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Sábado, 21 do Novembro do 1992 I Série - Número 17 579

DIÁRIO Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE NOVEMBRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado Vítor Manuel Caio Roque José Mário Lemos Damião José de Almeida Cesário

SUMARIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.º 233/VI e 234/VI, das ratificações n.ºs 53/VI a 55/VI e dos votos n.ºs 44/VI a 46/VI.
Concluiu-se a apreciação, na generalidade, das propostas de lei n.º 36/VI - Grandes Opções do Plano para 1993 e 37/VI - Orçamento do Estado para 1993, que foram aprovadas, tendo intervindo, a diverso título, além dos Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva), os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Nogueira de Brito (CDS), Carlos Carvalhas (PCP), Manuel dos Santos (PS) e Duarte Lima (PSD).
Foi aprovado um voto (n.º 47/VI), apresentado pelo Sr. Presidente, sintetizando os votos n.º 44/VI (PCP), 45/VI (PS) e 46/VI (CDS), de protesto pela prisão de Xanana Gusmão e exigindo o respeito pelos direitos humanos, por parte da Indonésia, relativamente a Timor Leste e ao resistente timorense.
A Câmara aprovou ainda um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um Deputado do CDS.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata Silva.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João de Deus Rogado Salvador Pinheiro.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maças.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Navarro.

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Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Joio Carlos da Silva Pinho.
José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Mário António Baptista Tomé.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.ºs 233/VI - Incentivos à actividade cultural (PS) e 234/VI - Revoga a Lei n.º 2(V 92, de 14 de Agosto, que estabelece normas relativas ao sistema de propinas (PCP), que baixaram à 8.ª Comissão; ratificações n.ºs 53/VI - Decreto-Lei n.º 240/92, de 29 de Outubro, que transforma o Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI) em Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI) (PCP); 54/VI - Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novem-

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bro, que estabelece o regime jurídico da formação contínua de professores da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário (PS), e 55/VI - Decreto-Lei n.º 251/92, de 12 de Novembro, que estabelece o regime jurídico do fomento, exploração e conservação dos recursos cinegéticos (PCP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa votos relativos à prisão de Xanana Gusmão, que serão submetidos à votação no momento próprio.
Srs. Deputados, vamos entrar na ordem de trabalhos agendada para boje, que consiste no encerramento do debate, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 36/VI - Grandes Opções do Plano e 37/VI - Orçamento do Estado para 1993 e respectiva votação.
Como os Srs. Deputados sabem, o encerramento do debate compreende declarações finais dos vários grupos parlamentares. Neste sentido, começo por dar a palavra à Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente" Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Em condições de pré-estado de graça face aos seus parceiros comunitários, o Governo apresentou-se para debater o Orçamento do Estado em maratona, por ora finda.
Não foi portador de mudança, confesso que a não esperávamos, não por má fé, como, porventura, dirá o PSD, mas por simples realismo antecipado.
O Orçamento veio e com ele a consagração acentuada, já que as eleições estão de folga, do economicismo mais puro como filosofia inspiradora, o dinheiro como valor sagrado.
O lucro como objectivo, ao qual, incondicionalmente, se subordina o bem-estar dos indivíduos: a sua segurança, a sua saúde, a sua qualidade de vida, o seu direito à felicidade.
Do Orçamento, sinais claros ficaram-nos!
O da coesão social, como sinónimo de uma sociedade mais desequilibrada, geradora de rupturas e apartheid social. Sinais também de uma cidadania que se quer limitada ao mero exercício individual de direitos e que omite a dimensão social do indivíduo, pela qual o Estado é responsável e à qual se furta. Fuga constante de responsabilidades em áreas do social, que lhe competem, na segurança, na justiça, na saúde, na educação, no ambiente, entre outros, quer transferindo-as para as autarquias, quer empurrando os contribuintes para a aquisição de "novos produtos", que, pela via da privatização, se lhes oferecem, afinal velhos produtos/direitos, de há muito adquiridos, já que de há muito pagos com o dinheiro dos contribuintes. Deste modo, a segurança estará mais insegura.
Na justiça, os entusiasmos ficam-se pelo número de tribunais construídos ou a construir - o que, obviamente, num país de conflitualidade, não contestamos-, mas o grave é quando se esquece que, para além do betão, há pessoas, há marginalizados/marginais, que o sistema produz. Há nas prisões milhares de pessoas que apelam, por vezes de modo dramático, à atenção e ao apoio da comunidade, apoio esse que este Orçamento recusa, comprometendo a sua futura reinserção social, uma vez que a dotação atribuída a muitos dos estabelecimentos prisionais e instituições tutelares de menores é zero.
Na saúde - à beira do colapso - é visível a lógica da desumanização, o descontentamento alargado. E a SIDA, cujo combate é um desafio em todo o mundo, teve dessa lógica da desumanização um escandaloso exemplo na proposta, eticamente impensável, de reduzir gastos, através da "poupança" de aproximadamente 300 000 contos, num medicamento (AZT) essencial para os seropositivos. Curioso critério quando o mesmíssimo Governo disponibiliza verba semelhante para que, em plena cidade de Santarém, militares pudessem melhorar as suas condições de treino de tiro.
Será, afinal, que o peso do gatilho é o que mais pesa nas escolhas do Governo?
Não o compreendemos, nem, decerto, os Portugueses entenderão o invejável desafogo do Ministério da Defesa Nacional, neste tempo de austeridade, já que não é dela, fundamentalmente, que o Governo está à espera! À espera estarão certamente os portugueses de melhor educação, mais alargada; educação não como investimento familiar mas como investimento de um país nos seus recursos naturais, no seu saber e na sua inteligência, como factores essenciais de desenvolvimento de futuro.
Ora, não é desta visão que o Orçamento é partidário: as despesas de funcionamento, em termos reais, reduzem-se, o que significa menos pessoal, menos equipamentos, menos cantinas - pior escola; a acção social escolar sofre cortes, o que acentua as injustiças numa população já fortemente penalizada; a formação dos professores é esquecida.
No ensino pré-escolar e no ensino especial tudo fica por fazer, nos ensinos básico e secundário a escolaridade, dita obrigatória, está longe de se cumprir, e no ensino superior o escândalo é total.
Fazendo das propinas forma de financiar o sistema público e brincando à justiça que não se quer fazer pela via fiscal, o Governo desperdiça milhares de contos em publicidade enganosa, viola a Constituição portuguesa e afronta estudantes e professores com total incapacidade de diálogo.
Mais, o Governo atenta pela asfixia financeira contra a universidade, como reserva autónoma do conhecimento científico, que representa, cuja independência importa preservar.
Falou-se de preservação a propósito de ambiente, o que subscrevemos inteiramente como medida urgente e impiedosa, e de preservação como defesa de todos nós e de cada um, do Governo e do ministro a que nos condenaram. E razões não faltam!
Dos velhos problemas nacionais, de anos, tudo continua por fazer, na dança dos números e dos investimentos, que, invariavelmente, estão por cumprir e transitam de ano para ano. Os chamados compromissos de honra estão à vista: o Alviela, a ria de Aveiro, o saneamento da Costa do Estoril, tudo igual ao fim de tantos anos, para que não restem dúvidas!
Da visão integrada, globalizante, só se assimilaram chavões para utilizar em discursos de ocasião.
Num país onde os rios, as áreas protegidas e o litoral são quotidianamente agredidos; num país onde a visão de ambiente é paroquial e as políticas energética, agrícola, de transportes e fiscal não têm o ambiente como factor estruturante; num país onde nem o ordenamento está resolvido e é, no mínimo, de mau gosto criticar com desprendimento agastado, como há dias se fez publicamente, outros por não serem capazes de, pós-Conferência do Rio de Janeiro, passar da palavra à acção. Este é um esquecimento, esquecimento do Governo em olhar sobre si próprio, o que é, aliás, uma constante deste ministério que tem da participação da sociedade civil, dos indivíduos, dos técnicos e das associações uma visão bem curta, mos-

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trada pela preparação da Conferência do Rio de Janeiro e confirmada agora pela reestruturação em curso.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Este é o Orçamento da competividade selvagem, da ditadura financeira, do poder militar. Contra ele estaremos por uma nova visão de solidariedade, por um desenvolvimento endógeno e pela partilha, que, claramente, este governo não tem e que este Orçamento tão bem evidencia.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para a intervenção final em nome do CDS, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começamos, neste debate, por cumprimentar sinceramente o Governo por aquilo que já continha esta proposta de Orçamento do Estado para 1993.
Fizemo-lo porque entendemos que para além das intenções, há anos anunciadas, existem este ano na proposta de orçamento alguns elementos novos, fundamentalmente identificados com a vontade de criação de condições para conter a despesa pública e, mais do que isso, para diminuir o efectivo peso do Estado, considerando-se expressamente o programa de privatizações como a mais relevante política estrutural e financeira reflectida no Orçamento.
Desde logo o nosso cumprimento, que reflectia, nem mais nem menos, a atitude de uma oposição responsável, foi mal recebido ou, melhor, foi recebido com uma ironia grossa, que não entendemos bem.
Ora, do que se tratava e tratou ao longo de toda a intervenção do partido neste debate foi de criticar o que entendemos criticável, sem deixar de louvar o que consideramos louvável, e, mais do que isso, de propor as soluções alternativas que, em nossa opinião, se afiguram as mais adequadas à situação que vivemos, tudo numa atitude própria de oposição construtiva.
Num mundo dominado pelas preocupações que resultam da acumulação de sinais de abrandamento do crescimento nuns casos e já de recessão em outros, o Orçamento ganha, sem dúvida, uma importância acrescida e assume-se como o documento político fundamental do Governo.
A economia volta a estar no centro da política, desde os Estados Unidos à China, passando, obviamente, por Portugal, onde terá, ao menos, de cuidar da "nascente" que alimenta e justifica este "oásis" à beira-mar plantado. Por isso entendemos que os aspectos positivos do documento e do discurso não eram e não são suficientes para o fazer ser mais do que um simples exercício de cumprimento daquilo a que nos obrigamos no quadro da vigilância multilateral comunitária - com mérito, mesmo assim, repetimo-lo!
Ora, num momento em que a vigilância é certa, mas a contrapartida da coesão económica e social é menos certa ou, melhor, é cada mais incerta, é preciso mais.
Havemos todos de convir que, nesta perspectiva, o crescimento do Programa de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central em cerca de 12 % não chega mesmo a constituir o sinal de que o País, em geral, e os agentes económicos, em particular, necessitam, de modo a garantir a permanência da convergência real.
Entende o CDS que é preciso mais, mas é preciso um mais que respeite os equilíbrios macroeconomia" fundamentais; um mais que, continuando a garantir a convergência real, através da dinamização do tecido produtivo nacional, não ponha em causa a estabilidade característica da convergência nominal; um mais que não poderá deixar de consistir na devolução à sociedade, cidadãos e empresas, da confiança e dos meios que lhe permitam tomar em mãos as tarefas da reestruturação e, por essa via, da recuperação do tecido produtivo.
O modelo público, o modelo do Estado está esgotado, como, de resto, o reconhece o próprio Governo nos documentos que hoje vão ser votados ou, ao menos, como tudo levava a crer, que o reconhecia o próprio Governo.
Do que se trata, portanto, é de transformar o Orçamento num documento que aposte mais e de modo eficaz no reforço dos mecanismos de mercado e que aposte mais e sem falsos respeitos no aumento da riqueza detida pelo sector privado, como meio de permitir a dinamização do investimento por parte das empresas e dos cidadãos, único dotado de racionalidade e de eficácia capaz de promover a reestruturação.
Ora, a via para o conseguir reside, no entender do CDS, em introduzir no Orçamento um objectivo que, infelizmente, nele não está presente e ao mesmo tempo levar mais longe uma ideia que o Governo não deixa de exprimir, ao menos, no relatório orçamental.
Onde o Governo nos diz que o ano de 1993 será mais um ano de consolidação de reforma fiscal, o que se exprime além do mais pela permanência do peso da receita fiscal no Produto Interno Bruto, dizemos nós que o ano de 1993 tem de ser o ano em que se eliminem os absurdos fiscais que subsistem, apesar da reforma, e em que se corrijam as injustiças que a reforma não afastou. Aliás, não entendemos que o Governo pretenda consolidar um sistema fiscal que ele mesmo considera portador de graves defeitos!...
Na verdade, que outro significado pode ter o facto de o Ministro das Finanças ter deixado de ser, no Governo, o único cobrador de impostos, associando, a essa tarefa ingrata de publicando, os seus colegas da educação e da saúde, que, ao imporem aos utentes dos respectivos serviços pagamentos acrescidos, não encontram outra justificação que não seja de natureza fiscal?

