O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 701

Sábado, 12 de Dezembro de 1992 I Série - Número 20

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE DEZEMBRO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.ºs 235/VI a 237/VI.
A Câmara autorizou quatro Srs. Deputados a deporem em tribunal.
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/VI - Altera a Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro (enquadramento do Orçamento do Estado) e do projecto de lei n.º 206/VI - Fiscalização pelo Tribunal de Contas relativamente à Assembleia da República e a Assembleia Regional da Madeira (PS), que foram aprovados. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares Luís Filipe Menezes, os Srs. Deputados Guido Rodrigues (PSD), Guilherme Oliveira Martins (PS), Octávio Teixeira (PCP) e António Lobo Xavier (CDS).
Foi igualmente aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República para 1992, apresentado pelo Conselho de Administração da Assembleia da República, sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Fernandes Marques (PSD), José Lello (PS) e José Manuel Maia (PCP).
A Câmara debateu também a proposta de lei n.º 41/VI - Altera a Lei n.º 2/92, de 9 de Março (Orçamento do Estada para 1992), que foi aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global. Usaram da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Manuela Leite), os Srs. Deputados António Campos (PS), Lino de Carvalho (PCP), Gameiro dos Santos, Ferraz de Abreu e Ferro Rodrigues (PS), Rui Carp e Rui Rio (PSD), Manuel dos Santos (PS), Castro Almeida (PSD) e António Lobo Xavier (CDS).
Procedeu-se ainda à apreciação do parecer da Comissão de Assuntos Constituintes, Direitos Liberdades e Garantias relativo ao recurso interposto pelo PCP da decisão do Sr. Presidente de admitir o projecto de lei n.º 225/VI - Lei Eleitoral para a Assembleia da República (PSD), que foi aprovada. Produziram intervenções os Srs. Deputados João Amaral (PCP), Riu Machete (PSD) e Alberto Costa (PS}.
Finalmente, foi aprovado o parecer da Comissão de Assuntos Constituintes, Direitos, Liberdades e Garantias relativo aos recursos interpostos pelo PCP e pelo PS da decisão do Sr. Presidente de admitir o projecto de lei n.º 227/VI - Lei Eleitoral para as Autarquias Locais (PSD), tendo usado da palavra os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Jorge Lacão (PS) e Luis Pais de Sousa (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 5 minutos.

Página 702

702 I SÉRIE - NÚMERO 20

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa Silva.

dérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata Silva.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Elói Franklin Fernandes Ribeiro.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João de Deus Rogado Salvador Pinheiro.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Agostinho Ribau Esteves.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Antero da Cunha Pinto..
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.

Página 703

12 DE DEZEMBRO DE 1992 703

Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Macheie.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ribeiro Marques da Silva.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José António Martim Goulart.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
João Carlos da Silva Pinho.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Mário António Baptista Tomé.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes projectos de lei: n.º 235/VI - Elevação de Charneca da Caparica a vila (PS), que baixou à 6.ª Comissão; n.º 236/VI - Alterações à Lei n.º 111/88, de 15 de Dezembro (acompanhamento e apreciação pela Assembleia da República da participação de Portugal na construção europeia) (PS), que baixou às 3.ª e 13.ª Comissões; n.º 237/VI - Cria o Fundo de Apoio e Solidariedade para com as Vítimas do Progresso (PSN), que baixou à 10.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai também dar conta de diversos relatórios da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras (processo n.º 269/92, 2.º Juízo, 1.ª Secção), a Comissão emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vasco Miguel a ser ouvido, na qualidade de testemunha, em audiência de julgamento do referido processo.

Página 704

704 I SÉRIE - NÚMERO 20

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Secretário (João Salgado): - A solicitação do Procuradoria da República da Comarca de Lisboa (processo n.º 57/92-OP), a Comissão emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Lopes Cardoso a ser ouvido, na qualidade de testemunha, no âmbito do ofício precatório referido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputadas, vamos proceder à votação do parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Secretário (João Salgado): - A solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Alcanena (processo n.º 26/92, 2.ª Secção), a Comissão emitiu parecer no sentido de autorizar os Srs. Deputados Alberto Costa, Almeida Santos, António Guterres, Jorge Lacão e Gameiro dos Santos a serem ouvidos, na qualidade de testemunhas, no âmbito do processo referido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputadas: Finalmente, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda (processo n.º 418/VI, 1.ª Secção), a Comissão emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Morgado a ser ouvido, na qualidade de testemunha, em audiência de julgamento do referido processo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Srs. Deputados, vamos entrar na nossa ordem do dia.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, a agenda indica como primeiro ponto a apreciação da proposta de lei n.º 39/VI, no entanto, ontem houve consenso na Comissão no sentido de apreciarmos conjuntamente o projecto de lei n.º 206/VI, do Partido Socialista, pelo que solicito que esses diplomas sejam discutidos e votadas em conjunto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos ia, de seguida, fazer essa referência.
Srs. Deputados, do primeiro ponto da ordem do dia de hoje consta, pois, a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/VI - Altera a Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro (enquadramento do Orçamento do Estado) e do projecto de lei n.º 206/VI - Fiscalização pelo Tribunal de Contas relativamente à Assembleia da República e à Assembleia Regional da Madeira (PS).

ambém considero entendido que, finda a discussão destes diplomas, se procederá à respectiva votação.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Luis Filipe Menezes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso quadro constitucional, designadamente o artigo 114.º da Constituição, afirma a separação e a interdependência dos órgãos de soberania, sem contudo deixar de contemplar um regime de responsabilidade e fiscalização mútuas.
Tais conceitos decorrem, de forma clara, no que diz respeito à fiscalização financeira, do espírito e da substância dos artigos 110.º, 165.º e 216.º da Constituição. O Estado está, desta forma, sujeito à fiscalização e, neste caso, a acepção constitucional de Estado deve englobar todos os órgãos de soberania (Presidente da República, Assembleia da República e tribunais).
A superior responsabilidade própria a que estão sujeitos os órgãos de soberania obriga-os a serem, eles próprios, um exemplo no que toca à transparência na gestão dos dinheiros públicos colocados ao serviço do seu financiamento. Assim sendo, ninguém, nem nenhuma instituição pode ficar isenta da responsabilização, livre do condicionamento de legalidade e da clara definição de quem responde e como, pelos meios financeiros sob a sua responsabilidade.
Os Governos presididos pelo actual Primeiro-Ministro encetaram reformas importantes e profundas da contabilidade pública e do Tribunal de Contas que representam um progresso claro no reforço da fiscalização e da transparência na aplicação dos dinheiros públicos. Através de propostas de lei posteriormente aprovadas pelo Parlamento previa-se a fiscalização das contas de todos os órgãos de soberania, incluindo a Assembleia da República, pelo Tribunal de Contas (artigo 17.º da Lei n.º 86/89).
Posteriormente, em Junho de 1990, a discussão conjunta da proposta de lei n.º 152/V (Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado), com projectos de lei sobre a mesma matéria apresentadas pelo PS e pelo PCP, conduziu à aprovação de um texto final onde se inserem artigos que eximem as contas da Assembleia da República de sujeição a julgamento do Tribunal de Contas - artigo 31.º da Lei n.º 6/91.
Sendo uma lei posterior e tratando-se de uma lei quadro, veio a Lei n.º 6/91 colocar a Assembleia da República na situação de ser a única entidade pública cuja realização de despesas cai fora da função jurisdicional do Tribunal de Contas, o que contraria o largo consenso obtido quando da discussão da reforma do citado tribunal.
A presente proposta de lei retoma o espírito e a letra que balizaram a opção feita através da Lei n.º 86/89 no que diz respeito às contas do Parlamento mas também

Página 705

12 DE DEZEMBRO DE 1993 705

propõe a revogação do artigo 32.º da Lei n.º 6/91, colocando todos os órgãos de soberania, neste caso também o Tribunal de Contas, sujeitos a relações de controlo mútuo.
O Tribunal de Contas tem poderes administrativos e financeiros, alguns idênticos aos que integram a competência ministerial e ainda a existência de um conselho administrativo e de um cofre próprio. Está assim justificada a existência da fiscalização, segundo o princípio de que ninguém nem nenhuma entidade pode deixar de se submeter a um controlo. Esta fiscalização deve ser realizada pelo órgão que por direito próprio representa, de forma exemplar, a soberania democrática - a Assembleia da República.
As tomadas de posição dos diferentes partidos com assento parlamentar, nos últimos tempos, sobre estas matérias fazem pressupor uma tranquila e alargada consensualidade à volta das alterações ou propostas. O CDS, em conferência de imprensa datada do pretérito Agosto, o PCP, em declarações e argumentos exprimidos pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira quando da discussão da Lei n.º 6/91; e o PS, através de declarações múltiplas e repetidas ao longo desta e da anterior legislatura, acompanham em larga medida o pensamento do Governo e até o próprio e insuspeito Presidente do Tribunal de Contas, quando teoriza sobre esta matéria no seu livro de finanças públicas, tem um pensamento semelhante àquele que está contemplado na proposta que o Governo apresenta na Assembleia da República.
Uma nota final: a aprovação por largo consenso desta proposta pode também contribuir para dignificar ainda mais a iniciativa regimental, que, tanto quanto julgo, será brevemente aprovada por esta Assembleia da República, no sentido de dar mais dignidade e importância política ao debate anual, em Plenário, da Conta Geral do Estudo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 39/VI tem como objectivo fundamental garantir o carácter de universalidade, transparência e rigor nos dinheiros do Estado e que são dos contribuintes e aos quais é preciso prestar contas.
A fiscalização permanente e total das despesas públicas é um pressuposto subjacente a esta proposta de lei, à qual o PSD dá obviamente o seu inteiro acordo.
O Tribunal de Contas, nos termos da sua lei orgânica - a Lei n.º 86/89 - é o Orgão do Estado encarregado de efectuar a apreciação e julgamento das contas das entidades públicas, e aí não pode haver excepções e nenhum organismo ou entidade do Estado pode estar isento da prestação de contas, da fiscalização das mesmas, com todas as consequências jurídicas e políticas que esse julgamento e essa fiscalização implicarem. Deverá, nestes precisos termos, julgar as contas da Assembleia da República e das Assembleias Legislativas Regionais da Madeira e dos Açores.
A proposta de lei em causa submete concretamente à consideração da Câmara alterações ao articulado da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, que tem a ver com a Assembleia da República, mas refere explicitamente nos seus considerandos a necessidade de estender esta mesma filosofia as contas da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, por alteração da lei n.º 28/92.
A Assembleia Legislativa Regional dos Açores esteve sempre sujeita ao julgamento das suas contas pelo que não há qualquer iniciativa a tomar quanto a este orgão.
Justifica-se a revogação dos artigos 31.º e 32.º da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, colocando assim a Assembleia da República em plano de igualdade com todas as restantes entidades dotadas de autonomia financeira. No entanto, há que tirar destas alterações à Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado todas as consequências e ponderar alguns aspectos que, em meu entender, merecem reflexão.
Assim, o julgamento da Conta implica a consequente responsabilização jurídica, civil e criminal dos respectivos responsáveis. E tal responsabilidade não pode ser assacada ao Conselho de Administração da Assembleia da República com a composição e com as funções que lhe são atribuídas pela Lei Orgânica da Assembleia da República. O Conselho não é na Assembleia da República um Orgão com a inteira capacidade de decisão e consequente assumpção de responsabilidades que tem uma qualquer direcção-geral, conselho ou gestão de empresa pública ou instituto público.
A sua capacidade decisória não se assemelha, nem por sombras, com as entidades referidas. Trata-se de um orgão que existe na Assembleia da República com funções predominantemente consultivas a latere da linha da decisão e responsabilidade hierárquica e funcional e, para além disso, com componente predominantemente política. Aliás, várias vezes tenho discutido esta matéria quer com o anterior Presidente desta Casa quer com V. Ex.ª.
Tudo visto, julgamos que a revogação dos artigos 31.º e 32.º, que implicam, e bem, o julgamento da conta da Assembleia da República pelo Tribunal de Contas, deverá conduzir, a curto prazo, à consequente alteração da Lei Orgânica da Assembleia da República no sentido que for considerado mais adequado, depois de devidamente ponderadas as funções que o Parlamento desejar atribuir-lhe (mutatis mutandis, os mesmos problemas devem ter os Conselhos de Administração das Assembleias Regionais).
Remanesce ainda a questão da responsabilização política. Mas este aspecto não nos levanta qualquer dúvida pois a Assembleia da República, nos termos do artigo 24.º. n.º 3, da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, «aprecia e vota a Conta Geral do Estado, incluindo a da segurança social, precedendo parecer do Tribunal de Contas, até 30 de Junho seguinte e, no caso de não aprovação, determina, se a isso houver lugar, a efectivação da correspondente responsabilidade».
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quanto à universalidade da Conta Geral do Estado, não parece poder haver opiniões divergentes. A Conta é o resultado final da execução orçamental, corresponde por imagem e com as devidas diferenças ao balanço das sociedades. Se o Orçamento do Estado que estamos a discutir e que iremos aprovar na próxima semana é uno e engloba todas as receitas e despesas da administração central, não se compreenderia que a Conta Geral do Estado não o fosse.
Na alteração proposta ao artigo 25.º pretende o Governo evidenciar, e bem, a nosso ver, que todos os organismos da administração central, Assembleia da República e o Tribunal de Contas, terão obrigatoriamente as suas contas integradas na Conta Geral do Estado e, portanto, sujeitas à apreciação e fiscalização dos órgãos de Estado competentes

Vozes do PSD: - Muito bem!

