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Quinta-feira, 13 de Maio de 1993 I Série - Número 70 2227
VI LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE MAIO DE 1993
SESSÃO SOLENE DE BOAS-VINDAS A S. EX.ª O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DA POLÓNIA, LECH WALESA
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
Alberto Monteiro de Araújo
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMARIO
Ás 16 horas e 15 minutos deu entrada na Sala o cortejo em que se integravam o Sr Previdente da República da Polónia (Lech Walesa), o Sr Presidente da República, o Sr. Presidente da Assembleia da República, o Sr Ministro Adjunto (Marques Mendes), em representação do Sr Primeiro-Ministro, o Sr Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Sr Vice-Presidente do Tribunal Constitucional, o Sr. Secretário-Geral da Assembleia da República, os Srs Secretários da Mesa, membros da comitiva do Sr Presidente da República da Polónia e os secretários do protocolo do Estado
Encontravam-se presentes nas galerias membros da comitiva do visitante
Constituída a Mesa, a Banda da Guarda Nacional Republicana executou os hinos nacionais dos dois países
Seguiram-se os discursos do Sr Presidente da Assembleia da República e do Sr Presidente da República da Polónia,
Eram 16 horas e 55 minutos quando a sessão foi encerrada.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Abílio Sousa e Silva.
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Milhomens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregaria Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
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Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Apolónia Maria Alberto Pereira Teixeira.
Arménio Horácio Alves Carlos.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Juvenal Alcides da Silva Costa.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputados independentes:
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Mário António Baptista Tomé.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Sr. Presidente da República da Polónia, em nome pessoal dos Srs. Deputados e de mim próprio e em nome da Assembleia da República e dos seus grupos parlamentares, cabe-me a honra de apresentar a V. Ex.ª as saudações de boas-vindas e os votos de feliz estada e, ao mesmo tempo, agradecer a cortesia desta passagem pela Assembleia da República, com que quis distinguir-nos na sua visita de Estado ao nosso país, e faço-o com a maior emoção e alegria.
Sr. Presidente da República da Polónia, Sr. Presidente da República Portuguesa, Sr. Ministro Adjunto, Srs. Vice-Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Srs. Convidados, Srs. Deputados: A Assembleia da República reúne-se hoje em sessão solene para manifestar ao Sr. Presidente da República da Polónia e ao heróico e nobre povo que representa o seu apreço e admiração pela luta em prol da liberdade, dos direitos da pessoa humana, da democracia e da independência nacional
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que, nas últimas décadas, percorreu e galvanizou a vida polaca. No calor dessa luta germinaram, tomaram forma e ganharam velocidade as poderosas forças da liberdade que varrem e agitam ainda a paisagem política e social, tanto da Europa Central como do Leste europeu, provocando mudanças e transformações que poucos, decerto, teriam ousado esperar para o século XX.
A verdade é que V. Ex.ª, Sr. Presidente Lech Walesa, desempenhou nessa luta histórica um papel relevantíssimo, pela coragem, pela determinação e pelo discernimento com que a soube conduzir nos altos e baixos conaturais a acontecimentos desta grandeza. As inúmeras detenções, prisões e demissões que sofreu - seja por liderar protestos e greves nos estaleiros de Gdansk, seja por resistir publicamente aos sindicatos enfeudados ao poder político imperante e activar a constituição de sindicatos livres, seja por ousadamente se manter à frente do formidável movimento político-sindical Solidariedade, mesmo após a sua ilegalização pela lei marcial, seja por encabeçar, a partir de 1988, o comité cívico para a mudança do sistema político da Polónia-, essas pressões e opressões, dizia, não só não atemorizaram nem amoleceram Lech Walesa perante os poderes estabelecidos, como também não lhe fizeram perder nunca o sentido da necessidade de diálogo e o escrupuloso respeito pelos métodos pacíficos da luta política.
