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I Série - Número 85

Sexta-feira, 31 de Maio da 1991

DIÁRIO Da Assembleia da República

V LEGISLATURA 4.º SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE MAIO DE 1991

Presidente: Ex.mº Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Ex.mos.
Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às IO horas e 25 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.º 762/V a 766/V. da proposta de M n.º 201/V e da Interpelação n.º 20-A/V.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º m/y - Altera diversa legislação focal e estabelece novos benefícios focais, sobre a qual Intervieram, a diverso titulo, alem do Sr. Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa), os Sn. Deputados Ruí Alvará Corp (PSD), António Domingues Azevedo (PS), Octávio Teixeira (PCP), Carlos Lilama (PRD) e Nogueira de Brito (CDS).
Discutiu-se, também na generalidade, a proposta de lei n. * 196/V - Permite a redução da taxa do imposto sobre produtos petrolíferos (ISP) Incidente sobre o gasóleo utilizado na actividade agrícola, lendo Intervindo, a diverso título, alem do Sr. Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Manuel dos Santos (PS), Rui Alvará Corp (PSD), Lua Rodrigues (PSD) e António Campos (PS).
Foi ainda apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 194/V - Autoriza o Governo a aprovar o novo regime para o calculo das Indemnizações a atribuir aos titulares de participações sociais no capital de empresas nacionalizadas, relativamente à qual usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretario de Estado do Tesouro (Carias Tavares), os Srs. Deputados Nogueira de Balo (CDS), Manuel dos Santos (PS), Rui Alvaret Corp (PSD), Carias Luala (PRD) e Octávio Teixeira (PCP).
Entretanto, havia sido aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados do PS e do PCP.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.

lberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Pereira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimira Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcíneo António Campos Rebelo.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Antunes Gomes.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condessa
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Mil-Homens,
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maria Oliveira Martins.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barras.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel José Dias Soares Costa.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antónia Pinho e Melo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Helena Ferreira Mourão.
Maria João Godinho Antunes.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rosa Maria Tomé e Costa.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Gomes da Silva
Rui Manuel Almeida Mendes.

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Rui Manuel Parente Chancerelle de Macheie.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Walter Lopes Teixeira.

Partido Socialista (PS):

Alberto Alexandre Vicente.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Henriques Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Miguel de Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Edmundo Pedro.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Fernando Francisco Mariano.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Henrique do Carmo Carmine.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Paulo Sacadura Coelho.
José Apolinário Nunes Portada.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Pedro Lopes Machado Ávila.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo Brito.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Júlio José Antunes.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Humberto Sertório Rodrigues.
José Carlos Pereira Lilaia.
Maria Isabel Ferreira Espada.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Deputados independentes:

António Alves Marques Júnior.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Herculano da Silva Pombo Sequeira.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel Santos Magalhães.
Manuel Gonçalves Valente Fernandes.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.º 762/V, apresentado pelo Sr. Deputado José Lapa Pessoa Paiva e outros, do PSD - Propõe a elevação da povoação de Cabanas de Viriato à categoria de vila; 763/V, apresentado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro e outros, do PCP - Propõe a elevação da povoação de Pontével à categoria de vila; 764/V, apresentado pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo e outros, do PCP - Propõe a elevação de Santa Marinha do Zêzere à categoria de vila, e 765/V, apresentado pelo Sr. Deputado António Mota e outros, do PCP-Propõe a elevação à categoria de vila da povoação de São Julião de Freixo, que baixaram à 6.º Comissão; o projecto de lei n.º 766/V, apresentado pelo Sr. Deputado João Camilo e outros, do PCP - Regionalização dos serviços de saúde, que baixou à 9.º Comissão; a proposta de lei n.º 201/V - Autoriza o Governo a estabelecer um novo regime de restrição do uso do cheque (altera o Decreto-Lei n.º 14/84, de 11 de Janeiro), que baixou às 3.º e 7.º Comissões, e, finalmente, a interpelação n.º 20-A/V, apresentada pelo PCP - Propõe um debate de política geral centrado nas questões da política de cultura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no primeiro ponto da nossa ordem do dia com a discussão da proposta de lei n.º 192/V, que altera diversa legislação fiscal e estabelece novos benefícios fiscais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de lei de ajustamento da lei fiscal tem a ver com vários aspectos, que passarei a sumariar.
Desde logo, a alínea a) do artigo 1.º propõe a prorrogação do prazo em que as entidades de desenvolvimento regional podem beneficiar do regime fiscal que estava estabelecido. Esta alteração resulta do facto de ter havido uma alteração do Decreto-Lei n.º 25/91, o que levou à não

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apreciação de projectos que estavam em curso. Sendo assim, impõe-se recriar as condições para que estas sociedades de desenvolvimento regional possam ir para a frente.
A alínea b) tem a ver com o tipo de papel de jornal, que anteriormente tinha de possuir «linhas ou marcas de água», sendo essa a posição pautai consagrada no Código do IVA (CIVA). Como entretanto ocorreram alterações no processo de fabrico daquele papel, é necessário que elas constem desse Código para que o papel de jornal possa continuar a ser isento de IVA. Estando o papel de jornal isento, não faz sentido impor este ónus financeiro às empresas editoras.
A alínea c) tem a ver com a harmonização fiscal. Com a Lei do Orçamento do Estado para 1991 houve uma alteração da taxa liberatória aplicável aos rendimentos de títulos de dívida pública auferidos por não residentes. Mas como não se fez essa mesma alteração na parte relativa ao Código do IRS (CIRS), com esta alínea c) procura-se harmonizar o regime, no sentido de evitar injustificadas diferenças de tratamento fiscal.
O mesmo se diga em relação à alínea d), em que também se procuram harmonizar as acções adquiridas antes da reforma fiscal, sujeitando-as, tanto no Código do IRS como no Código do IRC (CIRC), ao mesmo regime. O n.º 2 do artigo 4.º do CIRS define o regime de aplicação das mais-valias às acções adquiridas por incorporação de reservas ou por substituição desses valores mobiliários (de que é exemplo a alteração do seu valor nominal ou a modificação do seu objecto social). Estando esse regime já previsto no CIRS, impõe-se que também se aplique ao IRC.
Ora, na medida em que a redacção da alínea d), que é muito densa, tem uma pequena falha pedia ao meu grupo parlamentar...

O Sr. João Amaral (PCP): - Ao «seu grupo parlamentar»...?
Mas o Sr. Secretário de Estado também tem grupo parlamentar?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares (Carlos Encarnação): - O Sr. Secretário de Estado Oliveira e Costa é deputado eleito com o mandato suspenso.

Risos.

O Orador: -... que apresente uma redacção alternativa que consagre toda esta situação.
Na alínea e) faz-se uma correcção do valor monetário. A alteração que foi feita não distinguia as aplicações meramente financeiras das aplicações em acções. Assim, com a nova redacção do n.º 2 do artigo 43.º, pretende-se que esse regime não seja aplicado às acções, ou seja, excluem--se da correcção por desvalorização monetária apenas os investimentos de natureza monetária, mantendo-se as acções e partes de capital no regime geral da correcção.
Na alínea b) consagra-se o princípio de que os valores que são avaliados para efeitos de privatização devem ser também considerados no domínio fiscal, uma vez que não faz sentido o Estado estar a avaliar as empresas para reprivatizá-las e não considerar esses mesmos valores para efeitos fiscais.
No n.º l do artigo 2.º faz-se uma pequena correcção à redacção do Orçamento do Estado para 1991. Tentámos fazer esta alteração através de uma correcção de texto, uma vez que é apenas uma palavra, uma vírgula que está a mais, correcção que não foi possível fazer em tempo útil, pelo que havia que repor a situação.
O mesmo acontece no n.º 2 do mesmo artigo, que altera a redacção do artigo 48.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, em que, ao alterar o valor de 800 contos para 1000 contos, não se faz referência ao n.8 2. Havia, pois, que fazê-lo também agora.
Eram estes os principais motivos que justificam a proposta de lei em apreço.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Álvarez Carp.

O Sr. Rui Álvarez Carp (PSD): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o Grupo Parlamentar do PSD, ao ser contactado informalmente por V. Ex.ª, manifesta, desde já, a sua disponibilidade para apresentar essas propostas de substituição ou de aditamento à proposta de lei n.º 192/V.
Relativamente à proposta de autorização legislativa, a alínea/) do artigo 1." vem corrigir a lacuna da lei quanto ao modo como os imóveis que foram contemplados em termos de avaliação das empresas a privatizar estão a ser tributados em mais-valias. O Governo pede uma alteração legislativa para rever o tratamento, em Código de IRC, dessas mesmas mais-valias decorrentes de avaliações para efeitos de privatizações.
A pergunta que lhe faço é esta: em relação à alínea b) do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IRC, V. Ex.ª não aceitaria fazer uma alteração directa à lei. em vez de fazê-la através de uma proposta de autorização legislativa?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: -
Não vejo inconveniente algum nisso, Sr. Deputado. Pelo contrário, creio que isso será vantajoso, uma vez que ficará já expressa na lei a redacção definitiva desta disposição.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Álvarez Carp.

O Sr. Rui Álvarez Carp (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo pretende, através desta proposta de lei, alterar algumas normas do Código do IVA, quer relativamente à questão do papel de jornal, quer quanto ao Estatuto dos Benefícios Fiscais para dar uma nova configuração, um novo impulso às sociedades de desenvolvimento regional, quer em relação ao tratamento que é dado aos rendimentos resultantes das aplicações financeiras (mas que não sejam em títulos da dívida pública).
Harmoniza-se, assim, a retenção na fonte em 20 % e desaparece a discriminação entre não residentes e residentes. A partir de agora os não residentes passam a ter o mesmo tipo de retenção na fonte em IRC e o mesmo tipo de retenção que têm os individuais em IRS relativamente aos títulos da dívida pública emitidos após Fevereiro de 1991.
Em relação a outros casos, pretende garantir-se uma situação mais desagravada para os contribuintes ou evitar situações relacionadas com avaliações excepcionais e pesadíssimas para efeitos de Código de Contribuição Autárquica, suspendendo, assim, quaisquer avaliações. Creio que

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houve, até, uma autarquia do Alentejo que se preparava para fazer reavaliações em contribuição autárquica na ordem dos 9000%!...
Pensamos que é muito oportuno que o Governo suspenda esse tipo de reavaliações até à entrada do Código de Avaliações, código esse que consideraria muito problemático se porventura suscitasse reavaliações deste montante ou que pusessem em causa o direito à propriedade e à habitação, que é um direito inalienável dos portugueses.
Consideramos, pois, que estas propostas reúnem as condições para ser aprovadas. Daremos, assim, o nosso apoio.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Domingues Azevedo.

O Sr. António Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O conjunto de alterações que nos é proposto pelo Governo na presente proposta de lei merece-nos, global e inicialmente, o seguinte comentário: uma parte significativa desta proposta de lei diz respeito a alterações à Lei do Orçamento do Estado, ou seja, são alterações a uma lei que ainda nem sequer tem seis meses de vigência, o que revela a falta de conhecimento, por parte da Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, quanto às alterações a introduzir no sistema fiscal português. Depois de seis meses de vigência da Lei do Orçamento, é o próprio Governo que vem pedir uma nova alteração!...
O segundo comentário que nos merece esta proposta de lei, o que, aliás, para nós não constitui novidade, é que a estratégia fiscal orientadora da Secretaria de Estado e do Governo continua a ser a de favorecer os rendimentos de capital em preterição dos rendimentos de outra proveniência. E a sua ânsia neste domínio é tão elevada que faz propostas que daqui a quatro ou cinco meses terão de ser alteradas!
Analisemos caso por caso.
O aumento do valor nominal das acções e dos valores que estejam representados por efeito de incorporação de reservas fundamenta-se à data do valor histórico, com a argumentação de que o Código do IRS excluiu das mais--valias as geradas antes da entrada em vigor do respectivo código. Até aqui estou totalmente de acordo! Mas o problema é que o Governo não clarifica uma outra questão: é que este normativo deveria dizer que «as reservas que foram constituídas antes da vigência do Código do IRS e que influenciam os valores nominais das acções são sujeitas a mais-valias». Mas não é isso que o Governo propõe!
Sr. Secretário de Estado, e as reservas que tenham produzido alterações de valor já na vigência do Código do IRS e do IRC? O que o Governo propõe é uma isenção das mais-valias para os aumentos de valor das acções ou valores nominais das quotas, cujas reservas tenham sido constituídas já na vigência dos Códigos do IRS e do IRC. A redacção apresentada não cuida suficientemente o espírito do legislador manifestado no código do IRS e do IRC e introduz, camufladamente, uma isenção das mais-valias. No entanto, não nos surpreende esta temática uma vez que temos assistido todos os dias a que o Governo apresente nesta Assembleia isenções permanentes no domínio dos rendimentos de capitais - aquilo a que os brasileiros tanto gostavam de chamar os ganhos vindos ao vento - neste caso as mais-valias.
Há ainda uma outra novidade nesta proposta de autorização legislativa que o Governo nos apresenta... Aliás, se a memória não me atraiçoa, em Setembro de 1990 o Governo apresentou a esta Assembleia da República uma proposta de autorização legislativa para alterar o artigo 43.º do Código do IRC clarificando que não eram objecto de correcção monetária os investimentos financeiros. Ao tempo, nesta Câmara e num relatório que produzi na Comissão de Economia, Finanças e Plano e que o grupo parlamentar que sustenta o Governo rejeitou...

Vozes do PSD: - Estava mal feito.

O Orador: -... disse: so Governo não clarifica suficientemente o que entende por investimentos financeiros. É que investimentos financeiros não são só os investimentos monetários mas são, nos termos do novo Plano Oficial de Contas (POC) e do novo enquadramento de classificação de valores, também prédios de rendimento, acções de sociedades, participações de capital noutras empresas. O Grupo Parlamentar do PSD não foi sensível a este raciocínio e votou contra o relatório que elaborei, mas neste momento, nesta proposta de lei, propõe-se exactamente aquilo que nós dizíamos. Srs. Deputados do PSD, reconheço-lhes uma faculdade, VV. Ex.ª conseguem aprender alguma coisa com o Partido Socialista.

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Mas não consigo!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais referiu-se, há pouco, à proposta de lei que estamos a discutir dizendo que era um conjunto de ajustamentos de alguns aspectos da matéria fiscal. No entanto, julgo que a questão em causa não são alguns ajustamentos porque, pelo menos em parte substancial da proposta de lei que nos é presente, são alterações substanciais ao regime fiscal vigente.
Estas alterações substanciais apontam em determinadas matérias, em determinadas situações, um aumento significativo dos benefícios fiscais. Refiro, designadamente - porque o tempo é pouco e não posso referir todas as alíneas -, alguns aspectos que me parecem mais relevantes.
Assim, propõe-se a baixa, de 25 % para 20 %, da taxa do imposto sobre os rendimentos dos títulos de dívida pública adquiridos por pessoas colectivas não residentes. É completamente incompreensível que o Governo proponha esta alteração uma semana depois de o Sr. Governador do Banco de Portugal ter publicamente ameaçado os bancos portugueses por estarem a facilitar a entrada de capitais externos para aquisição da dívida pública devido aos reflexos negativos que tal facto está a gerar sobre a economia portuguesa, designadamente, no âmbito das taxas de juro, da inflação, da política monetária. Depois de, há oito dias atrás, o Sr. Governador do Banco de Portugal ter feito esta ameaça, que, em termos de política económica, tem toda a razão, o Governo vem, ele próprio, propor que, em termos de legislação fiscal, se facilite a entrada de capitais estrangeiros para a aquisição de títulos da dívida pública. É incompreensível e inadmissível porque, neste caso, pelo menos, é o Banco de Portugal que está certo e o Governo errado.

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Propõe-se a seguir mais um aumento de isenções em termos de mais-valias para acções detidas por empresas antes do início da entrada em vigor dos Códigos do IRS e do IRC, dando-se como justificação fundamental que as mais-valias, potenciais ou realizadas, de tais bens não eram tributadas pelo regime legal anterior. Mas esta afirmação é falsa, porque todas estas mais-valias eram tributadas (v. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de Fevereiro de 1985, sobre o problema da Abrigada) e é o Governo quem, neste momento, pretende que elas deixem de ser tributadas.
Aliás, não há muito tempo atrás houve uma alteração neste âmbito de matérias resultante de uma proposta de lei que tinha um nome claro e concreto tendo mesmo ficado conhecida como «lei Belmiro de Azevedo». A diferença entre essa proposta de lei e a que agora nos é apresentada é que neste momento, pela parte que me toca, não sei qual é o nome desta lei, mas certamente tem nome.
Uma outra questão relaciona-se com o problema da consideração, para efeitos fiscais, dos valores de avaliação das empresas do sector público a privatizar. Não se entende qual a especial razão por que o Governo pretende abrir uma excepção. As reavaliações deviam estar sujeitas, nestes casos concretos, ao regime fiscal vigente, às normas legais vigentes e não à avaliação feita para efeitos de privatização.
Estas duas situações são realidades completamente diferentes. Uma avaliação para efeitos de privatização pode e deve ter em conta circunstâncias que nada têm a ver com a problemática fiscal. O problema do good will e muitos outros devem ser considerados para efeitos de valor de privatização mas não têm nada a ver com valores fiscais.
Para além do mais gostaria que o Governo pudesse explicar, quando adoptar estes valores para efeitos fiscais, o que é que vai fazer em termos de amortizações. Efectivamente o que está aqui em causa 6 que com esta situação os que adquiram as empresas privatizadas vão ter um bónus de 40 % sobre o montante da reavaliação porque, de facto, o valor da privatização vai ser um valor enganador. Mais uma vez o Governo passa dinheiro do erário público para o privado por vias que não são, de modo nenhum, admissíveis num Estado de direito.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é apenas para informar que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais gostaria de fazer uma intervenção após as intervenções dos grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo à Assembleia da República caracteriza-se, fundamentalmente, pela intenção de vir a alterar um conjunto ainda vasto de disposições fiscais, no seguimento das múltiplas alterações a que, em dois anos e meio de reforma fiscal, já assistimos.
Em termos de análise substantiva, as alterações que agora se propõem parecem todas elas mais que justificadas pelas actuais distorções e «desarmonias» existentes em sede de IRS e de IRC.
Questão importante subjacente a tudo isto é, porém, o interrogarmo-nos sobre a justificação de tantas e tão frequentes alterações a que os referidos Códigos e o Estatuto dos Benefícios Fiscais têm estado sujeitos. Será justificativo suficiente o dizer-se que foram as próprias inovações trazidas pela reforma fiscal de 1988 que exigiram a consequente adaptação decorrente da sua aplicação à prática, à actividade económica e à situação pessoal e empresarial dos contribuintes?
Em parte, e só em parte, poderá aceitar-se tal explicação. Porém, casos existem no presente pedido de autorização legislativa e em pedidos anteriores a que esta Assembleia deu a sua concordância que inequivocamente evidenciam uma falta de rigor na concepção e no uso da técnica legislativa no campo fiscal que explicam as actuais alterações. Talvez por isso, porque eram por demais evidentes os lapsos e erros cometidos, é que o Executivo entendeu brindar a Assembleia da República com uma «pormenorizada e esclarecedora» exposição de motivos.
Mas em algumas das áreas em que agora se pretende vir a introduzir modificações e ajustamentos muito há ainda a fazer. A título exemplificativo, refira-se a multiplicidade de taxas de retenção - liberatórias ou não - que hoje ainda existem em sede de IRS e de IRC (em função da noção fiscal de residente/não residente, dos tipos de rendimento auferidos, do carácter de titular originário e não originário de custos, rendimentos, etc.) que se foram construindo com objectivos de discriminação fiscal seguramente pouco defensáveis em termos económicos e que tornam hoje em dia o sistema altamente complexo e de difícil conhecimento e aplicação.
Se a tudo isso juntarmos as taxas especiais acordadas em negociações efectuadas por Portugal com outros países, no âmbito dos acordos para evitar a dupla tributação internacional do rendimento, chegaremos à conclusão de que a cedularização e a discriminação fiscal imperam onde se pretendia que houvesse globalização, simplicidade e neutralidade.
Em alguns casos as correcções que se pretendem vão ao encontro de críticas e sugestões já produzidas nesta Câmara, nomeadamente, em sede de discussão do Orçamento. Por tudo isto e com o desejo de que não se perca mais tempo o Grupo Parlamentar do Partido Renovador Democrático dá a sua concordância à presente proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A intervenção que vou fazer será muito breve e destina-se apenas a salientar dois aspectos do pedido de autorização legislativa em apreço.
Por um lado, ele revela que o nosso sistema fiscal continua a ser um sistema fiscal itinerante, ou seja, um sistema fiscal que vai correndo ao longo do tempo e que todos os semestres - os anos já não chegam para contar a frequência das alterações!... - vai sofrendo modificações. Dirá o Sr. Secretário de Estado que é indispensável que

