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Sábado, 18 de Janeiro de 1992

I Série - Número 23

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE JANEIRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Abreu Salgado
Victor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 20 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.ºs 52/VI a 55/VI.
Foram aprovados os n.ºs 5 a 15 do Diário.
Procedeu-se à apreciação das seguintes petições: n.º 251/V (4.ª), apresentada por Carlos Alberto Henrique Correia Martins e outros, solicitando o debate do processo relativo à via longitudinal do Algarve - Via do Infante de Sagres; n. º 252/V (4. º), apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações, solicitando a apreciação do processo de reestruturação dos CTT, tendo em vista a defesa dos direitos económicos e sociais; n. º 257/V (4. º), apresentada pelo Movimento Unitário dos Reformados, Pensionistas e idosos, solicitando que sejam tomadas medidas legislativas sobre os passes sociais; n. º 262/V (4.ª), apresentada pela Comissão de Trabalhadores da Aliança Seguradora, S. A., solicitando medidas de protecção dos direitos dos trabalhadores no processo de privatização desta empresa; n. º 266/V (4.º), apresentada pela Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal, solicitando a inviabilização dos projectos governamentais que visam alterar a legislação do trabalho.
Intervieram sobre a matéria os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Lourdes Hespanhol (PCP), José Apolinário (PS), António Vairinhos (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Armando Vara (PS), Luis Carrilho da Cunha (PSD), Rui Vieira (PS), Odete Santos (PCP), Branco Malveiro (PSD), Jerónimo de Sousa (PCP), Artur Penedos (PS), Rui Rio (PSD), José Lamego (PS) e Rui Salvada (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Matos Barros.
António Barradas Leitão.
António Correia Vairinhos.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernandes Alves.
António Germano Sá e Abreu.
António José da Motta Veiga.
António Maria Pereira.
António Paulo Coelho.
Aristides Alves Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva Moreira
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Almeida Figueiredo.
Carlos de Almeida Coelho.
Carlos Duarte Oliveira.
Carlos Lopes Pereira.
Carlos Lélis.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Vallcré P. de Oliveira.
Carlos Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Domingos José Soares A. Lima
Duarte Rogério Matos V. Pacheco.
Eduardo Alfredo de C. Pereira da Silva.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco M. Andrade.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando dos Santos Antunes.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos S. Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Granja da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maças.
João do Lago V. Mota.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José António Peixoto Lima.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Frcilas Costa Leite.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leal Ferreira Piedade.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário Gaspar.
José Mário Lemos Damião.
José Pacheco Pereira
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Lima Amorim.
Manuel Maria Moreira.
Manuel da Silva Azevedo.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Fernanda Dias Cardoso.
Maria Helena Ramos Mourão.
Maria Leonor Beleza Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Santos.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Telmo José Moreno.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
Américo Albino Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Maninho.

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António Fernando Correia de Campos.
António Luís Santos Costa.
António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Eurico José Palheiros de Figueiredo.
Fernando Manuel Costa.
Fernando Alberto P. Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Guilherme Valdemar P. Oliveira Martins.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria Lemos de Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Jorge Lacão Costa.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Almeida Leitão.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Agostinho Nuno Azevedo Ferreira Lopes.
António Filipe Gaião Rodrigues.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Reis Morais.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Silva Viana de Sá.
Maria de Lourdes D. Fernandes Hespanhol.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Casimiro da Silva Tavares.
Manuel Tomás Cortês Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

João Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.(tm) 52/VI (PS) - Permite o acesso do público às declarações apresentadas pelos titulares de cargos políticos no Tribunal Constitucional, nos termos da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, que baixou à 3.ª Comissão; 53/VI (PS) - Regime jurídico das comissões eventuais de inquérito, que baixou às 1.ª e 3.ª Comissões; 54/VI (PS) - Criação de um registo de interesses dos deputados, que baixou à 1.ª Comissão; e 55/VI (PS) - Estatuto dos deputados, que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em apreciação os n.ºs 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 do Diário, relativos, respectivamente, às reuniões plenárias de 21, 28 e 29 de Novembro e 6, 10, 12, 13 e 17 de Dezembro de 1991.

Submetidos à votação, foram aprovados com unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Srs. Deputados, de acordo com a nossa ordem de trabalhos de hoje, vamos proceder à apreciação da petição n.º 25l/V (4.º), apresentada por Carlos Alberto Henrique Correia Martins e outros, solicitando o debate do processo relativo à via longitudinal do Algarve - Via do Infante de Sagres.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: A petição em apreço refere-se a um processo que levantou acesa polémica há cerca de 3 anos, incidindo em diferentes questões relacionadas com a escolha do traçado da Via do Infante, com os defeituosos procedimentos da Administração, com a violação dos direitos dos cidadãos da comunidade regional e em desprezo pela lei portuguesa e directivas comunitárias. Foi, aliás, um processo em que Os Verdes, na altura, tiveram oportunidade de participar activamente em virtude das graves consequências que tinha.
A região algarvia, como se sabe, cresceu desmesuradamente numa faixa litoral limitada à custa de atrofias e desprezo pelo resto da região. Impunha-se então, como se impõe ainda hoje, uma opção de desenvolvimento equilibrado, que passa por uma correcta política de ordenamento do território em que a componente das vias de comunicação e de importância decisiva.
Contudo, nada disto se passou com o processo de escolha do traçado da Via do Infante. O traçado, contra o parecer da Comissão de Coordenação Regional do Algarve (CCRA), foi imposto às populações através de múltiplos artifícios, nomeadamente a fabricação, após grande contestação pública, de um estudo de impacte ambiental a posteriori e uma pretensa consulta pública.
Os agricultores, em especial do Sotavento algarvio - a parte da população mais afectada -, protestaram até junto

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da residência oficial do Sr. Primeiro-Ministro, pois os solos agrícolas atravessados pela estrada suo dos mais ricos da região e, além do mais, toda a experiência de agricultura programada que no vale da Assaca se vinha fazendo foi posta em causa com este processo. Mas, apesar de tudo, não obtiveram qualquer resultado!
Também as associações de defesa do ambiente protestaram, pois a estrada vai atravessar zonas ecologicamente sensíveis. Mais uma vez em vão!
O «muro de asfalto» que vai construir-se dividirá ainda mais o litoral, o barrocal e a serra algarvia, com a perspectiva de um futuro de cada vez maior isolamento e desertificação do interior, ao mesmo tempo que o litoral será cada vez mais asfixiado, sendo certo que as assimetrias regionais não só serão mantidas como se acentuarão.
Uma obra vital para o desenvolvimento do Algarve, envolvendo os riscos enunciados, não pode estar unicamente dependente de decisões administrativas, desprezando a opinião da Comunidade e das entidades locais.
O «segredo foi a alma do negócio» sem que o Algarve tivesse tido outra oportunidade que não a de encaixar o golpe de misericórdia no ordenamento do território da região provocado por esta via.
Tem razão de ser, pois, a petição em debate porque um processo repleto de irregularidades e atropelos não pode ficar no esquecimento, tanto mais, que a Comunidade financia a construção desta estrada e está em causa todo o futuro de uma região. Pena é, tão-só, que este debate se laça quando a obra está em pleno desenvolvimento e num momento em que o silêncio se abate sobre este atentado aos mais elementares direitos dos cidadãos e aos equilíbrios ecológicos da região.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lourdes Hespanhol.

