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I Série - Número 88
Quinta-feira, 6 de Junho de 1991
DIÁRIO Da Assembleia da República
V LEGISLATURA 4.º SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE MAIO DE 1991
Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários. Ex mos Srs
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Apolónia Maria Pereira Teixeira
Daniel Abílio Ferreira Bastos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Deu-se conta de diversos diplomas
Foi aprovado o projecto de deliberação n.º 135/1. subscrito pelo Sr. Presidente, pelo PSD. pelo PS. pelo PCP. pelo PRD e pelo CDS, i dativo à prorrogarão do período normal de funcionamento da Assembleia da República.
Foi lida, pelo Sr. Presidente, uma mensagem do Sr. Presidente da República sobre comunicação social, após o que usaram da palavra, a diverso titulo. u\ Srs. Deputados António Guterres (PS). Carlos Brito PCP), Narana Coissoró (CDS), Carlos Lilaia (PRD), Pacheco Pereira l PSD), Jorge Lauto f PS) e Adriano Moreira (CDS).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um deputado do PS.
Foram discutidos, na generalidade, os projectos de lei n.º 709/V (PRD) - Alteração à Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (protecção da maternidade e da paternidade), 107V (PCP) - Atribuição de um subsídio mensal especial aos filhos a cargo das mães e pais sós. 265/V (PCP) - Aprova medidas tendentes a efectivação dos direitos das mães sós, í1 774/V (PS) - Da nova redacção a diversos artigos da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril (protecção da maternidade e da paternidade) Intervieram, a diverso titulo, os Srs. Deputados Isabel Espada (PRD), Paula Coelho (PCP), Julieta Sampaio (PS), Nogueira de Brito (CDS) Joaquim Fernandes Mui quês (PSD), Laurentino Dias (PS). Odete Santos (PCP). José l Ferreira de Campos l PSD) e Ferraz de Abreu (PS).
A Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 55 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lemos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Álvaro José Martins Viegas.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Augusto Lacerda de Queirós.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Mana Ourique Mendes.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Armando Lopes Correia Costa.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Lelis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Baptista.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimira Gomes Pereira.
Cecília Pua Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Dulcínco António Campos Rebelo.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingues M. P. Ribeiro da Silva.
Fernando Barata Rocha.
Fernando José Antunes Gomes.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Mil - Homens.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maria Oliveira Martins.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Dam ião.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Amadeu Barradas do Amaral.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Augusto Pinto Barras.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel João Vá/Freixo.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Amónia Pinho e Melo.
Mana da Conceição U. de Castro Pereira.
Mana Helena Ferreira Mourão.
Maria João Godinho Antunes.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mana Manuela Aguiar Moreira.
Mana Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstem Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rosa Maria Tomé e Costa.
Rui Gomes da Silva
Rui Manuel Almeida Mendes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Walter Lopes Teixeira.
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Partido Socialista (PS):
Ademar Sequeira de Carvalho.
Alberto Alexandre Vicente.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Manuel Henriques Oliveira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Miguel de Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Edite Fátima Matreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Henrique do Carmo Carmine.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Cosia.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Fernandes Miranda.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui do Nascimento Rubaça Vieira.
Rui Pedro Lopes Machado Ávila.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Ana Paula da Silva Coelho.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mola.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Vítor e Baptista Costa.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Rebocho Teixeira.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Júlio José Antunes.
Lino António Marques de Carvalho.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues. Octávio Augusto Teixeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Alexandre Manuel Fonseca Leite.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
José Carlos Pereira Lilaia.
Natália de Oliveira Correia.
Isabel Maria Ferreira Espada.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Narana Sinai Coissoró.
Deputados independentes:
António Alves Marques Júnior.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Herculano da Silva Pombo Sequeira.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projecto de lei n.8 772/V - Reelevação da povoação de Santa Catarina à categoria de vila, apresentado pelo Sr. Deputado José Lalanda Ribeiro, do PSD; projecto de lei n.9 773/V - Alteração do Decreto--Lei n.9 100/84, de 29 de Março (atribuições das autarquias locais e competências dos respectivos órgãos), apresentado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira e outros, do PSD; projecto de lei n.9 774/V - Dá nova redacção a diversos artigos da Lei n.9 4/84, de S de Abril (protecção da maternidade e da paternidade), apresentado pela Sr.ª Deputada Elisa Damião, do PS; projecto de lei n.9 775/V - Elevação à categoria de vila da povoação de Arcozelo, apresentado pelo Sr. Deputado António Mola e outro, do PCP; projecto de lei n.9 776/V - Elevação a cidade da vila de Ponte de Lima, também apresentado pelo Sr. Deputado António Mota e outro, do PCP; ratificação n.9 198/V, relativa ao Decreto Lei n.9 194/91, de 25 de Maio (Lei Quadro do Sistema da Acção Social Complementar para Funcionários e Agentes da Administração Pública), apresentada pelo PS; projecto de resolução n.9 85/V- Reciclagem dos desperdícios de papel da Assembleia da República, apresentado pelo PSD.
Deu também entrada na Mesa - e está a ser distribuído por todos os grupos parlamentares - o projecto de deliberação n.9 135/V-Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República subscrito por S. Ex.º o Sr. Presidente da Assembleia da República, pelo PSD, pelo PS, pelo PCP, pelo PRD e pelo CDS, que passo a ler:
Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República
A Assembleia da República, tomando em consideração os trabalhos pendentes nas comissões permanentes para efeito de votação final global e
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ainda o propósito de apreciação de diplomas e outras iniciativas agendadas para discussão em Plenário, delibera, ao abrigo do disposto no n." l do artigo 49.9 do Regimento, prosseguir os seus trabalhos nos dias 17, 18, 19 e 20 de Junho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, caso não haja objecções, vamos votar de seguida o projecto de deliberação que acaba de ser lido.
Pausa
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, José Magalhães, Jorge Lemos, Raul Castro e Valente Fernandes.
Srs. Deputados, vou proceder à leitura de uma mensagem do Sr. Presidente da República sobre comunicação social, que é do seguinte teor:
«Mensagem à Assembleia da República:
Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados:
Durante a campanha eleitoral para a Presidência da República, prometi aos portugueses que, no início do meu 2.B mandato, dirigiria uma mensagem à Assembleia da República sobre a comunicação social. Essa promessa baseou-se na minha convicção - confirmada por vários protestos públicos, vindos de quadrantes diferentes - de que o pluralismo e a isenção não estão a ser suficientemente observados, como determina a Constituição, em órgãos de comunicação social do sector público.
Esta situação, aliada à circunstância de se aproximarem as eleições legislativas, leva-me a dirigir-vos a presente mensagem, certo de que, da sua discussão, resolução medidas que acautelem e corrijam abusos e irregularidades que, sendo sempre inaceitáveis, se tomam particularmente graves em tempo eleitoral e num momento em que, à escala mundial, o pluralismo e a liberdade de informação são considerados valores universais.
Como é do conhecimento dos Srs. Deputados, tem havido queixas e protestos, individuais e colectivos, vindos dos mais diferentes sectores da opinião nacional, denunciando a discriminação ou a dificuldade no acesso aos meios de comunicação social do sector público - que constituem serviços com o dever de isenção - e, em especial, a governamentalização da RTP.»
Vozes do PS:- Muito bem!
O Sr. Presidente: - «A manipulação dos telejornais tem sido, frequentemente, referida como uma prática constante, indigna de um país democrático membro da Comunidade Europeia.»
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Sou sensível a estas queixas, como me cumpre. E, sem recorrer a uma enumeração de factos concretos - toda a gente os conhece, por experiência directa - não deixarei, contudo, de referir algumas práticas que, de modo mais comum, reflectem essas queixas: a incoerência dos critérios jornalísticos e o desequilíbrio da sua aplicação em relação ao Governo e aos partidos de oposição;»...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -... «o sistemático tratamento das iniciativas destes partidos em horários e blocos noticiosos de menor audiência;»...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -... «a utilização de técnicas de montagem que desvalorizam a capacidade de comunicação e a presença dos intervenientes, sobretudo quando não são certos membros do Governo;»...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -... «a omissão ou a minimização de iniciativas sociais independentes do Governo ou em confronto com ele; a insuficiência de debates sérios sobre os grandes problemas da actualidade;»...
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -... «o afastamento de profissionais qualificados e isentos;»...
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: -... «o recurso a comentadores anónimos ou apenas representativos de franjas marginais da opinião; finalmente, a chocante discriminação no tratamento das actividades dos diferentes órgãos de soberania».
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «É particularmente inaceitável, neste contexto, por atentatório do rigor e da objectividade, o procedimento recente da RTP ao revelar dados estatísticos sobre "os tempos dedicados à cobertura de actividades" dos órgãos de soberania e dos partidos políticos. Conforme foi apontado por dois partidos da oposição - em respostas que, significativamente, foram ignoradas pela televisão - esses dados sofismam a realidade visto não levarem em conta a diferente importância dos vários blocos informativos e dos acontecimentos a que eles se reportam, o lugar de colocação das notícias em "alinhamento", ou o diferente impacte causado pela difusão do som próprio ou por um resumo em voz off.»
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Numa altura em que, em Portugal, se completa o processo de privatização dos jornais antes integrados em empresas públicas e em que à iniciativa privada e permitido concorrer à atribuição de canais de televisão, considero ser meu dever propor à Assembleia da República, no uso da competência que me é conferida pelo artigo 136, alínea d), da Constituição, uma reflexão sobre a forma de melhor assegurar o pluralismo na comunicação social no nosso país, numa perspectiva não conjuntural e tendo em conta a regra básica da alternância do poder político em democracia.
Faço-o no convencimento de ser este o momento certo para se proceder a uma análise rigorosa e exigente sobre as modificações agora operadas na comunicação social - na imprensa escrita, na rádio e na televisão. Análise que tem, necessariamente, de ponderar em que medida as mudanças em curso asseguram e estimulam um efectivo pluralismo político, económico, social e cultural, garan(...)
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tindo aos cidadãos - a todos os cidadãos-, independentemente das suas opiniões e crenças, os direitos constitucionais de informar e de ser informado com isenção e, aos jornalistas, as condições de trabalho e de independência a que têm direito.»
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Sou, como se sabe, defensor da livre iniciativa na comunicação social e considero, como princípio geral, que o Estado democrático não tem vocação para ser proprietário e gestor de empresas neste sector. Seria, porém, indesejável que a desestatização da comunicação social e o consequente reforço de uma salutar concorrência viessem a originar formas ocultas de dependência e controlo ilegítimos.»
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Precisamente porque defendo o alargamento da livre iniciativa no sector da comunicação social, julgo ser indispensável o estudo de medidas que evitem a excessiva concentração da propriedade dos meios de informação e que assegurem a preservação do pluralismo, da liberdade de expressão do pensamento e de um diálogo democrático aberto.»
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Dir-se-ia que as actuais regras aplicáveis à rádio e à televisão, bem como a prática seguida na privatização dos jornais, encorajam a concentração, o que pode vir a constituir uma limitação ao pluralismo informativo.
Aponto, como exemplo, o processo de privatização de dois dos mais importantes diários nacionais: o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias. Levantaram-se dúvidas na opinião pública sobre a transparência destes processos. É importante reflectir sobre se as condições finais e concretas das operações de privatização respeitaram o disposto no artigo 38.8, n.9 4, da Constituição da República, que prevê que "o Estado assegura a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico [...] impedindo a sua concentração, designadamente através de participações múltiplas ou cruzadas".»
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Importa, igualmente, considerar que uma das formas mais eficazes de garantir a independência e o pluralismo da comunicação social consiste no reforço dos direitos de participação dos jornalistas nos órgãos de informação onde trabalham, designadamente através dos conselhos de redacção»...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Apoiado!
O Sr. Presidente: - ... se da criação de outros mecanismos que venha a provar-se serem adequados.
As competências dos conselhos de redacção encontram--se definidas na Lei de Imprensa, prevendo o Estatuto dos Jornalistas a sua extensão a todos os órgãos de comunicação social e, portanto, também à rádio e à televisão. Ora, quer a Lei da Radiodifusão, quer a Lei da Televisão são
completamente omissas quanto à sua existência, o que permite o seu apagamento ou mesmo a sua supressão, tornando menos democrático o funcionamento das redacções.
É hoje doutrina assente que a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e a liberdade de iniciativa dos empresários da comunicação social constituem direitos essenciais nos quais se fundamenta a liberdade de informação. É essa uma condição necessária mas não suficiente.
Com efeito, a liberdade de informação não pode ser apenas garantida pela observância dos direitos dos seus produtores e agentes. É necessário proteger, com igual eficácia, o direito dos cidadãos a uma informação livre, rigorosa, pluralista, diversificada e eticamente responsável.
É por isso que a plena garantia desse direito - e dos deveres que lhe estão associados - pode justificar a existência, em concorrência com operadores privados, de serviços públicos de rádio e de televisão, dado o carácter finito do espectro radioeléctrico e a poderosa influência de que esses meios dispõem na formação da opinião pública nas sociedades democráticas, em particular na televisão, como poderoso instrumento de informação, de cultura, de participação e de formação de opinião. A sua importância e influência impõem que esse serviço público seja, em absoluto, independente do poder político e do poder económico, se reja por critérios transparentes, tanto quanto possível consensuais, e tenha uma participação plural. Não pode entregar-se ao arbítrio individual de quem quer que seja - sobretudo quando, aparentemente, ninguém parece exigir-lhe responsabilidades - a definição dos critérios essenciais do que interessa ou não ser dito, informado ou discutido, e por que forma.
No caso português, é imprescindível que se assegure uma gestão isenta e participada da RTP, por forma a que esteja em condições de desempenhar um serviço público de qualidade, possibilitando-lhe um relevante papel na difusão da informação e da cultura, no respeito pela diversidade e pelo pluralismo, criando as melhores condições para que possa dar um contributo decisivo na formação cívica e cultural dos portugueses».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Toma-se, pois, necessário que a RTP - como concessionária do serviço público de televisão - seja gerida através de um modelo organizativo que evite a interferência do poder político, qualquer que seja, no conteúdo da programação e da informação, feita muitas vezes através da escolha dos seus responsáveis, de acordo com critérios em que preocupações de fidelidade político-partidária»...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Ora aí está!
O Sr. Presidente: -... «parecem sobrepor-se a uma justa avaliação do prestígio, da isenção, da qualidade técnica e da competência profissional, necessárias ao desempenho de tão importantes funções».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Em países da Europa comunitária existem interessantes experiências que importa analisar com atenção, verificando da sua aplicabilidade ao caso português, tendo em conta que a atribuição de competências mais vastas e precisas na gestão e direcção dessas empresas
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a organismos plurais e representativos da opinião pública tem garantido uma maior independência, isenção e pluralismo da sua informação e uma maior qualidade da programação.
De entre essas várias experiências europeias, sublinho as que institucionalizam a participação de representantes de diversos segmentos da opinião pública conjuntamente com especialistas de comunicação de reconhecida competência. Estes órgãos têm o poder de se pronunciar, regularmente, sobre a qualidade dos programas e dos procedimentos jornalísticos adoptados, constituindo um poderoso "tribunal de opinião" a que nenhum poder político democrático e responsável poderá permanecer indiferente.
A constituição de um órgão deste tipo representaria um importante progresso, permitindo corrigir actuais deficiências institucionais, para as quais, em devido tempo, alertei.
Os estatutos da RTP necessitam, a meu ver, de ser reformulados, de modo a dotar a empresa de um figurino de gestão próximo dos modelos de representatividade social existentes nos demais países da Comunidade Europeia, os quais, em geral, asseguram, melhor do que no caso português, o pluralismo e a independência da informação.»
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «De igual modo - e com idênticas preocupações - deveriam ser reanalisados os estatutos dos centros da RTP e da RDP nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores. Na verdade, de acordo com os estatutos destes centros regionais, os respectivos directores só podem ser designados por aquelas empresas com o voto favorável dos governos regionais, criando uma dependência entre aqueles centros e os governos das Regiões, a todos os títulos prejudicial à independência que a RTP e a RDP devem possuir, por igual, em todo o território nacional.»
Vozes do PS e PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - No que respeita à rádio, para a qual lambem são válidas, embora em menor escala, algumas das considerações feitas, há, todavia, que salientar a nova experiência das rádios locais e regionais, cuja actividade tem contribuído, de forma notável, para o reforço da liberdade e do pluralismo na radiodifusão.
A sua existência, sobretudo nas zonas mais carenciadas e marginalizadas do País, tem-se revelado um importante factor de desenvolvimento dessas regiões, dado serem elas, muitas vezes, os únicos órgãos de comunicação social a fazerem a divulgação dos valores, tradições e problemas dessas terras.
Afigura-se, assim, importante que seja garantida a viabilidade destas rádios através de formas de apoio gerais e abstractas, equivalentes, em lermos conceptuais, a algumas medidas de apoio à imprensa escrita, como, por exemplo, o "porte pago".
É sabido que as receitas publicitárias - sua principal ou mesmo única fonte de financiamento - escasseiam em muitas das regiões onde essas rádios estão implantadas. Parecem-me também insuficientemente justificados os entraves que têm sido levantados a formas de associação e cooperação entre estas novas estações.»
Vozes do PS e PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Em síntese, imporia, sobretudo, reflectir acerca do respeito pela liberdade de expressão e informação consagrada no artigo 37." da Constituição. De facto, a plena garantia do direito dos cidadãos à livre expressão do pensamento, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações, impõe que seja assegurada e promovida a influência de organismos que se proponham, com isenção, fiscalizar o exercício da liberdade de informação, garantindo que seja utilizada com respeito pelos limites legais ou deontológicos.
Do mesmo modo, importa assegurar, da maneira mais adequada à sua importância, o direito de resposta dos cidadãos, consagrado na lei - direito cuja observância se tem revelado deficiente -, bem como os direitos individuais e, nomeadamente, o direito dos cidadãos à reserva da intimidade da sua vida privada e a presunção da inocência dos arguidos não condenados, evitando prematuros e ilegítimos julgamentos pela opinião pública. A identificação inequívoca das mensagens publicitárias, separando-as, claramente, da restante programação, é também um imperativo legal que tem de ser respeitado.»
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - «Sr. Presidente, Srs. Deputados: O objectivo desta mensagem, que procurei ilustrar com alguns exemplos que poderiam ser longamente multiplicados, denota uma séria preocupação que sinto e que sei ser partilhada por muitos dos meus concidadãos, aos quais não tem sido dada suficiente voz para se exprimirem, como é seu inalienável direito. Vivemos numa sociedade aberta e estamos inseridos numa comunidade que tem como principal razão de ser a liberdade e o pluralismo democrático.
Nos últimos anos, têm vindo a verificar-se, em lodo o mundo, profundas mudanças no domínio da comunicação social, especialmente no sector do audiovisual, em consequência das novas tecnologias da informação. O desenvolvimento científico e tecnológico permitiu a generalização e a multiplicação do acesso aos meios de difusão e de informação e proporcionou uma maior iniciativa aos grupos sociais e aos indivíduos. O papel do Estado alterou-se, evoluindo para um tipo de intervenção reguladora e moderadora nas sociedades abertas e democráticas, com o objectivo essencial de assegurar o pluralismo e garantir a liberdade de imprensa. Esta e uma situação nova, que exige uma revisão profunda da perspectiva com que estes problemas têm sido encarados em Portugal.
