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Sexta-faira, 5 de Março do 1993
l Série - Número 44
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA
2.º SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE MARÇO DE 1993
Presidente: Ex.(tm) Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmo Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 268/VI, do projecto de resolução n.º 53/VI, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado Luís Capoulas Santas (PS) criticou a forma como o Governo tem aplicado a Lei da Caça. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Antunes da Silva (PSD), André Martins (Os Verdes) e Vasco Miguel (PSD), tendo este último dado também explicações ao Sr. Deputado André Martins.
O Sr. Deputado Delmar Palas (PSD) falou da situação da agricultura transmontana e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Martinho (PS).
O Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues (PCP), a propósito da sua participação na Conferindo de Solidariedade Internacional, realizada em Joanesburgo, referiu-se à situação que te vive na África do Sul.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho (PSD) abordou a temática da redução temporal do serviço militar. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Lello e António José Seguro (PS), a quem deu ainda explicações, e António Filipe (PCP).
A Assembleia aprovou o voto n.º 65/VI - De protesto pela situação em que se encontra o escritor britânico Salman Rushdie (apresentado pelas Comissões de Educação, Ciência e Cultura e de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação).
Ordem do dia. - Foi aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 47/VI -Autoriza o Governo a rever o regime jurídico dos revisores oficiais de contas. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário d» Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro), os Srs. Deputados Domingues Azevedo (PS), Octávio Teixeira (PCP), António Lobo Xavier (CDS) e Carvalho Martins (PSD).
A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República a Bruxelas.
Um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos foi aprovado, denegando autorização a um Deputado para depor em tribunal.
Finalmente, foram votados, na generalidade, os projectos de lei n.º 49/VI-Altera a Lei das Associações de Defesa do Ambiente (PCP) e 265/VI - Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Os Verdes), que foram rejeitados, e o projecto de lei n.º 185/VI - Lei das Associações de Defesa do Ambiente (PSD), que foi aprovado.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 15 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PSD):
Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel dos Santos Henriques.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José António Peixoto Lima.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Sirva.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
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António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrígues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
João António Gomes Proença.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Lufe Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Lufe Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Lufe Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Juvenal Alcides da Silva Costa.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputados independentes:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 268/VI - Criação da freguesia de Guedieiros, no concelho de Tabuaço (Deputado do PS José Eduardo Reis), que baixou à 6.º Comissão, e projecto de resolução n.º 53/VI- Criação de uma comissão para a reforma do ordenamento administrativo do País (PSD).
Na última reunião plenária, foram apresentados à Mesa os requerimentos seguintes: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado António José Seguro; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e à Câmara Municipal de Cascais, formulados pelo Sr. Deputado Mário Tomé; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados João Amaral e Crisóstomo Teixeira; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Fialho Anastácio; à Secretaria de Estado da Segurança Social, formulados pela Sr.ª Deputada Apolónia Teixeira; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado José Manuel Maia; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Duarte Lima.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Freitas do Amaral, na sessão de 14 de Janeiro; Luís Sá, na sessão de 12 de Fevereiro; Macário Correia, na sessão de 28 de Fevereiro e no dia 13 de Outubro; Jerónimo de Sousa, no dia 24 de Setembro; Eurico Figueiredo, na sessão de 18 de Novembro; Leite Machado, na sessão de 9 de Dezembro; António Martinho, na sessão de 10 de Dezembro; António Filipe e Miguel Urbano Rodrigues, na sessão de 15 de Dezembro; Elisa Damião, na sessão de 5 de Janeiro; Edite Estrela, na sessão de 15 de Janeiro; Lino de Carvalho, na sessão de 19 de Janeiro; Mário Tomé, na sessão de 9 de Fevereiro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há inscrições para declarações políticas, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Lufe Capoulas Santos (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A caça, mais do que uma simples prática desportiva que mobiliza centenas de milhares de portugueses, integra uma componente cultural que não pode ser negligenciada. Por isso, e por nela interferir um conjunto de elementos aparentemente contraditórios como sejam a conciliação da absoluta necessidade de preservação das espécies e da manutenção dos equilíbrios ecológicos com um elevado número de praticantes, é uma matéria que exige tratamento ponderado.
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Nestes termos, não pode deixar de constituir autêntico escândalo nacional a situação que se vive em Portugal, que urge denunciar e combater por todos os meios legítimos disponíveis.
Consideramos oportuno fazer esta denúncia neste momento, uma vez que a época da caça encerrou no passado domingo e, face ao crescente clima de descontentamento que grassa pelo País, entendemos prudente não nos pronunciarmos antes para que não pudéssemos ser acusados de fomentar a desordem social ou ser responsabilizados por qualquer ocorrência grave, que só ainda não se verificou porque o sentido cívico dos Portugueses, neste caso dos caçadores e dos agricultores, é bem mais elevado do que muitos pretendem fazer crer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Tal não significa, porém, que um profundo descontentamento e um sentimento de grande revolta não alastre pelo País e que situações graves não possam vir a ocorrer futuramente. E isto porque o Governo, demonstrando também neste domínio a insensibilidade social que o caracteriza, tem vindo a ser cúmplice de uma situação quase generalizada de incumprimento da lei, totalmente inaceitável num Estado de direito.
A evidência dos factos e a sua ampla constatação submergem totalmente o verniz conceptual que inspira a legislação em vigor, que é teoricamente aceitável mas que a realidade desmente em absoluto.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No campo, o que se passa, com óbvias excepções honrosas, é a restauração de uma prática feudalizante do acto venatório e da apropriação indevida, por parte de poucos, dos recursos naturais que pertencem a toda a comunidade nacional e de forma especial aos agricultores.
Aplausos do PS.
A política cinegética que o PSD tem vindo a executar faz inteiramente jus ao slogan segundo o qual, para o Governo, os Portugueses são um negócio e não pessoas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A forma como o Governo tem aplicado a Lei da Caça demonstra que esta, independentemente das alterações cosméticas recentemente introduzidas, é insusceptível de cumprir os objectivos que a justificaram. Por isso, apresentaremos aqui, a curto prazo, iniciativa legislativa que elimine, pelo menos, os seus aspectos mais chocantes e permita repor a justiça e contribuir decisivamente para preservar os inestimáveis recursos cinegéticos do País, conciliando essa preservação com a prática regrada e democrática da caça.
Aplausos do PS.
O PS entende, porém, que enquanto não for alterado o quadro legal vigente, o mesmo deve ser escrupulosamente cumprido.
A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Orador: - E isso manifestamente não acontece, como é do domínio público, por maiores que sejam as tentativas para ocultar esta realidade.
Já sei que alguns dos Srs. Deputados do PSD virão já a seguir, certamente, dizer que, se assim é, aponte-se caso por caso e remeta-se o assunto para os tribunais. Ao fazerem--no, sabem perfeitamente que, aparentando tranquilizar a própria consciência, assumirão uma atitude hipócrita, porque o papel dos Deputados não é substituírem-se à polícia mas, sim, dar voz pública aos cidadãos que os elegeram quando os seus protestos são justos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Até porque, como diz o povo, «a ocasião faz o ladrão» e os que se aproveitam, neste domínio, como noutros, das condições que Inês propiciam, são suficientemente hábeis para iludir os preceitos que violam.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Nenhum criminoso declara em formulário próprio os crimes que pratica e é para prevenir e verificar o cumprimento das normas que existe o aparelho administrativo do Estado.
No caso em apreço, tal omissão não pode ser invocada por falta de meios humanos, tendo em conta a anunciada disponibilidade de alguns milhares de funcionários do Ministério da Agricultura.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Hoje, por esse país fora, ninguém tem dúvidas que uma parte significativa das reservas associativas tem sócios fictícios; que um número considerável de reservas turísticas nada tem a ver com o turismo; que as zonas de caça sociais são praticamente inexistentes; que os critérios de deferimento dos processos de constituição de reservas do regime cinegético especial não são claros, sendo voz corrente o envolvimento remunerado de técnicos da Administração na sua elaboração; que a vigilância exercida pelos guardas de caça privados, que a lei toma obrigatórios, é diminuta, porque grande parte deles exerce todas as funções menos aquela para a qual foram alegadamente contratados; que a fiscalização da Direcção-Geral das Florestas é praticamente nula, aliás, como há poucos dias admitiu implicitamente o próprio Ministro da Agricultura perante as câmaras da televisão; que o controlo das espécies abatidas legalmente exigido não existe pura e simplesmente; que foram constituídas reservas englobando propriedades cujos titulares não foram sequer informados nos termos que a lei estabelece; que, por ausência de critérios de ordenamento, povoações inteiras estão totalmente cercadas de aramados, vários quilómetros ao redor, impedindo os seus habitantes de uma prática que tem raízes ancestrais no mundo rural; que as zonas progressivamente menores submetidas ao regime geral já estão ou caminham aceleradamente para o total despovoamento cinegético, em consequência da óbvia concentração de um elevado número de praticantes que não dispõe de qualquer outra alternativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo que acaba de ser dito, o PS responsabiliza o Governo pela degradação da situação existente e pelas consequências que daí advirão.
Aplausos dos Deputados do PS Armando Vara e Maria Julieta Sampaio.
Não podemos, por isso, deixar de apelar ao bom senso e ao sentido de Estado do Sr. Primeiro-Ministro e dos responsáveis do Ministério da Agricultura para que se inverta rã-
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pidamente a situação, para que se reponha a justiça e se garanta a paz social entre todos os portugueses que elegem a prática da caça e o contacto com a natureza como a sua principal actividade lúdica.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados Antunes da Silva e André Martins inscreveram-se para pedir esclarecimentos.
Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, não vou usar da palavra para dizer que remetemos o assunto para os tribunais. Fique descansado!
No início da sua intervenção, quando falou na conservação das espécies e na defesa do ambiente, fiquei satisfeito e admiti mesmo que tivesse de o elogiar por trazer aqui um assunto que, analisado por essa óptica, seria muito interessante debater nesta Casa. Pensei que o Sr. Deputado trazia aqui a Lei da Caça como uma forma ou um instrumento de conservação das espécies e de defesa do ambiente, mas lamento dizer-lhe que não o fez e caiu, de facto, numa série de contradições.
Desde logo, o Sr. Deputado referiu algumas situações de descontentamento, e sou capaz de corroborar o que disse, mas não soube esclarecer as razões desse descontentamento e procurou atribuí-las ao actual quadro legislativo no âmbito cinegético. Assim, a primeira pergunta que lhe coloco é a seguinte: essas situações de descontentamento devem-se ao quadro legislativo vigente ou, como o Sr. Deputado reconheceu, devem-se à falta de civismo de alguns praticantes da caça?
A segunda grande contradição em que o Sr. Deputado se deixou cair, deliberadamente ou não, tem ainda a ver com o quadro legislativo. A determinada altura, o Sr. Deputado disse que a legislação é «teoricamente aceitável» - foi esta a sua expressão-, mas um pouco mais adiante disse que ela tinha de ser alterada radicalmente e que o PS iria tomar medidas nesse sentido. A seguir, o Sr. Deputado fez outra afirmação: a de que os recursos cinegéticos pertencem a todos.
Em face destas afirmações, pergunto ao Sr. Deputado: qual é o principio que defende para dar forma ou corpo à Lei da Caça? E o princípio do rés nullius ou o que se lhe contrapõe, no sentido de que se trata de um bem escasso, mas tem de haver alguma ligação à terra, pois sem isso não haverá forma nem de preservar as espécies nem de preservar o ambiente, ao qual acrescem os problemas de civismo, de educação e de informação dos praticantes da caça que referiu, e com os quais concordo.
São estas as duas questões que lhe coloco, Sr. Deputado. Repito: o que é que está mal, em seu entender? É o quadro legislativo vigente ou é a falta de civismo das pessoas que praticam o acto cinegético? Diga-me concretamente qual o princípio que na sua opinião e na opinião do seu partido deve enformar a lei geral da caça?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos deseja responder já ou no fim?
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.
O Sr. Lufe Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antunes da Silva, as questões que colocou surpreenderam-me, porque supunha que ia pedir-me que demonstrasse as acusações que fiz sobre o generalizado incumprimento da lei, de que o Governo e o Ministério da Agricultura são os principais responsáveis, ou que ia contestá-las.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado.
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Deputado, é evidente que isso escapou-me na minha intervenção, mas também reconheço algumas insuficiências em termos de fiscalização.
Portanto, obrigado por me ter permitido esta interrupção só para lhe dizer que estou consigo nessa afirmação sobre a insuficiência.
O Orador: - Então não está com o seu Governo, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Deputado, posso continuar?
O Orador: - O Sr. Deputado colocou a questão de saber se discordo do quadro legislativo vigente ou da forma como ele está a ser cumprido. Sr. Deputado, a denúncia que aqui fiz foi a de que, neste momento, e enquanto este quadro vigorar, deve ser escrupulosamente cumprido e manifestamente não o é.
Obviamente que a legislação em vigor tem muitas imperfeições, que carecem de ser corrigidas, e tem, sobretudo, permitido que o seu incumprimento se tenha manifestado da maneira escandalosa como tem ocorrido.
Por essa razão, o conceito que temos de caça não nos leva a considerá-la como uma rés nullís, como é óbvio, nem como propriedade privada dos «senhores da terra». Tal como disse na minha intervenção, pensamos que é possível conciliar as duas coisas: a preservação das espécies com a prática regrada (e sublinho regrada) e democrática (e sublinho, também duas vezes, democrática) da caça.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, em primeiro lugar - e é, sobretudo, por isso que utilizo este pouco tempo de que disponho-, queria saudá-lo por ter feito esta intervenção e pela oportunidade da mesma, dado que o que se passa, em Portugal em termos da delapidação de recursos cinegéticos é uma vergonha para este país.
O Sr. Vasco Miguel (PSD): - É mentira!
