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Sábado, 26 de Março de 1994
I SÉRIE - NÚMERO 53
DIÁRIO
da Assembleia da Republica

VI LEGISLATURA

3 A SESSÃO LEGISLATIVA (1993-1994)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 25 DE MARÇO DE 1994

Presidente: Exmo. Sr. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
Belarmino Henriques Correia
Maria da Conceição Figueira Rodrigues

S U M A R I O

0 Sr Presidente declarou aberra a sessão às 10 horas e 25 minutos Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 241V1 e da interpelação n.º 171V1
Em sessão de perguntas ao Governo, usaram da palavra, além dos Sr.s Secretários de Estado do Ambiente e do Consumidor (Joaquim Poças Martins), das Comunidades Portuguesas (Luís Macedo) e do Orçamento (Norberto Sequeira d2 Rosa), os Srs. Deputados José Lello (PS) 15abel Castro (Os Verdes) Antónimo Braga (PS) Luis Peixoto (PCP) Maria Julieta Sampaio (PS), André Martins (Os Verdes), Miguel Urbano Rodrigues (PCP), Caio Roque e Helena Torres Marques (PS), António Lobo Xavier (CDS-PP), Carlos Ribeiro (PSD Carlos Luís (PS), Manuela Aguiar (PSD), Miguel Tavares Rodrigues (PCP), Lopes Cardoso (PS) 15abel Castro (Os Verdes), Raúl Brito (PS Sousa Lara

(PSD), João Corregedor da Fonseca (Indep.), Paulo Trindade (PCP) e Rui
Carp (PS) .
Foram ainda aprovados seis pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, cinco autorizando três Deputados a deporem como testemunhas e outro no sentido de arquivar processo relacionado com um Deputado do PSD.
Entretanto, após o Sr. Deputado Raúl Rêgo (PS) ter lamentado o falecimento do Dr. José Magalhães Godinho, intervieram também em sua homenagem, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Manuela Aguiar (PSD) Nanana Coissoró (CDS-PP), António Filipe (PCP) e João Corregedor da Fonseca (Indep.) No final, a Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
0 Sr Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 35 minutos

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0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva. Adérito Manuel Soares Campos. Adriano da Silva Pinto. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Alípio Barrosa Pereira Dias. Álvaro José Martins Viegas. Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto. Américo de Sequeira. Anabela Honório Matias. António Augusto Fidalgo. António Costa de Albuquerque de Sousa Lara. António da Silva Bacelar. António de Carvalho Martins. António do Carmo Branco Malveiro. António Esteves Morgado. António Fernando Couto dos Santos. António Germano Fernandes de Sã e Abreu. António Joaquim Correia Vairinhos. António José Barradas Leitão. António José Caeiro da Motta Veiga. António Manuel Fernandes Alves. António Moreira Barbosa de Melo. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha. Arménio dos Santos. Belarmino Henriques Correia. Carlos Alberto Lopes Pereira. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel de Oliveira da Silva. Carlos Manuel Duarte de Oliveira. Carlos Manuel Marta Gonçalves. Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira. Cecilia Pita Catarino. Cipriano Rodrigues Martins. Delmar Ramiro Palas. Domingos Duarte Lima. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.

Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva. Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista. Fernando dos Reis Condesso. Fernando José Antunes Gomes Pereira.

Fernando José Russo Roque Correia Afonso. Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira. Fernando Monteiro do Amaral. Fernando Santos Pereira. Filipe Manuel da Silva Abreu. Francisco Antunes da Silva. Francisco João Bernardino da Silva. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva. Hilário Torres Azevedo Marques. Jaime Gomes Milhomens. João Álvaro Poças Santos. João do Lago de Vasconcelos Mota. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado. João Granja Rodrigues da Fonseca. João José da Silva Maçãs. João José Pedreira de Matos.

João Maria Leitão de Oliveira Martins. Joaquim Cardoso Martins. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Maria Fernandes Marques. Joaquim Vilela de Araújo. Jorge Avelino Braga de Macedo. Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha. José Agostinho Ribau Esteves. José Alberto Puig dos Santos Costa. José Ângelo Ferreira Correia. José de Almeida Cesárío. José Guilherme Pereira Coelho dos Reis. José Guilherme Reis Leite. José Júlio Carvalho Ribeiro. José Leite Machado. José Luís Campos Vieira de Castro. José Macário Custódio Correia. José Manuel Alvares da Costa e Oliveira. José Manuel Borregana Meireles. José Manuel da Silva Costa. José Manuel Nunes Liberato. José Mário de Lemos Damião. José Pereira Lopes. Luís António Martins. Luís Carlos David Nobre. Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Luís Manuel Costa Geraldes. Manuel Acácio Martins Roque. Manuel Albino Casimiro de Almeida. Manuel Antero da Cunha Pinto. Manuel da Costa Andrade. Manuel da Silva Azevedo. Manuel de Lima Amorim. Manuel Filipe Correia de Jesus. Manuel Joaquim Baptista Cardoso. Manuel Simões Rodrigues Marques. Maria da Conceição Figueira Rodrigues. Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira. Maria Helena Falcão Ramos Ferreira. Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia. Maria Luísa Lourenço Ferreira. Maria Manuela Aguiar Dias Moreira. Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa. Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo. Mário Jorge Belo Maciel. Melchior Ribeiro Pereira Moreira. Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas. Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos. Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva. Olinto Henrique da Cruz Ravara. Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho. Pedro Manuel Mamede Passos Coelho. Rui Alberto Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp. Rui Fernando da Silva Rio. Rui Manuel Lobo Gomes da Silva. Simão José Ricon Peres. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros. Alberto Bernardes Costa. Alberto da Silva Cardoso.

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Alberto de Sousa Martins. Alberto Manuel Avelino. Alberto Marques de Oliveira e Silva. Ana Maria Dias Bettencourt. António Alves Marques Júnior. António Alves Martinho. António Carlos Ribeiro Campos. António Domingues de Azevedo. António Fernandes da Silva Braga. António José Borrani Crisóstomo Teixeira. António Poppe Lopes Cardoso. Armando António Martins Vara. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos. Carlos Manuel Luís. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues. Eduardo Ribeiro Pereira. Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Fernando Alberto Pereira Marques. Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa. Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins. Gustavo Rodrigues Pimenta. Helder Oliveira dos Santos Filipe. Helena de Melo Torres Marques. João António Gomes Proença. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Maria de Lemos de Menezes Ferreira. João Rui Gaspar de Almeida. Joaquim Américo Fialho Anastácio. Joaquim Dias da Silva Pinto. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira. Jorge Lacão Costa. Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho. José António Martins Goulart. José Eduardo dos Reis. José Eduardo Vera Cruz Jardim. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Rodrigues Pereira dos Penedos. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Júlio Francisco Miranda Calha. Laurentino José Monteiro Castro Dias. Leonor Coutinho Pereira dos Santos. Luís Manuel Capoulas Santos. Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio. Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Raúl Fernando Sousela da Costa Brito. Rogério da Conceição Serafim Martins. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz. Rui António Ferreira da Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues. António Manuel dos Santos Murteira. José Manuel Maia Nunes de Almeida. Lino António Marques de Carvalho. Luís Carlos Martins Peixoto. Luís Manuel da Silva Viana de Sã. Maria Odete dos Santos. Miguel Urbano Tavares Rodrigues.

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Octávio Augusto Teixeira. Paulo Jorge de Agostinho Trindade. Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira. António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier. José Luís Nogueira de Brito. Manuel José Flores Ferreira dos Ramos. Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins. 15abel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca. Mário António Baptista Tomé.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 24/VI - Equiparação dos cursos de especialização a cursos de estudos superiores especializados (ALRM), que baixou à 7.ª Comissão, e a interpelação n.º 17/VI - Sobre o balanço da evolução da economia portuguesa em 1993 e perspectivas económicas e sociais para 1994 (PS).

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, a ordem do dia de hoje consta de uma sessão de perguntas ao Governo.
Para formular a primeira pergunta, ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, sobre o transporte de matérias perigosas, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

0 Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A questão que hoje aqui trago constitui um factor de grande preocupação para todos os portugueses, em razão dos perigos e dos riscos graves que decorrem do transporte de mercadorias perigosas por estrada.
É sempre com grande preocupação e natural angústia que, a cada passo, nos confrontamos, nas estradas e perante a intensidade do trânsito, com o transporte de mercadorias de risco, inflamáveis, explosivas e tóxicas, desde combustíveis ao metanol, ao ácido clorídrico, ao ácido sulfúrico e até a matérias radioactivas, como o cobalto, em condições de segurança tais que prefiguram atitudes de clara negligência e, até, de irresponsabilidade.
Assim, vemos camiões-cisterna a circularem a alta velocidade, a todas as horas, sem aparentes restrições, sem sequer evitarem os traçados mais populosos, os percursos urbanos e o tráfego mais intenso é as vias mais estreitas e sinuosas.
Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor, sei que existe um regulamento nacional aplicável às situações de. transporte rodoviário de mercadorias perigosas.

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Todavia, porventura em resultado de lacunas, de alguma ambiguidade ou do hermetismo da própria legislação e, acima de tudo, devido à exígua fiscalização de tal tipo de transportes, os portugueses sentem-se inseguros perante essas "bombas" ambulantes que enxameiam as nossas estradas.
Os acidentes acontecem, e quando não atingem a devastação previsível os mais crentes falam logo em milagre. Com efeito, é tal a anarquia no sector que só por milagre ainda não aconteceram catástrofes dramáticas com efeitos perversos, quer para as pessoas, quer para o ambiente.
A formação dos condutores de tais transportes está regulamentada. Contudo, a sucessão dos acidentes faz prever o contrário. Aliás, nestes tempos de fronteiras abertas, surge-nos a questão de se também estão a ser fiscalizados os transportes estrangeiros e a aptidão desses condutores que percorrem as nossas estradas?
Sr. Secretário de Estado, tudo isto nos preocupa muito, e mais ainda o facto de ser grande a diversidade de entidades que levam à prática os regulamentos e a quem compete o domínio da protecção e fiscalização o que pode, porventura, prenunciar uma certa desarticulação funcional.
Perante isto, o que tem o Governo a dizer-nos sobre esses crescentes acidentes com transportes e mercadorias de risco, designadamente sobre os níveis de fiscalização, as condições de embalagem e o equipamento circulante?
Sr. Secretário de Estado, não entende que, para os transportes de matérias perigosas como as que referi, deveria haver períodos horários específicos e percursos convencionados previamente?
Sei que grande parte destas questões não são da sua tutela mas, sim, de outras, no entanto isso também mostra como todo este sector está tutelado por diversos ministérios, por diversas entidades, por isso é possível que lhe seja difícil responder a esta questão.
Em conclusão, gostaria de saber a opinião do Sr. Secretário de Estado e do Governo sobre estas matérias.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor.

0 Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor (Joaquim Poças Martins): - Sr. Presidente, a problemática dos resíduos industriais é, como referiu o Sr. Deputado José Lello e com quem concordo totalmente, um assunto extremamente importante e actual.
Começo por referir dois aspectos diferentes mas interligados: o problema do movimento dos resíduos e o do seu transporte.
Quanto ao transporte dos resíduos, existe a esse respeito regulamentação própria, que passa essencialmente por componentes no âmbito da segurança dos veículos, pela forma como os produtos são acondicionados, pela formação dos condutores e por regras de circulação, as quais, diria, estão bem regulamentadas e são fiscalizadas no âmbito das entidades nacionais dos vários países.
No que respeita ao movimento dos resíduos, não nos podemos esquecer de que alguns têm características tóxicas e perigosas, outros são matérias primas que em caso de acidente podem originar danos, explosões, por exemplo.
Relativamente aos resíduos de características tóxicas e perigosas, o Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais tem um papel muito importante.
Em primeiro lugar, refiro-vos a prevenção. Nestes casos valorizamos, de uma forma muito especial, a prevenção, pois pretendemos evitar que as coisas aconteçam, seguindo o ditado que diz: "é melhor prevenir do que remediar". Por isso, no que diz respeito aos resíduos tóxicos e perigosos, vamos procurar minimizar a necessidade desse mesmo movimento. Como fazemos isso? Procuramos que Portugal seja auto-suficiente quanto ao processamento dos resíduos industriais de características tóxicas e perigosas. Alinhamos com os países europeus mais exigentes neste domínio, no que diz respeito à exportação e à própria importação de resíduos.
Quanto à importação, está em curso a implementação de um sistema nacional de tratamento, que esperamos ver totalmente concluído até final do ano, de acordo com um calendário já discutido nesta Câmara por mais de uma vez. Esse sistema está dimensionado de forma a não ter capacidade para receber resíduos de outros países. Aliás, há formas extremamente engenhosas de contrariar os preceitos legais quanto a este mesmo transporte. Estamos a falar de verbas muito significativas porque o processamento destes resíduos tem custos muito elevados e, portanto, é propenso a ilícitos. Assim, à partida, procuramos evitar esse movimento mediante um dimensionamento adequado do nosso próprio sistema de transporte.
Para além disso, estes produtos de características tóxicas e perigosas estão sujeitos a um regime de notificação. 15to é, quem envia e quem recebe tem de dar conta, no caso de Portugal, à Direcção-Geral do Ambiente, a qual tem de receber as guias de transporte destes produtos tóxicos, para além da existência das guias de transporte normais a que qualquer mercadoria está sujeita, havendo, portanto, uma possibilidade de controlo.
No entanto, apesar da nossa grande aposta na minimização destes transportes, não podemos evitar totalmente a ocorrência de situações ilícitas. Mas repito que estamos atentos a estas situações, procurando essencialmente dar formação às entidades fiscalizadoras. Ou seja, o Ministério do Ambiente tem levado a cabo uma acção de formação muito importante em coordenação, por exemplo, com as próprias brigadas de fiscalização da GNR, e esperamos que, também através deste reforço de fiscalização, consigamos minimizar a situação.
Mas não quero deixar de dizer que, com efeito, estamos perante uma situação complexa que, a nível comunitário, procura evitar-se, minimizando os transportes deste tipo de substâncias.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