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assim seja, mas eu direi que isso também afecta muito a confiança dos agentes no sistema fiscal que regulamenta as suas relações de contribuição com o Estado.
Uma outra observação que pretendo fazer tem a ver com o que para mim constitui o tema mais importante da sessão de hoje e que se segue imediatamente na ordem do dia: trata-se da proposta de lei de autorização legislativa respeitante às indemnizações. Diria que o Estado, ao dar a migalha de que vou falar na próxima intervenção, não deixa de procurar reduzi-la à sua expressão mais simples.
Eu diria até que, no diploma com que veio pedir autorização para alterar alguns aspectos do regime fiscal do imposto sobre o rendimento, se aproveita da migalha concedida para já aqui colher algum beneficio, traduzido na circunstância da disposição que considera também para efeitos fiscais o valor das avaliações que dos activos das empresas nacionalizadas e devolvidas sejam feitas para efeitos de indemnização. Trata-se de um aspecto que não quereria deixar de sublinhar, porque realmente ele é característico e emblemático de toda a atitude do Governo em relação ao tema das indemnizações.
De momento, são estas as curtas observações que pretendia fazer sobre o primeiro diploma hoje em apreciação.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado António Domingues de Azevedo pôs em destaque, na linha, aliás, de outras intervenções, que o Governo está a vacilar com as alterações propostas, que são no fundo alterações à recente Lei do Orçamento do Estado para 1991. Quero reafirmar aquilo que já disse inicialmente, referindo que até existem no diploma em causa três alíneas que respeitam a ajustamentos de erros materiais que ocorreram no decurso do debate do Orçamento do Estado para 1991 e que houve agora que corrigir. Num dos casos, trata-se, como já referi, de uma palavra a mais e uma vírgula no sítio indevido. Disse também ao Sr. Deputado que inadvertidamente caiu o n.º 2, o que tentámos corrigir de acordo como o que a lei permite, mas que passou o prazo e que, em consequência, não foi possível publicar a correcção.
Os restantes aspectos focados têm a ver com a preocupação de harmonizar a filosofia fiscal no âmbito do IRS e do IRC. Houve pequenos detalhes que escaparam. Não pretendemos, todavia, ter obras perfeitas, mas obras que sejam o mais adequadas possível à sociedade. Consequentemente, admitimos que possa haver necessidade de fazer correcções, o que mostra simplesmente a dinâmica dos processos. Sempre se disse, aliás, que a reforma fiscal tinha uma componente de gradualismo que a cada passo se vai sentindo, importando, sim, aperfeiçoar. Se detectamos uma coisa que não está bem, não devemos meter a cabeça na areia e deixar que as coisas corram. Temos, sim, de corrigir e vamos continuar a fazê-lo, como não pode deixar de ser.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu-se ao aspecto de as leis terem nome. Neste caso, a lei tem nome no sentido de que é preciso fazer justiça e é necessário que as coisas fiquem equilibradas. Não pode numa norma estar de uma maneira e noutra de forma diferente. O que deve ser feito é harmonizar.
Quanto ao facto de o valor das privatizações ser considerado também para efeitos fiscais, pasmo, de algum modo,
com o que se diz. Pensa, então, o Sr. Deputado que o Estado, para efeitos de venda, pode dizer que determinado produto, apesar de valer 100, só é considerado por 20 para efeitos fiscais, por ser por 20 que consta da contabilidade? Isso não pode acontecer. Se o Estado quer vender um produto e diz que ele vale um determinado valor, tem de aceitar esse valor para efeitos fiscais. É isso, e apenas isso, que o Estado está a procurar fazer.
Julgo ter respondido, de uma forma muito genérica, às questões levantadas. A tranquilidade que temos e a clara orientação que resulta do próprio pedido de autorização legislativa falam por si.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em relação ao problema da consideração para efeitos fiscais do valor da avaliação das empresas a privatizar, coloco-lhe concretamente a seguinte questão: quem vai beneficiar depois da possibilidade de fazer amortizações ao longo dos anos devido a esta reavaliação de valores?

O Sr. Presidente:- Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, quando foram feitas as avaliações toda a gente admitiu à partida que efectivamente o valor da aquisição é o que deve ser consagrado na contabilidade. Logo, estaríamos a falsear o resultado final da venda se não considerássemos desta forma.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a discussão do primeiro ponto da ordem de trabalhos, passaríamos à discussão da proposta de lei n.º 194/V, inscrita em segundo lugar na ordem do dia...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é o Sr. Secretário de Estado do Tesouro que, em nome do Governo, virá apresentar a proposta de lei de autorização legislativa cuja discussão V. Ex.ª acaba de anunciar. Acontece, porém, que o Sr. Secretário de Estado ainda não chegou, mas temos ainda previsto em terceiro lugar da ordem de trabalhos o debate de uma outra proposta de lei.
Como o Sr. Secretário de Estado do Tesouro ainda não se encontra presente, o que sugiro à Mesa é que passemos de imediato, se todos os grupos parlamentares estiverem de acordo, à discussão do terceiro ponto da agenda de trabalhos, invertendo assim a ordem de apreciação dos diplomas agendados, para que haja uma solução de continuidade nos nossos trabalhos. Uma outra solução alternativa é a de interrompermos a sessão durante o tempo necessário, para depois retomarmos a discussão da proposta de lei em causa.
Aguardo, pois, a decisão de V. Ex.ª

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O Sr. Presidente: - Há alguma objecção ao que acabou de ser proposto pelo Sr. Secretário de Estado, no sentido de se inverter a apreciação dos diplomas agendados, iniciando primeiro o debate da proposta de lei n.8 196/V?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não temos objecção de princípio ao que acabou de ser proposto, mas necessitamos que o nosso camarada que irá intervir nessa matéria chegue ao Plenário. Peço, por isso, ao Sr. Presidente o favor de manter em suspenso a sessão durante alguns segundos.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, enquanto aguardamos pela vinda do referido Sr. Deputado, vai proceder--se à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia 29 de Maio de 1991, pelas 10 horas, foram observadas as seguintes substituições de Deputados:
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS):
Maria do Céu Fernandes Oliveira Esteves (círculo eleitoral de Viseu) por Ademar Sequeira de Carvalho [esta substituição é determinada nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.9 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), para o período de l a 30 de Junho próximo, inclusive.]
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP):
João Camilo Carvalhal Gonçalves (círculo eleitoral de Lisboa) por António Filipe Gaião Rodrigues [esta substituição é solicitada nos termos da alínea c) do n.9 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período não inferior a 15 dias, com início em 29 de Maio corrente, inclusive.]
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer.

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
João Domingos F. de Abreu Salgado (PSD), presidente-Alberto Marques de O. e Silva (PS), vice-presidente-José Manuel M. Antunes Mendes (PCP), secretário - Manuel António Sá Fernandes (PSD) secretário - Alberto Monteiro de Araújo (PSD) - Arlindo da Silva André Moreira (PSD) - António Paulo M. Pereira Coelho (PSD) - Belarmino Henriques Correia (PSD) - Carlos Manuel Pereira Baptista (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Domingos da Silva e Sousa (PSD)- José Augusto Ferreira de Campos (PSD) - José Augusto Santos da 5. Marques (PSD)- José Manuel da Silva Torres (PSD) - Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Mário Manuel Cal Brandão (PS)- José Manuel Moía Nunes de Almeida (PCP)- Francisco Barbosa da Costa (PRD)- José Luís Nogueira de Brito (CDS).

Srs. Deputados, vai proceder-se à votação do relatório e parecer que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães, Raul Castro e Valente Fernandes.

Srs. Deputados, aceite a alteração da ordem por que iremos continuar os nossos trabalhos, vamos dar início à discussão da proposta de lei n.º 196/V- Permite a redução da taxa do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) incidente sobre o gasóleo utilizado na actividade agrícola.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de lei tem em vista alterar profundamente o sistema de subsídios de gasóleo à agricultura. Em lugar do sistema actual, em que os lavradores tinham de pagar o gasóleo ao preço do mercado e, depois, recebiam, no ano seguinte, a correspondente indemnização em função dos valores que estão consagrados na lei como subsídio, pretende alterar--se esse sistema, tornando menos pesada para os agricultores a aquisição de gasóleo, na medida em que, com esta autorização legislativa, o Governo irá fixar o preço final do gasóleo, deixando de haver ajustamentos, no futuro, relativamente ao gasóleo consumido.
Julgamos que este é um passo importante no sistema de clarificação das relações do Estado com os agricultores, dando maior consistência a este apoio à agricultura e, acima de tudo, evitando o ónus financeiro para os agricultores de pagarem um preço para receberem, cerca de um ano depois, o respectivo contravalor.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Como o tempo de que dispomos é pouco, guardaremos as nossas posições de fundo para a intervenção que vamos fazer de seguida.
Assim sendo, nesta fase, quero somente colocar duas questões ao Sr. Secretário de Estado em relação à proposta de autorização legislativa em causa.

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A primeira questão tem a ver com o artigo 2.8, n.º 1. O Governo propõe que, no âmbito da autorização prevista, o gasóleo para a agricultura seja tributado a uma taxa inferior, no conjunto do ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos) e do IVA, em 30$. A minha pergunta é a seguinte: como 6 que este valor de 30$ se desdobra pelos dois impostos? Não deverá ficar claramente explicitado quais são as verbas correspondentes para a taxa do ISP e para o IVA, para evitar uma eventual leitura distorcida da nova aplicação do sistema, que levaria a que os agricultores, que, hoje, recebem o retomo do IVA por efeitos do Código, pudessem, pela expressão «conjunto», deixar de receber e, na prática, passassem a receber um subsídio inferior ao que recebem actualmente? Penso que não é essa a intenção e, por isso, gostaria de saber claramente qual é o desdobramento deste valor pelas duas taxas. Aliás, a Comissão de Agricultura, num parecer elaborado por unanimidade- que não sei se já terá sido distribuído pelas diversas bancadas - recomenda ao Governo que explicite esta matéria.
A segunda questão tem a ver com o modo de implementação do sistema. É do conhecimento público que, na aplicação do sistema, foi aberto um concurso público para o fornecimento do gasóleo à agricultura através do novo esquema que é aqui proposto e no qual se aponta para a possibilidade de haver um único posto abastecedor de gasóleo à agricultura por concelho. Não queremos entrar na «guerra» que já se instalou, relativamente as companhias petrolíferas, mas, sim, colocar a questão sob outro ângulo: nesta hipótese, aberta pela proposta de autorização, de haver um único posto abastecedor por concelho, tem o Governo a noção do que é haver, por exemplo, um posto abastecedor de gasóleo à agricultura no concelho de Odemira, ou no concelho de Vila Real? Isso inviabilizaria completamente o sistema e esvaziá-lo-ia de qualquer sentido prático, porque os agricultores teriam de se deslocar dezenas de quilómetros a esse único posto abastecedor.
Eram estas as duas questões que gostaríamos que fossem esclarecidas pelo Governo.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais:- Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que diz respeito à sua primeira questão, sobre qual é a parcela que se considera de ISP e de IVA, devo dizer que não há aqui que considerar parcelas. O IVA é um desconto que é feito por dentro do preço - há um preço e ele incorpora efectivamente esses valores. Reparem que não aparece o valor do gasóleo, do ISP e do IVA, mas sim um preço, e é esse preço que baixa 30$ e que corresponde ao subsídio. É evidente que os lavradores continuam a usufruir da lei, no sentido de abater o gasóleo que está incorporado no novo preço, de acordo com as regras que estão definidas. Portanto, não há alteração alguma a esse sistema. O que há é um preço que incorpora várias parcelas - e, repito, foi esse preço que baixou 30$ - e toda a componente de IVA que contiver o novo preço é abatida para quem tiver contabilidade organizada.
Quanto à segunda questão, que tem a ver com o concurso - e eu não sou a pessoa mais habilitada para falar sobre isso, apesar de conhecer os aspectos de aplicação prática deste novo regime que se pretende introduzir -, é preciso ter presente que, na primeira fase, haverá dificuldades de ordem vária, porque importa que haja o subsídio mas que ele só seja concedido a quem efectivamente trabalha na agricultura. A preocupação que está aqui subjacente- e este é um dos aspectos fulcrais em termos do controlo da aplicação dos subsídios - é a de se encontrar um sistema que seja controlado informaticamente e que tenha, depois, um cruzamento de informação que permita apurar com rigor quem é que trabalha na agricultura e quem não trabalha ou desvia o gasóleo.
Admitimos logo à partida que este sistema fosse universal, mas, para sê-lo, isso implicava que houvesse, por exemplo, um cartão, como o da Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS), que é universal e que permite a cada empresário ter acesso a qualquer bomba. Simplesmente foi--nos dito que isso iria criar algumas perturbações, porque em muitos meios rurais esse sistema não funciona, dado que as Caixas de Crédito Agrícola ainda não aderiram ao SIBS. Em função disso, tivemos de fazer opções. Repare: quando se está perante uma modificação tão profunda, há que ponderar as limitações que temos e, em função da solução óptima, encontrar a solução prática possível, e esta foi a solução prática possível que se encontrou.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, por que é que não se optou, por exemplo, por uma solução do tipo caderneta, em que o agricultor se poderia abastecer em qualquer posto, com o carnet certificado pela Direcção Regional de Agricultura e com os valores limite que estavam estabelecidos? Esse seria um sistema, quanto a mim, mais fácil, mais barato, que não implicava os custos de informatização que este vai ter e que seria perfeitamente controlável.

O Orador:- O problema é precisamente o do controlo... Sabemos - e dizem-nos isso com frequência - que 20 % a 25 % do subsídio não é utilizado efectivamente na agricultura. Portanto, ao modificarmos o sistema, temos de ter os mecanismos de controlo para subordinar alguns aspectos dessas facilidades, que dão origem à utilização abusiva deste subsídio, a este objectivo mais nobre que é o do rigor na aplicação das leis.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Moía.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado, na resposta que deu ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, V. Ex.ª já respondeu, em parte, a uma questão que lhe quero colocar. O Sr. Secretário de Estado descreveu muito simplesmente a mudança que se ia operar: era uma mudança magnífica, com bons objectivos e destinada a evitar as grandes esperas a que os agricultores estavam sujeitos na recepção do subsídio. Por outro lado, tinha como finalidade evitar as fraudes, apesar de esse aspecto - que, suponho, é o objectivo fundamental - não ter sido salientado na sua exposição inicial, mas só agora.
Simplesmente, Sr. Secretário de Estado, com este objectivo de evitar as fraudes, V. Ex.ª monta um esquema de controlo muito complicado para o novo sistema e seria

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bom que o Sr. Secretário de Estado nos desse uma explicação acerca do respectivo modo de funcionamento. Suponho que ele é de tal fornia complicado que, à primeira vista, se afigura difícil a sua efectivação,... a não ser com elementos desta natureza, como seja o da concentração, num único posto - num concelho ou numa pane de um concelho -, do abastecimento de gasóleo para a agricultura, o que é, porventura, manifestamente inconveniente e pode causar perturbações enormíssimas.
Levantada esta questão, Sr. Secretário de Estado, pedia-lhe que se detivesse um pouco mais naquele que pensa ser o sistema de controlo a aplicar.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nogueira de Brito: O sistema de controlo não é complexo. Ele foi criado para não dar trabalho a ninguém, para que ninguém tenha de fazer o quer que seja adicionalmente. É um sistema que procura ler a informática como suporte subjacente a todo o processo.
Temos de conhecer a situação, pois, dado que serão as alfândegas a avançar com o dinheiro para as companhias fornecedoras do gasóleo, lemos de ter esse elemento de controlo, isto é, temos de saber quem compra, quando compra e como compra. Portanto, é indispensável ter subjacente a tudo isto um sistema informático. Por isso referi há pouco que admitíamos, à partida, que o sistema pudesse ser polivalente, isto é, que pudesse ter esse cartão e estar também ligado ao sistema da SIBS, para toma-lo muito mais universal. Mas a conjugação destes dois sistemas tornar-se-ia, de facto, difícil.
Assim, vamos receber, em banda magnética, a informação sobre os consumos de todo o País, de forma concentrada, e, em poucos minutos, saberemos o que está a passar-se e ficaremos em condições de restituir às companhias o valor do ISP que pagaram quando disponibilizaram os meios. Repito, portanto, que não há trabalho adicional para ninguém. O que há é um sistema sofisticado que permite, sem acréscimo de papéis, sobretudo para os agricultores, estabelecer um controlo que é, de facto, indispensável.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): Posso interpelar a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, tanto quanto me é dado aperceber, não foi distribuído ao Plenário o parecer que, sobre esta matéria, a Comissão de Agricultura e Pescas elaborou e que foi aprovado por unanimidade. Trata-se de um parecer que penso ser de algum interesse pelas sugestões que levanta em relação ao sistema que agora está a ser implantado e, por isso, Sr. Presidente, agradecia que o mandasse distribuir pelas bancadas dos partidos e também à bancada do Governo.