A Sr.ª Lourdes Hespanhol (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia 15 de Maio de 1991 entrou na Assembleia da República a petição n.º 251/V, que solicita o debate sobre o processo relativo à via longitudinal do Algarve - Via do Infante de Sagres e que é subscrita por 1616 peticionários.
Esta petição é mais um passo nas inúmeras movimentações de cidadãos algarvios que se sentem lesados com o traçado da citada via e que, ao abrigo deste direito constitucional e regimental, exprimem o seu protesto, assim como o de muitos outros cidadãos que comungam das mesmas preocupações.
Importa clarificar que o PCP é favorável a uma via longitudinal do Algarve, considerando ser uma obra necessária e indispensável para, no caso de o seu traçado ser o mais adequado às necessidades de desenvolvimento e descongestionamento da via rápida e o menos prejudicial às populações e ao ambiente, poder contribuir para o desenvolvimento harmónico daquela região.
Encontram-se, hoje, construídos alguns quilómetros da Via do Infante, mas - pasme-se! - esses troços não atingem na maior parte dos casos mais do que 1 km; existem, mesmo, situações caricatas de curtíssimos troços, que começam e acabam em terrenos cultivados, como o provam alguns registos fotográficos interessantes.
Estes troços fazem parte do projecto aprovado em Janeiro de 1991 e que, apesar de posterior à existência de um estudo comparativo - «avaliação para dois traçados alternativos para a via longitudinal do Algarve» - que refere a necessidade de deslocar o referido traçado para norte a fim de preservar os solos agrícolas de grande qualidade e por estar implantado em zona geológica de recente formação e, por isso, instável, este traçado, dizia eu, nalguns casos piorou o traçado inicial. Isto deve-se ao facto de não terem sido introduzidas as alterações de fundo mas apenas rectificações de carácter técnico. Apesar de o traçado ter sido aprovado em Janeiro de 1991, a Via do Infante não foi adjudicada na sua totalidade mas apenas alguns dos seus troços. Cabe aqui perguntar: porquê?
As razões são múltiplas e encontram-se no conjunto de ilegalidades cometidas em todo o processo, assim como na falta de discussão pública do traçado, na fase inicial, e na falta de diálogo com o objectivo de evitar situações de decisão unilateral e puramente administrativas, no momento presente.
Das ilegalidades cometidas no passado são de referir as que se reportam ao incumprimento das Directivas (CEE) 85/337 e 79/409 e que valeram ao Governo português uma queixa junto das instâncias comunitárias. Os desenvolvimentos exteriores a esta queixa conduziram, por um lado, ao retirar dos financiamentos comunitários para a execução da obra e, por outro, à elaboração de estudos e pareceres que deveriam ter sido realizados antecipadamente.
As ilegalidades do passado pertencem já à história, mas as ilegalidades do presente confrontam cada dia proprietários dos terrenos com situações de abuso do poder com a entrada nas propriedades daqueles para elaboração de sondagens, medições, colocação de estacas, sem ter havido qualquer contacto ou autorização prévia dos mesmos.
Os contactos com os proprietários dos terrenos não respeitam algumas formalidades indispensáveis em matéria deste teor, uma vez que são feitos por cartas não intransmissíveis; convocatórias para reuniões sem explicitação da razão das mesmas; contactos por telefone, ou outros, sem identificação nem cabal esclarecimento do que se pretende; impedimento de consultas aos processos por parle dos expropriados; no caso de haver lugar a situações de arbitragem, estas são dificultadas ou impedidas de forma premeditada...
A agravar tudo isto, acresce o facto de as indemnizações dos terrenos a utilizar estarem a ser pagas sem um mínimo de critério, provocando clamorosas injustiças.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: situações como esta, por serem fruto de um processo pouco claro, que se arrasta há anos e não irá responder de forma clara e inequívoca aos objectivos que visava perseguir, não podem, não devem repetir-se!
A Via do Infante ainda não está concluída, há ainda hipótese, se não de «salvar a honra do convento», pelo menos de salvaguardar algumas situações de extrema importância, nomeadamente que seja dado cumprimento integral ao estudo de impacte ambiental para cada um dos sectores da estrada; que sejam tomados públicos os critérios de pagamento das indemnizações e que sejam cumpridos os compromissos, que não estão a ser respeitados pela Junta Autónoma de Estradas, de arranjo de caminhos de acesso a propriedades e habitações.
O PCP tem vindo, pois, a acompanhar, desde o início, todo o processo: acompanhou, as movimentações dos agricultores e apoiou-os nas suas justas posições e continuará, no futuro, a exigir do Governo a clareza que se impõe no processo, assim como o cumprimento dos compromissos assumidos.

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Iremos, com este objectivo, solicitar, em sede de Comissão de Equipamento Social, a vinda à Comissão de responsáveis dos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Ambiente e Recursos Naturais para os esclarecimentos que se impõem no âmbito da nossa acção fiscalizadora.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Plenário da Assembleia da República aprecia nesta data uma petição assinada por mais de 1 000 cidadãos, tendo como primeiro subscritor o Sr. Carlos Correia Martins, através da qual se solicita o debate do processo relativo à via longitudinal do Algarve.
Aquando da definição do traçado desta via, entre Vila Real de Santo António e Guia, foram consideradas duas soluções, curiosamente protagonizadas por duas entidades dependentes da administração central: a da Comissão de Coordenação da Região do Algarve e a da Junta Autónoma de Estradas, na prática, quase paralela à actual EN n.º 125.
Afirmaram os defensores desta última solução que só ela permitiria a diminuição do tráfego na EN n.º 125, além de uma previsível diminuição de custos nos acessos. Para quem, como nós, defendeu uma perspectiva tendencialmente mais próxima da solução da CCRA tratava-se, sim, de escolher uma alternativa que melhor salvaguardasse os interesses do Algarve, numa óptica de desenvolvimento regional integrado e de uma estrutura económica diversificada na região.
No início de 1988, o Partido Socialista tomou, aliás, a iniciativa de realizar um debate público sobre esta temática, ocasião aproveitada pelos principais intérpretes do PS no Algarve para um apoio preferencial à solução da CCRA. Não estávamos sós. Personalidades como, entre outras, os Próis. Doutores Caldeira Cabral, Gomes Guerreiro, Reis Cunha, Delgado Domingos, agentes empresariais diversos, como o Dr. António Eusébio, da CIALBE, ou o Sr. Manuel Pego, da Caixa Agrícola, manifestaram ao longo do ano de 1988 a sua adesão à solução da CCRA. Entretanto, em 11 de Março de 1988, o Ministro das Obras Públicas determinara que o parecer do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes fosse emitido em tempo, pois o Governo pretendia que em finais de 1991 parte substancial da via estivesse em utilização pública.
Ao longo dos anos de 1988 e 1989 sucederam-se as intervenções, os artigos de opinião, os abaixo-assinados dirigidos aos mais diversos órgãos de soberania, mas debalde! O poder dominante no Governo e na Assembleia, através da maioria PSD, «fez orelhas moucas» perante o sentir das populações do Algarve. O processo avançava - houve mesmo quem lhe chamasse «O crime da Via do Infante»!...
A 26 de Janeiro de 1989 é, finalmente, divulgada publicamente a solução adoptada, tendo como base a proposta da Junta Autónoma de Estradas. A necessidade de recorrer ao financiamento comunitário haveria, contudo, de levantar uma nova controvérsia: o estudo de impacte ambiental. É que, enquanto por cá o afã ambiental era grande, de encher o olho, sobretudo nas intenções, ã CEE pedíamos dinheiro sem cumprir os quesitos em matéria de meio ambiente. O presidente da Junta Autónoma de Estradas admitiu mesmo que só então se iria proceder ao estudo de impacte ambiental, ou seja, depois da definição do próprio traçado.
Sucederam-se alterações de pormenor, multiplicaram-se as intervenções governamentais anunciando novas alterações, ale que, em Fevereiro de 1990, o Ministro do Plano anunciou que «as novas alterações tornam o traçado aceitável pela Comissão Europeia».
O folhetim já vai longo, mas poderia continuar!
As expectativas e os compromissos assumidos perante as populações por responsáveis do PSD, como Cabrita Neto e Macário Correia, não foram cumpridas.
O estudo de impacte ambiental traduziu-se em mero «verbo de encher», com uma consulta pública formal, sem qualquer sequência. A construção desta via é, aliás, referenciada num relatório do Fundo Mundial para a Natureza e Instituto para uma Política Europeia do Ambiente como exemplo de impacte ecológico negativo da aplicação dos fundos estruturais.
O Governo e o PSD desrespeitaram o diálogo com as populações.
O PSD tomou a «nuvem por Juno»! As legítimas reivindicações das populações, o direito ao ambiente, a participação cívica, a defesa do património, a viabilização de explorações agrícolas, foram razões publicamente transformadas em delitos públicos de opinião. Houve mesmo quem não gostasse que as populações procurassem contactar o Primeiro-Ministro por ocasião da festa do PSD!
Na fixação dos valores devidos pelas expropriações imperou o abuso do poder e o ilegítimo aproveitamento dos conhecimentos jurídicos dos cidadãos, de que podemos fornecer à Câmara exemplos.
Como atempadamente denunciou o PS, uma empresa foi contratada, na prática, para regatear os preços a pagar pelas expropriações. Mal vai o Estado de direito quando os direitos dos cidadãos são, deliberadamente, desrespeitados, restando-lhes o recurso aos tribunais, caso tenham dinheiro, persistência e resistência física para tal.
Sejamos, contudo, realistas: a Via do Infante está em execução; a discussão essencial em tomo da via longitudinal do Algarve é assunto do passado! Sublinhámos a nossa posição de princípio pelo traçado da Comissão de Coordenação da Região do Algarve, contra a conduta do Governo, a falta de respeito pelos cidadãos, pelas leis, pelo ambiente, pelo património.
Os resultados de 6 de Outubro reconfirmaram a maioria PSD. Em ambas as perspectivas é necessário tirar ilações para o futuro.
Os algarvios saberão distinguir o «trigo do joio», quando alguns pretendem atribuir ao PS uma alegada posição contra a Via do Infante, por criticarmos, atempada e correctamente, a solução adoptada e as arbitrariedades na relação da Administração com os cidadãos. Como repetidamente afirmou o meu colega deputado Luís Filipe Madeira, uma má lei pode ser revogada por uma nova maioria, uma estrada não!
Assim sendo, continuaremos a bater-nos: pelo cumprimento integral de todas as recomendações constantes no estudo de impacte ambiental e compromissos assumidos pela Junta Autónoma de Estradas; por melhorias pontuais na execução do traçado; pela concretização da via longitudinal, até Lagos, com adequadas ligações às demais localidades; pela abertura de acessos que sirvam os interesses das demais localidades e se verifiquem em simultâneo com a abertura da via; pelo respeito dos direitos dos cidadãos, nomeadamente o da propriedade privada e o das justas indemnizações.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos mais graves estrangulamentos que se tem colocado ao desenvolvimento do Algarve, desde há mais de uma década, é precisamente o da acessibilidade.
A construção da ponte internacional do Guadiana, a expansão do Aeroporto de Faro, a melhoria da rede portuária, a beneficiação da EN n.º 125 constituem exemplos claros do avanço conseguido no reforço das relações do Algarve com o exterior.
Contudo, todo este conjunto de projectos, que exigiu um elevado esforço de investimento, não cumpriria os seus objectivos primeiros se, paralelamente, não fosse equacionada uma via longitudinal que permitisse o escoamento de todo o volume de tráfego de pessoas e mercadorias, de e para o Algarve, que a EN n.º 125 não consegue comportar desde há vários anos.
A necessidade de uma via longitudinal do Algarve remonta ao final da década de 70, lendo surgido na altura uma corrente de apoio à construção de uma estrada marginal. É, no entanto, no início da década de 80 que o processo da via longitudinal do Algarve se começa a desenvolver.
No período de 1980 a 1982 a Junta Autónoma de Estradas prepara um estudo de viabilidade onde encara três hipóteses alternativas: melhoria da EN n.º 125; construção de uma nova via; solução mista, isto e, melhorando parte da EN n.º 125 e projectando uma outra parte independente.
Neste estudo foram tidos em linha de conta, entre outros, os seguintes factores: a actividade do tráfego que utiliza a EN n.º 125; as tendências da expansão do tecido urbano e da actividade económica regional; a qualidade dos solos e o enquadramento paisagístico; as características do traçado.
Verificado que a solução mais viável seria a construção do uma nova via, foram estudados os vários corredores possíveis e definidos três, designados por sul, norte e intermédio.
Foram então inquiridas a Comissão de Coordenação da Região do Algarve e as 16 câmaras municipais, sendo que a Comissão não se pronunciou, 13 das autarquias foram a favor da solução intermédia, duas discordaram desta e uma não se pronunciou.
Em 1985 foi iniciado o estudo prévio com os objectivos seguintes: melhor definição do corredor de implantação; definição dos nós de ligação; avaliação técnico-económicas e faseamento da construção. Com base em vários parâmetros técnicos, nos quais se incluíam aspectos ligados à preservação dos recursos naturais e patrimoniais da região, foi encontrada uma solução base.
Foi então apresentado, em 1986, o respectivo estudo prévio.
Posteriormente, em meados de 1987, a Comissão de Coordenação da Região do Algarve apresentou um documento intitulado «Estudo de avaliação para dois traçados alternativos da via rápida».
Em face deste contributo e de outros oriundos da Secretaria de Estado da Agricultura e de grupos de agricultores, entendeu o Secretário de Estado das Vias de Comunicação, por despacho de 11 de Novembro de 1987, enviar o processo da via longitudinal do Algarve ao Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes (CSOPT) para parecer.
Surge então, em meados de 1988, o parecer do CSOPT, cujas recomendações, bem como as do estudo de impacte ambiental, entretanto elaborado de acordo com as normas comunitárias, foram lidas em devida conta na elaboração do projecto de execução da via longitudinal do Algarve.
A posição de compatibilização, então assumida pelo Secretário de Estado das Vias de Comunicação, e a elevada qualidade do parecer emitido pelo CSOPT permitiram encontrar as soluções mais adequadas aos interesses nacionais e regionais em causa, ou seja: primeiro, reduzir as áreas ocupadas de solos da Reserva Agrícola Nacional (RAN) de 202 ha, inicialmente previstos, para 93 ha, no projecto final, valor que se situa abaixo da média verificada noutras zonas do País; segundo, encontrar a solução que responde às necessidades reais de um efectivo desenvolvimento regional.
Na verdade, pese embora a necessidade de se atenuarem as assimetrias regionais, cuja solução passa pelos corredores transversais, grande parte da actividade sócio-económica da região concentra-se na sua faixa litoral. É nesta parcela do território que a pesca, a aquacultura, a agricultura competitiva, o turismo e os serviços, a indústria e os espaços urbanos se concentram, gerando fluxos de tráfego exponencialmente crescentes.
Esta situação reflecte-se, aliás, no elevado índice de sinistralidade que se verifica na EN n.º 125: em que o número de acidentes duplicou de 1990 para 1991, passando de 608 para 1255. Também o número de mortos e feridos aumentou significativamente neste período, verificando-se acréscimos de 20% e 75%, respectivamente.
Em terceiro lugar, pretendeu-se reduzir significativamente as situações de condito no processo de expropriação de terrenos e, ale ao momento, mais de 90% das cerca de 1700 parcelas a expropriar revestiram a forma de expropriações amigáveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: em suma, poder-se-á concluir que e natural, lógico e até legítimo que qualquer cidadão, ;a ululo individual ou em grupo, defenda os seus interesses particulares. Também se poderá facilmente concluir que, para qualquer um de nós, é sempre preferível que uma infra-estrutura, seja ela qual for, se localize no terreno do vizinho. O que não seria normal, justo e legítimo era que os representantes do Estado colocassem os interesses de particulares acima dos interesses da comunidade!
Estamos certos de que esta Assembleia e o Governo que dela emanou saberão responder às legítimas preocupações da população algarvia.
Via do Infante - conclua-se o mais rapidamente possível.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, a lei que regula o exercício do direito de votação prevê que o Diário da Assembleia da República relativo ao debate desta petição seja enviado ao primeiro signatário. Dado que este debate é, provavelmente, um dos últimos que esta Câmara fará, no que loca à questão da Via do Infante, pergunto à Mesa se é permitido anexar ao Diário alguns documentos, nomeadamente o estudo do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes, referido tanto pelo Sr. Deputado António Vairinhos como por mim, que se pronuncia perante as duas opções, e outros, quer da Junta Autónoma de Estradas, quer da Comissão de Coordenação da Região do Algarve que, de alguma forma, clarificam o que aqui se passou.