O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - O objectivo não pode ser, pois, o de consolidar mas, sim, o de sanear o sistema fiscal, o que, na nossa proposta, terá como símbolo a eliminação, desde logo, do obsoleto imposto do selo que incide sobre a importância dos recibos e sobre as operações bancárias, contribuindo assim para aproximar os salários líquidos aos salários nominais e para desagravar de modo significativo o preço do crédito suportado por empresas e particulares.
Não nos ficaremos, porém, por aqui e, na discussão na especialidade, apresentaremos propostas em sede do IRS, do IRC e da sisa que conduzirão à eliminação de injustiças gritantes e à redução da carga fiscal sobre a sociedade.
Sabemos que vamos, com tais medidas, diminuir a receita em montantes que rondarão os 200 milhões de contos e que não queremos financiar tal redução com um agravamento do défice.
Encontrámos, porém, compensação para a menor receita em igual diminuição da despesa e estamos certos de que

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o conseguimos, sobretudo, através do desenvolvimento da ideia exposta pelo Governo a propósito das privatizações.
O que pretendemos, com efeito, é, como é sabido, acelerar o programa das privatizações, não fazendo mais do que reconduzir tal programa aos objectivos que constam da respectiva lei quadro e ao facto de se tratar do elemento chave das políticas estruturais para este ano, como afirma o Governo. E pensamos que a aceleração será possível se o elemento preço não for decisivo e se aceitarmos a mobilização generalizada de títulos da dívida pública como meio de pagamento das empresas a privatizar.
Deste modo, ou seja, acelerando as privatizações, ao mesmo tempo que vamos contribuir para "modernizar as unidades económicas" e "aumentar a sua competitividade", "reforçando a capacidade empresarial nacional" (artigo 3.º da Lei n.º 11/90), estaremos a acelerar a amortização da dívida pública.
Daí, resultará que pouparemos na despesa com juros e, ao mesmo tempo, na despesa com transferências para as empresas públicas, especialmente com as referentes a aumentos de capital.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nisto das empresas públicas, a melhor solução para o Estado é desfazer-se do maior número possível o mais depressa possível. Para além de ser suficiente nesta matéria o exemplo português, a queda do muro de Berlim já nos permitiu observar o que aconteceu com a permanência prolongada do Estado no aparelho produtivo.
Este é o núcleo da nossa proposta de redução das despesas, a completar com a eliminação de funções, que os particulares farão melhor se aliviados da carga fiscal, e com um enquadramento adequado para as medidas, mais ou menos, desgarradas de reforma administrativa.
Ora, a nossa sugestão de alternativa, apesar de não pesar os 5 kg, como queria o Sr. Deputado Silva Marques,...

Risos do CDS.

... pesou o suficiente para incomodar quem não se lembrou de propô-la ou de adoptá-la.
Não o propusemos, porém, com tal objectivo, mas para ajudar a aprovar um Orçamento que pudesse ser entendido como um sinal de esperança para os Portugueses. Face às reacções tão negativas e despropositadas, teremos de votar contra aquilo que acaba por se mostrar insusceptível de ser melhorado.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate na generalidade do Orçamento do Estado para 1993 tornou claros os propósitos e os objectivos do Governo para o próximo ano e as consequências destes resultantes para a economia nacional e para os Portugueses.
Ao confirmar os grandes objectivos do Governo, o debate orçamental não só comprovou a justeza das apreciações do Partido Comunista Português sobre a natureza e resultados inevitáveis da política económica e social do PSD como mostrou a indispensabilidade da sua alteração e, portanto, do reforço da oposição e da luta contra esta política nos planos institucional e social.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Durante o debate, o Governo e o PSD persistiram num discurso optimista desmentido por todos e por tudo, nomeadamente pela realidade económica e social que se vive no nosso país. Mas o debate deixou claro que a economia portuguesa se confronta hoje com uma situação profundamente preocupante, em que a recessão atinge já a agricultura e as pescas e múltiplos ramos da indústria transformadora.
Contrariamente ao que seria necessário, isto é, em vez de um Orçamento que contribuísse para estimular e dinamizar a economia, o Governo, optando por navegar desde já nas águas de Maastricht, apresenta-nos um Orçamento de deflação que vira as costas às aspirações e esperanças dos Portugueses, que prejudicará o investimento e que agravará ainda mais a degradada situação de muitas empresas e sectores da actividade produtiva.
É indesmentível que o País se defronta hoje com um grave problema de desenvolvimento por exclusiva responsabilidade deste governo!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Porque se desperdiçaram meios e se perderam oportunidades ao longo dos últimos anos de conjuntura favorável sem se ter modernizado a economia nem se terem memorado a especialização do aparelho produtivo e o padrão das nossas exportações.
Porque estamos a dois passos do mercado único e o País vai no 3.º ano consecutivo de diminuição real da produção agrícola e piscatória, com a produção industrial e o investimento em quebra pronunciada e com o quadro económico e financeiro de muitas empresas numa situação insustentável.
Porque, inversamente ao exigido pelo quadro recessivo com que se debate a economia real, o Governo persiste numa política incomportável de sobrevalorização do escudo e de elevadas laxas de juro reais dos empréstimos bancários.
Estamos perante um Orçamento que não corresponde nem responde às necessidades da economia nacional, um Orçamento que já se desmentiu a si próprio, ainda antes de ter sido votado.
Tal como já sucedeu em 1992 e em anos anteriores, as projecções apresentadas pelo Governo para a evolução económica em 1993 são comprovadamente irrealistas e destituídas de qualquer credibilidade. O Sr. Ministro das Finanças reconheceu esse irrealismo na sua intervenção de abertura do debate orçamental, mas não tirou daí as inevitáveis consequências.
Porque se o produto, o investimento, o consumo e as exportações não vão aumentar em relação ao ano corrente, como o Governo dizia prever, antes vão desacelerar, como já era notório e o Governo agora confessa, então haveria que alterar as orientações da política macroeconómica contrabalançando as perspectivas de agravamento da crise. E, Sr. Ministro das Finanças, há que corrigir substancialmente a própria proposta de orçamento apresentada à Assembleia da República.

Aplausos do PCP.

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Não o tendo feito nem se propondo fazê-lo, o Governo confirma pelo menos duas coisas: em primeiro lugar, que assume publicamente que o seu orçamento não tem credibilidade e, em segundo lugar e fundamentalmente, que a sua estratégia é a da aposta cega na convergência nominal ditada pelas orientações monetaristas e neoliberais do Tratado de Maastricht, prejudicando conscientemente a convergência real e hipotecando irresponsavelmente o futuro, isto é, o desenvolvimento da estrutura produtiva da economia nacional e as possibilidades de melhoria sustentada do nível de vida dos cidadãos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, o debate nestes dois dias dissipou igualmente quaisquer ilusões que ainda pudessem persistir quanto à verdadeira política do Governo em relação aos trabalhadores, à população laboriosa do nosso país, aos jovens e aos idosos.
A face mais crua deste Orçamento está na frieza e cinismo com que encara a dimensão social. A apregoada contenção nas despesas de funcionamento significa afinal, e como ficou demonstrado no debate, a redução dos encargos com os salários dos trabalhadores da função pública e uma ainda maior desresponsabilização do Estado em relação às suas funções sociais.
Significativo é o facto de, no orçamento da segurança social, as duas rubricas que mais vêem reduzidas as dotações serem as referentes ao subsídio de doença e ao subsídio de desemprego.
Injustos e inaceitáveis são os míseros aumentos decretados para as pensões e reformas, que reduzem a pó as promessas eleitorais do PSD e recusam a cerca de 2 milhões de portugueses as condições dignas de vida a que têm direito.
Graves são o abandono a que o Governo vota o ensino especial, o estrangulamento financeiro a que sujeita o ensino superior, as restrições que impendem sobre a acção social escolar, em suma, o corte acentuado que impõe às dotações para a educação e que, de forma injusta e prepotente, o Governo pretende compensar com a imposição de um sistema de propinas inequivocamente contestado pela generalidade dos estudantes, dos docentes e das famílias portuguesas.

Aplausos do PCP.

Importa aqui saudar e realçar o significado, a importância e a vitalidade do movimento de luta desencadeado pela juventude estudantil e a sua convergência com as lutas e protestos dos senados universitários e dos professores, unidos contra a política educativa do Governo e a favor da igualdade de condições no acesso ao saber.

Aplausos do PCP.

