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Sexta-feira, 20 da Novembro do 1992 I Série - Número 16

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE NOVEMBRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 55 minutos.
Prosseguiu a apreciação, na generalidade, das propostas de lei n.º 36/VI - Grandes Opções do Plano para 1993 e 37/VI - Orçamento do Estado para 1993, tendo munindo, a diverso título, além dos Srs. Ministros da Justiça (Laborinho Lúcio), da Educação (Couto dos Santos) e da Agricultura (Arlindo Cunha), os Srs. Deputados José Vera Jardim (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Ferraz de Abreu e Laurentino Dias (PS), Rui Carp (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Manuel dos Santos e Ferro Rodrigues (PS), Norma Coissoró (CDS), Helena Tones Marques e Guilherme Oliveira Martins (PS), Carlos Coelho (PSD), Mano Tomé (Indep.), Adriano Moreira (CDS), Fernando de Sousa (PS), Jerónimo de Sousa (PCP), Ângelo Correia (PSD), André Martins (Os Verdes), Mário Maciel (PSD), Manuel Sérgio (PSN), Ana Maria Bettencourt (PS), João Corregedor da Fonseca (Indep.), António Filipe (PCP), Pedro Passos Coelho (PSD), Luís Capoulas Santos (PS), Rui Carp (PSD) e Nogueira de Brito (CDS).
A Câmara concedeu ainda autorização a cinco Deputados para deporem em tribunal e denegou-a a outros íris.

O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 55 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata Silva.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregaria Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António Poppe Lopes Cardoso.

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António Ribeiro Marques da Silva.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José António Martins Goulart
José Apolinário Nunes Portada.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rego.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Laura António Marques de Carvalho.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
João Carlos da Silva Pinho.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha

Deputados independentes:

Mário António Baptista Tomé.

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a nossa ordem de trabalhos de hoje é a continuação do debate, na generalidade, das propostas de lei n.º 36/VI - Grandes Opções do Plano para 1993 e 31/VI - Orçamento do Estado para 1993.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Laborinho Lúcio): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate simultâneo sobre as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado vem estabelecer necessariamente, entre este e aquelas, uma relação de verdade, valendo as primeiras não apenas pelo bem fundamentado da intenção que as determina mas também pelo grau de credibilidade que apenas o Orçamento do Estado lhes pode conferir.
Por outro lado, são ainda requisitos de verdade os que apelam, no mesmo debate, a um busquejo crítico sobre um passado que se encerra e ao anúncio de um futuro que tenha por conteúdo as próprias Grandes Opções e, por enquadramento de compromisso, a previsão orçamental.
Assim é hoje e assim foi há um ano quando, no início de uma nova legislatura, aqui trouxemos da justiça um diagnóstico, um projecto que o Programa do Governo recebeu e esta Câmara votou e um calendário que, gradualizando as medidas, servia, ao mesmo tempo, como documento de compromisso, do qual importa prestar contas, por intermédio de V. Ex.ª, ao País e aos Portugueses.
Destacámos, então, como deficiências mais sensíveis, que, todavia, vinham já denotando alguns sintomas de recuperação, a lentidão da justiça, a dificuldade de acesso ao direito e a exiguidade de condições de trabalho em alguns departamentos. Como atitude, assumimos a complexidade da tarefa, propusemo-nos um caminho necessariamente longo e definimos uma política, da qual destacámos, como ideia fundamental, a afirmação do cidadão enquanto elemento primeiro do sistema e em cuja concretização adiantámos, para o ano de 1992, a actividade legislativa como primeira prioridade.
E se o discurso foi importante para dar sentido à acção, esta constitui já hoje a prova material que dá crédito ao próprio discurso. A um caminho longo que importa ainda percorrer, antecede agora um trajecto, não menos longo, já percorrido. A recuperação global do sector da justiça deixou, assim, a sua vocação permanente de longo termo para se antever, agora, no quadro temporal do médio prazo, sendo certo que as muitas medidas entretanto adoptadas lhe conferem já uma outra face e despertam em todos um efectivo sentimento de mudança.
Da afirmação do cidadão como figura proeminente do sistema, retiraram-se, como fundamentais, o direito de aceder à justiça, o direito à sua informação e o direito a participar na sua administração. E, uma vez afirmados os direitos, aí estão, ora concretizadas ora em desenvolvimento, as medidas que lhes dão execução.
No domínio do acesso crescem os gabinetes de consulta jurídica gratuita. Ontem 2, boje 6, 10 nos próximos meses,

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num projecto agora credível de cobertura integral do território. Melhorou-se o estatuto do defensor oficioso, actualizaram-se as tabelas de honorários no apoio judiciário e multiplicaram-se mais do que duplicando os casos de patrocínio judiciário.
Ainda aqui prepara o Governo, fazendo-a coincidir cora a reforma em curso do Processo Civil, a revisão do Código das Custas Judiciais, sendo certo que, independentemente de uma vasta reapreciação dos custos da justiça, importa desmistificar o tema, distinguindo os vários encargos e informando, com transparência, o cidadão a tal propósito.
No plano informativo, depois de testado, projectou-se o «Programa Cidadão e Justiça», que constitui já um espaço ímpar de atendimento e de acompanhamento conhecido e procurado por milhares de portugueses, preparando agora o Governo a sua institucionalização, tendo dado já início a um importante processo de descentralização.
Por sua vez, materializando o direito de participação também como forma substancial de aprofundamento da própria democracia, deu-se início a medidas sérias de desjudicialização, de que são exemplo inovador as comissões de protecção de menores, com 19 já instaladas e mais 20 em processo de instalação, e o apoio à arbitragem voluntária, particularmente no que se refere aos conflitos de consumo.
No plano legislativo, que tem dominado grande parte das preocupações do Governo no ano ainda em curso, não pode deixar de destacar-se, a par de um conjunto de diplomas consubstanciando alterações pontuais mas de importância indesmentível, a revisão da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, propiciando, para 1993, a adopção de um vasto conjunto de medidas indispensáveis à melhoria do sistema; a revisão da Lei da Adopção, como instrumento fundamental de defesa dos direitos da criança; a aprovação da nova Lei do Combate à Droga, como diploma angular do sistema legislativo português; a conclusão do novo Código de Falências e de Recuperação de Empresas, ele próprio, peça essencial para o equilíbrio do tecido económico nacional.
Outros diplomas de fundo se encontram, entretanto, em fase final de elaboração, entre todos se destacando o Estatuto dos Magistrados, o Estatuto da Ordem dos Advogados, a Lei Orgânica das Secretarias Judiciais, o Estatuto dos Revisores Oficiais de Contas, o diploma de Apoio à Vítima de Crimes Graves, o Código de Processo Penal e o Código Penal. Entretanto, durante o próximo ano, proceder-se-á à revisão das leis do contencioso administrativo e de organização dos tribunais administrativos e fiscais, promovendo-se o debate público relativo à revisão do Código de Processo Civil.
Finalmente, neste domínio, e na esteira da prioridade do Governo quanto ao combate à criminalidade, em breve se submeterá à Assembleia da República legislação sobre corrupção e branqueamento de capitais,

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Desta forma se abarcam inúmeras áreas e se tutelam, de modo mais correcto, os interesses diversificados do cidadão, seja no plano cultural seja nos domínios social e económico, perante cujas exigências o direito haverá hoje de responder, não apenas como garante da indispensável segurança jurídica mas também em nome da eficácia, elevada esta à categoria de valor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Modernizar a justiça constitui objectivo tão indispensável quanto complexo e moroso, onde convergem a melhoria de instalações, o recurso a novas tecnologias e exigências óbvias de desburocratização, etc.
Também aí a crítica sempre legítima sobre o que falta fazer não pode dispensar, como pressuposto de seriedade, o reconhecimento do muito que já foi realizado.
Um parque judiciário degradado conhece hoje um ritmo de recuperação assinalável, com 29 tribunais inaugurados nos últimos anos, número este que ascenderá a 32 até ao fim do corrente. Durante 1993 concluir-se-ão mais 15, prosseguirá a construção de mais 32 e desenvolver-se-ão ou arrancarão os projectos relativos a outros 21, entre os quais se destaca a nova cidade judiciária de Monsanto, em Lisboa.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador; - É agora a passagem para os grandes centros urbanos, avançada que está a recuperação das comarcas de menor porte mas cujos cidadãos tem igual direito a uma justiça digna e de qualidade.
Nesta linha, enunciarei apenas como exemplos, em 1993, o início da construção dos Palácios da Justiça de São João da Madeira, Braga, Fundão, Moita, Seixal, Matosinhos, Vila Nova de Gaia, Seia, Loulé, Portimão, Vila Real de Santo António e Cantanhede, entre outros, e a continuação do projecto para a construção dos novos palácios de Ponte de Lima, Barreiro, Cascais, Loures e Coimbra, também entre vários outros.
Concluir-se-ão, entretanto, no mesmo ano, os de Setúbal, Oeiras e Funchal, como os de maior porte em fase final de construção.
Idêntico esforço, entretanto, vem sendo desenvolvido no domínio dos registos e notariado - com 63 novas instalações desde 1990 e com outras 41 projectadas para conclusão no próximo ano e no sector dos serviços prisionais, onde as carências são de todos conhecidas.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Concluir-se-ão, porém, em 1993, o novo estabelecimento prisional do Funchal e o novo pavilhão de Santa Cruz do Bispo; dar-se-á início ao Estabelecimento Prisional do Algarve e concluir-se-á o projecto para instalação da Aldeia Prisional de Sintra e da Comunidade Prisional Jovem de Viseu, do mesmo modo que, com a projectada construção, em 1993, de 15 novos pavilhões para regime aberto, se aumentará, num ano, a capacidade de lotação do sistema em cerca de 1000 lugares.
As novas tecnologias, desde a informática às telecomunicações, conheceram, entretanto, um incremento importante, havendo apenas agora que prosseguir, como se prevê, um trajecto em boa hora iniciado.
Instalado que foi o sistema de gravação audio, prepara o Governo os adequados diplomas legislativos que conformem a sua aplicação, pelo que a gravação e controlo da prova e o controlo da legalidade da audiência por aquela via não podem constituir já hoje reivindicação para o futuro à distância, antes se inscrevendo no número vasto das acções fundamentais em curso, embora de implantação gradual e faseada.
Por último, no plano da desburocratização, sem esconder o peso do desafio que ainda se ergue diante de nós, os passos já dados não são de desprezar, seja no que respeita ao conjunto de alterações legislativas introduzidas seja no que se refere à racionalização de serviços e de circuitos,

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de tudo resultando, a título meramente exemplificativo, os ganhos já sensíveis no que contende com os actos de registo e de notariado, com particular realce para o registo das sociedades comerciais, com a emissão do bilhete de identidade, com a recuperação da eficácia da Polícia Judiciária e com a lentidão da resposta dos tribunais, já bem mais atenuada e num processo sedimentado de recuperação.
E se muito há a fazer ainda, também aqui o caminho está encetado e parte do trajecto percorrido.
Surge, assim, o ano de 1993 sob o signo do desenvolvimento e da consolidação das medidas anteriores e voltado para a instalação dos novos instrumentos que a reforma legislativa de 1992 vem agora determinar.
Em primeiro lugar, na sequência da revisão da Lei Orgânica dos Tribunais, instalar-se-ão serviços de turno para questões urgentes em matéria penal e de menores, lançar-se-ão os primeiros tribunais auxiliares em zonas de maior acumulação e dar-se-á inicio ao funcionamento de tribunais de pequena instância e de comarcas em regime de agregação.
Simultaneamente, enriquecer-se-á a formação profissional do funcionário judicial, instalando-se, definitivamente, em Setúbal, no 1.º trimestre do próximo ano, o Centro de Formação Permanente dos Oficiais de Justiça, instrumento indispensável para a garantia da qualidade que definimos como meta.
No plano da segurança dos cidadãos e da qualidade e eficácia da Polícia Judiciária, reforçar-se-á o combate à criminalidade, como prosseguimento da particular incidência nos domínios da droga, da corrupção, das infracções antieconómicas e, em coordenação com a reforma das forcas de segurança, da pequena e média criminalidade urbana.
O sistema prisional conhecerá atenção especial, tanto no reforço de meios humanos como em matéria de instalações e de reorganização interna, sendo aqui de destacar a abertura à privatização de várias das suas componentes, como sejam as das oficinas e do trabalho prisional, da alimentação e, parcialmente, de saúde.
Idêntica solução, entretanto, se antevê para a área de intervenção da Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, em intima ligação com o Instituto de Reinserção Social.
Finalmente, nos domínios do registo e notariado passar-se-á de uma fase, que se teve por indispensável, de melhoria global do sistema para uma nova era de reforma de fundo, da qual se não exclui a própria revisão do estatuto do notariado, que, todavia, não deverá ocorrer sem um prévio e alargado debate, interessando mesmo, ainda que informalmente, a Assembleia da República.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não pretende o Governo, como nunca pretendeu, criar a ilusão da qualidade onde ainda persistem graves problemas e bloqueios que, tantas vezes, a contradizem. Temos disso consciência e disso assumimos, com frontalidade, a responsabilidade que é nossa. Entendemos, todavia, que num processo sem inocentes de nada serve fingir o monopólio da culpa, antes valendo partilhar o esforço que vença as causas e que supere as dificuldades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso que o Governo conte com a solidariedade, crítica se for caso disso, dos vários intervenientes no sistema, com particular realce para magistrados e advogados.
Deles depende, em muito, o êxito das mudanças, neles repousando muito a imagem da justiça portuguesa.
Ao Governo, e particularmente ao Ministro da Justiça, cabe dignificá-lo, reconhecendo e garantindo a sua independência como trave-mestra do Estado de direito democrático. Em contrapartida, deles se espera sempre, no exercício das suas funções, um alto sentido de Estado, isenção, exigência profissional e humana e assunção das responsabilidades que lhes são próprias.
Também aqui, e uma vez mais, é o cidadão a constituir o traço de união entre as diversas funções e os diferentes poderes que nos cabe exercer, sendo seu o direito em que se estrutura o nosso dever comum de solidariedade.
Num país e num sistema que reconhece ao poder judicial e aos tribunais um estatuto de independência que não encontra paralelo em qualquer outro, deve esta ser assumida com a humildade de um dever de Estado e não como mera afirmação de poder. Independência para o exercício isento da função jurisdicional e como garantia da divisão de poderes enquanto base do Estado de direito. Valor, por isso, radicado no povo enquanto detentor da soberania e confirmado num conjunto de deveres funcionais e políticos, entre os quais se destaca, em reciprocidade, o respeito pela autonomia própria dos restantes órgãos de soberania, nomeadamente no que se refere ao exercício do poder legislativo.
Independência, assim, indiscutível enquanto valor, mas exigente enquanto função ao serviço do povo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Justiça para o ano de 1993 conhece um crescimento que se pauta por duas referências essenciais à sua compreensão. Por um lado, feita excepção no contexto geral do Orçamento do Estado, por ele se afirma a consciência política da importância a reconhecer hoje à justiça e ao significado da sua qualidade no quadro de uma democracia moderna e eticamente entendida. Por outro, contido face a uma perspectiva expansionista e responsável, por ele se afirma a imposição de rigor na gestão dos dinheiros públicos, o compromisso de racionalização e a solidez de uma política definida por objectivos e marcada por um calendário onde a utopia que estimula o projecto se casa bem com a realidade que lhe marca a execução.
Concebida uma verdadeira política de justiça para Portugal, lançadas as bases para a sua concretização e iniciadas as acções que as realizam, é já possível encarar o presente não como a repetição de um passado de estagnação mas, antes, como um sólido trampolim para um futuro melhor. E, se nem todos assim entendem, é já também possível separar o pessimismo céptico dos que alimentam o mal para parecerem bem do optimismo crítico dos que, reconhecendo seriamente o mal, o assumem como desafio e acreditam na capacidade de todos nós para o vencermos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É, afinal, a diferença que vai entre a facilidade de dizer mal e a dificuldade de fazer bem!

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, V. Ex.ª é um ilustre percursor e inspirador do Sr. Ministro das Finanças, na medida em que, desde há vários anos, nos traz aqui uma série de miragens, que o seu colega das Finanças transformou, este ano, no «oásis».

Risos do PS.

Vou falar, muito rapidamente, de algumas dessas miragens.

Há anos que V. Ex.ª fala da miragem da desburocratização do sistema da justiça. E, Sr. Ministro, quando falo de desburocratizar não me refiro apenas aos tribunais mas também ao registo e notariado, que são um dos aparelhos mais pesados, em termos de burocratização, do nosso país.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Até agora nada se fez! Face às propostas do PS, repetidas, aliás, em várias sessões legislativas, de reformar o notariado, de acabar com muita da burocracia do nosso país, em especial no Ministério da Justiça, V. Ex.ª diz neste, não. No entanto, todos os anos promete-nos que vai desburocratizar!...
Por outro lado, o Ministério da Justiça vive, em grande parte, à custa dos cidadãos. No ano passado o Sr. Ministro confessou (e, como costumam dizer os advogados, «confissão que é para não mais ser retirada», porque está escrita em acta), mais uma vez, que os custos da justiça são altos. Eu direi, Sr. Ministro, que são enormes, os mais caros da Europa. Todos os anos V. Ex.ª promete a reforma do Código das Custas...

O Sr. Ministro da Justiça: - Não disse isso!

O Orador: - Prometeu-o na intervenção que fez agora, Sr. Ministro. Eu ouvi-o dizer que este ano ia reformar o Código das Custas.
Mas V. Ex.ª ainda não prometeu reformar os insuportáveis custos do notariado para evitar que os portugueses se desloquem de avião a Londres ou a Badajoz de carro para fazer escrituras que custam dez vezes menos do que em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se é este o apoio que o Governo dá aos empresários, à iniciativa privada, estamos conversados.
V. Ex.ª, desde há dois ou três anos, fala-nos da luta contra a criminalidade económica, da luta contra a corrupção, da luta contra o crime organizado. Pergunto-lhe: que meios é que existem no orçamento do Ministério da Justiça? Depois de extinguida a Alta Autoridade contra a Corrupção, V. Ex.ª apenas atribui à Polícia Judiciária um aumento de 3 % dos meios postos à sua disposição quando sabe que nem ela nem o Ministério Público têm meios técnicos, de peritos, de ajuda para lutar contra a criminalidade económica e a corrupção.
Eram estas três questões, Sr. Ministro, que queria colocar-lhe muito frontalmente.
Para terminar, pergunto-lhe: o que é que diz o Sr. Ministro das Finanças sobre os aumentos dos vencimentos dos magistrados?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, havendo mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ministro da Justiça: - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra a Sr* Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, V. Ex.ª tem o mérito, o que é, em minha opinião, importante no seu Governo, de poder falar de uma área que conhece, mérito esse que também pode ser perverso, porque lhe acresce as responsabilidades quando, com alguma elegância, ziguezagueia no seu discurso, omitindo desta forma algumas questões que, a meu ver, são importantes.
No entanto, gostaria de colocar, fundamentalmente, duas questões.
A primeira questão já colocada pelo Partido Socialista- tem a ver com a forma como esses meios, em relação à Polícia Judiciária, se traduzem neste Orçamento, porque, extinta a Alta Autoridade contra a Corrupção, com o que não concordámos, verificamos que tudo aquilo que se pretendia, e devia, salvaguardar e não ser posto em causa com a transferência de competências não tem expressão orçamental.
O Sr. Ministro estendeu-se, do meu ponto de vista, excessivamente na enumeração dos palácios de justiça que o seu Ministério vai construir, o que não contestamos, porque muitos deles são, aliás, promessas antigas, ou seja, não é mais do que o cumprimento dessas promessas que cabe ao Governo fazer, mas a questão que desejo colocar é outra.
O Sr. Ministro reconhece o aumento da criminalidade - quer a sua experiência o leve ou não a assumir isso publicamente, reconhece uma situação social geradora de um apartheid cada vez maior, de uma maior segregação social. O Sr. Ministro falou alguma coisa de palácios de justiça, mas quanto aos institutos prisionais já falou menos, muito menos ainda - quase esqueceu completamento - dos programas de reinserção social e de formação profissional, quer em relação aos menores, quer em relação aos reclusos. Ora, as verbas orçamentadas para esta matéria são, em alguns estabelecimentos prisionais, zero.
Sr. Ministro, perante tudo isto, gostaria que clarificasse e explicasse o seu posicionamento.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vera Jardim, tranquiliza-me o facto de verificar que de ano para ano os temas críticos são cada vez menores e mais circunscritos e que as intervenções críticas são cada vez mais solidárias, postulando uma atitude de consenso e de convergência naquilo que foi a primeira política de justiça que se concebeu para Portugal. É importante que assim seja, pois introduz-se seriedade no debate, exequi-

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bilidade no programa, abre-se por isso um espaço de esperança mais alargado junto dos cidadãos quanto à nossa capacidade colectiva de, enquanto questão de Estado, gerirmos a justiça, uns com os outros, e de não encontrar nela o espaço de conflito em que, uns contra os outros, enchemos de gáudio a nossa alma política e de tristeza a esperança dos Portugueses.
Fica por isso de lado tudo o que está feito, que era justamente tudo aquilo que fazia com que este fosse um longo debate de críticas, de referências ou omissões e de incapacidades de solução. Vamos, por isso, ater-nos àquele «muito» que eu próprio reconheci como tal, que importa ainda fazer, e, sobretudo, começar não por uma definição, que nunca seria necessariamente consensual, mas por uma abordagem crítica do que significa miragem.
Se a miragem é aquilo que se sonha, que ficticiamente se antevê e que, uma vez procurado, nunca se encontra, nunca houve qualquer miragem no meu discurso sobre a justiça em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas se a miragem é aquilo que se sonha, em que se acredita e que progressivamente se constrói pela determinação de percorrer o trajecto que leva desde o sonho à concretização da acção, então aí, sim, houve e há miragem na justiça em Portugal.

Aplausos do PSD.

Por outro lado, a miragem, por aquilo que dela conhecemos como jogo de côncavos e convexos, corre também o risco de ser alguma coisa que, definida negativamente, não é vista por quem a deve observar. É por isso miragem dizer-se que o registo de sociedades comerciais em Portugal demorava, há um ano, seis meses no Porto. No entanto, acreditámos que era possível vencer essa realidade e hoje o registo de sociedades comerciais no Porto demora entre 8 a 15 dias. E isto não acontece por golpes de magia mas, sim, porque acções de fundo de desburocratização e de racionalização permitiram que assim acontecesse. Não estou, evidentemente, ainda tranquilo quanto ao tempo que demora a constituição de uma sociedade comercial,...

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - ... mas estou perfeitamente tranquilo reconhecendo que ainda demora tempo, enquanto que VV. Ex.ªs denotam normalmente grande intranquilidade quando têm de reconhecer que muita coisa já não demora o tempo que demorava.

Aplausos do PSD.

É que neste momento é mais sólida a nossa segurança quanto à garantia do êxito do que a segurança de VV. Ex.ªs na persistência do insucesso.

Risos do PSD.

Hoje não se tem a noção do que é possível e, por isso, quer-se tudo, mas nós sempre dissemos, desde o primeiro momento, que, sendo tudo possível, não é tudo possível ao mesmo tempo. O importante é que o projecto seja coerente, sério na sua apresentação e consequente na sua execução.
O que demorava 6 meses demora hoje 8 ou 15 dias, o que permite concluir que este é o caminho que devemos continuar a seguir.
O sistema da construção do notário pivot está praticamente concluído e vai, portanto, credibilizado pelas acções conseguidas até agora, creditar-se também na sociedade portuguesa. Fica-nos, evidentemente, neste domínio, um conjunto, que eu definiria, de dois aspectos decisivos. O primeiro é o próprio estatuto do notariado, enquanto tal, e que tem, evidentemente, de ser revisto. Mas tem de ser revisto por todos nós, Srs. Deputados, sem quesilias de natureza política, num processo consensual, de partilha de propostas de solução, porque, Srs. Deputados, há duas razões para introduzir mudanças radicais: uma, é ler a certeza segura de que elas são positivas e, a outra, é não se saber o que se há-de fazer. E quando ninguém sabe o que faz, muda, porque, pelo menos, mudou. Portanto, como sabemos o que estamos a fazer, o que queremos e com quem queremos fazer, traremos aqui, para num debate convosco, ainda que informal, como vos disse, tudo o que sejam propostas alargadas de revisão de fundo do estatuto do notariado.
Quanto à redução dos custos, claro que é fundamental reduzir progressivamente os custos, nomeadamente nesse sector. Mas VV. Ex.ªs, que, como é evidente, acompanham não como miragem mas como publicação no Diário da República os vários decretos, publicados pelo Governo, que vêm sucessivamente isentando de emolumentos o que até aí era sempre susceptível de cobrar, que vêm introduzindo diminuição de custos, nomeadamente num caso concreto proposto o ano passado - e tenho todo o gosto em partilhar a sua autoria com o Sr. Deputado António José Seguro -, o da redução dos encargos das escrituras para a aquisição de habitação pelos jovens.
Ainda no mesmo sentido, foi agora agendado para Conselho de Ministros uma medida que vem igualizar o pagamento, no Registo Nacional de Pessoas Colectivas, das designações de firmas estrangeiras, igualizando-as às portuguesas, como é evidente, e não o contrário, estando, assim, encetado o caminho da redução de custos nessa área.
Seguindo a mesma lógica, com as alterações na própria gestão financeira, previstas no Orçamento do Estado para o próximo ano, vamos ter instrumentos mais fáceis por forma a que essa redução seja mais significativa. Não quero com isto dizer que neste momento o problema não existe e que o temos resolvido. Isolá-lo-ei como um dos que ainda não estão resolvidos, fazendo parte daquele cabaz, cada vez mais pequeno, dos problemas fundamentais a resolver na área da justiça.
Por outro lado, é importante, como eu disse, desmistificar o problema das custas judiciais. VV. Ex.ªs compreendem o que eu quero dizer com isto, pelo que não vale a pena desenvolver mais esta matéria. Em todo o caso, nunca prometi a revisão do Código das Custas Judiciais para um determinado período mas, sim, para a legislatura, compaginando-a sempre com a revisão do Código de Processo Civil, que está em curso. A promessa mantém-se com a intenção de concretização, mas, como é evidente, também numa perspectiva que não é de tensão de intervenção, porque agora o discurso já não é, de facto, a palavra que comanda a acção mas aquilo que, no fundo, se limita a ser a transmissão demonstrativa da acção até agora realizada.
Falou-se na criminalidade e na criminalidade económica. Srs. Deputados, nós não podemos olhar a Polícia Judiciária, fazer contas e apercebemo-nos de que ela cresce 3 %. Não

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temos uma perspectiva conservadora de que os problemas se resolvem apenas com mais dinheiro. Não queremos caminhar no sentido do aumento da receita e, portanto, dos encargos para uma gestão eventualmente incontrolada, queremos, sim, caminhar, claramente, no sentido de uma gestão racionalizada, que pode, no fundo, produzir maior eficácia, sem um aumento significativo dos encargos. Aliás, o Sr. Deputado Vera Jardim diz que o Ministério da Justiça vive do dinheiro dos cidadãos, infelizmente para eles é todo o Estado que vive do dinheiro dos cidadãos e não apenas o Ministério da Justiça. Portanto, o fundamental é que em todos os sectores tenhamos a noção de que são exigências de racionalização que produzem eficácia e que hão-de determinar o quantitativo de crescimento e não um crescimento comparativo com os anos anteriores pata, depois, ver se há necessidade de introduzir mecanismos novos de racionalização e de eficácia. Mas há um aspecto importante a ter em conta. É que quando falamos num aumento de 3 % temos a noção de que já não há encargos este ano, como houve em 1992, vindos do ano anterior e sobretudo da aplicação do novo sistema retributivo, pelo que este aumento é, em termos reais, claramente superior àquele que se verificaria, porque, no fundo, tem a ver com uma série de pagamentos de encargos assumidos anteriormente, que tiveram a sua repercussão em 1992 mas que não são repercutireis em 1993.
Por outro lado ainda, no sector específico do combate à corrupção, o que está acordado é que se fará a transferência do montante normalmente atribuído à Alta Autoridade contra a Corrupção para a Polícia Judiciária, a fim de se caminhar no sentido de uma maior consubstanciação financeira para a adopção das novas competências que, a breve trecho, lhes serão atribuídas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Deputada Isabel Castro, agradeço o cumprimento feito por eu ter algum conhecimento sobre a matéria que consubstancia a área de intervenção política que está sob a minha orientação.
Relativamente à questão dá corrupção e do combate à criminalidade, remeto a resposta para a. que acabei de, dar ao Sr. Deputado Vera Jardim, sublinhando um outro aspecto importante: o facto de hoje já ter sido sentido pela própria oposição que é excessiva a enumeração dos palácios da justiça construídos. É, de facto, verdade, mas que esse excesso não seja tido como crítica ao Governo no sentido de agora estar a fazer de mais.
Já tive ocasião de prometer que, embora recuperando todo o parque judiciário até finais de 1995, deixarei ainda um ou outro palácio da justiça por recuperar para que a oposição possa ainda falar, embora só, então, a título meramente simbólico, da degradação do parque judiciário.

Risos e aplausos do PSD.

Quanto ao problema do aumento da criminalidade e ao das suas leituras conexas com o sistema prisional, a reinserção social e os menores, tomaria agora a ocasião para felicitar V. Ex.ª por esta interacção, que nem sempre é feita e é importante que se faça para que se tenha a noção de que o sistema criminal arranca da investigação, enquanto momento de criação do fenómeno do crime, e acaba no momento final da execução da pena. Felicito-a, Sr.ª Deputada, por esta concepção integrada, que é fundamental e que incorpora grande parte da filosofia política do Ministério da Justiça, mas devo dizer-lhe que, no interior do sistema prisional, há também um caminho importante e longo a percorrer. Todos sabemos até que ponto, por razões conjunturais de vária natureza, que não importa trazer aqui,...,

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço que conclua.

O Orador: - Sr. Presidente, solicito que me dê apenas um minuto para terminar a resposta.
Dizia eu que todos sabemos até que ponto a modificação introduzida no interior do sistema prisional, em matéria de educação, de trabalho prisional e de formação profissional, comporta um salto qualitativo, que todos reconhecem.
A reinserção social está instalada em todo o território nacional e não foi fácil fazê-la. Essa instalação a nível nacional é hoje fundamental para o relançamento de uma política de intervenção mais consequente.
Por outro lado, em matéria de menores, é de realçar o que está a ser feito pela fusão com o Instituto de Reinserção Social e o que, no fundo, tem sido trazido aqui em matéria de alteração legislativa. A criação de comissões de protecção de menores, a lei da adopção e a criação de novos tribunais mistos de menores e de família são já acções concretas, trazidas, apresentadas, votadas e postas no terreno.
É importante a sua preocupação, Sr.ª Deputada, partilhamos dela, estamos tranquilos pelo que fizemos até aqui e temos a intenção de continuar na mesma linha, porque é por este caminho que vamos resolver, nunca de ume vez por todos, mas de uma forma democrática e socialmente aceitável, os vários problemas que teve ocasião de referir.
Muito obrigado, Sr. Presidente, e peço desculpa por ter esgotado o tempo regimental.

Aplausos do PSD.

Q Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, parece--me ter ouvido o Sr. Ministro dizer que as verbas que até aqui eram gastas com a Alta Autoridade contra a Corrupção iriam subsidiar a luta contra a corrupção no Ministério da Justiça. Gostava de perguntar ao Sr. Presidente da Assembleia da República se está previsto no nosso orçamento transferirmos verbas da Assembleia para q Ministério da Justiça.

O Sr. José Magalhães (PS): - É que não está! É um equívoco! É estranhíssimo!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Justiça, quer responder pelo Presidente?

Risos.

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Eu não conheço directamente o problema, mas suponho que as verbas da Alta Autoridade contra a Corrupção fazem parte do orçamento da Assembleia - e temos muito em que gastar o dinheiro. Mas não sei se o Conselho de Administração fez uma previsão de forma a alargar substancialmente o nosso orçamento nesse domínio.

O Sr. Ministro da Justiça: - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Justiça: - Começo por esclarecer que me levantei para dizer que não podia responder em nome do Presidente da Assembleia, como é evidente.
Mas uma vez que V. Ex.ª me permite esclarecer a questão colocada, direi que, como é evidente, nós sabemos como funcionam as regras orçamentais e as regras de transferência orçamental, e conhecemos o Orçamento que apresentámos à Assembleia da República. Aquilo que se pretendeu dizer foi que há a perspectiva de que aquilo que era previsto enquanto financiamento da Alta Autoridade contra a Corrupção seja previsto enquanto financiamento, na parte em que isso for necessário, da nova estrutura da Polícia Judiciária que vai responder nesse domínio, e não através de uma transferência cega e acrílica daquilo que era fornecido à Assembleia da República e que passa a ser fornecido à Polícia Judiciária. E evidente que é assim, mas foi importante ter podido esclarecê-lo.

O Sr. José Magalhães (PS): - O Dr. Braga de Macedo acenou que sim! Fica em acta.

