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Sábado, 29 de Outubro de 1994 I Série - Número

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 28 DE OUTUBRO DE 1994

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário de Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberta a reunião às 10 horas e 25 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n º 451/VI.
Foram aprovados os n.ºs 93 a 97 do Diário.
Em sessão de perguntas ao Governo, usaram da palavra, além do Sr Ministro da Indústria e Energia {Mira Amaral) e dos Srs. Secretários de Estado do Ambiente e do Consumidor (Joaquim Poças Martins), da Energia (Luís Conceição Pereira) e dai Comunidades Portuguesas (Luís Macedo), os Srs Deputados Narana Coissoró (CDS-PP), Ferro Rodrigues (PS), José Manuel Maia (PCP), Joel Hasse Ferreira, Joaquim da Silva Pinto, António Crisóstomo Teixeira e Miranda Calha (PS), Lino de Carvalho (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), João Rui de Almeida e Elisa Damião (PS), Rui Carp (PSD), Joel Hasse Ferreira e Caio Roque (PS), Carlos Miguel Oliveira (PSD), Paulo Trindade (PCP), Pereira Lopes (PSD), Fernando Pereira Marques e Carlos Luís (PS) e Paulo Pereira Coelho e Rui Gomes Silva (PSD).
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 30 minutos

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Aderido Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Américo de Sequeira.
António Augusto Fidalgo.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António Esteves Morgado.
António Fernando Couto dos Santos.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Ema Mana Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Leis António Carrilho da Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António Luís Santos da Costa.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Elisa Mana Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Cosia
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.

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João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP).

Adriano José Alves Moreira.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar o diploma que deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 451/VI - Aprova medidas tendentes à efectivação da administração aberta e à modernização da Administração Pública (PS), que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 93 a 97 do Diário, respeitantes às reuniões da Comissão Permanente dos dias 21 de Julho, 8 e 29 de Setembro e 13 de Outubro, e à reunião plenária do dia 21 de Setembro.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
O segundo ponto do período da ordem do dia compreende, como sabem, uma sessão de perguntas ao Governo.
Pedia, Srs Membros do Governo e Srs. Deputados, a vossa atenção para o seguinte aspecto: na anterior sessão legislativa houve sessões de perguntas ao Governo que correram bem, mas gostaria de recordar, na retoma desta figura regimental, os tempos e a cadência deste processo, pois, o que acontece normalmente é que os oradores excedem o tempo de que dispõem para usar da palavra.
Ora, de acordo com o Regimento, o Deputado dispõe de três minutos para formular a sua pergunta e o membro do Governo do mesmo tempo para responder; terminada a resposta, o Deputado volta a dispor, agora por apenas dois minutos, de tempo para formular uma segunda pergunta ou observação. Depois, quaisquer Srs Deputados podem dispor de um minuto para intervir na matéria. E, por fim - mas só no fim! -, o membro do Governo pode usar da palavra por um período de 10 minutos.
Srs. Deputados, se seguirmos esta marcação, e já algumas vezes a temos seguido, a sessão de perguntas ao Governo torna-se muito mais viva e muito mais parlamentar.
Posto isto, vamos passar à primeira pergunta - sobre a situação actual das obras na Lagoa de Óbidos e defesa da paisagem natural nas suas margens, designadamente quanto à proibição de abate de pinhais tradicionais -, que e dirigida ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulada pelo CDS-PP.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor, em primeiro lugar, quero agradecer a sua disponibilidade, uma vez que a sua presença foi solicitada em tão curto espaço de tempo - a pergunta foi entregue ainda não há dois dias. Contudo, como este assunto da Lagoa de Óbidos já é recorrente, V. Ex.ª poderá, rapidamente, dar uma resposta
Depois da visita da Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais, realizada no ano passado, durante a campanha para as eleições autárquicas, em que foram prometidas obras para a circulação das águas do mar e da lagoa, através da chamada aberta, efectivamente, foram dados alguns passos para a concretização dessa promessa.
Com efeito, ficou a saber-se que iriam ser feitos estudos de impacte ambiental, nomeadamente que seria aberto concurso para uma empreitada ou, pelo menos, iniciados estudos de engenharia marítima para determinar qual o melhor modo para fazer a «aberta», prevenir o assoreamento e restabelecer a livre circulação das águas na Lagoa de Óbidos, porque, volta e meia, a «aberta» fecha, provocando a necessidade de retirar as areias às pazadas, o que se tem prestado a certos negócios, de que muito se tem falado e que estão a ser apreciados pelo Tribunal de Contas.
As populações e, julgo, a própria câmara - faço parte da assembleia municipal e tenho-me informado sobre este assunto - não estão bem seguras daquilo que, efectivamente, se está a passar, no Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, sobre estas obras.
Entretanto, houve a calamidade de, no ano passado, o Inverno ter sido muitíssimo rigoroso, o que fez com que a praia ficasse quase reduzida à sua extensão mínima. Foi preciso colocar um grande paredão para suster as águas das marés e, desse modo, proteger a praia da erosão, obra essa que foi feita com o auxílio do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e, também, com a participação da câmara.
A obra está mais ou menos concluída e teve, efectivamente, efeitos positivos para suster os rigores do Inverno, mas precisa de continuação para que a praia volte à sua extensão normal, como uma das grandes praias portuguesas que é. Todavia, fica-se sempre por saber o que é que se passa com as obras da Lagoa de Óbidos.
Queremos, pois, saber em que estado se encontram os estudos ou as obras - se foram ou não adjudicadas -, o que se pretende fazer e qual é a última, digamos assim, versão do Governo sobre o andamento destas obras.

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Para já, gostava de o ouvir sobre este aspecto. Deixo a segunda parte da questão para os tais dois minutos de que disponho, depois da resposta de V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor (Joaquim Poças Martins): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de responder directamente a esta pergunta sobre a situação na Lagoa de Óbidos, queria recordar que houve uma sessão pública, em Junho de 1994, subordinado ao tema «A Lagoa de Óbidos, presente e futuro», em que um dos participantes afirmou que temia que a lagoa morresse. Creio que face àquilo que foi estudado, que foi feito, se pode dizer que a Lagoa de Óbidos pode sobreviver e é essa a conclusão daquele estudo que o Sr. Deputado Narana Coissoró referiu.
Aliás, gostaria de referir que a Lagoa de Óbidos é um exemplo entre outros, felizmente numerosos, em que foi possível identificar problemas criados ao longo de décadas, fazer os estudos, obter o financiamento, fazer a coordenação dos vários actores intervenientes e iniciar as obras. Como o Sr. Deputado Narana Coissoró referiu, algumas dessas obras de emergência foram feitas, foram boas obras e temos uma solução global à vista.
Assim, passo a dar-lhe o ponto da situação deste assunto. Foi feito um estudo de impacte ambiental que procurava dar resposta essencialmente aos problemas do assoreamento e da poluição. No que diz respeito ao assoreamento esse problema era de duas origens: proveniente do mar e dos rios que desaguam na Lagoa de Óbidos.
Havia várias soluções apontadas: uma que correspondia a fixar a barra com obras - chamadas obras duras - e outra que correspondia a fazer dragagens periódicas. Havia inclusivamente - e eu recordo-me disso por ter estado nesta Assembleia em Janeiro para falar sobre este assunto - quem tivesse tentações para fazer o desenho desta obra a traço grosso, ou seja, a bulldozer, isto é, como já havia estudos a mais o que era necessário era fazer entrar os bulldozer. Felizmente não se fez isso, pois o estudo de impacte ambiental mostrou que teria sido um desastre.
Com efeito, a solução de fixar a barra, de acordo com os elementos recentes que temos, seria totalmente desadequada. Se se abrisse definitivamente a barra entrariam, por ano, provenientes do mar, cerca de 500 000 metros cúbicos de sedimentos, enquanto que a barra só teria capacidade de expulsar, de repulsar, metade. Portanto, a abertura definitiva da barra correspondia à morte, a curtíssimo prazo, da Lagoa de Óbidos. Mas havia muita gente ou havia alguém que propunha isso!
Nesta Primavera/Verão foram gastos cerca de 40 000 contos em obras de emergência, que corresponderam a algumas dragagens e à construção de um molhe submerso transversal, sem impactes ambientais negativos. E a indicação que tenho é a de que funcionou O estudo aponta para que se consolide essa solução mista entre algumas construções e dragagens, o que irá agora ser discutido.
Outro aspecto relacionado com a lagoa é o problema da poluição. Uma boa parte dos sedimentos da lagoa são oriundos dos rios, mas esse problema está também enquadrado em termos técnicos e financeiros e vai ser resolvido no prazo de alguns anos - esse é um problema um pouco mais demorado -, estando em curso acções das câmaras, e outras, a serem desenvolvidas pelas indústrias. A Direcção
Regional do Ambiente tem estado a contactar as várias entidades e em, termos de financiamento, o Fundo de Coesão ajudará a pagar as obras que dizem respeito à protecção da lagoa em si e as restantes serão canalizadas para os planos operacionais regionais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para a pergunta complementar, o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Secretário de Estado, agradeço a resposta mas, pelo que vejo, por enquanto continua tudo nebuloso e vago. Isto é, tem que se falar com as entidades..., é preciso fazer estudos..., tudo vai levar algum tempo, etc., etc.
Ora, já são passados mais de 12 ou 14 anos desde a primeira dragagem, que foi feita no tempo da AD, quando o Primeiro-Ministro era o Dr. Pinto Balsemão e Ministro das Obras Públicas João Porto, e tudo continua mais ou menos na mesma a não ser o molhe e estes estudos de impacte ambiental. Vamos lá ver se, com estes dinheiros e o novo dinamismo que a Ministra do Ambiente e Recursos Naturais quer imprimir nesta área, estes estudos são feitos com mais presteza e se realmente vamos ter uma solução para a Lagoa de Óbidos.
O outro problema que estava na minha pergunta, e que podia ser agora tratado, é sobre a protecção da natureza das duas margens porque a maior das urbanizações que aí vêem sendo feitas sacrificam a arborização existente e aumentam a poluição por causa dos esgotos. Ora, sem a preservação da natureza a Lagoa de Óbidos também virá a sofrer natural desgaste e quanto mais urbanizações e mais «algarvisação» houver pior será para as duas margens da lagoa.
Nesse sentido, eu gostava de saber, embora saiba que isto não depende exclusivamente do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, se não haveria possibilidade de emitir qualquer legislação para que aquela área tivesse um estatuto semelhante ao de área de paisagem protegida, restringindo-se a destruição das manchas florestais, principalmente dos pinheiros, isto é, que estes apenas pudessem ser cortados para implantação de casas que se enquadrassem na paisagem natural e não para as urbanizações desordenadas e especulativas.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor: - O Sr. Deputado Narana Coissoró considerou vaga a minha resposta mas, se isto é ser vago.... Acabei de lhe dizer que temos a solução e que vamos pagá-la! Não estou a ver que possa ser muito mais claro! Se isto é ser vago...
Estamos aqui a falar de uma zona lindíssima, duma zona que teremos que manter protegida especialmente nas suas margens. O perímetro da lagoa é de cerca de cinco quilómetros e a indicação que tenho é a de que, a sul e a norte, há algumas urbanizações consolidadas de algumas centenas de metros e que contribuíram, elas sim, para cortes de árvores naquela zona. No entanto, há legislação sobre o assunto e concretamente houve indicações para que não houvesse construções na faixa de 200 metros da lagoa. As únicas excepções foram devidas a alvarás anteriormente concedidos e devidamente identificados.
Mesmo assim, na primeira faixa de 100 metros, dessa faixa de cerca de 500 a 700 metros de perímetro, foi conseguido

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que nada se construísse e que, na parte restante, algumas das construções consideradas inevitáveis fossem feitas com o mínimo de corte de árvores. Foram essas as indicações que foram dadas.
Para além disso, quero referir que está em curso O estudo global de reordenamento que dará origem às abras consequentes, uma vez que, neste momento, o acesso à lagoa é razoavelmente indiscriminado - qualquer pessoa tem acesso a qualquer local da lagoa. Vamos, portanto, fazer obras que consistem essencialmente em restringir o acesso a alguns locais e providenciar parques de estacionamento - no fundo, coordenar a utilização da lagoa.
Para finalizar, devo dizer que se proeurou conter a urbanização existente, restringir-se aquela que estaria a emergir, resolvendo-se, portanto, o problema do acesso e da utilização no perímetro da Lagoa de Óbidos num prazo curto.
Todos estes aspectos, para além de estudados, estão com um financiamento garantido, pois são obras que estão contempladas no Fundo de Coesão.
O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a segunda pergunta, que vai ser formulada pelo PS, é dirigida ao Ministério da Indústria e Energia e incide sobre o tema «Perspectivas do Projecto Auto-europa (Ford/Wolkswagen): participação nacional no valor acrescentado; relevância da indústria nacional de componentes no processo produtivo; contributo esperado para o crescimento económico e para o aumento das exportações em 1995».
Para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Ministro da Indústria, é sempre um prazer tê-lo aqui connosco para podermos aprofundar algumas questões concretas sobre a indústria portuguesa, embora, infelizmente, ainda não seja desta que podemos dizer que já passou a quebra pronunciada da produção industrial e a crise em que a nossa indústria tem estado mergulhada...!
Como o Sr. Ministro da Indústria e Energia sabe, tem havido uma mudança de paradigma em relação à importância estratégica do investimento estrangeiro. Com a internacionalização, com a modernização tecnológica, com os problemas de desemprego, em geral, aquilo que é hoje verdade, tanto nos Estados Unidos como na Europa, a caminho da moeda única, como em Portugal, é que mais importante do que o valor exportado é o valor acrescentado exportado; que mais importante do que o efeito líquido sobre a balança comercial que o investimento estrangeiro proporciona é o efeito multiplicador sobre o emprego em qualidade (qualificação), em quantidade e também em intensidade tecnológica do investimento.
Por outro lado, tão importante como isto é a importância, sob o ângulo da fixação no país destino do investimento, neste caso, em Portugal, do próprio valor acrescentado criado.
Assim, o tema proposto envolve várias questões no que se refere à empresa Auto-europa, ao chamado projecto Ford/Wolkswagen: como é explicitado, a parte nacional no valor acrescentado, no sentido de se saber qual é a importância relativa do valor acrescentado que será fixado nacionalmente, não apenas em salários mas também em impostos e noutras partes do excedente - o directa e o indirectamente gerado; a importância dos lucros reinvestidos; mas, também, além disto, a importância do valor acrescentado nacional na produção, o que se liga com o tema, da relevância da indústria nacional de componentes no processo produtivo; o contributo esperado para o aumento das exportações e do produto, para já, em 1995 e depois de ser atingida a «velocidade de cruzeiro» nos anos subsequentes.
Tudo isto são questões globais que nos parecem de extrema importância.
Para além disso, há algumas questões mais concretas e imediatas, colocadas, aliás, porque, nos últimos tempos, têm surgido algumas afirmações públicas de preocupação por parte dos industriais de vários sectores sobre os efeitos multiplicadores do projecto.
Portanto, passaria a colocar algumas dessas questões concretas, para além das que estão enunciadas. Em primeiro lugar, qual é a verdadeira importância relativa do investimento privado, no conjunto do investimento proporcionado também pelos apoios comunitários e pelos apoios nacionais?
Em segundo lugar, que análise é que o Governo faz das questões que são colocadas por vários industriais portugueses, fornecedores ou não da Auto-europa, no que diz respeito à frustração de expectativas quanto ao número e à importância dos fornecedores nacionais, pois parece haver apenas cerca de duas dezenas quando, logo no início, se falava em várias centenas?
É que existe a ideia de que são poucos os fornecedores que são totalmente portugueses e que são importantes numericamente os que estão envolvidos num sistema de alianças com fornecedores tradicionais da Ford e da Volkswagen; põe-se a questão da importância desses fornecedores tradicionais situados em Espanha e da possibilidade de o efeito multiplicador do projecto ser, a montante, mais importante para a indústria espanhola do que para a portuguesa; do perigo de acontecer, ao contrário do que aconteceu há anos, com o projecto Renault, não haver qualquer obrigatoriedade de incorporação nacional mínima e, portanto, de as coisas não correrem como estava previsto...

O Sr. Presidente: - Atenção ao tempo, Sr. Deputado!

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, da existência, também, de uma situação de concorrência no futuro, que não estava prevista à partida, nomeadamente o facto de existirem muito mais concorrentes do que se pensava para modelos do mesmo tipo - desde a Chrysler, a Fiat, a Peugeot, a Citroen, a Lancia, a Mitsubishi, a Nissan, a Pontiac, a Opel; a possibilidade ou não de o projecto ter alguma flexibilidade, tendo essa flexibilidade limites, impondo-se mínimos de produção. É ou não verdade que as metas de produção e do emprego previstas inicialmente já foram reduzidas, com implicações para os próprios fornecedores nacionais de componentes, visto que as firmas (algumas delas) ou foram obrigadas a reduzir investimentos ou a limitar a importação de Espanha, ficando-se numa lógica meramente comercial? Em suma, o risco deste projecto Ford/WoIkswagen não acabará por ser pesado, sobretudo, para o País?
O que é que se pode fazer se o mercado tornar o projecto menos rendível? Que hipóteses de reconversão é que existem?
Desejamos - e estou a dizê-lo com o máximo de sinceridade- que este projecto tenha êxito! Aliás, eu e o Secretário-Geral do PS já tivemos ocasião de visitar a empresa, há alguns meses atrás, e de colocar na própria empresa essas questões, antes mesmo de algumas delas terem sido postas perante a opinião pública.
Agora, é evidente que persistem dúvidas e interrogações. Apesar de sabermos que o Sr. Ministro, de certa

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maneira, «herdou» este projecto, na medida em que não foi o seu principal impulsionador e negociador, o que é um facto é que o Governo português tem de responder perante estes problemas que foram levantados, e não pode responder apenas com as incertezas determinadas pela lógica da economia de mercado, visto que houve aqui um apoio fortíssimo do Estado português, directa ou indirectamente, através dos fundos comunitários.
Portanto, há uma responsabilidade política sobre o futuro deste projecto que o Governo tem de assumir em conjunto e o Sr. Ministro da Indústria em particular.
Fico à espera de ouvir as suas respostas.

