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Quinta-feira, 3 de Novembro de 1994 I Série - Número 7
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE NOVEMBRO DE 1994
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário de Lemos Damião
José de Almeida Cesário
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 452/VI, de requerimentos e das respostas a alguns outros.
O Sr Deputado Paulo Trindade (PCP) anunciou a apresentação de uma audição parlamentar relativa à problemática da segurança no trabalho e respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Ferraz de Abreu e José Eduardo Reis (PS) e José Puig (PSD).
O Sr Deputado Luís Pais de Sousa (PSD) referiu-se às conclusões do 2.º Encontro sobre a Alta da Cidade recentemente realizado em Coimbra.
O Sr Deputado Luís Capoulas Santos (PS) criticou a política agrícola do Governo no que respeita à defesa dos interesses portugueses na União Europeia, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs Deputados Antunes da Silva, Carlos Duarte - que também exerceu o direito de defesa da consideração - e Rui Carp (PSD).
O Sr Deputado António Vairinhos (PSD) teceu algumas considerações sobre as principais prioridades para o desenvolvimento económico do Algarve e respondeu, no fim, a um pedido de esclarecimento do Sr Deputado Fialho Anastácio (PS).
Ordem do dia. - A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à substituição de dois Deputados do PSD.
Após o Sr Deputado Fernando Condessa (PSD) ter procedido à síntese do respectivo relatório daquela Comissão, o projecto de lei n.º 275/VI - Estabelece garantias de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais (PS) foi apreciado na generalidade, tendo ainda usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Narana Coissoró e Manuel Queira (CDS-PP) e António Filipe (PCP).
Procedeu-se à discussão do projecto de resolução n.º 123/VI - Manutenção na ilha de Santa Mana do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP), tendo produzido intervenções, a diverso título, os Srs Deputados Mário Maciel (PSD), Martins Goulart (PS), Lino de Carvalho (PCP), Narana Coissoró (CDS-PP), Guilherme Silva e Manuel Silva Azevedo (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Aderido Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abrem.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Meio.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Ema Maria Pereira licite Lóia Paulista.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Ferroando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Motta.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Albino da Silva Peneda.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Numes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bote.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Ganido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
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Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Eduardo dos Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Manuel dos Santos Murteira.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputado independente:
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 452/VI - Sobre o Imposto Automóvel (PS), que baixou à 6.ª Comissão.
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo e a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados André Martins e Isabel Castro; aos Ministérios do Ambiente e Recursos Naturais, Saúde, e Indústria e Energia, formulados pelos Srs. Deputados Luís Pais de Sousa, Macário Correia, Luís Sá e Luís Fazenda; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Fialho Anastácio, Paulo Trindade e Luís Fazenda; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado José Manuel Maia; aos Ministérios da Justiça e Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Luís Sá e José Eduardo Reis e ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Jorge Paulo Cunha, na sessão de 11 de Março; José Vera Jardim, na sessão de 18 de Maio; Luís Sá, no dia 24 de Junho; Álvaro Viegas, na Comissão Permanente de 21 de Julho, e André Martins, no dia 14 de Setembro.
Mais se informa a Câmara de que, na parte da manhã, reuniram as Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e Economia, Finanças e Plano.
Entretanto, as Comissões de Agricultura e Mar e Economia, Finanças e Plano encontram-se reunidas, respectivamente, desde as 14 horas e 30 minutos e 15 horas, estando marcadas para as 16 e 17 horas, respectivamente, reuniões das Comissões de Trabalho, Segurança Social e Família e Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.
O Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A sinistralidade no trabalho em Portugal atingiu níveis de verdadeira calamidade nacional. Segundo estatísticas recentemente divulgadas, em 1993, ocorreram 15 033 acidentes de trabalho dos quais resultaram 862 mortes.
Sendo estes números arrepiantes, mais preocupados ficamos quando sabemos que este tipo de estatísticas costuma pecar por defeito e que o número de acidentes já ocorridos no ano em curso aponta para um agravamento da situação. Em nome de que progresso, de que competitividade, é possível assistir-se a que, diariamente, percam a vida, pelo menos, dois trabalhadores?
Ignóbil e desumano progresso este em que as estatísticas da sinistralidade no trabalho são equiparáveis a números de um conflito militar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a existência de um tão elevado nível de sinistralidade no trabalho em Portugal não
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resulta de qualquer fatalismo, não é produto do acaso, mas - sim - das condições sub-humanas em que muitos trabalhadores são forçados a vender a sua força de trabalho.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - É verdade!
O Orador: - Com efeito, o aumento da sinistralidade tem tido uma subida paralela à da precarização do trabalho.
O Governo tem, no mínimo, por omissão, permitido e fomentado a proliferação de empresas de vão de escada a quem são entregues subempreitadas, nomeadamente, no sector da construção civil, que se caracterizam pela desumanização do trabalho, para cujos responsáveis a vida e a saúde dos trabalhadores são considerados pormenores desprezíveis. Daí que seja praticamente nulo o investimento em matéria de prevenção.
Por outro lado, mesmo as normas existentes, apesar de desactualizadas, não são aplicadas, sendo a fiscalização inexistente ou, nos raros casos de aplicação de multas ou coimas, o respectivo valor é tão ridículo que funciona como estímulo ao não cumprimento das mais elementares regras de segurança.
Esta caracterização é reflexo da crescente desprotecção social a que têm vindo a ser sujeitos os trabalhadores portugueses e que é exemplificada por dados recentemente tornados públicos, segundo os quais, por exemplo, se fica a saber que, no Porto, se aguarda em média cinco meses e meio pelo pagamento do subsídio de desemprego; em Braga, três meses; em Castelo Branco, dois meses; em Leiria, cinco meses; em Lisboa, seis meses; em Setúbal e Beja, três meses e, em Faro, cinco meses.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Um escândalo!
O Orador: - Este é um exemplo elucidativo dos efeitos da reestruturação da segurança social efectuada em Setembro de 1993 pelo Governo do PSD a fim de, alegadamente, racionalizar estruturas orgânicas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, infelizmente, os portugueses já estão habituados a que, sempre que ocorre um acidente cujo impacto o transforma em notícia nacional, surja alguém responsável e com um ar muito sério a declarar que vai proceder-se a um rigoroso inquérito. Só que as conclusões dos inquéritos ficam sempre esquecidas numa qualquer gaveta e os crimes vão continuando impunes. Sim, crimes, Srs. Deputados, porque é disso que se trata quando se põe em causa a vida de um trabalhador por incumprimento de normas de segurança.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E importa recordar que, apesar das propostas apresentadas nesse sentido pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, Portugal constitui, no quadro comunitário, a única excepção relativamente à tipificação dos crimes laborais.
A indiferença patenteada pelo Governo do PSD perante a sinistralidade no trabalho é chocante. Quando se pactua com a precarização do trabalho até níveis que se confundem com métodos esclavagistas, em que os trabalhadores a tudo se têm de sujeitar sob pena de perderem o emprego, estamos, nestes casos, perante uma violação dos direitos humanos, reveladora do desprezo com que a ideologia dominante encara o trabalho.
A exploração de mão-de-obra barata - trabalhadores dos PALOP - e o grau de precaridade em que os trabalhadores desses países exercem a sua actividade profissional em Portugal, no sector da construção civil, estão directamente relacionados com o respectivo índice de sinistralidade e revelam uma despudorada prática de dumping social, constituindo uma nódoa nos princípios humanistas e universalistas assumidos pela sociedade portuguesa.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP considera que a Assembleia da República não pode assistir passivamente à devastação de vidas humanas.
Importa alterar a organização e funcionamento das entidades a quem estão atribuídas funções fiscalizadoras, nomeadamente, a inspecção do trabalho.
Urge actualizar legislação, tomar as sanções efectivamente dissuasoras e criminalizar condutas que revelem um nexo de causalidade para a vida e a saúde dos trabalhadores.
O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Nesse sentido, e como contributo para a elaboração da revisão da legislação sobre segurança no trabalho, o Grupo Parlamentar do PCP vai apresentar na Mesa um projecto de audição parlamentar no sentido de ouvir quer o Governo quer os parceiros sociais ligados a esta problemática, visando a posterior propositura das iniciativas legislativas tidas por pertinentes.
O Sr. Orno de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Em nome do respeito por quem trabalha, em nome da defesa dos direitos humanos, lançamos a esta Câmara o desafio de viabilizar esta iniciativa!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Ferraz de Abreu e José Eduardo Reis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Trindade, foi com muito interesse que o ouvi abordar este problema, que, de facto, é trágico no nosso país. Mas, para além do quadro negro que pintou em relação à sinistralidade no trabalho, gostava de saber se dispõe de informação sobre outras consequências nefastas das más condições de trabalho as doenças profissionais.
Trata-se de uma situação cada vez mais gravosa, que passa mais despercebida por não ser muito espectacular, visto que as consequências vão surgindo insidiosamente e só ao longo da vida dos trabalhadores se vão revelando. Há problemas de surdez profissional, respiratórios, cancerígenos, etc., e penso que, para além das medidas de segurança técnica que são indispensáveis para prevenir os acidentes de trabalho, é necessário que nos debrucemos com a mesma preocupação sobre as causas das doenças profissionais. É, pois, sobre esta matéria que gostava de ser esclarecido.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Reis.
O Sr. José Eduardo Reis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Trindade, também eu segui com aten-
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cão a sua exposição sobre o problema, de índole nacional, da sinistralidade no trabalho e creio que tem razão quando diz que este Governo não ataca esta problemática da forma como deveria fazê-lo. Porém, há uma nuance que eu queria pôr à consideração de V. Ex.ª é que, por vezes, e falo com conhecimento de causa, atribui-se à Inspecção-Geral do Trabalho a responsabilidade por este calamidade. Ora, parece-me que o Sr. Deputado foi, de alguma forma, injusto para com esta entidade porquanto ela sofre pelo facto de não dispor de um quadro de agentes aro número suficiente que possam lutar pela prevenção desta situação.
Pergunto: não entende o Sr. Deputado Paulo Trindade que a causa deste problema reside na insuficiência do quadro da inspecção do trabalho, na deficiente legislação do trabalho e nos reduzidos montantes das multas e das coimas aplicáveis?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.
O Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferraz de Abreu, como é do seu conhecimento, as intervenções que ocorrem no período de antes da ordem do dia não permitem, muitas vezes, que seja. feita uma análise exaustiva dos problemas focados, tanto mais quando têm a gravidade do que pretendi abordar quanto à sinistralidade do trabalho. Por essa razão, não pude deixar suficientemente explícita na minha intervenção a ideia de que eu, bem como o Grupo Parlamentar do PCP, considero fundamental a prevenção, que começa logo no que diz respeito às doenças e aos riscos profissionais.
Aliás, foi promulgada em 1991 certa legislação que até apontava para a obrigatoriedade de tornar públicas as doenças e os riscos profissionais mas, como não está a ser cumprida no nosso país, constitui um factor extremamente grave contribuindo para este aumento da sinistralidade».
Eu diria mesmo que a fase repressiva é de somemos importância e que importa prevenir, desde logo, os riscos e as doenças profissionais.
Por outro lado, o que se verifica no actual quadro legal, como o Sr. Deputado certamente sabe tão bem ou até melhor do que eu, ou seja, o recurso a indemnizações par parte de empresas seguradoras não resolve o problema. Tenho conhecimento do caso de um trabalhador da CP que, em 1954/55, perdeu uma vista e que ainda hoje recebe a quantia de 21$80. É evidente que não há dinheiro que pague a vista de um trabalhador, mas também não é remetendo, a posteriori, a responsabilidade civil assumida pelas seguradoras, que podemos contornar este problema. Penso, pois, que a prevenção das doenças e dos riscos profissionais é prioritária e fundamental.
Quanto à questão formulada pelo Sr. Deputado José Eduardo Reis, devo agradecer a oportunidade que me é dada de esclarecer este ponto porque suponho que me, exprimi mal ou que fui mal interpretado: não houve, da minha parte, a intenção de lançar qualquer acusação aos profissionais da Inspecção-Geral do Trabalho.
Pretendi dizer - e, se não fui claro, quero sê-lo agora - que a Inspecção-Geral do Trabalho não dispõe de meio? humanos nem materiais para cumprir cabalmente a sua missão. Por sua vez, o Governo refugia-se num instituto, o tal IDICT, para sacudir e aliviar a responsabilidade política que tem nesta área e que, muitas vezes, é descarregada nos profissionais da inspecção do trabalho, situação contra a qual nos insurgimos.