O Sr. Presidente: - Vamos tomar providências para que assim se faça.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o tempo é muito curto para este debate, que merecia mais tempo. Por isso peço a indulgência da Mesa para algum complemento de tempo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O elevado e desproporcionado custo dos factores de produção para a agricultura em Portugal tem constituído um travão dos mais pesados, que prejudica a competitividade das explorações agrícolas nacionais face às comunitárias.
Não pode pedir-se aos agricultores portugueses que aceitem receber menos pelas suas produções e, simultaneamente, manter taxas de juro três e quatro vezes superiores às da Comunidade Económica Europeia: o custo da água para a rega, da luz, dos alimentos para o gado, a preços 30 % e 40 % acima da média europeia; o preço do gasóleo igualmente superior, em mais de 30 %, ao da Comunidade.
Impõe-se, por isso, a rápida aproximação desses valores das médias comunitárias. Nesse sentido, medidas que permitam, de algum modo, reduzir as diferenças existentes merecem o nosso acordo.
As medidas agora propostas para o gasóleo a fornecer à agricultura são, contudo, em nossa opinião, tardias e limitadas.
Tardias, porque de há muito se impunha alterar o sistema de subsídio do gasóleo agrícola e naturalmente que o Governo encontrou forma de fazê-lo a quatro meses das eleições!... Aliás, pela primeira vez este ano, os agricultores recebem, num mesmo ano, dois subsídios: o subsídio de 1990 e o subsídio de 1991, derivado da introdução do sistema. «Santas eleições», Sr. Secretário de Estado, que nos fazem desejá-las todos os anos!...
Limitadas também porque, como refere o parecer da Comissão de Agricultura e Pescas, mesmo com o subsídio de 30$ por litro pago no acto da aquisição do gasóleo ou deduzido no acto da aquisição do gasóleo por diminuição directa ao preço deste, Portugal ainda ficará com um preço superior (bastante superior, diria eu) aos valores médios da Comunidade.
Estando o gasóleo de uso agrícola, na Comunidade, a um preço médio de 58$56, o valor a futuro de 70$ ficará, ainda assim, 20 % superior àquele preço.
Ora o Governo poderia ter ido mais além. Basta fazer algumas contas: é ou não verdade que, de Dezembro para cá, devido à quebra do preço das ramas, o preço de aquisição do gasóleo baixou de 51S018 por litro para 37S7630 por litro em Maio, isto é, menos 18,5 %? Entretanto, o preço do gasóleo baixou somente uns ridículos 3$ - de 103$ para 100$ - isto é, menos de 3%. Com isto, o Governo embolsou, nestes primeiros cinco meses, só no gasóleo, mais de 5 milhões de contos de impostos acrescidos, numa autêntica poupança forçada extraordinária. A relação imposto/preço de venda ao público passou de 50,5 %, em Dezembro, para mais de 62 % actualmente.
É, pois, grave, em nossa opinião, que o Governo tenha mantido, sem necessidade, um preço tão alto para o gasóleo, tendo em conta o seu impacte em toda a economia e, particularmente, na agricultura.
Por isso o PCP avança, nesta oportunidade, com uma proposta de aumento do subsídio de 30$ para 40$, o que permite ao Governo, mesmo assim, continuar a manter um

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nível de receitas fiscais superior ao que tinha previsto em Dezembro passado, em sede de Orçamento do Estado.
Mas há mais do que isto: não pode desligar-se, como disse na minha pergunta, esta proposta de lei do sistema que vai ser posto em prática. E, nesse aspecto, é completamente inaceitável que o Governo tenha lançado um concurso público possibilitando apenas um posto abastecedor de gasóleo à agricultura por concelho, em condições adequadas a fornecer gasóleo no quadro do nosso sistema.
A «guerra» já está instalada entre o Governo e as companhias petrolíferas, mas para nós, como já disse, mais relevante do que essa «guerra» é o facto de a possibilidade da implantação de um tal sistema inviabilizá-lo e prejudicar profundamente os agricultores.
Não houve, com certeza, a noção do que é, por exemplo, haver um posto abastecedor de gasóleo num concelho como Odemira ou num concelho como Vila Real.
E mesmo em relação ao controlo das fraudes, Sr. Secretário de Estado, faço-lhe esta pergunta: se eu quiser furar o sistema, o que é que inviabiliza levar na minha carrinha dois bidons e, utilizando o cartão, enchê-los de gasóleo para aplicá-lo noutro lado? Onde está o controlo que certifica que esse gasóleo vai ser mesmo aplicado na agricultura? Este sistema não vai inviabilizar as fraudes a quem quiser fazê-las, enquanto que o uso, mais simples, de caderneta facilitaria o sistema, tomá-lo-ia mais barato, era igualmente controlável, era mais eficaz para a própria agricultura e não provocava a «guerra» que está a instalar--se com as companhias petrolíferas. As condições de tal concurso, em nossa opinião, terão de ser, necessariamente, alteradas, sob pena de o sistema poder transformar-se numa fraude, pelo que, também nesta matéria, apresentamos uma proposta de alteração, para apreciação em sede de especialidade.
Propomos ainda, Srs. Deputados, que, na sequência do consenso gerado na Comissão de Agricultura e Pescas, os agricultores rendeiros sem documento escrito possam ter entrada no sistema, através de simples prova testemunhal, nos termos em direito permitidos. Propomos ainda que o Governo esclareça e explicite, como dissemos claramente, qual é a incidência futura do subsídio no ISP e no IVA, separadamente, para não se criar o facto absurdo de o preço líquido do gasóleo não ficar, futuramente, mais caro do que hoje para os agricultores que beneficiam, actualmente, do retorno do IVA.
Está o Governo disponibilizado, Sr. Secretário de Estado, para melhorar o texto que nos apresenta, indo ao encontro das sugestões da Comissão de Agricultura e Pescas, aprovadas por unanimidade? Aqui fica o desafio. Esperamos a resposta!
Votaremos a favor da proposta de lei, com a consciência de que o seu objecto poderá ser substancialmente melhorado se o Governo tiver em linha de conta as reflexões constantes do parecer já referido e aprovado por unanimidade na Comissão de Agricultura e Pescas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão deste pedido de autorização legislativa não pode ignorar -como, aliás, já foi amplamente referido pelo Sr. Deputado do PCP - o específico contexto em que ele é aqui apresentado.
Em primeiro lugar, é extremamente estranho que este pedido de autorização legislativa - e, portanto, também a sua aprovação - seja posterior à abertura do concurso para o fornecimento do gasóleo, cujo prazo, como é conhecido pelas notícias da comunicação social, terminou exactamente ontem.
Se, por hipótese académica mas democrática, este pedido de autorização legislativa não fosse hoje aprovado pela Assembleia da República - a pergunta é para o Governo e, em especial, para o Sr. Secretário de Estado - qual era o sentido útil da abertura de um concurso que escora toda a sua legitimidade e utilidade exactamente na mudança do sistema que, aliás, é introduzida por esse concurso público? Em nossa opinião, esta é a questão essencial.
Como já foi dito pelo Sr. Deputado do PCP, não há grandes objecções a apresentar, sobretudo se forem levadas em conta algumas alterações sugeridas no âmbito da Comissão de Agricultura e Pescas-e, ao que tive oportunidade de ver, propostas agora pelo PCP. Não haverá grandes divergências em relação à proposta legislativa que o Governo aqui nos traz, mas temos todos de reflectir sobre o motivo da abertura de um concurso - que é, no mínimo, um concurso estranho - nesta altura e neste momento.
VV. Ex.ª têm anunciado, como linha essencial da política energética para o País, a liberalização do fornecimento dos combustíveis e têm-se escorado em decisões da CEE para fundamentar uma política de liberalização. Foi exactamente neste quadro que se abriu um concurso que o bom senso claramente indicia estar nitidamente preparado para ser ganho por una única empresa fornecedora de gasóleo: a Petrogal.
Portanto, gostava que o Governo me informasse se está a tentar fechar a porta da liberalização que abriu pela frente, abrindo por trás a porta do monopólio e mantendo, em relação à Petrogal, uma situação de enorme favoritismo. E não se diga que se trata de um benefício pouco importante, pois as projecções que podem ser feitas em relação ao consumo de gasóleo durante esse período de tempo - como todos sabem, o concurso foi aberto para um período de cinco anos - apontam, claramente, para um aumento de 10 %, em média, do volume da facturação global da Petrogal. Isto é significativo e, sobretudo, é inarticulável - ou, se calhar, talvez não o seja - com o que conhecemos do projecto em marcha de privatização da própria Petrogal.
Qual é o verdadeiro significado do aparecimento deste concurso, exactamente no momento em que se fala da privatização da Petrogal e em que se pretende privatizar essa empresa de uma forma relativamente conhecida e nem sempre suficientemente transparente e clara.
O novo sistema, ou seja, o que vai resultar, necessariamente, da concretização do concurso que foi aberto, pode, eventualmente, beneficiar a Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas, dado que permite transmitir para a empresa pública, para a empresa fornecedora de petróleo, boa parte do controlo administrativo. Mas, sobretudo, irá beneficiar a Petrogal.
Ora, não se diga que o concurso é aberto por um período limitado e que, findo esse período, estaremos em condições de, eventualmente, introduzir a concorrência no sector, pois todos sabemos que a empresa que ganhar esse concurso por cinco anos nele se sentará comodamente e dificilmente perderá a sua renovação. Isto porque, entretanto, terão sido feitos investimentos suficientemente vultosos para desencorajar qualquer tipo de concorrência.
Quem é que, afinal de contas, sai prejudicado disto tudo? Os primeiros prejudicados serão os agricultores que, apesar

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de poderem, efectivamente, vir a receber o subsídio de maneira mais célere, mais regular e até, se quisermos, de maneira mais normalizada, saem realmente prejudicados, porque terão ao seu dispor uma rede de abastecimento menos importante do que aquela de que hoje dispõem, havendo casos perfeitamente anedóticos em que, eventualmente, um agricultor terá de deslocar-se 400 km.
Há, até, um caso referido e analisado na Comissão de Agricultura e Pescas, em que o agricultor teria de fazer 200 km para um lado e 200 km para outro para se abastecer no único posto existente no respectivo concelho. Seria bom que meditassem sobre isso.
Aliás, Sr. Secretário de Estado, dou-lhe um exemplo do seu distrito que o senhor tanto gosta. Há concelhos limítrofes do concelho de Aveiro que têm apenas um único posto de abastecimento da Petrogal, posto esse situado, exactamente, no limite do concelho de Aveiro, isto é, a 200 ou 300 m do concelho de Aveiro, o que significa que um agricultor que se colocar no extremo do outro concelho terá de atravessar todo esse concelho para se abastecer de gasóleo.
Isto é uma aberração que tem sido denunciada...

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - O cartão dá para outros postos.

O Orador: - Não dá, não senhor! Aliás, esse é um esclarecimento que desde já solicito ao Sr. Secretário de Estado.
Depois, Sr. Secretário de Estado, quem perde, efectivamente - e isso é muito importante -, é uma rede de pequeno comércio que tem assento no fornecimento dos lubrificantes, das alfaias agrícolas e também do gasóleo. Toda essa rede assenta uma parte importante da sua viabilidade económica nesta área, pelo que, com a retirada desta fatia, passará, naturalmente, a ficar inviabilizada. Como já disse, no fundo, quem ganha é a direcção-geral dos Serviços Agrícolas e é, fundamentalmente, a Petrogal.
Sr. Secretário de Estado, o indiciamento desta situação é claramente perceptível se apreciarmos e interpretarmos as recentes intervenções de membros do conselho de gestão da Petrogal, que claramente indicam que há muito tempo se vem a investir neste sentido.
Para além disso, podemos imaginar o que é, todos nós a conhecemos, a sensibilidade do tal cartão magnético que os Srs. Deputados referiram. Conhecemos, por exemplo, as enormes dificuldades que a Petrogal tem para manter operacionais os cartões do sistema de abastecimento de frota que são distribuídos aos motoristas do TIR. A partir daqui podemos imaginar, portanto, o que será, para homens habituados a trabalhar com tractores e habituados a trabalhar na lavoura, a gestão material de um cartão extremamente sensível. Isso significará que, a muito curto prazo, esse cartão se encontrará deteriorado e com dificuldades de cumprir a sua missão.
Assim, aprovaremos a proposta de lei de autorização legislativa que V. Ex.ª aqui nos apresentaram, embora acompanhemos as preocupações e, sobretudo, as propostas concretas que aqui foram apresentadas pelo PCP.
No entanto, não quis deixar de colocar aqui esta reflexão que me parece muito importante, na esperança de que o Governo ainda possa fazer as alterações adequadas, para que, efectivamente, a concorrência e a liberalização não sejam apenas bandeiras verbais, mas sim realidades existentes e realidades a considerar.

Vozes do PS: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.
O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Iria colocar duas questões muito breves ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, que, pelos vistos, só poderá responder telegraficamente, dada a falta de tempo que tem.
A primeira é a seguinte: fica mal ao Governo defender os interesses nacionais e os interesses dos portugueses, até neste caso?
Em segundo lugar, gostaria de saber onde é que o Sr. Deputado Manuel dos Santos encontrou alguma norma que obrigue o agricultor a ir a 200 km encher o depósito da sua máquina através deste sistema de crédito, para se abastecer.
No exemplo que deu, devo dizer que não vi em parte nenhuma referido - nem por nenhum dos deputados desta bancada - que ele é obrigado a fazê-lo. O agricultor poderá abastecer-se em qualquer bomba que esteja qualificada para isso e, naturalmente, poderá ir a outro concelho que seja limítrofe da sua residência, ainda que, como eu disse, se trate de um concelho diferente. Não sei onde é que o Sr. Deputado vê isso.

Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Conhece mal o País!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, queria sublinhar a pergunta do Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, no sentido de saber como é que V. Ex.ª teve conhecimento de que esta circunstância dos 200 km podia acabar por resultar da implementação da autorização legislativa. Poderá o Sr. Deputado Manuel dos Santos explicá-lo à Câmara?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Está aqui no concurso público.

O Orador: - Isto é, como é que houve conhecimento de que o sistema encontrado podia ser o da concentração do abastecimento com um posto por concelho, o que já levará o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp a reconhecer que os agricultores terão de deslocar-se os 200 km.
Ora, esse é um dos vícios das autorizações legislativas, Sr. Deputado Rui Alvarez Carp! É que isso não está lá em parte alguma, mas, pelos vistos, vai estar no diploma autorizado!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Srs. Deputados, como não tenho muito tempo disponível, vou procurar ser rápido.
O exemplo que dei, obviamente, é um exemplo caricatural. O que quis significar é que, em determinadas circunstâncias, os agricultores têm de fazer grandes deslocações. De resto, é muito simples: mesmo que seja possível abastecerem-se em todos os postos, basta que não haja postos no concelho para o agricultor ter de se deslocar. Isto parece-me de meridiana clarividência.