O Sr Presidente: - Para responder, tem. a palavra o Sr. Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia (Mira Amaral): - Sr Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Ferro Rodrigues: É com todo o gosto que aqui estou para prestar-lhe alguns esclarecimentos sobre uma matéria da maior relevância para a indústria portuguesa, o chamado projecto Ford/Volkswagen.
Começo por dizer-lhe que estou de acordo com as considerações genéricas sobre a maneira como se deve, hoje em dia, ver os efeitos do investimento estrangeiro, dado que não podemos ver a análise clássica apenas dos impactos macroeconómicos nos efeitos induzidos sobre uma estrutura empresarial num projecto destes.
Os efeitos qualitativos, os efeitos no domínio da formação de recursos humanos e de gestores qualificados são extremamente importantes, sendo, às vezes, difíceis de quantificar a priori. Mas toda essa perspectiva dinâmica é tão importante como aqueles efeitos clássicos macroeconómicos que se quantificam a priori.
Posso dizer-lhe que, em 1 de Setembro de 1994, o projecto encontrava-se realizado a 98 %, conforme a descrição que tenho aqui nesta nota- e que tenho todo o prazer em dar-lhe- e que vou ler sinteticamente. Aliás, dar-vos-ei toda esta informação sobre o estado de avanço do projecto.
A previsão na produção acumulada para 1995 é da ordem das 120 000 viaturas, mas a cadência esperada de 630 viaturas/dia poderá ocorrer ainda em 1995. Nos anos seguintes, e a atingir-se a produção de cruzeiro, chegar-se-á às 830 viaturas/dia, ou seja, 182 600 viaturas/ano.
As 630 viaturas/dia, que se pensa produzir em 1995, serão suportadas por dois turnos, mas a produção de 830 viaturas/dia obrigará a reforçar os dois turnos previstos. Isto é, em suma, espera-se em 1995 ter dois turnos nesta cadência de 630 viaturas/dia.
Quanto ao pessoal, neste momento, os efectivos da unidade são da ordem dos 1900 trabalhadores nacionais e estrangeiros. Com o recrutamento que está em curso, a empresa espera atingir, em 1995, 3000 efectivos.
O seu aumento para valores próximos dos previstos e anunciados em 1991 vai depender da gestão dos turnos e, consequentemente, das necessárias cadências de produção.
Portanto, em termos de pessoal, não estamos ainda naquelas metas anunciadas de empregos directos, mas posso referir-lhe um aspecto extremamente positivo: em termos de empregos indirectos induzidos pelo projecto, no conjunto de investimentos de componentes que vão trabalhar para o projecto, já estão, neste momento, criados do 2678 postos de trabalho, isto num conjunto de empresas que tenho aqui listadas numa nota que tenho todo o gosto em fornecer-lhe.
Quanto ao valor acrescentado nacional, também lhe posso entregar o quadro que aqui tenho, o último quadro a que temos acesso e que contém os seguintes dados: valor médio por país, número de peças e número de fornecedores. É um quadro que mostra a produção em cada país para a Ford/Volkswagen. Em termos de valor, Portugal aparece em primeiro lugar com 46,6 %; em segundo lugar, a Alemanha com 43,53 %, e, em terceiro lugar, a Espanha com 6,6 %.
Portanto, este quadro mostra que, efectivamente, Portugal é o país com maior valor na produção de componentes para o projecto Ford/Volkswagen, seguido naturalmente da Alemanha, que é o país mais ligado à Ford e à Volkswagen, e, em terceiro lugar, do país vizinho, a Espanha.
Portanto, nós conseguimos atingir, graças à acção do IAPMEI e do GAPIN - o gabinete que eu criei para dinamizar a indústria de componentes no sector automóvel -, os valores que nos tínhamos proposto, em termos de valor acrescentado nacional para o Projecto Ford/Volkswagen. Embora não seja em valor mas em número de peças produzidas, posso dizer que Portugal vai produzir 1178 peças para a viatura, a Alemanha 753 peças e a Espanha 563 peças. Este quadro que vou dar-lhe mostra ainda que aqueles receios de que a Espanha se aproveitasse mais do que Portugal do projecto Ford/Volkswagen em termos de produção lá instalada, são infundados e que nós conseguimos, de facto, ter maior produção do que a Espanha nesta matéria Também lhe vou fornecer o conjunto de empresas que estão classificadas como fornecedores da Ford/Volkswagen.
Por outro lado, posso dizer também que, em ano cruzeiro, esperamos que o contributo para as exportações nacionais deste projecto seja cerca de 20 % das exportações nacionais e o valor acrescentado bruto do projecto rondará cerca de l % do produto interno bruto - é 1 % do produto interno bruto em termos de contribuição do projecto para o produto português.
Em termos gerais, Sr. Deputado, é este o ponto da situação neste momento. Tenho todo o gosto em fornecer-lhe agora esta nota que descreve exaustivamente o conjunto de elementos que, aqui, em termos genéricos, lhe referi.

O Sr. Presidente: - Para interpelarem o Sr. Ministro sobre este assunto inscreveram-se, entretanto, os Srs. Deputados José Manuel Maia, Joel Hasse Ferreira, Joaquim da Silva Pinto, Crisóstomo Teixeira e Miranda Calha.
Para fazer uma pergunta complementar, tem, de novo, a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Ministro da Indústria, agradeço a sua resposta, mas, de qualquer forma, há questões que não ficaram ainda suficientemente claras em matéria de perspectivas para o projecto em 1995, nomeadamente o impacto imediato do projecto em matéria de valor acrescentado. Contudo, se tivermos em linha de conta aquilo que o Sr. Ministro disse sobre a produção de 120 000 viaturas, em 1995, e de 180 000, depois, a partir de 1996, podemos concluir que, se tem um impacto, na velocidade de cruzeiro, de l % no PIB, admitamos que, em 1995, terá qualquer coisa como 0,75 %. Então, Sr. Ministro da Indústria, mudemos de flanco nesta discussão: se o projecto Ford/Volkswagen, por si só, tem um impacto de 0,75 % no crescimento económico do País em 1995, e é admitido nas Grandes Opções do Plano e no Orçamento que Portugal crescerá entre 2,5 % e 3,5 % em 1995, admitindo-se, portanto, que, no limite mínimo de 2,5 %, se cresça ao mesmo nível do crescimento médio europeu, então, aquilo que concluímos - e que é dramático! - é que, sem o projecto Ford/Volkswagen, a divergência seria brutal em 1995. E

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está é uma questão importante, do ponto de vista macroeconómico, que vamos ter que saber desenvolver e discutir durante o debate orçamental.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, embora tenha gostado de ouvir as suas explicações, o que é facto é que elas não batem muito certo com o sentimento que é expresso pelos próprios industriais do sector, pelo que gostaria que o Sr. Ministro desse um contributo para explicar essa contradição, porque o próprio presidente da associação patronal da metalúrgica e metalomecânica do Norte diz, pelo no branco, que o projecto Auto-europa irá frustrar as expectativas criadas junto da indústria portuguesa. Portanto, há uma discrepância entre as afirmações - que não quero pôr em causa - do Sr. Ministro da Indústria e este sentimento que abrange, pelo menos, uma parte dos industriais portugueses, alguns fornecedores e outros não fornecedores do projecto. Gostaria, pois, de ouvir a sua opinião sobre estes dois pontos, um mais macroeconómico e outro mais microeconómico.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.

O Sr. José Manuel Maia (PCP): - Sr. Ministro, para além de colocar algumas outras questões, permitia-me reforçar algumas ideias já aqui abordadas pelo Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
A primeira questão tem a ver com as posições aqui assumidas pelo Governo e aquilo que vem à luz do dia como opinião dos industriais. Eu sou daqueles que se lembram do início e das reuniões ligadas ao projecto, em que participaram centenas de industriais, induzidos pela propaganda, pela informação que o governo dava, na altura, relativamente à possibilidade de incorporação da indústria e do fornecimento nacional neste projecto do mono volume da Ford/Volkswagen. Hoje, a grande maioria destes industriais diz-se enganada, referindo que a Ford/Volkswagen tem os seus fornecedores conhecidos e homologados em Espanha e que é por aí que passará a grande fatia do fornecimento para este projecto.
A questão que coloco é a seguinte: Sr. Ministro, naquilo que foi negociado, o que é que ficou, na realidade, assente como obrigatório de incorporação genuinamente nacional na produção deste veículo? Porque há muitos industriais que referem que, através da associação com empresas estrangeiras e servindo-se do nome de uma empresa portuguesa, há produtos estrangeiros que entram aqui, nomeadamente espanhóis. Assim, aquilo que questiono é a incorporação de empresas «genuinamente» portuguesas...
A segunda questão que queria colocar, Sr. Ministro, é relativa aos postos de trabalhos criados e a criar: lembro-me dos muitos milhares que eram prometidos, até pelo reflexo que isso ia ter num distrito com as dificuldades que são conhecidas. Assim, em relação àquilo que o Sr. Ministro teve possibilidade de anunciar e àquilo que é a realidade, neste momento, do ponto de vista do desenvolvimento do projecto, quais são os objectivos que vão ser alcançados, de facto?
Por último, Sr. Ministro, coloco-lhe uma questão acerca das infra-estruturas necessárias na área e que têm a ver directamente com este projecto. Refiro-me a questões do ponto de vista da habitação, mas também posso acrescentar do ponto de vista da saúde, das acessibilidades, etc., o que é que está a ser implementado? E nas questões relativas ao ambiente, rede de esgotos, de tratamento, etc., o que é que está a ser feito? Qual é o ponto da situação?
Queria ainda solicitar ao Sr. Ministro que a nota que tem relativamente ao projecto não fosse só distribuída ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues mas aos vários grupos parlamentares, porque penso que são dados extremamente importantes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr Ministro, julgo que interessaria explicitar o que pensa sobre o impacto do projecto Auto-europa em toda a península de Setúbal. Nomeadamente, gostaria que me explicasse se concorda ou não com a opinião de que as verbas disponibilizadas para o Auto-europa teriam sido muito melhor aplicadas no apoio à criação e desenvolvimento de pequenas e médias empresas da região, o que teria permitido um reforço do tecido produtivo no distrito de Setúbal, com outra solidez e outras perspectivas de futuro.
Sr. Ministro, gostaria também que me referisse como enquadra as perspectivas de redução de investimento neste projecto, perspectivas que, segundo tem sido divulgado, já foram analisadas em reuniões de análise e reformulação das estratégias do próprio grupo Volkswagen.
Gostaria também de perguntar-lhe se considera que existem condições para garantir as infra-estruturas e as restantes condições envolventes do empreendimento que se previa que o Estado português assegurasse, bem como aquelas que são exigidas pela própria existência do projecto.
Para terminar, não poderá, Sr. Ministro, vir a verificar-se um futuro desinvestimento neste empreendimento, senão a breve prazo daqui a alguns anos, que comprometa ainda mais as perspectivas de desenvolvimento consolidado e sustentável na península de Setúbal e em toda a região?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Alves.

O Sr. António Alves (PSD): - Sr. Ministro, o projecto Auto-europa é um projecto importante e inovador para Portugal, trazendo tecnologia de ponta e novos métodos de produção, a par de um forte investimento com especial relevo ao nível da mão-de-obra Tendo, no entanto, surgido algumas notícias dando conta de que o projecto inicial terá sido alterado, permita-me, Sr. Ministro, que coloque as seguinte questões, está o projecto Auto-europa a atingir os objectivos inicialmente previstos, no que respeita ao investimento e quanto ao número de postos de trabalho criados? Qual o impacto do projecto Auto-europa ao nível da economia portuguesa, nomeadamente através do incremento que se prevê para as exportações portuguesas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim da Silva Pinto.

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Sr. Ministro da Indústria, num minuto, porque mais tempo não tenho, gostaria de pôr a V. Ex.ª algumas perguntas, mas, antes disso, queria sublinhar que, em meu entender, o projecto de que estamos a falar, pela sua inovação e abrangência, é um projecto que, em princípio, é desejável. Vamos a ver se a sua implementação vai obedecer, efectivamente, aos objectivos que estavam em causa. Aliás, e aí que se inserem as

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minhas perguntas, que são, em grande parte, inspiradas pelas interrogações e pelo mal-estar que está a gerar-se nos mundos associativos empresariais, concretamente do Norte.
Sr. Ministro, que informações tem V. Ex.ª, ou de que podem dispor os serviços do Ministério da Indústria, quanto à participação efectiva das empresas portuguesas neste projecto? Ou seja, no fundo, não estarão a ser criadas empresas de raiz portuguesa, juridicamente portuguesas, mas onde estão inseridos os fornecedores habituais da Ford e da Volkswagen? É que isto significa que os portugueses vão «ver passar a bola», com a consciência de que estamos em terreno português, mas a jogar com parceiros estrangeiros!...
Por outro lado, gostava de saber quais são os meios que o Governo português tem de controlo deste processo. Ou seja, se as coisas não correrem como V. Ex.ª, de boa fé, acredita que vão correr, tal como os seus colegas de Governo acreditarão que vão correr, quero saber qual é o controlo que temos sobre este processo.
Por outro lado ainda, V. Ex.ª falou - e falou com alegria - dos postos de trabalho criados, mas eu gostava de saber se os estrangeiros vão para as chefias e os portugueses vão para ser chefiados! Quero saber se os quadros portugueses terão acesso a esse leque de emprego ou se, efectivamente, teremos os portugueses relegados para as posições secundárias.
Finalmente, gostava que o Sr. Ministro, em relação ao esperado PEDIP-2 - e V. Ex.ª sabe que eu digo «esperado» com muita veemência, porque estamos à espera dele! -, nos dissesse como é que se insere o desenvolvimento deste projecto nesse enquadramento: eles vão ter mais apoios ainda ou os apoios que estão previstos são aqueles que se irão concretizar?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira.

O Sr. António Crisóstomo Teixeira (PS): - Sr. Ministro da Indústria e Energia, eu gostaria de me associar ao seu pesar por este Orçamento do Estado ser mais um em que a fiscalidade automóvel inviabiliza, de alguma forma, o desenvolvimento da indústria e do comércio automóvel em Portugal.
Gostaria de perguntar-lhe, relacionado com o problema do projecto Auto-europa, em que um dos elementos fundamentais é a viatura monobloco, se a criação, no âmbito do imposto automóvel, da chamada Tabela 3, destinada a veículos todo-o-terreno e furgões, segundo a qual uma viatura Ford Transit, por exemplo, vai passar a pagar 645 contos de imposto e uma viatura Toyota Hi-Ace vai passar a pagar 617 contos de imposto, o que não acontecia no passado, se destina ou não a criar um mecanismo proteccionista para as viaturas tipo monobloco produzidas pela Auto-europa, que irão ser classificadas como furgão e, consequentemente, deixarão de pagar a tabela integral do imposto automóvel.
De qualquer forma, para não o deixar numa situação de pesar relativamente à manutenção da estrutura do imposto automóvel, tenho o prazer de comunicar-lhe que, hoje, o Partido Socialista apresentou na Mesa desta Assembleia um projecto de lei tendente a rever a estrutura do imposto automóvel.

O Sr. Presidente: - Para fazer perguntas ao Sr. Ministro da Indústria e Energia, tem ainda a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.

O Sr. Miranda Calha (PS) - Sr. Presidente, Sr. Ministro, antes de mais, quero apresentar-lhe os meus cumprimentos.
O projecto Ford/Volkswagen é, de facto, um projecto que tem elevadíssimos investimentos e um apoio comunitário fortíssimo e, consequentemente. podemos analisá-lo também na óptica do nível e do número de postos de trabalho que inclui - aliás, parece-nos que há até um grande desequilíbrio entre o nível de investimentos e apoios comunitários e o fraco número de postos de trabalho que ali existe.
De qualquer modo, a minha questão vai no seguinte sentido: sendo essa a situação e, naturalmente, sabendo nós que a questão dos postos de trabalho é uma componente fundamental, sobretudo numa zona que tem a crise que é conhecida, gostaria de saber se o Governo está, de facto, a pensar em estratégias de acompanhamento do desenvolvimento da empresa, precisamente em problemas que possam vir a criar perturbações dentro dela. Refiro-me, concretamente, àquilo que saiu recentemente na imprensa sobre a questão da participação da Volkswagen e o que, na altura, constou sobre diminuição de investimentos ou de interesse em relação ao projecto da Volkswagen. E olhando, por exemplo, para a nossa vizinha Espanha, podemos ver o que se passou precisamente em relação à componente de apoio a essa empresa, em termos de indústria automóvel, onde a Volkswagen tem um peso efectivamente grande.
Em Portugal, uma situação que, porventura, pudesse ser semelhante em relação a um projecto deste género, teria repercussões extremamente graves, tendo precisamente em linha de conta o problema dos postos de trabalho e os níveis de investimento feitos.
Portanto, o que pretendo saber é se. de facto, da parte do Sr. Ministro da Indústria e Energia e do Governo, há um compromisso efectivo e real, em termos de acompanhamento da evolução deste projecto, justamente naquilo que ele significa de postos de trabalho e também, naturalmente, de consolidação de uma empresa que, certamente, tem o maior interesse em termos nacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra, por 10 minutos, o Sr. Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Emergia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sobre as questões colocadas, começaria por recordar ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues que o secretário-geral do seu partido, na sequência de uma intervenção do meu colega Ministro do Comércio e Turismo, teve ocasião de dizer que o projecto Ford/Volkswagen era uma das coisas bem feitas pelo Governo. Portanto, foi o secretário-geral do seu partido que fez um comentário elogioso sobre esta matéria. É evidente que nada na vida é perfeito, que este projecto também não o será e pode ter alguns problemas de percurso, mas é para isso que cá estamos.
No entanto, posso dizer, muito claramente, que se não fosse a acção do Gabinete de Apoio à Participação na Indústria Nacional - que criei, por despacho, para dinamizar as oito componentes - não teríamos atingido os valores de participação nacional no projecto que já atingimos E, quando digo «participação nacional», digo participação de componentes produzidos em Portugal com capital português ou estrangeiro.
Quero dizer-vos, desde já. que tenho aqui uma lista que vou dar a todos os grupos parlamentares, em que os senhores podem ver quais as empresas portuguesas e quais as joint-ventures que participam neste projecto. Parece-me que isto esclarecerá a vossa preocupação, que, aliás, é

