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Quarta-feira, 1 de Abril de 1992 I Série - Número 46
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 31 DE MARÇO DE 1992
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberto a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas.
Na abertura do debate da interpelação n.º 2/VI - Sobre política geral, centrado na política do ambiente e ordenamento do território do Governo (Os Verdes), intervieram o Sr. Deputado André Martins (Os Verdes) e o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais (Carlos Borrego), seguindo-se-lhes no uso da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais e dos Srs. Secretários de Estado dos Mercados Agrícolas e da Qualidade Alimentar f Luis Capoulas), dos Recursos Naturais (António Taveira) e da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Liberato), os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Mário Tomé (Indep.), Hasse Ferreira e Ferraz de Abreu (PS), Luís Peixoto (PCP), João Paulo Gomes (CDS), Daniel Banco (PCP), João Rui de Almeida, António Martinho e José Sócrates (PS), Mário Maciel e Manuel Moreira (PSD), José da Silva Costa (PS), André Martins (Os Verdes), Narana Coissoró (CDS). Gameiro dos Santos (PS), Manuel Sérgio (PSN), Casimiro Tavares (CDS), Lourdes Hespanhol (PCP), Raul Castro (Indep.) e Marques da Costa (PS).
A encerrar o debate, intervieram a Sr. º Deputada Isabel Castro (Os Verdes) e o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
Entretanto, foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um Deputado do PCP.
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 22/VI - Autoriza o Governo a rever o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional e rejeitado, também na generalidade, o projecto de lei n.º 1/VI - Regularização extraordinária de estrangeiros não comunitários em situação irregular (PS).
Foram ainda rejeitados os votos n.ºs 12/VI - De saudação pela passagem do 30.º aniversário do Dia do Estudante (PCP) e 15/VI - De saudação pelo Dia do Estudante (PS) e aprovado o voto n.º 14/VI - De saudação pela comemoração do Dia do Estudante (PSD).
O voto n. º 16/VI - De condenação pelas discriminações feitas pela Inquisição (PS) foi rejeitado, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Jaime Gama (PS), Pacheco Pereira (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Manuel Sérgio (PSN), Narana Coissoró (CDS), Isabel Castro (Os Verdes), Raul Castro e Mário Tomé (Indep.).
Foi igualmente rejeitado o voto n.º 17/VI (PCP), tendo depois sido aprovado o voto n.º 18/VI (PSD), ambos sobre a comemoração do Dia Mundial do Teatro.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Adérito Soares Campos.
driano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
António Barbosa de Melo.
António Barradas Leitão.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernandes Alves.
António Germano Sá e Abreu.
António Paulo Coelho.
António Santos Pires Afonso.
Aristides Alves Teixeira.
Arlindo da Silva Moreira.
Armando Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gaia da Silva.
Carlos Almeida Figueiredo.
Carlos de Almeida Coelho.
Carlos Duarte Oliveira.
Carlos Lopes Pereira.
Carlos Lélis.
Carlos Manuel Gonçalves.
Carlos Miguel de Oliveira.
Carlos Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Domingos José Soares Lima.
Duarte Rogério Pacheco.
Eduardo Pereira da Silva.
Ema Maria Lóia Paulista.
Fernando Correia Afonso.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Bernardino Silva.
Guido Orlando Rodrigues.
Guilherme Rodrigues Silva.
Hilário Azevedo Marques.
Isilda Maria Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja Silva.
João do Lago Mota.
João Granja da Fonseca.
João José da Silva Maças.
João José Pedreira de Matos.
João Salgado.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Roque da Cunha.
José Álvaro Pacheco Pereira.
José António Peixoto Lima.
José Augusto Silva Marques.
José Borregana Meireles.
José de Almeida Cesário.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Correia.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário Gaspar.
José Mário Lemos Damião.
Leonardo Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Antero Cunha Pinto.
Manuel Azevedo.
Manuel Baptista Cardoso.
Manuel Casimiro de Almeida.
Manuel Costa Andrade.
Manuel Lima Amorim.
Manuel Maria Moreira.
Maria Conceição Rodrigues.
Maia da Conceição Pereira.
Maria de Lurdes Póvoa Costa.
Maria Fernanda Dias Cardoso.
Maria Helena Ramos Mourão.
Maria Luísa Ferreira.
Maria Margarida de Sousa.
Marília Dulce Pires Morgado.
Mário Belo Maciel.
Mário de Oliveira Santos.
Melchior Pereira Moreira.
Miguel Bento Macedo e Silva.
Miguel Fernando Relvas.
Nuno Delerue Alvim de Matos.
Olinto da Cruz Ravara.
Pedro e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Miguel.
Virgílio de Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Bettencourt.
António Alves Martinho.
António da Silva Braga.
António de Almeida Santos.
António Domingues Azevedo.
António Luís Santos Costa.
António Marques Júnior.
António Oliveira Guterres.
António Ribeiro Campos.
António Ribeiro da Silva.
Artur Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Edite Marreiros Estrela.
Eduardo Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
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Eurico José de Figueiredo.
Fernando Gomes Sá.
Fernando Manuel Costa.
Fernando Pereira de Sousa.
Guilherme de Oliveira Martins.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Hasse Ferreira.
José Almeida Leilão.
José Apolinário Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Cruz Jardim.
José Eduardo Reis.
José Ernesto dos Reis.
José Gameiro dos Santos.
José Manuel da Silva Lemos.
José Manuel Lello Almeida.
José Manuel Magalhães.
José Rebelo dos Reis Lamego.
José Sócrates de Sousa.
Júlio da Piedade Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho Santos.
Luís Capoulas Santos.
Manuel Alegre Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Celeste Silva Correia.
Maria Julieta Sampaio.
Maria Santa Clara Gomes.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl Pimenta Rogo.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui Machado Ávila.
Rui Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Gaião Rodrigues.
Daniel dos Reis Branco.
João Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luís Manuel Viana de Sá.
Manuel Garcia Correia.
Centro Democrático Social (CDS):
Casimiro da Silva Tavares.
João Paulo Morais Gomes.
Manuel Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria Almeida Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira Cunha.
Deputados independentes:
Mário Baptista Tomé.
Raul de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr, Presidente e Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 23/VI - Revoga o Decreto-Lei n.º 354/88, de 12 de Outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 140/89, de 28 de Abril, 33/90, de 24 de Janeiro, e 276/90, de 10 de Setembro, e demais legislação subsequente (Assembleia Regional da Madeira), que baixou à 8.ª Comissão; projectos de lei n.ºs 116/VI - Criação da freguesia de Moicanos no concelho de Alcobaça (PS), que baixou à 6.ª Comissão, 117/VI - Reforça o controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos (altera a Lei n.º 4/83, de 2 de Abril) (PCP), que baixou à 3.ª Comissão, 118/VI - Regime jurídico das comissões de inquérito (PSD), que baixou à 1.ª Comissão, 119/VI - Alterações à Lei das Petições (PSD), que baixou à 2.ª Comissão, 120/VI - Alterações ao Estatuto dos Deputados (PSD) e 121/VI - Alterações à Lei n.9 77/88, de 1 de Julho (Lei Orgânica da Assembleia da República) (PSD) e, finalmente, o projecto de resolução n.º 15/VI - Alterações ao Regimento da Assembleia da República (PSD), tendo estes três últimos baixado à 1.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate da interpelação n.º 2/VI, da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes, sobre política geral, centrado na política de ambiente e ordenamento do território do Governo.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de saber se a Mesa já tem alguma informação sobre o processo de nomeação dos membros para a comissão de inquérito que foi constituída para o caso da albufeira do Maranhão.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a única informação que posso dar-lhe é a de que a Mesa ainda não dispõe da lista dos nomes dos Srs. Deputados que integrarão essa Comissão.
Para dar início ao debate da interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: Embora a Constituição da República Portuguesa proclame, desde 1976, para todos os portugueses, o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e estabeleça como uma das tarefas fundamentais do Estado a de «proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território», só em 7 de Abril de 1987 vieram a ser definidas as bases da política de ambiente que corporizam os princípios e determinações constitucionais.
A Lei de Bases do Ambiente integra no seu princípio geral, além dos parceiros constitucionais já referidos, a definição do próprio objecto da política de ambiente, determinando que esta «tem por fim optimizar e garantir
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a continuidade de utilização dos recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto básico de um desenvolvimento auto-sustentado».
Esta nova forma de encarar as questões do ambiente e do desenvolvimento parecia fazer antever uma alteração radical nas concepções e estratégias estritamente economicistas que consideram a natureza como um recurso inesgotável.
Como forma de consubstanciar o princípio geral, a Lei de Bases do Ambiente define princípios específicos; explicita objectivos e medidas a tomar; constrói conceitos e definições; identifica as componentes ambientais naturais e humanas susceptíveis de, em determinadas condições, promoverem ou condicionarem o estado do ambiente; expõe os instrumentos de política de ambiente e ordenamento do território; cria o Instituto Nacional de Ambiente como organismo destinado à promoção de acções no domínio da qualidade do ambiente, designadamente na formação e informação dos cidadãos e apoio às associações de defesa do ambiente; atribui amplos direitos e deveres aos cidadãos na defesa e promoção do ambiente; determina os organismos responsáveis pela prossecução da política de ambiente e pela aplicação da lei, deixando expresso que compete ao Governo a condução da política global e a adopção das medidas adequadas à aplicação dos instrumentos previstos na lei.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: Como facilmente se depreende do que acabamos de afirmar, os princípios fundamentais, o enquadramento legal, os instrumentos, as metas e os objectivos necessários para orientar e promover uma correcta política de ambiente e ordenamento do território, em Portugal, existem e estão expressos claramente, pelo menos, desde 1987.
Como se sabe, para fazer uma boa «sopa de pedra», depois de se estar de posse dos ingredientes básicos, tudo depende do querer, do empenho e da capacidade criativa e inovadora do responsável pela tarefa.
Mas o primeiro e principal responsável pela política de ambiente e ordenamento do território em Portugal, nestes últimos cinco anos, não querendo tirar partido de um bom e preciso lote de ingredientes que tinha à sua disposição, optou pelo desperdício e por introduzir produtos de segunda qualidade, que lhe levaram tempo demasiado a fabricar, de onde resultou um «tacho esturrado», com um produto final de má qualidade, e que só por força de muita publicidade enganosa conseguiu iludir demasiados convivas, para mal de todos nós, presentes e futuros.
Sc é verdade que 1986 foi o que se pode chamar o «ano da luz verde» para o ambiente em Portugal, não tanto pelas acções concertadas desenvolvidas, mas sobretudo pelas expectativas criadas em torno da elaboração de uma lei de bases que não é inóqua e de uma lei das associações de defesa do ambiente que reconhece e atribui um importante papel à participação das associações não governamentais na defesa do meio ambiente e na conservação da natureza, não é menos verdade que estes factores terão lido algum peso na obtenção da maioria absoluta pelo PSD, nas eleições de 1987, altura em que, um pouco por toda a Europa e também em Portugal, se faziam ouvir a voz e a razão dos movimentos e partidos verdes e alternativos.
Mas se as condições criadas e as ideias deixadas no ar durante o governo minoritário do PSD poderiam fazer antever que uma governação de maioria absoluta seria uma garantia para implementar a política de ambiente e ordenamento do território de que o País necessitava e necessita para se desenvolver de forma harmoniosa e auto-sustentada, podemos afirmar que o balde de água fria não só congelou as expectativas como fomentou em exponencial a degradação do estado do ambiente em Portugal no período de 1987 a 1991 (conforme o demonstra o Livro Branco do Estado do Ambiente).
De facto, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados, no período considerado, a política de ambiente, que tinha todas as condições para ser implementada e executada, por vontade política deliberada do governo do PSD (para usarmos uma expressão fortemente glosada), foi para a gaveta, fechada rigorosamente a sete chaves, não viesse o diabo tecê-las e alguém lembrar, na altura menos oportuna, a imposição de princípios constitucionais e determinações legais, ou até apelar ao respeito de compromissos eleitorais!...
Como acontece com a fauna roedora, «quando há sinais de naufrágio» - isto para utilizar uma terminologia adequada ao tema - o anterior responsável pela pasta do ambiente decidiu-se a abandonar o navio e a viajar para terra firme. É que o Governo e a maioria política então reforçada, aproveitando as vantagens de uma conjuntura económica internacional favorável e os fundos comunitários disponibilizáveis, decidira, em nome de uma pretensa modernização do País, aplicar a Portugal as velhas receitas do neoliberalismo. Esta opção política, para ter êxito e obter resultados imediatos, não podia ter em conta a estrutura económico-social do país real, por isso veio a traduzir-se num acentuar das assimetrias regionais e sociais já profundamente marcadas na sociedade portuguesa.
O crescimento a qualquer preço, gerador de especulação generalizada e potenciador de lucros fáceis, e um poder centralizador, que tem impedido que se complete a estruturação vertical do Estado democrático e inviabilizado o aprofundamento da democracia participativa, são os dois pilares destacados de uma política que não tem contemporizado com a defesa do ambiente, com o uso racional dos recursos naturais e com o ordenamento do território sustentado em bases biofísicas.
É assim compreensível que o ambiente, da posição que detinha como elemento de referência no primeiro governo do PSD, tenha passado a desempenhar o papel de mero elemento de ornamento no novo arranjo governamental. Foi assim que, após as eleições de 1987, o então detentor da pasta do ambiente se viu obrigado a fazer o tirocínio na especialidade de marketing político, procurando adequar-se às novas exigências preconizadas para a modernização forçada do País. Isso valeu-lhe uma prestação exemplar como promotor de produtos ecológicos e uma invejável performance na demonstração de dificuldades na aplicação do regulamento geral sobre o ruído...
Risos do PCP.
Foi já quando se identificavam os primeiros vestígios da aurora eleitoral de 1991 que o Governo fez eclodir dois intempestivos golpes de teatro, fazendo, como convinha, subir a temperatura na história do ambiente em Portugal, durante o reinado do Prof. Cavaco Silva.
O primeiro deles teve lugar em Janeiro de 1990, com a criação do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais ou, melhor, sem recursos, já que tinha acabado de ser aprovado o Orçamento do Estado e, pelo menos durante o ano em curso, restava ao Ministro nomeado ficar «enxertado» numa Secretaria de Estado.
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Mas para que o invento fosse tomado a sério, logo em 16 de Março o próprio Primeiro-Ministro entrou na casa dos Portugueses, ajudado pela força da magia que é reconhecida à «caixinha que fez mudar o mundo», e, sem meias medidas, falou durante onze minutos da importância que o seu Governo atribuía ou passaria a atribuir à defesa do ambiente e dos recursos naturais. E, para que não restassem dúvidas, prometeu que dentro de pouco tempo seria elaborado e apresentado aos Portugueses um plano nacional de política de ambiente, embrulhado em «papel surpresa», porque era disso que se tratava.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A paciência e a esperança são pergaminhos que neste país poucos estão dispostos a desperdiçar e, ao longo da nossa história, suo vários os exemplos que o demonstram - é bem sabido que ainda há muitos portugueses que acreditam em milagres nas manhãs de nevoeiro!... Não sabemos mesmo se não será por isso que ainda há poucos meses o PSD voltou a obter a maioria absoluta, embora estejamos convencidos de que os Portugueses não gostam de ser enganados mais de uma vez!
É que o hoje já célebre plano nacional de política de ambiente, anunciado no início de 1990 como se se tratasse da descoberta da pólvora, mas que ainda não deu à luz do dia, não é, nem mais ou menos, do que um dos 18 instrumentos de política de ambiente consagrados na Lei de Bases do Ambiente, que foi fechada na gaveta há cinco anos e que continuamos à espera que seja regulamentada na totalidade.
Antes de continuarmos, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, importa deixar bem claro que não nos anima qualquer gozo continuar a massacrar o Governo com perguntas já mil vezes repetidas. Por isso, temos esperança de que o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, que pela primeira vez convive connosco no Plenário da Assembleia da República (embora já estando no Governo há cerca de um ano), responda na sua intervenção às questões que lhe colocamos e de que passarei a dar exemplos.
Por que é que o plano nacional de política de ambiente, depois de tantas promessas e declarações públicas, depois de tantas expectativas criadas e outras tantas goradas, ainda não viu o dia do parto?
Para quando está prevista a aprovação, na Assembleia da República, da estratégia nacional de conservação da natureza, que o Governo ficou obrigado a elaborar até Abril de 1988?
Para quando a apresentação, na Assembleia da República, do relatório sobre o estado do ambiente e ordenamento do território relativo a 1991, que o Governo era obrigado a apresentar com as Grandes Opções do Plano para 1992?
Para quando o ordenamento integrado do território a nível regional e municipal?
Para quando o estabelecimento de critérios, objectivos e normas de qualidade para os efluentes e resíduos?
Para quando a redução ou suspensão de laboração de todas as actividades ou transferência de estabelecimentos que, de qualquer modo, sejam factores de poluição?
Para quando um rastreio nacional e programas de incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou transferência de tecnologias que contribuam para a melhoria da qualidade do ambiente?
Para quando uma verdadeira e efectiva avaliação prévia do impacte provocado por obras, pela construção de infra-estruturas, introdução de novas actividades tecnológicas e de produtos susceptíveis de afectarem o ambiente e a paisagem?
Para quando a regulamentação selectiva e quantitativa do uso do solo e dos restantes recursos naturais?
Para quando o inventário dos recursos e de outras informações sobre o ambiente a nível nacional e regional?
Para quando um sistema nacional de vigilância e controlo da qualidade do ambiente?
Para quando um sistema nacional de prevenção de incêndios florestais?
Para quando um plano internacional de educação ambiental?
Para quando uma lei quadro das áreas protegidas?
Para quando a implementação e regulamentação de uma rede nacional contínua de áreas protegidas, abrangendo áreas terrestres, águas interiores e marítimas?
Para quando o acesso dos cidadãos aos dados da Administração sobre o ambiente?
Para quando um plano nacional de saneamento básico?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Ao enumerarmos este conjunto de instrumentos, que reputamos como fundamentais para a execução de uma política de ambiente coerente e estruturante em qualquer processo integrado de desenvolvimento auto-sustentado, embora reconhecendo que não fomos exaustivos e considerando que relativamente à sua esmagadora maioria ainda tudo está por fazer, não pretendemos que se faça hoje o que não se quis fazer ao longo de cinco anos.
Não prescindimos de reivindicar a sua implementação e quisemos, sobretudo, demonstrar que o ambiente não pode continuar a ser considerado como um elemento marginal a qualquer política, que qualquer política de ambiente é transversal a todas as políticas sectoriais e que, na implementação destas, ignorar as razões do ambiente - como tem sido feito sistematicamente nos últimos anos - é esbanjar esforços e recursos escassos, cujos custos recaem primeiramente sobre os mais carenciados, mas que progressivamente vão hipotecando o nosso futuro comum.
Não sendo necessário inventariar hoje aqui todas as lutas, manifestações e protestos desencadeados pelo Partido Ecologista Os Verdes, pelas associações de defesa do ambiente e pela população em geral, um pouco por todos os cantos do País, para demonstrar as contradições de uma actuação no domínio do ambiente que, de forma deliberada, legitimava as opções economicistas que tom promovido a especulação e o lucro fácil, não podemos deixar de passar em revista algumas das manchas mais alaranjadas que marcaram um período negro da história do ambiente.
Se a nomeação de um ministro para o ambiente foi uma necessidade sentida pelo Governo para intensificar a malha da cortina de fumo branco, capaz de dissimular melhor uma política economicista que se tem traduzido no aumento galopante da poluição atmosférica, na contaminação dos solos e dos recursos hídricos, na devastação da flora, da fauna e do património cultural, na descaracterização do mundo rural, na utilização indiscriminada dos solos para a plantação de espécies de interesse exclusivamente industrial, com consequências alarmantes na desertificação e no despovoamento de vastas áreas do território e que tom sido uma das principais causas dos incêndios florestais e ainda no aumento da insegurança de pessoas e bens e das condições de risco para a saúde
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pública, então podemos dizer que o objectivo real foi. conseguido.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados, costuma dizer-se - e é verdade! - que não há bela sem senão. O «senão» desta vez foi demasiadamente escandaloso e extravagante para iludir a realidade aos olhos dos Portugueses.
Quando um ministro do Ambiente aceita perder a razão, recorrendo a todos os argumentos para justificar a construção do maior campo de tiro da Europa junto a uma das reservas naturais mais importantes do mundo e que terá efeitos nefastos numa região onde vivem e trabalham cerca de três milhões de portugueses ou quando, em nome da defesa do ambiente, aconselha a utilização de um composto químico, que pôs em risco agravado todo o ecossistema do Baixo Mondego, o que poderia ser uma solução real passou a ser uma solução adiada.
Mas este período de má memória, para além de acções espectaculares avulsas de efeitos duvidosos, por força da pressão da opinião pública e dos normativos comunitários, caracterizou-se ainda pela publicação de alguma legislação, que, além de mal feita e desgarrada, serviu em muitos casos para inglês ver e, sobretudo, para viabilizar acções e projectos que penalizam o ambiente e empobrecem o nosso património cultural, como é o caso dos exemplos que a seguir vou dar.
A legislação sobre a avaliação dos impactes ambientais, além de não vincular o parecer dos responsáveis do ambiente - o que nos leva a perguntar para que e que os queremos -, permite que sejam as entidades interessadas nas obras a realizar os estudos de impacte e, como é obrigatório fazê-los, muitos tem sido realizados depois das obras iniciadas ou até acabadas.
No domínio dos recursos hídricos, o Decreto-Lei n.9 70/90 institui o novo sistema institucional de gestão dos recursos hídricos, mas a maior parte dos seus artigos remete para regulamentação posterior; quanto ao Decreto-Lei n.º 74/90, que aprova as normas da qualidade da água, ele mantém como elemento fortemente negativo um número demasiado elevado de entidades com competências no domínio do controlo da qualidade da água, muitas delas em sobreposição. Além disso, não faz qualquer referencia à articulação entre estas entidades e o INAG e as ARE, organismos criados pelo Decreto-Lei n.º 70/90.
Nestas condições, a poluição e contaminação dos recursos hídricos em Portugal ainda não tem os dias contados. E não é com repressão em acções avulsas, como tem acontecido para mostrar que se faz alguma coisa, que se resolve o problema de fundo, o que, em nosso entender, de entre outras medidas, passa pela elaboração e aprovação de uma nova lei de bases dos recursos hídricos.
No que se refere à qualidade do ar, o Decreto-Lei n.º 352/90 estabeleceu uma situação inédita ao criar um quase total vazio legislativo no que se refere à protecção e controlo da qualidade do ar, remetendo todos os artigos para posterior regulamentação.
Quanto aos resíduos urbanos, hospitalares e industriais, embora a legislação exista, e apesar do esforço das autarquias locais, permanece uma situação quase generalizada de falta do seu tratamento, com os riscos crescentes que isso implica para a saúde pública e os efeitos que tem na contaminação do ar, das correntes de água, dos solos e dos lençóis freáticos, cuja situação é praticamente desconhecida.
As áreas protegidas, pela forma como tem sido esventradas, apesar do esforço dos que nelas trabalham, representam mais uma justificação pouco séria de mau pagador do que um instrumento de defesa e salvaguarda de valores raros, que não são quantificáveis nas tabelas contabilísticas dos tesa-património da humanidade.
De uma maneira geral, as áreas mais sensíveis do território nacional tem sido submetidas a atentados sucessivos por um governo que, em nome «do menos Estado melhor Estado», vem desanexando milhares de hectares de matas nacionais, cedendo-as a particulares para fins diversos, contrários à defesa do ambiente e à salvaguarda do património, quando, simultaneamente e em nome de um desenvolvimento cada vez mais difícil de atingir, vai cedendo às pressões da especulação urbanística no litoral, ao «quero posso e mando sem olhar a quo» do plano rodoviário nacional e dos projectos da Direcção-Geral de Portos.
Perante tudo isto, quando já não era possível sobrepor por mais tempo o real à realidade e quando as eleições estavam à porta, só havia uma saída: substituir o ministro.
De novo se criava um outro élan sobre o ambiente.
E foi nestas condições que obtivemos como ministro um especialista com provas dadas (como convinha) para tomar mais convincente aos olhos do eleitorado a perspectiva de mudança.
Mas passado praticamente um ano da sua posse, Sr. Ministro, a realidade no que se alterou foi para pior. As promessas ainda não deixaram de sê-lo; a legislação que era má ainda não foi alterada; o orçamento continua nos limites mínimos - em nosso entender, claro! -, os resíduos tóxico-perigosos continuam a ser uma fantochada; os estudos de impacte ambiental continuam a ser uma fantochada; os industriais continuam sem saber o que fazer aos efluentes e resíduos que produzem, a não ser lançados no meio ambiente sem qualquer tratamento; o ordenamento do território continua a ser marginal aos interesses do ambiente; o Parque Nacional do Geres nunca esteve tão ameaçado; as opções na produção de energia continuam a sobrepor-se aos interesses do ambiente. A descaracterização do mundo rural está a atingir níveis irreversíveis.
«Neste ano da graça do Prof. Carlos Borrego» quem não tem achado graça alguma é o estado do ambiente em Portugal, que não tem deixado de agravar-se.
Em suma, nestes cinco anos, o governo do PSD não só utilizou o ambiente como um adorno para despistar maus cheiros como promoveu o descrédito do Estado perante os cidadãos ao não cumprir, não fazer cumprir e não criar as condições para ser cumprida a legislação que ele próprio produziu!
Mas se a acção do Governo e do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais não é animadora em Portugal, no plano internacional a sua contribuição, que deveria ser acrescida ao assumir a Presidência das Comunidades, revela, no mínimo, grande falta de solidariedade, como veremos ao longo do debate.
O Grupo Parlamentar de Os Verdes, ao agendar esta interpelação ao Governo, teve como objectivos fundamentais demonstrar que a política de ambiente nos últimos cinco anos não passou de um logro, no qual o Primeiro-Ministro participou como principal protagonista; permitir que a Assembleia da República assuma as suas responsabilidades na fiscalização da prática governativa; e, finalmente, exigir do actual Ministro do Ambiente e Recursos Naturais e da sua equipa que passe das promessas
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aos actos, já que a política de ambiente não é só feita com a proclamação de boas intenções. Hoje, tem oportunidade de dizer aos Portugueses do que são capazes.
É isso que todos esperamos já há demasiado tempo!
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão alunos da Escola de Anselmo de Andrade, de Almada, e das Escolas Secundárias de Pombal, de Beja e de Bocage, de Setúbal, para os quais peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais.
Para intervir em nome do Governo na abertura deste debate sobre política do ambiente e ordenamento do território, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais(Carlos Borrego): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Em Portugal, o desenvolvimento económico e social, tendo em vista o bem-estar das populações, começa a ficar fortemente dependente da qualidade do ambiente e da disponibilidade de recursos renováveis nacionais, com particular destaque para os recursos hídricos.
O Governo tem tido uma forte preocupação com a informação e sensibilização pública sobre a possibilidade e a necessidade da compatibilização das políticas de ambiente com objectivos de desenvolvimento económico.
Consideramos que o progresso social não pode ser obtido unicamente a partir de meros objectivos quantitativos, devendo a qualidade ambiental ser considerada como uma condição de desenvolvimento e de bom funcionamento das actividades económicas.
Felizmente que, apesar da fase acelerada de desenvolvimento verificado nos últimos anos, os problemas ambientais não têm progredido, como se verificou em outros países industrialmente mais avançados.
Este sucesso da política de ambiente em Portugal deve-se, sobretudo, aos enormes progressos verificados nos últimos seis anos, como reflexo dos investimentos efectuados pela administração central e local, pelas empresas públicas e pelo sector privado, dando cumprimento à enorme quantidade de diplomas legais publicados pelo Governo para regulamentação da Lei de Bases do Ambiente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Assim, houve uma alteração significativa no licenciamento industrial com a publicação do Regulamento do Exercício da Actividade Industrial, que obriga à integração das condições ambientais na licença a conceder.
Foi aprovada legislação no domínio dos recursos hídricos, com particular atenção para a qualidade das águas. Pela primeira vez foi implementada uma actuação sistemática da inspecção neste domínio, com o objectivo de reduzir as emissões poluentes das empresas e multar os prevaricadores.
No domínio da atmosfera, foi aprovado um regime de controlo da qualidade do ar, através da obrigação da medição dos principais poluentes gasosos emitidos.
Foi aprovada legislação na área da avaliação dos impactes ambientais, medida fundamental para o harmonioso desenvolvimento do País, tendo-se iniciado a sua correcta aplicação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Governo prosseguiu uma política intransigente de defesa do litoral, área que está sujeita a enormes pressões turísticas, urbanísticas e industriais, como bem sabemos.
No que se refere particularmente à atenção que o Governo deu, na sua actividade legislativa, à área do ambiente, dela resultou a publicação de 97 decretos-leis e decretos regulamentares e 445 outros diplomas, o que dá um total de 539 documentos legislativos.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Verificam-se, todavia, situações pontuais de degradação ambiental, que se evidenciam mais fortemente com a ocorrência de condições climáticas desfavoráveis, resultantes, fundamentalmente, de certas insuficiências de infra-estruturas e equipamentos de tratamento das emissões poluentes.
Estes casos, que já se encontram devidamente identificados e sob controlo, revelam ainda algumas dificuldades estruturais do País, cuja rápida superação tem constituído - e vai constituir nos próximos anos - uma prioridade do Governo.
Apesar de os indicadores, em lermos de atendimento das populações, estarem, em Portugal, ainda abaixo da média comunitária, é notável a recuperação registada nos últimos anos. Senão, vejamos alguns exemplos, passando das palavras aos factos: ao nível do abastecimento da água, a população servida com rede pública passou de 54 %, em 1985, para 68 %, em 1990; no que se refere à população servida por estações de tratamento de águas residuais registou-se, no mesmo período de tempo, um aumento de cerca de 12 %; no que diz respeito ao tratamento final do lixo, a população servida ultrapassa já os 30 %, sendo que, em 1985, cifrava-se pouco acima dos 10 %; a recolha de vidro para reciclagem triplicou entre 1985 e 1990, o que traduz uma cada vez maior sensibilização da opinião pública, do poder local e dos agentes económicos para o ambiente.
Estes indicadores dão-nos a certeza de que estamos no caminho certo, mas de que ainda é pouco o que está feito façe ao muito que é preciso fazer. Por isso temos previsto para a área do ambiente, para 1992, a nível do PIDDAC, investimentos no valor de 15,8 milhões de contos - quase o triplo do que se encontrava previsto no Orçamento de 1985.
Foi também aprovado o programa comunitário ENVIREG, cujos principais objectivos são a redução dos desequilíbrios regionais e o contributo para a aplicação das medidas de política ambiental. O ENVIREG envolve um investimento global de 22 milhões de contos, dos quais 14 milhões provém de comparticipação comunitária, e desenvolve-se até finais de 1993.
No âmbito do Programa Específico da Indústria Portuguesa foi criado um sistema de incentivos para a redução das cargas poluentes na indústria. Além disso, foram celebrados cerca de nove protocolos com os sectores mais poluentes das áreas industriais e agrícolas, definindo metas e calendários para a resolução da respectiva carga poluente.
Pretende-se, portanto, que as empresas possam cumprir a legislação sem pôr em causa a sua viabilidade e garantindo os respectivos postos de trabalho. Procura-se
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assim, simultaneamente, a preservação do ambiente e o reforço do tecido empresarial.
Recentemente foi aprovada, por concurso público, a construção, gestão e exploração do Sistema Nacional de Tratamento de Resíduos Industriais, que deverá entrar em funcionamento em 1993 e cujo investimento é da ordem dos sete milhões de contos. Resolveremos, deste modo, o problema dos resíduos tóxicos e perigosos, que, actualmente, são depositados sem qualquer tratamento, desrespeitando a legislação e as mais elementares normas de segurança e de saúde pública.
No âmbito das medidas de combate à poluição marítima, o Acordo de Lisboa, integrando a Comunidade Europeia, a França, a Espanha, Marrocos e Portugal, foi. um marco importante, reforçado pela criação do Centro Internacional de Luta contra a Poluição no Atlântico Nordeste e pela constituição de um conjunto de equipamento de combate à poluição marítima.
A segurança nuclear não foi esquecida, tendo sido implementada a rede de vigilância contínua do ar e aumentado o número de postos de medição de radioactividade das águas, em especial dos rios internacionais, a qual se encontra integrada na Rede Nacional de Qualidade de Medida do Ambiente.
O Governo considera sempre como pressuposto fundamental a formação dos cidadãos e, por isso, tem vindo a apoiar a informação e a educação ambientai através de acções de formação e sensibilização, concedendo apoio técnico e financeiro às associações de defesa do ambiente, que também tem participado nesta cruzada de formação de uma consciência ecológica dos Portugueses.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, os resultados obtidos nos últimos cinco anos dão-nos a certeza de estarmos no caminho certo. Mas, agora, pretendemos ir mais longe: a resolução pontual dos problemas existentes está enquadrada por instrumentos adequados de planeamento. Cabe aqui destacar o livro branco do ambiente, os planos de recursos hídricos, a estratégia nacional de conservação da natureza e, a um nível superior, o plano nacional de política do ambiente, que é intenção do Governo aprovar brevemente.
Assume assim o Governo, correcta e claramente, a política de ambiente como uma política integradora, de carácter horizontal, influenciadora e orientadora, a priori, do desenvolvimento das diversas políticas sectoriais.
Também com o objectivo de reforçar este carácter horizontal será incentivada a actuação dos centros de estudos ambientais, integrados nos ministérios que mais directamente tem a ver com a problemática ambiental, e foi ainda dinamizada a comissão consultiva do ambiente, com representação de todos os ministérios, como orgão eminentemente de consulta do ministro.
A criação do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais constituiu um passo decisivo, demonstrando a importância que as questões ligadas ao ambiente assumem a nível governamental. Dois anos após a sua criação, com a sua lei orgânica aprovada e tendo reforçado as suas competências em áreas fundamentais de ambiente como o são a gestão do litoral, o controlo da poluição marítima, a reserva ecológica nacional e a reserva agrícola nacional, encontramo-nos em condições de desenvolver uma política estruturada de ambiente e de estabelecer um quadro institucional transparente.
Vamos constituir este quadro legislativo coeso e completo através da revisão de alguns diplomas legais e da elaboração de novos diplomas, sendo de referir as
revisões que vamos levar a cabo da Lei de Bases do Ambiente, da Lei das Associações de Defesa do Ambiente, da legislação relativa à avaliação dos impactes ambientais e à caça nas áreas protegidas; aprovaremos também, no domínio da conservação da natureza, a lei quadro das áreas protegidas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em relação à poluição atmosférica, prosseguiremos com a regulamentação da redução das emissões gasosas, no sentido da melhoria da qualidade do ar; contribuiremos, igualmente, no âmbito da concertação internacional para a resolução dos problemas associados ao efeito de estufa e à delação da camada de ozono.
