco, foi lida pelo meu camarada Alberto Martins, citando expressamente, a declaração do então deputado António Vitorino, reparariam como nessa altura se dizia que não basta falar em círculo nacional, mas que é necessário compreender o tipo e a natureza desse círculo nacional; e, designadamente, que a possibilidade, de utilização de um círculo nacional como aproveitamento de restos, reforçando e não mitigando o princípio da proporcionalidade, tem consequências razoáveis ou, até mesmo, completamente diferentes.
A versão apresentada pelo PSD sobre o círculo nacional não era conhecida pelo meu camarada Marques da Costa, dado que a proposta do Governo não tinha sido apresentada a tempo e horas. Quando o Sr. Ministro abordou a matéria não conhecíamos a proposta e, em consequência disso, a nossa expectativa,- tal como a de toda a gente de boa-fé, seria conhecer primeiro a proposta, a sua razão de ser e os seus fundamentos. Agora percebemo-la e percebemos que qualquer eventual alteração das dimensões dos círculos, no âmbito de Lisboa e do Porto, se, imaginemos, pudesse ser uma divisão em dois círculos, porventura teria comprometido o princípio da aplicação da proporcionalidade. Com o critério que VV. Ex.ªs utilizaram, foi o princípio da proporcionalidade que atingiram e com isso denunciaram o único e exclusivo objectivo da vossa proposta: com os mesmos eleitores, poder ler mais deputados.
Esta é, verdadeiramente, a única questão política relevante sobre a qual todos temos de nos pronunciar, e acerca da qual todos temos de tomar posição.
O Sr. Deputado Pacheco Pereira disse ainda que - não falei da moção de censura construtiva. Ora, isso não é verdade - o Sr. Secretário de Estado, há pouco, também estava distraído.
Na minha intervenção referi-a, para vos dizer que na revisão constitucional perderam uma excelente oportunidade de ter contribuído, por essa via, para melhorar as condições de estabilidade no funcionamento dó sistema de governo em Portugal. O que não queremos nem aceitamos é que, em nome da estabilidade dos governos, se desestabilize a própria sociedade. Não permitir o acesso de famílias ideológicas à representação no interior do sistema político é devolver o conflito do interior do sistema político para o interior da própria sociedade.
Ora, isto, Srs. Deputados, é a vossa responsabilidade perante o País porque, justamente, não têm uma visão nacional deste problema - têm, estritamente, uma visão partidária.
Como o Sr. Deputado Pacheco Pereira acabou, mais uma vez, de confirmar, a obsessão de 1991 é vossa - não é nossa! Fizemos hoje lodo este debate e em nenhum momento falámos das nossas preocupações sobre o resultado que obteremos em matéria eleitoral na sequência, ou na consequência, da revisão da lei eleitoral.
Queremos ganhar eleições em diálogo directo com os Portugueses e não à custa de manipulações da lei eleitoral.
Aplausos do PS e do CDS.
O Sr. Presidente: - A Mesa tem, neste momento, vários pedidos de palavra, pelo que vai ter de saber a que se destinam.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Solicito à Mesa a mesma benevolência que foi concedida ao Sr. Deputado Almeida Santos há pouco...
Protestos do PS.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (INDEP): - Então, também eu peço benevolência!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso é que era bom!
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Dizia eu, a mesma benevolência, para dizer ao Sr. Deputado Jorge Lacão que viabilize o círculo nacional e nós aceitaremos a discussão de todas as alternativas.
Vozes do PSD: -Muito bem! Protestos do PS.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.
O Sr. Presidente: - Tem ã palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
Protestos do PS.
O Sr. Silva Marques (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: As vossas reacções, mesmo sobre pequenas coisas, mas bem expressivas, como uma gota de água, mostram o que VV. Ex.ªs fariam se amanhã pudessem estabelecer as regras da democracia neste Plenário. Aliás, já uma vez o mostraram.
Vozes do PS: - Olha quem fala!
O Orador: - Uma última tentativa para que VV. Ex.ªs aceitem um debate serio sobre as questões do nosso país, sobre as questões da democracia, sobre as questões da governação da Nação que somos, embora este termo «nação» -eu sei bem! - lhes cause dificuldades conceptuais. Eventualmente, nem sequer o aceitam!
Sr. Deputado, se a questão e a das regiões e se os senhores as querem fazer tão depressa, é elementar, do ponto de vista da coerência, que apresentem hoje mesmo um projecto de delimitação das regiões.
Vozes do PSD:-Muito bem!
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O Orador: - O vosso congresso faz-me lembrar... Protestos do PS e do CDS.
O Sr. José Lello (PS): - Isso ó uma falta de honestidade!
O Orador: - Sr. Presidente, aguardo que as condições se recomponham...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, com o consentimento e a compreensão de VV. Ex.ªs, permitiam-me chamar a vossa atenção para o facto de a figura da defesa da honra e da consideração ser uma figura regimental e para a circunstância de - repito-o - a Mesa estar a sentir, como é natural, muitas dificuldades para saber em que medida é que o Sr. Deputado Silva Marques se sentiu ou não ofendido e em que medida é que está usar, regimentalmente e de uma forma adequada, essa figura.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Estamos a seguir o paradigma do Sr. Deputado Basílio Horta...!
O Sr. Presidente: - O processo que a Mesa seguiu foi o de não questionar esse facto relativamente à defesa da honra e da consideração.
Foi esse o critério que seguiu, provavelmente mal, de não questionar sobre se o Sr. Deputado estaria ou não no uso específico e concreto dessa figura.
Este é um apelo que tem sido feito sistematicamente aos Srs. Deputados, pelo que continuarei a não questionar essa situação - deixo isso ao critério de interpretação dos próprios Srs. Deputados.
Na verdade, é esse o critério que se tem estado a adoptar e não é agora que o vamos alterar.
Sr. Deputado Silva Marques, faça favor de continuar. Com este desconto de tempo que naturalmente tem, concedo-lhe três minutos para exercer o direito regimental de defesa da honra e da consideração.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado José Lello está perplexo com as minhas afirmações por uma razão muito simples, que passarei de imediato a expor.
Os actuais dirigentes do seu partido foram os realizadores da célebre Convenção da Esquerda Democrática, mas nessa altura o Sr. Deputado «não estava numa de convenção». Só que se esquece que a principal resolução da célebre convenção, que se destinava a abrir ideias e a criar projectos, foi fazer o famoso abaixo-assinado para forçar a implantação das regiões.
Porém, até hoje, nada de abaixo-assinado - nem 10000 assinaturas, nem uma! De qualquer modo, o Sr. Deputado não estava lá...
Ora, o seu congresso de agora - em que o Sr. Deputado já esteve... - faz-me lembrar um pouco a referida convenção: as regiões, depressa! Só que acções de coerência... nenhuma!
Protestos do PS.
Sr. Deputado Jorge Lacão, voltemos à questão agendada para hoje.
Assim, gostaria de saber se o Sr. Deputado reconhece ou não que estamos a discutir uma questão que tem sido, ao longo da História, o cerne de grandes debates políticos e que tem dividido as correntes políticas. Reconhece ou não? É que a sua resposta consubstancia já um princípio de aceitação da discussão séria e intelectual deste assunto tão importante.
Por outro lado, gostaria também de saber se o Sr. Deputado reconhece que os homens que, ao longo da História e em diversas nações, se têm dividido sobre este ponto, são igualmente democratas ou da mesma forma se assumiram como democratas e patriotas. Reconhece ou não?
Sr. Deputado Jorge Lacão, V. Ex.ª aceita, sequer, a hipótese de que alguns dos seus camaradas, em momento anterior e pelo facto de terem admitido a alteração do sistema eleitoral, fossem menos democratas ou menos patriotas?
Finalmente, Sr. Deputado, subscreveria V. Ex.ª as declarações do porta-voz dos socialistas franceses, chamando Roccard de imbecil e de traidor? Receio bem que o senhor o fizesse!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente:-Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dar explicações a quem. Sr. Presidente...? Aos dois deputados que intervieram?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sc não sabe a quem, não as dá!
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, foi só um deputado que interveio, ou seja, o Sr. Deputado Silva Marques...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, o que me embaraça é que o Sr. Deputado Pacheco Pereira estava, na altura, a usar da palavra e não percebi qual a figura regimental ao abrigo da qual ele o estava a fazer.
O Sr. Silva Marques (PSD): - A do seu colega Almeida Santos!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Por isso é que perguntei a quem é que devia dar explicações...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, o Sr, Deputado Pacheco Pereira invocou a tolerância da Mesa relativamente a uma questão, reconhecendo objectivamente a Mesa que, também sem nenhum enquadramento regimental, linha permitido ao Sr. Deputado Almeida Santos o uso da palavra numa situação semelhante.
Portanto, Sr. Deputado, tem a palavra para responder ao Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - E suponho que com o mesmo grau de tolerância, a fim de dizer uma palavra sobre as afirmações do Sr. Deputado Pacheco Pereira, não é verdade, Sr. Presidente...?
Sr. Deputado Pacheco Pereira, realmente o vosso estado de angústia supera os níveis que eu imaginaria.
No final do debate, e verdadeiramente em desespero de causa, o Sr. Deputado Pacheco Pereira faz-nos este apelo patético: «aprovem-nos então esse círculo eleitoral de que esteve para aí a falar há pouco!». Por conseguinte, o PSD já está neste ponto: «Aprovem-nos um círculo
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nacional qualquer e depois venham falar connosco, que talvez a gente vos dê gato pela lebre que vocês nos entregaram!»
Sr. Deputado Pacheco Pereira, não caia agora na desonestidade intelectual de querer que a Assembleia da República vote sem saber sequer a natureza do instituía que está a debater!
Se por acaso o PSD e o Governo, na sequência deste debate entenderem retirar a proposta, ir estudá-la, reformulá-la e apresentá-la de novo, nessa altura, voltaremos a fazer o debate, em nome dos mesmos princípios, para ver a consequência da proposta que então lenha sido apresentada.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Qual é então a proposta?
O Orador: - Sr. Deputado Silva Marques, lenho alguma dificuldade, sinceramente lhe digo, em responder. Estava com atenção mas não cheguei a perceber do que é que o Sr. Deputado Silva Marques estava a falar.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Ah, isso eu compreendo!
O Orador: - Falou... Não sei se consigo, por isso, agarrar nas suas considerações, de que o Partido Socialista deveria, então, apresentar, amanha, um projecto de lei de delimitação das regiões administrativas.
Ora, o que está aprovado, na generalidade, na Assembleia da República, e que não há maneira de dar os passos ao ritmo adequado na comissão respectiva, é a lei de bases da criação das regiões administrativas.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não desvie a, conversa!
O Orador: - Sr. Deputado Silva Marques, não estou a desviar a conversa. Faço um desafio ao seu grupo parlamentar: aprovem, até ao final da sessão legislativa, a lei de bases das regiões administrativas e, imediatamente após, apresentaremos o projecto de delimitação em concreto dessas mesmas regiões.
Aplausos do PS.
E digo-lhe mais: fazemo-lo com tanto mais à vontade, porque este tipo de debates, que em muitos aspectos se revelam uma pura manobra de diversão, não nos fazem esquecer do essencial.
Amanhã mesmo - já hoje o entregámos na Mesa da Assembleia da República - apresentaremos publicamente um projecto de lei para a criação das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não desvie a conversa!
O Orador: - Lamento que o seu Governo e o seu grupo parlamentar andem distraídos nestas guerras de «alecrim e mangerona» e não tratem a sério dos problemas nacionais como, efectivamente, deveriam tratar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Secretário de listado Adjunto do Ministro, dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - Para defesa da consideração, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Secretário de Estado, relativamente a que intervenção?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - É profundamente ofendido que o faço, pois o Sr. Deputado Jorge Lacão acusou o Sr. Primeiro-Ministro de iludir a boa fé - a boa-fé do Sr. Deputado Jorge Lacão e também do Sr. Dr. Marques da Costa.
Ora, entendo que é uma acusação grave e que não tem cabimento.
Aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro fez vem na sequência perfeita daquilo que já há muito tempo se pensava e se discutia.
Gostaria de dizer ao Sr. Deputado Jorge Lacão, em três frases simples, o que se pensou, o que se discutiu e como é que se chegou a isto, para resumir algumas coisas que aqui foram ditas o para que o Sr. Deputado Jorge Lacão entenda melhor qual é, de facto, o centro fundamental da discussão.