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pertinente, sobre se não estamos só a ter investimento estrangeiro com capa portuguesa. Não estamos, com(r) poderão ver na referida lista que vos vou dar, pois há aqui um conjunto significativo de empresas portuguesas e há também algumas joint-ventures entre portugueses e estrangeiros.
Aliás, posso dizer que, por exemplo, foi feita uma joint-venture entre a Somner-Allibert e uma das melhores empresas têxteis portuguesas, para produzir os têxteis para a indústria automóvel. E esta empresa portuguesa não vai dar apenas o nome, porque já produzia este tipo de componentes antes da joint-venture com a Somner-Allibert; a joint-venture com a Somner-Allibert vai reforçar e potenciar toda a sua capacidade não só com a Ford/Volkswagen como também com os mercados europeus.
Portanto, parece-me que esses vossos receios são infundados, porque há, de facto, participação portuguesa e, hoje em dia, numa economia aberta, na economia global em, que estamos, não podemos fazer tudo sozinhos, algumas vezes fazemos alianças estratégicas com os outros.
Quanto ao sentimento dos industriais do sector, sou o primeiro a dizer que compreendo algum sentimento deles. De qualquer forma, os senhores nunca me ouviram dizer que este projecto ia permitir que todos os industriais portugueses do sector metalúrgico e metalomecânico trabalhassem com a Ford/Volkswagen. Nunca, da minha parte, houve uma afirmação desse tipo. Pelo contrário, sempre assumi uma postura realista e responsável, dizendo que havia um grande conjunto de empresas portuguesas que não tinham capacidade de acesso a este projecto, mas que íamos pegar nas melhores do sector, naquelas que teriam condições e tentar dinamizá-las e apoiá-las para que acedessem ao projecto, tentando atingir os objectivos de 45 % do valor acrescentado nacional. Ultrapassámos esses objectivos, estamos em 46,6 %.
Sempre tive uma atitude realista e responsável e, como tal, não me podem acusar de ter gerado expectativas infundadas nos industriais do sector. Compreendo que aqueles que não ouviram as minhas afirmações tenham criado expectativas que, hoje em dia, não consigam acomodar, mas, da minha parte, nunca houve uma afirmação no sentido de que este projecto ia satisfazer todas as empresas do sector metalúrgico e metalomecânico nacional, pois isso seria irrealista. Pelo contrário, sempre chamei a atenção para o facto de que isto não iria ser assim.
Em relação ao que disse o Sr. Deputado José Manuel Maia, já referi que há associações com empresas estrangeiras, mas também há uma grande participação nacional. Aliás, como já disse, vou dar uma lista que esclarece essa questão, a todos os grupos parlamentares.
No que diz respeito ao número de postos de trabalho criados, efectivamente, o projecto inicial previa, à partida, cerca de 4600 postos de trabalho directos na empresa, mas, neste momento, prevê-se que ela vai arrancar com 3000, ou seja, um número inferior ao que estava inicialmente pensado. Quanto ao número de postos de trabalho indirectos, já gerados, neste momento, nas empresas que vão trabalhar para a Ford/Volkswagen, acabei de o referir há pouco.
Relativamente às infra-estruturas, elas são uma responsabilidade do Governo português, estão a ser desenvolvi das e há apenas uma - gostaria de o dizer aqui claramente - que me dá grandes preocupações: temos de implementar um sistema de tratamento de resíduos industriais no nosso país. É que o problema existe, os resíduos andam por aí a «passear» e, de facto, é importante implementar um sistema que minimize este problema e que venha também tratar os resíduos do projecto Ford/Volkswagen Na medida em que haja atrasos na implementação deste
sistema, por dificuldade na escolha de sítios, é óbvio que temos de equacionar aqui um novo problema, que é o de saber como vamos tratar os resíduos gerados neste projecto.
Esta é a única infra-estrutura que nos preocupa; o resto está tudo a avançar normalmente, de acordo com os compromissos assumidos.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, quero dizer que o impacto do projecto Auto-Europa na região de Setúbal é extremamente significativo, pelo número de empresas que se estabeleceram naquela região e que são fornecedoras da Ford/Volkswagen.
Quanto à questão de que se não se fizesse um projecto Ford/Volkswagen esse dinheiro podia ir para as PME do distrito, é evidente que isso, em termos teóricos, poderia equacionar-se sempre, mas, na prática, Sr. Deputado, são projectos destes que têm um efeito de arrastamento sobre as PME.
As PME, muitas vezes, por si só, não conseguem já a sua dinâmica, precisam de um «motor», de um impulsionador da sua dinâmica e são estes projectos, como, aliás, o Sr. Secretário-Geral do PS reconheceu, que dinamizam toda a sua estrutura. Isto é visível na indústria de componentes que lá se estabeleceu e num conjunto de PME de serviços que vão aproveitar as oportunidades na região de Setúbal.
Relativamente às notícias de reduções neste projecto, até este momento, repito, até este momento, ninguém da Ford ou da Volkswagen ou da direcção do projecto em Portugal nos anunciou qualquer redução. O que nos foi dito claramente é que estão a fazer o exercício - que considero normal - de ver em que medida é possível aumentar a rentabilidade do projecto, diminuindo custos na própria fábrica, em Palmeia. Foi isso que a Volkswagen disse que estava a ser feito, na sequência dos esclarecimentos que pedi sobre as notícias dos jornais.
Na minha opinião, trata-se de um exercício que todas as empresas devem fazer hoje em dia, isto é, a partir do momento em que têm uma capacidade instalada, devem ver a forma como se tornam mais eficientes e produtivas.
Foi isto que me foi dito e, portanto, neste momento, não há nenhuma perspectiva de desinvestimento da Ford/Volkswagen. Aliás, seria irrealista que tivessem, em Portugal, a fábrica mais moderna da Europa, com um investimento de 400 milhões de contos, e fechassem no dia seguinte. É óbvio que isto não é credível nem é minimamente realista.
Quanto à pergunta do Sr Deputado António Alves, o investimento está praticamente feito e é evidente que se trata de um investimento tipo «capital intensivo», como acontece, hoje em dia, com os projectos industriais modernos, e, portanto, a geração de postos de trabalho não e aquela que, idealmente, gostaríamos, porque é um projecto de capital intensivo. Em todo o caso, os efeitos indirectos, os efeitos sobre a modernização dos recursos humanos em Portugal são extremamente importantes e sublevam o número quantitativo de postos de trabalho que se criam.
Sr. Deputado Joaquim da Silva Pinto, já tive oportunidade de esclarecer que se geraram expectativas para as quais não contribuí mas que compreendo, pois alguns não leram bem o projecto Ford/Volkswagen e criaram um excesso de expectativas. No entanto, já expliquei, claramente, a minha posição sobre esta matéria.
Quanto a estrangeiros para chefias e a portugueses a serem chefiados, como é evidente, não mandamos nas empresas privadas e são elas que escolhem os seus directores. O que posso dizer-lhes e que estão a ser recrutados muitos engenheiros portugueses para o projecto.
Posso também dizer-lhe, com base na experiência que tivemos com o projecto Renault, que os jovens engenhei-

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ros portugueses que entrem para este projecto, mesmo que não fiquem lá a vida inteira e, naturalmente, não vão ficar-se nele permanecerem cinco anos e depois saírem para as PME portuguesas, levam uma experiência de gestão e de organização industrial que, só por si, mostra que este projecto deu um excelente contributo para a modernização da estrutura empresarial e produtiva portuguesa. É essa uma das grandes vantagens de um projecto destes e isso preocupa-me mais do que os portugueses entrarem directamente para as chefias do projecto. O que me interessa é o efeito que eles vão ter depois, quando saírem, noutras empresas portuguesas.
Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira, a pergunta que me pôs contém matéria no âmbito dos impostos, que deve ser colocada ao meu colega, Ministro das Finanças, quando do debate do Orçamento do Estado, já que não estou em condições de responder-lhe.
Em todo o caso, posso dizer que isto não tem nada a ver com o projecto Ford/Volkswagen. Aliás, posso ainda acrescentar que a empresa gostaria de uma alteração do imposto automóvel no sentido de poder vender mais em Portugal aquele veículo, que essa alteração foi pedida mas não foi satisfeita pelo nosso Governo. Isso mostra que o que está aqui em causa não é favorecer o furgão da Ford/Volkswagen, que, aliás, não é um furgão mas, sim, um multi propose vehicle.
Mas, como a sua pergunta contém questões de fiscalidade, peco-lhe que as discuta com o meu colega, Ministro das Finanças, no âmbito próprio, que é o Orçamento do Estado.
Também já respondi ao Sr. Deputado Miranda Calha sobre o nível de investimento versus postos de trabalho. Trata-se de um investimento do tipo capital intensivo e, portanto, não pode ser visto como se fosse um investimento de mão-de-obra intensiva, com milhões de contos versus postos de trabalho criados imediatamente.
Também já expliquei a diminuição do interesse da Volkswagen. Não há confirmação de que estejam para ficar mas seria irrealista ter a mais moderna fábrica do ramo e fechá-la. Porém, admito, com toda a franqueza, que, no futuro, na sequência lógica do que são hoje em dia os modelos industriais, esta fábrica, que é a mais moderna, a mais automatizada e a mais flexível no contexto europeu, possa ser utilizada para fazer outros modelos. Essa hipótese pode ser plausível no futuro, mas, neste momento, nem esse problema se põe, visto que ela vai arrancar com a produção prevista do veículo que tinha sido estabelecido.
Chamo a vossa atenção para o facto de, nesta matéria, haver um contrato entre o Governo português e a Ford/Volkswagen. Ora, um contrato implica compromissos de ambas as partes e, portanto, nesta matéria, temos uma estrutura jurídica que nos defende no cumprimento das cláusulas contratuais.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS). - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, quero apenas que fique registado que o que solicitei ao Sr. Ministro da Indústria e Energia foi uma resposta sobre a questão da redução do investimento a curto prazo, nos termos exactos que obrigaram o Sr. Ministro a pedir um esclarecimento à própria Ford/Volkswagen.
Por outro lado, obviamente que o que eu queria referir era um desinvestimento curto nesse sentido, no curto prazo, e um desinvestimento a mais largo prazo, obtido um conjunto de lucros que permitiria um desinvestimento que voltaria a pôr a região de Setúbal em crise.
Não obtive estas respostas, assim como me parece não ter obtido resposta à questão das necessárias infra-estruturas, ou de algumas das infra-estruturas, para apoio à Ford/Volkswagen.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, gostava de dizer que, no mundo de hoje, ninguém pode assegurar que esta fábrica continue em Portugal no ano 3000.
Portanto, sejamos realistas sobre esta matéria: o que temos de ter é uma estratégia de diversificação que permita.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É no ano 2000, Sr. Ministro.

O Orador: - Foi isso o que eu quis dizer, Sr Deputado. No ano 2000 está cá, com certeza! Fique descansado que no ano 2000 está cá a fábrica!
Ora, a estratégia que se montou foi a de que a indústria de componentes que vai produzir para a Ford/Volkswagen portuguesa possa também produzir para o sistema europeu da Ford/Volkswagen, isto é que possa produzir para as empresas da Ford/Volkswagen existentes nos outros países, por forma a que não fiquemos excessivamente dependentes de apenas um projecto. Dito de outra forma, pretende-se utilizar este projecto como alavanca para que a indústria nacional de componentes entre na rede internacional da Ford/Volkswagen. É essa a minha estratégia clara nesta matéria, por forma a não dinamizarmos um cluster que fique apenas dependente da fábrica Ford/Volkswagen em Portugal. É isso que estamos a conseguir nalguns casos e temos já experiências felizes de indústrias de componentes que vão produzir para fábricas fora de Portugal.
Posso dizer que, neste momento, o trabalho que fizemos de levantamento e de aproveitamento da capacidade nacional da indústria de componentes vai permitir, por exemplo, produzir componentes para a fábrica Mercedes, coisa que há dois anos era impensável Portanto, o aproveitamento da Ford/Volkswagen para trabalhar para fábricas de outros países é já um bom exemplo de diversificação.
É este o esclarecimento que posso dar-lhe.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um brevíssimo comentário, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Silva Pinto.

O Sr. Joaquim Silva Pinto (PS): - Sr Presidente, eu ia fazer uma respeitosa interpelação à Mesa, mas agradeço muito que V Ex.ª me permita usar a figura do comentário para dizer que gostava que ficasse registado que as respostas que o Sr. Ministro da Indústria e Energia me deu foram, em muitos aspectos, satisfatórias, tendo, porém, havido duas lacunas importantes.
Disse V. Ex.ª, por um lado, que da sua parte não tinham sido criadas expectativas Não terão sido por V. Ex.ª mas foram criadas - e não poucas - pelo Governo de que V. Ex.ª faz parte.

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Por outro lado, V. Ex.ª esqueceu-se de responder e vai responder, com certeza - sobre quais os meios de controlo que o Governo tem sobre a execução do projecto.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Sr. Deputado, sobre os meios de controlo de execução do projecto a resposta é muito simples: está montada uma estrutura, de que fazem parte o ICEP, o IAPMEI e com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, para o acompanhamento do projecto, o qual, em termos de investimento, está praticamente realizado.
Quanto ao cumprimento das condições contratuais no futuro, o Ministério do Comércio e Turismo, através do ICEP, vai, naturalmente, fazer a empresa respeitar o negócio que contratou com o Governo português. Estamos num Estado de direito, temos legislação sobre investimento estrangeiro, que a Ford/Volkswagen subscreveu e assinou, e é isso que, no futuro, nos permite que tenhamos garantias na matéria.
Sobre a execução do projecto, esclareço que a nossa estrutura de acompanhamento tem seguido a par e passo a execução do projecto e é isso que me permite, Sr. Deputado, fornecer-lhe, com todo o gosto, este conjunto de elementos, que tem uma descrição minuciosa de tudo o que está a passar-se relativamente ao projecto.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Eles não percebem, não vale a pena...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora, passar à outra pergunta, também ela dirigida ao Ministério da Indústria e Energia, mas que incide sobre as condições em que está a processar-se a instalação da rede de gás natural no território nacional.
Trata-se de uma pergunta que provem do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e que vai ser formulada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados, Sr. Ministro do Indústria e Energia, Sr, Secretário de Estado da Energia: A implantação da rede de gás natural em Portugal é, sem dúvida, uma obra e um investimento de inegável interesse para o País.
Mas apesar de o ser e independentemente das críticas e dos pontos de vista diferentes que temos em relação à forma como o processo tem decorrido nas diversas fases, deve sê-lo não só pelo interesse que se tem em que a rede de gás natural seja implantada e os prazos da calendarização previstos sejam cumpridos, mas também assegurando que os direitos das populações e, em particular, dos proprietários e dos municípios que são atravessados, nesta fase, pela instalação da rede de gás natural, sejam respeitados e defendidos.
Ora, o que acontece, como sabem, é que a instalação da rede de gás natural - nesta fase, a instalação concreta das condutas -, tem vindo a ser alvo de forte e crescente polémica e contestação, tanto por parte de proprietários e de agricultores cujos terrenos são atravessados pela conduta, como, inclusivamente, por autarquias.
Apesar de a própria legislação referir que «os podares conferidos pelas servidões serão sempre exercidos por forma a que os titulares dos imóveis sofram um mínimo de prejuízo ou embaraço», na prática o que se tem verificado é que tal não tem acontecido.
Não tem havido, por exemplo, por parte da Transgás, um processo prévio de ampla informação e de debate com os próprios interessados. A Transgás começou este processo com uma posição algo magestática. só descendo dela quando se viu perante os protestos - e, em alguns casos, até as revoltas violentas - contra os métodos e procedimentos que foi usando nos terrenos e municípios por onde foi passando.
Os exemplos são, aliás, muitos, são casos em que as obras de instalação da conduta se iniciaram invadindo propriedades e destruindo culturas sem qualquer audição negociai prévia com os respectivos titulares; é o incumprimento do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 11/94, que prevê que, primeiro que tudo, o montante da indemnização seja determinado de comum acordo entre as partes, mas. na verdade, os baixos valores - em alguns casos menos de 40$ por metro2 para servidões de 35 anos - têm sido impostos, um lateralmente, pela Transgás; é, muitas vezes, o processamento ilegítimo dos frutos pendentes - as lenhas, as madeiras- pertencentes aos proprietários e que as empresas a quem são adjudicadas as obras de instalação não respeitam; é o desrespeito pelos prazos previstos na lei e, muitas vezes, a falta de noção do que são, no nosso país, as estruturas da propriedade minifundiária, ainda indivisa nos registos prediais mas já distribuída, em concreto, por proprietários, o que faz com que muitas vezes a Transgás considere desconhecidos os proprietários que existem no terreno e na vida, levando-os, portanto, a estarem perante factos consumados; é a imposição de valores de indemnização extremamente baixos, que não têm em conta a completa limitação que a servidão impõe não só ao uso, enquanto a conduta está a ser construída, mas também aos rendimentos futuros, porque em certas faixas não se podem fazer obras nem quaisquer investimentos futuros; são as excessivas áreas de servidão, é, muitas vezes, o aproveitamento abusivo, por parte da empresa, do desconhecimento e da ignorância da lei, por parte de proprietários e agricultores, que, muitas vezes, não sabem ler e são obrigados a assinar acordos em branco contra os seus interesses e as suas vontades; é o desrespeito por parte dos próprios pareceres das direcções regionais da agricultura e de ambiente; é a ausência de conhecimentos sobre o que se passa quanto a estudos de impacte ambiental; é um conjunto de factos que têm vindo a provocar uma polémica.
Aquilo que deveria ser um elemento de mobilização das populações e das autarquias em relação a um projecto de interesse nacional passa a ser, pela forma como tem sido tratado, um elemento de divisão, de desconfiança, de protesto e de polémica, porventura, desnecessário.
Por isso, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, as minhas perguntas são as seguintes: como é que o Governo está a encarar todo este problema. Que orientações defende, de molde a garantir o necessário diálogo sério entre as empresas concessionárias de capitais públicos e os proprietários afectados, particularmente antes dos factos consumados? Que disposição existe para reconhecer os erros que têm havido no processo e para os alterar, designadamente repensando todo o processo das servidões e aumentando substancialmente o valor das indemnizações? Onde vão ser construídos os depósitos subterrâneos para o armazenamento do gás e que estudos de impacte ambiental foram feitos a esse respeito?
Estas são algumas das questões que, nesta fase, gostaria de ver respondidas.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, começo por registar as suas palavras, no sentido de que este é um projecto de inegável interesse nacional. Assim, está de acordo comigo e com as declarações que tenho feito sobre esta matéria, em que tenho dito que as empresas de gás, neste caso a Transgás, e as empresas regionais de distribuição têm de saber conciliar o inegável interesse público do projecto com o respeito pelos direitos dos proprietários cujos terrenos vão ser atravessados pelo gasoduto. Esta é a minha declaração pública, que, certamente, o Sr. Deputado subscreve, acerca do equilíbrio entre o interesse público e os legítimos interesses dos proprietários dos terrenos atravessados pelo gasoduto.
Em todo o caso, trata-se de matéria em que somos inovadores, em Portugal. Não se trata de uma expropriação, como sabe, mas apenas de uma servidão, isto é, de um direito de passagem, de um direito de se servirem do terreno para passar o gasoduto. E aí, de facto, têm de se conciliar estes interesses.
Posso dizer que não há imposições unilaterais, até porque a própria lei - o Sr. Deputado conhece-a - diz que o proprietário que não estiver satisfeito pode sempre recorrer a uma comissão arbitrai, que fixa o valor. Se não chegarem a acordo, há sempre alguém superior às empresas ou à Transgás que vai fixar o valor.
Estamos num Estado de direito, é isso que se passa. Nunca pode haver qualquer veleidade de imposição unilateral, visto que todo o proprietário de terreno atravessado pelo gasoduto tem sempre a possibilidade, depois, de recorrer, se entender que os seus legítimos direitos não estão a ser satisfeitos.
Se o Sr. Presidente me permite, gostaria que o Sr. Secretário de Estado da Energia respondesse, com maior pormenor, às questões colocadas, mas, antes, gostaria apenas de chamar a atenção para o seguinte: tenho uma transcrição de declarações do Presidente da Associação de Beneficiários do Baixo Mondego em que ele diz que «com a Associação de Beneficiários, as negociações têm decorrido com credibilidade» e reconhece o espírito de diálogo e concertação que têm tido com a Transgás. Não sei se em todos os casos isto se tem passado assim. Porém, posso dizer que as declarações do Presidente da Associação de Beneficiários do Baixo Mondego correspondem, justamente, às orientações que demos às empresas acerca do modo como deveriam actuar.
Sr. Deputado, admito que ninguém é perfeito, sei-o muito bem, admito que em alguns casos a maneira de dialogar ou de fazer as coisas não tem sido perfeita, admito que a Transgás tenha de corrigir, e está a fazê-lo, em alguns aspectos, os seus procedimentos. Mas o que lhe posso garantir, da parte do Governo, é o nosso sincero desejo de que, numa obra de inegável interesse público, tal seja feito respeitando os legítimos interesses, por forma a que este projecto seja um factor mobilizador da vontade nacional, de acordo com o inegável interesse que ele tem, e não cause perturbações.
Uma vez mais, se o Sr. Presidente me permite, solicito ao Sr. Secretário de Estado da Energia que, com mais pormenor, responda às questões colocadas.
Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Energia.

