O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 3433

I Série - Número 101

Quinta-feira, 12 de Setembro de 1991

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)

COMISSÃO PERMANENTE

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE SETEMBRO DE 1991

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Daniel Abílio Ferreira Bastos

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - A Câmara autorizou cinco Srs. Deputados a depor como testemunhas em tribunal e denegou autorização a um outro.
Foi aprovado um voto de saudação e evocação de Antera de Quental, no centenário da sua morte.
O recurso, apresentado pelo Sr. Deputado António Guterres (PS), sobre o não agendamento para a reunião da Comissão Permanente do debate relativo às circunstâncias que rodearam a visita do Sr Primeiro-Ministro a Angola foi rejeitado, lendo ainda intervindo os Srs. Deputados Mário Montalvão Machado (PSD) e João Amaral (PCP).
O Sr. Deputado António Guterres (PS) voltou a referiu-se à visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola, posteriormente produzindo intervenções sobre a mesma questão os Srs. Deputados Herminio Maninho (PRD) - que deu explicações ao Sr. Deputado António Guterres (PS) -, Adriano Moreira (CDS) e José Pacheco Pereira (PSD) - que deu também explicações ao Sr. Deputado António Guterres (PS) e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado João Amaral (PCP).
O Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) criticou a política económica e social do Governo.
O Sr Deputado André Martins (Os Verdes) realçou o regresso do seu partido aos trabalhos parlamentares e condenou os critérios da RTP quanto aos debates televisivos.

Ordem do dia. - O projecto de deliberação n.º 152/V(PS) - Apreciação do caso do pagamento de uma indemnização de 2 milhões de contos pela BRISA e elaboração de relatório pela Comissão de Equipamento Social foi aprovado. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Armando Vara (PS), Mário Montalvão Machado (PSD) e João Rui de Almeida (PS).
Foi aprovado o projecto de deliberação n.º 153/V (PCP) - Encarrega a Comissão de Equipamento Social para, em reunião a convocar com urgência, proceder à análise da situação e debater as possíveis soluções para o conflito com o Sr. Ministro das Obras Publicas, Transportes e Comunicações, cuja presença deve ser solicitada por aquela Comissão, tendo produzido intervenções os Srs. Deputados João Amaral (PCP), José Lello (PS) e Rui Gomes da Silva (PSD).
Foi igualmente aprovado o projecto de deliberação n.º 154/V (PCP), no sentido de encarregar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de analisar a situação relativa ao conflito laborai que abrange os trabalhadores dos Serviços de Identificação Civil e Criminal e do Registo Nacional de Pessoas Colectivas A diverso título, intervieram os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Laurentino Dias (PS) e José Silva Marques (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 17 horas e 5 minutos.

Página 3434

3434 I SÉRIE - NÚMERO 101

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Vítor Pereira Crespo, Presidente (PSD).

Maria Manuela Aguiar Dias Moreira, Vice-Presidente (PSD).
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu, Vice-Presidente (PS).
José Manuel Maia Nunes de Almeida, Vice-Presidente (PCP).
Hermínio Paiva Fernandes Martinho, Vice-Presidente (PRD).
Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD).
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira (PSD).
António Paulo Pereira Coelho (PSD).
Luís Manuel da Costa Geraldes (PSD).
Domingos Duarte Lima (PSD).
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira (PSD).
Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD).
João Domingos F. de Abreu Salgado (PSD).
José Álvaro M. Pacheco Pereira (PSD).
José Augusto S. da Silva Marques (PSD).
Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD).
Mário Júlio Montalvão Machado (PSD).
Jorge Paulo Roque Cunha (PSD).
Rui Carlos Alvarez Carp (PSD).
António Manuel de Oliveira Guterres (PS).
Armando António Martins Vara (PS).
João Rui Gaspar de Almeida (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
José Manuel Lello R. de Almeida (PS).
Laurentino Castro Dias (PS).
Octávio Augusto Teixeira (PCP).
João António Gonçalves do Amaral (PCP).
Rui José Santos Silva (PRD).
Adriano José Alves Moreira (CDS).
André Valente Martins (PEV).

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar os trabalhos com a leitura e votação de uma série de pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos. Passaremos depois à leitura e votação de um voto de saudação pela passagem do centésimo aniversário da morte de Antera de Quental e continuaremos com o que ficou combinado na conferência dos representantes dos grupos parlamentares hoje realizada.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de alguns pareceres da Comissão de Regimentos e Mandatos.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Srs. Deputados, há um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Esposende, 2.º Secção, relativo ao Sr. Deputado António Fernandes Ribeiro, no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações, como testemunha, no processo n.º 85/91-CP, que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário: - Srs. Deputados, há outro parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo de Paiva, relativo ao Sr. Deputado Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos, no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor, como testemunha, no processo n.º 233/91, que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário: - Srs. Deputados, há também um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, 2.º Juízo, 1.º Secção, relativo ao Sr. Deputado Joaquim António Rebocho Teixeira, no sentido de autorizar o Sr. Deputado a depor como declarante no processo n.º 241/91, que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário: - Outro parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo de Paiva, relativo ao Sr. Deputado Luís da Silva Carvalho, é no sentido de autorizar este Sr. Deputado a depor como testemunha no processo n.º 233/91, que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário: - Há ainda um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação da Procuradoria da República, Tribunal Judicial de Almada, relativo ao Sr. Deputado Eduardo Ribeiro Pereira, que é no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações, como testemunha, no processo n.º 1200/91 - MF - 2.º M. P., que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Página 3435

12 DE SETEMBRO DE 1991 3435

Srs. Deputados, o Sr. Secretário Reinaldo Gomes, vai proceder à leitura de um outro parecer da Comissão de Regimentos e Mandatos.

O Sr. Secretário: - Srs. Deputados, o parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, a solicitação do Tribunal de Polícia de Lisboa, 1.º Juízo, 3.1 Secção, relativo ao Sr. Deputado João Álvaro Poças Santos, é no sentido de não autorizar a suspensão do mandato do Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à leitura do voto de saudação e evocação de Antero de Quental, no centenário da sua morte, subscrito pelo PS.

Foi lido. É o seguinte:

Voto n.º 225/V, de saudação evocação

Antera de Quental morreu em 11 de Setembro de 1891, faz hoje 100 anos.
Antera de Quental permanece um grande vulto da literatura e da cultura portuguesas. Uma expressão inconformista e sempre atenta na defesa dos valores da liberdade e do humanismo.
Como ele próprio dizia, «faço veementes votos pelo aniquilamento de todas as tiranias e pela confusão final de todos os tiranos».
Não poderiam ter maior actualidade as palavras de Antero de Quental, cultor «das grandes, das belas, das boas cousas».
«Mas a condição da grandeza, da beleza, da bondade [...] é a elevação moral, a virtude da altivez interior, a independência da alma e a dignidade do pensamento e do carácter.»
Neste tempo, nosso, Antera de Quental 6 ainda um símbolo vivo da elevação moral, da persistência de um sonho de todos os tempos e gerações pela construção de um mundo melhor.
A Comissão Permanente da Assembleia da República saúda a memória de Antero de Quental por ocasião do centenário da sua morte, delibera recomendar à Subcomissão de Cultura a organização de uma iniciativa de âmbito parlamentar, especialmente evocativa da sua Figura e obra, e recomenda ao Presidente da Assembleia da República, em homenagem ao grande vulto das Conferências do Casino, a atribuição do nome de Antero de Quental a uma das salas da Assembleia da República.
Srs. Deputados, antes de passarmos à respectiva votação, informo que, depois de uma troca de impressões com o Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, a última parte do voto agora lido será alvo de apreciação a nível da conferência de representantes dos grupos parlamentares, sem embargo da votação do voto tal como ele é apresentado, dado que temos de ponderar sobre a matéria.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Posso interpelar a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o PSD propõe que uma das suas salas, a mais nobre, venha, eventualmente, a ter o nome desse grande ilustre português.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não quis dizer que havia qualquer dúvida da minha parte, ou de quem quer que seja, quanto à atribuição do nome de Antera de Quental a uma das salas da Assembleia da República. Quis apenas dizer que a questão tem de ser ponderada, até porque, felizmente, vão haver outras salas aqui na Casa e, portanto, vamos encontrar para o assunto uma forma positiva. Foi por isso que disse que podíamos votar o voto tal como está redigido, sob reserva de uma conversa posterior para a sua concretização.
Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, há na Mesa um recurso que já foi distribuído. Para apresentá-lo, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António G u ter rés (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este recurso tem a ver com as decisões que foram tomadas hoje de manhã na conferência dos representantes dos grupos parlamentares sobre o agendamento ou não das circunstâncias que rodearam a visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola para a sessão de hoje da Comissão Permanente.
Não está, portanto, em causa, nesta minha intervenção, qualquer apreciação favorável ou contrária à oportunidade ou ao eleitoralismo desta visita, nem sequer qualquer observação-essa ficará para o seu tempo - sobre o comportamento concreto do Sr. Primeiro-Ministro.
O que está em causa, para nós, foi o que se passou, hoje de manhã, na conferência dos representantes dos grupos parlamentares.
Há um aspecto em relação ao qual este recurso é manifestamente ineficaz: o Sr. Primeiro-Ministro não estará presente no debate, qualquer que seja a forma que o debate venha a revestir. Em relação a isso quero apenas protestar pelo facto de um Primeiro-Ministro que se dispõe a participar num comício partidário no estrangeiro não se disponha a vir à Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, fundamentalmente, destina-se o recurso a combater uma decisão prepotente da maioria do PSD na conferência dos representantes dos grupos parlamentares, que recusou a possibilidade de se agendar para esta reunião da Comissão Permanente um debate sobre aquilo que ocorreu na visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola.
Gostava de dizer que esta decisão é insólita, vai contra precedentes vários da vida do Plenário da Assembleia da República e da sua Comissão Permanente e não colhe a desculpa dada pelo PSD de que o PS poderá sempre levantar a questão no período de antes da ordem do dia. Também era melhor que não pudesse!... Ainda não há censura para essas intervenções.

