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Quarta-feira, 20 de Janeiro de 1993 I Série-Número 31
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)
REUNIAO PLENARIA DE 19 DE JANEIRO DE 1993
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes de ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da ratificação n.º 57/VI e de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) condenou o processo seguido na regularização dos imigrantes ilegais, tendo, no final, respondido a um pedido de esclarecimento e dado explicações ao Sr. Deputado João Matos (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado José Leitão (PS), a propósito da situação dos desalojados de Camarote, criticou a política de habitação social do Governo. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento das Srs. Deputados João Matos (PS) e Mário Tomé (Indep.).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) referiu-se a uma acusação pública de corrupção a um membro de um Governo feita durante um programa da RTP 1. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Almeida Santos (PS) e António Lobo Xavier (CDS).
A Sr.ª Deputada 15ilda Martins (PSD) abordou diversos problemas do Algarve, congratulando-se pelos melhoramentos que têm vindo a ser realizados na região.
O Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues (PCP) reprovou o Governo pela condução do caso ale Timor Leste, respondendo, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Luís Geraldes (PSD).
O Sr. Deputado Casimiro de Almeida (PSD) apelou à urgente resolução do problema de inquinação de águas com que se debatem as populações dos municípios de Oliveira de Azeméis, São João da Madeira e Vale de Cambra e responder a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado André Martins (Os Verdes).
O Sr. Deputado Artur Penedos (PS) abordou a questão da formação profissional e das normas que presidem à atribuição dos apoios financeiros comunitários.
Os votos n.º 52/VI - De pesar pela deportação de 400 palestinianos (Deputado independente Mário Tomé) e 53/VI - De condenação pela deportação de 410 palestinianos (PCP) foram rejeitados, tendo sido aprovado o voto n.º 54/VI - De protesto, reprovando o desrespeito pela Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU (PS).
Ordem do dia.- Procedeu-se à apreciação do Decreto-Lei n.º 188/92, de 17 de Agosto, que extingue o Instituto Nacional de Investigação Científica [ratificação n.º 40/VI (PCP)]. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia (Manuel Thomaz), os Srs. Deputados José Calçada (PCP) Fernando de Sousa (PS), Adriano Moreira (CDS), Aristides Teixeira (PSD), Mário Tomé e João Corregedor da Fonseca (Indep.).
Foi aprovado, na especialidade e em votação final global o texto final elaborado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente relativo ao projecto de lei n.º 153/VI - Regime jurídico de criação de freguesias (PSD).
Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados António Murteira (PCP), Júlio Henriques (PS), João Amaral (PCP), Silva Marques e Luís Martins (PSD) e João Carlos Pinho (CDS).
Foi ainda apreciado n Decreto-lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que autoriza o serviço de transportes colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiras que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto [ratificação n.º 41/VI (PCP)]. A diverso título, usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Jorge Antas), as Srs. Deputados José Calçada (PCP), Artur Penedos (PS) e Simão Ricon Peres (PSD).
Finalmente, foi também apreciado o Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, que extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos [ratificações n.º 44/VI (PCP) e 45/VI (PS)]. Produziram intervenções, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Cultura (Santana Lopes), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Fernando Pereira Marques (PS), Carlos Lélis (PSD), João Corregedor da Fonseca (Indep.) e Edite Estrela (PS).
Entretanto, foram rejeitados as seguintes projectos de resolução: n.ª 45/VI (PCP), que recusa a ratificação do Decreto-lei n.º 184/92, de 22 de Agosto - Reestrutura o Secretariado Nacional de Reabilitação (ratificação n.º 39/VI): n.º 46/VI (PS), que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 22o/92, de 15 de Outubro - Estabelece normas relativas à concessão de uma nova ponte sobre o Tejo (ratificação n.º 38/VI): n.º 43/VI (PCP), que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 188/92, de 27 de Agosto - Extingue o Instituto Nacional de Investigação Científica (ratificação n.º 40/VI).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Abílio Sousa e Silva. Adérito Manuel Soares Campos. Adriano da Silva Pinto. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Álvaro Roque de Pinho Bissau Barreto. Ana Paula Matos Barros. Anabela Honório Matias. António da Silva Bacelar. António de Carvalho Martins. António do Carmo Branco Malveiro. António Esteves Morgado. António Germano Fernandes de Sá e Abreu. António Joaquim Correia Vairinhos. António Manuel Fernandes Alves. António Moreira Barbosa de Melo. António Paulo Martins Pereira Coelho. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Arlindo da Silva André Moreira. Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha. Arménio dos Santos. Belarmino Henriques Correia. Carlos Alberto Lopes Pereira. Carlos de Almeida Figueiredo. Carlos Filipe Pereira de Oliveira. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel de Oliveira da Silva. Carlos Manuel Duarte de Oliveira. Carlos Manuel Marta Gonçalves. Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira. Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho. Cecilia Pita Catarino. Cipriano Rodrigues Martins. Delmar Ramiro Palas. Domingos Duarte Lima. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco. Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva. Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista. Fernando Carlos Branco Marques de Andrade. Fernando dos Reis Condesso. Fernando José Antunes Gomes Pereira. Fernando José Russo Roque Correia Afonso. Fernando Monteiro do Amaral. Fernando Santos Pereira. Filipe Manuel da Silva Abreu. Francisco Antunes da Silva. Francisco João Bernardino da Silva. Guido Orlando de Freitas Rodrigues. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva. Hilário Torres Azevedo Marques. 15ilda Maria Renda Periquito Pires Martins. Jaime Gomes Mil-Homens. João Alberto Granja dos Santos Silva. João Álvaro Poças Santos. João Carlos Barreiras Duarte. João do Lago de Vasconcelos Mota. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia. João José da Silva Maçãs. João José Pedreira de Matos. Joaquim Cardoso Martins. Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva. Joaquim Maria Fernandes Marques. Joaquim Vilela de Araújo. Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha. José Álvaro Machado Pacheco Pereira. José Ângelo Ferreira Correia. José Augusto Santos da Silva Marques. José Fortunato Freitas Costa Leite. José Júlio Carvalho Ribeiro. José Leite Machado. José Macário Custódio Correia. José Manuel Borregana Meireles. José Manuel da Silva Costa. José Mário de Lemos Damião. Luís António Carrilho da Cunha. Luís António Martins. Luís Carlos David Nobre. Luís Manuel Costa Geraldes. Manuel Acácio Martins Roque. Manuel Albino Casimira de Almeida. Manuel Antera da Cunha Pinto. Manuel Castro de Almeida. Manuel da Costa Andrade. Manuel da Silva Azevedo. Manuel de Lima Amorim. Manuel Filipe Correia de Jesus. Manuel Maria Moreira. Manuel Simões Rodrigues Marques. Maria da Conceição Figueira Rodrigues. Maria da Conceição Uhich de Castro Pereira. Maria de Lurdes Borges Póvoa Costa. Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia. Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares. Maria Luísa Lourenço Ferreira. Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa. Mário Jorge Belo Maciel. Melchior Ribeiro Pereira Moreira. Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva. Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas. Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos. Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva. Olinto Henrique da Cruz Ravara. Pedro António de Bettencourt Gomes. Pedro Manuel Cruz Roseta. Pedro Manuel Mamede Passos Coelho. Rui Alberto Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp. Rui Fernando da Silva Rio. Simão José Ricon Peres. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Virgílio de Oliveira Carneiro. Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho. Alberto Bernardes Costa. Alberto de Sousa Martins. Alberto Manuel Avelino. Alberto Marques de Oliveira e Silva.
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António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Ribeiro Marques da Silva.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Maneiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Gomes Ká.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadora Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José António Martins Goulart.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
João Carlos da Silva Pinho.
José Luís Nogueira de Brito.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Partido de Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputados independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa a ratificação n.º 57/VI- Ao Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, relativo ao Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, apresentada pelo PCP.
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados José Calçada, Artur Penedos, Maria Julieta Sampaio e Guilherme Oliveira Martins; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Pereira Marques, Fernando Pereira e Edite Estrela; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Arons de Carvalho, Pereira Marques, José Magalhães, José Seguro, Carlos Miguel Oliveira, João Amaral, Luís Peixoto, Jerónimo de Sousa e Guilherme Oliveira Martins; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Marques Júnior; ao Instituto Nacional de Estatística, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados Fialho Anastácio e Gustavo Pimenta; ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Luís Peixoto; ao Ministério da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Alberto Costa; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados Casimiro de Almeida, Cerqueira de Oliveira e Guilherme Oliveira Martins; ao Ministério do Comércio e Turismo, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Julieta Sampaio; à Câmara Municipal de Faro e à Administração Regional da Saúde de Faro, formulados pelo Sr. Deputado Macário Correia; e, por último, ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado António Maninho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão de hoje compreende um período de antes da ordem do dia com declarações políticas.
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Assim, para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No próximo dia 13 de Fevereiro termina o prazo concedido pelo Governo para a regularização extraordinária dos imigrantes que residem em Portugal em situação ilegal. No momento em que este prazo expirar, terá já entrado em vigor um outro decreto-lei relativo ao regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional.
Com a cessação de vigência do primeiro diploma, sem que seja atingido o seu objectivo de permitir à generalidade dos cidadãos imigrantes proceder à regularização da sua situação - e hoje tudo aponta para a impossibilidade prática de atingir esse objectivo -, e com a entrada em vigor do decreto-lei relativo à expulsão de estrangeiros, estão a ser criadas condições para que a partir do dia 13 do próximo mês largos milhares de imigrantes residentes em Portugal, na sua grande maioria originários de países de língua oficial portuguesa, possam ser colocados nos tais "centros de instalação temporária" previstos nesse diploma, enquanto aguardam a expulsão para os seus países de origem.
A possibilidade real de uma situação destas se vir a verificar, admitida já pelo Ministro da Administração Interna, e que resultará de uma decisão premeditada do Governo, merece do Grupo Parlamentar do PCP a mais viva condenação e repúdio.
Quando há um mês atrás aqui debatemos, em sede de ratificação, um conjunto de propostas, apresentadas pelo PCP, de alteração ao decreto-lei sobre a regularização extraordinária dos imigrantes - que o PSD entendeu recusar em bloco -,tivemos a oportunidade de chamar a atenção para os perigos reais de malogro na concretização dos objectivos visados por esse diploma.
Temos agora, quando falta menos de um mês para terminar o prazo de regularização, lamentavelmente, elementos que nos permitem acusar o Governo de não estar a revelar qualquer vontade política séria de facilitar a regularização dos imigrantes residentes em Portugal.
Para além de ter reafirmado aqui a sua convicção de que o prazo de quatro meses para a regularização seria suficiente, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna comprometeu-se, perante esta Assembleia, a não dificultar o processo de regularização, adoptando, através da actuação dos serviços competentes para a recepção e decisão dos processos de regularização, a maleabilidade suficiente para levar em linha de conta a situação particularmente complexa em que vivem os imigrantes, ajudando-os a concretizar a respectiva legalização.
Porém, não é isso que está a acontecer! Na área da Grande Lisboa, onde vivem dezenas de milhares de imigrantes em situação irregular existem apenas três locais de recepção de documentos; os trâmites burocráticos que estão a ser impostos pelos serviços, longe de facilitar o processo, estão a dificultá-lo seriamente; a divulgação televisiva do processo de regularização, cuja emissão foi atrasada porque o Sr. Secretário de Estado não gostava do anúncio realizado aliás, foi ele o próprio que aqui esclareceu ter sido essa a causa do atraso-, foi emitida apenas durante cerca de um mês; finalmente, o Governo, pela sua parte, não tomou quaisquer medidas sérias de divulgação do processo e da forma de regularização junto das comunidades de imigrantes, nem apoiou quaisquer entidades para que o fizessem.
O Governo não ignora a lentidão com que está a decorrer o processo e as dificuldades práticas que estão a ser opostas aos imigrantes que prebendem regularizar a sua situação.
Na verdade, às dificuldades que resultam de exigências burocráticas da parte dos serviços, em muitos casos injustificadas, somam-se casos, que são do conhecimento geral, de entidades patronais que se recusam a passar as declarações exigidas para o processo de regularização, que descontam 25 contos no salário para passar essas declarações, ou que ameaçam com o despedimento os trabalhadores imigrantes que pensem em regularizar a sua situação.
Perante esta realidade, o Ministro Dias Loureiro e o Secretário de Estado Carlos Encarnação continuam a fazer de conta que o processo decorre a um ritmo satisfatório e a invocar benevolência: da parte do Governo, mas sempre afamando que a partir de 13 de Fevereiro próximo quem não estiver legalizado será expulso do nosso pais.
Ainda há poucos dias diversos órgãos de comunicação social noticiavam que apenas 4000 processos haviam sido despachados pelo Grupo Técnico de Avaliação e Decisão, criado no âmbito do processo de regularização, isto quando falta menos de um mês para terminar o prazo e quando se calcula em cerca de 90 000 o número de imigrantes a regularizar. Neste quadro, referiam vários jornais, estamos perante o risco iminente de expulsão de 90 000 cidadãos.
A verdade é que o Governo não demonstrou, até ao momento, qualquer preocupação com a situação que se está a criar. Aliás, quem tem desenvolvido esforços para apoiar a regularização dos imigrantes têm sido algumas câmaras municipais (saliento como mais significativos os esforços que têm sido feitos pelas Câmaras de Amadora, Loures e Lisboa), os sindicatos e as associações representativas dos imigrantes...
Aplausos do PCP e do Deputado do PS Fernando Ká.
... pois da parte do Governo não se tem visto mais do que uma acção que só contribui para acentuar sentimentos de desconfiança dos imigrantes em relação aos serviços competentes para a regularização, agravados com as frequentes rusgas policiais selectivamente apontadas a esses cidadãos.
As populações que diariamente utilizam os transportes públicos, designadamente a linha de Sintra, têm assistido, com alguma frequência, à realização de rusgas envolvendo um número elevado de efectivos policiais, destinadas a interpelar exclusivamente os cidadãos originários de países africanos. Porém, não se trata de medidas destinadas a prevenir a criminalidade, pois não incidem sobre os marginais ou em locais que eles frequentem mas, sim, sobre cidadãos que pacificamente se deslocam para o seu trabalho ou que regressam a casa depois dele.
Actuações destas, no momento em que está em curso um processo extraordinário de regularização, só podem ter como efeito lançar fundadas dúvidas sobre a seriedade com que o Governo está a encarar esse processo.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Na mesma linha de actuação, lamentável e condenável, inserem-se alguns comportamentos, recentemente vindos a público, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; nomeadamente o caso de um cidadão guineense que se deslocou a Portugal para tratamento médico e ficou
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durante vários dias retido no aeroporto unicamente por não possuir os meios financeiros exigíveis para entrar em Portugal e o caso de uma cidadã de São Tomé e Príncipe vítima de uma detenção ilegal no Aeroporto da Portela são factos chocantes e inadmissíveis do ponto de vista do respeito pelos direitos humanos e do relacionamento de Portugal com os países e povos de língua oficial portuguesa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No estado em que se encontra o processo de regularização em curso, a menos de um mês do seu termo, são fundadas as maiores dúvidas quanto ao seu sucesso.
A situação que neste momento é de recear e que é já muito dificilmente evitável é a de que muitos milhares de imigrantes (porventura a maioria) permaneçam em situação ilegal, ficando sujeitos à aplicação das disposições relativas à expulsão.
Assim, se não for prorrogado o prazo para a regularização extraordinária dos imigrantes e não forem tomadas medidas sérias de apoio à concretização desse processo, o Governo PSD assumirá a pesada responsabilidade de ter inviabilizado a regularização da situação de muitos milhares de cidadãos residentes em Portugal com o objectivo evidente de expulsá-los do País.
O Grupo Parlamentar do PCP, não se conformando com a situação que se está a criar, apresentará ainda hoje na Mesa desta Assembleia um projecto de lei de prorrogação do prazo de regularização extraordinária dos imigrantes em situação ilegal, sendo conveniente relembrar que continua a aguardar apreciação o projecto de lei n.º 211/VI, do PCP, que propõe a adopção de medidas de apoio a essa regularização incentivando a participação activa nesse processo das associações representativas dos imigrantes existentes em Portugal.
Aplausos do PCP.
Fazemos, pois, votos para que a Assembleia da República possa ponderar atentamente essas propostas no momento em que se pronunciar sobre a prorrogação do prazo de regularização, o que, para ter sentido útil, terá de ocorrer muito em breve.
No momento em que perigosos ventos de racismo e xenofobia sopram em vários países europeus e em que a violência racista sobe assustadoramente de tom, não é admissível que o Governo Português promova a expulsão massiva de Portugal de cidadãos que, na sua esmagadora maioria, têm trabalhado e vivido entre nós em condições que os tornam credores da solidariedade e da protecção do Estado Português.
Milhares de trabalhadores imigrantes vivem em Portugal em condições de extrema precariedade e vulnerabilidade, sujeitos às mais penosas e desprotegidas condições de trabalho; habitam na sua maioria em bairros e habitações degradadas, sujeitos a situações, como a que ocorreu em Camarate, em que centenas de pessoas foram desalojadas sem qualquer contemplação de ordem social ou humanitária.
A este respeito importa salientar as iniciativas tomadas pela Câmara Municipal de Loures e pela Junta de Freguesia de Camarate, nas quais a Cruz Vermelha Portuguesa e os bombeiros se têm empenhado, traduzidas, primeiro em sucessivas diligências junto das entidades governamentais, alertando com antecedência para a situação e
disponibilizando-se para cooperar numa solução, e, posteriormente, no sentido de minimizar os efeitos de uma tão dura e lamentável situação.
A perspectiva de solução a que se chegou há poucas horas, fruto da disponibilidade da Câmara Municipal de Loures para assumir encargos e responsabilidades para além dos limites que legalmente lhe competiriam, e reveladora da ostensiva orientação de demissionismo do Governo em relação às suas responsabilidades sociais e um factor mais a somar ao roubo das finanças locais para empurrar novos encargos para o poder local.
Aplausos do PCP.
Numa Europa onde proliferam manifestações violentas de racismo e xenofobia e onde, através do Tratado de Maastricht, dos Acordos de Schengen, de Dublim e da alteração das legislações nacionais sobre direito de asilo, se pretende fechar ao mundo, começam a surgir em Portugal sinais de racismo e xenofobia, com uma inquietante tradução na actuação do Governo, concretamente no diploma projectado sobre o direito de asilo e no diploma, inadmissível, que foi aprovado em Conselho de Ministros sobre a permanência e expulsão de estrangeiros do território nacional.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Muito bem!
O Orador: - A criação, prevista nesse decreto-lei, dos chamados "centros de instalação temporária" destinados à detenção (porque é mesmo de detenção que se trata) de estrangeiros em situação irregular que aguardem que seja executada a decisão de os expulsar do País constitui uma medida que só pode causar repugnância a quem se reivindique de um pensamento democrático e de respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Convém mesmo lembrar que, durante a discussão na especialidade da autorização legislativa que deu origem a este diploma, o Governo aceitou retirar a referência à possibilidade da existência de centros dessa natureza, afirmando na altura não ser sua intenção criá-los. O facto de ter sido retirada da autorização legislativa aprovada a possibilidade da criação dos centros de acolhimento faz com que o decreto-lei, aprovado em Conselho de Ministros, incorra em clara violação dos limites da autorização concedida por esta Assembleia.
O facto de ressurgirem no decreto-lei governamental esses famigerados centros de detenção e de estarem a criar-se condições para a sua utilização massiva representa inequivocamente o desrespeito do Governo para com a Assembleia da República e, sobretudo, uma preocupante falta de respeito para com os direitos humanos, razão pela qual o Grupo Parlamentar do PCP anuncia desde já a sua intenção de chamar à ratificação, pela Assembleia da República, o decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros relativo à permanência e expulsão de estrangeiros, logo que ele seja publicado no Diário da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal e o povo português encontram-se unidos aos países e povos de língua oficial portuguesa por laços recíprocos de amizade e solidariedade que não devem, em caso algum, ser preteridos. A atitude do Governo Português de actuar de forma persecutória em relação aos cidadãos imigrantes em obediência a uma Europa onde prolifera o racismo e a xenofobia não pode passar sem uma veemente condenação.
Aplausos do PCP e dos Deputados do PS José Leitão e Fernando Ká.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para formular pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Matos.
O Sr. João Matos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quero começar por comentar o facto de o Sr. Deputado ter aproveitado a sua intervenção, relativa à legalização dos cidadãos estrangeiros residentes em Portugal, para referir a situação de Camarate.
Entendo que é uma vergonha o Sr. Deputado ter utilizado a situação de pessoas que vivem na miséria, que, como sabemos, vivem há mais de uma semana na rua, após despejo! Na verdade, isso é, no mínimo, lamentável, porque o Sr. Deputado está a aproveitar-se da situação com fins partidários, o que tenho de denunciar.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas, por outro lado, ainda bem que o Sr. Deputado referiu essa situação, porque me dá oportunidade - a mim, a esta Câmara e ao País - de ter conhecimento das verdadeiras razões que levaram aquelas pessoas a estar hoje nessa situação. 15to tem, única e exclusivamente, a ver com a política social que o seu partido tem tido na autarquia de Loures ao longo dos últimos anos, onde detém o poder, em quase exclusividade, desde há muito tempo.
Na verdade, o Sr. Deputado esquece-se de que esta situação data de 1977, tem a ver com a brilhante descolonização que foi feita e com a chegada dos ex-retornados a Portugal.
Mas, para que se verifique a vontade política do PCP na autarquia, é preciso demonstrar qual tem sido a sua política na área da habitação. Assim, quero recordar com números aquilo que é, de facto, a política de habitação social no município de Loures: em 1987, a Câmara de Loures investiu 9000 contos, cerca de 2 % do seu orçamento; em 1988, investiu 89 000 contos, cerca de 1 % do seu orçamento; em 1989, investiu 97 000 contos, o que corresponde a 1,4 % do seu orçamento e este ano tem previsto, segundo tenho conhecimento pelo jornal do concelho de Loures, cerca de 500 000 contos, que corresponde, num total de 20 milhões de contos que é o orçamento da câmara, a cerca de 2,5 % para a área da habitação social. 15to num município que tem graves problemas habitacionais, designadamente a questão dos clandestinos, que é, de facto, uma chaga social que se vive neste concelho!
Assim, a questão que quero colocar-lhe, Sr. Deputado, e porque os Decretos-Leis n.ºs 286/87 e 226/88, que foram promulgados por este Governo, impõem que as câmaras tenham responsabilidade na execução de obras de construção da habitação, é a seguinte: atendendo a que o Governo tem disponibilizado desde sempre verbas importantes, cerca de 50 % a fundo perdido e 50 % com juros bonificados, por que é que a Câmara nunca resolveu esta questão e pede agora, em desespero, que seja o Governo a resolvê-la? Srs. Deputados do PCP, assumam as vossas responsabilidades, porque os senhores são os primeiros a tê-las!
Aplausos do PSD.
Vozes do PCP: - 15so não é verdade!
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - São as palmas da hipocrisia!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado João Matos falou em vergonha. Ora, devo dizer que uma vergonha é aquilo que o senhor acaba de fazer,...
Vozes do PCP: = Muito bem!
Protestos do PSD.
O Orador: - ... na medida em que o Sr. Deputado sabe perfeitamente que é da responsabilidade do Governo a promoção da habitação social; que o Governo gasta menos em habitação social do que aquilo que gastou no Centro Cultural de Belém;...
Protestos do PSD.
... que, desde 1988, a Câmara Municipal de Loures tem projectos apresentados na área da habitação social a que, até ao momento, o Governo ainda não deu resposta;...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... que ao longo deste processo de Camarate tem sido a Câmara Municipal de Loures que, desde a primeira hora, tem procurado encontrar soluções e que a encontrada, embora precária, resulta da disponibilidade da Câmara para ir além daquilo a que as suas competências a obrigariam e tem sido graças a essa disponibilidade que o problema se vai resolver, pois da parte do Governo não houve qualquer vontade séria de resolver o grave problema das 600 pessoas que durante uma semana dormiram ao relento.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD.
O Sr. João Matos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Matos (PSD): - Sr. Deputado, compreendo a situação em que se encontra ao dizer que a minha intervenção foi uma vergonha, pois a única entidade que tem aqui graves responsabilidade é a Câmara Municipal de Loures e o PCP.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E digo-lhe isto por uma razão simples, Sr. Deputado: tive oportunidade de, durante seis anos, exercer funções autárquicas na oposição e durante todo esse tempo andei a lutar para que essa situação se invertesse no concelho de Loures. Aliás, estou convencido de que deve ser o único concelho do País onde se faz um investimento de 2 % na habitação quando se dispõe de um orçamento de 20 milhões de contos para este ano!
Na verdade, a única coisa que o Sr. Deputado me obriga a dizer aqui, hoje, é só isto: os senhores continuam, de facto, sem querer resolver o problema da habitação, que é uma chaga naquele concelho, e as prioridades que continuam a dar - a exemplo daquilo que vem no jornal - destinam-se ao investimento na cultura, na rede viária e naquilo que, efectivamente, não é prioritário para
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o concelho, prevendo-se nestas áreas um investimento de cerca de 1,5 milhões de contos.
E mais, Sr. Deputado: gostaria que o senhor, de uma vez por todas, tivesse oportunidade de, com os seus camaradas da Câmara de Loures, ler o Boletim Municipal de 1988 onde se apresentou uma proposta para construção de habitação social com base em decretos-leis que já tinham sido revogados.
Como lhe disse, desde 1987-1988, não é possível ao Estado continuar a suportar o encargo de construir habitação social porque essa competência pertence às câmaras, cabendo ao Estado a única responsabilidade de encontrar os meios financeiros para poder fazer essa mesma habitação - aliás, isto está previsto no decreto-lei e o Sr. Deputado não o pode escamotear.
Portanto, a única coisa que a Câmara pretende é que continue a ser o Estado a construir habitação social, quando nenhuma câmara neste pais procede dessa forma, a começar pelo exemplo que temos da Câmara de Lisboa, que, com o apoio do Estado, faz os contratos-programas e a respectiva construção.
Sr. Deputado, não enterre mais a cabeça na areia! Deixe-se de demagogia! De hipocrisia! Assuma a sua qualidade de Deputado comunista e, de uma vez por todas, tenha a coragem de dizer ao País aquilo que são as vossas responsabilidades nesta matéria e que os senhores têm de assumir.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se amuro o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sei se terei ofendido o Sr. Deputado João Matos e considero que é lamentável a intervenção que acaba de fazer.
O Sr. João Matos (PSD): - O Sr. Deputado ofendeu as câmaras municipais e não a nós!...
O Orador: - O Sr. Deputado está a utilizar a vida daquelas 600 pessoas...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Olha quem fala!
O Orador: - ... para vir aqui criticar a Câmara Municipal de Loures.
Sr. Deputado, a acção da Câmara Municipal de Loures, ao longo dos últimos anos, tem sido julgada - e bem pela população do respectivo município.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado sabe perfeitamente, ao longo de todo este processo, quem é que, em momento nenhum, fugiu às suas responsabilidade e quem é que, pelo contrário, proeurou sempre escapar-lhes, dizendo que não tinha nada a ver com essa situação. Eu vi, porque também lá estive, o presidente da Câmara Municipal de Loures, de dia e de noite, ao lado daquelas populações,...
Protestos do PSD.
O Sr. Silva Marques (PSD): - 15so é que é cinismo!
O Orador: - ... até que o Governo se decidisse a assumir as suas responsabilidades.
Ora, o Governo, através da sua política, é responsável pela criação de bolsas de probreza como aquelas que, dramaticamente, proliferam pelo concelho de Loures e por outros concelhos da Área Metropolitana de Lisboa e é preciso de ter uma grande desfaçatez, Sr. Deputado, para vir aqui procurar responsabilizar as autarquias locais que, todos os anos, são roubadas através da aplicação da Lei das Finanças Locais.
Protestos do PSD.
É inadmissível, Sr. Deputado, que um Governo que, cada vez mais, procura passar atribuições para as câmaras municipais, sem lhes dar os competentes meios financeiros, venha aqui brincar com a vida das pessoas - não há outra expressão para definir a sua intervenção.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Leitão.
O Sr. José Leitão (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Uma semana após o despejo que abrangeu centenas de moradores do chamado Lar Panorâmico, em Camarate, os desalojados começam a entrever, finalmente, uma hipótese de resolução da sua situação.
Para qualquer cidadão normal, é totalmente incompreensível como se pôde prolongar esta situação, com centenas de pessoas dormindo ao frio, abrigadas por uns bocados de plástico, apenas aquecidas com as brasas de uma ou outra fogueira.
A situação era não só evitável como podia já estar há muito resolvida se a insensibilidade social não fosse uma das características da actuação deste Governo.
A Junta de Freguesia de Camarate e a Câmara Municipal de Loures vêm, há vários anos, a chamar a atenção dos diversos departamentos governamentais para a delicadeza das situações sociais existentes no Lar Panorâmico.
A Câmara Municipal de Loures, em 1988, apresentou uma proposta para a resolução habitacional de várias situações existentes no concelho, entre as quais a do Lar Panorâmico, que não teve resposta senão muito recentemente. As exposições que foram enviadas ao próprio Primeiro-Ministro foram tendo como resposta que o assunto fora enviado, para estudo, à Secretaria de Estado da Habitação. E, contudo, nada foi feito.
Uma vez verificado o despejo, foi com espanto e indignação que fomos percebendo que a situação corria o risco de arrastar-se e degradar-se sem que se procurasse uma solução. Quando nos deslocámos, pela primeira, vez ao local, na tarde do segundo dia, ficámos impressionados com a total situação de abandono em que os desalojados se encontravam e com a tentativa de dar como resolvida uma situação que corria o risco de agravar-se.
Não cabe ao PS a solução de um problema, que só é possível através do acordo entre o Governo e o município, com o apoio de organizações humanitárias e de solidariedade. Contudo o PS avançou, inclusive, com a proposta de instalação dos desalojados no antigo Hospital Militar na Artilharia 1, que está completamente desocupado .e que, ainda há pouco tempo, serviu para a instalação de emergência dos refugiados portugueses do Zaire.
Afigurou-se-nos, na passada quarta-feira, que a utilização de uma instalação militar desactivada teria sido uma solução. Aliás, a Câmara de Loures considerou, posterior-
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mente, que esta era uma das soluções possíveis para uma situação de emergência. Mas o que nos interessa é que se tenha encontrado, finalmente, uma solução que assegura aquele mínimo de dignidade a que qualquer pessoa tem direito.
A tentativa de desresponsabilização do Governo e a sua longa omissão perante a situação criada tinham um objectivo claro: responsabilizar, em exclusivo, as autarquias locais por tudo o que tem a ver com a sua resolução.
O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!
O Orador: - Ora, sem a participação do Governo é impossível às autarquias locais enfrentarem as carências gritantes em matéria de habitação social que se vêm acumulando.
Sr. Presidente, Sr.- e Srs. Deputados: A tendência para a concentração de residentes na Área Metropolitana de Lisboa, que começou por ter a sua origem em elevada migração interna nas décadas de 60 e de 70, acentuou-se a partir de 1974 com a vinda da população regressada das ex-colónias e de imigrantes, não tendo sido acompanhada de um adequado planeamento e ordenamento urbano.
Tudo foi deixado à espontaneidade das forças em presença. As rendas de habitação mantiveram-se limitadas e as novas habitações tornaram-se cada vez mais caras. Como afirmou a Dr.ª Manuela Silva num importante estudo publicado em 1988 sobre a pobreza urbana: "A consequência deste processo não pode ser mais visível: a manifesta falta de acessibilidade a uma habitação condigna. A incompatibilidade entre o nível de rendas é encargos com arrendamento ou com a aquisição atira uma percentagem elevada de famílias (sobretudo jovens) para situações de sobreocupação, utilização de casas velhas de precárias condições, construções clandestinas nas zonas periféricas ou mesmo para as barracas e outros abrigos precários que proliferam na cidade e seus arredores."
De 1988 para cá a situação foi-se agravando consideravelmente, sem que o Governo tivesse em conta o papel desintegrador da sociedade de que se reveste a falta de habitação condigna.
Como se refere no mesmo estudo, esta carência básica repercute-se "no estatuto social (nos casos limites, é estigma social), nas condições de acesso ao emprego e na produtividade do trabalho, nas oportunidades de saúde, de instrução, de cultura e de participação social".
A construção das novas vias, nomeadamente da CRIL e da CREL, que implicaram a necessidade de destruir centenas e centenas de barracas, veio tornar mais premente a carência de habitação a preços acessíveis para as famílias com mais escassos rendimentos.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Muito bem!
O Orador: - A política de indemnização aos desalojados seguida em muitos casos, em lugar da política de construção de habitação social, só tem contribuído para agravar os problemas. AS indemnizações, quando desacompanhadas de qualquer projecto efectivo de construção de habitação, só contribuem para um proliferar de novas construções clandestina..
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - Não é socialmente suportável, sem que surjam graves conflitos sociais, que se assista a um número
cada vez mais significativo de pessoas e de famílias que vão sendo colocadas sem tecto, entre ruínas, sem que sejam tomadas as medidas necessárias para modificar esta situação. O Governo age, nesta matéria, por um lado, como se acreditasse que o mercado irá resolver este problema e, por outro lado, procurando descarregar sobre as autarquias esta responsabilidade que lhe compete assegurar.
No debate do Orçamento o PS criticou a insensibilidade do Governo em matéria de habitação. O Ministério das Obras Públicas foi um dos ministérios mais favorecidos peio Orçamento do Estado para 1993, tendo sido previstos 123 milhões de contos em PIDDAC. Como então o PS afirmou, consideramos escandaloso, neste quadro, que o Governo apenas dedique 6,4 milhões de contos a realojamentos e 0,9 milhões à recuperação do parque habitacional degradado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - É um escândalo!
O Orador: - Dentro das sete medidas que então propusemos em matéria de habitação defendemos, nomeadamente, que era necessário dedicar a totalidade das verbas obtidas por alienação do património habitacional do Estado à habitação social e, reforçando no PIDDAC, em 10 milhões de contos, as verbas destinadas à habitação social.
O PS vem, deste há muitos meses e pelas mais diversas formas, a chamar a atenção do Governo e da opinião pública para a necessidade premente de habitação social.
A falta de casas para camadas sociais mais carenciadas pode vir a estar na origem de conflitos sociais evitáveis.
O problema dos desalojados de Camarate e a sua evolução recente vêm confirmar, lamentavelmente, a r a o de ser dos alertas do PS.
Sendo uma grande parte das populações residentes em piores condições de habitação constituídas por imigrantes e por minorias étnicas nacionais, as carências existentes em matéria de habitação e a ausência de políticas integradas para a sua inserção harmoniosa na sociedade portuguesa facilitam o alastramento de preconceitos raciais e de manifestações de xenofobia.
À falta de habitação condigna soma-se, muitas vezes, o insucesso escolar e educativo e ausência de formação profissional para as novas gerações. Tudo isto tem que ter respostas políticas adequadas.
O PS tem, por diversas vezes, chamado a atenção do Governo para esta situação, sem que este dê mostras de ser sensível a estes alertas. Como afirmou ainda ontem António Guterres: "O PS vem, desde há muitos meses, insistentemente e pelas mais diversas formas, chamando a atenção do Governo e da opinião pública para a necessidade premente de uma política de integração harmoniosa das comunidades imigrantes, nomeadamente africanas, na sociedade portuguesa e da criação das entidades oficiais que possam aplicar em concreto essa política. Há problemas de emprego, de habitação e de educação da 2.ª geração que não podem continuar a ser ignorados com a chocante indiferença do Governo.
Desde há muito que alertamos que o agravamento destes problemas, inevitável se nada se fizer, irá criando cada vez mais problemas de tensão social e contribuirá para gerar, em Portugal, as manifestações de xenofobia e de racismo que temos visto generalizarem-se em toda a Europa.
O problema dos desalojados de Camarate e a sua evolução recente vêm confirmar, lamentavelmente, a razão dos alertas do PS."
