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Sábado, 31 de Outubro de 1992 I Série - Número 8

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE OUTUBRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Alberto Monteiro de Araújo
Maria da Conceição Figueira Rodrigues

SUMÁRI0

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutas.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 220/VI.
Foi discutida a proposta de resolução n.º 12/VI - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República de Moçambique para Evitar a Dupla Tributação. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Carlos Miguel Oliveira (PSD), Domingues Azevedo (PS) e Narana Coissoró (CDS).
A proposta de resolução n.º 13/VI - Aprovação do Acordo entre a República Portuguesa e a República da Hungria sobre Promoção e Protecção Recíproca de Investimentos foi apreciada, tendo intervindo, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo (António de Sousa), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Domingues Azevedo (PS) e Rui Rio (PSD).
Foi igualmente apreciada a proposta de resolução n.º 14/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Alterações à Carta Social Europeia. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social (Jorge Seabra), os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), João Proença (PS), Fernandes Marques (PSD) e Narana Coissoró (CDS)
Finalmente, procedeu-se ainda à discussão da proposta de resolução n.º 15/VI -Aprova, para adesão, o Convénio Constitutivo da Associação Internacional de Desenvolvimento, tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (José Braz). os Srs. Deputados Luís Geraldes (PSD), Domingues Azevedo (PS), Mário Tomé (Indep.) e Octávio Teixeira (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva
Adérito Manuel Soares Campos
Alberto Cerqueira de Oliveira
Alberto Monteiro de Araújo
Álvaro José Martins Viegas
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Paula Matos Barros
António da Silva Bacelar
António de Carvalho Martins
António do Carmo Branco Malveiro
António Esteves Morgado
António Germano Fernandes de Sá e Abreu
António Joaquim Correia Vairinhos
António José Barradas Leitão
António Manuel Fernandes Alves
António Moreira Barbosa de Melo
Aristides Alves do Nascimento Teixeira
Arlindo da Silva André Moreira
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha
Arménio dos Santos
Belarmino Henriques Correia
Bernardino Gata Silva
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves
Carlos Manuel de Oliveira da Silva
Carlos Manuel Duarte de Oliveira
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho
Cecília Pita Catarino
Cipriano Rodrigues Martins
Delmar Ramiro Palas
Domingos Duarte Lima
Domingas José Soares d´ Almeida Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva .
Elói Franklin Fernandes Ribeiro
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade
Fernando dos Reis Condesso
Fernando José Antunes Gomes Pereira
Fernando José Russo Roque Correia Afonso
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira
Fernando Santos Pereira
Filipe Manuel da Silva Abreu
Francisco Antunes da Silva
Francisco João Bernardino da Silva
Francisco José Fernandes Martins
Guido Orlando de Freitas Rodrigues
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hilário Torres Azevedo Marques
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins
Jaime Gomes Milhomens
João Álvaro Poças Santos
João Carlos Teixeira Baltazar Gomes
João do Lago de Vasconcelos Mota
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
João Granja Rodrigues da Fonseca
João José da Silva Maçãs
João José Pedreira de Matos
João Manuel das Santos Henriques
João Maria Leitão de Oliveira Martim
Joaquim Cardoso Martins
Joaquim Eduardo Gomes
Joaquim Maria Fernandes Marques
Joaquim Vilela de Araújo
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha
José Alberto Puig dos Santos Cosia
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
José Augusto Santos da Silva Marques
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha
José de Almeida Cesário
José Fortunato Freitas Costa Leite
José Guilherme Reis Leite
José Leite Machado
José Macário Custódio Correia
José Manuel Borregana Meireles
José Manuel da Silva Costa
José Pereira Lopes
Luís António Carrilho da Cunha
Luís António Martins
Luís Carlos David Nobre
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa
Luís Manuel Costa Geraldes
Manuel Acácio Martins Roque
Manuel Antero da Cunha Pinto
Manuel Castro de Almeida
Manuel da Silva Azevedo
Manuel de Lima Amorim
Manuel Joaquim Baptista Cardoso
Manuel Maria Moreira
Manuel Simões Rodrigues Marques
Maria da Conceição Figueira Rodrigues
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira Mourão
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça
Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de
Sousa
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo
Mário Jorge Belo Maciel

Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos
Olinto Henrique da Cruz Ravara
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho
Rui Alberto Limpo Salvada
Rui Carlos Alvarez Carp
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Simão José Ricon Peres
Vasco Francisco Aguiar Miguel
Vítor Manuel da Igreja Raposo
Vítor Pereira Crespo

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto da Silva Cardoso
Alberto de Sousa Martins

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Alberto Manuel Avelino
Alberto Marques de Oliveira e Silva
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Carlos Ribeiro Campos
António de Almeida Santos
António Domingues de Azevedo
António Fernandes da Silva Braga
António José Borrani Crisóstomo Teixeira
António José Martins Seguro
António Manuel Oliveira Guterres
António Ribeiro Marques da Silva
Artur Rodrígues Pereira dos Penedos
Carlos Cardoso Lage
Carlos Manuel Luis
Edite de Fátima dos Santos Marreiros Estrela
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Eduardo Ribeiro Pereira
Elisa Mana Ramos Damião
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo
Fernando Alberto Pereira de Sousa
Fernando Alberto Pereira Marques
Guilherme Valdemar Pereira D' Oliveira Martins
Gustavo Rodrigues Pimenta
Helena de Melo Torres Marques
Jaime José Matos da Gama
João António Gomes Proença
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Américo Fialho Anastácio
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Apolinário Nunes Portada
José Eduardo Reis
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos
José Paulo Martins Casaca
José Rodrigues Pereira dos Penedos
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio da Piedade Nunes Henriques
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Filipe Nascimento Madeira
Luís Manuel Capoulas Santos
Manuel António dos Santos
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes
Raúl D'Assunção Pimenta Rego
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Comunista Português (PCP):

António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
João Carlos da Silva Pinho.
José Luís Nogueira de Brito Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro

Partido Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha

Deputados Independentes

Mário António Baptista Tomé
João Cerveira Corregedor da Fonseca

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 220/VI - Criação da freguesia de Formoselha no concelho de Montemor-o-Velho (PS), que baixou à 6.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos hoje apreciar várias propostas de resolução, para aprovação de convenções internacionais, a primeira das quais é a proposta de resolução n.º 12/VI, que aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República de Moçambique para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.
O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Convenção entre a República Portuguesa e a República de Moçambique para Evitar a Dupla Tributação, que hoje vai ser discutida nesta Câmara, é um documento importante, não só porque resolve as questões de dupla tributação que se possam colocar no relacionamento entre Portugal e Moçambique, como também porque se trata de uma convenção com um país de expressão portuguesa, o que é de salientar.
A discussão desta convenção sobre a dupla tributação surgiu na esteira da visita do Sr. Primeiro-Ministro a Moçambique, em 1989. Posteriormente, foram iniciadas negociações entre as autoridades dos dois Estados membros, tendo sido possível, ao longo dos anos de 1989, 1990 e 1991, prosseguir essas mesmas negociações e chegar a bom porto, conseguindo-se o acordo expresso no texto hoje sujeito à apreciação desta Câmara para aprovação.
Fundamentalmente, esta é uma convenção que, obviamente, elimina os problemas de dupla tributação que possam colocar-se entre os dois Estados membros e estabelece mecanismos adequados de controlo de evasão fiscal