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Como, entretanto, há apenas 1300 postos da Petrogal em Portugal e, provavelmente, não serão todos adaptados a este sistema, será fácil V. Ex.ª ter, conhecendo o País e a sua rede de distribuição, claramente indiciado que, em determinadas circunstâncias, há deslocações grandes.
Ouvi citar o caso, obviamente caricatural, dos 200 km, que terá ocorrido no concelho de Santiago do Cacem. Admito que seja um caso limite, mas existem casos perfeitamente anedóticos em que se não são 400 km são 50 km, o que continua a ser muito; o agricultor tem de deslocar-se muitos quilómetros para conseguir o respectivo abastecimento.
Quanto à sua referência ao interesse nacional, é evidente que estamos sempre de acordo com a sua defesa, mas os senhores é que passam a vida a referir a liberalização «assim» e a liberalização «assado». Ora, realmente, este concurso abre, por trás, a porta do monopólio que foi teoricamente fechada pela frente através da liberalização.
Isso é um facto inequívoco. Aliás, não sei se se estão a defender os interesses nacionais, porque ainda não sei a quem vai ser vendida a Petrogal. Tenho algumas suspeitas, mas não sei bem! Portanto, na altura própria é que iremos ver se se estão a defender os interesses nacionais ou os interesses internacionais.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, V. Ex.ª sabe muito bem que foi através do concurso público e de um protesto das companhias petrolíferas que, no seu legítimo direito, fizeram chegar aos grupos parlamentares e aos deputados - o que também aconteceu com o nosso partido- as suas queixas e as suas interrogações e é, obviamente, através disso que temos conhecimento da existência desta questão.
Aliás, ao que parece, o Sr. Deputado Lino de Carvalho tem, inclusivamente, o texto do concurso, coisa que não possuo, mas que conheço suficientemente para fazer a intervenção que fiz.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos hoje em análise a proposta de lei n.8 196/V que permite reduzir a taxa do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) incidente sobre o gasóleo utilizado na actividade agrícola.
Trata-se de uma proposta que se propõe alterar significativamente o mecanismo actual, bem como aproveitar as virtualidades da recente substituição do regime do imposto sobre os produtos petrolíferos, em benefício de um rigor acrescido e de uma pronta devolução do actual subsídio.
O actual sistema, introduzido pela Portaria n.º 256-C/83, de S de Março, permitiu atenuar os reflexos directos, nos custos de produção da agricultura, dos encargos decorrentes da utilização das máquinas agrícolas motorizadas e, em particular, do gasóleo por elas consumido, por recurso à concessão de subsídios aos proprietários dessas máquinas, desde que preenchidos os condicionalismos específicos.
Este esquema de funcionamento mostrou algumas insuficiências no domínio do controlo dos consumos subsidiados e, sobretudo, nos atrasos verificados na entrega dos subsídios, o que ocorre invariavelmente no ano seguinte a que dizem respeito.
Consciente destas insuficiências e aproveitando a substituição do regime do imposto sobre os produtos petrolíferos, o Governo propõe alterar o actual mecanismo.
Aproveitando as virtualidades daquela subastação e introduzindo um maior rigor e uma imediata devolução do subsídio através da criação de um cartão informatizado, que será distribuído aos agricultores e no qual consta a quantidade de gasóleo a que o agricultor tem direito anualmente e onde serão registadas as quantidades consumidas e as ainda disponíveis.
Quanto ao subsídio, deixa de assumir a forma de acerto por transferência bancária, conformando-se, no futuro, como redução de taxa do ISP que incide sobre o gasóleo, ao que acrescem os efeitos da redução desse imposto no montante do IVA, mecanismo que, como já referi, possibilitará a imediata utilização do benefício pelo agricultor. Os montantes correspondentes aos abastecimentos efectuados com redução de taxa serão posteriormente devolvidos à empresa petrolífera distribuidora pela Direcção-Geral das Alfândegas, mediante prova das quantidades abastecidas.
A redução de impostos será limitada ao número de litros por hectare de área regada por bombagem e em função do tipo e classe de máquinas.
Durante o corrente ano, o limite referido será o correspondente ao número de meses de aplicação do regime previsto no artigo 1.º da proposta de lei, tendo como base mensal 131 por hectare de área regada por bombagem e em função do tipo e classe de máquinas. A partir de l de Janeiro de 1992, a dotação será anual e vai constar do cartão informatizado a distribuir ao agricultor.
Prevê ainda a proposta de lei o agravamento das infracções, o que desmotiva situações que aconteceram no passado, como sejam a sobreposição de áreas ou a declaração de máquinas que o agricultor não possuía ou então máquinas que possuía mas que não eram funcionais.
De salientar ainda que a proposta de lei prevê o alargamento do subsídio de gasóleo a outros equipamentos automotrizes exclusivamente agrícolas, referenciados no quadro anexo à proposta de lei, como sejam os colhedores de ervilha, de forragem e de tomate, a gadanhei condicionadora, a máquina de vindimar e o vibrador de tronco para colheita. Trata-se de máquinas ainda pouco utilizadas no nosso país, mas cujo peso tende a aumentar.
Analisado que está o essencial da proposta de lei, deixaria mais alguns considerandos sobre a matéria em apreciação. Desde logo, gostaria de chamar a atenção dos agricultores para que é recuperável o IVA incidente por cada litro de gasóleo que o agricultor paga, pelo que é da conveniência dos próprios agricultores possuírem uma contabilidade organizada, de forma a que possam recuperar os mais de 7$ por litro de gasóleo utilizado.
Consideramos que o aumento do subsídio de gasóleo de 21$50, em 1990, para 30$, em 1991, bem como o facto de este subsídio ser pago no acto da aquisição do gasóleo por dedução directa, constitui um passo muito positivo e um esforço assinalável do Estado Português.
No entanto, reconhecemos que o preço do gasóleo para a agricultura em Portugal continuará a ser superior ao preço médio da Comunidade, pelo que gostaríamos de, no futuro, ver uma aproximação gradual do preço nacional à média comunitária.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Gostaríamos também de chamar a atenção do Governo para a situação particular dos agricultores rendeiros, já que, mantendo-se a exigência actual da apresentação do respectivo contrato de arrendamento para

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poderem ter acesso ao subsídio, tal poderá excluir do sistema muitos agricultores que não sejam detentores de qualquer documento escrito, ainda que essa obrigatoriedade esteja prevista na Lei do Arrendamento Rural. Recomenda-se, nesses casos, a possibilidade de o agricultor poder, através de prova testemunhal, nos lermos permitidos em direito, ter acesso ao sistema.
Consideramos ainda a possibilidade de o sistema poder ser condicionado por um só posto abastecedor por concelho em condições de fornecer gasóleo à agricultura, já que existem concelhos de grandes dimensões onde os agricultores poderão ter dificuldades de abastecimento. Cremos, contudo, que um posto abastecedor é o limite mínimo que decorre do anúncio do concurso público, publicado no Diário da República, 3." série, de 24 de Abril de 1991, pelo que, nos concelhos onde reconhecidamente sejam necessários outros postos abastecedores, estes serão instalados, não só por pressão e vontade expressa dos utentes, como também pelo reconhecimento da viabilidade económica desses postos por parte da empresa abastecedora.
Por todos os aspectos referidos, estamos perante uma proposta de lei muito positiva e que, por isso, merece a concordância do Grupo Parlamentar do PSD.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Luís Rodrigues, tomando conhecimento da sua preocupação, volto a colocar uma questão já aqui levantada e que é a que emerge da actual redacção do artigo 2.ª do texto da proposta de lei.
Efectivamente, de acordo com esse preceito, este tipo de produtos passará a ser tributado por taxas de imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) e de correspondente IVA inferiores, no conjunto, em 30$ por litro.
O Sr. Deputado já ponderou a possibilidade de esta redacção implicar um efectivo prejuízo para os agricultores, designadamente, para os que possuam contabilidade organizada e que recuperem as importâncias que pagaram a título de IVA? É que, com efeito, calculando o ISP actual em 27$, a ajuda em 27$, e o IVA recuperado em 7$, eles poderão estar, com este novo regime, a ser prejudicados.
Não ponderaria o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar a possibilidade de sugerir ao Governo uma alteração desta redacção, eliminando daqui a referência ao IVA, de modo que aquilo que se propõe constitua um benefício efectivo para todos os agricultores? É que, de contrário, poderemos estar a laborar num erro!
Por conseguinte, é esta a questão que lhe deixo, relativamente à qual gostaria que me desse uma resposta, que, no fundo, se traduz na sua reacção a este problema.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, é evidente que ponderei sobre esta situação. Aliás, já tinha chamado a atenção para o facto de que a redacção da proposta talvez não fosse a mais feliz.
De qualquer forma, a intenção do legislador vai no sentido de que o acerto de contas deixe de ser feito por transferência bancária e passe a ser realizado através da redução do ISP e do IVA correspondentes.
Quanto ao IVA recuperável, mantém-se o sistema actual e, portanto, o agricultor iria continuar a receber os cerca de 7$ que recebia já anteriormente.
No que concerne à contabilidade, o agricultor terá toda a vantagem em ter a sua contabilidade organizada. Aliás, no âmbito da competição comunitária directa que se aproxima, não se poderá aceitar outra situação que não essa.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Deputado diz que se mantém o actual sistema de recuperação do IVA. Todavia, repare que, se aqui se fala em «tributadas por uma taxa conjunta de ISP e IVA inferior em 30$ por litro», isto poderá significar que a recuperação do IVA não se mantém nos termos actuais, uma vez que há um tecto de 30$.
Ora, se com a ajuda e a recuperação do IVA o agricultor estava a receber mais do que 30$, ele terá um prejuízo, já que passará então a beneficiar de apenas 30$!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Não, não! E o resto?!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais é que nos poderia também esclarecer nesta matéria...

O Orador: - Bem, já agora solicitaria o esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado.
De qualquer modo, as informações que tenho vão no sentido de que não irá haver prejuízo dos agricultores relativamente a esta matéria.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para uma intervenção, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectivamente, para além de pagarem os 70$ por litro de gasóleo, os agricultores têm depois direito, e desde que possuam contabilidade organizada - é esse o único aspecto a ponderar -, a deduzir o IVA no quadro da sua actividade e de acordo com as regras próprias deste imposto.
Por conseguinte, são situações autónomas. Com efeito, uma coisa é a aplicação do IVA, em que tem todos os direitos, e outra coisa é o preço, com que aquele aspecto nada tem que ver. O que é importante é que a pessoa paga menos de 30$, tendo, adicionalmente, todos os benefícios decorrentes do Código do IVA.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, tem sido argumentado que este

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sistema acarreia benefícios para os agricultores. Contudo, o único benefício é a antecipação no recebimento.
Assim, a pergunta que fazia ao Sr. Secretário de Estado iria no sentido de saber se, de facto, isto tem algum beneficio para os agricultores, já que penso que a instalação do sistema, se for para 1000 postos de abastecimento aos agricultores, vai custar cerca de 4 milhares de contos, ou se tais benefícios se irão traduzir na entrega de um monopólio à Petrogal.
Na verdade, considerando os custos do sistema por antecipação de pagamento, constata-se que se poderia seguir o mesmo sistema dando, antecipadamente, o dinheiro aos agricultores, já que, para estes, tal sistema não acarreta, de facto, mais nenhum beneficio.
Por isso, gostaria de saber se isto não 6, no fundo, uma grande jogada-aliás, de acordo com toda a política do Governo-para preservar o abastecimento da Petrogal e para que esta fique com o correspondente monopólio.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, a instalação deste sistema não possui, por enquanto, qualquer rigor técnico.
Nestes termos, gostaria de lhe perguntar se o cartão do agricultor só serve para uma determinada bomba ou se serve para o sistema na sua globalidade. É que, se servir, o sistema será muito mais caro! Com efeito, nessa aluíra, o Sr. Secretário de Estado irá ter um sistema que orçará em muitos milhões!
Sr. Secretário de Estado, em vez de estar a criar um sistema que custa tantos milhões de contos, por que é que não divide esses milhões, normalizando o subsídio de gasóleo aos agricultores pelo nível da Europa?
Aliás, o Sr. Secretário de Estado sabe que, hoje, os agricultores vendem tudo a preços da Europa. Contudo, compram tudo muito mais caro do que os seus congéneres europeus.
O Sr. Secretário de Estado vai obrigar o sistema a, no mínimo, consumir cerca de 4 ou 5 milhões de contos. Por que razão não faz então já a normalização do preço do gasóleo aos agricultores?

O Sr. José Manuel Lello (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, gostaria de regressar a questão da redacção do artigo 2.º
Na verdade, admito que seja essa a intenção do Governo, isto é. a atribuição de um subsídio de 30$ e depois, para aqueles que, nos termos do Código do IVA, tem direito a isso. a recuperação do IVA. Só que a redacção parece-me, no mínimo, extremamente perigosa, uma vez que não vai haver retorno do IVA em duplicado - não pode haver.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, gostaria que me dissesse qual o sentido útil de, na redacção do artigo 2.º, incluir a referencia ao IVA. É que, se se mantiver a possibilidade de retomo do IVA aos agricultores que têm contabilidade organizada, qual é o sentido útil dessa referência ao IVA; por que é que não fica apenas a referência ao ISP?

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: -O Sr. Deputado está referir-se a um valor de 4 milhões de contos, mas este processo, efectivamente, para o Estado não tem qualquer custo. Há um concurso, e quem quiser concorrer, concorre, respeitando as regras de jogo. Nada mais interessa!
Tive oportunidade de dizer, na minha intervenção, que inicialmente se admitia que a adesão à rede de SIBS (Sociedade Interbancária de Serviços) fosse a solução ideal, mas o facto de as caixas agrícolas de crédito mútuo não fazerem ainda parte do sistema, pelo menos por enquanto, isso iria criar obstáculos.
Vamos, então, arranjar uma solução que garanta o controlo. E não me venha dizer que quando se compra o gasóleo só numa bomba tem um custo e quando se pode comprar em todas as bombas tem outro custo. Há um número de referência, que é quanto basta, e eu estava a indicá-lo, claramente, para que se possa comprar onde se queira. O computador recebe a informação, selecciona-a e envia para onde deve fazê-lo. Não tenha receio, Sr. Deputado, pois isso não dá trabalho nenhum adicional. Está redondamente enganado quanto a esse aspecto.
Relativamente à redacção do artigo 2.º, não vejo que isso tenha problema algum. Aliás, os temas são autónomos e a necessidade de se referir o ISP e o IVA tem a ver com o facto de o IVA ser calculado em função do preço, para que não suscite dúvidas, independentemente, portanto, deste subsídio de 30$, que está incorporado no preço. Por isso, paga menos 30$, ou seja, é de 70$, em função dos preços actuais, funciona paralelamente e não é necessário especificar isso, porque faz parte do Código do IVA, já que está consagrado o princípio da dedução do IVA.
Portanto, não há qualquer necessidade de a referirmos aqui, sendo esta referência apenas cautelar em virtude de o IVA ser calculado por dentro do imposto.

O Sr. Presidente:-O Sr. Deputado António Campos pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, não me sinto esclarecido e, por isso, preciso de um complemento de esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Regimento não prevê complementos, mas como o PRD lhe cedeu tempo, tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Secretário de Estado, estamos aqui perante um complot entre o Governo e a GALP. Esta vai gastar 4 milhões de contos para instalar um sistema e o senhor vai dar-lhe o monopólio. Isto não tem nada a ver com os agricultores, pois estes até ficam prejudicados com este sistema que os senhores inventaram. Eles são os inocentes úteis para este complot.
E, Sr. Secretario de Estado, dado que o complot é entre uma empresa pública e o Governo, é óbvio que há um desvio do orçamento para uma empresa pública em troca do monopólio.
Por isso, pergunto-lhe: sendo o dinheiro da empresa pública ou do Governo, não valia mais normalizar já os preços e pô-los ao nível da Europa e acessíveis aos produtores, fazendo, assim, qualquer coisa em benefício dos próprios agricultores, dado que eles aqui só servem para o papel de inocentes úteis?
Se o Sr. Secretário de Estado quiser pode esclarecermo-nos devidamente sobre esta matéria.

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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, solicitando-lhe que seja muito rápido.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Deputado, já expliquei que o concurso que se abriu exige determinadas acções por parte dos agentes - e eles assumem-nas! Não temos nada a ver com o assunto. O que nos interessa aqui é estabelecer um controlo adequado, permitindo, através dele, que se progrida no sentido que o Sr. Deputado aponta.
Mas vamos ter certezas: quando me dizem que, pelo menos, 20 % a 25 % dos subsídios são desviados, então, temos efectivamente que partir de uma base sólida de controlo,...

O Sr. António Campos (PS): -Qual?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Fica na mesma!

O Orador: -... e a partir dessa base sólida iremos dar passos sucessivos no sentido de procurar melhorar, inclusivamente, se for caso disso, as condições de venda do gasóleo.

O Sr. António Campos (PS): - O sistema de controlo é igual! Isso não corresponde à verdade!

O Orador: -O Sr. Deputado não pode confundir, pois se a Petrogal diz que gasta 4 milhões de contos, se calhar é a instalar bombas, pelo que o problema é da empresa!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate da proposta de lei n.º 196/V. A sua votação, na generalidade, far-se-á na próxima terça-feira.
Vamos, agora, passar à discussão da proposta de lei n.º 194/V, que autoriza o Governo a aprovar o novo regime para o cálculo das indemnizações a atribuir aos titulares de participações sociais no capital de empresas nacionalizadas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Carlos Tavares): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia da República um pedido de autorização legislativa com vista à alteração do quadro jurídico do processo de indemnizações por nacionalização de empresas. Trata-se de introduzir alguns ajustamentos no quadro legal existente, visando a sua clarificação e a sua melhoria, tendo em conta os ensinamentos colhidos durante a sua aplicação.
Em qualquer alteração nesta matéria, existem condicionantes que não podemos ignorar. Em particular, o encargo orçamental emergente de qualquer solução terá de estar presente. Sendo a consolidação orçamental um dos objectivos fundamentais da política económica na perspectiva de uma convergência tão rápida quanto possível com as economias comunitárias, toma-se evidente que custos muito mais elevados com o processo de indemnizações não poderão deixar de se traduzir no sacrifício dos contribuintes ou de despesas públicas em áreas essenciais e, portanto, do próprio progresso do País. E não se pode sequer argumentar que o esforço dos contribuintes é aliviado pelo excesso das receitas de privatizações sobre os valores de indemnização das empresas. É que, ao longo dos últimos 15 anos, e a preços actuais, o Estado suportou cerca de 2000 milhões de contos com as empresas públicas, a título de subsídios, dotações de capital e prejuízos. Este é um encargo que hoje a dívida pública reflecte e que onera as gerações presentes e futuras.
O Governo tem sempre, aliás, acentuado a necessidade de separar claramente os processos de indemnização e de privatização. São processos distintos, de cuja confusão não se divisa qualquer resultado positivo. É claro que o Governo deseja que os portugueses tenham um papel preponderante no processo de privatizações em curso. Entende, todavia, que a melhor via para assegurar esse desiderato 6 o próprio modo de condução das operações de reprivatização que, sem prejuízo da indispensável transparência, deverá criar condições para a tomada de posições importantes por parte de accionistas nacionais. Além disso, ao fazer um esforço de redução do défice orçamental, o Governo está a abrir espaço para o financiamento do sector privado, que pode ser fundamental para a disponibilização de meios aplicáveis nas reprivatizações.
Nestas condições, haverá que encarar o problema das indemnizações com equilíbrio, responsabilidade e realismo.
Nesta, como em outras matérias, o Governo rejeita posições maximalistas - que, como se sabe, existem nos dois sentidos - e procura uma solução equilibrada dentro dos limites que são impostos pela defesa do rigor das Finanças públicas e, portanto, dos cidadãos contribuintes.
Como referi, qualquer solução maximalista no sentido do alargamento dos encargos implicaria, no actual quadro orçamental, uma redefinição das prioridades da despesa pública - sacrificando áreas a que atribuímos grande importância (saúde, educação, infra-estruturas)- e ou um significativo agravamento da carga fiscal sobre os contribuintes cumpridores. E não colhe sequer o argumento de que as indemnizações aumentadas seriam pagas em títulos mobilizáveis nas privatizações, já que é bem sabido que uma receita cessante tem um efeito sobre a dívida pública- e portanto sobre os encargos das gerações futuras - exactamente equivalente a uma defesa emergente.
Pretende, por isso, o Governo, com a presente proposta de lei, introduzir, sobretudo, aperfeiçoamentos no quadro legal existente, com base na experiência que, ao longo deste processo, demonstrou alguns problemas de aplicação prática daquele quadro. Pretende-se também criar condições para um encerramento rápido deste capítulo da nossa história económica recente.
As alterações propostas implicarão - não o escondemos- algum encargo orçamental adicional. É, todavia, nossa convicção de que o montante de dívida pública, autorizado por esta Assembleia para efeitos de pagamento das indemnizações, será suficiente para cobrir o valor global das indemnizações por nacionalização de empresas.
Permitam-me agora breves comentários ao conteúdo da proposta de lei. Os objectivos visados são essencialmente de duas naturezas: por um lado, ajustar o método de cálculo das indemnizações, considerando elementos até aqui não ponderados e estabelecendo claramente os critérios de avaliação das empresas nacionalizadas; por outro lado, clarificar definitivamente o estatuto jurídico das até agora designadas comissões arbitrais.
Clarificado o quadro normativo do processo indemnizatório, todos os processos serão, naturalmente, revistos à luz dos novos critérios.
Em relação aos critérios de avaliação, assinale-se a introdução sistemática do elemento rendibilidade efectiva das empresas e alteração dos ponderadores da forma de cálculo