Repito: não consideramos responsáveis pela sinistralidade os inspectores do trabalho; pelo contrário, achamos que devem ser-lhes dados meios instrumentais e que a inspecção do trabalho deve ser reforçada dos meios humanos necessários para cumprir cabalmente as suas atribuições dentro do quadro legal em vigor que, só por si, é insuficiente, perspectiva em que serão, eventualmente, necessários muitos mais profissionais. Esta é a mensagem que pretendi deixar e que, penso, agora terá ficado clara.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, por tempo não superior a um minuto, uma vez que se inscreveu tardiamente, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Trindade, cheguei fora de horas e só tardiamente dei conta da matéria que abordou na sua intervenção, exactamente porque estive na sala da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família preparando o debate que vai iniciar-se daqui a pouco sobre a ratificação do diploma relativo à higiene, segurança e saúde no trabalho, que sofreu um atraso de duas semanas por razões que agora não interessam.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que o Sr. Deputado sabe bem que vão ser introduzidos alguns melhoramentos no diploma sobre higiene, segurança e saúde no trabalho que têm a ver com esta matéria, os quais terão algum efeito - é essa a nossa convicção - sobre o tema que acabou de abordar.
Em segundo lugar, não vamos verificar aqui quem está mais consternado nem quem lamenta mais os acidentes que têm ocorrido nos últimos tempos. Nós temos o mesmo direito e a mesma autoridade moral para lamentarmos esses factos e para exprimirmos sentimentos idênticos aos vossos, mas, em termos de responsabilização, penso que há alguns aspectos que devem ser analisados e que não o foram na sua intervenção. É que talvez o Sr. Deputado não saiba que recentemente foram admitidas algumas dezenas de funcionários na Inspecção-Geral de Trabalho, exactamente para prevenção deste tipo de situações.
Por fim, quero deixar-lhe uma pergunta muito concreta. Este assunto já foi estudado e debatido no âmbito do Acordo Económico e Social de 1990. Assim, há alguma medida concreta, por exemplo em termos de iniciativa legislativa, que não esteja prevista no nosso ordenamento legal e que o PCP sugira com vista a melhorar o funcionamento do sector nesta matéria? Se há, é melhor que o diga porque se não há, então, vimos aqui todos lamentar-nos e adiantamos relativamente pouco quanto a esta questão.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade, que dispõe de dois minutos.
O Sr. Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Puig, julgo que é melhor ir ao fundo da questão e falar sobre medidas concretas.
Como o Sr. Deputado sabe tão bem quanto eu próprio, o decreto-lei que está a ser objecto de discussão na especialidade em sede da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, após ter sido submetido a dois pedidos de ratificação, versa apenas um dos muitos aspectos em que o Decreto-Lei n.º 441/91 carece de regulamentação. Repito que o que está a ser discutido é um desses aspectos e só apenas nesta área é que o Governo legislou, e mal, o que
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levou a Assembleia da República a intervir e os diversos grupo parlamentares, incluindo o do PSD, a serem forçados a apresentar propostas de alteração, tão mal estava elaborado o Decreto-Lei n.º 26/94.
De toda a forma - e esta é a primeira questão -, todos os outros aspectos, nomeadamente o da participação das organizações de trabalhadores nesta matéria, continuam a não ter qualquer tipo de regulamentação por parte do Governo.
A segunda questão, que coloquei na minha intervenção e que também é de fundo, diz respeito à criminalização de certas condutas enquanto lesivas da vida e da segurança dos trabalhadores as quais não estão criminalizadas na nossa ordem jurídica, ao contrário do que acontece noutros países. Esta matéria já foi objecto de uma proposta do PCP no âmbito da revisão do Código Penal, a qual foi chumbada pela maioria.
Por outro lado, o Sr. Deputado José Puig perguntou-me se eu sabia ou não que foram admitidos mais funcionários para a Inspecção-Geral de Trabalho. Ora, eu tenho é conhecimento da promessa de serem abertos concursos para a admissão de 47 novos inspectores de trabalho, que seria para completar o actual quadro de pessoal que só por si é insuficiente. Mas, se quer que lhe diga, Sr. Deputado, também tenho conhecimento de que no EDICT e na própria Inspecção-Geral de Trabalho há muitos casos de trabalho precário e a «recibo verde», o que viola a própria legislação de trabalho.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pais de Sousa.
O Sr. Luís Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas grandes cidades tem vindo a perder-se o sentido da escala, da harmonia e da memória colectiva.
A poluição, o ruído, os engarrafamentos, constituem algumas das agressões a que o habitante das cidades está cada vez mais sujeito. Tais situações contribuem significativamente para o stress urbano, o qual se agrava com as distâncias crescentes que afastam a residência do trabalho.
Estas mutações ou «quase-rupturas» são, de facto, o resultado de grandes transformações nos hábitos de vida das pessoas nos últimos 20 ou 30 anos, bem como de certos urbanismos virtualmente «modernos».
Só que o futuro das cidades tem de se conceber e construir a partir do passado e as amputações ou demolições, além de não renovarem a polis, empobrecem-na de forma lamentável.
Daí que, se queremos ter cidades mais humanas e saudáveis, seja fundamental o «regresso» às zonas históricas e isto através da redução da circulação automóvel, da qualificação dos transportes públicos ou municipais, da reabilitação, valorização e animação social e cultural dos centros históricos em causa.
Vem isto a propósito da realização em Coimbra, nos passados dias 22 e 23 de Outubro último, do 2º Encontro sobre a Alta da Cidade.
Antes de mais é devida uma palavra de apreço e de estímulo para o GAAC (Grupo de Arqueologia e Arte do Centro) que, ao assumir mais esta iniciativa, continua o seu «combate», face a um certo défice de acção e de participação bem como de debate em torno destes problemas.
Das conclusões do 2º Encontro sobre a Alta de Coimbra consta que «a Alta contínua a degradar-se, o trânsito automóvel intensificou-se, o estacionamento não teve solução».
Mais se concluiu que a autarquia de Coimbra - entenda-se a câmara municipal - deve encontrar respostas para tal situação, desde logo organizando e gerindo transportes colectivos com qualidade e eficácia e, paralelamente, criando «parques de estacionamento que constituam verdadeiras soluções alternativas». E concluiu-se ainda que «õ problema da habitação, sua conservação e restauro, bem como o do pavimento das ruas, necessitam de uma intervenção de qualidade, urgente e eficaz, que dignifique as condições de vida dos moradores (da Alta) e os impeça de abandonar a área».
Por último, foi expressamente feito mais um apelo à autarquia de Coimbra para que se concretize -ò processo de candidatura da Alta a «património mundial», • o qual se arrasta lamentavelmente há anos, sem que se saiba se há realmente estudos prévios ou sequer uma boa 'articulação com as entidades co-envolvidas, designadamente com o IPPAR, já que, pela voz de um seu representante, um vereador, foi afirmado, categoricamente, que «em 1995, o processo estaria pronto para análise na competente comissão da UNESCO».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Posto isto, devem, no futuro, ser reforçados os mecanismos de participação, incumbindo também aos cidadãos dinamizar o debate em torno dos novos direitos urbanos, maxime, o direito ao silêncio, ao espaço, à higiene e à paisagem.
É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados - e este é apenas um breve registo que gostaríamos de deixar perante a Câmara -, quanto maior for a consciencialização sobre tais direitos, maior será o grau de participação e de influência positiva na administração da cidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. LPÍS Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de se ter constituído paladino da reforma da Política Agrícola Comum, em 1992, e de ter protagonizado a defesa dos interesses das agriculturas ricas do norte da Europa, esquecendo completamente os interesses portugueses, o Governo sustentado pelo PSD, só mais de dois anos após a então considerada estrondosa vitória da presidência portuguesa da então Comunidade Europeia, começou a pôr em execução, tímida, tardia e insuficientemente, algumas das poucas medidas que poderão ter algum interesse para Portugal.
Mais uma vez, o calendário eleitoral do PSD foi posto à frente dos interesses nacionais, correndo-se o risco de o País não receber da União Europeia quaisquer verbas, em 1994, relativas às medidas de acompanhamento por não ter apresentado até ao momento qualquer execução financeira ou material destas medidas.
No entanto, o show off continua. Hoje, o Sr. Ministro da Agricultura anunciou mais uma vez, salvo erro pela quinta - só ele próprio, já é a segunda vez que o faz -, os milhões do PDR para os próximos anos, mas ainda não teve tempo para vir expor a sua perspectiva da agricultura portuguesa ao Parlamento porque, aparentemente, este lhe sobra para funcionar de acordo com a comissão técnica eleitoral do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A razão que me leva a subir a esta tribuna é para, mais uma vez, em nome do PS, denunciar o total imobilismo do PSD que, novamente, não quis, não pôde ou não soube defender os interesses nacionais em sede comunitária.
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Como é do conhecimento de VV. Ex.ªs, decorreu no Luxemburgo, nos passados dias 24 e 25 de Outubro, mais um Conselho de Ministros da Agricultura da União Europeia. Aí estiveram em discussão algumas propostas de simplificação da reforma da Política Agrícola Comum, de iniciativa de alguns Estados membros, designadamente a França e a Alemanha.
Infelizmente, como decorre do hábito instituído pelo Governo, de que VV. Ex.ªs, Srs. Deputados da maioria, são cúmplices, não só o Parlamento não foi minimamente informado das posições que o Governo português se propunha defender como não lhe foi permitido sugerir o que quer que fosse num domínio onde acima dos ganhos e perdas e das estratégias partidárias deveriam estar sempre os interesses nacionais.
Mais uma vez, a delegação portuguesa não apresentou qualquer proposta nem demonstrou qualquer capacidade de iniciativa, quando é sabido que, por via da simplificação dos mecanismos de algumas medidas da reforma da Política Agrícola Comum, é possível obter benefícios adicionais para a agricultura e para os agricultores portugueses. Neste como noutros domínios, os socialistas têm propostas concretas e positivas para apresentar. A título de exemplo e para que não digam que a nossa crítica se reduz à simples crítica sem propostas alternativas, indico a alteração do actual sistema rígido de atribuição de direitos individuais aos produtores de carne de ovinos e caprinos que, a manter' se, impede cerca de 6000 produtores de terem acesso aos respectivos prémios e que faz com que Portugal perca cerca de l ,5 milhões de contos por ano. Seria extremamente fácil apresentar esta ou outras propostas nesse sentido ou não tendo capacidade para elaborá-las, ouvirem-nos em sede de comissão, apropriarem-se das nossas próprias propostas e com elas defenderem, em Bruxelas, em Estrasburgo ou no Luxemburgo, os interesses nacionais.
O mesmo se passa quanto ao limite mínimo de 10 cabeças, no caso dos ovinos, elegíveis para efeitos de concessão do direito ao respectivo prémio e cuja manutenção não tem qualquer justificação quando, a partir de 1995, é abolido o limite máximo. Esta indiferença e este desprezo pelos, pequenos agricultores é a resposta mais eloquente do PSD ao desrespeito e à falta de sensibilidade que têm para com aqueles que mais carecem e que mais deveriam beneficiar com os subsídios comunitários.
Outra das questões que esteve em discussão foi a da eventual redução do set aside - ou, para ser mais explícito, do pousio obrigatório - de 15 % para 13 % de área por exploração. É absolutamente lamentável que, segundo a comunicação social, a posição do Ministro da Agricultura tenha sido a de manter o status quo com argumentos tais como: «não temos ainda experiência da reforma da PAC» ou «as propostas falham por falta de oportunidade». Para o PS é possível, também neste domínio, conciliar as vantagens das ajudas ao pousio obrigatório em zonas menos produtivas com a despenalização das explorações mais competitivas e com solos com melhor aptidão, desde que a gestão do set aside seja feita em termos globais por região, em detrimento da sua aplicação individual, como agora acontece. Eis outra proposta, Srs. Deputados do PSD, que o Ministro do Governo que suportam podia ter apresentado e com ela ter defendido os interesses dos portugueses onde deveria fazê-lo e não, como pretensamente quer a todo o custo, fazê-lo crer frente às câmaras da televisão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como acabo de demonstrar, o Ministério da Agricultura, por imobilismo, incompetência ou insensibilidade, não é capaz de defender adequadamente os interesses de Portugal. E quem os não defende no Luxemburgo, em Estrasburgo ou em Bruxelas, muito menos é capaz de defendê-los em Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Espero que os Srs. Deputados da maioria reflictam sobre esta realidade e façam alguma coisa, no seio do vosso partido ou do vosso Governo, para que quem deveria conduzir pelo bom caminho a agricultura portuguesa não se converta, como todos os dados indiciam, no seu principal coveiro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Antunes da Silva, Carlos Duarte e Rui Carp.
Tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, não pedi a palavra para formular um pedido de esclarecimento propriamente dito mas, sim, porque quero prestar uma informação à Câmara e, através dela, repor a verdade relativamente à vinda do Sr. Ministro à Assembleia da República.
É que o Sr. Ministro da Agricultura já por várias vezes se disponibilizou a vir à Comissão de Agricultura e Mar... - o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos conhece esta realidade mas se quiser prestar alguma atenção ficar-lhe-ia bem.
Como dizia, o Sr. Ministro da Agricultura já se disponibilizou várias vezes para vir à Assembleia da República. A primeira vez que o fez pôs duas datas à consideração da Comissão de Agricultura e Mar, mais precisamente os dias 14 e 28 de Junho de 1994. Por razões que dizem respeito aos diferentes grupos parlamentares, não era aconselhável a data do dia 14 e só por esse motivo é que o Sr. Ministro não veio à Comissão. A data apontada foi a do dia 28 de Junho e, também por razões que só dizem respeito à Assembleia, não foi possível realizar a reunião da Comissão de Agricultura e Mar nessa altura.
Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, esta é a realidade dos factos; não imputemos ao Sr. Ministro o facto de até esta data não ter vindo à Assembleia da República.
Era esta a informação que queria deixar à Câmara.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antunes da Silva, quando percebi que o Sr. Deputado, ilustre Presidente da Comissão de Agricultura e Mar, se inscreveu para colocar questões supus que era para contraditar as afirmações graves que produzi contra o seu Governo do alto daquela tribuna e não que seria para justificar as razões por que, em seis meses de governação que já perfez, o Sr. Ministro da Agricultura não veio ao Parlamento, quando sabemos que se disponibilizou para fazê-lo por duas vezes, nos dias 14 e 28 de Junho.
Peço, no entanto, ao Sr. Deputado que faça as contas para ver quantos dias decorrem entre 14 e 28 de Junho e quantos dias perfazem os mais de seis meses que o Sr. Ministro já tem de mandato.
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A Sr.ª Maria Julieta (PS): - Muito bem!
Protestos do PSD
O Orador: - De qualquer modo, registo que, com o seu silêncio, corrobora as graves acusações que fiz ao Ministro da Agricultura quanto à incapacidade para defender os interesses de Portugal no Luxemburgo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, penso que a sua intervenção não mereceria grandes pedidos de esclarecimento mas há uma questão que logo à partida merece realce. É que, pela primeira vez nesta Câmara, o Partido Socialista vem congratular-se com a reforma da Política Agrícola Comum.
Na verdade, o PS andou dois anos a criticar o Governo português por ter assinado aquela reforma institucional e importantíssima para a agricultura portuguesa no ano da presidência portuguesa da Comunidade e, passados dois anos, vem reconhecer esta matéria. Também não é por acaso que o seu ex-colega de bancada, António Campos, que aqui atacava a reforma da PAC, vai para Bruxelas defender que o âmbito da reforma se alargue a outros produtos, numa actuação contraditória relativamente a todas aquelas afirmações descabeladas que muitas vezes produzia neste Hemiciclo.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Quanto às críticas que V. Ex.ª aqui teceu ao Sr. Ministro da Agricultura, terá oportunidade de fazê-las amanhã. Naturalmente, o Sr. Ministro poderá desmentir o que V. Ex.ª afirmou ser a posição do Governo português - e que, de facto, não o é - e poderá esclarecer o que, na verdade, é a posição do Governo em Bruxelas. Mas enquanto o Governo português tem uma posição sobre a matéria o Partido Socialista não tem nenhuma, tal como demonstrou hoje.
Ainda a propósito da negociação em Bruxelas efectuada pelo Governo português, vou ler-lhe palavras de alguém a quem se referia o líder do seu partido, Engenheiro António Guterres, como sendo o ministro-sombra da agricultura ideal para o Partido Socialista, o Sr. Professor Francisco Avillez. Em estudo recente, e relativamente à negociação do Governo português em Bruxelas, o Sr. Professor Francisco Avillez diz o seguinte: «As decisões do Governo português (...) é aquela que utiliza mais eficientemente os recursos disponíveis, o que parece significar que um alargamento dos fundos disponíveis para além dos valores previstos implicará aplicações de capitais com eficiência decrescente.» Isto é, o Governo português conseguiu em Bruxelas, dentro do quadro comunitário, aqueles apoios que podem maximizar o investimento disponível em Portugal e relançar e modernizar a agricultura portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, o líder do seu partido, há um ano, nesta Assembleia, disse que Portugal devia apostar naquelas culturas que tinham vantagens comparativas. E disse quais eram as três culturas que o Partido Socialista entendia terem vantagens comparativas: as fintas, os hortícolas
e as flores. Pergunto-lhe: ainda é essa, neste momento, a posição do Partido Socialista ou já mudou novamente?
Não quero terminar, sem dizer o seguinte: o líder do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, há 15 dias, fez afirmações graves que foram desmentidas e comprovadas, há 2 dias, pelo Grupo Parlamentar do PSD. Por isso, pensei que, hoje, o Sr. Deputado viesse aqui pedir perdão, com um ramo de flores, aos 35000 agricultores portugueses que investiram com o apoio do Governo português, pois construíram-se 11 000 km de estrada e de caminhos florestais, conseguiram irrigar-se 85 000 ha e fez-se um esforço tremendo de modernização da agricultura portuguesa, com o apoio e também com o investimento dos agricultores portugueses.
Pensei que, hoje, aqui, com um raminho de flores, o Sr. Deputado ia pedir perdão a todos os agricultores portugueses, naturalmente, porque o líder do seu grupo parlamentar não é obrigado a saber e a perceber de agricultura.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Duarte, como vê, foi com grande satisfação e serenidade que o ouvi, aliás, tal como ouvi o orador da sua bancada que o antecedeu e que relativamente às questões que coloquei também disse nada.
Fiz acusações concretas à actuação do Ministro da Agricultura nos passados dias 24 e 25 de Outubro, no Luxemburgo, no Conselho Europeu dos Ministros da Agricultura, e, sobre isso, V. Ex.ª disse nada.
V. Ex.ª colocou, na minha boca, declarações que não produzi e, nessa medida, vou facultar-lhe, com todo o gosto, o texto da minha intervenção, para verificar que não felicitei ninguém nem me congratulo com a reforma da política agrícola. Sabido como é, pelos portugueses, que ela é lesiva dos nossos interesses, não cometeria tamanha aleivosia!
Disse que os 36 000 agricultores portugueses que investiram se sentem chocados e ofendidos com o Partido Socialista pelo facto de o meu camarada Jaime Gama ter dito aqui, há alguns dias, que só uma única exploração falida recebeu mais de 4 milhões de contos de subsídios,...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Não disse isso!
O Orador: - ... certamente mais do que os 35 000 laboriosos agricultores que V. Ex.ª aponta e que nós, obviamente, apoiamos com a mesma satisfação.
Gostava de lhe dizer o seguinte: o Sr. Deputado não se pode esquecer de que a agricultura portuguesa, mesmo segundo as vossas estatísticas, tem 600 000 agricultores e o Partido Socialista pugna para que os benefícios da política agrícola comum sejam extensíveis a todos ou quase todos, não apenas a 35 000 deles e muito menos a um número razoável deles que, como o Sr Thierry Roussel, sem contribuírem, em nada, para o progresso do País, apenas delapidam os nossos recursos e minam as nossas expectativas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, ouvi-o, com muita atenção, e, no fundo, a sua intervenção tem um objectivo político.
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O Partido Socialista sabe que o Ministro da Agricultura português tem defendido, em Bruxelas, com grande coragem, os interesses da agricultura portuguesa, mesma contra a posição dos Estados mais poderosos da União Europeia. Esse é um facto inquestionável. Aliás, as criticais que foram feitas relativamente ao assunto dos vinhos, por exemplo, nem lhe foram feitas a ele. A própria bancada socialista fez-lhe elogios e o Ministro da Agricultura português tem desenvolvido uma política de defesa intransigente dos, interesses dos agricultores portugueses.
O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, no fundo, teve de fazer esta intervenção, porque o líder parlamentar da sua bancada colocou-a numa situação um pouco incómoda. É que, há 15 dias, fez algumas afirmações graves, mas não foram aquelas que o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos referiu. Vou usar exactamente as palavras do Dr. Jaime Gama, que desafiou o Governo, na pessoa do Sr. Ministro Adjunto, para, e cito, «visitarmos uma herdade de sucesso (...)» - uma exploração agrícola de sucesso - «(...) que se reveja nos subsídios, com resultado útil, que não esteja falida e que tenha actividade agrícola». Estas foram as palavras do Sr. Deputado Jaime Gama.
O PSD, por seu lado, aceitou o repto e, na semana passada, apresentou uma primeira lista de 40 ou 42 explorações agrícolas de sucesso, tendo convidado o Dr. Jaime Gama e o Grupo Parlamentar do PS para visitar as referidas explorações e os projectos agrícolas que beneficiam de apoios comunitários. Isto, porque o Sr. Deputado Jaime Gama citou a herdade do Sr. Thierry Roussel, ou lá como se chama, como um caso de insucesso - e não vou discutir isso- e disse que não havia uma única de sucesso.
Ora, nós apresentámos 40 e dissemos: «Agora, desta lista de 40, vamos visitar, se não todas, 4 ou 5, aleatoriamente». Mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados: o PSD propõe que se façam, para já, 4 ou 5 visitas, no âmbito da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar - e suponho que está aqui o seu presidente ou de uma delegação parlamentar constituída para esse efeito.
O Dr. Jaime Gama teve uma resposta dúbia, porque disse que aceitava o repto mas não queria visitar essas empresas agrícolas, essas explorações agrícolas, essas «herdades agrícolas», para utilizar a sua expressão, e sim outras três uma que diz ser do irmão do Sr. Secretário de Estado Álvaro Amaro, outra do tal Thierry Roussel e uma terceira naquela câmara, salvo erro, da Lourinhã, cujo presidente está com problemas.
O Sr. Alberto Avelino (PS): - O que é que a Lourico-op tem a ver com o presidente da câmara?!
O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado. Sei que está nervoso.
O Sr. Alberto Avelino (PS): - A Lourico-op é uma cooperativa. Não sabe o que é uma cooperativa?!
O Orador: - Exactamente!
O Sr. Alberto Avelino (PS): - Então, estude!
O Orador: - O senhor é que «enfiou o barrete», não eu Portanto, a resposta é dúbia e, como tal, ou o PS aceite o repto que lançou ou não faz agora outro desafio, embora não tenhamos quaisquer problemas em visitar as outras, explorações agrícolas. Aliás, suponho que já receberam uma carta do tal irmão do Sr. Secretário de Estado Álvaro Amaro, convidando o próprio Partido Socialista e o Sr Deputado Jaime Gama a visitar a exploração dele - que não é só dele é de 18 sócios -, cujo nome é Horta Pronta-Hortas do Oeste, e fica em Atouguia da Baleia, Peniche.
O Partido Socialista fez um repto ao Governo e ao PSD. O PSD aceitou-o, está disponível para ir visitar as explorações agrícolas e demonstrou que há, pelo menos, 40 explorações de sucesso. É claro que há muitas mais, mas vamos a uma, vamos a quatro, vamos a cinco, vamos às 40! Agora, não desviem é o objecto do vosso desafio, porque, senão, só podemos concluir que os senhores fazem os desafios convencidos de que não aceitamos o repto, mas, como nós o aceitámos, os senhores desviam-se, o que significa que, no fundo, fazem demagogia e estão aqui a aproveitar-se dos interesses e dos valores dos agricultores portugueses para uma luta política que nem sequer é muito elevada, em vez de os defenderem.