A Assembleia da República é o órgão de soberania fiscalizador, por excelência, da vida pública e também um guardião dos valores democráticos. Daí que vos solicite uma reflexão actualizada - e, tanto quanto possível, objectiva e rigorosa - sobre a complexa problemática da comunicação social, bem como acerca das medidas legislativas que tiverem por convenientes. Faço-o com total isenção, não esquecendo que me cumpre, por imperativo constitucional, assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas e na convicção de que, assim, contribuo, dignificando a Assembleia da República como expressão plural da representação nacional, para um efectivo aperfeiçoamento do nosso Estado democrático de direito, em defesa de um maior pluralismo na comunicação social e de um estatuto de dignidade e de independência para os profissionais da imprensa escrita e falada.»
Aplausos do PS, do PCP, do CDS, dos deputados do PRD Alexandre Manuel e Natália Correia e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca. José Magalhães e Jorge Lemos.
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O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, queria, em primeiro lugar, sublinhar a importância e o carácter histórico desta mensagem presidencial.
Risos do PSD.
Penso que ela deve ser encarada, pelos Srs. Deputados, com serenidade e com espírito aberto, de forma a propiciar uma reflexão profunda sobro os temas nela invocados.
Considerando ainda que está agendado para sexta-feira, por iniciativa do CDS, um debate sobre comunicação social, parece-me ser esse o momento mais adequado para que os deputados possam livremente exprimir as suas opiniões em relação à problemática da comunicação social que foi objecto desta mensagem presidencial.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a atitude do meu grupo parlamentar em relação à mensagem presidencial ficou bem expressa nos aplausos com que a acolhemos.
A sua importância é também manifesta!
Todos nós sabemos que está agendado, por iniciativa do CDS, um debate sobre comunicação social. Ora, esse parece-me ser o momento adequado para se tomar em consideração o conteúdo desta mensagem.
No entanto, creio que valeria a pena fazer, o mais rapidamente possível, uma conferência dos representantes dos grupos parlamentares para ser considerada a possibilidade de, na sequência da mensagem do Sr. Presidente da República, poderem ainda ser tomadas algumas iniciativas legislativas, indo ao encontro daquilo que é proposto na mensagem presidencial, e que possam, na verdade, diminuir ou eliminar alguns dos males que aí sito assinalados.
Era esta a sugestão que gostaria de fazer ao Sr. Presidente e a todo o Plenário.
Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, o nosso Regimento 6 omisso quanto ao procedimento a seguir após a leitura de uma mensagem presidencial.
Contudo, como, aliás, já referi hoje, em conferencia dos representantes dos grupos parlamentares, ainda quando a mensagem não unha dado «fisicamente» entrada no gabinete de V. Ex., o CDS, embora tivesse outras iniciativas legislativas para agendar, dada a importância de que este assunto se reveste para a opinião pública e para a própria Assembleia da República, decidiu agendar para a próxima sexta-feira, e no único agendamento da ordem do dia a que tem direito durante ioda a sessão legislativa, a problemática da comunicação social.
O CDS fará, naturalmente, desta mensagem o objecto principal do seu agendamento.
Fica assim dada uma explicação aos Srs. Deputados do PSD, que, espero, enriqueçam o debate com intervenções muito claras.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): -Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PRD gostaria de saudar a chegada da mensagem de S. Ex.º o Sr. Presidente da República à Assembleia da República. Depois de sistematicamente anunciada, corria-se o risco de cia só chegar quando a Assembleia da República já estivesse fechada.
Mas também gostaria de a saudar porque ela vem ao encontro de algumas das preocupações que o Grupo Parlamentar do PRD trouxe, ao longo de cinco anos, a essa Câmara, designadamente por parte da Sr. Deputada Isabel Espada.
Apesar de tudo, devemos reconhecer que cinco anãs £ demais para só agora se ler chegado à conclusão de alguns defeitos e anomalias no funcionamento do sector da comunicação social em Portugal, mas mais vale tarde do que nunca.
Concordamos com algumas das críticas e pressupostos que estão, de facto, inerentes a esta mensagem. Mas gostaríamos também de deixar aqui a nossa crítica pelo facto de esta mensagem só ter chegado em período pró- eleitoral, com as eleições já marcadas.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a seguir à leitura da mensagem presidencial alguns Srs. Deputados pediram para fazer interpelações à Mesa, a quem eu dei a palavra. Dentro desta lógica, vou dar a palavra aos grupos parlamentares que ainda não usaram da palavra, mas apenas a esses. Como já foi aqui dito, não há debate sobre a mensagem presidencial.
Sendo assim, vou apenas dar a palavra ao Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa registou várias inscrições do grupo parlamentar do PS, mas, tal como já disse, não vamos abrir um período de debate.
Comecei por dar a palavra ao Sr. Deputado Amónio Guterres, depois aos representantes dos Grupos Parlamentares do PCP, do CDS e do PRD.
Não havendo debate político sobre esta matéria, só pode usar da palavra um elemento de cada grupo parlamentar. É esse o nosso procedimento habitual.
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Para além disso, Srs. Deputados, já foi aqui dito que este debate terá lugar na próxima sexta-feira, aquando do agenciamento que já foi anunciado pelo CDS.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, queria penas fazer dois comentários, o primeiro dos quais para dizer que a minha interpelação à Mesa teve apenas como objectivo dar uma sugestão de natureza processual. Foi por isso mesmo que não me referi ao conteúdo da mensagem do Sr. Presidente da República, o que a minha bancada, seguramente, não deixará de fazer no debate da próxima sexta-feira.
O segundo comentário que gostaria de fazer é o de que, no entender da minha bancada, o direito de interpelação à Mesa é um direito individual dos deputados e parece-me difícil que ele possa ser restringido. No entanto, apelo para que os Srs. Deputados, qualquer que seja a ordem da sua bancada, que dele queiram fazer uso respeitem o facto de que esta mensagem justifica, naturalmente, alguma reflexão e deve ser debatida no momento próprio e com um sentido de profundidade e objectividade.
Vozes do PS: -Muito bem!
O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, antes de iniciar a minha intervenção, gostaria de dizer que a pretendo fazer da tribuna, uma vez que quero estar de frente para os meus companheiros e para os órgãos de comunicação social.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge. Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Cada orador pode falar de onde entender, Sr. Deputado.
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, trata-se de uma interpelação à Mesa e cada um dos Srs. Deputados pode fazê-la de onde muito bem entender, ou seja, na primeira ou na última fila...
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - De resto, Srs. Deputados, não é a primeira vez que isto acontece!
Srs. Deputados, gostaria que se fizesse silencio na Câmara.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não me eximirei de exprimir, nos mesmos lermos de alguns dos Srs. Deputados que me precederam, aquilo que entendo dizer sobre a mensagem do Sr. Presidente da República, utilizando a mesma figura regimental.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O nosso ponto de vista é de discordância, quer quanto ao conteúdo, quer quanto à oportunidade da mensagem do Sr. Presidente da República.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tal como procedi em relação às outras bancadas, dou autorização ao Sr. Deputado José Pacheco Pereira para fazer uma interpelação à Mesa.
Após isso, vou interromper os trabalhos por uns momentos e peço aos líderes das diferentes bancadas que se reunam comigo no meu gabinete.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, a nossa discordância tem três ordens de razões.
A primeira e a de que não concordamos...
Protestos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a sessão.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 16 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, na conferência dos representantes dos grupos parlamentares que teve lugar ficou estabelecido que cada partido disporá de 3 minutos para fazer uma apreciação, um comentário sobre a mensagem de S. Ex. o Sr. Presidente da República.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado José Pacheco Pereira.
O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou retomar aquilo que estava a dizer quando fui interrompido pelo pluralismo dos Srs. Deputados da oposição...
Aplausos do PSD.
Gostaria, assim, de reafirmar a discordância do PSD quanto ao conteúdo e à oportunidade da mensagem do Sr. Presidente da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E discordamos pelas seguintes razões: primeiro, não concordamos com a análise que faz da si-
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tuação da comunicação social. Se há coisa que caracteriza os últimos seis anos da comunicação social é precisamente a progressiva diminuição do papel do Estado, do Governo e do poder político na intervenção da comunicação social...
Aplausos do PSD.
... através da privatização da imprensa, da criação de um sistema de rádios independente e da progressiva autonomia dos órgãos públicos. Qualquer caracterização da situação da comunicação social que não parta deste pressuposto vicia a análise daquilo que está a acontecer!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mais: a grande diferença que existe entre a situação de hoje, em 1991, e a que existia antes de 1985, da qual devemos ter memória, está no facto de hoje não ser possível ao poder político adoptar os comportamentos que assumiu nessa altura, em relação aos órgãos de comunicação social.
Aplausos do PSD.
Em segundo lugar, qualquer análise sobre o pluralismo dos órgãos de comunicação social tem de ser feita em relação ao conjunto dos órgãos de comunicação social e não apenas em relação ao sector público. O problema do pluralismo na comunicação social portuguesa é mais lato do que os órgãos que pertencem ao sector público. Sobre essa matéria também nós temos suficientes razões de queixa para exprimir a nossa discordância quanto à inexistência, em muitos sectores e em muitos órgãos de comunicação social, de um real tratamento equilibrado das forças políticas e da actuação dos principais agentes políticos, sociais e económicos na vida pública portuguesa.
Em terceiro lugar, discordamos da oportunidade da mensagem do Sr. Presidente da República, anunciada durante a campanha eleitoral, em Janeiro, e trazida a esta Assembleia depois de o Sr. Presidente da República ter marcado a data das eleições, num momento em que a oposição sofre de um considerável impasse político, pois não dispõe de temas para a discussão e não consegue defrontar o Governo, no final da primeira legislatura de estabilidade.
Pensamos que o Sr. Presidente da República, no âmbito da sua intervenção institucional, tem de ter em conta os efeitos públicos das suas afirmações sobre matérias que têm o melindre desta.
Por último, quero apenas dizer que, como parlamentares que somos, é nossa intenção discutir a substancia da intervenção do Sr. Presidente da República, mas não pretendemos alimentar qualquer conflito artificial sobre esta matéria.
Risos do PS e do PCP.
Deste modo, exprimimos aqui a nossa posição quanto à mensagem do Sr. Presidente da República. A partir de agora, vamos discutir a matéria com a oposição.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No exercício de um direito constitucional inquestionável, o Sr. Presidente da República entendeu por oportuno dirigir à Assembleia da República uma mensagem reflectindo a sua preocupação sobre questões essenciais do exercício de direitos públicos fundamentais na sociedade portuguesa.
Perante isso, assistimos a uma reacção, verdadeiramente irresponsável, de afrontamento do PSD ao Sr. Presidente da República.
Aplausos do PS. Protestos do PSD.
E essa reacção foi, desde logo, a primeira demonstração da razão de ser das preocupações constantes da mensagem presidencial.
Aplausos do PS.
Com efeito, para além de ser inteiramente legítima, a mensagem é igualmente oportuna e reflecte uma inquestionável exigência democrática.
O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - É uma hipocrisia!
O Orador: - Na verdade, quando numa sociedade, que se quer democrática, o Presidente da República, o mais alto magistrado da Nação, com a isenção que lhe é conferida pelo mandato popular, manifesta preocupações sobre esse pluralismo à Assembleia da República, o dever fundamental de todos os deputados ê acolher o teor da mensagem, reflectir sobre ela e retirar dela as inevitáveis consequências no plano institucional.
Aplausos do PS e dos deputados independentes Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Que lição de democracia!
O Orador: - Mas quando ouvimos o Sr. Deputado José Pacheco Pereira, em representação do PSD, manifestar, de forma totalmente precipitada, uma total discordância quanto ao conteúdo e à oportunidade da mensagem, então ficamos cientes de que em Portugal existe, verdadeiramente, um problema de liberdades públicas por resolver.
Aplausos do PS.
Agora, já não se trata de o PSD fazer «orelhas surdas» às posições dos grupos parlamentares da oposição. Trata--se, neste momento, de o PSD demonstrar ter feito «orelhas surdas» a um apelo do Presidente da República de Portugal.
Aplausos do PS. Protestos do PSD.
Nestas circunstancias, entendemos, como sempre temos feito, que é fundamental garantir um estatuto desgoverna- mentalizado para o serviço público de televisão em Portugal, que é fundamental garantir um modelo de gestão para a televisão baseado no princípio da representatividade social, que é fundamental garantir condições de rigor, de pluralismo e de isenção no funcionamento dos serviços públicos informativos no nosso país e manifestamos todos disponibilidade para, ainda no decurso desta legislatura, aprovarmos todos os instrumentos legais adequados a
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dignificar a democracia portuguesa, a consolidar o pluralismo em Portugal e a dar voz a todas as diferenças existentes na sociedade portuguesa.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD
Há ainda uma coisa que queremos dizer aos Srs. Deputados do PSD: há momentos na história da democracia, há momentos na história das instituições em que se conhece a verdadeira face dos democratas. Os senhores estão a demonstrar, neste momento, uma face muito duvidosa quanto ao espírito como se comportam na sociedade portuguesa.
Aplausos do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, solicito à Câmara que mantenha o silencio adequado ao prosseguimento dos trabalhos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subi a esta tribuna seguindo o exemplo dos oradores que me antecederam, e creio que, tratando-se de uma mensagem presidencial, não é excessivo fazê-lo.
Pela minha parte, gostaria de salientar que a mensagem do Sr. Presidente da República, feita ao abrigo das suas prerrogativas constitucionais, mereceu ao meu grupo parlamentar o maior respeito e uma concordância quase completa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, tive ocasião de o dizer há pouco, quando referi que os aplausos com que acolhemos a mensagem traduziam a nossa posição de aprovação em relação a ela.
Também não queremos alterar a posição que já há pouco anunciámos. O Sr. Presidente da República pede-nos para reflectir sobre as questões da comunicação social. Sena prematuro fazermos um debate imediato. Esta 6 apenas uma primeira reacção da nossa parte. Pensamos que, na próxima sexta-feira, lemos condições de fazer o debate substancial que, na verdade, esta mensagem reclama e propõe. De facto, devemos fazê-lo.
O Sr. João Amaral (PCP): -Muito bem!
O Orador: - Em lodo o caso, quero lambem dizer que as caracterizações que o Sr. Presidente da República faz e as propostas que suscita nos parecem tão razoáveis, ião óbvias e tão naturais que ficamos surpreendidos com a maneira como o PSD a cias reage.
Aplausos do PCP. Risos do PSD.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Estamos a pensar no Saramago a dirigir o jornal Diário de Notícias.
O Orador: - Diria mesmo que o PSD reagiu como se tivesse «enfiado a carapuça» e parece até que foi «apanhado com a boca na botija».
Aplausos do PCP, do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro
É por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que, ao contrário do que disse o Sr. Deputado José Pacheco Pereira, creio que esta mensagem se reveste da maior oportunidade.
O Sr. José Silva Marques (PSD): - Para vós!
O Orador: - O autoritarismo e o abuso do poder são sempre graves em democracia, mas são ainda mais graves quando exercidos contra as liberdades e contra a comunicação social...
Aplausos do PCP, do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
Protestos do PSD.
... e ainda - permitam-me que o diga, Srs. Deputados - quando são exercidos em vésperas de eleições.
Vozes do PSD: -Ah!...
O Orador: - Aquilo que particularmente dói ao PSD é o facto de esta mensagem surgir neste momento, isto é, quando o PSD unha planeado lodo um programa de manipulações e de instrumentações da comunicação social em proveito das suas posições eleitorais.
Aplausos do PCP, do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Finalmente, e repelindo o que já disse há pouco, creio que seria ainda altura de todos nós reflectirmos sobre a possibilidade de aprovarmos algumas medidas legislativas que vão ao encontro das preocupações que nos são transmitidas pelo Sr. Presidente da República, as quais, como iodos sabemos, exprimem as preocupações que abarcam uma grande parte do País.
Pela nossa parte, estamos disponíveis para corresponder a estas solicitações e dar o nosso melhor contributo para que possam ser ainda aprovadas algumas medidas legislativas que garantam a igualdade, para iodos e lambem para o PSD, nas próximas eleições. Pela nossa parle, vamos esperar, com ioda a confiança, pelo voto do povo português.
Aplausos do PCP, do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos, José Magalhães e Raul Castro.
O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os analistas da situação mundial julgam
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que uma das principais revoluções do nosso tempo ó a da comunicação e apontam também para a circunstância de que grande parle da liberdade de decisão dos estados está condicionada pela realidade de a informação estar alienada em centros, em relação aos quais não exercem a menor das influências. Isso acontece em relação a países com uma capacidade muito superior à do nosso. Isso foi visível nas últimas crises internacionais e todos nós sabemos que se trata de um fenómeno mundial contra o qual dificilmente podemos reagir.
São anónimas as entidades que detêm o poder de gerir os grandes órgãos de informação internacionais; são anónimos os critérios de recolha das notícias que nos fornecem; são anónimos os responsáveis pela selecção das notícias que condicionam o nosso julgamento diário sobre o que acontece no mundo.
Há um imperialismo da informação. Alguns preocupam-se com a circunstância de ser possível que a esse imperialismo da informação corresponda um feudalismo interno da informação em vários países.
Acontece que, de acordo com a nossa Constituição, aquilo que o Presidente da República detém, em grande parte, é apenas uma autoridade e nenhum poder, e fia-se da organização do Estado que essa autoridade seja respeitada, porque, justamente, ela não condiciona as decisões de poderes que pertencem a outros órgãos. É o que acontece com a Assembleia da República. O Presidente da República não condiciona as decisões da Assembleia da República. Ele tem autoridade, não tem nenhuma espécie de poder. Mas, justamente o que se espera de uma interpretação autêntica e responsável da Constituição ó que, assim como nós respeitamos o exercício do poder tal como resulta da composição da Assembleia, a Assembleia toda respeite o exercício da autoridade que a Constituição estabelece e no exercício da qual o Chefe do Estado se dirige ao País e aos órgãos de soberania.
Aplausos do CDS, do PS, do PCP, do PRD, do deputado do PSD Manuel Coelho dos Santos e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos e José Magalhães
O Orador: - E, justamente por isso, eu gostaria de exprimir apenas a nossa interpretação da Constituição.
Com efeito, não é à Assembleia que compete julgar da oportunidade do exercício da autoridade do Presidente da República. É a cie que pertence julgar da oportunidade do exercício. À Assembleia incumbe apreciar a mensagem.
E, justamente em relação a este tema e à importância de se tratar da primeira vez que o Presidente da República exerce esse seu dever de utilizar a sua autoridade para se dirigir à Assembleia da República, é essa circunstância que me leva a sugerir que talvez seja um pouco precipitado imaginar que, em três minutos, a inteligência desperta, autorizada e informada dos deputados, podendo chegar a uma opinião fundamentada sobre uma mensagem que o Presidente da República levou tanto tempo a elaborar e a enviar à Assembleia.
Vozes do PSD: - Isso é verdade! Isso é verdade!
O Orador: - Aquilo que o Presidente da República pura e simplesmente pede, e não precisava de pedir calculo que se trata de observância de regras de cortesia-, é isto: solicita uma reflexão actualizada e, tanto quanto possível, objectiva e rigorosa sobre a complexa
problemática da comunicação social. É isto que ele solicita.
Devo dizer que nós temos a humildade suficiente para admitir que o Presidente da República, quando nos pede para reflectir, merece ser escutado.