O Sr. Presidente: - Afinal, estava tudo esclarecido.
Antes de dar a palavra ao próximo orador, queria, em nome da Câmara, cumprimentar três grupos de alunos das Escolas n.º 1, da Buraca, da Escola Secundária Gama Barros, do Cacém, e da Escola Secundária de Queluz.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em sede de Orçamento do Estado, neste final de ano de 1992, faz todo o sentido trazer à discussão a problemática da Administração Pública e debater assim a política ou, talvez, a ausência de política do Governo numa área de inegável importância para a vida do País.
O Programa do Governo aprovado pelo PSD nesta Assembleia, quando se refere à Administração Pública, enuncia um conjunto de princípios que - supunha-se - deveriam ser desde logo cumpridos por aqueles que os subscrevem, ou seja, os próprios responsáveis governativos. Aí se diz que «urge reforçar a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos e importa qualificar, mobilizar e dignificar os funcionários» e ainda que «importa construir um modelo de administração que incentive e dinamize a vitalidade e capacidade realizadora da sociedade e o talento empreendedor dos Portugueses».
Conferir execução a tais princípios programáticos implica uma política de reestruturação e modernização eficaz, uma gestão criteriosa dos dinheiros públicos e, finalmente, mas não menos importante, um diálogo sério e criador com
os trabalhadores da Administração Pública. Desde há sete anos - cinco dos quais assentes em maioria absoluta - que o Governo, o Primeiro-Ministro e o PSD, em matéria de Administração Pública, mais parecem frei Tomás. Sabemos o que diz, permitam que apreciemos um pouco o que faz.
A estrutura global da Administração Pública teima em manter-se pesada e estática, como sempre se constata e repetidamente se reprova. A orgânica e o funcionamento dos mais variados serviços públicos apenas varia - e não necessariamente para melhor- sempre que se muda de ministro, apesar de no mesmo Governo. Cada titular define a sua própria política e as suas competências orgânicas e se, por vezes, os nomes e os organismos mudam, quase sempre tal acontece para que se assegure a confiança, seja pessoal, seja política. Não se conhecem programas ou perspectivas de médio prazo. Tudo se promove à vista, mantendo circuitos administrativos ultrapassados, nem sempre claros ou transparentes, e serviços com competências sobrepostas e mesmo inúteis. Enquanto isto, desmotivam os trabalhadores sem perspectivas de dignificação e futuro, sofrem os cidadãos que pretendem transparência e capacidade, perde o País que, para ser moderno, exige uma administração eficiente.
Em Portugal, o peso do número de trabalhadores da Administração Pública na população activa é menos de 14 %, sendo a média comunitária de cerca de 17 %. Não envolverá grandes riscos a afirmação de que, em termos globais, não existirão trabalhadores a mais. Se, porventura, há sectores com pessoal em excesso (e vamos admiti-lo), não competirá ao Governo a responsabilidade dessa definição e organização? O Governo deve promover e incentivar mecanismos adequados de apoio à mobilidade voluntária dos trabalhadores - estamos de acordo. Mas, para isso, é preciso saber, e precisa o Governo de assumir publicamente, de onde e para onde se fará tal mobilidade. Não é isso apenas e o mínimo que impõe o respeito devido pelo Estado aos seus servidores? Só que o Governo fecha--se em copas perante esta evidência e decide iludir as suas intenções escondendo-se por trás de uma lei dita dos disponíveis ou excedentes da função pública.
Srs. Membros do Governo, desde quando é que V. Ex.ª acham que há trabalhadores a mais na função pública? Desde ontem? Permitam-me que faça uma pergunta: quem admitiu, nos últimos cinco anos, mais de 10000 novos trabalhadores por ano na Administração Pública? Foi o Governo? Foi a oposição? Foi o PS?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: o Sr. Ministro das Finanças, ontem, limitou-se a confirmar o que já era sabido. Disse - e cito - que, mercê da recente promulgação da Lei dos Disponíveis, a gestão dos recursos humanos será activada em 1993 e que o Governo se dispõe, por essa via, a reduzir as despesas de funcionamento de quase todos os ministérios. O que é dramático em tudo isto é que os milhares de trabalhadores da função pública sintam hoje que o Estado pondera sobretudo (diria mesmo que quase exclusivamente) o seu peso nas despesas de funcionamento do Orçamento do Estado e manipula os seus postos de trabalho numa perspectiva cega de redução dessas mesmas despesas. É só isto o que o Governo pretende: criar uma bolsa de milhares de trabalhadores inactivos, colocados indiscriminadamente na situação de excedentes. Poupará dinheiro, ninguém o duvida, mas promoverá a intranquilidade, a insegurança, a inactividade e o desemprego.

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Em 1991, nesta Casa, o Governo chamava harmonização fiscal àquilo que, em 1992, foi o aumento de impostos. Agora, em 1992 e hoje, o Governo chama de reestruturação ao que, em 1993, será, certamente, despedimentos. Enquanto vai falando de oásis, o Governo prepara um exílio domiciliário para os trabalhadores da função pública.
As alterações posteriores à apreciação de constitucionalidade da lei foram positivas. Ao menos aí fixaram-se alguns critérios de qualificação e, sobretudo, impediu-se a aposentação obrigatória. Curou-se nesse momento algum mal, mas a doença, essa, ficou. E quem nos garante que daqui a algum tempo não será ao Governo apetecível uma recaída? Esperemos para ver, mas contem V. Ex.ª com a frontal oposição do PS imposta, aliás, pela vossa incapacidade e sugerida pelas vossas intenções.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo tem consciência- outra coisa não seria de admitir de que um Estado moderno exige uma administração eficiente e esta só é possível com trabalhadores motivados e profissionais qualificados, credores de retribuições compatíveis. Mas 4,5 % ou 5,5 % de aumento salarial para 1993 o que é senão uma desconsideração? O que significa senão uma desqualificação para os trabalhadores da função pública?
Esta proposta, aliás, reflectida no Orçamento do Estado, é no mínimo inaceitável, para não dizermos escandalosa. E mesmo que façamos a franqueza de esquecer a desejada progressão em direcção aos níveis salariais europeus, o que não evitamos certamente é de constatar o agravamento significativo que de tal proposta resultaria para o diferencial salarial em comparação com o sector privado ou para público. Estes valores significam uma clara diminuição do poder de compra real, situam-se abaixo de previsões da inflação, desqualificam a função pública, sugerem o abandono de quadros. Esta política, ainda que sirva ao Governo, que só quer poupar, não serve ao País, que quer crescer, desenvolver-se e modernizar-se.
O Orçamento do Estado para 1993, no que à função pública directamente respeita, reflecte um objectivo confessado neste debate pelo Governo: reduzir as despesas de funcionamento. Para prosseguir tal objectivo, não hesitam o PSD e o Governo em usar os trabalhadores da função pública, quer ao nível da sua situação profissional, quer ao nível salarial, como mero suporte instrumental.
Não contem com o PS para disfarçar ou ignorar esta realidade. Para nós, a Administração Pública nunca significará apenas despesas de funcionamento; significará, sobretudo, um fundamental papel na satisfação das necessidades dos cidadãos, na promoção do desenvolvimento e na modernização do País. Votaremos sempre e agiremos em conformidade.

Aplausos do PS e do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Deputado Laurentino Dias, V. Ex.ª referiu-se à função pública e eu iria pedir-lhe para me responder a algumas perguntas.
Sabe V. Ex.ª em que anos é que os funcionários públicos tiveram aumentos salariais muito abaixo da inflação? E sabe em que anos é que os funcionários públicos tiveram aumentos salariais superiores, por vezes muito superiores, à inflação? Já vi que não sabe!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Vai ver que sabemos!

O Orador: - Então vou dizer-lhe: os funcionários públicos tiveram diminuições salariais reais profundas em 1976, 1977, 1978 e 1979, e depois na década de 1980, excepto no ano de 1980, durante o governo presidido por Francisco Sá Carneiro, e a partir do governo social-democrata presidido pelo Prof. Cavaco Silva, ou seja, quando o PS teve responsabilidades governamentais, a seguir ao falecimento de Sá Carneiro e à saída do governo de Cavaco Silva!

Vozes do PS: - Graças à AD!

O Orador: - Também assumo essa responsabilidade, porque o meu partido pertencia à AD, mas infelizmente tinha de comparticipar com outros que não tinham uma visão correcta da política económica.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Isso significa que essa é uma questão de ciclo económico, e não uma questão de partidos!

O Orador: - Estamos, pois, à vontade para dizer que foi com os governos sociais-democratas que os funcionários públicos tiveram aumentos reais dos seus vencimentos.
E, já agora, V. Ex.ª sabe quem é que criou o regime de excedentes da função pública? Foi um governo e um ministério presidido por ilustres membros do seu partido!
O Sr. Deputado falou do aumento de funcionários públicos em termos líquidos, mas não se referiu às saídas por aposentação ou por outros motivos, sempre voluntários, dos trabalhadores da função pública. Mas, nessas admissões na função pública, sabe V. Ex.ª quais foram os ministérios que aumentaram o número dos seus funcionários em cerca de 85 %? Foram os Ministérios da Educação, em professores, e o da Saúde, em pessoal médico, paramédico e enfermeiros.
Assim, a pergunta concreta que lhe faço é esta: V. Ex.ª está contra o reforço de meios humanos para o ensino? Está contra o reforço de meios humanos para a saúde? Responda se puder, Sr. Deputado!

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Estou para ver esse reforço de meios humanos no ensino!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Deputado Rui Carp, terei com V. Ex.ª a deferência de não recuar muito no tempo para fazer a apreciação que V. Ex.ª pediu porque, eventualmente, entraria em tempo de governos em que V. Ex.ª também era responsável por áreas de finanças, pelo que teríamos de fazer outro tipo de discussão.
Em relação à questão essencial da sua pergunta, queria dizer-lhe o seguinte: os trabalhadores da função pública, neste ano de 1992, já se deram conta- não é preciso que nós o digamos, e eu nem sequer o disse na minha intervenção - de que, não sendo este ano um ano de eleições, sendo um ano pós-eleições, não terão, naturalmente, os

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aumentos que tiveram no ano de 1991 ou, pelo menos, comparáveis aos de esse ano! A regra é, de facto, essa!
E aquilo que, eventualmente, os homens e mulheres (que são milhares) que trabalham na função pública vão verificar, a continuar a política do governo do PSD e a cumprirem-se as intenções que este Orçamento do Estado reflecte, é que vão ter de esperar pelo Orçamento do Estado para 1995 para terem aumentos salariais compatíveis com a necessidade de combater a inflação ou de ultrapassar, em termos de valores reais e de poder de compra, as questões de inflação. Portanto, Sr. Deputado Rui Carp, não gostaria muito de enveredar por essa matéria.
Respondendo à segunda parte da sua questão, em que referiu números de aposentação, direi que eu nem sequer falei desses números. O que eu disse foi que, nos últimos cinco anos, este governo do PSD fez admitir mais de 50 000 funcionários novos na Administração Pública e nem sequer deduzi desse número o dos aposentados, que foram também duas ou três dezenas de milhar porque, se assim fosse, as contas seriam ao contrário: não seriam 50000, seriam 60, 70 ou 80000 novos funcionários entrados na função pública, porque, a este número que mencionei, não deduzi as aposentações que ocorreram também ao longo destes anos.
V. Ex.ª poderá verificar e rectificar isso com números exactos, se quiser fazê-lo; mas eu não quis fazer exagero de números - V. Ex.ª ajudou a corrigir nessa parte e ajudou a acrescentar, aos 50 000 trabalhadores admitidos nos últimos cinco anos, mais 10, 20 ou 30 000 que, entretanto, se aposentaram.
Sr. Deputado Rui Carp, o que eu gostaria que aqui fosse respondido pelo PSD ou pelo Governo são as questões essenciais que a minha intervenção suscitou: quanto à lei dos excedentes da função pública, quais são os objectivos do Governo, quais são as prioridades do Governo, quais são as áreas em que essa lei vai incidir? Ou seja, quais são as expectativas que os trabalhadores da Administração Pública vão enfrentar no próximo ano de 1993? E, mais ainda, com que dignidade vão os trabalhadores da função pública receber no ano que vem os aumentos salariais que os desqualificam, que os desmotivam? E por que é que, quando se fala de Administração Pública, o Governo apenas tem em primeira linha do seu pensamento e orientação a redução de despesas de funcionamento em relação ao Orçamento do Estado e não a qualificação, a motivação e a melhoria de qualidade dos serviços que, essas sim, preocupam naturalmente os cidadãos portugueses?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: É com confiança que afirmamos que a proposta de Orçamento do Estado para 1993 dá um forte impulso ao processo de convergência nominal com a Europa e se adequa positivamente ao processo de convergência real, conforme se constata da leitura atenta das Grandes Opções do Plano.
Por outras palavras, está o «pilar orçamento», da exclusiva iniciativa do governo social-democrata, perfeitamente calibrado aos outros dois pilares, que são a concertação social, em curso, e as políticas estruturais e financeiras, sendo estes dois últimos pilares da responsabilidade compartilhada entre aquele órgão de soberania, os agentes económicos e sociais e as autarquias.
Esperamos, muito sinceramente, que estes parceiros do Governo mantenham o mesmo realismo e visão de futuro de que deram mostras quando assinaram os acordos económico-sociais ou se empenharam no grande desafio de modernização do País.
Nos últimos meses, Portugal foi o País europeu cuja divisa melhor suportou a «borrasca» cambial, embora, logo nessa altura, houvesse, do lado da oposição ou em «bilhetes postais de Linda-a-Velha», quem preconizasse um seguidismo doentio à desvalorização da peseta e da libra.

O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Obsessão! Obsessão!

O Orador: - Linda-a-Velha, digo bem, Sr. Deputado. Linda-a-Velha era um bucólico local dos arredores de Lisboa, muito citado pelos nossos românticos, e que boje se começa a parecer mais com o Loch Ness. Mas talvez não, esperemos que não!
A este propósito, convém sublinhar que seria muito improvável que o alinhamento do escudo à libra, à lira ou mesmo à peseta tivesse algum efeito positivo na competitividade das nossas exportações tradicionais nos mercados britânico, italiano ou espanhol, dadas as dificuldades acentuadas que estão a sentir essas economias europeias. Mais: tal realinhamento conduziria ao desmoronar do clima de confiança económico tão laboriosamente conquistado nos últimos sete anos por Portugal, no contexto internacional, e iriam repetir os erros do passado, onde era frequente a adopção de medidas de stop and go.
Entramos no mecanismo cambial, Srs. Deputados, depois de um difícil período de ajustamento para criarmos estabilidade aos investidores. Não vamos agora regressar a artificiais proteccionismos cambiais com o recrudescimento de fenómenos inflacionistas para agradar à oposição, e espanta-nos até a sua incoerência quando, ao mesmo tempo, fala da falta de transparência e propõe a manutenção do controlo dos movimentos de capitais - como ainda ontem o Sr. Deputado Ferro Rogrigues nos propôs -, propõe desvalorizações discretas do escudo e, por outro lado, clama por uma forte descida das taxas de juro dos empréstimos, esquecendo que a manutenção daqueles «tapumes» dificultam esta descida.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo, também nestes domínios, segue a política correcta, que passa pela manutenção da estabilidade e confiança no escudo, pela prossecução da descida da inflação e pela aprovação de uma nova lei bancária de modernização, liberalização e supervisão do sector, que irá dar um novo enquadramento para as instituições de crédito e sociedades financeiras, esperando-se, sublinho, esperando-se que daí resulte uma redução da margem entre as taxas activas e as taxas passivas no crédito bancário pela intensificação de concorrência.
E é assim que se caminha na via certa - que os empresários dignos desse nome bem apreciam -, a da promoção sustentada da baixa dos custos dos factores produtivos, neste caso, os do investimento, a que se juntam a moderação salarial e o reinvestimento a um nível mais elevado dos lucros obtidos.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A política económica global apresentada insere-se num quadro de médio prazo, o Programa Q2, na continuidade do que já assumira no Orçamento para 1992, e tem em devida conta as incertezas e a turbulência da economia internacional e o atraso na retoma do crescimento nalguns dos maiores países industrializados.
Para isso, o Governo insere na sua política global uma envolvente macroeconómica e social transparente, conforme ainda ontem aqui nos esclareceu o Sr. Ministro das Finanças, e que merecem ser bem sublinhadas.
São elas: a defesa da competitividade das empresas nacionais, sem prejuízo de não criar situações artificiais de manutenção às empresas claramente inviáveis; a melhoria real do poder de compra dos trabalhadores e dos reformados; a manutenção de altos níveis de investimentos nas infra-estruturas e nos equipamentos sociais; a modernização da Administração Pública e a melhoria na qualidade dos serviços públicos, em especial na justiça - como ainda agora muito bem nos referiu o Sr. Ministro da Justiça -, na segurança interna, na saúde, no ensino e na segurança pública; a consolidação da estabilidade fiscal - aliás, uma das mais fortes reivindicações dos contribuintes, sejam eles empresas ou agregados familiares -, e que foi uma segura promessa eleitoral; o combate ao desperdício nas finanças públicas, cujas poupanças são aplicadas ou na redução do défice orçamental ou nos programas de modernização já citados.
Tudo isso, Srs. Deputados, está bem patente na vasta documentação apresentada ao Parlamento com a proposta do Orçamento do Estado e das GOP e no esforço da concertação social, esforço que ninguém pode negar, quer face aos vários acordos que já conseguimos alcançar, no passado recente, quer o esforço actual para se conseguir um novo acordo ainda este ano, e esperamos sinceramente que se alcance.
Sem querer repetir o que vem nessa vasta documentação. Ou o que os Srs. Ministros já aqui disseram, parece-me de salientar, do ponto de vista de um parlamentar com alguma experiência política e profissional nos domínios fiscal e orçamental, cinco características do orçamento da despesa, indiscutíveis sinais de que o rigor e o combate ao desperdício (que em linguagem anglo-saxónica se designa por value for money) estão definitivamente instalados nas finanças do Governo dando um óptimo exemplo para os outros sectores do País.
Primeiro: o Orçamento leva a uma redução do défice global para um valor inferior a 4 % do PIB e, visto em termos de analisadas as receitas, atinge um valor mais próximo do 3 % do PIB, um dos indicadores do programa de convergência nominal, e isto sem política de agravamento fiscal.
Segundo: as despesas orçamentais sem juros ficam na casa dos 2900 milhões de contos, apresentando quebra do consumo público (sem pessoal), em termos reais.
Terceiro: As despesas de funcionamento, em regra, tiveram uma redução de 5 %, salvo as dos sectores considerados mais prioritários pelo Governo, em 1993, e que se relacionam, como foi anunciado por este, com os departamentos da justiça, da segurança interna - ambos fundamentais para o combate à criminalidade e à delinquência - e com a educação, cuja importância crucial me dispenso de explicar.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Ah!...

O Orador: - Quarto: a inclusão, no Orçamento, de todos os fundos e serviços autónomos, incluindo os serviços de saúde, do que é a consagração de um princípio de unidade e transparência orçamental pelo qual alguns «carolas» das finanças públicas há muitos anos vínhamos pugnando.
Quinto: o abandono da metodologia incrementalista de fazer o Orçamento (segundo a qual as verbas de um dado ano são iguais às inscritas no ano anterior vezes um quoficiente mais ou menos igual à inflação esperada), o que se irá traduzir na aplicação das novas normas da reforma da contabilidade pública que, pelo que se está a ver, não vão para a gaveta, como alguns senhores da oposição teriam a tentação de proceder dadas as experiências do passado.
No capítulo da fiscalidade, e a seguir a estas cinco características, que, sublinho, são muito importantes para apreciar o orçamento da despesa, regista-se com muito agrado que, na tributação dos rendimentos dos cidadãos e famílias, todas as medidas vão no sentido do desagravamento ou da compensação do efeito da inflação projectada e do incentivo à poupança produtiva, enquanto que na tributação das empresas dão-se mais uns passos positivos para atenuar situações vigentes de dupla tributação e incentivar e modernizar a internacionalização do tecido empresarial.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O programa de privatizações prosseguirá com a determinação de continuar a atingir plenamente os objectivos da respectiva lei quadro e na valorização e defesa intransigente de interesse nacional, plenamente integrado na Europa comunitária.
Entre os que desejariam que o Estado vendesse as suas participações nas empresas nacionalizadas por «tuta e meia» ou os que queriam que o processo parasse até «às calendas gregas», o Governo continuará a seguir a via certa.
Mas vejamos agora o que é que a oposição nos apresenta de alternativas, se é que as tem.
Confesso-lhe a minha dificuldade, Sr. Deputado Manuel dos Santos, em me aperceber da lógica e da coerência desses ditos «orçamentos alternativos» ou, quando querem ser mais modestos, «propostas de alteração orçamental», designadamente do Partido Socialista e do CDS.
Começando pelo PS - socorremo-nos, à falta de melhor, das intervenções dos Srs. Deputados António Guterres, do dia 29 de Outubro, e Ferro Rodrigues, ainda ontem, e num escrito deste último no Público de 9 de Novembro-,...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Estão nos jornais!

O Orador: - Sr. Deputado, nós procuramos entendê-los, mas se VV. Ex.ªs quiserem ser mais explícitos, cá estamos para receber as vossas respostas.
Mas, começando pelo PS, a sua alternativa global, embora pecando pela completa falta de quantificação e de nenhuma temporização, assentaria no seguinte:

Quanto à política monetária: baixa administrativa das taxas de juro activas, com redução das margens de intermediação, não explicando quanto seria e como o faria (será que voltaríamos à fixação administrativa das taxas de juro e à fixação por despacho das taxas de juro dos

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títulos da dívida pública, com colocação compulsiva no sistema bancário?).

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com franqueza, Sr. Deputado!

Quanto à política cambial: desvalorização do escudo (quando?) para manter a relação que tinha em Setembro/Outubro com a peseta, a libra e a lira, esquecendo que ou saímos do mecanismo cambial do sistema monetário europeu - e tanto trabalho tivemos para lá entrar - ou teremos de respeitar as regras do Comité Monetário Europeu, «que não vai em cantigas» das perdas da competitividade por falta de capacidade reestruturante de alguns empresários.
Além disso, e sem pôr minimamente em causa a boa fé e a vontade de serviço público e de serviço à causa pública dos Srs. Deputados em causa, pergunto-lhes se já reflectiram no que os empresários especuladores iriam agradecer com essas desvalorizações, tal como já o fizeram no passado com os, tristemente célebres, fenómenos de sobrefacturação das importações e subfacturação das exportações,...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Foi o Eldorado dos especuladores!

O Orador: - ... dos BRI e que fizeram perder ao País muitos milhões de contos? Espero que não sejam os Srs. Empresários a que se referiu ontem o Sr. Deputado Almeida Santos.
Finalmente, recordo-lhes que o escudo apresenta boje uma paridade muita próxima daquela que o Comité Monetário aceitou no momento da sua entrada no SME!

Vozes do PSD: - Muito bem!
Quanto à política orçamental: o PS propõe um défice maior para acomodar mais despesas - quais? - ou o agravamento muito forte da tributação indirecta (e socorro--me, de novo, do artigo do Público, escrito pelo Sr. Deputado Ferro Rodrigues, onde diz «desligando os aumentos de salários dos aumentos de consumo ... através de medidas políticas fortemente incentivadores da poupança»). Também poderia aumentar a tributação dos capitais ou dos lucros, mas então lá iriam as poupanças para o desenvolvimento económico.
Quanto à política de rendimentos e preços: não se lhe referem, o que é natural, porque nunca os socialistas portugueses conseguiram acordos de rendimentos e preços, em concertação social, quando tiverem responsabilidades executivas.
Quanto às políticas estruturais: mais recursos orçamentais para todos os sectores, o que não será revelador de opções muito claras. Dizer-se que é preciso arrancar com verdadeiras políticas estruturais é muito pouco, embora caia bem nos ouvidos menos atentos.
Srs. Deputados do PS, se querem aplicar Keynes, um dos maiores pensadores deste século e, sem dúvida, o maior economista do século xx,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Quer dizer que não há?! Está a criticar severamente o Governo!

O Orador: - ... sem desprimor para os presentes e para os ausentes,...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Está a falar para o Sr. Ministro?

O Orador: - ... nos quais eu também me incluo, naturalmente, leiam-no com mais atenção.
Passemos agora ao CDS, que, em mais uma demonstração de claro menosprezo pela Assembleia da República, pela sua novel direcção, apresentou o que apodou de propostas alternativas ao Orçamento, em conferência de imprensa na sua sede, antes do seu Grupo Parlamentar aqui apresentar o que julgo ser o resumo, ainda que brilhantemente apresentado pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, e que se concretiza no seguinte - e lamento que o Sr. Deputado não esteja presente, mas estarei aqui todo o dia para lhe esclarecer esta minha análise das suas propostas:

Primeiro: redução ou eliminação do imposto do selo e suponho que do IRS. É sempre simpático para o contribuinte mais distraído anunciar-lhe que vai deixar de pagar impostos, o que redundaria em mais défice se não prometesse também a redução dos juros da dívida pública, em resultado da utilização dos títulos da dívida pública para aquisição de acções das privatizações. Entre outras, esta operação de gestão de porta-fólio -é isso que se trata - seria, bem pelo contrário, mais grave para o Estado (porque deixaria de receber em dinheiro e receberia em títulos nas operações de privatização) e pouco atraente para os detentores de títulos da dívida pública, que têm rendimentos certos, que iriam trocar acções de empresas cujos dividendos, naqueles casos, não seriam competitivos com os rendimentos dos títulos da dívida pública. Além disso, a menor despesa em juros da dívida pública não tem o mesmo valor da menor receita efectiva da venda das empresas nacionalizadas, em clara perturbação do mercado monetário.
Terceira característica das propostas do CDS: corte nas despesas do Estado, ignorando-se se seria nas de investimento, de pessoal (como?), nas transferências para as autarquias locais ou nas prestações sociais.
Em suma, à pergunta sobre se existirão alternativas ao modelo de política económica global do Governo para 1993 surgirão, mais ou menos implicitamente, duas respostas: a do PS, que mantém o status quo em tudo aquilo onde é necessário decidir e romper com o que está mal e vai adiando comodamente as reformas financeiras e monetárias até ao dia em que viria o FMI para mandar, mais uma vez, «apertar o cinto» e impor a austeridade aos trabalhadores, aos pensionistas e traria em si uma forte recessão às empresas; a proposta do CDS aplicaria uma dramática travagem no desenvolvimento das infra-estruturas e nos rendimentos dos trabalhadores, com agravamento brutal do desemprego, já que as empresas ficariam totalmente entregues ao mercado, numa pequena economia muita aberta ao exterior.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se querem ver um bom exemplo dessas políticas recomendo-lhes as memórias do ex-chanceler do Tesouro, Nigel Lawson, em que ele explica os erros que nessa matéria se cometeram, na década de 80, na Grã-Bretanha- esse é um bom exercício para o CDS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Está bem claro que não é nenhum desses modelos alternativos que serve aos Portugueses, porque qualquer deles iria trazer-lhes insegurança e diminuição do nível de vida. Os Portugueses, como já demonstraram inequivocamente, preferem as propostas do governo social-democrata, que não está a ocultar as dificuldades por que passa a conjuntura internacional, em especial a europeia. Mas, como todos os mecanismos de regulação da economia ao seu dispor estão sob perfeito controlo, conclui-se que o Governo tem accionado correctamente e no tempo certo as opções mais ajustadas e que molestam o menos possível os cidadãos, em especial os dos sectores mais desfavorecidos ou vulneráveis, permitindo que a economia portuguesa continue a crescer a um nível superior ao da média comunitária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está a ser assim, como comprovam as análises elogiosas que os observadores internacionais fazem à condução, pelo governo Cavaco Silva, da política global. E assim vai continuar no futuro porque, apesar dos augúrios das oposições, a confiança na solidez da economia vai sobrar para enfrentar os próximos desafios, bem difíceis mas que, por isso mesmo, ainda vão dar muito prazer a vencer.
Em conclusão, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Portugal conquistou uma imagem de marca internacional, sendo um caso sério de sucesso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Disseram as oposições que foi quase só devido à conjuntura internacional muito favorável e à entrada na Comunidade Europeia. Pela mesma ordem de ideias, o governo social-democrata, como a conjuntura internacional atravessa muitas turbulências e incertezas, poderia agora justificar um quadro depressivo interno muito profundo para travar a estratégia de crescimento e progresso sustentado. Mas não o faz, como o comprovam a quebra da inflação, o quase pleno emprego persistente, o equilíbrio nas contas externas, o crescimento bem acima dos nossos parceiros europeus.
E porquê? Porque (e não me importo de repetir o que ontem se disse aqui) acredita que pode assegurar a prosperidade de Portugal face às provas dadas, porque acredita na vontade e na qualidade dos Portugueses neste desafio, que temos de ganhar, porque os Portugueses adquiriram finalmente o culto pelo progresso, em liberdade e em diálogo social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, quatro Deputados. Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, a sua intervenção foi uma espécie de fotocópia em dimensão reduzida e até com as mesmas imagens de Linda-a-Velha, daquilo que o Sr. Ministro das Finanças ontem aqui trouxe. Mas essa fotocópia continua a iludir uma questão de fundo e era sobre ela que gostaríamos que V. Ex.ª pudesse esclarecer melhor o seu pensamento, o do PSD e o do Governo, uma vez que também ontem o Sr. Ministro das Finanças a iludiu.
A questão é a seguinte: não reconhece V. Ex.ª que a contrapartida da política que está a ser seguida -uma política que assenta sobretudo nos vectores do escudo forte, de taxas de juro altas - tem, como reverso dessa moeda, as crescentes dificuldades estruturais para o aparelho produtivo nacional, com a crescente perda de competitividade das empresas e da economia nacional? E estes factos não se vão traduzir, como, aliás, todos os dias nos chegam notícias, em crescente número de falências e, a prazo, num aumento do desemprego, numa diminuição dos salários e numa crescente instabilidade no mundo laboral? Não lhe parece, Sr. Deputado, que esta política de vistas curtas, de navegar com a costa à vista, se vai traduzir, a prazo, na hipoteca do desenvolvimento sustentado da economia portuguesa e da esperança para as futuras gerações?
Sr. Deputado, não lhe merece nenhuma reflexão, nenhum comentário, nenhuma preocupação o relatório da Direcção-Geral dos Assuntos Económicos da Comunidade Europeia que, há bem pouco tempo, referia: «observa-se o mais dramático movimento que continua a ser observado pelo escudo. A perda de competitividade pelos custos traduz-se, desde o início de 90, num valor superior a 30 %». Não o preocupam as repercussões que tudo isto tem na perda de competitividade das empresas e na perda de competitividade da economia nacional, que se traduzirá, a prazo, num descalabro crescente para todo o aparelho produtivo nacional?
Não lhe parece, Sr. Deputado, que os três pilares de que tanto fala o Governo e de que V. Ex.ª se fez eco assentam, cada vez mais, em «pés de barro» que vão sacrificar o futuro sustentado da economia portuguesa?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, agradeço a sua pergunta sobre a modernização e reestruturação das empresas, pois V. Ex.ª utilizou a expressão correcta - «pés de barro» - embora no contexto não correcto. Não queremos um tecido empresarial industrial com «pés de barro».

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Querem é que não haja tecido empresarial!

O Orador: - Queremos, efectivamente, que as empresas que não sejam viáveis dêem lugar a empresas viáveis porque, naturalmente, essas empresas vão absorver os postos de trabalho que as empresas inviáveis eliminaram. Essa é a solução correcta e é isso que está a suceder neste momento, ainda que o programa respectivo tenha sido aplicado há relativamente pouco tempo, por exemplo, no Vale do Ave, onde novas empresas surgem noutros sectores, porventura mais competitivos, e foi também o que sucedeu na península de Setúbal. Portanto, não somos contra o encerramento das empresas, somos pela substituição de empresas inviáveis por outras viáveis e o Governo tudo tem feito para isso, aliás, com algum sucesso.
Quanto às apreciações desse serviço da Comissão Europeia, devo dizer que o desconheço...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Posso dar-lhe uma cópia.

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O Orador:- ... e, por isso, não posso comentar. Todavia, não é inédito que esses estudos se louvem em dados ultrapassados ou truncados e não sejam conformes à realidade, estando até errados - aconteceu isso no passado e é provável que aconteça presentemente.
No entanto, noutra ocasião, depois de estudar esse documento, terei muito gosto em o comentar. Porém, devo dizer que me preocupo mais com as análises que conheço e essas são todas bastante favoráveis à forma como o Governo está a «aguentar» os fenómenos de turbulência internacional e a prova é que a nossa economia é a que menos tem sofrido, não obstante ser uma economia aberta.
Aliás, V. Ex.ª ajudou-me a reforçar a minha opinião dizendo que a nossa economia não pode ser construída com «pés de barro» mas, sim, com os pés bem assentes na terra e que, efectivamente, está a ser construída dessa maneira.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, enquanto V. Ex.ª falava, lembrei-me daquele magnífico filme, que certamente todos vimos, que tinha por título Bem-vindo Mr. Chance e, com essa lembrança, aproveito para lhe desejar boas-vindas a este debate. Foi realmente importante que tivesse subido à tribuna, porque já estávamos preocupados por V. Ex.ª não ter usado da palavra e não termos podido fruir da sua inteligência, da sua capacidade parlamentar.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Que amigo!

O Orador: - No entanto, coloco-lhe duas questões e faço-lhe um comentário ou uma referência.
V. Ex.ª passa a vida a falar das propostas que diz não existirem. V. Ex.ª pode dizer que as propostas são más e em minha opinião, efectivamente, pelo que se viu na televisão, algumas das propostas que o CDS vai apresentar são muito más. V. Ex.ª pode dizer que as propostas são más, que as propostas do CDS são más ou muito más, boas ou regulares mas já não pode dizer que não há propostas, porque é óbvio que elas existem. Ainda hoje no debate com o Sr. Ministro da Justiça ficou claro que o Partido Socialista apresentou várias propostas, com incidência orçamental, que eram alternativas à forma de gerir e intervir do Governo. Por isso, peço-lhe -a expressão é mesmo esta- que não insista que não há propostas do PS porque é evidente que as há e V. Ex.ª sabe perfeitamente que assim é.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Claro que há! Tem razão!