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entre os mesmos, isto é, nos problemas que se possam colocar, relativamente aos rendimentos, entre empresas ou pessoas singulares no relacionamento entre os dois Estados membros.
Permito-me igualmente salientar, como pontos particularmente dignos de nota, por um lado, a possibilidade que existe de incrementar as relações entre os Estados membros, na medida ern que se clarificam situações de eventual dupla tributação, designadamente ern relação às pessoas singulares que trabalham ou vão prestar serviços, quer em Moçambique quer ern Portugal, em regime de reciprocidade, se incrementam as relações de cooperaçâo, que nos são tão caras, designadamente de professores portugueses que vão desenvolver as suas actividades em Moçambique, e se vai apurar a tributação dos portugueses que, por exemplo, vão trabalhar para Moçambique e que, até agora, poderiam estar sujeitos a regimes de efectiva dupla tributação.
Só por Isso, esta convenção é importante, já que incentiva a cooperação ou o trabalho desenvolvido por portugueses em Moçambique - e, evidentemente, a inversa também é verdadeira.
Por outro lado, gostaria de salientar que esta convenção, aqui apresentada para aprovação, tem a preocupação de incrementar ou de estabelecer mecanismos que incrementem o investimento de empresas portuguesas em Moçambique, designadamente através da possibilidade de eliminação dessa mesma dupla tributação e da concessão do chamado tax sparing credit a empresas portuguesas. Isto é, nas termos do artigo 23.º da Convenção, os benefícios fiscais que porventura Moçambique conceda para investimento de empresas portuguesas são contabilizados como se efectivamente a tributação existisse ern relação às empresas portuguesas, o que significa, na prática, que estas vêem melhorada a sua situação tributária e incentivado o investimento português em Moçambique.
Por todas estas razoes, pensamos que este documento é politicamente importante, na medida em que elimina um problema que existe no relacionamento, designadamente o da dupla tributação. Por outro Indo, é de salientar a sua oportunidade, porque se trata de um país de expressão portuguesa.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP vai votar favoravelmente esta proposta de resolução, esta convenção entre o nosso país e Moçambique, para, através dos mecanismos que nela são propostos, se poder favorecer o estreitamento de relações entre Portugal e Moçambique.
Aliás, gostaríamos que se criassem as condições para que este tipo de convenções pudesse ser estendido a outros países de língua oficial portuguesa, porque nos parece que este é um dos possíveis caminhos - não o único, evidentemente - que pode permitir estreitar essas relações de cooperação mutuamente vantajosas e, de algum modo, consentir que Portugal dê um contributo efectivo ao desenvolvimento desses países, através da possibilidade, que assim concede, de um maior investimento e de uma maior circulação de quadros.
Contudo, gostaria de colocar uma ou duas questões que ressaltaram de uma leitura da convenção. A primeira traduz-se na estranheza pelo facto de a convenção ter sido assinada em 21 de Março de 1991 e de, só hoje, cerca de um ano e meio depois, ter vindo para ratificação à Assembleia da República. Gastaria que o Governo esclarecesse a razão da existência deste prazo tão dilatado entre o momento da assinatura e a vinda para ratificação em sede de Assembleia da República.
A segunda questão é a seguinte: nos textos dos artigos 15.º e 17.º, isto é, quando nos referimos aos critérios e às medidas que vão ser tomadas em relação às profissões independentes e dependentes, parece haver critérios diferenciados em relação às medidas que se me afiguram mais favoráveis para aqueles a que se chama de artistas e desportistas na troca de relacionamento. Gostaríamos igualmente de saber qual a razão deste favorecimento, aparentemente maior, que está proposto para um certo tipo de cidadãos, derivado das especiais relações que mantêm com outros.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretaria de Estado Adjunta e do Orçamento: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, de facto, decorreu algum tempo entre a assinatura e a apresentação desta convenção para ratificação. Isso resultou de alguns aperfeiçoamentos formais e também do compasso de espera que houve ern relação à sua ratificação por Moçambique.
Por outro lado, quero acrescentar que, em relação aos artigos 15.º e 17.º, não descortino, à primeira vista, uma grande discriminação em relação aos artistas e desportistas. 1 De qualquer forma, Isso obedeceu a um acordo entre os dois Estados membros, no sentido de incrementar essa actividade profissional em particular.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miguel Oliveira.

O Sr. Carlos Miguel Oliveira (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos crentes que esta convenção que hoje se apresenta para ratificação por esta Assembleia deverá merecer o apoio consensual de todas as forças políticas se considerarmos primeiramente os objectivas da convenção e, seguidamente, o significado que Moçambique tem para Portugal no seu contexto histórico, cultural, economia) e estratégico.
Embora o objecto específico da convenção seja a eliminação das duplas tributações do rendimento, a convenção insere-se num objectivo mais vasto que é o incentivo ao investimento português em Moçambique e o incremento do desenvolvimento das relações sociais, culturais e económicas entre os dois países.
Esta convenção insere-se na política do Governo de fomentar as relações económicas e culturais com os países africanos de língua oficial portuguesa, nomeadamente Moçambique, e não deve ser dissociada do conjunto de medidas que o Estado português tem vindo a efectuar no âmbito desta política. Uma política que o PSD e o Governo sempre entenderam como sendo nacional e suprapartidária. Alias, o sucesso da actual política de cooperação e o excelente relacionamento político, económico e cultural entre os dois Estados deve ser realçado antes de se analisar esta proposta de resolução.

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Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-nos importante salientar a abrangência desta convenção, senão vejamos: a convenção define o direito de tribulação de cada Estado relativamente as diferentes categorias de rendimento e estabelece o método para eliminar a dupla tributação, regulando ainda alguns aspectos importantes como o tratamento não discriminatório, a troca de informações entre as autoridades competentes das dois Estados, o procedimento amigável para a resolução de problemas que se suscitem e a cooperação entre as administrações fiscais das dois países no domínio da formação de pessoal e outras matérias.
Esta convenção oferece certas garantias e benefícios aos empresários portugueses que desejem investir em Moçambique. Neste contexto, salientam-se os artigos 6.º a 14.º, que estabelecem os princípios a seguir no que se refere aos vários tipos de rendimento, nomeadamente aos bens imobiliários, lucros de empresas, empresas associadas, dividendos, juros, royalties, mais-valias e ainda profissões independentes.
Este aspecto da convenção demonstra, inequivocamente, a vontade política do Governo Português em proporcionar mecanismos de protecção aos interesses dos empresários portugueses e o empenho em estimular o investimento em Moçambique.
Sem desejar pormenorizar, demasiadamente, esta curta intervenção, gostaríamos de realçar vários aspectos positivos. Salvo raras excepções a convenção estabelece o princípio da tributação dos vários tipos de rendimento no Estado da residência da pessoa ou da entidade que explora a empresa e impõe um limite máximo à tributação pelo Estado proveniência do rendimento. Por exemplo, no que se refere à tributação dos lucros das empresas associadas salienta-se a aplicação do princípio de arm's length na determinação do lucro tributável. Um outro exemplo, no que se refere à tributação de dividendos, a convenção determina que a taxa de imposto tributado pelo Estado fonte de rendimento não pode exceder os 15 % do montante bruto dos dividendos.
No que se refere à tributação sobre juros, a convenção limita o Estado proveniência dos juros a taxa máxima de 10 %. Quanto à tributação de royalties esta taxa máxima está registada em 10 % do seu montante bruto. Em relação às mais-valias este limite é estabelecido em 10 % do saldo positivo das mais-valias apôs dedução das menos-valias.
É igualmente importante salientar que o método de dupla tributação adoptado favorece a promoção do investimento estrangeiro em Moçambique e por interligação o desenvolvimento económico em termas do método adoptado. Este método é o seguinte: uma vez que o Estado da residência do beneficiário pode tributar sempre - salvo raríssimas excepções - e podendo, nalguns casos, o Estado de origem do rendimento fazer o mesmo, a eliminação da dupla tributação incumbe ao primeiro mediante o método da imputação normal. Neste sentido, Portugal admitiu o tax sparing credit.
Esta convenção contém de igual modo importantes vantagens para cooperantes, estudantes e professores, fomentando o incremento das relações culturais e sociais além das relações económicas. Neste sentido, é de realçar que relativamente à remuneração dos professores derivadas do ensino estabelece-se a não tributação ern qualquer dos Estados durante um período máximo de dois anos. Este dado é uma clara demonstração da vontade de cooperação entre os dois países no âmbito cultural e cientifico e terá - estamos crentes - efeitos práticos bastante positivas.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: para finalizar, uma observação final. Após um longo período de história colonial, esta convenção é mais um exemplo de que Portugal está hoje presente ern África e, nomeadamente, ern Moçambique de uma forma descomplexada, munida de princípios de universalismo, humanismo, e imbuído da vontade de auxiliar os povos dos países em vias de desenvolvimento através de uma política de cooperação sólida

(O orador reviu.) Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Poder-se-á dizer que hoje vai ser um dia calmo na Assembleia da República, pois, dada a constituição da agenda e as matérias em debate, não há indícios de que não haja essa calma.
Quanto à proposta de resolução n.º 12/VI, que nos é presente hoje, lembrarei apenas uma questão que já foi focada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho: ela só peca por vir um pouco atrasada, de resto não temos absolutamente nada a objectar, uma vez que pensamos que esta convenção é extremamente importante.
Se, de facto, se pretende fomentar as relações económicas entre Portugal e Moçambique, que têm tido alguma dificuldade em serem desenvolvidas, a convenção não é suficientemente ambiciosa para atingir esse desiderado, no entanto não deixamos de considerá-la, mesmo nesse domínio, como um princípio e, por isso, concordamos com ela.
Na verdade, esta convenção é importante e Portugal, em matéria de evitar a dupla tributação, que é o aspecto mais saliente desta convenção, tem alguma vantagem, porquanto está actualmente em vigor em Moçambique um sistema fiscal que ainda tem os resquícios da nossa presença em África e que, ainda, se sustenta na base da cédula fiscal.
Assim, é importante que a própria convenção anteveja a possibilidade da renovação deste sistema fiscal, criando o mecanismo da sua continuidade, mesmo com a alteração do sistema fiscal de Moçambique, desde que os princípios subjacentes a esta convenção não sejam feridos, ou seja, desde que o actual sistema fiscal continue a integrar as mesmas categorias e cédulas de rendimento do nosso actual sistema. Julgamos, pois, que este é um dado positivo, por isso estamos de acordo com ele.
Quanto às isenções também não temos absolutamente nada a assinalar a não ser a possibilidade de tratamento desigual entre os possíveis cooperantes portugueses que vão para Moçambique no domínio destas missões com os nacionais de Moçambique, mas penso que aí também não haverá grande inconveniente, na medida em que são acções totalmente específicas.
O único senão nesta convenção tem a ver com as verbas que são consideradas isentas, auferidas e pagas por entidades moçambicanas no que respeita às acções desenvolvidas no âmbito da investigação científica, do ensino e da cultura.