Portanto, Sr. Deputado, a pergunta que lhe faço é a seguinte: cumprem ou não o desafio que nos fizeram? Ficamos à espera da vossa resposta
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Carp, na peugada dos seus colegas que o antecederam, às questões que coloquei também disse nada.
Vim aqui, com muita seriedade, repito, com muita seriedade, apresentar questões e problemas concretos que respeitam aos agricultores portugueses e disse que, por culpa do Sr. Ministro da Agricultura sustentado pelo PSD, por falta de iniciativa dele na sede própria, que é o Conselho de Ministros europeu, há 6000 produtores de ovinos e caprinos que estão a ser lesados anualmente em cerca de 1,5 milhões de contos.
Acusei o Sr. Ministro de não ter sido capaz de ouvir sugestões de quem sabe formular as propostas ou de quem teve capacidade de as produzir, para defender os interesses portugueses no local adequado Por outro lado, disse também que o Ministro da Agricultura não teve sensibilidade para defender milhares e milhares de pequenos agricultores que têm menos de 10 cabeças de gado, porque, como sabe- e esta foi uma crítica feita à PAC, mesmo antes da sua reforma, e que continua a ser pertinente -, a grande maioria dos subsídios vai para quem menos deles necessita.
Ora, esta é uma posição que o PS não aceita e tudo fará, nos locais e no momento próprios, para apresentar iniciativas nesse domínio. Ou seja, defendemos a reforma da PAC, no sentido de que é necessário alargar o leque de beneficiários aos agricultores que mais precisam de apoio e que em 10 anos de governação do PSD nem sequer o viram.
Temos um ministro da agricultura que, em Bruxelas, defende a abolição do tecto superior, podendo ter-se, a partir de 1995, vários milhares de cabeças de gado e receber-se por cada uma delas um montante significativo, mas que se abstém de propor a eliminação por baixo desse valor, impedindo os que têm menos de 10 cabeças de poderem auferir qualquer rendimento.
Portanto, Sr. Deputado, coloquei questões concretas, acusando o Ministro da Agricultura de não ter iniciativa e disse também que o PS tinha iniciativas relativamente a essas questões.
Contudo, V. Ex.ª, em alternativa, quis conduzir o debate para um campo em que me recuso a participar: o da chicana política.
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O Sr. Rui Carp (PSD): - O desafio é vosso!
O Orador: - Sr. Deputado, o PSD, ao que li na comunicação social, lançou-nos um repto ao qual respondemos com outro. E digo-lhe mais: eu, no lugar do meu camarada Jaime Gama - e se ele me permite -, às três herdades que ele colocou como prioridade para visitar, acrescentaria uma quarta que é aquela de que é co-proprietário o Sr. Deputado Braga de Macedo.
Aplausos do PS.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Onde é que está esse jovem agricultor?!...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de entregar à Mesa um documento que, no fundo, vem confirmar, ratificar e registar o desafio que o Deputado Jaime Gama nos fez, desafio esse a que nós respondemos e que o PS continua, agora, a recusar-se honrar.
Em nosso entender, isto deve ficar registado.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dado que fui atacado pelo Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, ao afirmar que fugi às suas questões, devo dizer que elas não têm razão de ser.
Lamento ter de dizer, mas o senhor deve ler os documentos relativos ao subsídio para ovinos e para caprinos, porque, se o fizesse, não diria o que disse. É mentira o que afirmou! Não tem razão de ser!
Em relação às negociações em Bruxelas, só lhe respondi com a opinião de um técnico insuspeito, o Professor Francisco Avilez, que participou consigo nos Estados Gerais do PS, que é o «ministro-sombra» do PS, dizendo que o Governo português conseguiu uma alocução de fundos financeiros que maximizam as potencialidades disponíveis a nível da agricultura nacional. Esta é, pois, a melhor resposta que poderia dar, Sr. Deputado - aliás, amanhã poderá tê-la em sede de reunião da Comissão de Agricultura e Mar.
Quanto ao projecto de Thierry Roussel, devo dizer-lhe que foi um projecto apoiado em cerca de 15 % do investimento global feito. Enquanto o investimento global para os agricultores foi de 250 milhões de contos, naquele projecto não ultrapassou l milhão de contos.
Já agora que o senhor falou nesse processo, que foi excepção relativamente a todos os outros que têm, neste momento, impacto positivo na agricultura portuguesa, dir-lhe-ei que, repito., esse caso é um que, devido a intempéries e outras situações de excepção, teve dificuldades.
Mas, aproveitando o facto de o senhor ter focado um caso de excepção, então vou referir-lhe um projecto que foi apoiado pelo Governo português: o do Matadouro da Guarda. Neste caso, o Governo deu 1,05 milhões de contos e quando saiu de lá o presidente de conselho de administração - seu camarada de partido Abílio Curto - estavam construídos 84 000 contos de obra e já tinham ido para lá cerca de 1 milhão de contos.
Portanto, Sr. Deputado, peco-lhe para olhar no interior do PS e averiguar porque razão é que, havendo um projecto interessante para uma região degradada, com uma infra-estrutura importantíssima para o sector das carnes, não se sabe onde param 950 000 contos.
Peço-lhe, pois, para no interior do PS averiguar isso! Era um serviço que o senhor fazia! Era a primeira vez que o PS fazia um serviço de interesse para o País e para a agricultura nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.
O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Deputado Carlos Duarte, penso que o facto de se considerar certamente embaraçado...
O Sr. Carlos Duarte (PSD)- - Embaraçado?
O Orador: - ... por aquilo que ouviu não lhe dá o direito de recorrer ao insulto,...
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Insulto?!
O Sr. Rui Carp (PSD): - Se são fraudes do PS, são insultos!...
O Orador: - ... até porque penso que o nosso relacionamento pessoal deveria impedi-lo disso.
V. Ex.ª chamou-me mentiroso. Ora, rejeito, obviamente, esta acusação e, felizmente, como as declarações que produzi estão escritas, aconselho o Sr. Deputado a lê-las. Perdoe-me que me dirija a si nesses termos, mas, se tem vergonha na cara, recorra ao texto e sublinhe uma única frase que não seja verdadeira de entre todas as que produzi.
A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à corrupção em questões que tenham a ver com a agricultura e com o Ministério da Agricultura, aquilo que nos distingue, ou, pelo menos, que me distingue, a mim, de si e da sua bancada, Sr. Deputado, é o seguinte: entre a denúncia ou a cumplicidade com a corrupção eu, se porventura existir, em qualquer circunstância, um corrupto no meu partido, serei o primeiro a denunciá-lo, enquanto que VV. Ex.ª, quando têm provas sobejas de algumas dezenas de corruptos, sistematicamente, recorrem à táctica do seu encobrimento...
A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Orador: - Pergunto-lhe: o que é que já fez este Governo, que explicações já deu nesta Assembleia - e eu já as pedi - relativamente às razões que levaram à demissão do ex-presidente do IROMA e presidente demissionário das empresas PEC depois da denúncia pública dos desmandos feitos a esse nível?
O que é que VV. Ex.ªs já tentaram esclarecer relativamente à verdadeira dimensão da burla com a comercialização de cereais que foi aqui comprovada, uma vez que foi aprovado o relatório sobre o que se passou na Cooperativa Agrícola de Torres Vedras? Daí resultou que existem indícios no sentido de que problemas semelhantes se terão verificado em muitos outros locais.
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Que autoridade tem V. Ex.ª quando nessa bancada, nesse mesmo local e perante estas mesmas pessoas, jurou, a pés juntos, que a existência da "doença das vacas loucas" em Portugal era uma invenção da oposição e do PS?
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - Que autoridade moral tem V. Ex.ª? E digo-lhe mais: quanto ao caso que acabou de falar, o do Matadouro da Guarda, sugiro-lhe que tenha cuidado quando (ala da Guarda, não fique V. Ex.ª com a cabeça a prémio.
A Sr.ª Maria Julieta Sampaio (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas, se o senhor tem alguns indícios de que algo corre mal nesse matadouro, então o que é que o impede, a si ou ao seu grupo parlamentar, de apresentar uma proposta para a constituição de uma comissão de: inquérito, que é aquilo que temos feito em todas as situações idênticas que temos detectado?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.
O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr. Presidente, Sr;"5 e Srs. Deputados, os algarvios, até há bem poucos anos esquecidos do poder central, têm assistido, na última década, à concretização de velhos sonhos. Na verdade, o forte crescimento da actividade turística, a partir da década de 60, não foi acompanhado de um planeamento eficaz no domínio das infra-estruturas necessárias a um crescimento sustentado e harmonioso.
Esta situação gerou um conjunto de carências, principalmente nos domínios do abastecimento de água, sistemas de recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos e na rede de comunicações. Os elevados investimentos concretizados nos últimos anos, associados aos projectos em execução melhoraram significativamente a imagem da região. Se tivermos em linha de conta o papel que o turismo desempenha na economia nacional, facilmente se compreende que este esforço orçamental era, e é, justificável, numa região que, durante anos, só era lembrada no período estival, onde tudo se lhe exigia e nada lhe era dado em troca.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, se é notório o conjunto de obras, donde se destacam a Ponte Internacional do Guadiana e a Ponte de Portimão, a Via do Infante (1.ª fase), a ampliação do Aeroporto de Faro, as melhorias na EN n.º 125 e na rede de portos, a rede de escolas e Centros de Saúde, os avanços obtidos nos sistemas de Odeleite/Beliche e Funcho/Odelouca, etc, é também verdade que é preciso continuar a investir por forma a que definitivamente sejam ultrapassados os estrangulamentos que ainda afectam o desenvolvimento da região e condicionara o bem-estar das suas populações e de todos aqueles que nos visitam.
É, pois, evidente que o novo Quadro Comunitário de Apoio terá de contribuir fortemente para que o Algarve vença os desafios do futuro. A construção da 2.ª fase da Via Infante (Guia-Lagos), os itinerários complementares - IC 4- e a substituição da EN n.º 122 pelo novo IC n.º 27, a conclusão dos sistemas de barragens e os seus perímetros de rega, a Auto-Estrada Algarve-Lisboa, a melhoria generalizada da orla costeira, a funcionalidade da rede de portos, a construção do Hospital do Barlavento, a concretização das zonas industriais, a melhoria da rede ferroviária incluindo a sua ligação à Andaluzia e o reforço da rede de infra-estruturas sociais constituem prioridades no desenvolvimento do Algarve que nunca é demais realçar.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, não se fique com a ideia errada de que, quando se equacionam as prioridades regionais, se esgotam o rol de necessidades a que é preciso dar resposta para que o Algarve vença os desafios do futuro. Trata-se, tão somente, de um conjunto de obras fundamentais que visam alcançar o objectivo da diversificação da base económica regional.
Na verdade, o modelo de desenvolvimento seguido após a década de 60, assente essencialmente no turismo e actividades afins, tem debilitado, de certa forma, a economia regional. Qualquer crise neste sector afecta significativamente toda a região. O passado recente é bem exemplo disso. A crise mundial e europeia, que se tem sentido nos últimos anos, à qual o nosso País, enquanto economia aberta, não foi alheio, manifestou-se, em primeiro lugar, na actividade turística que, por arrastamento, conduziu a economia regional para uma situação delicada. Os recentes sinais de retoma económica, que se fazem sentir prioritariamente no turismo, em que o ano de 1994 foi já um bom ano, talvez o melhor de sempre, não podem, mais uma vez, convencer-nos de que tudo está bem e de que nada há a fazer. São precisamente estes exemplos que se têm repetido ciclicamente e que devem constituir a base de uma reflexão séria para o futuro.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, é evidente que muito há a fazer para melhorar a nossa oferta turística. E evidente que o Plano Regional de Turismo do Algarve, a apresentar em breve, é um instrumento fundamental para a melhoria da qualidade da nossa oferta. É evidente que o novo Quadro de Apoio Financeiro ao turismo é fundamental para o desenvolvimento do sector. Mas o que é por demais evidente é que o Algarve necessita de um novo modelo de desenvolvimento assente na diversificação das suas actividades e na correcção das assimetrias intra-regionais.