Página 706

706 I SÉRIE - NÚMERO 20

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que aqui nos traz reúne, como foi referido, um grande consenso. Todavia, começo por referir o processo que, em meu entender, será o mais correcto relativamente a estas duas iniciativas.
V. Ex.ª afirmou que iremos proceder à votação, na generalidade, dos textos em discussão, mas penso que deverão baixar à respectiva comissão porque há uma matéria - a respeitante à lei de enquadramento da Região Autónoma da Madeira - que carece de consulta aos órgãos próprios do Governo Regional. É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com esse procedimento, seguiremos o caminho mais correcto e adequado já que na sequência dessa consulta se deverá proceder então à votação final global em Plenário.
Posta esta questão processual, que penso ser importante, chamo a atenção - reafirmando o que disse antes do final da última sessão legislativa quando se discutiu aqui a lei de enquadramento orçamental da Madeira - para o facto de a prática apontar para a necessidade de não haver excepções no tocante ao julgamento de contas. E já nessa ocasião referi o facto de haver uma situação anómala, que correspondia ao facto de a conta da Assembleia Regional dos Açores estar sujeita a julgamento e as da Assembleia Regional da Madeira e da Assembleia da República não estarem sujeitas a esse julgamento, mas sim a parecer.
Desta vez pretende-se pôr no «são» este problema, e por isso me parece que tendo as duas iniciativas o mesmo sentido e objecto e correspondendo às mesmas preocupações, devem, em nome da unidade orçamental e da transparência, ser aprovadas por este Plenário. E se é certo que, no caso da Assembleia da República, o texto da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, neste particular, foi aprovado por unanimidade, e, consequentemente, não há qualquer incoerência ao decidirmos desta vez submeter também a julgamento as contas da Assembleia da República, uma vez que é a prática que revela como absolutamente necessária esta orientação.
Evidentemente que os leigos nesta matéria perguntarão qual a diferença entre o sistema de julgamento e o de parecer.
No sistema de julgamento, o Tribunal de Contas apura responsabilidades, mas «quem não deve não teme»... e, Srs. Deputados, a Assembleia da República não deve e não teme!
Neste sentido, aponta-se para a necessidade de submeter as suas contas a julgamento.
Coloca-se também o problema - que ainda agora o Sr. Deputado Guido Rodrigues levantou - de saber quem é que são os executores orçamentais (e, no caso da Assembleia da República, é essa a questão fundamental). Quem vão ser os agentes responsabilizáveis? É uma questão que vai ter de ser devidamente ponderada na Lei Orgânica, pelo que, nesta fase, limitamo-nos a apontar o problema, que carece de clarificação posterior. No que respeita à indefinição de poderes do Conselho de Administração ou até também no que toca a clarificação das competências do próprio Secretário-Geral desta Casa, a situação actual tem de ser absolutamente clarificada e tornada transparente quando discutirmos e aprovarmos as alterações à Lei Orgânica.
Por último, a proposta de lei que está aqui apreciação refere expressamente a submissão do Tribunal de Contas a fiscalização. Essa submissão já existe boje e as suas contas já estão integradas na Conta Geral do Estado. Trata-se de uma clarificação, que, tal como disse - e muito bem! - o Sr. Secretário de Estado, vai ao encontro daquilo que a própria doutrina tem sustentado nesse particular.
Creio, pois, que daremos um passo positivo ao aprovar estas duas iniciativas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrígues (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins, não considera que, apesar de as contas do Tribunal de Contas estarem integradas na Conta Geral do Estado, e uma vez que há esta precisão concreta relativamente à Assembleia da República, deve ser explicitamente mencionado o Tribunal de Contas, para que se torne perfeitamente claro que ele não se pode eximir à mesma fiscalização, à mesma transparência, ao mesmo rigor que tem os outros organismos?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guido Rodrigues, tal como decorre da minha intervenção, estou de acordo com V. Ex.ª quanto a essa explicitação, que clarifica a situação, nada acrescentando à realidade.
Estamos, pois, perfeitamente de acordo com essa referência autónoma.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por afirmar que o Grupo Parlamentar do PCP vai votar favoravelmente os dois diplomas em apreço. Não há dúvida nenhuma de que todas as contas relativas a dinheiros públicos são objecto de fiscalização por parte do Tribunal de Contas. Pela nossa parte, gostaríamos que este princípio base de que todas as contas devem ser fiscalizadas ficasse, quer na Assembleia da República quer fora dela devidamente esclarecido.
Depois desta afirmação muito clara, queria fazer mais um ou dois acrescentos, designadamente quanto à questão da alteração formal que se propõe para a conta da Assembleia da República.
Não concordo com algumas das opiniões que já foram aqui expressas sobre o actual regime da conta da Assembleia da República, sujeita a parecer do Tribunal de Contas. Aliás, este regime é exactamente o mesmo a que está sujeita a Conta Geral do Estado. Pode eventualmente acontecer - e há pouco fui informado de que será provavelmente essa a situação - que o Tribunal de Contas dê, ele próprio, uma interpretação diferente aos regimes de pareceres da Conta do Estado e da conta da Assembleia da República. Se assim for, será um problema do Tribunal de Contas.
Estou à vontade nesta matéria, porque, tal como disse há pouco o Sr. Secretário do Estado, fui um dos intervenientes e proponentes da alteração à lei de enquadramento

Página 707

12 DE DEZEMBRO DE 1992 707

orçamental, que foi aprovada por unanimidade. A nossa interpretação era exactamente esta: sujeitando-se a conta da Assembleia da República a parecer do Tribunal de Contas, tudo o resto ficaria também, na medida em que o regime da Conta Geral do Estado é também de parecer. Nesse sentido, a conta da Assembleia da República ficaria sujeita ao mesmo regime da Conta Geral do Estado.
Creio que com esta proposta de lei a questão ficará definitivamente clarificada, pelo que lhe damos o nosso apoio.
Neste campo gostaria também de realçar a questão colocada pelo Sr. Deputado Guido Rodrigues, que deve ser reanalisada e reapreciada pela Assembleia da República. Se a responsabilidade da conta da Assembleia da República for atribuída ao Conselho de Administração (como, em princípio, será) este terá de ter as competências completas para a realização de todas as despesas da Assembleia da República. Só tendo toda a competência é que poderá ter e assumir toda a responsabilidade.
Em relação à inserção das contas do Tribunal de Contas na Conta Geral do Estado, nada temos a objectar. De acordo com a lei de enquadramento orçamental, neste momento o Tribunal de Contas já envia regularmente a sua conta à Assembleia da República. No essencial e no fundamental, essa é, pois, uma questão que tem a ver com a necessidade de clarificação da situação.
Uma última nota, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tem a ver ainda com o próprio Tribunal de Contas. Creio que é importante que o Tribunal de Contas possa cumprir as suas funções de fiscalização da utilização dos dinheiros públicos, quaisquer que sejam as entidades que os utilizem, sendo para isso absolutamente necessário que ele tenha todas as condições para poder cumprir a sua tarefa. Ora, essas condições não lhe têm sido atribuídas. Entre outros, gostaria de recordar aqui o problema da Lei Orgânica dos Serviços de Apoio ao Tribunal de Contas, que espera há anos por uma iniciativa do Governo, que a não toma. Aliás, há pouco tempo o Grupo Parlamentar do PCP teve oportunidade de apresentar na Assembleia da República um projecto de lei sobre a lei orgânica desses mesmos serviços, assumindo um projecto do próprio Tribunal de Contas. Repito: não é possível que o próprio Tribunal de Contas cumpra as suas funções se não tiver, para além dos meios materiais, meios humanos necessários, capazes e competentes para realizar essas tarefas. Creio que esta situação vai ser resolvida em breve pela Assembleia da República para que se possa conjugar, por um lado, a obrigatoriedade de clarificação da fiscalização de todos os gastos de dinheiros públicos e, por outro, a possibilidade de a entidade competente, o Tribunal de Contas, poder cumprir essas funções.

Vozes do PCP: - Multo bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, relativamente a conta da Assembleia da República há, efectivamente, uma diferença significativa. A única coisa que o Tribunal de Contas faz é elaborar o parecer sobre a conta, não julgando a conta da Assembleia da República.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP) - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Guido Rodrígues, a dúvida que se coloca é esta: o Tribunal de Contas julga a Conta do Estado?

O Orador: - Sr. Deputado, na realidade, o Tribunal de Contas não julga a conta da Assembleia da República. Houve uma alteração a esta matéria, mas a proposta de lei e o projecto de lei do PS tentam ultrapassar essa dificuldade, generalizando a todos os organismos do Estado o rigor que implica esse julgamento.
V. Ex.ª falou também nas futuras competências do Conselho de Administração. Essa matéria necessita de uma reflexão muito profunda, porque, na Assembleia da República, para além da existência do Conselho de Administração, há o Secretário-Geral e toda uma cadeia hierárquica e funcional. Portanto, teremos de caminhar num sentido ou noutro. Há inúmeras possibilidades de solução do problema, mas não é simples resolver essa matéria.
Quanto à questão dos meios ao dispor do Tribunal de Contas, essa matéria não está neste momento em apreciação. Mas, tal como o Sr. Deputado sabe, a questão dos meios de que possam dispor os organismos do Estado para a prossecução das suas tarefas é matéria da responsabilidade de cada organismo e tem indirectamente a ver com. o Orçamento do Estado.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, gostaria de dar um esclarecimento sobre o alcance do julgamento e do parecer.
Tendo em conta o regime de autonomia da Assembleia da República, ela deve submeter-se a julgamento, que é o regime geral das entidade que têm autonomia, sendo essa, aliás, a forma que a lei prevê para o apuramento de responsabilidades financeiras.
Nos organismos sem autonomia, que são os que estão integrados na generalidade do Orçamento do Estado, há um apuramento próprio de responsabilidades através de um processo que começa com a fiscalização a priori e que, depois, envolve um acompanhamento da execução financeira.
Neste sentido, o parecer sobre a Conta Geral do Estado é um parecer em sentido preciso, é um documento indispensável e constitucionalizado para apreciação, pela Assembleia da República, da Conta Geral do Estado. Portanto, parecer sobre a Conta do Estado e parecer sobre a conta da Assembleia da República são coisas ligeiramente diferentes. O parecer sobre a conta da Assembleia da República era um sucedâneo para o facto de não haver julgamento e um processo autónomo de apuramento de responsabilidades.
Neste sentido, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas aponta para que a Assembleia da República seja submetida a esse julgamento. Nós é que, na lei de enquadramento orçamental, a certa altura, considerámos ou excepcionámos esta situação, que agora pretendemos transformar em regra.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

Página 708

708 I SÉRIE - NÚMERO 20

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guido Rodrigues, quando estávamos os dois no Conselho de Administração já tive ocasião de discutir consigo esta questão. Neste momento, não tenho uma posição definitiva sobre qual deve ser o modelo interno da Assembleia da República, fora da questão do julgamento, da apreciação ou da fiscalização das contas. É evidente que, do meu ponto de vista, quem for responsável pelas contas terá de ter a competência necessária para se poder responsabilizar por elas. Se for o Conselho de Administração, será ele; se for outra entidade, será então ela.
Em relação às referências feitas pelo Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins, admito, e não ponho em causa, as apreciações que faz. Apenas gostaria de referir que quando houve em sede da lei de enquadramento orçamental a sujeição da conta da Assembleia da República ao parecer do Tribunal de Contas foi no espírito, que, há pouco, acabei de referir - e julgo que esta foi também a interpretação dada, na altura, pelas outras bancadas - , de que, em todo o sistema de fiscalização, as contas da Assembleia teriam o mesmo regime que as contas do Estado. Por conseguinte, penso que a questão está clarificada, independentemente de qualquer interpretação divergente que possa haver numa ou noutra matéria de pormenor.
Já há pouco referimos que, pela nossa parte, estamos de acordo com estes diplomas e vamos votá-los favoravelmente, no sentido de que esta questão fique definitivamente clarificada.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS, por carência de meios, não esteve presente na reunião em que se deu como dos debates havidos a este propósito. E apesar de eu ter tido apenas um conhecimento recente dos diplomas que estão em jogo, queria que ficasse registado que o CDS está de acordo com o progresso - nalguns casos, só de fixação de uma interpretação que já existia - em matéria de transparência das contas e que entende ser o projecto do PS mais completo, pelo que se inclina a votá-lo favoravelmente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrado o período de debate, vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/VI - Altera a Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro (enquadramento do Orçamento do Estado).

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

Srs. Deputados, passamos agora a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 206/VI, da autoria do PS, sobre a fiscalização pelo Tribunal de Contas relativamente à Assembleia da República e à Assembleia da Madeira.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

Srs. Deputados, estes dois diplomas baixam açora à respectiva comissão.
Por acordo das bancadas, vamos fazer uma alteração na sequência das matérias da ordem do dia, passando à análise do projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República para 1992, apresentado pelo Conselho de Administração da Assembleia da República.
Antes disso, informo que se encontram a assistir à sessão os alunos do Colégio Salesiano, de Lisboa, da Escola Secundária do Forte da Casa, da Póvoa de Santa Iria, e do Instituto de Educação Técnica, de Lisboa, para os quais peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernandes Marques, presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República.

O Sr. Fernandes Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República, designado como primeiro orçamento suplementar - e será o primeiro e o único orçamento suplementar de 1992 -, foi elaborado de acordo com a Lei Orgânica da Assembleia e tem por finalidade, fundamentalmente, adequar diversas rubricas do orçamento da Assembleia às necessidades e aos acontecimentos que, entretanto, se foram verificando. Há que referir, especialmente no capítulo das receitas, que, com este orçamento suplementar, está a fazer-se um necessário ajustamento do orçamento da Assembleia da República, tendo em conta o saldo final do exercício de 1991, que, naturalmente, transitou para o orçamento deste ano.
Por outro lado, houve também que incluir no orçamento da Assembleia da República o empréstimo contraído junto da Caixa Geral de Depósitos para a aquisição do edifício situado na Avenida de D. Carlos I, onde, como é do conhecimento geral, uma grande parte dos serviços da Assembleia vão ser instalados, para que os Deputados e os grupos parlamentares tenham futuramente melhores condições de trabalho no Palácio.
Por outro lado, houve também a necessidade de inscrever neste orçamento suplementar da Assembleia da República um reforço de verbas concedido pelo Ministro das Finanças ao Serviço do Provedor de Justiça.
Isto, no que diz respeito às receitas.
Quanto às despesas, houve que reforçar algumas rubricas, nomeadamente as respeitantes ao pessoal, dado que, este ano, concretizou-se o descongelamento de escalões na função pública, que, como é sabido, é aplicável aos funcionários parlamentares.
Também houve necessidade de reforçar as verbas destinadas a equipamento, que tem muito a ver quer com a informática quer sobretudo com a utilização das instalações que têm ficado livres com as obras em curso na ex-Torre do Tombo. Deve igualmente referir-se, porque não é despiciendo, que os trabalhos da Assembleia da República, este ano, prolongaram-se muito além do que é habitual, tendo terminado só em finais de Julho, e, por outro lado, recomeçaram, praticamente com trabalhos de quase todas as comissões parlamentares especializadas, quer permanentes quer eventuais, em 15 de Setembro. É óbvio que tudo isto acarreta encargos acrescidos e, por isso, foi necessário reforçar algumas rubricas do orçamento inicial de 1992.
Estas são, sobretudo, as grandes linhas que devem ser referidas e que justificam, de acordo com a Lei Orgânica, este orçamento suplementar. Devo dizer que ele foi

Página 709

12 DE DEZEMBRO DE 1992 709

aprovado, por unanimidade, no Conselho de Administração da Assembleia da República, porque, de facto, era isto o que tinha de ser feito - nem mais nem menos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A justificação para a apresentação do projecto de orçamento suplementar em apreço já foi feita pelo presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República. Todavia, complementando-o, direi que se tratou de corresponder à necessidade de se proceder a ajustamentos decorrentes de imposições de ordens técnica e formal, bem como em razão de opções que, entretanto, foram feitas no decurso do ano de 1992. Procedeu-se, assim, como foi referido, à integração no orçamento da Assembleia da República do saldo transitado, tendo sido feita a respectiva distribuição por diversas rubricas a carecerem de maior sustentação, designadamente pelo tacto de, no seguimento da entrada ern vigor do novo sistema retributivo da função pública, ler sido necessário fazer acertos em relação ao que anteriormente fora previsto.
Também as despesas de funcionamento da Assembleia estavam dotadas deficitariamente pelo que foi necessário proceder ao respectivo reforço, pois os trabalhos parlamentares tiveram particular incidência durante o Verão deste ano designadamente no âmbito das Comissões Eventuais para a Revisão Constitucional e para a Reforma do Parlamento.
Este orçamento suplementar inclui igualmente o reforço da dotação orçamental da Provedoria de Justiça, que foi feito através de verbas concedidas pelo Ministério das Finanças. Tal formalidade impunha-se na medida em que o orçamento do Provedor de Justiça faz parte formal e legalmente, do da Assembleia da República.
Finalmente, sublinho a integração orçamental da despesa decorrente do empréstimo contraído junto da Caixa Geral de Depósitos para a aquisição do novo edifício destinado à instalação dos serviços da Assembleia da República, na Avenida de D. Carlos I.
Esta e as outras opções referidas mereceram a nossa concordância, pelo que o PS votará favoravelmente este projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República para 1992.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.

O Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, podia dizer - e a posição do meu grupo parlamentar é essa - que não havia muito a acrescentar ao que foi dito. Mas, no quadro da transparência, que importa assinalar do orçamento suplementar da Assembleia, gostaria também se tecer algumas considerações acerca desta matéria.
O orçamento suplementar tem por base um reforço de cerca de 2.5 milhões de contos, mas esta verba compreende receitas que importa assimilar, a saber: aproximadamente 513 000 contos com o saldo do gerência do ano anterior o empréstimo da Caixa Geral de Depósitos, resultante do contrato celebrado entre a Assembleia e essa instituição, no valor de 1000 milhões de contos: diversas receitas cobradas pela Assembleia da República derivadas da alienação de bens e também verbas - cobradas directamente pela Assembleia que tem a ver com coisas simples, mas que importa assinalar, como as receitas dos prédios da Praça de São Bento.
Há também um reforço de 20 000 contos no orçamento do Provedor de Justiça, que se deve a uma transferência do Orçamento do Estado, através de um despacho do Ministro das Finanças.
Com esta integração reforçam-se algumas rubricas da despesa, entre as quais destaco a referente ao vencimento dos Deputados - no entanto, baseada em grande parte no afluxo de pensões de aposentação provisórias -, no valor de 9000 contos.
Há também uma outra rubrica, a das ajudas de custo e despesas de deslocação, à qual se atribui uma verba - que parece demasiado elevada, mas que não o é - de 145 000 contos. Tem a ver com o facto já aqui explicado pelos Srs. Deputados Fernandes Marques e José Lello - de para o orçamento inicial, se ter feito um cálculo baseado ern 9 a 10 meses de trabalho, quando, na verdade, este ano, apenas não se trabalhou no mês de Agosto, tendo o Plenário funcionado até ao fim do mês de Julho e as comissões iniciado os seus trabalhos logo no mês de Setembro.
Quanto a outra rubrica reforçada, que tem a ver com o pessoal, além do descongelamento de escalões já aqui referenciado, houve também o preenchimento, não total, mas quase, do quadro de pessoal, o que implicou a necessidade deste reforço.
Por outro lado, ainda no quadro da despesa temos a amortização do empréstimo, com o pagamento da primeira prestação, no valor de 160 000 contos.
Para finalizar, importa referir que a verba de 2,5 milhões de contos tem, logo à partida, duas rubricas que importa assinalar: 1,990 milhões de contos do empréstimo para a aquisição do edifício situado na Avenida de D. Carlos I e 160 000 contos para esta primeira amortização.
É, neste quadro. Sr. Presidente, que o Grupo Parlamentar do PCP dá o seu voto favorável ao projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputadas, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação deste diploma. Proponho se faça uma votação conjunta, na generalidade, na especialidade e final global.
Como nenhum Sr. Deputado se opõe, vamos proceder à votação conjunta, na generalidade, na especialidade e final global, do projecto de orçamento suplementar da Assembleia da República para 1992, apresentado pelo Conselho de Administração da Assembleia da República.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

Srs. Deputados, vamos passar a discussão na generalidade, da proposta de lei n.º 41/VI - Altera a Lei n.º 2/92, de 9 de Março (Orçamento do Estado para 1992).

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Manuela Leite): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: listamos aqui hoje para proceder a algumas alterações ao Orçamento do Estado para 1992 alterações essas que não implicam nem aumento de despesa nem alteração no défice. São meras alterações, quase que formais, feitas uma atitude de boa gestão e de transparência. De boa gestão, porque os recursos postos à disposição do Estado.

Página 710

710 I SÉRIE - NÚMERO 20

para a resolução de determinadas tarefas deverão seguramente ser empregues com toda a utilidade possível, e de transparência, porque a maior das alterações que aqui propomos se traduz na distribuição da dotação provisional, o que evidentemente não seria absolutamente necessário, mas que entendemos deveria ser feito, dada a altura em que esta alteração é proposta, ou seja, já no final do ano.
Acrescento também que as alterações agora propostas ern nada alteram a estimativa de execução do Orçamento do Estado para 1992, que está incluída na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1993, motivo pelo qual em nada se altera a análise que é feita nesse documento.
Finalmente, gostaria de dizer que estarei à disposição dos Srs. Deputados para responder a questões que queiram colocar sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados António Campos, Lino de Carvalho e Gameiro dos Santos.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr.ª Secretária de Estado, a primeira coisa que estranho è que este orçamento rectificativo recaia, acima de tudo, num sector que está em profunda crise, havendo transferencias de verbas desse sector, que é o da agricultura, uma vez que este sector viveu um ano terrível com o problema da seca, e atendendo que os agricultores, desde há anos, e apesar dos meios disponíveis e por razões de falta de política do Governo, tem vindo a perder rendimento.
Na verdade, a maioria das verbas vêm do sector agrícola, razão peia qual gostaria de perguntar à Sr.ª Secretária de Estado por que razão é que é o Ministério da Agricultura o sacrificado nesta rectificação orçamental.
Gostaria ainda que explicasse a Câmara de onde vêm as verbas, principalmente as do INGA e do seguro de colheitas, pois como sabe a actividade agrícola está muno dependente da situação climatérica e, atendendo ao ano de profunda seca e à situação dramática no sector, como é que consegue ir buscar, dinheiro aos seguros agrícolas, nomeadamente ao INGA uma vez que, creio, de certeza absoluta, esse dinheiro foi retirado das indemnizações compensatórias que como sabe são as pequenas ajudas dadas aos pequenos agricultores.
Portanto, gostaria que nos explicasse como é que é possível ser o Ministério da Agricultura o sacrificado nestas transferências de verbas que o Governo está a fazer.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Secretária de Estado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - No fim, Sr. Presidente.

A Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado a primeira questão que queríamos relevar tem a ver com as condições, diria, inaceitáveis e desnecessárias.
Em que estamos a discutir estas alterações ao Orçamento do Estado para 1992.
Naturalmente, este orçamento foi muito negado pelo Governo, nomeadamente pelo Sr. Ministro das Finanças, aos nome o Governo sem dizer que se trata de uma operação de rotina». Então, se assim é, por que razão é que isso não foi admitido já há mais tempo pelo Sr. Ministro das Finanças e por que razão é que não tivemos mais tempo para que o orçamento rectificativo pudesse ser apreciado e devidamente discutido por esta Câmara, pois a verdade é que esta discussão está a ser feita de forma apressada, numa sexta-feira de manhã, no meio da apreciação de cinco outros diplomas, e depois de esta proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 1992 nos ter sido entregue há dia e meio sem relatório justificativo, embora a Sr.ª Secretária de Estado, depois, se tivesse disponibilizado para ir à Comissão, como foi, para dar algumas justificações que pudessem colmatar essa ausência do relatório justificativo.
Portanto, Sr.ª Secretária de Estado, a questão que quero colocar-lhe é a seguinte: por que é que, sendo como o Governo diz, uma «operação de rotina» ela foi negada pelo Sr. Ministro das Finanças? Ou será que não se trata, de facto, de uma «oneração de rotina», como uma análise mais detalhada das verbas assim o demonstra e como, aliás, iremos afirmar na nossa intervenção?
A segunda questão tem a ver com problemas que já foram focados pelo Sr. Deputado António Campos e respeita à incompreensão de como é que no âmbito da redução das despesas excepcionais, em relação às quais a Sr.ª Secretária de Estado teve ontem a amabilidade de discriminar a que é que elas diziam respeito, se explica a diminuição de 2,5 milhões de contos no INGA e de quase 1 milhão de contos no seguro de colheitas.
Sabe-se que em relação ao INGA não se trata de subsídios, porque não é essa a questão ern curso, mas sim do próprio funcionamento deste organismo. Assim, sabemos que o INGA é hoje um aparelho altamente burocratizado, de tal forma que as dificuldades de funcionamento estão na origem do atraso do pagamento dos subsídios aos agricultores.
Portanto, o que se trataria era de simplificar o seu funcionamento, tomando este organismo mais operacional e dotando-o de verbas para esse efeito. Contudo, o que verificamos é que se vão buscar verbas ao INGA, quando este precisava era de melhorar o seu aparelho para poder corresponder às funções para as quais foi criado.
Um outro problema que gostaria de colocar tem a ver com a redução de verbas que estavam previstas para a cooperaçâo com os PALOP, tinto em sede de transferência para o Instituto de Cooperaçâo Económica como em sede do seguro de crédito.
Como é que se compreende que numa área que nos interessava fomentar, dinamizar, e em relação à qual os empresários têm colocado críticas por ausência de apoio e de garantias, que permitam fomentar as relações empresariais com esses países, se venham, cortar verbas que seriam necessárias para esse efeito.
Estas eram as explicações que gastaríamos de obter da parte da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr.ª Secretária de Estado, em primeiro lugar, gostaria de constatar que o Governo vem agora, com este orçamento rectificativo, dar a mão à palmatória, designadamente no sector da saúde, quando apresenta um aumento de verbas para este sector de cerca de 6 milhões de contos.

Página 711

12 DE DEZEMBRO DE 711

De facto, o que é importante referir aqui hoje é que mesmo estes 26 milhões de contos estuo muito aquém das necessidades sentidas pelo sector da saúde em Portugal, designadamente pelos hospitais.
Na verdade, toda a gente conhece a situação de asfixia financeira em que vive a maioria dos hospitais portugueses - aliás, ainda ontem tivemos oportunidade de ouvir representantes dos sindicatos dos médicos dizer que há hospitais que já não têm dinheiro para comprar seringas, medicamentos e até - pasme-se! - papel higiénico... Vejam bem ao ponto a que chegámos!...
Por outro lado, está estimado que o défice do orçamento da saúde não anda muito longe dos 80 milhões de contos, pelo que pergunto à Sr.ª Secretária de Estado como é que é possível manter em boas condições de funcionamento um serviço fundamental para os Portugueses, como é o serviço de saúde, quando para um défice estimado de 80 milhões de contos temos apenas 26 milhões de contos de reforço.
Bom, isto é lamentável, tanto mais que através do orçamento da saúde terão de sair as verbas para pagar aos bombeiros, que têm atrasos significativos nos seus recebimentos, quer por parte, das administrações regionais de saúde quer dos próprios hospitais.
Sr.ª Secretária de Estado, creio que este governo tem de ser uma pessoa de bem, tem de honrar os seus compromissos e, por isso, não pode ser um Governo caloteiro e em relação à saúde este Orçamento, no nosso entender, devia ser mais reforçado do que aquilo que foi nesta proposta de orçamento rectificativo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar. tem a palavra a Sr.º Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Começarei por responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho relativamente à razão pela qual só agora o Orçamento foi alterado.
Bom, Sr. Deputado, gostaria muito de não ver nesta sua observação um convite ao Governo para reforçar todos os anos a dotação previsional, porque o montante que neste momento, está em causa, em termos de alteração orçamental, é bastante inferior a 1 % do total da desposa, o que significa que era verdadeiramente lógico que a dotação previsional pudesse ter sido mais elevada em 1902.
Nesse sentido, se ela tivesse sido mais elevada num valor absolutamente aceitável, neste momento não era necessário fazer qualquer tipo de alteração orçamental. Contudo, penso que nenhum de nós nem o Governo nem a Assembleia da República, deve fomentar este tipo de actuação em termos orçamentais: bem pelo contrario, a dotação previsional deverá ter tendencia a ser menor e a haver uma maior agilidade em termos de gestão do Orçamento, agilidade essa que deveria sor transferida para a Assembleia da República, desde que este processo de alteração, que, neste momento, está em curso, não tosse dramatizada nem politizada.
Assim, se este tipo de alteração que hoje estamos a discutir for normalizada, provavelmente a dotação previsional num extremo, até poderia ser eliminada.
Portanto. Sr. Deputado Lino de Carvalho, espero que a sua sugestão não seja um convite a um reforço a dotação provisional, como já disse, e sim um desabafo, provavelmente, por hoje a manhã ter sido um pouco mais pesada do que aquilo que seria esperado. Mas, por outro lado, o senhor também sabe que se a alteração orçamental, que neste momento está a ser feita, tem o objectivo que os senhores já conhecem, porque eu já tive oportunidade de explicar, então ela não poderia ter sido feita antes, uma vez que só a partir do conhecimento da execução de Novembro é que estávamos em condições de proceder às alterações, razão pela qual foi no primeiro dia útil do mês de Dezembro que comuniquei aos Srs. Deputados a respectiva alteração orçamental.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Foi só um convite a que o Sr. Ministro das Finanças não sonegasse o que foi sonegado!

