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Sexta-feira, 22 de Maio de 1992 I Série - Número 66
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE MAIO DE 1992
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutas.
Deu-se conta titia diplomas entrados na Mesa.
oram aprovadas quatro pareceres da Comissão de Regimento e Mandados, sendo o primeiro relativa à substituição de Deputados do PS e do PCP e do outros denegando autorização para Deputados do PSD e do CDS deporem em tribunal.
O Sr. Presidente deu conta de um cartão enviado pela viúva de Salgueiro Maia, agradecendo o voto aprovado pela Câmara.
O parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que não considerou procedente o recurso de admissão, apresentado pelo PCP, do projecto de lei n.º 174/VI - Lei da Greve (CDS), foi aprovado, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Margarida Silva Pereira (PSD), Laurentino Dias (PS), Nogueira de Brito (CDS), Mário Tomé (Indep.) e Jerónimo de Sousa (PCP).
Na abertura do debate da interpelação n.º 5/VI - Sobre politica geral, com incidência na solidariedade institucional e do cumprimento das competências do Governo da República quando às Regiões Autónomas (CDS), intervieram o Sr. Deputado Minuta Coissoró (CDS) e o Sr. Ministro Adjunto (Marques Mendes), seguindo-se-lhes no uso da palavra, a diverso título, além dos Srs. Secretários de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota), Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro) e dos Transportes (Jorge Antas), os Srs. Deputados José Magalhães e Alberto Martins (PS), Guilherme Silva (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Manuel Queiró (CDS), Marques da Silva, Rui Ávila (PS), Mário Maciel e Manuel Azevedo (PSD), Casimiro Tavares (CDS), Cecília Catarino (PSD), Narana Coissoró (CDS), Mário Tomé (Indep.) e José Reis Leite (PSD).
A encerrar o debate, intervieram o Sr. Deputado Nogueira de Brito (CDS) e o Sr. Ministro Adjunto.
Entretanto, foi aprovado o voto n.º 23/VI - De congratulação pela designação, em assembleia geral da UCCILA, da cidade de Díli como membro honorário da União das Cidades Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas, apresentado por todos os grupos parlamentares.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 30 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Sousa e Silva.
dérito Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Maios Barros.
António Barbosa de Melo.
António Barradas Leilão.
António Correia Vairinhos.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernandes Alves.
Amónio Germano Sá e Abreu.
António Paulo Coelho.
António Santos Pires Afonso.
Aristides Alves Teixeira.
Arlindo da Silva Moreira.
Armando Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gaia da Silva.
Carlos Duarte Oliveira.
Carlos Lopes Pereira.
Carlos Lélis.
Carlos Manuel Gonçalves.
Carlos Oliveira da Silva.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Domingos José Soares Lima.
Duarte Rogério Pacheco.
Eduardo Pereira da Silva.
Elói Franklin Ribeiro.
Ema Maria Lóia Paulista.
Fernando Cardoso Ferreira.
Fernando Correia Afonso.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Gomes Pereira.
Fernando Marques de Andrade.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Bernardino Silva.
Francisco Fernandes Martins.
Guido Orlando Rodrigues.
Guilherme Rodrigues Silva.
Hilário Azevedo Marques.
Isilda Maria Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Duarte.
João do Lago Mola.
João Granja da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Maios.
João Salgado.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo Roque da Cunha.
José Alberto Puig Costa.
José Augusto Silva Marques.
José Bernardo Falcão Cunha.
José Borrcgana Meireles.
José de Almeida Cesário.
José Freitas Costa Leite.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Correia.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário Lemos Damião.
José Reis Leite.
Leonardo Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Antero Cunha finto.
Manuel Azevedo.
Manuel Baptista Cardoso.
Manuel Casimiro de Almeida.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Costa Andrade.
Manuel Lima Amorim.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Marques.
Maria Conceição Rodrigues.
Maria da Conceição Pereira.
Maria de Lurdes Póvoa Costa.
Maria Fernanda Dias Cardoso.
Maria Helena Ramos Mourão.
Maria José Barbosa Correia.
Maria Leonor Beleza.
Maria Luísa Ferreira.
Maria Manuela Aguiar.
Maria Margarida de Sousa.
Marília Dulce Pires Morgado.
Mário Belo Maciel.
Melchior Pereira Moreira.
Miguel Bento Macedo e Silva.
Miguel Fernando Relvas.
Nuno Delerue Alvim de Matos.
Olinto da Cruz Ravara.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Miguel.
Virgílio de Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Alberto Domardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Bettencourt.
Antero Paiva Vieira.
António Alves Martinho.
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Amónio Correia Campos.
António Crisóstomo Teixeira.
António da Silva Braga.
António de Almeida Santos.
António Domingues Azevedo.
António José Martins Seguro.
António Marques Júnior.
António Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ribeiro da Silva.
Armando Martins Vara.
Artur Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite Marreiros Estrela.
Eduardo Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Manuel Costa.
Fernando Pereira Marques.
Guilherme de Oliveira Martins.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Ferraz de Abreu.
João Maria Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Fialho Anastácio.
Joel Eduardo liasse Ferreira.
Jorge Lacão Cosia.
Jorge Paulo Almeida Coelho.
José Almeida Leilão.
José Apolinário Portada.
José Eduardo Reis.
José Ernesto dos Reis.
José Gameiro dos Santos.
José Manuel Magalhães.
José Rodrigues dos Penedos.
José Sócrates de Sousa.
Júlio da Piedade Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Leonor Coutinho Santos.
Luís Capoulas Santos.
Luís Filipe Madeira.
Manuel Alegre Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Sampaio.
Raúl Pimenta Rêgo.
Rogério Conceição Martins.
Rosa Maria Albernaz.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui Machado Ávila.
Rui Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião.
António Simões de Abreu.
Apolónia Maria Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia.
Lino Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Vítor Manuel Ranita.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Casimiro da Silva Tavares.
José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria Almeida Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira Cunha.
Deputados independentes:
Mário Baptista Tomé.
Raul de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados, o Sr. Secretario vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e Coram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 267/VI - Estabelece normas relativas ao sistema de propinas, que baixou à 8.ª Comissão; projecto de lei n.º 150/VI - Lei Quadro de Apoio às Associações (PS), que baixou à 3.ª Comissão; projecto de lei n.º 151/VI - Medidas de simplificação formal nas relações jurídico-contratuais (PS), que baixou à 3.ª Comissão; inquérito parlamentar n.º 5/VI - Apreciação dos critérios de avaliação e processos de privatização das empresas nacionalizadas (PCP); projecto de resolução n.º 25/VI - Criação de uma comissão eventual para a revisão da Constituição (PSN); projecto de resolução n.º 26/VI - Assunção de poderes de revisão constitucional pela Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se a substituição dos Srs. Deputados Emanuel Jardim Fernandes, do PS, para o período de 21 de Maio corrente a 4 de Junho próximo, inclusive, por Marques da Silva; Teresa S anta Clara Gomes e José Mota, do PS, por um período não interior a 15 dias, com início a 21 de Maio corrente, respectivamente pelos Srs. Deputados Antero Gaspar de Paiva Vieira e Rosa Maria Albernaz, e Domingos Abrantes, do PCP, por António Abreu.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido n votação, foi aprovado por unanimidade.
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Para dar conta de mais três relatórios da Comissão de Regimento e Mandatos, tem a palavra o Sr. Secretário João Salgado.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Cultural da Comarca do Porto, 2.ª Secção, a Comissão de Regimento e Mandatos emitiu parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Rui Carp a prestar declarações como testemunha num processo pendente nesse Tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal de Polícia de Lisboa, 2.º Juízo, 1.ª Secção, a Comissão de Regimento e Mandatos emitiu parecer no sentido de não autorizar a suspensão do mandato do Sr. Deputado Correia Afonso a fim de comparecer num processo que corre seus termos no referido Tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, 2.º Juízo, 2.ª Secção, a Comissão de Regimento e Mandatos emitiu parecer no sentido de não autorizar a suspensão do mandato do Sr. Deputado Nogueira de Brito a tem de comparecer no processo que corre seus termos no referido Tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, nos termos regimentais, vou ter um cartão, que recebi da Sr.ª D. Maria Natércia da Silva Santos Salgueiro Maia:
Sr. Presidente da Assembleia da República, pelo presente agradeço a V. Ex.ª o voto de pesar pelo falecimento de meu marido, bem como as palavras proferidas na sessão em que o mesmo foi expresso. Muito grata ficaria a V. Ex.ª se pudesse dar conhecimento deste meu agradecimento a todos os Srs: Deputados.
Antes de entrarmos na primeira parte da ordem do dia, que vai versar um recurso para o Plenário, quero fazer uma saudação especial a um conjunto de meninos da Escola Primária de Figueira, que se encontram nas galerias e são meus conterrâneos e vizinhos, e as suas professoras, particularmente à Sr. D. Olga Arlete, que atinge este ano - suponho - o limite do tempo de ensino, através da qual saúdo todas as professoras e professores, e são muitos em Portugal que se deslocam para as terras graníticas ou não graníticas e a elas dão o melhor da sua vida.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, passamos à apreciação do recurso interposto pelo PCP da admissão do projecto de lei n.º 147/VI (CDS) e, nos termos regimentais, vamos lê-lo e votá-lo. No entanto, será dispensada a leitura se nenhum dos Deputados a requerer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, penso que, para uma melhor consciencialização da Câmara, o texto deve ser lido.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que um Sr. Deputado o requer, vai ser lido, para o que darei a palavra ao Sr. Secretario João Salgado.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte teor:
1 - Porque, em nosso entender, condicionadores do exame jurídico que se segue, sublinham-se alguns traços do actual direito do trabalho português.
É um direito que se vem desenvolvendo a partir de normas constitucionais e ordinárias vastas, por vezes minuciosas, mas cuja sedimentação jurisprudência! e doutrinária se acha ainda muito incipiente.
Esta incipiência condiciona em boa medida o intérprete e mesmo o próprio legislador - independentemente do nível ou âmbito da matéria a interpretar e dificulta-lhes a tareia.
A falta de sedimentação dogmática de muitos dos conceitos com que o direito da greve opera, e a carregada penetração ideológica que lhes é própria, obrigam, pois, a cautelas adequadas na detecção, do sentido das opções normativas.
Uma interpretação de índole acentuadamente literal-positivista é sempre de rejeitar, assim como convirá ler presente a evolução histórica dos conceitos que se vão manuseando.
Cautelas que, na medida do possível, se terão presentes ao longo do parecer.
2 - As finalidades a prosseguir com a greve - É desde logo objecto de apreciação o n.º 1 do artigo 1.º, que define a greve como «abstenção total e concertada da prestação de, trabalho por um conjunto de trabalhadores com o objectivo de promover ou defender os seus interesses sócio-profissionais».
Nem o artigo 57.º da Constituição nem a Lei da Greve em vigor se ocuparam da definição jurídica desta e muito menos do recorte da sua finalidade. Esta opção vem ao arrepio da legislação imediatamente anterior, o Decreto-Lei n.º 392/74, de 27 de Agosto, o qual afectava o exercício da greve à «defesa e protecção dos interesses colectivos profissionais dos trabalhadores».
Numa clara rejeição deste princípio, o legislador constituinte baniu referências mais pormenorizadas.
Isto não evita, contudo, o recorte dos limites às finalidades da greve.
Assim: ela não poderá colidir com interesses e direitos fundamentais constitucionalmente protegidos; não poderá igualmente lazer periclitar a organização política do Estado, as suas estruturas instituições.
Fora destes aspectos que fazem secante à figura do abuso do direito de greve, a doutrina tem vindo a desenvolver-se em duas direcções.
Uma é o pensamento de acordo com o qual a greve pode ser utilizada para defender ou prosseguir, em geral, os direitos económicos dos trabalhadores, mesmo que transcendam o campo socioeconómico das organizações a que pertencem e envolvidas no processo.
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A outra é a tese que postula uma ligação entre a greve e a autonomia colectiva. Assim, o exercício do direito à greve viria a circunscrever-se aos interesses a defender pelo sindicato.
A verdade é que em ambos os casos se aceita que a conexão funcional entre o direito de greve e os interesses sócio-profissionais dos trabalhadores se verifica, quer quando estão em causa as condições de trabalho a praticar nas relações de trabalho que lhes dizem respeito, quer quando se trate de outros interesses dos trabalhadores.
Este alargamento do âmbito do entendimento dos interesses sócio-profissionais articula-se, alias, com a concepção hoje maioritariamente aceite de que as funções sindicais não se confinam a inaniria estritamente profissional.
É assim que mesmo a tese aparentemente mais estrita de Bernardo Xavier vem aceitar a licitude, por exemplo, de greves políticas e de solidariedade - claramente alheias à disponibilidade do empregador.
Ora, não se retira do preceito do n.º 1 do artigo 1.º do projecto uma conclusão avessa a esta doutrina. Convém sublinhar a diferença entre a expressão por ele utilizada: «promover ou defender interesses sócio-profissionais» e a do velho Decreto-Lei n.º 392/74.
Assim, não parece sustentável que uma correcta interpretação da disposição em causa restrinja o sentido constitucional da amplitude dos motivos de greve.
3 - A greve na função pública - O artigo 3.º do projecto remete para legislação especial «o exercício do direito à greve dos trabalhadores da função pública».
É, aliás, o que sucede com o artigo 12.º da Lei da Greve em vigor.
A diferença entre os dois preceitos reside no facto de o actual artigo 12.º enfatizar, em número autónomo, a garantia do direito à greve na função pública.
Tem sido considerações de oportunidade política e a concretização do princípio da igualdade aplicado aos trabalhadores que levam a admitir, em muitos ordenamentos jurídicos, a greve na função pública.
Esta permissão, a que Portugal adere na lei vigente em homenagem as razoes apontadas (e entre as quais se sublinha o princípio constitucional da igualdade) não é posta em causa pelo artigo 3.º do projecto, embora fosse de ponderar uma sua melhor precisão.
A especificidade da Administração Pública dita, ela própria, as características da regulamentação da greve em questão, o que justifica a dualidade de tratamentos legais.
4 - Greve de empresa (artigo 5.º) - Contrariamente à lei em vigor, o projecto vem considerar necessária a deliberação de greve pela assembleia de trabalhadores, sempre que o respectivo âmbito se defina por referência a uma única empresa (n.º 1 do artigo).
Este preceito vinca o carácter individual do direito à greve, cujo recorte jurídico é, no direito português, de grande subtileza.
Na verdade, a greve apresenta hoje, na lei, níveis colectivos e níveis individuais.
O direito de declarar greve identifica-se com uma permissão genérica de o fazer, a que subjaz a liberdade de associação e de expressão.
O direito de fazer greve é já um direito potestativo de adesão à declaração de greve.
O caminho de uma maior autonomia pessoal face aos sindicatos não infringe o texto constitucional.
Não pode extrair-se da Constituição um monopólio sindical de declaração da greve, como sucede relativamente à contratação colectiva (artigo 56.º, n.º 3).
5 - Pré-aviso (artigo 6.º) - A Lei da Greve institui a figura do pré-aviso (artigo 5.º), cujo prazo mínimo é de quarenta e oito horas e atinge em certos casos os cinco dias.
Se é certo que este requisito do pré-aviso não é universalmente consagrado e representa tendência contrária à de várias outras ordens jurídicas, não o é menos não representar ele num coarctar do exercício do direito de greve.
A diferença essencial entre a lei em vigor e o projecto, nesta maioria, reside no alargamento dos prazos do pré-aviso. Discutível no plano doutrinário, não é sustentável uma limitação ao exercício do direito a greve por esta via.
é - Negociações prévias (artigo 8.º) - Alarga o projecto o prazo do pré-aviso para oito dias, sempre que a deliberação do recurso à greve se insira em processo tendente à defesa ou promoção dos interesses colectivos profissionais dos trabalhadores envolvidos. Este alargamento do prazo não vulnerabiliza o exercício do direito à greve.
Nem, obviamente, se reconduz a um qualquer dever de paz social. Parece estar-lhe subjacente uma ideia de boa fé negocial, que - pese a discutibilidade da solução - assim se pretendeu juridificar.
7 - Serviços mínimos (artigo 10.º) - A delimitação dos serviços mínimos tem em conta a «satisfação de necessidades sociais básicas» e é exemplificativa a enumeração das empresas que se entendem prestadoras dos mesmos.
A normalização dos «serviços mínimos» não é isenta de escolhos. Terá sido Pera, em Lo sciopero nei pubblid servizi (Riv. Dir. Lav., 1978, h. 241) quem melhor os recortou: «Serviços utilizáveis pela generalidade das pessoas f...l cuja funcionalidade é inerente à salvaguarda de bens primários destinados a prevalecer sobre a autotutela de categoria.»
O objectivo essencial nestes casos é evitar que a satisfação de necessidades sociais impreteríveis sofra perigo e assim se possa afectar interesses básicos da comunidade.
Independentemente da bondade da solução técnico-jurídica encontrada, parece ser esta filosofia que preside à redacção dos artigos 10.º e 11.º do projecto.
8 - Piquetes de greve (artigo 12.º) - Restringe-se a liberdade de circulação dos piquetes de greve às áreas exteriores à empresa.
O problema de saber qual o âmbito geográfico de actuação dos piquetes de greve está longe de ser pacífico, designadamente na doutrina portuguesa.
Vêm-se afirmando como limites constitucionais à sua actuação os casos em que contendam com a liberdade de trabalhar dos trabalhadores que não aderiram à greve (situação que o artigo 12.º assegura). E discute-se a possibilidade da sua actuação dentro da própria empresa.
A falta de legislação adequada tem dificultado a dogmatização do tema.
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Mas, sendo cena a possibilidade de o empregador vedar, em circunstâncias normais; o acesso de trabalhadores a algumas zonas da empresa (nomeadamente a serviços que lhes não compilam) não se vislumbra como sustentar o impedimento de piquetes nessas circunstâncias.
E de nenhum modo parece haver aqui violação de norma constitucional - sem prejuízo da avaliação político-legislativa que se faça da norma.
9 - Proibição de substituição de grevistas (artigo 13.º). Reporta-se aos casos limite de sobrevivência da empresa ou de prestação de serviços mínimos. Trata-se de razões de interesse geral (concretamente: a subsistência de uma sede laboral e a satisfação de necessidades sociais indiscutíveis) que justificam actuações adequadas.
Este recrutamento de trabalhadores é claramente assumido como uma última ratio.
10 - Eleitos da greve (artigo 4.º) - Aponta-se o carácter incompleto do preceito, mas não se lhe encontram regras que ficam a constitucionalidade.
11 - Formas ilícitas de greve (artigo 16.º) - O projecto vem considerar ilícita a chamada «greve trombose».
A «greve trombose», como outras figuras atípicas de greve, não se reconduz directamente ad arquétipo legal da greve, entendida como suspensão da prestação laboral.
Trata-se de um tipo de conduta desviada do modelo clássico da greve, sempre ilegítima quando se verifique manifesta desproporcionalidade entre os prejuízos causados e os efeitos pretendidos.
Mas numa valoração do sistema jurídico que lhe procure a «normalidade social» deixará estas situações de fora, pelo que não é clara a inconstitucionalidade.
Aliás, o artigo 16.º do projecto ao utilizar a expressão «desorganização do processo produtivo» parece ter em vista uma situação limite de greve trombose, qual seja, aquela em que há nítida infracção ao princípio da proporcionalidade entre Os objectivos que os trabalhadores prosseguem com a greve e os prejuízos causados à empresa. E uma greve violadora do princípio da proporcionalidade é, segundo a melhor doutrina, ilícita em qualquer caso.
12 - A requisição civil opera-se, segundo o artigo 17.º do projecto, nos termos habituais.
13 - O artigo 18.º do projecto ostenta deficiências técnicas notórias. Assim:
1.º Reconduz ao conceito de termo da greve os casos de requisição civil, que consubstanciam uma realidade jurídica completamento diferente;
2.º A sua alínea c) é completamente imperceptível.
Com efeito, afirma-se que a greve termina «pela prestação de trabalho [...]» o que configura uma situação em que o fenómeno de greve nem sequer pode ser iniciado. Aliás, o próprio artigo 1.º do projecto, ao definir a greve, aponta a necessidade de um corpus, ou seja, de uma efectiva abstenção da prestação de trabalho.
Desta forma deveria fazer-se uma interpelação rolante desta alínea c), caso se tratasse de norma em vigor.
Conclusão: Não se detectando, numa apreciação para os efeitos do artigo 130.º do Regimento, no projecto de lei n.º 147/VI as alegadas inconstitucionalidades, o recurso não ser deverá considerar procedente.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz, de Abreu.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de acordo com o Regimento, cada grupo parlamentar pode, se assim o desejar, produzir uma intervenção de duração não superior a três minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu diria que, de facto, a leitura deste parecer, numa determinada parte.- até é bastante elucidativa, porque o CDS, no seu projecto de lei, querendo tapar tudo, acabou por tudo destapar.
Efectivamente, o projecto de lei do CDS não garante a greve quando o texto constitucional diz que é garantido o direito à greve dos trabalhadores. Aliás; na medida em que dizem que a requisição civil põe termo à greve, está tudo dito! O que os senhores pretenderam foi neutralizar o exercício, do direito de greve. Mas como tenho muito, pouco tempo e as inconstitucionalidades são tantas que dariam para uma intervenção mais extensa, lerei de restringir-me as questões fundamentais.
Disseram-nos, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que a Assembleia da República não deveria inviabilizar iniciativas legislativas e que, portanto, a apreciação da inconstitucionalidade seria apenas provisória, sem se entrar «em grandes considerações. Mas eu diria que este projecto de lei tem alguns artigos- que apresentam inconstitucionalidades grosseiras, que não podem passar o Sr. Deputado Narana Coissoró sabe-o bem; mas enfim, faz parte do seu papel e escusa de levantar as mãos ao ar - pela peneira da Assembleia da República.
É como se estivéssemos aqui a discutir um parecer sobre um projecto de lei de um Deputado monárquico, no qual se. propunha que houvesse um monarca no País com a alegação - diria, PSD de que, da iniciativa legislativa, podia sair um monarca nascido da família do PSD; simplesmente; chamar-se-ia Presidente da República.
Efectivamente, o n.º 1 do artigo 1.º do projecto de lei do CDS é clara, manifesta e grosseiramente inconstitucional!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - E eu recomendaria aos Srs. Deputados do PSD que não estiveram cá na última revisão constitucional, é que, portanto, podem não ter tido os trabalhos da Comissão Eventual, para a Revisão Constitucional, que lessem o debate que nessa Comissão, se fez sobre uma proposta apresentada pelo PSD de alteração ao artigo 57.º da Constituição, que era, como disse na altura a representante do PSD, nitidamente para que fossem proibidas as greves políticas, porque o PSD reconhecia que, por exem-
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plo, as greves políticas eram permitidas por esse artigo. O PSD agora acha que isto não é de facto uma inconstitucionalidade.
Mas é! O artigo 57.º da Constituição nem sequer autoriza o legislador a restringir o direito a greve mas tão-só que legisle descobrindo, e não criando, os limites imanentes ao direito à greve, quando estejam em colisão com interesses constitucionalmente protegidos.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exactamente!
A Oradora: - Ora, o artigo 57.º diz que só os trabalhadores podem definir o âmbito da greve. Permite, por exemplo, as greves políticas, as greves de solidariedade e não admite que se proíbam as greves intermitentes ou as greves de «trombose».
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Deputada, queira concluir, pois já ultrapassou o tempo regimental.
A Oradora: - Em conclusão e de uma forma resumida, o projecto de lei do CDS - e ative-me nomeadamente a este primeiro artigo - viola a garantia do direito à greve, consagrada constitucionalmente, nos artigos em que proíbe a entrada dos piquetes de greve no interior da empresa, nos artigos em que diz que silo entidades, como comissões de utentes, etc.,...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Deputada, queira concluir.
A Oradora: -... a definir os serviços mínimos e naqueles em que permite u admissão de pessoal do exterior para substituir os grevistas.
Há mais artigos em que essa garantia é, efectivamente, violada e, por isso mesmo, a Assembleia da República que hoje, ao que parece, vai aprovar o parecer com os votos favoráveis do PSD, não garante o cumprimento da Consumição em relação a este projecto de lei que os senhores querem discutir à pressa, mas que não passará despercebidamente!
Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.
A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao pronunciar-se pelo indeferimento do recurso de admissão do projecto de lei sobre a greve, apresentado pelo CDS, o Partido Social-Democrata pretende sublinhar com toda a clareza alguns aspectos.
Em primeiro lugar, o facto de se viabilizar a discussão por esta Câmara do referido projecto de lei não significa que o PSD deixe de salvaguardar a sua posição quanto ao diploma na sua globalidade e quanto a cada uma das suas disposições em particular.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ficamos muito descansados!
A Oradora: - Muito provavelmente elas suscitar-nos-ão objecções, críticas e no momento próprio, ou seja, aquando da discussão do diploma, isso será devidamente
apreciado. Não e um diploma nosso, e um diploma cuja discussão viabilizamos!
Em segundo lugar, o que emendemos õ que o projecto de lei do CDS não comum disposições cujo entendimento seja absoluta e inequivocamente contrário ao texto constitucional.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado!
A Oradora: - Concretizando, e porque foi esta a disposição sobre a qual recaiu mais ênfase no momento da discussão na Comissão e ainda hoje no Plenário, somos de parecer de que a noção de greve apresentada comporta, de facto, uma interpretação segundo a qual apenas ficarão excluídas greves que configurem situações de abuso do direito da greve. Quero ser muito precisa: emendemos que esta interpretação de texto apresentado comporta a possibilidade de realização de greves políticas, constitucionalmente admitidas, e de greves de solidariedade, constitucionalmente admitidas também, e í nessa medida que entendemos que esta disposição não colide com o texto constitucional.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
A Oradora: - Em terceiro lugar, e para terminar, vincamos que este juízo de não inconstitucionalidade, que é um juízo prévio, limitado por circunstâncias processuais e temporais, vem possibilitar a troca de ideias nesta Câmara sobre maioria da maior relevância social e da maior dignidade jurídica e será, com certeza, no interesse da opinião pública, dos trabalhadores envolvidos e da própria dignidade do trabalho parlamentar que a viabilização da discussão do projecto em causa se poderá fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PSD): - Fraquita! Nunca chegará a juiz do Tribunal Constitucional!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito deste projecto, já teve o PS oportunidade de dizer publicamente e em traços gerais que matérias com esta importância e relevância em lermos sociais devem ser tratadas nesta Casa com o cuidado de que carecem e, bem assim, com a consciência de que a eventual alteração desta ou daquela lei - e, no caso do projecto de lei do CDS, que é uma revisão completa da Lei da Greve - deve resultar não de quaisquer elucubrações jurídicas dos seus autores ou da oportunidade política do partido que as apresenta mas, sim, de necessidades que a evolução da sociedade vá apontando como sendo passíveis de exigirem a consagração legal de um novo envolvimento e de uma nova evolução social.
Quer parecer-me que, com este projecto de lei, o CDS não se lembrou de que os últimos anos de vida e de relações entre os trabalhadores e os empresários, entre as associações sindicais e patronais em Portugal - que o PSD Cunhem esqueceu no seu habitual discurso -, tem primado por alguma concertação, por alguma paz social.
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Vozes do PSD: - Ah!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Alguma!...
O Orador: - De facto, tem evoluído no sentido de a conflitualidade social ser cada vez menor. Aliás, não há, em Portugal, ao contrário do que acontece noutros países da Europa, surtos dê greve com a conflitualidade e á profundidade a que já assistimos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ainda nem que disse isso!
O Orador: - Assim, Srs. Deputados do CDS e lambem, já agora, pela exposição que acabei de ouvir, Srs. Deputados do PSD, entendemos que não e tempo de rever e de modificar esta Lei da Greve, sobretudo, quando a alteração à aquela que o CDS apresentou e vai querer discutir nesta Assembleia. Desde logo, porque, de facto, ela encerra considerações inconstitucionais.
Não temos muito tempo para depor sobre algumas das considerações, o que era importante fazer, mas queremos deixar aqui dito o seguinte sobre o artigo 1.º deste projecto de lei: a nossa Constituição define claramente que é da competência estrita, rigorosa e exclusiva dos trabalhadores a definição do âmbito da greve ...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O âmbito de interesses!
O Orador: -... e dos interesses a promover. O projecto de lei do CDS vem-nos dizer que a greve se destina e tem como objectivo promover e defender os seus interesses sócio-profissionais.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não percebeu!
O Orador: - Louvo a tentativa habilidosa que o PSD quis aqui deixar de que talvez caiba no âmbito de um texto como este o respeito pelas greves políticas e de solidariedade. Srs. Deputados do PSD, não cabe e não pode caber!
Este texto é bastante claro quando, para o disfarçar, no n.º 2 do artigo 1.º, é reposto o texto constitucional, ou seja, no n.º 1 desse artigo, diz-se que constitui greve o objectivo levado a cabo pelos trabalhadores de promover a defesa dos seus interesses sócio-profissionais, exclusivamente. Mas como, de lacto, este texto é forte demais e é obviamente inconstitucional, o CDS introduziu-lhe um n.º 2 em que repôs o texto da Constituição. É um gato escondido, mas tem, de facto, um rabo - e grande - de fora, que o PSD viu, mas que não quis aqui dizer que tinha visto.
Srs. Deputados do CDS e do PSD, connosco, não contem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não contamos!
O Orador: - Não contem com o PS para violar, a Constituição! Não contem com o PS1 para promover convosco a revisão da Lei da Greve. Não contem com o PS para ofender, assim, os direitos constitucionais dos trabalhadores!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Consigo não contamos. Contamos com os outros!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr, Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cabe-me agora fazer uma curta intervenção e isso não significa, contrariamente ao que foi afirmado pela Sr.ª Deputada Odete Santos, que estejamos a tentar apressar o processo respeitante ao nosso projecto.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Então por que é que querem só 20 dias para a consulta pública?
O Orador: - Sr.ª Deputada, estamos a cumprir rigorosamente o Regimento e vamos ver quando é que realmente teremos possibilidade de apreciar aqui o diploma. Agora, estamos a apreciar o recurso de admissibilidade interposto pelo PCP.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O parecer, Sr. Deputado!
O Orador: - Estamos a apreciar o recurso através de um parecer que foi proferido pela Comissão.
Srs. Deputados, este ó o nosso projecto de lei sobre a greve. Esperemos, porém, que ele venha a transformar-se na nova Lei da Greve, aprovada pela Assembleia da República.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Esperanças vãs!
O Orador: - Será a futura Lei dá Greve aprovada pela Assembleia da República, efectivamente!
É claro que, quando propusemos este projecto de lei, estávamos impressionados com certos episódios recentes da história da greve em Portugal, que tornaram evidente que a regulamentação existente, que é pré-constitucional - porque tem na sua base um diploma anterior á Constituição do 1976 não punha devidamente as coisas no seu lugar e permitia que o direito à greve entrasse em conflito com outros direitos e princípios fundamentais consagrados na Constituição.
E esse claramente o entendimento do PCP, aqui evidenciado pela Sr.ª Deputada Odete Santos, que também é sufragado pelo PS, através da intervenção do Sr. Deputado Laurentino Dias.
É um preconceito obreirista com que alguns ainda lêem a nossa Constituição, mas ela não pode mais ser lida com esse preconceito.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Laurentino Dias (PS): - É respeito constitucional!
O Orador: - Para esses, os que lêem assim a nossa Constituição, ela tem um artigo fundamental, que é o que consagra o direito à greve, e todos os outros são artigos subordinados a este artigo fundamental. Assim, no exercício do direito à greve, pode fazer-se tudo, inclusivamente atropelar o exercício de outros direitos fundamentais constitucionalmente consagrados!
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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Como, por exemplo?
O Orador - Mas não é assim, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.ª Deputada Odete Santos, que entendemos a consagração do direito à greve no artigo 57.º da Constituição. Não è assim que a jurisprudência e a doutrina sobre ele elaboradas tem entendido o direito à greve consagrado nesse artigo. E é natural que, volvidos 15 anos sobre a publicação do diploma original do direito à greve, venhamos apresentar um projecto de lei fundamentalmente inspirado pela necessidade de conciliar o exercício deste direito com outros direitos fundamentais consagrados na Constituição.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Só isso, e mais nada! O princípio da liberdade, o princípio da proporcionalidade, o direito ai) trabalho, o direito a iniciativa, o direito à conservação das empresas, é isto o que queremos conciliar com o direito à greve. Não queremos diminuir esse instrumento, que consideramos fundamental na defesa dos trabalhadores, em nada que não esteja em colisão com outros direitos também fundamentais. É esse o nosso objectivo!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Tem de adequar o texto à sua afirmação!
O Orador: - E o nosso é um diploma correcto nessa perspectiva, ó um diploma constitucional. É que a Constituição fala em greve, mas pressupõe que ela seja definida e ó à legislação ordinária que cabe essa definição.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, faça o favor de concluir, porque já ultrapassou o tempo de que dispunha.
O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
É, por isso, evidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, que há um n.º 1 e um n.º 2 no artigo 1.º do nosso diploma, e eles são perfeitamente conciliáveis. A greve não pode servir para tudo, inclusive para definir interesses que nada tem a ver com os trabalhadores, e é por isso que os n.º 1 e 2 são perfeitamente compatíveis.
Sr. Presidente, é neste contexto que o nosso é um diploma que julgamos tecnicamente perfeito mas que consideramos aberto à discussão e que vai com certeza beneficiar dela e dos contributos que lhe possam dar outros partidos nesta Assembleia.
Estamos convencidos que respondemos a uma necessidade fundamental da sociedade portuguesa e que vamos contribuir para que seja aqui aprovado um diploma fundamental, a nova regulamentação do direito à greve.
Aplausos do CDS.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, dada a gravidade do assunto que está a ser tratado, que colide e tem directamente a ver com todo o funcionamento da nossa sociedade e com a própria Constituição, quero pedir ao Sr. Presidente - até porque os representantes dos grupos parlamentares excederam o tempo de que dispunham beneficiando da benevolência do Sr. Presidente - que me permitisse dizer duas, ou três palavras acerca deste assunto de tão grande importância. É que aquilo que o CDS propõe vai contra o que as sociedades, hoje, no mundo, mais requerem, ou seja, a participação, a democracia, e que sejam os trabalhadores a definir os seus próprios interesses, nomeadamente no âmbito da greve. Não se pode consentir que a greve seja tutelada, que os interesses dos trabalhadores sejam tutelados.
O projecto do CDS quer transformar as empresas numa caserna, não responde, de facto, às necessidades democráticas da nossa sociedade e vê nos trabalhadores a causa de todos os males da sociedade.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, queira concluir, porque V. Ex.ª está a interpelar a Mesa e não o CDS.
O Orador: - Sr. Presidente, considero que este projecto de lei do CDS é inconstitucional e, como tal, não pode ser admitido pelo Plenário desta Assembleia para discussão.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferra/de Abreu): - Para que efeito?
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração da minha bancada, tendo em conta alguns adjectivos usados pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito em relação à nossa posição nesta matéria.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, com certeza que a Mesa lhe concede a palavra, mas solicita-lhe que se limite à defesa da consideração, se pensa que ela foi ofendida. Tem a palavra.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - O Sr. Deputado Nogueira de Brito afirmou que a minha bancada, secundada pela do PS, tinha uma visão obreirista do direito à greve. Consideramos que o Sr. Deputado Nogueira de Brito, mais do que ofender a minha bancada, ofendeu a própria Constituição da República, na medida em que ela, quando definiu o direito à greve, fê-lo não numa posição neutral mas, sim, de defesa dos direitos dos trabalhadores e, quer o Sr. Deputado Nogueira de Brito goste ou não, temos a Constituição que temos.
O senhor, durante a revisão constitucional, tentou alterar esse princípio.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Os senhores votaram contra a revisão!
O Orador: - O PSD, durante a revisão constitucional, tentou alterar esse princípio em relação ao artigo 57.º Porém, não conseguiu os dois terços necessários para o fazer! Então, respeitem a Constituição!