É bem verdade que este objectivo fundamental tem sido perseguido há vários anos. Os vários programas de desenvolvimento, desde o PDR regional, até aos programas operacionais, passando por outros instrumentos de planeamento de nível subregional ou sectorial, têm equacionado este problema, mas os êxitos alcançados tem ficado bastante aquém do desejado. Existe hoje um Plano de Ordenamento do Território (PROTAL) que visa promover a correcta especialização das diferentes actividades económicas, instrumento enquadrador dos Planos Directores Municipais. Estão, então, preenchidas todas as condições para se prosseguir numa perspectiva de desenvolvimento integrado e harmonioso de toda a região. O que importa agora é que os planos e programas deixem de ser meros documentos de retórica e passem a ser criteriosamente executados.
No entanto, o que por vezes se verifica e que estes mesmos planos só são cumpridos nas áreas de maior ou melhor conveniência, esquecendo alguns objectivos em detrimento de outros. Exemplificando: reconhece-se a necessidade de criar zonas ou loteamentos industriais para atrair investidores; estas zonas são delimitadas, constam dos planos, mas a sua concretização é, pura e simplesmente, adiada, não se sabendo bem as razões porque tal sucede. Paralelamente, perdem-se oportunidades de investimento vultosos na área industrial, de que são exemplo dois casos recentes que receberam como resposta das câmaras municipais em causa - "não temos terrenos disponíveis"!
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O PROTAL contempla três zonas industriais, cuja concretização não se sabe bem para quando será uma realidade. Não há plano nem programa cujos objectivos se atinjam se não houver vontade clara dos seus responsáveis em concretizá-los. Há sempre formas, mais ou menos denunciadas, de boicotar o desenvolvimento. A administração, seja ela central ou local, deverá ser mais célere e objectiva no processo de tomadas de decisão, por forma a não inviabilizar a oportunidade dos investimentos. Por muito esforço que se faça na resolução dos grandes problemas do Algarve, estes não serão completamente debelados se não forem acompanhados dos projectos complementares que localmente potenciem os investimentos em macro-infra-estruturas.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, o Algarve necessita cada vez com maior urgência de diversificar a sua base económica. Certamente que situações idênticas se verificam noutras regiões do País. Se é necessário ter consciência desta situação, mais premente se torna que todos os responsáveis, políticos ou técnicos, tenham sempre presente este objectivo fundamental, sem o qual os algarvios não conseguirão atingir os níveis de bem-estar que tanto anseiam. Os próximos anos são fundamentais para se conseguir, ou não, inverter o modelo de desenvolvimento em que assenta a economia algarvia.
Não podemos, pois, deixar passar ao lado as oportunidades que se colocam ao Algarve com o novo Quadro Comunitário de Apoio. Os sistemas de incentivos à actividade produtiva, principalmente nas áreas que permitem a diversificação económica, não podem passar ao lado da região. Para tal, é necessário um diálogo activo e permanente entre os diferentes níveis da administração, e é preciso que a classe política e a sociedade civil saibam, em conjunto, pugnar pelos verdadeiros interesses da nossa região. Saibamos contribuir decisivamente para que o Algarve vença os desafios do futuro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fialho Anastácio.
O Sr. Fialho Anastácio (PS): - Antes de mais, quero cumprimentar o Sr. Deputado António Vairinhos pela demonstração de interesse pelo Algarve no documento que acabou de ler nesta Casa. Foi uma forma construtiva de chamar a atenção para os problemas reais do Algarve, embora eu, subscrevendo a maioria das questões aqui colocadas, me interrogue ainda sobre algumas, pelo que passaria a colocá-las. Bem sabemos que, nos últimos anos, o Algarve se desenvolveu a um ritmo muito mais acelerado - mérito, efectivamente, dos fundos comunitários e do entusiasmo das autarquias locais, acompanhadas também pela administração central. Mas bem sabemos também que era fundamental resolverem-se questões que têm a ver com as assimetrias regionais, designadamente aquilo que se passa entre o litoral e o interior do Algarve: o litoral desenvolve-se a um ritmo, aumentando a sua população pela sua actividade, e o interior vai perdendo população, não havendo modelos de fixação para essa mesma população.
Seria importante que reflectíssemos um pouco sobre a diversificação da base económica que subscrevo, e que é um dos aspectos fundamentais para o desenvolvimento da região. E, nessa diversificação, gostaria de ter ouvido o Sr. Deputado António Vairinhos - até pela experiência que tem nalgumas áreas, designadamente nas pescas- referir-se ao facto de não ter havido um aprofundamento desta questão que permitisse definir e apresentar propostas sobre qual a estratégia das pescas para o Algarve Este é um dos aspectos importantes que têm a ver com a diversificação do tecido económico do Algarve e da sua actividade produtiva.
Gostaria também, por fim e para não me alongar, porque julgo que foi uma intervenção extremamente positiva, de ouvir a opinião do Sr. Deputado Vairinhos sobre se, efectivamente, fazendo uma chamada de atenção a todos os políticos e a todas as forças partidárias, não seria possível darmos as mãos e levarmos para a frente a regionalização. Julgo que, este sim, seria o grande factor que iria contribuir para que o Algarve desse um passo em frente e não deixasse passar ao lado o Quadro Comunitário de Apoio.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.
O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr Deputado Fialho Anastácio, agradeço as suas palavras simpáticas, que penso terem sido sinceras.
Como é óbvio, a minha intervenção referiu-se a determinados aspectos da região do Algarve. Não e a primeira que falo sobre a diversificação da base económica e sobre a questão das assimetrias, pelo que este é mais um contributo para uma discussão e para algo que tem de ser muito aprofundado, num modelo de desenvolvimento que defendo, em relação ao qual já tive muitas vezes a oportunidade de me manifestar publicamente e até de o discutir com o Sr. Deputado Fialho Anastácio. Se fosse agora enunciar aqui aquilo que já fiz faria uma nova intervenção, mas penso que no que acabei de dizer estão contidas todas essas minhas preocupações.
Quanto às pescas, há muitos anos que escrevi sobre o que pensava, ainda muito antes da crise que se instalou no Algarve nesse sector. Disse aqui, no ano passado, nesta Câmara, que a crise que o sector das pescas atravessava no Algarve era das mais graves de sempre. Das mais graves de sempre! No entanto, temos de distinguir entre sectores ou subsectores na pesca que sofrem situações de grande preocupação e outros que não.
Penso que quando o Sr. Deputado fala na questão da diversificação isso se deve centrar em dois segmentos muito concretos da pesca, que é a chamada pesca artesanal e a pesca de arrasto de crustáceos. Esses são os dois segmentos da pesca algarvia que atravessam grandes problemas: quanto à pesca artesanal, tivemos oportunidade de ouvir um conjunto de preocupações que foram manifestadas; sobre a pesca de arrasto de crustáceos, tem vindo a ser desenvolvido um conjunto de reuniões com o Governo, a última das quais se realizou na sexta-feira passada, estando marcada outra para esta semana.
Esperemos que se consigam encontrar as tão desejadas soluções para a resolução dos problemas concretos do arrasto de crustáceos e também da pesca artesanal, com diálogo e com a participação de todos nós.
No que concerne à pesca de cerco ou à pesca de arrasto de peixe, estes não são sectores com dificuldades, até são sectores em expansão- tive, na semana passada, conhecimento de uma empresa algarvia, que o Sr. Deputado também conhece, que até vai construir uma traineira, coisa que não se fazia há já uns bons anos. Bom sinal! Esperemos que assim continue!
Portanto, Sr. Deputado, peco-lhe que distinga as coisas, veja os segmentos. É que há diversos tipos de laranjas -
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as algarvias, as de Valência ... -, e a qualidade não é a mesma. Os problemas também não são iguais! Aprofunde essa matéria porque penso que, a partir daí, as questões serão mais precisas e eu poderei responder-lhe com maior clarividência ou mais capazmente.
Quanto à regionalização a minha posição é a mesma de sempre. Mas também não seria pelo facto de haver uma região administrativa que não existiria, neste momento, crise nas pescas. Existe crise neste sector por causa da deficiente gestão dos stocks e por não haver um ordenamento correcto das zonas de pesca, e não pela falta de uma região administrativa!
Aplausos do PSD.
O Sr. João Amaral (PCP): - Mas qual é a sua posição?
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período antes da ordem do dia.
Eram 16 horas e 45 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos no período da ordem do dia.
O Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Álvaro Barreto, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, com início em 2 de Novembro corrente, inclusive, e Couto dos Santos, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, com início em 9 de Novembro corrente, inclusive, respectivamente pelos Srs. Deputados Francisco José Martins e Carlos Pereira Oliveira.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o respectivo parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN, de Os Verdes e aos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, passamos agora à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 275/VI- Estabelece garantias de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais (PS).
Na qualidade de relator da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso pelo tempo regimental de cinco minutos.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 275/VI pretende regulamentar a matéria de tratamento de dados pessoais por parta das forças policiais. Propõe o diploma que esse tratamento seja objecto de uma fiscalização por parte da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados e que os cidadãos tenham um acesso indirecto a esses dados, detidos e geridos pelas forças policiais, efectuando requerimentos à Comissão nesse sentido, que fará as verificações necessárias, procedendo, em face disso, em conformidade.
Sr. Presidente, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias apreciou hoje, em termos de relatório, este projecto de lei e entendeu, por unanimidade, que ele podia ser apreciado na generalidade pelo Plenário, dado que nada há nele, em termos de direito constitucional ou de direito internacional, que possa fazer obstáculo ao seu debate e aprovação.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei, apresentado já há meses pelo Grupo Parlamentar do PS, visa dar resposta a uma situação cuja gravidade e relevância foi posta a nu na semana passada a propósito da regulamentação da lei atinente ao controlo do Sistema de Informação Schengen.
O que esse episódio recente veio fazer avultar foi que Portugal tem um quadro constitucional e um quadro legal que dá grande importância à protecção dos direitos dos cidadãos contra eventuais abusos decorrentes da utilização de meios informáticos, mas tem, por um lado, um défice normativo e de controlos práticos num domínio cuja sensibilidade se afigura a todos evidente.
Esse é um défice prolongado, é um défice que diria quase congénito, prolonga-se e arrasta-se desde a entrada em vigor da Constituição e do seu artigo 35.º, que é modelar do ponto de vista dos preceitos de enquadramento e de delimitação de abusos, e tem hoje riscos adicionais. Tem riscos adicionais decorrentes do facto de os meios disponíveis se terem sofisticado, de as formas de utilização possíveis conducentes a eventuais abusos proliferarem e de haver um salto tecnológico não acompanhado de um salto jurídico e dos meios de fiscalização e de acompanhamento.
Da parte do Grupo Parlamentar do PS, a filosofia que presidiu à apresentação deste projecto de lei pode ser sintetizada em dois pontos. Por um lado, na era da revolução digital seria anacrónico, para não dizer perigoso, que as forças policiais vivessem na era do papel. A nossa atitude é a de que a criminalidade, sobretudo a altamente organizada, e o terrorismo são para serem levados a sério. E para o combate a ameaças desse tipo é necessário ter meios adequados, meios digitais, designadamente o uso da informática e da telemática, que são, nas condições modernas, meios essenciais, básicos, meios sem os quais, pura e simplesmente, não há actuação eficaz mormente no plano internacional, no plano transnacional.
Não nos move, pois, nenhum preconceito contra o uso da informática para realização de finalidades de defesa do Estado de direito democrático quando há ameaças à segurança interna, o que nos rege é uma preocupação quanto ao facto de esses usos poderem ser desacompanhados de mecanismos adequados de fiscalização. Esse é o nosso segundo ponto e é para isso que serve este projecto de lei.
O que diz o projecto de lei? Diz alguma coisa que a própria evolução das coisas tornou insuficiente.
Há meses, quando este projecto foi apresentado, em conjunto com um outro que visava assegurar o controlo do Sistema de Informação Schengen, dando origem a uma lei que foi aprovada nesta Câmara e que entrou em vigor, o quadro com que nos deparávamos era caracterizado pelo facto de a própria Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados não ter existência. A Comissão não tinha tomado posse, não funcionava, não exercia qualquer papel relevante e, portanto, o défice de controlo era absoluto.
Hoje, o défice de controlo é relativo e importa ter consciência de quais são os seus limites.
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O défice de controlo decorre, primeiro, do facto de o Governo não ter dado cumprimento à obrigação fluente da Lei n.º 10/91, de apresentar e fazer aprovar regulamentos dos serviços policiais quanto à recolha de tratamento e disseminação de dados.