A pertinácia, a inteligência, o desassombro e o carisma que revelou na direcção desse movimento da consciência nacional polaca - simbolicamente organizado em tomo do nome Solidariedade - são decerto a causa da extraordinária e indiscutida consagração pública de que goza por todo o lado e, em particular, no mundo democrático. Dela nos dão testemunho exemplar as láureas doutorais que recebeu de prestigiadíssimas universidades dos Estados Unidos e da Europa (como Harvard, Columbia e Paris), o Prémio Nobel da Paz, que lhe foi atribuído em 1983, e o Prémio Europeu dos Direitos do Homem, com que foi galardoado em 1989
Lech Walesa apresenta-se-nos, em suma, Srs. Deputados, como uma personalidade histórica à escala mundial, segundo o critério apresentado pelo politólogo americano Henry Kissinger no seu estudo académico sobre Bismark. Aí se parte da ideia segundo a qual o génio revolucionário ou histórico se verifica quando é legítimo imputar à personalidade em causa a autoria da alteração da geografia política que ela encontrou ao entrar na vida pública. Isto foi o que Walesa exactamente fez, através desse movimento da consciência nacional polaca: contribuiu decisivamente para a alteração da geografia política do mundo, acelerando a destruição do império soviético e pondo fim à geopolítica própria da guerra fria.
Eis, assim, esboçada, ainda que a traços muito ténues e imprecisos, a dimensão da figura política que hoje honra a Assembleia da República com a sua visita. Lech Walesa foi agente, promotor ou catalizador de uma nova geografia política nas partes mais orientais da Europa e no mundo inteiro, uma geografia cujos contornos, aliás, ainda não se acham completamente estabilizados.
Srs. Presidentes da República da Polónia e de Portugal, Srs. Convidados, Senhoras e Senhores: São muito antigas as relações culturais, comerciais e diplomáticas entre o povo português e o povo polaco.
Conta-se, por exemplo, que no acto inaugural da expansão portuguesa - refiro-me à tomada de Ceuta, em 1415 - já dois cavaleiros polacos integraram o Exército Português. Mas é segura a criação, no século XVI, de uma "rede de amizade verdadeiramente fraterna" entre destacados humanistas portugueses, como Damião de Góis, Diogo Paiva de Andrade e D. Jerónimo Osório, e humanistas pensadores e cientistas da nação polaca, sediados na Polónia ou residentes noutros países. E essa rede de fraternidade e cultura perduraria pelos séculos fora.
Ainda em 1863, quando os Polacos se ergueram, mais uma vez, contra a opressão russa, a juventude universitária portuguesa levantou-se em uníssono contra a prepotência do Czar. Eça de Queirós, então estudante em Coimbra, recordaria mais tarde: "os jornais transbordavam de poemas à Polónia e de injúrias ao urso do Norte! Empenhavam-se batinas e compêndios para socorrer a Polónia, em subscrições entusiásticas".
As relações entre a Polónia e Portugal podem intensificar-se hoje muito mais. E isto tanto as relações quantificáveis em termos ou padrões económicos, como também as relações não quantificáveis ou dificilmente quantificáveis. É o caso das trocas culturais e espirituais entre dois povos que possuem um rico património histórico, seguem, em geral, a mesma religião e cultivam, cada um a seu modo, com mestria e rigor, diversas artes, ciências e letras.
Mas as relações no domínio económico, ou economicamente quantificáveis, prometem intensificar-se, cada vez mais, nos próximos anos, seja no âmbito bilateral, seja no âmbito multilateral. Lembro só o Acordo Europeu de Associação com a Polónia e o estado de adiantamento em que se encontra o processo da respectiva ratificação pelos Doze Estados membros.
Espero, Sr. Presidente, que Portugal e a Polónia saibam aproveitar bem as grandes oportunidades que se lhes deparam hoje para o progressivo estreitamento das suas relações diplomáticos, culturais e económicas. A visita oficial de V. Ex.ª a Portugal é um bom augúrio e constitui penhor desta minha esperança.
Srs. Deputados, a democracia há-de permitir a resolução, em paz e na concórdia, dos grandes problemas políticos, sociais e económicos que, hoje, percorrem o chão europeu, porque só ela congrega nos centros de decisão o querer e o saber de todos os membros da comunidade política, também só ela é capaz de reunir o máximo das energias humanas disponíveis em cada tempo.