É por isso que nós agendamos o debate para a próxima sexta-feira.
Aplausos do CDS, do PS, do PCP e dos deputados independentes Herculano Pombo, João Corregedor da Fonseca, Jorge Lemos e José Magalhães.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como há pouco afirmei, em interpelação que fiz à Mesa, o PRD concorda com muitos dos aspectos levantados na mensagem do Sr. Presidente da República sobre comunicação social.
Contudo, a grande maioria dos factos aí expressos são conhecidos há mais de cinco anos.
O Sr. José Leite Machado (PSD): - E só agora se lembrou!
O Orador: - O PRD pediu uma audiência há mais de um ano, que lhe foi concedida, para exprimir ao Sr. Presidente da República a nossa preocupação sobre a situação na comunicação social.
Uma parte significativa das intervenções do nosso grupo parlamentar centrou-se exactamente sobre a problemática da comunicação social. Porém, poucos nos ouviram, poucos se preocuparam com esta mesma situação.
Não entendemos porque questões, algumas delas reais, contidas na mensagem do Sr. Presidente da República, não foram dadas a conhecer ao País durante o período de campanha eleitoral para a Presidência da República, ...
José Silva Marques: (PSD) - Exacto! Uma das questões ó essa!
O Orador: -... porque já existiam, terão, em nossa opinião, sido omitidas.
O Sr. Presidente da República tem o direito de escolher o momento para dirigir as suas mensagens à Assembleia da República. Mas, reafirmamos, estes problemas são de há muito conhecidos. Não são problemas de agora, não são problemas que se possam discutir de forma profunda e não menos apressada, a escassos dias do fecho desta legislatura, com as eleições já marcadas e em plena campanha pré eleitoral.
Conforme sempre desejámos, o Sr. Presidente da República tornou-se finalmente interventor e preocupado com problemas fundamentais da sociedade portuguesa. Terá, em nossa opinião, escolhido o momento menos adequado pelas razões que há pouco referi.
Reservaremos, contudo, a nossa posição para o debate, que desejamos alargado e profundo, que aqui terá lugar na próxima sexta-feira.
Aplausos do PRD e do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado este capítulo, e antes de passarmos à discussão dos diplomas agendados para hoje, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto para uma interpelação à Mesa.
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O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, se me permite, quero felicitá-lo, a si e à Mesa, por me ter dado a palavra. De outro modo, estávamos todos a ser cúmplices com a partidocracia e o colectivismo parlamentar.
Acontece que houve um breve debate, que acabamos de ouvir, de improviso, mas que demonstrou, com as reacções dos diferentes grupos parlamentares e dos diferentes deputados que usaram da palavra, que a Assembleia da República estava viva e que não tinha reacções programadas.
Perante este facto, eu não tenho mais nada a dizer e a minha interpelação à Mesa limita-se a isto.
Acontece que se eu não tomasse a palavra e se aceitasse renunciar ao uso dela, era eu que provaria que estava morto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia S de Junho de 1991, pelas IS horas, foi observada a seguinte substituição de deputado:
Solicitada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS):
João António Gomes Proença (círculo eleitoral de Lisboa) por Edmundo Pedro [esta substituição 6 solicitada nos termos da alínea b) do n." 2 do artigo 5.º da Lei n.8 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), para o período de 4 a 18 de Junho corrente, inclusive].
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
João Domingos F. de Abreu Salgado (PSD), presidente - Alberto Marques de O. e Silva (PS), vice-presidente - Manuel António Sá Fernandes (PSD), secretário - Alberto Monteiro de Araújo (PSD)-Arlindo da Silva André Moreira (PSD) - Belarmino Henriques Correia (PSD) - Carlos Manuel Pereira Bastos (PSD) -Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Domingos da Silva e Sousa (PSD)-João Álvaro Poças Santos (PSD) -José Augusto Ferreira de Campos (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Hélder Oliveira dos Santos Filipe (PS) -
Júlio da Piedade Nunes Henriques (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Hermínio Paiva Fernandes Maninho (PRD).
Srs. Deputados vamos votar o parecer que acaba de ser lido.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, Herculano Pombo e José Magalhães.
Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Sr. Presidente, no uso dos seus direitos regimentais, o PRD agendou para hoje a discussão do projecto de lei n." 709/V.
Também o Partido Comunista Português, na sequência daquilo que é uma praxe parlamentar, e por arrastamento, agendou para hoje a discussão dos projectos de lei n- 107/V e 265/V.
Para espanto meu e dos restantes membros da Comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Família, constatamos que se encontra agendado, também para hoje, um outro projecto de lei sobre a mesma matéria que deu entrada no Plenário às 16 horas.
Sr. Presidente, desejava perguntar, em primeiro lugar, como foi possível ter sido agendada para hoje a discussão de um projecto de lei distribuído às 16 horas, tanto mais quanto é certo que ainda hoje de manhã, como habitualmente, houve reunião da Comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Família, onde nós esperámos quase uma hora que aparecesse algum ilustre deputado do Partido Socialista para nos dizer o que se passava a esse respeito. E o que aconteceu foi que nenhum Sr. Deputado do Partido Socialista teve certamente possibilidade de participar nos trabalhos da Comissão.
Assim sendo, Sr. Presidente, questiono-o sobre a regularidade regimental, e até em termos de praxe parlamentar, de agendamento deste diploma do Partido Socialista.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho muito gosto em dar-lhe uma explicação. Aliás, o que sucedeu hoje já se verificou também na semana passada.
O que aconteceu foi o seguinte: houve marcações indicativas de vários grupos parlamentares as quais só foram definidas relativamente tarde. Isso foi compreendido e aceite pela conferencia dos representantes dos grupos parlamentares, tendo sido igualmente definido e aceite que, uma vez que o grupo parlamentar linha direito à marcação e que a fazia já de forma muito tardia - tem a ver com fins-de-semana mais alongados que houve-, os prazos normais para entrada dos diplomas, neste particular momento, seriam, por arrastamento, encurtados como o foram os prazos da definição dos agendamentos.
Ontem tive ocasião de anunciar a entrada deste diploma do Partido Socialista. Na altura não o tinha para distribuir e se ele não foi discutido na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, lamento-o. Isto, porém, não sendo
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regimental, resulta de um acordo estabelecido na conferência de representantes dos grupos parlamentares e das circunstancias dos feriados. Foi o único acordo que foi aceite por todos nós. Está explicado.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: -Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): -Sr. Presidente, já há pouco tinha pedido a palavra no sentido de dizer que este agendamento é nosso e que gostaríamos de estar acompanhados, o mais possível, pelos outros grupos parlamentares, o que só virá provar, como é natural, o interesse e a justeza da nossa iniciativa.
Todavia, no que diz respeito ao projecto de lei do Partido Socialista, estamos impossibilitados de nos pronunciar sobre ele, porque-e também ao contrário do que costuma ser a praxe-nem sequer houve a atenção de fazê-lo chegar, informalmente, aos diferentes grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, o entendimento que, julgo, todos temos 6 o de que o próprio Partido Socialista fará a apresentação do seu diploma, sem esperar que haja muita reacção por pane dos outros grupos parlamentares. No entanto, devo dizer - e o Sr. Deputado Carlos Lilaia há pouco também indicou -, ele resultou dos acordos estabelecidos.
Contudo, podia o Partido Socialista-e não se veja nisto uma crítica - ter distribuído o diploma directamente aos grupos parlamentares intervenientes. Não o fez e, portanto, não vai ter reacções por parte dos intervenientes. Julgo, por isso, que não vale a pena combinarmos esta discussão.
Srs. Deputados, passamos então à discussão, na generalidade, dos projectos de lei n." 709/V (PRD) - Alteração à Lei n." 4/84, de S de Abril (protecção da maternidade e da paternidade). 107/V (PCP) - Atribuição de um subsídio mensal especial aos filhos a cargo de mães e pais sós, 265/V (PCP) - Aprova medidas tendentes à efectivação dos direitos das mães sós, e 774/V (PS) - Dá nova redacção a diversos artigos da Lei n.8 4/84, de S de Abril (protecção da maternidade e da paternidade).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O panfleto de propaganda que o PSD tem colocado nas caixas de correio dos eleitores anuncia que, em Portugal - supomos que durante o governo de Cavaco Silva e não graças a ele-, nasceram 600000 crianças.
A estatística é apresentada com algum triunfalismo, o que, se bem entendemos, tem apenas uma explicação: o Governo desenvolve uma política pró- natalista ou, no mínimo, uma política de protecção à família, protagonizada naturalmente pelos aumentos dos subsídios de nascimento, casamento e abono de família.
Não sendo a política concreta do Executivo nesta matéria que nos move analisar hoje, é fundamental, no entanto, chamar a atenção de que as políticas centralizadas na protecção e na promoção das famílias assumem um significado e uma importância crescentes no seio dos países comunitários.
A valorização desta vertente nas políticas nacionais varia substancialmente entre os vários Estados membros, mas as perspectivas de envelhecimento acelerado da população europeia, com as consequências sociais e económicas que se provêem, nomeadamente quanto ao peso da população inactiva sobre a população activa, obriga a Europa a equacionar um novo impulso nas políticas de família com o desenvolvimento de incentivos e a criação de condições à formação de núcleos familiares estáveis.
Alguns países, como a França, a Bélgica, o Luxemburgo e a Alemanha, tom uma política de família explícita que se traduz pela existência da terminologia «política de família» na retórica política. Em geral, nesses países, essa política é institucionalizada através da formação de ministérios com responsabilidade específica nesta área.
Noutros países, no entanto, como a Grécia, a Grã-Bretanha, a Dinamarca, a Irlanda ou a Espanha, a política de família encontra-se apenas implícita na retórica política, o que, no entanto, não impede que as medidas tomadas se assemelhem as praticadas em países com ministérios próprios.
Em Portugal, a política de família tem oscilado entre explicitude e implicitude com um certo carácter de descontinuidade que se caracteriza, por exemplo, pela existência episódica de membros do governo com responsabilidades próprias na área da política de família.
De qualquer modo, em todos os países as políticas de família - explícitas ou não são desenvolvidas através de medidas económicas que asseguram a sua estabilidade financeira e medidas que asseguram a prestação de serviços, que promovem e facilitam a vida familiar, como sejam os serviços de acolhimento de crianças.
A protecção das mulheres grávidas no seu emprego, bem como as provisões legais de licença de maternidade e paternidade em consequência da gravidez e do parto, são medidas que se enquadram na protecção da estabilidade económica e social da família e são comuns a todos os Estados membros. No entanto, as regulamentações e práticas nacionais variam enormemente quanto aos tempos de licença, aos níveis de remuneração auferidos durante o período de licença de trabalho, quanto às condições de acesso ao direito e quanto à partilha dos tempos de licença entre pai e mãe.
Quanto à duração do período de licença de maternidade, a diversidade é enorme. Portugal tem apenas 13 semanas (90 dias), enquanto a Grã-Bretanha contempla um período de licença de 40 semanas, a Itália S meses e a Dinamarca 28 semanas de licença de maternidade e paternidade. Entre estes extremos, ficam todos os outros países da Comunidade, sendo certo que Portugal se apresenta, hoje, com o período de licença mais reduzido do conjunto comunitário. À nossa frente, nesta matéria, estão, nomeadamente, a Espanha, onde as mulheres gozam de um período de licença de 16 semanas, ou a Grécia, com 14 e 16 semanas, respectivamente, para o sector privado e público, embora esse período seja muitas vexes alargado de acordo com os contratos colectivos de trabalho.
No entanto, alguns dos países que apresentam disposições legais que permitem um longo período de dispensa de trabalho não concedem, em simultâneo, níveis de remuneração durante a licença que permitam a manutenção das condições económicas do agregado familiar. Este facto leva a que a grande maioria das mulheres não goze da totalidade dos tempos de licença que a lei lhe confere. Por direito encontra-se nesta situação a Grã-Bretanha, onde apenas seis semanas de licença de maternidade são pagas na totalidade.
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Contra este tipo de opção tem-se pronunciado a Comunidade Económica Europeia. As recomendações que incentivam o alargamento dos períodos de licença de maternidade e paternidade nos vários Estados membros, nomeadamente através de limitação do plafond de 14 semanas como mínimo aceitável, alertam igualmente no sentido de que a esse alargamento não deve corresponder uma descida drástica dos níveis de rendimento das mulheres que se encontram no gozo da dispensa de trabalho.
De resto, tanto a Comissão como o Parlamento Europeu têm produzido um importante trabalho de investigação nesta área, plasmado em relatórios e recomendações que nos permitem, hoje, avançar com segurança na redifinição do sistema português.
Assim, sendo certo que a Lei n." 4/84, de S de Abril, se encontrava, à altura da sua aprovação, como extremamente favorável no panorama europeu dos anos 80, ela, hoje, carece de profundas alterações e algumas delas serão feitas através da introdução de aspectos inovadores.
Permitimo-nos destacar alguns dos considerandos e alguns dos sentidos em que deve caminhar a alteração do enquadramento legislativo português, no que respeita à protecção da maternidade e paternidade.
Em primeiro lugar, Portugal apresenta, injustificadamente, o período de licença mais curto no seio da Comunidade, estando aquém do nível mínimo recomendado.
Em segundo lugar, Portugal apresenta taxas de cobertura dos serviços de acolhimento e guarda de crianças extremamente reduzidas.
Em terceiro lugar, Portugal apresenta, comparativamente, as mais elevadas taxas de emprego entre as mulheres com filhos com menos de 10 anos.
Em quarto lugar, o sistema português favorece a desigualdade no seio do núcleo parental, na repartição das responsabilidades familiares, nomeadamente, quanto à guarda e acompanhamento das crianças mais jovens, com prejuízo, como é óbvio, para as mulheres.
Neste sentido, e acolhendo os considerandos acima dispendidos, bem como as conclusões que a investigação comunitária tem sobre esta matéria, defende-se a introdução de alterações à Lei n.8 4/84 em dois planos essenciais: por um lado, o alargamento do período de licença de pano; por outro, a promoção do estatuto do pai quanto aos direitos e deveres no acompanhamento da criança e na partilha da responsabilidade.
A opção concreta que fizemos em sede do projecto de lei, que hoje se discute, tem a ambição de ser apenas isso, isto é, uma opção susceptível de sofrer a introdução de inúmeras soluções alternativas, que, dentro e de acordo com os sistemas europeus, podem ser adoptadas.
No entanto, as opções que, para além da nossa, hoje deveríamos discutir devem obedecer aos mesmos princípios, isto e, aumento da protecção da grávida e da criança, sem que de tal facto resulte a degradação do conjunto das condições de trabalho das mulheres e, nomeadamente, da sua situação no mercado de emprego.
O projecto de lei que apresentamos prevê, dentro destes parâmetros, a criação de um prolongamento complementar do período de dispensa de trabalho com a duração máxima de 60 dias, para além dos 90 dias já consagrados pela Lei n." 4/84. Esse período complementar, que visa essencialmente o acompanhamento da criança nos primeiros meses de vida, pode ser gozado pelo pai ou pela mãe e corresponde a uma redução de 30 % nos subsídios de maternidade e paternidade, auferidos durante o período anterior.
Desta forma, o pai passa a ter direito -e nós diríamos, em algumas circunstâncias, o dever - de gozar da dispensa de trabalho, em substituição da mãe, durante, aproximadamente, 75 dias - metade do período lotai -, eliminando-se desta forma o carácter excepcional da Lei n. v 4/84, no que se refere ao direito do pai à dispensa no trabalho.
O pai passa, ainda, a ter direito ao gozo de uma licença de paternidade ato cinco dias após o parto e à dispensa de trabalho em caso de nado-morto ou aborto.
A propósito da importância deste «direito paternal» à guarda da criança nos primeiros meses de vida para a promoção das pré-condições de acesso à igualdade de oportunidades, permito-me citar um extracto do relatório da Comissão das Comunidades relativo à guarda de crianças na Comunidade Europeia.
Assim, a Comissão considera que so trabalho e a responsabilidade que implica o acolhimento das crianças e a satisfação das suas diversas necessidades não se encontram repartidas equitativamente. As mulheres têm a seu cargo uma parte demasiadamente grande dessa responsabilidade e, por outro lado, os homens, os empregadores e a sociedade assumem uma pane muito restrita. Essa desigualdade e uma das causas fundamentais da desigualdade das mulheres no mercado de trabalho e das discriminações que dela decorrem no emprego e nos rendimentos auferidos. A guarda das crianças compromete não apenas as oportunidades da mulher no mercado de trabalho mas, igualmente, a sua participação noutras actividades. A guarda das crianças e, portanto, fundamental à promoção da igualdade de oportunidades no seu sentido mais lato».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com o objectivo de reduzir esta distribuição desigual dos custos sociais da função reprodutiva, salvaguardando o bem-estar e as necessidades das crianças, bem como o bem-estar e a estabilidade do núcleo familiar, que este projecto de lei foi elaborado.
Admitimos, como é óbvio, que outros contributos, dentro dos parâmetros acima definidos, se nos apresentem razoáveis, nomeadamente, quanto aos aspectos relacionados com o alargamento do período remunerado a 100 %, complementado com uma eventual redução do montante do subsídio auferido durante o período complementar.
Admitimos, igualmente, que outra articulação possa ser emprestada ao diploma, embora nos caiba referir que entendemos que o texto base vertido na Lei n.0 4/84 deve ser preservado sem grandes alterações de forma.
Entendemos que o nosso contributo não é modesto e que merece por parte dos deputados a atenção devida. Por acreditarmos nas suas potencialidades entregamo-lo pura debate aberto, conducente não só ao enriquecimento final do diploma mas, principalmente, à promoção do acerto de pontos de vista de que esta matéria carece. Na verdade, sendo uma questão facilmente instrumentalizável na perspectiva partidária, é, sobretudo, dada a importância social da maternidade, uma área a salvaguardar com ética e respeito político.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por último, e antecipando-nos às interpelações deste ou daquele deputado mais atento a estas questões, queremos referir claramente que, uma vez aprovado, este projecto de lei só poderá entrar em vigor, de acordo com os parâmetros constitucionais, com a respectiva provisão orçamental de 1992, como, de resto, acontecerá com todos os diplomas que o Governo anunciar em período de campanha eleitoral. Não queremos, no entanto, que este pequeno «senão» formal obs(...)
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laculize o debate da questão primordial e que, portanto, constitua alibi para a indefinição das posições e opções de cada um.
Queríamos, por fim, oferecer este diploma, o empenhamento e o entusiasmo na sua feitura, bem como a iniciativa do agendamento que hoje promovemos, aos milhares - mais de 600 000 - de crianças portuguesas que, durante e depois de Cavaco Silva, nascerão.
Serve, pois, este agendamento como comemoração do Dia Mundial da Criança, festejado no passado dia l de Junho. No fundo é disso que se trata hoje! Serve este projecto de lei, essencialmente, as crianças e o seu direito ao bem-estar, à saúde e à qualidade de vida, ao desenvolvimento harmonioso no seio da família.
Aplausos do PRD, do PS e do deputado independente Marques Júnior.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente ler mimo Maninho
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr.ª Deputada Paula Coelho.
A Sr. Paula Coelho (PCP): - Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: A Constituição da República Portuguesa reconhece o valor social eminente da maternidade e paternidade, o que significa que a criança não tem só valor para os seus pais mas representa também um valor social de grande importância, na medida em que assegura o futuro da própria comunidade, futuro esse que pode ser comprometido, se houver um acentuado envelhecimento da população, com todos os problemas daí decorrentes.