Estamos a tratar de uma reforma possível do sistema eleitoral, sobre a qual o bloco central trabalhou em hipóteses, como aqui foi demonstrado. Essas hipóteses foram desenvolvidas num projecto de código eleitoral, que foi escrito, foi apresentado e publicado e que teve intervenção de pessoas do PSD, do PS e de independentes.
O Sr. Primeiro-Ministro, depois de feita a revisão constitucional, cuja lógica implicava necessariamente que se fizesse uma alteração do sistema eleitoral, posto que se linha referenciado a criação do círculo nacional, realidade nova no nosso universo eleitoral, deu a conhecer, em devido tempo, as bases gerais de uma proposta de lei eleitoral a apresentar à Assembleia da República.
O Governo ouviu os partidos da oposição sobre essa proposta de lei eleitoral. O Sr. Dr. Marques da Costa estava distraído quando foram anunciados os princípios: o Sr. Dr. Jorge Lacão estava ausente e também, com certeza, distraído. Reagiram mal na ocasião e dizem, agora, que foi iludida a boa-fé, quando o que realmente fizeram foi, num determinado momento, terem ficado surpreendidos com as propostas, terem reagido porventura, de uma maneira mais leviana em relação ao seu profundo pensamento e, neste altura, dão o dito por não dito. Esta é a realidade.
Mas também lhe diria mais, Sr. Deputado Jorge Lacão, em relação a essa regionalização de que V. Ex.ª fala, fornecendo-lhe um dado novo que V. Ex.ª- por ser novidade aqui nesta Casa - com certeza não conhece,' mas que é da minha experiência pessoal.
É que eu já estive num governo que apresentou uma lei eleitoral autárquica, na qual se definiam as bases essências da eleição dos órgãos regionais. Essa lei eleitoral autárquica foi apresentada em 1981 e o PS combateu-a e votou contra estas disposições.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: -Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Secretário de Estado Carlos Encarnação, meu particular amigo, percebo que o seu papel é o de ter de fazer, de vez em quando, a figura do defensor oficioso. Só que, como por vezes acontece ao defensor oficioso, faz defesas sem convicção.
Ora, foi exactamente o seu caso, ao pretender sustentar posições que não têm grande sustentação.
De tal maneira o fez, e eu citei a sua afirmação de há pouco, dizendo que «a revisão constitucional implicava necessariamente que se alterasse a lógica do sistema eleitoral», que, Sr. Secretário de Estado, as suas palavras traíram-no! Então a revisão constitucional implicava que se alterasse a lógica do sistema eleitoral?
Os senhores deputados andavam verdadeiramente distraídos, sem saberem o que estavam a aprovar na Constituição, e agora ...
Protestos do PSD.
... parece que estuo todos a acordar de um sonho mau! E qual foi esse sonho? Quando pretenderam fazer manipulação sobre os círculos eleitorais descobriram, um pouco atonitamente, que não havia «volta a dar-lhe» sem a maioria qualificada de dois terços e, agora, estilo colocados numa situação de verdadeira fobia, porque não podem alcançar o vosso último objectivo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é um disparate!
O Orador: - Sr. Secretário de Estado, as matérias relativas à lei eleitoral suo muito sérias e profundamente estruturamos dos regimes democráticos. Ora, nesta matéria o Governo e o PSD tem um currículo um pouco negro...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Pois!... O vosso é branco!...
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado lembra-se, por exemplo, do que aconteceu à proposta de lei eleitoral para o Parlamento Europeu, que os senhores aqui fizeram aprovar por maioria simples, pejada de inconstitucionalidades, declarada insconstitucional pelo Tribunal Constitucional e vetada pelo Sr. Presidente da República? Assim sendo, veja lá como é que nós vamos ter confiança nas vossas posições!...
Aplausos do PS
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço muita desculpa mas, na verdade, não posso deixar de pedir a palavra para defesa da consideração.
Protestos do PS.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Outra vez?! Isso não pode ser!
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, a Mesa vai ter de tomar uma atitude relativamente a esta questão...
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Então, Sr. Presidente, em vez de pedir a palavra para defesa da consideração peço-a para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa tem, fundamentalmente, um objectivo- aliás, se o Sr. Deputado Jorge Lacão me tivesse deixado interrompe-lo eu tê-lo-ia leito na altura e teríamos poupado esta maçada e este aborrecimento...
Bem, mas a única coisa que gostaria de dizer - interpelando a Mesa e para que fique registado no Diário da Assembleia da República - é que o Sr. Deputado Jorge Lacão me citou incorrectamente e trocou completamente aquilo que eu disse em relação à revisão constitucional e ao sistema eleitoral.
Vozes do PSD: - Ele já não sabe o que diz!... O Orador: - Apenas disse que a lógica ...
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, como compreenderá, o que está a fazer não é uma interpolação a Mesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, mio tenho outra forma de ditar para o Diário a correcção àquilo que foi dito...
O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Secretário de Estado, mas pode inscrever-se para uma intervenção, pois o Governo ainda dispõe de tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, não tenho outra forma de corrigir uma intervenção que foi feita, focando o meu nome e fazendo referências incorrectas.
No meu entender, a única forma de que disponho é a interpelação à Mesa e não uma intervenção.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa do Governo, em má hora apresentada e agora em debate, não visa acautelar nenhum interesse público em matéria de alteração do actual sistema eleitoral.
Por isso, a chamamos de iniciativa e não proposta de alteração da legislação eleitoral. Desde o inicio, dissemos que esta proposta não merecia sequer discussão, uma vez que não tinha a base de seriedade mínima que justificasse o seu nome.
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Os argumentos aparentes (dos inconfessados trataremos a seguir) de crítica ao actual sistema residem fundamentalmente nos seguintes aspectos ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia-lhe que não continuasse, porque não existem, neste momento, condições no hemiciclo para prosseguir a sua intervenção.
O Orador: - Sr. Presidente, não 6 no hemiciclo, é na bancada do PSD!
O Sr. Presidente:-Sr. Deputado Basílio Horta, não há no hemiciclo.
Agradecia que os Srs. Deputados que estilo de pé se sentassem.
O Orador: - Sr. Presidente, posso prosseguir?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Basílio Horta, por favor, aguarde um momento.
Pausa.
Sr. Deputado, creio que estuo reunidas as condições para continuar a sua intervenção.
Sr. Deputado, tem a palavra.
O Orador: - Primeiro, não aproxima os eleitos dos eleitores, criando um défice de representação política.
Segundo, dificulta a formação de maiorias absolutas e, consequentemente, e susceptível de gerar instabilidade política a nível da formação de governos de legislatura.
Terceiro, é causa de alguma distorção entre a representação eleitoral e a representação parlamentar, e a este respeito não quero deixar de sublinhar o desvelo com que o PSD aqui citou a nossa representação, comparando-a com a representação do PRD. Pena é que esta lei em nada corrigisse essa situação; pelo contrário, agrava-a substancialmente.
Ora, aquando da, revisão constitucional, sede própria para análise e consideração destes argumentos, foi decidido, com o acordo do PSD, manter o método de Hondt, com a força de um limite material expresso, repito, com a força de um limite material, expresso, manter, a exclusividade dos partidos na apresentação de candidaturas, reduzir o número de deputados e, finalmente,- prever a possibilidade, que aliás nunca foi excluída nos textos anteriores, de criação de um círculo nacional.
Daqui resulta, com clareza, que a única obrigatoriedade criada ao legislador ordinário seria - e é - a resultante da diminuição do número de deputados e correspondente adaptação aos círculos eleitorais existentes.
Não e pois verdade dizer-se, repetir-se, que a actual proposta, nomeadamente no que toca à criação do círculo nacional, tem por base um imperativo constitucional.
Com isto, o Governo talvez queira dizer que a proposta não e da responsabilidade do Governo, mas também da responsabilidade da Constituição.
Temos que dizer, aos Portugueses que a proposta é única e exclusivamente do Governo, não sendo lícito, imputar à Constituição opções que a mesma não exige.
É certo que poderia ter sido eventualmente útil que o Governo tivesse usado a oportunidade de legislar, no sentido de reduzir o número de deputados para introduzir correcções sérias no actual sistema, sempre, como é óbvio, dentro do respeito pelas normas constitucionais.
Um Governo com credibilidade, respeitado e isento na representação dos interesses do Estado teria começado por ouvir todos os partidos antes de elaborar qualquer proposta. Isto porque á avaliação de um sistema eleitoral não se deve limitar à discussão das suas intenções formais e dos seus fundamentos teóricos. Deverá, como lei estrutural que é, avançar na análise das consequências concretas da sua aplicação em diferentes cenários político-eleitorais.
Se assim fosse, então, o Governo, constitucionalmente condicionado, deveria ter-se limitado a consultar os partidos sobre a criação de um círculo nacional, sobre o número de deputados desse círculo, que, em caso algum, corresponderia a cerca de um oitavo de número total de deputados e sobre as regras do respectivo processo eleitoral, que deveriam expressamente contemplar o voto preferencial e o aproveitamento dos restos das eleições pelos círculos eleitorais, como única forma de garantir uma representação política séria aos partidos com eleitorado disperso. Em caso algum, deveria ter alterado o número de círculos antes de ter, sequer, iniciado o processo de regionalização, tal como se comprometeu e não cumpriu.
Outra, bem diferente, foi a atitude do Governo, que optou decididamente por usar a nova lei eleitoral como instrumento político destinado a assegurar a manutenção de uma hegemonia que o eleitorado, com cada vez maior nitidez, lhe vai negando.
Assim, o Governo começa por apresentar esta proposta sem obedecer a um processo normal e eticamente exígivel de consultas prévias. Coloca os partidos perante uma proposta acabada e apenas, condescende em os ouvir, não para ter em consideração os seus argumentos, mas como simples liturgia que se cumpre para descargo da consciência que se não, tem.
Depois, analisada a proposta com o mínimo de cuidado e isenção, imediatamente ressalta a evidencia de que ela não visa corrigir nenhum só - repito, nenhum só - dos aspectos susceptível de crítica do actual sistema eleitoral, antes o deforma e eticamente o distorce.
A criação de um círculo eleitoral nacional com 30 deputados, sem aproveitamento dos restos resultantes dos escrutínios locais, e sem voto preferencial, conjugada com a divisão dos círculos, tal como é concebida, apenas se destina a desvirtuar ainda mais as regras da proporcionalidade e da representatividade.
A, divisão dos círculos eleitorais de Lisboa, Porto, Aveiro, Braga e Setúbal, pela forma como é feita, tem como únicos objectivos inutilizar o crescimento eleitoral do CDS e assegurar ao PCP uma representatividade parlamentar, posta em causa pela diminuição do número de deputados nos círculos onde e tradicionalmente forte.
É pena que o Sr. Deputado Pacheco Pereira não esteja agora aqui presente, para lhe dar a resposta, quando diz que e ao eleitorado que compete dar a confiança e votar em maior número no CDS. Basta referir que o CDS, aumentando para o dobro a sua votação de 1987 nestes círculos, como e previsível que venha a acontecer...
Risos do PSD.
O Sr. Silva Marques (PSD):-Grande líder!
O Orador: - Quando o Sr. Deputado perder as eleições é que vai mudar de líder!
Aplausos do CDS e do PS.
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O Orador: - Como dizia, obteria resultados parlamentares que escandalosamente -e chamo a atenção das consciências ainda não eticamente desvirtuadas do PSD - se traduziriam na perda de um deputado em Lisboa, na perda do único deputado pelo Porto, na ausência de representação parlamentar em Aveiro e Setúbal e apenas na manutenção do único deputado eleito pelo círculo eleitoral de Braga.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso suo as contas do Ricardo Vieira!
O Orador: - Ou seja, o CDS passa para o dobro a sua votação nestes círculos e o resultado é perder dois deputados. Não se zanguem Srs. Deputados do PSD de que nós pensemos na «ignóbil porcaria».
Por outro lado, da análise da proposta resulta que, ao contrário, a condenação do PSD pelo eleitorado, fazendo-o baixar dos 50% de 1987 para 40%, que seguramente não irá atingir, não impediria que este partido, colocado em minoria por vontade do País, continuasse a assegurar a maioria absoluta na representação parlamentar. Menos votos, mais deputados para o PSD, é a regra de ouro do Governo sempre aplicada na actual proposta!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sabe-se hoje que esta proposta não passará, pois o Partido Socialista, de cujos votos dependia a sua aprovação, não se deixou seduzir pelos cantos de sereia e recusou-se a ser cúmplice ou co-autor de uma iniciativa que fere gravemente a consciência ética dos cidadãos.