Apesar de os reflexos patentes na cultura dos povos longamente dominados por regimes autoritários tenderem para outro lado, estou em crer que só uma gestão da rés publica assente no consenso nacional frequentemente renovado e na participação dos cidadãos e suas instituições autónomas na resolução dos problemas nacionais, poderá garantir à acção política a força, a maleabilidade e a criatividade indispensáveis à superação das crises e à anulação das resistências com que as inovações se confrontam, tanto nas sociedades em desenvolvimento como nas sociedades desenvolvidas.
Os Polacos conhecem bem a importância de que se revestem os direitos fundamentais para a salvaguarda da dignidade das pessoas e do bem-estar das comunidades políticas concretas. Por isso, a República da Polónia tem vindo a apoiar, em todas as instâncias internacionais, a causa do povo de Timor Leste e o seu direito à autodeterminação e independência.
Portugal não esquece esta indefectível atitude, ou solicitude, da Polónia para com Timor Leste, antes a regista com gratidão e a incentiva vivamente, por o direito internacional estar a ser gravemente violado nesse território; por nós, portugueses, sentirmos como nossas as angústias e tristezas que afligem este povo irmão e por ardentemen-
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te querermos ver terminada uma tragédia que fere o mais fundo da consciência ética da Humanidade.
Srs. Presidente da República da Polónia e membros da sua ilustre comitiva: sejam bem-vindos à Assembleia da República e sejam bem-vindos a Portugal.
Sr. Presidente da República Portuguesa e Srs. Convidados: Em nome da Assembleia da República e em meu nome pessoal, agradeço a VV. Ex.as a aceitação do convite e a honra e distinção da vossa presença nesta sessão solene, a qual ficou, assim, rodeada da maior dignidade.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente Freitas do Amaral, de pé.
Vai usar da palavra S. Ex.ª o Sr. Presidente da República do Polónia.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS, de Os Verdes, do PSN e do Deputado independente Freitas do Amaral, de pé.
O Sr. Presidente da República da Polónia (Lech Walesa): - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Vivemos numa época de grandes transformações: desapareceu a divisão mundial; o comunismo caiu; foram aniquiladas as diferenças de outrora.
As actuais transformações estão a desenvolver em várias nações a independência, a liberdade, a democracia e o sentimento da própria existência. No entanto, juntamente com as mudanças positivas, aparecem também as negativas, pois renascem não só as velhas desconfianças como também os antagonismos e os conflitos.
Tais situações surgem, por vezes, de uma forma dramática - é esse o caso da ex-Jugoslávia -, outras vezes revestem a forma de intolerância e em alguns países aprofunda-se a crise económica e política Surge, então, a seguinte pergunta: os efeitos negativos das transformações não poderão vir a ser a forma definitiva da nova ordem europeia?
Pessoalmente, não sou pessimista. Por isso, entendo que, de qualquer modo, a actual desordem é melhor que a chamada ordem de outrora, já que essa, para além de representar a intolerância política, social e económica, também escondia a verdade, limitava a liberdade e permitia a acção indiscriminada de criminosos.
Aplausos do PSD do PS e do CDS.
Hoje nasce uma nova realidade europeia. Cabe aos políticos - e daqui lanço esse desafio - torná-la segura e justa para todos. Para tal, é importantíssimo o papel da Comunidade Europeia. Dela dependerá o futuro dos países do nosso continente, não só daqueles que já a integram mas também dos que a ela ainda não aderiram.
No que respeita à segurança, a política da Polónia tem três prioridades: a cooperação com as organizações internacionais, tais como a NATO, as organizações europeias e a união da Europa Ocidental; o fortalecimento da rede de acordos e de tratados bilaterais; a participação da Polónia nos processos da Comunidade Europeia.
Damos uma especial importância à NATO, sendo prova disso os esforços que temos desenvolvido para conseguir a nossa adesão. Á NATO continua a ser um sistema de defesa geral, mas é também a garantia da segurança geral e, assim, acreditamos que acabará por ter uma operatividade cada vez mais virada para a Europa Central e do Leste.
É também nosso desejo aprofundar os contactos com a união da Europa Ocidental e conseguir um status formal nesta instituição.
