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Sábado, 24 de Outubro de 1992

I Série - Número 5

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1992•1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE OUTUBRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José de Almeida Cesário

Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 20 minutos.
Em sessão de perguntas ao Governo, usaram da palavra, além dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Parlamentares (Luís Filipe Menezes), dos Ensinos Básico e Secundário(Manuel de Azevedo), Adjunto do Ministro da Administração Interna (Carlos Encarnação). Adjunto do Ministro da Saúde (Jorge Pires) e do Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura (José Manuel Oliveira), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), António Costa e Eurico Figueiredo (PS) e 15ilda Martins (PSD), tendo, ainda no início, o Sr. Deputado André Martins (Os Verdes) interpelado a Mesa por não constar da ordem do dia qualquer resposta às perguntas que foi formulou ao Governo.
Foi ainda lido o voto n.º 34/VI de congratulação pelo Dia das Nações Unidas, subscritos pelos Deputados do CDS, do PSD, do PS e de Os verdes.
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 45 minutos.

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O Sr Presidente: - Srs Deputados, temos quorum. pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Manuel Acácio Martins Roque.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Manuel Fernandes Alves.
António da Silva Bacelar.
António José Barradas Leitão.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
Francisco Antunes da Silva.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
António Moreira Barbosa de Melo.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata Silva
António do Carmo Branco Malveiro.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Joaquim Cardoso Martins.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Miguel de Vallere Pinheiro de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Cecília Pita Catarino.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Cipriano Rodrigues Martins.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos José Soares d' Almeida Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Joaquim Eduardo Gomes.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Joaquim Mana Fernandes Marques.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira Mourão.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Carlos Teixeira Baltazar Gomes.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João Manuel dos Santos Henriques.
João José Pedreira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Manuel Borregana Meireles.
José Alberto Puig dos Santos Costa
José Guilherme Reis Leite.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Manuel de Lima Amorim.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
José Macário Custódio Correia.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel da Silva Azevedo.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
António José Caeiro da Mota Veiga.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvin de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
José Pereira Lopes.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Alberto Limpo Salvada.
José Augusto Santos da Silva Marques.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.

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Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins
António de Almeida Santos.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Fernandes da Silva Braga.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Luís Santos da Costa.
António Alves Martinho.
Armando António Martins Vara.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Vítor Manuel Caio Roque.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima dos Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiro de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Apolinário Nunes Portada.
José Eduardo Reis.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Barbosa Mota.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Ernesto Figueira dos Reis.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
António Ribeiro Marques da Silva.
António Alves Marques Júnior.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
João Carlos da Silva Pinho.
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
15abel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Mário) António Baptista Tomé.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar de (Os Verdes apresentou na sexta-feira, dia 19, no Gabinete de V. Ex.ª, duas perguntas ao Governo, que, segundo apurámos, não chegaram ao Gabinete do Sr. Secretário de Estado dos Assuntou Parlamentares para este providenciar a sua resposta.
A questão que quero colocar é a de saber se há alguma forma de ultrapassar este problema, uma vez que o Grupo Parlamentar de Os Verdes é prejudicado com esta situação, sem que tenha contribuído para isso.
São duas as perguntas: uma tem a ver com a situação dos recursos hídricos em Portugal; a outra com a criação da carreira de tiro na cidade de Santarém. Nesta última situação, que avança de dia para dia, estão a ser investidos milhares de contos, pelo que o protelamento da resposta do Governo à nossa reivindicação de paragem das obras e de reflexão sobre este problema fica naturalmente prejudicado com o seu agendamento para uma próxima sessão de perguntas ao governo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa apenas lhe recorda o que está estipulado no n.º 3 do artigo 238.º do Regimento da Assembleia da República:

O Governo escolhe as matérias a que responde, dando indicação da sua escolha e dos membros do Governo encarregados de responder até à sessão anterior àquela em que se realiza a das perguntas.

Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, o texto das perguntas não saiu do Gabinete de V. Ex.ª e

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não chegou ao Gabinete do Sr. Secretário de Estado dos
Assuntos Parlamentares. Não houve, pois, a possibilidade de este dar andamento às perguntas, pelo que não se põe em causa a interpretação ou aplicação desse artigo do Regimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado André Martins, vou ler-lhe o ofício n.º 08096, de 2l de Outubro de l992, do Sr. Director-Geral para o Chefe de Gabinete de S. Ex.ª o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que refere o seguinte:

Para os devidos efeitos, junto envio a V. Ex.ª fotocópias das perguntas ao Governo formuladas pelos
partidos seguintes: PSD, PS, PCP, CDS e Partido Ecologista Os Verdes.

Daqui se conclui, Sr. Deputado, que o Gabinete fez seguir a pergunta que Os Verdes tinha formulado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Luís Filipe Menezes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, o Governo tem tido o cuidado de responder a todas as perguntas que têm sido formuladas pelos vários partidos, particularmente pelo Partido Ecologista Os Verdes, até porque tem em conta o facto de este grupo parlamentar só ter direito a fazer uma única pergunta em cada uma das sessões quinzenais de perguntas ao Governo.
Aliás, o seu partido até foi o único que, na anterior sessão legislativa, viu o Governo responder-lhe a 100% das perguntas formuladas durante todo o ano.
Desta vez, por lapso meramente administrativo (e ainda está por apurar se esse erro é da responsabilidade do Gabinete do Sr. Presidente ou do Gabinete do próprio Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares), não foi possível responder à pergunta de Os Verdes.
Nestes termos, de hoje a 15 dias, o Governo estará disponível para responder à pergunta a que os Verdes regimentalmente tenham direito, acrescida de uma outra, transferida desta sessão.

O Sr. Presidente: -0 Sr. Deputado André Martins pediu a palavra para que efeito?

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, compreendo a situação, que, de resto, é admissível. Porém, é necessário que fique registado que Os Verdes formularam essas perguntas.
Por fim, gostaria de dizer que registo com agrado esta disponibilidade do Governo para, de hoje a l5 dias, responder a duas perguntas do nosso grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia de hoje que é dedicado a uma sessão de perguntas ao Governo.
A primeira pergunta vai ser formulada pelo Sr. Deputado António Filipe, do PCP, e respeita à extinção do PIPSE.
Tem, pois a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

SÉRIE - NÚMERO 5

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário, a pergunta que formulámos ao Governo refere-se à extinção do PIPSE, Programa Interministerial para a Promoção do Sucesso Escolar.
Não vou questionar o Governo sobre o porquê o porquê da sua extinção, na medida em que, desde há cinco anos, já se sabia que isso iria acontecer nesta altura, pois em um programa calendarizado, criado para três anos, para acabar em 1992. Foi, com efeito, isso que aconteceu!
Portanto, é tempo para reflectirmos sobre os objectivos propostos para o Programa, sobre as acções efectivamente realizadas, sobre os resultados e o futuro do sistema educativo sem PIPSE.
Lembro-me de que, na altura, este Programa foi justificado, numa publicação vistosa do Ministério da Educação, devido a gravíssimos índices de insucesso escolar.
Nessa publicação fala-se em 350 000 repetências nos ensinos básico e secundário e l50 000 no ensino primário; em função das repetências que se verificaram no ensino básico, refere-se um prejuízo de 45 milhões de contos anuais.
O PIPSE foi estabelecido em várias fases, e é importante lembrar que quando o Programa foi lançado o PSD ocupava a pasta da educação há sete anos, pelo que já era responsável por muito do que se passava.
O PIPSE previa diversas medidas em l0 vertentes complementares, designadamente a nível da saúde escolar e da alimentação, da educação pré-escolar. Propunha-se aumentar substancialmente a rede de educação pré-escolar, considerando haver uma relação entre a educação pré-escolar e o sucesso educativo: propunha-se também intervir a nível da educação especial, do apoio familiar, da ocupação de tempos livres e do desporto escolar, da rede escolar e de transportes, a nível de material escolar, de apoio pedagógico e didáctico e de iniciação
profissional.
O PIPSE, tal como também é definido nesta publicação, traduzia-se numa campanha contra o insucesso, e, acrescento, destinada, sobretudo a fazer de conta, à medida que se fosse desenvolvendo, que o insucesso estava efectivamente a ser combatido.
A verdade é que o PIPSE surgiu desenquadrado de tudo: desenquadrado dos professores, desenquadrado dos órgãos do poder local, a quem eram cometidas tarefas importantes, e desenquadrado das necessidades locais detectadas, isto é, não passou de um conjunto de acções mais ou menos desgarradas entre si, apesar de terem sido criadas expectativas a muitas das pessoas intervenientes no Programa, as quais acabaram por ver inteiramente goradas essas expectativas.
A calendarização deste Programa foi feita tendo como pano de fundo um cenário de promessas risonhas que nos eram feitas aqui, aquando dos debates sobre educação, e que eram feitas ao país através da comunicação social.
A ideia - e consta das intervenções de vários membros do Governo da altura - era a de que, com as medidas que estavam a ser tomadas, o PIPSE acabaria ao fim de três anos, por ser desnecessário, isto é, nessa altura estariam criadas as condições para garantir efectivamente o sucesso educativo.
Ora as promessas não passaram disso mesmo. O Ministro Roberto Carneiro abandonou a ficção educativa com que nos brindou durante quatro anos e dedicou-se à produção televisiva, o PIPSE acabou, mas os problemas, no entanto, ficaram.
Se havia problemas com o PIPSE, agora existem problemas sem ele. E a situação actual é que até o suplemento alimentar concedido no âmbito desse Programa foi cortado e, agora, as autarquias, se quiserem, que o assegurem a expensas suas.