Por último, Sr. Deputado Nogueira de Brito, não voltaremos ao tempo - e o senhor lembra-se bem! -, antes do 25 de Abril, em que fazer greve custava dois a oito
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anos de prisão aos grevistas. Não voltaremos, com certeza, a esse tempo em que o senhor era secretário de Estudo. Continuamos a viver o 25 de Abril numa democracia e o seu projecto, perante a vida e a lula dos trabalhadores, com certeza que não terá sucesso nesta Assembleia da República, ou pelo menos nas empresas, porque os trabalhadores não o aceitarão.
Aplausos do PCP, do Deputado do PS Rui Ávila e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, suponho que V. Ex.ª não ficou ofendido. Tenho a certeza de que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa e o PCP tem uma visão obreirista da Constituição e quando digo isto não os ofendo. Mas essa interpretação não é mais possível, embora o fosse face ao texto constitucional de 1976; ora, esse texto já desapareceu Sr. Deputado! Apesar de tudo o que o Sr. Deputado disse, esse texto já desapareceu, não sendo hoje possível fazer uma interpretação de classe da nossa Constituição:
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O senhor fá-la!
O Orador: - E essa é uma interpretação de classe porque viola o princípio da igualdade, dando a uma classe direitos que não dá às outras, numa concepção de classe que VV. Ex.ªs ainda perfilham.
O Sr. Jerónimo de Sousa. (PCP): - Honra lhe seja feita, porque, tem uma opção de classe!
O Orador: - Assim, Sr. Deputado, é esta a explicação que lhe dou. O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa não foi ofendido com a minha intervenção, nem eu fui ofendido com a sua.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. deputados, está encerrado o debate acerca do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso interposto da decisão do Presidente da Assembleia da República de admitir o projecto de lei n.º 147/VI - Lei da Greve -(CDS), que será votado na hora regimental.
Antes de prosseguirmos os nossos trabalhos, quero chamar a atenção da Câmara para o facto de as nossas galerias se encontrarem hoje «recheadas» com estudantes dás Escolas Secundária Infanta D. Maria I, de Coimbra, Primária de Figueira, de Penafiel, Secundária di) Cadaval, n.º 1 do Cartaxo, Secundária de Passos Manuel, de Lisboa, todos eles acompanhados dos respectivos professores, e ainda com alguns jovens do Núcleo do PSD de Magueija, em Lamego. Para eles, peço a saudação da Câmara.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, vamos agora dar início a interpelação ao Governo n.º 5/VI (CDS), sobre política geral, com incidência na solidariedade institucional e do cumprimento das competências do Governo da República quanto às Regiões Autónomas.
Srs. Deputados, vamos aguardar por alguns momentos, que o Governo dê entrada na Sala.
Pausa.
Para uma intervenção; tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Ministro Adjunto e outros Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero saudar a presença do. Governo nesta interpelação que hoje vai ter lugar, mas não deixo de estranhar - e esta é a palavra mais suave que posso utilizar que não estejam aqui presentes os dois ministros da República para a Madeira é para os Açores.
Vozes do CDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ern primeiro, lugar, porque são eles que representam a soberania nacional nas Regiões Autónomas; em segundo lugar, porque, pelas atribuições que lhes compete são eles os coordenadores, dos, serviços centrais da República na respectiva Região. E, se não tem obrigação de vir cá e mostrar-se perante a Assembleia da República - porque nós nunca os, vimos, apesar de fazerem parte do Conselho de Ministros -, não sabemos, por que é que eles exercem estas funções quase clandestinamente em relação, a esta Assembleia da República e se, porventura, merecem a crítica que as Regiões lhes fazem de que eles são supranumerários na nossa Constituição da República.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os arquipélagos da Madeira e dos Açores constituem, na terminologia comunitária hoje adoptada, duas zonas ultraperiféricas, devido não só à sua posição geográfica mas, sobretudo, às condições económicas e sociais das duas Regiões e das suas, populações. Nestas parcelas de Portugal os problemas de desenvolvimento é de modernização assumem uma gravidade e uma dimensão de tal modo excepcionais que as colocam na própria fronteira de todos os índices e indicadores vigentes dentro da República, e, do próprio espaço comunitário.
Trata-se de regiões insulares, espaços isolados, caracterizados por situações dê desigualdade e de desvantagens que condicionam o seu crescimento económico, atingindo os Açores o caso extremo da perifericidade. A natureza obriga a grandes investimentos nas infra-estruturas necessárias, à sua acessibilidade, porque é total a sua dependência em relação a transportes, marítimos e aéreos, e ainda hoje insuficientes a frota e os equipamentos. Esta circunstância dificulta às relações comerciais com o exterior, porque as exportações dos produtos obrigam a incorporar nos custos a componente do transporte, o que elevando os preços obriga a uma diferenciação dê qualidade de bens oferecidos para resistir à pressão da competitividade. Em sentido contrário, as importações dos produtos, pela alta de preços e baixa qualidade, aumentam as desvantagens e dificultam a inserção nos padrões e regras do mercado interno nacional.
Nos Açores, estes inconvenientes são acrescidos pela existência de nove ilhas que, a bem dizer, aparecem como nove mini-regiões a multiplicar os hundicaps referidos. Acrescem as características climatéricas e orográficas, que limitam as escolhas de aproveitamento dos solos e das áreas habitáveis, para além de restringir a introdução dos meios, o transporte para atingir todos os lugares. São es-
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tes, em grandes linhas, os chamados «custos de insularidade» e de perifericidade, responsáveis pelas carências, desníveis e atrasos, que laxem com quo as obrigações do listado sejam multiformes e abrangentes e o papel da iniciativa privada reduzido em comparação com o território continental.
São o Estado, o sector público produtivo, e o aparelho administrativo os verdadeiros motores de desenvolvimento destas Regiões Autónomas, o que coloca a sociedade civil numa situação de dependência e permite longas permanências do mesmo partido no poder regional, alo porque são também reduzidas as opções alternativas dos próprios modelos de desenvolvimento.
O Mercado Único Europeu obriga a que as duas Regiões disponham de serviços de transportes eficientes, com custos baixos de tarifas nas comunicações áureas e a renovação de frotas nos transportes marítimos, para responderem aos novos desafios e exigências. Internamente é mister que se melhore a rede viária para rápida circulação e acesso dos habitantes aos centros populacionais, portos, aeroportos, hospitais, escolas, mercados, locais de interesse paisagístico e turístico.
A exclusividade da exploração da linha de transportes de mercadorias entre o continente e a Madeira, entre os portos de Leixões, Lisboa e Funchal, através das empresas nacionais, faz com que estes tenham estabelecido um cariei de preços insuportáveis, que em muito penaliza os consumidores e as indústrias transformadoras da Região. Os transportes deveriam ser liberalizados, permitindo a concorrência de preços mais acessíveis e aproveitando a roía marítima da Península Ibérica (Vigo, Leixões, Lisboa, Madeira) e Açores-Canárias.
Ainda nos transportes, a exclusividade- da exploração das linhas de tráfego regulares pela transportadora aérea nacional penaliza os utentes e coloca nas mãos da TAP todos os trunfos sem haver necessidade de melhorar os serviços.
Por isso, é de extrema utilidade a garantia da liberalização deste espaço aéreo, mesmo nos voos domésticos regulares e não apenas nos charters, assegurando o Estado os custos sociais inerentes e enunciados no Estatuto das Regiões Periféricas da Europa.
A Região Autónoma dos Açores, por exemplo, por si só não gera recursos financeiros que lhe permita continuar a suportar cerca de 4500 contos por dia de prejuízos na SATA. Como é que se pode conceber que um arquipélago com potencialidades turísticas não possua transporte marítimo de passageiros condigno que sirva todas as ilhas? Como é que se compreende que o que existe seja demasiado modesto para as necessidades sentidas e apenas sirva o grupo central?
Os elevados custos dos transportes marítimos de mercadorias por contentor é um dos mais caros do mundo e pesam muito no nível de vida dos Açorianos, que exportam quatro vezes menos do que importam. Como é possível manter uma região insular sem transportes marítimos de passageiros entre o continente e os Açores, pelo menos na época estival para promoção do seu turismo como medida alternativa aos elevados custos dos transportes aéreos?
A crise da habitação na Madeira legitima que lhe seja atribuído, pela generalidade das forças políticas, a característica do principal problema social da Região. Faltam cerca de 15 000 fogos, o que representa cerca de um quinto do parque existente. Mas o problema habitacional não é só um, existem diversos problemas na habitação. A região tem pedido para que a habitação social seja considerado um problema de interesse comunitário, a fim de poder beneficiar de fundos comunitários que ajudem a resolver a situação, até porque há interesses económicos profundos que o justificam, na argumentação para a CEE.
O Estado não pode ter a política do silêncio perante esta pretensão regional, até porque é o interlocutor preferencial da Comunidade e é justo que se questione qual é a sua posição.
Quanto ao ambiente, que tem feito o Governo para a sua preservação e protecção, com vista ã optimização das capacidades naturais, patrimoniais e humanas das Regiões Autónomas? Sabemos que a industrialização nas Regiões é ainda diminuta e caracteriza-se pela concentração em escassas actividades, coexistindo com um importante sector artesanal. As novas empresas são geralmente para o aproveitamento de recursos locais.
Devido a dificuldades de mobilidade, o elevado grau de analfabetismo, que ainda persiste, e a impreparação profissional das populações ao nível de vida comparativamente inferior em relação ã média continental, a escassez de meios, o peso da actividade agrícola com a estrutura minifundiária e ancestral, que a mantém numa situação mais estática que dinâmica antes da introdução dos regimes políticos autonómicos, obrigam os governos regionais a um esforço de adaptação e ajustamento que não tem comparação com outras parles de Portugal, com emprego de meios financeiros excepcionalmente elevados, internos e comunitários, para tornar efectiva a solidariedade nacional, que não precisaria sequer de estar expressa e formalmente consagrada na Constituição da República.
Dada a sua importância, comecemos pelos transportes. Estudos recentemente publicados indicam que o transporte marítimo das mercadorias entre os Açores e o continente, em função da distância, é cerca de 70 % mais caro do que os transporte rodoviários e nos transportes marítimos interilhas o diferencial atinge valores próximos ao dobro. O movimento de passageiros nas duas Regiões Autónomas faz-se exclusivamente por via aérea, com inevitáveis reflexos na mobilidade das populações. Por essa razão as telecomunicações desempenham um papel vital para manterem os contactos com o mundo exterior.
Daí a importância do chamado «mercado étnico», com o turismo próprio e impacte na valorização das zonas rurais de origem, tanto cultural como económica.
Todavia, é também importante desenvolver a política de estreitamento e de relacionação das Regiões com os seus emigrantes, apoiando as suas associações, desenvolvendo escolas e incentivando a preservação de tradições próprias, prestando serviços nas terras de fixação.
No contexto comunitário, o Governo central tem de se empenhar na rápida modernização do sector primário para garantir melhores rendimentos aos agricultores, principalmente jovens, proporcionando o aumento da produtividade, a melhoria da qualidade e a criação de condições de competitividade de produção regional.
Nos Açores o desenvolvimento das pescas implica uma abordagem especial desde que a região pretenda ter uma voz própria no aumento de produção. Exige-se a prioridade no domínio da investigação e da experimentação, melhor gestão e conservação de recursos marinhos. A formação profissional dos pescadores deve ser incentivada para a melhoria dos seus rendimentos e para criar as condições de competitividade.
Vozes do CDS: - Muito bem!
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O Orador: - A Região Autónoma dos Açores vive, neste sector, uma das mais graves crises de sempre, com preços pagos à lavoura leiteira que permanecem praticamente constantes de há quatro anos a esta parte, enquanto o nível de vida sobe e o preço da carne tem mesmo baixado.
Numa região em que as duas maiores uniões cooperativas leiteiras (Unicol, na Terceira, e Unileite, em São Miguel) estão tecnicamente falidas, com valores da ordem dos 1,6 milhões de contos, à escala económica da Região, ó facto muito grave, porque ainda há três meses havia atrasos no pagamento do leite ao produtor de seis meses (Unicol) e quatro meses (Unileite), enquanto os factores de produção não pararam de subir, apesar dos subsídios da Secretaria Regional da Agricultura e Pescas.
A agricultura na Madeira representa 15 % do rendimento regional e ocupa 22 % da população activa (trabalho exclusivamente manual).
A agricultura na Madeira passa por uma crise idêntica à da agricultura nacional, associando-se a uma dimensão diminuta da propriedade fundiária, uma forte dependência do exterior, uma finalidade importante para a subsistência e um pendor individualista dos proprietários.
As indemnizações compensatórias aos agricultores da Madeira, previstas nas decisões comunitárias, não tem chegado àquela Região Autónoma desde o ano de 1990. As ajudas por conta do IFADAP atravessam dificuldades ao ponto de muitos dos projectos de investimento na agricultura, por conta do FEOGA ou do PEDAP, estarem em atraso ou mesmo bloqueados. Tudo porque não existe entendimento entre o governo regional e o IFADAP. Mas quem fica prejudicado é o agricultor madeirense.
Os custos dos factores de produção na Madeira ficam acrescidos dos preços dos fretes e dos custos resultantes da inexistência de economias de escala.
São alguns de outros aspectos que importa atender.
Acrescente-se que a banana vinda do estrangeiro tem um preço de referência fixado e o montante de compensação.
Mas se o preço da entrada da banana se situar abaixo daquele preço é cobrado um direito de compensação a favor do Estado, além dos direitos de importação de 20 % ad valorem.
O Governo é responsável pela crise da banana, uma vez que tem vindo a autorizar crescentes quantidades de banana importada da América do Sul.
A título de curiosidade, no ano de 1986 a quantidade importada autorizada foi de 10 000 t, no ano de 1988 foi de 42 000, em 1990 foi de 90 600 e em 1991 foi superior a 100000. Além disso, estas autorizações de importações incidem sobre os meses de maior produção, muito concretamente entre o mês de Maio e Outubro. Verifica-se uma substituição da banana da Madeira pela banana da América do Sul, que, como já foi dito, tem um preço de entrada bastante baixo, descontando-se o custo de transporte e de comercialização, resulta para o agricultor sul americano um valor equivalente a $50/kg e assegurando ao Estado Português elevadas receitas fiscais das quais a Madeira é ilegitimamente arredada, segundo pensam os produtores madeirenses.
Cabe-nos, pois, alertar o Governo para o facto de as indemnizações compensatórias aos agricultores da Madeira, previstas nas decisões comunitárias, não terem chegado desde o ano de 1990. As ajudas por conta do IFADAP desenvolvem-se com grandes dificuldades e caracterizam-se também por uma insuficiência de resposta perante as necessidades projectadas, ao ponto de muitos dos projectos de investimento na agricultura por conta do FEOGA e o PEDAP estarem em atraso ou mesmo já abandonados. Tudo porque o governo regional e o IFADAP não se entendem- e nós sabemos porquê!
Ainda no âmbito do aproveitamento dos recursos naturais é necessário chamar a atenção para a crise dos produtos de exportação, nomeadamente bordados e vinhos.
A CEE não significou para a Madeira o «El Dorado» que anunciara para os seus produtos. O bordado da Madeira, que já exportou no último decénio mais de 200 t, tem vindo a decrescer, tendo atingindo em 1988 muito poucas toneladas. O vinho da Madeira, embora tivesse até 1988 um contingente de prestação estável, nos últimos anos mais de milhão e meio de litros de vinho da Madeira não encontram compradores no estrangeiro.
Quanto às obras de vime, a crise prolonga-se já há vários anos e vive momentos de agonia.
Em resumo, estas crises devem-se à subida vertiginosa dos preços da mão-de-obra, aos custos sociais e fiscais e à concorrência a nível de preços dos países da CEE.
A agravar esta situação acrescenta-se o lacto de o bordado da Madeira ser copiado pelos industriais chineses e o Estado Português não procurar defender as nossas patentes ou, pelo menos, não se conhecerem medidas concretas que travem este. desgaste dos produtos regionais.
Na sequência da política de relacionamento com os países da Comunidade preocupa-nos a comparticipação nacional no âmbito do SIRT (Sistema de Incentivos Financeiros ao «Investimento no Turismo), SIMC (Sistema de Incentivos à Modernização do Comércio), SIBR (Sistema de Incentivos de Base Regional), SIPE (Sistema de Incentivos ao Potencial Endógeno), SIVEDIP (indústria), que estão abertos às iniciativas de empresas madeirenses e para os quais tem havido, pelo menos em alguns sectores, uma grande adesão. Só que estes sistemas tem uma parte de participação comunitária e outra nacional. Esta última, embora fixada no Protocolo de Reequilíbrio Financeiro, como sendo da responsabilidade financeira do Governo da República, ainda não chegou lá, o que entrava o investimento e impede o sucesso dos empreendimentos constituídos ao abrigo dos incentivos enunciados. Ern consequência, há investimentos parados, há projectos à espera de serem iniciados e os custos sobem em flecha perante as estimativas feitas.
A economia da Região não pode ficar à espera de resolução e quesilias financeiras entre o Estado e as Regiões Autónomas. E bom que se esclareça esta situação de uma vez por todas.
O ambiente é hoje uma questão nacional. É na verdade um problema mundial, como vai ser tratado na Conferência do Rio, dentro de poucos dias, e assim deve ser protegido e preservado.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Na Madeira, falar de ambiente é falar da Região. Esta defesa que se impõe terá que ser levada a cabo no quadro da política nacional e comunitária de defesa do ambiente, numa reunião de esforços e meios de prevenção que a natureza da agressão exige.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Estado tem que ser mais activo e eficaz. Não se podem repetir situações como aquela que foi
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notada a posteriori, na afumada visita do Ministro e do Secretário de Estado, aquando da discussão na pantalla da televisão sobre quem tinha chegado primeiro a ilha de Porto Santo, aquando da chamada «maré negra». É indispensável criar os organismos e as estruturas necessárias no combate às agressões mais frequentes (incêndios, marés negras) e prevenir o futuro.
A Constituição da República e os estatutos da Região asseguram a esta o direito de participação na definição de políticas nacionais, como sejam as políticas monetária, fiscal, financeira e cambial, nas que dizem respeito a águas territoriais, à CEE e aos fundos marinhos e na elaboração dos planos nacionais e negociação de trabalhos sobre matérias que lhe digam respeito.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, já terminou os vinte minutos de que dispunha!
O Orador: - Sr. Presidente, vou utilizar tempo de debate.
Nenhuma destas maiorias está regulamentada. Seria necessário elaborar uma lei quadro que clarifique e assegure estes direitos fundamentais das Regimes Autónomas, porque constitucionais, definindo e delimitando as competências dos governos nacional e regionais.
Também aqui se devem incluir os problemas relativos à participação de madeirenses e açorianos em acontecimentos nacionais para os quais tenham sido seleccionados, nomeadamente no domínio desportivo, e à formação universitária nas duas Regiões Autónomas, já que a recente abertura da Universidade da Madeira e a existência já antiga da Universidade nos Açores confere ao Estado responsabilidades na necessária superação dos custos de insularidade, por exemplo, no que diz respeito aos preços de propinas e refeições.
Numa perspectiva de desenvolvimento económico foi criada, em 1980, a zona franca, o que veio a ser efectivamente promovida a partir de 1985, como um projecto para incrementar a economia regional, em especial na dos serviços financeiros, embora numa dimensão ainda muito reduzida para algumas actividades industriais. A zona franca pode vir a representar para o País motivo de atracção de capitais estrangeiros e abertura de novos mercados, novos fluxos de comércio e mais postos de trabalho. O regime destas zonas tem-se baseado em medidas, entre as quais num regime de benefícios fiscais, previstos no seu estatuto.
O Governo, nesta matéria, não tem dado qualquer tipo de resposta.
Define a Constituição da República que os órgãos de soberania assegurem o desenvolvimento económico e social das Regiões Autónomas, visando em especial a correcção das desigualdades derivadas da insularidade. Estas obrigações constitucionais não estão a ser cumpridas eficazmente, em especial nos seguintes aspectos: a Região Autónoma dos Açores, sob o ponto de vista demográfico, tem vindo a perder população de uma forma preocupante. Desde 1970 a 1991 perdeu 51 513 habitantes, dos quais cerca de 30 000 já sob a responsabilidade do regime autonómico, com o natural desprestígio que esta situação pode acarretar para a autonomia. E se é certo que, historicamente, a emigração faz parle da tradição insular, não deixa de ser um sintoma de mal-estar grave esta perda tão significativa, que ultrapassa inclusivamente a situação anterior à Revolução de 1974.
A população açoriana, cuja fonte de receita se apoia especialmente no sector primário (agro-pecuário e seus derivados) e no sector terciário (serviços e comércio), vive neste momento a angústia do seu futuro. Efectivamente, a agro-pecuária açoriana atravessa uma das maiores crises de sempre, com receitas constantes - o preço do leite mantém-se o mesmo, como já o disse, enquanto sobem os factores da produção desses produtos.
O comércio ressente-se da perda do poder de compra de uma população que investiu especialmente no subsector pecuário, em detrimento do agrícola. E a angústia dos comerciantes é neste momento grande.
A grave crise económica que os Estados Unidos atravessam agrava também este sector, que, com a ausência de emigrantes, perde mais uma oportunidade de vender.
A própria incerteza da presença dos americanos na base das Lages e o já anunciado abandono da base de rastreio pelos franceses, na ilha das Piores, vem trazer aos açorianos factores destabilizadores no seu tecido social, para além de privar a Região de uma receita estimada em 6,5 milhões de contos (40 milhões de dólares da base das Lages e 500 OOO contos do acordo com os franceses).
E num momento destes, com a conjuntura desfavorável que enunciei, que o Governo da República deve rever o seu conceito de solidariedade para com a Região Autónoma dos Açores.
E, nesta conjuntura, assume cada vez mais importância o acotovelar da população na procura de um posto de trabalho nos órgãos dependentes do governo regional, transformado na entidade empregadora mais potente da Região, com todos os inconvenientes daí advenientes para o desenvolvimento autêntico e saudável dos Açores, vulnerabilizando, aliás, o desenvolvimento de uma verdadeira democracia de liberdade e a formação da classe média.
A poderosa e pesada máquina administrativa, arquitectada pelo governo social-democrata e paulatinamente implantada (na ordem dos 15 000 funcionários públicos para uma população activa de cerca de 100 000), constitui uma preocupação séria, agravada pelos fracos recursos financeiros gerados na Região.
A indústria nos Açores não sofreu nenhuma revolução estruturante, e mesmo a indústria transformadora, ligada h agro-pecuária e ao sector das pescas, não atingiu o nível de desenvolvimento e modernidade que permita á Região visionar o futuro com alguma confiança. Aliás, os factores que lhe permitiriam progredir sistematicamente têm-lhe sido negados, ou, dito de outra forma, não lhe tem sido facilitados. E entre eles permito-me salientar os custos caros dos transportes-e digo-o pela enésima vez -, quer marítimos quer aéreos, de mercadorias e passageiros, com um elevado preço da energia eléctrica, e o recurso ao crédito, que, pesando significativamente no produto final e sua colocação no mercado continental, os prejudicam drasticamente em lermos de concorrência. E não se vislumbra vontade política nacional para um autêntico movimento de solidariedade, para se tomarem medidas sérias e eficazes que, de uma vez por iodas, dêem asas para que o espírito empresarial dos açorianos e madeirenses voe na sua terra natal, como tem voado nos países para onde tem emigrado.
Como se compreende, por exemplo, que a energia para o consumo industrial seja vendida mais cara do que a consumida no uso doméstico? Assim não pode ser!
A hora é única e, se não for aproveitada neste momento, pode vir a perder-se uma ocasião histórica de desenvolvimento regional através do recurso aos fundos co-
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imunitários. E compreende-se maí que se não tenha estabelecido uma quota regional para os fundos comunitários do SIBR, do SIFIT e do SIMC, fazendo-a depender de negociações entre os governos regionais e o da República. Negociações estas que, como iodos os negócios, geram incertezas com reflexos negativos. Mais, deveria o Governo da República subsidiar, no todo ou em parte, o esforço que a pedido à entidade regional que por falta de recursos financeiros, pode perder a oportunidade de os explorar rendivelmente.
O combate à insularidade passa muito por uma atenção especial as telecomunicações, como forma de se mitigar o isolamento, quer de madeirenses quer de açorianos, estes, sobretudo, sofrendo com uma intensidade particular dada a sua configuração de nove ilhas.
Na área das comunicações, sobretudo nos Açores, há insuficiências que têm de ser colmatadas imediatamente. As ligações telefónicas interilhas. são um desafio permanente à paciência humana e a inconfidencialidade das mensagens telefónicas é uma precaução sempre a ter em conta. Aliás, telefona-se com mais facilidade para fora da Região do que entre Santa Maria e o Corvo. E sendo este um meio de combater o isolamento entre insulares não se percebe como ainda se não tomaram medidas tendentes a aliviar os pesados custos das chamadas telefónicas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa visa o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses e o artigo 231.º determina que os órgãos de soberania assegurem, em cooperação com os órgãos do governo regional, o desenvolvimento económico e social das Regiões Autónomas, visando, em especial, a correcção das: desigualdades derivadas da insularidade.
A interpelação que hoje fazemos - e este é o primeiro debate nacional sobre as regiões insulares aqui na Assembleia da República, se outro mérito não tiver é a primeira vez que se fiscaliza um governo central quanto as suas atribuições nas Regiões Autónomas - é sinal e testemunho deste reforço de unidade nacional e do cumpri mento das obrigações políticas da Assembleia da República ao pretender questionar o Governo da República sobre a sua actuação quanto à solidariedade entre todos os portugueses.
A palavra é agora para os membros do Governo aqui presentes poderem responder, perante esta Assembleia e perante as Regiões Autónomas, sobre como tem cumprido os deveres que a Constituição lhes impõe.
Aplausos do CDS, do PS e do PCP.
(O orador reviu.)
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o CDS ultrapassou nove minutos do tempo de que dispunha para a abertura do debate, o que será descontado no tempo de debate propriamente dito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto (Marques Mendes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo tem muito gosto em participar neste debate, como é seu direito, como é sua obrigação também-e falo na presença de vários membros do Governo, escolhidos livremente, uma vez que o Governo, nos termos da Constituição e das leis, é responsável pela sua própria organização e faz-se representar nos debates, em cada momento, pelos membros que considera mais adequados, e mais competentes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, nunca como nos últimos tempos se falou tanto em Portugal das Regiões Autónomas, nunca como nos últimos tempos se produziram tantas declarações e se promoveram tantos debates acerca da realidade das autonomias regionais dos Açores e da Madeira.
A esquerda e á direita as iniciativas sucedem-se, as afirmações proliferam, as deslocações multiplicam-se, os hosanas à autonomia regional fazem-se agora sentir com o fervor que nunca se viu nem conheceu no passado.
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Orador: - De repente, parece que um qualquer fundamentalismo autonómico ou um qualquer síndroma insular se apossou dê alguns partidos da oposição.
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Orador: - Num ápice, parece que alguns responsáveis políticos decidiram converter-se, ou arvorar-se em paladinos, da autonomia regional. Em bom rigor, parece que é assim, mas não é.
No passado num passado ainda não muito distante -, tomavam-se, iniciativas ou apresentavam-se projectos nesta Câmara apenas para se saber e aquilatar quem, de entre a oposição, ora mais oposição ou conseguia fazer maior oposição.- Agora, de repente, a disputa é outra, talvez até alguns dos protagonistas sejam diferentes, mas o sentido de competição, os objectivos e a forma utilizada permanecem inalterados.
Trata-se então agora de saber quem mais fala das Regiões Autónomas, quem tem a autonomia regional mais à flor da pele, quem mais recados manda para o interior dos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não lemos TV regional!
O Orador: - Porquê então - perguntarão os Portugueses- este frenesi de última hora? Porquê então este agitar de ocasião? Porquê então esta avalanche? Porquê então esta sucessão de iniciativas? Para alguns tudo isto pode parecer estranho, para alguns outros a dúvida ou a interrogação até podem ser legítimas, mas para a grande maioria dos portugueses a resposta é indiscutivelmente clara e inequívoca: tudo isto sucede porque estamos em, ano de eleições regionais dos Açores e na Madeira e porque para alguns tudo é admissível e tudo parece legítimo na mira de tentar obter ganhos, ou maior, espaço eleitoral.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Olha quem fala!
O Orador: - Sr: Presidente, Srs. Deputados: O nosso povo, em regra, desconfia da fartura, seja da fartura de
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promessas, de intenções, de declarações ou de elogios, seja no continente ou nas Regiões Autónomas, seja do continente e para as Regiões Autónomas.
E mais ainda desconfia quando os maiores protagonistas de hoje são, quantas vezes, os mais reticentes e descrentes de ontem, os que mais dúvidas levantaram e maiores interrogações colocaram aos princípios, ao figurino político e ao sucesso electivo da autonomia regional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como é óbvio e evidente ninguém esta impelido de defender ou apoiar, com maior ou menor convicção, o processo autonómico em curso nos Açores e na Madeira.
Mas falar de autonomia regional e de solidariedade nacional apenas em períodos eleitorais, ou próximo deles, não é uma postura séria, não é correcto e pode mesmo ser interpretado e entendido como uma manobra oportunista resultante de meros efeitos e jogos eleitorais.
Aplausos do PSD.
Sobretudo quando, como tem sucedido e continua a suceder, a abordagem da autonomia que alguns laxem não é, em boa verdade, para a defender ou para a incentivar.
Aquilo a que se assiste, não raras vezes, são ataques à autonomia regional, é uma deficiente e incorrecta compreensão da solidariedade nacional, é a substituição do que deveria ser uma visão de Estado, credível e responsável, por uma perspectiva mesquinha, quantas vezes estritamente partidária e a maior parte das ocasiões marcada por interesses menores, de ocasião, de circunstância ou de mera táctica política.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Boa autocrítica!...
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Durante alguns meses um partido da oposição, com o desacerto, a incontinência política e verbal e a ineficácia política conhecidas, submeteu ao País, com grande pompa e circunstancia, a questão de um alegado défice democrático na Região Autónoma da Madeira.
Vencido ou convencido do insucesso da sua iniciativa, abandonou-a e não lhe deu qualquer sequência ou desenvolvimento.
Vozes do PS: - Falso!
O Orador: - Cumpriu a sua estratégia laboratorial, produziu o seu próprio epifenómeno, com os resultados conhecidos, sobretudo a falta de sentido de Estado evidenciada.
Fê-lo, não procurando sequer garantir um mínimo de originalidade, já que se limitou a regionalizar uma estratégia nacionalmente já experimentada e já derrotada.
E é assim porque o alegado défice democrático da Madeira mais não é do que a versão revista e reduzida dos fantasiosos riscos advenientes para a democracia da existência de uma maioria na Assembleia da República, levantados, com o fracasso que é conhecido, na última campanha eleitoral.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É por isso que Setembro de 1991 e Maio de 1992 são, pois, datas que assinalar um mesmo sofisma, com premissas requentadas, sem originalidade, sem imaginação e, obviamente, sem qualquer êxito ou sucesso.
Temos agora, através de uma nova e diferente iniciativa, a oportunidade de voltar a falar das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Desta vez o tema é outro, e quase se poderia dizer desde já que a presente iniciativa se coloca e se posiciona nos antípodas da primeira.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Reconhecemos que é importante- - é sempre importante - abordar a questão da solidariedade nacional e do relacionamento cria-se Governo da República e governos das Regiões Autónomas. Trata-se de uma questão importante, sobretudo se analisada com seriedade e com sentido de responsabilidade, e de uma questão que parecendo pacífica e consensual - e, a nosso ver, deveria sê-lo sem hesitações - nem sempre, infelizmente, o tem sido ao longo da nossa história democrática.
A memória dos homens é cinta, mas não tanto que não permita recordar as vezes, as situações e as declarações que, em momentos anteriores a 1985, foram evidenciando divergências claras, clivagens notórias e fricções várias entre Governo da República e governos regionais, e na e o poder central e o poder regional, a respeito e a propósito do grau de concretização da autonomia regional e da intensidade da afirmação do princípio da solidariedade nacional.
Felizmente que nos últimos anos a situação tem sido outra e bem diferente. O bom relacionamento hoje impera, a cooperação estreita-se, a autonomia desenvolve-se, a solidariedade nacional afirma-se. E bom para o País que assim seja!
Aplausos do PSD.
O Governo da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não tem, nem deve ter, qualquer tutela sobre os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas. A sua relação não é uma relação de tutela mas, sim, uma relação de comparação, à semelhança da postura que lemos com os órgãos de soberania, com a sociedade civil e com as autarquias locais.
Mas ninguém hoje, de boa fé e com factos concretos, questiona ou põe em causa o esforço de solidariedade nacional que neste plano se afirma e se pratica; ninguém hoje, com seriedade e responsabilidade, ousa colocar em questão a excelência do relacionamento entre Governo da República e governos regionais.
Não o faz o Sr. Presidente da República que, manda a verdade que aqui se recorde uma vez mais, é o garante tanto da soberania nacional quanto, em última instância, da autonomia regional; não o fazem as autoridades regionais, legítimas representantes dos destinatários do esforço de solidariedade nacional que está em curso; não o faz a generalidade dos portugueses, sejam eles continentais ou insulares.
A autonomia regional não é um património exclusivo de ninguém, como a solidariedade nacional não é um monopólio ou uma propriedade absoluta de quem quer que seja. Ambas pertencem ao património singular e único da nação portuguesa.
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Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas quem. como nós, sociais-democratas, desde 1975, se tem balido com entusiasmo pela consagração política, prática e quotidianamente assumida da autonomia regional e da solidariedade nacional não pode, por isso mesmo, deixar de exprimir o seu legítimo orgulho pela obra de progresso e de desenvolvimento que está à vista, repito, que está à vista, pela excelência dos resultados alcançados, pelas alterações quantitativas e qualitativas que o País registou, e muito em particular, neste caso, as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Aplausos do PSD.
A solidariedade nacional é um imperativo político, uma exigência ética, um pressuposto da coesão nacional, uma obrigação de cidadania, um traço de união entre portugueses.
Assim o temos entendido, assim o temos praticado, em todos os momentos e não tanto em períodos eleitorais; assim o tem interpretado politicamente a população dos Açores e da Madeira, através das sucessivas e reiteradas votações de sinal claro e inequívoco.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas temos uma perspectiva e uma concepção verdadeiramente nacionais da solidariedade; A aposta decidida e determinada na autonomia regional nunca nos fez esquecer, postergar ou fazer diminuir o elevado esforço de solidariedade para com nutras zonas e regiões do nosso país.
Somos intransigentes defensores de um desenvolvimento harmonioso, integrado e coerente do todo nacional.
O Governo assume, por inteiro e com idêntico empenho, as suas competências e atribuições para com as várias parcelas do lodo nacional, continental e insular.
E uma postura de Estado aquela que cultivamos, não por favor e muito menos por gratidão ou paternalismo, mas, única e exclusivamente, porque temos uma concepção nacional do País, uma visão global de Portugal, uma perspectiva ética, política e não partidária do desenvolvimento colectivo.
Os factos aí estão a comprová-lo. O acelerado desenvolvimento que o País regista não admite grande espaço para dúvidas; o esforço de investimento que tem vindo a ser produzido prova-o á sociedade.
E a solidariedade nacional traduzida em todas as vertentes, estendida as várias parcelas do País, direccionada para os vários estratos da população portuguesa.
Assim o tem entendido os portugueses em geral, e não apenas os das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. O seu voto claro e inequívoco confirma bem o acerto da concepção que defendemos, o equilíbrio da postura que ensaiamos, a perspectiva nacional que temos da solidariedade.
Iremos, no futuro, prosseguir este caminho e aprofundar esta orientação, com equilíbrio, sem tentações perversas, afirmando permanentemente a concepção que temos da solidariedade nacional, porque temos a consciência e a convicção seguras de que a autonomia regional é um importante e decisivo factor de reforço da unidade do todo nacional.