A Oradora: - Essa referência ao Sr. Ministro das Finanças e às questões que muitas vezes os senhores colocam tem obviamente, a ver com um aspecto que não é o que hoje está em discussão: o problema do aumento da despesa ou o aumento do défice.
Nesse sentido, o Sr. Ministro das Finanças sempre respondeu que o Orçamento estava bem, muito obrigado! E eu continuo a dizer que o Orçamento está bem, muito obrigado, porque, efectivamente, não há aumento de despesa nem alteração do défice. Portanto, o Orçamento está de acordo com os limites aprovados por esta Assembleia.
Os Srs. Deputados António Campos e Lino de Carvalho ficaram preocupados com o facto de ter havido alguma anulação nas verbas destinadas ao sector agrícola. Srs. Deputados, é preciso notar quais são os montantes envolvidos: no que respeita ao seguro de colheitas a verba é de 500 000 contos...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - 900 000 contos!

A Oradora: - Desculpe, mas os restantes 400 000 contos respeitam à construção naval. E no que concerne ao INGA e no que se refere aos subsídios a verba é de 2,5 milhões de contos.
Srs. Deputados, nem nós estamos a dever subsídios nem consideramos que seja lógico darem-se subsídios caso os processos que conduzem à concessão dos mesmos ainda não estejam completos. Portanto, se existe, neste momento, alguma folga é porque, provavelmente, existirão ainda, desconheço-o, processos por resolver (porque, provavelmente, eles não são susceptíveis de ser resolvidos) e, como sabe a concessão de subsídios não é algo que se faça sem as diferentes comprovações de natureza legal.
Quanto à saúde, o Sr. Deputado Gameiro dos Santos referiu-se à necessidade de maiores verbas para este sector.
Relativamente aos défices que existem no Ministério da Saúde, gostaria de dizer que eles correspondem a acordos com fornecedores que levam a haver, pelo menos, prazos da ordem dos 90 dias para pagamentos. Esse montante se aumentou alguma coisa foi-o em prazo - mas creio que está a ser reduzido - e em volume é natural que tenha aumentado, porque em dois anos o volume Já despesa desses contratos, que tem um prazo de pagamento dilatado, subiram de 300 milhões de contos para 600 milhões de contos.
Portanto, é natural que o volume de despesa que rola neste momento seja um valor bem superior e de uma dimensão muito diferente daquela que acontecia há dois

Página 712

712 I SÉRIE - NÚMERO 20

anos. Contudo, isso não significa que os prazos de pagamento tenham sido totalmente dilatados e penso que o montante de divida que estava em causa para fora do sistema não era muito superior ao valor que, neste momento, está consagrado.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito. Sr. Deputado?

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, uma vez que pedi algumas explicações à Sr.ª Secretária de Estado, e dado que não estou satisfeito, gostaria de insistir.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pode inscrever-se para uma intervenção.

O Sr. António Campos (PS): - Com certeza. Sr. Presidente. É o que farei.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peco a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faca favor. Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria de chamar a atenção da Sr.ª Secretária de Estado para o facto de não ter respondido as questões que lhe coloquei relacionadas com a quebra das dotações para as relações com os PALOP que, penso, é extremamente importante.
Já agora, se o Sr. Presidente me permitisse, há pouco esqueci-me de colocar uma questão à Sr.ª Secretária de Estado...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado,...

O Orador: - É uma questão simples, Sr. Presidente.
Gostaria de perguntar se as alterações no Ministério da Defesa, para além da participação de Portugal nas operações em Angola, tem também a ver com a aplicação da Lei de Programação Militar e com a redistribuição da verba do Gabinete do Ministro para os respectivos sectores de defesa nacional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Campos, uma vez que deixei o Sr. Deputado Lino de Carvalho infringir o Regimento, concedo-lhe também a palavra.

O Sr. António Campos (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr.ª Secretária de Estado, penso que a agricultura portuguesa nunca viveu, neste século, a crise que está a viver hoje. Penso mesmo que, independentemente da profunda crise que existe no sector eleitoral também acrescida este ano por aquilo que se considera a seca do século. Hoje, mais de 13 % da população portuguesa está a viver horas dramáticas.

O Sr. José Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sei que o Governo está distante de todos estes problemas. O que eu pensava, e que seja lógico e que o Governo, perante este problema gravíssimo da sociedade portuguesa, viesse a esta Camará fazer todos os esforços possíveis para auxiliar o sector. Surpreendentemente, o Governo aparece-nos a pagar dívidas de outros sectores à custa de verbas que estavam disponíveis no Ministério da Agricultura.
Mas, Sr.ª Secretária de Estado, como sabe, o sistema de seguros agrícolas em Portugal é inviável. Comparando-o com os sistemas que existem na maioria dos países da Europa é impassível aos agricultores portugueses terem alguma segurança através dos seguros agrícolas.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Porquê?!

O Orador: - É estranho que a um sector decisivo, onde o Governo devia ir de encontro à ajuda aos produtores, aumentando os subsídios aos seguros agrícolas, a Sr.ª Secretária de Estado venha retirar 1 milhão de contos, ou 900 000 contos, mais concretamente. É também estranho que havendo grande quantidade de subsídios que não estão a ser pagos aos produtores, e outros que se encontram em situação de grande atraso em relação aos agricultores, a Sr.ª Secretária de Estado venha pegar nesses subsídios, que já deviam estar na mão dos agricultores...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não há atrasas nenhuns!

O Orador: - Há vários subsídios em atraso, alguns deles ern bastante atraso. E a Sr.ª Secretária de Estado retira 2,5 milhões de contos, que eram fundos destinados a esses subsídios, para pagar dívidas ao Ministério.
A conclusão lógica, Sr.ª Secretária de Estado, é que o Governo não quis apresentar a esta Assembleia um orçamento para aumentar o défice, e então vai pagar pequenas migalhas a custa daqueles....

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Dizia eu que vai pagar pequenas migalhas à custa daqueles que são os cidadãos mais débeis na sociedade portuguesa, que estão mais desorganizados e que estão a passar por um dos piores momentos da existência da agricultura portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador. - Aconselho a Sr.ª Secretária de Estado a ver o abandono e o drama que se está a passar no mundo rural!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Ferraz de Abreu pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, como ainda não perdi qualidades auditivas as condições acústicas desta Sala devem ser mas, porque não tenho a certeza do que a Sr.ª Secretária de Estado disse: se foi que «o Orçamento estava nem, muito obrigado» ou se disse «está mal, não obrigado».

Página 713

12 DE DEZEMBRO DE 1992 713

Também me pareceu ouvi-la dizer que as receitas e as despesas não unham sofrido qualquer alteração, mas não ouvi falar do endividamento de quase todos os ministérios e, portanto, o Orçamento está mal, muito obrigado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa considera que as condições acústicas estão razoáveis.

Risos.

A Sr.ª Secretária de Estado anunciou à Mesa que irá posteriormente fazer uma outra intervenção onde responderá a essas dúvidas.
Mas vamos parar com as infracções ao Regimento e voltar à ordem normal das coisas.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em primeiro lugar é conveniente- relembrar o processo que conduziu à apresentação destas alterações ao Orçamento do Estado para 1992. Logo no começo desta sessão legislativa, o Partido Socialista, na Comissão Permanente, apresentou um projecto de deliberação sobre a questão das dívidas dos departamentos de Estado, que nessa altura era uma questão bastante talada e continua a ser. O PSD impediu que esse projecto de deliberação fosse aprovado votando contra.
Depois, houve um debate, proposto pelo Governo, sobre matéria económica e social, e essa exigência foi reiterada no decorrer do mesmo. O Governo fez orelhas moucas mais uma vez.
Também nessa altura, pela primeira vez, exigimos que dessem entrada na Assembleia da República as alterações (que toda a gente sabia serem indispensáveis) ao Orçamento do Estado para 1U92, aquilo a que se tem chamado tradicionalmente o orçamento rectificativo, para atempadamente, se poder analisar a sua conformidade, para que o seu debate pudesse, como seria de toda a lógica anteceder o debate do Orçamento do Estado para 1993, por óbvias exigências de clareza e transparência. Também aí o Governo nada disse.
Insistimos mais tarde, aquando da interpelação do PS sobre política económica, para esta necessidade. Mantivemos essa dupla reivindicação política, de clarificação da questão das dívidas e da entrega atempada do orçamento rectificativo, nos debates que tiveram lugar já no quadro da proposta do Orçamento do Estado para 1993, tanto na generalidade como na especialidade, com a recusa sistemática do Ministro das Finanças. Aliás, tivemos sempre respostas de tipo sobranceiro: «a execução orçamental vai bem, muito obrigado», pelo que houve sempre uma recusa de clarificar o problema das dívidas dos ministérios e os problema» orçamentais de cada ministério. Tudo isso foi sendo sucessivamente adiado, postergado, enquanto se sabia, por protestos da sociedade civil, dos agentes económicos em geral, dos fornecedores, dos empreiteiros, que a deterioração da situação financeira do Estado a este nível dos vários departamentos públicos, se ía agudizando.
O Ministro das Finanças chegou, aliás, ao cúmulo do caricato ao recusar-se, na passada semana, a confirmar aqui, nesta mesma Sala, que existia um orçamento rectificativo para 1992, que entretanto tinha sido aprovado umas horas antes em Conselho de Ministros. E um processo pouco edificante!

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Como é também pouco edificante o facto de este orçamento rectificativo ter dado entrada na Assembleia da República, mais concretamente na Comissão de Economia, Finanças e Plano, menos de quarenta e oito horas antes deste debate que estamos a ter, como, aliás, vem assinalado no relatório da Comissão. Terá sido dito na Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares de anteontem, para permitir esta urgência no agendamento, que a proposta de lei n.º 41/VI já tinha dado entrada na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Não era verdade. À hora a que se realizou a Conferência ainda não tinha entrado na Comissão esta proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 1992.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Isso é crítica sampaísta!

O Orador - A proposta de lei entrou na Comissão, como já foi aqui assinalado, sem qualquer nota justificativa. No entanto, evidentemente que houve uma colaboração séria da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento ontem, embora a menos de vinte e quatro horas deste debate em Plenário. Não houve, portanto, tempo suficiente para o PS. como gostaria de ter feito, proceder a audições junto dos agentes económicos a quem o Governo deve dinheiro para saber concretamente se este orçamento rectificativo responde a estes problemas.

Vozes do PS: - Deve e continua a dever!

O Orador: - Temos consciência de que não responde a estes problemas.
Este debate, que tem grande relevância politica, acaba assim, por intenção óbvia do Governo, por passar completamento à margem da opinião pública. Bem, aos esclarecimentos pedidos ontem, a Sr.ª Secretária de Estado respondeu. Mas a verdade é que este agendamento de emergência para o dia em que se sabia de antemão que o Sr. Ministro das Finanças não poderia estar presente não contribui para a dignificação da Assembleia da República, que, como é visível, é cada vez mais precisa e urgente.
Quanto à descrição dos aspectos essenciais desta proposta, em primeiro lugar confirma-se o «buraco» no Ministério da Saúde: 26 milhões de contos foram «tapados»! Fica, no entanto, um buraco muito maior de dívidas em atraso!
Verifica-se que a previsão de despesas no Ministério da Defesa foi ultrapassada em 3,5 milhões de contos.
A previsão de despesas relativas à presidência portuguesa do Conselho das Comunidades Europeias foi insuficiente. E digo isto porque as despesas com a presidência portuguesa foram o dobro daquilo que estava previsto.
Houve também um «buraco» de 14 milhões de contos nas verbas para pensões e reformas da responsabilidade do Ministério das Finanças.
O Governo tinha uma condicionante, que era a de não exceder as despesas a que se comprometera no Q2. Então. como é que procedeu? Fez cortes no investimento e o PIDDAC sofreu cortes generalizados de 4%.
Mas o mais espantoso é que é na área da educação, que e a prioridade das prioridades, que o PIDDAC sofre ainda um corte maior. Não sofre um corte de 4 %, mas são mais do dobro desses 4%.

Página 714

714 I SÉRIE - NÚMERO

O Sr. Gameiro doa Santo» (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Eis como o Governo trata a prioridade das prioridades, num país em que se conhecem as insuficiências que existem nos equipamentos das escolas, a inexistência de ginásios, enfim, todo um panorama extremamente negativo... fazem-se poupanças ao nível dos investimentos na área da educação!...

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - Depois, há outras poupanças que só entre aspas fazem sentido. Isso sucede, por exemplo, numa área tão sensível como a respeitante às bonificações de juros, que certamente afectou ainda mais a situação ao nível da habitação - 900 000 contos foram poupados em bonificações de juros.
Quanto às transferências para o INGA, que já foram aqui referidas, e aos seguros de colheitas, é fantástico como é que, num ano com uma seca destas e com os protestos dos agricultores por todo o País, se fazem poupanças na área da agricultura. Isto é um ultraje nos agricultores portugueses!