Vozes do PS: - Muito bem!
Assim, não me parece correcto dizer-se que os socialistas funcionaram, neste caso, como anjos da guarda dos chamados pequenos partidos. Só quem entende mal o funcionamento dos mecanismos da democracia representativa poderia produzir uma tal afirmação.
Entende-se, pois, mal como o Sr. Secretário de Estado Carlos Encarnação vem aqui falar no CDS como culpado!... Onde é que eu já ouvi isto? Foi nos países de Leste ou na declaração de algum anónimo de antes do 25 de Abril?...
A função dos partidos não é a de serem anjos da guarda uns dos outros, mas sim de acturem de acordo com a sua tradição e no respeito pelos seus princípios em representação da vontade nacional.
O Partido Socialista, ao votar contra esta lei, mais não faz do que assumir o melhor da sua tradição democrática, não consentindo na deturpação da vontade livremente expressa pelo eleitorado nem admitindo a tentativa de «assassinato político» de um partido representado nesta Assembleia e cuja doutrina tem fundas raízes na sociedade portuguesa.
Aplausos do PS e do CDS.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Quando será o casamento?!
O Orador: - Porém, o facto de esta proposta ir ser reprovada não tira gravidade política à simples intenção subjacente à sua apresentação.
Um Governo que se disponibiliza a utilizar mecanismos de Estado em proveito próprio e que, para isso, não se coíbe de tentar aliciar o principal partido da oposição não tem qualquer credibilidade para assegurar a prossecussão dos interesses colectivos que, institucionalmente, lhe compete garantir.
Aplausos do CDS e do PS.
Este é um terreno que já se situa para além tia tradicional dicotomia governo-oposição, para se projectar na própria concepção e no funcionamento do Estado democrático.
O Governo, no seu afã cego de se manter no Poder a qualquer preço, pois sabe que disso poderá depender a própria sobrevivência do PSD...
Risos do PSD.
Não sou eu que o digo, é o José Miguel Júdice que o escreve, já que os senhores gostam tanto de citar pessoas do meu partido!
Repito, o Governo, no seu afã cego de se manter no Governo a qualquer preço, pois sabe que disso poderá depender a própria sobrevivência do PSD, não olha a meios para atingir os seus objectivos e já não se detém, sequer, na barreira que o simples respeito das regras da convivência democrática deveria representar.
Por isso, rejeitada esta proposta, o CDS aguarda, com expectativa, os próximos episódios. Será que iremos assistir a uma tentativa de revisão constitucional antecipada, que exigirá a concordância de quatro quintos dos deputados e sempre terá de respeitar os limites materiais de revisão? E se essa tentativa falhar, que mais nos irá acontecer?
O CDS está certo de que a consciência democrática nacional irá impedir o Governo de ir mais longe. Porém, se assim não se verificar (o que já não nos espantaria) e o Governo teimar em se manter por via administrativa, ignorando a vontade popular, isso só irá agravar a inexorável derrota do PSD em próximas eleições que, aliás, esta proposta, que é uma mancha e uma nódoa no currículo do Governo, em muito ajudou a construir. Então o PSD terá, finalmente, de se conformar e os portugueses poderão, finalmente, regozijar-se.
Aplausos do CDS e do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.
Protestos do PS e do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): -Sr. Presidente e Srs. Deputados: Surpreendem-me as vossas reacções, sobretudo as dos socialistas, que colocaram agora no seu programa a expressão «promover a equidade». Os senhores escrevem, mas é apenas para fingir. Se assim não fosse, não se comportariam como estão a comportar-se
O que os senhores não queriam era a equidade neste debate! Queriam que os vossos aliados defendessem a consideração como forma de intervir, mas não queriam que nós o fizéssemos!
Fiquem com a vossa equidade, pois ela não presta para nada!
Risos e aplausos do PSD.
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2870 I SERIE - NÚMERO 84
Sr. Deputado Basílio Horta, não nos insulte! Discuta!... Não nos insulte!...
Não ousarei dizer que o seu discurso me faz pensar na «ignóbil porcaria», porque o que eu desejo é discutir com o Sr. Deputado! Argumento contra argumento!
Sr. Deputado, já que ninguém me respondeu aqui deste lado, do lado socialista, ou da fracção socialista desta grande oposição, interpelo a ala direita desta oposição que, apesar de tudo, e tendo em conta as suas raízes democratas-cristãs, há-de, com certeza, ter um momento de grande elevação de alma!
Risos.
Sr. Deputado, é ou não verdade que aquilo que estamos a discutir é um dos maiores temas e das grandes polémicas que têm tido lugar ao longo da História c. relativamente à qual se têm dado as grandes clivagens quanto às correntes políticas?
Por isso pergunto-lhe, Sr. Deputado: porquê abordar esta questão, que diz respeito ao Governo do nosso País, na base de insultos e de invectivas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, mesmo que tivessem alguma validade as suas invectivas e os seus insultos, com que legitimidade, com que consciência aceitou o Sr. Deputado ser membro da governação de Portugal, membro do governo deste País, na base daquilo que se chamou Aliança Democrática, que teve a maioria absoluta dos deputados sem ter a maioria absoluta dos votos? Terá sido isso uma «ignóbil porcaria», Sr. Deputado?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, não ouso, porque penso que não devo ultrapassar o limite desse imperativo de cidadania e de rigor intelectual, considerar que o Sr. Deputado teve uma inaceitável (não direi ignóbil) incoerência.
Levo apenas a sua posição e a sua incoerência a conta de um grande desespero intelectual. É ele que vos leva a tocar os limites da irracionalidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS) : - Sr. Presidente, permita-me que, antes de dar explicações, interpele a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa pelo seguinte: o PSD, pela voz de vários dos seus Deputados - e já tentei por várias vezes interpelar a Mesa, mas tenho desistido porque ainda tinha a esperança que esse tipo de argumentação fosse abandonado -, tem vindo a dizer que pede a defesa da honra porque nós iniciámos essa prática aqui na Assembleia da República de forma destorcida e com abuso.
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - Gostaria de lembrar ao Sr. Presidente e perguntar à Mesa se não é verdade que utilizámos essa prática apenas por três vezes: uma quando o Sr. Ministro fez uma confissão de conluio, não provado, com o Partido, Socialista num determinado objectivo - e não foi, obviamente, a honra pessoal mas, sim, a honra política -, outra quando o Sr. Deputado Duarte Lima falou uma e outra vez no Prof. Freitas do Amaral e outra ainda quando o Sr. Secretário de Estado, com o maior dos à-vontades, invectivou o PS por ter poupado o CDS.
Portanto, gostaria que a Mesa confirmasse isso e dissesse que, em condição nenhuma, o exercício do nosso direito regimental saiu fora daquilo que está regimentalmente previsto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Basílio Horta, a Mesa já se pronunciou hoje vezes de mais relativamente à questão da figura da defesa da honra.
A Mesa tem-se recusado a interpretar se efectivamente os Srs. Deputados se sentem ou não ofendidos. Portanto, a Mesa não está a contabilizar isso.
Do ponto de vista do nosso debate poderemos questionar- e isso ficará para a conferência de líderes - se, do ponto de vista de disciplinar o debate, as defesas de honra devem ou não passar a ser incluídas, nomeadamente nestes debates, nos tempos globais dos respectivos partidos. Mas essa é outra questão, porque foi uma prática que a Mesa não iniciou e, neste momento, a Mesa recusa-
se a contabilizar se o Sr. Deputado utilizou muitas ou poucas vezes essa figura. Utilizou, no critério da Mesa, as vezes que entendeu adequadas e nós não estamos a contabilizar isso.
Assim, Sr. Deputado Basílio Horta, agradecia que desse as explicações, se assim o entender, em resposta à defesa da honra que foi exercida pelo Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Basílio Horta: - Sr. Presidente, este esclarecimento prévio era realmente importante porque, depois de nos terem dado só 15 minutos e depois de tudo o resto, depois desta Lei Eleitoral também não nos permitir responder aos insultos que nos fazem, era demais. Enfim, mas já nada me espantaria...!
Sr. Deputado Silva Marques, gostaria de começar por lhe dizer que a minha elevação de alma vai ser tão grande que eu estava tentado a pedir aos democratas-cristãos que rezem por si. Eu penso que o Sr. Deputado precisa que rezem por si!...
Risos.
O Sr- Silva Marques (PSD): -E eu não rejeito as preces!
O Orador: - Vai u esse ponto efectivamente a minha elevação de alma, para ver, Sr. Deputado, se o senhor realmente usa ou usufrui do resultado dessas orações, porque com isso beneficiava V. Ex.ª e todos nós.
Sr. Deputado, quero-lhe dizer que não insultei nem o seu partido nem o Governo. Falei na «ignóbil porcaria», que e uma expressão de Hintze Ribeiro,...
Protestos do PSD.
O Sr. Silva Marques (PSD): - É o contrário!
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O Orador: -... e, consequentemente, não se aplica directamente à vossa lei. Embora dizer isso da proposta que aqui apresentaram resulte dela mesma, porque quem insulta o CDS, Sr. Deputado, suo os senhores. Esta lei é um insulto ao CDS ...
Risos do PSD
... e à consciência democrática nacional.
Os senhores querem é ficar sozinhos, isso não é de agora, já vem de 1974, a representar um espaço político e como os votos não lhes dão essa possibilidade os senhores querem atingir esse objectivo pela força, sob a forma de lei. Isso é um insulto! E não venha o Sr. Deputado falar na Aliança Democrática que com 43% dos votos tinha a maioria absoluta, porque é algo completamente diferente. A Aliança Democrática não usou essa maioria absoluta para mudar a lei eleitoral, porque essa Aliança Democrática não era servida pelas mesmas pessoas que hoje ó servido o seu partido.
Risos do PSD.
Sc assim não fosse, eventualmente, teria feito dessa mesma forma.
Portanto, não há aí nenhuma comparação em que o Sr. Deputado se possa basear.
Para terminar, não posso deixar de salientar que, em boa verdade, o Sr. Deputado protesta, mas não diz, rigorosamente, o que quer que seja em relação aos argumentos que invoquei.
Com efeito, se o eleitorado entender aumentar, substancialmente, os votos do CDS, passando-os para o dobro, é ou não verdade que nos grandes círculos iremos perder dois deputados?
O Sr. Silva Marques (PSD): -Nos trabalhos do Sr. Deputado Almeida Santos não acontecia isso!
O Orador: - É ou não verdade? É verdade! E o senhor não pode negar isso!
Esta proposta de lei está feita «a régua e esquadro» e os senhores estuo zangados com o Partido Socialista, porque ele não foi aliciado pelos vossos «cânticos de sereia».
É que, dessa forma, sabendo perfeitamente que o PS nunca poderia ser governo, os senhores ficariam nele perpetuamente, ao que os senhores, eufemisticamente, chamam estabilidade!... Mas isso não tem a ver o que quer que seja nem com estabilidade nem com uma concepção saudável de democracia!
Por isso, somos nós, e não os senhores, quem se deve sentir insultado!
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, é para defesa da honra e consideração, visto que fui citado directamente pelo Sr. Deputado Basílio Horta.
Protestos do PS.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Isto é uma vergonha!
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Vou passar a trazer lanche!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, solicito que se faça silencio na Câmara para podermos prosseguir com os trabalhos.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça lavor, Sr. Deputado, uma vez que a figura da interpelação tem prioridade.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, dirijo-me a V. Ex.ª, usando estritamente a figura da interpelação, para salientar que cabe unicamente a V. Ex.ª conduzir os trabalhos, mantendo a disciplina e a equidade.
O Sr. Deputado Basílio Horta, no início deste debate, pediu a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração. Foi-lhe concedida. Usou esta figura regimental, pelo menos, por três vezes, o que lhe permitiu, quando chegou ao momento de fazer a sua intervenção, ter intacto o tempo que havia sido distribuído à sua bancada, isto embora tivesse falado mais do que todos nós até esse momento.
O Sr. Basílio Horta (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - Assim, tendo a bancada do Sr. Deputado Basílio Horta 4 deputados e a minha 147, gostaria de saber se o Sr. Presidente considera que estamos a violar o princípio de equidade, sempre que solicitamos a palavra - e já o fizemos algumas vezes, durante este debate-, para exercer o direito de defesa da honra e consideração, e se V. Ex.ª nos deve negar esse direito, tendo em conta, precisamente, a aplicação do já nomeado princípio de equidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, creio que a resposta à sua pergunta já, por diversas vezes, foi dada no decorrer desta sessão.