0 Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, não posso deixar de ressaltar a lucidez do seu discurso ao ter constatado as dificuldades com que se depara. Aliás, constatei igualmente as dificuldades em congregar todas as acções necessárias, na medida em que há áreas que são da sua responsabilidade, nomeadamente quanto à tramitação processual, etc., e que há outras que, efectivamente, são da área da prevenção e, acima de tudo, da fiscalização.
0 Sr. Secretário de Estado disse que os transportes de
cargas muito largas são sempre acompanhados de polícias,
que os precedem. Ora, apesar de serem perigosíssimos, não
há acompanhamento policial, não há ' horários definidos para
serem efectuados, nem há definição de percursos.
Sr. Secretário de Estado, louvo-o por ter encarado a perigosidade do sistema e por não ter enveredado por uma resposta de minimização dos perigos, atitude que outros governantes certamente teriam tomado, utilizando o Lexotan da "farmacopeia anti-depressiva" do Sr. Prof. Cavaco Silva.

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Tenho comigo a indicação de alguns transportes que gostaria de comentar consigo. A 4 de Março, um camião carregado com 22 t de produtos altamente tóxicos e corrosivos caiu a uma vala do rio Mondego. Nesse mesmo dia, em Fão, o condutor de um transporte de combustíveis adormeceu e caiu ao rio Cávado. A 13 de Outubro, no Funchal, ardeu um contentor durante o processo de descarga de matérias que iriam ser transportadas por estrada devido à ausência de acomodação para caixas de éter etílico. Em 15 de Novembro, um camião-cisterna contendo 23 t de metanol capotou e pôs em pânico toda a população da Gafanha da Nazaré. Em 16 de Novembro, um outro camião-cisterna derramou 300 l de ácido clorídrico. Estes episódios são de molde a alarmar de tal forma as populações que, para além das terapias cautelares que o Sr. Secretário de Estado apontou, é preciso fazer algo mais, em conjugação com outras entidades e com os outros Ministérios, no sentido de se atalhar claramente esta situação que, na verdade, é angustiante para os cidadãos.

0 Sr. Alberto Costa (PS): - Muito bem!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr a Deputada 15abel Castro.

A Sr a 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, penso que a questão hoje trazida a Plenário é de extrema pertinência, sendo importante fazer algumas considerações sobre a mesma.
Aliás, embora haja outros igualmente perigosos, reportar-me-ei somente aos transportes terrestres destas matérias. Os números que temos abrangem o período das 10 às 15 horas do dia 16 de Março e dizem respeito a incidentes ocorridos em Carvalhos, Grândola, Coimbra, Montemor-o-Velho, e que envolveram derrame de ácido clorídrico, de matérias perigosas nem sequer identificadas, desconhecimento este que pressupõe a não existência das tais guias de identificação das matérias transportadas.
0 Sr. Deputado José Lello disse que não estão definidos horários para serem efectuados estes transportes mas eles existem. 0 problema é que, embora sejam interditos, por exemplo, ao fim-de-semana, não é feita a sua fiscalização.
A questão concreta que quero colocar-lhe diz respeito a 30 bidões de cianeto de vinil que foram desembarcados no porto de Leixões com todas as precauções: o porto foi encerrado, o pessoal foi retirado, as pessoas usavam máscaras, houve médicos e bombeiros de prevenção. 0 transporte dos bidões foi feito para a cidade, acompanhado por batedores, seguindo as normas. 0 destino final era o de um armazém, na Travessa da Prelada, junto a uma escola e a um hospital, numa zona altamente densificada. Perante isto, pergunto como é possível acontecer uma coisa destas na cidade do Porto. Qual foi o papel da autarquia e do Ministério no que toca à fiscalização de tudo isto?

0 Sr. José Lello (PS): - Leixões não é a cidade do Porto!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, recordo que é de 1 minuto o tempo disponível para cada pedido de esclarecimento. Portanto, mesmo que a Mesa exerça alguma tolerância, este tempo não poderá ser largamente ultrapassado.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

0 Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a questão do transporte implica, obviamente, a da manipulação e a do armazenamento, pelo que, de facto, com estes dois factores, os riscos aumentam todos os dias.
A este propósito vou citar-lhe alguns casos como o de fábricas que manipulam essas substâncias e que laboram paredes-meias com blocos habitacionais. Outro tanto pode afirmar-se quanto aos casos de armazenamento de combustíveis, instalados em áreas fortemente habitadas. Acresce a estas situações que, em caso de emergência, muitas vezes, os acessos são impraticáveis. Por outro lado, temos frequentemente notícia do rebentamento de um ou outro paiol que serve de apoio às oficinas de pirotecnia.
Sr. Secretário de Estado, sendo certo que vivemos com esta realidade, pergunto o que tem feito o Governo no domínio da fiscalização preventiva destas situações de risco e se tem uma caracterização real dessas situações resultantes da manipulação e do armazenamento de substâncias perigosas.
Por fim, como articula o Governo as medidas de prevenção e de informação das populações com os serviços de socorro? Faço-lhe esta pergunta porque os serviços que intervêm no socorro a situações de dificuldade resultantes destas substâncias dependem de várias tutelas. De facto, o Serviço Nacional de Bombeiros depende do Ministério da Administração Interna, o Serviço Nacional de Emergência Médica depende do Ministério da Saúde e, agora, o próprio Ministério do Ambiente também intervém nestas situações. Portanto, repito que gostaria de saber como é que o Governo articula esta política de prevenção e de intervenção.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Peixoto.

0 Sr. Luís Peixoto (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, os transportes de substâncias perigosas não se fazem apenas por via terrestre pelo que a via marítima também deve constituir uma preocupação, uma vez que ambas se complementam.
V. Ex.ª disse que faz uma aposta forte na prevenção neste domínio. Ora, a minha questão prende-se exactamente com essa prevenção e com o transporte de substâncias perigosas por via marítima. É que, como V. Ex.2 sabe, o facto de a lei não prever uma notificação para o transporte nestas condições conduz a que não possa fazer-se uma prevenção eficiente. Ou seja, em caso de acidente, é muito difícil reagir atempada e eficientemente porque - repito não está prevista a notificação, fundamental, quanto a nós.
Como é que V. Ex.ª pensa ser possível fazer a prevenção de qualquer acidente no transporte de substâncias - perigosas por via marítima se não existe na lei a figura da notificação?

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr a Deputada Maria Julieta Sampaio.

A Sr." Maria Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a Sr a Deputada 15abel Castro já se referiu ao caso do armazém situado numa zona residencial do Porto. Porque eu própria considero ser este um assunto muito importante, vou referi-lo de novo, dando algumas achegas às palavras da Sr a Deputada.
0 referido armazém está situado numa zona muito residencial, fortemente povoada, com vários bairros sociais e, a menos de 100 m de distância, está uma escola C+S. 0 problema é o de que as cargas e descargas para o armazém ocorrem a qualquer hora do dia, sem nenhum cuidado. Os camiões TIR atravessam a estrada, provocando os

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consequentes condicionamentos de trânsito, muitas vezes causando perigos para as crianças que entram e saiem da escola. 15to, Sr. Secretário de Estado, sem falar nos prejuízos que têm sofrido os moradores daquela área residencial devido a problemas de saúde - já os há graves como, por exemplo, problemas de asma e de alergias -, motivados pelos produtos que são descarregados ao ar livre, sem qualquer cuidado.
Outro problema que quero suscitar é o da agressão ambiental a que estão sujeitos os moradores daquela zona. Todos os camiões que, à sexta-feira, ali chegam por volta das l6 horas não são descarregados, ficando estacionados frente às casas das pessoas até à segunda-feira seguinte. Assim, como pode compreender-se que, numa zona residencial no coração do Porto, tal como é a Travessa da Prelada, com uma escola preparatória e secundária localizada a menos de l00 m, possam ocorrer situações de tanta gravidade como esta sem que se tomem precauções? É que os moradores já fizeram vários abaixo-assinados, já recorreram a todas as entidades e não vêem o seu problema resolvido.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

0 Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor, o Grupo Parlamentar de Os Verdes já apresentou um projecto de lei que tinha, precisamente, por objectivo identificar, controlar e prevenir os acidentes na Zona Económica Exclusiva de Portugal. 0 PSD votou desfavoravelmente esse projecto de lei pelo que, naturalmente, ele foi rejeitado.
E conhecida a situação de perigo e de grande risco em que circulam cerca de 600 navios - cargueiros - ao longo da nossa Zona Económica Exclusiva, além de que parte significativa deles circula, inclusivamente, no mar territorial português.
0 Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, desde que foi criado, fez propagandas várias a propósito de iniciativas nacionais e comunitárias. Por exemplo, estou a lembrar-me do "Acordo de Lisboa" e do "Plano Mar Limpo", posto de parte na altura e agora ressuscitado com um mini investimento. De facto, até alguns comandantes de porto responsáveis por estas acções se riem quando se lhes pergunta se dispõem dos meios necessários para fazer frente aos grandes acidentes que, aliás, já têm ocorrido.
A questão que se coloca, Sr. Secretário de Estado, é a seguinte: como é que o Governo está a encarar estas situações? Como sabe, as nossas praias, de ano para ano, estão cada vez mais contaminadas, com perigo para a saúde pública e para as nossas costas, dada toda a poluição - com resíduos perigosos em grande maioria - que daí advém.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor, por um período máximo de 10 minutos.

0 Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor: - Sr. Presidente, penso que as perguntas formuladas têm alguns aspectos em comum, pelo que procurarei dar resposta a todas elas.
De facto, o problema existe e é de difícil resolução. Há aqui aspectos de resíduos por um lado, e de matérias-primas por outro, e, tanto num caso como noutro, temos de apostar fortemente na prevenção, no sentido de evitar que as coisas aconteçam.

