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Quinta-feira, 6 de Maio de 1993 I Série - Número 66

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE MAIO DE 1993

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas e de requerimentos ao Governo.
O Sr. Deputado António Filipe (PCP), a propósito do IV Congresso da Juventude Comunista Portuguesa recentemente realizado, fez um balanço crítico da política de juventude do Governo, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Nobre (PSD) e António José Seguro (PS).
O Sr. Deputado Casimiro de Almeida (PSD) abordou problemas diversos do concelho de Oliveira de Azeméis.
O Sr. Deputado António Campos (PS) criticou a política seguida pelo Ministério da Agricultura no que se refere à sanidade animal e à saúde pública e respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Duarte (PSD), Lino de Carvalho (PCP), António Lobo Xavier (CDS) e Mário Maciel (PSD).
Foi aprovado o voto n.º 80/VI (PS e PCP) - De pesar pelo falecimento do historiador de arte Túlio Espanca, sobre o qual intervieram os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Armando Cunha (PSD) e Luís Capoulas Santos (PS). No fim, a Câmara guardou um minuto de silêncio.

Ordem do dia.- Foram aprovados quatro pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando três Deputados a deporem em Tribunal como testemunha e outro denegando-a ao Sr. Presidente da Assembleia.
Procedeu-se à discussão da proposta de lei n.º 55/VI - Autoriza o Governo a alterar o regime contra-ordenacional aplicável às violações das normas legais sobre o direito de habitação periódica e direitos análogos, que foi aprovada na generalidade, na especialidade e em votação final global. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Turismo (Alexandre Relvas), os Srs. Deputados António Lobo Xavier (CDS), Raul Castro (Indep.), António Vairinhos (PSD), José Vera Jardim (PS), António Filipe (PCP), Manuel dos Santos (PS), Correia Afonso (PSD) e Joaquim da Silva Pinto (PS). Produziram declarações de voto os Srs. Deputadas José Vem Jardim (PS) e Carlos Coelho (PSD).
Procedeu-se à eleição do presidente e dois vogais da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados (CNPDPI).
Foi rejeitado, na generalidade, o projecto de lei n.º 137/VI - Alarga o período de protecção post mortem dos direitos de autor (PCP) e aprovado o projecto de deliberação nº 60/VI - Constituição de uma Comissão Parlamentar para o Contacto com as Cortes de Espanha (PSD).
A Câmara apreciou ainda a proposta de resolução n.º 20/VI - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Protecção das Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Carácter Pessoal, tendo intervindo, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro), os Srs. Deputados José Magalhães e Alberto Martins (PS), Odete Santos (PCP), António Lobo Xavier (CDS) e Ana Paula Barros (PSD).
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cipriano Rodrigues Martins.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Manuel Borregaria Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Luis António Carrilho da Cunha.
Luis António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luis Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.

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António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luis Filipe Marques Amado.
Lufe Filipe Nascimento Madeira.
Luis Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Arménio Horácio Alves Carlos.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calcada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
José Luís Nogueira de Brito.
Juvenal Alcides da Silva Costa.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Mário António Baptista Tomé.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as propostas de lei n.08 56/VI - Integração desportiva nacional (ALRM), que baixou à 7.ª Comissão, 57/VI - n Lei de Programação Militar (Lei n.º 15/87, de 30 de Maio) e 58/VI - Altera a Lei n.º 1/85, de 23 de Janeiro (lei quadro das leis de programação militar), que baixaram à 4.ª Comissão.
Deram também entrada na Mesa as ratificações n.ºs 611 VI - Decreto-Lei n.º 133/93, de 26 de Abril, que aprova a Lei Orgânica do Ministério da Educação (PS), 68/VI - Decreto-Lei n.º 136/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica do Departamento do Ensino Superior (PS), 69/VI - Decreto-Lei n.º 137/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica do Departamento do Ensino Secundário (PS), 70/VI -Decreto-Lei n.º 138/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica do Departamento da Educação Básica (PS), 71/VI- Decreto-Lei n.º 139/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica do Departamento de Gestão de Recursos Educativos (PS), 72/VI -Decreto-Lei n.º 140/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica da Inspecção-Geral da Educação (PS), 73/VI-Decreto-Lei n.º 141/93, de 26 de Abril, que estabelece a orgânica das direcções regionais de educação (PS) e 74/VI - Decreto-Lei n.º 144/93, de 26 de Abril, que estabelece o regime jurídico das federações desportivas dotadas do estatuto de utilidade pública desportiva (PS).
Deram igualmente entrada na Mesa os inquéritos parlamentares n.ºs 14/VI - Constituição de uma comissão eventual de inquérito com vista a dar continuidade à averiguação cabal das causas e circunstâncias em que ocorreu a tragédia que, em 4 de Dezembro de 1980, vitimou o Sr. Primeiro-Ministro, Dr. Francisco de Sá Carneiro, o Sr. Ministro da Defesa, engenheiro Adelino Amaro da Costa, e seus acompanhantes (PSD) e 15/VI-Constituição de uma comissão eventual de inquérito com vista ao apuramento das factualidades referentes a actos praticados pelo Sr. Secretário de Estado da Agricultura e, designadamente, a legalidade ou ilegalidade do seu despacho de 29 de Junho de 1992, relativo à atribuição de indemnizações e montantes compensatórios (PSD).
Deram ainda entrada na Mesa as interpelações n.º 9/VI - Debate de política geral, centrado sobre a situação econó-

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mica e as consequências da recessão para o futuro do País (PS) e IO/VI-Debate sobre política do Governo e a situação dos resíduos em Portugal (Os Verdes).
Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Ema Paulista, Caio Roque, José Manuel Maia, Luis Peixoto, Fialho Anastácio, Raúl Castro e Arménio Carlos; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulados pelos Srs. Deputados Leonor Coutinho e Octávio Teixeira; ao Ministério da Agricultura, formulados pelos Srs. Deputados António Murteira, Carlos Marta Gonçalves e Mário Tomé; ao Ministério da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados Odete Santos e Álvaro Viegas; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelo Sr. Deputado Fonseca Silva; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Castro e Mário Tomé; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados António Murteira, José Gameiro dos Santos, Isabel Castro e Luís Peixoto; à Câmara Municipal de Silves, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Viegas, e ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ao abrigo do artigo 8.º, n.º 2, dou a palavra ao Sr. Deputado António Filipe, para uma intervenção de interesse político relevante.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Utilizo hoje o direito que o Regimento me confere de produzir uma intervenção nesta sessão legislativa sobre um assunto de interesse político relevante, para me referir ao IV Congresso da Juventude Comunista Portuguesa (JCP), realizado nos passados dias 3 e 4 de Abril na cidade do Barreiro.
Este Congresso, que culminou um intenso debate preparatório em que participaram milhares de jovens comunistas, procedeu a uma análise detalhada da situação, problemas e movimentos da juventude e dos efeitos da política governamental sobre esta camada social. Debateu e aprovou as soluções orgânicas e de direcção para uma intervenção dinâmica dos jovens comunistas, bem como as propostas da JCP para o desenvolvimento da acção e luta da juventude portuguesa por uma política que efectivamente corresponda à defesa dos seus direitos e à concretização das suas legítimas aspirações.
O IV Congresso da JCP analisou com particular detalhe os principais aspectos e consequências da chamada política de juventude do governo PSD nos últimos quatro anos. O balanço é claramente negativo. Mais uma vez, as promessas com que o PSD conseguiu convencer muitos milhares de jovens ficaram por cumprir. Mais uma vez, as expectativas de muitos jovens que acreditaram nessas promessas saíram goradas.
Há sete anos que o PSD governa sozinho e há mais de 13 que integra o Governo em áreas chave para a política de juventude. O que se alterou de essencial para melhor, para a generalidade dos jovens portugueses? O que ganharam os jovens trabalhadores com o governo PSD, senão mais precaridade no emprego e menos direitos sociais? Que benefícios tiveram os trabalhadores-estudantes com os governos PSD, primeiro responsável pelo incumprimento do seu Estatuto? O que fizeram os governos PSD de tantos milhões de contos que entraram em Portugal para financiar o sistema de formação profissional, para além de promover acções descoordenadas e alimentar a ganância de alguns empresários corruptos? O que melhorou efectivamente no sistema educativo, que se vê hoje a braços com uma situação de crise e instabilidade generalizadas? Que novas possibilidades foram dadas aos jovens para terem acesso a uma habitação condigna?
Já passou tempo suficiente para podermos concluir que as promessas do PSD ficaram todas no papel. Nos anos que passaram, não faltaram oportunidades para superar atrasos e para melhorar as condições de vida, de trabalho e de estudo dos jovens portugueses. Não faltaram centenas de milhões de contos de fundos comunitários que poderiam ter sido decisivos na superação do atraso dos sistemas educativo e de formação profissional. Não faltou uma situação económica internacional com condições excepcionais, que tão cedo não se repetirão, para o desenvolvimento económico e para o melhoramento das condições de vida.
Não faltaram as oportunidades, mas faltou a vontade política. E hoje, com o mundo capitalista em crise, com a recessão instalada e para ficar em Portugal, os jovens começam a pagar mais dolorosamente a factura da política neoliberal do PSD, alheia a quaisquer direitos dos jovens ou a quaisquer princípios de justiça social.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o engenheiro Couto dos Santos já fez um ano como Ministro da Educação. Não merece as nossas felicitações.
A acção deste ministro não veio alterai em nada a natureza essencial da política educativa que o PSD tem vindo, há 13 anos, a pôr em prática. Esta política tem vindo a afundar ministros atrás de ministros e cada um que aparece consegue ser pior que os anteriores e, prosseguindo a mesma política, agravar a situação em que encontra o sistema educativo.
O Ministro Couto dos Santos não é excepção. E se por alguma coisa ele se destaca é por ter transformado o disparate em discurso oficial do Estado e por ter transformado a arrogância, a prepotência, a provocação, a ameaça e mesmo o recurso à repressão, como formas de actuação do Governo face aos justos protestos e manifestações dos estudantes.
O PSD recusa-se a entender a educação e o ensino como direitos sociais fundamentais e como elementos essenciais de desenvolvimento e de progresso económico, social e cultural. O PSD concebe a educação e o ensino como meros privilégios individuais e assume o projecto de uma sociedade dividida entre os que possam pagar esse privilégio e os que não podendo se vêem condenados ao insucesso e abandono escolares.
Esta orientação estratégica traduz-se numa política educativa que aponta para a desvalorização da escola pública e particularmente do ensino básico obrigatório e para a descapitalização do sistema de ensino público, a todos os níveis, estrangulando o crescimento dos meios financeiros que o suportam, provocando a sua descaracterização e degradação, privilegiando o crescimento do ensino privado, inculcando a ideia de que quem quiser estudar tem de possuir meios económicos para suportar os custos reais do ensino.
A convergência do sistema educativo português com os sistemas educativos dos restantes países da Comunidade Europeia em termos de sucesso e de níveis de escolaridade, superando uma situação de profundo atraso educativo nacional, que foi anunciada há cerca de cinco anos pelo pró-

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prio Governo como um objectivo estratégico, nunca passou de ficção.
Nunca se realizou, apesar dos fundos comunitários, o esforço de investimento que seria necessário para atingir taxas de escolaridade próximas das que existem nos demais países da Comunidade Europeia.
Os governos PSD têm vindo a restringir deliberadamente o acesso ao ensino superior público através de sistemas de numerus clausus, mais ou menos encapotados, que limitam drasticamente as possibilidades de ingresso, introduzem graves injustiças no acesso ao ensino superior e consolidam a posição de Portugal como o país mais atrasado da Comunidade Europeia ao nível da capacidade de oferta do ensino superior, mesmo considerando o crescimento anárquico e, em alguns casos, desprestigiante do ensino superior privado que esta política provocou.
O governo PSD inviabiliza financeiramente o investimento no ensino superior público e mesmo o seu funcionamento normal. Mantém a acção social escolar a níveis escandalosos e decidiu recentemente extinguir os Serviços Sociais Universitários e passar os seus encargos para as próprias Universidades, sem querer saber da opinião dos estudantes ou das próprias instituições.
No entanto, o exemplo mais flagrante da prepotência, do ataque ao ensino superior público, da tentativa de acentuar a elitização social no acesso e frequência do ensino superior e da alienar as responsabilidades do Estado para com o financiamento do ensino superior público, está na absurda lei das propinas, que pretende ser um primeiro passo no sentido de impor aos estudantes e às suas famílias o pagamento do chamado custo real do ensino e contrariar a progressiva gratuitidade do acesso aos graus mais elevados de ensino, que a nossa Constituição estabelece.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não sabemos até onde chegará o Ministro da Educação no seu desvario para impor o aumento das propinas. Fracassou a tentativa de convencer os estudantes da bondade do aumento. Fracassaram tentativas sucessivas de instrumentalização do movimento associativo. Caíram no ridículo as ameaças mais absurdas aos estudantes. Não sabemos até onde levará a desorientação do Ministro, mas sabemos muito bem que os estudantes continuarão a recusar o aumento das propinas e a lutar com firmeza e coragem contra a aplicação desta lei iníqua e violadora de um direito fundamental.
Embora a situação da educação tenha estado naturalmente em destaque no IV Congresso da JCP não foi apenas sobre esta matéria que incidiram os debates e as preocupações. Não é apenas ao nível da educação que se faz sentir o carácter anti-juvenil da política do Governo. Também a situação que se vive no mundo do trabalho, que afecta duramente muitos milhares de jovens trabalhadores, é bem reveladora da natureza anti-juvenil do governo PSD.
A precarização dos vínculos laborais que se tem vindo a acentuar de há vários anos é geradora de uma completa instabilidade na vida dos jovens trabalhadores, e toma-se ainda mais grave agora, que a recessão se instalou, e que a destruição de postos de trabalho é uma realidade diária.
Acentuou-se o ataque aos direitos dos jovens trabalhadores. O alcance social dos regimes de protecção no desemprego é diminuto. Os horários de trabalho são dos mais elevados da Europa. Faltam condições de higiene e segurança no trabalho. Continua a vergonha do trabalho infantil. O sistema de formação profissional continua inconsequente e a servir para o enriquecimento de clientelas que metem ao bolso muitos milhares de contos dos fundos comunitários.
Os trabalhadores-estudantes continuam a ser preteridos na efectivação dos seus direitos, a deparar com as maiores dificuldades na frequência dos estudos e a não ver aplicado o seu estatuto legal.
A falta de acesso à habitação, o serviço militar obrigatório que se reduz antes das eleições e se prolonga depois, num quadro em que a profissionalização das Forças Armadas começa a aparecer como objectivo mal disfarçado do Governo, a falta de meios e condições de atendimento e tratamento de tantos milhares de jovens vítimas de toxicodependência, a incerteza de tantos jovens quanto ao futuro, são também traços marcantes das consequências negativas da acção governativa do PSD.
Há uns anos atrás o Governo lançou com todo o aparato e toda a demagogia a tão falada política global e integrada de juventude. Movimentou avultados meios financeiros. Criou o Instituto da Juventude. Instalou centros de juventude em quase todos os distritos. Apostou na propaganda. Criou uma rede de informação dirigida aos jovens. Criou um conjunto de programas destinados a envolver largos milhares de jovens. Incumbiu membros do Governo de se dedicarem exclusivamente a pôr estas acções em prática.
Os objectivos desta política sempre foram claros para nós. O governo PSD pretendeu e pretende controlar o associativismo e o activismo juvenil. Substituir a livre iniciativa dos jovens pelo seu envolvimento em acções promovidas pelo Governo. Gerir os apoios ao associativismo juvenil em função das simpatias partidárias, pondo em causa a sua autonomia e independência.
Os contornos mais recentes desta política são particularmente graves. A confusão entre a JSD e o aparelho de Estado é escandalosa. Não há qualquer transparência na gestão dos dinheiros públicos para a área da juventude. Os apoios ao associativismo juvenil têm vindo a ser drasticamente diminuídos de ano para ano e são geridos sem qualquer pudor em função de interesses partidários. São manifestos e escandalosos os cortes de apoios ao Conselho Nacional de Juventude e à Associação Académica de Coimbra a partir do momento em que essas estruturas passaram a assumir posições críticas em relação à política do Governo. Sucedem-se as ingerências e as chantagens sobre as associações juvenis.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, muito mais do que criticar a política do governo PSD, o IV Congresso da JCP apresentou um conjunto de propostas e reivindicações para uma política que resolva efectivamente os problemas dos jovens. Estas propostas e reivindicações, constantes da base programática para o desenvolvimento da acção e da luta da juventude portuguesa aprovada pelo Congresso da JCP, correspondem às mais profundas aspirações da juventude portuguesa e traduzem um projecto político de defesa e consolidação do regime democrático-constitucional, de garantia e desenvolvimento da democracia política, de construção da democracia económica, social e cultural e de afirmação da soberania nacional.
A base programática aprovada pela JCP no seu IV Congresso, que assume como objectivos prioritários e essenciais

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a luta pelo direito ao ensino, ao emprego estável e com condições dignas, à habitação, à saúde e a uma vida independente, a uma ampla participação social, constitui o ponto de partida para uma política alternativa, capaz de responder aos problemas mais gritantes com que se debate a juventude e capaz de mobilizar as energias dos jovens num grande projecto para transformar Portugal num país mais democrático, mais participado, mais justo, mais humano e mais jovem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Nobre e António José Seguro.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.

O Sr. Lufe Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, antes de mais, quero comunicar-lhe o meu júbilo pelo facto de a JCP ter realizado o seu IV Congresso e pelo facto de, apesar de os anos passarem, V. Ex.ª continuar muito dignamente a representar a JCP, o que decerto tem a ver com a profunda renovação de quadros que VV. Ex.ªs têm realizado nos últimos anos.

Vozes do PSD: - É até aos 100 anos!

O Sr. João Amaral (PCP): - O que vocês têm é inveja!

O Orador: - No entanto, o que me preocupa é que um jovem que já anda há tanto tempo nestas lides continue, apesar disso, a manter a miopia inicial sobre as questões da juventude, miopia essa que se revela, por exemplo, no problema da habitação.
Mas com a miopia do vosso congresso ou com a miopia de V. Ex.ª - não sei bem, pois foram suas todas as conclusões -, esqueceu-se de nos dizer que este ano tinham sido tomadas medidas por parte deste Governo, designadamente os incentivos ao arrendamento jovem. VV. Ex.ªs não os referiram, talvez por entenderem que não tem importância que a prestação pecuniária da renda de casa de alguns jovens seja subsidiada pelo Estado, desde que estejam nas condições previstas na lei.
Por outro lado, para a JCP e para o Sr. Deputado, de acordo com a sua intervenção, também não tem qualquer importância o ensino superior privado. Decerto preferiam que todo o ensino fosse público e que a liberdade de ensinar fosse tolhida, pelo que não fazem qualquer referência a essa questão.
Ainda uma outra questão, a questão dos jovens e do emprego. VV. Ex.ªs, com certeza, também não notaram que nos últimos três anos houve uma real diminuição de jovens desempregados neste país e uma melhoria na remuneração do primeiro emprego dos jovens.
Para terminar, gostava de lançar um desafio. V. Ex.ª fez a acusação de que havia falta de transparência nos dinheiros distribuídos pela Secretaria de Estado da Juventude ao associativismo. Mais grave, insinuou que havia uma confusão entre a JSD e essa mesma Secretaria de Estado.
Sr. Deputado, tendo vindo cá várias vezes o Sr. Ministro Adjunto e a Sr. Secretária de Estado da Juventude, é pena que V. Ex.ª nunca tenha referenciado essa questão, quando se confrontou com eles, antes pelo contrário, sempre a tenha omitido. O Sr. Deputado preferiu esconder essas questões e vir aqui hoje dizer que há falta de transparência a esse nível.
Assim, desafio-o a dizer em que situações é que existe essa falta de transparência, pois teremos muito gosto e muito prazer em debatê-las profundamente em sede de Comissão de Juventude, uma vez que temos a consciência bem tranquila, o que certamente não acontece com VV. Ex.ªs, designadamente nas câmaras municipais da CDU, onde o apoio ao associativismo é bem controlado e é sempre concedido a associações de jovens, que como V. Ex.ª pensam continuar a ser muito jovens.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Filipe quer responder já ou no fim?

O Sr. António Filipe (PCP): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, gostava de, em nome da Juventude Socialista e do Grupo Parlamentar do PS, felicitar a JCP pela realização do seu congresso irais também gostava de aproveitar esta oportunidade para lhe dizer quanto lamento que o Sr. Deputado não tivesse centrado mais a sua atenção nas questões da educação.

Protestos do Deputado do PSD Silva Marques.

E faço-o não só pelas razões por que o Sr. Deputado Silva Marques está neste momento nervoso mas, particularmente, porque as questões da educação são, neste momento, questões centrais não só para os jovens portugueses como também para o desenvolvimento estratégico do País.
Ontem, infelizmente, fomos confrontados com mais uma ausência de diálogo por parte do Governo, o que esteve na origem dos conflitos entre polícias e estudantes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD):- E quem foram os provocadores?

O Orador: - Srs. Deputados, estamos face a uma lei que, segundo me parece, se falasse e tivesse pernas, há muito que ela própria se tinha envergonhado de existir e ido embora.
Só por pura teimosia do Primeiro-Ministro, do gestor político do Ministério da Educação, da bancada do PSD e da JSD é que ainda permanece a insensibilidade para não pôr de parte, de uma vez por todas, a lei das propinas.

Aplausos do PS.