Aplausos do PSD.
... porque temos a convicção plena de que estamos a dar passos, no sentido de aprofundar a coesão entre todos os portugueses, porque à coerência impõe que quem se recusa a aceitar, uma Europa a duas velocidades não pode igualmente tolerar a ideia de viver num País a dois ritmos, a duas cadências ou a duas velocidades.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira apresentam, relativamente ao território continental do País, uma situação claramente desigual, resultante das suas particulares características de insularidade.
Muitos dados ou indicadores poderiam ser utilizados para confirmar esta conclusão. Mas isto é particularmente visível e evidente nos PIB per capita, em que os Açores e a Madeira se encontram sensivelmente á um terço da média europeia, enquanto o continente já ultrapassou tis 56 %.
Daí o imperativo nacional de aposta na solidariedade. Aposta traduzida não apenas nos discursos mas, acima de tudo, em actos, decisões e iniciativas concretas. Desde logo, nas transferências anuais através do Orçamento do Estado.
Aplausos do PSD.
Só de 1985 até ao momento elas registaram um aumento superior a 100 %. É um esforço financeiro e de solidariedade muito significativo. Importa aqui recordar que nem sempre, no passado, tal sucedeu.
Por outro lado, as transferências financeiras para as Regiões Autónomas, em matéria de fundos comunitários, ascendem já, desde 1986, a 158 milhões de contos, representando um investimento global de 291 milhões de contos. E um esforço financeiro, de solidariedade nacional e comunitária muito substancial, porque a solidariedade nacional afirma-se também, e em grande medida, pela defesa e aposta na própria solidariedade comunitária.
E a este respeito os factos e as iniciativas, aqui não referidos, de resto, falam por si, sem margem para dúvidas e sem receios de desmentido.
Foi o Primeiro-Ministro português quem, por exemplo, na cimeira de Rhodes, em Dezembro de 1988, apresentou e fez vingar na Comunidade, pela primeira vez, o conceito de ultraperiferia e o reconhecimento da especificidade dos problemas sócio-económicos das ilhas mais distantes da Comunidade.
Aplausos do PSD.
Sem esta iniciativa a solidariedade nunca teria tido a expressão que tem; sem esta iniciativa não leria sido possível a aprovação de vários e importantes programas comunitários; sem esta iniciativa - sem dúvida precursora, ousada e inovadora -, dificilmente leria sido possível consagrar em Maastricht uma declaração dos Doze relativa às regiões ultraperiféricas da Comunidade.
Esta declaração, lambem aqui não referida, traduz o reconhecimento, ao nível do Tratado, da realidade específica das regiões da ultraperiferia, abrindo caminho para o aprofundamento das acções já iniciadas, bem como para a adopção de outras que se venham a demonstrar adequadas a atenuação do atraso estrutural e das vulnerabilidades inerentes à situação insular.
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O País está, assim, com equilíbrio, empenho e determinação, a dar tradução política e concretização prática ao imperativo de solidariedade.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É uma postura, a nosso ver, de seriedade e de responsabilidade, assumida numa perspectiva nacional e nunca partidária, executada com rigor e sem privilégios, entendida como factor de união e não de querela entre os Portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solidariedade nacional para com as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não peca por deleito nem peca por excesso. Ela é ditada por um sentimento de justiça colectiva e tem vindo a ser exercida com equilíbrio, com justiça, com sentido de responsabilidade.
Não é, por isso mesmo, nem de mais, nem de menos. É sim a justa medida dos imperativos nacionais, das exigências da crescente coesão entre o todo nacional, dos pressupostos de um desenvolvimento de todo o País harmonioso, equilibrado e global.
Aplausos do PSD.
Estamos, por isso, perante uma questão que é, a nosso ver, demasiado seria e demasiado importante para ser usada como arma de arremesso político.
Fazemos votos para que assim possa suceder. Hoje, amanhã e sempre.
Aplausos do PSD, de pé.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Magalhães, Narana Coissoró, Octávio Teixeira, Manuel Queiró, Marques da Silva e Rui Ávila.
Para esse eleito, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, eu pedi a palavra para fazer uma pergunta ao Sr. Ministro e não ao Sr. Deputado Narana Coissoró. Portanto, se há oradores inscritos para fazerem perguntas ao partido interpelante, suponho que eles tem precedência.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, eu anunciei que estavam inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro os Srs. Deputados José Magalhães, Narana Coissoró, Octávio Teixeira, Manuel Queiró, Marques da Silva e Rui Ávila.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, então reformulo a pergunta: não há qualquer orador inscrito - é o que isso pressupõe - para fazer perguntas ao Sr. Deputado Narana Coissoró?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Não! Não ha!
O Sr. José Magalhães (PS): - Compreenderá V. Ex.ª que eu eslava a sublinhar, de uma maneira um pouco ínvia, que não há oradores inscritos para fazer perguntas ao Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, mas eu não prescindo da palavra para fazer perguntas ao Sr. Ministro!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, se não prescinde, tem a palavra.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, como compreenderá, não havia aqui qualquer agravo em relação ã Mesa, mas apenas a distinção entre o momento interpretativo e o momento da pergunta, que gostaria que fosse feita.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, havia uma certa expectativa em relação à posição com que o Governo se apresentaria na Câmara para esta interpelação. Qual seria a postura.
Acabámos de ver qual é de um lado, o ciúme, o ciúme por ver a oposição colocar importantes questões relacionadas com o futuro das autonomias regionais.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - A oposição quase não se vê!
O Orador: - V. Ex.ª parece considerar que tem o monopólio e uma espécie de casamento monogâmico com as ilhas e com a autonomia regional e não quer aí ver mão alheia. Não é! É uma questão nacional importante. Temos direito a intervir.
De outro lado, o generalismo, uma vez que V. Ex.ª fez um discurso que é, eu diria, magistralmente uma colagem de slogans e completamente vácuo em relação as questões concretas, mas já lá iremos.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado!
O Orador: - E, de outro lado, uma atitude que, reclamando-se do antieleitoralismo, é a mais desgarradamente eleitoralista que se possa imaginar.
Gostaria de sublinhar, Sr. Ministro, que foi o PSD, por exemplo, que, instrumentalizando importantes questões regionais, terá pedido ao Governo Norte-Americano que diferisse o despedimento de 100 trabalhadores da base das Lajes para depois das eleições de Outubro de 1991.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Olhe as informações que a CIA lhe dá!
O Orador: - Não se pode imaginar atitude mais eleitoralista e menos adequada por parte de um governo responsável!
Vamos perguntar-lhe também, Sr. Ministro, o que é que vão fazer em relação ao estado actual dos despedimentos dos trabalhadores da base das Lajes, neste momento em que parece haver também iguais pressões para que certas decisões sejam calendarizadas em função do calendário regional eleitoral.
Isto é apenas para que V. Ex.ª possa adoptar uma atitude de mais modéstia em relação às acusações, um tanto destemperadas, de eleitoralismo que, partindo do PSD, não têm qualquer razão de ser. Em matéria de eleitoralismo, o PSD não merece lições, pois tem praticado o mais desgarrado eleitoralismo em todos os planos!...
Q Sr. Duarte Lima (PSD): - Olha quem fala!
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O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Ministro - e aqui iria às perguntas -, apresentaremos ha Mesa, dentro de segundos, um documento com 10 perguntas sobre questões decisivas sobre as autonomias regionais e o seu futuro, que, precisamente, procuram fazer com que V. Ex.ª baixe à terra do concreto - entenda a expressão devidamente -, baixe à terra no sentido de colocar os pés no chão concreto dos problemas.
E essas perguntas vão desde a inadequação dos actuais instrumentos de relacionamento entre a República e as Regiões. Pergunto a V. Ex.ª por que é que o Governo não adianta qualquer iniciativa em matéria de enquadramento das relações financeiras entre a República e as Regiões? Sabe V. Ex.ª porquê? Pode explicar à Câmara?
Mais: como é que o Governo responde, por exemplo, à questão do fim das transferências norte-americanas para Portugal, e para a Região Autónoma dos Açores em particular, na sequência da alteração de contextos geoestratégico» bem conhecidos. Qual é a resposta governamental?
Como é que V. Ex.ª, em concreto, responde a perguntas que foram aqui equacionadas durante o debate orçamental - e mal respondidas, designadamente pela Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional, que se encontra sentada ao seu lado - quanto ao futuro do aeroporto de Santa Catarina, por exemplo? Onde é que há verbas asseguradas para o financiamento desse projecto?
A nossa pergunta explicita concretamente alguns dos 10 terrenos que, para nós, são essenciais. Nesse sentido, Sr. Ministro, pedia-lhe que, lendo esse documento atentamente, ainda possa, durante o debate, dar as respostas que agora não quis dar, ao subir à tribuna, uma vez que a sua função não era discutir em especial os problemas das Regiões mas, sim, tecer considerações vagas e genéricas e reivindicar para si o monopólio que o PSD, felizmente, não tem.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Ministro, deseja responder já ou no final?
O Sr. Ministro Adjunto: - Desejo responder já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então tem á palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, agradeço as questões que me colocou, mas desde já, em termos de nota prévia, gostaria de lhe dizer que o Governo considera que este é um debate importante e sério, por isso o tratou com seriedade, por isso está aqui representado pelos membros do Governo que considera necessários para prestar todos os esclarecimentos e por isso é que lhe tem dado, está a dar e dará, até ao fim, toda a atenção.
Confesso, com toda a franqueza, que, se considera o debate assim tão importante e tão sério como nós o consideramos, esperava que a sua bancada estivesse, pelo menos, melhor representada do que está.
Aplausos do PSD.
Ern segundo lugar, Sr. Deputado, tive ocasião de referir, e reafirmo, que a autonomia regional e a solidariedade nacional, disse-o, não são monopólio, nem património exclusivo de ninguém. A esse respeito, até tive o aplauso ou um aparte positivo por parte do Sr. Deputado Narana Coissoró. Mas disse-o e repito, sem qualquer receio, que também é normal que quem, como o partido que apoia o Governo desde a Constituinte, se bateu fortemente por este modelo de autonomia regional e, posteriormente, pelo seu aprofundamento sinta um legítimo orgulho pelo êxito e pelo sucesso desta experiência política e constitucional.
Aplausos do PSD.
Ern terceiro lugar, Sr. Deputado, não se trata e penso que nau tem sentido falar nisso - de qualquer tipo de eleitoralismo, a propósito da minha intervenção. O contrário é que podia ser verdadeiro!
Risos do PS.
Porque estamos em ano de eleições nas Regiões Autónomas, agitar permanentemente a questão da autonomia, ainda por cima, a maior parte das vezes, para a atacar ou para a censurar, é que é uma forma, pode ser ínvia, de fazer eleitoralismo. Seguramente que não será a forma mais bem sucedida! Será, sem dúvida, uma vez mais, um fracasso!... Mas, enfim, é uma determinada forma de fazer eleitoralismo.
O Sr. José Magalhães (PS): - Vamos ver!
O Orador: - O Sr. Deputado talvez não, mas os seus colegas de bancada já experimentaram outras no passado relativamente as eleições legislativas e tiveram o «sucesso» que tiveram. Esperem agora também para ver o sucesso que vão ter!...
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PS): - Vamos ver!
O Orador: - Na minha intervenção, tive o ensejo, porque é uma questão que considero (e considera o Governo) séria, uma questão de Estado, de, naturalmente, explicitar o ponto de vista que temos, não apenas em teoria mas sobretudo na prática, da concepção da solidariedade nacional. Por isso o desenvolvi e o aprofundei. Tal como tive ocasião de traduzir em dados concretos aquilo que tem sido o entendimento do Governo. Não tenho culpa se, eventualmente, o Sr. Deputado aqui ou acolá esteve desatento!...
Mas não tenho qualquer pejo e receio em dar mais alguns elementos relativamente...
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Ministro, permite-me que o interrompa?
O Orador: - Sr. Deputado, se me permite, eu concluiria o meu raciocínio. Já conheço esse truque!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Ministro, por favor conclua a sua resposta.
O Orador: - Sr. Presidente, peço naturalmente mais alguma compreensão, senão corro o risco de o Sr. Deputado José Magalhães, daqui a pouco, dizer que fugi as perguntas, pelo que...
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O Sr. José Magalhães (PS): - Claro que fugiu!
O Orador: - Não, não vou fugir as questões. Eu precisava de explicitar estes princípios como notas prévias, o que era importante, relativamente às questões que colocou sobre a base das Lajes.
Sr. Deputado, penso que sabe perfeitamente, até porque os Srs. Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa Nacional já estiveram na comissão parlamentar respectiva a explicar esta questão, que neste momento estilo em curso conversações e negociações em relação ao acordo das Lajes. Já foi explicado em sede própria, mas tenho muito gosto em repetir, que Portugal esta, naturalmente, com lodo o empenho e determinação, pelas vias normais e diplomáticas, a defender aquilo que considera serem os interesses nacionais, incluindo, obviamente, os interesses dos Açores. Consideramos - e aqui o reafirmamos - que a utilização da base das Lajes deve comportar contrapartidas para o Estado no seu conjunto e especificamente para as Regiões Autónomas. Reconhecemos, como é evidente, o momento difícil e delicado, por força do processo eleitoral que decorre neste momento nos Estados Unidos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Ali! As eleições deles!
O Orador: - Mas o empenho e a determinação continuam e a defesa dos interesses nacionais será levada até à exaustão. Entendemos que os nossos pontos de vista acabarão por ter reconhecimento e que a Administração Norte-Americana acabará por reconhecer muita da justeza dos nossos ponto de vista. O Sr. Deputado compreenderá que estas questões são sérias e delicadas...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Ministro, cinco minutos é o tempo limite para usar da palavra, em resposta a um pedido de esclarecimento.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Como eu eslava a dizer, o Sr. Deputado compreenderá que estas questões são sérias e delicadas em matéria de negociações e que estar a entrar neste momento em mais pormenores, obviamente, pode até ser prejudicial à própria negociação e à defesa dos próprios interesses nacionais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à questão do aeroporto - a não ser que a deixe para a questão seguinte -, de uma forma quase telegráfica, direi ao Sr. Deputado que não tem razão, uma vez mais, na questão que coloca. De duas uma: ou o Sr. Deputado não conhece a questão, não a estudou ou, então, se a estudou, eventualmente, faltam-lhe dados. A questão do aeroporto neste momento está a correr os seus trâmites normais e a demonstração disso é que ainda ontem tomaram posse ...
O Sr. José Magalhães (PS): - Leia esse papel!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Ministro, peco-lhe para guardar essa explicação, quando responder a outros pedidos de esclarecimento, porque, de facto, já ultrapassa bastante o tempo regulamentar.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que tenho muito gosto em explicitar esta questão em posteriores intervenções. Quero, porém, dizer ao Sr. Deputado que, ao contrário do que afirma, a questão do aeroporto de Santa Catarina é para nós importante, empenhámo-nos desde o princípio e vamos levá-la até ao fim.
Aplausos da PSD.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração da minha bancada, suscitada pela resposta do Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, a intervenção que V. Ex.ª acaba de fazer, na parte em que respeita à ausência de Deputados do meu partido neste momento do debate, é manifestamente infeliz.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É verdadeira!
O Orador: - E devo dizer-lhe que é manifestamente infeliz pelo seguinte: em defesa da dignidade do debate, o Partido Socialista, tendo embora uma reunião neste momento do Grupo Parlamentar, não quis interromper este debate. E não o quis da mesma forma que o Sr. Presidente da Comissão de Reforma do Parlamento, do seu partido, também convocou para esta mesma hora uma reunião da Comissão e não quis interromper o debate.
Penso que esse Deputado que preside à Comissão de Reforma do Parlamento tem o mesmo sentido da dignidade do debate que nós e que não é pela presença escassa de 47 Deputados do PSD neste momento que a dignidade está garantida.
Sr. Ministro, foi infeliz, pois conhecia a explicação.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, quero dizer, de uma forma muito rápida, que, obviamente, não tive intenção de ofender ninguém. Limitei-me a constatar um facto e eu penso que o facto tem tradução e significado político. O Sr. Deputado dá a explicação que dá e eu continuo a lazer a constatação que fiz e a retirar dela ilações e significados políticos. Não mais do que isso!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, perguntou o Sr. Deputado José Magalhães, para ficar lavrado em acta, se ninguém me tinha colocado questões, principalmente por parle do partido que apoia os governos regionais e o Governo da República e, sobretudo, os Deputados madeirenses e açorianos. Este silêncio pareceu-me natural, porque se eu viesse aqui fazer
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chicana, se começasse a Calar dos Drs. Alberto João Jardim e Mota Amaral haveria 14, 15, 16 pedidos de esclarecimento, atiravam-se pelo estrado abaixo, gritavam...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas eu não falei dos Srs. Presidentes dos governos regionais mas dos problemas da Madeira e dos Açores. É natural que os Deputados da Madeira e dos Açores não sintam esses problemas como nós sentimos. Sentem só os Drs. Alberto João Jardim e Mota Amaral e pouco lhes diz a Madeira e os Açores!...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, V. Ex.ª gastou dez minutos do seu precioso tempo e eu estava a ouvi-lo e a dizer-me: «O Sr. Ministro veio enganado e atrasado.» Isto, porque eu não falei do défice democrático, não falei da interpelação feita pelo Partido Socialista, não falei das inúmeras questões concretas que todas as bancadas colocaram sobre o abuso do poder na Madeira. E pensei assim: «Mas onde é que estava o Sr. Ministre), que escolhe agora uma interpelação do CDS para responder ao PS quando os protagonistas do PS nem sequer estão aqui presentes?» Não seria eticamente correcto que o Governo tivesse dado respostas para todos os problemas de défice democrático e se fizesse representar no respectivo debate, em vez de agora, passados íamos dias, a propósito de solidariedade nacional vir mostrar a solidariedade, com Alberto João Jardim sobre o défice democrático?
Mas V. Ex.ª depois, quando deu conta do caminho que estava a trilhar, entrou no assunto, então gostei de o ouvir. Porque V. Ex.ª é um dos grandes especialistas de programas, discursos, aproveitamentos parlamentares, aproveitamento dos telejornais para as campanhas eleitorais! Não há dia em que V. Ex.ª não faça campanha eleitoral a título de porta-voz do Governo!
Vozes do PSD: - Não é justo!
O Orador: - E vem V. Ex.ª dizer-me que a 21 de Maio, em que normalmente pela agenda parlamentar que nos cabe, o CDS apresenta uma interpelação - V. Ex.ª utilizou as seguintes palavras - que o CDS usa armas de arremesso político! Nós não arremessamos nada, não arremessamos armas políticas, nem pessoas, porque não fazemos esse desporto.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - É um amor de pessoa!
O Orador: - O que fazemos são interpelações. E V. Ex.ª há-de dizer-me em que parte da minha interpelação viu qualquer arremesso de uma arma política, desafio-o a dizer...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: -... uma única frase,, um único número, um único juízo que tenha feito na minha intervenção que esteja errado, desviado da verdade, que esteja a ser apontado com um dedo acusador sem objecto definido, que esteja a mostrar defeitos que não existam...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: -.... ou que esteja a fazer o que quer que seja desta maneira. Por que é que V. Ex.ª traz este discurso feito, de eleitoralismo barato? Por que é que diz que tudo quanto aqui se diz são sempre armas de arremesso político contra o Governo da República, contra V. Ex.ª. Que arremesso, quem arremessou o quê e contra quem? V. Ex.ª considera-se arremetido?: Porquê?
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não chore!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, já gastou quatro minutos!
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Em segundo lugar, quanto a esta questão da integração regional, da solidariedade, é fácil mastigar conceitos. Onde está a prova da resposta às 18 perguntas que fiz, e muito repelidas? Diga-me o que é que o Governo tem feito quanto a tudo quanto indaguei.
V. Ex.ª, pelo menos, podia ler a bondade de dizer: «Trouxe o meu discurso leito para a televisão, para logo no Telejornal passarem um excerto (que eles já sabem qual é)!...
Risos do PCP e do PS.
Quanto as 18 perguntas, estão aqui os meus colegas que responderão no eseuro, para o Telejornal, mas responderão para o 24 Horas!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, atenção ao tempo!
O Orador: - Vou terminar. Sr. Presidente. VV. Ex.ªs nem sequer teve a hombridade de dizer: «Os meus colegas responder-lhe-ão. V. Ex.ª agasta-se mastiga o que chama «discursos do Estado». Por que é que o discurso que V. Ex.ª faz é discurso de Estado e aquele que eu faço não o é? O Estado é seu?
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Tudo aquilo que V. Ex.ª profere o do Estado? O Sr. Ministro tem o monopólio do Estado? Traz o cr achai de defesa do Estado? Que traz V. Ex.ª a mais que nós, Deputados, para dizer que aquilo que sai da sua boca é voz do Estado e aquilo que eu digo é partidário e não do Estado? Porquê, Sr. Ministro?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir. Sr. Deputado...
O Orador: - Finalmente, V. Ex.ª vem dizer que isto é uma táctica política; táctica política de quê? Táctica política de quem? Falar da Madeira e dos Açores é táctica política?
Quer o Sr. Ministro que todas as vezes que se fale de insularidade, que se refiram os problemas das Regiões Autónomas isso seja táctica política? Se é táctica política referir ;isso e trazer o Governo a esta Câmara, pela primeira vez na história da II República, para falar das Regiões Autónomas e de solidariedade nacional, bendita essa táctica política, bendito este momento e que os seus cole-
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gás saibam responder as 18 perguntas que formulei. O meu discurso já foi distribuído, leiam-no e espero que tenham respostas.
(O orador reviu.)
Aplausos do CDS e do Deputado do PS Raúl Rêgo.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, peco-lhes para não ultrapassarem os tempos regimentais. Como houve tolerância da Mesa relativamente ao Sr. Ministro, a Mesa viu-se depois na obrigação de permitir um prolongamento ao Sr. Deputado Narana Coissoró. Mas peco-lhes que sejam o mais concisos possível e que não ultrapassem muito o tempo.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Narana Coissoró fez uma afirmação que não deixou de ofender a minha honra e a dos meus companheiros, Deputados das Regiões Autónomas. Referiu que, se na sua intervenção ...
O Sr. José Magalhães (PS): - Anunciou a palavra magica!
O Orador: -... tivesse feito alusões ao Dr. Alberto João Jardim ou ao Dr. Mota Amaral, não faltariam pedidos de esclarecimento por parte dos Deputados das Regiões Autónomas.
Sr. Deputado, compete-nos a nós, aí também em plena autonomia, ajuizar da oportunidade dos pedidos de esclarecimento em relação as outras intervenções.
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Compele aos senhores e aos outros!
O Orador: - A decisão de pedir esclarecimentos compele-nos a nós soberanamente...
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Agora tom o exclusivo!
O Orador: - A decisão de fazer ou não pedidos de esclarecimento compete a cada Deputado individualmente, designadamente a V. Ex.ª também.
V. Ex.ª tratou de problemas concretos das Regiões Autónomas e referiu que nós, Deputados dessas Regiões Autónomas, não nos interessámos em lhe pedir esclarecimentos. É realmente aqui que as suas palavras se traduzem numa ofensa à honra dos Deputados das Regiões Autónomas.
O pedido de esclarecimento pressupõe antes de mais, pela sua natureza, a menor clareza da intervenção. Como a intervenção de V. Ex.ª foi clara, não necessitei de pedir-lhe qualquer esclarecimento, tirei o alcance global da sua intervenção. Até lhe digo que também estou preocupado com alguns dos problemas que colocou.
A questão é, sim, a da motivação deste pedido de interpelação e do enquadramento que V. Ex.ª faz dessas questões em termos de elencar esses problemas, como sempre e necessariamente, decorrentes de falta de solidariedade do Governo da República, o que não é verdade, l lá problemas na Região Autónoma da Madeira e na Região Autónoma dos Açores, como em todas as partes do País, e a circunstância de esses problemas existirem, seja na Madeira, seja nos Açores, seja em Trás-os-Montes, seja no Algarve, não decorre necessariamente, como tentou enquadrar e explicar na sua intervenção, de falta de solidariedade do Governo. Infelizmente, o Governo não pode atender a todas as situações e os problemas continuarão a subsistir.
Cabe-nos, obviamente, empregar lodo o empenho na sua solução. E terei de confirmar, a este respeito, que o governo do Prof. Cavaco Silva, quer em termos directos da sua actuação interna, quer em termos de articulação com as Regiões Autónomas no âmbito comunitário, tem sido de plena solidariedade.
Há, efectivamente, questões pontuais que tem de ser resolvidas, sobre algumas das quais me pronunciarei. VV. Ex.ªs verão quais são realmente as preocupações dos Deputados que integram o Partido Social-Democrata relativamente às Regiões que também representam.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, meu caro amigo, não ofendi a sua honra nem a dos restantes Srs. Deputados, lá aqui assistimos a debates e sabemos o que os senhores pretendem e aquilo que querem mostrar. Se amanhã formos ler a imprensa dos Açores e da Madeira veremos o que eles relatam, como também vimos aquando do debate sobre o défice democrático.
Diz o Sr. Deputado que V. Ex.ª é o juiz de saber se deve ou não pedir esclarecimentos. A verdade é que eu também sou o juiz de tirar todas as ilações do silêncio político de VV. Ex.ªs, como efectivamente tiro e a comunicação social também vai fazer o mesmo.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!
O Orador: - Os senhores vieram aqui dizer que concordavam comigo e que, por isso, não me faziam perguntas, quando dizem que a minha intervenção foi tão clara que não mereceu pedidos de esclarecimento da vossa parte.
Isto mostra que os senhores não tiveram a coragem de, durante iodos estes meses, suscitar na Assembleia da República esses problemas. VV. Ex.ªs dizem sempre que as questões das Regiões não se debatem nesta Assembleia, porque é na assembleia legislativa regional da respectiva Região Autónoma que se devem debater! Mas, quando faço perguntas sobre matérias da competência da Assembleia da República, VV. Ex."" gritam «Viva o Prof. Cavaco Silva. Viva o Prof. Cavaco Silva», «Ele fez tudo e nada há para responder!»
Risos do CDS, do PS e do PCP.
Das duas uma: ou VV. Ex.ª acham que a Assembleia da República é competente para tratar de problemas que são da sua alçada - e não podem responder com «Viva
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Cavaco Silva» - ou dizem quo esta Assembleia não é competente - e respondem «Viva Alberto João Jardim da Madeira».
Risos do CDS, do PS e do PCP.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Viva Narana Coissoró!...
O Orador: - Isto não são respostas: são, vi vas para, a vossa recondução como Deputados na próxima legislatura.
Risos do CDS, do PS e do PCP.
Aplausos de alguns Deputados do PS.
Finalmente, V. Ex.ª conseguiu dizer que também eslava preocupado, ao contrário do que o Sr. Ministro disse. O Sr. Ministro disse que não eslava preocupado com nada, porque a autonomia e a solidariedade nacional vão de tal maneira de braço dado que tudo o que o Governo faz é a medida justa, nem mais nem menos, nem muito nem pouco
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E moralmente!
O Orador: - Também a nós nos assiste o direito de fazer um juízo político da iniciativa da interpelação.
Vozes do PSD: - É claro!
O Orador: - Muitas das interrogações que aqui se colocam e que abordei são, naturalmente, legítimas. Porquê esta interpelação agora? Porquê sobre este tema? Por que não, antes?
Também nós fazemos ó juízo político de que, ela surgiu agora e o tema é este por, naturalmente, estarmos em vésperas de eleições regionais nos Açores e na Madeira e importar mandar determinados recados políticos para aqueles dois arquipélagos. Temos o pleníssimo direito, de fazer este juízo político.
Se o Sr. Deputado não, o reconhece, penso que estará a manifestar alguma contradição nos seus próprios lermos, porque estará, no fundo, a dizer que tem dois pesos e duas medidas. Não esperava isso de si!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Eu não disse isso!
Aplausos do PSD.
O Orador: - Sois o que sois! Sois autonomia, sois o governo central, sois todos laranjas! V. Ex.ª está preocupado, mas o Sr. Ministro não. Sr. Ministro, ouça estas preocupações e depois responda!
(O orador reviu.)
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Ministro Adjunto deseja responder já às questões entretanto colocadas ou no fim, depois de formulados os restantes pedidos de esclarecimento?
O Sr. Ministro Adjunto: - Já, se o Sr. Presidente mo permitir.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, tentarei ser rápido e sintético na resposta às questões por si colocadas, as quais, de resto, agradeço.
Falou o Sr. Deputado da expressão que usei de que o tema da autonomia regional e da solidariedade nacional não deveria ser usado como arma de arremesso político. Obviamente que o disse, porque considero que é uma questão demasiado séria e importante para ser usada como instrumento de ataque ou de crítica política. O Sr. Deputado interpreta-a, naturalmente, como uma acusação dirigida ao seu grupo parlamentar. Outros terão o direito de fazer outra interpretação.
Penso que, sobretudo, a questão é outra, que passo a referir. O Sr. Deputado acabou de dizer há momentos, e bem, que está no pleníssimo direito de fazer um julgamento político da actuação do Governo, designadamente neste domínio. Tem esse pleníssimo direito, que lhe assiste constitucional e politicamente.
Quanto às questões que diz ter abordado na sua intervenção em número de IX, pareceu-me até, com toda a franqueza, terem sido mais, mas admito agora - e ainda bem - que sejam 18. Tinha entendido que eram aliás, como de resto entendi ou, pelo menos, pensei entender várias outras coisas. Sobre isso, devo salientar que estamos ainda no início do debate,, e que, estando aqui presentes vários membros do Governo, eu e os meus colegas teremos muito gosto em ir tentando responder, ao longo do debate, às várias questões que forem colocadas. Eu próprio já avancei com alguns dados que penso serem importantes e que, segundo creio, o Sr. Deputado não terá, casualmente, abordado na sua intervenção, por certamente os conhecer.
Não deixo, todavia, de ficar um pouco perplexo com muitas das questões que suscitou na sua intervenção. No fundo, o Sr. Deputado fez uma intervenção levantando um conjunto de questões sobre, as Regiões Autónomas como se nada estivesse regionalizado em lermos de atribuições e competências e como que praticamente tudo fosse da competência do poder central.
O Sr.. Narana Coissoró (CDS): - Não é verdade!
O Orador: - Isso demonstra evidentemente - permita-me que lhe diga, sem nada de pessoal - algum desconhecimento ou alguma impreparação do debate. É que algumas- das questões que o- Sr. Deputado claramente aqui colocou ou estão já resolvidas ou estão em vias de resolução, designadamente por via de programas estruturais. O Sr. Deputado manifesta de facto algum desconhecimento.
Face a essas questões - e efectivamente muitas delas não tem razão de ser, o que se demonstrará ao longo do debate - fico na dúvida sobre se, afinal, é verdadeira a afirmação que constava de um jornal desta manhã de que o Sr. Deputado eslava com dificuldades em preparar esta interpelação. Fiquei com algumas dúvidas a esse respeito.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para defesa da consideração.
O Sr. Presidente (Ferraz do Abreu): - Tem a palavra. Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, toda a gente sabe que, além de Deputado, sou académico. Não sou Deputado pelo círculo eleitoral da Madeira, nem residente na Madeira. Nilo tenho o Espírito Santo nem carisma apostólico para saber tudo o que se passa na Madeira e nos Açores.
É verdade que disse a uma jornalista que eslava com uma certa dificuldade em organizar a interpelação, porque linha de estudar e de apresentar, com o nível que o meu grupo parlamentar habituou o País, uma coisa que fosse digna. Não vejo que maí há nisso.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: - Far-lhe-ia justiça se, perante esta dificuldade que tive, o Sr. Ministro tivesse de reparar, por exemplo, que «foi tal a dificuldade que o Sr. Deputado se enganou», ou «não disse», ou «disse uma coisa em vez de outra». O que, pelo contrário, acontece é que esta atenção a pequena miudeza jornalística, em vez de a dignificar, é aqui trazida como piada em termos de se dizer que eu fiz a interpelação com dificuldade.
A dificuldade está aqui, ao meu lado, com 44 Deputados do PSD aqui sentados que não conseguem estrebuchar sobre problemas da Madeira e dos Açores, alguns sendo eles naturais de lá e aí exercendo o poder. Não sou eu, mas a bancada da maioria, quem tem dificuldades.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Que dificuldades?
O Orador: - É isso que V. Ex.ª deve registar e levar ao conhecimento do Prof. Cavaco Silva, para ele tomar nota.
(O orador reviu.)
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, não tive qualquer intenção de o ofender minimamente ou de ofender a sua bancada.
De resto, presto homenagem, não apenas por este debate como por muitos outros, à circunstância de um grupo parlamentar relativamente reduzido, como é o do CDS, fazer um grande esforço de preparação de muito debates, quer em sede de Plenário quer em sede de comissão, e neles participar. Faço-o aqui publicamente, sem qualquer cinismo e com total sinceridade.
Devo é dizer ao Sr. Deputado, com toda a franqueza, que apenas fiz uma constatação. Ao associar uma coisa que li hoje de manhã, não tive qualquer intenção de ofender. Penso até que esse facto não é minimamente ofensivo. Atento o fair play que o Sr. Deputado costuma ler, custa-me admitir que tenha ficado ofendido.
Eu, pelo contrário, não fico minimamente ofendido com coisas que a meu respeito V. Ex.ª disse há pouco, quando me dirigiu um pedido de esclarecimento, pela simples razão de pensar ter-se tratado também de uma apreciação desajustada e incorrecta que fez, naturalmente própria do posicionamento de oposição que a bancada do Sr. Deputado assume, mas que não corresponde minimamente à verdade.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É o calor do debate!...
O Orador: - Mas longe de mim ficar ofendido! Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Antes de lhe dar a palavra, a Mesa quer solicitar aos Srs. Deputados que não abusem das figuras regimentais da interpelação a Mesa e da defesa da honra ou consideração, porque, sendo os tempos disponíveis para este debate muito latos, as previsões mais optimistas apontam para que ele não termine antes das 21 horas.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Garanto-lhe, Sr. Presidente, que não haverá abuso da minha parte, pois apenas tenciono fazer uma pergunta à Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Peço, assim, aos Srs. Deputados que, na medida do possível, reservem tudo o que queiram dizer e seja suscitado pelas sucessivas intervenções - o debate é extremamente importante - para as intervenções que, naturalmente, irão fazer.
Tem então a palavra, para interpelar a Mesa, o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, porque o Sr. Deputado Narana Coissoró insiste em lançar o labéu da incapacidade dos Srs. Deputados eleitos pelos círculos eleitorais dos Açores e da Madeira, pergunto: estão ou não inscritos para intervir no debate Deputados do Partido Social-Democrata? Quais?
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Peça desculpa. Sr. Deputado Narana Coissoró!
Neste momento registam-se manifestações de trabalhadores da Fábríca-Escola Irmãos Stepliens, dizendo: «Trabalho sim. desemprego não.»
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Peço aos agentes da autoridade o favor de evacuarem as galerias, ficando, no entanto, as pessoas que não se manifestaram.
Pausa.
Respondo à interpelação do Sr. Deputado Mário Maciel dizendo-lhe que há vários deputados do seu partido inscritos para intervenções. Além do próprio Sr. Deputado Mário Maciel, estão inscritos os Srs. Deputados Rui Ávila, Guilherme Silva, Marques da Silva e Reis Leite, todos eleitos pelos círculos eleitorais das Regiões Autónomas.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, na sua intervenção levantou dúvidas sobre o interesse genuíno dos partidos da oposição em
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relação ao regime autonómico e ao problema da solidariedade nacional para com as Regiões Autónomas.
Julgo que o Sr. Ministro não tem razão nessa afirmação, na medida em que é facilmente demonstrável que isso não é assim - e lógica e naturalmente que me refiro ao comportamento do Grupo Parlamentar do PCP. Basta, Sr. Ministro, ter assistido, ao longo de vários anos, aos debates orçamentais e consultar os Diários da Assembleia da República para ver quem, de facto, não nas palavras mas nos actos, tem defendido a autonomia regional e a solidariedade nacional.