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Na verdade, estas verbas afiguram-se-me excessivamente reduzidas, pois trata-se de 5,4 dólares/ano, que é dado como complemento das importâncias que eles recebam de entidades portuguesas. Acho este complemento muito curto e praticamente insignificante para a vida normal destas pessoas.
Assim sendo, gostaria de perguntar ao Sr. Subsecretário de Estado o porquê destes 5,4 dólares e se se justificava, dado o montante, fazer esta referência.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - São 5400 dólares/ano, Sr. Deputado!

O Orador: - Então, há um erro de dactilografia na proposta que é bom que fique registado para depois confrontar entre aquilo que está escrito e aquilo que é a, intenção do Governo. Diz, então, o Sr. Subsecretário de Estado que não são 5,4 mas, sim, 5400 dólares/ano. Bom, então, isso já faz sentido, porquanto a minha pergunta deixa de ter razão de ser.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pode parecer um pouco insólito o problema que vou levantar a propósito da dupla tributação, uma vez que nada temos a opor quanto a esta proposta de resolução, pois trata-se de um acto simbólico que não tem, em nosso entender, matéria contraditória.
Porém, como existe, neste momento, em Moçambique dinheiro de portugueses que não se sabe a que tributação estão sujeitos, gostaria de abordar este tema, pois trata-se de dinheiro que foi entregue por portugueses à guarda do Consulado quando estes tiveram de vir para Portugal.
Na verdade, este dinheiro foi tributado e, inclusivamente, o Consulado, para além de passar os respectivos recibos, começou até a pagar juros do dinheiro que lhe tinha sido entregue para segurança, dinheiro esse que atinge centenas de milhares de contos, porque foram muitos os empresários e pessoas singulares que no momento de deixarem o território moçambicano julgaram que o dinheiro estaria bem entregue.
Mas, a dada altura, o Consulado comunicou aos proprietários que o dinheiro não podia estar mais à sua guarda, tendo-o depositado nos bancos moçambicanos não em escudos mas, sim, em meticais.
O que acontece, neste momento, é que este dinheiro está a pagar o imposto de aplicação de capitais, segundo a legislação moçambicana, mas não pode ser trazido para Portugal nem ser movimentado e, apesar de estar depositado num banco, não recebe juros, o que faz que se esteja a viver uma situação terrivelmente incómoda para quem deixou o dinheiro à guarda do Consulado.
Já no ano passado perguntei ao Sr. Secretário de Estado Durão Barroso o que é que se passava com este assunto e foi-me respondido que ele estava bem encaminhado, que não tinha sido esquecido pelo Governo e que, dentro em breve, seria solucionado.
Mas, o que é certo é que, até à data, este assunto ainda não foi solucionado e, embora à primeira vista possa parecer que ele nada tem a ver com a proposta de resolução hoje em apreciação, a verdade é que se trata de um problema de tributação do dinheiro de portugueses, dinheiro esse que não se pode movimentar, repito, mas que paga encargos ern Moçambique.
Assim, se o Sr. Subsecretário de Estado souber e julgo que não sabe, pois é um assunto que quanto mais passar despercebido e menos dele se falar, melhor!..., gostaria que dissesse qualquer coisa, pois a minha obrigação é alertar para este problema.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições sobre esta matéria, passamos, de imediato, à apreciação da proposta de resolução n.º 13/VI - Aprovação do Acordo entre a República Portuguesa e a República da Hungria sobre Promoção e Protecção Recíproca de Investimentos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio

Externo (António de Sousa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Acordo entre Portugal e a Hungria sobre a Protecção e Promoção Mútua de Investimentos insere-se na política de internacionalização das empresas portuguesas.
Efectivamente, cada vez é mais importante que as nossas empresas comecem a olhar para o exterior em termos, de novas oportunidades de negócio e de acesso a mercados internacionais. Por outro lado, as joint venturas em Portugal são importantes e, neste domínio, temos vindo, com diversos países, a negociar acordos que permitem criar um enquadramento jurídico mais favorável a este tipo de investimentos mútuos.
O caso que temos presente, o acordo entre Portugal e a Hungria, insere-se, para além disso, no conjunto de medidas que temos vindo a pensar relativamente a ligações comerciais e de investimento com os países da Europa Central e Oriental, pois, dadas as modificações na política económica destes países, é importante considerarmos as possibilidades de investimento nos referidos países. Aliás, quando este acordo foi rubricado - o que levou, o Sr. Primeiro-Ministro e eu próprio, ern Fevereiro deste ano, à Hungria - houve uma missão empresarial que fez um conjunto de contactos no sentido de dinamizar este tipo de investimentos mútuos.
Por outro lado, como sabem, foi recentemente aprovada uma resolução do Conselho de Ministros, no domínio da internacionalização das empresas portuguesas, na qual está previsto o acelerar e dinamizar a celebração de acordos como este que hoje temos para apreciação.
Este acordo, ern termos específicos, tem fundamentalmente as regras que são habituais em acordos entre Estados neste domínio, nomeadamente no que respeita à defesa dos investimentos mútuos feitos por nacionais de um país no outro país, a aspectos referentes à possibilidade de repatriação de dividendos e dos investimentos " a todos aqueles aspectos que são importantes em termos de seguros comerciais e de investimento.
Penso que neste domínio nada há de especial a anotar no acordo, que tem, fundamentalmente, a formulação que tem vindo a ser habitual neste tipo de assunto.
No caso concreto julgo este acordo particularmente importante, dado que, como sabe, o comércio entre Portugal e a Hungria é, neste momento, bastante escasso e tem--se traduzido, geralmente, por valores não muito superiores a 1 milhão de contos Por isso pensamos que será através do investimento directo, quer português na Hungria quer húngaro em Portugal, nomeadamente através de joint ventures (como disse, estão neste momento várias em dis-

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cussão, que poderá aumentar substancialmente este tipo de comércio.
Em termos concretos, penso que o acordo se traduz fundamentalmente num incentivo importante a dinamização do comércio e do investimento entre os dois países.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): -Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo, nada temos a à proposta de resolução que hoje aqui nos é apresentada, embora, como o próprio Sr. Secretário de Estado, as nossas relações comerciais com a Hungria extremamente escassas. Assim sendo, o impacte que a aprovação do acordo irá ter sobre a nossa economia e sobre o apoio às empresas portuguesas está também na dimensão da própria escassez dessas relações. Contudo, é evidente que, no respeito e no quadro de relações mutuamente vantajosas e de reciprocidade, estes acordos constituem bons caminhos para potenciar, ajudar e apoiar as empresas portuguesas na sua internacionalização e na conquista de novos mercados, tanto que, como sabemos, devido à política cambial que o Governo tem seguido, as nossas empresas exportadoras estão hoje a passar por uma fortíssima crise, COMO alada ontem aqui foi de algum modo demonstrado e COMO ainda hoje, no Diário de Notícias, o próprio Sr. Primeiro-Ministro vem confirmar, contrariando as tese" largamente optimistas que o Sr. Ministro das Finanças aqui nos trouxe.
Este acordo, apesar de limitado, devido à própria limitação das relações que mantemos com a Hungria, pode, pois, constituir um elemento, embora pequeno, que contribui para o desbloqueamento das dificuldades com que se estão a defrontar as empresas exportadoras, dificuldades essas que, na nossa opinião, radicam fundamentalmente M politica errada de sobrevalorização do escudo que tem sido seguida e nas altas taxas de juro, que efectivamente marcam competitividade no campo internacional.
Não tendo, pois qualquer questão de fundo a colocar, queremos apenas equacionar uma questão que nos suscitou duvidas.
Diz-se, no artigo 10.º, que o presente acordo se aplica aos investimentos realizados a partir de 1 de Janeiro de 1973. A minha pergunta, com alguma perplexidade, é a seguinte: como é que um acordo, agora ratificado, de protecção recíproca de investimentos se vai aplicar a investimentos feitos há quase 20 anos? Não estará aqui eventualmente em causa algum grande empresário do sector corticeiro que tenha na Hungria investimentos antigos que necessite de ver protegidos?
EM qualquer caso, volto a perguntar porquê a partir de 1 de Janeiro de 1973 e que meios práticos permite o acordo implementar de modo a proteger esses investimentos realizados há 20 anos atrás?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo, a questão que ateria colocar-lhe foi antecipadamente suscitada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho. Trata-se, de facto, da razão de ser da retroactividade dos efeitos deste acordo a 1973 e ainda da efectiva capacidade de produção dos efeitos desta norma. Cabe perguntar, dada a dinâmica dos próprios sistemas legislativos, até que ponto é que tal norma tem aplicação concreta ou, por outras palavras, quais os interesses que efectivamente representa neste domínio.
Aproveitando esta ocasião, gostaríamos também de referir que estamos de acordo com esta proposta Como já disse, matérias hoje em debate não são polémicas, sendo, antes. Muito pacíficas.
Há, no entanto, uma questão que me chamou a atenção na proposta de resolução agora em apreço. Trata-se do uma proposta muito fechada sobre aspectos exclusivamente de ordem económica e não salvaguarda algumas questões que são inerentes ao desenvolvimento económico, nomeadamente a possibilidade de transferência tecnológica de possíveis investimentos e a segurança dessa mesma (tecnologia de investimentos possivelmente realizados ern Portugal por indústrias húngaras ou por indústrias portuguesas na Hungria. Não é prevista esta situação nem alguma obrigatoriedade neste domínio, incluindo a da continuidade da transferência tecnológica e da sua segurança no que respeita aos investimentos.
Quanto ao restante, nada lemos a assinalar. Entendemos que esta proposta de resolução está bem elaborada, com excepção de -um pormenor - sobre o qual gostaria de ouvir o Sr. Secretário de Estado - que respeita às questões acessórias relativas ao próprio investimento, que não se encontram de alguma maneira previstas na presente proposta.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, diria, em relação à primeira pergunta concreta que me foi colocada, que o que se pretendeu - dado que, como foi dito, o conjunto de investimentos que já existem entre Portugal e a Hungria é muito escasso, embora haja já algumas empresas a investir - foi cobrir todos os investimentos já feitos. Isto não significa muito ern termos práticos, mas significa, pelo menos, que as vantagens que agora são dadas para o futuro, no sentido da segurança desse mesmo investimento, se aplicam, na prática, a todos os investimentos existentes entre Portugal e a Hungria nomeadamente às empresas portuguesas (cerca de cinco) que já anteriormente fizeram investimentos na Hungria.
Quanto à questão de não estar prevista a transferência de tecnologia, ela está efectivamente prevista, mas indirectamente, porque ao proteger-se o investimento e também a possibilidade de pagamentos de dividendos, royaltiex, etc., está automaticamente prevista a possibilidade de defesa dos direitos de quem faça a transferência de tecnologia ou seja, quer da empresa portuguesa que a faça para a Hungria, quer da empresa húngara que a faça para Portugal. Essa possibilidade - repito - está indirectamente coberta.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Dá-me licença que o interrompa. Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Secretário de Estado, quando lhe coloque* a questão, referia-me ao interesse do próprio Estado, nomeadamente o Português, em assegurar a possível inovação tecnológica que os investimentos húngaros possam trazer para o País e ter algum mecanismo que assegure a continuidade, dos países contratantes, dessa transferência tecnológica, sendo certo que o que o Sr. Secretário de Estada me acaba de responder se refere apenas à tecnologia inserta no próprio investimento, sem qualquer garantia de continuidade ern termos do país que a recebe. A pergunta que lhe fiz ia, sim, neste sentido.