O Sr. Secretário de Estado da Emergia (Luís Conceição Pereira): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, gostaria de dar algumas explicações adicionais sobre a importância deste projecto e responder concretamente às questões que levantou.
Antes de mais, gostava de referir, e penso que é importante termos isto presente, que se trata, de facto, de um projecto nacional que, apenas no que diz respeito aos grandes gasodutos, ou seja, aos gasodutos de alta pressão, implica uma construção de cerca de 800 Km, sendo atravessadas perto de 20 000 parcelas de terreno. Em termos de negociação, temos a agravante, que implica uma dificuldade adicional para chegar a acordo com os proprietários, de em certos trechos do gasoduto, por cada quilómetro que este atravessa, existirem 60 a 70 proprietários, havendo outros em que chega mesmo a haver 100 a 120 proprietários.
Isto significa, como é evidente, que, havendo 20 000 proprietários - e poderão ser mais do que 20 000, porque há, como todos sabemos, propriedades que têm mais do que um detentor -, é impossível conseguir a unanimidade no que diz respeito à negociação.
A lei prevê mecanismos, prevê comissões arbitrais, para o caso em que a Transgás e os proprietários não cheguem a acordo. Vou dar-lhe um número que, julgo, é relevante. Neste momento, estão negociadas cerca de 5000 parcelas, o que equivale a negociações com 5000 detentores de propriedades, em números redondos - para ser mais exacto, são 4962 -, e 83 % deles chegaram a acordo, pelo que o gasoduto vai passar nessas propriedades, tendo esses proprietários, inclusive, já recebido o valor que acordaram.
Portanto, parece-me - e desculpar-me-á esta expressão - um pouco excessivo o panorama dado nesta Sala, visto que mais de 80 % dos proprietários já acordaram, estiveram de acordo com os critérios e, portanto, o gasoduto irá atravessar as suas respectivas parcelas.
No entanto, gostaria de ser ainda mais exacto, mais pormenorizado, em relação a alguns aspectos. Pôs-se o problema de como contactar os proprietários O que a lei diz, aliás, é a única forma prática de o fazer, tem sido seguido pela Transgás. A Transgás tem-se socorrido das repartições de finanças para conhecer o cadastro disponível e identificar os proprietários, e também das conservatórias do registo predial.
Ora, acontece que em algumas parcelas não estão actualizados os registos, quer na conservatória quer na repartição de finanças. Posso garantir-lhe, Sr. Deputado, que tem havido esforços e há instruções precisas, por parte da tutela, para que se consiga descobrir quem são os verdadeiros proprietários, mas, como há-de reconhecer, muitas das vezes há dificuldade em encontrar os responsáveis, o que por vezes dá origem a alguns mal-entendidos. Posso, no entanto, reafirmar que há instruções bem definidas, por parte da tutela, no sentido de determinar quem são os proprietários, para poder haver negociações.
Em relação aos montantes das indemnizações, devo recordar-lhe que o próprio critério para o cálculo das indemnizações está expresso na lei. Mas, para ser mais exacto, essa indemnização abrange um conjunto de parcelas: o ónus da servidão a constituir; a interrupção, por destruição temporária, da actividade agrícola; a destruição de culturas em curso ou dos chamados frutos pendentes; a destruição de fruteiras e ainda a destruição de outras benfeitorias.
Tem havido um esforço no sentido de dar um preço justo - o que quer que isso signifique - aos agricultores.

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tendo sempre presente que temos de esperar, por parte dos proprietários, uma postura de maximização do valor a receber, o que é óbvio e esperado. No entanto, temos de ter critérios, por região, que sejam justos mas uniformes, sob pena de agravarmos o custo do gasoduto, fazendo pagar a todos os portugueses que vão servir-se do gás natural - e atingindo, assim, a sua competitividade, o que quer dizer o tecido económico e a indústria em particular - um custo que é indevido, havendo apenas algumas pessoas que se apropriarão dele.
Sr. Deputado, não estou a dizer que não surja um ou outro caso mais difícil, pois em 20 000 parcelas é impossível prevenir todos os casos; nada é perfeito, mas posso garantir-lhe que tem havido um esforço sério, honesto, no sentido de resolver esses problemas.
O Sr. Deputado referiu um outro aspecto relacionado com as margens de segurança do gasoduto, isto é, a faixa dentro da qual está condicionada, por exemplo, a construção.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Secretário de Estado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, posso dizer-lhe que essas faixas foram reduzidas ao mínimo e apenas numa faixa de 5m é que não há a possibilidade de fazer algumas culturas, pois, a partir daí, há a possibilidade de cultivar, estando vedados, como é óbvio, alguns aspectos, como sejam as construções.
Vou responder, muito rapidamente, a uma última questão, que diz respeito às cavidades subterrâneas de armazenagem do gás natural. Essa armazenagem terá de ser feita em minas de sal. Em princípio será feita na zona centro, como, aliás, se sabe, com certeza. Porém, estão a decorrer estudos e só perto do final deste ano, provavelmente em meados de Dezembro, estaremos habilitados a determinar se há, de facto, condições técnicas para construir a armazenagem subterrânea na zona de Leiria.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Indústria e Energia, V. Ex.ª começou por sublinhar uma das partes da minha intervenção, em que tinha concordado com o facto de o projecto ser de inegável interesse nacional. Isto é óbvio, mas não deve esquecer-se de que, para além disso, referi também os desacordos que temos em relação à forma como o processo tem decorrido.
Registei igualmente, da parte do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado, o reconhecimento de que tem havido erros no processo. No que respeita à dimensão, poderemos estar, porventura, em desacordo, mas há um ponto em que convergimos: têm havido erros na forma como o processo tem sido conduzido. Aliás, é o próprio presidente da Transgás que, em sucessivas entrevistas, o (em afirmado, ao referir que têm havido atitudes menos correctas na intervenção da Transgás no concreto, nos terrenos junto dos proprietários. E de tal modo é assim que o próprio Provedor de Justiça, como sabe, foi obrigado a intervir tio processo e a fazer um conjunto de sugestões para que esses erros e procedimentos, utilizados de uma forma algo majestática pela empresa concessionária da rede de gás natural, fossem alterados.
O Sr. Ministro disse que tem de haver equilíbrio entre o interesse público e o interesse privado. Estamos de acordo com isso. Só que o problema aqui é que esse elemento tem sido desequilibrado sempre a favor da empresa concessionária.
O número daqueles que, eventual ou alegadamente, terão já assinado acordos não é muito relevante, Sr. Secretário de Estado. E não o é porque, em muitos casos, os proprietários foram colocados perante factos consumados, perante situações em relação às quais não têm capacidade de resposta e, muitas vezes, capacidade legal, pelo que se sentiram obrigados a aceitar valores com os quais não estão de acordo. Contudo, como é hábito dizerem, já que esse foi o valor que lhes foi imposto, preferem aquele a não receber nenhum.
A verdade, Sr. Secretário de Estado, é que o problema não é só em relação à ausência de possibilidade de utilização do terreno no momento em que a construção está a ser realizada. Como V. Ex.ª sabe, não podem fazer-se não só aquelas obras que o Sr. Secretário de Estado referiu como qualquer tipo de construção numa faixa de 10 metros para cada lado do eixo do gasoduto, o que em pequenas explorações microfundiárias significa, em muitos casos, a inviabilização de toda a exploração. Acontece que a figura da servidão, ao contrário da da expropriação, faz com que o proprietário do terreno se mantenha como tal e, embora não possa explorá-lo para o futuro, pelo menos na parte em que é atravessado pelo gasoduto, nem retirar dele rendimentos, tem de continuar a pagar contribuições e impostos ao Estado por uma propriedade que, na prática, não utiliza.
Ora, nesse aspecto, gostaria de saber se o Governo, através do Ministério da Indústria e Energia, está a pensar em propor ao Ministério das Finanças uma alteração do quadro legal que permita isentar estes proprietários do pagamento de contribuições por propriedades que vão ser inutilizadas do ponto de vista da sua exploração normal.
Por outro lado, é sabido que há o recurso para o tribunal e para as comissões de arbitragem. Porém, como o Sr. Secretário de Estado seguramente saberá, esse recurso é feito para estabelecer os valores das indemnizações e, muitas vezes, já tem acontecido que, quando as comissões de arbitragem ou o tribunal se desloca ao terreno para fazer o cálculo das indemnizações, vê-se impossibilitado, na prática, de fazê-lo, porque, entretanto, as empresas a quem foram adjudicadas as obras já entraram nos terrenos, por vezes, com desconhecimento dos proprietários, liquidaram as culturas e levantaram os frutos pendentes, estando, assim, o próprio tribunal impossibilitado de fazer o cálculo prático desses valores. Estes são elementos diversíssimos, a imprensa tem-nos referido e o Sr. Secretário de Estado, com certeza, conhece-os através das exposições que tem recebido das comissões.
Sr. Secretário de Estado, a minha questão é esta: estão de acordo em dar orientações à Transgás, enquanto empresa de capitais públicos, para alterar os procedimentos, fazer uma política de diálogo sério com os proprietários, resolver o problema da carga fiscal e procurar encontrar uma solução que, por um lado, sirva o interesse nacional mas, por outro, respeite também os interesses e os direitos dos proprietários e agricultores, cujos terrenos estão a ser atravessados, e das próprias câmaras, que, em muitos casos, como o da Câmara Municipal de Leiria, têm vindo a colocar sérias objecções à forma como tudo isto tem decorrido?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Indústria e Energia, a minha pergunta não tem tanto a ver com a questão, aqui já abordada, das indemnizações, porque essa está por demais discutida, mas com o facto de, em 2 de Setembro de 1993, termos feito um requerimento ao Governo, mais concretamente ao Ministério da Indústria e Energia, no sentido de saber qual a localização do gasoduto e quais os estudos de avaliação dos impactes ambientais daí resultantes.
Ora, se estamos a falar de uma linha de conduta de 580 Km, de um trajecto que vai de Braga a Setúbal e que passa por regiões e por ecossistemas de grande sensibilidade, é óbvio que os estudos de avaliação do impacte ambiental num projecto que consideramos positivo não são questões menores que possam ser consideradas ou respondidas com ambiguidades ou lugares-comuns.
Colocámos também essa questão, nessa perspectiva, em relação àquilo que é o património arqueológico de toda a zona envolvente e, lamentavelmente, em vez das informações que solicitámos nessa data, ou seja, as conclusões e o relatório resultantes do estudo de avaliação do impacte ambiental, recebemos uma mera conclusão, um resumo não técnico desse estudo.
Portanto, aquilo que pretendemos saber, e hoje voltamos a questionar, é quais são as conclusões do estudo de avaliação do impacte ambiental feito e quais são os seus efeitos directos e secundários. Aquilo que, hoje, pedimos, uma vez mais, ao Governo, passado já mais de um ano, é o estudo completo e não um resumo alienatório que o Ministério entendeu fazer sobre os impactes ambientais deste projecto.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rei de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Energia, a instalação da rede de gás natural tem sido polémica, principalmente no Vale do Mondego, no Baixo Mondego. Aí, registaram-se conflitos muito acentuados, que originaram mesmo a intervenção das forças de segurança para tentarem acalmar os ânimos.
Têm surgido muitas notícias, algumas contraditórias, e tem-se verificado uma profunda falta de diálogo. Há pouco, o Sr. Ministro falou, se bem ouvi, de uma associação de beneficiários, mas existe uma outra, que é a dos proprietários e rendeiros do Vale do Mondego, que está profundamente descontente com esta matéria.
Sr. Secretário de Estado, fundamentalmente, gostaria de saber, pela voz do responsável máximo por esta matéria, qual o ponto da situação em que se encontra esta zona do Vale do Mondego, dado os conflitos acentuados que se têm verificado, nomeadamente em relação às duas questões mais importantes, ou seja, os montantes indemnizatórios em causa e a topografia do traçado do gasoduto. Ora, há ali uma área, junto à via rodoviária norte e Condeixa, que coloca problemas mais específicos, dadas as características topográficas. Concretamente, gostaria de saber se há predisposição para o diálogo e como está a ser resolvida esta questão.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Energia, este importante projecto assume uma certa compatibilização ou coordenação entre diferentes zonas geográficas, tendo implicado aqui alguma compatibilização geoestratégica, que temos vindo a acompanhar nos últimos anos, e acarretado algumas inflexões não necessariamente no mau sentido.
A minha primeira pergunta é a seguinte: em relação ao gasoduto que passa por Espanha e França, nomeadamente com a energia vinda do gasoduto eurosibenano, de que forma equaciona agora o Governo, em concreto o Sr. Secretário de Estado, o problema das eventuais perturbações geopolíticas na área da ex-União Soviética, ou seja, que tipo de condições de segurança e de garantias teremos nesse sentido?

O Sr. Secretário de Estado da Emergia: - O gás vem da Argélia!

O Orador: - O segundo ponto tem a ver com o facto de, recentemente, ter sido dado o arranque das obras relativas ao gasoduto que envolve o gás vindo da Argélia e de Marrocos. Gostaria de saber se podiam dar-nos elementos sobre a data prevista para a conclusão dessa obra e também uma resposta sobre as condições de segurança nessa zona, tendo, nomeadamente, em conta as ameaças feitas por alguns fundamentalistas argelinos quanto à segurança das pessoas e de bens ocidentais.
O terceiro ponto é o seguinte em relação ao gás que atravessará o distrito de Setúbal, o gás liquefeito, gostaria de saber o que está previsto quanto ao arranque de obras e, inclusivamente, ao aproveitamento de eventuais instalações existentes.
Poderá ainda dizer-me alguma coisa acerca do impacte económico na região de Setúbal, como, por exemplo, quanto à utilização de mão-de-obra e de quadros e às necessidades de investimentos, designadamente de apoio, que possam ser necessários em termos portuários, na óptica do arranque?
Assim, no que toca à combinação das três origens do gás, gostaria de ser elucidado, por um lado, acerca dos condicionamentos geoestratégicos ou geopolíticos, relativamente ao que vem de Leste e do norte de África, e, por outro, quanto ao problema de Setúbal, mais concentrado na questão dos impactes económicos e dos investimentos. Em qualquer caso, gostaria de saber as datas previsíveis quer para o que vem do norte de África quer para o que virá liquefeito através Setúbal.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim da Silva Pinto.

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Indústria e Energia e Srs. Secretários de Estado, começo por renovar os cumprimentos a VV. Ex.ªs.
Quanto a este tema, gostaria de fazer três perguntas. Em primeiro lugar, aproveitem VV. Ex.ªs a oportunidade de estarem a dialogar connosco para nos dizer como é que se insere toda esta problemática do gás na política energética portuguesa e, muito concretamente, que efeitos vêem VV. Ex.ªs no curto e médio prazo.
Depois, devo referir a VV. Ex.ªs que parte do que ia dizer está dito, pelo que me limito a enunciar, para efeitos de registo, a minha preocupação quanto ao problema geoestratégico das opções assumidas - e louvo-me nas considerações feitas pelo meu colega de bancada, Joel Hasse Ferreira - e quanto à forma como está a ser implementado

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este projecto, fazendo a veemente recomendação d£ que a empresa tenha uma sensibilidade, ao nível do diálogo, superior à que tem tido, porque compreendemos a enorme dificuldade na implementação deste projecto, cujo. interesse é inegável. Porém, para isso é necessária uma. grande capacidade de diálogo com os interessados e as autarquias, o que, em muitos aspectos, não tem acontecido, a não ser na opinião do Sr. Deputado Rui Carp, que é um optimista.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Energia.

O Sr Secretário de Estado da Energia: - Sr. Presidente, Sr Deputado Lino de Carvalho, gostaria de acrescentar algo às informações que dei ainda há pouco. Antes de mais, quero chamar a atenção dos Srs. Deputados para o seguinte: estamos a construir uma obra importante, o que já foi aqui reconhecido, cujos trabalhos têm de ser continuados. Ao contrário das auto-estradas, em que podemos pôr troços em funcionamento.

O Sr Joaquim da Silva Pinto (PS): - E fixar portagens!

O Orador: - enquanto resolvemos problemas num determinado percurso ou propriedade, aqui basta apenas não estar construído um metro de gasoduto para que a obra não funcione Assim sendo, a construção do gasoduto tem características muito específicas e próprias que exigem uma atenção cuidada e também um diálogo - e já lá irei - com os proprietários, mas o que é certo é que temos dois anos e meio, o que não é excessivo, para o construir, para que Portugal tenha o gás natural no final de 1996 ou início de 1997.
Nesse aspecto, mais uma vez lhe digo que, de facto, quando se atravessam 20000 parcelas, é impossível que não existam problemas Estou de acordo consigo em que a pergunta que se pode colocar é' qual a percentagem dos casos com problemas e dos que já se encontram resolvidos? Aqui parece-me claro que os cerca de 80 % de proprietários que já deram o seu acordo dão credibilidade aos esforços da empresa para resolver os problemas Se tivéssemos uma situação em que apenas 20 % dos proprietários tivessem dado o seu acordo, em vez dos 80 %, dar-lhe-ia razão, mas a situação é exactamente a inversa.
Julgo que não vale a pena dizer que as pessoas assinaram compelidas, com uma pistola à cabeça; elas assinaram porque achavam que aquela era a forma que, em seu entender, mais vantagens lhes traria.

O Sr Lino de Carvalho (PCP) - Tenho aqui protestos e reclamações de pessoas que assinaram e que, depois, se sentiram defraudadas!