Página 3436

3436 I SÉRIE - NÚMERO 101

O que está em causa é que ao confinar a apresentação deste tema ao período de antes da ordem do dia limitamos a capacidade de o próprio Partido Socialista vir a tratar, nesse período, de outros lemas e, sobretudo, limitamos a capacidade de outros partidos políticos consagrarem no período de antes da ordem do dia a resposta natural a este tema e as suas próprias iniciativas.
O que está em causa é, portanto, sempre uma tentativa de «amordaçar» a oposição em matérias de relevante interesse nacional e que, porventura, o Governo considere incómodas.
Por isso mesmo, queria sugerir que o PSD revisão a sua posição e que pudéssemos, tranquilamente, agendar para a nossa sessão de hoje um debate sereno sobre a problemática ligada com a visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola, com apenas cinco minutos para cada grupo parlamentar.
Desde já tranquilizaria a maioria: pela nossa parte há a intenção de que esse debate decorra com a dignidade e com a elevação necessárias não só para que este Parlamento saia prestigiado, mas também para que dele só possam advir vantagens para as relações entre Portugal e Angola, como, infelizmente, nem sempre aconteceu no passado recente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Montalvão Machado.

O Sr. Mário Montalvão Machado (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quero deixar um ligeiro apontamento, apenas sobre esta matéria do recurso e não sobre o fundo da questão.
Em conferencia dos representantes dos grupos parlamentares, o Partido Socialista propôs, pela voz autorizada do seu presidente, que a Comissão Permanente criasse um debate autónomo sobre a visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola e sobre aquilo que as oposições em Portugal tom estado a aproveitar dessa mesma visita.
O PSD opôs-se a esse debate autónomo visto que o PSD se opõe, sistematicamente, a tudo o que é inútil.

O Sr. José Lello (PS): - Inútil?!...

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Claro!...

O Orador: - Sr. Deputado, tenha a bondade de ouvir calmamente e verá que é inútil.
Nesta Comissão Permanente há um período de antes da ordem do dia de 45 minutos que os grupos parlamentares podem aproveitar como lhes aprouver. Consequentemente, nada se opõe a que o Partido Socialista, ou qualquer outro partido, preencha estes 45 minutos de debate com essa matéria.
Quero apenas chamar a atenção para o facto de que estarmos aqui a criar um conflito de natureza processual, que, necessariamente, se reflecte sobre o fundo do problema, só vem criar questões para a política interna portuguesa e servir, mais uma vez, para a apropriação ilícita e ilegítima de problemas estranhos à política portuguesa nesta campanha pré-eleitoral.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para se pronunciar, nos termos do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, efeito para o qual, como sabe, dispõe de três minutos.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pronunciando-me sobre esta questão, entendemos que bem poderia o PSD ter evitado, antes das eleições de 6 de Outubro, na última reunião da Comissão Permanente, este exercício público de prepotência em relação a uma proposta perfeitamente aceitável - que, aliás, o Partido Socialista agora justificou em termos muito claros - de ser feito aqui um debate sobre uma questão que deve preocupar o Parlamento e sobre a qual este deve opinar.
Creio que se trata do desenvolvimento das relações Estado a Estado entre Portugal e a República Popular de Angola, que é uma questão excessivamente importante e de tão alto interesse nacional que não devia, em nenhum caso, ser submetida à situação indecorosa que se tem verificado nestes últimos dias.
As relações de Portugal com a República Popular de Angola não podem nem devem ser instrumentalizadas por qualquer espécie de interesses, privados ou político-partidários. Em nenhuma circunstância isso é admissível, muito menos no quadro de uma campanha eleitoral em curso.
Esta é a posição que assumimos face às questões levantadas pela visita do Primeiro-Ministro à República Popular de Angola.
As relações Estado a Estado processam-se, naturalmente, através dos órgãos de soberania e, naturalmente, também através do Governo. Simplesmente, há um limite a impor: o Governo, mesmo alegando o que quiser em torno da oportunidade ou da imprescindibilidade de determinado acto, tem o dever político de o rodear, numa circunstância como esta, de todas as cautelas, por forma que esse acto não seja passível de uma segunda leitura, incluindo da intenção de aproveitamento político-partidário. Ora, o Governo não só não o fez como pode dizer-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que fez o possível para que a visita fosse também entendida no quadro da campanha eleitoral. E esta é uma questão que deveria ser objecto de debate.
Por outro lado, as reacções a toda a visita e à forma como cia decorreu, reacções que visem tirar efeitos eleitorais dos incidentes que rodearam a visita, merecem da nossa parte a mesma bitola de análise e o mesmo repúdio.
É tudo o que tenho para dizer sobre a questão, assinalando que, no entanto, o debate deve ser realizado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Guterres, embora tenha pedido a palavra, não tenho, regimentalmente, possibilidade de lha dar.
Vamos, então, passar à votação do recurso apresentado pelo PS.

Submetido â votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD e do CDS.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

Página 3437

12 DE SETEMBRO DE 1991 3437

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, o PSD não conseguirá calar a nossa voz a este respeito. Gostaria de balizar a minha intervenção em torno de três considerações gerais essenciais. Em primeiro lugar, o Grupo Parlamentar do PS considera extremamente importante o processo de paz em Angola e deseja que todos os portugueses que de alguma forma se relacionam com aquele país sempre contribuam positivamente para a consolidação desse processo de paz.
Em segundo lugar, o PS considera que as relações entre Portugal e Angola, bem como as relações entre Portugal e os restantes PALOP, são uma prioridade da nossa política externa.
Em terceiro lugar, o PS não se envolverá em nenhuma polémica partidária entre as forças políticas de Angola, não toma partido a favor de nenhuma delas e considera que 6 aos Angolanos e não aos Portugueses que compete escolher quem governará democraticamente Angola apôs as eleições.
O que está para nós em causa neste momento é um juízo sobre a oportunidade da visita do Sr. Primeiro-Ministro a Angola e é hoje claro para todos que esta visita se não justificou com objectivos que tivessem a ver com a consolidação do processo de paz ou com o desenvolvimento das relações entre Portugal e Angola, mas unicamente com a intenção de o PSD tirar efeito eleitoral interno das relações entre os dois Estados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E por isso mesmo foi preciso prepará-la sobre o joelho, precipitadamente, e ocorreu tudo o que ocorreu. Já isso seria grave e já isso sugeriria a nossa intervenção, mas há factos mais graves. O Sr. Primeiro-Ministro participou ou, se aceitarem a incorrecção linguística, deixou-se participar num comício de estrita natureza partidária durante a sua visita ao Estado de Angola. E 6 evidente que não nos pronunciaríamos se o tivesse feito como cidadão, nem nos pronunciaríamos se o tivesse feito como líder do PSD. Como cidadão e como líder do PSD o Primeiro-Ministro tem todo o direito de se pronunciar como entender sobre questões internas seja de onde for. Já o fez, aliás, em São Tomé, nunca por isso protestámos, constatámos que não foi muito acertada a sua escolha, mas isso é um problema do Primeiro-Ministro e do PSD, sobre isso não temos que nos pronunciar.
Só que em Angola o Primeiro-Ministro estava como Primeiro-Ministro de Portugal, representava todos os portugueses e, portanto, representava-nos também a nós, pelo que não tinha o direito de envolver Portugal numa questão político-partidária interna ao Estado de Angola. É necessário sabermos se o Primeiro-Ministro agiu nisto com premeditação ou por ingenuidade. Porque se agiu com premeditação e se isto serve um objectivo da política externa do Estado Português tal como o PSD a entende, estamos em frontal desacordo e o PSD tem de a explicar. Se foi com ingenuidade diria que Portugal mereceria ler um Primeiro-Ministro com a inteligência, o sangue-frio, a coragem, o bom-senso de evitar ou contornar uma situação como esta.

Aplausos do PS.

Estou à vontade para falar, porque tive ocasião de elogiar a actuação positiva do Governo aqui nesta Câmara aquando da mediação do processo de paz em Angola E é com esse mesmo à vontade que aqui digo que a visita do Primeiro-Ministro, tal como decorreu, não deu um contributo positivo nem à consolidação desse processo de paz nem ao correcto desenvolvimento das relações entre os Estados de Angola e de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num momento em que é evidente o frenesim eleiçoeiro de que os membros do Governo, todos os membros do Governo, estão imbuídos, importa trazer ao debate na Assembleia da República situações concretas da vida real geradas pela sua política.
São a própria vida quotidiana e o Banco de Portugal que desmentem categoricamente os discursos governamentais pintados de cor-de-rosa e que nos mostram o recrudescer dos despedimentos e dos conflitos laborais, o preocupante plano inclinado a que o Governo conduziu a economia portuguesa, a crise que se aprofunda em vários e importantes sectores de actividade.
As fortes desacelerações registadas na actividade económica são visíveis na agricultura e na construção civil como na indústria transformadora. A queda de cinco pontos percentuais na utilização da capacidade produtiva na indústria no 2.8 trimestre do ano e o facto de. pela primeira vez desde 1987, mais de 50% dos empresários apontarem como principal limitação à produção sa insuficiência da procura» dão bem a ideia da situação a que se chegou.
Aliás, foi esta evolução negativa da actividade económica que levou o Banco de Portugal a rever as suas projecções macroeconómicas para o ano em curso, apresentando agora uma previsão do crescimento do PIB de apenas 3%, valor idêntico ao que se verificou no ano de «vacas magras» de 1985!
Situação igualmente grave é aquela por que passa o investimento produtivo, com previsões de taxas de apenas 5% em média anual, a taxa mais baixa desde 1987 e, mesmo assim, provavelmente optimista face ao desastre registado no 1.º semestre.
Não menos gravidade e preocupação* apresenta a evolução das exportações, que na primeira metade do ano regista uma evolução negativa de 2% em termos nominais. Este facto reflecte a fragilidade da estrutura das nossas exportações, que o Governo apregoa ter alterado radicalmente, como mostra a situação de crise em que se encontram vários sectores de actividade da nossa economia.
Designadamente, em vez de o Ministro da Indústria se andar a passear eleitoralmente e ao serviço do PSD pela zona centro do País e de continuar a negar a mais que evidente crise do vale do Ave, a responsabilidade governativa deveria impor-lhe que se ocupasse da tomada de medidas urgentes para fazer face à crise que se aprofunda no sector têxtil. Do mesmo modo que ao Ministro da Agricultura se exigiria, se ele estivesse no Governo para governar o sector que tutela, que se ocupasse da forte crise que atinge a região do Douro e desse resposta adequada às justas reivindicações dos agricultores portugueses.