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Os lamentáveis acontecimentos verificados na Portela aí estão para tornar urgente que estes e outros alertas que o PS tem formulado sejam tidos em consideração.
Toma-se necessário, como se disse, criar estruturas para tratar, de uma forma integrada, os problemas colocados pela necessidade de proceder a uma integração harmoniosa de imigrantes e das minorias étnicas nacionais. Enquanto algumas cântaras dão passos nesse sentido, como é o caso, por exemplo, da Câmara Municipal de Lisboa, o Governo não tem uma Secretaria de Estado ou uma Alta Autoridade, que procure articular as medidas necessárias à prossecução da integração harmoniosa dos imigrantes e das minorias étnicas nacionais na sociedade portuguesa.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Urge prevenir situações como a que se tem verificado relativamente aos desalojados do Lar Panorâmico em Camarate.
Quem conheceu directamente as pessoas sentiu a sua angústia e sofrimento, percebeu que qualquer acção política digna desse nome deve procurar eliminar o sofrimento inútil e prevenir os conflitos sociais evitáveis.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não quero terminar sem dizer quanto me impressionou a solidariedade que segmentos significativos da sociedade civil foram transmitindo aos desalojados, a acção da comunicação social e de tantas organizações humanitárias e de solidariedade, a posição do conselho directivo da Escola C+S de Camarate, que acolheu as crianças que a frequentavam, as tomadas de posição portadoras de futuro dos bispos D. Januário e D. António Ribeiro, que se empenharam numa solução, o último dos quais me disse publicamente, ao despedir-se: "Façam tudo o que puderem por esta gente."
Tudo isto são elementos positivos. Nós precisamos de muitos movimentos de solidariedade da sociedade civil para enfrentar os grandes desafios de construção da coesão social nas periferias das grandes cidades. Nós precisamos e temos o direito de esperar que o Governo assuma as suas responsabilidades em situações sociais desta gravidade, que perceba que a construção de habitação social e que a definição de uma política integrada de inserção harmoniosa dos imigrantes e das minorias étnicas nacionais na sociedade portuguesa não pode ser adiada.
Não podem ser os municípios a suportar, exclusivamente - embora devam dar o seu contributo -, a responsabilidade pela resolução destes problemas, de que não controlam todas as variáveis.
Só através do diálogo e da conjugação de esforços entre a administração central, os municípios e os moradores das zonas degradadas será possível prevenir e resolver problemas como o que se gerou relativamente aos desalojados do Lar Panorâmico, em Camarate.
Temos o direito de esperar que assim seja e que o Governo não continue a ignorar por mais tempo os alertas que lhe temos dirigido.
O Primeiro-Ministro e o Governo não podem continuar indiferentes a estes problema.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Matos.
O Sr. João Matos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Leitão, começo por dizer-lhe que subscrevo
inteiramente a sua intervenção, concretamente no que diz respeito às suas preocupações sociais, com as quais me identifico completamente.
No entanto, há um aspecto que quero realçar, referente à sua afirmação de que o problema das pessoas que estilo nessa situação há cerca de uma semana já podia estar resolvido. Nisso estou absolutamente de acordo com o Sr. Deputado, por várias razões: esta situação arrasta-se desde 1977; o Partido Socialista teve responsabilidades, em termos executivos, na Câmara Municipal de Loures, onde ocupou, inclusivamente, a presidência, tendo aí hoje um vereador com responsabilidades na área da habitação. Por outro lado, o Partido Socialista já foi Governo e já teve também oportunidade, de alguma forma, para resolver esse problema. Porém, o Partido Socialista nunca teve, de facto, uma política no sentido de minorar os problemas daqueles que são mais desfavorecidos.
Aliás, Sr. Deputado, os números são os factos que demonstram a realidade e, neste aspecto, posso dizer-lhe que, em 1985, foram construídos 1048 fogos para realojar pessoas em situações como as que referiu e, em 1991, foram construídos 8733 fogos. Por outro lado, em termos de investimentos do Estado na resolução deste mesmo problema, em 1985, a preços constantes de 1991, foram investidos 23 milhões de contos e, em 1992, investiram-se perto de 100 milhões de contos.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - E o que é que o Governo tem no Orçamento?
O Orador: - Esta é, de facto, a diferença que existe, em termos de preocupação social, entre o PS e o PSD. Nós demonstramo-lo com factos e os números não podem ser negados.
Por isso, Sr. Deputado, não podia deixar passar a sua intervenção sem lhe colocar, frontalmente, esta questão: por que é que o Partido Socialista, quando foi Governo, quando teve responsabilidades nessa câmara, em termos executivos, de presidência, ou em coligação ou de acordo com o Partido Comunista - como lhe quiser chamar -, não resolveu este problema e deixou que se chegasse à presente situação, obrigando o Governo a encontrar uma solução por a autarquia se ter demitido dessa mesma responsabilidade?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Leitão, há ainda um outro pedido de esclarecimento. Prefere responder já ou responde no fim?
O Sr. José Leitão (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Leitão (PS): - Sr. Deputado João Matos, compreendo a sua dificuldade, bem como a necessidade que tem de recuar a tempos muito longínquos para tentar encontrar uma justificação para a omissão do Governo. Mas recorrendo também a tempos muito longínquos, seria de relevar que o Partido Socialista, quando Governo, ajudou a integrar na sociedade portuguesa cerca de 600 000 retornados, por exemplo.
Aplausos do PS.
0 Sr. Silva Marques (PSD): - Essa não, Sr. Deputado!
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O Orador: - Por outro lado, o Sr. Deputado conhece também o numeroso conjunto de exposições que a Junta de Freguesia de Camarate e a Câmara Municipal de Loures, durante anos, enviaram aos diversos ministérios, dos quais recebiam a resposta sacramental de que "o assunto foi entregue à Secretaria de Estado da Habitação".
Sr. Deputado, esta foi sempre a resposta sacramental que recebemos em 1988 e em 1989. De facto, tardou a solução. Na realidade, só ontem foi possível ver um Secretário de Estado, o da Segurança Social, a procurar encontrar uma solução concreta para a resolução deste problema.
O Sr. João Matos (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Deixe-me acabar, Sr. Deputado. Desculpe, mas eu também quero completar a minha resposta.
Além disso, sei que o senhor e o Sr. Deputado Pacheco Pereira não conseguiram eleger-se para a Câmara Municipal de Loures...
O Sr. José Matos (PSD): - O PS também não!
O Orador: - ... Se tivessem ganho as eleições, teriam resolvido o problema do Lar Panorâmico! Porém, ganharam as eleições no País, Sr. Deputado, e, portanto, não estão isentos de contribuírem para a resolução do problema que se vive no concelho de Loures.
Penso, Sr. Deputado, que não vale a pena estarmos aqui a esgrimir responsabilidades porque o que nos interessa é a resolução do problema concreto.
A Sr.ª Conceição Castro Pereira (PSD): - E a nós também!
O Orador: - Não nos interessa saber se foi o Governo ou a Câmara quem deu mais ou menos contributo. Neste momento, não é essa a aritmética que estamos a fazer.
Vozes do PSD: - Ah!
O Orador: - Por outro lado, queria recordar ao Sr. Deputado - já que referiu isso - que, pela leitura do Orçamento do ano passado, resultava claro que a habitação social seria apenas uma realidade em zonas onde passassem auto-estradas. Portanto, para casos como este, que não estão no caminho das auto-estradas, não estavam previstas verbas para a habitação social.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esta é que é a realidade! É sistemática a demissão do Governo em matéria de habitação social, quando isto é uma questão estratégica para a coesão social. E infelizmente, Sr. Deputado, se calhar, a curto prazo estaremos aqui perante outros problemas de igual modo graves, porque são muitas as carências de habitação. E não vale a pena esgrimir espadas, há que assumir responsabilidades. Todos os parceiros têm de assumir responsabilidades: Governo, câmaras municipais, instituições privadas. É preciso que todos contribuam para a habitação, de modo que esta se torne acessível às pessoas com menores rendimentos.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Leitão, não me vou debruçar sobre as razões estruturais deste caso. Estou, no essencial, de acordo com a sua exposição e, neste momento, quero posicionar-me a outro nível, que releva já um pouco da questão civilizacional.
Como é possível que uma ordem legitima de um tribunal - ninguém a coloca em dúvida - não seja previamente preparada para poupar cerca de 600 pessoas a uma situação que é digna de um pais de barbárie, de total incivilidade, em que a própria civilização come perigo, em que o coração desta civilização parece estar à venda, como dizia, e muito bem, Adalberto Alves na televisão, ontem.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Nesse sentido, pergunto ao Sr. Deputado se não concorda que há, de facto, um perigo grave no nosso pais após 25 de Abril, nesta civilização, se não estamos perante uma nova glaciação, desta vez, dos sentimentos e das consciências.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Leitão.
O Sr. José Leitão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer-vos que sou sensível ao tom da intervenção do Sr. Deputado Mário Tomé porque, perante este problema, interroguei-me sinceramente sobre que tipo de sociedade pretendemos construir. Penso que, de facto, há que fazer um grande esforço para valorizar os sentimentos de solidariedade, bem como os laços que devem ligar todas as pessoas, independentemente das suas raças e convicções. É necessário enfrentar solidariamente estes problemas. O perigo da barbárie espreita-nos, efectivamente, se nos esquecermos do valor da pessoas, do carácter universal dos direitos do homem, daqueles valores essenciais que quer o cristianismo quer a Revolução Francesa reconhecem a cada pessoa, e isso parece-me uma aquisição fundamental que não podemos esquecer, valores relativamente aos quais temos de estar sempre alerta e vigilantes no sentido de os procurar insuflar em concreto na sociedade.
Aplausos do PS
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A democracia aprofunda-se quando, sem falsos preconceitos, reflectimos, em cada momento, sobre os limites éticos ao pleno exercício dos valores que constituem a sua essência, e entre os quais avulta o da liberdade. Liberdade nas suas variadas vertentes e em particular da liberdade de expressão e de informação.
O direito constitucional comparado refere a nossa Constituição como uma das que, entre as demais do mundo, consagra com maior amplitude e profundidade os direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão.
Trata-se de um património sócio-político de que todos nos devemos orgulhar e cujo harmonizado exercício o Estado e as instituições que o integram têm a obrigação de garantir.
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A boa doutrina constitucional, que encontra insuspeito eco em autores como Gomes Canotilho, Vital Moreira e Vieira de Andrade, não aponta para uma hierarquização dos direitos fundamentais que tende a minorizar uns em favor de outros e, no limite, a excluir direitos tidos por menos importantes em favor de outros considerados hierarquicamente prevalentes. Não, os direitos fundamentais são todos fundamentais, importando assim, em cada momento, efectuar e garantir o esforço necessário à sua harmonização que evite exclusões que a Constituição não consente.
O Sr. João Amaral (PCP): - Foi o que VV. Ex.as fizeram com o direito à greve!
O Orador: - Valor inestimável da democracia é o da constante responsabilização dos titulares dos cargos políticos e da exigência de transparência da actuação da Administração e dos seus responsáveis, que envolve, saudavelmente, a denúncia de abusos, atropelos e desonestidades.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quem assume funções públicas em democracia, sabe bem serem estas as regras do jogo, não sendo legítimo que se incomode ou reaja negativamente à denúncia pública de tais situações.
É inegável a importância que assume a comunicação social nessa tarefa e que a5 sociedades democráticas dela exigem. Cabe aqui salientar o chamado "jornalismo de investigação", que se visa detectar, e denunciar práticas lesivas ou desonestas por parte de titulares do poder político.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porém, se a denúncia de tais situações se insere na essência da democracia e da transparência que lhe é inerente, igualmente se inclui na sua essência "a verdade" do que se denuncia e a "responsabilidade" do denunciante.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Vem tudo isto a propósito da circunstância de, de vez em quando, e de ânimo leve, se lançarem impunemente acusações e suspeitas, por vezes generalizadas, a conjuntos de pessoas ou instituições, e particularmente órgãos de soberania e titulares de cargos políticos, através de órgãos de informação, sem se cuidar minimamente de documentar ou confirmar da sua verdade ou, ao menos, da sua segura indiciação.
15to não é sério, isto não é responsável!
Aplausos do PSD.
O inestimável serviço que a comunicação social e os jornalistas com tanta dignidade prestam ao País não pode ser manchado por tais situações isoladas que os próprios profissionais da informação inequivocamente reprovam.
Esquece-se que a par da liberdade de expressão e de informação a nossa lei constitucional também confere aos cidadãos outros direitos fundamentais, como o direito ao "bom nome e reputação".
A este propósito, referem Gomes Canotilho e Vital Moreira na sua Constituição anotada: "[...] conclui-se, porém, que há certos limites ao exercício do direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento, cuja infracção pode conduzir a punição criminal. Esses limites visam salvaguardar os direitos ou interesses constitucionalmente protegidos de tal modo importantes, que gozam de protecção penal. Entre eles estarão designadamente os direitos dos cidadãos à sua integridade moral, ao bom nome e reputação (cf. artigo 26.º); a injúria e a difamação ou o incitamento ou instigação ao crime (que não deve confundir-se com a defesa da discriminalização de certos factos) não podem reclamar-se de manifestações da liberdade de expressão ou de informação."
Igualmente a Convenção Europeia dos Direitos do Homem no seu artigo 10.º, n º 2, inclui, entre outros, como limite à liberdade de expressão e de opinião a protecção individual ao bom nome e reputação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recentemente, no programa do 1 º canal da RTP Conversa Afiada, em que se debatiam questões relacionadas com o combate à corrupção, a jornalista Helena Sanches Osório afirmou textualmente o seguinte: "Há valores, dos quais nunca chegaremos a ter provas, de que sabemos a história. Eu sei da história de uma virgula num decreto-lei que custou 120 000 contos à pessoa que pagou para que essa virgula fosse posta por um ministro. Agora nunca vou ter provas disso e tenho muita pena, porque é uma história muito engraçada, muito engraçada."
Por incrível que pareça, tal afirmação não foi debatida nem aprofundada no próprio programa em que foi produzida,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... nem foi, desde logo, que se saiba, objecto de diligências de investigação que a sua gravidade exige.
Saliente-se, porém, em abono desta Assembleia, que foi um Deputado quem, em primeiro lugar, reagiu a tal informação, exigindo, com frontalidade, a instauração de procedimento adequado à sua investigação e apuramento dos factos e dos seus responsáveis.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Foi, efectivamente, o Deputado Pacheco Pereira quem, no programa Flash Back, da TSF, no domingo passado, levantou, com toda a pertinência e desassombro a questão. E, dada a sua importância e gravidade, aquele Sr. Deputado voltou a ocupar-se do assunto em artigo publicado no Diário de Notícias de ontem.
Apesar de todos VV. Ex.as conhecerem, por certo, o referido artigo do Sr. Deputado Pacheco Pereira, não resisto à tentação de transcrever a sua síntese final, por constituir a correcta interpretação de uma exigência, com que qualquer de nós, enquanto cidadãos responsáveis e conscientes, facilmente se identifica. Refere o Sr. Deputado Pacheco Pereira ao concluir o seu citado artigo: "E eu, enquanto cidadão e político, também não quero suspeitas destas a pairar sobre o governo do meu pais - seja o do Dr. Mário Soares, seja o do Prof. Cavaco Silva, seja o do PS, do "Bloco Central" ou do PSD. Eu quero que o ministro corrupto que a Helena Sanches 'sabe' que aceitou os 120 000 contos vá para a rua (se for do actual governo) e para a cadeia."
Aplausos do PSD e do PS.
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"Agora, também quero que, se aquilo que Helena Sanches Osório afirmou não passar de um boato e for mais uma das invenções das muitas que circulam no submundo da política, das polícias e dos jornais, haja responsabilização para quem o possa ter dito levianamente em público, na televisão, tudo aquilo que nos passa pela cabeça e as palavras deixam de ter valor. E isso não tem `graça' nenhuma. É a corrupção das almas." Fim de citação.
A acusação é de tal forma imprecisa quanto à pessoa a que possa ser imputada que se lança uma suspeição quer sobre os membros do actual governo, quer sobre quem tenha integrado anteriores executivos.
Bem andou, pois, o Sr. Primeiro-Ministro ao solicitar ao Sr. Procurador-Geral da República a instauração dos procedimentos adequados à investigação do caso e ao apuramento da verdade.
A gravidade da questão justificou também que o Primeiro-Ministro desse conhecimento do teor da carta dirigida ao Sr. Procurador-Geral da República, ao Sr. Presidente da República e à Assembleia da República e informasse disso o País através de nota oficiosa.
De matérias com esta gravidade e implicação, nenhum órgão de soberania se deve alhear, actuando, com oportunidade e adequadamente no âmbito das suas competências próprias.
Um Estado de direito democrático só o é verdadeiramente, quando todas as suas instituições funcionara com a prontidão e eficiência que lhes é exigida. A sensibilidade do Sr. Procurador-Geral da República para estas questões foi ainda recentemente confirmada na conferência que proferiu na Faculdade de Direito de Coimbra na cerimónia de entrega de diplomas aos alunos do primeiro curso de Direito da Comunicação, que ali se realizou e onde afirmou: "Ainda relevante, em termos de conflitualidade, é o facto de a comunicação social, pela sua função, se encontrar perigosamente próxima de abismos como o da intrusão ou invasão da vida privada, assumindo-se, também por esta forma, como actividade de risco, em que são particularmente visados direitos e interesses juridicamente protegidos. A conflitualidade típica desta situação é indubitavelmente daquelas com que a justiça tem maiores dificuldades em lidar."
"Em primeiro lugar, o principio de que os direitos de informar e de procurar informação não são só direitos constitucionalmente tutelados como também valores estruturantes da ordem democrática, desde logo por serem instrumentais da liberdade de saber e de escolher.
Por outro lado, o de que o exercício daqueles direitos supõe a observância de normas e princípios de natureza legal ou deontológica que os jornalistas têm de respeitar rigorosamente, assumindo uma tensão que, muito à semelhança dos magistrados, tem dimensões de consciência." Fim de citação.
Não deixa também de ser significativo que os próprios jornais e alguns jornalistas se associem ao clamor que este caso concreto vem gerando, recolocando, a propósito a questão da ética e do rigor jornalísticos, como o fez o jornalista Pedro Cid no Jornal de Notícias do Porto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados 18 anos sobre a implantação da democracia em Portugal, não podemos continuar a justificar desvios e distorções ao correcto exercício das liberdades fundamentais, com o trauma da ditadura e à necessidade de descompressão social que se lhe seguiu e que compreensível e inevitavelmente con-
duziu, então, a alguns excessos. Somos hoje uma democracia estabilizada e atingimos, felizmente, a maturidade cívica que não pode jamais dissociar o precioso valor da liberdade do da responsabilidade.
À comunicação social, pelo impacte que tem sobre a opinião pública e pela superior função de informar que lhe compete, tem de se garantir a liberdade que a Constituição consagra, mas tem de se lhe impor também responsabilidade e exigir verdade.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que está em causa é uma questão de Estado muito séria, é uma questão institucional que tem a ver com a solidificação dos alicerces da democracia que construímos e que se não compadece de aproveitamentos, nem de desvirtuamentos político-partidários. Em causa está também a dignidade dos profissionais da informação a quem a democracia tanto deve e que não podem ser manchados nem confundidos com casos isolados deontologicamente reprováveis.
Não se trata, sequer, de desencadear novas iniciativas legislativas tendentes a criar novos mecanismos de responsabilização de quem quer que seja. Trata-se, tão-só, de fazer cumprir e impor o acatamento da lei vigente no âmbito do regular funcionamento das instituições democráticas, sem qualquer demissão de responsabilidades.
Por assim ser, e dada a gravidade da questão, entendemos e propomos que a Assembleia da República promova a realização de inquérito parlamentar, aprovando deliberação tendente a constituir uma comissão eventual, para apurar qual o ministro a quem é imputada a alteração de decreto-lei contra o recebimento de avultada quantia, bem como qual o diploma a que tal respeita. E fazemo-lo em nome da transparência da vida pública, da responsabilização dos titulares de cargos públicos e do apuramento integral da verdade com todas as suas consequências.
Propomos também que tal comissão seja presidida por um Deputado de um dos partidos da oposição e seja aberta à comunicação social, para que fique bem claro o rigor e a isento que se pretende garantir aos seus trabalhos e à investigação a que irá proceder.
Apelo para o consenso da Câmara e estou certo de que nenhum partido deixará de votar favoravelmente o procedimento proposto, porque ditado pela mais elementar exigência de defesa das instituições e da democracia, de que esta Assembleia e os Deputados que a integram, legítimos representantes do povo que os elegeu, se não podem alhear. E em cuja primeira linha sempre se têm encontrado.
Vou apresentar na Mesa o requerimento, pedindo a abertura do inquérito e a constituição da comissão eventual para o efeito.
Aplausos do PSD e do PS,
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, também eu me indignei quando tive conhecimento dessa denúncia feita de forma tão genérica e tão imprecisa como é o caso dessa famosa vírgula, que está a apaixonar a opinião pública. Em todo o caso, penso que há instrumentos para responder a essas denúncias assim formuladas,
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que são sobretudo perigosas porque se referem a um universo de pessoas não identificadas, todos os actuais ministros, todo os ex-ministros, não se sabe até que data remota Assim sendo, eu próprio, que fui ministro, considero-me ofendido, como é óbvio.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Portanto, se o Governo não tivesse tomado a atitude que tomou, de participar imediatamente à Procuradoria-Geral da República o facto, eu próprio teria tomado a iniciativa de o fazer. Também nós estávamos a preparar-nos para declarar aqui a nossa disponibilidade para votar uma comissão de inquérito e penso que não é de mais, perante situações de tal gravidade, que usemos duas vias: a via parlamentar, porque a Assembleia acaba de ter conhecimento que, eventualmente, um ministro (que ela tem obrigação de fiscalizar), possivelmente, terá cobrado, por uma virgula, 120 000 contos, ao que parece.
Estamos perante um facto que merece condenação e é preciso agir com eficiência, agir com capacidade de chegar a resultados positivos, porque, se é total a liberdade de imprensa, com as restrições previstas na lei, é também bem definida na lei a responsabilidade dos seus profissionais.
É claro que não gostaria que partíssemos daqui, e o Sr. Deputado também não partiu, para uma batalha de pendão e caldeira de modo a arranjarmos novas forças de bloqueio. Não é essa a sua ideia nem a minha. Agora, o que penso é que, de facto, se deve acentuar cada vez mais a responsabilidade dos órgãos de comunicação social e dos respectivos agentes, mas também o grau da sua responsabilidade definida na lei actual, que chega e cresce para que o problema se resolva.
Portanto, só posso desejar que se chegue a um resultado positivo, que não se fique, mais uma vez, na nebulosidade de uma afirmação não concretizada, pois, se não o for, se não se chegar a resultados positivos, ela enodoa, suja, o nome de todos aqueles que fazem parte do universo abrangido e a classe política tem o direito de se defender de acusações deste género.
Penso que estamos no bom caminho para o fazermos, vamos usar os instrumentos de que dispomos para nos defendermos, desejando que a verdade que venha à tona. E se houver alguém que tenha cobrado por uma vírgula tamanha soma- ou que sejam 120$, porque o montante não é o mais importante -, nessa altura que seja demitido, se for um ministro actual, ou que seja posto na cadeia, se for um ministro do passado.
Aplausos do PS, do PSD e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, o CDS comunga, também, em boa parte, das preocupações que o Sr. Deputado expôs à Câmara.
Concordamos inteiramente com as afirmações cuidadas que fez sobre a liberdade de imprensa e sobre os direitos fundamentais, mas a nossa opinião é a de que esta Câmara não pode levar a sério todas as atoardas que qualquer jornalista profira, em qualquer circunstância, com o seu direito e os seus conhecimentos, em termos de tornar as coisas do conhecimento público, formando, de imediato,
comissões de inquérito para averiguar não se sabe bem o quê.
Assim, embora reprovemos a acusação que foi feita, não a podemos levar a sério nem nos parece correcto que se faça um inquérito contra incertos ou, melhor, contra dúzias de incertos, sabe-se lá ao longo de quanto tempo e de quantas sessões legislativas.
Em segundo lugar, acabámos de aprovar aqui, no Parlamento, regras novas sobre os inquéritos parlamentares, entre as quais figura a ideia de que, estando a correr, pelas vias próprias, um procedimento criminal ou um processo oficial de inquirição ou de averiguação de determinadas circunstâncias ou factos, esta Câmara não se deve substituir às verificações oficiais.
Nestes termos, compreendemos e acompanhamos o PSD no seu lamento sobre a situação, acompanhamos os princípios expendidos pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, mas a criação de uma comissão de inquérito é uma ideia que não pode merecer, de forma alguma, o nosso acordo.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, antes de mais, queria manifestar o meu regozijo e a minha satisfação pelo facto de V. Ex.ª e o Partido Socialista se identificarem com as nossas preocupações relativamente a este incidente.
Quero deixar claro, e penso que a minha intervenção foi suficientemente explícita nesse sentido, que não estamos em nenhuma cruzada contra a comunicação social. Aliás, parece-me que todos nos devemos regozijar com o facto de a informação ter profissionais dignos, na sua maioria.
No entanto, entendemos que a reacção a estas situações é nosso dever, não só como classe política atingida mas também pelas funções que desempenhamos, para as repor no seu devido lugar, em nome da dignificação da informação e dos profissionais que exercem com dignidade a sua função.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Aproveitando a abertura de V. Ex.ª, propunha que procedêssemos já hoje à votação do requerimento que apresentámos, se houver consenso nesse sentido.
Em relação ao Sr. Deputado António Lobo Xavier, tenho de dizer que estranho muito a sua posição, pois não se trata, obviamente, de uma afirmação qualquer, de um fait divers ou de uma questão secundária, mas de uma questão suscitada na televisão, perante muitos milhões de telespectadores, e que se traduz numa acusação de tal gravidade que não pode, efectivamente, passar em claro.
Se assim não fosse, estaria inteiramente de acordo consigo, tanto mais que não é frequente assumirmos estas iniciativa; porém, a gravidade da situação impunha que se desencadeasse este processo.
Por outro lado, como disse há pouco o Sr. Deputado Almeida Santos, esta questão não atinge só os membros do actual governo. Ela foi colocada de uma forma que abrange talos e quaisquer ministros que tenham integrado qualquer executivo, incluindo os ministros do CDS, e muitos houve em vários governos.
Ora, V. Ex.º, perdoar-me-á esta expressão, negligenciou um pouco a defesa de companheiros seus que integraram,
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efectivamente, vários executivos e deveriam merecer, neste momento, alguma solidariedade, ou seja, a viabilização desta iniciativa por parte do CDS.
Aplausos do PSD e do Deputado do PS José Reis.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Deputado, pode conceder-me alguns minutos do seu tempo?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado, teria muito gosto em conceder-lhe alguns minutos, mas há limitações de tempo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotou-se o tempo destinado às declarações políticas.
Vamos dar inicio a uma outra fase do período de antes da ordem do dia, a da produção de intervenções pela ordem das inscrições.
Entretanto, informo a Câmara de que vai proceder-se à distribuição do requerimento apresentado pelo PSD, que será votado, se houver consenso, à hora regimental.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15ilda Martins.
A Sr.ª 15ilda Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das características mais interessantes da Europa do pós-guerra foi o fenómeno turístico, que emergiu de factores diversos mas sobretudo das facilidades de acesso que as vias de comunicação exigidas pelo esforço da guerra proporcionaram às populações europeias.
Este fenómeno acabou por se reflectir no nosso pais, em particular no Sul, no Algarve.
Quando, em 1971, o empresário André Jordan adquiriu a Quinta dos Descabeçados, no litoral algarvio, tinha em mente a execução de um projecto que correspondesse ao grau de qualidade que, no seu entender, exigia este recanto privilegiado da Europa Ocidental, de extensas praias de areias finas e douradas, banhadas por um mar calmo de águas transparentes aquecidas por um sol que brilha com persistência todo o ano.
O Algarve deslumbrava os empresários estrangeiros mais cultos e esclarecidos, cuja filosofia de markting turístico assentava no princípio de que a uma boa qualidade de oferta deve corresponder idêntico grau de qualidade de serviços.
A indústria turística algarvia nascia assim em berço de ouro. Pela mão de empresários estrangeiros, floresceram complexos turísticos de grande qualidade, como Vale de Lobo e Quinta do Lago, e pela primeira vez associou-se a ideia de turismo de qualidade à cultura, sendo o fundador deste último empreendimento o promotor, em 1973, do primeiro Festival Internacional de Música do Algarve.
É lícito perguntar por que razão estes exemplos não fizeram escola.
Em primeiro lugar, pensamos que tais empreendimentos, em termos de padrões de cultura ocidental, correspondiam a um nível de desenvolvimento superior e não se ajustavam à realidade portuguesa que era a de um pais acentuadamente atrasado com uma classe média em geral descapitalizada.
Assim, infelizmente, o que vimos proliferar, como cogumelos, foram iniciativas de oportunistas vindos de todo o lado, sedentos de lucros fáceis, procurando explorar, de uma forma apressada, uma galinha que inesperadamente começara a pôr ovos de ouro.
Era a mentalidade típica de uma classe média inculta, a mesma que no Norte do País, com as descargas das suas fábricas, poluía os cursos de água e colocava em desequilíbrio diversos ecossistemas.
O governo central, habituado ao marasmo económico próprio das oligarquias, nem se apercebia de que as modificações produzidas na Europa se estavam a reflectir no Algarve.
Acresce que, sendo o Algarve uma região periférica, os cargos administrativos eram considerados de menor importância e, se a monarquia os atribuiu a nobres de segunda, a República mantém a tradição e confia-os a clientelas políticas menos dotadas.
Os raros quadros técnicos enfermavam de deficiente formação científico-cultural.
As autarquias, desprovidas de poder e de saber, vogavam ao sabor de interesses pontuais.
Sem uma estratégia de desenvolvimento regional ou local, a indústria turística algarvia acabou por ser vítima de um crescimento anárquico que se manteve mesmo depois da Revolução de Abril.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É justo salientar que foi só com o governo presidido pelo Prof. Cavaco Silva que se tomaram medidas tendentes a pôr cobro a esta anarquia. Foi o governo do Prof. Cavaco Silva que defendeu o principio de que a qualidade da indústria turística estava intrinsecamente ligada ao grau de evolução da região e que seria impossível fazer progredir uma das partes, um sector, desligada do todo a que, por natureza, pertence.
Entendendo o Governo que o progresso assenta no desenvolvimento harmonioso e integrado de todos os sectores, havia que definir as estratégias e criar os instrumentos adequados à sua concretização.
Assim, em termos gerais, elaborou-se o primeiro Programa Regional de Ordenamento do Território (PROTAL), estão em curso os planos directores municipais (PDM) e tomaram-se medidas concretas para o desenvolvimento integrado dos sectores primário, secundário e terciário que passam pela florestação da serra algarvia, pela defesa dos pomares mediterrânicos, pela construção de barragens que permitam o alargamento das áreas de regadio ou, ainda, no sector da cinegética, pela criação de coutadas que possibilitem a diversificação da oferta turística.
Designadamente, no sector das pescas promoveu-se a construção de portos, docas e lotas informatizadas e no sector do ensino o Governo apoiou, sem tibiezas, a Universidade do Algarve, onde estão a formar-se os quadros técnicos de que a região carece, e adquiriu recentemente o belíssimo Convento de São Francisco, em Faro, onde irá funcionar a Escola Superior de Hotelaria e Turismo, estando, entretanto, em curso a construção de uma rede de escolas que cobrirá todo o Algarve.
Por outro lado, a nível de acessibilidades está em curso a abertura de um vasto leque de novas estradas e o melhoramento das existentes, sendo de salientar a construção da longitudinal denominada "Via do Infante", auto-estrada que permitirá uma rápida deslocação por todo o Algarve e facilitará os acessos a Lisboa e a Andaluzia.
Vai ser este desenvolvimento integrado que possibilitará ao Algarve a oferta de um turismo de qualidade que, no nosso entender, assenta em cinco pilares: na qualidade do alojamento, do meio ambiente, dos serviços, da animação e da promoção.
No que se refere ao alojamento, estão em curso medidas para uma fiscalização rigorosa, de modo a garantir que a oferta de alojamentos turísticos seja de boa qualidade. Na
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verdade, há que tomar medidas urgentes contra o alojamento clandestino, as camas paralelas e o alojamento de má qualidade, pois prejudicam a imagem e contribuem para a desvalorização de toda a indústria turística algarvia.
Em relação ao ambiente, um meio ambiente cuidado é o principal indicador de qualidade da indústria turística.
Neste âmbito, o Governo tem em curso uma panóplia de medidas regulamentares de preservação do meio ambiente, nomeadamente a criação de zonas de ocupação turística e o ordenamento da orla costeira De facto, é desagradável, por falta de cumprimento de prazos de construção, ver velhos lotes transformados em lixeiras; logradouros e edifícios inacabados abandonados; casas e muros por pintar.
A responsabilização dos residentes em zonas turísticas pela conservação do seu património parece-nos mais vantajosa para a qualidade do ambiente do que pesados encargos fiscais.
Por seu lado, as câmaras deviam ser autuadas quando não cumprem as regras mínimas de saneamento básico, pois algumas, por desleixo, não reparam as avarias das estações elevatórias, permitindo que os detritos sejam canalizados directamente para as praias, como acontece em Vila do Bispo.
No que diz respeito aos serviços, poderíamos subdividir esta área em meios técnicos e humanos.
Vamos cingir-nos aos polémicos apoios de praia que proliferam ao longo da costa algarvia de uma forma anárquica e desprovida de qualidade. Chega a ser chocante que, em instâncias turísticas de grande qualidade, o apoio de praia assuma o carácter de barracão de feira, onde é notória a falta de higiene e de preparação do pessoal e onde se praticam preços exorbitantes.
Também uma breve referência aos inúmeros restaurantes e similares clandestinos de má qualidade, que não pagam impostos nem têm encargos com a segurança social. Acabado o Verão, arrecadam os vultosos lucros e, sem qualquer responsabilidade, fecham a porta e desaparecem, enquanto os empresários dos restaurantes legais e de qualidade, com pessoal especializado e permanente, se vêem sobrecarregados com impostos e outros encargos, originando a situação injusta de a legalidade ser penalizada.
A ocupação dos tempos livres é importante na caracterização do turismo. É um dado adquirido que o moderno turista exige para os seus tempos de lazer mais do que a praia e o sol. Aqui, desempenha papel primordial o turismo cultural, para o qual o Algarve tem capacidade de oferta quer a nível de património cultural quer natural, pelo que seria aconselhável uma conjugação de esforços mais eficaz entre as Secretarias de Estado do Turismo e da Cultura.
Em relação à promoção, a indústria turística deve ser objecto de tratamento idêntico às restantes congéneres, tendo em conta as respectivas especificidades.
A indústria turística é hoje uma ciência e, como todas as outras, nasceu de uma forma empírica, sendo as actuais comissões ou regiões de turismo os vestígios dessa fase primária. Trata-se de estruturas obsoletas, pouco eficazes e muito onerosas.
A indústria turística é de iniciativa privada, pelo que cabe aos empresários a responsabilidade da promoção e venda do seu produto.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Por isso é que é uma ciência; se fosse de iniciativa pública, era uma prática!
A Oradora: - Ao Governo compete regulamentar e apoiar as empresas nas áreas de formação, no estudo das melhores estratégias de mercado e, em suma, na adopção de medidas favoráveis ao desenvolvimento desta indústria.
Os milhares de empresas e estabelecimentos de vocação turística existentes no Algarve poderiam financiar, sem qualquer esforço, um programa de promoção e publicidade. Aliás, mais vale gastar em promoção do que oferecer descontos ruinosos e pouco dignificantes para a imagem de qualidade que se pretende.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A indústria turística é uma indústria jovem e em fase de expansão.