Trata-se de uma lei que foi aprovada na Assembleia da República muito rápida e tardiamente e que teve de ser suportada, pela primeira vez, por spots publicitários, sem que o Governo fosse capaz de ter a coragem de a assumir frontalmente na Assembleia da República no seu Programa ou na sua campanha eleitoral. À última da hora, teve de pró-

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por alterações à Lei do Orçamento do Estado para obrigar os estudantes, para os coagir a pagar as propinas nas respectivas academias.
Por último, houve ameaças, designadamente a ameaça escandalosa feita pelo Ministro da Educação no sentido de que quem não pagasse propinas não poderia entrar na função pública.
Ontem, o Sr. Ministro da Educação veio à Assembleia da República, à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, e esteve cá bastante tempo. Aliás, segundo consta, chegou uma hora mais cedo, penso que por razoes de tráfego na Avenida de 5 de Outubro.
Nessa reunião, fizemos um apelo, mais ao homem do que ao político, mais ao cidadão do que ao ministro, do seguinte teor «Sr. Ministro da Educação, por favor, tenha a coragem de perceber o que se está a passar no ensino superior em Portugal. A única coisa que pedimos é que dialogue com todas as associações de estudantes para que, de uma vez por todas, a paz possa voltar às universidades portuguesas».
Assim, Sr. Deputado António Filipe, a pergunta que lhe faço é no sentido de saber se o senhor e o seu grupo parlamentar são sensíveis a este apelo e estão de acordo em reforçá-lo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero agradecer as perguntas que me fizeram, bem como as felicitações que dirigiram à JCP.
Sr. Deputado Luís Nobre, relativamente à referência que fez à minha idade, devo dizer-lhe que o tempo passa com igual velocidade sobre mim e sobre V. Ex.ª e, além disso, não temos uma diferença de idade significativa.
Por outro lado, quero lembrar-lhe que neste IV Congresso da JCP verificou-se uma muito significativa renovação, nomeadamente na área dos dirigentes, na medida em que a direcção eleita tem uma média de idades na ordem dos 23 anos, o que representa, seguramente, uma substancial renovação dos quadros dirigentes.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): -São mais novos do que os da JSD!

O Orador: - Vou agora referir-me as questões políticas que suscitou. O Sr. Deputado estranhou eu ter vindo aqui referir a falta de transparência na atribuição de subsídios ao movimento juvenil. Ora, não é a primeira vez que refiro esta questão. Aliás, se o Sr. Deputado esteve atento à última discussão do Orçamento do Estado, isto mesmo foi referido por mim, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, nesta Assembleia, quer no que se relaciona com o volume de verbas envolvido, que tem diminuído significativamente, quer no que se relaciona com o compadrio na atribuição de subsídios. E repito a acusação.
Se o Sr. Deputado quiser apresento-lhe casos concretos. O Conselho Nacional de Juventude está há três anos com o mesmo nível de apoio por parte do Governo, que é de 12 000 contos. Ora, esta situação não se altera de há três anos para cá, porque, de facto, há um envolvimento da JSD nas actividades do Conselho Nacional de Juventude.
Por outro lado, é público e notório que os apoios à Associação Académica de Coimbra diminuíram drasticamente a partir do momento em que esta importante associação de estudantes passou a assumir posições críticas relativamente à política educativa do Governo. Estas acusações são públicas, foram feitas pelos próprios dirigentes associativos e, portanto, não tenho qualquer problema em repeti-las aqui.
O Sr. Deputado António José Seguro colocou a tónica numa questão que consideramos central e que procurei referir na minha intervenção, à semelhança do que aconteceu no nosso congresso onde ela também foi discutida, que é a questão da política educativa.
Em relação a esta questão, o aspecto que consideramos, particularmente, mais absurdo da política educativa deste Governo, no momento presente, no momento em que por toda a Europa e também em Portugal se discutem alternativas e estratégias sérias para o desenvolvimento do ensino superior que é inquestionavelmente necessário, é a lei das propinas, que procura não incentivar mas reduzir sensivelmente as possibilidades dos jovens portugueses acederem ao ensino superior. Esta lei é um absurdo, e estamos à vontade para o dizer, porque até este momento fomos o único grupo parlamentar que apresentou, nesta Assembleia, um projecto de lei para a revogação da lei das propinas, que aguarda agendamento para discussão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos com as intervenções, quero, em primeiro lugar, fazer um aviso à Câmara: entre as 16 e as 18 horas terá lugar, na Sala D. Maria, a votação para a eleição dos três membros da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados. Os escrutinadores são os Srs. Deputados Maria da Conceição Rodrigues, do PSD, Alberto Araújo, também do PSD, e José Eduardo Reis, do PS.
Por outro lado, informo que se encontram de visita à Assembleia da República, a assistir à reunião plenária, um grupo de estudantes da Escola Primária de Albufeira e das Escolas Secundárias de Ponte de Sor, de Mem Martins e da Infanta D. Maria, de Coimbra, e ainda um grupo significativo de mulheres do Algarve, a quem, na qualidade de anfitriãs que são, todos os anos, de boa parte dos veraneantes portugueses, entendo dever dirigir um cumprimento especial.
A todos, as nossas saudações.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro de Almeida.

O Sr. Casimiro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua profunda e objectiva intervenção do passado dia 21 de Outubro de 1992, o Sr. Ministro da Administração Interna expressou inequivocamente nesta Câmara o seu entendimento sobre a segurança - entendimento que decorre dos textos legais - e a importância que lhe atribui. Aliás, poucos dias antes, e em cerimónia na Escola Superior de Polícia, afirmara que não entende a segurança como visando manietar ou tolher a sociedade, antes, pelo contra-

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rio, entende-a como alguma coisa que deve potenciar uma vida em plenitude, o exercício em plenitude da liberdade e dos direitos fundamentais. Acrescentaria que se somos uma sociedade fundada sobre o primado da liberdade, as questões de segurança que permitam o exercício da liberdade ganham, no País democrático que somos, uma importância ímpar.
Analisando com minúcia os indicadores que apontam para um aumento quer quantitativo, quer qualitativo dos índices de criminalidade em Portugal, nomeadamente a violência que encerram, não escondeu o Sr. Ministro da Administração Interna a sua preocupação.
Um tanto paradoxalmente, e analisando alguns ratio europeus disponíveis, o Sr. Ministro referiu que o ratio português é dos mais elevados dos países da Europa comunitária, concluindo que, em termos absolutos, não há em Portugal um défice de agentes de segurança. Haverá, isso sim, uma evidente distorção no sistema, tornando-se mister actuar rapidamente nessa direcção, a fim de atingir rapidamente os objectivos enunciados.
Valerá a pena, por exemplo, recordar algumas das distorções apontadas. Em Lisboa, que é uma zona de alto risco, há tantos agentes de segurança por 1000 habitantes como em Portalegre e em Évora, onde o risco é incomparavelmente menor. O nível de agentes de segurança no Porto é equivalente ao de Castelo Branco, Viana do Castelo e Coimbra, e não são comparáveis os níveis de risco ou a incidência da criminalidade.
Da intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna, intervenção que definiu as metas do Governo relativamente ao actual problema da segurança, uma conclusão sumária parece poder retirar-se: a introdução de novos critérios nos esquemas de actuação das forças de segurança, com os quais se pretende conferir-lhes uma capacidade e rapidez de actuação que leve às populações a desejável tranquilidade dos que em paz querem viver e trabalhar, assegurando-se ao mesmo tempo uma racionalização de meios e custos. Efectivamente, dos 48 milhões de contos despendidos com a segurança em 1988, passou-se para 122 milhões de contos em 1992.
A generalidade dos princípios e dos propósitos enunciados ajustam-se em larga medida à situação concreta de Oliveira de Azeméis e à vasta região de que esta próspera cidade é um natural pólo aglutinador. Oliveira de Azeméis e o seu concelho há muito que vêm abandonando decisivamente as suas características de grande ruralidade para se transformarem -a cidade e as restantes 18 freguesias - em meios de características aceleradamente urbanas.
Para além do aumento dos índices de densidade demográfica, a criação de muitos milhares de postos de trabalho, resultante de uma autêntica explosão industrial, provocou, naturalmente, a atracção de novas populações e a alteração de hábitos e comportamentos. Tudo isto, acrescentado à tendência vivida em todo o País no que se refere à subida dos índices de criminalidade, passou a criar legítimas preocupações entre a população no capítulo da segurança, preocupações a que urge dar resposta atempada e eficaz.
Não será despiciendo referir ainda que Oliveira de Azeméis e o seu concelho são atravessados por vias rodoviárias onde se verificam as mais elevadas taxas de tráfego, o que aumenta significativamente a sinistralidade e, consequentemente, a permanente intervenção das forças de segurança e a sua inevitável retirada de outras funções e tarefas bem mais específicas.
Pois bem, relativamente ao concelho de Oliveira de Azeméis, com uma área total de 170 km2, a segurança das pessoas e do seu património está confiada a três postos da Guarda Nacional Republicana: um na sede do concelho, outro na Vila de Cucujães e outro ainda na freguesia de César, estendendo este último a sua área de actuação a algumas freguesias do fronteiriço concelho de Arouca.
Atentas as conhecidas especificidades da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, bem como a aludida e profunda alteração do tecido social do concelho, desde há mais de três décadas que as populações vêm insistentemente reclamando, e com inquestionável legitimidade, a instalação da Polícia de Segurança Pública.
Esta pretensão viria a ser satisfeita através da Portaria n.º 49/87, de 21 de Janeiro, que criou a esquadra de Oliveira de Azeméis, provocando, compreensivelmente, o regozijo das populações. Uma nova portaria, de 12 de Junho de 1990, fixaria para esta esquadra o efectivo de 65 unidades.
Entretanto, a câmara municipal adquiriu um vasto palacete do princípio do século que disponibilizou para a instalação da Polícia de Segurança Pública. Simplesmente, a necessidade de profundas obras de adaptação do edifício -obras morosas na fase de estudo e brutalmente dispendiosas na de execução - e as dificuldades financeiras do município, em virtude dos investimentos noutras infra-estruturas de carácter inadiável, determinaram que a referida esquadra da Polícia de Segurança Pública não tivesse ainda entrado em funcionamento. E, em face das aludidas iniciativas legislativas anunciadas pelo Sr. Ministro da Administração Interna, fácil será concluir pelo abandono deste projecto, isto é, a Polícia de Segurança Pública não chegará a ser instalada em Oliveira de Azeméis.
Se perante o novo espírito que preside à instalação das forças de segurança e aos seus esquemas de futura actuação, não se questiona o abandono do projecto da instalação da Polícia de Segurança Pública, é óbvio que se impõe, e com toda a urgência, a tomada de medidas alternativas, aliás já previstas na nova legislação. E terei de reclamar essa urgência, procurando assim interpretar os legítimos anseios das populações, permitindo-me ainda fornecer alguns elementos que reputo de indispensáveis para uma análise, ainda que naturalmente sucinta, da situação, que se apresenta, aliás, muito preocupante.
A secção e o posto da GNR de Oliveira de Azeméis instalam-se no edifício da velha cadeia comarca: edifício construído no início da década de 30, ultrapassado de todo, e a que todas as benfeitorias introduzidas não forneceram, por ausência de condições, a necessária capacidade. Bem longe disso!
Nos três postos da GNR instalados no concelho - Oliveira de Azeméis, Vila de Cucujães e César, este a ocupar também um edifício improvisado- prestam serviço cerca de 60 unidades.
Ainda de acordo com as medidas enunciadas pelo Sr. Ministro da Administração Interna, prevê-se que os concelhos com mais de 50 000 habitantes devam ter um efectivo de forcas de segurança na proporção de 300 por cada 1000 habitantes. Assim sendo, ao concelho de Oliveira de Azeméis caber-lhe-á um número próximo de 200, isto é, um número significativamente superior ao triplo do número de agentes que actualmente ali prestam serviço.

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De referir ainda que os agentes da GNR prestam, em funções estranhas - nomeadamente aos três tribunais ali instalados -, entre 70 % a 80 % da sua operacionalidade, com inevitável abandono das suas funções específicas e o consequente rol de inconvenientes na defesa da segurança dos cidadãos e nas desejáveis, e não menos necessárias, acções pedagógicas sobre as populações.
O problema, contudo, não poderia jamais resolver-se com uma hipotética chegada imediata de mais efectivos, pela simples razão de que não haveria onde os acolher, já que o actual quartel - isto é, a velha cadeia comarca - não tem a menor hipótese de cedência de mínimo espaço para mais unidades nem reúne quaisquer possibilidades de ampliação.
Perante a situação vivida e aqui exposta com a exigível brevidade, a construção de um edifício de raiz -problema primeiro e inadiável- não poderá deixar de constituir a prioridade das prioridades, sem graves e bem previsíveis consequências na segurança das populações, onde se nota uma crescente preocupação, de todo legítima.
De resto, a construção de um edifício capaz insere-se perfeitamente na nova ordem das forças de segurança, que aponta para a criação de superesquadras, dentro do espírito da necessária redução de custos e do exigível aumento de eficácia e de operacionalidade.
Porém, a Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis não tem capacidade económica nem financeira para custear a construção de um novo quartel. Muito longe disso, até porque se encontra de momento, e por alguns anos ainda, envolvida em investimentos vultosos nos domínios do saneamento básico, da distribuição de água e da rede rodoviária, onde a situação também é preocupante.
No entanto, e dentro do maior espírito colaborante, a Câmara Municipal disponibilizará de imediato a parcela de terreno necessária à construção do futuro quartel, ainda que isso lhe exija um esforço só possível mediante pesado sacrifício e rígida disciplina orçamental.
Em cerimónia pública realizada recentemente, o Sr. Ministro da Administração Interna anunciou que o ano de 1993 seria o ano de lançamento de novos quartéis. Oliveira de Azeméis não pode deixar de figurar à cabeça do rol das mais justas prioridades.
Este é o apelo que aqui dirijo ao Sr. Ministro da Administração Interna, apelo que mais não representa que o eco do grito de angústia das populações, cujos interesses me cumpre defender.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho nesta tribuna, e fora dela, denunciado com profunda indignação o que se passa no Ministério da Agricultura.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - É um ministério clandestino e irresponsável, que não tem política para o sector e que governa para clientelas. Nesta Casa já por várias vezes foi demonstrada a falta dessa política e denunciadas as clientelas.
Hoje o meu objectivo é exemplificar-vos a irresponsabilidade e a forma criminosa de actuação deste ministério, em relação à sanidade animal e à saúde pública.
Em 1986, foram identificados em Inglaterra os primeiros casos de encefalopatia espongiforme bovina, mais conhecida em Portugal pela doença «das vacas loucas». A Comunidade, em 21 de Julho de 1988, tomou esta doença de declaração obrigatória, e Portugal, por portaria, incluiu-a nessa lista.
Em Inglaterra desde essa data, mais de 80 000 animais doentes foram abatidos e destruídos totalmente, sendo os criadores indemnizados pelo valor real.
É uma doença recentíssima cuja incubação média é de quatro a cinco anos e com a mesma sintomatologia das encefalopatias espongiformes humanas. Os primeiros sintomas são reacções violentas, seguidas de forte emagrecimento, paralisia total e morte.
Além desta doença entrar na lista de declaração obrigatória a Comunidade Europeia tomou medidas para que certo número de medicamentos fortificantes, que contêm extractos de tecidos de origem nervosa cérebro e fígado bovino, fossem colhidos em animais e países isentos. Foram ainda tomadas decisões suplementares no que toca ao fabrico de certos medicamentos, de forma a seleccionar mais restritamente as matérias-primas de origem animal.
Volto a informar que é uma doença recente, com um período médio de incubação de quatro a cinco anos, desconhecendo-se ainda o seu impacte na saúde humana. Há criadores atacados e mortos por encefalopatia mas a relação causa/efeito não está demonstrada cientificamente.
Todos os países onde apareceu a doença fazem declaração da sua existência os médicos veterinários são esclarecidos e criam-se mecanismos de vigilância junto dos criadores.
Agora vejam a forma irresponsável e criminosa como actuou o Governo Português: entreguei na Mesa da Assembleia da República um ofício com a chancela de confidencial, dirigido, em 29 de Abril de 1991, pelo director do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária ao director-geral da Pecuária.
Este é um ofício que, pelo seu teor, demonstra cabalmente os métodos de actuação do actual Governo. Dada a sua extensão, transcrevo apenas o último parágrafo: «Segundo as instruções que V. Ex.ª me transmitiu, não foram comunicados os resultados dos exames efectuados no Laboratório Nacional, em que foi diagnosticada a encefalopatia espongiforme dos bovinos, sendo também bastante restrito o número de pessoas que neste laboratório têm conhecimento desse diagnóstico.» Assina o director Dr. Matos Águas.

Vozes do PS: - Que vergonha!

O Orador: - Entreguei também na Mesa nomes de criadores, por mim conseguidos, onde, nas suas explorações, só por acaso, foi comprovada a respectiva doença.
Há cerca de 15 dias, numa conferência de imprensa no Largo do Rato, afirmei que havia encefalopatia espongiforme de bovinos em Portugal e dei alguns nomes de criadores. No dia anterior a essa afirmação telefonei ao director-geral da Pecuária que me informou não ter conhecimento de nenhum caso em Portugal.
No dia em que fiz a conferência de imprensa, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura convocou os jornalistas para o ministério e desmentiu a minha afirmação.

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Entreguei então na Mesa as provas da mentira, da traficância e dos métodos utilizados naquele ministério.
O Sr. Secretário de Estado e o director-geral mentiram! E mais grave ainda: sonegaram informações à Comunidade científica nacional e internacional e aos Portugueses a quem eram obrigados a dá-las, por lei.

Vozes do PS: - Que vergonha!

O Orador: -O director-geral, posto perante casos concretos e imagens esclarecedoras, anteontem, no noticiário do canal l, voltou a mentir, dizendo não haver casos confirmados mas apenas três suspeitas.

Vozes do PS: - Que vergonha!

O Orador: - Esqueceu-se de dizer que, contra todas as normas éticas de um profissional veterinário, como é o director-geral, deu instruções ao Laboratório Nacional para esconder os resultados das análises detectadas. Um escândalo!
Este servilismo criminoso tem já a distinção merecida: ao Sr. Dr. João Machado Gouveia, director-geral da Pecuária, vai-lhe ser dada posse amanhã, com pompa e circunstância, de presidente de um novo e importante instituto criado no Ministério da Agricultura.

Protestos do PS.

O Orador: - Exigimos a imediata suspensão da tomada de posse de tal director-geral.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Consideramos uma afronta nacional se ela se efectivar e protestaremos por todos os meios ao nosso alcance.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Entregarei na Mesa da Assembleia da República um pedido de inquérito sobre este assunto, a juntar ao já entregue por irregularidades e ilegalidades praticadas nos processos de indemnizações por abates sanitários de bovinos, os quais lesaram os interesses do Estado num montante superior a 600 000 contos e onde está envolvido o mesmo director-geral.
É revoltante a mentira e a clandestinidade em que mergulhou o Ministério da Agricultura. Espero que a maioria neste Parlamento não tenha o mesmo comportamento, nestes inquéritos, que teve ao não deixar investigar o destino dos mais de 900 milhões de contos distribuídos nos últimos seis anos pela agricultura portuguesa.
Vamos ao segundo exemplo da irresponsabilidade criminosa deste Governo em matéria de saúde pública. A utilização de promotores de crescimento nos animais, conhecidos a nível popular como a droga dos animais, principalmente hormonas e beta-agonistas, é proibida na Comunidade e pela lei portuguesa, dando pena de prisão.
Está mais do que provado que a sua utilização em determinadas doses põe em risco a saúde pública, tendo havido já em Espanha e França casos gravíssimos de intoxicação em centenas e centenas de pessoas.
As redes de tráfico destes produtos são poderosas e altamente perigosas, pelo que é preciso coragem para lhes fazer frente. É um negócio clandestino que em Portugal envolve muitas dezenas de milhões de contos.
A Comunidade está mesmo com imensas dificuldades em controlar estes especuladores e em desmantelar as redes dos traficantes. Os criadores honestos estão em risco de subsistência não podendo competir com os criadores especuladores. A situação é muito grave em Portugal.
A Comunidade está a forcar cada vez mais medidas para fazer frente a estas redes organizadas. Em Portugal, o Governo é boje um aliado de todas estas redes que põe em risco a saúde de milhões de portugueses!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Senão vejamos: não há um corpo de inspectores sanitários; não há fiscalização junto dos engordadores de gado; não há listagem oficial actualizada de criadores de gado na Direcção-Geral da Pecuária; há médicos veterinários a fiscalizar o abate de animais em matadouros privados que são pagos pelos donos.
Além de não haver nenhuma medida implementada de combate eficaz, o que quero hoje aqui denunciar é a cobertura feita pelo Ministro da Agricultura a estes traficantes.
Em Fevereiro deste ano, o Sr. Ministro da Agricultura apareceu no ecrã do canal 1, num Telejornal, a informar os Portugueses de que as hormonas e os beta-agonistas não fazem mal à saúde pública.

Vozes do PS: - Isso é gravíssimo! É uma vergonha!