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Convém lembrar que esta situação representa para concelho de Loures - só para dar um exemplo de um concelho significativo - um encargo suplementar de mais de 60 000 contos anuais.
Concluo, assim, com as seguintes perguntas: o Sr. Secretário de Estado é capaz de dizer que o PIPSE acabou por ter cumprido os seus objectivos e por existirem condições de sucesso, tal como se previa no momento em que foi lançado? Que soluções é que o Governo perspectiva para as crianças que se vêem privadas, agora, até do apoio alimentar que o PIPSE conferia?

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário.

O Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário (Manuel de Azevedo): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço a sua pergunta porque me permite esclarecer um conjunto de questões relativas ao Programa Interministerial para a Promoção do Sucesso Escolar.
Como referiu, o termo do Programa estava estabelecido desde início ou, pelo menos, desde l989, portanto ele processou-se com toda a normalidade e sem qualquer situação de colapso, como se fez crer inicialmente.
Tratou-se de uma intervenção de emergência, de uma intervenção excepcional, e, como tal, foi uma medida de política que alcançou alguns dos seus objectivos e, no que se refere a outros, permite que as medidas de política que o Ministério da Educação possa tomar hoje sejam sustentadas em relação à obtenção dos resultados esperados.
Posso dizer-lhe que, em relação à meta da redução do insucesso escolar, este Programa conseguiu, ainda assim, obter resultados muito significativos, embora, como sabem, persistam elevadas taxas de insucesso escolar no País.
Em 1986-1987. o aproveitamento dos alunos, no primeiro ciclo, situava-se em torno dos 68%, e, no fim do programa, subiu para 77%, o que significa um aumento de 9%, durante os cinco anos do Programa.
Mas, se é verdade que em Lisboa e em Setúbal, por exemplo, que são os distritos do País onde as taxas de aproveitamento são mais elevadas, a taxa subiu 6%, também é verdade que foi exactamente nos distritos onde havia maior insucesso escolar - Vila Real, Viana do Castelo e Bragança - que as taxas aumentaram muito ao longo destes cinco anos. Assim, em Vila Real aumentou l3% em Viana do Castelo 14% e em Bragança l0%, o que significa, de facto, um salto muito grande, exactamente nos distritos onde havia mais problemas de insucesso escolar, Penso que
é aí que se vê a importância de uma intervenção deste tipo.
O PIPSE acabou por surtir os seus efeitos, não apenas através de intervenções como o suplemento alimentar, como também através de outras intervenções, como sejam: o apoio psicopedagógico e didáctico, que foi muito importante para
muitas escolas do ensino primário; o apoio às famílias; a promoção de cuidados de saúde escolar, onde também houve uma intervenção muito importante em articulação com o
Ministério da Saúde, e a elaboração de currículos alternativos, que não estava inicialmente previsto e que, no entanto, acabou por ser uma alternativa importante à iniciação profissional e pré-profissional.

As maiores limitações do Programa centraram-se na capacidade de intervenção estrutural no sistema de ensino. Mas isso tem a ver com a própria natureza do Programa, pois
Trata-se de um programa de emergência de um programa de intervenção sobre um conjunto de variáveis, que não
pretende intervir na natureza estrutural dos problemas.
Digamos que o Programa permitiu lançar, a partir de agora, três dinâmicas de intervenção estrutural que, essas sim, tendo raíz nas próprias limitações do Programa, em alguns casos, e nas suas potencialidades, noutros, acabam por hoje as intervenções fundamentais.

Essas dinâmicas de intervenção incidem sobre a revisão da rede escolar, existindo, neste momento, uma programação de uma intervenção muito forte nos próximos quatro anos em torno do reordenamento da rede escolar - penso que essa intervenção nasce exactamente de uma análise muito rigorosa do que foi acontecendo ao longo da aplicação do PIPSE-, sobre a avaliação dos alunos, onde há outra intervenção estrutural muito importante a realizar-se neste momento e sobre a formação de professores. Penso que estas são três áreas fundamentais, em que defluiu a própria intervenção que o PIPSE veio proporcionar.

Por outro lado, o Ministério criou o programa educação para todos, como um programa que, em alguns dos aspectos e no que diz respeito ao ensino básico, visa dar continuidade a uma intervenção não já estrutural mas a uma intervenção no domínio da sensibilização das populações para uma escolaridade básica de sucesso.

Neste momento, há uma programação muito rigorosa de uma intervenção mais clara junto da população portuguesa, nomeadamente em torno do cumprimento da escolaridade obrigatória de nove anos.

Entendemos que uma intervenção como a do PIPSE não se justificaria nos anos que se avizinham, uma vez que se trata de uma intervenção demasiado cara e muito pouco centrada, como disse, nas questões estruturais e, por isso, devíamos abandonar o Programa no seu termo, deixando-o nesta fase, e avançar agora com intervenções de nível diferente.

Portanto, há um salto qualitativo que de dá, há claramente uma melhoria significativa das condições de sucesso. Entendemos, pois, que com estas três intervenções no reordenamento da rede, no que respeita à avaliação dos alunos e à formação de professores, estão criadas condições pira que se possa prosseguir com a melhoria significativa das taxas de aproveitamento escolar nos próximos anos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Secretário de Estado, permita-me que lhe diga que intervenções como esta do PIPSE são típicas da estratégia do Governo em relação a vários problemas. 15to é, quando o Governo se reconhece incapaz de resolver um problema de grande gravidade inventa um programa.

Risos do PS

Existem vários exemplos. O Governo cria expectativas, envolve pessoas, envolve inclusivamente boas vontades, envolve pessoas seriamente empenhadas em resolver os problemas e depois se as acções não correspondem, por falta

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de meios, aos objectivos traçados a culpa, é de todos menos do Governo que, enfim, diz que fez a sua obrigação e lançou o programa. E então acaba-se com os programas que estivam em curso e inventam-se outros que vão resolver aquilo que os anteriores não conseguiram resolver. Foi este o destino do Projecto VIDA que começou com uma primeira fase, depois com uma segunda e agora uma terceira fase em que se acaba com o coordenador nacional e se nomeia um alto-comissário.
Agora que o programa PIPSE acabou, e tal como o Sr. Secretário de Estado previsivelmente anunciou, já está aí o programa educação para todos, que vai resolver aquilo que o PIPSE não resolveu, embora a outro nível. Aliás, foi este também o destino de várias equipas do Ministério da Educação que fizeram determinadas promessas. É que ao fim de um certo tempo verificou-se que tais promessas não foram cumpridas, o que gorou expectativas e levou à substituição da equipa.
O PIPSE tem uma outra particularidade. O Governo - numa atitude que, estou convencido, vai ter custos graves para o País no futuro -, como sabia que as causas profundas do insucesso escolar não estavam a ser atacadas em termos estruturais, foi tomando medidas administrativas para camuflar o insucesso baixando a repetência. E o que se verifica é que o Governo não é capaz de dizer que efectivamente, em termos substantivos, diminuíram as condições para o insucesso escolar. Aquilo com que o Governo está preocupado é em batê-lo aos pontos nas pautas. E estou convencido que isto vai ter custos muito graves em termos de formação futura da nossa juventude e em termos do futuro do País. Porque vejamos qual é a situação terminado o PIPSE e - aquilo que propunha.
A rede de educação pré-escolar continua a ter uma taxa de cobertura que não ultrapassa os 35%, quando na média comunitária anda à volta de 85% a 90%.
A nível dos manuais escolares, todos sabemos, agora no início deste ano lectivo, quanto é que cada família teve de desembolsar por manuais escolares para os seus filhos.
Todos conhecemos a situação muito grave que se vive ao nível da educação especial, particularmente pela falta de apoio estatal e pela alienação do Estado das suas responsabilidades a este domínio.
Relativamente ao apoio alimentar - e ainda há pouco tivemos oportunidade de falar sobre esta matéria - foi eliminado o suplemento alimentar das crianças, que não foi substituído por coisa nenhuma.
A nível do desporto escolar, finalmente, que era uma das vertentes do PIPSE, embora menos falada, todos verificámos que nos últimos cinco anos foram criados cinco grupos de trabalho para estudar este problema. Foi aprovado um decreto-lei pelo Governo, que foi publicado, mas não entrou em vigor porque a equipa seguinte veio dizer que não havia o mínimo de condições para o pôr em vigor e criou um novo grupo de trabalho para o desporto escolar. A nova equipa ministerial quando chegou, mais ma vez, demitiu o grupo de trabalho para criar outro que começasse tudo de novo.
O Sr. Secretário de Estado afirmou - e vou concluir Sr. Presidente - que o Programa não pretendia intervir estruturalmente sobre os problemas. Devo dizer que esse é o verdadeiro problema, Sr. Secretário de Estado. É que se fazem programas, mas não se resolvem ou não se procuram resolver os problemas de um ponto de vista estrutural. O Governo não intervém sobre os problemas do insucesso escolar, intervém sobre as pautas para fingir que o insucesso não existe. Com efeito, essa estratégia não nos leva a lado nenhum!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário: - Sr. Deputado, não resolve nada tentar escamotear as questões!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Além disso, o Sr. Deputado fugiu a equacionar a questão de fundo, que é a passagem de uma intervenção de emergência para uma intervenção estrutural. Foi aquilo que tentei esclarecer.
Estamos a realizar, como lhe disse, três tipos de intervenções, que são
intervenções de fundo, não são programas, Sr. Deputado. São intervenções de fundo e, paralelamente, enunciei um programa que existe e que deve corresponder a uma intervenção importante no sistema de ensino - o programa educação para todos, de sensibilização.
Mas, como dizia, há três intervenções que estão em curso.
A intervenção no reordenamento da rede, que é uma intervenção
do mais estrutural que pode haver no sistema de ensino, está a decorrer e vai continuar nos próximos quatro
anos. Vão ser reformuladas completamente as redes municipais e regionais que existem hoje ao nível do sistema de ensino. Vai haver um reordenamento muito profundo das estruturas do ensino básico e secundário.
Há uma segunda intervenção, como lhe disse também, em torno da avaliação dos alunos. Não se trata de medida administrativa de espécie nenhuma.