Neste campo, está a ser elaborado o plano de faseamento para a redução das emissões de CO, a nível nacional e já foi decidido eliminar os CFC até 1995.
O enquadramento legislativo referente ao sistema institucional de recursos hídricos vai ser ainda melhorado e completado, no sentido de uma melhor inserção e articulação com os restantes serviços e de uma maior participação e responsabilização dos agentes económicos, dos cidadãos e da sociedade civil em geral. Nesta reestruturação daremos a maior atenção à valorização da actuação a nível regional, cabendo destacar a actual implementação das delegações regionais do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
A política de recursos hídricos constitui uma prioridade governativa. Vamos avançar com a nova lei da água e com o código de usos da água, diplomas legais que reputamos como fundamentais a aprovar nesta legislatura e que, como já referimos, constituirão um pacote legislativo composto por instrumentos da maior importância para a concretização de uma política racional de gestão dos recursos hídricos.
Estão, igualmente, a ser regulamentados os princípios do utilizador-pagador e do poluidor-pagador. A legislação concluída estabelece a existência de uma taxa com um duplo sentido: por um lado, é criado um custo sobre a emissão de poluentes e que incentiva a sua redução na fonte; por outro lado, sendo o produto da taxa gerido como um fundo autónomo, a .sua aplicação reverterá, principalmente, a favor da indústria, através do apoio financeiro à aquisição de equipamentos de despoluição e de redes de medição e controlo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não é, de facto, justo que continue a ser sociedade civil, em geral, a suportar, de uma forma indiscriminada, os custos inerentes à utilização dos recursos naturais.
Aplausos do PSD.
O Governo está a promover o pacto ambiental, que será concretizado com a assinatura de contratos-programa, protocolos ou outras formas de cooperação, com o objectivo de dar um melhor enquadramento às iniciativas da administração local no que se refere ao saneamento básico e apoiar os municípios a fazer façe às suas responsabilidades neste âmbito.
Mas pretende o Governo que o pacto ambiental seja alargado ao maior número possível de agentes económicos, por forma a envolvê-los numa política ambiental realista e credível. Dada a importância das incidências
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ambientais da laboração industrial, já propusemos aos vários sectores industriais a celebração de um protocolo de adaptação à legislação ambiental, que esperamos assinar a curto prazo.
Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Estima-se, de acordo com um estudo do Ministério, que só para o abastecimento de água, redes de esgotos e tratamento de águas residuais será necessário investir, até ao ano 2020, cerca de 1500 milhões de contos.
Por outro lado, grande parte deste investimento deverá ser feito até ao fim desta década, por forma a iniciarmos o novo século com índices de atendimentos próximos da média europeia, em consonância com os objectivos de convergência comunitária e dando cumprimento às directivas da Comunidade Europeia.
Assim, considera o Governo desejável a intervenção progressiva dos agentes económicos nos investimentos ambientais, devendo, para isso, permitir a abertura do sector do saneamento básico à iniciativa privada.
No que se refere ao litoral, prosseguiremos uma política de defesa deste importante património, promovendo a sua valorização e protecção ambiental mediante a concretização de acções de recuperação e de infra-estruturação de áreas degradadas.
Continuaremos a incrementar uma política ambiental preventiva e de redução na fonte, do uso de tecnologias pouco poluentes e de redução da poluição em geral.
Estamos também a reforçar as medidas que permitam um aumento significativo da percentagem de reciclagem a todos os níveis, mas particularmente quanto aos resíduos urbanos e industriais, estando já a ser preparadas campanhas específicas para o papel, vidro e plásticos.
Tão importante como a elaboração destes instrumentos ao serviço de um sistema e de uma nova política é a sua implementação. A aproximação do país real ao país legal, concebido este de uma forma racional e solidária, é a nossa aposta na presente legislatura.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Estamos a criar mecanismos que assegurem a efectiva aplicação do quadro legal em vigor. A consecução deste objectivo passa também pela divulgação dos dados obtidos e por um maior envolvimento dos cidadãos nos processos relativos às questões ambientais. Estão em curso acções que possibilitem um fácil acesso por parte dos cidadãos à informação, à formação em geral e à educação ambiental nas escolas.
Continuaremos também a apoiar programas de investigação e de desenvolvimento, privilegiando os projectos directamente relacionados com a promoção da melhoria da qualidade do ambiente e do uso eficiente dos recursos naturais.
No que se refere à política externa, destaco o papel do Ministério no âmbito da Presidência Portuguesa da Comunidade Europeia, empenhando-se em fazer avançar assuntos importantes como o 5.º Programa Comunitário do Ambiente, a regulamentação do trânsito de resíduos perigosos e a eliminação dos produtos nocivos à camada de ozono.
No âmbito da Presidência Portuguesa tem sido também dada especial importância à Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, a realizar no Brasil em Junho deste ano. O facto de Portugal assumir a Presidência durante a realização deste acontecimento, que marcará a história do nosso planeta, é, simultaneamente, uma honra e um desafio.
Neste âmbito, tem sido desenvolvidos inúmeros contactos com representantes dos vários blocos em confronto, procurando alcançar consensos que possam assegurar o sucesso da Conferência do Brasil.
Nos planos externo e interno assumiremos as nossas responsabilidades e tudo faremos para tomar efectivas as legítimas aspirações dos cidadãos a um ambiente saudável.
Apostamos, decididamente, na consciencialização ambiental da sociedade portuguesa. Uma correcta política ambiental terá de ser assumida por todos!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de anunciar quais os Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos, lembro à Câmara que, na hora regimental, procederemos às votações, na generalidade, da proposta de lei n.º 22/VI - Autoriza o Governo a rever o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional e do projecto de lei n.º 1/VI - Regularização extraordinária de estrangeiros não comunitários em situação irregular (PS).
Votaremos ainda três votos relativos ao Dia Nacional do Estudante, dois à comemoração do Dia Mundial do Teatro e um relativo às discriminações feitas pela Inquisição, sobretudo aos judeus, além de um relatório que se encontra pendente.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Isabel Castro, André Martins, Mário Tomé, Hasse Ferreira, Ferraz de Abreu, Luís Peixoto, João Paulo Gomes, Daniel Branco, João Rui de Almeida e António Martinho.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, V. Ex.ª referiu, na sua longa intervenção, que o Governo vai avançar com a lei da água.
Quero lembrar-lhe que, em 1988, um documento da então Secretaria de Estado do Ambiente dizia: «Devido à sua importância, é de referir a preparação, em versão final, da lei da água, que será posta à discussão pública no decorrer do ano de 1988, para aprovação pela Assembleia da República no ano de 1988.» Como sabemos, esta lei não saiu!...
Recentemente, ouvimos o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais dizer na FIL, no decurso de um seminário sobre a água, que estava para breve a saída desta legislação.
Hoje, quatro anos mais tarde, pergunto ao Sr. Ministro, que espaço de tempo significa esse «breve» e qual vai ser a metodologia da discussão da lei que, em 1988, o Governo disse que estaria pronta nesse ano.
A segunda questão que quero colocar-lhe tem a ver com o Plano Nacional de Política de Ambiente, um instrumento legislativo que, de acordo com a Lei de Bases do Ambiente, publicada em 1987, devia ter sido regulamentado no prazo de um ano a contar dessa data e não o foi.
Em 1990, o Sr. Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, foi expressamente à televisão manifestar preocupação - sua e do seu governo - sobre o ambiente e anunciar uma coisa que, aliás, já há muito deveria ter sido feita, ou seja, a elaboração de um plano nacional de política do ambiente.
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Foi então, por despacho ministerial, constituído um grupo de trabalho, que devia apresentar a proposta de um plano para vigorar entre os anos de 1991 e de 1995.
Gostava que, de modo concreto, o Sr. Ministro nos esclarecesse sobre esta matéria.
A minha terceira questão tem a ver com a preocupação. que o Sr. Ministro manifestou relativamente aos resíduos industriais - e que é uma preocupação justa -, referindo que no próximo ano vai ser implementado um sistema para a sua recolha e tratamento.
Este é também um problema que o tal documento que referi, da Secretaria do Estado do Ambiente, já então dizia ser uma preocupação do Governo. Sabemos que em 1990 foi adjudicada a construção desta estação de tratamento de resíduos industriais e o que lhe perguntamos, Sr. Ministro - e estamos a falar de resíduos que, pelo menos, segundo os dados de 1986, eram superiores a 1,05 milhões de toneladas/ano -, é como encara o arranque dessa estação, ou seja, que medidas está a tomar, nomeadamente em relação ao diálogo com os industriais, para que o seu funcionamento se de em devido tempo e de uma forma eficaz.
O Sr. Ministro levantou também aqui a questão da reciclagem e da preocupação que existe, por parte do Governo, sobre esta matéria. Gostava de saber que estratégia existe, nomeadamente no que se refere a incentivos positivos de apoio aos produtos que utilizem embalagens de longa duração, o que, aliás, é prática usual em toda a Europa.
O Sr. Ministro falou também no INAMB, organismo que, do nosso ponto de vista, tem um importante papel nesta matéria. Sabemos que no Orçamento do Estado, para além das críticas que já eram feitas à reduzidíssima verba que lhe era atribuída, mantém este ano o mesmo valor orçamentado, o que significa que efectivamente o INAMB vai ter menos dinheiro para funcionar e que a sua descentralização, que era também um objectivo, ficará posta de lado.
Assim, pergunto-lhe: neste contexto qual é o entendimento que V. Ex.ª tem relativamente à importância que atribui ao INAMB e, por consequência, às associações de defesa do ambiente e à sua participação na política do ambiente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, a sua intervenção defraudou as nossas expectativas, pois que, quando V. Ex.! aceitou o desafio de ser Ministro do Ambiente reconhecemos-lhe uma grande coragem porque o senhor foi co-autor do Livro Branco do Ambiente, que nós e, penso eu, todos os portugueses consideramos mais como um livro negro do estado do ambiente em Portugal.
Assim, ao ser co-autor desse livro, ao aceitar e, portanto, ao assumir uma posição fortemente crítica à política do Governo e depois ao aceitar o desafio, ao aceitar «pegar o bicho pelos ditos», o senhor manifestou, quanto a nós, uma forma de coragem que lhe reconhecemos e que nos criou expectativas de que hoje viesse aqui mas não só dizer que a política de ambiente até 1991 foi um desastre em Portugal, que hoje estamos a sofrer as consequências deste desastre, que daqui a alguns anos, porque o ambiente funciona por acumulação e tem efeitos a médio e a longo prazos, se o Sr. Ministro e o seu Ministério não se esforçarem, terá efeitos ainda mais gravosos para todos nós.
No entanto, o Sr. Ministro veio aqui dizer-nos que os resultados obtidos nos últimos cinco anos são fortemente animadores, daí que tivéssemos ficado defraudados com a sua intervenção.
Sr. Ministro, V. Ex.ª disse que as leis são boas - por exemplo os estudos de impacte ambiental -, mas, ao mesmo tempo, também disse que vai rever a lei que regula os estudos de impacte ambiental. Nessas suas afirmações, permita-me que lhe diga, certamente que há alguma contradição porque uma coisa é dizer que está de acordo com o Governo e que o Governo tem actuado bem e outra é dizer que a lei sobre os estudos de impacte ambiental e má - é efectivamente má, dado que o Ministro do Ambiente não pode dizer que não quer aquilo que está a ser feito!
O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território está a sorrir mas sabe que é verdade o que afirmo e que esses estudos não podem ser impedidos pelo Sr. Ministro do Ambiente, que, aliás, nem tem sido o maior abusador... Naturalmente que falta aqui um vosso companheiro que tem usado e abusado dos estudos de impacte ambiental, feitos normalmente depois de os investimentos e de empreendimentos estarem feitos.
V. Ex.ª falou, relativamente aos rios, do trabalho de controlo sistemático que tem estado a ser feito sobre as descargas de efluentes para os recursos hídricos e eu pergunto-lhe: esse trabalho de controlo sistemático estava a ser feito quando se deu aquele acidente no rio Zêzere? E, a propósito disto, que medidas vão ser tomadas para que os 50 000 m3 que estão retidos junto à fábrica possam não ser, num dia de nevoeiro ou num dia que já não seja possível aguentar mais resíduos nos depósitos que estão construídos, lançados directamente para o rio Nabão e depois para o Zêzere?
Uma outra questão tem a ver com as suas posições relativamente aos resíduos tóxicos que se encontram em Setúbal. O Sr. Ministro tomou posições, estipulou prazos para que os resíduos fossem reexportados. O primeiro prazo foi até 23 de Novembro, o segundo até 23 de Dezembro e eu pergunto: o que é feito dos resíduos? A única coisa que sabemos e que a empresa de onde foram originários já foi à falência, por isso gostaríamos de saber quais são os mecanismos que tenciona accionar para resolver este problema.
A outra questão tem a ver com as áreas protegidas. Em Portugal existem 24 áreas protegidas, mas dessas apenas só tem planos de ordenamento, e as é que tem plano de ordenamento - não tenho tempo para dizer-lhe quais são, mas V. Ex.ª sabe - estão numa situação de profunda degradação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, o seu discurso foi uma limpeza e eu fico à espera de que V. Ex.ª saia daqui e vá dar um mergulho revigorante a Pernes, nas águas do Alviela...
Risos.
No entanto, parece-me que o Grupo Parlamentar do PSD não gostou tanto do discurso - ou será do Ministro?... - porque não se manifestou com a vivacidade que
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um tema destes e um discurso destes, que mostra todo o caminho que o Governo abre para a qualidade de vida no nosso país, merecia.
Sr. Ministro, a seca não se resolve com procissões! É uma calamidade para a agricultura, para os homens e mulheres, mas veio revelar também e de forma brutal o submundo do mercado todo-poderoso e sem regras adequadas. O veneno da poluição sistemática e sem controlo engrossa os rios moribundos incapazes de o diluírem e eu pergunto: no Verão como irá ser? Que iniciativas vai tomar o Governo para responder à falta de água? Por que razão ainda não foram criados os organismos regionais de descentralização e gestão da água anunciados em 1987 pelo então Secretário de Estado Carlos Pimenta? Cinco anos depois estamos na mesma!
Sr. Ministro, eu fiz, em 6 de Dezembro de 1991, um requerimento sobre a questão da METALIMEX, sobre a acumulação de resíduos, e, como ainda não recebi resposta, desejava saber se a cidade de Setúbal vai continuar com os resíduos que se infiltram - por exemplo, as dioxinas - nos lençóis freáticos que matam a sede da população mas que nós não desejamos que venham a matar essa mesma população.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, relativamente ao depósito de resíduos tóxicos que foi estudado e estará decidido para o litoral alentejano, desejava saber quais as precauções que o Governo que V. Ex.ª integra irá tomar para salvaguarda do sistema ecológico e do bem-estar das populações da zona e ainda quais as contrapartidas reais que terão sido dadas ou prometidas aos municípios da zona ou vizinhos, nomeadamente os de Sines, Grândola e Santiago do Cacém. O que é certo, Sr. Ministro, é que nas populações da zona lavra grande inquietação eu próprio estou preocupado.
Sr. Ministro, para terminar, permita-me que deseje que sob a sua direcção o ambiente não seja apenas uma bandeira governamental para enganar alguns incautos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): -Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, gostava imenso de me associar ao seu optimismo quando falou na situação ecológica em Portugal, comparando-a com a de outros Estados da Europa, sobretudo falando na política de sucesso aplicada nestes últimos cinco ou seis anos em Portugal, como gostava igualmente de me associar às palmas que o partido apoiante do Governo lhe deu quando, com uma certa ênfase, falou no rigor com que a legislação iria ser aplicada.
No entanto, e apesar dos 539 diplomas que V. Ex.ª anunciou, a verdade é que a situação não é brilhante - os resultados também não o são - e eu pergunto mesmo se a degradação, menor, em que se encontra o nosso País sob o ponto de vista ecológico não se deve mais ao atraso da nossa industrialização do que propriamente às medidas que foram tomadas.
Aliás, V. Ex.ª conhece muito bem um problema que eu vou apontar e sobre o qual desejo pedir-lhe alguns esclarecimentos.
O Sr. Ministro foi o autor ou pelo menos presidiu ao grupo de trabalho que elaborou, em 1989, um projecto para a salvação da ria de Aveiro, para o qual, em 1990, estava orçamentado e já se sabia que era necessário dispor de alguns milhões de contos para iniciar esse programa. Mas estamos em 1992 - parece que já estão desbloqueadas algumas verbas do ENVIREG -, existe um atraso enorme e a situação mantém-se tal e qual porque não houve o mínimo sucesso da política do Governo nesta matéria.
Toda a bacia do Vouga se encontra poluída e, como V. Ex.ª conhece muito bem a situação do Vouga, do Caima e da própria ria de Aveiro, não lhe aconselho banho algum, mas, como falou em rigor na aplicação destes 539 diplomas, devo dizer-lhe que há um ano fiz um requerimento procurando saber se o tal princípio do poluidor-pagador teria sido aplicado a uma empresa que foi identificada pelo Gabinete da Ria de Aveiro como tendo lançado uma descarga de mercúrio na ria e se algumas alterações na tecnologia da empresa causadora teriam sido impostas para modificar este panorama e evitar futuras descargas nesta matéria. Acrescentarei que recebi resposta acerca do desbloqueamento das verbas do ENVIREG, mas que sobre a outra parte a resposta foi totalmente omissa.
No entanto, mantenho a minha afirmação de que o panorama da degradação ecológica do distrito de Aveiro todos os anos se tem vindo a agravar. Portanto, a política ecológica deste governo não tem lido o menor resultado na ria de Aveiro.
Também falou V. Ex.ª no melhoramento do abastecimento de água às populações, mas aí temos é que «tirar o chapéu» e prestar a nossa homenagem aos municípios porque esses é que tem feito obra nessa matéria.
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Peixoto.
O Sr. Luís Peixoto (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, V. Ex.ª pintou a mania com tal optimismo que eu só não me atreveria a chamar-lhe cor-de-rosa porque certamente ofenderia a vontade que V. Ex.ª e o partido que o apoia tom de pintar o País de cor de laranja...
Risos.
De qualquer forma, eu queria referir-me a uma outra mancha que é, digamos, uma onda negra que vai, essa sim, cobrindo aos poucos a nossa floresta. E indiscutível o papel que os fogos florestais tom na degradação do ambiente. Lembro-lhe que, só em 1991, em mais de 22 000 incêndios que ocorreram, ardeu uma área superior a 160 000 ha que suplantou a ardida em anos anteriores, tanto que, em 1989, arderam mais de 103 000 ha e, em 1990, 129 000 ha.
Falou V. Ex.ª em grandes medidas orçamentais, em grandes aumentos de verbas. Realmente, este ano, o orçamento prevê, para o Serviço Nacional de Bombeiros, um acréscimo de 2 milhões de contos, passando essa verba de 5,2 para 7,2 milhões de contos. No entanto, deste valor, apenas 2 milhões de contos serão atribuídos à prevenção dos fogos florestais, verba que se prevê venha a ser inferior à orçamentada em 1991.
O orçamento da Direcção-Geral das Florestas desce de 4,9 para 4 milhões de contos, enquanto que as verbas
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disponíveis para o Plano de Acção Florestal sofrem um decréscimo de 1,1 milhões para 926 000 contos.
Quanto a nós, é dentro deste quadro que é possível prever qual vai ser o resultado desta política, faltando apenas saber quantos milhares de fogos florestais ocorrerão em 1992 e quantos milhares de hectares irão também arder em 1992.
As perguntas que queria fazer a V. Ex.ª são, pois, as seguintes:
Quando pensa o Governo e o PSD esgotar uma política de ordenamento e de reconversão florestal que acabe com as grandes manchas monoculturais que permitem o desenvolvimento de grandes incêndios?
Quando pensa executar este governo um programa eficiente de rearborização de áreas ardidas em incêndios florestais?
Para quando pensa este governo tomar medidas que evitem o despovoamento e a desertificação das imensas áreas ardidas?
Para quando a criação de um verdadeiro serviço de detecção e de alerta de incêndios florestais?
Para quando uma política de colaboração no melhor equipamento das corporações de bombeiros?
Para quando uma política eficaz de prevenção dos fogos florestais?
Coloco todas estas questões para perguntar, definitivamente, quando pensa este governo cumprir as promessas eleitorais?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Gomes.
O Sr. João Paulo Gomes (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, ouvi com bastante atenção a sua intervenção e considero que, de facto, foi uma boa declaração de princípios. Vamos aguardar que se passe à realidade, para que todos nesta Câmara nos regozijemos com esse facto.
Apesar de tudo, e embora não estejam directamente relacionadas com a sua intervenção, gostaria, porque considero que é importante para o CDS, colocar duas ou três perguntas.
O Sr. Ministro conhece, com toda a certeza, a realidade do rio Cávado. Sabe-se que a diminuição do seu caudal tem efeitos extremamente nefastos. Por outro lado, tem-se assistido ciclicamente a várias tentativas de instalação de mini-hídricas no Baixo Cávado, com todas as consequências gravíssimas que daí adviriam, e supõe-se que, neste momento, há uma nova tentativa - que seria a terceira - de instalação dessas mesmas mini-hídricas no Baixo Cávado.
Gostava de ouvir a V. Ex.ª, Sr. Ministro, se, de facto, se abandonou por completo essa ideia ou se ela se mantém no subconsciente do Governo, embora de uma forma camuflada?
Também recentemente correram alguns rumores em relação aos quais gostaria que o Sr. Ministro me dissesse que veracidade existe na hipótese de uma captação de água a montante de Barcelos, que serviria para o abastecimento de água a diversas localidades, nomeadamente à Póvoa de Varzim, a Vila Nova de Famalicão e a Maia, entre outras. Esta captação de água a montante leria naturalmente os mesmos efeitos nefastos de diminuição de caudal das mini-hídricas.
Por outro lado, como também já foi referido nesta Câmara, para quando teremos a aplicação do princípio poluidor-pagador no Baixo Cávado?
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Branco.
O Sr. Daniel Branco (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, anotei que, na sua intervenção, o trabalho feito pelo Ministério do Ambiente e Recursos Naturais foi avaliado em diplomas e em palavras e quando o Sr. Ministro passou das palavras aos factos, a exemplo de casos e de comparações anteriores, prestou uma homenagem ao poder local referindo índices de recolha de lixo, de recolha de vidro, de estações de tratamento de águas residuais, de distribuição de água às populações, áreas que são da competência das autarquias. Registo a homenagem, tanto mais que vão escasseando as homenagens, mas julgo que esta acção não pode ser considerada a credito do Governo.
Gostava de formular três perguntas relativamente às questões da água. Ern primeiro lugar, o Sr. Ministro referiu-se à lei da água para esta Legislatura, à legislação complementar sobre recursos hídricos e qualidade da água e lambem a diplomas regulamentares sobre o Instituto Nacional da Água. Daí que lhe pergunte quando é que estes diplomas vão ver a luz do dia. Quando é que serão submetidos ao debate indispensável de forma a integrarem medidas adequadas aos reais problemas a que devem dar resposta e que papel concreto estará reservado para os municípios nesta legislação?
Em segundo lugar, atendendo ao facto de as directivas comunitárias sobre saneamento, fundamentalmente sobre tratamento de águas residuais, exigirem ao nosso país avultadíssimos recursos para o seu cumprimento, perguntamos qual o volume de investimentos necessário, se é que o Governo já fez uma estimativa a este respeito, e como pensa o Executivo disponibilizar os financiamentos para cumprir os imperativos de qualidade impostos?
Por último, perante as restrições impostas .ao lançamento, em cursos de água ou no mar, de águas residuais sem tratamento secundário, como pensa o Governo resolver o problema do saneamento da Costa do Estoril, em construção e ainda sem data conhecida para entrar em funcionamento, pois apenas está projectado um tratamento primário, na Guia, com a remessa do esgoto para o oceano por meio de um emissário submarino sem tratamento secundário?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, depois do discurso de V. Ex.ª, fica-se com a ideia de que este governo e, em particular, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, tem agido eficazmente na protecção do ambiente. Infelizmente, o Sr. Ministro também conhece esta realidade e sabe que não é isso que acontece.
Vou colocar uma questão muito concreta: as duas fábricas de celulose no concelho da Figueira da Foz drenam ainda quantidades elevadíssimas de efluentes
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líquidos nas praias a sul daquela cidade. Mas há uma circunstância agravante, 6 que além da quantidade importante deste efluente líquido que é drenada, tal sucede a céu aberto. É, pois, visível a influência destes efluentes em toda a superfície do mar naquela zona, com todas as consequências que daí advêm para a poluição marítima. Queria saber, através de V. Ex.ª, o que é que tem sido feito pelo Ministério do Ambiente e Recursos Naturais a este respeito.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, «desça comigo à Terra»!
A exploração desenfreada de pedreiras e refiro-me mais especificamente às pedreiras de granito do distrito de Vila Real, constitui, em primeiro lugar, um grave atentado ao ambiente natural da região, porque não tem em consideração a preservação do equilíbrio paisagístico. Em segundo lugar, constitui um roubo às populações, o que é mais evidente quando estas pedreiras se situam em baldios, já que, na maioria dos casos, o aluguer pago é irrisório, por vezes simbólico, e muitas vezes a concessão é depois subalugada a preços muito superiores.
Qual a sua política, Sr. Ministro, para rentabilizar a riqueza desta e de outras regiões, salvaguardar o equilíbrio da paisagem e proteger os interesses das populações?
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com prazer que registo o facto de a minha intervenção ter suscitado tantos pedidos de esclarecimento, o que significa que foi seguida com particular atenção, que esta Câmara se interessa por aquilo que disse.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Menos a sua bancada! Não ligaram nenhuma!
O Orador: - Decorreram cerca de cinco meses desde a eleição deste governo. Estamos a apresentar a política de ambiente do XII Governo e temos quatro anos à nossa frente para a fazer cumprir. É, pois, nessa perspectiva que olhamos para as medidas aqui propostas. De qualquer modo, algumas das questões que foram suscitadas merecem alguns comentários particulares, que passarei a fazer, tentando agrupá-las sempre que possível, até porque muitas delas foram repetitivas e era bastante aborrecido para a Câmara dar sistematicamente o mesmo tipo de resposta.
A pergunta formulada sobre «a lei da água, para quando?» merece alguma reflexão relativamente aos diferentes diplomas que, entretanto, foram aprovados. Os Srs. Deputados sabem que existe um diploma sobre os recursos hídricos, o Decreto-Lei n.º 74/90, que estabelece a qualidade da água, e que, sobre o sistema institucional de recursos hídricos, incide o Decreto-Lei n.º 70/90. Ambos fazem parte dos pilares de uma casa cujo tecto será a lei da água. Portanto, esta lei nunca poderia aparecer sem alicerces, sem que antes tivéssemos construído as paredes. Estamos, neste momento, a ultimar o referido diploma para o poder apresentar à Assembleia e aqui ser discutido.
Perguntaram também: «Para quando o Plano Nacional da Política de Ambiente?» Obviamente que este documento é um instrumento horizontal, como referi na minha intervenção inicial, o que significa que o Governo está a assumir as suas responsabilidades, em termos ambientais, ao nível de todos os departamentos ministeriais. Aliás, ele está a ser preparado com o cuidado necessário para que seja efectivamente cumprido, porque para termos um Plano da Política de Ambiente que não venha a ser cumprido é preferível mantê-lo quieto e sossegado na secretária. Daí que nos pareça necessário que, antes de ser posto à discussão, tenha de reunir o consenso necessário ao nível da intervenção das políticas dos diferentes ministérios; mas certamente que o daremos a conhecer aos Srs. Deputados, durante os próximos seis meses.
Quanto aos resíduos industriais, existe legislação e é necessário fazê-la cumprir. O Ministério estava interessado em que não houvesse resíduos espalhados por todo o lado e conseguiu criar as condições para que essa situação se alterasse. Inclusivamente, estabeleceu prazos bem claros. Temos um consórcio de empresas que está a trabalhar nessa matéria e que, em 1993, certamente irá ter o sistema pronto para começar a funcionar.
Sr. Deputado André Martins, ainda bem que não estamos exactamente sintonizados em relação à forma como olhamos para a política de ambiente, o que só pode significar que estou no bom caminho. Sc estivéssemos sintonizados, era capaz de me sentir preocupado!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Também me dá a sensação de que o Livro Branco sobre o Estado do Ambiente em Portugal foi mal lido e mal interpretado. Se o Sr. Deputado faz essas críticas é porque, com certeza, o interpretou mal, porque faço uma leitura completamente diferente da sua e obviamente que, tendo sido um dos seus autores, vai-me permitir que considere como correcta a minha, que é a que estamos a tentar implementar.
O Livro Branco dá-nos determinadas pistas. Consideramo-lo um dos instrumentos fundamentais, acompanhado de outros pilares que aqui referi, os instrumentos de planeamento, a estratégia da conservação, o próprio Plano da Política de Ambiente, assim como o sistema dos recursos hídricos. Será nesses pilares, para além da Lei de Bases do Ambiente, que assentará toda a política de ambiente deste governo.
Este aspecto leva-me a mencionar duas questões relacionadas com a reciclagem e com os incentivos, precisamente porque estão na linha do Livro Branco e do que nós próprios estamos a implementar no Ministério, nomeadamente quando falei aqui no problema da reciclagem.
Quando somos atacados por os nossos orçamentos serem reduzidos relativamente àquilo que se gostaria de ter, posso dizer que é óbvio que é sempre importante ter mais dinheiro, porque com ele provavelmente conseguiríamos fazer mais coisas. Mas mais importante do que isso - e esta é que é, de facto, a vontade política do Governo - é, com o mesmo dinheiro, conseguir maior rentabilização. Portanto, o facto de se dizer que lemos um orçamento igual ao do ano passado não significa que não consigamos melhorar a nossa política, melhorando também a rentabilização dos serviços que prestamos.
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O Sr. André Martins (Os Verdes): - A inflação sobe e o orçamento estica!
O Orador: - Sr. Deputado André Martins, quando V. Ex.ª diz que 1991 foi o ano do desastre, em termos ambientais, neste país, peco-lhe que olhe para ,os países do Leste europeu, se quer ver o que é um desastre ambiental.
Isto significa que Portugal ainda está numa situação em que podemos dar-nos ao luxo de implementar uma política correcta do ponto de vista ambiental, política essa que nos permite um crescimento sustentado, coisa que, a nível da Europa, não é comparável. Temos uma condição ambiental que ainda 6 das melhores.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Isso já não chega!
O Orador: - De facto, em termos de indicadores económicos, é - e deixemos as palavras e passemos aos números - dos melhores que temos.
A questão do acidente do rio Zêzere e uma situação ião pontual que não posso, de modo algum, deixar de a referir, mas apenas como uma situação pontual, porque tem havido ...
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - É como a do Al viela?
O Orador: - No rio Alviela gastámos a módica quantia de 4,2 milhões de contos, Sr. Deputado, o que demonstra que o Governo está preocupado com a resolução do problema. Mas, neste caso, infelizmente, são as indústrias que estão a «acelerar». E, quando temos algumas dificuldades a nível dos municípios, o mesmo tipo de comparação se faça.
O Sr. Carneiro dos Santos (PS): - Isso não é verdade!
O Orador: - E aqui referi uma situação que o Sr. Deputado Daniel Branco aqui indicou. Sem dúvida que prestei uma homenagem ao poder local e não posso deixar de o fazer. Considero que não conseguiremos implementar uma política de ambiente neste país se não tivermos -c por isso a nossa proposta do pacto ambiental - os municípios do nosso lado. Mas apenas com uma pequena nuance, Sr. Deputado: ó que quem de facto assinou os contratos-programa para que o poder local conseguisse fazer isso tudo foi o governo central; mais, foi o XI Governo, apoiado pelo PSD. Essa é que 6, de facto, a realidade e a situação concreta.
Aplausos do PSD.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Não há outra forma, porque os senhores impõem que seja assim!
O Orador: - Se me permitirem, continuarei a responder às perguntas pontuais que aqui me foram feitas. De facto, parece que os Srs. Deputados conseguiram ler o livro da Sr.ª Brunkland, que dizia que devemos olhar para o ambiente pensando globalmente e actuando localmente- era tão bom que isto tivesse aplicação! Quando os Srs. Deputados colocam aqui todas estas questões locais e põem de lado os problemas globais, seria bom que começassem a pensar que também há outras questões que não apenas a do rio Zêzere ou a dos resíduos tóxicos em Setúbal.
De qualquer modo, vou responder, para que não digam que nós «fugimos» às questões. No que se refere aos resíduos tóxicos em Setúbal, trata-se de uma situação que resolvemos de uma maneira que nos parece perfeitamente correcta. E, pela primeira vez na Europa, deu-se o caso, que é único, de um Estado ter assumido a responsabilidade que o Governo Português assumiu, e que vai fazer cumprir, de reenviar para a origem os resíduos tóxicos que foram enviados para este país. Na verdade, temos neste momento o acordo do Governo Suíço para que isto seja feito. Trata-se, portanto, de produtos que vieram de uma maneira indevida, que foram detectados - inclusivamente foram salvaguardadas as condições em que eles estão armazenados - e que vão ser reexportados para a Suíça, já com o acordo do Governo Suíço. Isto responde a várias perguntas que aqui foram feitas.
Quanto à questão dos órgãos regionais, julgamos que a aproximação do País legal ao País real passa exactamente pela implementação desses órgãos regionais e é isso o que estamos a fazer actualmente. Só a partir do momento em que foi publicada a lei orgânica do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais é que foi possível dar esse passo significativo. Quer isto dizer que a maior parte da política do ambiente pode agora ser implementada a nível regional, apenas com uma pequena ressalva: é que temos de ter, a nível nacional, todo o normativo que nos permita fazer a implementação da política do ambiente a nível regional e não aceitamos, de modo algum, que isto seja separado daquilo que entendemos ser a grande prioridade nacional: os recursos hídricos.
Isto tem uma certa ligação com o que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu me perguntou acerca da situação da ria de Aveiro - e até ficava admirado se não falasse dela! A ria de Aveiro é, sem dúvida, um ponto que consideramos importante. Por isso, foi-lhe atribuída uma verba no ENVIREG (Programa Comunitário para o Ambiente e Política Regional) e, tendo uma associação de municípios, espero que, na linha do que disse o Sr. Deputado Daniel Branco, os municípios assumam aquilo que eu próprio considerei como importante e que o Governo, enquanto órgão que tem vindo a apoiar todo este desenvolvimento regional e municipal, defendia. Julgo que os municípios dessa associação irão assumir a sua responsabilidade, implementando aquele plano que eles próprios aceitaram. O Governo já disponibilizou as verbas, através não só do ENVIREG como também do próprio PIDDAC e, portanto, esta é uma questão que está, neste momento, a ser tratada ...