Não admira, pois, que a baixa natalidade constitua, hoje, na Comunidade Europeia, uma preocupação generalizada de governos e governantes, comissões pró governamentais, técnicos e peritos e seja invariavelmente referida em todas as estatísticas sobre política social.
Em alguns destes países, têm vindo, inclusivamente, a ser implementadas medidas de natureza económica e social que visam estimular a maternidade. Por exemplo, em França as mulheres com mais filhos podem obter a reforma mais cedo e na Alemanha podem alcançar reformas com valores mais elevados. Em Portugal, tem-se vindo a registar, nos últimos anos, um decréscimo da laxa bruta da natalidade relativamente mais acentuada do que nos restantes países da CEE.
É lamentável que no nosso país o governo do PSD nada tenha feito no sentido de inverter esta situação, nomeadamente, através de mecanismos de fiscalização e cumprimento das leis em vigor. Verifica-se, no entanto, um aumento de fecundidade das jovens entre os 15 e os 19 anos de idade, o que justifica, em certa medida, o facto de ter vindo a aumentar o número de mães solteiras.
Continua, assim, a colocar-se na ordem do dia a necessidade urgente de colmatar as graves lacunas existentes no que respeita à educação sexual nas escolas e facilitar o acesso dos jovens ao planeamento familiar. Decidir o número de filhos e a oportunidade do seu nascimento tem que ser, cada vez mais, uma decisão consciente. As razões económicas e sociais, relacionadas com a incerteza em relação a carreiras profissionais e postos de trabalho, com problemas de habitação, com carências enormes no que respeita à existência e acessibilidade de equipamentos sociais de apoio à criança e à família, são alguns dos factores que obstaculizam a que pais e mães assumam a decisão de ter um número maior de filhos ou, mesmo, de ter apenas um filho.
Cada vez mais, as mães são punidas por desejarem ter filhos. Por reais absurdo e trágico que pareça, a mulher é desincentivada a ter filhos, a sofrer a marginalização no emprego ou, mesmo, a perder o seu posto de trabalho. Ela está, permanentemente, sob «suspeita» de que um dia pode decidir ter filhos, coisa absolutamente inconcebível e inconveniente para muitos empresários. Os exemplos avultam: os testes de gravidez introduzidos em provas de acesso a determinados empregos e, em muitas empresas de vários sectores de actividade, as trabalhadoras são punidas por faltarem para prestar assistência aos filhos. No Banco Borges & Irmão, por exemplo, as mulheres que, em 1990, estiveram de licença de pano ou que utilizaram os direitos relativos à amamentação dos filhos foram prejudicadas na distribuição dos lucros. Noutros sectores, a licença de parto é transformada em baixa por doença e as faltas para assistência aos filhos são descontadas para efeitos de prémios de assiduidade e produtividade. As infra-estruturas de apoio à criança são escandalosamente insuficientes e muitas comportam preços inacessíveis.
Sr." e Srs. Deputados: A legislação actualmente em vigor assegura, em diversas vertentes, aspectos fundamentais no que respeita à maternidade e paternidade, mas o seu não cumprimento é quase desastroso. Toma-se, assim, necessário e urgente o cumprimento não só da Lei n.8 4/84 como da Constituição da República. As acções de fiscalização, a criação de condições efectivas que assegurem à mulher e ao homem as condições sociais e económicas e o incentivo da sociedade perante a maternidade e paternidade são questões urgentes e que carecem, lambem, de vontade política para o seu cumprimento.
O agendamento destas questões merece da parte do Grupo Parlamentar do PCP total acordo.
Ao longo desta e de outras legislaturas, o PCP tem apresentado sobre esta matéria, diversos projectos de lei, bem como outras iniciativas. Hoje trazemos, também, à discussão nesta Câmara, dois projectos de lei que visam, respectivamente, a atribuição de subsídio aos filhos a cargo de mães e pais sós, com o objectivo de compensar o baixo valor do abono de família junto de famílias mono parciais com dificuldades económicas específicas, e a aprovação de medidas tendentes à efectivação dos direitos das mães sós, direito à informação oficiosa e competência do Ministério Público para agir em representação da mãe menor.
Em relação ao projecto de lei apresentado pelo Grupo Parlamentar do PRD, direi que constitui mais um contributo neste domínio, sendo, contudo, insuficiente e merecendo da nossa parle algumas críticas- no que respeita a algumas das soluções preconizadas.
Assim, no que se refere à licença de parlo, o projecto de lei prevê o prolongamento facultativo de mais dois meses em relação ao que está actualmente em vigor e ameia que, durante este prolongamento, os subsídios estabelecidos sejam reduzidos em 30% do total atribuído actualmente durante a licença de parto.
Entende o Grupo Parlamentar do PCP que a primeira questão a colocar é o cumprimento efectivo da actual legislação, ou seja, que, de lacto, os 90 dias de licença de parto sejam cumpridos, sem quaisquer restrições ou penalizações, e que o subsídio a ser atribuído não seja diminuído, porque, como a Constituição prevê, no seu artigo 68.", as mulheres têm direito a uma protecção especial durante a gravidez e à licença de parto, sem perder a remuneração e outras regalias. O PCP defende não só o cumprimento da actual lei como também propõe que o
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período de licença de parto seja alargado de três para quatro meses, sendo duas semanas desse período antes do pano e sem quaisquer perca de regalias e direitos. Em relação às mães desempregadas, propomos a atribuição de um subsídio correspondente ao salário mínimo nacional.
Sr." e Srs. Deputados: O direito à maternidade e paternidade obriga o Estado e o Governo a criarem condições que permitam à mulher ser mãe e, simultaneamente, integrar-se e realizar-se profissionalmente, participar na vida social, cívica e cultural do nosso país. O acto de maternidade e paternidade é uma importante manifestação de vida e felicidade.
No dia l de Junho comemorou-se o Dia Internacional da Criança. Não nos devemos esquecer dos direitos que as crianças têm a viver e crescer numa sociedade que lhes abra portas e as incentive para uma vida de oportunidades e realização social, económica e cultural. Terá de ser a sociedade actual a assegurar o futuro daqueles que hão-de ser os seus obreiros.
Aplausos do PCP e do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr. Deputada Julieta Sampaio.
A Sr. Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr- e Srs. Deputados: Começa a ser um lugar comum reconhecer que o homem e a mulher gozam de iguais direitos e oportunidades. Esta constatação reflecte a evolução histórica e constitui uma resposta às questões da condição da mulher na família e na sociedade.
É indiscutível que a legislação especial assegurada à mulher na maternidade tem como objectivo central a protecção à criança. É, pois, injusto que uma função social seja interpretada como uma regalia. A família é a célula da sociedade. Esta tem o dever de lhe garantir condições de vida favoráveis ao seu crescimento, se for essa a opção livremente tomada.
A maternidade e a paternidade constituem valores sociais que exigem do Estado e da sociedade protecção. A sua acção em relação aos filhos 6 insubstituível, nomeadamente na educação. O ser humano quando nasce é a mais desprotegida das criaturas que povoam a terra. A sua sobrevivência seria inviável se não fosse rodeada, desde o nascimento, de especiais cuidados e precauções. A duração do período que decorre até à total autonomia é proporcionalmente maior em relação aos outros mamíferos, acrescendo o facto de não ser apenas no domínio do fisiológico que as necessidades se fazem sentir. O afecto, a estimulação sensorial e cognitiva, comunicação, sentimento de pertença a uma família, são componentes indispensáveis à estruturação de uma personalidade harmoniosa, só conseguida no seio da família.
Infelizmente, nem sempre as coisas se passam assim. A criança é vítima, depois do nascimento, do precoce afastamento do carinho constante da mãe ou do pai. Está provado que o aleitamento materno se deve fazer até aos quatro meses e só depois são aconselháveis as alimentações alternativas. São muitas as crianças que mostram perturbações fisiológicas e outras, quando, passados os três meses da licença por maternidade, passam para as creches ou outros meios alternativos que a família encontra.
Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: São já muitos os países onde a protecção à maternidade é encarada pelos governos não como uma discriminação positiva mas como uma exigência social. Em países com avançados sistemas
de segurança social, o período de apoio à criança, nos primeiros meses do seu nascimento, é garantido tanto à mãe como ao pai. Este sistema permite que o casal livremente opte, de acordo com os interesses da criança e da estabilidade familiar.
Os instrumentos jurídicos garantem à família, em condições de igualdade de direitos e deveres, a manutenção e educação dos filhos. À mulher é juridicamente garantido um período de 90 dias de licença por maternidade, sem perda de remuneração ou de quaisquer outras regalias. Esta «garantia», reconhecendo que a criança, para um desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, deve crescer em ambiente familiar, deve ser reconhecida como uma legítima protecção que a sociedade e o Estado devem à criança e nunca como um facto de discriminação positiva da mulher.
Os pais e as mães tom direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos. A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes, relacionados com o desenvolvimento e o progresso do País no futuro. Nenhuma criança deve estar limitada no seu desenvolvimento integral. Esse desenvolvimento pleno está ligado ao acompanhamento insubstituível dos pais.
Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: A Declaração dos Direitos da Criança diz que o direito da criança à saúde é o direito de a criança beneficiar de uma protecção especial e de lhe serem concedidas possibilidades e facilidades através da lei, para que tenha um normal desenvolvimento físico e psíquico.
O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!
A Oradora: - Esse direito deve iniciar-se quando a criança é concebida. É no ventre materno que o pequeno ser inicia a sua vida. Essa vida, numa das fases mais vulneráveis, tem de ser assegurada com a protecção à mãe. Antes do nascimento, no período pré-natal, os exames médicos feitos à mãe devem detectar possíveis factores de risco, na gravidez e no início do parto, quer para a criança quer para a mãe. A concretização desta regra de segurança é quase sempre difícil para a mulher trabalhadora.
É frequente termos conhecimento das dificuldades das mulheres que trabalham para obterem dispensa do trabalho quando pretendem deslocar-se à consulta médica e, se esta é concedida na hora do trabalho, é-lhes exigida a apresentação de documento comprovativo. Na sociedade portuguesa, a humanização não existe. A frieza da lei é o imperativo que se sobrepõe constantemente aos mais nobres sentimentos humanos.
A licença da maternidade ou de paternidade, de acordo com a legislação vigente, é remunerada sem quebra de vencimento, se o vínculo laborai é de funcionária pública ou, no caso do sector privado, se estiver abrangida pela segurança social. Sabe-se que, no primeiro caso, a lei é rigorosamente cumprida, mas no segundo as mães com contratos a prazo são pressionadas pelas entidades patronais para não «gozarem» os 90 dias. Confrontada com a perda do emprego ao terminar o contrato, a mãe «renuncia» a acompanhar os primeiros meses de vida do seu filho.
Os pediatras recomendam a necessidade de a criança ser acompanhada pela mãe logo depois do nascimento, o que é uma condição essencial a um normal desenvolvimento da criança. O aleitamento materno recomendado mundialmente é, face à legislação portuguesa vigente, abruptamente cortado aos três meses. São conhecidos os
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inconvenientes desta situação para a criança. As alimentações alternativas, a que as mães tem de recorrer, está reconhecido não serem recomendadas por alterarem o equilíbrio fisiológico, que pode atingir desequilíbrios psíquicos.
Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: Com base no reconhecimento que para a criança 6 necessário, nos primeiros meses de vida, um acompanhamento pela mãe o mais alargado possível, a maioria dos países da Europa tem vindo a dilatar esse período.
Portugal é dos poucos países da Comunidade que mantém uma reduzida licença de parto e, para uma grande parte das mulheres que trabalham no sector privado, nem sequer esse reduzido prazo é cumprido. Países como a Dinamarca, a França, a Grécia, a Nova Zelândia e outros têm períodos compreendidos entre 14 e 26 semanas, em alguns casos. A nossa vizinha Espanha já alargou esse período para quatro meses e na Itália o período de licença é de cinco meses. Há países onde até as «donas de casa» usufruem de um período de benefícios idênticos aos da mulher que trabalha - é o caso do Luxemburgo e da Suécia.
Temos consciência de que Portugal não está ao nível destes países, mas pensamos que se deve começar a avançar um pouco mais.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - A alteração à Lei n." 4/84, de 5 de Abril, proposta pelo PRD, tem de inovador um sistema mais flexível de alternativas e opções, que, no nosso entender, são insuficientes. Embora estando de acordo com a filosofia subjacente, entendemos que podemos e devemos avançar mais.
Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: Portugal está na Europa. Ouvimos esta frase, diariamente, até à exaustão. Assim, as normas jurídicas dos Estados membros no que respeita aos direitos qualificados de fundamentais devem atingir o indispensável nivelamento comunitário, se tivermos em consideração a aproximação da livre circulação dos cidadãos.
Em matéria de protecção à maternidade, Portugal é o país da Europa que menos tem avançado. Todos têm evoluído no alargamento desta licença, como já referimos. Impõe-se, pois, que, antes de 1993, se dêem passos concretos para atingirmos, nesta temática, o nivelamento mínimo já existente noutros países da Comunidade.
Congratulamo-nos com o facto de o PRD ter trazido este tema para debate. Pela importância de que o assunto se reveste, propomos que os projectos de diplomas do PS e do PCP sejam analisados conjuntamente. A aproximação de 1993 impõe que medidas como esta tenham que ser ponderadas. Não fará sentido que, no futuro, a legislação da protecção da maternidade e da paternidade não seja nivelada pelos valores existentes na Europa. Se assim não for, corremos o risco de as crianças portuguesas ou as que, por imposição de trabalho das mães, venham a nascer em Portugal sejam vítimas de discriminação.
Temos de analisar esta questão de relevante importância não como um benefício concedido à mulher mas como um direito da criança e um dever do Estado e da sociedade para com ela. A protecção à maternidade e ã paternidade é um direito que deve ser entendido na igualdade de direitos e de oportunidades e cuja análise deve sempre, e acima de tudo, ser feita tendo em atenção os interesses da criança.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: No quadro da Convenção Europeia dos Direitos do Homem são os Direitos da Criança. Esta (em de ser defendida a partir do seu nascimento. Os Estados têm o dever de lhe proporcionar qualidade de vida e felicidade. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e o meio natural para o crescimento e bem-estar de todos os seus membros, em particular das crianças.
Tendo em atenção a necessidade de garantir à criança uma protecção especial, damos a nossa aprovação a esta iniciativa do PRD e renovamos a proposta atrás formulada de análise conjunta dos projectos de lei do PS e do PCP, tendo sempre em consideração a íntima ligação mãe/filho durante o período do aleitamento. Divulgar os direitos da criança e promover a sua efectivação é um acto indispensável para que passem do domínio dos princípios para a consciência de cada um de nós, porque só é realizável o que previamente se interiorizou.
O Dia Mundial da Criança já passou, mas as nossas crianças merecem uma prenda deste Parlamento, no final da legislatura.
Aplausos do PS, do PCP e do PRD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputada Julieta Sampaio, na sua intervenção, designadamente na pane final, em que aderiu à iniciativa do PRD nesta matéria, V. Ex., no entanto, introduziu uma nuance no seu discurso, que me pareceu ser desde logo determinada pela preocupação central de que o regime jurídico da protecção da maternidade ou paternidade seja fundamentalmente centrado e influenciado por uma preocupação de defesa e protecção da família. É essa instituição natural e básica que está no centro das preocupações de V. Ex., pelo menos, não sei se também do Partido Socialista.
Vozes do PS: - Também do PS!
O Orador: - Por outro lado, a Sr. Deputada referiu-se às alterações introduzidas pelo PRD, focando principalmente a protecção da maternidade e a necessidade de assegurar o primeiro período de protecção do novo ser nascido, em lermos de acompanhamento pela mãe. Significa isto que V. Ex.º adere a um determinado modelo de família nuclear, ou seja, que tem em menos consideração a família mono parental em termos latos e que, portanto, não lhe merece igual preocupação a opção livre e a possibilidade de esse acompanhamento incumbir ao pai e não à mãe da criança?
O Sr. António Guterres (PS): - Está feito um verdadeiro socialista!...
O Orador:-Não, eu apenas perguntei!... Risos.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr. Deputada Julieta Sampaio.
A Sr. Julieta Sampaio (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, a concepção que o Partido Socialista tem
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da protecção da maternidade é uma concepção filosófica que reflecte, na verdade, que a criança tem de ser protegida em simultâneo pelo pai e pela mãe. É natural que nos primeiros meses de vida da criança, por questões de aleitamento e de outras que já mencionei, a ligação seja maior com a mãe, o que não quer dizer que a presença do pai não seja indispensável.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito sabe perfeitamente - e eu, que sou professora, testemunhei isso muitas vezes - que muitas das crianças em cujas famílias não há harmonia, mas antes separação entre o pai e a mãe, são sempre crianças traumatizadas e divididas. O equilíbrio psíquico que se exige a essas crianças para o normal desenvolvimento a que todas elas tem direito ó muitas vezes quebrado. No exercício das minhas funções, detectei muitos casos de crianças desequilibradas e frustradas, mas, quando tentava investigar, verificava que geralmente essas crianças eram oriundas de famílias onde não havia harmonia e o pai e a mãe estavam divididos.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença que a interrompa, Sr. Deputada?
A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputada Julieta Sampaio, sou, então, levado a concluir que V. Ex.º será favorável à introdução de uma legislação que, por exemplo, contrarie e dificulte o divórcio? Será essa a orientação de V. Ex/?
Risos
É que, nesse caso, aplaudi-la-ia, porque isso significaria a adesão a um modelo de família que é realmente um modelo capaz de garantir o melhor acompanhamento do novo ser no princípio da sua vida, e não só.
Constato, em lodo o caso, que está guiada por boas ideias. Pode V. Ex. exprimi-las até ao fim?
A Oradora: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, sou da opinião, muito sincera, de que o melhor meio para a criança se desenvolver é a família, mas uma família onde exista harmonia e não desarmonia. É muito mais nefasto a criança viver no seio de uma família onde há desarmonia e na qual cia apenas vive formalmente e dividida. Nesse caso, sou favorável ao divórcio, que não significa necessariamente que não haja harmonia entre o pai e a mãe e, assim, apoio à criança. Conheço muitas crianças filhas de pais divorciados que são igualmente apoiadas pelo pai e pela mãe.
Trata-se, Sr. Deputado Nogueira de Brito, de concepções diferentes, embora eu entenda - e não sei se o meu partido me acompanha nesta opinião, que 6 meramente pessoal - que o melhor meio para a criança se desenvolver em harmonia e felicidade é realmente no seio da família. Daí que tenha centrado toda a minha intervenção na criança, porque, erradamente, há na sociedade portuguesa a concepção de que a maternidade é uma regalia para as mulheres. Ouvi há tempos, na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, um Sr. Deputado dizer que se tratava de regalias para as mulheres. Essa posição é errada. Sr. Deputado, porque não são regalias para as mulheres. Trata-se, isso sim, de direitos da criança. É dever do Estado e da sociedade dar à partida à criança, desde a sua concepção no ventre materno, lodo o apoio que esse novo ser merece.