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Portanto, como isso não está previsto na lei, embora lenha sido prática, em lermos de funcionamento normal da Assembleia da República, interpelo o Sr. Presidente no sentido de saber se é ou não possível fazer a entrega desse documento na Mesa para o anexar ao Diário.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa regista o pedido e informa que esse dossier será, naturalmente, enviado ao primeiro signatário da petição, visto também constituir um elemento do material com base no qual se procedeu à sua apreciação.
Srs. Deputados, dou por terminada a discussão da petição n.º 251/V.
Vamos dar início ao debate da petição n.º 252/V, apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações, solicitando a apreciação do processo de reestruturação dos CTT, tendo em vista a defesa dos direitos económicos e sociais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que nos é proposta, subscrita por 2552 trabalhadores dos CTT, solicita a apreciação do processo de reestruturação da empresa pública CTT à luz da sua incidência negativa, por um lado, na degradação da qualidade de serviço prestado e, por outro, na anulação ou redução de direitos e regalias dos trabalhadores e do ambiente de instabilidade provocado pela recusa ao diálogo por parte da administração da empresa dos Correios e Telecomunicações de Portugal, E.P.
É uma petição que ganha, nos dias de hoje, plena actualidade e importância. O elenco das questões colocadas na petição é, de facto, significativamente actual.
O processo de reestruturação, que se propunha aumentar a rentabilidade e a produtividade dos serviços dos Correios e Telecomunicações, teve como efeito o encarecimento dos serviços prestados e a redução de trabalhadores, levando não só à perda de qualidade dos CTT como ao aumento, na prática, das tarifas cobradas. Foi esse, aliás, o «gato escondido com rabo de fora» que foi o correio azul.
Portugal tinha, antes do correio azul, uma qualidade de serviço acima da própria média europeia. O indicador para aferir essa qualidade, como é referido no próprio Plano de Desenvolvimento Postal, é o chamado indicador «Entrega D+1», que expressa a percentagem de correio com origem e destino que é entregue no dia imediato ao seu depósito.
Com um valor de 85%, segundo o próprio Plano de Desenvolvimento Postal, Portugal estava acima da Grécia (80%), da França (79%), da Espanha (42%) e próximo do Reino Unido (89%). Então, para justificar um serviço especial mais caro, a introdução do correio azul, com tarifas mais elevadas (a diferença entre a tarifa normal e a do correio azul atinge, na prática, mais de 100% nas cartas e 300% nos impressos ou nos pacotes postais), a administração dos CTT atrasou, deliberadamente, a entrega do correio normal, que - e os Portugueses estão bem lembrados - chegou a levar uma semana para ser entregue.
Portanto, optou pela via do atraso do correio normal, para justificar desnecessariamente, como os números que temos pela frente indicam, a introdução de um serviço especial mais caro.
Desta forma, em vésperas de eleições, houve, de facto, um aumento das tarifas praticadas pelos CTT sem que o Governo tivesse de dar a cara. Engenhoso, convenhamos!...
Mas podíamos falar ainda na redução da distribuição nas áreas de Lisboa e Porto, onde se passou de duas para uma posta única; do isolamento a que foram votadas muitas áreas rurais, onde a distribuição passou a ser apenas semanal; da redução do número de estações; da entrega da distribuição de telegramas a uma empresa autónoma - o Post Expresso-, exclusivamente constituída por trabalhadores contratados a prazo sem formação, ou mesmo da alteração da classificação da correspondência.
Entretanto, todo este processo de reestruturação é feito, como sempre, à custa de direitos dos trabalhadores.
Empenhada na redução dos postos de trabalho, a administração implantou o processo de reestruturação, designadamente no caso do correio azul, com base no abusivo recurso aos contratados a prazo (num total, hoje, de cerca de 2500), na imposição de elevados planos de trabalho nos sectores em reestruturação, enquanto na maior parte do país se verificava a existência de trabalhadores sem ocupação, declarados excedentários, no aumento substancial do recurso ao trabalho nocturno sem contrapartidas e na redução do horário de trabalho.
Com o objectivo de reduzir despesas à custa dos trabalhadores, o processo de qualificação e enquadramento profissional está pouco mais do que congelado, levando, por exemplo, a que técnicos qualificados estejam a sair da empresa; a que as negociações de revisão do acordo de empresa fossem abandonadas pela administração dos CTT; e a que tivessem sido reduzidas de forma drástica as prestações de cuidados de saúde e encerradas creches e cantinas, restringido-se o serviço de medicamentos.
Viola-se o direito à greve, o direito de reunião e o próprio direito à igualdade, consagrado constitucionalmente através da retirada de todos os prémios e subsídios às mulheres trabalhadoras dos CTT durante a licença de parto, situação esta que já foi objecto de queixa pelos sindicatos e condenada, inclusivamente, pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: ao contrário do que constituía antes um ambiente saudavelmente tradicional de diálogo entre a administração dos CTT e os trabalhadores, através dos seus sindicatos representativos, passou-se para um clima de confronto e para uma ruptura do diálogo.
Esta situação, exclusivamente da responsabilidade da administração dos CTT e da sua tutela, tem vindo a traduzir-se num significativo aumento das greves e em outras formas de luta legítimas dos trabalhadores. Ascende a cerca de meia centena o número de pré-avisos de greve que durante o ano de 1991 foram desencadeados nos CTT.
Como afirmam os trabalhadores, todo este processo gera um clima de intranquilidade que se repercute na própria relação com o público. Por detrás de uma cara cansada ou até agressiva, que por vezes encontramos nos balcões dos CTT, está um clima de trabalho degradado e sem motivações, resultante de uma política profundamente marcada pelo vezo autoritário do Governo e das administrações que nomeia, e para quem, muitas vezes, os trabalhadores são pouco mais do que um número.
Falando com os trabalhadores subscritores da presente petição e preocupados, com razão, com o próprio processo de divisão dos CTT, dizemos também que é preciso um melhor correio, mas que um serviço público desta natureza não pode ser construído com critérios puramente produtivistas e comerciais e, muito menos, à custa dos portugueses utentes dos serviços dos CTT e dos seus trabalhadores.