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Reconhece, portanto, que, por enquanto, está tudo na mesma?
O Orador: - Não propriamente. E aproveito para responder a mais uma daquelas questões pontuais que me foram colocadas: a do mercúrio lançado na ria de Aveiro por uma determinada empresa.
Felizmente que essa empresa modificou o seu processo de fabrico, tendo reduzido esse lançamento, há mais de dois anos, na sequência, aliás, daquilo que tinha sido proposto por esse tal grupo de trabalho criado para estudar os problemas da ria de Aveiro, e estando, neste momento, a utilizar um processo de fabrico que já não implica o lançamento de mercúrio na ria. Isso não quer dizer que não estejamos preocupados, porque há lá mercúrio e é
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preciso retirá-lo. Para isso, existe um programa de recuperação no próprio ENVIREG.
Quanto à questão dos fogos florestais, limito-me a dizer que essa é uma preocupação do Governo e, por isso mesmo, existe uma coordenação entre três Ministérios - o da Administração Interna, o da Agricultura e o do Ambiente e Recursos Naturais -, relativamente à questão dos incêndios. No entanto, deixaria que o Sr. Secretário de Estado dos Mercados Agrícolas e Qualidade Alimentar respondesse mais detalhadamente à questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Peixoto a este propósito.
Relativamente à preocupação do Sr. Deputado João Paulo Gomes com o rio Cávado, quanto à instalação das mini-hídricas, à captação de água e à eventual redução do seu caudal, quero dizer-lhe que esse é talvez um dos poucos rios deste país - não sei se o sabe - cujo caudal está regularizado. Isto significa que se traia de um rio que, neste momento, está perfeitamente conhecido e quando, eventualmente, se pretende fazer este tipo de intervenções, elas fazem-se conhecendo o que se está a pretender realizar. Ou seja, os estudos técnicos é que vão dizer-nos se aquelas obras suo boas e se podem ou não realizar-se. Ninguém vai fazer intervenções no rio Cávado, nem noutro, sem primeiro conhecer o impacte ambiental que daí possa advir. Portanto, pode estar descansado, Sr. Deputado, porque não iremos deixar que os problemas das mini-hídricas ou do abastecimento de água com uma captação no rio Cávado venham a prejudicar o rio, através de um impacte ambiental negativo. Isso não sucederá. Sr. Deputado!
Quanto aos problemas colocados pelo princípio do poluidor-pagador, existe aqui alguma confusão quando se relaciona esse princípio com a aplicação das coimas ou das multas.
O princípio do poluidor-pagador é uma situação normal, em que se paga porque se polui, porque se utiliza um recurso natural. Quando uma empresa prevarica, como é o caso da empresa que lançou os efluentes no rio Zêzere ou outra do mesmo género, é-lhe aplicado aquilo que foi previsto pelo Ministério do Ambiente, a coima, que, depois, poderá transformar-se numa multa. Esta tem sido a actuação seguida e é a correcta. Ora, o princípio do poluidor-pagador é completamento diferente deste sistema. O próprio Ministério e os próprios inspectores do ambiente que existem têm estado a actuar nesse sentido, como se viu, aliás, pelos 54 casos que ganhámos em tribunal durante o ano de 1991.
Só para referir que não trabalhamos «às cegas» e que o Governo tem ideia de quanto precisa gastar para implementar, em Portugal, uma política correcta, em termos de saneamento básico, quero apenas dizer que temos quantificadas as necessidades, em termos financeiros, para Portugal poder cumprir a directiva comunitária que nos vai ser imposta, a partir de 1996, sobre as águas residuais. Isso está quantificado, temos os valores que podem ser disponibilizados e tenho-os aqui à minha frente.
Já agora, respondo a um problema que foi aqui colocado pelo Sr. Deputado Daniel Branco quanto à questão da Costa do Estoril e ao facto de os efluentes lançados no Atlântico só terem um tratamento primário.
Sr. Deputado, como sabe, o oceano Atlântico, contrariamente ao mar Mediterrâneo e ao mar do Norte, tem uma água balida e uma capacidade autodepuradora que, felizmente, não precisa que os nossos contribuintes paguem mais para fazer uma estação secundária quando a primária chega. Esta é que é a maneira de utilizar melhor os fundos que são postos à nossa disposição, Sr. Deputado!
Quanto às empresas de celulose, gostaria de dizer-lhe. Sr. Deputado, que esse foi um dos poucos campos em que o Governo actuou com um contrato-programa, antes da existência da legislação. Foi feito um contrato-programa com as empresas de celulose quando ainda não havia legislação que as obrigasse a cumprir e conseguiu-se que elas aceitassem essa imposição sem que a legislação existisse. Portanto, muito foi feito e a grande maioria delas conseguiu cumprir esse contrato-programa.
Quanto às explorações de pedreiras, Sr. Deputado António Martinho, limito-me a dizer-lhe que não há exploração de pedreiras, desde que saiu a lei, que não seja feita com um estudo de impacte ambiental. Portanto, as recuperações paisagísticas, inclusive, estão a ser exigidas. É óbvio que, assim como as pedreiras levam tempo a começar a produzir, o mesmo sucede para se conseguir a recuperação.
Espero que, com estas informações, os Srs. Deputados fiquem mais calmos, relativamente à necessidade e à vontade que o Governo tem de fazer implementar a legislação. Não estejam tão preocupados, porque estamos efectivamente a caminhar neste sentido.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais devolveu a resposta de uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado dos Mercados Agrícolas e Qualidade Alimentar. Assim, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, que dispõe de dois minutos.
O Sr. Secretário de Estado dos Mercados Agrícolas e Qualidade Alimentar (Luís Capoulas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente à questão suscitada pelo Sr. Deputado Luís Peixoto, apesar da ausência no estrangeiro do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado da Agricultura, o Ministério da Agricultura não quer deixar de acrescentar aqui alguma coisa relativamente à política florestal que o Sr. Deputado tanto questiona.
Efectivamente, ela existe, é um facto e tem tradução prática. Existe na sua dimensão económica e também na sua dimensão ecológica e assenta fundamentalmente em três eixos: na expansão, na beneficiação e na valorização do nosso património florestal. Relativamente à expansão, porque somos um país com vocação florestal e porque lemos ainda cerca de 2 milhões de hectares de incultos ou de áreas marginais para a agricultura; quanto à beneficiação através do seu adensamento e desmatagem e no que se refere à valorização através da potenciação do seu uso múltiplo e da diversificação da sua exploração.
Efectivamente, o fogo é um flagelo que a todos perturba e não apenas ao Sr. Deputado. Todos temos que nos considerar insatisfeitos com os resultados até aqui conseguidos na prevenção e no combate, mas é, fundamentalmente, numa maior consciência cívica, num maior espírito de prevenção, de amor e de apego à floresta que temos de encontrar as soluções mais expeditas para combatermos esse flagelo.
Não é, no entanto, por falta de cuidado e por falta de aumento de meios que este combate não tem tido o sucesso que iodos almejamos. De ano para ano, as disponibilidades de meios, as brigadas de investigação e os postos de vigia têm crescido. Entrou também este ano em funcionamento um corpo de sapadores visando especificamente este
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objectivo. Considero, portanto, injusta a afirmação de que a floresta não tem tido o zelo e a protecção que merece, quer pela sua valia económica quer ecológica.
Cumpre-me também salientar, neste domínio, o programa de acção florestal, que 6, de longe, o maior, o mais dotado do nosso Programa Específico para o Desenvolvimento da Agricultura e Pescas. Estuo destinados 28 milhões de contos para a protecção e expansão da floresta, dos quais cerca de metade já foram aplicados na primeira fase, quer em acções de arborização quer de beneficiação. Lembro ainda que esta dotação tem sido, fundamentalmente, destinada a espécies de crescimento lento, e não, como por vezes se quer inferir, para espécies industriais de crescimento rápido.
Até 1993 estará cumprido este esforço de ampliação e de protecção da nossa floresta, pelo que de modo algum pode colher a apreciação do Sr. Deputado de que esta matéria não tem merecido o cuidado devido por parte do Governo. Aliás, nunca até aqui houve qualquer governo que tivesse tido a coragem de aprovar e aplicar o «pacote florestal», que -esse sim! - é fortemente penalizador para aqueles que prevaricam e agridem a floresta.
Também está em preparação, para apresentação nesta Assembleia muito brevemente, uma lei de protecção de espécies indígenas, que vai alargar a outras espécies o regime que já existe para os montados de sobro e de azinho.
Julgo que, com estas breves explicações, está destituída de fundamento a apreciação crítica que o Sr. Deputado fez relativamente à política de ordenamento florestal do Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Hasse Ferreira pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, há uns anos que estou ausente do Hemiciclo mas suponho que a figura regimental de protesto ainda existe e, como o Sr. Ministro fez uns comentários completamento descabidos relativamente à minha pergunta, gostaria de saber...
O Sr. Presidente: - Na altura própria dar-lhe-ei a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Hasse Ferreira (PS): - Pelo que me dizem, é a figura regimental de defesa da honra e da consideração que devo usar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Queira aguardar, Sr. Deputado. O Sr. Deputado João Rui de Almeida pediu a palavra para que efeito?
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, eu coloquei uma questão muito concreta ao Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais que não obteve resposta.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pretende interpelar a Mesa ou o Sr. Ministro?
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, gostaria de, sob a forma de interpelação à Mesa, lembrar o Sr. Ministro que fiz uma pergunta, a que ele não respondeu, certamente por esquecimento.
Vozes do PSD: - A sua pergunta não foi importante!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Campos pediu a palavra para que efeito?
O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
O Sr. Presidente: - Não pode, Sr. Deputado, porque o Sr. Secretário de Estado da Agricultura apenas deu um esclarecimento.
O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, penso que os pedidos de esclarecimento foram feitos relativamente à intervenção do Sr. Ministro c...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Sr. Ministro solicitou à Mesa que um dos pedidos de esclarecimento que lhe foi dirigido fosse respondido pelo Sr. Secretário de Estado, que nessa qualidade interveio.
O Sr. António Campos (PS): - Então, posso gastar tempo do meu partido?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado poderá fazer uma intervenção na altura própria.
Se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, para responder à pergunta a que o Sr. Deputado João Rui de Almeida se referiu.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais: - Sr. Presidente, muito rapidamente, para dizer que o Sr. Deputado João Rui de Almeida não deve ter acompanhado a minha resposta, porque ela já foi dada, no caso dos resíduos tóxicos e perigosos e também no das celuloses da Figueira da Foz.
Já que a resposta relativamente à questão da Figueira da Foz foi clara e evidente, limito-me apenas a dizer, quanto aos resíduos tóxicos e perigosos, que está, neste momento, constituído um consórcio para construir o sistema nacional de resíduos industriais, o qual tem em mãos um projecto para negociar com os vários municípios, no sentido de encontrar o local mais correcto.
Aguardamos o estudo de impacte ambiental para podermos saber exactamente quais são as soluções alternativas que, como se sabe, o impacte ambiental impõe, soluções essas a vários níveis, não só em termos de tecnologia como em termos de localização.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, não estou «ofendidinho», mas, se calhar, se Sá Carneiro fosse vivo, estaria ofendido com certo tipo de comentários de algumas pessoas do PSD que não sabem bem qual é a história do PSD.
Protestos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira cingir-se ao tema para que pediu a palavra.
O Orador: - Quando o Sr. Presidente conseguir que a bancada do PSD esteja calma...
Pausa.
O Sr. Ministro entrou há pouco tempo na política, o que é sempre bom para renovar a classe política, que não é uma classe.
Protestos do PSD.
Isto não é tanto como em Mogadouro, quando aqui há uns anos ofereciam pancada, mas aproxima-se disso!
Risos do PSD.
Sr. Presidente, espero que este tempo esteja a ser descontado no do PSD e não no do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, este tempo é seu e peço-lhe que use a palavra para o efeito que pediu.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, mas parece que não querem que use da palavra.
Risos do PSD.
Parece que a bancada do PSD não quer que eu use da palavra...
Sr. Ministro, diria apenas que, da segunda vez que usou da palavra, começou a responder à pergunta que lhe linha feito, mas na primeira resposta usou uma descabida arrogância, citando inclusivamente uma senhora que - o Sr. Ministro não sabe mas eu digo-lho - é minha camarada e não sua!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, se assim o entender, o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais: - Não tenho explicações a dar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.
O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta interpelação dá um bom ensejo às diversas forças políticas para se fazer um balanço da política de ambiente nos últimos anos.
Infelizmente, o Sr. Ministro não resistiu à tentação da demagogia e apresentou-nos a política de ambiente como uma política de sucesso. Devem ter-lhe explicado que nestes debates parlamentares, em que é estreante, quanto mais demagogia melhor. Explicaram mal! Porque a demagogia é como sal na comida: só deve ter quanto baste; quando é demais estoura-lhe na cara.
Vozes do PS: - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Orador: - O Sr. Ministro não resistiu até a cometer o mesmo erro do seu antecessor. Citou os 539 diplomas legislativos do Governo - lá vem a lista outra vez - e se VV. Ex.ªs consultarem essa lista, verão que lá vem a adesão do Burkina Faso à Convenção de Montreal! O que seria do ambiente no Mundo se isso não se tivesse verificado, se esse acto legislativo de relevante importância não se tivesse verificado?! Dessa lista constam os bolos de pastelaria e o alargamento das áreas de recrutamento... Quando a coisa já não dá para os «laranjinhas», é preciso alargar!
Risos.
Infelizmente, o Sr. Ministro não resistiu à demagogia de nos apresentar aqui de novo essa lista. Isso foi uma reprise que já deu o que tinha a dar no passado, já foi gozada no passado, provocou uma enorme vontade de rir. Gostaríamos que o Sr. Ministro não voltasse a referi-la, porque é de má memória.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A avaliação das políticas faz-se em termos de resultados, não de discursos ou de manifestações de intenção. É por isso que um debate político sobre ambiente não pode ser confundido com um colóquio sobre ecologia teórica.
Era bom que o Sr. Ministro também aprendesse essa distinção, porque a mera reposição de princípios consensuais do tipo «o desenvolvimento do País tem de ser harmonioso e equilibrado» ou «conciliar o crescimento económico com a defesa dos valores ambientais» ou ainda «integrar as preocupações ambientais nas diversas políticas sectoriais» não traz nada de novo, é já sabido. Importa saber - isso, sim, é motivo de debate - em que medida é que estes princípios tiveram aplicação prática, isto é, em que medida foram considerados na decisão política.
Ora, podemos começar justamente por este último princípio, «integrar as preocupações ambientais nas diversas políticas sectoriais».
Srs. Deputados, valerá a pena falarmos das obras públicas? Valerá a pena enumerar todos os conflitos que ao longo destes anos estalaram entre os Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Ambiente e Recursos Naturais? Certamente que não! Não incomodemos o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, esse grande construtor, com miudezas ambientais. Ele acha tudo isso meros empecilhos às suas pontes e estradas; preocupações ambientais são forçosamente coisas que não lhe tiram o sono!
Por este lado, estamos conversados.
Mas falemos, então, da indústria. Também aqui as preocupações ambientais não passaram de preocupações, que se mantém e que se ampliam à medida que os anos passam.
É sabido que o nosso parque industrial é antiquado e usa ainda tecnologias muito poluentes. Por outro lado, é também sabido que a maior parte da nossa indústria não tem capacidade para os investimentos ambientais necessários e para incorporar os custos de despoluição nos custos de produção. É um dos mais graves problemas do País. E custa muito ouvir o Sr. Ministro minimizá-lo, dando a entender à Câmara que este problema está em vias de solução. Não está e é uma tremenda descaracterização da situação ambiental do nosso país.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - O Governo, durante todos estes anos, apenas manteve um programa ambiental para a indústria - o PEDIP/Ambiente. A avaliação dos resultados deste instrumento, que o Sr. Ministro não trouxe aqui, nunca foi publicada nem o Sr. Ministro aproveitou este debate para nos explicar quem utilizou o dinheiro, como, quando e em que condições. Não foram, com certeza, resultados exaltantes, como está bom de ver!... Há muito que este instrumento mereceria correcção e tal não foi feito. Foi um instrumento sem sucesso e por culpa dos políticos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, os contratos-programa assinados não produziram resultados. O das celuloses terminou em Junho de 1991 -o Sr. Ministro tem obrigação de saber - e é possível detectar larga margem de incumprimento do acordado, como referiu o meu camarada João Rui de Almeida, ao qual o Sr. Ministro respondeu dizendo os contratos-programa com as celuloses tinham sido assinados há cinco anos atrás.
Também aqui o Sr. Ministro perdeu uma boa oportunidade para dar conhecimento à Câmara do cumprimento efectivo desses contratos-programa.
Aplausos do PS.
E não há notícia de qualquer penalidade imposta!
Dos outros contratos-programa, feitos com os cortumes, com os suinicullorcs e com industriais de embalagens spray, apenas se conhecem as declarações de intenção, que é tudo no contrato-programa, porque lá não estão referidos nem metas nem objectivos. Portanto, até agora não produziram resultados concretos e o Sr. Ministro não fez também a avaliação desses contratos-programa neste debate.
Os contratos-programa - não hesito em dizê-lo - foram um rotundo falhanço! E é pena que assim tenha sido porque, desta forma, o Governo desacreditou esta fórmula de contratualização, que tem virtualidades se utilizada com rigor na definição de objectivos e prazos.
O que se passa no País é o seguinte, Srs. Deputados: se um sector industrial tiver problemas ambientais, toca a fazer um contrato-programa com o Governo! Assim, durante uns tempos ninguém incomoda e, no final, haverá sempre uma desculpa para justificar o seu não cumprimento. É esta a verdadeira situação.
Em conclusão, a pressão das indústrias sobre a água, o ar e o solo tem crescido, em Portugal, e tem transformado algumas áreas do País em áreas de forte crise ambiental.
Na política florestal - e estava aqui o Sr. Secretário de Estado-, a única política de que nos foi dado conhecimento é conhecida como sendo «eucalipto-petróleo verde». Os Srs. Deputados conhecem alguma outra?
A floresta foi considerada, ao longo destes anos, apenas como matéria-prima para as indústrias de celulose. Mais nada! Esta é a única floresta de produção que o Governo conhece. Falar em preocupações ambientais na política florestal até dá uma enorme vontade de rir!
Quanto à agricultura, é a mesma coisa. Os conflitos desta actividade com os sistemas ambientais tem-se agravado e o uso e abuso de pesticidas e de adubos tem conduzido a pressões críticas sobre a água e sobre o solo. Neste sector, as preocupações ambientais são totalmente inexistentes e o Governo parece apostado em resolver os seus problemas ambientais acabando de vez com ele.
Está bem de ver, Srs. Deputados, que o princípio de «integrar as preocupações ambientais nas diversas políticas sectoriais» nunca passou dos discursos.
A política de ambiente, nestes últimos anos, não passou de uma política marginal e de actuação limitada e pontual.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!
O Orador: - O ambiente foi visto, quase sempre, como um empecilho ao desenvolvimento e a defesa do ambiente foi tratada como se fosse um conjunto de peias burocráticas que apenas servem para atrasar e impedir o crescimento económico.
Independentemente de um diagnóstico mais rigoroso, penso que os problemas ambientais são, hoje, maiores no nosso país; a crise ambiental agravou-se e o cidadão paga, hoje, maiores custos ambientais.
E é então que o Governo costuma colocar os «óculos cor-de-rosa» e anuncia que o País tem grandes áreas sem problemas de poluição. Srs. Deputados, a verdade, como sabem, é sempre relativa e não parece difícil acreditar que um Alentejo desertificado e quase transformado em reserva natural, para recreio de fim-de-semana das classes médias urbanas, apresente ainda zonas de baixa poluição.
Mas, Sr. Ministro, a questão que o Governo não resolveu foi a da compatibilização entre desenvolvimento e poluição. O crescimento industrial do País significa, claramente, ainda mais focos de poluição, o crescimento turístico significa ainda mais degradação do capital-paisagem e o equilíbrio quantidade de desenvolvimento/qualidade de vida é ainda, para a maior parte dos portugueses, um sonho.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A política de ambiente continua, como esteve nos últimos tempos, uma política apagada, sem novidade e sem chama, como se pôde ver no debate anterior e na intervenção do Sr. Ministro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A política de ambiente não encontrou ainda quem lhe dê o destaque de política social prioritária.
Vamos no terceiro ministro, em cinco anos, mas a novidade das caras não trouxe qualquer novidade nas políticas.
Aplausos do PS.
O ambiente, com o actual Ministro, quase desapareceu de cena; no discurso político, a temática «ambiente» acabou, foi-se!
No ano passado, por exemplo, arderam 160 000 ha de floresta e o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais achou que isso não era nada com ele. E, agora, não respondeu à questão ecológica sobre os fogos e passou a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Concludente!
O Orador: - Em 10 anos ardeu um terço da floresta portuguesa e o Sr. Ministro deve ler achado que isso não era com o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e, portanto, ficou calado. Até que - salvo seja - lhe
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começaram a «arder as barbas», pois o fogo também decidiu não poupar o Parque da Arrábida. Aí o Sr. Ministro falou! E falou para, de imediato, procurar um bode expiatório - os bombeiros. Sinceramente, mais valia que tivesse permanecido calado, neste caso!
Depois, aconteceu a catástrofe do Maranhão. Escândalo ambiental! Porventura, o mais escandaloso procedimento da Administração, que torna claro a total ausência de sensibilidade ambiental por parte dos serviços públicos. Sem desculpas! O Ministro tinha sido avisado antes pelas câmaras e pelas associações de ambiente da zona e foram os seus próprios serviços - vejam só, Srs. Deputados - , a Direcção-Geral dos Recursos Naturais (DGRN) a responsável pela operaçao de vazamento da barragem.
Este incidente e as imagens que dele se gravaram, ilustram bem o nível a que está a política de ambiente no nosso país. Também neste caso o Sr. Ministro optou pelo silêncio. Nem uma palavra aos Portugueses! Parece que nada se passou! Nem uma explicação! Pois bem, terá de dar agora essa explicação na comissão de inquérito parlamentar, quando analisarmos o problema.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Num caso que, num país com mais forte consciência ambiental, provavelmente teria atirado ministros abaixo, o Sr. Ministro quase caiu, ... mas de sono.
Risos do PS.
O caso não o perturbou. Fica registado...
E agora, Srs. Deputados, temos a seca. Temos a seca e o silêncio do Sr. Ministro continua, como se isto nada tivesse a ver com ele.
A seca veio mostrar a todos a incapacidade do País para responder a situações de emergência; veio mostrar a debilidade do País ao nível da gestão dos nossos recursos hídricos, porque a seca, Srs. Deputados, não é uma catástrofe natural, pois toda a gente sabe que o clima tem ciclos e que, de vez em quando, há secas e há cheias. As respostas a estas manifestações climatéricas preparam-se antes. A seca não é um castigo dos céus, pois a incapacidade para responder a estas situações é mais fruto da estupidez humana.
Este ano vamos, portanto, ter mais peixes mortos, mais rios poluídos e menos água para beber. A seca, Srs. Deputados, é um problema ambiental de primeira ordem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Pergunto ao Sr. Ministro que resposta tem para esta situação. Não a sabemos ainda, mas o silêncio, Sr. Ministro, tem limites e nós não vamos permitir que ele continue.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de vos anunciar que o PS vai propor a realização de uma audição parlamentar sobre a questão da água no nosso país.
Aplausos do PS.
Esta audição poderá, certamente, contribuir para quebrar o silêncio do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, para que se tenha consciência do estado dos nossos recursos hídricos, da forma como são geridos e dos investimentos que é necessário ainda fazer para garantir que este recurso natural seja bem aproveitado.
Mas, depois, Srs. Deputados, veio também o orçamento do ambiente. Nova decepção! Quem julgava que era altura de um novo fôlego na política de ambiente fica desiludido. No ano passado tivemos mais ou menos 13í(milhões de contos; este ano temos mais ou menos 15J milhões. A percentagem do orçamento ambiental não passa dos S % do orçamento global e a sua relação com o produto interno bruto mantém-se ao nível dos 0,2 %.
E reparem, Srs. Deputados: é claro que o Sr. Ministro - coisa que ele não referiu há pouco -, quando era consultor, aconselhava a Administração, através do Livro Branco do Ambiente, que só tem uma leitura, a investir 0,5 % do produto interno bruto já em 1991. Ora, acontece que estamos em 1992 e, agora, o Sr. Ministro contenta-se com 0,2 %! Que terá levado o Sr. Ministro a mudar de ideias? Vá lá saber-se!...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Foi ter ido para Ministro!
O Orador: - Mas o orçamento não é só pobre em números, também é pobre em ideias! Nenhuma novidade, nenhuma causa, nenhuma prioridade e nenhum novo programa ambiental!
O princípio do poluidor-pagador está já velhinho de 20 anos e não se sabe do que é que se está à espera para o aplicar.
E claro, Srs. Deputados, que os custos da poluição não podem ser evitados, alguém vai ter de os pagar. Até aqui pagámos todos, como vítimas. Ora, já devíamos estar a discutir de que forma - como contribuintes ou como consumidores - é que os pagaremos no futuro.
O que acontece é que este problema é eminentemente político e as diversas doutrinas dão, naturalmente, respostas diversas. Por um lado, o contribuinte pode estar fora do alcance das principais poluições e não se sente nada estimulado a eliminá-las e, por outro, os cidadãos mais pobres dificilmente aceitarão, de bom grado, um aumento de preços de consumo, mesmo quando lhes agrade desfrutar de uma atmosfera mais limpa.
Mas esta discussão política não pode ser adiada só porque é difícil. Ora, o que acontece é que, nesta altura, Sr. Presidente e Srs. Deputados, embatemos contra a relutância do Sr. Ministro pela política. São conhecidas as duas mais célebre frases do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais: «Tanto entraria num Governo PS como num governo PSD» - não se sabe ainda o que é que o Sr. Prof. Cavaco Silva pensa de tão displicente afirmação - ou ainda « O ambiente não tem partido», frase pitoresca que, de tão transcendente, não se percebe o que significa. Será que o ambiente é só para os que não tem partido? Não se acredita que V. Ex.ª, Sr. Ministro, apenas quisesse dizer o banal, isto é, que todos os partidos se preocupam com o ambiente, mas poderia ser de outra forma.
Mas o problema, Srs. Deputados, é que, ao negar assim a política no primeiro momento em que nela entra - parece que toda a gente detesta a política, mas ninguém lhe resiste! -, o Sr. Ministro confessa a sua incapacidade em decidir politicamente, porque lhe falta a doutrina e os julgamentos sociais que estão sempre na base de qualquer decisão política.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, sejamos claros. A questão ambiental exige uma arbitragem política e não técnica, porque a
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síntese operativa entre conservação e crescimento só encontra resposta no domínio daquela. Há um elemento inevitável e essencial de distribuição de recursos na base de qualquer problema ambiental, assim como há um problema de justiça social sob toda a ordem política.
Já se tinha percebido que o Sr. Ministro não tem grande inclinação para a política. Pois é pena! É que bem precisávamos que a política de ambiente tomasse novo fôlego, novo alento. E logo agora que precisávamos de um político, sai-nos um não político! Azar dos Távoras!... Parece que agora 6 moda ou fica bem que os ministros não sejam políticos!...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito mal!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este ano, o mundo faz o balanço de 20 anos de política ambiental; este ano, o mundo prepara novas etapas, na Conferência do Rio; este ano, está em discussão o 5.º Programa de Acção Ambiental da Comunidade Europeia; este ano, anuncia-se também o Fundo de Coesão, que vai ler uma valência ambiental e permitirá a Portugal ter acesso a recursos financeiros que não teve no passado; Srs. Deputados, este ano, a política de ambiente, em Portugal, merecia muito mais.
Com este cinzentismo do nível de investimento, dos programas e das ideias, a política de ambiente parece que não é capaz de levantar voo.
Mas, já que o Governo nada faz, faz o PS.
Risos do PSD.
Vamos dar-lhes uma boa ajuda e o Sr. Ministro sabe do que estou a falar!
Apresentámos ontem quatro projectos de lei - sei que custa ouvir isto, principalmente quando o Governo entrou numa espécie de torpor legislativo. Um deles é sobre impactes ambientais, que, por exemplo, poderá resolver a questão da ponte, já que vamos dar competências ao Ministro do Ambiente e Recursos Naturais para exercer um parecer vinculativo, o que quer dizer que o braço de ferro entre o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações - Carlos Borrego versus Ferreira do Amaral - pode ser decidido, se aprovarem a nossa lei, para Carlos Borrego. Vamos dar-lhe uma ajuda.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Não sei se ele quer!
O Orador: - Os outros dizem respeito a áreas protegidas, à utilização aérea de pesticidas - e parece que o Governo não tem qualquer vontade de regulamentar esta área - e à utilização de papel reciclado na Administração Pública.
Que sejam de bom proveito para o Governo e que ele retire deles algumas ideias! Esperamos, sinceramente, que o Governo os aproveite.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para concluir, não tenho a visão da ruína ecológica eminente e não pinto a situação ambiental como tão desesperante que nada possa ser feito, pelo contrário, tenho confiança de que o homem é capaz de aprender com os seus próprios erros.
Em boa verdade, para uma vasta gama de problemas ambientais há soluções e há políticas disponíveis que podem produzir resultados. Podem ocorrer mudanças - a água pode correr limpa, o sol pode brilhar sobre cidades claras e as colheitas podem amadurecer em campos não contaminados -, mas é necessária vontade política.
Os cidadãos estão fartos de se queixar e de exigir, os especialistas avisam-nos que não se pode perder mais tempo. Cabe aos políticos agir.
Esperemos que este debate sirva ao Governo para espevitar, para deixar de dormir e para deixar de tirar o sono a tantos que com estas questões se preocupam.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Mário Maciel, Manuel Moreira, Isabel de Castro e José Silva Costa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, ainda ressoa nesta Câmara uma frase lapidar do Sr. Deputado José Sócrates: « A política de ambiente merecia muito mais». É verdade! Merecia um dirigente nacional do PS, porta-voz para as questões do ambiente com mais credibilidade e dignidade nesta Câmara.
Aplausos do PSD.
Merecia que o Sr. Deputado José Sócrates abandonasse o tom de graçola, de chacota, que trouxe aqui à Câmara, que apenas serve para divertir alguns amigos, nas ocasiões que tem para se encontrar com eles, e provocar gargalhadas estridentes à Sr.ª Deputada Julieta Sampaio.
Risos do PSD.
Seria bom que abandonasse essa postura e confirmasse, nesta Câmara, porque é que ascendeu à direcção do Partido Socialista, porque não tivemos aqui a Queda de um Anjo, de Camilo de Castelo Branco, mas, sim, a ascensão de um anjo à direcção nacional do Partido Socialista, que tem conclusões do seguinte teor: «A culpa da seca é do Governo.»
Risos do PSD.
Ou seja, o Sr. Deputado José Sócrates ignora que o balanço hídrico português é dos melhores que há na Europa e que estamos a viver uma situação excepcional, da qual o Sr. Ministro do Ambiente, coitado, não tem culpa nenhuma. Mas posso dar-lhe alguns números. Segundo o balanço hídrico, Portugal tem 910 mm de precipitação média anual, dos quais 400 são captados sob a forma de águas subterrâneas ou sob a fornia de águas superficiais. Esses 400 mm de precipitação média anual são mais do que suficientes para suprir as necessidades de consumo de Portugal. Fique com esses números!
Estamos, pois, numa situação excepcional, o balanço hídrico português não vai desaparecer...
Protestos do PS.
O Orador: - Uma outra questão que lhe quero colocar é relativa às florestas. O Sr. Deputado deu a entender que a postura do Governo é a de considerar que apenas a floresta tem um valor económico, é uma postura economicista, que entende a árvore unicamente como um usufruto comercial, mas não é assim. Estamos a batalhar para impor limites de base territorial à exploração de árvores consideradas de crescimento rápido e, portanto,
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com valor comercial, coadunando todo este esforço com outras espécies que possam reforçar e alastrar a chamada floresta mediterrânica, dando assim um carácter multifuncional à floresta portuguesa.
Estamos também interessados em continuar a experiência rica e salutar de comprometer as autarquias locais e a administração local, sob a forma de contratos-programa (c esse esforço requer a mobilização da sociedade civil), para, em conjunto, consciencializarmos todos os cidadãos portugueses da necessidade de preservarmos o meio ambiente.
O Governo nunca disse que iria resolver num ápice todas as disfunções ambientais. Isso seria de uma tremenda demagogia. O governo do PSD trouxe à política portuguesa essa honrosa tarefa de consciencializar todos os cidadãos portugueses para a premente necessidade de interligar o desenvolvimento económico deste país, que está acontecer, com os programas de conservação da natureza. Uma pergunta: qual é o projecto do Partido Socialista, agora que o Sr. Deputado teve necessidade de pedir ajuda ao ex-deputado Herculano Pombo? Veja só a carência de quadros que há no Partido Socialista!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas o que é isto'?!
O Orador: - Já foi buscar o Sr. Ex-Deputado Herculano Pombo e a Sr.ª Ex-Deputada Maria Santos...
O Sr. José Lello (PS): - E vocês vão buscar ajuda ao Jardim!
O Orador: -Qual é o projecto que VV. Ex.ªs estão a conceber nas altas esferas do Partido Socialista?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Deputada Julieta Sampaio, pediu a palavra para que efeito?
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa no seguinte sentido: há no Regimento alguma figura que impeça os deputados de se rirem, sempre que as intervenções sejam espirituosas?! Aguardo a sua resposta e muito obrigada.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Deputada, naturalmente que a minha resposta é negativa.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado José Sócrates, disse V. Ex.ª no seu discurso que a intervenção do Governo nesta interpelação, pela voz do Sr. Ministro, não teve chama. Porquê então, Sr. Deputado José Sócrates, tanta água do PS para apagar aquilo que afinal não existiu, a chama do Governo?
O Sr. Deputado, para além da enxurrada com que nos brindou no seu discurso, que veio poluída de pobre ironia e demagogia, limitou-se a criticar o Governo nos potenciais erros ou omissões da sua política. Pergunto-lhe: os quatro
projectos de diploma, que ainda não conhecemos (que apresentaram, pelos vistos ontem, nesta Câmara) são a alternativa global que o PS apresenta à política de ambiente do actual governo ou não?
Gostaríamos que nos desse uma resposta. Porque nos parece pouco, que com quatro projectos de diploma, por mais substanciais e positivos que eles sejam, possam constituir uma alternativa global à política que o Governo vem realizando há anos a esta parte, para que realmente o nosso País tenha um ambiente mais equilibrado e mais desejável para a nossa população.