Fortemente penalizador para os utentes e para a generalidade dos portugueses é o orçamento proposto para o Serviço Nacional de Saúde, ameaçando agravar as rupturas já existentes, penalizando os doentes e os profissionais do sector e substituindo o princípio da gratuitidade pelo do pagamento obrigatório e geral no acesso aos cuidados de saúde.
O movimento de greves dos médicos e enfermeiros, os generalizados protestos contra o negocismo e as taxas moderadoras e a indignação causada pela atitude do Governo que conduziu à demissão dos principais responsáveis da Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA são bem demonstrativas da contestação que está a gerar a política de saúde do Governo.
Profundamente revelador da política anti-social deste Orçamento é a tentativa de imposição da redução dos salários dos trabalhadores da Administração Pública, escolhidos como alvo prioritário e como exemplo punitivo para todos os trabalhadores portugueses, bem como a ameaça da sua sujeição à lei dos disponíveis, uma autêntica lei de despedimentos que visa atingir dezenas de milhar de trabalhadores da função pública.
Esta é a estabilidade que o Primeiro-Ministro promete aos trabalhadores portugueses! Mas poderá alguém convencer-se de que os trabalhadores da função pública vão aceitar conformados estas afrontas sem utilizar os seus direitos legais e constitucionais? Certamente que não! A poderosa afirmação de descontentamento e de indignação de cerca de 400 000 trabalhadores da função pública, da administração central e local, foi inequivocamente manifestada na greve do dia 13, demonstrando simultaneamente o carácter iníquo das gravosas alterações à lei da greve propostas pelo Governo e aprovadas pelo PSD.

Aplausos do PCP.

Política de injustiça social igualmente presente na vertente fiscal da proposta orçamental, mais uma vez penalizando os rendimentos do trabalho e aligeirando a tributação dos rendimentos do capital, em particular, os de natureza financeira e especulativa.
Em nome de que princípios, Sr. Primeiro-Ministro e Sr. Ministro das Finanças, e de que justiça social é que um trabalhador ou um reformado subsidiam com os seus impostos os benefícios fiscais concedidos às actividades especulativas e parasitárias?
Em nome de que princípios é que o imposto sobre os rendimentos do trabalho financia os compradores de acções e de obrigações?
Em nome de que justiça social se continua a aumentar o peso dos impostos indirectos, impostos cegos, que tributam de igual modo o milionário e o trabalhador com salário mínimo?
É esta a estabilidade fiscal do Ministro das Finanças, a mais importante razão, segundo ele próprio, que o Governo aponta para que a bancada do PSD aprove de olhos fechados este Orçamento?

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, este é um Orçamento que não está à altura das necessidades do País. Esta é a política do PSD, uma política que põe em causa o desenvolvimento económico e social de Portugal, dos portugueses e das portuguesas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas o Governo e a sua política colocam hoje o País em confronto não só com um problema de desenvolvimento mas também com um problema de regime e liberdades.
A verdade é que a destruição das estruturas sócio-económicas criadas com o 25 de Abril tem vindo a ser acompanhada, objectivamente, pela degradação da democracia política, pela crescente governamentalização do Estado e fuga ao controlo democrático, pela crescente limitação de direitos e garantias reais dos cidadãos e dos trabalhadores.

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Não haverá um problema de regime quando, por parte do Governo e do PSD, partem ataques e campanhas de contestação em relação ao Tribunal Constitucional, ao Tribunal de Contas, ao Procurador-Geral da República, ao Provedor de Justiça, aos tribunais e ao Presidente da República sempre que estes, no exercício das suas funções e competências, se opõem à política governamental?
Não há uma questão de regime quando o Governo esvazia os poderes de fiscalização desta Assembleia ou se serve do pretexto do segredo de Estado para tentar tapar e silenciar os abusos de poder, os escândalos e os sucessivos atropelos ao Estado de direito?
Tudo isto são factos conhecidos, como o é o facto de os direitos dos trabalhadores estarem a sofrer graves limitações e restrições, nomeadamente na sua acção sindical e na greve ou o facto de os serviços secretos de informações exorbitarem descaramento das suas funções, e tenderem a actuar como se se tratasse de uma polícia política.
São factos indesmentíveis, Sr. Primeiro-Ministro, mostrando, ao contrário do que têm dito, que há em Portugal não só um problema de desenvolvimento como um problema de liberdade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em Portugal, são o Governo, as suas políticas e o seu Orçamento que comprovadamente estão a bloquear o desenvolvimento económico e impedem a concretização de legítimas aspirações e importantes direitos sociais.
Pela nossa parte, Sr. Primeiro-Ministro e Sr. Ministro das Finanças, quer em sede do Orçamento quer fora dele continuaremos a confrontar o Governo, o PSD, a sua bancada, com as nossas propostas concretas, procurando assim tomar mais evidente que há alternativas - e há, de facto! - e que esta política é errada e contrária aos interesses dos Portugueses e de Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate realizado sobre as propostas de lei n.ºs 36/VI e 37/VI enfraqueceu consideravelmente a credibilidade da política orçamental.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, não é, nem técnica nem politicamente, correcto proceder a revisões sucessivas do cenário macroeconómico suporte dessa política e, simultaneamente, não reconhecer as consequências que essas sucessivas revisões terão sobre os agregados previamente definidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No limiar de uma crise económica, assente sobretudo em erros de política interna, embora potenciada pelo abrandamento da economia internacional,
é irresponsabilidade não fazer corresponder às alterações introduzidas alterações correspondentes nos fluxos financeiros inscritos no Orçamento do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Prever um aumento da riqueza do País, para 1993, de 3 % não é a mesma coisa que prever 2 %.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não é a mesma coisa para o cálculo das receitas que se cobram, dos rendimentos que se distribuem, das prestações sociais que se aplicam, dos investimentos que se fazem e se promovem e do emprego que se cria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo não apresentou, nem referiu durante o debate, nenhuma informação acerca das consequências sobre a política orçamental da alteração do cenário de partida.
Não o tendo feito, foi o próprio Governo que tirou toda a credibilidade às suas próprias propostas.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ou o Orçamento do Estado está agora certo e estava errado quando foi apresentado ou o Orçamento do Estado estava correcto inicialmente e está agora errado e desajustado à evolução da situação económica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em 15 de Outubro, quando o Orçamento do Estado entrou na Assembleia da República, era para o Governo o tempo do oásis feito de sucesso e de desenvolvimento.
Num mês a opinião pública e as notícias da conjuntura económica pulverizaram as miragens ministeriais.
As contas nacionais relativas ao 2.º trimestre de 1992 vieram mostrar-nos que o produto agrícola, no conjunto dos dois anos imediatamente anteriores, caiu de 22 % e o produto industrial caiu de 1 %.
O que há de novo e preocupante no período que agora se inicia é o enfraquecimento de alguns sectores que, até aqui, tinham vindo a desempenhar o papel de "bóias de salvação" da nossa economia. Passado que foi o período eleitoral, a construção civil entra agora em queda "sustentada".
O produto da construção baixou significativamente no 2.º trimestre deste ano, como já não acontecia há muito tempo. As perspectivas de emprego, a carteira de encomendas e a apreciação da actividade caem agora a pique em todos os ramos de actividade da construção.
A evolução do produto geral no sector bancário, autêntica árvore das patacas ao longo dos últimos anos, demonstra que não é possível finanças ricas sem agricultura nem indústria que a sustentem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A discussão sobre a recessão da economia portuguesa já deixou o campo da interpretação dos dados estatísticos (e mesmo os mais fervorosos militantes

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social-democratas já aceitam como são negativos) e passou para o campo meramente académico. Enquanto o actual Ministro das Finanças se atém à definição clássica de recessão aplicável aos países desenvolvidos que não tem fundos comunitários nem objectivos de convergência real, um dos seus antecessores e colega de partido lembra que, se tivermos em conta que as transferências da Comunidade são maiores do que o crescimento do produto, Portugal está efectivamente em recessão económica.
É reconhecido que, a partir de 1985, Portugal se defrontou com a conjuntura económica internacional mais favorável das últimas décadas.
Curiosamente foi nos últimos sete anos que o PSD governou o País. A explicação do oásis do Sr. Ministro das Finanças, se porventura oásis houvesse, seria esta e não outra.
Infelizmente, a natureza das políticas e a subordinação dos interesses nacionais ao ciclo eleitoral do Sr. Primeiro-Ministro apenas nos permitiram antever, esporadicamente, miragens do prometido e desejado oásis.
Com fundos comunitários de centenas de milhões de contos (nos últimos meses têm entrado no País ao ritmo de 1,5 milhões de contos por dia) seria impossível não crescer e, sobretudo, não se construírem infra-estruturas que, sendo necessárias, tinham ainda a vantagem de permitir o adequado aproveitamento eleitoral.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tem o País, no entanto, boas razões para pensar que pagou cada quilómetro de auto-estrada com a entrada em situação difícil de uma pequena ou média empresa e que isto é consequência das erradas e contraditórias políticas aplicadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste debate o Governo e o partido que o apoia continuam a falar-nos na necessidade de reestruturar e modernizar o tecido empresarial português, de promover justiça social, de desenvolver equilibradamente o País, de acautelar o futuro, de reestruturar a Administração Pública, em suma construir uma sociedade melhor.
Mas o Governo não diz que está no poder há sete anos, que teve todas as condições para atingir os propósitos que agora anuncia e que, afinal, o que pode hoje apresentar aos Portugueses é bem pouco face ao muito que teve oportunidade para fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O apregoado diferencial de crescimento da economia portuguesa relativamente à média europeia, nos últimos anos, é outro mito que o Partido Socialista, no debate, colocou na sua verdadeira dimensão.
Como foi demonstrado, esse diferencial não acomoda sequer o volume dos fundos comunitários recebidos e é, em muito, inferior ao diferencial médio verificado na economia portuguesa noutros anos e em diversos períodos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quando o Governo afirma o contrário está, pois, a mentir aos Portugueses!
A evolução negativa do produto agrícola e do produto industrial e a certeza (por ausência de políticas adequadas nas propostas em apreciação) de que para o Governo não há um grande problema com o desaparecimento da base agrícola e com a progressiva desindustrialização do País (porque os serviços resolvem a questão) é extremamente preocupante e, a curto prazo, muito lesiva dos interesses nacionais.
O Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro dos Finanças que, tantas vezes, se referem ao seu hábito de leitura da imprensa especializada internacional, fariam bem em meditar sobre os exemplos que tal imprensa frequentemente apresenta e sobre as consequências dessa visão sobre as respectivas economias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate sobre a política orçamental para 1993 demonstrou o irrealismo das projecções macroeconómicas do Governo (apesar da sua sucessiva correcção) e, consequentemente, a incorrecção da política de suporte.
O Orçamento do Estado, enquanto instrumento financeiro de uma política, tem, pois, a sua credibilidade seriamente posta em causa.
Com a evolução mais provável da economia portuguesa nos próximos trimestres serão precisos novos cálculos, novas políticas e, consequentemente, um Orçamento do Estado diferente.
O Governo mantém o seu autismo porque se recusa a ver a realidade, ou, vendo-a, a manipula ao sabor dos seus interesses eleitorais.
Durante o debate foram anunciadas propostas alternativas e políticas diferentes pelos diversos partidos.
O Partido Socialista contrapôs sete razões para rejeitar o Orçamento do Estado às seis razões que o Sr. Ministro das Finanças tinha apresentado para convencer as oposições a apoiarem o projecto governamental.
Apresentámos sete argumentos, mas poderíamos ter apresentado 14 ou 21, pois tal era facilmente concretizável face à fragilidade da proposta em apreciação.
Rejeitaremos, pois, o Orçamento do Estado e as GOP apresentadas pelo Governo.
E porquê?
Em primeiro lugar, o quadro macroeconomia) de partida, mantendo-se as políticas monetária e cambial do Governo e a ausência de políticas sectoriais, continua irrealista e manipulado e, consequentemente, não se ajusta à proposta de orçamento e aos objectivos definidos nas Grandes Opções.
Apresentámos um cenário macroeconomia) alternativo, verificável no pressuposto de que o Governo continue a rejeitar o realinhamento da paridade do escudo, proceda à liberalização integral dos movimentos de capitais monetários em 1 de Janeiro de 1993 e mantenha a política orçamental apresentada.
Desafiamos o Governo ou a alterar as suas políticas ou a redefinir os seus objectivos de crescimento, tirando daí todas as consequências.
Em segundo lugar, a proposta orçamental mantém e agrava a iniquidade fiscal e, consequentemente, a injustiça social, como tem vindo a denunciar o PS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É bem verdade que o Orçamento do Estado é um orçamento de estabilidade, entendível esta