O Orador: - Mentiu, porque o Sr. Ministro deve ter na sua mão relatórios explosivos sobre esta matéria.
As declarações feitas pelo Ministro, em qualquer país com sentido cívico, impedi-lo-iam de voltar a entrar no seu gabinete.
Em Bruxelas assina convénios para fazer frente aos traficantes, em Portugal branqueia-os.
A Comunidade subsidia um plano nacional de pesquisa de resíduos que não funciona devidamente em Portugal.
As amostras não são, na sua maioria, colhidas nas explorações mas, sim, nos matadouros. Faltam os tais grupos de fiscalização junto das explorações. Os especuladores sabem suspender a aplicação das hormonas e dos beta-agonistas com antecedência para não serem apanhados no abate.
As amostras colhidas não têm representatividade senão de 0,06 % da totalidade dos suínos e bovinos abatidos por ano.
Apesar disso, em 1992 foram detectadas 281 análises positivas. Na Direcção Regional de Agricultura do Ribatejo e Oeste foram detectados 207 casos positivos.
Nada aconteceu à maioria desses criadores, nem perderam os subsídios comunitários anuais.
Em Portugal não há um único especulador utilizador de hormonas ou beta-agonistas preso.
Pela percentagem positiva apanhada, com a representatividade que têm por exploração e tendo em conta o número de animais abatidos, conclui-se que muitos milhares de produtores utilizam em Portugal as hormonas e os beta-agonistas perigosos para a saúde pública.
A actual situação toma-se insustentável por mais tempo.
Desafio mais uma vez o Governo a desmentir as afirmações feitas na televisão, a combater os especuladores, a criar

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serviços de fiscalização na produção e a rever todo o funcionamento do plano nacional de pesquisa de resíduos.
Se o não fizer a saúde de milhões de portugueses está em perigo e este Governo tem de ser penalizado.

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

Srs. Deputados da maioria, eu sei que para VV. Ex.ªs a obediência é superior à vossa indignação, mesmo quando a saúde do semelhante ou a vossa própria corre perigo.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Para VV. Ex.ªs tudo isto é normal: a incompetência, a clientela, a irresponsabilidade criminosa e o tráfico de influências.
Que grande estômago!...

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

Protestos do PSD.

Vou terminar, esperando pelo menos o vosso silêncio, concordante com as minhas denúncias, em vez do já habitual malabarismo das vossas palavras.
Requeiro a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que os documentos entregues na Mesa sejam publicados no Diário.

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé, de pé, e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Duarte, Lino de Carvalho e António Lobo Xavier.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, também me quero inscrever, mas para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terá a oportunidade de o fazer no final dos pedidos de esclarecimento.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - O Sr. Deputado António Campos habituou-nos já, periodicamente, a vir aqui fazer algumas cenas de teatro, com especulação e sem fundamento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

Fê-lo em Janeiro passado, acusando os agricultores portugueses em geral e alguns dirigentes de uma estrutura nacional, privada, associativa, em particular, mas provou-se que o senhor não tinha razão.
Aliás, a própria estrutura desafiou-o e pôs-lhe um processo crime. O Sr. Deputado, com a mesma hombridade que vem à tribuna fazer espectáculo, assume perder a imunidade parlamentar e defender, em instância própria, as acusações que faz?

Vozes do PSD: -Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Hoje vem novamente lançar o anátema sobre os agricultores, dizendo que eles são traficantes.
É lamentável que o Sr. Deputado, que teve responsabilidades no sector, que cometeu asneiras políticas como responsável governativo,...

Protestos do PS.

... venha hoje, com toda a irresponsabilidade, acusar os agricultores de traficantes.

Protestos do PS.

Desconhecia a competência técnica e científica do Sr. Deputado António Campos em relação a estas matérias. Nunca o demonstrou no passado. Fiquei admirado por tê-lo demonstrado no presente, com este à vontade, quando, ainda ontem, a autoridade sanitária nacional enviou uma informação pública a todos os órgãos de comunicação social, que diz o seguinte: «Está claramente identificada em termos científicos a não transmissão natural da doença aos animais e ao homem.» - ao contrário do que o Sr. Deputado disse.
«Em Portugal, verificou-se que três dos animais importados do Reino Unido evidenciaram sintomas semelhantes aos descritos para aquela doença. Depois de todos os exames feitos foi levada à conclusão da não confirmação da doença em Portugal.» Foi isto que a autoridade sanitária disse.

Protestos do PS.

O Sr. António Campos (PS): - Não diga mais asneiras! Sente-se!

O Orador: - Peço à bancada do PS para manterem a calma.
A autoridade sanitária nacional, com competência científica e técnica para avaliar da ocorrência das doenças e que faz o controlo sanitário do efectivo nacional, afirmou isso claramente.
O Sr. Deputado António Campos, irresponsavelmente, vem aqui falar num ofício confidencial que eu e a minha bancada desconhecemos.

Protestos do PS.

Veio falar num ofício confidencial que trata de umas análises que foram feitas...
Quando o Sr. Deputado vai a um laboratório fazer análises, não é aí que lhe dizem que está doente. É o seu médico que verifica as análises e diz se é ou não necessário fazer mais. Foi este o caso.
Algumas análises feitas em 1990 demonstraram que, em relação a algumas componentes, podia haver suspeitas, pois havia alguma sintomatologia. Diligências posteriores confirmaram que isso não era verdade.
É por ser irresponsável que o Sr. Deputado vem aqui com algumas suspeições lançar o anátema de uma doença que pode prejudicar o consumidor, o consumo de carne e, desta forma, os produtores, uma vez que não tem qualquer fundamento para as acusações que faz.
Não é pelo facto de alguém, natural de um país onde haja cólera ou outra doença qualquer, chegar a Portugal e manifestar os sintomas dessa doença, que se vai dizer que, em Portugal, ela também já existe. Isso não se passa assim.

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O Sr. Deputado é irresponsável ao fazer essas afirmações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir!

O Orador: - Importa referir que nos outros países da Comunidade, nomeadamente na Alemanha, é este o procedimento.
Entendemos, portanto, que as afirmações feitas pelo Sr. Deputado António Campos no seguimento de outras são de uma grande irresponsabilidade. Esperamos, pelo menos, que tenha comprovativos para que, com fundamento, possa sustentar tais afirmações.
Alertamo-lo para a campanha desenfreada que está a fazer contra a produção agrícola nacional, contra os agricultores portugueses, contra a agricultura nacional!
Era mais importante que, em lugar de levantar falsas suspeições, viesse aqui apontar uma medida de política agrícola.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe para terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

O PS não apresenta uma iniciativa política para o sector agrícola desde há oito anos.
Sr. Deputado, em lugar de levantar suspeições, apresente o que quer, diga o que pretende para o sector agrícola, e não esteja a prejudicar consecutivamente a agricultura nacional e os agricultores portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Campos, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. António Campos (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Deputado Carlos Duarte, estamos a discutir questões extremamente sérias,...

Vozes do PSD: - Não parece!

O Orador: - ... que envolvem a saúde de milhões de portugueses.
O Sr. Deputado tem de se comportar, neste debate, de uma forma séria e honesta ...

Protestos do PSD.

... e tem de se comportar à altura do lugar que ocupa nessa bancada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, já lhe apresentei os documentos que entreguei na Mesa, não só os que dizem respeito aos nomes dos criadores, onde eu próprio consegui colher os elementos para provar que havia essa doença, como lhe entreguei documentação de um laboratório nacional de investigação veterinária, em que o director-geral proibia o laboratório de...

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - É mentira!

O Orador: - Leia a documentação que entreguei na Mesa.
O senhor é irresponsável! É-o normalmente, porque não leva estas coisas a serio. O senhor é mais um daqueles homens que eu denunciei ali da tribuna, que não tem nenhuma indignação, só está aqui para servir o poder, passando por cima de questões de alta responsabilidade do Estado.
Neste caso trata-se de uma doença de declaração obrigatória, O senhor deve saber o que isso representa.
Aliás, há convénios internacionais assinados. Portanto, não estou aqui a atacar os agricultores, os senhores é que estão a destruir...

Protestos do PSD.

... a saúde dos Portugueses, de uma forma criminosa e irresponsável.

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

Eu sei que para o senhor é capaz de valer mais um bom negócio do que uma vida humana, ...

Protestos do PSD.

... mas para mim vale mais uma vida humana do que um bom negócio!

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

Eu próprio, Sr. Deputado, telefonei ao director-geral, como disse na minha intervenção, e denunciei esta questão de determinada forma. Mas o Sr. Secretário de Estado, que é irresponsável, na conferência de imprensa que deu no Ministério, desmentiu-me e chamou-me mentiroso.
A prova está ali na Mesa: quem é que mente, quem são os mentirosos, quem é que se serve do poder para fazer negócio em detrimento da defesa dos interesses nacionais...

Aplausos do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Campos, as informações que aqui nos trouxe são extremamente graves e atestam, em nossa opinião, a irresponsabilidade do Governo, porque sobrepõe os interesses nacionais, neste caso, os interesses da saúde pública à sua política clientelar.
São graves mas não são isolados, articulam-se com outros aspectos da política do Governo em matéria de sanidade animal, que tem vindo a público há uns tempos a esta parte.
Estamos a recordar, por exemplo, as notícias quanto aos processos de inseminação artificial nas vacas leiteiras, que atinge, em Portugal, cerca de 300 000. Grande parte das inseminações, cerca de metade, é feita com sémen importado por empresas privadas, sémen não testado, que vai contra o que está legislado.

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Recordamo-nos ainda da recente extinção da Comissão de Combate ao Contrabando de Gado, comissão interministerial, que tinha como objectivo apoiar o combate à fraude, na defesa do interesse público. Foi extinta quando se adensavam no horizonte denuncias e novos processos, fraudes e irregularidades no processo de importação de gado e nas fraudes que rodeavam todo este sector.
A própria Comissão dizia, na altura em que estava em curso o processo de extinção, que a informação era enviada ao Sr. Ministro da Justiça, dadas as razões que estiveram na base da sua criação. Processos artesanais, práticas ilícitas assumiriam agora formas altamente sofisticadas, sem paralelo com as que ao tempo se verificam, conforme constam em detalhe dos relatórios anuais, na posse dos membros do Governo competentes, que revelam a existência da prática de actos ilícitos, inaceitáveis ao nível do comportamento dos funcionários e de altos agentes da Administração Pública.
Apesar disso, o Governo extinguiu a Comissão e de muitos desses processos não se lhes conhece o destino.
A questão que lhe coloco, Sr. Deputado, é a seguinte: não lhe parece que o conjunto de elementos que existem sobre a matéria justificaria um inquérito não só sobre a questão que aqui nos trouxe hoje mas sobre toda a política de sanidade animal em Portugal?

O Sr. Mário Tomé (Indep.): -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Campos, não é nem a primeira nem a segunda vez que o Sr. Deputado traz à Câmara revelações espectaculares, quer pelo seu estilo quer pelo seu conteúdo.
Não queremos, todavia, colaborar em que se comece a instalar o sentimento de que é por feitio ou por hábito que o Sr. Deputado António Campos faz essas declarações. O que quero dizer com isto é que o CDS não tolerará que se crie aqui um clima propício a que, não respondendo, não ligando importância, não investigando, se comece a fazer crer que se trata de uma questão do seu feitio ou do seu estilo.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Peço à maioria parlamentar, em nome do meu partido, que faça tudo o que tem ao seu alcance para mostrar uma de duas coisas, não havendo meio termo: ou para vincar a clara derrota política e a irresponsabilidade do Sr. Deputado António Campos, coisa que - devo dizê-lo - me custaria muito, ou para punir e perseguir os responsáveis por estas acusações, que têm vindo em crescendo, sendo certo que as mais graves são as que o Sr. Deputado formulou até agora. Penso que não há meio termo e peço, assim, ao PSD que não tenha complacência e faça tudo o que puder para demonstrar, rapidamente e com a maior urgência, uma dessas duas coisas.

Aplausos do CDS e do PS.

O Sr. João Amaral (PCP): - Meteu o dedo na ferida!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por responder ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, dizendo-lhe que estou de acordo com tudo o que disse.
Também acho que foi escandalosa a forma como foi dissolvida a Comissão para o Combate ao Contrabando de Gado/Carne, que já tinha apanhado dois grandes processos, os relativos à «raia-norte» e a uma outra rede da zona da Guarda, e estava a entrar noutros problemas muito mais importantes ligados aos Açores e a outras redes de contrabando em Portugal. No momento em que estava a investigar e a começar a fornecer elementos, foi simplesmente dissolvida.
Ainda ontem, aliás, o homem que estava à frente desse organismo denunciou aqui as coacções a que ele próprio foi sujeito - até o levarem à demissão!...

O Sr. José Sócrates (PS): - Escandaloso!

O Orador: - Em matéria de sanidade animal, o que se passa em Portugal é a total irresponsabilidade, não só em relação ao sémen como também quanto à fiscalização dos abates e das explorações pecuárias. Portugal é o único país da Europa onde não há um corpo de inspectores sanitários nem legislação forte de protecção a esse corpo de inspectores sanitários, que deveria até funcionar junto de um ministério independente, o qual não poderia ser nem o do Comércio e Turismo nem o da Agricultura. A maior parte dos países da Europa tem esse corpo de inspecção sanitária a trabalhar junto dos respectivos Ministérios da Justiça, precisamente para que não esteja sujeito a pressões e possa defender a saúde pública, em detrimento dos negócios dos criadores. Produz-se para servir as pessoas e não para servir quem produz.
No que respeita às questões colocadas pelo Sr. Deputado António Lobo Xavier, vale a pena deixar registada neste Parlamento uma história sobre o assunto em apreço. Desde que tenho vindo a fazer denúncias no Parlamento, a minha vida tem sido devassada por todas as formas. Toda a gente sabe que sou agricultor...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Agricultor?!... Quem é que inventou essa?

O Orador: - Imediatamente o director regional actua sobre o meu concelho, a dizer que «o homem está a investir e a servir-se dos fundos comunitários». Só que chegaram lá e depararam com um grande problema: eu tinha avisado os serviços de que sou Deputado e não «agricultor a tempo inteiro»!...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Agricultor não, empresário!...

O Orador: - Assim sendo, não podia servir-me de fundos, mas apenas de ajudas nacionais.
Entretanto, já havia jornalistas contratados para ir buscar os processos...

Protestos do PSD.

... e quando eu passei pelo Ministério da Agricultura, pela Secretaria de Estado do Fomento, pelos serviços de reestrutu-

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ração agrária, pela Presidência do Conselho de Ministros, já os papéis tinham sido totalmente devassados.
É um grande desafio o que o Sr. Deputado lhes dirigiu, porque esta maioria ou, pelo menos, o Governo tem feito tudo para procurar devassar a minha vida privada,...

Uma voz do PSD: - Não diga isso!

O Orador: -... na mira de encontrar uma forma de me atacar. O próprio director regional de Agricultura da Zona Centro - o Engenheiro Maia - se encarregou dessa missão no meu concelho.

Vozes do PS: - É uma vergonha!

Protestos do PSD.

O Orador: - Isso não me preocupa, porque sou um cidadão que tem, como o Sr. Deputado diz, um determinado feitio,...

Vozes do PSD: - Mau feitio!

O Orador: -... por utilizar a cabeça, mas que, apesar da minha idade, ainda não perdi a minha indignação pessoal perante o que vejo. Face a tais indignidades, reajo emotivamente.
Desafio os senhores a provarem o contrário do que tenho afirmado nesta Casa. Não são capazes! Daria o maior gozo à maioria descobrir um ponto fraco através do qual pudesse «saltar» sobre mim e dizer que nesse aspecto é mentira o que afirmo. Seria o maior gozo que a bancada da maioria teria. Apesar dos esforços brutais que há meses vêm desenvolvendo, continuo a utilizar a minha indignação e o meu feitio para denunciar aquilo que considero um crime contra a saúde pública, a clientela organizada, a falta de política e a perda de oportunidade que Portugal tem perante tantas ajudas comunitárias e tantas responsabilidades, como nós, que nos sentamos nesta bancada, hoje temos perante um sector em profunda crise: o da agricultura portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Campos, há coisas, mesmo no debate político, que não devem ser feitas. Em democracia há limites que os políticos, no seu discurso, não podem nem devem ultrapassar. Ora, o Sr. Deputado ultrapassou muito, nesta como noutras circunstâncias, mas hoje ainda mais, tais limites!!

Vozes do PSD: - É habitual!

O Orador: - É indigno e irresponsável da sua parte acusar-nos, como fez, de darmos mais importância a outros assuntos do que à vida humana, de a preterirmos em benefício de matérias de outro jaez. Sabe que isso não é verdade, mas sabe também que actualmente, quando percorremos os países da Comunidade e vemos o que acontece em Espanha, em França e em Itália, os socialistas são acusados de corrupção e os graus dessa corrupção comprovados. Mesmo em Portugal isso acontece, nalguns processos pendentes que se encontram a correr a sua tramitação. Que autoridade moral têm muitas dessas pessoas para nos acusar?

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Os senhores não podem nem devem enveredar por esse tipo de situações. É indigno da sua parte fazer o que fez!... Pela minha parte, só lhe peço que o faça noutra sede, porque não é esta a instância própria para se demonstrar que o Sr. Deputado não tem razão; não é esta a instância própria para acalmarmos os ânimos perante o alarmismo que o Sr. Deputado, com essas declarações irresponsáveis, ocasiona na opinião pública; não é esta a instância própria para denunciarmos as motivações do Sr. Deputado António Campos ao fazer o que faz e quando o faz; não é esta a instância própria para desmascararmos o Sr. Deputado António Campos. Há já quem o tenha desafiado para no foro judicial demonstrar a inverdade e irresponsabilidade das suas afirmações.
Só quero desafiar o Sr. Deputado António Campos a fazer prova do que diz, tal como alguns já o fizeram instaurando-lhe em tribunal processos contra si...

O Sr. António Campos (PS): - Quais?

O Orador: - Ó Sr. Deputado, os veterinários e alguns órgãos da Administração Pública, que não o Governo, que o Sr. Deputado aqui acusou! Se alguém propuser em tribunal uma acção com o propósito de o Sr. Deputado comprovar aquilo que disse, admite prescindir da imunidade parlamentar para, nessa sede, provar que tem razão e que as críticas que fez têm fundamento?

Aplausos do PSD.

O Sr. Lufe Filipe Madeira (PS): - O Sr. Deputado Carlos Duarte não sabe o que isso é!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Duarte, terei, pelos vistos, a garantia da sua bancada de que os pedidos de inquérito que entreguei na Mesa e aquele que ainda irei apresentar serão aprovados, com vista a apurar responsabilidades.
Espero que os senhores se portem em relação a esses inquéritos de forma diferente daquela como se comportaram quanto aos dinheiros que vêm da Comunidade e sobre os quais aqui fiz denúncias. Há já vários processos em tribunal e muitos mais irão dar entrada, pois, felizmente, considero-me hoje um dos homens mais bem informados, em Portugal, sobre essas matérias, não porque trabalhe nesse sentido mas porque os cidadãos me entregam documentação atinente a tais matérias.
Poderemos marcar, no dia que quiser, uma discussão em torno de muitos mais problemas de corrupção, burlas e desvios de dinheiros. Não é isso, todavia, o que agora está em causa.
Devo dizer-lhe que não tenho medo dos processos a correr nos tribunais. Como o Sr. Deputado sabe, todas as afir-

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mações que aqui foram proferidas foram já provadas publicamente. Os tribunais prová-las-ão, porque todos os processos estão a seguir os seus trâmites normais, alguns com 7, 8, 9 e 10 vezes mais o volume de fraudes que aqui denunciei!...
Julguei que o Sr. Deputado, quando veio falar de vidas humanas, vinha protestar pelo comportamento do seu governo em relação à utilização dos beta-agonistas e das hormonas no gado.
Gostaria -e repito o que já disse na minha intervenção- que o Sr. Deputado apresentasse nesta Assembleia os nomes dos 207 criadores que foram «apanhados» no Oeste do Ribatejo e viesse aqui dizer o que aconteceu a esses 207 criadores...

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Estão 500 processos em tribunal!

O Orador: - Não estão, não! Não há um único desses indivíduos preso. A maioria dos processos está arquivada, quase todos os processos foram metidos na gaveta, porque agora os processos são dados. As colheitas foram mal colhidas e os processos foram todos para a gaveta.
Desafio o Sr. Deputado a apresentar aqui os 207 nomes e o destino de cada um desses processos. Confrontaremos então, dado que sei os nomes e o destino de cada um dos processos, a actuação do seu governo.
Mas não vale a pena perder muito tempo com o Sr. Deputado, porque se trata de um daqueles Deputados que não tem emenda e que não vale as palavras que perco consigo.

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado António Campos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não vou protestar contra o estilo parlamentar do Sr. Deputado António Campos. Cada um tem o seu estilo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado António Campos, como Deputado opositor que é, traz aqui, com afinco, reflexões, considerações e críticas que, na esfera de Deputado da oposição, acha serem plausíveis perante o País e a Câmara.
Todavia a legitimidade no exercício desse direito e toda a nobreza que enquadra essa atitude ficam, no nosso entender, seriamente danificadas quando o Sr. Deputado António Campos faz uma miscelânea, ou seja não só traz essas considerações à tribuna como não resiste à tentação, rasteira e fácil, de insultar e caluniar o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma coisa - e peco-lhe o favor de doravante se comportar assim - são as críticas, acusações e reflexões que o Sr. Deputado António Campos traz à tribuna e que nós, homens de boa vontade aqui sentados, até ouvimos, interrogando o nosso espírito sobre a sua pertinência e plausibilidade,...

Risos do PS.

... outra coisa Sr. Deputado, é intimidar psicologicamente os meus companheiros de bancada...

Risos do PS.

... e denegrir a origem, que é igual à sua de homens eleitos, que, numa postura de serenidade, pretendem, analisando os seus argumentos, discernir esses mesmos argumentos, ajuizar da sua intervenção e tomar uma decisão. Era isso que estávamos a fazer: eu e os meus companheiros de bancada estávamos a ajuizar da sua intervenção.
O Sr. Deputado António Campos não tem o direito de insultar intelectualmente os meus companheiros de bancada partindo do princípio de que nós temos menos dignidade do que o Sr. Deputado. V. Ex.ª tem a dignidade de Deputado da oposição e nós temos a dignidade de Deputados apoiantes do Governo, que é igual à sua Sr. Deputado! Não é menos digno ser apoiante do Governo. Portanto, não aceitamos as etiquetas de servilismo e de menor dignidade intelectual que o Sr. Deputado António Campos nos quis colocar.
Para terminar, quero ainda dizer que ouço sempre com muita atenção as suas intervenções e posso adiantar-lhe que o considero um parlamentar corajoso, interveniente e muito capaz. De facto, todas as suas intervenções despertam em mim muitas interrogações que levo para o seio do meu partido, porque também as quero ver respondidas e resolvidas. Ora, o Sr. Deputado ao exercer a actividade parlamentar desta forma também dignifica o exercício da função de parlamentar português.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Aprovem o inquérito!