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Bem, outro método foi o da distribuição da dotação provisional.
Os cortes na dotação de capital para as empresas públicas foram da ordem dos 3,2 milhões de contos.
Refiram-se também os cortes que afectaram a nossa política de cooperaçâo com os países africanos de expressão oficial portuguesa e seria bom que fossem aqui explicados quais os seus resultados políticos.
Quanto às receitas, nada é dito. Mas como nos anos anteriores, o Governo, sempre que apresentava aumentos das despesas, também apontava aumentos das receitas para mostrar que havia diminuição de défice, é muito mau sinal que não nos apareça aqui nada sobre as receitas. Tal pode significar que há uma insuficiência previsível em matéria de impostos cobrados ern relação àqueles que estavam estimadas. Portanto, a conclusão óbvia será a de que. mesmo que a despesa global se mantenha, havendo menos impostos cobrados, o défice em 1W2 será porventura maior di) que aquele que foi aprovado pela Assembleia da República. Teremos ocasião de verificar isso aquando do debate da Conta Geral do Estado para este ano. mas esperamos que antes haja condições para sabermos concretamente o que é que se passou nesta matéria.
Conclusão: nada se sabe sobre a execução em matéria de receitas; nada se sabe sobre a evolução das dívidas dos Ministérios: as despesas correntes excedem duramente as despesas orçamentadas: houve cortes importantes nas despesas de capital e nada se sabe de definitivo quanto ao défice.
A preocupação do Governo é maior em mostrar que e bom aluno em matéria europeia e está mais preocupado com u supervisão multilateral que existirá em Janeiro e volta do Q2 do que em clarificar, junto da Assembleia da Republica, a execução orçamental e a verdade sobre a situação financeira do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O processo seguido foi incorrecto, visto que decorreram menos de quarenta e oito horas entre a entrada deste orçamento rectificativo na Comissão de Economia, Finanças e Plano e o seu debate e votação hoje, neste Plenário. Aliás, trata-se de um processo caricato, na medida em que, na semana passada, em sessão pública, neste Plenário, o Sr. Ministro das Finanças não confirmou a decisão que já havia sido tomada em Conselho de Ministros, o que demonstra um claro desrespeito pela Assembleia da República.
A conclusão final é a de que o Governo fez tudo para negar e evitar este orçamento rectificativo mas não o conseguiu, porque a realidade impôs-se à política politiqueira. E aí está o orçamento rectificativo, como o PS sempre sustentou, com alguns «buracos» financeiros colmatados, mas com outros «buracos» financeiros muito maiores ainda em aberto.
Este orçamento rectificativo, que vem alterar a Lei n.º 2/92 (Orçamento do Estado para 1992), é, sem dúvida, uma derrota política deste governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Carp inscreveu-se para pedir esclarecimentos. Porém, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues não tem tempo para responder.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, concedemos dois minutos do nosso tempo ao Sr. Deputado Ferro Rodrígues.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, quando o ouvi referir-se, na tribuna, ao pouco tempo que antecedeu a entrada na Assembleia da República desta proposta de lei de alteração orçamental -aprovada em Conselho de Ministros no dia 3 de Dezembro -, pensei que V. Ex.ª iria, posteriormente, elogiar o Governo. E isto porque o Governo traz-nos aqui, no final do ano, um exemplo de como se deve gerir o Orçamento do Estado, isto é, chega ao final do ano, aos últimos dias do exercício orçamental, e faz um pedido à Assembleia da República para realizar alterações orçamentais que extravazam a competência que lhe é conferida, nesse domínio, pela lei de enquadramento orçamental.
Ora. afinal. V. Ex.ª referiu-se, outra vez, às dívidas. Assim, a pergunta que lhe faço é muito simples ë, por isso, também não precisa de muito tempo para me responder. V. Ex.ª tem a lista dos fornecedores do Estado, onde eles reclamam o pagamento de dívidas vencidas, cujo prazo de pagamento pelos serviços do Estado esteja ultrapassado, exceptuando o sector da saúde?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - A Associação Nacional de Farmácias, os bombeiros!...

O Orador: - Em relação a este aspecto temos de ser sinceros e frontais, pois trata-se de um sector com um problema estrutural que já vem de há muitos anos, nomeadamente do tempo de outros ministros e de outros partidos, mas como o Sr. Ministro da Saúde aqui disse, e muito bem, está em resolução.
Assim, se o Sr. Deputado tem a lista dos tais fornecedores em dívida, gostaria que a

Página 715

12 DE DEZEMBRO DE 1992 715

apresentasse aqui, porque ainda ontem ouvimos dizer, por parte da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento, que, se há dívidas, o Ministério não as conhece. Até ao momento em que as dívidas dão entrada nos serviços de contabilidade competentes elas não existem.
No fundo, o que VV. Ex.ª querem é «deitar poeira para o ar» e tentar desmerecer o grande mérito do Governo e cabe-me a mim, aqui, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, elogiá-lo.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Claro!

O Orador: - Aliás, parece-me que até era uma prova de democracia deste Plenário elogiar o Governo, que tio final do ano vem aqui dizer que não quer fazer qualquer agravamento do défice ou qualquer alteração à política orçamental definida na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1992, limitando-se, portanto, a desencadear um processo de competência legislativa que tem mais a ver com a gestão orçamental, mas que está a dar-nos uma boa perspectiva de que o Orçamento do Estado não ultrapassará as verbas que foram aqui aprovadas.
Em conclusão, Sr. Deputado, tem ou não a lista dos fornecedores? É que se não tem. então, tinha poupado muito tempo da sua intervenção quando se referiu a elas.

O Sr. Presidente: - Para responder, usando o tempo cedido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, agradeço a sua pergunta, mas nem preciso dos dois minutos, porque, como é óbvio, a sua pergunta não faz sentido, uma vez que o Partido Socialista pediu várias vezes ao Governo a lista das dívidas e ó o Governo que tem obrigação de a dar.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Vocês é que fazem a acusação! O ónus da prova é vosso!

O Orador: - Não, desculpe-me mas os senhores é que estão à frente do aparelho de Estado e têm a obrigação de responder às perguntas concretas que vos são colocadas nesta matéria.
No entanto, não é preciso termos listas, porque todos os dias as pessoas ouvem rádio, vêem televisivo e lêem os jornais. Aliás, será certamente muito interessante verificar amanhã, na imprensa, que o Sr. Deputado Rui Carp considera que há uma situação totalmente clara na relação entre o Governo e os diversos fornecedores e empreiteiros que em entrevistas, dizem ter milhões de contos em atraso como é o caso das farmácias e dos bombeiros.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Tragam as provas!

O Orador: - As provas estão em acreditarmos naquilo que esses agentes económicos dizem, que até nunca é negado pelo Governo.
Os senhores estão a dar cobertura a uma prática caloteira,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador -... que não abona em favor de um Governo que devia representar um Estado «pessoa de bem».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para fazer uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo vem, nos termos legais, apresentar a esta Assembleia da República a proposta de lei n.º 41/VI, que introduz alguns ajustamentos no Orçamento do Estado para 1992, aprovado pela Lei n.º 2/92, de 9 de Março.
Os ajustamentos em causa constam dos mapas n a IV e XI da referida lei orçamental e são apresentados em anexo à proposta de lei que hoje somos chamados a apreciar.
Foi preocupação do Governo, aquando da elaboração do Orçamento do Estado para 1992, fixar o tecto do total da despesa pública sem juros e caminhar para o cumprimento dos critérios de convergência nominal e real com a Comunidade Europeia.

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Na altura, o Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente a proposta orçamental do Governo crente de que ela garantia um caminhar seguro no sentido do desenvolvimento do País, que todos, sinceramente, desejamos.
Seria, pois, indesejável, que o Governo viesse agora propor à Assembleia da República um qualquer orçamento suplementar que, de qualquer forma, pudesse atrasar a caminhada que o País, seguramente, tem vindo a fazer. Foram essas, aliás, as profecias de alguns sectores da oposição que julgavam não ser possível evitar a apresentação de uma rectificação ao presente Orçamento do Estado que apontasse, inevitavelmente, para um aumento considerável da despesa e do défice público.
Enganaram-se os que assim pensaram e é com agrado que constatamos que a proposta de ajustamento orçamental, que hoje está a apreciar-se, em nada altera os principais parâmetros da lei que, em 9 de Março último, colheu a aprovação maioritária desta Câmara.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Se assim fosse, não estávamos aqui!

O Orador: - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O défice público previsto para 1992 surge, pois, inalterado face à proposta de ajustamento que o Governo apresenta. Porém, essa manutenção do défice orçamental não se deve a qualquer variação similar das receitas e despesas do Estado, mas sim à sua manutenção nos níveis inicialmente previstos.
Com efeito, não há qualquer alteração no total da despesa, nem da receita. As alterações propostas situam-se apenas no campo da composição da despesa e advêm do tacto de se pretender canalizar poupanças feitas em alguns ministérios para outros cujos orçamentos necessitam de reforço.
São alterações que implicam, no entanto, transferências de verbas entre diferentes capítulos e diferentes ministérios, pelo que. nos (ermos do n.º 2 do artigo 20.º da Lei n.º 6/91 de 20 de Fevereiro (Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado), toma-se necessária a sua aprovação por esta Assembleia da República.
As poupanças referenciadas situam-se, essencialmente, no capitulo 60 do Ministério das Finanças, ou seja no capitulo de despesas excepcionais e através da aplicação cláusula de reserva de convergência prevista no artigo

Página 716

716 I SÉRIE - NÚMERO 20

da Lei do Orçamento do Estado para 1992. Enquanto no primeiro caso conseguem obter-se 10 milhões de contos, no segundo, a verba é de 12,4 milhões de contos, isto é, exactamente os 4 % da verba total do PIDDAC. Há ainda uma utilização da dotação provisional que. por si só, não necessitava sequer de ser submetida à votação deste Plenário.
O Governo pretende canalizar as aplicações destes montantes para os Ministérios da Saúde, dos Negócios Estrangeiros e da Defesa Nacional e para a Caixa Geral de Aposentações.
A necessidade de reforço prende-se, essencialmente, com acréscimos de despesa motivados por aumentos salariais, no caso do Serviço Nacional de Saúde, com a presidência comunitária portuguesa, no caso do Ministério dos Negócios Estrangeiras, e com a operação em Angola, no que concerne ao Ministério da Defesa Nacional.
São, ainda, propostas, no âmbito de alguns ministérios, algumas transferências internas entre diferentes capítulos.
Tal como já referi, a presente proposta de lei em nada altera o fundamental da política orçamental definida para o presente ano, pelo que, desta forma, assegura a continuidade do caminho que escolhemos e que também está presente no Orçamento do Estado para 1993 já aqui aprovado na generalidade.
Não há assim, qualquer agravamento do défice ou da dívida pública. Registamos, ainda, com agrado, que a inflação tem continuado a abrandar e que o crescimento da economia portuguesa se tem situado acima da média de crescimento das restantes economias comunitárias. Tudo isto num cenário internacional que está bem longe de ser favorável a Portugal.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: - É, pois, com tranquilidade que o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata irá votar favoravelmente a proposta de lei n.º 41/VI ciente de que deste modo, dá o seu contributo para uma gestão orçamental rigorosa, que, naturalmente, pretende afectar da forma mais eficiente todos os recursos disponíveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos. Peco-lhe que use um estilo rigorosamente telegráfico, pois tem cerca de meio minuto.

O Sr. Manual dos Santos (PS): - Sr. Presidente, vou de facto, usar um estilo rigorosamente telegráfico, que aliás, está facilitado pela parte final da intervenção do Sr. Deputado Rui Rio.
Na sua intervenção, o Sr. Deputado disse que a proposta do Governo em nada alterava a Lei n.º 2/92. A pergunta que lhe faço é muito simples: o que estamos, então, aqui a fazer? É que se há realmente uma proposta de lei de orçamento rectificativo, apresentada pelo Governo, para ser discutida nesta Assembleia, é óbvio que ela a altera.
Se me permite utilizar mais alguns segundos, Sr. Presidente, diria ainda que um Orçamento do Estado não é apenas um conjunto de despesas e receitas mas também de opções e essas são significativamente alteradas com a proposta de lei n.º 41/VI.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, obviamente que aquilo que estamos aqui a fazer são alterações ao Orçamento do Estado para 1992.
No entanto, o que eu disse foi que se trata de pequenas alterações e de pequenos montantes, ou seja, no fundamental, tudo se mantém relativamente aos critérios de convergência com a Comunidade, as alterações que aqui introduzirmos hoje em nada mudam os valores fundamentais da política orçamental do Governo.

O Sr. Presidente: - Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, vou fazer uma breve interpelação à Mesa e não vou falar da substância do problema, dado que as intervenções da Sr.ª Secretária de Estado e dos Srs. Deputados do PSD já demonstraram que esta proposta não é mais do que a afirmação daquilo que caracteriza o rigor orçamental habitual dos governos do PSD.
Em todo o caso, o rigor orçamental também pode ter como contrapartida, na Assembleia, o rigor na palavra e na exposição dos argumentos parlamentares.
Ora, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues afirmou que esta proposta de lei tinha entrado somente no dia 9 e indiciou também que o Governo teria feito questão em propor que este debate se realizasse hoje, não dando tempo a que os partidos abordassem de uma forma aprofundada a proposta de lei em causa, o que não é rigorosamente verdade.
A proposta de lei n.º 41/VI não deu entrada na quarta-feira e não foi certamente por culpa do Governo que ela chegou à Comissão de Economia. Finanças e Plano somente na quarta-feira. Por fim, quando o Governo propôs este, agendamento na Conferência dos Representantes do» Grupos Parlamentares demonstrou toda a abertura para que ele se realizasse, eventualmente, em qualquer dia da próxima semana, ajustando-o com a necessidade de o fazer coincidir de uma forma politicamente correcta com a discussão e votação final global do Orçamento do Estado para 1993.
Assim, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues não foi rigoroso, pelo que eu tinha de fazer esta correcção.

O Sr. Presidente: - Também para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, a minha intervenção foi rigorosa. O que disse, e mantenho, foi que, aquando da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares não unha dado entrada na Comissão de Economia. Finanças e Plano a proposta de alteração do Orçamento do Estado para 1992 e portanto, ela não era, evidentemente, do nosso conhecimento.
Em consequência, há aqui todo um processo apressado, que torna bastante mais difícil a realização deste debate em boas condições para a Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Presidente, vou fazer interpelação referente ao Sr. Secretária de Estado

Página 717

12 DE DEZEMBRO DE 1992 717

do» Assuntos Parlamentares falou em rigor e, naquilo que disse, até pode ter envolvido a Assembleia da República, certamente por lapso.
O Sr. Secretário de Estado disse que a proposta de lei não teria dado entrada na quarta-feira, mas antes. Ora. rigor por rigor, Sr. Secretário de Estado, devo dizer que o carimbo de entrada na Assembleia da República, subscrito pelo Sr. Presidente, é de 9 de Dezembro, quarta-feira, dia ern que se realizou a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra. A Mesa é que tem estado a ser interpelada, pelo que espero que não estejam a responder uns aos outro».
Em todo o caso, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é só para dizer que tenho muito gosto em pedir aos serviços que façam uma fotocópia do protocolo do meu gabinete para o gabinete do Presidente da Assembleia da República, que demonstra não fazer qualquer sentido aquilo que o Sr. Deputado Lino de Carvalho afirmou.
O documento a que o Sr. Deputado Lino de Carvalho está a referir-se é o despacho de V. Ex.ª que remete a proposta de lei para a Comissão de Economia, Finanças e Plano. Mas isso, obviamente, não é da responsabilidade do Governo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, a Mesa não tem aqui o protocolo e, portanto, pode apenas testemunhar que esta proposta de lei foi admitida e anunciada por mim no dia 9 de Dezembro. E o que consta do registo.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - E agora?