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O Orador: - É em primeiro lugar, é uma vergonha para este Governo, uma vez que o principal responsável, no Governo, pela salvaguarda e pela defesa dos recursos cinegéticos é que anda a licenciar coutadas para exploração de espécies em regiões do País, já estão consignadas à salvaguarda de recursos de espécies de interesse nacional e internacional - como é o caso do Tejo internacional - e onde, inclusivamente, há investimentos nacionais e internacionais de associações de defesa do ambiente. Mas, de facto, é o Sr. Secretário de Estado da Agricultura que licencia a concessão da exploração cinegética naquela mesma região.
Ora, perguntamos: que política de ambiente, que política de defesa dos interesses nacionais, que política de defesa dos recursos naturais é esta, num país em que tanta propaganda se faz sobre o ambiente e onde tantos atropelos se fazem ao interesse nacional?
Sempre contestámos esta legislação relativamente à caça, à exploração da caça e à forma como ela é feita, porque, logo à partida, sabíamos que ia ter este resultado. Com efeito, numa primeira fase, os caçadores foram levados a acreditar nas propostas contidas na lei, mas o que se verifica, hoje, é que está em vias de extinção um maior número de espécies que eram abundantes no nosso país.
Por outro lado, verifica-se ainda que mais proprietários de terra vêem, de um dia para o outro e sem saberem porquê, a sua propriedade aramada, sem que tenham, sequer, a possibilidade de poder caçar no seu próprio terreno, e constatam o incumprimento daquilo que a própria legislação consagra, ou seja, a existência de espaços e de corredores entre as reservas concedidas. É isto que acontece, designadamente, no Alentejo e na Beira, onde os corredores previstos na Lei da Caça não são respeitados pelo Governo e pela Administração.
Finalmente, Sr. Deputado - e já que anunciou uma medida legislativa-, não posso deixar de aproveitar esta oportunidade para lhe perguntar que interesses é que há para salvaguardar? Os interesses dos caçadores e daqueles que, em grande parte, são os principais defensores e até sensibilizadores da opinião pública dos Portugueses para a importância da defesa dos equilíbrios ecológicos, ou os grandes interesses que sobrepõem os lucros à defesa dos recursos naturais e do interesse nacional?
O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.
O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, penso que foi oportuno falar sobre este tema, mas parece-me que V. Ex.ª se excedeu em populismo e demagogia.
Se, porventura, sentimos que algo não está a ser completamente cumprido, isso só vem de encontro ao que manifestámos, na altura em que a Lei da Caça foi aprovada, nesta sede, com os votos favoráveis do Partido Socialista. De facto, o nosso projecto não foi aprovado com base naquilo que o senhor referiu na sua intervenção, e por isso critico-o de demagógico, isto é, que a caça não deve ser património nacional, mas deve-se equacionar uma forma híbrida, intermédia, pois a caça deve ser ao mesmo tempo património cinegético nacional e também dos agricultores. Ora, Sr. Deputado, esta fórmula só não constitui lei, neste momento, porque o Partido Socialista, na altura, se opôs.
Com efeito, participei na elaboração da Lei da Caça, desde o primeiro momento, e posso dizer que ela não consagra que a caça é património dos agricultores, porque o Partido
Socialista se opôs, aliás, como se opôs a que muitas outras coisas fossem consideradas nessa lei, devido ao complexo de esquerda que tinha na altura. E posso só citar um exemplo: por que é que as zonas associativas não se chamam coutos? Durante várias reuniões discutimos se haviam de ser chamadas de coutos ou de zonas, pois, na altura, o Partido Socialista tinha um complexo de esquerda, que agora parece já não ter.
O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos disse muitas verdades, mas também muitas inverdades. Verdades quando referiu que há zonas do nosso país que estão integradas nas zonas de aptidão cinegética, onde um caçador, que não queira aderir a uma zona associativa ou que não tenha terrenos próprios, sente dificuldade em encontrar uma zona liberta para caçar. Estou de acordo com esta afirmação, porque penso que se deveria ter accionado, desde início, o mecanismo dos intervalos ou dos corredores. Ora, este mecanismo não foi accionado e também não está consagrado na lei. E, a este propósito, quero dizer que o que o Sr. Deputado André Martins aqui disse não tem nada a ver com isto. De facto, não disse nada de jeito, e já vou explicar porquê!
Mas, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, chamo a sua atenção para o facto de este processo das zonas associativas ser recente e os guardas não estarem formados para desempenhar estas novas funções. Embora a formação esteja a ser lenta, penso que estão a cumprir a missão que lhes está destinada.
Por outro lado, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que há muito mais caça, no nosso país, e até mesmo algumas espécies que já, há muito anos, não se viam. Posso citar-lhe o caso concreto das aves de rapina- e há um colega da sua bancada que pode confirmá-lo -, que não existiam no Oeste, porque não existia caça, e hoje, infelizmente, podemos ver inúmeras aves de rapina a sobrevoar o Oeste. Só quem não sabe nada disto nem visita o que devia visitar é que pode dizer o contrário.
Por outro lado, há que realçar o esforço que tem sido feito pelas direcções das' zonas associativas no sentido de injectar inúmeras espécies no terreno. Seguramente, e para não falhar, penso que 20 % das zonas associativas tem perdizes a reproduzirem-se em cativeiro para injectar no terreno. E mais de 20 % de todas essas zonas associativas têm sede própria, onde é feita formação aos seus sócios.
É evidente que todo este processo é novo, houve uma adulteração que foi provocada, e o senhor também concorda contigo nesse aspecto, mas não havia qualquer legislação sobre a caça até ao momento de aparecer esta.
E, já agora, gostaria de fazer-lhe também uma pergunta importante. O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos é caçador?
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Não!
O Orador: - Ah! Não é caçador! Então perdoo-lhe muita coisa do que disse. Se calhar, o senhor veio aqui a recado de alguém que não tem exactamente a noção da caça.
Sou caçador e sócio de umas das primeiras zonas associativas - tenho honra nisso - e pergunto-lhe se sabe qual é exactamente o sentimento que existe acerca dessas zonas. De facto, ele é absolutamente contrário àquele que o senhor exprimiu daquela tribuna, que até dá a noção que ninguém quer zonas associativas neste país.
Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, a caça tem de passar a ser dos agricultores e a constituir um valor acrescentado ao dono da terra. Isto é um ponto assente e nós concordamos. Tenham agora a coragem que da outra vez não tiveram! Até porque as zonas associativas têm sido benéfi-
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cãs para o património cinegético nacional. Eu concordo, o senhor discorda, mas não apresentou as razões porque discorda.
Por último, Sr. Deputado, um ponto que lhe é favorável: vamos assumir com coragem os corredores, porque me parece que, neste momento, é a única carência que necessita de ser implementada Mas tenha em atenção o que existe e o que pode existir no futuro.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por responder ao Sr. Deputado Vasco Miguel, dizendo-lhe que o facto de não ser caçador me dá, obviamente, muito mais legitimidade para defender os interesses que aqui defendi.
Por outro lado, surpreende-me que, tendo eu feito uma extensa lista, um extenso libelo acusatório ao Governo, com gravíssimas acusações de incumprimento da lei, tenha V. Ex.ª vindo dizer-me em resposta a isso que, afinal, o que acontece é que aves de rapina sobrevoam o Oeste! Pergunto-lhe se sobrevoam, por acaso, Torres Vedras!?
Risos do PS.
V. Ex.ª acusou-me de populismo e de demagogia e terminou dizendo que concordava com quase tudo o que eu tinha dito. O que quero dizer-lhe - e espero que o País nos oiça- é que isso é a demonstração inequívoca do embaraço que, neste momento, atravessa a bancada do PSD ao ser confrontada com gravíssimas acusações que o País inteiro faz. E eu assumo inteira responsabilidade pelas afirmações que produzi, porque entendo que o papel do Deputado é o de trazer aqui os justos protestos daqueles que nos elegeram.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado André Martins, quero ainda agradecer as palavras amáveis que V. Ex.ª me dirigiu ao considerar oportuna esta intervenção e, relativamente às questões que colocou, devo dizer que concordo com a generalidade delas porque apenas vieram corroborar muitas das minhas próprias afirmações.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Deputado Vasco Miguel, V. Ex.ª manifesta alguma dificuldade quando expressa as muitas dúvidas que tem quanto à realidade que afecta este país. Neste caso, quando se refere ao aumento da quantidade de aves de rapina como um dos exemplos que justificam a actual Lei da Caça, gostava de lhe dizer que a inventariação das aves de rapina existentes em Portugal e dos predadores naturais que também existiam em Portugal mostra que o seu número diminuiu significativamente. Dentro de algum tempo teremos oportunidade de lhe facultar os dados reais mas, neste momento, posso garantir-lhe já que diminuíram significativamente.
E diminuíram significativamente porque esta lei e quem devia administrá-la, pelo menos de acordo com o que está estipulado, deveria impedir que se destruíssem os predadores naturais - no entanto, é isso o que tem vindo a acontecer.
A actividade da caça é também uma forma - entendêmo-lo nós - de estabelecer o equilíbrio das espécies. Naturalmente que o Sr. Deputado tem alguma dificuldade em compreender isto, mas nós defendemos os caçadores como interventores num meio em que é necessário restabelecer os equilíbrios. V. Ex.ª não, nem o seu Governo, nem quem fez esta lei! Entendem os caçadores como uma fornia de sobrepor os interesses individuais, ou, muitas vezes, as frustrações de andar aos «tirinhos» só por andar, ao interesse nacional.
De facto, é verdade - e todos os relatórios o demonstram - que as condições que existem em Portugal para o desenvolvimento de determinado tipo de espécies são as melhores; no entanto, verificamos que, com esta lei, tudo vai sendo destruído e não há, da parte do Estado, nenhuma responsabilidade nem investimento necessário para que se diversifiquem as espécies em quantidade, de forma a manter os equilíbrios que são necessários para que não haja extinção de espécies, tal como está a acontecer.
É isto o que se passa. E para que não fiquem dúvidas sobre aquilo que eu disse, repito: o Sr. Secretário de Estado da Agricultura anda a fazer concessões de licenças para exploração da actividade cinegética em áreas que já são contempladas pela Comunidade e por entidades do Governo, em determinadas áreas nacionais como seja o Tejo internacional. É isto que deve dizer se é verdade ou não, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.
O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Deputado André Martins, começo por uma das últimas frases que proferiu: «tudo o que vai sendo destruído».
Sr. Deputado, tudo o que destruíram nós estamos a construir. Com alguns erros, certamente, já o admiti há pouco.
Protestos do PS e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Com arame farpado?
O Orador: - Sr. Deputado Mário Tomé, a sua democracia é essa? Não deixar as outras pessoas falarem?
O Sr. Mário Tomé (Indep): - Não se pode falar? Não se podem fazer apartes aqui, na Casa de José Estevão?
O Orador: - Eu conheço-o bem, Sr. Deputado! Ainda andei a seu mando!
Sr. Deputado André Martins, penso que está mal informado. Falo pelas pessoas que me elegeram: no Oeste, nada do que aqui foi dito se passa. Nada, Sr. Deputado! Existem espécies, os tais predadores naturais ... - estou a falar com honestidade agora! Tenho de dizer isto porque, senão, julgam que estou a fazer demagogia, e não estou! Estou a dizer isto sinceramente! Existem espécies como o texugo ou a raposa que eu nunca tinha visto em áreas de vinhedo como é a minha e que, nesta altura, se vêem frequentemente. E as aves de rapina também não as via e agora existem muitas! Creia que não existem predadores naturais nem aves de rapina (que também são predadores naturais), se não existir caça!
Sr. Deputado, tem sido feito um esforço, e os caçadores não são nenhuns chacinadores! Eu também não sou nenhum chacinador caço três ou quatro vezes durante toda a época de caça para me divertir, porque é saudável caminhar - quando erro, errei, não fico nada «chateado» com isso! Para
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mim, a caça é um desporto e penso que contribuo da melhor maneira para o tal equilíbrio. V. Ex.ª não pode tomar todos os caçadores por chacinadores porque não o somos! Falo por mim e estou a trazer aqui um caso concreto: para além de ser um indivíduo que conhece a região, que anda na região, que tem contactos directos, sou também um praticante da caça. Portanto, não posso admitir certas coisas que aqui foram ditas.
Sr. Deputado André Martins, volte um dia destes a falar nesta sede sobre o tema agora abordado, mas venha melhor informado porque, desta vez, creia, deu a noção de nada saber sobre este assunto.
Já agora, aproveito ainda para responder ao Sr. Deputado Luís Capoulas Santos acerca das pessoas que nos elegeram.
Sr. Deputado, compreendo a sua preocupação em trazer aqui esta matéria, porque a sua intervenção tem a ver com anseios de uma pequena faixa do eleitorado que o elegeu, mas aquilo que eu disse aqui, e assumo, foi em nome da totalidade da franja que me elegeu para Deputado.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Delmar Palas.
O Sr. Delmar Palas (PSD): - Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: Ao eleger a agricultura transmontana como tema central da minha intervenção, pretendo apenas dar um contributo positivo para a análise da situação no actual quadro da reforma da PAC, fazer um diagnóstico da situação e ajudar na reflexão e procura das soluções que melhor sirvam à região e às gentes que a ela se dedicam.
A agricultura comunitária passa, no momento, por transformações profundas com reflexos mais evidentes, pela negativa, em regiões de estruturas mais débeis. Entre estas, insere-se a região de Trás-os-Montes e Alto Douro onde cerca de metade da população activa continua no sector primário e apenas contribui com cerca de 20 % para o produto regional. Os mecanismos comunitários criados com o objectivo de promover o desenvolvimento só poderão conduzir à prossecução dos seus fins, nesta região, se acompanhados de uma política objectiva que contrarie a debilidade e a desertificação humana. Teremos de saber aproveitar os instrumentos contemplados no Tratado da União Europeia, nomeadamente o Fundo de Coesão, para contrariar o actual cenário.