O Orador: - Finalmente, na sequência do que disse o Sr. Deputado António Lobo Xavier, gostaria de salientar que pela minha parte...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe que termine, pois já esgotou o tempo de que dispunha para fazer o protesto.

O Orador: - Sr. Presidente, termino já!
Sr. Deputado António Campos, na qualidade de Deputado do PSD, quero dizer-lhe que as suas intervenções provocam interrogações no meu espírito e eu, de forma responsável e consciente, faço eco delas no seio do meu partido. Tudo o mais pode até transcender-me!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos, que para o efeito dispõe de dois minutos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mário Maciel, muitas vezes não me bato aqui, neste Parlamento, como Deputado da oposição, acredite! Confesso-lhe -e digo isto com sinceridade- que muitas vezes actuo apenas como um cidadão revoltado e sob uma certa carga emotiva porque o sentimento de revolta em relação a esta matéria é, realmente, bastante elevado.
Devo dizer-lhe que não «intimido» a bancada do Sr. Deputado porque penso que os Deputados da maioria não são intimidáveis, mas o que posso garantir é que preparo as

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minhas intervenções com algum cuidado, estudo os dossiers e só trago para aqui os elementos que, em minha opinião, têm rigor, para não dar oportunidade a quem quer que seja de me «apanhar em falta».
Expresso-me de determinada maneira -é o meu feitio ... -, mas nunca pretendo insultar ninguém! Exijo é que cada um assuma as suas responsabilidades perante os factos e quando houver dúvidas é preciso que esta Casa as deixe apurar para alcançarmos as certezas. Logo que isso aconteça, cada um tem de assumir a sua própria verdade.
Mas cada vez que faço aqui uma intervenção vejo que o comportamento dessa bancada é atabalhoado; ouço respostas de qualquer forma e feitio, sem sentido e sem conhecimento, o que ainda me revolta mais. E, como já disse, a minha revolta já é grande perante a actuação do Ministério da Agricultura.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lembro à Câmara que está a decorrer a eleição para a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Vamos agora votar o voto de pesar n.º 80/VI pelo falecimento de Túlio Espanca.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.
É o seguinte:

Voto n.º 80/VI

De pesar pelo falecimento do historiador da Arte Túlio Espanca

Faleceu no passado dia 2 de Maio o historiador da Arte Túlio Espanca.
A sua memória ficará indissoluvelmente ligada à cidade de Évora e à região alentejana que amou profundamente e a cujo estudo e divulgação dedicou toda uma vida de trabalho insaciável.
Nascido em Vila Viçosa, com a instrução primária como habilitações literárias, autodidacta, Túlio Espanca transformou-se num dos mais importantes historiadores da Arte do País, seguramente o grande historiador de Évora e do Alentejo, membro da Academia de Ciências, da Academia Nacional de Belas-Artes, da Academia Portuguesa de História, titular do Prémio Europeu para a Conservação de Monumentos Históricos, doutor honoris causa pela Universidade de Évora, medalha de ouro da cidade de Évora, agraciado com a Comenda de Santiago de Espada.
A sua vastíssima obra percorre toda a monumentalidade do Alentejo e em particular de Évora, cuja classificação como património histórico da humanidade muito lhe deve e a que junto a um dos seus monumentos morreu.
Não havia monumento, arco, ogiva, pedra de que não lhe conhecesse o nome, o seu humanismo, a sua figura de cidadão emento, exemplo de dignidade cívica.
Com a morte de Túlio Espanca, a história da Arte ficou mais só; Évora, o Alentejo e o País ficaram mais pobres, mas a obra e o exemplo de Túlio Espanca perdurarão para sempre.
Com profunda emoção, a Assembleia da República curva-se perante a memória do homem íntegro e do cidadão exemplar que foi Túlio Espanca e manifesta profundo pesar pela perda irreparável que a sua morte constitui.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço à Câmara que guarde um minuto de silêncio por intenção de Túlio Espanca.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é fácil para quem o conheceu e com ele conviveu pessoalmente falar sobre Túlio Espanca. Túlio representava esse tipo de grandes figuras que dedicam toda uma vida modesta e discreta a uma causa - neste caso, a causa da Arte e, mais particularmente, a história da Arte do Alentejo e da sua cidade: Évora.
Pelas calçadas milenares da cidade deixará de se ouvir o toque da sua bengala, que ele usava nos últimos tempos, a sua passada em busca do conhecimento da origem dos percursos das coisas e dos homens. Deixará de se avistar a sua cabeleira branca, mas ficará para sempre o exemplo da sua vida e de uma obra de quem subindo a pulso, desde a sua inicial profissão de barbeiro, simplesmente com a instrução primária, se tomou num dos mais eminentes conhecedores da história da Arte do País, membro da Academia de Ciências, da Academia Nacional de Belas-Artes, da Academia Portuguesa de História, titular do Prémio Europeu para a Conservação de Monumentos Históricos, doutor honoris causa pela Universidade de Évora, medalha de ouro da cidade de Évora, agraciado com a Comenda de Santiago de Espada e a quem, no próximo domingo, Vila Viçosa, sua terra natal, se preparava para prestar uma homenagem nacional pelo octogésimo aniversário.
Figura grande de humanista, de dignidade cívica, de democrata, escolheu morrer quando viveu, junto aos monumentos que com ele dialogavam, em Maio, mês do seu nascimento.
O Grupo Parlamentar do PCP e a Assembleia da República não poderiam, pois, deixar de prestar homenagem a esta figura ímpar e de manifestar profundo pesar pelo seu falecimento, certos de que a sua vida, a sua obra e o seu exemplo perdurarão para sempre.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Cunha.

O Sr. Armando Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD associa-se também ao voto de pesar pelo falecimento do eminente homem de arte que foi Túlio Espanca, que tive a honra e o agrado de conhecer pessoalmente. Eu era, então, menino e já ele era homem, quando ainda desempenhava, em Évora, como agora se disse, a profissão de barbeiro.
Nessa época, em Évora, houve um grupo de pessoas de espírito iluminado - e entre elas destaco o, ao tempo, reitor do Liceu de André de Gouveia, Dr. Bartolomeu Gormi-

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cho, o secretário do Governo Civil, Dr. Celestino David, o cónego Mendeiros - que perante a monumentalidade de Évora, que eles já tinham a percepção de que seria conveniente mostrar a todo o mundo, inspiradamente e em boa hora, fundaram o Grupo Pró-Évora, que se predispunha defender os valores artísticos de que Évora é riquíssima, mas que eram quase desconhecidos.
Foi através dessa instituição, que ainda hoje perdura, que se reuniu um grupo de pessoas para desempenharem a função de «cicerone» junto dos estrangeiros que visitavam os monumentos de Évora. Por graça, Túlio Espanca fez parte do primeiro grupo desses discípulos; e, sem dúvida alguma, servido pelo seu extraordinário talento, de tal forma, com tal simplicidade e pertinácia se dedicou a esses estudos que não temos a menor dúvida de que à hora da sua morte, que lamentamos profundamente, era com certeza das pessoas que melhor conheciam o património arquitectónico de Évora e de todo o Alentejo.
Aliás, as coisas no mundo não acontecem por acaso. Não foi por acaso que sua prima, Florbela Espanca, desvendou a Portugal a alma alentejana, como ele transferiu para os outros o conhecimento que obteve no estudo dos monumentos alentejanos. Ela divinizou a alma do povo, ele estudou a história do povo e contou-a, ía frequentemente, por vezes quase semanalmente, a várias terras, a Reguengos, a Vila Viçosa - a sua terra natal - e a outros povoados, vilas e aldeias do Alentejo, explicar monumento por monumento, com um carinho e com um amor que só alguém, com uma alma extraordinária e uma intenção de investigador simples, como ele possuía, poderia fazer. Ele estudou para si, mas deu principalmente os frutos do seu trabalho científico aos outros. É essa dádiva, essa forma de ser, essa coragem e essa qualidade invulgar de persistência e de amor à sua terra, que ele mostrou, que o dignificam.
Paz à sua alma!
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD apresento à família sentidas condolências.

(O orador reviu).

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive o privilégio de. ter conhecido e contactado com Túlio Espanca De origem humilde, possuindo apenas a instrução primária mas doutorado honoris causa pela Universidade de Évora, membro da Academia Nacional de Belas-Artes e da Academia Portuguesa de História agraciado com a medalha de ouro da cidade e com a Comenda de Santiago de Espada, Túlio Espanca simboliza bem a dignidade do homem alentejano e aquilo de que, mesmo cercado de adversidades, é capaz. A sua memória confunde-se já com a de Évora e a do Alentejo que tanto amou e a que devotou uma vida de incansável e honesto labor. Simples, afável e disponível, como só os grandes grupos sabem ser, além da grande saudade que nos deixa coloca-nos e à cultura portuguesa perante uma enorme dívida de gratidão pela vasta obra que nos legou e de que se destaca o inventário artístico dedicado aos distritos de Évora e de Beja.
Contribuiu também de forma inestimável para a preservação do nosso património histórico e Évora deve-lhe em parte o reconhecimento como património mundial.
Por tudo isto, é com sentida emoção que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se associa a este voto de pesar e comovidamente se curva perante a memória do historiador insigne, do homem íntegro e do cidadão exemplar que foi Túlio Espanca.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia com a leitura de quatro relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal do Círculo de Alcobaça a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República a prestar depoimento, na qualidade de testemunha num processo que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Freitas do Amaral.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Rui Gomes Silva (PSD) a prestar declarações, por escrito, na qualidade de testemunha num processo que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Freitas do Amaral.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Bragança a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Adão e Silva (PSD) a ser inquirido num processo que se encontra pendente naquele Tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Freitas do Amaral.

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O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 10.º Juízo do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) a depor, na qualidade de testemunha, num processo que se encontra pendente naquele Tribunal, desde que seja designada nova data.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Freitas do Amaral

Peço ao Sr. Secretário para anunciar as comissões que se encontram reunidas ou que irão reunir esta tarde.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, encontram-se reunidas ou irão reunir-se, durante esta tarde, as Comissões de Educação, Ciência e Cultura e de Juventude.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão da proposta de lei n.º 55/VI - Autoriza o Governo a alterar o regime contra-ordenacional aplicável às violações das normas legais sobre o direito de habitação periódica e direitos análogos.
Para uma intervenção inicial, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Alexandre Relvas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conforme se deixou expresso na exposição de motivos da proposta de lei apresentada, o Governo propõe-se rever, globalmente, a regulamentação do direito real de habitação periódica e dos direitos análogos que possibilitam igualmente a utilização de empreendimentos turísticos por períodos determinados de cada ano.
A par das maiores exigências que possam recair sobre os promotores de empreendimentos turísticos, nos quais se pretendam constituir direitos de habitação periódica, é essencial alterar o quadro sancionatório, de forma a que, punindo eficazmente as condutas infractoras, se desmotivem futuras violações da lei.
O montante das coimas permitido pelo regime geral do direito de mera ordenação social é manifestamente insuficiente, quer em face dos comportamentos que se pretendem sancionar quer em face do benefício económico que os potenciais infractores colhem.
Nesse sentido, pretende o Governo alterar o limite dos montantes das coimas, bem como determinar outras sanções acessórias, além das que já decorrem do regime geral.
Os objectivos que presidiram à autorização da constituição de direitos de habitação periódica sobre empreendimentos turísticos mantêm hoje total actualidade.
Para os promotores de empreendimentos turísticos, a alienação destes direitos alarga o espectro de clientes, permite a mobilização de financiamentos complementares para a respectiva construção e pode constituir um meio para assegurar a redução da sazonalidade da procura.
Por outro lado, este sistema pode permitir, como se refere no preâmbulo do diploma que regulamenta esta matéria, o acesso, nomeadamente através da constituição de um direito real, a uma habitação para férias, por períodos curtos, respondendo, assim, às necessidades sentidas por alguns segmentos da procura, quer nacionais quer internacionais, que valorizam a possibilidade de gozar férias num local e período pré-estabelecidos, em casa, de algum modo, sua, e beneficiando, simultaneamente, de serviços hoteleiros.
Este segmento da oferta turística nacional conheceu, em Portugal, desde que foi regulamentado em 1981, um importante desenvolvimento, representando a oferta nacional entre 10 % a 15 % dos empreendimentos e direitos de habitação periódica já comercializados na Europa.
De acordo com a Direcção-Geral do Turismo, existem 70 empreendimentos devidamente classificados com direitos reais de habitação periódica, constituídos por escritura pública, que representam um total de 7000 apartamentos e de 30 000 camas, o que permite referir que, sobre cerca de 15 % da oferta turística nacional, recaem, em maior ou menor extensão, direitos reais de habitação periódica.
O número de semanas potencialmente comercializáveis nestes empreendimentos é de 357 000 e as já vendidas ascendem a cerca de 100 000, o que, a preços actuais, representa, seguramente, mais de 100 milhões de contos.
Apesar de datar dos princípios de 1989 a última alteração à regulamentação dos direitos de habitação periódica, a experiência de funcionamento do mercado, nos últimos anos, revela que se torna necessário introduzir alterações nesta matéria, visando dois objectivos: reforçar a protecção dos consumidores adquirentes dos direitos de habitação periódica e assegurar a manutenção, a prazo, da qualidade dos empreendimentos.
São, de facto, múltiplas as reclamações que quer o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor quer a Direcção-Geral do Turismo têm recebido, associadas aos métodos de promoção de venda usados, à realização de publicidade enganosa, à dificuldade de resolução dos contratos-promessa, à não conclusão dos empreendimentos nas condições acordadas, a atrasos na emissão dos certificados prediais, ao funcionamento dos empreendimentos e à manutenção da sua qualidade.

O Sr. Joaquim Silva Pinto (PS): - E tudo isso se tem consentido!

O Orador: - Muitas destas reclamações, atendendo à natureza das infracções, têm sido enviadas ao Ministério Público.
Não podemos ignorar que estes excessos, de índole diversa, atingem não apenas os interesses das pessoas e instituições mais directamente envolvidas, como também a credibilidade do produto e da generalidade dos empresários que comercializam, bem como a imagem do sector turístico nacional, o que é totalmente inaceitável.
Embora o decreto-lei esteja ainda em fase de ultimação, não tendo por isso sido distribuído aos Srs. Deputados em conjunto com a proposta de lei, não quero deixar de apresentar, a seguir, as principais alterações, relativamente à actual legislação, que o novo regime consagrará, para assegurar a concretização dos objectivos apresentados:
Limitação do acesso à actividade a sociedades comerciais, desde que o ratio de solvabilidade das mesmas não seja inferior a 25 %, assim se devendo manter;

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Imposição de um limite de comercialização de direitos reais de habitação periódica sobre apenas 60 % das unidades de alojamento do empreendimento, devendo, no entanto, manter-se a exploração hoteleira integrada com os restantes 40 %;
Proibição da constituição de outros direitos reais sobre as unidades de alojamento que integram o empreendimento;
Alargamento para 14 dias do prazo de resolução do contrato concedido ao adquirente e ao promitente--adquirente de direitos de habitação periódica;
Estabelecimento de regras rigorosas sobre a publicitação dos direitos de habitação periódica, designadamente quanto ao tipo de informação a prestar;
Proibição de actividades de promoção e comercialização dos direitos de habitação periódica fora das instalações do proprietário, do cessionário da exploração do empreendimento ou do mediador;
Reforço da informação, nomeadamente através da criação de um documento complementar, a entregar aos consumidores antes da celebração dos contratos de transmissão e de promessa de transmissão, no qual se contemplem elementos detalhados sobre o empreendimento e o direito a transmitir;
Criação de uma caução que garanta, em primeiro lugar, a devolução das quantias entregues pelo adquirente ou pelo promitente-adquirente, em caso de exercício do direito de resolução, em segundo lugar, a possibilidade de efectiva e plena fruição do direito pelo adquirente na data e nas condições previstas no contrato e, em terceiro lugar, a expurgação de hipotecas ou outros ónus oponíveis ao adquirente do direito;
Reforço da participação dos titulares de direitos de habitação periódica na gestão do empreendimento, designadamente através da criação de uma assembleia de titulares, com poderes deliberativos, que vão da aprovação das contas desse empreendimento ao poder de, em casos limite, desencadear um processo de substituição da administração;
Obrigatoriedade da definição rigorosa das regras a que obedece a alteração da prestação periódica a pagar pelos titulares dos direitos;
Aumento para o mínimo de 4 % do valor da prestação periódica a afectar à constituição de um fundo de reserva...

O Sr. Joaquim Silva Pinto (PS): - 4% é pouco!

O Orador:

... destinado à realização de obras de reparação e conservação das unidades de alojamento;
Estabelecimento do montante mínimo da caução de boa administração em valor não inferior ao valor anual do conjunto das prestações periódicas a cargo de todos os titulares dos direitos transmitidos;
Extensão aos direitos análogos, que possibilitam, igualmente, a utilização dos empreendimentos turísticos por períodos determinados de cada ano, com a necessária adaptação, da generalidade das disposições estabelecidas para o direito real da habitação periódica.
De todas estas alterações destacaria: a obrigatoriedade de estar constituída, pelo promotor, uma caução no momento da assinatura do contrato-promessa ou da transmissão do certificado predial, conforme os casos, que garanta a devolução do sinal no caso de resolução do contrato; a possibilidade de efectiva e plena fruição do direito nas condições e data previstas no contrato, bem como a expurgação de hipotecas ou outros ónus oponíveis ao adquirente do direito, o que vem aumentar, significativamente, a segurança do adquirente; e a imposição de um limite de comercialização de direitos sobre apenas 60 % das unidades de alojamento, o que, associado ao facto de se consagrar uma exigência de unicidade da titularidade e da administração do empreendimento, vincula, fortemente, o promotor e proprietário ao futuro desse empreendimento, sendo, assim, o primeiro interessado em assegurar a manutenção da qualidade.
Conforme referi no início da minha intervenção, a par das alterações referidas, é essencial que seja modificado o quadro sancionatório.
Nestas condições, vem o Governo pedir autorização legislativa para estabelecer coimas até ao montante máximo de 20000 contos, conforme os artigos 1.º, alínea a) e 2.º, alínea d), da presente proposta de lei.
Em complemento do agravamento das coimas e com o mesmo objectivo, na presente proposta de lei pedimos ainda autorização para: estabelecer a responsabilidade subsidiária, pelo pagamento das coimas, dos gerentes, administradores ou directores das sociedades proprietárias ou concessionárias da exploração dos empreendimentos punidos; determinar a publicação obrigatória da punição ou da contra-ordenação a expensas do infractor, e determinar que, ocorrendo violação de normas relativas a publicidade, seja aplicado o regime especial a estabelecer para os direitos reais de habitação periódica ou direitos análogos.
Finalmente, propõe-se ainda, na proposta de lei, que fique o Governo autorizado a manter isenta do imposto municipal de sisa a transmissão dos direitos reais de habitação periódica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O reforço da qualidade da oferta e a defesa do turista, enquanto consumidor, são duas áreas fundamentais na estratégia que se encontra definida para o sector do turismo.
Nesse sentido é, actualmente, sem dúvida, imperiosa a alteração, nos termos apresentados, do regime do direito real de habitação periódica e de direitos análogos.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado do Turismo os Srs. Deputados António Lobo Xavier, Raul Castro, António Vairinhos, José Vera Jardim e António Filipe.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Turismo, depois de conhecidas as notícias do mundo do, assim designado, time-sharing, compreendemos a preocupação do Governo em agravar as coimas já estabelecidas, que são realmente pouco significativas.