O Orador: - Sr. Deputado, não digo que não haja pessoas nessa situação, o que estou a dizer é que a esmagadora maioria dos casos - e aí estão os números para o provar - concordaram com os critérios e assinaram os papéis; por isso, parece-me que é um pouco excessivo dizer que essas pessoas assinaram quando não queriam, porque é passar-lhes um atestado não sei de quê, mas julgo que não muito abonatório.
Em relação ao outro aspecto que aqui trouxe de novo e que tem a ver com as servidões e com as faixas de protecção, penso que o Sr Deputado talvez esteja mal informado Tenho aqui o esquema e, de facto, numa faixa para além de 5 metros há possibilidade de se fazerem todas as culturas, milho, trigo, iodas elas, havendo apenas condicionantes para a plantação de árvores, cujas raízes possam ir mais fundo e trazer problemas para o gasoduto.
No que se refere ao Sr. Provedor de Justiça, é evidente que ele tem todo o direito de intervir e não achamos mal que o faça, pelo contrário, até achamos bem. No entanto, a lei regula os conflitos de uma forma determinada, através das comissões arbitrais De qualquer das formas, devo dizer-lhe que o Sr. Provedor de Justiça esteve em várias reuniões, inclusivamente com a Transgás, e na última em que esteve verificou que a empresa estava a fazer esforços e a cumprir aquilo que legalmente está estipulado.
Penso que, nestes assuntos, terá de haver um equilíbrio e contesto que ele deva pender só para o lado da empresa, tem da haver um equilíbrio entre o interesse público e o interesse privado. Nesse sentido, posso garantir-lhe que há instruções para que haja diálogo e, neste momento, ele já existe; no entanto, também julgo que todos os interessados deverão fazer esforços nesse sentido e não apenas a empresa.
Quanto ao problema das servidões, é evidente que não faria muito sentido expropriar toda uma parcela, por vezes com hectares ou com milhares de quilómetros quadrados, para, muitas vezes, na sua extremidade passar um tubo que, ainda por cima, está enterrado a cerca de dois metros de profundidade!
Esta é a razão pela qual utilizamos a figura da servidão, o que nem sequer é novidade, pois já aconteceu a mesma coisa noutros países, porque, pura e simplesmente, não faz sentido expropriar uma terra quando apenas se quer fazer passar um gasoduto a dois metros de profundidade e muitas vezes nas extremidades das parcelas de terreno. É esse o motivo que faz com que utilizemos a figura da servidão e não a de expropriação, o que me parece lógico.
Em relação à questão que me foi levantada pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, devo dizer que este projecto, previamente à sua aprovação, foi objecto de análise por diversos departamentos do Estado, diversos ministérios; houve audição de todas as câmaras envolvidas e, inclusivamente, para o assunto que interessa, foi exigido um estudo de impacte ambiental, que se encontra aprovado, embora fazendo recomendações de melhorias, como e óbvio. Aliás, devo dizer que uma das condições prévias de aprovação do projecto - desculpem a insistência - era a existência de um estudo de impacte ambiental, que foi feito e aprovado.
Se a Sr.ª Deputada quiser ter acesso a esse estudo de impacte ambiental, poderá dirigir-se ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, que foi a entidade que o fez, e, com certeza, não terá dificuldade em saber quais os seus resultados e as recomendações que foram feitas.
Sr. Deputado João Rui de Almeida, tenho lodo o gosto em dar-lhe todas as informação sobre a questão concreta que me colocou, ou seja, sobre o Baixo Mondego.
De facto, no Baixo Mondego levantaram-se alguns problemas específicos. Houve diversas reuniões com a associação de regantes e com a associação dos proprietários e, neste momento - julgo que é isto que lhe interessa saber-, estamos a tentar estudar um novo traçado, que vai passar junto à linha de caminho de ferro, evitando, assim, atravessar campos de mais elevada produtividade, nomeadamente arrozais, solução esta que poderá ser adoptada. Esta hipótese já foi discutida quer com a BRISA quer com o IN AG, quer com os proprietários, quer com a associação dos regantes e poderá ser, de facto, uma solução para o problema específico do Baixo Mondego.
No que se refere à questão levantada pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, que e bastante vasta, irei respon-

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der de uma forma muito sintética dado que tenho pouco tempo De facto, o projecto aponta para o recebimento de gás da Argélia, do chamado gasoduto do Magrebe, que atravessará o Norte de África, isto é, Marrocos, o estreito de Gibraltar, a Espanha até Córdova, donde inflete um ramal para a fronteira portuguesa, na zona de Campo Maior, e daí para Leiria e Braga. Na zona de Leiria entroncará também com o gasoduto que vem do Sul, de Setúbal.
Em termos práticos e muito sintéticos, podemos dizer que existem dois grandes ramais de alta pressão: um que vai de Setúbal a Braga, chamemos-lhe o gasoduto longitudinal, e um outro, de grande dimensão, que vai da zona de Leiria até à zona de Campo Maior, entroncando com o gasoduto do Magrebe, a que podemos chamar gasoduto transversal.
Esta solução tem, a nosso ver, vantagens geoestratégicas, porque, mesmo na fase de gasoduto - o nosso projecto também prevê, numa segunda fase, a importação de gás líquido, coisa a que já me referirei -, há possibilidade não só de receber gás através de Espanha, vindo do Norte de África, da Argélia, como ainda, através da ligação que faremos de Braga a Tui e, depois, de Tui ao Norte de Espanha, pela Galiza, ao Norte da Europa.
Nesta primeira fase de gasoduto, via terrestre, teremos possibilidade de ter alguma diversificação, o que aumenta a segurança do abastecimento, para além de, em termos económicos, esta solução ser mais competitiva e barata. É evidente que há ou poderá vir a haver problemas nos países que produzem gás natural - não é o caso específico da Argélia, pois outros países têm problemas, como é o caso da ex-União Soviética, que citou há pouco; diria até que, em regra, quase todos os países produtores de hidrocarbonetos, gás natural ou petróleo têm situações que, potencialmente, podem ser não direi explosivas, que é um termo até adequado, mas desestabilizadoras -, de qualquer maneira, se seguirmos atentamente o evoluir dos acontecimentos...
No entanto, poder-lhe-ei dar a seguinte informação: de facto, no contexto europeu, nem sequer seremos nós a depender mais da Argélia, pois a Espanha, a Itália e a França dependem fortemente das importações de gás natural daquele país, por isso, se houver uma ruptura de longo prazo, esses países e a própria União Europeia serão os primeiros a tentar tomar medidas, visto que serão eles a serem atingidos primeiro.
Em relação à conclusão das obras, pensamos que o gasoduto de alta pressão, ou seja, aquele que ainda há pouco denominei de gasoduto longitudinal e transversal, estarão prontos no final de 1996, por forma a que, no início de 1997, possamos ter gás natural em Portugal, a ser queimado quer na central eléctrica que construiremos para o efeito, quer, e sobretudo, para o sector doméstico e industrial.
Em relação à sua outra pergunta do gás liquefeito, devo dizer-lhe que, numa segunda fase, está prevista a recepção de gás natural líquido por via marítima, mas, para isso, há necessidade de construir um terminal que o receba e faça a sua regaseificação, ou seja, que o torne de novo gasoso. Os estudos indicam que, em princípio, ficará na península de Setúbal, mas prevemos apenas que esta segunda fase, que dependerá da aceitação do gás natural pelo mercado português, se torne efectiva talvez para o ano de 2002 ou 2003, portanto, é ainda cedo...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - 2000 e não 3000, como disse o Sr. Ministro há pouco!

O Orador: - 3000 é a Ford-Wolkswagen.

Sr. Deputado Joaquim da Silva Pinto, em relação à questão de saber como o gás se insere na política energética, é óbvio que poderia falar durante várias horas sobre isso, mas vou referir apenas dois aspectos muito rápidos, que, segundo penso, respondem à sua pergunta.
O gás liga-se com a política energética em dois sentidos fundamentais e num terceiro que tem a ver com o ambiente. Por um lado, permite diversificar os produtos energéticos - como sabe, um dos problemas em Portugal é a sua dependência do petróleo, porque 70 % do que importamos vem sob essa forma - e dar à indústria e também ao sector doméstico mais uma alternativa em relação aos produtos energéticos a utilizar, o que é um aspecto importante. Por outro lado, vem aumentar a competitividade dos agentes económicos em Portugal, sobretudo na indústria, que, neste momento, sofre a concorrência alargada por efeito da integração europeia, o que todos nós sabemos. O terceiro aspecto, que já não releva tanto da política energética, apesar de hoje ser bastante difícil falar em política energética sem falar em ambiente, é o de termos um produto mais limpo, não digo completamente, visto ter apenas 50 % das emissões de CO2, mas mais limpo que, por exemplo, o carvão.

O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para interpelar a Mesa, Sr. Deputado.

O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Para interpelar a Mesa ou para usar uma outra figura regimental que...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Limo de Carvalho (PCP). - Sr Presidente, o Sr. Secretário de Estado da Energia, na sua intervenção, disse que eu não conhecia os termos da limitação dos direitos dos proprietários e agricultores impostos pelo regime de servidão. Acontece que os tenho aqui à minha frente, Sr. Secretário de Estado, e sublinho que V. Ex.ª só referiu duas das 10 limitações nele constantes, entre as quais destaco: «a proibição de qualquer tipo de construção numa faixa de 10 m para cada lado o livre acesso, por uma faixa de 4 m, do pessoal da montagem; a ocupação temporária de faixas máximas de 22 m para efeitos de depósitos; após a conclusão da obra, o cumprimento, com carácter permanente e por prazo ilimitado, de todas as regras que estão definidas nestes condicionamentos». Isto é efectivamente uma servidão, mas é uma servidão que não tem para o beneficiário, apesar de tudo, as vantagens que poderá ter a expropriação. Não quero, no entanto, com isto dizer que se vá para a expropriação.
Há pouco coloquei uma pergunta concreta a que o Sr. Secretário de Estado não respondeu, pelo que vou repeti-la. Como se sabe, a servidão mantém no proprietário a propriedade, mas não lhe mantém os frutos. Está o Governo a encarar a possibilidade de criar um quadro legal que beneficie fiscalmente os proprietários e agricultores nas áreas em que a servidão impõe, de facto, uma total impossibilidade da utilização dos terrenos, pois é o que se passa, não sendo verdade o que consta, aliás, do comunicado da Transgás de hoje?

O Sr. Joaquim da Silva Pinto (PS): - 3000 é a Ford-Wolkswagen.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - A Mesa foi interpelada, mas quem se encontra em melhores condições

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para responder é o Sr. Secretário de Estado da Energia, a quem dou a palavra.

O Sr. Secretário de Estado da Energia: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Gostaria de dizer ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, muito rapidamente, que também tenho comigo a legislação, que ambos conhecemos, sobre as servidões. Há efectivamente condicionalismos consoante a faixa: numa faixa de 4 m não se pode lavrar nem cavar a mais de 50 em de profundidade - o que ainda disse há pouco -, não se podem plantar árvores nem fazer qualquer construção; mas o mesmo já não acontece numa faixa de 3 m mais 3 m, etc.
Ora - e não vou repetir uma coisa que já conhece -, o que me parece ser fundamental é que está a ser levantado o problema da utilização de outra figura jurídica que não a da servidão ou o de alargar a figura jurídica que hoje existe.
Sr. Deputado, vou ser muito claro' de facto, a figura da servidão é a que melhor se adequa a este projecto específico e a que é utilizada em todo o lado para projectos de gasoduto. E a figura utilizada em países onde se constróem gasodutos e não só em Portugal, e os gasodutos há muito que são uma realidade na Europa, nós é que estamos agora a começar.
O que posso dizer é que na figura da servidão Há limites mínimos em relação àquilo que não pode ser feito no terreno, mas, de qualquer forma, os proprietários podem sempre reclamar, têm sempre a possibilidade de apresentar recurso para os tribunais. Isto é, se de facto a negociação não conduzir a um acordo, se houver divergências entre as partes, há sempre a possibilidade, para além da comissão arbitrai, de recurso aos tribunais para, digamos, uma decisão final.
Respondendo em termos claros, a figura da servidão e de facto aquela que permite a Portugal ter e aqui vem o interesse público- o gás natural em 1996. O problema é que, enquanto que na construção das estradas a expropriação, por exemplo, de uma parcela de terreno com vários herdeiros e que ainda esteja indiviso pode levar um ou dois anos a resolver, porque, entretanto, outros troços estão a ser construídos, aqui, neste caso concreto, não há essa possibilidade, pois basta não estar construído um metro, de gasoduto para que o não possamos ter. Logo, tem de, Inevitavelmente, vir ao de cima o interesse público, no sentido de garantir que o gás natural esteja, em finais de 1997, em Portugal, sem prejuízo e sem atentar, dentro de um critério de razoabilidade, contra os interesses particulares, como é óbvio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito?

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, para usar da mesma benevolência que V. Ex.ª usou para com o Sr Deputado Lino de Carvalho. Gostaria, pois, de interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Não se trata de usar de benevolência mas, sim, de uma figura regimental a que tem direito.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Muito obrigada, Sr. Presidente.
O Sr. Secretário de Estado da Energia proferiu uma afirmação que, por não ser verdadeira, quase me levou a solicitar o uso de uma outra figura regimental, a da defesa da honra e consideração.
Sr. Secretário de Estado, a relação com os proprietários, sobretudo da área de Alcobaça, e particularmente da freguesia de Prazeres de Aljubarrota, tem sido tudo menos correcta e o respeito pelo preceito constitucional e outras normas legais - não estou sequer a falar da legislação de excepção entre o interesse público e o interesse da propriedade privada, que deixa, de facto, alguma margem para dúvidas quanto ao respeito desse preceito constitucional - não tem sido sequer respeitado. Não gostaria de me citar como exemplo, mas sou-o, porque já apresentei uma queixa-me contra a Transgás por invasão da minha propriedade e por ter retirado árvores sem ter trocado comigo qualquer correspondência, sem ter qualquer assinatura, qualquer assentimento, qualquer negociação.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Afinal eu tinha razão!

A Oradora: - Isto aconteceu não só comigo mas com a esmagadora maioria dos habitantes desta freguesia, que estão lesados e a quem os senhores oferecem uma ridícula indemnização que, na primeira volta, a mais elevada orçava os 40000$. Realmente, se isto fosse feito por um Governo socialista dana origem a um levantamento popular, pois é um atentado contra a propriedade privada. No entanto, é feito com enorme arrogância, em nome do interesse público, prejudicando de facto pequenos empresários e levando as pessoas, num clima de terror, a entregar as suas propriedades por patacas.
Eu apresentei uma queixa-crime, mas, provavelmente, outros proprietários não o farão.
Pergunto, Sr. Secretário de Estado: é legítimo instalar um tubo de alta pressão, com os riscos e a manutenção que exige - e ainda não foi dito quem fará a manutenção desses terrenos, se o proprietário, se a Transgás -, a menos de 20 m de uma casa, como é o meu caso?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O exemplo veio dar razão a tudo aquilo que eu Unha dito!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Da mesma forma, peço ao Sr. Secretário de Estado da Energia, se o desejar, que responda a esta interpelação à Mesa.
Tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado da Energia: - Sr. Presidente, muito obrigado pela sua benevolência em me dar de novo a palavra.
Sr.ª Deputada Elisa Damião, não diria que estava à espera da sua interpelação, mas era provável que a fizesse, pelo que me rodeei de alguns cuidados com a informação do seu caso particular. Era intuitivo que me fosse colocar a questão.
A informação que tenho e a de que, no caso da sua propriedade específica, houve contacto com o chamado cabeça-de-casal, visto ser uma propriedade...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Não é verdade! Está mal informado, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Peço que me deixe prosseguir, Sr.ª Deputada. Tenho todo o gosto em dar-lhe todas as explicações do seu caso específico e particular.

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Como deve calcular, não está nas nossas intenções espoliar quem quer que seja, como é óbvio. Estamos interessados em garantir que uma obra fundamental para o país se faça dentro dos prazos e com equilíbrio, e, desculpe a insistência, é evidente que, com o elevadíssimo número de proprietários e prazo para a concretização de uma obra desta importância para o país, tem de haver regras com as quais nem toda a gente vai estar de acordo. Há pessoas com ideias diferentes, naturalmente, quanto ao valor das indemnizações, que são calculadas de acordo com o que ainda há pouco disse. São feitos estudos de região a região, que são discutidos com o Ministério da Agricultura e outras entidades e que, depois, são negociados.
Portanto, e peço que me desculpe, Sr.ª Deputada, parece-me francamente excessivo usar a expressão «clima de terror», quando 83 % das pessoas assinaram, a menos que me diga que o fizeram com uma pistola apontada à cabeça, o que é - volto a repetir - um atestado muito pouco abonatório para elas. Ao dizer isso é um atestado de menoridade mental que está a passar aos mais de 80 % dos portugueses que assinaram, cujos terrenos serão atravessados pelo gasoduto.
No seu caso concreto, e a Sr.ª Deputada tem, como é óbvio, muito mais informação do que eu, tenho todo o gosto, repito, em dar-lhe toda a informação que desejar. E evidente que poderá haver casos, não sei se o seu...

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Não houve qualquer correspondência.

O Orador: - Não é essa a informação que tenho. Mas também é inequívoco que, maioritariamente, o gasoduto está a ser feito. Estamos a tentar fazê-lo com equilíbrio, com discussão, com diálogo. E evidente que tínhamos pouca experiência disto, pois é a primeira vez que se faz um projecto destes em Portugal, que os proprietários são confrontados com este tipo de situação. Estamos todos a aprender! Mas é inequívoco que a esmagadora maioria das pessoas tem tido um comportamento honesto - e daqui faço-lhes justiça e equilibrado, o que tornou possível o atravessamento das 5000 propriedades.
Sr.ª Deputada, no que diz respeito a esta questão, quanto muito, coloco-me à sua inteira disposição para dar toda a informação específica que necessitar, como é óbvio

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa, no perfeito cumprimento desta figura regimental.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor

O Sr Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, através da figura regimental da interpelação à Mesa, temos, no fundo, estado a assistir a pedidos de esclarecimentos ao Governo. No entanto, não interviemos, interpelando a Mesa, porque, embora tivéssemos a plena consciência de que se estava a fazer uma entorse à figura regimental, entendemos, dado que o Governo veio à Assembleia com uma total abertura para explicar e debater estas matérias, deixar seguir, Sr. Presidente, esta entorse.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Deixaram!?...

O Orador: - Deixámos seguir, sem protestar, esta entorse à figura regimental da interpelação, porque entende-mos que, dada a maneira como o Governo, como aliás sempre faz, estava a esclarecer a Câmara, seria a forma de mostrar aos Srs. Deputados da oposição que o Governo está aberto a esclarecer tudo, na Assembleia. E, Srs. Deputados, depois não venham dizer que o Governo não explicou tudo.
Em matéria de tolerância e de respeito pela Assembleia, está aqui uma prova, Sr. Presidente, de quem está a favor do esclarecimento e de quem está aqui só para fazer chicana política, que e o que alguns dos Srs. Deputados da oposição acabaram de fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Rui Carp, como fez uma interpelação à Mesa, é ela que vai responder, não havendo, portanto, mais interpelações sobre este problema.
O Sr. Deputado Rui Carp não tem qualquer razão, e vou explicar porquê. O Sr. Presidente, que foi quem esteve a presidir aos trabalhos antes de mim, consentiu nestas interpelações à Mesa, ou seja, que através delas se fizessem perguntas ao Governo. Todas as bancadas utilizaram a figura regimental da interpelação à Mesa, desvirtuando o Regimento, e a sua bancada, Sr. Deputado, não faz excepção. De modo que o Sr Deputado Rui Carp não tem qualquer razão em estar a invocar este problema só para criticar a Mesa.