Acreditamos no futuro da indústria turística em Portugal, sobretudo no Algarve, que é uma região de grandes potencialidades.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Timor Leste, uma vez mais. O tema, eu sei, incomoda a maioria.
A ocupação de Timor Leste pela Indonésia, a memória viva do genocídio, a certeza da repressão quotidiana, o sofrimento de um povo privado do direito de construir em liberdade o seu futuro provocam em Portugal solidariedade, dor e mal-estar. Esses sentimentos embaraçam o Governo e incomodam-no muito, porque o discurso oficial sobre a terra maubere, barroco e nevoento, prolonga incertezas, estimula ilusões e evita sistematicamente as questões de fundo.
O Grupo Parlamentar do PCP não exige do Governo o impossível. Pede-lhe somente o possível e indispensável: que seja coerente e firme na condução do caso de Timor Leste.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Abril próximo, os Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal e da Indonésia vão retomar na Europa as conversações sobre Timor Leste, cuja primeira fase decorreu em Dezembro nas Nações Unidas sem produzir quaisquer resultados. Seria uma ingenuidade esperar que o novo encontro tire o diálogo do pântano em que caiu, ou seja, que se chegue a um consenso que corresponda minimamente às aspirações do povo maubere à autodeterminação e independência.
A contradição entre as palavras e os actos dos governantes indonésios assume aspectos cada vez mais chocantes. Enquanto em Timor a repressão prossegue - são muitos os indícios de que o anunciado julgamento de Xanana Gusmão será mais uma farsa judicial montada pelas autoridades indonésias -, o general Suharto apresenta o seu país como campeão mundial na luta pelas liberdades e direitos dos povos.
No discurso de encerramento que proferiu em Jacarta, na Cimeira dos Não Alinhados, o Presidente da Indonésia condenou insistentemente "o domínio do forte sobre o fraco, do rico sobre o pobre". Foi também categórico na condenação de atrocidades cometidas no território da antiga Jugoslávia e das graves violações dos direitos humanos que ali atingem as populações. Afirmou, então, que os Estados poderosos devem respeitar os vizinhos débeis, aproveitando a oportunidade para reafirmar o seu apoio à luta do povo palestiniano "pelos seus direitos inalienáveis à autodeterminação e independência". De Timor, obviamente, não disse uma palavra.
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Porventura o Governo Português, no local mais adequado, ou seja, na Assembleia Geral das Nações Unidas, pelo Conselho de Segurança da ONU.
denunciou a contradição frontal entre os princípios proclamados pelo general Suharto em Jacarta e a prática que os Vozes do PCP: - Muito bem!
nega, nomeadamente a invasão de Timor Leste e os crimes ali cometidos?
O Sr. João Amaral (PCP): - Bem perguntado!
O Orador: - Não, Srs. Deputados. O Governo
Português continua a tratar a Indonésia com luvas de seda,
evitando arranhar-lhe a sensibilidade. É contra silêncios
como este que os comunistas portugueses protestam.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Muito bem!
O Orador: - No momento em que Jacarta se prepara
para ser sede de uma Conferência Internacional sobre
Direitos do Homem - vejam só! -, a passividade do
Governo Português na denúncia frontal e permanente do
cinismo indonésio encoraja a ditadura de Suharto a levar
mais longe o seu farisaísmo. O Ministro Ali Alatas, em
rasgo de humor negro, já nos chama hipócritas!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O general Suharto,
quando visitou Paris, em Novembro, ofereceu, aliás, ao
povo francês uma demonstração prática, esclarecedora do
seu conceito de democracia e de respeito pelas liberdades.
A sua policia secreta - à paisana, como é óbvio -, ao
encontrar, numa das cerimónias oficiais, trabalhadores
imigrantes portugueses que protestavam contra a anexação
de Timor Leste e as últimas violências dos ocupantes,
retirou faixas e cabazes das mãos dos nossos compatriotas,
agredindo mesmo alguns. Não respeitou sequer a soberania
francesa.
Pergunto, Srs. Deputados: manifestou o Governo Português o seu repúdio por atitudes como essa, definidoras de
arrogância autocrática e policiesca das invasores de Timor
Leste? Não! Ignorou também o espancamento em França,
por esbirros indonésios, de cidadãos portugueses solidários
com a causa de Timor Leste.
Naturalmente, a Indonésia adopta esse estilo desafiador
porque sabe contar como apoio dos Estados Unidos. A posição norte-americana é muito clara: Washington considera
a anexação de Timor Leste pela Indonésia como um facto
consumado.
Perante a situação criada, como procede o Governo
Português? Fala muito, mas faz pouquíssimo, quase nada!
Há poucos dias, o futuro secretário de Estado dos Esta
dos Unidos, Sr. Christopher Warren, afirmou, com expressão de tédio, não ter < soluções mágicas - foram estas
as suas palavras para Timor Leste.
Não é este o lugar para dizer o que penso do comportamento moral de sucessivas administrações norte-americanas no tocante a Timor Leste, mas não é certamente o
silêncio a resposta que tais atitudes merecem.
Não geria realista exigir do governo do PSD o que não
está ao seu alcance, ou seja, forçar uma reviravolta da
posição americana, mas é legítimo exigir-lhe - insistimos - uma política de firmeza na sustentação dos
interesses e direitos do povo maubere.
Sintetizo, Srs. Deputados: não basta pedir a Jacarta que
respeite os direitos humanos. É indispensável insistir, e o
Governo não o faz, no direito dos Timorenses à autodeterminação e à independência, pois esse direito é referido
na Constituição da República Portuguesa e consta explicitamente de resoluções aprovadas pela Assembleia Geral
O Orador: - Em segundo lugar, é dever do Governo desmascarar a política de cobertura dos Estados Unidos à Indonésia. No entanto, o Governo Português, que acaba de engolir o desabafo do Sr. Christopher Warren sobre as "soluções mágicas", engoliu antes os insultos ao 25 de Abril do ex-Secretário dos Assuntos para a Ásia Oriental e Pacifico, Sr. Quinn.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, repito: o primeiro dever do governo de Cavaco Silva no tocante à política timorense é assumir posições límpidas e sustentá-las sem desvios nem receios. O respeito que merece a luta pela liberdade do povo maubere torna cada vez mais indispensável uma mudança da política timorense do Governo Português. A actual, semeada de ambiguidades e omissões, não serve.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.
O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Urbana Rodrigues, ouvi com bastante atenção a intervenção que acabou de proferir sobre uma matéria tão sensível e tão cara a talos os portugueses, a todos os homens de boa vontade que, à superfície da terra, defendem e pugnam pelos direitos do homem.
V. Ex.º fez algumas afirmações, na minha opinião, em tom de certa forma acusatório relativamente ao Governo Português. Ora, na minha qualidade de acompanhante de toda esta questão na Assembleia da República, penso que teria de haver uma maior ponderação por parte do Partido Comunista, atendendo à dificuldade e à situação em que os governos de Cavaco Silva receberam a questão da problemática de Timor Leste.
Quero associar-me a V. Ex.ª nas preocupações relativas aos direitos do homem quanto à situação vivida naquele território, mas também faço a seguinte pergunta: onde estavam os comunistas portugueses, em 1974, em 1975, em 1976 e nos anos seguintes até 1983, altura em que foi constituída na Assembleia da República a Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste? Onde estavam os comunistas portugueses no início da convulsão naquele território para defenderem com igual força e veemência os direitos do homem no território de Timor Leste?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Geraldes, vou responder-lhe de forma rapidíssima porque o tempo de que ainda dispomos para este período de antes da ordem do dia é para ser preenchido por uma intervenção da minha camarada Odete Santos.
Em primeiro lugar, o meu tom não foi "de certa forma acusatório", foi frontalmente acusatório.
Em segundo lugar, como prova de que as minhas acusações são justas, apenas citarei um pormenor: vinte e quatro horas após a prisão de Xanana Gusmão, em Díli,
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foram elaborados dois votos nesta Assembleia, que, posteriormente, foram lidos pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
Nessa altura, o Sr. Deputado João de Deus Pinheiro, que tinha acabado de deixar o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, em que teve a responsabilidade da questão de Timor Leste, considerou que os referidos votos continham referências criticas à Indonésia que ele pediu para serem retiradas dos textos. Ora, acho que isto, só por si, confirma o que eu disse.
Para terminar e quanto à referência que fez aos comunistas, respondo-lhe que, em qualquer lugar e em qualquer momento, os comunistas estão sempre na primeira linha da batalha pela defesa dos povos que lutam pela liberdade e pela independência.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro de Almeida.
O Sr. Casimiro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O apelo que aqui trago a esta Câmara - no cumprimento de um dever de solidariedade para com as populações cujos legítimos interesses me incumbe defender - tem a dramática dimensão de uma grande angústia.
Angústia a que urge pôr termo com toda a celeridade, a mesma celeridade com que essas populações atingidas acreditaram, confiaram e confiam nos compromissos assumidos pelas entidades que, diligentemente, se vêm empenhando na conquista de soluções de emergência, tão eficazes quanto possível.
A situação, muito em síntese, poderá resumir-se do modo que passo a expor.
Procurando resolver o problema da defesa do ambiente - problema que assumia foros de incontrolável gravidade face ao desenvolvimento da região, inquestionável sejam quais forem os ângulos de observação -, os municípios de Oliveira de Azeméis, São João da Madeira e Vale de Cambra constituíram-se em associação e abalançaram-se à construção de um aterro sanitário. Solução prevista para 20 anos, período que possibilitaria o estudo e execução de mais arrojado projecto, porventura, abrangendo uma bem maior área geográfica.
Apesar da reconhecida experiência das empresas seleccionadas - produtora do projecto, construtora e gestora do aterro, erguido sob estudo submetido a todos os pareceres das entidades responsáveis -, viria agora a verificar-se um gravíssimo problema de inquinação de águas.
Águas utilizadas nos usos domésticos e nas actividades agrícolas que, para estas populações, têm ainda muito significativo peso económico. Fáceis de avaliar, em tais circunstâncias, a angústia e o estado emocional destas laboriosas gentes, privadas do mais essencial dos bens. Perfeitamente compreensíveis, portanto, a1 vozes a as atitudes de protesto que, não ultrapassando os limites do civismo, apenas reclamaram legitimamente a resolução de tão angustiante problema.
Todas as entidades envolvidas, com especial relevo para a Associação dos Municípios das Terras de Santa Maria, de imediato procuraram desencadear as providências possíveis no sentido do abastecimento de água, enquanto que, paralelamente, sempre se optou por privilegiar o diálogo com as populações e seus representantes.
Fruto desta actuação, a que o Sr. Governador Civil de Aveiro concedeu a mais prestimosa e decisiva colaboração, obtida a desejada tranquilidade, estão reunidas as condições para se iniciarem os trabalhos de recuperação e beneficiação do aterro, de acordo com as directrizes dos especialistas na matéria, para que não possa voltar a repetir-se acidente de tão catastróficos efeitos, para que a confiança regresse a essas martirizadas gentes.
Esta atarefa em que a Associação de Municípios se vai empenhar de imediato, o que de modo algum exclui o propósito de, em tempo oportuno, proceder a uma exaustiva análise das razões que estiveram na origem do acidente, incluindo, obviamente, um eventual apuramento das responsabilidades.
Embora não seja, por enquanto, possível determinar, com credível margem de segurança, os custos dos trabalhos a realizar, é facto sabido que atingirão verbas muito elevadas, de todo incomportáveis para os réditos daqueles três municípios aveirenses.
Mas, em situação de catástrofe como esta, criminoso seria que a ausência de meios financeiros constituísse impedimento e atraso. E, a prová-lo, está a já assegurada promessa de financiamento do Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, procedimento que, por certo, será acompanhado pelo Sr. Ministro do Planeamento e Administração do Território, muito em especial, no que concerne as estudo, apresentação e aprovação de um projecto de candidatura aos indispensáveis apoios comunitários, visando a recuperação técnico-funcional do respectivo empreendimento.
É nesta convicção ou bem mais que isso -, é nesta certeza que proeuro interpretar os sentimentos de angústia das populações atingidas, também elas imbuídas de uma esperança que não poderemos trair.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins, que apenas dispõe de um minuto.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Casimiro de Almeida, em primeiro lugar, quero saudá-lo por ter trazido esta matéria à Assembleia da República. Aliás, eu próprio já me tinha comprometido a abordá-la nesta sede e fá-lo-ei quando entender conveniente. De momento e face à sua intervenção, colocar-lhe-ei duas questões.
A primeira questão é a de saber por que razão depois do mal feito querem pôr "trancas à porra", visto que foi isto que o Sr. Deputado aqui veio dizer-nos. É que, nesta matéria, entendemos que as responsabilidades são do PSD e do Governo.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Porquê, Sr. Deputado?
O Orador: - Em segundo lugar, gostaria de saber como é que o Grupo Parlamentar do PSD e o Governo encaram o problema que está a alastrar por todo o País e que consiste na contaminação das nossas águas de superfície e também subterrâneas.
Nestes termos, também gostaria de saber como é possível o Sr. Deputado vir aqui dizer que os Srs. Ministros do Ambiente e Recursos Naturais e do Planeamento e Ordenamento do Território estão fortemente empenhados
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na resolução do caso que citou, indo arranjar fundos comunitários para resolver o problema. É que o Sr. Deputado certamente sabe tão bem como nós que o empreendimento a que se referiu foi co-financiado pelos fundos comunitários. Perante isto, gostaria de saber porque é que se construiu aquela vergonha, que é, de facto, o que ali está, Sr. Deputado, que - repito - é da responsabilidade do PSD e do Governo.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Porquê, Sr. Deputado?
O Orador: - Com efeito, é uma vergonha que na altura não se tenha feito o investimento devido, que obedecesse às condições técnicas obrigatórias por lei e, agora, verificamos que, dadas as condições de contaminação da água, só talvez daqui a 20 ou 30 anos aquela região disponha de água potável, em condições de ser consumida por seres humanos. É a esta situação que estamos sujeitos e é esta a política do actual Governo, sustentado pelo PSD.
Gostaria, pois, de ouvir as suas explicações, Sr. Deputado.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Pouca clareza e muita demagogia! O Sr. Deputado tem um completo desconhecimento das coisas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro de Almeida.
O Sr. Casimira de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, as suas palavras não nos trazem nada de novo. Na verdade, opta por responsabilizar-nos por este problema quando, neste momento, estamos é a tentar resolvê-lo. Aliás, ao querer responsabilizar o Governo e o PSD, o Sr. Deputado engana-se redondamente e coloca mal o problema.
É que, em primeiro lugar, o estudo, o projecto e a respectiva aprovação relativos à obra nem sequer ocorreram durante a governação do PSD mas antes.
Em segundo lugar, se o que pretende é atingir as autarquias locais que exploram este aterro sanitário, também se engana redondamente, porque, mesmo querendo falar em termos políticos, respondo-lhe que duas das autarquias que utilizam o aterro não são PSD e numa que também o utiliza o vereador responsável pelo pelouro respectivo é do CDS. Portanto, como vê, está a colocar mal o problema.
Para além disto, como afirmei, não estamos preocupados em saber de quem são as responsabilidades por esta obra porque, neste momento, pretende-se é resolver o problema. Ora, é nesse sentido que aqui vim dizer que, felizmente e ao contrário de tudo o que se dizia, o Governo disponibilizou verbas para resolver a questão, enquanto a vossa preocupação certamente era a de que o problema se mantivesse para poderem continuar a "arvorar a bandeira". Ora, quero dizer-lhe que não é dessa forma que procedemos, mas sim que, primeiro, tentamos resolver os problemas e só depois iremos apurar as responsabilidades, numa segunda fase do processo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.
O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As principais forças políticas e os parceiros
sociais têm vindo a considerar a formação profissional como um dos elementos chave do sucesso do mercado interno, iniciado em 1 do corrente.
É inquestionável o esforço que agentes económicos e sociais têm colocado neste objectivo com as orientações e apoios que a Comunidade Europeia tem despendido para este 8m. E note-se que os apoios comunitários, em termos financeiros, no final do ano em curso, atingirão 400 milhões de contos.
E esperava-se que no primeiro ano do mercado interno tais esforços se multiplicassem, fosse pelos parceiros sociais, fosse pelo Governo da República.
A Cimeira de Edimburgo, com a aprovação das medidas propostas pelo Presidente da Comissão da Comunidade, Sr. Jacques Delors, foi um sinal motivador e expectante para todos os parceiros sociais que aí viram a possibilidade de aumentar a sua competitividade, produtividade e qualidade e, consequentemente, viram diminuídos os seus legítimos receios do mercado interno.
É neste quadro - só assim o podemos entender - que o Instituto do Emprego e Formação Profissional, através da sua comissão executiva, em 24 de Novembro último, delibera cancelar apoios à formação profissional, nomeadamente, aos cursos de novas tecnologias - os chamados PO 4 - e aos cursos de curta duração de activos (iguais ou inferiores a cinquenta horas) - os chamados PO 1.
15to surge quando na revista Emprego e Formação Profissional, de Setembro de 1992, editada pelo IEFP (dois meses antes da decisão da comissão executiva), na análise feita à execução do referido Programa Operacional n.º 4, pela gestora nacional do programa, se afirma: "A repartição dos formandos por actividades económicas pode ser visualizada no quadro e gráfico seguintes, verificando-se que as actividades ligadas ao sector terciário, tais como comércio, hotelaria e sector bancário, deverão ver o seu peso relativo aumentado, com vista a uma melhor integração nos padrões de desenvolvimento comunitário."
15to surge como se fosse possível aumentar a competitividade e produtividade dos agentes económicos e, simultaneamente, aumentar a qualidade dos seus recursos humanos, exclusivamente através de acções de formação profissional com a duração mínima de oitenta ou noventa horas, isto é, 10 ou 12 dias de trabalho!
A verdade é que, desde há quatro semanas, quem aposta na formação profissional vem sendo surpreendido por cartas do IEFP, em resposta a pedidos de apoio à formação de Setembro, Outubro e Novembro, contendo a seguinte comunicação: "A proposta de indeferimento a que se reportam os formulários acima mencionados assenta na decisão da comissão executiva do IEFP, a qual, na qualidade de responsável pela gestão dos programas operacionais e tendo em conta a sua actual execução financeira, deliberou que deixavam de ser co-financiados os cursos com características idênticas às inscritas no formulário B acima referido."
A verdade é que a grande maioria dos receptores destas cartas candidatou-se ao apoio à formação profissional, preenchendo todos os quesitos processuais em vigor à data, e terá mesmo iniciado a respectiva formação por incumprimento, por parte do IEFP, dos prazos estipulados e vê-se agora, fruto de um expediente que em nada dignifica os organismos governamentais, privada do correspondente apoio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um mal nunca vem só!
E como se este quadro não bastasse, o Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional faz
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publicar, em 19 de Dezembro último, o Despacho Normativo n.º 241/92, onde se lê: "Determino que o pagamento dos saldos das acções de formação que no âmbito do actual quadro comunitário de apoio terminem no ano de 1993 tenha lugar imediatamente após a liquidação pela Comissão das Comunidades Europeias do saldo do programa em que aquelas acções se inserem."
Ou seja, que os 50 % devidos pela realização de toda e qualquer formação profissional que termine em 1993, mesmo que se tenha iniciado no 1 º semestre de 1992, seja paga em 1995, isto é, no ano das eleições legislativas! Senão vejamos: Até Maio de 1994, o Governo Português envia a Bruxelas a documentação necessária. Consideremos seis meses para a análise comunitária, adicionemos um mês de férias e estaremos em Dezembro de 1994.
Esqueceu o Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional que, quando os agentes económicos se candidataram e iniciaram as respectivas acções de formação profissional se encontrava estabelecido, pelo Despacho Normativo n.º 68/91, que o saldo seria pago até seis meses após a conclusão dos cursos.
Será que também nesta área o Governo pretende pagar os apoios comunitários em função do calendário eleitoral do PSD?
Srs. Deputados, não será exigível ao Governo que assuma, perante o País e, designadamente, perante os agentes económicos e sociais, que com esta medida e à custa destes financiará o Orçamento do Estado para 1993 em cerca de 50 milhões de contos, isto sem fazermos contas às tributações em sede de IVA, IRC e IRS?
É que, se o pagamento de saldos foi diferido para 1995, as normas de organização contabilística da execução financeira dos correspondentes cursos mantêm-se, pelo que os promotores de formação têm de garantir documentos contabilísticos dos agentes formativos, e de duas uma: ou pagam de imediato, com os consequentes desequilíbrios de tesouraria e respectivos riscos; ou negoceiam com aqueles o pagamento, com a consequente tributação pelo Ministério das Finanças de receitas que não deram entrada. Em qualquer dos casos "que venha o diabo e escolha"!
Sr Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não deseja que a formação profissional possa, eventualmente, voltar a caminhos tortuosos. E temos de admitir que estas medidas a isso podem conduzir. Também não questionamos o direito à prática de actos administrativos decorrentes das funções exercidas. Questionamos, isso sim e de momento, a forma como estes actos administrativos são aplicados.
Os interesses dos parceiros sociais e, consequentemente, do País assentam na estabilidade das normas, o que lhes permite a organização e o desenvolvimento da formação profissional. E, nesta matéria, os seus interesses encontram-se profundamente afectados e penalizados pelas novas normas e não se pode exigir aos parceiros sociais o dom de prever as alterações administrativas do futuro e, muito menos, sujeitarem-se à ausência de planeamento de quem tanto fala em orçamentos de rigor.
Daí decorre que o Partido Socialista não compreenda, nem aceite, que não se apliquem aos apoios à formação profissional as normas em vigor ao tempo da sua prática, por ser com os efeitos destas que os agentes económicos e sociais, ao agirem, podem e devem contar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, ao produzir as alterações a que aludimos demonstra, tuna vez mais, total insensibilidade perante os problemas do País real e poderá com tal comportamento vir a pôr em causa não só
o normal funcionamento de algumas empresas mas também, e contrariamente aos fins a que se destinam os apoios comunitários em matéria de formação profissional, a qualificação do emprego, o necessário aumento de competitividade e produtividade e, por que não dizê-lo?, a defesa dos recursos humanos do Pais, que, num quadro comunitário de livre circulação de pessoas, estão ameaçados pelas desigualdades das formações educativa e profissional.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Estamos a chegar ao fim do período de antes da ordem do dia, pelo que nos termos do n º 1, alínea d), do artigo 72 º do Regimento, vamos proceder à votação de três votos que já foram distribuídos pelas diversas bancadas.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o voto n º 54/VI, apresentado hoje pelo Partido Socialista, suscita-nos a questão de saber qual é a parte resolutiva deste voto, isto é, a parte a que a Assembleia da República poderá ou não associar-se, de acordo com a votação que se verificar.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, em resposta à sua interpelação, limito-me a fazer a leitura do parágrafo que se refere à Assembleia da República e que é do seguinte teor: "A Assembleia da República considera seu dever formular um voto de reprovação do desrespeito pela Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU e pelos direitos fundamentais postos em causa com o acto de deportação, pronunciando-se a favor da rápida reparado da situação criada em condições internacionalmente aceitáveis e da retoma do diálogo no quadro das negociações de paz em curso, que acima de tudo devem ser preservadas."
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, se o voto que nos foi distribuído é igual ao que V. Ex.ª tem em seu poder, penso que a questão que coloquei resulta precisamente de tuna parte do voto que não foi referida na sua leitura. E, em meu entender, convém que esse aspecto fique claro.
Com efeito, o que se diz no voto é: "No momento em que a Assembleia da República é chamada a pronunciar-se sobre o tema, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista [...]" e mais adiante refere-se ainda "pela direcção do Partido Socialista".
Ora, pretende-se que a Assembleia se pronuncie sobre a posição do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e da direcção do Partido Socialista ou que assuma um voto de reprovação em relação à posição do Governo de 15rael?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, não posso deixar de considerar pertinente a questão que acaba de colocar, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Almeida Santos para esclarecer o sentido do voto apresentado pelo PS.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, na verdade, o voto de reprovação apresentado pelo Grupo Parla-
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mentar do Partido Socialista já, em anteriores momentos, foi assumido pela direcção do Partido Socialista, nomeadamente quando recentemente visitámos 15rael.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas é isso que se vota?
O Orador: - Não, não é isso! Formulámos um voto de reprovação e gostaria de esclarecer que já em anteriores momentos essa reprovação foi expressa.
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Então, não o pode formular nestes termos!
0 Orador: - Por que não? Sinceramente não sei porquê! Então, não podemos dizer que não é a primeira vez que fazemos esta reprovação e que já anteriormente a direcção do nosso partido a fez? Peço desculpa por discordar, mas parece-me que podemos fazê-lo!
Na verdade, não consigo perceber por que é não podemos expressar o voto desta forma mas, se o Sr. Deputado me esclarecer, estou disposto a rever a minha posição. 0 que queremos expressar neste voto é que a reprovação já foi assumida anteriormente. Portanto, não queremos dizer que o voto já foi assumido, mas que a reprovação já foi assumida. Daí dizermos: "já em anteriores momentos assumida pela direcção do Partido Socialista" - e posso esclarecer -, nomeadamente quando visitámos 15rael.
0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Permite-me que o interrompa, Sr. Deputado?
0 Orador: - Faça favor!
0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado Almeida Santos, inicialmente, não compreendi a interpelação do Sr. Deputado Octávio Teixeira, mas com a resposta de V. Ex.ª já a percebo. Com efeito, ninguém impede que o PS, na fundamentação do voto agora em causa, refina que se trata de uma posição já assumida anteriormente, mas, de acordo com a tradição desta Casa, qualquer voto tem de conter um texto resolutivo que possa ser partilhado por toda a Assembleia e, naturalmente, o sentido de voto dos diversos grupos parlamentares dependerá desse texto.
Se o Sr. Deputado Almeida Santos considerar que podemos entender que o texto resolutivo é: "A Assembleia da República formula um voto de reprovação do desrespeito da Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU [...]", julgo que este voto terá um sentido. Mas, se a referência ao passado histórico do Partido Socialista, nomeadamente às posições que o Partido Socialista tomou sobre a matéria, constar da parte resolutiva, naturalmente que não o aceitamos.
0 Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, como pode verificar, a frase "já em anteriores momentos assumida pela direcção do Partido Socialista" é intercalar, mas, se faz muita confusão aos Srs. Deputados, não temos a menor dúvida em riscá-la. Não transformemos isto num casto, pois não vale a pena perdermos tempo com esta questão e a Mesa está autorizada a eliminar esta frase.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, a sugestão da Mesa é no sentido de o terceiro parágrafo do voto ter a seguinte redacção: "A Assembleia da República
considera seu dever formular um voto de reprovação do desrespeito pela Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU e pelos direitos fundamentais postos em causa com o acto de deportação, pronunciando-se a favor da rápida reparação da situação criada em condições internacionalmente aceitáveis e da retoma do diálogo no quadro das negociações de paz em curso, que acima de tudo devem ser preservadas."
O Sr. Almeida Santos (PS): - Muito bem, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação dos votos relativos à deportação de palestinianos para uma região situada a sul da Palestina. Começamos pelo voto n.º 52/VI, subscrito pelo Deputado independente Mário Tomé.
Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PSD, os votos a favor do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e as abstenções do PS, do CDS e do PSN.
Era o seguinte:
Voto n.º 52/VI
De pesar pela deportação de 400 palestinianos
A Assembleia da República expressa a sua consternação pela situação de mais de quatrocentos deportados palestinianos na "terra de ninguém".
Sujeitos a condições desumanas, ao frio, à fome e à doença e impedidas de receber apoio humanitário, aqueles palestinianos foram violentamente privados de todos os direitos através de uma pena que evoca lamentavelmente métodos que não são entendíveis por parte de um pais civilizado.
A ordem de deportação decidida pelo Primeiro-Ministro 15aac Rabin, contraria as esperanças legitimamente criadas pelas suas declarações no seguimento da sua tomada de posse.
A Assembleia da República, profundamente preocupada pela violação dos mais elementares direitos humanos e pela degradação das condições do diálogo para a paz na Região, apela ao Governo de 15rael para que crie, com a urgência que a gravidade da situação requer, as condições que permitam o regresso ao seu território dos deportados no cumprimento da Resolução n.º 799, de 19 de Dezembro de 1992, do Conselho de Segurança da ONU.
Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 53/VI, apresentado pelo Partido Comunista Português.
Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PSD, os votos a favor do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e as abstenções do PS, do CDS e do PSN.
Era o seguinte:
Voto n.º 53/VI
De condenação pela deportação de 410 palestinianos
No próximo dia 17 completa-se um mês sobre a deportação pelo Governo de 15rael de 410 palestinianos aos quais foi retirado pela força o direito de permanecerem na sua própria terra.
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Essa foi, por múltiplos motivos, uma decisão política imoral de que ficará memória sombria pelo desafio que carrega a convenções internacionais subscritas pelo Estado que a tomou e por princípios morais e éticos que afirma defender.
A deportação de presos para qualquer pais configura um desafio à ordem jurídica internacional, agravado no caso presente por se tratar de uma decisão que visa manter, contra resoluções das Nações Unidas, territórios palestinianos ocupados. Além do mais, no caso dos 410 palestinianos, expulsos devido exclusivamente ao seu ideário, foram colocados em território do Líbano contra a vontade expressa do próprio Estado Libanês.
Transcorridas quatro semanas, os deportados continuam do outro lado da fronteira, vivendo sob tendas, na solidão das montanhas fustigadas por nevões intensos. Morrem um pouco a cada dia que passa. A intransigência de 15rael atinge, aliás, tais extremos que os seus governantes proíbem inclusivamente a passagem de alimentos pela fronteira.
A opinião pública acompanha, naturalmente com sentimentos de crescente condenação, o desenvolvimento da grave situação criada pelo Estado de 15rael.
Calar o protesto perante as consequências do fanatismo guindado a doutrina do Estado repressiva, é sempre uma forma de cumplicidade indirecta.
A Assembleia da República cumpre, por isso mesmo, um dever inseparável do seu respeito pelos direitos humanos e do seu combate pelas liberdades, onde quer que elas sejam feridas, ao protestar como desumana e incompatível com a ordem jurídica internacional contra a deportação para o Líbano, em 17 de Dezembro de 1992, de 410 palestinianos residentes em 15rael.
Nesta conformidade, a Assembleia da República condena o acto de deportação tomado pelo Governo de Telavive e, tendo presente a Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, espera que aquele alto organismo executivo da ONU tome as medidas adequadas ao imediato regresso dos deportados ao território - sua pátria - do qual foram ilegitimamente expulsos.
Srs. Deputados, vamos agora votar o voto n.º 54/VI, apresentado pelo Partido Socialista, já com a nova redacção do último parágrafo.
Submetido à votação do foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Voto n.º 54/VI
De protesto, reprovando o desrespeito peta Resolução
n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU
A deportação, pelo Governo de 15rael, de 410 palestinianos, a não permissão da sua entrada em território libanês, e as desumanas condições a que têm estado sujeitos têm provocado a justo titulo a emoção e a condenação da consciência universal.
Está em causa a violação de direitos de validade universal, o respeito pelos ditames de um Estado de direito e o acatamento da Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Esta resolução e aqueles valores não podem ser postos em causa só porque aquele facto ocorre num teatro de conflitualidade latente, nem a decisão de deportação pode ser legitimada invocando o extremismo e as acções violentas do grupo Hamas.
A Assembleia da República considera seu dever formular um voto de reprovação do desrespeito pele Resolução n.º 799 do Conselho de Segurança da ONU e pelos direitos fundamentais postos em causa com o acto de deportação, pronunciando-se a favor da rápida reparação da situação criada em condições internacionalmente aceitáveis e da retoma do diálogo no quadro das negociações de paz em curso, que acima de tudo devem ser preservadas.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 30 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai apreciar-se o Decreto-Lei n.º 188/92, de 27 de Agosto, que extingue o Instituto Nacional de Investigação Científica (ratificação n º 40/VI, apresentada pelo PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A extinção do INIC é perfeitamente lógica e coerente com a actuação do Governo nos mais diversos domínios da vida nacional, pelo que assim não pode deixar de ser o que é.
Quem quer saúde paga-a, e aí estão as taxas moderadoras; quem quer educação paga-a, e aí estão as propinas; quem quer casa paga-a, e aí está a total ausência de uma política social na área da habitação.
Este liberalismo de inspiração thatcheriana (inspiração ultimamente menos citada pelo Governo e particularmente pelo Sr. Primeiro-Ministro, como se compreende), não podia deixar de se reflectir na área da ciência, da investigação e da tecnologia.
Em nome de boas razões economicistas e orientado por um pragmatismo que faz corar de inveja as tradicionais capacidades nacionais de desenrascanso e de improvisação, o Governo não esteve com meias medidas ou com paliativos dilatórios e, de uma penada, extinguiu o INIC. E fê-lo, é preciso reconhecer, com a coragem típica dos ignorantes ou daqueles que encaram como meros paliativos dílatóríos aquilo que outros olham como uma prática de diálogo, ou uma expressão da capacidade de ouvir os outros, ou tão-só a consciência de que a sensatez na busca paciente do máximo consenso possível era o mínimo a exigir de um governo neste, ainda novo, Portugal democrático, um pais em que, ao longo da história, o espírito crítico e a ciência se têm visto tão regularmente amordaçados.
Só que a democracia não se ensina, pratica-se. E, pelos vistos, estamos perante um governo democrático não praticante ou que pratica a democracia com a ligeireza de quem destas coisas tem uma visão moderna, objectiva, quantitativa, isto é, uma visão científica, o que - sem humor- vinha mesmo a calhar para o INIC, e exprime-se assim: se tive 51 % dos votos, foi porque o povo
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confiou em mim. Logo, posso fazer tudo o que quiser, logo
posso extinguir o INIC e, daqui a algum tempo, quando o
novo período eleitoralista, perdão, eleitoral se aproximar,
então o povo será chamada a pronunciar-se nas umas sobre
o INIC. Noutra uma, entretanto, o INIC jaz morto e
arrefece.
Claro que há sempre quem discorde deste modelo de Risos.
aproximação às coisas. Há sempre alguém que diz não.
Há sempre alguém - e desta vez esse alguém foi quase
toda a comunidade científica e académica portuguesa -
que (que diabo!) entende que deveria ter sido ouvido! Ou
que, tendo-o sido, entende que as suas propostas, fruto de
uma experiência concreta da vida na investigação, nos
laboratórios e nas universidades portuguesas, deveriam ter
merecido algum acolhimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas a ciência deste
governo - ou a governamentalização da ciência - por
outros parâmetros se rege.
No momento em que, mais de 300 anos passados sobre
o seu julgamento, a Igreja finalmente se decidiu a reabilitar
Galileo, o governo PSD/Cavaco Silva executa friamente o
INIC, sem qualquer julgamento, sem verdadeira audição
das testemunhas de defesa.
Que confrontado com o repúdio de toda a comunidade
científica, o Sr. Ministro Valente de Oliveira, em plena
Comissão de Educação desta Casa, se tenha limitado a
classificar esse repúdio como "natural, e até saudável, uma
vez que a insatisfação mora paredes-meias com a curiosidade científica e com o espírito crítico", não é senão uma
blague (passe o galicismo) de mau gosto, incompatível
com uma abordagem séria deste problema.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Muito bem!
0 Orador: - Aliás, o Sr. Ministro e o seu governo
têm sobre esta questão mais uma ou duas ideias interessantes, que, aqui reveladas, poderão ajudar esta Câmara a
melhor enquadrar este crime a sangue frio, praticado sobre
a ciência em Portugal. $ que este Governo tem um fétiche:
quer "re-sul-ta-dos". E, desesperado, porque a ciência não
se inaugura como as auto-estradas, bem avisado do longuíssimo tempo que decorreu entre a fórmula einsteiniana
E = mc2, de 1906, e a investigação atómica concreta da
resposta à ameaça do nazi-fascismo, em 1944-1945, este
governo, sábio, profundo conhecedor da história, sempre
capaz de aprender com os erros dos outros, quer resulta
dos, já!