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ale agora utilizada, no sentido de valorizar menos o valor de balanço e mais os elementos de rendibilidade e de cotação das acções, que é aperfeiçoado, procurando aproximá-lo da data em que efectivamente ocorreu a nacionalização.
Também no que toca à valorização dos elementos patrimoniais se propõem algumas correcções. De facto, grande parte da controvérsia gerada nesta matéria radica numa aparentemente insuficiente definição das regras jurídicas que regulam a aplicação daqueles critérios. Há que pôr termo a esta situação que introduz um grau de incerteza adicional em todo o processo e alimenta injustificadas polémicas.
Definidas regras sobre a matéria, certamente que as dúvidas geradas pelo confronto entre os resultados das avaliações das empresas feitas pelo Governo e pelas comissões arbitrais poderão ser dissipadas. O trabalho das comissões arbitrais teve, aliás, o mérito de mostrar algumas possibilidades de melhoria do actual quadro jurídico, designadamente, ao sugerir critérios de avaliação dos elementos patrimoniais das empresas que nele não encontravam acolhimento.
Estão, neste caso, os novos critérios com que se propõe sejam apreciadas as concessões (particularmente relevantes no sector dos transportes) e as participações financeiras, critérios que implicarão uma considerável valorização em numerosos casos e que encontram plena justificação técnica.
No que diz respeito as até aqui chamadas comissões arbitrais, é conhecida a polémica jurídica que o seu estatuto tem fomentado. Polémica que resulta, em grande medida, das alterações legislativas de que tem sido alvo, as quais, há que reconhecer-se, não garantiram uma total clareza.
Apesar de toda a controvérsia, é entendimento do próprio Tribunal Constitucional que na intervenção da administração na fixação dos valores de indemnizações prossegue ainda o interesse público subjacente ao acto de nacionalização no domínio da função administrativa e não é resolução jurisdicional» (conforme os acórdãos do Tribunal Constitucional 280/89 e 317/89). Deste modo, o despacho homologatório dos membros do Governo a que os respectivos pareceres estão sujeitos encontra a necessária legitimidade.
O Governo entende não haver razões para alterar o sistema actual, tanto mais que não estão minimamente coarctadas as possibilidades de os particulares impugnarem contenciosamente os despachos em causa. Conforme refere o Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 39/88 «O acesso à via judicial para atacar um acto administrativo eventualmente viciado aí está».
Interessa, no entanto, por via legislativa sanar os focos de controvérsia existentes. De facto, a ninguém aproveita - incluindo, em primeira linha, os antigos proprietários- o prolongamento deste processo para além de todos os limites razoáveis. Por isso o Governo propõe-se clarificar definitivamente o estatuto destas comissões, como órgãos preparadores da decisão final da Administração, em que os particulares têm assento. Para evitar ambiguidades, altera-se a denominação das referidas comissões, as quais passarão a designar-se comissões mistas.
Valerá a pena deixar claro que esta alteração, traduzindo uma inegável clarificação jurídica, não traz qualquer mudança substancial aos actuais meios de participação dos interessados na formação da decisão.
Finalmente, e porque este aspecto tem sido referido publicamente, o facto de o projecto de decreto-lei, que acompanha a proposta de lei, prever a necessidade de o pedido de constituição das comissões mistas ser feito por accionistas que representem a maioria do capital social das empresas em causa é, em nosso entender, um factor de simplificação do processo e não visa, de modo algum, criar dificuldades acrescidas.
Com efeito, tal como actualmente acontece, não é razoável admitir-se a existência, como todos reconhecerão, de mais do que uma comissão por empresa. Assim sendo, a forma mais eficaz e mais célere de constituir essa comissão será garantir um entendimento prévio entre os accionistas mais interessados.
Mais uma vez valerá a pena olhar a experiência e verificar os longos tempos que a constituição de algumas comissões arbitrais levou, num regime em que só podendo existir uma comissão qualquer accionista tinha o direito de requerer a sua constituição.
Assim, não se traia de retirar quaisquer meios de defesa aos pequenos accionistas. Aliás, seria surpreendente que os pequenos accionistas sentissem a necessidade de requerer a constituição de comissões se os grandes accionistas não o considerassem necessário.
Todavia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este não será certamente um ponto de grande dificuldade. E se esta Assembleia encontrar uma fórmula mais feliz certamente ela será bem-vinda.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já referi, todas as alterações que acabo de descrever aplicar-se-ão não só aos processos pendentes como, ainda, aos já concluídos, o que obrigará a um considerável esforço adicional do Estado e garantirá maior equidade.
Com efeito, sendo que dos 270 processos de indemnização apenas 60 foram objecto de análise de comissões arbitrais, facilmente se concluirá da maior equidade de uma solução que consagre iguais critérios para todos os casos.
Em relação a outros projectos sobre esta matéria há, porém, um ponto que a proposta do Governo não contempla; ele refere-se às condições do empréstimo emitido, designadamente à taxa de juro que o remunera e à forma de pagamento.
Trata-se de uma questão muito controvertida onde a necessidade de equilíbrio e realismo se coloca com particular acuidade. Do ponto de vista jurídico, é reconhecido que as normas em causa se conformam com os princípios básicos das indemnizações por nacionalização.
Aliás, o Tribunal Constitucional, pronunciando-se sobre as normas da Lei n.º 80/77, que regulam o problema, considerou-as conformes à Constituição e ao princípio de justiça que enforma o Estado de direito.
Por outro lado, as consequências financeiras de qualquer alteração, por pequena que seja, nas taxas de juro dos títulos de indemnização são de tal monta que tomam inviáveis tais ajustamentos no nosso contexto orçamental. Refira-se, ainda, que muitos dos títulos emitidos não estão já na posse dos seus titulares originários, quer porque amortizados, quer porque alienados, quer, ainda, porque mobilizados ao valor nominal para os fins que a lei permite, incluindo a aquisição de acções de empresas privatizadas.
Daí resultam dois tipos de consequências: por um lado, o problema surge relativamente atenuado; por outro, a correcção das taxas de juro, para ser equitativa, exigiria a reconstituição de toda a história de cada título de

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indemnização, o que tornaria a medida provavelmente impraticável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresentou esta proposta - e teve ocasião de o referir aos partidos com assento na Assembleia da República - numa perspectiva de fornecer um contributo para a discussão que esta Assembleia tinha em curso. Aliás, na apresentação dessa proposta - que foi feita pessoalmente aos grupos parlamentares - tivemos ocasião de referir a total disponibilidade do Governo para quaisquer esclarecimentos ou troca de impressões posteriores, pois o respeito por esta Assembleia e pelo seu trabalho nesta matéria assim o impunham.
Hoje, reafirmamos a nossa disponibilidade para, no quadro desta discussão e neste fórum, encontrar as soluções que sejam as mais adequadas à resolução definitiva desta questão.
O Governo não trouxe a esta Assembleia uma proposta de alteração radical do quadro regulamentar do processo indemnizatório. Aliás, nem poderia fazê-lo, quer pelas consequências das soluções maximalistas, quer porque qualquer viragem numa matéria desta natureza teria, em nosso entender, de ser legitimada eleitoralmente.
Por outro lado, o Governo não tem a pretensão de trazer a esta Assembleia com este diploma uma solução que repare todas as injustiças - e certamente elas foram muitas - que os antigos ululares das empresas nacionalizadas sofreram no pós-1974, pois também isso não seria possível num processo com as características de que este se revestiu.
Aliás, basta ter em conta as vissicitudes da questão ao longo dos últimos IS anos para concluir que não é difícil encontrar diversas situações em que ao tentar corrigir-se uma situação de injustiça se criam, automaticamente, outras situações porventura não menos injustas.
Todavia, creio que damos um contributo positivo que visa o difícil equilíbrio entre os legítimos interesses daqueles que há 15 anos se viram privados das suas empresas e dos seus bens, e de quem o País ainda muito tem a esperar, e a salvaguarda do rigor das finanças públicas, condição fundamental de sucesso do grande projecto nacional que é a integração bem sucedida de Portugal na União Económica e Monetária Europeia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado, enquanto ouvia o seu discurso, pensei que estava perante um exercício dialéctico, atribuível a um sofista, porque V. Ex.º mostrou-se perito na arte do sofisma.
Vou tentar demonstrar-lhe porquê, Sr. Secretário de Estado. V. Ex.ª falou em soluções maximalistas - e não sei bem de quem é que estaria a falar -, tanto de um lado como do outro, referiu-se a encargos orçamentais e acena com o fantasma da necessidade de agravar os encargos tributários para fazer face às necessidades impostas pelos tais maximalistas.
Mas, Sr. Secretário de Estado, fixemo-nos na solução do Governo. O Sr. Secretário de Estado tem admitido que ela implica a emissão de dívida pública - e é isso que implica, não é verdade, Sr. Secretário de Estado? - em mais 40 milhões de contos, porque disse que, aliás, ela já está contida nos limites do artigo 8.º da Lei do Orçamento.
Então, Sr. Secretário de Estado, pode dizer-me que consequências orçamentais é que vai ter esta emissão de dívida que vai ser amortizada daqui a 28 anos e que vai pagar juros anuais de 2,5 %?
No tal caso maximalista a emissão de dívida era superior, mas durante os próximos cinco anos ela tinha apenas uma espécie de mobilização e depois destes cinco anos é que era tratada como dívida pública normal. Pergunto, então, que consequências orçamentais é que ela iria ter. Ou será que o Sr. Secretário de Estado deixou de ser fiel à teoria do défice primário, que tem aqui sido defendida pelo Sr. Ministro das Finanças e por toda a equipa que o acompanha?
Quando o Sr. Secretário de Estado fala de défice orçamental, a propósito desta matéria, será que está relamente a pensar em défice orçamental? Ou será que está apenas a pensar em aumento do stock da dívida, que pode vir a ter consequências-e é preciso determinar em que termos - em matéria de despesa orçamental?
É que, Sr. Secretário de Estado, é preciso não enganarmos as pessoas!... E não enganar as pessoas passa, nesta matéria, por explicar-lhes rigorosamente o que se está a passar ou, então, dizer que o CDS é maximalista porque quer gastar 580 milhões de contos que vão ser retirados directamente do bolso dos beneficiários do sistema de saúde, dos pretendentes a uma habitação - e digo pretendentes porque não há utentes desde há muitos anos-, etc.
O Sr. Secretário de Estado disse - e esta é a segunda questão que quero colocar-lhe - que o actual sistema das comissões arbitrais com a homologação era muito bom, por isso vamos mante-lo. Então, por que razão é que o substitui? O Sr. Secretário de Estado disse que vai mantê-lo, mas isso não é verdade; o Sr. Secretário de Estado vai modificá-lo radicalmente, tal como eu vou demonstrar daqui a pouca na minha intervenção.
Então, se esse sistema era bom por que razão é que o substitui? É que citou um acórdão do Tribunal Constitucional, mas esqueceu-se de dizer que esse Acórdão, indiscutivelmente, atribui carácter jurisdicional à função exercida pelas comissões arbitrais e com a pequena mudança que o senhor lhes introduz essa natureza jurisdicional desaparece completamente.
O Sr. Secretário de Estado referiu, ainda, que esse mesmo acórdão do Tribunal Constitucional, que é de 1988, tal como o senhor citou, reconhece a justiça dos critérios materiais, mas, como sabe, essa justiça dos critérios materiais, reconhecida pelo Tribunal Constitucional, foi feita sob a condição de que a conjugação desses critérios não conduzissem ao pagamento de irrisórias indemnizações. Mas isso foi em 1988! Hoje vamos ver o que dirá o Tribunal Constitucional, Sr. Secretário de Estado.
Finalmente, o Sr. Secretário de Estado falou do muito tempo que os interessados demoraram para constituir as comissões arbitrais. Mas quanto tempo é que o Sr. Secretário de Estado e os seus antecessores demoraram para homologar as deliberações dessas comissões arbitrais? Por quanto tempo é que jazeram nas secretárias do Ministério das Finanças deliberações de comissões arbitrais tomadas por unanimidade? E a quantas dessas deliberações tomadas por unanimidade foi recusada homologação ou foi conferida apenas a homologação parcial?
Sr. Secretário de Estado, estas eram as questões que gostaria que o senhor esclarecesse.

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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: -
Sr. Deputado Nogueira de Brito, de Tacto, a minha intenção não foi enganar quem quer que fosse - aliás, suponho que o senhor também não se sentiu enganado, como, certamente, reconhecerá.
Sr. Deputado, não citei as soluções maximalistas, tomei--as apenas em abstracto e a quem elas servirem que as retenha, mas é evidente que - e não vale a pena estar a esconder esse facto - o CDS tem uma proposta diferente da nossa, porquanto a proposta do Governo tem um encargo que cabe dentro daquilo que está autorizado por esta Assembleia, para efeitos de emissão de dívida. Já agora queria esclarecê-lo de que isso não está estabelecido no artigo 8.º da lei orçamental - há aqui uma confusão do Sr. Deputado nesta matéria-, mas num específico para este fim, o das indemnizações, que está fixado desde 1980 e que tem, portanto, ainda uma margem de utilização, onde entendemos que as consequências desta proposta cabem.
Por outro lado, é evidente que a proposta apresentada pelo CDS, que referiu, tem encargos de 580 milhões de contos, que, provavelmente, até nem estão calculados por excesso mas por defeito, como poderei mostrar, o que tem consequências orçamentais sérias.
O Sr. Deputado tentou fazer a comparação entre o. défice primário e o défice total, quase insinuando que eu estava a desviar-me do que tem vindo a ser defendido pelo Ministério das Finanças sobre esta matéria. Não é exacto! Ambos os conceitos são úteis, como o Sr. Deputado certamente reconhecerá.
O saldo primário porque é a partir do seu montante que se pode avaliar se a execução orçamental está a pôr em causa a sustentabilidade da dívida pública no médio prazo. Isto é, se o ratio da dívida pública, em percentagem do PIB, está a diminuir ou a aumentar. É útil, portanto, do ponto de vista do critério da sustentabilidade.
O saldo total é um critério igualmente útil, não menos que o outro, embora tenha uma consequência diferente: refere-se à estabilidade financeira em cada ano.
É evidente que o Sr. Deputado não me vai dizer que é indiferente ter um saldo de 10 % ou de 2 % do PIB se o saldo primário for o mesmo. Em cada ano, a estabilidade financeira, a política monetária e o sector privado são afectados por isso. Nunca o Governo ou o Ministério das Finanças, em particular, disse o contrário; o que tem feito é pôr em relevo a importância, tem dado ênfase ao saldo primário, por também ser um conceito útil do ponto de vista da sustentabilidade.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, a proposta do CDS acrescentava de uma vez só, num ano, 5 % ao ratio da dívida pública em percentagem do PIB, o que é um salto muito grande num período em que temos de continuar a fazer todos os esforços para baixar este ratio, que atingiu o seu máximo, como sabe, em 1988 e que, desde então, tem vindo a decair.
Portanto, é evidente que qualquer encargo adicional tem consequências orçamentais, quer seja devido ao pagamento de juros, quer seja devido à redução das receitas das privatizações. Qualquer que seja a forma que venha a assumir, tem consequências.
O Sr. Deputado disse ainda que o sistema das comissões de arbitragem, que defendi, é bom e que, portanto, não havia razões para o substituir. De facto, o que tentei dizer foi que o efeito prático do sistema que propomos é
exactamente o mesmo, porque as garantias de que os titulares dispõem são exactamente as mesmas - e aqui o Sr. Deputado tem uma opinião diferente, que respeito mas com a qual não concordo, segundo a qual o novo sistema difere do anterior, o que, em nosso entender, não é assim. São as mesmas garantias.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não são, não!

O Orador: - O que dissemos foi que é útil uma clarificação jurídica nesta matéria, uma vez que não é útil para ninguém alimentar a polémica jurídica que hoje existe a este propósito e que é, como eu também disse, injustificada aos nossos olhos.
O Sr. Deputado terá, porventura, uma leitura diferente da minha do acórdão, que referiu, do Tribunal Constitucional, ou então estamos a falar de acórdãos diferentes, o que não creio, e não me parece que ele atribua natureza jurisdicional às comissões arbitrais. Não é isso o que posso deduzir.
Sr. Deputado, o Tribunal Constitucional reconhece justiça ao processo indemnizatório, sob condição de não conduzir a pagamento de indemnizações irrisórias. Lembro o Sr. Deputado de que, quando o Tribunal Constitucional proferiu este acórdão já havia indemnizações processadas, pagas, e, portanto, o Tribunal já linha objecto material para avaliar se elas eram ou não irrisórias - e não as considerou como tal! -, de forma a porem em causa a justiça da indemnização.
Uma coisa diferente é a questão da indemnização total e integral e a indemnização justa, como o Sr. Deputado e os juristas sabem, porque fazem a distinção - e aqui, mais uma vez, reconheço a sua vantagem absoluta em relação à minha pessoa. Logo, são conceitos diferentes, como os juristas distinguem, e refiro-lhe, Sr. Deputado, que a própria Constituição alemã, que é insuspeita nesta matéria, estabelece o princípio da indemnização justa e não o da indemnização integral.
Para terminar, quanto ao tempo necessário às comissões arbitrais para se constituírem, exercerem as suas atribuições e ao necessário para as homologações, dou-lhe, Sr. Deputado, um exemplo recente de uma comissão arbitrai que levou dois anos para se constituir e praticamente todas as comissões arbitrais pedem, por sistema, prorrogações várias do seu prazo de funcionamento.
Bom, mas não é isto que está em causa. Reconheço que, por vezes, as condições não são fáceis para a constituição das comissões nem para levar a cabo o trabalho em tempo mais oportuno. O que procuramos fazer é criar condições para que tudo ande mais rapidamente.
Quanto ao tempo necessário para as homologações, o Sr. Deputado reconhece as dificuldades que este processo tem. Por isso foi nossa preocupação ponderar todos os aspectos envolvidos, o que leva tempo, resultando de toda essa ponderação e reflexão feita pelo Governo as condições para apresentar aqui uma proposta de lei que, segundo penso, resolve alguns dos problemas que surgiram.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, efeito para o qual dispõe de seis minutos.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, antes de começar a contagem do tempo, quero dizer que conto com alguma concessão de tempo por parte do PRD, embora esteja ainda a aguardar a confirmação.

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O Sr. Presidente: - Mas teve a possibilidade de solicitá-lo ao PRD?!