O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Soei Hasse Ferreira (PS)- - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, a Mesa não autoriza mais interpelações. Vamos prosseguir os nossos trabalhos.

Protestos do PS e do PCP.

Srs. Deputados, não vamos fazer disto um incidente. A Mesa já respondeu ao Sr. Deputado Rui Carp, que interpelou a Mesa e não as bancadas, portanto, não há razão..

O Sr. Lino de Carvalho (PCP)- - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado Lino de Carvalho quer interpelar a Mesa ou o Sr. Deputado Rui Carp?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Sr. Presidente não me deixa falar!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado, se não é para interpelar a Mesa, corto-lhe a palavra.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra face às afirmações do Sr. Deputado Rui Carp, que acusou a oposição de estar a fazer chicana com este caso.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, este problema, como o Governo o reconheceu, afecta, pelo menos, 20 000 parcelas correspondentes, em média, a cerca de 20 000 proprietários e agricultores. Como é um assunto que merece a atenção da Assembleia da República, trouxemo-lo a esta Câmara e estabelecemos um diálogo - em que nem todos estivemos de acordo- sério e respeitoso da nossa parte e da do Governo.
Foi completamente inoportuna e inadequada a intervenção do Sr. Deputado Rui Carp e, aliás, o exemplo trazido pela Sr.ª Deputada Elisa Damião veio confirmar as questões que aqui abordámos. Pena é que os 20 000 agricultores que vão ver as suas parcelas atravessadas pelo gasoduto não tenham a mesma possibilidade que a Sr.ª Deputada no sentido de poderem ver tratado o seu problema., pessoalmente, pelo Sr. Secretário de Estado da Energia.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, as suas palavras vieram corroborar o que eu disse, que mantenho e confirmo. O Governo respondeu a todas as questões colocadas, esclareceu-as amplamente e mostrou estar preocupado com os problemas dos agricultores afectados pela instalação do gasoduto.
Mas os Srs. Deputados confirmaram o que eu disse - o desrespeito claro pelo Regimento da Assembleia da República, pelo instituto das perguntas ao Governo - e mostraram, mais uma vez, que baralharam as perguntas ao Governo porque, de outro modo, esta situação não só teria verificado. Na verdade, os Srs. Deputados da oposição que intervieram em primeiro lugar e formularam perguntas as Governo não estavam coordenados com os seus colegas de bancada, o que provocou a situação a que acabei de fazer referência.
Ora, quando não se cumpre o Regimento nem se utiliza correctamente um instituto parlamentar, no fundo, faz-se chicana política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, efectivamente, não estava prevista a minha intervenção nesta matéria mas as declarações do Sr Secretário de Estado da Energia provocaram-na.
Na qualidade de Deputada, não podia ficar calada quando, na qualidade de cidadã, sou vítima de um caso concreto a que o Sr. Secretário de Estado não respondeu. Disse que tinha apreciado o meu problema, o que não é verdade porque não há um cabeça de casal já que sou a única e legítima herdeira e proprietária do terreno em causa.
Mais: prestei-me a esclarecer uma situação concreta no âmbito deste debate, que me parece importante, porque atinge, como aqui foi duo, milhares de pequenos proprietários, aliás, a esmagadora maioria dos proprietários da zona.
Perante isto, não e admissível que o Sr. Deputado Rui Carp tenha chamado ao debate chicana parlamentar quando apenas é feito um uso legítimo da verdade numa discussão que é importante para muitos cidadãos. Se o senhor não a considera importante e tentou aligeirar a situação gravíssima em que o Governo se colocou perante estes proprietários, retorquindo dessa forma por falta de argumentos, só posso lamentar que tenha apoucado a discussão, que poderia ter sido interessante.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD) - Sr Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Damião, recordo a toda a Câmara que o Sr Presidente da Assembleia da República pediu o maior rigor na utilização da figura da interpelação à Mesa e, a esse propósito, lembro as anteriores intervenções do Governo, em sessão de perguntas ao Governo, nas quais tem procurado corrigir as deficiências que ocorreram no lançamento do gasoduto.
Quanto às questões relativas ao caso pessoal da Sr.ª Deputada Elisa Damião...

A Sr.ª Elisa Damião (PS) - Não é pessoal mas de todos os cidadãos!

O Orador: - .. apenas quero recordar que, nesta sede, defendemos os interesses do povo e não resolvemos os casos que nos interessam pessoalmente.
E, se o Governo não respondeu às perguntas da Sr.ª Deputada Elisa Damião, não foi a minha intervenção que ofendeu a sua honra mas os seus colegas de bancada, que deviam ter organizado melhor a pergunta formulada ao Governo, porque se a Sr.ª Deputada tivesse usado a palavra antes do seu colega de bancada, talvez tivesse resolvido o problema.
Trata-se de um problema vosso, da família socialista, pelo que não nos diz respeito A nós, interessam-nos os problemas dos portugueses e de quem nos elegeu!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Os meus problemas pessoais defendo-os em tribunal, os dos cidadãos defendem-se aqui e é isso que os senhores não querem fazer.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira pediu, há pouco, a palavra para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr Presidente, era para, muito brevemente, exercer o direito regimental de defesa da honra, não pessoal, porque ninguém me atingiu neste debate mas...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado pretende usar da palavra para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, quando me inscrevi e recebi, pelo telefone interno, uma resposta desabrida do primeiro Secretário da Mesa, pretendia exercer o direito regimental de defesa da honra e consi-

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deração da bancada mas como o debate se alongou muito porque as interpelações «carpeiosas»,...

Risos do PS.

... perdão, capciosas, do Deputado Rui Carp tentaram lançar a confusão, prescindo do exercício desse direito de defesa da honra e consideração da bancada, que está sempre bem defendida pelo povo e pelas instituições.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Rei Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Rol Carp (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, ainda não disse à Mesa para que efeito pretende usar da palavra. É para exercer o direito regimental de defesa da honra?

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não, não.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, Sr. Deputado?

O Sr. Rui Carp (PSD): - O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira disse que se sentiu...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, não está a falar com o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira mas a dirigir-se à Mesa. Pede a palavra para que efeito?

O Sr. Rui Carp (PSD): - Ao abrigo do direito que tenho de esclarecer o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira que se sentiu...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado só tem direitos regimentais. Como esse direito não existe, pergunto, quer interpelar a Mesa ou exercer o direito regimental de defesa da honra?

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa porque me sinto no direito...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Nesse caso, tem a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Ruí Carp (PSD): - Sr. Presidente, solicito à Mesa o uso da palavra para responder àquilo que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira disse no sentido de que eu ofendi a honra da bancada do Partido Socialista, e parece-me que tenho o direito de esclarecê-lo.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está encerrado este incidente! Mas quero dizer ao Sr. Deputado Rui Carp que teve precisamente a mesma atitude de que, há pouco, acusou a Mesa: usou a figura da interpelação, não para interpelar a Mesa, mas para fazer uma intervenção. Tal e qual!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, dou por terminado este incidente.
Segue-se a última pergunta, que será formulada pelo Partido Socialista ao Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre a reestruturação deste Ministério e a ineficácia da Secretaria de Estado da Emigração, de novo revelada face às medidas lesivas dos trabalhadores portugueses na Alemanha e em outros países.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, sinto-me no direito regimental de responder ao Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira. Se V. Ex.ª me nega esse direito, no mínimo queixar-me-ei da posição adoptada pelo Sr. Presidente no que me diz respeito. Assim, interpelo a Mesa ao abrigo dessa figura.
Se V. Ex.ª confirma que não me dá o direito de responder,...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Mas qual direito?

O Orador: - ... registo essa atitude e não posso deixar de criticá-la, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado invoca o Regimento e naturalmente que a Mesa respeita os seus direitos regimentais Porém, não tem o direito de dizer que quer responder a um Deputado porque tem de invocar uma figura regimental e não pode inventá-la.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, se me dá licença, volto a recordar que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira disse que a honra da bancada do Partido Socialista foi atingida com as minhas declarações e, a seguir, expendeu algumas considerações a esse propósito pelo que tenho o direito...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, sente-se ofendido?

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não. Mas o Partido Socialista disse que...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado conhece o Regimento tão bem ou melhor do que eu mas está a querer sofismar. Se se sente ofendido, pode invocar o direito regimental de defesa da honra e a Mesa concede-lhe a palavra.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Mas não há no Regimento qualquer figura que permita a um Deputado pedir a palavra para responder a outro Deputado. Não há! Não existe! E não posso dar-lhe a palavra nessas condições!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente,...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Se quer usar da palavra para defender a honra, a Mesa concede-lha mas tem de invocar a figura regimental respectiva.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, se um Deputado, neste Plenário, diz que foi ofendida a sua honra ou a consideração da sua bancada, do seu grupo parlamentar, o

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que é que faz a Mesa perante essa situação? Dá a palavra para que sejam prestados esclarecimentos, não é assim?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Não, Sr. Deputado. Se algum Sr. Deputado invoca a defesa da honra, a Mesa concede-lhe a palavra e o Sr. Deputado que â ofendeu ou que se presume que a tenha ofendido tem o direito de dar explicações.

O Sr. Rui Carp (PSD): - É isso!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Mas o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira não defendeu a honra, irritou-se a fazer um comentário à Mesa e esta considera que não deve dar-lhe a palavra para responder.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Para terminar, Sr. Presidente, não ofendi minimamente a honra da bancada do Partido Socialista. Não é verdade?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sim.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito obrigado. Era só esse aspecto que queria ver esclarecido.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para formular a pergunta sobre a reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros e a Secretaria de Estado da Emigração, de novo revelada face às medidas lesivas de trabalhadores portugueses na Alemanha e em outros países, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: Vou colocar-lhe duas questões, :uma nos primeiros três minutos e outra nos últimos dois minutos.
Em 29 de Novembro de 1991, alertámos nesta Câmara o Governo para o crescimento da xenofobia, racismo e intolerância que se verificavam em vários países do velho continente.
Dizíamos então que, com a queda do Muro de Berlim e dos regimes de Leste, os grupos neonazis e outros de extrema-direita não enjeitaram a possibilidade de aliciar aqueles que por deformação vêem nos trabalhadores estrangeiros os responsáveis pela sua situação social, esquecendo-se que foram os emigrantes os grandes impulsionadores da reconstrução multiracial e multicultural.
Apelámos então às autoridades nacionais e internacionais para que nos países de acolhimento, incluindo Portugal, se investigassem todos os contactos existentes com as organizações de extrema-direita, principalmente as neonazis e agremiações com as suas congéneres a nível internacional. Infelizmente, não só nos países de acolhimento dos nossos concidadãos como também em Portugal, preparavam-se e aprovavam-se mais tarde leis limitadoras dos mais elementares direitos dos cidadãos que se deslocavam para outros países à procura de uma melhor situação social. Os governos conservadores de direita, ultimamente o de França, davam assim a possibilidade àqueles que se organizavam para lançar o pânico nas comunidades migratórias e criar grande insegurança e instabilidade com as suas ameaças e violentas agressões. A aprovação destas leis foi fatal para a segurança e bem-estar de milhares de famílias.
Nos últimos meses temos vindo a assistir ao crescendo do ódio contra cidadãos estrangeiros nos países de acolhimento e, nomeadamente, há portugueses que têm sido vítimas de agressões por parte de grupos neonazis alemães, tendo alguns deles recebido tratamento hospitalar. Como V. Ex.ª sabe, Sr. Secretário de Estado, este caso é recente.
Em 25 de Março, V. Ex.ª, na sessão de perguntas ao Governo, não deu respostas concretas sobre estas mesmas questões, limitando-se apenas a responder que tais acontecimentos não deveriam ser vistos como uma vaga generalizada de violência dirigida à comunidade portuguesa, lendo simplesmente o relatório enviado pelo Sr. Embaixador de Portugal na RFA, referindo-se ao relatório circunstancial então fornecido pela polícia alemã.
Perante este crescendo de violência e dos ataques brutais de que têm sido vítimas os cidadãos portugueses naquele país e noutros, como sabe, vou mais uma vez fazer umas perguntas - e digo «mais uma vez» porque já em Março coloquei esta pergunta ao Governo.
Vai o Governo convocar com urgência uma reunião da Comissão Mista Luso-Alemã para analisar estes casos e exigir ao Governo alemão mais segurança para os cidadãos portugueses? Os cidadãos portugueses ali residentes sentem-se inseguros e reclamam respostas concretas e imediatas por parte do Governo.
Em segundo lugar, tal como foi aqui exposto em Março e tendo o Governo francês aprovado já este ano, como disse há pouco, legislação que fere os princípios do Tratado de Maastricht, pondo em causa os direitos humanos, intentou o Governo alguma acção contra o Governo francês no Tribunal de Justiça das Comunidades, conforme aqui foi proposto pela Sr.ª Deputada Helena Torres Marques?
Terceiro: que actuação teve o Governo nestas duas matérias?
Quarto: que informações pode dar-nos V. Ex.ª sobre o caso muito grave do desaparecimento de um cidadão português, o Sr. Augusto Sardinha Duarte, que foi contratado por uma empresa cuja sede era na Rua dos Correeiros - agora já não é -, que foi para a Alemanha em Junho de 1994, tendo a sua família contactado por várias vezes as autoridades portuguesas sem ter conseguido obter resposta?
Quinto: tive conhecimento ontem, através de uma jornalista, de que os cidadãos que foram repatriados na sequência das penúltimas agressões de que foram vítimas na Alemanha estão a receber notas para o pagamento do respectivo repatriamento. O que diz o Sr. Secretário de Estado sobre esta questão?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (Luís Macedo): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: De facto, a matéria que hoje trouxe aqui o Governo tem a maior gravidade. Pelo enunciado da questão que o Sr. Deputado Caio Roque colocou, de facto, a matéria tem a maior gravidade. Aliás, bastaria que houvesse uma única situação de agressão a um trabalhador português no estrangeiro para que ficássemos preocupados, pior ainda se, de facto, não se trata de um português mas de alguns nessa situação. Assim, dada a gravidade da situação e o interesse em situarmos o problema, gostaria de pedir a vossa benevolência para abordar, sem quaisquer equívocos, as tais situações graves que têm atingido vários compatriotas nossos a trabalharem no estrangeiro. Portanto, antes de mais, vou precisar alguns pontos.
Em primeiro lugar, deveremos localizar os incidentes. Todos eles - e adiante falarei destacadamente de cada um - tiveram origem no território alemão que corresponde ao

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da antiga Alemanha de Leste e mais concretamente na zona de Leipzig. Ora, como todos sabem, a queda do Muro veio permitir descobrir, tal como o Sr. Deputado acabou de afirmar, uma situação altamente preocupante de empobrecimento generalizado, de produção industrial e comercial obsoleta, de qualidade de produção altamente deficiente, de formação profissional inadequada. E mais: a impossibilidade de se conseguir, de um momento para o outro - e é o que estamos a constatar -, levar a cabo uma rápida e harmoniosa integração social, política e económica das «duas Alemanhas» tem feito surgir um conjunto de situações graves e preocupantes que são muito a expressão da inevitável frustração de bom número de alemães, sobretudo nas camadas mais jovens.
São preocupantes e graves os afloramentos indisfarçáveis de xenofobia e de racismo, que, aliás, têm vindo a ser divulgados, e uma consequente agressividade social de que, nesta lógica, são os estrangeiros as primeiras vítimas, estrangeiros estes que, em nossa opinião, canalizam ainda mais hostilidade quando, apesar das dificuldades existentes e do desemprego significativo que se verifica, são preferidos devido à sua capacidade de trabalho e à sua integridade, como é genericamente o caso dos trabalhadores portugueses, e todos o sabemos.
Por outro lado, o complexo processo de reabilitação e organização da antiga Alemanha Oriental, sobretudo no campo da construção civil, tem exercido uma forte atracção sobre empresas portuguesas do sector, muitas delas com importantes obras adjudicadas, empregando trabalhadores portugueses sem quaisquer problemas. Digamos que este é o facto positivo da questão, pelo número de negócios que gera e pelos postos de trabalho que efectivamente proporciona. Mas, infelizmente, essa mesma atracção exerce-se sobre outros, alguns portugueses, verdadeiros oportunistas sem qualificação mas, sobretudo, sem escrúpulos que, a troco de lucros fáceis, não hesitam em aliciar, enganar e vigarizar outros portugueses. O que acabei de afirmar nem por um só momento atenua ou justifica os acontecimentos, embora explique muito do que esteve na sua origem.
Valerá ainda a pena precisar e julgo que isto é importante - que a larga comunidade portuguesa residente tradicionalmente na Alemanha se encontra integrada e que, de facto, nunca foi envolvida ou afectada por estes acontecimentos.
Posto isto, iremos rapidamente caracterizar, ainda que sumariamente, os incidentes que afectaram os nossos compatriotas e que devido à sua natureza são distintos. Como não poderá deixar de ser, irei explicitar também as acções globais que têm sido tomadas pelo Governo nestes casos, já que o acompanhamento, enquadramento e apoio aos nossos compatriotas tem sido imediato, exaustivo e, felizmente, eficaz e gratificantemente reconhecido pelos interessados.
O primeiro caso e o da contratação ilegal dos trabalhadores portugueses que, na maioria dos casos, se insere no contexto da contratação temporária levada a cabo por empresas portuguesas que, no âmbito da livre prestação de serviços e do regime de subempreitada, trabalham na Alemanha por conta própria. Neste contexto há, infelizmente, empresas ou indivíduos que, apesar de cientes do facto de estarem a cometer ilegalidades, mesmo assim não deixam de aceitar uma prestação de serviços muito mais barata ou até de contratarem elas próprias, com a ajuda de intermediários, mão-de-obra estrangeira com salários inferiores. O Ministério dos Negócios Estrangeiros - acredite! - tem desenvolvido, com regularidade e pelos meios ao seu alcance, um conjunto de iniciativas sobre o trabalho no estrangeiro, fundamentalmente na área da divulgação e da prevenção, chamando a atenção das pessoas para o perigo que correm em embarcarem, tal como eu próprio tenho dito publicamente várias vezes, nos «cantos de sereia». O próprio Ministro dos Negócios Estrangeiros, recentemente, em Bona, fez um apelo público nesse sentido, pedindo as maiores precauções para que sejam verificados por todos os interessados a idoneidade das empresas e os contratos que eventualmente estejam em causa. Ainda neste capítulo essencial da informação, foram dadas instruções ao delegados regionais da Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas para que também eles, na respectiva área de jurisdição, junto dos meios de comunicação social regionais falados e escritos, possam divulgar amplamente os perigos, disponibilizando também todas as autoridades portuguesas para darem apoio e acompanhamento à apreciação de eventuais contratos. Por outro lado, temos mantido contactos permanentes de apreciação desta situação com a Inspecção de Trabalho que, aliás, nos tem dado toda a colaboração.
Diferentes, obviamente, são os casos de violência relativamente aos trabalhadores. São do nosso conhecimento três casos ocorridos respectivamente em 22 de Março, em 28 de Maio e, mais recentemente, em 16 do corrente, todos eles, mais uma vez, na região e nos- arredores de Leipzig. Em todas estas situações o Governo determinou às nossas autoridades diplomáticas e consulares o acompanhamento e o apoio pessoal e presencial dos trabalhadores portugueses envolvidos, bem como determinou contactos e reuniões que se efectivaram com autoridades locais, quer a nível autárquico, quer a nível policial, quer mesmo a nível do Governo da Saxónia. Do mesmo modo, em todos os casos, foram apresentadas notas de protesto formal pela nossa embaixada ao Ministério Federal dos Negócios Estrangeiros.
Finalmente, importa referir que, visando encontrar um quadro referencial e enquadrado que permita definir actuações comuns e ultrapassar e solucionar todas estas questões, formulei um convite, que foi aceite, ao Secretário de Estado do Trabalho do Governo Federal da Alemanha para se deslocar a Portugal, o que vai acontecer já entre os dias 15 e 17 do próximo mês de Novembro, encontro esse onde irão abordar-se questões de interesse comum, nomeadamente quanto a estes casos de violência, a contratação ilegal de trabalho e também quanto à marcação da comissão mista a que o Sr. Deputado Caio Roque acabou de referir-se.
Uma última referência é a de que para melhor enquadrarmos esta situação já está determinada a deslocação de um diplomata para integrar a secção consular de Berlim bem como o reforço da estrutura social de apoio aos portugueses que estão nesta zona da Alemanha, nomeadamente através da criação do lugar de chefe de serviço social e de um técnico de serviço social para a área de Berlim.
Restam algumas questões que...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Secretário de Estado, vai ter oportunidade de intervir outra vez e já ultrapassou largamente o seu tempo disponível.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, falou em contactos, etc., etc., feitos pelo Minis-

