O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

27 DE MARÇO DE 1992 1387

É bom, portanto, que se tenha a noção de que os clandestinos, os que poderão ser abrangidos pela regularização extraordinária, sendo um conjunto qualitativamente importante, quantitativamente não atinge os números que tem sido veiculados.
É importante termos presente que, desses clandestinos, uma parte substancial é de origem cabo-verdiana e, segundo alguns estudos, parte dela já completou o seu reagrupamento familiar, pelo que não é aceitável a criação de fantasmas acerca do perigo de uma invasão massiva, quando mesmo esses números, ainda que empolados, não alterarão substancialmente, no contexto da Comunidade Europeia, a posição de Portugal, que continuará a ter uma das mais baixas percentagens de imigrantes.
Esta é a razão por que não podemos aceitar que a proposta de lei não admita a regularização dos ascendentes quando comprovadamente residam em comum e estejam economicamente dependentes dos filhos, bem como a dos descendentes maiores que, residindo também em comum, não podem comprovar rendimentos próprios ou exercício de actividade profissional remunerada porque dependem dos pais (por exemplo, estudantes maiores) ou ainda que não seja admitida a regularização nos casos das «uniões de facto».
Tais exclusões arriscam a multiplicar casos em que uma mesma família é lançada no caos pela regularização de uns e expulsão de outros, regularizando pais e expulsando filhos, regularizando homens e expulsando as suas companheiras de vida, regularizando filhos, porque nascidos em Portugal, e expulsando pais, condenando todos a separações violentas e humanamente indesejáveis.
É justamente porque tal pode acontecer e porque a esses casos se podem vir a juntar aqueles em que a lei, mesmo contra a vontade e o espírito do legislador, permita ao seu aplicador interpretar a existência de infracção dolosa pelo facto de o requerente se encontrar em situação ilegal, que não concordamos que a proposta de lei não preveja garantias de recurso judicial, com inibição da aplicação da medida de expulsão, ate que esses mesmos recursos se encontrem decididos.
A margem dada ao aplicador na interpretação e preocupante, pois as comunidades conhecem bem como alguns «homens do carimbo» tendem a interpretar e a praticar formas restritivas e distorcidas das leis, pelo que acresce ao Governo a obrigação de um real empenhamento de fiscalização dos aplicadores.

O projecto de lei do PS, mais generoso e clarividente, exige, tão-só, aos cidadãos lusófonos a prova de entrada até 4 de Novembro de 1991 e o requerimento respectivo em que expressem a sua vontade de se regularizar, enquanto a proposta de lei exige, para os que tenham entrado depois de 1 de Junho de 1986 e tenham presença continuada, a prova de exercício de uma actividade profissional remunerada.
Srs. Deputados, em muitas situações tal não será possível. E não será possível porque os empregadores, apesar das garantias de não procedimento judicial, são, entre outras razões, por exemplo, subempreiteiros da construção civil e também clandestinos, portanto sem capacidade para testar seja o que for.
Gostaríamos, pelo menos, de ter visto o Governo prever que, no caso de ao trabalhador ser recusada a declaração comprovativa de actividade profissional remunerada, este pudesse recorrer a alguma autoridade a quem competiria a averiguação da veracidade da recusa e a responsabilidade de, ela própria, passar essa mesma declaração no caso de aquela ser comprovada.
Por outro lado, não podemos concordar com a formulação expressa no pedido de autorização legislativa, que permite ao juiz colocar os expulsandos em «centro próprio». Apesar das intenções do legislador de salvaguardar na lei as garantias dos direitos humanos, há a possibilidade de, na prática, as realidades serem bem diversas do espírito da lei e originarem injustiças e tratamentos inadequados.
Não se pense que não admitimos que o juiz não determine meios de controlo e de fixação do expulsando, mas não podemos concordar com a ideia de um «centro próprio» que levante nos nossos subconscientes a memória não muito distante de outros campos, com as consequências conhecidas para a dignidade humana.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: O enquadramento da lei da regularização extraordinária com outros projectos de lei visando a repressão da imigração, regulando as expulsões, aludindo a terrorismos, delinquências e criminalidade em geral, é, no mínimo, um enquadramento pela negativa e traz as comunidades aqui residentes a sensação de serem agora indesejáveis, o que está em contracorrente com o tratamento quotidiano que a sociedade portuguesa, em geral, dispensa aos imigrantes lusófonos.
O PSD tinha obrigação de fazer aquele enquadramento numa perspectiva dignificadora, que foi exactamente o que o PS fez, em consonância com a sociedade civil, associando-a, pela positiva, a outros projectos de lei, visando uma «política integrada da imigração», promissora de futuros mais risonhos para as comunidades lusófonas e para Portugal.
Creiam que estaríamos aqui a aplaudir a proposta de lei do Governo sobre a regularização extraordinária se nela encontrássemos a capacidade de igualar ou rivalizar com o projecto de lei do PS, no que respeita aos seus efeitos e alcance práticos, garantias humanas, generosidade e solidariedade. Não é esse o caso.
Não o podemos fazer, por existir, em nosso entender, o risco de importantes quantitativos de imigrantes das comunidades lusófonas serem expulsos, responsabilidade que não queremos nem podemos assumir perante elas, porque com elas nos comprometemos aqui dar voz aos seus anseios e expectativas.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A cooperação positiva com o Brasil e os PALOP, a solidariedade e apoio ao desenvolvimento destes passa aqui, em Portugal, por uma lei de «regularização extraordinária» que não admita a expulsão, em pouco tempo, de significativos quantitativos de imigrantes das comunidades lusófonas, situação que pode vir a fomentar importantes tensões e conluios étnicos em Portugal e que, pela sua importância e pelas suas características, podem contribuir, em Cabo Verde, para desorganizar o seu tecido económico e para fragilizar a democracia recém-iniciada, a qual é, geralmente, reconhecida como exemplar em África e à qual desejamos os maiores sucessos.
A cooperação e a solidariedade medem-se também, Srs. Deputados, pela cooperação e solidariedade claras, sem sofismas nem paternalismos, com a África e o Brasil que aqui temos.

Aplausos do PS.

Páginas Relacionadas
Página 1378:
1378 I SÉRIE - NÚMERO 44 O Sr. Deputado perdoar-me-á que tenha lido parte do artigo 9.º, ma
Pág.Página 1378
Página 1379:
27 DE MARÇO DE 1992 1379 Destas interrogações externas passo a algumas interrogações de car
Pág.Página 1379
Página 1380:
1380 I SÉRIE-NÚMERO 44 adiamento enquanto o do Governo é no sentido de resolver questões co
Pág.Página 1380