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expressão como significando a manutenção da iniquidade, da injustiça e da irracionalidade fiscal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O ano de 1993 será, de novo, um ano de aumento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e os consumos mais agravados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - À injustiça inerente ao actual sistema mantém-se - o seu carácter globalmente repressivo e penalizador para as classes médias e, em particular, para os trabalhadores por conta de outrem não sofre alterações de fundo.
As propostas específicas do PS no sentido da correcção dos escalões do IRS (tendo em conta a inflação e a produtividade esperadas) e das deduções e abatimentos das despesas com a educação e a habitação destinam-se essencialmente a neutralizar o aumento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho consagrado neste Orçamento do Estado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mantém-se, contudo, a iniquidade, traduzida no tratamento diferenciado dos diversos tipos de rendimento.
O PS desafia o Governo a encetar imediatamente uma verdadeira reforma fiscal orientada pelo princípio do englobamento de todo o rendimento pessoal, visando, assim, a criação de um imposto único sobre o rendimento, nos termos e nos moldes definidos constitucionalmente.

Aplausos do PS.

Pela nossa parte apresentaremos ou reapresentaremos, naturalmente fora do contexto da discussão orçamental, propostas com esse objectivo.
Em terceiro lugar, a nossa rejeição do Orçamento do Estado funda-se na constatação da inexistência de qualquer critério ou prioridade na definição dos grandes objectivos sectoriais, inserta na atitude dita de rigor (leia-se "corte de meios financeiros").
O corte praticamente uniforme das despesas correntes dos vários ministérios exprime irresponsabilidade e, já agora, ausência de criatividade.
É inaceitável esta atitude que, a não ser corrigida, conduzirá à provável paralisia de serviços fundamentais, em áreas como a educação e a saúde.
As prioridades expressas no PIDDAC não integram qualquer estratégia visível.
A insuficiente inscrição de verbas para áreas fundamentais, como a habitação social e o ambiente (claramente desproporcionadas relativamente ao investimento em obras públicas ou de mera celebração como o Centro Cultural de Belém), e o desprezo pelo estímulo a uma necessária política industrial, de reestruturação e modernização do tecido produtivo são francamente preocupantes.
As propostas do PS procurarão corrigir, nos limites condicionantes do modelo de crescimento (e correspondentes políticas) implantado pelo PSD ao longo dos sete últimos anos, algumas destas deficiências e destas distorções.
Acentuaremos, portanto, a necessidade de afectar mais dinheiro à educação, à investigação, à ciência e à cultura, mesmo que tal implique um agravamento ligeiro do défice orçamental (0,3 % a 0,5 % do PIB).
Reforçaremos as dotações para a saúde, nomeadamente no que diz respeito aos programas especiais de assistência materno-infantil, de combate e prevenção à droga e de prevenção e combate da SIDA.
Proporemos o reforço de verbas para habitação social, nomeadamente para o realojamento e programa RECRIA e para a revisão do subsídio de rendas, sem aumento de défice, por transferência de verbas inscritas no sector das obras públicas.
Reconhecemos a necessidade de intervir mais activamente na política do ambiente, nomeadamente ao nível da despoluição dos rios e dos parques, pelo que ajustaremos as respectivas dotações.
A forma como a função educação é tratada neste Orçamento do Estado é uma vergonha e um escândalo nacionais. A educação é o mais valioso dos investimentos porque é a garantia do futuro.

Vozes do PS: Muito bem!

O Orador: - A educação é o mais valioso dos investimentos porque é a garantia do futuro. Não priorizando esta área o Governo mostra-se insensível e desconhecedor dos verdadeiros mecanismos de desenvolvimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproveitando a oportunidade deste debate, o verdadeiro desafio que lançamos ao Governo tem a ver com o modelo de desenvolvimento. Ficou patente nos últimos debates sobre a política económica que, nas condições que foram proporcionadas ao PSD, o PS faria diferente e seguramente faria muito melhor.
O desafio que a sociedade lança ao poder político é o de definir políticas que impeçam o crescente desequilíbrio regional, que evitem o aparecimento da nova pobreza e dos novos excluídos, que acentuem a necessidade de um melhor acesso à educação, à saúde e à habitação e que contribuam para a efectiva (e não adiada) modernização e reestruturação da economia real.
Como ontem acentuava o Deputado Jorge Lacão, "o modelo do PSD está esgotado e não tem remissão". A distinção entre o que o PS propõe e defende e o que o PSD tem vindo a aplicar não se esgota na mera divergência pontual, porque se traduz numa visão diferente da sociedade e do papel que nela o homem deve desempenhar.
A economia não é uma ciência neutra e as pessoas não são meros instrumentos para uma qualquer convergência nominal ou contabilística. Com o PSD tem sido assim. Com o PS seria de certeza diferente.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Assembleia da República acaba hoje a discussão, na generalidade, do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano para 1993, e de tudo quanto ficou dito no debate resulta, para o Grupo Parlamentar do PSD, que não foi apresentada alternativa simultaneamente viável e credível que, com realismo, possa ser seguida, em detrimento dos objectivos que nesses documentos se propõem ao País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Este Orçamento do Estado e estas Grandes Opções do Plano, bem como as escolhas políticas que nele estão implícitas, integram-se numa linha de continuidade sempre presente nos governos do PSD, que apostou decisivamente no crescimento sustentado da economia e da riqueza nacional, na aproximação progressiva aos padrões de bem-estar e desenvolvimento dos nossos parceiros comunitários, num esforço continuado de infra-estruturação pública, no controlo rigoroso da inflação, na modernização do tecido empresarial português, no crescimento seguro dos rendimentos reais das famílias e na promoção de padrões mais justos de justiça social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São objectivos extremamente ambiciosos e difíceis de alcançar, particularmente em momentos como o actual, em que se adensara expectativas negativas quanto à evolução da conjuntura internacional, particularmente a dos países com os quais entretecemos o essencial das nossas relações económicas. Seria estultícia pensar que uma pequena economia aberta como a nossa não reflectiria os movimentos, quer de euforia, quer de depressão económica dos seus principais parceiros.
Mas é inegável hoje, em função dos resultados e dos dados analíticos disponíveis, que as políticas de rigor e de verdade seguidas nos últimos anos deram ao nosso país o grau de segurança suficiente para poder, neste momento difícil, minimizar esses efeitos negativos e poder continuar a apostar num crescimento da sua economia acima da média comunitária, num controlo apertado da inflação, na manutenção de níveis extremamente invejáveis de emprego e no crescimento real do poder de compra dos salários.
O Governo, tal como o Grupo Parlamentar do PSD, tem a noção clara de que estes objectivos se não alcançarão apenas pela atitude voluntarista do seu mero enunciado. Sabemos que só o empenhamento activo de todos os agentes económicos garantirão, sem custos indesejáveis, a sua obtenção. É fundamental que todas as partes envolvidas nesse processo, particularmente os parceiros sociais, não radicalizem nem maximizem os pontos de vista próprios, antes os possam compatibilizar com os objectivos comuns que se traduzem nestes documentos.
Por isso chamamos a este Orçamento do consenso social, já que foi o consenso social verificado nos últimos cinco anos - caso praticamente inédito em toda a Europa comunitária - que permitiu que todas as partes envolvidas no processo de concertação minimizassem os custos e maximizassem as vantagens, com benefício claro do interesse nacional.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Europa e todo o mundo ocidental está a viver, nos últimos anos, sob o espectro da incerteza e da dificuldade. Os próprios países mais ricos e desenvolvidos da Comunidade Europeia encontram--se, neste momento, a braços com graves problemas de natureza vária, que vão da incerteza cambial à estagnação do crescimento económico, do aumento do desemprego ao descontrolo na inflação e à própria diminuição das garantias sociais das classes mais favorecidas de que temos exemplos bem próximos de nós. Essas ilhas de prosperidade e progresso que serviram de apelo aos povos do Leste para porem fim a regimes de miséria e sem liberdade sentem também boje as dificuldades inerentes a um processo generalizado de travagem no crescimento da economia mundial.
Num quadro internacional desta natureza, torna-se ainda mais imperioso - se bem que mais difícil - ousar continuar com a modernização de Portugal, acabando com gastos inúteis e sem vantagens para os cidadãos, racionalizando estruturas administrativas e pondo termo a desperdícios, que são pagos, sempre à custa dos contribuintes. Apostar na modernização e na mudança, neste quadro, é difícil - sabemo-lo bem, temos disso clara consciência. Mas é um caminho que vale a pena continuar a seguir.
Sabemos, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que estas dificuldades em particular são o ambiente propício em que viceja e cresce o discurso da facilidade e da demagogia. Infelizmente, uma parte da discussão deste Orçamento teve disso tradução evidente nos discursos de alguns partidos da oposição.
Há seis anos que, sem imaginação e sem glória, que as suas intervenções nas discussões do Orçamento e das Grandes Opções do Plano circulam entre a promessa da facilidade e o anúncio da crise. Entre a facilidade das soluções que propõem e a crise que há seis anos anunciam se esgota uma parte substancial do seu discurso. Toquemos, ao de leve, numa e noutra.
À facilidade, em primeiro lugar. Sabemos todos que em qualquer orçamento, por mais próspero que seja o país, há, todos os anos, medidas difíceis que não podem deixar de ser tomadas. Os governos do Professor Cavaco Silva têm-no feito com coragem, arrostando muitas vezes com fortíssimas contestações e pagando nas sondagens o preço da impopularidade. O tempo e os resultados, porém, têm demonstrado ser esse o caminho seguro que conduziu a economia portuguesa a um grau de solidez que a impediu de ruir, com fragor, aos primeiros sintomas de dificuldade que assolaram as principais economias do ocidente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E como as pessoas de bom senso se habituaram a analisar as árvores pelos frutos, as últimas palavras dos Portugueses têm sido sempre de estímulo e de compreensão, e os seus votos de confiança. Por isso aqui estamos para continuar esse caminho.
Em contrapartida, qualquer observador atento quedará de espanto ao verificar que, nos últimos cinco ou seis anos, uma parte substancial da oposição - particularmente o seu maior partido - critica políticas, contesta objectivos, duvida de metas, desfaz cenários, arrasa projecções - e, no fim de tudo, o que nos dá, ou, antes, o que propõe ao Pais? Facilidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É assim que arrojados economistas desfilam alegres nesta tribuna, explicando com a mais ingénua singeleza, com que excelência comparabilizariam os objectivos mais antagónicos de qualquer política económica: reduzir mais a inflação, mas aumentando simultaneamente os salários e até mesmo o nível actual de emprego; diminuir drasticamente o défice, mas aumentar ainda mais a despesa em tudo quanto é ministério ou área de intervenção do Estado, com a dulcíssima boa nova de que tudo isso pode ser acompanhado com uma redução significativa dos impostos; modernizar o tecido empresa-