Vozes do PCP : - Muito bem!

O Orador: - Igualmente preocupante, Srs. Deputados, é o recrudescimento da instabilidade laborai e social a que conduziu a política do Governo. Só no distrito de Braga

Página 3438

3438 I SÉRIE - NÚMERO 101

mais de 1000 trabalhadores depararam com o encerramento das empresas quando regressaram do período de férias. Os despedimentos colectivos voltaram em Torça à ordem do dia. A empresa SEAGATE, no distrito de Setúbal, que há pouco tempo o Primeiro-Ministro elogiava como um caso de sucesso da política do seu Governo, anuncia agora o despedimento de 850 trabalhadores.
O mesmo se passa com centenas de trabalhadores da TABOPAN, da SOLISNOR e da AEP/CENTREL e de muitas outras empresas por esse País fora. Os salários em atraso reapareceram, como o comprovam, por exemplo, os SOO trabalhadores da Empresa Industrial de Carides, que, com dois meses de salários por receber, voem agora a empresa suspender a actividade por falta de encomendas.
As situações vividas pelos trabalhadores da CP ou dos Serviços de Identificação Civil e Criminal e do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, e que hoje mesmo trazemos ao debate da Comissão Permanente, são outros exemplos vivos que desmentem a estabilidade social apregoada pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro do Emprego, que, aliás, fecha os olhos à realidade, que se demite do exercício das funções que ainda lhe estão confiadas e que se ocupa exclusivamente em percorrer freneticamente o distrito de Bragança ao serviço da campanha eleitoral do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na previsivelmente última reunião da Comissão Permanente antes do acto eleitoral de 6 de Outubro, quisemos trazer à Assembleia da República alguns exemplos indesmentíveis da realidade que hoje se vive no nosso País.
Infelizmente para a economia nacional e para os trabalhadores portugueses esta realidade não é alterada pelos sofismas da propaganda eleiçoeira do Governo e do PSD. Essa realidade não desaparece pelo facto de a RTP, ao serviço da campanha eleitoral do PSD, a escamotear nos seus serviços (des)informativos. Mas, felizmente para os trabalhadores portugueses, como para os agricultores ou para muitos dos empresários do vale do Ave, as eleições são já em 6 de Outubro; o reinado do PSD e da sua maioria parlamentar está a chegar ao fim.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após o afastamento forçado e ilegítimo da voz do Partido Ecologista Os Verdes da Assembleia da República por um período de cerca de um ano, queria em primeiro lugar aproveitar esta oportunidade para reafirmar que os princípios, os valores e os propósitos que animam Os Verdes e o seu projecto ecologista estão bem vivos e actuais. Que mantemos a nossa capacidade de reciclar as ideias, de estudar e observar e reflectir sobre os ensinamentos que nos proporciona a realidade, que acompanhamos a evolução do conhecimento científico e as potencialidades de novas tecnologias, procurando construir, reconstruindo, o projecto de uma sociedade ecologista cujo objectivo central é a garantia de bem-estar e de satisfação das necessidades do homem como indivíduo e enquanto ser social e parte integrante de um ecossistema com o qual, sob pena de pôr em causa a sua própria existência, se tem de comprometer a manter uma relação de equilíbrio e harmonia.
Considerando que ao longo deste ano de ausência de Os Verdes do Parlamento muitos portugueses se sentiram ludibriados por não terem representantes na Assembleia da República que tratassem de forma sistemática, séria e coerente os problemas do meio ambiente e do património natural e construído numa perspectiva integrada, reconhecemos que outros terão ficado satisfeitos com o nosso afastamento e até beneficiado por não terem sido suficientemente incomodados com a nossa actividade e irreverência. Hoje, aqui, aos primeiros queremos agradecer a confiança que depositaram no Partido Ecologista Os Verdes e dizer que podem continuar a confiar em nós, aos segundos dizemos que vão ter de continuar a aturar-nos e a ouvir-nos, ainda não foi desta que se viram livres de nós.
A todos queremos afirmar a nossa disponibilidade e empenhamento para continuar a defender os interesses dos Portugueses e a dar voz aqui na Assembleia da República a todos aqueles que se sintam marginalizados do sistema democrático e pluralista que defendemos.
E é precisamente a este propósito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que hoje aqui vimos denunciar a arbitrariedade e o desrespeito pelas mais elementares regras democráticas inerentes ao pluralismo de expressão na sociedade portuguesa perpretados pelo serviço público da Radiotelevisão Portuguesa, ao excluir dos debates televisivos em período pré-eleitoral todas as forças concorrentes as eleições de 6 de Outubro não representadas no Parlamento e se permitir o luxo de não incluir nas forças políticas parlamentares o Partido Ecologista Os Verdes. Pela vontade expressa do voto do povo português em 1987 e pela amostra junta, podemos concluir pelo avançado estado de miopia da RTP, certamente por força de alguma infecção provocada pelo vírus laranja.
A maioria absoluta do PSD, que tem sustentado as atropelias e a governamentalização de instituições e serviços públicos pelo governo do Prof. Cavaco Silva, entendeu mais uma vez afastar a presença e a voz do Partido Ecologista Os Verdes de um órgão de comunicação social público. Certamente que estes procedimentos são coerentes e ilustrativos do significado que o PSD e Cavaco Silva atribuem aos seus slogans de campanha, de que vivemos numa democracia de sucesso e de aqui assim estamos no bom caminho. Pela nossa parte, iremos accionar todos os mecanismos legais ao nosso alcance para que seja reposta a legalidade constitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Maninho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Maio passado, perspectivando a conclusão do processo que conduziu à paz em Angola e tendo em linha de conta que uma coisa é a cooperação entre países numa situação de guerra e outra é a situação de paz, e não esquecendo também que muito do que em Angola pode ser feito deve ter uma participação de Portugal e sobretudo das muitas centenas de milhares de portugueses que lá têm interesses - e talvez mais importante, o seu coração -, o PRD suscitou no plenário da Assembleia da República um debate sobre a cooperação. Fomos na altura criticados até com o argumento de que estávamos a fazer um favor ao Governo.
Entendeu agora o Sr. Primeiro-Ministro fazer uma visita oficial a Angola na 1.ª semana do mês de Setembro, em

Página 3439

12 DE SETEMBRO DE 1991 3439

nossa opinião bem. Foi sujeito a críticas, é natural, pois estamos em clima de pré-campanha, mas, em nossa opinião, é mais salutar e tem mais interesse para o País que essas críticas sejam feitas pela sua visita do que outras que eventualmente estariam hoje aqui a ser feitas se não tivesse lá ido ...

Uma voz do PS : - É uma vergonha!

O Orador: - Não sei se 6 uma vergonha, Sr. Deputado, pode dizer isso a seguir. Mas certamente que em clima de pré-campanha eleitoral se o Sr. Primeiro-Ministro não tivesse ido a Angola estava hoje aqui a ser criticado por não ter ido antes do Presidente Collor de Melo e ele ter ido lá antecipar-se e reforçar as posições do Brasil em Angola!

Aplausos do PSD.

Estamos preocupados com os interesses do País e o que lamentamos 6 que o Sr. Primeiro-Ministro tenha sido elogiado durante toda a visita por todos os partidos angolanos e depois existirem partidos em Portugal que, por estarmos em pré-campanha e confundirem o interesse partidário com o interesse do Pais, levantem críticas. Quer dizer, só depois, repito, é que surgiram críticas, problemas e atritos num processo extremamente importante para Angola e para Portugal. Lamento, pois, que por interesses estritamente partidários estejam a ser levantados problemas, atritos e prejuízos que atingirão certamente o nosso país.
Iria lembrar, Sr. Presidente, uma situação que eu próprio vivi em Janeiro deste ano integrando uma delegação da Assembleia da República às primeiras eleições livres e pluripartidárias em Cabo Verde. À chegada fui sujeito a fortes pressões e críticas, bem como outros deputados, nomeadamente do PCP e do PSD, por a delegação portuguesa integrar um deputado do PS que tinha estado em Cabo Verde três semanas antes a gravar tempos de antena para a televisão de Cabo Verde a favor de um partido - do PAICV. Depois de uma conversa, por solidariedade e para defesa do prestígio e dignidade desta Casa, demos todo o apoio ao nosso colega deputado, por quem o interesse do país que estava em causa.