Essa prevenção deverá envolver a minimização das necessidades de transporte, a utilização de processos que permitam, nos próprios locais, dar tratamento adequado aos resíduos produzidos e evitar, de acordo com o processo de licenciamento, que haja transportes para zonas mais densamente povoadas.
0 processo de licenciamento das várias instalações industriais envolve um conjunto vasto de entidades, o que não tem qualquer mal, pois temos que articular as várias entidades da administração central, das autarquias, bombeiros, etc., no sentido de assegurar que esses processos de licenciamento sejam os mais adequados.
Neste momento, em termos de localização, temos planos directores municipais que podem minimizar esse tipo de situações. Mas não tenhamos ilusões porque existem situações instaladas e unidades industriais com postos de trabalho que estão localizadas, se calhar há algumas décadas, em determinados sítios e cuja solução, dentro desta óptica da prevenção, poderá demorar algum tempo, não se podendo resolver, portanto, de um dia para o outro.
No que diz respeito à fiscalização, ela tem os seus limites, pois não podemos pôr um fiscal atrás de cada português ou um batedor à frente de cada camião de transporte de gasolina! Até porque teríamos todos de pagar, também, esses custos.
Há, pois, que apostar fortemente, no que diz respeito aos transportes, na segurança inerente ao próprio transporte, ou seja, devemos assegurar, por exemplo, que os horários dos motoristas são adequadamente cumpridos e que eles têm a formação adequada.
Independentemente de estarmos agora a falar de resíduos industrias, especialmente daqueles que estão mais dentro da óptica do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, há matérias-primas cujo transporte envolve, necessariamente, alguns riscos. Creio que temos de levar ao máximo a exigência de qualidade nesse mesmo transporte, quer ele seja terrestre, marítimo ou aéreo, apostando fortemente no assegurar dos mecanismos de segurança próprios do transporte.
Depois, qualquer acidente que ocorra põe-nos no campo da resolução de situações de emergência. Ora, nessas situações de emergência temos tido uma responsabilidade partilhada. Mas, como tem de haver um comando único, entram em acção os bombeiros e, no caso marítimo, os capitães de porto. Como sabem, os planos de contingência para situações de maior risco são testados de tempos a tempos, de forma a que haja uma resposta o mais célere possível face a eventuais situações de risco eminente ou mesmo de catástrofe que ocorram.
Concretamente, no aspecto marítimo, há uma articulação clara destas competências. Foi aqui referido que a operação "Plano Mar Limpo" terá sido suspensa, mas é claro que não foi! Todos esses aspectos estão em curso e, também no que diz respeito ao transporte marítimo, temos uma acção preventiva, fiscalização e planos para fazer frente a situações de emergência.
Em relação às situações de emergência, as autoridades portuárias têm actuado em alguns casos que, infelizmente, têm ocorrido e que, também infelizmente, se podem repetir no futuro. Temos, pois, de estar preparados, para dar uma resposta pronta, resposta essa que passa não só por ter os meios - os portos foram, designadamente, dotados de meios adicionais no âmbito do Programa ENVIREG -, mas também pelo reforço da capacidade de mobilização de meios dentro do País e no estrangeiro, bem como o recurso a empresas especializadas internacionais, que garantam

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a constituição de equipas fortes e muito especializadas nessas situações de emergência.
Penso que respondi, no essencial, à generalidade das questões que me foram colocadas. Se houver mais algum pedido de esclarecimento, terei todo o gosto em responder.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu):- Srs Deputados, a Sr. Secretária vai informar a Câmara dos grupos de alunos que se encontram presentes nas galerias a assistir à sessão.

A Sr.ª Secretária (Maria da Conceição Rodrigues):Sr. Presidente e Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Alcaides de Faria, de Barcelos, um grupo de 50 alunos da Escola Secundária António Nobre, do Porto, um grupo de 40 alunos da Escola Secundária Francisco da Holanda, de Guimarães, um grupo de 50 alunos da Escola de St.ª Maria Maior, de Viana do Castelo, um grupo de 50 alunos da Escola Secundária José Régio, de Vila do Conde e um grupo de 51 alunos da Escola Secundária de Valadares.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, peço a vossa habitual saudação para estes nossos visitantes.

Aplausos gerais.

Para formular uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas sobre a preocupação causada por medidas do governo francês restritivas do direito de estadia de trabalhadores portugueses desempregados e pela situação de portugueses sem contrato que trabalham ilegalmente na Alemanha, explorados por empresários inescrupulosos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, já depois de esta pergunta ter sido encaminhada para o Governo, produziram-se na Alemanha, na região de Leipzig, gravíssimos acontecimentos, que ontem motivaram um voto desta Câmara.
Antes de entrar na pergunta propriamente dita, pedia, pois, ao Sr. Secretário de Estado que nos dissesse o que é que o Governo vai fazer relativamente a esses acontecimentos. Pergunto isto porque o que o Governo fez até agora, para além de ser absolutamente insuficiente, é até inquietante.
Cheguei ontem à noite de Paris, onde há uma certa inquietação entre os trabalhadores portugueses com quem falei pelas notícias que chegavam sobre a passividade do Governo relativamente aos acontecimentos ocorridos na Alemanha.
Falarei agora da situação francesa.
À tradicional ausência de iniciativas que respondam a reivindicações legítimas dos nossos emigrantes soma-se agora outra ausência: o Governo, decorridas duas semanas sobre a adopção de medidas pelo Governo francês que violam o Tratado da União Europeia, não assumiu até agora publicamente a defesa dos interesses dos nossos emigrantes brutalmente atingidos pelo decreto de 11 de Março, que golpeia o direito de estadia de dezenas de milhar de portugueses residentes naquele país.
Segundo o artigo 7.º desse diploma, publicado no Diário Oficial da França, o cidadão europeu desempregado que proceda pela primeira vez à renovação da chamada carta de séjour somente obterá essa renovação pelo prazo de um ano. Findo esse período, se permanecer desempregado poderá receber ordem de expulsão.

0 Governo francês fundiu ardilosamente disposições anteriores a Maastricht, globalizando-as num decreto. Acontece que a definição da cidadania europeia fez caducar essas disposições, pelo que o decreto é ilegal.
Porventura, emitiu o Governo Cavaco Silva um protesto oficial? Que se saiba, não!
Porventura, pediu, pelo menos, ao Governo Balladur que suspenda a aplicação do decreto vicioso até apreciação do mesmo pelas instituições comunitárias competentes? Que se saiba, também não!
0 embaixador de Portugal em Paris, numa declaração à Agência Lusa, qualificou de "controversas" as disposições do referido decreto que tripudiam sobre a cidadania comunitária e ferem a livre circulação de pessoas no espaço dos Doze.
Que significa, Sr. Secretário de Estado, a palavra "controversas" para o Ministério dos Negócios Estrangeiros?
Acresce que o artigo 6.º do mesmo decreto impõe também restrições ao direito de estadia a cidadãos da Comunidade atingidos por doenças que possam - cito - "pôr em perigo a ordem pública ou a segurança pública".
Sublinho, Sr. Secretário de Estado, que a imprensa francesa qualifica de "extremamente repressiva" a legislação que aos olhos do Embaixador Sherman de Macedo aparece apenas como "controversa".
Pergunto, Sr. Secretário de Estado:
Primeiro, por que continua o Governo calado a respeito de medidas ilegais que atingem gravemente direitos da comunidade portuguesa em França?
Segundo, que iniciativa ou iniciativas se propõe o Governo tomar para exigir do governo francês o cumprimento das disposições relativas ao direito de cidadania?
Terceiro, admite o Governo levar o assunto ao Tribunal do Luxemburgo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (Luís Macedo): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues, das duas questões que V. Ex.ª COIOCOU começo por referir-me à segunda, à questão francesa.
De facto, no passado dia 13 de Março foi publicado no Diário Oficial Francês o Decreto n.º 94 22 1, de 11 de Março, sobre as condições de entrada e residência em França dos nacionais dos Estados membros da Comunidade Europeia beneficiários da livre circulação de pessoas. 0 diploma em causa constitui uma compilação de legislação avulsa que sobre o assunto já vigorava em França anteriormente. Trata-se, pois, de uma iniciativa que reúne num só diploma disposições constantes de outros diplomas, nomeadamente de 1977, de 1979 e 1981, ora revogados.
No essencial, o regime nele estabelecido respeita as obrigações comunitárias que decorrem não só do Tratado de Roma no que toca à livre circulação de trabalhadores, direito de estabelecimento e livre prestação de serviços, como também da inúmera legislação comunitária que tem vindo a ser adoptada em execução dos princípios fixados no Tratado desde a década de 60.
Assim, muitas das suas disposições constituem mesmo reprodução quase literal daqueles preceitos. Aliás, o próprio preâmbulo do diploma em causa faz referência expres-

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sa a esta legislação. Nesse sentido, tal como a França, os restantes Estados membros (Portugal inclusive) dispõe de legislação nacional semelhante à que se encontra em apreço.
Relativamente aos aspectos do diploma que aparentemente suscitaram dúvidas, amplamente divulgadas pela comunicação social, concretamente o seu artigo 7.º, sobre o regime a aplicar aos desempregados, refira-se o seguinte: a limitação do período de validade de autorização de residência a um ano em caso de primeira renovação é admitida pela Directiva n.º 681360. Uma disposição idêntica a esta já existia na legislação francesa revogada pelo presente diploma - é o caso do Decreto n.º 81 405, de 20 de Abril de 1981. A legislação portuguesa, o Decreto-Lei n.º 60193, de 3 de Março, dispõe do mesmo modo.
Findo este prazo, e continuando o trabalhador desempregado, as autoridades francesas podem recusar nova renovação do título de residência. Trata-se, assim, de uma faculdade e não de uma obrigação. 0 universo passível de aplicação destas disposições abrangerá apenas os trabalhadores comunitários residentes em França desde l989, ou seja, no caso português, e de acordo com os dados estatísticos disponíveis, cerca de 18 000 pessoas - e, mesmo assim, dentro destes 18 000 tais disposições só se aplicarão, eventualmente, aos que estiverem desempregados durante um ano consecutivo. Todavia, tem vindo a ser colocada em evidência a questão da incompatibilidade desta legislação com a letra e o espírito do Tratado de Maastricht, nomeadamente com o seu artigo 8.º - A, o qual consagra o direito à livre permanência no território dos Estados membros, apenas limitável pelo próprio Tratado ou por disposições adoptadas em sua aplicação.
Dada a curta vigência do Tratado, ainda não foram adaptadas quaisquer disposições do tipo das descritas, pelo que se podem considerar em vigor as normas constantes do ordenamento jurídico dos Estados membros criadas em conformidade com as directivas e os regulamentos do Tratado de Roma. Foi este, aliás, o entendimento político que prevaleceu no decurso das negociações do Tratado de Maastricht e, portanto, válido como critério de interpretação do espírito da lei.
Pelo exposto, estamos convictos de que não há efectivas razões para os portugueses residentes em França se alarmarem com a publicação de um decreto que sistematizou as disposições legais decorrentes do direito comunitário e que já estavam em vigor, em França, desde 1981, não havendo, felizmente, conhecimento de cidadãos portugueses a quem essas disposições tenham sido aplicadas.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É claro que não! Só foi publicado na semana passada.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a sua resposta foi francamente insatisfatória e- peço desculpa pela expressão -, quase um insulto à inteligência dos portugueses.

Vozes do PCP, do PS e de Os Verdes: - Muito bem!

0 Orador: - 0 Sr. Secretário de Estado trouxe um papel preparado, mas não sabia exactamente o que eu ia perguntar.
Embora não faça exactamente a adopção da tese francesa, emprega os mesmos argumentos. Diz que os trabalhadores portugueses não têm razões para estar preocupados. Eles é que sabem, Sr. Secretário de Estado! Tal como já lhe disse, vim ontem de Paris e eram de indignação os sentimentos dos trabalhadores com quem falei.
Mas diria que na sua resposta está plasmada a imagem da política externa portuguesa, da política em relação a Maastricht, da vassalagem quanto aos grandes de Maastricht, que é a imagem do cavaquismo.
0 caso que citei foi o francês, mas V. Ex.ª não respondeu à questão da Alemanha - e não foi certamente por esquecimento, pois o senhor deve ter uma memória razoável. 0 caso do Embaixador Sherman de Macedo não é um caso isolado. A "posição de Pilatos" do Governo e do Embaixador Sherman de Macedo prolonga-se na Alemanha. 0 que aconteceu na Alemanha é mais do que gravíssimo! Quando um grupo de neo-nazis, de skinheads, que têm feito tristes proezas contra os turcos, assalta um dormitório de 32 portugueses o responsável pela missão oficial portuguesa, o Conselheiro da Embaixada, é chamado, não sei por que motivo (e isto até veio na imprensa de outros países), a pronunciar-se e faz uma declaração - que vem no Diário de Notícias - em que diz que, em relação àquele acontecimento, não se justifica um protesto oficial. Cito mesmo a sua expressão: "nada justifica, neste momento, um protesto formal da Embaixada." Então o que é que justificará um protesto da Embaixada? 0 que é que justificará um protesto do Governo português?

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu):
Sr. Deputado.

Queira terminar,

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Será quando começarem a assassinar os portugueses, como têm feito com os turcos? Será nessa altura que o Governo português protesta e que a Embaixada acha que é caso para isso?

Aplausos do PCP, do PS e de Os Verdes.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, com a sua intervenção e resposta provou-se, mais uma vez, a inércia do Governo no que respeita à política de emigração.
Gostaria apenas de colocar-lhe duas questões.
Em primeiro lugar, V. Ex.ª já convocou uma reunião das comissões mistas com estes dois países para analisar a questão?
Em segundo lugar, não acha que esta lei vem na sequência da lei mais reaccionária da Europa sobre emigração, que é a lei portuguesa? E andámos nós, Deputados pela emigração, nos últimos anos, por essa Europa fora, a criticar severamente os governos de França, da Alemanha, da Holanda, etc., etc., sobre as novas políticas de emigração... Qual foi a posição do Sr. Secretário de Estado? Qual a sua sensibilidade para esta questão como Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas?