O Orador: - De facto, Sr. Deputado, este acordo respeita exclusivamente ao domínio da protecção e promoção mútua de investimentos.
O que temos de prever é que, no caso de haver transferência de tecnologia entre empresas, tal transferência fique perfeitamente protegida. A transferência de tecnologia fora de uma relação de investimento, como, seja, por exemplo, a de cooperação a nível científico, não está efectivamente no âmbito deste acordo. Foram, aliás, celebrados na altura vários outros acordos, designadamente de carácter cultural e científico, que estão fora do âmbito estrito do presente acordo, o qual se destina exclusivamente a protecção dos interesses que advenham da relação entre duas empresas.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Ri" (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo vem, nos termos constitucionais, submeter à aprovação da Assembleia da República o Acordo sobre Promoção e Protecção Recíproca de Investimentos, assinado, em 28 de Fevereiro de 1992, entre a República Portuguesa e á República da Hungria.
De entre os diversos aspectos que são avançados como razão para a assinatura do presente acordo, são de salientar a perspectiva de evolução do relacionamento entre a Hungria e a Comunidade Europeia, os princípios anunciados na Carta de Paris sobre a nova Europa e as conclusões da Conferência de Bona da CSCE, assinadas, respectivamente, em 11 de Novembro e 11 de Abril de 1990.
Com efeito, apontam esses documentos para o estreitar da cooperação económica entre os Estados que os subscrevem, com um especial destaque no que concerne aos países democráticos em transição para uma economia de mercado. Entende-se, e bem, que .se tomou imperioso apoiar o desenvolvimento económico e social dos referidos países, o que terá, naturalmente, de passar pelo reforço do seu relacionamento económico.
Apontam ainda os referidos documentos que os Estados signatários deverão facilitar, entre si e sem discriminação, o estabelecimento e o funcionamento de empreendimentos nos seus territórios.
É, pois, neste quadro que surge agora o Acordo para Promoção e Protecção de Investimentos entre Portugal e a Hungria. O investimento é, sem dúvida, uma das principais formas de cooperação económica, pelo que o presente acordo irá, com certeza, impulsionar o relacionamento económico entre os dois países.
No âmbito do termo "investimento" estão, neste caso, fundamentalmente, incluídos a propriedade dos bens móveis ou imóveis, ou direitos derivados de participações sociais, os direitos de autor, de patentes e de marcas, de denominações comerciais, de know how de concessões de direito público.
Aspecto a realçar é a garantia de que os investidoras verão, de imediato, transferidas todas as verbas relacionadas com os investimentos realizador. Tal ponto deverá aplicar-se não só as transferências inerentes à prossecução do investimento, como também aos rendimento" gerados, como sejam os lucros, os juros, as royalties ou quaisquer outras formas de remuneração.
Deverão igualmente ser adoptadas todas as iniciativas que concorram para o desenvolvimento das exportações e para a informação dos agentes económicos de avisem os países sobre possibilidades concretas de comércio bilateral, a par da realização de simpósios e do fomento do intercâmbio entre as organizações de índole económica e as empresas em geral.
O articulado acorde salvaguarda ainda a importunidade de nacionalização ou expropriação que privem, directa ou indirectamente, os investidores da. titularidade dos seus bens, salvo em situações concretamente definidas e sempre acompanhadas do pagamento de uma junta indemnização.
O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata entende que a presente proposta de resolução deve ser votada favoravelmente, no desejo de que, desta forma, w esteja a dar um importante passo no estreitamento das relações económicas entre os dois países e, com isso, também uma contribuição para a consolidação da democracia e da economia de mercado na Hungria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, terminámos o debate sobre a proposta de resolução n.º 13/VI.
Vamos agora dar início à discussão da proposta de resolução n.º 14/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Alterações à Carta Social Europeia.
Para apresentar a referida proposta, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social (Jorge Seabra): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Carta Social Europeia constitui, a par da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, um dos pilares sobre que assenta a Actuação do Conselho da Europa na prossecução dos fins para que, foi criado, isto é, "a realização de uma união mais, estreita entre os seus membros, com vista a salvaguardar e a promover os ideais e princípios que são património comum da Europa e a favorecer o progresso económico e social, nomeadamente através da defesa e do desenvolvimento dos direitos do homem e das liberdades fundamentais".
Destinada, na sua origem, a funcionar como Magna Carta dos direitos sociais na Europa, a Carta Social, Europeia, apesar de constituir, ainda hoje, um importante elemento de referencia da política social e uma fonte inspiradora das legislações sobre direitos sociais na Europa, tem vindo, contudo, ao longo os anos, a perder certa eficácia, principalmente por causa de deficiência do seu sistema de controlo e de práticas adoptadas pelos diversos órgãos intervenientes neste sistema.