É neste contexto que o novo Quadro Comunitário de Apoio poderá contribuir para uma profunda alteração do processo de desenvolvimento regional, cujos resultados dependerão, naturalmente, dos meios empregues e da forma de abordagem desse mesmo desenvolvimento. Assim, o desenvolvimento desta região, onde o peso do sector primário continua muito elevado, deverá ser encarado globalmente numa perspectiva de promoção do mundo rural, abrangendo todas as áreas e atendendo à preservação da sua identidade cultural e histórica.
Sr. Presidente, Srª e Srs. Deputados: Trás-os-Montes caracteriza-se por uma grande diversidade de condições ambientais ditadas pela extrema variabilidade das condições de relevo, de clima e de solos. Esta diversidade traduz-se numa grande heterogeneidade de sistemas agrários e num forte potencial de produtos de qualidade. A região constitui-se, assim, num vasto reservatório natural que urge preservar e desenvolver valorizando. No panorama agrário regional predominam as pequenas explorações familiares que, de um modo geral, praticam uma agricultura tradicional enquadrada por condições naturais que, se, por um lado, impõem fortes condicionantes à intensificação e concentração de produtos indiferenciados, favorecem, em contrapartida, a obtenção de uma vasta gama de produtos personalizados e de qualidade.
Este quadro, caracterizado, fundamentalmente, pela prática de uma agricultura extensiva, desenvolvida em nichos ecológicos diferenciados e com fracos recursos a factores importados e ou poluentes, tem facultado a salvaguarda dos equilíbrios biológicos e a manutenção de uma grande diversidade vegetal e animal que é imperioso preservar. É, também, por este facto que, dadas as limitações impostas pelas condições naturais adversas e pelas estruturas agrícolas predominantes, bem como pela reduzida oferta de emprego noutros sectores de actividade, se tem vindo a acelerar o processo de desertificação rural. Para obviar a estas situações, é indispensável concentrar esforços e apoios que facultem a implementação de medidas capazes de promoverem uma maior diversificação da economia e a manutenção de um satisfatório tecido rural, e que privilegiem a preservação dos recursos naturais e a obtenção de produtos de qualidade «natural» capazes de obter vantagens comparativas.
Neste contexto, é primordial para a região ter em conta o papel multifuncional da agricultura, o que implica encarar as explorações agrícolas não só como integradoras de actividades e rendimentos, mas também como entidades insubstituíveis na preservação do espaço, dos recursos naturais e na protecção do ambiente. Nesta perspectiva, é indubitável que a modernização agrícola, baseada numa estabilidade compatível com as condicionantes ecológicas e sócio-económicas do espaço regional e, portanto, satisfatoriamente integrada em sistemas de agricultura adequados para esse mesmo espaço, está inequivocamente dependente de um conjunto de medidas sócio-estruturais.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Para dar consistência aos pressupostos enunciados, julgo dever ser necessário, numa perspectiva de futuras ajudas comunitárias, ter em conta as seguintes particularidades da agricultura da região: primeiro - extensificação das produções vegetais e manutenção dos regimes existentes, de que me permito destacar os cereais praganosos, a produção forrageira em prados permanentes naturais (lameiros/baldios), os amendoais extensivos de sequeiro, o olival em áreas de difícil mecanização, em especial o olival em muretes, e a manutenção de socalcos na vinha da Região Demarcada do Douro. O apoio a estas actividades agrícolas justifica-se por constituírem um importante factor de equilíbrio ambiental, favorecerem a manutenção das populações rurais e não terem alternativa viável.
Segunda particularidade: apoio à manutenção de raças autóctones e respectivas associações, nomeadamente as raças bovinas barrosã, maronesa e mirandesa, e as raças ovinas churra badana, churra da terra quente, galegas, bragançana e mirandesa. A importância deste apoio reside no grande valor patrimonial das nossas raças autóctones e na manutenção de sistemas produtivos de zonas desfavorecidas.
Terceira: preservação de povoamentos de espécies arbóreas e arbustivas autóctones, não só por constituírem parte integrante do património paisagístico e genético da região, como ainda por contribuírem para minorar os problemas de degradação física em condições topográficas difíceis.
Quarta: apoio à manutenção de terras agrícolas inseridas em espaços florestais, a fim de salvaguardar uma adequada defesa contra incêndios. Esta manutenção é de importância vital à preservação do ecossistema e da floresta.
Quinta: melhoria das condições de transformação e comercialização de produtos agro-pecuários, proporcionando
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aos agricultores preços mais justos e regulares à sua produção. Destes, permito-me destacar o azeite, o vinho, a castanha, a cereja, a maçã, a batata e a salsicharia tradicional.
Sexta: criação de estruturas de certificação. Estas só poderão funcionar devidamente se os produtores se organizarem. A modernização agrícola está inequivocamente dependente do fortalecimento do movimento associativo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sem pretender ter sido exaustivo, achei oportuno reflectir sobre este tema, não só por se enquadrar na filosofia da nova PAC, mas sobretudo por ser minha convicção que o futuro agrícola da região transmontana e a melhoria de vida das suas populações rurais passam pelos princípios enunciados.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Delmar Palas, passados 15 dias sobre a grave crise que se manifestou na região do norte de Trás-os-Montes, zona em que o Sr. Deputado reside, era urgente e imprescindível que nesta Câmara se fizesse eco, como acabou de acontecer, das preocupações dos agricultores da sua e minha região. Congratulo-me com esse facto.
Aproveito a oportunidade para transmitir à Câmara algumas das preocupações que o então Deputado Chaves Medeiros, que me substituiu nesse período, queria submeter à consideração desta Assembleia, mas que questões regimentais relacionadas com a dita reforma do Parlamento não possibilitaram.
É um facto, Sr. Deputado Delmar Palas, que posso concordar com o seu diagnóstico. É um facto, por outro lado, que o Sr. Deputado integra uma bancada que constitui maioria, saída de eleições, mas também é um facto que essa bancada aprovou um Programa do Governo que, na área da agricultura, tem servido única e exclusivamente para prejudicar os agricultores transmontanos, concretamente os da área de montanha. Esse é um facto que ninguém pode recusar.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A nova PAC, que foi negociada com tanto estardalhaço e anunciada ao País pelo Sr. Ministro da Agricultura, é uma ofensa às regiões de montanha, aos agricultores transmontanos. As suas consequências estão à vista, com as manifestações na cidade de Chaves e o corte da estrada de Vila Verde da Raia.
O Sr. Rui Carp (PSD): - E a deitarem fora a batata?!... É uma vergonha!
O Orador: - Se não vejamos. É um facto que cerca de metade da população transmontana vive da agricultura e que se os problemas agrícolas de Trás-os-Montes e dessas zonas debilitadas não forem resolvidos atingiremos uma situação de fome. É ainda um facto que a política agrícola deste governo levou a que a batata apodreça nos armazéns; se degrade constantemente o preço do vinho, do leite, da carne e dos produtos hortícolas; os factores de produção continuem a crescer, os produtores de gado não recebam atempadamente aquilo a que tem direito quando é abatido algum gado através dos agrupamentos de defesa sanitária; os recursos financeiros postos à disposição de Portugal pela Comunidade se esvaiam e desapareçam; a resposta que os agricultores transmontanos do Alto Tâmega obtiveram quando propuseram ao Governo um apoio pontual para o corrente ano, no que se refere à batata, tenha sido a de que não «há nada para ninguém». E, no entanto, «há batota na batata».
Não considera o Sr. Deputado que assiste aos agricultores transmontanos o direito de exigirem para eles algo do que é distribuído pelos restantes agricultores de Portugal, os ditos empresários da agricultura? Conhece as diligências do Governo Português para colmatar estas falhas nas negociações da PAC, que tanto prejudicam os agricultores transmontanos? Conhece o Sr. Deputado as negociações da OCM da batata, que, pelos vistos, irá ser, por desleixo do nosso Governo, uma OCM para privilegiar os produtores de batata da Holanda?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Delmar Palas.
O Sr. Delmar Palas (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, retribuo-lhe desde já as palavras que inicialmente me dirigiu relativamente à intervenção por mim proferida.
Permita-me, todavia, que discorde de muitos dos aspectos que mencionou, nomeadamente na introdução que fez às perguntas que só no fim do pedido de esclarecimento, e muito rapidamente, foram suscitadas.
Quero combater aqui uma ideia que foi afirmada na televisão por um camarada seu que o substituiu há 15 dias no exercício do seu mandato, mas que quer eu, como transmontano, quer, segundo creio, os Transmontanos em geral têm de repudiar. A ideia de fome em Trás-os-Montes só reflecte efectivamente o discurso miserabilista do PS em todas as áreas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que falar de fome em Trás-os-Montes neste momento é despropositado e até ofensivo. Os Transmontanos são pessoas que não estão habituadas a sobreviver apenas através dos subsídios mas, sim, pessoas habituadas ao trabalho. Penso, nessa perspectiva, que é uma ofensa dizer que em Trás-os-Montes se passa fome.
Aplausos do PSD.
O grande problema que aqui se colocou e ultimamente tem sido ventilado nos meios de comunicação social de forma mais evidente é o da batata. O Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, que o problema da batata reside fundamentalmente em três estrangulamentos existentes: o armazenamento, o escoamento e a comercialização.
Sabe muito bem que o da comercialização, que constitui o grande estrangulamento com que a batata se depara na região do Alto Tâmega, reside essencialmente no facto de o agricultor, por si só, não ter condições, nem técnicas nem financeiras, para proceder ao armazenamento.
Sabe ainda que, nesse contexto, cabe um papel importantíssimo às cooperativas e aos dirigentes associativos, que, em vez de irem para a frente de manifestações para, de uma forma demagógica, virem requerer subsídios ao Governo, deveriam informar, apoiar e criar condições para que os agricultores de Chaves, nomeadamente os produtores de batata, tenham acesso aos subsídios que o Governo colocou à disposição desses produtores de batata.
O Sr. Deputado não desconhece certamente que no ano de 1992 foram colocados à disposição dos agricultores, com vista à comercialização de produtos agrícolas, fundos estru-
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tarais provenientes da CEE no montante de 56,7 milhões de contos. Pergunto: o Alto Tâmega candidatou-se a tais fundos?
Sabe o Sr. Deputado, por último, que, por via de uma portaria de 17 de Agosto, foram colocados pelo Governo à disposição dos agricultores 150 OOO contos destinados a apoio ao armazenamento. Pergunto: o que fez o Alto Tâmega?
Os seus dirigentes associativos, em vez de se preocuparem em criar essas condições para os agricultores, andam apenas preocupados em reinvindicar junto do Governo, no momento em que os problemas se colocam, as medidas que, no fundo, são mais fáceis de ser aproveitadas em termos políticos.
O Sr. Fernando Pereira (PSD): - É folclore!
O Orador: - Não estive na frente - francamente lho digo-, mas andei preocupado, junto das instâncias onde os problemas se podem resolver, em tentar solucionar tais problemas.
Aproveito para o informar- se já não o sabe, ficará a sabê-lo agora - de que irá ser publicada ainda esta semana, se é que não o foi já, uma portaria que contempla precisamente alguns dos aspectos que aqui foram focados, nomeadamente na perspectiva do apoio à agricultura.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao próximo orador inscrito, quero cumprimentar, em nome da Assembleia, os jovens que se encontram nas galerias a assistir à sessão. Trata-se de grupos de alunos das Escolas Secundárias de Silves, Cascais, Anadia e Vila do Conde e da Escola Primária de Vila Nova de Santo André.
Encontra-se também presente um outro grupo, não tão jovem, da Associação de Auditores de Defesa Nacional.
Aos mais jovens e aos menos jovens fica a saudação da Câmara.
Aplausos gerais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Visitar a África do Sul neste ano de 1993 é uma estranha corrida través de um mundo de surpresas encadeadas. Fiz essa experiência em Fevereiro, durante duas semanas, integrando um grupo de Deputados da Assembleia da República.
A convite do Ministério dos Negócios Estrangeiros daquele país estivemos nas principais cidades; falámos com destacados dirigentes de todas as forças políticas significantes e com personalidades representativas dos mais diferentes sectores da vida económica e cultural, desde o governador do Banco Central a dirigentes sindicais do Cosatu, com professores universitários, artistas, lutadores pelos direitos humanos, diplomatas e parlamentares, homens de negócios e humanistas de prestígio.
Este leque, heterogéneo, abrangeu o Ministro Pik Bolha, o chefe zulu Buthelezi, do Inkhatta, combatentes históricos do ANC e do Partido Comunista da África do Sul, que passaram grande parte da vida nas prisões por não abdicarem da luta pela liberdade e pela democracia. Conversámos, inclusive, com racistas fanáticos que até nas meias exibiam pistolas- além da cintura! Foi uma visita fascinante.
Srs. Deputados, pretendo aflorar aqui somente algumas questões, inseparáveis de grandes mudanças sociais em perspectiva, que fazem neste momento da África do Sul um laboratório único, no qual a humanidade tem os olhos postos - uma terra onde o sentido, a amplitude e o significado de transformações, por ora nevoentas, podem vir a ter um peso decisivo para o futuro não apenas da África Austral mas de todo o continente.
Srs. Deputados, todos sabemos que na África do Sul se implantou, cresceu e assumiu características monstruosas um sistema político, económico e social que assentava no apartheid, ou seja, numa ideologia racista que hierarquizava os homens de acordo com a origem étnica e a cor da pele.
São conhecidos e trágicos os efeitos dessa aberração. A república de senhores e servos isolou-se não apenas do continente africano, mas do conjunto da humanidade.