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Porém, a iniciativa que V. Ex.ª aqui nos traz não diz apenas respeito a isso - e muito bem! Nela é abordada uma questão que me causa alguma estranheza ou mesmo alguma perplexidade e que julgo ser uma matéria relativamente à qual deve ser exigida a maior cautela. Por isso, não podemos votar este pedido de autorização legislativa sem saber, ao certo, o que é que se pretende sobre essa matéria.
Refiro-me especificamente à questão da responsabilidade subsidiária dos gerentes, administradores ou directores das sociedades relacionadas com este tipo de actividade ou com este tipo de produto.
Assim, em primeiro lugar, a minha preocupação tem a ver com o seguinte: que responsabilidade subsidiária é esta? Respondem apenas quando haja culpa? Presume-se a culpa e esses administradores ou gerentes são obrigados a provar que não tiveram culpa efectiva? Respondem quando a sociedade não tem bens suficientes? Respondem apenas quando a sociedade foi executada para pagar as multas e não tem, pura e simplesmente, bens? Respondem, por exemplo, nos termos em que respondem os mesmos administradores e gerentes perante as dívidas fiscais? O que é que se prevê?
É que esta responsabilidade é uma distorção de tal maneira grave ao princípio da autonomia das sociedades que não podemos, tranquilamente, pronunciar-nos sobre elas sem conhecermos a extensão do seu pensamento em relação a esta matéria.
Aliás, Sr. Secretário de Estado, haverá de convir que não parece que haja mais necessidade de responsabilizar os gerentes e administradores destas sociedades do que de outras que colaborem na venda, na produção ou na promoção enganosa de determinados produtos!... A não ser que se pretenda dar uma protecção tão ampla e tão economicista a esse bem «turismo nacional», não vejo que razões especiais há para responsabilizar desta forma os gerentes ou os administradores destas sociedades e não os gerentes e administradores de todas as sociedades que façam publicidade enganosa, que promovam produtos de uma forma deficiente, que pretendam enganar a opinião pública ou que tenham, em geral, práticas contrárias ao respeito pelos direitos dos consumidores.
Para já, era sobretudo esta questão que gostaria de ver esclarecida.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Secretário de Estado pretende responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - No fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep.): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado do Turismo, quero colocar-lhe duas questões, a primeira das quais resultante da disposição da alínea b) do artigo 1.º desta proposta de lei, da qual consta que se mantém a isenção do imposto municipal de sisa à transmissão do direito real de habitação periódica.
Ora, como é sabido, a sisa é uma receita dos municípios, pelo que, quando o Governo isenta de sisa qualquer transmissão, está a privar o município dessa mesma receita. Não se encontra aqui qualquer referência no sentido de o Governo vir a providenciar pela transferência dos montantes da isenção de sisa a favor dos respectivos municípios...
A segunda questão relaciona-se com a coima estabelecida na alínea a) do artigo 2.º da mesma proposta de lei, onde se estabelece apenas o máximo da coima. Por que razão não se estabelece o mínimo? A verdade é que, nesse caso, seria possível exercer uma importante acção de prevenção especial e geral, porque qualquer infractor já saberia que a coima a pagar nunca seria inferior aquela importância, mas existe aqui uma indeterminação total quanto ao mínimo da coima a aplicar, o que funciona como falta de instrumento de dissuasão, falta essa que, creio, seria suprível pelo estabelecimento desse mínimo.
São estas as duas questões que deixo colocadas ao Sr. Secretário de Estado do Turismo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado do Turismo, muito telegraficamente, as questões que pretendo colocar-lhe são as que passo a enunciar.
V. Ex.ª demonstrou - e bem! -, no início da sua intervenção, a importância que o ame-sharing tem para o sector do turismo, o que, aliás, constitui uma verdade não só em Portugal como em toda a Europa comunitária. Todos temos conhecimento dos problemas que têm surgido, e com grande gravidade, neste subsector.
Assim, a primeira questão que lhe coloco é a seguinte: em termos comunitários, o que se passa com esta matéria? Tanto quanto sei, ainda não há regulamentação alguma sobre esta área concreta. Gostaria, caso fosse possível, que me esclarecesse a esse respeito.
É evidente que terei de congratular-me pelo facto de o Governo Português aparecer aqui com um conjunto de propostas, que irão dar um contributo bastante válido para dignificar o ame-sharing no nosso país, mas terei de ter em conta o seguinte aspecto: estamos em princípios de Maio, sabemos que o período de maior comercialização deste produto é precisamente durante a época estival, que, de resto, se aproxima. A proposta de lei n.º 55/VI diz, no seu artigo 3.º, que a autorização legislativa é concedida por 120 dias, por isso pergunto ao Sr. Secretário de Estado se, efectivamente, poderemos dispor deste instrumento legislativo ainda durante a próxima época estival. Será possível conseguir atingir essa meta?
A terceira questão relaciona-se com as situações, gravosas, que existem neste momento, anteriores, portanto, a esta proposta de lei e que são mais que muitas!... De que forma este instrumento, que se pretende levar a efeito, poderá ou não responder a essas situações? Penso que é o desejo de todos nós e também daqueles que viram lesados os seus legítimos interesses.
A última questão, e muito directa, tem a ver com as actividades de promoção e comercialização dos direitos de habitação periódica, pois todos sabemos que tem sido utilizado tudo e mais alguma coisa com o objectivo da venda. Gostaria que me dissesse o que se prevê, nesta proposta de lei, em termos de agravamento das sanções para a publicidade ilícita que temos vindo a observar.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Turismo, o Governo apresenta aqui, de vez em quando, pedidos de autorização legislativa quanto a contra-ordenações e coimas. Sente-se que - pelo menos, eu sinto-o, bem como a minha bancada- a este respeito há matéria para «todos os gostos»: desde coimas que a nada correspondem hoje em dia, como era o caso, aliás, daquelas que já constavam do antigo regime do direito de habitação periódica; coimas que vão até 500 000 contos; até coimas que vão até 20000 contos!... E não há coerência alguma neste sistema!
Aproveito o facto de estar aí ao lado de V. Ex.ª o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça para perguntar o seguinte: em que critério se baseia o Governo quando diz que a coima pode ir até 20 000 contos? Em que é que se baseia para nuns casos dizer que a coima será de 20000 contos e noutros dizer que será de 200000 contos?
Sr. Secretário de Estado do Turismo, até lhe dou um exemplo: no Código da Publicidade, publicado há um ano, o máximo das coimas é de 6000 contos. Para o caso da publicidade enganosa, por exemplo, a um indivíduo que faça publicidade enganosa - que pode até ser de extrema gravidade para a saúde pública-, aplica-se-lhe uma coima cujo máximo é de 6000 contos; se fizer publicidade enganosa de time-sharing, pode-se-lhe aplicar uma coima cujo máximo é de 20 000 contos.
Pergunto, por isso, a V. Ex.ª - pode ser que, com a ajuda do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, cheguemos a alguma conclusão - qual é a coerência disto tudo.
Pergunto-lhe ainda o seguinte: diz a proposta de lei que as coimas poderão ir até 20 000 contos. Mas que coimas e para que situações? Há imensas situações no time-sharing que merecem, umas, uma coima de 1000 contos; outras, uma coima de 500; e, outras, uma coima de 20 000 contos.
VV. Ex.ªs pretendem um «cheque em branco» para poderem pôr 20 000 contos à vossa vontade, onde quiserem e a propósito de que contra-ordenação quiserem? Penso que não é esse o sentido do vosso pedido de autorização legislativa!...
Poderia V. Ex.ª ser mais claro? Já que não tivemos acesso ao que V. Ex.ª nos disse telegraficamente, há pouco - ou seja, o que o Governo está a pensar fazer em matéria de mais uma revisão do time-sharing -, ao menos, procure dizer-nos que coimas se aplicam a que contra-ordenações. Senão, o que o Governo vem aqui pedir é um «cheque em branco», isto é, quer que digamos: «Sim, senhor, até 20 000 contos façam o que muito bem entenderem.»
Sr. Secretário de Estado, não tem sido esse - pelo menos, até agora- o conteúdo dos pedidos de autorização legislativa que o Governo aqui tem apresentado nesta matéria, porque esta Câmara, salvo o devido respeito, não é um «passa-culpas».
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, quero corroborar o que foi dito pelo ilustre Deputado da bancada do CDS, no sentido de que começa a ser preocupante que, nesta fúria punitiva do Governo, os administradores e os gerentes das sociedades passem a trabalhar pela aplicação sistemática da chamada desconsideração da personalidade jurídica. A verdade é que V. Ex.ª já tem, quer no Código das Sociedades
Comerciais quer em legislação avulsa, muitas disposições que lhe permitem punir também os administradores e gerentes. Só que essa legislação, muitas vezes, não se aplica - há talvez uma falta de atenção a muitas coisas que lá vêm. Agora, com esta coisa de as sociedades, daqui a pouco, terem um regime muito parecido ao da responsabilidade ilimitada -que ainda por cima não é para os sócios mas é para os administradores e gerentes -, com isso há que ter uma certa cautela, senão qualquer dia ninguém tem confiança alguma no regime jurídico das sociedades comerciais.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Turismo, quando nos debruçámos sobre esta proposta de lei de autorização legislativa para intervir neste debate, ficámos com um conjunto de interrogações que as três páginas que a compõem não clarificaram. A tal ponto assim foi que o Sr. Secretário de Estado se sentiu na obrigação de dar aqui conta de algumas linhas de alteração que o Governo tenciona aprovar quanto à alteração do regime do direito de habitação periódica, para o qual convencionalmente se utiliza a designação anglo-saxónica time-sharing.
De facto, V. Ex.ª compreenderá como é difícil alguém ter de se pronunciar sobre a alteração de um regime sancionatório sem saber em que sentido é que o próprio regime substantivo vai ser alterado. Isto é, nós sabemos que o Governo se propõe passar o limite máximo das coimas para 20 000 contos, mas não sabemos, em rigor, sobre o que é que isso vai incidir, na medida em que se prevê que haja uma revisão geral do regime do time-sharing e, portanto, isso não deixará de ter implicações sobre a matéria a regular e sobre a matéria a sancionar, sobre o que constituirá infracção a sancionar.
A consideração da matéria substantiva é, pois, essencial para se poder aferir a bondade do regime sancionatório que se propõe. Daí que nos pareça um tanto insólito que não nos seja dado qualquer conhecimento atempado de quais vão ser as linhas mestras da alteração do regime que se prevê, até porque a aplicação do direito de habitação periódica entre nós - e isso já foi aqui de alguma forma dito - rege-se por um regime um tanto pioneiro, poderemos dizer um tanto permissivo, relativamente a esta figura. Isto trouxe problemas - aliás, o Sr. Secretário de Estado já os referiu na sua intervenção - de defesa do consumidor, considerando as várias reclamações que têm surgido ao longo destes últimos anos da parte de pessoas que se sentiram burladas e que não foram devidamente esclarecidas sobre os compromissos que assumiam antes de os assumir e que reclamaram da situação que lhes foi criada e também problemas de defesa do cidadão que via a sua tranquilidade posta em causa ao ser abordado pelas formas mais extraordinárias por pessoas que procuravam, de alguma forma, aliciá-las a adquirir direitos de time-sharing.
Estas situações foram de tal gravidade que obrigaram a que houvesse, inclusivamente, intervenções administrativas relativamente a isso. Tenho comigo o regulamento policial do distrito de Faro, que tem um capítulo apenas dedicado aos problemas que resultaram do time-sharing. Mas existe também um edital do Governo Civil de Faro relativamente

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às fornias utilizadas pelos angariadores de time-sharing para desenvolverem a sua actividade...
A questão que coloco, Sr. Secretário de Estado do Turismo, é se não considera que o regime substantivo de time-sharing poderia, com toda a vantagem, ser objecto de um debate nesta Câmara, e não apenas a parte relativa ao regime sancionatório - não se sabe muito bem de quê... - e se estas situações não mereceriam uma intervenção legislativa que as clarificasse e que pusesse cobro a essas situações, que têm de ser, assim, resolvidas, e em muitos casos mal resolvidas, por meras intervenções administrativas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo, que para o efeito dispõe de cinco minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que a nossa principal preocupação foi criar um conjunto de mecanismos inerentes ao próprio negócio que garantam a normalidade e a segurança no mercado chamado do time-sharing. E repito as duas situações a que fiz referência: criar um conjunto de cauções que garantam quer o reembolso do sinal, no caso de resolução do contrato, quer a finalização do empreendimento nas condições definidas, quer que o empreendimento é expurgado de todos os ónus que caem sobre ele. Há, portanto, um conjunto de mecanismos associados ao próprio negócio que lhe conferem segurança.
Por outro lado, o segundo mecanismo que pretendemos introduzir é o da obrigatoriedade de o proprietário ou promotor reter 40 % das unidades de alojamento. Ele é o primeiro interessado em que o empreendimento mantenha a qualidade de futuro e é até uma das preocupações que actualmente existe em relação ao time-sharing.

utra forma ainda através da qual se pretende assegurar uma normalidade e uma segurança em relação a este negócio é a da imposição de uma capacidade financeira mínima às empresas assegurada, em princípio, por um ratio de solvabilidade.
De qualquer modo, não podemos ignorar que o regime geral das coimas é totalmente insuficiente para este negócio se tivermos em Unha de conta, por um lado, a gravidade das infracções que estão em causa e o princípio de que a coima deverá exceder o benefício económico do infractor e, por outro lado, um forte efeito que se pretende neste momento ao nível do mercado - e julgo que não se pode ignorar, ao analisar as coimas propostas, a experiência real e a necessidade de, no momento actual, se ser particularmente rigoroso, não se pode ignorar a necessidade de elas terem um forte efeito preventivo e dissuasor. Daí o valor das coimas proposto e a medida excepcional, também proposta, no sentido de os que administram as empresas responderem subsidiariamente, em relação às dívidas fiscais, até ao valor das coimas que forem estabelecidas.
Relativamente à questão das contra-ordenações estabelecidas, do seu valor e da comparação com outros regimes, apenas posso dizer que seguimos, enfim, o regime geral estabelecido. Porém, o Sr. Secretário de Estado da Justiça informou-me de que o Governo está a promover uma reformulação do regime das contra-ordenações, reformulação essa que, eventualmente, irá responder às preocupações que foram apontadas.
Quanto à questão da sisa, devo dizer que nos limitamos a manter uma isenção, que já existe. Portanto, não há qualquer alteração relativamente à situação passada. Apenas há, em virtude de existir um regime corripletamente novo, uma revogação completa dos diplomas, daí, ter-se feito este pedido quanto à sisa.
O Sr. Deputado Raul Castro perguntou por que é que se não estabelece um montante mínimo. Sr. Deputado, o pedido de autorização legislativa é precisamente para estabelecer o montante máximo já definido!...
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado sobre se há uma tipificação dos ilícitos a sancionar, tenho de dizer que nos é difícil de estabelecer... Enfim, os mínimos e os máximos dependem de situações concretas com que nos depararmos...
Em relação à questão colocada sobre o que se passa a este nível da Comunidade, posso informá-lo de que se encontra em discussão há cerca de dois anos uma directiva comunitária neste domínio, mas que em relação a ela tem havido adiamentos sucessivos da sua discussão por falta de entendimento relativamente a alguns aspectos que, sendo até de importância limitada, têm sido dificilmente ultrapassáveis. É exemplo disso o prazo de resolução do contrato ou ainda - e essa é outra matéria que tem dado alguma discussão - a legitimidade de se efectuarem ou não pagamentos na altura da assinatura do contrato-promessa ou apenas depois, aquando da assinatura dos contratos definitivos.
Quero ainda esclarecer que a nossa intenção é exactamente a de que o diploma, enfim..., não antes da época estival, porque praticamente já aí nos encontramos, mas que o diploma esteja publicado nos finais de Junho ou na primeira quinzena de Julho.
Em relação à questão que colocou sobre as situações que vêm do passado -e esta é uma questão que me parece fundamental -, isto é, sobre aquilo que constitui a herança do time-sharing, quero dizer que são três os conjuntos de situações, cujos aspectos fundamentais passo a enunciar a não finalização dos empreendimentos, a negligência na gestão dos empreendimentos e situações relacionadas com hipotecas registadas anteriormente ao registo dos direitos, o que faz com que estes caiam, no caso de execução, nomeadamente associados a financiamentos que não foram pagos pelas empresas promotoras.
Ora, Sr. Deputado, é impossível, com este diploma, responder a duas destas questões: à da não finalização dos empreendimentos e à última. Já relativamente à negligência na gestão os mecanismos que estão estabelecidos ou que pretendemos estabelecer, pensamos que são mais céleres e mais eficazes do que os anteriormente estabelecidos. Há, nomeadamente, uma situação relativa à qualidade da gestão: se, por exemplo, o empreendimento for desclassificado, pode dar origem à substituição da administração.
Em relação à proposta feita pelo Sr. Deputado António Filipe, desde já me comprometo, em nome do Governo, se a Comissão de Economia, Finanças e Plano assim o entender, a que quer eu quer o Sr. Ministro do Comércio e Turismo virmos apresentar o diploma a essa Comissão e prestar todos os esclarecimentos que forem entendidos por convenientes.
Fico, portanto, à vossa disposição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Seria muito agradável!

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O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr.ª Presidente, na qualidade de presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr.ª Presidente, penso estar em condições de anunciar ao Sr. Secretário de Estado do Turismo -aliás, tanto quanto me apercebi, era intenção da bancada socialista apresentar um requerimento nesse sentido e, segundo creio, não há oposição da parte do partido maioritário - que, oportunamente, através dos meios habituais (e gostaria que isto ficasse registado na acta), iremos marcar uma reunião com o Sr. Ministro do Comércio e Turismo para se discutir exactamente a legislação que o Secretário de Estado do Turismo aqui referiu, e agradeço, desde já, a sua disponibilidade.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado António Vairinhos, visto a Mesa ter sido informada de que até agora muitos Srs. Deputados ainda não votaram, lembro à Câmara que se encontra a decorrer na Sala D. Maria eleições para três membros da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados e que a uma irá ser fechada às 18 horas.
Tem a palavra, Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr.ª Presidente, gostaria de transmitir à Mesa que, da parte do Partido Social-Democrata, não há qualquer oposição à proposta formulada, quer pelo PCP quer pelo PS, quanto à vinda de membros do Governo à Comissão de Economia, Finanças e Plano. Damos, portanto, a nossa total solidariedade a esta proposta.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quando há vários anos, no fim da década de 70, se começou a falar muito do time-sharing - ainda não havia em Portugal legislação própria e muito menos a que veio criar o direito real de habitação periódica -, tive ocasião de frequentar, em Inglaterra, um seminário (dos muitos que os ingleses e os americanos fazem à volta destas novas figuras) sobre o time-sharing, para satisfazer a minha curiosidade. E lá ensinaram--me - aliás, como V. Ex.ª sabe muito bem, os anglo-saxónicos têm, nestas matérias jurídicas, um grande sentido pragmático e assim se explica que tenham sido eles, nos últimos anos, a lançar no mundo jurídico uma série de figuras novas para irem ao encontro, digamos, de novos interesses, e o time-sharing é um caso típico disso, como foi o leasing, o factoring, etc. -, mas, como estava a dizer, lá ensinaram-me que há, em matéria de time-sharing, uma coisa, uma, que é essencial: as garantias dadas pelo construtor e pelo explorador, quer à construção, aos acabamentos, etc., do que vai ser posto em time-sharing, quer à exploração. Eles só falavam nisto, Sr. Secretário de Estado! O grande problema do time-sharing é o das garantias: seguro ou caução.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Ora bem, desde 1991, Sr. Secretário de Estado - e aí toda a gente pode «limpar um pouco as mãos à parede» -, que andamos enredados, como sabe, neste problema do time-sharing, que assume hoje, de acordo, aliás, com os elementos trazidos por V. Ex.ª à Câmara, grande importância - designadamente, em certas regiões como no Algarve e, de alguma forma, também na Madeira- e a verdade é que ainda não consta da nossa lei garantias suficientes. O que acontece é que andamos aqui com a garantia disto..., que o contrato tem de dizer isto e aquilo...
O Sr. Secretário de Estado, eu já vi os contratos time-sharing. E não há um, um só, que cumpra tudo o que vem na lei, porque, às tantas, é quase impossível, visto ser tanta, tanta coisa!... Só há uma coisa importante, Sr. Secretário de Estado: o seguro ou a caução.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª esqueça tudo o resto, porque é aqui que está o nó do problema.
Ora bem, efectivamente, os problemas são muitos. Eu sei que V. Ex.ª não tem, nem o Governo tem certamente, apesar de hoje estar eivado da tal fúria punitiva, julgando que resolve tudo com o aumento das penas ... Mas não resolve. Já se sabe há dezenas de anos que ninguém consegue resolver seja o que for só pelo aumento das penas ou das coimas. Ponha V. Ex.ª em funções um seguro-caução ou uma caução ou um seguro em termos correctos - e, obviamente, quantitativos- e verificará que os problemas do time-sharing, se não acabarem, irão diminuir. Aliás, assim se explica o uso desta figura pelos americanos há dezenas de anos, e não me consta que haja problemas nas Bermudas, na Florida, etc.! Porquê? Porque só se compra quando há um seguro ou uma caução.
Sr. Secretário de Estado, temos o direito real - e, segundo sei, só nós e a Grécia é que o implantámos -, mas no fundo, ao procurarmos criar garantias, não criámos a fundamental, que é a do seguro ou a da caução ajustada.
Quanto às coimas, há pouco, aquando do meu pedido de esclarecimento, tive ocasião de criticar o que vem no diploma, dizendo que V. Ex.ª vem perdir-nos um «cheque em branco». Porquê? Porque vai haver variadíssimas tipificações de comportamentos susceptíveis de constituírem contra-ordenação e, como é natural, para cada uma dessas tipificações irá corresponder uma determinada coima. Porém, VV. Ex.ªs nada nos dizem sobre isto. Dizem apenas: «Vamos poder aumentar até 20 000 contos», e nada mais! Sr. Secretário de Estado - e esta dirige-se, em especial, ao Ministério da Justiça -, começa a ser um pouco perigoso o facto de não haver qualquer coerência, qualquer lógica, nesta coisa das coimas, e já há pouco lhe dei um exemplo.
O Código da Publicidade tem como máximo de coima 6000 contos. V. Ex.ª, para comportamentos ilícitos que constituam contra-ordenações, ao abrigo da lei do time-sharing, vem-nos propor como máximo 20 000 contos. Pergunto: o que justifica isto? Serão os interesses em jogo? Sr. Secretário de Estado, os interesses em jogo podem ser tão grandes numa empresa de publicidade como numa empresa de time-sharing.