Julgo que não será demasiado dizê-lo, porque isso está expresso no Diário, através de votações e posicionamentos diversos, que, muitas vezes, quando os próprios Deputados do PSD oriundos dás Regiões Autónomas apresentam propostas em sede orçamental recebem como apoio, exclusivamente, a votação dos Deputados das oposições e não dos Deputados da sua própria bancada.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Do CDS não!
O Orador: - Eu sei que o Sr. Deputado Nogueira de Brito normalmente vota contra esse tipo de propostas, mas isso é outro tipo de questão. Não estava a referir-me a todos os Deputados da oposição!...
O Sr. Nogueira de. Brito (CDS): - Exactamente!
O Orador: - Por outro lado, existe também a questão dos jogos eleitorais e da sua relação com a autonomia regional.
Sr. Ministro, julgo que é complicado para o Governo, que representa, falar na ligação dos jogos eleitorais com o apoio às Regiões Autónomas, designadamente com o apoio financeiro, porque se há uma característica clara do posicionamento do Governo da República, do PSD,, relativamente às Regiões Autónomas no referente as transferências financeiras para as Regiões Autónomas, a sua estreita relação com os períodos eleitorais.
E mais do que isso: há uma estreita ligação com ó peso relativo que os Deputados do PSD eleitos pelas Regiões Autónomas tem nesta Câmara. Isto é, quando eles são necessários para formar uma maioria ou para aumentar o número de votos do Grupo Parlamentar do PSD, é claro que as transferências para as Regiões Autónomas crescem; quando eles não são necessários, ou seja, dispensáveis em termos de votos, essas transferências não crescem.
Aliás, é contrariando a ideia que o Sr. Ministro há pouco referiu de que tem havido, um crescimento enorme das transferências financeiras para, as Regiões Autónomas, basta consultar a publicação da Secretaria Regional das Finanças e do Planeamento dos Açores para verificar a ligação directa da evolução das transferências com a situação que há pouco referi.
Assim, podemos ver que as transferências financeiras aumentaram dê 1986 para 1987, ;atura em que ainda não havia maiorias absolutas e em que, portanto, eram necessários os votos dos Deputados do PSD da Madeira e dos Açores, enquanto que em 1988, já o PSD tinha; maioria absoluta, as transferências financeiras estagnaram, em termos nominais, e depois, ao fim de três anos, aumentaram 5 %, isto quando a inflação foi superior a 30 %.
O Sr. Rui Ávila (PS): - É uma chatice publicarem esses livros!
O Orador: - De facto, há uma ligação directa!
Finalmente, Sr. Ministro, gostaria de perguntar-lhe quais são as medidas que o Governo da República está a tomar ou a prever para compensar, minimamente, os fortes custos financeiros sociais e económicos que a problemática da base das Lajes e das instalações dos franceses nas Flores está a provocar na Região Autónoma dos Açores. Última questão: não, preocupa o Sr. Ministro que, no último quinquénio, o produto das Regiões lenha crescido a taxas mais baixas que o produto nacional? Isto é, não o preocupa que, em vez de haver uma convergência nominal entre todo o País, esteja a haver uma divergência real entre as Regiões Autónomas e o continente?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Ministro, antes de lhe perguntar se pretende responder já ou no fim, quero recordar-lhe que já usou dez minutos dos quinze que tem disponíveis para responder aos pedidos de esclarecimento, restando-lhe apenas cinco minutos e estando ainda inscritos quatro Srs. Deputados.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, se me permitisse, vou responder já por uma razão simples: não quero ter qualquer desconsideração para com o Sr. Deputado Octávio Teixeira, e tê-la-ia se não respondesse de imediato, como fiz anteriormente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Ministro é o gestor do seu tempo. Quis apenas lembrar-lhe de que dispõe de cinco minutos, embora a Mesa possa condescender um pouco para responder a todos os pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra, Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Muito obrigado, Sr. Presidente. É bom ser árbitro em qualquer coisa na vida!...
É interessante!
O Sr. Deputado Octávio Teixeira, não sendo jurista, tem um afinado sentido jurídico, ao dizer que eu coloquei dúvidas sobre a questão da oposição versus autonomia. De facto, posso lê-las colocado a contrario sensa, uma vez que o que eu disse o que nós, por lodo o nosso passado, lemos um legítimo orgulho na autonomia regional, sempre levantámos menos obstáculos e sempre fomos muito mais defensores da questão da autonomia do que qualquer outro partido. Todavia, isto tudo quer dizer, obviamente, que não ficamos satisfeitos com todos aqueles que sinceramente e com convicção tem defendido e lutado pela autonomia regional!
Em todo o caso, penso que o povo tem reconhecido, através das votações claras e inequívocas que tem feito, quer nos Açores, quer na Madeira, quer no continente, que temos estado no bom caminho do ponto de vista da autonomia e da solidariedade nacional.
A segunda questão tem a ver com as transferências financeiras em períodos eleitorais com o objectivo de ganhar votos ou de garantir maiorias. Sr. Deputado, penso que, de facto) não só é completamente descabida essa sua afirmação como também se trata de acusações ou críticas semelhantes às que já muitas vezes- ouvimos, designadamente em momentos eleitorais nesta Câmara, ao sermos acusados de eleitoralismo.
Sr. Deputado, penso que, ao fazer críticas e acusações dessa natureza, o senhor - e digo-o com toda a fran-
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queza - não me está n criticar! Nem a mim nem a» Governo! Está, sim, a criticar os Portugueses, dizendo que eles são distraídos, que não são inteligentes, que se deixaram manipular e que o seu voto não foi consciente e esclarecido. A ofensa é, pois, para os Portugueses e não para mim, em termos pessoais, nem para o Governo de que laço parte!
Quanto à questão da base das Lajes, já expliquei ao Sr. Deputado José Magalhães por que razão...
O Sr. José Magalhães (PS): - Mal, mal!
O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, é mais ou menos como as suas questões, que, entretanto, tive oportunidade de ler, porque há pouco não tive tempo.
O Sr. José Magalhães (PS): - Então aproveite para responder!
O Orador: - Se o Sr. Deputado, com estas questões quase tão de pormenor,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Mas as Lajes são um assunto menor?
O Orador: -... considera que isso é o contributo relevante para uma questão revelante como esta, então, por amor de Deus, estamos entendidos!... A sorte que o senhor tem é a de os outros Srs. Deputados, penso, ainda não conhecerem esse texto!...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas o que gostaria de dizer, respondendo ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, é que a questão da base das Lajes é delicada, é complexa - não vamos dizer que é uma questão fácil. E é uma questão complexa, desde logo, Sr. Deputado - sejamos trancos! -, por uma razão muito simples: é que nos últimos anos houve uma alteração geoestratégica na cena internacional, devida ao fim do comunismo e do bloco de Leste.
Na verdade, toda a gente sabe qual é a política da Administração Norte-Americana, não apenas para Portugal mas também quanto a muitas outras bases que tem no resto no mundo... E toda a gente sabe que é política da Administração Norte-Americana desactivar cerca de 1 milhão de homens. Evidentemente que esta situação também nos preocupa!
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, informo-» de que já esgotou três minutos.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar.
Porque considero que esta questão é importante, gostaria de dizer que continuaremos, como é nossa obrigação, a defender os interesses nacionais, designadamente os do território dos Açores, e levaremos este assunto até à exaustão! De qualquer forma, penso que não é justo, não é legítimo, não é politicamente sério e adequado estar a jogar com o legítimo e normal desespero decorrente desta situação, designadamente para o arquipélago dos Açores! De facto, jogar com isso e lazer aproveitamentos a partir do desespero dos outros não me parece minimamente correcto!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não é isso!
O Orador: - Quanto ao demais, dir-vos-ei que defenderemos intransigentemente, como já foi explicitado com muito mais pormenor na Comissão, os interesses nacionais, que consideramos legítimos e adequados.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, no decurso da resposta que agora acaba de aduzir, o Sr. Ministro fez algumas alusões bastante desprimorosas ao questionário que tivemos ocasião de entregar à Mesa. Assim, gostaria de dizer alguma coisa, em nome da bancada do PS, porque o que foi dito foi excessivo e não pode ficar sem explicação.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, então vai usar da palavra ao abrigo da figura regimental de defesa da consideração. No entanto, peco-lhe que não ultrapasse o tempo que o Regimento permite.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, serei breve e até telegráfico.
Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Fico verdadeiramente surpreendido pelo lacto de o Sr. Ministro, em vez de valorizar e discutir uma a uma as questões que lhe foram entregues, entender que elas eram de pormenor... Evidentemente haverá outras questões, o CDS elencou 18 e nós seríamos capazes de elencar mais 15, 16, 20, 35. A questão não é o número das perguntas; a questão é que nenhuma das perguntas formuladas é despicienda, o que, aliás, V. Ex.ª acaba de demonstrar.
Com efeito, o fim dos financiamentos da economia açoriana e da economia nacional por força das alterações geoestratégicas e da renegociação do acordo das Lajes não é uma pequena questão, ela é uma questão relevante! Aliás, V. Ex.ª foi o próprio a confessar que não podia adiantar mais nada porque, em seu entendimento, as negociações em curso impediam-no de deduzir mais argumentos Ora, isso significa reconhecer a importância e pertinência da questão.
Por outro lado, a questão institucional, a questão da dificuldade de aplicação das normas constitucionais originárias sobre a participação das Regiões, por exemplo, na definição da política económica, financeira e monetária, também não é de menor importância.
Sr. Ministro, pense, à luz de Maastricht, o que é que isto implica e como essas normas têm de ser relidas para encontrarmos mecanismos legais que dêem as Regiões poderes de participação que neste momento estão verdadeiramente prejudicados.
De tacto, não é uma questão pouco importante e o silencio do Governo, por exemplo, quanto a uma lei quadro das finanças regionais não é saudável Assim sendo, V. Ex.ª não tem qualquer razão para desvalorizar perguntas desse tipo.
Por outro lado, também não percebo por que é que V. Ex.ª desvaloriza as perguntas sobre a banana ou sobre os lacticínios açorianos. São questões dramáticas, em certos casos!
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Mais ainda, Sr. Ministro: não tive oportunidade, por mero acaso, de juntar ao texto que entreguei a Mesa uma cópia da Resolução n.º 84/92, agora publicada pelo governo regional dos Açores, em que, mais uma vez, se adia a publicação da conta da Região e se fixa a data de 31 de Julho de 1992 como data limite para o pagamento das despesas em conta do orçamento da Região Autónoma dos Açores,...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Exactamente sete meses depois!
O Orador: - ... porque as contrapartidas não tem inscrição e o dinheiro não foi arrecadado. Ou seja, há uma situação muito melindrosa neste momento, tal como leni havido todos os meses e nós aludimos a essas situações no bloco de perguntas que colocámos.
De qualquer forma, se V. Ex.ª acha que há outras perguntas mais necessárias, então peço-lhe que responda, mas que, previamente, tenha a gentileza e a cordialidade institucional de responder a estas, uma vez que nenhuma delas é pouco importante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era isto que gostava que ficasse claro, não vá alguém julgar - aliás, tenho a certeza que ninguém o fará, mas ...- não vá alguma alma mais malévola entender que V. Ex.ª estava a depreciar esta iniciativa por achar, porventura; que tem o monopólio das boas perguntas. Não tem! Tenha o das boas respostas e estará de parabéns!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto...
O Sr. Ministro Adjunto; - Sr. Presidente, de resto, faço-o sempre com todo o gosto já que lenho muito prazer em abordar as questões colocadas pelo Sr. Deputado José Magalhães.
Há pouco quando fiz referência ao carácter um pouco vago e pontual de algumas questões levantadas neste momento, foi pelo facto de o Sr. Deputado estar um pouco numa situação de favor, de privilégio, porque nunca o interrompo, o que já não acontece com V. Ex.ª.
O Sr. José Magalhães (PS): - Mas pode interromper à vontade!
O Orador: - Más não quero. Além disso, gostava de dizer ao Sr. Deputado que algumas das questões aqui apresentadas são, de facto, importantes outras, apesar de importantes, são eminentemente pontuais.
Evidentemente, há pouco quando me colocou ás questões nem sequer tinha o texto, portanto, não iria responder-lhe. V. Ex.ª colocou-me questões sobre as Lajes e sobre o aeroporto, que são importantes, e em relação às quais tentei responder o melhor possível.
Sr. Deputado, com toda a franqueza; existem questões relacionadas com a agricultura nos Açores, como são as da banana e do leite, que são decisivas e importantes. Por exemplo, com toda a franqueza, surpreende-me um pouco que ainda não tivesse sido colocada a questão no sentido de saber qual é o ponto da situação de um instrumento decisivo para os Açores e para a Madeira, em termos de reestruturação futura, designadamente na agricultura, como e o programa comunitário POSEIMA - se foi colocada, então peço desculpa -, que é uma questão determinante. Nesse programa vai encontrar, além de outras situações que ao longo do debate iremos esclarecer, respostas bastante positivas para muitas das questões que se colocam relativamente à agricultura e a outros sectores dos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
Ao longo do debate leremos muito gosto em prestar todas as explicações e todos esses esclarecimentos. Com o empenhamento e o interesse que o Sr. Deputado tem na questão da autonomia regional - que não posso obviamente colocar em causa -a única coisa que hão quero é que saia menos esclarecido deste debate.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não me faça chorar!
O Orador: - Sr. Deputado, não tenho qualquer monopólio é V. Ex.ª também não, mas, seguramente, está a defender esta questão com sinceridade e nós estamos a tentar ajudá-lo a compreender o esforço e a excelência deste relacionamento que tem vindo a ser feito entre o Governo da República e os governos regionais para o desenvolvimento das duas Regiões.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Pará pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, realmente, inscrevi-me para fazer um pedido de esclarecimento sobre um ponto inicial da sua intervenção, mas já lá vai tanto tempo que, posteriormente, o Sr. Ministro teve ocasião de chamar a atenção para a importância, para a relevância e para seriedade das questões que hoje aqui estamos a abordar, chegando até a dizer quê este debate era necessário; simplesmente, esqueceu-se - e, porventura, algumas bancadas lambem - que no início da sua intervenção passou cinco minutos a desqualificar este e outros debates desta natureza sobre as Regiões Autónomas.
Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Ministro Adjunto fez um processo, de intenções a quem tomou a iniciativa, de fazer este debate aliás, é a primeira vez que se realizar sobre os mecanismos da solidariedade com as Regiões Autónomas e sobre a autonomia.
Pela primeira vez o Governo tem a ocasião de participar num debate que considera sério, importante e necessário, mas, ao mesmo tempo, não se coibiu de o desqualificar e diminuir, porque é da iniciativa de um partido da oposição e, sobretudo, porque ocorre num ano em que há eleições...
Ora, a questão que quero colocar-lhe é precisamente no sentido de saber que entendimento tem o Sr. Ministro do papel das eleições na democracia, do papel que as eleições tem em provocar o debate e qual o papel de um debate desta natureza no. necessário esclarecimento dos eleitores em democracia que a impressão com que fiquei, foi que o Sr. Ministro Adjunto gostaria que a proximidade dos actos eleitorais provocasse não o aparecimento de debates e de esclarecimentos, mas a sua diminuição ou o seu eventual desaparecimento.
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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Cheguei a temer que o Sr. Ministro amanha colocasse aqui uma proposta de lei justamente para impedir o crescimento dos debates ou para impor a sua diminuição porque há anos em que se verificam eleições!
Sr. Ministro Adjunto, nos próximos anos registam-se eleições em Portugal praticamente ano a ano e 6 natural que suscitem a necessidade de esclarecimento dos eleitores. É natural que esse esclarecimento se taça com um debate que se realize na sua sede própria que é a Assembleia da República. E se forem os partidos da oposição a suscitar tais debates isso não será motivo para condenações por parte da bancada do Governo, mas será um motivo para, possivelmente, expiar as culpas pela falta de iniciativa do Governo e do partido que o apoia em suscitar esses mesmos debates necessários, sérios e importantes!
O Sr. Ministro Adjunto lançou um processo de intenções a esta bancada e ao meu partido que considero injustificável e inaceitável. Não quero devolver as acusações de eleitoralismo à procedência porque este debate não se destina a transformar-se numa arma de arremesso político, mas, já agora, pergunto-lhe se considera ou não eleitoralismo que, por exemplo, na Região Autónoma dos Açores tenha havido em cerca de um mês, ou seja, de 10 de Abril a 15 de Maio, 113 despachos da Secretaria Regional da Habitação e Obras Públicas referentes a subsídios à habitação degradada no valor de cerca de 300 000 contos.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - É trabalho fundamental! Acha mal?!
O Orador: - É preciso esclarecer que este não é o ritmo normal de trabalho da Secretaria Regional de Habitação; trata-se de um ritmo de produção legislativa sem precedentes. Portanto, pergunto ao Sr. Ministro, que, pelos vistos, é especializado nestas questões, se atribui esta aceleração brutal do trabalho da Secretaria Regional à proximidade das eleições e, sendo assim, se estamos a assistir à instrumentalização de fundos públicos para fins eleitorais.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, em primeiro lugar, duas respostas rápidas quanto à desqualificação do debate. Penso que 6 uma questão recorrente que já esclareci, mas não quero deixar de responder-lhe outra vez.
Sr. Deputado, não desqualifiquei minimamente o debate, antes pelo contrário, até disse que o debate é importante. O que fiz foi um juízo político-.estou no meu direito - relativamente à oportunidade quanto ao momento do debate e, como é natural, associei-o à questão eleitoral.
Penso que é legítima esta associação não só da minha parte, mas também de muita gente. Ao longo dos anos nunca o seu grupo parlamentar tomou uma iniciativa desta natureza. Mas se para o futuro, passado o período eleitoral, se mantiver esta constância, esta permanência, esta já maior preocupação pelas questões das Regiões Autónomas, designadamente em relação a outros debates, pode ser que nessa ocasião já não o desqualifique nos moldes em que o Sr. Deputado diz que o fiz desta vez. Sr. Deputado, quanto à outra questão relacionada com cento e não sei quantos despachos de um secretário do governo regional dos Açores, quero dizer-lhe o seguinte: das duas uma, ou o Sr. Deputado pensa que sou politicamente distraído - penso que não me foram essa injúria ou então tem uma deficiente compreensão da autonomia regional. Porque essa questão que, com toda a franqueza,...
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Mas faça o juízo político!
O Orador: - Sr. Deputado, permita-me que continue, por favor. Essa é uma questão que tem de ser colocada - e é legítimo fazê-lo- na Região Autónoma dos Açores, nomeadamente na Assembleia Legislativa Regional. E porquê? Porque é preciso que compreendamos e não tenhamos qualquer deficiência de compreensão política a esse respeito. Ou seja, que o Governo da República não tem nem deve ter qualquer tutela sobre os órgãos dos governos próprios das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Por isso, é lá que deve ser colocada essa questão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marques da Silva.
O Sr. Marques da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, V. Ex.ª falou da solidariedade em abstracto, mas vou fazer-lhe perguntas concretas porque penso que a solidariedade é feita de actos concretos.
Um dos maiores problemas com que se debate a Região Autónoma da Madeira é o dos transportes marítimos. Sabemos que os fretes marítimos, assim como as despesas portuárias, atingem níveis absolutamente incomportáveis. Precisamente na última sexta-feira, por acaso na Madeira, ouvi um debate na televisão regional em que o próprio director regional dos Portos declarava, ou melhor, confessava, que o porto do Funchal era um dos portos mais caros do inundo juntamente com os portos de Leixões e de Lisboa.
Sr. Ministro Adjunto, Iara o Governo qualquer coisa para moralizar esta situação? Porque são 270 000 habitantes que vivem do acréscimo de preços resultantes destes fretes absolutamente exorbitantes.
Outro aspecto para o qual gostaria de chamar a atenção do Sr. Ministro é o seguinte: não houve transferências ainda bem dos Ministérios da Justiça e das Finanças, mas as secretarias notariais, as repartições de finanças e os tribunais existentes na Madeira ostentam a pobreza e a sujidade que está absolutamente contra a dignidade que é exigível tanto às pessoas que aí trabalham como às que se servem dessas instituições as quais pertencem esses serviços.
Sr. Ministro Adjunto, quando é que o Governo irá construir, num prazo relativamente rápido, edifícios relativamente dignos para esse eleito?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
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O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marques da Silva, sobre as questões da justiça pedia a sua compreensão, mas o Sr. Secretário da Justiça vai daqui a momentos lazer uma intervenção e, portanto, responderá com mais propriedade do que eu.
Em relação à questão dos portos, quero dizer que a preocupação que aqui manifestou é uma preocupação - legítima que, apesar de ser matéria regionalizada, vai ter também - esperamos nós -, a curto prazo, alguma tradução em termos de apoios no programa estural da Comunidade, o POSEIMA, que em princípio será aprovado na COREPER da Comunidade a 27 de Maio e no Conselho de Assuntos Gerais no próximo mês de Junho. Este programa comunitário terá também algumas respostas positivas para a questão que levantou no domínio dos transportes.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, não gostei de uma insinuação que fez - e to-mei-a só como insinuação de que os partidos da oposição apenas em períodos eleitorais tem levantado nesta Assembleia as questões da autonomia.
Se V. Ex.ª quiser pedir a alguns dos seus assessores que consulte a base de dados desta Assembleia, facilmente encontrará intervenções minhas sobre estes problemas com estas preocupações desde Março de 1990. E, já não falando em mim, refiro toda aquela situação que o Partido Socialista tem trazido a esta Câmara, quer aquando da discussão da Constituição, quer em 1987 aquando da aprovação do Estatuto dos Açores. É que as situações são sempre as mesmas. Aliás, é sintomático ver que aplaudo diagnóstico feito pelo CDS. E vai ser muito difícil, se o PSD - o PSD das Regiões Autónomas - quiser fazer também um diagnóstico sério sobre estas questões, fugir a muito daquilo que já foi dito até aqui.
Sr. Ministro, quanto à sua afirmação de que ultimamente não tem havido querelas mas uma excelência de relacionamento entre os governos regionais e tis governos da República, quero citar-lhe um jornal insuspeito, o Açoreano Oriental de Punia Delgada, onde o Sr. Secretário Regional das Finanças Valter Furtado diz - e são só títulos - «precisamos de instrumentos financeiros que permitam quebrar incertezas; por que nos havemos de endividar se o Estado tem compromissos connosco? Os Açores são fortemente afectados por políticas restritivas». Comente depois, se entender, Sr. Ministro!
Finalmente, Sr. Ministro, e, principalmente, Srs. Deputados do PSD, quanto à ausência momentânea dos meus colegas de bancada que há pouco aqui se verificou, gostaria de lembrar-lhes que no dia 30 de Maio, se bem se recordam, quando nesta Casa foi discutido, na generalidade, a 2.ª proposta de revisão do Estatuto dós Açores e a primeira proposta definitiva da Região Autónoma da Madeira, VV. Ex.ªs, Srs. Deputados das Regiões Autónomas, acabaram aí sozinhos nessa bancada.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Muito telegraficamente, Sr. Deputado Rui Ávila, gostaria de dizer-lhe que quanto à consideração que apoiou o diagnóstico feito pela intervenção do Sr. Deputado do CDS, penso que ninguém ficou minimamente surpreendido, mas gostei de registar a sua constatação.
Quanto à excelência do relacionamento entre os órgãos regionais e os órgãos do Governo da República, penso que ela existe, mas cada qual, como é óbvio, defende as suas competências e os seus interesses com determinação. E aí os governos regionais, há que lhes presidir justiça, tem sido empenhados e determinados. No entanto, quero salientar que falei da, excelência do relacionamento em comparação com determinado período histórico anterior a 1985 ...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ali!
O Orador: - ... e, nessa perspectiva, relativamente a 1985, penso que não, há de facto dúvidas de que o esforço de cooperação é agora muito superior ao que se verificou nessa ocasião.
Quanto à recorrente interpelação em matéria de eleitoralismo, penso, Sr. Deputado - e em resposta deixe-me fazer esta consideração -, com toda a franqueza, que V. Ex.ª corre o risco de ser censurado pela sua bancada, politicamente, como é evidente, porque está a dar demasiada importância a essa questão que suscitei na minha intervenção, o que significa que ficaram, de alguma forma, incomodados com a acusação política que fiz.
Quanto ao demais, tive muito gosto em ouvi-lo!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma, intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A autonomia constitucional é democrática dos Açores e da Madeira é politica,' administrativa e financeira. Os Açores e a Madeira tem órgãos e governos próprios.
É acto de justiça, pois reconhece legitimidade em históricas lutas entrelaçadas com seculares aspirações. É uma experiência descentralizadora de sucesso já que fez desabrochar especificidades culturais e potencialidades modernizamos sufocadas por uma ditadura colonialista e obscurantista. Há hoje uma matriz politica, social, económica e cultural autónoma nos Açores, imbuída no respeito pelos valores nacionais que professamos com orgulho mas com identidade própria.
A autonomia libertou nos de um estatuto subalternizado de cidadãos portugueses e conduziu-nos, como, aliás, o PSD sempre previu enfaticamente pelo pensamento visionário do Dr. Francisco Sá Carneiro, para a construtiva afirmação da idiossincrasia insular nó todo nacional.
Reforçaram-se laceis que a história explica e a cultura impõe. Desvendou-se a riqueza humana da «Açorianidade», esse neologismo de Vitorino Nemésio que tem cunho universalista e é cimento aglutinador de insularidades dentro da insularidade açórica.
A geografia impõe regras e condiciona nos Açores. Ela sulca a personalidade do açoriano como um vulcão que rasga a crosta terrestre e derrama a sua lava basáltica sobre a qual decidimos ter o direito de vi vermos, como cidadãos livres num País livre.
O Portugal democrático, de progresso e ressurgimento internacional, que a revolução de Abril almejou, está em construção permanente também nos Açores.
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Estamos, actualmente, em boa fase. Mas tempos houve de grande desorientação governativa e profunda perturbação social no continente. Já nesses tempos os açorianos, como que a prenunciar o Portugal de estabilidade de hoje, depositaram sempre nas umas eleitorais um cívico voto de confiança no PSD. E tem reiterado essa confiança. E voltarão a fazê-lo, porque a trajectória reformista imprimida é de sucesso e 6 prestigiada.
Aplausos do PSD.
Sob a liderança do Dr. Mota Amaral e volvidos 16 anos de governo regional social-democrata, a Região dos Açores já não é aquela região portuguesa marcada fatalmente pela miséria e pelo subdesenvolvimento. Apagámos esse estigma indigno com uma vontade política inquebrantável. Globalmente - temos de dizer sinceramente - há boa qualidade de vida nos Açores.
Mas não queremos estacionar, temos a legítima pretensão de nos aproximarmos gradualmente dos indicadores médios da Comunidade Europeia em matéria de conforto e qualidade de vida. O mesmo é dizer: criar ainda mais razões de fixação nos Açores e garantir um futuro viabilizante para a produtividade das novas gerações. O afluxo da comparticipação financeira comunitária em programas específicos de desenvolvimento da Região Autónoma dos Açores, e que foram arduamente negociados, tem sido muito significativo e só foi possível com o empenho solidário do Sr. Primeiro-Ministro e dos restantes membros do Governo da República envolvidos.
O apoio comunitário às Regiões ultraperiféricas portuguesas e o reconhecimento das suas especificidades consta mesmo do Tratado de Maastricht, em valiosa declaração anexa. Eis um cabal exemplo de solidariedade nacional e europeia para que o CDS medida na oportunidade política desta interpelação que, em nossa opinião, é algo tardia e eleitoralista. A comparticipação do Orçamento do Estado no orçamento regional tem sido, naturalmente, discutível mas tem-se exercido dentro dos parâmetros que os sucessivos ministros das finanças tem considerado ser os montantes possíveis do solidário contributo nacional.
Na década de 80, por exemplo, a receita da Região Autónoma dos Açores cresceu de 5 491 700 contos, dos quais l 867 000 do Orçamento do Estado, em 1980, para 62 265 800 contos, em 1990, dos quais 8 700 000 contos do Orçamento do Estado. Em 1992 a comparticipação do Orçamento do Estado foi de 11 900 000 contos num orçamento regional de 93 500 000 contos.
Todavia, a solidariedade nacional para com as Regiões Autónomas não se pode reduzir a uma pretensa dádiva financeira ou a um frio cálculo contabilístico do que vai, do que vem e do que se apura. Quem o fizer, obcecadamente, mata com o cifrão aquilo que não tem preço: a alma do povo açoriano.
Aplausos do PSD.
Os jovens querem investir os seus talentos na prometedora terra açoriana cujas potencialidades são inegáveis e não estão ainda totalmente usufruídas.
Não querem, ao invés dos seus pais e avós que a tal foram obrigados, derramar valiosas energias na construção de outros países que lhes de os meios que Portugal, para nossa vergonha, não soube ou não quis dar.
A emigração tem sido atenuada, todavia, pelo desenvolvimento regional. A variação negativa da população residente nas décadas de 60, 70 e 80 foi, respectivamente, de - 11,7 %, - 15,8 % e - 2,4 %.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A compreensível vulnerabilidade do desenvolvimento económico açoriano lerá de ser reduzida com o apoio, determinação e firmeza do Estado Português e na sequência de uma vontade política harmonizada entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio.
Impor soluções sem as consensualizar com os legítimos representantes do povo açoriano é ignorar, na prática, os fundamentos teóricos do interesse regional.
Resistir, com relutância, ao diálogo com os órgãos de soberania, em nome de uma autonomia radicalizada e arrogante, é dificultar, inutilmente, o imperioso entendimento institucional.
Isto não são constatações actualizadas, são orientações balizadoras indispensáveis, penso eu, para a correcta inserção do fenómeno autonómico na organização política do Estado Português.
Não há afirmação autonómica sem dialéctica discursiva com a soberania pela simples razão de que dar autonomia é dar poder.
O factor moderador deverá ser a solidariedade nacional que obriga, constitucionalmente, à recíproca entreajuda no debelar da motivação conflitual e ao respeito pela unidade nacional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: A autonomia regional não é um capricho gratuito de alguns políticos insulares para gerarem controvérsias e desagregações pessoalmente vantajosas. A autonomia regional é um feito constitucional que honra e orgulha o Portugal democrático e dá razão aqueles que, convictamente, se bateram por ela desde o remoto século XIX até aos constituintes de 1976.
É justo destacar a combatividade do Grupo Parlamentar do PSD de então pelos valores autonómicos e em corajosa disputa com o centralismo serôdio e patrioleiro do CDS, do PS e do PCP.
Aplausos do PSD.
Vozes d» PS: - Não apoiado!
Protestos do PCP.
O Sr. Rui Ávila (PS): - É ingrato para com o Sr. Deputado Jaime Gama!
O Orador: - Hoje estes partidos pregam a boa doutrina autonómica. O PSD regozija-se com tão espectacular conversão, mas lembra que os vossos pecados na matéria não vos dão autoridade maioria duvidar da originalidade do projecto autonómico social-democrala e da sua prestigiada autenticidade.
Aplausos do PSD.
O CDS e o PS pregam solidariedade nacional para com os Açores e a Madeira, para, logo de seguida, dentro de portas, aniquilarem com golpes palacianos os seus líderes regionais democraticamente eleitos em congressos.
Querem arrebatar-lhes a sua legítima candidatura a presidente do governo regional dos Açores e oferecê-la, com repugnante subserviência, a independentes oportunistas que dão entrevistas repudiando os partidos e os políticos, mas não desprezam, afinal, o seu apoio, porque só querem trampolim para a sua basófia.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Rui Ávila (PS): - Esse discurso está muito pouco ambientalista!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não estamos num comício, Sr. Deputado!
O Orador: - O PSD não se sujeita, nem se sujeitará a essas indignidades e está solidário no continente, na Madeira e nos Açores em tomo de um projecto vencedor que extravasa o âmbito partidário e se alarga ao relacionamento institucional entre o Governo dar República e os governos regionais.
Para nós, social-democratas, solidariedade é sinónimo de responsabilidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista regista como muito positiva, a iniciativa do CDS que hoje preenche o período da ordem do dia desta sessão, li é natural esta nossa posição, na, medida em que o Partido Socialista sempre tem defendido, coerentemente, um relacionamento transparente, solidário, equilibrado e com rigoroso enquadramento legal entre o Estado e as Regiões Autónomas.
Quero mesmo frisar, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que se compulsarmos o Diário desta Assembleia, das últimas três sessões legislativas, encontramos intervenções proferidas, nomeadamente, pelos meus camaradas Carlos César, Mota Torres, Martins Goulart e por mim próprio que sustentam, de forma inequívoca, essas preocupações.
Felizmente não temos estado sós nesta «cruzada», porquanto inúmeras vezes os Srs. Deputados do partido da maioria eleitos pelas Regiões Autónomas, bem como outros grupos parlamentares, têm lambem abordado este tema e ale votado com o PS. Lembro o debate em Plenário do pedido de ratificação do Decreto-Lei n.º 336/90 de 30 de Outubro, solicitado pelo nosso grupo parlamentar, e que decorreu em 1 de Fevereiro de 1991.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Poderíamos citar a alínea d) do artigo 81.º da Constituição e complementar essa ideia geral da incumbência do Estado em promover o desenvolvimento das Regiões com o artigo 93.º do Estatuto Autonómico dos Açores, onde se refere que «a solidariedade nacional vincula o listado a suportar os custos das desigualdades derivadas da insularidade, designadamente no respeitante a comunicações, transportes, etc.», ou ainda o artigo 99.º, que preceitua o seguinte: «De harmonia com o princípio da solidariedade nacional, o Estado dotará a Região dos meios financeiros necessários à realização dos investimentos constantes do Plano Regional que excederem a capacidade de financiamento dela [...]» Faço notar aos Srs. Deputados que este Estatuto a Lei n.º 9/87, de 26 de Março - foi aprovado nesta Casa por unanimidade.
O Sr. José Magalhães (PS): - Mas é letra morta!
O Orador: - Ficaríamos, em nosso entender, com o enquadramento necessário para que os governos da República e da Região desenvolvam um relacionamento transparente, solidário e equilibrado, como já referi, e que deveria já ter culminado com a elaboração de uma lei quadro das finanças, regionais.
Mas tal nunca aconteceu! É inútil. Sr. Presidente e Srs. Deputados, iludir esta questão. Por mais que nos queiram fazer crer os membros dos governos da República e regionais de que não existem dificuldades de relacionamento, basta compulsar os jornais açorianos dos últimos anos, publicados aquando da aprovação dos orçamentos e planos regionais ou nacionais, para constatarmos a veracidade da nossa argumentação.
Compreendemos naturalmente a dificuldade que outros lerão em abordar esta matéria. Não olvidamos mesmo que a 2.ª proposta de revisão do Estatuto dos Açores que, desde Maio de 1990, altura em que também foi aprovada na generalidade nesta Assembleia; da República, até Junho de 1991, ou seja, até ao fim da anterior legislatura, não conseguiu um mínimo de entendimento político entre o PSD nacional e o PSD Açores 13 meses não foram suficientes para que o PSD se entendesse em duas ou ires questões, com realce para a tentativa do Governo di República em eliminar, pura e simplesmente, os artigos 93.º e 99.º, que atrás citei, e em vez de aprovar o texto do relatório elaborado na comissão eventual criada para, o eleito, o que seria bastante para que a referida proposta de, revisão fosse devolvida ao parlamento regional, preferiu o cómodo «voto de gaveta» que se revelou de lodo desprestigiante para esta Assembleia, enquanto órgão de soberania, atitude que foi amargamente sentida na Região" Autónoma dos Açores.
Como referi na intervenção que proferi nesta Câmara, em 23 de Abril último, o Grupo" Parlamentando PS na Assembleia Legislativa Regional dos Açores já apresentou naquele parlamento regional um projecto de lei quadro de finanças regionais. Lá como cá estamos abertos a todas as sugestões que se revelem úteis.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Há outra preocupação para nós e de gritante acuidade para â generalidade dos açorianos. Aludo à política nacional de transportes!