O Sr. António Braga (PS): - Trata-se de uma tamanha asneira!

O Orador - Trata-se de uma medida de fundo que neste momento está já em curso em todo o País e que visa não deixar nenhuma franja da população escolar de lado. Porque neste momento o que acontece é que um em cada quatro alunos abandona a escola ao longo da escolaridade básica.
O que pretendemos é que as escolas acolham esses alunos e promovam o seu sucesso escolar no contexto das
próprias aprendizagens e que não os deixem cair administrativamente
ao longo da escolaridade básica.
A terceira intervenção estrutural é sobre a formação de professores e, como o Sr. Deputado sabe, está em curso um programa de formação contínua, sem precedentes,...

O Sr. António Filipe (PCP): - Ah!... Sempre há programa!

0 Orador: -... o que também é uma intervenção estrutural importante, porque se trata de intervir ao nível das próprias representações dos professores sobre o que estes estão a fazer e as expectativas que têm em relação à própria aprendizagem e ao papel do sistema de ensino. Intervenções mais estruturais que estas não conheço, pois, a meu ver, trata-se de obter um objectivo central, o da qualidade da educação e do ensino, e não de tentar fazer intervenções laterais, acidentais, pontuais, como o Sr. Deputado quer fazer crer.
Aliás, gostava também de dizer-lhe que, em relação ao desporto, o programa de desporto escolar nunca deixou de ser executado por causa dos problemas entre os técnicos da respectiva área...

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O Sr. António Filipe (PCP): - Os técnicos não têm culpa!

O Orador:- ... ou das divisões entre os grupos de trabalho. O programa do desporto escolar está a ser executado, e este ano duplicou em meios financeiros, pois é um programa importante e está em curso em todo o País.
Penso que este meu esclarecimento vai directamente ao encontro da questão que colocou.
Há de facto intervenções estruturais a decorrerem neste momento e julgo não ser necessário aludirmos ao programa PIPSE apenas para dizer que o Governo cria programas.
O programa educação para todos foi lançado há dois anos, não agora, e é uma tentativa, muito pouco esclarecida, de tentar fugir às questões de fundo, que são as do reordenamento da rede, de avaliação pedagógica doe alunos e da formação contínua dos professores. Aí, sim, existe uma intervenção, que, penso, está para já, a ser bem sucedida.

O Sr. Presidente: - Para uma pergunta oral, relativa à legalização dos clandestinos, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, a pergunta, obviamente, refere-se aos emigrantes clandestinos e não propriamente à legalização de imóveis clandestinos.

Risos do PS.

Sr. Secretario de Estado, começo por felicitá-lo visto ter de reconhecer que o Decreto-Lei n.º 212/92, que fez publicar na sequência do pedido de autorização legislativa, debatido nesta Assembleia, soube reter vários dos contributos que tinham resultado do debate parlamentar, tendo, designadamente, eliminado duas das questões que nos pareciam mais gravosas: uma, que tem a ver com a limitação da amnistia aos casos das actuações por negligência, e a outra relativa aos «infelizes» centros de ... bem, não eram de concentração, ... mas, enfim, tinham uma linguagem esdrúxula e todos sabíamos o que queria dizer.
De qualquer forma, temos três tipos de preocupações relativamente à forma como está a decorrer este processo de regularização, que se iniciou no passado dia 13.
A primeira questão, chamada a atenção, repetidas vezes, pela imprensa e ainda hoje o Público chama novamente a atenção para isso, é relativa à dificuldade da prova.
Como o Sr. Secretário de Estado sabe, o diploma recorre a sucessivos conceitos vagos e indeterminados, condições económicas mínimas de subsistência, presença continuada no território nacional, e a um que, não sendo vago e indeterminado o exercício da actividade profissional remunerada por conta de outrem exige a passagem de declaração pela entidade patronal.
Por outro lado, o decreto-lei favorece, de alguma forma, a entidade patronal ao amnistiá-la da infracção de os ter contratado. Mas, como o Sr. Secretário de Estado sabe, e já insistimos nisto, aquando do debate do pedido de autorização legislativa, não podemos ignorar a realidade existente no País.
Grande parte destes emigrantes clandestinos trabalham no sector da construção civil, como sabe, não directamente para as empresas de construção civil, mas, sim, para as chamadas empresas fornecedoras de mão-de-obra, que são, em regra, empresas que não se encontram regularmente constituídas e que nem sequer estão interessadas em fazê-lo. Logo, como isso acontece, as entidades patronais têm vindo, sistematicamente, a recusar-se à emissão destas associações.
Sei, por um lado, que as associações das comunidades de emigrantes já fizeram sugestões ao Governo no sentido de flexibilizar a prova documental quanto ao exercício da actividade profissional remunerada, e, por outro, que o Governo já recusou, por exemplo, a possibilidade de a declaração ser emitida pelas associações sindicais.
Mas gostaria que o Sr. Secretário de Estado nos dissesse aqui, com clareza, quais são os meios que os serviços entenderão como suficientes para a prova de exercício de actividade profissional remunerada por conta de outrem quando haja recusa da entidade patronal.
A segunda questão que nos deixa muito preocupados tem a ver com o facto de este processo ter de decorrer, como todos sabemos, no prazo previsto e de não poder ter qualquer tipo de prorrogação. Os exemplos da Espanha, da França e da Itália dizem-nos que estes processos só têm sucesso quando decorrem de uma única vez e pelo prazo previsto, que é curto, pois é de quatro messes.
Ora, como o período de regularização já se iniciou no dia 13 de Outubro, é com espanto que verifico a inexistência de qualquer campanha de informação e de divulgação deste diploma. Em todos os outros países houve uma campanha massiva, com recurso à televisão, aos órgãos de comunicação social, à rádio, à imprensa, mas, em Portugal, zero. Até agora não houve rigorosamente nada.
Neste sentido, pergunto se o Governo tem prevista qualquer campanha de divulgação activa, através dos meios de comunicação social, do processo de regularização. Mas é mais grave, porque é com grande espanto que temos verificado ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, peço-lhe que termine.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Dizia eu que é com grande espanto que temos verificado que, por exemplo, no distrito de Lisboa, que é onde se concentra, como todos sabemos, a esmagadora maioria dos emigrantes clandestinos, só temos três postos de atendimento: o Governo Civil e um posto de serviço de estrangeiros em Lisboa e um outro em Cascais.
O Governo considera ou não a possibilidade de realizar protocolos com as associações das comunidades emigrantes, tendo em vista uma maior divulgação do processo de regularização. Refiro-me ,a um sistema de protocolos com as câmaras municipais, sobretudo com aquelas onde se concentram muitos dos emigrantes clandestinos, como a de Loures, a da Amadora e a de Lisboa, que, aliás, publicamente, já se disponibilizou para participar neste processo assim como a Câmara Municipal de Oeiras, onde há uma importante comunidade de emigrantes residentes. Gostaria, pois, de saber se o Governo pretende ou não ,assinar este tipo de protocolos.
Última questão, para terminar...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, V. Ex.ª já ultrapassou, em muito, o tempo de que dispunha para formular a pergunta. Faça favor de terminar.

O Orador: - Sr. Presidente, é a última questão, se me permite.
Como o Sr. Secretario de Estado sabe, é essencial para o processo de regularização a existência de um clima de confiança dos emigrantes clandestinos quanto à disponibilidade efectiva de acolhimento por parte do Estado onde é residente.