Para exercer o direito de defesa da honra e consideração pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, um debate sobre uma lei eleitoral não deve nem pode ser feito, exclusivamente, na base de quem directamente é beneficiado ou prejudicado.
Estou de acordo em que se discutam os efeitos tias alterações no panorama dos partidos nacionais, mas, antes disso, é necessário discutir as virtualidades das soluções trazidas para o sistema de representação e foi isso que, com excepção do PSD, praticamente ninguém fez neste debate, particularmente o CDS, que, desde o princípio, colocou o debate em termos da golpada e da batota e nunca discutiu os fundamentos da crítica ao sistema de representação actual e o sentido das medidas propostas pelo PSD, limitadas pela revisão constitucional, que vão no sentido das críticas que o CDS sempre fez.
Mas vou dar-lhe razão num aspecto - e espero obter o consenso da Câmara nessa matéria-: quando os senhores dizem que a actual alteração da Lei Eleitoral beneficia o PSD, e eu digo que só beneficia se o PSD for o primeiro partido, tal como beneficia o PS, se o PS
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for o primeiro partido. Mais: as alterações à actual Lei Eleitoral só prejudicam o CDS se o CDS continuar a ler a votação que tem!
Não admito uma discussão baseada apenas na projecção dos efeitos da actual aplicação da lei, baseada em pressupostos que nunca suo explicados sobre o que irá acontecer nas próximas eleições legislativas. Ora, discutir nesta base, não me parece eticamente correcto. E esta não é uma acusação pessoal ao Sr. Deputado mas uma acusação à maneira como o CDS passou para este debate. É que, se se discute em termos dos efeitos das propostas existentes sobre o CDS, a proposta que, efectivamente, faz desaparecer o CDS do sistema político foi feita pelo actual dirigente político do CDS.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, se outra fosse a Lei Eleitoral que o Governo que V. Ex.ª apoia aqui tivesse trazido e estivesse em discussão, V. Ex.ª tinha razão!...
É que esta lei eleitoral, por muito que se analise, não dá resposta, em nosso entender, a qualquer das críticas de que o actual sistema é susceptível de ser atacado - nem uma só! Não é criando um círculo nacional só com 30 deputados; não é omitindo o voto preferencial e não é não considerando - como eu, aliás, disse - os restos dos círculos locais que nós conseguimos conjugar a proporcionalidade com a representatividade.
Por outro lado, V. Ex.ª, que é um expert nesta matéria, tem de dar-me razão em que não é dividindo os círculos - não é dizendo que os grandes círculos passam a ser mais pequenos, dividindo-os por dois ou por ires - que se aproximam os eleitores dos eleitos - nem sequer contribui para isso!
Ora, se não há nenhuma solução visível nesta lei que responda a qualquer dos inconvenientes do actual sistema, obviamente que ficam as contas, que tem um destinatário... E essas contas, que não foram só feitas por nós mas por muitas outras pessoas, em todo o País - na comunicação social, nas revistas da especialidade e nos meios políticos-, certamente estuo bem feitas. E não me responda, como o fez uma vez o Ministro Dias Loureiro, dizendo: mas este regime é óptimo para vocês, porque se subirem de 4,5% para 35% ficam satisfeitíssimos!...
É óbvio que o Ministro Dias Loureiro estava a brincar connosco, porque nós não podemos subir de 4,5% para 35%!... Agora, se nós tivermos a subida normal que um partido democrático pode ter, subindo de 4,5% para 9%, 10% ou 11% - falando seriamente nas coisas-, é evidente que esta lei impede que esse crescimento eleitoral se reflicta nesta Assembleia.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Com certeza.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, digo-lhe, de novo, o mesmo que disse ao PS: por que razão não viabilizam a lei e, na especialidade, propõem as alterações? É que, até agora, não propuseram, qualquer alteração concreta!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Basílio Horta e Pacheco Pereira, esta interrupção, quando o Sr. Deputado Basílio Horta está a dar explicações relativamente a uma defesa da consideração pessoal, significa, de uma forma clara e evidente para toda a Câmara, que não é a defesa da consideração pessoal que está em causa. Isso tem de ficar claro, Srs. Deputados!
Aplausos do PS e do PCP.
Peço-lhe, pois, Sr. Deputado Basílio Horta, o favor de continuar, até ao fim do tempo regimental de que dispõe.
O Orador: - Permiti a interrupção por uma questão de cortesia para com o Sr. Deputado Pacheco Pereira, Sr. Presidente.
Mas termino já, Sr. Presidente, dizendo o seguinte ao Sr. Deputado Pacheco Pereira: nós não viabilizamos a proposta de lei porque não podemos viabilizar um instrumento que entendemos ler sido elaborado a pensar na nossa «morte»; nós não podemos viabilizar uma arma de arremesso contra nós; nós não podemos viabilizar - nem política nem eticamente é exigível que nos peçam isso - uma lei que é feita para os senhores obterem a hegemonia num espaço político, que, sei há muito desejam e não tem conseguido - aliás, digo-lhe que não irão conseguir!
Portanto, esta proposta de lei não tem, para nós, discussão possível e tem de ser rejeitada!
Mas uma proposta de lei que seja séria...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado, porque os seus três minutos já se esgotaram!
Orador:-Termino já, Sr. Presidente.
Como eu ia dizer, nessa altura e desde que sejamos ouvidos antes de a proposta ser apresentada, teremos todo o gosto em colaborar com todos os partidos de forma a darmos a nossa opinião para que se constitua um amplo consenso democrático à volta de uma lei de alteração estrutural do próprio sistema democrático.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, faço esta interpelação à Mesa com um sentido construtivo, como espero que todos o reconheçam.
O Sr. Silva Marques (PSD):-É a moção construtiva!...
O Sr. José Lello (PS): - Não seja malcriado!
O Orador: - Cada um de nós terá a sua interpretação sobre as razões e as motivações que têm levado ao prolongamento excessivo deste debate... - eu tenho as minhas, mas não vou expô-las porque não quero abrir qualquer polémica.
Com a autoridade moral que decorre do facto de o Partido Socialista ser uma força que ainda tem tempo disponível - tendo, aliás, intervenções preparadas -, venho sugerir o seguinte: se todas as forças políticas.
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Governo e partidos, estiverem dispostas a abdicar das suas intervenções, nós próprios também abdicaremos das nossas. Dessa forma poderíamos dar por encerrado o debate.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Guterres acabou de apresentar uma proposta. Há mais inscrições, que a Mesa presume que são para defesa da honra e consideração. Não sei se se mantém esses pedidos de palavra, mas se assim for o debate irá recomeçar.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço imensa desculpa, mas o Governo ainda tem uma intervenção para fazer e para tal ainda dispõe de tempo.
Penso que estava inscrito para intervir a seguir o Sr. Deputado Alberto Martins e o Governo inscreveu o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros para uma intervenção final. Sc forem respeitados os tempos e se nos limitarmos um pouco mais nas defesas da honra e consideração - excesso esse em relação ao qual eu próprio me penitencio - acabaremos, rapidamente, a sessão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa também tem uma proposta alternativa relativamente a esta questão e que é a de suspender a sessão e convocar uma conferencia de líderes para reorganizar os nossos trabalhos.
Protestos de alguns deputados do PSD.
O Sr. António Guterres (PS):-Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista retira as suas inscrições, mas reserva, naturalmente, o direito de repô-las se a intervenção do Sr. Secretário de Estado a isso nos obrigar.
Vozes do PS e do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está ainda inscrito o Sr. Deputado Duarte Lima, que gostaria de pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Basílio Horta.
Sr. Deputado Duarte Lima, prescinde da sua intervenção?
O Sr. Duarte Lima (PSD): -Sr. Presidente, na medida em que não houve interrupção dos trabalhos, eu não prescindo da minha intervenção.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, Sr. Deputado Duarte Lima, V. Ex.ª pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Para exercer o direito de defesa da consideração. E quero explicar porque!
Protestos de alguns deputados do PS e do PCP, batendo com os punhos no tampo das carteiras.
Sr. Presidente, é a primeira vez, hoje, que utilizo esta figura regimental e quero explicar à Mesa e à Câmara porque 6 que o faço.
Protestos do PCP.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Querem ou não discutir?
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados..., agradeço-lhes que permitam o mínimo de condições para que os trabalhos prossigam.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, eu não abuso desta figura e quero explicar à Mesa...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Duarte Lima, eu ainda não lhe dei a palavra!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas, afinal, querem ou não discutir?
Protestos de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Por favor, Sr. Deputado Silva Marques...
Srs. Deputados, agradeço que colaborem connosco...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sc têm fome, vão para casa. Estamos aqui para discutir!
Protestos do alguns deputados do PS, batendo, de novo, com os punhos no tampo das carteiras.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques e Srs. Deputados do PS agradeço-lhes que façam silêncio na sala.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD):-Sr. Presidente, por consideração para com a Câmara, para com V. Ex.ª e para com a Mesa, faço questão de dizer porque é que utilizo esta figura regimental, em resposta ao Sr. Deputado Basílio Horta.
Ele disse, na sua intervenção, que as pessoas que vieram defender aqui esta proposta de lei tinham proferido um insulto à consciência democrática nacional! Sucede que a defendi em nome do meu partido e considero que, nem subjectiva nem objectivamente, proferi qualquer insulto contra a consciência nacional.
Penso, pois - e os Srs. Deputados concordarão -, que não estou a utilizar abusivamente o direito de defesa da consideração para dar explicações sobre isto.
Diz V. Ex.ª, relativamente aos três argumentos que utilizou, o seguinte: ainda se houvesse o voto preferencial ou aprovei lamento de restos, poderia ter a proposta algum valimento, mas não, o Governo desenhou logo os círculos. Portanto, em sua opinião, não devia tê-los desenhado antes.
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Mas, Sr. Deputado Basílio Horta, este argumento não colhe, porque a possibilidade de se alterarem as soluções do Governo está sempre de pé até ao fim da discussão - ponto final sobre o primeiro argumento! Portanto, se V. Ex.ª acha que o aproveitamento dos restos ou o voto preferencial melhora a solução do Governo, tem sempre a possibilidade de fazê-lo, porque não há uma solução definitiva.
O segundo argumento, que é importante na sua intervenção, diz que o circulo eleitoral nacional de 30 deputados desvirtua ainda mais a proporcionalidade.
Eu sei que o Sr. Deputado Basílio Horta tem defendido a possibilidade de haver um círculo eleitoral nacional com mais de 30 deputados (com 60 ou com 70)... Nesse caso o que é que acontece? Acontece que o círculo de 50 deputados (de 60 ou superior) distorce - esse; sim! - ainda mais a proporcionalidade. E distorce-a de que modo? Se o círculo eleitoral nacional for um círculo maior, esses deputados têm de ser buscados onde? Nos círculos actualmente existentes!
E nos círculos pequenos a redução tem de ser sempre feita - como o Sr. Deputado Basílio Horta sabe - não de forma arbitrária, mas, como impõe a Constituição, de uma forma proporcional ao número de recenseados em cada círculo, o que leva a que os círculos actualmente com menos deputados (com quatro ou com três), como é o caso de Portalegre, passariam a ter dois ou três deputados, o que - isso, sim - poria em causa o princípio da proporcionalidade, e que está definido pelo Tribunal Constitucional que a partir desse limite o princípio da proporcionalidade ficaria em causa!...
De resto, Sr. Deputado Basílio Horta, compreendo o seu argumento, porque tem alguma coerência o círculo maior, mas lembro que, normalmente, o círculo eleitoral nacional de maior dimensão vai de par com um modelo diferente dos círculos locais, que é o modelo dos círculos uninominais.
Por último, há na sua intervenção uma contradição ao dizer que este é o modelo que mais prejudica o CDS. Dei-lhe exemplos concretos de que esses dois modelos que referiu, que é o aproveitamento de restos e o sistema misto com dois votos, nas três eleições que referi, penalizariam mais o CDS do que este sistema actualmente proposto pelo Governo.
Era apenas isto, Sr. Deputado!
Julgo que fui claro quando pedi para defender a seriedade da argumentação que utilizei na minha intervenção perante o Sr. Deputado Basílio Horta, e creio que ele a compreendeu.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, quero dizer muito rapidamente - quase telegraficamente - que em relação àquilo que considerei ser uma ofensa à consciência democrática nacional, uma e outra vez expliquei que penso que, quando se pretende reduzir e calar a voz do movimento democrata-cristão português, a consciência democrática nacional não está pacificada!