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Justifica-se, por isso, que o Grupo Parlamentar do PCP, desde já, assuma aqui este compromisso de, na sequência do debate já iniciado, em sede de Comissão de Equipamento Social, requerer a presença do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações na Assembleia da República para novos aprofundamentos e esclarecimentos sobre esta importante matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em nome da Câmara, gostaria de saudar a numerosa assistência, que hoje se encontra nas galerias seguindo este debate, em particular os alunos do Externato de São José de Lisboa, da Escola Secundária de Canecas e do Colégio do Sagrado Coração de Maria de Lisboa, para quem peço uma saudação especial.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar da existência de algumas deficiências de funcionamento, o serviço de distribuição postal sempre mereceu a confiança da generalidade dos cidadãos.
Todos sabíamos que, com uma ou outra excepção, uma carta enviada de e para qualquer ponto do País estaria no seu destino no dia seguinte. Até 1985, o grau de satisfação deste propósito não parou de crescer e os CTT sempre fizeram ponto de honra em cumprir esse objectivo.
A partir dessa data, o serviço foi-se deteriorando e, ano a ano, á percentagem de satisfação foi diminuindo, em grande pane fruto das orientações governamentais impostas à empresa.
Para o Governo tudo tem de dar lucro, esquecendo que há serviços que, pelo seu carácter eminentemente social e pela sua importância no desenvolvimento do País, devem ser assegurados em condições de igualdade a todos os cidadãos, independentemente do seu lugar de residência.
Um sector de fundamental importância como e o das comunicações postais e telecomunicações, que deveria ser um elemento decisivo para atenuar assimetrias, contribuindo para um desenvolvimento harmonioso do País, está exactamente a fazer o contrário, promovendo o aumento de assimetrias entre regiões do nosso país.
Enquanto na Europa há hoje vários países com duas distribuições domiciliárias de correio por dia, em Portugal há zonas, nomeadamente zonas rurais do interior do País, com uma ou duas distribuições por semana, fruto da chamada «lógica de rentabilização» imposta pelo Governo.
No fundo, reside aqui a principal preocupação dos promotores desta petição, a par de problemas relacionados com direitos e regalias dos trabalhadores dos CTT e, da falta de diálogo entre os diversos intervenientes no processo de reestruturação do sector.
Sabíamos que isto acabaria por acontecer e dissémo-lo, aqui, quando se discutiu a Lei de Bases das Telecomunicações; a reestruturação de um serviço público não pode ter como critério determinante apenas o lucro. O critério tem de estar fundamentado em razões de serviço público, em concepções do interesse geral, que nem sempre, como todos sabemos, se identificam com a mera lógica do mercado.
Não somos contra a racionalização de meios, os critérios de eficácia, as legítimas preocupações de modernização de estruturas ou a procura de novas áreas de prestação de serviços, mas o que não podemos aceitar e esta lógica que
deixa tudo entregue às regras assépticas do mercado e transforma tudo, desde a saúde dos Portugueses a outros serviços vincadamente sociais, em mera contabilidade do tipo mercantilista do deve e haver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Carrilho da Cunha.

O Sr. Luís Carrilho da Cunha (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que apreciamos neste momento foi apresentada na Assembleia da República em 18 de Maio do ano passado e decorre, segundo os seus subscritores, da preocupação com a defesa dos direitos económicos e sociais dos. trabalhadores dos CTT e com a qualidade do serviço...Esta posição, assumida pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações, radica na apreciação que este faz das eventuais consequências negativas para os trabalhadores da empresa derivadas da restruturação em curso.
A petição em si mesma, o facto de a empresa em causa empregar mais de 30 000 pessoas e a inegável importância estratégica que os CTT assumem no desenvolvimento do País são uma tripla imposição para reflectirmos em conjunto nos problemas apontados...
Esta reflexão não poderá, no entanto, e como é óbvio, substituir, o papel único e determinante que a administração dos CTT, e as estruturas representativas dos seus trabalhadores hão-de continuar a desempenhar em sede própria e conducente à concertação das respectivas posições.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: os Correios de Portugal são uma realidade concreta desde 1520. Ganhando a sua autonomia administrativa e financeira, em 1911, adoptaram, a actual forma jurídica de empresa pública em 1969, com a designação que ainda se mantém, ou seja, CTT - Correios e Telecomunicações de Portugal, E.P.
No Conselho de Ministros de 9 do corrente mês foram aprovadas novas e profundas alterações para a empresa - a sua passagem a sociedade anónima de capitais públicos, por exemplo, entre outras decisões fundamentais para o seu futuro.
A estas alterações formais da vida da empresa acresce todo um conjunto de determinantes tácticas de gestão, traduzidas em medidas tendentes a racionalizar os meios, por forma a possibilitar á recepção, tratamento e entrega rápida de um volume cada vez maior de objectos, que, neste momento, rondam cerca de três milhões por dia.
A introdução de serviços diversificados, que correspondam a necessidades diferentes, nomeadamente em termos de rapidez, deixam aos, diversos públicos que recorrem aos serviços dos CTT um conjunto de opções, que escolherão de acordo com as suas necessidades concretas e às quais, corresponderão laxas específicas.
Assim, a criação do correio azul, da Post Expresso, do express mail e de outros novos serviços na empresa quebraram rotinas e modificaram hábitos.
A criação da Post Expresso, participada quase a 100% pelos CTT, e do Instituto das Comunicações de Portugal ocasionaram mobilidade de pessoal, sempre negociado individualmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: não temos a visão pessimista do Sindicato que apresentou esta petição, quando, em documento de há dois dias e a propósito da sua fundamentação, afirma que é permanente a degradação da qualidade dos serviços dos CTT.