Vozes do PCP: - Cifrões!
O Orador: - Ou há resultados, ou não há dinheiro!
E essa história de as condições propiciadoras da caiação
científica viverem, ao mesmo tempo, da criação artística,
ou de uma e outra não serem, afinal, mais do que cias
formas de expressão de uma mesma capacidade base, tudo
isto não é mais do que poesia! E este governo, prosaico,
é prosa o que prosaicamente faz! Tudo nos seus devidos
lugares: os cientistas fazem ciência, o Governo governa
Que a investigação, a ciência e o desenvolvimento temo
lógico se não compadeçam com formas estritas e estreitas
de governamentalização e de controlo financeiro e
burocrático, pior para eles. Que se atirem para o mercado,
e ele lhes dará, ou não, a resposta que merecem.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não é mais do que, afinal, a sobrevivência dos mais aptos - e Darwin vem aqui muito a propósito.
Os dinossauros não eram tão simpáticos e não se extinguiram?... Foi há maio de 65 milhões de anos, e não havia ainda o governo PSD/Cavaco Silva.
Admiramo-los agora, em plástico e computadorizados, fruto da tecnologia japonesa, no Museu de História Natural da Faculdade de Ciências, à Rua da Escola Politécnica.
O INIC morreu. Aliás, foi morto. Desta vez, pelos dinossauros do Governo, os quais, estou convicto, havemos de admirar, a muito breve prazo, extintos e de plástico, computadorizados pelos cientistas portugueses, esses sim, e apesar do Governo, ainda vivos.
Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.
O Orador: - Porque, creiam-me, não é por causa do Governo que o trigo nasce para cima e os rios correm da nascente para a foz.
Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.
O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A sociedade portuguesa enfrenta hoje um conjunto de desafios científicos e tecnológicos, que não têm merecido, da parte leste governo, as respostas adequadas, susceptíveis de definirem e articularem as estratégias de curto e médio prazo do nosso desenvolvimento científico.
Desenvolvimento cientifico cuja construção exige linhas estratégicas de acção, das quais salientamos: a internacionalização da actividade científica portuguesa através da ligação concertada de instituições e investigadores a "contextos científicos internacionais mais avançados, muito especialmente, no âmbito europeu, onde se exige uma participação mais alargada de Portugal no âmbito dos programas em curso; a avaliação rigorosa e atempada de projectos e programas, em ordem a estimular a qualidade científica; o reforço dos meios financeiros destinados à investigação e desenvolvimento, no âmbito de projectos concretos; uma maior participação das empresas no processo de inovação e difusão das novas tecnologias, através da ligação às universidades e aos centros de investigação, e a criação de programas específicos destinados às pequenas e médias empresas; uma maior integração das ciências sociais e humanas no contexto de programas científicos específicos; a difusão pública das medidas tomadas pelo Governo, assim como dos projectos e programas científicos em curso; a implementação de uma política nacional de ciência e tecnologia, ainda não claramente expressa, mediante a definição de objectivos e projectos que tenham em conta as realidades que o mercado, as empresas e os consumidores apresentam, de forma a conhecerem-se as prioridades do financiamento.
Lamentavelmente, nada disto se passa em Portugal. A ligação a projectos internacionais e a centros de investigação estrangeiros é tímida. Não há avaliação da actividade cientifica, e as comissões de acompanhamento do
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Programa Ciência falharam estrondosamente. Os meios financeiros destinados à investigação e desenvolvimento têm sido reduzidos, e a despesa nacional, neste sector, é ainda muito inferior ao 1 % do PIB, que o Primeiro-Ministro já defendeu. O esforço financeiro desenvolvido pelas empresas neste sector e os programas destinados às PME são praticamente inexistentes.
As ciências sociais e humanas debatem-se com verbas cada vez mais exíguas, não dispondo de uma linha específica de financiamento. Não há conhecimento público da actividade cientifica nem há diálogo com a comunidade cientifica.
Enfim, não existe uma verdadeira política nacional de ciência e tecnologia. Se há alguma política é a do stop and go, mais de paragem do que de avanço, e sem nunca se saber por que é que trava e por que é que se arranca
É neste contexto que se deve interpretar a desastrosa decisão, por parte do Governo, da transferência do INIC do Ministério da Educação para o Ministério do Planeamento e da Administração do Território e da sua extinção.
Decisão autoritária, sem dúvida, sem qualquer consulta às universidades ou à comunidade cientifica, mais própria de um pais subdesenvolvido do que de um pais da Comunidade Europeia. A oportunidade da extinção do INIC exigia, com efeito, uma reflexão prévia e profunda com a comunidade cientifica sobre a política cientifica em Portugal.
Decisão inoportuna, contraditória até dos propósitos que o Governo vinha defendendo, de afirmar e projectar Portugal no mundo - as comemorações dos Descobrimentos, a Europália, a Lisboa capital da cultura, e o Porto - Infante, em 1984 -, uma vez que ao extinguir o INIC suprimiu o principal alicerce de investigação no domínio das ciências sociais e humanas, as quais suportavam, em última análise, a consistência e a seriedade de tais realizações.
Decisão ruinosa, uma vez que veio prejudicar o regular funcionamento da investigação cientifica universitária, da investigação fundamental e da investigação nas ciências sociais e humanas, lançar a incerteza na comunidade científica e travar a actividade editorial desenvolvida pelo INIC.
Decisão cega, uma vez que o Governo nunca explicou por que é que aquele organismo passou do Ministério da Educação para o Ministério do Planeamento e da Administração do Território, e muito menos adiantou as razões da sua extinção. Quais terão sido os benefícios decorrentes desta decisão, se nenhum centro de investigação concordou com ela? Por que razão é que as prioridades da investigação nas universidades passam a ser definidas no Ministério do Planeamento e da Administração do Território? Por que razão é que o Ministério da Educação deixou de definir a estratégia da investigação cientifica no ensino superior em Portugal?
Havia necessidade de reestruturar o INIC? Sem dúvida! Talos os investigadores estavam de acordo nesse ponto, e o Conselho de Reitores aprovou mesmo, pouco antes, o projecto de reestruração do INIC, onde se considerava, porém, fundamental a sua manutenção.
Existiam problemas de coordenação entre o INIC e a JNICT, concedendo ambas as instituições, bolsas do mesmo tipo e financiando projectos de investigação semelhantes? Existiam, como era público e notório.
Estes problemas, contudo, apenas queriam dizer que havia necessidade de se definir claramente uma política de investigação, efectuar um estudo sério dos organismos
de investigação científica e tecnológica, e após consulta às universidades e centros de investigação, decidir em conformidade, efectuando a necessária e desejada reestruturação, que poderia passar, até, pela fusão daqueles dois organismos.
Mas não! O Governo, primeiramente, extinguiu o INIC, fazendo a política do facto consumado a que já nos habituou nos mais diversos sectores (saúde, educação, etc.) e só depois, face às criticas generalizadas, decidiu nomear uma comissão, para estudar a reestruturação dos organismos de investigação cientifica e tecnológica.
Não é de admirar que, face a todas estas decisões precipitadas, algumas instituições cientificas estrangeiras, como a Fundação Europeia da Ciência, tecessem criticas e reparos a tal decisão.
A extinção do INIC só se compreenderia se o Governo, atendendo ao que o Partido Socialista defende no domínio da ciência, criasse um ministério da ciência e das universidades ou um ministério da ciência e ensino superior, um ministério que tutelaria as actividades do sistema cientifico e tecnológico nacional, no âmbito do qual se garantissem o seu planeamento e coordenação, promoção e financiamento, relações internacionais e informação, responsável pelas grandes linhas da política cientifica e tecnológica, bem como sobre a execução das actividades de ciência e tecnologia e, finalmente, que procedesse à avaliação das políticas e programas desenvolvidos.
Caso assim não seja, deveria ser criado, conforme defende o relatório da Comissão de Reestruturação dos Organismos de Investigação Científica e Tecnológica, um Instituto Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (INICT), um Conselho Nacional da Ciência e Tecnologia (CNCT) e uma Comissão Nacional de Avaliação (CNA), com as funções que nós já referimos, mas sempre dependentes do Ministério da Educação e nunca do Ministério do Planeamento e da Administração do Território.
O Governo, porém, elogiou os autores daquele relatório, mas fez orelhas moucas às suas recomendações, deixando tudo no mesmo estado em que se encontrava.
Com efeito, o Governo transferiu as principais atribuições do INIC para a INICT, a "título transitório até à efectiva criação dos organismos resultantes da reestruração" dos organismos dependentes do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Mas, até ao momento, limitou-se a integrar os centros do extincto INIC nas universidades e a desbloquear, através da JNICT, as verbas para o pagamento aos funcionários. Os centros encontram-se praticamente paralisados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Torna-se necessário definir, urgentemente, uma política cientifica e tecnológica, que tenha em consideração os seguintes aspectos, que decorrem da extinção do INIC: o Ministério da Educação, na ausência de um ministério da ciência e das universidades, deve continuar a deter o controlo da investigação cientifica; deve ser criado, no âmbito do Ministério da Educação uma estrutura autónoma de ciência e tecnologia.
Toma-se indispensável dotar as universidades de uma verba especial para a investigação, através do Plano de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC), verba essa até hoje não existente, uma vez que o Governo aduziu sempre, em tal matéria, o argumento de que existia o INIC com tal objectivo.
Extinto o INIC, é preciso garantir um financiamento continuado da investigação universitária, investigação essa tanto aplicada como fundamental. De acordo com o
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relatório DEKKER, da Comunidade Europeia, as universidades devem desenvolver a sua investigação sem a exigência de terem de se unir às empresas. A investigação universitária passa pelas empresas, mas não pode esgotar-se nelas. E o critério de avaliação para o financiamento da investigação nas universidades só pode ser o da qualidade científica.
É imperioso reforçar as dotações financeiras destinadas à investigação cientifica e terminar de vez com uma política que tem subalternizado a ciência como uma variável estratégica fundamental da modernização da sociedade portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este emblema da extinção do INIC exige alguns comentários que não se destinarão, nesta altura do processo, a repor a situação anterior, mas, sim, a evitar - espero - que sejam cometidos, repetidamente, alguns erros que, na minha opinião, estão a afectar o processo.
Esta Câmara deve lembrar-se da discussão da Lei n.º 91/88, de 13 de Agosto, que marcou um dos momentos mais altos da Legislatura. A convergência de opiniões e o sentido de Estado, que animou todas as bancadas, foi notável. Considero que essa lei, aqui votada, é um documento que ilustra a actividade da Assembleia da República. Simplesmente, talvez não se tenha reparado, no que toca à execução, que essa lei foi votada na década de 80, em que, definitivamente, foi abandonado o critério de que a modernidade tem de ser avaliada sempre em relação ao objecto cientifico ou ao facto cientifico. Novamente, as ciências da cultura vieram ocupar um lugar fundamental, e até os observadores insistem que a concorrência japonesa, no Ocidente, foi um facto determinante para a reposição das ciências sociais, de novo, num plano de importância.
De facto, é isso que é mais preocupante na avaliação do conjunto de decisões que estão a ser tomadas nesta matéria e que já estão exemplificadas, não apenas na extinção do TNIC mas também na modificação do LNETI, que está submetido a um diferente ministério. De que se trata? Trata-se de que talo o processo continua dominado pelo critério da investigação e desenvolvimento, sem prestar a atenção que é necessária às ciências sociais.
Realmente, o próprio processo da extinção do INIC é surpreendente. O INIC estava integrado no Ministério da Educação e é transferido para o Ministério do Planeamento e da Administração do Território, para ser extinto e para fazer regressar às universidades os centros que dependiam do INIC e que foram integradas nas universidades seleccionadas, tendo o Governo reparado que apenas existiam a Universidade Técnica de Lisboa, a Universidade de Lisboa e a Universidade Nova de Lisboa. Este é justamente um dos aspectos preocupantes, o que toca ao afastamento do Ministério da Educação deste domínio. É que, tendo este processo concluído pela integração dos centros nas universidades, não foi tomado em conta que um dos problemas mais sérios que o Pais encara neste momento é o da identificação, avaliação e classificação das universidades.
Continuamos a usar um conceito semântico de universidade, continuamos a achar que é uma instituição que
investiga, que ensina e que divulga, e a verdade é que a realidade portuguesa está a distinguir as instituições universitárias por finalidades. Há algumas que conseguem, com, dificuldade, realizar os três objectivos, mas são muitas as que só realizam um deles. Há universidades que só investigam, há outras que só ensinam e há muitas que não divulgam coisa nenhuma.
A avaliação tem se ser feita. O Ministério da Educação está já empenhado nessa avaliação. Portanto, é um momento que devia exigir grande ponderação na definição dos centras que coordenam a investigação cientifica em Portugal. Sobretudo, pelo que toca as ciências humanas, no momento de tanta mudança, em que a internacionalização, nas áreas da ciência e da técnica, é um facto inelutável, onde a hierarquia dos países está a ser estabelecida de uma maneira que só pode ser vencida pela internacionalização.
A universidade portuguesa deu grandes passos no caminho da internacionalização. Os mais antigos lembram-se dos anos, não muito afastados, em que a universidade se recusava a reconhecer qualquer titulo estrangeiro. Hoje, muitas escolas honram-se de que a maior parte dos títulos que os professores ostentam foram obtidos no estrangeiro, a universidade foi capaz de enfrentar a necessidade da internacionalização.
Não parece, pois, acertado que o Ministério da Educação seja afastado da coordenação cientifica. Portanto, retomamos a proposta, que, aliás, é coincidente, em larga medida, com a do PS, de que é absolutamente inadiável a criação de um ministério da ciência ligado ao serviço das universidades. É que 80 % da responsabilidade pela investigação científica em Portugal ainda pertence às universidades, o que tem muito a ver com as ciências sociais, porque estas não podem estar submetidas ao critério de investigação e desenvolvimento que vigorou até à década de 80 e que hoje está a ser ultrapassado. A investigação nas ciências sociais é uma investigação que tem de ser autorizada a praticar o desperdício, para garantir a liberdade e a criatividade do investigador,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... justamente no momento em que a tal internacionalização da ciência e da técnica nas áreas da Natureza implica a maior das atenções das comunidades mais pequenas, como acontece com o nosso pais, para os emblemas da identidade, da cultura e, por consequência, das ciências sociais.
Recordaria que neste momento se conta entre as vitimas anunciadas desta pequena modificação a revista Direito e Economia da Faculdade de Direito de Coimbra, dirigida pelo Sr. Prof. Ferrer Correia, à qual, segundo suponho, irá ser aplicada uma medicina de urgência para salvar este elemento fundamental de trabalho para todos nós. Mas este é apenas um elemento exemplificativo, que poderíamos multiplicar.
Não podemos dar a impressão de que ainda vigora, na área das ciências da cultura, o complexo de Savonarola, que atrasou o desenvolvimento das ciências sociais. Como sabem, o frade foi advertido para não falar de futuríveis, precisamente porque uma das actividades que as ciências sociais têm como principais é a de analisar o Estado, o poder político, a previsão da evolução social. Ao frade foi dito que seria melhor que ele não fizesse esses anúncios, para não perturbar os processos de modernização de acordo com os critérios desse mesmo poder político.
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Suponho que em Portugal não existe o complexo de Savonarola e que deveremos estar habilitados a repor as ciências sociais no plano que é do interesse do País e que constitui uma exigência fundamental das nossas universidades. Suponho, por isso mesmo, que poderemos subscrever um conceito que foi formulado por Michel Serres nesse conjunto de estudos da década de 80 referido sob a designação de Sience Studies, mas que na Europa aparece normalmente com o titulo de "Estudos sobre ciência e cultura" ou "Estudos sobre ciência, técnica e sociedade". Disse tal autor que "não há maior mito do que uma ciência pura de qualquer mito".
Devemos assumir este conceito e entender que as ciências sociais não podem ser secundarizadas. Devemos ainda entender que o critério de investigação e desenvolvimento foi ultrapassado na década de 80. Devemos entender, finalmente, que não chega invocar a autonomia universitária para considerar que os problemas estão resolvidos.
A autonomia universitária diz respeito à independência de espírito, à capacidade de julgamento, à inventiva, mas a autonomia universitária em matéria financeira traduz-se na capacidade de gerir os meios que o Governo põe à sua disposição. Por consequência, esta entrega de investigação às universidades sem cuidar dos recursos financeiros significa verdadeiramente condenar o esforço que se tem feito nesta área a um fracasso facilmente previsível.
Aplausos do CDS, do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Aristides Teixeira.
O Sr. Aristides Teixeira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A ratificação do Decreto-Lei n.º 188/92, de 27 de Agosto, que extingue o Instituto Nacional de Investigação Científica (INIC), pedida pelo Partido Comunista, vai certamente permitir o debate que demonstrará o acerto da medida legislativa consagrada no referido diploma.
Vozes do PS: - Não apoiado!
Vozes do PCP e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé: - Já cá se esperava!
O Orador: - Todavia, valerá a pena, para melhor se conhecer a situação, fazer um pouco do historial da instituição em causa.
Criado pelo Decreto-Lei n.º 538/76, de 9 de Julho, como resultado do desdobramento do Instituto de Alta Cultura (IAC) em INIC e também em Instituto de Cultura e Língua Portuguesa (ICALP), o INIC herdou do IAC todas as funções e atribuições inerentes à "formulação, coordenação e realização da política cientifica nacional e execução dos planos de preparação do pessoal qualificado necessário ao desenvolvimento do País" - assim se lia no artigo 1.º do mencionado decreto-lei, ficando o INIC a depender da tutela do então Ministério da Educação e Investigação Cientifica.
É ainda de referir que os núcleos e projectos de investigação do IAC nas universidades são estruturados em centros de investigação, de acordo com o respectivo despacho.
Em 27 de Setembro de 1980 é publicada a Lei Orgânica do WIC, vindo os organismos dependentes deste - centros de investigação e complexos - a ser regulamentados por decreto.
Convém aqui recordar que os actuais Complexos Interdisciplinares I e II tiveram a sua génese ainda no âmbito do Instituto de Alta Cultura e se constituíram com o conjunto de centros e serviços de apoio hoje existentes, na sequência do despacho já suscitado.
É de lembrar também que o INIC detinha quadro próprio de pessoal, que incluía as várias carreiras da Administração Pública e a carreira de investigação. Além deste pessoal, prestava ainda serviço no INIC e organismos dependentes pessoal do quadro único do Ministério da Educação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Aqui chegados, e por virtude da actual Lei Orgânica do Governo (Decreto-Lei n.º 451/91), foi determinada a transido do INIC para o Ministério do Planeamento e da Administração do Território, para proceder à sua extinção, em articulação com o Ministério da Educação.
Nesta perspectiva, é iniciado um processo de consulta e de estudo do conjunto de acções a desenvolver para a reestruturação dos organismos de investigação, sob a égide do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, em que se integrará a extinção do INIC, e nomeada uma comissão, encarregada de apresentar um relatório que contivesse recomendações e preconizasse orientações nesse sentido. Em tal conformidade, foi publicado o Decreto-Lei n.º 188/92, agora sujeito a ratificação, que determina o modo como se processará a extinção do INIC, a qual veio a concluir-se em 30 de Novembro de 1992.
Assim, dando-se cumprimento ao diploma, foram desencadeadas as várias etapas previstas, retendo-se as seguintes: os centros do INIC foram integrados nas universidades onde vinham desenvolvendo a sua actividade, de acordo com a deliberação dos órgãos próprios das universidades; o Observatório Astronómico de Lisboa foi integrado na Universidade de Lisboa; os Complexos Interdisciplinares I e II e o Centro de Tecnologia Química e Biológica foram integrados, respectivamente, nas Universidades Técnica de Lisboa, de Lisboa e Nova de Lisboa.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Nós sabemos ler o decreto-lei, Sr. Deputado!
O Orador: - Às vezes parece que não. Convém, por isso, relembrar o que se passa.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Diga qualquer coisa de substancial, Sr. Deputado!
O Orador: - É o que farei a seguir, se entendeu o contrário.
Neste capítulo, convém esclarecer que, no que concerne às unidades mencionadas em primeiro e segundo lugares, foram estabelecidos protocolos entre o Estado, envolvendo os Ministérios do Planeamento e da Administração do Território, da Educação e da Agricultura, e as três Universidades de Lisboa, tendo como objectivo garantir o prosseguimento das correspondentes transferências patrimoniais e orçamentais, bem como, do mesmo modo, assegurar a continuidade das competências cientificas e do carácter interuniversitário dessas unidades.
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A Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) recebe as competências e atribuições do INIC, sendo de destacar as de apoio aos centros de investigação, à elaboração e edição de textos e publicações de carácter científico e técnico, à investigação científica e ao patrocínio da realização de congressos, colóquios e outras reuniões.
Relativamente ao pessoal em serviço no INIC, foi, conforme a sua situação, integrado na JNICT e nas Universidades ou regressou aos seus lugares de origem.
O património do INIC foi, segundo os casos, ou transferido para as universidades ou afecto aos Ministérios do Planeamento e da Administração do Território e da Educação, tendo os arquivos (livros e documentos) transitado para a JNICT.
Foram também, de acordo com o legislado, efectuadas as transferências. orçamentais necessárias ao funcionamento e vencimentos, assumindo a JNICT a sua gestão.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sn. Deputados: Completou-se, assim, todo o processo, que, no entender do Partido Social-Democrata, se desenrolou de maneira tranquila e adequada, devendo ficar bem claro que mesmo no que diz respeito ao sector de pessoal, por vezes mais melindroso, todas as situações foram resolvidas, satisfazendo-se todos os legítimos anseios de investigadores e outro pessoal nas diversas carreiras. Foram também ouvidos, ao contrário do que aqui já se afirmou, todos os intervenientes e responsáveis dentro do INIC, bem como o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
A publicação do Decreto-Lei n.º 188/92, enquadrada na filosofia política do Governo para o desenvolvimento do sistema científico e tecnológico português, deseja valorizar e incentivar a investigação nas universidades. Parece-nos, pois, mais lógico e que se compreenda melhor que as universidades, com a sua lei da autonomia, aprovada por unanimidade nesta Câmara, como há pouco referiu, e bem, o Sr. Deputado Adriano Moreira - lei que consagra a autonomia cientifica, dizendo expressamente, no seu artigo 6 º, n.º 1, que "a autonomia científica confere às universidades a capacidade de livremente definir, programar e executar a investigação e demais actividades cientificas e culturais" -, tenham no seu seio os centros de investigação e deles obtenham a maior rentabilização e eficiência.
Defende também o Partido Social-Democrata que as universidades devem assumir o papel e a responsabilidade que lhes cabe em investigação e desenvolvimento, devendo ser dotadas de meios materiais e humanos adequados, o que o Governo tem garantido e disponibilizado, para fazer as ligações necessárias quer ao sector produtivo quer ao sector empresarial.
Considera ainda o PSD que a extinção do INIC, obedecendo a uma estratégia geral de dinamização da investigação, produzirá efeitos de racionalização de meios, evitando que por vezes, como há pouco referiu o Sr. Deputado Fernando Sousa, um mesmo projecto concorresse a fundos concedidos quer pelo então INIC quer pela JNICT, forma de expediente eticamente pouco correcta.
Por outro lado, é também certo - e manda a verdade que aqui se mencione - ter havido protestos e alguma contestação de organismos dependentes do INIC, alguns deles recebidos na Comissão de Educação, Ciência e Cultura,...
A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem dito!
O Orador: - ... mas que, curiosamente, admitiam e não punham em causa que era necessário efectuar uma profunda reestruturação.
Risos do PCP e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Devem tais protestos e contestação entender-se como naturais e compreensíveis, dado que qualquer mudança implicará sempre a assunção de novas atitudes e comportamentos.
Porém e por muito que custe ao Partido Comunista, dada a forma tranquila, correcta e responsável como a transição se efectuou, esses protestos tornaram-se vazios de sentido e despropositados, já que - é garantido nenhuma das actividades que vinham a ser desenvolvidas pelo INIC foi prejudicada ou atrasada, antes pelo contrário.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Neste contexto e pelas razões aduzidas e sustentadas, o Partido Social-Democrata, na convicção da justeza das suas posições, vai votar a favor da ratificação do Decreto-Lei n.º 188/92, de 27 de Agosto, realçando o que consagra o artigo 1.º da Lei da Autonomia Universitária: "As universidades são centro de criação, transmissão e difusão da cultura, da ciência e da tecnologia, que, através da articulado do estudo, da docência e da investigação, se integram na vida da sociedade."
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia
O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia (Manuel Thomaz): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproveito o tempo que me é devido para confirmar as potencialidades que existem numa decisão que foi tomada.
Na verdade, não há decisões políticas 100 % boas, bastando-nos que sejam mais boas do que más e que, a partir da sua concretização, se tire o melhor proveito possível. Uma decisão pode ser muito correcta no papel e no Diário da República, mas ser implementada de uma forma desastrosa; pode ser uma decisão menos correcta, mas da qual, pela maneira como for implementada, se consiga tirar o máximo de frutos e benefícios para o sistema, a sociedade, o País.
A decisão de extinção do INIC tem, naturalmente, razões perfeitamente válidas e tem por base, como foi afirmado, a necessidade de racionalizar o sistema de coordenação da investigação científica e tecnológica no País e de compatibilizar o sistema com a recente Lei, aqui aprovada por unanimidade, da Autonomia das Universidades. Como sabem, no seio do próprio INIC havia já estudos e uma comissão nomeada, que produziu relatórios com a assinatura não só do presidente do INIC como também do Ministério da Educação e do representante do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, preconizando a necessidade de integrar os centros do INIC nas universidades, mantendo-os (uma vez que o INIC não estava extinto na altura) num regime de associação a uma entidade financiadora, que seria o INIC de então.
Com a extinção do INIC e a deliberação de integrar os seus centros nas universidades, isso foi conseguido com naturalidade, dando oportunidade às universidades de deliberarem quanto a essa integração, de tomarem uma decisão consciente sobre a integração ou não dos centros de investigação do então INIC. Todas as universidades
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deliberaram, através dos seus órgãos máximos, os senados, a integração dos centros do INIC no seu seio, o que significa que os centros do INIC foram considerados pelas universidades como uma rede de investigação válida que importava não destruir mas aproveitar e manter à disposição, para, em seguida, construir outras coisas, como nos anos futuros se verá.
Esta decisão foi tomada e os diferentes processos inerentes a essa decisão foram conduzidos com a máxima tranquilidade e aceitação e, ao contrário do que aqui ouvi dizer, os centros do INIC não estão paralisados mas, antes, a funcionar em pleno.
Com efeito, os centros do INIC, após um período de uma certa ansiedade que resultou deste processo, estão hoje convictos de que vão continuar a ser financiados e apoiados. Para além disso, as bolsas de curta duração, que o INIC atribuía ao pessoal não integrado em centros - o investigador das universidades -, continuarão a ser proporcionadas, bem como os apoios às publicações e teses de doutoramente. Aliás, ainda hoje deliberei nesse sentido.
Portanto, está a fazer-se uma transição entre a situação antes da extinção do INIC e a situação posterior à sua extinção, que vai dar oportunidade às universidades de disporem de uma rede de investigação, com a qual, depois, farão o que entenderem.
Gostava de fazer um ou outro comentário relativamente a assuntos de carácter mais geral referidos pelo Srs. Deputados Fernando de Sousa e Adriano Moreira, designadamente quanto à política científica e tecnológica nacional.
Ao ouvir o Sr. Deputado Fernando de Sousa referir quais as linhas que deveriam ser seguidas pela política científica e tecnológica do País, não posso estar mais de acordo com ele, porque elas são, exactamente e pela mesma ordem, as que estão expressas pelo Governo, quer no seu Programa, quer no Programa Ciência, quer em todos os programas de implementação da política científica do País. Portanto, estamos 100 % de acordo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Assim, vejamos: a internacionalização a proporcionar programas e projectos para a investigação cientifica; o reforço dos meios financeiros que tem acontecido ao longo dos anos; a maior participação das empresas, em particular das pequenas e médias empresa; o apoio às ciências humanas e sociais; a difusão pública da ciência e da tecnologia; enfim, a implementação de tuna política com prioridades bem definidas.
Tudo isto está contido na política do Governo e tem estado a ser praticado, estando até já numa fase de um relativo adiantamento. Há, pois, agora, que ir mais longe, nomeadamente pensar qual a sequência a dar a esta política cientifica que já está a ser implementada há alguns anos, como todos sabem.
Gostava também de fazer uma referência à questão das ciências sociais e humanas. Estas não são nem têm sido um "parente pobre" no contexto do apoio à investigação científica, quer nas universidades quer fora destas. Para tanto, basta olhar para o crescimento dos orçamentos que lhe são destinados pela JNICT ou para os que lhe têm sido proporcionados pelo INIC, que até aqui têm sido mantidos, mas que irão aumentar em 1993, além dos programas novos que estão a nascer de iniciativa conjunta da JNICT e do Instituto Camões, como é o caso do Programa Lusitânia, já anunciado.
Por outro lado, há que atender também ao facto de, através do Programa Quadro de Investigação e Desenvolvimento das Comunidades, aparecerem projectos no âmbito das ciências sociais e humanas, como é o caso do Programa Capital Humano e Mobilidade. Aliás, para o Quarto Programa Quadro também se prevê o mesmo.
Portanto, repito, as ciências sociais e humanas não são um "parente pobre", pois há a perfeita consciência de que, elas têm um papel muito importante no contexto do desenvolvimento cientifico, tecnológico, económico e social do País e, por isso, julgo que tal afirmação é resultado de um certo complexo que existe da parte dos nossos colegas da área das ciências sociais e humanas. Aliás, na passada sexta-feira visitei os centros de investigação das quatro faculdades da área das ciências sociais e humanas da Universidade de Coimbra para assegurar às pessoas, confirmando e comprovando, que realmente não há problemas relativamente ao financiamento das ciências sociais e humana.
Uma outra questão que queria aqui dirimir prende-se com o conceito de sistema científico e tecnológico. Trata-se, pois, de um conceito muito mais abrangente do que aquele que resultava do facto de a ciência estar incluída no Ministério da Educação.
Assim, a política cientifica não deve voltar a estar ligada ao Ministério da Educação e à política educativa. 15to é, deve também estar ligada, mas não incluída como departamento na política educativa. Porquê? Porque o conceito de sistema científico e tecnológico é hoje muito mais vasto e tem perspectivas muito mais abertas do que a simples ligação à educação.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Quais?
O Orador: - Quais são? A resposta é muito fácil: são as que têm a ver com a ligação da ciência à educação no aspecto formativo, ao sistema produtivo, à internacionalização, bem como a uma série de problemas que não cabem dentro da política educativa.
Portanto, incluir novamente a ciência no Ministério da Educação significaria um regresso ao passado, o que não convém! O que interessa é dar passos em frente. Tal não significa que não se continue a privilegiar a ligação da ciência com a educação, mas as perspectivas têm que se abrir noutros sentidos.
Com certeza que o Governo procura estabelecer e executar uma política cientifica que tenha em conta o desenvolvimento do País, de forma que, ao visitarmos uma exposição sobre os dinossauros, não tenhamos de os ver produzidos por uma tecnologia que vem do Japão porque no nosso país não foi possível, nem através da tecnologia nem da criatividade, produzir os meios adequados para fazer essa mesma exposição.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Mário Tomé, José Calçada, Fernando de Sousa e João Corregedor da Fonseca.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, gostaria que me dissesse como relaciona a questão da racionalização da coordenação da investigação com aquilo que me parece ter sido uma dissipação dos meios de investigação científica.
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É que, segundo informação de que disponho, nos países mais avançados está a fazer-se o contrário, ou seja, opta-se por concentrar departamentos científicos, aproveitando ao máximo as sinergias entre a técnica e as ciências, criando depois delegações regionais e centros próprios junto da universidade e da indústria, mas mantêm uma estrutura fundamental que permita, de facto, uma maior eficácia da investigação cientifica.
Assim, como é que o papel da investigação científica no desenvolvimento do nosso país e até na sua independência nacional - se é que ainda se pensa nisso, nomeadamente da parte do Governo e do PSD -, se compatibiliza com, por exemplo, a afirmação do Sr. Ministro Valente de Oliveira, que mandou os cientistas do INIC oferecerem-se à indústria, como se o Estado não tivesse um papel importante no desenvolvimento da investigação cientifica, isto é, quis que os cientistas se desenrascassem, ou mesmo com o facto de ouvirmos dizer que "com o nosso sol e os nossos eucaliptos nada mais seria necessário"?
Para terminar, Sr. Secretário de Estado, não pensa que, tendo em conta a indústria no nosso pais - cada vez mais dependente e dirigida pelas multinacionais -, fica muito pouco espaço para uma investigação científica básica nacional que preserve os interesses do nosso país e, é claro, dos cientistas?
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia pretende responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento?
O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia: - Respondo no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, quem o tenha ouvido deve ter ficado a pensar que não vive neste país ou que, vivendo, não lê os jornais! Que não leia jornais, isso já não é para nós muito estranho, uma vez que, certamente, segue um hábito - revelado há algum tempo - do Sr. Primeiro-Ministro e, portanto, insere-se numa linha de coerência, mas que tente fazer ver a esta Câmara que, no que se refere à extinção do INIC e questões correlativas, "tudo correu no melhor dos mundos", isso é querer fazer-nos acreditar que, em última análise, de duas uma: se tudo o que o INIC fazia continua a ser feito - e então é porque o Governo entende, na sua "sábia sabedoria", que é necessário fazê-lo -, ou a extinção do INIC esteve a mais ou, então, extinguindo e criando qualquer "outra coisa", essa "outra coisa" tem papel igual ao do INIC, o que, de outra forma, nos faz sair exactamente no mesmo.
De facto, o Sr. Secretário de Estado meteu tudo no mesmo saco! Referiu os problemas da extinção do INIC e da sua reestruturação... Ora, ninguém questionava tal - no mundo académico e cientifico houve sucessivas comissões no sentido da reestruturação do INIC - porque, aliás, não era isso que estava em causa. A verdade é que o Governo, relativamente às propostas apresentadas pelas comissões, fez ouvidos moucos a todas essas tentativas de reestruturação e o resultado foi o que se viu!
Sr. Secretário de Estado, para ouvir as pessoas não basta ouvi-las, é também preciso tê-las em conta, sob pena de a audição não passar de mera formalidade! Foi exactamente o que aconteceu na situação da extinção do INIC.
Repare, Sr. Secretário de Estado, que não somos nós que estamos com fantasmas. De facto, tenho aqui declarações do reitor da Universidade do Porto, o Sr. Prof. Alberto Amaral, que, se me permite, passo a citar. "Ironia das ironias: quando uma comissão nomeada pelo Secretário de Estado do Ensino Superior produziu finalmente, em 1991, uma proposta consensual de reestruturação do INIC, que mereceu o apoio unânime do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e dos órgãos científicos do INIC, ela foi, pura e simplesmente, ignorada pelo Governo."
Mais adiante, e para terminar, diz ainda o Sr. Prof. Alberto Amaral: "É que a investigação universitária tem algumas características importantes, como seja a da sua ligação ao ensino e formação pós-graduada e à execução de investigação fundamental sem preocupações de retorno económico a curto prazo, problemas a que as agências de financiamento sediadas e outros ministérios nem sempre serão muito sensíveis."
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.
O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, penso que se notou um certo desconforto na defesa que faz de um processo do qual, efectivamente, não é responsável. De facto, este processo ultrapassou-o ou, melhor, a Secretaria de Estado que dirige.
O Sr. Secretário de Estado refere que foram ouvidas as universidades para a integração dos centros de investigação, dizendo que tal constituiu um facto positivo, pois elas concordaram com essa integração. Mas, por outro lado, todos os centros foram ouvidos quanto à oportunidade de extinção do INIC, o Conselho de Reitores foi ouvido quanto à sua oportunidade e todos se pronunciaram contra. No entanto e apesar disso, o Governo decidiu extinguir o INIC.