(O Orador reviu).
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel de Castro.
A Sr.ª Isabel de Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, V. Ex.ª referiu-se hoje a uma questão que nos parece extremamente importante e pertinente, ligada ao ordenamento do território, quanto ao hipotético diferendo dos vários ministérios relativo à nova travessia do rio Tejo. Esta questão leva-me a colocar-lhe uma outra, que lhe está associada.
Fala-se, em lermos do ordenamento do espaço físico da área metropolitana de Lisboa, no novo atravessamento, mas não se refere o Campo de Tiro de Alcohete, que, como sabem, está instalado na Área Protegida da Reserva Natural do Estuário do Tejo, uma zona húmida importante assim classificada ao abrigo de uma convenção que está há 12 anos à espera de ser regulamentada. De qualquer modo, a minha questão vai noutro sentido. Há longos anos que o aio falado Campo de Tiro de Alcochete passou de projecto a uma realidade, uma realidade a instalar-se e a ampliar-se. Até agora, nunca ouvimos o Partido Socialista dizer uma palavra quanto a esta matéria e daí que gostava que o Sr. Deputado José Sócrates nos dissesse qual é a posição do PS relativamente a esta problemática.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Silva Costa.
O Sr. José Silva Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, V. Ex.ª citou a referência aos 539 diplomas em atitude crítica ao PSD e ao Governo, mas perguntava-lhe quantos diplomas produziu o PS enquanto foi Governo?
Vozes do PS: - Oh!
O Orador: - Possivelmente não pode apresentar esses números!
Protestos do PS.
Por outro lado, Sr. Deputado, referiu que o crescimento industrial e o crescimento turístico estavam a exercer fortes pressões sobre o ambiente e sobre zonas que devem ser protegidas. É uma verdade - entendi-o nesses termos - que exercem essas pressões, e ainda bem que o fazem, pois isso é sinal de desenvolvimento, de que existem projectos industriais, que estão a concretizar-se projectos turísticos com este governo! Sc não se verificassem essas
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pressões, então é que estávamos mal, pois era sinal de que o País estava parado. Preservar e defender o ambiente não significa, naturalmente, imobilizar o País.
Vozes do PSD: - E o País não pode parar!
O Orador: - O que é preciso, Sr. Deputado, é que de facto, se controlem essas pressões e os efeitos que podem ter. E aí as autarquias têm um papel importantíssimo, que, penso, ninguém pode negar. Sc a aplicação dos PDM (planos directores municipais) for correctamente executada, parece-me que as preocupações do Sr. Deputado não terão grande razão de ser. No entanto, essa é uma preocupação que é legítima.
Finalmente, queria referir um outro aspecto, que se prende com a sua alusão a que a seca não é um elemento de catástrofe natural e que este governo, como tal, se deveria ter prevenido e criado condições para que os seus efeitos, agora, se não fizessem sentir. Mas, se, de facto, as secas são cíclicas como referiu, então eu pergunto o que fez o PS, quando foi governo, para prevenir que elas se repetissem e para evitar os seus efeitos catastróficos, que nos preocupam a todos?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.
O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Mário Maciel, peço-lhe desculpa mas não parece que seja crime fazer política com graça! Ano considero...
O Sr. Mário Maciel (PSD): - O senhor é que não tem graça! O problema é esse!
O Orador: - Pois, se não tenho graça, desculpar-me-á!
Penso que se pode fazer política com espírito, sem sermos brindados com uma intervenção maçadora e aborrecida, como foi a do Sr. Ministro do Ambiente, em que citou programas, leis e regulamentos!...
Parece-me que a política pode não ser feita assim e que culpa tenho eu se tenho um estilo que, porventura, desagradará a V. Ex.ª?! Mas, lá no fundo, possivelmente até lhe agrada, porque V. Ex.ª também é um daqueles que considera que uma certa dramatização na política não fica mal.
Vozes do PS: -Muito bem!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - E ele, nos Açores, bem sabe disso!
O Orador: - E bem posso fazer política com graça. Que culpa tenho se sou mais espirituoso que o Sr. Ministro!? O Sr. Ministro passou a vida a citar regulamentos e leis, ainda por cima com evidência e exagero!...
Eu disse que a seca era culpa do Governo!? Não disse nada disso, o Sr. Deputado compreendeu tudo mal. O que disse foi que a seca é um grave problema ambiental que põe a nu a inexistência de uma gestão de recursos hídricos que permita responder a uma situação de emergência. Foi isto que eu disse!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): -E disse bem!
O Orador: - Isto é um problema ambiental e o Sr. Ministro tem o dever de dizer ao País quais são as medidas de emergência que está em condições de tomar. Vamos ter mais rios poluídos no Verão, os focos de poluição vão-se agravar, assim como as crises ambientais pontuais, e vai haver por todo o País, em muitos sítios que já sofrem de grande agressão, principalmente industrial, mais peixes mortos. Vamos ter, com certeza, na televisão, imagens desse tipo com maior frequência. O que é que o Sr. Ministro pensa deste assunto? Ou isto não lhe diz respeito?
O Sr. Ministro não se referiu a isto e é. obrigação de um governante referir-se a este assunto,, não fazendo declarações cândidas, como ouvimos do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, no sentido de que os Portugueses tem de poupar água. O único plano de emergência que o Governo tem é pedir aos Portugueses que poupem água?!
Bem, é que às tantas em Lisboa ninguém se apercebe de que há seca. Mas ela existe, de facto, e é preciso estarmos preparados para responder a situações deste tipo. A seca não é nenhum castigo dos céus e estas coisas preparam-se. Para combater as secas e as cheias há programas de emergência e os países preparam-se para isso.
Quanto às florestas, Sr. Deputado, francamente não há nenhuma desculpa! A única política florestal seguida pelo seu governo, nos últimos anos, foi uma política de forte eucaliptização - basta ver os números! - e, mais do que isso, de total incapacidade para prevenir incêndios. Basta dizer que, nos últimos 10 anos, ardeu um terço da floresta portuguesa. Então, o Sr. Deputado não considera que isto é um problema ambiental e que o Sr. Ministro do Ambiente devia dizer ao País o que pensa sobre este problema? Foram estes desafios que lancei.
Quanto à participação de pessoas nos trabalhos do PS, tenho muito orgulho em lhe dizer que, de facto, os ex-deputados Herculano Pombo e Maria Santos participam com o PS na definição das políticas e fazem parte de um grupo de aconselhamento do PS. Noto nisso alguma inveja e ciúme, Sr. Deputado!
Risos gerais.
O Orador: - Sr. Deputado Manuel Moreira, V. Ex.ª diz, que o PS devia apresentar uma alternativa global. Sc o Sr. Deputado não percebeu a diferença entre a linha estratégica do meu discurso e a linha estratégica do Sr. Ministro, não tenho culpa, não lhe posso fazer um desenho para explicar isso!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr.ª Deputada Isabel Castro, quanto ao Campo de Tiro de Alcochete, só lhe digo o seguinte: consideramos que é essencial e não abdicamos de aplicar no País todas as directivas relacionadas com a protecção da fauna.
Sr. Deputado José Silva Costa, há efectivamente um crescimento industrial e o que eu disse foi que o País cresceu, mas cresceu mal, sem acautelar as implicações ambientais que se deveriam acautelar em qualquer processo de desenvolvimento. Porque não basta o Sr. Ministro vir à Câmara fazer grandes discursos sobre a necessidade de compatibilizar desenvolvimento ou crescimento com a conservação da natureza sem que, de facto, isso se traduza em realidades concretas.
Os instrumentos financeiros que a indústria teve ao seu dispor para proceder às alterações de reconversão ambiental
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foram insuficientes e, portanto, o que se passa é que os cidadãos continuam a pagar a poluição como vítimas e não como contribuintes ou consumidores que devem ser no futuro. Ora, eu apelei ao Sr. Ministro para passarmos rapidamente a essa questão, em vez de andarmos todos a pagar a poluição, como andamos.
O que noto, Sr. Deputado, é que VV. Ex.ªs já não defendem o Governo, já não dizem uma palavra em sua defesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A única coisa que os Srs. Deputados do PSD dizem é, por exemplo: «E vocês, quando estavam no Governo?»
O Sr. Manuel Moreira (PSD): -Tem de se comparar!
O Orador: - Quando me chamam incapaz, respondo sempre que não sou incapaz. Os senhores, quando são disso acusados, respondem: «E vocês, quando estavam no Governo?». Sr. Deputado, estivemos no Governo há já tanto tempo, quando o certo é que os senhores lá estão há 10 anos. É altura de responderem pelos vossos actos.
Aplausos do PS.
Isto é um interpelação ao Governo e os senhores tom obrigação de dizer o que pensam sobre estas matérias e sobre a tal política de sucesso relativa ao ambiente que, segundo o Sr. Ministro explicou, teríamos.
Aplausos do PS.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - No governo do bloco central o ministro desta área era deles, era o Dr. Sousa Tavares!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais.
O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais (António Taveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um factor determinante que ainda não foi abordado nesta Câmara e que consiste no facto de se poder estar a travar um debate sobre política de ambiente, o que constitui um mérito do governo do PSD, do governo do Prof. Cavaco Silva, porque até ao primeiro governo do Prof. Cavaco Silva nunca houve política de ambiente em Portugal. Esse parece-me ser um facto determinante que tem de ser salientado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Por este andar, ainda chega a ministro!...
O Orador: - Estou efectivamente de acordo com o Sr. Deputado José Sócrates quando diz que uma política de ambiente se avalia por resultados. Mas dir-lhe-ei que também se avalia por objectivos, por instrumentos e por meios. Quando o PS vem aqui dizer que é necessário intensificar a política que o Governo está a prosseguir, o PS está a apoiar a política do Governo. Quer é mais. Nós também!
Aplausos do PSD.
Mas nós, Sr. Deputado José Sócrates, não somos irresponsáveis. Temos a noção de que uma política de ambiente e os meios que tom de lhe ser afectos dispõem apenas de duas fontes possíveis para a suportar financeiramente: ou o bolso do contribuinte ou o bolso do consumidor. Não queremos destruir a economia portuguesa por excesso de peso no bolso do consumidor no que se refere à base política industrial, nem afectar o consumidor em mais do que aquilo que é devido, nem ainda afectar o contribuinte. Somos realistas e temos a noção exacta do equilíbrio entre os vários instrumentos e as várias políticas.
Aplausos do PSD.
Tenho de reconhecer, com alguma mágoa, mas cumprimentando o Sr. Deputado André Martins, que a única oposição que o Governo enfrenta em matéria de política de ambiente está efectivamente no Partido Ecologista Os Verdes.
Risos.
O Sr. José Sócrates (PS): - Vocês bem gostariam...
O Orador: - Tenho de reconhecer esse facto, porque, efectivamente, o PS não foi capaz de apresentar, de uma forma minimamente coerente, um conjunto articulado daquilo que pensa que deve fazer. É sintomático disso mesmo o facto de, quando o Governo fez referência, no seu Programa, às leis que tenciona elaborar durante a presente legislatura, o PS ter vindo a correr apresentar iniciativas legislativas. Espero que não suceda como no passado, quando as vossas iniciativas legislativas chegaram a ser praticamente a fotocópia das iniciativas do Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não quero terminar esta intervenção sem abordar uma questão central: a questão do financiamento, que tem sido suscitada e tem sido alvo de sucessivos esclarecimentos, quer em comissões parlamentares quer mesmo durante o debate do Orçamento do Estado no Plenário da Assembleia.
Quero recordar, em primeiro lugar, que, ao contrário dos números apontados pelo Sr. Deputado José Sócrates, o orçamento do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais foi, no ano anterior, de 11,5 milhões de contos e é, para este ano, de 15,5 milhões de contos.
Quero dizer, em segundo lugar, ainda sobre o orçamento destinado à política de ambiente, que, felizmente, este governo não tem os problemas que os governos da responsabilidade do PS tiveram em termos de relações entre o ambiente, o ordenamento do território e as outras políticas sectoriais. Contrariamente ao que os senhores gostariam, o actual governo tem uma relação equilibrada e coesa a esse nível. O financiamento da política de ambiente também acontece noutros ministérios, sendo, pois, na globalidade do orçamento existente para financiar a política de ambiente que as questões tom de ser analisadas.
Quero uma vez mais explicar ao Sr. Deputado José Sócrates - é, segundo julgo, a quinta vez que o faço - que no PIDDAC estão as contrapartidas para muitos investimentos, cujo remanescente se encontra, nomeadamente, nos programas operacionais a nível dos fundos comunitários. O valor global do orçamento de investimento é, pois, bastante mais alargado.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados André Martins, Narana Coissoró, Isabel Castro, Gameiro dos Santos e Manuel Sérgio.
O Sr. José Sócrates (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para formular um protesto em nome da minha bancada.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais, a prova de que o Sr. Ministro não teve chama é o facto de ter sido preciso mandar alguém com chama a mais.
Aplausos do PS.
Risos.
O Sr. Secretário de Estado confundiu a Assembleia da República com um comício do PPD.
Em primeiro lugar, passo a indicar-lhe dois números, citando o Livro Branco e chamando a atenção para o facto de não haver alternativa ao que consta deste Livro, pois o que nele está (também da autoria do Sr. Ministro Carlos Borrego) nele está.
A primeira citação é a seguinte: «Igualmente por esta razão, considerou-se que o esforço do investimento em despoluição devia ser intensificado ao longo da década, mas nunca ultrapassando o limite de 0,8 % do PIB.» E continua o texto: «Sc considerarmos que o investimento em despoluição representa cerca de 60 ou 70 % do investimento global no ambiente, este terá o limite superior de, aproximadamente, 1,2 ou 1,3 % do PIB.»
Não tem qualquer justificação a afirmação do Sr. Secretário de Estado de que o orçamento do investimento é só parte do orçamento do ambiente, porque já se contava com estes números. O Sr. Secretário de Estado não tem razão, tanto mais que da publicação citada consta, para «investimento em percentagem do produto interno bruto» em relação a 1991, 0,5 %. A verdade é que estamos com 0,2 %.
Referi factos indesmentíveis. É melhor que os senhores os aceitem, com honestidade intelectual.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, não lhe admito, Sr. Secretário de Estado, essas insinuações de plágio.
Protestos do PSD.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Plágio? Onde é que eu ouvi isso?
O Orador: - O PS apresentou um projecto de lei quadro das áreas protegidas cuja não aprovação é da responsabilidade do Governo. É o Ministério que está em falta. Desde 1987 que o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais devia apresentar, tal como consta do Programa do Governo, uma proposta de lei quadro das áreas protegidas. Até hoje, não a apresentou.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Onde é que já ouvi isso?
O Orador: - Não admito - e vejo nisso uma ponta de ciúme e de inveja- que o Sr. Secretário de Estado tente dizer alguma coisa a propósito de plágios quanto ao Partido Socialista. Não lhe admito isso!
Fiquemo-nos por aqui, Sr. Secretário de Estado, em matéria de plágios.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais.
O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, começo por esclarecê-lo de que não foi minha intenção fazer qualquer comício. Tenho pena que a verdade das minhas palavras o tenha perturbado tanto,...
Aplausos do PSD.
O Sr. José Sócrates (PS): - As insinuações é que me perturbam, é isso que não lhe admito!
O Orador: -... mas efectivamente procurei fazer uma intervenção muito objectiva, que gostaria, aliás, de repisar, porque verifico que não a entendeu.
Na elaboração do orçamento do PIDDAC do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, como na de outros ministérios, entra em linha de conta o esforço que recai na despesa pública.
O Sr. José Sócrates (PS): - Já contava com isso!
O Orador: - Não, Sr. Deputado, não contava com isso. Essa questão é completamente irrelevante e não tem discussão se analisarmos a forma como o Orçamento do Estado é elaborado. Trata-se de uma daquelas questões perfeitamente lineares.
Parece-me que o que o Sr. Deputado ainda não percebeu é que os valores lineares apontados para o investimento pressupõem a agregação de um esforço colectivo da sociedade portuguesa, cujas bases foram lançadas e cuja implementação da política está a funcionar em plena velocidade de cruzeiro. Nesse valor global do investimento, terão de incidir, naturalmente, quer os custos que são afectos às autarquias locais, quer o investimento do Estado, quer ainda os fundos comunitários. É a agregação de todos estes valores, Sr. Deputado, que perfaz os valores globais.
Quero ainda salientar que, do ponto de vista legislativo e da formulação e implementação da política, nenhuma das críticas que o Partido Socialista hoje aqui avançou discorda, na essência, dos objectivos, dos instrumentos e dos meios.
Repito o que referi há pouco: o Sr. Deputado diz-me que quer mais e eu respondo-lhe que também eu.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a 'palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais, quero, em primeiro lugar, agradecer-lhe o elogio que dirigiu ao
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Partido Ecologista Os Verdes. Temos manifestado e continuaremos a manifestar, naturalmente, lodo o empenho na defesa dos princípios e dos valores pelos quais andamos por aqui. A sua intervenção, pela forma como foi feita, talvez até constitua um incentivo a que nos esforcemos ainda mais no sentido de que a política de ambiente em Portugal seja cada vez melhor.
Mas, como o Sr. Secretário de Estado compreenderá, há entre nós grandes divergências relativamente ao que hoje é a política de ambiente em Portugal. Dessas divergências, retiro duas pequenas questões, para as quais gostaria de obter resposta.
Se há política de ambiente em Portugal, por que é que os serviços do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais enterraram na albufeira do Maranhão toneladas de peixe e lhe deitaram fogo com pneus? Esta foi uma atitude tomada pelos serviços do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais. Qual é o seu posicionamento em relação a esta questão? Haverá, naturalmente, um inquérito parlamentar sobre tais factos, mas, em todo o caso, gostaria de conhecer a sua posição quanto ao problema.
A segunda questão diz respeito ao rio Alviela. O Sr. Secretário de Estado declarou que no próximo Verão poderíamos tomar banho à vontade no Alviela. Ligando a estas suas afirmações, temos como dados adquiridos, já hoje aqui referidos, os de que o Governo já investiu cerca de 3 milhões de contos no Alviela e irá investir mais 1 milhão e «tal» de contos. O que, todavia, verificamos é que, de dia para dia, o Alviela está cada vez mais poluído. Perguntamos, então: se foram investidos 3 milhões de contos, foram investidos para quo? Se vai ser investido mais 1 milhão de contos, vai ser investido para quê?
A questão que coloco e que me parece ser a questão de fundo - teremos oportunidade de ainda a tratar aqui hoje - é a de não haver em toda a região do Alviela uma correcta política de ordenamento do território. As fábricas de curtumes, designadamente que estão a ser instaladas a montante do rio Alviela, são a causa fundamental do agravamento da situação que está a registar-se no Alviela. E, naturalmente, importante que a estação de tratamento possa funcionar, mas, quando uma estação de tratamento é construída com o fim de tratar efluentes, em determinado desenvolvimento dessa indústria, para cerca de 80 empresas, é muito difícil, com o desenvolvimento da actividade dessas indústrias e a implantação, nos últimos três anos, de mais 10 indústrias, algumas das quais das mais importantes a nível nacional, que essa estação de tratamento obtenha condições para tratar os efluentes da forma necessária a que as populações ribeirinhas do Alviela vivam, efectivamente, em igualdade de circunstâncias, pelo menos como vive a generalidade das populações em Portugal. Tem esse direito. Todos nós, incluindo o Governo, devemos isso às populações do Alviela.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais, fazendo jus à sua grandeza, V. Ex.ª fez um discurso inflamado, ao contrário do autentico ensopado de medidas eleitorais do «livro laranja» do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, que não disse nada, limitando-se a repelir - e bem! -, pura e simplesmente, o conteúdo do caderno eleitoral do PSD. Com efeito, como o Sr. Ministro nunca aqui veio durante a anterior legislatura e até agora lambem ainda não linha aparecido nesta Assembleia, fê-lo hoje, pela primeira vez, dando uma grande honra ao Parlamento, e expôs o programa eleitoral para quatro anos, em vez de apresentar claramente o programa eleitoral para esta sessão legislativa, ou seja, para este curió período de um ano, que, aliás, era o que pretendíamos.
Em face de uma interpelação que procurava respostas a curto prazo para problemas concretos do dia a dia, o Sr. Ministro veio aqui fazer um discurso para quatro anos - aliás, todos os anos pode vir dizer: «Temos estas medidas para quatro anos» -, e foi incapaz de revelar a prioridade das prioridades do seu Ministério, assim como de revelar a política que vai adoptar para esta sessão legislativa.
Por outro lado, V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, da Tribuna, veio aqui gritar: «Pela primeira vez, por causa do Prof. Cavaco Silva...»-, que, neste momento, deve estar a ouvi-lo e a aplaudi-lo, dizendo: «Cá tenho um bom ministro para quando o outro sair.»
Risos.
V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, veio aqui dizer o quê? Que o PSD, pela primeira vez, tem uma política de ambiente? Então, e a Margarida Borges de Carvalho era de que partido? Do CDS? Do PPM? Do PS? De que partido era a Secretária de Estado que os senhores louvavam como sendo uma grande Secretária de Estado do Ambiente, e que, hoje, como acontece com a história trotskista ou com a leninista, passam a esponja como se a história não existisse? Como se o nome dela tivesse sido riscado?
Vozes do PS: - Bem observado!
O Orador: - Porquê? Por que é que não repetem os mesmos louvores que repetiam quando ela estava no Poder? E por que é que hoje dizem que a política de ambiente começou agora e não em 1983-1984.
V. Ex.ª disse ainda: «O Partido Socialista é incapaz!» E o Partido Socialista disse: «O PSD é incapaz em matéria de ambiente!» Mas nós dizemos: Os dois tem razão!
Risos.
Na verdade, Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª não pode embrulhar o discurso morno do Sr. Ministro com grilaria, porque o que queremos é que V. Ex.ª, que já está habituado ao Parlamento, mantenha a serenidade. Gostamos de vê-lo aqui a responder às perguntas e temos um bom trato parlamentar, que, aliás, o Sr. Ministro não tem, até porque se estreou hoje no Parlamento e é natural que gagueje. Mas V. Ex.ª não! V. Ex.ª tem de dizer com calma quais são as medidas da Secretaria de Estado dos Recursos Naturais para esta sessão legislativa. Até agora ainda não foi capaz de revelá-las.
(O Orador reviu.)
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais, V. Ex.ª referiu-se, com extrema vivacidade, às questões que lhe foram colocadas - registo essa nota -, mas há uma incorrecção que gostaria de esclarecer.
Disse V. Ex.ª que se estava a decorrer um debate, nesta Assembleia, sobre o ambiente era mérito do PSD, mas é bom que compreenda que não se trata de mérito do PSD mas, sim, do funcionamento normal das instituições democráticas. De facto, este debate resulta de um agendamento que, em termos regimentais, o Partido Ecologista Os Verdes fez. Isto que fique bem claro!
Aproveitando o facto de o Sr. Secretário de Estado se ter pronunciado e o Sr. Ministro não ter respondido, gostaria agora de colocar uma questão concreta relativamente às áreas protegidas, nomeadamente a que foi referida, ou seja, a protecção do litoral, sujeito a pressões extremamente graves: urbanísticas, lixeiras, pedreiras e construções clandestinas. Pergunto, concretamente, como é que o Sr. Secretário de Estado explica que o recente decreto-lei que criou as áreas protegidas - e posso referir a área de paisagem protegida do Sueste Alentejano e da Costa Vicentina - tenha limitado fortemente a autonomia das direcções das áreas, nomeadamente ao dizer que os pareceres negativos que elas emitem sobre o projecto ficam dependentes do parecer do Ministro do Ambiente e do ministro a que se refira o parecer em causa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais; em primeiro lugar, agradeço-lhe por ter falado aqui no nome do Sr. Primeiro-Ministro, o Prof. Cavaco Silva.
Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais: - Com muita honra e prazer!
O Orador: - Agradeço-lhe, porque V. Ex.ª veio aqui confirmar que o Sr. Primeiro-Ministro é o grande responsável pelo insucesso da política de ambiente deste governo.
Mas, para além disso, o Sr. Secretário de Estado veio aqui falar com essa sua voz tão grossa e levou a que eu confirmasse que, de facto, a população ribeirinha do Alviela tem toda a razão para lhe erigir lá uma estátua. V. Ex.ª sabe que tem uma estátua junto ao Alviela?! Trata-se de uma estátua em função das promessas que V. Ex.ª lá fez, pois neste ano de 1992 todos os pernenses vão poder já tomar banho nas águas límpidas do Alviela. Certamente que, no próximo Verão, V. Ex.ª vai ser o primeiro a dar o exemplo e dará lá um grande mergulho. Estamos todos à espera disso!
V. Ex.ª veio ainda dizer-nos uma coisa muito curiosa, isto é, veio dizer que este governo se preocupava em estabelecer o equilíbrio entre as diversas políticas. Não há dúvida alguma!... O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações diz uma coisa, o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território diz outra, o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais não sabemos o que diz -, o Sr. Ministro da Agricultura tem umas políticas, mas, entretanto, a que é que assistimos? À contaminação da rede de águas de Minde e Mira de Aire, à contaminação das águas da lezíria ribatejana. Não há dúvida alguma, Sr. Secretário de Estado, de que tem havido uma grande articulação entre as políticas deste governo!...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais, tanto quanto sei, ainda aqui não foi abordado um tema que me parece também importante neste debate, que tem decorrido com uma jocosa vivacidade: o problema das relações entre a escola e o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
De facto, se queremos preservar as nossas florestas, as nossas aldeias, as nossas idades, enfim, a fisionomia própria do nosso país, deve investir-se também na escola. Enquanto isso não for feito, o leonino orçamento para os bombeiros, sistemas de vigilância e para duvidosos sistemas de fiscalização outra coisa não fará do que desacelerar o ritmo do inevitável, retardando a morte da tipicidade portuguesa.
Gostaria de saber o que tem feito o Governo para que os problemas ecológicos cheguem ao conhecimento e à reflexão dos alunos das nossas escolas. É uma interrogação que aqui deixo.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais.
O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Naturais: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dizer que a questão do Alviela merece ser reflectida, até porque neste momento foi feito um investimento global de, aproximadamente, 4,5 milhões de contos no Alviela. Mas, como o Sr. Deputado André Martins disse, ainda não se conseguiu atingir a plena eficácia em termos de funcionamento do sistema, que tem a ver com uma situação histórica criada no Alviela e decorrente da existência de um determinado tipo de indústria altamente poluente. Portanto, do ponto de vista da intervenção socialmente relevante e ecologicamente eficaz, os problemas que se colocavam estão efectivamente a ser resolvidos.
Neste momento, do ponto de vista da reabilitação global do rio, há apenas um problema essencial que falta resolver, ou seja, a questão da limpeza do leito e das margens, por forma a retirar de lá material que durante anos a fio se foi depositando. É o único investimento que ainda não está em curso, mas irá ser concretizado no decorrer deste ano.
Aproveito esta oportunidade para dizer que, em meu entender, todas estas questões devem ser enfrentadas sem demagogia. Trata-se de problemas demasiado sérios.
Assim, as questões sérias que o Sr. Deputado André Martins colocou merecem-me respostas sérias, pelo que me congratulo com o estilo calmo com que foram apresentadas e que contrasta vivamente com outros estilos usados aqui, nesta Assembleia.
Risos do PS e do PCP.
No que respeita à política de recursos hídricos que vigora em Portugal, há que ter consciência de dois aspectos
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fundamentais: em primeiro lugar, não vai ser possível despoluir todos os rios ao mesmo tempo, nem executar, de imediato, uma política de reabilitação de recursos hídricos, que demorou dezenas de anos a concretizar. Penso que é demagogia, irrealismo, falta de conhecimento técnico, é tudo o que quiserem, menos uma postura séria, em termos de política de ambiente, argumentar que é possível fazer tudo de repente, automaticamente, e que vai resultar de imediato.
Relativamente ao problema dos peixes do Maranhão, já tive oportunidade de expor o que pensava sobre isso, quando aqui vim debater esta questão numa outra altura. Referi, então, que uma sucessão de acidentes que ocorreram em torno do Maranhão levou a que se tivessem seguido metodologias e implementado soluções que, num cenário diferente, não teriam sido seguidas.
De qualquer maneira, não posso deixar de salientar que nunca faço qualquer juízo sem que o julgamento se realize; não faço réus, nem condeno ninguém, sem haver julgamento e considero que é prematuro estar, à partida, a lançar juízos sobre as direcções-gerais ou outras quaisquer entidades sem que a Assembleia do por concluído o inquérito que deveria estar em curso e do qual aguardamos os resultados.
Sr. Deputado Narana Coissoró, tenho pena de que não tenha interpelado directamente o Sr. Ministro, porque grande parte das questões que me colocou eram-lhe dirigidas. No entanto, de uma maneira clara, posso adiantar-lhe que, no que respeita às prioridades, elas foram perfeitamente equacionadas no discurso do Sr. Ministro. A prioridade é manifestamente a política de recursos hídricos e a política da conservação da natureza, sobretudo nas áreas e nos habitat protegidos. Isso foi claramente expresso no discurso do Sr. Ministro.
Relativamente às áreas protegidas, posso dizer que a situação não é tão grave com foi apresentada, pois acabámos de passar a fase de consolidação e vamos agora entrar na fase de desenvolvimento. A situação está perfeitamente controlada, os planos de ordenamento para as áreas protegidas mais importantes estão concluídos ou em vias de conclusão para as áreas protegidas sujeitas a maior pressão. Portanto, trata-se de uma política que está a seguir o seu curso normal, sem sobressaltos nem preocupações.
Quanto a Minde e a Mira de Aire, não queria deixar de fazer uma referência. Na verdade, às vezes é muito fácil criticar, fazer insinuações, mas nem sempre os Srs. Deputados se socorrem das fontes de informação mais apropriadas.
Vozes do PS: - As do Governos é que são as mais apropriadas, não é verdade?!
O Orador: - Por vezes, tom a tendência de se socorrerem de fontes de informação oriundas do seu próprio partido, que nem sempre são as mais adequadas.
Assim, no quadro do Programa Operacional de Vale do Tejo, a meia dúzia de quilómetros de Minde e de Mira de Aire, passa uma conduta que está a ser financiada pela EPAL e, tanto quanto sei, a Câmara de Alcanena rejeitou a hipótese de o abastecimento de água a Minde ser feito através dessa conduta.
Relativamente às questões que o Sr. Deputado Manuel Sérgio colocou, considero-as da maior relevância e o Governo tem procurado dar-lhes a maior atenção.
Em matéria de educação ambiental, entendemos que tem de ser encontrado um equilíbrio entre a componente da educação ambiental, que deve ser incorporada no sistema educativo, e a componente da educação ambiental, a que poderíamos chamar de sensibilização, que deve ser difundida na sociedade civil.
Temos procurado actuar nestas duas componentes e, naturalmente, comungamos das suas preocupações nesta matéria.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Grupo Parlamentar do PSD reage sempre com serenidade e autoconfiança quando é agendada uma interpelação sobre a temática ambiental.
Tal como dissemos ao PS na sessão plenária de 15 de Fevereiro de 1990, dizemos hoje o mesmo ao Partido Ecologista Os Verdes: «Bem-vinda esta interpelação!»
O Governo e o grupo parlamentar que o apoia vão demonstrar, outra vez, que tem uma política de ambiente criteriosamente alicerçada em princípios humanistas e reformistas das mentalidades e práticas agressoras do nosso património natural.
Assim, o partido interpelante fica confrontado com a obrigatoriedade de substituir a comum curiosidade por um projecto nacional alternativo, realista e articulável com as obrigações comunitárias de um desenvolvimento sustentável resultante da premente interligação dos programas de crescimento económico com os de conservação da natureza.
O PSD, quer na revisão do seu próprio Programa quer nos recentes programas eleitoral e do Governo, deixou bem claro a sua determinação de continuar, sem desfalecimentos, a honrosa tarefa que trouxe à política portuguesa, qual seja a da consciencialização de todos os cidadãos portugueses de que o imperioso desenvolvimento económico do nosso país não se fará à custa da delapidação dos nossos recursos naturais biológicos e geológicos mas com a garantia de que eles prevalecerão com índices quantitativos e qualitativos viabilizamos do «ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado», como postula a Constituição, no seu artigo 66.º
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com tal entusiasmo e ênfase, o Partido Social-Democrata tem defendido a inclusão da preocupação ambiental na tomada de decisão que, após uma proficiente acção ao nível da respectiva Secretaria de Estado, o Primeiro-Ministro decidiu criar o Ministério do Ambiente, hoje indispensável no Governo Português.
Face à importância deste evento, continuamos ainda à espera de que a maldizente oposição consiga substituir os seus enfadonhos e pessimistas inventários de disfunções ambientais por um conjunto de soluções alternativas àquelas que o Governo tem utilizado, não para erradicar num ápice - não somos irrealistas! - as causas e consequências das agressões ambientais mas, sim, para controlar a sua nocividade, relegando-a para os níveis legalmente vigentes nos espaços nacional e comunitário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Reflictamos, não obstante apressadamente, sobre o estado de alguns domínios do ambiente em Portugal.
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A poluição atmosférica é, globalmente, das mais baixas no contexto europeu, sendo certo que a nossa produção industrial é menor. Todavia, largas zonas do País usufruem de uma atmosfera de boa qualidade, havendo zonas críticas como, por exemplo, Estarreja, Barreiro, Seixal e Sines, onde há emissão de determinados poluentes específicos.
O programa europeu CORINE AR, em que Portugal participou, permitiu iniciar a normalização da quantificação das emissões de dióxido de enxofre, de óxidos de azoto e de compostos orgânicos voláteis. Assim, uma análise por sectores de actividade indica que 96 % do dióxido de enxofre é emitido pelas indústrias, enquanto os transportes são responsáveis por 62 % das emissões de óxidos de azoto e 56 % de compostos orgânicos voláteis.
Neste sentido, seria de grande utilidade o aperfeiçoamento da rede nacional de qualidade do ar, abrindo postos de medição em zonas isoladas e despoluídas, por forma a possibilitar leituras comparativas, mais rigorosas, de um leque mais vasto de poluentes atmosféricos.
Por outro lado, o «efeito de estufa» e a destruição da camada de ozono são assuntos ambientais que estão na ordem do dia.
Em Portugal, a emissão de dióxido de carbono, per capita, é duas vezes inferior à dos restantes países europeus e não há produção de clorofluorcarbonetos, tendo sido a sua importação reduzida, de acordo com as indústrias utilizadoras, para 400 t/ano.
Louvável é, ainda, a recente decisão do Conselho da Comunidade de eliminar a produção de clorofluorcarbonetos ate 1996, antecipando em quatro anos o Acordo de Londres.