O Orador: - Não tenho elementos do protocolo mas, em todo o caso, verifico que deu entrada na Assembleia da República, no meu gabinete, no dia 7 de Dezembro de 1992, foi despachada para a Divisão de Apoio a Plenário nesse mesmo dia e eu admiti-a no dia 9. Eis o que se pode concluir.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, na qualidade de presidente da Comissão de Economia. Finanças e Plano, gostaria também de dar o meu testemunho sobre esta matéria.
Ern minha opinião, este incidente tem um significado político relativamente limitado, a não ser que seja visto pelo lado positivo. Com efeito, está a fazer-se, neste momento, na Comissão de Economia. Finanças e Plano e por parte de todos os partidos, um grande esforço de consenso em matérias que, independentemente da divisão política que, salutarmente, nos opõe, são de interesse geral.
Se fossemos falar em todos os aspectos verdadeiramente processuais, teríamos de aceitar e compreender que todo este processo estava, à partida, inquinado, na medida em que. face à Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado e independentemente dos datas que V. Ex.ª registou, esta discussão; manifestamente, não poderia ser feita hoje, porque estaria sujeita às regra» gerais da discussão do Orçamento, face ao artigo 20.º da referida lei.
Portanto, o que queria registar é que, efectivamente, se verificou um significativo consenso entre as diversas forcas políticas representadas na Comissão de Economia, Finanças e Plano, o que é um aspecto positivo a ser também relevado e assinalado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria apenas de acrescentar uma pequena nota. De facto, esse consenso também se verificou na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, pelo que a Assembleia está a funcionar regularmente ao apreciar, hoje, esta matéria.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como já foi hoje, aqui, largamente afumado, depois de muito negado pelo Governo e, em particular, pelo Sr. Ministro das Finanças, as alterações ao Orçamento do Estado para 1992 aqui estuo, dando razão à oposição, e, designadamente, ao PCP.
Teria sido mais sério que, em tempo útil, o Sr. Ministro das Finanças tivesse reconhecido, sem qualquer dramatismo, aliás, desnecessário, a necessidade deste orçamento rectificativo e que, ainda antes do debate do Orçamento do Estado para 1993, tivéssemos tido a oportunidade de apreciar o que desde há muito era dado como inevitável.
Evitar-se-ia assim que a análise deste orçamento possa dar origem a interpretações que só se justificam face a este segredo que o Sr. Ministro das Finanças foi mantendo, quando era inevitável que ele seria aqui apresentado, como acabou por ser. Como há pouco se disse, se o orçamento é de mera rotina - como, aliás, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares invoca, e algumas dás questões são-no de facto -, então, mais uma razão para não se justificarem esses malabarismos de linguagem que o Sr. Ministro das Finanças foi usando. Mas ele teria, porventura, alguma razão para ir procurando adiar a discussão do orçamento e faze-lo passar com a maior discrição possível.
É que, desnudando as verbas que nos são propostas, verifica-se que muitas das alterações não são mera operaçao de rotina e tem um significado político mais sério e mais profundo. De facto, o Governo procura manter, como disse o Sr. Deputado Rui Rio há pouco, a despesa pública e o défice abaixo da «linha da água» - e só no final do ano, com a execução orçamental, é que vamos determinar isso com exactidão -, mas procura fazê-lo como já temos afumado, à custa da economia real, à custa do País, poupando nas funções sociais do Estado, poupando em sectores vitais para a vida e o futuro dos Portugueses e do País e para a nossa própria afirmação do mundo e poupando, ern particular, e sobretudo, à custa do prolongamento inaceitável da situação de múltiplas dívidas dos ministérios a vários fornecedores do Estado.
O Governo poupa na educação, na saúde, na agricultura e nas relações de cooperaçâo com os PALOP, questão em relação à qual aliás, a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento não chegou a responder. Esperemos que ainda responda!
No sector da educação reduz as despesas com o investimento e particularmente, as despesas com o estabe-

Página 718

718 I SÉRIE-NÚMERO 28

lecimentos de ensino não superior, quando se sabe que muitas e muitas escolas, por exemplo, estão a braços com enormes constrangimentos nos seus orçamentos, que em muitos casos não lhes dá para pagar as despesas correntes, ou com a falta de pessoal administrativo e auxiliar, que as coloca numa situação de ruptura, por muito que o Sr. Ministro da Educação diga que assim não é. É uma verdade que tal situação provoca dificuldades e degradação na qualidade da função educativa.
Por outro lado, o Governo vem reforçar com 2,6 milhões de contos a verba para os estabelecimentos de ensino superior, o que confirma plenamente os alertas e as críticas que lançámos no momento do debate do Orçamento do Estado para 1992, em Fevereiro passado, quando dissemos, e volto a repetir agora, que, «no tocante ao ensino superior a proposta orçamental não perspectiva uma alteração sensível nas condições de desequilíbrio financeiro do ensino superior público».
O Governo e o PSD disseram, contra todas as evidências, que não, que o Orçamento era suficiente, criando durante o ano desnecessárias rupturas financeiras e tensões sociais com as universidades e em particular, com o Conselho de Reitores, para agora, afinal, darem o dito por não dito.
Neste capítulo, aliás, o Governo, em todos os Orçamentos, tem seguido uma prática condenável, que é a de, sistematicamente, cortar nas dotações orçamentais inicialmente previstas para o ensino superior público, criar situações de confronto durante o ano e depois acabar por rectificar, tarde e a más horas, o que, desde o início, deveria ter sido rectificado.
Como se pode acreditar, de uma vez por todas, no rigor que, com tanta pompa e circunstância, o Governo propagandeia permanentemente.
No sector da saúde, o reforço de 27 milhões de contos para o Serviço Nacional de Saúde confirma a situação permanente de dívidas e de ruptura financeira em que «navega» o Ministério e, pelo que conhecemos, esta verba está longe também de satisfazer o elevado volume de dividas a fornecedores, as convenções e aos bombeiros, que. considerando os prazos de pagamentos já vencidos, ascende seguramente a mais de 70 milhões de contos.
Nesta linha inaceitável, o Governo reduz em 2,5 milhões de contos as verbas para a cooperação com os PALOP, a que há a somar mais 1,2 milhões de contos do seguro de crédito, que é essencial para a garantia das operações que muitas empresas, designadamente pequenas e médias empresas, desenvolvem com esses mesmos países.
Enquanto a Espanha ou a França apoiam largamente a expansão das suas empresas naqueles países. Portugal, que tem todas as condições e necessidades para o fazer com vantagens, naturalmente num quadro de cooperação e respeito para com o desenvolvimento próprio e independente daqueles países, corta no apoio as suas empresas.
Igualmente não se compreende a redução de 2,5 milhões de contos ao INGA, como já foi aqui dito, quando se sabe que este Instituto atrasa sistematicamente o pagamento dos subsídios aos agricultores porque a sua enorme máquina burocrática está longe de responder as necessidades das novas formas de funcionamento em que a agricultura está submergida.
Não se compreende também a redução de quase 1 milhão de contos no seguro de colheitas, exactamente num ano em que a seca provocou prejuízos e perdas enormes em searas a milhares de pequenos produtores.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este orçamento rectificativo, pelas áreas em que incidem as alterações, vem confirmar não só a ausência de rigor na previsão de despesas, que, aliás, já estavam claramente determinadas aquando da elaboração normal do Orçamento, como a teimosia irresponsável do Governo em definir inicialmente dotações muito abaixo do previsível, criando, como dissemos, desnecessárias situações de tensão e de ruptura e ainda, e sobretudo, poupando à custa dos Portugueses de menores recursos, à semelhança do que pretende fazer para 1993, em que quer «poupar» à custa, entre outros, das autarquias locais, suspendendo ilegitimamente a aplicação da Lei das Finanças Locais e levando milhares de eleitos por todo o País, de todas as forças políticas, a convergiram, como estão a fazer hoje, numa significativa acção de protesto, que aproveitamos para aqui sublinhar, realçar e aplaudir.
Por isto tudo, é evidente que este orçamento, pelas condições em que nos é apresentado e pelo significado político das alterações propostas, merece ser rejeitado, e o nosso voto contribuirá para esse efeito.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro Almeida.

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, antes de mais. gostaria de referir que o Sr. Ministro das Finanças nunca negou que viesse a ser apresentado à Assembleia da República um orçamento rectificativo ao Orçamento do Estado para 1992. O que o Sr. Ministro disse, na altura que entendeu própria - e eu nunca o ouvi negar esse facto quer em
Plenário quer na Comissão -, foi que a gestão orçamental de 1992 estava a correr bem. Aliás, até costuma mesmo dizer «Está a correr bem, muito obrigado!» Portanto, trata-se de questões distintas e o orçamento rectificativo nunca foi negado.
Assim, e tal como já fez o meu colega Deputado Rui Carp, o que julgo dever assinalar, nesta circunstância, é o tacto do rigor que é posto na execução orçamental, neste ano, de tal forma que logo no final de Novembro, quando foram apurados os subsídios de Natal a pagar aos funcionárias públicos - como a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento nos explicou -, rigorosamente três dias depois, o Governo estava a apurar definitivamente os acertos finais a fazer no Orçamento do Estado para 1992 para imediatamente, os enviar à Assembleia da República.
Apraz-me também registar, como o Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano referiu, o consenso que se verificou nos partidos para que pudéssemos discutir, em tempo útil, este orçamento, à revelia dos procedimentos regimentais que a oposição poderia invocar e não o fez.
Gostaria, assim, de obter um comentário de V. Ex.ª relativamente ao seguinte: estas alterações, que hoje discutimos, envolvem - e o Sr Deputado já tez contas, com certeza - transferências de dotações de uns ministérios para outros, sem alterar o valor global da receita ou da despesa orçamentada, e são da ordem de 1% ao valor total orçamentado para 1992. É bom que fique claro e que se saiba que o que estamos aqui a discutir é uma alteração que não chega a atingir 1 % do valor orçamentado para 1992.

Página 719

12 DE DEZEMBRO DE 1992 719

Assim, pergunto ao Sr. Deputado se considera ou não que é uma boa perfomance para qualquer empresa e para qualquer serviço e muito mais para o Estado, que tem uma máquina deveras mais complicada, chegar ao fim do ano e fazer alterações que envolvem cerca de 1 % do montante global orçamentado. E pergunto-lhe ainda se não consideraria excelente qualquer gestor de uma empresa pública ou privada que, no final do ano tivesse de fazer alterações de 1 %, que é, de facto, aquilo que estamos a discutir. Pergunto-lhe mesmo se o senhor consegue chegar ao final do ano e ter gasto rigorosamente o que tinha inicialmente previsto no seu orçamento familiar.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Não consegue, porque paga mais impostos!

O Orador: - Eu não sei mesmo se consegue fazer essa performance no final de cada mês, quanto mais no final de cada ano!...
Sr. Deputado, sejamos claros: quando um Estado consegue chegar ao final do ano e ter alterações de 1 %, temos de convir que se trata de uma previsão rigorosa que não envergonha qualquer bom gestor.
Nestas circunstâncias, quando o Estado consegue poupar e transferir verbas de uns sectores para os outros, onde se revelam mais necessárias, nó posso dizer venham mais orçamentos rectificativos nos próximos anos, pois estaremos sempre de acordo em que se afectem recursos aos sectores que se revelem mais necessitados, face as opções actualizadas ao longo do ano e que vão tendo em conta os incidentes de percurso que surgem.
Desejamos, portanto, que o Governo consiga fazer uma gestão permanente, porque estão orçamental não é apresentar o Orçamento em Novembro de cada ano é executá-lo ao longo de todo o ano. E o que verificamos é que o Governo o fez com aceno de previsões e com rigor na execução.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Castro Almeida V. Ex.ª fez duas afirmações iniciais e colocou-me uma questão.
Quanto à primeira afirmação que o Sr. Ministro das Finanças nunca teria negado a eventual entrega à Assembleia do orçamento rectificativo, quero lembrar ao Sr. Deputado que, nesta Casa exactamente no dia em que já tinha sido aprovado em Conselho de Ministros as alterações ao Orçamento, o Sr. Ministro das Finanças continuou a afirmar desconhecer a necessidade da apresentação de um orçamento rectificativo à Assembleia.
É evidente que isso foi aqui dito várias vezes com a tal linguagem cifrada que o Sr. Ministro das Finanças aqui sempre procura trazer. Mas a questão que está por detrás de tudo isto, ou seja esta linguagem cifrada ou de meias palavras utilizada para negar a evidência de coisas que no próprio dia estavam a ser aprovadas, tem um significado e a verdade é que o Governo procurou, como disse o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, desdramatizar e retirar significado político às alterações, procurando convencer-nos a todo de que aquelas que porventura, viessem algum dia a existir seriam meras operações de ronda e não teriam qualquer leitura política.
Ora, é evidente que assim não é, como disseram e sublinharam, em relação a algumas áreas, todas as bancadas da oposição que até agora intervieram e eu próprio. Não é exactamente assim!
O Sr. Deputado afirma que só 1 % do valor total do orçamento é que está em causa; é uma questão que veremos com a execução orçamental do final do ano. Mas, mais do que isso, o problema não é ser 1 % ou 2 %, t saber a qualidade e o significado político dessas alterações.
Portanto, quando o Sr. Deputado diz que tudo está a correr bem, que as alterações são mínimas, pergunto: pensa que, mesmo sendo mínimas - para utilizar a linguagem do Sr. Deputado -, se poderá dizer que tudo está a correr bem quando o que está em causa são milhões de contos de dívidas que se arrastam ao longo de meses, dos ministérios a fornecedores? Estará tudo a correr bem quando, como é o caso do Ministério da Saúde, se procura a redução das despesas e do défice à custa dos fornecedores, das convenções e dos bombeiros, passando o pagamento para data muito posterior à de vencimento, arrastando-o meses e meses e criando-lhes dificuldades acrescidas?
Esta é, em sua opinião, uma execução boa, quando se está a poupar e a reduzir despesas em áreas como a dos estabelecimentos de ensino não superior, com todas as dificuldades que as escolas já têm? Isto é, em sua opinião, uma execução boa é a que cria durante o ano, situações desnecessárias, como eu já disse e que não contestou, de tensão e de ruptura com as universidades e com os conselhos de reitores para, no final do ano, vir propor verbas que, desde o princípio, já se sabia que viriam a ser necessárias?
Sr. Deputado, nem isto me parece ser uma boa execução, um bom rigor, nem o caso do processo, que conduziu ao debate do orçamento da Assembleia da República me parece ser de bom respeito por esta Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não acompanhamos alguma carga política negava com que os outros partidos da oposição rodeiam a rectificação do Orçamento, pelo contrário, pensamos que o extraordinário num sistema como o nosso é o facto de já não haver mais rectificações do Orçamento. Portanto, não ligamos a essa carga política negativa, tratando-se de uma rectificação pura e simples e não de um orçamento.
No entanto, já lamentamos uma questão de procedimento que tem a ver com o facto de não podermos falar sobre as transferências, de não podermos julgá-las, por não termos elementos, e pelo que vejo, embora não tenha sido comigo, existiu um acordo no sentido de se suprimirem os procedimentos normais previstos na lei de enquadramento. Não vou censurar nem o Governo nem o partido da maioria por isso, pois o acordo já se fez, mas com esta atitude não é possível saber o que se deixa de fazer com estas transferências de verbas.
Deste modo, não tenho elementos para saber qual ou quais os projectos que deixam de ser realizados, que tipo de serviços é que deixam de ser financiados, segundo as suas expectativas, e, portanto, limito-me a perceber que a rectificação do Orçamento do Estado é uma escolha do Governo em termos de gestão, que não merece cerca

Página 720

720 I SÉRIE - NÚMERO

negativa alarmista embora existam dúvidas, de facto, sobre os caminhos da execução. Porém, a própria rectificação não merece algum alarme por parte do CDS.
De qualquer modo, gostaria de dizer que também não merece o elogio que o Sr. Deputado Rui Carp aqui pedia, com certeza com ironia, porque se, por um lado, o Governo não agrava o défice, por outro, também não faz muitas outras «malandrices» de que se poderia lembrar, algumas até puníveis. Neste sentido, sem alarme, não criticamos mas também não vemos motivo para elogiar um comportamento normal.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não percebi essa!