O paraíso anunciado, que tinha por inspiradores os pioneiros míticos da intolerância calvinista, emergiu na África Austral como um inferno social incompatível com a dignidade da condição humana. Pertence à República da África do Sul o recorde de violência no planeta: 53 assassínios diários. A miséria, a ignorância e a doença alastram nas townships que envolvem belas cidades, criadas para tomar os brancos mais ricos, mais egoístas e mais distantes. Sete milhões de desempregados confirmaram também, no terreno económico, a derrota do projecto cruel e irracional de separação dos homens por raças.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O apartheid, felizmente, agoniza. Desconhecemos ainda o amanhã, mas o sistema está no fim. O partido que o impôs e quase o erigiu em religião reconhece hoje não somente o fracasso e a injustiça do projecto, mas a sua inviabilidade social e económica, A luta dos oprimidos e a pressão internacional forçaram-no a isso.
Em encontros com altas personalidades oficiais ligadas ao governo da minoria ouvi sobre o processo de mudança comentários que convergiam para uma mesma conclusão. A esmagadora maioria dos sul-africanos brancos já se habituou à ideia de que o próximo presidente do país será Nelson Mandela se o ANC vencer as próximas eleições, o que é tido por inevitável.
A naturalidade com que se encara a entrega das insígnias do poder - o que não implica a entrega do poder real - a um negro, um grande revolucionário e humanista que passou no cárcere 27 anos, precisamente por recusar o apartheid e lutar por uma sociedade não racista com igualdade de direitos para os homens de todas as etnias - essa aceitação tardia da democracia racial como projecto ilumina o difícil, longo e espinhoso caminho percorrido através de inenarráveis sofrimentos pela maioria no seu combate contra o sistema.
A regra uma pessoa um voto, finalmente, passou a ser encarada como opção natural e até como factor de estabilidade social por aqueles que há meia dúzia de anos puniam ainda severamente o menor desafio às leis segregacionistas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Participei, como representante do PCP, na Conferência de Solidariedade Internacional que se realizou em Joanesburgo, de 19 a 21 de Fevereiro. Estive ali com centenas de democratas de mais de 66 países para levar ao ANC, em nome dos comunistas portugueses, palavras de apoio, de confiança e de admiração.
Elas são mais do que justificadas pela luta exemplar e heróica travada por milhões de sul-africanos, sob a direcção do ANC, para que na África do Sul, banido o racismo sob todas as suas formas, sejam criadas, finalmente, condições para que negros, brancos, mestiços, indianos possam viver em democracia, enterrando um sistema odioso ideado pelos descendentes dos primitivos colonos vindos da Europa com o holandês Jan Van Riebeeck.
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Seria uma ingenuidade acreditar que os grandes problemas já foram resolvidos. Longe disso! A tarefa da democratização da África do Sul está apenas no início. A atmosfera de desordem internacional que intoxica a humanidade neste final do século XX favorece e até estimula a acção de poderosas forças que, na África do Sul e fora dela, continuam a fazer o que está ao seu alcance para sabotar o processo negocial entre o ANC, o Governo e outros partidos e organizações.
Persistem, aliás, diferenças importantes entre as posições sustentadas pelo ANC e as propostas do Partido Nacional. Pessoalmente creio, porém, que o espírito de confiança que tem dominado o discurso e a acção dos dirigentes da aliança ANC-SACP-Cosatu mergulha bem fundo as suas raízes na terra martirizada de Tambo, Sisuli e Mandela.
Espero que 1993 seja um ano decisivo e de viragem para o povo da África do Sul. Sem concessões ao romantismo, sem rancores, batendo-se com tenacidade por cada reivindicação justa, os dirigentes do ANC - o movimento de massas é a sua grande força- estão, dia após dia, a fazer o possível para que uma eleição justa e livre abra as portas a uma assembleia constituinte democrática e à instalação de um governo provisório de unidade nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naquela manhã, em 20 de Fevereiro, quando Nelson Mandela entrou no pavilhão da Conferência de Solidariedade, em Joanesburgo, e se dirigiu aos convidados estrangeiros e aos seus compatriotas, todos os que lhe ouvimos as palavras compreendemos que aquele homem, fisicamente frágil, mas sustentado por uma vontade de aço e uma firmeza de princípios inquebrantável, expressava o que sentia. A África do Sul encontra-se no limiar de grandes mudanças - o que aumenta as responsabilidades de quantos ali se batem pela humanização da vida.
A esperança e a tragédia entrelaçam-se no quotidiano de maneira tão complexa no grande, rico e atormentado país que, enquanto a Conferência decorria, foi divulgada uma resolução do ANC sobre Angola, aprovada na reunião da sua Comissão Executiva Nacional. Nela se responsabilizava totalmente a UNITA pela guerra criminosa desencadeada após a sua derrota nas eleições de Setembro.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Muito bem!
O Orador: - O ANC apela ao Governo da África do Sul para que não permita a utilização do território para iniciativas de apoio à UNITA - como tem acontecido.
Transcorridos três dias, o Partido Comunista da África do Sul manifestava numa resolução o temor de que Jonas Savimbi estivesse no Transval e pedia uma explicação clara a respeito de voos regulares de apoio à UNITA, organizados com a assistência técnica das Forcas Armadas sul-africanas. A resposta de Pretória esteve longe de ser clarificadora; não veio dissipar o receio de que o envolvimento sul-africano em Angola continue a ser uma perigosa realidade.
Não podemos, como portugueses, ser indiferentes a essa situação.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gravíssima e a intolerável situação de desafio ao direito internacional criada pelo comportamento criminoso - repito a palavra criminoso - do presidente da UNITA é acompanhada com apreensão crescente, uma apreensão que roça pela angústia, por aqueles que na África do Sul estão empenhados em lançar os alicerces de uma sociedade democrática, livre de todas as sequelas do racismo.
Os sul-africanos lúcidos estão conscientes de que existe uma relação íntima a ligar a história que está a ser construída em ambos os países. O futuro da África do Sul será influenciado pelo desfecho da crise angolana. A inversa é ainda mais evidente: o futuro de Angola será condicionado decisivamente pelo êxito ou peto malogro do projecto de mudança que, a concretizar-se, fará de 30 milhões de negros sul-africanos, finalmente, sujeito da história da sua pátria.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vieram esta semana a público algumas notícias referentes à nova Lei do Serviço Militar e à possibilidade de neste primeiro ano, subsequente ao regime de transição de dois anos, para adequar a estrutura das Forcas Armadas a um tempo de prestação do serviço militar de quatro meses, se prever o seu prolongamento para oito meses.
Naturalmente, desculpar-me-ão que faça, desde já, duas notas introdutórias.
A primeira é a de que esta Lei do Serviço Militar, aprovada há dois anos na Assembleia da República, foi proposta pelo PSD - motivo de empenhamento eleitoral antes das últimas eleições legislativas - e, naturalmente, acolhida com muito entusiasmo e prudência pelos jovens portugueses.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com entusiasmo porque esperamos, há longos anos, ver as Forcas Armadas portuguesas transformadas num corpo profissional, com um serviço de voluntariado; com prudência porque as Forcas Armadas constituem também uma estrutura pesada que não se modifica nem se altera em dois dias.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A segunda nota é a de que a própria JSD se empenhou, desde sempre, para que se criassem condições para um sistema de voluntariado. Daí que, aquando da apresentação da lei na Assembleia da República pelo Governo, a tenha apoiado com entusiasmo, pois considerou ser essa a forma mais rápida de conduzir, num plano muito próximo, à desconstitucionalização da obrigatoriedade do serviço militar.
Queremos, por essa razão e com essa autoridade, dizer, desde já, que não esperaremos pela informação do Governo para afirmar a nossa absoluta exigência pelo cumprimento dessa lei. Com efeito, queremos que as Forças Armadas portuguesas possam, já este ano, acolher na sua estrutura interna um serviço militar de quatro meses.
Em segundo lugar, queremos dizer que não deixaremos de olhar com olhos muito críticos se, durante este ano, tal não vier a acontecer.
Em terceiro lugar, convém referir que a nova Lei do Serviço Militar obriga não apenas ao comprometimento de toda a hierarquia militar na preparação do [...]tema para acolher esta nova lei [....] parte do Governo, uma intervenção e um empenhamento sério - de que não duvidamos - para que o serviço de voluntariado possa ser bem sucedido.
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Todos sabemos que não pode existir um serviço militar não obrigatório- e, sim, de voluntariado- se não houver, por parte do Estado e das Forças Armadas, um tratamento à altura do que os jovens portugueses esperam para poder ingressar nas fileiras militares como voluntários. Daí que seja urgente que o Governo possa, perante o País e a Assembleia da República, dar um esclarecimento do que realmente se passa e não apenas daquilo que a comunicação social veicula.
Esta atitude é importante por duas razões.
Por um lado, porque os jovens portugueses estavam legitimamente à espera de que, este ano, quem viesse a ser incorporado cumprisse apenas quatro meses dê serviço militar obrigatório. De facto, não é indiferente para um jovem português, que foi ou vai ser incorporado, saber que pode ter um serviço militar de quatro, seis, oito meses ou de qualquer outro tempo! Seria defraudar as expectativas desses jovens.
Por outro lado, porque é essencial o esclarecimento sobre a resposta que obteve toda a campanha de angariação de jovens voluntários para as Forças Armadas, em que o Governo e as próprias Forças Armadas se empenharam.
Quero, finalmente, recordar que existe, da parte da JSD, um apoio total para que a aplicação desta lei prossiga e para que os quatro meses de serviço militar obrigatório sejam uma realidade este ano, de acordo com aquilo que a lei prevê.
Do balanço que ficou feito dos dois meses de transição, sabemos que haverá, certamente, através do esforço desenvolvido pelo Governo e pelas Forcas Armadas, condições para que esta lei seja respeitada. Sé tal não acontecer relativamente ao seu princípio essencial de garantia, que é o de que todos os jovens cumpram apenas quatro meses de serviço militar obrigatório, gostaríamos, naturalmente, de ter, da parte do Governo, um esclarecimento muito claro sobre esta matéria.
Não quero, no entanto, terminar, sem dizer que, nesta nossa posição, o que nos distingue de outras organizações de juventude é um posicionamento muito claro quanto à estrutura das Forcas Armadas e quanto à prestação do serviço militar obrigatório.
Os Deputados da JSD não irão propor nesta Assembleia que o serviço militar obrigatório tenha a duração de um dia, de algumas horas ou do tempo que, normalmente, é conferido às inspecções militares.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador - Também não iremos propor que se aplique às Forcas Armadas qualquer regime de excepção que venha a beliscar a sua operacionalidade, a sua integridade e a sua dignidade perante o País. No entanto, não seremos moles a avaliar a política que o próprio Governo se comprometeu a realizar, com o apoio desta Câmara, tão depressa quanto a lei prevê, de redução do serviço militar obrigatório a quatro meses, que, pelo seu sucesso, conduzirá inevitavelmente - estou certo - ao seu fim e não apenas à sua desconstitucionalização.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Lello, António José Seguro e António Filipe.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.
O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, estava inscrito para falar neste período de antes da ordem do dia e, como ia abordar esta questão, solicitava-lhe a palavra para uma intervenção, dado que sou o último inscrito.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª não é o último mas, sim, o primeiro dos que se seguem!
Risos gerais.
O Sr. José Lello (PS): - É uma consideração que V. Ex.ª faz!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já excedemos em quinze minutos o tempo agendado para o período de antes da ordem do dia e, por isso, a Mesa tinha decidido que não haveria mais intervenções.
Por outro lado, encontra-se presente o Governo para intervir na discussão da proposta de lei agendada para o período da ordem do dia e, por isso, não seria curial nem regimental alongarmos mais este período.
Nesta conformidade, dou-lhe a palavra por um ou dois minutos para pedir esclarecimentos ou para fazer uma pergunta à Mesa e informo-o de que a sua intervenção passará para o próximo sessão.
O Sr. José Lello (PS): - Muito bem, Sr. Presidente.
De facto, a minha intervenção não era para fazer uma pergunta à Mesa, nem, muito menos, ao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
Queria, sim, fazer uma pergunta ao Governo em nome dos jovens portugueses, que se sentem frustrados nas suas expectativas, face às promessas feitas pelo Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional em relação ao cumprimento do serviço militar obrigatório, que, pelos visto, vai ser o dobro do prometido em tempo oportuno, ou seja, durante a campanha eleitoral.
Nessa altura, foi feita uma promessa de que os jovens que fossem incorporados em 1993 iriam cumprir apenas quatro meses de serviço militar obrigatório, e pode-se mesmo dizer que o isco eleitoral lançado pelo Sr. Ministro durante a campanha para as eleições legislativas iria ao ponto de dispensar as classes que, pela primeira vez, votassem em 1991.
Neste momento, apesar de tudo isso e com a incorporação à porta, o Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional veio confirmar o que se suspeitava, ou seja, que os jovens vão cumprir o dobro do tempo de serviço militar obrigatório de que estariam à espera.
Portanto, a pergunta que faço ao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho é se ele veio aqui afirmar, por parte da JSD, o seu criticismo face à quebra das promessas eleitorais do Sr. Ministro Fernando Nogueira, se se confirmar essa triste e funesta expectativa, ou se veio aqui na tentativa de o ressalvar, face a esta situação que configura, efectivamente, o defraudar das expectativas dos jovens, que esperavam cumprir apenas quatro meses de serviço militar obrigatório.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Rui Carp (PSD): - Que confusão!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, compreendo a sua intervenção, que foi avisada pelos maus comportamentos que a JSD teve, tanto na questão da PGA como na das propinas. E com medo de ser, novamente, «apanhada por trás», a JSD veio ao Plenário tentar antecipar-se ao que será a contestação de mais uma promessa não cumprida pelo Governo.