O Orador: - Todavia, as duas questões que quero colocar-lhe são de carácter geral e têm a ver com o facto de os vossos discursos falarem sistematicamente em modernização, internacionalização, reestruturação, justiça fiscal, que desta vez não há agravamento. Mas não é há sete anos que VV. Ex.ªs estão no Governo? Não é há sete anos que estão a receber ajudas de pré-adesão e pós-Adesão, que têm os valores que já aqui foram citados variadíssimas vezes - neste momento estão numa média de 1,5 milhões de contos por dia? Então, por que é que não fizeram a reestruturação, a internacionalização, a modernização, a justiça fiscal? Por que é que não a fizeram?! O que é que andaram a fazer durante sete anos?
Essa é que é a questão fulcral! Para que serviu toda a ajuda que tiveram? A culpa é dos empresários, disse V. Ex.ª da tribuna e não quero defendê-los porque a posição do Partido Socialista é defender os empresários, os trabalhadores agrícolas, os trabalhadores industriais, em suma, o povo português e sobretudo os contribuintes. Mas será que V. Ex.ª é capaz de sustentar e justificar esse facto e dizer que não há culpa do Governo?
A minha terceira observação: o Sr. Deputado acha, com franqueza, e tendo o Sr. Ministro das Finanças, nos últimos 15 dias, apresentado realmente três cenários enquadradores do Orçamento do Estado - primeiro, crescimento a 3 %, entendendo-se 3 % como 3+1/4 ou 3-1/4; segundo, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, crescimento a 3 %, entendendo-se 3 % como algo situado entre 2 % e 3 %, ou seja 2,5 %; terceiro, ontem dito aqui, crescimento a 2 % até 2,25 % mas a tender para 2 % -, que estes números têm alguma credibilidade? Acha que o Orçamento do Estado não «foi» já? Acha que é possível aceitar que a proposta orçamental tem alguma credibilidade quando o Sr. Ministro das Finanças muda o cenário 3 vezes em 15 dias e não muda as receitas, as despesas, as dotações orçamentais?
São estas perguntas que lhe deixo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, meu caro amigo e caro colega, começo por lhe agradecer as boas-vindas profissionais, embora considere que os economistas, como qualquer outro profissional, não se sintam com o dom de tudo saber. Sabem alguma coisa, como sabem os outros, e estamos sempre a aprender uns com os outros.
Porém, considero que a minha bancada ontem, como foi inequívoco e até a própria imprensa já revelou, ganhou o debate.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Que imprensa? O Povo Livre?!

O Orador: - O Povo Livre não sai à quarta-feira, Sr. Deputado! Considero que os outros jornais não são o Povo Livre, mas se V. Ex.ª quer chamar-lhes assim... enfim, de facto, somos um povo livre...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª pergunta o que é que se fez nos últimos anos. Afinal de contas, nós é que somos ambiciosos, estamos sempre a querer ...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Não deve ter visto a primeira página do Público de hoje: «Economia em baixa/contestação em alta»!

O Orador: - A propósito da manifestação cuja fotografia vem nesse jornal, senti-me muito triste com a

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atitude do Partido Socialista, que puxa sempre pelos seus galões ...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Já percebi que não vai falar sobre o que fizeram nos últimos sete anos!

O Orador: - ... em defesa do respeito e da dignidade desta instituição, quando ontem um estudante, à porta da Assembleia da República, tratou esta Casa por «isto». E lamento que os senhores, que são sempre tão pressurosos a defender, e muito bem, o bom nome desta instituição, tenham ficado calados a esse propósito. A Assembleia da República não é «isto»!...

Aplausos do PSD. Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Peço à Câmara que faça o silêncio necessário para que se possa ouvir o Sr. Deputado que está no uso da palavra.

O Orador: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, pergunta V. Ex.ª «então o que é que se fez?!» Bem, primeiro, quando o Governo e a bancada parlamentar do PSD aparecem aqui com um incentivo à reestruturação, à harmonização, ao progresso, ao crescimento, é porque somos ambiciosos, nunca estamos satisfeitos. Naturalmente, há muito por fazer e as dificuldades agora são muito maiores, a margem de manobra é muito menor do que porventura os senhores julgariam que fosse. Mas, e resumindo a resposta, volto a referir-lhe um texto de um homem que é perfeitamente independente do Governo, o embaixador e ilustre escritor José Fernandes Fafe, constante da edição de 16 de Outubro do Diário de Notícias: «Portugal atravessou, nos últimos anos, talvez o mais activo período de modernização da sua história e de tudo isto resultou um manifesto impulso à formação profissional, à modernização do terciário, a algum reequipamento industrial ...»
Isto é inegável! Podia citar outros, mas já que os senhores dizem que só cito o The Economist e o Finantial Times, aqui têm a posição de um homem que não é do sector económico e que nem sequer é da nossa área política.
Quanto aos outros aspectos que referiu, quero realçar que a Grécia e a Espanha também receberam fundos estruturais e pode constatar-se qual é o estado económico da Grécia e as taxas de desemprego da Espanha. Confrontem o orçamento português com o orçamento de crise espanhol! Mas os senhores só gostam de viver em crise e talvez gostassem mais de estar neste momento em Espanha a apoiar este programa. É natural, é a vossa vocação natural!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - A Espanha?! Verificou-se em todo este 92!

O Orador: - Quanto à falta de credibilidade, volto a repetir aquilo que já ontem citaram o Sr. Ministro das Finanças e alguns colegas da minha bancada, recomendando-lhes a leitura da p. 174 do relatório do Orçamento, onde se diz claramente que «este orçamento louva-se em dados bem fundamentados de instituições inquestionáveis como o Fundo Monetário Internacional e a Comissão Europeia». Naturalmente que se a conjuntura é de grande incerteza é muito difícil fazer previsões.
E a propósito da dificuldade de fazer previsões e de incertezas, recomendo-lhe a leitura de um artigo de alguém que, provavelmente, muito lhes agrada, o Dr. Vítor Constâncio, no último número da revista Expansão. Veja o que ele diz e veja se não refere as dificuldades de previsão e as incertezas! Os senhores já nem sequer ...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Também fala do crescimento de 1,5 %!

O Orador: - ... conseguem ler aquilo que os mestres de economia da vossa bancada escrevem, pelo que já não posso fazer mais nada!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Deputado Rui Carp, agradeço muito as citações e a leitura dos meus artigos, já não lhe agradeço tanto as deturpações, ...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Para nós são uma bíblia!

O Orador: - ... visto que ninguém falou em baixa administrativa das taxas de juro. Fala-se apenas da necessidade de uma consonância, na política monetária, entre as autoridades monetárias responsáveis, visando uma descida mais rápida das taxas de juro, o que é possível e legítimo.
Em segundo lugar, ninguém fala em desvalorização discreta, mas, sim, na necessidade de, em próximo realinhamento do sistema monetário europeu, existir uma recuperação da nossa competitividade em matéria de paridades cambiais. E vamos ver, se calhar mais depressa do que o Sr. Deputado pensa, quem tem razão nesta matéria. Vamos esperar, talvez, pelo período entre o Natal e Ano Novo para vermos quem tem razão sobre essa matéria!
Agora a questão que lhe queria colocar não está relacionada com o essencial da sua intervenção, que foi uma intervenção apologética e muito seguidista em relação ao Ministro das Finanças, pelo que não suscita outras críticas para além daquelas que já ontem aqui enunciei. Só teve uma parte interessante, que foi a sua profissão de fé no keynesianismo que deve ter deixado alguns dos mais acérrimos seguidores da mão invisível um pouco sem saberem em que partido estão ou se, finalmente, no Congresso do PSD, se tinha chegado a alguma conclusão consensual em matéria estratégica!

Risos do PS.

A questão que lhe queria colocar, muito rapidamente, está relacionada com algumas passagens da sua intervenção. Não leve a mal, mas quando se referiu ao romantismo português e citou Linda-a-Velha, pergunto-lhe se não terá confundido Linda-a-Velha com Linda-a-Pastora; é que nem todas as pastoras são velhas e, depois do grau de elevação que o Sr. Ministro das Finanças ontem deu ao debate do ponto de vista cultural, penso que todos temos de ter um pouco mais de cuidado com alguns desvios.
Segundo ponto: quando compara Linda-a-Velha com o Loch Ness, estará a chamar monstro ao autarca Isaltino de Morais?!

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O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, quero começar por agradecer as questões que me foram colocadas. Referi-me efectivamente às suas intervenções e o Sr. Deputado volta a confirmar que, afinal, a política cambial do Governo está correcta. Os senhores apontam um realinhamento no futuro. Bem, no futuro, quando? Em que condições? E também não negam que desejam um seguidismo relativamente à peseta, à lira e à libra. Não desmentiram isso! Simplesmente, não explicaram, nem provaram, se tais medidas iriam aumentar a competitividade e a procura nesses mercados britânico, espanhol e italiano das exportações portuguesas e com que sustentabilidade. Isso não explicaram! Portanto, a pergunta permanece e a crítica mantém-se fundamentada, ou seja, com políticas dessas quem iria ganhar seriam certamente os especuladores e nós não queremos dar dinheiro aos especuladores! O senhor, que tem tanta preocupação com lavagem dos cupões, também se devia preocupar com esse tipo de limpeza!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Não se esqueça das OPV!

O Orador: - Quanto às outras medidas, relativamente ao aspecto dos arredores de Lisboa, peço desculpa se não são de Linda-a-Velha mas de Linda-a-Pastora. Quanto ao Loch Ness, V. Ex.ª é que disse que era monstro, porque o Loch Ness tem outras potencialidades, designadamente encantos, nebulosidades e mistérios. Mas o Sr. Deputado é que disse que era um monstro, não fui eu!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Os mistérios do concelho de Oeiras!

O Orador: - Agora o que é importante é que o PS continua a não ter alternativas nenhumas à política do Governo.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Outra vez?!

O Orador: - E a imagem que sai deste debate é indiscutivelmente a de que o Governo tem a economia sob controlo, para o bem e para o mal, e é isso que os Portugueses querem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, achei realmente alguma piada quando...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Acha? Então ria-se!

O Orador: - E rio-me, rio-me bastante! Quando V. Ex.ª disse que não era preciso uma conferência de imprensa e que tal ofendia o Parlamento, de repente passou-me pela cabeça: «que diabo, o que é que é melhor, é a conferência de imprensa ou um circo?!» Porque vi um circo onde foram enunciadas muitas das medidas que vieram depois para o Parlamento.
Há também o chamado Pontal, que é o novo Parlamento do País, de onde o Sr. Primeiro-Ministro lança as grandes medidas. Agora se V. Ex.ª entende que o circo e o Pontal têm mais dignidade do que o Parlamento, deveria calar-se porque, efectivamente, este Parlamento é muito pouco para apenas tratar de uma matéria!
Em segundo lugar, V. Ex.ª está a par de corridas que se fazem muitas vezes pelos corredores desta Casa, para depois se perguntar quem fintou quem nas conferências de imprensa. E VV. Ex.ªs são useiros e vezeiros nestas fintas das conferências de imprensa. E o Sr. Deputado também há-de compreender que não sendo o Dr. Manuel Monteiro Deputado, tem todo o direito de dizer qual é a posição do partido em relação a um diploma importante como é o Orçamento do Estado. É um grande acontecimento e os líderes partidários, quando não estão no Parlamento, têm a obrigação de dizer ao País qual é a sua opinião. Se o Dr. Manuel Monteiro estivesse aqui no Parlamento com certeza que não precisava de fazer uma conferência de imprensa. Mas um líder partidário perante diplomas de tanto relevo e de tanta importância, como o são o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano, tem de dizer ao País qual é a sua posição.

(O orador reviu).

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às críticas, penso que o Dr. Nogueira de Brito esteve ontem à vossa disposição e o Sr. Deputado Rui Carp não foi capaz de lhe fazer as críticas, foi preciso ir ver, ontem à noite, o tal economista dos arredores de Lisboa, mas aprendeu mal o que ele disse e hoje vem criticar aqui estas lições, o que demonstra realmente que nem para aluno V. Ex.ª serviu para aprender a lição!
Quanto ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, ele estará aqui logo à tarde, o seu discurso está publicado, irá responder-lhe se tal considerar relevante. E também se não houver tempo e o considerar importante, o Dr. Manuel Monteiro dará outra conferência de imprensa para responder!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Diga ao Sr. Deputado Nogueira de Brito que traga os apontamentos de ontem porque vamos fazer-lhe uma segunda chamada!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, também reconheço o seu esforço para defender o indefensável.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ah!...

O Orador: - Porque, de facto, ou bem que o Grupo Parlamentar do CDS está zangado com o seu líder partidário ou bem que o Grupo Parlamentar do CDS poderia - e nós sabemos que o Sr. Dr. Manuel Monteiro não é Deputado - fornecer as suas instalações na Assembleia da República para ele aqui, dentro do contexto parlamentar, apresentar ...

Vozes do CDS: - Apresentar aqui?!

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O Orador: - Não no Hemiciclo, mas tem salas lá fora. Conferências de imprensa todos nos as damos! Os senhores têm é um profundo desprezo pela instituição parlamentar, como o provam as declarações bem claras dos vossos líderes e essa vergonha do referendo dito sobre Maastricht.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E quanto a fintas, bem, isso é melhor irem falar com o Sr. Prof. Diogo Freitas do Amaral, porque os senhores é que sabem disso!

Aplausos do PSD.

Protestos do CDS.

Quanto ao mais e ao resto, ouvimos aqui o Sr. Deputado Nogueira de Brito e aquilo que nos trouxe (tenho comigo o discurso dele) não é o que o líder do CDS disse no Largo do Caldas. Portanto, das duas uma: ou é uma coisa ou outra!... Disse que as fotocópias se estragaram. Penso que há coisas muito mais estragadas no seu partido do que a máquina de fotocópias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Deputado Rui Carp, esperava que com a sua intervenção e as suas respostas, devido as suas capacidades óbvias, se acabasse com este diálogo de surdos que se tem aqui passado, em que as respostas não têm nada a ver com as perguntas que os Deputados colocam, não se respondendo lealmente e com interesse aos pontos que são focados.
As questões que os meus colegas têm colocado, que me parecem ser extremamente importantes para quem está a analisar o Orçamento do Estado e está preocupado com a economia portuguesa, mereceram da sua parte respostas de tal forma fugitivas e vagas que espero que, quando me responder, isso não aconteça, esclarecendo directamente os problemas que lhe vou apresentar.
Na reunião em Londres, onde estivemos os dois, a certa altura um Deputado alemão veio ter comigo e perguntou--me o seguinte: «Então, quando é que o escudo é realinhado?» Repare que ele não perguntou «se», perguntou «quando»! E que ninguém entende, só o Ministro das Finanças de Portugal - quanto ao Sr. Primeiro-Ministro não sei, porque, apesar de gostar muito de vir à Assembleia da República, afinal vem cá e fica calado -, as possibilidades futuras da economia portuguesa nestas bases.
Os senhores dizem que este Orçamento é para apoiar os investidores. Sr. Deputado, foquemos os três casos que o senhor apresentou na sua resposta - e fez muito bem, pois pegou exactamente nos bons exemplos-, ou seja, as nossas exportações relativamente à Espanha, à Inglaterra e à Itália.
Como é possível que a Espanha, que passou a ser o nosso principal parceiro comunitário, que a Inglaterra, que até há pouco tempo era um dos nossos principais parceiros comunitários, que a Itália, com quem temos a balança comercial mais deficitária, como é possível, numa situação como esta, que a nossa resposta seja a de mantermos um escudo artificialmente forte?! Ninguém compreende que a economia portuguesa se possa compatibilizar com isto!
A pergunta que lhe coloco é esta: depois da profissão de fé que o senhor fez na tribuna e depois do realinhamento que se vai verificar numa tal sexta-feira à tarde ou numa reunião no fim do ano, o Sr. Deputado vai explicar o que aconteceu? O senhor tem responsabilidades nesta matéria e não precisa de ser seguidista, pois sabe que o escudo não tem nada a ver com o que se está a passar na economia portuguesa - é o seu descrédito e o descrédito da sua bancada-, e pergunto-lhe como é que vai sair desta, depois do que irá acontecer ao escudo português.
A segunda pergunta que quero fazer-lhe tem a ver com o seguinte: o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e a Sr.ª Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional foram, há dias, à Comissão de Assuntos Europeus apresentar o rol das realizações que se conseguiram com 1,5 milhões de contos que entraram em Portugal de há quatro anos para cá. Efectivamente, tudo o que este Governo se gaba de ter feito, afinal, foi realizado com os dinheiros comunitários!
Aconselho-vos a leitura daquilo que o Sr. Ministro do Planeamento e do Ordenamento do Território levou à Comissão de Assuntos Europeus - e como a nossa máquina de fotocópias não está estragada, também vos dou cópia-, pois é curiosíssimo concluir que tudo o que este Governo se gaba de ter feito foi levado a cabo com os dinheiros da Comunidade, à excepção da reestruturação da economia.
O Sr. Deputado disse que não querem uma indústria e uma agricultura de «pés de barro»; no entanto, na nossa economia, o produto agrícola e o produto industrial diminuem e acontece também uma coisa espantosa que se traduz no facto de este país cobrar mais no imposto sobre produtos petrolíferos do que em IRC. Os lucros da nossa economia são menores do que o que se recebe com o imposto sobre a gasolina! Que economia é esta?! Que economia de sucesso é esta, se ocasiona este problema?
O que era necessário era ter utilizado os dinheiros da Comunidade, nos últimos anos, a reestruturar a economia, mas sobre isso o senhor não disse nada.
Este Governo é que está a construir uma economia de «pés de barro» e é contra isso que estamos!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Há manifestas divergências entre os socialistas e os democratas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, agradeço-lhe também as questões que me colocou.
O que se ouviu a semana passada em Londres, designadamente pela voz do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros inglês, foi que a Inglaterra, quando quis seguir uma política desalinhada, contra a política coordenada a nível comunitário, entrou numa via de indecisão, de incerteza, de ausência e de crise profunda, no seguimento, aliás, de políticas monetaristas. E se existe alguém neste momento aqui no Hemiciclo que defenda as políticas monetaristas, esses são os que o Sr. Deputado Narana Coissoró há pouco referiu e estão na sua bancada, não na minha, nem na do Governo ... ou então não sabem o que é monetarismo. Mas, enfim!...

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Quanto a esta matéria, o que é, de facto, importante é que o escudo é uma divisa que merece a confiança dos mercados financeiros e monetários. E porquê? Porque a economia portuguesa é considerada uma economia forte,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Está a brincar connosco!

O Orador: - ... dentro das dificuldades estruturais que todos lhe conhecemos, e temos uma política económica correcta quer do ponto de vista global, quer do ponto de vista de apoio aos sectores. Portanto, em relação à questão de saber quando é que o escudo vai desalinhar, situação a que a Sr.ª Deputada Helena Tones Marques se referiu,...

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Não é desalinhar, é realinhar!

O Orador: - ... recomendo-lhe apenas a leitura atenta de como se processam os mecanismos do sistema monetário europeu e, em especial, o mecanismo cambial. Se for necessário, facultar-lhe-ei os elementos que tenho para que possa ver que só há duas alternativas: ou o escudo sai do sistema monetário europeu, como aconteceu com a Inglaterra, ou o Comité Monetário decidirá, atendendo a questões objectivas. Neste caso, não há nenhumas questões objectivas para que o escudo tenha uma variação discreta relativamente a outras moedas do cabaz de moedas europeu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Vamos ver!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Daqui a dois meses falamos!

O Orador: - Isto é indiscutível e os Srs. Deputados não têm quaisquer provas que contrariem esta afirmação.
No que diz respeito ao PIDDAC, o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território foi bem claro quando disse aqui, ontem, que as acções do PIDDAC são co-financiadas em cerca de 60 % - nalguns casos mais, noutros menos - pela Comunidade. Mas, apesar de tudo, a percentagem é muito inferior quando consideramos o investimento e a formação bruta de capital fixo ou o investimento bruto. Isto é, os fundos comunitários, e repito mais uma vez o que já se disse tantas vezes, foram um factor multiplicador e disciplinador do investimento público e um factor selector do restante investimento; porém, o progresso do País deve-se aos agentes económicos portugueses. Pela minha parte, acredito neles e se VV. Ex.ªs não acreditam o problema é vosso, pois eu continuarei a acreditar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão do seguidismo, não sei quem o faz e não tenho seguidismos relativamente a ninguém. Tenho, isso sim, apoios.
VV. Ex.ªs sigam quem quiserem. Só espero que não me sigam a mim, pessoalmente, porque sou uma pessoa de bem que está sempre pronta para discutir aqui. Se outros querem ser seguidistas, não contem comigo, pois eu apoio, não sigo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nos debates orçamentais convencionou-se dividir os parlamentares entre despesistas e não despesistas. E a uns e a outros é dado o labéu, ora infamante ora benigno, consoante pontos de vista que, invariavelmente, têm menos a ver com o País e os cidadãos do que com preconceitos ou com o tal tirano pensador desconhecido que, sem sabermos, comanda os nossos passos. No entanto, a divisão perdeu sentido.
Ontem o Sr. Ministro das Finanças citava-nos Laoconte, através de Virgílio, receoso de que alguém desejasse usar de novo a artimanha de Ulisses - tudo em torno da virtude antidespesista e do pecado despesista. Fiquem os Srs. Deputados da maioria e o Governo mais descansados, pois não faremos aqui o discurso da despesa pela despesa, que ninguém seriamente pode fazer. Mas não se nos peça que esqueçamos o discurso da equidade e da justiça. Não calaremos essa preocupação fundamental. Para nós a convergência nominal subordina-se à convergência real e esta, sempre, à igualdade de oportunidades e à dignidade das pessoas. Desconfiamos profundamente de quantos se limitam a enaltecer a eficiência esquecendo que esta é totalmente posta em causa se não houver equidade e justiça. Por isso, a simplificação que pretende colocar-nos do lado da despesa não é pertinente. Coloque-se-nos, sim, ao lado da equidade - essa é a alternativa que claramente assumimos.
Não podemos ser indiferentes a que a progressividade do nosso imposto sobre o rendimento das pessoas singulares quase só atinja os trabalhadores por conta de outrem. Não podemos ignorar que, como factor de redistribuição de recursos e rendimentos, o nosso sistema não funciona. Não podemos ficar impávidos perante a grelha de taxas do IRS, altamente penalizadora das famílias das classes médias, e perante a timidez das deduções no domínio, por exemplo, da educação. Não podemos ficar em silêncio perante a persistência das inconstitucionais taxas liberatórias para os rendimentos do capital ou perante a dupla tributação dos dividendos das sociedades comerciais. Não podemos deixar de nos interrogar sobre as misteriosas quebras na receita do imposto sobre sucessões e doações, reveladora de que algo está desajustado da realidade.
Felizmente, porém, nem tudo são más notícias. No último debate orçamental dissemos aqui, nesta tribuna, que a autorização que o Governo pedia para alterar o Código das Avaliações era inconstitucional. A declaração do Tribunal Constitucional veio dar-nos razão e agora a intenção governativa desvaneceu-se por encanto, em nome da estabilidade fiscal e, sobretudo, aqui para nós, da conjuntura eleitoral de 1993!...
Onde está a coerência? Onde está o gradualismo no sentido da maior equidade? Onde estão as medidas de justiça fiscal concreta? Não há um único ponto onde se revele a intenção do Governo de corrigir injustiças e iniquidades gritantes. O contribuinte continua a ser mera fonte de receitas, um número, uma abstracção e não uma pessoa!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos tempos que atravessamos, a equidade prende-se, cada vez mais, com a realização de um moderno Estado de solidariedade - ideia que, infelizmente, anda demasiado esquecida dos

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discursos oficiais. Em vez dela prefere-se ainda falar do sucesso, mesmo que essa moda vá passeado em toda a parte com grandes dissabores e a súbita explosão do quarto mundo, com todos os seus efeitos perversos, injustiças e miséria. Tudo, porque se julgou que a felicidade estava ao virar da esquina, como alguns pensam, ainda boje, entre nós, levianamente.
Olhe-se o tema da educação. Pela primeira vez, de há muitos anos a esta parte, o Ministério da Educação e a função educativa, isto é, todas as despesas que dizem respeito à educação nos diversos ministérios - não se trata, pois, de um palavrão, Sr. Ministro! - sofrem no Orçamento do Estado uma redução em termos reais. Diz--se que é para fazer poupanças e para evitar desperdícios - louvável propósito! Mas onde estão os critérios para apurar os desperdícios? Onde está a coragem para olhar de frente a grave situação com que se debatem a educação e o ensino em Portugal? Dir-se-á que a questão é de qualidade e não de números. De acordo! Mas como é possível realizar a qualidade sem meios adequados, sem infra-estruturas, com escolas superlotadas, com professores desapoiados, com uma reforma que naufraga, com carências aterradoras na educação especial, com um incompreensível vazio na educação pré-escolar?
É isto o discurso miserabilista? Pergunte-se aos professores, aos pais, aos estudantes! Fale-se com eles, partilhe-se das suas angústias.
Antes de subir a esta tribuna um grupo de professores dava-me conta da sua revolta pelo esquecimento a que estão votados. Onde está a mobilização necessária?

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - Senão, vejamos esquematicamente sete questões candentes. Falta em Portugal uma rede escolar equilibrada e bem distribuída, com estilos e conteúdos de ensino adaptados à diversidade de vocações e de capacidades. Em vez disso contínua a correr-se atrás da tentação uniformizadora.
O crescimento acelerado das taxas médias de escolarização verificado nos últimos anos tem sido gravemente prejudicado pelas grandes assimetrias regionais existentes, que urge combater.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!

O Orador: - A escassez da educação pré-escolar e o atraso na reestruturação do ensino básico do l.º ciclo originam elevados e persistentes níveis de insucesso escolar, agravado também pelas acentuadas disparidades regionais e sociais.
Não há avaliação periódica dos objectivos dos currículos e das condições concretas de ensino. Como têm salientado os Profs. Fraústo da Silva e Valadares Tavares, Portugal é um dos raros países da Europa que não possui uma avaliação aferida em todo o ensino básico e secundário. A qualidade é, pois, um slogan. Desconhecemos como pode realizar-se e como se tem realizado.
Ao invés do que acontece com os sistemas produtivos para os quais se podem construir com rigor funções de produção, em educação não é possível aplicar critérios economicistas. Nesse sentido, o que acontece é que qualquer redução orçamental contribui para o abaixamento do nível de eficiência do sistema. Há, sim, que reafectar recursos, que racionalizar, que investir. E quando estamos a investir fazemo-lo quer nas despesas de funcionamento, quer nas despesas de investimento. Em toda a parte se age deste modo. Será que em Portugal teremos descoberto a pedra filosofal ou o segredo de Polichinelo?
Este Orçamento restritivo irá ter, pois, consequências nefastas e imprevisíveis - deixamo-lo aqui dito neste momento, atempadamente, e acompanharemos esta situação, que é extraordinariamente grave.

Aplausos do PS.

Por outro lado, continuamos a seguir o método empírico-burocrático para responder aos problemas. Faltam-nos instituições capazes de apoiar de forma competente e estável as acções relativas à inovação pedagógica, à avaliação correspondente ao desenvolvimento curricular ou à construção escolar. No entanto, continuamos a insistir na miopia centralista e na sapiência de gabinete!...
Por fim, aí está a tentação de encarar a educação como se fosse um tema de conjuntura -mais um! -, um tema de curto prazo. Como se o futuro da nossa identidade, a livre circulação das pessoas na Europa e a concorrência que isso exige não obrigassem, da nossa parte, a redobrados cuidados e a redobrados esforços neste domínio.
Ponto a ponto, qualquer destas questões obriga a um esforço acrescido. Não podemos dar-nos ao luxo de marcar passo. Mas a verdade é que, por este andar, estamos a atrasar-nos, e a atrasar-nos perigosamente. A retracção nas despesas da educação atingirá gravemente a equidade, a qualidade e a eficiência- o tempo confirmá-lo-á.
Não se está a cuidar das pedras vivas de que falava o nosso António Sérgio, que, nas Cartas ao Terceiro Homem, se insurgiu claramente contra a tentação de um país se ficar pela ilusão das pedras mortas.
E a universidade? A universidade portuguesa está doente e há quem pretenda atingi-la no seu coração e na sua autonomia lançando a suspeição sobre os seus dirigentes e o seu corpo docente. O Governo julgou que as propinas seriam uma panaceia mas não são, não podem ser. O labirinto da discussão sobre as propinas não tem saída se não se for seriamente ao fundo das questões. Reforme--se o sistema de financiamento do ensino superior, crie-se uma autêntica acção social escolar, que não existe; distinga-se função educativa e investigação nas universidades; ponha-se termo à inconstitucional distinção quanto ao valor das propinas.
Em lugar disto, eis que se privilegia um suposto «acordo social» muito bizarro, aliás, que dir-se-ia pretender consagrar uma «santa aliança» contra a autonomia universitária. Tudo para não discutir o essencial e evitar o gesto corajoso que seria, como propomos, o de suspender neste momento a aplicação de um diploma iníquo que necessita de complementos sérios.
E se dizemos que a universidade está doente, não é por falta de matéria-prima, nem de potencialidades, mas por incompreensão por parte do Governo do momento decisivo que atravessamos. Momento decisivo, em que a universidade de D. Dinis, de D. João III ou de Marquês de Pombal tem de se abrir ao novo tempo e às novas circunstâncias, pois se não se abrir, se não se reformar, a universidade estará atingida no seu cerne.
A cegueira de alguns leva-os a encarar a universidade como uma máquina registadora ou como uma fábrica de enchidos. Nós negamos essa visão. A aposta na inovação e na criatividade exige, assim, a audácia de darmos à

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educação o melhor que temos de nós, em nome de Portugal e dos Portugueses!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins fez uma intervenção assaz curiosa, que nos deixa, no entanto, muitas perplexidades. Fala o Sr. Deputado numa aposta conjuntural no sistema educativo.
Não sei, de facto, como pode sustentar essa conjunturalidade num momento de grande reforma, reforma pensada, planeada, que está a ser executada há vários anos e que tem ainda alguns anos para chegar ao fim.
E essa reforma tem a ver com a maneira como entendemos o valor «educação», pois, ao contrário do que o Sr. Deputado diz, educação, para nós, é um investimento essencial num modelo de desenvolvimento e não reveste a forma leviana, como me pareceu interpretar das palavras com que o Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins adjectivava a intervenção do Governo e da maioria.
O Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins referiu-se também à universidade de uma forma que nem a imaginação mais pródiga poderia supor, tratando-a como «fábrica de enchidos». Julgo ter sido esta a metáfora que utilizou para ilustrar não sei o quê - devo confessar que não percebi.
Mas, a propósito da universidade, referiu valores que também são nossos, como, por exemplo, os valores da equidade e da eficiência. E, deixando o da equidade para depois, ficar-me-ei agora pelo da eficiência.
Assim, em jeito de resposta, perguntava ao Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins qual é o rigor que devemos imprimir aos dinheiros públicos quando, por exemplo, no ratio professor/aluno, estamos abaixo de metade de outros países da Europa Comunitária; quando, por exemplo, a Bélgica, a França, a Itália, a Espanha têm mais do dobro do nosso ratio; quando países como a Áustria ou a Inglaterra chegam a ter mais 60 % do que nós?
Portanto, não considera, Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins, que, em vez de fazermos o discurso fácil, dizendo «mais dinheiro para a educação», temos de também ter a coragem e a consciência de ver como esse dinheiro está a ser gasto? E nos termos em que o Sr. Deputado, e bem, colocou a questão, pedir maior rigor e eficácia na gestão dos dinheiros públicos que estão a ser investidos na educação?
O Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins falou ainda na rede escolar. Sobre isso, não pensa o Sr. Deputado que, por exemplo, em relação aos ensinos básico e' secundário, particularmente o l.º ciclo do ensino básico, o esforço de eficácia que o Governo está a fazer tem sentido quando há várias centenas de escolas com um aluno, muitas centenas com três alunos e perto de 1500 do 1.º ciclo do ensino básico com menos de 10 alunos? O Sr. Deputado não acha que, também aqui, há que fazer um esforço de rigor e de eficácia?
Mais: como é que o Sr.. Deputado Guilherme Oliveira Martins defende o crescimento do sistema quando ele não está a crescer? Há, com efeito, subsistemas em crescimento, como, por exemplo, o do ensino superior, que é flagrante, mas há também subsistemas do sistema de ensino a decrescer, por força da pirâmide demográfica - e aqui também é flagrante o caso do ensino básico. Portanto, não crê o Sr. Deputado que, em vez de cair nesse discurso fácil, como já referi, faria sentido sermos mais rigorosos na gestão destes dinheiros públicos?
Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins, satisfaça também uma curiosidade nossa a propósito da equidade. O valor da solidariedade é muito caro para nós, social--democratas; o valor da equidade é, também para nós, um valor relevantíssimo. E, na parte em que o Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins referiu os princípios, pareceu-me comungar dessa opinião, sobretudo quando, depois de uma diatribe em relação ao discurso sobre o sucesso, falava num «Estado de solidariedade».
Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins, como é que concilia este princípio do «Estado solidariedade» com a posição que o Partido Socialista tomou a propósito das propinas, que, na sua intervenção, considerou inconstitucional quanto à distinção referente ao valor? Não acha que aquilo que é desigual deve ser tratado de forma desigual?
Como é que o Sr. Deputado concilia a aversão, o repúdio, o descontentamento que deixou patente naquela bancada em relação ao sistema de propinas? Pretende introduzir alguma justiça social com os princípios, que tão galhardamente defendeu, referentes à solidariedade e ao valor da equidade?
Responda-nos a isso também, Sr. Deputado.

(O orador reviu).

Aplausos do PSD.

O Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, terei de ser muito breve porque temos problemas de tempo.
Em primeiro lugar, quanto à aposta conjuntural, devo dizer que a reforma do sistema educativo está a ser posta em prática a partir de um diploma aprovado por unanimidade nesta Câmara. E esse diploma, que foi aqui definido no exercício das nossas próprias competências, está a ser aplicado não se sabe bem como.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sabe-se, sabe-se!