O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Fazia hoje aqui um apelo ao bom senso, que já fiz aqui há dois meses e fui fortemente criticado por um certo agudizar de relações e de tensões, estimuladas por algumas pessoas como se viu e comprovou mais tarde, entre o Governo e o Sr. Presidente da República.
Fiz um apelo ao bom senso para que preservássemos o interesse do País.
Volto hoje a fazer um apelo ao bom senso: que os interesses partidários não ponham em causa um processo extremamente importante para o nosso país e que pode pôr em causa e ter reflexos negativos inclusive em participações e posições que Portugal deve assumir noutros processos, nomeadamente em Moçambique. Faço isto por Portugal, faço isto por Angola, faço isto por todos os portugueses em geral e, em particular, por aquelas centenas de milhares que, como disse há pouco, têm muitos dos seus interesses e grande parte do seu coração naquele território de África, que merece um futuro melhor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres inscreveu-se para que efeito?

O Sr. António Guiares (PS): - Para defesa da consideração e da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, esta intervenção do Sr. Deputado Hermínio Maninho representa um dos seus recentes contributos à campanha eleitoral do PSD e é nesse quadro que nós a entendemos.

Vozes do PSD: - E o José Magalhães e o Marques Júnior?

O Orador: - Por essa razão, ao utilizar o plural majestático quando referiu sem nossa opinião», não pensava, seguramente, na do PRD, mas sim na do PSD, como nós já sabíamos.
Quero apenas afirmar-lhe que contundiu tudo em relação ã presença do meu camarada Lopes Cardoso em Cabo Verde. É bom que se saiba que esteve nesse país duas vezes, em qualidades diferentes: na primeira, na mesma em que o Sr. Primeiro-Ministro foi a São Tomé e Príncipe, isto é, com a sua posição pessoal e, inclusivamente, partidária, tendo emitido as opiniões que entendeu, com todo o seu direito; na segunda, esteve integrado numa delegação da Assembleia da República e, já agora, gostava de perguntar ao Sr. Deputado Hermínio Maninho se ele participou nalgum comício de alguma das forças políticas de Cabo Verde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar esclarecimentos, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Maninho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, aquilo que o Sr. Deputado António Guterres acabou de dizer não vem alterar nada do que eu disse, mas apenas servir de confirmação tratou-se de uma delegação da Assembleia da República que efectuou uma visita durante três ou quatro semanas.
Não vou fazer ao Sr. Deputado António Guterres a mesma pergunta por ele feita ontem ao Sr. Primeiro-Ministro, se a indicação do deputado Lopes Cardoso-e há pouco não o mencionei - foi feita três semanas depois por ingenuidade ou por premeditação.
Apenas sei o que lá vivi. Respondo-lhe, dizendo que o deputado Lopes Cardoso não participou em nenhum comício. Também desconheço se o Sr. Primeiro-Ministro participou nalgum comício, mas também não vi a mesma atitude da parte do Partido Socialista quando o Sr. Presidente da República se viu no Hospital de São João, no Porto, e no dia seguinte, em Guimarães, assediado pelo secretário-geral daquele partido em relação a esse aproveitamento político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se, Sr. Deputado António Guterres, de uma questão de dignidade e de coerência: estou a falar por mim, não devo nada ao PSD nem a ninguém nem nunca esta questão foi debatida com os membros desse

Página 3440

3440 I SÉRIE - NÚMERO 101

partido. Aliás, há vários meses que os Srs. Deputados do PS, para justificarem outras coisas - percebi eu mais tarde - andavam a dizer que eu ia ser deputado do PSD. Hoje, a verdade é clara, não devo nada ao PSD, não estou nas suas listas, não tenho nenhum acordo com este partido nem com ninguém.
Devo tudo a mim próprio, à minha coerência, à minha consciência e à minha cara, que há-de aparecer sempre em público como tem aparecido até hoje.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sinto-me obrigado a fazer uma observação prévia antes de ler a pequena intervenção que escrevi, para dizer que os interesses internacionais do País são os mesmos antes, durante e depois das campanhas eleitorais. Por consequência, é necessário, para ter alguma contenção e sentido de responsabilidade perante os interesses do País, conseguir avaliar as circunstâncias, independentemente do processo eleitoral. Designadamente, talvez a Assembleia da República possa tratar dos interesses do País com a mesma independência em qualquer momento do processo eleitoral, sendo poupada a ouvir que os que são da oposição estão a aproveitar, em Portugal, o que se passou na visita do Primeiro-Ministro a Angola. Não vejo nenhuma possibilidade de descobrir em que é que consiste este aproveitamento e ale penso que a expressão é bastante infeliz, porque só pode haver aproveitamento de alguma coisa e com má intenção se um erro tiver sido cometido.
Não é disso que estamos aqui a tratar, mas sim dos interesses do País, e acontece que esta matéria tem sido conduzida na base de reconhecido consenso das forças políticas. Como é que ele não legitima as críticas às coisas que parecem menos certas para servir os objectivos consagrados?

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Penso que isto precisa de ser tomado em conta e que é necessária alguma contenção quando se examina este problema.
A intervenção de Portugal no processo de paz em Angola, com os bons resultados conhecidos, apenas foi tomada possível pela nova política dos Estados Unidos da América e da União Soviética...,

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -... consequência da desmobilização do império soviético: teve essa política portuguesa, ela própria, o mérito de avaliar bem as circunstâncias, diagnosticar a oportunidade e activar com prudência a relação especial entre os dois países.
A generalidade das forças políticas fez justiça ao Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e aos resultados que ele tinha obtido.
Instalada a CCPM (Comissão Conjunta Político-Militar), o processo exige um distanciamento do Governo Português que, para além das intenções, garanta a imagem da imparcialidade e faça crescer a confiança, ao mesmo tempo, das forças envolvidas no conflito e dos restantes Estados directamente interessados, neste caso, especialmente, as duas antigas superpotências.
Tem de reconhecer-se que a visita do Primeiro-Ministro a Angola, em vista das reacções, críticas e queixas verificadas, não foi uma contribuição positiva. Sugerimos que o Primeiro-Ministro deve assumir este facto, pelo qual é objectivamente responsável, sem qualquer necessidade de avaliar as suas próprias intenções ou as intenções abusivas do Governo hospedeiro.
O que está em causa é o facto objectivo produzido nas relações internacionais e também está em causa, para nós, saber como é que foi possível que não tivesse sido feita uma avaliação diplomática prévia das circunstâncias pelo Ministério competente. Não se conhece uma avaliação feita pelo Ministério competente, uma avaliação da disponibilidade efectiva de ambas as partes em Angola antes da visita do Primeiro-Ministro, das possibilidades logísticas para cada uma das partes se encontrar com o Primeiro-Ministro e da certeza de os encontros se verificarem sem ferir, nem sequer na imagem, a imparcialidade.
Mais de uma vez, temos chamado a atenção para a necessidade urgente de acudir com meios e ordenamento ao nosso aparelho diplomático e este acidente não pode ser ignorado pelo próprio Governo, para que não venham a repetir-se iguais erros de julgamento das circunstâncias e das suas eventuais consequências.
A lista de agravos recíprocos das forças angolanas envolvidas era conhecida, e o tempo e o modo da deslocação deveriam tê-las em conta. As expectativas portuguesas e angolanas precisam de ser reanimadas.
Os interesses em causa são tão excessivamente importantes que dificilmente pode aceitar-se que sejam porta-vozes e que não seja o Primeiro-Ministro, pessoalmente, a assumir a situação criada.

Aplausos do CDS e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. .Deputado José Pacheco Pereira.

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, antes de entrar propriamente na substancia da minha intervenção, gostava de referir que o consenso verificado sobre a política do Governo em relação a Angola é, em grande parte, um consenso a posteriori dos resultados dessa política em função do seu sucesso e num momento em que era muito difícil, politicamente, criticar os seus sucessos.
Quero referir sobre esta matéria a posição do Partido Social-Democrata. Em primeiro lugar, consideramos que as matérias que dizem respeito a Angola e ao processo de paz são questões de Estado e que estão muito para além dos conflitos interpartidários. Portugal teve um papel decisivo no processo de paz em Angola, continua a ter um papel decisivo nesse processo, o qual não pode nem deve ser substituído por nenhum outro país. Nesse sentido, não pode ser posto em causa por razões de política interna e do momento eleitoral em Portugal.

O Sr. Domingos Duarte Lima (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Este papel permanece crucial, como todas as partes o reconheceram, e a visita de Estado do Primeiro-Ministro fez-se em função dos interesses portugueses e da paz em Angola, tal como foi reconhecido por todos os partidos políticos angolanos. A circunstância de os partidos da oposição reduzirem todas as acções do Governo a uma

Página 3441

12 DE SETEMBRO DE 1991 3441

mera intencionalidade eleitoral diz muito mais sobre o pensamento e as intenções da oposição do que retraia a actuação do Governo.