Mas a JSD chega tarde, Srs. Deputados, porque sabe que a Juventude Socialista entregou, nesta Assembleia da República, um requerimento- que tomou público-, pedindo ao Sr. Ministro da Defesa Nacional que lhe desse informações sobre os estudos que fundamentaram duas decisões: uma, a redução do serviço militar obrigatório para quatro meses; outra, esta alteração, ainda não consumada, de alargamento da lei que, neste momento, está em vigor.
Como disse o meu camarada de partido, José Lello, ...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Porta-voz da juventude!
O Orador: - ... os senhores, de facto, neste momento, estão encurralados.
Não se exige à JSD que se «vire» no Parlamento, a dizer que exige o cumprimento da lei mas, sim, que tenha coragem de, no interior do PSD, obrigar o vosso militante e Ministro da Defesa Nacional a cumprir uma lei da República. É esse o desafio que se pede à JSD, porque o seu discurso, de tentar ser a linha avançada e de tentar recuperar no terreno os votos que o PSD e o Governo perdem depois das promessas que não podem cumprir, «já deu». Os senhores tem de assumir as vossas responsabilidades no interior do vosso partido.
Mais, Sr. Deputado: já convencemos o PS à desconstitucionalização do serviço militar obrigatório, como já o confirmou o líder António Guterres. E os senhores, no interior do PSD, já convenceram alguém? É altura da JSD assumir as suas responsabilidades.
Por isso, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, pergunto-lhe concretamente: no caso de o Governo - como parece que assim venha a ser- não vier a cumprir essa lei e a pôr em prática os quatro meses de serviço militar obrigatório, qual será a posição da JSD? Vai pedir a demissão do Ministro?
Gostava que, sincera e concretamente, me respondesse a essa questão. Não bastam as intenções. De «intenções está o inferno cheio», sobretudo das boas. Interessa é a prática.
A última questão que pretendo colocar, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, relaciona-se com a sua intervenção. Disse V. Ex.ª que não faz como outras organizações - estava a referir-se à Juventude Socialista- que propõem petições para a redução do serviço militar obrigatório para um dia. Quando a petição vier a Plenário, conversaremos. E o mesmo acontecerá, Sr. Deputado, todas as vezes que a sua organização de juventude, o seu partido e o seu Governo não cumpram aquilo que prometem.
Os senhores prometeram aos jovens portugueses que o serviço militar obrigatório teria a duração de quatro meses. Fizeram disso uma arma durante a campanha eleitoral e tiveram, sem dúvida, muitos votos por causa disso. Chegou, pois, a altura de serem confrontados com a vossa consciência
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular o seu pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, V. Ex.ª faz bem em lembrar este problema.
De facto, creio que é uma questão pertinente a ser abordada na Assembleia da República, sobretudo se nos lembrarmos do debate que tivemos, aqui, aquando da aprovação da lei que o Governo, agora, diz não ter condições para cumprir e se prepara, efectivamente, para não cumprir.
É evidente que já vem sendo habito, por parte do Governo do PSD, a quebra de promessas eleitorais, e faltava deixar esta por cumprir.
Acontece que, agora, não se trata de uma simples promessa mas, sim, do incumprimento de uma lei da República, que foi, precisamente, proposta pelo Governo a esta Assembleia. Ninguém lhe pediu que o fizesse. O Governo, por sua iniciativa, e após o anúncio, mediaticamente estrondoso, do Sr. Ministro da Defesa Nacional, de que tinha encomendado estudos que permitiriam reduzir o serviço militar obrigatório para quatro meses, veio aqui à Assembleia propor essa lei. Foi uma das grandes bandeiras eleitorais do PSD para a juventude, e o que é que aconteceu? A realidade é que, agora, passadas as eleições, quando se trata de pôr a lei em aplicação, o Governo começa a dizer que não tem condições para o fazer e prepara-se para não a cumprir.
Esta situação é, do ponto de vista institucional, extremamente grave, porque põe claramente em causa a seriedade com que o Governo veio a esta Assembleia propor a redução do serviço militar obrigatório para quatro meses. Alertámos, na altura, para a falta de seriedade dessa proposta.
Compreendemos a posição da JSD, que é contra o serviço militar obrigatório e nunca o escondeu. Já tivemos, aqui, oportunidade de discutir essa matéria e de, claramente, discordar da posição que, sobre ela, a JSD tem. É uma opinião que mantemos.
Apesar de defendermos a redução do serviço militar obrigatório, na altura em que foi discutida a lei, chamámos a atenção e exigimos ao Governo - era um dever institucional que tinha- que fornecesse à Assembleia da República os estudos que tinham sido elaborados pelas chefias militares, fundamentadores da proposta de lei que o Governo estava a apresentar. O Governo, na altura, não o fez e nós alertámos para a irresponsabilidade que estava a cometer e para a eventual probabilidade de o Governo vir a ter grande dificuldade em cumprir o que estava a propor à Assembleia da República. Fizémos esse alerta e, por essa razão, não apoiámos a lei que o Governo aqui veio propor.
Agora, este tempo passado, quando se trata de aplicar a lei, verifica-se, afinal, que a proposta do Governo não tinha credibilidade e que ele sabia, já nessa altura, que não ia ter condições para fazer o que estava a propor à Assembleia, hipótese para a qual não deixamos de alertar.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se não está, neste momento, provada a hipocrisia política do Governo quando aqui veio, «eleitoralisticamente», propor a redução do serviço militar obrigatório para quatro meses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, não fora, depois, a pronta questão colocada pelo Deputado António José Seguro, e quase me sentiria inclinado a saudá-lo como o novo porta-voz da Juventude Socialista para estas matérias.
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O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas sei que, e reconheço-o porque ouvi a sua questão, a queria endereçar mais ao Governo do que a mim. Nessa medida, desculpar-me-á se a resposta que lhe der não for muito diferente da que irei dar aos outros Srs. Deputados que levantaram, grosso modo, as mesmas questões.
Em primeiro lugar, não fiz intervenção alguma, nesta Casa, com base no esclarecimento ou na informação publicamente prestada pelo Ministério da Defesa Nacional ou pelo Governo. Embora alguns dos Srs. Deputados, nomeadamente o Sr. Deputado António Filipe, tivessem formulado questões como se fosse claro que o Governo não tem condições pata aplicar a lei ou que ela não tem credibilidade e tivessem concluído pela existência de uma hipocrisia da parte do Governo. Limitei-me, no início da intervenção, a relembrar que têm «vindo a lume», na comunicação social, algumas notícias que imputam ao Governo a possibilidade de não vir a aplicar integralmente a lei.
Nessa medida, decidi, como julgo ser legítimo, aproveitar para questionar, nesta Assembleia, o cumprimento dessa lei. dizendo, desde logo, que questionaremos o Governo para um esclarecimento público sobre esta matéria.
Julgo que fui extremamente claro na forma como coloquei o problema. A lei, quando foi aprovada, logo que proposta pelo Governo, mereceu o nosso entusiasmo e a nossa concordância porque, do nosso ponto de vista, conduz rapidamente à criação de um serviço de voluntariado. A nossa expectativa sobre o seu cumprimento é enorme.
Deduzo, portanto, que o Sr. Deputado António Filipe estivesse a fazer um exercício académico e hipotético. Vamos supor, Sr. Deputado, que vai haver jovens portugueses, este ano, que não vão cumprir quatro meses de serviço militar obrigatório. Para que a lei seja cumprida é importante que o Governo diga porque é que esse tempo terá de ser prolongado. Como o Sr. Deputado sabe, a lei prevê casos de excepção, em que o tempo de serviço militar obrigatório possa exceder os quatro meses.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: Portanto, não existiria, aqui, nenhuma fuga á lei.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): Ao contrário do que disseram!
O Sr. António Filipe (PCP): - Ainda o chamam para a tropa, Sr. Deputado Carlos Coelho!
O Orador: - O que importa é saber se o cumprimento de quatro meses de serviço militar obrigatório será extensivo à grande maioria daqueles que o vão prestar ou não. Admito que, no primeiro ano - e com isto respondo também aos Srs. Deputados José Lello e António Filipe -, findo o qual termina o período de transição e de preparação das Forças Armadas, alguns problemas possam existir. Mas, então, é importante que essa especulação não seja feita nos jornais e que o Governo a possa trazer aqui. Julgo que não ficaram dúvidas quanto à posição política que a JSD adoptará se esta lei não vier a ser cumprida.
Sr. Deputado António José Seguro, mais uma vez aproveitou para me desafiar- e à JSD também - a obter do PSD o que V. Ex." obteve do PS. Mas o senhor ainda não obteve nada! O Sr. Deputado anunciou que o secretário-geral do Partido Socialista anunciou que ia propor ao PS que se retirasse da Constituição a obrigatoriedade do serviço militar. Perguntei-lhe, Sr. Deputado, por mais de uma vez, se isso significava a retirada do plano constitucional para o da lei ordinária, ao que o Sr. Deputado nada disse. O Sr. Deputado António Guterres nada diz e o Partido Socialista também nada diz, ao contrário, no entanto, de vários Srs. Deputados do Partido Socialista que parecem não concordar, em nada, com essa ideia Mas, nós, ainda não sabemos o que o Partido Socialista pensa sobre essa matéria,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... nem o que a Juventude Socialista vai concluir desse debate.
Aplausos do PSD.
Ao contrário, Sr. Deputado, a Juventude Social-Democrata pode orgulhar-se de ter mantido a coerência do seu pensamento e de ter conseguido que o seu Governo apresentasse nesta Assembleia uma lei de serviço militar que conduzirá, inevitavelmente, a um serviço de voluntariado.
Se o Sr. Deputado estiver tão interessado e genuinamente empenhado nesse horizonte, como diz - e acredito que pense da mesma forma que eu, há mais tempo do que a Juventude Socialista o divulga -, espero, nesse caso, que o seu entusiasmo seja igual ao meu e que V. Ex.ª seja inflexível para que esta lei se possa cumprir.
Aplausos do PSD.
O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da consideração da bancada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, talvez não seja V. Ex.ª o Deputado que mais merece ouvir isto - portanto, não leve à letra, embora seja dirigido a si -, mas, sim, o conjunto da sua bancada e também o Sr. Deputado, porque não deveria ter a ousadia de referir o que referiu.
Compreendo que os senhores tenham alguma facilidade, nos tempos que correm, em poder «brincar» com aquilo que são as diversas expressões que no interior de um partido plural, como o PS, existem sobre diferentes temáticas. Não recordamos agora várias pessoas, dirigentes do PSD, que foram expulsos por discordarem, por exemplo, da política de saúde do Governo.
Vozes do PSD: - Não!...
O Orador: - Nem sequer trazemos para aqui o nome do engenheiro Eurico de Melo, presidente do Conselho Nacional do PSD, sobre esta problemática
Vozes do PSD: - Oh!...
O Orador: - O que trazemos, Srs. Deputados, ... Protestos do PSD.
O que trazemos, Srs. Deputados, são duas concepções diferentes de viver a vida partidária:...
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O Sr. Rui Carp (PSD): - Essa deve ser do adiantado da hora!
O Orador: - ... uma, onde se pode falar e, por vezes, dizer asneiras, mas porque fala...
Risos do PSD.
Este é um conceito de democracia importante. Os senhores estão muito nervosos! Os senhores sabem o que é que vos vai cair em cima...
Protestos do PSD.
Sr. Presidente, proponho que o tempo regimental de que disponho não seja contado, enquanto os Srs. Deputados não fizerem silêncio.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - O facto de os Srs. Deputados estarem a falar não o impede de continuar a intervir. Pode continuar, porque desse modo não perde tempo.
Vozes do PSD: - Claro!
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O que se passa é que os senhores, no vosso partido, só falam quando o «chefe» deixa e só dizem o que o «chefe» quer que vocês digam.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Os senhores são uma espécie de São João Baptista que, de vez em quando, aqui vêm dizer e anunciar, tentando pôr acima da linha a imortalidade política do vosso líder, que é aquele que vos dá votos para os senhores terem uma maioria absoluta
Risos do PSD.
Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, devo dizer-lhe que o líder do Partido Socialista disse, concretamente, que iria propor tanto no interior do PS como também à sociedade portuguesa um debate sobre a desconstitucionalização da obrigatoriedade da prestação do serviço militar.
Como sabe, a JS tem uma posição semelhante à da JSD sobre esta matéria.
Vozes do PSD: - Plagiada!
O Orador: - A única coisa que aqui há de diferente, Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, é que o PSD nada disse sobre a desconstitucionalização da obrigatoriedade do serviço militar. E a pergunta que quero colocar-lhe é exactamente sobre esta matéria, mas gostaria que também me respondesse à questão que há pouco lhe fiz. Porém, peco-lhe que não fuja à questão, Sr. Deputado.
O que pensa o PSD sobre a desconstitucionalização do serviço militar obrigatório e o que vai a JSD fazer no caso de um ministro da Defesa Nacional não aplicar a lei que estabelece a obrigatoriedade dos quatro meses para a prestação do serviço militar obrigatório?
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, concordo consigo, pois existem, de facto, concepções diferentes quanto à forma de estar dos partidos.
A Sr.ª Conceição Castro Pereira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não me sinto autorizado a dizer-lhe o que pensa o PSD, porque ele ainda o não disse, mas, no entanto, o Sr. Deputado sente-se com legitimidade para dizer o que pensa o PS antes de ele ter dito alguma coisa.
Risos do PSD.
O Sr. António José Seguro (PS): - O Cavaco ainda não disse nada!
O Orador: - Sr. Deputado, não gosto de ter uma visão autoritária da minha presença no PSD nem que o meu líder dê indicações a respeito de coisas que o partido não discute ou não assume sobre os grandes temas políticos.
Logo, o Sr. Deputado compreenderá que não está na maneira de ser da JSD não só abdicar do seu pensamento ou de lutar por ele, como também de pôr na boca dos outros o que não dizem nem decidem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): - Eu sei! Responda à questão!