No que concerne aos recursos hídricos portugueses, a situação de seca que nos atormenta este ano é excepcional. O balanço hídrico nacional, em ano médio, é superior à média europeia. Mesmo considerando que, dos 910 mm de precipitação média anual só 400 mm são captados para consumo, as nossas disponibilidades hídricas cobrem folgadamente as actuais necessidades e consumos. Os recursos hídricos subterrâneos são a principal fonte do abastecimento doméstico, industrial e agrícola, contribuindo as águas de superfície com 20 %.
A qualidade dos recursos hídricos superficiais armazenados em albufeiras pode considerar-se boa, já que 61 % dessa água encontra-se no estado oligotrófico e apenas 2,6 % no estado eutrofisado.
Das 223 praias analisadas em 1990, 132 (59 %) apresentavam boa qualidade balnear, de acordo com a legislação comunitária; 35 (10 %) tinham uma qualidade aceitável e 56 (25 %) tinham má qualidade, sendo as descargas directas de esgotos urbanos e industriais a principal causa.
Os recursos hídricos fluviais estão sujeitos, como sabemos, a enormes pressões urbanísticas e industriais. O facto de algumas unidades industriais - algumas licenciadas por câmaras do PS - considerarem o rio como mero meio expedito de lançarem os seus efluentes não tratados à mistura com efluentes domésticos de centros urbanos populosos, gera, em alguns casos, cargas poluentes incompatíveis com a qualidade hídrica, sendo as espécies piscícolas contaminadas e ficando a saúde pública em perigo.
Os contratos-programa entre as administrações central e local para a construção de estações de tratamento das águas residuais, que os governos do PSD tem desencadeado ao ritmo possível, assumem-se de grande utilidade, aliás já patenteada na redução da carga poluente de alguns rios.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este esforço tem sido completado com legislação rigorosa no controlo das emissões de efluentes industriais e com a transposição completa para o direito interno de todas as directivas comunitárias relativas à água, salientando-se o Decreto-Lei n.º 74/90, referente às normas de qualidade da água, e o Decreto-Lei n.º 70/90, sobre a definição do regime de bens do domínio público hídrico do Estado.
A boa qualidade da água e a regularidade da sua distribuição espacial e temporal impõem um modelo de gestão mais flexível e descentralizado, o que passa pela revisão, já anunciada, da actual Lei da Água, que data de 1919, devendo-se ter em conta aspectos como, por exemplo, a criação de organismos de âmbito regional capazes de gerir a qualidade e quantidade da água disponível; a definição de um regime de utilização das águas subterrâneas; a aplicação dos princípios do poluidor-pagador e do utilizador-pagador.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A biodiversidade e a manutenção do património genético das espécies em regressão populacional é um imperativo no gizar de uma política de ambiente.
É errado pensar nas florestas, exclusivamente, como um factor comercial! Os actuais 550 000 ha de eucaliptos são, certamente, uma fonte de riqueza nacional, mas a base territorial para a sua exploração não poderá ser ilimitada.
O usufruto económico da árvore deve coexistir com o seu usufruto ambiental: é esse o espírito do PSD e do seu governo!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Afinal, quem purifica o ar e trava a desertificação? Quem favorece a infiltração da pluviosidade e ameniza o clima? Quem oferece áreas de lazer e o encontro privilegiado com a natureza?
Recentemente, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais propôs à Comissão do Ambiente da Comunidade Europeia a criação de instrumentos comuns aos Estados membros na prevenção, detecção e luta contra os incêndios florestais.
Decorre a campanha nacional de arborização de espaços urbanos e de florestação de áreas com interesse ecológico, lendo sido já plantadas um milhão de árvores, prevendo-se a plantação de 10 milhões nos próximos cinco anos. Aliás, não estou a dizer que com isto se vá resolver o problema das florestas em Portugal, mas é, sem dúvida, um valioso contributo do Governo Português.
Aplausos do PSD.
A gestão e o ordenamento florestal deve contar com uma melhor articulação e cooperação entre os diversos organismos da administração central com responsabilidades ha matéria - e são muitos, como sabemos! -, as autarquias, as universidades, as empresas públicas e privadas, os proprietários, para que tenhamos uma floresta multifuncional, diversificada e abundante.
A flora nacional é cientificamente relevante, havendo cerca de 7000 espécies, das quais 3000 são plantas vasculares e, destas, 2500 são autóctones e 500 introdu-
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zidas, existindo no continente 86 endemismos, nos Açores 56 e na Madeira 145.
Um recenseamento recente das plantas vasculares, a proteger em Portugal continental, menciona 291, das quais 17 estão já, provavelmente, extintas, 99 em perigo de extinção, 154 vulneráveis e 20 raras.
Assim, convém estender a protecção legislativa já consagrada para o azinho e montado de sobro a outras espécies, bem como incluir todas as espécies ameaçadas no anexo I da Convenção de Berna.
A criação dos bancos de germoplasma no Instituto Superior de Agronomia e no Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza foi um factor decisivo para garantir a manutenção genética das espécies ameaçadas, especialmente as endémicas.
A fauna portuguesa tem grande diversidade, embora com populações pouco numerosas. Assim, dados recentes apontam para 99 espécies de mamíferos, 310 de aves, 34 de répteis, 17 de anfíbios, 43 de peixes de água doce e 400 de peixes marinhos litorais.
Há protecção legislativa especial para os mamíferos da área da zona económica exclusiva como, por exemplo, o mero, a tartaruga marinha, as lapas, isto na Região Autónoma dos Açores, e, ainda, para o lobo ibérico, no continente.
As convenções internacionais subscritas por Portugal são instrumentos de apoio e reconhecimento internacional da nossa fauna. Somos um bom exemplo na aplicação da CITES ou Convenção de Washington sobre o comércio internacional das espécies selvagens ameaçadas de extinção.
Por outro lado, os anexos da Convenção de Berna contemplam 436 vertebrados portugueses, ou seja, cerca de 87 % do total de espécies.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os problemas ambientais são transfronteiriços e internacionais! A actual Comunidade Europeia plasmou para o Tratado da União, em Maastricht, o carácter comum da política de ambiente, inscrevendo-o como objectivo prioritário num quadro de desenvolvimento sustentável, o mesmo é dizer no pleno respeito pela saúde dos cidadãos, no uso racional dos recursos naturais, na cooperaçâo internacional.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Os recursos financeiros necessários para fazer política de ambiente suo astronómicos! Só em Portugal estima-se que a redução de 20 % nas emissões de dióxido de enxofre, de óxidos de azoto, de compostos orgânicos voláteis, o completo tratamento das águas residuais domésticas e industriais e dos resíduos sólidos e tóxicos exigiria um investimento imediato superior a 500 milhões de contos.
É, pois, merecedor de aplauso o esforço do Governo Português - aliás bem sucedido - para que, no âmbito do Pacote Delors II, sejam afectados fundos comunitários significativos para a reparação ambiental em Portugal, não porque estejamos em situação catastrófica mas, simplesmente, porque o nosso produto interno bruto não suporta, sem auxílio, tamanho investimento.
O 5.º Programa de Acção Comunitária em matéria de Ambiente para o período de 1992-1997 e a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento são empreendimentos que não podem ficar apenas no patamar da proclamação de belos e sublimes princípios gerais.
Quando, por exemplo, os 16 milhões de metros de quadrados de Floresta Amazónica estão actualmente reduzidos a 9 milhões de metros quadrados e sofrem um ritmo de abate na ordem dos 200 000 km2/ano; quando a concentração de dióxido de carbono na atmosfera aumentou, desde a chamada era industrial, 25 % e o ozono diminui, em algumas zonas, 2,5 %; quando se prevê que, numa década, a temperatura média global do planeta aumente 0,3.º C e o nível das águas do mar suba 0,14 cm, é, então, altura de a humanidade substituir as incessantes perguntas sobre a origem da vida e as razões da sua existência por respostas que assegurem a sobrevivência das gerações futuras.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Portugal, à escala mundial, tem ainda um ambiente aprazível, com recantos de rara beleza e qualidade ecológica. É esta a conclusão séria que gostava de ouvir dos partidos da oposição. De facto, os senhores não são capazes disso, embrenhados que estão na vossa tarefa de apenas dizer mal do governo do PSD!
Aplausos do PSD.
Repito, em conclusão: Portugal, à escala mundial, tem ainda um ambiente aprazível, com recantos de rara beleza e qualidade ecológica, sendo as disfunções existentes recuperáveis.
A educação ambiental dos cidadãos, a colaboração dos agentes económicos utilizadores de recursos naturais, a aplicação e fiscalização rigorosa da legislação ambiental, a investigação científica no domínio das tecnologias ambientais e um investimento expressivo na aplicação das políticas de ambiente são instrumentos decisivos.
Nesta perspectiva, o Grupo Parlamentar do PSD reafirma o seu apego aos valores ambientais e ao desenvolvimento sustentável e humanizado de Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Isabel Castro e André Martins, aos quais dou, de imediato, a palavra, esperando que sejam breves, uma vez que entrámos na hora regimental para procedermos às votações.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Deputado Mário Maciel, gostaria de, muito rapidamente, colocar-lhe ires questões.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado falou da floresta amazónica e das florestas tropicais, um tema extremamente importante que vai estar em discussão na Conferência sobre o Ambiente que vai ter lugar no Brasil, embora este dossier não vá ser votado.
De qualquer modo, sabe-se, hoje, que os oceanos contribuem, através das algas, para a produção de cerca de 80 % do total de oxigénio em todo o planeta. Portanto, sabendo-se isso e porque os oceanos são alvos de constantes agressões, nomeadamente de descargas químicas, pergunto-lhe qual a opinião do PSD relativamente a esta matéria. Qual a possibilidade de procedermos a uma discussão, com vista a que também este dossier possa estar em apreciação na Conferência sobre o Ambiente, que terá lugar no Brasil?
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A segunda questão que gostaria de colocar-lhe tem a ver com o facto de a poluição ser, tal como o Sr. Deputado referiu - e bem! -, uma questão transfronteiriça. A este propósito, coloco-lhe uma questão muito directa relacionada com os resíduos tóxico-perigosos.
Como certamente sabe, este assunto tem estado em discussão e está em estudo a aprovação de uma directiva comunitária, que pretende autorizar o transporte transfronteiriço e a exportação de resíduos tóxico-perigosos, o que, na prática, vai significar que, nomeadamente, países como Portugal, que não tem energia nuclear, venham a receber dos países do Norte resíduos altamente tóxico-perigosos, isto sem que tenhamos qualquer tecnologia adaptável para resolver este problema.
Sabemos que esta questão foi abordada na última reunião do Conselho de Ministros da Comunidade, em 23 de Março passado, mas não sabemos qual a posição do Governo sobre esta matéria. Assim, gostaria de saber o que é que o PSD pensa sobre o facto de esta directiva poder vir a ser aprovada e como é que se posiciona relativamente a esta matéria, isto é, se é a favor ou contra as consequências que daí advirão.
A terceira questão que gostaria de colocar-lhe tem a ver com a água, uma vez que o Sr. Deputado referiu-se à importância da elaboração de uma lei da água. Assim e uma vez que já foram elaborados dois projectos de lei relativos à água, um sobre a qualidade e outro sobre o sistema institucional de gestão dos recursos hídricos, e como, em nosso entender, a lei da água deveria encimar o topo da legislação, pergunto-lhe de que forma e com que limites é que pensa que a lei da água pode ser elaborada, mantendo-se estes dois diplomas em funcionamento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Deputado Mário Maciel, em primeiro lugar, quero felicitá-lo porque, ao longo de vários anos, tem assumido aqui, à frente do Grupo Parlamentar do PSD, a difícil tarefa de afirmar que o governo do PSD e o PSD tem feito muito pelo ambiente.
O Sr. António Bacelar (PSD): - É verdade, é verdade!
O Orador: - Sabemos quais são as suas sensibilidades e preocupações relativamente ao ambiente e, por isso, compreendemos o esforço que faz por, sistematicamente, quando se discutem aqui questões do ambiente, ter de vir fazer estas afirmações.
Uma primeira questão que lhe queria colocar prende-se com o facto de o Sr. Deputado ter afirmado que Portugal vive ainda num ambiente aprazível relativamente aos restantes países da Comunidade. Como sabe, nós não temos essa opinião, ou melhor, a opinião que temos é a de que isso não é justificação para deixar poluir, porque essa tem sido a argumentação do PSD e do Governo para que sejam justificáveis todos os atentados ao ambiente. Não é esse, pois, o nosso entendimento da política de ambiente e do processo de desenvolvimento do nosso país. O que me parece é que o Sr. Deputado, como tantas vezes o Governo e o PSD aqui tem referido, quer estar no «pelotão da frente» para a integração europeia.
Assim sendo e uma vez que continua a dizer que em Portugal se vive ainda num ambiente aprazível, pergunto-lhe se podemos continuar a poluir para atingir o «pelotão da frente». Espero bem que esta não seja a sua interpretação!
Sr. Deputado, já agora e porque falamos de questões comunitárias, gostaria de lhe colocar uma outra questão. O Sr. Secretário de Estado da Indústria disse, há já algum tempo, num seminário sobre a indústria das tintas, que a Comunidade Europeia tinha de ter mais consideração por Portugal, para que a aplicação de determinada legislação comunitária não implicasse um atraso ou um congestionamento no desenvolvimento do País.
Como sabe - lembra-se, certamente -, o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui, no debate do Programa do Governo, que uma das exigências que iria fazer à Comunidade era a de que esta aceitasse flexibilizar a aplicação dos normativos comunitários sobre o ambiente para que Portugal possa continuar a ter um desenvolvimento, disse o Sr. Primeiro-Ministro, mas eu diria crescimento, como o que tem tido nos últimos anos.
Gostaria de saber qual é a sua opinião relativamente a estas duas questões.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do mesmo partido, foram-me feitos dois pedidos de esclarecimento completamento distintos. Parece incrível: dois Deputados e dois pedidos de esclarecimento completamento diferentes! Por um lado, o pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Isabel Castro, que reputo de alta qualidade, com preocupações ambientais fundamentadas, com as quais partilho e em relação às quais vou, aliás, entabular algumas considerações e, por outro, o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado André Martins completamento insensato, querendo fazer crer quo venho aqui defender, sem convicção, o governo do meu partido. Pelo contrário, estou com entusiasmo e convicção a defender o programa governamental do Partido Social-Democrata!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Da mesma forma que eu concedo ao Sr. Deputado o estatuto de Deputado da oposição sério, empenhado e do contribuição para uma melhor política ambiental em Portugal, o Sr. Deputado deverá conceder-me, também, o estatuto de Deputado apoiante do governo do Partido Social-Democrata, que sou com entusiasmo e convicção!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Relativamente às questões que a Sr.ª Deputada Isabel Castro colocou, devo compartilhar com ela algumas preocupações. Por exemplo, em relação à floresta amazónica, quando sei que por cada segundo uma área do tamanho do um campo do futebol desaparece da área dessa floresta, fico preocupado, e penso que também o ficam todos aqueles que têm sensibilidade ecológica, que somos praticamente todos nós, felizmente.
Ou seja, a floresta amazónica é o pulmão do planeta, pelo que destruí-la é pôr em causa a sobrevivência da humanidade no nosso planeta. Portanto, penso quo a conferência, que irá decorrer no Rio de Janeiro, deverá lançar um alerta bem alto para a contenção do abate criminoso da referida floresta.
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Sei que o Sr. Ministro está preocupado com essa questão - foi o que nos disse na Comissão de Assuntos Europeus - e, como presidente em exercício do Conselho da Comunidade, irá, certamente, no âmbito da Conferência do Brasil, apelar para que saia dessa conferencia uma declaração das florestas, de modo a preservar a floresta amazónica, mas não só! Deixar, também, recomendações para que, a nível europeu, a chamada floresta mediterrânica se alastre e não se reduza, em detrimento de espécies de crescimento rápido que têm o fim único e exclusivo do economicismo, quando a floresta deve ter duas vertentes: uma ecológica e outra comercial.
Sobre os oceanos, Sr.ª Deputada Isabel Castro, também partilho das suas preocupações, pois o oceano Atlântico banha, obviamente, o nosso país e é zona de passagem de inúmeros barcos que ou lavam os seus tanques ao largo, por exemplo, dos arquipélagos ou, então, tem acidentes catastróficos, como foi aquele que recentemente aconteceu na Região Autónoma da Madeira.
Relativamente a esta matéria, penso que devemos ter esperança de que a Agência Europeia do Ambiente instale em Portugal um centro temático sobre matérias de poluição marítima, por forma a chamar, digamos assim, aos países periféricos da Europa um conjunto de meios, de técnicos e de instrumentos capazes de actuar nas chamadas marés negras.
Sobre essa matéria, lembro também...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Mário Maciel desculpe interrompê-lo, mas, como há muito burburinho na Sala, peço aos Srs. Deputados o favor de fazerem silêncio, para que V. Ex.ª possa acabar a resposta.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, continuo, então, dizendo que é também importante o acordo que o Governo Português estabeleceu com alguns países, quer com Marrocos quer com a França e Espanha - países da área mediterrânica -, para que se socorram mutuamente e empreguem esforços mútuos aquando de uma eventual catástrofe marítima aqui, na área do Mediterrâneo e nas áreas próximas do nosso país.
Quanto à problemática dos resíduos tóxicos e, enfim, da sua eliminação em Portugal, trata-se, obviamente, de um tema ainda em debate. Todavia, também lanço aqui, à Câmara, a intenção meritória do Governo em construir uma central de eliminação de resíduos tóxicos e perigosos, pois não pode continuar a situação de esses resíduos estarem a céu aberto, pondo em perigo a saúde pública.
Temos, pois, de encontrar uma solução mais expedita para eliminar resíduos de alta nocividade. Portanto, a anunciada construção da central de eliminação é, sem dúvida, um passo importante para acabarmos com essa disfunção ambiental.
Penso ter abordado todas as questões que me foram colocadas e gostaria de terminar agradecendo as perguntas que os Srs. Deputados Isabel Castro e André Martins me colocaram, deixando aqui a certeza de que Portugal, ao ser um país aprazível sob o ponto de vista ecológico, não dispensará deste governo uma atenção cuidada nas políticas de ambiente, porque, quando dizemos que Portugal é um país aprazível, orgulhamo-nos daquilo que já temos, mas, ao mesmo tempo, estamos em cima, atentos e accionando o princípio da prevenção, para que Portugal continue a ser esse país aprazível.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, antes de iniciarmos o período de votações, vou dar a palavra ao Sr. Secretário, que vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado Luís Sá, do PCP, por um período não inferior a 15 dias, com início em 1 de Abril próximo, pelo Sr. Deputado Victor Manuel Rodrigues Ranita.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 22/VI - Autoriza o Governo a rever o regime da entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PSN, votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul de Castro.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 1/VI - Regularização extraordinária de estrangeiros não comunitários em situação irregular (PS).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro e a abstenção do PSN.
A Sr. Maria Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra apenas para anunciar que vou entregar na Mesa uma declaração de voto sobre a votação anterior.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 12/VI - De saudação pela passagem do 30.º aniversário do Dia do Estudante, apresentado pelo PCP.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl de Castro.
Era o seguinte:
Passa hoje o 30.º aniversário do dia 24 de Março de 1962, data que assumiu um significado profundo na luta dos estudantes portugueses pela democracia, contra a guerra colonial, pela autonomia universitária e pela dignificação das condições de estudo em Portugal.
Neste ano de 1992, em que o dia 24 de Março é comemorado mais uma vez em democracia, a Assembleia da República, reunida em sessão plenária, associa-se às comemorações do Dia Nacional do Estudante e saúda todos os estudantes portugueses que hoje, em diversas acções por todo o País, designadamente contra a PGA e contra o aumento de propinas, fazem, mais uma vez, do 24 de Março um dia marcante na afirmação dos direitos dos jovens, da igualdade de oportunidades e da justiça social no acesso ao ensino.
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Vamos proceder à votação do voto n.º 14/VI - De saudação pela comemoração do Dia do Estudante, apresentado pelo PSD.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
É o seguinte:
Hoje, 24 de Março, comemora-se o Dia do Estudante, data de profundo simbolismo e significado histórico na vida dos estudantes portugueses, que a Assembleia da República reconheceu de forma especial ao aprovar uma lei sobre este dia. Essa lei confere o significado devido a este dia e prevê o apoio às comemorações.
Os Deputados do PSD, abaixo assinados, saúdam os estudantes portugueses e todas as associações de estudantes, esperando que o esforço por um melhor e mais exigente sistema de ensino tenha sucesso e seja partilhado por todos os agentes educativos e pela generalidade da sociedade portuguesa.
Vamos proceder à votação do voto n.º 15/VI - De saudação pelo Dia do Estudante, apresentado pelo PS.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul de Castro.
Era o seguinte:
A participação dos estudantes no movimento associativo constitui fenómeno de educação cívica, de formação e de pedagogia democrática, de um civismo activo, cujo papel antes e depois do 25 de Abril de 1974 é por todos reconhecido.
Na esteira do combate dos jovens que desencadeara a Questão Coimbrã, do movimento estudantil após o ultimato de 1890, da crise académica de 1907, dos movimentos estudantis de 1928 e 1931, das greves de 1945, um pouco ao longo de toda a história da resistência antifascista, as associações de estudantes institucionalizaram a comemoração anual do Dia do Estudante. Ponto alto desta contestação foi a crise académica de 1956-1957 contra a imposição do Decreto-Lei n.º 40 900, instrumento através do qual o Governo pretendia cercear a liberdade do movimento associativo.
Em 1962 o Governo proibiu a comemoração do Dia do Estudante, previsto para 24 e Março desse ano. Com tal iniciativa, o Governo penalizava os estudantes e a sua luta em prol da autonomia universitária e reconhecimento da liberdade associativa. Durante toda a década de 60 sucederam-se as movimentações estudantis, com destaque para a crise académica de Coimbra, em 1969.
O combate dos estudantes de então era o do futuro contra o passado, o da liberdade contra a ditadura.
Para sucessivas gerações antes do 25 de Abril de 1974, o Dia do Estudante foi um marco de unidade e de grito pela liberdade, pelo fim da guerra colonial, pelos direitos da cidadania, pela deposição do regime ditatorial e instauração da democracia.
Hoje, 30 anos após o 24 de Março de 1962, as instituições políticas do regime democrático acolhem e dão dignidade própria, ao nível institucional, às
associações de estudantes e ao Dia do Estudante. A Assembleia da República aprovou a Lei das Associações de Estudantes, a Lei do Dia do Estudante e uma participação significativa dos estudantes no processo de elaboração da legislação de ensino e das autonomias da universidade e do ensino politécnico. Ultrapassada a questão do regime, os estudantes batem-se hoje por questões relacionadas com o seu futuro, na perspectiva do desafio europeu com que Portugal está confrontado, anseiam por uma escola com melhores condições de estudo, por saídas profissionais dignas, por uma escola inserida na sociedade e virada para um mundo em mudança. O movimento associativo passa por uma fase de consolidação num quadro democrático.
Ao assinalar o 30.º aniversário do 24 de Março de 1962, a Assembleia da República manifesta a sua inteira solidariedade para com as recentes manifestações estudantis em prol de um ensino de qualidade, por um sistema de acesso ao ensino superior mais justo e por uma melhoria da acção social escolar, exortando o Governo ao diálogo com os estudantes e à satisfação daquelas justas reivindicações.
A Assembleia da República saúda neste dia os estudantes portugueses, bem como os dirigentes associativos de todas as épocas, na convicção de que o civismo activo que protagonizaram e protagonizam constitui um alicerce do regime democrático, de pedagogia e prática da democracia.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 16/VI - De condenação pelas discriminações feitas pela inquisição, apresentado pelo PS.
Creio que há acordo entre os vários grupos parlamentares para que se proceda a uma curta intervenção.
Tem a palavra, para esse efeito, o Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista apresentou este voto à Assembleia da República porque hoje ocorre o 5.º centenário do início da expulsão dos judeus da Península Ibérica.
Com efeito, foi nesta data que Isabel, a Católica, assinou o decreto de expulsão dos Judeus e dos Mouros de Espanha e, na sequência dessa decisão, aliás por pressões políticas e diplomáticas dos próprios Reis Católicos, viria D. Manuel I a promulgar, em 5 de Dezembro de 1496, um decreto de expulsão de idêntico teor.
Hoje, a consciência democrática portuguesa e espanhola rejeita e repudia esses factos. Na tradição democrática portuguesa, esta expulsão sempre foi objecto de crítica fundada, a tal ponto que as próprias Constituintes do liberalismo, no dia 17 de Fevereiro de 1821, revogaram expressamente este decreto de expulsão e a não discriminação fundada em razões de raça ou de religião consta da actual Constituição Portuguesa.
Hoje mesmo, decorre nas Cortes Espanholas uma sessão solene comemorativa deste acontecimento, a que não apenas a comunidade judaica internacional mas também as comunidade judaicas de Portugal e de Espanha atribuem o maior significado.
A proposta de voto do PS tem apenas em vista significar para nós, socialistas, a importância em termos democráticos e da consciência jurídica universal desta data, para que
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discriminações desta natureza se não voltem a repetir e para que, em matérias desta ordem, os valores hoje consagrados na Constituição da República Portuguesa possam perdurar, porque são também os valores das Comunidades Europeias e da ordem jurídica universal e, em especial, também os valores das Nações Unidas.
O Partido Socialista quer, por intermédio deste voto, associar o Parlamento Português a esta comemoração e, pela sua importância e alto significado, reiterar de forma solene que os decretos e as medidas conexas tomadas por D. Manuel I, há cinco séculos, estão definitivamente irradicados da ordem jurídica portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero informar a Câmara de que vamos votar contra este voto, que consideramos um completo contra-senso nos planos histórico e político.
Protestos do PS.
E dizemos isto por várias razões.
Em primeiro lugar, o que este voto pede à Câmara é, nem mais nem menos - e convém lembrar o texto, para não estarmos a falar em abstracto -, que a Assembleia da República «condene as discriminações feitas pela Inquisição e confirme solenemente que o referido decreto de D. Manuel I e toda a legislação conexa estão inequívoca e definitivamente revogados da ordem jurídica portuguesa».
Consideramos que a apresentação de votos desta matéria desprestigia esta Assembleia, por razões muito simples.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A história portuguesa tem muitos actos que, à luz dos nossos olhos, são iníquos, a começar pelo acto de fundação da nacionalidade, em que o D. Afonso Henriques, efectivamente, combateu os Mouros, que ocupavam uma parte importante do território português. Muitas atitudes iníquas, deste ponto de vista, foram tomadas na história portuguesa, desde a expulsão das ordens religiosas... Não quererá, com certeza, o Partido Socialista que protestemos contra a expulsão dos Jesuítas, na I República, considerados associação de malfeitores, ou contra os actos muito bem descritos na Peregrinação de Fernão Mendes Pinto, que, objectivamente, são violências contra o alheio.
Protestos do PS.
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sou contra a ignorância, Sr. Deputado Pacheco Pereira!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Pacheco Pereira está a fazer a sua intervenção e seria bom que se criassem as condições necessárias para ser ouvido pela Câmara.
Queira continuar no uso da palavra, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, nós nem queríamos acreditar no que líamos, quando recebemos este voto, pois ele não só tem implícita uma noção completamento
reducionista da nossa história como tem uma noção ainda mais grave de que herdamos uma espécie de culpa colectiva pelos actos dos nossos antepassados em função de uma determinada interpretação, essa sim, minoritária e reducionista da história, que, evidentemente, é inaceitável. É inaceitável que, hoje, ponhamos a Assembleia da República a fazer sucessivas revisões de actos da nossa história em função de uma interpretação jacobina da história portuguesa,...
Aplausos do PSD.
... que há muito tempo tem o seu papel.
Quando era jovem li um livro de um republicano ilustre e socialista utópico, chamado João Bonança, que resolveu exactamente fazer o que Partido Socialista hoje faz. Isto é, pretendia fazer uma revisão da história portuguesa e então mudava os cognomes aos reis, contava a história dos reis ao contrário, falava dos seus filhos naturais, das suas aleivosias em relação aos seus, etc.
Nós sabemos isso tudo.
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Isso é o que o Sr. Deputado faz agora!
Aplausos do PS. Protestos do PSD.
O Orador: - Mas não é sério querer pôr esta Assembleia a aprovar votos de condenação da Inquisição, votos de condenação de legislação do século XVI e daqui a pouco até dos séculos XV, XIV, XVII ou XVIII.
Há muitas coisas que, do nosso ponto de vista, são inaceitáveis. Mas o ponto de vista contemporâneo é para aquilo que é inaceitável aos olhos de hoje. Ora bem, querer fazer este tipo de revisão da história não é grande política e é péssima história.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra ou consideração da minha bancada.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o sentido e o propósito deste voto do Partido Socialista falam por si.
É um voto que tem a ver com um acto histórico que não é para nós objecto, sequer, de reinterpretação. É uma acto histórico condenável em toda a história pretérita portuguesa; foi-o sempre pelos constituintes democráticos e liberais portugueses, pelos constituintes em 1821, em 1911 e também pelos constituintes que fundaram o novo regime democrático português.
Actos e votos desta natureza são perfeitamente normais e habituais em todos os parlamentos democráticos da Europa, dos Estados Unidos e do Canadá.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - São actos e votos absolutamente normais nas organizações internacionais democráticas, designada-
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mente nas organizações interparlamentares, como o Conselho da Europa ou no próprio Parlamento Europeu.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É para nós corripletamente surpreendente esta posição do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, já que ela assenta no que há de mais ultramontano,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: -... no que há de mais retrógrado,...
Aplausos do PS.
... no que há de profundamente ultraconservador, reaccionário, anti-semita e totalitário na história política portuguesa.
Aplausos do PS.
É uma posição de voto perfeitamente insustentável à luz dos princípios democráticos, à luz da ordem jurídica actual,...
Protestos do PSD.
... à luz daquilo que constitui o património espiritual das nações civilizadas.
VV. Ex.ªs podem votar como quiserem, mas, seguramente, irão com esse voto comprometer o prestígio da Assembleia da República.
Protestos do PSD.
Isso pode não vos interessar absolutamente nada, mas o Partido Socialista não abdica de ser fiel a estes valores e por essa razão não abdica de estar em sintonia plena com a consciência democrática europeia e universal, que os senhores com o vosso voto vêm aqui recusar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não faz parte nem da nossa cultura política, nem da nossa visão do mundo olhar para ele como se fosse um conflito entre a luz e as trevas, entre o preto e o branco. Temos mais dúvidas interiores sobre a luz e sobre as trevas, sobre o preto e sobre o branco, e reduzir a nossa história e o nosso entendimento do real a esta espécie de anacronismos não conta com a nossa colaboração.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos absolutamente legítimo que qualquer grupo parlamentar aproveite uma efeméride histórica para apresentar um voto que, ao fim e ao cabo, pretende significar, do nosso ponto de vista, que a Assembleia da República manifesta claramente a sua oposição e condena toda e qualquer discriminação com origem na raça ou na religião.
Nesse sentido, parece-nos que essa efeméride histórica, o 31 de Março de 1492, pode servir para este efeito e penso que terá sido também esse o entendimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que apresentou o voto.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Maí elaborado!
O Orador: - Lamentamos, no entanto, que um voto sobre questões desta natureza possa ter esta forma, até porque coloca, além do mais, algumas questões, uma vez que a partir do momento da sua apresentação as alternativas estreitam-se.
Estamos, por conseguinte, de acordo com o objectivo,- mas lamentamos a forma assumida.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Neste sentido, se o Grupo Parlamentar do Partido Socialista o permitir, gostaria de sugerir que retire pelo menos a última frase, aquela em que se pretende que a Assembleia, através de um voto, confirme que desapareceu do ordenamento jurídico português o decreto de D. Manuel I. Porque, com toda a sinceridade, penso que isso retira dignidade àquilo que se pretende manifestar com este voto, para não entrar em questões que não tem propriamente a ver com o assunto principal, como a de saber se há necessidade de confirmar o seu desaparecimento do ordenamento jurídico, o que nos levaria para a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Aplausos do PCP.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso não precisar de sublinhar que o PSN está contra as discriminações da Inquisição. Sentimo-nos contemporâneos do futuro. A que título regredir ao século XVI?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas votamos a favor...
Vozes do PSD: - Muito mal!
O Orador: -... porque nunca...
Risos do PSD.
De facto, já reparei que os Deputados são almas extremamente sensíveis e tem vozes extremamente fortes, mas aguardem um bocadinho, se fizerem o favor.
Como dizia, votaremos favoravelmente porque nunca é demais salientar marcos relevantes da história da humanidade sem precisar de descer a acusações de ultramontanismo ao PSD, que, julgo, não as merece.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto hoje apresentado pelo Partido Socialista, em primeiro lugar, coloca em causa séculos e séculos de ecumenismo e de humanismo português, que já deram provas, em todo o mundo, de que o português não é discriminador nem racista, pelo contrário, abraça todas as religiões e todas as culturas dos outros povos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só isto bastaria para que o acto que hoje se pretende repudiar fosse um acto pontualmente excepcional sem particular relevo na história quase milenária de Portugal.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado Jaime Gama foi muito infeliz ao dizer que este voto divide o País entre semitas e anti-semitas, porque deu a impressão de que com este voto o PS quer introduzir uma nova forma de racismo e de divisão entre os Portugueses.
Aplausos do CDS e do PSD.
Sempre pensámos que um debate sobre semitismo e anti-semitismo nunca seria tolerado pelos Portugueses, não só porque Portugal como nação não o merece, como também não pode dar azo a que uma questão desta gravidade seja levantada, hoje, em 1992, com a Constituição que temos e com o regime democrático em que vivemos.
Aplausos do CDS e do PSD.
Como o CDS não quer contribuir para a divisão dos Portugueses entre semitas e anti-semitas, entre sionistas e anti-sionistas, vai votar contra este voto apresentado pelos socialistas.
Aplausos do CDS e do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É nosso entendimento que toda e qualquer questão, possibilidade, hipótese e pretexto pode ser motivo para que uma Assembleia formule votos de protesto contra qualquer forma de racismo ou de discriminação por razões religiosas, de raça ou política.
Contudo, pensamos que a forma como este voto nos chega e como foi concebido não é de modo algum a melhor forma de se poder expressar. Daí Os Verdes, embora sejam contra qualquer forma de discriminação, irem, perante o voto apresentado, abster-se.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Peço a palavra, para uma intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Mário Tomé, o que ficou acordado é que só poderiam fazer declarações os grupos parlamentares.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - É uma discriminação!
O Sr. Presidente (Ferraz do Abreu): - Os Deputados pendentes...
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - E o Sr. Deputado Manuel Sérgio?!