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Sc considerarmos, por exemplo, os indicadores fornecidos pela empresa no que concerne ao grau de probabilidade de chegada do correio normal dentro dos esperados três dias úteis, verificamos um valor na casa dos 97%, bem assim como a expectativa de chegada no dia seguinte do correio azul se cifra em 96,8%. Estes indicadores não permitem falar de degradação, pelo menos nestes serviços.
Não podemos, no entanto, deixar de concordar que, no início do lançamento destes novos serviços, nomeadamente do correio azul, se registou alguma perturbação na distribuição efectuada pelos CTT.
O esforço já feito, e a continuar, na modernização dos numerosos balcões dos CTT espalhados pelo País, com o recurso à informatização e ao alívio dos procedimentos administrativos, aliados a uma política de formação profissional contínua, com forte incidência nos 6 000 funcionários atendedores da empresa, darão ao público uma garantia de qualidade dos serviços prestados.
Também se reveste de particular importância todo o esforço gigantesco que tem vindo a ser leito na modernização da área das telecomunicações.
Não pretendendo fazer uma análise longa dos serviços dos CTT, parece-nos, no entanto, que as alterações na forma jurídica da empresa, a introdução de novos produtos e serviços e a criação de uma mentalidade empresarial na gestão decorrente da necessidade de dar resposta às solicitações cada vez mais exigentes da sociedade criaram nos CTT uma dinâmica de mudança estrutural e funcional, que obviamente poderá criar alguma inquietação geradora de uma compreensível ansiedade.
Qualquer organização possuidora de uma cultura organizacional cimentada numa vida de séculos, em que as mudanças profundas foram quase inexistentes, vive sempre, quando estas ocorrem a ritmo acelerado, como agora acontece nos CTT, um processo de adaptação algo complicado.
Sentida em todos os momentos da vida da empresa, mas mais imperiosa nestas alturas, é a necessidade de diálogo que desejavelmente deverá existir entre a gestão, com as suas responsabilidades próprias, e as estruturas representativas dos trabalhadores, elementos fundamentais neste complicado processo de modernização.
A motivação pessoal dos trabalhadores dos CTT, a formação profissional contínua, a negociação paciente dos pontos de vista eventualmente divergentes, tanto no campo salarial como nas restantes garantias sociais da empresa, são condições fundamentais para o sucesso, traduzido na melhoria continuada dos serviços prestados ao País.
Para finalizar, pensamos poder afirmar que os mais de 30 000 trabalhadores dos CTT compreendem o esforço que está a ser feito e tem demonstrado, na prática, um grande sentido de responsabilidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos, pois, à apreciação da petição n.º 257/V (4.º) -Solicita que sejam tomadas medidas legislativas sobre os passes sociais-, apresentada pelo Movimento Unitário dos Reformados, Pensionistas e Idosos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Vieira.

O Sr. Rui Vieira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 257/V, subscrita por 12 810 cidadãos, pede a intervenção dessa Assembleia a fim de que sejam eliminadas as restrições em vigor na utilização dos passes sociais pelos reformados, pensionistas e idosos.
Trata-se de uma aspiração justa, cuja concretização virá, de facto, facilitar a vida a um sector da população, maioritariamente constituído por pessoas de recursos económicos insuficientes.
As condições de validade horária dos passes sociais para a terceira idade, actualmente em vigor, fixadas pela Portaria n.º 600/84, de 11 de Agosto, impedem, na prática, os seus detentores de os utilizarem durante os períodos de ponta, de segunda-feira a sexta-feira.
Mais concretamente: entre as 6 horas e 30 minutos e as 9 horas e 30 minutos e entre as 17 e as 18 horas, os passes não tem validade. Assim, sabendo-se que os idosos precisam de se deslocar com frequência, quantas vezes por motivo de doença, para consultas e tratamentos médicos, é fácil imaginar os transtornos e dificuldades decorrentes dos condicionamentos do passe social.
Em 1986, através da Portaria n.º 235, de 22 de Maio, o Governo de então, reconhecendo as dificuldades que já aqui referi, propôs-se eliminar as aludidas restrições de circulação, desde que o cidadão em causa tivesse um rendimento igual ou inferior ao salário mínimo nacional.
Era um passo pequeno, mas já era qualquer coisa! O pior e que a mesma portaria, ao remeter para despacho favorável das empresas de transportes a concessão do benefício, tomou inviável a sua aplicação.
Foi uma medida que proporcionou a oportunidade de o Governo lazer propaganda em proveito próprio e que em nada beneficiou os seus destinatários.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PS assume aqui o compromisso de, em breve, apresentar na Mesa da Assembleia da República um projecto de lei que acabe com os condicionamentos e restrições na utilização dos passes sociais pelos reformados, pensionistas e idosos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito desta petição, pudemos acompanhar Maria Guinot num belo poema que nos foi transmitido por uma cassette distribuída pela Câmara Municipal de Lisboa e acompanhámo-la olhando para o mundo da terceira idade, abrindo as portas do Jardim da Estrela e entrando nas praças públicas deste país. Nos bancos pejados de idosos descobrimos olhares vazios de quem se sente isolado e marginalizado nesta sociedade, também ela vítima, no seu conjunto, de opções políticas desumanizadas.
A descoberta deste mundo existente hoje e aqui, no final do século XX, onde contraditoriamente se arrastam os segundos e minutos, na sua caminhada célere para a mela, esperando, apesar de tudo, a luz ao fundo do túnel, transforma em comédia negra, afirmações que ouvimos constantemente neste hemiciclo, como ainda ontem: que o Governo tem dado a maior ênfase às questões sociais, que o combate à pobreza se encontra na primeira linha de preocupações, etc.
Está, de facto, a decorrer - e é bom que seja lembrado - um programa de acção comunitária contra a pobreza, com o seu termo em 1994, no qual se salienta a necessidade de integrar económica e socialmente os grupos de pessoas menos favorecidos, combatendo a sua exclusão económica e social.

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A recomendação da comissão europeia de 10 de Maio de 1989 afirma, e passo a citar, «ser necessário encorajar as pessoas idosas a tirarem um maior proveito das possibilidades de enriquecimento pessoal, facilitando dessa forma a sua autonomia e uma melhor participação das pessoas idosas na vida social».
E é realmente bom que tenhamos hoje, nesta Assembleia, crianças que podem, de facto, aperceber-se, pela discussão desta petição, de quanto sofrem os seus irmãos de idade mais avançada.
Perante isto, o que faz o Governo, para além de propagar os costumeiros slogans de lula contra a pobreza, nomeadamente em relação aos idosos?
No quadro mais geral em que esta petição se integra, a degradação dos serviços públicos de saúde, o aumento anunciado das taxas moderadoras, a redução do receituário gratuito e a diminuição das comparticipações no preço dos medicamentos contrariam tudo aquilo que consta de recomendações e decisões da Comunidade Europeia e contribuem para uma maior marginalização e isolamento da terceira idade.
Por outro lado, relativamente à questão concreta suscitada por esta petição, é necessário salientar o seguinte: em 1986, como já foi referido na intervenção anterior, o Governo decretou, numa portaria com que plantou, seguramente, mais umas dores na paisagem que vem impingindo, que os reformados e pensionistas de recursos insuficientes, com mais de 65 anos, teriam direito aos passes sociais sem qualquer restrição horária e diária.
Mas logo no artigo 2.º da referida portaria o Governo colocou na dependência de soberano despacho favorável da administração das empresas de transportes a concessão dos referidos benefícios. E para completar, ainda, o quadro e torná-lo mais hipócrita, e óbvio que ficou na dependência do Governo a emissão desse despacho favorável pois o Governo teria de entregar às empresas de transportes a indemnização compensatória pela diminuição das receitas, coisa que não fez, verificando-se, assim, a continuidade das restrições. Tudo isto, é claro, no hipócrita aforismo «menos Estado, melhor Estado», ou seja, na nudez crua da verdade: menos Estado, piores condições sociais.

Vozes do PCP: -Muito bem!

A Oradora: - Aliás, a referida portaria também se desmascara quando, por exemplo, considera sem direito ao passe social não aqueles que tenham um rendimento per capita inferior ao salário mínimo nacional mas aqueles que tenham um rendimento do agregado-familiar superior ao salário mínimo nacional, o que é diferente da anterior afirmação. Assim, num agregado com três pessoas, em que se verifique, na globalidade, um rendimento superior ao salário mínimo nacional - 14 000$ per capita - já um reformado não tem direito ao passe social, ou seja, o valor de 14 000$ per capita é uma fortuna neste país! Daí a hipocrisia da portaria, daí que, no que toca a concessão e uso dos passes sociais, os idosos tenham continuado a ser marginalizados, isolados e privados do uso do transporte público, apesar das suas necessidades culturais, e de saúde.
Entregámos há quase um ano, na Mesa da Assembleia, da República, o projecto de lei n.º 46/V, que responde às reivindicações apresentadas pelo Movimento Unitário dos Reformados, Pensionistas e Idosos (MURPI) nesta petição. E, para que o projecto de lei não sofra mais atrasos, vamos entregar agora mesmo à Mesa um requerimento no sentido de que a Assembleia adopte o processo de urgência em relação a esta questão.
Esta petição, pelo número dos seus subscritores - 12 810 cidadãos -, demonstra bem que, afinal, nos olhos vazios irrompe, através do musgo da solidão, um grito jovem de lula, que o poeta Daniel Filipe expressou num seu poema: «Pelos meninos tristes suburbanos/contra o peso da angústia contra o medo/.../lutaremos meu Amon.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Branco Malveiro.