Quero também dizer que esse reconhecimento é claro e explícito por todas as partes envolvidas no processo angolano. Irei, apenas, aqui repetir o que disse o engenheiro Salopeto Pena, chefe da delegação da UNITA, no Final da visita do Primeiro-Ministro, ou seja, depois de conhecidas todas as circunstâncias e todos os acidentes, incidentes e eventos relacionados com a visita do Sr. Primeiro-Ministro. Disse que esta «foi um sinal de solidariedade do Governo Português para com os Angolanos na sua totalidade e que a visita contribuía para animar um pouco mais o processo de paz».
Esta afirmação é taxativa e exprime um juízo de valor sobre o significado da visita do Sr. Primeiro-Ministro.
Não restam dúvidas a ninguém que era vontade do Sr. Primeiro-Ministro encontrar-se com o presidente da UNITA em Angola. Que fique bem claro que essa vontade existia!
Há uma diferença muito importante no papel de Portugal em Angola em relação aos outros intervenientes no processo: quer os Estados Unidos da América quer a União Soviética são partes integrantes e têm compromissos com cada uma das partes envolvidas na guerra civil angolana; apenas Portugal não tem qualquer compromisso com nenhuma dessas panes. Essa independência portuguesa foi essencial para o papel que Portugal cumpriu no processo de paz e é ela que todas as partes no processo angolano, muito naturalmente, querem chamar para o seu lado. Tanto o querem fazer aproximando-se excessivamente da posição portuguesa quer atacando-a.
Não é algo de novo, não foi nada que tivesse acontecido apenas na semana passada, já sucedeu muitas vezes durante todo o processo de paz e Portugal tem sabido permanecer acima dos interesses de cada uma das partes no processo angolano, independentemente de todos os incidentes provocados por esta aproximação que é normal em todos os processos deste tipo.
Não podemos perder a cabeça pela circunstância de as partes pressionarem Portugal, exactamente porque o nosso apoio a cada uma delas seria decisivo para alterar o equilíbrio e as relações de força entre elas. E é precisamente porque Portugal não o fez nem o pode fazer que conseguiu manter um processo de independência que permanece ainda reconhecido como necessário entre todas as partes.
Nesse sentido, não discutimos publicamente nem as razões nem as afirmações do MPLA e da UNITA, nem entrámos em qualquer polémica pública que se ligue as razões das partes angolanas no processo de paz. Mais, considerámos que a oposição presta um mau serviço a Portugal quando ela própria não só funciona como câmara de eco desses conflitos existentes em Angola mas também os utiliza e os amplifica para efeitos meramente eleitoralistas em Portugal. Ao fazer isso, dificulta a posição de independência do País, prejudica os interesses de Portugal, que estão muito para além da situação eleitoral, da vitória do PSD - só para falarmos por nós próprios - e presta um mau serviço ao País.
Particularmente ao Partido Socialista, devo dizer que não lhe reconheço sobre esta matéria qualquer autoridade para aparecer hoje como defensor dos interesses de uma das parles no processo político angolano quando, não há muito tempo, nesta Assembleia, se recusou...

O Sr. José Lello (PS):-Não 6 nada disso. É o interesse do País.

O Orador: -... a receber uma delegação da UNITA, para o que estiveram presentes o CDS e o PSD, abandonando a reunião conjuntamente com o Partido Comunista e insultando os deputados que nela permaneceram.

Aplausos do PSD.

Isto aconteceu nesta legislatura e, como foi há muito tempo, talvez seja bom ter alguma memória destes acontecimentos antes de se assumirem as dores alheias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Guterres (PS): - Para defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, neste debate é claro quem não confunde as questões de Estado e as questões partidárias e quem as confunde.

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Exactamente!

O Orador: - O PS, o PSD, o CDS e o PCP tinham, têm e terão lodo o direito à opinião que quiserem sobre as questões de Angola, de serem mais ou menos a favor da ideologia desta ou daquela força política angolana.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Isso está fora de questão! Não recusamos esse direito ao PSD e, por isso, não protestámos quando o Sr. Primeiro-Ministro fez o que fez na campanha eleitoral de São Tomé e Príncipe, mas reivindicamos o direito de fazer a mesma coisa quando, como e onde entendermos.
Isso é uma coisa e outra é o Estado Português, que tem a sua própria política. As relações do Estado Português com Angola são extremamente importantes e o que esta visita do Primeiro-Ministro de Portugal, e não do presidente do PSD, a Angola veio precisamente pôr em causa foi a imparcialidade do Estado Português na questão de Angola.

O Sr. José Lello (PS): - Muito bem!

O Orador: - E a prova de que é o PSD que vive a questão partidariamente é que é o próprio PSD quem, permanentemente, cila declarações de membros de partidos políticos de Angola. Eu também podia citar agora, aqui, declarações do Comité Permanente da Comissão Política da UNITA, dizendo exactamente o contrário do que foi dito, há pouco, na sua citação de um dirigente qualquer da UNITA.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - O presidente da Comissão!

O Orador: - Mas essa não é a minha questão! A UNITA fará o que quiser, o MPLA fará o que quiser, terão ambos as contradições que quiserem... esse é um problema deles! E aos Angolanos a quem compete julga-

Página 3442

3442 I SÉRIE - NÚMERO 101

-los, será aos Angolanos que competirá decidir se é a UNITA, o MPLA ou outra qualquer força política que terá que governar Angola. O que não tolero é que o Primeiro-Ministro português, em representação de Portugal, se envolva nessa questão partidária angolana como se envolveu.
E a verdade é simples e é isso que vos custa: o Sr. Primeiro-Ministro foi a Angola buscar lã e veio tosquiado!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Pacheco Pereira, há outros oradores inscritos para pedirem esclarecimentos. Deseja responder já ao Sr. Deputado António Guterres ou no final, em conjunto?

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Respondo de imediato, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado António Guterres, pela sua intervenção, é muito claro que o que custa e sempre custou ao Partido Socialista e o sucesso da política portuguesa em relação a Angola, sucesso esse reafirmado pela visita do Sr. Primeiro-Ministro a esse país, a qual seria completamente impossível se o Estado Português prosseguisse, em relação a Angola, a política que o Partido Socialista sempre teve em relação aos partidos africanos dos países de língua oficial portuguesa.
Por isso, não adianta discutir mais esta questão, porque compreendemos muito bem o papel do ressentimento na reacção do Sr. Deputado e do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Pacheco Pereira, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Pacheco Pereira, o meu pedido de esclarecimento tem a seguinte razão de ser: o Sr. Deputado e a sua bancada votaram, no início, contra a realização de um debate e, afinal, propiciam-no da pior maneira porque, em vez de ele se realizar de uma forma organizada, em que, serenamente, os diferentes agentes parlamentares expusessem os seus pontos de vista, o Sr. Deputado vem fazer uma defesa apaixonada do comportamento do Sr. Primeiro-Ministro, contra vemos e marés, contra tudo o que lhe foi aqui dito, respondendo de uma forma que, devo dizer, não contribui para o esclarecimento da situação. Por isso, a situação permanece.
É ou não um facto que a visita, medida pelos seus resultados, provocou esta tempestade? Porque assim é, não posso deixar de lhe fazer a seguinte pergunta: não teria sido de boa cautela, antes de concretizar a visita, ter, por exemplo, consultado adequadamente os partidos políticos, através de uma comissão parlamentar, e ter encontrado formulações que permitissem desdramatizar a visita? Não é pela ausência dessas cautelas que se confirma que o Primeiro-Ministro visou precisamente tirar, também, efeitos eleitorais dessa visita, mesmo que ela fosse necessária, ainda que fosse imprescindível? E é ou não esta a ferida que, de alguma maneira, o Sr. Deputado, com a sua intervenção, desastradamente - peço desculpa do termo -, reabre?
Para terminar, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não basta à mulher de César ser honesta, é necessário que o pareça. E, neste caso, não o pareceu.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Pacheco Pereira.

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado, em relação à parte inicial da sua intervenção, queria dizer que é preciso que se perceba, de uma vez, nesta Assembleia - infelizmente isto ocorreu durante todas as sessões -, que as assembleias e os parlamentos funcionam em função da vontade maioritária dos seus membros. E, neste momento, a maioria dos membros desta Assembleia são do PSD, o que noutras alturas não se verificou.

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso não é verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, não há outro critério para fazer funcionar uma instituição parlamentar que não seja o exercício da vontade da maioria, e este é o único critério democrático para dirimir os conflitos sobre as prioridades da actuação do Parlamento.
Em segundo lugar, desejava dizer que os partidos não têm que ter a mesma visão da importância e do lugar das coisas. Do nosso ponto de vista, não pretendemos impedir ninguém de discutir o que entender na Assembleia da República, o que queremos impedir, por não corresponder à nossa concepção nem ao nosso entendimento dos trabalhos parlamentares, é que se utilizem as instituições parlamentares para provocar conflitos parlamentares e para dar importância, notoriamente subordinada ao ciclo político eleitoral, ao levantamento de determinadas questões.
Os senhores sabem tão bem como eu, repito, sabem tão bem como eu, que a tentativa de trazer aqui o Primeiro-Ministro e de fazer um debate especial sobre a questão de Angola destinava-se a dar uma valorização interna que não corresponde ao nosso entendimento do assunto.
Temos, portanto, o direito de exercer, sobre esta matéria, a nossa vontade democrática, que tem genuína fonte na vontade popular, entendendo que não deve ser assim. Não estamos a exercer nenhuma prepotência, não estamos a impedir ninguém de exprimir as suas opiniões, mas, sim, a exercer o direito que nos cabe hoje a nós e que no futuro pode caber aos senhores.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Guterres (PS): - Para, sob a forma de uma interpelação à Mesa, perguntar ao Sr. Presidente se esta Assembleia não funciona de acordo com o Regimento e se a maioria não faz, apenas, valer os seus direitos para decidir num sentido ou no outro em relação às matérias que aqui são trazidas a lume.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Pacheco Pereira também deseja interpelar a Mesa?

O Sr. José Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, desejava interpelar a Mesa no sentido de nos dizer se na atitude do PSD ouve alguma violação do Regimento da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputados, como é óbvio, esta Assembleia funciona de acordo com as leis e o Regimento, que não sofreram qualquer violação.
Srs. Deputados terminou o período de antes da ordem do dia.