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Serão os interesses dos consumidores? Estes, Sr. Secretário de Estado, podem ser tão graves e tão merecidos de protecção numa publicidade enganosa, designadamente de produtos alimentares, como no time-sharing.
Então, o que é que justifica esta desproporção? Será conforme o Ministério de onde vem? O Ministério da Justiça não tem qualquer palavra a dizer sobre isto? Tem algum estudo sobre as dezenas de contra-ordenações existentes nos vários diplomas legais e a coerência interna deste regime? Assim como o Código Penal, que, obviamente, tem de ter uma coerência entre as várias penas que constituem reacção aos vários comportamentos ilícitos, também o sistema de contra-ordenações tem de ter uma coerência interna. Ora, Sr. Secretário de Estado, essa coerência não existe, e o exemplo que lhe dei é o que melhor patenteia essa situação, mas, repare, posso dar-lhe outros.
Temos, por exemplo, a lei da concorrência, onde as coimas vão para centenas de milhar de contos. O que é que justifica uma coisa num caso e outra coisa noutro?
Sr. Secretário de Estado, esta política avulsa é perigosa! E mais perigosa é o que já há pouco referi: a política avulsa de fazer incidir sobre os administradores e os gerentes das sociedades comerciais, a título subsidiário, responsabilidades, como é feito nesta matéria.
Sr. Secretário de Estado, no Código das Sociedades Comerciais há vários princípios que se baseiam sobretudo na culpa, mas também no dolo, para atribuir responsabilidades aos seus administradores ou gerentes. Não podemos esquecer que as sociedades comerciais são, regra geral, de responsabilidade limitada: os sócios não tem responsabilidade e os gerentes ou administradores só a devem ter quando for provada a existência de culpa. Mas, como não é isso que está escrito na proposta de lei, ficamos sem saber se é essa ou não a intenção do Governo.
Em suma, conhecemos os muitos problemas que o time-sharing vem gerando nalgumas zonas do País, sabemos que são bastante variados - vão desde a pouca clareza do contrato até à inexistência de seguros adequados, passando pela impossibilidade de controlo por parte dos adquirentes da sobreposição de vendas de vários títulos- e que, muitas vezes, as 52 semanas transformam-se rapidamente em 200. Até pela experiência de familiares, temos a noção de como são feitos os convites. Toca o telefone: «Ganhou num concurso um fim-de-semana - de graça, claro! - no Algarve» e depois as pessoas são sujeitas a pressões, a coacção, qualificada como tal no Código Civil.
Não pense V. Ex.ª nem tenha a ilusão de que será através da criação de penas ou da prestação de caução que vai resolver o problema; é mais a montante que ele se resolve, através da educação dos consumidores, de campanhas lançadas localmente em termos adequados, enfim, através de uma política integrada para este sector.
Referiu V. Ex.ª que cerca de 15 % dos imóveis, em Portugal, foram vendidos em time-sharing, mas, Sr. Secretário de Estado, eu diria que esses 15 % são relativos também a direitos análogos, porque duvido que hoje essa percentagem esteja correcta.
O time-sharing é um negócio aliciante! V. Ex.ª sabe muito bem como é que um apartamento, que vale 10 000 contos, passa a custar 30 000 contos. Através do time-sharing! De facto, é um óptimo negócio não só por essa razão mas também por constituir para muitos empreendedores praticamente a única forma de venderem imobiliário. Os preços do imobiliário chegaram a tal ordem que o time-sharing é uma forma chamativa de a generalidade das pessoas, com um pequeno investimento, terem acesso a uma propriedade e, embora se trate de um direito real menor, vai satisfazer os seus interesses, pois permitir-lhes-á passar férias numa propriedade a que também podem chamar sua.
Efectivamente, trata-se de um negócio aliciante, que tem de manter-se - sejamos realistas -, mas que deve ser aperfeiçoado. Resolva V. Ex.ª, rapidamente, o problema das garantias, do seguro e da caução e verificará que as coisas entram na ordem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, acabámos de o ouvir referir que, aquando de uma deslocação a Inglaterra, foi-lhe revelado o segredo do time-sharing, mas devo dizer-lhe o seguinte: certamente que os ingleses lhe ensinaram o segredo para consulta externa porque eles próprios ainda não o aprenderam!...
O problema do time-sharing não existe só em Portugal, faz sentir-se em toda a Europa, bem como na América, à semelhança, aliás, do que o Sr. Deputado disse. Apenas para comprovar essa afirmação, ler-lhe-ei parte da análise feita por um jornal, que data do dia 2 de Maio, na qual se descreve a situação do time-sharing, que é calamitosa na Europa, nomeadamente na Grã-Bretanha. Diz o seguinte: «Cerca de 78 % das queixas são a respeito das técnicas de vendas desleais e sem ética; 9 % a respeito dos serviços prestados abaixo do esperado; 5 % a respeito do prazo ou da demora para prestar esses serviços; 2 % a respeito da injustiça das condições e dos termos de contratação; 2 % a respeito da baixa correcção das faltas ou penalidades [...]»
Os ingleses, que há vários anos transmitiram determinados ensinamentos ao Sr. Deputado, anos depois verificam que também não os aprenderam!
Como sabe, o time-sharing apareceu na Europa na década de 60, na América na de 70 e em Portugal na de 80, pelo que todos estamos a aprender esta matéria.
Por outro lado, diz o Sr. Deputado -e muito bem! - que gostaria de conhecer a coima que corresponde a cada infracção e depois, justificando esta afirmação, apela para o sentido de coerência que deve existir no regime das coimas.
Todos sabemos que existe um regime geral de enquadramento, ou seja, o ilícito de mera ordenação social, e regimes especiais com coimas que - tem toda a razão! - não têm qualquer sentido ou relação umas com as outras. Temos coimas como, por exemplo, na área bancária em que o limite máximo, para quem faz operações cambiais sem autorização, vai até 100000 contos e temos coimas, como acontece agora, de acordo com a previsão feita para o time-sharing, de 20000 contos, o que me parece pouco, Sr. Deputado! É que, como disse, um simples apartamento que vale 10 000 contos passa a valer 30 000 contos através do time-sharing. Portanto, se este limite máximo referido na autorização legislativa peca é, na minha perspectiva, por defeito.
Como é que o Sr. Deputado pretende que, neste momento e nesta sede, se faça um estudo sobre a coerência global das coimas que existem na lei portuguesa? Certamente que será feito noutra altura, mas quero dizer que estamos aber-

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tos para discutir e debater esse ponto, que me parece muito importante.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Correia Afonso, agradeço-lhe as questões colocadas.
Eu não disse que não existiam queixas por parte dos ingleses relativamente ao time-sharing, mas repare que a maior parte é relativa a práticas da chamada Europa mediterrânica, nomeadamente à publicidade agressiva da venda. A única forma de resolver as situações mais graves - aquelas em que a pessoa fica sem nada porque os imóveis postos à venda têm vendas sobrepostas ou são de edifícios que não existem ou que não podem ser postos à venda nesta modalidade, etc. -, a única garantia para prevenir esse estado de coisas, e certamente que o Sr. Deputado concordará comigo, é o seguro ou a caução. É a única!
Quanto ao resto - à publicidade enganosa, à forma agressiva das vendas -, naturalmente que há muita coisa a fazer, mas estava a referir-me a um problema muito mais grave: àquele que ocorre quando alguém paga 400, 500 ou 600 contos e fica sem nada, apenas com um papel na mão para emoldurar. De facto, parece-me que a única forma de solucioná-lo é através do seguro ou da caução e, nisso, certamente que o Sr. Deputado estará de acordo comigo.
Por outro lado, chamei a atenção para o problema das coimas, não apenas a propósito deste diploma mas porque têm surgido diplomas em catadupa com coimas - a Assembleia vai aprovando as coimas e o Governo vai trazendo aqui as autorizações legislativas para as contra-ordenações.
Ora, limitei-me a fazer um apelo, apoiado por si, segundo me pareceu, no sentido de pormos alguma ordem neste estado de coisas. E quem é que pode fazê-lo? A meu ver, é o Governo, designadamente o Ministério da Justiça, que terá de fazer um estudo comparado sobre a actual situação e dar coerência a este sistema.
Como o Sr. Deputado disse - e muito bem - as coimas previstas neste diploma são de 20 000 contos. Não creio que seja um valor alto, talvez possa considerar-se baixo, mas, como ninguém apresentou um qualquer estudo para justificar essa posição, eu não posso avaliá-la. Atiraram com um número - «até 20 000 contos» -, mas desconheço se ele tem coerência. Se calhar, deveriam ser 100000 contos ou seria suficiente considerar 10000 contos. Nem eu nem o Sr. Deputado o sabemos, só «a olho»!
Ora, eu exigia que o Governo fizesse um estudo do sistema das nossas coimas, que já é imenso - há coimas a propósito de tudo e de nada e nos mais variados sectores - para termos a percepção do sistema na sua globalidade, para que, quando a Assembleia conceder uma autorização legislativa, sabermos o que estamos a fazer, e nesse aspecto o Sr. Deputado Correia Afonso está certamente de acordo comigo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo vem pedir autorização para legislar acerca do regime sancionatório aplicável à violação das normas legais sobre o direito real de habitação periódica e direitos análogos. Por outras palavras, mais curtas e talvez mais claras, o Governo diz que vai reformular a regulamentação sobre time-sharing. Mas só pede autorização para legislar no domínio das contra-ordenações. Porquê? É natural que seja assim. O Governo nunca precisou de autorização para legislar sobre time-sharing. Não é, portanto, obrigado a pedir aquilo de que não necessita. Mas, depois da primeira revisão constitucional de 1982, passou a necessitar de autorização legislativa para poder mexer no ilícito de mera ordenação social e determinar o montante das coimas.
Na proposta de lei fala-se apenas em contra-ordenações, mas os dois grandes temas que neste momento estão em apreciação são, por um lado, o direito real de habitação periódica e, por outro, o limite máximo das coimas propostas e contra-ordenações.
O time-sharing é um regime de propriedade fraccionada no tempo, apenas autorizado para os empreendimentos turísticos. Falar em time-sharing é, portanto, falar em habitação de férias, em habitação turística. A este respeito, o XII Governo Constitucional, no seu Programa, já registava uma intenção. Dizia nesse documento que, ao definir as linhas de força da política de desenvolvimento turístico, haveria que criar uma «sensibilização para o investimento na realização de projectos de habitação turística».
O time-sharing ou o direito real de habitação periódica, como lhe chamamos em português, é assim um instrumento de promoção turística mas é também -e é preciso dizê-lo - um meio de dinamizar o investimento imobiliário e a construção civil. Trata-se, portanto, de um instituto jurídico que é simultaneamente um pilar do turismo e um suporte da construção civil.
Turismo e construção civil - actividades a montante e a jusante, duas componentes das mais importantes na economia nacional. De uma forma simples diríamos: por um lado, o turismo cria qualidade de vida e traz divisas; por outro, a construção civil oferece mais emprego.
Não é possível, pois, negligenciar a importância deste debate, do time-sharing e desta autorização legislativa. O direito real de habitação periódica é a forma acessível que se encontrou na década de 60 para que o maior número de utentes possível pudesse alcançar a sua habitação de férias para curtos períodos.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Num mundo em transformação, vão surgindo novas formas de actuação que não são mais do que o reflexo do dinamismo dessa mutação. Apareceu assim o time-sharing, introduzido em Portugal em 1981. Mas não só! Pouco a pouco têm chegado a Portugal novas figuras que são já correntes entre nós, como há momentos referiu o Sr. Deputado José Vera Jardim. É o leasing, joint venture, o franchising,...

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Uma coisa não tem nada a ver com a outra!

O Orador: -... o engineering, o factoring, o consórcio, e muitas outras que ainda cá não chegaram mas que se encontram prestes a passar a fronteira. Todas são peças da mudança com uma vocação e utilidade próprias.
O time-sharing destaca-se de entre elas e enquadra-se na promoção turística e no investimento imobiliário. Sendo importante, há que reconhecê-lo, perdeu credibilidade,

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pois as tropelias de que tem sido vítima desacreditaram-no, não apenas em Portugal mas em toda a Europa.
Como há pouco referi, segundo uma análise publicada há dias na Grã-Bretanha, só em 1992 o investimento de time-sharing na Europa ascendeu a mais de l bilião de libras. Não obstante essa avultada quantia, o time-sharing está em crise em toda a parte, principalmente por falta de confiança. Segundo o organismo oficial inglês, o Office of Fair Trading -e cito-o, até pelo que disse há pouco o nosso ilustre colega do PS -, a principal razão da crise generalizada do time-sharing está no facto de muitos dos operadores turísticos desse sistema não respeitarem a ética nem a lealdade nas suas práticas comerciais.
Em Portugal, chegou o momento de reconquistar a confiança no time-sharing.

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Ou de acabar com ele!

O Orador: - É com esse fim que o Governo se propõe tomar medidas e vem anunciá-las com este pedido de autorização legislativa. É preciso dar credibilidade ao direito real de habitação periódica e aos direitos análogos. Essa é uma das mensagens da autorização legislativa, na defesa do turismo, do investimento imobiliário e da construção civil, mas diria que, principalmente, para garantia dos interesses dos titulares e utentes desses direitos do time-sharing.
Para o efeito, o Governo propõe-se reformular a regulamentação do time-sharing, mas precisa de autorização para rever o correspondente regime das contra-ordenações e das coimas -cujo limite máximo propõe ser de 20000 contos-, proposta de autorização legislativa que cumpre os imperativos constitucionais e define com clareza o seu objecto, sentido, extensão e duração.
Como referiu há pouco - e muito bem! - o Sr. Deputado que me antecedeu, com coimas, garantias e cauções, os dois domínios mais significativos a sancionar serão, fundamentalmente: a prática comercial - publicidade, venda e promessa de venda - e a administração, conservação e reparação dos empreendimentos objectos de time-sharing. No entanto, podem questionar-se esses dois aspectos. É sabido que a tendência moderna é no sentido de descriminalizar, mas podemos inquirir se a natureza de coimas, com valores que vão de 20 000 contos a 100 000 contos e superiores, pode estar no âmbito de uma política penal administrativa, num âmbito mais pequeno que o do direito penal, quando põe em causa verdadeiramente a fazenda dos cidadãos.
Por mim, a respeito de uma coima de 20 000 contos numa área como o time-sharing, tenho afastada essa dúvida, mas continuo a ter dúvidas se a garantia prestada na defesa dos direitos dos cidadãos acerca do julgamento das contra-ordenações e do sistema de recursos assegura, efectivamente, esses mesmos direitos - creio que este ponto merece uma profunda reflexão, mas também estou certo de que não é esta a sede nem o momento próprio.
Na autorização legislativa agora pedida, o poder de dissuasão é, efectivamente, o montante das coimas. A substância é o time-sharing, mas a segurança para os utentes do mesmo time-sharing estará nas coimas, nas cauções e nas garantias. E este é o único caminho por onde é possível avançar, porque não há outra alternativa nem em Portugal nem lá fora.
Diria ainda, fazendo referência a um poeta trágico grego de há 2500 anos, que a vitória neste caso é sempre o resultado de duas coisas contraditórias: a audácia, por um lado, e a segurança, por outro. Agora posso afirmar que nesta tarefa, numa matéria tão sensível e que julgo tão importante, o Governo terá não só o nosso estímulo como também o nosso apoio.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em primeiro lugar, quero registar a disponibilidade manifestada pelo Governo para que, a curto prazo, se possa realizar uma reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano, segundo foi proposto, a fim de que o Governo possa esclarecer com maior pormenor aquilo que pretende fazer quanto à revisão geral do regime relativo ao direito de habitação periódica. Isto porque, como já tive oportunidade de dizer, não faz grande sentido que a Assembleia se pronuncie sobre um regime sancionatório a aplicar a um determinado sistema jurídico sem ter conhecimento do seu conteúdo substantivo.
Não se coloca aqui um problema de constitucionalidade mas, seguramente, um problema lógico. Quando o Sr. Deputado Correia Afonso se sente na obrigação de dizer que, constitucionalmente, não há qualquer problema no facto de o Governo vir pedir autorização legislativa - a que, constitucionalmente, é obrigado -, no que respeita ao regime sancionatório, e de não trazer uma proposta de lei relativamente à matéria substantiva em causa, está implicitamente a reconhecer que, não existindo um problema constitucional, existe um problema lógico. Digamos que a proposta de autorização legislativa fica um tanto no ar, na medida em que não nos é dado conhecimento do que o Governo pretende fazer quanto àquilo que efectivamente a sustenta
Registo, pois, a disponibilidade para a realização de uma reunião, mas também não posso deixar de registar a forma vaga como se propõe que a Assembleia conceda uma autorização legislativa, que é pouco mais do que um «cheque em branco» ao Governo.
Consideramos importante desenvolver aqui um debate em torno das questões de substância que se colocam com o regime jurídico do time-sharing. Isto porque há problemas, tal como foi referido, a nível da defesa dos direitos dos adquirentes, a nível da agressividade com que os angariadores procuram vender estes produtos. Contudo, creio que não se trata apenas de um problema de agressividade mas também de preterição de direitos essenciais dos consumidores, é um problema de desconformidade entre a vontade real dos adquirentes e as obrigações concretas que assumem, em que as pessoas, só depois de verificarem que assumiram uma obrigação que não era a que pretendiam e que, de alguma forma, foram enganadas, reclamam para as instâncias adequadas. Mas o que é verdade é que estas situações não foram prevenidas e ocorreram.
Já há pouco referi a existência de regulamentos administrativos que, relativamente a esta matéria, usam formulações contundentes. Não posso deixar de citar um edital do governador civil de Faro, homologado pelo .Ministro da Administração Interna, que refere «chegando tal actividade a ser considerada por alguns turistas como verdadeiro massacre»

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e «urge tomar medidas drásticas e adequadas à sua erradicação definitiva, sob pena de poder resultar irreversivelmente prejudicada a imagem turística deste província», que é o Algarve. Há, portanto, problemas que devem ser encarados não apenas do ponto de vista dos regulamentos administrativos mas também através de uma intervenção do legislador, porque, efectivamente, poderão mesmo ter implicações no próprio regime sancionatório, que é aquele que o Governo aqui põe directamente em discussão.
Por outro lado, é do conhecimento geral que o regime legal do time-sharing suscita problemas, mesmo do ponto de vista da sua qualificação jurídica como direito real ou como um direito meramente obrigacional. É do conhecimento geral que o time-sharing tem a ver essencialmente com a construção civil e com investimentos imobiliários e, consequentemente, deve ser tratado como tal na legislação. Ora, o que se verifica actualmente - e a legislação portuguesa é neste aspecto extremamente permissiva- é que os adquirentes do time-sharing são tratados como se fossem simples utilizadores de produtos turísticos colocados à sua disposição, como se alugassem um quarto num hotel e não tivesse sem qualquer direito real sobre um determinado bem, neste caso um bem imobiliário.
Assim, seria indispensável que este valor da protecção do adquirente, como adquirente de um direito real e não de algo meramente obrigacional, fosse tido em conta na revisão da legislação que agora se anuncia, pelo que seria também importante ouvir o Governo sobre este problema.
Relativamente ao regime sancionatório, importa ainda referir o seguinte: a forma como o Governo apresenta esta proposta de autorização legislativa, questão que já abordei aquando do meu pedido de esclarecimento, é inconcebivelmente vaga. É que o Governo não pode limitar-se a propor o aumento das coimas para um limite máximo de 20000 contos, sem referir a moldura que quer ver aplicada a cada um dos tipos apresentados na proposta de autorização legislativa, tipos esses com configurações e sanções diversas, que não têm apenas limites máximos mas também mínimos. Seria, portanto, indispensável que, para que a Assembleia se possa pronunciar sobre alguma coisa em concreto, o Governo dissesse algo mais do que propor aumentar o limite máximo das coimas para 20 000 contos.
Relativamente a esta matéria, o Governo necessita de dar esclarecimentos -que até ao momento não prestou-, a fim de que a Assembleia possa decidir.

Vozes do PCP: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim da Silva Pinto, que disporá de um minuto cedido pelo CDS.

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, quero agradecer ao CDS a gentileza dessa cedência, dizendo depois ao meu ilustre amigo, Dr. Correia Afonso, que por favor não misture leasing, factoring e time-sharing, porque são termos ingleses com uma diferenciação fundamental. O leasing impôs-se, o factoring vem-se impondo como actividade legítima interessante e o time-sharing desacreditou-se. São termos ingleses, mas não têm nada que ver uns com os outros. Que nesta Câmara isto fique dito e assinalado!
Em segundo lugar, quero congratular-me, Sr. Secretário de Estado, pelos propósitos do Governo em regulamentar essa actividade. Só que deve fazê-lo depressa porque o PSD tem sido o responsável pelo sector do turismo e foi durante essa responsabilidade que cresceu, em termos incontrolados, uma actividade a que importa pôr cobro.
Devo pedir a V. Ex.ª, agradecendo-lhe o gesto de querer vir discutir este assunto no seio da Comissão de Economia, Finanças e Plano, que nos envie esse texto o mais depressa possível, para que possamos estudá-lo e discuti-lo ainda antes do período de férias, porque se o Governo quer efectivamente ter uma acção pedagógica neste sector terá de começar a criar a notícia política de que este assunto é discutido na Assembleia e de que ele é discutido com grande urgência.