O Sr. Branco Malveiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A direcção do meu grupo parlamentar encarregou-me de, em nome do Partido Social-Democrata, explanar o nosso ponto de vista sobre a petição que ora sobe a este Plenário, apresentada pela Coordenadora Nacional do Movimento Unitário dos Reformados, Pensionistas e Idosos, na qual os peticionários nos solicitam medidas legislativas sobre os passes sociais para os cidadãos em situação de reforma, pensionistas ou idosos. É, portanto, este o corolário lógico de estarmos hoje, aqui, a dar a merecida, e devida, atenção e resposta a cerca de 12 810 cidadãos portugueses que usaram esse direito constitucional.
Essencialmente pelas três ordens de razões que adiante referirei, e com enorme entrega, muito interesse e grande respeito que sempre encararei estas questões da política social. Pelo seu carácter de nobreza e dignidade, é-nos exigida, no seu tratamento, uma postura de rigor, de verdade e, de ética, pois, quando o que está em causa é a pessoa humana, até aos políticos ficam vedadas certas teorizações utópicas e a pura e irresponsável demagogia política.
Eis, sucintamente, as minhas três motivações principais: primeiro, porque, como humanista convicto que me considero, coloco na vivência do meu dia-a-dia e no trato com o meu semelhante (cm especial com os mais vulneráveis e desfavorecidos) toda a minha afectividade, voluntarismo e sentimentos; segundo, porque, de há 25 anos a esta parte, laço das questões da previdência e do social o meu modus vivendi, quer como gestor de organismos da segurança social, quer como dirigente de organizações não governamentais, quer como membro de instituições de solidariedade social; terceiro, porque, como futuro beneficiário das conquistas pelas quais estas organizações hoje pugnam e em função da melhoria das suas condições de vida e da obtenção de cada vez, mais regalias e direitos para os seus representados, delas irei usufruir quando chegar a minha vez.
Retenho-me agora exclusivamente na petição, mas, antes de referenciar a questão fulcral da mesma, que revela e releva as condições de atribuição e utilização dos passes sociais, não consigo eximir-me de tecer breves considerações ao seu. preâmbulo, extrapolando o parágrafo, que passo a citar: «Os reformados, pensionistas e idosos tem sido altamente penalizados, ao longo dos anos, pela inflação, pelo corte e ou diminuição das regalias sociais - anteriormente asseguradas pela segurança social [...], pela grande insuficiência do aumento de pensões de reforma».
Ora, se no passado, felizmente já longínquo, alguns destes considerandos podiam ter valimento, não se pode hoje aceitar tão apressada e simplista afirmação. Isto porque, situando-me na decorrência temporal dos últimos anos da responsabilidade governativa do PSD, a constatação da realidade e, felizmente, bem diferente.

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Assim e em vez do corte ou da diminuição das regalias sociais, muito pelo contrário, tem vindo a ser adoptadas medidas de protecção social, outrora meros exercícios de retórica, entre as quais: a redução na taxa de assinatura do telefone; a isenção das taxas de utilização da rádio e televisão; a isenção de impostos sobre depósitos da conta Poupança-Reformados; o subsídio de renda de casa; a comparticipação parcial ou total em medicamentos, análises, radiografias e outros exames, próteses e veículos de rodas; a proliferação da rede nacional de lares, centros de dia, centros de convívio e centros de apoio domiciliário; o acesso gratuito a museus, palácios e outros monumentos, etc.
Será isto que tem constituído diminuição de regalias sociais relativamente às anteriormente asseguradas pela segurança social?
Socorrendo-me apenas dos números - que, embora frios, para bom entendedor respondem a muita coisa-, se o crescimento do volume de despesas com pensões da segurança social passou de 193 milhões de contos, em 1985, para mais de 635 milhões de contos, em 1991, o que implica um crescimento de 230%, e, por outro lado, se lhe aduzirmos a institucionalização do 14.º mês, pedir mais é, obviamente, um direito e sê-lo-á da maior justiça.
Mas para reforço deste entendimento bastará, apenas, chamar a atenção para o facto de que só para o pagamento de pensões de reforma da segurança social, em 1991, cada um dos 10 milhões de portugueses, incluindo recém-nascidos, teria de ter pago, no ano transacto, 63 500$.
O povo português, em geral, e os reformados, pensionistas e idosos, em particular, sabem bem como o Sr. Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, e tão escrupuloso no cabal cumprimento dos programas de acção dos seus governos, para que não subsistam quaisquer dúvidas quanto à efectivação dessas realizações.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PSD e o seu governo vão continuar a «cumprir a esperança», no objectivo do alargamento da utilização dos passes sociais e nas condições da sua acessibilidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não apoiado!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da petição n.º 262/V (4.ª)- apresentada pela Comissão de Trabalhadores da Aliança Seguradora, S.A., solicitando medidas de protecção dos direitos dos trabalhadores no processo de privatização desta empresa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição, cujos primeiros signatários são os membros da comissão de trabalhadores da Aliança Seguradora vem, por agendamento casuístico, demonstrar a falta de razão da bancada do PSD, quando afirmou recentemente que nas empresas privatizadas estão a ser respeitados os direitos e regalias dos trabalhadores existentes à lei da privatização.
Há oito dias atrás um deputado da bancada da maioria reclamava da nossa parte exemplos concretos sobre a restrição desses direitos e eu julgo valer a pena fazer essa prova, nos escassos minutos de que dispomos. Será um exemplo apenas, mas valerá por isso mesmo.
Na primeira fase da privatização, quando se procedeu à fusão das seguradoras que vieram a integrar a Aliança, constatou-se a necessidade de uniformizar a malha mais diversificada de regalias extracontratuais. Mediante um processo negocial, tais regalias foram uniformizadas e reconhecidas, sem quaisquer restrições, aos trabalhadores que reuniam as condições para o efeito.
O decreto que veio alterar o estatuto da empresa reconhecia que «os trabalhadores da Aliança Seguradora mantêm todos os direitos, obrigações e regalias emergentes dos contratos individuais e colectivos de trabalho que descrevem à data da entrada em vigor deste diploma». Aliás, o decreto vinha confirmar os princípios e orientações emanados da Lei n.º 11/90, de 5 de Abril, e do acórdão do Tribunal Constitucional que sobre ela se pronuncia.
Feita a privatização, em cujo processo não se pretendiam sobressaltos, eis que o actual conselho de administração, de forma unilateral, recorre abusivamente a ordens de serviço para desfigurar e limitar regalias adquiridas há muitos anos. Usando de um subterfúgio mistificador, o conselho de administração afirma que não retirou regalias dos trabalhadores, bastando para sinto que, em vez da liquidação dos direitos e das regalias, os actos fossem classificados de alteração.
Assim, com esta manobra, os trabalhadores da Aliança Seguradora foram prejudicados no que se refere às condições de acesso ao seguro automóvel, assente numa tarifa especial, e ao seguro de doença. Com a alienação da tarifa especial e a aplicação da tarifa geral, os trabalhadores foram materialmente punidos. No caso do seguro de doença, para alem das alterações do clausulado, foi aplicada uma franquia pesada, antes inexiscismo.
No exercício dos seus direitos, a comissão de trabalhadores tentou negociar as matérias referidas, mas teve como resposta a recusa sistemática do conselho de administração.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: estão os trabalhadores da Aliança Seguradora profundamente preocupados com o seu futuro: tem a percepção de que estas medidas, contrárias à lei, podem constituir precedência para novas ofensivas aos seus direitos, conforme se consolida a privatização da empresa. Aliás, a própria ameaça aos postos de trabalho com a tentativa de impor reformas compulsivas e já outro sinal desta preocupação e desta razão que assiste aos trabalhadores.
A Assembleia da República não pode silenciar os actos aqui denunciados pelos peticionários e nesse sentido o PCP vai requerer ao Governo para que na Aliança Seguradora seja reposta a justiça e os direitos que são de lei e dos trabalhadores.

Aplausos do PCP e do deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A comissão de trabalhadores da empresa Aliança Seguradora e 85% dos trabalhadores que a mesma representa posicionaram esta Assembleia com o claro objectivo de verem repostos e ou garantidos direitos adquiridos, conquistados ao longo de muitos anos de trabalho e dedicação às empresas, que, em 1981, e em resultado da fusão, deram origem a esta seguradora e que o conselho de administração, cuja nomeação e consequente investidura foram da total responsabilidade do governo do PSD, claramente violou.