O Orador: - Exactamente, Sr. Presidente, apenas estou a aguardar a confirmação.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, faça favor. Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por não serem estas as melhores condições para estabelecer diálogo com V. Ex.ª, mas não quero deixar de dizer-lhe o seguinte: o Sr. Secretário de Estado não está, porventura, esquecido, porque é uma pessoa de boa memória, que, na discussão do Orçamento do Estado para 1991, o CÓS fez uma proposta de alteração ao texto do artigo 8.8, na qual propunha o aditamento do n.º 4 e, nesse número, a importância proposta, como acrescento à dívida para este efeito concreto, era de 220 milhões de contos. Isto é, o CDS propunha-se introduzir no seu projecto, em ordem a obter consensos na Câmara para alcançar a sua aprovação, as alterações necessárias para que se atingisse esses 220 milhões de contos.
É bom que isto se esclareça porque, com a intervenção do Sr. Secretário de Estado, de A, de B ou de C já lemos, nos jornais, que o nosso projecto de lei. a nossa intenção, implicava uma despesa da ordem dos 800 milhões de contos.
Bom, isto vai por aí fora e é bom, para quem nos ouve, que fique, mais uma vez, ciente de que a nossa última proposta nesta matéria, que nos propúnhamos completar com alterações introduzidas no nosso projecto, se situava nesse contexto.
Voltemos agora ao objecto da nossa discussão de hoje.
O primeiro comentário que se nos oferece fazer, face à proposta de autorização agora em discussão, é que se trata de uma resposta ao combate, que, desde há anos, vimos sustentando no Parlamento, em prol da justa correcção do regime jurídico das indemnizações a que têm direito os titulares das empresas nacionalizadas após 25 de Abril de 1974. Resposta insatisfatória e, sobre certos aspectos, até mesmo negativa, dada a forma ínvia que o Governo costuma adoptar nestas circunstâncias, mas. sem dúvida, uma resposta.
Para quem colocava tão grande ênfase na afirmação, tantas vezes reafirmada, de que não tomaria qualquer iniciativa no sentido de rever o regime das indemnizações, tal como fora fixado em 1987 e alterado em 1980, é já alguma coisa, convenhamos, são, pelo menos, 40 milhões de contos.
Reconhecemo-lo sem esforço, mas nem por isso nos é possível congratularmo-nos com o facto, tantos são os aspectos negativos desta proposta de lei. De tal modo que, ao invés de progresso, cabe antes falar de retrocesso em relação ao regime actual, tal como vem sendo entendido e aplicado pelas comissões arbitrais.
Quer dizer, o Governo diz que veio, finalmente, corrigir a situação dos antigos titulares das empresas nacionalizadas, vítimas de autêntica espoliação nos idos de 197S, o que em verdade veio fazer é tentar eliminar, definitivamente, a possibilidade mais sólida que, apesar de tudo, lhes restava de conseguir que lhes fosse feita justiça. É esse o sentido da extinção das actuais comissões arbitrais.
E tudo isto a troco da correcção parcial dos critérios de avaliação das empresas nacionalizadas, ou melhor, da interpretação que de tais critérios, legislativamente fixados, faz e tem feito o Governo. Nenhuma correcção, porém, em relação à interpretação desses mesmos critérios, faziam, e fazem, as comissões arbitrais, antes pelo contrário, acresce-se a isto que a forma utilizada é, uma vez mais, incorrecta.
Conhecendo, perfeitamente, que na Assembleia se encontrava pendente um projecto de lei com o mesmo objectivo formal -o projecto de lei n.º 561/V, do CDS, o qual foi já discutido, na generalidade, neste Plenário, e aguarda na Comissão de Economia Finanças e Plano a possibilidade de encontrar os consensos propiciadores de uma solução para o problema-, o Governo reagiu apresentando uma proposta de lei de autorização legislativa.
Quer dizer que o Governo, uma vez mais, se furtou ao diálogo com a Assembleia e, ao mesmo tempo, impediu o partido que o apoia de travar esse diálogo.
Embora usual nem por isso se torna aceitável tal procedimento.
E diremos que, neste caso, o procedimento habitual é ainda menos aceitável, exactamente porque o texto do decreto-lei que se pretende publicar, no uso da autorização legislativa, visa alterar uma lei aprovada pela Assembleia em 1977 (a Lei n.º 80/77, de 26 de Outubro); porque um projecto com o mesmo objectivo aguarda votação na Assembleia, repete-se; e, finalmente, porque o Governo dispõe já do texto do diploma autorizado que, aliás, se trata de um texto curto perfeitamente susceptível de ser discutido e aprovado como lei. Processo reprovável, portanto, do ponto de vista das relações institucionais Governo/Assembleia.
Mas, pior do que isso, a proposta merece, também, censura do ponto de vista constitucional.
Ao extinguir as comissões arbitrais e ao criar, em sua substituição, simples comissões mistas, com funções meramente consultivas do Governo, mesmo assim só susceptíveis de ser constituídas quando requeridas por titulares do direito à indemnização, representando a maioria do capital social da respectiva empresa, o Governo, com este pedido, prepara-se para cometer várias e flagrantes inconstitucionalidades.
Assim, ao alterar, uma vez mais - depois de com o Decreto-Lei n.6 343/80, de 2 de Abril, ter sujeitado a homologação as suas deliberações-, o regime das comissões arbitrais, agora de forma radical, isto é, passando-lhes uma certidão de óbito, o Governo viola o princípio da confiança inerente ao Estado de direito democrático, tal como se encontra definido desde 1982 no artigo 2.º da Constituição. Confiança que deve ser assegurada, especialmente, quando estão em causa meios destinados a garantir a salvaguarda de direitos fundamentais, como é o direito à justa indemnização em caso de apropriação colectiva.
E não só o princípio da confiança, mas também o princípio da igualdade, cuja violação se alarga e aprofunda com mais esta alteração ao regime das indemnizações, fazendo coincidir, lado a lado, cidadãos que beneficiaram do julgamento de comissões com outros que delas vão ser privados.
Finalmente, ao confiar definitivamente à Administração o julgamento dos conflitos de interesses surgidos entre ela própria e os indemnizados, a propósito do exercício do direito à indemnização, é o próprio princípio da separação

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de poderes que é violado, com a Administração a usurpar o exercício de uma função materialmente jurisdicional.
É claro que haverá sempre alguns profissionais do pragmatismo para dizer que comissões sujeitas a homologação e comissões consultivas são, ao fim e ao cabo, a mesma coisa, o que reduziria o alcance da modificação. O Sr. Secretário de Estado do Tesouro já o fez.
Engano, porém, como o demonstra a embaraçosa situação a que se chegou, com dezenas de deliberações votadas por unanimidade em favor dos indemnizados a aguardar homologação no Ministério das Finanças.
Deve dizer-se, de resto e em abono da verdade, que é precisamente para pôr termo a tal embaraço - autêntico veto de bolso-que surgiu agora este pedido de autorização legislativa.
A lógica é simples: as comissões estão a incomodar, teimando em fazer justiça, apesar de contarem com um árbitro nomeado pelo Governo e um presidente nomeado por comum acordo? Dá-se cabo delas, reduzindo-as a meros órgãos de consulta e, mesmo assim, dificultando-se, ao máximo, a sua constituição, em prejuízo, principalmente, dos pequenos accionistas.
É o que se chama «cortar o mal pela raiz». Em termos de eficiência, não conhecemos melhor!
Quanto ao mais, e para fugir às críticas mais acesas, corrigem-se ligeiramente os critérios de avaliação, tal como eram entendidos pelo Governo, mas não se toca na maior causa de injustiça do actual regime: a forma de pagamento das indemnizações.
De tal modo que os valores que, porventura, vão ser pagos, a título de correcção, vão continuar a ser em títulos com prazos de amortização de 28 anos e a vencer um juro de 2,5 % ao ano.
Quer isto dizer que vão ser, efectivamente, pagos, no próximo século (ano 2005), com um valor que nada terá a ver com o valor nominal dos títulos agora entregues em pagamento.
Ora, o nosso projecto visa precisamente o contrário, ou seja, a correcção que propomos incide na forma de pagamento, com a abolição da distribuição em classes - violadora, por diversas vias, do princípio da igualdade- e com a correcção dos valores das taxas de juro, aproximando-os dos valores normais das taxas da dívida pública normal do respectivo ano.
Quanto aos critérios de avaliação, confiamos nas comissões arbitrais, limitando-nos a remover o obstáculo absurdo da homologação e reconduzindo-as à pureza inicial de 1977.
É caro o nosso projecto de lei? Envolve, naturalmente, montantes superiores aos 40 milhões calculados pelo Governo para a sua solução ou pseudo-solução.
De qualquer modo é necessário desfazer alguns mitos alimentados, em parte, pelo próprio Sr. Secretário de Estado do Tesouro, Dr. Carlos Tavares, aqui presente.
Assim, em primeiro lugar, as diferenças apuradas serão pagas, de acordo com o nosso projecto, em títulos de dívida pública, chamados certificados de privatização, precisamente, porque num prazo de quatro anos só poderão ser mobilizados para ocorrer ou concorrer as privatizações. Só depois desse prazo se transformarão, os que restarem, em títulos normais da dívida pública.
Em segundo lugar, opera-se, no nosso sistema, como que uma consolidação pública dos direitos à correcção. Eliminando os pagamentos internos dentro do próprio sector público, com o Estado a corrigir indemnizações de que, por interposta pessoa, é ele próprio titular.
Finalmente, aquando da votação do Orçamento do Estado para o corrente ano, fizemos aqui uma proposta de previsão de dívida, que fundamentamos na nossa disponibilidade para rever as soluções do nosso projecto, alterando o modo de correcção das formas de pagamento.
É claro que, apesar disso, será sempre mais do que os 40 milhões de previsão do Governo, os quais, adicionados aos 148 milhões que já foram pagos, não chegam a alcançar o resultado das privatizações previsto para este ano de 1991.
Neste aspecto, porém, naquilo que visamos corrigir, todos os dias se alarga o número dos que aderem aos nossos argumentos. É o caso, bem recente, do ex-titular da pasta das Finanças, Dr. Miguel Cadilhe!
Com efeito, pagar uma dívida com papéis só resgatáveis ao fim de 28 anos, a vencer um juro de 2,5 % ao ano, com uma inflação que não desce de 13 % e que já rondou os 30 %, é de tal modo escandaloso que acabará por ser insustentável, como sustentava o Dr. Miguel Cadilhe.
A ver vamos quem vem aqui trazer a próxima revisão. Mas estamos certos de que esta não vai ser a única revisão. A justiça impõe o contrário.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, certamente para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, os Srs. Deputados Manuel dos Santos, Rui Alvarez Carp e o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
Uma vez que o Sr. Deputado Nogueira de Brito já não dispõe de tempo para responder, apelo aos Srs. Deputados do PS e do PSD que permitam a transferência de algum tempo para o CDS.
Nestes termos, dou a palavra em primeiro lugar ao Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, começo por felicitá-lo, pois hoje, V. Ex.ª coroa uma longa luta em relação a esta matéria. Lamentavelmente, e como tenho repetidamente dito em várias circunstâncias, ao que parece, esta não é uma prioridade nacional profunda e decisiva, porque se fosse provavelmente mereceria um maior interesse da Câmara. De qualquer modo, V. Ex.ª acaba de produzir uma intervenção que vem na linha da sua coerência e do seu comportamento político, pelo que o felicito.
Em minha opinião, as duas características essenciais do seu projecto de lei, pelo menos aquelas que mais me tocaram, são as seguintes: «a correcção das indemnizações já atribuídas aos ex-titulares dos direitos sobre bens nacionalizados, incluindo o acréscimo de juros já, entretanto, vencidos pelos correspondentes títulos da dívida pública e a abolição da diferenciação por classes de indemnização estabelecida no quadro anexo à Lei n.º 80/77, de 26 de Outubro, considerando em todas as situações uma única taxa de juro».
Como V. Ex.º sabe, o Partido Socialista tem manifestado opinião contrária, nomeadamente, contra a abolição das classes de indemnização, mas também é certo que V. Ex.º, quer na Câmara, quer em reuniões de trabalho, em sede especializada de Comissão de Economia, Finanças e Plano, manifestou a disponibilidade do CDS para acomodar alterações neste domínio. Isto é, sendo o seu projecto, realmente, um projecto de uniformização de classes, V. Ex.ª várias vezes declarou que o CDS estava disponível para encontrar uma solução melhor.
Neste sentido, gostaria de saber, concretamente, se V. Ex.ª mantém esta postura e se o CDS pode exprimir o

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seu juízo até onde pensava ser possível, no sentido de manter as classes diferenciadoras que actualmente existem.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, em primeiro lugar, posso informá-lo que o PSD lhe cede dois minutos.

Em relação ao que afirmou na sua intervenção, gostaria de colocar-lhe algumas questões e espero obter respostas tão telegráficas quanto possível.

Primeira questão: o que fez o CDS, quando foi governo, designadamente governo da AD e quando fez coligação com o PS, para resolver esta grave injustiça e escândalo nacional: o processo decorrente das nacionalizações do PREC?
Recordo-lhe, Sr. Deputado, que, nessa altura, especialmente no governo da AD, o Prof. Freitas do Amaral, que era o líder do Partido Democrata Cristão, fazia parte desse governo, assim como o Dr. João Morais Leitão, que tinha a pasta das Finanças. Poderá V. Ex.º, mantendo o respeito pelo sigilo próprio da actividade intragovernamental, dar alguma informação sobre esta matéria? É que é muito fácil propor tudo quando não se têm responsabilidades governativas!
Por outro lado, Sr. Deputado Nogueira de Brito, quando V. Ex.ª, nas propostas que aqui apresentou, diz que, relativamente às empresas públicas, eliminava a hipótese de indemnização, permito-me recordar-lhe que há um princípio da regra do orçamento bruto e um princípio da transparência do sector público, neste caso do sector público global, pelo que não vejo hipótese de, mais cedo ou mais tarde, essa eliminação da dívida - de que as empresas públicas terão direito a ressarcir-se porque têm títulos de indemnização que estão no activo da empresa - não ir agravar o balanço dessas mesmas empresas, com repercussões em termos orçamentais.
Quanto aos tais certificados especiais de privatização, pode ser uma solução, simplesmente, penso que ela não é razoável, porque, na prática, salvo erro ao fim de quatro anos, como consta do vosso projecto de lei, eles seriam transformados em dívida pública e, portanto, iriam efectivamente agravá-la. Nestas condições, as propostas que o Sr. Deputado aqui apresentou não serão um pouco contraditórias em face do que o CDS defende em matéria de maior rigor e mais disciplina orçamental?

O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: -

Sr. Deputado Nogueira de Brito, não vou dizer que quer enganar as pessoas, como V. Ex.ª disse a propósito da minha intervenção, mas porque, de facto, proferiu algumas inexactidões, acho que vale a pena clarificá-las.

Por isso, muito rapidamente e apenas sobre duas ou três questões, fazia-lhe diversas perguntas.

Primeiro: o Sr. Deputado tem repetido frequentemente

-já não é a primeira vez que lhe ouço dizer- que as alterações que são propostas na fórmula do cálculo (ajustamentos técnicos que nós propomos) são incorrectas. Porém, nunca me disse porquê. Ora, eu desafio-o a dizer-

-me o motivo por que os métodos de cálculo agora consagrados são incorrectos.

A segunda questão que o Sr. Deputado tem referido repetidamente é a do sveto de bolso».

Ora, Sr. Deputado, só para sua informação - e espero que corrija a sua afirmação a seguir a este esclarecimento -, devo dizer-lhe que o total de processos de indemnização foi de 270, que foram pedidas 58 comissões arbitrais, que estão encerrados 251 processos, que estão pendentes nas comissões arbitrais 14 processos e no Ministério das Finanças 5 processos.
Espero, portanto, Sr. Deputado, que a sua afirmação relativa ao «veto de bolso» seja, de facto, definitivamente corrigida.
Um pouco na linha da pergunta do Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, também devo dizer-lhe que a pureza das comissões arbitrais, consagrada na lei de 1987, foi retirada em 1980, com os votos favoráveis do seu partido. Não sei se, entretanto, mudou de opinião mas, pelos vistos, na altura, a alteração era considerada justificada e, hoje, já não.

Finalmente, e uma vez por todas, quanto aos certificados de privatização, o Sr. Deputado sabe exactamente o que o Governo faz com as receitas das privatizações: amortiza a dívida pública ou reforça o capital de empresas do sector empresarial do Estado.
É evidente que ao afectar estas receitas a outro fim qualquer é a dívida pública que aumenta mais e, portanto, demos-lhes as voltas que quisermos, serão sempre encargos orçamentais futuros.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, para o que dispõe de três minutos.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, vou tentar ser breve.

Sr. Deputado Manuel dos Santos, é verdade que o CDS, apesar de tudo, está disposto a aceitar o princípio da divisão em classes desde que, pela alteração das taxas de juro que lhe estão associadas, se diminua ao máximo os efeitos, para nós perniciosos e negativos, da divisão em classes. Mas estamos dispostos a aceitar alterações nessa matéria. Aliás, volto a insistir, a proposta que aqui fizemos, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1991 assenta precisamente nessas alterações que estamos dispostos a fazer no nosso projecto. E isso é claro.

Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, perguntou V. Ex.º o que é que fez o CDS quando foi governo e, nomeadamente, quando foi governo com o PS.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que com o PS não fez quase nada porque saiu logo do governo, ao contrário do que sucedeu com VV. Ex.ª que estiveram no bloco central durante muito tempo. Agora, queria também dizer-lhe que, quando estivemos com o PSD, fomos enganados pelo PSD nessa matéria. E digo claramente que fomos enganados! Fizemos mal, Sr. Deputado! Estou a confessá-lo agora e já o fiz, também, quando apresentámos o nosso projecto de lei.
Com efeito, dissemos na altura que este projecto de lei era para o CDS um acto de consciência. E porquê? Porque colaborámos nessa lei de 1980, que introduziu o princípio da homologação, com o pretexto de que se iam acelerar as coisas -sabíamos quem era o ministro das Finanças, nessa altura, não é verdade?-e, depois, até fomos aqui os campeões - veja lá o Sr. Deputado! -do processo de ratificação desse decreto-lei. E confesso-lhe isso! Eu e o Sr. Prof. Adriano Moreira não fazíamos parte

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do grupo parlamentar, mas. no entanto, confesso-o, fomos os campeões embora tivéssemos feito mal, como se veio a demonstrar. E porquê? Tudo, afinal, a troco de um melhor regime de mobilização dos títulos da dívida pública com que se pagavam as indemnizações. É claro que, na altura, ainda não havia nenhumas indemnizações pagas nem coisa que se parecesse e, por isso, estava-se a vogar um pouco no campo das teorias.
Portanto, repilo, fizemos mal e estamos a tentar aqui apagar o mal que fizemos.