O Sr. Presidente (Ferraz do Abreu): - Srs. Deputados, a Mesa tem de confessar que considerou o Sr. Deputado Manuel Sérgio como um grupo parlamentar...
O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Não sou de jure, mas sou de facto!
O Sr. Presidente (Ferraz do Abreu): - É o seu desejo, Sr. Deputado, o que não quer dizer que o problema já esteja resolvido.
No entanto, creio que, perante esta excepção, a Câmara estará de acordo em que se dê também a palavra aos Srs. Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro, porque foi o primeiro a solicitá-la.
O Sr. Raúl Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensámos que um voto contra a discriminação, nos termos em que foi proposto, não é algo que se confunda com um juízo sobre a história que se possa pôr em causa.
O que aqui está fundamentalmente em causa, em meu entender, é o voto e o sentido profundo que tem, embora, na realidade, o aspecto formal de ratificação de uma votação que já está mais que sancionada nos pareça dispensável.
De qualquer forma, pensamos que este voto tem um sentido profundo, seja a discriminação traduzida na expulsão dos judeus, sejam outras medidas trágicas assumidas pela Inquisição, que tem um passado, e representa, como não pode deixar de ser, a nossa condenação, pelo que nos associaremos ao voto do Partido Socialista, nos termos que acabámos de referir.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer que vou associar-me ao voto do Partido Socialista, no sentido em que ele significa uma reflexão, que, em meu entender, é útil, principalmente quando pretende incidir sobre os dias que passam, sobre a necessidade de hoje não haver discriminações de qualquer espécie, como, aliás, aponta a nossa Constituição.
É evidente que olhar hoje para a história não é fácil, mas, penso, ela teve o seu próprio percurso e foi esse mesmo percurso que permitiu que pudéssemos estar aqui neste momento a pensar desta maneira.
Portanto, fazer a critica histórica, como está um pouco insinuado no próprio voto, não me parece totalmente ajustado e não deixo de sublinhar a posição do Deputado Pacheco Pereira, que, segundo me parece, tem alguma justificação, do ponto de vista do entendimento da história.
Neste sentido, vou votar favoravelmente o voto apresentado pelo Partido Socialista.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 16/VI, subscrito por Deputados do PS.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS, votos a favor do PS, do PCP, do PSN e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl Castro e a abstenção de Os Verdes.
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Era o seguinte:
Voto n.º 16/VI
Condena as discriminações feitas pela Inquisição
Decorre este ano o V Centenário do Início da Expulsão dos Judeus da Península Ibérica.
Foi, com efeito, a 31 de Março de 1492 que Isabel, a Católica, assinou o decreto que baniu da permanência em Espanha os membros daquela comunidade.
Em Portugal, D. Manuel I viria a assinar em Muge, a 5 de Dezembro de 1496, diploma de idêntico teor.
A expulsão dos Judeus e dos Mouros, as conversões forçadas e demais perseguições que lhes foram movidas inserem-se numa das piores tradições políticas da história europeia e nacional, que, aliás, em Portugal, foram, depois, expressamente reparadas pelas Cortes, a 17 de Fevereiro de 1821, renovando, confirmando e pondo em prática antigos direitos que, por tradição, usufruíam no País.
Nestes termos, por ocasião do V Centenário da Expulsão dos Judeus da Península Ibérica, a Assembleia da República, expressão legítima da vontade nacional e intérprete dos valores constitucionais que hoje inspiram o nosso país e que afastam qualquer arbitrariedade racial ou religiosa, condena as discriminações feitas pela Inquisição e confirma solenemente que o referido decreto de D. Manuel I e toda a legislação conexa estão inequívoca e definitivamente revogados da ordem jurídica portuguesa.
Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto n.º 17/VI, apresentado pelo PCP.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl Castro e a abstenção do CDS.
Era o seguinte:
Voto n.º 17/VI
Comemoração do Dia Mundial do Teatro
O teatro em Portugal tem sobrevivido, em larga medida, à custa da iniciativa e do esforço quase exclusivo dos criadores profissionais de teatro, sem definição de políticas de enquadramento e incentivo que contemplem objectivos, esforços de actividade, formas orgânicas e política financeira.
O teatro em Portugal precisa de ultrapassar a situação em que as medidas pontuais e contraditórias o tem colocado, nomeadamente a destruição e desactivação de salas de espectáculo sem criação de alternativas com condições de produção e de exibição.
O teatro em Portugal necessita de condições materiais e institucionais estáveis que lhe permitam um diálogo vivo e actual com o público.
A Assembleia da República, por ocasião do Dia Mundial do Teatro, saúda os profissionais do teatro e sublinha os esforços que tem desenvolvido para a manutenção do teatro.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 18/VI, subscrito por Deputados do PSD.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, em relação a este voto do PSD, tenho alguma dificuldade em posicionar o meu sentido de voto, porque, a meu ver, o voto tem uma questão que não me parece ser verdadeira. Logo, em minha opinião, o voto deveria ser, pelo menos, apreciado, porque faz apreciações que não são verdadeiras e é um bocado difícil pô-lo à votação sem qualquer manifestação por parte das várias forças políticas.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, o acordado na conferência de líderes foi que...
O Orador: - O que está em causa não é a intenção do voto, Sr. Presidente, mas o facto de conter afirmações que não são verdadeiras. E, a meu ver, é difícil votá-lo sem haver uma prévia discussão.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Mário Tomé, como dizia, o acordado na conferência de líderes foi que os votos seriam apresentados e votados sem discussão, à excepção do voto n.º 16/VI, sobre o qual houve um acordo nesse senado, logo uma distinção.
Portanto, cada um dos Srs. Deputados julgará do mérito do voto e votá-lo-á de acordo com esse julgamento.
Sendo assim, vamos votar o voto n.º 18/VI, apresentado pelo PSD:
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro e a abstenção do PSN.
É o seguinte:
Voto n.º 18/VI
Comemoração do Dia Mundial do Teatro
Porque os «Dias Mundiais de...» constituem, na sua criação e calendarização, um apelo à consciência dos povos para valores a preservar ou causas a defender, porque o teatro é ritual, e festa, é indicador, vivo e renovado em cada representação, do grau civilizacional de um país; porque, na última sessão legislativa, os debates nesta Assembleia prestaram testemunho de que os criadores e os agentes de teatro, em Portugal, se reconheceram no acerto de medidas oficiais na área da cultura, nomeadamente a decisão de considerar o teatro como sector prioritário nas iniciativas a promover; porque, em data já próxima, vai realizar-se, de novo, o Festival Internacional de Teatro, que, no ano anterior, foi êxito com raízes, agora a perdurar, a Assembleia da República, reunida em sessão plenária, não pode deixar de associar-se ao significado do dia em comemoração.
E porque sem actores e sem público não há teatro' e porque os actores, pela sua interposição e talento pessoal, são também o nosso riso e as nossas
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lágrimas, a Assembleia da Republica, como fórum representativo da Nação, saúda os actores e actrizes portugueses, os homens e as mulheres de teatro em Portugal e propõe à Câmara que essa mesma saudação revista a forma mais grata às gentes do palco e da ribalta: os mais fortes aplausos, numa salva de palmas.
Sr. Deputado Mário Tomé, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Mário Tomé (Indep): - Sr. Presidente, é apenas para informar a Mesa de que vou apresentar declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos retomar o debate.
Sr.ª Deputada Edite Estrela, pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, é para informar a Mesa de que entregarei declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Fica registado. Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, vamos, como acabei de dizer, reiniciar o debate.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Escassas semanas nos separam já da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento que, no Rio de Janeiro, irá acolher toda a comunidade internacional para discutir questões essenciais para o nosso futuro comum e tentar adoptar um novo código de conduta ecológica.
Trata-se de, na maior cimeira jamais realizada, caracterizar o estado do ambiente a nível mundial, inter-relacioná-lo com as opções tomadas para o desenvolvimento e tentar integrá-lo nas políticas económicas, tendo como objectivos: promover o desenvolvimento sustentado em todo o mundo; impedir o agravamento dos problemas ambientais e corrigi-los; promover transferências de tecnologias e seu acesso e estabelecer uma agenda de prioridades de acção através da aprovação de decisões e orientações conjuntas que conduzam a uma nova relação económica entre os povos, em particular do Norte e do Sul, e a uma política mundial que permita à humanidade proteger o planeta e geri-lo de modo mais solidário.
Afinal, um universo de questões de extrema importância que se relacionam com a saúde, a educação, a pobreza, mas também com a segurança, a desmilitarização e a paz. Questões que a todos respeitam e exigiriam um conhecimento que não se confinasse aos corredores do Poder, mas que envolvesse toda a sociedade, nomeadamente através das suas organizações feministas, pacifistas, ambientalistas, de empresários ou sindicais e da comunidade científica que representam importantes sectores de opinião e cuja efectiva participação, não só na preparação da conferência mas no posterior processo que se lhe seguir, assume papel fundamental.
Papel para o qual a resolução das Nações Unidas, ao convocar a conferência, chamava a atenção - e reconheceu ao facultar meios financeiros de apoio e autorização - para que, na segunda reunião de Genebra, os grupos independentes participassem oficialmente no processo preparatório de modo inédito, numa conferência desta dimensão, embora sem poder negocial.
Natural e desejável teria sido, pois, que Portugal, mesmo com o extremo atraso com que criou, em 11 de Abril de 1991, a Comissão Nacional Preparatória da Conferência, se tivesse lançado activamente na preparação da participação portuguesa, como lhe compelia, tendo em particular conta a responsabilidade acrescida que do próximo exercício da Presidência da Comunidade lhe advinha.
Tal, porém, não aconteceu e todo o processo encerra em si uma opção que deve, do nosso ponto de vista, ser politicamente avaliada. Desde logo, a própria composição da Comissão Nacional nomeada. O peso excessivo de três ministérios, em contraste com um único representante das associações de defesa do ambiente, e a exclusão, pura e simples, dos municípios, que intervêm quotidianamente nas questões de desenvolvimento e ambiente e que foram, assim, marginalizados neste processo.
Depois, na própria metodologia adoptada para a elaboração daquilo que se designou por relatório de Portugal.
Que credibilidade, perguntamos, pode ter o relatório de um país que, afinal, esquecendo as recomendações expressas da ONU, não foi antecedido de nenhum debate público nem reflecte a opinião conjunta da sociedade civil que é suposto representar?
Que profundidade e rigor pode ler o relatório quando se sabe que, no início do mês de Julho, estava por fazer, e só após reunião do gabinete do ministro com as direcções-gerais, em 9 de Julho, se concluiu «pela necessidade de, urgentemente, se elaborar, sendo, então, considerada uma tarefa prioritária.
Que importância, questionamos, se atribui, afinal, aos próprios técnicos da administração central quando se propõe «participações de fachada» em memorandos de 11 de Julho para contributos a chegar até 17?
Em relação ao próprio grupo de trabalho criado, e para além da diferente perspectiva que temos quanto à sua composição, que deveria ter integrado importantes sectores técnico-profissionais (biólogos, engenheiros do ambiente, médicos, juristas), perguntamos, Sr. Ministro, que sentido faz declarar, como fez, que ele deveria ser canalizador de debates quando tem noção, e presumo que o Sr. Ministro a terá, das extremas dificuldades que o grupo de trabalho tem enfrentado, tais como: dificuldades logísticas porque nem o acesso a fotocópias lhe é facultado; dificuldades financeiras que inviabilizam a sua intervenção e, por vezes mesmo, a sua possibilidade de deslocação para participar; dificuldades geradas no próprio acompanhamento dos trabalhos preparatórios, que o Ministério quis centralizar e que nas falhas constantes de comunicação e circulação de informação entrava.
Sr. Ministro, múltiplas foram as ocasiões em que falou «em alargar a participação à sociedade civil».
Disse, mas não o fez!
Que sabe o cidadão comum do que se vai e está efectivamente a passar? Pouco, muito pouco, para além da azáfama de viagens de que os jornais dão conta. E, se há dúvidas, faça-se um inquérito e pergunte-se aos Portugueses o que sabem sobre a Conferência, se conhecem a existência de uma comissão a preparar a participação dos Portugueses e quais as posições que lá vamos defender.
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Faça-se um inquérito e pela resposta se concluirá que as nossas críticas são justas porque daquilo que na resolução do conselho de ministros de 11 de Abril de 1991, se dizia ser competência para «promover a realização de acções de informação e sensibilização da opinião pública» não há vestígios.
E se este foi o processo, ele não é inédito, como se pode concluir da leitura do insuspeito relatório de Maio de 1990 do GEOTA, sobre o balanço da participação portuguesa na então Conferência de Bergen, ao registar-se «a indesculpável ausência da preparação portuguesa para a Conferência de Bergen» bem como «de contacto consistente do Governo Português com os parceiros sociais, quer para divulgar informação quer para concertar posições.
Sr. Ministro, de acordo com os objectivos previstos para a Conferência do Brasil, os documentos a aprovar na Conferência deverão ser: a Carta da Terra, declaração de princípios pelos quais os cidadãos do mundo se deverão relacionar uns com os outros e com o meio ambiente; convenções, isto é, diplomas legais internacionais de cumprimento obrigatório por parte dos Estados subscritores e relativos à biodiversidade e às alterações climáticas; a agenda 21, designação do programa de acção para implementação dos princípios enunciados na carta; acordos financeiros que definam formas de financiamento das acções a desenvolver; acordos relativos à transferência tecnológica que criem mecanismos de acesso a tecnologias menos poluentes por parte dos países em desenvolvimento e, ainda, acordos relativos a processos institucionais que definam melhores formas de reforçar ou ajustar as instituições internacionais à implementação das acções a desenvolver.
Gostaria, Sr. Ministro, que, em concreto, nos informasse objectivamente das seguintes questões: em primeiro lugar, relativamente à Carta da Terra, quais os lermos em que foi feito ou ultimado o seu debate na última reunião preparatória.
Em segundo lugar, em relação à Conferência sobre Alterações Climáticas, considerando que se têm verificado inquietantes fenómenos como o aumento da temperatura média da superfície da terra, com graves consequências para a humanidade, resultantes do chamado efeito de estufa e da redução da camada protectora do ozono, provocados pela emissão de CO2 e de CFC e pela destruição de importantes áreas florestais, com reflexos em processos de desertificação e erosão dos solos, gostaria de lhe perguntar que incentivos à investigação, e posterior utilização de processos tecnológicos menos poluentes, estão previstos e quais os incentivos ou penalidades previstos que favoreçam uma mais racional utilização da energia.
E porque do Norte também somos Sul, pergunto-lhe o que é que tem Portugal proposto, no âmbito do exercício da Presidência, para reivindicar apoios para combate à desertificação, que, em certas zonas do nosso país, se verifica já, e como compatibiliza esse facto com a Política agrícola comum que vem sendo proposta pelos países do Norte da Europa, numa perspectiva pós-Brasil.
Em terceiro lugar, sobre a biodiversidade, considerando que a perda de recursos genéticos, pela extinção de espécies de animais e vegetais, resulta da destruição de ecossistemas naturais, estimando-se hoje que, em média, 100 espécies serão perdidas por dia nos próximos 20 a 30 anos, e considerando que as áreas protegidas tem um papel fundamental na defesa da biodiversidade, pergunto, Sr. Ministro, como explica que a Convenção de Ramsar, destinada a proteger zonas húmidas de especial interesse por serem habitat de aves - refiro-me à Reserva do Estuário do Tejo -, embora transcrita para a lei portuguesa, esteja há 12 anos à espera de ser regulamentada.
Do mesmo modo, pergunto como explica que o Projecto Corine, da maior importância para a caracterização e defesa dos biótopos portugueses, esteja, desde 1987, parado.
Em relação às florestas, sabe-se que o dossier não estará concluído e em condições de ser assinado. Contudo, a minha interrogação vai no sentido de saber não se se defendem ou não as florestas tropicais, e dentro destas a amazónica, porque conhecemos a posição da Comunidade nesta matéria, embora fosse interessante discutir-se o porquê de alguns países o estarem a fazer, mas, sim, em relação à defesa da floresta na Europa, e dentro desta, se está previsto algum programa específico de defesa da floresta mediterrânica de sobro e azinho.
Sr. Ministro, a resolução dos problemas da sobrevivência que se colocam à humanidade só poderá ser encontrada no âmbito da nova ordem económica mundial, no quadro da qual os custos de transferências tecnológicas terão de ser estabelecidos para alcançar o desenvolvimento auto-sustentado.
Neste contexto, naturalmente, o Acordo Geral de Tarifas e Comércio, que regula todos os aspectos relativos a trocas comerciais, preços de matérias-primas e circulação de produtos, é fundamental para os países em desenvolvimento e indissociável do próprio sucesso do que vier a ser decidido na Conferência do Brasil.
Estando previsto que as negociações do GATT só se concluirão depois da conferência e não dependerão de nenhum dos compromissos aí assumidos, não pensa, Sr. Ministro, que este facto pode vir a comprometer seriamente os resultados da conferência? E como se tem Portugal posicionado perante este problema no exercício da Presidência?
Ainda, sabendo-se que o negócio de armas absorveu mais de 300 biliões de dólares nos últimos 20 anos, três quartos dos quais em vendas aos países do Terceiro Mundo, pergunto-lhe como é que, em seu entendimento, a perspectiva de um desenvolvimento sustentado pode ser articulada com a produção e gastos em armamento?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: Estas são algumas das múltiplas interrogações que a Conferência sobre Ambiente e Desenvolvimento coloca no imenso debate que ainda está por fazer, tanto nesta Assembleia como fora dela.
Não temos ilusões quanto às dificuldades do desafio que a Conferência lança. É o próprio desafio que, desde sempre, os movimentos e partidos verdes, em todo o mundo, tem vindo a lançar e como utopia foi interpretado.
Não será fácil. Mas não defendemos, como alguns, que tudo é preferível a um mau acordo, porque não temos da conferência a opinião que tudo aí começa e acaba.
A Conferência é um tempo, num processo e percurso que também por pressão da opinião pública foi iniciado há mais de 20 anos atrás. Um percurso da humanidade em busca de soluções que, no quadro de uma nova ordem económica internacional, terão de ser encontradas e favoreçam uma relação entre os povos, pautada pela solidariedade, a justiça entre gerações e a salvaguarda do futuro comum.
Aplausos de Os Verdes, do PCP e do Deputado independente Raul Castro.
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O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado Narana Coissoró pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa no sentido de saber se esta quase desertificação da bancada da maioria significa, neste momento, desinteresse total pela política do ambiente neste país ou se ó uma propositada desconsideração pelo Sr. Ministro do Ambiente, que se encontra presente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, V. Ex.ª não interpelou a Mesa mas sim o partido da maioria. Mas nós, daqui, temos uma visão mais ampla do Hemiciclo e verificamos que não é só o partido da maioria que está muito reduzido porque sucede o mesmo com os outros partidos.
Porém, o problema não é da Mesa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Tavares.
O Sr. Casimiro Tavares (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, Srs. Deputados: Este debate sobre política do ambiente corre o risco de, em certos momentos, se preocupar mais com a política do que propriamente com o ambiente.
A contribuição do CDS para este debate procurará contrariar esta tendência. Vamos, por isso, aproveitar o diminuto tempo de que dispomos para levantar duas questões concretas de degradação do ambiente que afligem as populações das zonas atingidas. Referir-me-ei, também, ainda que de forma sumária, à instalação de transfer de resíduos industriais e à degradação da ria de Aveiro.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A criação da QUIMIPARQUE para administrar o património imobiliário da QUIMIGAL e a sua gestão empresarial implicam, como é óbvio, uma optimização de recursos. Pensamos nas áreas construídas ou na largueza a ocupar; pensamos nas zonas infra-estruturadas e nos dois ramais de ligação à via Norte.
Aceitamos que a QUIMIPARQUE se «arregale» com a instalação, no seu território, de uma unidade bem dimensionada em termos de absorção financeira. Admitimos que se esfregue na ideia de que quanto mais tóxicos e perigosos forem os produtos melhor na medida em que maior será também o rendimento da exploração.
Por sua vez, a ECOTEDRI, empresa exploradora dos resíduos industriais, não irá desperdiçar uma oportunidade tão salutar aos seus interesses. E daí que vá de sensibilizar os nossos autarcas com deslocações graciosas a idênticas estações de tratamento sediadas no estrangeiro.
É evidente que esta sensibilização tem subjacente a ideia final dos interesses empresariais, conseguida através de uma dupla acção: obter luz verde nos órgãos autárquicos decisórios e decidir a divulgação do bem-bom ou do menos-mau.
Simplesmente, Sr. Ministro, para além dos resultados financeiros em jogo não podemos deixar de ter em conta o supremo interesse da população porque para ela não vão nem tem ido os benefícios e, bem pelo contrário, terão, como tem tido, de suportar os graves prejuízos e os elevados riscos.
Depois dos aquíferos contaminados; depois dos solos degradados; depois dos ares impestados; depois dos cursos de água enlambuzados de peste, cremos que será tempo de dizer basta.
Será que, Sr. Ministro, o princípio da justiça distributiva apenas respeita aos «cómodos»? Ou estender-se-á também aos «incómodos»?
Não será já tempo de distribuir o mal pelas aldeias, como diz o povo sofredor-pagador?... Mal que os países da Comunidade irão, naturalmente, agravar, pois receamos vir a ser a lixeira da Europa.
Lembramos que, em entrevista a um semanário, a 19 de Maio de 1990, o Sr. Engenheiro Macário Correia afirmou ter, em cima da sua secretária, um projecto de um grupo francês propondo a construção gratuita da fábrica de tratamento em troca da possibilidade de exportar para Portugal (e tratar no local) lixos tóxicos provenientes nomeadamente da França.
Certo é que o Sr. Ministro terá já garantido que não haverá importação de resíduos. Mas também é certo que representantes do Greenpeace em Lisboa se mostraram altamente preocupados com as dificuldades de controlo da entrada de resíduos em Portugal, façe à abolição das fronteiras da Comunidade Europeia.
Além disso, não parece clarificada a posição dos Doze quanto à proibição da exportação ou da circulação de resíduos destinados à destruição total dentro dos países da OCDE.
Permita-nos, pois, Sr. Ministro, algumas perguntas para as quais esperamos uma resposta clara.
Primeira: vai ser efectivamente instalada em Estarreja a estação de transferência e, bem assim, a de tratamento de resíduos industriais tóxicos e perigosos, para o que, apenas, se procura o local concreto?
Segunda: a sua legalização competirá ao Governo, à autarquia ou a ambos?
Terceira: a estação irá receber também os resíduos do parque industrial de Estarreja, já depositados no solo, que rondam as 500 000 t, e, bem assim, os resíduos que aí virão a ser produzidos?
Quarta: irá, ainda, receber os resíduos industriais dos países da Comunidade Europeia?
Quinta: por que não instalar a estação de transferência junto às estações de tratamento, aterro ou incineração?
Sexta: será que o Governo respeitará o resultado de uma eventual consulta a nível local, agora permitida pela Lei n.º 49/90, de 24 de Agosto, no caso de vir a ser desfavorável à implantação de transfers!
Sétima: quais as compensações para o município estarrejense derivados dessa instalação?
Oitava: por que não deverá cada indústria ou parque industrial construir as instalações adequadas à deposição e ao acondicionamento seguro, ainda que temporário, dos seus resíduos?
E já agora, Sr. Ministro, não abusando da bondade de V. Ex.ª e aproveitando a inegável vontade de sempre esclarecer, façe aos seus conhecimentos profundos na matéria, permita-nos acrescentar algo sobre a formosa ria de Aveiro, que já só o luar beija.
A ria continua a ser a cloaca dos efluentes urbanos e industriais da região, designadamente do mercúrio que nela é, ainda, lançado às carradas. Por isso, pergunto: qual o destino final destes efluentes? Qual a situação técnica prevista, designadamente onde o terminal do grande colector agora - parece-nos - posto em causa pelas Câmaras de Mira e Vagos?
Entretanto, está elaborado o estudo para despoluição da nossa ria. A execução ultrapassará os 20 milhões de contos. As verbas disponíveis do ENVIREG rondarão, segundo
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cremos, os 2 milhões de contos, restando algum do PIDDAC.
Perguntamos, por isso, Sr. Ministro, onde e para quando encontrar os financiamentos para levar a bom termo os restantes trabalhos a executar, uma vez que as autarquias não tem disponibilidades financeiras próprias?
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.
O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de corrigir uma afirmação feita pelo Sr. Deputado Casimiro Tavares quando se referiu à minha pessoa e que importa clarificar.
Daquilo que disse o Sr. Deputado Casimiro Tavares, concluo que, em determinada altura, eu teria dito que estava em cima da minha secretária uma proposta de uma empresa estrangeira para exportar para Portugal resíduos industriais e que haveria alguma abertura para ela vir a ser aceite.
Ora, quero dizer à Câmara que tal não corresponde nem à verdade, nem a factos, nem a pensamentos. Se alguma coisa é cena são os títulos das capas de alguns jornais do dia em que isso aconteceu, em que eu próprio sou a fonte de notícia. Aí, em letras claras e em frases firmes, diz-se: «Portugal não será lixeira de ninguém, não será aceite a importação de resíduos em circunstância alguma, qualquer que seja a proposta que nos façam, com as mais variadas facilidades financeiras.»
Foi isto que afirmei e era o que gostaria de ver registado para efeitos do Diário.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Tavares.
O Sr. Casimiro Tavares (CDS): - Sr. Deputado Macário Correia, limitei-me a ler aquilo que vem transcrito no jornal Expresso, de 19 de Maio de 1990, o que não significa que tal corresponda, efectivamente, à sua vontade. V. Ex.ª pode apenas ter referido o facto, mas convencido e determinado em não dar seguimento à construção gratuita ou à proposta melhor do grupo francês, mas a verdade é que o jornal Expresso escreveu essa notícia.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lourdes Hespanhol.
A Sr.ª Lourdes Hespanhol (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e Desenvolvimento, conhecida por «Cimeira da Terra», designação que denota bem a importância de que se reveste esta iniciativa, está, em todos os países, a mobilizar esforços no sentido de debater as questões que se colocam ao planeta Terra e a todos os povos do mundo em relação ao ambiente e ao desenvolvimento.
A opinião pública em geral, os lobbies e a classe política analisam, propõem, no sentido de melhorar a vida.
É prática constante do Governo Português a não informação pública, em geral, e a falta de debate nas instituições, em particular. Isto conduz a que hoje, a
escassos dois meses de realização da Cimeira, a Assembleia da República não tenha tido qualquer tipo de participação enquanto órgão representativo do povo português. Não lhe foi dada possibilidade de tomada de posição ou elaboração de propostas com o objectivo de enriquecer a participação nacional.
É no ano das grandes decisões sobre o ambiente que o PSD vem impedindo, sistematicamente, a criação da subcomissão especializada de ambiente na Assembleia da República, sede privilegiada de debate e estudo destas questões.
O Ministro do Ambiente limitou-se a informar em reunião com a Comissão para os Assuntos Europeus de quais seriam os temas e resoluções em debate. Mas esta informação pecou por ser restrita e por não indiciar qual a posição portuguesa em relação a essas temáticas. Apenas ficámos a saber que Portugal já não disputa, neste momento, a sede da Agência Europeia do Ambiente e que apenas somos candidatos a um centro temático da Agência!
Será que em relação ao ambiente, Portugal não assume por inteiro a sua posição de Presidência Portuguesa da Comunidade e por isso entendida de forma mais abrangente de informação/divulgação que ajudasse à preparação da Cimeira da Terra? Desde o início da Presidência Portuguesa o que a comunicação social veicula sobre as questões ambientais não são os temas em debate, não são as propostas a apresentar no Rio de Janeiro na Conferência, que se destina a preparar um futuro mais saudável, bem pelo contrário, todos os dias a informação que chega à opinião pública é a de desastres ecológicos atrás de desastres ecológicos!
Não é só com a «promessa», saída das Jornadas Parlamentares do PSD, de alteração da Lei das Associações de Ambiente e todas as outras promessas saídas do programa eleitoral do PSD e do Programa do Governo que se colmatam os graves problemas ambientais do País ou que se faz participar activamente o povo português neste grande debate que engloba também as questões do diálogo Norte-Sul.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sc o objectivo é fortalecer e pôr no terreno a sociedade civil em defesa e preparação de um ambiente mais saudável e com índices de bem-estar aceitáveis, justificar-se-ia que desde há muito tivessem sido tomadas! Ó que sabemos também é que o esforço notável desenvolvido pelas inúmeras associações de ambiente tem evitado que o estado do ambiente em Portugal seja ainda mais gravoso. Não podemos admitir passivamente que o responsável no Governo por esta matéria profira de forma impassível afirmações que indiciam que o bem-estar e o estado do ambiente em Portugal sejam positivos e que o relatório sobre o estado do ambiente em Portugal, a apresentar na Conferência das Nações Unidas, tenha sido elaborado de forma unilateral pelo Governo sem qualquer tipo de participação das organizações não governamentais, que acabaram por recusar discutir este elemento de trabalho como proposta a ser adoptada como documento base da Cimeira da Terra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A contrapor a esta posição, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou, em 15 de Janeiro, um projecto de resolução que visa romper com o silêncio do Governo e a falta de participação da classe política, dos especialistas e da sociedade civil, propondo a realização, em Maio, de uma Convenção sobre
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Ambiente e Desenvolvimento na Assembleia da República. É tempo de tomarmos uma decisão de bom-senso e quero aqui sensibilizar os Srs. Deputados de todos os partidos para a necessidade e oportunidade da aprovação e realização desta iniciativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fizemos atrás referência aos desastres ecológicos que tem vindo a ser noticiados. O PSD no seu programa eleitoral apresenta 28 medidas para o ambiente, ordenamento do território e defesa do consumidor. Os Deputados na Assembleia da República têm como obrigação fiscalizar a actuação do Governo. Importa, pois, perguntar, quais destas promessas já foram ou estão a ser implementadas? O PSD prometeu, e vou passar a citar ...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É um programa para quatro anos e o Governo só tem quatro meses!
A Oradora: - Sr. Deputado Manuel Moreira, tenha calma!
... «a execução de programas de regularização e valorização das zonas fluviais e estuarinas e a elaboração de planos de protecção contra secas e cheias», mas a que é que assistimos hoje? Há seis meses de seca e os problemas emergiram, opondo-se aquilo que pudemos chamar uma verdadeira apatia do Governo. O que se sabe é que o abastecimento de água às populações pode estar em perigo. Situações como a do Alviela e Mira de Aire devem ser referidas e não podemos esquecer que na margem esquerda do Guadiana a água do rio hoje a ser distribuída pela Câmara Municipal às populações só pode ser utilizada para lavagens e nem tão-pouco dá para fazer uma açorda!
Quando há cheia o Governo acode aos prejuízos da água a mais, quando há seca lamenta-se e promete cobrir os prejuízos. Fala do pacto ambiental extensivo à sociedade civil e particularmente aos industriais, mas o que acontece na realidade é que a ria de Aveiro, de que há pouco aqui se falava, todos os dias muda de cor e quase todos os dias morrem demasiados peixes!
O que é facto é que este governo, que é maioria absoluta desde há cinco anos, e outros em que o PSD também esteve no Governo, não implementou um plano de armazenamento e utilização de águas pluviais, assim como de regularização dos leitos de cheia quando chove para que se possa utilizar a água quando há períodos de seca.
Sem água não se vive! Sem uma política séria que urge cada ano será uma interrogação para as populações que vivem nas zonas afectadas pelas intempéries. O gado começou a morrer, as culturas de sequeiro, em grande parte do País, estão perdidas. Esta situação de seca pode acelerar e despoletar os fogos florestais, tão comuns entre nós! Também aqui as promessas foram abundantes, mas pergunte-se aos bombeiros se foram dotados de equipamentos apropriados, se estão a ser preparadas brigadas profissionais de sapadores florestais para apoio ao combate aos fogos. Que medidas preventivas foram até hoje tomadas para a detecção precoce de incêndios?
Se o Governo não tem ideias e planos definidos nesta matéria podia, ao menos, estudar e discutir os projectos existentes na Assembleia da República apresentados pelo PCP. Talvez esta discussão, este trabalho, possibilitasse o impedimento de atentados gravíssimos ao ambiente no que se refere à florestação e reflorestação do País.
Evitar-se-ia, certamente, que em nome do «desenvolvimento» se cometam atentados gritantes como o caso recente do arranque de 700 pinheiros para dar passagem a
uma estrada sem que, previamente, tenha sido elaborado qualquer estudo de impacte ambiental, como de resto a lei impõe.
Evitar-se-ia, certamente, que se arranque o montado de sobro para plantar eucaliptos e que depois se doem incentivos para a plantação de áreas de montado de sobro! Evitar-se-ia, certamente, o alentado que se está a fazer na Área de Paisagem Protegida do Litoral de Esposende em que se estuo a cortar pinheiros do Pinhal de Ofir para fazer monstros de cimento!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A costa portuguesa, considerada até há bem pouco tempo a mais despoluída da Europa, afirmação corroborada pelo elevado número de bandeiras azuis atribuídas a praias portuguesas, corre hoje o risco de perder esse epíteto. Foram primeiro as da Costa Azul, depois as da Costa Verde e hoje são as do litoral algarvio a verem desclassificadas as suas areias e águas vítimas de graves problemas de poluição.
Problemas que se reflectem não só na qualidade de vida das populações residentes mas que arrastam problemas sócio-económicos derivados da menor procura turística dessas zonas. Por outro lado, obrigam a programas de recuperação dispendiosos e que muitas vezes acabam por não devolver a beleza natural que as caracterizava. Estes problemas são fruto não só de atentados feitos em terra mas em muitos casos de desastres ocorridos no mar. Ainda todos estamos lembrados dos graves incidentes acontecidos em Porto Santo e junto à costa vicentina.
Num país comunitário com a maior área de zona económica exclusiva, ainda não existe nem legislação interna nem equipamentos e mecanismos de prevenção e socorro, em número julgado necessário, no caso de qualquer tipo de acidentes com matérias poluentes. Também nesta área o PCP apresentou um projecto de lei que visa estabelecer condições e regras mínimas a cumprir pelos navios que transitam nas nossas águas e que transportem mercadorias perigosas ou poluentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero terminar sem que, em nome do PCP, saúde o Partido Ecologista Os Verdes pela marcação desta interpelação. As matérias hoje abordadas não esgotam o tema. Um ambiente saudável constrói-se todos os dias. As políticas tendentes a equilibrar o binómio ambiente-desenvolvimento tem de ser discutidas e encontradas com a participação de todos.
Aplausos do PCP e do Deputado independente Raul Castro.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Liberato): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Constato em primeiro lugar que as críticas à política de ordenamento do território do Governo são inexistentes e, nessa medida, não irei alongar-me tanto como tinha pensado de início relativamente à exposição da política do Governo nesta matéria.