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr a 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, penso que o Governo, hoje, traduziu com grande clareza o modo como se preocupa com os emigrantes portugue-

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ses. Para o Governo português, os emigrantes são apenas os votos nas presidenciais! Só isso lhe interessa!
A forma como o Governo português reage, mesmo em relação a cidadãos portugueses, com tanta passividade, tolerância e capacidade de interpretar aquilo que são as posições de outros governos, nomeadamente o francês, dá bem a dimensão de como os cidadãos portugueses no estrangeiro estão fragilizados e desprotegidos.
Penso que é bem claro qual é o sentido da cidadania e a forma como ela se traduz no espírito do Tratado da União e pedia-lhe também que falasse sobre a situação dos portugueses na Alemanha, porque, há poucas semanas, esteve cá uma delegação do Bundestag que se referiu aos trabalhadores portugueses clandestinos como sendo pessoas sem formação profissional que aí estariam a trabalhar.
É verdade que eles não têm formação profissional, mas é grave que eles estejam a ser explorados como trabalhadores clandestinos e que o Governo alemão não tenha uma palavra a dizer, como não tem em relação à agressão de que os portugueses foram alvo recentemente.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr a Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, estamos perante uma aplicação concreta que viola profundamente o espírito e a letra do Tratado de Maastricht.
Sabemos que o Ministro do Interior francês era contra o Tratado de Maastricht - eu própria assisti aos debates em que ele se pronunciou contra o tratado -, mas nunca esperei que um país da Comunidade como a França, que o é desde a sua origem, pudesse, em relação a cidadãos da Comunidade, criar uma legislação deste tipo.

0 Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Muito bem!

A Oradora: - 0 que se passou em França pode vir a passar-se em qualquer outro país e o que se passa já na Alemanha é extraordinariamente inquietante.
Assim, peço ao Sr. Secretário de Estado que me responda directamente ao seguinte: o Governo português vai ou não intentar uma acção contra o Governo francês no Tribunal de Justiça das Comunidades? É que, se os senhores não fizerem isso, estão a pactuar com a política que está a ser seguida em França contra os portugueses.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

0 Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, quero, em nome do CDS-PP, cumprimentá-lo, visto ser a primeira vez que vem a esta Câmara responder a perguntas e defender o ponto de vista do Governo. Como sabe, é grande a consideração que tenho por V. Ex." e, apesar das diferenças partidárias e políticas, acalento alguma esperança de que V. Ex.ª possa fazer muito pela cooperação.
A questão que hoje aqui foi colocada suscita-me alguns comentários.
Ontem, por razões de trabalhos parlamentares, reli as intervenções que aqui se fizeram a propósito da ratificação do Tratado de Maastricht e constatei que, por parte dos apoiantes dessa ratificação, as maiores ilusões e os maiores entusiasmos ligavam-se às vitórias e às conquistas de cidadania e ao que isso significaria para um país como o nosso, com a emigração que tem. Só que, depois da data da ratificação, essas convicções foram sendo sucessivamente abaladas...

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado, porque já ultrapassou o seu tempo.

0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
... na Dinamarca, no Luxemburgo, em França e na Alemanha.
Devo dizer-lhe que, para o CDS-PP, não se trata apenas de um problema dos emigrantes portugueses, é antes um problema de direitos humanos, que afecta todos os cidadãos. Perante este problema de direitos humanos, o Governo deve reagir com vigor, não só por se tratar de cidadãos portugueses, mas porque deve exigir a um Estado membro da União que, de facto, controle, fiscalize e vigie o respeito pelos direitos humanos, tal como fazemos no nosso próprio país.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Oliveira.

0 Sr. Carlos Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, antes de mais, gostava de saudar esta primeira participação de V. Ex.ª neste Hemiciclo e congratulá-lo pela forma precisa como respondeu às questões que lhe foram apresentadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS e do PCP.

0 Sr. Caio Roque (PS): - É ridículo!

0 Orador: - Quero aproveitar esta pergunta para salientar o cinismo e a demagogia da oposição de esquerda em relação a esta questão.
Em primeiro lugar, devo dizer que o manifesto ontem discutido foi aprovado por todos os partidos e foi da iniciativa do PSD.
Em segundo lugar, VV. Ex.as estão a explorar uma questão pontual, à qual o Governo está a reagir de uma forma eficaz e ponderada e com o vigor com que foi apresentada pela bancada do CDS-PP.
Falou-se de subserviência, ...

Protestos do PS e do PCP.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Neste momento, está a tornar-se!

O Orador: - Acalme-se, Sr. Deputado!
O indignação que os senhores sentem é a mesma que nós sentimos.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Não parece!

0 Orador: - E não é por tentarem projectar que se sentem mais indignados que vão ganhar!

0 Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - V. Ex.ª está a mentir e nós não!

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0 Orador: - Falou-se de subserviência e de direitos de emigrantes. Quanto à subserviência, que foi salientada pela bancada do Partido Comunista, quero dizer que VV. Ex.ª não a devem referir porque, em termos de experiência política de subserviência, têm muito a esconder em relação ao passado, em relação à União Soviética e a tudo isso.

Vozes do PCP e do PS: - É a cassette!

Protestos do PCP.

0 Orador: - É verdade!
Em relação a direitos dos emigrantes, gostava de falar sobre o direito de voto na eleição presidencial.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, já utilizou dois minutos, que é o dobro do tempo de que dispunha. V. Ex.ª é que faz a gestão do seu tempo, portanto, se quer dialogar, dialogue, mas dentro do seu tempo.

0 Orador: - Vou concluir já, Sr. Presidente.
É na cidadania e nos direitos de cidadania, principalmente em Portugal, que os senhores deviam estar a defender os direitos do emigrantes, mas não fazem isso.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

0 Sr. Caio Roque (PS): - É ridículo!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

0 Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, partilho totalmente das preocupações manifestadas, nesta Câmara, pelo Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues, assim como das dos meus camaradas de bancada. Mas, após ouvir a intervenção do Sr. Secretário de Estado, se preocupado estava, mais fiquei.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Muito bem!

0 Orador: - É que V. Ex.ª retoma o único documento conhecido até ao momento, que é o comunicado da Embaixada de Portugal em Paris, do embaixador Sherman de Macedo, sobre a situação grave que se vive em França e não pode escamotear esta situação, porque, neste momento, estão em causa 80000 portugueses residentes em França.
Depois das declarações do Ministro do Interior Charles Pasqua, em que se atreve a violar o Decreto-Lei n.º 2111 94, que retoma a filosofia do Decreto-Lei n.º 405181, V. Ex.ª mais não faz do que um arrazoado de compilação de matéria avulsa sobre este tema, o que vem violar - aqui, sim, Sr. Deputado Carlos Oliveira - a cidadania europeia, porque, antes do Decreto-Lei n.º 211/94, estava a coberto do Decreto-Lei n.º 405181.
Pensamos que aqui está em causa a cidadania europeia e por isso, Sr. Secretário de Estado, pergunto a V. Ex.ª o seguinte: que medidas concretas a sua Secretaria de Estado tomou em relação ao Governo francês e também ao Governo alemão, no que se refere à grave situação que compatriotas nossos residentes na Alemanha têm vivido nestes últimos dias.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Muito bem!

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, quero, nesta sua primeira vinda ao nosso Parlamento, felicitar V. Ex.ª e manifestar-lhe a minha solidariedade, porque conheço bem estas questões e os ataques que são feitos ao Governo português, em função de legislações ou de medidas abstractas tomadas por governos estrangeiros que não se concretizam na prática.
Tenho a certeza de que, se isso viesse a acontecer, o Governo português levantaria a sua voz com toda a veemência e saberia defender os trabalhadores portugueses. Sempre assim aconteceu e há-de continuar a acontecer!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Secretário de Estado, a minha total solidariedade e as minhas felicitações pela sua prestação nesta Assembleia!

0 Sr. Caio Roque (PS): - 15so nunca aconteceu!

A Oradora: - Sr. Deputado, quando estava no Governo, passei seis ou sete anos a ouvir toda a imprensa portuguesa falar de regressos em massa de emigrantes e de expulsão de portugueses daqui e dacolá, coisa que, em concreto, nunca se verificou e o Governo português nunca permitiu que acontecesse.
0 Governo português tem canais discretos de negociação e de entendimento com os seus parceiros e, se as coisas acontecerem, saberá, então, se for caso disso, tomar as iniciativas.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, uma vez que fui interrompida, peço-lhe apenas mais um segundo para dizer que também devemos distinguir os problemas da sociedade e ter atenção tanto ao que se passa na sociedade portuguesa como nas outras sobre os direitos dos estrangeiros.
Estou totalmente solidária com todos os estrangeiros, tanto com os que vivem em Portugal como com os que vivem na Alemanha, mas devemos também separar aquilo que os governos podem fazer em relação a essas sociedades em cada momento. São dois problemas muito diferentes.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que uma acusação ao Governo, vinda de onde veio, de subserviência ao estrangeiro e a ideologias estrangeiras, sejam quais forem, é perfeitamente deslocada.
Não há, no que eu disse, qualquer subserviência, bem pelo contrário, e o que procurei explicitar e desdramatizar - porque, de facto, entendo que isto tem de ser desdramatizado - foi o seguinte: estamos apenas perante a aplicação de um conjunto de legislação comunitária, que está em vigor há muitos anos e entendemos, porque foi esse o espírito da negociação política do Tratado de Maastricht neste capítulo, que o Tratado de Maastricht, no seu artigo n.º 8-A, dá uma simples orientação política, é um acquis político e não jurídico, e a sua aplicação carece, obviamente, de ser regulamentada. Enquanto isso não acon-

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tecer, é evidente que está em vigor - ou tem de estar em vigor, não pode ser de outra forma - todo um conjunto de legislação comunitária que, no caso francês, já se arrasta de há muitos anos.
0 que procurei frisar foi que, apesar da actual legislação não ser mais do que a reformulação e a compilação dessa legislação anterior, não temos conhecimento da aplicação dessa legislação contra os portugueses no passado.
Poderei ainda acrescentar que penso não ser legítimo continuar a falar-se em 80000 trabalhadores, pois, meus senhores, a população portuguesa em França é de cerca de 750 000 pessoas, das quais 645 000 estão no activo e a taxa de desemprego da população francesa, portanto, relativamente ao activo, é na ordem dos 40 %, em termos globais.
Mas, mais do que isto, volto a frisar o que disse na minha exposição: esta medida, a ser a aplicada, o que nós não acreditamos - e já vou dizer porquê - poderá, quanto muito, abranger uma pequena percentagem dos portugueses residentes em França nos últimos cinco anos, que, como acabei de dizer, não deve ultrapassar 18 000 pessoas, incluindo crianças e idosos.
De qualquer modo, a nossa convicção de que isto não pode causar alarme junto dos portugueses - não há razões para que tal aconteça - provém do facto de eu próprio ter contactos com dirigentes da comunidade, a quem procurei auscultar directa e indirectamente, e, ao contrário do que aqui foi dito, não vi sinais de preocupação em dirigentes altamente credíveis da nossa comunidade.