Aplausos do PS e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tivemos muito tempo para ponderar devidamente as iniciativas legislativas em apreço não só em termos da comissão parlamentar competente como até em termos da análise desta problemática. O agendamento destes diplomas foi efectivamente feito de uma forma um pouco repentina, o que nos criou algumas dificuldades na sua apreciação.
De qualquer forma, creio não escandalizar ninguém se disser que, em boa verdade, os projectos de lei do Partido Renovador Democrático e do Partido Comunista Português sobre a criação de um eventual subsídio para filhos de famílias monoparentais são, efectivamente, inconstitucionais, por violarem clara e objectivamente - não se iram de uma mera interpretação- o n.º 2 do artigo 170." da Constituição, onde se diz que os deputados, os grupos parlamentares e as assembleias legislativas regionais não podem apresentar projectos de lei, propostas de lei ou propostas de alteração que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento».
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - No ano económico em curso, que termina em 31 de Dezembro de 1991!
O Orador: - É óbvio que, sendo esta norma de aplicação imediata, a Mesa da Assembleia da República, quando estes projectos de lei foram apresentados, não os deveria ter admitido. Simplesmente, a exemplo dos brandos costumes do nosso país - e ainda bem que assim c! -, também aqui, em lermos de cumprimento do Regimento e de outras normas que tem de pautar os trabalhos da Assembleia da República, caímos um pouco nos brandos costumes, acabando por vezes por criar dificuldades.
Penso, pois, que estes projectos de lei, quando deram entrada na Mesa, não deveriam ter sido admitidos. A Mesa ou o Sr. Presidente da Assembleia da República deveria explicar aos parados proponentes a razão por que o fazia e, eventualmente, convidar os autores das iniciativas legislativas em causa a alterar aquilo que devia ter sido alterado oportunamente, para evitar esta inconstitucional idade.
A Sr.ª Deputada Isabel Espada já referiu que o que agora pretende é que essa medida produza efeitos a partir de 1992. É uma forma oral de tentar, aliás um pouco apressadamente, resolver e ultrapassar a tal dificuldade constitucional que referi. Sc não houvesse tal dificuldade constitucional, a Sr." Deputada não leria lido necessidade de verbalmente alterar um projecto de lei, que não e passível de ser alterado oralmente mas apenas através de propostas concretas.
Em lodo o caso, se eventualmente tivéssemos podido recorrer da admissão destes projectos de lei, o PSD seria acusado de que, embora estando a cumprir um norma regimental e constitucional, não queria permitir que estas matérias fossem discutidas na Assembleia da República. Seria isso que as oposições logo viriam dizer, mas sem razão, porque o fundamento de um recurso do agenciamento desta matéria seria perfeitamente plausível, devido ao que já referi. Mas não o fizemos e estamos a discutir aqui estes diplomas, para que as oposições, que tão pouco têm sido assíduas nas reuniões das comissões parlamentares especializadas, possam dar-nos alguma outra informação sobre esta matéria.
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O Sr. Rui Ávila (PS): - Não vá para esse campo!
O Orador: - Não vou para campo nenhum, Sr. Deputado, porque estou no meu campo, com muita honra e muito orgulho.
A Sr. Odete Santos (PCP): - Está a jogar a guarda- redes!
O Orador: - Não, Sr. Deputada, guarda- redes era o Sr. Deputado Herculano Pombo. Eu não era guarda- redes...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Agora V. Ex. confundiu-se!...
O Orador: - Não, Sr. Deputado, não me confundi.
O que penso a respeito desta matéria é que estas questões não devem ser apreciadas exclusivamente em termos de mera técnica jurídica. Através da comissão parlamentar especializada, se os autores destas iniciativas o tivessem sugerido atempadamente, poderíamos eventualmente ler ouvido as associações de pais, as organizações de trabalhadores e outras organizações sociais que representam legitimamente os interesses que aqui estão em causa. Para além das boas intenções, que naturalmente não estão postas em causa, dos projectos de lei em discussão - e não me refiro ao projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, porque em consciência não posso pronunciar-me sobre ele...
A Sr. Julieta Sampaio (PS): -É um projecto muito bom e terei todo o gosto em oferecer-lhe um exemplar!
O Orador: - Não sei se o é ou não, Sr. Deputada. Tenho muita confiança em V. Ex., mas permita-me que lenha algumas reservas em relação àquilo que a Sr.ª Deputada diz ser bom. O Partido Socialista diz que há muitas coisas que são boas, mas nós sabemos que efectivamente não o são.
Não posso pronunciar-me relativamente ao projecto de lei do Partido Socialista porque, infelizmente, ele foi distribuído pelas bancadas às 16 horas de hoje. Ou seja: se não tivesse havido um debate anterior e, antes, tivéssemos começado normalmente esta reunião plenária, às 15 horas, com a discussão desta matéria,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): -A culpa 6 do Sr. Deputado Pacheco Pereira!
O Orador: -... estaríamos, ainda assim, a discutir - porventura não nós, mas outros deputados - um projecto de lei do Partido Socialista completamente desconhecido da Câmara.
Não irei, por isso, pronunciar-me sobre o diploma do Partido Socialista, por uma questão de dignidade da Assembleia da República, nomeadamente do trabalho das comissões parlamentares, que é tão reivindicado pelos partidos da oposição, de uma forma especial pelo Partido Socialista, porque isso seria alinhar - passe a expressão - com o comportamento pouco interessado que o Partido Socialista demonstrou sobre esta matéria.
Quando, por outro lado, se diz que Portugal, no que respeita à adopção de medidas de fomento à protecção da família, da criança, da paternidade e da maternidade, é um dos países que está atrás dos restantes países europeus, devo dizer que tal afirmação não corresponde à realidade.
A respeito desta matéria, a Carta Social Europeia do Conselho da Europa, que a Assembleia da República, finalmente, discutiu e ratificou há cerca de um mês, consagra, no seu artigo 8.º, que, com vista a assegurar o exercício efectivo do direito das trabalhadoras à protecção, as parles signatárias da Convenção obrigam-se a assegurar às mulheres, antes e depois do nascimento, um repouso de uma duração total de, no mínimo, 12 semanas.
Esta norma do Conselho da Europa encontra-se amplamente ultrapassada pela legislação interna portuguesa. Com efeito, a Lei n." 4/84, de S de Abril, aprovada nesta Câmara, é extremamente progressiva e positiva nesse sentido, sofrendo depois, aliás, diversos desenvolvimentos, nomeadamente através do Decreto-Lei n.º 135/85, de 3 de Maio, que veio consagrar e desenvolver os princípios constantes daquele diploma, regulamentando os seus preceitos para a função pública.
De qualquer forma, ao longo dos últimos cinco anos, tem o Governo procedido ao aumento sistemático - e sempre superior aos valores acusados pela inflação - das prestações familiares, o que tem lido uma extraordinária relevância.
Porém, em colaboração com as instituições particulares de solidariedade social, o Governo tem igualmente vindo a criar equipamentos sociais, que podem hoje ver-se de norte a sul de Portugal, onde se está a dar resposta à necessidade de garantir aos pais e às crianças uma melhor qualidade de vida e onde se está a instituir a possibilidade de os pais, sem prejuízo da sua própria actividade profissional, poderem dispor de locais adequados e vigiados por técnicos especializados, o que, como é natural, contribui para um melhor desenvolvimento das crianças.
Como há pouco dizia, a licença mínima consagrada pelo Conselho da Europa é de 12 semanas. Todavia, em Portugal, através do estatuído no artigo 9." da lei atrás referida, encontra-se estabelecido um período de 13 semanas (90 dias). Isto sem contar com o facto de o artigo 13.s do mesmo diploma consagrar a possibilidade do gozo de uma licença de mais 30 dias, isto é, de mais quatro semanas. E tudo isto abstraindo de situações de baixa clínica, que as mães possam sofrer no caso de eventuais doenças.
De qualquer modo, considerando uma situação de normalidade, as mães de recém-nascidos podem, nesse momento, ler acesso a uma licença por maternidade de 17 semanas.
Tenho entre mãos um relatório emanado do Conselho da Europa, datado de Fevereiro do presente ano, sobre o controlo de aplicação da Carta Social Europeia, e que é anualmente elaborado. Aí se diz por exemplo, a este respeito, o seguinte: Na Dinamarca, na Suécia e no Reino Unido, a licença pós-natal não e obrigatória. Nos Países Baixos, em caso de nascimento prematuro, a legislação não prevê o prolongamento da licença pós-natal e, portanto, ela será inferior a 12 semanas. No Remo Unido, o montante e a duração das prestações de maternidade são insuficientes.» Repare-se que se está a referir a países desenvolvidos de um ponto de vista económico, embora, nesta matéria, provavelmente menos desenvolvidos do que Portugal.
Por outro lado, referindo-me ainda à Carta Social Europeia e à matéria constante deste relatório de controlo da aplicação deste instrumento, do qual terei muito gosto em fornecer exemplares à Sr. Deputada Julieta Sampaio - não para lhe retribuir o exemplar que me ofereceu do seu projecto de lei-, bem como a ioda a bancada do PCP, se estiver interessada...
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A Sr. Odete Santos (PCP): - Agradeço muito. A gente não recusa! Tudo o que for para aprender...
O Orador: - Bem, gostaria de dizer que, por exemplo, o Chipre, a Irlanda, a Noruega e a Turquia, que ratificaram a Carta Social Europeia, fizeram-no com reserva do n.º l do artigo 8.º, que estabelece um mínimo de 12 semanas para a licença de maternidade. Por conseguinte, nesses países -e dado que ainda não retiraram aquela reserva -, a licença de maternidade será ainda inferior à que existe em Portugal.
Nestes termos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, no fundo, a licença de maternidade pode, em Portugal, ir até às 17 semanas. Porém, discute-se neste momento, no âmbito das Comunidades, a possibilidade da emanação de uma directiva - que eventualmente será consagrada - em que o limite máximo da licença de maternidade é de 14 semanas. Portanto, está neste momento em discussão na CEE um valor temporal da licença por maternidade inferior às 17 semanas que já referi, resultantes da Lei n.8 4/84, de S de Abril.
Por outro lado, sendo o sistema de segurança social em Portugal - aliás, isto é quase geralmente reconhecido - um sistema que dá uma efectiva resposta aos grandes riscos que os trabalhadores (homens ou mulheres) e as suas famílias podem correr durante a vida, pensamos que a introdução de alterações nesta matéria deve ser devidamente ponderada. Com efeito, se estamos de acordo em que, em termos de cobertura de riscos, a segurança social nada fica a dever à generalidade dos sistemas de segurança social, teremos de reconhecer uma excepção a esta regra - aliás, comummente reconhecida -, já que uma parte importante das prestações da segurança social é, em termos de valores, baixa. Contudo, ao longo dos anos, temos vindo a demonstrar que, com o crescimento económico, com a estabilidade política e a confiança dos agentes económicos e dos portugueses em geral, temos vindo a, progressivamente, de uma forma sustentada, consciente e responsável, melhorar os valores dessas prestações. E é isso que vamos continuar a fazer.
Por último, gostaria de referir que existe também nestes projectos de lei, para além das outras disposições que mencionei, referência a algumas licenças de nascimento para o pai ou a mãe da criança. Porém, o estabelecimento da possibilidade destas faltas justificadas teria de, naturalmente, ser conjugado com o regime jurídico que regulamenta esta matéria.
Sabemos que, através da contratação colectiva e da livre negociação colectiva, é possível e desejável que nas diversas situações possam ser encontradas fórmulas consensuais que garantam os legítimos interesses dos pais e das crianças, mas que também tenham em conta os legítimos interesses da actividade económica.
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - É precisamente isso que interessa ao PSD!
O Orador: - Por isso, pensamos que o desenvolvimento de novas regras no âmbito da segurança social se enquadra muito no diálogo social que, finalmente, foi possível estabelecer em Portugal. E pela primeira vê/, com um governo social democrata, com o governo do Prof. Cavaco Silva, tem sido possível celebrar acordos sociais.
De facto, foram celebrados já dois acordos económicos sobre política de rendimentos e preços...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É sempre a mesma coisa! Transformam a Assembleia num comício!...
O Orador: - Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex." compreenderá que se eu estivesse aqui a fazer um comício, não estaria a dirigir-me aos Srs. Deputados! Aliás, estou certo de que V. Ex. nunca seria sensível aos meus argumentos, pois está virado para o outro lado!...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Está sempre a fazer comícios ao PSD!
O Orador: - Ó Sr. Deputado, mas eu sou obrigado a dizer aqui o que o senhor quer que eu diga ou digo aquilo que livremente tenho o direito de dizer?!
Vozes do PS: - Não se exalte!
O Orador: - É que isto é uma questão de princípio! Ainda há pouco, os senhores disseram aquilo que quiseram a respeito de determinadas matérias, mas quando eslava um companheiro meu a falar nas mesmas, os senhores interromperam-no e não permitiram a continuação do seu discurso! É essa a vossa liberdade?!
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha bancada pensa, portanto, que, tal como está previsto no Acordo Económico e Social, no âmbito destas matérias, também existe uma negociação respeitante à segurança social.
Pensamos assim que, sem que se tenham ouvido as associações de família, as associações de trabalhadores e as organizações que, no seio da sociedade portuguesa, representam legitimamente os interesses em causa, aprovar qualquer um destes projectos de lei é uma precipitação que não dignificaria a capacidade de diálogo, de que a Assembleia da República tem vindo a dar provas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS compreende que o atribulado dos últimos dias parlamentares e a decisão, por parte do PSD - aliás, já hoje recuada -, de terminar os trabalhos no dia 14 de Junho tenham trazido, por efeitos de marcação das ordens do dia e de preparação dos trabalhos parlamentares, alguma perturbação. Compreendo, portanto, que, como sucedeu há pouco, aconteçam intervenções como a do Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, que, aos costumes e à matéria destes projectos de lei, disse nada. Provavelmente, acontecerá o mesmo nos próximos dias, a propósito de outras matérias, uma vez que não haverá tempo para preparar estas questões.
No entanto, gostaria de deixar aqui dito, muito claramente, que já o Sr. Presidente desta Câmara deu, há pouco, conhecimento à Assembleia - e também ao Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques... - de que, em conferência dos representantes dos grupos parlamentares, linha sido agendada esta marcação do PRD, sem que, de imediato, lenha sido indicada qual a matéria a discutir. Assim, em conformidade, foi decidido e acordado pelos diferentes li(...)
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deres parlamentares - entre os quais se inclui, certamente, o líder do Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques - que, a ser assim, estariam preenchidos todos os prazos. Nestes termos, o PRD indicaria, como indicou, Tora do prazo, qual a matéria e o projecto de lei que deveria subir, hoje, a Plenário para discussão, reservando-se os restantes grupos parlamentares o direito de entregarem, até à discussão, idênticos ou conexos projectos de lei no âmbito desta matéria Aliás, julgo que aquilo que foi acordado pelo meu líder parlamentar também o foi pelo líder parlamentar de V. Ex.1
Não nos fica, portanto, o direito - nem a si, nem a mim, nem a ninguém neste Plenário-de vir aqui, na hora do debate, afirmar que outros partidos apresentaram projectos de lei intempestivamente e sem os submeterem à discussão!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: -No entanto, Sr. Deputado, fica-me o direito de dizer que, neste contexto e cumprindo com as deliberações da conferencia dos representantes das grupos parlamentares, onde se encontravam os nossos líderes parlamentares, fizemos aquilo que a dignidade desta matéria e a importância do objecto desta discussão nos impunham, ou seja, preparar um projecto de lei. E, na verdade, apresentámos esse projecto de lei, ontem!
Se foi distribuído hoje, às 16 horas, isso suo questões de ordem burocrática e administrativa que nos ultrapassam. Agora, o que é facto é que cumprimos com a nossa obrigação e com a importância da matéria que tínhamos hoje em discussão, aliás de acordo com o determinado em conferencia de representantes dos grupos parlamentares!
Nestes termos, Sr. Deputado, lavro este protesto, porque me causou algum espanto e indignação o facto de V. Ex.1, em nome de um grupo parlamentar que, em relação a esta matéria e articuladamente, não ofereceu qualquer contributo em termos de projecto, vir aqui dizer que o PS teve um comportamento pouco interessado.
Sr. Deputado, que V. Ex. tenha muito a dizer sobro o que está em discussão, que não tenha discurso sobre esta matéria, ainda aceito. Agora não posso aceitar que venha aqui afirmar o que afirmou!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este protesto do Sr. Deputado Laurentino Dias é um autentico tiro no próprio pé! É que, de facto, os projectos de lei do PCP e do PRD sobre esta matéria foram entregues e distribuídos na comissão há dois ou três meses...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Do PCP, Sr. Deputado?! É de 1987!
O Orador:-Exacto, até há mais tempo! Por isso, aquilo que quero dizer é que, no mínimo, poderia ter havido por parte do PS a atenção de ir alguém hoje, de manhã, à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família dizer: Nós lemos aqui este projecto!» Mas, de facto, os deputados do PS, hoje - e não foi esta a única vez -, primaram pela ausência total e absoluta na reunião da comissão parlamentar especializada.
Por outro lado, aquilo que quero dizer é que não é possível, em consciência, aqui, em Plenário, discutirmos um projecto de lei que nos é distribuído às 16 horas do próprio dia em que se debate esta matéria.
Sr. Deputado Laurentino Dias, gostaria muito de ser simpático e dizer-lhe que os senhores apresentaram um projecto de lei excelente e que vamos analisá-lo. Se quiserem, vamos analisá-lo, mas vamos faze-lo na sede própria, que é a comissão. É que, aqui, não há possibilidade material de, em consciência, pronunciarmo-nos sobre um texto que chegou aqui à bancada, há cerca de uma hora - às 16 horas!
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Queixe-se ao seu líder parlamentar!
O Orador: - Sr. Deputado Laurentino Dias, que eu saiba, não é o meu líder parlamentar o autor das iniciativas legislativas do PS!
Sr. Presidente, creio que este assunto está esclarecido. O que se passou, objectivamente, foi isto. Contudo, parece-me que o Sr. Deputado Laurentino Dias continua a pensar que este projecto, que o PS apresentou aqui às 16 horas, está em condições de ser discutido. O problema é deles...
Protestos do PS.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Não o apresentámos às 16 horas; apresentámo-lo, ontem! E isso foi convencionado com o seu líder parlamentar!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr.1 Isabel Espada (PRD): - Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, penso que todos verificámos - e não sei se isso terá mais a ver com motivos processuais do que com motivos pessoais - que o Grupo Parlamentar do PSD não vem muito bem preparado para este debate. Esse é um facto inelutável que, penso, todos constatámos.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Está a «nadar», nesta matéria!
A Oradora: - Em relação aos outros projectos de lei em discussão, não me posso pronunciar, mas, relativamente ao do PRD, posso dizer-lhe que ele já jazia na comissão, de que o Sr. Deputado é presidente, há bastante tempo.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - E era um deputado do PRD o coordenador do grupo de trabalho.
A Oradora: - Pelo menos, o Sr. Deputado tinha obrigação de conhecer o âmbito do diploma. Portanto, em relação ao projecto de lei do PRD, não pode dizer que a questão era praticamente desconhecida, até há algum tempo atrás.