Mesmo assim, considero apropriado fazer algumas referencias. Com efeito a situação em que se encontrava o nosso País em 1985, em termos de ordenamento do território, pode ser caracterizada como de profunda degradação. Esta situação decorria quer da forma casuística como era gerido o processo de ocupação quer do sistemático desrespeito pelos planos existentes e pelo património natural e construído.
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Por outro lado, dominava a permissividade na construção e na expansão dos aglomerados através de loteamentos urbanos que se dirigiam não para as áreas mais adequadas mas para as mais atractivas para a especulação. As estruturas governamentais responsáveis pelo planeamento urbanístico eram inimigas dos responsáveis pelo ambiente. A problemática ecológica estava totalmente ausente do processo de decisão do ordenamento ao ponto de as estruturas governamentais bloquearem totalmente o processo de regulamentação e delimitação da Reserva Ecológica Nacional.
Tudo isto tendo como pano de fundo uma demissão por parte do Estado na gestão do solo sob a concepção ultrapassada de que se tratava apenas de uma competência municipal.
Porque se tratava de uma situação de quase vazio em matéria de planeamento territorial, sem qualquer comparação com os outros países comunitários, e porque a concretização de uma política de ordenamento do território não se traduz em resultados imediatos, foi opção do Governo definir uma política estruturada segundo três eixos fundamentais: impedir a continuação do ritmo e extensão da delapidação de recursos que vinha ocorrendo, através da concretização de uma política de salvaguarda; apostar na cobertura completa do território nacional por planos de ordenamento ao nível do município e assumir as suas responsabilidades em parcelas críticas do território, cuja importância justificava uma actuação integrada de nível supramunicipal, e instituir uma coerência global em todo o sistema de ordenamento do território, articulando os processos de transformação do solo com o processo de planeamento.
Em concretização desta política, adoptou-se um conjunto de legislação completo. Inúmeros diplomas foram aprovados nesta matéria: a Reserva Agrícola Nacional; a Reserva Ecológica Nacional; o regime de gestão urbanística do litoral; o regime de ocupação de solo objecto de incêndio florestal; o regime de bens do domínio público; o programa de recuperação de áreas urbanas degradadas; os planos regionais de ordenamento do território (PROT); os planos municipais de ordenamento do território (PMOT); o programa de apoio financeiro à elaboração de planos directores municipais; o regime de licenciamento da indústria hoteleira; o regime de licenciamento das grandes superfícies comerciais; o regime da caducidade das licenças municipais de construção civil; o regime de instalação e licenciamento de estabelecimentos industriais; o Código das Expropriações; o regime do licenciamento municipal de obras particulares; o regime dos loteamentos urbanos e obras de urbanização; o regime transitório, para vigorar em 1992, na ausência de plano director municipal.
Foi um conjunto de legislação coerente que foi adoptada durante os últimos anos.
A reacção da sociedade civil, dos municípios e dos departamentos do Estado a esta autêntica revolução legislativa tem sido positiva e tem contribuído para criar um novo espírito para esta área.
De um ponto de vista substantivo, em estreita correlação com os objectivos de política apresentados e com os instrumentos definidos, é já possível identificar alterações que representam uma profunda mudança no panorama do ordenamento do território em Portugal.
Assim, em paralelo com a definição do regime, promoveu-se a elaboração de planos regionais de ordenamento do território para áreas que, por motivos diversos, justificavam uma actuação urgente e concertada. Considerou-se, então, que o Algarve, a zona envolvente do Douro, a zona envolvente da Barragem da Aguieira, a área metropolitana de Lisboa, o litoral alentejano e o litoral centro eram as áreas prioritárias que mereciam atenção imediata.
Em relação ao Douro, à Aguieira, ao litoral alentejano, tratava-se de áreas pouco ocupadas, onde se podia fazer politica de ordenamento do território nos termos em que deve ser feita, de forma preventiva e antecipativa.
Quanto ao litoral centro e ao Algarve, estava sobretudo em causa a regulação da ocupação do solo e da transformação dos usos em zonas de elevada pressão urbanística.
No Algarve fizemos aquilo que, em 20 anos, ninguém teve coragem de concretizar: disciplinar a ocupação do solo de uma região que a paralisia da acção do Estado deixava caminhar vertiginosamente para o abismo.
A inclusão da área metropolitana de Lisboa fundamenta-se mais na necessidade de institucionalizar um processo decisório articulado e integrado, envolvendo as autarquias locais, já que existe a consciência de que grande parte das decisões estruturantes nesta área pertence à esfera supramunicipal.
O PROT do Algarve e o da zona envolvente do Douro estão em vigor e o da zona envolvente da Barragem da Aguieira está concluído. Vamos, naturalmente, concluir a breve prazo os restantes planos que se encontram em preparação. A resposta tem sido construtiva e aderente da parte das autarquias locais, quer no desenvolvimento dos planos regionais de ordenamento do território que citei, quer na sua aplicação no que diz respeito aos planos directores municipais.
Atente-se que, após a alteração do regime dos planos municipais, os municípios do País, que até então tinham permanecido à margem do processo de planeamento do território, decidiram já todos promover a elaboração de planos directores municipais. O contraste com a situação de 1985, em que havia apenas um plano director municipal em vigor é flagrante, sendo hoje possível ter a confiança de que esta batalha está ganha a este nível.
Posso, aliás, anunciar ter sido ratificado na última sexta-feira o Plano Director Municipal de Vila Real de Santo António e que hoje mesmo seguiu para o Diário da República a portaria que ratifica o Plano Director Municipal de Beja.
Justifica-se ainda uma referência aos mecanismos criados pelo Governo no âmbito das formas institucionais de cooperação municipal. Ultrapassa os 2 milhões de contos o apoio do Governo às câmaras municipais no domínio da elaboração desses planos directores municipais.
Definimos também orientações técnicas, não vinculativas, para a elaboração desses planos directores municipais, em cooperaçâo com as instituições universitárias.
Aliás, a sociedade civil - importa sublinhar este aspecto com bastante relevo- tem revelado um grande interesse sobre esta matéria, traduzido não só no elevado número de colóquios, seminários e encontros especializados sobre esta matéria mas também pelo significativo número de publicações sobre esta questão.
A política de desenvolvimento é indissociável desta política de ordenamento do território e se a política prosseguida representa, em Portugal, uma alteração radical de um status quo de quase 40 anos, em termos reais, ela não representa mais do que o atingir de um patamar mínimo em termos do ordenamento do território.
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Lamentavelmente tardio em relação aos outros países civilizados, inutilmente discutido e inquestionavelmente imprescindível, este patamar mínimo é o ponto de partida indispensável para uma política de ordenamento eficazmente orientada.
Mas, em termos da aplicação do nosso Programa de Governo, em cumprimento desta estratégia que foi definida e tendo presente o vasto leque de instrumentos que, implícita ou explicitamente, foram referidos, a concretização desta política de ordenamento do território terá de passar pela Lei de Bases do Ordenamento do Território, para coroamento dos vários instrumentos já disponíveis, fixando as normas e princípios gerais que devem presidir à gestão e utilização do solo e criando incentivos à sua correcta utilização.
A elaboração de planos regionais de ordenamento do território, respeitantes àquelas zonas onde se verifique um crescimento demográfico dinâmico ou onde esteja em causa a preservação de valores sensíveis e onde seja necessária uma intervenção supramunicipal.
Refira-se, desde já, o início, a curto prazo, de um plano regional de ordenamento do território para a zona raiana do Alto Minho.
O desenvolvimento de um programa de sensibilização e cultura do ordenamento do território dirigido aos principais actores nos processos de transformação dos usos do solo - autarcas, projectistas, industriais de construção civil - é outra prioridade.
A promoção da melhoria da qualidade do meio urbano nas suas diversas componentes, nomeadamente através da institucionalização de um regime de seguros obrigatórios que cubram a responsabilidade civil dos técnicos autores de projectos; a consagração do certificado de conformidade do projecto de obras, a emitir por entidades de reconhecida idoneidade; a revisão do regime da qualificação a exigir aos técnicos autores de projectos, são prioridades nesta definição de uma melhoria da qualidade do meio urbano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é fácil interpelar o Governo em matéria de ordenamento do território, como este debate está a demonstrar. Sobretudo quando, antes de 1985, não havia uma política que pudesse ter esse nome e, hoje, há. Por isso, é possível uma interpelação nesta matéria.
Foi, por isso, com a maior serenidade que intervim, consciente de que há muito a fazer, mas que fizemos mais do que os governos que nos antecederam todos juntos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que temos de proceder de acordo com o Regimento da Assembleia da República e, portanto, se interviemos, primeiro, a propósito do ambiente - e, de facto, a questão central aqui era a do ambiente, independentemente da nossa posição relativamente à importância do ordenamento do território em toda esta matéria - foi porque assim ficou estabelecido.
Aceitamos o seu desafio e, desde já, coloco algumas questões. O Sr. Secretário de Estado diz que o Governo iniciou um processo de ordenamento do território que, de facto, tem vindo a pôr em ordem á intervenção ao nível municipal, designadamente. Quero recordar-lhe, Sr. Secretário de Estado - sei que concorda comigo, mas é preciso que isto fique claro -, que as autarquias locais, desde há vários anos, vinham reivindicando condições para o ordenamento do território a nível municipal. Portanto, o Governo não fez mais do que dar seguimento a uma reivindicação que as autarquias vinham fazendo.
A minha segunda observação tem a ver com o seguinte: há alguns anos atrás, dizíamos que a Junta Autónoma de Estradas é que desordenava o território nacional - muitas das grandes aberrações que temos derivaram da autonomia de um serviço da Administração que intervinha naquilo a que chamamos o «desordenamento do território».
Mas agora, com este governo, e tendo em conta as observações que fez, verificamos que, novamente, a Junta Autónoma de Estradas e o célebre Plano Rodoviário Nacional tom continuado a desordenar o território.
E quero lembrar-lhe, por exemplo, o caso da Via Longitudinal do Algarve; o caso da auto-estrada Lisboa-Porto, que divide ao meio o Parque Natural da Serra de Aires e Candeeiros, uma via rápida cujo traçado está situado em grande parte sobre terrenos da Reserva Agrícola Nacional. E porque entendemos que, numa perspectiva de desenvolvimento sustentado, a questão do ordenamento tem de estar ligada à do ambiente, quero perguntar ao Sr. Secretário de Estado o seguinte: por que é que os serviços do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais não fazem parte das comissões de acompanhamento dos planos directores municipais? E por que é que o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais não pode dar parecer na ratificação dos planos directores municipais, de acordo com a legislação em vigor?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lourdes Hespanhol.
A Sr.ª Lourdes Hespanhol (PCP): - Sr. Secretário de Estado, foi pena não ter lido todo o seu discurso, porque, na parte final da sua intervenção, deu-nos algumas novidades e penso que, no restante, teria outras para nos dar. Estas novidades que nos deu, e que, de alguma forma, colidem - no bom sentido - com as actividades municipais, colocam-nos algumas dúvidas.
É que, hoje, nas câmaras, por exemplo - e vou citar um exemplo muito concreto da zona do Alentejo, porque já se falou hoje aqui no montado de sobro -, sempre que se colocam pedidos de parecer sobre plantação de eucaliptos ou arranque de sobro, o parecer emitido pelas câmaras municipais, normalmente, tem de ser subordinado ao parecer que vem da Direcção-Geral das Florestas, porque o das câmaras municipais é meramente consultivo.
Sr. Secretário de Estado, isto é um contra-senso! E vou lembrar-lhe que, no concelho de Ferreira do Alentejo, há dias, aconteceu algo que é digno de anedota.
Recebemos um parecer da Direcção-Geral das Florestas sobre uma plantação de eucaliptos, para que a Câmara emitisse também o seu parecer. Recebemos, 15 dias depois, outro parecer a dizer: «Afinal, o parecer que tínhamos emitido e que era contra, agora, é a favor, porque nos tínhamos enganado na área que ia ser plantada.»
De facto, é anedótico que isto aconteça, porque se mantinham as mesmas condições junto de uma linha de água, terras de primeira para a agricultura. O que não é, realmente, admissível é que haja um parecer destes, feito por uma organização que depende directamente do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, não estou ofendido pelo facto de o ordenamento do território não ter tido outro relevo neste debate. Julgo que é muito justificado o relevo que foi dado ao ambiente.
Em todo o caso, espero uma interpelação do seu grupo parlamentar sobre a matéria, e terei muito gosto em comparecer aqui com o relevo que o ordenamento do território também merece.
Portanto, não existe nenhuma competição nesta matéria. Estou completamente disponível para intervir e voltar a apreciar a forma como, embora exercendo oposição ao Governo, que é o vosso papel, tem contribuído para este debate, que tem sido significativa.
Aproveito para referir que, relativamente a essa questão da Junta Autónoma de Estradas, do Plano Rodoviário Nacional, que foi aprovado por um governo de que não fiz parte e levado a Conselho de Ministros por um ministro de um outro partido, portanto, não está em causa na nossa perspectiva, temos de nos antecipar em termos do ordenamento do território. Não podemos parar o esforço de desenvolvimento porque está a ser feito um plano de ordenamento do território. O que está em causa são as infracções ao planeamento e ordenamento do território.
Aproveito para pegar nas palavras da Sr.ª Deputada Lourdes Hespanhol, dizendo-lhe que devia aconselhar a Câmara de Ferreira do Alentejo, de que faz parte, a preparar rapidamente o seu plano director municipal, para que possa, de raiz, resolver muitos desses problemas, que, dessa forma, ficarão automaticamente resolvidos.
A Sr.ª Lourdes Hespanhol (PCP): - Está quase concluído!
O Orador: - Temos procurado fazer uma compatibilização entre todos os objectivos, o que nem sempre é fácil porque existem objectivos contraditórios - e já se falou aqui, várias vezes, na ligação entre o ambiente e o desenvolvimento. Portanto, são questões que tem de ser objecto de uma convergência muito grande e que, do ponto de vista espacial, o ordenamento é uma boa cena para isso acontecer.
Por isso, temos feito tanta pressão para que os municípios adoptem planos municipais de ordenamento do território.
Não quero entrar em competição com os municípios sobre esta matéria, mas gostaria de dizer que, tendo em conta a experiência que tenho, nomeadamente em relação a alguns planos regionais de ordenamento do território, foi o Governo que tomou a iniciativa - e falo, por exemplo, do Algarve.
Os presidentes das câmaras do Algarve motivaram uma discussão muito critica entre estes e o Governo. Eu ouvi - e não foi confusão minha, não estava doido - presidentes de câmara referir que não queriam o planeamento municipal no seu território, pois o seu modelo era Torremolinos. Conheço um presidente de câmara para quem o modelo é Torremolinos. Hoje, já mudou de opinião, mas, se calhar, o Governo também ajudou alguma coisa a instituir essa nova aproximação aos problemas de ordenamento do território.
Isto não é generalizável a todos os autarcas portugueses - faço-lhes essa justiça -, mas quero dizer que a nossa intervenção foi útil nessa matéria. Motivar municípios também é dar-lhes apoio, nomeadamente financeiro, para que concretizem os seus objectivos. Mas isto é uma acção que tem de ser feita em conjunto entre o Governo e os municípios.
Não veja, pois, nestas palavras qualquer dissensão. Pelo contrário, veja uma atitude no sentido de exprimir que os municípios são os detentores de toda a virtude e o Governo o detentor de todos os meios.
Aplausos do PSD,
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro, dispondo apenas de 2,1 minutos.
O Sr. Raul Castro (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Saudamos a iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes» sobre esta matéria, mas dois minutos - há pouco lembrados pelo Sr. Presidente - para dizer o que o Governo fez e não fez, sobretudo o que não fez, ao longo de já tantos anos, obriga a recorrer apenas a alguns exemplos, já que não cuidamos de discursos e promessas. Basta referir a recente afirmação da Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais de Coimbra, criticando não ter ainda sido implementada, na região, a política do poluidor-pagador - afirmação bem recente, de 28 do corrente.
Quanto ao ordenamento do território, é sintomática a opinião do presidente da Câmara de Loulé, há quatro dias, sobre o plano de ordenamento do território do Algarve, expressa nos seguintes termos: «Não vai resolver nada em termos de desenvolvimento da região, servindo apenas como travão ao crescimento urbano.» Isto vem na comunicação social.
O Sr. Filipe Abreu (PSD): - É uma câmara PS!
O Orador: - No que respeita ao ambiente, é conhecida a poluição nos rios Mondego, Cértima, Liz, Vouga ou Zêzere e as mortandades de peixes, como, ainda há poucos dias, aconteceu no rio Febros, em Avintes, Vila Nova de Gaia.
E os rios mortos, de que é triste exemplo o rio Leça?
E o erro do despejo de esgotos na ribeira de Artozela, pondo em causa o abastecimento de água a Cascais?
E os incêndios que devastam as nossas florestas, como o Marão, serra calcinada?
Sobre os rios que vão, em Babilónia me achei.» Mas se o poeta ressucitasse, e visse, agora, os nossos rios, com certeza angustiado preferia, em definitivo, os rios quo levam a Babilónia.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A interpelação ao Governo do Partido Ecologista Os Verdes sobre a política de ambiente e ordenamento do território é mais uma excelente oportunidade, como se está a ver, para o Governo mostrar e demonstrar a sua importante acção nestes dois domínios da política nacional.
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Se hoje se pode falar de uma verdadeira política de ambiente e de ordenamento do território em Portugal, isso se deve, indiscutivelmente, ao Partido Social-Democrata e aos governos que formamos e apoiamos desde 1985.
De então para cá, muito se fez e avançou nestes dois domínios da nossa vida e do nosso futuro colectivo. Os partidos da oposição, com particular destaque para o PS, quando estiveram no Governo, não fizeram rigorosamente nada nos domínios do ambiente e do ordenamento do território. A sua política foi zero.
Por isso falta aos partidos da oposição, em primeiro lugar, autoridade moral para poder apontar o dedo acusador ou criticar, com credibilidade, o PSD e o Governo nestas duas áreas da política governativa. Só podiam fazer, hoje e aqui na Assembleia da República, uma crítica fundada, se tivessem feito mais e melhor, mas, infelizmente para o País e para os Portugueses, nada disso aconteceu quando esses partidos fizeram parte do Governo.
E nas autarquias locais, designadamente nas câmaras municipais em que detêm a maioria ou lideram, o que tem feito em matéria de ambiente e ordenamento do território? Também aí existe um grande défice de acção e de uma política eficaz e coerente nesses domínios. Refiro um caso que bem conheço: a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, de maioria socialista, cujo vereador Nuno Portas, um bom teórico, que detém os pelouros do ambiente e do urbanismo, é um exemplo acabado de má gestão nestes dois domínios.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É muito fácil criticar, apontando defeitos e omissões, e até fazer demagogia barata, como é o estilo e o apanágio dos partidos da oposição. A nós, sociais-democratas, fica-nos uma missão mais edificante e patriótica que é fazer o que os partidos da oposição não fizeram quando foram Poder, realizando políticas exequíveis para dar solução aos problemas dos cidadãos e, assim, construirmos um Portugal melhor, com boa qualidade de vida para todos os portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O meu colega de bancada Deputado Mário Maciel já se referiu desenvolvidamente à política de ambiente que está a ser implementada pelo governo do Prof. Cavaco Silva, que apoiamos.
Cumpre-me agora a mim falar um pouco desenvolvidamente sobre o outro item desta interpelação, que quase foi esquecido, ou seja, a política do ordenamento do território do Governo.
Quando o PSD formou Governo sozinho, em fins de 1985, o País, em termos de ordenamento do território, entendido este quer como processo de planeamento do território quer como forma de concretização das tendências dominantes ao nível da ocupação do espaço, estava caótico.
Este quadro negativo decorria quer da forma casuística como se desenrolava a gestão do processo de ocupação de solos, quer do desrespeito sistemático pelos planos urbanísticos existentes e pelo património natural e construído e ainda porque dominava a permissividade à construção e à expansão dos aglomerados através de loteamentos urbanos que se dirigiam não para as áreas mais adequadas, mas para as mais atractivas para o investimento, que eram, geralmente também, as ecologicamente mais ricas e sensíveis.
Assim, neste processo, ia-se consumindo indiscriminadamente o solo disponível, deixando-se, paralelamente, a degradação avançar nas infra-estruturas e nos equipamentos instalados nos centros urbanos, muitos dos quais se foram desertificando, com a adulteração das condições de vida locais.
A razão para tal forma de gestão dos solos resultou de diversos factores, dos quais se salientam: a falta de planos ou a existência de planos desactualizados; a compartimentação entre organismos da administração central e o distanciamento entre aqueles, a administração local e os administrados; a apatia da Administração face ao desrespeito pelas disposições legais e regulamentares, designadamente das constantes nos planos em vigor; a inadequação dos mecanismos destinados a assegurar a participação/colaboração das populações; a ausência de estímulos e de enquadramento normativo ao planeamento municipal e à protecção do património natural e edificado; e a inoperância dos dispositivos destinados a promover a salvaguarda do património natural.
Os governos do PSD, em face desta situação, procederam a uma reforma profunda da legislação urbanística, concebendo-a na sua globalidade e de forma a concretizar uma política de ordenamento do território com êxito, adequada à sociedade em que vivemos e aos novos valores urbanísticos, patrimoniais, ecológicos, culturais e sociais que se pretendem preservar.
Porque se tratava de uma situação de «quase vazio» em matéria de planeamento territorial e porque a concretização de uma política de ordenamento do território não se traduz em resultados imediatos, a curto prazo, o governo social-democrata optou por definir uma política capaz de produzir resultados eficazes, no mais curto espaço de tempo, estruturada em três vectores fundamentais: impedir a continuação do ritmo e a expansão da delapidação de recursos que vinha ocorrendo através da concretização de uma política de salvaguarda; apostar na cobertura completa do território nacional por planos de ordenamento ao nível do município e assumir a responsabilidade sobre parcelas críticas do território cuja importância justificava uma actuação integrada de nível supramunicipal; criar coerência verbal em todo o sistema de ordenamento do território, articulando os processos de transformação imediata do solo com o processo de planeamento.
Para a prossecução dos objectivos definidos, o Governo assentou a sua estratégia na elaboração de um pacote legislativo que contemplasse os três vectores da política adoptada.
Subjacente aos diplomas elaborados, podem referir-se como princípios comuns os seguintes: desburocratização administrativa assente na transparência e simplificação processual; desconcentração de competências, de forma a tornar o processo mais expedito e a decisão mais próxima da realidade e a facilitar a oportunidade de diálogo entre a administração central, as autarquias e as populações; demarcação clara de competências entre os dois níveis da Administração dentro do actual quadro político e institucional, entrando, portanto, em linha de conta com a existência de um poder local autónomo e democrático, com competências e responsabilidades próprias; garantia da defesa dos interesses públicos e privados; garantia da participação da população nos processos de planeamento e gestão, de modo a atrair a própria sociedade civil no sentido da interiorização da disciplina do ordenamento do território; consagração de uma nova filosofia de planeamento, tornando-o operativo, flexível e adaptando-o ao actual estatuto da administração local, à conveniência de institucionalizar a consulta às populações e à orgânica do Governo; garantia de que o processo de planeamento constitui um lodo coerente e claro, liberto, o mais possível,
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de subjectivismos na elaboração, apreciação e aprovação dos planos, garantindo às populações a devida consideração dos seus anseios e vontades e ao Governo a sua adequação ao interesse nacional, constituindo ainda, para o município, um enquadramento correcto para a sua estratégia de desenvolvimento.
O Governo tem-se empenhado em definir os instrumentos da política que consubstanciam esta nova filosofia de intervenção em matéria de ordenamento do território. Cada um desses instrumentos fundamentais, de cariz legislativo, constitui uma peça chave na arquitectura do modelo global adoptado. São disso exemplo os muitos diplomas aprovados pelo governo do PSD, como os que referiu aqui o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, e, por isso, me abstenho de os repetir exaustivamente, sublinhando apenas, pela sua importância, os planos regionais de ordenamento do território e os planos municipais de ordenamento do território, bem como o Regime dos Loteamentos Urbanos e Obras de Urbanização, o Regime de Licenciamento Municipal de Obras Particulares e o Código das Expropriações.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Conforme o referido no Programa do XII Governo Constitucional, o ordenamento do território é um verdadeiro imperativo nacional, que o PSD defende e que importa prosseguir; o ordenamento do território é a base do desenvolvimento; o ordenamento do território é uma política interdisciplinar e integrada, que tem por objectivo um desenvolvimento harmonioso das regiões e uma racional utilização do espaço.
A política de desenvolvimento é indissociável da política de ordenamento do território, apresentando-se o espaço cada vez mais como um vector estratégico de desenvolvimento.
Assim, parece inevitável a subordinação da política de ordenamento do território a uma política urbana. Como principais razões justificativas desta estratégia referem-se: a debilidade do sistema urbano português; as implicações espaciais decorrentes da concretização do plano de desenvolvimento regional; a definição e o impacte das redes transeuropeias; a necessidade de criar redes de centros de excelência que se possam constituir como sistemas articulados capazes de aumentar a competitividade das regiões e do País no seio da Comunidade; e a consolidação de uma estratégia nacional de desenvolvimento regional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nos últimos anos, como já referiu o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, e eu próprio nesta minha intervenção, procedeu-se a uma revisão profunda do quadro legal vigente referente ao ordenamento do território e, acima de tudo, lançaram-se as bases de uma verdadeira política de ordenamento do território com expressão substancial na elaboração dos planos directores municipais e de planos regionais.
Mas temos de reconhecer que há muito ainda a fazer para se dispor de uma autêntica política de ordenamento do território em Portugal. Importa prosseguir esta política fundamental para o País, como é a política de ordenamento do território que o PSD defende e o Governo vai continuar a executar.
Assim, durante a VI Legislatura e durante o mandato do actual Governo importa avançar com os seguintes objectivos: elaboração e aprovação da lei de bases do
ordenamento do território; promoção de planos especiais para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, com grande prioridade à viabilização dos bairros clandestinos recuperáveis, envolvendo as respectivas autarquias locais e fazendo intervir directamente o Estado, quando necessário; a protecção das zonas sensíveis de elevado interesse ecológico ou cultural; a protecção do litoral através de uma coordenação eficaz das várias intervenções nele existentes; a revisão das disposições legais relativas à avaliação de impactes ambientais, alargando o seu âmbito de aplicação e os mecanismos de audição pública; a revitalização dos espaços rurais, evitando a desertificação e a degradação do património rural e defendendo os solos agrícolas como uma reserva estratégica do País.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Para o PSD o ordenamento do território tem como objectivo último o proporcionar aos Portugueses uma maior e melhor qualidade de vida, promovendo para tanto, uma racional gestão dos recursos naturais, a protecção do ambiente, a defesa e a recuperação do património arquitectónico e cultural e a preservação das zonas de elevado interesse paisagístico e ecológico. O PSD defende uma pedagogia para envolver e aproximar a sociedade civil da cultura do ordenamento do território. Porque ao assumir uma adequada política de ordenamento do território a sociedade portuguesa estará no presente a garantir e a assegurar as condições que viabilizem um futuro colectivo de maior qualidade, como refere o Programa do Governo. O PSD faz votos para que no futuro haja uma maior e melhor cooperação entre a administração central, as autarquias, os agentes económicos, as instituições da sociedade civil e os cidadãos em geral, para uma eficaz e coerente política de ordenamento do território em Portugal, para que esta lenha sucesso.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É este o nosso projecto, é esta a nossa missão, é isto o que os Portugueses esperam de nós, por isso vamos continuar a cumprir, mudando Portugal para melhor.
(O Orador reviu).
Aplausos do PSD.
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques da Costa.
O Sr. Marques da Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, o Sr. Secretário de Estado há momentos, num instante menos inflamado, mas talvez por isso mais genuíno, não deixou de reconhecer que a situação, referindo-se ao Sr. Deputado André Martins, não era tão grave. Implicitamente reconheceu que ela é grave. E o problema de que aqui lhe quero falar é, de facto, bastante grave.
Há cerca de 20 anos foi criado o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) e o balanço dos objectivos que hoje se faz da criação desse parque é claramente medíocre. Até a sua própria classificação foi posta em causa. As últimas albufeiras hidroeléctricas construídas são exemplo de algumas dessas razões. Os próprios serviços a quem foi competindo preservar a região introduziram espécies exóticas que alteraram equilíbrios e habitais. As utilizações indevidas do Parque não foram devidamente prevenidas.
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Mas acresce a tudo isto que as próprias populações que o habitam foram tratadas como parte menor, a quem não se concedeu prioridade para a criação de condições de fixação na área do próprio Parque. Essas populações foram hostilizadas. Foi-lhes dificultado, sem compensação eficaz, o exercício das suas actividades produtivas tradicionais. Muitas indemnizações que lhes são devidas estão por pagar. Não há estímulos sérios à necessária construção de habitações tradicionais.
A desertificação do parque é uma realidade côa consequência quase irreversível e um dos mais graves atentados ao equilíbrio entre o homem e o ambiente, que esse Parque procurava testemunhar.
É necessário traduzir em acção concreta a consciência de que são necessários novos instrumentos que reconheçam que a função de conservação é uma nova tarefa nacional e que entre esses novos instrumentos são de primeira importância aqueles que reconhecem explicitamente a existência e a necessidade de permanência das populações residentes e activas no interior das áreas protegidas. As populações locais são um recurso insubstituível na tarefa de conservação. Devem ser colaboradores e agentes da conservação e não ser apenas considerados, como o faz o Governo, como prevaricadores potenciais que imporia disciplinar sem critério.
Mas para lhes incutir esse espírito de cooperação na preservação do seu próprio Parque é necessário assegurar, em primeiro lugar, a justa compensação por prejuízos ou falta de rendimentos associados à função de conservação e o atempado pagamento dessas mesmas compensações. Nada disso faz o Governo. O princípio de indemnização aos proprietários de terrenos situados em zona de protecção integral, de forma a compensá-los pela perda de rendimentos, tem de ser clara e inequivocamente assumido. E o que houver a indemnizar tem de ser pago sem atrasos, que são um agravo às populações privadas dos rendimentos pelos quais vão ser compensados.
É urgente ter uma política que promova uma acção social concertada em favor da preservação e da reabilitação do PNPG, envolvendo o parque, as populações, as autarquias, as universidades e os centros de investigação. Não é ao Estado que cabe o papel de único fiscalizador e actor da política de ambiente. Mas é indiscutível que é a ele que cabe clarificar e atribuir os custos decorrentes da protecção do ambiente e estimular a acção dos actores privados. Nesta missão o Governo tem falhado sistematicamente.
A política de insucesso, de laxismo e desrespeito pelo PNPG e pelas necessidades das populações que o habitam não pode continuar se se quiser salvar o Parque no seu equilíbrio entre o homem e a natureza.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, aproveitava para referir que o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território há pouco não respondeu a duas questões que lhe coloquei e que estão relacionadas com a participação do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais na ratificação dos planos directores municipais e dos serviços do ambiente nas comissões de acompanhamento.
Sr. Secretário do Estado, V. Ex.ª falou no regime da ocupação de solos percorridos por incêndios. Recordava-lhe - hoje já não dá tanto dinheiro - o que foi o lobby dos eucaliptos nos governos do PSD. É que no decreto-lei diz-se que «nos terrenos com povoamentos florestais percorridos por incêndios ficam proibidas pelo prazo de 10 anos, a contar da data do fogo», referindo-se, depois, o que fica proibido, e uma dessas proibições refere-se à introdução de espécies exóticas. Mas, de seguida, no n.º 2 deste artigo, estabelece-se que «a proibição referida no número anterior apenas pode ser levantada mediante despacho conjunto dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território, da Agricultura, Pescas e Alimentação e do Ambiente e Recursos Naturais, sobre pedido fundamentado dos interessados em que se demonstre, nomeadamente, que o incêndio da propriedade em causa se ficou a dever a causas fortuitas».
Sr. Secretário de Estado, a questão que lhe coloco é a seguinte: uma vez que os tribunais não tem julgado quem tem provocado incêndios florestais, isto significa que qualquer proprietário que tenha terrenos que sejam percorridos pelo fogo pode sempre ultrapassar o que está expresso neste decreto-lei?! É esta, um pouco, a legislação que tem sido feita e que dá os resultados que dá.
E agora, Sr. Presidente, se me permite, irei produzir a minha intervenção.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Ao contrário da concepção e estratégia política que tem estado subjacente à acção do governo do PSD, Os Verdes consideram não só que o ambiente é um elemento estruturante em qualquer política de desenvolvimento, com forte pendor qualitativo, mas também que o ordenamento do território é um instrumento de base indispensável à harmonização da actividade do homem com a natureza.
Assim, e embora geralmente a opinião pública associe mais os problemas ambientais à poluição e à sobreexploração dos recursos naturais, o que é facto é que as principais causas dos desequilíbrios ambientais resultam de uma ocupação desordenada do território, da degradação dos padrões de povoamento e de um incorrecto uso dos espaços.
Nesta perspectiva, não podíamos hoje deixar de analisar os efeitos nocivos que para o ambiente e o desenvolvimento do nosso país resultam da incorrecta política de ordenamento do território, conduzida pelo governo do PSD.
Como pano de fundo desta política, assistimos, de ano para ano, a uma crescente desertificação e despovoamento do interior e, como contrapartida, a uma concentração de população e actividades económicas no litoral do País.
Os efeitos desta situação não resultam, como muitas vezes se tem pretendido fazer crer, do preço que temos de pagar pelo desenvolvimento. A génese da sua razão é, antes, indissociável das concepções economicistas que tem como objectivo primeiro o crescimento a qualquer preço e a obtenção do maior lucro possível no menor espaço de tempo.
Um dos exemplos mais gritantes desta política em Portugal tem sido a opção industrialista, a partir de um processo de florestação indiscriminada com espécies de crescimento rápido, que progressivamente tem substituído a floresta de uso múltiplo, ocupado solos com aptidão agrícola e provocado a sua erosão, tornando-se principal factor de desertificação biofísica. Se esta tem sido uma das razões do despovoamento e da desertificação do mundo rural, uma das causas mais poderosas que lhe está
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subjacente releva de uma total ausência - de condições e incentivos ao desenvolvimento harmonioso do País.
A conjugação destas situações - plantação indiscriminada de eucaliptos, erosão dos solos e desertificação humana - é a causa iniludível da crescente calamidade que representam os fogos florestais. Os dados são elucidativos: de 1956 a 1985, a área eucaliptada passou de 58 000 para 405 000 ha e, em 1991, a eucaliplização cobre uma área de 600 000 ha. Ao mesmo tempo, e para que não restem dúvidas na relação causa-efeito, se em 1989 arderam em Portugal 104 000 ha, em 1990 a área ardida ultrapassou os 129 000, tendo até Outubro de 1991 sido destruídos pelo fogo mais de 160 000 ha, dos quais 116 000 eram área de povoamento florestal.