0 Sr. Caio Roque (PS): - Patrões?

0 Orador: - Resta-me frisar, para encerrar esta questão em termos de esclarecimento, que o Governo português, desde o primeiro minuto, está em contacto intenso com o Governo francês e dele tem absolutas garantias de que, tal como no passado, os trabalhadores portugueses não são os visados, nem o serão, por esta medida. Mas se forem, como é evidente e tal como tem acontecido no passado, o Governo português saberá ter a actuação adequada.
Relativamente à questão dos incidentes, que reputamos graves e têm o nosso total repúdio, ocorridos na Alemanha, gostaria, muito brevemente, de historiar o que aconteceu, porque sobre eles existem já elementos absolutamente definitivos.
No dia 22 de Março, terça-feira, dois indivíduos do sexo
masculino assaltaram os alojamentos de trabalhadores portugueses, tendo partido os vidros de duas portas e mais
quatro vidraças de janelas que dão para a rua, provavelmente com tacos ' de hóquei
De acordo com as declarações das testemunhas, pelo
menos uma pessoa entrou no interior do edifício. Na entrada do prédio, o intérprete dos trabalhadores, que queria alarmar a polícia, foi intimado a sair por mais dois assaltantes, o que não fez.
Os assaltantes terão ameaçado voltar mais tarde e afastaram-se de seguida em direcção desconhecida. Ninguém ficou ferido.
Cerca das 4 horas e 30 minutos, mais exactamente às 4 horas e 28 minutos, o intérprete conseguiu alertar a competente polícia através do número de urgência. Quando os dois carros de patrulha da polícia chegaram ao local, não foi possível encontrar lá ou nas imediações quaisquer pessoas suspeitas.
A Comissão Especial de Extremismo de Direita dos serviços criminais da Saxónia iniciou investigações, por suspeita de prática de crime grave contra a ordem pública, com base no parágrafo 125.º do Código Penal alemão, em ligação com o delito xenófobo. As investigações continuam e foram tomadas várias medidas policiais para proteger os trabalhadores portugueses, mas os acontecimentos referidos não deverão ser vistos como uma vaga generalizada de violência na região contra estrangeiros nem como uma agressão específica dirigida à comunidade portuguesa.
A polícia iniciou imediatamente as averiguações habituais e, no seguimento das mesmas, os serviços de polícia de Dresden anunciaram ontem, através de comunicado, terem já detido dois presumíveis autores do incidente de violência contra os 32 trabalhadores portugueses, continuando as averiguações' sobre a ocorrência. Um dos detidos, um jovem de 23 anos, que considera ligado à
extrema-direita, já confessou ter participado naquele acto de violência.
Quero salientar que o Ministro de Estado Federado da Saxónia manifestou já publicamente a sua satisfação pelo rápido êxito das investigações dos serviços criminais.
Entretanto, as averiguações confirmaram que o lar dos portugueses foi escolhido por mero acaso.
A Secretaría de Estado das Comunidade Portuguesas, através da Embaixada de Portugal em Bona, tem estado a acompanhar o assunto com a maior atenção e com o maior interesse e tem mantido uma cooperação institucional com as entidades alemães, no sentido de prestar todo o apoio aos portugueses vitimas das citadas agressões.
Assim, para além da nota verbal remetida ao Ministério Federal dos Negócios Estrangeiros alemão, expressando a nossa profunda preocupação pelo ocorrido e solicitando que nos sejam transmitidos, com a possível brevidade, os resultados das averiguações em curso, o Conselheiro Social deslocou-se ontem mesmo a Lieptzig e a Dresden, a fim de analisar os referidos acontecimentos, apoiar os trabalhadores portugueses e colaborar, através da tomada de medidas eventualmente necessárias, com as entidades alemães responsáveis, pela segurança dos nossos compatriotas.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - V. Ex.ª vem para aqui ler os jornais?

0 Sr. Caio Roque (PS): - Leu as notas de imprensa!

0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Presidente.

0 Sr. Miguei Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, para exercer o direito de defesa da dignidade da minha bancada.

0 Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

0 Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, quero apenas saber desde quando os Deputados e esta Assembleia tem de ser alvo da leitura dos relatos da imprensa alemã.
No fundo, aquilo que o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas fez aqui foi relatar-nos o que vem na imprensa, o que é desnecessário e faz-nos, pura e simplesmente, perder tempo.

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Já agora seria mais importante que a Mesa solicitasse ao Sr. Secretário de Estado que nos esclarecesse sobre quais as medidas que o Governo tem tomado para impedir que o tráfico de trabalhadores portugueses para a Alemanha continue a fazer-se da forma que se faz, sem nenhumas garantias, e que sanções ou que medidas têm sido tomadas em relação aos empresários que se comportam deste modo, num quadro que me atreveria quase a classificar como de simples escravatura.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, VV. Ex.as têm a liberdade de fazer as perguntas que entenderem, mas, neste caso, ao Governo e não à Mesa, porque essa pergunta não é para a Mesa responder.
Para exercer o direito de defesa da dignidade da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, foram duas as expressões proferidas pelo Sr. Secretário de Estado e por um Sr. Deputado que motivaram este meu pedido. São elas, por um lado, a referência ao cinismo da bancada do PCP e, por outro, a frase do Sr. Secretário de Estado"vinda de onde veio".
Sr. Secretário de Estado, faço minhas as palavras que o Sr. Deputado Lopes Cardoso acabou de proferir, pois, na prática, acabou por repetir um relatório mofino da polícia alemã. Quase só faltou elogiá-la...
Em segundo lugar, V. Ex.ª veio aqui para não responder às questões que lhe foram colocadas; com essa expressão "vinda de onde veio" - e nós não aceitamos lições suas em matéria de democracia -, o Sr. Secretário de Estado veio fazer a apologia e o elogio, ou seja, veio dar o seu aval ao funcionário da embaixada que diz que não é caso para protestar. Bom, nós repetimos: é caso para protestar!
Quanto ao Sr. Deputado Carlos Oliveira, que baralhou, como de costume, que gosta muito de abordar as questões de linguagem, que falou de subserviência, de cinismo - e porque uma vez, referindo-se a uma intervenção minha, disse que eu adjectivava muito o meu discurso -, aconselho-o a, tendo em conta os seus substantivos e os seus verbos e o facto de estar constantemente a repetir a expressão "vão haver", não abordar questões de linguagem.

0 Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Essa é para os anais desta Casa!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

0 Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Nada tenho a dizer.

0 Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Luís Filipe Menezes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa,

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

0 Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Lopes Cardoso, na interpelação que fez à Mesa, pediu um esclarecimento ao qual a Mesa não poderia responder.

Contudo, ficou óbvio, da intervenção do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, que ele não veio ler qualquer jornal alemão mas, sim, uma nota circunstanciada da Embaixada de Portugal na Alemanha - aliás, de tal forma circunstanciada que demonstra o rigor, o empenho e o profissionalismo que os diplomatas portugueses colocaram, de imediato, no tratamento desta questão.
Portanto, penso que a observação do Sr. Deputado Lopes Cardoso demonstra um desrespeito grave para com a diplomacia portuguesa e não só para com o Governo.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra.

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

0 Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, se alguém desconsiderou a diplomacia portuguesa não fui eu mas, sim, o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, resumindo a actuação da diplomacia portuguesa ao mero relato das fontes policiais alemãs.
De facto, repito, se houve desconsideração, ela não foi da minha parte mas, sim, do Sr. Secretário de Estado! A diplomacia portuguesa merece-me a consideração que merece, mas parece não merecer do Sr. Secretário de Estado a consideração que lhe deveria merecer.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

0 Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, penso que o Sr. Deputado Lopes Cardoso já explicou.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Antes de passarmos à próxima pergunta, também dirigida ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, peço ao Sr. Secretário o favor de passar à leitura dos relatórios que temos de aprovar hoje.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação da Procuradoria da República - Delegação da Comarca de Vila Pouca de Aguiar, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Pereira (PSD) a ser inquirido, na qualidade de testemunha, sobre matéria dos autos em referência.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

Ó Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Figueiró dos Vinhos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jú-

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lio Henriques (PS) a ser ouvido, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação do Tribunal de Círculo de Coimbra, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Lobo Xavier (CDSPP) a depor, na qualidade de testemunha, nos autos em referência.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Figueiró dos Vinhos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Júlio Henriques (PS) a depor, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação da Procuradoria da República - Delegação da Comarca de Vila Pouca de Aguiar, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Pereira (PSD) a ser inquirido, na qualidade de testemunha, sobre matéria dos autos em referência.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solicitação do Tribunal de Polícia de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de arquivar o processo em epígrafe relacionado com o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD), em virtude de ter sido recebido nesta 1.ª Comissão o oficio n.º 1511, de 10 de Março de 1994, do Tribunal em referência, informando da desnecessidade da comparência do Sr. Deputado em causa.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN e do Deputado independente Mário Tomé.

Srs. Deputados, passamos, de seguida, à pergunta sobre a situação em Timor Leste e a forma como Portugal e os países comunitários se têm posicionado na matéria, que irá ser formulada pela Sr.ª Deputada 15abel Castro, a quem concedo a palavra.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão de Timor Leste, aquando do massacre de Santa Cruz, em Dili, deixou de ser circunscrita a alguns cidadãos portugueses e, peia força das imagens transportadas para todo o mundo, foi uma questão que todos, também nesta Casa, tiveram de passar a assumir como sua - aliás, já o era - e como uma prioridade.
A propósito, lembro as intervenções do Governo português, nomeadamente as do Sr. Primeiro-Ministro, do então Ministro dos Negócios Estrangeiros, João de Deus Pinheiro, e o modo como Portugal dizia - e muito correctamente - que a questão tinha de ser tratada por Portugal e pela comunidade internacional, sendo que Portugal tem uma prioridade e um imperativo humano e ético perante este povo para agir activamente, por forma a que a questão seja tratada.
0 problema de Timor Leste gerou uma onda de solidariedade nunca vista em Portugal, particularmente nos jovens, e quase que em nenhum ponto deste País, em nenhuma escola, deixou de haver uma acção em favor de Timor Leste. 15to independentemente de, ontem, aqui mesmo, o Sr. Deputado Braga de Macedo ter recusado que a Presidência portuguesa tenha sido uma presidência tímida. Em nosso entendimento, ela foi-o, muito particularmente em relação à questão de Timor Leste. Aliás, lembro que o Conselho de Lisboa não contém uma linha sequer sobre a questão de Timor Leste e a situação do povo Maubere e é bom lembrar que este é um povo que tem sido torturado e alvo de extermínio.
Esta é uma questão que se coloca porque, passado todo este tempo e tudo aquilo a que temos assistido (e gostaria que o Sr. Secretário de Estado comentasse isto), a leitura que fazemos é a de que esta é uma diplomacia de conformismo, uma diplomacia de circunstância perante uma realidade que é esta: a ditadura militar indonésia não está minimamente interessada, como é normal numa ditadura, em alterar o modo como o povo Maubere é tratado.
Os Estados membros da União Europeia, os chamados nossos parceiros comunitários, têm, desde logo, no início do Tratado da União, as questões dos direitos humanos como fundamentais e em tomo das quais se justifica uma política externa e de segurança comum, vinculativa para os Estados membros naquilo que se considera importante e prioritário e, para nós, era suposto que as questões da paz, da defesa dos direitos humanos e da liberdade dos povos seriam prioritárias.
Ora, o que é facto é que temos assistido, perante toda esta situação, a uma atitude perfeitamente hipócrita por parte dos Estados membros e da Comunidade. Senão, vejamos: a Espanha faz compras à Indonésia; a França também; a Alemanha vendeu 29 fragatas à Indonésia, permitindo-se vir a este Parlamento dizer que essas fragatas se destinam apenas a vigilância da costa; os ingleses vendem motores para caças bombardeiros e a própria Comunidade recusou o embargo de venda de armas e de material bélico.
Estamos, pois, perante uma situação que, em nosso entendimento, exige um posicionamento muito claro, nomeadamen-

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te quando sabemos que, no norte do País, um Sr. Macedo faz importações, trocas comerciais, com a Indonésia.
Face a este problema, pretendemos que o Governo português se posicione e diga frontalmente se esta questão é prioritária ou que assuma, perante os portugueses solidários com esta causa, que Portugal nada risca no contexto internacional e, mais, que a Comunidade, em relação ao princípio da liberdade, tem uma mera visão de abstracções.

0 Sr. Presidente: - Para responder, em tempo não superior a três minutos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: Sr. Presidente, Sr a Deputada 15abel Castro, a estratégia portuguesa para a abordagem da questão de Timor Leste é norteada - para além do objectivo constitucional conhecido de todos - pela ideia de permitir ao povo de Timor Leste o exercício do seu direito à autodeterminação, pela preocupação com a defesa dos direitos humanos da sua população e pela manutenção da sua identidade como povo, nos seus diferentes aspectos.
Com estas finalidades, tem o Governo desenvolvido esforços em duas áreas fundamentais de actuação: continuação da pressão internacional e sensibilização de outros governos, organizações internacionais e opinião pública em geral a respeito do problema e prosseguimento do diálogo nas Nações Unidas, sob os auspícios do Secretário-Geral, com a Indonésia e com todas as partes interessadas, ao abrigo da Resolução n.º 37130, de 1982, da Assembleia Geral, na sequência da proposta por nós feita em Janeiro de 1992 para que fossem retomadas conversações com vista à obtenção de uma solução de fundo para o problema.
Relativamente à primeira das áreas que acabei de referir, a actuação portuguesa tem sido continuada e persistente quer a nível bilateral quer multilateral, aproveitando as oportunidades que se nos deparam para o efeito nos planos político e diplomático. Aliás, tem estado sempre presente a preocupação de ligar a questão da defesa dos direitos humanos e liberdades fundamentais à necessidade de permitir ao povo de Timor Leste a livre escolha do seu destino político.
Quanto à segunda das áreas de actuação que a princípio se identificou, relativa ao diálogo sob os auspícios do Secretário-Geral das Nações Unidas, deverá, como é público, realizar-se em Genebra, no próximo dia 6 de Maio, a quarta ronda de conversações ministeriais a que o Sr. Butros Ghali tem vindo a presidir.
Conforme o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tem referido publicamente, temos plena consciência das dificuldades que este processo encerra, que são reflexo, afinal, de todas as condicionantes de natureza política que rodeiam a questão e que têm impedido a restauração da legalidade internacional em Timor Leste e a conclusão válida do seu processo de descolonização, de harmonia com a Carta e com as resoluções aplicáveis da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
As posições de Portugal e da Indonésia quanto à substância da questão continuam a mostrar-se profundamente divergentes, diria mesmo opostas, no que respeita ao ponto crucial do exercício do direito à autodeterminação. Não são de esperar progressos espectaculares neste domínio, mas podemos e devemos manter aberta a porta do diálogo, demonstrando a nossa boa fé e empenhamento em cooperar com os esforços do Secretário-Geral baseados numa resolução da Assembleia Geral de que fomos co-autores e