Página 3443

12 DE SETEMBRO DE 1991 3443

ORDEM DO DIA

Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com a apreciação do projecto de deliberação n.º 152/V (PS) - Apreciação do caso do pagamento de uma indemnização de dois milhões de contos pela BRISA e elaboração de relatório pela Comissão de Equipamento Social.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Maria Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Tínhamos razão! Aí estão de novo, na comunicação social, os factos a confirmar todas as nossas afirmações.
Assim, a BRISA vai ter de pagar ao consorcio construtor do lanço Águas Santas-Campo uma indemnização de 2 milhões de contos por atrasos na entrega dos terrenos para construção da auto-estrada. Directa ou indirectamente vão ser os Portugueses a pagar a factura, ou como contribuintes ou como utentes da auto-estrada.
Já não restam quaisquer dúvidas. Como sempre dissemos, estamos perante um caso de incompetência e delapidação de dinheiros públicos e começam, agora, a ser evidentes para todos as razões que levaram o PSD a obstruir iodas as iniciativas do PS e o Governo a recusar resposta a requerimentos e a fornecer os elementos sobre empreitadas.
O Governo é responsável pela criação do clima de total impunidade, de irresponsabilidade na gestão de fundos públicos e do primado dos calendários eleitorais, que tem caracterizado a construção das grandes obras públicas.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Não se trata já de denunciar o ao eleitoralista do Governo. A isso já deu o Pais resposta. De norte a sul. o riso e a chacota à volta das inaugurações ê total.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que exigimos é clareza e que a verdade seja apurada sem margem para dúvidas, para que se não mantenha este clima de impunidade que tem caracterizado a gestão dos dinheiros públicos.
Quem não deve não teme, já aqui o dissemos. Queremos averiguar responsabilidades e nomeadamente as responsabilidades dos membros do Governo que tutelam as obras públicas.
Entendemos que a Assembleia da República, no exercício do poder de fiscalização e em defesa do prestígio das instituições, deve analisar os factos e elaborar um relatório. É para isso que apresentamos este projecto de deliberação.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Mário Montalvão Machado pede a palavra para que efeito?

O Sr. Mário Montalvão Machado (PSD): - Para uma intervenção, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Mário Montalvão Machado (PSD): - Sr.ª Presidente, muito sucintamente para dizer, tal qual o Sr. Deputado Armando Vara, que quem não deve não teme; nós lambem não devemos e, por isso, não tememos.

O Sr. José Lello (PS): - Está bem de ver!

O Orador: - E é essa a razão por que vamos votar favoravelmente este vosso pedido. Não tememos coisa nenhuma!
Porém, o que não fazemos é política pré-eleitoral nem galhofamos com coisas que são positivas e de interesse para o povo português.
Os senhores dizem que o País inteiro se ri com as inaugurações que se vêm fazendo e eu direi a V. Ex.ª que o País inteiro se orgulha de ter um Governo que foi capaz, nestes anos, de lhe proporcionar tantos bens e tamanha subida de vida como agora se verifica.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado João Rui de Almeida pediu a palavra para que efeito?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Para um pedido de esclarecimento, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): -Sr. Deputado Montalvão Machado, a propósito do riso ou não riso que, hoje em dia, o povo português faz sobre este carnaval inauguracionista do PPD/PSD e do seu Governo, gostaria que V. Ex.ª, como presidente do Grupo Parlamentar do PSD, comentasse o que vou referir.
Em Condeixa, concelho do distrito de Coimbra, vai ser inaugurado, na próxima sexta-feira, um pilar de cimento e ferro que custa 40 000 contos, embora haja quem fale em 60 000. Gostava que o Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do PSD comentasse este facto, pois o País vai estar atento à inauguração de um monumento às auto-estradas! Julgo que 6 único caso no mundo e certamente na Europa.
Este Governo, no nosso entender e certamente de muita da opinião pública portuguesa, dá-se ao ridículo de inaugurar um monumento às auto-estradas, que certamente vai ter lambem o nome do Prof. Cavaco Silva!
Como acabei de dizer, na sua construção gastaram-se cerca de 60 000 contos até este momento, mas as indemnizações devidas aos proprietários dos terrenos sitos na parte do distrito de Coimbra onde passa essa auto-estrada ainda não foram pagas.
Era sobre isto que gostava de ouvir o comentário do Sr. Deputado Montalvão Machado, até porque certamente também irá assistir a esta inauguração do pilar de cimento e ferro que constitui o monumento à auto-estrada.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Montalvão Machado.

O Sr. Mário Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado, tenho muita pena de não poder ir à inauguração mas leria muito gosto nisso.

O Sr. José Lello (PS): - Tem de fazer campanha em Lisboa, como pode ir lá!?

O Orador: - V. Ex.ª também não pode porque faz campanha no Porto!
Mas, Sr. Deputado João Rui de Almeida, repetindo-me, quero dizer-lhe que não vou, porque não posso, mas teria muito gosto em lá estar porque, como V. Ex.ª sabe e é do conhecimento geral, sempre que se encerra uma grande auto-estrada, uma grande via ferroviária, uma grande via de transporte entre duas grandes regiões de um país, efectivamente faz-se um monumento.

O País vai assistir à inauguração do monumento e este Governo vai fazê-lo orgulhosamente, porque foi capaz de

Página 3444

3444 I SÉRIE - NÚMERO 101

fazer a obra que ele vai comemorar e os senhores não foram capazes de fazer um marcozinho para inaugurar meio metro de auto-estrada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Onde está o monumento às pontes?!

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de inscrição, declaro encerrado o debate e vamos passar à votação do projecto de deliberação n.º 152/V.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Deputado António Guterres pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Guterres (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.ª Presidente, queria apenas recomendar que se mande erigir um monumento nos Passos Perdidos, porque é a primeira vez que um projecto de deliberação apresentado pela oposição é aprovado desde que o Plenário encerrou os seus trabalhos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sob a forma de interpelação à Mesa, sugiro que seja posto a par com esse um outro monumento que assinale a primeira vez em que o PS foi capaz de apresentar alguma coisa com jeito e medida.

Aplausos do PSD.

A Sr.- Presidente: - Vamos dar início ao debate do projecto de deliberação n.9 154/V, apresentado pelo PCP, no sentido de encarregar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de interferir no conflito laborai que abrange os trabalhadores dos Serviços de Identificação Civil e Criminal e do Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Ainda em relação ao projecto de deliberação n.º 152/V, julgo que a Comissão Permanente terá de dar um prazo para a elaboração e apresentação do relatório.

O Sr. António Guterres (PS): - O projecto já inclui esse prazo.

O Orador: - Há um prazo de 30 dias - convenhamos que é um prazo excessivamente longo! Convinha, talvez, oito dias.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Dois dias.

O Orador: - Não sei se o PS pretende propor um prazo mais curto...

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr.ª Presidente, é manifesto que não é nossa intenção obter efeitos eleitorais com esta matéria, por isso propusemos um prazo em que, à utilidade eleitoral, se sobrepôs a utilidade na averiguação da verdade.
Parece-me óbvio que em oito dias não é possível averiguar coisa nenhuma! Talvez que aquilo que o PSD deseja seja aprovar uma daquelas conclusões do costume, para delas vir a retirar algum efeito eleitoral.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa tinha já anunciado o início do debate do projecto de deliberação n.º 154/V, mas, por ordem cronológica de apresentação, deveríamos antes discutir o projecto de deliberação n.º 153/V pelo que passaremos agora ao respectivo debate. O seu objecto é encarregar a Comissão de Equipamento Social para, em reunião a convocar com urgência, proceder à análise da situação e debater as possíveis soluções para o conflito com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, cuja presença deve ser solicitada por aquela Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sra. Presidente, Srs. Deputados: Para que a Comissão Permanente tenha uma ideia acerca das razões que nos levam a apresentar o projecto de deliberação n.º 153/V, vou fazer a sua apresentação.
As negociações, até certa altura conduzidas pelo conselho de gerência da CP, basearam-se num «acordo social para a modernização da empresa», apresentado às organizações representativas dos trabalhadores. Era um acordo bastante mau, que limitava, ilegalmente, aliás, o direito à greve, flexibilizava, de uma forma aguda, os horários de trabalho e conduzia à liquidação de postos de trabalho.
Houve negociações em 2 de Agosto, mas, a partir daí, o conselho de gerência prossegue os trabalhos relativos a toda esta matéria, marginalizando as organizações representativas dos trabalhadores - desde a Federação dos Ferroviários ao Sindicato dos Maquinistas e até à própria comissão de trabalhadores.
As organizações de trabalhadores têm procurado o diálogo, mas o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações não aceita esse diálogo e a situação agudizou-se de uma forma que pode conduzir, devido a esta intransigência, à greve.
É uma situação que lesará os próprios trabalhadores, que são obrigados a recorrer a uma arma que é de última instância, bem como os utentes.
Creio que seria salutar para a Assembleia da República intervir, no uso das suas competências, no sentido de possibilitar um diálogo por parte do Governo, dado que este se nega a fazê-lo.
É este o objectivo que procuramos, através deste projecto de deliberação, no sentido de que a Comissão de Equipamento Social convoque, com urgência, o Sr. Ministro para o esclarecimento destas questões, por forma a defender os interesses da empresa, dos seus trabalhadores e dos utentes.

A Sr.ª Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O pessoal da CP tem sentido na carne, no seu quotidiano e nas suas perspectivas de futuro, o amargo ónus de pertencer a uma empresa, esquecida pelos poderes públicos, que, prestando um inestimável serviço à comunidade, tem sido continuamente adiada, na sua reformulação, na sua modernização e na valorização dos seus funcionários.

Vozes do PSD: - Isso não é verdade!