É essa a intenção do Governo e, daí, a minha afirmação.
Em segundo lugar, quanto ao círculo de 30 deputados, quero dizer-lhe, Sr. Deputado Duarte Lima, que não é obrigatório tirar os deputados dos pequenos círculos!...
O Sr. Duarte Lima (PSD): - É, é, Sr. Deputado!
O Orador: - Lembro-lhe só isto: os grandes círculos de Lisboa e Porto, com a sua proposta, ficam com 85 deputados, 74 a nível nacional e 11 no círculo nacional, o que e muito mais do que tem hoje!
Alarga-se, pois, a macrocefalia representativa de Lisboa e do Porto, em detrimento dos pequenos e dos médios círculos.
Quero, finalmente, dizer a V. Ex.ª que tudo aquilo que referiu respeita a outra proposta de lei. Ora, como não estamos a discutir essa proposta de lei, mas esta, poderemos então, quando discutirmos a outra, debater os argumentos que V. Ex.ª trouxe a esta Assembleia.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Vamos, então, seguir a ordem das inscrições, presumindo eu que o Sr. Deputado Alberto Martins prescinde da sua inscrição, reservando-se o direito de se inscrever, querendo, noutra altura...
O Sr. Silva Marques (PSD): - A renúncia ao uso da palavra é irreversível, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:-Neste momento, o Sr. Deputado Alberto Martins não está inscrito...!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): -E não pode voltar a inscrever-se, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Marques Mendes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É um facto que a proposta de lei apresentada pelo Governo não vai ser aprovada. A obstinação, a intransigência e a tremenda incapacidade do PS para agir e decidir a tal vão conduzir.
Importa, pois, nesta ocasião, do nosso ponto de vista, não tanto reafirmar os méritos e a bondade da nossa iniciativa mas, fundamentalmente, extrair deste debate as ilações e as conclusões políticas que a situação exige e o País requer.
A primeira conclusão é muito simples, mas igualmente muito importante.
Todos os políticos, em regra, têm por hábito falar do sistema político, das suas insuficiências e defeitos, das suas vulnerabilidades e perigos, da falta de eficácia que o caracteriza e da necessidade de modificá-lo e aperfeiçoá-lo.
Para conferir maior eficácia ao sistema político uma nova Lei Eleitoral não é tudo, mas é, seguramente, um passo, e dos mais importantes e decisivos.
Vozes do PSD: -Muito bem!
O Orador: - Mas quem ousou, neste domínio, ter iniciativa política e capacidade de acção? Quem ousou dar «uma pedrada no charco» e reavivar o sentimento de que, também nesta matéria, temos a obrigação de fazer mais e melhor?
Aplausos do PSD.
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Quem ousou dar tradução política concreta às opiniões generalizadas - que ninguém pode escamotear-, vindas de diversos quadrantes políticos, que em favor de uma nova Lei Eleitoral se tom manifestado, de forma pública e sistemática?
Não foram, como está bem de ver, os Srs. Deputados da oposição! Nilo foram também, por isso mesmo, os Srs. Deputados do Partido Socialista, porque estes tom por hábito falar muito, agitar muitas bandeiras, produzir muitos discursos, realizar muitas conferências..., mas há uma coisa em que continuam iguais a si mesmos, ontem, hoje e sempre: é que não conseguem disfarçar a crónica incapacidade para decidir, seja o que for, aliada a uma flagrante aversão à mudança e a uma histórica tendência para o conservadorismo!
Aplausos do PSD.
Também aqui, uma vez mais, vem ao de cima, de modo inapagável, a verdadeira face do PS: a sua incapacidade para compreender e aceitar as exigências da modernidade, da dinâmica do fenómeno político, da evolução dos povos e dos sistemas políticos.
O PS continua, de facto, adiado e atrasado. Atrasado em relação à História e ao futuro; adiado porque não tem soluções nem, muito menos, objectivos reais e credíveis a apresentar.
Aplausos do PSD.
A segunda conclusão política é igualmente, do nosso ponto de vista, importante: perante a iniciativa do Governo, perante o diálogo proposto, perante a disponibilidade por nós manifestada para alterar e aperfeiçoar o texto apresentado, o PS demonstrou a mais gritante das incapacidades, que é a incapacidade de formular um texto alternativo ou de apresentar alterações à proposta do Governo.
Aplausos do PSD e protestos do PS.
Para um partido que quer e ambiciona ser Poder, esta postura não deixa de ser politicamente grave e preocupante.
Não é apenas a incapacidade política que demonstra; é, sobretudo, a sua falta de credibilidade. Um partido que não decide e não age - quando e onde é Poder, quando e onde é oposição - é um partido sem presente e sem futuro e, sobretudo, um partido sem credibilidade e sem sentido de responsabilidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Credibilidade não tem quem quer, porque a credibilidade não se compra, não se vende, nem se alimenta em discursos pomposos. A credibilidade conquista-se com actos, iniciativas e decisões concretas e não apenas com discursos inflamados, retórica inconsequente ou palavreado do mais estéril que se possa imaginar.
Aplausos do PSD e protestos de alguns deputados do PS, batendo com os punhos no tampo das carteiras.
A terceira conclusão, por muito que isso custe, é igualmente sintomática, e significativa: o PS, sobretudo em questões essenciais, não tem ideias claras e coerentes, demonstra contradições permanentes, tem uma opinião quando é Poder e outra quando é oposição, oscila ao sabor das circunstâncias, da conjuntura e das conveniências políticas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em matéria de Lei Eleitoral não foge à regra!
Defendeu no bloco central, «preto no branco», «a redução tendencial do número de deputados, o estabelecimento de uma ligação mais estreita entre eleitores e eleitos e o reforço da estabilidade dos governos», ou seja, no plano dos princípios, o mesmo que o PSD já então sustentava e que o Governo actualmente propõe.
Acresce que na altura - em 1985 - o PS, então no Poder, não se lembrou de propor a regionalização, esqueceu-se de defender os pequenos partidos, não lhe ocorreu o fantasma da manipulação política e eleitoral.
Aplausos do PSD.
Hoje, cinco anos volvidos, o PS - que é suposto continuar a ser o mesmo - dá o dito por não dito, remete para as calendas o que antes defendia a toda a pressa, esqueceu-se, num ápice, das insuficiências que então apontava ao sistema político português.
O Sr. José Lello (PS):-É falso!
O Orador: - Quem mudou então? O sistema político ou o PS? E o que prevalece? A tão alegada candura de princípios dos dias de hoje, em que está na oposição, ou o desejo de ganhar, manipulando os resultados eleitorais quando estava no poder em 1985?
Aplausos do PSD.
Vozes do PS: - Isso é falso!
O Orador: - O PS é, de facto, do nosso ponto de vista, verdadeiramente uma de duas coisas - o que fica uma vez mais claro e patente aos olhos dos Portugueses -: ou o exemplo acabado da contradição militante ou o protótipo eloquente da mais pura hipocrisia política.
Aplausos do PSD.
Mas nem só a 1985 remontam as contradições: aquando da revisão constitucional, o PS acordou com o PSD a possibilidade da criação de um círculo nacional.
Hoje, é o que se vê! Mas eu diria que, formalmente, legalmente, juridicamente, é verdade: não ficou criado, desde logo, no texto constitucional o círculo nacional.
E politicamente, Srs. Deputados? Alguém acredita que, se o PS tivesse então objecções de fundo à criação de um círculo nacional, aceitaria, politicamente, consagrar a possibilidade da sua criação e da sua existência?
Aplausos do PSD e protestos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão, ao contrário do que aqui foi referido, não é jurídica mas política, pela mesma razão de que não estamos aqui a litigar juridicamente num tribunal, mas a discutir, politicamente, questões políticas essenciais, no órgão político por excelência do regime democrático português.
Aplausos do PSD.
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E tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não são palavras nem meras provocações políticas de circunstância. De resto, quem transformou o debate num debate menos sério não fomos nós.
O Sr. António Campos (PS): -Não?!...
O Orador: - Tudo isto são factos, verdadeiros, implacáveis e indesmentíveis, por muito que isso custe; factos que são, sem dúvida, dolorosos para quem então os praticou e hoje os renega, porque minam, afectam e desgastam aos olhos dos Portugueses o sentido de responsabilidade do Partido Socialista e colocam a nu, de forma irreprimível, a sua falta de credibilidade política.
Aplausos do PSD.
Uma última conclusão, Sr. Presidente e Srs. Deputados: o facto político e a iminência do facto legal suscitado pela iniciativa do Governo criaram uma indisfarçável perturbação no Partido Socialista.
O Sr. António Campos (PS): - Nota-se!
O Orador: - Ainda hoje tivemos aqui mais uma demonstração disso mesmo: a tentativa de fuga para a frente, de que a anunciada interpelação hoje aqui feita é um exemplo, é bem a demonstração disso!
Tudo isto porque o PS falhou, e falhou numa questão essencial do sistema político.
E falhou porquê? Porque o PS pensa no Poder e ambiciona-o, mas não tem, na prática, uma real e consistente convicção de conseguir alcançá-lo.
Aplausos do PSD.
Porque, no fundo, no fundo, o seu real objectivo não é obter o Poder mas, sim, evitar que os outros o consigam alcançar. Por outras palavras: o seu comportamento e os seus objectivos políticos são definidos pela negativa e não pela positiva ou pela afirmativa.
Em suma, falta hoje ao PS, em coragem para mudar, em audácia e em espírito de ambição o que lhe sobra neste momento em arrogância e triunfalismo.
Aplausos do PSD e protestos do PS.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, há um coisa que, do ponto de vista do Governo, fica muito clara depois do debate hoje aqui travado: o tempo se encarregará, mais ano menos ano, de demonstrar a premência, á urgência e a necessidade de modificar, séria e profundamente, o nosso sistema político.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Mas sem batota!
O Orador: - Por isso, é caso para dizer: mais vale ter razão antes de tempo do que, como é habitual no PS, tarde e a más horas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, é para defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado fez um discurso caceteiro, sem altura e sem estatura.
Aplausos do PS, do PCP, do CDS e do deputado independente João Corregedor da Fonseca e protestos de deputados do PSD, batendo com os punhos no tampo das carteiras.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Alegre, dado que está a defender a honra e a consideração, sugiro-lhe que utilize os termos regimentais correctos para fazê-lo.
Aplausos do PSD.
O Orador: - Sr. Presidente, a intervenção a que me referi foi um discurso sem altura e sem estatura e que demonstra que o Sr. Secretário de Estado não tem o sentido de Estado, tem é o instinto da defesa partidária.
Protestos do PSD.
O Sr. Secretário de Estado acusou o Partido Socialista de não ter capacidade de decisão. Ora, há algo que o Partido Socialista decidiu, no momento decisivo: decidiu o destino da liberdade e da democracia, sem o qual o senhor não estaria aí sentado,...
Aplausos do PS.
O Orador: - ... sem o qual o senhor não seria secretário de Estado, pelo menos de um regime democrático!
Há outra coisa que o Partido Socialista vai decidir e que é votar contra esta proposta de lei, que é um atentado u democracia portuguesa!
Aplausos do PS, do CDS e do deputado independente Raul Castro e protestos de deputados do PSD, batendo com os punhos no tampo das carteiras.
O Sr. Silva Marques (PSD): - O que ele está é a ofender a consideração!
O Sr. Carlos Brito (PCP):-O Sr. Deputado Silva Marques não percebeu o debate!
O Sr. Raul Rego (PS): - Isto assim é irrealizável!
Alguns deputados do PSD continuam a protestar, batendo com os punhos no tampo das carteiras.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa agradece que colaborem no sentido de podermos prosseguir o debate.
Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei três breves comentários ao que acabou de ser dito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não comente só; explique também!
O Orador: - Srs. Deputados do Partido Socialista, permitam-me que diga que penso que, neste como nou-
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tros momentos, o PS, quando não dispõe de outros argumentos, usa o único ao seu alcance, já «estafado» e repetido, que é o da defesa da liberdade, da democracia e do combate ao gonçalvismo,...
Protestos do PS.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - O senhor não é juiz!
O Orador: -... mas isso já se passou há muitos anos! Aplausos do PSD e protestos do PS.