O Orador: - E não há efectivamente mecanismos transparentes de aferição. Vejam-se os agentes educativos, as suas dúvidas, as suas perplexidades ... Eles não estão efectivamente mobilizados e há que mobilizá-los e isto é uma tarefa nacional, Sr. Deputado, e não uma questão do PSD, do PS ou de qualquer dos partidos desta Câmara.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Completamento de acordo!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho, relativamente à questão da eficiência, percebo a sua lógica e o seu raciocínio, mas basta abrir qualquer manual, dos mais elementares, sobre financiamento de educação para se saber que, quando há uma redução, em termos reais, das despesas com a educação, sejam elas de funcionamento sejam elas de investimento, há consequências negativas em termos do sistema e nós não estamos em condições...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mas não há redução!

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O Orador: - Isso vem em qualquer manual, Sr. Deputado. Posso indicar-lhe bibliografia. Há redução em termos reais e em termos nominais de 0,8 % no Ministério da Educação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não há crescimento, mas também não há redução!

O Orador: - Há redução, Sr. Deputado. Não podemos entrar neste diálogo. Sr. Deputado, a eficiência e a qualidade andam de par, assim como a qualidade. Não são bandeiras abstractas e, neste sentido, o esforço que, penso, deve ser feito é o de acompanhar, com extraordinário cuidado, esta questão e evitar os juízos economicistas que sobre ela estão a ser feitos, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a facúndia oratória tem sido longa. Já são 13 horas e S minutos, pelo que vamos suspender os nossos trabalhos e retomá-los-emos às 15 horas e 15 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 33 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate que está tendo lugar nesta Câmara mostra que o Governo se encontra em estado de convergência e o País em estado de pré-recessão. Trata-se, afinal, da cara e da coroa da mesma moeda. Pela nossa parte, estamos em estado de divergência.

O Sr. Ministro das Finanças: -... e não quero ser injusto em generalizar todo o Governo - gosta de jogar com slogans, desembaraça-se em vários estilos de retórica mas é pouco frontal nas respostas. Fala-se em alhos e responde em bugalhos; fala-se de um orçamento de competitividade, que reserva só a alguns, e de solidariedade de que quer responsabilizar a maior parte; fala-se de consenso social e fecham os olhos à magnitude dos protestos como o dos estudantes ou da função pública.
O Governo pede concertação e porta-se como o pior dos patrões.
Ontem interpelei o Sr. Ministro das Finanças, a respeito do Orçamento do Estado, que o próprio Primeiro-Ministro definiu como de «maior aperto», sobre o facto de aumentarem os benefícios e isenções fiscais às aplicações de capital e o valor das indemnizações aos monopolistas do 24 de Abril mas não aumentarem as pensões, baixarem os subsídios de doença, os subsídios de desemprego quando o próprio Governo admite o aumento do desemprego, se desinvestir na educação e se sacrificarem os trabalhadores da função pública.
Se isto não são «dois pesos e duas medidas», digam--me, façam favor, do que se trata. Nada disto tem a ver com solidariedade. A estas perguntas não se responde com jogos de retórica.
O que saliento é que num orçamento contraccionista, o Governo e o seu partido optam pelo aumento da injustiça social e pela diminuição da solidariedade.
É contra a conversa fiada, que vai sendo difícil de aceitar pelos sindicatos, autarquias e escolas, que apresentarei, no debate da especialidade, propostas que, sem aumentarem o défice, optam por uma distribuição mais justa das despesas, tais como: o aumento das pensões e outras medidas como a abolição das taxas moderadoras, a actualização dos escalões do IRS não inferiores a 10 % e, no âmbito da acção social do ensino superior e das propinas, a eliminação do artigo 55.º da Lei do Orçamento.

O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O texto das Grandes Opções que foi apresentado ao Parlamento e a exposição que sobre ele aqui foi feita pelo Ministro Valente de Oliveira sugerem a conveniência de não deixar passar esta oportunidade sem formular, pelo menos, um apontamento a respeito de alguns valores fundamentais que informam a maior parte dos debates dos últimos dias.
A sequência da revisão constitucional e do debate orçamental, tudo já condicionado pelo projecto da União Política Europeia, definem uma conjuntura temporal que não se repetirá com frequência, pelo que fundadamente se pode falar em jornadas históricas da Assembleia da República.
Por outro lado, a tentativa de globalizar os problemas do Estado Português, cada ano repetida em função das exigências constitucionais a que obedece o documento, contribui para evitar que tudo fique submetido à perigosa aversão tecnocrática dirigida contra os condicionamentos por escalas de valores ou opções axiológicas.
Um inconveniente que se evidenciou no presente debate em vista da escassa curiosidade que a exposição do ministro responsável suscitou, não certamente porque o tema e o tratamento que lhe deu não o merecessem, mas porque as questões de intendência são prementes e absorventes.
Ora, um problema básico, especialmente posto em evidência no capítulo das opções que lida com a função e projecção de Portugal no mundo, diz respeito ao valor da Nação e do Estado nacional, porque, neste caso, a programação em apreço ocupa-se de uma identidade à qual o qualificativo não pode ser negado.
Talvez não seja difícil admitir que, em vésperas de ratificar a União Política Europeia, se vai tornando comum ver adoptar como ponto de partida a afirmada crise e até falência do Estado nacional, sendo frequentes inquietações e urgências de apostolado contra os perigos dos nacionalismos.
Quando se procede à revisão da história do conceito e realidade desse Estado nacional, não pode deixar-se de surpreender alguma contradição entre a novidade da referência na política e no direito internacional, a escassez de estados nações que existem no mundo e a dimensão do clamor que não distingue espécies de nacionalismos e diversidade de políticas nacionalistas. Um clamor que agora vem, sobretudo do norte para o sul do mundo, invertendo a queixa que, até ao ano zero europeu de 1945, subiu sempre do sul europeu contra o norte.
Não é difícil referir uma vasta literatura, completamento independente das nossas preocupações domésticas, toda

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orientada, todavia, pela referida noção de crise do Estado nacional, e toda aplicada a desvendar os futuríveis de uma nova ordem internacional sem aquele protagonista. Por exemplo, Robin Wright e Dayle Mac Mances, extremamente inquietos com o anunciado fim da história, que veio dos Estados Unidos, oferecem-nos um livro chamado Flashpoints, traduzido na Europa com o título de Futuro Imperfeito, e que bondosamente formula as «chaves para interpretar um mundo em crise». Tudo a partir da crise do Estado nacional, que, neste caso, como é frequente nos analistas, também abrange casos como o da Jugoslávia, da Checoslováquia e até da extinta União Soviética.
Porque o intuito deste apontamento não é o de fazer longas demonstrações, mas tentar evitar que os equívocos semânticos se agravem e tomem ainda menos claras as opções com que os Portugueses vão ser confrontados dentro de breves dias, sem terem participado excessivamente nos debates, gostaríamos de deixar consignado nas actas da Assembleia que, em nosso parecer, aquilo que está em causa, no mundo a que pertencemos e em cuja gestão não desistimos de participar, é o Estado soberano, é o ocidente dos Estados soberanos, não é a Nação, nem os raros Estados-nações que existem.
Ao contrário, parece um elemento importante desta crise temporal do Estado soberano, o ressurgimento concomitante e evidente das nações e da sua luta contra os constrangimentos dos Estados plurais em que estão integradas, a vários títulos.
Quando, em Julho de 1990, o Kosovo foi proclamado independente por uma assembleia ao ar livre de povo sem distinções de ocupação ou hierarquia social, um jovem e apaixonado escritor e líder político chamado Veton Surroi proclamava que «era um erro a existência da Jugoslávia porque era um país contra a natureza». Seis meses depois, no Quebeque, do outro lado do mundo, 70 % da população apoiava a secessão e a formação de um novo estado.
Mas o fenómeno é o mesmo em todo o território da antiga URSS, na índia, na Nigéria, na Inglaterra, onde não pode já deixar de se acrescentar à questão da Irlanda do Norte as aspirações de Gales e da Escócia; os franceses da Córsega e da Bretanha exibem símbolos que são de intenção mais do que regional.
Por todos, vale a falência da URSS, que representou a tentativa de submeter 104 nacionalidades a uma só soberania, com o projectado novo cidadão soviético a servir de elo do tecido humano.
De facto, são visíveis dois movimentos só aparentemente contraditórios, mas aparentemente contraditórios: a alternativa da desintegração e a alternativa da integração; o movimento em direcção à libertação das pequenas unidades e o movimento em direcção aos grandes espaços formalizados por tratados, e pelo consentimento.
Tal como foi anunciado por Helmut Wagner, da Universidade Livre de Berlim, as pequenas nacionalidades, libertadas dos constrangimentos estaduais do passado, suspiram, suplicam pela oportunidade de pertencer a uniões mais vastas, sem perda da sua indentidade, da língua, da cultura e costumes, nem da capacidade, finalmente alcançada, de gerir os interesses próprios, na medida das suas capacidades.
Como foi notado, «tornar-se membro de uma união maior é um esforço tão profundo e sério como o esforço da desintegração». Por outro lado, gritos como «turcos para a Turquia» ou «a Bulgária para os búlgaros» e conflitos como os dos combates corpo a corpo entre romenos e húngaros, em 1990, reflectem-se em distantes filosofias políticas, por exemplo na Coreia do Sul, onde Lee Hong Koo, conselheiro político da presidência, concluiu que «a comunidade está a ganhar importância e o Estado está a perder importância».
Em suma, multiplicam-se os casos das nações ou grupos étnico-culturais em revolta contra o Estado, atacando a validade da definição do seu instrumento opressor que é a soberania. A verdadeira lei da complexidade crescente que se vai revelando é a da articulação da multiplicidade crescente dos centros de decisão e da convergência delas para o encontro em unidades superiores que supram a crise do Estado soberano, do ocidente dos Estados soberanos e não da Nação ou do Estado-nação. É o Estado que se pretende que seja outro, não é que a Nação ou a comunidade abdiquem.
Quando uma comunidade como a nossa tem a natureza, em face do mundo, de comunidade nacional, o reconhecimento da crise mundial dessa criatura que foi o Estado de soberania absoluta é um primeiro passo lúcido no sentido de preservar a Nação e os seus valores, um afã que tem de chamar-se nacionalismo, por muito que outros abusem dos sentidos possíveis da palavra e, neste sentido, as Grandes Opções do Plano não admitem equívocos. As Grandes Opções do Plano falam de mais mundo e não apenas da Europa.
Quando da ratificação do Tratado de União Política é da soberania que nos ocuparemos, é do destino do ocidente dos estados soberanos que estaremos a cuidar. O texto das GOP, ao fixar um conjunto de objectivos relacionados com a função de Portugal no mundo, para além da Europa unida, e com autonomia no espaço atlântico, no Brasil, na África e no Oriente, também obriga a meditar sobre a soberania, não agora pelo que toca à sua definição formal, aos planos de co-gestão e às áreas de transferências de competências inerentes às integrações em grandes espaços institucionais como a União Política, mas concretamente pelo que respeita às capacidades efectivas que estão ao dispor do Estado Português.
Os recursos, medidos pelas dotações orçamentais, ficam certamente muito aquém dos sonhos. Basta comparar a dimensão do aparelho diplomático com o projectado, para admitir que a renovada tentativa de definição de um conceito estratégico nacional ultrapassa muito aquilo que vai necessariamente ser um conceito estratégico do Governo. Não há, porém, mal na distância para os que acreditam que o projecto nacional não está vinculado às possibilidades e à vida de um governo. Todavia, num dos aspectos importantes do documento que diz respeito à investigação na área da ciência e da cultura, queremos reeditar uma proposta antiga, que é a da criação de um ministério da ciência e da tecnologia, dispensando a existência de outros para que não se diga que se promove mais Estado. Aqui trata-se, obviamente, de querer melhor Estado, numa área em que temos capacidade para ser o pólo de referência da vasta área da língua portuguesa e onde a coordenação de recursos humanos e materiais, a luta contra o duplo emprego e desperdícios e a busca da qualidade, terão vantagem em dispensar os protagonismos dispersos.
Também aqui a lei da complexidade crescente teria aplicação, conciliando a linha da libertação das pequenas unidades e da criação desinteressada com a coordenação das autonomias, à luz de uma visão geral do panorama, onde a intervenção da comunidade científica ficaria assegurada a todos os níveis.

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Teríamos até a oportunidade de avaliar melhor a valia e função de antigas instituições frequentemente esquecidas e que intervieram utilmente diminuindo as carências. A liberdade criadora da comunidade científica é, em primeiro lugar, o valor que deve presidir a essa reorganização.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Adriano Moreira, quero apenas corroborar as suas preocupações no domínio da ciência e da tecnologia e dizer que também o PS defende desde há muito tempo a criação de um ministério da ciência e do ensino superior.
Nós pensamos que o actual Ministério da Educação deveria ser divido em dois: um ministério da educação propriamente dito, que abrangesse desde o ensino pré-escolar até ao ensino secundário, e um ministério do ensino superior e da ciência, que abrangesse as escolas do ensino superior, com particular relevo para as universidades e a área da ciência, que consideramos também dever estar ligada às universidades.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, em primeiro lugar, quero agradecer a declaração que fez, reafirmando o projecto do PS nesta área, e dizer que concordamos com essa preocupação, mas dando-lhe a solução que acabei de sugerir. E uma preocupação antiga, julgo ter feito esta proposta pela primeira vez há alguns 30 anos, mas é difícil fazê-la passar, sobretudo por causa das ciências sociais, pois os governos, seja qual for o regime, gostam de tê-las domesticadas. Por isso mesmo, esta reorganização é muito difícil Mas julgo que é fundamental não perder a ocasião e creio que esta solução garantiria melhor a total liberdade e autonomia da comunidade científica, que creio ser um problema que precisamos de enfrentar, ao lado do problema, que não é pequeno e que o Sr. Deputado mencionou, da administração do aparelho do ensino.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na matriz do Orçamento do Estado para 1993 e no discurso do Ministro das Finanças elegem-se os trabalhadores da Administração Pública como alvos prioritários da política de redução de salários, de precarização e redução dos postos de trabalho. Era nome da redução das despesas públicas e da reestruturação do sector, sob slogans sonantes e com um aproveitamento condenável e hipócrita da justa aspiração dos utentes em ter acesso a uma melhor qualidade dos serviços, o Governo pretende que este «castigo exemplar» sirva de exemplo a todos os trabalhadores portugueses.
É cínico vir aqui ameaçar e responsabilizar as organizações sindicais com o cenário da crise caso não se submetam aos ditames do Governo. Sob o manto diáfano do consenso e da concertação esconde-se uma autêntica declaração de guerra aos trabalhadores.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não é negociação nem concertação que o Governo quer dos sindicatos; quer a sua rendição sem condições! Doutra forma não pode ser entendida a proposta de 4,5 % e 5,5 & de aumento salarial, acompanhada da entrada em vigor da «lei dos disponíveis» a que o Ministro das Finanças, na comissão parlamentar especializada, num lapsus linguae ou num suspiro de alma, chamava de lei dos despedimentos. O corte das despesas com pessoal no Orçamento para 1993, definido como pilar para a contenção orçamental e ó controlo da inflação, não pode ser sustentado com rigor, à luz do percurso dos últimos 15 anos, já que a despesa de pessoal passou de 44 % para 31 % do total das despesas correntes.
Acresce que, até por sectores do Governo, é reconhecido que não há trabalhadores a mais na função pública, tomando como referência os países da Comunidade Europeia. Também serve como prova insofismável a existência de milhares de contratados a prazo e com «recibos verdes», quantas vezes a exercerem trabalho efectivo e permanente, tão grandes são as carências em sectores estratégicos como a educação, a saúde, a segurança social e as autarquias.
Que consenso ou concertação quer o Governo quando, à revelia dos sindicatos, força a aprovação de uma lei que visa fragilizar o vínculo laboral e criar inseguranças, através de critérios na sua esmagadora maioria carregados de arbítrio e subjectividade? As chamadas opções de aposentação involuntária, de pré-aposentação e de desvinculação da função pública, mediante indemnização, as licenças sem vencimento por tempo indeterminado e a transferência para o quadro de outros serviços ou organismos públicos não visam uma verdadeira modernização ou reestruturação da administração central, regional e local desejada, essa sim, pelos trabalhadores e pelas suas organizações.
Para o Governo importa reduzir despesas e depois logo se vê. Para o Governo importa despedir 20, 50 ou 100 000 trabalhadores, com uma visão contabilística de poupança, independentemente dos custos sociais, silenciando as propostas sindicais, não promovendo a formação profissional, mantendo-se indisponível para discutir a reestruturação de carreiras e o futuro dos contratados a prazo. O Governo está em mora em matérias acordadas ou por compromissos assumidos, nomeadamente quanto à redução e uniformização dos horários de trabalho, quanto ao funcionamento das comissões técnicas, para discutir problemas de carreiras de higiene e segurança no trabalho, quanto ao não cumprimento integral do pagamento dos 2 %, simultaneamente não considerados no salário, quanto às promessas de redução da idade de reforma para as profissões sujeitas a um maior risco físico ou desgaste rápido, quanto à recuperação de pensões dos trabalhadores aposentados antes de Outubro de 1989 e quanto ao início de negociações de um novo diploma de revalorização de carreiras a ser aplicado em 1993.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acusamos o Governo de cometer dois agravos aos trabalhadores da função pública, fugindo a compromissos, promessas e responsabilidades anteriores, querendo, agora neste Orçamento, puni-los duplamente no seu direito à segurança no emprego e nos

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aumentos salariais justos. Sobre os aumentos de salários, como é possível o Ministro das Finanças vir aqui dizer, sem corar, que os aumentos discriminados de 4,5 % e 5,5 % (+ l % para os salários mais baixos) são orientados pela justiça social? Haja seriedade, Sr. Ministro! Os aumentos de 5,5 %, abaixo da inflação prevista, são inaceitáveis, mas, para agravar ainda mais a situação, o Governo faz um nivelamento por baixo, ou seja, a harmonização no retrocesso, aplicando, discricionariamente a outros, 4,5 %.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Acenar com títulos do tesouro a troco da redução salarial, no mínimo é uma brincadeira de mau gosto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nestes factos residiu a poderosa resposta de cerca de 400 000 trabalhadores das administrações central, regional e local, que, correspondendo ao apelo das suas organizações sindicais mais representativas, demonstraram o seu profundo descontentamento e a sua justa indignação pela atitude afrontosa do Governo. Derrotadas foram as mistificações, as pressões do Ministério das Finanças, que, não colhendo nem lição nem ensinamento desta manifestação inequívoca dos trabalhadores da função pública, veio ontem reafirmar aqui a sua postura ameaçadora e antinegocial.
O que está no Orçamento é que o combate ao desperdício - de que ainda há pouco falou o Sr. Deputado Rui Carp- se traduz tão-só num aumento de despesas correntes e numa diminuição real dos gastos com pessoal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para o PSD desperdício quererá dizer trabalhadores da função pública? Se assim é, mau caminho é este! Mas isso não surpreende quando verificamos que este garrote salarial, esta ânsia de despedir, tentando «servir de exemplo», está a ser testado noutros sectores, nomeadamente nos aduaneiros, nos portuários, na indústria e nos transportes. A propósito: em que rubrica do Orçamento estão consideradas as medidas e o apoio social aos trabalhadores aduaneiros ameaçados de despedimento em massa? Onde pensa o Governo parar quando considera haver excedentes na função pública, nas alfândegas, nas Forças Armadas, nos estabelecimentos fabris das Forças Armadas, na TAP, na CP, na CIMPOR, na EDP, no sector da indústria metalo-mecânica pesada, nos têxteis? Onde pensa, de facto, parar o Governo?
No orçamento da segurança social as «válvulas de segurança» vão diminuindo, sendo significativo que as rubricas do subsídio de desemprego e de doença sofram uma real diminuição. Onde está o compromisso do Governo em cumprir a Lei de Bases da Segurança Social, transferindo para o orçamento da segurança social as verbas para os regimes não contributivos que a lei impõe? E onde está a promessa do PSD em aproximar as pensões ao salário mínimo nacional, quando verificamos que, também aqui, o Governo aplica o princípio do nivelamento por baixo? À excepção das reformas do regime geral, com um aumento que não chega a 2 contos, todas as outras pensões tiveram aumentos de 6,5 %, o que, a manter-se a tendência nos anos seguintes, levaria a que todos os reformados e pensionistas qualquer dia estivessem na alçada do regime geral.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uma nota a finalizar. Quem nesta Casa passou pela discussão de 15 orçamentos, -com Ministros das Finanças mais ou menos vibrantes, gastando mais ou menos latim, mais ou menos aplaudidos por maiorias eleitorais maiores ou menores, verificando que as soluções são sempre velhas e repetidas, como velho é o sistema capitalista com toda a sua carga de injustiças sociais, sente uma distância enorme entre o país real e aquilo que aqui é dito pelos governos de direita.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Qual é o vosso orçamento?

O Orador: - Entre o discurso do Ministro Braga de Macedo, entre o artigo 59.º do Orçamento, que aumenta de 200 para 270 milhões de contos as indemnizações para uns quantos detentores de interesses e de fortuna, acompanhado do garrote aos salários, entre isso e o protesto daquela reformada com pensão de sobrevivência que veio mostrar-nos o recibo de reforma com o aumento de 6,5 % e o aviso da senhoria para pagar mais 8 % de renda de casa, nós somos capazes de ver a verdade e a natureza de classe deste Orçamento. Sempre se procura que sejam os trabalhadores a pagar a factura substancial da política de direita, criando novas exclusões sociais como reverso dos privilegiados que o PSD faz sentar à mesa do Orçamento.
Um dia as coisas hão-de mudar. Para melhor, temos a certeza!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: -; Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O momento da discussão das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1993 é um momento duplamente significativo, em primeiro lugar, porque ele é simultâneo com a vivência em pleno do Mercado Interno Único e com todas as suas consequências, e, em segundo lugar, porque o mundo que nos rodeia, que nos influi e que nos determina, está em crise. É por isso natural e inevitável a projecção dessa mesma crise e das suas consequências sobre Portugal. Escamotear esta realidade nós nunca o fizémos, nem o faremos.
O Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano são, por isso, de analisar neste duplo contexto, mas, simultaneamente também, de acordo com aquilo que tem sido a evolução do modelo natural de desenvolvimento que o Governo Português, já há alguns anos, empreendeu e que tem hoje uma tradução lógica e sequencial face ao passado.
Portugal não está em depressão, apesar da envolvência externa ser uma envolvência difícil. Alguns analistas têm procurado centrar o seu discurso - inclusive algumas forças partidárias - na imagem de que Portugal está em crise no sentido de uma depressão. Portugal não está em depressão mas, sim, numa fase de abrandamento do seu crescimento económico. E isso é inevitável, dadas a natureza da economia aberta portuguesa e a inevitabilidade das relações que Portugal sofre e retém do exterior. Mas é muito diferente falar de depressão e falar de redução do nosso nível de desenvolvimento económico. São questões substancialmente diferentes e têm naturezas distintas.

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Durante muitos anos, Portugal baseou o seu desenvolvimento empresarial num modelo de salários baixos, de incorporação tecnológica limitada, de um mercado limitado e, em algumas circunstâncias, parcialmente fendido, e em ajustamentos cambiais permanentes, de modo a reporem a ausência de produtividade estrutural da própria economia portuguesa. Foi o modelo pretérito de Portugal. Agora, o modelo que se começou a aplicar há alguns anos atrás tem cambiantes completamente diferentes: é um modelo de referência cambial mais estabilizada; é um modelo de produtividade interna mais intensa é um modelo de evolução do poder de compra dos salários mais visível e mais premente; é também um modelo de acesso tecnológico mais visível e mais consagrável.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a delicadeza e a dificuldade da discussão das Opções para 1993 boje derivam de uma coincidência: a coincidência de um momento conjunturalmente difícil externo a Portugal e da simultaneidade de vivermos em Portugal o período de transição, ou seja, assumirmos boje, nesta altura, os custos de transição entre um modelo passado negativo e um modelo futuro desejável. E é da coincidência do momento de custos de transição visíveis e inevitáveis com uma conjuntura difícil que nós, naturalmente, nos encontramos numa situação que não é a ideal. E ela é uma situação complicada.
Alguns poderiam pretender fazer parar esse período de transição, ou seja, que Portugal não continuasse na defesa do modelo empresarial que há alguns anos foi estabelecido. Pretender suspender o modelo e as dificuldades inevitáveis da condução deste mesmo modelo. Era uma opção possível, mas era uma opção de adiamento e Portugal foi demasiadas vezes, no passado, um país adiado. Portugal não pode, nem deve ser um país adiado, mesmo que algumas dificuldades se notem e se vivam no presente. Suspender hoje a aplicação deste modelo em Portugal era apenas paralisar e retroagir, era apenas tomar inevitável a prossecução mais tarde deste mesmo modelo, com mais dificuldades ainda. Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos de reconhecer a dificuldade do momento que atravessamos. E não a escondemos. Mas ai de nós se suspendêssemos a continuação da política traçada, porque os custos da sustentação do emprego em Portugal seriam muito piores.
Não faz sentido falar, em Portugal, na defesa à outrance do emprego que existe, porque algum emprego que existe é precário por natureza e é precário porque as empresas onde os trabalhadores estão não têm viabilidade.
O que temos de defender em globo é a inevitabilidade do modelo auto-sustentado de emprego, que só se pode consagrar a longo prazo com uma política de produtividade. Não é defender o que está mal, mesmo que, aparentemente, dê postos de salário. Nós não temos de defender postos de salário. O que temos de defender são postos de produção viáveis. Essa é a questão fundamental da economia portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Governo quis consagrar, de uma maneira transparente, visível e poderosa, esta visão microeconómica, a ponto de colocar, como segunda opção fundamental, a modernização, a internacionalização e o aumento do reforço da competitividade das empresas portuguesas. Não é que esta política não seja uma política inovadora, mas a sua consagração, da maneira como foi feita - e a
explicitação que ontem o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território aqui fez é disso transparência clara-, mostra à evidência que é uma questão chave para Portugal. É uma questão chave para Portugal as empresas serem viáveis e poderosas, porque a estratégia de um país já não é hoje dependente da força política, da sua força militar, a estratégia de um país, hoje em dia, assenta na força das suas unidades empresariais.
Por isso, a lógica da consagração, no próprio Plano, das opções, da necessidade e do cabimento desta política. Sobre ela gostaria que nos detivéssemos um pouco e abordássemos o tema com alguma incidência.
O tecido empresarial português tem envolvências e, em Portugal, elas estão claras: está definido um quadro institucional onde se movem as empresas, está definido um parâmetro cambial rigoroso para o seu funcionamento, difícil de cumprir mas rigoroso, e está definido um parâmetro financeiro sobre as mesmas.
E a propósito dos parâmetros financeiros que caem sobre as empresas, não posso deixar de considerar paradoxal a intervenção do PS nesta matéria.
Todos nós sabemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que tivemos dois mundos em Portugal: um, o mundo produtivo que se verteu na Europa, que se integrou no Mercado Interno Único, que viveu em concorrência dentro do Mercado Interno Único, e outro, o mundo financeiro, que esteve à parte. E é espantoso como, no momento em que, respondendo ao apelo histórico, até do próprio PS, no passado, e do tecido empresarial português hoje, nós vamos fazer com que o nosso aparelho financeiro se integre nessa corrente genérica do mercado financeiro. E no momento em que fazemos isto, em que se apela ao Mercado Interno Único, não só produtivas numa área financeira, o PS considera um aventureirismo, que existe uma liberalização das entradas de capitais externos em Portugal. Ou seja, numa altura em que o custo financeiro ainda é um ónus, é óbvio que a liberalização dos capitais externos tem dois efeitos imediatos na economia portuguesa: o primeiro é o de tornar mais disponível e acessível, a preço mais barato, o crédito para as empresas; o segundo é o de tornar a moeda portuguesa mais competitiva com as moedas externas, de modo a fazer baixar a taxa das operações activas em Portugal.
A proposta de acção do Governo é a proposta mais lógica e mais conducente a que os custos financeiros das empresas baixem em Portugal. Por isso, é duplamente paradoxal, na altura em que se celebra o Mercado Interno Único, que o PS faça cavalo-de-batalha dessa mesma integração e considere um aventureirismo esta política do Estado Português. «É pior para o Estado Português, é pior para as empresas portuguesas». Ai de nós se as empresas tivessem um Partido Socialista assim a defender os seus interesses em Portugal!... E falam VV. Ex.ªs dos empresários. Falem deles, que estão no seu legítimo direito e razão, mas, pelo menos, oiçam completamente as suas necessidades e não tomem apenas uma parte ou a nuvem por Juno.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma intervenção nas Grandes Opções do Plano é uma intervenção em relação à política do Estado e à política geral do País, incluindo os agentes económicos. Este Plano consagra uma perspectiva da necessidade de uma orientação estratégica para as empresas portuguesas. Sem essa orientação