Vozes do PS: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostaria apenas de referir que os problemas com que actualmente se defronta o sector do time-sharing têm a ver, essencialmente, com a não finalização dos empreendimentos, com a negligência na gestão e com direitos alienados sobre imóveis hipotecados com o registo anterior de hipoteca o que, em caso de execução, põe em causa os direitos adquiridos.
Aliás, analisando estes problemas, concordo totalmente com o que disse o Sr. Deputado José Vera Jardim de que, mais do que as coimas, a única forma ou a forma prioritária de resolver estes problemas é criar mecanismos inerentes ao próprio negócio que sejam preventivos dos problemas referidos.
Daí que, na minha intervenção inicial, de todas as alterações que irão ser introduzidas no actual regime, tenha destacado a obrigatoriedade de, no momento da assinatura do contrato-promessa ou da transmissão do certificado predial, conforme os casos, estar constituída pelo promotor uma caução, um seguro, uma garantia ou um depósito bancário que garanta, para além da devolução do sinal, no caso de resolução do contrato, a possibilidade de efectiva e plena fruição do direito nas condições e datas previstas no contrato, bem como a expurgação das hipotecas.
Para além disto, ainda no âmbito destes mecanismos inerentes ao próprio negócio e que sejam preventivos em relação a problemas futuros, pensamos que é essencial outra alteração que vai ser introduzida e que tem a ver com a comercialização de direitos apenas sobre 60 % das unidades de alojamento, pois a negligência na gestão e o seu abandono só podem parar interessando o próprio promotor no empreendimento, transformando o time-sharing de um negócio imobiliário para um negócio hoteleiro.
Portanto, ao nível dos mecanismos preventivos, para além das garantias ou das cauções, este parece-nos fundamental e vai ser introduzido, bem como um outro que tem a ver com a garantia da capacidade financeira da empresa.
Porém, há ainda outro aspecto que me parece fundamental e que também irá ser consagrado - e a prática começa a mostrar que há desenvolvimentos neste domínio -, que visa estabelecer para os direitos análogos um enquadramento legal equivalente, isto é, para direitos obrigacionais que venham a ser criados haverá um enquadramento legal equivalente ao dos direitos reais de habitação periódica.

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Todavia, não se pode deixar de ter em conta que a experiência real -nomeadamente, a situação do mercado, os problemas que todos conhecemos e que aqui foram enumerados, os elevados benefícios económicos envolvidos - ensinou que os mecanismos preventivos só são eficazes com coimas que tenham um forte efeito persuasivo e dissuasor. Daí a nossa proposta de autorização legislativa.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, terminámos a apreciação da proposta de lei n º 55/VI.
Enquanto não iniciamos as votações agendadas para hoje, o Sr. Secretário vai proceder à leitura da acta da eleição de três membros da Comissão Nacional de Protecção de Dados Informatizados.

O Sr. Secretário (Belarmino Correia): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A acta é do seguinte teor:
Aos cinco dias do mês de Maio de mil novecentos e noventa e três, na Sala D. Maria, do Palácio de São Bento, procedeu-se à votação para a eleição do presidente e dois vogais da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados (CNPDPI).
O resultado obtido foi o seguinte:

Votantes -174;
Lista A - sim - 121;
Lista B - sim - 45;

tendo-se ainda verificado 6 votos brancos e 2 nulos. Nos termos legais aplicáveis, face ao resultado obtido, declaram-se eleitos para a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados (CNPDPI) os seguintes cidadãos:

Presidente - Victor Coelho.
Vogal - Luís José Durão Barroso.
Vogal - João Alfredo Massano Labescat.

Para constar se lavrou a presente acta, que foi assinada pelos Deputados escrutinadores.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 131/VI - Alarga o período de protecção post mortem dos direitos de autor (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS, votos a favor do PCP e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro e abstenções do PS e do PSN.

Srs. Deputados, passamos à votação do projecto de deliberação n.º 60/VI - Constituição de uma Comissão Parlamentar para o Contacto com as Cortes de Espanha (PSD).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e do Deputado independente Freitas do Amaral.

Srs. Deputados, vai ser votada, na generalidade, a proposta de lei n.º 55/VI - Autoriza o Governo a alterar o regime contra-ordenacional aplicável às violações das normas legais sobre o direito de habitação periódica e direitos análogos.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS e do PSN e abstenções do PCP e aos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na especialidade, da proposta de lei.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do PSN e abstenções do PS, do PCP, do CDS e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do PSN e abstenções do PS, do PCP, do CDS e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado José Vera Jardim pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Para fazer uma declaração de voto sobre o nosso voto de abstenção em relação à votação final global deste diploma, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Durante a discussão do diploma que acabámos de votar, foi chamada a atenção do Governo para a necessidade de esta discussão e votação serem precedidas do conhecimento exacto do diploma geral que o Governo aqui veio anunciar, tendo o Sr. Secretário de Estado assumido o compromisso de vir à Comissão de Economia, Finanças e Plano apresentar e discutir esse diploma para que esta autorização legislativa tivesse todo o sentido.
Sendo assim e embora tivéssemos votado favoravelmente na generalidade, parece-nos que está mais que justificado o sentido do nosso voto ao pretendermos que esta Câmara ficasse completamente elucidada, através da análise do decreto que o Governo tem em preparação, sobre as reformas que o Governo se propõe introduzir no regime legal do time-sharing.

Vozes do PS: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Carlos Coelho pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Para fazer uma declaração de voto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PSD votou a favor desta proposta de lei no entendimento de que, concedendo autorização para o Governo legislar sobre esta matéria, o Sr. Secretário de Estado não deixará de cumprir aquilo que prometeu, isto é, que o Governo, antes de aprovar o decreto-lei que resultará

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desta autorização, dialogará com o Parlamento em sede de comissão.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação da proposta de resolução n º 20/VI-Aprova, para ratificação, a Convenção para Protecção das Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Carácter Pessoal.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da justiça (Borges Soeiro): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Portugal foi um dos primeiros países europeus a preocupar-se com a defesa da intimidade da vida privada e da protecção dos dados pessoais relativamente à utilização da informática.
Logo em 1976, na primeira Constituição após a Revolução de 1974, o artigo 35.º proibia a utilização da informática para tratamento de dados referentes à vida privada.
A actual redacção do artigo 35.º da Constituição da República Portuguesa, após a revisão constitucional de 1989, consagra os seguintes princípios fundamentais: o direito de os cidadãos tomarem conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou registos informáticos que lhes digam respeito e do fim a que se destinam, podendo exigir a sua rectificação e actualização, sem prejuízo do disposto na lei sobre segredo de Estado e segredo de justiça; a proibição do acesso a ficheiros e registos informáticos para conhecimento de dados pessoais relativos a terceiros e respectiva interconexão; a proibição da utilização da informática para o tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa ou vida privada, salvo quando se trate do processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis; a proibição da atribuição de um número nacional único aos cidadãos; a definição do regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras ser definido na lei, estabelecendo-se formas adequadas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifique por razões de interesse nacional.
O dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei da Protecção de Dados Pessoais face à Informática (Lei n.º 10/91, de 29 de Abril), que se baseia nos princípios definidos pela Convenção n.º 108 do Conselho da Europa - agora em análise - e das linhas directrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).
São princípios fundamentais da lei, como condição para o tratamento automatizado de dados pessoais, o consentimento das pessoas a quem os dados se referem, ou a existência de motivos de interesse público, fundamentados na lei, o respeito pela finalidade para a qual os dados foram recolhidos, bem como a existência de uma autoridade independente do poder executivo com competência para investigar infracções e fazer cumprir a lei.
A Lei n.º 10/91 abrange apenas os dados automatizados, não incluindo, portanto, os ficheiros manuais, e aplica-se tanto no sector privado como no sector público, embora preveja regimes ligeiramente diferentes para cada um destes sectores.
A lei isenta da sua aplicação os ficheiros de dados pessoais que contenham exclusivamente informações destinadas a: uso pessoal ou doméstico; processamento das remunerações de funcionários ou empregados, bem como outros procedimentos administrativos atinentes à mera gestão dos serviços; facturação de fornecimentos efectuados ou de serviços prestados; cobrança de quotização de associados ou filiados.
Como autoridade de controlo, foi criada a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, que tem como atribuição genérica a fiscalização do processamento automatizado de dados pessoais, em rigoroso respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituição e na lei.
A aludida Comissão é uma entidade pública independente, com poderes de autoridade, que funciona junto da Assembleia da República e dispõe de serviços próprios de apoio técnico e administrativo. No exercício das suas funções, a Comissão profere decisões com força obrigatória, passíveis de reclamação e de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo.
A constituição de ficheiros automatizados que não contenham dados pessoais considerados sensíveis apenas está sujeita a prévia comunicação à Comissão, acompanhada dos elementos de informação exigidos na lei.
São considerados dados sensíveis os referidos no n.º 3 do artigo 35.º da Constituição da República Portuguesa e, bem assim, os dados referentes à origem étnica, a condenações em processo criminal, a suspeitas de actividades ilícitas, ao estado de saúde e à situação patrimonial e financeira.
O tratamento automático de dados sensíveis apenas pode ser efectuado desde que tenha havido iniciativa da própria pessoa no sentido de para tanto fornecer os seus dados com pleno conhecimento da utilização que deles possa ser feita.
Os dados sensíveis acima referidos e que estão previstos no artigo 35.º da Constituição podem ainda ser tratados automaticamente por serviços públicos, desde que tal esteja expresso na lei, com prévio parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais face à Informática.
Finalmente, a interconexão de ficheiros automatizados só é permitida quando estes contenham exclusivamente dados públicos e a interconexão se processe entre entidades que prossigam os mesmos fins específicos na dependência do mesmo responsável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a aprovação e entrada em vigor da citada Lei n.º 10/91, encontram-se satisfeitas as condições de ratificação da Convenção para a Protecção de Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Carácter Pessoal.
Assim, e como bem se refere no douto parecer da 3.ª Comissão desta Assembleia, o direito interno português adequa-se à Convenção pois: dirigindo-se aos ficheiros automatizados de dados pessoais nos sectores público e privado, acompanha o campo de aplicação da Convenção: contempla os princípios da recolha leal e lícita dos dados, da finalidade do ficheiro, da qualidade e da conservação limitada dos dados; rodeia de especiais garantias o tratamento dos dados sensíveis quando, excepcionalmente, o autoriza; impõe que os ficheiros automatizados sejam equipados com sistema de segurança; garante ao titular dos dados os direitos de acesso, de rectificação, de completamento e de supressão dos dados; prevê, como vias de recurso, a queixa à aludida comissão Comissão Nacional de Dados Pessoais face à Informática, a reclamação e o recurso contencioso relativamente aos actos praticados pela mesma Comissão; estabelece um vasto leque de sanções de natureza cível,

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administrativa e penal; permite os fluxos transfronteiras de dados com autorização da comissão, o que é compatibilizável com o livre fluxo de dados entre Estados que sejam parte na Convenção.
Por último, justifica-se que o Estado Português no momento da entrega do instrumento de ratificação faça a declaração que a Convenção lhe permite da sua não aplicabilidade a certas categorias de ficheiros automatizados de dados de carácter pessoal cuja lista será depositada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a ratificação da presente Convenção que visa sobremaneira a defesa da intimidade da vida privada está a dar-se mais um importante passo no sentido de imprimir real execução a uma política consistente e coerente que tem no respeito dos direitos do homem o seu norte e as suas referências.
Convencidos, como estamos, de que a tutela desses direitos fundamentais e a afirmação veemente e bem explícita de que a defesa dos direitos dos cidadãos é a pedra angular de um Estado de direito, solicitamos por parte desta Câmara a ratificação da Convenção para a Protecção das Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Carácter Pessoal.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, quem ouvir a sua intervenção não poderá aperceber-se minimamente, descontado que seja o facto de ter descrito o sistema que vamos apreciar, das condições exactas em que o Estado Português se prepara para aprovar por ratificação este instrumento.
A primeira dessas condições é a mora, que é enorme. Gostava que o Sr. Secretário de Estado pudesse justificar, perante a Câmara, os atrasos e, designadamente, o último dos atrasos.
Como V. Ex.ª sabe, o agendamento desta matéria esteve feito há algumas semanas atrás, foi adiado, mas não sabemos porquê. No dia em que o adiamento ocorreu, o Sr. Ministro da Saúde anunciava publicamente - não sei bem o quê! - o dominado cartão de saúde; o Governo não explicava - também não sei porquê! - por que razão é que estava tão confuso o processo de regulamentação da Lei n.º 10/91, e a verdade é que a Convenção, que deveria ter sido discutida nesse dia, não o foi. É-o hoje. Em todo caso, com um atraso de muitos anos em relação à data da assinatura que é, se bem lembro, de 14 de Maio de 1981! Pelo caminho deveriam ter sido produzidas normas, que não o foram.
A pergunta é, pois, no sentido de saber, em primeiro lugar, quais as razões da mora -sobretudo, da última- e, em segundo lugar, se V. Ex.ª considera que estão reunidas todas as condições necessárias para a ratificação deste diploma, uma vez que, embora haja a Lei n.º 10/91, não há vários dos instrumentos de regulamentação que esta previa e que são indispensáveis à plena vigência da Convenção no nosso direito interno.
Sem prejuízo de outras considerações que serão feitas oportunamente, a pergunta que gostaria de fazer-lhe tem a ver mais exactamente com o conteúdo da lista a que aludiu na parte final da sua intervenção. Gostaríamos que V. Ex.ª dissesse, para que ficasse registado em acta, dos fundamentos de cada uma das exclusões que o Governo considera pertinentes, para que sobre esses fundamentos possamos ter ainda alguma discussão útil durante o tempo que temos reservado para o debate.
São estas as perguntas que deixo feitas, em nome da minha bancada.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, relativamente às condições exactas pelas quais está a haver alguma demora na regulamentação da lei, quero dizer que, em primeiro lugar, para ratificarmos esta Convenção, precisávamos de ter um instrumento jurídico. Quando o Sr. Deputado referiu que a Convenção foi aberta à assinatura de uma ratificação em 1981 e só hoje o Estado Português está a empreender a adequação ao sistema jurídico português e, portanto, a aprovação da respectiva Convenção, temos de ter presente que o Estado Português só pode ratificar a Convenção desde que tenha legislação aprovada e em vigor. Ora, esse facto ocorreu, como todos sabemos, com a Lei n.º 10/91, de 29 de Abril. Portanto, só a partir do momento em que foi publicada a lei é que estávamos em condições de ratificar esta Convenção.

O Sr. José Magalhães (PS): - Estamos em Maio de 1993!

O Orador: - Exacto.
Relativamente ao porquê da demora, penso que essa resposta é absolutamente linear e, obviamente, não vou intrometer-me na questão dos agendamentos dos diplomas que passam por esta Assembleia, pois isso pertence à Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares e o Governo aí não tem qualquer espécie de intervenção.
No entanto, quero apenas referir que a informação que tivemos, logo praticamente a seguir à publicação da lei da protecção de dados, em fins de Abril de 1991, era que a nível da Comunidade eslava em estado muito adiantado a aprovação de uma directiva que vinha, de alguma forma, pôr em causa alguns normativos da nossa lei.
Pensámos que a aprovação dessa directiva fosse relativamente célere, mas aconteceu que se atrasou, nomeadamente com a presidência inglesa e agora a presidência dinamarquesa não a vai aprovar até ao fim do seu mandato.
Portanto, presume-se que o será somente durante a presidência belga, ou seja mais para o fim do ano.
Entretanto, como todos sabemos, ia havendo necessidade, face a um outro diploma a uma outra realidade, de ser regulamentada a lei no senado de instituir, empossar e pôr em funcionamento a comissão. Isso aconteceu, o Governo aprovou o respectivo decreto-lei e hoje mesmo está a decorrer a eleição para os membros dessa comissão.
Quanto à questão da regulamentação dos serviços públicos - e aqui refiro-me basicamente aos serviços policiais - está em actuação como que uma task force entre os Ministério da Justiça e da Administração Interna, no sentido de, a curtíssimo prazo, termos a regulamentação dos serviços públicos policiais que são, se facto, aqueles que neste momento contêm dados mais sensíveis.

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Este é o ponto da situação relativamente ao porquê de só agora se estar a regulamentar a lei de bases. Foi sobretudo para acompanhar, no seio da Comunidade, a evolução da discussão e aprovação de uma directiva que tardou.
Como não está aprovada neste momento, chegámos à conclusão de que era urgente avançar com a regulamentação e depois se fosse de alterar a lei logo testaríamos essa possibilidade.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para apresentar o relatório sobre esta proposta de resolução, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, aprovado por unanimidade, chama particularmente a atenção para a necessidade de convergência entre o sentido da Convenção e a sua adequação ao texto constitucional e à Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, onde pareceu à Comissão e ao relator não haver quaisquer matérias de discrepância.
No entanto, também aí se chama particularmente a atenção para o facto de a protecção de dados pessoais ter constituído, entre nós, uma história de enganos, omissões, abusos e atrasos.
Já foi referido que, desde 1981, há uma Convenção, a que Portugal aderiu, nesse mesmo ano, e que entrou em vigor em 1985. Temos um texto constitucional enquadrador das grandes linhas da Convenção, desde 1976. Esta matéria é a única, até hoje, explicitamente declarada pelo Tribunal Constitucional como merecedora de uma declaração de inconstitucionalidade por omissão e, não obstante ter sido publicada a Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, podemos dizer que, na prática, continuamos a viver numa situação de inconstitucionalidade por omissão.
A lei existe, mas é uma lei vazia e inaplicável até hoje.
Poderia dizer que espanta - e o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça vai permitir-me uma consideração lateral, não contida no relatório - que alguma vez uma directiva comunitária pudesse ser condição para aprovação de uma convenção, que, ela sim, é condição de um conjunto de princípios, regras e normas que têm de entrar em vigor no nosso Estado de direito para ele o ser efectivamente.
O Sr. Secretário de Estado já referiu que a assinatura da Convenção estava dependente da mediação de lei ordinária, mas hoje é opinião comum que não basta a Lei n.º 10/91 para haver uma aplicação efectiva da protecção de dados pessoais informatizados. Nesse sentido, recordava que o próprio relatório, aprovado por unanimidade, apresentava como condições de efectividade da Convenção a necessidade da criação da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, da publicação de um decreto regulamentar, que vise adequar o funcionamento dos ficheiros detidos pelos serviços públicos, e de legislação dos restantes ficheiros, precedendo parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Existindo lei ordinária e tendo nós hoje dado o primeiro passo para a criação da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, as questões colocadas pelo relatório, às quais o Sr. Secretário de Estado não deu resposta, são as seguintes: há lei ou disposição regulamentar sobre as competências dessa Comissão (interrogação para a qual gostaríamos de obter resposta)? Há decreto regulamentar que a de que o funcionamento dos ficheiros detidos pelos serviços públicos (segunda disposição legislativa necessária) e legislação dos restantes ficheiros (terceira exigência legislativa)?
Se a resposta a estas questões, que a Comissão entendeu como necessárias e absolutamente imprescindíveis ao funcionamento e à aplicação efectiva desta Convenção, não for satisfatória, a Convenção vai continuar a «navegar no mar» das omissões, dos enganos, dos abusos e do direito que não é cumprido.
Diríamos que, se a resposta for negativa, continuamos a viver numa inconstitucionalidade por omissão - não uma inconstitucionalidade normativa mas, perdõem-me a expressão, institucional.