votantes. Podemos e devemos utilizá-lo, por outro lado, para melhorar a situação prevalecente em Timor Leste, procurando aliviar a pressão que se exerce sobre o seu povo. Apenas temos ao nosso dispor meios políticos e diplomáticos para resolver esta questão, que devemos utilizar em pleno com paciência mas também com determinação.
Estamos, neste momento, em fase de preparação da reunião de 6 de Maio, em que se procura a adopção e concretização das chamadas medidas geradoras de confiança, que procuram melhorar a atmosfera de diálogo e promover a aproximação entre as partes.
No conjunto das medidas que, eventualmente, vierem a ser adoptadas, as que incidirem sobre a situação no território são essenciais; o próprio
Secretário-Geral reconheceu, no último relatório que sobre o assunto levou à Assembleia Geral, que a melhoria da situação dos direitos humanos em Timor Leste é condição sine qua non para o progresso das conversações, o que não deixa de ser altamente significativo.
Em Janeiro passado e, pela primeira vez, desde o início deste processo, o Secretário-Geral fez deslocar a Portugal, à Indonésia, a Timor Leste e à Austrália um seu representante com o objectivo de auscultar os governos português e indonésio mas, também, explicitamente, os timorenses, acerca das perspectivas de condução das conversações. Pensamos que esta atitude representou um importante passo em frente no sentido de associar, como sempre temos vindo a defender, os principais interessados - o povo do território - ao processo de diálogo em curso.
Em conclusão, poderá dizer-se que, embora tenham sido conseguidos progressos indiscutíveis ao nível da sensibilização dos governos, da opinião pública e da comunidade internacional em geral acerca do problema de Timor Leste, estamos plenamente conscientes do caminho que falta percorrer, das dificuldades que haverá que ultrapassar para a solução global, justa e internacionalmente aceitável que se pretende seja conseguida. Diálogo e pressão internacional são dois instrumentos ao nosso dispor, que têm de ser utilizados conjugadamente para com eles se obter o melhor resultado possível em relação aos objectivos que é imperativo prosseguir quanto a esta questão.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado: No fundo, V. Ex.ª coloca as questões que oficialmente têm sido formuladas sobre esta matéria e tão-só. Ora, parece-me que essa atitude - insisto - é manifestamente insuficiente, pelo que deverá ser feita uma clarificação caso Portugal não tenha capacidade para agir diferentemente. Estou a pensar que deveriam ser criadas, com imaginação e mais energia, formas mais eficazes de o nosso país manifestar o seu empenho em relação à causa de Timor Leste. Mais, se o estatuto de Portugal não lhe permite, em relação aos parceiros e aos Estados membros da União, influir diferentemente, tal deverá ser assumido frontalmente perante a opinião pública e os portugueses que, com generosidade, tomaram esta causa como sua.
Pedimos à Comunidade que fosse prosseguido um bloqueio económico. Com que autoridade moral, se o nosso país tem permitido que as trocas comerciais com a Indonésia, ao longo deste período, tenham duplicado? Que bloqueio é este?! Como podemos viver de vagas intenções, como tem acontecido? Pensamos que é francamente insuficiente o que tem sido feito e lembro que o café, a pimenta, todos os produtos provenientes da Indonésia, entram em

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Portugal sem quaisquer constrangimentos. Esta realidade tem de ser assumida pelo Governo e pelo Estado português, que também compra produtos à Indonésia.
Relativamente a Portugal, registo positivamente o facto de o Sr. Secretário de Estado ter referido o dispositivo constitucional da autodeterminação que, infelizmente, para nosso gosto, parece sofrer demasiadas nuances no discurso oficial português, situando-se, muitas vezes, exclusivamente nos direitos humanos quando o problema é mais vasto.
Porém, no que diz respeito à comunidade internacional, é necessário agir diferentemente, multiplicar e concertar esforços - estratégia que, em nossa opinião, não tem sido suficientemente aprofundada -, porque não me parece que o Sr. Secretário-Geral das Nações Unidas considere como uma das mais importantes para a humanidade a causa de Timor Leste, nos termos em que entendemos dever ser, e igual juízo fazemos da União Europeia.
Quantas mulheres mais terão de ser violadas, quantas pessoas mais terão de ser torturadas e mortas para que a comunidade internacional se deixe de hipocrisias e assuma, neste domínio, o papel que manifestamente lhe cabe?

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos adicionais, em tempo não superior a um minuto, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Brito.

0 Sr. Raúl Brito (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, como é do seu conhecimento, quer a Comissão Permanente quer a própria Assembleia Parlamentar da UEO aprovaram recomendações no sentido de ser embargada a venda de armas à Indonésia. Mas todos os dias lemos nos jornais que países membros desta organização continuam a vender armamento que sabemos ser utilizado para o genocídio do povo timorense.
Como não é do conhecimento público que o Conselho de Ministros da UEO tenha tomado uma posição sobre esta matéria, gostava que o Sr. Secretário de Estado nos comunicasse que iniciativas apresentou o Governo português nesse órgão e as razões do insucesso destas recomendações.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos adicionais, em tempo não superior a um minuto, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

0 Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, é de saudar a iniciativa de Os Verdes abordarem de novo, no Parlamento, a questão de Timor Leste. Tudo o que puder ser feito pelo povo de Timor Leste.. e pela sua autodeterminação é justo e merecido.
No entanto, ao mesmo tempo que sublinho que o PSD e o seu Grupo Parlamentar não desistem de levar a cabo essa tarefa constitucional e é de ânimo próprio que desejamos ver o povo de Timor Leste conquistar a sua liberdade, os seus direitos, designadamente, os que lhe são merecidos como pessoa humana, saliento que nunca daria o seu apoio a qualquer governo - e por maioria de razão o nosso - que enveredasse por uma via de recuo, precipitada, por um aparente fogo de artifício que trouxesse mais prejuízo e atraso do que benefício à causa de Timor Leste. Nisso, não teria o nosso apoio!
Aliás, sabemos que a política comercial transcende, neste momento, a decisão estritamente portuguesa, está no âmbito comunitário e é uma zona delicada de intervenção. Por conseguinte, consideramos que a atitude de grande ponderação que o Governo português tem tomado neste domínio é de ressaltar, sublinhar e aplaudir.
Ao mesmo tempo que sublinho a posição permanente do meu grupo parlamentar no sentido de reivindicar uma posição firme relativamente a Timor Leste e aos direitos do seu povo, designadamente ao direito à autodeterminação e independência, sublinho também que nunca daríamos o nosso apoio a medidas precipitadas, a aventureirismos, que só prejudicariam a causa de Timor Leste.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, por um minuto, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, apesar daquilo que declarou, creio que alguma tibieza existe da diplomacia portuguesa na questão de Timor, não obstante alguns esforços de diversos e bons diplomatas que se têm comportado de maneira positiva a propósito deste problema.
Gostaria de saber, quanto à atitude de certos países na União Europeia, como a Grã-Bretanha, a Alemanha, a Holanda - sabemos que nem sequer são ambíguos, tomam uma posição clara contra Timor - e no tocante a recentes afirmações do Ministro dos Negócios Estrangeiros da Grã-Bretanha, proferidas em Lisboa, que tipo de reacção manifestou o Governo em relação a essas declarações?
Por outro lado, pretendo ser esclarecido, também, se o Governo pensa apresentar, na próxima cimeira da União Europeia, qualquer' proposta que deva ser discutida e assumida pelos parceiros da União Europeia, quanto ao tipo de relações comerciais, ou outras, que este bloco europeu deve, ou não, manter com a Indonésia.

(0 Orador reviu.)

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, por um minuto, o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A bancada do PCP também considera que a posição do Governo, essencialmente a do Primeiro-Ministro, é uma posição recuada em relação a Timor Leste, é uma posição cheia de ambiguidades.
Ainda esta semana, na Austrália, o novo Primeiro-Ministro fez elogios ditirâmbicos ao general Suharto e à política do género desenvolvimentista indonésio, no fundo, à estratégia do Estado indonésio. Este é o tipo de situação que exige uma imediata réplica, mas não tenho conhecimento que tal tenha acontecido, apenas do habitual silêncio.
Ora, quando a política assenta sobre o amoralismo, a factura da História pode tardar mas é pesada. E não é apenas opinião da Sr. Deputada que a política do Estado português em relação a Timor Leste é insuficiente, a imprensa francesa, a imprensa norte americana e dezenas de organizações não governamentais têm a mesma opinião.
Aliás, Sr. Presidente, proeuro, com esforço, a palavra autodeterminação no discurso do Sr. Primeiro-Ministro e confesso que o resultado é mau, porque só a tenho encontrado - pode-me escapar alguma - no discurso das Nações Unidas, uma vez por ano, para cumprir o calendário.
Pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado, se não acha que é - pouco utilizada a palavra autodeterminação no discurso do chefe do Governo.

0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, num tempo não superior a 10 minutos, o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

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0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem dera ao Governo poder responder afirmativamente quando a Sr a Deputada perguntou quando é que termina, de facto, esta situação de massacre e esta situação de subjugação do povo de Timor Leste! Quem dera podermos responder que já terminou ou que terminará hoje mesmo!
Infelizmente, como sabe- e saberá, certamente, até melhor do que eu -, toda esta situação de Timor Leste conduz-nos a negociações muito delicadas, muito difíceis, onde acredito que houve progressos importantes. Há anos atras, seguramente, Timor Leste não era uma questão colocada nas agendas internacionais e por persistência do Governo português, desta própria Casa e de todos os portugueses de uma forma geral, Timor Leste é hoje um assunto das agendas internacionais.
Por outro lado, penso que também o Governo português - e o Sr. Deputado Sousa Lara acabou de o dizer - tem conduzido todo este processo, sem dúvida, com a maior determinação. Simplesmente, tem privilegiado, dada a delicadeza destas negociações e o que está em causa, que o diálogo e uma posição firme e determinante sejam colocados nos locais próprios, junto dos outros governos, não procurando retirar daí efeitos mediáticos.
De qualquer forma, na minha opinião e na do Governo, os progressos têm sido evidentes e inegáveis no campo dos direitos do Homem, no campo da tentativa de protecção e sensibilização da Comunidade internacional relativamente à defesa dos direitos do Homem; porém, os progressos têm sido menos evidentes, infelizmente, em tudo o que diga respeito às relações comerciais.
Sr.ª Deputada e Srs. Deputados: É certo que fomos os primeiros a reclamar e a protestar junto dos governos inglês e alemão, por exemplo, a propósito da venda de armamento militar à Indonésia.
Infelizmente, não existem sanções económicas contra a Indonésia, nem a nível das Nações Unidas nem a nível comunitário. Portanto, não estamos obviamente habilitados a solicitar um cumprimento de sanções que não foram decretadas. Agora, o que podemos fazer, e fizemos, é protestar energicamente e manifestar a nossa mais profunda indignação e estranheza junto dos governos inglês e alemão sobre esta matéria.
É conhecida a resposta dos governos inglês e alemão à nossa nota entregue aos respectivos ministérios dos negócios estrangeiros e é também evidente que a resposta não nos satisfez, longe disso. Pensamos que as declarações e os compromissos públicos, em matéria de política de defesa dos direitos humanos, devem ter uma tradução coerente com o comportamento efectivo dos governos. Obviamente que continuaremos a manifestar a nossa oposição a tais transacções que, além do mais, transmitem um sinal político altamente inconveniente à Indonésia, fazendo-lhe crer que o business as usual acabará sempre por prevalecer.
Srs. Deputados, de uma forma geral, penso que respondi à questão. É certo que gostaríamos que os progressos tivessem sido ainda maiores, mas volto a enfatisar que, olhando para trás e para hoje, é evidente que o caminho percorrido é longo e há efectivamente uma sensibilização da comunidade internacional, nomeadamente na área dos direitos humanos, que cumpre registar.
Mas, felizmente, tenho um anúncio a fazer a esta Casa e permitam-me ter essa alegria - sobre um progresso efectivo já no campo de embargos militares. A nova administração do Presidente Clinton tem vindo a mostrar-se muito mais receptiva a toda esta questão de Timor Leste, aliás, como