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tério dos Negócios Estrangeiros, mas interessa-nos e saber que medidas concretas tomou o Governo português.
Recordo-me que quando estive na República Federal da Alemanha já havia agressões a turcos e a quase todos os cidadãos de outras nacionalidades. Acontece e que o Governo turco dirigia-se de imediato ao Governo alemão, impondo condições para os seus trabalhadores continuarem a trabalhar no país. Tinham coragem para o fazer, que é aquilo que nós não temos tido. Ora, de facto, temos de esclarecer muito bem esta questão: que medidas é que o Governo tem para tal?
Passemos à segunda questão relativamente à reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros e à extinção do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas, na sequência da reestruturação levada a efeito no Ministério e da consequente integração daquele instituto na Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas. Verifica-se que existe efectivo bloqueio às acções em curso, nomeadamente os Programas Operacionais 9 e 14, no âmbito da formação profissional, co-financiados pelo Fundo Social Europeu devido à falta de verbas e meios humanos.
Quanto às acções culturais de apoio nas comunidades portuguesas emigradas existem entraves face à perda de autonomia administrativa e financeira, uma vez que o orçamento do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas foi aglutinado pelo orçamento geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, não sendo sequer atribuídas à direcção-geral quaisquer verbas para que houvesse continuação dessas acções. Neste caso, há problemas nas classes transplantadas, no apoio aos artistas portugueses que se deslocam às comunidades portuguesas emigradas, exposições, bibliotecas, etc., etc..
Quanto ao apoio social verifica-se que a direcção-geral não funciona, tendo sido desfeita a direcção a quem efectivamente competia...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
acções de apoio, que não têm meios humanos necessários para esse efeito, nomeadamente, para as organizações internacionais representativas como, por exemplo, o Conselho da Europa para as questões das migrações, a OCDE, relativamente ao SOPEMI, Segurança Social. E, mais gritante ainda, é o facto da fiscalização dos contratos de trabalho das empresas que, no âmbito da livre circulação de pessoas e bens, deixaram de estar na alçada daquele organismo, permitindo actos de verdadeiro vandalismo, como os que se verificaram com os nossos compatriotas na Alemanha.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)- - Queira concluir, Sr. Deputado, porque já ultrapassou o seu tempo.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.

Por outro lado, temos o não aproveitamento da estrutura dos audiovisuais para apoio às associações nas comunidades portuguesas e a falta de programação na edição de livros no âmbito das migrações e da sociologia das migrações, ensaios e outros trabalhos nessa área.
Assim sendo, todos nós esperávamos, como era objectivo do Governo, que depois da reestruturação do MNE OS serviços de apoio à emigração, transformados em Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas, viessem a dar uma nova dinâmica na organização dos serviços e apoios às comunidades. Infelizmente, foram goradas todas as expectativas. Que reestruturação, Sr. Secretário de Estado?

Protestos do PSD.

Tendo conhecimento de um projecto que lhe foi recentemente entregue sobre o encerramento de consulados de carreira nos EUA....

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir. Sr. Deputado. Já utilizou o dobro do tempo de que dispunha!

O Orador: - Termino já, Sr Presidente.

... Brasil, França e Espanha, quer o Sr. Secretário de Estado informar esta Câmara e os portugueses sobre o objecto do projecto?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Concluiu. Sr. Deputado?

O Orador: - Só mais uma questão.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem de concluir imediatamente porque ultrapassou largamente o seu tempo.

O Orador: - Sr. Presidente, é tão difícil falar sobre as questões de emigração neste Plenário, que agradecia a sua benevolência.
Quanto à RTP Internacional,...

Protestos do PSD.

... era suposto que o governo suportasse os encargos decorrentes da transmissão via satélite para os EUA sem quaisquer encargos para os cidadãos portugueses que ali trabalham e residem, porem, tal não se verifica sendo-lhes cobradas taxas. Sabendo-se que V. Ex.ª se reuniu várias vezes com responsáveis da RTP, queira o Sr. Secretário de Estado informar esta Câmara sobre a realidade dos factos. É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miguel Oliveira.

O Sr. Carlos Miguel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito directo pois só temos um minuto. Tenho conhecimento das importantes medidas que foram tomadas pelo Governo relativamente à emigração mas gostaria de ter uma actualização sobre três áreas.
A primeira refere-se ao novo e ambicioso plano de informatização da rede consular. Qual é o seu estado de implementação? Na mesma altura também foi mencionado o plano de formação de pessoal consular acerca do qual lhe peço que forneça alguns detalhes.
Relativamente aos bilhetes de identidade, houve um grande afluxo de pedidos, indicativo do crescente orgulho destes portugueses na sua cidadania portuguesa, que tem gerado alguns atrasos na emissão dos bilhetes de identidade e, por isso, queria também uma informação actualizada.
Para terminar, não queria deixar de me referir à pergunta essencial e principal que foi feita, e bem, pela bancada do Partido Socialista É que estes trabalhadores foram alvo de exploração por parte de pessoas menos escrupulosas, mas penso que é também nossa responsabilidade e

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cuca política fazer com que a dramática situação em que se encontram não seja agora alvo de aproveitamento político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade

O Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, perante a gravidade dos factos que foram aqui descritos pelo Sr. Deputado Caio Roque e que têm a ver com os nossos emigrantes na Alemanha, o Sr. Secretário de Estado, quer queira quer não, minimizou uma situação que é extremamente grave.
Não é só a questão da agressão física, que recentemente ocorreu e que já é, pelo menos, a terceira vez que acontece com cidadãos nossos na Alemanha, é toda uma serie de discriminações.
Sr. Secretário de Estado, qual é a sua posição perante o facto de o governo holandês cobrar, por exemplo, 50 e 500 florins para passar cartões de residência e de fixação a cidadãos portugueses quando isto e proibido por uma directiva comunitária?
Por outro lado, a situação de passividade que o Governo português tem tido quanto à discriminação de direitos de cidadãos nossos compatriotas noutros países da Europa, leva-nos a questionar que política de emigração tem o Governo português. Não estará a usar, simplesmente, a emigração como uma válvula de escape apara amortecer o choque do desemprego, sujeitando-se a um «mal menor» de todas as discriminações e ataques a que os nossos concidadãos estão sujeitos noutros países?
Foi aqui perguntado pelo Sr. Deputado Caio Roque - e volto a questionar - quais as medidas concretas para obstar a estas situações. E, por outro lado, reafirmo a pergunta: vai ou não o Governo agendar este problema, o com do na Alemanha, para a próxima reunião da Comissão Mista Luso-Alemã?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pereira Lopes.

O Sr. Pereira Lopes (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero reconhecer aqui, nesta Câmara, todo o esforço meritório que este e o anterior Governo têm feito para que os portugueses, espalhados por todos esses países da Europa Comunitária, vejam concretizado o maior número possível das suas aspirações. E, desde logo, reconhecer quão importante foi para eles a RTP Internacional. Aliás, da visita que fiz a esses países tenho verificado quão importante é para a comunidade portuguesa, espalhada pela Europa, esse instrumento de difusão da língua e da cultura portuguesas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Reconhecemos que muito tem sido feito ao longo deste tempo, como também sabemos que muito há a fazer. Preocupa-nos, tal como ao Sr. Deputado Caio Roque, os sinais de racismo e xenofobia que grassam por essa Europa. Mas também sabemos que este combate não pode, não deve ser, não será com certeza resolvido através de decretos de quaisquer que sejam os governos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terá de ser uma luta de todos nós, de toda a Comunidade Europeia, de todos os agentes económicos e sociais, de todas as forças políticas! E cada um de nós, cada partido político, cada grupo parlamentar, deverá exercer a influência nos aerópagos internacionais com peso bastante para tal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por conseguinte, preocupa-nos também a exploração da mão-de-obra barata, explorada sem escrúpulos por empresas fantasmas que transportam os nossos trabalhadores para outros países, nomeadamente neste caso, na Alemanha.
Por isso, estamos preocupados, no entanto as explicações do Sr. Secretário de Estado deixaram-nos, não digo totalmente tranquilos, mas com alguma esperança.
Porém, gostaríamos ainda de ser esclarecidos do seguinte: será que na reunião anunciada com o Sr. Secretário de Estado alemão haverá já algum protocolo ou algumas medidas que possam ser concretizadas por altura dessas visitas?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, não quero perder esta oportunidade, lendo em conta a presença dos Srs. Secretários de Estado do Ministério dos Negócios Estrangeiros, para pôr a seguinte questão: no âmbito da Subcomissão de Cultura, de que sou Presidente, e seguindo os trâmites regimentais normais, pedimos já por várias vezes a presença do presidente do Instituto Camões que, na sequência da última reestruturação, foi integrado, como sabem, no âmbito do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Até hoje, ainda não conseguimos ter essa reunião de trabalho com o presidente do Instituto Camões.
Em contrapartida, apesar de o projecto da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa ser apresentado como um grande desígnio pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a verdade é que a única informação sobre esse grande desígnio que, até hoje, tivemos foi-nos fornecida pela embaixada do Brasil, que nos enviou uma brochura acompanhada por um suplemento do Jornal de Letras. Não posso deixar de sublinhar este contraste flagrante!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nesta óptica e muito rapidamente, tendo em copla o tempo limitado que tenho, Srs. Secretários de Estado, no que diz respeito ao Instituto Camões e à política externa no âmbito da cultura e da língua, as questões muito precisas que eu tinha para colocar são as seguinte: para quando a revisão do estatuto orgânico do Instituto Camões? É verdade ou não que, no caso concreto da França, a Comissão Mista já não reúne há cerca de quatro anos, com todas as implicações, inclusive no domínio cultural? Para quando a renovação do protocolo de intercâmbio? É verdade ou não que os compromissos ao abrigo dos acordos culturais não estão a ser cumpridos no que diz respeito à atribuição de bolsas e de subsídios? É verdade ou não que, na sequência de reestruturação havida, deixou de haver planeamento de acções culturais, deixou, no fundo, de haver uma política cultural externa?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado Carlos Luís

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O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, cumprimento V. Ex.ª pela presença neste Plenário, pois há cerca de um ano que ando a fazer diligências junto do Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros. Comunidades Portuguesas e Cooperação para que um membro do Governo venha, em sede de comissão, abordar todos estes problemas que foram aqui focados.
Foi anunciado ao País, tanto pelo Sr. Ministro das Negócios Estrangeiros como por V. Ex.ª, nomeadamente numa entrevista ao Diário de Notícias, de 27 de Janeiro d$ .1993, a reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros e da sua Secretaria de Estado. Nessa entrevista, com pompa e circunstância, e nos dias seguintes, previa-se uma grande reestruturação do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Não tenho tempo disponível para agora, aqui, £ abordar, mas fá-lo-ei no próximo dia 8 e conto com a presença de V. Ex.ª na Comissão de Negócios Estrangeiros para, aí sim, abordarmos esta e outras questões que já aqui foram focadas.
Não tendo tido qualquer resposta para que um membro da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros viesse ao Plenário ou à Comissão para abordarmos estes problemas, utilizei a figura regimental do requerimento e dirigi um a V. Ex.ª, em Março, sobre os graves problemas que estão a acontecer, nomeadamente na Alemanha e na Bélgica. Estive em Antuérpia, no sábado passado, onde tive uma reunião com compatriotas nossos que me contaram casos idênticos ou semelhantes, não com a gravidade, daqueles que estão a acontecer na Alemanha mas também com alguma expressão e alguma gravidade, em que quer a nossa Embaixada quer o nosso Consulado não têm dado resposta cabal a esses problemas.
Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber, sendo todos estes países membros da União Europeia, que diligências tomou a sua Secretaria de Estado junto da União Europeia para que esses problemas possam ser colmatados?
Também no que diz respeito ao Instituto Camões, a pergunta é pertinente, na medida em que foram suprimidos 22 leitorados. Só em França foram suprimidos cinco leitorados de português! Sendo a língua e a cultura portuguesas uma das prioridades deste Governo, não compreendo como é que foram suprimidos 22 leitorados, cinco dos quais em França, já para não falar de outras medidas relativas à língua e cultura portuguesas.
No início de Setembro, através de carta dirigida ao Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, solicitei a presença de V. Ex.ª ou do Sr. Ministro em sede de comissão. Porquê todo este tempo, Sr. Secretário de Estado? Há oito meses que ando a pedir a comparência de um membro do Governo da área dos negócios estrangeiros, em que há três Secretários de Estado e um Ministro. Porquê esta ausência de oito meses? É a fuga aos problemas ou é a «fuga para a frente» destes problemas?

Vozes do PSD: - Isso é falso!

O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Não tem vergonha de estar aqui a dizer mentiras?!

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Também pata pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr Secretário de Estado, aproveito esta oportunidade para, em primeiro lugar, me congratular com a iniciativa do Sr. Deputado Caio Roque, porque, naturalmente, este assunto preocupa-nos a todos e, por isso, nesta sede, impunha-se, de facto, que houvesse algum esclarecimento sobre esta matéria. Daí o facto de me congratular com a iniciativa e também de a agradecer, em nome de todos aqueles que representamos.
Em segundo lugar, gostava de dizer que das explicações já dadas pelo Sr. Secretário de Estado se infere que, de facto, o Governo português, dentro dos canais e da iniciativa possível que lhe está reservada, naturalmente, já fez tudo aquilo que podia fazer.
Por outro lado, como o Estado português, ou alguém, em sua representação, não pode, de forma nenhuma, chegar junto do Chanceler Kohl e ameaçá-lo com isto ou aquilo - não seria aconselhável um procedimento desse género restam-nos apenas algumas iniciativas.
Por isso, proponho, desde já, ao Sr. Deputado Caio Roque que, no âmbito da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e dentro daquele que é o normal funcionamento dessa mesma Comissão, se faça o agendamento de uma reunião com o Sr. Embaixador da República da Alemanha, no sentido de nos prestar alguns esclarecimentos sobre esta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto para que possamos, também nós, como Deputados, a partir daí, contribuir para o enriquecimento deste debate e para a procura das melhores soluções, com vista à defesa dos portugueses que trabalham na Alemanha.
Quero ainda acrescentar que não só nos preocupam os portugueses que trabalham na Alemanha como também nos preocupam os portugueses que trabalham na África do Sul e que têm sido alvo de diferentes ataques, os que trabalham na Venezuela; enfim, os que trabalham em todos os lados e sofrem ataques da mais variada índole.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Caio Roque (PS): - Tive o cuidado de me referir também a «outros países»!

O Orador: - No nosso entendimento, o Governo andou bem, porque fez aquilo que estava ao seu alcance e as démarches que vão seguir-se parecem-nos, de facto, adequadas.
A nós, Deputados, dentro desta missão nacional, compete-nos ajudar a encontrar as melhores soluções para que, pedagogicamente, estes acontecimentos não se voltem a repetir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes Silva.

O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Sr. Presidente, sob esta figura regimental, mais uma vez, e no seguimento da minha intervenção da passada quarta-feira, quero lamentar que o Partido Socialista venha aqui, a Plenário, sucessivamente, continuamente, apresentar falsas questões, que não existem nem foram suscitadas em comissão.
Mais uma vez, reafirmo, em Plenário, para que fique registado em acta, que todas as solicitações feitas pelo Partido Socialista ou por qualquer outro membro da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e

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Cooperação, em relação a membros do Governo, têm sido atendidas e têm sido sempre viabilizadas pelo Partido Social Democrata. Não é verdade, repito, não é verdade que o PSD, alguma vez, tenha inviabilizado qualquer presença de qualquer membro do Governo na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.
O Sr. Deputado Carlos Luís deveria ter estado aqui na passada quarta-feira, quando o Deputado Marques da Costa suscitou esta questão, porque já falámos disto.
Esse problema é falso, não existe e estamos fartos de mentiras desse tipo. Se os senhores querem falar verdade, convidem os membros do Governo, pois os senhores sabem que eles lá irão. Aliás, o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas vai estar presente na Comissão no próximo dia 8.
Estamos fartos de mentiras, estamos fartos da vossa ausência nas reuniões da Comissão e estamos fartos de que venham, depois, aqui dizer que os membros do Governo não vão lá.