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É por isso com preocupação acrescida que vejo, no preciso momento em que está em curso este processo de regularização, notícias ameaçadoras sobre comportamentos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras do Aeroporto de Lisboa - situação que, aliás, foi objecto de um requerimento meu para o qual aguardo a resposta desde Julho -, sobre comportamentos da empresa transportadora nacional, a TAP.
Por outro lado, vejo o bloqueio que a maioria mantém aqui, nesta Assembleia da República, e que o próprio Ministério dai Administração Interna, em particular também mantém relativamente a um conjunto de diplomas que estão sobre a mesa, quer sobre o direito de voto dos cidadãos estrangeiros nas eleições autárquicas quer sobre os aspectos que referi, pelo que gostaria de saber qual é efectivamente a vontade política do Governo e desta maioria quanto a uma política integrada de emigração.
Quer dizer, como todos sabemos, a regularização é um primeiro passo essencial mas não chega para que essa política de emigração exista.
Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado, e sobretudo à Mesa pela tolerância relativamente ao tempo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão alunos da Escola Profissional de Electrónica e Telecomunicações para os quais peço a nossa habitual saudação.

Aplausos gerais.

Para responder às questões formuladas, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Carlos Encarnação): - Sr. Deputado António Costa, reconheço em si uma das pessoas que mais se tem interessado por este problema, tendo, aliás, sido autor de alguns projectos apresentados à Assembleia da República que deram um contributo importante para o encarar destas questões.
Mantivemos e ,ainda mantemos algumas divergências quanto a este problema, mas penso que elas são mais de natureza enquadradora do que, propriamente, divergências de natureza prática. Assim, tive oportunidade de salientar, na altura em que apresentámos a nossa proposta de autorização legislativa, para não dar corpo aos seus receios, que eles seriam infundados e que havia algumas coisas a alterar na proposta que, apenas a título exemplar, enviámos para a Assembleia para conhecimento de VV. Ex.as, e que iríamos fazê-lo aquando da publicação do decreto-lei.
V. Ex.ª acabou por congratular-se com o que aconteceu - aliás, do ponto de vista da sua honestidade intelectual e política não tinha outra coisa a fazer senão isso. Porque, na verdade, aquilo que, apresentámos aqui foi um projecto de interesse nacional que visava resolver a responsabilidade do Estado e da sociedade portuguesa, adquirida ao longo de vários tempos, em relação a um problema concreto, importante e momentoso, e foi isso que tentámos lazer como ninguém nunca tinha tentado fazer até aqui.
De facto, V. Ex.ª ao reconhecer isso está, como é evidente, a apresentar as felicitações à Câmara, que aprovou a nossa proposta de autorização legislativa, se bem que com o voto contrário do PS, e, certamente, ao Governo que eu aqui represento.
O Sr. Deputado colocou três questões pontuais importantes e falou de uma outra questão geral que abordou de
um ponto de vista leve e apenas indiciário. Limitar-me-ei apenas a responder às três questões pontuais que colocou, porque senão, com certeza, que iria gastar todo o meu tempo na outra, que é substancialmente importante mas que não valeria a pena ser aqui debatida neste momento.
Quanto aos meios de prova já demos a entender, e várias vezes o tenho dito, mesmo em debates que tenho feito com várias, associações de emigrantes, que neste decreto-lei tentámos ser tão generosos quanto possível relativamente aos meios de prova e, na verdade, fomos até ao limite da lei que, no fundo, é a prova testemunhal. É aí que acabam os meios de prova considerados bastantes em relação ao conjunto dos problemas a provar e, necessariamente, também a questão da prova do trabalho por conta de outrem.
É evidente que temos aqui dois aspectos que devem ser salientados: em primeiro lugar, não entendemos possível, a exemplo, como já disse, da lei italiana, que a entidade patronal fosse excluída deste processo. Por isso, tentámos dar uma ideia, um pedido, uma solicitação à entidade patronal, sendo certo que uma entidade patronal que esteja a praticar uma ilegalidade está numa situação de violação da lei, portanto também ela tem de lembrar-se que está nessa mesma situação, e é certo que pode haver aqui um conflito que motive uma recusa.
Bom, se a entidade patronal colaborar, com certeza que terá também os seus problemas legais resolvidos, e é isto que está na lei, por isso ela é completa neste sentido; se a entidade patronal não colaborar, então, como é evidente, resta ao cidadão que requer a legalização a exibição de outros meios de prova substitutivos.
V. Ex.ª disse que eu tinha proibido meios de prova. Não proibi nenhum meio de prova e aquilo que veio no jornal, a que V. Ex.ª se referiu, é simplesmente mentira! Antes pelo contrário, o que tenho feito - e
justamente conseguido, penso- é que todas as associações e todas as centrais sindicais colaborem neste processo e posso dizer-lhe que tem havido uma grande receptividade e toda elas interpretaram bem este diploma.
Temos feito - e com isto começo a responder à segunda parte da sua pergunta - uma grande campanha de divulgação pública com trípticos explicando como é que as pessoas se devem dirigir e para onde para fazer o pedido de regularização da sua situação.
Envolvemos neste processo todas as instituições que têm vindo ter connosco - e podia citar-lhe algumas - com as quais temos feito debates, e temos também um spot televisivo preparado, que só ainda não saiu por uma razão simples: é que, muito sinceramente, não gostei do spot que estava feito. Foi só por esta questão que ele não foi para o ar esta semana, mas irá para a próxima.
Portanto, esteja descansado quanto a isso, pois não é à falta de interesse da comunicação social que se deve o facto de este assunto não ter sido debatido: aliás, para um acta de solidariedade e de humanidade, como este, recuso-me a aceitar que a única publicidade seja a paga, pois penso que todas as instituições da sociedade portuguesa, designadamente as privadas, têm uma certa obrigação moral de contribuir e de colaborar, e é neste sentido que envolvo toda a sociedade portuguesa e peço a colaboração, que sei não regatearão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Por que é que não faz protocolos?

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O Orador: - Quero ainda dizer também ao Sr. Deputado, em relação aos postos de atendimento que nós tentámos ...

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que tenha em atenção o tempo.

O Orador: - Peço desculpa. Sr. Presidente, estou a exceder-me um pouco no tempo, mas as perguntas foram de tal maneira longas ...

O Sr. José Magalhães (PS): - E grandes!

O Orador: - ... que não consigo poupar tempo, Sr. Presidente.
E as questões foram grandes, como diz o Sr. Deputado José Magalhães, sempre com aquele a propósito que o caracteriza.

Risos do PS.

Dizia eu, que tentámos fazer colaborar várias entidades neste processo para multiplicarmos os postos de recolha, e devo dizer-lhe que a questão principal que aqui se coloca é esta: a sensibilização das pessoas.
Se lhe disser, por exemplo, que, nesta altura, temos 250 processos entrados, isto não me preocupa porque o número de pedidos de esclarecimento, o número de requerimentos que têm sido endereçados às várias associações, que estão a colaborar, é imensamente superior. Aliás, suponho que a partir das próximas semanas o volume de processos entrados será muito maior.
Também como sabe, tentámos aqui dar um pequeno golpe na burocracia, fazendo com que os processos que estão pendentes e que nesta altura rondam os 20 ou 30 000 - estejam a ser aproveitados e posso dizer-lhe que na próxima segunda-feira 8 000 desses processos já darão entrada no grupo técnico de avaliação e decisão.
Finalmente, V. Ex.` disse que o grande problema é o da confiança e, de facto, isso é verdade. O que dizemos é que com uma providência excepcional do Estado Português que se envolve dentro do seu conceito de política de emigração estamos a dar uma oportunidade às pessoas que pretendam legalizar a sua situação. É isto que queremos. É esta oportunidade que queremos que aproveitem.
E qualquer notícia alarmista, qualquer ameaça velada, qualquer tentativa de jogar com palavras, com atitudes ou com conceitos acerca desta matéria é uma atitude condenável. Temos tentado evitar isso e esperamos também que outras pessoas, que às vezes estão desejosas de consideração social e de valorização política, não aproveitem este processo para fazerem exactamente isso e prejudicarem esse processo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em bom rigor não deveria permitir novas perguntas e respostas porque os tempos estão esgotados. Todavia, agora vou ser estrito: dou a palavra ao Sr. Deputado interrogante para fazer um pedido de esclarecimento suplementar, mas dentro do período de três minutos que o Regimento impõe e, posteriormente, ao Sr. Secretário de Estado para responder, igualmente dentro do mesmo período de tempo.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente. Sr. Secretário de Estado, verifico com satisfação que, embora com algum atraso, vai avançar a campanha de informação, com o que estou inteiramente de acordo. Aliás, aproveito para informar que o Partido Socialista, tendo consciência de que
é um dever cívico colaborar com este processo, criou um gabinete de apoio ao processo de regularização e que vai proceder à impressão e posterior distribuição pelos bairros de um conjunto de folhetos de divulgação do diploma.
No entanto, Sr. Secretário de Estado, a questão essencial é que os folhetos existem mas existem nos sítios onde as pessoas se terão de deslocar para fazerem a regularização. Só que os folhetos têm de existir no sítio onde as pessoas vivem, ou seja, nos bairros, sendo relativamente indiferente, como admitirá, que os folhetos estejam no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras ou no Governo Civil, porque é aí que as pessoas terão de ir apresentar o requerimento. Na minha opinião os folhetos têm de sair do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e do Governo Civil para chegarem aos bairros onde as pessoas vivem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado admite ou não que os tão «queridos» postos móveis do Ministro da Administração Interna deveriam ser utilizados, nos próprios bairros, pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras na divulgação do processo de legalização?
V. Ex.ª admite ou não a celebração de protocolos com as associações de emigrantes? Admite ou não a celebração
de protocolos com as câmaras municipais? Nesse campo da colaboração dou-lhe o exemplo da Câmara Municipal de Lisboa, que já se disponibilizou publicamente para colaborar com o Governo na questão da regularização rápida da situação dos emigrantes.
Quanto à questão do clima, estou de acordo consigo quando diz que o pior que pode acontecer é haver qualquer tipo de alarmismo nesta matéria. Aliás, nós próprios não temos feito publicamente uma única crítica a este diploma que, como sabe, gostaríamos que tivesse sido ligeiramente melhor do que é. No entanto, a criação do clima propício à regularização impõe da parte de V. Ex.ª e do seu Ministério uma actuação clara que elimine quaisquer dúvidas existentes.
Sr. Secretário de Estado, alerto-o para as sucessivas chamadas de atenção que têm sido noticiadas na imprensa - e eu próprio fiz um requerimento para que aguardo resposta - quanto ao comportamento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no aeroporto em que se faziam
acusações graves, que não sei se são verdadeiras, ou falsas. Nesse aspecto era importante que o MAI desse notícia pública de quais foram os resultados das averiguação a que certamente - e não ponho isso em causa, pois não posso admitir que assim não tenha sido feito - V. Ex.ª e o seu ministério tenham procedido. Sr. Secretário de Estado, foi tudo invenção da comunicação social ou há mais alguma coisa?