Página 3445

12 DE SETEMBRO DE 1991 3445

O Orador: - Sei que os Srs. Deputados do PSD não utilizam os serviços da CP! Andam nos confortáveis carros escuros do Estado, com ar condicionado! Mas deixem-me continuar, por favor.
É assim que a CP se apresenta hoje como uma empresa lutando contra o tempo, com estruturas obsoletas e deficientemente apetrechada, técnica, tecnológica e funcionalmente. Daí que, no quadro do voluntarismo instilado pela filosofia do actual Governo, onde o liberalismo não tem limites no tocante às relações laborais e, paradoxalmente, o intervencionismo pretende ser total no domínio do controlo e da gestão do sector empresarial do Estado, reformar as empresas significa reformar os trabalhadores, modernizar as empresas significa substituir os trabalhadores antigos por outros novos e torná-las mais eficientes significa muscular a sua gestão, à revelia do diálogo com as organizações sindicais e minimizando os aspectos sociais em jogo.
Esta atitude de asséptico distanciamento do social em benefício do voluntarismo estatístico leva logicamente ao confronto laborai, suscitando, nesta como em outras empresas, um clima de angustia e ansiedade não compatíveis com o desenvolvimento e melhoria que se dizem pretender atingir! Por isso, no caso vertente, pensamos também que, em face da situação em apreço e aqui referenciada, é importante que a mesma seja objecto de análise em sede própria nesta Assembleia e na Comissão de Equipamento Social, aqui referida.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além de recusarmos os epítetos que o Sr. Deputado José Lello utilizou, nomeadamente considerando as posições do PSD como obsoletas, defensoras de um liberalismo ortodoxo e lambem de um voluntarismo estatístico, defendemos que os assuntos e as questões devem ser analisadas em conformidade. Por isso, para além de desejarmos falar com o País, pretendemos que os representantes do País falem com os deputados do PSD.
Nesse sentido, e perante o projecto de deliberação n.º 153/V, apresentado a esta Comissão Permanente, iremos votar a favor.
É certo que recusamos todas as considerações feitas pelo Deputado José Lello, pretendemos negociar e deliberar em conjunto com as tais forças vivas que ele próprio referia.
Dessa forma, iremos votar a favor do referido projecto de deliberação n.º 153/V.

A Sr.ª Presidente: - Dado que não há mais inscrições, a Mesa dá por encerrado este debate, pelo que vamos proceder à votação do projecto de deliberação n.º 153/V, apresentado pelo PCP, em que a Comissão Permanente delibera encarregar a Comissão de Equipamento Social para, em reunião a convocar com urgência, proceder à análise da situação e debater as possíveis soluções para o conflito com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, cuja presença deve ser solicitada por aquela Comissão.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vamos dar início ao debate do projecto de deliberação n.º 154/V, no sentido de encarregar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de analisar a situação relativa ao conflito laborai que abrange os trabalhadores dos Serviços de Identificação Civil e Criminal e do Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Neste momento, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar este projecto de deliberação o Grupo Parlamentar do PCP teve como objectivo contribuir para a resolução de um conflito que exige diálogo e soluções.
Pretendemos que aos trabalhadores do Centro de Identificação Civil e Criminal e do Registo Nacional de Pessoas Colectivas seja reconhecido o direito à estabilidade no emprego e a uma justa promoção nas suas carreiras. Pretendemos que, com a solução do conflito, se resolva a situação de milhares de cidadãos (entre eles, convém recordar, alunos e emigrantes) e de empresas que, face à indisponibilidade do Governo para negociar e resolver o conflito acabam por ser prejudicados na passagem de documentos importantes e urgentes.
Os trabalhadores reclamam o cumprimento cabal do Decreto-Lei n.º 42/89, para o caso do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, e contra uma medida de gestão imposta pelo Ministério da Justiça, no caso do Centro de Identificação Civil e Criminal. Sobre estes últimos trabalhadores recai a possibilidade de uma mistificação do Governo, que já admite a integração no notariado, mas não lhes reconhecendo o carácter de prestadores de serviço externo, ou seja, não lhes reconhecendo direitos e regalias idênticos a outros trabalhadores já colocados.
Quanto aos trabalhadores do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, em regime de instalação desde 1980, a solução anunciada pelo Governo visa não só o adiamento como o agravamento da situação em que actualmente se encontram. É tão caricata a situação que actualmente existe um conservador sem conservatória.
O Sr. Ministro da Justiça em reunião com o sindicato representativo do sector pediu oito dias para resolver o problema. Afinal, só quis ganhar tempo, frustrando as expectativas dos trabalhadores em luta.
O Governo está a demitir-se de um conflito com grandes repercussões na vida dos cidadãos. Torna-se exigível que a Assembleia da República, no exercício dos poderes que são conferidos à Comissão Permanente, intervenha para desbloquear esta situação. Essa é a razão do nosso projecto de deliberação.
Em vigília há 48 horas à porta do Sr. Primeiro-Ministro, os trabalhadores do Registo Nacional de Pessoas Colectivas e do Centro de Identificação Civil e Criminal tiveram como resposta do contínuo que a concessão de audiências costuma ser dada ao fim de três meses. Isto é inaceitável para uma situação tão urgente como esta.
É, pois, pertinente que este órgão de soberania aprove este projecto de deliberação em nome dos interesses dos trabalhadores, dos cidadãos e das empresas. Ele visa encarregar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de proceder com urgência à análise da situação descrita, com vista à procura de soluções para este conflito, conjuntamente com o Sr. Ministro da Justiça, cuja presença deve ser solicitada por aquela Comissão.
São estas as razões, é este o nosso projecto de deliberação - esperemos que a Câmara tenha a sensatez de o aprovar, promovendo a reunião imediata, no mais breve espaço de tempo, da comissão respectiva.

Página 3446

3446 I SÉRIE - NÚMERO 101

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os trabalhadores do Registo Nacional de Pessoas Colectivas e do Centro de Identificação Civil e Criminal encontram-se em greve, como 6 de público conhecimento, desde os dias 2 e 22 de Agosto respectivamente. Dir-se-á porventura que, ao decidirem a greve, tais trabalhadores mais não fazem, como tantos outros, senão exercer o seu direito constitucional de defender dessa forma as suas reivindicações e poder-se-ia acrescentar que, dada a particularidade deste sector, não assumiria relevância para ser abordado especificamente nesta Comissão Permanente.
Assim não é, e entende o PS que não apenas a justeza das suas reivindicações o justifica mas também importa que sejam esclarecidos alguns aspectos menos correctos e transparentes no processo que conduziu a esta situação.
O regime de instalação em que a Direcção de Serviços do Registo Nacional de Pessoas Colectivas se vem mantendo, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 144/83, tem-se traduzido em manifesto e progressivo prejuízo dos trabalhadores, pois que daí resulta a inexistência do normal quadro de pessoal e a consequente impossibilidade de progressão na carreira, sua expectativa legítima.
Com o Decreto-Lei n.º 42/89, o Governo definiu o princípio da integração do Registo Nacional de Pessoas Colectivas na Direcção-Geral dos Registos e do Notariado. Em consequência, impunha-se que se procedesse à regulamentação do quadro de carreiras profissionais com o necessário reconhecimento de aplicação das carreiras de oficiais de registo e conservatória. Nesse sentido, e desde Maio de 1990, encetaram os trabalhadores um diálogo permanente e, ao que se sabe, nem sempre correspondido, com o ministério da tutela, o da Justiça, com vista a uma definição consensual de tal quadro.
Cerca de um ano depois, ou seja, em Junho passado, os trabalhadores do RNPC concluíram essas negociações, lendo nelas igualmente participado os trabalhadores do CICC, aqui e quanto a este serviço mesmo por iniciativa do próprio Ministério da Justiça.
O acordo entre os trabalhadores e o Ministério foi vertido num projecto de decreto-lei enviado por determinação do Ministro da Justiça, em 26 de Junho passado, ao Ministro das Finanças para recolha de concordância e assinatura. Tal diploma não veio, no entanto, a ser aprovado em Conselho de Ministros e publicado na folha oficial.
E porquê? Naturalmente - e diremos nós espantosamente - porque ao que o Sr. Ministro da Justiça disse sim o Sr. Ministro das Finanças terá duo não!
Que o Governo não cumpra promessas suas, já o sabemos. O que não acreditávamos ser possível era que o Governo, através de um dos seus ministros, neste caso o da Justiça, discutisse e negociasse com os trabalhadores esta matéria, aprovasse a solução final consensual, a vertesse de seguida num texto de decreto-lei e, no final, tudo ficasse na mesma. Ou antes, pior.
É que o Sr. Ministro da Justiça, já depois de iniciado o período de greve, recebeu os trabalhadores - não sem que tivesse resistido a tal incomodidade - e o que leve para lhes transmitir foi nada mais, nada menos que isto: «Esqueçam as negociações, o acordo feito e a proposta de decreto-lei que eu aprovei e assinei; vamos apenas integrar os serviços em causa na Direcção-Geral dos Serviços e Notariado e no prazo de 180 dias regulamentar-se-á tal integração no que respeita aos trabalhadores.»
Isto quer dizer que as expectativas, os anseios legítimos consolidados ao longo de um ano e meio de negociações e, mais ainda, os compromissos assumidos pelo Governo na solução final aprovada serão para esquecer e decretar-se-á, pura e simplesmente que o que foi dito não foi dito. Perante tal quadro, não pode duvidar-se da legitimidade e da justiça do processo de greve iniciado por estes trabalhadores há mais de um mês. Para além das suas reclamações de ordem profissional, têm, naturalmente, estes trabalhadores o direito a ser tratados como pessoas de boa-fé e a reclamar do Governo do País a mesma atitude. Louve-se aqui, e apesar de tudo o que vem acontecendo, a disponibilidade para o diálogo manifestada pelos trabalhadores nas suas mais recentes posições públicas.
O PS apresentou, já na passada semana, um requerimento nesta Assembleia ao Sr. Ministro da Justiça para esclarecimento da situação.
Hoje, e nessa mesma sequência, declaramos a nossa concordância ao projecto de deliberação em discussão e reclamamos a presença do Sr. Ministro da Justiça na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para, em nome do Governo e não apenas do seu Ministério, esclarecer esta situação.

Aplausos do PS.

Neste momento, assistentes presentes nas galerias manifestam-se aplaudindo.