O Sr. Raul Rego (PS): - Onde é que o senhor estava nessa altura?!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul Rogo e Srs. Deputados, creio que concordarão comigo em que, embora os apartes sejam permitidos regimentalmente, estamos todos a cair num pouco de exagero. Assim, agradecia-vos que contribuíssem para a manutenção do necessário silencio na Sala, para que o Sr. Secretário de Estado - que está no uso da palavra - possa terminar a sua intervenção.
Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, com toda a sinceridade, afirmo que todos estamos de acordo quanto à importância de muitas pessoas, designadamente da bancada do Partido Socialista, ...
Neste momento, registaram-se aplausos do Sr. Deputado do PS José Lello, o que provocou risos do PSD.
O Orador: -... na defesa da liberdade...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos silencio!
Pausa.
Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado José Lello, não é minha intenção perturbá-lo, pelo que, creio, poderá aguardar e deixar os seus aplausos para o fim, sem ter necessidade de interromper-me...
Aplausos do PSD.
Pela minha parte, apenas queria, de uma forma muito breve e com seriedade, dizer que, de facto, não se trata de qualquer tipo de ofensa.
A defesa da liberdade e da democracia e o combate ao gonçalvismo foram coisas importantes. Todos respeitamos e enaltecemos o combate que muitas das pessoas, designadamente algumas que estuo sentadas na bancada do Partido Socialista, travaram nesses momentos e nessas ocasiões. De resto, há pessoas em todas as bancadas e fora delas que travaram essas lutas, mas hoje, 14 anos volvidos, a questão é outra! E a questão política essencial que está aqui em debate não se combate, do meu ponto de vista, duma forma séria e eficaz com argumentos dessa natureza!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esses argumentos invocados são importantes em outros momentos, em outras circunstâncias e para outras questões. A questão agora em causa combate-se com outro tipo de argumentos e o que nós esperávamos era que se pudesse combater com soluções alternativas que viessem de outros partidos!
O segundo comentário que eu gostava de fazer é o de que penso, não ofendi, em termos pessoais, a honra de qualquer dos Srs. Deputados, porque aquilo que fiz foram considerações políticas,...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Fracas!
O Orador: -... que são duras e difíceis de ouvir, seguramente, para os seus destinatários, mas, permitam-me que lhes diga, a culpa não é minha mas, sim, das incoerências, das contradições, da incapacidade e da falta de credibilidade que, ao longo dos tempos, o Partido Socialista vem demonstrando aos olhos dos Portugueses, aos olhos da História e do regime democrático em Portugal!
O exemplo da Lei Eleitoral foi, uma vez mais, a demonstração das contradições, ao longo dos tempos, das incoerências de actuação, da incapacidade, uma vez mais patenteada, para agir e para decidir de uma forma séria, profícua e responsável.
É isto que custa politicamente, mas é isto também que, com verdade, tem de ser dito aqui e fora daqui para que os Portugueses saibam julgar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Alegre pediu, de novo, a palavra?
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sim, Sr. Presidente, mas prescindo.
O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, desejo pela via da interpelação à Mesa, que me parece adequada, fornecer uma informação urgente e fundamental a este debate. Se me permite, vou produzi-la imediatamente.
Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado, no momento em que no nosso País se decidia a questão da democracia, estava no campo dela, mas vários dos actuais dirigentes do PS estavam no campo contrário ou no campo do gonçalvismo!
Aplausos do PSD e protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Obviamente, Sr. Deputado Silva Marques, a sua intervenção não se enquadrou na figura regimental da interpelação à Mesa!...
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se alguma coisa esta sessão tem mostrado é o desespero do PSD!
Risos do PSD.
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O PSD não sabe perder, mas vai perder hoje, e vai perder cada vez mais..
Aplausos do PS e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Se alguma coisa, hoje, se concluiu foi também que o mistério do acordo secreto do PSD está desvendado; o PSD faltou à verdade; o PSD usou todos os meios, repudiados pela ética política para tentar esconderia fragilidade dos seus argumentos!
É falso que tenha havido qualquer compromisso na revisão constitucional, como ficou provado, conducente à aprovação das soluções contidas na proposta de lei defendida pelo PSD. A única regra indiscutível, aceite pelo PS nesta matéria, e que está na Constituição, foi a da redução do número de deputados. A possibilidade de um círculo é uma pura faculdade. O PSD acusa por isso com falsidades o PS, em matéria de compromisso eleitoral. E falo com todo o despudor; acusa, lança a pedra, esconde a mão!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os Srs. Deputados do PSD têm de saber que quem acusa tem o ónus da prova da acusação.
Exigimos, por isso, confirmação credível que prove as acusações do PSD. O PSD, não o fazendo - e não pode fazê-lo!- limita-se apenas a esbracejar, a delirar na calúnia e a mentir.
Aplausos do PS e do deputado do CDS Basílio Horta.
Isso não é sério e avilta os seus autores e a democracia.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final deste debate, não podemos deixar de frisar que as regras do sufrágio, da sua organização e representatividade condicionam não só o sistema de partidos como o de Governo e, nesse sentido, a própria realidade em acto do regime democrático. A proposta de lei do Governo PSD vinha, assim, ao encontro de um centro nevrálgico do sistema democrático, por isso, na delicadeza da operação, deveria cumprir rigorosamente a Constituição e garantir os mecanismos com que se faz a democracia que somos.
Nesta matéria, na última revisão, as mais relevantes alterações no que respeita à Assembleia da República respeitaram à diminuição do número de deputados e à definição dos círculos eleitorais, que passaram a estar sujeitos a uma maioria qualificada de dois terços, maioria essa seguramente imune às tentações de conjuntura. Esse foi um resultado do acordo de revisão de que o Partido Socialista se regozija - e agora, depois deste debate, mais do que nunca!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A evidência dos factos - e onde há factos cedem as palavras estreitas! - e a estreiteza das palavras demonstram-nos claramente que, se assim não fosse, o PSD imporia atribiliariamente a sua vontade!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Disso ninguém tem dúvida; não têm dúvidas os Portugueses, nem sequer o PSD!
É porque mesmo assim, com a exigência constitucional dos dois terços, com a evidencia dos acordos escritos, com a claridade das declarações públicas na Assembleia da República, o PSD vem inovar, num vale tudo de falsas declarações e falsos compromissos que só se encontram em quem perdeu o Norte e não se casa com a razão!
O PSD em matéria de compromisso eleitoral falta à verdade e sabe que está a faltar a essa verdade!
Mas passemos a alguns aspectos de debate sobre a proposta de lei e, desde logo, ao círculo eleitoral nacional, o qual nasceu - como já se disse e é importante frisá-lo de novo - como uma faculdade legal, manteve-se como uma faculdade legal e é, nos termos da mera e única interpretação constitucional possível, uma faculdade legal! Mas o círculo nacional pode ter os mais diversos contornos práticos. Pensar ou pretender o contrário é embuste de ilusionista desesperado, sem convicção, e só pode alicerçar-se em números toscos e gastos.
A que se deve, então, o desgarrado dos argumentos de pretensa má-fé, de afirmação de compromisso inexistente? A que se devem estas invocações de compromisso que se não provam? A que se deve este surpreendente desespero do PSD face à lei eleitoral? A que se deve este delírio de argumentos, que não resistem à prova da verdade de negociadores honrados?
Será que os Srs. Deputados Rui Machete, Assunção Esteves, António Vitorino, Almeida Santos e outros agiram com reserva mental quando falaram nas soluções, facultativas, e tão-só nessas?
O que visionava o PSD com esta proposta de lei? O PSD só teve com esta iniciativa, e na forma como a corporizou, um intento, um motivo: garantir as melhores condições da sua perpetuação no poder e entreviu essa possibilidade tentando a «piscadela de olho» ao PS no sentido de uma solução, que, no mercadejo de votos, lhe fosse favorável.
Este exercício de manipulação da «genética eleitoral» poderia ser favorável ao PS, mas o PS não o quer, repudia-o porque isso provocaria um aleijão irrecuperável na democracia portuguesa, nas suas regras e na sua pluralidade.
Aplausos, do PS e do deputado do CDS Basílio Horta.
As contas já estão feitas e dispensam artifícios. Vale, de qualquer modo, a pena determo-nos quanto, ao número mínimo de sufrágios necessários para a obtenção de um mandato: a divisão dos círculos de Aveiro, Braga, Lisboa, Porto e Setúbal penalizaria fortemente os partidos menos votados; a criação do círculo nacional não compensaria, de nenhum modo, a subida do limiar a nível nacional; a penalização e maior quanto se traia de partidos em que o voto é pouco concentrado, para os quais a penalização se reflecte em todos os círculos; o círculo de 30 deputados, penaliza os partidos de pequena votação e dispersa e sobrevaloriza os mais votados. Em suma, o PSD tinha como claro intuito tentar irradiar do mapa eleitoral o CDS, eventualmente o PRD, cristalizando à esquerda as melhores condições à reprodução do PS e PCP.
A manobra foi notória, direi mesmo até canhestra, e o gesticular dos pretensos princípios anunciados não resiste à evidência dos números. A proposta de lei do PSD era contrabando eleitoral, não passa a fronteira e vai ter o destino que merece!
Aplausos do PS e do CDS.
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E não se façam - como já ouvimos aqui!... - arquejos de almas, arrufos de amoroso arrependido ou ludíbrios de falsa eloquência para ocultar o intuito inicial. A proposta de lei não teve desígnios superiores; não procurou consensos; não tem justificação sólida e séria; situa-se no puro terreno de manipulação da «genética eleitoral» que não olha a meios para produzir o novo ser: um aleijão democrático!
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Ignorância!... Não sabe o que é «genética eleitoral»!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O que o PSD pretende é criar uma maioria in vitro!
O Orador: - Mas teria a proposta de lei, ao menos, o desígnio de aproximar eleitos e eleitores? Não linha! E é bom lembrar, no entanto, que num sistema eleitoral proporcional o objectivo participativo não é alcançável por regras de votação uninominal, próprias do sistema maioritário, mas, sobretudo, por regras de articulação informativa e de funcionamento do Parlamento e dos partidos.
Num sistema proporcional, em que não há possibilidade de votação uninominal, a ligação do deputado ao eleitor só poderá fazer-se ou pela escolha personalizada dentro da opção partidária, assinalando preferências pessoais, ou, à margem do sistema eleitoral, por um sistema informativo eficaz, meios de comunicação e acção política próprias e regras de funcionamento do Parlamento e dos partidos adequados.
Acresce que, num sistema proporcional, quanto maior for o número de lugares maior é o grau de proporcionalidade; a diminuição dos círculos acarreta a diminuição da sua proporcionalidade, sendo adquirido que círculos inferiores a quatro ou cinco lugares não respeitam a proporcionalidade.
O Sr. Duarte Lima (PSD):-Três a cinco lugares...? O sistema mais democrático, que é o irlandês, tem três a cinco lugares!
O Orador: - Há também que reconhecer, quanto à estabilidade política anunciada, que qualquer sistema eleitoral deverá ser simultaneamente simples, equitativo e eficaz. Evidentemente que, ao optar pela regra da proporcionalidade, os constituintes portugueses erigiram, como objectivo prevalecente do sistema eleitoral, o pluralismo representativo em detrimento da eficácia e da estabilidade governativas. Ficou-se por aqui, no essencial, o nosso sistema proporcional. Agora, diria que pretender alterar o sistema proporcional por entorse desse mesmo sistema, na mais descabelada engenharia eleitoral ou no mais despudorado aleijão por imposição ortopédica, o que leva à criação de círculos eleitorais «artificiais» de pendor só lucrativista, constitui, além do mais, uma solução arbitrária, a qual, por sua vez, cria uma cláusula-barreira mínima na prática em todos os círculos na ordem dos 8% a 9% mínima, com a excepção de um, que é uma cláusula-barreira mínima de 5%.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isso é outra mentira! É ignorância pura!
O Orador: - A reforma do Estado que, neste domínio, passe pela criação de novos círculos eleitorais, desde logo emergentes das realidades regionais, das realidades metropolitanas a criar, do desaparecimento consequente dos distritos, far-se-á necessariamente, como temos dito e reafirmamos, no quadro da regionalização. Esta ingente falta na reorganização territorial do Estado - que a Constituição de 1976 consagra e que é uma exigência nacional urgente, mas que o PSD não cumpre - é, no nosso ponto de vista, a partida para uma nova geografia eleitoral, não a geografia dos pequenos fautores ou topógrafos de vistas curtas, que marcam os terrenos e as barreiras da sua conveniência, mas uma nova geografia regionalizadora, que constitua um desígnio nacional na geografia da liberdade.