Portanto, essa consulta foi meramente formal, servindo apenas para o Governo se aproveitar ou para citar quando lhe interessa ou tratou-se, efectivamente, de uma consulta real que deve ter em consideração aquilo que defende a comunidade científica?
A segunda questão prende-se com o problema das linhas estratégicas de acção da política cientifica e tecnológica em Portugal. De facto, elas estão traçadas pela comunidade científica desde há alguns anos. O problema em causa não está na definição dessas linhas estratégicas mas, antes, em o Governo responder a todas essas questões.
Ora, em relação a este assunto, fui bem claro na minha intervenção e tentei explicar que o Governo não tem seguido essas linhas estratégicas de desenvolvimento da ciência e da tecnologia, de apoio às ciências sociais e humanas, de consulta à comunidade científica, de diálogo continuo que deve ter com ela, etc.
Quanto aos centros, permita-me que discorde, pois tenho conhecimento da situação em que se encontram alguns deles e a verdade, Sr. Secretário de Estado, é que os centros estão, neste momento, descapitalizados. A actividade editorial, de facto, não paralisou totalmente mas diminuiu significativamente e os próprios reitores das universidades dizem que, com excepção do desbloqueamento das verbas processadas através da JNICT para o pessoal, tudo está ainda por definir. Portanto, vamos ver, ao longo deste ano, como é que os contratos plurianuais de investigação e os
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projectos vão ser definidos e implementados. Mas a verdade é que a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia vai ter, este ano, muito que fazer para colmatar justamente as indecisões, as lacunas e todos os problemas que estão para trás.
Finalmente, gostaria de dizer também que discordo em absoluto que o organismo responsável pela ciência e tecnologia deva estar na dependência do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Certamente que isso não acontece noutros países, em que, muitas vezes, está na dependência do próprio Ministério da Educação.
Aliás, o recente Relatório Dekker, da Comunidade Europeia, demonstra que essa não é a melhor política no que diz respeito à tutela da investigação e, sobretudo, à tutela da investigação desenvolvida pelas universidades.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, não sei se V. Ex.ª sabe que o País precisada investigação científica e tecnológica como do pão para a boca. V. Ex.ª deve saber isso mais do que ninguém, com certeza.
A verdade é que V. Ex.ª diz que a extinção foi feita por razoes perfeitamente válidas. E não foi, nos nove minutos da sua intervenção, nem sequer no preambulo do decreto-lei, que o Governo explicou quais as razões que levaram à extinção do INIC.
V. Ex.ª diz que houve a "máxima tranquilidade e a máxima aceitação", o que é notório pois trata-se de um decreto-lei feito no silêncio do seu gabinete, que colheu de surpresa a comunidade científica, por isso, só nos resta, agora, votar os pedidos de ratificação que aqui são apresentados.
Há momentos, dizia o Sr. Deputado do PSD, quando interveio para ler apenas o decreto, que se enquadrava este diploma na filosofia política do Governo. É evidente que o Sr. Deputado tem razão, pois a filosofia política do Governo é extinguir o INIC, como é tentar extinguir - como, há dias, foi amplamente divulgado - a Escola de Saúde Pública, como é extinguir tudo aquilo que, na óptica do Governo, não dá lucro imediato. Esta é a questão!
É muito grave o que o Governo está afazer, isto é, quando mais necessitamos de investigação cientifica sejamos confrontados com um decreto-lei deste teor com objectivos que continuam por esclarecer.
O Sr. Secretário de Estado referiu a Lei da Autonomia
das Universidades e não esqueceu a unanimidade que
houve na sua aprovação. Já agora, Sr. Secretário de Estado,
com que meios é que as universidades vão poder desenvolver, nos seus diversos departamentos, a investigação
cientifica e tecnológica se as universidades nem para o seu
funcionamento têm verbas suficientes? E não vale a pena
dizer que foram d espoletadas algumas verbere apenas para
pessoal científico. Diga-me com que meios é que se poderá
fazer investigação e quando é que a Secretaria de Estado
da Ciência e Tecnologia vai tornar públicos, muito clara
mente, os meios que vai atribuir às diversas universidades?
Não terá sido preferível optar-se por uma reestruturação do INIC em termos muito reais e muito concretos, tendo em conta as realidades do País, e não acabar, desta forma,
com aquele instituto, porque esta actuação não conduz a uma valorização de um sector tão carenciado e importante?
(O orador reviu).
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia.
O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia: - Sr. Presidente, começando pelo fim e respondendo ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, gostava de dizer que as razões que levaram à extinção do INIC são duas - e, no fundo, o que vou dizer é a repetição do que já disse.
A primeira dessas razões é a racionalização da coordenação do sistema científico e tecnológico, que se traduz, concretamente, numa poupança de estruturas, de métodos e de comissões de avaliação e de meios que eram repetidos em duas instituições pertencentes a ministérios diferentes e que, devido às naturais dificuldades de coordenação interministerial, eram muito bem aproveitadas, com beneficio daqueles grupos mais aguerridos de investigação, que era quem se aproveitava melhor desta confusão.
A segunda razão é o respeito pela autonomia das universidades. Estas têm, agora, os seus centros de investigação para executarem a sua política científica, que estão a ser apoiados numa base orçamental que lhes dá para serem capazes de se organizar e concorrer, em termos nacionais e internacionais, aos meios e programas postos à sua disposição, quer pelo Governo, quer pela Comunidade Europeia, quer por outras instituições.
Portanto, estas são as razões que temos de aproveitar e que constituem, realmente, meios que dão uma possibilidade de melhorar o sistema.
O Sr. Deputado José Calçada disse que bastaria ler os jornais para se verificar que o processo da extinção do INIC não correu da melhor forma. Sr. Deputado, eu não disse que correu como se estivéssemos no céu! Basta ter de lidar com um processo destes, que é um processo de inovação, para, de acordo com as leis normais da resistência natural à inovação, se verificar que, realmente, seria muito estranho que tudo corresse como se as pessoas não tivessem as suas ideias próprias, não fossem inteligentes, confrontando, portanto, as decisões. 15so é bom!
Mas quem tem a responsabilidade de governar é o Governo, quem tem a responsabilidade e o mandato para tomar as melhores medidas possíveis relativamente à sociedade em geral é o Governo. Portanto, ele fez isso com respeito pelas pessoas, pelas situações e, mais do que tudo isso, pelos grandes objectivos da investigação científica e tecnológica e, em particular, a das universidades, que era a que estava em causa. E isso conseguiu-se! Não há qualquer dúvida a esse respeito!
Se tudo o que o INIC fazia era bem feito, por que é que as responsabilidades do IIVIC foram assumidas pela JNICT? Exactamente pelas razões que acabei de mencionar, isto é, para respeitar as universidades e para introduzir um elemento de simplificação e de clarificação na gestão do sistema a nível nacional.
O Governo tem essa responsabilidade porque é o responsável pelos dinheiros públicos e, portanto, não pode dar-se ao luxo de ter estruturas duplicadoras, por isso tem de racionalizar ao máximo os meios que são postos à sua disposição.
Para terminar, em resposta ao Sr. Deputado Fernando de Sousa e para descansar, mais uma vez, as pessoas, direi que, na realidade, os centros, neste momento, até não estão
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descapitalizados. E não o estão por uma razão que não tem a ver com INIC mas, sim, com a JNICT e com os programas do Quadro Comunitário de Apoio ou de iniciativa comunitária, particularmente os Programas Ciência e Stride, que vieram trazer às universidades e à sua estrutura organizada, que eram os centros do INIC, meios para executarem os seus projectos de uma forma muito melhor.
Portanto, se realmente existe algo de novo, é um reforço de capitalização em termos de equipamento, de bolseiros e de meios à disposição nos centros, devido, não ao IN1C, que estava, esse sim, um pouco descapitalizado, mas, sim, à JNICT.
É natural que ainda tenham algumas dúvidas e algumas ansiedades, mas tenho a certeza de que, já no fim deste mês, quando começarem a receber, pontualmente em Janeiro, o que nunca acontecia durante a vigência do INIC - as bolsas, as verbas para as despesas correntes e as informações relativas aos projectos e às coisas que estão à sua disposição -, essas dúvidas se hão-de dissipar. Penso que é natural que haja dúvidas, mas não duvido de que elas se irão dissipar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais pedidos de intervenção, declaro encerrado o debate relativo à ratificação n.º 40/VI.
Nos termos regimentais, vamos agora passar às votações agendadas para hoje.
A primeira votação diz respeito ao texto final, apresentado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, relativo ao projecto de lei n.º 153/VI - Regime jurídico de criação de freguesias (PSD).
Como VV. Ex.as sabem, este tema, por força do artigo 171.º, n.º 4, da Constituição, tem de ser discutido e votado em Plenário, pelo que, de acordo com o Regimento, temos de votar, artigo a artigo, os 14 artigos do texto final apresentado pela Comissão referida. Para a discussão na especialidade foram atribuídos aos grupos parlamentares os tempos que estão marcados no quadro electrónico.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, gostava que a Mesa nos informasse se houve consenso quanto ao pedido que formulei no período de antes da ordem do dia para que fosse efectuada hoje a votação do pedido de constituição de uma comissão eventual de inquérito parlamentar e, se não houve, quem é que se opôs a que essa votação fosse feita hoje.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não há consenso para que o pedido de constituição de uma comissão de inquérito parlamentar seja votado hoje, porque a tal se opôs o Partido Comunista Português.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Partido Comunista Português não dá, portanto, a sua anuência?
O Sr. Presidente: - Essa é a informação de que disponho, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, dada a forma como V. Ex.ª colocou a questão, peço a palavra
para, sob a forma de interpelação, esclarecer o seguinte: a lei e o Regimento dizem, explicitamente, que os inquéritos parlamentares são agendados, objecto de debate e, depois, de votação.
Ora, o que o PSD propõe não é apenas que o requerimento seja agora votado mas também que não haja debate, isto é, que não se possa aqui, no Plenário, explicar e debater a posição de cada um dos partidos, com o tempo e a profundidade que o assunto merece.
É por essa razão, Sr. Presidente, que não damos consenso, pois invocamos o Regimento e a lei para que a Mesa proceda em conformidade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas dar um esclarecimento ao Sr. Deputado João Amaral, na medida em que há, efectivamente, um equivoco na sua interpretação. E que, da parte do PSD, não há, obviamente, oposição a que haja debate em relação ao requerimento de constituição da comissão eventual de inquérito. Estamos perfeitamente de acordo em que se faça um debate com a duração de cinco minutos ou de um tempo mais ou menos limitado a cada partido e, depois, se faça a votação. Não pomos qualquer obstáculo à realização do debate, aliás entendemos mesmo que é assim que se deve fazer e, portanto, propomos essa solução.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não gostaria que. fizéssemos agora o debate, que, pelos vistos, não queremos fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, era apenas para, em 30 segundos ou muito menos, dizer que ainda não decorreram oito dias após a aprovação, aqui, de uma alteração à Lei das Comissões de Inquérito, que define procedimentos que tutelam interesses que têm de ser devidamente protegidos.
O que o Sr. Deputado aqui propõe é a votação, de supetão, ao sabor dos interesses do seu partido, como se a função parlamentar e as regras parlamentares tivessem dois pesos e duas medidas: muitas dificuldades, sempre que isso não convenha ao PSD, e muitas facilidades, sempre que esse seja o interesse do PSD! 15to não é aceitável, a qualquer título.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que ficamos cientes de que o Partido Comunista se opõe e não dá consenso para que se faça o debate e a votação hoje. Estamos perfeitamente esclarecidos.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PCP invoca a lei e o Regimento que
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definem a metodologia procedimental para a apreciação dos inquéritos parlamentares. É isso que o PCP pede que o Sr. Presidente comunique à Câmara.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está tudo esclarecido.
Vamos passar à votação...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o Regimento em vigor permite a deliberação que neste momento propomos. É preciso que fique claro quem prefere as discussões políticas inúteis e quem prefere aclarar a verdade e fazer funcionar os órgãos do Estado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço
palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, usarei da palavra todas as vezes que forem necessárias, desde que me seja concedida pelo Sr. Presidente, mas também devo dizer que não posso deixar de usar da palavra quando aqui se diz algo que não é rigorosamente verdade. 15to é, não é verdade que o Regimento, hoje, possa permitir isso. O Regimento e a lei definem, mesmo no sistema actual, uma tramitação para apreciação dos inquéritos parlamentares propostos pelos grupos parlamentares que implica, como o Sr. Presidente sabe muito bem, o decurso de um prazo, uma publicação ou a distribuição em folhas avulsas, o decurso de um outro prazo, um agendamento em conferência, um debate e uma votação. Nada disto o PSD queria aceitar. É porque o PSD, afinal, se acomoda mal com o próprio Regimento, que fez votar, que toda esta situação se verifica.
Não posso deixar de dizer aqui, Sr. Presidente, que é lamentável que toda esta situação se tenha criado apenas porque o PSD tem urgência num determinado assunto e que se possa ter aqui este debate num quadro factual que é permitido pela Mesa, quando, no fundo, o que está em causa é que o ónus incumbia ao PSD e é esse partido que não cumpre os ónus que o próprio Regimento lhe impõe.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa usou apenas o mesmo critério que tem utilizado para aplicar o Regimento. Quando há unanimidade de pontos de vista e desde que tenha sido distribuído o texto a discutir e votar, não tem havido impedimentos, na praxe parlamentar, a que se proceda a essa discussão e votação, mesmo não se observando estritamente o Regimento. Neste caso concreto, o que se verifica é que não há consenso, e cada um tem as suas razões. A questão está esclarecida.
O Sr. João Amaral (PCP): - Como não há consenso, não há nada a explicar!
O Sr. Presidente: - Vamos iniciar a discussão e votação, na especialidade, do texto final apresentado pela
Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente relativo ao projecto de lei n.º 153/VI - Regime jurídico de criação de freguesias (PSD). Os Srs. Deputados dispõem dos tempos que se encontram fixados no quadro electrónico e cada grupo parlamentar usará o tempo global para a discussão dos artigos como melhor entenderem, findo o qual não terá mais oportunidade de falar.
Vamos, então, seguir a ordem dos artigos, pelo que começaremos pelo artigo 1.º, cuja leitura será feita pelo Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é do seguinte teor.
Artigo 1.º
A presente lei define o regime jurídico de criação de freguesias.
a O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a
palavra o Sr. Deputado António Murteira.
O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente,
Srs. Deputados: Gostaria de, numa breve intervenção, situar
a posição do PCP face ao projecto de lei em discussão.
O PCP sempre tem defendido, e continua a defender,
um ordenamento democrático do território, isto é, um
ordenamento que permita a participação das populações,
através dos seus eleitos, na gestão da Administração
Pública aos diversos níveis consignados na Constituição
- freguesia, concelho, região -, com vista a um melhor
ordenamento e aproveitamento dos recursos e qualidade de
vida. A legislação e a política que defendemos têm sempre
em conta aquela nossa posição básica sobre estas questões.
Com a Lei n.º 11/82, sobre o regime de criação e extinção das autarquias locais e de designação e determinação
da categoria das povoações, foi possível avançar no
ordenamento do território nacional. Foram criadas, em 10
anos, 147 novas freguesias, passando Portugal de 4061 para
4208 freguesias, presentemente - estão pendentes na
Comissão da Administração do Território, Poder Local e
Ambiente cerca de 20 projectos -, e desde 1989 não foi
criada nenhuma nova freguesia.
Fica, assim, claro que a Lei n.º 11/82 é equilibrada e
permite um avanço adequado no ordenamento, sem
exageros, mas também sem constrangimentos arbitrários e
de pendor exageradamente quantitativo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Se tivermos em conta que "mais de
metade das freguesias portuguesas hoje existentes têm uma
população inferior a 1000 eleitores" e que "a dimensão
média das freguesias portuguesas, em termos populacionais, abrange entre 500 e 1000 eleitores" e se ao
requisito do número de eleitores juntarmos os outros
requisitos da lei, não serão muitas mais as freguesias
possíveis de criar face a essa mesma lei.
Ainda de acordo com a Associação Nacional de
Municípios Portugueses, "as hipóteses de criação de novas
freguesias ficam ainda mais restringidas se observarmos
os requisitos específicos exigidos pela lei para as freguesias
que se situam em sede de município ou em agregado
urbano com 5000 ou mais eleitores".
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O PCP é, pois, de opinião que a Lei n.º 11/82 não é
permissiva a excessos, é equilibrada e continua a
responder, no fundamental, às exigências das populações
em matéria de ordenamento do território a nível das
freguesias.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O projecto de lei n .º 153/VI, sobre o
regime jurídico de criação de freguesias, inicialmente
apresentado pelo PSD, face à realidade portuguesa, visava,
como regra, impossibilitar a criação de novas freguesias,
particularmente em "82 % do território nacional" onde a
"densidade populacional é inferior a 100 eleitos por
quilómetro quadrado".
Apesar do recuo do PSD, o texto final, hoje apresentado
à Assembleia da República, visa, na generalidade e sem
razões ou fundamentações objectivas, dificultar a criação
de freguesias, com a agravante de a sua aplicação ser
retroactiva em relação aos cerca de 20 projectos de lei
"retomados na VI Legislatura".
Aplicando a 10 destes projectos de lei pendentes (e só
a 10 porque não dispomos dos elementos dos outros)
apenas o requisito do mínimo de 800 eleitores para a
criação de novas freguesias em zonas com menos de 100
eleitores por quilómetro quadrado, logo se vê que, com o
diploma em debate, 70 % dos projectos de lei pendentes
serão rejeitados.
Chega-se ao absurdo de até o projecto de lei para a
criação da freguesia de Vila Verde, em Seia, apresentado
por três partidos - PCP, PS e PSD-, vir a ser
chumbado!
Olhando para o diploma, na especialidade, votamos a
favor dos artigos que, com base nos princípios que
defendemos, possam melhorar a Lei n.º 11/82 e votamos
contra os artigos cuja filosofia e objectivo concreto é
dificultar, ou até impedir, a criação de freguesias, com
critérios, por vezes, meramente quantitativos.
Nesta situação, estão, particularmente, a alínea c) do
artigo 4.º, que exige o mínimo de 150 eleitores não na
área da freguesia a criar mas na sua futura sede; as alíneas
a), b) e d) do n.º 1 do artigo 5 º e as alíneas a) e b) do
n.º 2 do mesmo artigo, cujos critérios agravam as
condições para a criação de novas freguesias.
O n.º 3 do artigo 9.º, que retirou à assembleia municipal
a capacidade de nomear a comissão instaladora, passando
-a para a câmara municipal, vai contra qualquer lógica
democrática. Por sua vez, os n.ºs 1 e 3 do artigo 11 º
impõem a realização de eleições para as novas freguesias
apenas "na data de realização, a nível nacional, das
eleições autárquicas seguintes".
Inaceitável é também o n.º 1 do artigo 13.º, que decide
ser "a presente lei aplicável a todos os projectos de lei de
criação de freguesias pendentes na Assembleia da
República".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos ainda de lamentar
não ter sido pedido formalmente e por escrito o parecer à
Associação Nacional de Freguesias sobre esta matéria.
Porque a experiência já mostrou que, com as freguesias,
os municípios e, amanhã, as regiões, os cidadãos poderão
participar mais efectivamente e o ordenamento do
território, para além de uma dimensão geográfica e
económica, contará com a indispensável dimensão social
e humana que só os trabalhadores e as populações lhe
poderão imprimir.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sn. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação do artigo 1.º
Submetido d votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
Srs. Deputados, está em apreciação o artigo 2 º Não havendo inscrições, vamos votá-lo.
Submetido d votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 2.º
Competência
A criação de freguesias incumbe à Assembleia da República, no exercício do seu poder legislativo e no respeito do regime geral definido na presente lei quadro.
Srs. Deputados, está em discussão a proposta de aditamento de um artigo 2.º-A, apresentada pelo PCP.
Não havendo inscrições, vamos votá-la.
Submetida à votação, foi rejeitada, com os votos contra do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos a favor do PCP, de Os Verdes e das Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Era a seguinte:
Artigo 2.º-A
Petições da criação de freguesias
1 - As petições de criação de nova freguesia subscrita` pelo menos por um quarto dos cidadãos eleitores da área respectiva são obrigatoriamente apreciadas pelo Plenário.
2 - A tramitação destas petições obedece em tudo o mais à tramitação prevista na lei respectiva para as petições a serem apreciadas obrigatoriamente em Plenário.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 3 º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao artigo 3 º, o Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração, que integra o texto final e que visa eliminar a possibilidade de existência de requerimento dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia da República com vista a uma iniciativa legislativa.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas manifestar a minha perplexidade pelo facto de o PS não ter reparado que a proposta não corresponde a nenhuma iniciativa legislativa, nos termos em que o PS agora a caracterizou, e por se limitar a dizer que determinadas petições devem ser apreciadas como tal pelo Plenário da Assembleia da República, como são, por
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exemplo, todas as subscritas por mais de 4000 cidadãos ou as que a Comissão de Petições entenda que o devam ser. Este seria um caso a aditar à apreciação obrigatória, pelo Plenário, de petições, das quais não resultaria, evidentemente, uma lei mas, sim, entre outros possíveis resultados, um eventual pronunciamento pelos partidos acerca do mérito da petição.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, em abono da minha tese, desejo declarar que, para além de ser de duvidosa constitucionalidade, o facto de o projecto de lei em discussão referir que as assinaturas dos peticionários devem ser autenticadas pela junta de freguesia revela-se de total ilegalidade.
O Sr. João Amaral (PCP): - A minha proposta não refere nada disso.
Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr, Presidente, não posso deixar de interpelar a Mesa porque foram feitas apreciações pelo Sr. Deputado Júlio Henriques acerca da proposta apresentada pelo PCP que nada têm a ver com ela, isto é, que não correspondem ao seu conteúdo. Por exemplo, refere normas relativas ao procedimento notarial que não estão incluídas na nossa proposta.
Queria apenas que ficasse registado, com clareza, o que eu disse no inicio da outra intervenção: o Sr. Deputado está a falar de uma outra proposta, que não é a do PCP. Está a discutir e a votar a proposta inicial do PSD, que ninguém pôs à votação. O que foi posto à votação foi uma proposta, apresentada pelo PCP, de aditamento de um artigo 2.º-A, que se refere a petições e contra a qual o PS votou, tecendo argumentos que são completamente descabidos e que nada têm a ver com a proposta.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faço um apelo para que possamos reflectir um pouco antes de continuarmos esta discussão. Suponho que o artigo 2.º-A está ultrapassado e estamos agora a discutir o artigo 3.º, tal como foi aprovado em Comissão.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, não foi acerca da proposta de alteração apresentada pelo PCP que pedia palavra e me pronunciei no Plenário mas acerca da votação do artigo 3.º, porque era desse que se tratava no momento em que pedi a palavra. Tratava-se de votar o artigo 3 º e eu limitei-me a informar que o Partido Socialista tinha apresentado propostas sobre esse artigo.
O Sr. João Amaral (PCP): - Cada vez se enterra mais!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Júlio Henriques anunciou ter feito em Comissão da Administração do Território, Poder Local e Ambiente umas tantas propostas, que o texto da Comissão não consagra, pelos menos algumas delas.
Srs. Deputados, se não houver mais inscrições, vamos proceder à votação do artigo 3.º, tal como consta do texto final elaborado pela Comissão.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 3.º
Factores de decisão
Na apreciação das iniciativas legislativas que visem a criação de freguesias, deverá a Assembleia da República ter em conta:
a) A vontade das populações abrangidas, expressa através de parecer dos órgãos autárquicos representativos a que alude a alínea
e) do artigo 7 º desta lei;
b) Razões de ordem histórica, geográfica, demográfica, económica, social e cultural;
c) A viabilidade político-administrativa, aferida
pelos interesses de ordem geral ou local em
causa, bem como pelas repercussões administrativas e financeiras das alterações pretendidas.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 4.º
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, solicito à Mesa que a alínea c) do artigo 4.º seja votada em separado.
O Sr. Presidente: - Como não há oposição, vamos votar de acordo com o requerimento agora apresentado pelo PCP.
Srs. Deputados, vamos votar o corpo e todas as alíneas do artigo 4.º, à excepção da alínea c).
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
São os seguintes:
Artigo 4.º
Indicadores a ponderar
Na criação de freguesias atender-se-á aos indicadores seguintes, ponderados de acordo com os escalões constantes do quadro que constitui o anexo ao presente diploma:
a) Número de eleitores da freguesia a constituir,
b) Taxa de variação demográfica na área
proposta para a nova freguesia, observada
entre os dois últimos recenseamentos
eleitorais, intervalados de cinco anos;
d) Diversificação de tipos de serviços e de estabelecimentos de comércio e de organismos
de índole cultural, artística ou recreativa
existentes na área da futura freguesia;
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1122 I SÉRIE -NÚMERO 31
e) Acessibilidade de transportes entre a sede proposta e as principais povoações da freguesia a criar;
f)Distância quilométrica entre a sede da freguesia a instituir e a sede da freguesia de origem.
Srs. Deputadas, vamos proceda à votação da alínea c)
do artigo 4.º
Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé.
É a seguinte:
c) Número de eleitores da sede da futura freguesia;
Srs. Deputados, passamos ao artigo 5 º
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, creio que a votação do artigo 5 º seria facilitada se votássemos do seguinte modo: em primeiro lugar, o n º 1 e as alíneas a) e b); em segundo lugar, a alínea c) do n.º 1; em terceiro lugar, a proposta de aditamento de uma expressão à alínea c) do n.º 1, do PCP; em quarto lugar, a alínea d) do n.º 1 e o n.º 2 com as respectivas alíneas; e, em quinto lugar, os n.ºs 3 e 4.
Se houver acordo de todos os grupos parlamentares, penso que este esquema facilita a votação, ficando, deste modo, todo o artigo votado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há objecções, vamos votar o artigo 5.º, de acordo com a proposta agora apresentada, isto é, o corpo do n.º 1 e alíneas a) e b).
Submetidos à votação, foram aprovados, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes todo Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
São os seguintes:
Artigo 5 º
Critérios técnicos
1- A criação de freguesias fica condicionada à verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
a) Número de eleitores da freguesia a constituir não inferior a 800 nos municípios com densidade populacional inferior a 100 eleitores por quilómetro quadrado, a 1200 nos municípios com densidade populacional compreendida entre 100 e 199 eleitores por quilómetro quadrado, a 1600 nos municípios com densidade populacional compreendida entre 200 e 499 eleitores por quilómetro quadrado e a 2000 nos municípios com densidade populacional igual nu superior a 500 eleitores por quilómetro quadrado;
b) Número de eleitores da sede da futura
freguesia não inferior a 150;
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da alínea c) do nº 1.
Submetida d votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente
Freitas do Amaral.
É a seguinte:
c) Número de tipos de serviços e estabelecimentos de comércio e de organismos de índole cultural, artística e recreativa existentes na área da futura freguesia não inferior a 4;
Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de aditamento da expressão "[...], bastando 1 se for polivalentes à alínea c) do n.º 1, apresentada pelo PCP.
Submetida d votado, foi rejeitada, com os votos contra do PSD, do CDS e do PSN, os votos a favor do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção do PS.
Srs. Deputados, vamos votar a alínea d) do n.º 1 e o nº 2.
Submetidos d votação, foram aprovados, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes Jogo Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
São os seguintes:
d) Obtenção, de. acordo com os eiveis de ponderação constantes do quadro anexo de pelo menos, 10 pontos, para as freguesias a constituir em municípios com densidade populacional inferior a 100 eleitores por quilómetro quadrado, 20 pontos, em municípios com densidade populacional compreendida entre 100 e 199 eleitores por quilómetro quadrado, 30 pontes, em municípios com densidade populacional compreendida entre 200 e 499 eleitores por quilómetro quadrado e 40 pontos em municípios com densidade populacional igual ou superior a 500 eleitores por quilómetro quadrado.
2 - Nas sedes de município e nos centros populacionais de mais de 7500 eleitores a criação de freguesias fica condicionada à verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
a) Número de eleitores na futura freguesia não inferior a 7000 nos municípios de Lisboa e do Porto e a 3500 nos restantes municípios;
b) Taxa de verificação demográfica positiva e superior a 5 % na área da futura circunscrição, observada entre os dois últimos recenseamentos eleitorais intervalados de cinco anos.
Srs. Deputados, vamos, finalmente, proceder à votação dos n.ºs 3 e 4 do artigo 5.º
Submetidos d votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
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São os seguintes:
3 - A criação de freguesias não poderá privar as freguesias de origem dos recursos indispensáveis à sua manutenção nem da verificação da globalidade dos requisitos exigidos nos números anteriores.
4 - A observância dos requisitos mínimos estabelecidos para a criação de freguesias não é exigível para as que se constituam mediante a fusão de duas ou mais freguesias preexistentes.
Srs. Deputados, vamos votar o artigo 6.º
Submetido d votado, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 6.º
Limites geo-administrativos
1 - O território das novas freguesias deve ser espacialmente continuo.
2 - A criação de freguesias não deverá provocar alterações nos limites dos municípios salvo quando tal se revele indispensável por motivos de reconhecido interesse público devidamente explicitado.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 7.º
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral. Dispõe de 30 segundos.
O Sr. João Amarai (PCP): - Obrigado, Sr. Presidente, pela informação, mas, apesar de me facilitar a missão, não preciso de muito tempo para dizer que a proposta de alteração do n.º 2 do artigo 7.º, subscrita pelo Sr. Deputado Silva Marques, corresponde a um processo de clara governamentalização da Assembleia, inaceitável a todos os títulos.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - É sempre o mesmo disco! Está gasto!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, sempre defendemos este ponto de vista!
Mas solicitei a palavra para interpelar a Mesa sobre o processo de votação. É que, Sr. Presidente, gostaria de saber se o que V. Ex.ª vai colocar à votação, em primeiro lugar, é a proposta de alteração apresentada pelo PSD ou o artigo 7.º, tal como consta do texto da Comissão.
Segundo presumo, o correcto seria pôr, primeiro, à votação a nossa proposta de alteração e só depois...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, de acordo com o artigo 157 º do Regimento, em vigor, será colocada à votação, em primeiro lugar, a proposta de alteração.
O Sr. Luís Martins (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. Luís Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-nos que a proposta de alteração, subscrita pelo meu colega Deputado Silva Marques, está de acordo com os princípios que enformaram o grupo de trabalho da Comissão.
Entendeu-se, no grupo de trabalho, que a palavra "poderá" seria suficiente para que amanhã a Subcomissão só enviasse ao Governo, apenas para fazer o relatório, os projectos de lei que, à partida, constatasse não terem condições de virem a ser posteriormente aprovados.
Ora, a intervenção do Sr. Deputado João Amaral vem confirmar que a nossa leitura, ao nível do grupo de trabalho da Comissão, justifica, de facto, esta proposta de alteração do n.º 2 do artigo 7.º, de que terá de ser "deverá" e não "poderá", porque o entendimento do grupo de trabalho é o de que só se deverá enviar ao Governo, a fim de emitir relatório, os projectos de lei de que, à partida, a Comissão entenda haver possibilidades de virem a ser criadas as freguesias.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, manifesto a mais completa surpresa com o surgimento desta proposta de alteração ao artigo 7.º, n.º 2, porquanto, como consta do relatório distribuído, aprovado por unanimidade, uma proposta do Partido Socialista, que integra o texto final, foi, no grupo de trabalho, aprovada pelo PSD, pelo PS e pelo PCP. pois, estranho que surja esta proposta de alteração, porquanto a Assembleia da República deveria reservar para si o direito de solicitar, quando bem o entendesse, o relatório técnico ao Ministério da tutela, mas não se devia constituir a obrigatoriedade de o fazer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, para interpelar a Mesa, Sr. presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, solicitamos que a votação do n.º 2 do artigo 7 º seja feita em separado, bem como as propostas de alteração respectivas.
Pronunciando-me sobre a questão de fundo, devo dizer que é muito simples: o poder de elaborar a lei é da Assembleia, pelo que não pode estar condicionada a qualquer actividade administrativa da responsabilidade do Governo. Ora, isto pode convir ao PSD para conseguir resolver os problemas que tem, nomeadamente aquando da apresentação dos projectos de lei - e respondo directamente ao Sr. Deputado Duarte Lima, que disse que o disco era sempre o mesmo -, visto assumir compromissos perante a população e, depois, querer que seja a Assembleia a resolver o problema desta maneira simples. A Assembleia diz: "Não, não! A lei não permite que esses projectos tenham execução." Então, o PSD, nas suas capelinhas, nos seus círculos, diz: "Vamos criar a freguesia tal", para depois, quando voltam aos círculos, dizerem: "São uns malandros, não nos deixam fazer nada! Aprovam leis que não nos permitem isso!" 15to é o que se chama uma política de caciquismo, Srs. Deputados!
Vozes do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca: - Muito bem!
Risos do PSD.
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1124 I SÉRIE - NÚMERO 31
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entretanto, sou informado de que a proposta de alteração do n.º 2 do artigo 7.º, do PSD, sofreu um ajuste gramatical necessário, passando a dizer: substituir no n.º 2 "poderá" por "deverá".
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Silva Marques já há pouco explicou, em termos regimentais, como se deveria proceder à votação.
Em primeiro lugar, deve votar-se a proposta de alteração do n.º 2 e só depois o n.º 2 do texto da comissão.
O Sr. Presidente: - Portanto, para o n.º 2 do artigo 7 º na redacção dada pelo texto final da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente há uma proposta de alteração apresentada pelo PSD, que será votada em primeiro lugar, procedendo-se, de seguida, d votação dos restantes números deste artigo. Aliás, suponho que foi esse o sentido do requerimento apresentado pelo PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, proponho
que, em primeiro lugar, se proceda à votação do n.º 1 do
artigo 7.º, depois, da proposta de alteração do n.º 2,
apresentada pelo PSD, em seguida, do n.º 2 do texto da
Comissão já com essa alteração caco seja aprovada, e,
finalmente, do n.º 3.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, votaremos em primeiro lugar os n.ºs 1 e 3 do artigo 7.º, em seguida, a proposta de alteração do n.º 2 e, finalmente, o n.º 2
resultante do texto da Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar os n.º 1 e 3 do artigo 7.º
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
São os seguintes:
Artigo 7.º
Instrução do processo
1 - O processo a instruir para efeitos da criação
de freguesias será organizado com base nos seguintes
elementos:
a) Fundamentação do projecto ou proposta de
lei com base nos factores de decisão
enunciados no artigo 3.º;
b) Verificação de critérios e requisitos técnicos
exigidos nos termos do artigo 5.º;
c) Indicação da denominação e da sede
propostas para a futura freguesia;
d) Descrição minuciosa dos limites territoriais
da futura freguesia, acompanhada da
representação cartográfica, pelo menos, à
escala de 1:25 000;
e) Cópia autenticada das actas das reuniões tios
órgãos deliberativos e executivos do
município e freguesias envolvidos em que foi emitido parecer sobre a criação da futura freguesia.
3 - Quando verificada a existência de todos os elementos necessários à instrução do processo, a Assembleia da República solicitará aos órgãos do poder local os respectiva pareceres, os quais deverão ser emitidos no prazo de 60 dias.
Vamos votar a proposta de alteração do PSD para o n º 2 do artigo 7.º, que substitui a palavra "poderá" por "deverá".
Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PSD e do PSN e os votos contra do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Vamos votar o n.º 2 do artigo 7.º, já com a alteração aprovada.
Submetido d votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do CDS e do PSN e os votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
2 - Tendo em vista o que dispõe esta lei e designadamente o seu artigo 5.º, deverá a Assembleia da República solicitar ao Governo, o qual fornecerá, sob a forma de relatório e no prazo máximo de 60 dias, os elementos com interesse para o processo.
Uma vez que não há pedidos de palavra em relação ao
artigo 8.º, vamos votá-lo.
Submetido d votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freiras do Amaral.