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rial, mas não permitindo, em nenhuma circunstância, que as más empresas possam dar lugar às boas.
É demasiado fácil, e é também demasiado simples. Por isso nos ocorre, como ocorrerá à generalidade dos portugueses, que quando a esmola é grande, o santo desconfia. Mas a este mundo de facilidades que hoje é a essência ideológica a que se reduziu o socialismo democrático, a este delicado papel azul de celofane em que se envolve a si próprio o maior partido da oposição, contrapõe-se, no seu discurso dos últimos seis anos, o negro da realidade, que putativamente será fomentada pelo Governo e pelo PSD, enfim, a crise que, com teimosia sebastiânica todos os anos o PS anuncia na discussão do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano.
O Governo anunciou, num destes anos atrás, o combate à inflação como uma prioridade nacional? Eis que de imediato se abeirou do microfone o Sr. Deputado Manuel dos Santos para dizer que isso não era realista, já que o Orçamento do Governo era eleitoralista e expansionista, e as suas consequências inevitáveis seriam mais inflação e, consequentemente, a criação de um ambiente de crise.
Prometeu o Governo, há uns anos atrás, o aumento real dos salários e das pensões, por forma a garantir níveis acrescidos de justiça social, logo aí por 1987, tendo ainda a ousadia de dizer que esse era um caminho para trilhar firme e obter ganhos acrescidos todos os anos? Arremete na altura o Sr. Deputado Cravinho -hoje distante de nós - chamando o Governo de irrealista e anunciando de novo a crise para o fim do ano.
Avança o Governo com uma reforma fiscal ousada e mais justa para os contribuintes? Eis que assoma o Sr. Deputado António Guterres, condenando-a - à reforma, claro - à falência, anunciando o colapso fiscal, quase prevendo a eclosão de uma dúzia de "Manas da Fonte" pelo País, com uma crise de repercussões inevitáveis. Tranquilo, o País interiorizou a reforma fiscal e a crise quedou-se a aguardar melhores dias, já cansada de aguardar melhor oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assegura o Governo que é possível manter a aposta estratégica na manutenção do crescimento económico e da riqueza nacional, preferindo menor crescimento mas com bases de sustentabilidade, do que maior crescimento hoje sem essas bases, o que redundaria, amanhã, em retrocesso e travagem?
Eis que irrompe, flagelador, o Sr. Deputado Almeida Santos, invocando, como há dias, os Evangelhos e falando dos pobres e dos desvalidos da sorte, que são, agora e sempre, o sinal de que a crise aí está.

Aplausos do PSD.

Nos últimos seis anos, a todas as grandes projecções apresentadas nesta discussão pelos governos do PSD o PS respondeu com a negação, concluindo sempre que as mesmas se não cumpririam e alertando, no fim dos seus avisos, para o desfecho inevitável do caminho seguido: a crise.
A crise, presente de forma tão obsessiva que numa das mais acaloradas discussões orçamentais e quando, a certa altura, o Hemiciclo jazia num breve minuto de silêncio, o próprio Sr. Deputado Raúl Rêgo se levantou num repente e dando um violento murro na mesa fez troar a sua voz na sala concluindo: "Sim senhor, é a crise que aí vem." E a crise, teimosa, ainda não veio, persistindo em fazer negaças ao Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

Tal como para Marx a religião era o ópio do povo, a crise tem sido o ópio do Partido Socialista. Sem o seu anúncio, sem o fervoroso desejo da sua chegada, o PS não tinha, de há seis anos a esta parte, discurso orçamental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela nossa parte, vamos continuar a fazer tudo para que a crise continue a não chegar ao nosso país.
Não porque, neste particular, tenhamos um especial interesse em contrariar o Partido Socialista, partido que se tem mostrado amigo, particularmente nos actos eleitorais. Mas sim porque esse é o interesse de Portugal e dos Portugueses.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Este Orçamento do Estado e estas Grandes Opções do Plano são dois excelentes instrumentos para defender Portugal da crise com todos os pontos fracos que podem ter e como tem todas as obras humanas. Por isso lhe daremos, dentro de minutos, o nosso inequívoco apoio.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não faz parte das nossas atribuições ajudar a oposição, incluindo o seu maior partido, mas não nos custa reconhecer que faz falta ao País e faz falta ao Governo uma oposição eficaz que, também no domínio do Orçamento e das Grandes Opções do Plano, complemente as escolhas do Governo com críticas e propostas alternativas, mas simultaneamente realistas.
Essas críticas e essas propostas alternativas, com carácter global e realista, não estiveram presentes este ano. A nossa esperança é infinita e aguardamos que no próximo ano isso se verifique, porque ainda estamos longe do fim da legislatura. Até lá, atrevo-me, em nome do meu grupo parlamentar, a pedir às oposições, em particular ao seu maior partido, que possam, com o seu voto favorável a este Orçamento, que se pretende de consenso social, reivindicar também eles no próximo ano, com o nosso aplauso, evidentemente, uma quota-parte da responsabilidade política por terem garantido a aprovação de um documento de rigor e de verdade que, apesar dos ventos procelosos que sopram do exterior, manteve Portugal fora do quadro da crise.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1993 são apresentados no contexto de um quadro económico internacional que evidencia uma das situações mais preocupantes do passado recente. Pode mesmo dizer-se que o mundo se encontra na maior crise global desde o fim dos anos 70.

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Se os dados do crescimento económico não permitem falar de depressão à escala mundial, é indiscutível que alguns países se encontram em grave situação recessiva. Além disso, o ambiente geral nas economias industrializadas é de estagnação e expectativa pouco optimista.
O produto mundial, depois de crescer 3,2 % em 1989 e 1,8 % em 1990, estagnou em 1991. No corrente ano, espera-se um fraco e hesitante crescimento em tomo de 1 %. As economias dominantes, dos Estados Unidos à Alemanha e ao Japão, registam, por seu turno, taxas de crescimento que devem estar bem abaixo dos 2 % este ano.
O desemprego sobe um pouco por toda a parte. Os últimos valores da Comunidade mostram situações que se podem considerar quase dramáticas. Existem países com taxas de desemprego acima dos 15 %, como a Irlanda e a Espanha, mas, ainda mais preocupante, são vários outros que se mantêm acima dos 10 %, como a Itália, a Grã-Bretanha e a França. A média comunitária da taxa de desemprego está neste momento acima dos 9 %.
Esta grave situação económica tem levado os governos, um pouco por todo o mundo, da Espanha à Itália, da Alemanha ao Japão, a tomar medidas excepcionais, nalguns casos de intensidade pouco usual.
A Espanha teve de adoptar medidas orçamentais fortemente restritivas para tentar controlar a evolução da economia. A subida acentuada dos impostos situa-se "no mais restritivo orçamento dos últimos 20 anos", segundo foi afirmado pelo Governo Espanhol. E estas medidas são tomadas num quadro previsível de aumento do desemprego para quase 20 % e de contracção do emprego e do investimento em mais de 1%.
E este quadro negativo da economia espanhola repete-se um pouco por todo o lado. Orçamentos extraordinários de austeridade na Itália, na Holanda, na Alemanha, ou de expansão forçada no Japão; elevadas taxas de juro na Alemanha, na Itália, na Suécia e nos outros países nórdicos são apenas alguns dos indicadores da difícil situação da maior parte dos países desenvolvidos. A recente crise cambial, que hoje teve novo desenvolvimento nas moedas dos países nórdicos, veio apenas agravar e sublinhar as dificuldades da maior parte destas economias.
Talvez o aspecto mais preocupante deste quadro resida no perigo proteccionista. Detectam-se, em alguns países, sintomas de recrudescimento de pressões proteccionistas e tendências autárquicas. Estas tendências podem vir a perturbar definitivamente a estrutura fundamental da economia internacional como hoje a conhecemos e retardar ainda mais a recuperação económica.
É neste quadro sombrio que se podem compreender os problemas sentidos pela Comunidade Europeia. Alguns países, penalizados hoje por políticas incorrectas do passado, sobretudo a nível orçamental, fazem reflectir no processo comunitário os efeitos dos seus próprios erros. Para alguns, a Comunidade tende a ser vista, essencialmente, como fonte de benefícios imediatos. Ora, a construção europeia é um objectivo que ultrapassa, de longe, os pequenos percalços pontuais. Temos todos de estar bem conscientes disso, pois também entre nós se levantam vozes que afinam por aquele outro diapasão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputados, é difícil, ao contemplar o quadro económico internacional, não olhar com algum alívio para a situação portuguesa. Nos campos do crescimento, transformação estrutural, estabilização e redistribuição, os avanços de Portugal desde 1985 foram e são notáveis.
Os resultados alcançados decorrem directamente da estratégia sensata, serena, sustentada e firme que os meus Governos vêm delineando desde essa altura.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Outros, com desatenção ou má fé, começaram por negar esses avanços. Depois, perante a sua evidência, passaram atribuí-los a factores externos e fortuitos. A circunstancia de esses factores externos serem comuns a outras economias cujos resultados foram bem piores não os incomodava.
Hoje, perante a ausência da conjuntura internacional favorável que lhes serviu de alibi para se esconderem da verdade, esses profetas da desgraça caem no mutismo ou enveredam por catastrofismos e alarmismos extemporâneos. O povo português saberá dar a esses arautos do miserabilismo, como soube no passado, a importância que merecem.

Aplausos do PSD.