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Na verdade, os mecanismos de controlo instituídos pela Carta, peio número de órgãos a que fazem apelo (Comité de Peritos Independentes, Comité Governamental, Assembleia Parlamentar e Comité de Ministros) e pela indefinição do, papel a desempenhar por cada um deles, revelaram-se complexos, morosos e com resultados contraditórios. Assim se explica que, durante os seus 30 anos de vigência, nenhuma recomendação tenha sido dirigida aos Estados Contratantes no sentido de respeitarem as obrigações decorrentes da ratificação, não obstante o Comité de Peritos Independentes ter assinalado vários casos de não cumprimento dosas obrigações.
Há, por isso, necessidade de encontrar solução para esta situação, dotando a Europa de um instrumento de direito internacional capaz, por um lado, de funcionar como elemento de referência no plano dos direitos sociais fundamentais e, por outro, de garantir eficazmente a protecção e a promoção desses direitos.
Este objectivo tornou-se, nos últimos tempos, premente, face às modificações políticas, económicas e sociais, pelo que foi constituído um comité de "encarregado de fazer propostas com vista a melhorar a Carta e o seu funcionamento, no que se refere, designadamente, aos seus mecanismos de controlo", em cujos trabalhos Portugal tem vindo a participar.
Este Comité elaborou, até ao momento, dois protocolos destinados a aperfeiçoar o sistema de controlo instituído pela Carta, sendo um deles o Protocolo de Alterações, sobre o qual nos debruçamos nesta sessão.
Constituíram objectivos norteadoras das alterações a introduzir por este Protocolo, designadamente: o aumento do grau de participação dos parceiros sociais e de outras organizações internacionais não governamentais no controlo do cumprimento das disposições da Carta Social Europeia; a definição clara do papel a desempenhar pelos diversos órgãos que fazem parte do sistema de controlo, em especial do Comité de Peritos Independentes e do Comité Governamental, e o melhor funcionamento do Conselho de Ministros nas votações, com vista à adopção de resoluções contendo recomendações individuais aos Estados Partes na Carta.
Com as alterações referidas, o Comité de Peritos Independentes passa a deter competência exclusiva na apreciação, do ponto de vista jurídico, da conformidade das legislações, das regulamentações e das praticas nacionais com o conteúdo das obrigações decorrentes da Carta.
Quanto ao Comité Governamental, competir-lhe-á seleccionar, de maneira motivada, com base em considerações de política social e económica, as situações que, do seu ponto de vista, deverão ser objecto de recomendações a dirigir pelo Conselho de Ministros as Partes Contratantes em falta.
Com o Protocolo de Alterações e com outras medidas já adoptadas, a título experimental, relativas à apresentação dos relatórios respeitantes à aplicação das disposições aceites da Carta, espera-se ter contribuído pura que, de futuro, esta se transforme num instrumento eficaz mi salvaguarda e promoção dos direitos sociais na Europa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação para ratificação deste Protocolo contribuirá para a construção de uma Europa alargada, onde a democracia pluralista, o Estado de direito e o progresso social sejam uma realidade indestrutível e eficaz pelos mecanismos de controlo agora instituídos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social, julgo que é pacífica a ideia de que tudo o que possa contribuir para dar eficácia aos mecanismos de fiscalização e à própria concretização dos princípios da Carta Social Europeia do Conselho da Europa são bem-vindos e, nesse sentido, damos o nosso acordo a este Protocolo de Alterações.
No entanto, e nesta perspectiva da eficácia, gostaria de lhe colocar uma questão muito concreta sobre a alteração que se verifica entre a parte final do n." l do artigo 23.º e o n.º 2 do actual artigo 23.º, isto é, as Partes Contratantes deixam de estar obrigadas a fazer observações sobre os relatórios elaborados por organizações nacionais, quer patronais quer civis, enquanto, de acordo com a legislação actual, sempre que essas organizações pedissem o parecer das organizações governamentais, elas eram obrigadas a dá-lo. Julgamos que isso é negativo, embora eu já tenha referido que vamos dar o nosso acordo a este Protocolo de Alterações.
O que gostaria de saber é se há alguma razão específica ou de peso que possa ter conduzido a esta alteração e não tanto saber se isso é negativo ou positivo.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, a razão que levou a que esta alteração fosse introduzida tem a ver, fundamentalmente, com o critério de maior independência que se proeurou conferir à abordagem de todas estas matérias da aplicação da Carta nos respectivos Estados. E o sistema evoluiu não no sentido de manter um enquadramento de relação interna no que diz respeito à abordagem da não aplicação da Carta mas, sim, para um sistema, direi, transnacional, no que se refere à abordagem da aplicação dessa Carta.
Por isso, o Comité de Peritos Independentes viu reforçada a independência com que intervém na apreciação da não aplicação dessa Carta e, por sua vez, na possibilidade que tem de solicitar esclarecimentos às Partes Contratantes, e poderá obter todas as informações que forem necessárias, nomeadamente por via indirecta relativamente aos parceiros sociais, no que se refere à aplicação dessa mesma Carta.
Todo o sistema evolui a partir das informações dadas pelo Comité de Peritos Independentes aos vários órgãos - o Comité Governamental e de Ministros -, ocorrendo também uma alteração no que diz respeito à intervenção da Assembleia, que, em vez de proceder à apreciação e à votação, apenas tomará conhecimento dessas decisões e promoverá o debate público das questões relacionadas com os relatórios que sejam produzidos relativamente à não observância da própria Carta.
Por isso, no fundo, não há uma diminuição da intervenção critica das entidades não governamentais nos respectivos Estados; pelo contrário, o sistema evoluiu para tentar reforçar, em termos de mecanismo, a eficácia da

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aplicação e das observações feitas pelas Partes não governamentais, no que diz respeito à aplicação da Carta.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado João Proença para uma intervenção, queria anunciar que se encontram de visita à Assembleia da República e a assistir a esta sessão, nas galerias, alunos da Escola Preparatória de Vila Franca de Xira, da Escola Secundária de Rafael Bordalo Pinheiro, das Caldas da Rainha, e da Escola Primária n." 57, de Telheiras, aos quais endereçamos as nossas saudações.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Proença.

O Sr. João Proença (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em Abril de 1991, discutimos aqui a ratificação da Carta Social Europeia. O PS manifestou, então, o seu empenhamento nesta ratificação, de modo a garantir, a nível nacional, um não retrocesso social e a obrigação de, em progresso, desenvolver direitos sociais fundamentais.
Portugal foi o penúltimo país das Comunidades Europeias a ratificar a Carta Social Europeia-atrás de nos só o Luxemburgo. A nossa entrada (ardia no clube dos signatários deveria significar um empenhamento acrescido no seu cumprimento, o que passaria pela divulgação da Carta e pela promoção da pedagogia dos seus princípios, pela elaboração de relatórios periódicos de execução e sua discussão nesta Assembleia da República e com os parceiros sociais.
Nada foi feito até hoje! Passados 18 meses sobre a decisão de ratificação, poderemos dizer que a Carta continua a ser inexistente ern Portugal.
Do mesmo modo, o PS considerou importante a ratificação do Protocolo Adicional, adoptado em Maio de 1988, que completa a Carta Social Europeia com quatro novos direitos, entretanto, entrada em vigor, por ter sido ratificada por três Estados membros. Também aqui nada foi feito por Portugal, apesar da possibilidade de ratificação, com reserva, de algumas das disposições.
Convém, no entanto, analisar o que é, hoje, a Carta Social Europeia e qual o seu significado.
Durante muito tempo - e discordando aqui do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social -, a Carta Social Europeia leve como principal virtude o facto de existir, mas exige-se muito mais, isto é, exige-se que a Carta passe a funcionar de facto.
A funcionar, em primeiro lugar, com uma articulação estreita com os instrumentos da OIT e das Comunidades Europeias, como um ponto de referência obrigatório na construção da política social europeia.
Tal permitiria ao Conselho da Europa ser a organização de referência dos direitos do Homem em todas as suas facetas: políticas, económicas, sociais e culturais. Diria que isto seria ainda muito mais importante do que o papel que o Conselho da Europa poderá ter no desenvolvimento social dos países da Europa Oriental.
Nos últimos tempos, têm sido dados passos positivos a nível do Conselho da Europa: em primeiro lugar, a transferência da divisão da Carta Social Europeia para a direcção dos direitos do Homem e, em segundo lugar, o facto de os parceiros sociais a nível europeu terem passado a estar mais estreitamente associados aos trabalhos da Carta.
Apesar disso, certos governos pretendem transformar a Carla num modelo positivo, mas confidencial.
Saúdam-se, pois, todos os passos no sentido de tomar a Carla mais efectiva É o caso deste Protocolo de Alterações, que traz, essencialmente, um elemento de clarificação entre o papel da interpretação jurídica e o di apreciação e decisão política. Essa clarificação foi pro" posta e desejada, a nível europeu, pelos parceiros sociais e pela OIT para por fim a um jogo dúbio, em que o* governos eram, ao mesmo tempo, juízes e partes.
Por outro lado, traz igualmente elementos de divulgação da Carta e uma melhor participação dos parceira sociais.
Assim, o PS aprova esta ratificação, que vem no partido que defendemos: uma memória no funcionamento e no controlo da Carta.
Mas, em relação a esta matéria, também lançamos um desafio ao Governo, que é o da defesa de um protocolo adicional sobre os processos de reclamações colectivas, dando a uma instância imparcial e competente o poder de arbitragem. O Conselho da Europa tem já uma longa experiência com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, pelo que poderia ser esta a instância adequada.
Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Emprego e da Segurança Social, esperamos que para o Governo Português a Carta Social Europeia seja um documento vivo, eficaz e um instrumento de progresso social.
Para isso, consideramos importante que se promova, ern Portugal, a divulgação e participação, no sentido do acompanhamento daquilo que a Carta tem de vivo, daquilo que a Carta tem de defesa dos direitos sociais fundamentais.
Mas o papel do Governo Português não é só um papel interno, mas também externo. A nível do Conselho da Europa, há, também, que ter um papel positivo de participação, de desenvolvimento no progresso.
Daí a elaboração deste novo Protocolo, que já foi discutido a nível de Comité de Peritos e que tem sido reivindicado pelas parceiros sociais.
É fundamental desenvolver um processo de ratificação e pensar na ratificação, por Portugal, do Protocolo Adicional sobre os quatro direitos novos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernandes Marques.

O Sr. Fernandes Marques (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vou procurar evitar afirmações que já aqui foram feitas, nomeadamente pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto do Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, em que praticamente tudo foi dito relativamente a esta proposta de resolução que visa aprovar, para ratificação, o Protocolo de Alterações à Cada Social Europeia.
No ano passado, Portugal ratificou, finalmente, a Carta Social Europeia, e é bom que se diga que isso só aconteceu no ano passado pela mão de um governo do PSD. Em relação a este aspecto, eu próprio promovi, ern diversas ocasiões, não só ern Portugal como também no âmbito da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, diversas acções tendentes a que, de facto, isso viesse a acontecer.
Tal como já foi aqui referido, depois da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que foi o grande documento elaborado no âmbito do Conselho da Europa, a Carta Social Europeia é um dos grandes textos sobre os