Lembremos que a segurança não significa apenas a existência de um mero sistema de defesa ou de prontidão militar, mas também a construção da democracia nos lugares onde ela não existia, onde foi destruída. Nesta matéria, o Conselho Europeu, em Estrasburgo, tem um papel importante.
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: A integração europeia não terá êxito se não conseguirmos a igualdade do nível de vida de todos os habitantes deste continente. O ano de 1989 trouxe aos povos da Europa Central e do Leste a liberdade e a democracia, mas não as fez acompanhar de um mais elevado nível de vida. Ao conquistá-las, descobrimos que temos de pagar um preço muito elevado pelas mudanças económicas.
Os países do Grupo de Visegrad conseguiram já alcançar algumas vitórias. A inflação caiu e aumentaram os níveis de produção e de exportação, mas isto é ainda insuficiente. Grande parte da população não percebe a situação, o que provoca a frustração e o descontentamento.
Os desafios que se colocam a um só país ultrapassam as suas reais condições de enfrentá-los. Os países da Europa Ocidental estão unidos através de uma rede de compromissos económicos comuns, sociais e culturais. Integrar essa Europa é a esperança dos países que reconquistaram a sua independência e a frustração dessas esperanças poderá provocar uma onda de nacionalismos, de intranquilidade social e a emigração descontrolada pode chegar mesmo ao ponto de atirar para um precipício as conquistas das nossas revoluções.
A fixação da Polónia na Europa integrada é a razão da existência do nosso Estado. No entanto, a sua participação nessas formas de união irá requerer ainda mais sacrifícios e problemas. Gostaríamos de acreditar que os países da Comunidade Europeia entendem as nossas esperanças e dificuldades. No entanto, temos a impressão de que eles, preocupados com a defesa dos seus próprios interesses, estão a perder a noção da missão desta instituição.
Na verdade, a criação de barreiras fiscais e a dificuldade de entrada das nossas mercadorias nos mercados ocidentais em nada ajuda a integração europeia. É uma política de visão curta e de banalidade, que só pode ajudar os inimigos das reformas e, simultaneamente, afastar os nossos países do caminho da democracia.
A Polónia ratificou, em Outubro do ano passado, um acordo de união com a Comunidade Europeia, que até agora ainda não foi oficializado, porque a maioria dos 12 países ainda não o ratificou, tendo-se ocupado, até agora, com a ratificação do Tratado de Maastricht.
A opinião generalizada - e ouvimo-la frequentemente - é a de que os países do Grupo de Visegrad não conseguirão enfrentar os efeitos da integração acelerada. Uma tal mentalidade só provocará a divisão entre ricos e pobres, ou seja, os ricos do Ocidente e os pobres do Leste. Segundo essa opinião, polacos, checos, eslavos e húngaros não conseguiriam alcançar os níveis exigidos pela Comunidade Europeia pelo que ficariam sempre "às suas costas".
Ora, a Comunidade Europeia é constituída por países de diferenciados níveis de desenvolvimento económico, havendo, no entanto, formas de gestão direccionadas para o desaparecimento dessas diferenças.
Não creio que possa existir, em Portugal, a opinião de que os países mais ricos deveriam formar uma primeira
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Europa e os demais países uma segunda Europa. Á Polónia, tal como Portugal, deseja uma única Europa integrada, onde não se faça a diferenciação entre países melhores e piores. A integração na Comunidade Europeia dos países do Grupo de Visegrad não provocará efeitos negativos. Estou certo que, nesse caso, aumentará o valor das trocas comerciais e a produção dos países ocidentais mais desenvolvidos. Além disso, o aumento do bem-estar e de segurança desses países iria estabilizar a região da Europa Central, o que é do interesse de todo o continente europeu.
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: A Polónia atravessa um período de profundas mudanças internas. Estamos a reformar todos os domínios da nossa vida, desempenhando o nosso Parlamento um papel importante nesse processo. Este órgão de soberania, o primeiro nascido de eleições livres após anos de comunismo, festeja este ano o S.º aniversário da sua existência.
Por outro lado, quero assinalar que a Polónia é o único país da Europa Central que, no ano passado, teve um aumento da sua receita interna bruta, o que prova que estamos no caminho certo.