O Governo sabe, e o povo português compreendeu, que no mundo de hoje só uma Unha de política estável, estrutural e prolongada pode trazer benefícios duradouros para o País. Por isso, toda a nossa estratégia foi definida no horizonte do médio prazo. Os percalços do caminho e as flutuações pontuais não perturbam a linha sólida e persistente que o Governo traçou. Continuaremos nessa linha de rumo como até aqui.
A nassa economia, que como a economia comunitária que mais cresceu desde 1986, manteve taxas sempre acima dos 4 % até 1990. A Guerra do Golfo e o pendor recessivo de 1991 fez descer esses valores, mas para uns muito respeitáveis 2,5 %. Só o facto de se terem, entretanto, habituado aos níveis excepcionais do crescimento anterior pode ter levado alguns a desdenhar deste valor.
Este crescimento esteve e está solidamente radicado nas exportações e no investimento. Na verdade, e mesmo contando com a crise mundial de 1991, a formação bruta de capital fixo e as exportações cresceram, nos seis anos desde 1986, a taxas médias anuais superiores a 9 %. A par da forte expansão do consumo privado, afinal o objectivo de toda a actividade económica, o emprego expandiu-se a uma taxa média anual superior a 2 %, descendo a taxa de desemprego de cerca de 8,5 % em 1986 para 4 % no corrente ano.
Neste processo de crescimento, foi dada forte atenção à equidade na repartição do bem-estar entre os Portugueses. A distribuição de rendimentos revelada pelo Inquérito aos Orçamentos Familiares de 1990, agora disponível, é bastante mais igualitária que qualquer outra da história portuguesa.
Os salários reais, depois de terem descido quase 10 % de 1980 a 1985, subiram significativamente desde então, tendo, só na indústria, crescido 17 % de 1986 a 1991.
Também nas prestações sociais, a melhoria foi inquestionável. As pensões mínimas do regime geral cresceram, desde 1985, a taxas médias superiores a 20 %. Este esforço continua a verificar-se. A criação, em 1990, do 14.º mês para os pensionistas e o aumento, recentemente decidido pelo Governo, das pensões mínimas a uma taxa bem superior à da inflação são testemunho da sua constante preocupação com os estratos mais vulneráveis e desfavorecidos da sociedade portuguesa.

Aplausos do PSD.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A crise internacional tem inevitáveis reflexos sobre um pequeno país de economia aberta e integrada na Europa e introduz um acrescido grau de incerteza na sua evolução a curto prazo.
Mas estas consequências, que a tantos fazem tremer, devem antes reforçar a nossa vontade em prosseguir no rumo delineado.
O caminho que traçámos e os objectivos que pretendemos são demasiado importantes para que as dificuldades pontuais nos levem a abandoná-los. Mas temos que aceitar que, embora plenamente justificadas pelo ganhos de futuro, as dificuldades imediatas desse caminho podem não ser negligenciáveis.
É essencial notar que, em crises económicas internacionais anteriores, o comportamento da economia portuguesa foi sempre o de ampliar, no ciclo interno, as dificuldades externas. Isso foi devido, sempre, à ausência de uma linha de rumo adequada e à prossecução de políticas conjunturais desajustadas. Não é agora o caso!
Portugal tem conseguido filtrar, pelo menos em parte, as más influências da crise internacional e manter uma conjuntura nacional menos adversa do que o choque externo que recebemos. A política do Governo tem permitido, assim, não só não ampliar mas até amortecer significativamente as perturbações que nos vêm lá de fora. Isto é caso único na história recente da economia portuguesa. Só por ignorância, ou má fé, se pode ignorar esta nova realidade em Portugal.

Aplausos do PSD.

Mas amortecer não significa inverter o sentido das perturbações externas. Somos uma pequena economia aberta e, por isso, nunca poderemos ser imunes às dificuldades internacionais.
É essencial compreender que, perante a crise internacional, a vida das empresas não será fácil. A concorrência acrescida dos dias de hoje exige muito mais do que antes. Temos de estar preparados para isso!
Quando os parceiros internacionais sucumbem à recessão, o mercado apenas permite a sobrevivência dos melhores. Temos de estar preparados para ser os melhores!

Aplausos do PSD.

Os distraídos ou mal-intencionados tentam aproveitar-se destes factos para contestar a nossa estratégia de fundo. A disparidade entre os enormes ganhos estruturais da nossa estratégia e as localizadas dificuldades conjunturais tornam ridículas tais intervenções. Mas o ridículo não incomoda os que estão dispostos a deitar tudo a perder, mesmo o futuro do País, para evitar um incómodo momentâneo ou tentar capitalizar simpatia contra o Governo. Não é nem será essa a nossa postura. Temos uma linha de rumo desenhada pelos objectivos de modernização e desenvolvimento do País e dela não nos afastaremos à primeira dificuldade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A tendência de fundo do crescimento nacional e a capacidade da economia em amortecer choques conjunturais adversos provêm, ambos, dá mesma estratégia de desenvolvimento. Essa estratégia tem privilegiado, como suportes cruciais, as transformações estruturais e a estabilidade monetária e financeira.
As transformações estruturais estão a tocar profundamente todas as áreas da actividade nacional. Em primeiro lugar, é de notar o campo das leis de enquadramento. A reforma fiscal, a redução do peso do Estado na economia, a reforma da legislação laboral e da Administração Pública e a liberalização do sistema financeiro são apenas algumas das importantes medidas que transformaram as regras do jogo económico no País. Ã adequação da estrutura legislativa às necessidades de uma sociedade moderna ainda não está terminada, mas muito já foi realizado.
Talvez o aspecto mais visível da transformação de fundo da economia portuguesa seja o das infra-estruturas físicas. A construção maciça de infra-estruturas é uma realidade bem patente e que modificou, de uma vez para sempre, o ambiente económico e social do País, introduzindo poderosas economias externas de que beneficiam todos os agentes económicos e sociais e os cidadãos em geral.
Finalmente, o esforço de liberalização externa e a integração na Comunidade devem também ser referidos. Não só criaram ganhos bem visíveis na vida das famílias e das empresas, mas também transformaram Portugal num dos países que mais está sintonizado com as linhas de futuro da economia europeia. Num momento em que alguma confusão e incerteza se faz sentir sobre o futuro da Europa, é de sublinhar a serenidade do Governo e da economia portuguesa neste processo de integração. Portugal tem um rumo traçado e ideias claras sobre o projecto que melhor serve a Europa e que, fazendo-o, melhor serve o País.
A recente aprovação da revisão constitucional extraordinária por parte desta Assembleia e a ratificação do Tratado de Maastricht, que em breve terá lugar, são expressão de uma serenidade e de um realismo português quanto ao projecto de construção europeia que é prestigiante para o nosso país.

Aplausos do PSD.

As transformações estruturais levadas a cabo mudaram radicalmente a face da economia portuguesa. Herdando uma estrutura enviesada por erros seculares e por abusos revolucionários, o Governo conseguiu, nestes sete anos, transformar a economia nacional numa economia dinâmica, aberta, motivada e, bem mais, resistente no difícil ambiente do mundo de hoje.
A reestruturação empresarial e sectorial a que se tem assistido, e a que se assiste presentemente, no País é algo que a economia portuguesa não realizava há décadas. Este é, pois, um momento histórico, em que se estão a lançar os fundamentos da economia e da sociedade portuguesa do século XXI. Este magno objectivo não pode ser esquecido por ninguém que aborde a política do Governo.
A reestruturação empresarial passa pela afirmação da qualidade nas empresas e por uma atitude diferente por parte dos nossos empresários. Isso significa uma atenção acrescida a aspectos que, tradicionalmente, foram esquecidos ou menosprezados nas empresas portuguesas. A importância das redes de distribuição, a atenção ao marketing, à embalagem e apresentação, a criação de marcas portuguesas prestigiadas, o cuidado com os fluxos de informação, quer internos quer externos à empresa, terão de passar a ser prioritários para os empresários portugueses.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - As ligações internacionais, as participações em empresas externas, a criação de filiais no es-

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trangeiro, a negociação de joint-ventures, têm de passar a ser correntes em Portugal, como o são nos nossos parceiros.
É este o verdadeiro caminho para as empresas portuguesas. E quem quiser seguir por este caminho terá o apoio do Governo. Os esquemas de apoio à reestruturação e internacionalização das empresas portuguesas, recentemente aprovados pelo Governo, são, disto, mais uma prova evidente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas o resultado da estratégia económica do Governo não ficou por um alto nível de crescimento. Os problemas da estabilidade, que tantos esquecem em épocas de progresso acelerado, tiveram também prioridade nessa estratégia.
No campo da estabilização, a longa luta que o Governo levou a cabo, desde 1985, tem já frutos bem patentes. Quem olhar para a economia portuguesa, hoje, dificilmente se pode lembrar do tempo, ainda recente, em que o desequilíbrio externo e a inflação foram, não as condicionantes naturais da política económica, mas as suas determinantes fundamentais. Parece já longínquo o período em que, por mais de uma década, Portugal viveu continuamente sob a ameaça dos credores externos e de uma inflação interna quase galopante.
O défice da balança de transacções correntes está perfeitamente dominado, registando valores abaixo de 1 % nos últimos anos. Estamos, portanto, bem longe dos défices incontroláveis do passado não muito longínquo. A dívida externa, que já atingiu o valor alarmante de 90 % do produto interno, mantém-se actualmente abaixo dos 25 % do PIB, valor que consideramos perfeitamente aceitável. Enquanto isto, as reservas líquidas em meios de pagamento sobre o exterior quase triplicaram, desde 1986 à actualidade.
A conclusão, simples mas fundamental, é que se conseguiu quebrar o círculo vicioso e ruinoso das recessões induzidas pelo desequilíbrio da balança de pagamentos. A situação das contas e da dívida externas deixou de ser problema em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas também o défice do sector público administrativo deixou de ser o problema que era em tempos anteriores. Se, em 1984 e 1985, esse défice se encontrava bem acima dos 10 % do produto interno, prevê-se, para 1992, cerca de 5,2 % e a baixa, em mais um ponto percentual, em 1993.
A inflação, pelo seu lado, mantém-se como uma questão importante na economia portuguesa, mas os seus efeitos nefastos foram, em boa medida, eliminados. Na verdade, numa zona do forte estabilidade monetária como é a Europa, o crescimento actual do índice de preços, da ordem dos 6 % e 7 %, é ainda uma dificuldade; mas temos de ter presente que se trata de um problema de dimensão bem inferior aos quase 30 % de meados dos anos 80. Também aqui o sucesso foi visível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prosseguiremos o combate à inflação, que ainda subsiste, por forma a trazê-la para os valores médios comunitários, apesar das vozes confusas dos que
não entendem a importância capital da estabilidade nominal.
O sucesso do Governo na estabilização está bem patente no esquecimento a que alguns remeteram estas condicionantes da política económica, quando no passado eram tema privilegiado dos seus discursos.
Assim, algumas vozes -cujos ziguezagues em matéria de política económica não permite atribuir-lhes grande credibilidade - levantam-se hoje para propor medidas de combate aos efeitos internos da crise mundial que mais não fariam do que renascer os antigos fantasmas do desequilíbrio externo e da inflação. O Governo tem e terá sobre esta matéria a posição serena de quem sabe controlar, mas de quem não quer trazer esses males de volta ao nosso país.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É neste quadro que se compreende a verdadeira dimensão do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano para 1993 que esta Assembleia tem vindo a apreciar.
E se dediquei algum tempo a explicar a envolvente internacional e as suas exigências foi precisamente para demonstrar a inconsistência e a inadequação das propostas feitas pela oposição. Se já era claro não ser a oposição capaz de apresentar políticas alternativas credíveis, em tempo de conjuntura internacional normal, fica agora bem demonstrado que também não é capaz de fazê-lo em tempo de conjuntura adversa.