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estratégica, nós ou confiamos no Estado providência, no Estado administrativista, e temos a falência do modelo soviético, ou caímos na tese inversa da ocupação do espaço português pela capacidade externa de intervenção. Nem uma nem outra são necessárias nem aceitáveis em termos nacionais.
Daí a necessidade dessa afirmação. E essa afirmação passa por uma noção de dimensão, porque sem o mínimo de dimensão crítica as empresas não têm planeamento estratégico, não têm orientação estratégica.
A política do Governo, conduzida nos últimos anos e proposta no texto das Grandes Opções, assegura e mantém esta perspectiva.
Em primeiro lugar, a política de privatizações correspondeu a uma tentativa bem sucedida de minorar o carácter de dívida pública, mas constituiu também, na prática, um reforço das grandes empresas, dos grandes grupos, que são indispensáveis para Portugal poder concorrer.
Em segundo lugar, a política de manutenção de todos os incentivos fiscais, financeiros às políticas de aquisições, de fusões foi fundamental em Portugal e vai ser um aspecto fundamental a considerar no futuro.
Em terceiro lugar, a política que o sector empresarial do Estado gizou, no sentido de fomentar coligações de interesses entre várias instituições financeiras, constituiu a melhor forma de assegurar o mínimo de invenção crítica, para podermos intervir no estrangeiro e, sobretudo, para também intervirmos no mercado interno para nos defendermos.
Ao assegurar esta política, o Estado Português foi favorecedor de uma política patriótica, de uma política importante para a conciliação de todo o tecido empresarial português.
É por isso que esta política do Governo nos lembra um pouco o modelo que foi seguido na Holanda, um pequeno país como o nosso, com o mesmo número de população, com a mesma dimensão e com um tecido industrial também baseado numa dúzia de grandes empresas e num conjunto de pequenas empresas onde se irradiam os efeitos de dispressão, de irradiação, de subcontratação tecnológica que as grandes empresas fazem.
O modelo holandês, que está um pouco retratado nas Grandes Opções que o Governo apresenta, é um modelo correcto, necessário e inevitável para que continuemos.
Decorre ainda da questão da orientação estratégica das empresas um terceiro problema - o da sua internacionalização.
Verifiquei, com alegria, que nenhum partido da oposição contestou, nem sequer o discurso do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território nem tão-pouco qualquer opção fundamental contida no Plano. Ê não contestou estas, em particular, porque elas são correctas, são justas e a oposição, além de não ter apresentado alternativa, o que também não se vai pedir- ninguém vai pedir àqueles que nada têm para dar que dêem alguma coisa -, mas, sobretudo, não se lhes pediu o reconhecimento do mérito e da importância desta política.
A internacionalização da economia portuguesa é fundamental, porque é preciso passarmos da noção dos 10 para os 300 milhões. Simplesmente, em Portugal houve a sensação e a percepção de se viver muito tempo do ênfase do campo produtivo. E, Srs. Deputados, se compararmos o preço de um bem produzido em Portugal e vendido no estrangeiro e o preço de produção (da fábrica portuguesa), constata-se que o preço por que é vendido no mercado
exterior é mais do dobro, na maior parte dos casos, do preço de produção. O que é que isto significa? Significa que o nosso ênfase no tecido produtivo português não pode estar meramente na produção, tem de estar na intermediação, tem de estar no passo a jusante da produção. Para isso, de que é que carece? De diagnóstico, de percepções, de apoios financeiros.
O PAEP, o plano de apoio do Estado Português à internacionalização das empresas portuguesas é, por isso, vital, é a única maneira de conseguirmos compensar dificuldades que, boje em dia, encontramos no campo da produção e compensarmos com alguns ganhos, com algum valor acrescentado adicional. Aquilo que não obtivermos na produção vamos encontrar na intermediação.
É fundamental esta política que o Governo propõe, propondo até meios de implementá-la e apoiá-la. Não podemos deixar de ficar satisfeitos e de contemplar esta política, mas não só nesta como noutras áreas o Governo quer apoiar, dependendo, naturalmente, da capacidade empresarial portuguesa conseguir obtê-la.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste inciso, vale a pena meditarmos sobre, talvez, uma questão nova, um paradigma novo, que este Plano nos traz. Em Portugal, durante muito tempo, houve a concepção de uma separação, quase de uma dicotomia: sector público/sector privado. Uns defendiam que o Estado devia ser meramente regulamentador, que não devia intervir directamente na economia; outros consideravam que era fundamental que o Estado assumisse a propriedade e a gestão dos grandes meios de produção.
A proposta deste Governo é extremamente original, é talvez o conteúdo mais original, mais inovador de um moderno Estado, imbuído de uma óptima social-democrata para combater esta dicotomia que é falsa. Hoje em dia, não faz sentido a defesa meramente de uns ou de outros; faz sentido, sim, o reforço da capacidade nacional. É por isso que a proposta que este Governo faz é de uma intervenção directa do Estado nas empresas com viabilidade, com capacidade, com um plano de horizontalidade determinado, de modo a propiciar a sua reconversão, a sua internacionalização e assegurar postos de trabalho permanentes e auto-sustentados.
A versão que o Governo nos propõe, que está a praticar desde há um ano e meio e que está orientada e reforçada nestas Grandes Opções, consagra esta moderna visão do Estado que para além das funções normais tradicionais num Estado providência também procura compensar a debilidade do tecido empresarial, apoiando o que deve ser apoiado.
Mas mais: nesta proposta o Estado não quer só apoiar quem deve ser; quer fornecer um quadro geral de informação, diria, de parceria com as empresas, com o tecido produtivo, de modo a fornecer-lhes a informação, a análise das vulnerabilidades, que muitas das empresas portuguesas ainda hoje não dispõem. Trata-se de um paradigma novo, de um paradigma de coligação, de parceria, joint venture, entre o Estado e as empresas, de modo a criarem-se condições para o sucesso desse mesmo tecido empresarial.
Com isto, ficam em causa todos aqueles que nos acusam de ultraliberalismo. Ultraliberalismo é a perspectiva daqueles que não se preocupam com o futuro, os que não têm pena dos que sofrem, que não sentem pena nem dor por aqueles que um dia podem perder o emprego.
Ser ultraliberal é escamotear a realidade humana. As propostas deste Governo procuram não só propor mas fazer, até comparticipar.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos a consciência das dificuldades de momento, temos consciência da crise que alastra em todo o mundo e que também se projecta sobre nós. Temos uma opção: suspender o modelo, voltar ao passado, aguardar por melhores momentos. Se o fizéssemos, pagaríamos mais cara a factura, mais tarde. É a opção que Portugal não pode correr.
Estas Grandes Opções do Plano - e, naturalmente, as suas aplicações na área orçamental - consagram o momento de dificuldade, de adaptações, consagram o momento inevitável que a economia portuguesa tem de atravessar. Mas é um momento fundamental que temos de viver para que, daqui a alguns anos, aqueles que nos vão seguir não nos acusem de, no momento próprio, os termos traído, de, no momento próprio, em nome de uma certa facilidade, termos na prática comprometido o futuro e a solvabilidade de Portugal.
É isso que não fazemos, é isso que estas Grandes Opções e o Orçamento também não fazem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Deputado Ângelo Correia, fiquei cheio de curiosidade ao vê-lo subir à tribuna, porque V. Ex.ª, além de um arguto político, é também um profundo conhecedor do nosso meio empresarial, tem uma experiência longa de actividade empresarial.
Esperava, pois, que V. Ex.ª nos fosse dar um retrato real do nosso tecido empresarial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, afinal, o retrato que nos deu é muito próximo daquele que nos tem sido trazido até agora pelo discurso mais político do que técnico, o retrato do futuro, o retrato da miragem do futuro, mas não o retrato da situação presente.
Nesse sentido, gostaria de confrontá-lo directamente com uma intervenção, suponho que de ontem, do presidente da Associação Industrial de Aveiro -do seu distrito, Sr. Deputado -, que, entre muitas outras coisas, começa por fazer uma crítica ao Governo por ter esquecido toda a Região Centro em prejuízo de outras regiões do País. Enfim, ainda podemos admitir que o regionalismo tenha aqui um peso muito importante, mas depois diz: «Todo o tecido empresarial do centro está preocupado com as situações financeiras e económicas das empresas. Os indicadores económicos não são optimistas.»
Sr. Deputado Ângelo Correia, este foi o discurso do representante dos empresários da sua região, do distrito de Aveiro.
Gostaria que V. Ex.ª, confrontado com este discurso, que é muito diferente do seu, segundo a minha interpretação, o pudesse comentar.
Já agora quero fazer uma correcção: o PS não criticou a liberalização dos movimentos financeiros, mormente dos empréstimos; criticou, sim, a liberalização dos movimentos de curto prazo, que tem um sentido completamento diferente, porque são movimentos, sobretudo, especulativos, como muito bem sabe. Aliás, a liberalização dos movimentos financeiros, como também sabe, não vem resolver todos os problemas, pela simples razão de que as instituições financeiras estrangeiras exigem, para além dos juros mais baixos no mercado interno, cauções e garantias bancárias que, muito altas em Portugal, fazem também elevar o preço dos empréstimos.
Enfim, é uma correcção; o esclarecimento fica feito - é um repto ao seu conhecimento do real, para que V. Ex.ª não venha misturar o oásis com as miragens, no que diz respeito ao futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ângelo Correia, recentemente tem marcado algumas das suas intervenções pela preocupação e até oposição ao Tratado da União Europeia, de Maastricht, tendo considerado - e isto veio a público e não foi desmentido - que este Tratado vai agravar as dificuldades e as dependências do País, designadamente do seu tecido produtivo.
Como o Sr. Deputado sabe, este Orçamento é marcado pelo espírito de Maastricht, designadamente quando acentua a aceleração dos indicadores para a convergência nominal em detrimento da economia real. Como também sabe, nas condições em que essa aceleração está a ser feita, desprezando os períodos de transição que foram negociados no quadro da Comunidade, está a conduzir ao agravamento da situação económica das empresas, ao aumento das falências e à perspectiva do agravamento da instabilidade e do desemprego para milhares de trabalhadores.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Deputado, pergunto-lhe se para si Maastricht é mau e se este Orçamento é bom.
A outra questão é a de que a opção que o Sr. Deputado aqui nos traz não é a da solidariedade e da justiça social. O Sr. Deputado defende - aliás, o Governo também defende - que neste país só têm lugar as empresas e os sectores viáveis. Ora, uma vez que, se comparados com os indicadores da economia europeia, o grosso dos sectores da actividade económica deste país e das empresas dos vários sectores não são viáveis, em sua opinião, acha que devemos «fechar» o País? É esta a dimensão social do desenvolvimento? Que futuro defende o Sr. Deputado para o País neste quadro?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, agradeço as perguntas que me foram postas por ambos os Srs. Deputados e começarei por responder ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
As empresas que não são viáveis têm de fechar para darem lugar a empresas onde a alocação de capital possa permitir emprego sustentado a longo prazo. A pior política que existe é a de manter um tecido empresarial falso que, a longo prazo, quando cair, rebenta com maior fragor e prejudica todos com maior intensidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E a transição?

O Orador: - A minha preocupação, que, seguramente, será igual à sua, porque ambos somos portugueses e não temos outro sítio para viver senão este, é a de tentarmos não fechar empresas por fechar mas fechar para reconverter, é a de permitir que, partindo das que se fecham e que não estão bem por não terem viabilidade, se criem capacidades para novas empresas. Repito que não se deve fechar empresas por fechar...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas onde está a alternativa?

O Orador: - Sr. Deputado, a alternativa está na capacidade empresarial portuguesa, que todos devemos tentar apoiar e estimular e é para isso que são úteis as Grandes Opções do Plano.
A sua segunda pergunta foi sobre Maastricht. Respondo-lhe que eu próprio não sou favorável ao Tratado de Maastricht e por isso não votarei a favor. Assim, não estarei na Assembleia por ocasião da votação, tendo pedido a suspensão do mandato para não votar algo com o qual não estou de acordo.
Porém, chamo a sua atenção para o facto de, apesar de não estar de acordo com o Tratado de Maastricht, os meus motivos não serem os mesmos que os do Sr. Deputado. Não estou de acordo por várias razoes, uma das quais é por considerar que, neste momento, não tem viabilize a base de solidariedade que está criada no Tratado. Mas as opções do Governo em matéria financeira nada tem a ver directamente com Maastricht; podem decorrer do Tratado de alguma forma, mas isso acontecerá sempre em qualquer circunstância.
Eu aplaudi e aplaudo o Orçamento. Quem é que não é a favor de uma redução da despesa do Estado? Quem não é a favor da diminuição do défice público? Quem não é a favor da diminuição da dívida pública do Estado? Eu sou a favor e este Governo assim procedeu. E fez muito bem! Por isso o aplaudo e estarei pronto a aplaudi-lo, quando for necessário.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas o Sr. Deputado não está de acordo com o Governo sobre Maastricht. Têm de entender-se!

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, talvez por pertencer ao partido a que pertence, não percebe a natureza dos outros partidos! É que nós estamos num partido democrático, em que somos livres de pensar e de agir em consequência Há um grau de lealdade que nos é exigido, mas, quando intervimos, dizemos o que temos a dizer, não só no cumprimento dessa lealdade mas também no grau de crença e de adesão a valores. Ora, os valores que este Governo defende coincidem em parte com o que determinam as cláusulas financeiras de Maastricht, só que coincidiriam sempre, em qualquer circunstância, quer assinássemos ou não o Tratado - e ainda bem que Portugal o fez! Aliás, em termos orçamentais, Portugal está no caminho certo. Por isso aplaudo e só não o faz quem não perceber um mínimo destas matérias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Contradição absoluta!

O Orador: - Sr. Deputado José Vera Jardim, as suas perguntas tocaram-me profundamente.
O Sr. Presidente da Associação Industrial de Aveiro, pessoa que muito respeito e que é importante líder da Secção local do CDS -é preciso fazer esta pequena destrinça, importante para se perceber alguns contextos discursivos-,...

Risos do PSD e do CDS.

... retratou um quadro empresarial com o qual concordo e com que vivo no dia a dia.
Na minha intervenção, não quis dizer que a economia portuguesa estava num «mar de rosas» mas antes pelo contrário- e se tiver dito algo a mais, pedirei desculpa e retratar-me-ei. Aliás, se não retratei as dificuldades, talvez tenha sido por senti-las no dia a dia, tal como as sentem muitos portugueses.

O Sr. José Sócrates (PS): - Então reconhece as dificuldades?

O Orador: - Sr. Deputado José Sócrates, reconheci-as em dupla instância: primeiro, porque Portugal atravessa uma fase em que existem os inevitáveis custos de transição de um modelo industrial e empresarial pretérito para um outro modelo futuro que é viável; segundo, sobre estes custos recai uma conjuntura externa a Portugal que se abate sobre nós. É devido à simultaneidade de ocorrência deste dois fenómenos que, obviamente, todos sentimos dificuldades. E ninguém as nega. A questão política não é a de viver as dificuldades ...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Então não estamos num oásis?

O Orador: - Sr. Deputado, fale de oásis, fale de camelos, fale de erva, fale do que V. Ex.ª quiser...

Risos do PS.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Ferro Rodrigues, respeito as opções zoológicas e botânicas de V. Ex.ª, mas o problema não é esse.
Na verdade, o problema não é o de dizermos que não há dificuldades pois elas existem, o problema é o de sabermos qual o modelo viável e sustentável para conseguirmos superar as dificuldades. A obrigação de um poder político -nosso, vosso, ou de quem quer que seja- é a de tentar encontrar um caminho correcto e viável. Assim, na minha intervenção o que tentei não foi dizer que não há dificuldades - pelo contrário! - mas, acima de tudo, que há um caminho possível, que reconheço difícil, Sr. Deputado José Vera Jardim, com escolhos, se calhar, com alterações tácticas de curto prazo em algumas políticas...

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Srs. Deputados, não digam «ah!». Sei que VV. Ex.ªs estão a criticar, mas este Governo não pode é copiar a atitude do anterior candidato a primeiro-ministro que, durante a campanha eleitoral e antes de ser eleito, já dizia que ia desvalorizar a moeda. Isso é que este Governo

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nunca pode fazer. Isso é algo que outros fizeram em 1983, mas o Governo Português não pode nem deve fazê-lo. O Governo Português sabe-o tão bem como nós próprios, como o Sr. Deputado José Vera Jardim, com a sua superior condição e conhecimento nesta área e com a nossa humilde condição. Portanto, todos temos confiança de que o Governo Português saberá encontrar os instrumentos próprios no momento próprio. Por isso não digo que não há dificuldades, digo e acredito é que há um caminho possível, que é difícil, que tem riscos, que tem ónus, que deve ser tão partilhado pelo Sr. Deputado José Vera Jardim, como por mim próprio, como por todos nós, de modo a conseguirmos encontrar o melhor caminho para Portugal.
Volto à sua primeira pergunta sobre a questão do movimento de capitais, matéria que merece alguma reflexão.
Em Portugal, as empresas necessitam, fundamentalmente, de dois tipos de financiamento: de financiamento a longo e a médio prazo e de financiamento a curto prazo. O movimento de capitais externos de curto prazo permite sobrepor e encontrar alguma solubilidade nalguma área onde, hoje em dia, o credito é mais procurado. Sr. Deputado José Vera Jardim, como sabe, a procura de crédito em Portugal não é, fundamentalmente, ao nível do médio e longo prazo mas no domínio do capital de curto prazo - V. Ex.ª chamou-lhe capital especulativo e eu chamo-lhe de curto prazo. Assim sendo, a liberalização nessa área é extremamente benéfica para Portugal, porque vai suprir a carência mais importante que se verifica hoje em dia e que se manifesta a nível desse financiamento mais concorrencial - passe a expressão -, para obrigar a banca portuguesa a cumprir regras e a utilizar mecanismos similares.
Assim, não compreendi a posição de VV. Ex.ªs e por isso compreendo a posição do meu governo. Não pense V. Ex.ª que tudo são rosas; pelo contrário, o caminho é difícil. Mas ai de nós se, em conjunto, não soubermos ultrapassar um momento difícil para Portugal, porque o resultado obtido não é para nós próprios, nem para este Governo, mas para todos os portugueses e para os nossos filhos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Depois de apreciar as propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1993, de as comparar com as apresentadas para 1992 e após ter ouvido a intervenção do Sr. Ministro das Finanças, Os Verdes são obrigados a concluir que, em matéria de Grandes Opções do Plano e de Orçamento do Estado, não há nada de novo, antes pelo contrário, verifica-se que a desertificação se espraia por falta de ideias novas e sentido crítico.
De facto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nos discursos dos membros do Governo e do PSD insiste-se em tomarem a realidade pela vontade do que gostariam que fosse, e é este desfasamento que transparece nas propostas orçamentais que apresentam. Como tudo é pressuposto ser o que não é, quando são confrontados com a realidade, ou seja, com a oposição, que não apenas a oposição parlamentar, como o demonstram, de entre outras, as lutas dos estudantes, dos professores, dos médicos e dos trabalhadores da função pública em geral e também dos guarda-nos, os fazedores da política do PSD não têm qualquer pejo em jurar, por tudo quanto têm por mais sagrado, que a realidade se está a passar para a oposição.
Mas é verdade, Srs. Membros do Governo e Deputados do PSD, a realidade é o que é e, por muito que vos doa, não vale a pena desperdiçar mais energias dessa maneira. Certamente já terão ouvido falar que a realidade não se transforma por decreto!
Os factos e as situações demonstram isso à evidência. No entanto, o Governo, para o ano de 1993, ao mesmo tempo que impõe a manutenção da carga fiscal agravada sobre o rendimento das famílias, propõe actualizações salariais inferiores à meta da inflação, que, como se sabe, é irrealista. Basta considerar que se a magia do número oito não funcionou para 1992, mantendo-se o valor da inflação ainda acima dos 9 %, em 1993, mantendo esta política, nem com milagres será atingida a meta dos 6 %.
Quando já não é novidade para ninguém que a situação social se vai agravar, por já se estar a verificar o encerramento de um número crescente e significativo de empresas com o inerente desemprego em cadeia, agravado pela «lei dos disponíveis», não só se perspectiva um agravamento das condições de vida dos Portugueses, afastando-nos ainda mais dos padrões europeus, como se degrada deliberadamente a qualidade de vida em Portugal.
Por força da implementação de uma política economicista, forçou-se a desertificação e o despovoamento dos campos que teve como contrapartida o crescimento desmesurado das periferias dos grandes centros populacionais, com a inevitável degradação do quadro de vida nos meios urbanos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O irrealismo que grassa nas hostes do PSD e do Governo subiu ontem ao rubro, quando o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, ao querer convencer-nos a comprar o seu novo plano de poupança para a reforma (PPR), afirmou que, na política de ambiente, tudo correria bem, não fossem aqueles malandros das autarquias que se recusam a estabelecer contratos-programa com o Governo para investirem 1,6 milhões de contos em saneamento básico, por forma a atingir os níveis comunitários no ano 2020, acusando também as autarquias de serem as culpadas de ainda não estar em funcionamento o sistema nacional de tratamento de resíduos tóxico-perigosos que o Governo promete desde 1990.
Quando as autarquias assumem, cada vez mais, responsabilidades nos domínios da educação, da saúde, do património e do ambiente, sem contrapartidas financeiras, e quando os municípios se vêem penalizados, com este Orçamento, em mais de 50 milhões de contos porque o Governo se recusa a cumprir a Lei das Finanças Locais, são agora as autarquias, os mais prestigiados órgãos da Administração Pública, acusadas de serem «as más da fita».
Esta acusação é tanto mais grave quando parte de um responsável da governação que, não tendo estratégia nem orçamento para cumprir os compromissos assumidos por Portugal na Cimeira da Terra, se vê incapaz de dar rumo certo à resolução de problemas que, no nosso país, hipotecam o futuro dos nossos filhos.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais subiu ontem à tribuna, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para dizer que continua a cumprir rigorosamente o papel que lhe foi encomendado pelo Sr. Primeiro-Ministro: «agitar as águas estagnadas do lago para parecer que navegamos no alto mar».

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Mais uma vez a realidade não se compadece com o esforço e a vontade do Sr. Ministro. De facto, o valor orçamentado para o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais em 1993, em termos reais, é inferior ao de 1992; o orçamento no PIDDAC para 1993, relativamente a 1992, limita-se a acompanhar a inflação, o que, se considerarmos que, em 1993, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais assume competências que, em 1992, estavam atribuídas aos Ministérios da Defesa e do Mar e ainda que a propalada integração do ambiente nas políticas sectoriais tem menor expressão em 1993 do que teve em 1992, Sr. Presidente e Srs. Deputados, resta-nos informar o Governo - e é para isso também que estamos aqui - que caiu a máscara à política que o PSD tem para o ambiente.

Aplausos do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mário Maciel inscreveu-se para pedir esclarecimentos. Acontece que o Sr. Deputado André Martins não dispõe de tempo para responder, mas o Partido Comunista Português cedeu-lhe algum tempo para este efeito.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, as estatísticas recentes da OCDE, que foram magnificamente interpretadas pela reputada economista deste organismo, Candice Stevens, num artigo que foi profusamente distribuído em sede da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, indicam que já há um mercado mundial de equipamentos e serviços na área do ambiente da ordem de 200 milhões de dólares e que este mercado se aproxima paulatinamente do mercado da indústria química e também do aeroespacial. Trata-se de boas notícias que, obviamente, indicam uma inflexão na mentalidade antiga face à problemática ambiental. Isto é, hoje em dia para que a economia seja mais rentável é necessário investir no ambiente porque, sendo os recursos humanos a principal propulsão de uma economia, é necessário que o homem esteja de saúde. Ora, hoje em dia lutar contra os focos de poluição é conferir mais saúde aos cidadãos, é torná-los mais compensados face ao mercado laboral.
Portanto, a mentalidade moderna que está plasmada nos objectivos do Governo e que ontem foi corroborada pela intervenção do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, é a de inserir a vertente ambiental nas preocupações do desenvolvimento económico, porque sabemos que é desta forma que a própria economia se tornará mais rentabilizada.
Por isso mesmo o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais avançou três ideias, que nos parecem muito atraentes e às quais não se referiu o Sr. Deputado André Martins: a do pacto ambiental, a de criar empresas ligadas ao ambiente e a da recuperação e articulação entre a administração central e a administração local.
O Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais também erigiu como primeira prioridade do Governo a política da água e o Sr. Deputado André Martins não se referiu a este facto. Aliás, limitou-se a «passear-se» por questões pontuais sem ter tido a elevação de reconhecer que, em termos de Governo, há, notoriamente, uma mentalidade modernizante face à aplicação das políticas ambientais, as quais não podem esgotar-se numa análise fria e calculista das verbas a elas atribuídas.
Quanto ao pacto ambiental, ideia que é muito atraente, significa, no fundo, concertar opiniões e esforços entre a administração central, a sociedade civil e seus empresários e a administração local. É impensável que a administração central continue a adoptar e a pugnar por políticas, se, no plano local, as mesmas não são respeitadas, por exemplo, ao nível dos licenciamentos. De facto, no nosso país há muito licenciamento criminoso que parte da administração local. Assim, é necessário que esta última esteja em consonância com os objectivos primeiros traçados pela administração central.
Finalmente, quanto à política de ambiente, pensamos que combater hoje as disfunções ambientais é proporcionar imediatamente a rentabilização da economia. E porque um trabalhador agredido ambientalmente é um trabalhador descompensado. Por isso mesmo a política de ambiente - esta é a ideia do Governo - é um vector inserido no desenvolvimento económico do nosso país.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mário Maciel, estou de acordo com o que pensa, mas já não concordo com as referências que fez à intervenção do Sr. Ministro.
No que se refere à questão da água, é importante frisar bem que, em 1990, este Governo publicou dois decretos-leis impossíveis de aplicar e agora este ministro diz que é necessária uma nova lei da água. Afinal, em que ficamos?
Quero também dizer-lhe que continuamos à espera do aparecimento do plano nacional de política de ambiente, como continuamos à espera que seja apresentada e aprovada, na Assembleia da República, a estratégia nacional de conservação da Natureza.
No entanto, não contente com toda a propaganda que foi feita ao longo destes anos, sem repercussões práticas da política que vem defendendo, o Sr. Ministro veio agora falar-nos que Portugal vai ter uma Agenda 21. Sr. Deputado, onde se vislumbra neste Orçamento do Estado para 1993 - e onde é que tem efeitos práticos - essa Agenda 21, de que o Sr. Ministro já está a falar, quando ainda a não deu? Que solução prática há para o plano nacional de política de ambiente e para a estratégia nacional de conservação da Natureza?
Sr. Deputado, é com esta propaganda e com esta especulação que eu não estou de acordo e, consequentemente, não estou de acordo também com as referências positivas que fez ao discurso que o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais aqui proferiu ontem.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um ano atrás e a este mesmo propósito apontei, desta mesma tribuna, o equívoco e o vício cultural de que têm vindo a enfermar todos os Orçamentos do Estado.
Pois bem, este, o de 1993, é o primeiro que indicia um tímido mas efectivo esforço para desembaraçar o Estado daquilo que bem poderia considerar-se um autêntico

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«colete de forças», que o tem mantido refém da sua relação dependencial com o cidadão.
Já por diversas vezes e em diversas circunstâncias, o PSN teve oportunidade de manifestar-se contra aquilo que, numa imagem do quotidiano, designou por «efeito de chuveiro», produzido pela obsessão assistêncial do Estado que, querendo controlar todo o tecido social, pretensão indevida e perigosa, se lança num exercício de bombeiro em dia de enxurrada - de tantas solicitações e de a tantas situações tentar acudir acaba por não satisfazer plenamente a nenhuma.
Na recolha de receitas através do sistema tributário, continua o PSN a ver graves distorções, já que se a unificação processual (leia-se IRS) trouxe inegáveis vantagens operacionais, ela está ainda longe de garantir a justiça relativa na distribuição dos encargos fiscais pelos diferentes grupos de cidadãos.
A lei das propinas, por exemplo, segundo o PSN, outra coisa não é do que o reconhecimento, politicamente implícito mas tecnicamente explícito, desta insuficiência do sistema fiscal, já que, se a tributação a montante fosse inequivocamente razoável e justa, não haveria necessidade de recorrer a quaisquer expedientes de casuística tributiva, como acontece no caso concreto do financiamento do ensino superior, constitucionalmente gratuito. Mas isto são contas de outro rosário.
Entremos neste Orçamento do Estado para 1993.
O seu objectivo nuclear é o da redução do défice. Ora, sendo o défice o efeito do balanceamento entre despesas e receitas, caberá interrogarmo-nos, para já, sobre a fiabilidade deste desiderato fundamental.
É claro que as perspectivas de claro nada têm. O futuro é fluido e nebuloso. Vejamos.
As receitas que dependem do crescimento económico assentam na previsão, algo temerária, de que este se manterá em 1993 a uma taxa de 3 %, pelo menos, o que, a julgar pelas indicações do 2.º semestre de 1992, em que o crescimento se manteve abaixo dos 3 % com tendência para o agravamento, se perfila como muito pouco provável. Ora, ficando as receitas aquém do previsto, fica, automaticamente, ameaçado o grande objectivo do Governo: o de reduzir o défice (4,5 % do PIB).
Esta previsão é inquietante porque lança, uma vez mais, para a praça pública, o espectro de um agravamento fiscal, única forma de atenuar o desequilíbrio entre as despesas e as receitas.
Só se espera que o clima eleitoral em que o País vai entrar a partir das autárquicas seja um bom motivo para evitar o recurso a uma tão fácil quão perigosa solução.
Mas é inegável que este Orçamento do Estado espelha um significativo esforço na que à contracção das despesas se refere. Só se lamenta que, também aqui, haja uma flagrante injustiça, já que situações há que se não compadecem com a poupança do Estado, dado tratar-se de situações material e humanamente inconvertíveis, como o são a dos nossos reformados e pensionistas, com pensões impossíveis, ou a dos nossos deficientes.
Mas há mais: a referida contracção de despesas, mais do que incidir no aparato do poder, que esse continua esplendoroso, é conseguida à custa dos funcionários públicos, sendo até previsível algum desemprego naquele sector. Na realidade, os funcionários públicos serão, claramente, os mais atingidos.
No que diz respeito à previsão de aumento salarial de 4 %, anunciado não sem alguma dramatização pelo Governo, importará dizer o que nem por ser óbvio deixa
de ser importante e que é o seguinte: a meta da inflação apontada pelo Governo situar-se-á entre os S % e os 7 %. Ora, uma tal meta é, de facto, muito difícil de conseguir, mas, reconhece-se, não é de todo inatingível, mas o mais sensato é situá-la na banda dos 7 %.
Ora, significa isto que, da titânica luta entre o aumento salarial de 4 % e a inflação de 7 %, resultará um abaixamento dos salários reais dos trabalhadores portugueses, o que é socialmente penalizante.
Numa apreciação necessariamente genérica, importa reconhecer que este Orçamento do Estado é dos mais equilibrados e está tecnicamente bem elaborado. Apenas está afectado por uma doença grave chamada assincronia. Isto é, este Orçamento do Estado, com as virtudes que nada nos custa reconhecer-lhe, não aparece no timing adequado, porque, julgamos, irá contribuir para o agravamento da conjuntura e para a propiciação da recessão que já se insinua. Dir-se-á que o médico, ao receitar uma dose cavalar ao doente, em vez de curá-lo, agravou o seu estado, fragilizando as suas resistências.
Não basta ser um bom médico, é preciso ser também um bom doente. E a nossa economia está a precisar de uma consulta urgente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Manuel Sérgio. Aliás, o Sr. Deputado teve a virtude de quase não terminar a sua intervenção em estado de ucronia. Registou apenas 0.3 negativos na utilização do tempo de que dispunha.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Couto dos Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A educação é, para este Governo, um dos desafios fundamentais, pois ela é a essência da modernização e do desenvolvimento do País e constitui um dos pilares da identidade nacional.
No actual contexto internacional, onde a incerteza predomina, a competitividade é cada vez maior e mais exigente e a mobilidade social assume um papel importante, o sistema educativo não pode ignorar tais realidades.
Com efeito, o limiar do século traz-nos diferentes exigências e expectativas, renovados anseios e necessidades.
Se o mundo se transforma, a educação não pode alhear-se dessa transformação e tem de incrementar a sua criatividade e a sua capacidade de inovar.
Se os valores que nos rodeiam se alteram, a educação não pode continuar numa perspectiva materialista e iludir que a qualidade é uma exigência que o sistema acrescidamente impõe.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se a gestão dos recursos é uma necessidade e um anseio geral, o sector da educação tem de ser um paradigma de rigor e de racionalidade na gestão dos imensos recursos que a comunidade, através de um Orçamento como o presente, lhe confere.
Por estas razões, o Governo considera que o sistema tem de orientar-se por três vectores fundamentais: a melhoria da qualidade do sistema de ensino; o rigor e a racionalidade da gestão; a confiança e o empenhamento dos agentes envolvidos.

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E estes três vectores são, para nós, bússolas constantes e faróis permanentes, porque são vectores que encerram em si mesmo a reforma do ensino, há tantos anos desejada.
São vectores que obedecem a prioridades políticas e, encarando o sistema de ensino de forma global, temos de ser capazes de articulá-los, com critérios e objectivos e com convicção política, e de desenvolver o conjunto das actuações que, tendo como vértice a escola, não ignorem a especificidade dos jovens e a sua formação inicial, bem como a individualidade dos docentes e a sua contínua formação profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A escola é, para nós, não só um espaço de formação integral como também um dos elementos de onde emana a qualidade da sociedade civil.
Creio que, com efeito, a batalha da qualidade do ensino será um dos eixos fundamentais da nossa acção, sendo, ao mesmo tempo, um desafio para Portugal e para os Portugueses.
Por isso consideramos encerrado o ciclo da quantidade que absorveu, durante os últimos seis anos, o nosso sistema de ensino, aliás, como o demonstram os últimos dados demográficos.

A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Completo absurdo!

O Orador: - Agora estamos profundamente empenhados na batalha da qualidade. É nesta perspectiva que o ano lectivo de 1992-1993 constitui o início de um novo ciclo, o ciclo da qualidade, coincidindo com o primeiro passo da generalização da reforma educativa ao nível do ensino básico e secundário e das grandes reformas ao nível do ensino superior.
Mas, Srs. Deputados, a qualidade no sistema educativo não se decreta, estimula-se, não se impõe, aceita-se. Repito, ou se assume como projecto ou se perde como desafio.

Aplausos do PSD.

E este desafio é de todos: dos órgãos de soberania, das autarquias, dos pais, dos professores e dos alunos.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - E também do Governo!

O Orador: - E, sendo de todos, não entendemos, se bem que percebamos, as resistências e as incompreensões que algumas forças de bloqueio oferecem e evidenciam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compreendemos e aceitamos que as reformas devem obedecer aos princípios da gradualidade e da justiça social. Compreendemos que as reformas mexem com interesses instalados e privilégios. Porém, não compreendemos aqueles que, querendo afirmar-se como alternativa política, têm medo da mudança e navegam no mar do cinzentismo político perante essas mudanças.

Aplausos do PSD.

Pelo contrário, entendemos e percebemos as obstruções e os ataques de outras forcas que, perturbadas com as mudanças, tudo fazem para as paralisar. Estas forças continuam a entender a democracia como expressão do seu próprio programa partidário, não havendo lugar para o pluralismo de ideias.
Vamos prosseguir, de forma ponderada, determinada e equilibrada, a reforma do sistema educativo, porque ela é uma exigência nacional face aos enormes desafios que o futuro nos reserva. É uma reforma que não pode ser adiada ou interrompida, sob pena de sermos cúmplices de um sistema que não se regenera e não se adapta às exigências que este final de século impõe a cada um de nós, seres livres e responsáveis.
Apostamos, decididamente, na dignificação e qualidade do ensino. Passos decisivos foram já dados neste final de ano, ao lançarmos, pela primeira vez em Portugal, um programa de formação contínua para mais de 60000 professores, ao aplicarmos, no terreno, a generalização da reforma curricular, o novo modelo de avaliação dos alunos, o novo modelo de gestão das escolas e ao reforçarmos o orçamento do ensino superior em mais de 8 milhões de contos, saldando-se, pela primeira vez, todos os compromissos financeiros com as universidades portuguesas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um orçamento que exige criteriosa gestão e uma efectiva nacionalidade. O combate ao desperdício dos dinheiros públicos é um imperativo para todos aqueles que estão ao lado dos contribuintes. As atitudes «despesistas», como aquelas que norteiam o comportamento político da oposição, são factores que sacrificam o bem-estar dos trabalhadores e o seu futuro.
Que fique bem claro: para o Governo, a educação é um dos mais importantes investimentos. Mas, como em qualquer investimento, também aqui tem de haver opções e prioridades políticas. E é isso que aparece, de forma clara e estruturada, no orçamento da educação para 1993.
Com efeito, neste orçamento aparecem claramente como prioridades a acção social escolar no ensino superior, o desporto escolar, a difusão da língua portuguesa no estrangeiro e as escolas profissionais.
Um orçamento de mais de 670 milhões de contos, sem entrar em linha de conta com os aumentos salariais, representa uma enorme participação financeira dos contribuintes portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esse esforço orçamental poderá ser aferido de forma mais clara se tivermos em conta que a despesa global da educação ultrapassará, pela primeira vez, 14 % da despesa pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A educação é uma das políticas que exige o empenhamento de todos e a busca de largos consensos. Porém, isso não pode constituir obstáculo a que se evidenciem as diferenças de forma e conteúdo. E entre o Governo e a oposição há uma clara diferença quanto aos pressupostos políticos que caracterizam a função social da educação.
Para nós, esses pressupostos são a qualidade, o rigor e a confiança. Para a oposição, são o desperdício e o consumismo. Para nós, há prioridades políticas. Para a oposição, tudo são prioridades porque, como não governa nem acreditam vir a fazê-lo, tudo é possível, tudo pode acontecer!