O Sr. José Magalhães (PS): -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Que a Assembleia da República aprove para ratificação esta Convenção, não nos suscita outra emoção que não seja a do aplauso. Não estamos senão em atraso. A questão fundamental que importa registar, ao praticarmos este acto, que da nossa parte não envolve senão um voto favorável, é a de saber em que ponto estamos, no que diz respeito ao cumprimento da artigo 35.º da Constituição. O juízo a exprimir objectivamente sobre essa matéria é o de que estamos mal!
Por um lado, a margem de protecção constitucional não tem qualquer correspondência no direito convencional vigente na ordem interna e, por outro, como já foi sublinhado, a própria criação dos pressupostos legais para a entrada em vigor desta concreta Convenção está longe de estar realizada na proporção e na dimensão adequadas. Isto, porque a Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, era, ela própria, largamente devolutiva para o legislador, para uma espécie de elaboração legislativa secundária, deixando ao Governo numerosas coisas a regulamentar e à Assembleia numerosas outras coisas a legiferar.
Essas numerosas outras coisas incluem matérias de tão grande melindre, como, por exemplo, a regulamentação do regime dos fluxos de dados transfronteiras, questão esta da mais total actualidade. De facto, circulam neste momento milhões de dados de todas as espécies e procurar controlar os fluxos de dados transfronteiras teria, suponho, como efeito paralisar sectores essenciais da nossa vida económica, em geral, e, em especial, da nossa vida financeira. Quem tenha estudado uma proporção que seja, minúscula, da maneira como funciona hoje o sistema bancário a nível mundial ou as estruturas financeiras tem ideia do carácter decisivo de que hoje se revestem os fluxos de dados transfronteiras em todos os domínios, mas, em particular, nestes.
Sobre este ponto, a Assembleia da República ficou de assumir, ela própria, uma segunda fase de elaboração legislativa, para a qual seria necessária uma intervenção preparatória governamental, mas da qual não se vislumbram sinais alguns. Ou seja, face à Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, o Governo fez duas coisas, ambas censuráveis.
Em primeiro lugar, «meteu a lei na gaveta». A lei teve uma vacatio legis de um ano, pelo que deveria ter entrado

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em vigor plenamente em Abril de 1992, altura em que deveriam estar completados alguns processos fundamentais mas em que nenhum deles estava.
Ora, o que o Sr. Secretário de Estado referiu, como sendo um acto positivo e feliz que se realizou hoje - a eleição de parte dos membros da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados -, é, na verdade, o fruto de um esforço persistente e resistente, designadamente protagonizado por esta bancada, contra o silêncio, a não regulamentação governamental que impediu a eleição desse orgão pelo Parlamento e depois o adiamento sucessivo da eleição dos seus membros, que aguardou, até há poucas semanas, a publicação do malfadado decreto que o Governo não elaborava e não publicava.
Assim, aquilo que foi apresentado como uma cedência e uma colaboração traduziu-se, na verdade, num acto de bloqueio e de resistência ao cumprimento da Lei n.º 10/911.
Como também referi, o Governo absteve-se de legislar, ou de ajudar a legislar, em qualquer dos outros domínios respectivos. Isto criou, desde logo, uma situação de amputação do nosso quadro legal, que é incompleto, e, sobretudo, não efectivo. Quando o Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade por omissão, já aqui também aludida pelo Sr. Deputado Alberto Martins, fê-lo porque não havia um corpo de normas.
O que aconteceu a seguir é absurdo: foi aprovado quase por unanimidade esse corpo de normas e, a seguir, em vez de se dar cumprimento pleno a esse quadro normativo, ele foi bloqueado, aparentemente porque alguns lobbies consideraram haver nele soluções excessivamente protectoras de direitos fundamentais. Houve um bloqueio surdo, invisível, mas eficaz, que só agora vai ser moderado aparentemente, graças a este esforço que culminará com a eleição da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Mais ainda, verificou-se uma outra situação disforme ou disfuncional: enquanto tudo isto se passava, o Governo prosseguia o mecanismo de criação de mais serviços públicos dotados de computadores, ligando-os, além do mais, através da rede telefónica, e, portanto, da telemática, a vários zonas do País e do estrangeiro; avançava-se na criação do sistema de informações Schengen, o qual, por definição, implica a concentração de meios informáticos, sem precedentes, no nosso país e a sua utilização numa área particularmente sensível.
A par de tudo isto - informatização das polícias no quadro de Schengen e fora dele, inclusivamente da Polícia Judiciária e, em particular, da DCCB (Direcção Central de Combate ao Banditismo), com o seu ficheiro de pessoas perigosas, com as suas características específicas, analisadas no relatório, de há dois anos, da Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informações -, verificava-se notavelmente que não havia qualquer percepção da necessidade de criar sistemas de controlo. O Governo não só não os criou, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, como até entendeu não dar importância alguma à conclusão do último relatório da Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informações sobre esta matéria.
No penúltimo relatório, houve o alerta para o quadro e, no último, houve a recomendação expressa de criação de mecanismos de fiscalização dos bancos de dados das polícias, sublinhando-se o carácter frágil de todo o sistema de controlo dos bancos de dados dos serviços de informações. Não houve qualquer resposta governamental!
A situação que daí flui é, em nosso entender - e creio que no de qualquer pessoa razoável -, extremamente perigosa. É que vivemos, em Portugal, naquilo que se tem dito, com toda a verdade, ser uma «selva» informática. Mas essa «selva» informática não é apenas privada, isto é, aquela que decorre do uso por entidades privadas, as mais diversas, de computadores interligados, ou não, é também uma «selva» informática impulsionada pela Administração Pública e pelo Governo que a comanda. E, mais, é uma «selva» informática onde funcionam sectores sensíveis! Falei das polícias e dos serviços de informações, mas gostaria de falar, não provavelmente com pormenor, do sector da saúde.
Creio que no sector da saúde reina uma pura derrisão, ou, se se quiser, desrazão - e estou a ser comedido na linguagem. Por um lado, porque o Governo utiliza massivamente equipamentos informáticos para concentrar e tratar dados de todas as espécies, incluindo os de altíssima sensibilidade, sendo o sistema de controlo e de segurança desses dados mais do que precário. A prová-lo, o canal l da RTP exibiu, no passado domingo, um filme sobre alguns hachers, à moda portuguesa, que, a partir de computadores razoavelmente elementares e com o uso de modem, de forma totalmente ilegítima - não há qualquer problema nos modem, mas só naquela forma de utilização desses instrumentos-, penetravam em bancos de dados da Administração Pública, inclusivamente do Ministério das Finanças, onde se encontram dados de carácter reservado, alguns deles, seguramente, sobre a situação das finanças públicas!
Nada impede, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, em particular, que isso aconteça também em relação aos bancos de dados do sector da saúde, cujas defesas, devo dizer-lhe, são fragílimas!
Por outro lado, o Governo quer criar um cartão de saúde - quis criá-lo antes da existência da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, cujo parecer é indispensável nesta matéria-, concentrando nesse cartão dados de carácter pessoal que, segundo me parece, constitucionalmente não são susceptíveis desse tipo de registo. E fê-lo com uma insensibilidade jurídica e constitucional verdadeiramente espantosa: o Ministro da Saúde, que não é jurista - aliás, nem sei se é especialista da saúde - entendeu sobre esta matéria declarar, pura e simplesmente, que não via qualquer obstáculo!... Mas a cegueira do Ministério da Saúde é, sem dúvida, um dos factores de proliferação da «selva informática».
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Concluo dizendo que talvez o debate da aprovação para ratificação desta Convenção seja um momento razoável para que nos apercebamos em que ponto de derrapagem é que está este sistema e quão longe estamos do respeito mínimo pelo artigo 35.º da Constituição.
A aprovação da Convenção é, sem dúvida, um passo; mas um passo que, tal como a aprovação da Lei n.º 10/91, será coisa nenhuma ou mesmo um álibi ilusório se não for acompanhado da aprovação de medidas legislativas concretas.
Finalmente, gostaria de dizer que este grupo parlamentar já apresentou atempadamente três contributos relevantes para esse efeito: o primeiro, visava o agendamento da eleição para a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, o que foi conseguido, pois ela realizou-se hoje; os dois outros projectos visavam, por um lado, controlar o

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sistema de informações Schengen e, por outro, os bancos de dados de todas as forças policiais.
Devo dizer, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, que ou são adoptadas medidas deste tipo, e nós temos possibilidade de dizer honradamente que existe em Portugal controlo dos meios informáticos utilizados, ou então teremos todos, colegialmente, mas o PSD dominantemente, a responsabilidade pela «selva informática» em curso.
Portanto, o nosso voto, é o de que o combate à «selva informática» tenha hoje um momento alto.

Vozes do PS: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Toda a legislação relativa à informática e à protecção dos direitos dos cidadãos perante a mesma é, necessariamente, uma legislação dinâmica, dados os avanços técnicos que constantemente obrigam a adaptar o direito, por forma a compatibilizar a evolução com os princípios sobre que repousa a democracia.
Entre nós, o debate sobre a tutela dos direitos dos cidadãos no campo da informática, perante o Estado, perante os outros cidadãos e perante os outros Estados iniciou-se tardiamente, e mais tardiamente ainda se aprovou a lei de protecção dos dados pessoais, isto é a Lei n.º 10/91.
Por outro lado, atrasada está, e sem qualquer justificação, a regulamentação daquela lei - como, aliás, já foi hoje bastamante salientado -, da qual não pode ser separada a Convenção que hoje debatemos.
Efectivamente, há ainda uma área razoável de matérias a regulamentar, por forma a que a informática, no dizer de Toffler, possa permitir o exercício de uma cidadania instruída, com vista à tomada de muitas decisões políticas, e não se tome, perversamente, no reforço de centros de poder em prejuízo das liberdades fundamentais.
A Convenção em debate afigura-se, pois, conforme à Constituição da República.
Os princípios orientadores de qualquer lei de protecção de dados pessoais, que é desnecessário enunciar por sobejamente conhecidos, estão na mesma contidos e o núcleo irredutível da privacidade, consagrado ha nossa Constituição, tem acolhimento na Convenção.
Merecem, no entanto, alguma atenção certas normas da Convenção que estabelecem a possibilidade de derrogar direitos dos cidadãos, por forma a verificar se tais normas são compatíveis com o texto constitucional.
O texto em debate prevê a derrogação nomeadamente: dos princípios relativos à qualidade dos dados (tratamento de forma legal e lícita, dados adequados, pertinentes e não excessivos, exactos e actualizados, utilizados apenas para a finalidade que determinou a recolha); de garantias adicionais para o titular dos dados; da garantia do conhecimento da existência de um ficheiro automatizado de dados de carácter pessoal e das suas principais finalidades, bem como da identidade e residência ou sede do responsável pelo ficheiro; do direito de que é titular o cidadão de obter, sem demoras e despesas excessivas, a confirmação da existência ou não, no ficheiro informatizado, de dados de carácter pessoal que lhe digam respeito, e do direito a obter a comunicação dos dados de forma inteligível; a possibilidade do direito a obter a rectificação ou mesmo a suspensão dos dados, quando recolhidos em violação dos princípios básicos; e, finalmente, admite a derrogação do direito do cidadão a dispor de uma via de recurso.
Mas tais derrogações, como a Convenção assinala, só poderão ser feitas ou para proteger o titular dos dados e os direitos e liberdades de outrem, ou para protecção da segurança do Estado, da segurança pública, dos interesses monetários do Estado ou para repressão das infracções penais, quando tais medidas sejam as necessárias a uma sociedade democrática.
Estes princípios, aliás, constavam já da Recomendação n.º 19/81, de 25 de Novembro, do Comité de Ministros do Conselho da Europa, que ressalvava limites às próprias restrições: a ponderação devida ao interesse particular do cidadão.
A nossa Constituição, depois da última revisão, consagrou uma autorização da restrição legal do direito ao conhecimento dos dados informáticos nos casos de segredo de Estado e do segredo de justiça, pelo que a possibilidade das derrogações previstas está conforme com o texto constitucional.
Contudo, a restrição prevista pela Constituição está submetida aos limites constitucionais previstos no seu artigo 18.º, conforme se realça no relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (reserva de lei, necessidade e proporcionalidade).
Assim, a matéria que hoje debatemos tem a ver com a própria definição de segredo de Estado (em apreciação na especialidade na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias).
Como dizem Gomes Canotilho e Vital Moreira, a definição de segredo de Estado não pode ser tão ampla que permita sonegar aos cidadãos o acesso aos bancos de dados pessoais, o mesmo acontecendo quanto à definição do segredo de justiça.
Neste particular, é importante que se tome isto em conta quando já se fala da revisão do Código de Processo Penal e as notícias que vão chegando, mesmo através do Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, são preocupantes.
De facto, o legislador pode definir, dentro dos limites atrás referidos e contidos no artigo 18.º, o conceito de segredo de Estado e de segredo de justiça, mas os limites no acesso aos dados pessoais só podem ser os que decorrem do artigo 18.º da Constituição. Uma definição ampla em fórmulas vagas do segredo de Estado remeteria os dados pessoais para o «domínio interno da administração secreta».

O Sr. João Amaral (PCP): -Muito bem!

A Oradora: - Ora, um segredo de justiça que excedesse o objectivo do segredo interno e externo - o da realização da justiça - violaria o artigo 18.º da Constituição da República.
Estas questões, que se prendem com as condições de acesso aos ficheiros policiais, não estão resolvidas na legislação ordinária. É importante salientar que, já num debate que teve lugar em 1984, o comité de peritos do Conselho da Europa, em conferência realizada em Roma por iniciativa do parlamento italiano, assinalava que era importante prever-se um efectivo acesso do cidadão aos ficheiros pó-

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liciais, já que estes, na maioria dos casos, eram até ficheiros com informações «por ouvir dizer» e, muitas vezes, são inexactas.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Ora, esta lacuna, em matéria de direito de acesso aos ficheiros policiais, é tanto mais preocupante quanto é sabido que o Governo pretende levar por diante um diploma que, sob a fórmula suave e atractiva de prevenção da corrupção, policializa a investigação controlada apenas pelo Governo através do Ministério da Justiça.
O que é ainda preocupante, quanto é certo que não estão tomadas as medidas adequadas à protecção dos cidadãos perante outros Estados - e referimo-nos, como é óbvio, ao sistema de informações Schengen.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A legislação sobre protecção dos cidadãos perante a informática se insuficiente, se suportada apenas, mas não promovida verdadeiramente - e isto por falta de regulamentação em vastas áreas-, acentuará as desigualdades entre os cidadãos, nomeadamente na questão do direito de acesso que tem de provir de uma informação conveniente a todos os cidadãos.
O chamado direito à autodeterminação informacional não pode ser apenas um mero direito formal, conhecido e realizado só por alguns perante uma Administração menos transparente.
A efectivação dos princípios que enformam a protecção dos dados pessoais têm de estar ao alcance de todos, sob pena de, como diz Hegel, postarmos as tábuas da lei tão alto que nenhum cidadão as pode ler.

Aplausos do PCP e do Deputado independente Raul Castro.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estou longe de me considerar ou de poder ser considerado um especialista nesta matéria, mas tenho, pelo menos, a consciência cívica da especial dignidade da matéria que está em discussão e a consciência de que, de facto, algumas das reflexões feitas pelo Sr. Deputado José Magalhães são extremamente pertinentes. Aliás, aproveito também para cumprimentar o autor do relatório e parecer, o Sr. Deputado Alberto Martins, pela qualidade do seu trabalho.
Aquando da discussão da Lei n.º 10/91, o CDS participou nela e votou favoravelmente todos os contributos que estavam nessa altura em discussão e a grande preocupação que então manifestou foi a de que a questão da protecção das pessoas relativamente aos dados informatizados não tivesse um enquadramento normativo piedoso, absolutamente platónico e que não se limitasse a um mero exercício de ética.
Nesse sentido, cremos que a Constituição portuguesa mostrou que o legislador constituinte teve uma preocupação profundíssima nesta matéria, indo a um nível de regulamentação que demonstra, claramente, querer que o enquadramento desta questão fosse muito mais pormenorizado do que aquele de que dispomos.
Em todo o caso, para nós, a possibilidade de votar esta resolução é um motivo para nos regozijarmos e esperarmos que as sugestões aqui feitas, nomeadamente pelo Sr. Deputado José Magalhães, sejam seguidas e ponderadas pelo Governo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que o Senhor o ouça!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Barros.

A Sr.ª Ana Paula Barros (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de dizer que também nós nos regozijamos com a aprovação, para ratificação, desta Convenção de Protecção de Dados Pessoais, apesar de reconhecermos o seu atraso, e com o facto de hoje ter sido possível, finalmente, criar-se a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Na verdade, ainda há muito a fazer nesta área, nomeadamente no tocante à qualidade da prestação dos serviços informáticos, à segurança de ficheiros e às próprias condições de acesso a estes. Mas o que também não se pode escamotear é que este é um primeiro passo - e positivo! -, e que de hoje em diante estarão mais protegidos os direitos dos cidadãos no acesso às bases de dados informatizados.

Vozes do PSD: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, com tempo cedido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, utilizarei de facto muito pouco tempo, apenas para que não se fique com a sensação de que, utilizando a expressão do Sr. Deputado José Magalhães, estamos numa perfeita «selva informática». Não estamos perante uma «selva» informática, porque, se assim fosse, é óbvio que não poderíamos ratificar a Convenção que hoje está em análise nesta Câmara, nem teríamos, como temos, a Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, que vem prever todo o sistema de protecção do cidadão face aos abusos e face à informação. Não teríamos ainda a comissão que hoje está a ser eleita nesta Câmara, nem teríamos -e respondendo, um pouco, a um comentário do Sr. Deputado Alberto Martins - estabelecido no artigo 8." da Lei n º 10/91 as competências dessa comissão.
É óbvio que alguns serviços públicos que têm dados sensíveis -e referi Isso há pouco a nível de forças policiais-, ainda não têm a sua regulamentação aprovada. Como também disse há pouco, esses serviços públicos, nomeadamente as forças policiais, estão a trabalhar -e arduamente - no sentido de, a muito curto prazo, terem pronta a regulamentação prevista na Lei n.º 10/91.
Além disso, existe já um projecto de diploma, respondendo a uma questão levantada pelo Sr. Deputado José Magalhães, no tocante ao sistema de informações Schengen. O Governo não está de braços cruzados ou caídos, está a trabalhar na regulamentação, não obstante - e penso que é um sentimento de toda a Câmara- se estar numa área tremendamente complexa e difícil, quando se chega ao pormenor de proceder à regulamentação serviço a serviço. Mas a vontade de regulamentar a lei é forte e firme, e é isso que se está a fazer.

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6 DE MAIO DE 1993 2125

Aproveito este ensejo para responder a uma pergunta que por mero lapso não respondi, quando foi formulada pelo Sr. Deputado José Magalhães, logo no termo da minha intervenção inicial.
Portugal, nos termos do artigo 3.º, n.º 2, da Convenção, vai apor uma declaração no sentido de esta Convenção não ser aplicável aos ficheiros que constam do artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 10/91, isto é, aos ficheiros de uso pessoal ou doméstico, ao processamento da remuneração de funcionários, bem como a outros procedimentos a nível administrativo atinentes à mera gestão de serviços, à facturação de fornecimentos efectuados e à cobrança de quotização de associados ou filiados.

Vozes do PSD: -Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado, pelo tempo de um minuto, cedido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, creio que não vale de nada e não é útil que V. Ex.ª seja compelido a repetir, quase obsessivamente, que «não há uma selva informática, não há uma selva informática, não há uma selva informática», porque a repetição, ainda por cima tão insistente, funciona talvez como um exorcismo, mas dificilmente pode funcionar como uma negação da realidade.
O que hoje aqui fizemos foi derrubar algumas árvores da «selva» informática. Desgraçadamente, ela continua. E continua, desde logo, porque, como V. Ex.ª enunciou no seu discurso, há uma quantidade enorme de disposições legislativas que continuam por aprovar sequer, quanto mais por aplicar.
Assim, gostava que V. Ex.ª tomasse posição sobre algumas coisas que elegantemente ignorou.
Em primeiro lugar, o Sr. Secretário de Estado disse aqui que a RTP, concretamente o canal l, exibiu no passado domingo um filme onde, a propósito das actividades de hackers portugueses, se provava que houve acesso ao computador central do Instituto de Informática e ao banco de dados dos contribuintes portugueses, com violação de regras de sigilo diversas.
Gostava, pois, de saber o que é que pensa sobre essa questão e se entende que isso não é uma componente de uma perigosa selva informática.
A segunda questão que lhe quero colocar tem a ver com o facto de V. Ex.ª não ter dado indicação nenhuma de quando é que se tenciona pôr cobro à situação aberrante dos bancos de dados dos serviços de informações.
O SIM, Serviço de Informações Militares, declara sistematicamente que não tem bancos de dados. Ora, V. Ex.ª sabe porquê: é que usa o banco de dados do Estado-Maior-General das Forcas Armadas, o qual não está controlado pela lei dos serviços de informações e pela comissão de procuradores da República, que acompanha o banco de dados do SIS (Serviço de Informações de Segurança). Isto acontece perante o olhar impávido do Governo e V. Ex.ª considera isso normal. Não considera que isso faz a tal «selva»?
Em terceiro lugar e por último, V. Ex.ª não apresentou nenhuma data em relação ao próprio banco de dados da PJ e aos meios informáticos da PSP e da GNR. Nada!
Portanto, não só corroboramos a ideia de que a «selva» continua como não confundimos, de forma alguma, a árvore com o calhau e com a floresta. O calhau e as más árvores, desgraçadamente, continuam e o Governo tem a principal responsabilidade pelo atraso na adopção das providências necessárias para colmatar esta situação.
Pela nossa parte, apresentámos dois projectos de lei que continuam pendentes e na gaveta, o que muito nos contrista e com o que não nos resignamos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Na gaveta não, na comissão!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, julgo que também não se pode, de forma nenhuma, ser maximalista.
Como V. Ex.ª sabe, em diversos países com um grau de desenvolvimento superior ao português em matéria de novas tecnologias, e estou a recordar-me dos Estados Unidos, os livros e os filmes, por vezes, mostram-nos que há intromissão nas redes de informação não digo com alguma facilidade, mas com alguma frequência.
Assim, quando o Sr. Deputado me diz para eu reagir ao facto de a RTP ter apresentado um filme em que se revelava a intromissão num banco de dados existente na Administração Pública portuguesa, a única coisa que lhe posso dizer é que tal conduta é punida pela lei, que foi aprovada nesta Câmara, relativa à criminalidade informática.

O Sr. José Magalhães (PS): - E a lei é efectivada?

O Orador: - Com certeza que sim!

O Sr. José Magalhães (PS): -Não se vê!

O Orador: - Se o Ministério Público funciona, se os tribunais funcionam, é óbvio que aquele procedimento é passível de sanção e de reacção penal.
Portanto, o Sr. Deputado não pode agora assacar ao Governo, que aprovou ou fez aprovar uma lei em que está prevista a criminalidade informática, tal responsabilidade, pois existem os mecanismos judiciais normais, isto é, o Ministério Público intenta a acção penal e se se provar que, de facto, houve um crime informático, processar-se-á a respectiva condenação.
Não queria repetir-me, mas vou dizer isto pela terceira vez, dado que o Sr. Deputado me colocou novamente a questão de saber o que se passa com as bases de dados da PJ, da PSP, da GNR, etc.

O Sr. José Magalhães (PS): -Estão descontroladas!

O Orador: - Não!

O que já lhe disse é que foi criada uma pequena equipa que está a trabalhar seriamente na regulamentação das bases de dados das forças policiais. Quando falo nas forças policiais, falo também em todos os serviços públicos, por-

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que há uma vontade firme da parte do Governo em fazer cumprir a lei da protecção de bases de dados e, enfim, no sentido de os direitos dos cidadãos serem protegidos e devidamente acautelados face à informação que advém da informática.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O Sr. Secretário de Estado esqueceu-se de referir a base de dados do Deputado José Magalhães, que é extremamente perigosa!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas é privada!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegámos ao fim da ordem do dia.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, quinta-feira, dia 6 de Maio, às 15 horas, e terá como ordem do dia o primeiro debate nos termos do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República, cujo tema é «A situação dos idosos e a problemática da exclusão social em Portugal».

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António de Carvalho Martins.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Delmar Ramiro Palas.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

António Luís Santos da Costa.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edite de Fátima Santos Matreiros Estrela.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Ema Maria Pereira Leite Lóia. Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Francisco João Bernardino da Silva.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Macário Custódio Correia.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Domingos de Sousa e Holstein Campilho.

Partido Socialista (PS):

Alberto da Silva Cardoso.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Helena de Melo Torres Marques.
João Maria de Lemos de Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Rui António Ferreira da Cunha.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Carlos Martins Peixoto.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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DIÁRIO

da Assembleia da República

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