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Trata-se, pois, de mais um processo em que os representantes do Governo nos cargos de administração das empresas de que o Estado é ou foi proprietário se esquecem que vivemos num país de direito e, mais grave ainda, que ao Estado, mais que a qualquer outra entidade, e exigido o escrupuloso cumprimento da lei.
Não obstante a prática de violações por interposta pessoa, e atentas as iniciativas do órgão de representação dos trabalhadores da Aliança Seguradora, constata-se facilmente que o Governo, nomeadamente os Srs. Secretários de Estado do Tesouro e das Finanças, tomou conhecimento da situação através de pedidos de audiência e da recepção de um dossier completo sobre a matéria, nada tendo feito para eliminar a violação praticada pelos seus representantes no conselho de administração.
Apesar da manifesta falta de vontade dos órgãos de gestão para resolver o problema comido na petição em discussão, os trabalhadores, numa atitude de grande dignidade, decidiram (e passo a citar) «Mandatar a comissão de trabalhadores para encetar negociações com o conselho de administração, no sentido de ser renegociado o conjunto das regalias [...], tendo por base o seu actual conteúdo [...] prevendo [...] nessas negociações poder vir a ser contemplada uma eventual actualização do custo das garantias custeadas pelos trabalhadores, com contrapartidas bastantes e efectivas».
À atitude de abertura negocial dos trabalhadores respondeu o conselho de administração com a decisão ilegal de retirar direitos adquiridos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: num curto espaço de tempo, oito dias, esta Assembleia analisou - e repito «analisou», porque outra coisa não fez- 10 petições apresentadas por cidadãos de diferentes sectores da sociedade portuguesa e representando, na óptica do Partido Socialista, milhares de trabalhadores. Certamente que para o Partido Social-Democrata se tratará, apenas de uns quantos, poucos, eleitores descontentes!
Creiam, Srs. Deputados, que as petições irradiam confiança e apreço pela Assembleia da República. Assim, não podemos nem devemos, seja a que pretexto for, desvalorizar o instituto da petição, sob pena de, inevitavelmente, virmos a descredibilizar esta Câmara.
O efectivo exercício do direito de petição é, hoje, o melhor indicador de que os cidadãos portugueses continuam a acreditar nas instituições democráticas, particularmente na Assembleia da República. No entanto, que não restem dúvidas a ninguém, esperam respostas claras e objectivas para os problemas que os afligem e um combate ética às injustiças que os perseguem.
Por isso, e de forma cautelar, recorreram já para os tribunais de trabalho. Só que, como é sabido, a aplicação, da justiça em Portugal é extremamente morosa. Que o digam os inúmeros trabalhadores sujeitos à prepotência e às injustiças, que aguardam - sabe-se lá com que sacrifícios! - quatro, cinco e seis anos pela resolução dos conflitos laborais. E, apesar da permanente denúncia de ião injusta situação, não se vislumbram quaisquer iniciativas do Governo para pôr fim à manifesta incapacidade do poder judicial.
Os peticionários esperam de nós o exercício das competências que a lei fundamental nos confere. Não os desiludamos e sejamos capa/es de repor a legalidade e de fazer aplicar a justiça.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferra de Abreu):- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: a petição n.º 262/V (4.º) tem, fundamentalmente, quatro pontos, o primeiro dos quais se prende com o montante do prémio do seguro automóvel pago pelos trabalhadores da Aliança Seguradora S.A. Tive, simultaneamente, informações do conselho de administração e da comissão de trabalhadores da empresa de que ambos aceitam a indexação do crescimento do montante do prémio aos níveis salariais.
Relativamente a esta matéria, parece-me que, neste momento, há uma possibilidade de consenso, desde que se estabeleça o diálogo. É esse o apelo que aqui gostava de fazer, ou seja, de que as partes se sentem à mesa e, com base nisto -agora parecem estar de acordo-, consigam chegar ao consenso.
Relativamente ao seguro de doença, tive, igualmente, informações do conselho de administração da empresa de que pretendem negociar um pacote global mais abrangente do que aquele que existe no momento e parece-me, também, que por essa via, e desde que haja o necessário diálogo, se conseguirá chegar a bom porto.
Quanto ao outro ponto, o da constituição do fundo de pensões pós-privatização, neste momento não tem equidade, já que o fundo de pensões está perfeitamente constituído nos termos desejados pelas partes.
A constituição de um seguro de vida que salvaguarde o pagamento das pré-reformas para a eventualidade de a companhia ter dificuldades financeiras e não o fazer, parece-me um pouco mais difícil de aceitar, já que os próprios trabalhadores em efectividade de funções não gozam desse direito. Daí não me parecer justo que os pré-reformados tenham esse direito, quando os trabalhadores não o tem. Aliás, por esta lógica, qualquer empregado poderia exigir, nesse país, ao seu patrão que fizesse um seguro para a eventualidade de a empresa ter dificuldades financeiras. Não parece uma posição facilmente defensável.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao pagamento dos complementos de reforma aos trabalhadores nos termos do contraio colectivo de trabalho, tenho conhecimento de que esse pagamento está a ser leito e de que a lei está a ser cumprida. Não está e a ser feito da fornia como é pedido na petição, ou seja, através de um seguro de rendas vitalícias diferidas.
Srs. Deputados, só que a forma como se paga esse complemento de reforma e um acto de gestão e tal está na esfera de competências do conselho de administração da empresa, que não responde perante a comissão de trabalhadores nem perante a Assembleia da República, mas, sim, perante a assembleia geral da Aliança Seguradora.
Nessa medida, o importante é que a lei seja cumprida, que os complementos de reforma sejam pagos, e eles estão ser pagos. Quanto à forma, essa é da competência do conselho de administração.
Em suma, e relativamente a esta petição, entendemos que existem condições para que as preocupações da comissão de trabalhadores para este período pós-privatização possam ser praticamente diluídas e, por isso, fazemos um apelo ao diálogo entre as partes.
Acresce também a este factor que a saúde financeira da Aliança Seguradora vai, com certeza, melhorar graças à privatização. Digo isto porque é óbvio que ninguém compra uma empresa para a arruinar mas, sim, para a recuperar e o

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novo leque de accionistas da Aliança Seguradora tem iodas as potencialidades para a sua concretização. Se o fizerem, obviamente que os trabalhadores serão logo os primeiros beneficiados. Estamos certos de que isso, com certeza, acontecerá.

O Sr. Lino de Carvalho(PCP): - É o porta-voz do conselho de administração!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da petição n.º 266/V (4.º), apresentada pela Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal, solicitando a inviabilização dos projectos governamentais que visam a aliciação da legislação de trabalho.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: À laia de intervenção, permita-me um pequeno reparo. Nesse sossegado fim de manhã de sexta-feira, esta petição fecha o ciclo de discussão e apreciação, em Plenário, de petições subscritas por mais de 50 OOO cidadãos. Não é dignificante para esta Assembleia nem para os peticionários que este instituto constitucional seja assim tratado. É inevitável que as bancadas do Plenário e dos jornalistas tenham o aspecto que tem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: a estrutura sindical mais representativa dos trabalhadores da hotelaria e turismo, acompanhada por mais de 1000 peticionários, coloca como preocupação central a aplicação da vasta legislação laboral que recentemente entrou em vigor.
Os mentores, subscritores e defensores das leis de despedimento por inadaptação, da flexibilização dos horários de trabalho, do alargamento do período experimental e da limitação ao direito de ferias consideram tal preocupação sem fundamento. Os argumentos, com maior ou menor novidade na adjectivação, são idênticos quando comparados com aqueles que foram proferidos durante o debate sobre as alterações antecedentes à lei dos despedimentos. Nessa ocasião, o Sr. Ministro Penedo e a bancada do PSD enxofravam-se quando denunciávamos os reais objectivos que emanavam da lei. Que exagerávamos, diziam!
Os despedimentos na Seagate, na Automática Eléctrica Portuguesa, na Firestone, na Siemens, os anúncios de outros processos idênticos vão calando tais defensores. Com este segundo pacote laboral, agora a vigorar, não é necessário ser profeta para ver a razão que assiste aos trabalhadores, a estes peticionários, quando acusam tais diplomas de aumentar a precariedade no emprego, de visar a desregulamentação de direitos, com diminuição do estatuto do homem social.
Ouvindo-os, eles davam um pequeno exemplo: onde e que o Governo e o PSD se podem suscitar para justificar o aumento, para 90 dias, do período experimental na maioria das empresas do sector de hotelaria, enquanto nas empresas de maior dimensão de outros sectores se exige 60 dias? Três meses à experiência não é uma forma encapotada de criar um regime mais precário que o contraio a prazo, não é uma forma de reduzir o direito dos trabalhadores, particularmente dos jovens trabalhadores, ao salário, sem qualquer outra prelecção ou subsídio? A flexibilização dos horários diários e semanais em conformidade com os exclusivos interesses da empresa, o forçar à renúncia do direito pleno às férias por parte do trabalhador, não significa «coisificar» quem trabalha e produz? É sustentável que a aplicação dos novos avanços da ciência e da técnica sejam virados contra os trabalhadores mais velhos, criando uma nova figura de despedimento, denominada de inadaptação?
A lógica do lucro prevalece sobre a dimensão social do trabalho.
Não duvidamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de que estes diplomas, motivadores das reclamações dos peticionários, caso fossem aplicados, iriam provocar novas discriminações, exclusões e insegurança no mundo do trabalho. Pela calada dos dias seguintes às eleições de 6 de Outubro foram publicados.
Nos processos de negociação da contratação colectiva que agora estuo em curso vão surgindo as pressões patronais para os incluir nas convenções a negociar, a par da contenção salarial, mas os trabalhadores e as suas organizações representativas estão atentas.
Simultaneamente com a lula por salários mais dignos, não abdicam de defender os direitos duramente conquistados ao longo de dezenas de anos e acolhidos na contratação.
No terminal de discussão pública realizada em tomo do projecto de lei do PCP sobre a revogação e alteração das normas mais gravosas do pacote laboral, constatando os pareceres das organizações dos trabalhadores, temos a certeza de que a aplicação desta legislação de trabalho vai contra as aspirações e interesses sociais dos trabalhadores. Impõe-se, por isso, a sua revogação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferra de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lamego.