Se nestes últimos anos a opção foi plantar eucaliptos, não olhando a como nem onde, para obter lucros rápidos e fáceis, hoje, quando a indústria da pasta de papel está em crise e já poluiu em demasia o ar que respiramos e a água que nos ajuda a viver, importa que o Governo, principal responsável desta política, responda qual é a porta de saída, sabendo nós que importamos cerca de 70 % do consumo alimentar e que a contribuição dos eucaliptos para o equilíbrio da balança comercial já foi chão que deu uvas. Se esta situação provoca desequilíbrios ecológicos graves no mundo rural, eles estendem-se, com idênticas proporções, aos meios urbanos do litoral, onde se concentram já 75 % da população do território continental.
No litoral do País, com particular destaque para as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, a ocupação desordenada do território tem sido o maior factor de degradação do ambiente urbano, com inerentes repercussões na qualidade de vida e na saúde de quem aqui vive e trabalha. A concentração crescente de actividades económicas e de população nos meios urbanos do litoral tem provocado o crescimento anárquico e a descaracterização das cidades, bem como de toda a importante e sensível faixa costeira do País, situação que, tendo o seu início mais notório no Algarve, alastra hoje por toda a costa portuguesa.
As cidades e meios envolventes têm vindo a transformar-se em aglomerados urbanos descaracterizados, onde a situação ambiental atinge níveis altamente preocupantes. Os efeitos mais significativos da poluição atmosférica e do ruído, resultantes, designadamente, da actividade industrial, do trânsito automóvel e dos aviões, embora mais directamente sentidos ou detectados em determinadas horas e locais, são produzidos a longo prazo e, por isso, mais facilmente observáveis, em muitos casos, nos estragos que provocam na natureza ou nos edifícios do que na lenta deterioração que causam à saúde humana.
A expansão urbana tem-se feito em grande parte à custa da ocupação de solos de elevado potencial agrícola, por via de um crescimento de subúrbios e cidades dormitórios, através da implantação de grandes centros comerciais, pelo declínio dos centros como zonas residenciais, em favor de actividades comerciais e administrativas especializadas, e, ao mesmo tempo, pela invasão de trânsito congestionado, auto-estradas urbanas e arquitectura uniforme e medíocre, tanto no centro, como na periferia. Esta é a outra face da medalha da opção economicista, que encontra no ambiente e no ordenamento do território as falsas razões de um conflito que o governo do PSD não quis deliberadamente assumir, mas que só não é resolvido por falta de vontade política.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, a falta de uma correcta política de ordenamento do território tem-se ainda manifestado no desordenamento resultante da aplicação do conhecido Plano. Rodoviário Nacional, no qual primeiro se definem os traçados, depois se iniciam as obras e finalmente se elaboram os estudos de impacte ambiental e onde o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais se limita a dizer que tomou conhecimento. Destes factos são celebérrimos exemplos a construção da via longitudinal do Algarve, a auto-estrada Lisboa-Cascais e alguns troços da auto-estrada Lisboa-Porto. Importa perguntar, a este propósito, como vai ser quanto à nova travessia do Tejo.
É, no entanto, sabido que estão a ser realizados planos directores municipais por todo o País. Mas, ao tomar esta decisão acertada, o Governo não quis deixar, mais uma vez, de marginalizar o ambiente do seu acompanhamento e do seu parecer final na ratificação dos planos. Como ponto de honra de todo este processo, as autarquias locais, que tem revelado grande compreensão da importância dos planos directores municipais para o desenvolvimento integrado dos territórios que administram, por não terem cumprido os prazos apertados que o Governo lhes impôs e por estes não terem sido alargados, vêem-se hoje na situação de não poderem beneficiar dos fundos comunitários, por birra do Governo.
Através desta política avessa à descentralização e à adopção de medidas e instrumentos fundamentais à prossecução de um desenvolvimento integrado e sustentável, têm-se acentuado as assimetrias regionais e hipotecado o nosso futuro comum, tendo como exemplos mais significativos a concentração urbano-industrial numa estreita faixa do litoral, a consequente desertificação humana e biofísica de todo um interior cheio de potencialidades, que está a ser explorado de forma degradante, a destruição de grande parte de toda a orla costeira do País, a degradação de recursos essenciais à vida, como a água, o solo, a flora e a fauna, e o aumento dos impactes negativos, causados por concepções meramente utililaristas de indispensáveis infra-estruturas viárias.
Terminamos, naturalmente, com mais um desafio ao Governo: assumam hoje, perante a Assembleia da República e o País, que tudo isto vai ser alterado, que se vai fazer um plano de ordenamento dos espaços florestais, que se vai incentivar a fixação no meio rural, que se vai implementar uma correcta política de ordenamento do território a nível nacional, regional e local, que se vai proceder, finalmente, à rápida instituição das regiões administrativas.
A Sr.ª Lourdes Hespanhol (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, posso desde já satisfazer uma das suas pretensões, esclarecendo-o que o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais é parte nas decisões das comissões técnicas de acompanhamento. Se V. Ex.ª ler a portaria que hoje foi enviada para publicação no Diário da República, a qual ratifica o Plano Director Municipal de Beja, verá a assinatura do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, que participou na decisão de ratificação desse plano. Mas isso é apenas uma questão formal!
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O Sr. André Martins (Os Verdes): -A lei não foi alterada!
O Orador: - Mas, Sr. Deputado, esse decreto-lei foi aprovado e promulgado antes da vigência da Lei Orgânica do Governo, portanto, antes de ter sido criado o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Não foi, Sr. Secretário de Estado!
O Orador: - Peço desculpa por discordar, mas veja as datas, Sr. Deputado!
Na verdade, o Decreto-Lei n.º 69/90, embora tendo sido publicado em Março de 1990, foi aprovado ainda em 1989. Estou a falar de cor, pois não tenho aqui elementos, mas o Sr. Deputado, que os tem, pode verificar se estou a falar correctamente.
Nessa altura, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais ainda não existia, mas agora, como é óbvio, ele tem de participar em lodo o processo de decisão. Nem pelo meu espírito passaria outra ideia! É evidente que o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais tem de participar em muitas decisões, tal como acontece, actualmente, também em relação ao Ministério do Mar. O Sr. Deputado terá oportunidade de confirmar o que digo, quando vir a portaria que ratifica o Plano Director Municipal de Beja, publicada no Diário da República. O mesmo acontecerá também, dentro de poucos dias, com a portaria relativa ao Plano Director Municipal de Vila Real de Santo António.
Quanto à ocupação de terrenos percorridos por incêndios, gostaria de dizer que o Governo proeurou fazer uma inovação ao adoptar essa medida de política, aliás ratificada por esta Assembleia da República, com emendas.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - A Assembleia já tinha avançado com essa proposta há muito tempo!
O Orador: - Foi ratificada por esta Assembleia, com emendas e, neste momento, os preceitos que o Sr. Deputado André Martins referiu ainda estuo em vigor. Quanto ao despacho, de nunca foi utilizado, pelo que não há necessidade de levantar a questão.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Gomes, que dispõe de tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. João Paulo Gomes (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: O rio Cávado constitui, com todo o seu sistema biológico, um bem natural de importância fundamental para ioda a região, nomeadamente em dois aspectos a realçar - o económico e como fonte de lazer e recreio.
Na sua vertente económica deve considerar-se, em primeiro lugar, a fauna de um rio que, ainda há bem pouco tempo, era rico em peixes de alto valor económico e que hoje já desapareceram totalmente ou estão em regressão muito rápida.
Como fonte de energia, este rio foi e é muito importante. Em todo o sistema fluvial do Cávado (o próprio rio e seus afluentes) situa-se um dos conjuntos mais importantes de centrais hidroeléctricas, responsável pela produção de grande parte de energia que se consome no Norte de Portugal. Refiro-me concretamente às centrais do Alto Cávado, Paradela, Pisões, Vilarinho das Fumas, Venda Nova, Salamonde, Caniçada e Penide.
Mas, para além de ainda ser uma grande atracção turística por proporcionar a prática de desportos náuticos, o bem económico mais elevado do Cávado é, sem dúvida, a própria água, quer como elemento fundamental da agricultura da região, quer como instrumento de produção do parque industrial, quer ainda como fonte de abastecimento domiciliário.
É, no entanto, como meio de produção fabril e como fonte de abastecimento de água ao domicílio que alcança a sua maior importância e utilidade pública. Além de servir de abastecimento de água de várias dezenas de unidades produtivas industriais, é a principal fonte de abastecimento de água ao domicílio dos grandes aglomerados urbanos que se situam nas suas margens.
É um bem tão rico como este que, infelizmente, está a ser inexoravelmente destruído.
O factor principal desta destruição é, sem dúvida, a poluição das águas que resulta dos esgotos urbanos e dos efluentes industriais, sobretudo das tinturarias. Não obstante os esgotos das redes urbanas terem grandes quantidades de lixívias, sabões, etc. que são bastante prejudiciais, a maior parte dos efluentes urbanos são biodegradáveis, pelo que são os efluentes industriais os principais responsáveis pelo estado moribundo em que se encontra o rio Cávado, fazendo perigar, como facilmente se depreende, a saúde pública.
Com efeito, só o parque industrial de Barcelos debita em média 400 1/segundo de efluentes agressivos. Se a este valor se acrescentarem os cerca de 250 1/segundo de efluentes industriais e urbanos que Braga lança directamente nas suas águas, compreende-se que se ainda alguma vida existe no Cávado da deriva apenas do saudável fluxo e refluxo das marés na sua zona estuariana.
Recentes trabalhos, de indiscutível idoneidade, referem que são lançados no rio, em média diária, os seguintes produtos: 2 a 3 l de detergentes; 20 a 25 t de cloreto de sódio; 2 a 3 t de lixívias; l a 2 t de soda cáustica; 2 t de água oxigenada; 2 l de corantes, essencialmente constituídos por componentes organometálicos, abundantes em metais pesados como sejam o cádmio, mercúrio, chumbo e ainda os vulgarmente conhecidos corantes directos, que mais não são do que benzidinas, derivados do benzeno que, quando combinados com o cloro, originam substâncias altamente cancerígenas.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A situação exposta não é recente, pelo que assume aspectos extremamente graves. Aliás, a presente problemática, e por solicitação da Assembleia Municipal de Esposende, já conduziu à deslocação, em 1989, da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente desta Assembleia ao rio Cávado, do que resultou um relatório da mesma, onde se refere, inequivocamente, o «grave perigo para a saúde pública ocasionado pelas águas do rio Cávado, muito especialmente com as descargas de efluentes industriais muito próximas das captações».
Mas, perante esta triste realidade, que contraria frontalmente a tão propalada modernidade e envergonha a sistematicamente referida democracia de sucesso, e não obstante as inúmeras denúncias da mesma, quer pelo poder autárquico, quer pela sociedade civil junto da Administração Central, a passividade desta mantém-se, pactuando, voluntária ou involuntariamente, neste indiscutível atentado ao ambiente.
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No entanto, se tivermos em consideração as recentes declarações de um alto responsável da Direcção-Geral de Hidráulica do Douro, entidade que deveria fiscalizar o estado das águas do Cávado, entende-se a actual situação, porque ninguém actua contra os violadores do ambiente e da qualidade de vida das populações. Perante o facto de as empresas continuarem a poluir, sem regras, e não sofrerem quaisquer penalizações, declara aquela individualidade que «c caso, os empresários podem desinteressar-se do projecto da ETAR. Temos garantias de que as pessoas estão a colaborar e, por isso, a aplicação das multas não tem lógica». Brilhante, simples e eficaz!
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Podemos permitir que, no nosso País, onde desejamos que haja progresso e desenvolvimento, uma direcção-geral, para além de não fazer cumprir a legislação vigente, passe um atestado de menoridade a essa legislação?
A não serem tomadas drásticas medidas na sua defesa, entre outras a aplicação da lei e a criação, já anteriormente preconizada, do Gabinete de Gestão da Bacia Hidrográfica do Rio Cávado, o mesmo morrerá como elemento vivo da natureza, destruindo-se um precioso bem natural de valor económico incalculável.
Todos conhecem os casos do Ave, Alviela e Leça. Por este caminho, também o Cávado entrará neste rol de rios inúteis, até que alguém se resolva a remediar a destruição que as gerações actuais estão a fazer. E depois, Sr. Ministro, que investimento financeiro será necessário? Entretanto, a que males e que se sujeitaram as populações? E, finalmente, que consequências incontroláveis não se terão repercutido noutros elementos da natureza?
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Srs. Deputados, vamos passar ao período destinado ao encerramento do debate.
Para uma intervenção final, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Hoje, o ambiente subiu a Plenário, tendo assim, por iniciativa de Os Verdes, o tempo maior e a oportunidade, até agora inédita, de marcar encontro com o seu-Ministro!
Encontro esse para que, da realidade vivida à realidade falada, se fizesse o balanço, e este foi feito! Não o balanço de hoje ou de ontem, mas, sim, de sete anos ao longo dos quais, sozinho, o PSD e Governo e Poder nesta área - não o balanço da forma, mas, sim, do conteúdo.
Quanto à forma, essa foi assumindo invariáveis variantes, ao sabor do engenho, temperamento e arte de quem a moldou: numa época marcada pela imagem de ecologismo verbalista, noutra pelo militantismo fundamentalista e noutra, ainda, pelo distanciamento tecnocracista.
Épocas que, de um ou outro modo, mantêm como traço comum, a apropriação do discurso ecologista que começava, então, a surgir e a ganhar novos ímpetos, para o banalizar e tentar esvaziar o conteúdo na essência das reivindicações, críticas e propostas muitas das quais trazidas por nós, Os Verdes, a esta Assembleia.
Um constante recurso às justas aspirações dos cidadãos que um pouco por todo o lado nasciam, para delas fazer demagógico discurso, colorido ao sabor da moda, mas que ao cinzentismo da realidade não resiste. Realidade da qual o PSD fala, como convém, em tom distanciado e douto aliás, de quem do exercício do poder parece não querer partilhar as responsabilidades.
Sc diz, como o fez o Sr. Primeiro-Ministro, aquando do debate do Programa do Governo, que o PSD tem sido responsável pelo crescimento da consciência ecológica dos Portugueses, isso é verdade, mas não resulta, certamente, do facto de ela ter sido, como porventura julgará, por si decretada, mas porque a deterioração e a degradação passou já a produzir efeitos directos e claramente identificados com o quotidiano das pessoas e a constituir problema cuja vivência próxima para o despertar da consciência ecológica naturalmente contribuiu.
Problemas dos mais variados, no ar que respiramos, no ruído a atordoar-nos, nos engarrafamentos sem fim, naquilo que consumimos, na poluição do olhar, na desumanização e violência de um quotidiano em que a qualidade e o bem-estar são palavras sem sentido!
Problemas gerados por incorrectas concepções de crescimento, ou seja, por um crescimento anárquico em que a regra de facturar o máximo no tempo mínimo foi a única admissível.
Um crescimento do litoral que se baseou numa industrialização e urbanização selvagens, gerando gravíssimos desequilíbrios e assimetrias, num país de 10 milhões de pessoas, onde cerca de 7 milhões se concentram no litoral entre as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
Um País que se vai desertificando progressivamente no seu interior, invadido por floresta intensiva que vai degradando os solos, provocando erosão e expulsando pessoas que, cada vez mais, tentam na emigração a sobrevivência que da terra lhes não vem em resultado da política seguida; uma terra que, sem regra, vai sendo invadida de pesticidas, pondo em risco a saúde pública e a diversidade genética; um mundo rural em vias de extinção também ele, com consequências profundas na perda do nosso património natural, ambiental e cultural.
Uma realidade a provar-nos que não estamos numa fase assim tão avançada de política integrada de ambiente - como se dizia com optimismo irresponsável no relatório de Portugal à Conferência do Brasil, para Europa ver - nem passada a fase intermédia da prevenção, mas antes, e ainda muito modestamente, a marcar passo na fase primeira: a da correcção de situações a que, em boa verdade, nem mesmo se está a corresponder eficazmente.
De facto, como é que se pode ousar falar em política integrada de ambiente quando ainda hoje há comunidades que boicotam eleições porque nem as mais elementares necessidades básicas, em termos do direito à vida e ao ambiente, estão resolvidas, como, por exemplo, a povoação de D. Maria, a escassos quilómetros de Lisboa, bem provou.
Como falar em política integrada de ambiente, quando durante largo período essa política consistiu em atacar autarquias, perseguir fumadores, encerrar boites, promover a bicicleta - de que, aliás, somos partidários - em campanhas de duvidosa eficácia para promoção de detergentes verdes?
Como falar de política integrada quando se elabora um Plano Rodoviário Nacional, definindo percursos e acessos de vias e criando pólos de crescimento sem qualquer estudo rigoroso e sem diálogo dos ministérios e outras partes envolvidas, como aconteceu, por exemplo, no traçado da serra dos Candeeiros.
Como falar de política integrada de ambiente, quando a saúde e a toxicologia ambiental ainda não existem como áreas curriculares do ensino universitário e a surdez é em
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Portugal a segunda doença profissional, ilustrando bem o que é a qualidade, a segurança e o ambiente de trabalho.
Como falar de política integrada, quando o ambiente e a agricultura não se enquadram numa mesma estratégia e as opções de uma contrariam frontalmente os objectivos da outra?
Como falar em política integrada quando, evocando o segredo de Estado, se conjura e implanta um campo de tiro numa das mais importantes reservas naturais, a do estuário do Tejo, e se projecta já numa das mais ricas zonas arqueológicas do País, em Mértola, um campo militar?
E se assim é também aqui o que o Governo Português designa por 2.ª geração de política ambiental está longe da realidade. A prová-lo estão os planos, as leis, os projectos, os programas orçamentais que, invariavelmente, constam e transitam dos documentos oficiais desde 1986 designados por: ora em estudo, ora em elaboração, ora em vias de conclusão, ora prontos, ora em vias de publicar. Isto é, em variações terminológicas que a leitura dos relatórios da então Secretaria de Estado e do actual Ministério vão fielmente registando como ao longo deste debate provámos.
Promessas em cadeia, repetidas sem fim, com o despudor de quem parece não ter vergonha na cara! A realidade essa fala por si, traduzindo a incapacidade de um governo fora da lei, num Estado dito de direito!
Um ambiente agredido a que, numa óptica de prevenção, se não pode pretender responder com a mera aplicação do princípio do poluidor-pagador como se fosse a panaceia para todos os males, sem cuidar da especificidade do tecido sócio-económico e despojando de relevo ético toda e qualquer agressão ambiental.
E falar de prevenção como, quando tanto ainda está por fazer? Desde logo, pelo desconhecimento real do estado do ambiente e das actividades que lhe causam ou são susceptíveis de causar danos que resulta da inexistência de um banco de dados sobre o ambiente. Medida cuja concretização é inseparável do efectivo direito dos cidadãos à informação em matéria de ambiente, nomeadamente o acesso àquela que é detida por organismos com responsabilidades públicas, sem a qual a participação dos cidadãos fica limitada.
Prevenção que terá de passar por uma nova relação baseada na cooperação, apoio e diálogo que envolva todos os agentes do processo, desde os agentes económicos aos cidadãos, passando pelas autarquias e pelas associações.
Prevenção que terá de resultar da veiculação de novos valores, novas atitudes, da sensibilização a partir da escola através da educação ambiental, da maior intervenção do INAMB e da própria valorização do papel das associações.
É exactamente da resolução de todos os problemas que ao longo do debate aqui foram trazidos que o próprio objectivo do desenvolvimento sustentado a atingir globalmente terá de passar, em cada país e em Portugal.
Um desenvolvimento que já não pode, de forma ultrapassada, pretender exprimir-se por crescimento bruto, mas terá de ser sinónimo de bem-estar, de qualidade e de equilíbrio; um desenvolvimento que não comprometendo o amanhã, atenda às necessidades de hoje; um desenvolvimento assente numa nova relação dos homens com a natureza, mas também dos homens entre si e que tenha implícita uma nova atitude ética; um desenvolvimento que ponha fim à exploração dos recursos naturais, que preserve o equilíbrio, a justiça e a solidariedade, que respeite a natureza e a sua bio-diversidade.
Um desenvolvimento que transporte, por analogia, para a comunidade - de que o homem é parte integrante - esses mesmos valores, num futuro que terá de passar em Portugal pela protecção dos rios, das paisagens, das florestas, da fauna, da flora e do meio ambiente, mas também um futuro que terá de significar e não esquecer as pessoas que dele fazem parte.
Desenvolvimento esse que garanta o emprego, para que dele se não faça razão de emigração e desertificação; que elimine o analfabetismo e a pobreza que, como manifestações de subdesenvolvimento, estão associadas à degradação ambiental; que garanta a qualidade ambiental porque dela depende a saúde; a justiça para que o desequilíbrio se não gere; que garanta não a ausência da guerra, mas uma paz que implique necessariamente a transferencia de recursos para a protecção do ambiente e o desenvolvimento, em vez de os desperdiçar em fins militares.
Um desenvolvimento auto-sustentado que nos obriga a reflectir no modo como vivemos, como produzimos, como consumimos. E que tem, por isso mesmo, para além das questões ambientais e tecnológicas, uma dimensão cultural, que implica tomada de decisões e participação democrática de todos. Não formal, mas vivida, ou seja, uma democracia directa e participada.
Esperemos que agora, no preciso ano em que toda a comunidade internacional vai de novo reunir-se para discutir o futuro colectivo, o Governo não se feche às propostas nem se limite a declarar que nada de original aqui foi trazido.
Srs. Deputados, hoje fez-se um balanço no debate que promovemos. A vivacidade do debate, a profusão de propostas, a imensidão de problemas provou a oportunidade da iniciativa do Grupo Parlamentar Os Verdes.
Um debate, que veio evidenciar muitos problemas mas também apontar caminhos; um debate em que fizemos perguntas, muitas das quais ficaram por responder, como, por exemplo, a relacionada com a lei da água e do ambiente, sobre a articulação dos projectos e prazo da sua apresentação e discussão; sobre o plano nacional de política do ambiente e sobre qual a metodologia que vai ser adoptada para a sua discussão; sobre os resíduos tóxico-perigosos...
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr.ª Deputada, solicitava-lhe que terminasse a sua intervenção, pois temo que a lista seja muito grande.
A Oradora: - Cabe agora ao Governo, que dos problemas tem sido responsável - mau grado o Sr. Ministro ter querido rejeitar a herança passada -, tomar as decisões que lhe cabem.
Quanto a nós, iremos continuar a apresentar propostas e projectos e, por isso, aproveito para anunciar a esta Câmara as iniciativas que vamos apresentar: uma relativa à proposta de realização de um debate parlamentar acerca dos temas da Conferência Mundial da ONU sobre Ambiente e Desenvolvimento;...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso também o Governo vai fazer!
A Oradora: -... outra sobre a alteração da lei das associações de defesa do ambiente; um projecto de lei quadro sobre as áreas protegidas; projectos de lei sobre o acesso dos cidadãos aos dados sobre o ambiente, sobre a criação de um promotor ecológico, para a utilização de
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papel reciclado, também com vista a fazer reverter parte das coimas das contravenções ambientais para o INAP - Instituto Nacional do Ambiente e ainda sobre o crime ecológico.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção final, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de entrar propriamente no tema do debate, gostava de esclarecer o Sr. Deputado José Sócrates quanto a algumas insinuações e, mesmo, afirmações menos correctas feitas sobre a minha posição política.
Limitar-me-ei a dizer que, além das deturpações jornalísticas que foram feitas sobre uma frase tirada de contexto, nunca se pôs em causa - nem eu nunca pus em causa, também - a minha identificação com a política do PSD. O que justifica não só a aceitação do primeiro convite do Sr. Primeiro-Ministro como o agradecimento da sua reiterada confiança no XII Governo.
Aplausos do PSD.
A sua intervenção leva-me, também - com o espanto irreal que mereceu uma questão de tão pequena importância -, a pensar que se fosse com o PS a situação seria exactamente a oposta. Isto e, enquanto o PSD mostra que e um partido que congrega valências - todas elas -, e que o Sr. Primeiro-Ministro está aberto a isso, no caso do PS, como se infere das suas palavras, essa aceitação nunca aconteceria.
O Sr. José Sócrates (PS): - Nós não precisamos, Sr. Ministro!
O Orador: - À abertura do PSD corresponde o afunilamento político do PS.
Aplausos do PSD.
Obviamente que nem me merecem qualquer comentário as referências à dualidade: perfil técnico/perfil político. A actuação e os resultados, quer ao nível nacional quer internacional, demonstram que é um falso problema e que, talvez, apenas a constatação da falta de conhecimentos técnicos do Sr. Deputado e a tentativa de politizar o discurso possa justificar essa dualidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Certamente que, e agora entrando dentro do assunto em debate, compete ao Governo compatibilizar o desenvolvimento económico, velando pela perenidade dos valores naturais e ambientais como suporte vital e pelos interesses dos agentes económicos como geradores de riquexa e condição de bem-estar.
Para isso, identificaram-se os grandes problemas internacionais e nacionais no Ministério. Foi feito o diagnóstico e apresentámos os objectivos da política do ambiente do XII Governo Constitucional, aliás na lógica de que esta era a minha primeira intervenção como Ministro neste Plenário - porque as comissões já fui pelos menos quatro vexes - e, além disso, em termos de diálogo nunca nos temos furtado enquanto equipa governativa. Estamos aqui quase de 15 em 15 dias para responder às questões que nos são colocadas. Sc não vim antes - note-se - foi porque nenhum partido político invocou a figura regimental que implicasse a presença do Ministro, o que até pode significar concordância com a política do Governo.
Quanto às medidas concretas que aqui nos foram pedidas, relativamente ao ano de 1992, elas decorrem das Grandes Opções do Plano. Quem as leu com calma, com certeza veria quais são. No entanto, tenho muito gosto em concretizá-las e, acima de tudo, porque me foi aqui pedido, vou dividi-las em três grandes domínios só para que não haja dúvidas.
A primeira e de âmbito estrutural. Além da implementação das direcções regionais que referi, há toda a necessidade de avançar com a implementação do Instituto Nacional da Água. Este ano teremos no domínio legislativo o novo quadro jurídico para o litoral, assim como o princípio do poluidor-pagador e do utilizador-pagador; no domínio nacional e administrativo temos a regulamentação do impacte ambiental.
Quero ainda esclarecer aqui duas coisas, porque me parece que os Srs. Deputados não chegaram a perceber quando, há pouco, referi que o impacto ambiental era, no domínio do saneamento básico, para as autarquias e, no domínio da legislação ambiental, para as indústrias. Portanto, não estamos aqui a separar.
Além disso, organizar a comissão nacional contra a poluição do mar, assim como as estruturas do acordo de Lisboa, são iniciativas para este 1.º semestre.
Faremos ainda o lançamento do programa de educação ambiental até Junho e reforçaremos a rede nacional da qualidade do ambiente para facilitar o conhecimento real do País e, ao mesmo tempo, permitir que a informação chegue a todos os cidadãos.
Portanto, este reforço já começou, pelo que, em termos nacionais, é mais do que suficiente para demonstrar que estamos alentos às preocupações e que temos propostas concretas e reais para fazer.
Quanto à política europeia e mundial, fiquei admirado que só na fase final do debate alguém se tivesse lembrado da Presidência e da Conferência do Brasil. Fiquei admirado, porque pensei que a nossa actuação era de tal modo correspondida pelos partidos da oposição que não havia críticas a fazer. Só na parte final ouvi essas críticas.
Felizmente, na Presidência da Comunidade conseguimos que fosse feita a apresentação do V Programa e conseguimos a aprovação de várias directivas. Refiro, por exemplo, a do CFC para demonstrar o empenhamento que tivemos, assim como também conseguimos que a directiva de trânsito de resíduos fosse, de facto, aprovada na sua componente externa, ficando apenas em discussão a componente interna. Isto significa que vamos ter de avançar no próximo Conselho de Ministros com uma discussão alargada sobre este assunto.
Quanto à preparação da Conferência do Brasil, temos mantido a liderança da Comunidade Económica Europeia, tal como se devia fazer em todo o processo do Rio de Janeiro e nas suas várias vertentes, quer das convenções, quer da declaração sobre as florestas, tendo sido já aprovados, durante a Presidência portuguesa, os 70 milhões de dólares para o apoio ao programa piloto da floresta amazónica, que aqui foi tão discutida e que ninguém se lembrou desta particularidade, assim como incluímos na declaração da floresta a questão da floresta mediterrânica.
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Foi sob proposta da Presidência portuguesa que ela foi incluída na 4.ª Pré-Con, para a preparação da Conferência do Rio de Janeiro, tal como a declaração de desertificação, que também aparece por apoio da Comunidade Europeia.
Meios financeiros, cooperaçâo tecnológica, alterações institucionais das Nações Unidas, tudo isto tem sido a grande preocupação da Presidência portuguesa e o Conselho informal do Estoril foi o ponto fundamental para que este consenso fosse criado e, ao mesmo tempo, reconhecida pelos nossos parceiros a necessidade deste diálogo.
Continuamos a trabalhar com muito realismo, pragmatismo, usando a credibilidade ganha e tentando os consensos possíveis.
Ao nível nacional, existe um grupo de trabalho que tem vindo a promover acções. Todo o financiamento e até os locais foram disponibilidades pelo Ministério, significando isto que não temos grandes problemas para garantir que a sociedade civil participe.
Quanto a questões pontuais aqui apresentadas, se me permitem, não vou entrar outra vez no detalhe, mas limitar-me-ei apenas a dizer que basta olhar para o nosso PIDDAC para perceber onde é que vão ser investidos os dinheiros do ambiente nas questões concretas, como, por exemplo, o rio Cávado, a ria de Aveiro, Alviela, etc., assim como a necessidade de adoptar os instrumentos de planeamento correctos por parte das autarquias, quo é um ponto fundamental.
Isso quer dizer que temos dado, de facto, cada vez mais, uma especial atenção aos princípios da prevenção e da solidariedade.
Entende o Governo que o verdadeiro problema que tem para resolver não é de facto, como pretendia aqui fazer crer o Partido Ecologista Os Verdes, o tipo de sociedade que queremos construir, mas, mais do que isso, a gestão dos recursos, visto estarmos num planeta e num país onde os recursos suo finitos. Sendo assim, o que exactamente pretendemos saber é o crescimento que ainda podemos ter ou, melhor dizendo, o crescimento sustentável adequado para Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Srs. Deputados, está encerrado o debate da interpelação ao Governo n.º 2/VI
A nossa próxima reunião plenária terá lugar na próxima quinta-feira, dia 2 de Abril, às 15 horas, que terá como ordem do dia a discussão das propostas de resolução n.ºs 4 a 8/VI, inclusive.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 10 minutos.
A proposta de lei contida no pedido de autorização legislativa do Governo aponta para a regularização de alguns imigrantes, mas tornará impossível a regularização de muitos outros.
Aquele pedido de autorização legislativa inclui outras medidas, ou omissão das mesmas, as quais não posso subscrever, tais como seja a possibilidade de colocar os expulsandos em «centros próprios» ou a ausência de verdadeiras garantias de recurso relativas às decisões não favoráveis de regularização de imigrantes.
Não posso, por isso, co-responsabilizar-me pela não regularização de muitos desses imigrantes, designadamente cabo-verdianos, com as consequentes expulsões que tal facto implica.
Empenhar-me-ei, nos estritos termos da lei, na regularização do maior número de imigrantes que for possível.
A Deputada do PS, Celeste Correia.
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação do voto n.º 18/VI
Este voto do PSD sobre o Dia Mundial do Teatro afirma: «Sem actores e sem público não há teatro». Certo! Tento, no entanto, que as medidas do Governo, em nome abusivo do público, tendam a acabar com os actores.
No ano passado, 87 pessoas assinaram pela política do Dr. Santana Lopes, em vésperas de eleições. Mas não muitas centenas.
Tanto bastou para o PSD, tão ávido de reconhecimento cultural, chamar a isso «reconhecimento das medidas oficiais na área da cultura».
A política do PSD e do Governo no campo do teatro é quantitativa onde devia ser qualitativa (relação público/criações) e falsamente qualitativa onde devia ser quantitativa (distribuição de subsídios).
Particularmente preocupantes são as declarações da Sr.ª Directora do Teatro de D. Maria II que compara Passa por mim no Rossio, com Minetti, de Rui de Carvalho, para concluir que o caminho do teatro passa pela primeira, que dá lucro e não pela segunda.
Acho que a solução passa pelas duas e por muitas outras.
Finalmente, resta-me dizer que, para alem das medidas avulsas e arbitrárias que criam uma situação de expectativa e de angústia, a SEC não tem política para o teatro, como confessa, aliás, a Subsecretária de Estado Maria José Nogueira Pinto.
Abstenho-me no voto do PSD, mas associo-me às palmas e aplausos às gentes do palco e da ribalta.
O Deputado independente, Mário Tomé.
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação da proposta de lei n.º 22/VI
Tenho-me batido de há longo tempo a esta data, ao lado de personalidades, igrejas, sindicatos e numerosas organizações humanitárias e cívicas de todos os quadrantes da sociedade portuguesa, pela regularização justa e respeitadora dos direitos humanos para os imigrantes ilegais.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António José da Mola Veiga.
António Maria Pereira.
Delmar Ramiro Palas.
Dinah Serrão Alhandra.
Elói Franklim Ribeiro.
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Fernando Cardoso Ferreira.
Fernando Gomes Pereira.
João de Oliveira Martins.
José Alberto Puig Costa.
José Ângelo Correia.
José Bernardo Falcão Cunha.
José Freitas Costa Leite.
José Pereira Lopes.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Castro de Almeida.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Passos Coelho.
Vítor Manuel Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
António José Martins Seguro.
João António Gomes Proença.
João Maria Meneses Ferreira.
Joaquim Fialho Anastácio.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Almeida Coelho.
Luís Filipe Madeira.
Partido Comunista Português (PCP):
Apolónia Maria Teixeira.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Ana Paula Matos Barros.
António Correia Vairinhos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Fernandes Martins.
João Álvaro Poças Santos.
Joaquim Fernandes Marques.
José Reis Leite.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Simões Marques.
Maria Leonor Beleza.
Maria Manuela Aguiar.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto de Oliveira e Silva.
Armando Martins Vara.
Carlos Manuel Costa Cabral.
Jorge Fernando Sampaio.
José Rodrigues dos Penedos.
Júlio Miranda Calha.
Raul Fernando Costa Brito.
Rogério Conceição Martins.
Partido Comunista Português (PCP):
Lino Marques de Carvalho.
Miguel Urbano Rodrigues
A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.
Depósito legal n. º 8818/85
E. P.
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