O Orador: - Quando o Sr. Deputado tiver, do PS, uma resposta sobre esta matéria, então, serei o primeiro a felicitá-lo por ter conseguido do seu partido o que ainda não consegui do meu.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, quanto a saber o que vão o PSD e a JSD fazer se o Sr. Ministro não cumprir a lei, devo dizer-lhe que não gosto de fazer considerações desta natureza sem ter a certeza de haver alguma legitimidade para sobre elas discorrer.
Sr. Deputado, quis exprimir, em primeiro lugar, perante a Assembleia, a expectativa que toda a minha organização tem no cumprimento desta lei, e, em segundo lugar, a noção exacta de que sabemos que esta mudança nas Forças Armadas não é simples.
Na minha intervenção quis deixar bem claro que esta situação resulta apenas de haver um regime de transição que terminou agora. Porém, se os rumores vierem a confirmar-se, deve exigir-se publicamente do Governo um esclarecimento sobre as razões que motivam esse prolongamento e que tipo de prolongamento poderá existir. Se ele vier a existir, podem o Sr. Deputado e a sua bancada ter a certeza de que não será o nosso silêncio que irá corolar essa decisão política.
Aplausos do PSD.
O Sr. António José Seguro (PS): - Não sei!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto termos já ultrapassado o tempo regimental das intervenções políticas, pelo que peço desculpa, vamos proceder à votação do voto n.º 65/VI, já distribuído, apresentado pelos membros das Comissões de Educação, Ciência e Cultura e de Negócios
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Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, subscrito por todos os grupos parlamentares, sobre a condenação, obsoleta e primitiva, à morte do escritor britânico Salman Rushdie por parte de um regime teocrático.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente Freitas do Amaral.
É o seguinte:
Voto n.º 65/VI
De protesto pela situação em que se encontra o escritor britânico Salman Rushdie
Há quatro anos, em Fevereiro de 1989, o escritor britânico Salman Rushdie foi, na sequência da publicação de uma obra de sua autoria, condenado à morte pelo então dirigente supremo da República Islâmica do Irão Khomeini, que apelou aos Muçulmanos para executarem essa sentença onde quer que o referido escritor se encontrasse.
Posteriormente, não só essa condenação foi reafirmada pelos actuais dirigentes do Irão como foram aumentados os prémios pecuniários para quem a levasse a cabo, obrigando esse escritor a viver escondido e sob protecção permanente.
Considerando que estes factos contrariam, entre outros, os direitos consagrados no artigo 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, relativos à liberdade de opinião e de expressão, os princípios da tolerância religiosa e política, da convivência entre povos e Estados e as próprias bases do direito internacional, pondo ainda em causa a liberdade de criação cultural:
A Assembleia da República, associando-se aos governos, parlamentos e organizações internacionais, como o Conselho da Europa, que já se pronunciaram no mesmo sentido, apela ao Governo da República Islâmica do Irão para que, dando seguimento aos referidos apelos da comunidade internacional, levante aquela condenação arbitrária de forma a que o escritor Salman Rushdie possa retomar a vida normal a que tem direito.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia
Eram 17 horas e 10 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem dia com a discussão da proposta de lei n.º 47/VI - Autoriza o Governo a rever o regime jurídico dos revisores oficiais de contas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Remonta a 1969 a institucionalização, por via legislativa, da figura dos revisores oficiais de contas, aquando da revisão do regime jurídico de fiscalização das sociedades anónimas.
É, contudo, no início da década de 80 que, com a publicação do Decreto-Lei n.º 519-L2/79, de 29 de Dezembro, é concedido público reconhecimento ao relevante papel dos revisores oficiais de contas na prossecução das tarefas do Estado em tal domínio, do mesmo passo que se dignificou o exercício da respectiva actividade profissional.
Impõe-se agora, após cerca de 12 anos de vigência do mencionado decreto-lei de 1979, que se proceda à adequação do regime jurídico nele consagrado à realidade económica e social do País. Esta mesma realidade é indissociável das significativas modificações que, entretanto, se operaram no nosso ordenamento jurídico.
Com efeito, a Lei de Revisão Constitucional n.º 1/82, de 30 de Setembro, referia-se às associações públicas profissionais, estabelecendo que estas só poderiam ser constituídas para a satisfação de necessidades específicas, aproximando, assim, os interessados da gestão efectiva, tendo sido tal regime mantido pela Lei de Revisão Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho.
As associações públicas representam, como pessoas colectivas públicas que são, uma modalidade de administração indirecta traduzida numa devolução de poderes do Estado a uma organização própria de profissionais, confiando nela a regulamentação e disciplina do exercício de uma profissão que reputa de interesse público.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Face à natureza e ao regime jurídico das referidas associações, a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas não pode deixar de ser considerada, à luz das atribuições que lhe são cometidas por lei, com vista a satisfazer necessidades específicas decorrentes do exercício de funções de interesse público pelos revisores oficiais de contas, uma estrutura profissional idêntica às ordens profissionais stricto sensu e a outras câmaras profissionais, abandonando, por isso, o seu actual estatuto de pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública e assumindo de jure o de pessoa colectiva pública.
Isto não poderá significar, contudo, que o Estado, ao delegar poderes de jus imperii, o faça de forma algo irreversível, abdicando da vigilância que se impõe tendo em conta direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente o que respeita ao acesso à profissão.
Entretanto, da adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia decorrem implicações várias entre as quais se contam as que se integram no direito comercial comunitário assim como as relativas ao regime de habilitação dos revisores e à forma de organização das sociedades dos mesmos mediante o preenchimento de determinados requisitos essenciais com os quais o regime jurídico dos revisores oficiais de contas terá necessariamente de conformar-se.
Por esse facto, foi dada particular observância às regras constantes da Directiva do Conselho n.º 84/253/CEE (8.º Directiva) respeitante à habilitação dos revisores oficiais de contas, assim como da Directiva do Conselho n.º 89/48/CEE, relativa ao reconhecimento de diplomas profissionais do ensino superior, já transposta para o nosso direito interno.
Caberá, por outro lado, sublinhar em especial a aprovação do Código das Sociedades Comerciais no qual, para além do alargamento do âmbito de actuação dos revisores oficiais de contas, quer integrados nos órgãos de fiscalização das sociedades, quer através da sua intervenção própria e autónoma em várias situações, foram também contempladas diversas disposições com reflexo no seu regime jurídico. Tiveram-se ainda em conta as implicações relevantes do Código do Registo Comercial, da recente reforma fiscal e da legislação respeitante ao mercado de capitais.
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Sr. Presidente e Srs. Deputados: Os aspectos focados, conjugados com a experiência adquirida, vieram assim tomar inadiável a revisão do Decreto-Lei n.º 519-L2/79, de 29 de Dezembro, por forma a adaptá-lo às novas exigências legais e profissionais. De entre os aspectos mais relevantes objecto da referida revisão e, para alem do reconhecimento à Câmara dos Revisores Oficiais de Contas da natureza de pessoa colectiva de direito público - o que constitui marco histórico significativo-, destacam-se, a título exemplificativo: a atribuição à Câmara dos Revisores Oficiais de Contas de competência em toda a matéria respeitante aos estágios e aos exames dos candidatos a revisores oficiais de contas; a criação do conselho de inscrição como órgão eleito da Câmara; a clarificação e o alargamento do âmbito de actuação dos revisores oficiais de contas; a reordenação do estatuto profissional dos revisores oficiais de contas que, a par do desenvolvimento de alguns princípios de ética e de deontologia profissional, conduziu, nomeadamente, à revisão do regime disciplinar aplicável, à redefinição do âmbito das incompatibilidades e impedimentos, à introdução do regime de dedicação exclusiva, à liberalização dos honorários e à criação de cédulas profissionais dos revisores, e estagiários; a possibilidade de haver sócios não revisores nas sociedades de revisores oficiais de contas, tendo em vista, por um lado, uma adequada complementaridade em matérias conexas ao seu objecto principal e, por outro, a potenciação do reforço da sua capacidade técnica e organizativa; o aperfeiçoamento das condições de acesso à profissão, designadamente em matéria de estágio e de obtenção, suspensão e perda da qualidade de revisor, a aprovação da quase totalidade dos regulamentos pela assembleia geral da Câmara e a institucionalização do regulamento disciplinar dos revisores e, por fim, a faculdade de realização periódica de congressos de revisores.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Concedendo a autorização que ora se solicita, permitirão VV. Ex.ª que o Governo prossiga os seus objectivos de descentralização institucional do Estado, o desenvolvimento da política legislativa naqueles domínios em que se preveja a intervenção dos revisores oficiais de contas e, finalmente, a consolidação e dignificação da sua actividade profissional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Domingues Azevedo, Octávio Teixeira e António Lobo Xavier.
Tem a palavra, para esse efeito, o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, na sequência da sua intervenção, gostava de formular-lhe algumas perguntas.
É sabido que esta proposta de autorização legislativa surge na Assembleia na decorrência de diversos contactos que o Governo estabeleceu com a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, dos quais resultaram vários estudos que conduziram à elaboração quase definitiva de um projecto de decreto-lei. Tendo sido este projecto de decreto-lei praticamente ultimado em termos de intervenção das partes, por que razão é que, em vez desta proposta de autorização legislativa, não veio a ser discutido nesta Câmara o próprio projecto de decreto-lei, sendo coarctada assim a possibilidade de os Deputados intervirem mais directa e activamente na elaboração do produto final.
Por outro lado, do sentido global desta proposta de lei depreende-se que há uma preocupação em atribuir à Câmara dos Revisores Oficiais de Contas competências de gestão, libertando-a, consequentemente, da tutela administrativa prevista no diploma actualmente em vigor, o Decreto-Lei n.º 519-L2/79, de 29 de Setembro. No âmbito do exercício dessa tutela, competia ao Governo a nomeação das comissões de inscrição nos termos do artigo 57.º deste mesmo decreto-lei. Na proposta de autorização legislativa, que agora nos é presente, o Governo prevê a possibilidade de recurso das deliberações do conselho de inscrição para o Ministério da Justiça.
Ora, sendo o conselho de inscrição eleito na Câmara dos Revisores Oficiais de Conta, conforme o Sr. Secretário de Estado agora o afirmou - embora a proposta de lei o não estabeleça-, e gerido praticamente sob a sua inteira responsabilidade, não seria mais curial, em caso de discordância por parte dos concorrentes à inscrição, dirimir o conflito nos tribunais comuns? Será que esta atitude não revela uma libertação, mas a medo, da tutela do Ministério da Justiça? Por que razão se mantêm estes resquícios da tutela do Governo sobre a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas quanto a este aspecto?
Outra pergunta que gostava de colocar ao Sr. Secretário de Estado diz respeito ao regime vigente, que também consta do diploma mencionado, e que estabelece as condições, as habilitações, os graus académicos, que é necessário possuir para efeitos da inscrição na Câmara dos Revisores Oficiais de Contas.
Por outro lado, o artigo 9.º da Directiva n.º 84/253/CEE prevê a possibilidade de algumas inscrições se efectuarem sem que, no entanto, os concorrentes a essas inscrições reunam os graus académicos exigidos no Decreto-Lei n.º 519-L2/79.
Pede o Governo para transpor para o ordenamento jurídico interno esta directiva. No entanto, na proposta de lei, praticamente nada é dito em relação a esta questão, pelo que gostava de saber se o projecto de decreto-lei que o Governo já ultimou prevê esta possibilidade, verificando-se, entretanto, os condicionalismos previstos na directiva, ou seja, uma prática comprovada de muitos anos em lidar com profissões conexas com a dos revisores oficiais de contas.
Eram estas as perguntas que tinha para fazer ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, vou suscitar, logo de início, uma questão que, aliás, foi colocada e com a qual suponho que o Sr. Secretário de Estado estará de acordo. Refiro-me ao facto de a alteração legislativa solicitada dizer muito pouco e, com toda a sinceridade, o seu sentido - e julgo que facilmente o Sr. Secretário de Estado concordará com esta ideia- não ser visível.
Por exemplo, fala-se em reestruturar, mas em que sentido? Fala-se em definir os requisitos, mas defini-los em que sentido? Que requisitos e como é que vamos defini-los, pelo menos, em Unhas gerais?
Julgo que esta questão seria aplanada desde que tivesse sido apresentado à Câmara outro articulado ou desde que este fosse acompanhado de um pré-projecto -pelo menos, de uma declaração de intenções mais clara - sobre o que se pretendia.
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O Sr. Secretário de Estado falou, por exemplo, na revisão do regime disciplinar. De facto, tal revisão é solicitada, mas em que sentido? Para agravar, para suavizar? Qual é o sentido deste pedido?
Para além desta questão geral, gostava de colocar-lhe duas questões - e apenas essas - que me suscitam dúvidas.
A primeira tem a ver com o que é proposto para a alínea c) do artigo 2.º, que diz: «Prever que das deliberações do conselho de inscrição que respeitem aos requisitos de acesso à profissão caiba recurso para o Ministro da Justiça»
Julgo saber- pelo menos, era isso que era proposto pela Câmara dos Revisores Oficiais de Contas - que o acesso e, por conseguinte, a possibilidade de inscrição como revisor oficial de contas exigiria previamente um exame. Se for esse o sentido que o Governo pensa- aspecto sobre o qual gostava de ser esclarecido- dar à lei, imediatamente me surge a seguinte questão: pode ser recusada a inscrição a alguém que tenha sido aprovado no exame? Aparentemente, não deverá ser possível, mas se for esse o caso, então, porque razão é necessário o recurso para o Ministro da Justiça ou para quem quer que seja.
A segunda questão relaciona-se com a alínea J) do artigo 2.º de «consagrar a possibilidade de existência de sócios não revisores nas sociedades de revisores oficiais de contas».