Aplausos do PSD.

Ao apresentar as suas propostas, o Governo mantém-se fiel à estratégia de modernização e desenvolvimento que propôs ao País e que mereceu a clara aprovação do povo português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma estratégia de médio prazo assente na garantia da estabilidade financeira, no reforço da capacidade competitiva da economia e no aprofundamento do diálogo e da solidariedade social.
Uma estratégia que, ao contrario do que alguns se recusam a admitir, já provou ser a que melhor serve o interesse do País. Uma estratégia que, independentemente das incertezas que possam pairar quanto ao ritmo do aprofundamento da integração europeia, continua a representar a via correcta para o aumento sustentado, a prazo, do bem-estar dos Portugueses.
Na ausência de um quadro de estabilidade monetária e financeira, falar-se de progresso económico sustentado é pura ilusão. Todas as experiências - quer a nível internacional quer a nível interno - assim o testaram: os efeitos favoráveis sobre a trajectória do produto e do emprego que, no curto prazo, possam decorrer de uma menor disciplina financeira são, fatalmente, mais cedo ou mais tarde, factor de travagem do próprio desenvolvimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A estabilidade cambial e a consolidação orçamental são objectivos indispensáveis. O recurso a facilidades conjunturais, como à desvalorização da moeda para ilibar os produtores não competitivos ou a despesas públicas para suprir falhas privadas ou para satisfazer a

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mentalidade despesista de certos agentes da Administração Pública, sempre deu mau resultado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Respeitamos demasiado o consumidor, o aforrador e o contribuinte para que a transparência dos mercados seja prejudicada e os dinheiros públicos sejam orientados para os interesses particulares de lobbies sectoriais.

Aplausos do PSD.

As medidas definidas no Orçamento do Estado para 1993 são, objectivamente, exigentes. Na Administração Pública, tal como no chamado sector produtivo, é possível e é necessário obter ganhos de eficiência. O Estado não pode dar um exemplo de autocomplacência quando os desafios que se colocam à economia e à sociedade como um todo só pela via do rigor, da eficiência e da qualidade podem ser ultrapassados.
Exigindo ao seu próprio funcionamento corrente um esforço palpável de racionalização e de reestruturação, o Estado liberta, além do mais, recursos públicos e privados, contribuindo, assim, para o crescimento não inflacionista da economia
Ao prosseguir, a bom ritmo, o esforço de investimento público, que tem sido apanágio dos últimos anos, ao robustecer a função social do Estado e ao aprofundar a dimensão regional da acção pública, assegura-se a consistência entre a melhoria da produtividade global dos factores nacionais e a afirmação de uma efectiva noção de solidariedade.
O Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1993 traduzem a prioridade que o Governo continua a atribuir à provisão de infra-estruturas físicas, à acumulação de capital humano, à satisfação de carências e à correcção de desequilíbrios regionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Fazem-no, de resto, no quadro mais vasto de uma política económica que, do lado da oferta, propicia a reestruturação do aparelho produtivo nacional - flexibilizando o funcionamento dos mercados, acrescendo a sua transparência e estimulando, globalmente, a abertura e a concorrência - e que, do lado da procura, é orientada para a modernização da expansão da despesa interna e do nível geral de preços.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento apresentado perante esta Assembleia reflecte bem a forma séria como o Governo encara o futuro do País, rejeitando as soluções de facilidade e o artificialismo.
O Governo aposta, sim, na racionalização, na reestruturação, na disciplina e na responsabilização. Sem subida da carga fiscal sobre os indivíduos e as empresas e, mesmo, com a prorrogação e amplificação de alguns benefícios fiscais, apostamos em atingir, em 1993, o défice mais reduzido desde 1974, em consonância com os objectivos do programa de convergência para o próximo triénio.
Admitir com coragem a necessidade de urgentes alterações estruturais, para que se possam preservar os progressos económicos e sociais alcançados, ultrapassar os atrasos ainda existentes e enfrentar com maior segurança os desafios e as incertezas que se perfilam é um imperativo nacional e não apenas uma obrigação do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Adepto fiel do diálogo social permanente, responsável e construtivo, o Governo entende que o interesse nacional não pode deixar de constituir-se numa realidade em que, de algum modo, se revêem os vários e diversificados interesses de que é composta a sociedade portuguesa, sem que isso possa pôr em causa a legitimidade que nos foi conferida pelo povo português para executar o nosso programa.

Aplausos do PSD.

Minimizar os riscos e os custos que inelutavelmente emergem de qualquer processo de mudança - e que, na fase turbulenta e complexa que atravessamos, adquirem uma nova magnitude - requer uma vasta e profunda tarefa de coordenação entre as decisões e as expectativas dos agentes actuantes na esfera económica e social.
O sucesso da experiência portuguesa de concertação é indesmentível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os resultados positivos alcançados estão à vista e talvez por isso mesmo possamos entender as dificuldades com que alguns, hoje, se debatem, ao ver os seus prognosticas tão radicalmente desmentidos pelos factos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Da nossa parte, faremos o possível para que também este ano se chegue a um acordo de concertação social. Mas só aceitaremos um acordo que sirva os interesses do País, no quadro internacional de crise em que vivemos. Se isso não for possível, por recusa ou inibição de alguns parceiros sociais, forneceremos aos sectores público e privado as orientações da política de rendimentos que consideramos compatível com a competitividade da economia portuguesa.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Encontramo-nos perante uma crise internacional séria. Mas Portugal, bem fundado no progresso recente e bem orientado para os objectivos futuros, saberá ultrapassá-la Já vencemos dificuldades talvez ainda maiores, por isso encaramos estas com realismo e serenidade.
Realismo e serenidade que o povo português, estou certo, partilha, não obstante o alarmismo e o catastrofismo que alguns pretendem disseminar. Lamentamos sinceramente que muitos dos Srs. Deputados da oposição sejam derrotistas por convicção e incapazes de um discurso de estímulo e de futuro.
O Governo está preparado para enfrentar as dificuldades. O rigor e a competência serão as determinantes do sucesso. O Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1993, que apresentámos à Assembleia da República, são adequados aos objectivos, por isso merecem ser aprovados.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa três votos, subscritos pelo PCP, pelo PS e pelo CDS, relativos à prisão de Xanana Gusmão. Como a respectiva votação sai da ordem de trabalhos, só poderá ter lugar havendo concordância geral de todas as bancadas nesse sentido.

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O sentido dos votos - suponho que todos o subscrevem - é o de protestar por mais uma vez não ser respeitado o direito à autodeterminação e independência do povo de Timor Leste e o de apelar para que sejam respeitados os direitos do homem, etc.
Portanto, Srs. Deputados, os votos só poderão ser votados hoje no caso de haver concordância de todas as bancadas. De outro modo, procederemos à sua votação na próxima reunião plenária.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, uso da palavra no sentido de darmos a nossa concordância para que se proceda à votação dos votos apresentados.
Na verdade, não se justificaria que qualquer dos votos apresentados perdesse a oportunidade. Mas, mais do que isso, entendemos que não faz sentido que se votem três votos, pelo que sugeria aos outros grupos parlamentares que juntassem a sua concordância à nossa, no sentido de que a Mesa, nomeadamente o Sr. Presidente, fosse encarregada por nós de reconduzir os votos à unidade - votando-se em separado ou em conjunto, é indiferente da nossa parte -, de forma que daqui saísse um único voto representativo da vontade colectiva de todos nós.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, o meu partido tomou conhecimento dos votos entrados na Mesa, como tomou também conhecimento das eventuais ocorrências verificadas em Timor Leste, não tendo apresentado até este momento qualquer voto porque entende que antes de se pronunciar sobre uma matéria tão delicada deve ter conhecimento de factos supervenientes, sem prejuízo de se rever na linguagem que está expressa nos diferentes votos.
Já tinha, até, feito apelo a alguns dos líderes parlamentares no sentido de procurarmos obter um texto que reforçaria a posição de Portugal, particularmente a desta Câmara, que fosse subscrito não por um único partido mas por todos, ou então apresentado por V. Ex.ª e votado favoravelmente pela Câmara.
Damos, pois, o nosso consenso para que sejam votados na sessão de hoje e damos o nosso apoio à sugestão feita pelo Sr. Deputado Almeida Santos, confiando ao Sr. Presidente a tarefa de redigir um texto no qual a Assembleia se possa rever.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte estamos disponíveis e concordamos em que seja feito um voto consensual. Penso que é fácil fazê-lo. Aliás, foi essa a nossa intenção, não se tendo concretizado logo de início dadas algumas objecções.
Para o PCP, o voto deveria ser votado hoje porque a próxima reunião plenária só terá lugar daqui a algum tempo, pelo que corremos o risco de perda de oportunidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, é também para dar o nosso consenso à ideia expendida pelo Sr. Deputado Almeida Santos. Podemos até retirar o nosso voto em benefício de um voto comum de toda a Câmara que expresse a nossa preocupação pela eventual prisão de Xanana Gusmão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

O Sr. Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, nós identificamo-nos com o conteúdo de qualquer dos votos que foram apresentados, mas penso que será pacífico consensualizar um voto comum.
Entendemos, pois, que é importante não adiar esta votação, embora não prevista na ordem de trabalhos de hoje.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tendo como base os três votos apresentados, redigi um texto único, por enquanto provisório, ficando, portanto, sujeito a uma redacção mais cuidada a elaborar na próxima segunda-feira em Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
O voto de protesto, conforme está redigido, tem três considerandos e três conclusões e é do seguinte teor
Os órgãos de comunicação social acabam de noticiar a prisão, em Díli, do líder da resistência timorense, Xanana Gusmão.
Certa de que esta importante baixa na resistência militar timorense não diminuirá, antes pelo contrário, a indómita força de ânimo dos Timorenses;
Convencida de que, com esta atitude, o governo do general Suharto pretende reafirmar a sua recusa ao diálogo e à busca de uma solução justa que respeite a Carta da ONU e as decisões do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral relativas ao exercício pelo povo de Timor Leste do direito à autodeterminação e à independência:

1 - A Assembleia da República expressa, mais uma vez, a sua comovida solidariedade ao povo martirizado e heróico de Timor Leste, reafirmando o direito inalienável de Timor à autodeterminação e independência.
2 - Apela ao povo e ao Governo da Indonésia no sentido de respeitarem, na pessoa de Xanana Gusmão, os direitos do homem reconhecidos e aceites pela consciência universal dos povos, expressa na Declaração Universal aprovada na ONU, em 10 de Dezembro de 1948, libertando de imediato e sem condições o comandante Xanana Gusmão.
3 - Associa-se aos demais órgãos de soberania para mais um esforço acrescido de sensibilização da comunidade internacional no sentido de a Indonésia respeitar, urgentemente, os direitos fundamentais dos Timorenses e do novo de Timor Leste.
Srs. Deputados, como disse, esta redacção é provisória e fica sujeita a uma redacção definitiva a ser feita numa próxima Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, mas, se ninguém se opõe, vou, entretanto, submeter este texto à votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado João de Deus Pinheiro.