Da Comunidade Europeia chegam-nos recursos financeiros que são aplicados - não me cabe aqui e agora aferir se bem se mais nas vias de acesso às redes transeuropeias. Infelizmente os Açores apenas têm visto redes «transcontinentais». Perguntamos, pois,, se como Região insular, não estará lambem inserida nessa aposta de união prevista no Acordo de, Maastricht?, Já referi também esta questão em intervenção aqui proferida em 10 Dezembro de 1990.
O que é certo, para nosso desencanto, é que com a excepção de alguns programas, pontuais como o, REGIS, que beneficiou mais a Região Autónoma da Madeira do que a Região Autónoma dos Açores, nesta, Região, quer nas ligações interilhas quer nas suas ligações com o continente, continuamos muito penalizados pela ausência de uma política nacional de transportes integrada.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sem dúvida!
O Orador: - E esta questão é premente. É mesmo angustiante. Todas as vezes que a responsáveis regionais coloco o assunto, que reputo básico e fundamental, do acesso do cidadão europeu residente, por exemplo, na ilha do Corvo, a Bruxelas ou Paris, a resposta é evasiva. Geralmente dizem-nos: primeiro estudaremos Açores-Europa e só depois serão consideradas as ilhas de per si.
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Mas, depois, quando? Como? Quantos anos perdidos, ou melhor, não aproveitados?!
A responsabilidade deste atraso, em nosso entender, é quase só imputável ao Governo da República.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Afirmo-o com toda n responsabilidade e com toda a autoridade que me advém do facto de ser utente de um circuito aéreo efectivamente vocacionado e orientado para servir, com alguma eficácia, apenas a ligação Açores (entenda-se as ilhas de São Miguel, Terceira e Faial) com Lisboa. Trata-se afinal de uma aspiração legítima dos açorianos das restantes ilhas, que como cidadãos europeus tem pleno direito a um tratamento digno e orientado para a igual acessibilidade ao continente.
Perguntamos ao Governo que medidas tornará para evitar a desestabilização na regularidade das ligações, previsível com a anunciada privatização da TAP?
Nos últimos seis anos os Açores não evoluíram de maneira significativa no sector dos transportes. Houve alguma evolução na primeira metade da década de 80. Depois optou-se quase exclusivamente pelo transporte aéreo e esqueceu-se a nossa secular tradição marítima.
Por falar em tradição marítima, não esqueçamos que, na rota atlântica América-Europa, os Açores são a fronteira mais ocidental da Comunidade Europeia. Hm Março de 1990, em requerimento dirigido ao Governo da República, alertava para a falta de fiscalização dessa denominada «rola da droga». Apesar da resposta de então, quê informava estar o Governo atento ao problema, ninguém duvida que hoje a situação se agravou. Que medidas pensa o Governo implementar?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não poderia deixar de destacar também dois problemas relacionados com a política externa e que tem incidências prejudiciais na Região: em primeiro lugar, a base das Lajes, na Terceira.
Segundo afirmação veiculada pela comunicação social, e não desmentida, já antes das eleições de Outubro último, os Governos da República e da Região tinham conhecimento da intenção dos EUA de despedir trabalhadores em número significativo, tendo-o, todavia, ocultado propositadamente por motivos eleitorais óbvios.
O não pagamento, até esta data, da verba referente a 1991 por parte dos EUA pela utilização daquela base e a grande dúvida, já admitida pelo Governo, quanto à efectivação do pagamento no presente ano ou no próximo, conforme resposta a requerimento subscrito por todos, repilo Iodos, os Deputados eleitos pelo círculo eleitoral dos Açores à Assembleia da República, parece estar nos propósitos do Governo Americano.
Os terrenos onde se encontra implantada a referida base aérea das Lajes, em grande parte, continuam em regime de arrendamento desde há 50 anos, altura em que foi construída. São cerca de 900 os proprietários de uma área que ronda os 4430 alqueires. Em Junho de 1991, o Sr. Ministro da Defesa, em audiência que teve a «benevolência política» de me conceder, anunciou-me que o Estado iria adquirir os referidos terrenos, o que se lhe afigurava de elementar justiça.
O Sr. Primeiro-Ministro, mais tarde, em visita aos Açores, confirmou que o Estado ia promover o processo de aquisição. As notícias que ora circulam são preocupantes e dão a entender algum desinteresse por parte do Governo em acelerar as negociações com a Associação de Proprietários. Saliento que na passada semana, na ilha Terceira, esta Associação deu uma conferência de imprensa em que anunciava a suspensão destas negociações. Porquê esta falta de palavra, Srs. Membros do Governo?
O Sr. José Magalhães (PS):- Boa pergunta!
O Sr. Alberto Martins (PS): - Não vai ter resposta!
O Orador: - Em segundo lugar, destaco a estação francesa da ilha das Flores, lima breve referência para alertar o Governo da República, já que é quase certo que os franceses desactivarão aquela estação de rastreio de mísseis, bem como o apoio logístico do polígono acústico que mantêm na ilha de Santa Maria, que se salvaguarde a tempo a reconversão para fins turísticos, culturais ou afins das referidas instalações, não se caindo na indefinição que levaria à sua degradação a prazo.
Quer ao Ministério da Defesa, quer ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, lanço desta tribuna o meu veemente apelo para que, nalguns momentos que tenham vagos do absorvente e frenético exercício da nossa presidência comunitária, não descurem por mais tempo a resolução dos pontos que referi sobre a base das Lajes e sobre a estação dos franceses da ilha das Flores.
Negociemos com dignidade e algum orgulho nacional, tendo presente que se (rata da defesa dos interesses de povos já castigados ao longo dos séculos pela insularidade e indiferença dos governos centrais.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Tentámos focar ao longo desta intervenção grandes questões ou omissões políticas deste Governo. Além da crítica clara e frontal que fizémos, moveu-nos, acima de tudo, o propósito de dar a este debate um contributo sereno e responsável, a fim de que o relacionamento, até aqui algo difícil entre o Estado e as Regiões Autónomas, mereça uma atenção política mais cuidada e, particularmente menos emotiva e mais responsável.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel da Silva de Azevedo.
O Sr. Manuel da Silva Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Ávila, em minha opinião, a sua intervenção merecia uma série de questões, mas vou colocar-lhe uma apenas muito concreta sobre um assunto que aqui já foi referido várias vezes e que V. Ex.ª abordou agora novamente. Trata-se da questão da lei das finanças públicas regionais.
Em princípio, estamos de acordo em que é necessário um enquadramento legal deste género. V. Ex.ª referiu que o Partido Socialista entregou, há pouco tempo, na Assembleia Regional, um anteprojecto de lei sobre este mesmo assunto.
Ao ler esse anteprojecto de lei conclui que se limita a copiar o Estatuto e a Lei do Enquadramento Orçamental Regional e tem duas novidades: primeira, a fórmula que VV. Ex.ªs conseguiram em matéria de transferências do Estado para a Região Autónoma dos Açores, se fosse aplicada em 1992, fazia com que a transferência do Estado para os Açores fosse inferior em 1 687 000 contos; a segunda novidade é que os Srs. Deputados do Partido Socialista consagram nesse anteprojecto de lei, no ar-
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ligo 9.º, uma laxa suportada pelo orçamento regional sobre as receitas cobradas pelas tesourarias da Fazenda Pública nas Regiões Autónomas, e essa taxa já foi abolida há bastante tempo.
São essas duas novidades que o vosso projecto de lei das finanças públicas regionais nos traz!
O Sr. Rui Ávila (PS): - Só cá faltava essa!
O Orador: - É essa lei que os senhores nos querem trazer? É essa lei que resolve o nosso problema?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Manuel Azevedo: Nem outra coisa seria de esperar de V. Ex.ª! No entanto, quero referir quo me comunicaram, porque não tive o prazer de observar, quê um Sr. Secretário de Estado aplaudiu a minha intervenção, o que, para mim, é bastante sintomático.
E, sendo assim, vou começar pelo fim. Essa última questão que V. Ex.ª trouxe sobre a compensação dos serviços de cobrança foi abolida no ano passado na Comissão de Economia, Finanças e Plano numa sessão presidida pelo Sr. Deputado Rui Macheie em que estavam presentes os Srs. Deputados Rui Carp e Álvaro Dâmaso e, sob proposta deste, foi votada pelos Deputados do Partido Socialista.
Ora, admira-me que V. Ex.ª, que agora está tão preocupado, na altura em que a outra proposta foi apresentada pelo meu camarada Martins Goulart na Comissão de Economia, Finanças e Plano não tivesse o cuidado de verificar isso.
O Sr. Manuel Azevedo (PSD): - Esta?
O Orador: - Sim, Sr. Deputado. Tenho aqui a cópia da acta em que se pode verificar que V. Ex.ª estava presente. Vá ver o dia em que este ano na (Comissão se discutiu a proposta do meu camarada Martins Goulart e em cuja discussão V. Ex." interveio dizendo que era assunto que ficava para depois...
O Sr. Manuel Azevedo (PSD): - Eu?!
O Orador: - Quer a cópia? Sr. Presidente, peço aos serviços da Assembleia da República que tragam o relatório ...
O Sr. Manuel Azevedo (PSD): - Estamos a falar de uma taxa que está imposta.
O Orador: - Não está nada imposta.
O Sr. Manuel Azevedo (PSD): - Quer ver o seu projecto?
O Orador: - Sr. Deputado, está aqui o nosso projecto.
O Sr. Manuel Azevedo (PSD): - Foi eliminada!
O Orador: - Claro que foi eliminada. Eu estive presente nessa reunião. Portanto, esse problema não tem nada a ver com a primeira proposta.- Como proposta de lei esse assunto é secundário, e o que interessava, e o que gostaria de ouvir de VV. Ex.ªs e espero serenamente até ao fim do debate - são os vossos contributos para todas as questões que têm a ver com as ligações das Regiões Autónomas com a Europa e não as louvaminhas ao Governo da República porque isso a nós não nos interessa nada. Interessa-nos discutir as questões, os problemas, as nossas preocupações porque amanhã, vamos para o Governo...
Protestos do PSD.
... ou não admitem a alternância no poder? Não admitem?
Protestos do PSD.
Mas já admitiram na Câmara de Ponta Delgada, ou não! Quantas câmaras domina a vossa bancada nos Açores?
Aplausos do PS.
O Sr. Ministro afirmou, que os governos tem sido sucessivamente sufragados mas as câmaras também e como hoje já não são maioritariamente do PSD na Região Autónoma dos Açores eu pergunto: admitem Ou não a alternância no poder? Se admitem, devo dizer que estamos preocupados porque não queremos, quando chegarmos ao Governo, uma Região mais endividada do que já esta e também não queremos aquilo que VV. Ex.ªs sabem e lamentam pelos corredores que aconteça com a Região Autónoma da Madeira em termos financeiros, isto é, a catadupa incrível, a bola de neve dos juros de uma dívida que foi maí negociada e de que hoje os próprios municípios madeirenses são vítimas.
Aplausos do PS.
Protesto do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos interromper durante alguns momentos o debate para procedermos às votações.
Vamos começar por votar o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso interposto da decisão do Presidente da Assembleia da República de admitir o projecto de lei n.ºs 147/VI - Lei da Greve, apresentado pelo CDS.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD. do CDS e do PSN e votos contra do PS do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.
Srs. Deputados, a Mesa foi informada de que há consenso para se proceder à votação do voto n.º 23/VI - De congratulação pela designação, em assembleia geral da UCCLA, da cidade de Díli como membro honorário da União das Cidades Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas, apresentado por todos os grupos parlamentares que foi admitido e distribuído.
O Sr. Secretário vai proceder à sua leitura.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor.
1 - A assembleia geral da UCCLA, reunida na cidade da Praia em Cabo Verde, aprovou, por unanimidade e aclamação, sob proposta do seu presidente,
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subscrita por todos os municípios presentes, a designação «de membro honorário tia União das Cidades Capitais Luso-Afro-américo asiáticas a cidade de Díli, no ente colectivo do seu povo, mas recusando naturalmente a mediação das instâncias autárquicas representativas do ocupante».
2 - A Assembleia da República, ao tomar conhecimento deste facto, entende dar público testemunho da sua satisfação por esta inequívoca manifestação de solidariedade da comunidade lusófona para com o povo de Timor Leste.
3 - A Assembleia da República exprime a sua esperança que não tarde o dia em que Díli possa assumir o lugar que lhe cabe na União das Cidades Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas e reafirma o seu empenhamento, no quadro das competências que lhe suo próprias, na procura de uma solução pacífica e justa que conduza ao reconhecimento dos direitos inalienáveis do povo de Timor Leste.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Raul Castro.
Srs. Deputados, vamos retomar o debate. Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Casimiro Tavares.
O Sr. Casimiro Tavares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Portugal é grande! Portugal é lindo! Obra de heróis. Reza de santos. Alforge de ouro. Nau de tormentas. Berço de sonhos. Sanha de guerreiro. Amálgama de credos. Abraço de raças...
Assim nasceu e cresceu Portugal.
Os tempos correram, a história fez-se e Portugal continuou grande na dimensão da língua, na ara da religião, no culto do passado. Mas Portugal continuou lindo: no luar de Janeiro, no loiro das searas, na fragrância das flores, nos socalcos da serra, na imensidão do mar, na dor da saudade, na esperança sebastiânica.
Por isso. Sr. Presidente e Srs. Deputados, subimos hoje a esta tribuna, onde o verbo fecunda a acção, para dizer que é sempre urgente grilar Portugal: lindo e grande no limiar do novo século, na aposta do novo inundo, onde Maastricht não seja canto de cisne mas hino de esperança.
Portugal está hoje integrado na Comunidade Europeia, usufruindo de uma posição geoestratégica ímpar, de uma cultura e de uma história a que não fogem os arquipélagos dos Açores e da Madeira. Aliás, foram precisamente as suas características específicas - geográficas, económicas, sociais, culturais e históricas - que constitucionalmente lhes permitiram um regime político-administrativo autonómico, ainda que com os consequentes custos da insularidade ou periferia, se preferirem.
E são estes custos causa primeira de solidariedade perante estas novas Regiões. Não solidariedade recíproca mas una porque todos somos filhos da mesma Pátria. Cessem pois as guerrilhas verbais de lá para cá e de cá para lá. Transformem-se os défices de democracia, os défices de bom senso e de educação em superavit de solidariedade.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que criem as condições ideais para continuarmos o debate, dado que alguns Srs. Deputados se queixam de que o barulho os impede de ouvirem o orador.
Queira prosseguir Sr. Deputado Casimiro Tavares.
O Orador: - Solidariedade imperiosa na protecção do ambiente: com a preservação paisagística da faixa costeira onde os acessos ao mar são escassos e as praias um remedo; com a protecção das zonas adjacentes ao mar e a correntes de água de forma a obviar a que o mar lamba a leira e terra engula os homens com torrentes, enxurradas e aluimentos; com a definição do tipo de edificações fora dos aglomerados urbanos de modo a não prejudicar a beleza natural; com a luta contra a peste dos incêndios, contra a destruição voluntária do revestimento vegetal ou alteração do relevo natural.
Nós gostaríamos de continuar a rever na Madeira um presépio de Natal, não uma favela de morte mas um autêntico presépio de vida onde o lixo tenha o seu lugar na estação de tratamento de resíduos sólidos da Meia Serra.
Solidariedade no apoio a construção dos fogos necessários à resolução do problema social da habitação. Solidariedade na criação de condições culturais que permitam aos senhores do povo o uso, que não o abuso, dos seus poderes e as populações o de se determinarem com liberdade e escolher sempre com consciência.
Solidariedade na criação de condições a aplicação da justiça com a construção de edifícios dignos na Ribeira Grande, na Graciosa, nas Flores e em Santa Maria, na Ponta do Sol e em Porto Santo, aliás, já inaugurado antes de nascer; com a ampliação da casa da justiça do Funchal já superlotada ou com a construção de uma nova; com a edificação de casas de magistrados de modo a permitir maior facilidade de fixação nas Regiões e com a implantação do Tribunal do Trabalho no Funchal em edifício nobre.
Solidariedade com a nomeação de magistrados judiciais para as Flores, Angra do Heroísmo (2.º Juízo) e magistrado do Ministério Público para a Praia da Vitória.
Solidariedade com a criação de incentivos aos magistrados de modo a recuperarem os processos judiciais jazentes há vários anos com reais prejuízos para os interessados e consequente descrédito para a justiça.
Solidariedade com a criação de um Provedor de Justiça, redutor dos abusos e apoio de populações indefesas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desdilhada a guitarra das lamentações, só nos resta augurar que o verbo fecunde a acção para que não nos quedemos à vista da anunciada terra da promissão onde, se diz, corre o leite e o mel da Comunidade.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O quadro constitucionalmente consagrado para o sistema autonómico da Madeira e dos Açores garante uma resposta adequada à organização regional de múltiplos poderes do Estado, confere ao sistema uma natureza democrática, possibilita que
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as populações das Regiões Autónomas promovam, a. resolução dos seus problemas específicos, assegura o respeito pela identidade regional ao mesmo tempo que defende a unidade nacional.
O sistema constitucional da autonomia é, pois. o sistema adequado às realidades regionais e nacional e não se compagina com conceitos de autonomia progressiva com objectivos mais ou menos separatistas nem com atitudes e acções tendentes à restauração do centralismo do Terreiro do Paço ou da Gomes Teixeira.
É neste quadro básico e essencial que o Grupo Parlamentar do PCP encara a problemática da solidariedade institucional e do cumprimento das competências do Governo da República quanto às Regiões Autónomas que hoje se discute. E é ainda nesse quadro que a solidariedade institucional e nacional para com as Regiões Autónomas se deve, desde logo, manifestar com o objectivo de eliminar as contradições substanciais que hoje existem entre a natureza democrática do sistema autonómico e as práticas dos governos regionais do PSD, de natureza autoritária, conservadora e elitista de cariz antidemocrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É manifesto quo os níveis de desenvolvimento económico e social nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores são bastante inferiores é já baixa média dos níveis que se registam no País. Mais grave ainda: o diferencial entre os níveis de desenvolvimento tem vindo a aceitar-se nos últimos anos, como bem o mostram, por exemplo, os níveis de evolução do produto no último quinquénio.
A primeira responsabilidade desta efectiva divergência real tem de ser assacada, indubitavelmente! aos governos regionais do PSD que sobrepõem os seus objectivos político-partidários de manutenção e de manipulação do poder regional, de clientelização e de compadrio, às necessidades objectivas de definir e implementar políticas globais e sectoriais assentes nas realidades regionais e orientadas para o desenvolvimento económico e para a melhoria das condições e do nível de vida das populações.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas também o Governo da República tem enormes responsabilidades no atraso crescente dás Regiões Autónomas em relação a parte continental do País.
Os governos centrais do PSD sempre tem encarado a solidariedade económico financeira para com as Regiões Autónomas, não como uma responsabilidade nacional de carácter estrutural e de natureza permanente, mas como um instrumento aleatório, como uma contrapartida proporcional à relatividade do peso parlamentar dos Deputados regionais do PSD na Assembleia da República.
Se o número desses Deputados é essencial para garantir maiorias - e já o foi -, os cordões da solidariedade da Gomes Teixeira e anexos abrem-se fácil e abundantemente.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Se essa essencial idade não existe, e é a situação, actual, a dita solidariedade retrai-se, o centralismo impera e as populações regionais sofrem os custos dos jogos intrapartidários do poder laranja.
É isso mesmo o que nos mostra a evolução das transferências do Orçamento do Estado para as Regiões Autónomas. Essas transferências não só têm vindo a perder peso nos orçamentos regionais como, e fundamentalmente, têm registado uma redução em lermos reais de 1985 para cá.
Em consequência; as dívidas públicas regionais aumentam em flecha e hipotecam as possibilidades do necessário desenvolvimento das Regiões Autónomas.
Nesta perspectiva, a realidade da Região Autónoma da Madeira é paradigmática. As relações de conflitualidade Unipartidária entre o governo regional e o Governo da República e os desmandos e incompetência dos governos regionais de Alberto João Jardim conduziram as finanças regionais a uma situação catastrófica que serviram ae justificação para a imposição, pelo governo de Cavaco Silva, de um draconiano protocolo financeiro à Região Autónoma da Madeira, violando mesmo princípios da autonomia regional.
Mas é igual a tendência que nos últimos anos se vive na Região Autónoma dos Açores, com o crescimento acentuado da dívida pública. Situação que ameaça agravar-se com a decisão da Administração Americana de suspender esses pagamentos pela utilização da base das Lages e idêntica decisão do Governo Francês em relação às Flores. Facto, aliás, que não só terá efeitos directos nas finanças • da Região, como terá repercussões sérias no âmbito social e no plano da economia regional. Resultado, afinal, de uma política errada assente em contrapartidas financeiras pelo aluguer de estruturas nacionais a potências estrangeiras e que desde sempre o PCP denunciou e criticou.
Exige-se agora que o Governo da República tome as medidas necessárias para que os resultados dessa política não se abatam drástica e violentamente sobre a população açoriana.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O esforço de desenvolvimento de que as Regiões Autónomas carecem tem de, basear-se fundamentalmente no aproveitamento racional dos recursos endógenos e na diversificação e valorização da sua actividade económica.
Mas o seu fraco nível de desenvolvimento económico, actual e as desvantagens e custos estruturais que decorrem da situação insular e ultraperiférica das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores exigem que aquele esforço de desenvolvimento seja complementado e apoiado pela solidariedade nacional constitucionalmente consagrada.
Solidariedade que, desde logo, deve implicar a nível regional como a nível nacional e comunitário a consideração e a adopção de políticas e de medidas específicas adequadas às situações concretas, em áreas diversas como as dos transportes, dos acessos aos mercados e da fiscalidade.
E para nós inequívoco, por exemplo, que as capacidades de desenvolvimento regional estarão seriamente limitadas enquanto não forem considerados e compensados os elevados custos de transportes decorrentes da insularidade, que gera custos acrescidos dos factores de produção e dos bens de consumo importados e reduz a capacidade concorrencial das produções regionais.
Impõe-se, pois, que a nível comunitário e nacional sejam plenamente suportados os diferenciais desses custos acrescidos em matéria de transportes.
A solidariedade com as Regiões Autónomas exige igualmente a instauração de um relacionamento financeiro com o Estado que assente em regras claras, imunes às conjunturas partidárias do exercício do poder, que solidariamente assuma uma parle do esforço de desenvolvimento das Regiões num quadro de garantia da efectiva autonomia financeira regional.
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Por exemplo, parece-nos adequada a consagração de um princípio de calculo das receitas fiscais próprias das Regiões, tendo como ponto de partida o valor da respectiva capitação média nacional e, bem assim, a criação de mecanismos de atribuição de outros recursos financeiros as Regiões Autónomas estabelecidos a partir da definição regional das prioridades e necessidades.
De igual modo é para nós essencial que seja lida em consideraçâo a constatação do Tribunal de Contas segundo a qual «a atribuição às Regiões Autónomas da generalidade das funções do listado no domínio da satisfação das necessidades públicas confronta-se com a limitação das receitas próprias das Regiões para corresponderem àquelas necessidades, o que justifica, em parte, as dificuldades financeiras que as Regiões tem conhecido».
Em consequência, deverá ser assegurada a comparticipação ajustada do Governo da República para fazer face a tais encargos e impedir os reflexos negativos da situação actual.
Mas essa solidariedade que defendemos e pela qual o Partida Comunista Português tem pugnado exige igualmente que, a nível das instituições do poder regional, seja garantida a aplicação eficaz e não partidarizada dos recursos que são colocados à sua disposição, que sejam impedidos os desmandos e aventureirismos financeiros que se tem verificado, em especial na Região Autónoma da Madeira, e que sejam assegurados na vida quotidiana das Regiões o pleno e livre exercício dos direitos e liberdades democráticas e a efectiva igualdade de oportunidades independentemente das opiniões político-partidárias dos cidadãos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sabemos, Srs. Deputados, que estas contribuições regionais para uma efectiva solidariedade nacional são de difícil concretização enquanto o poder regional estiver asfixiado pelo poder omnipotente do PSD.
Só com alterações significativas ao nível do poder político nas Regiões Autónomas, só com a desmonopolização do poder laranja se criarão as condições necessárias para alterar o actual estado de subdesenvolvimento democrático, económico e social que se vive nas Regiões Autónomas.
Mas estamos em crer que as próximas eleições regionais poderão dar um passo decisivo nesse sentido, para bem das populações e da democracia nacional.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino.
A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Octávio Teixeira, pensava que a cassette já linha sido completamento abolida!
Afinal, vejo que V. Ex.ª...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Oh!
A Oradora: - O Sr.ª Deputada, faça os apartes que entender...
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Faço, faço!
A Oradora: - ... mas como o meu partido tem pouco tempo e os meus colegas ainda vão intervir, não lhe posso responder.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira trouxe aqui a velhíssima questão dos endividamentos das Regiões Autónomas, mas o Sr. Deputado sabe muito bem, até porque faz parte da Comissão de Economia, Finanças e Plano desta Casa, as condições em que foi criada essa dívida, por que razão 6 que ela funcionou tipo bola de neve!...
Os governos do Partido Socialista não resolviam a situação e foi graças ao primeiro governo do Prof. Cavaco Silva...
O Sr. Rui Ávila (PS): - Só em 1985!
A Oradora: - ... ao seu empenhamento directo e ao do Sr. Ministro das Finanças da altura, Dr. Miguel Cadilhe, que a situação se desbloqueou e que hoje em dia se verifica o cumprimento integral e escrupuloso do protocolo financeiro. Não sou eu que o digo, são os membros do Governo que o dizem; qualquer pessoa que esteja dentro do funcionamento do sector económico é capaz de avaliar o cumprimento por parte da Região Autónoma da Madeira de todas as questões que a ela dizem respeito.
Sr. Deputado, compreendo que deseje que se verifique uma grande alteração política nas Regiões Autónomas, mas não me parece que seja pela via do acordo que o seu partido pretende fazer na Madeira que vai conseguir alterar alguma coisa.
Enquanto o governo do PSD souber governar e tiver o apoio da população. Sr. Deputado Octávio Teixeira, não ó com esses acordos que os senhores conseguem alterar o figurino do governo da Região Autónoma da Madeira.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Deputada Cecília Catarino, começaria pela parte final da sua intervenção.
Estou a ver que, de facto, os Deputados do PSD eleitos pelas Regiões Autónomas estão muito preocupados não com o debate propriamente dito ou com as questões de fundo que se colocam mas, sim, com o problema das eleições de Outubro.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não pensam noutra coisa. É uma obsessão!
O Orador: - Ainda há pouco o Sr. Deputado Mário Maciel falou no problema dos eventuais acordos entre forças políticas que possam vir a desviar o poder político na Região Autónoma dos Açores. Agora a Sr.ª Deputada Cecília Catarino fala nos acordos políticos que o PCP quer fazer na Madeira. Estão preocupados, afinal, com o problema dos resultados eleitorais!
Passo à questão central e de fundo do pedido de esclarecimento. Não há qualquer cassette. Sr.ª Deputada Cecília Catarino. E, V. Ex.ª sabe tão bem como eu quais foram as razões que conduziram à enorme dívida pública da Região Autónoma da Madeira; sabe que ela tem consequências e que está a ter consequências enormes na capacidade de desenvolvimento dessa Região.
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A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - E de quem é a culpa?
O Orador: - Julgo que se não estivéssemos no Plenário, V. Ex.ª, bem como os restantes Deputados do PSD oriundos da Madeira, estaria de acordo comigo.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Claro!
O Orador: - De tacto, houve razões, várias para que isso sucedesse, há razoes várias pura que continue a suceder e para que essa situação se esteja agora a verificar também na Região Autónoma dos Açores.
É que os governos centrais não têm cumprido as responsabilidades constitucionais da solidariedade nacional e tem travado, em termos reais, as transferências, para as. Regiões Autónomas. São estas as questões de fundo e de base que importa discutir.
No caso concreto da Madeira, acresce uma outra razão que foi determinante. Refiro-me à incapacidade de gestão financeira dos governos regionais da Região Autónoma da Madeira dirigidos pelo Sr. Dr. Alberto João Jardim. De facto, ainda hoje, Sr.ª Deputada Cecília Catarino, - apesar do protocolo draconiano que foi Urinado, a dívida pública da Região Autónoma da Madeira deve ultrapassar os 100 % do produto interno bruto.
Sejamos claros: na Região Autónoma dos Açores, tal valor é bastante interior, andará à volta dos 40 %, irias o problema grave é que está em crescimento acelerado.
São estas questões de fundo que devemos debater aqui para bem das Regiões Autónomas, para bem da autonomia regional e das suas populações.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.ª Secretária de Estudo do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A coesão económica e social tem constituído um verdadeiro cavalo-de-batalha do Governo Português, não só lia negociação das reformas da Comunidade em que estamos empenhados como também na concretização da política de desenvolvimento regional rio nosso país.
Em ambas as vertentes, os resultados são animadores e dão-nos, por isso, alento para prosseguir no reforço desta estratégia.
De facto, a recente assinatura, em Maastricht, do Tratado da União Europeia representa um novo salto em frente ao reforçar o papel da coesão económica e social no contexto comunitário e ao elevá-la a um dos pilares essenciais da nova União.
No plano interno, a par da aproximação gradual da nossa economia aos níveis médios europeus, é hoje indiscutível que a nossa aposta em promover a valorização das potencialidades e recursos em lodo o território nacional tem contribuído decisivamente para a redução das assimetrias regionais internas.
A interpelação que hoje é, feita ao Governo sobre a solidariedade nacional para com as Regiões Autónomas vem centrar o debate num dos domínios em que considero ser mais evidente a expressão da coesão.
Refiro-me ao reconhecimento inequívoco de que dois tipos de Regiões - as insulares e as fronteiriças -, pelos seus tradicionais problemas de fragilidade económica e pelas suas desvantagens naturais de localização, merecem uma atenção particular.
O Governo, ao eleger estas Regiões como um dos alvos prioritários da política de desenvolvimento, assumiu claramente, em toda a sua dimensão e em todas as suas consequências, uma das principais mudanças de perspectiva política operada nos últimos anos.
Portugal é todo ele, um país composto de regiões periféricas, umas claramente mais do que outras. O carácter periférico observa-se a vários níveis e não apenas em termos, geográficos.
O combate à perificidade económica é uma aposta que temos feito e que visa, a par da melhoria das acessibilidades - internas, mas também com o resto da Europa e com as outras regiões do mundo -, a promoção da complexidade, o fomento da inovação e da criatividade e o reforço da coesão interna.
A promoção da competitividade, porque constitui uma peça fundamental da estratégia de internacionalização da economia, que permite crescer e conquistar os mercados essenciais para a criação de riqueza e a melhoria do nível de vida para gerar empregos com qualidade e estabilidade. Devem aqui explorar-se as potencialidades de cada Região, produzindo nelas aquilo para que são vocacionadas, consolidando bases económicas que permitam fixar actividades e populações.
As Regiões Autónomas cumprem um papel importante na construção desta diversidade da oferta nacional, em que, a par dos bens de produção tradicionais, devemos colocar a riqueza cultural e ambiental e o clima.
O fomento da inovação e da criatividade, porque são elementos importantes para a construção de uma imagem de Portugal como produtor de qualidade, para a melhoria dos recursos humanos e para uma participação mais empenhada nos processos produtivos e na sua transformação.
O reforço dos laços com as Regiões Autónomas, com as suas. comunidades científica e empresarial, tem vindo neste quadro a ter grande, importância.
Finalmente, o reforço da coesão interna, porque é determinante, porque só desta forma conseguiremos vencer um desafio que é nacional - não se confinando a esta ou aquela parcela do território e consolidar os elementos que permitam a Portugal afirmar-se numa Europa unida, coesa e profundamente inserida e actuante na esfera internacional.
O reforço da coesão interna faz congregar os esforços nacionais e mobiliza os agentes, permitindo assim dar expressão ao projecto de desenvolvimento que temos vindo a trazer a esta Câmara e que partilhamos, quer no plano dos princípios quer no da actuação, com as Regiões Autónomas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No âmbito da aplicação dos instrumentos financeiros comunitários em Portugal, o esforço de solidariedade para com as Regiões Autónomas foi assumido de forma clara desde o início da adesão e com particular relevo após a reforma dos fundos estruturais em 1989, data que marca a entrada em vigor do actual Quadro Comunitário de Apoio (QCA).
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora:- A preparação dos programas de apoio para as Regiões Autónomas, inseridos no actual Plano de
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Desenvolvimento Regional, apontou, desde logo, como orientação prioritária, a necessidade de concentração de um volume de fundos que permitisse uma capitação de investimento nas ilhas significativamente superior à média do País, dando assim um sinal claro do objectivo de correcção dos desequilíbrios de desenvolvimento entre as Regiões.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - A Madeira e os Açores viram assim contemplados na íntegra, no QCA, os seus programas e projectos. Na Madeira, o Programa Operacional Plurifundos, grande programa integrado de investimentos, com apoio do FEDER e do Fundo Social Europeu (FSE), com um investimento global da ordem de 56 milhões de contos. Nos Açores, o Programa Específico de Desenvolvimento (PEDRAA), apoiado pelo FEDER e pelo FSE; o Programa Nacional de Interesse Comunitário, apoiado pelo FEDER e orientado exclusivamente para o sector do turismo, e ainda o projecto de aquisição de duas aeronaves para a SATÃ, igualmente apoiado pelo FEDER, envolvendo os três um montante de investimento de perto de 78 milhões de contos.
Para além destas acções, o Governo negociou ainda com Bruxelas dois outros programas especificamente para as Regiões Autónomas - o REGIS e o POSEIMA - cuja concretização muito deve à acção empenhada do Sr. Primeiro-Ministro na Cimeira de Rhodes, em Dezembro de 1988, momento em que ganhou corpo a ideia de intervenções especiais para as Regiões insulares.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - O REGIS é um programa para as regiões isoladas apoiado pelo FEDER no contexto das iniciativas comunitárias, representando um investimento global da ordem dos 12 milhões de contos, adicional aos valores que antes referi. Tem uma importância estratégica para as duas Regiões Autónomas, posicionando-se de modo complementar em relação aos outros programas, na medida em que os meios financeiros adicionais que representa permitem potenciar e multiplicar os impactes económicos globais - recorde-se que será através do REGIS que se tomará finalmente possível lançar, a muito breve prazo, as obras de expansão do aeroporto de Santa Catarina, ambição profunda dos madeirenses.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PS): - Falta o dinheiro nacional!
A Oradora: - O POSEIMA & um programa de natureza diferente, incidindo em domínios que não são cobertos pelas ajudas dos fundos estruturais - ajudas aos transportes, ao abastecimento de energia, à agricultura, incluindo modulações fiscais, etc.
A aprovação do quadro regulamentar do POSEIMA é, inclusivamente, uma das prioridades da presidência portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Note-se que estes programas não esgotam a aplicação dos fundos estruturais as Regiões Autónomas, na medida em que elas beneficiam ainda do acesso a um conjunto de intervenções de âmbito nacional, designadamente nos domínios dos sistemas de incentivos ao investimento privado na indústria, turismo, telecomunicações, ambiente e agricultura - que reforçam os meios financeiros ao seu dispor para o desenvolvimento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Desde a adesão à Comunidade e ato 1993 as Regiões Autónomas tem já garantidos compromissos de cerca de 158 milhões de contos dos fundos estruturais, mobilizando um investimento global da ordem dos 291 milhões de contos.
Perto de metade dos compromissos referidos entraram já efectivamente na economia das duas Regiões.
É, contudo, em termos comparativos globais que se tornam mais evidentes os excelentes resultados que as Regiões Autónomas estão a ler na aplicação dos fundos estruturais.
Note-se que, com base nos dados de execução acumulados até ao final do ano passado, 6 já possível verificar que u percentagem de fundos recebida pelas Regiões Autónomas, ato essa data, no total dos fundos distribuídos, ultrapassa o que eslava previsto, evidenciando já um «ganho líquido».