Aplausos do PSD.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Leis (PS): - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Nos termos do Regimento da Assembleia da República, a palavra ser-lhe-á concedida no final do debate, Sr. Deputado.
Para dar esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.
O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, a pluralidade de questões que me foram colocadas, provavelmente, vai tornar materialmente impossível que responda a todas, pelo menos com o detalhe que a questão me merece, e acreditem como eu gostaria.
Foi aqui dito que no próximo dia 8 estarei na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação. Quero dizer que fá-lo-ei com muito gosto e tenho a certeza de que também será o momento para poder responder a algumas questões que não esclarecerei hoje ou cuja resposta, pelo curto espaço de tempo de que disponho, ficará necessariamente incompleta.
Permitam-me, no entanto, um pouco em complemento do que já foi aqui dito, dizer o seguinte: sempre que solicitado para vir à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação - e esta resposta destina-se a vários Srs. Deputados que colocaram a questão -, a minha disponibilidade, acreditem, é total e imediata. A questão das marcações, como imaginam, ultrapassa-me e nem quero pronunciar-me sobre ela.
Permitam-me ainda uma consideração, que também faço com total sinceridade e de olhos nos olhos de todos os Srs. Deputados: não tenho quaisquer pretensões de, nesta matéria, fazer melhor ou mais do que qualquer Sr. Deputado. Mais do que isso, julgo que, se calhar, será ilegítimo que qualquer um de nós, seja eu ou algum dos senhores, erga a bandeira da prioridade da defesa dos interesses dos portugueses no estrangeiro. Penso que esta é uma luta comum, onde todos fazemos, seguramente, o melhor que sabemos e que podemos, com total empenhamento. Por esta razão, tenho dito muitas vezes - e volto a repeti-lo - que penso que este é um campo de eleição onde os esforços do Governo, do Parlamento e de outras instituições serão sempre de menos para garantir o apoio aos muitos milhares de portugueses que vivem no estrangeiro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente às medidas concretas - e com isto julgo também responder a dois ou três Srs. Deputados, seguramente ao Sr. Deputado Caio Roque -, tenho um largo dossier cronológico dos acontecimentos que, como é lógico, não vou ler. Mas quero referir que, logo tivemos deles conhecimento, fizemos aquilo que era, penso eu, razoável e expectável: a deslocação imediata de representantes da embaixada de Portugal e dos consulados ao local dos acidentes.
Assim, enquadrámos, apoiámos e estivemos pessoalmente com todos os portugueses vítimas de qualquer incidente, fosse ele de contratação ilegal ou de ataque. Tivemos os tais contactos - e não foram contactos sociais, Srs. Deputados - com a polícia local, com as autoridades autárquicas locais e com o Governo da Saxónia. Obviamente que não o fizemos para tomar chá mas, sim, para verberarmos os comportamentos, para manifestarmos seriamente a nossa preocupação e para exigirmos a tomada de medidas adequadas à protecção dos portugueses. E as notas verbais de protesto entregues nos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, como todos os Srs. Deputados sabem, são instrumentos sérios, da maior dignidade, em que um governo interpela outro e lhe manifesta a sua preocupação, o seu protesto, o seu repúdio, conforme os acontecimentos. Também isso fizemos.
Penso, no entanto - e permitam-me que também o diga -, que devemos ter algum cuidado na apreciação destes casos, porque, na realidade, a sua apreciação casuística e, sobretudo, a sua generalização a todos os países onde estão portugueses, pode levar-nos a uma análise seguramente menos serena e, eventualmente, não adequada dos acontecimentos.
É evidente que em todos os lados há conflitos humanos, que não têm necessariamente cariz político ou sequer persecutório. Nós próprios, aqui, em Lisboa, sabemos que existem conflitos com cidadãos estrangeiros e isto não significa que Portugal seja objecto de notas de protesto por parte dos governos dos países a que esses cidadãos pertencem e muito menos de ameaças de cortes de relações ou de coisas parecidas. Temos de situar alguns destes incidentes dentro do quadro normal de conflitualidade que as sociedades têm.

O Sr. Caio Roque (PS): - Ninguém falou em cortes de relações!

O Orador: - Não, não. Não estou a pôr isto na boca de nenhum dos Srs. Deputados! Só estou a dizer e penso que foi um Deputado da bancada do PSD quem o disse - que poderia até levar-nos a um corte de relações ou a medidas drásticas dessa natureza. Mas não é o caso e julgo que era importante situarmos as ocorrências na sua verdadeira dimensão.
De facto, de contornos essencialmente organizados e políticos só houve um incidente, o último, o dos skinheads de Dresden. Houve um outro, que foi nitidamente um conflito à saída de um bar - e eu sei-o por informações dela-

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lhadas que me chegaram -, na sequência daquelas questões que são normais ao fim da noite. Um terceiro incidente foi provocado por um grupo de jovens entre os 15 e os 25 anos, desempregados, hostis, com certeza, dentro daquele quadro referencial que mencionei, que escolheram, por acaso, a residência dos portugueses, como podiam ter escolhido a residência de outro indivíduo qualquer. Quiseram, àquelas horas da noite, expandir a sua fúria, e sua zanga e a sua agressividade e, infelizmente, como sabem, ela caiu sobre os portugueses.

O Sr. Caio Roque (PS): - E o assassinato em Berlim?!

O Orador: - Agora, Sr. Deputado, independentemente desta análise realista que, penso eu, todos devemos fazer, o que e facto e que as diligências e as medidas tomadas pelo Governo português surtiram efeito, porque em todos os casos houve não só - obviamente e como não podia deixar de ser pedidos de desculpas formais por parte do Governo da Alemanha e a garantia de que lhes seria dado o enquadramento policial devido, como, mais do que isso, casos concretos de detenção, de prisão, de apreensão de viaturas, etc.
Portanto, penso que, na sequência das nossas diligências - partindo do princípio de que as autoridades alemãs nada fanam se assim não fosse, e acreditamos que o fariam mesmo que não houvesse a nossa pressão -, houve já providências para este tipo de situações.
Mas não estamos satisfeitos.

O Sr. Caio Roque (PS): - E o assassinato de Álvaro Carreira em Berlim?!

O Orador: - Sr. Deputado, gostaria de, depois, trocar impressões consigo, porque não tenho elementos que me permitam responder-lhe a essa questão.
Mas, como dizia, não estamos satisfeitos. Queremos, evidentemente, muito mais, razão pela qual tive oportunidade de convidar o Secretário de Estado Federal do Emprego alemão a deslocar-se a Portugal entre os dias 15 e 17 de Novembro e, então, iremos discutir vários aspectos. Vamos discutir, seguramente, aspectos de formação profissional para os jovens portugueses, o problema da contratação ilegal dos nossos compatriotas e estes casos de violência.
No entanto, mais uma vez, não é nossa intenção ficar por uma amigável - serena, seguramente - troca de impressões. Nada disso! Queremos que desta reunião saiam, de facto, compromissos mútuos, porque, penso, Portugal também tem responsabilidades neste aspecto. Algumas das nossas autoridades deverão, igualmente, ter outro tipo de actuação. Queremos obter compromissos mútuos, que permitam de facto enquadrar, ultrapassar e evitar, tanto quanto está ao alcance da obra humana, situações ou a repetição de situações desta natureza.
A informação tem de ser total e penso que a solidariedade institucional de todos nós será sempre de menos, Srs. Deputados. Repito, a informação tem de ser total, porque os «cantos de sereia» existem e as tentativas de aliciamento de compatriotas nossos, baseadas em verdadeiras mentiras, infelizmente, também existem em Portugal! Por isso, não podemos descurar a informação e a colaboração a todos os níveis.
Se me permitem, faço um apelo a todos os Deputados desta Câmara e peço que, na medida das vossas possibilidades, façam dele eco: solicitem às pessoas que, antes de «embarcarem» em qualquer aventura, se dirijam às autoridades locais, aos governos civis, aos presidentes de câmaras, às juntas de freguesia, às delegações regionais da Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas e se informem, perguntem, porque existem pessoas aptas e, obviamente, adequadas a dar-lhes os esclarecimentos que pedirem.
É evidente e isto é importante para que o quadro de toda esta situação seja perfeitamente transparente - que nem sempre temos a colaboração de compatriotas nossos. Também existem, infelizmente, e em relação a esses julgo que toda a informação ainda tem de ser mais cuidada, compatriotas nossos que, embora conhecedores destas situações e dos riscos que correm, preferem, para ganharem mais dinheiro mais rapidamente, correr esses riscos temos de os convencer a todos, sem excepção, de que e um risco que não se pode correr, porque as consequências são, efectivamente, graves.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste quadro ainda, e respondendo a outra pergunta que foi feita, recordo que o repatriamento dos portugueses foi feito imediatamente. Através da embaixada de Portugal, foram colocados meios de transporte à disposição para os trazer para Portugal, ao abrigo da protecção consular.
Srs. Deputados, a verdade é que o repatriamento ao abrigo da protecção consular, acessível a qualquer um de nós em situação de dificuldade, define que o Estado garante esse repatriamento, pedindo depois, em devido tempo, e caso haja possibilidades de satisfazer essa dívida, o reembolso da despesa efectuada. É um comportamento normal que afecta todos os cidadãos portugueses e que só por uma medida excepcional poderá ser alterada.

O Sr. Caio Roque (PS): - Os homens perderam os seus empregos!

O Orador: - Penso que não e verdade, não pode ser verdade, não é, seguramente, verdade que - como ouvi, e penso que o Sr. Deputado também se referia ao mesmo órgão de comunicação social - os portugueses tinham pago a deslocação. Isso não é verdade. Os autocarros foram disponibilizados pelo Governo português.

Vozes do PCP: - Tiveram de pagar!

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Secretário de Estado, se me permite uma interrupção, a informação que recebi ontem, de uma jornalista, é a de que esses cidadãos que foram repatriados estão a receber notas de pagamento do seu repatriamento. Ora, eles foram despedidos e perderam os seus empregos, não tendo possibilidade de fazerem esse pagamento.

O Orador: - Sr. Deputado, não sei se já estão a receber, porque esse é um mecanismo administrativo, que, obviamente, não controlo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP)- - Estão a receber, sim!

O Orador: - Mas, admitindo que sim, insere-se no que acabei de lhe dizer. É o comportamento que está determinado às autoridades do Estado português cumprir e fazer cumprir, que é, justamente, remeter aos interessados a nota das despesas e, no caso de haver possibilidade de paga-

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mento, as pessoas pagarem. Como imagina, este mecanismo é muito brando, porque, normalmente, não há forma de fiscalizar se as pessoas têm ou não condições de pagamento e, que eu saiba, muito menos no caso de as pessoas, pura e simplesmente, não pagarem. Não estou a fazer um convite a que isso aconteça, porque estaria, como é óbvio, a ser cúmplice em defraudar o Estado e, sobretudo, a fazer uma interpretação ilegítima de uma norma que obriga a todos nós, mas a realidade é essa e não deve constituir preocupação para quem esteja, efectivamente, em necessidade.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, as questões colocadas foram muitas mais. Porém, vou ainda procurar responder globalmente a uma outra, formulada por vários Srs. Deputados, que tem a ver com a reestruturação da Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas, a qual, de certa forma, herdou toda uma múltipla, difícil e complexa situação pré-existente - não se trata de uma herança directa mas, sim, de heranças indirectas.
Obviamente, também estarei à disposição dos Srs. Deputados, como não pode deixar de ser - e terei muito gosto e interesse nisso -, na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, pelo que limitar-me-ei aqui, dado o pouco tempo regimental de que disponho, a fazer o seguinte afloramento: tínhamos - e é preciso não esquecê-lo - uma situação pré-existente extremamente complexa. A saber: consulados e agentes consulares espalhados pelo mundo, sem qualquer retaguarda; uma direcção-geral bicéfala, porque tratava tanto de assuntos administrativos e financeiros como vagamente dos consulados, e um instituto que, ao longo dos anos - e, nestas matérias, sou seguramente muito mais novo do que muitos dos Srs. Deputados -, vinha a ser verberado por todos pela sua inoperância, ineficácia e, mais do que isso, por cada vez se tornar ou estar a ser mais elíptico na condução de políticas concretas no terreno.
Assim, a nossa preocupação foi a de dar uma coerência global a tudo isto, partindo do princípio de que a representação externa do Estado português no estrangeiro, em todas as suas vertentes, compete, como não pode deixar de ser, às embaixadas e aos consulados - é isso o que os outros Estados reconhecem. Nesse sentido, teríamos de integrar, dentro deste pressuposto, que é o que nos permite ter eficácia na actuação no exterior, toda uma realidade, que era a do instituto, dentro de uma lógica que só as embaixadas e os consulados têm legitimidade para prosseguir.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor de concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Foi, portanto, este o pressuposto. Posso ainda dizer-lhe - e, mais tarde, terei muito gosto em explicar-lho - que não vejo razões para não estarmos satisfeitos. É evidente que todas as reestruturações têm os seus custos, sobretudo como aconteceu no Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde se operou uma reestruturação global - não só deste ou daquele departamento, mas do Ministério inteiro -, e é óbvio que as pessoas oferecem as resistências normais e há dificuldades de adaptação. Não o nego e, muito mais do que isso, até pode haver inadequação das pessoas para os lugares, o tempo o dirá... Tudo isso é verdade, normal e lógico e acontece em qualquer situação. Agora, o modelo, julgo, é dificilmente questionável, ainda mais, estando ele, neste momento, a iniciar o seu funcionamento. Contudo, podem crer que tudo farei para que ele corresponda efectivamente àquilo que esteve na sua génese, no seu pensamento e na sua origem.
Quanto a acções,...

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor de concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Muito ficou por dizer. Porém, se me permitem e não levam a mal não o fazer agora, terei muito gosto em retomar esta conversa, embora não com todos, no próximo dia 8, na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Gomes Silva, aquilo que afirmei na minha intervenção foi que, há cerca de oito meses, solicitei ao Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, Deputado António Mana Pereira, a vinda à Comissão de um membro do Governo do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Aliás, confidenciei ao meu ilustre amigo, Deputado Luís Geraldes, que tinha solicitado ao Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação a vinda do Sr. Ministro à Comissão, antes da realização das eleições na África do Sul, uma vez que a situação tinha alguma gravidade - ou previa-se que pudesse vir a ter -, não sendo assim tão calma Portanto, como Deputado, tinha o direito de estar informado sobre o desenrolar dos acontecimentos.
Depois, como, durante o mês de Abril, nem o Sr. Ministro nem o Sr. Secretário de Estado vieram à Comissão, renovei o meu convite, no mês de Maio, através do Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, para que um membro do Governo do Ministério dos Negócios Estrangeiros o fizesse nessa altura, o que também não aconteceu. Em Junho, voltei a renovar esse convite e, no mês de Julho, como fui hospitalizado, não pude fazê-lo. Em Agosto, resolvi enviar uma carta ao Sr Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, que chegou em princípios de Setembro, mais concretamente, datada de 5 de Setembro, no sentido de aqui se deslocar um membro do Governo do Ministério dos Negócios Estrangeiros para nos prestar vanadíssimos esclarecimentos, uma vez que os problemas se iam avolumando, como o senhor focou - e muito bem! - sobre a África Austral, sobre a Venezuela, sobre o Brasil, sobre a Europa, enfim, uma série de problemas do âmbito da Secretaria de Estado de que V. Ex.ª é responsável.
Não tinha obtido qualquer resposta, até que, há cerca de oito dias, sensivelmente, o Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação me disse: «até que enfim, no dia oito cá tem o Sr. Secretário de Estado! O Sr Deputado anda há uma série de tempo a solicitar a presença de um membro do Governo...».
Sr. Deputado Rui Gomes Silva, tenho por V. Ex.ª a maior consideração e estima e acredite que não me ouviu dizer, nesta Câmara, que os Deputados do PSD teriam impedido a vinda de um membro do Governo à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação. Irei avocar o Sr. Presidente da Comissão para, no início dos trabalhos da próxima reunião, no dia 8, o ter como testemu-

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29 DE OUTUBRO DE 1994

nha das minhas insistências para a vinda à Comissão de um membro do Governo, a fim de tratarmos desses problemas.
Assim sendo, penso que V. Ex.ª não tinha razão quando invocou que eu afirmei que os Srs. Deputados do PSD teriam impedido a vinda de um membro do Governo à Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação. Isso não é correcto! Isso não foi verdade! Eu não fiz essas afirmações! E, como tal, para além da carta que dirigi ao Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tomá-lo-ei como testemunha de que, durante estes oito meses, lhe ando a pedir para que um membro do Governo venha à Comissão.
Tenho o máximo de consideração e estima pelo Sr Secretário de Estado, pois temos amigos comuns que me têm dado as melhores referências acerca da sua pessoa. Ainda antes de vir para este debate, confidenciei um Deputado da bancada do PSD que tinha por V. Ex.ª a maior consideração e que V. Ex.ª tem a melhor vontade em resolver estes problemas. Mas a questão fundamental não é essa, a questão e que V. Ex.ª não tem meios para resolver estes problemas e, por isso, iremos retomar este debate no próximo dia oito, em sede de Comissão.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Ruí Gomes Silva.

O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Luís, a verdade é que a sua acusação de há pouco, em termos muito leves, tocou de novo naquilo que o Sr. Deputado Marques da Costa aqui tinha referido, aliás com alguns epítetos de que não gosto e que lhe referi na altura, ao dizer que o PSD era a muralha de aço do Governo e que não deixava vir cá o Governo.
Agradeço-lhe a correcção...

O Sr. Raul Rego (PS): - Não há correcção alguma!

O Sr. Carlos Luís (PS). - Eu prestei um esclarecimento!

O Orador: - ... ou esclarecimento, porque a verdade é que o PSD sempre se disponibilizou, desde que houvesse uma proposta, para solicitar aos membros do Governo a sua vinda à Comissão. Agora, se o Sr. Deputado me diz que, no dia x, quer cá o Sr Ministro dos Negócios Estrangeiros e ele está em Nova Iorque, no Nepal ou onde quer que seja, eu não o posso obrigar a vir à Comissão quando o Sr. Deputado deseja. No entanto, devo dizer-lhe que há, e sempre houve, por parte do PSD, toda a disponibilidade para convidar os membros do Governo para virem cá, tal como para os receber quando se quiserem deslocar à Comissão por iniciativa própria.
Mas se houve algumas questões, em termos pontuais, que impediram o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros de vir cá no dia x, da Comissão reunir no dia y ou de vir cá outra pessoa no dia z, é um problema que não nos pode ser assacado e pelo qual não podemos ser responsabilizados. Todos devemos compreender que há circunstâncias que nos impedem de reunir com as pessoas que queremos nos dias em que queremos. Infelizmente, não somos só nós e os princípios mas somos nós, os princípios e as circunstâncias e, neste caso, muitas vezes, as circunstâncias são mais determinantes do que os princípios.
Sr. Deputado, eu não disse que o PSD estava a inviabilizar, a sua intervenção foi nesse sentido e, portanto, constato com gosto que o PSD, neste caso, é o principal veículo de solicitação da presença dos membros do Governo na Comissão, à qual os próprios nunca se recusaram.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á na quarta-feira, dia 2, pelas 15 horas, com a agenda que já foi distribuída.

Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Anabela Honório Matias.
António de Carvalho Martins.
António José Barradas Leitão.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Jaime Gomes Milhomens.
João José Pedreira de Matos.
José Albino da Silva Peneda.
José Manuel Nunes Liberato.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
António de Almeida Santos.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Eduardo Ribeiro Pereira.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel António dos Santos.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

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196 I SÉRIE - NÚMERO 6

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António José Caeiro da Motta Veiga.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando Monteiro do Amaral.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
José Angelo Ferreira Correia.
José Mendes Bota.
Luís António Martins.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

António Domingues de Azevedo.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Leis Carlos Martins Peixoto
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró
Maria da Conceição Seixas de Almeida.

Deputados independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda.

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