O Sr. Presidente: - Atenção ao tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Era importante que isso se soubesse publicamente para evitar que se criassem situações duvidosas. Qual foi a actuação do Governo face a notícias que eu próprio confirmadas pela empresa transportadora nacional, relativas à aplicação de critérios de discriminação racial no transporte dos passageiros para determinados países, designadamente para a Grã-Bretanha! Qual a razão porque o artigo l5.º da Constituição ...

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo e vou retirar-lhe a palavra.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Secretario de Estado, essas são, no essencial, as minhas dúvidas. As restantes procurarei esclarecê-las no corredor para não agravar mais o défice de tempo da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, as questões que colocou já constam na resposta ao seu requerimento, que se ainda não chegou às suas mãos foi por qualquer razão de natureza burocrática. Aliás, tenho sempre muito prazer em responder às suas perguntas, mas, como nesta altura V. Ex.ª falou da legalização dos clandestinos e não propriamente da actuação do SEF, foi assim que entendi sua pergunta.
No entanto, estou perfeitamente à vontade para lhe responder aqui, desde que o faça de modo regulamentar e eu tenha tempo para lhe responder. Desde já, fica a saber que foram feitas as averiguações necessárias, foi concluído o inquérito e, como V. Ex.ª terá o grande prazer de o receber, não quero estragar esse prazer com uma resposta antecipada.
Em relação à segunda questão, embora o prazo que demos tenha sido muito combatido, veja que a situação é a seguinte: estamos a falar de um universo potencial de 100 000 emigrantes clandestinos e como não temos um universo similar ao de todos os países europeus que legalizaram os seus emigrantes e também não temos um território idêntico à Espanha, França ou Itália, onde a campanha durou seis meses, a campanha aqui dura quatro.
Esse foi o tempo considerado necessário para que todos os processos de regularização entrassem mas, não, provavelmente, para que todos sejam decididos; certamente ninguém espera isso, mas espera-se que este tempo seja de facto o necessário para que todos os processos dêem entrada.
Por outro lado, estou aberto a toda a colaboração, portanto, peço desculpa, o que V. Ex.ª disse não é verdade. Os prospectos informativos não se encontram apenas nos serviços de acolhimento e recepção, pois foram distribuídos por todas as associações ou entidades que têm colaborado connosco. E se existem algumas entidades mais - câmaras municipais, juntas de freguesia ou quem quer que seja que queiram colaborar neste processo, estamos inteiramente disponíveis para aceitar de bom grado essa colaboração.
Mais: penso, e já lho disse, que é uma obrigação cívica de toda a gente dar um contributo para esta campanha. Queremos evitar a marginalização destas pessoas, queremos integrá-las na sociedade porque achamos que é obrigação do Estado. Esperamos agora que a sociedade também dê uma resposta positiva ao nosso alerta e à nossa campanha.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima pergunta tem a ver com a regionalização e o Serviço Nacional de Saúde e será formulada pelo Partido Socialista.

Para a formular, tem a palavra o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.

o Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, tivemos conhecimento, apenas por mão amiga, de que existiria um estatuto do Serviço Nacional de Saúde recentemente aprovado em Conselho de Ministros. Infelizmente, a Comissão de Saúde deste Parlamento não tem conhecimento desse estatuto aprovado. Como V. Ex.ª sabe, a imprensa divulgou extractos, opiniões, palpites sobre esta área e os Deputados são pressionados a pronunciar-se, a comentar, a, muitas vezes, mesmo sem fundamentação, poder colaborar com o alarmismo que, obviamente, surge em situações como estas.
De qualquer forma, para todos podermos ficar mais informados de quais são as verdadeiras intenções do Governo, gostaria de fazer algumas perguntas ao Sr. Secretário de Estado.
Passo à primeira questão. Diz-se, no intróito desse documento que me chegou à mão, que é intenção de o Governo aproximar dos cidadãos as decisões que têm a ver com a saúde e com as condições sanitárias das populações. Mais adiante, verificamos, nesse mesmo estatuto, que das 18 administrações regionais de saúde existentes no País 13 são pura e simplesmente eliminadas. Gostaria que V. Ex.ª me explicasse como é que as decisões se aproximam dos cidadãos quando 13 administrações regionais de saúde são, como referi, pura e simplesmente eliminadas. Curiosamente, essas administrações regionais de saúde cobrem praticamente todo o País dito interior.
A segunda pergunta que quero fazer-lhe prende-se com o artigo 23.º, cujo corpo e alínea a) dizem o seguinte:

Além do Estado, respondem pelos encargos resultantes da prestação de cuidados de saúde prestados no quadro do Serviço Nacional de Saúde:

a) Utentes não beneficiários do Serviço Nacional de Saúde;
.....................................
Pergunto o que ó que isto quer dizer, se o Serviço Nacional de Saúde, como é constitucionalmente uma exigência, deixou de ser universal. É óbvio que V. Ex.ª poderá esclarecer e tranquilizar os Portugueses em relação a esta formulação.
Em terceiro lugar, diz-se, no n.º 1 do artigo 25.º, que «os limites mínimos e máximos dos preços a cobrar pelos cuidados prestados no quadro do Serviço Nacional de Saúde são estabelecidos por portaria do Ministério da Saúde», estabelecendo a seguir o n.º 2 do mesmo preceito que «compete às administrações regionais de saúde introduzir algumas variações nesses preços».
Gostaria que V. Ex.ª nos informasse se o Serviço Nacional de Saúde deixou de ser tendencialmente gratuito, como obriga a Constituição, e se esta desigualdade se transformou também numa desigualdade regional.
Ainda me restariam algumas questões para colocar, já que as ambiguidades e os sectores pouco claros deste estatuto são ilimitados. Deixo, todavia, essas questões para outra oportunidade, por ter terminado o tempo de que dispunha. Em todo o caso, as que acabo de colocar já são suficientes para este momento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde (Jorge Pires): - Sr. Deputado Eurico Figueiredo, muita coisa se tem dito e escrito ultimamente sobre o novo
estatuto do Serviço Nacional de Saúde. É esta uma oportunidade
que nos é dada para, perante esta Câmara, esclarecer-