O Sr. Deputado Rui Alvarez Carp já sabe que 6 essa a minha opinião, que confesso com toda a franqueza.

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Freitas do Amaral 6 um anjinho?

O Orador.-Não, Sr. Deputado. Isso agradecia-lhe que não dissesse, porque eu também de maneira alguma digo que o Sr. Primeiro-Ministro é um anjinho...

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Ele não é!

O Orador: - Não emprego essas expressões. Eu agora poderia falar da história do partido e falar de anjinhos, de santos e de pau carunchento, mas não o faça E os senhores sabem que eu não o faço. O Sr. Primeiro-Ministro é o Sr. Primeiro-Ministro e trato-o nessa qualidade; o presidente do partido é o presidente do partido e trato-o nessa qualidade.
Nunca, portanto, me ouviram dizer qualquer expressão menos respeitadora e gostaria que V. Ex.ª fizessem exactamente da mesma maneira. E um feitio institucional que eu tenho de abordar estas questões.
Agora, quanto a agravar a dívida nas empresas públicas, não percebi como é que agrava. É que, Sr. Deputado, a dívida de que são titulares as empresas publicas fica como está, não é corrigida. Agrava, talvez, a sua situação por comparação com outras. E vendem-se essas empresas mais baratas? Bom, olhe que, por outro lado, terá algumas vantagens porque essa dívida, hoje em dia, está a ser jogada de maneira muito estranha.
Sobre essas dívidas recíprocas havemos de falar aqui, certamente, ainda nesta sessão legislativa. E teremos muito a falar, talvez!
Quanto aos certificados, o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp pergunta se eu não sou contraditório comigo mesmo. Não, Sr. Deputado. Como V. Ex.ª sabe e é evidente, a nossa bancada, sem desvio em qualquer caso, tem tido sempre a função de bater-se efectivamente contra o crescimento do défice, mesmo do défice primário, ou até de criticar um pouco essa distinção-nisso, como vimos hoje, temos o apoio do Sr. Deputado Carlos Tavares - porque o outro défice, que não é primário, sempre tem várias importâncias. Não é verdade?... E, portanto, registamos essa para a próxima discussão orçamental. É que nós temos sido sempre inflexíveis nessa matéria.
Simplesmente, Sr. Deputado, há princípios. E o princípio de fazer justiça neste caso é um daqueles que tem de se sobrepor às nossas precupações nesta matéria. Isto é. as nossas preocupações mantêm-se mas há uma hierarquização de preocupações, sem dúvida nenhuma.
Sr. Secretário de Estado do Tesouro, eu não disse que eram incorrectas as correcções. Até as saúdo. Simplesmente, o Sr. Secretário de Estado sabe muito bem que elas nada representam face às que já foram introduzidas pelas comissões arbitrais. Isto é, V. Ex.ª vêm corrigir o que não necessitava ser corrigido.
Mas mais: os senhores vêm revogar a legislação de 1976, que vigorava sobre esta matéria e possibilitava uma aplicação pelas comissões arbitrais conducente a resultados mais positivos para os indemnizados do que aqueles que vão resultar das correcções que VV. Ex.ªs vão introduzir. A título de exemplo, diremos que a consideração do good will das empresas é concedido em termos muito limitados, sob certos aspectos, por VV. Ex.ªs Por sua vez, as comissões arbitrais estavam a considerar o good will das empresas sem limitações.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, é assim que se passam as coisas.
Quanto ao «veto de bolso», o Sr. Secretário de Estado homologou e despachou depois de ter mandado para cá a proposta de leit Porque, até aí, sabia que não podia fazer nada! Não queria homologar mas, ao mesmo tempo, também não queria cair nisso. E, assim, arranjou uma justificação. Isto é, porque agora tinha um regime de correcção loca a despachar recusando a homologação a tudo ou homologando parcialmente e não concedendo a homologação mesmo a deliberações tomadas por unanimidade. Foi o que aconteceu.
Sr. Secretário de Estado, o acórdão do Tribunal Constitucional deixa intocada essa questão da natureza jurisdicional. Com efeito, ele pronuncia-se, apenas, sobre se está precludido ou não o recurso aos tribunais e termina por dizer que não está precludido tal recurso. Mas, na forma como trata as atribuições das comissões arbitrais, é inquestionável-e entende-o, assim, por exemplo, o seu correligionário Marcelo Rebelo de Sousa, de forma iniludível - que o acórdão trata as funções das comissões arbitrais como tendo natureza rigorosamente jurisdicional.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): -Sr. Presidente, quero começar por agradecer aos Grupos Parlamentares do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata a gentileza que tiveram ao permitir esta alteração da ordem de inscrições a fim de também me permitir acompanhar os trabalhos da conferência de líderes.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Srs. Deputados: Gostaria de dizer que a posição do PRD relativamente a esta matéria ficou, em nossa opinião, bastante bem explicita aquando da discussão do projecto de lei n.º 561/V, do CDS, relativo ao regime de indemnizações a atribuir aos ex-titulares de acções e de outras partes sociais das empresas nacionalizadas e expropriadas após o 25 de Abril.
Na altura manifestámos uma grande simpatia por este projecto de lei do CDS, tendo até, para o efeito, recorrido, na exposição que fizemos, a certos princípios de natureza internacional que apontavam para que as indemnizações relativas a um processo de nacionalização e expropriação como aquele que vivemos se deveriam pautar por critérios que as tornassem adequadas, efectivas e imediatas. Ou seja, o PRD dava, e continua a dar, acolhimento ao princípio de indemnização de acordo com os princípios vigentes no direito internacional.
Definimos também, e continuamos a definir, que a melhor solução, do ponto de vista do PRD, para a revisão do processo das indemnizações deveria assentar mais sobre a problemática das taxas de juro e dos prazos de amortização, tendo em vista adequar as taxas de juro e os

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prazos de amortização a condições mais realísticas e mais aproximadas das que vigoram habitualmente no mercado de capitais.
Aliás, essa nossa posição deriva do facto de que também considerámos que as taxas de juro e os prazos de amortização que tinham sido definidos eram manifestamente injustos e assim fazíamos assentar a nossa posição menos naquilo que seria o valor nominativo resultante dos valores expropriados. E manifestámos nessa altura uma menor propensão para a revisão dos critérios de ordem económica que tinham valorizado os títulos nominativos desses valores expropriados.
Essa continua a ser a nossa posição e foi isso que exprimimos de forma clara completando esta ideia com o facto de, em nossa opinião, dever existir também um tratamento igualitário de todos os indemnizados perante a lei. Nesse sentido não definimos classes ou categorias de indemnizados de acordo com a sua participação anterior no capital social dessas empresas.
Discute-se hoje uma proposta de lei do Governo, a que foi atribuído o n.º 194/V, que vem ao encontro de algumas das preocupações que aqui manifestámos e que vem igualmente ao encontro de algumas - poucas - preocupações contidas no projecto de lei anteriormente apresentado pelo CDS.
No entanto, esta não é de facto a solução que tínhamos preconizado e em termos de valores absolutos fica muito aquém daquilo que estaria contido no projecto do CDS e portanto nunca se pode colocar em termos de uma eventual revisão do valor dessas partes do capital social poder compensar a proposta ou sugestão que tínhamos feito relativamente à actualização das taxas de juros e à diminuição dos prazos de amortização. Apesar de tudo, continuamos a entender que a solução do Governo é um passo - diria mesmo um pequeno passo - no sentido de resolver este mesmo problema.
Assim, damos o nosso acolhimento e manifestamos o nosso acordo relativamente a esta posição mas exclusivamente enquanto posição de princípio. Gostaríamos que o assunto, tal como tínhamos recomendado na intervenção que fizemos aquando da discussão do projecto de lei do CDS, fosse objecto de um estudo profundo em comissão de forma a poder englobar conjuntamente a proposta de lei do Governo e as sugestões que demos anteriormente relativas à actualização das taxas de juro e à diminuição dos prazos de expropriação.
Por último, quero manifestar o nosso total desacordo relativamente à figura das comissões mistas que substituirão as anteriores comissões arbitrais. Os problemas resultantes do funcionamento das anteriores comissões arbitrais não se resolvem pelo estabelecimento das novas comissões agora designadas por comissões mistas.
No fundo, os problemas subsistirão e, em nossa opinião, esta alteração constitui uma mera alteração de denominação, já que as comissões mistas não irão fazer outra coisa senão aquilo que teriam feito, e mal, as comissões arbitrais. Não daríamos, pois, acolhimento a esta solução das comissões mistas.
Quanto ao resto, entendemos que pode ser um primeiro passo na solução de um problema que tem a magnitude e as implicações de natureza económica e social que aqui foram já suficientemente explicitadas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O direito à indemnização justa, de harmonia com critérios definidos na lei, é um direito constitucional que o Partido Socialista repetidamente e em todas as circunstâncias tem defendido.
Com efeito, é fundamentalmente na base de um projecto da iniciativa do Partido Socialista que a Assembleia da República vem a estabelecer, em Outubro de 1977, através da Lei n.º 80/77, a consagração dos direitos de indemnização a atribuir aos ex-titulares de bens nacionalizados. Temos hoje consciência da relatividade deste ordenamento jurídico, que traduziu na altura o equilíbrio possível entre duas concepções antagónicas e maximalistas, mas é indiscutível e inquestionável que a iniciativa política do Partido Socialista, assumida em circunstâncias conhecidas e vividas em 1977, nos toma credores de legitimidade e autoridade reforçadas para intervirmos nesta matéria.

O Sr. Armando Vara (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconhecemos a importância da revisão equilibrada da Lei n.º 80/77.
Subscrevemos a preocupação de encerrar, à luz dos ensinamentos mais recentes e tendo em conta a evolução dos sistemas e das coisas, o dossier das indemnizações.
Julgamos que o processo de indemnizações, para lá de tendencialmente dever traduzir uma mais adequada (mas sempre relativa) justiça, pode e deve associar-se ao processo de modernização e desenvolvimento do País, constituindo-se como elemento relevante de uma estratégia de privatizações.
Concordamos com a necessidade de reavaliar, à luz de critérios mais adequados, as partes sociais das empresas nacionalizadas, tendo sobretudo em conta o interesse da esmagadora maioria dos ex-titulares (independentemente do valor individual das suas participações) que foram arrastados para o jogo especulativo e sem regras da Bolsa, vivido no período que antecedeu o 25 de Abril de 1974.

O Sr. Armando Vara (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos, também aqui, ao lado da classe média. É, no entanto, essencial que o processo de revisão tenha um fim ou, pelo menos, um fim previsível.
Para o efeito, torna-se necessário que a utilização que o Governo vier a fazer da autorização legislativa que agora solicita seja equilibrada, mas, sobretudo, consensual. Ora, a motivação da iniciativa governamental não parece ter sido a de contribuir para uma revisão da lei, tendo em conta os propósitos anunciados.
Não o foi, em primeiro lugar, porque surge como resposta a uma iniciativa do CDS, que, independentemente do carácter maximalista de que se revestia, estaria em condições, até pela sua polémica, de propiciar uma discussão aprofundada e, quiçá, constituir' a base para o estabelecimento de um novo quadro legal. Neste contexto, a proposta governamental surge mais como elemento de neutralização de uma iniciativa alheia e potencialmente embaraçadora, face a um certo tipo de eleitorado, do que como contributo sério para uma alteração da legislação em vigor.
Não o é, seguramente, porque, visando, através da alteração de critérios (do ponto de vista técnico relativamente justificados), a correcção dos valores de indemnização, o

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que pretende na realidade é a superação de uma dificuldade decorrente do funcionamento das comissões arbitrais, que o Governo não tem saindo superar nem resolver.
A verdadeira motivação desta proposta de lei -entendemos nós- é a substituição das comissões arbitrais pelas comissões mistas, de natureza essencialmente consultiva (elaboram pareceres sobre os quais o Ministro das Finanças emitirá despacho definitivo), o que, evidentemente, diminui as garantias dos cidadãos possuidores dos direitos de indemnização, até porque o exercício do correspondente direito de recurso é apenas reconhecido aos titulares que representem a maioria do capital social da empresa. Concentra-se, de resto, neste domínio boa parte do desacordo do Partido Socialista em relação à proposta do Governo, que, a não ser superado, inviabilizará da nossa parte um voto afirmativa
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Segundo informações provenientes do Governo, assentes na projecção dos valores de indemnização calculados de acordo com os novos critérios, o valor global de aplicação da proposta de lei situar-se-á entre os 50 e os 60 milhões de contos. Este valor é acomodado nos actuais limites da dívida pública autorizada para efeitos de indemnizações.
Em princípio, achamos aceitável o novo esforço que se solicita à comunidade para a superação deste problema. Importa agora ver se a contrapartida social resultante da aplicação desta lei justifica o esforço financeiro despendido.
Mantendo-se o essencial da Lei n.º 80/77, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 343/80, de 2 de Setembro, mantém-se a divisão dos títulos em classes distintas e, consequentemente, a aplicação de taxas de juros distintas. A uniformização das classes e das taxas e a sua actualização constituem elementos fundamentais do projecto apresentado pelo CDS, com os quais estivemos em desacordo, independentemente da disponibilidade daquele partido para se comprometer com uma solução diferente. Este deverá ser um domínio susceptível de um maior consenso e, portanto, de uma solução mais equilibrada.
Como temos repetidamente afirmado, a reviste da Lei das Indemnizações, não sendo um problema nuclear da sociedade portuguesa, não é necessariamente uma prioridade para o Partido Socialista.
Não se confunda a nossa abertura com a aceitação passiva de um dever de iniciativa. Se a opção é entre gastar com as escolas, com a saúde, com a cultura, contribuir para a atenuação das desigualdades e promover a justiça social ou aplicar os recursos públicos na correcção das indemnizações, o PS prescinde da correcção das indemnizações. Se, no entanto, for possível conciliar uma adequada actualização com os principais objectivos da política macro-económica, nomeadamente com os de maior e mais forte incidência social, e, sobretudo, mobilizar os recursos adicionais assim afectados para o desenvolvimento económico e para a correcção das assimetrias e desigualdades, o PS, então, apoia uma iniciativa para a correcção das indemnizações.
Ora, o projecto do CDS esgota-se numa lógica de justiça formal (medida pelo mercado) que não tem em conta o adequado equilíbrio e pretende ignorar, anular ou eliminar todas as consequências das transferencias de propriedade que entretanto se verificaram e a proposta do Governo não é mais do que a eliminação, a troco de SÓ ou 60 milhões de contos, das consequências incontroláveis das decisões das comissões arbitrais que agora se extinguem. Ambas as iniciativas são insuficientes e a aprovação de uma (a do Governo) e a rejeição de outra (a do CDS) pela maioria da Assembleia da República contribuirão inevitavelmente para a manutenção de um clima de contestação à legislação em vigor, ou seja, manterão em aberto na sociedade portuguesa o dossier das indemnizações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não inviabilizaremos nenhuma das iniciativas legislativas em apreciação, porque entendemos que, parcialmente, ambas contêm elementos de equilíbrio e ponderação.
Contudo, não concebemos o processo de indemnizações desarticulado da estratégia de privatizações e desligado da justificada reestruturação do sector empresarial público remanescente. Estamos disponíveis para abrir uma ampla discussão que tenha em conta estes três instrumentos de política. Fá-lo-emos seguramente em condições políticas bastante mais favoráveis na próxima legislatura.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente:-Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, queria colocar-lhe uma breve questão, a qual, aliás, gostaria já de ter colocado ao Sr. Deputado Carlos Lilaia. Porém, como na altura me atrasei no pedido de esclarecimento, gostaria agora de saber se o Sr. Deputado Manuel dos Santos ponderou o custo de um ponto que seja de alteração percentual nas taxas de juro.
Por conseguinte, o que pretendia saber de V. Ex.ª é se ponderou quanto é que isto implica, ou seja, quanto é que é necessário gastar para haver uma alteração satisfatória nas taxas de juro das diversas classes e quanto é que custa a simples igualização das classes-presumo que seriam igualizadas por cima e não pela mais baixa, pela do meio ou por onde quer que seja.
Por outro lado, pretendia também que o Sr. Deputado me dissesse se ponderou também o aspecto prático desta questão. É que, como referi, muitos dos títulos que foram entregues já não estão nas mãos dos titulares originários. Seria assim necessário reconstituir a história de cada título, pois não é lógico que um titular que na Bolsa comprou o seu título abaixo do par vá ser hoje compensado com uma laxa de juro mais elevada. De facto, se tal acontecesse, chegaríamos, provavelmente, a uma situação quase impraticável-não sei, mas julgo que levaríamos muitos anos até reconstituir toda esta história.

O Sr. Presidente:-Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS):-Sr. Presidente, antes de mais, começaria por pedir a V. Ex.ª que me permita nesta sede esclarecer que na minha intervenção, que presumo ter sido distribuída à comunicação social, figura um erro de dactilografia É que se encontra aí redigida a palavra «inaceitável», quando o que pretendia dizer era «aceitável». Com efeito, aí refiro que o valor que, eventualmente, custará a proposta do Governo é aceitável e não inaceitável, como, por lapso, consta do texto. De qualquer modo. eu li «aceitável». Pedia-lhes então o favor de procederem a essa correcção, pois só me apercebi do lapso quando já eslava na tribuna.

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O Sr. Presidente: - Melhor correcção do que esta não pode ser feita. Fica registado no Diário da Assembleia da República.