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Pará uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado adjunta e do Orçamento.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por confirmar que, tanto quanto me apercebo, as condições acústicas das bancadas dos Srs. Deputados são boas e as Já bancada do Governo não são piores. Ora, precisamente por as condições acústicas serem aqui, na bancada do Governo, tão boas, chego a pensar que me encontro num sitio diferente daquele ern que estou ou que houve alguma troca de discursos neste debate, isto é. que se fizeram aqui discursos que deveriam ser feitos noutro local que não aqui.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Digo isto porque houve intervenções ou pelo menos, uma intervenção de tal forma acalorada em termos de política que me pareceu estar-se a discutir a aprovação do Orçamento, ele próprio, e não uma pequena alteração no final do ano, que corresponde a uma execução, que se verifica não ter sido feita e que realmente, não tem sentido neste momento nem nesta sede.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ouvi também várias afirmações, um pouco díspares.
Ouvi um Sr. Deputado dizer que se estava a poupar à custa da afirmação de Portugal no mundo e um outro a criticar o excesso de despesa com a presidência portuguesa das Comunidades Europeias.
Ora, são duas afirmações que mio me parecem ser equilibradas e portanto ajustadas uma à outra. Todas as alterações que existem foram, de alguma forma, imprevisíveis, muito especialmente no caso da presidência portuguesa das Comunidades Europeias, no do Ministério Já Defesa Nacional, que teve a ver com o processo de paz em Angola e na Jugoslávia, e ainda no da Caixa Geral de Aposentações, que teve, evidentemente, uma despesa superior que era esperada - alias, já ontem, em omissão, expliquei os motivos desse aumento de despesa.
Mas. Srs. Deputados, não quero deixar de salientar, mais uma vez que o que neste momento justifica este pedido de alteração à Assembleia da República, que se traduz no orçamento rectificativo, não é a alteração em termos de Caixa Geral de Aposentações, porque esta era verdadeiramente superável por via da dotação provisional.
Mais uma vez retiro que em termos nominais, a maior parte das alterações aqui contempladas têm a ver com a anulação feita na dotação provisional, ou seja, é uma tentativa de mostrar ao Parlamento a distribuição da dotação provisional pelas restantes verba», o que significa que não é correcto o aspecto político que se pretende dar a esta alteração do Orçamento, considerando, nomeadamente, que ela seria verdadeiramente inevitável. Porque se os Srs. Deputados fizerem uma análise atenta não poderão dizer que esta era uma alteração inevitável, ela era verdadeiramente evitável. Não era necessária! É, simplesmente, muito útil e, nesse aspecto, entendemos que a devíamos fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ao longo de todo o debate do Orçamento do Estado para 1993 houve um ponto, que não deixei de ouvir, abordado pelos Srs. Deputados da oposição, que corresponde a uma expectativa, praticamente certa, de que um sector extremamente carente era o do Ministério da Educação. No entanto, não ouvi qualquer referência ao tacto de este Ministério se apresentar com uma execução e uma gestão orçamental que considero verdadeiramente notável e que em minha opinião, deveria ser salientado nesta sede.
Finalmente, gostaria de dizer aos Srs. Deputados que não me parece justo, sendo verdadeiramente desapropriado, que se fale em ausência de rigor naquilo que está aqui em causa e, da mesma forma, não deixarei de salientar o que considero ter sido uma colaboração digna, muito útil e que registo com todo o prazer, a que foi dada por todos os grupos parlamentares à alteração que se considerou útil fazer neste orçamento e que muito contribui para uma boa execução orçamental.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, simultaneamente, da proposta de lei n.º 41/VI - Altera a Lei n.º 2/92, de 9 de Março (Orçamento do Estado para 1992).
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PSN, votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Srs. Deputados, vamos agora entrar na apreciação do parecer, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao recurso, interposto pelo PCP, de comissão pelo Sr. Presidente do projecto de lei n.º 225/VI - Lei Eleitoral porá a Assembleia da República (PSD).
Srs. Deputados, uma vez que o parecer da Comissão que vamos apreciar e votar foi distribuído, vamos considerá-lo lido.

Pará uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Pareceu-me existir a pressuposição de que o parecer tivesse sido lido e a ser assim, devo dizer que vou ter alguma dificuldade porque me reporto a um parecer que não foi dado a conhecer nos termos regimentais, mas vou tentar.

Sr. Presidente. Srs. Deputados: Sustentamos a inconstitucionalidade do projecto de lei n.º 225/VI do PSD.

Página 721

12 DE DEZEMBRO DE 1992 721

relativo a Lei Eleitoral para a Assembleia da República, porque entendemos que efectivamente viola o principio da representação proporcional, tal como está consagrado na Constituição, e introduz, na prática, uma cláusula-barreira que a Constituição também, explicitamente, não permite.
A violação da representação proporcional mostra-se, como muito bem assinala, aliás, o parecer, analisando o projecto de lei em concreto, com os números que ele contém. E creio que é com números, a meu ver claros, que se vê efectivamente se o princípio da representação proporcional é ou não violado.
Ora, a aplicação deste projecto de lei levaria, por exemplo, o CDS a descer de cinco para dois Deputados, o PSN a desaparecer, pura e simplesmente e o grande beneficiário destas operações, reportando-me, claro, aos resultados eleitorais das últimas eleições, seria o PSD.
Creio que deste modo a distorção do universo eleitoral é clara, tanto mais que o princípio da representação proporcional não se aplica por razoes abstractas. Isto é, este princípio existe para realizar um certo fim, que é o de o orgão, no caso concreto a Assembleia da República, ter uma correspondência na vontade real expressa pelos eleitores. Esta forma de fazer desaparecer um partido com 2 % ou de reduzir a dois Deputados um partido com pouco mais de 4 % revela, de uma maneira clara, que se quer distorcer a vontade do eleitorado.
Aliás, há um estudo feito pelo Governo, já divulgado, que refere que com este diploma o PSD conseguiria maiorias absolutas, bastando para isso obter um resultado à volta dos 41 %. Isto é, o PSD garantiria uma maioria absoluta com quase menos cerca de í) % do que o resultado obtido nas últimas eleições,...

O Sr. Silva Marques (PSD): - O PSD ou qualquer outro! Assuma!

O Orador: -... pois bastaria ter mais votos que qualquer outra formação política.
Ora, é este o objectivo que norteia claramente, como sabe e acabou de sublinhar o Sr. Deputado Silva Marques, este projecto de lei e que o marca inconstitucionalmente, porque é uma distorção da vontade real do eleitorado. Ou seja, o que se procura é que esta Assembleia não corresponda, na sua composição, à vontade real do eleitorado.
Esta é uma técnica que se consegue, como é sabido, pela proliferação de círculos, pela divisão dos círculos de Aveiro, de Lisboa, do Porto, de Setúbal e de Braga em outros mais pequenos, de forma totalmente arbitrária, o que também viola o princípio da proporcionalidade.
Na tradição histórica a divisão arbitraria sempre foi usada para conseguir artificialmente a obtenção de maiorias. Há exemplos históricos muito conhecidos - não vale a pena citá-los aqui - que mostram claramente como, com menos votos, foi possível conseguir maiorias absolutas.
Quanto à cláusula-barreira ela ressalta evidente dos números apontados. Em nenhum dos círculos locais é possível eleger Deputados com menos de 5 % dos votos. Por sua vez, no círculo nacional, tal como está configurado no projecto de lei do PSD, são necessários, para conseguir eleger um Deputado, pelo menos 3 %, sendo de referir que à cláusula-barreira em Espanha se situa também em 3 %. Isto significa a instituição de uma cláusula-barreira que a nossa lei fundamental não repete.
No que respeita ao parecer da comissão competente nesta matéria, não se esperaria outra coisa. Sendo ele feito por um Sr. Deputado da própria bancada que apresenta o projecto, haveria de reconhecer, naturalmente, que o mesmo projecto não deve ser inviabilizado, embora não o faça com muito calor. Não me compete, porém, estar a apreciar o estilo dos relatórios...
O que muito concretamente pergunto ao Partido Socialista é o que significa o seu posicionamento ou, pelo menos, a posição que assumiu no âmbito da Comissão. Considera o PS que, neste caso, a referida distorção da representação proporcional é desejável, aceitável? O que está o Partido Socialista a preparar, muito em concreto, sobre esta matéria?
Não posso esquecer que, no debate sobre leis eleitorais aqui travado, a bancada do PSD entendeu a marcação do projecto de lei eleitoral feita pelo PS como um sinal de encorajamento. O que pergunto ao Partido Socialista é se isto constitui outro sinal de encorajamento para o PSD prosseguir esta via da revisão antidemocrática das leis eleitorais, que é aquilo ern que consiste o essencial das propostas apresentadas pelo PSD.

Aplausos elo PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero proferir algumas breves palavras para explicar as razoes por que consideramos que a proposta apresentada pelo PSD não é inconstitucional.
O Sr. Deputado João Amaral, nas suas explanações, foi, aliás, muito claro quanto às razoes pelas quais está contra o projecto do PSD. Está contra por razões políticas, que compreendemos. Só que uma coisa são as questões políticas e outra as constitucionais.
É evidente que o próprio princípio de Hondt, que a Constituição explicita, nunca é aplicado de uma forma matematicamente rigorosa. Nem o poderia ser, porque, se assim fosse, teríamos de encontrar, para um partido que obtivesse 200 ou 300 votos, algum tipo de representação na Assembleia da República.

O Sr. João Amaral (PCP): - Essa é uma argumentação pelo absurdo!

O Orador: - O essencial é encontrar uma fórmula quê corresponda à ideia de que não estamos dentro de um princípio maioritário. A meu ver, a fórmula do princípio proporcional pode, dependendo do tipo de votações, aproximar-se mais ou menos do tipo ideal da proporcionalidade pura.
No que respeita ao projecto apresentado pelo PSD, que aliás se limita a desenvolver, evidentemente em termos políticos, as possibilidades oferecidas pela revisão constitucional de 1089 parece-me absolutamente claro não estarmos face a um problema de inconstitucionalidade. Poderemos estar é perante visões opostas - e compreendo-as - acerca da melhor maneira de produzir uma lei eleitoral, matéria sobre a qual cada partido reflectirá, naturalmente, as sensibilidades e os interesses nas suas expectativas políticas. Mas - repito - uma coisa é a discussão do mérito do projecto em função dos interesses políticos de cada partido e outra a de saber se estamos perante uma violação da Constituição.

Página 722

722 I SÉRIE - NÚMERO 20

A própria argumentação do Partido Comunista, no seu recurso, é reveladora de que o Partido Comunista absolutiza os resultados eleitorais obtidos na última consulta popular. É evidente que OH resultado* poderão ser completamento diferente se, porventura, como está tilo preocupado, o CDS subir em termos de eleitorado.
Em resumo, penso que estamos a discutir a questão da constitucionalidade do diploma Esta questão refere-se à refracção de um princípio e não a um mero juízo de subsunção e o Sr. Deputado João Amarai conhece as diferenças entre os conceitos de norma e de princípio. Esta Assembleia é uma câmara política e não um tribunal e penso que o projecto em apreço se insere perfeitamente no quadro admitido pela Constituição.
Em consequência, não deveremos transmutar este debate sobre a constitucionalidade para um debate sobre o mérito dos diplomas. A seu tempo, quando discutirmos essa matéria, entraremos na análise pormenorizada da argumentação aqui expendida pelo Sr. Deputado João Amaral.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O Partido Socialista dissocia-se da argumentação produzida pelo Partido Comunista, mas isso não significa que proceda aqui a uma operação de branqueamento político desta iniciativa legislativa do PSD.
Não nos associamos à argumentação do Partido Comunista por nos parecer de duvidosa fundamentação e duvidoso acolhimento constitucional. Desde logo em relação à cláusula-barreira, não nos parece que se possa retirar do presente diploma que por exemplo, um Deputado eleito por Beja possa deixar de o ser em virtude de o Partido Comunista, por hipótese, não atingir determinada percentagem mínima de votos ao nível nacional. O sentido útil da norma constitucional é exactamente o de não inviabilizar mandatos por virtude de uma exigência ao nível de um número mínimo de votos no plano nacional.
Em relação ao princípio da proporcionalidade, é evidente que. tratando-se de um princípio, há diversas formas de concretização legislativa, umas mais e outras menos correctas do ponto de vista político. É, no entanto, muito difícil, sobretudo jogando com a situação de partidos menores, alegar a violação desse princípio como argumento para retirar da discussão política uma proposta de revisão da lei constitucional:
Não pode dizer-se, como é evidénte, que um sistema deixa de ser proporciona) por determinado partido com a mudança da lei eleitoral, passar de zero para um ou dois representantes ou de dois ou um para zero representantes. Não é nessa franja do sistema eleitoral que se pode medir o grau de proporcionalidade do sistema político.
Pronunciamo-nos com a segurança de que o nosso voto é necessário a que a solução política e legislativa seja elaborada nesta matéria. Ao nos dissociarmos desta argumentação constitucional, reservamo-nos para defrontar politicamente esta iniciativa legislativa do PSD. É que ela não tem qualquer dos méritos que se propõe, não realiza qualquer melhoria significativa, como se apregoa, no domínio da ligação entre eleitores e eleitos. Desvincula-se dessa base objectiva que são os distritos para rumar em direcção a critérios contingentes e aleatórios que não tem o mesmo grau de consistência e objectividade que o distritos possuem. Ao reduzir a dimensão dos círculo ao conceber o círculo nacional como o concebe, reduz proporcionalidade do sistema, sendo que o actual grau de proporcionalidade desse sistema tem constituído um importante factor de legitimidade politica. Finalmente, ao tornar mais alto o preço de entrada no sistema político, pode criar problemas de legitimação que até ao momento não têm existido com o grau de proporcionalidade que o sistema tem.
Concluo dizendo que não queremos atribuir a este diploma duvidosos defeitos constitucionais, de forma a ficarmos à vontade para lhe atribuir todos os seus reais defeitos políticos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate.