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direitos económicos e sociais dos cidadãos em geral, que não só dos trabalhadores (como acontece, por exemplo, com a Carta Social Comunitária dos Trabalhadores). A Carta Social Europeia, "velha" de 30 anos, continua, ern nosso entender, a ser um texto perfeitamente actual que exige uma acrescida atenção, no sentido da sua aplicação concreta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com este Protocolo de Alterações, que, estou certo, a Câmara irá aprovar, pretende-se, como também disse o Sr. Deputado João Proença, que haja, da parte dos parceiros sociais, da sociedade em geral, uma maior capacidade de controlo da efectiva aplicação da Carta Social Europeia. Pensamos que, com o actual texto- que é um bom texto e que até esta ern vias de vir a sofrer, eventualmente, algumas alterações na sua substância -, é interessante associar cada vez mais os parceiras sociais aos mecanismos de controlo e de fiscalização da sua própria aplicação nos Estados signatários.
Por isso, o PSD apoia, sem qualquer reserva e de uma forma inequívoca, a aprovação deste protocolo, de forma que possamos contribuir, também por esta via, para que a aplicação da Carta Social Europeia seja cada vez mais efectiva, no sentido de melhorar progressivamente as condições de vida das populações europeias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É sempre honroso para qualquer país democrático ratificar documentos tais como a Carta Social Europeia. Não obstante a ratificação da Carta já ter ocorrido no ano passado, esse assunto já foi objecto de debate várias vezes nesta Assembleia.
Lembro-me que, ern 1978, a bancada do PSD, quando era presidida pelo Dr. Sérvulo Correia, fez uma magnífica exposição sobre a Carta Social, sobre o seu valor e sobre a necessidade de ser ratificada, tendo correspondido, da parte da nossa bancada, uma intervenção do Dr. Lucas Pires. Ficou, assim, proposta a necessidade de a Carta Social Europeia entrar urgentemente em vigor no nosso património jurídico. Pena foi que tivesse demorado alguns anos!
Na verdade, só no ano passado é que entrou em vigor, o que não significa de forma nenhuma, que tenha sido uma criação, um monopólio ou um exclusivo deste governo. Calhou ser este Governo a fazer essa ratificação!
Estas normas processuais que estamos aqui a debater são necessárias para a boa aplicação e para a boa interpretação da Carta Social Europeia, pelo que nada temos a opor.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de resolução n.º 14/VI.
Vamos agora dar início ao debate da proposta de resolução n.º 15/VI - aprovada para adesão, o Convénio Constitutivo da Associação Internacional de Desenvolvimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (José Braz): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A adesão de Portugal à Associação Internacional de Desenvolvimento (AID) surge, naturalmente, no quadro de uma estratégia que Portugal tem vindo a prosseguir desde o início da década de 80, no sentido de participar nas instituições financeiras multilaterais de apoio ao desenvolvimento de países económica e financeiramente mais desfavorecidos. Reforça, assim, o seu nível de intervenção nas respectivas instituições e países, apoiando também a internacionalização da classe empresarial portuguesa.
Com a aprovação dos Estatutos da Associação Internacional de Desenvolvimento, Portugal culmina não só o processo de adesão às instituições de Brelton Woods como participa, em pleno, numa das mais importantes instituições de financiamento, ern condições concessionais, de projectos e programas de apoio ao desenvolvimento, nomeadamente no continente africano.
A adesão a esta instituição, para além de concretizar um processo de intenções, formalizado já há muitos anos, pretende assegurar mercados que, de outra forma, nos seriam vedados a muito curto prazo. De facto, Portugal, por força do nível do rendimento per capita actualmente atingido, vê-se obrigado a proceder à sua graduação no Banco Mundial, passando de país beneficiário a país doador. Com este estatuto, não poderá continuar a beneficiar das oportunidades de negócio criadas pelos financiamentos da Associação Internacional de Desenvolvimento, a menos que se tome membro desta Associação, o que foi proposto.
As condições de adesão, agora negociadas com a Associação Internacional de Desenvolvimento, são-nos extremamente favoráveis, uma vez que, deste modo, foi possível conseguir que o cálculo da contribuição inicial portuguesa não reflectisse ainda os encargos, bastante mais onerosos, que decorreriam do estatuto de país doador que Portugal já assumiu.
Assim, o encargo com o ingresso de Portugal na AID atingirá o equivalente a 4,2 milhões de dólares, a realizar num período que decorre até 1994. Se compararmos este número, os 4,2 milhões de dólares, com o valor dos contratos atribuídos só nos últimos dois anos às empresas portuguesas para o financiamento de bens e serviços no âmbito de projectos e programas do Banco Mundial, designadamente em países apoiados pela Associação Internacional de Desenvolvimento, montante esse que foi superior a 18 milhões de dólares, penso poder afirmar que a adesão que o Governo se propõe agora concretizar representa um investimento com um retomo muito satisfatório. Trata-se, além disso, de uma decisão indispensável para assegurar mercados que, paulatinamente, têm vindo a ser conquistados pelas empresas portuguesas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de resolução n.º 15/VI, que aprova, para adesão, o Convénio Constitutivo da Associação Internacional de Desenvolvimento e que, por despacho de 6 de Outubro de 1992 de S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República, bai-

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xou à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação para apreciação.
Criada em 1960 e sendo filial do Banco Internacional de Reconstrução e de Desenvolvimento, a Associação Internacional de Desenvolvimento tem como finalidade a concessão de empréstimos em condições particularmente favoráveis, com vista ao financiamento de acções de desenvolvimento económico e social nos países mais pobres do mundo, envolvendo a participação, por um lado, de países mais desenvolvidos, na qualidade de fornecedores de recursos financeiros, e, por outro, de países menos desenvolvidos, como beneficiários de créditos concessionais.
A Associação Internacional de Desenvolvimento é uma importante instituição de desenvolvimento, na qual Portugal decidiu participar como país doador, uma vez que, desse modo, poderá ter uma função mais activa na ajuda internacional ao desenvolvimento.
Por forma a viabilizar o processo de adesão à AID, que deverá ocorrer até 31 de Dezembro de 1992, torna-se necessário publicar um decreto-lei que permita ao Estado Português participar nos fundos daquela instituição, conforme o que foi aprovado pela resolução do Conselho de Governadores de 15 de Agosto de 1992.
Os montantes previstos para a subscrição portuguesa nessa Associação Internacional de Desenvolvimento atingem o valor de 4 195 304 dólares americanos, repartidos em duas parcelas: a primeira, a contribuição inicial, é no valor de 3 643 177 e a segunda, a contribuição adicional, é de 552 127 dólares americanos, correspondente a uma subscrição nas anteriores reconstituições da AID-3 e AID-9 e na proporção das contribuições dos países beneficiários.
Por outro lado, a forma de pagamento desta subscrição será, em numerário, o montante correspondente a 10 % da subscrição inicial e os restantes 90 % realizar-se-ão mediante a emissão de títulos de obrigação, que assumirão a forma de promissórias. Esta última liquidação será repartida por três anos, a partir de 1992.
Com efeito, foram elaborados os estatutos que regem os princípios da Associação Internacional de Desenvolvimento.
Segundo o artigo 1.º desses estatutos, são objectivos da AID: promover o desenvolvimento económico e aumentar a produtividade, melhorando desta forma o nível de vida das regiões menos desenvolvidas do inundo, cujos países sejam membros da Associação e, em particular, prestando-lhes auxílio financeiro, de modo a satisfazerem as suas necessidades básicas de desenvolvimento, em termos mais flexíveis e com reflexas menos gravosos na balança de pagamentos do que os originados por empréstimos convencionais, favorecendo desse modo a prossecução dos objectivos de desenvolvimento do Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento e completando as suas actividades. Em todas as suas decisões, a AID será orientada pelo disposto no presente artigo.
A Comissão, numa análise cuidada dos estatutos, realça em particular o artigo V, secções 1 e 6, bem como o artigo vi, secções 7, 9, 10 e 11, e os artigos VI e VII. Analisada a proposta de resolução a Comissão reconheceu o alto significado da AID e deliberou que o diploma se encontra ern condições de ser discutido em Plenário, pelo que aprovou o presente relatório.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Penso que, como nota final, é de realçar a importância de Portugal aderir a uma instituição desta envergadura.
Portugal tem sido um país que, nos últimos anos, se tem preocupado com o diálogo Norte-Sul; Portugal tem sido um país que, nas instâncias internacionais, tem defendido, cada vez mais, um maior equilíbrio da distribuição da riqueza, pugnando, de forma firme e bem acentuada, por os que se encontram em melhores condições, obviamente, contribuírem para a ajuda de outros povos que, infelizmente, não têm o mesmo grau de desenvolvimento e de bem-estar, nomeadamente os de África e da América Latina. Tem sido uma vocação deste governo, do Primeiro-Ministro português, e, a meu ver, é importante e interessante realçá-la aqui e em qualquer outra instância Não é Portugal, o Governo ou a Assembleia da República que ganha com atitudes desta envergadura nem, obviamente, com adesões a instituições desta dinâmica. Em minha opinião é Portugal, os Portugueses, a Nação, que efectivamente reconhece que, em tão pouco tempo, passámos da situação de beneficiados para a de contribuintes líquidos, ajudando outros povos que não tom, ou que não tiveram até este momento, a mesma oportunidade de desenvolvimento e de sucesso.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como nota de registo, que reafirma tudo aquilo que acabo de dizer, direi que há precisamente uma década, em 1982, Portugal "recebia" instruções do Fundo Monetário Internacional. Uma década volvida, Portugal é um líquido doador para contribuir para o progresso e bem--estar de outros povos do mundo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou ler o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano porque todas o temos presente, mas, embora estejamos de acordo com a grande maioria das disposições contempladas na proposta de resolução, algumas dúvidas se nos levantam.
Dir-se-ia que Portugal, que normalmente entrava nos organismos internacionais para ir buscar dinheiro, pela primeira vez entra para dar algum dinheiro.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Se quer receber, tem que dar!