O Orador: - Relativamente à questão que o Sr. Secretário de Estado me colocou, insisto em que o PS não pode ser onerado com o dever de iniciativa.
Na realidade, na altura própria, isto 6, na altura em que esta situação era extremamente difícil, o PS (ornou a iniciativa de fundamentar a organização essencial que, desde há muito tempo, suporta a política de indemnizações. No entanto, temos consciência de que esta não é uma questão essencial para a sociedade portuguesa e que, portanto, não nos compete a nós tomar a iniciativa.
Já por várias vezes disse, assim como o disseram outros dirigentes do PS em outras circunstâncias, que o PS está aberto à revisão da lei. Porém, o que é facto é que a iniciativa não pode ser nossa.
Nestes termos, os aspectos que me coloca são de natureza eminentemente técnica, para os quais não possuo conhecimentos. É que o Sr. Secretário de Estado, independentemente da muita informação que me deu quando me apresentou a lei, não me deu essa informação - provavelmente porque não a teria.
De qualquer modo, tenho consciência de que o problema não é fácil. Confirmo-o e estou de acordo consigo, sobretudo quanto ao segundo aspecto que referiu.
Há, com efeito, alterações de situação, em relação aos títulos decorrentes das indemnizações, que tornariam esse problema impossível de resolver. Porém, tenho também, por outro lado e como tive oportunidade de referir no meu discurso, consciência de que há um limite de esforço por parte da comunidade que me parece impossível de ultrapassar.
Dir-me-ão o Sr. Deputado Nogueira de Brito, o CDS e todos os defensores de uma política mais aberta e mais forte de indemnizações, que há uma injustiça formal, já que o Estado está hoje a vender, por valores muito avantajados, bens patrimoniais que conseguiu de outra maneira.
É capaz de haver essa injustiça. Só que essa situação é insolúvel e nós não podemos - o Sr. Deputado Nogueira de Brito «ameaçou» com esse perigo, e reconheço que ele existe - estar aqui a reabrir constantemente o processo das indemnizações! Isso não tem nenhum sentido e toma-se necessário pôr um ponto final nessa história, já que, de contrário, em todas as sessões legislativas, teremos sempre mais um bocadinho; teremos sempre mais 60 milhões de contos!
Por conseguinte, independentemente de atingirmos ou não a tal justiça perfeita, temos de obter uma solução equilibrada. De resto, como tive oportunidade de dizer numa intervenção anterior a propósito da apresentação do projecto de lei do CDS, a questão do valor é controversa. E o facto de a proposta governamental prever vários métodos para chegar ao valor das coisas significa que não há uniformidade nessa questão e que esse valor configura algo de subjectivo e, portanto, temos de encontrar uma solução equilibrada. Penso que a proposta do Governo é sobretudo desequilibrada no domínio da não defesa dos interesses de titulares minoritários de partes sociais das empresas.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador:-Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Só para esclarecer que, na minha intervenção, citei precisamente esse ponto como um desejo de facilitar a constituição rápida de comissões arbitrais, porque, se um pequeno titular se sente prejudicado, naturalmente que os grandes se sentem muito mais. Mas também disse aqui que este não é certamente um ponto que se revista de grandes dificuldades; se esta Assembleia encontrar uma fórmula mais feliz, certamente que ela será bem-vinda.

O Orador: - Ainda bem que o Sr. Secretário de Estado refere isso. Aliás, foi esse o sentido da minha conversa particular, há pouco, consigo. Penso que esse é um ponto essencial que temos de modificar e, se V. Ex.ª e o Governo estão de acordo, teremos de fazer uma alteração que permita o acesso às comissões mistas dos titulares minoritários de partes sociais das empresas, numa situação diferente daquela que está inicialmente consagrada na proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro, Srs. Deputados: Estamos na fase final do debate da proposta de lei n.º 194/V, sobre a autorização legislativa que o Governo nos solicita para aprovar um novo regime calculatório das indemnizações a atribuir aos titulares de participações sociais no capital de empresas «nacionalizadas», ou melhor, confiscadas, durante o período revolucionário de 1974/1975 - o chamado PREC.
Em primeiro lugar, quero salientar que este governo teve a coragem de «pegar» neste problema delicado, melindroso e sempre susceptível de ser criticado por todas as partes, quer pelas oposições, quer pelos indemnizados, quer por aqueles que não têm direito a qualquer indemnização, porque «quem torto nasce, tarde ou nunca se endireita» e este processo decorre exactamente de um processo que nasceu muito torto - o processo das nacionalizações.
Mais tarde, com a Lei n.º 80/77, tentou fazer-se alguma justiça. Contudo, quanto a nós, as injustiças agravaram-se no sentido de que quem mais investiu nessas empresas - que, por serem tão importantes, até foram nacionalizadas - foi quem mais prejudicado ficou, através dos critérios subjacentes das classes considerados na Lei n.º 80/77.
Mas, volto a repetir, o Governo merece um elogio público, porque teve a coragem de tratar este assunto. É claro que ele aqui teve de compatibilizar -e isso denota-se claramente, quer na proposta de autorização legislativa, quer no anteprojecto de decreto-lei que o Governo teve a bondade de enviar aos partidos com assento parlamentar - a redução das enormes injustiças sociais, que já referi, com limitações orçamentais e com a celeridade em resolver este problema.
Haveria outras soluções? É claro que haveria! E há outras soluções. Simplesmente, essas soluções poderiam não preencher estes três aspectos a que o Governo teve de atender: as limitações orçamentais, a celeridade em resolver o problema e, dentro desta celeridade, a resolução das injustiças e a capacidade para resolver complexidades técnicas que outras soluções poderiam eventualmente trazer. Neste momento, temos de conceder o benefício da dúvida ao Governo, temos de considerar que o Governo, que tem os meios técnicos para responder a estas soluções, as

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apresentou porque outras que poderiam surgir seriam complexas para a Administração Pública poder resolver estas situações com celeridade.
É importante considerar o aspecto das limitações orçamentais, neste momento, porque sabemos que a União Económica e Monetária envolve uma ideia de disciplina orçamental E, nesta disciplina orçamental, há dois factores que vão ser fundamentais: um deles é o défice orçamental, ou melhor, eliminar excessivos défices orçamentais; o outro 6 fazer um ratio entre a dívida pública e o produto interno bruto.
Ora bem, uma solução porventura menos injusta (qualquer solução será sempre injusta) para com os potenciais indemnizados poderia «macular» quer o ratio défice orçamental/produto interno bruto -e, portanto, o problema dos sucessivos défices orçamentais-, quer o ratio dívida pública/produto interno bruto, o que tem a ver, digamos assim, com um menor ritmo de amortização da dívida pública, a que levaria, por exemplo, uma outra solução próxima da que o Sr. Deputado Nogueira de Brito aqui referiu, relativa à concessão de títulos especiais apenas vocacionados para mobilização no processo de privatizações.
Este processo, naturalmente, podia ter algum impacte em termos de dívida pública, a não ser que houvesse uma engenharia fianceira a que, repito, a Administração Pública pode não estar, neste momento, em condições de responder em tempo útil Logo, entendemos que o pedido de autorização legislativa do Governo deve ser votado favoravelmente e é assim que a bancada do PSD procederá.
Concluindo esta minha breve intervenção, quero transmitir ao Governo a ideia-que é consensual na minha bancada - de que deve ser dado o máximo de empenhamento para que, no âmbito do projecto de decreto-lei que executará a autorização legislativa (que não vai alterar uma regra que vem de anterior legislação relativa à mobilização para efeitos de privatizações), no âmbito dos aspectos que tenham que ver, em termos do decreto-lei e dos raios que constam, salvo erro, do artigo 7.º, seja encarada a hipótese de haver alguma coisa que permita um ratio mais favorável para as indemnizações apenas vocacionadas para o processo da privatização. Isto porque me parece que o processo de indemnizações deve ser um instrumento que reforce a limitada capacidade dos investidores nacionais para recorrerem às privatizações.
Se isso for assim, no âmbito da capacidade da Administração Pública, em tudo o que for possível dentro das restrições orçamentais, a bancada do PSD e, naturalmente, também o País-não só os potenciais beneficiários, mas o Pais como um todo-, verão que o Governo fez tudo o que estava ao seu alcance para garantir as máximas condições aos portugueses que vão ter de enfrentar uma cada vez mais forte concorrência estrangeira, não só em matéria comercial, em matéria económica, mas, no caso específico, em matéria de detenção da propriedade das empresas que se encontrem em processo de privatização.
Em suma, apesar de muitas propostas e de muitas críticas, algumas delas ocas de conteúdo, o Governo apresentou a sua proposta. Estou convencido que ela terá vencimento e estou também convencido que, no âmbito das limitações em que essa proposta terá de ser apresentada e que já referi, terá também o apoio e o acordo da maioria da população.

Aplausos do PSD e do deputado do CDS Nogueira de Brito.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, permitia-me levar ao vosso conhecimento e também, desta forma, àqueles Srs. Deputados que me estejam a ouvir pelo circuito interno de televisão, que segunda-feira, dia 3 de Junho, às 15 horas, a Assembleia volta a reunir.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, em tempo cedido pelo PRD.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero felicitar o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp pelo tipo de preocupações que aqui exprimiu. Estou convencido que, a ser assim, vamos conseguir, efectivamente, chegar a uma solução consensual com o projecto-lei do CDS e com a proposta de autorização legislativa do Governo, porque o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp, juntamente com o Sr. Deputado Manuel dos Santos, demonstraram uma coisa importante: ambos entendem que este processo não pode deixar de ser conexionado com o processo das privatizações.
Isso é óbvio! Aliás, a nossa iniciativa nasce no momento das privatizações, porque ganha aí justificação. Consequentemente, o nosso projecto interlaça, definitivamente, os dois processos, ao prever o pagamento...
Neste momento, o deputado do PSD Ra Alvarez Carp mostra ao orador um artigo do Diário de Lisboa de 15 de Setembro de 1989, da autoria do Prof. Cavaco Silva, com o título «Títulos de indemnização servem nas privatizações».

Isso é do Prof. Cavaco Silvai Muito bem! Fico contente porque o Sr. Prof. Cavaco Silva, quando iniciou o seu governo, disse-me aqui, nesta Assembleia, que rever isso, nunca!

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Mudou de ideias!

O Orador: - É claro! Mudou e mudou bem! Já há uma mudança! Mas é, realmente, uma mudança que pode ter um sentido perverso, como eu acabei por demonstrar.

Agora, o que é positivo é que V. Ex.ª demonstre essa preocupação, porque o Governo não a demonstrou!

Se VV. Ex.ªs, com o PS, estão dispostos a comungar dessa preocupação e a tentar exprimi-la, isso poderá ser positivo.
Mas, Sr. Deputado Rui Alvarez Carp. queria apenas fazer-lhe uma pergunta, como técnico que é: há aqui um fantasma que o Sr. Secretário de Estado aponta, que é o de saber como iremos resolver este problema se os títulos já mudaram de mão. Isto é um fantasma, mas é um fantasma que está resolvido na proposta do CDS.
Os títulos que mudaram de mãos foram, na quase totalidade, parar aos cofres do Estado ou de entes públicos. Assim, o problema oferecido por esses títulos é resolvido com a consolidação proposta pelo CDS. Porque só comprou títulos, mesmo a 300 mil-réis, mesmo por um terço do valor, quem os quis utilizar para os efeitos de mobilização que estavam previstos naquela altura. Portanto, eles estão todos já no Estado e esse problema é um fantasma.

O Sr. Presidente: -Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp.

O Sr. Rui Alvarez Carp (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, infelizmente, V. Ex.ª não tem razão quando refere «quase». É que a diferença entre o quase e

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o todo redundaria numa injustiça. Estou convencido que o Governo não avançou com uma proposta mais próxima daquela que o Sr. Deputado Nogueira de Brito referiu exactamente por causa dessa problema da injustiça relativa. É que há um problema técnico impossível ou muito difícil de resolver para fazer surgir a solução que o Sr. Deputado apontou. É a diferença entre o quase e o todo que leva a que o Governo, que tem de se pautar por regras gerais, não possa, salvo melhor opinião, resolver o problema do modo como o Sr. Deputado sugere, embora com muita mágoa minha o afirme neste momento.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Lá vem o apoio ao Governo!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Nogueira de Brito tem razões para estar com esse sorriso, para estar satisfeito e feliz! De facto, a aprovação desta proposta de lei é inegavelmente uma vitória do CDS. Não temos dúvidas sobre isso e julgo que ninguém as terá! É, de facto, uma vitória do CDS, que tem toda a razão para mostrar publicamente esse sorriso de satisfação. Conseguiu, para além da questão essencial, como há pouco acabou de referir, que o Sr. Primeiro-Ministro mudasse de opinião!
O Sr. Primeiro-Ministro foi peremptório: tocar nas indemnizações, nunca! Não contem com o governo do PSD, não contem com o Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, para mexer no processo de indemnizações. É o que se está a ver...
Verdade seja dita, o Governo só arranjou «coragem» - a coragem a que se referia há pouco o Sr. Deputado Rui Alvarez Carp- para mexer neste processo quando foi publicamente desafiado, nesta Assembleia, pelo PS, através da voz do presidente do respectivo grupo parlamentar, há uns meses atrás, desafio feito aqui frontalmente ao Governo, para que apresentasse uma proposta de lei que aumentasse as indemnizações. Mas, empurrado ou não pelo PS, o Sr. Primeiro-Ministro mudou a sua posição.
No entanto, a questão fundamental é que esta proposta de lei propõe à Assembleia da República a realização de um negócio, um negócio claro: nós (Governo) compramos os passes - utilizando uma imagem futebolística - das comissões arbitrais por mais 50 ou 60 milhões de contos.
É, de facto, um negócio, mas não é, do nosso ponto de vista, um negócio que deva ser tomado a sério nesta perspectiva. Não é transparente, não é claro, não é muito honesto!
Tivemos oportunidade, na altura em que foram criadas as comissões arbitrais, de chamar a atenção para as consequências que essas comissões iriam trazer ao processo, na medida em que podiam, para além da sua própria constituição, fazer apelo a análises subjectivas para definir o valor das indemnizações. Não estavam sujeitos a seguir critérios objectivos.
Por isso, muitos são os casos que se têm verificado em que o valor das indemnizações, proposto nas comissões arbitrais, é extremamente empolado, não com base no valor real das empresas que foram nacionalizadas, mas, sim, com base em valores subjectivos.
O Governo, agora, propõe o tal negócio: «então, acabemos com as comissões arbitrais; compramos os respectivos passes e, para já, à partida, garantimos mais 50 ou 60 milhões de contos». Mas é «à partida», porque o Governo não fez os cálculos de quanto é que isto vai dar.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: -Fez, fez!

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado Nogueira de Brito, não tenha problemas sobre o valor em si. Isto é o ponto de partida! Depois de assumido este contrato, em termos legais, logicamente que se for necessário emitir dívida pública por mais 10, 20 ou 30 milhões de contos, o Governo, qualquer que ele seja, terá de fazê-lo, a não ser que altere esta lei.
Aparentemente, o Governo diz: «bem, agora vamos aplicar uns critérios mais objectivos e a alteração é fundamentalmente em termos do chamado valor da efectiva rendibilidade». Só que o valor da efectiva rendibilidade que nos é proposto pelo Governo não é o valor da rendibilidade efectiva, porque os parâmetros que vão ser utilizados para o cálculo da rendibilidade das empresas à data da nacionalização são os valores de balanço, de balanço não corrigido. E todos nós sabemos que, naqueles anos da febre bolsista, antes do 25 de Abril, havia muitas, mas muitas, empresas que empolavam os seus resultados ostensivamente para obterem efeito em termos de cotação na Bolsa. Por conseguinte, essa alteração não vai conduzir a uma objectividade - objectividade aparente, na medida em que se baseia em elementos que estão inscritos nos balanços -, não vai alterar a realidade de fundo.
Fundamentalmente, falou-se hoje muito, aqui, para tentar justificar esta proposta de lei, em temos de justiça - e aí mais uma vitória do CDS, durante a discussão, pois teve promessas de que, em termos de especialidade, daqui até à próxima semana, até à votação final global desta proposta de lei, ainda haverá mais umas alterações no sentido que pretende.
Bom, mas, essencialmente, falou-se muito em termos de justiça. É evidente que a justiça absoluta não existe e quando se fala em justiça tem de falar-se sempre em justiça relativa e esta está, para além do mais, ligada a prioridades.
Assim, não temos a mínima dúvida, pela nossa parte, que em termos de justiça e de prioridades há, neste momento e neste país, muito melhores aplicações para os 40 ou 50 milhões de contos do que no processo de indemnizações.
Logicamente que ninguém estaria à espera de outra coisa mas, para que fique claro e para que não haja quaisquer dúvidas, por todas estas razões e por muitas outras que poderiam ser avançadas, a proposta de lei não tem o apoio por parte do Grupo Parlamentar do PCP e merecerá, lógica e naturalmente, o nosso voto contra, porque consideramos que se trata de uma má proposta e que este não é o momento próprio para a apresentar, uma vez que a utilização de 40 ou 50 milhões de contos do erário público teriam aplicações muito mais úteis e prioritárias noutros sectores.
Os exemplos são múltiplos, mas, para terminar, vou apenas dar um exemplo claro e evidente que ninguém negará: era muito mais rentável aplicar esses 40 ou 50 milhões de contos na construção de habitações.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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31 DE MAIO DE 1991 2801

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, permito-me ler o n.9 2 do artigo 87.º do Regimento, que diz o seguinte: «Os deputados podem interpelar a Mesa quando tenham dúvidas sobre as decisões desta ou a orientação dos trabalhos.»
É, pois, neste quadro e não noutro que dou a palavra ao Sr. Deputado. •

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa sobre a orientação dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, era para saber se o Sr. Presidente não poderia obter do PCP algum tempo para eu poder colocar uma questão ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, uma vez que temos posições extremamente radicais sobre esta matéria.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, penso que, pela reacção dos deputados do PCP, isso não será possível. Contudo, a proposta de lei ainda vai ser discutida na especialidade e o senhor terá oportunidade de colocar as suas questões.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, pela sua compreensão, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, está encerrado o debate. As votações dos diplomas que discutimos ontem e hoje serão efectuadas na terça-feira, às 19 horas e 30 minutos.
A nossa próxima sessão terá lugar no próximo dia 3 de Junho, pelas 15 horas, para apreciação das propostas de lei n.º 200/V - Autoriza o Governo a estabelecer o regime de indemnizações às vítimas de crimes; 182/V - Autoriza o Governo a regulamentar a actividade cinematográfica, e 191/V - Alteração à Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto (Lei de Defesa do Consumidor).

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 35 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Angelo Ferreira Correia.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.

Partido Comunista Português (PCP):

Octávio Augusto Teixeira.

Faltaram â sessão os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Fernandes Marques
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Margarida Borges de Carvalho
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Vasco Francisco Aguiar Miguel

Partido Socialista (PS):

Ademar Sequeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helena de Melo Torres Marques.
João António Gomes Proença.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.

Partido Comunista Português (PCP):

Ana Paula da Silva Coelho.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Octávio Rodrigues Pato.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Natália de Oliveira Correia.

Centro Democrático Social (CDS): Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.

Deputados independentes:

Jorge Manuel Abreu Lemos.
Maria Helena Salema Roseta.

Os REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - Diogo-Cacilda Nordeste.

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