O Sr. Presidente: - As pessoas presentes nas galerias não podem aplaudir!
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Silva Marques.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, para dizer muito brevemente a nossa posição.
O que é colocado à nossa apreciação e votação é uma proposta que não merece a nossa oposição. Os seus autores, e bem, tiveram a preocupação de se ater aos limites constitucionais da Assembleia, propondo que o Parlamento, pela via da comissão adequada, se debruce sobre o assunto e solicitando, para o efeito - é melhor solicitar ou requerer do que reclamar! -, a presença do Sr. Ministro da Justiça, com o que estamos inteiramente de acordo, pelo que vamos votar a favor.
Devo dizer que somos tão sensíveis como qualquer outro aos problemas dos trabalhadores, que temos dado sobejas provas disso e que desejamos a solução dos conflitos. Não queremos conflitos, antes pelo contrário, só que lemos uma diferença fundamental quanto a esta matéria: recusamos a demagogia!

Risos do PS e do PCP.

Mesmo em fase de aproximação eleitoral, recusamos a demagogia! Fomos nós - e sobretudo o Sr. Primeiro-Ministro - que iniciámos um ciclo novo em Portugal, provando que é possível governar com os Portugueses sem demagogia! Aqueles que julgam que a demagogia é a solução política não têm confiança nem na seriedade nem na lucidez dos Portugueses, particularmente dos trabalhadores.
Por isso, vamos votar a favor, sem que com isso subscrevamos, bem pelo contrário, as vossas análises e muito menos as vossas condenações, até porque, infelizmente - e eu desejaria o contrário -, as acusações vêm de quem menos tem autoridade moral para isso.

Página 3447

12 DE SETEMBRO DE 1991 3447

O PCP fala dos trabalhadores e é sensível aos seus problemas quando estão em causa os trabalhadores dos outros! Porque quando se trata dos seus próprios trabalhadores despede-os implacavelmente, por vezes apenas por razões ideológicas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, dêmos à política um pouco mais de consistência e de seriedade! Os Srs. Deputados socialistas falam em promessas e dizem que um ministro terá assinado um compromisso que não cumpriu.

O Sr. António Guterres (PS): - Estava a ver que se esquecia de nós.

O Orador: - Devo dizer que não domino os pormenores desse processo, mas que hoje recebi um conjunto de trabalhadores do serviço em questão e que os ouvi, quer pessoalmente, quer através do meu grupo parlamentar. Diligenciaremos, também, no sentido de esclarecer e de procurar a solução do conflito em questão, mas não cairemos em demagogias.
Srs. Deputados: O PS sempre se caracterizou por faltar às suas promessas! Foi o PS que, infelizmente, introduziu na governação de Portugal o exemplo do prometer e não cumprir, dizendo sim a todos - aos trabalhadores e também aos patrões! Essa tentativa de enganar uns e outros, dizendo incondicionalmente sim a todos, caracterizou-o.
De forma que, Srs. Deputados, não falem em promessas, pois isso é extremamente desagradável. E não será necessário falar mais do passado, pois o próprio presente, infelizmente, mostra que o PS continua a caracterizar-se por ser um partido sem coerência. Aí rendo homenagem ao PCP que mantém coerência e uma grande seriedade de posições.
Porque, Srs. Deputados socialistas, o vosso actual líder prometeu ontem, fortemente, activamente, formar governo - o tal «governo-sombra» -, mas quando viu que a coisa não era tão fácil, já não digo relativamente ao País mas relativamente às intrigas do vosso partido, meteu a promessa no bolso!
Por isso, Srs. Deputados, vamos ocupar-nos seriamente do conflito em questão e deixemo-nos de demagogia, porque esta nunca deu nem emprego nem promoção a ninguém.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, julgo que posso intervir sob a figura de defesa da honra. Ou lenho a hipótese de fazer um pedido de esclarecimento?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado ainda tem tempo para fazer uma intervenção, se assim o desejar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Então farei uma intervenção, Sr Presidente.
Srs. Deputados, muito rapidamente para referir que o Sr. Deputado Silva Marques foi quem acabou por fazer a mais pura e completa demagogia, na intervenção que acabou de proferir aqui. Quem se afastou da questão concreta em debate foi o Sr. Deputado Silva Marques na sua intervenção, tentando manobras de diversão, aprofundando muito, para além daquilo que é normal mesmo da parte do PSD, a demagogia que campeia nos membros do Governo do PSD por esse país fora.
O Sr. Deputado vem referir que o Governo e o PSD são quem são bons para os trabalhadores e quem inaugurou uma nova nova via de resolução dos conflitos! O Sr. Deputado não tem pudor em fazer essa afirmação, quando os trabalhadores em causa, aqueles que referimos e para cujos problemas apresentámos um projecto de deliberação, estão há 48 horas em vigília e em greve há 45 dias, quando o Ministro da Justiça lhes pediu 8 dias, que já foram ultrapassados, continuando sem lhes dar qualquer resposta?! Isto é a mais completa demagogia!
Ainda bem que o Sr. Deputado Silva Marques vota a favor do nosso projecto de deliberação, porque queremos que a comissão respectiva, de acordo com o nosso projecto, reúna muito urgentemente. Não queremos - e opor-nos-emos a tal! - que haja qualquer tentativa por parte do PSD de aprovar o nosso projecto de deliberação e que depois não reúna a respectiva comissão. A comissão terá a presença do PSD, não aceitaremos qualquer manobra de diversão, para que depois esta não reúna, pois se isso acontecer faremos um requerimento de avocação à Mesa e ao Sr. Presidente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Silva Marques pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Para responder, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se V. Ex.ª quiser fazer uma intervenção ainda tem algum tempo.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, proferi alguns comentários fora da proposta estrita que VV. Ex.ªs fizeram. Aliás, comecei por me referir a ela porque o Sr. Deputado fez várias acusações ao meu partido e ao Governo, também fora do texto conclusivo e da parte dispositiva.
Os Srs. Deputados acusaram-nos de desinteresse pela solução dos conflitos, ao que respondi, dizendo que isso é falso. Nós, tanto como para qualquer outro sector ou pessoa, desejamos a solução dos conflitos. Aí nem sequer vos ataquei, pois reconheci que os senhores também o desejam. O que eu disse é que nós também o desejamos.
Os Srs. Deputados disseram que se interessam pelos trabalhadores e que nós não nos interessamos. Eu disse que isso era falso, mas acrescentei que o fazemos sem demagogia. E procurei demonstrar que o dar resposta positiva aos interesses dos trabalhadores não é assim tão fácil, da forma mais irrespondível, dizendo que os senhores mesmos, quando estão em causa problemas laborais ou de trabalho, não solucionam as coisas com essa facilidade.
Com certeza que quando os senhores despediram trabalhadores, o vosso coração sangrava! Só que os senhores despediram-nos!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Isso é falso! O senhor é um mentiroso!

Página 3448

3448 I SÉRIE - NÚMERO 101

O Orador: - Eu quis apenas, Srs. Deputados, pôr um pouco de água fria na vossa facilidade demagógica. Mais nada! Porque nós, tanto como os senhores, desejamos que os conflitos sejam resolvidos, que os trabalhadores tenham justiça e que tenham futuro nas suas carreiras. Foi tudo o que eu disse.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Desejam, mas não fazem nada para isso!

O Orador: - Fazemos, Sr. Deputado. Qual foi o governo que contribuiu para o progresso dos trabalhadores em Portugal de forma sólida e sustentada? Qual foi o governo que contribuiu, ao longo dos últimos anos, para dar perspectivas de futuro à generalidade dos trabalhadores portugueses?

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, deixemos este assunto.

Vamos, pois, votar a favor deste texto, que é absolutamente razoável, o que e também meritório da vossa parte, e ocupemo-nos seriamente dos problemas dos trabalhadores na comissão respectiva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação do projecto de deliberação n.º 154/V, que acaba de ser apreciado.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade

O Sr. Deputado Octávio Teixeira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa tem o seguinte sentido: o Grupo Parlamentar do PCP, na sequência do projecto de deliberação que apresentou e que acabou de ser aprovado, tal como do anterior, requer ao Sr. Presidente que a convocação das duas comissões, quer da do Equipamento Social, quer da dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, seja feita para a próxima terça-feira, dia 17 de Setembro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso recomendar aos presidentes das duas comissões que o façam. Agora, exigi-lo ultrapassa a minha competência.
O Sr. Deputado António Guterres pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Guterres (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, apenas para dizer que, sendo previsível a indisponibilidade do Sr. Presidente da Comissão de Equipamento Social por razões pessoais, sugeria, caso ele não esteja disponível, que fosse substituído pelo vice-presidente da comissão respectiva.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado, é a regra.
Srs. Deputados, com isto terminámos os trabalhos da Comissão Permanente.

Está encerrada a reunião.
Eram 17 horas e 5 minutos.

Os REDACTORES: Cacilda Nordeste - José Diogo.

DIÁRIO da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

AVISO

Por ordem superior e para constar, comunica-se que não serão aceites quaisquer originais destinados ao Diário da República desde que não tragam aposta a competente ordem de publicação, assinada e autenticada com selo branco.

PORTE PAGO

1 - Preço de página para venda avulso, 5$, preço por linha de anúncio, 104$.

2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.

3 - Os prazos de reclamação de faltas do Diário da República para o continente e regiões autónomas e estrangeiro são, respectivamente, de 30 e 90 dias à data da sua publicação.

PREÇO OESTE NÚMERO 80$00

Páginas Relacionadas
Página 3437:
12 DE SETEMBRO DE 1991 3437 O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, o PSD não conseg
Página 3438:
3438 I SÉRIE - NÚMERO 101 mais de 1000 trabalhadores depararam com o encerramento das empre

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×