Vamos, pois, proceder de imediato à votação do parecer elaborado pela Comissão competente sobre o recurso interposto pelo PCP da decisão de admissão do projecto de lei n.º 225/VI - Lei Eleitoral para a Assembleia da República (PSD), o qual conclui pela rejeição do mencionado recurso.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS.D e do PS, votos contra do PCP, de Os Verdes t do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.

O Sr. Gameiro do» Santos (PS): - Peço a palavra. Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou na Mesa, há pouco tempo, um voto de saudação aos autarcas portugueses, cuja delegação do seu conselho directivo está hoje na Assembleia da República a protestar, muito justamente, pela forma como este governo tem aplicado a Lei das Finanças Locais, ao ponto de lhes retirar, em dois ano» consecutivos, mais de 60 milhões de contos.

Protestos do PSD.

Pergunto ao Sr. Presidente se o aludido voto de saudação aos autarcas portugueses já foi distribuído pelos grupo» parlamentares e se há possibilidade de obter consenso junto destes no sentido de proceder à votação daquele ainda hoje.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr. Deputado, o voto que mencionou deu entrada na Mesa às 12 horas e 15 minutos e foi distribuído logo a seguir.
Quanto ao consenso, a Mesa aguardará que os grupo» parlamentares lho transmitam na altura em que ele existir, se isso vier a acontecer.
Passamos ao último ponto da ordem de trabalhos, que consiste na apreciação e votação do parecer elaborado pela comissão competente sobre o, recurso interposto pelo Partido Comunista Português e pelo Partido Socialista da decisão do Sr. Presidente de admitir o projecto de lei n.º 227/VI - Lei Eleitoral para as Autarquias Locais (PSD).
Para apresentar os motivos do referido recurso, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

Página 723

12 DE DEZEMBRO de 1992 723

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No recurso que interpusemos da admissão do projecto de lei em apreço apontámos duas ordens de inconstitucionalidades.
Relativamente às candidaturas de cidadãos independentes, entendemos que da consagração expressa de tais candidaturas relativamente às assembleias de freguesia deve concluir-se que, não tendo havido igual previsão quanto aos órgãos municipais, não é possível encará-las na lei ordinária.
Considerações mais acerbas nos merecem, no entanto, as outras inconstitucionalidades apontadas.
Depois de ter falhado, na segunda revisão constitucional, a subversão do sistema eleitoral de representação proporcional, o PSD finge ignorar o texto constitucional e pretende consagrar na lei ordinária aquilo que não conseguiu transpor para a Constituição.
É gritante a inconstitucionalidade do artigo 1.º do projecto de lei. Ao propor a transmutação de maiorias relativas em maiorias absolutas na formação de executivos municipais, o PSD afronta claramente, de uma só penada, o princípio da representação proporcional previsto, como princípio geral de direito eleitoral, no n.º 5 do artigo 116.º da Constituição, mas também o princípio da igualdade de sufrágio previsto no artigo 10.º da lei fundamental e ainda, reflexamente, o pluralismo de expressão e organização política democráticas e a democracia participativa, bases do Estado de direito democrático nos termos do artigo 2.º da Constituição da República.
O que pretende, de facto, o PSD? Corrigindo um pouco a sua proposta inicial - que se reteria também às assembleias municipais, mas ainda assim reiterando, com a proposta, os vícios de inconstitucionalidade -, o PSD pretende que se formem maiorias absolutas nas câmaras municipais, mesmo nos casos em que o vencedor apenas tenha obtido uma maioria relativa Desta forma consumar-se-ia por via de uma lei inconstitucional, um autêntico assalto aos votos daqueles cidadãos que não tivessem votado com a maioria e, assim, uma investidura desta maioria relativa num mandato que efectivamente não lhe havia sido conferido pelos eleitores.
Por via desta verdadeira usurpação de mandatos, teríamos entre nós cidadãos de segunda categoria, menos iguais do que outros, aqueles que veriam depreciado o seu voto e perdida a representação da sua opção política em favor de um «cuco em ninho alheio».

Vozes do PCP - Muito bem!

A Oradora: - Desta forma, transforma-se o sistema de representação proporcional num sistema maioritário que a Constituição inequivocamente veda.
Desta forma seria possível que uma lista vencedora a escassas centenas de votos de outra ou outras se visse brindada com uma maioria absoluta criada in vitro, no laboratório de uma lei iníqua que tripudiaria sobre o espectro político da sociedade, sobre o pluralismo de expressão consagrado na Constituição da República.
Que objectivos estão subjacentes à iniciativa legislativa do PSD? A experiência - tão rica - do poder local democrático demonstra que nenhuma instabilidade resultou do sistema de representação proporcional. Executivos plurais, representando com fidelidade a sociedade política que os elegeu, tomam possíveis consensos em tomo da satisfação dos interesses das populações, consensos onde estão presentes, como devem estar, as várias sensibilidades da população.
O sistema de representação proporcional é, por outro lado, aquele que, fazendo sentir ao eleitor a importância do seu voto, melhor garante a participação organizada do povo na realização da democracia, no, aprofundamento da democracia participativa.
Ao invés, o sistema proposto pelo PSD poderia fazer fermentar a conflitualidade, o desânimo, a saturação política e o estreitamento de horizontes, ou seja, tudo
aquilo que os constituintes quiseram evitar e que se impediu na revisão constitucional.
O sistema eleitoral, tal como a Constituição o consagra - o proporcional -, é um elemento básico do sistema democrático que o PSD não pode nem poderá subverter.
Contra este projecto, a arma política fundamental, principal e inicial é, de facto, a Constituição da República. O recurso apresentado pelo PCP deve, pois, ter provimento e o parecer da Comissão, por que sem qualquer fundamentação - como resulta, obviamente, da sua leitura -, deve ser rejeitado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Singular projecto de lei este apresentado pelo PSD, revelador de uma notável soma de contradições.
Em 1989, o PSD quis alterar o sistema eleitoral para as autarquias locais e, para tanto, entendeu que a matéria era constitucional e apresentou-a no seu projecto de revisão constitucional. Contudo, a proposta do PSD não fez, então, vencimento, uma vez que violentava claramente o princípio da proporcionalidade como regra de conversão de votos em mandatos.
Mais tarde, em 1990, quando o PSD apresentou na Assembleia um outro projecto, agora um projecto de lei em sede de lei ordinária, para rever alguns dispositivos institucionais das autarquias, reconhecia explicitamente que a matéria relativa à alteração do sistema eleitoral autárquico era de natureza constitucional.
A este propósito, permitam-me os Srs. Deputados que cite a voz autorizada do Sr. Deputado Pacheco Pereira, que dizia então: «Sem se pretender a abertura de uma discussão jurídico-constitucional sobre a matéria, no quadro actualmente em rigor, entende-se oportuno suscitar a adesão dos partidos e forcas políticas a uma solução correctiva» Mas acrescentava: «Neste sentido, o PSD propõe que, na próxima revisão do texto fundamental, se procure uma solução que garanta a constituição de executivos maioritários, sólidos e operacionais.»
Segundo o que se regista na acta dessa reunião plenária, o PSD bateu palmas. Ou seja, o PSD bateu palmas a uma posição segundo a qual a matéria a ser alterada careceria de o ser em sede de revisão constitucional.
Porém, um ano volvido - ou pouco mais do que isso o PSD mudou de ideias e resolveu que poderia alterar por via ordinária aquilo que há pouco tempo atrás considerava que só poderia fazer por via constitucional. O que é que se alterou ou que factores mudaram para que o PSD modificasse a sua orientação?
A verdade. Srs. Deputados, é que o projecto de lei apresentado pelo PSD insere, para além da questão da

Página 724

724 I SÉRIE - NÚMERO 20

alteração dos executivos, também a matéria relativa aos independentes para as candidaturas autárquicas. Ora, o que presumimos é que o PSD não deixa de estar consciente de que a inconstitucionalidade do seu projecto é flagrante e vai, por isso mesmo, travar a possibilidade da sua entrada em vigor.
Este é o objectivo final pretendido pelo PSD; isto é, para que, ao ser travada a possibilidade de entrada ern vigor desse projecto, as candidaturas independentes não venham a ver a luz do dia.
O projecto do PSD, digo-vos Srs. Deputados, é apresentado com reserva mental: quer o que não quer, defende o que não defende, apenas por que, na matéria das candidaturas independentes, o PSD não tem a coragem de se manifestar claramente favorável a essa medida e de proporcionar a sua aprovação autónoma na Assembleia da República. Por isso, Srs. Deputados, o PSD envolve essa disposição com este preceito inconstitucional de alteração do sistema eleitoral para as autarquias.
Como já foi referido, a disposição violenta, claramente, o princípio da proporcionalidade como regra de conversão de votos em mandatos. Neste sentido, o próprio parecer, que agora está em apreciação e que, em seguida, será votado, não deixa ele mesmo de reconhecer que a questão não é linear. Srs. Deputados do PSD, Isto era o mínimo que um Deputado da vossa bancada poderia dizer como autor deste parecer.
A questão não é, de facto, linear, pois o PSD não está convencido da bondade da sua solução. Espera que ela agora passe, mas, no fundo, espera que o Tribunal Constitucional a chumbe. E a moral deste projecto é a de que a inconstitucionalidade vai impedir que se introduza, a tempo e horas, uma reforma significativa, no sentido de favorecer o direito dos cidadãos a uma participação mais alargada na vida pública, particularmente na vida autárquica.
Srs. Deputados do PSD, «gato escondido com o rabo de fora», reserva mental na apresentação deste projecto e tudo o mais.
Vai, pois, ser apenas o vosso voto maioritário a consolidar formalmente um processo legislativo que os senhores não acreditam que venha a chegar ao fim.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr. Deputado Luís Pais de Sousa, tem a palavra.

O Sr. Luís Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente! Srs. Deputados: O primeiro contributo para este debate é, simultaneamente, do nosso ponto de vista, uma clarificação. O que é objecto do nosso debate de hoje é o recurso da constitucionalidade apresentado pelos Grupas Parlamentares do PS e do PCP sobre o projecto de lei n.º 227/VI.
Assim, como relator recuso-me a discutir, hoje e aqui, a questão politica, de fundo ou do mérito do projecto.
O que está em causa é, de facto, saber se o projecto de lei é ou não desconforme à Consumição, se a iniciativa legislativa do PSD viola ou colide com disposições constitucionais, nomeadamente - no dizer dos recorrentes - com os artigos 116.º, n.º 5. 241.º, n.º 1 e 2, 251.º e 252.º e da nossa lei fundamental.
Ora, o quadro de apreciação da constitucionalidade que o n.º 1 do artigo 130.º do Regimento traça deve ser visto, sim, à luz de uma apreciação preventiva, mas que é forçosamente uma apreciação não jurisdicional e, apreciação provisória, uma vez que não excluiu dessa lei, a seu tempo e, como tal, requerida com legitimidade, pelo Tribunal Constitucional declaradamente terminado o processo legislativo. Nesta fase, estamos perante processos só agora se iniciam e, deste modo, face à relativa em presença, do que se trata é se ela em causa o chamado «princípio constitucional da nacionalidade».
Este princípio consente várias leituras. Há, efectivamente, outros métodos de proporcionalidade e não se cingir esta discussão, por exemplo, à aplicação do chamado método da média mais alta de Hondt A Constituição excepciona, no fundo, esta situação para a chamada, electo de Deputados, nos termos do n.º 5 do artigo 116.º
Com efeito, o que se pretende é que, no caso das câmaras municipais (os chamados executivos majoritárias, municipais), ao partido mais votado corresponda, maticamente, uma maioria no executivo. Segundo os rentes, tal é, à partida, inconstitucional.
Pensamos que essa solução não é, semi inconstitucional, pois é uma solução que deixa sempre o espaço para o preenchimento do princípio da proporcionalidade e, como tal, é possível - o que tem - ser sustentado por vários sectores da doutrina, inclusivé universitários - que a questão dos executivos municipais maioritários deixe ainda em aberto um amplo espaço para a concretização do princípio constitucional da proporcionalidade.
Quanto ao problema das assembleias municipais, tendo que essa questão foi devidamente clarificada, se não bastasse o que consta da exposição de motivos - sei- que isto não é argumento - , mas supervenientemente foi introduzida uma alteração, pelos autores e subscritores projecto, à iniciativa legislativa em presença.
Portanto, o relator conclui que a iniciativa legislativa não é desconforme, sem mais, à Constituição.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Srs. Deputados, está encerrado o debate.
Estão em causa dois recursos e dois pareceres. Uma vez que ambos os pareceres concluem da mesma forma, e seja, pela rejeição dos recursos, apresentados pelo PCP e PS, relativamente à admissibilidade do projecta de lei n.º 227/VI (PSD), se todos estiverem de acordo, votaram em conjunto estes dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Srs. Deputados, vamos votar.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos, os favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e ao Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS.

Srs. Deputados, damos assim por terminada a ordem do dia de hoje, considerando que não houve consenso parte que se votasse o voto de saudação que foi apresentada.
A próxima reunião plenária realiza-se terça-feira, às 10 horas, para debate, na especialidade, das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1993.

Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 5 minutos.

Página 725

12 DEZEMBRO DE 1992 725

Faltaram a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Fernando Monteiro do Amaral.
João Álvaro Poças Santos.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.

Partido Socialista (PS):

António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Jaime José Matos da Gama.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Manuel Videira Lopes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Centro Democrático Social (CDS):

João Paulo de Castro Morais Gomes.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPUBLICA.

Página 726

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×