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Nós entendemos o sistema educativo no quadro da política global do País, isto é, não esquecemos as outras prioridades, como as políticas da saúde, da segurança social, do ambiente e das acessibilidades. A oposição não estabelece articulações. Isola-se na análise fragmentada e no discurso difuso. Perde-se nas ideias.
Em termos orçamentais, a nossa atitude em relação ao sistema educativo é de prudência assumida. Se condenamos uma visão estritamente económica do sistema de ensino, também rejeitamos uma visão consumista, pelos efeitos nefastos que gera no sistema e pelo esforço acrescido que exige aos contribuintes.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o financiamento do sistema educativo não pode ser olhado de forma abstracta. Tem de ser analisado em todas as suas componentes e detectar quais as que, por efeito do decréscimo demográfico ou da melhoria e inovação na gestão, poderão contribuir para reduzir o desperdício.
É nesta perspectiva que a valorização dos professores, através da formação contínua, a introdução de novos modelos de administração, de direcção e de gestão das escolas e a celebração de contratos-programa com as universidades determinarão, de per si, uma acrescida co-responsabilização, uma melhoria das condições científico-pedagógicas e uma maior ligação entre a escola e a sociedade civil.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta relação entre a escola e a vida tem como pressuposto a confiança e o empenhamento de todos os agentes na modernização. E a confiança começa nas famílias, que tem de acreditar que a escola é um elemento determinante do processo de desenvolvimento das crianças e dos jovens.
A confiança passa também pelos professores que, conscientes da relação profunda entre o saber do homem e as suas vinculações sociais, são protagonistas dessa exigência que é conbecermo-nos para conhecer o mundo.
Mas a confiança dos alunos é também uma das molas da evolução do sistema, já que precisam de acreditar que o saber que acumulam não os leva a construir o seu futuro em areias movediças mas prepara-os para o mundo e para a vida, num tempo concreto e num espaço que tem identidade própria.
Esta aposta, sendo crítica de uma racionalidade utilitária e calculista, constitui o desafio da educação que está subjacente a este Orçamento do Estado. O mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são anacronismos dos tempos modernos ou então ecos do passado. E tanto uns como outros não acreditam nem desejam que a educação seja um desafio.
É esta diferença que também aqui está presente: uns dizem-se ausentes, mesmo que pretensamente muito presentes; nós afirmamo-nos presentes e, contra ventos e marés, contra «velhos do Restelo» e corporativismos, contra inércias e bloqueios, contra atavismos e interesses instalados, afirmamos que queremos, com todos e solidariamente, construir um sistema de ensino para Portugal neste final do milénio.
É este outro sentido da educação e do ensino que o Governo perspectiva como um desafio e como uma irrecusável aposta.

Quero crer que VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, também acreditam neste desafio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Sr. Ministro da Educação, esperava que o seu discurso, uma vez que a reforma vai começar, trouxesse aqui projectos concretos e meios para realizá-los. No entanto, o seu discurso foi apenas um somatório de intenções, como, aliás, aconteceu com os discursos dos seus antecessores.
Sr. Ministro, o que se passa na educação é grave. O Ministério da Educação - e vou começar por este tema por ele me parecer extremamente grave - está a manchar, de modo oportunista e demagógico, o nome da Assembleia da República com os spots publicitários sobre as propinas do ensino superior.

Aplausos do PS.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem lembrado!

A Oradora: - É ou não verdade, Sr. Ministro, que estão a ser gastos 600 000 contos com essa publicidade?

O Sr. Ministro da Educação: - Não é verdade!

A Oradora: - Então, se não são 600 000 contos, diga-nos qual é o montante. Mesmo que sejam 10 000 contos é uma vergonha!...
É ou não verdade que, ao usar estes meios e ao envolver o nome da Assembleia da República, o Sr. Ministro da Educação (em medo de assumir as suas responsabilidades no processo de aprovação desta «lei laranja»? Porque esta é uma «lei laranja»!...
É ou não é verdade que as verbas gastas nos spots publicitários dariam para construir várias residências universitárias?

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - E fico-me por aqui, pois não tenho muito tempo!...
Sr. Ministro da Educação, só com um grande investimento e metas bem claras conseguiria fazer aquilo que disse, ou seja, racionalizar o sistema.
Recordo que, em 1990, foram desenvolvidos estudos de necessidade e elaborados projectos para o desenvolvimento do sistema educativo em Portugal que previam metas a atingir. Onde estão essas metas, Sr. Ministro?
Aliás, nunca os valores do PIDDAC aí previstos para os anos seguintes foram atingidos, nunca foram investidas as verbas previstas para o ano de 1990, como nunca houve qualquer investimento no desenvolvimento da educação, nem mesmo com as verbas comunitárias, o que permitiria pôr Portugal ao nível dos outros países da Europa. Portanto, Sr. Ministro, o que lhe pergunto é: onde estão as suas metas?
O Sr. Ministro diz que acabou o ciclo da quantidade. Não é possível! Não é possível dizer-se, havendo cerca de 40 % de jovens fora do ensino básico e 50 % ou 60 % fora do ensino secundário, que acabou o ciclo da quantidade, mesmo com o decréscimo do número de alunos no ensino primário a que temos vindo a assistir. Vivemos num país europeu. O que é que vai acontecer? Vai o Sr. Ministro criar numerus clausus!

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O ciclo da quantidade acabou. Quais são as suas metas? Quando é que os objectivos dos ensinos básico, especial e pré-escolar vão ser cumpridos? Quando é que vamos ser um país europeu em matéria educativa? Quando?
Assuma as suas metas porque senão não 6 possível falar de racionalidade nem de planeamento, até porque este Orçamento do Estado denota uma brutal incapacidade de planeamento!
O Sr. Ministro também fala muito em qualidade. Mas a qualidade da educação depende dos orçamentos de funcionamento das escolas.

Vozes do PSD: - Não depende!

A Oradora: - Depende, sim!
Os orçamentos de funcionamento das escolas, e não os gastos em pessoal, na média dos países da OCDE, rondam os 30 %. Em Portugal, são da ordem dos 10 %. É o pior país da Europa em matéria de atribuição das verbas que permitem a qualidade e o funcionamento diário das instituições educativas. Assim não é possível proceder a qualquer reforma!
Termino, perguntando a que reforma e a que qualidade se refere o Sr. Ministro, face à penúria e à miséria em que vivem as nossas escolas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação: Face à prática política seguida e às vossas intenções, não acredito no desafio a que se referiu na parte final da sua intervenção. V. Ex.ª proferiu palavras muito bonitas, voltou a referir-se à qualidade, à justiça social e vá lá que desta vez não falou de forma demagógica, como é habitual na televisão, no dinheiro dos contribuintes.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Começou por falar de competitividade e da necessidade de o País estar bem preparado. Mas, Sr. Ministro, com o «seu» ensino, o País não está a ser bem preparado em relação a este objectivo.
Os professores vivem num clima de instabilidade, que também se verifica ao nível dos seus empregos; há quem se queixe com razão de ser mal pago! O parque escolar está a degradar-se, o ensino especial foi quase abandonado e o ensino em geral, como ontem referi, é visto sob uma óptica do economicismo, a exemplo do que se passa em relação à saúde, à habitação ou mesmo em relação à justiça.
O Governo usa um termo novo - pelo menos eu não o conhecia- e só sabe dizer que tudo é despesista: «Vamos acabar com a despesa!», diz. E a verdade é que também quer acabar com as despesas do ensino. Quem tiver dinheiro, tem ensino! Esta é a realidade com que este Governo nos confronta.
É bem claro que se sentem dificuldades ao nível do ensino universitário, que a autonomia universitária sofre os estrangulamentos financeiros que todos conhecemos e que há cortes orçamentais reais, por muito que V. Ex.ª nos tente dizer o contrário a propósito do orçamento para a educação.
Por falar em política economicista, não posso deixar de salientar a questão das propinas. Não nos venha o Sr. Ministro falar do artigo 55.º da proposta de lei do Orçamento do Estado - que não sei se é demagógico - cujo n.º 3 traz «água no bico». Mas a verdade é que o Sr. Ministro não sabe quantificar, através dos dinheiros das propinas, as construções escolares, não nos apresenta um plano de qualquer espécie. Fala nisso apenas para tapar os olhos às pessoas.
V. Ex.ª também diz que qualquer discurso da oposição é difuso. A classificação é sua. Pela minha parte, devolvo-lha e lembro-lhe uma questão candente. Ontem realizou-se à porta do Parlamento uma manifestação de milhares de estudantes mas o Sr. Ministro teve o cuidado de, há tarde, «não ter cá posto os pés», pelo menos eu não o vi...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mas que raio de linguagem é esta?

O Orador: - ... quando os estudantes pretendiam ser recebidos para apresentarem as suas petições.

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado!

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Só gostava de saber, Sr. Ministro, se, perante as manifestações a que temos assistido por todo o País, o Governo continua insensível ao protesto dos estudantes, no que também são acompanhados pelos professores?
Não lhe parece que o protesto global que se tem feito sentir em relação as propinas merece que o Governo repense esta problemática e recue em relação à posição assumida, tomando a iniciativa de proceder a uma nova discussão sobre este grave problema que atinge não só os estudantes, como também milhares de famílias deste país?

(O orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, prescindo do uso da palavra, em virtude do pouco tempo que resta ao meu grupo parlamentar.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Fizeste muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, coloco-lhe uma pergunta muito breve, tendo em atenção o facto de a nossa bancada dispor de pouco tempo.
Tendo em consideração que o Sr. Ministro prefere intervenções não fragmentárias mas globais, coloco-lhe a seguinte questão: com o cumprimento da escolaridade obrigatória actualmente existente, com as taxas de insucesso escolar que se registam em Portugal, com a ausência de um verdadeiro desporto escolar, com o decréscimo da acção social escolar que não tem parado de baixar nos últimos 12 anos, com a asfixia das universidades públicas, com a reforma educativa em curso que necessita urgentemente de novos investimentos, com a inexistência de uma verdadeira rede pré-escolar, como é

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que o Sr. Ministro ousa falar na passagem de um ciclo da quantidade para um ciclo da qualidade?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, folgo muito em vê-lo cá hoje no debate do Orçamento do Estado porque, como ontem, a seguir à abertura da sessão, se foi embora,...

O Sr. Ministro da Educação: - Eu estive cá!

O Orador: - ... pensei que não teríamos o gosto de vê-lo na continuação deste debate.
Esperava que, na sua intervenção, apresentasse alguns elementos sobre o Orçamento do Estado, mas reparei que passou quase todo o tempo a atacar a oposição, o que pode significar duas coisas: ou que tem muito pouco para apresentar ou que o que tem é francamente mau e prefere nem dizer nada sobre isso.
Sr. Ministro, considerar a educação como um desafio fundamental é algo que, num tom mais abaixo ou num tom mais acima, já foi dito por outros. V. Ex.ª é o terceiro Ministro a quem tenho a oportunidade de ouvir dizer isso, pelo que, creio, a situação não se tem alterado significativamente desde então. E se conheci três ministros da Educação foi, provavelmente, por só estar no Parlamento há quatro anos, porque, caso contrário, ao longo de 12 anos, já poderia ter visto aqui vários ministros do PSD a dizerem mais ou menos a mesma coisa sobre a mesma situação.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - E na próxima não estará cá!

O Orador: - Agora o chavão do Sr. Ministro Couto dos Santos é o de que se encerrou o ciclo da quantidade para se iniciar o ciclo da qualidade.
O discurso que o Sr. Ministro aqui fez não só não teve nada a ver com o Orçamento do Estado como o Orçamento do Estado, que é apresentado pelo Governo, tem muito pouco a ver com o seu discurso. Como é que o Sr. Ministro pretende generalizar a reforma educativa, quando verificamos que grande parte das escolas no nosso país não dispõe de qualquer instalação para a prática de educação física ou do desporto em geral?

Vozes do PSD: - Mentira!

O Orador: - Como é que o Sr. Ministro quer generalizar a reforma curricular, designadamente no plano da educação física, nestas condições?
Como é que o Sr. Ministro quer generalizar a área--escola com um mínimo de condições, quando muitas das escolas não tem, sequer, um telheiro para os estudantes se abrigarem e quando ainda, particularmente na periferia das grandes cidades, vivem situações de superlotação absolutamente insuportáveis?
Como é que o Sr. Ministro considera encerrado o ciclo da quantidade, quando a taxa de cobertura da educação pré-escolar em Portugal não ultrapassa os 95 % e a média comunitária já ultrapassou, há muito, os 85 %?
Como é que o Sr. Ministro se considera satisfeito com esta situação, quando o Orçamento não prevê qualquer verba para investimento na educação pré-escolar?
Como é que o Sr. Ministro concilia aquilo que acabou de dizer com o facto de o Governo ter decidido cortar os destacamentos para as instituições privadas de solidariedade social a partir do próximo mês de Dezembro, quando, no fundamental, são estas instituições que asseguram o ensino especial em Portugal? Será que o Sr. Ministro quer negar à grande maioria das crianças e jovens deficientes o mais elementar direito à educação e ao ensino?
Vou referir-me ainda a aspectos relacionados com o ensino superior. Muito concretamente, gostava de perguntar-lhe o que é que, com este Orçamento do Estado, vai alterar-se a nível da acção social escolar no ensino superior, considerando as promessas que o Sr. Ministro assinou ainda há poucos dias, perante alguns dirigentes associativos do ensino superior? Não vemos neste Orçamento do Estado qualquer garantia de que a situação, a nível da acção social escolar para o ensino superior, possa ser alterada.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso já foi esclarecido na Comissão!

O Orador: - Se assim não for, o Sr. Ministro dir-me-á quantas novas residências para estudantes serão construídas, previsivelmente, durante o ano que vem, quantos estudantes irão beneficiar de bolsas de estudo e qual será o montante previsto para os aumentos das bolsas de estudo.
Já que o Sr. Ministro deu garantias de que as verbas destinadas à acção social escolar iam aumentar e porque elas não são visíveis na proposta de lei do Orçamento do Estado, gostava que nos esclarecesse sobre esse assunto.
Significativamente, o Sr. Ministro não falou da questão das propinas,...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado!

O Orador: - Terminarei de imediato, Sr. Presidente. ... quando, no Orçamento do Estado, uma das disposições constantes do articulado é a de alterar precisamente a lei das propinas. Em que sentido? O Governo, que, aquando da aprovação dessa lei, nesta Assembleia, afirmando prezar tanto a autonomia universitária, remeteu para as instituições a definição do montante concreto das propinas, depois de verificar a contestação não apenas por parte dos estudantes mas também de muitos órgãos universitários em aplicarem a lei das propinas, vem agora propor que a Assembleia da República altere essa lei para que seja a própria lei do Orçamento do Estado a impor automaticamente a definição dos montantes das propinas, obrigando, assim, que seja aplicada uma lei que é generalizadamente contestada.
Por último, coloco-lhe a seguinte questão: o Sr. Ministro não tira qualquer conclusão daquilo que se passou ontem, da petição de 25 000 assinaturas de estudantes universitários que deu entrada nesta Assembleia,...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado, 22 000 ficaram pelo caminho, porque só 3000 é que estavam lá fora!

O Orador: - ... e da vaga de contestação que passa por todas as instituições de ensino superior no nosso país?

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, intervim ontem no debate do Orçamento do Estado apenas porque alguns Srs. Deputados da oposição o utilizaram para levantar questões alheias a esta discussão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O quê? Essa é boa!

O Orador: - E, exercendo a intervenção política, que é legítima a todos, frisei-o exactamente ontem na Assembleia.
Quis boje, com a serenidade que o debate deve trazer, colocar algumas questões ao Sr. Ministro da Educação - que se prendem, de facto, com o Orçamento do Estado - e, por essa via, também ao Governo.
Em primeiro lugar, estou integralmente de concordo com a ideia de que, muitas vezes, mais do que o financiamento, é importante saber como é que o dinheiro é gerido e como é que consegue imprimir-se qualidade ao sistema de ensino.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - À dimensão de Portugal, o nosso país fez um esforço de investimento sem paralelo nos últimos anos na área educativa sem com isso, no entanto, ter conseguido atingir os resultados que poderiam e deveriam ser esperados. A alteração qualitativa do sistema de ensino não deve, por isso, buscar-se apenas em aumentos do financiamento mas em regras e numa maior clarificação do financiamento do sistema e também através de uma maior exigência sobre a nacionalidade da gestão do sistema educativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - As duas perguntas que quero colocar-lhe são objectivamente as seguintes: em nome do Governo e juntamente com outros ministros, o Sr. Ministro da Educação assinou um acordo social com um número muito expressivo de academias estudantis do ensino superior. Tanto quanto me é dado perceber, a data em que esse acordo foi assinado, já as propostas do Governo para o Orçamento do Estado estavam elaboradas. Ora, não encontrei na proposta de lei do Orçamento do Estado algo que distintamente indicasse a forma como o Governo tenciona saldar o compromisso que assinou com os estudantes.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Cá está a pergunta que faltava!

O Orador: - Como o Governo não costuma faltar à sua palavra, o Ministro da Educação terá, com certeza, uma resposta clara para esta minha pergunta: como é que, no Orçamento do Estado, o Governo tenciona fazer jus ao compromisso que assinou com os estudantes?
Em segundo lagar, quando, nesta Câmara, foi votada a lei de actualização das propinas, alguns Deputados do PSD, nos quais me incluo, apresentaram uma declaração de voto, em que afirmavam que a lei das propinas deveria ser
complementada por diversos outros instrumentos por parte do Governo e da Assembleia. Um deles respeitava à exigência de que no Orçamento do Estado e no IRS viesse a ser possível a dedução integral do valor dispendido com o pagamento das propinas. Não ferindo isto nenhum princípio do Orçamento do Estado - já que, relativamente a outras matérias, como a da saúde, não existem leis que prevejam a muito curto prazo um financiamento de cerca de 25 % do custo de funcionamento do sistema -, pergunto-lhe se o Sr. Ministro e o Governo estarão na disposição de contemplar na Lei do Orçamento do Estado a proposta de dedução integral do valor dispendido com as propinas, não obstante o plafond que desde já está estipulado, em sede de IRS, para as propinas.
Quero concluir, Sr. Presidente, dizendo que esta é para nós uma questão de princípio que, esperávamos, fosse contemplada pela proposta de lei do Orçamento aqui entregue, mas que não o foi. A nossa posição em relação a este Orçamento do Estado dependerá, naturalmente, da posição que o Governo adoptar nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt, é evidente que os meios não estão nos meus discursos mas, sim, no Orçamento. Aliás, a Sr.ª Deputada conhece-os bem, porque escalpelizou-os comigo e com os meus Secretários de Estado em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura. De facto, conhece bem todos os projectos e os meios necessários para dar corpo à política de educação, que aqui foi expressa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Deputada, abordemos agora a questão dos spots publicitários e das propinas.
Em relação às propinas, é necessário que fique bem claro que a posição do Governo foi expressa na proposta de lei que apresentou a esta Câmara e no meu discurso e, contrariamente aos partidos da oposição, o Governo não muda de posição, de um dia para o outro, só pelo que acontece na rua. O Governo tem uma verticalidade na governação!

Aplausos do PSD.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - E a PGA?

O Orador: - O que estranho, Srs. Deputados, é a posição dos partidos da oposição, nomeadamente a do PS, que já acusou aqui o Governo de não ter coragem para aumentar as propinas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que, enquanto um Deputado, ou um membro de um partido, pode mudar de posição, um partido - o PSD, pelo menos, fá-lo - deve manter-se fiel à sua política.

Protestos do PS.

A minha interpretação é a de que a filosofia política subjacente traduzia a opinião do PS.

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O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Não se esqueça da PGA!

O Orador: - Srs. Deputados, que credibilidade tem um partido que recua à primeira dificuldade que surge pelo caminho?! Que credibilidade tem um partido que recua face às primeiras pressões que sobre ele exercem?

Protestos do PS.

Que credibilidade tem um partido que desafia a legalidade democrática e as leis legitimamente aprovadas?!

Aplausos do PSD.

Um partido, como o PS, que se quer afirmar, com credibilidade democrática, como alternativa, mas que está ao sabor das pressões e manifestações de rua, não pode receber a confiança dos Portugueses.

Aplausos do PSD.

Sr.ª Deputada Ana Bettencourt, julgo que as observações que fez em relação aos spots publicitários devem ter deixado o seu camarada de partido, Jorge Sampaio, muito aflito na cadeira.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Sr* Deputada evidenciou aqui uma única preocupação: a de que, numa sociedade democrática, não se deve informar aqueles que têm direito à informação!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Deputada sente-se mal, porque certamente não quer que a verdade chegue aos Portugueses. A Sr* Deputada sabe perfeitamente que muitos dos jovens e dos pais portugueses pensavam que teriam de pagar 50 contos por mês, quando, no fundo, mais de 50 % dos alunos ficam isentos e aqueles que têm um rendimento mensal superior a 500 contos pagarão entre 3500$ e 5000$ por mês.
A Sr.ª Deputada tem é medo de encarar isto! E porquê?! Aliás, é estranho que o PS e o PCP apareçam como arautos da defesa dos ricos, da desigualdade social e da injustiça!

Aplausos do PSD.

Se assim não é, Srs. Deputados, digam-me se é justo que aqueles que têm uma fortuna superior a 250000 contos, ou que ganham mais de 500 contos por mês, paguem 1200$, que "saem" dos impostos dos Portugueses, quando um aluno, hoje, no ensino superior, custa 500 contos, ou mais, em média, por ano, e, tratando-se de um curso de Medicina, por exemplo, esse custo é de 2000 contos! Qual 6 a vossa justiça social, Srs. Deputados?!

Aplausos do PSD.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - E a acção social escolar?

O Orador: - Já explicito esse aspecto. Sr. Deputado! V. Ex.ª está muito nervoso! Mas compreendo-o, porque é difícil assumir uma posição num dia e outra noutro! E que as pressões de ma são tantas que o Sr. Deputado ^não sabe que posição tomar!

Risos do PSD.

Quanto ao ciclo da quantidade, Sr.ª Deputada, ou V. Ex.ª não entendeu ou não quis entender o que eu disse.

Vozes do PSD: - Não quis!

O Orador: - É que a Sr.ª Deputada sabe tão bem quanto eu, porque se dedica ao estudo de questões educativas, e não pode escamoteá-lo com a sua responsabilidade política, que, nos últimos 10 anos, o numero de alunos no ensino básico, ou seja, no 1.º ciclo, passou de quase 1 milhão para pouco mais de 500 000. A Sr.ª Deputada sabe também que entre 1980 e 1992 entravam cerca de 200 000 alunos para o 1.º ano do ensino básico e que neste momento estão a entrar cerca de 100000.
Também é do seu conhecimento que a racionalidade que tem sido introduzida no ordenamento escolar traduz ganhos no sistema, não sendo, portanto, lícito nem justo para os contribuintes gastar mais dinheiro só para se poder dizer que há muito dinheiro na educação. E isto quando há cerca de 1500 escolas com menos de 10 alunos e 200 escolas, em media, com 3 alunos!
O que eu quis dizer com o fim do ciclo da quantidade, Sr.ª Deputada, é que nós estamos conscientes do muito que há a fazer em relação à qualidade do ensino, há muitas infra-estruturas a construir. Por isso mesmo é que, recentemente, aquando da reunião com os reitores, apresentámos um plano de intervenção em infra-estruturas de apoio pedagógico em memores condições de trabalho para os professores e para os alunos, para que as taxas de repetência no ensino superior, que boje chegam a atingir 70 % em algumas escolas, não sejam dessa ordem de grandeza. E que quanto mais tempo esses alunos frequentarem essas escolas mais eles custam aos contribuintes portugueses.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Deputada, naturalmente, manifestou algum receio ou preocupação pela qualidade. Admiro-me, porque, como especialista da educação, deveria pugnar por isso como primeira prioridade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só que qualidade não é o número; quantidade, sim. Mas confundiu-o. Não sei se me fiz entender, ou se não percebeu o que eu disse.
Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, há dificuldades financeiras nas universidades?! Ó Sr. Deputado, pela primeira vez, o Governo fez um esforço financeiro acrescido para não ter dívidas às universidades. Se o Sr. Deputado não acredita em mim, pergunte aos reitores.
Já agora, aproveito para responder ao Sr. Deputado António Filipe que me perguntou onde é que eu estive ontem. Estive aqui, Sr. Deputado! Noutras situações, fui às universidades discutir com os alunos. Mesmo quando o Sr. Deputado, ou outros ligados ao seu partido, se apressavam a telefonar, dizendo que "quem aí vai é o Ministro!", eu lá ia falar com eles, de frente, explicando o porquê, a razão da revisão do sistema de propinas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Deputado Fernando de Sousa, 6 evidente que estamos conscientes do conjunto de situações que referiu. Mas quem pode boje dizer que o problema do sistema educativo em Portugal está resolvido?! Dizê-lo seria inconsciência! O Governo está disso consciente e sabe que é preciso trabalhar muito. Há muito a fazer no sistema educativo! Enquanto houver um aluno que abandone o sistema escolar, ninguém pode ficar descansado.

Aplausos do PSD.

Agora o que o Sr. Deputado não pode é baralhar os números! Em relação à acção social escolar, de facto, se analisar a verba para a acção social escolar no ensino superior, verificará certamente que ela tem crescido todos os anos a taxas superiores a 15 %. O Sr. Deputado talvez tenha querido referir-se à verba deste ano, mas esquece-se que, por aquela razão que apontei há pouco, não pode comparar uma verba a atribuir à acção social escolar para 1 milhão de alunos com uma outra para SOO 000 alunos! É metade, Sr. Deputado! Por que razão?! Só por uma questão de um delta incremental, para o Sr. Deputado ficar satisfeito com a sua consciência? Não, Sr. Deputado! Nós pensamos muito nos contribuintes.

Protestos do PS.

Sr. Deputado António Filipe, admito que V. Ex.ª tenha lido o Orçamento - não faço um atentado à sua inteligência nesse aspecto - e que o conheça em pormenor. Por isso não referi no meu discurso tudo aquilo que V. Ex.ª esperava. Em relação ao desporto escolar e às infra-estruturas, já explicitei ao Sr. Deputado Fernando de Sousa o que pensamos. Mas é preciso termos consciência de que o sector da educação é o mais dinâmico que existe em termos de políticas sectoriais. De facto, não pode ser visto de uma forma estática, como um conjunto de betão armado que se constrói ou contabilizando simplesmente os números que nos apresentam. Pelo contrário, é um processo dinâmico de uma realidade que se altera a todo o momento e que envolve directamente no ensino um conjunto de agentes que, presentemente, perfaz 2,2 milhões alunos e 220 000 agentes.
Quanto às residências, sei que no protocolo de acordo assinado com alguns estudantes - até bastantes, porque os que o subscreveram representam 70 % dos estudantes portugueses - se afirmava, política e publicamente, que o número de camas das residências para estudantes iria triplicar, no período de três anos, e que as bolsas iriam duplicar. O Sr. Deputado como, certamente, não gosta desse acordo, não o leu nem quis, sequer, tirar as suas conclusões.
Quanto à questão do que se passou na Assembleia da República, só tiro uma conclusão: recordo-me de ter visto uma coisa semelhante em 1975.

Protestos do PS e do PCP.

Para que fique bem claro. Sr. Deputado, quero salientar que vivemos num regime democrático e todos os estudantes têm o direito, como qualquer estrato da população portuguesa, de se manifestar com o devido respeito pelas regras democráticas.

Aplausos do PSD.

Vivemos num país livre e numa democracia estabilizada, o que dá o direito, a qualquer cidadão, de se manifestar e de dizer que não concorda com isto ou com aquilo. Este é, para mim, um princípio muito caro e defendo que qualquer cidadão deve ter, legitimamente, direito a ele.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É o que diz a lei!

O Orador: - É bom reafirmar este princípio, Sr. Deputado, pois ele já existiu em outros tempos e não foi respeitado. No entanto, nós sempre o respeitámos, assim como respeitámos a lei.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Esperamos que os senhores saibam, efectivamente, respeitá-la!

O Orador: - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, em relação ao protocolo de acordo social, é evidente que há no Orçamento do Estado para 1993 verbas inscritas, quer em investimentos do PIDDAC, quer numa parte do ensino superior, que atingem, aproximadamente, 1 milhão de contos, num caso, e 1,7 milhões de contos, no outro caso, para acorrer àquilo que foi feito. Este reforço que fizemos é o nosso contributo para a acção social escolar.
Quanto à outra questão que colocou, devo dizer que a lei consagra, sobretudo no artigo 280.º, o princípio das deduções. Nesta matéria, o Governo mantém os seus princípios, deixando este aspecto para o debate a travar em sede de comissão de especialidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, solicitei o uso desta figura regimental, em virtude de o Sr. Ministro, generalizando a propósito da lei das propinas, e referindo-se aos partidos da oposição, ter dito que estes ontem diziam uma coisa e, por força das pressões, dizem hoje outra.
O Sr. Ministro fará a justiça, em relação ao PCP, de dizer que sempre tivemos uma posição coerente a este respeito. Contestámos a lei das propinas a partir da primeira hora em que foi apresentada e ainda antes disso, ou seja, sempre que se referiu esse problema. Portanto, é essa a posição que continuamos, intransigentemente, a manter hoje e o Sr. Ministro fará a justiça de a reconhecer.
Mas, direi mais: o Sr. Ministro voltou a usar o argumento da justiça social e a atacar-nos com ele. O Sr. Deputado Rui Rio disse ontem que o PCP estava a meter o comunismo na gaveta por não estar de acordo com esta lei das propinas. Ora, devo dizer que não subscrevo esta afirmação e não chamarei de comunista a este Governo.
Mas o Governo invoca a justiça social contra nós para defender a lei das propinas, o que considero um argumento absolutamente primário, que já não convence ninguém. De facto, como é que um Governo que privilegia a injustiça fiscal, pode invocar a lei das propinas como medida de injustiça social?
Devo, no entanto, dizer-lhe, Sr. Ministro, que não estou preocupado com os milionários que tenham de pagar propinas. Não são esses que me preocupam. O que me

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preocupa são as outras famílias, os outros estudantes, que, n3o sendo milionários, serão obrigados, com esta lei das propinas, a pagá-las, o que constituirá, para essas famílias, um pesado encargo, que, em alguns casos, poderá levar a que os seus filhos tenham de abandonar o ensino superior.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A haver propinas, estas famílias que, com os rendimentos do seu trabalho, já pagam o ensino superior, continuarão a pagá-lo.
Por outro lado, os filhos de muitas delas não poderão frequentá-lo, por não terem possibilidade de pagar as propinas.
Quanto às outras famílias que o Sr. Ministro invoca, provavelmente, estará a referir-se à tal família Silva de que falam os spots publicitários. Já agora, aproveito para perguntar se a tal família Silva tem alguma coisa a ver com a do Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos e risos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, faço justiça ao seu partido, porque sempre esteve contra esta lei das propinas, o que significa que sempre esteve do lado dos ricos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Risos do PSD!...

O Orador. - Faço justiça ao seu partido, porque isso significa que está do lado da injustiça social. E faço ainda justiça ao seu partido, porque continua a seguir o princípio político da justiça social "de boca", mas, na prática, não está com a justiça social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao problema das propinas, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado: as isenções neste momento, de acordo com os dados que possuímos, apontam para uma isenção que atinge, no ensino politécnico, cerca de 70 % dos alunos e, no ensino universitário, cerca de 50%.
São alunos que pagavam e deixaram de pagar, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, toda a tese do Sr. Ministro sobre as propinas se baseou na ideia de que nós é que mudamos sobre a pressão das manifestações de rua e que o Governo não muda.
Ora bem, o que é que se passou com a PGA? Logo que essa absurda prova foi criada, o Partido Socialista apresentou inúmeras propostas alternativas, fez análises estatísticas e denunciou as centenas de alunos que ficaram com a vida irremediavelmente perdida, por causa dessa prova que era - desculpem que o diga- estúpida, e os senhores demoraram três anos para a retirar do sistema de acesso à universidade.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - É verdade, bem lembrado!

A Oradora: - Na verdade, antes das eleições, o Sr. Primeiro-Ministro até disse que seria um erro tremendo retirar essa prova e, no entanto, foram as pressões de rua que obrigaram o Governo a retirá-la.

Aplausos do PS.

Foi o Governo que voltou atrás, que mudou e que teve de reconhecer que não tinha o direito de prejudicar mais os alunos.
Em relação à lei das propinas, devo lembrar que, logo que o Conselho de Ministros aprovou esse projecto absurdo, o Partido Socialista apresentou uma proposta alternativa, no mesmo dia, e desde então não mudou a posição assumida. Ora, essa alternativa defende: mude-se, primeiro, a acção social escolar. Já aqui disse isto e o Sr. Ministro sabe, perfeitamente, que temos razão. Os estudantes deslocados custam fortunas às famílias, os alunos que têm de comer sempre nas cantinas ficam doentes, porque as cantinas não têm condições, não há residências suficientes para estudantes, pelo que apenas um número ridículo de alunos tem acesso às residências que existem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Um outro aspecto a salientar é o do IRS. O Sr. Ministro sabe muito bem, até porque já tem dados e não anda a dormir, que quem é penalizado com o actual sistema são as pessoas que vivem dos rendimentos do trabalho e têm de os declarar, uma vez que os ricos, por que não pagam o IRS, não têm de pagar as propinas. Sabemos muito bem que é assim, aliás, toda a gente sabe, até os filhos dos Srs. Ministros sabem disto e conhecem, perfeitamente, os colegas ricos que usufruem de todos os bens de consumo, mas não vão pagar as propinas. Eu também os conheço!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Ministro, o Governo deveria era saber das necessidades dos jovens que querem estudar.
E quanto à qualidade de ensino, Sr. Ministro? Onde é que estão as bibliotecas?
É verdade que há países onde se pagam propinas, mas não se pagam livros, há bibliotecas e tudo o que é preciso, enquanto que em Portugal não há nada. Até as universidades estão num estado de completa degradação. É uma tragédia!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso é demagogia inaceitável!

A Oradora: - Sr. Ministro, não vou falar sobre a qualidade do ensino ou sobre o crescimento, mas peço-lhe que medite nesses aspectos, pois temos de crescer muito ainda em termos de educação pré-escolar, de ensino

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especial, secundário e superior, senão os jovens portugueses ficam na cauda da Europa e não poderão competir com os europeus.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt, de facto, espanta--me a facilidade política, para não dizer outra coisa, com que V. Ex.ª fez aqui certas afirmações.

Aplausos do PSD.

O Orador: - E espanta-me que as faça em relação à PGA, uma prova cuja retirada não resulta de qualquer movimento de rua.

Risos do PS.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): Essa é boa! É a anedota da semana!