o demonstrou na Comissão dos Direitos Humanos, em 1993 e há poucas semanas apenas, na última sessão da Comissão.
Assim, tenho grande satisfação em poder anunciar-vos ter sido tomada recentemente, pela administração americana, a decisão de suspender o fornecimento à Indonésia de armas ligeiras e de material de controlo de manifestações susceptível de causar a morte, que só será levantada quando se registarem progressos significativos em matéria de direitos humanos.
Penso que é uma notícia que dará satisfação a todos nós e constitui mais um progresso em todo este complicadíssimo processo de Timor Leste.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, para concluir, permito-me cumprir um pequeno dever de educação e um dever cívico, agradecendo as palavras tão amáveis que aqui me foram dirigidas por vários Srs. Deputados, uma vez que essa atitude não deixou de me sensibilizar. Por outro lado, quero manifestar também a honra e satisfação de estar nesta Casa, esperando que esta minha modesta contribuição possa ter sido minimamente útil.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Em nome da Mesa, agradeço ao Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas as referências amáveis que a todos fez.
0 Sr. Deputado Raúl Brito pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. Raúl Brito (PS): - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Raúl Brito (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considero que o Sr. Secretário de Estado, não respondendo à questão que lhe formulei, não mostrou respeito por um Deputado desta Câmara, neste caso a minha pessoa.
Compreendo que o Sr. Secretário de Estado não esteja informado, não saiba as posições que o Governo português tornou no âmbito do Conselho de Ministros da UEO ou que não queira dizer que o Governo português não tomou nenhuma- posição, o que, em meu entender, é grave.
No entanto, já não posso aceitar que o Sr. Secretário de Estado omita e não queira responder a uma questão. Efectivamente, é inaceitável que, tendo a Comissão Permanente e a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa aprovado uma resolução onde se solicitava o embargo, o Governo não tenha utilizado todos os mecanismos que, como membro do Conselho de Ministros, dispõe para que essa resolução fosse aprovada. E agora o Sr. Secretário de Estado limitou-se a desconhecer a minha pergunta. Lamento que o tenha feito mas isso é comprovativo que o Governo português não está a fazer tudo aquilo que podia fazer pela causa do povo de Timor Leste.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

0 Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, não tenho qualquer explicação a dar.

0 Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pediu a palavra para que efeito?

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0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, creio que V. Ex.ª mediante acordo de todos os grupos parlamentares, pode ceder tempo para que o Sr. Secretário de Estado responda às questões que eu e outros Deputados lhe colocámos.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Raúl Rego.

0 Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, é uma interpelação triste, pois destina-se a comunicar à Assembleia da República a morte do Dr. José Magalhães Godinho, que foi um dos homens chave da resistência durante 40 anos e que por si e pela sua família manteve uma permanente ligação à 1 República. Além disso, quer como vice-presidente do Tribunal Constitucional quer como presidente da Comissão do Livro Negro sobre o Fascismo, prestou os mais relevantes serviços à República, republicano que sempre foi, democrata que nunca titubeou nas suas atitudes.
Assim, parece-me que não será demais que a Assembleia da República manifeste o seu pesar através de um minuto de silêncio.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar

A Sr.3 Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com a maior tristeza que recebi a notícia do falecimento do Sr. Dr. José Magalhães Godinho, com quem tive a grande honra de trabalhar no serviço do Provedor de Justiça.
Assim, quero associar-me ao voto aqui feito e dizer que sempre reconheci no Dr. Magalhães Godinho não só as mais altas qualidades de inteligência e rectidão, de capacidade e competência, como também as mais raras qualidades de trato humano.
José Magalhães Godinho foi a pessoa com quem mais gostei de trabalhar na minha vida. Permitam-me pois, Srs. Deputados, que deixe nesta Assembleia da República o testemunho de uma admiração ilimitada e de uma grande, grande, amizade.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 CDS-PP não pode ficar indiferente ao falecimento do Dr. José Magalhães Godinho, que foi uma referência democrática dos oposicionistas ao regime deposto em 25 de Abril e levou uma vida consagrada ao amor à Pátria, ao Saber e aos ideais democráticos. José Magalhães Godinho foi um grande profissional do foro, honrando com a sua presença nos tribunais as virtudes que hoje, infelizmente, vão desaparecendo, e também como vice-presidente do Tribunal Constitucional deixou grande nome. Foi um cidadão exemplar.
Certamente que havia poucas afinidades, tirando o denominador comum da democracia e da liberdade, entre as suas ideias e as do CDS-PP pois ele era um socialista convicto e nós não o somos. No entanto, de forma nenhuma
quero dizer que não tenhamos tido um trato de grande afectividade, de grande respeito, de grande amizade. E eu, que o conheci e com ele tive trato pessoal, ainda mais sinto a sua falta.
Deste modo, a minha bancada associa-se ao pesar que hoje é manifestado por esta Câmara.

(0 Orador reviu.)

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

0 Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, quero manifestar a profunda tristeza com que tomámos conhecimento do falecimento do Dr. José Magalhães Godinho. Naturalmente, associamo-nos ao sentimento expresso pelos vários grupos parlamentares e consideramos plenamente justificado que, perante o falecimento desta grande figura da democracia portuguesa, a Assembleia da República faça um minuto de silêncio.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Morreu um amigo de todos nós e, por isso, associo-me às palavras de tristeza já pronunciadas.
José Magalhães Godinho era uma grande figura de lutador anti-fascista e de democrata, sendo a sua morte uma grande perda para o País.
Creio, Sr. Presidente, que a Assembleia da República, para além desta homenagem singela que vamos fazer agora, deve ponderar uma homenagem pública, sentida e solene, a ser organizada por V. Ex.ª com a concordância de todos os grupos parlamentares.

(0 Orador reviu.)

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de pedir o cumprimento da proposta feita pelo Sr. Deputado Raúl Rego, permitam-me também que, pessoalmente e em nome da Mesa, me associe a esta expressão de pesar pelo falecimento de José Magalhães Godinho.
Tive a honra de trabalhar com ele no primeiro órgão que tratou de estudar e organizar o sistema eleitoral aplicado à Assembleia Constituinte e que, ao fim e ao cabo, se mantém em vigor nos seus traços essenciais. Também mantive um trato próprio com o Sr. Dr. José Magalhães Godinho na área das colaborações jurídicas ocasionais em tempos anteriores mas aí, nesse primeiro contacto, pude aperceber-me da excelência do seu carácter, da delicadeza com que tratava as pessoas e de uma pureza interior admirável. Nunca vi aquele homem fazer raciocínios calculistas sobre o que quer que fosse. Vi-o dar-se às coisas, às ideias, aos seus valores, por si, numa total oblação pelos ideais por que se movia. Esta é aquela mensagem que Magalhães Godinho me deixou nesse primeiro contacto no âmbito da política, tendo-o depois visto realizar persistentemente uma acção destinada a mostrar isso mesmo. Até o modo como soube sair na hora própria quando já não podia servir as causas com aquela grandeza que ele suponha dever pôr nelas, bem como o modo como soube sair dos cargos que deteve. Associo-me, pois, nesta singela homenagem a uma figura de grande democrata e de grande cidadão de Portugal.

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0 Governo associa-se também às palavras da Mesa segundo informação entretanto aqui recebida.
Peço à Câmara que guarde um minuto de silêncio em memória de José Magalhães Godinho.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos passar à última pergunta ao Governo, que é dirigida ao Ministério das Finanças, sobre a situação e problemas da integração dos trabalhadores da Função Pública de Macau. A pergunta é formulada pelo Grupo Parlamentar do Partido do Centro Democrático Social, CDS-PP.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier, dispondo de três minutos.

0 Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Orçamento: 0 calendário do processo a que vai ser sujeito o Tenit6rio de Macau coloca, como é sabido, alguns problemas, muitos até, em relação aos portugueses que aí residem, sendo um deles seguramente o do futuro dos funcionários e agentes dos serviços públicos de Macau.
Os observadores mais atentos desses problemas - que, embora sejam longínquos e porventura não representem um grande universo eleitoral, são, no entanto, problemas delicados e sensíveis do trajecto de Portugal no mundo - sabem que existe entre esses funcionários e agentes dos serviços públicos de Macau uma grande agitação, um grande descontentamento e uma sensação de abandono que é repetidamente comunicada em público nos mais diversos locais.
Falam mesmo nos riscos de um processo semelhante ao da descolonização, do ponto de vista dos efeitos sobre os cidadãos portugueses. E há queixas sobre a falta de abertura do Governo português para ouvir as suas razões.
No CDS-PP não temos por hábito acolher as reivindicações de quem quer que seja ou de dar guarida aos desejos e às vontades de todas as insatisfações que andam pelo País, mas reconhecemos aos funcionários e agentes dos serviços públicos de Macau razões bastantes para o seu protesto e para o seu desencanto.
Com efeito, a integração desses funcionários nos serviços da República Portuguesa está regulada em termos que merecem alguns reparos. A sua previsão normativa consta do Decreto-Lei n.º 357193, de 14 de Outubro, que reconhece o direito à integração nos serviços da República Portuguesa ao pessoal dos serviços públicos desse Território desde que sejam cidadãos portugueses e exclui o direito à integração para, entre outros casos, por exemplo, aqueles que não tenham um grau de conhecimento do Português equivalente ao 6.º ano de escolaridade.
Primeiro reparo, Sr. Secretário de Estado: por que é que estes portugueses, que puderam ser funcionários em Macau, com este nível de escolaridade, são agora excluídos do processo de integração? Como é que é possível explicar a estes portugueses que trabalharam no serviço público de Macau que são bons para Macau e não são bons para a República Portuguesa?
A segunda questão é a seguinte: com base na regulamentação desse processo de integração, quem tem menos de l 5 anos ao serviço de Macau não tem direito a qualquer compensação, a nenhuma protecção, a nenhum sistema de guarida, pelo que desejava saber das razões porque é assim. Por que é que existe esta situação?
Em terceiro lugar, quero dizer-lhe que também não se percebe por que é que o sistema de integração, regulado

nos diplomas que referi, é tão exigente em matéria de anos de serviço relativamente àqueles que querem optar pela antecipação da aposentação. A exigência de 15 anos, no mínimo, para que se tenha direito a qualquer indemnização, constitui uma violência para quem percebe que aqueles cidadãos portugueses prestaram durante muito tempo um serviço à comunidade portuguesa.

0 Sr. Carlos Luís (PS): - Muito bem!

0 Orador: - E depois, Sr. Secretário de Estado, para abreviar - vou terminar, Sr. Presidente -, há também um descontentamento evidente em relação ao prazo previsto para exercer o seu direito de opção. Esses funcionários dispõem do prazo de um ano para tomarem uma decisão tão importante nas suas vidas, como a de saber se ficam em Macau, se vêm para Portugal e são integrados, se escolhem a aposentação antecipada ou se escolhem uma indemnização pela sua saída relativa ao tempo que passaram ao serviço de Macau. Este ano é muito pouco tempo para uma decisão tão grave. Haveria, talvez, a possibilidade de alargar este prazo... Mas voltarei depois ao tema.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, por um período de tempo não superior a três minutos.

0 Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Norberto Sequeira da Rosa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 CDS-PP interrogou o Governo sobre a situação dos cidadãos portugueses que trabalham nos serviços públicos de Macau, tendo em conta o estabelecimento da região Administrativa Especial.
Tenho o maior gosto em responder a esta questão, já que o Governo vai garantir plenamente o futuro desses cidadãos.
Com efeito, a política a prosseguir neste domínio tem de garantir esse futuro e, simultaneamente, os interesses da Administração do Território e da Administração da República.
Com esta finalidade, já foi publicada legislação adequada, a qual prevê a possibilidade de os funcionários e agentes da Administração do Território optarem pela integração nos quadros da Administração da República ou pela aplicação de medidas de descongestionamento - aposentação antecipada a cargo da Caixa Geral de Aposentações ou desvinculação mediante indemnização pecuniária.
A opção pelas medidas de descongestionamento poderá efectivar-se se os interessados tiverem 15 ou mais anos de serviço em 19 de Dezembro de 1999. Todos os restantes funcionários podem optar pela integração na Administração Pública da República Portuguesa.
A integração nos quadros pressupõe que a legislação já publicada seja regulamentada no que respeita às condições concretas dessa integração, designadamente a equivalência entre as respectivas categorias funcionais.
Já está publicada a regulamentação referente ao pessoal militarizado e do corpo de bombeiros das forças de segurança.
Prevê-se a publicação até ao final de Maio próximo da regulamentação respeitante ao pessoal civil, com as respectivas equivalências entre categorias.
Trabalham no território cerca de 6000 funcionários e agentes, em condições de serem abrangidos pela legislação publicada, 2700 dos quais pertencentes às forças de segurança.
Do total dos 6000 funcionários, cerca de 2000 poderão optar pelas medidas de descongestionamento.