Em relação ao processo de consulta pública-e esta era uma dúvida que eu linha anteriormente, mas que agora se atenuou -, o Sr. Deputado disse que não concordava que este tipo de consulta pública pudesse ser feito no âmbito da comissão, nomeadamente depois da aprovação, na generalidade, dos diplomas, que é o que se faz, na maior parte das vezes. Depois da aprovação, na generalidade, dos projectos de lei, eles baixam à respectiva comissão, para
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discussão, na especialidade. Quando se concorda com os princípios gerais de um projecto de lei, vota-se favoravelmente, na generalidade, e só depois, para se fazer os acertos finais, para adaptá-lo à realidade e às vocações das várias organizações envolvidas na temática, é que o Sr. Deputado fará a consulta pública. Mas fá-la, depois de aprovar o diploma, na generalidade, se concordar com os pressupostos e os princípios plasmados no mesmo.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Portanto, parece-me que o problema da consulta pública se encontra ultrapassado. De qualquer modo, constato que não é esse o caminho que o PSD pretende seguir em relação a estes diplomas!
Quero ainda esclarecê-lo em relação a algumas matérias, porque penso que a falta de preparação relativamente a estes diplomas se evidencia também no conhecimento que V. EX." tem sobre esta temática.
O Sr. Deputado fez referência a um limite mínimo que está, neste momento, a ser estudado. De facto, ele está previsto numa recomendação comunitária, que está em vias de ser aprovada. Mas, já que dá tanta importância à questão do limite mínimo anterior, devo dizer-lhe que Portugal é o país que tem o sistema menos favorável da Europa, em termos de gozo de licença de trabalho por motivo de parto. Tenho comigo - e o Sr. Deputado também deveria tê-los - os números que evidenciam isso de uma forma extremamente clara. Aliás, na minha intervenção, limitei-me a dar alguns exemplos, porque não podia estar a apontar todos os exemplos na Europa Comunitária.
Mas, relativamente a esta matéria, devo dizer que em Portugal vigora, de facto, o período mais curto e, uma vez que seja aprovada a referida recomendação comunitária, que prevê um período mínimo de 14 semanas, Portugal vai deixar de se encontrar dentro dos parâmetros comunitários, porque, como sabe, no nosso país esse período é de 13 semanas.
Afirmou o Sr. Deputado que, na prática, esse período é de 17 semanas. Contudo, quero dizer-lhe que está a cometer um erro extremamente grave, pois os 30 dias que referiu dizem respeito a baixa por motivo de doença, caso haja necessidade, após o gozo da licença devida de parto. Portanto, essa baixa não tem a ver com o período de licença de parto.
Em relação a outras inúmeras matérias, o Sr. Deputado, de facto, nada disse. Falou do aumento dos subsídios da maternidade e de outras coisas que o Governo, eventualmente, teria feito, mas, em relação ao conteúdo concreto do projecto de lei, ou seja, se concorda que o tempo deve ou não ser alargado, se os pais devem ou não partilhar desse tempo de licença de maternidade, criando-se, assim, uma alteração à Lei n.9 4/84, nada disse.
Quero ainda acrescentar uma outra coisa: o Sr. Deputado não pode trazer para aqui o acordo social, porque a alteração da Lei n. ª 4/84 tem de ser feita aqui, na Assembleia da República. Ela não pode ser feita, apenas, através de acordos colectivos entre as entidades patronais e os trabalhadores - neste caso, as trabalhadoras. Trata-se de uma alteração legislativa que tem de ser feita pela Assembleia da República.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr." Deputada Julieta Sampaio.
A Sr. Julieta Sampaio (PS): - Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, V. Ex. é ou não o presidente da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família? É! O Sr. Deputado sabia, com certeza, que ambos os projectos de lei do PCP, tanto o n." 107/V como o n.9 265/V, se encontram há muito tempo nessa Comissão. Assim sendo, por que é que o senhor, como presidente dessa Comissão, e o PSD, aberto como está a estas questões tão importantes da família, das crianças e da protecção da maternidade, não providenciaram, há mais tempo, o agendamento desta temática?
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Nós é que agendamos as iniciativas de outros partidos?!
A Oradora: - Sim, os senhores! Os projectos de lei do PCP estão lá, salvo erro, desde 1987! E agora, porque não tem nenhuma política para apresentar a esta Câmara sobre a maternidade, o PSD vem invocar questões processuais. E isto apesar de o senhor saber -como a Sr." Deputada Isabel Espada referiu, e muito bem - que Portugal, nessa matéria, está muito atrasado, lendo que avançar rapidamente se quiser acompanhar os outros países da Europa.
Penso que, nesta matéria, o PSD pertence àquela sociedade desumanizada de que falei há pouco. Na verdade, para o PSD, só é válido aquilo que é imposto pela lei; porque aquilo que é a sensibilidade da sociedade, isso, para o PSD, não interessa. Daí que o senhor, na sua intervenção, só tenha falado de economia e mais economia!
Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, muito mais importante do que toda a economia que o senhor aí invocou com tanto ênfase é o valor que damos a um ser que vai nascer, que precisa de protecção e que, amanhã, tem direito a ser feliz. Não entende V. Ex. que um assunto de tanta importância merece uma discussão atenta na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família e na Subcomissão para a Igualdade de Direitos e Participação da Mulher, em simultâneo? Está o PSD aberto a que se faça essa discussão? O Sr. Deputado pensa que é com o diálogo social que vai resolver, por exemplo, o caso a que me referi, há pouco, das mães que, com contratos a prazo, passados 30 dias após o parto, são pressionadas pelos patrões a regressarem ao trabalho, sem o que, no final do contrato, elas encontram a porta de saída do emprego que têm e que muitas vezes lhes faz falta para o sustento dos seus Olhos?
Que respostas tem o PSD e o Governo - e o Sr. Primeiro- Ministro Cavaco Silva, quando percorre o País de norte a sul - para dar a estas mães?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, é evidente que não quero obrigá-lo a dizer coisa alguma, isto é, a dizer o que quero que diga.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Assim, estou mais descansado!
O Orador: - É bom que esteja!
O que lhe quero dizer é o seguinte: V. Ex., um pouco ao jeito do presidente do seu partido, o Sr. Primeiro- Ministro Cavaco Silva, abordou este diploma numa óptica quantitativa.
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A Sr. Julieta Sampaio (PS):-Exacto!
O Orador: -Exacto, Sr.1 Deputada, mas V. Ex. fez agora uma intervenção no mesmo estilo! Falou do tempo de duração das licenças, do subsídio, ...
Risos do PSD e do CDS.
E a característica principal deste diploma 6 a de contrapor uma filosofia diferente àquela que enforma a Lei n.º 4/84, isto é, ao invés do direito à diferença - de que falámos aqui, aquando da revisão constitucional -, quer-
se levar a igualdade entre homem e mulher a extremos que, porventura, não têm cabimento. Este é o objectivo do diploma.
O objectivo do diploma, ao eliminar o carácter supletivo do alargamento ao pai das licenças em matéria de parto e ao torná-lo perfeitamente equiparável, em certo sentido, às licenças concedidas à mãe, quer efectivamente levar a limites, para nós considerados como absurdos, a igualdade entre homem e mulher, que, obviamente, defendemos. Não está aqui em causa o problema das famílias mono parentais, mas, sim, o das famílias em que existem os dois pais. E o que o PRD pretende é equiparar o papel do pai e da mãe, em termos que não estavam consagrados na Lei n." 4/84.
Ora, Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques, gostaria que se pronunciasse sobre o seguinte: como é que V. Ex.1 encara este grande objectivo do PRD? O PSD aceita-o ou entende que as soluções actuais são mais razoáveis e suficientes? E, por outro lado, porque representam a adesão a um modelo de família em que a mulher tem um determinado papel e a mãe tem um papel insubstituível, essas soluções devem ser mantidas ou devem ser alteradas, em nome desta absurda tese de igualdade que o PRD nos vem aqui propor?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques.
O Sr. Joaquim Fernandes Marques (PSD): - Quero, antes de mais, dizer que o meu colega, o Sr. Deputado José Ferreira de Campos, vai fazer uma intervenção sobre o projecto de lei n." 265/V, do PCP, e, por isso, não me referi a essa iniciativa legislativa.
Quanto às questões colocadas pela Sr.1 Deputada Isabel Espada, devo dizer-lhe que li, com atenção, o projecto de lei do PRD. Simplesmente, estou aqui a discutir esta matéria na generalidade e não na especialidade - isso faz-
se na comissão.
Por outro lado, posso informá-la - e os deputados aqui presentes, de outros partidos, que pertencem à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, podem confirmar ou infirmar aquilo que vou dizer-acerca do seguinte: na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família estabelecemos como norma, desde o início desta legislatura, que era designado um deputado do partido que apresentava a iniciativa legislativa para coordenar um grupo de trabalho que elaborasse um parecer e propusesse medidas sobre cada projecto. No caso concreto, o deputado encarregado de coordenar o grupo de trabalho que deveria elaborar o parecer sobre esta matéria era um senhor deputado do PRD, cujo nome não refiro, porque ele não está presente. Portanto, Sr. Deputada Isabel Espada, talvez por ignorância, V. Ex. está a ser injusta para comigo, quando diz que eu não fiz nada. Sr. Deputada, olhe para dentro da sua «casa»
e veja quem é que, de entre os seus companheiros de bancada, não fez, de facto, nada!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputada, não se trata da discussão pública de um projecto de lei, a qual não é necessária para este caso. Como não se trata de legislação de trabalho, ela não tem de ser submetida a discussão pública.
Mas aquilo que referi foi que seria bom que, a propósito de um projecto de lei desta natureza, a comissão pedisse às organizações da sociedade civil, que têm responsabilidades nesta matéria, para virem à comissão dar o seu contributo relativamente às propostas que foram feitas. O PRD poderia tê-lo proposto na comissão parlamentar especializada, mas não o fez.
Quanto à recomendação da CEE que a Sr.ª Deputada referiu, gostaria de dizer-lhe que o que está em preparação não é uma recomendação mas, sim, uma directiva, que vai passar a ser legislação comunitária obrigatória para todos os Países membros.
Disse a Sr. Deputada Julieta Sampaio - e, como V. Ex. está no Parlamento há, pelo menos, quatro anos, eu até pensei que não estava a ouvir bem! - que os projectos de lei do PCP sobre esta matéria estão há na comissão desde 1987 e perguntou por que é que o PSD não os agendou Sr. Deputada, também há projectos de lei do PS na comissão. Então, o PSD vai passar a distribuir agendamentos pelos partidos da oposição, rateá-los e dizer ao PCP tem dois agendamentos para escolher, o PS tem x, etc.»?
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): -Eu não disse isso!
O Orador: - Foi isso que a Sr.ª Deputada disse!
Seria a contradição absoluta dos trabalhos parlamentares se um qualquer partido estivesse a gastar os seus direitos regimentais com agendamentos de iniciativas de outros grupos parlamentares!...
Mais à frente a Sr. Deputada, que fez a sua intervenção um pouco no estilo «choradinho», referiu-se às «coibidas das criancinhas, às coitadas das mães» e disse que ao Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques só fala em economia, economia, economia»... Eu não falei só em economia, Sr. Deputada! Referi-me à economia para dizer que, neste momento, o sistema jurídico da segurança social cobre praticamente todos os riscos que os cidadãos, trabalhadores e familiares, correm por virtude do exercício de uma actividade profissional, porque têm família, porque tem filhos, porque entretanto atingiram a idade de poder requerer a reforma. Agora aquilo que disse foi que os valores das prestações do sistema da segurança social, o qual é já extremamente positivo e bem desenvolvido, são ainda insuficientes. Temos de continuar a contribuir para que, com o desenvolvimento económico, com a estabilidade política, com a estabilidade que resulta da confiança dos portugueses em geral, possamos, cada vez mais e porque há recursos para isso, aumentar os valores das prestações da segurança social, que, de facto, já cobrem todos os riscos existentes.
Mas, Sr.ª Deputada, também lhe digo que é verdade que há valores que são ainda insuficientes e, em muitos casos, manifestamente insuficientes. Foi isso que disse, Sr. Deputada! Eu não falei em economia, economia, economia, a Sr. Deputada é que pensou isso porque, provavelmente, é
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esse o discurso oficial do PS relativamente ao PSD. Isso já está tão metido na cabeça de V. Ex.1 que julgou que eu pensava aquilo que não penso!
Repito, Sr. Deputada, todas estas iniciativas poderiam ter sido discutidas na comissão. Esta iniciativa do PS só deu entrada na Mesa às 16 horas e que dizer desta iniciativa do PRD, que nem sequer foi analisada em comissão porque o deputado do PRD encarregue de coordenar o grupo de trabalho com representantes de todos os deputados nunca tomou essa iniciativa?... Os projectos de lei do PCP tiveram, atempadamente, os respectivos pareceres elaborados na comissão. Foi um deputado do PCP que coordenou o grupo de trabalho, composto por deputados dos diversos partidos, que elaborou o parecer e que o submeteu à aprovação da comissão parlamentar especializada competente. Portanto, os projectos de lei do PCP eram os únicos que estavam em condições de subir a Plenário!
Por outro lado, a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio falou nas «coitadas das mães» que têm contratos a prazo e em relação às quais os patrões não respeitam a lei. Sr. Deputada, é evidente que somos contra todas aquelas entidades que violam a lei! Em relação a estas situações, ainda é inaceitável que o façam, mas o que deve fazer-se é punir os infractores, aqueles que utilizam abusivamente a lei em vigor. Porém, a actual lei dos contratos a prazo tem vindo a contribuir para a diminuição, em termos globais, do número destes contratos - e isto é o que dizem os próprios trabalhadores! - e é bastante melhor do que a lei socialista dos contratos a prazo de 1976!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por último, gostaria de responder ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Como é óbvio, Sr. Deputado, as soluções que a actual lei consagra, em termos de «facilitar», após o nascimento de uma criança, quer a vida do pai quer a da mãe, são, em nosso entender, as que traduzem uma filosofia correcta. E essa filosofia correcta não é, com certeza, aquela que consta do projecto de lei do PRD...
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odeie Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com muito agrado a intervenção do Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques. Creio que o Sr. Deputado fez muito bem referir o Acordo Económico e Social, porque a partir daí pus de lado o início da minha intervenção e lembrei-me de que esse acordo e o pacote laborai, que W. Ex." têm agendado já para a semana, prevêem que possa haver semanas de 50 horas de trabalho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Como é que o PSD pode falar em nome das crianças e da mãe quando esta pode sair do trabalho às 10 ou 11 horas da noite? Pergunto-lhe, Sr. Deputado, qual é a instituição privada de solidariedade social, onde a criança possa ficar, que está aberta até essa hora?
Quando o Sr. Deputado fez essa alusão pensei, inclusivamente - embora não o conheça pessoalmente - contactar António Gedeão e pedir-lhe para reformular o seu belíssimo poema, «Calçada de Carricho». Se ele o fizesse, a situação descrita seria, então, bem pior - e sê-lo-á se W. Ex. teimarem nessa vossa posição...
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - São muito amigos da vossa família...
A Oradora: - De facto, esse poema, que fala na mulher que regressa a casa já noite fechada, pega na filha, dá-lhe a mamada, bebe a sopa numa golada, tudo muito à pressa, retraia fielmente a vida das mulheres portuguesas.
Com o vosso pacote laborai, as crianças ficarão em pior situação relativamente àquela que têm hoje! Ora, sendo este o ano em que foi aprovada a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, isso é muito grave!
Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Também registei com agrado a sua afirmação de que se deveria consultar esta e aquela organização. Concordo com isso, Sr. Deputado e, aliás, antes de elaborar os projectos de lei, nós, PCP, consultámos diversas organizações. Mas só me admiro, Sr. Deputado, que, apesar dessa sobrevalorização da consulta -que, aliás, me parece um pouco teórica-, V. V. Ex. teimem em avançar com um pacote laborai que teve o parecer absolutamente negativo de 329 organizações de trabalhadores! Só uma, e com algumas críticas, se pronunciou a favor.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Para que é que poderia servir, ao PSD, a consulta pública sobre estes diplomas?
O Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques tentou justificar o voto contra do seu grupo parlamentar. Para mim, não tem qualquer justificação! E não a (em, Sr. Deputado, em relação a qualquer dos projectos que, hoje, estão aqui em discussão. Repito, aos olhos do povo português não há justificação possível para votar contra!
Espero que a comunicação social faça eco de que o PSD vai votar contra direitos das mães e das crianças, contra direitos das mães solteiras. É essa a conclusão que temos de lidar de qualquer intervenção que W. Ex." aqui façam!
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Em relação à Lei n. 4/84, devo registar - para além dos projectos de lei que foram apresentados e que, em meu entender, deveriam ser aprovados- que nós, PCP, logo na altura da sua aprovação, fizemos algumas críticas, a que a Assembleia da República não foi sensível, manifestando que, ao conceder-se mais direitos, estava a impedir-se a mulher de aceder ao emprego. Na verdade, as mulheres são privadas de aceder ao emprego por causa de uma política virada para a precarização do trabalho, a qual atinge todos, homens e mulheres.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Não posso deixar de registar que, de facto, a Lei n." 4/84 regrediu, isto é, andou para trás em relação ao regime das faltas por assistência ao agregado familiar. Com efeito, o Decreto- Lei n. 874/76 estabelecia apenas a assistência inadiável, não marcava limite anual e consagrava o direito à remuneração, porque entendia que se tratava de faltas justificadas. A Lei n.º 4/84 -porque a Assembleia esteve surda às alterações apresentadas - veio limitar o número de faltas para a assistência ao
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agregado familiar e veio estabelecer que, além de inadiável, a assistência ainda linha de ser imprescindível.
Para além disso, até em relação à Lei n.8 49 408, a Lei n.º 4/84 regrediu, porque enquanto nesse diploma, no artigo 118.", se previa a interrupção diária do trabalho para a aleitação, a Lei n.8 4/84 passou a exigir a amamentação, o que, efectivamente, é diferente. De facto, ser aleitado pela mãe - não amamentado - é, em termos psicológicos, bem diferente do que ser aleitado por um estranho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Assim, como podem verificar, a Lei n.8 4/84 merece-nos muitas críticas e se os projectos de lei, agora em discussão, fossem aprovados, na generalidade, teríamos ainda a oportunidade de apresentar algumas propostas de alteração, nomeadamente em relação à remuneração durante o período da licença por maternidade, uma vez que a Constituição prevê que não haja perda de remuneração e as mulheres são prejudicadas, pois não recebem a remuneração como se estivessem, efectivamente, a trabalhar. Em minha opinião, isto é inconstitucional.
Mas já tive até a desagradável surpresa de ter acesso a um anteprojecto do código da segurança social, da responsabilidade do Governo, que, por acaso, estabelece coisas incríveis em relação a esta matéria da protecção da maternidade e da paternidade. Estabelece, por exemplo, que só há direito ao subsídio por doença nos seguintes casos: o descendente ter idade inferior a 10 anos; o descendente viver no mesmo agregado familiar e o beneficiário não dispor de rendimentos mensais per capita superiores a 70 % da remuneração mínima mensal.
Na verdade, se este anteprojecto do código da segurança social for avante, retirará ainda mais direitos do que a Lei n. 4/84.
Em face deste quadro, que se perspectiva, é preciso que todas as pessoas, particularmente as mulheres, saibam que não devem deixar-se levar pelo «canto de serpente» - é este o nome exacto - do PSD, que guarda ainda na gaveta algumas medidas (outras já saíram de lá, como o pacote laborai, por exemplo) para retirar direitos já adquiridos pelos cidadãos, mas que ainda não são suficientes.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a minha intenção, ao solicitar à Mesa que me concedesse a palavra, não era, propriamente, falar no projecto de lei apresentado pelo PRD e nas alterações introduzidas,...