O Orador: - A Sr.ª Deputada sabe muito bem que a lei previa que, ao fim de três anos, seria feita a avaliação da PGA e se fosse preciso alterá-la, alterava-se ou retirava-se.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Ana Maria Bettencourt (PS): - Não é verdade!

O Orador: - A Sr.ª Deputada sabe isso, mas quer ser a arauta das movimentações de rua.
Mas quanto a esta questão concreta, o Governo responde-lhe: cumpriu-se, rigorosamente, a lei, porque vivemos num Estado de direito democrático.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão da acção social escolar, já lhe disse, Sr.ª Deputada, não sei quantas vezes - já lhe enviei documentos, mas posso enviar-lhe mais e convido-a para uma reunião no Ministério da Educação -, que a acção social escolar, em termos orçamentais, expressa um crescimento significativo e, em termos de compromisso político, isso está lá concebido. E mais, Sr.ª Deputada: O diálogo que o Governo estabeleceu com os estudantes, que, aliás, nunca tinha acontecido em Portugal...

O Sr. Silva Marques (PSD): - É isso que lhes dói!

O Orador: - É isso, certamente, que lhes dói.
Dizia eu que tal facto permitiu assumir compromissos, a níveis já europeus, em termos do número de camas e de bolseiros.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação às propinas e aos rendimentos, a Sr.ª Deputada também sabe, se teu a lei - a não ser que tenha parado a leitura em determinado parágrafo, porque não queria ver o resto -, que ela inclui os rendimentos, mais os rendimentos englobados. Estão lá todos os rendimentos e também lá está consagrado que será feito um acompanhamento em termos de fiscalização autónoma. A Sr.ª Deputada sabe isso e sabe também, perfeitamente- a não ser que queira fazer demagogia-, que, de facto, só paga propinas quem ganha muito e que aqueles que têm dificuldades económicas não pagam. E mais, a lei tem um princípio fundamental e constitucional: ninguém, ou seja, nenhum jovem deixará de ter acesso ao ensino superior por dificuldades económicas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O País, como todos sabemos, está a beneficiar de transferências financeiras provenientes dos fundos comunitários, cujo impacte no crescimento do PIB anda na ordem dos 2 %. Afirma agora o Sr. Ministro das Finanças que a previsão de crescimento para 1993 oscilará entre os 2 % e os 2,25 %.
Eis como, a partir da própria previsão governativa, uma primeira ilação se nos impõe: não fosse o impacte interno das transferências comunitárias e o crescimento económico, em 1993, poderia ficar muito perto dos O %.
Eis, portanto, Srs. Deputados, uma evidência, cuja crueza põe flagrantemente em causa a miragem do "oásis", devendo obrigar o Governo a uma reponderação das suas políticas, a qual exige posições claras quanto à orientação portuguesa na prossecução do objectivo comunitário da coesão económica e social e quanto ao modo e sob que modelo de desenvolvimento são internamente rentabilizados os apoios comunitários.
Primeiro, a coesão económica e social: qual é a estratégia portuguesa para garantir, na próxima Cimeira de Edimburgo, uma decisão de duplicação efectiva das transferências comunitárias para Portugal? Qual a data em que o Governo espera poder contar com o Fundo de Coesão e com que montantes? Com que disciplina espera também poder contar para o acesso das entidades locais na área da protecção ambiental? Quais as posições concretas do Governo no sentido de garantir, na revisão em curso dos regulamentos dos vários fundos comunitários, o alargamento da sua elegibilidade a sectores tão vitais para a sociedade portuguesa como são, particularmente, os da educação, da saúde e da habitação?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O quase silêncio do Governo sobre estas matérias é politicamente insustentável, sobretudo se nos lembrarmos que está em curso a preparação do segundo Quadro Comunitário de Apoio para Portugal, cuja aprovação deverá ter lugar já no 2.º trimestre do próximo ano. E que, em consequência dos ciclos semestrais para a realização das cimeiras comunitárias, poderá muito bem acontecer que melhor oportunidade não se prefigure para uma defesa eficaz e tempestiva dos interesses portugueses.
Todavia, a conversa vaga do Governo e o nível de abstracção e generalidade das GOP só conferem opacidade ao que deveria ser transparente e mobilizador das energias nacionais numa batalha de todos os dias pela modernidade e pelo desenvolvimento.
Por isso, preocupado em contribuir para a máxima clarificação dos interesses nacionais, ao abrigo do Estatuto

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da Oposição, o PS comunicou boje ao Governo o seu propósito de realização de um encontro urgente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Queremos saber e apreciar os exactos termos das posições portuguesas com vista à realização da coesão económica e social; queremos discutir os critérios nacionais de utilização futura dos fundos comunitários; e queremos, muito particularmente, debater o modo como o próximo Plano de Desenvolvimento Regional e o subsequente Quadro Comunitário de Apoio vão viabilizar a plena aplicação, entre nós, dos princípios comunitários da subsidiaridade e da parceria, ou seja, como vão as colectividades regionais e locais e os agentes económicos e sociais poder assumir-se como parceiros activos da mudança.
Eis o segundo nível de um desafio essencial, relacionado com o modelo de desenvolvimento.
Pretende o Governo continuar a gerir, por sua conta e risco, mais de 80 % das transferências financeiras com origem comunitária? Está o Governo à espera de fazer aprovar, em 1993, um modelo de utilização dos fundos comunitários que, à semelhança do ocorrido de 1989, faça do Estado, como nunca, um "Estado administrador" e um "Estado patrão", senão mesmo um "Estado clientelar", proteccionista e fonte de corrupção?
Até agora nada prenuncia, infelizmente, uma mudança de atitude: continuam, no essencial, os velhos métodos centralistas, com rejeição da iniciativa descentralizada, continua a insistência em programas verticais e sectoriais, com desvalorização das operações integradas de desenvolvimento e continua, ao fim e ao cabo, a reprodução de uma prática de governo já responsável pelo agravamento de muitas tendências negativas de desequilíbrios cada vez mais graves entre o litoral e o interior; de contradições entre o novo-riquismo e a nova pobreza; de degradação das condições de acesso à educação, à saúde e à habitação; e de crescentes sinais de dificuldade nos vários sectores da actividade económica.
O modelo está esgotado e não tem remissão possível. Por isso mesmo, no PSD já se levantam vozes para reivindicar a descentralização do Estado e a regionalização, como condição de um desenvolvimento justo.
Mas é curioso atentar nos argumentos que também, dentro do PSD, se lhe opõem: só depois das auto-estradas, dizem uns; só depois de 1997, acrescentam outros!
Afinal, o que se percebe é um enorme incómodo do Governo por ter de admitir a necessidade da regionalização, ainda durante o período de aplicação dos apoios comunitários a Portugal, e este é que é o problema.
O Governo e o PSD tudo têm feito para não abrir mão do Estado administrador e da sua cultura de poder, mesmo se, por causa disso, têm de abdicar dos pressupostos indispensáveis ao desenvolvimento equilibrado do País.
Estamos, todavia, num momento de verdade. O PSD não pode querer a subsidiariedade nas relações entre as instituições comunitárias e o Estado nacional e, simultaneamente, negar o seu significado no plano interno.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É tempo de pôr fim à incongruência e de tirar a máscara da hipocrisia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo e o PSD ou são a favor ou assumem que são contra a participação democrática das regiões no processo de desenvolvimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PSD e o Governo ou são a favor das regiões administrativas e se empenham politicamente na sua criação ou confessam, de uma vez por todas, que são pelo autoritarismo do Estado administrador e inimigos da subsidiariedade e da parceria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Socorrendo-me de uma voz autorizada do PSD, direi que, também aqui, não poderá haver meio termo, ou o PSD é pelo branco ou é pelo preto. Não pode é persistir no cinzentismo de quem é por tudo e por nada ao mesmo tempo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Srs. Deputados, para ajudar à vossa decisão, e, seguramente, para bem do País, tenho o gosto de vos anunciar que o Grupo Parlamentar do PS vai promover, com prioridade, no mais curto prazo, o agendamento do projecto de lei de criação das regiões administrativas.

Aplausos do PS.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É assim que se faz o consenso? Isso é demagogia!

O Orador: - 1993 pode e deve ser o ano da regionalização. Os órgãos regionais podem e devem ser eleitos em simultâneo com os das demais autarquias locais.
Se o PSD recusar essa possibilidade, não terá desculpa, em face do persistente agravamento das desigualdades. Não que a regionalização seja uma panaceia capaz, só por si, de realizar milagres.

as as regiões são - disso estamos certos - pressuposto essencial de um novo modelo de desenvolvimento, aberto à participação e à iniciativa.
É impossível, em face de um quadro económico, ambiental e social, em ameaça de degradação progressiva, deixar de chamar às coisas os nomes que elas têm. A chamada "democracia de sucesso" é hoje, a muitos títulos, um símbolo do fracasso desta governação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em termos tais que se impõe, com rigor e exigência, dar início a um ciclo de reformas estruturais do Estado e da Administração. É chegado o tempo de promover uma descentralização articulada de competências e de meios, que permita pôr em marcha uma verdadeira modernização - afinal, a modernização que falta fazer - da nossa Administração e dos nossos serviços públicos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Também aqui, a par da regionalização, as posições do Governo, reflectidas nas GOP e no Orçamento do Estado, são uma desilusão total.

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Quem não se lembra, nesta Camará, da promessa, solenemente assumida pelo Ministro das Finanças, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1992, de que 60 dias -não mais do que 60 dias! - ia ser o tempo necessário para o Governo promover uma descentralização de competências da administração central para a administração local?!

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - Já nos habituámos a esperar pouco das bravatas do Sr. Ministro das Finanças.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador:- É, no entanto, um escândalo -um verdadeiro escândalo - que uma governação, há sete anos em continuidade, nada de melhor tenha sabido fazer do que vir, no Orçamento do Estado para 1993, pedir uma autorização legislativa, sem delimitação do objecto, do sentido e da extensão - portanto, uma norma inconstitucional e um verdadeiro cheque em branco-, para produzir inominadas transferências de encargos para as autarquias locais. Afinal, o que o Governo apenas procura é aliviar o Orçamento do Estado à custa da asfixia dos orçamentos dos municípios, com indiferença total pelos interesses legítimos dos cidadãos.
Por isso o PS vai votar, no momento próprio, contra o referido pedido de autorização legislativa.
Por isso este é o momento para questionar o PSD sobre o entendimento que tem relativamente ao princípio constitucional da autonomia do poder local.
É, Srs. Deputados, politicamente sério, através das leis anuais do Orçamento, colocar sistematicamente em causa a esfera das atribuições municipais e o regime das finanças locais? Como justificar o facto de o peso do FEF no PIB ter diminuído, de 1985 para 1993, de 1,8 % para 1,5 %? E quanto à percentagem do FEF nas receitas fiscais ter diminuído, no mesmo período, de 10,3 % para 6,2 %?
E são capazes, Srs. Deputados do PSD, de ficar indiferentes a uma situação de diminuição progressiva do peso das transferências autárquicas, no que já só representa 6,8 % do total da despesa pública da administração central? E indiferentes ainda quando, em muitas autarquias, os aumentos do FEF para 1993 ficam escandalosamente abaixo do patamar da inflação prevista? É assim que se conferem às autarquias as condições mínimas indispensáveis à realização do bem-estar das populações?
A resposta dos autarcas, essa, já chegou, pela voz autorizada do presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses: "a atitude do Governo é uma atitude imoral, arbitraria, prepotente e inconcebível num Estado de direito".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Governo não tem - e não tem - uma estratégia coerente de descentralização administrativa nem uma ideia inovadora para as finanças locais, cujo regime todos os dias perverte uma actuação casuística, sem norte e sem rigor, habilitem-se os Srs. Deputados do PSD a votar favoravelmente os projectos do PS - lei quadro de novas atribuições e competências para as autarquias e novo regime de finanças locais. Muito brevemente, aliás, vão ter também ocasião para o fazer.
Só terá sentido falar-se em vontade modernizadora quando for possível deixar de falar de Portugal como o lanterna vermelha das Comunidades em matéria de descentralização administrativa e de meios ao dispor das colectividades regionais e locais.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, coesão económica e social, iniciativa descentralizada, regionalização, dignificação e reforço do poder local, solidariedade e promoção da igualdade de oportunidades são requisitos básicos de uma sociedade que se quer humanizada e justa e aberta à iniciativa e à modernidade.
Nenhum de tais requisitos é visível nas GOP ou no Orçamento do Estado, espelhos de uma política sem rasgo e sem inovação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O ano de 1993 vai, todavia, representar para Portugal uma era de muitos desafios, que só venceremos se lograrmos articular capacidade e inovação com iniciativa e solidariedade. Para isso precisamos de novas políticas e de novos instrumentos para as concretizar. Precisamos, numa palavra, de um novo modelo de desenvolvimento para Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É esse modelo que o PS, há muito, vos vem propondo e que boje, de novo, aqui renovamos, dando um passo mais na sua concretização.
Que seja, pois, este o tempo das opções claras, para que, entre o branco e o preto, os Portugueses não tenham de vergar-se ao cinzentismo de políticas incapazes de antecipar o futuro.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, os senhores demonstram, mais uma vez, que falam muito, mas fazem pouco. É convosco!
Aliás, as vossas atribulações levam-vos a apanhar comboios que, ainda por cima, partem mas voltam ao mesmo sítio, como se viu ontem. Não tomam o nosso comboio, que é o mais importante e o que está a abrir o caminho do futuro...

O Sr. José Gameiro dos Santos (PS): - O vosso comboio está a descarrilar!

O Orador: - ... e no qual tomam lugar todos os portugueses que tenham o patriotismo de ousar seguir esse caminho.
O Sr. Deputado falou, surpreendido, do congresso do PSD, pois teve notícia de que nele, além de outros assuntos - um dos quais também já aqui foi debatido -, se falou de descentralização e de regionalização de forma divergente. Isso é verdade, e ainda bem!
Sentimo-nos privilegiados por o congresso do PSD dar lugar a tais debates e a tais temas, que têm imediato eco no Plenário da Assembleia da República, aliás, por vossa iniciativa.

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Mas o Sr. Deputado trouxe-nos hoje aqui esse tema, surpreendido por ele ter sido objecto de debate no interior do PSD. Foi sim, Sr. Deputado! Mas o senhor surpreende-se precisamente influenciado pelo estado em que está o seu partido.
Repare que o Sr. Deputado acusa o Governo de ter dado passos concretos na desconcentração. É verdade, tem dado! E fica surpreendido de ter dado um BOVO passo concreto e diz que não o devia ter feito.

O Sr. José Gameiro dos Santos (PS): - Diga lá quais foram esses passos!

O Orador: - Os da desconcentração que tem feito e agora o da descentralização!
E a vossa posição relativamente à questão das propinas é exactamente a mesma, pois dizem: "não deviam ter dado esse passo enquanto não pudessem dar 100" ou então "andem para trás, voltem ao ponto de partida". Essa não é a nossa posição. Está mais do que claro, perante os senhores e, sobretudo, perante os Portugueses, de que a nossa postura vai no sentido de fazer reformas sistemáticas para a modernização do nosso país e do progresso. Se os senhores as não querem, fiquem onde estão.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Na verdade, é muito concreto!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Deputado acusou o meu partido de não ter uma posição sobre a questão da regionalização. Isso não é verdade!

O Sr. José Gameiro dos Santos (PS): - Qual é então essa posição, que ninguém sabe?!

O Orador: - Eu digo-lhe qual é, mas tinha obrigação de já saber!
O meu partido defende a regionalização, privilegiando, sobre essa questão tão importante e nas circunstâncias concretas do nosso país, a prudência e a consensualidade, e acho isso muito bem.
Pertenço a este partido e estou nele cada vez com mais convicção. E ainda bem que pertenço a um partido que aborda as questões nacionais do País que somos com prudência e com sensatez! E por Isso não posso se não deixar levar-me pela posição do meu partido.
Para terminar, Sr. Deputado, hoje a 'diferença entre o meu partido e o seu é muito clara.

Vozes do PS: - Ai é, é!...

O Orador: - Do vosso congresso não há notícia de qualquer grande questão, a não ser de zangas entre vós. Relativamente ao congresso do PSD, há notícia de divergências e de debates entre nós, mas não de zangas. Nós pensamos, os senhores zangam-se!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Marques, a sua intervenção - desculpar-me-á que lhe diga- foi verdadeiramente divertida.
Em primeiro lugar, foi divertida porque veio aludir, em defesa da sua consideração, ao facto de eu ter falado no congresso do seu partido. Lamento ter de lhe dizer que, na intervenção que fiz daquela tribuna, não falei, uma única vez, no congresso do PSD.
Depois o Sr. Deputado veio dizer que falamos muito e fazemos pouco. Voltei a divertir-me, porque me lembrei que, muito recentemente, num debate que tive oportunidade de fazer consigo na televisão, V. Ex.ª me disse que o PSD não podia votar nos projectos do PS sobre a descentralização e as competências das autarquias, sobre o novo regime das finanças locais e sobre a regionalização porque eram perfeitos de mais, pois a obra humana é imperfeita e, assim sendo, não nos podia acompanhar.

Risos do PS.

Afinal de contas, são insusceptíveis de serem votados, porque ainda não os fizemos ou porque são perfeitos de mais, Sr. Deputado Silva Marques?
Depois voltei a ficar divertido porque o Sr. Deputado Silva Marques disse que eu estava contra o passo concreto dado pelo Governo. Mas qual foi ele? O passo dos 60 dias do Sr. Ministro das Finanças de há um ano atrás?

O Sr. José Gameiro dos Santos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Não, porque esses 60 dias já estão completamente caducados. Então qual é o passo concreto agora? Um pedido de autorização legislativa para, eventualmente, o Governo transferir competências da administração central. Mas em que área? Em nenhuma, porque o Governo não diz.
Sr. Deputado Silva Marques, politicamente falando, é um escândalo que um Governo que há sete anos nos governa se apresente na Assembleia da República, ao fim desse tempo, a pedir um cheque em branco para, eventualmente, fazer umas descentralizações, sem ter a mínima ideia sobre a reforma administrativa que quer...

Aplausos do PS.

... e sobre a nova fronteira entre a administração central e a administração local.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Silva Marques, aquilo que disse sobre a regionalização foi também um motivo de divertimento para mim, porque não sei se V. Ex.º é a favor da regionalização ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não, eu pessoalmente sou contra!

O Orador: - ... ou o seu partido ou o Dr. Mendes Bota ou o Sr. Secretário de Estado Luís Filipe Meneses.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Pergunte ao Sr. Dr. Almeida Santos!

O Orador: - O que sei é que, em regra, os senhores são a favor da regionalização, com uma condição, ou seja, desde que ela não se faça. Este é que é o problema essencial do PSD: é a seu favor, desde que ela não se faça.

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Mas, Sr. Deputado, permita-me então que volte aqui a citar as palavras de alguém autorizado do seu partido, que disse que vos deveríeis comportar em termos muito claros e abandonar o cinzentismo de posições. Ou são pelo branco ou são pelo preto! Agora o cinzentismo permanente das vossas posições, digo-vos mais, é um logro à opinião pública portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Só que, mais do que um logro à opinião pública portuguesa, está a ser um atentado ao desenvolvimento equilibrado do nosso país.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma questão muito séria, porque o vosso modelo de desenvolvimento está esgotado e os senhores continuam sem ter qualquer alternativa para apresentar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Ministro da Agricultura (Arlindo Cunha): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que o primeiro conjunto de questões que se devem colocar, quando se debate um orçamento, é o de se saber quais as condicionantes e quais os pressupostos que conduziram à sua definição.
É por aí que gostaria de começar, já que considero a política agrícola seguida nos últimos anos e os seus resultados como um dos importantes pressupostos do Orçamento que preparamos para 1993.
Sem dar um ênfase ao passado, porque o documento em discussão é sobretudo um projecto de trabalho para o futuro, quero aqui referir que há obviamente um fio condutor basilar nas políticas agrícolas seguidas desde que somos Governo: promover a passagem progressiva, mas decidida, de um sector agrário e agro-industrial submetido no passado a uma situação de proteccionismo anquilosante e asfixiante, para um estado de abertura a um mercado alargado, que a integração na Comunidade Económica Europeia veio implicar.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O proteccionismo não promoveu a eficiência nem a eficácia; propiciou o atraso económico e protegeu até alguma mediocridade; condenou o sector ao isolamento e a um certo tipo de pobreza perseguindo uma visão de auto-suficiência alimentar incompatível, em muitos casos, com as capacidades ecológicas do País.
A abertura que temos vindo a promover significa a integração num espaço europeu alargado, em que a um aumento da competitividade deverá corresponder uma procura de eficiência acrescida, uma dignificação da função do produtor agrícola, que deve ser tratado como um agente económico de corpo inteiro e ainda uma utilização mais racional dos recursos.
Esta evolução tem significado para o nosso país: o de estimular a modernização acelerada do sector, pela adopção de uma política de promoção de investimentos a todos os níveis do complexo agro-alimentar.
Processo de evolução acelerado, mas ainda assim faseado e suficientemente dilatado no tempo, já que havia e há a consciência de que o fosso a vencer era enorme e a rigidez que alguns factores determinantes - como o homem e a terra - apresentam no nosso país levam a que essa rigidez não pode ser desprezada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem pretender trazer-vos aqui um qualquer panorama idílico, um cenário cor-de-rosa, podemos apresentar um balanço positivo dos anos que já passaram, não obstante as dificuldades de conjuntura por que passam actualmente alguns sectores da nossa agricultura.
Em agricultura, que é uma actividade por todos conhecida pelos bons e maus anos meteorológicos e pela característica de instabilidade dos mercados, só as médias têm significado enquanto medição das tendências e entre nós as tendências são consideradas globalmente positivas: o peso do investimento no produto agrícola cresceu de 15 % para 22 % no decénio, o que é um indicador claro de que o sector se está a equipar com capital para a sua modernização; a produtividade do trabalho cresceu 5,7 % ao ano entre 1985 e 1990; no mesmo período, a produção cresceu 9,9 % e 1,2 % ao ano em termos reais, respectivamente em valor e volume; e a taxa de cobertura das importações pelas exportações da balança comercial agro-florestal passou de 65,3 % no período de 1981-1985 para 81,3 % no quinquénio seguinte.
Perante estes dados positivos da evolução não poderemos deixar de ponderar a questão dos rendimentos.
Há, certamente, razões que justificam o facto de não terem acompanhado a franca evolução que acabei de retratar.
Em primeiro lugar, é necessário ter em conta o factor "remuneração do trabalho" que, nos últimos quatro anos, cresceu 37 %. Até aqui, Srs. Deputados, se espelha bem a profunda mudança no nosso tecido social rural. Ninguém questionará, certamente, a validade desta realidade que, objectivamente, revaloriza a função social da agricultura.
Em segundo lugar, o rendimento é influenciado pelas debilidades ainda existentes na estrutura comercial da agricultura que não tem sabido ou não tem conseguido ganhar para si muitas das mais-valias geradas no sector - debilidades estas que queremos superar com uma política de robustecimento do sector comercialização e transformação.
Não foi fácil este esforço e tenho a certeza que estes números que acabei de citar escondem muito esforço, muito sacrifício, porventura até, muitos dramas individuais, mas traduzem, igualmente, um espírito muito determinado de conseguir vencer o desafio de modernização que ao sector se coloca. São a expressão do inconformismo e da vontade de romper com o passado.
Por uma questão de seriedade política e intelectual, quando se discute a evolução da agricultura, há que não confundir os efeitos das secas ou das enxurradas com os efeitos da política seguida.
Pela nossa parte não fazemos essa confusão. Sabemos que modernizar é um trabalho para uma geração mas, felizmente, já vão surgindo sinais encorajadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Agricultura para 1993 respeita este fio condutor, privilegiando a modernização a todos os níveis do sector. É nessa perspectiva que o PIDDAC prevê um significativo acréscimo de cerca de 14 %, apesar de termos reduzido em percentagem as despesas correntes do Ministério da Agricultura.

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Não existe, portanto, qualquer orçamento restritivo para 1993, mas sim uma proposta de apoio ao desenvolvimento e à modernização. Proposta que é generosa no que loca aos agentes económicos, aos investimentos, às infra-estruturas e aos demais aspectos produtivos e de muito rigor no que toca à administração já que aí a modernização passa pelo constante esforço de racionalização da aplicação dos dinheiros públicos e pelo aumento da eficácia da organização dos serviços do Ministério.
Nas grandes linhas de orientação política, subjacentes ao orçamento do próximo ano, há ainda outras preocupações e a definição de outras vertentes da política, não menos importantes, de que gostaria de lhes fazer algumas referências.
Com efeito, 1993 vai ser o primeiro ano de aplicação da nova política agrícola comum, o que é um aspecto fundamental, já que, num futuro próximo, esta nova orientação da política comunitária acabará por marcar todos os aspectos da política agrícola seguida.
É um factor de esperança para as agriculturas menos competitivas da Comunidade e para as agriculturas entre as quais se integra a nossa.
A reforma da PAC cria condições para um papel mais efectivo do mercado na orientação das opções do sector e na promoção da sua eficiência. Em contrapartida, salvaguardamos os rendimentos dos produtores e a estabilidade do tecido socio-económico rural, procura-se ajustar a oferta à procura e introduzem-se, pela primeira vez de forma significativa, na política agrícola novas vertentes que a sociedade dos nossos dias muito valoriza: a preservação ambiental; uma política de qualidade dos alimentos; uma política florestal reforçada, e ainda políticas de rejuvenescimento da população activa agrícola de que o programa de cessação antecipada de actividade será a maior novidade.
Trata-se de um conjunto de novos instrumentos, de uma nova visão da Comunidade, que vem reduzir a distancia que tínhamos para percorrer, já que faz, sobretudo, retroceder os sistemas agrícolas europeus que se mostraram no passado excessivamente intensivos e perturbadores dos mercados.
A aplicação a Portugal deste conjunto de novos instrumentos e medidas de política vai provocar, só neste primeiro ano de aplicação, um acréscimo de cerca de 26 milhões de contos nas transferências do FEOGA para os nossos agricultores, o que implica um aumento de 34 % em relação aos quase 100 milhões de contos que vão receber este ano.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ano de 1993 será também o primeiro ano do Mercado Único. É um passo fundamental, diria mesmo, tão óbvio quanto essencial na evolução da Comunidade Europeia. Mas é também um desafio para a nossa agricultura e não vou esconder esse facto.
Todavia, não estando fechado à negociação das medidas transitórias aprovadas no Tratado de Adesão e no quadro da segunda etapa, é para mim claro que qualquer alteração dessas medidas terá de respeitar escrupulosamente as expectativas e direitos criados aos agentes económicos do sector. Se assim não for, a Comissão Europeia não poderá contar com a nossa disposição de negociar o que quer que seja.
O Mercado Único é, assim, um desafio que terá de ser superado por todos. Iremos continuar a criar condições para uma adaptação da agricultura ao mercado, dando um maior ênfase nos nossos programas aos aspectos da qualidade, da promoção, da comercialização, da transformação, do marketing e da distribuição.
Mas o Governo tem por vocação essencial enquadrar, apoiar, definir a política e avaliá-la. Por isso, terão que ser os produtores a fazer o investimento fundamental que passa, entre outras coisas, por um significativo reforço das organizações associativas, cooperativas e interprofissionais.
A elas terá que caber um papel destacado a este nível, pois é assim com todos os países que conseguiram resolver satisfatoriamente o problema da modernização das suas agriculturas e Portugal não será, certamente, uma excepção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O GATT passa neste momento por uma fase negocial difícil mas decisiva. O mundo precisa de um bom acordo do Uruguay Round e a agricultura europeia também. Um bom acordo significa sempre um encontro razoável de posições e não uma capitulação de qualquer das partes. A Comunidade Europeia deu já um passo decisivo e corajoso com a reforma da PAC para que o GATT seja possível. É bom que os nossos parceiros comerciais entendam que este acordo tem de respeitar o espírito da reforma da PAC, ou seja, salvaguardar os rendimentos e a estabilidade dos agricultores europeus.
A agricultura portuguesa tem hoje um quadro de referência que está, em grandes linhas, definido. Falta apenas a conclusão das negociações do Uruguay Round para que se encerrem os grandes dossiers agrícolas que, nos últimos anos, introduziram algumas incertezas ou dúvidas no caminho a seguir. Acontece sempre assim no momento de grandes mudanças.
Penso, portanto, que estão reunidas as condições para que, em breve, durante o 1.º semestre do próximo ano, ou seja, nesta sessão legislativa, o Governo apresente nesta Câmara uma proposta de lei de bases do desenvolvimento agrário, peça essa que deverá funcionar, num futuro já próximo, como a bússola que precisamos para trilhar este caminho que é o do desenvolvimento da agricultura portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, estou de acordo com V. Ex.ª quando afirma que existe um fio condutor na política do Ministério da Agricultura, ministério ao qual o PSD preside há mais de uma década. Só que o que está no fim desse fio não é, em minha opinião, o balanço positivo que V. Ex.ª aqui nos apresenta, mas, exactamente, um panorama e um horizonte negro para a agricultura e para os agricultores portugueses. É um horizonte de indefinição e de profunda instabilidade no mundo rural.
O Sr. Ministro escolhe algumas médias em função da manipulação das estatísticas que interessam ao Governo. Mas o que interessa aqui considerar são algumas comparações entre a situação da agricultura de hoje e a que existia quando nos integramos na Comunidade Económica Europeia. Por isso, avanço com três elementos

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para contrapor às médias falaciosas - sem ofensa, obviamente - que V. Ex.ª aqui apresentou.
Com efeito, pelo terceiro ano consecutivo, há uma quebra do produto agrícola: 1,7 % em 1990, 11,8 % em 1991 e 13,2 % no 1.º trimestre deste ano, como confirmam as contas do Instituto Nacional de Estatística.
Portanto, não venha dizer que isto é o resultado da seca porque os seus efeitos ainda não se fizeram sentir nestes indicadores que acabei de referir.
O segundo aspecto é que em relação ao nosso momento de integração europeia a balança comercial agro-alimentar, ou seja, a taxa de cobertura, como sabe, desceu de 48,9 %, em 1986, para 38 %, em 1991, e atingiu 35,5 % no final do 1.º semestre deste ano.
Mas se o Sr. Ministro quiser, como tem o hábito de chamar à colação, quando se fala neste indicador, a balança agro-alimentar e florestal, importa dizer que também aí, nos últimos anos, a quebra tem sido grande, tendo diminuído a taxa de cobertura de 87,4 %, em 1986, para 67,8 % no final do 1.º semestre deste ano.
Assim, estes indicadores de comparação da situação actual com o que tínhamos no início da entrada na Comunidade provam que o Governo não tem feito uma política de alteração estrutural da agricultura portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto é, uma política que permitisse à agricultura fazer face às exigências decorrentes da política agrícola comum e da sua reforma e que levasse no seu horizonte à modernização, ao aumento da produção agro-pecuária, ao aumento das produtividades e à garantia do rendimento dos agricultores no nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isso traduz-se, posteriormente, nas várias áreas sectoriais - que não são pequenas - que estão permanentemente em crise: são os produtores vinícolas, os produtores de carne bovina e ovina, de batata, de tomate, os próprios produtores de cereais, do vinho do Douro, as cooperativas de transformação que são essenciais para a malha que relaciona a produção com o consumo e que estão em gravíssima rotura financeira e que quanto ao seu orçamento, Sr. Ministro, têm lá no seu Gabinete 1200 contos para a sua viabilização - que é uma verba para a qual não encontro explicação.
Verificamos que quando a agricultura é confrontada com uma reforma da política agrícola comum, mal negociada e que não interessa aos interesses nacionais, ela está muito mais enfraquecida e muito mais desprotegida do que estava na altura da entrada para a Comunidade Económica Europeia. E vai agravar-se com o facto de o Governo estar a abrir as portas - como o Sr. Ministro agora confirmou - à possibilidade de ser anulado o período de transição, porque não há negociação que possa compensar o facto dos mecanismos complementares de troca (MST) poderem ser postos em causa de um momento para o outro, sabendo V. Ex.ª que foi com base nestes mecanismos que no ano passado e há dois anos que a importação sofreu alguma diminuição.
Não existem negociações que possam pôr em causa uma nova aceleração dos preços aos produtores, em virtude da anulação do período de transição que tinha sido negociado quando o Mercado Único já estava previsto. Do ponto de vista jurídico não existe qualquer razão para que a Comunidade venha agora a pôr em causa esse período de transição e, portanto, também não há qualquer razão para que o Sr. Ministro e o Governo queiram abrir a porta a essa negociação a troco de alguns cruzados.
Perante isto, estávamos à espera de um orçamento que desse um golpe de asa, que nos apresentasse uma estratégia nova para a agricultura, para poder fazer face à necessidade de uma reorientação e uma reconversão da política agrícola, designadamente para regiões como o Alentejo que, como sabe, vai ser particularmente afectada pela reforma da PAC. É que não tendo essa região uma interpenetração entre a esfera da produção agrícola e a esfera da produção industrial vai ser penalizada no próprio agravamento do despovoamento e da desertificação rural.
Sr. Ministro, onde estão no orçamento as verbas para uma verdadeira política de desenvolvimento rural.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas mesmo em relação a algumas verbas sectoriais do seu Gabinete, o orçamento de funcionamento sobe, em termos reais, cerca de 12 %, o que significa uma diminuição da capacidade de intervenção do Ministério em relação aos agricultores, numa altura em que estes mais precisavam de apoio e de enquadramento.
Por outro lado, as verbas para as medidas complementares da reforma da PAC não ultrapassam 1 milhão de contos, o que pouco mais dá para uma meia dúzia de projectos de reflorestação. O logro da cessação antecipada de actividade, no fundo, vai aplicar-se a meia dúzia de agricultores. Os mais pequenos, os mais pobres, os mais carenciados, como sabe, não vão ter acesso a esse mecanismo. As verbas para o emparcelamento não vão além do 65 000 contos, os mercados de origem continuam a marcar passo e esta era a condição essencial para a ligação entre a produção e o consumo.
Portanto, a agricultura está a ser penalizada. Este Orçamento não responde aos novos desafios que a agricultura portuguesa tem neste momento e, assim, vão ser penalizados os agricultores mais activos e que mais tinham investido nos últimos anos e que agora são convidados a desinvestir.
O Sr. Ministro voltou agora a anunciar, pela quarta vez, a entrega a esta Assembleia de uma lei de bases do ordenamento agrícola. lá o tinha feito em 1990 e agora diz que será até ao final do ano.
Da nossa parte, Sr. Ministro, queremos dar um contributo e também anunciamos que, muito brevemente, vamos entregar um projecto de lei de bases de política agrícola e vamos cumprir com o que aqui dizemos neste momento.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Para defesa da consideração da minha bancada. Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Muito bem, Sr. Deputado, mas só depois de o Sr. Ministro responder, se assim o desejar, aos pedidos de esclarecimento que foram formulados.
Sr. Ministro da Agricultura, tem a palavra.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Ministro, quer a máquina de calcular?