Estamos a privatizar os bens estatais e uma quarta empresa já foi privatizada. No nosso país, mais de metade dos trabalhadores labora no sector privado e as privatizações estão a ocorrer de uma forma mais branda que nos demais países pós-comunistas.
Sempre tivemos a agricultura individual e a propriedade privada da terra e do comércio. O nosso Parlamento ocupa-se, de momento, da elaboração da nova lei da reprivatização, segundo a qual os antigos donos serão indemnizados pelas perdas ocorridas na época da nacionalização. Por outro lado, criamos condições favoráveis aos investimentos estrangeiros e, nas nossas reformas, queremos aproveitar as experiências de outros países. Por isso, estamos interessados nos modelos de privatização levados a cabo pelo Governo do Sr. Primeiro-Ministro, Cavaco Silva.
Risos do PCP.
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Quando assumi a liderança da paralisação dos estaleiros de Gdansk muitos diziam que a guerra estava perdida. Avisavam-nos que os comunistas jamais permitiriam a criação de sindicatos livres e insistiam que o Solidariedade não tinha a mínima hipótese na sua luta para conseguir mudanças no poder então existente.
A criação, por este, do estado de guerra parecia provar que os pessimistas tinham razão. Porém, o Solidariedade venceu o até então invencível sistema.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS.
Hoje enfrentamos um novo desafio. As nossas aspirações de fazer parte de uma Europa unida nem sempre encontram o entendimento e a solidariedade de outros. Não raro, temos de lutar contra o egoísmo, a insegurança ou ainda a falta de imaginação. Temos tido também dificuldade em fazer aceitar a ideia de que o sucesso das reformas nos países pós-comunistas representa igualmente sucesso para toda a Europa, bem como a garantia da sua estabilidade e segurança. Contudo, estou convicto de que alcançaremos esta meta.
Nesse sentido, contamos com cada gesto de boa vontade. Acredito que Portugal, que tem muitos aspectos em comum com a Polónia, não desapontará essa esperança, na qual todos cremos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou imensamente grato pelas palavras de apoio e de ajuda que o Solidariedade sempre recebeu e que hoje, aproveitando o facto de estar pela primeira vez neste país, quero agradecer.
Durante a nossa luta, sentimos a solidariedade de Portugal. Hoje e como ex-revolucionário, quero dizer-vos que, outrora, lutámos, cada qual a seu modo, defendendo os mesmos ideais; agora, alcançadas as metas, encontramos novos desafios, deparamos com novos focos de insegurança que temos de enfrentar na medida do possível.
Temos agora uma oportunidade única para formar uma Europa livre e segura, mas não o conseguiremos se não o fizermos em conjunto. Existem enormes possibilidades de desenvolvimento economia) e democrático, mas temos de nos unir, num trabalho conjunto, para atingirmos esses fins.
Estou absolutamente certo de que os contactos efectuados entre os nossos pequenos países podem servir de exemplo a toda a Europa. Os mercados da Ucrânia, da Rússia, da Bielo-Rússia, da Lituânia têm enormes possibilidades e estamos a procurar estabelecer acordos com Portugal no sentido de, em conjunto, formar uma união económica para aquela região.
A distância que separa os nossos países é proporcional aos investimentos que podem ser feitos. Países como a Polónia não necessitam de apoio financeiro, necessitam, sim, de ajuda económica. Temos uma mão-de-obra altamente especializada e barata e um grande parque industrial. O mercado da ex-comunidade soviética está esgotado, pelo que é necessário organizar um novo mercado. Convido-vos a cooperar connosco, de uma forma justa e correcta, com a finalidade de construirmos uma Europa nova, limpa, livre e tranquila.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Raul Castro, de pé.
O Sr. Presidente: - Srs. Convidados, Srs. Deputados:
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 55 minutos.
A Banda da Guarda Nacional Republicana executou de novo os dois hinos nacionais.
Realizou-se então o cortejo de saída, composto pelas mesmas individualidades do da entrada.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Pedro António de Bettencourt Gomes.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Partido Socialista (PS):
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS):
José Luís Nogueira de Brito.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.
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Deposito legal n º 8818/85
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