As capitações do investimento apoiado são ainda mais expressivas, visto que as duas Regiões Autónomas são as que apresentam os valores mais elevados no conjunto do País, atingindo um valor de 380 contos por habitante nos Açores e de 335 contos por habitante na Madeira, para uma média nacional de 221 contos.
Este facto é particularmente importante se pensarmos que se traia das duas Regiões mais desfavorecidas do País.
Comparando as posições dos PIB per capita regionais, em relação à média nacional (atribuindo a esta um índice 100), e fazendo a mesma comparação com os investimentos per capita regionais e a média nacional, obtêm-se as seguintes conclusões, muito estimulantes e indiciadoras do bom caminho que prosseguimos: a Madeira está 36 pontos abaixo do índice 100 do PIB per capita, mas está a investir 51 pontos acima do investimento médio nacional apoiado pelos fundos estruturais;...
Aplausos do PSD.
... os Açores estão 42 pontos abaixo do índice 100 do PIB per capita e estão a investir 72 pontos acima do investimento médio nacional apoiado pelos fundos estruturais.
Aplausos do PSD.
Os números são elucidativos por si: estamos, efectivamente, perante um processo que aponta para objectivos de convergência e que indicia condições para a redução das disparidades regionais à escala nacional.
O Sr. José Magalhães (PS): - Pergunte ao Dr. José Reis Leite se ele acha suficiente!
A Oradora: - Estes não são, no entanto, os únicos indicadores que ilustram o que se está a lazer nas Regiões Autónomas com aquele objectivo.
Em minha opinião, aliás, tem-se por vezes empobrecido o debate recorrendo apenas a indicadores económicos, que são importantes e permitem as leituras que acabei de fazer, mas que não devem ser exclusivos.
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Gostaria de mudar um pouco a perspectiva, alargando o campo de análise e indo ao encontro das realidades e das necessidades práticas, daquilo que as pessoas e os agentes económicos sentem como problemas dos seus quotidianos e anseiam ter como soluções.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Temo-nos empenhado, por isso, na área da avaliação das intervenções em curso, trabalho, de grande complexidade técnica mas em que começamos a ler os primeiros resultados - preocupa-nos conhecer os impactes duradouros dos investimentos e, naturalmente, queremos corrigir o que for necessário para melhor permanentemente.
Não vou ser exaustiva por motivos evidentes, por isso deixo para a vossa reflexão, sem outros comentários, uma simples enumeração das realizações que teremos completadas nas Regiões Autónomas no final deste QCA: construção e reconstrução de cerca de 490 km de estradas; construção de 40 novas pontes e viadutos; construção e melhoramento de mais de 2400 m de cais e molhes portuários; construção de perto de 1200 km de redes e condutas de abastecimento de água e 20 novas unidades de captação, tratamento e armazenagem; construção de 120 km de redes de saneamento básico e 3 estações de tratamento; construção de 2 "novas zonas industriais; construção de 26 novos equipamentos culturais (bibliotecas, museus e auditórios.
Aplausos do PSD.
... construção, e beneficiação de 30 escolas dos diversos graus de ensino; construção, do novo Hospital de Ponta Delgada, início das obras de expansão da pista do aeroporto de Santa Catarina.
O Sr. José Magalhães (PS): - A vaca agoniza e a banana murcha!
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria, se me permitem, de retinir uma primeira conclusão por sirva destes elementos, do que eles representam no contexto da história recente do esforço de desenvolvimento regional em Portugal e da forma como, no caso especial dos Açores e da Madeira, se tem processado o relacionamento entre o Governo da República e os governos regionais, incluindo as administrações central e regionais.
Parece-me claro que há um mérito inegável no que se tem leito: os bons resultados, sendo em primeiro lugar das Regiões Autónomas; devem-se muito, na minha opinião, ao óptimo e profícuo clima de relacionamento que a todos os níveis, foi possível estabelecer entre os principais parceiros deste processo - o Estado e as Regiões.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Acima das naturais diferenças de interpretação ou modo de agir perante os problemas concretos, impôs-se o espírito aberto de colaboração, para a procura de consensos.
Assume-se aqui plenamente o desafio que representa a experiência mais avançada de descentralização em boa hora feita em Portugal, no respeito pela diferença e na partilha das responsabilidades.
E, cumpre-se aquilo que esse desafio ter de mais aliciante e compensador a capacidade de coordenar esforços de instituições de matriz forçosamente distinta, tendo em vista o interesse último das populações o seu bem-estar e a criação de, condições de progresso para enfrentar um futuro mais competitivo.
A continuação do que se vem fazendo e os novos trabalhos que nos esperam não serão tarefas fáceis.
Estando neste momento o Governo empenhado em garantir um reforço significativo dos apoios estruturais no quadro na negociação do Pacote Delors II, de acordo com as orientações aprovadas em Maastricht, abrem-se novos horizontes para a satisfação das expectativas e anseios das Regiões Autónomas.
Iniciámos já, em conjunto com os governos regionais, ò processo de preparação do novo Plano de Desenvolvimento, Regional (PDR), tendo em vista a próxima negociação dos fundos estruturais a incluir no QCA e no Fundo de Coesão.
A experiência colhida no passado, os resultados que hoje testemunhamos e a garantia de que a solidariedade nacional, no respeito escrupuloso pelo estatuto da autonomia regional, será uni elemento sempre presente na política regional dão a necessária confiança aos açorianos e aos madeirenses para prosseguirem na construção do seu futuro.
O optimismo de hoje não permite, porém, abrandamentos. Não há que alimentar ingenuidades quanto a isto, porque a modernização económica de Regiões insulares, afastadas dos centros de decisão, é uma obra de dimensões gigantescas e para várias gerações.
Mas os resultados começam a estar à vista: as esperanças vão-se tomando progressivamente realidade: vamos melhorar, aprofundar, aumentar o que já alcançámos e fá-lo-emos com determinação, no mesmo espírito de cooperação e parceria em que trabalhamos no passado, contando com o apoio de todos.
Tem sido esta a chave do nosso êxito.
Aplausos, de pé, do PSD.
Entretanto, reassumiu, a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Ávila.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, realmente reconheço, pelo sentido de responsabilidade que tem procurado ter neste debate, que é difícil fazer uma pergunta à Sr.ª Secretária de Estado ...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sem dúvida!
O Orador: - Mas reconheço mais, Sr. Deputado Silva Marques, meu ilustre amigo que faz o favor de me dispensar a sua amizade.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Inestimável!
O Orador: - ...que não sou eu que tenho dito, ao longo dos tempos, aquilo que, por exemplo, aqui está escrito neste documento sobre a Cimeira Madeira/Açores. Passo a citar: «Ainda não se pode considerar encontrada a plataforma de justiça que traduza [...]» - quer que continue a ler? - «[...] já que sobre o povo açoriano e madeirense vêm recaindo ónus adicionais derivados das
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desvantagens a que estão sujeitos e cia dívida pública.» Não sou eu que digo isto, Sr.ª Secretária de Estado!
Protestos do PSD.
O documento que estou a citar tem o timbre da Região Autónoma da Madeira!...
A Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: - Faça a pergunta, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr.ª Secretária de Estado, já vou fazer a pergunta, mas antes disso quero lazer outro considerando. Nós vivemos num País de sucesso,...
Aplausos do PSD.
... na vossa opinião! Ontem, por mero acaso, eu e mais dois Deputados do meu grupo parlamentar entrámos numa via da cidade de Lisboa ...
Vozes do PSD: - Isso é só «buracos»!
O Orador: - ... que nos conduziu, para «fugir» do trânsito, a um bairro próximo da Avenida de Ceuta. Atravessámos o bairro com algum pânico. Eram 18 horas. A expressão da população daquele bairro - que me escuso de citar- levou-nos a meditar profundamente. Era eu, o Deputado Amónio Draga e a Deputada Julieta Sampaio, que, julgo, são pessoas responsáveis, e o bairro era o Casal Ventoso de Baixo. Claro que nós não fomos lá de propósito; foi por mero acaso que, inadvertidamente, nos «metemos» num sítio que não era o nosso.
Sr.ª Secretária de Estado, aquilo nada tem a ver com o vosso «País de sucesso»!...
Aliás, quero voltar a dizer aqui uma coisa: quando há pouco o Sr. Deputado Mário Maciel disse que «vivemos numa Região Autónoma com qualidade de vida», isso é verdade. Agora quando a Sr.ª Secretária de Estado nos diz que o êxito existe também nas Regiões Autónomas, esquece-se de que nós não colocámos aqui questões de carácter global do vosso governo. Nós abordámos questões concretas, como a dos transportes, à qual a Sr.ª Secretária de Estado não se referiu - não sei se será outro membro do Governo que vai falar sobre isso... Relativamente a tudo aquilo que a Sr.ª Secretaría de Estado disse, posso fazer-lhe uma pergunta agora, mas primeiro quis trazer aqui à colação a questão do Casal Ventoso. É que fiquei horrorizado, Sr.ª Secretária de Estado, com aquilo que vi! Vivo aqui, em Lisboa, há três anos, e garanto-vos que não sabia que aquilo existia neste País! Por isso e volto a frisar -, felizmente, temos alguma qualidade de vida na Região Autónoma dos Açores. As poucas bolsas de pobreza que temos nada são comparadas com aquela coisa que não sei qualificar...
Quero dizer-lhe concretamente que dentro de Iodos esses fundos estruturais- e a última unidade de gestão do PEDRAA reuniu no dia 8 de Maio - nenhum projecto foi aprovado, embora o Sr. Secretário da Administração Interna Regional tenha dito que as câmaras não se candidatam pela simples falta de verbas da Região para contribuir com a sua parte.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr.ª Secretária de Estado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
A Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então tem a palavra o Sr. Deputado Marques da Silva.
O Sr. Marques da Silva (PS): - Sr. Presidente, eu tinha pensado pedir solidariedade nacional para as Regiões Autónomas, mas a torrente de verbas da Comunidade Europeia que a Sr.ª Secretária de Estado mencionou parece que tornou os ilhéus milionários!...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não tanto!
O Orador: - Nesse caso, qual a necessidade deste debate? Por que não separou as verbas da CEE das magras comparticipações do Orçamento do Estado?
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr.ª Secretária de Estado, quero felicitá-la pela sua estreia na tribuna, dadas as raríssimas vezes que temos a honra de ouvi-la, e também pelo seu entusiasmo.
Risos.
Mas julgo que não devia entusiasmar-se tanto e aconselhava-a a ler dois documentos que eu li ontem à noite: o plano a médio prazo do Governo Regional da Madeira para 1988-1992, que consagra as verbas que esperava receber e o que é que tinha sido prometido, porque diz quais são as verbas prometidas, estão aí os números todos; e devia ler, em compensação, como um vade mecum, o parecer do Tribunal de Contas sobre os dinheiros efectivamente recebidos e gastos no ano de 1988, porque neste ano não estão incluídas as participações do Governo central que deviam completar os fundos comunitários. Mas pode ler o de 1989 e pode ler o borrão referente a 1990, que ainda não está publicado, mas que o Tribunal de Contas me forneceu e que fornecerá mais facilmente a V. Ex.ª, pois está em vias de ser publicado.
Terá então oportunidade de ver uma enorme diferença entre os números que V. Ex.ª enumerou - e são muitos e elevados -, aquilo com que efectivamente o governo regional contava e o que lhe foi posto nas mãos.
Portanto, de duas uma: ou foi-lhes prometido muito mais e o Governo não chegou a negociar suficientemente bem, com sucesso, estas verbas, de modo a cumprir o que tinha sido prometido para as diversas rubricas, ou andam a enganá-lo, ou V, Ex.ª passa uma esponja sobre o que realmente as populações contavam e o que lhes foi dado.
Agora dizer que foram feitos, por exemplo, 15 km de estradas quando o plano previa mais de 20 km, é dar-nos um grande número..., pois 15 km é um grande número para quem tinha zero, mas é menos 5 km daquilo que linha sido prometido, tendo-se, aliás, criado expectativas pelo Governo nesse sentido. Portanto, tudo isto é relativo ...
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Pergunto-lhe novamente - já o tinha leito na minha, intervenção e V. Ex.ª, cautelosamente, não respondeu - se já foram entregues as verbas do IFADAP.
E já começaram as obras do aeroporto de Santa Catarina? V. Ex.ª falou duas ou três vozes em Santa Catarina, e eu pergunto-lhe se já começaram as obras, quando é que deviam ter começado e quando é que deviam estar concluídas.
V. Ex.ª falou ainda de altos índices de valorização. De facto, regozijamo-nos com estas valorizações, mas V. Ex.ª tem de dizer à Câmara, porque não somos ceguinhos, de onde é que eles partiram. Partiram do zero, muitas vezes partiram do negativo! Portanto, qualquer coisa que se de é enorme. Para uma pessoa que está com fome e nunca viu um pão, se lhe derem uma côdea de pão isso é uma «grande côdea», mas se dermos uma côdea a uma pessoa que está habituada a comer um pão, isso é sempre uma «côdeazinha»!...
Não quero minimizar, de forma nenhuma, os sacos de dinheiro que o Governo - e bem! - tem trazido da Comunidade e tem levado ás regiões periféricas, mas V. Ex.ª não devia minimizar o que disse o Sr. Ministro. É que foi o Prof. Cavaco Silva que cunhou a palavra ultraperiférico. Isto não vem nos livros, não vem nas revistas! Por isso, é bom dizer várias vezes, para que se lembrem, amanhã, de pôr nas revistas internacionais este direito de autor e de patente...
Risos.
Ontem o primeiro-ministro dinamarquês perguntava: o que é que o Prof. Cavaco Silva quer mais? Quanto dinheiro quer mais para não voltar a pôr a condição de dizer que não assina o tratado, ou vai pôr reticências ao tratado se não houver Delors II?
Vozes do PSD: - E perguntava muito bem!
O Orador: - Não é «muito bem»! E que anda o mundo inteiro hesitante, sem saber se há ou não Pacote Delors II, se está na mira da Alemanha, que diz eu não dou mais dinheiro, e V. Ex.ª deu-o como adquirido! Segundo V. Ex.ª, o Pacote Delors II vem aí, vêm aí mais fundos, vêm aí mais transportes. E toda a bancada do PSD bateu palmas como se isso estivesse «no papo». Mas não está «no papo»!...
V. Ex.ª fez uma boa propaganda, levantou esta gente toda, para dizer: até que enfim pudemos dar para o telejornal números. Amanhã os jornais publicam os números, amanhã a Madeira e os Açores estão cheias de números, estão os Deputados todos contentes, mas a população da Madeira não irá compreender. Eles não comem os seus números, Sr.ª Secretária de Estado! As expectativas deles foram frustradas e V. Ex.ª tem de dizer à Câmara por que é que foram frustradas, se negociou mal e de quem é a culpa da má negociação!
Aplausos do CDS e do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretaria de Estado.
A Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: - Sr. Presidente, tenho alguma dificuldade em responder, porque julgo que não houve exactamente perguntas nem pedidos de esclarecimento e ninguém se debruçou sobre o discurso.
Vozes do PS:- Oh!...
A Oradora: - Houve, sim, desabafos! Percebo-os e entendo e tenho lodo o gosto em tentar responder, também com alguns desabafos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Desabafe!...
A Oradora: - Primeiro, custa-me muito que, ao fim destes anos todos de aplicação de fundos estruturais, ainda se continue a falar só em milhões e nos sacos da CEE, que vem aí o Pacote Delors II, sobretudo no momento em que se está a jogar o futuro de todos nós, porque, para mim, os fundos estruturas são um mero instrumento a que temos direito, como membros que somos da Comunidade Económica Europeia, para pôr ao serviço do desenvolvimento do nosso país.
O que acontece. Sr. Deputado, é que temos aplicado bem, com bons resultados - e eles estão h vista. Portanto, é nessa perspectiva que devemos encarar as coisas. De facto, isso é, mérito do Governo, que tem lido uma grande capacidade de negociação, mas é, sobretudo, mérito dos Portugueses!
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Isso está dito, há comparações feitas. Tem sido dito, inclusivamente, sem ser pelo Governo.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Em relação aos gregos!
A Oradora: - Não! basta ter os tais relatórios, que o Sr. Deputado disse que tanto leu, para verificar o quão é evidente para todos que Portugal é, de facto, um caso exemplar. Para mim é sobretudo mérito dos Portugueses e do empenho que as pessoas têm em perceber que, pela primeira vez, tem uma chance à sua frente e podem preparar um futuro, com futuro, para os nossos filhos. É essa a grande diferença. Daí, o facto de eu ter falado com ar entusiasmado. Quando o Sr. Deputado pergunta por que é que me entusiasmo, é por isso mesmo, é porque vejo que os meus filhos vão ler, um futuro completamente diferente do que as expectativas que, eu tinha quando era nova.
Aplausos do PSD.
Julgo que isso, para quem está na vida política, é o melhor alento que pode haver, mais do que os relatórios todos, mais do que o do Tribunal de Contas, mais do que isso tudo que o Sr. Deputado citou.
Aplausos do PSD.
No entanto, quero dizer-lhe que, obviamente, também tenho lido os ditos relatórios, mas julgo que, mais importante do que oscilar, é visitar as Regiões Autónomas, o que me parece que não é o caso de alguns dos Srs. Deputados quê aqui estão, porque, pelo modo como falam, parece que tudo está na mesma, parece que nada mudou. Portanto, é essa a grande diferença.
Vozes do PSD: - É isso mesmo!
A Oradora: -, Portanto, para finalizar esta interpelação, julgo que era útil fazerem uma visita às Regiões Autónomas para verificarem a diferença que existe e o esforço de desenvolvimento que a tem provocado.
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E, respondendo ao Sr. Deputado Rui Ávila, queria dizer o seguinte: o senhor disse que, «por acaso», outro dia foi a um bairro pobre de Lisboa, mas eu tenho ido lá som ser «por acaso», porque penso que temos de fazê-lo para conhecer a realidade. Portanto, não é «por acaso» que lá vou.
Aplausos do PSD.
Ainda há muito pouco tempo visitei o bairro que referiu e estou perfeitamente de acordo consigo quando diz que se trata de uma situação em cuja resolução todos nós temos de nos empenhar. Simplesmente eu tentei, na intervenção que fiz, mostrar, sem qualquer demagogia, que, como e evidente, o processo de desenvolvimento é de gerações, que o problema da pobreza e dos focos de pobreza é um problema que não se resolve de um dia para o outro e, sobretudo, que não é com discursos nem com palavras vãs que se resolve mas, sim, com a acção, com uma política, com uma estratégia.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso está bem!
A Oradora: - Perguntava também ao Sr. Deputado se pensa que, nessa matéria, não tem havido melhorias. Essa é a posição que o Governo tem tomado, com simplicidade, assumindo claramente que a matéria de que estamos a falar é um trabalho, é uma tarefa de todos, é uma tarefa que tem de unir as pessoas, é uma tarefa de gerações.
E o que nos dá ânimo para prosseguir é o facto de vermos resultados. Nós não dizemos que os problemas estão resolvidos, pois lemos imensos problemas para resolver, mas, como lemos resultados, isso dá-nos força e, portanto, queremos prosseguir e melhorar. É tão simples como isto, Sr. Deputado!
Por isso mesmo, não estranho como o senhor, quando diz que «mal fora se os governos regionais já estivessem satisfeitos com tudo o que têm», porque, então, não mereciam a confiança dos madeirenses nem dos açorianos. Eles têm de continuar a lutar por mais. É evidente!
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora:- Acho que eles tem toda a razão quando dizem «ainda...». Com certeza, nós também dizemos «ainda».
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Querem mais!...
A Oradora: - É mais do que legítimo que queiram mais, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Era para solicitar à Mesa o favor de informar a Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional de que, segundo consta do registo da Assembleia e também para informação pessoal, eu me desloco todos os fins de semana à ilha do Pico, na Região Autónoma dos Açores.
Risos gerais.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, creio que a Mesa não tem necessidade de confirmar as palavras do Sr. Deputado, porque, da maneira como falou, disse a verdade, com certeza.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
C) Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Recentemente a Assembleia da República aprovou, por unanimidade, um voto de solidariedade com as autonomias regionais.
Esta interpelação ao Governo, tia iniciativa do CDS, permite demonstrar que aquela solidariedade não é apenas um voto piedoso, mas que a Assembleia da República, no uso das suas atribuições, o assume com responsabilidade e pretende medir até que ponto o Governo da República cumpre com as suas próprias responsabilidades, assume a solidariedade institucional e responde aos apelos e exigências regionais para concretização da solidariedade nacional, lendo em conta os custos da insularidade.
Entre o Governo da República e os governos regionais estabeleceu-se uma relação híbrida de cumplicidades e tensões, que acarreta, naturalmente, prejuízos as autonomias.
As autonomias carecem de autonomia financeira, porque senão não há autonomia política, e de solidariedade nacional que supra os custos terríveis de insularidade, que são a dobrar, a triplicar, a multiplicar nos Açores.
O problema mais premente nos Açores, e que marca todos os outros, ú o dos transportes, da relação com o continente e com a Europa, da relação com a própria Madeira, da ligação entre as suas ilhas. É mais barata a ligação comercial com o norte di Europa do que com a Madeira. A banana da Madeira chega muito mais cara aos Açores do que a da América do Sul.
A circulação de mercadorias dentro dos Açores acarreia grandes custos e só existe ligação para passageiros por via marítima no grupo central. Os transportes, vitais em absoluto, não são encarados pelo Estado na sua componente social. Eles determinam, aliás, a economia, são essenciais para o mercado regional e são também um elo de unidade regional.
No que respeita á Madeira, o Governo não dá os passos necessários para a resolução do problema da dívida que se arrasta indolente, mas crescente, pressionante e sufocantemente, porque a dívida permite manter o governo regional numa certa dependência do Governo da República.
A solução é aquela que a UDP/Madeira tem proposto reiteradamente: o Governo da República deve anular a dívida na parte correspondente aos investimentos necessários e justificados pelo brutal atraso que o regime facista impôs aos madeirenses.
Quanto ao crédito mal parado, chamemos-lhe assim, o governo regional deve ser responsabilizado pelos gastos não justificados, sumptuários ou tocados de corrupção política ou económica.
O Tribunal de Contas, nas averiguações que tem levado a cabo, tem dado um sério e útil contributo naquele sentido.
Os Açores, com o leite, a carne e as pescas, e a Madeira, com os bordados e as bananas, necessitam de um Governo da República que se saiba bater com dureza, no âmbito da Comunidade Europeia, pelas Regiões Autónomas. Mas, infelizmente, não é isso que tem acontecido.
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O governo do PSD desdobra-se em promessas, mas vai adiando as soluções de fundo; o Governo tem pouca protecção à solidariedade, seja ela com os cidadãos, seja com as autarquias, seja com as Regiões Autónomas. Neste aspecto é usurário, caciquista, controleiro, medindo a solidariedade em réditos político/eleitorais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já que se fala de solidariedade com as Regiões Autónomas - e nesse sentido aqui estamos a interpelar, muito justamente, o Governo - era bom que a Assembleia da República desse sempre o exemplo e fosse ela, primeiro que todos, solidária na prática com as assembleias regionais.
Há matéria diversa de grande importância que entrou como propostas das assembleias regionais. Refiro-me, em especial, à proposta aprovada por unanimidade na Assembleia Regional da Madeira para igualar as pensões mínimas ao salário mínimo nacional que, desde há dois anos, se tem mantido na gaveta aqui na Assembleia da República, mas que agora, finalmente, foi apreciada em Comissão e aguarda agendamento.
Os grupos parlamentares a quem regimentalmente compete esse agendamento não assumem. Portanto, sugiro e proponho à Mesa da Assembleia da República, pelo respeito e consideração que as assembleias legislativas regionais lhe merecem, honrando o recente voto, unanimemente expresso por esta Assembleia, que devia promover o agendamento oportuno e sistemático de todas as propostas que aqui chegassem das assembleias regionais. Seria um bom exemplo.
Aplausos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Em democracia cabe, antes de mas, aos partidos essa tarefa, cada vez mais necessária, da dignificação da política. O lugar privilegiado para essa dignificação ó, sem dúvida, o Parlamento.
É legítimo, pois, esperar que as iniciativas dos diferentes grupos parlamentares constituam o veículo dessa pedagogia política e sejam portadoras de autenticidade e de genuínas preocupações de servir o povo que nos elegeu.
Importante para ajuizar das reais motivações das diferentes iniciativas parlamentares é também a história e as raízes das forças políticas que as promovem.
Têm estas considerações a ver com a iniciativa do CDS de interpelação ao Governo sobre a solidariedade e exercício das competências do Governo relativamente às Regiões Autónomas, como tem a ver com o recente debate da iniciativa do Partido Socialista sobre a situação política na Região Autónoma da Madeira.
A oposição despertou agora (e só agora!) para a questão das autonomias regionais.
Em ano de eleições regionais, que são lambem o primeiro acto de consulta popular, após a vitória esmagadora do PSD nas eleições legislativas dê Outubro último, instalou-se nos partidos de oposição o nervosismo e o desespero.
E preciso esconder o passado antiautonomista e centralista e apanhar, à pressa e a todo o custo, o comboio de autonomia regional:
Só que o povo não esquece e no que às Regiões Autónomas diz respeito disso podem estar seguros. O povo não esquece que o CDS1 é o partido herdeiro directo e continuador dê unia direita conservadora que submeteu as populações das Regiões Autónomas, durante décadas, a um verdadeiro estado de sujeição colonial.
O povo não esquece as posições; em sede de elaboração e de revisão constitucional, de obstrução ao reforço das autonomias e até a pretensão de ver regredir, poderes e competências dos órgãos de governo próprios das Regiões.
São escusadas, pois, por tardias e não autênticas, estas tentativas de um apagar de memórias, tanto mais difícil quanto não só deixaram profundas cicatrizes, como até por subsistirem ainda na sua actual conduta política.
Manobras de diversão, de cosmética e de oportunismo político não conduzem a dignificação da vida política e da actividade parlamentar.
A visão centralista do CDS não deixa duvidas de quo é neste quadro que se insere a iniciativa que deu lugar ao presente debate. E estamos à vontade para produzir esta apreciação, fundamentada em prática política pública e conhecida! porquanto, em matéria de autonomia regional, o PSD não precisa de desalojar ninguém para ocupar o seu espaço, pois que tem, de há muito, o seu espaço próprio, como um partido que, na primeira linha, as mais das vezes contra as demais forças políticas, construiu e vem consolidando as autonomias regionais dos Açores e da Madeira.
E isto é assim tanto a nível nacional como regional, onde, desde sempre, temos governado.
O PSD não precisa, pois, de lançar mão de iniciativas isoladas, para, com fins meramente mediatico, agitar a (bandeira da autonomia.
E não precisamos disso porquanto a autonomia vivemo-la e sentimo-la no dia-a-dia, aqui e nas Regiões Autónomas, no esforço colectivo, de que temos sabido, ser os mais fiéis intérpretes, como o tem comprovado a livre expressão popular nas unias.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O povo da Madeira não tem dúvidas em reconhecer que Francisco Sá Carneiro e o Prof. Cavaco Silva são os governantes nacionais a quem as autonomias regionais mais devem e que sempre mantiveram a maior, mais expressiva e concreta solidariedade para com as Regiões Autónomas.
Não fora o empenho do Primeiro-Ministro e dos competentes departamentos do seu governo, nomeadamente dos Ministério e Secretaria de Estado do Planeamento e da Secretaria de Estado da Integração Europeia, apoiando sempre ás iniciativas e propostas regionais no âmbito comunitário, e não teria sido possível à Região Autónoma da Madeira contar com os apoios comunitários que lhe permitiram continuar o desenvolvimento e a concretização de empreendimentos indispensáveis à melhoria do bem-estar das suas populações.
É certo que nem sempre o inequívoco empenho do Primeiro-Ministro é acompanhado em alguns departamentos ministeriais com a mesma intensidade e com a celeridade que ele sempre empresta ao que dele directamente depende.
O Sr. José Magalhães (PS): - Distingue entre o Primeiro-Ministro e o Governo?!
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O Orador: - Algumas dificuldades se têm verificado na área das finanças, facto a que não terá sido alheia a circunstância de, não obstante lerem sido cumpridos os prazos legais na sua apresentação à Assembleia, o Orçamento do Estado para 1992 ter entrado em vigor mais tardiamente do que o usual, tal como é também compreensível que a presidência das Comunidades absorva alguma atenção e obrigue a preocupações, que envolvem algum atraso em questões conjuntamente tidas por menos prementes.
Há, porém, indícios seguros de que as questões da Região Autónoma da Madeira, dependentes desse sector do Governo da República, estão a ser resolvidas.
Tenho notícia de que foram desbloqueadas pela Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento, na sequência de compromissos assumidos aquando da discussão do Orçamento do Estado, as verbas relativas às comparticipações nacionais e comunitárias em projectos do SIFIT.
Igualmente, no que respeita a participações em atraso relativamente a projectos de agricultura e pescas, no âmbito do IFADAP, há indicação de que uma solução articulada entre o Ministério da Agricultura e o Sr. Secretário de Estado do Tesouro permitirá, dentro de dias, atribuir aos respectivos empresários as comparticipações que lhes dizem respeito.
Importa, aliás, salientar que as dificuldades registadas nesse âmbito não constituem uma discriminação relativamente à Região Autónoma da Madeira, inserindo-se antes em problemas de ordem geral que tem afectado igualmente projectos similares de empresários do continente.
Integro, com particular honra, um grupo parlamentar que teve o cuidado de, em homenagem ao princípio da maior aproximação dos eleitos aos eleitores, pedir aos Deputados de cada círculo que inventariassem os problemas regionais dependentes dos órgãos de soberania, e em particular do Governo, promovendo mesmo, com a maior transparência, a publicação desse caderno de anseios e aspirações das populações que representamos.
Impõe-se-me, pois, referir aqui algumas dessas questões mais prementes relativamente à Região Autónoma da Madeira, apelando, como me compete, aos Srs. Membros do Governo respectivos, o maior empenho na sua implementação, na sequência, aliás, de recomendações expressas do Sr. Primeiro-Ministro em regulares reuniões conjuntas entre responsáveis do Governo da República e membros do governo regional.
A Madeira tem de procurar alternativas que permitam a reconversão de uma economia que não pode continuar a assentar apenas em produções tradicionais.
É preciso desenvolver e acentuar o sector dos serviços em que se integra a zona franca, o centro off shore e o registo internacional de navios.
Há, pois, que implementar legislação que permita: dispensar as sociedades off shore das exigências próprias das sociedades internas, tais como a publicação local dos estatutos e a obrigação de incluir no seu conselho fiscal revisores oficiais de contas; criar um serviço mais célere e mais eficiente para a emissão das apostilhas da Haia; a possibilidade de criação de filiais ou sucursais, no âmbito da zona franca, na forma de sociedades unipessoais; ampliação do âmbito da actividade das sociedades seguradoras off shore à imagem e semelhança do que acontece com idênticas praças financeiras concorrentes; a possibilidade de criação de novas empresas financeiras no âmbito institucional da zona franca; aprovação de diploma de alteração do estatuto dos benefícios fiscais, ao abrigo da autorização concedida pelo Orçamento, sem afectar a competitividade internacional do centro off shore da Madeira; alteração da legislação relativa ao registo internacional de navios, de modo a que não se mantenha a exigência de que os comandantes e 50 % da tripulação dos navios registados no MAR sejam de nacionalidade portuguesa; a prevalência das hipotecas constituídas sobre navios registados no MAR relativamente aos demais privilégios creditórios.
Estas são medidas que jardim e tornam inútil a promoção internacional destes serviços em que se vem investindo.
Importa ainda encontrar uma solução - já prometida - relativamente a todos os atrasos das comparticipações nacionais e comunitárias no âmbito dos projectos regionais nas áreas da agricultura e pescas.
No âmbito agrícola, importará assegurar em portaria, a publicar em breve, a fixação do preço de referência da banana, em valor não inferior a !54$/kg, por ser o que garante ao produtor, onerado com os aumentos dos custos de produção, uma compensação mínima.
Estando em vias de concretização no âmbito comunitário o Programa Operacional de Melhoria e Modernização das Estruturas da Comercialização da Banana e sendo indispensável garantir a parte do financiamento nacional, sob pena de se perder o financiamento comunitário - numa primeira fase 5 milhões de ecus -, importa canalizar para este fim parte das receitas provenientes do direito compensatório cobrado na importação de banana do estrangeiro, nos lermos do Decreto-Lei n.º 503/85, receita esta que não tem sido afectada, como em parte está previsto na lei, para apoio à reconversão da cultura da banana.
No âmbito das pescas deverá ser reequacionada a distribuição de competências entre a República e as Regiões, permitindo-se uma mais eficaz intervenção dos órgãos regionais, designadamente no respeitante à zona económica exclusiva.
No respeitante à justiça, importa completar as obras em curso, designadamente a construção do tribunal da Ponta do Sol e a transferência de tribunais e de serviços do Ministério da Justiça para o Edifício 2000, no Funchal, o que também creio estar para breve.
Estas algumas das questões mais prementes dependentes do Governo da República que estamos certos, no quadro de uma solidariedade que o Sr. Primeiro-Ministro tem superiormente revelado e concretizado em actos da maior importância, não deixarão de ser resolvidas a breve prazo.
Outras questões não são tão urgentes, mas dependem igualmente de decisões do Governo da República, pelo que importará aqui também deixar mencionadas. Refiro-me à parte proporcional das receitas das reprivatizações a afectar à amortização da dívida pública regional; ao apoio técnico e financeiro à Universidade da Madeira e à compensação dos encargos decorrentes do novo sistema remuneratório da função pública, que não foram tomados em consideração a quando do protocolo de reequilíbrio financeiro.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sem a solidariedade do Governo da República presidido pelo Sr. Prof. Cavaco Silva, sem o esforço e trabalho que a nível regional, com particular empenho do PSD, enquanto governo da Região, tem desenvolvido, não teria sido possível atingir indicadores económicos tão reveladores como os que se vêm atingindo.
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Assim, a taxa de desemprego passou de 8,1 % em 1983 para 4,5 % em 1991 (uma das mais baixas da Europa); a taxa de inflação que era na Madeira, em 1978, de 22,8 % passou, em Janeiro de 1992, a 9,2 %;
De 1976 a 1991, o número de dormidas na hotelaria cresceu 83,5 % e a capacidade de alojamento aumentou 42,8 %;
De 1976 a 1990, cresceu em 96,9 % o tráfego aéreo no Funchal e em 90,6 % o número de passageiros o número de passageiros transportado entre a Madeira e o Porto Santo por via aérea aumentou 497,9 % e por via marítima 132,6% em igual período;
A entrada de mercadorias avaliada em número de contentores teve um aumento, no mesmo período, de 2540%;
De 1976 a 1990 houve um aumento de cerca, de 300 km de novas estradas e caminhos municipais;
O número de veículos da Região de matrícula anterior a 1980 é de 28 %, percentagem inferior a de qualquer região do continente;
O aumento de consumo de cimento, em idêntico período, foi da ordem dos 250,2 %;
O aumento de consumo da gasolina, no mesmo período de tempo em questão, foi de 235 % e de 867 % o aumento de consumo do fuel;
A tonelagem de pescado subiu no mesmo período 104%;
Passou-se de um médico para 1352 habitantes, em 1979, para um médico para 693, habitantes, em 1990;
No ensino complementar houve um aumento de 1936 alunos, no ano de 1976, para 10 126; em 1991, e no ensino universitário passou-se de 292 alunos, em 1980, para 785, em 1991;
As creches e jardins de infância passaram de 14, em 1977, para 50, em 1991, e o número de crianças abrangidas passou de 910, em 1981, para 4.164, em 1991, o que corresponde a um aumento médio de 45 % ao ano;
De 1978 a 1991 foram construídas 966 novas, salas de aula a taxa de analfabetismo teve nos últimos 10 anos uma baixa de 10 %.