Submetidos d votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 8.º
Menções legais obrigatórias
Os diplomas de criação de freguesias devem, obrigatoriamente, incluir os seguintes elementos:
a) Indicação da denominação e da sede;
b) Explicitação das autarquias locais de onde
provieram os territórios da nova freguesia;
c) Descrição minuciosa dos limites territoriais,
acompanhada de representação cartográfica
ilustrativa;
d) Composição da comissão instaladora
atendendo ao disposto nos n.ºs 3 e 4 do
artigo seguinte.
Srs. Deputados, está em discussão o artigo 9.º
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
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20 DE JANEIRO DE 1993 1125
O Sr. João Amaral (PCP). - Sr. Presidente, solicito que sejam votados em primeiro lugar os n.ºs 1 e 3 e, depois, os n.ºs 2 e 4 do artigo 9.º
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar os n.ºs 1 e 3 do artigo 9.º
Submetidos d votação, foram aprovados, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
São os seguintes:
Artigo 9 º
Comissão instaladora
1- Afim de promover as acções necessárias à instalação dos órgãos autárquicos da nova freguesia, é nomeada uma comissão instaladora, que funcionará no período de seis meses que antecedem o termo do mandato autárquico em curso.
3 - A comissão instaladora é nomeada pela câmara municipal com a antecedência mínima de 30 dias sobre o início de funções nos termos do n.º 1 do presente artigo, devendo integrar maioritariamente cidadãos eleitores da área da nova freguesia, para além de membros dos órgãos deliberativo e executivo quer do município quer da freguesia de origem.
Vamos votar os n.ºs 2 e 4 do artigo 9.º
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
São os seguintes:
2 - Para o efeito consignado no número anterior, caberá à comissão instaladora preparar a realização das eleições para os órgãos autárquicos e executar todos os demais actos preparatórios estritamente necessários ao funcionamento da discriminação dos bens, universalidades, direitos e obrigações da freguesia ou freguesias de origem a transferir para nova freguesia.
4 - Na designação dos cidadãos eleitores da área da nova freguesia, ter-se-ão em conta os resultados das últimas eleições para a assembleia de freguesia de origem.
Srs. Deputados, está em discussão o artigo 10.º Como
não há pedidos de palavra, vamos votá-lo.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade,
registando-se a ausência do Deputado independente
Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 10.º
Partilha de direitos e obrigações
Na repartição dos direitos e obrigações existentes
à data da criação da nova freguesia entre esta e a de
origem, atender-se-á aos seguintes critérios orientadores:
a) Proporcionalidade em função do número de
eleitores e da área das respectivas
freguesia;
b) Localização geográfica dos edifícios e
outros bens imóveis a repartir,
c) Quaisquer outros que a comissão instaladora
entenda dever considerar.
Passamos ao artigo 11.º
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, solicito que sejam votados, em primeiro lugar, os n.ºs 1 e 3 do artigo 11 º e, de seguida, o n º 2.
O Sr. Presidente: - Vamos votar os n.ºs 1 e 3 do artigo 11 º, conforme foi solicitado.
Submetidos d votação, foram aprovados, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
São os seguintes:
Artigo 11.º
Eleições
1 - Não é permitida a criação de freguesias durante o período de seis meses que imediatamente antecede a data marcada para a realização de quaisquer eleições a nível nacional.
3 - A eleição dos titulares dos órgãos das novas freguesias só ocorrerá na data da realização, a nível nacional, das eleições autárquicas seguintes.
Vamos votar o n.º 2 do artigo 11.º
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
2 - No caso de eleições intercalares, a nível regional, municipal ou de freguesia, a proibição atinge unicamente a criação de freguesias na área respectiva.
Srs. Deputados, está em discussão o artigo 12.º Como não há pedidos de palavra, vamos votá-lo.
Submetido d votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e as abstenções do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
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É o seguinte:
Artigo 12.º
Apoio financeiro e técnico
Sem prejuízo da colaboração que possa ser fornecida pelos municípios ou pelas freguesias de origem, o Governo prestará apoio financeiro à instalação de novas freguesias, nos termos e nas condições estabelecidas no diploma regulador da concessão excepcional de auxílios financeiros por parte do Estado às autarquias locais, para além da assistência técnica que poderá fornecer.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 13 º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração aditando um novo n .º 2 ao artigo 13 º que consideramos do maior interesse. O Partido Socialista não aceita que se pretenda, com a redacção dada ao projecto de lei que resulta do texto foral em presença, aplicar a nova lei aos projectos de lei pendentes na Assembleia da República.
De facto, não faz sentido que, não tendo o PSD nestes últimos três anos consentido sequer o debate em sede de comissão dos projectos aqui apresentados, alguns subscritos por Srs. Deputados da bancada da maioria, venha agora com este artigo arrumá-los na "prateleira", ou seja, lançá-los para o arquivo morto.
A nossa proposta vai no sentido de a nova lei não ser aplicável aos projectos de lei que deram entrada até ao termo da V Legislatura e que, entretanto, foram retomados. É esta a nossa posição, pelo que votaremos necessariamente contra o texto final da Comissão relativo ao projecto de lei n.º 153/VI.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr: Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.,
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sequência do método a que há pouco fiz referência, este n.º 1 do artigo 13 º é perfeitamente esclarecedor. Nas últimas eleições legislativas, os Srs. Deputados do PSD - e talvez alguns se sentem na primeira fila da bancada social-democrata - prometeram aos seus eleitores elaborar alguns projectos de lei, os quais já foram apresentados mas, agora, os "malandros" dos Deputados vão aprovar este n.º 1, segundo o qual se aplica a esses projectos de lei uma lei que não permite a sua aprovação.
Eu imagino as lágrimas de crocodilo que esses Deputados vão chorar nos braços dos seus eleitores...!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Martins.
O Sr. Luís Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após a acesa discussão na generalidade deste projecto de lei, chegados ao final da votação na especialidade, podemos concluir que os argumentos apresentados pelos partidos da oposição não eram tão fortes como à partida pareceriam. Normalmente, acusam o PSD de ser arrogante, de não dialogar e de não ser rapaz de acolheras propostas feitas pelos partidos da oposição, mas esse argumento foi, nesta votação, sobejamente contrariado.
A verdade é que "encalhámos" no artigo 13.º Por razões de princípios ou de rigor jurídico? Entendemos que não! O que aqui está em causa - e alguns juristas que mo perdoem - é uma situação semelhante à seguinte: depois de aprovar uma Constituição, vir dizer que ela não se aplica aos projectos e às propostas de lei que deram entrada na Assembleia da República, mas só a outros diplomas. Esta lei quadro é um pouco assim, aplica-se a todos menos aos projectos de lei apresentados na última legislatura que, entretanto, foram retomados e que, Sn. Deputados, não são muitos, apenas 12. Fomos tentar saber e chegámos à conclusão de que seis foram apresentados pelo PCP, três pelo PS e três pelo PSD. Por acaso, os do Partido Socialista foram subscritos pelo nosso colega e amigo Júlio Henriques e os do PSD por mim próprio.
O Sr. João Amaral (PCP): - Fica-lhe mal, Sr. Deputado.
O Orador: - Não fica!
Na minha perspectiva, ser Deputado, não é seguir a linha demagógica de pensamento do Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Demagógico é o Sr. Deputado!
O Orador: - Ser Deputado é assumir a responsabilidade dos nossos actos. Não esteja o Sr. Deputado preocupado que aos meus eleitores saberei eu explicar por que é que os projectos de lei não são aprovados.
Risos do PS e do PCP.
Mas, Sr. Deputado João Amaral, veja que credibilidade eu teria perante a minha bancada e os meus colegas se viesse aqui defender uma proposta idêntica à apresentada pelo Parido Socialista para salvaguardar três projectos de lei dos quais sou subscritor, sendo prejudicados os subscritos pelos meus colega. Do ponto de vista do rigor jurídico, nós não concordamos com essa proposta e, do ponto de vista ético, ainda menos podemos estar de acordo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao n.º 2 do artigo 13 º da proposta a que o Sr. Deputado Júlio Henriques se referiu, concretamente ao que diz respeito à reorganização administrativa, não concordamos com ela, porque, apesar de a reorganização administrativa dos municípios ser, de facto, uma acção Importante, não se trata da mera criação de uma freguesia, pelo que tem de ter um tratamento mais adequado, e, tal como a proposta de alteração do Partido
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Socialista é apresentada, ela seria o alçapão para criar freguesias fora da lei quadro.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - 15so não é verdade!
O Orador: - Aliás, certamente que o Sr. Deputado
Oliveira e Silva se recorda, relativamente à Lei n .º 11/82,
de termos acedido ao pedido do Partido Comunista para
nela introduzirmos aquele artigo 9.º Desconfiámos que se
tratava do alçapão para criar vilas e cidades por tudo
quanto é sitio e este seria o alçapão para negar e não
cumprir a lei.
Desta forma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido
Social-Democrata, embora com pena, não dá acolhimento
a esta proposta de alteração apresentada pelo Partido
Socialista, mantendo o texto final da Comissão para este
artigo. Mas recordamos, mais uma vez, que o Partido
Social-Democrata aceitou todas as propostas de alteração
apresentadas pelo Partido Socialista e pelo Partido
Comunista Português em sede de Comissão e que apenas
esta mereceu a nossa oposição e justificou este debate.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a
palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curta intervenção esclarecedora para salientar que a nossa proposta de aditamento de um n.º 2 ao artigo13 º não pode constituir nunca um qualquer alçapão de
permissividade. De facto, pensamos que seria importante
que a nova lei contemplasse a possibilidade da
apresentação de projectos ou de propostas de lei de reorganização administrativa dos concelhos sem que lhe fosse aplicado este regime de criação de freguesias. Esta questão ficaria salvaguardada na nossa proposta, ao referir-se ser necessária e obrigatória a emissão de parecer favorável por parte da assembleia municipal respectiva,
parecer esse obtido por maioria qualificada de dois terços.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
João Carlos Pinho.
O Sr. João Carlos Pinho (CDS): - Sr. Presidente, o n.º 1 do artigo 13 º refere que a presente lei é aplicável a todos os projectos de criação de freguesias pendentes na Assembleia da República.
Sabendo que há cerca de 12 projectos pendentes na
Comissão, se a presente lei lhes for aplicável serão, por
certo, defraudadas as expectativas das populações que, num
passado recente, solicitaram a esta Assembleia a criação
de novas freguesias, não podendo, na perspectiva da nossa
bancada, prejudicar esses projectos os atrasos verificados
na sua aprovação prévia.
Nesse sentido, solicito ao Sr. Presidente que se faça a
votação em separado dos n.- 1 e 2 do artigo 13.º
O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. Há ainda uma proposta de alteração do artigo 13.º, apresentada pelo PS.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, essa proposta foi rejeitada pelo grupo de trabalho, e nós não queremos seguir o mau exemplo de, depois de acordada e votada por unanimidade, fazer a sua reposição, pelo que a retiramos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar o n.º 1 do artigo 13 º do texto da Comissão.
Submetido d votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD e os votos contra do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
É o seguinte:
Artigo 13.º
Aplicação da lei
1 - A presente lei é aplicável a todos os projectos de lei de criação de freguesias pendentes na Assembleia da República.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do n.º 2 do mesmo artigo.
Submetido d votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
2 - A aplicação da presente lei às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não prejudica a publicação de diploma legislativo regional que lhe introduza as alterações decorrentes do condicionalismo geográfico e populacional.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 14.º
Como não há pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Artigo 14.º
Norma revogatória
São revogados os artigos 4.º a 11 º, inclusive, da Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, bem como o artigo 1 º da mesma lei, na parte respeitante à criação de freguesias.
Por último, vamos votar o mapa anexo ao artigo 4 º
Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a
favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e os votos contra
do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes
apresentada pelo PS. João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé
ï
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É o seguinte:
Quadro anexo a que se refere o artigo 4º?
Indicadores
2 pontos 4 pontos 6 pontos 10 pontos
Eleitores de freguesia 800 a 1199 1200 a 1599 1600 a 1999 2000 ou mais.
Taxas de variação demográfica da freguesia - 0,5 % a 0 % 0,1 % a 5 % 5,1 % a 10 % Superior a 10 %.
Eleitores da sede 150 299 300 a 499 500 a 750 Mais de 750.
Número de tipos de serviços e estabelecimentos na sede 4 a 6 7 a 9 10 a 12 Mais de 12.
Acessibilidade de transporte à sede Automóvel Automóvel + transporte Automóvel + transporte Automóvel + 2 tipos de
colectivo não diário. colectivo diário. transporte colectivo.
Distância da sede proposta à sede da primitiva freguesia Menos de 3 km Mais de 3 km e menos 5 a 7 km Mais de 7 km.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto elaborado pela Comissão.
Submetido d votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do CDS e do PSN, os votos contra do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção do PS.
O Sr. Deputado Júlio Henriques pediu a palavra paia que efeito?
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Para fazer uma declaração de voto sobre esta matéria, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto de abstenção na matéria em apreço, longe de constituir a decisão mais fácil, traduz a mais ponderada reflexão, não significando a indiferença "do tanto faz", muito menos a atitude cómoda de quem não participa, não conhece, mas exprime, antes, o compromisso possível.
O Partido Socialista, depois de ter votado contra o projecto de lei n.º 153/VI aquando da sua apreciação na generalidade, participou interessadamente na fase de especialidade, como então se propusera. Aí apresentou propostas de alteração, acolheu as de outros partidos, interveio na formulação do texto que acaba de ser votado e chegou a admitir como possível e desejável votá-lo favoravelmente, não fora a intransigência do PSD quanto às propostas de alteração - emenda e aditamento - que apresentámos para o artigo 13.º, que, sendo pertinentes, consideramos do maior interesse, quer para as populações que justamente aspiram ver consagrados em lei os projectos de caiação de novas freguesias apresentados na Assembleia da República no quadro da Lei n.º 11/82 (alguns desde há anos), quer para os subscritores de tais iniciativas legislativas, que agora as vêem a caminho do arquivo morto, por força da aplicabilidade da nova lei aos projectos pendentes (projectos pendentes, aliás, por exclusiva culpa do PSD que, desde 1989, não viabilizou sequer a análise em comissão dos diplomas entrados).
Apesar disso, lamentando a insensibilidade da maioria quanto a este ponto, registamos como positivo o
acolhimento que tiveram muitas outras propostas apresentadas pelo Partido Socialista, o que diz bem do seu mérito e da razoabilidade da posição assumida aquando do debate e votação na generalidade e justifica o voto de abstenção hoje produzido.
Partindo do princípio de que a Lei n.º 11/82 não era nem tinha de ser imutável, esta que a revoga, na parte respeitante à criação de freguesias, não é, obviamente, a que gostaríamos, muito embora registemos as benfeitorais que foi possível introduzir ao projecto e de que destacamos: o reporte à área e não à sede da nova freguesia de alguns requisitos imperativos; a recondução às normas constitucionais quanto às iniciativas legislativas; a redução, relativamente ao projecto de lei, do número mínimo de eleitores necessário à criação de novas freguesias.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nos termos do n º 1 do artigo 200 º do Regimento, vamos agora proceder à votação dos projectos de resolução n.ºs 45/VI, 46/VI e 43/VI.
O projecto de resolução n.º 45/VI, da iniciativa do PCP, recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 184/92, de 22 de Agosto, que reestrutura o Secretariado Nacional de Reabilitação (ratificação n.º 39/VI).
Vamos votar, Srs. Deputados.
Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PSD, os votos a favor do PS, do PCP, de os Verdes, do PSN e do Deputado independente Mário Tomé e a abstenção do CDS.
Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 46/VI, do PS, que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 220/92, de 15 de Outubro, que estabelece normas, relativas à concessão de uma nova ponte sobre o Tejo (ratificação n.º 38/VI).
Submetido d votação, foi rejeitado, com os votos contra do PSD, do CDS e do PSN, os votos a favor do PS e as abstenções do PCP, de os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé.
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O Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra porque, em relação à tramitação do processo de ratificação, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou uma proposta de eliminação do n º 2 do artigo 2.º Quanto a nós, o processo continua agora em comissão para apreciação na especialidade.
Era este facto que gostaria que V. Ex.ª confirmasse.
O Sr. Presidente: - Como não foi aprovada a recusa de ratificação, assim será.
Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 43/VI, do PCP, que recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 188/92, de 27 de Agosto, que extingue o Instituto Nacional de Investigação Cientifica.
Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PSD e do CDS, os votos a favor do PS, do PCP, de os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé e a abstenção do PSN
Srs. Deputados, retomando a ordem do dia, vamos apreciar o Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto - ratificação n.º 41/VI (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Partido Comunista Português traz à Assembleia da República, para ratificação, o Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto, isto é, nos concelhos do Porto e ainda nos de Caia, Matosinhos, Valongo, Gondomar e Maia.
A questão da subconcessão ao sector privado de transportes da área do Grande Porto prende-se com os objectivos e com as implicações que dela derivam.
Assim, posso dizer-vos, e no que se refere à metodologia utilizada para levar a cabo essa subconcessão, que a Comissão de Trabalhadores do Serviço de Transportes Colectivos do Porto (STCP) não foi ouvida pelo Governo e que até foi posta perante aquilo que `se pode chamar uma intenção consumada Aliás, nessa mesma altura, o conselho de gerência da empresa informou que, como consequência da subconcessão e entrega ao sector privado, seria dispensada grande parte dos seus 3600 trabalhadores. Chamo a vossa atenção para o facto de estarmos perante trabalhadores com uma média de idade de 44 anos, com profissões em grande parte exclusivas dos STCP, que, uma vez libertados - é assim que o Governo diz - do seu compromisso de trabalho, terão graves dificuldades de colocação noutras empresa..
Também não deixa de ser estranho que a acompanhar esta subconcessão ao sector privado a empresa tenha elaborado inquéritos à mobilidade, onde gastou quase 150 000 contos, para saber quais as carreiras mais lucrativas na área. Não podemos deixar de assinalar esta pelo
menos estranha coincidência! Além disso, tal subconcessão implicará a entrega aos operadores privados de 50 das 71 carreiras neste momento exploradas pelos STCP, o que significa 75 3'o da população transportada. E devo dizer que o STCP transporta actualmente, por dia, na área do Grande Porto, um milhão de passageiros.
Esta situação tem levantado protestos de várias forças sociais e políticas, a começar, legitimamente, como já citei, pelos próprios trabalhadores do STCP, mas não se esgotando aí. Assim, várias moções autárquicas têm caminhado no sentido de denunciar que a entrega da subconcessão ao sector privado de transportes não traria, antes pelo contrário, nenhuma. melhoria quer para a qualidade de transporte quer para o preço praticado.
Posso dizer-vos que a Assembleia de Freguesia de Fânzeres, do concelho de Gondomar, em 6 de Novembro de 1992, repudiou essa tentativa de subconcessão da rede de transportes públicos e lamentou que a Assembleia e a Junta Metropolitana do Porto, órgãos legítimos da Área Metropolitana, tenham sido completamente marginalizados nessa decisão sobre a qual deveriam ter sido ouvidos, pois é para esses autarcas muito claro que as subconcessionárias procurarão antes de tudo a rentabilização em detrimento da qualidade dos serviços.
No mesmo sentido caminhou uma moção aprovada pela Câmara Municipal de Gondomar, em 26 de Outubro, a qual acrescentava ainda que a junção da exploração do STCP da rede de transportes rodoviários no interior da área urbana do Porto com a subconcessão fora da área urbana comportaria necessariamente morosidade, desconforto, utilização de várias carreiras com vários operadores. Igualmente se pronunciou a Assembleia de Freguesia de Ermesinde, pela voz do Partido Socialista, e ainda a Assembleia Municipal de Valongo e a Junta de Freguesia de Pedrouços, no concelho da Maia.
No entanto, se faço estas citações de posições autárquicas é para vos dizer que, com excepção da Junta de Freguesia de Pedrouços, em nenhuma delas a CDU ou o PCP detêm maioria e também para vos dizer que estas são posições que correspondem rigorosamente ao interesse e à vontade das populações e por isso com grande gosto delas nos fazemos eco.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Aliás, devo dizer-vos também, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que muitas das carreiras que neste momento o STCP explora foram conseguidas mercê da luta concreta no terreno de muitas das populações da área do Grande Porto que, doutro modo, não teriam direito a transportes públicos.
É importante salientar este aspecto porque ainda há poucos dias foi perguntado ao presidente da Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários Pesados de Passageiros (ANTROP) a razão por que a ANTROP e o sector privado estavam interessados em assumir 1,2 milhões de contos de prejuízos relativamente ao ano transacto no sector das carreiras não rentáveis e o referido presidente deu uma resposta embrulhada. Mas fica muito claro que o que interessa aos transportadores do sector privado não são as carreiras não rentáveis - essas têm uma função social insubstituível que o STCP desempenha na zona do Grande Porto - mas sim aquelas que dão lucro. É neste sentido que se insere o estudo de mobilidade, que atrás referi, mandado elaborar pelo conselho de gerência do STCP.
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Todavia, esta não é uma questão de hoje. Vou dar-vos dois exemplos que mostram bem como há questões que apesar de tudo permanecem e que estão muito para além ou muito para aquém das nossas preocupações à volta deste problema.
Posso dizer-vos que o Decreto-Lei n.º 38 144, de 30 de Dezembro de 1950 - repito, para não haver equívocos, de 1950 -, diz o seguinte: "A dura lição de mais de 40 anos de discussões, conflitos e pleitos não parece aconselhar que se tente de novo o regime de concessão." Esta passagem mostra como o próprio regime salazarista tinha dificuldades em tentar um sistema de concessão aos operadores privados porque certamente iria provocar na zona do Grande Porto problemas mais ou menos conturbadores.
Também numa declaração muito mais recente - a 15 de Janeiro de 1993, isto é, há quatro dias - uma personalidade nada suspeita, o presidente do conselho de. gerência do STCP, Carlos Brito, figura destacada do Partido Social-Democrata no Norte e no Porto, afirmava: "Não se compreende o que sucede com os passes sociais comuns ao STCP e a empresas privadas, estando estas últimas isentas da concessão de descontos aos utentes mas não o STCP."
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que ficaram suficientemente claras as razões pelas quais não podíamos deixar de trazer a esta Casa o pedido de ratificação do Decreto-Lei n º 208/92, de 2 de Outubro.
Aplausos do PCP e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Jorge Antas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é com grande admiração que saliento esta intervenção e este pedido de ratificação por parte do Partido Comunista Português. Relembro que em 1975, quando se iniciou e (concretizou o processo de nacionalizações, todos os operadores privados de determinada dimensão foram nacionalizados, todos os operadores interurbanos e suburbanos à volta de Lisboa, mas, talvez por lapso do PCP, sobraram ainda uns tantos transportadores privados, mais do Norte, que hoje representam à volta de 75 % das carreiras interurbanas na cidade do Porto.
Esta é uma primeira observação para se perceber que é de conteúdo nitidamente ideológico esta questão que, obviamente e coerentemente - devo sublinhar -, incomoda o Partido Comunista Português sempre que qualquer iniciativa vise uma maior liberalização e aproveitamento das potencialidades do sector privado na economia de mercado em que estamos inseridos.
Mas voltemos ao problema concreto da cidade do Porto. Todas as cidades mais importantes e de grande dimensão, como a cidade do Porto, têm um sistema exclusivo de transporte urbano por razões de coordenação, mas o transporte interurbano é feito de acordo com regras que são, como não poderia deixar de ser, iguais para públicos e privados.
Neste momento o regime de exploração e o de preços do transporte efectuado pelo STCP fora dos limites urbanos
do Porto é rigorosamente igual ao que se aplica aos transportadores privados. Aliás, não podia ser de outro modo porque a nossa Constituição assim o defende, isto é, havendo concorrência entre o sector público e o privado não há regras diferentes para um e para os outros.
O diploma cuja ratificação é hoje pedida prevê apenas, e com cuidados redobrados, que as concessões serão feitas caso a caso e com um caderno de encargos previamente aprovado pelo Governo. Portanto, não vai haver um clima maciço e generalizado de subconcessões. Aliás, não há uma subconoessão obrigatória, mas haverá propostas das empresas, que serão cuidadosamente analisadas e em que a subconcessão será aprovada caso a caso pelo Governo.
Assim, o STCP poderá deixar de operar numa, duas ou mais carreiras que forem concessionadas mas com duas garantias: a de que o serviço público é prestado por privados nas mesmas condições de exploração e a de que os meios que ficarem disponíveis irão reforçar o transporte urbano na cidade do Porto, que continua a ser um exclusivo do STCP.
Esses são os objectivos a que o Governo está obrigado porque o Programa do Governo é claro em obrigar que exista concorrência entre empresas e modos de transporte.
Gostaria ainda de salientar um segundo ponto. Esta questão, efectivamente, preocupa apenas o Partido Comunista Português. Como toda a gente sabe, está em estudo o metropolitano ligeiro de superfície para o Porto e a própria Junta Metropolitana do Porto, maioritariamente socialista, aponta para que a sua exploração seja feita por uma empresa 100 % privada Portanto, a exploração de meios de serviço público urbano e suburbano privado é uma questão que incomoda um partido que ideologicamente defende soluções cuja justeza está bem expressa no tamanho da sua bancada nesta Câmara.
Assim, estou perfeitamente certo' de que, com os cuidados tomados, o serviço prestado, não só no Porto como nos concelhos limítrofes, será de maior qualidade. Essa é, aliás, a .intenção do Governo, que dará a maior atenção ao cumprimento deste diploma para que a sua implementação seja feita com o maior cuidado possível.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.
O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 208/92 provocou grande perplexidade e interrogação entre todos aqueles que se preocupam com o difícil e complexo problema dos transportes nas áreas metropolitanas, por se afigurar como um instrumento desgarrado e isolado da necessária política de transportes para a Área Metropolitana do Porto.
De facto, todos sabem que o STCP serve não apenas a cidade do Porto mas, desde longa data, os municípios vizinhos que têm movimentos intensos de passageiros com aquela.
O STCP era, até 1975, uma empresa municipal, sendo por aquela tutelados até que se procedeu a uma espécie de "nacionalização" daquilo que já era público para o submeter ao controlo do Estado.
É certo que a Câmara Municipal do Porto passou a designar um administrador em cinco, ficando, assim, numa situação desvalorizada e sem possibilidades de equacionar
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uma política de transportes coerente com outras políticas urbanas, já que o principal instrumento dessas políticas - os transportes colectivos - passou a ser comandado a partir do Terreiro do Paço.
A situação descrita tem vindo a ser criticada e contrariada pelos actuais responsáveis da Câmara Municipal do Porto, tendo encontrado eco no Ministério que deseja, ardentemente, passar, de novo, as responsabilidades do STCP para a Câmara Municipal.
Numa palavra, a Câmara Municipal do Porto manifesta-se disposta a recuperar o STCP, numa perspectiva metropolitana, e o Governo interessado em transferir o controlo sobre a empresa para aquela entidade pública.
Acresce ainda que, estando a funcionar actualmente a Área Metropolitana, quer a Câmara do Porto quer as dos restantes municípios pretendem cooperar na gestão de um serviço de transportes que interesse e faça sentir os seus efeitos sobre todo o território metropolitano, mediante a constituição de uma entidade de transportes metropolitanos controlada por aquela instituição supramunicipal.
Decorrem, actualmente, negociações entre as partes interessadas para eventual acordo sobre o problema dos transportes numa das mais importantes áreas metropolitanas, e eis senão quando o Governo, na pessoa do Sr. Ministro Ferreira do Amaral, com o decreto-lei que discutimos, designadamente no seu artigo 8.º, põe em causa todos os projectos de solução integrada nos transportes da Região do Porto.
Contrariando, ou antes, afrontando o Ministro Valente de Oliveira e o próprio Governo, que, na Lei de Bases dos Transportes para as regiões metropolitanas apontam as seguintes soluções que passo a citar: um artigo diz: "[...] com vista a regular as bases de funcionamento do sistema de transportes em cada região metropolitana, será estabelecido um plano de transportes [...]"; um outro refere: "[...] proporcionar condições para uma movimentação fluida e aos menores custos económico-sociais das pessoas e bens [...]"; finalmente, um terceiro artigo, que entendo dever citar, diz: "[...] que o Governo instituirá em cada região metropolitana de transportes um organismo público dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa e financeira, denominado "Comissão Metropolitana de Transportes" [...]"
De notar que a função desta Comissão Metropolitana, conforme o estabelecido no artigo 28 º da Lei de Bases, é justamente conceder, autorizar ou contratar a exploração de transportes regulares na região, função essa que o Governo, sem ter criado aquela, transferiu para o STCP.
É que, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, é habitual que uma qualquer subconcessão, findo o prazo estabelecido, regresse ao titular da concessão, podendo este renovar ou colocar de novo a concurso. Sóque este decreto-lei não adopta aquilo que é tradicional e, então, findo o prazo, transfere automaticamente para o subconcessionário a parte subconcessionada.
Poderá alguém de boa-fé acreditar que esta medida permitirá, no futuro, alguma solução integrada para os transportes públicos na Área Metropolitana do Porto? Poderá alguém acreditar na boa-fé do Governo quando, perante legislação deste tipo, ainda se afirma que se pretende transferir para a autarquia o controlo sobre o STCP?
Não, Srs. Deputados, o que se pretende com esta medida é inviabilizar toda e qualquer possibilidade de permitir às áreas metropolitanas a gestão intermunicipal e, por via disso, dificultar a eventual resolução de um problema que afecta as populações.
E convirá reter que não são apenas estes os problemas que ressaltam do decreto-lei em discussão. Senão, vejamos o n.º 2 do artigo 6.º do citado decreto-lei que refere que os subconcessionários ficam obrigados a criar e manter passes intermodais.
Sabem os Srs. Deputados quantos operadores privados actuam na Área Metropolitana do Porto? Cerca de 60! Sabem das dificuldades que um tal número encerra para se chegar aos necessários entendimentos? Acham que é possível, perante um tal cenário, que as populações servidas hoje por transportes públicos venham, no futuro, a manter o tipo de serviço e respectivos custos?
Não nos iludamos. O Decreto-Lei n.º 208/92 virá, objectivamente, agravar os problemas de uma enorme massa de cidadãos que, diariamente, se deslocam nos dois sentidos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, erros toda a gente comete, corrigi-los é imperativo de todos nós. Sejamos capazes de o fazer.
Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Simão Ricon Peres.
O Sr. Simão Ricon Peres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vai o PSD votar favoravelmente a ratificação do Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que "autoriza o Serviço de Transportes Colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transportes rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto". Fá-lo desde já, pois entende que o referido decreto-lei não nos oferece qualquer dúvida ou reserva, não necessitando de qualquer outra fundamentação acessória, pois o preâmbulo do diploma é, quanto a nós, suficientemente esclarecedor sobre os seus objectivos, da justeza dos mesmos, assim como dos meios para os atingir.
Importa também referir que o decreto-lei em apreciação se enquadra na filosofia do Programa do Governo, apresentado ao eleitorado em Outubro de 1991, por este sufragado maioritariamente e no qual a frase "menos Estado, melhor Estado", foi a ideia força. Por isso, também hoje aqui dizemos: menos STCP, melhor STCP.
Com este diploma, fica o STCP de posse de uma nova ferramenta de gestão que permitirá racionalizar a sua rede de transportes, o que se traduzirá numa evidente melhoria dos serviços prestados, numa melhor rentabilização dos seus meios materiais e humanos, com as vantagens correspondentes para os seus utilizadores, principalmente para a população do Porto cidade, onde o STCP actua em regime de exclusivo, não havendo qualquer outra alternativa de transporte para os portuenses.
Poder-se-á, no entanto, questionar: irão os utentes das carreiras e, eventualmente, subconcessionar, ou seja, irão aqueles que residem nos concelhos envolventes da cidade do Porto ser prejudicados quer no serviço público prestado quer na alteração do regime tarifário? A resposta é, evidentemente, negativa.
Em primeiro lugar, recorde-se que somente 20 % das actuais 140 carreiras que ligam esses concelhos ao Porto são explorados pelo STCP. E, sabendo que há pedidos de novas carreiras para esses percursos, abro aqui um
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parêntesis para perguntar a quem deverão ser atribuídas as novas concessões, se ao STCP, se aos privados. E isto desde logo indicia que a iniciativa privada tem demonstrado capacidade de resposta na exploração dos transportes interurbanos de passageiros, quer em quantidade quer em qualidade.
Quanto ao eventual aumento de tarifas, o mesmo está salvaguardado no decreto-lei, quando, no seu artigo 6.º, n.º 1, se diz que "os subconcessionários ficam sujeitos ao mesmo regime de preços aplicável ao concessionário" e, no n.º 2, que " o STCP e os subconcessionários ficam obrigados a criar e manter passes intermodais, por forma a assegurar a ligação entre as respectivas carreiras".
Todos sabemos que os serviços públicos não se esgotam nas empresas públicas. Hoje, em toda a Europa, a iniciativa privada presta serviços públicos de qualidade, com vantagens para os utentes, para o erário público e para os que pagam os seus impostos, de quem convém não esquecer.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos certos que não haverá, nesta matéria, diferenças fundamentais entre a nossa posição e a de alguns partidos da oposição.
Quanto ao PCP, ao trazer a esta Câmara a ratificação do decreto-lei em apreço, aliás, um direito que lhe assiste quer constitucional quer regimentalmente, mais não pretende do que mostrar que existe, continuando agarrado a velhos dogmas depositados no seu local próprio- e sabem qual é - e tentando, sempre que possível, arvorar-se em paladino da defesa de tudo e de todos, mas servindo-se demagogicamente daqueles que diz defender.
Por tudo o que atrás foi dito, reafirmamos o nosso apoio ao diploma governamental.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transpores.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de referir-me a três questões que foram colocadas pelo Sr. Deputado Artur Penedos.
Quanto à primeira, relativa à municipalização do STCP, estamos completamente de acordo e outra coisa não poderia esperar-se uma vez que faz parte do programa do Governo. Os contactos sobre o assunto iniciaram-se ainda no Governo anterior, e a posição do actual Governo, em relação à municipalização do STCP, é colocar a disponibilidade total em relação a qualquer proposta que seja feita pela Câmara Municipal do Porto. E que, a parir de determinada altura, a Câmara Municipal do Poro pediu a suspensão das negociações para alargar o âmbito à Área Metropolitana do Porto.
Com a mesma flexibilidade e com o mesmo desejo de entendimento, estamos em negociações e conversações com a Área Metropolitana do Porto para chegar ao entendimento que resulte de uma proposta que ela nos faça. Continuamos a aguardá-la e esperamos que ela venha com brevidade.
Relativamente à subconcessão, após o seu termo, se ela for cumprida, obviamente, passará a ser um concessionário como os outros setenta e tal "horríveis concessionários" na opinião do Partido Socialista. Bom, o que é que havemos de fazer?... O que acontece é que isso apenas dá uma garantia do serviço uma vez que dificilmente um subconcessionário com um prazo de três anos se equipa
adequadamente para servir um público cada vez mais exigente. É, de facto, um prazo relativamente curto que não dá qualquer espaço de amortizações e, obviamente, o bom serviço exige que um privado não tenha um serviço durante três anos, para o qual não pode equipar-se. Julgo que isto é relativamente evidente.
Em relação à tão apregoada coordenação, terei que deduzir das palavras do Sr. Deputado que essa coordenação de operadores só se pode fazer com operadores públicos e, portanto, correrei o risco de pensar que na opinião do Partido Socialista apenas com a nacionalização dos restantes operadores é que essa coordenação poderá ser eficaz. Julgo que se trata, com certeza, de um mal-entendido e, portanto, considero que os privados, aliás, privados esses que, sendo até Deputados do Parido Socialista, pretendem criar empresas de camionagem e, portanto, não estarão objectivamente contra a exploração de privados uma vez que até empresários desejam ser.
Portanto, não será, com certeza, um problema de princípio.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.
O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a expressão que usou de "horríveis concessionários", como tendo sido usada pelo Partido Socialista, responsabiliza apenas e só o Sr. Secretário de Estado porque eu não usei essa expressão na intervenção que fiz.