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mos algumas das dúvidas que têm surgido e algumas das coisas erradas que se têm dito sobre o Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. Deputado terminou a sua intervenção dizendo que mais perguntas teria para fazer, mas que, face à limitação de tempo, teria de as deixar para outra ocasião. Tentarei então, na minha resposta, fazer uma cobertura geral do tema, respondendo concretamente às três questões que me apresentou.
Este estatuto da Serviço Nacional de Saúde concretiza, como é sabido, os princípios enunciados na Lei de Bases da Saúde, aprovada nesta Câmara em 1990. Não estamos, pois, nem mais menos do que a fazer regulamentação de parte dessa lei de bases.
As linhas de orientação fundamentais deste estatuto são as seguintes: primeiro, a criação de uma nova organização administrativa, através da diferente descentralização dos serviços (irei adiante abordar o problema das administrações regionais de saúde, que referiu); segundo, a criação de um sistema de saúde caracterizado pela integralidade da prestação de cuidados de saúde, sem descontinuidade entre cuidados de saúde primários e cuidados de saúde hospitalares ou secundários; terceiro, a institucionalização de um Serviço Nacional de Saúde tendencialmente gratuito, com co-responsabilização dos utentes pelos encargos de acordo com as suas capacidades económicas e financeiras; quarto, formas alternativas de financiamento do sistema de saúde: quinto, a introdução de formas inovadoras de gestão, através de contratos de gestão, convenções com grupos de médicos e contratos-programa; sexto, novas regras quanto à articulação efectiva entre o Serviço Nacional de Saúde e os órgãos centrais do Ministério; sétimo, a mobilidade do pessoal entre o Serviço Nacional de Saúde e o sistema de saúde, face a uma definição clara, que se tentou introduzir no sistema, do que é que são as áreas de responsabilidade do público e do privado.
O estatuto que agora constitui tema de debate resulta de um trabalho, cuidado e sereno, que vem sendo desenvolvido desde há algum tempo, logo após a publicação da respectiva lei de bases. Significa isto que o documento a que se chegou tem subjacente mais de dois anos de reflexão profunda. Foram obtidos durante este período - devo dizê-lo - vários contributos, oriundos de diferentes correntes de opinião na área da saúde, e também introduzidas, nesta última fase, algumas observações dos próprios parceiros sociais.
A alteração organizativa que foi introduzida ,assenta na divisão do território, única e simplesmente para efeitos administrativos, que nos pareceu a mais adequada e que se aproxima das chamadas NUTS, ou seja, das unidades de nível 2 da nomenclatura de unidades territoriais para fins estatísticos, prevista no Decreto-Lei n.º 46/89, de 15 de Fevereiro.
Temos como objectivo efectivo não o de regionalizar a saúde, mas o de organizar os serviços com maior eficácia, dentro de uma nova filosofia, que há pouco referi, de integralidade de prestação de cuidados de saúde. Nesta perspectiva, surgem unidades de saúde, como forma funcional de articulação entre os serviços prestadores, que pressupõem, sob o ponto de vista organizativo, uma estrutura também ela integrada.
Para além deste aspecto estrutural da maior importância foram estabelecidas medidas que permitem a diminuição da pressão financeira sobre o Serviço Nacional de Saúde. Os objectivos nesta área - respondo agora a uma outra questão colocada pelo Sr. Deputado - são claros: em primeiro lugar, a introdução de medidas de gestão que possibilitem, por ganhos de eficiência do sistema, uma diminuição dessa pressão financeira; em segundo lugar, a diversificação das fontes de financiamento.
Quanto ao primeiro aspecto, consagramos modelos inovadores de gestão das unidades de saúde, que - saliente-se - continuam efectivamente integrados no Serviço Nacional de Saúde. No que diz respeito à diversificação de meios de financiamento da saúde, abre-se a possibilidade de os chamados seguros de saúde garantirem aos próprios utentes a universalidade e a integralidade do direito à saúde. Neste sentido, está prevista a criação do seguro, alternativo de saúde.
Pretende garantir-se, e será o ponto de partida de qualquer das iniciativas, que a concretização do direito constitucional à protecção da saúde seja conseguido basicamente através de um serviço nacional de saúde que continua a ser a referência de todo o sistema.
Assim, o Serviço Nacional de Saúde, enquanto serviço prestador, continuará a ser universal, de livre acesso e tendencialmente gratuito. Importa clarificar a que significa esta expressão, questão que já debatemos nesta Assembleia.
De facto, esta última característica introduz a preocupação de justiça social, presente no Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, quando se prevê que uma parte dos encargos com a saúde seja suportada pelos utentes na medida das suas capacidade económica-financeira, sem que seja posto em causa o acesso aos cuidados, e este é um ponto extremamente importante.
Por outro lado, assumindo como essencial para o sistema de saúde a mobilidade pessoal, estão previstos instrumentos específicos, os quais contêm as soluções desejadas pelos próprios profissionais que, assim, poderão prestar os cuidados de saúde no sector público ou no privado.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O Estatuto do Serviço Nacional de Saúde é, de facto, um documento inovador e pretende mudar a saúde em Portugal, embora admita outras concepções possíveis e, como dizia um professor meu, a concepção do mundo e da vida difere em todos nós.
Há muito que a oposição vem reclamando - devo reconhecê-lo - a regulamentação da Lei de Bases da Saúde. Hoje, porque o fizemos, porque se concretizou, efectivamente, este desiderato, acusam-nos também, como foi feito ,ainda há pouco tempo, de o levarmos a cabo «em cima do joelho». Vamos abandonar definitivamente uma certa lógica deficiente e socializante existente no anterior estatuto- isso, para nós, pertence ao passado -, mas devo salientar que aproveitámos o que de válido nele havia. Pela nossa parte, queremos que o sistema garanta a prestação de cuidados de saúde de qualidade ,junto dos utentes com ganhos de eficiência.
Em conclusão, o novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde define e separa a actividade pública da privada por forma a evitarem-se, inclusivamente, os próprios conflitos de interesses, cria mecanismos que permitirão a concorrência entre o sector público e privado com condições para a prática da qualidade, que é uma das nossas grandes preocupações, e, em terceiro lugar, dá ao utente a possibilidade da livre escolha, logo, reforça também por esta via a prestação de serviços de qualidade mas saliente-se que nada impomos porque o utente é que vai escolher o sistema que lhe interessa.

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Descentraliza-se a organização aproximando os órgãos de gestão das áreas geográficas respectivas e das suas forças vivas. Este é um ponto extremamente importante, porque não haja dúvida alguma de que são as populações quem melhor conhece os problemas e as realidades locais. Por último, importa salientar que criámos um sistema inovador e aberto.
O problema das administrações regionais de saúde é simples. As 18 ARS não são efectivamente eliminadas.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Por questões administrativas, surgem cinco áreas coincidentes com legislação já existente, permanecendo, no entanto, como o Sr. Deputado Eurico Figueiredo sabe, através das sub-regiões, as antigas ARS com cutia a sua estrutura. E, mais, reforçam-se os seus poderes na medida em que essa legislação vai fazer a coordenação entre cuidados de saúde primários, competência que tinha até então, com os cuidados diferenciados ou hospitalares. Permanece a mesma estrutura e reforça-se a capacidade de intervenção das ARS, na medida em que vão ter órgãos de consultas, conforme está previsto no estatuto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.

O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, admito que os meus ouvidos sejam pouco sensíveis às explicações de V. Ex.ª, mas, depois desta discussão, fico tão pouco esclarecido como estava no seu início.
Com efeito, foi a minha voz que disse ter o sentimento de este governo estar a legislar em «cima do joelho». Ora, diz V. Ex.ª que esta legislação foi baseada em relatórios e que implicou um trabalho de investigação levado a cabo durante dois anos. Não duvido dessa afirmação mas, para crer realmente nisso, preciso de ser confrontado com dados concretos e foi por essa razão que enderecei um requerimento ao Governo no sentido de me serem enviados todos os trabalhos que mencionou. Terei muito prazer em poder dizer que, de facto, o Governo não legislou em «cima do joelho», o que só acontecerá quando esses documentos me forem enviados, bem como à Comissão Parlamentar de Saúde, como, no meu entender, já devia ter sido feito.
Todos os Deputados da Comissão Parlamentar de Saúde têm o dever e a obrigação de ser informados e quer os do PS quer os do seu partido não o foram sobre este assunto, pelo que agradecia que, o mais depressa possível, a informação base que permitiu a elaboração desta legislação nos seja facilitada.
Por outro lado, surpreende-me que o governo actual tenha modificado os seus pontos de vista em relação ao executivo de Pinto Balsemão, pois em 1982, de acordo com o decreto-lei que cria as administrações regionais de saúde, entendia-se que «as ARS têm como zona de limitação o distrito enquanto não estiverem criadas as regiões administrativas previstas na Constituição da República».
Ora, no meu entender, foram eliminadas 13 administrações regionais de saúde, enquanto se criaram cinco, o que me parece ser uma prática clandestina de criar as regiões administrativas sem transparência e sem que se parta, de facto, da sua criação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Surpreendem-me também, as preocupações financeiras do Governo. Compreendo que elas existam, mas causa-me admiração que a preocupação fundamental deste executivo pareça ser relativa ao Orçamento ao nível do Serviço Nacional de Saúde, quando Portugal é o país que, ao nível do Estado, paga menos o seu serviço nacional de saúde em relação aos outros países da CEE. O nosso PIB é de 4% enquanto, por exemplo, o da Holanda é de 11% e, como V. Ex.ª também sabe, é em Portugal que o sector privado mais contribui para a manutenção do Serviço Nacional de Saúde.
Compreendo as preocupações legítimas do Governo, mas não entendo que a sua incidência seja fundamentalmente nesta área, quando estarmos francamente abaixo dos níveis europeus em termos do financiamento do Estado e acima desses mesmas níveis ao nível do financiamento do sector privado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eurico Figueiredo, não quero prolongar muito este tipo de diálogo sobre a questão de legislar «em cima do joelho», mas o que é certo é que trabalhámos durante dois anos e meio sobre esta matéria.
Na última vez que aqui estive presente, juntamente com outros membros do Governo, fomos acusados de ineficácia legislativa, visto que ainda não tínhamos sido capazes de regulamentar a Lei de Bases da Saúde em aspectos tão fundamentais como o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde. Fizemo-lo e, apesar disso, continuamos a ser criticados por outra via. Portanto, não sei efectivamente onde é que se produziu uma maior mudança, se em nós, se em vocês.