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Mas falaste bem! O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Falou pouco!
O Orador: -... mas nos projectos de lei que nós, PCP, apresentámos, que, em nossa opinião, dizem respeito também à protecção da maternidade e da paternidade.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pensa mais na fábrica de sabonetes, nos gelados e na Firma do que nos direitos da família!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Veja lá se a água de sabão também lava a criança!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): Veja lá se não fica com os olhos empolados do sabão!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Conheço-o bem! Conheço-o de gingeira!
A Oradora: - Posso continuar, Srs. Deputados?!
Com efeito, o PCP apresentou já dois projectos de lei, um em 1987 e outro em 1988. E já sabia que o Sr. Deputado Joaquim Fernandes Marques iria dizer que um deles era inconstitucional. De facto, o projecto de lei em causa foi apresentado em 1987 e nele consta um artigo onde se diz que só entrará em vigor no dia l de Janeiro de 1988, uma vez que se perspectivava que o debate se realizaria algum tempo depois e não passados quatro anos da sua apresentação. Mas é, de facto, esse artigo que inutiliza o argumento da lei travão e nele deve ler-se que entrará em vigor em l de Janeiro de 1992. Isto se for aprovado.
Pela nossa parte, entendemos que não há qualquer razão para que as famílias mono parentais, nas condições descritas neste diploma, isto é, condições de carência económica, com rendimento per capita inferior a V, do valor mais elevado do salário mínimo nacional, não tenham direito ao subsídio que estabelecemos, o qual é correspondente a '/„ do salário mínimo nacional, a acrescer ao abono de família. E, desta forma, pensamos até estar a dar resposta às recomendações internacionais, que falam nos problemas das famílias mono parentais.
Sendo este o ano da aprovação da convenção a que já me referi, este projecto de lei seria um dos contributos
é evidente que não seria o único - para a efectivação dos direitos nela previstos.
Quanto ao outro projecto de lei, o que apresentámos em 1988, devo dizer que nos merece referências mais detalhadas.
Talvez nem todos os Srs. Deputados tenham conhecimento, mas trata-se de um diploma que foi alvo de dois pareceres: um da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, desenvolvido em duas folhas A4 dactilografadas, e um outro da Procuradoria-Geral da República, expressamente solicitado pela Comissão já mencionada, que contém 47 páginas dactilografadas. E evidente que não é o número de páginas ou de folhas que pode significar alguma coisa, em lermos qualitativos, mas quem tiver a paciência, ou melhor, o prazer de o ler porque dá prazer ler o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República - chegará à conclusão de que, afinal, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que, em numerosos pareceres, tem já dado contribuições valiosíssimas, em relação a esta matéria, deu uma péssima contribuição.
Na verdade, confrontado um parecer com o outro - e se o queria obter, Sr. Deputado José Ferreira de Campos, que faz parte da Comissão, bastaria tê-lo pedido à funcionária, Sr.ª Helena Rocheta - ...
O Sr. José Ferreira de Campos (PSD): - Também os tenho!
A Oradora: - Então não aprendeu nada!
Ora, como estava a dizer, confrontado um parecer com o outro, verificamos que a diferença entre eles é abismal e, obviamente, não podemos deixar de dedicar muito mais interesse ao parecer da Procuradoria- Geral da República do que a este magro parecer da Comissão.
No entanto, gostaria de referir que, a certa altura, o parecer da Comissão diz que o projecto de lei retalha o Código Civil. Isto é falso! O projecto de lei não retalha, de forma alguma, o Código Civil, mas dá execução c
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concretiza direitos que estuo previstos no seu artigo 1884.º, que é um artigo com quase 100 anos de existência, embora com algumas alterações, pois tem origem numa das leis da família publicada por Afonso Costa, e visa proteger não só as mães solteiras, mas estas em especial.
A minha camarada Paula Coelho já aqui referiu que são os nascimentos de mães entre os IS e 19 anos que têm vindo a contrabalançar a queda abrupta da natalidade em Portugal, país que, na CEE, apresenta uma das quedas mais abruptas de natalidade ao longo dos últimos anos. E percebe-se porquê! É que as pessoas não têm condições para ter filhos. As mulheres estão contratadas a prazo e sabem que se tiverem um filho vão para a rua. Por isso, preferem não ter filhos, para evitar perder o emprego sem o qual ficariam sem condições para os tratar.
Mas, dizia eu, isto não é retalhar o Código Civil, 6 propor concretizações, adaptar artigos do Código Civil para a execução do seu artigo 1884.9 Só que, também aqui, admira a dualidade do PSD porque, efectivamente, não se importou de retalhar o Código Civil, alterando um artigo relativamente às acções de despejo para fazer aumentar os despejos, para inutilizar a jurisprudência dos tribunais.
Nessa altura, o PSD não se importou de retalhar o Código Civil e de alterar a unidade do sistema jurídico, e agora está tão preocupado com um projecto que não tem nada a ver com isso. Aliás, há ainda mais retalhos no Código Civil, nomeadamente em relação aos contratos de arrendamento, que recentemente foram aqui discutidos, e o próprio processo da adopção, já em 1980, foi retalhado e alvo de regulamentação em diploma avulso. Portanto, este argumento reduz-se efectivamente a nada.
Mas o parecer da Procuradoria- Geral da República, na sua conclusão 2.º, que registamos e que, penso, é importante ler, diz o seguinte: «Trata-se de uma iniciativa legislativa que respeita e pretende pôr em execução medidas que são conformes com os normativos constantes de instrumentos internacionais relativos ao reconhecimento do princípio da igualdade de direitos dos homens e das mulheres, como 6, designadamente, o caso da Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, adoptada em 18 de Dezembro de 1969 e ratificada por Portugal através da Lei n.º 23/80, de 26 de Julho».
Penso, Srs. Deputados, que esta conclusão é importante para, quando votarem contra, saberem que estão a votar contra um projecto que deve ser melhorado. E eu nem sequer me preocuparei agora, embora tivesse escrito na intervenção que aceitava as críticas da Procuradoria- Geral em relação a certos artigos, em referir que deviam introduzir-se estes melhoramentos, porque, decididamente, o PSD fez um relatório abaixo da qualidade da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Certamente, foi num dia em que alguém estava atacado de spleen, numa Lisboa crepuscular, chegou à paragem do autocarro e não conseguiu entrar, fechou-se a porta porque a lotação estava esgotada, e disse «ora bolas, e eu que queria entrar! E eu que queria ter-me lembrado disto e não me lembrei!»
Foi certamente com essa disposição que foi feito este parecer, que não me merece mais comentários porque, de facto, a sua inutilidade é manifesta.
Mas recordaria ainda que a própria Procuradoria- Geral da República cita, a determinado passo, a Resolução n.º 15, de 15 de Maio de 1970, do Comité de Ministros do Conselho da Europa, que aponta como obrigatoriedade dos Estados: primeiro, informar as mães solteiras dos seus direitos; segundo, pôr à disposição delas todas as medidas, todos os meios necessários para que possam obter, para si e para os Filhos, as prestações pecuniárias a que têm direito. É isto que diz a Resolução do Comité de Ministros do Conselho da Europa.
E o nosso projecto respeita precisamente isso, criando dois sistemas de informação jurídica às mães sós, sendo um através da Conservatória do Registo Civil, porque, só aí, será possível elucidar a mãe que não vive com o pai do filho, do direito que tem a uma pensão de alimentos até um ano após o parto e durante o período gravidez. As acções em tribunal sobre este assuntos são, de facto, muito parcas porque as pessoas não sabem que tem direito a isso.
Penso, pois, que os advogados não devem ter medo de perder clientes com uma coisa que está prevista no projecto, atribuir ao Ministério Público a obrigação, se a mãe quiser, de propor a acção.
Mas, por sua vez, também o Ministério Público tem o dever de informar a mãe solteira se a acção de investigação de paternidade for decorrente de um processo crime. E outro meio de informação jurídica às mulheres. E eu pergunto ao PSD que meios criou de acesso ao direito, de informação jurídica às pessoas que efectivamente substitua isto? Não criou absolutamente nada!
Há, com efeito, três ou quatro gabinetes de consulta jurídica que se funcionarem como o de Lisboa funcionarão muitíssimo mal e, de facto, neste projecto, é a informação que vai ter com as mulheres e não são as mulheres que vão em busca da informação, porque cias, se não suspeitarem que têm o direito, não a vão procurar.
E claro que esse parecer -aprovado na Comissão só com os votos favoráveis do PSD, registe-se - desconfia dos conservadores dizendo que eles não sabem fazer isso. Igualmente, desconfia do Ministério Público e diz que o Ministério Público não sabe fazer e que, por isso, pouca eficácia tem.
Ora, é importante que aqui se diga, pelo conhecimento que tenho das consultas prestadas pelo Ministério Público em determinados dias da semana nos tribunais, que o Ministério Público tem, até à data, exercido um importante papel para informar os cidadãos dos seus direitos. E já me apareceu muita gente no escritório a dizer: «Olhe, o Dr. Delegado diz que já não podia propor a acção porque a criança linha mais de dois anos e tinha de ir ter com um advogado.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que não vale a pena entrar mais em questões de especialidade e, resumindo, diria que com estas duas iniciativas legislativas que apresentamos se poderia dar mais uma ajuda e colocar mais uma pedra no edifício jurídico de protecção da maternidade e da paternidade.
Efectivamente, sei que o PSD votará contra, porque já mo disse. Mas um voto contra apenas significará que, apesar da vizinhança dos ensolarados dias de Verão, o receio das folhas mortas do próximo Outubro faz perder o discernimento.
Aplausos do PCP, do PS e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.1 Deputada Odeie Santos, ouvi, como sempre, com agrado a sua intervenção. V. Ex.1, neste período ensolarado, acentuou a sua
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veia poética. Aliás, tem-nos brindado aqui com várias citações poéticas e terminou nesse mesmo estilo.
Mas, Sr.ª Deputada, V. Ex.1 não deixou de se pronunciar, também, sobre o projecto do PRD, não é verdade? Dedicou-lhe até a primeira parte da sua intervenção. No entanto, abandonando um texto que trazia e com os seus conhecidos dotes de improvisação, pronunciou-se sobre os aspectos quantitativos, principalmente do projecto de PRD - lá iremos a essa preocupação quantitativa.
Mas, quanto ao mais, Sr/Deputada, os projectos do PCP e os projectos do PRD têm, apenas, uma vaga conexão entre si. E já que V. Ex.1 citou o parecer da Procuradoria--Geral da República, apetece-me também citá-lo, pois é realmente uma peça de categoria. A certa altura, na conclusão S.º, salienta-se, respondendo a uma preocupação que perpassou em todo o parecer, que «não são consideradas discriminatórias as medidas que visem proteger a maternidade, enquanto valor social, sendo garantidos às mães direitos especiais, relacionados com o respectivo ciclo biológico». Aliás, o parecer da Procuradoria- Geral da República faz ainda outras citações.
Sr. Deputada Odeie Santos, com a preocupação da protecção às mães solteiras, que é o que inspira os dois projectos do PCP, W. Ex." alinham medidas de protecção à maternidade, acentuam essa diferença, valorizam a maternidade. O PRD. ao legislar para famílias não mono- parentais, faz uma coisa diferente e pretende igualar a paternidade e a maternidade no que respeita a medidas de protecção.
Sr. Deputada, o que é que, nessa matéria, V. Ex., tem a dizer sobre as alterações propostas à Lei n." 4/84? Porque V. Ex.1 falou de algumas alterações que considerava necessárias, mas não falou nessas. Portanto, Sr.1 Deputada, que diz às alterações que o PRD propõe?
Por outro lado, Sr.ª Deputada, pronunciando-se sobre o projecto do PRD e sobre as alterações quantitativas, o alargamento da licença por ocasião da maternidade-ou paternidade, como pretende o PRD -. V. Ex.1 citou várias situações que a todos impressionam e especialmente ao CDS, que é um partido que defende a maternidade e a paternidade, a família, e que, portanto, se preocupa com essas situações.
Mas, Sr.1 Deputada Odeie Santos e Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, o facto é que temos também uma preocupação realista. W. Ex.", por vezes, avançam uma preocupação distribuidora sem olharem à produção prévia. Sabemos que VV. Ex., em última análise, não são imunes a essa consideração da produção e da protecção da produção. Por isso é que, nas vossas organizações, tem de promover despedimentos, quando falam contra elas, por isso é que W. Ex." se vêem constrangidos a tomar medidas com as quais, porventura, não concordam.
No entanto, há um realismo que é preciso ter. E pergunto-lhe, Sr.1 Deputada, se realmente as considerações sem limites em favor da distribuição - e reconhecemos a justiça das situações que aqui foram trazidas à consideração do Parlamento - não devem, em certos casos e em nome da própria protecção, ser temperadas por alguma consideração de realismo, que tenha em conta a necessidade de pensar a própria produção.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.
A Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.1 Deputada Odeie Santos.
A Sr. Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, vamos por partes. Em primeiro lugar, devo recordar que um dos projectos que apresentámos diz também respeito aos pais e não só às mães. Não sei o número, mas é o que estabelece o subsídio em relação às famílias mono parentais. Portanto, - recordo-lhe - refere-se aos dois casos.
Em relação a essa conclusão S., que V. Ex. referiu, devo dizer que a minha camarada Paula Coelho fez uma intervenção e essa, sim, foi sobre as medidas propostas pelo PRD. Não ficou a meu cargo a intervenção, mas, no entanto, lenho uma opinião sobre a matéria, como é óbvio.
Efectivamente, entendo que as mães devem ter a protecção necessária baseada no ciclo biológico, tal como consta do projecto. Entendo que, para além disso, deve haver, de facto, igualdade nas medidas para mães e pais.
Aliás, devo dizer que tenho uma experiência pessoalíssima - e não era para falar nisso - de ter estado, desde sempre, em termos de aprendizagem da vida, mais ligada ao meu pai do que à minha mãe, porque sou filha única e o paizinho gosta sempre da menina. O povo até diz que as meninas pertencem aos pais e os meninos às mães» - não sei se já lhe apareceu alguém a dizer isto. Mas isto é uma experiência pessoalíssima, repilo, e por isso entendemos que a protecção à mãe deve estar balizada pelo ciclo biológico.
É claro que não tenho conhecimentos, não sou psicóloga - e às vezes até desconfio um pouco dos psicólogos, porque penso que estão a fazer depender exageradamente as crianças das mães e, com isso, estão, de certa maneira, a limitar-lhes a progressão profissional -, também não sou médica nem sou psiquiatra para lhe poder dizer se, de facto, deve ser um ano, até pode ser que seja, ou se deve ser menos, mas pareceu-nos justo esse valor. Aliás, quando apresentámos o nosso projecto de lei de protecção da maternidade, que veio dar origem ao grande debate que a Assembleia travou, consultámos médicos, psicólogos e, em função dessa consulta, apresentámos, na nossa proposta, os 120 dias, porque a consulta deu como resposta esse número.
Quanto ao resto, julgo que o Sr. Deputado saiu bastante da matéria. As outras considerações que fez sobro a produção, etc., saíram bastante da matéria. Mas de uma coisa pode o Sr. Deputado estar certo: é que o nosso lema é que, com uma política a favor do progresso do País, há maneiras de organizar empresas, serviços, de inventar rentabilidade em recursos do nosso país entregues a estrangeiros, que evitariam o desemprego.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ferreira de Campos.
O Sr. José Ferreira de Campos (PSD): - Sr.1 Presidente, Srs. Deputados: Não usei nem vou usar da palavra para pedir esclarecimentos, na medida em que a Sr.1 Deputada Odete Santos já demonstrou que era inútil pedir esclarecimentos.
De facto, perante a minha afirmação de que unha lido o parecer da 3." Comissão e o parecer da Procuradoria- Geral da República, a Sr.1 Deputada, sem saber o que eu iria dizer, declarou que eu não aprendi nada.
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Por outro lado, já declarou peremptoriamente, antes de ouvir a intervenção do PSD, que o que há a demonstrar aqui ó que o PSD não tem razão.
Nesta medida, prescindo de formular alguns pedidos de esclarecimento, no âmbito dos quais poderia, por hipótese, indagar sobre a inutilidade ou utilidade do artigo 10." e colocar questões sobre a compatibilização do artigo 7.º com o artigo l.e, na medida em que, se este prevê genericamente o direito de petição sem limites, já o artigo 7.º não permite, em determinadas condições, que essa acção seja proposta depois de decorridos dois anos para além do pano. Cito apenas dois exemplos, mas outros poderia referir.
Irei, pois, fazer uma intervenção muito simples.
Dispõe o n.9 l do artigo 1884.6 do Código Civil que o pai não unido pelo matrimónio à mãe do filho é obrigado, desde a data do estabelecimento da paternidade, a prestar--lhe alimentos relativos ao período da gravidez e ao primeiro ano de vida do filho, sem prejuízo das indemnizações a que por lei ela tenha direito».
O projecto de lei n.9 265/V, apresentado pelo PCP, alegando serem ainda poucas as acções propostas em tribunal para efectivação deste direito, sugere um conjunto de medidas por si entendidas como adequadas a torná-lo mais eficaz. Aponta como causas essenciais deste estado de coisas o desconhecimento dos interessados quanto aos seus direitos e a sua falta de meios económicos.
Admite-se, obviamente, que o desconhecimento da lei e a falta de meios possam conduzir à inacção dos cidadãos quanto à salvaguarda e defesa dos seus direitos. O ordenamento jurídico português é sensível a tais situações e daí os aperfeiçoamentos que se vêm processando a nível do apoio judiciário nas suas vertentes de informação jurídica e patrocínio gratuitos, enquadradas no acesso ao direito e aos tribunais. E é óbvio que têm sido feitos progressos nessa matéria.
Temos, todavia, dúvidas sobre se pelo menos algumas das medidas propostas pelos autores do projecto de lei n.9 26S/V, da iniciativa do PCP, serão as mais adequadas para atingir aqueles propósitos e ainda se elas constituirão um articulado claro e coerente com os diplomas com que se inter- relacionam, nomeadamente a lei e o decreto-lei respeitantes ao apoio judiciário, que há pouco referi, a Organização Tutelar de Menores, o Código de Registo Civil, a Lei Orgânica dos Tribunais de Justiça e até o próprio Código Civil.
A única solução que nos mereceria alguma ponderação é talvez a eventual consagração da possibilidade de o Ministério Público patrocinar judicialmente a mãe do menor - mesmo que juridicamente capaz, por ter já atingido a maioridade - na propositada da referida acção de alimentos, em termos análogos aos que permitem, por exemplo, a representação dos lesados na acção cível enxertada no processo penal, sem embargo de pensarmos que, nessa parte, o articulado é confuso e repetitivo e que um simples aditamento ao artigo 1884.9 do Código Civil em que se consagrasse a competência do Ministério Público para patrocinar a mãe do menor a solicitação desta, sem prejuízo da faculdade de constituição de mandatário judicial próprio, resolveria o interesse em questão.