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O Sr. João de Deus Pinheiro (PSD): - Sr. Presidente, concordo, obviamente, com o sentimento geral expresso no voto, mas gostava de chamar a atenção da Câmara para o facto de o Governo Português e o Governo Indonésio irem entabular um diálogo, com início em Dezembro, que, do ponto de vista de Portugal, é vantajoso para o povo de Timor.
Assim, parece-me que o terceiro considerando deveria, porventura, ser redigido de outra forma, a fim de não colocar o Governo e, particularmente, o Ministro dos Negócios Estrangeiros numa posição delicada daqui a algumas semanas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esta observação será, naturalmente, tida em conta na redacção deste voto, mas o sentido geral será o que acabei de ler.
Vamos, pois, proceder à votação deste voto de protesto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de um Deputado.

O Sr. Secretário (Caio Roque): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado Manuel Queiró, do CDS, por um período não inferior a 15 dias, a partir do dia 23 de Novembro corrente, pelo Sr. Deputado António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 36/VI - Grandes Opções do Plano para 1993 e 37/VI - Orçamento do Estado para 1993.
Vamos votar, em primeiro lugar, a proposta de lei n.º 36/VI - Grandes Opções do Plano para 1993.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e abstenções do CDS e do PSN.

Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de lei n.º 37/VI - Orçamento do Estado para 1993.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção do PSN.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de informar a Mesa de que vou apresentar uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - A Mesa regista a sua informação, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, é também para anunciar que vou apresentar na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de informar V. Ex.ª de que vou apresentar na Mesa uma declaração de voto por escrito.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - É por causa das propinas?

O Sr. Presidente: - A Mesa regista a sua informação, Sr. Deputado.
Informo ainda a Câmara de que os Srs. Deputados João Granja, Carlos Almeida Figueiredo, Melchior Moreira, Fernando Pereira, Jorge Paulo Cunha, Vítor Raposo, Luís Nobre e Duarte Pacheco fizeram também chegar à Mesa a informação de que pretendem apresentar declarações de voto por escrito.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, gostaria só de dizer que não vou apresentar qualquer declaração de voto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de lembrar aos representantes dos grupos parlamentares que conto com a presença de VV. Ex.ªs, na Sala de Visitas, na segunda-feira, dia 23, às 15 horas e 30 minutos, para receber a visita de S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro de Cabo Verde, Dr. Carlos Veiga.
Informo também os Srs. Deputados de que a Comissão de Petições reúne na próxima quarta-feira, dia 25, às 15 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 15 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação da proposta de lei n.º 36/VI

Concede-se o benefício da dúvida, já que apesar da falta de clareza vinculativa nas opções expressas, o PSN reconhece que, havendo vontade política, elas são, mesmo assim, susceptíveis de propiciar alguns, poucos, benefícios aos Portugueses.

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21 DE NOVEMBRO DE 1992 597

Não é pois suficientemente fone o motivo que levasse o PSN a votar claramente contra este documento, pelo que, construtivamente, se abstém.

O Deputado do PSN, Manuel Sérgio.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação da proposta de lei n.º 37/VI

Os Deputados abaixo assinados, aquando da votação da Lei n º 20/92, relativa ao sistema de actualização do valor das propinas para o ensino superior público, apresentaram declaração de voto em que referiram como urgente a necessidade e acautelar, em sede de IRS, a dedução integra) à matéria colectável dos valores despendidos com o pagamento das propinas.
Sendo que no conjunto dos sistemas sociais, e pela Lei n.º 20/92, o sistema de ensino superior público é o único a exigir um financiamento particular de 25 % dos custos de funcionamento deste sistema, e que a fixação do valor respeitante a esse financiamento dependerá em boa medida do que for determinado pelo Governo, é justo que, desde hoje e para o futuro, consagre o Orçamento do Estado a garantia de que não serão os contribuintes "duplamente" onerados nas suas obrigações fiscais.
Esta garantia poderá ser acautelada através da possibilidade de, não obstante os limites consagrados às deduções em IRS na área da educação, ser sempre possível deduzir na totalidade o valor despendido no pagamento de propinas no ensino superior.
Neste sentido, irão os Deputados subscritores apresentar proposta de alteração à proposta de lei do Orçamento do Estado que permita consagrar esta garantia.

Os Deputados do PSD: Álvaro Viegas - Carlos Almeida Figueiredo - Duarte Pacheco - Fernando Pereira- Jaime Mil-Homens - João Granja -Jorge Paulo Cunha - Luís Nobre - Melchior Moreira - Pedro Passos Coelho - Vítor Raposo.

Os atributos técnicos que se reconhecem a este Orçamento não chegam para anular dois aspectos essenciais, do ponto de vista negativo. A saber: não ilude o desfasamento temporal que envolve a sua aplicação, pois em 1993 é quase certo que em vez de aliviar a conjuntura irá agravá-la; não dispensa a atenção (não prevê benefícios) que a situação de autêntica emergência humana de cerca de 2 milhões de portugueses a viver abaixo da linha da dignidade humana reclama.
Reconhecendo, porém, o esforço de equilíbrio humanizante que, em todo o caso, este Orçamento reflecte, o PSN decide abster-se, colocando-se desde já numa atitude de crítica vigilante.

O Deputado do PSN, Manuel Sérgio.

O Orçamento do Estado para 1993, apresentado pelo governo do PSD/Cavaco Silva, representa mais um grave obstáculo para o desenvolvimento do País, que se pretende equilibrado, tendo em conta nomeadamente os grandes problemas de carácter social que atingem a generalidade dos portugueses, principalmente as classes trabalhadoras.
Cavaco Silva e o Governo que chefia dão, uma vez mais, uma demonstração clara da incapacidade para solucionar os gravíssimos problemas que criaram e continuam a criar ao País.
Restritivo, este Orçamento não dá resposta aos anseios da população e às necessidades da economia portuguesa e a sua aplicação pode agravar a crise em que Portugal já se encontra mergulhado, por força da política negativa do Governo, promovendo ainda uma mais forte recessão dos nossos tecidos industrial e produtivo.
Perante a actual situação política, social e cultural do País impunha-se a adopção de instrumentos capazes para um amplo desenvolvimento que relançasse a economia do País conduzindo-o para um progresso que considerasse a necessidade de se pôr termo às injustiças sociais.
Acontece, contudo, que a prática do Governo acentuou e continua a acentuar as desigualdades sociais, vivendo a grande maioria das famílias portuguesas numa profunda instabilidade provocada pelo desemprego - cada vez mais acentuado, atingindo dezenas de milhares de pessoas - pela precariedade política do emprego, pela falta de perspectivas que a nossa juventude sente, pela onda de falências que se verifica não só no sector das pequenas e médias empresas.
A recessão económica que já sentimos em Portugal não pode ser enfrentada com medidas orçamentais como as preconizadas pelo governo PSD/Cavaco Silva. A falta de realismo dos governantes levou o próprio Ministro das Finanças, com o apoio do Primeiro-Ministro, a declarar de forma irresponsável que o nosso país era um "oásis" no contexto internacional.
A realidade, porém, é bem diferente e contraria as frases propagandísticas. O sector de saúde, ao contrário do que seria de esperar, não é dotado das verbas que se impõem pelo que a esmagadora maioria dos portugueses se vêem confrontados com uma política economicista que tem conduzido, agravando-a, a uma situação em que as classes mais desfavorecidas, sem meios, não podem tratar-se e medicar-se convenientemente. A política governamental circunscreve-se a uma máxima anti-social: "Quem tem dinheiro, tem habitação própria, quem tem dinheiro, pode mandar os filhos à escola, quem tem dinheiro, tem facilitado o acesso à justiça [...]"
Para agravar a situação social dos Portugueses, através do Orçamento do Estado acentuam-se as desigualdades por força de um sistema fiscal injusto em que os trabalhadores por conta de outrem são os mais duramente atingidos, ao contrário do que acontece com as classes mais poderosas, que beneficiam do apoio governamental.
O neoliberalismo económico de Cavaco Silva, a teimosa aplicação de um sistema ultrapassado e inadequado ao nosso país são visíveis: os sectores produtivos estão em crise, as classes trabalhadoras descontentes e preocupadas, o ambiente social deteriorado, verificando-se um conjunto acentuado de greves e de protestos dos trabalhadores que sofrem, nomeadamente os da função pública, os violentos ataques governamentais como os que dizem respeito à lei dos excedentes ou disponíveis que poderá lançar no desemprego milhares e milhares de pessoas.
O governo PSD/Cavaco Silva, incapaz de analisar com realismo a situação de Portugal, remete-se a um isolamento só quebrado pela solidariedade das antigas e poderosas famílias que estão a readquirir injustamente um poder, que no tempo do fascismo tão maus resultados provocou ao País, através da recuperação discutível de empresas públicas.

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598 I SÉRIE - NÚMERO 17

O Governo, subordinado aos interesses dos grandes grupos de pressão económica, nacionais e estrangeiros, quer promover, deliberadamente, o aumento sensível do desemprego ao mesmo tempo que pretende impor uma diminuição flagrante dos salários reais propondo aumentos salariais que os trabalhadores e os seus sindicatos não podem aceitar.
Este Orçamento de Estado surge, ainda, num momento em que o Governo, por inadmissível teimosia política, agravou a situação portuguesa ao não ter atempadamente procedido às correcções cambiais que se impunham.
Votar, na generalidade, contra este Orçamento do Estado era um dever que se me impunha pelas razões apontadas e por muitas outras que, ao longo do debate, se assinalaram. Resta aguardar que na discussão na especialidade se possa proceder a alterações qualitativas deste documento que, a ser aprovado pelo PSD, vai agravar fortemente a vida social, política e cultural no nosso país.
O Deputado Independente, João Corregedor da Fonseca.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
João Álvaro Poças Santos.

Partido Socialista (PS):

António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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