Por que a democracia é simultaneamente uma técnica e uma ética, um sistema de regras e um conjunto de valores, não se podem constituir e construir soluções sofismadas pela avidez do mercadejo de votos e pretender regras que se compatibilizem com os princípios superiores da democracia.
A proposta do Governo é, por estas razões, uma carta viciada, num jogo perigoso que não serve a democracia. Terá, por isso, o destino que merece!
Aplausos do PS e do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora entrar no período de votações que estão agendadas para hoje.
Em primeiro lugar, procederemos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 134/V, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira, que estabelece o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PRD. de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro e a abstenção do CDS.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, socorrendo-me da praxe, quero anunciar que entregarei na Mesa uma declaração de voto por escrito, que justifica o adequado voto que acabámos de produzir nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, de seguida, votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 142/V, apresentada pela Assembleia Regional dos Açores, e que procede à segunda revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo e Helena Roseta.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta de lei n.º 119/V, sobre cooperação judiciária internacional em matéria penal.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo e Helena Roseta.
Srs. Deputados, vamos agora passar à votação final global do texto final da Comissão de Assuntos Constitu-
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cionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 115/V, quê autoriza o Governo a legislar sobre processamento e julgamento de contravenções - e transgressões.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor, do PSD e abstenções do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação, final global da proposta de lei n.º 124/V, que altera as bases gerais das empresas públicas, no sentido de afastar a necessidade de autorização e aprovação tutelar para as aquisições e vendas de montante superior a 50 000 contos realizadas por aquelas empresas, segundo alteração ao Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
Srs. Deputados, iríamos, de seguida, passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 151/V, que dá nova redacção à Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (Lei Eleitoral para a Assembleia da República).
Naturalmente que este aviso será dispensável, mas, de qualquer forma, previno os Srs. Deputados de que suo necessários 126 votos para o presente diploma ser aprovado na generalidade. Aliás, faço esta observação, dado que esta votação se apresenta de alguma complexidade.
Vamos então votar.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro e a abstenção do deputado do PS António Barreto.
Srs. Deputados, vamos agora passar à votação, na especialidade...
O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, parecia-me útil que, antes de se começar a fazer a votação na especialidade, se pudesse, com clareza, encontrar um critério comummente aceite, com vista à definição dos preceitos que deverão ser votados exigindo uma maioria qualificada de dois terços, para a definição de quais são os outros dispositivos nesse sentido e para alguns eventuais ajustamentos que decorram da aprovação de uns e da não aprovação de outros, de modo a que a lei não fique aleijada - para usar uma expressão hoje muito em voga.
Assim, se fosse possível, pediria que a Mesa pudesse apresentar a sua proposta global relativamente a estas votações, para que, no início e antes de começarem a cair em cascam, possamos obter entre nós um consenso que evite depois problemas que iodos desejamos evitar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não sei se a Mesa estará em condições, mas vai fazer a proposta, contando, aliás, com a ajuda dos Srs. Deputados relativamente à melhor metodologia a seguir nesta matéria.
Assim, não iríamos votar o artigo único da proposta de lei, mas os vários artigos, isto e, os artigos 12.º, 13.º, 23.º e 107.º
Os n.ºs 2 e 3 do artigo 12.º requerem maioria de dois terços. Os n.ºs l e 2 do artigo 13.º requerem maioria simples, enquanto que os seus n.ºs 3 e 4 requerem uma maioria qualificada de dois terços, embora este último número caia com a eventual não aprovação do n.º 3 -o que, pensamos, acontecerá também com o n.º 5...
O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, chamaria a atenção de todas as bancadas para algumas eventuais correcções em relação ao que foi dito pela Mesa. que penso corresponderem melhor ao entendimento constitucional.
Assim, parece-nos claro que o n.º 2 do artigo 12.º exige uma maioria de dois terços, o que, independentemente do facto de ser ou não controverso, acontece também com o n.º 3 do artigo 12.º Do. nosso ponto de vista, o n.º l do artigo 13.º não exige maioria de dois terços, mas já o n.º 2, não sendo controverso, nos parece exigir aquela maioria qualificada, na medida em que corresponde ao simétrico do número de deputados dos círculos da emigração. Penso que os n.ºs 3 e 4 deste artigo 13.º exigem uma maioria de dois terços, - enquanto, no nosso entendimento, o seu n.º 5 não exige tal maioria. Por seu lado, os n.ºs l e 2 do artigo 2.º igualmente não obrigam à verificação de uma maioria qualificada de dois terços.
O Sr. Presidente: - E o artigo 107.º, Sr. Deputado António Guterres, na opinião do Partido Socialista?
O Sr. João Amaral (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, para ajudar a Mesa neste problema.
O Sr. João Amaral (PCP):-Sr. Presidente, não tenho por função, nesta intervenção, ajudar ninguém mas tentar contribuir para se conseguir algum ponto de entendimento. E esse ponto de entendimento tem de partir de uma realidade, ou seja, a de que, quando considerámos, aqui, por consenso, que são necessários dois terços, não subsiste nenhuma espécie de dúvida, isto é, suceda o que suceder, nós consideramos a norma aprovada com dois terços e, depois, será inatacável.
Mas, quando se fazem exigências de grau inferior, se o correcto entendimento constitucional que o Tribunal Constitucional eventualmente venha a ter for diferente do que aqui for feito, é bom termos consciência de que aquele que prevalece e o do Tribunal Constitucional.
Dito isto, quero declarar que lenho as máximas dúvidas que o n.º l do artigo 13.º necessite para aprovação de, apenas, uma maioria simples e não dá maioria de dois terços. E passo a explicar porque é que considero que a aprovação deve ser feita por uma maioria de dois terços. É porque o que está no n.º l do artigo 13.º, como número total de deputados, é um pressuposto, aliás o primeiro pressuposto, do número de deputados por-círculos.
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Isto é, como não é irrelevante para o número de deputados por círculos o número de deputados no seu total - se são 230, 231, 232, 233, 234 ou 235-, defendo que também esse n.º l carece de uma maioria de dois terços.
O Sr. Silva Marques (PSD): - E aí, os socialistas votam a favor, com certeza!
O Orador:-Era isto, Sr. Presidente, que queria deixar aqui registado para os devidos efeitos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos em condições de votar. A única dúvida que subsiste relativamente à interpretação - mas a votação dirá - é, creio eu, quanto a considerar-se aprovado ou não o n.º l do artigo 13.º, em função da votação por maioria simples ou da votação por dois terços.
Quanto ao resto, creio que o Partido Social-Democrata concorda com os números que foram sugeridos como necessitando da votação de dois terços. Sobre isso, não há dúvidas.
Creio, Srs. Deputados, que face a isto, estamos em condições de votar.
Como deve ser do conhecimento geral - mas não sei se já foram distribuídas -, há propostas de substituição apresentadas pelo Partido Comunista Português relativamente aos n.ºs l e 2 do artigo 13.º
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, era nossa intenção, por razões de mera adequação processual, apresentar uma proposta de substituição na altura para o n.º 2 do artigo 13.º. Vou entregá-la, agora, na Mesa. Ela tem uma explicação técnica que no momento será feita e penso que será fácil de compreender pela Câmara.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do ponto de vista formal, e creio que isto seria correcto, devia haver alguma discussão na especialidade artigo a artigo.
O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!
Uma voz do PSD: - Mas a discussão está feita!...
O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas penso que não se considera feita na medida em que há Srs. Deputados que, relativamente à discussão na especialidade e a determinados números, têm objecções concretas a fazer. Pelo menos creio que pode ou deve haver,... aliás, existem também propostas de alteração.
Vamos, pois, começar pelo artigo 12.º
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para aclarar a forma de votação. Quero perguntar o seguinte: se o n.º 2 do artigo 12.º não obtiver os dois terços, o que sucede ao n.º 3? É que, na minha opinião, o n.º 3 carece de objecto e por isso gostaria de saber se está claro que este número fica prejudicado se isso acontecer.
Vozes do PSD: - Claro que fica prejudicado!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para que não restem dúvidas, vamos pôr à votação, na especialidade, o n.º 2 do artigo 12.º, que necessita da maioria de dois terços para ser aprovado. Se assim acontecer o n.º 3 deste mesmo artigo fica prejudicado, como já foi dito.
Srs. Deputados, vamos votar.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos contra do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro, votos a favor do PSD e a abstenção do deputado do PS António Barreto.
Era o seguinte:
2 - No território nacional há um círculo eleitoral coincidente com toda a área do território, designado por círculo eleitoral nacional, com sede em Lisboa, e 30 círculos eleitorais locais cujas áreas, denominações e sedes constam do quadro anexo à presente lei, que dela faz parte integrante.
O Sr. Silva Marques (PSD): -A «santa aliança» para a obstrução!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS):-Sr. Presidente, gostaria apenas de esclarecer que o n.º 3 do artigo 12.º e exactamente igual ao que está em vigor na lei. Portanto, nesse sentido, ele fica prejudicado!
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Exacto!
O Sr. Presidente: - Sim, também é essa a interpretação da Mesa.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não tendo sido aprovado, com a maioria necessária de dois terços, o n.º 2 do artigo 12.º o n.º 3 deste artigo fica prejudicado, uma vez que o que fica em vigor e o que consta do actual artigo 12.º da Lei Eleitoral.
Vozes do PSD: - Ó Sr. Deputado, isso já tinha sido dito!
O Orador: - É para prevenir!,..
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foi distribuída, e já deve ser do conhecimento de todos, uma proposta de substituição dos n.ºs l e 2 do artigo 13.º, apresentada pelo PCP.
Vamos votar.
O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Presidente não põe essa proposta de substituição à discussão?
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O Sr. Presidente:-Sr. Deputado, como foi dito no início desta sessão os tempos globais atribuídos aos grupos parlamentares destinavam-se à discussão na generalidade e na especialidade desta proposta de lei.
De facto, deveria haver discussão, se e que surgem dúvidas relativamente à interpretação dos números dos artigos, mas como não restam tempos...
De qualquer modo, uma vez que o Sr. Deputado João Amaral interpelou a Mesa relativamente à interpretação que dá e à necessidade da maioria de dois terços para o artigo 13.º, n.º l, da proposta de lei n.º 151/V, vou-lhe dar a palavra para justificar a proposta de substituição, apresentada pelo PCP.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, muito obrigado. Essa é, aliás, uma decisão justa, na medida em que nós não fizemos grandes defesas da honra nem ocupámos tanto tempo como isso no debate....
Quero dizer muito simplesmente que na revisão constitucional, em nossa opinião mal, se diminuiu o número total de deputados para 230 a 235. Nada, mas nada, obriga a que se opte pelo número mínimo de 230; pelo contrário, tudo justifica, nomeadamente as garantias de representação proporcional, que se mantenha o número máximo, isto e, que se opte pelo número de 235 deputados.
O conteúdo da nossa proposta, na parte que 6 relevante, é a proposta de substituição do n.º l do artigo 13.º da proposta de lei 151/V, que, concretamente, diz que o número total de deputados é de 235.
Quanto à proposta de substituição do n.º 2 do artigo 13.º, da mesma proposta de lei, seria uma decorrência da aprovação do n.º l, que consideramos - e apelamos nesse sentido - uma solução muito mais adequada para a representação dos Portugueses nesta Assembleia da República.
O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, como não há mais inscrições relativamente à discussão dos n.ºs l e 2 do artigo 13.º da proposta de lei 151/V, vamos proceder à votação da proposta de substituição apresentada pelo PCP, submetendo separadamente à votação o n.º l e o n.º 2.
Vamos votar a proposta de substituição do n.º 1.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e do PS, votos a favor do PCP, do PRD e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca, Raul Castro e da deputada do PS Teresa Santa Clara Gomes e abstenções do CDS, de Os Verdes e do deputado do PS António Barreto.
Era a seguinte:
l -O número total de deputados e de 235.
Srs. Deputados, vamos votar o n.º l do artigo 13.º da proposta de lei n.º 151/V.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, para dizer que o n.º 2 da nossa proposta de substituição fica prejudicado com a rejeição daquilo que propusemos para o n.º 1.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, então, vamos votar o n.º l do artigo 13.º da proposta de lei n.º 151/V.
Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo sido aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS, votos contra do PCP, do PRD, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro e abstenção do deputado do PS António Barreto.
É a seguinte:
l - O número total de deputados e de 230.
O Sr. António Guieiros (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente:-O Sr. Deputado António Guterres pede palavra para que efeito?
