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1976 I SÉRIE - NÚMERO 60

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, se eu não estivesse estado preso pela PIDE, se não tivesse sido brutalmente espancado, se não tivesse sido torturado, eu não tomava a palavra neste momento.
Tomo a palavra por esse facto; por um apelo irreprimível do fundo do meu ser em não participar em mistificações, pelo mesmo apelo que me fez mover contra a Ditadura e suportar, sem trair, as atrocidades da PIDE.
Não suporto a mistificação! Não é suportável a mistificação em nome da liberdade, da dignidade e da Democracia! A liberdade não pode ser fraccionada. A dignidade do Homem não pode ser fraccionada. É insuportável a mistificação que a tente dividir. É por isso que tomo a palavra.
Nunca fui movido por ressentimentos relativamente a ninguém. Fui movido por ideias e pela coragem de travar um combate político.
Sr. Deputado Manuel Alegre, é evidente que os crimes da PIDE são insuportáveis e, infelizmente, nem todos conseguiram a coragem para os suportar, mas mais insuportáveis são as ditaduras que se apoiam nas polícias políticas. Ou será que alguém nos quer convencer que há ditadores contrariados? Será que alguém nos quer convencer que se as ditaduras tivessem boas polícias seriam mais suportáveis? Alguém nos quer convencer que estava distraído e que sendo responsável não o era?
É contra isto, Sr. Deputado Manuel Alegre, que tomo, neste momento, a palavra, porque a mistificação vai longe demais. Não é apenas a mistificação dos ignorantes e dos oportunistas de última hora, que ainda depois do 25 de Abril nos estavam a colocar e ao País perante o perigo de uma nova ditadura, são os oportunistas comerciais, é gente de pouco carácter, mas são muitos outros, inclusivamente, aqueles que brandem, de uma forma, a meu ver, inadequada, o estandarte, que precisa de boa explicação, que é o do antifascismo.
Sr. Deputado, não há perseguições políticas boas e más. Eu levantei-me contra as perseguições políticas da Ditadura como me levantei contra as do pós 25 de Abril. Contra ambas me levanto e me levantarei sempre!
0 Sr. Deputado invocou a condenação, ontem, a prisão perpétua do francês Touvier, colaboracionista com a Alemanha nazi. Mas, Sr. Deputado, a justiça francesa seria hipócrita e vil se antes não tivesse condenado à morte e, depois - pena essa comutada em prisão perpétua-, o principal responsável da República Francesa de Vichy. Seria uma vergonha condenar um contínuo e absolver o seu chefe.
Sr. Deputado, se não fosse isto, eu não tomaria hoje aqui a palavra.
É uma vergonha! É por isso que tomo a palavra e digo que é uma vergonha. Será que os culpados da Ditadura foram os contínuos?
Sr. Deputado Manuel Alegre, repito, a liberdade não se divide. A dignidade do Homem não sofre, não pode suportar discriminações. A liberdade não tem donos. A liberdade que queremos é a liberdade sem fronteiras e a dignidade do Homem não tem limitações.
A melhor forma de tomar a palavra para desmistificar esse incidente com um ex-PIDE desavergonhado é a de pôr a claro quem é, de facto, o responsável, quem são os responsáveis: os contínuos ou os seus dirigentes?

0 Sr. José Magalhães (PS): - São todos!

0 Orador: - Exacto, Sr. Deputado! É por isso que não é bom ou útil, até para a própria pedagogia cívica das novas gerações, criar a ideia de que pode haver ditaduras sem polícias más. Não há!
Por isso, Sr. Deputado, esse embuste e essa fraqueza de certos defensores da Democracia não tem sido uma forma de a consolidar, mas uma forma de a mistificar e enfraquecer.
Sr. Deputado, se não fosse por este apelo profundo de revolta contra uma mistificação inaceitável, eu não tomaria a palavra.
0 exemplo francês que o senhor invocou é bem a lição que podemos aplicar ao caso concreto. Se os contínuos merecem a nossa reprovação, não podemos desculpar os que mandaram nos contínuos! Porque os «pides», sim, Sr. Deputado, esses foram instrumentos dos ditadores! Ou o Sr. Deputado admite que há ditadores com boas polícias? Devo dizer que uma das razões por que pertenço ao PSD está por trás do debate que estamos a travar.
É que depois do 25 de Abril foi o meu partido e os partidos à direita do meu que reivindicaram imediatamente a realização de eleições, enquanto que a esquerda estava ainda ocupada com o esclarecimento do povo! Sr. Deputado, afinal de contas, não me enganei! Fiz bem em aderir ao PSD!

Aplausos do PSD, de pé.

0 Sr. Presidente (Adriano Moreira): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Deputado Silva Marques, estou muito à-vontade para lhe responder: tal como o senhor, eu estive preso, fui torturado e não traí. Participei em todos os combates pela liberdade, antes e depois do 25 de Abril, e não me transformei de perseguido em perseguidor.

Aplausos do PS e do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

0 Orador: - Penso que uma matéria desta natureza é incompatível com a chicana, com aproveitamentos políticos e devo dizer que não compreendo o sentido do seu discurso. Assim, pergunto-me se a mistificação não vem do sentido equívoco do seu discurso!

Vozes do PS: - 15so é verdade!

0 Orador: - Porque, em matéria desta natureza, uma pessoa com a responsabilidade do Sr. Deputado, que foi um antifascista, que passou por aquilo que passou, tem responsabilidades políticas. E tem responsabilidades de pedagogia! As intervenções nesta matéria devem ser para somar e não para dividir, Sr. Deputado.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Na minha intervenção, falei dos responsáveis, dos ministros, dos agentes e dos cúmplices. Quando fazemos o julgamento da PIDE não estamos a absolver a responsabilidade política dos ditadores. 0 meu combate foi contra o sistema político, foi contra a ditadura, contra os seus principais responsáveis. E, se eles foram absolvidos, não foi com a minha cumplicidade nem com a minha benevolência.

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