Contudo, gostaria que o Sr. Secretário de Estado me respondesse à seguinte pergunta: como é que é possível, por parte do Governo, esquecer, neste momento, a Lei de Bases dos Transpores e tudo aquilo que a mesma encerra no que respeita às áreas metropolitanas? Pretende ou não o Governo criar condições para que possa haver uma gestão integrada dos transportes na Metropolitana do Poro? Pretende ou não o Governo estabelecer o diálogo com a Junta Metropolitana de forma a que seja possível resolver os problemas que aos transportes se colocam na Área Metropolitana do Porto?
É a este tipo de questões que se torna necessário responder porque, penso, "filosofar" não é propriamente aquilo que nos interessará neste momento.
Por outro lado, quando, no artigo 8.º, se diz que "a subconcessão fica para o subconcessionado no seu término", consideramos tratar-se de mais uma forma de criar dificuldades de gestão integrada. 15to é, como é que se está a negociar hoje com a Junta Metropolitana e, à partida, se tomam medidas que podem inviabilizar toda uma rede de transpores no sentido em que ela hoje está a ser produzida?
Nós não somos contra os operadores privados.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Só ideologicamente!
O Orador: - Nem ideologicamente!
O que entendemos é que, no mínimo, aquilo que está a acontecer representa uma situação que não é perceptível, que ninguém pode compreender. Se há uma negociação directa entre o Governo e a Junta Metropolitana, porquê formular uma lei onde se criam condições para que amanhã toda a área de transportes que vai para além da cidade do Porto fique fora do controlo de uma empresa que hoje existe e que, como aqui já foi dito, tem um conjunto de
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trabalhadores, tem uma dada frota, tem especificidades próprias e tem problemas próprios que se colocarão, certamente, a esses trabalhares e aos utentes das carreiras?
Por outro lado, gostaria que o Sr. Secretário de Estado me dissesse quantos passes intermodais existem na cidade do Porto ou na Área Metropolitana do Porto, fruto de grandes negociações e de grandes aberturas que os operadores intervenientes conseguiram estabelecer.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, dado que há outros Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos, pergunto se deseja responder já ou se aguarda que este segundo pedido seja feito.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: Sr. Presidente, desejo responder já ao pedido de esclarecimento que acabou de ser formulado.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: Sr. Presidente, Sr. Deputado, em primeiro lugar, fico satisfeito por o Partido Socialista não ser contra as actuais carreiras privadas mas sim, apenas, contra mais carreiras privadas, isto é, não é contra as actuais mas contra o seu crescimento. Esta é uma nuance que registo.
Relativamente à coordenação dos transportes, como é óbvio, as áreas metropolitanas nasceram agora e o relacimento com elas não podia ser melhor do que tem sido. E, a partir desse belíssimo relacionamento, esperamos, obviamente, melhorar a coordenação dos transportes.
Em relação à questão dos passes intermodais, é evidente que eles têm sido pouquíssimos, e essa é uma razão que prejudica bastante os transportes do Porto.
Um diploma sobre transportes combinados, recentemente aprovado (um decreto-lei recentíssimo), incentiva a criação dos transportes combinados e por isso é que também neste decreto-lei não poderá haver subconcessão sem o passe combinado. Mas para estas subconcessões não poderá ser possível porque é uma condição do próprio caderno de encargos.
Sobre o que perguntou, nada mais tenho a acrescentar, Sr. Deputado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, atendendo a que, neste momento, só disponho de doze segundos, peço a complacência de V. Ex.ª e da Mesa, embora vá ser o mais rápido possível.
Sr. Secretário de Estado, francamente estava à espera de uma resposta "mais técnica" na medida em que, reconheço, estamos numa Casa que é essencialmente política e não numa comissão de coordenação disto ou daquilo. Portanto, admito que a sua resposta também tenha, antes de tudo, um carácter político. E certamente que sim, pois tem esse direito.
No entanto, responder-me com aquela cassette, já estafadíssima, de que as posições que tomamos são-no exclusivamente por razões ideológicas... Bem, se bem visto, é verdade. Se entende que as razões que foram apontada, e que há momentos também acabei de enunciar daquela tribuna, por várias assembleias municipais, por várias juntas de freguesia - numerosas, devo dizer - da área do grande Porto, e todas elas de maioria PS, à excepção da de Pedrouços que tem maioria CDU, significam que as nossas razões são ideológicas, no sentido em que defendemos interesses das populações expressos nos órgãos próprios e no momento próprio, então, sim, assumo, com toda a honra, a carga ideológica da minha intervenção.
Mas a questão que desejava colocar prende-se com a intervenção do Sr. Deputado Simão Ricon Peres, e é a seguinte: o decreto-lei em causa diz que se manterá o mesmo regime de preços ou, dito de outro modo, o mesmo regime de tarifas, mas é completamente omisso quanto ao enquadramento desse regime, isto é, nada diz quanto às paragens, nada diz quanto à periodicidade das carreiras e limita-se a estabelecer, apenas, o regime de tarifas. É evidente que estamos perante uma questão estritamente quantitativa.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, agradecia que me respondesse concretamente como é que dá a volta a esta situação concreta.
O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, embora me reste pouco tempo, gostaria de clarificar, para que não haja a mínima dúvida, que o Partido Socialista, obviamente, reafirma agora, e de resto sempre, que é extremamente vantajoso que haja concorrência nos transportes e que haja operadores privados. Mas não é disso que se trata, mas, sim, do poder de concessão, que é um poder público.
A Lei de Bases de Transportes Terrestres, aprovada por este governo há mais de dois anos, e que devia ter sido regulamentada no prazo de dois anos, não o foi. Ela prevê que nas áreas metropolitanas seja nomeada uma comissão metropolitana de transportes que terá o poder de conceder, contratar e autorizar os transportes, ou seja, ter a função, que essa é pública, de definir qual é o serviço e de conceder o transporte.
Ora, em nenhum país da CEE o poder de conceder é transferido para privados. Os privados são empresas para cumprir os contratos de concessão, mas compete ao Governo concessionar. É disso que se trata. E este governo não só não criou a comissão metropolitana de transportes como está a retirar concessões ao STCP e a retirar à Junta Metropolitana a possibilidade de, mais tarde, noutras condições, poder vir a concessionar transportes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: Sr. Presidente, começo por responder ao Sr. Deputado José Calçada dizendo que eu disse não foi que o Governo tenha feito este decreto-lei por razões ideológicas mas, sim, que o PCP apresentou o pedido de ratificação por razões ideológicas, o que é um pouco diferente, e não critiquei o PCP por isso, antes pelo contrário.
Relativamente às regras de exploração, o Sr. Deputado tem razão, mas o decreto-lei é claro, ao preceituar que as condições de exploração têm de se manter e deverão
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constar do caderno de encargos. Por isso é que o caderno de encargos tem de ser previamente aprovado pelo Governo.
Respondendo à Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, quero referir que, neste momento, quem tem a concessão é o STCP e o poder é o de subconcecsionar, sendo a concessão feita ao abrigo de um diploma que existe, o RTA (Regulamento de Transporte em Automóveis). Portanto, as concessões são, neste momento, do STCP e do que se trata aqui é de uma subconcessão, que, obviamente, será transformada numa concessão igual à dos outros, por concurso público. De facto, essa é a forma normal através da qual, neste momento, se dão as concessões.
Quanto ao problema que colocou relativo às competências da Área Metropolitana do Porto, quero dizer-lhe que essa entidade não tem a competência de concessionar mas apenas a de coordenar os transportes municipais de que é responsável. Estamos atentos e, se algo puder contribuir para rapidamente transferir o STCP para a Área Metropolitana do Porto, não haverá o mais pequeno obstáculo da parte do Governo. E, a partir dessa data, como é óbvio, sendo a iniciativa da subconcessão da empresa e não do Governo, se o poder accionista mudar para a área metropolitana, é evidente que terá uma última palavra em relação à gestão das subconcessões. Então, esse problema resolver-se-á, automaticamente, dessa forma.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate sobre o pedido de ratificação n.º 41/VI, apresentado pelo PCP, ao Decreto-Lei n.º 208/92, de 2 de Outubro, que autoriza o serviço de transportes colectivos do Porto a subconcessionar a exploração de carreiras de transporte rodoviário de passageiros que ultrapassem o limite urbano da cidade do Porto.
Srs. Deputados, vamos, agora, passar à discussão conjunta dos pedidos de ratificação n.ºs 44/VI (PCP) e 45/VI (PS), ao Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, que extingue a empresa que gere o Teatro Nacional de São Carlos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputadas: A extinção da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos, através do Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, constitui mais um acto típico da actuação do Governo PSD em geral e particularmente na área da cultura.
Esta medida é grave, sob diversos pontos de vista. Do ponto de vista do processo seguido, exemplo do diálogo que o Governo PSD privilegia, de decidir autoritária e unilateralmente contra tudo e contra todos.
É grave do ponto de vista dos direitos fundamentais dos trabalhadores da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos, que foram gravemente preteridos, com a substituição dos respectivos contratos de trabalho por contratos precários, chamados de prestação de serviços.
É grave, ainda, do ponto de vista das opções de política cultural, subjacentes a esta extinção, de demissionismo do Estado na promoção dos valores culturais nacionais, de destruição de estruturas estáveis de produção cultural e sua substituição por estruturas empresariais destinadas a vender no mercado alguns produtos culturais mais vendáveis, num momento em que os músicos portugueses atravessam uma situação de grande dificuldade.
Numa coluna de crítica musical publicada no Público, de 14 de Junho último, o crítico Alexandre Delgado, escrevia, a propósito da destruição de duas orquestras sinfónicas e de uma de ópera, que o Estado "conseguiu tornar-nos, em três anos, o mais imponente deserto sinfónico do continente europeu; o mais extraordinário fenómeno de autofagia cultural da segunda metade do século XX".
E, mais adiante, afirmava: "A manter-se o ritmo actual de destruição de orquestras, e caso Lisboa e Porto não sejam dotadas com urgência de dois grandes aparelhos sinfónicos, os corredores do Metropolitano não serão suficientes para albergar tantas gerações de músicos desempregados.
Estas linhas foram escritas em Junho de 1992. Nesse mesmo mês, iniciou funções uma comissão liquidatária do Teatro Nacional de São Carlos. Em Agosto, cessaram os contratos de trabalho dos 300 trabalhadores do Teatro Nacional de São Carlos e realizaram-se as audições, com vista à possível integração de músicos na futura Orquestra Sinfónica de Lisboa. Em 8 de Setembro, foi publicado o decreto-lei que extingue a empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos. 15to é, a empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos, antes de ter sido legalmente extinta, já o estava efectivamente a ser na prática.
Não é verdade, ao contrário do que chegou a afamar o Sr. Secretário de Estado na televisão, que a extinção da Orquestra do Teatro Nacional de São Carlos tenha sido pacífica e não tenha gerado contestação.
São conhecidas muitas posições de contestação a essa medida, no plano nacional e mesmo a nível internacional. Para além da posição do Sindicato dos Músicos, para além do natural descontentamento da generalidade dos trabalhadores do Teatro Nacional de São Carlos, é conhecida a moção aprovada por unanimidade no XV Congresso da Federação Internacional de Actores, que teve lugar em Montreal, em Setembro último, relativo à situação dos profissionais de espectáculo do Teatro Nacional de São Carlos.
Para além de não ter sido pacifica, a extinção da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos não respeitou os direitos mais elementares dos seus trabalhadores.
É inadmissível e inédito que a extinção de uma empresa pública tenha significado o despedimento dos respectivos trabalhadores e a sua sujeição, no caco dos músicos, à celebração eventual de contratos de prestação de serviços com a futura orquestra sinfónica. Contrato de prestação de serviços só no nome, na medida em que o regulamento do contrato a que os músicos estão sujeitos configura um contrato de trabalho a termo, dado o grau de subordinação e o conteúdo das cláusulas contratuais a que os músicos serão sujeitos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - De facto, o regulamento da Orquestra Sinfónica Portuguesa implica, para além de uma actividade continua, com um horário de trinta horas semanais de segunda a sábado, sob a direcção de um maestro em representação do poder de direcção da entidade patronal, a proibição do direito de crítica ao maestro, aos solistas e às instâncias da orquestra, bem como de quaisquer contactos com a comunicação social, num estilo "lei da rolha" muito caro aos membros do actual governo.
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Trata-se, evidentemente, não de contratos de prestação de serviço, mas de contratos de trabalho subordinado, em condições precárias e, em alguns aspectos, ilegais.
A ilegalidade é também manifesta na cessação dos contratos de trabalho em consequência da extinção da empresa pública. Continuando a existir, por enquanto, o Teatro Nacional de São Carlos, tendo havido a transmissão da titularidade para outra entidade, não há razão para que os contratos de trabalho tenham cessado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A forma como os músicos do Teatro Nacional de São Carlos foram tratados é uma indignidade. Os músicos que não se sujeitaram às audições para ingressarem na Orquestra Sinfónica de Lisboa, ou os que foram excluídos - e foram excluídos músicos que são unanimemente considerados como dos melhores executantes portugueses -, sobrevivem a dar aulas, a tocar em bares e restaurantes ou passaram ao quadro de excedentes.
A extinção da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos foi mais uma reestruturação à maneira do governo de Cavaco Silva. Quando algum membro do Governo fala em reestruturação de qualquer instituição, é certo e sabido que vai intervir de camartelo e que a reestruturação vai redondar em demolição, para se construir, sobre os escombros, algo de indefinido.
Foi assim no caso do INIC, que aqui debatemos há pouco, e é assim também no caso do Teatro Nacional de São Carlos.
Porém, o procedimento do Governo em relação ao Teatro Nacional de São Carlos não é grave apenas dos pontos de vista do processo seguido e dos direitos dos trabalhadores, mas também de um ponto de vista das opções de política cultural.
O que o Governo pretende é fazer voltar o Teatro Nacional de São Carlos ao velho modelo de sala de visitas, que se pretende prestigiar enquanto tal, com a apresentação de espectáculos vindos de fora, dirigidos a um público da alta finança e utilizado como feira de vaidades sem qualquer nexo com a criatividade nacional nem com o exercício de uma efectiva função cultural.
O governo PSD corporiza uma política que exclui a cultura como componente essencial da democracia, reservando-lhe um papel de objecto de consumo, de tráfico de influências, de propaganda e ostentação e de veículo de promoção da imagem do poder.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O mecenato e as fundações, de contornos e financiamentos ainda indefinidos, não podem substituir as responsabilidades para com a cultura. A lei do lucro das indústrias de produção cultural não pode sobrepor-se ao necessário desenvolvimento e democratização da cultura. Indústria, comércio e mercado são realidades que constantemente intervêm na cultura, mas a cultura não se reduz a uma parte da economia. O mercado, só por si, não garante a democratização da produção e fruição, a diversificação das apetências culturais.
A necessidade de uma reestruturação do Teatro Nacional de São Carlos, que lhe garantisse condições para exercer uma missão cultural efectiva, mantendo as companhias residentes, era inquestionável. Mas não foi esse o sentido da reestruturação demolidora levada a cabo pela SEC.
A música, em Portugal, atravessa uma crise de proporções muito sérias. Os compositores portugueses estão votados ao ostracismo e passam-se meses e meses sem que as suas obras sejam ouvidas.
As orquestras que se vão constituindo em Portugal integram uma larga maioria de músicos estrangeiros.
Não existe uma única orquestra sinfónica em Portugal. Portugal é o único pais europeu onde não existe um estatuto jurídico do músico profissional.
Num debate promovido pelo Diário de Notícias sobre o panorama musical português, Leonardo Barros, solista e maestro convidado da extinta Orquestra da RDP de Lisboa, afirmava: "Em poucos anos, cometeram-se tantos danos no sector das orquestras em Portugal que me lembra as hordas de bárbaros ao praticarem saques em cidades e aldeias incendiadas, onde não ficou pedra sobre pedra."
A extinção da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é mais uma investida das bárbaros.
O Grupo Parlamentar do PCP propõe a recusa da sua ratificação por parte desta Assembleia.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. e Srs. Deputados: O processo de extinção da empresa pública que geria o Teatro Nacional de São Carlos, pelo Decreto-Lei n.º 195-A/92, de 8 de Setembro, constitui um dos casos paradigmáticos daquilo que tem sido a acção do Governo no domínio da cultura. Acção onde, frequentemente, a prepotência se conjuga com a incompetência, o activismo propagandístico se disfarça de política cultural e critérios estreitamente economistas e contabilísticos se mascaram com o sentido de Estado e o interesse nacional.
Como se se tratasse de uma má peça operática, entre o trágico e o cómico, dividamos -em três actos os argumentos com que fundamentarei estas asserções.
Primeiro acto.
Aconselha o bom senso que toda a reforma ou reestruturação de qualquer sector de actividade, mas por maioria de razões no sensível e delicado da cultura, deveria assentar em várias premissas. A saber: na confiança e participação dos agentes que integram, aos vários níveis, esse sector de actividade; na definição rigorosa e criteriosa de um projecto alternativo e, por consequência, de metas a atingir, de forma faseada e responsável; na ponderação das consequências e na salvaguarda dos direitos de quem veja o seu posto de trabalho, as suas expectativas profissionais, a sua carreira, postos em causa por essa mesma reforma ou reestruturação.
Em vez disto, o que fez o Governo e, mais concretamente, o Sr. Secretário de Estado?
Mal tinha tomado posse do cargo, em Junho de 1990, anuncia, inusitadamente e à revelia dos próprios responsáveis do São Carlos, que o mesmo iria ser encerrado. Perante as reacções que inevitavelmente suscitou, o agravamento das tensões e da insegurança, dá o dito por não dito e prolonga o estado de indefinição, quer no que diz respeito à situação do teatro em geral, quer ao seu funcionamento programático e ao futuro dos que nele trabalhavam.
Em Dezembro de 1991, aquando de uma visita ao Teatro que se pretendia pacificadora, tranquiliza os
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trabalhadores, garantindo que, tanto nos aspectos laboral como no da sobrevivência das carreiras, não havia razões para inquietação.
Porém, logo no mês seguinte, a então Subsecretária, Dr.ª Maria José Nogueira Pinto, anuncia a extinção da empresa pública e concretiza as grandes linhas do processo que acabaria por ser levado a cabo entre peripécias várias, improvisações e ausência de ideias claras sobre o que se seguiria. Primeiro, extinguia-se, depois, logo se veria!
Segundo acto.
Pelo decreto-lei agora em discussão, é efectivada a extinção. Ou seja, através de um subterfúgio jurídico, procede-se, de facto, ao despedimento colectivo dos trabalhadores, procurando o Estado eximir-se das obrigações contratuais que tinha assumido.
Os cantores, que integravam a companhia residente, foram lançados no desemprego.
Os músicos da orquestra foram submetidos a provas de avaliação e os seleccionados contratados em regime de prestação de serviços e em condições desvantajosas, no que concerne, nomeadamente, à segurança social.
Em situações de diverso tipo se encontra o pessoal técnico e administrativo, o coro, que foi integralmente readmitido, e a Companhia Nacional de Bailado, que foi autonomizada, voltando à fase de instalação.
Em qualquer dos casos, os que não se encontram desempregados viram a sua relação de trabalho transferida para uma instituição que prolonga a extinta com os mesmos rins, facto que obscurece a boa-fé e a legalidade de todo o processo.
Terceiro acto.
Já quase soavam as badaladas do fim do ano de 1992 quando as redacções dos jornais receberam uma nota emanada da Secretaria de Estado da Cultura, na qual se anunciava que o diploma que criava a Fundação de São Carlos fora enviado para Conselho de Ministros e se divulgava, finalmente, o programa da temporada e o nome do maestro titular e director musical.
O País já podia entrar no novo ano, dizendo, reconhecido e tranquilizado: "Muitos prometem, Santana Lopes cumpre!"
Aplausos do PSD.
Risos do PS.
Mas cumprirá mesmo?
Desde logo, não cumpriu os compromissos assumidos pela sua ex-Subsecretária em relação ao maestro inglês Martin André, que, desde Agosto de 1992, participara na selecção dos músicos para a nova orquestra sinfónica, a qual, na lógica das coisas, deveria passar a dirigir. A ex-Subsecretária considera isto uma vergonha.
Por razões alegadamente de economia, de novo o Governo baralha e volta a dar, prejudicando, mais uma vez, a nível internacional, o prestigio do São Carlos e também a imagem do Estado.
Por outro lado, mantêm-se na indefinição toda uma série de outras questões fundamentais, quer no que se refere à natureza da Fundação e à sua base financeira, quer ao projecto para o São Carlos e ao papel que desempenhará no futuro da arte lírica, em Portugal, estas últimas constituindo, afinal, as grandes interrogações para as quais ainda não encontrámos respostas satisfatórias por parte da Secretaria de Estado da Cultura.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com a ratificação que recusamos por todas estas razões, mas que a maioria obviamente não regateará, cai, de forma inglória, o pano sobre todo um período agitado da história do São Carlos, no ano em que se festejará o bicentenário.
Convenhamos que não começa da melhor maneira a sua comemoração.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.
O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr .m e Srs. Deputados: Ouvindo o Sr. Deputado António Filipe, no seu "bota-abaixo", e o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, nas suas asserções, devo dizer que não concordo com o que dizem, mas defenderei sempre o direito de o dizerem, até porque o pedido de ratificação é um dos meios que esta Casa tem - sendo uma sua obrigação, mas também prerrogativa de Fiscalizar os actos do Governo.
Quando, no pedido de ratificação do PS - porque, enfim, o pedido de ratificação do PCP estaria talvez mais enquadrado -, vi, como primeiro subscritor, o Sr. Deputado João Proença, antevi hoje aqui uma discussão centrada principalmente em princípios laborais, ou então orientada no sentido de transformar esta Assembleia numa sede de jurisprudência sobre legalidades ou ilegalidades, em vez de direccionada para uma política de cultura, uma política musical, se quiser, na medida em que se falou hoje tanto de música, embora nem tudo o que se diz sobre o Teatro Nacional de São Carlos tenha a ver com música.
Ora, o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques não fugiu à sua preocupação de falar sobre política cultural, ainda que se tenha também ocupado de problemas jurídicos e tenha cometido algumas incorrecções. Vejamos se, a esta hora e nesta altura do campeonato, poderemos aclarar alguns pontos.
Creio que não está em causa o direito de os trabalhadores defenderem o seu posto de trabalho. O que interessa, sim, numa política de gestão para a qual aponta a nota justificativa do decreto em apreço, é ver a floresta - e o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques falou de muitas coisas, numa quase floresta de enganos, com a nobreza de ser vicentina, é certo, mas, de qualquer modo, uma floresta de enganos - e não a árvore. E, então, ficamos na gestão.
A figura de empresa pública tem os resultados que os senhores e todos nós conhecemos. Qualquer um de nós pode perguntá-lo aos nossos companheiros de bancada, que foram, ou são, gestores, e ficará ciente de que mesmo os bons gestores, nesse enquadramento, o não conseguem ser.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Aí há uma grande confusão!
O Orador: - Não se explicita no decreto-lei em causa qual é a nova figura e a personalidade jurídica que fica diferida, até por motivos técnicos, para suceder a esta empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos. Mas, para já, como motivo de congratulação, há que referir - e é preciso não só dizê-lo como também reproduzir o que essas entidades nos dizem - que a Companhia Nacional de Bailado ganhou autonomia. Este é, para mim, um ponto adquirido e positivo, em relação ao qual, julgo, é fácil chegarmos a consenso. A Companhia Nacional de Bailado ganhou, inclusivamente, um programa autónomo
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e se, de vez em quando, sabemos ouvir os artistas, compreendamos quanto um programa autónomo é importante para eles! Falem com a Companhia Nacional de Bailado!
Há também a passagem daqueles trabalhadores que tinham um vinculo jurídico administrativo para um quadro de efectivos interdepartamental, que respeita muitos dos seus direitos; há também a possibilidade, dada por este decreto, de o Estado pagar os seus débitos, de ser pessoa de bem; há também -citemos os números - uma verba de 12 milhões de contos destinados a apoios, a subsídios, a que era preciso pôr cobro.
Na preparação destas notas soltas e avulsas, em fim de tarde, servi-me dos relatórios da comissão fiscalizadora e do conselho de administração da empresa pública do Teatro Nacional de São Carlos, que tenho aqui comigo e que, com tempo e com vagar, poder-nos-iam dizer alguma coisa.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - É pena que V. Ex.ª os tenha e nós não!
O Orador: - Tenho, porque procurei. Também deveria tê-los!
Mas vamos fazer uma outra coisa, mais prática, até porque ainda falta, para esclarecer as razões acerca dos problemas colocados, a explicação do governante responsável. Por hipótese, académica, que, neste caso, será uma hipótese académico-parlamentar, vamos supor que, nesta altura, não haveria, por parte desta Assembleia, a ratificação deste decreto.
Vozes do PS: - É uma boa hipótese!
O Orador: - É bom trabalhar, a esta hora, com esta animação!
Que aconteceria neste momento, na medida em que a política, embora gerindo interesses inconciliáveis, tem de ser realista e pragmática?
Srs. Deputados, não vos quem citar, por falta de tempo, a data em que foi publicado o decreto-lei, a data em que deu entrada a vossa ratificação e a data em que estamos a fazer este debate, mas quero voltar ao ponto zero da questão, ou seja, o que aconteceria aos casos laborais já resolvidos? Haveria um regresso e um retrocesso à casa que já não é empresa? Haveria um regresso, que era inviável? E depois dessa ratificação que mais haveria?
A Sr.ª Edite Estreia (PS): - Haveria avarias, avarias!...
Risos do PS.
O Orador: - Será que as pessoas voltavam a uma casa inviabilizada pelos seus 12 milhões de contos que estão em causa?
Os senhores vão dizendo que o Estado tem obrigações no teatro lírico, que a sociedade civil não pode acorrer a muitas dessas coisas, que noutras partes do mundo também é assim, mas vão esquecendo muita coisa, apesar de terem falado dos mecenas, nomeadamente que, em relação à ópera, há um novo espaço construído...
Vozes do PS: - O Centro Cultural de Belém?!...
O Orador: - Sim!
Risos do PS.
Não tenhamos medo de falar, porque ele há-de ficar em causa! Os senhores vão dizer que a sala está cheia de água,...
A Sr.ª Edite Estreia (PS): - Só dá para encenar o Lago dos Cisnes...!
O Orador: - ... é um problema da beira rio... Mas é necessário que a cidade se volte para o rio, pois há lá um novo espaço lírico...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lélis, peço-lhe o favor de falar para o microfone, caso contrário a sua intervenção não ficará gravada.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente, mas é que gerou-se um diálogo tão vivo que eu não resisti a esta convivência.
Bom, Srs. Deputados, deixem ficar o Centro Cultural de Belém, que é um desafio que é preciso ganhar!
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Lá isso é!
O Orador: - De qualquer maneira, a nossa bancada vai ratificar este decreto-lei...
Vozes do PS: - Oh!...
O Orador: por estas razões e, sobretudo, porque
temos razão!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Pedro Santana Lopes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de umas muito agradáveis horas passadas nos corredores da Assembleia da República...
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - E aqui também!
O Orador: - ... e alguns minutos aqui dentro, onde houve oportunidade para reencontrar algumas pessoas que já não via há muito tempo, não quero deixar de dizer que essa espera prejudicou, de alguma forma, o ritmo normal de trabalho.
Relativamente ao projecto que está em apreciação, gostaria de dizer que, tal como se pôde constatar pelo tom das intervenções dos Srs. Deputados dos grupos parlamentares que pediram a ratificação, é notória a sensação de quanto este debate está um pouco deslocado no tempo.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Infelizmente, todos sabemos, os que estão no Governo, na bancada que têm a responsabilidade de levar à prática um programa sufragado pelo eleitorado e os que estão na oposição, que, por vezes, decisões que são tomadas exigem, até à sua compreensão pela generalidade das pessoas e por aqueles que, por razões particulares não podem compreendê-las logo de imediato, que passe algum tempo para que a naturalidade dos factos desminta algumas suspeitas, insinuações, acusações, receios
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ou temores que aparecem nas intervenções que são produzidas.
Vozes do PS: - Pois, pois!
O Orador: - Srs. Deputados, respeito muito os apartes parlamentares - aliás, tive toda a atenção e enlevo a ouvir os Srs. Deputados - mas agradecia alguma reciprocidade nessa matéria, isto tanto quanto posso abusar da vossa paciência.
Assim, gostaria de dizer que o Teatro Nacional de São Carlos, ao contrário do que foi dito e como os Srs. Deputados poderão ir constatando, não foi liquidado, não foi extinto, como disse o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques. Aliás, creio que há um ponto que, penso, já podia estar claro entre nós: é que não é pelo alarido que existe na opinião pública que, se for fundado artificialmente, as decisões são alteradas no que respeita à política geral do Governo e, concretamente, à política desta Secretaria de Evado.
Assim, quando em Junho de 1990 foi anunciado que o Teatro Nacional de São Carlos ia encerrar, nessa altura, foram anunciadas medidas para alguns anos e o Teatro Nacional de São Carlos foi encerrado, estando-o ainda neste momento, para obras de beneficiação de que muito carecia. Aliás, o Teatro de São Carlos está a beneficiar de obras agora mas a Sala Experimental do Teatro Nacional de D. Maria já beneficiou de obras muito grandes, assim como o novo - permitam-me utilizar ente qualificativo Teatro Nacional de São João.
De facto, o teatro encerrou, a decisão não foi alterada, só que não foi uma decisão tomada no sentido de um anúncio de encerramento per omnia saecula saeculorum da única instituição lírica que temos em Portugal. Tal não estaria na intenção de ninguém, como é evidente!
Gostaria que este debate se processasse de modo a que todos utilizássemos argumentos que tenham um mínimo de nacionalidade e de seriedade. Por isso mesmo, também, quando foi anunciada a reestruturação do Teatro de São Carlos, anunciou-se não por más razões ou maus motivos. A crise doe instituições líricas existe não só em Portugal mas em todo o mundo, nos vários continentes, e são muitos os estudos e as publicações, são muitas as tentativas de encontrar uma solução para as crises em que a generalidade dessas instituições estão mergulhadas, quer os governos sejam de orientação mais socialista ou mais liberal, pois uma coisa não está relacionada com a outra. São as realidades dos novos tempos que têm posto em causa a generalidade dos espectáculos e a afluência de público a essas salas, principalmente as realidades da tecnologia áudio-visual.
Portanto, quando um Governo olha para os números - para os quais, com certeza, tem de olhar-, para a situação de um teatro, como disse o Sr. Deputado Carlos Lé1is, é considerada uma vantagem pelos próprios profissionais aquela autonomização dos corpos artísticos. Não quero considerar um erro o que se fez em 1980 e em anos posteriores, pois foi a decisão que pareceu mais adequada na época. Agora, aquela inserção da Companhia Nacional de Bailado, da própria orquestra, do coro, dos cantores, dos profissionais, tudo no mesmo teatro sem instalações, sem meios materiais adequados à vivência de todos esses corpos artísticos, era um erro e havia que reestruturar. Por outro lado, não passa pela cabeça de ninguém, em 1992 ou 1993 - pode ter passado em 1980, tudo isto tem o seu tempo-, que um teatro lírico seja
gerido por uma empresa pública, até por razões fiscais. Hoje em dia, com a constituição da Fundação de São Carlos, as razões fiscais estão, com certeza, presentes, face à participação cada vez maior de mecenas, que tentamos estimular.
Os Srs. Deputados tentam, por vezes, caricaturar, ridicularizar ou satirizar o apelo que fazemos à participação de mecenas. Mas essa participação, agora com uma nova e excelente Lei de Mecenato, que registo com agrado ter sido elogiada por todos os sectores, é cada vez mais desejável na cultura, em Portugal e fora de Portugal.
E em resposta aos Srs. Deputados que diziam, há uns meses, que eu agora estava convencido de que ia conseguir também mecenas para a Fundação de São Carlos devo referir que já os tenho a participar no Centro Cultural de Belém, na peça Passa por Mim no Rossio, nas exposições do pós-Europália! Agora também os vamos ter na Fundação de São Carlos! As vezes, os Srs. Deputados fazem esses raciocínios apenas porque não acreditam que sejamos capazes de alcançar as metas que resultam das premissas desse raciocínio. Mas temos sido e seremos capazes de as alcançar, como dentro de um mês se vai ver, em 12 de Março, dia da abertura oficial da temporada do novo Teatro de São Carlos - novo, depois das obras de remodelação, que passam pela sua nova estrutura. orgânica, com a programação que já foi anunciada,...
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Quero ver as obras!
O Orador: - ... cuja qualidade foi até elogiada por todos os sectores e em que a generalidade dos profissionais do antiga Teatro de São Carlos, para além de outros novos que estão a ser contratados, estão empenhadíssimos, pois estão a trabalhar em paz e serenidade.
Os elementos do coro estão contratados desde Outubro pelo Fundo de Fomento Cultural, como foi dito na altura, porque era importante para a programação da temporada que eles entrassem em funções logo nessa ocasião; os músicos da Orquestra Sinfónica Portuguesa iniciam a sua actividade este mês e vão fazer a sua primeira apresentação de uma temporada sinfónica no próximo mês de Fevereiro, o que não acontece há anos em Portugal.
Portanto, o Teatro de São Carlos abre as suas portas no dia 12 de Março, completamente remodelado com obras que vão merecer a alegria - estou convencido - da generalidade dos cidadãos portugueses.
Os contratos dos músicos e dos outros profissionais foram remetidos para a normalidade dos estatutos profissionais congéneres, porque o que se verificava até aqui, Srs. Deputados, era que os músicos da Orquestra chamada de São Carlos tinham um regime laboral completamente anómalo, ou seja, eram verdadeiros funcionários públicos com direitos e subsídios absolutamente inacreditáveis, o que contraria totalmente a situação da generalidade dos seus colegas da Europa e do mundo. 15to é verdade e se os Srs. Deputados estudarem em termos comparados verão!
Ora, será que os músicos vêm para Portugal por pensarem "temos de ir; temos lá uma oferta de trabalho completamente diferente da que existe nos outros poises; existe lá um poder reaccionário, inquisitório que não nos deixa alternativa"? E ai vêm eles, músicos estrangeiros, músicos nacionais, quererem trabalhar na Orquestra Sinfónica Portuguesa. Será porque existe essa aberração tão grande? Não, Srs. Deputados! O que existe é um plano cuidado e bem elaborado.
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Quando extinguimos a empresa do Teatro Nacional de São Carlos, sabíamos, tínhamos uma ideia dos passos que iriam ser dados a seguir. A corporização na fundação seguiu-se à liquidação, que foi concluída em tempo recorde praticamente com todas as responsabilidades do Teatro saldadas.
Portanto, a afirmação do Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, no sentido de que as obrigações contratuais do Estado não foram assumidas, é falsa, uma vez que todas as indemnizações a todos os trabalhadores foram pagas, nos termos da lei do trabalho, não havendo nenhuma obrigação por cumprir.
Assim, temos a consciência inteiramente tranquila, pois foi e está a ser feito um excelente trabalho pelos responsáveis artísticos, que são os que sabem do métier. A nossa única tarefa é coordenar, impulsionar, estimular os que sabem do métier, assumindo a responsabilidade pelo que é feito de bom e de mau na condução e execução deste processo.
Os Srs. Deputados dizem que este governo tem a obsessão dos resultados. É verdade, o Governo tem a obsessão dos bons resultados!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E neste caso os bons resultados vão estar, mais uma vez, à vista, pois vamos ter uma excelente temporada, a Fundação do Teatro Nacional de São Carlos tem a participação de mecenas privados e a tutela da Orquestra Sinfónica Portuguesa.