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, para explicar brevemente o problema que nos levou a introduzir a proposta de emenda distribuída aos grupos parlamentares.
O n.º 3 do artigo 13.º da proposta de lei 151/V caducou com a não aprovação do artigo 12.º, n.º 2, mas linha uma norma que é imprescindível que fique consignada. Trata-se da norma que define a proporcionalidade na distribuição dos círculos e que consta aliás da actual lei. Isto é, como o n.º 2 tem de ser mudado para mudar de 256 para 226, imperioso é que se lhe acrescente a mesma norma de proporcionalidade. Ora, é neste sentido que se apresenta a proposta.
O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, vamos votar a proposta de substituição do Partido Socialista para o n.º 2 do artigo 13.
Submetida à votação foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Raul Castro e João Corregedor da Fonseca e a abstenção de Os Verdes e do deputado do PS Amónio Barreto.
É o seguinte:
2 - O número total de deputados pelos círculos eleitorais do território nacional e de 226, distribuídos proporcionalmente ao número de eleitores de cada círculo, segundo o método da média mais alta de Hondt, de harmonia com o critério fixado no artigo 16.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio.
Srs. Deputados, na sequência desta votação penso que caem os n.ºs 3, 4 e 5 do artigo 13.º
O Sr. Basílio Horta (CDS):- O n.º 4 não cai!
Pausa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o n.º 3 e o n.º 4 do artigo 13.º caem, naturalmente, em função da votação agora feita para o n.º 2 desse artigo.
O Sr. João Amaral (PCP): - Posso interpelar a Mesa, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o n.º 4 não cai, como tal.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Está caduco!
O Sr. António Guterres (PS): - Posso interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, penso que os n.ºs 4 e 5 da proposta de lei n.º 151/V devem ser votados, carecendo o n.º 4 da maioria de dois terços e o n.º 5 apenas de maioria simples.
No entanto, tal não deve impedir a consideração de que o n.º 4 do artigo 13.º da Lei Eleitoral deve manter-se, lendo, eventualmente, um número diferente, o que não é agora a minha preocupação essencial.
O que me parece importante referir 6 que o n.º 4 da Lei actual não está em causa e mantém-se com o número que lhe vier a corresponder na redacção final e que devemos agora votar os n.ºs 4 e 5 da proposta de lei, o primeiro exigindo maioria de dois terços e o segundo exigindo maioria simples.
Penso ser esse o entendimento de todos nós.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pediu a palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dar o meu contributo para o esclarecimento deste assunto. Sendo certo que vamos formular um artigo completo para substituir o actual artigo, parece-me mais prudente reproduzir e votar o actual artigo 13.º, n.º 4, introduzindo num novo articulado o artigo 13.º A não ser assim, e se ficarmos pelas boas intenções, podemos criar um problema de difícil resolução. Parece-me mais prudente fazermos com o n.º 4 do actual artigo 13.º o mesmo que se faz com o que está disposto agora no n.º 5, que também reproduz o que está actualmente no n.º 3.
Srs Deputados, chamo a atenção para esse lacto, porque o n.º 5 do artigo 13.º, tal como está configurado, limita-se a reproduzir o que está no n.º 3 do actual, e em vigor, artigo 13.º Por isso, é mais prudente fazermos essa mesma reprodução em relação ao artigo 13.º, n.º 4 actual, que, para registo, passo a ler: «O mapa referido no número anterior [...]» -seria portanto um número seguinte ao n.º 5-»[...] e elaborado com base no número de eleitores segundo a última actualização do recenseamento.»
O Sr. António Guterres (PS): -Sr. Presidente, peço a palavra para dar um esclarecimento acerca deste assunto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): -Sr. Presidente, do nosso ponto de vista, não há qualquer inconveniente em que se vote, não nos parece necessário, mas se há dúvidas é melhor votarmos duas vexes do que não votar nenhuma.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro cios Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:-O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Secretário de listado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, apesar de pensar que a questão está ultrapassada, quero dizer o seguinte: parece-me que, estando aprovado este número tal como está, mesmo assim, em redacção final, poderia ser ultrapassada esta questão, visto ser vontade expressa da Câmara que este número e o próximo sejam aprovados. No entanto, se quiserem fazer uma redacção nova para o número também não me oponho a isso, mas penso que não valerá a pena.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, podemos pôr à votação os n.ºs 3, 4 e 5 com o entendimento de que essa questão seria ultrapassada, posteriormente, em sede de revisão de redacção...
Pausa.
Srs. Deputados, não havendo dúvidas, creio que a metodologia a seguir é esta: em primeiro lugar, procederemos à votação do n.º 4 do artigo 13.º, que requer a maioria de dois terços, depois votaremos o n.º 5, que não requer maioria simples, e, finalmente, o aditamento ao artigo 13.º, que será um novo número com a redacção do n.º 4 do artigo 13.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio o qual tem a redacção já lida pelo Sr. Deputado João Amaral e que volto a repetir: «O mapa referido no número anterior é elaborado com base no número de eleitores segundo a última actualização do recenseamento.»
Srs. Deputados, vamos votar n.º 4 do artigo 13.º, que requer a maioria de dois terços para a sua aprovação.
Submetido à votação, obteve a maioria de dois terço necessária, lendo sido aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Helena Roseta e Carlos Macedo.
É o seguinte:
4 - A cada um dos círculos eleitorais referidos no n.º 3 do artigo anterior correspondem dois deputados.
Srs. Deputados, vamos votar o n.º 5 do artigo 13.º da proposta de lei, cuja aprovação se obtém por maioria simples.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo e Helena Roseta.
É o seguinte:
5 - A Comissão Nacional de Eleições fará publicar no Diário da República, l. ª série, entre os 80 e os 70 dias anteriores a data marcada para a realização das eleições, um mapa com o número de deputados e a sua distribuição pelos círculos.
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Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de aditamento de um n.º 6 ao artigo 13.º, cuja redacção e a do n.º 4 do artigo 13.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo e Helena Roseta.
É o seguinte:
6 - O mapa referido no número anterior e elaborado com base no número de eleitores segundo a última actualização do recenseamento.
Srs. Deputados, vamos passar à votação do artigo 23.º da proposta de lei.
O Sr. António Guterres (PS):-Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, salvo melhor opinião, penso que o n.º 2 deste artigo está prejudicado, pois a alteração da palavra «capital» para «sede» já não se justifica, uma vez que se mantêm os distritos.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente:-Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral: (PCP) - Sr. Presidente, estou de acordo com o que o Sr. Deputado Amónio Guterres disse em relação ao n.º 2 do artigo 23.º e parece-me que existe também um problema semelhante em relação ao n.º 3, uma vez que nele se referia qual era o juíz, em concreto, onde deveriam ser apresentadas as candidaturas por Lisboa e Porto, que constituíam um único círculo, o que poderia e deveria ser leito.
Esta alteração do n.º 3 do artigo 23.º pressupunha, o que não aconteceu, a divisão dos distritos de Lisboa e Porto em vários círculos. Neste quadro, o n.º 3 também não tem, neste momento, razão de ser e, por isso, não tem qualquer interesse ser votado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Caiu!
O Orador:-Caiu também!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que o entendimento da Câmara é no sentido de que os n.ºs 2 e 3 do artigo 23.º estão prejudicados, vamos passar à votação do artigo 107.º da proposta de lei.
O Sr. João Amaral (PCP): Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, suponho que aqui a questão é a mesma e «repete-se a cena». Isto é, havia uma alteração que tinha em atenção o facto de, em vários distritos, haver vários círculos e para isso e que havia um local designado pelo respectivo governador civil. Como isso não se verifica e o local de reunião é, como consta da lei actual, o governo civil, parece-me que não há razão alguma para estar a alterar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, também a Mesa é da opinião de que esta observação feita pelo Sr. Deputado João Amaral é pertinente, não havendo, pois, necessidade de se votar o artigo 107º, que se encontra prejudicado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, se me e permitido que diga uma verdade de Monsieur De La-palicc, quero apenas confirmar que e necessariamente o entendimento de todos que a votação final global, que se vai seguir, se aplica a uma lei que contém apenas as disposições, em lermos de especialidade, que recolheram as respectivas maiorias exigidas pela Constituição.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que a Mesa pode fazer suas as palavras do Sr. Deputado António Guterres e é nesse entendimento que se vai passar à votação.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 15l/V.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS, votos contra do PCP, do PRD, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro e a abstenção do deputado do PS Amónio Barreto.
Aplausos do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Raul Castro.
Srs. Deputados, permitia-me, antes de encerrar os nossos trabalhos, dizer aos Srs. Deputados que amanhã às 10 horas reúne o Plenário, estando em discussão várias propostas e projectos de resolução.
Quero também dizer que, objectivamente, face ao decorrer dos trabalhos, não sei onde é que o Presidente da Mesa errou, mas tenho a consciência de que, provavelmente, errei, hoje, na condução dos trabalhos.
Aplausos gerais.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 23 horas e 50 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Arménio dos Santos.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando dos Reis Condesso.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
João Maria Oliveira Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
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8 DE JUNHO DE 1990 2885
José Assunção Marques.
José Leite Machado.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Rui Gomes da Silva
Walter Lopes Teixeira.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Miguel de Morais Barreto.
Carlos Cardoso Laje.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edmundo Pedro.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Maria Luísa Amorim.
Octávio Rodrigues Pato.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Rui José dos Santos Silva.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Faltaram â sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Maria Pereira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Henrique Nascimento Rodrigues.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Álvaro Poças Santos.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Júlio Vieira Mesquita.
Licínio Moreira da Silva.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel José Dias Soares Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Armando António Martins Vara.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Partido Comunista Português (PCP):
José Manuel dos Santos Magalhães.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Deputados independentes:
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Maria Helena Salema Roseta.
Declarações de voto enviadas â Mesa para publicação, relativas à proposta de lei n.º 134/V
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português votou favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei do Estatuto da Região Autónoma da Madeira, atentas as seguintes razões:
1) A base de trabalho que constitui para, na especialidade, proporcionar a elaboração de uma lei positiva, consagradora de uma autonomia constitucionalmente regular e sem crispações centralistas;
2) A manifesta impossibilidade de o PSD fazer vingar soluções que brigam, de modo frontal, com a lei fundamental do País;
3) A hipótese de introdução de inúmeras correcções e melhorias, quer arredando matérias que carecem de dignidade estatuária, quer afeiçoando normas cuja justeza técnica se questiona;
4) A condenação clara das propostas de alteração do regime eleitoral, que não poderá manter-se como vem sem ofensa grave do direito a que devem respeito.
Tivemos em conta, igualmente, a circunstância de ser hoje muito diferente, para melhor, o texto subscrito pela Assembleia Legislativa da Madeira, que abrandou múltiplas tentativas de conflito institucional e violação da Constituição da República. Assim, a benefício de expurgos vários e benfeitorias indespensáveis, entende o PCP, valorizando a importância do diploma a lavrar escorreitamente, destinar aos trabalhos que vão seguir-se os contributos de sua reflexão e da sua disponibilidade, seguro de que, a final, poderá obter-se um resultado que honre a Assembleia da República, não acentue a mora do legislador face à Constituição e de satisfação plena às aspirações dos Portugueses da Região Autónoma da Madeira.
O Deputado do PCP, José Manuel Mendes.
O CDS absteve-se na votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 134/V - Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, tal como, de resto, já o havia feito o seu grupo parlamentar na Assembleia Legislativa Regional daquela Região Autónoma, dado entender serem fundadas todas as críticas que a ela dirigiu no debate em Plenário, nomeadamente as relativas ao seu excessivo pendor governamentalista; à quase completa omissão de uma figura constitucionalmente
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consagrada e importante como e o Ministro da República; e à clara constatação da existência de graves inconstitucionalidades no texto proposto, por nós denunciadas de forma clara no debate.
Nestas circunstâncias, e perante a disponibilidade manifestada pelo Grupo Parlamentar do PSD para repensar as questões levantadas em debate na especialidade, o CDS absteve-se aguardando que as suas críticas sejam tomadas em consideração, e, se assim suceder, naturalmente mudará o sentido do seu voto na votação final global.
Estamos perante uma questão de Estado e como sempre nestas questões o Grupo Parlamentar do CDS na Assembleia da República assume responsavelmente a posição que melhor se adequa aos interesses e princípios em causa.
O Deputado do CDS, Narana Coissoró.
Os Redactores: Maria Leonor Ferreira - Cacilda Nordeste-Anita Pinto da Cruz - Maria Amélia Martins-José Diogo.
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