O Sr. Eurico Figueiredo (PS):- Ficamos ã espera das documentos.

O Orador: - Quanto ao problema que referiu a propósito das ARS, o Sr. Deputado confessou que desconhecia o diploma e, portanto, admito que só por esse simples facto não consiga perceber o sistema, mar vou explico-lho muito rapidamente.
Por uma questão de descentralização administrativa, foram criadas cinco regiões de saúde, que coincidem, conforme disse, com as NUTS (nomenclatura das unidades territoriais estatísticas) e continuam a estar previstas as sub-regiões de saúde correspondentes ao distrito, portanto, ás actuais ARS, e não se confunda as ARS antigas com esta nova nomenclatura, pois elas apenas têm uma coisa em comum, que é o nome - ARS -, nada mais.
Depois, há as áreas de saúde que funcionam a nível distrital e, ainda mais abaixo, temos as chamadas unidades funcionais de saúde, os hospitais, com um conjunto de centros de saúde que lhes são periféricos, precisamente no sentido de acabarmos com as divisão entre cuidados de saúde primários e cuidados de saúde diferenciados, em que muitas vezes o utente acabava - porque o sistema assim o permitia - por andar com um papel do centro de saúde para o hospital e do hospital para o centro de saúde. Ora, nós que-

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remos acabar com isso e criar acessibilidade aos cuidados de saúde.
Como o Sr. Deputado continua a confundir as actuais cinco ARS com as antigas 18 ARS, posso dizer-lhe que se ler atentamente o diploma verificará que há uma grande diferença e, mais, um reforço inclusivamente das competências das antigas ARS, as agora chamadas sub-regiões de saúde, que a nível distrital têm um coordenador, que passam a ter também a coordenação da área hospitalar, que não tinham até aqui, e a possibilidade de, através das comissões concelhias de saúde e altas comissões regionais de saúde, como órgãos de consulta, poderem ter uma informação mais aturada e precisa, visto que desses órgãos de consulta fazem parte as estruturas do poder local.
Quanto às preocupações financeiras que referiu, é evidente que elas existem, e não só em Portugal, mas em todo o mundo. Basta ler o que se tem publicado sobre esta matéria e estar atento às reuniões internacionais que se têm realizado sobre o assunto- veja, por exemplo, o que se passou, no ano passado, em Norwich, precisamente sobre este assunto. É, portanto, um problema europeu e mesmo mundial. Os custos em saúde, face a novas tecnologias, a uma maior acessibilidade e a uma maior cobertura sanitária, têm tendência a crescer de forma exponencial.
Há pouca, referiu também que o PIB português é de 4%. Sr. Deputado, não é de 4%!O PIB total português é de 6,4%! E disse também que o sector privado é o que mais contribui. Não é verdade! O sector público contribui - e refiro-me apenas ao Orçamento do Estado e não aos subsistemas - com 4%, enquanto que o sector privado contribui com pouco mais de 2 %. Esta é a realidade. Referiu também que a Holanda contribui com 1.5%, mas não são esses os números de que dispomos.
Para concluir esta questão e demonstrar-lhe a prioridade que este governo tem dado, em lermos de apoio financeiro, à saúde, quero dizer-lhe que, no início do ano de 1990 - altura em que passei a fazer parte deste governo -, fechou-se o ano de 1989 com 263 milhões de contos e agora, o de 1992, com praticamente o dobro, ou seja, com 500 milhões de contas. Não me digam que isto não revela um esforço financeiro! O que o Sr. Deputado não disse foi que o PIB português, comparativamente com o dos seus parceiros comunitários, tem crescido o dobro e o valor relativo ao sector da saúde tem-se mantido constante. É evidente que se o PIB português crescesse ao nível do PIB comunitário, certamente não estaríamos, nesta ,altura, nos 4% mas nos 6% ou 7%.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A próxima e última pergunta diz respeito a medidas para evitar a extinção dos pomares mediterrâneos do Algarve.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15ilda Martins.

A Sr.ª 15ilda Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A pergunta que vamos formular prende-se com o progressivo desaparecimento dos pomares tradicionais do barrocal algarvio e com as preocupações que nos têm sido expostas pelos respectivos agricultores.
O Algarve é uma região diversificada. Compreende três sub-regiões naturais: serra, barrocal e litoral, cada uma das quais com as suas especificidades, quer ao nível do património cultural, quer do natural.
O barrocal, ou médio Algarve, caracteriza-se por terrenos calcários com afloramentos rochosos denominados «barrocas». O habitat é disperso e as casas brancas conservam da tradição romana a planta e o mimetismo da cor envolvente.
No que concerne à cobertura vegetal, predominam os pomares mediterrâneos de sequeiro: figueiras, alfarrobeiras e amendoeiras.
Amendoeiras que serviram de inspiração a dezenas de poetas, que fixaram em verso a beleza das suas flores.
Este lindo barrocal, que se vestia de branco no Inverno, está descaracterizado. Dos pomares, hoje moribundo, restam velhas amendoeiras, figueiras e alfarrobeiras.
E não foi culpa do turismo, a quem é costume assacar todos os males. Foi, sim, por incúria e abandono. Ninguém providenciou a salvaguarda da cobertura vegetal, característica do barrocal e parte integrante do património natural da região.
Ninguém providenciou a modernização destes pomares e os agricultores descapitalizados não dispõem de meios para levar a efeito os necessários investimentos.
Assim, em nome dos agricultores do barrocal, pergunto ao Governo: vamos assistir à total extinção dos pomares de amendoeiras, figueiras e alfarrobeiras?
Que medidas pensa o Ministério da Agricultura tomar tendentes a inverter esta situação e a promover a reestruturação e vivificação dos referidos pomares?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura (José Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada 15ilda Martins, a questão que coloca é pertinente por duas razões: primeiro, porque tem a ver com cerca de 20 000 agricultores algarvios e, segundo, porque tem a ver com quase 20000 ha de solo agrícola. Mas é também pertinente porque, em nome do Governo, vai permitir-me esclarecer a Assembleia sobre essas mesmas preocupações e sobre um conjunto de medidas que vimos adoptando de há alguns anos a esta parte.
Antes de comentar ,alguns pressupostos da sua questão, responderia de imediato às pergunta. que formulou.
Primeiro, para dizer que não vamos assistir à extinção dos pomares de sequeiro; antes pelo contrário, vamos, com calma, tranquilidade e muito entusiasmo, assistir àquela que já vem sendo a sua recuperação. E, pata que essa recuperação seja possível, adoptámos também, de alguns anos a esta parte, um pacote de medidas, com o apoio comunitário ou apenas com o apoio nacional, que se prende com essa reestruturação que, no fim, referirei mais em pormenor.
Mas os pressupostos que a Sr.ª Deputada põe na sua questão são deveras interessantes e gostaria de comentá-los.
Primeiro, há, de facto, uma tendência cultural muito grande quando observamos toda esta problemática. O número de pessoas e os hectares de terra que referi apontam nesse sentido e ainda bem que, também nessa óptica, conseguimos observá-los.
Mas gostaria de dizer que, nessa matéria, não estamos passivos, de há muitos anos a esta parte. Temos tomado a devida atenção às reclamações dos agricultores e às suas preocupações e nós próprios temos verificado in loco o que se passa.