O Orador: - Não obstante, em termos de responsabilidade, Portugal ter que dar apenas 10 % do montante, que lhe foi fixado pelo Conselho de Governadores, que é, se a memória não me atraiçoa, a instância que fixa os valores a subscrever para efeito de admissão, e esse montante ser insignificante, não resisto a deixar uma pergunta no ar: tendo Portugal actos, relações e um sentimento profundo para com os países de África, e uma vez que há um encargo, de facto, com esta admissão, por que é que, em vez da adesão a esta Associação, não se fez, neste domínio, a opção de intensificar e desenvolver mais a cooperação com África?
Há uma outra questão que me parece não estar suficientemente cuidada e que pode, essa sim, ter alguns engulhos no que concerne h adesão de Portugal a esta Associação. Repare-se na redacção da secção 4 do arti-

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go VIII, em que se refere que os bens da Associação são impenhoráveis em quaisquer circunstâncias. Entendo que esta redacção, tal como está feita, é uma limitação, dado que os estatutos da Associação postulam que estes bens não são passíveis de quaisquer acções que diminuam o direito que a Associação tem sobre eles, seja por acto do poder executivo ou do poder legislativo, ou seja, da própria Assembleia da República.
Assim, admitindo a possibilidade de haver, em Portugal, na titularidade da Associação um prédio e que esta não assume os seus compromissos com os seus credores, e dado não poder ser penhorado este bem, não há um tratamento discricionário em relação a estes bens, quando comparados com os dos nacionais? Ou seja, estes prédios, nos termos dos estatutos, não constituem garantia real em relação aos seus credores.
Para além do mais, penso que este artigo é limitativo da soberania dos próprios Estados, no que concerne à sua acção legislativa.
Uma outra questão é a dos rendimentos auferidos em qualquer Estado membro pela Associação, que são isentas de quaisquer impostos, obrigações ou direitos e que se encontra contemplada na secção 10 do artigo VIII. Todavia, o nosso sistema fiscal, nomeadamente o Estatuto dos Benefícios Fiscais, não contempla estas situações e, por isso, gostaria de saber como é que vamos adequar esta obrigatoriedade constante dos estatutos - e estamos obrigados a fazê-lo, pois, ao aderirmos, subscrevemos os estatutos - com o nosso sistema actual. Ou seja, a adesão de Portugal pressupõe também uma alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais, no sentido de passar a incluir as disposições constantes da secção 10 do artigo VIII da Associação.
São estas dúvidas que se nos levantaram em relação à proposta de resolução.
Quanto ao resto, entendemos que ela está bem elaborada os estatutos são conformes ao nosso sistema legal -, mas gostaríamos de ouvir o Sr. Secretário de Estado quanto às questões que levantei.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Adriano Moreira.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Começa por ser esclarecedor o entendimento que o Governo tem de desenvolvimento ao mandar para esta discussão o Secretario de Estado do Tesouro.
Portugal vai agora aderir à Associação Internacional de Desenvolvimento. Sem querer chegar ninguém, diria que é preciso descaramento. O sistema mundial de apoio aos países em vias de desenvolvimento, o BIRD, a AID, o FMI, está ultrapassado e condenado, na opinião dos povos.
Em vez de estarmos aqui a discutir a adesão à AID, bem melhor seria que estivéssemos a discutir e a tentar contribuir para alternativas sérias. De facto, com as ajudas para o desenvolvimento, o fosso entre os mesmos ricos e pobres duplicou nos últimos 30 anos. Isto porque, com todos os investimentos e ajudas, os países pobres - pasme-se! contribuíram, entre 1983 e 1990, com uma renda anual de 21 000 milhões de dólares para o desenvolvimento dos países ricos. Agora, Portugal passará também a beneficiar deste contributo dos países que estão a morrer à fome, porque passou a ser doador. A dívida dos países em desenvolvimento, nos últimos 20 anos, multiplicou por 13 atingindo actualmente 1,3 biliões de dólares.
Esta situação, entre outras perversidades, provoca a fuga alucinante e trágica de quadros. Os Estados Unidos e o Canadá receberam mais de um milhão de especialistas e técnicos provenientes dos países em desenvolvimento que único precisam deles. Num único ano, saíram do Sudão um quinto dos professores universitários, 17 % dos dentistas, mais de um quarto dos engenheiros, ele.
Estas as consequências das ajudas que provocam o holocausto brutal a que assistimos paulatinamente em nossas casas, enquanto palitamos os dentes.
O BIRD e a AID apoiam, sem grande disfarce, os negócios das grandes potências, reproduzindo aceleradamente relações de dependência, o desastre económico e a fome. Eles servem a exportação de capitais sanguessugas. Criam--se pólos de crescimento avançadíssimos, que desarticulam as economias tradicionais e as relações sociais de forma trágica, não dando resposta, marginalizando brutal e totalmente as grandes massas sofredoras e esfomeadas.
No Brasil, cerca de 80 % da população está fora dos circuitos normais do mercado. Massas enormes avançam lentamente para a morte, sem sequer terem tido a hipótese de protestar. Quem não evoca Treblinka ou Auschwitz ou Pol Pot, mais recentemente, quando vê a morte senhora absoluta na Somália ou na Etiópia!?
Sem SS nem milícias, à distância, o mercado dos ricos cumpre orientações malthusianas.
E nem a afirmação de independência política da AID é verdadeira; pelo contrário, é uma mentira repugnante. Lembremo-nos da recusa do BIRD ao Chile de Allende, preparando o caminho ao carrasco Pinochet.
Quem alinhar nesta farsa monstruosa, que é a AID, assume uma cumplicidade explícita com o holocausto moderno. Terá que assumir essa responsabilidade.
A solidariedade para com essas vítimas indefesas, para com os pobres que pagam aos ricos tem de passar pela criação de um sistema de relações iguais, solidárias, em que os países sejam tratados de forma igual e como entidades soberanas, o que não acontece nesta Associação. Só elas podem enquadrar as vontades de ajuda real aos povos em desenvolvimento.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Tesouro: Considero que é totalmente errado encarar a AID nos moldes em que fez o Sr. Secretário de Estado do Tesouro. O Sr. Secretário de Estado, contrastando, aliás, fortemente com a visão optimista do Sr. Deputado Luís Geraldes, veio aqui dizer-nos que a intenção do Governo de apresentar à Assembleia, para ratificação, e aprovar, esta proposta de adesão ao Convénio que criou a AID não tem a ver com o Diálogo Norte-Sul, nem com facto de o Governo ter decidido participar como país doador, mas, isso sim, tem em vista a obtenção de lucros. Ora, esta é uma visão completamente economicista, negocista, que está completamente fora do texto, da letra e dos objectivos do Convénio.
O artigo I, que aliás o Sr. Deputado Luís Geraldes fez o favor de ler, tem objectivos que nos parecem de aço-