Mereceriam já a nossa total oposição as soluções que representariam uma mais do que aparente sobreposição ou duplicação entre a averiguação oficiosa da paternidade prevista e regulada na Organização Tutelar de Menores e uma estranha averiguação oficiosa da viabilidade da acção de alimentos a correr termos na conservatória do registo civil e que leriam também como pressuposto fundamental
a própria averiguação oficiosa da viabilidade da acção. De facto, saber se a acção de alimentos é viável implica necessariamente um juízo sobre a existência da viabilidade da paternidade. Ora, afigura-se-nos que a complexidade e delicadeza da instrução de um processo com tal objectivo é objectivamente incompatível com a específica e normal tramitação do processo do registo civil.
Perguntar-se-á: o dever de informação da conservatória do registo civil em matéria que nada tem a ver com a efectivação de actos do registo civil não deveria, então, entender-se, generalizar-se e ser genericamente formulado no Código de Registo Civil, de modo a abranger situações merecedoras de tratamento análogo?
O artigo 1884.9 do Código Civil atribui à mãe a faculdade de pedir alimentos provisórios. O projecto de lei n.9 265/V. no seu artigo 6.9, impõe ao Ministério Público a obrigação de deduzir tal pedido. Pergunta-se: porquê tal dualidade de critérios e ponderação de oportunidades? Será o Ministério Público mais zeloso na defesa dos interesses do menor do que a própria mãe deste?
Em suma, o projecto de lei n.9 265/V apresenta-se-nos eivado de contornos confusos e repetitivos de soluções que se nos afiguram pouco consistentes, em particular no que se refere à sobreposição ou duplicação entre a averiguação oficiosa da paternidade prevista na Organização Tutelar de Menores e uma estranha averiguação oficiosa da viabilidade da acção de alimentos por parte da conservatória do registo civil, que pressupõe, por seu turno, a averiguação da viabilidade da própria paternidade, para a qual esta conservatória não está minimamente vocacionada nem apetrechada.
Por isso, Sr.1 Presidente, Srs. Deputados, o PSD veria com interesse que o projecto de lei em apreço baixasse à comissão respectiva sem votação.
Aplausos do PSD.
A Sr.1 Presidente: - Para pedir esclarecimentos, utilizando tempo cedido pelo PS, tem a palavra a Sr." Deputada Odeie Santos.
A Sr. Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado José Ferreira de Campos, devo dizer-lhe que, em relação à questão da imposição ao Ministério Público, se esqueceu de coordenar artigos e referir o preceito inicial que diz que é necessário a mãe solicitar a intervenção do Ministério Público. Só depois dessa solicitação é que se colocará, então, a questão dos alimentos provisórios.
Sobre a questão da averiguação oficiosa, eu disse que não iria ler o que linha escrito em matéria de especialidade, dado que conhecia a vossa posição, mas - tenham paciência - não podem passar pela glória de sair daqui sem terem tido o sacrifício de votar contra. Hão- de votar contra e há-de saber-se lá fora que votaram contra direitos de mães solteiras. Apesar de tudo, há-de saber-se isso, porque as mulheres, sejam elas de que partido forem, tem vozes militantes no que loca aos seus direitos.
Disse que não referiria as questões de especialidade, mas anotei a crítica da Procuradoria - Geral da República, que pensa, a respeito dessa matéria, que deveria haver uma averiguação na conservatória do registo civil no senado de recolher provas da viabilidade da acção de alimentos. Ia apresentar uma alteração nesse sentido, mas não em relação às questões da paternidade, que não quis referir, por ter achado escusado. V. Ex., porém, veio aqui abordar essas questões, que são pequenas questões, de fácil resolução.
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Perguntar-lhe-ia, então, o seguinte: a conservatória do registo civil serve para ouvir testemunhas em relação ao afastamento da presunção de paternidade, mas já não serve para ouvir testemunhas quanto à viabilidade da acção de alimentos?
A Sr.ª Presidente: - Para responder, também utilizando tempo cedido pelo PS, tem a palavra o Sr. Deputado José Ferreira de Campos.
O Sr. José Ferreira de Campos (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, o que eu disse foi que a conservatória do registo civil não está vocacionada nem apetrechada para esse tipo de indagação. Não me parece, efectivamente, que o esteja.
Posso acrescentar que não foi apenas esse facto que foi objecto da minha intervenção. Em resposta à Sr.1 Deputada, pergunto-lhe se não pensa que há aqui, por exemplo, uma sobreposição de indagações da conservatória e do Ministério Público. Sabendo-se que aquela é obrigada a enviar a este o duplicado do registo do nascimento, haveria, obviamente, uma sobreposição entre essa indagação da conservatória e a do Ministério Público. Sobre isso a Sr.ª Deputada nada disse.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Disse, disse!
A Sr.ª Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que lamento que o Sr. Deputado Nogueira de Brito não tenha intervindo sobre esta matéria, pois, à laia de pedido de esclarecimento, poderia dar-lhe alguns esclarecimentos.
De qualquer modo, relativamente a esta matéria, ficou aqui a ideia de que o projecto de lei do PRD criava condições de perfeita igualdade entre pai e mãe no que diz respeito à partilha de responsabilidades nos primeiros meses de vida do filho. No entanto, tal não acontece, sendo nesse sentido que faço esta intervenção, isto é, para demonstrar que não é assim.
Por um lado, existem, na Lei n.º 4/84, de S de Abril, preceitos que não foram alterados e que consagram períodos de dispensa para a mãe, não os consagrando para o pai.
Por outro lado, no que diz respeito à alteração que agora sobrevêm, ela só pode ser permitida na última parte dos primeiros 90 dias de licença de pano, bem como nos últimos dois meses - portanto, já dentro do período complementar. Ora, isto impede que, por exemplo, o pai possa gozar licença de parto nos dias imediatamente seguintes ã sua realização.
A ideia que temos em relação a esta matéria - e V. Ex. também fez referencia ao ciclo biológico-é a de que, de facto, existe um período que pode variar. Penso até que é discutível determinar esse período, pois depende especialmente das mães e da sua recuperação física. Contudo, o que é facto é que existe um período que é necessário a essa recuperação, o qual, como é óbvio, tem de ser gozado pela mãe, não podendo de modo algum, em qualquer circunstância, ser usufruído pelo pai.
A partir de determinado momento, consideramos que a licença de maternidade não deve ser analisada, como o fazia a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio, isto é, não é tanto uma necessidade física da mãe, mas, especialmente, um
direito da criança de ser acompanhada nos primeiros meses de vida. Nessa perspectiva, consideramos que esse direito pode ser usufruído pela criança quer através do pai, quer através da mãe, embora salvaguardando as questões a que fez referência e que tom a ver com o ciclo biológico e com a necessária recuperação física. É evidente que isto tem um objectivo: flexibilizar.
Devo dizer que aquilo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito apontou como aberração, neste momento, existe já na maioria dos países da Europa comunitária. Portanto, a tendência é a de caminhar nesse sentido, o que tem um motivo.
Na realidade, devo dizer-lhe que, na Europa Comunitária, os pais nem sempre aproveitam este direito que tom, sendo que, portanto, continua a manter-se uma estatística que aponta, tendencialmente, para serem as mulheres a ficar em casa durante todo o período. Porém, começa a haver algumas situações em que se vê que, tanto para a família como para a criança e mesmo para a própria mãe, é mais vantajoso que seja o pai a gozar parte do período.
Ora, é para criar essa flexibilidade, que pode ser adaptada a vários tipos de família e de circunstâncias, que o PRD apresentou este projecto, embora não seja, obviamente, obrigatória. De facto, esta alteração da partilha de responsabilidades tem de ser concatenada com outra alteração: o alongamento do período. E será de acordo com o alongamento do período de gozo da licença por parto que o pai poderá operar a partilha das responsabilidades.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, devo dizer-lhe que isto tem a ver com uma tendência verificada na CEE - penso que a Sr.ª Deputada Odete Santos referiu isso há pouco, ainda que noutro âmbito-, no sentido de que quanto mais aumenta o período de licença de maternidade, mais dispositivos de limitação à entrada no mercado de trabalho existem para as mulheres. Com efeito, considera-se que o longo período em casa por parte da mãe, pode, de facto, prejudicá-la no mercado de trabalho. Por conseguinte, através da geração do sistema que permita que seja também o pai a ficar em casa, serão então os pais e as mães a ficar prejudicados no mercado de trabalho.
A perspectiva é, de facto, essa, correspondendo - não é uma situação estranha - a recomendações da CEE nesse sentido.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, era este esclarecimento que lhe pretendia dar, de modo a que fique a saber que se Portugal caminhar nesse sentido, não estará a fazê-lo à revelia do que se está a passar na Europa.
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Deputada Isabel Espada, é evidente que as questões que lhe coloquei tem razão de ser. Aliás, V. Ex. acaba de confessar que o PRD vem aqui propor medidas sem sentido prático, sem qualquer alcance útil; são medidas tomadas por uma necessidade mimética de imitação do que se fez na Europa, mas que se não pratica. Além disso, Sr.ª Deputada, tais medidas nunca seriam praticadas na sociedade portuguesa.
Por outro lado, as investigações científicas recentes no domínio da medicina levam, cada vez mais, a acentuar, nos primeiros tempos de vida e nos anteriores ao nascimento - e dá-se já hoje como certa a existência de um verdadeiro diálogo entre o feto e a mãe-, o papel da mãe, que tem sido realçado pelos resultados de todas as investigações que se têm feito.
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Com certeza que o papel do pai é fundamental -a Sr.ª Deputada Odete Santos trouxe-nos o seu exemplo pessoal, que é válido e correcto. Porém, e um papel que, fundamentalmente, se exerce num período mais avançado da vida- não um período consciente, apenas no período da linguagem ou quando a criança pode falar com o pai, mas num período mais avançado da vida.
Sr.ª Deputada, o que acontece com o projecto de W. Ex." e o do PCP, é que eles avançam modelos e concepções de família que, porventura e em última análise, são em si mesmos destruidores da própria ideia de família. Serão eventualmente projectos carregados de boas intenções, mas de boas intenções está o inferno cheio...
Na realidade, o que cies iriam provocar seria a destruição do verdadeiro modelo de família, o qual tem como fonte uma relação estável, isto é, o casamento, e que, portanto, para além de uma protecção das famílias mo-noparentais, que se considero indispensável e necessária, não deixo de acentuar que o que pretendemos é uma família dotada de estabilidade e em que se reconheça a diferença e o papel específico da mãe. É que quando abandonarmos esses modelos, pela acentuação exagerada e inútil de aspectos normativos, que acabam por não ter consequências práticas, estaremos a «esfaquear» um modelo que, esse sim, tem consequências práticas e é indispensável para a existência da família, para a educação e felicidade dos filhos.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Espada.
A Sr. Isabel Espada (PRD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, devo dizer-lhe que o Sr. Deputado enunciou aqui um sistema social que não corresponde à nossa era, aos anos 90. Sr. Deputado, de acordo com os números comunitários, 62 % das mulheres portuguesas, com filhos com menos de 10 anos, trabalham. Ora, o modelo de família que V. Ex. enunciou aqui corresponde a um modelo nuclear tradicional -com pai, mãe e filhos-, em que a protagonização da educação e do acompanhamento dos filhos era levado a cabo pela mãe, numa sociedade em que não existiam estes números da actividade feminina no mundo do trabalho.
Por conseguinte, temos de tomar em consideração o facto de serem 62 % as mulheres portuguesas que, com filhos menores de 10 anos, trabalham, as quais precisam de evoluir nas suas carreiras e ter as mesmas condições de acesso ao mercado de trabalho. Portanto, há que adaptar a legislação à situação que, no que concerne às mulheres, se vive em lermos de mercado de trabalho, nomeadamente em Portugal.
O Sr. Deputado não pode estar a defender um sistema de uma sociedade que existiu, adaptando-o a uma sociedade que, neste momento, é já outra e que oferece outras exigências.
Por outro lado, nos países em que este sistema vigora, designadamente na Dinamarca, existe uma taxa de actividade muito menor por parte do sector feminino. E isso pode explicar a fraca adesão, por parte do sector masculino, a um sistema em que haja paridade no gozo da licença por maternidade. Penso mesmo que a adaptação a Portugal de um sistema deste tipo teria resultados bastante mais significativos do que os obtidos em países em que a taxa de actividade feminina é muito inferior à que nós lemos.
Portanto, não se trata de uma questão mimética. Aliás, se houvesse intenções nesse sentido, seria neste aspecto
concreto e penso que teria sido muito bem imitado, se o PSD tivesse dado luz verde para isso.
A Sr.ª Presidente: - Para uma curta intervenção, em tempo cedido pelo PRD, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Deputada Isabel Espada, V. Ex.º faz apelo a uma situação que existe, do mesmo modo que eu; simplesmente, ela não me agrada porque é uma situação em que campeiam diariamente agressões à família, em que a droga alastra, em que os filhos estão isolados e saem de casa, sem qualquer protecção - e isto não se passa só com famílias mono parentais-, em que os filhos, condenados a um autêntico ostracismo social, se multiplicam todos os dias ...
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Isso resulta das condições da sociedade, não é um problema da família!
O Orador: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, isso resulta efectivamente das condições da sociedade! Das condições que forçam, muitas vezes, a mulher a ter de trabalhar, contra a sua vontade, para completar o salário familiar, não para obter uma condição de igualdade com o homem, mas acicatada por necessidades económicas! E não é isso que tentamos resolver, tentamos ser nessa onda» e não pensamos que há que combatê-la pelas suas consequências.
Ora, é em nome da situação que existe que entendo que muitas das soluções que aqui hoje foram propostas não devem ser aprovadas. É que uma coisa é certa: embora a família conheça hoje vários modelos - e, nessa matéria, na nossa Lei de Bases da Família, não hesitamos, por exemplo, em conceder igualmente protecção às famílias mono parentais, porque entendemos que há patamares de protecção que devem ser concedidos-, aderimos ao modelo de família que referi, porque embora a família, como instituição, sobreviva com variadíssimos modelos, a única coisa que garante verdadeiramente a sua sobrevivência é o modelo. Efectivamente, é o modelo que lhe proporciona estabilidade-disso não temos dúvidas, Sr. Deputado.
A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, estou de acordo consigo no seguinte: todos nós devemos muito mais às mães do que aos pais, porque o pui é um acidente no aparecimento da criança, embora se trate de um acidente com grandes consequências genéticas.
Mas o que me surpreendeu foi a actualização científica que o Sr. Deputado aqui evidenciou, ao falar no diálogo mãe e filho, já durante a concepção. Gostava de saber se esse diálogo é apenas químico, hormonal ou em morse. É que não me consta que haja alguma cassette com esses diálogos gravados; e, se há, gostava de as conhecer.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogucna de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -Sr. Deputado Ferraz de Abreu, nós lemos muito boas relações mas temos
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grandes discordâncias em muitos aspectos fundamentais e
este é um deles. Contudo, o diálogo 6 sempre salutar.
Em primeiro lugar, discordo que o pai seja acidental...
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Não disse que ele era acidental mas, sim, um acidente.
O Orador: - Não julgo que seja um acidente. O pai 6 essencial, assim como a relação pai/filho (ou filha). Aliás, não critico esse aspecto no projecto de lei do PRD, o que penso é que, neste período da vida do filho, o papel da mãe é fundamental. E com esta ou aquela solução - destituída, por vezes, de utilidade e repercussões práticas, como referi há pouco-, podemos estar a querer salientar falsamente (e falsamente no sentido de que não tem adesão à realidade) o contrário.
O nosso segundo ponto de discordância é o seguinte: Sr. Deputado Ferraz de Abreu a sua especialidade, como médico, era a cirurgia. Como todos sabemos, V. Ex.1 era um ilustre médico cirurgião. Mas remeto-o para um seu colega, o Dr. Carlos Gomes Pedro, que é professor da Faculdade de Medicina de Lisboa e pediatra, que tem feito investigações - inclusivamente, constituíram o fundamento da sua tese de doutoramento-, nas quais alude a esse diálogo, que não é em morse mas orgânico, entre o feto e a mãe.
E esse seu colega médico e professor, Sr. Deputado, não linha a mesma posição que nós relativamente a essa matéria da vida, à interrupção da gravidez e ao aborto. Mas, apesar de não ter essa posição, ele trata esse argumento, que, há meses, foi objecto central de um colóquio que trouxe a Lisboa professores e médicos de todo o mundo, que comungavam da mesma opinião, ou seja, há, de facto, um diálogo genético, orgânico, entre o feto e a mãe, que. depois, se prolonga, após o nascimento, e que é fundamental. Mesmo antes de haver linguagem, ou fala, esse diálogo existe e é fundamental. Sr. Deputado Ferraz de Abreu, se V. Ex.1 consultar os trabalhos desse seu ilustre colega, vai com certeza concordar comigo.
A Sr.ª Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, tinha-lhe pedido um esclarecimento acerca do tipo de diálogo que o Sr. Deputado mencionou. É que quando se fala de diálogo, parece que existe uma conversa entre a mãe e o filho. E perguntei-lhe se, para além do diálogo químico e hormonal que existe entre a mãe e o filho, havia qualquer outro tipo de diálogo, se havia alguma cassette gravada.
De facto, a mãe tem a noção da existência do filho, através dos movimentos -c, por isso, jocosamente, fiz alusão ao morse mas não há propriamente um diálogo de fala, porque isso seria conceder à criança um grau de desenvolvimento mental que lhe permitisse falar, o que, como sabe, é algo que só surge tardiamente. Portanto, o que há, sim - e isso está certo -, é um diálogo orgânico. E o tal diálogo hormonal e químico que se estabelece, entre mãe e filho, através de vários intermediários químicos.
Por outro lado não estou de acordo quando diz que estamos em desacordo. Estou de acordo consigo quando diz que devemos muito às mães. Elas são extraordinariamente importantes, sobretudo nesse período!
A Sr.- Presidente: - Srs. Deputados, terminámos, por hoje, os nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, às 10 horas e às 15 horas, com período de antes da ordem do dia e tendo como ordem do dia o inquérito parlamentar n." 23/V e a apreciação das propostas de resolução n.» 38/V, 47/V e SOA', e das propostas de lei n- 197/V e 201/V. Entre as 16 horas e 30 minutos e as 19 horas e 30 minutos, lerá lugar, na Sala D. Maria, a eleição do presidente do Conselho Nacional de Educação e, às 20 horas, haverá várias votações.
Está, pois, encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 55 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Maria Pereira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando José Alves Figueiredo.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
João Costa da Silva.
Joaquim Vilela de Araújo.
Manuel Ferreira Martins.
Maria Leonor Beleza M. Tavares.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
António Fernandes Silva Braga.
Edmundo Pedro.
Jorge Paulo Sacadura Coelho.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alfredo Brito.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Odete Santos.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
Deputados independentes:
José Manuel Santos Magalhães.
Manuel Gonçalves Valente Fernandes.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Cosia de A. Sousa Lara.
António José Caciro da Mota Veiga.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Monteiro do Amaral.
José Júlio Vieira Mesquita.
Licínio Moreira da Silva.
Manuel José Dias Soares Costa.
Pedro Manuel Cruz Roscia.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
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Partido Socialista (PS):
António José Sanches Esteves.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Jaime José Matos da Gama.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Leonor Cominho dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria lida Costa Figueiredo.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Deputada independente:
Maria Helena Salema Roseta.
As REDACTORAS: Ana Maria Marques da Cruz - Isabel Barral - Maria Amélia Martins.
Depósito legal n. º 8818/85
NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.
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