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, a PSP, a GNR, a PJ e outros serviços, como, por exemplo, a Direcção-Geral das Alfândegas, que é uma importante polícia económica, e outras polícias económicas, têm de ter regulamentos para a recolha e tratamento de informações. Todavia, esses regulamentos não existem, o que viola a lei. Houve projectos submetidos à CNPDPI, ao SEF, à GNR e à PSP, mas não quanto à Polícia Judiciária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Isso quer dizer que o principal elemento de combate à criminalidade, a arma principal do Estado de direito democrático português contra o terrorismo e contra a criminalidade altamente organizada não tem sequer um fumo de regulamento em gestação quanto a este aspecto sensível e fundamental.
Falta, por outro lado- e que faltasse isto, já era grave -, um diploma de carácter genérico que explique e enquadre a maneira como o acesso dos cidadãos a este tipo de dados se deve processar. É óbvio que não pode haver acesso directo, bater-se à porta e dizer "quero ver a minha ficha informática, quero aceder com o meu terminal e o meu modemzinho ao vosso PAC system para saber o que é que têm sobre mim"; é um mecanismo impraticável e seria contrário à lógica de eficácia das forças policiais, mas, na esteira daquilo que a Recomendação R (87) 15 do Comité de Ministros do Conselho da Europa inculca, tem de haver um sistema que garanta aos cidadãos algum controlo, ou um controlo razoável, contra eventuais abusos.
O sistema que propomos seja adoptado em Portugal é o de um acesso indirecto, ou seja, face a suspeitas de ilegalidade ou de abuso, a pessoa apresenta uma queixa à CNPDPI que apura, diligência, conclui, transmitindo o que for de concluir à pessoa interessada, podendo assim prevenir e, aliás, moderar eventuais abusos.
É isto o que o projecto de lei do PS propõe.
Dizia eu, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, todavia, isto não bastava. Não basta, na leitura que fazemos, porque é preciso definir regras materiais concretas, substantivas, sobre a recolha e o tratamento da informação. E é necessário definir regras de articulação entre os serviços quanto à circulação da informação porque vamos ter, Sr. Presidente - temos já, mas vamos ter mais ainda -, os arquivos digitais da PSP, da GNR, da PJ, do SEF, do Sistema de Informação Schengen, da EUROPOL! É preciso somar, na componente informações, os arquivos dos Serviços de Informações. É um sistema com muitos terabytes de informação, com enorme volume de informação e com a informação que é, quase toda ela, sensível. Tem de haver um mecanismo seguro, fiável e credibilizador que permita o acompanhamento desta evolução do uso pelas forças policiais deste tipo de instrumento.
Termino, Sr. Presidente, fazendo votos de que sejamos capazes de aprovar essa regulamentação. Este projecto deve ser objecto de parecer da CNPDPI - não o foi ainda, mas pode sê-lo até à sua votação final. Na nossa opinião, deveríamos aproveitar este debate e ensejo, criado pela apresentação do projecto de lei do PS, para fazer uma reflexão sobre o estado do País em matéria de uso destes meios pelas forcas policiais e pelos Serviços de Informações.
Não temos, infelizmente, informação bastante sobre o sistema que está a ser criado no âmbito da EUROPOL, mas podemos tela. Não temos informação bastante sobre o estado do Sistema de Informação Schengen, mas podemos e devemos tê-la! E devemos ter um quadro geral de forma a que possamos dizer aos portugueses que merece o juízo a, b ou c. Temos esse dever, temos essa responsabilidade! Da parte do Grupo Parlamentar do PS, o que se quis foi accionar o exercício desse dever, pelo que apelamos à vossa votação favorável a este projecto de lei por nós apresentado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Narana Coissoró e Manuel Queiró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, ninguém põe em dúvida que o projecto do PS, que V. Ex.ª subscreveu e defendeu aqui, é da mais alta importância para o regime democrático e para os Direitos, Liberdades e Garantias.
Quero apenas perguntar-lhe duas coisas. Em primeiro lugar, este projecto parece resumir-se a organismos oficiais que actualmente dispõem de banco de dados; mas sabemos, embora não tenhamos provas disso através de qualquer publicação, que, fora dos serviços, existem bancos de dados que dispõem de informações sobre as nossas vidas, sobre nós, como sucede em algumas actividades bancárias, em algumas companhias de seguros e não sei mesmo se haverá outras agências que prestam serviços aos particulares sobre a solvibilidade ou a insolvibilidade de determinadas pessoas.
Por exemplo, quando queremos intentar uma acção executiva, tornou-se hoje em dia absolutamente normal contactar (e não interessa o nome, todos temos debaixo dos olhos) uma destas três ou quatro multinacionais que funcionam em Portugal e pedir "por favor, dê-me os dados sobre este senhor para saber quais são os bens que ele tem e o que é que posso executar". Não há dúvida alguma que nós, advogados, sabemos que, pagando bem, dentro de quatro ou cinco dias, aparece uma listagem de qual o activo, qual o passivo, a quem é que deve, quanto deve, qual o saldo activo, qual o saldo passivo, se tem imóveis, se não tem imóveis, se tem letras assinadas, se tem livranças, o que deve ou não atacar, o que está fora do alcance ou ainda resta fora do alcance dos credores, etc. Isto existe no nosso País como um meio - talvez também na Europa, não sei - normal de obter informações sobre pessoas.
Ora, se existem estas multinacionais, que dão estas informações sobre o património, é muitíssimo natural que também, com a tecnologia de que dispõem de cruzamento de linhas, de telefones, de dados, etc., ligados a quaisquer outras agências, possam ter toda a nossa vida registada no seu banco de dados.
De facto, não sei qual é actualmente a possibilidade que temos de saber quais as entidades que têm dados sobre a nossa vida patrimonial - para não dizer a outra -, e como podemos atacar para que a nossa vida seja preservada desse comércio sobre a nossa própria vida e os nossos próprios haveres.
Em segundo lugar, quero perguntar-lhe se a Comissão, que actualmente funciona junto da Procuradoria-Geral da República, constituída por magistrados e com acesso ao banco de dados do SIS, sendo melhor apetrechada, não poderia centralizar os dados e colaborar com a Comissão de Dados que V. Ex.ª propõe neste projecto, de modo a
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que não houvesse uma dualidade de funções e que esses dois organismos pudessem coordenar entre si a actividade não só pública como privada sobre os dados.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, quero colocar-lhe uma questão que se prende com a emergência, praticamente inevitável, de bancos de dados de natureza policial a nível europeu. O Sistema de Informação Schengen produzirá, duma forma que não poderemos controlar, a transferência de dados de natureza policial existentes em Portugal para serviços da mesma natureza localizados fora das nossas fronteiras- esta é uma presunção razoável que podemos fazer - e no momento em que o Sr. Deputado está preocupado com a capacidade de fiscalização do cidadão português junto desses bancos de dados existentes em Portugal e tendo em vista prevenir a sua eventual utilização abusiva pergunto-lhe: no quadro europeu como é que pode perspectivar a fiscalização desse tipo de utilização de dados produzidos, gerados em Portugal e eventualmente já presentes ou futuramente presentes nesses bancos de dados fora das nossas fronteiras? E, nesse quadro, o que é que o cidadão português poderá fazer, através dos seus representantes, isto é, através dos parlamentos nacionais, em termos de acção preventiva e fiscalizadora?
Este problema está ligado ao nosso processo de construção europeia na fase em que estamos, tem a ver com o problema levantado neste momento pela sua iniciativa legislativa e por isso gostaria de ouvir a sua opinião.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr Presidente, Srs. Deputados Narana Coissoró e Manuel Queiró: As vossas perguntas, que agradeço, permitem-me tentar alargar e aprofundar um pouco o debate em relação a cinto aspectos que me parecem da máxima importância.
O Sr. Deputado Narana Coissoró suscita desde logo um primeiro aspecto porque nos alerta para a vastidão do campo que estamos a examinar. O que estamos hoje aqui a debater e aquilo que deveria conduzir a legislação diz respeito a certos instrumentos informáticos ao dispor dás forças policiais definidas estritamente. E nem sequer se refere às forças policiais em sentido lato para incluir nelas as polícias administrativas, ou seja, a Inspecção-Geral de Finanças, a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, a Direcção-Geral das Alfândegas, que são também polícias em sentido administrativo com funções de prevenção e repressão criminal em áreas que são nevrálgicas e também elas compendiam informações de carácter altamente sensível que podem, por revelação ou mau uso, conduzir a situações de extraordinária gravidade.
No entanto, não é dessas que estamos hoje aqui a tratar, mas tão-só da situação atinente aos bancos de dados das forças policiais. E aí, como sublinhei, de um lado, há anomia, há falta de regras do jogo quanto ao que pode ser recolhido e tratado e há, por outro lado, falta de controlo. Mas isso não nos leva a diminuir a gravidade da situação que o Sr. Deputado descreveu, qual seja a que decorre do uso de meios similares, em alguns casos melhores, em, alguns casos mais sofisticados, que implicam a digitalização de altos volumes de imagem e a sua transmissão acelerada por via telemática para fora do país ou de fora para dentro, pela linha telefónica normal ou por redes, por parte de entidades privadas.
Nesse caso também creio que a regra aplicada e prevista na nossa Lei n.º 10/91, tal qual foi revista pela Lei n.º 28/94, é correcta. Ou seja, a lei estabelece regras que permitem a circulação dessa informação e, simultaneamente, prevê controlos, isto é, nós não podíamos dizer: a informação patrimonial e financeira sobre a vida dos cidadãos não pode ser tratada por computador. Se disséssemos isto mataríamos a banca, os seguros, a segurança social, o Ministério das Finanças e a nossa vida económica. Não o podemos fazer, isto é, este mundo em que vivemos teria um colapso sem todas essas coisas.
O que podemos dizer e que consta da lei é: haja olhos e ouvidos fiscalizando eventuais abusos e, sobretudo, evitando que certas informações sejam alguma vez - porque todo o mal está em começar a fazê-lo - postas em suporte electrónico. O que acontece é que a CNPDPI não tem meios, foi criada tarde, com défice regulamentar, com défice de pessoal, não tem equipamentos informáticos adequados, tem uma panóplia de poderes insuficientes e está a arrancar, isto é, está a começar agora a fazer o seu trabalho.
Portanto, há um défice não só de enquadramento como de acção. O PS apresentou uma queixa sobre a questão que o Sr. Deputado suscitou tendente a apurar se há abusos por parte da banca, designadamente por, em registos das contas bancárias das pessoas, serem incluídas menções sobre eventual cadastro criminal que é monopólio do Estado, isto é, não é possível difundir informações sobre cadastro criminal a não ser através dos serviços de registo criminal. Essa queixa ainda não teve provimento, ainda não teve andamento, está a ser neste momento investigada e tratada. Temos, no entanto, indícios de que há situações desse tipo.
Assim, a sua preocupação parece-me extraordinariamente actual e pertinente. Deve é ser resolvida noutra sede, não hoje, não nesta lei, mas através da concessão à CNPDPI de meios.
Em relação à sua pergunta sobre que sistema de controlo é que deveríamos instituir para as forças policiais as possibilidades são várias: um controlo pela CNPDPI, por esta comissão geral contra os abusos de informática ou pela comissão que criámos para os bancos de dados dos Serviços de Informações, comissão de três magistrados, como referiu, que era suposto exercer controlo sobre os bancos de dados do SIS, dos outros serviços incluindo os militares e que tem tido dificuldade concreta em exercer esse controlo.
A resposta que demos neste projecto é a de que não deve ser essa comissão porque, por um lado, é mau misturar polícias e Serviços de Informações. A nossa lei quis separá-los e por isso é que dá às polícias poder de fazer escutas e não os dá aos serviços de informações; por isso é que criou um sistema de controlo para os serviços de informações, primeiro, aliás, do que o de controlo das polícias. E, não por acaso, o actualmente suspenso Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, no seu relatório de 1992, alertou para a aberração que era haver um sistema de controlo dos bancos de dados desses Serviços e não haver um sistema similar para os bancos das forças policiais normais que podem ter dados resultantes de informações de bufos, informações incorrectas, informações já desactualizadas, puramente caluniosas ou pura e simplesmente tolas, que deveriam ser objecto de correcção.
Portanto, entendemos que deve haver controlo e que deve ser separado. Seria mau, entendemos nós, misturar numa entidade única o controlo do continente das polícias e dos Serviços de Informações.