Ora, não era possível sem a articulação de uma boa gestão regional e a solidariedade nacional do Governo da República atingir os indicadores aqui referidos. Não gostaria deixar de salientar como manifestação concreta da solidariedade do Governo da República- e permitam-me salientar o Primeiro-Ministro em particular as seguintes decisões e soluções, algumas delas já aqui referidas:
A consagração de um regime especial de apoio às regiões periféricas, obtido pelo Primeiro-Ministro na Cimeira de Rhodes;
O Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira, que se ficou a dever ao empenhado do ministro Cadilhe;
A garantia da não inclusão da banana no âmbito das negociações GATT e a protecção à produção regional;
A declaração anexa ao Tratado de Maastricht relativa às regiões ultraperiféricas da Comunidade em que se incluem a Madeira e os Açores;
O empenho no apoio comunitário ao Projecto de Ampliação do Aeroporto do Funchal e a garantia de ò Estado assegurar a comparticipação nacional nesse projecto;
A importância para a Região Autónoma da Madeira, para o seu futuro e desenvolvimento, dos pontos que acabo de referir são o bastante para revelar que os governos do Prof. Cavaco Silva são efectivamente solidários com as Regiões Autónomas, não apenas em palavras mas também e principalmente em actos.
Aplausos, do PSD.
Ó Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, consideramos a sua intervenção um momento importante deste debate, já que foi a primeira da sua bancada que, embora rodeada dos jogos florais habituais numa intervenção de carácter partidário, foi ao cerne da questão e não se conformou com o quadro cor-de-rosa já aqui várias vezes pintado pela bancada do governo ou, pela sua bancada, com larga satisfação, aliás, da mesma. E apresentou aqui uma série de questões que, no fundo consubstanciam uma espécie de caderno reivindicativo.
O Sr. Deputado o que fez, do alto daquela tribuna, foi apresentar - aproveitando a presença na bancada do governo de elementos responsáveis, e bem um caderno reivindicativo em nome do PSD/Madeira. Portanto, essa intervenção acabou por adquirir um tom ligeiramente diverso do daquelas que já forum produzidas, em particular do optimismo e do entusiasmo transmitidos pela intervenção da Sr.ª Secretária de Estado.
Gostaria ainda de referir, quanto aos jogos florais de carácter partidário com que precedeu o essencial da sua intervenção, que vamos passar por cima deles, até naquela parte que poderíamos considerar como um ataque despropositado e até injurioso ao CDS, habitual em campanhas eleitorais, que já foi feito até na televisão (a nível nacional) por um Deputado da assembleia regional. Portanto, vamos passar por cima desse tipo de ataques injuriosos, porque são característicos justamente da tal campanha eleitoral que VV. Ex.ªs queriam aqui inaugurar.
Talvez esta sua intervenção vá ser largamente reproduzida em jornais regionais, nos órgãos de comunicação regional, e isso indica de forma clara o carácter desrespeitoso para com esta Assembleia, mas em particular de campanha eleitoral que o início da sua intervenção teve. Vamos passar por cima disso, justamente porque não queremos transformar este debate numa espécie de pré-campanha eleitoral.
No que diz respeito ao essencial da sua intervenção, o Sr. Deputado acabou por manifestar optimismo e esperança de que se estejam a desbloquear completamente os compromissos europeus e os compromissos nacionais correspondentes às expectativas criadas, tal como disse o Sr. Deputado Narana Coissoró já há algum tempo neste debate: E o Sr. Deputado exprimiu a esse respeito uma grande esperança e uma grande certeza no sentido de que se vão desbloquear os compromissos nacionais e não apenas os compromissos europeus.
Sr. Deputado, V. Ex.ª chegou até a particularizar, no que respeita ao aeroporto de Santa Catarina, que o desbloqueamento dos compromissos europeus significará o desbloqueamento dos compromissos nacionais. Só que, Sr. Deputado, bem recentemente, em Dezembro, um decreto-lei do Ministério das Obras Públicas constituiu a sociedade de capitais encarregada das obras do aeroporto de Santa, Catarina, e no preâmbulo dessa lei está claramente dito que: «cabendo, por se tratar de um bem do domínio público, regional, a Região Autónoma da Madeira
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assegurar o remanescente financeiro que integra a comparticipação nacional do projecto». Assim, para o Governo central, a libertação do compromisso europeu no que diz respeito ao financiamento do aeroporto de Santa Catarina implica que vá libertar não o compromisso nacional mas o compromisso regional, Sr. Deputado! Portanto, o seu discurso é mais do que um caderno reivindicativo: é a demonstração da contradição da posição do PSD/Madeira com as posições do Governo central. E isso talvez não seja tão oportuno para a campanha eleitoral que o Sr. Deputado hoje aqui quis começar.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, agradeço as questões que me colocou e quero, antes de mais, dizer que não tive o menor intuito de ofender a bancada de V. Ex.ª Tanto assim, que V. Ex.ª nesse sentido interpretou e não usou de qualquer figura que encarasse a questão dessa forma.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Eu relativizei!
O Orador: - Penso que a questão que me coloca é uma questão que, enfim, decorre de uma leitura que fez desse diploma. Contudo, dados os antecedentes da questão, esse não 6 um diploma isolado, há lodo um conjunto de legislação que vem desde uma resolução do tempo do Dr. Sá Carneiro, de 1980, passa depois por um decreto--lei de 1981 que criou o Gabinete do Aeroporto de Santa Catarina, a que se seguiu um outro diploma que reformulou também esse diploma em 1982, havendo ainda um outro de 1986 que atribui ao Gabinete do Aeroporto de Santa Catarina novas tarefas, designadamente no que respeita à ampliação do aeroporto da Madeira. Todo esse conjunto de diplomas, em que vem desembocar este, já referem expressamente que há um assumir pelo Estado da parte do encargo nacional relativamente a este projecto.
Por sua vez o Programa de Recuperação Financeira, que é um programa em que está estabelecida a fórmula com base na qual se faz o cálculo anual para obtenção da transferência em sede de Orçamento do Estado para a Região, e que inclui como dedução nessa verba os investimentos feitos directamente pelo Estado na Região, exclui desse somatório as infra-estruturas aeroportuárias. Ou seja, o Estado aceita que será um encargo seu a participação nacional. Aliás, várias vezes tem sido afirmado publicamente que o Governo não vai deixar perder um só ECU de comparticipação comunitária. E é sabido que a Região Autónoma não gera receitas que possam fazer face à parte de comparticipação nacional para este projecto, portanto seria impensável para um governo responsável - e o governo do Prof. Cavaco Silva tem comprovado a todos os títulos essa superior responsabilidade - deixar à Região resolver esse problema para o qual não tem efectivamente meios.
Além disso penso que a criação da ANAM através do diploma que V. Ex.ª refere e a concessão da exploração do aeroporto a essa entidade, e, portanto, a obtenção das receitas dessa exploração por parle dessa entidade que vai gerir e administrar a ampliação do aeroporto, é também a confirmação disto que acabo de dizer-lhe.
Essa nota que consta do preâmbulo tem de ser interpretada, segundo penso, no rigor orçamental que ela pretende introduzir. Ou seja: o Estado assegurará e transferirá essas verbas para o orçamento regional e este incidirá na verba própria e atribuí-la-á à RAM para fazer face á comparticipação nacional. Esse é que me parece ser o circuito jurídico-financeiro adequado e é nesse sentido que essa nota do preâmbulo tem de ser interpretada.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, quem 10 esse preâmbulo fica com a sensação exactamente contrária,...
O Orador: - Admito, Sr. Deputado!
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - ... ou seja, a de justamente o Governo central alijar todas as responsabilidades neste financiamento.
Em todo o caso, fica a nota da esperança do Sr. Deputado!...
O Orador: - Não é esperança, é certeza!
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - É mais um ponto essencial do seu caderno reivindicativo.
Já agora, completo este parte com a seguinte pergunta: será por razão de lodo este alijar de responsabilidades da parte do Governo central que ainda não começaram as obras de extensão do aeroporto?
O Orador: - Não, Sr. Deputado! Nada tem a ver com isso. Está-se numa fase em que, obviamente, tem de ser feitos os concursos e os estudos necessários, não havendo, pois, qualquer razão de menor boa vontade que estejam a impedi-las. No momento próprio - não tenha dúvidas - se iniciarão as obras do aeroporto do Funchal.
O Sr. José Magalhães (PS): - E o dinheiro? Não há!
O Orador: - Quanto à sua afirmação de eu ter apresentado aqui um caderno reivindicativo, quero dizer a V. Ex.ª, muito simplesmente, que sou Deputado pelo círculo eleitoral da Região Autónoma da Madeira e que não é a primeira vez que refiro algumas das coisas que aqui abordei hoje, as quais tratei na intervenção que proferi por ocasião da discussão do Orçamento do Estado e trato em todas as ocasiões possíveis. Aliás, não só nunca tive o menor cerceamento da parle do meu grupo parlamentar para apresentá-las como tenho tido a maior cooperação quer do grupo parlamentar quer de membros do Governo no sentido do encaminhamento para a solução destas questões.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Terão agora lugar, sucessivamente, intervenções do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça e do Sr. Secretário de Estado dos Transportes.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
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O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No início de uma legislatura é sempre desejável perspectivar o futuro não só optando por prioridades que inexoravelmente hoje se colocam, como escalonando no tempo o que se irá empreender e em que áreas haverá uma maior intervenção, calendarizando procedimentos, estabelecendo políticas, debatendo e abrindo, ao diálogo questões; que, pela sua importância, lerão de obter consensos alargados e devidamente reflectidos. Numa palavra, haverá que, no início de uma legislatura, proceder ao delinear de uma verdadeira política de justiça.
Tal já foi leito em sede própria. Não se trata, ou não se tratou, de elencar meros projectos de intenção, meros desejos que se querem concretizar, alguns sonhos facilmente qualificáveis de utópicos. Não se tratou, numa palavra, de fazer o discurso da justiça, mas sim de erigir uma política de justiça.
Mas para que tal aconteça - para que aqui e hoje seja erigida uma verdadeira política de justiça - necessário se torna partir de uma profunda reflexão baseada na experiência e no conhecimento da realidade, compreendendo o passado e estabelecendo a partir dele sustentáveis pontes, para o futuro. Assim, uma política de justiça prevê e pressupõe, nesse profundo processo de reflexão, que tenha, havido previamente um coerente discurso sobre a justiça. Esse discurso já ocorreu, pelo que a obra, agora assumidamente mais consequente, irá surgindo naturalmente, num esforço qualitativo que sempre se persegue.
É óbvio que partimos de constatações, que felizmente vão pertencendo ao passado, para, modelos que hoje já ocorrem, mas que irão marcar decisivamente a política de justiça dos próximos anos. Essas constatações, que se poderão qualificar como. o enquadramento tradicional, o enquadramento que se quer que pertença já ao passado, apresentam como principais consequências a existência de um sistema fechado, e , distante, a burocracia, o corporativismo, a prevalência da forma, e um notório sistema de conceitos.
Estas consequências levam a que se faça um diagnóstico em que imperam a desconfiança, do cidadão e uma manifesta dificuldade de aceder à justiça, lentidão, prevalência dos direitos sobre os deveres no interior do sistema e deficientes condições de trabalho. Donde resulta uma justiça lenta, ineficaz, incómoda e autoritária.
Ao contrário, o enquadramento que já pertence ao presente e que se quer, decididamente, que fique a marcar o futuro próximo apresenta como principais consequências a existência de um sistema aberto, flexível e próximo, concebido como instrumento ao serviço de interesses concretos, a desburocratização, um menor corporativismo, a prevalência da substância sobre a forma e um sistema de interesses contrapondo-se a, um sistema de conceitos.
Estas consequências apontam para um diagnóstico, tendo em conta as medidas já em curso, de uma maior proximidade e um melhor acesso do cidadão à justiça, menor lentidão e maior conforto, acentuação dos deveres em relação aos direitos, prevalência do cidadão e melhores condições de trabalho. Apresenta como resultado uma justiça, já hoje, menos lenta, mais eficaz e menos incómoda.
Para isso vem contribuindo um conjunto concertado de políticas, de que se destacam a institucionalização do Programa Cidadão e Justiça, os cursos de formação sobre o atendimento do público e os gabinetes, de consulta jurídica gratuita, no que concerne à maior proximidade e melhor acesso por parte do cidadão.
No que se refere às melhores condições de trabalho, destaca-se a existência de. um avultado número de novos tribunais, novas instalações dos registos e do notariado, novas tecnologias, novo, equipamento, e melhoria progressiva também em instalações; e equipamento no que se refere à Polícia Judiciária, aos estabelecimentos prisionais e de menores e ao Instituto de Reinserção Social.
É de assinalar, sem pretender extrapolar conclusões, que, se verifica, pelas últimas estatísticas, que a percentagem dos processos julgados em menos de um ano ultrapassa já os 50 % e que se encontra equilibrada a relação entre o número de processos entrados e o número de processos findos por ano, sendo certo ainda que a maior lentidão processual se circunscreve a zonas de bloqueio já detectadas, onde se está ou estará a intervir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O quadro traçado, que parte, como se disse, de uma reflexão prévia e de uma actuação consistente e coerente, não privilegiou sobremaneira qualquer zona específica do País. Trata-se de executar uma politica nacional, uma política de justiça nacional, em que os elos da solidariedade foram estabelecidos para os serviços ou as zonas do País mais carenciados.
Interveio-se tanto em Trás-os-Montes ou no Algarve como na Madeira ou nos Açores. As prioridades foram estabelecidas de harmonia com o sentir dos que tem sob os seus olhos todo o País.
Assim, nos últimos dois anos tanto entraram em funcionamento os novos tribunais, por. exemplo, de Espinho, Vila da Feira, Vila Nova de Foz Côa ou Baião, como os da Horta, Povoação e Praia da Vitória. Irão entrar em funcionamento; a muito curto prazo, Tribunal de Trabalho do Funchal, no Edifício 2000, e o Tribunal Judicial de Porto Santo, como amanhã o irá o Tribunal Judicial de Albufeira.
Tanto se encontra em construção o Estabelecimento Prisional do Funchal, como se irá iniciar, a curto prazo, a edificação do Estabelecimento Prisional do Algarve.
Tanto se está a investir no Estabelecimento Prisional de Lisboa, recuperando as alas ainda degradadas, como se está a recuperar o Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
Enfim, tanto se opta por um edifício condigno e operacional para a delegação da Polícia Judiciária de Faro, como para a delegação desta polícia em Ponta Delgada.
Tanto se descentralizou já a emissão do bilhete de identidade em Braga, Faro e Funchal, como se a irá descentralizar, a muito curto prazo, em Leiria, Viseu e Ponta Delgada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há, no entanto, que estar particularmente atentos às especificidades das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. E o Governo tem bem revelado essa atenção.
Assim, por exemplo, no que se refere à organização judiciária, encontram-se criados tribunais de competência especializada de competência especializada mista que só encontram paralelo nas cidades de Lisboa e Porto. Refiro-me concretamente aos juízos cíveis, aos juízos criminais,; ao tribunal de menores e de família, ao tribunal de trabalho e ao tribunal administrativo de círculo do Funchal e de Ponta Delgada.
Refiro-me ainda aos primeiros gabinetes de medicina legal, extensões dos institutos de medicina, legal, que irão ser instalados no Funchal e em Ponta Delgada, a par de Faro.
Refiro-me, enfim, ao notário privativo que vai ser nomeado para a zona franca da Madeira.
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Refiro-me também às seis comissões de protecção de menores que irão ser instaladas, já no princípio do próximo mês de Julho, na Região Autónoma dos Açores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já tive ocasião de salientar, estamos empenhados numa verdadeira política de justiça que, obviamente, abrange e abarca todo o território nacional. A nossa solidariedade vai em primeira linha para o cidadão português, já que é em seu nome que é administrada a justiça.
Isso explica que esteja a ocorrer um enorme esforço para que em 1994 se encontre renovado todo o parque judiciário, por forma a que a justiça seja dignificada e o cidadão sinta que algo importante sucede no local onde a sua cidadania se protege, onde a sua fazenda se defende.
Isso explica também que neste momento, ao contrário do que sucedeu durante anos e anos, os quadros dos magistrados e dos oficiais de justiça se encontrem quase na totalidade preenchidos. A título de curiosidade, refira-se que, de todas as comarcas que integram as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, só a comarca da ilha das Flores se encontra sem magistrado judicial. Todas as outras dispõem, pois, de juiz e de agente do Ministério Público.
Também todos os tribunais das Regiões Autónomas, com excepção das comarcas das lhas Graciosa e das Flores, a par do que ocorre no continente, estuo dotados das novas tecnologias - equipamento informático, telecópia e sistema audio de gravação.
No tocante a investimentos constantes do PIDDAC, verifica-se que, no ano de 1990, os que foram realizados per capita correspondem, no continente, a 0,793 contos, nos Açores a 1097 contos e na Madeira a 1207 contos, enquanto para o ano em curso se perspectivam 0,981 contos para o continente e 294é contos para a Região Autónoma da Madeira, não tendo de momento dados fiáveis para a Região Autónoma dos Açores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não obstante tudo aquilo que tem sido realizado, não estamos ainda satisfeitos, pois há muito a fazer, muitas obras e intervenções a encetar, inúmeras dificuldades a vencer e certamente obstáculos de peso a ultrapassar. Move-nos, no entanto, um profundo sentimento de que a evolução que se está a operar, na sequência de uma justiça mais moderna e que apresente um grau acrescido de qualidade, em que o conceito de eficácia entra fatalmente em jogo dialéctico com a tradicional concepção que parte da certeza e segurança do direito, se está a realizar, tendo sempre como principal interventor o cidadão.
Sendo assim, são consequentes todos os apelos que se façam em redor da solidariedade social e da solidariedade nacional. É consequente e imperativo, pois, que se apresenta como uma das principais linhas de força no Programa do Governo e no programa do partido que o apoia.
Com efeito, a par da defesa intransigente dos direitos políticos e dos direitos económicos, é especialmente relevante a ênfase que se vem pondo na defesa e na concretização dos direitos sociais. O homem não é um ser isolado, embora eventualmente livre, que se encontre à mercê de inúmeras vicissitudes que o transcendem, pois essas vicissitudes não o tomam por sujeito, mas como mero objecto.
O homem, apelando aos critérios da solidariedade social, é alguém que se realiza em sociedade, pois, para além de ser livre, sabe que a sociedade, ao evoluir, ao se transformar, está de olhos postos em si, está ao seu serviço.
Por isso, Sr. Presidente Srs. Deputados, o Governo não necessita de fazer o discurso da solidariedade social ou da solidariedade nacional, já que a pratica no seu dia-a-dia, quer seja na área da justiça quer seja em outras áreas onde temos diante de nós o homem.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, gostei de o ouvir, pelo tom sereno, sem ser comicieiro. Diga-se, aliás, que os assuntos relativos a justiça não permitem esse tipo de espectáculo mediático.
Seria o último a apontar ao Ministério da Justiça, principalmente a V. Ex.ª, a acusação de que fazia discriminações. V. Ex.ª não precisava de dizer ã Câmara que tanto faz um edifício em Trás-os-Montes ou em Albufeira, como na Ribeira Brava, na Graciosa ou em Ponta Delgada. V. Ex.ª é que, ao dizer isto, discrimina e causa a impressão de que as outras pessoas estiveram a discriminar ou que agora o Governo acabou com tais discriminações, porque passou a tratar todos por igual. Encheu as páginas do seu discurso com isso, mas não precisava de o fazer, porque nunca ninguém o acusou de fazer discriminações negativas em relação às Regiões Autónomas.
As estatísticas e informações que V. Ex.ª avança estão, naturalmente, correctas, mas não balem certo com as nossas, porque, segundo as informações que ontem me foram transmitidas pela secção da Ordem dos Advogados, nos Açores os processos estão com quatro a cinco anos de atraso. Refiro-me, todavia, apenas aos processos ordinários, até atingirem o caso julgado, e não aos processos sumários ou sumaríssimos.
Dizem-me que é extremamente difícil a colocação dos magistrados (não no sentido dos tribunais, mas no de residências condignas) para lhes darem o incentivo de fixação na comarca.
Disse V. Ex.ª que só havia uma vaga na ilha das Flores, mas sei - estou a fiar-me numa informação que me foi prestada ontem - que há mais. De qualquer forma, disseram-me que há falta de edifícios para magistrados na Ribeira Grande, na Graciosa, nas Flores, em Santa Maria, na Ponta do Sol e em Porto Santo - neste caso, aliás, já foi inaugurado um edifício antes de estar acabado, mas já estamos habitados a isso nestas paragens.
Foi-nos também dito que a Casa da Justiça do Funchal está superlotada, sendo necessário desdobrá-la; que não há magistrado do Ministério Público em Praia da Vitória - e V. Ex.ª dirá se isto é ou não verdade - e que há processos judiciais jazentes há mais de seis anos, com reais prejuízos que daí advêm, em mais de quatro ou cinco comarcas.
De modo que pergunto como é que estes dados não batem certo com as informações prestadas por V. Ex.ª, apesar de os seus dados deverem ser provenientes de estatísticas mais apuradas.
Outro problema que também incomoda é o da criminalidade na Madeira. Aliás, o próprio presidente do governo regional disse que isso é uma coisa endémica no arquipélago,...
O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Endémico?
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O Orador: - ... porque as pessoas facilmente recorriam ao homicídio por pequenas coisas, principalmente em pequenas localidades e que isso deve ser tomado em consideração como uma parte ainda não dominada da cultura.
Realmente, parece-me que este assunto não pode ser tratado com esta ligeireza, ou seja, não se pode dizer a criminalidade é assim, porque o nosso povo é assim! O nosso povo mata por mínimas coisas, por causa da água, por causa disto e daquilo! É uma espécie de maneira do ser do povo ...
Assim, gostava de saber que espécie de medidas preventivas é que o Governo tem tomado para debelar esta criminalidade endógena na Região.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro dai Justiça: - Sr. Deputado Narana Coissoró; em primeiro lugar, quero agradecer-lhe as perguntas que colocou, uma vez que são oportunas e permitem esclarecer melhor alguns detalhes que não foram objecto da maior atenção ou melhor compreensão por parte do Sr. Deputado.
Assim, relativamente à intervenção numa política de investimentos do Ministério da Justiça, referi que tínhamos como objectivo e objecto as carências a nível de todo o País.
Portanto, quando falei das diversas zonas do País integrei aí, forçosamente - até pelo tema que hoje está em discussão -, as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, como sendo um dos locais mais carenciados.
Desta forma, se verificar a evolução dos investimentos ao longo dos últimos anos verá que, por exemplo, o investimento per capita na Madeira é sensivelmente o dobro do que se faz no continente e que nos Açores esses valores estão perto dos do continente. Ora, isto significa que nas Regiões Autónomas havia uma situação muito negativa a nível, por exemplo, de instalações, o que está a tentar recuperar-se em grande parte.
Referi também alguns dos novos tribunais que já estão a funcionar - aliás, podia também falar no dá Ponta do Sol, que está em vias de arrancar e de outros tribunais nos Açores - sempre na preocupação de que, em 1994; e essa é uma intenção do Ministério da Justiça, tenhamos um parque judiciário completamento renovado, quer nas Regiões Autónomas quer no continente.
Por outro lado, julgo que o Sr. Deputado Narana Coissoró não compreendeu o que eu disse quanto ao atraso dos processos. As estatísticas que tenho em meu poder são de 1991 e revelam que mais de 50% dos processos terminam em menos de um ano. Mas acrescentei que isso não significa que não haja 'zonas de bloqueio, zonas onde há arrastamento e atraso de processos. De qualquer forma, esses casos já estão detectados e está a intervir-se no sentido de se ultrapassarem essas situações.
No tocante à colocação dos magistrados, neste momento não há problemas, pois foram dados alguns incentivos de ordem financeira, e os números que referi relativamente a vagas nos quadros das magistraturas lembram-me fornecidos ontem pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República. Portanto, reputo-os de fiáveis e foram os que veiculei na minha intervenção.
O Sr. Deputado Narana Coissoró falou ainda na questão da Casa da Justiça do Funchal, dizendo que ela se encontra superlotada. De lacto, isso é verdade, conheço o edifício e as condições em que ele está a funcionar, e isso, fundamentalmente, por uma razão: porque o Tribunal de Círculo está a funcionar dentro das instalações do antigo Tribunal de Comarca.
Porém, com a aquisição, adjudicada há dias por cerca de 500 000 contos, do Edifício 2000 vai albergar-se aí os serviços de registos e notariado, do Instituto do Reinserção Social e também do Tribunal de Trabalho e do Tribunal de Círculo. Ora, isto vai permitir que o Tribunal do Funchal fique, muito mais operativo e em condições de funcionar melhor.
Quanto à questão da criminalidade na Madeira, deve ter-se em linha de conta a problemática da prevenção, da repressão, e da investigação dos ilícitos, que se tem reforçado não só, a nível de recursos humanos mas também de equipamentos, nomeadamente de equipamentos de telecomunicações entre as diversas instalações da Polícia Judiciária.
Por outro lado, a delegação da Polícia Judiciária do Funchal tem sido reforçada em meios humanos e materiais, pelo que considerámos que está absolutamente idónea e adequada para responder às solicitações da comunidade que existe no Funchal.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretario de Estado dos Transportes, utilizando tempo cedido pelo PSD.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de voltar à intervenção que o Sr. Deputado Narana Coissoró fez, atacando o problema, extremamente importante, da solidariedade e do transporte aéreo na Região Autónoma dos Açores.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Na liberalização!
O Orador: - Exacto, no problema da liberalização!
Gostaria, pois, de explicar a incompatibilidade é incoerência de falar de solidariedade em alguns casos e da liberalização noutros.
A primeira questão tem a ver com o transporte aéreo. Na verdade, na Região Autónoma dos Açores pude verificar-se o grau de grande solidariedade que existe entre o Governo da República e a população dos Açores. Há, de facto, uma grande consonância e cooperação, que é indispensável!
No campo das infra-estruturas é sabido que grande parte das infra-estruturas aeroportuárias da Região Autónoma dos Açores estão a cargo e à responsabilidade do Governo dá República, existindo aí quatro aeroportos dos mais importantes, tendo os respectivos investimentos sido leitos. De facto, há sempre coisas para fazer - Roma e Pavia não se fizeram num dia -, mas posso afirmar que o processo está adiantado e antes do Verão será lançado um concurso público para a nova aerogare de Ponta Delgada que estará concluída em menos de três anos. É uma responsabilidade que obviamente se assume por solidariedade, porque os transportes são uma questão fundamental para as Regiões insulares, e hão por uma questão de rentabilidade, como todos saberão, e o esforço neste campo, nos últimos anos, tem sido notável.
Relativamente á organização dos transportes, não basta ter infra-estruturas aeroportuárias. Haver um aeroporto em cada ilha é, de facto, uma questão de sobrevivência para
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a Região Autónoma dos Açores, mas é preciso uma organização de transportes que considere como primeiro objectivo o serviço público. Ou seja, que haja a garantia de que todos os residentes, bem como todos aqueles que querem visitar - não só do continente - os Açores e movimentar-se interilhas o possam fazer, mesmo que aconteçam as perturbações atmosféricas comuns na Região Autónoma dos Açores e que obrigam a verdadeiras pontes aéreas.
O Governo defende como base, como o Sr. Deputado sabe, a economia de mercado, mas não a vê tão cegamente ao ponto de pôr em causa, em relação às Regiões Autónomas, a questão do serviço público e da garantia do transporte como primeira questão.
Aliás, não somos únicos. Discute-se o pacote aéreo e a liberalização do transporte aéreo em países como a Espanha, a Itália e a Grécia, que tem Regiões insulares e que têm tido, obviamente, o mesmo cuidado, porque a questão da solidariedade e da ligação às ilhas são, de facto, questões fundamentais. Inclusivamente, posso dizer-lhe que também a SATA tem esse problema.
Portanto, pergunto o que aconteceria à SATA se uma companhia mais pequena fizesse uma ponte aérea, livre, em concorrência, entre Ponte Delgada e a Terceira. O que aconteceria é que os recursos e os prejuízos da SATA triplicavam ou quadriplicavam e a população de muitas das ilhas não seria, de facto, servida.
É o que tem acontecido, por exemplo, com a liberalização do transporte aéreo nos Estados Unidos da América. Como sabe, as linhas mais fortes são, de facto, servidas e o mesmo já não acontece com as linhas mais fracas.
Ora, não podemos consentir isso. A própria estratégia da TAP tem uma condicionante de serviço público e num País como o nosso, em que existem garantias de transporte para as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, isso obriga a determinadas cautelas, não só na privatização da TAP, para que haja no transporte aéreo uma garantia constante e uma segurança para todos os cidadãos.
Sr. Deputado, era essa garantia que queria dar-lhe.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques da Silva.
O Sr. Marques da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Madeirenses e açorianos têm sempre diante dos seus olhos o mar, mas sabem que para lá do horizonte marítimo chegarão a bom porto, ao País mais ocidental da Europa, a que pertencem. A mesma origem étnica, a mesma língua, a mesma religião, os mesmos costumes, tornam-nos portugueses, mau grado a descontinuidade geográfica e as eventuais diferenciações que a geografia e o isolamento imprimem à idiossincrasia do ilhéu. E, neste sentido, a solidariedade entre continentais e ilhéus, todos portugueses, abre-se na fecunda beleza da hospitalidade das ilhas e na compreensão por parle do continental de que essa solidariedade institucional ao seu irmão afastado é um dever e não um favor.
Por isso, serenamente, sem subserviências ou descabidas reclamações apresentamos factos, começando pela celebrada dívida da Região Autónoma da Madeira.
Se analisarmos as transferências do Orçamento do Estado para a Região Autónoma da Madeira, a partir de 1977, verificaremos que, entre esse ano e 1980, a percentagem de transferências em relação às receitas correntes e de capital electivas oscilam pelos 50 %. Quer dizer, estávamos, assim, perante uma execução orçamental favorável, com cerca de metade do orçamento a ser providenciado pelo Estado.
A partir de 1981, com Sá Carneiro, há uma grande viragem no critério de financiamento do défice orçamental regional descendo a percentagem de transferências para 22 %, atingindo-se um momento muito crítico com o governo de Balsemão, numa descida até 12 %; verifica-se depois, com o governo de Mota Pinto, uma tendência para melhorar em 1984 e 1985, mas em 86 e 87 o governo Cavaco Silva faz descer as percentagens para 14 % e 19 %, recuperando-se depois, em 1988, com 24,1 %. Todavia, há nova descida, em 1989, para 18,6%.
Porque referi esta evolução? Em pane para focar as origens do núcleo inicial da dívida, em parte para demonstrar que é falsa a acusação de que o governo PSD/Madeira tenha sido maltratado pelos governos Partido Socialista e que tenha melhorado significativamente com o seu congénere da Madeira.
As oscilações apontadas mostram, ao contrário, uma certa tendência para melhor acolhimento de governos não PSD relativamente ao PSD/Madeira.
Quem defende a autonomia? A dívida nasce e toma corpo entre 1981 e 1984, em virtude de o governo regional, face à quebra nas transferências pela via do Orçamento do Estado para a Região, ter contraído empréstimos na banca, com avales do Estado, a taxas de juro correntes, há mais empréstimos até 1987, data em que se atinge um total de 23 748 milhões de contos; depois, entre 1986 e 1988, contrai-se uma dívida de cerca de 27 530 milhões de contos. Isto é, o capital inicial da dívida é de 51 282 milhões de contos. No Programa de Recuperação Financeira da Região Autónoma da Madeira a dívida é consolidada em 1990, através de um empréstimo junto do Banco de Portugal, num total de 41 997 375 contos, e com a contracção de outro empréstimo junto de outras instituições de crédito, no valor de 40 997 375 contos.
Isto dá um total de 82 813 085 contos. Assim, de um capital de cerca de 51 milhões de contos, a dívida, qual Hidra de Hércules, multiplica-se em juros, atingindo quase 83 milhões de contos!
O Programa de Recuperação Financeira da Região Autónoma da Madeira prevê a resolução desta dívida entre os anos de 1990 e 2002, portanto, por um período de 12 anos, cabendo a amortização da dívida e 50 % dos juros à Região Autónoma da Madeira e ficando o Estado a suportar os outros 50 %.
A dívida da Região só favorece a banca que fica a receber juros durante 12 anos, a repartir entre a Região e o Governo da República. Politicamente o Governo central receberá algum conforto, ao verificar a dependência financeira da Região Autónoma da Madeira relativamente ao Estado.
Mau grado o estranho optimismo de certos madeirenses e continentais, a Região Autónoma da Madeira sente a pressão de uma situação financeira difícil. Por exemplo, em 1991 vieram do Orçamento do Estado 16 400 milhões de contos, dos quais 7,8 milhões de contos foram para o pagamento de juros por parle da Região.
Está claro que a Região Autónoma da Madeira não ficou de tanga porque dispunha de receitas fiscais próprias
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através de impostos directos e indirectos. É verdade que se pode contar com os fundos da Comunidade Europeia, e só assim não se vêem completamento estagnados os investimentos que a Madeira tem de realizar.
De tudo isto resulta que o Programa de Recuperação Financeira, neste período de 12 anos, não será o ideal, pelo que se afigura sensato negociar um novo Protocolo de Reequilíbrio Financeiro. O ideal seria ver o Governo da República responsabilizar-se pela totalidade dos juros, cabendo à Região a amortização do capital. Não seria atitude inédita: o Governo da República já se responsabilizou por dívidas de empresas na área de Sines em milhões de contos.
Mas, no mínimo, é necessário que o Governo central proceda de modo a não se agravarem as condições financeiras da Região Autónoma da Madeira.
Isso não sucede. O Fundo de Equilíbrio Financeiro para as autarquias prejudicou a Região este ano em cerca de l milhão de contos. Poderá falar-se ainda nos constantes atrasos nas remessas financeiras devido a burocracias do Governo da República, para além das referentes a fundos estruturais da Comunidade Europeia, através do IFADAP.
Face as dificuldades financeiras da Região Autónoma da Madeira, penso que, para além de um novo protocolo, sem exigir privilégios, porventura ofensivos relativamente a outras regiões do País, haverá que, pelo menos, tratar a Região com plena limpidez em todos estes aspectos. O Partido Socialista preza a dignidade dos madeirenses e não quer ver os seus governantes a utilizar políticas reivindicativas de natureza quase sindical, nem a se colocarem, solícitos, todos os anos, perante as autoridades do Governo central, para pedirem o que legal ou justificadamente lhes é devido.
Em nome da solidariedade nacional e dos custos da insularidade, pretende-se uma normalização das relações entre a Região e o Governo da República, devendo o governo da Região Autónoma da Madeira proceder sem desnortes financeiros e apresentar contas transparentes, o que, como todos sabemos, não foi a opinião do Tribunal de Contas referente à conta do ano de 1989.
Outro aspecto que gostaria de focar diz respeito aos serviços não regionalizados e sob a alçada do Ministro da República. Como se sabe, referem-se aos Ministérios da Justiça, Finanças, Administração Interna e Forças Armadas. A maioria dos edifícios e instalações dependentes destes ministérios, com excepção das Forças Armadas e Ministério da Administração Interna, não ostentam a dignidade mínima.
Muitos são mesmo pobres, sujos e de instalações insatisfatórias, queixando-se os que superintendem nesses serviços que dispõem de parcas verbas para limpeza. Refiro-me, sobretudo, a registos civis, secretarias notariais e de finanças.
Urge, portanto, que o Governo central ponha fim a incompreensíveis delongas e laça construir edifícios funcionais e dignos.
Um último ponto - os transportes entre o continente e a Região. Muito importantes são as vias aéreas. A ampliação do aeroporto da Madeira não visa apenas fins turísticos ou de transporte de passageiros. A economia madeirense, que poderá ter uma solução na exportação de flores e frutos tropicais, necessita de uma pista adequada aos grandes aviões de carga, pois só a via aérea se presto para o transporte de produtos que exijam condições de exemplar armazenamento e, sobretudo, de rapidez na .sua colocação nos mercados.