O Sr. Ministro da Agricultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, tenho muito gosto em responder às questões que me colocou. No entanto, quando o Sr. Deputado fez a análise do orçamento do Ministério da Agricultura para este próximo ano e afirmou que esperava que déssemos um "golpe de asa" para, na sua opinião, tentar inverter a situação, devo dizer-lhe que a nossa forma de estar na política é nunca dar golpes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que fizemos foi apenas um esforço para ir mais longe do que no passado.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho fez também referência a um futuro negro para a nossa agricultura. De facto, já o conheço pelo menos há sete anos aqui nesta Casa e nunca lhe ouvi outro discurso.

O Sr. Lino de Carvalho (PSD): - E eu nunca ouvi outro ao Sr. Ministro!

O Orador: - Como o Sr. Deputado com certeza reparou, porque esteve atento, tive o cuidado de, na minha intervenção, fazer uma referência ao que considerava positivo ancorado em estatísticas e ao que considerava negativo, também ancorado em estatísticas.
Assim, Sr. Deputado, da minha parte, tenho a consciência tranquila, uma vez que lhe respondi com seriedade.
Não considero ofensivo o facto de ter falado em manipulação de estatísticas mas, enfim, desconto-lhe isso por um abuso de linguagem involuntário. Até me ouviu falar na baixa do rendimento, que não escondi, aliás, não podia nem quero fazê-lo.
Em relação à medição da evolução do produto agrícola, proeuro ser sério na minha análise, porque na agricultura não podemos fazer brilharetes ou críticas com base no que acontece num ano - e o Sr. Deputado já o ouviu, há pouco, quando me referi a essa matéria.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é um ano, são três anos!

O Orador: - Por outro lado, referi muito claramente que não vamos confundir evoluções estruturais com questões de chuvas ou de secas. Quem fizer essa confusão está a ser profundamente hipócrita e demagogo!
Agora se o Sr. Deputado for ver toda a série de anos, desde 1981 até 1991, encontra uma taxa de crescimento real, médio anual do produto agrícola bruto de 1,3 % e, para o sector agro-industrial, de 2,4 %. Isto, sim, já faz algum sentido porque se está a estabelecer uma tendência baseada numa média de 10 anos. Esta, para mim, é uma análise séria. Agora medir um ano?!...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - São três, quatro anos!

O Orador: - Por exemplo, no ano de 1989 o produto agrícola cresceu 21 %. O Sr. Deputado não me ouviu explorar este dado, pois não? Porquê? Porque 1988 foi um ano horrível e, portanto, seria demagogo da minha parte estar aqui a dizer-lhe que em 1989 cresceu 21 %.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, também referi que uma das características, infelizmente tão próprias da agricultura, é a conjuntura de mercado. É, pois, normal, em qualquer economia de mercado, haver situações de penúria ou de excedentes que implicam até, por vezes, questões algo paradoxais. É o caso, por exemplo, do agricultor ganhar menos dinheiro em anos de grande produção, mas esta é a lei do mercado.
O que acontece é que temos alguns mecanismos de regulação do mercado, mas, obviamente, não chegam ao ponto de o Estado ter de comprar os excedentes. É evidente que posso ter dificuldades que o senhor possa não compreender em alguns aspectos da economia do mercado, mas esta é, de facto, uma realidade.
Quanto aos MCT (mecanismos complementares de troca), Sr. Deputado, quero dizer-lhe que esta foi uma das grandes preocupações que o actual Governo teve quando negociou a segunda etapa. Como sabe, os mecanismos complementares de troca, as quotas máximas de importação anual de praticamente todos os produtos agrícolas foi o mecanismo que considerámos importante, até para, psicologicamente, não assustar os nossos produtores.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Assustados já eles andam!

O Orador: - Com efeito, sabíamos que algumas dessas quotas de importação não iam ser utilizadas. Aliás, o Sr. Deputado sabe que criámos MCT para quase todos os produtos e que só houve dois sectores em que os MCT foram integralmente utilizados: os sectores da carne bovina e do arroz.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E com razão!

O Orador: - Repito, Sr. Deputado, apenas dois sectores, dos 12 em que há MCT. E mais: falava-se muito das frutas, mas nem a 35 % se chegou na utilização dos MCT.
Isto, Sr. Deputado, para ver que negociámos, porque no seu discurso até parece que não foi o Governo a negociar os MCT. É, pois, preciso fazer uma análise com rigor e profundidade.
Como igualmente sabe, estes MCT foram negociados - e na altura o senhor contestou, o que compreendi - tendo em conta que eles eram crescentes, ou seja, que a quota de importação vai aumentando ano após ano. Ora, quando se chegar ao quinto ano (1995) o seu valor efectivo será muito relativo, como é evidente.
Portanto, o que é que temos perante nós? Temos um mercado único que acaba com as fronteiras. Assim, se conseguirmos trocar o que ainda temos de protecções por um bom apoio aos agricultores e ao seu rendimento, penso que os agricultores ficarão a ganhar.
De facto, o Sr. Deputado pode não gostar e fazer a sua análise, mas respeite o que lhe vou dizer a seguir, pois tenho sobre esta matéria uma posição muito clara, que, aliás, expus há alguns dias na Comissão. É que nós temos

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o direito do nosso lado. Quando elaborámos o Acto Único Europeu e agora o Tratado da União Europeia não revogámos as medidas transitórias, simplesmente há um projecto que nos transcende, que é o Mercado Único. Em todo o caso, repito, temos o direito pelo nosso lado.
Com efeito, queremos que da negociação resulte uma compensação equivalente, Sr. Deputado. Se quiser, espere pela negociação, mas se ela existir só negoceio se a compensação for equivalente. Sobre esta matéria fui, aliás, muito claro, há alguns dias, na Comissão, como o Sr. Deputado se deve lembrar.
Para terminar, uma última referência: por amor de Deus, sejamos ao menos uma vez sérios! O Sr. Deputado não pode julgar as intenções do Governo no que respeita as medidas complementares de reforma da PAC, que são medidas de vocação estrutural, por termos lá 1 milhão de contos. É que, como sabe, estamos precisamente agora a preparar a aplicação dessas medidas, que só se iniciará em 1993, tendo para o efeito 1 milhão de contos do Orçamento do Estado e mais 2,5 da Comunidade, o que perfaz um total de 3,5 milhões de contos. E, digo-lhe mais, se gastarmos este dinheiro para estas medidas, já teremos um óptimo começo.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Como há outro Sr. Deputado que já havia manifestado vontade de usar da palavra para esse efeito, ser-lhe-á concedida de seguida.
Para defesa da honra, tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, a defesa que fez da proposta de orçamento do Ministério da Agricultura -custa-me dizer-lhe isto- foi, para mim, a demonstração de que estamos a assistir a mais um acto da peça "o assassinato a sangue-frio da agricultura portuguesa", ainda que por um processo de morte lenta.
Com efeito, negociada a reforma da PAC, seria de esperar que este orçamento traduzisse uma política substancialmente diferente daquela que tem vindo a ser prosseguida, em duas vertentes.
Por um lado, relativamente às medidas complementares da reforma da PAC, acabou de ser dito que, havendo, no que refere ao rendimento dos agricultores, a necessidade imperiosa da sua implementação, não deixa de ser estranho que num Orçamento global de quase 70 milhões de contos, incluindo a comparticipação comunitária, não lhe seja destinada cerca de, apenas, 3 milhões.
Por outro lado, havendo necessidade imperiosa de que as nossas vantagens comparativas sejam tidas em conta - e todos sabemos que elas passam, designadamente, pela reconversão do sequeiro em regadio -, neste orçamento nada de inovador se refere a esse respeito. O PEDDAP está em declínio e, no que se refere às obras de hidráulica agrícola, quer no âmbito do orçamento do Ministério da Agricultura quer do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, são verdadeiramente insignificantes e omitem, completamente, as regiões onde as potencialidades são maiores.
Por último -foi esta a razão por que o questionei nestes termos-, o Sr. Ministro referiu que quando se discute a agricultura há que não confundir os efeitos das secas ou das enxurradas, e porque disse que o PSD não seguia esse raciocínio, deduzi que quereria nele incluir-me e à minha bancada, razão pela qual me senti ofendido.
Sobre isso, tendo o Governo anunciado pressurosamente, com pompa e circunstancia, um apoio de cerca de 20 milhões de contos aos agricultores afectados pela seca, tendo pago, até ao momento, exclusivamente, cerca de 500 000 e conhecendo o clamor que vai por esse País fora sobre esta matéria, gostaria de perguntar-lhe por que razão é que no Orçamento do Estado para 1993 -que é quando, certamente, a haver intenções de pagamento, ele se efectuará - apenas estão incluídos 7 milhões de contos.
Gostaria, pois, de saber como é que o Sr. Ministro tenciona pagar os restantes 13 milhões que prometeu e que, até ao momento, não cumpriu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Ministro da Agricultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, não quis ofender nem V. Ex.ª nem o seu partido. No meu espírito nunca esteve a ideia de o seu partido ir numa enxurrada,... longe de mim essa ideia!

Vozes do PS: - Não vai, não!

O Sr. Lufe Capoulas Santos (PS): - O seu partido é que está a ser uma grande seca!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, garanto-lhe que não pequei em espírito nessa matéria!

Risos do PSD.

Em todo o caso, quero dizer-lhe que utilizou uma linguagem que não é muito condizente com a imagem que tenho de si: "assassinato a sangue-frio"?!... Francamente, Sr. Deputado!
Há que distinguir as coisas. Temos, perante nós, três realidades a considerar: a primeira é o orçamento de funcionamento do Ministério. E, em relação a este, o Sr. Deputado sabe qual é a aposta em que o Governo está empenhado: ter menos mas melhor, ou seja, racionalizar.
Queremos que o Ministério preste um melhor apoio aos agricultores e, mais do que isso, queremos reforçar as organizações agrícolas, as associações e as cooperativas para que elas tenham quadros técnicos para apoiar os seus. associados. Como sabe - o senhor é um homem da Casa-, temos o PROAGRI para esse efeito, e queremos aplicá-lo bem. Por isso, ainda recentemente, alterámos as regras.
A segunda: modernização. Para ela temos o PIDDAC, que cresce mais do que a média. Como o senhor sabe, o PIDDAC da agricultura cresce 14 %.
Por fim, temos uma realidade nova que é a grande parte dos apoios ao investimento, daqui em diante, ir até 100 %

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do FEOGA-garantia e por isso o senhor não o vai, naturalmente, buscar ao PIDDAC. Mas está lá, peça que eu dou-lhe os quadros do INGA onde vêm essas previsões.
Sobre a questão dos 3,5 milhões de contos, não faço mais comentários, pois em rigor parece-me que V. Ex.ª não queria fazer tal afirmação. O Sr. Deputado sabe como é que se trabalha e sabe que no ano de 1993 nós mal começaremos a aplicar as medidas complementares.
Quanto à seca, se conhecesse os mecanismos de decisão comunitária compreenderia, com certeza, que nós pouco mais podíamos fazer do que aquilo que fizemos relativamente aos timings.
O programa operacional que envolveu a verba de 12 milhões de contos da linha de crédito moratória, relativamente à parte de apoio aos furos, às forragens, etc., foi um programa operacional que não precisava de ir ao Conselho nem ao Parlamento Europeu, sendo por isso decidido pela Comissão logo em Julho e está em aplicação total.
Contudo, as medidas de apoio ao rendimento, no caso dos cereais e dos bovinos, têm de ir ao Parlamento e, como sabe, nós não controlamos os timings do Parlamento Europeu mas, apesar disso, já conseguimos essa aprovação.
Já agora aproveito a oportunidade para dizer aos Srs. Deputados, que estamos à espera que o regulamento saia publicado no Jornal Oficial para começarmos a pagar.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro da Agricultura, reconheço-lhe toda a legitimidade e o direito para defender as suas ideias e para ter ideias políticas, obviamente, diferentes das nossas, por isso o senhor está no PSD e nós estamos no PCP.
Mas o que não posso aceitar nem admitir é que o Sr. Ministro - que não se tem distinguido por esse tipo de fraseologia - e a sua equipa acusem permanentemente os seus adversários políticos de pouco sérios quando avançam com perspectivas, com políticas ou até com números estatísticos diferentes daqueles que os senhores avançam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se há pouca seriedade, então, Sr. Ministro, permita-me que lhe devolva esse epíteto, porque o Sr. Ministro faz essa análise do crescimento do produto, mas esquece-se de dizer que nos primeiros anos a que se refere o verdadeiro impacte das consequências da reforma da PAC ainda não se estava a sentir e que é nessa altura que tal impacte se verifica ao entrarmos na segunda etapa, com a consequente diminuição das garantias e das defesas e a quebra dos princípios da especificidade da agricultura portuguesa.
Portanto, nestes últimos três anos, em que não figuram as questões da seca nem das enxurradas, que o Sr. Ministro frisou, já se podem verificar os impactes estruturais, estruturantes e não meramente conjunturais, das consequências das novas exigências que decorrem da integração na Comunidade e para a qual a agricultura portuguesa não está a ser preparada do ponto de vista estrutural.
Portanto, os indicadores destes últimos anos têm um significado importante que deveriam preocupar o Sr. Ministro e que, pelo vistos, não o preocupam!
Quanto ao facto de eu ser pouco sério, terei também de devolver-lhe esse epíteto, porque ainda há pouco tempo
o Sr. Ministro dizia que os rendimentos dos agricultores não estavam a baixar, pelo contrário, até aumentavam... Mas, dois meses depois, o Sr. Ministro já vem aqui reconhecer que, afinal o rendimento dos agricultores tem vindo a baixar!...
Na verdade, o senhor não reconhece é as causas, mas sabe que os rendimentos dos agricultores têm vindo a baixar, porque entre 1986 e hoje os preços reais no produtor baixaram 30 % e o que tem acontecido é que, no momento imediato, essa quebra de rendimentos tem sido, de algum modo, coberta pelos subsídios comunitários.
Assim, quando terminado o período de transição e quando terminarem as medidas instituídas pela reforma da PAC e desaparecerem os subsídios, então a liquidação e ruína de milhares e milhares de agricultores é que vai surgir com muito maior peso.
Portanto, a falta de seriedade está aí! Está na forma como o Sr. Ministro encara e analisa esses números. E está também no facto de o Sr. Ministro não ter respondido a uma questão que é central: qual é o futuro? Que política agrícola? Que política de desenvolvimento rural é que o Sr. Ministro tem para uma região que ocupa um terço do País, o Alentejo, e onde vai haver o maior impacte com as medidas da reforma da PAC, que estão a conduzir, como se tem verificado, à desertificação e ao despovoamento?
Estas são as respostas concretas que pretendo ouvir do Sr. Ministro!

Vozes dó PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Ministro da Agricultura: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, a expressão que utilizei de "pouco sério" era a respeito da análise, mais nada!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, quando pedi para interpelar a Mesa tinha-se verificado no quadro electrónico uma transferência de tempo entre o Governo e o PSD que já foi, e bem, entretanto, corrigida.
Sr. Presidente, entendo que a bancada do PSD deve ter um tratamento que deverá ser equilibrado com aquele que V. Ex.ª concedeu às bancadas da oposição, nomeadamente à minha- e lembro que temos um saldo negativo de dois minutos -, pelo que aceito, perfeitamente, que isso possa ser concedido ao PSD assim como também percebo que a invocação das figuras regimentais tenha por parte de V. Ex.ª uma aceitação mais maleável do que aquela a que o Regimento obrigaria.
Em todo o caso, se houver distribuição do tempo do Governo, proporia ao Sr. Presidente que ela fosse feita equitativamente por todas as bancadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa nada tem a responder a não ser o seguinte: vai fazer um apelo à Comissão de Revisão do Regimento para arranjar uma figura de defesa da consideração da Mesa...

Risos gerais.

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Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje de manha referi-me a uma proposta que o CDS, com pompa e circunstancia e de modo extraparlamentar, apresentou relativamente ao Orçamento do Estado para 1993.
Porém, como o Sr. Deputado Nogueira de Brito não estava presente, gostaria de, neste momento, repetir algumas das alegações que então produzi até para esclarecer toda a Câmara do irrealismo da proposta apresentada pelo CDS.
É que a proposta do CDS, à luz dos documentos que nos foram disponibilizados pela imprensa e pela intervenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito, implica uma significativa perda de receitas fiscais que só ao nível dos impostos sobre o rendimento e do imposto do selo deverão ultrapassar os 300 milhões de contos.
Diz o CDS que para compensar isto pouparão um quantitativo equivalente à perda das receitas fiscais com poupanças nos juros da dívida resultantes da eliminação antecipada do stock dessa mesma dívida pública.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Como é que isso é possível?!...

O Orador: - Mas quanto é que seria preciso eliminar de dívida pública para se encontrar essas tais poupanças nos juros da dívida pública? Convencionemos que as taxas de juro da dívida pública rondam os 10 %,...

Vozes do PS: - 14 %!

O Orador: - ... o que significaria que seria necessário uma eliminação de cerca de 3000 milhões de contos da dívida pública para se encontrarem esses 300 milhões de contos de poupança nos juros da dívida.
E o CDS diz o seguinte: bom, com estes títulos nós vamos substituí-los por acções de privatização. Mas o Estado tem neste momento, na melhor das hipóteses, em termos de activos financeiros para privatizar, cerca de 1000 milhões de contos, o que significa que, no máximo, só se poderia eliminar 1000 milhões de contos de dívida pública - e isto falando só de uma forma contabilística, sem entrar em linha de conta com a temporalidade das privatizações, o próprio mercado e a formação de aforradores para as privatizações.
Ora, no máximo, conseguir-se-ia encontrar uma poupança, nos juros da dívida pública, de cerca de 100 milhões de contos,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Não! De 50 milhões de contos! Esse valor era se fosse tudo feito em 1 de Janeiro de 1993!

O Orador: - ... o que significa que 300 milhões de contos a menos na receita fiscal e menos 100 milhões de contos nos juros dá um agravamento do défice orçamental de 200 milhões de contos, ...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - É um escândalo!

O Orador: - ... o que se traduziria...

Vozes do PSD: - Num agravamento do défice!

O Orador: - ... mim agravamento do peso do défice orçamental no PIB de cerca de 4 % para 6 %, que originaria um agravamento do défice orçamental em mais de 50%.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - É uma loucura!

O Orador: - É esta a total irresponsabilidade financeira, que significaria o fim da convergência com a CEE.

Aplausos do PSD.

É uma posição do socialismo mais radical, que nem o PS defende!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Bom, mas vamos ver agora o que se passaria do lado da procura. Os Srs. Deputados do CDS, no fundo, dizem o seguinte: quem tem títulos da dívida pública com rendimento fixo e com prazos de amortização fixa vai substituí-los por acções que irão dar dividendos, não se sabe quando, de empresas a privatizar.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Isso é má política para as privatizações!

O Orador: - Isto é, um detentor de um FIP iria substituí-lo por uma acção da Siderurgia Nacional. Bom, então como é que se processaria esta substituição? Voluntariamente? Compulsivamente? Que sistema? É o sistema dos vouchers utilizados na Checoslováquia?

Risos do PSD.

Finalmente, os Srs. Deputados do CDS deveriam ter em atenção que a outra grande medida que os senhores anunciaram, a da dedução total dos encargos com a aquisição de habitação social - não através de plafonds, que são actualizados anualmente com o Orçamento e que têm a ver com o mercado da oferta e da procura-, provocaria um disparo nos preços da habitação e, naturalmente, quem iria ser prejudicado seriam aqueles que andam à procura de habitação, principalmente os jovens.
Na verdade, os senhores iriam atirar com os preços do mercado da habitação para valores incomportáveis!

O Sr. Duarte Lima (PSD): - E irresponsáveis!

O Orador: - Finalmente, os senhores cairiam no mesmo erro em que caíram as economias americana e inglesa de Reagan e da Sr.ª Thatcher- e os senhores afio uma espécie de Reagan economics serôdio!... O que sucedeu, por exemplo, na América foi que os bancos estavam "encharcados" nos seus balanços com activos sobre a habitação social e quando este sector entrou em quebra, por falta de procura, os bancos viram os seus balanços fortemente agravados, o que deu origem à crise financeira no sistema americano, e também no inglês, sendo esta uma das principais razões pela recessão económica que se vive a nível internacional.
Finalmente, gostaria de dizer que os senhores, no fundo, vieram aqui com uma proposta de disciplina, de grande rigor e de moralização financeira e saem daqui com uma proposta que seria a total irresponsabilidade financeira e

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o fim do processo de convergência com a CEF.- não é preciso ser perito de finanças públicas para ver isto.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores hoje colocaram-se à esquerda deste Hemiciclo! Estão no seu direito!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Soube que de manhã o Sr. Deputado Rui Carp. excedeu-se um pouco em entusiasmo...
Mas, de qualquer maneira, agradeço a sua atenção em vir aqui agora, novamente, para ter oportunidade, embora em tempo curto, de debater comigo esta questão.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Estivemos à sua espera!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Silva Marques continua, tenho de responder-lhe, qualquer dia, à Alberto João Jardim, o que é uma maçada!...

Risos gerais.

O Sr. Deputado Rui Carp. queixou-se muito da conferência de imprensa e eu não vejo bem por que razão, francamente! Nós também tomámos conhecimento do Orçamento do Estado para 1993 através de uma conferência de imprensa...

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Quando o Orçamento já cá estava!

O Orador: - Não, Sr. Deputado! E o Sr. Ministro não me deixa mentir!... Fomos conversar com ele, que nos deu uns papelinhos e depois recolheu-os; fez uma conferência de imprensa e depois mandou para cá os elementos...
Mas eu não me queixei disso!...
Soubemos os números, as percentagens e as projecções pela conferência de imprensa e não me queixo disso! Trata-se de documentos públicos!

O Sr. Ruí Carp. (PSD): - Vamos aos casos concretos, Sr. Deputado!

O Orador: - Sim, vamos aos casos concretos!
Sr. Deputado Rui Carp., iniciámos a nossa intervenção neste Orçamento por fazer uma pergunta ao Sr. Ministro das Finanças que começou por ser um comentário e um elogio sincero. O Sr. Ministro não o tomou bem assim, mas foi sincero e corajoso. E foi-o de tal maneira que, por exemplo, nesse dia a RTP 1 disse que o CDS concordava com o Orçamento do Estado.
Ora, nós não hesitamos e dissemos aqui que estávamos de acordo com princípios fundamentais que o Sr. Ministro enunciou, pois acreditávamos neles. Com a intervenção feita agora pelo Sr. Deputado Rui Carp., chegámos à conclusão de que fizemos mal.
O primeiro princípio fundamental enunciado pelo Sr. Ministro das Finanças respeita à austeridade indefessa, com o qual estamos plenamente de acordo. Só que depois o Sr. Ministro disse assim: "o aspecto das políticas estruturais e financeiras mais relevantes no Orçamento do Estado é o do programa das privatizações". Acreditamos e é isso que o Sr. Ministro quer!
Então o que é que faltou ao Sr. Ministro? Embora seja estranho, creio que faltou a V. Ex.ª um pouco de imaginação para ir mais além. E como? Este Orçamento do Estado, que é apresentado numa conjuntura difícil, deveria ser não apenas um orçamento da convergência nominal mas também um orçamento de retoma da confiança pelos Portugueses e de devolução dos instrumentos necessários para os pôr a colaborar na obra de recuperação económica do País. Julgávamos que era isso (e, pelos vistos, bem!).

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Vamos à substância, Sr. Deputado.

O Orador: - Esteja descansado, Sr. Deputado! Vamos aos números.
Pensávamos que o Governo estava disposto a cumprir o artigo 3.º da lei quadro das privatizações e a respeitar as respectivas prioridades nessa matéria.
No fundo, o Governo espera arrecadar cerca de 200 milhões de contos, fazendo, sobretudo, bons negócios, vendendo pouco e devagar e nem sempre vendendo aquilo que diz que vende. Ora, o que pretendemos é que o Governo venda o mais depressa possível.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Vender tudo!

Vozes do PS: - Barato!

O Orador: - Até estou de acordo que venda barato, porque se o Governo livrar o Estado do peso das empresas públicas fará uma obra meritória, o que, de resto, estará de acordo com aquilo que se diz no Orçamento do Estado.
Pensamos, Sr. Deputado Rui Carp., que o Governo pode, efectivamente, vender 600 milhões de contos de capital das empresas públicas e amortizar igual quantia de dívida. E como? Alterando a lei quadro das privatizações e dizendo que o Governo, para pagamento das empresas a privatizar, receberá títulos da dívida pública e não apenas títulos respeitantes às indemnizações.
Ora, o objectivo que, boje em dia, o Governo cumpre a 80 % com as privatizações, isto é, 80 % desse resultado é para amortizar a divida pública, passaria a ser cumprido a 100 %. Porquê? Porque íamos fazer aqui várias economias. É que nem sequer há 3 milhões de dívida pública. Não há! Neste momento há 1,8 milhões de contos de títulos FTP.
Portanto, não somos irresponsáveis, contra aquilo que o Sr. Deputado Rui Carp. está a querer dizer.
Pensamos que seria à volta dos 600 milhões de contos, o que iria possibilitar uma poupança, em termos de juro, à volta dos 67 milhões de contos. E para chegarmos ao montante da poupança dos impostos, que iria, efectivamente, permitir o relançamento das empresas e a confiança dos particulares...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe que termine. Há aqui um bem altamente escasso que é o tempo.

O Orador: - Na verdade, o tempo é escasso, mas esperemos que este montante não seja escasso, Sr. Presidente.

Risos.

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Como dizia, eliminaríamos, assim, a necessidade de transferências, incluindo para aumentos de capital nas empresas públicas.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Mas como?

O Orador: - Se as vendemos, se nos desfazemos delas, se não estamos a tentar fazer essas cosméticas para venda, não podemos estar a gastar dinheiro a transferir para empresas públicas, não podemos mante-las no património do Estado durante mais tempo, porque isso só serviria para que a sua situação económica do País se degradasse.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Poderíamos, sim, eliminar despesa em institutos e em funções em que o Estado pretende substituir-se aos particulares e que nós, com o desagravamento fiscal, permitiríamos que estes tomassem a seu cargo.
Vamos propor um enquadramento global de reforma administrativa que permita enquadrar as medidas e alcançar maiores poupanças.
Desta forma, chegaríamos, Sr. Deputado, aos 200 milhões de contos, que iríamos perder em receita dos impostos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, este seria um sinal positivo para a economia e para os Portugueses e permitiria transformar este Orçamento do Estado em qualquer coisa de diferente, isto é, em qualquer coisa que fosse não apenas um orçamento da convergência nominal mas também o da convergência real.

Aplausos do CDS.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Sr. Presidente, ainda tenho dois segundos e quero pedir-lhe mais tempo para fazer uma intervenção. E peço isto porque o Grupo Parlamentar do CDS já tem um défice de 3,5 minutos, enquanto que a minha bancada só tem 1,8 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a ilegalidade não cria direitos de igualdade. Tenho muita pena, mas com esse argumento não lhe dou a palavra.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - S. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, creio que seria importante clarificar esta questão.
O PS está disponível para aceitar que cada bancada disponha de mais alguns minutos para podermos desenvolver este debate.

O Sr. Presidente: - Esse argumento já é diferente, Sr. Deputado.
Estão todos de acordo que a Mesa conceda mais três minutos a cada bancada?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o debate do Orçamento do Estado é um debate em que os parlamentares têm de dar o exemplo quanto à gestão do seu tempo, tempo esse que, como V. Ex.ª acabou de dizer -e bem-, é um bem precioso.

Protestos da Sr.ª Deputada do PS Helena Torres Marques.

O Orador: - Sr.ª Deputada Helena Torres Marques, esse é um argumento que se pode eternizar em todas as sessões, porque, presumivelmente, os Deputados discutem sempre questões sérias no Parlamento.
Creio, pois, que temos de dar um bom exemplo neste debate.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - São as contradições da bancada do PSD!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há, pois, consenso sobre esta questão.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Luís Filipe Meneses): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, só quero dar mais um toque de rigor ao que todos os grupos parlamentares e o próprio Governo estão a ter neste debate orçamental.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito afirmou aqui que tinha tido conhecimento do Orçamento do Estado através de uma conferência de imprensa do Governo, o que não é verdade e que poderia levar, quer os Srs. Deputados quer quem está a assistir ao debate, a pensar que o Governo teria, em primeiro lugar, apresentado o Orçamento do Estado à opinião pública e só depois à Assembleia da República.
Ora, como V. Ex.ª pode testemunhar, não foi isso que aconteceu: o Governo fez questão de entregar na pessoa de V. Ex.ª o Orçamento do Estado para ser discutido nesta Câmara e só posteriormente é que realizou uma conferência de imprensa, onde o apresentou à opinião pública.

O Sr. Presidente: - É verdade! Essa é a versão dos factos!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Então peço desculpa!

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Rui Carp. (PSD): - Sr. Presidente, tal como há pouco disse, o CDS apresentou na conferência de imprensa o seu projecto de orçamento alternativo. Na minha bancada não recebi nenhum documento desse tipo. Apenas o vi, por via informal, na mão dos jornalistas, pelo que gostaria de saber se a Mesa o recebeu.
E pergunto isto porque até agora o Sr. Deputado Nogueira de Brito disse - e confirmou-o agora - que o sistema que preconiza é o dos vouchers utilizado na Checoslováquia. Portanto, só queríamos confirmar se esse sistema é idêntico ao da Checoslováquia ou a de um outro qualquer país de Leste.
De facto, é essa proposta que apresentam à opinião pública e que o Sr. Deputado Nogueira de Brito defendeu agora.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, sobre essa questão a Mesa nada sabe.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, quero apenas informar a Mesa de que daremos, em devido tempo, entrada na Mesa das propostas de alteração ao Orçamento.

Vozes do PSD, PS e PCP: - Ah!...

O Sr. Presidente: - A Mesa agradece a informação, Sr. Deputado.

O Orador: - É a isso que estamos obrigados.
A Mesa e os Deputados irão receber as propostas de alteração ao Orçamento, que consubstanciam a alternativa que o CDS propõe.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Estamos esclarecidos!

O Orador: - E, como é evidente, as propostas que dão entrada na Mesa não vão para um sítio qualquer mas, sim, para os Deputados.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Estamos esclarecidos, Sr. Deputado.

O Orador: - Quanto à questão da Checoslováquia, talvez daí nos venham alguns bons exemplos, uma vez que quer na Checoslováquia quer noutros países de Leste se devolvem as empresas aos antigos donos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para dizer que já percebi, assim como toda a Câmara, porque é que o Sr. Deputado Nogueira de Brito não respondeu a uma questão muito concreta que ontem lhe coloquei e que hoje foi retomada pelo Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, a exemplo do que fez o CDS, desejo apenas informar a Mesa e os Srs. Deputados de que o PS apresentará em devido tempo as várias propostas de alteração a este Orçamento. Portanto, em termos políticos, nada distingue a atitude da oposição à direita do Governo da atitude da oposição à esquerda, em matéria de propostas alternativas ao Orçamento.
Estivemos num debate na generalidade, onde a questão fundamental foi a de deixar bem claro que, relativamente a ele, a postura do PS é bastante diferente da do Governo e da do CDS.

O Sr. Rui Carp. (PSD): - Penso que deviam apresentar uma proposta conjunta!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, respondendo às interpelações, a Mesa apenas pode dizer que não tem conhecimento dessas propostas de alteração, uma vez que estas ainda não deram entrada, acreditando, no entanto, que todos as apresentarão.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal da Comarca do Porto, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado António Bacelar (PSD) a ser inquirido, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um outro parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, a solicitação do 6.º Juízo do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu autorizar o Sr. Deputado José Magalhães (PS) a prestar depoimento, como testemunha, e a não autorizar os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS) e Narana Coissoró (CDS) a deporem, como testemunhas, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Não havendo objecções, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

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Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do penúltimo parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo dos Juízos Correcionais de Lisboa, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu autorizar os Srs. Deputados Arons de Carvalho (PS), Joel Hasse Ferreira (PS) e José Magalhães (PS) a deporem por escrito, como testemunhas, nos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do último parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca da Figueira da Foz, a Comissão de Regimento e Mandatos decidiu autorizar o Sr. Deputado Rui Gomes Silva (PSD) a depor por escrito, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas, e terá como ordem do dia o encerramento do debate e a votação na generalidade das propostas de lei n.º 36/VI e 37/VI.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Paulo Martins Pereira Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva
João de Deus Rogado Salvador Pinheiro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Ângelo Ferreira Correia.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Maria Moreira.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui António Ferreira da Cunha.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
João Álvaro Poças Santos.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS):

António Carlos Ribeiro Campos.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vate Gomes Carvalha.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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DIÁRIO

da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

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