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Sobre a última questão suscitada pelo Sr. Deputado Manuel Queiró, de como prevenir os abusos dos serviços internacionais, direi o seguinte: a Convenção de Aplicação do Sistema de Informação Schengen prevê os mecanismos, que são, por um lado, uma autoridade comum de controlo, que está constituída e que tem representantes dos vários Estados membros, por outro, autoridades nacionais, que se pressupõe que existam não apenas na letra da lei mas na vida, e, além disso, os parlamentos e os tribunais, incluindo a nossa Procuradoria-Geral da República na vertente Ministério Público.
Sem essas três, quatro, componentes os cidadãos estarão desprotegidos, ou seja, o nosso problema não é resolúvel com uma aspirina, e é dúbio que seja resolúvel com um só medicamento. Precisa de acção completa, convergente e compacta de pelo menos cinco elementos terapêuticos sem o que haverá desprotecção das liberdades. O nosso apelo vai no sentido de que aprovemos aqui hoje mais um elemento terapêutico e que se obrigue o Governo a aplicar as doses que em leis anteriores já tínhamos considerado adequadas para tratar da doença que existe.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção vai ser curta e servirá apenas para dizer que concordamos em absoluto com o projecto de lei do PS. Acho que é um projecto de lei que não é político, é um projecto de lei essencialmente técnico, é um projecto de lei que não mexe com opções fundamentais de qualquer programa do Governo ou contra o programa do Governo. Trata-se, fundamentalmente, de proteger a vida dos cidadãos duma intromissão que poderia ser exagerada ou que ditada pelas leis científicas poderia subverter o verdadeiro espírito que anima a nossa Constituição e as nossas leis ordinárias.
Cremos que não é a primeira vez que se faz este debate nesta Assembleia e, pelo menos, já tivemos três grandes debates a este respeito: quando da criação da CADA, quando da criação do próprio Serviço de Informações e quando do problema de saber como os bancos de dados devem ser protegido das próprias polícias ou do poder político.
Por isso mesmo a razão de ser deste projecto não nos oferece qualquer dúvida, simplesmente, gostaríamos que este problema não fosse tomado como um problema da oposição contra o Governo porque, efectivamente, como disse, nada vejo neste projecto que tenha que ver com quaisquer opções políticas a não ser que estas opções políticas levem a que não seja a oposição a apresentar um projecto técnico e seja a própria maioria a querer avançar com um projecto próprio para dizer que afinal o projecto é do PSD e não de qualquer outro partido. Nós não nos metemos nesta guerrilha na medida em que não vemos sacrifício de quaisquer ideias que sejam contrárias à nossa ideologia, à nossa maneira de ser, à nossa maneira de conceber este sector de informação e dos dados pessoais e, por isso mesmo, daremos a nossa aprovação.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr Presidente: - Tendo de me ausentar do Plenário, peço ao Sr. Vice-Presidente Correia Afonso o obséquio de me substituir na direcção dos trabalhos.
Quero, entretanto, aproveitar para cumprimentar, em meu nome pessoal, os representantes da comunidade de Vila do Porto que hoje vieram até à Assembleia da República para participar, na qualidade de ouvintes, de um tema que muito lhes interessa e que está relacionado com o que se passa com o Centro de Controlo Oceânico e demais serviços instalados na ilha de Santa Maria.
Em meu nome pessoal, ao Sr. Presidente da Assembleia Municipal, ao Sr. Vereador e ao senhor que participa do trabalho da comunicação social local, os meus cumprimentos pessoais.
Aplausos gerais.
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Correia Afonso.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero referir, em primeiro lugar, que a situação de incumprimento da Lei de Protecção de Dados Pessoais Informatizados por parte do Governo é um facto absolutamente escandaloso e que não pode, de maneira nenhuma, passar em claro, particularmente no que se refere à matéria em apreço, que é a da utilização de dados pessoais por parte das forças policiais. Mas, em geral, existe um incumprimento total da Lei n.º 10/91 no que se refere aos bancos de dados na posse de serviços públicos. Claro que, dada a natureza particularmente sensível dos eventuais bancos de dados na posse de forças policiais, esta matéria tem especial gravidade.
De facto, quer a Constituição, quer a Lei n.º 10/91, com as alterações que lhe foram introduzidas em Agosto último, proíbem taxativamente o tratamento de determinados dados pessoais e a Lei de Protecção de Dados Pessoais Informatizados prevê que alguns outros dados pessoais só possam ser objecto de tratamento informatizado por serviços públicos mediante lei especial que os regule e sempre com parecer prévio da CNPDPI. Efectivamente, nenhuma desta regulamentação foi considerada necessária, nenhum dos passos foi dado para que os bancos de dados na posse de serviços públicos sejam colocados de acordo com as disposições legais e tenham a fiscalização que é legal e constitucionalmente exigível.
Portanto, estamos neste momento perante uma situação de total ilegalidade, de inconstitucionalidade, nesta matéria, que é extraordinariamente grave e naturalmente relevante no que se refere ao funcionamento das forças policiais e aos dados que estas forças possuam.
Importa lembrar que, mesmo que os dados utilizados não fossem os dados protegidos pela Lei n.º 10/91, ainda assim existiria a obrigatoriedade de a constituição e a manutenção desses bancos de dados serem comunicadas, previamente, à Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Portanto, estamos perante uma situação em que ninguém nos garante que as forças policiais não possuam, ilegalmente, ficheiros de dados pessoais protegidos, sem que exista qualquer protecção legal e eficaz dos cidadãos sobre esta matéria. Também ninguém nos garante que, relativamente a esses dados, não sejam feitas interconexões de uns ficheiros com os outros, igualmente em completa violação das garantias que a lei e a Constituição nos dão nesta matéria. Esta é, pois, uma situação que tem de ser ultrapassada.
No entanto, face aos termos em que a questão é colocada no debate de hoje, relativamente à iniciativa que está
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em apreço, colocam-se problemas que devem ser analisados quanto ao âmbito das competências da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, já que esta comissão exerce as suas funções nos termos gerais e nos limites que estão estabelecidos na Lei n.º 10/91, com as alterações da Lei n.º 28/94, de 29 de Agosto último, mas funciona também como autoridade nacional no âmbito do Sistema de Informação Schengen. A questão que sé coloca é a de saber se, na falta da lei especial exigida pura a constituição e manutenção dos bancos de dados, as competências da comissão não são exercíveis, nos termos gerais da Lei de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, em relação aos bancos de dados das forças policiais que eventualmente existam.
Somos, designadamente, do entendimento - e não nos parece que possa haver outro - que no caso de quaisquer reclamações dos cidadãos sobre bancos de dados das forças policieis a Comissão deve exercer as suas competências legais.
Portanto, a questão que se coloca relativamente ao projecto de lei em apreço é a de saber no que é que consiste a competência especial prevista para a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados.
Recordo que em Agosto, quando aprovámos aqui a lei e os regulamentos relativos a esta Comissão, foram estabelecidas as normas para o exercício das suas competências, em termos que foram considerados adequados por todas as bancadas e não já de acordo com uma proposta inicial que atribuía a esta Comissão o direito de, indiscriminadamente, ter acesso aos próprios dados pessoais. Na aluíra foram estipulados os limites de actuação desta Comissão e entendemos que, no momento presente, ela deve poder exercer essas competências em relação a todos os bancos de dados existentes, incluindo os dados pessoais. Isto é, havendo uma reclamação de um cidadão relativamente a esse tipo de banco de dados, ela reclamação deverá ser feita à Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, que tem competências, em nosso entender, legais e inequívocas, para actuar face a essas situações. Portanto, entendemos que os poderes especiais de fiscalização devem ser exercidos no quadro destas limitações e destas competências.
Mas temos uma preocupação: face a uma eventual recusa desta iniciativa poder-se-ia entender que a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados não exerce as suas competências gerais em relação às forças policiais?
Creio que esse entendimento não e possível e que deveria ser taxativamente afastado.
Por outro lado, não vemos razão para que não se estabeleça um sistema de fiscalização pelo Ministério Público, como existe, aliás, relativamente aos bancos de dados do sistema de informações da República portuguesa. Como pensamos que, nos termos da própria lei, essa fiscalização é feita sem prejuízo das competências gerais da Comissão de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, entendemos que seria de toda a conveniência- aliás, o próprio preâmbulo desta iniciativa legislativa considera-o, embora no articulado não o clarifique e não o proponha dessa forma- que esse tipo de fiscalização (via Ministério Público) pudesse ser exercido em relação a todos os bancos de dados das forças policiais e não apenas ao sistema de in>-formações da República.
Uma segunda questão, que consideramos da máxima relevância nesta matéria, tem que ver com a garantia dos direitos dos cidadãos face à utilização de dados pessoais informatizados.
Efectivamente, o direito de acesso directo dos cidadãos, como princípio, tem tutela constitucional, já que o artigo 35.º da Constituição diz que "todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam...", mas tem também tutela expressa na Lei n.º 10/91, onde as únicas ressalvas- aliás, isso também resulta da Constituição - são o segredo de Estado e o segredo de justiça. Aliás, o acesso indirecto dos cidadãos aos dados pessoais, a processar-se através da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, só existe no caso do Sistema de Informação Schengen, que se rege por lei especial, aprovada nesta Assembleia também não há muito tempo.
Relativamente ao projecto em apreço entendemos que parece não fazer grande sentido - a menos que não seja esse o sentido que se queira dar ao projecto, mas é nesse sentido que aponta a letra do articulado que temos para discussão - que o acesso dos cidadãos aos bancos de dados das forças policiais só possa ser feito através da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados. Parece ser isso o que resulta, de facto, da letra do projecto, e a ideia que temos desta matéria é a de que não vemos razão para que o mecanismo contido na Lei n.º 10/91, que prevê o acesso directo dos cidadãos e que o recurso para a Comissão seja feito face à recusa desse acesso, seja afastado. Pensamos que poderá ir-se por um caminho de limitação dos direitos dos cidadãos e, enfim, aprovar um "menos" quando o conveniente seria aprovar um "mais".
Portanto, este texto, tal como é apresentado, preocupa-nos, porque parece apontar para uma redução dos direitos dos cidadãos.
Assim, importava que esta questão ficasse devidamente clarificada.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Filipe teve ocasião de suscitar interrogações que me parecem dignas de discussão e de aprofundamento e, por isso, procurarei suscitar as minhas contra-dúvidas, ou as minhas dúvidas complementares, em relação àquelas que enunciou.
A primeira, desde logo liminar, é esta. não é por acaso que a lei de controlo do Sistema de Informação Schengen não prevê o acesso directo a certos ficheiros policiais sensíveis. Fá-lo porque isso comprometeria - e quase diria em absoluto- a operacionalidade das forças policiais. Na realidade, se um alto, um médio ou um pequeno responsável de um grupo de terrorismo organizado, ou razoavelmente organizado, ou até mesmo um pilha-galinhas, pudesse ter acesso directo ao ficheiro operacional relativo a uma investigação que lhe diz respeito, aplicando-se exactamente as mesmas regras que se aplicam em relação a documentos acessíveis por força das regras da administração aberta, seria praticamente impossível poder prosseguir, em termos normais, as actividades de defesa da segurança interna e de combate à criminalidade. É por isso que não conheço nenhuma legislação que permita esse acesso directo, imediato e em tempo real, ao ficheiro de investigação. Ou seja, batia-se à porta da Policia Judiciária e dizia-se: "Olhem, em relação àquele caso de branqueamento de dinheiro, já agora queria ter a certeza que vocês, no banco de dados, não tem nenhuma informação a respeito do Sr. X, que é
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meu constituinte e que está, neste momento, na Suíça. Digam-se isso no prazo de 10 dias, ao abrigo da lei."
Sr. Deputado, não é isso o que decorre da Constituição, devidamente interpretada, e menos ainda da Lei n.º 10/91. Portanto, a nossa solução é a que decorre da recomendação do Conselho da Europa e é aquela que, se implementada, significaria um substancial acréscimo do grau de tutela dos direitos dos cidadãos em Portugal.
Em segundo lugar, a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados já tem hoje ou não algumas competências?
Eu tenderia a dizer, Sr. Deputado, que seria difícil negar à Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados o direito de intervenção nesta área. O problema é que, em termos práticos, é preciso clarificar essa competência, senão a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados quer intervir e as forças policiais dizem: "Não, não podemos, é segredo de justiça." Ou então: "Não, não podemos, porque isso é essencial à segurança operacional dos ficheiros."