Esta questão parece-me extremamente controversa. Peço-lhe, pois, que explicite um pouco mais a sua ideia sobre o porquê desta questão. Aparentemente, a única hipótese, ou a hipótese mais verosímil, para que se possam abrir, digamos assim, sociedades profissionais a não profissionais, aquilo a que chamam o «sócio capitalista», é a possibilidade de poder vir a integrar sociedades de revisores oficiais de contas nas grandes empresas, como a Emst Young ou a Arthur Anderssen, que são empresas de auditoria.
Ao fim e ao cabo, transformar uma actividade liberal como esta poderá, indirectamente, colocar os revisores oficiais de conta como trabalhadores por conta de outrem, embora formalmente não o sejam, através da admissão do sócio capitalista Então, poderemos vir a ter - se este diploma do Governo avançar nesse aspecto concreto - empresas que são fiscalizadas, em termos de auditoria propriamente dita, por uma determinada empresa, qualquer que ela seja, vindo depois a ser feita a certificação legal de contas da empresa auditorada pela mesma empresa que fez a auditoria. Ora, isso é extremamente perigoso e inconveniente!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, de facto, tendo em conta as Unhas da proposta que está aqui em discussão, não admira que a oposição ou os Deputados interessados nestas matérias tenham exactamente as mesmas dúvidas sobre os mesmos pontos e se interroguem sobre as mesmas questões.
Quero começar por dizer que, apesar de já ter sido lavrado o protesto conveniente, este seria um dos casos em que se recomendaria que conhecêssemos mais algumas linhas do que simplesmente o que consta nesta proposta de lei. E por uma razão de dignidade da profissão, de dignidade indesmentível, basta pensarmos como «rasgaríamos as vestes» se o Governo pedisse uma autorização semelhante para a modificação dos estatutos da Ordem dos Médicos ou da Ordem dos Advogados. O que não se diria se, de facto, apenas se conhecessem estes traços gerais.
É certo que há uma desculpa que tem a ver com o facto de o regime que está em vigor ser excessivamente minucioso - e, portanto, haver uma base - e estas linhas indicativas servirem de alguma orientação no sentido do que vai mudar. Mas é bastante pouco e, em termos simbólicos, em nome da dignidade da profissão, preferiria também que conhecêssemos o texto.
Vou colocar-lhe uma questão, embora admita que o Sr. Secretário de Estado não seja a pessoa, dentro do Governo, melhor posicionada para responder, por razões de competência.
Como sabe, este estatuto demorou vários anos a ser discutido e aprovado- recordo-me que ele era já uma promessa do anterior governo -, mas, agora, pergunto-lhe: para quando o estatuto dos técnicos de contas?
A segunda questão tem a ver com o problema levantado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, ou seja, a questão dos sócios. É sabido que uma das esperanças dos revisores oficiais de contas, quanto ao novo estatuto, é a questão do acesso à profissão. Sabe-se que boa parte dos revisores admitem que tenham acesso à profissão pessoas ou entidades que não têm a formação específica Eles querem isso-não é possível escondê-lo nem há qualquer interesse em fazê-lo-, exactamente para que as grandes empresas de auditoria, que não podem exercer efectivamente a função de revisores oficiais de contas, possam passar a fazê-lo por via da participação nestas sociedades.
Se fosse só isso, não seria extremamente crítico, mas a admissibilidade sem limites da participação de sócios de capital nestas sociedades é algo muito preocupante. Confesso que desconheço qual é a posição dos revisores oficiais de contas, mas admitir o que é, por exemplo, vedado- e bem! - às sociedades de advogados, admitir que sócios de capital, que não sejam essas empresas de auditoria, mas que seja qualquer sócio de capital, a participar nessas sociedades, parece-me algo extremamente preocupante, tendo em conta as funções dos revisores oficiais de contas.
Isso justifica-se no domínio das sociedades de corretagem ou das sociedades financeiras de corretagem, mas não no domínio das sociedades dos revisores oficiais de contas.
De facto, não sabemos - e gostaria de ser informado - se vão ou não existir limitações.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seguindo a ordem das perguntas que me foram formuladas - que, desde já, agradeço - houve uma que foi comum aos três Srs. Deputados sobre o porquê de não vir junto ao pedido de autorização legislativa o projecto de decreto-lei.
Ao contrário do que sucede habitualmente, nomeadamente quando o Ministério da Justiça apresenta um pedido de autorização legislativa, como os Srs. Deputados, com certeza, estarão recordados, os decretos-leis vêem, quase sempre, em anexo. Nesta situação particular, isso não aconteceu, por uma razão simples, linear e transparente: o texto está ainda em fase de projecto, não está ultimado. Portanto, achámos por bem não mandar à Assembleia da República um texto que não tinha sequer a apreciação do Governo no seu todo.
No entanto, procedendo a um hábito que vem sendo natural e normal, o Governo, nomeadamente o Ministério da Justiça, está completamente disponível, inclusivamente no seio da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de prestar aos Srs. Deputados todos os esclarecimentos, que venham a colmatar alguma omissão
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deste pedido, que tem de ser forçosamente «seco», de autorização legislativa.
O Sr. Deputado Domingues de Azevedo colocou a questão do porquê do recurso do conselho de inscrição para o Ministro da Justiça. O Sr. Deputado recordou, e bem, que, no regime actual, a competência do conselho de inscrição e toda a sua tutela pertence ao Ministério da Justiça
No entanto, com esta proposta de autorização legislativa e o consequente decreto-lei, isso vai ser alterado. Mas temos de ter consciência de uma realidade que se pode consubstanciar nalgum balizamento, que a nossa Constituição da República possa imprimir, do que é aceder a uma profissão - e estou a recordar-me do artigo 47.º da Constituição, que é uma matéria em que há, de alguma forma, uma reserva ao nível da definição do interesse publico. No entanto, consideramos que não deve ser dada a uma associação pública esses critérios de denegar o exercício ou o acesso a uma profissão.
Não sei se os Srs. Deputados terão presente, mas o problema discutiu-se nesta Câmara aquando da alteração ao Estatuto da Ordem dos Advogados. Perguntou-se se o Conselho Geral da Ordem dos Advogadas tinha ou não a possibilidade legal, ou mesmo constitucional, de impedir o acesso à profissão de advogado. A questão, na perspectiva constitucional, é duvidosa Mas não obstante estarmos perante uma associação pública em que o Estado, por si, delega numa instituição de direito público, poderes para exercer funções que têm a ver com a regulamentação e com o exercício da profissão, quando se trata de denegar ou não a possibilidade de exercer efectivamente uma profissão, julgamos que talvez seja ir longe demais - e quando digo «julgamos» é porque a questão não é pacífica- outorgar a essa associação pública poder decisivo e absolutamente decisório de «sim» ou «não» aceder a uma profissão.
Por isso mesmo, neste pedido de autorização legislativa -já consubstanciado, obviamente, num projecto de decreto-lei - está a possibilidade última de o Ministro da Justiça em via de recurso, responder ao candidato recorrente, face a uma denegação da comissão de inscrição.
Aproveitando também para responder desde já a uma pergunta do Sr. Deputado Octávio Teixeira, devo dizer que isto não tem a ver com o facto de já se estar inscrito, porque uma coisa é a inscrição, portanto, o exame de aptidão, e outra é o estágio, no fim do qual haverá, então, possibilidade de se registar uma apreciação do aproveitamento do candidato. Ora, é no caso de esta ser negativa que caberá recurso dessa decisão para o Ministro da Justiça
O Sr. Deputado Domingues Azevedo perguntou se a transposição da directiva, no tocante aos requisitos habilitacionais, aos graus académicos, era tout court como estava na directiva ou se haveria a possibilidade de os não licenciados poderem vir a inscrever-se como revisores oficiais de contas. Devo dizer-lhe que, em princípio, o decreto-lei irá para a exigência dos requisitos de licenciatura.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Secretário de Estado, creio que fez aí uma pequena confusão, talvez gerada pelo facto de eu não me ter explicado suficientemente bem.
Na verdade, a actual legislação não prevê essa possibilidade mas a directiva, no seu artigo 9.º, prevê que as pessoas que não tenham o grau académico exigido pelo actual Decreto-Lei n.º 519-L2/79, desde que comprovem a prática do exercício de certas profissões durante um determinado tempo, possam inscrever-se como revisores oficiais de contas.
Era, pois, em relação a esse domínio que perguntava se, na transposição desta directiva cuja autorização também é solicitada para o direito interno, se prevê ou não este mecanismo do artigo 9º A minha pergunta era apenas esta.
O Orador: - Compreendo perfeitamente a questão e respondo-lhe nos mesmos termos em que o fiz há pouco: conheço o texto da lei actual, o da directiva e o do projecto de decreto-lei e, em princípio, Sr. Deputado, exige-se a licenciatura.
Relativamente às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira já respondi à questão de saber porque é que não se juntou o projecto de decreto-lei ao pedido de autorização legislativa. Normalmente, Sr. Deputado, o decreto-lei é junto aos pedidos de autorização legislativa mas neste caso isso não se fez porque ele não estava pronto e ainda não tinha sido apreciado no seio do Governo.
Quanto à questão respeitante aos recursos para o Ministro da Justiça creio que já a expliquei ou tentei explicar. Isto é, apontamos para um recurso ao Ministro da Justiça porque o que está em causa é aceder ou não a uma profissão e parece que uma associação pública não deverá ter essa competência mas essa é uma questão altamente duvidosa ao nível constitucional.
A questão dos sócios não revisores nas sociedades revisoras de contas é polémica e houve algum debate no seio dos revisores oficiais de contas e das suas associações de classe. Devo dizer aos Srs. Deputados que, embora não fosse unanimemente defendida, a solução encontrada foi aceite por larga maioria dos revisores oficiais de contas, que consideraram boa esta solução de haver sócios não revisores de contas nessas sociedades.
Não se pensou apenas nas sociedades de auditoria -como referiu o Sr. Deputado António Lobo Xavier-, mas teve--se também em mente as sociedades de prestação de serviços, que poderão dar às sociedades de revisores de contas um staff z um apoio administrativo. Portanto, foi tendo em conta a necessidade de às sociedades de revisores de contas se juntarem sócios dessas sociedades de prestação de serviços, de apoio logístico e administrativo, que não se viu razão para limitar o acesso desses sócios que não sejam revisores de contas.
Respondendo agora à última questão colocada pelo Sr. Deputado António Lobo Xavier, sobre o Estatuto dos Técnicos de Contas, julgo que estamos perante duas realidades completamente diversas. Em primeiro lugar, a dos revisores oficiais de contas, em que, quer no Código das Sociedades Comerciais (no n.º 2 do seu artigo 414.º, respeitante às sociedades anónimas, e no artigo 262.º respeitante às sociedades por quotas) quer no diploma que regula as empresas públicas, se aponta nítida e manifestamente, para a necessidade de haver revisores oficiais de contas nas nossas empresas comerciais, dando-se a estes fé pública para reverem as contas.
Isto é, o Estado considera que, ao outorgar fé pública ao revisor oficial de contas, isso revela manifestamente um interesse público. Por isso é que, ao contrário daquilo que acontecia na legislação de 1979, agora vai-se para uma associação pública, na medida em que aí há um poder delegado do Estado na Câmara dos Revisores Oficiais de Contas. Por detrás da eventual defesa dos interesses da classe, está, sobretudo, o interesse público que o Estado lhe confere ao atribuir-lhe fé pública quando procede à revisão de contas.
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No tocante aos técnicos de contas, não há neste momento - havia, sim, no Código da Contribuição Industrial - qualquer disposição que exija que as empresas ou sociedades tenham técnicos de contas.
Portanto, o Estado, ao contrário do que acontece com os revisores oficiais de contas, não sente qualquer necessidade, porque não está em causa nenhum interesse público, em conceder aos técnicos de contas o estatuto de delegado de uma associação pública. Tal como disse, não está em causa nada que o Estado delegue do seu jus imperii a uma associação de técnicos de contas.
Esta é, pois, a razão principal: interesse público nos revisores oficiais de contas, criando-se uma associação pública, enquanto que nos técnicos de contas não há interesse público primordial, não havendo associação pública, pelo que entendemos que os técnicos de contas não devem acompanhar o destino dos revisores oficiais de contas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão alunos e professores da Escola Avelar Brotero, de Coimbra, a quem quero cumprimentar, como Deputado eleito pelo círculo de Coimbra.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS):- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O exercício da profissão de revisor oficial de contas encontra-se actualmente regulamentado no nosso ordenamento jurídico interno através do Decreto-Lei n.º 519.-L2/79, de 29 de Dezembro, na sequência da consideração como prestação de um serviço público, consagrada no Decreto-Lei n.º 49 381, de 15 de Novembro, e por efeito da reformulação do Decreto-Lei n.º 1/72, de 3 de Janeiro, que pela primeira vez procedeu à regulamentação do exercício da profissão de revisor oficial de contas.
A diversa legislação actualmente existente exige o concurso destes profissionais na certificação legal das contas das sociedades anónimas, de algumas sociedades por quotas que, reunindo o conjunto de determinadas características, se prendem fundamentalmente com a sua dimensão, das empresas públicas e em alguns actos de constituição de sociedades, sempre que haja necessidade de certificar com rigor e objectividade valores de imobilizado que se destinem a integrar o capital social de outras sociedades.
Esta exigência visa assegurar a conformidade da gestão com as normas legais consagradas no nosso ordenamento jurídico, credibilizar a mesma e, sobretudo, constitui uma garantia para todos aqueles que, não tendo uma intervenção directa na gestão das empresas, têm, no entanto, nas mesmas aplicadas as suas economias e, porquanto, a necessidade de que entre a gestão e esses interessados se interponha uma figura que salvaguarde a transparência de processos e a garantia de que os resultados apresentados, bem como a situação patrimonial das empresas, é consonante com a realidade dos factos.