O Sr. José Lamego (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os subscritores da petição n.º 266/V (4.º), apresentada pela Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal, dirigiram-se à Assembleia da República solicitando a inviabilização dos projectos governamentais que visam a alteração da legislação do trabalho, nomeadamente em matéria do regime jurídico de trabalho de menores, das férias, do trabalho em comissão de serviço, do período experimental, da duração do trabalho e da cessação do contraio de trabalho por inadaptação.
O Partido Socialista apresentou sobre esta matéria iniciativas legislativas próprias, conforme os Srs. Deputados estão recordados, e apresentou igualmente diversos requerimentos de avocação que, tal como as suas iniciativas legislativas, foram rejeitados pela maioria parlamentar do PSD. Contamos ainda, e é a resposta fundamental que damos aos subscritores dessa petição, nesta sessão legislativa, voltar a apresentar projectos de lei sobre algumas destas matérias.
Nós, Partido Socialista, consideramos que a persistência em Portugal de trabalho infantil em larga escala deve constituir uma preocupação permanente desta Assembleia e sobre esta matéria vamos apresentar iniciativas legislativas próprias. Consideramos lambem que a admissão de despedimentos individuais fora de situações de justa causa deverá merecer cuidados que a actual legislação não acautela. Dissemos isto aquando da discussão do pacote laboral e voltamos a repeti-lo hoje.
Para além disso, causa a maior apreensão a precarização real de muitas situações de prestação de trabalho fora dos enquadramentos legais vigentes. Esperamos que tudo isto venha a merecer a atenção dessa Câmara na presente sessão legislativa.

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É sabido também que o PS não só votou contra a legislação elaborada pelo Governo mas lambem apontou a inconstitucionalidade decorrente da não audição prévia das organizações de trabalhadores, para além de ter suscitado dúvidas sobre a constitucionalidade material de muitos destes preceitos legislativos.
O Tribunal Constitucional corroborou esta posição do Partido Socialista, quando declarou á inconstitucionalidade de todas as normas com fundamento em inconstitucionalidade formal, no quadro da fiscalização preventiva desses diplomas, que, então, foi requerida pelo Sr. Presidente da República. Sanada, posteriormente, a inconstitucionalidade formal, subsistem, na opinião do Partido Socialista, normas cuja inconstitucionalidade material é evidente. Mas quem; com força de autoridade, se pronunciará sobre estas questões será o Tribunal Constitucional, junto de quem está pendente o processo de fiscalização sucessiva de constitucionalidade desta legislação.
Esta foi, e é, a posição do Partido Socialista.
Reconhecemos a autonomia plena dos parceiros sociais e para nós a concertação e um instrumento legítimo de regulação de interesses. Consideramos que a UGT celebrou, nas condições políticas e sócio-económicas existentes, o acordo que era o possível para a altura, salvaguardando os interesses dos trabalhadores e os do sindicalismo em Portugal. Neste ponto divergimos claramente - e devemos confessá-lo - da posição política geral que 6 indiciada pelos peticionários.
No entanto, nós, Partido Socialista, devemos reconhecer, e afirmamo-lo perante esta Assembleia da República, que vamos repropor a discussão e apresentar uma iniciativa legislativa própria que, esperamos, venha a ter o assentimento da maioria desta Assembleia e que, portanto, contribua para corrigir muito do que, na actual legislação laboral, e manifestamente violador dos interesses dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferra de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.

O Sr. Rui Salvada (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 266/V (4.º), da iniciativa da Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal, visa protestar contra as alterações introduzidas nó ordenamento jurídico-laboral português.
Como é sabido, a questão substancial que a petição levanta está ultrapassada, uma vez que o conjunto de diplomas que era seu objecto já foi consagrado em forma de lei, na sequência de uma autorização legislativa da Assembleia da República.
Mas se esta questão está resolvida, a petição tem o mérito de tornar oportuna uma reflexão sobre o sentido político-social que está na base desta iniciativa da direcção da Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal.
O PSD, que sempre pautou a sua política no mundo do trabalho por um grande respeito pela autonomia das organizações sindicais façe às forças partidárias, e pôr conferir às organizações de trabalhadores um grande peso institucional, enquanto representantes dos legítimos interesses dos trabalhadores, não pode deixar de lamentar que as posições defendidas na petição indiciem claramente o indesejável seguidismo em relação às posições conservadoras de algumas forças, ditas, de esquerda e que, objectivamente, contrariam muitos dos interesses dos trabalhadores portugueses.
Recordo que o conjunto de diplomas em questão é uma consequência do acordo económico-social, que é a aposta mais séria que alguma vez se fez em Portugal no domínio do diálogo e da concertação social e que mereceu o maior consenso entre o Governo e os parceiros sociais, os quais bem souberam interpretar o sentido da grande maioria dos trabalhadores portugueses, como, aliás, se viu em 6 de Outubro e como se vê no dia-a-dia da vida portuguesa, pois não se nota qualquer vestígio das graves consequências invocadas pelos peticionários, designadamente grandes tensões sociais, instabilidade nas empresas, instabilidade nos trabalhadores, instabilidade nas famílias.
O nosso país constrói-se todos os dias e nunca e tarde para reconsiderar e recomeçar!
Perante o desfasamento real que emana do texto da petição, o PSD gostaria de aproveitar esta oportunidade para relembrar que os seus resultados eleitorais têm muito a ver com a coragem com que desfez alguns velhos tabus instalados na sociedade portuguesa, de que a sacralização da legislação laboral, enquanto quadro de referência pretensamente inamovível, era um dos maiores fantasmas.
Os Portugueses e os trabalhadores perceberam bem e depressa que a melhor e mais progressista legislação do mundo, como a classificavam socialistas e comunistas, não impediu; antes pelo contrário, acelerou a existência em Portugal, em 1985, de 500 OOO desempregados e de 150 OOO trabalhadores com salários em atraso e que as alterações que, desde 1949, o PSD tem vindo a introduzir, em diálogo e concertação social, no ordenamento jurídico-laboral propiciaram, em conjugação com o desenvolvimento global da economia, praticamente um pleno emprego, aumentos sustentados do valor real dos salários e a diminuição progressiva dos contratos a prazo, estes, sim, foram inesgotável de instabilidade e de precariedade do emprego que o governo socialista quis tomar regra em Portugal.
Sendo as coisas como são, se aceitássemos como bons os propósitos dos subscritores da petição, estaríamos a ser coniventes com políticas que contrariam os interesses gerais dos Portugueses e mesmo dos trabalhadores, coisa que, se a alguns pode não inquietar, o PSD rejeita liminarmente, ao mesmo tempo que reafirma a ideia chave de que continuará, ao contrário de outros, a fazer do diálogo e da concertação social a metodologia de eleição, na qual todos os contributos são válidos e à qual todos os regressos são possíveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de .Abreu): - Srs. Deputados, esgotada a agenda de hoje, a próxima reunião plenária realizar-se-á na terça-feira, dia 21, às 15 horas, sendo o período de antes da ordem do dia destinado a declarações políticas e o período da ordem do dia à apreciação do projecto de lei n.º 6/VI - Garante aos cidadãos de menores recursos o acesso gratuito a medicamentos para doenças crónicas e outros benefícios, da iniciativa do PCP.

Está encerrada a sessão.

Eram 11 horas e 50 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Alberto Cerqueira de Oliveira.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Barbosa de Melo.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.

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Francisco Antunes da Silva.
José Ângelo Ferreira Correia.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Pedro Domingos de Sousa Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
António Fernandes da Silva Braga.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Bernardino Gaia da Silva.
Guilherme Rodrigues Silva.
José de Oliveira Costa.
José Pereira Lopes.
Leonardo Ribeiro de Almeida.
Manuel Casimiro de Almeida.
Manuel Costa Andrade.
Maria de Lurdes Póvoa Costa.
Maria Margarida de Sousa.
Rui Carlos Alvarez Carp.

Partido Socialista (PS):

Ana Maria Bettencourt.
António Correia de Campos.
António Domingues Azevedo.
António José Martins Seguro.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Manuel Costa Candal.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena Torres Marques.
Jorge Paulo Almeida Coelho.
José Eduardo Cruz Jardim.
José Manuel Magalhães.
José Martins Goulart.
José Rodrigues dos Penedos.
Júlio Miranda Calha.
Leonor Coutinho Santos.
Manuel Alegre Melo Duarte.
Rogério Conceição Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Gomes Carvalhas.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

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DIÁRIO
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