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lher, pois têm em vista auxiliar os povos mais sacrificados, os países, menos desenvolvidos e subdesenvolvidos a promoverem o seu desenvolvimento. Porém, sabemos que a prática tem sido bastante diferente!...
Mas o Sr. Secretário de Estado foi muito mais longe: penso que nos apresentou aqui, ao fim e ao cabo, aquilo que é o objectivo da FCI, que é o terceiro ramo do Banco Mundial, e que tem em vista o investimento privado, que, por sua vez, se destina ao lucro. E aí tudo bem! Agora, o objectivo da AID, em princípio, é o de promover o auxílio financeiro, em condições extremamente favoráveis, para o desenvolvimento dos países menos desenvolvidos.
Dizer que Portugal vai aderir à AID porque já está a ter resultados positivos com isso, uma vez que há empresas que já foram beneficiadas com estudos e outras que já obtiveram contratos com base em empréstimos concedidos pela AID, penso que é declaradamente a pior forma de se analisar esta questão.
Disse há pouco que a prática da AID, como a do Banco Mundial, é bastante diferente daquela para que apontam os seus princípios estatutários. Pensamos que é precisamente na alteração dessa prática que se deve actuar, pois a AID deve servir para que os países mais ricos, muitos dos quais enriqueceram à custa da exploração dos países que agora são os mais pobres, disponibilizarem recursos financeiros em condições não condicionadas, nem do ponto de vista económico, nem do ponto de vista comercial, nem do ponto de vista político, para que esses países possam construir o seu futuro, desenvolver as suas economias, industrializar-se e não estejam obrigados a ser meros fornecedores de matéria-prima e compradores de produtos transformados. Pensamos que é aí que o Governo Português deve actuar no sentido da alteração da prática da AID e não, contrariamente àquilo que foi dito pelo Sr. Secretário de Estado, transformar a AID numa outra FCI, numa mera associação que procura explorar, o máximo possível, os povos menos desenvolvidos, os povos mais carenciados deste mundo. A intenção do Sr. Secretário de Estado, aqui exposta há pouco, não deverá ser a de explorar os famintos e os deserdados, mas no sentido completamente inverso.
Do nosso ponto de vista, deve ser encarada por Portugal a participação na AID, mas, se não for essa a visão, então o melhor é não aderir, o melhor é acabar com a AID.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostava de referir-me, em primeiro lugar, à intervenção do Sr. Deputado Domingues Azevedo e creio que, embora com um teor um pouco diferente, a mesma resposta também pode abarcar pontos levantados pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
A primeira parte da pergunta colocada pelo Sr. Deputado Domingues Azevedo foi a de saber por que é que não se faz mais, deixando no ar a ideia de que, se contribuíssemos com uma soma superior a 4,2 milhões de dólares, teríamos mais vantagens ou maior poder de decisão. Ora, na realidade, não é assim que as coisas se passam! Com a nossa adesão, somos membros de pleno direito, à semelhança do que sucederia se a nossa contribuição não fosse tão elevada.
Porém, a importância da cooperação, questão também levantada e salientada na última intervenção, é plenamente reconhecida pelo Governo e, na pratica, traduz-se em várias acções e programas que já foram ou que estão a ser levados a cabo. Por exemplo, com o facto de se ter dado andamento ao Fundo para a Cooperação Económica com um valor que atingiu, em 1992, os 4 milhões de contos; pôde considerar-se um grande número de projectos e, inclusivamente, aprová-los em cada um dos cinco países africanos luso tonos. Este é um exemplo da importância dada à cooperação.
Outros exemplos dizem respeito à reorientação dos estatutos e da actuação do Banco de Fomento e Exterior e do IPE (Investimentos e Participações do Estado), ainda ao Programa de Apoio à Internacionalização das Empresas Portuguesas (PAIEP) conduzido pelo ICEP (Instituto do Comércio Externo de Portugal) e mesmo à constituição dos FRIE, que são fundos de apoio à reestruturação e internacionalização das empresas, nomeadamente, no seu vector de actuação nos países em desenvolvimento.
Por essa razão, não estamos aqui a considerar uma proposta de alteração dos Estatutos da Associação Internacional de Desenvolvimento e é bom que não se confundam os estatutos da AID e do FCI, porque, embora sejam duas instituições do mesmo grupo do Banco Mundial, têm objectivos e actuações muito diferentes e, claro, o facto de participarmos em ambas não implica que se confundam os objectivos de cada uma.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Mário Tomé, que fez o favor de focalizar com grande pormenor o desespero existente em grande parte do mundo em desenvolvimento, tenho apenas um comentário a fazer: é cada vez mais aceite, excepto por aqueles que o não querem ver, que o principal factor responsável pelo desespero destes países, pela degradação das respectivas economias e condições humanas não é a intervenção de instituições internacionais mas, sim, a adopção de políticas económicas centralizadoras, que não só não têm funcionado nos países em desenvolvimento, onde se tentaram implementar à força, como também nos países de onde essas teorias são oriundas.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Secretário de Estado, vai desculpar-me, mas penso que atribuir as culpas sempre ao mesmo facto não serve. Senão, diga-me: como é que, com essa teoria, é possível explicar aquilo que eu há pouco disse relativamente ao financiamento dos países que estão a morrer à fome aos que vivem luxuosamente? Como é que, com essa teoria, o Sr. Secretário de Estado explica esta realidade?

O Orador: - Sr. Deputado, as cifras do financiamento apontadas, e que já foram referidas anteriormente, dos países na miséria em direcção aos países desenvolvidos, referem-se normalmente ao repagamento de dívidas por países que estão em condições de pagar, por exemplo, pela Argentina. Trata-se do refluxo normal e ainda bem, que esses países estão em condições de o fazer, porque como os Srs. Deputados muito bem sabem, a maior par-

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lê dos países em condições miseráveis não está a fazer repagamentos. Por essa razão, não pode dizer-se que é pelo facto de serem forçados a fazer repagamentos às instituições que estuo na miséria.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Não tom dinheiro!

O Orador: - Não tem dinheiro e porquê? Pela aplicação de políticas desastrosas e todos nós sabemos qual é a «na origem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Não pense nisso, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma curta intervenção.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, vou lazer uma intervenção, porque, de facto, não existe outra figura regimental para poder interpelar novamente o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, dado que ele já tinha feito uma intervenção e respondeu agora àquelas que, posteriormente, foram efectuadas.
Sr. Secretário de Estado do Tesouro, V. Ex.ª não entendeu nada daquilo que eu disse. Nada! Eu não referi que Portugal deveria aumentar a sua subscrição, mas, se Portugal tem dinheiro para entrar numa associação de desenvolvimento, por que é que não aumenta também as verbas de cooperação com os PALÜP? Por que é que não aumentamos, então, as verbas destinadas à cooperação com África?
Eu não disse aquilo que o Sr. Secretário de Estado mencionou, que Portugal, por efeito de aumentar a sua subscrição, ia ter mais poder decisório na Associação. E o Sr. Secretário de Estado não me respondeu às questões que lhe coloquei! Como é que vai funcionar, por exemplo, um escritório que a AID abra em Lisboa? Como é que vai integrar os estatutos da actual AID no nosso sistema fiscal, uma vez que esta isenção não está prevista no estatuto dos Benefícios Fiscais?
Admita que, daqui a um ano, o que é possível nos termos da secção 8 do artigo vi, cuja epígrafe é «Local dos escritórios» e que diz: «A sede da Associação será a sede do Banco. A Associação pode abrir outros escritórios nos territórios de qualquer membro», é aberto um escritório ao território de um qualquer país membro. Não há aqui nenhuma medida de salvaguarda que proporcione aos Estados membros, antes da instalação destes escritórios, a possibilidade de darem a sua anuência, o seu agrémente ao mínimo, de adaptarem as suas legislações.
Foram estas as questões concretas que lhe coloquei, e não nada daquilo que V. Ex.ª respondeu! Aliás, vou ler-lhe o que consta da secção 10 do artigo VIII dos Estatutos, que tem como epígrafe «Aplicação do presente artigo»: «Cada membro deverá adoptar, nos seus próprios territórios, todas as medidas necessárias para introduzir na sua própria legislação os princípios prescritos neste artigo e informará a Associação, em pormenor, das medidas que tiver adoptado.» Como é que isto vai funcionar, Sr. Secretário de Estado? De facto, continuo a não ter resposta para a esta minha questão.
Finalmente, o Sr. Secretário de Estado ainda não respondeu à questão da impossibilidade de qualquer país membro fazer diminuir - mesmo que seja em termos de garantia real da assunção de compromissos assumidos pela Associação -, de qualquer forma, os bens activos da Associação. Diga-me, pois, se este facto - que tem de ser introduzido, por força da secção 10 do artigo VIII, na legislação do Estado membro - não se traduz num tratamento discricionário em relação aos restantes bens reais dos cidadãos portugueses.

O Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Entalo do Tesouro: - Sr. Deputado, percebi muito bem as perguntas que colocou e respondi-lhe. Lamento, porém, que as respostas não tenham sido suficientes para o esclarecer.
Quanto à utilização ou importância da cooperação, há acções que estão em curso para aumentar o apoio português na área da cooperação, matéria em que já dei os pormenores.
Decidi não responder a uma pergunta específica, que levantou novamente, referente às isenções fiscais necessárias para a abertura de um escritório da AID em Portugal. E não respondi porque a questão, realmente, é irrelevante. Assim, quando se diz nos estatutos que é necessário estabelecer as condições para a abertura de escritórios, trata-se, obviamente, de escritórios da AID nos países onde os apoios da AID se vão direccionar. É claro que nunca está em causa a abertura de um escritório num país doador.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - O Sr. Secretário de Estado permite-me que o interrompa?

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Faça favor. Sr. Deputado.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Desafio o Sr. Secretário de Estado a indicar-me onde é que está consagrado o que acabou de dizer, isto é, que a Associação só pode abrir escritórios nos países beneficiários e não nos países doadores. Onde é que isso está consagrado nos estatutos?
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - É óbvio que os estatutos não chegam a esse pormenor. Porém, pela forma de operação da Associação, pela implementação dos programas do Banco Mundial, qualquer pessoa que conheça minimamente a forma como funciona a instituição saberá que é esse o caso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate da proposta de resolução n.º 15/VI.
A próxima reunião plenária realiza-se na terça-feira, dia 3 de Novembro, pelas IS horas, e, então, proceder-se-á à votação das propostas de resolução que boje estiveram em debate.

Está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 5 minutos.

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214 I SÉRIE - NÚMERO 5

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adriano da Silva Pinto
Anabela Honório Matias
António José Caeiro da Moita Veiga
António Maria Pereira
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Alberto Lopes Pereira
Carlos de Almeida Figueiredo
Fernando Monteiro do Amaral
João Alberto Granja dos Santos Silva
José Angelo Ferreira Correia
José Júlio Carvalho Ribeiro
José Mário de Lemos Damião
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida
Manuel Albino Casimiro de Almeida
Manuel da Costa Andrade
Maria Luísa Lourenço Ferreira
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete
Virgílio de Oliveira Carneiro

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa
Ana Maria Dias Bettencourt
António Luís Santas da Costa
António Poppe Lopes Cardoso
Armando António Martins Vara
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa
José Barbosa Mota
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Santos de Magalhães
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Manuel Alegre de Melo Duarte
Raul Fernando Sousela da Costa Brito
Rogério da Conceição Serafim Martins
Vítor Manuel Caio Roque

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues
Carlos Alberto dó Vale Gomes Carvalhas
Maria Odete dos Santos

Centro Democrático Social (CDS):

Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

André Valente Martins

DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

DIÁRIO da Assembleia da República

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