Relativamente aos transportes marítimos, temos coleccionado investigação de que se dão eco os jornais e outros media, os quais, através de pessoas responsáveis, reconhecem que o porto do Funchal, como o de Leixões e Lisboa, é um dos mais caros do mundo.
São excessivos os preços dos fretes marítimos. Operavam na Região empresas praticando preços elevados e com tabelas iguais. Houve conluios de interesses, mas chegou-se a acordo, formando-se um oligopólio, com as diferentes empresas a praticarem as mesmas tabelas e acordando numa repartição de quotas de operação. Prejudicada ficou a população da Madeira e Porto Santo que viu crescerem os preços numa Região em que quase tudo é importado. Só a título de exemplo, o frete de banana anda à volta de 30SOO por quilograma, numa viagem de dois dias entre Funchal e Lisboa, enquanto o mesmo frete paga 15$00 entre o Equador e Lisboa.
Impõe-se a intervenção dos Governos central e regional no sentido de regularização deste problema e ainda o trabalho de uma conjugação das redes transeuropeias, com os seus terminais ferroviários ou viários, aos portos que podem fazer ligações com as ilhas atlânticas. E assim volto ao inicio da minha intervenção, não ao mar que separa, mas a essa grande estrada descoberta pelos Portugueses há 500 anos, a esse mar que aproximará a Madeira e os Açores de Portugal e da Europa.
Aplausos do PS.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, tem a palavra para esse efeito. Espero que seja mesmo uma interpelação à Mesa, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, desejava pedir à Mesa que providenciasse junto do Ministério das Finanças e do Governo Regional o elenco exacto e exaustivo dos empréstimos contraídos pela Região Autónoma da Madeira, bem como das suas datas de vencimento, para que o Sr. Deputado Marques da Silva ficasse ciente de que os governos socialistas não honraram o aval prestado no seus vencimentos e não resolveram a acumulação de juros no momento próprio, o que levou à formação de uma bola de neve.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, já não está a interpelar a Mesa, mas a pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Marques da Silva. Portanto, está a subverter a figura regimental.
O Orador: - Era, pois, para solicitar esses elementos ao Ministério das Finanças e ao governo regional para o Sr. Deputado Marques da Silva ficar ciente deles.
O Sr. Marques da Silva (PS): - Já temos esses elementos!
O Sr. Alberto Martins (PS): - Afinal o Sr. Deputado Guilherme Silva é o único que não tem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
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O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Ministro da República da Região Autónoma dos Açores e o Ministro da República na Região Autónoma da Madeira participam habitualmente nas reuniões do Conselho de Ministros.
Os Ministros da República superintendem nas funções administrativas do Estado naquelas Regiões e coordenam a actividade dos serviços centrais não regionalizados. Aos Ministros da República não está apenas confiada a tarefa de representar a soberania da República, cabe-lhes também personalizar o interesse dos órgãos centrais do Estado pelo desenvolvimento económico, social e político das Regiões Autónomas. São eles que, por várias formas, devem comandar a acção que o Estado central exerce a favor daquele desenvolvimento.
Os Ministros da República manifestam, na prática, um desinteresse objectivo pelas suas funções, presenciam inertes à transformação das Regiões Autónomas em sociedades assistidas, aparentemente em nada os incomoda a crescente dependência das despesas públicas em que se encontram a economia e o emprego regionais e assistem impávidos às situações de abuso do poder, não exercendo o papel moderador e esclarecedor dos órgãos nacionais que deviam representar ou instalar nas Regiões.
Sobre o seu desinteresse fala, melhor do que ninguém, a sua ausência hoje na Assembleia da República, justamente no dia em que se debate o exercício das competências que, constitucionalmente, tem o dever de coordenar.
O desinteresse dos Ministros da República pelas suas competências reflecte-se naturalmente em prejuízo para as populações, tanto no que toca ao desempenho dos serviços não regionalizados do Estado, como na vida política regional, muito particularmente na observância das garantias de igualdade dos cidadãos e dos partidos.
A Comissão Nacional de Eleições continua sem estar instalada nas Regiões Autónomas e os Ministros da República recusam-se, na prática, a exercer as suas funções, como seria normal. Na verdade, o normal seria eles assumirem o encargo de procederem à sua instalação, mas não o fazem, assim como não dão qualquer seguimento aos pedidos de aclaração ou de protesto que lhes tem sido entregues na sequência de variados casos surgidos em altura de eleições.
Verifica-se também que os Ministros da República não têm exercido qualquer poder de influência: no sentido de ser devidamente observado o dever de imparcialidade e neutralidade, no período eleitoral, por parte das entidades públicas; no sentido de impedir o abuso de utilização de meios públicos para fazer propaganda das intervenções de carácter partidário; nas relações entre as autarquias e o governo regional, onde a autonomia financeira dos órgãos autárquicos está inibida; no sentido de permitir o confronto e o debate democrático de ideias nos órgãos de comunicação social pública.
Estas questões têm particular incidência nas Regiões Autónomas e sabemos que a sua solução deve ser procurada, em primeira instância, pelos órgãos autonómicos regionais, mas não pode ignorar-se que elas dizem respeito a direitos garantidos na Constituição da República e não podem, portanto, passar ao lado da responsabilidade do Governo da República e de quem representa a soberania da República nas Regiões Autónomas.
É este o nosso claro entendimento e consideramos esta questão central. Queremos pedir contas ao Governo e aos Ministros da República por situações de abuso do poder que se verificam nas Regiões Autónomas, e fazemos isto com tanto mais vigor quanto mais patente é o alheamento e a vontade de desresponsabilização que o Governo demonstra sobre a matéria e quanto maior é o descanso com que os Ministros da República rodeiam o desempenho do sua missão.
O nosso entendimento é claro: a autonomia regional não isenta de responsabilidades o Governo da República e os seus serviços e a sua acção deve ser coordenada e compatibilizada com os órgãos autonómicos pelos Ministros da República, exactamente nos termos definidos na Constituição.
O baixíssimo perfil da sua actuação é um claro indicativo, a nosso ver, de uma visão partidária dos mecanismos da autonomia. As relações normais e constitucionais entre a soberania da República e os órgãos autonómicos não podem ser substituídas por contactos intrapartidários, mas devem antes ser assumidas nacional e institucionalmente. Só assim elas ocorrerão à vista e sob a fiscalização dos portugueses das Regiões e do todo nacional; só assim se poderá garantir a sua continuidade e a sua dignidade para além dos resultados eleitorais a nível nacional ou a nível regional; só assim ela deixará de ser uma conveniência partidária para ser a expressão da solidariedade nacional.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Reis Leite, que é o último Deputado inscrito.
O Sr. José Reis Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate, como forma de interpelação ao Governo, incidindo sobre a solidariedade institucional e o acompanhamento das competências governamentais quanto às Regiões Autónomas, leva-me a reafirmar que a solidariedade é um imperativo constitucional que compete aos órgãos de soberania: o Presidente da República, a Assembleia da República e o Governo. Devo também testemunhar que, no meu ponto de vista, não tem faltado solidariedade.
Em votos recentemente aprovados unanimemente pela Câmara, foram realçados aspectos importantes dessa solidariedade. Referiam-se ao Presidente da República, nomeadamente às suas viagens pelas ilhas e à presidência aberta nos Açores, e também se releriam à Assembleia da República. Tiveram a solidariedade formal de reafirmar o apoio político da Assembleia da República à solução da autonomia, como resposta democrática aos anseios dos ilhéus de se autogovernarem e como resposta às históricas aspirações dos povos insulares para se integrarem e enriquecerem a nação portuguesa, com as suas características geográficas, económicas, sociais e culturais.
É na diversidade que nos engrandecemos e na complementaridade que os Portugueses se unem.
Mas seria injusto esquecer a solidariedade do outro órgão de soberania: o Governo. Antes de mais, solidariedade política que este Governo tem reafirmado, consciente do grande apoio que encontrou no eleitorado das ilhas. Solidariedade e apoios específicos que, noutras ocasiões, pareciam vacilar, mas que, em tempos recuados e em governos de outras cores, foi bem menos concreta e muitas vezes faltou.
Mas o passado lá vai e os caminhos que percorremos são os do futuro. Contudo, o clima de entusiasmo que, manifestamente, renasce nos partidos e no aparelho do
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Estado, pela autonomia insular, deve agora traduzir-se em concretizações. Solidariedade para melhorar os instrumentos reais da construção do edifício autonómico-constitucional. Aperfeiçoar a autonomia, que é uma obra de construção e de reconstrução permanente, é neste campo um desafio preferencial à Assembleia da República.
Convém não escamotear que a solidariedade inscrita no texto constitucional é para reforçar a autonomia e, através dela (nunca contra ela), a unidade nacional, porque os constituintes compreenderam que essa unidade se consegue com vontade e consciência e nunca com imposições.
Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Creio, aliás, que um dos aspectos mais importantes da solidariedade expressa nos votos da Assembleia da República é a reafirmação voluntária do conteúdo político do texto constitucional nesta matéria, afastando as tentações de o declarar vazio de sentido.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Fazer sair da apatia e do esquecimento Regiões insulares, periféricas e pobres tem sido sempre um esforço muito grande e, noutras paragens, feito com êxito. O caso português não nos envergonha e até se pode contar entre aqueles que tem despertado maior curiosidade pelos seus resultados positivos.
As ilhas portuguesas do Atlântico são hoje assinaladas como experiências notáveis do progresso e do desenvolvimento. Esse progresso, é bom que fique claro, deve-se antes de mais ao esforço dos insulares e aos recursos gerados pelo seu trabalho. Mas seria absurdo não relembrar que foi ao PSD que coube a meritória t are f u de compreender a necessidade de enquadrar essas potencialidades e de lhe dar corpo. A liderança política do PSD e dos seus governos são os responsáveis por muito desse progresso.
É precisamente por esse êxito e pela obra realizada que a cobiça pelo poder nos Açores parece ler cegado os partidos da oposição. É vê-los num ala indescritível para conquistar o poder, com casamentos espúrios de última hora, e até, ao que parece, com verdadeiras mancebias.
O Sr. José Magalhães (PS): - Mancebias, que horror!
O Orador: - Não recuam perante nada, nem nenhumas conveniências. Não os detém, sequer, o sacrifício público dos seus líderes regionais.
Mas voltemos, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs Deputados, ao tema central do nosso debate: a solidariedade!
É evidente que ao Governo da República compete dar corpo aos aspectos mais concretos do preceito constitucional. Tem dado, nomeadamente ao interessar a Comunidade Europeia para os problemas da insularidade e das Regiões ultraperiféricas, como ainda agora se viu pelo Tratado de Maastricht.
Tem dado pelas transferências do Orçamento do Estado, insipientes e insuficientes, sem dúvida ao princípio, mas de longe melhores do que as de qualquer outro governo.
Tem dado até pelo cuidado nos serviços a seu cargo, espalhados pelas ilhas das Regiões Autónomas, os quais, a um ritmo que gostaríamos de ver acelerado, começam a deixar de ser os piores em termos de instalações e de funcionamento.
Com estas promessas e com este novo e frutuoso clima, abrem-se novos horizontes para melhorar aspectos fundamentais que ajudarão a ultrapassar aquilo que é negativo na insularidade.
Antes de mais, os transportes, de pessoas e bens, que constituem um estrangulamento clássico ao desenvolvimento e ao progresso das sociedades insulares. Transportes, marítimos e aéreos, eficientes, rápidos e baratos são o segredo para acelerar o desenvolvimento económico e social das Regiões Autónomas e modernizar a sua estrutura.
É uma área que, apesar do muito que tem sido feito, deixa a desejar. No caso específico dos Açores, os fretes marítimos são penalizantes e a circulação pelas ilhas não é compensadora. Os transportes aéreos feitos pela TAP constituem um serviço que não é digno de uma Região europeia. Aviões pouco confortáveis a preços exorbitantes e com serviço de aeroporto (da responsabilidade da ANA) e de bordo pouco dignificantes, precisam de urgente intervenção da tutela. Temo que só o fim do monopólio possa obviar a esta situação.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Espero que agora respondam ao Sr. Deputado, que é a voz da maioria e tem, por isso, mais autoridade!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Secretário de Estado vai-lhe responder!
O Orador: - Os remédios para estes males certamente o actual governo também os encontrará no diálogo com as Regiões Autónomas, prosseguindo as experiências comunitárias e entusiasmando a iniciativa privada.
As ilhas atlânticas portuguesas não são um paraíso! São hoje as Regiões Autónomas lugares de esperança e terras onde vale a pena viver. Como sempre viver em ilhas é um desafio e não é um privilégio para todos aceitar esse desafio. Para os pessimistas para os negativistas e para os derrotistas não há lugar nesse mundo que são as ilhas.
O Sr. Jaime Cama (PS): - Muito bem!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir um esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró. No entanto, o PSD não tem tempo mas como o Sr. Deputado José Reis Leite é dos Açores, a Mesa concede-lhe mais um minuto.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Deputado Reis Leite, já é a segunda vez que os Deputados da sua bancada tomam a iniciativa de trazer para este debate o tema das eleições regionais. É que, curiosamente, não têm sido os partidos da oposição que tem estado muito preocupados com isso. Preocupado parece estar o seu partido e a sua bancada que referem agora a cobiça que os partidos da oposição têm pelo poder.
É curioso sublinhar este aspecto: o desejo, mais do que legítimo, que o PSD teve de assumir o poder e tem de o manter é, por vós, considerado perfeitamente legítimo em democracia, mas já o desejo igual de outros partidos é considerado cobiça. E cobiça aparece agora associada a uma mancebia para nos inculcar um sentimento de culpa ainda maior e, por sermos da oposição, agora estamos amancebados.
Sr. Deputado, a esse respeito, não transforme a Assembleia da República numa espécie de órgão da comunicação social, não queira armar em jornalista e dar notícias aos seus Deputados. Aguarde a conclusão do pro-
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cesso de negociações em que parece que V. Ex.ª participa, visto que trouxe aqui essas informações em primeira mão e aguarde pelas datas já anunciadas para saber os resultados e, então sim, dizer se está de acordo com as previsões ou com as notícias que V. Ex.ª vai adiantando.
No entanto, quero colocar-lhe uma pergunta.
O Sr. Ministro, quando lhe coloquei uma questão, chamou-me a atenção para o lacto de estar em causa neste debate apenas as relações dos órgãos centrais com as Regiões Autónomas e que eu não podia levantar questões que dissessem respeito ao foro autonómica das Regiões. Ora, os Deputados do PSD não se cansam de trazer aqui questões que têm a ver com a actividade normal dos governos regionais, isto é, questões que têm a ver com o foro autonómico das ilhas.
Apesar de não estarem em causa essas questões, mas já que o Sr. Deputado as trouxe para o debate, e tendo em atenção o mecanismo da solidariedade, referir-me-ei ao ensino, às escolas na sua Região Autónoma.
Há uma média regional de mais de 35 % dos professores do ensino secundário que não têm habilitação própria e, em algumas ilhas mais pequenas, esta mídia sobe para 70 %. Deixando de lado o caso particular da ilha do Corvo, cito-lhe as ilhas da Graciosa, São Jorge e Faial em que as escolas preenchem apenas as necessidades da escolaridade obrigatória. E para o secundário como 6 que fazem? Vão todos à ilha do Pico? Deixo-lhe esta questão, sublinhando, perante a Câmara, que iodos estes índices têm vindo a piorar desde 1986 e daí não estarmos a assistir a uma dinâmica de melhoria mas a uma progressiva degradação da situação. Agradecia o seu comentário.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Reis Leite.
O Sr. José Reis Leite (PSD): - Sr. Deputado Manuel Queiró, V. Ex.ª não fez verdadeiramente nenhuma pergunta, mas sim uma apreciação sobre a minha intervenção e levanta problemas que são do foro da Assembleia Legislativa Regional dos Açores e aos quais, como ó óbvio, não responderei aqui porque não 6 esse o nosso papel.
Só direi uma coisa. No Faial há uma escola secundária que é herdeira de um velho liceu nacional que contribuiu em muito para o desenvolvimento cultural de Portugal, visto que o Presidente da República Manuel Arriaga foi seu ilustre aluno. E está tudo dito.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputados, está concluída esta parte do debate.
Tem a palavra, para a intervenção de encerramento, o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira Brito (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Não há dúvida de que tomámos uma boa iniciativa. Fizemos uma boa interpelação, como ela deve ser feita, e elencos uma série de questões que se põem em relação às ilhas e que respeitam directamente às relações com o poder do Estado e da República. O elenco que fizémos mereceu o acordo da Câmara que se manteve silenciosa, apesar de regularmente provocada pelo líder da minha bancada. Deputado Narana Coissoró, o Governo esteve presente, eu diria, em força, deu respostas e esclareceu questões e os Deputados interessados fizeram intervenções. Vamos terminar!
Começo por constatar que alguma coisa vai maí nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Sobre isso, aliás, já ninguém tem dúvidas. Do Dr. Mota Amaral ao Dr. Alberto João Jardim, passando pelos Drs. Martins Goulart e Jardim Fernandes, sem esquecer, é claro, os nossos Drs. Rui Meireles e Ricardo Vieira que são, aliás, os mais avisados e prudentes, como é sabido por todos.
No que respeita aos açorianos e madeirenses, de resto, não havia mesmo necessidade de inquéritos, de interpelações e de denúncias políticas para os tomar conscientes desta realidade, da crise que há algum tempo já chegou às costas das suas ilhas - e às suas costas - e ameaça instalar-se, sabe-se lá por quanto tempo.
São as falências nas empresas a suceder-se a um ritmo mais acelerado, é a vida na agricultura cada vez mais difícil com atrasos no pagamento dos produtos a acompanhar a queda nos preços e o aumento nos custos - o que também acontece no continente -, são as iniciativas prometidas que não arrancam como se prometera e previra, é o Estado que cada vez mais se endivida, são as privatizações que não avançam ou que, quando avançam, acabam por ler de voltar à estaca zero.
E depois são, sem dúvida, os meios políticos a agitar-se e a tentar reflectir e canalizar para os órgãos do governo próprio, maxime para os parlamentos regionais, o mal-estar e as dúvidas que a todos afligem.
Mais do que isso, é o próprio Parlamento nacional que se ocupa do assunto, através de iniciativas que podem considerar-se discutíveis nos contornos concretos que assumem, mas que não podemos, todos, deixar de louvar na exacta medida em que representam tentativas de recondução ao debate político nos locais apropriados de questões importantes sentidas já pela sociedade.
A atitude de oposição radical à discussão parlamentar destas questões só pode ter como consequência o alargamento do fosso que um pouco por toda a parle começa a separar a classe política do povo e mina a credibilidade das instituições próprias da democracia representativa.
Para que assim não seja e porque muitos dos problemas - diríamos mesmo os principais problemas - que afligem as Regiões Autónomas são de relacionamento com o Estado nacional é que o CDS entendeu dar também o seu contributo a esse debate.
Procurámos fazê-lo em tom ameno, não apaixonado, evitando a fulanização das questões, pese embora a importância que naturalmente atribuímos à personalidade dos dirigentes na condução da política e o reconhecimento de que, nos Açores e na Madeira, os presidentes dos respectivos governos regionais são personalidades fortes, com grande tendência para a intervenção pessoal e que por isso mesmo marcam de modo indelével a política das respectivas Regiões.
A questão não é, porém, essa! Nem é mesmo, como tem vindo a ser afirmado pelo CDS-Madeira, que o nega, uma questão de défice democrático.
A questão é, antes de mais, de distorção nas relações entre a Administração e os administrados provocada por um claro desequilíbrio entre a sociedade e o Estado nas Regiões Autónomas. E é também uma questão de falta de clareza no relacionamento entre o Estado e as Regiões.
São, portanto, razões de fundo que provocam situações de mal-estar, como as que levaram às recentes interpelações e que sem dúvida estão a afectar o relacionamento
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político nas Regiões e, pior do que isso, a própria imagem da política e das relações de representação política.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: - É delas que pretendemos tratar, na tentativa de, em discussão alargada, encontrar, para os problemas detectados soluções aceitáveis por todos e susceptíveis, por isso mesmo, de vir a ser aplicadas.
Ora, o que é que na realidade se passa e corresponde, em nosso entender, a uma razão de fundo?
É antes de mais um peso excessivo do Estado, como resulta, por exemplo, da simples ponderação do facto de nos Açores a despesa pública representar quase 80 % do total do produto interno bruto regional.
Em 1990, para um produto de 80 milhões de contos, medido a preços de 1986, a despesa lotai prevista no orçamento regional era de 62 186 milhões de contos. Por sua vez, na Madeira, a despesa pública em 1989 foi de 56,3 milhões de contos, representando um acréscimo de 20 % em relação ao ano anterior.
É claro que o conjunto de factores agrupados sob o conceito de insularidade explicam uma presença mais significativa do Estado, ajudando a superar as deficiências próprias de um mercado reduzido, afectado pela descontinuidade geográfica e isolado também em relação aos espaços em que será necessário procurar e encontrar compensação para tal redução ou pequenez.
Simplesmente, ajudar a superar é isso mesmo, ou seja, lerá que haver um momento em que as sociedades regionais e as suas próprias iniciativas ganhem autonomia, passando a contribuir de modo mais significativo para o produto gerado nas Regiões.
E a situação é tanto mais preocupante quanto é certo que, no caso dos Açores, a manutenção de uma despesa pública tão essencial à economia da Região, 80 %, começa a defrontar-se com uma carência progressiva de receitas, como resulta evidente da evolução do peso crescente que u assunção da dívida tem vindo a assumir nas contas da Região.
Assim, no período de quatro anos que mediou entre 1987 e 1991 a Região passou de uma situação de relativo equilíbrio nas suas contas para uma situação em que o stock global da dívida do sector público administrativo deverá ter atingido os 35 milhões de contos que, adicionados aos 25 milhões do sector empresarial público, perfaz uma dívida de todo o sector público rondando os 60 milhões de contos, o que aguenta perfeitamente quaisquer comparações com os índices nacionais, mas que, no contexto regional, não pode deixar de se considerar como altamente preocupante.
Tanto mais preocupante quanto é certo que as receitas da Região começam, repito, a esvair-se, como é principalmente o caso das contrapartidas recebidas pela utilização de determinados pontos do território por potências estrangeiras para fins de defesa. É, para já, o caso das Flores e pode perfeitamente vir a ser o caso das Lajes.
Aliás, é precisamente a diminuição do peso percentual de tais receitas, juntamente com as provenientes de transferências do Orçamento do Estado - transferências essas que, contrariamente ao que disse o Sr. Ministro, passaram de 7,3 milhões, em 1985, para 5,5 milhões, em 1990 -, o que tem determinado o recurso crescente ao endividamento regional.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Claro!
O Orador: - E tudo isto, sem que se vislumbre a possibilidade de a actividade e a despesa do Estado poderem ser substituídas pela iniciativa privada, através da dinamização do tecido empresarial açoreano, sendo certo que as privatizações continuam a marcar passo.
O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!
O Orador: - E o que se passa nos Açores, em termos de dívida, passa-se na Madeira, em termos de certo modo mais gravosos.
Com efeito, aí, e como já lembrou o Sr. Deputado Marques da Silva, vem de mais longe a tendência para o endividamento que, no final de 1990 e em termos consolidados, atingia já o valor de 82,8 milhões de contos, o que implica um serviço de dívida, com encargos anuais, que, até 1995, se situam nos 7,8 milhões de contos para subirem a 11,2 milhões, em 1996, dado o prazo de graça, se não houver, entretanto, aumento do stock.
Isto, perante um quadro orçamental em que as receitas correntes, cobradas em 1989, se quedaram pelos 33,8 milhões de contos e em que as despesas com o pessoal atingiram os 7,7 milhões de contos.
E, curiosa mas naturalmente, a dívida total de 82,8 milhões tem a sua origem num capital inicial de dívida de 51 milhões- como lembrou o Sr. Deputado Marques da Silva -, representando, no seu volume actual consolidado - e apesar da solidariedade do Estado central -, o resultado da acumulação de juros não pagos, face à incapacidade financeira da administração regional.
O processo é conhecido - mais dívida mais juros, mais juros mais dívida mais juros - e tem levado muitos empresários, mais incautos ou menos prevenidos, à falência em todos os pontos do território.
Daí que o governo regional se lenha visto na necessidade de recorrer a acordos de reequilíbrio financeiro, o primeiro assinado em 1986 e o segundo, actualmente em vigor, assinado em 1989.
Trata-se fundamentalmente de acordos de consolidação do passivo da Região, acompanhados da concessão de garantias respeitantes ao pagamento futuro e da assunção da obrigação de pagamento de uma parte dos juros - metade.
Ao mesmo tempo o Governo da República aproveita a oportunidade para introduzir obrigações de disciplina orçamental, procurando conter o endividamento e obrigando ao cumprimento de índices moldados, de resto, nos termos de acordos que já vincularam a própria República - lembro os acordos com o Fundo Monetário Internacional - e daqueles que voltarão a vincular-nos com a aprovação e entrada em vigor do Tratado de Maastricht.
Temos, portanto, um panorama claramente demonstrativo de um contributo exagerado do Estado e da sua despesa para o produto regional. Ou seja, de um panorama em que pouco há para além do Estado.
Ora, é isto mesmo que, aliado à hegemonia política de um partido, contribui para situações concretas de constrangimento e incomodidade, que estão sem dúvida na base da acusação de défice democrático, ou de abuso de poder como preferiu o CDS.
Pior ainda, o papel predominante do Estado é em si mesmo gerador da hegemonia e principalmente da sua conservação.
Por outro lado, a falta de regras disciplinadoras das relações financeiras e, designadamente, das transferências orçamentais do Orçamento do Estado para os orçamentos
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regionais contribui também, claramente, para perpetuar a conservação da hegemonia política.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!
O Orador: - É preferível, para quem quer conservar o poder, apresentar os eventuais sucessos na obtenção de auxílios e apoios como consequência de relações pessoais ou políticas privilegiadas do que fazê-las decorrer do simples cumprimento de regras claras definidas publicamente.
Vozes do CDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - É por tudo isto que esta nossa iniciativa, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, não vai ficar sem consequências.
Antes pelo contrário, o partido, através dos seus grupos parlamentares regionais e nacional, vai promover a oportuna aprovação de um quadro global de incentivos à iniciativa privada e ao seu desenvolvimento - única forma de tirar as Regiões Autónomas da crise para que se encaminham -, bem como ao enquadramento legal da actividade orçamental das Regiões, a sua disciplina orçamental e das relações financeiras entre as Regiões e a República.
Assim, pensamos que vamos contribuir, de uma forma correcta, para endireitar o que vai mal nas Regiões Autónomas!
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou dizer algumas breves palavras no encerramento deste debate.
Permitam-me que comece por sublinhar um facto, porventura, uma feliz coincidência. Este debate ocorre no preciso dia em que, em Bruxelas, ao fim de longas, difíceis e complexas negociações, a presidência da Comunidade conseguiu a aprovação, por unanimidade dos Doze, de uma decisão de longo alcance e importância: foi aprovada a reforma da política agrícola comum.
Aplausos do PSD e do CDS.
É, portanto, um facto suficientemente importante para a Comunidade e para o nosso país, para, excepcionalmente, daqui o saudarmos e referenciarmos, não por razões partidárias, não para retinir quaisquer dividendos especiais, mas, sobretudo, para assinalar um êxito da presidência portuguesa, o que honra Portugal e os portugueses.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não é um facto qualquer, não é uma situação vazia de conteúdo, não é uma qualquer promessa de intenções, é uma mudança de filosofia no sentido de uma maior solidariedade e apoio aos países menos desenvolvidos da Comunidade. Trata-se, uma vez mais, do reforço da coesão económica e social, que Maastricht desenvolveu e aprofundou, e de mais um passo agora no domínio agrícola para acentuar o princípio de uma Europa mais homogénea, mais justa e mais solidária.
É esta mesma preocupação, a da solidariedade e do desenvolvimento harmonioso e equilibrado, que tem presidido às relações do Governo da República com os governos regionais dos Açores e da Madeira.
Uma vez mais tal ficou aqui demonstrado neste debate, não tanto nos discursos, sobretudo em actos, em indicadores, em resultados concretos. Difícil é detectar, nesta matéria, qualquer défice de solidariedade nacional, como agora se diz, para com as Regiões Autónomas.
Os Srs. Deputados que o tentaram demonstrar limitaram-se a suscitar dúvidas, a exprimir curiosidade e vontade de saber quanto à forma a utilizar na resolução de alguns problemas e a manifestar, de uma forma que consideramos saudável, um novo espírito que nos últimos anos está incutido nos sentimentos dos Portugueses.
A vontade, estimulada pelos bons resultados alcançados, de fazer-se mais, de fazer-se melhor, de fazer-se mais depressa, é uma preocupação de exigência salutar e saudável que não só saudamos como, sobretudo, importa reconhecer que temos até sido dos primeiros a estimular o País. Tal como dissemos, e agora o reafirmamos, esta solidariedade nacional não são meras palavras ou intenções.
Gostaria apenas de sublinhar alguns exemplos ao nível de três questões concretas, e das mais importantes, relativamente aos Açores e à Madeira.
No que diz respeito ao aeroporto do Funchal, já foi conseguida a aprovação da comparticipação comunitária de 75 % e iremos ainda lutar por um aumento desta comparticipação. O concurso de pré-qualificação já está a decorrer e terminará, em princípio, no próximo mês de Agosto. A empresa encarregue da concessão e da exploração já está a funcionar. O contrato de concessão será assinado em breve. A obra vai mesmo por diante. Contrariamente a algumas afirmações aqui produzidas, a ampliação do aeroporto vai ser uma realidade, uma velha aspiração que se transforma em realidade.
Aplausos do PSD.
Assim se manifesta e se manifestará até final a solidariedade nacional.
Em segundo lugar, as legítimas preocupações dos governos regionais, quanto à agricultura dos Açores e da Madeira, sobretudo quanto à defesa das suas produções tradicionais, está, de facto, em vias de ser salvaguardado.
Posso aqui sublinhar aquilo que há pouco telegraficamente referi, isto é, que existem condições para que, já no próximo mês de Junho, ainda no decurso da presidência portuguesa, os regulamentos específicos do POSEIMA, no tocante à defesa e protecção das produções tradicionais dos Açores e da Madeira, sejam definitivamente aprovados.
Aplausos do PSD.
Ultimada que foi a sua negociação a nível técnico, posso dizer que eles vão de encontro as aspirações, às reivindicações e às legítimas expectativas da população da Madeira e dos Açores. Assim, penso que se manifesta e se manifestará, uma vez mais, a solidariedade nacional.
Em terceiro lugar, o cumprimento escrupuloso do protocolo de reequilíbrio financeiro com a Região Autónoma da Madeira está a ser, e será até final, integralmente respeitado.
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Atrasos decorrentes de questões burocráticas ou administrativas estão em vias de ser resolvidos e não ensombram nem fazem perigar os compromissos assumidos, as expectativas criadas e o esforço de solidariedade que, oportunamente, foi feito e consagrado.
Em quarto lugar, a questão da base das Lajes é, como dissemos, uma questão que a todos preocupa. Não escondemos, ninguém deve esconder, que é uma questão difícil e complexa. Não é justo nem sério atacar ou criticar seja quem for, designadamente o Governo da República, por situações a que, como todos sabemos e temos obrigação de saber, somos absolutamente alheios e que resultam de alterações geoestratégicas na cena internacional.
Mas os açorianos sabem que podem contar, e continuarão a contar, com o esforço político e diplomático das autoridades portuguesas, para que a razão venha ao de cima e as legítimas pretensões nacionais do arquipélago e do País sejam salvaguardadas.
Seremos intransigentes, exaustivos e perseverantes na defesa dos nossos legítimos interesses e direitos. Também desta forma se manifesta, e se manifestará até final, a solidariedade nacional.
Apesar das razões de oportunidade política que presidiram a esta iniciativa, apesar das intenções subjacentes, importa reconhecer o contraste político significativo entre este debate e outro que, igualmente sobre as Regiões Autónomas, aqui teve lugar. Com diferenças de pontos de vista, normais e salutares, talvez mais de oportunidade até do que de substância, importa realçar algo que ficou claro ao longo de todo este debate.
O desenvolvimento, o progresso e a melhoria das condições de vida das populações dos Açores e da Madeira são, quer se queira quer não, uma realidade visível, palpável e notória. Está bem nítida aos olhos de todos, basta, de facto, visitar aquelas duas Regiões Autónomas.
É com orgulho que constatamos e que registamos que o desnível de desenvolvimento, as desigualdades e as vulnerabilidades tradicionais e antigas daquelas duas Regiões Autónomas estão a ser vencidas a olhos vistos, a um ritmo que, podemos mesmo dizer, é muito, mas muito, significativo. É bom, é importante, é positivo que assim seja. Isto é esforço, em grande medida, da solidariedade nacional e comunitária, mas é justo e legítimo reconhecer o esforço gigantesco dos governos regionais e o esforço, o trabalho e o dinamismo da população madeirense e açoriana.
Aplausos do PSD.
O grande mérito, o grande esforço e os grandes repousáveis pelas mudanças são, sem dúvida, os governos regionais e as respectivas populações. Como sempre dissemos no passado, a respeito de outras matérias e noutras ocasiões, uma conjuntura internacional favorável não é suficiente se não for devidamente aproveitada. Dissemos isto aqui até à exaustão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Se as políticas não forem correctas, adequadas e corajosas, se o País não tiver um rumo certo e uma estratégia rigorosa e adequada. Dissemos isto e a prova dos factos aí está!
O mesmo raciocínio, a mesma orientação, a mesma postura são aplicáveis aos Açores e á Madeira. Não fora a perseverança, a capacidade e a determinação das autoridades regionais dos Açores e da Madeira e a solidariedade nacional não teria sido suficiente. Felizmente o tem sido, num processo que está longe de terminar, que é dinâmico e está em marcha acelerada, mas um processo que já deu e está a dar resultados bem positivos.
Hoje, tal como no continente, também nas Regiões Autónomas o progresso sente-se, o desenvolvimento afirma-se, a confiança das populações aumenta e reforça-se. Como portugueses e, acima de tudo, como portugueses solidários, devemos exprimir a nossa congratulação. Este debate leve esse mérito e essa oportunidade: o mérito de acentuar, uma vez mais, a solidariedade nacional, a oportunidade de mostrar, uma vez mais, ao País as vantagens, os benefícios e a grande razão de ser da autonomia regional dos Açores e da Madeira.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está encerrado o período da ordem do dia. A sessão de amanhã lerá início às 10 horas, dela constando o debate do inquérito parlamentar n.º 2/VI, apresentado pelo PCP, e os projectos de resolução n.ºs 25/VI e 26/VI, respectivamente do PSN e do CDS.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 30 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Amónio José da Motta Veiga.
António Maria Pereira.
Carlos de Almeida Coelho.
João de Oliveira Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Pereira Lopes.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons de Carvalho.
António Ribeiro Campos.
Carlos Manuel Costa Candal.
José Eduardo Cruz Jardim.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Carlos Almeida Figueiredo.
Carlos Miguel Oliveira.
Filipe Manuel Silva Abreu.
José Álvaro Pacheco Pereira.
José Angelo Correia.
Luís Manuel Costa denudes.
Pedro Holstein Campilho.
Pedro Manuel Passos Coelho.
Rui Fernando da Silva Rio.
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22 DE MAIO DE 1992 2167
Rui Manuel Lobo Gomes Silva.
Vítor Manuel Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto de Oliveira e Silva.
Carlos Cardoso Lage.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José de Figueiredo.
Fernando Pereira de Sousa.
José Manuel da Silva Lemos.
José Manuel Lello Almeida.
José Rebolo dos Reis Lamego.
Júlio Miranda Calha.
Raul Fernando Costa Brito.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.
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