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Neste sentido, diria que, no campo da experimentação e no da demonstração, muito se tem feito, quer a nível oficial, ,quer a nível privado, sendo possível até, nalguns casos perfeitamente bem sucedido, observar que a produção de miolo de amêndoa, por exemplo, que é possível obter por hectare de terra, quadruplicou, o que nos dá um conjunto de indicadores que, de alguma forma, permitirão tranquilizar em relação à recuperação que já referi.
Quanto ao turismo, de facto, ele não é culpado por tudo isto. De qualquer forma, diria que ele é um beneficiário bastante interessado, pois foi possível receber das melhores gentes algarvias que trabalhavam a terra, quer ao nível de trabalhadores assalariados quer ao nível de empresas de menor dimensão. Houve aí um mais forte aliciante que motivou as pessoas, mas, de qualquer forma, devo dizer que alguns indicadores que temos apontam no sentido de poder haver alguma reversão, ou seja, algum regresso das pessoas.
Na nossa óptica, o que está em causa é toda uma problemática universal, são as novas regras do jogo da agricultura internacional, que penalizam, neste caso, o pomar tradicional de sequeiro, com as principais produções que referiu, mas que penalizam outros produtos, não apenas em Portugal como em toda a Europa comunitária e por esse mundo fora. Há, de facto, novas regras de jogo, para as quais, logicamente, já temos um conjunto de antídotos através das medidas que já referi e que, dentro em pouco, a terminar, referirei com mais pormenor.
Portanto, Sr.ª Deputada, entendo que muitos, incluindo eu próprio quando tive responsabilidades na região algarvia, providenciaram a modernização de tudo isto. Poderia até adiantar que nós, os actuais responsáveis pela agricultura regional, estamos a prosseguir uma estratégia que, como já referi, está a trazer-nos indicadores perfeitamente optimistas.
Em relação às medidas de apoio que estão a resultar, gostaria de referir três em particular, embora depois vá aludir a mais duas ou três que estão complementarmente a ensaiar os novos dias, ou seja, o novo futuro do pomar tradicional.
A primeira medida tem a ver com o programa NOVAGRI, que é um programa específico de apoio à fruticultura. Este programa contempla medidas de apoio ao arranque do pomar, ou seja, daquele que está de facto decrépito, apoia as plantações de substituição e apoia ainda a promoção dos produtos agrícolas algarvios. Poderia referir ainda que, em menos de um ano, foi possível á região investir qualquer coisa como 300 000 contos neste sentido, verba essa que, afinal, dá corpo à dita recuperação que venho referindo.
Mais ainda: existem diplomas da nossa iniciativa que tiveram o apoio comunitário e que são perfeitamente dirigidos às organizações de produtores para que estes possam visar quatro aspectos muito pertinentes: primeiro, a produção da qualidade dos seus produtos; segundo, a preparação de novos modos de acondicionamento do produto; terceiro, a difusão de conselhos sobre toda a problemática da comercialização que, como disse, e insisto, quanto a mim, está particularmente em causa; quarto, a organização e a participação em feiras da especialidade onde seja possível, conforme os pressupostos da sua pergunta, promover os produtos agrícolas, neste caso, algarvios.
Logicamente, a estratégia que está montada não é apenas do Ministério da Agricultura, mas é uma estratégia integrada.
Terminaria, dizendo que está a funcionar e a dar alguns resultados, pois os indicadores que temos na nossa mão são de modo a deixar-nos perfeitamente optimistas. As medidas que referi são complementares com muita formação profissional que se está a fazer na matéria e com sessões de esclarecimento várias.
Referia ainda que, há pouco tempo, por exemplo, na última FATACIL, já foi possível assistirmos a um concurso de doçaria em que o produto visado era precisamente a amêndoa. No entanto, aproxima-se, ainda este ano, um seminário sobre a problemática does frutos secos e confio que toda esta estratégia devidamente integrada prevê já hoje melhores dias para o pomar tradicional de sequeiro, que foi a sua preocupação e que é também a nossa, e, no futuro breve, vamos ter os agricultores algarvios a sorrirem de outra forma em relação a estes produtos, que são bastante queridos para eles.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15ilda Martins.

A Sr.ª 15ilda Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado, agradeço-lhe as referências elogiosas que fez e congratulo-me pelas medidas que o Governo tomou.
No entanto, não posso deixar de discordar da ideia que me pareceu inferir da sua exposição no sentido de que os agricultores algarvios do barrocal teriam trocado, a prática da agricultura pela indústria turística devido a usufruírem daí maiores lucros.
Acontece que a ideia que tenho é a de que, de facto, os agricultores, que são os possuidores de terras, estão ligados a elas por laços de afectividade e vêem como mágoa a ruína dos seus pomares. Penso que o mal reside no facto de os frutos secos terem uma cotação muito baixa. A mão-de-obra é escassa e muito cara e os assalariados são atraídos para a indústria hoteleira que se desenvolve no litoral e com a qual os agricultores não podem competir na prática de preços. Portanto, penso que essa será a realidade.
À semelhança da política que o Governo adoptou em relação ao turismo, ao criar mecanismos para a sua venda no estrangeiro, pensamos que essa política se deveria estender também à promoção dos frutos secos do Algarve a nível internacional. Na verdade, tratam-se de produtos de base que estão ligados a uma cadeia de actividades tradicionais indissociáveis do complexo geocultural da região e cujo desaparecimento põe em risco a sua própria identidade cultural.
Portanto, pergunto ao Governo, na pessoa de V. Ex.ª, se a solução para o problema que acabamos de expor não passaria por um entendimento nesta matéria entre os Ministérios da Agricultura e do Comércio e Turismo.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura: - A Sr.ª Deputada 15ilda Martins levanta três questões, de novo pertinentes, que evidenciam bem o conhecimento profundo que tem sobre a região que representa e sobre estes problemas da agricultura.
Em primeiro lugar, sobre a problemática agricultura versus turismo, não tenho a mínima dúvida de que os agricultores algarvios são daqueles que, de facto, mais amor têm à terra.

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Recordaria, a este propósito, uma reunião que há bem pouco tempo se fez no Algarve a nível internacional - estavam presentes os 12 países comunitários -,onde a maior tónica que os agricultores da Europa comunitária registaram foi a amor à terra da parte dos agricultores algarvios. Portanto, se porventura houve uma opção por outros sectores de actividade foi uma opção, sem dúvida, a contragosto.
A promoção dos produtos algarvios é, de tacto, o cerne da questão dentro desta problemática das novas regras do jogo. Gostaria de informar a Sr.ª Deputada e os Srs. Deputados de que algo tem sido possível fazer nessa matéria. Recordo, até, que é precisamente no Algarve que existe a denominada «PROALGAR», ou seja, a Associação para a
Promoção dos Produtos Agrícolas do Algarve.
Aliás, quando tinha responsabilidades na região tive oportunidade de, no nosso país, visitar as feiras de Santarém, de Braga, de Aveiro e, logicamente, as feiras algarvias, bem como de estar em França e na Alemanha com os produtos do Algarve. Eles foram extremamente bem recebidos e, ainda por cima, a amêndoa, o figo e, um pouco, a alfarroba também, por razões de ordem mais industrial, mereceram muita aceitação de todos aqueles a quem foram apresentados.
A baixa cotação dos produtos, poderá resolver-se desta forma - promovendo, como disse e com razão confio
que a uma cada vez maior promoção corresponda uma cada
vez maior produção, pois através de uma promoção bem feita não se irá registar qualquer abaixamento da cotação do produto, antes pelo contrário, irá corresponder à sua subida.
Por fim, o entendimento que sugere entre o nosso Ministério e o do Comércio e Turismo. Tal é, de facto, importante, pois o Ministério do Comércio e Turismo tem sob a sua responsabilidade o Instituto de Comércio Externo de Portugal, organismo que promove os produtos agrícolas. Já foram estabelecidos
alguns contactos, eu próprio participei num diálogo sobre essa matéria com o Sr. Ministro do Comércio e Turismo e ficou entendido que as acções que agora têm sido feitas são pontuais, da iniciativa regional, mas que no ano de 1993 irá haver um leque ambicioso de feiras a nível mundial, onde os produtos agrícolas serão tão acompanhados como aqueles outros que já tom vindo a ser objecto das iniciativas do Instituto.
Portanto, a questão é pertinente, estamos atentos a ela e confio que, num futuro próximo, seja possível reforçar tudo isto que vem sendo feito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a sessão de perguntas ao Governo, informo que deu entrada na Mesa o voto n.º 34/VI, de congratulação pelo Dia das Nações Unidas, subscrito por Deputados do CDS, do PSD, do PS e de Os Verdes.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Celebrando-se hoje o Dia das Nações Unidas, especificamente dedicado à agenda para a paz que define o programa de acção que, por decisão do Conselho de Segurança de 31 de Janeiro de 1992, foi elaborado pelo Secretário-Geral da ONU:
A Assembleia da República associa-se ao objectivo de «reforçar a capacidade da Organização nos domínios da diplomacia preventiva, do restabelecimento e da manutenção da paz, no quadro da Carta e das suas disposições», e junta-se ao apelo à cooperação com tal objectivo de todos os países e povos das Nações Unidas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não tendo havido consenso quanto à votação deste voto na sessão de hoje, a mesma fica agendada para a próxima reunião plenária.
Concluídos os trabalhos, informo VV. Ex.ªs que a próxima reunião plenária realizar-se-á na terça-feira, dia 27, com início às 15 hora, com período de antes da ordem do dia, incluindo eventuais declarações políticas, e do período da ordem do dia constará a discussão dos projectos de lei n.º 167/VI - Introduz alterações ao regime geral da segurança, higiene e saúde no trabalho (PCP) e 169/VI Procede á revisão parcial do regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais (PCP).
Está encerrada a sessão.

Eram 11 horas e 45 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

José Ângelo Ferreira Correia.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
António Maria Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Monteiro do Amaral.
João Álvaro Poças Santos.
José Leite Machado.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
António Manuel Oliveira Guterres.
António José Martins Seguro.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Carlos Cardoso Lage.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António Domingues de Azevedo.
Helena de Melo Torres Marques.
Jorge Lacão Costa.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Gomes Carvalhas.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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DIÁRIO da Assembleia da República

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