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Os 2700 funcionários e agentes das forças de segurança já têm a sua situação inteiramente definida e os restantes terão a situação definida até final de Maio.
Resta acrescentar que o carácter aliciante das medidas de descongestionamento faz prever que uma parte significativa dos interessados optará por essa alternativa.
Deste modo, será assegurada a situação do pessoal em causa sem sobressaltos e sem perturbação na Administração da República e do Território de Macau.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

0 Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, realmente, não fiquei totalmente satisfeito com a sua resposta, porque o senhor deu-me uma indicação sobre o conteúdo dos diplomas - o que, admita-o, conheço razoavelmente -, e eu referi-me às escolhas dos diplomas, às suas soluções. De facto, o que questionei foram as soluções dos diplomas.
0 Sr. Secretário de Estado disse, a certa altura do seu discurso, que, quem quiser, poderá ser integrado. Ora, fiz-lhe uma pergunta concreta - e este é apenas um, no pouco tempo de que dispomos, dos problemas de que se queixam os funcionários de Macau - relacionada com o facto de poder ter sido funcionário de Macau um português que não tivesse o 6.º ano de escolaridade e que agora, segundo o Decreto-Lei n.º 357193, de 14 de Outubro, esse mesmo português já não tem direito à integração no serviço da República. Pergunto-lhe: porquê? Estará na base deste decreto-lei a ideia de que há funcionários que valem para Macau mas que não são suficientemente formados para o serviço da República? É uma ideia, porventura, de discriminação de territórios? Como é que se explica esta solução? Este é o primeiro aspecto que pretendia entender.
Depois, o Sr. Secretário de Estado disse que as situações estavam em vias de ser resolvidas. Lamento dizer-lho, Sr. Secretário de Estado, mas, muito antes de V. Ex.3 ter assumido esta pasta, contactei frequentemente esses funcionários e eles não são, de modo nenhum, da mesma opinião! 0 Sr. Secretário de Estado falou-me em números. Também conheço esses números, mas constato que esses funcionários estão descontentes por acharem que o prazo é curto, por se sentirem muito pressionados e por estarem em causa-opções de vida que os marcam profundamente para todo o sempre. Assim, eles necessitam não só de mais tempo para pensar como também de ser ouvidos mais vezes pelo Governo relativamente às críticas que querem apresentar.
De facto, esses funcionários elaboraram um dossier de alternativas e de soluções e pretendem discuti-las, pelo gostariam de ser recebidos de uma forma mais aberta e ouvidos de um modo mais concreto pelo Governo. Porém, não têm tido essa possibilidade, talvez por serem poucos e corresponderem a um universo muito pequeno.
Na realidade, o clima não é bom. Para estes portugueses trata-se de uma mudança de vida drástica, porque não estamos a falar de deslocações em espaços próximos, em Estados vizinhos, mas, sim, de situações geradoras de uma mudança de vida drástica em relação a pessoas que prestaram serviço a Portugal, seja qual for o tempo em que o fizeram.
Assim sendo, Sr. Secretário de Estado, o que critiquei foram as soluções concretas, pedindo-lhe que as explicasse. A saber: a) Porquê a exigência de 15 anos de serviço para a compensação? b) Porquê a exigência do 6.º ano de

escolaridade? c) Porquê um ano, porquê esta pressão, ainda que se saiba, obviamente, que o prazo não pode ser muito alargado, face aos compromissos internacionais que existem?

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

0 Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, quero cumprimentar a bancada parlamentar do CDS-PP por ter trazido a esta Câmara um problema que é grave e que tenho acompanhado de perto, porque também eu fui funcionário da administração pública de Macau. De facto, tenho acompanhado, na medida do possível, as legítimas aspirações e preocupações dos milhares de portugueses que residem em Macau.
Tendo o Sr. Deputado António Lobo Xavier focado o Decreto-Lei n.º 357193, de l4 de Outubro, é necessário salientar que a mais representativa associação dos funcionários públicos de Macau, a APFPM (Associação Portuguesa dos Funcionários Públicos de Macau) não foi consultada e teve apenas cinco dias úteis para se pronunciar.
É evidente que reina uma ansiedade muito grande e uma preocupação permanente relativamente à integração dos funcionários nos quadros da República. Por outro lado, é óbvio que a legislação relativa à Função Pública de Macau é completamente diferente da dos quadros da República e os três pontos, já citados, constantes do Decreto-Lei n.º 357/93, são, de facto, muito redutores relativamente à possibilidade de os funcionários terem direito de opção. Verifica-se, no que diz respeito à exigência dos l5 anos de serviço na Função Pública, que, em 1999, muitos dos funcionários não terão completado esse tempo, pelo que, desde logo, não poderão optar por qualquer das três hipóteses previstas.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir, Sr. Deputado.

0 Orador: - Concluo, já, Sr. Presidente.
Nesse sentido, Sr. Secretário de Estado, pergunto-lhe: o Governo encara a hipótese de conceder uma maior dilatação do prazo ou não pretende reconsiderar, digamos, a legislação em vigor, isto é, o Decreto-Lei n.º 357193, de 14 de Outubro?

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.

0 Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, neste pouco tempo de que disponho - mas que, apesar de tudo, em termos relativos, consegue ser superior à actualização salarial com que o Governo "brindou" os trabalhadores da administração pública -, não quero deixar de manifestar as nossas preocupações quanto ao futuro dos funcionários e agentes de Macau.
Para além das questões muito concretas colocadas pelo Sr. Deputado António Lobo Xavier, nomeadamente quanto ao prazo de opção, gostaria de lembrar que estamos a tratar do futuro de milhares de funcionários, para quem este prazo de um ano para decidir da sua vida é, de facto, extremamente escasso.

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Por outro lado, gostaria de saber o que o Governo tenciona fazer relativamente àqueles que optem, embora no quadro restritivo do Decreto-Lei n.º 357193, pela integração efectiva nos quadros da Administração da República. E que se vamos por via do QEI (Quadro de Efectivos Interdepartamentais), gerido pela DGAP (Direcção-Geral da Administração Pública), as minhas preocupações avolumam-se, porque essa gestão de efectivos tem sido extremamente desastrosa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, muito rapidamente, quero expressar aqui o meu apreço, porque também tive algum conhecimento do modo como este processo tem sido tratado, pela maneira extremamente eficaz e brilhante com que o Governo da República tem articulado com as autoridades de Macau e com as outras entidades que detêm a superintendência do Território, uma matéria que é extremamente sensível, de modo a que a transferência de poderes da administração portuguesa para a República Popular da China se faça sem sobressaltos, com qualidade e, ao mesmo tempo, garantindo a todos aqueles que trabalham em Macau várias hipóteses de solução profissional, de um modo que, percebo, é excepcional, porque não se pode tratar o caso destes funcionários como o de outros, pois muitos deles não são, ou
são-no dificilmente, recicláveis para a administração portuguesa e, naturalmente, poderão querer seguir outras vias, que não as da Função Pública.
Em minha opinião, garantido o financiamento - que, julgo, está-o - das diversas soluções que se visualizam, pode garantir-se também aos funcionários quer aos "fardados" (a expressão não é tecnicamente correcta, mas VV. Ex.ªs percebem ao que me refiro) quer aos outros, várias soluções, de maneira que, no momento em que se dê a transição da administração do Território para a República Popular da China, quem quiser fica lá a trabalhar, quem quiser vem para a Europa, concretamente para Portugal, e quem quiser vai para outro sítio, tendo todos uma garantia de financiamento e não sendo, assim, muito afectados nem o seu nível de vida nem o seu equilíbrio social.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, tem de concluir, porque já utilizou o dobro do tempo de que dispunha.

0 Orador: - Sr. Presidente, vou concluir, com a seguinte pergunta: todos estes esforços estão a ser feitos em articulação com o Governador do Território?

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

0 Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, Srs. Deputados, tentarei ser preciso e dar respostas concretas às perguntas que me foram feitas.
Em primeiro lugar, gostaria de clarificar, pois penso haver dúvidas quanto a isso, que todos os funcionários e agentes da Administração do Território de Macau com menos de 15 anos de serviço em 1999 têm direito a ser integrados na Administração Pública portuguesa, estando garantidos todos os seus direitos.

Quanto à questão de como será feita essa integração, o Sr. Deputado Paulo Trindade disse que seriam integrados no Quadro de Excedentes Interdepartamentais (QEI), mas devo dizer que essa não é a primeira opção. A opção primeira será a sua integração nos serviços congéneres de Macau e só em último caso, não havendo possibilidade de ser feita essa integração, é que serão integrados no QEI, mas com a ressalva de, durante o primeiro ano, terem direito a l00 % do seu vencimento.
Uma outra questão que o Sr. Deputado colocou tem a ver com a exigência do conhecimento da língua portuguesa. Penso que a questão que se coloca não é a da necessidade de esses funcionários terem o 6.º ano de escolaridade, mas um conhecimento da língua portuguesa equivalente ao 6.º ano de escolaridade, pois, como é natural, para que sejam integrados na Administração Pública portuguesa é necessário que tenham o mínimo conhecimento da língua portuguesa, pois, de outro modo, essa integração seria impensável. Daí que, durante este período que decorre até 1999, mesmo aqueles funcionários que porventura não tenham esse conhecimento, poderão adquiri-lo, sendo garantida a sua integração plena na Administração Pública portuguesa.
Quanto ao período de decisão, é evidente que se pode sempre dizer que ele é curto ou longo, mas temos de salientar que a passagem da administração do Território de Macau para a China se realizará em l999 e que os trabalhadores e funcionários do Território de Macau têm direito a optar até Maio de 1995 - é, portanto, um prazo superior a um ano, porque decorre até 90 dias após a entrada em vigor do diploma, ou seja, como disse, até Maio de l995.
Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado Rui Carp, é evidente que todo este processo tem sido feito em articulação com o Governo de Macau. Tem havido uma cooperação entre o Governo de Macau e os Ministérios das Finanças, da Administração Interna e da Defesa - tem havido uma cooperação e uma articulação perfeita entre os serviços. Naturalmente, que não caberá ao Governo da República ouvir os trabalhadores da Administração do Território de Macau, mas o Sr. Governador de Macau tem ouvido esses trabalhadores e as medidas que foram tomadas tiveram em consideração as aspirações que estes manifestaram.
Julgo ter respondido cabalmente às perguntas que me foram colocadas e que penso terem sido oportunas para tornar este processo mais claro e informar a opinião pública sobre uma questão em que o Governo está empenhado e que julga fundamental, no sentido de garantir o direito dos funcionários e agentes da Administração do Território de Macau, que tão bem defenderam o nome de Portugal nessa zona bastante longínqua.

0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, terminámos o período da ordem do dia. Como sabem, as próximas segunda e terça-feira são destinadas a reuniões de Comissões, havendo, depois, um pequeno período de férias para os festejos da Páscoa. A próxima sessão plenária será no dia 6 de Abril, quarta-feira, em que terá lugar, no período de antes da ordem do dia, um debate de urgência, a pedido do Grupo Parlamentar do PS, sobre o tema "A situação no Vale do Ave". No período da ordem do dia, procederemos à discussão do projecto de deliberação n.º 12/VI - Constituição de uma Comissão Eventual para a avaliação e análise da actual situação no Vale do Ave (PCP) e do Relatório do SIS relativo a 1992 e à apreciação do Relatório da Comis-

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são de Inquérito Parlamentar n.º 3/VI - Sobre a utilização das verbas concedidas, de l988 a 1989, pelo Fundo Social Europeu e Orçamento do Estado para cursos de formação profissional promovidos pela UGT. Srs. Deputados, para todos uma boa Páscoa. Está terminada a sessão.

Eram 12 horas e 35 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Maria Pereira. António Paulo Martins Pereira Coelho. Carlos Alberto Pinto. Carlos de Almeida Figueiredo. Fernando Carlos Branco Marques de Andrade. Guido Orlando de Freitas Rodrigues. João Alberto Granja dos Santos Silva. José Albino da Silva Peneda. José Álvaro Machado Pacheco Pereira. José Augusto Santos da Silva Marques. José Fortunato Freitas Costa Leite. Luís António Carrilho da Cunha. Manuel Maria Moreira. Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva Pedro Augusto Cunha Pinto.

Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vítor Pereira Crespo

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho. António de Almeida Santos António José Martins Seguro. António Luís Santos da Costa. António Manuel de Oliveira Guterres. Carlos Cardoso Lage. Elisa Maria Ramos Damião. Jaime José Matos da Gama. José Alberto Rebelo dos Reís Lamego. José Manuel Santos de Magalhães. Luís Filipe Marques Amado. Luís Filipe Nascimento Madeira. Manuel Alegre de Melo Duarte. Manuel António dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas. João António Gonçalves do Amaral.

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