Quero ainda referir mais um aspecto, até para os ilustres pares desta Câmara terem a noção dos termos em que estes debates, por vezes, são colocados. Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, posso garantir-lhe - e, se me permite, aconselhava-o a não ir por aí porque para além da injustiça da sua argumentação ela será, antes de mais, completamente incompreendida pela opinião pública - o seguinte: não há nenhuma responsabilidade assumida pelo Governo Português, pela Fundação do Teatro Nacional de São Carlos, ou pela antiga empresa pública em relação ao maestro Martin André. É que, de repente, estes nomes aparecem mitificados.
Esse senhor é um maestro de nacionalidade inglesa, tanto quanto julgo saber, que foi convidado para a face de audições e relativamente a quem se admitiu a hipótese de continuar na orquestra. No entanto, quando acabaram as audições, fez-se uma coisa muito simples, ou seja, abriram-se negociações e perguntou-se a esse senhor, como se perguntou a outros, quais as condições que pretendia para assumir o cargo de maestro da orquestra. Mas nunca ficámos só com um nome em carteira! Os Srs. Deputados digam o que fariam no nosso lugar?!
Ora, esse senhor colocou-nos condições absolutamente inaceitáveis. Contudo, chega-se ao espanto de ver escrito num semanário do sábado passado, segundo opiniões insuspeitas que nunca são citadas, porque normalmente resultam de "cozinhados", de "panelas", de "tachos", que 30 000 contos de ordenado por ano até nem é caro.
A Sr.ª Edite Estreia (PS): - O Sr. Secretário de Estado paga isso aos administradores da Fundação das Descobertas!
O Orador: - Sr.ª Deputada, vamos colocar as coisa como elas são.
Quando se falou no maestro Koenig, da Régie Sinfonia, era mau, porque era estrangeiro e ficava muito caro. Então, dizia-se: "Por que vão contratar maestros estrangeiros e pagar dezenas de milhares de contos por ano, se há maestros portugueses tão bons? Que escândalo nacional!"
Contrata-se um maestro português, têm-se em conta as exigências financeiras, que também devem estar presentes, e também é mau.
Srs. Deputados, não se pense nem passe pela cabeça de ninguém que fechamos contratos da seguinte forma: .Quanto quer o senhor? É inglês? Esteve cá estes meses? É estrangeiro? Muito bem! Tem um bom currículo! Quanto quer? Quer 30 000 contos? Negócio fechado." Nós não trabalhamos assim, Srs. Deputados!
O Sr. Subsecretário de Estado da tutela deu instruções para dizer ao maestro Martin André que as condições eram absolutamente inaceitáveis. 15to está documentado e quem quiser censurar que censure à vontade.
Aliás, o maestro escolhido, Álvaro Cassuto, era óptimo e nunca foi criticado enquanto maestro da Nova Filarmonia, com o alto patrocínio de S. Ex.ª o Presidente da República e da Dr.ª Maria de Jesus Barroso,...
O Sr. Presidente: - Peço-lhe para concluir, Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Orador: - ... mas, quando aceitou o contrato proposto pelo Governo, passou a ter uma competência profissional duvidosa.
Srs. Deputados, já chega de "conversa de chacha", se me permitem a expressão.
Aplausos do PSD.
O Orador: - E, depois, assistimos ao espectáculo indecoroso de ver um funcionário da Presidência da República, na altura a exercer funções de alta responsabilidade, envolver-se em polémicas de ciúmes com um jornalista de um jornal da capital. De facto, em certos aspectos e à semelhança do que os senhores às vezes gostam de dizer, que saudades de alguns escritores da nossa praça! Que bem que nos faria ter aqui o Eça de Queirós ou As Farpas do Ramalho Ortigão, agora que vemos um chefe da Casa Civil da Presidência da República trocando cartas com um jornalista de um jornal diário da capital, devido aos ciúmes que sentiu por termos ido contratar um maestro que era considerado "da casa".
Nós fizemos um trabalho com principio, meio e fim. Assim, esperem só mais um mês e os próprios Srs. Deputados sentirão orgulho no Teatro de São Carlos, que irão visitar por ocasião das comemorações do seu bicentenário, por nós promovidas, mais uma vez, com contenção e racionalização de meios contra esse tal desperdício, comemorações estas que nos enchem de orgulho, com um Teatro de São Carlos que vai orgulhar-nos ainda mais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente:- Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, Edite Estrela, Fernando Pereira Marques e
António
O Sr. Secretário de Estado dispõe de 2,4 minutos para responder às questões que lhe forem colocadas.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
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O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): -
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, há pouco, V. Ex.ª
salientou que esteve a ouvir-nos com todo o "enlevo", mas
não deixou de afirmar que está farto de "conversa de
chacha". Espero que o que lhe vou perguntar não seja
considerado por si como "conversa de chacha".
Também disse que veio à Assembleia da República
"perder tempo". O que deveria dizer era o contrário, isto é,
que veio à Assembleia da República ganhar tempo. Aliás,
quando a Assembleia da República chama o Governo para
tratar de uma ratificação, o Sr. Secretário de Estado deveria
estar satisfeito por poder vir proferir afirmações com as
quais, na sua maioria, não estou de acordo.
No decreto-lei em apreço diz-se: "O Teatro São Carlos
afirmou-se, ao longo de 200 anos, como instituição ímpar
no panorama lírico nacional e como uma das mais prestigiadas da Europa" A verdade é que a actuação do
Governo não teve isto em consideração e, pura e
simplesmente, estourou com a empresa que geria o Teatro
Nacional de São Carlos. E quando V. Ex.ª diz que o Teatro
Nacional de São Carlos não acabou, é difícil considerarmos
essa uma razão plausível e aceitável, se tivermos em
consideração o decreto-lei.
No referido diploma diz-se, ainda, que "a ponderação
entre critérios económico-financeiros e os objectivos de
promoção e difusão cultural não se revelam adequados".
Talvez seja esta a verdadeira razão do encerramento do
Teatro São Carlos. 15to é, uma política cultural baseada
no economicismo, nas questões económico-financeiras é
evidente que acaba por dar este resultado. Buscam-se
razões onde elas não existem e, realmente, Sr. Secretário
de Estado, a cultura obriga a gastos e não pode ser olhada
apenas sob a óptica das questões de dinheiro ou do
mecenato, aguardando que caia por aí um mecenas para
garantir o futuro deste Teatro.
Sr. Secretário de Estado, uma política cultural de que
o País tanto carece obrigaria, com certeza, à defesa de um
teatro como o São Carlos, privilegiando, como é evidente,
o seu papel de divulgação, de dinamização e de promoção
cultural, não uma política cultural indefinida como a desenvolvida pelo Governo.
Sempre que se fala em "ponderação económico-financeira" e nos resultados da promoção cultural, nunca
podemos deixar de referir aquele mamarracho de Belém,
a que o Governo chama "Centro Cultural de Belém",
verdadeiro e lamentável sorvedouro de milhões de contos
sem qualquer aplicação prática, pelo menos de momento.
Neste caso, estamos perante 200 anos de tradição
cultural. E eu não sou dos que dizem que tudo era bom
no Teatro São Carlos. Eu próprio também sou contra os
elitismos e entendo que aquele Teatro tinha de ser mais
aberto à população juvenil e não só. Mas isso obrigaria a
um estudo e a uma sensatez que o Governo não revelou
possuir.
Acabar com o Teatro São Carlos da forma como o fez
é o mesmo que, amanhã, sermos surpreendidos por uma
noticia em que se diga que foi encerrada a empresa do
Teatro Scala de Milão ou a da Opéra Garnier de Paris.
É a mesma coisa, Sr. Secretário de Estado, salvas as
devidas distâncias!
Para finalizar, só queria perguntar-lhe por que razão não
se optou por uma análise mais aprofundada antes de ter
tomado esta atitude, que criou um claro desprestígio nos
nossos meios culturais, e não apenas em Portugal.
(O orador reviu.)
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, começo com um comentário que, embora feito com cordialidade, não deixa de ser uma crítica.
O Sr. Secretário de Evitado revelou, mais uma vez, a sua tendência centralizadora, não dando oportunidade ao Sr. Subsecretário de Estalo para intervir neste debate, o que é estranho, tanto mais que ele é quem detém a tutela do São Carlos. Certamente, estaria muito à vontade para falar sobre um processo a que esteve intimamente ligado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
Risos do PSD.
A Oradora: - Os Sr. Deputados do PSD ainda estão cheios de força, apesar de ainda não terem jantado. Ainda bem, é porque o assunto é estimulante e, pelos vistos, as minhas palavras também.
Protestos do PSD.
Mas, se me permitissem, continuaria afazer os meus comentários.
O Sr. Secretário de Estado disse que este debate estava um pouco deslocado no tempo e de, facto, assim é, mas não vai, por certo, assacar responsabilidades à oposição.
No entanto, essa sua observação leva-me a perguntar-lhe: se, por acaso, o Governo não dispusesse de uma confortável maioria, na Assembleia, teria tido o mesmo tipo de comportamento, ou seja, passada por cima de um pedido de ratificação - que não foi assim tão tardiamente apresentado como isso, pois foi apresentado em Novembro e o diploma que extingue o Teatro Nacional de São Carlos é de Setembro, e tendo em conta que há um tempo para a sua publicação, não me parece que tenha decorrido assim tanto tempo como isso, mas enfim -, como é que, realmente, se teria comportado? Provavelmente, não teria acelerado tanto o processo, porque poderia ter de retroceder.
Em relação às obras que estão a ser feitas no Teatro Nacional de São Carlos e no Teatro de Dona Maria II, deixo apenas mui a informação de que irei solicitar aos elementos da Comissão de Educação, Ciência e Cultura que verifiquem as obras in loco, pois só assim os Deputados poderão avaliá-las e, se for caso disso, reconhecer o mérito Delas. Pela nossa parte, assim faremos!
A Sr.ª Marta Julieta Sampaio (PS):- Muito bem!
A Oradora: - Pegando agora numa outra observação que o Sr. Secretário de Estado fez em relação ao modelo de empresa pública, devo dizer que, em nosso entender, não é o modelo que está em causa, nem os males que advieram decorrem dele.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputada, solicito-lhe que termine.
A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, mas apelo à Mesa que use da mesma benevolência para comigo que usou para com o Sr. Secretário de Estado.
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O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, já estou a usar de muita benevolência no que respeita ao tempo de que o Partido Socialista dispunha.
A Oradora: - Mas, como estava a dizer, penso que as deficiências devem ser imputadas à má gestão da empresa, ou eventualmente aos maus gestores que o Governo nomeou para o Teatro Nacional de São Carlos. Portanto, não é o modelo que está em causa mas as pessoas que, provavelmente, estiveram à frente da empresa pública.
Por outro lado, no que respeita às razões fiscais, percebe-se que recorra ao modelo de fundação para poder mais facilmente fugir ao controlo do Tribunal de Contas. Mas, já agora, também gostaria de saber por que é que não teve essa mesma preocupação em relação aos trabalhadores do Teatro Nacional de São Carlos, que, pelo facto de agora serem obrigados a assinar um contrato aberrante vão ser penalizados em termos fiscais, porque a situação é completamente diferente quando se trata de um contrato de prestação de serviços ou de um contrato de trabalho por conta de outrem.
Para terminar, gostaria apenas de colocar três perguntas muito sinteticamente.
Primeira: o Sr. Secretário de Estado entende que este contrato, apresentado designadamente aos músicos, em que lhes limita o direito à segurança social, ao subsidio de desemprego, à reforma e em que são obrigados a ceder os direitos conexos, é correcto?
A segunda questão tem a ver com a nomeação do maestro Álvaro Cassuto. Não vou defender se os ingleses são melhores ou piores do que os portugueses, mas, face às declarações da ex-Subsecretária de Estado da Cultura, que diz que havia um compromisso com o anterior maestro, gostaria de saber se há ou não. Se há compromisso, então, o Sr. Secretário de Estado terá de o assumir, porque o Estado tem de (Lar o exemplo; se não há, deverá entender-se com a ex-Subsecretária de Estado da Cultura e fazer um desmentido.
Finalmente: o que vai acontecer aos 17 cantores residentes que estão no desemprego e a quem, há 12 anos, quando foram contratados para o Teatro Nacional de São Carlos, foram criadas determinadas expectativas?
(A oradora reviu).
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fernando Pereira Marques dispõe apenas de 1,2 segundos, para fazer o seu pedido de esclarecimento.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, quase que recorreria à figura da defesa da consideração, na medida em que o Sr. Secretário de Estado me ofendeu, ao classificar a minha intervenção e algumas das minhas afirmações como "conversa de chacha".
Gostaria, pois, de utilizar essa figura regimental.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, naturalmente, o último juiz da honra e da consideração entre pessoas é a própria pessoa O senhor é que sabe o que há-de fazer, não sou eu quem lhe posso tirar angústias para a sua decisão.
Tem, pois, a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS):- O Sr. Secretário de Estado, ao classificar como "conversa de chacha" quer a minha intervenção quer a intervenção da Sr.ª Deputada Edite Estrela, desvalorizou o conteúdo destas intervenções e proeurou ridicularizá-las, quando, no fundo, dissemos coisas extremamente sérias. Portanto, é o Sr. Secretário de Estado quem vem para aqui com uma conversa de chacha.
Protestos do PSD.
Agradeço que me deixem falar, Srs. Deputados.
Risos.
Se pretende convencer-nos com as afirmações que fez, porque está a partir do pressuposto de que, tanto eu como os meus colegas, não sabemos do que falamos, devo dizer-lhe que as suas afirmações sobre a Companhia Nacional de Bailado são simplesmente ridículas.
A Companhia Nacional de Bailado repõe os mesmos espectáculos há três anos. Se formos cotejar declarações do Sr. Subsecretário de Estado, Frexes, com actuais declarações do director-geral, António Xavier, chegar-se-á à conclusão de que esses dançarinos têm todas as razões para estar inquietos sobre o seu futuro. Aliás, é o próprio director-geral, António Xavier, quem confessa no Diário de Notícias, em 9 de Janeiro passado, que ainda não sabe qual é o modelo que irá ser adoptado para aquela Companhia.
Mas, Sr. Secretário de Estado, não entremos nesse pormenor.
O senhor disse que não se submete ao "alarido", mas o "alarido" que, porventura, tenha surgido em todo este processo é o "alarido" de pessoas que são artistas, de pessoas como 17 cantores, que deram o melhor da sua carreira, no auge da sua juventude, para um projecto que era o Teatro Nacional de São Carlos. É, pois, o "alarido" de pessoas preocupadas com a sua própria carreira, com o seu próprio futuro e com a cultura deste pais. O senhor não cede ao "alarido", mas é responsável por ele, na medida em que actua, a curto prazo, de acordo com a pressão das circunstâncias, sem que tenha um projecto global, metas rigorosas e estratégia.
Um terrível comunista, como o Ministro da Cultura francês Jacques Duhamel, que foi o seguidor de André Malraux, ao abordar a área da música, da dança e da arte lírica, em França, definiu um projecto por 10 anos, um projecto faseado, cujo primeiro ponto era precisamente o de suscitar a confiança dos artistas e dos principais interessado. É que não se pode reformar o que quer que seja na cultura, provocando a insegurança e a instabilidade daqueles que são a parte viva dessa cultura.
É isto que o Sr. Secretário de Estado parece não perceber, na medida em que tem uma visão meramente gestora, circunstancial e superficialmente política destes problemas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.
O Orador: - Para concluir, gostaria de perguntar-lhe se...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir, uma
vez que está no uso da palavra para defesa da consideração.
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1142 I SÉRIE - NÚMERO 31
O Orador: - Terminei, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Está ainda inscrito, para pedir
esclarecimentos, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. Secretário de Estado pretende usar já da palavra
para dar explicações à defesa da consideração ou fá-lo no
final do próximo pedido de esclarecimento?
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Pretendo
usar já da palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, quando usei a expressão
"conversa de chacha" - como, aliás, poderá ser verificado
no Diário -, não estava a referir-me ao que aqui foi dito
mas a escritos e comentários que foram feitos fora desta
Assembleia.
Se, todavia, os Srs. Deputados querem fazer teatro, devo
dizer ao Sr. Deputado Fernando Pereira Marques que, neste
aspecto, já esgotei os apoios para o ano de 1993.
Aplausos do PSD.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - O Sr. Secretário de Estado toca bem, mas não canta bem!
O Orador: - Não entrarei por esse campo.
Não tenho por hábito ofender quem quer que seja.
Quando falei em conversa de chacha, fi-lo, como disse,
referindo-me a outras circunstâncias e a outras personagens. Já por muitas vezes disse, cara a cara e a quem
era necessário, aquilo que tinha a dizer.
Ao Sr. Deputado Fernando Pereira Marques quem dizer
que temos o maior respeito pelo futuro pessoal de cada
um dos que estão envolvidos nessas estruturas artísticas.
A prova de que temos esse respeito - e a Sr.ª Deputada
Edite Estrela fez apelo à estreia parlamentar do Sr. Subsecretário de Estado, que espero vir a acontecer dentro de
muito pouco tempo - é exactamente a de que, como os
Srs. Deputados saberão muito bem, não atribui a
responsabilidade a nenhum desses tais gestores que foram
nomeados.
Se os Srs. Deputados estudarem a evolução do Teatro
desde 1980, verificarão que a situação se vem agravando
de ano para ano, com todos os governos e todos os
conselhos de gestão, mas também poderão ver que, nesta
época de reestruturação, este mesmo Subsecretário de
Estado da Cultura, quando foi nomeado presidente do
Teatro Nacional de São Carlos e administrador responsável
pelo pelouro do pessoal, teve o maior elogio de uma
comissão de trabalhadores que talvez algum gestor público
tenha tido depois do 25 de Abril, não só pelo aspecto
profissional como também pelas relações laborais que na
altura existiam na empresa. Se, por isso, esse facto
aconteceu, não foi por nos ser indiferente a situação de
cada uma das pessoas. O que poderia acontecer às pessoas
é que, a suceder esta situação, perdessem o seu futuro e
o horizonte de esperança e essas estruturas artísticas
fossem definitivamente postas em causa.
Ao citarem o caso francês, devo dizer aos Srs. Deputados que não tenho querido enveredar por esse caminho O Orador: - O Sr. Secretário de Estado faz muito bem
- nem sequer quando me falam do Centro Cultural de em falar das obras do Teatro Nacional de São Carlos
Belém ou de teatros líricos -, para já não falar da actuação de governos socialistas.
Querem os Srs. Deputados ir à capital do país vizinho e ver o que é feito dos teatros de ópera lá? Lá é que acabaram, e com governos socialistas no poder!
Sabe o Sr. Deputado para quando estava prevista a conclusão das obras do Teatro? Para a altura de Madrid Capital Europeia da Cultura 92!
Sabe o Sr. Deputado o que foi decidido? Que não estava a tempo! Por isso, tiveram de parar as obras agora, por não terem dinheiro.
Sabe o Sr. Deputado porquê? Porque o orçamento quadruplicou em relação aos 6 milhões de contos que estavam previstos no inicio!
Querem os Srs. Deputados ir às obras do grande Presidente Mitterrand e do grande Ministro Jack Lang, em França, e sabes quanto custaram, que tempo demoraram, para que estão a servir?
Protestos do PS.
Querem os Srs. Deputados ir à solução da ópera da Bastilha e do Palais Garnier?
Querem os Srs. Deputados ir às demissões dos directores das óperas?
Querem os Srs. Deputados ir à troca de directores de uma ópera para a outra, porque nenhum deles é capaz de as pôr a funcionar?
As nossas vão ficar a funcionar. O Teatro Nacional de São Carlos já aí está. Em relação ao Centro Cultural de Belém, posso dizer-vos que só faltam uns mesinhos, muito poucos, nalguns casos um mês e meio, para os Srs. Deputados o poderem ver em funcionamento.
Mais uma vez e com base em factos, quero dizer ao Sr. Presidente, como entidade máxima deste Parlamento, que não ofendi nem nenhum Sr. Deputado nem ninguém nesta Câmara. Se o fizesse, apresentaria desculpas. Não 0 fiz, procurei apenas esgrimir aqui com a força da convicção que é a minha.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Secretário de Estado da Cultura, percebi, pela sua explicação, que a "conversa de chacha" não era connosco.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quando, todavia, o Sr. Secretário de Estado diz que perdeu muitas horas nesta Assembleia, pelos comedores, e pede um mínimo de seriedade, creio que nós podemos pedir o mesmo, na medida em que a intervenção que o Sr. Secretário de Estado aqui proferiu relativamente às questões que quer o Grupo Parlamentar do PCP quer o Grupo Parlamentar do PS colocaram, a meu ver pertinentemente, poderia fazer sucesso, há uns anos atrás, no café A Brasileira, ao Chiado, mas não respondeu, evidentemente, às graves questões que foram colocadas.
Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!
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-acho muito bem que as faça-, mas não precisava de fazer as obras com os trabalhadores lá dentro. É que não passa pela cabeça de ninguém que a extinção de uma empresa pública implique o ,despedimento dos seus trabalhadores. 15so não aconteceu com a extinção de nenhuma empresa pública, sendo certo que foram extintas muitas empresas públicas, nos últimos anos, neste país. O Sr. Secretário de Estado sabe perfeitamente que, passando outra entidade a gerir o Teatro Nacional de São Carlos, as obrigações laborais nesse teatro se transfeririam para essa nova entidade.
Não passa, pois, pela cabeça de ninguém que trabalhadores tenham sido despedidos e obrigados a novas audições, alguns passados à situação de excedentes e outros andem agora a dar aulas ou a tocar em bares e restaurantes para poder sobreviver. Foram preteridos músicos com muitos anos de actividade e provas dadas. Foram postos na rua músicos que são quase unanimemente reconhecidos como dos melhores executantes portugueses.
Devo dizer, para terminar, que as reestruturações como as que o Sr. Secretário de Estado faz têm tradição neste pais. Fazem-me lembrar a demolição da baixa da Mouraria para resolver o trânsito em Lisboa, mas que mais não fez do que manter, durante 30 anos, os barracões no Martim Moniz.
Creio que é esse o resultado a que estão a conduzir as reestruturações levadas a cabo no âmbito da SEC: fazem-se "demolições" de projectos que existem há muitos anos e que funcionam para criar situações indefinidas e com pormenores rocambolescos, como o do maestro do Teatro Nacional de São Carlos! 15to é, o maestro Martin André procedeu a todas as audições, foi quem seleccionou os músicos, decidindo quem ia para a rua e quem ficava, e agora o Sr. Secretário de Estado vem dizer que, afinal, ele não nos serve, pois só agora foram discutidas as condições.
Sr. Secretário de Estado, não era elementarmente exigível que essas condições fossem discutidas antes de dar plenos poderes ao maestro, nomeadamente para decidir quais eram os músicos que ficavam e os que iam para a rua?!
Relativamente a estas questões, creio que o Sr. Secretário de Estado não deu qualquer resposta, limitando-se a vir fazer o discurso que faria independentemente de tudo o que os Deputados da oposição aqui dissessem.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Sr. Presidente, com franqueza, tenho uma noção talvez diferente do que seja o debate parlamentar. As vezes lemos, nalguns escritos da imprensa ou de instâncias. de comunicação, coisas que não vale a pena tentarmos esclarecer, porque as pessoas não querem ser esclarecidas: escrevem o que já trazem na cabeça que querem escrever com base em campanhas que estão montadas! Mas, num debate parlamentar, as pessoas estarem a falar só por falar, ficando todos na mesma... Sinceramente, repito, não tenho essa noção do debate parlamentar!
Muitas vezes, ouvi aqui argumentos que me convenceram e que me levaram a dizer "sim senhor, tem razão". E não continuei a perguntar a mesma coisa e a criticar as pessoas quando "estava na cara" o que se estava a passar.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Quando é que foi isso?
O Orador: - De facto, faz-me impressão ouvir o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca dizer: "O Teatro de São Carlos foi extinto." Gostava de perguntar à generalidade das pessoas que estão aqui na Assembleia o que pensam disso!
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - Foi extinta a empresa! Mostrei-lhe o decreto...
O Orador: - Sr. Deputado, eu não o interrompi...
A Sr.º Edite Estrela (PS): - A empresa?!
O Orador. - Então, Sr.ª Deputada Edite Estrela, não me diga que não sabe ler!... Acabam-lhe com a coluna em A Capital!
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Que não é chamada para aqui!
O Orador: - Sr. Presidente, se me dá licença, deixe-me que diga aos Srs. Deputados que às vezes aparecem como tão puristas da língua, que uma coisa é ser extinta uma empresa, outra é acabar-se com um teatro!
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - O Teatro tem lá as paredes...
O Orador: - Desculpe, o que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca disse, várias vezes, foi "o Teatro São Carlos foi extinto".
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Secretário de Estado, permite-me que o interrompa?
O Orador: - Não, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Então leia os artigos 4 º e 2 º do decreto...
O Orador: - Tenho-o aqui! Posso ler, se quiser, o artigo 2.º... '
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - O que eu quero que leia é o artigo sobre o património da empresa!
O Orador: - Desculpe, está aqui "O Teatro Nacional de São Carlos, E. P.", ou não? O Sr. Deputado deve saber ler! Ora, toda a gente sabe que o que é extinto, como é evidente... Aliás, sendo o Sr. Deputado uma pessoa tão inteligente e tão esclarecida, como todos sabemos ser, não é preciso estar-lhe a explicar que o Teatro Nacional de São Carlos já existia muito antes de ser empresa pública. E com a sua inteligência iluminadíssima, que todos lhe reconhecemos, há-de aceitar que o Teatro São Carlos vai continuar a existir, mesmo depois de deixar de ser empresa pública!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, como é que os Srs. Deputados podem não ter qualquer preocupação com o que fica
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registado nas actas da Assembleia? As pessoas que as lerem daqui a 20 anos, daqui a um ou dois séculos, constatarão que nada têm a ver com a realidade! E perguntarão: "Mas quem é este Deputado Corregedor da Fonseca que continuou a dizer a mesma coisa quando estava na cara que era diferente?!
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): O Senhor está a alterar completamente tudo aquilo que lhe disse! Vou mandar-lhe a acta, Sr. Secretário de Estado! Claramente!
O Sr. Presidente: - Silêncio, Srs. Deputados. O Sr. Secretário de Estado está no uso da palavra.
O Orador: - Sr. Presidente, pedia a V. Ex.ª que, quando estiver transcrito...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Amanhã!
O Orador: - Dá-me licença que acabe a intervenção?
Solicitava, pois, ao Sr. Presidente que, quando estiver transcrito o que hoje aqui foi dito, peça aos serviços respectivos da Assembleia da República que me façam chegar a acta desta sessão. Assim que dispuser desses elementos, virei imediatamente à Assembleia para fazer - como diz o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca - a avaliação do que foi dito.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E, nessa altura, veremos o que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca disse ou não disse!
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Vamos ver!
0 Orador: - Portanto, Sr. Deputado, espero que não se esqueça. Amanhã, depois de amanhã ou quando quiser, estou disponível para vir a este Plenário ler a transcrição! Fica lançado o repto! Espero que não se esqueça, porque a sua indignação foi tão sentida que há-de ter fundamentação nos factos!
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Responda é às questões que lhe coloquei!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pedia silêncio, porque o Sr. Secretário de Estado tem de concluir, porque já está a ultrapassar o seu tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, se me permite, concluía e, se quiserem, falaria com os Srs. Deputados numa outra altura, com mais tempo, sobre a situação dos contratados pela nova entidade que vai gerir o Teatro Nacional de São Carlos.
Sobre a questão do maestro, já prestei os esclarecimentos que tinha a prestar. Mas quando o Sr. Deputado António Filipe pergunta por que é que, logo na altura, não assegurámos que fosse o mesmo maestro a ir dirigir a orquestra, pois não faz sentido que assim não tivesse sido, só posso responder. essa é boa! Então agora o maestro que
faz as audições para a orquestra é que tem de ficar para sempre à frente dela?!
Mas, já agora, posso dizer-vos que não foi apenas um maestro a fazer as audições mas, sim, cinco.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Mas quem é que vai dirigir a orquestra?
O Orador: - Gostava apenas que os Srs. Deputados ouvissem, já que até a comunicação social dá tanta importância a esta ratificação que não está aqui presente qualquer representante, tanto quanto saiba, o seguinte: dizem que estava um maestro nas audições, pois digo-vos que estavam cinco. 15to é para verem a verdade dos factos daquilo que, todos os dias, se escreve nos jornais e se diz aqui também.
Não se pode mudar o maestro depois de se constituir a orquestra?! Então o maestro fica para sempre? E quando ele sair, extingue-se a orquestra, não?!...
O Sr. Deputado António Filipe pediu para lhe responder às questões em concreto. Os Srs. Deputados ficam muito inquietos e há sempre esse barulho cada vez que começo a falar e a tentar prestar esclarecimentos.
Sr. Deputado António Filipe, já lhe respondi a todas as questões concretas que me colocou, por isso não me acuse de não responder e de fugir às perguntas, porque, se mais algumas tiver, responder-lhe-ei a todas. E a melhor resposta a dar é esta: o Teatro Nacional de São Carlos vai continuar, depois de ser empresa pública, como fundação.
E quando a Sr.ª Deputada Edite Estrela lança aquela gracinha do costume, porque não há dia em que não lhe fuja a graça para esse tipo de boca - desculpe a expressão -...
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Sr. Secretário de Estado, eu sei que sou engraçada!
O Orador: - ... de que essa alteração é para fugir à fiscalização do Tribunal de Contas... A Sr' Deputada sabe que as empresai públicas também não estão sujeitas ao visto do Tribunal de Contas? Deve ter a noção disso!
A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Não é só ao visto!
O Orador: - E a mais nada! Portanto, mais uma vez, esse argumento não tem pés nem cabeça. Faz-me impressão estarmos aqui durante horas - e não são as horas que aqui estou que considero perdidas, pois essas considero ganhas, mas, sim, as que estive lá fora - a debater argumentas que nada têm a ver com a realidade.
A Sr.ª Deputada Edite Estrela está a acusar-me, para constar das actas desta Assembleia, que criei uma fundação apenas porque quero fugir à fiscalização do Tribunal de Contas, quando é certo que as empresas pública também não estão sujeitas a essa fiscalização. É uma ficção pura o que se lê na comunicação social e o que, por vezes, aqui se debate.
Sr. Presidente, termino com a devida vénia, como sempre.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Fernando Pereira Marques.
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O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Cultura, uso da palavra apenas para prestar alguns esclarecimentos muito rápidos e retirar algumas conclusões.
Quando V. Ex.ª fala de França, tem uma reacção pavloviana e pensa em socialistas. Eu falei de Jacques Duhamel, Ministro de De Gaulle, no principio dos anos 70.
Quanto à questão do maestro inglês, obviamente que não nos convenceu, e utilizou até argumentos de carácter patrioteiro, que são simplesmente lamentáveis.
As obras que estão a ser feitas serão, seguramente, importantes, mas apenas lhe dou como ponto de informação histórico que o próprio Teatro Nacional de São Carlos foi construído de 8 de Dezembro de 1792 a 30 de Junho de 1793. Mais rapidamente do que essas obras! Mas isso é simplesmente factual e circunstancial!
Três comentários finais: V. Ex.ª não conseguiu demonstrar que o processo de extinção não foi digno de qualquer empresário, sem escrúpulos da democracia de sucesso que todos conhecemos neste país; também não nos pôde dizer qual é o modelo futuro para o Teatro Nacional de São Carlos, integrado no quadro de um projecto global para a música e para a dança; e também não nos soube dizer se a Fundação vai ter capital próprio, qual vai ser a participação dos mecenas e como é que vai ser viabilizada essa Fundação pela participação de mecenas, quando ainda não resolveu esse problema com a Fundação das Descobertas. Não nos respondeu a estas questões.
Aplausos do PS.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Para defesa da consideração e da honra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Sr. Presidente, é para defesa da consideração e da honra não só minha, nem principalmente minha, mas daqueles que trabalham comigo neste projecto da cultura, nomeadamente os operários e outras pessoas que trabalham nas obras do Teatro Nacional de São Carlos.
Este argumento do Sr. Deputado Fernando Pereira Marques é supinamente inacreditável, Sr. Presidente. Diz ele que o Teatro de São Carlos só demorou uns messes a ser construído - tal como o Mosteiro dos Jerónimos e outros grandes monumentos do passado -, mas pergunto-lhe se quer que contrate os milhares de elementos de mão-de-obra, nas condições em que foram contratados naquela altura, com os direitos que tinham naquela altura, para contratar a essa velocidade.
Risos do PSD.
Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, não acredito tal lhe passe pela cabeça! Eu nunca faria isso.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado da Cultura tem sentido de humor, mas a estas hora. já não me faz rir. Talvez o faça aos seus colegas de bancada.
Protestos do PSD.
O que pretendo dizer, Sr. Secretário de Estado, é que não nos venha iludir, não responda a questões de fundo com questões de pormenor, como, por exemplo, as óptimas obras que estão a ser feitas...
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - De pormenor!
O Orador: - ... e como as questões ligadas à temporada. O senhor imagina que não sei tudo o que se passou com a temporada do Teatro Nacional de São Carlos?
Vozes do PSD: - No Verão só lá há tarefeiros!
O Orador: - E pensa que o não sabem também todas as pessoas ligadas a este meio? O senhor quer convencer-nos de que, inclusive, esta magnífica temporada não assentou em circunstâncias várias que contribuíram para o descrédito internacional do Teatro Nacional São Carlos e do Pais, na medida em que se pegou numa tarefa já feita pelo Dr. Ribeiro da Fonte e Paulo Ferreira de Castro fez o melhor que pôde mas tudo foi feito atabalhoadamente, por força das circunstâncias impostas?
Protestos do PSD.
O senhor quer convencer-nos, ao referir-se à temporada e às obras, de que, de facto, não existem estas questões de fundo para as quais não tem resposta? Responda-nos às questões de fundo, que se relacionam com o futuro do modelo de gestão do Teatro Nacional de São Carlos, o futuro da Fundação do Teatro Nacional de São Carlos e como irá integrar o projecto do São Carlos num plano global para a arte lírica, a música e a dança, no nosso país. São essas as questões de fundo, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: - Foi referido, por várias vezes e ao longo desta sessão, o tempo tardio em que estamos a tratar deste ponto. Quero apenas lembrar à Câmara que todos sabíamos, hoje, que os nossos trabalhos iam ser alongados e que nenhum tema deixou de entrar no tempo próprio, na ordem própria do nosso debate.
Srs. Deputados, o Plenário volta a reunir no próximo dia 21, para, no período de antes da ordem do dia, tratar de assuntos de interesse político relevante e, no período da ordem do dia, discutir conjuntamente os projectos de lei n.º 139/VI - Criação do Conselho Nacional de Juventude do PS, e 187/VI - Estatuto Jurídico de Conselho Nacional de Juventude, do PCP. Estão agendadas, também, votações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 40 minutos.
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Rectificação ao n.º 21, de 16 de Dezembro
Na p. 744, 2' col., 1.59, onde se lê "No entanto, dada a incoerência", deve ler-se "No entanto, dada a coerência".
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Álvaro José Martins Viegas. António José Barradas Leitão. António José Caeiro da Mota Veiga. António Maria Pereira. Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira. Joaquim Eduardo Gomes. . José Alberto Puig dos Santos Costa. José de Almeida Cesário. José Manuel Nunes Liberato. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida. Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Manuel Joaquim Baptista Cardoso. Maria Manuela Aguiar Dias Moreira. Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho. Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa. Armando António Martins Vara. José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Luís Filipe Nascimento Madeira. Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Partido Comunista Português (PCP):
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara. João Granja Rodrigues da Fonseca.
João Manuel dos Santos Henriques.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
José Pereira Lopes.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo. .
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Partido Socialista (PS):
Ana Maria Dias Bettencourt. António Poppe Lopes Cardoso. Carlos Cardoso Lage. Carlos Manuel Natividade da Costa Candal. Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Gustavo Rodrigues Pimenta. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. Mário Manuel Videira Lopes. Rogério da Conceição Serafim Martins.
Deputados Independentes:
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.