Lógico é que o exercício desta profissão, dados os relevantes interesses em apreço, tenha a suportá-lo um normativo de ordem pública que, por um lado, lhe confira credibilidade e, por outro, constitua uma garantia de seriedade e transparência para todos aqueles a quem a mesma se destina ou dela se servem.
Facilmente se compreende a necessidade de revisão do Decreto-Lei n.º 519-L2/79, de 29 de Dezembro, dado o seu tempo de vigência e a consequente vantagem em o adaptar às novas realidades, bem como consagrar no mesmo normas de direito comunitário consagradas em diversas normativas da Comunidade.
Sabemos, entretanto, que a proposta de lei n.º 47/VI surge na decorrência de diversos contactos e estudos elaborados com a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, contactos e estudos que conduziram à concretização de um projecto de decreto-lei, que se encontra acordado entre as partes. Não obstante a explicação dada sobre este aspecto pelo Sr. Secretário de Estado, consideramos que a nossa discussão fica diminuída na medida em que esse projecto de decreto-lei, apesar de não se encontrar concluído, viria enriquecer esta discussão e necessariamente também o contributo que a Assembleia da República, através dos Deputados, poderia dar àquilo que já se encontra trabalhado em relação a este decreto.
Depreende-se, entretanto, da presente proposta de lei, uma vontade de entregar à Câmara dos Revisores de Contas a gestão universal do exercício desta profissão, terminando assim a tutela que o Ministério da Justiça sobre ela exercia. Tal facto, do nosso ponto de vista positivo, não nos parece que irá acontecer na totalidade, na medida em que nos fica a sensação de que se irá manter a tutela que o Governo, através do Ministério da Justiça, ainda detém, em especial no que concerne às deliberações do conselho de inscrição.
Pensamos que seria mais aconselhável que, no domínio das inscrições dos revisores oficiais de contas, tal atribuição fosse da competência da Câmara e, no caso de divergência dos interessados com as deliberações do conselho de inscrição, coubesse recurso para os tribunais comuns e nunca para o Ministério da Justiça. Assim, fica--se com a sensação de que, neste domínio, o Governo não pretende entregar a total autonomia à Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, na medida em que pretende continuar a tutelar um dos mais importantes mecanismos do funcionamento da profissão.
Por outro lado, em nosso entender, não se cuida, em termos de preocupação, suficientemente a criação de mecanismos de total independência dos revisores oficiais de contas em relação às entidades a quem prestam a sua actividade. Sabemos que este é um dos pormenores importantes no exercício de qualquer profissão liberal e, por isso, a lei deve prever mecanismos capazes de salvaguardar os profissionais, na sua independência, para que não tenham que vender a sua idoneidade e honorabilidade quando executam esse tipo de serviços.
Pensamos que a proposta de lei não nos deixa apreender a instituição de qualquer mecanismo capaz de salvaguardar esta idoneidade e esta integridade por parte dos revisores oficiais de contas e este é um dos aspectos mais importantes do exercício da profissão, pois sabemos que muitas vezes estes profissionais são sujeitos às mais diversas pressões, com vista a menosprezarem aspectos de capital importância no que concerne à credibilidade e fidelidade das contas que certificam.
Deixamos aqui esta preocupação, com a esperança de que o Governo acolha, no decreto-lei a publicar, medidas e mecanismos que não permitam o desvirtuamento do exercício da profissão de revisores oficiais de contas.
Finalmente, o Partido Socialista acolhe de bom grado a ideia inserta na presente proposta de lei de consagrar a possibilidade da existência de sócios não revisores oficiais de contas, salvaguardando, como já foi suscitado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, que a qualidade desses revisores não sócios nunca seja susceptível de desvirtuar o sentido do exercício da profissão.
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Todavia, salvaguardado este mecanismo, pensamos que a inclusão de revisores não sócios só pode vir a enriquecer o trabalho final, porque permite o entrosamento de diversas experiências, quando não isoladas e conexas com o resultado final da revisão.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Deixamos expresso o nosso pensamento relativamente à proposta de lei n.º 47/VI. Não obstante lamentarmos o facto do projecto de decreto-lei não nos ter sido remetido pelo Governo, mas depois das explicações dadas pelo Sr. Secretário de Estado, o Partido Socialista vai votar favoravelmente a presente proposta de lei.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carvalho Martins.
O Sr. António Carvalho Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A primeira consagração legislativa, em Portugal, da figura dos revisores oficiais de contas teve lugar em Novembro de 1969, aquando da revisão do regime jurídico de fiscalização das sociedades anónimas, atribuindo aos revisores oficiais de contas funções de interesse público no âmbito da fiscalização das contas e da gestão das sociedades anónimas. É assim consagrada legalmente a figura dos revisores oficiais de contas e era preciso, a partir daí, dar corpo à sua organização, modo de funcionamento e de responsabilização.
Aparece, por isso, o Decreto-Lei n.º 1/72, de 3 de Janeiro, que criou a Câmara de Revisores Oficiais de Contas e a respectiva Comissão, e mais tarde, com a Portaria n.º 837 74, de 6 de Fevereiro, a sua regulamentação. Entre 3 de Janeiro de 1972 e 6 de Fevereiro de 1974 é publicada a primeira lista de revisores oficiais de contas, com um número total de 59.
Foi, portanto, ao longo da década de 70 que foram dados os primeiros passos, verificando-se um progressivo alargamento das funções de interesse público cometidas por lei aos revisores, consubstanciadas, nomeadamente, na atribuição aos mesmos de funções de fiscalização nas empresas públicas, pelo Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, e elaboração de pareceres sobre contas, nos termos do Decreto-Lei n.º 135/77, de Junho.
Mas é ao longo da década de 80, com o Decreto-Lei n.º 519-L2/79 de 29 de Dezembro, esteio fundamental no enquadramento institucional e no desenvolvimento da profissão, com a publicação do Código das Sociedades Comerciais, a aprovação do Plano Oficial de Contabilidade, a constituição da Comissão de Normalização Contabilística, a integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia, que se dão de facto passos importantes para o progresso, desenvolvimento e afirmação da profissão de revisor oficial de contas.
A década de 90 terá de ser, sem dúvida, a década da consolidação profissional num espaço alargado e difícil, o do Mercado Único Europeu. Em particular, 1993 trará para Portugal uma clara aceleração no processo de abertura e internacionalização da nossa economia, processo esse que, ainda por cima, se efectua num enquadramento recessivo da economia mundial.
Acontecimentos como o fim do período de transição, a entrada em funcionamento do Mercado Único Europeu, a intensificação da liberalização do comércio mundial, irão ter consequências importantes no tecido empresarial português, levantando novos problemas e grandes desafios, consequentemente também à classe profissional de revisores oficiais de contas, cuja função é de proceder à verificação e certificação das contas, implicando por isso mais responsabilização, mais especialização e maior concorrência profissional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estão presentemente sujeitas a revisão legal as empresas públicas, as sociedades anónimas, as sociedades por quotas com ou sem conselho fiscal e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada. Nestes dois últimos casos, incide apenas sobre as empresas de certa dimensão económica e social fixadas por lei. A finalidade básica da revisão é obter uma opinião objectiva e imparcial sobre as contas anuais, compreendida nas demonstrações financeiras, no sentido que tais demonstrações apresentem uma imagem verdadeira e apropriada da sua situação financeira à data do balanço e de acordo com os princípios contabilísticos geralmente aceites. Ou seja, em termos simples, emitir um documento que certifique a qualidade das demonstrações financeiras, isto é, da informação e que tem o nome técnico de certificação legal de contas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao longo dos últimos anos tem-se assistido à transposição de um conjunto de directivas para a ordem jurídica nacional com um claro impacte na profissão de revisor oficial de contas, destacando-se a Directiva n.º 89/48/CEE, relativa ao sistema geral de reconhecimento dos diplomas do ensino superior para o exercício de uma actividade profissional, através do Decreto-Lei n.º 289/91, de 10 de Agosto, instrumento legal que abre inegavelmente novas perspectivas profissionais no âmbito do Mercado Comum, trazendo obviamente uma competitividade acrescida para os profissionais portugueses e, acima de tudo, uma maior qualidade nos serviços prestados, que a proposta de lei, no seu artigo 2.º, alínea e), se propõe adequar ao regime jurídico dos revisores oficiais de contas.
Além disso, a proposta de lei visa também consagrar a possibilidade de existência de sócios não revisores nas sociedades de revisores oficiais de contas, com o claro objectivo de reforçar a estrutura organizativa e funcional, bem como a possibilidade de recurso para o Ministro da Justiça das deliberações do Conselho de Inscrição, no que respeita aos requisitos de acesso à profissão, visando, em última análise, reestruturar o exercício da actividade de revisor oficial de contas, tendo em conta as profundas modificação/exigências que se têm feito e sentido, nos últimos anos, na economia portuguesa e em todo o seu edifico jurídico.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, desejava tecer apenas mais duas considerações sobre o tema.
É do conhecimento público e dos observadores mais atentos que os revisores oficiais de contas desejavam um novo estatuto e, sobretudo, acalentavam que esse novo estatuto viesse atingir três grandes objectivos: primeiro, o fim de um peso público directo no controlo da actividade dos revisores de oficiais de contas; segundo, modificar alguns aspectos do acesso à profissão, designadamente o acesso de estrangeiros e de quem, por via indirecta, não seja especificamente revisor oficial de contas e, finalmente, assegurar algum controlo na gestão e orientação da formação própria.
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Temos a ideia de que os revisores oficiais de contas estão, de um modo geral, de acordo com o estatuto preparado pelo Governo. De resto, isso afere-se de conversações havidas com os interessados e basta-nos tratar-se de assegurar uma disciplina de uma associação pública de profissionais que exercem uma função de interesse público, basta-nos esse acordo fundamental dos interessados, para sermos obviamente favoráveis a esta iniciativa legislativa.
De facto, o regime em vigor está profundamente marcado pela história e pelas modas de então. O regime dos revisores oficias de contas, como muitas outras leis do mesmo tempo, está marcado pela preocupação minuciosa do controlo dos poderes públicos, razão pela qual é muito melhor a nova opção pela criação de uma associação pública de cariz profissional.
De resto, a importância dos revisores oficiais de contas tem crescido cada vez mais, nomeadamente no que diz respeito às modificações legislativas que ocorreram no País, das quais é possível lembrar algumas como o IVA, a reforma fiscal da tributação directa, o Código das Sociedades Comerciais, as regras sobre a consolidação de contas e as próprias directivas comunitárias- por exemplo, estou a lembrar-me das fusões transfronteiriças.
De facto, a importância desta profissão tem crescido, havendo já universidades privadas que pensam no estabelecimento de um curso especificamente destinado a estes profissionais. Julgamos que é preciso dignificar esta profissão, que é pluridisciplinar e tem um grau de exigência em termos de formação quase inexcedível, pelo que o CDS é a favor deste passo no sentido da dignificação dos revisores oficiais de contas.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos.
Pausa.
Srs. Deputados, antes de passarmos à votação dos diplomas pendentes, vou ler uma carta enviada por S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, que é do seguinte teor.
Estando prevista a minha deslocação a Bruxelas entre os dias 14 e 16 do corrente mês de Março para proferir uma conferência, a convite das Grandes Conferences Catholiques, venho requerer, nos termos dos artigos 132.º, n.º l, e 166.º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura de um parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.
O Sr. Secretário (João Salgado):- A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Exª o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar em visita de carácter oficial, a Bruxelas, entre os dias 13 e 16 do corrente mês de Março, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:
Nos termos do n.º l do artigo 132.º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à visita de carácter oficial a Bruxelas, entre os dias 13 e 16 do corrente mês de Março.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de resolução.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar ainda conta de um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Santiago do Cacém, a Assembleia da República decidiu não autorizar o Sr. Deputado Carlos Manuel Duarte Oliveira a suspender o seu mandato a fim de comparecer no Tribunal de Polícia de Lisboa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 49/VI - Altera a Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Lei n.º 10/87, de 4 de Abril), apresentado pelo PCP.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS, votos a favor do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e abstenções do PS e do PSN.
Srs. Deputados, vamos votar o projecto de lei nº 185/VI - Lei das Associações de Defesa do Ambiente (PSD).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PS e abstenções do PCP, do CDS, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 265/VI - Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Os Verdes).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e abstenções do PS, do CDS e do PSN.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta de lei n.º 47/VI - Autoriza o Governo a rever o regime jurídico dos revisores oficiais de contas.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.
Srs. Deputados, terminámos, por hoje, os nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, dia 5, pelas 10 horas, tendo como ordem do dia a discussão das ratificações n." 49/VI (PS) e 53/VI (PCP), ambas relativas ao Decreto-Lei n.º 240/92, de 29 de Outubro, que transforma o Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETT) em Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI), 50/VI (PCP) e 51/VI (PS), também as
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5 DE MARÇO DE 1993 1581
duas referentes ao Decreto-Lei n.º 247/92, de 7 de Novembro, que racionaliza o emprego dos recursos humanos da Administração Pública e, finalmente, 52/VI (PS), relativa ao Decreto-Lei n.º 238/92, de 29 de Outubro, que regula o policiamento de espectáculos desportivos realizados em recintos desportivos.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Álvaro José Martins Viegas.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Francisco João Bernardino da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Pereira Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Partido Socialista (PS):
António Domingues de Azevedo.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
Maria Teresa Dona Santa Clara Gomes.
Centro Democrático Social (CDS):
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Deputado independente:
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
João Álvaro Poças Santos.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Pedro Manuel Cruz Roseta,
Partido Socialista (PS):
Ana Maria Dias Bettencourt.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Jaime José Matos da Gama.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.
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