Portanto, na prática, haverá um conflito de competências muito negativo.
A nossa proposta é, em primeiro lugar, a de que se clarifique que há competência.
Em segundo lugar, propomos que sejam publicados os regulamentos que o Governo não emitiu e que está a reter, como muito bem sublinhou. Esses regulamentos são essenciais.
Em terceiro lugar, solicitamos que se deixe os cidadãos, através da Comissão de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, saberem o que é que se passa, na medida em que possam.
Sr. Deputado, pareceu-me perceber que defende a concentração do sistema de fiscalização de todos os serviços - polícias e Serviços de Informações - numa única autoridade, o que não me parece que faça grande sentido.
O articulado do projecto de lei do PS clarifica que - falo do articulado e não do preâmbulo - a Comissão deve exercer as suas competências sem prejuízo do normal exercício dos poderes da Procuradoria-Geral da República. Mas não defendemos que esses poderes sejam exercidos através da Comissão que está encarregada de acompanhar os Serviços de Informações, porque nos parece que essa tendência concentracionária é prejudicial. É por essa mesma razão que não defendemos que não haja um banco de dados único ou que haja mistura entre polícias e Serviços de Informações. A filosofia aponta para uma separação e julgava, aliás, que V. Ex.ª defendia uma filosofia semelhante a esta, que tem sido a filosofia comum a uma determinada área, na qual V. Ex.ª se insere.
A minha última dúvida, Sr. Deputado, é a seguinte: que medidas alternativas a estas encara como adequadas? Haverá algumas que nos tenham faltado? Considera que estas não são necessárias?
Creio que seria bastante interessante que se formasse aqui um consenso alargadíssimo quanto à necessidade de dar um novo impulso à actividade de controlo destes bancos de dados, não para que não existam bancos de dados em geral - gostaria de insistir nisto -, mas para que eles sejam eficazes e limitados.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Deputado, começando por uma das últimas questões suscitadas, quero esclarecer que não defendemos que haja a concentração da fiscalização do controlo dos vários bancos de dados de todas as forças policiais numa única autoridade.
O Sr. José Magalhães (PS): - Tinha percebido o contrário.
O Orador: - Quer dizer, não dizemos que deve ser a comissão que existe para o sistema de informações da República a controlar tudo. O que nos parece mais aconselhável é um sistema de controlo dependente da Procuradora-Geral da República, do Ministério Público, não necessariamente a mesma entidade mas o mesmo modelo de controlo dos bancos de dados. Creio que a questão fica clarificada.
Quanto à outra questão suscitada, com é evidente, Sr. Deputado, havendo segredo de justiça a solução é clara: qualquer Constituição excepciona esses casos e a lei também o faz.
O que temos de regular são as situações em que não existe esse segredo de justiça, mas temos também de saber quais são os direitos que os cidadãos têm perante essas situações, perante a utilização de dados pessoais que lhes digam respeito e cujo tratamento informatizado seja, de facto, proibido pela lei e pela Constituição, ou seja, que protecção tem o cidadão contra a utilização abusiva e ilegal desses dados.
E evidente que a situação actual está absolutamente inquinada pela total falta de regulamentação desta matéria. Como a lei especial, que está prevista desde a Lei n.º 10/91, nunca foi elaborada nem se sabe o que é que foi feito dela ou quais são as intenções do Governo relativamente a esta matéria - e ela é indispensável -, há que, na sua falta, saber a que meios de protecção devem os cidadãos recorrer.
O Sr. José Magalhães (PS)- - Ao acesso directo?
O Orador: - Quanto a esta matéria, não vemos que seja aconselhável que se crie uma situação excepcional igual à que foi criada para o Sistema de Informação Schengen. Isto é, nós pensamos - e, aliás, isso não é originalidade nenhuma- que, ressalvadas as excepções que são necessárias e que lei especial deve regular, o princípio deve ser o do acesso directo dos cidadãos. É para aí que a Constituição aponta e, Sr. Deputado, salvas as excepções previstas na lei, nomeadamente o segredo de justiça, a regra geral deve ser a do acesso directo dos cidadãos aos dados pessoais informatizados que lhes digam respeito.
Não me parece que se devam inverter as situações no sentido desfavorável dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, isto é, considerar que a regra deve ser a inacessibilidade dos cidadãos aos dados pessoais e que a excepção é o acesso a esses dados. Deve ser o contrário.
O Sr. José Magalhães (PS)-Sr Deputado?
O Orador: - Faça favor.
Posso interromper,
O Sr. José Magalhães (PS): - Sem dúvida que deve haver o princípio da máxima protecção, compatível com determinadas finalidades. O Sr Deputado exceptuou o segredo de justiça, mas o que me perturba é que esse raciocínio pode conduzir a uma noção alargada de segredo de justiça, que abranja também fenómenos que estão no domínio da mera investigação criminal...
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O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado José Magalhães, o Sr. Deputado António Filipe não tem tempo para ceder, mas faça o favor de terminar.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito obrigado. Sr. Presidente.
Portanto, esse conceito alargado pode deixar fazer entrar pela janela, de maneira "indelimitada", uma coisa que o Sr. Deputado queria que não entrasse, isto é, o corrupto que pergunta: "Eu quero ver o que é que a PJ tem sobre as actividades que dizem ser corruptas e que eu desempenho. Quero ver o ficheiro operacional. Venha o banco de dados, venham as investigações, venham os acessos aos bancos de dados, às contas bancárias. Quero ver isso já."
O Sr. Deputado deixa? Eu não deixava.
O Orador: - Sr. Deputado, evidentemente, ninguém pretende deixar. A questão está em saber, perante a ausência total de regulamentação, por lei especial, do$ bancos de dados das forças policiais, como é que o legislador vai colmatar essa lacuna. Vai fazê-lo, dizendo que a regra é a inacessibilidade e o acesso directo é a excepção, Ora, pensamos que deve ser o contrário. Isto é, existindo o princípio constitucional do acesso dos cidadãos aos; dados informatizados que lhe dizem respeito, a lei deve debelar a excepção e não deve fazer o contrário, ou seja, não deve subverter o princípio constitucional, dizendo que a regra é a inacessibilidade.
Esta matéria tem de ser regulada quanto antes, Isso é fundamental, e creio que a situação que se vive actualmente, a este nível, é, em absoluto, inadmissível.
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso,
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Portugal tem vindo a colmatar os défices legislativos no domínio da protecção da vida privada face às potencial idades dos novos meios de registo e tratamento de dados e, desde logo, de dados pessoais. Como é óbvio, estes meios têm riscos acrescidos, que não tinham os outros meios mecanográficos e manuais, e que as polícias, em face das possibilidades acrescidas de eficácia que estes meios trazem, estão a informatizar-se por todo o lado,
Neste domínio, o que está em causa é a conciliação das exigências de eficácia das polícias, que, no fundo, defendem a segurança de todos, com os direitos fundamentais, com os direitos dos cidadãos de preservarem a sua vida privada.
Penso que o que consta do projecto de lei em apreciação, em termos de fixação da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados como autoridade de controlo desse tratamento, desse registo de dados, é pacífico. Aliás, o debate já aqui efectuado demonstrou que não haverá divergências, não haverá quem defenda que se copie para aqui um modelo de concentração de regimes e identidades, sejam elas policiais ou dos Serviços de Informações.
Creio que, entrando no debate aqui feito há pouco, é preciso dizer-se o seguinte: será um pouco demagógico tentar culpar o Governo de atraso ou de falta de regulamentações.
A lei está em vigor, há regulamentações que são necessárias, mas a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados foi instalada há pouco tempo, está a começar a dar os seus primeiros passos.
Por um lado, o que está em causa e ouvir essa Comissão, para a regulamentação dos domínios novos. Ela tem de ser ouvida, nos termos da lei. Não o fizemos hoje, vamos ter de o fazer a seguir, porque, repito, ela tem de ser ouvida. O próprio Governo, ao regulamentar, tem de a ouvir. É sabido que o Governo tem várias matérias pendentes na Comissão para serem apreciadas.
Por outro lado, há um problema que é importante: o da regulamentação dos dossiers constituídos no passado. Esse problema, que é importante, também passa por um plano legislativo, o qual, necessariamente, terá de mexer com alguns domínios que, em termos substantivos, vão alterar a disciplina da própria lei geral da protecção dos dados informatizados, porque vão alterar a iniciativa, no sentido de o direito de acesso ser realizado em termos indirectos, e o enquadramento da procria recolha e tratamento de dados sensíveis.
E sabido que a lei de acesso aos dados informatizados distingue entre dados absolutamente interditos e dados relativamente interditos. Ao tratar dos absolutamente interditos, a lei utiliza a expressão "os dados referentes à vida privada". Esta expressão tem uma amplitude muito grande. A nossa lei ampliou o conceito de dados sensíveis e o conceito que aparece na convenção que se aplica em Portugal e torna, em termos absolutos, não passíveis de tratamento, de recolha, certo tipo de dados. Ora, esta matéria tem de ser enquadrada, sem dúvida, numa legislação que se refira aos serviços policiais.
Portanto, é óbvio que esta legislação que está em causa, esta "legislação-chapéu", tal como as regulamentações que tratem especificamente a recolha e tratamento de dados nas diferentes polícias, é urgente. Esta regularização dos dossiers antigos é algo, sem dúvida, urgente. Mas não se trata apenas de um processo em que digamos: "regularizem isso, vão buscar tudo o que têm, de anos e anos, do passado, e passem isso para algo que seja declarado e regularizado". É necessário saber que é importante a actualização destes ficheiros que vêm do passado, a qual tem de passar por algo que tenha actualidade.
Penso que neste domínio, aliás tal como aconteceu em outros países que tiveram de fazer essa regularização dos dossiers do passado, é importante a cooperação, o seguimento concreto da própria Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados. Há atrasos, mas em todos os países tem havido atrasos nestas matérias e as leis têm surgido depois dos factos, e só agora, com a entrada em funcionamento e depois deste período de instalação desta Comissão Nacional, é que as coisas poderão correr de maneira mais acelerada.
No que diz respeito às questões de fundo que este projecto de lei suscita, já as enquadrei no relatório, referindo, nalgum domínio, questões de experiências comparadas ou de direito comparado.
A meu ver, a questão do acesso indirecto não pode deixar de ser seguida, pois estamos perante algo que poria em causa a própria eficácia policial se, efectivamente, pudesse haver um acesso directo Claro que se pode sempre dizer - rcfcn-o no relatório - que há países que têm o chamado acesso directo, o qual, depois, está cheio de excepções, e há outros que têm o chamado sistema misto, que permite o acesso directo a alguns dados, no fundo, aos que são realmente anódinos, a um certo tipo de matérias que não mexe com o âmago, com o coração da actividade das próprias polícias.
Ao fim e ao cabo, o que é essencial ou é interdito ou é sujeito a uma fiscalização através dos meios indirectos pela autoridade de controlo.
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Sr Presidente, Srs. Deputados: Penso que é necessário aguardar, de certo modo, que em vários domínios - e não são aqueles aqui propostos para enquadramento - o Governo termine, em colaboração com a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, o estudo que está a fazer destas matérias.
Acerca deste projecto de lei, hoje em apreciação, teremos tempo para ouvir a Comissão e debater os termos em que ele deverá ser construído. É natural, como eu dizia há pouco, referindo-me a algumas matérias, que existam neste diploma aspectos que devam ser construídos para resolver todas as questões que se colocam em relação às polícias no que toca ao tratamento dos dados informatizados.
Creio que estamos de acordo em que esta é uma matéria importante, que urge regulamentar, sendo certo que os domínios da autoridade, do poder, são algo fundamental numa sociedade, mesmo na sociedade democrática, para defender os cidadãos. Não devemos esquecer que também os abusos são mais fáceis e que o próprio avanço tecnológico permite hoje, e permitirá no futuro, porque os avanços não pararam, outras possibilidades de abusos. Por isso, penso que todos estamos de acordo em que este é um domínio que importará regulamentar e deverá ser objecto de uma legislação rápida para enquadrar as situações do passado e o tratamento de todos estes temas no futuro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Condesso, gostaria de lhe perguntar o que pensa sobre um problema que não abordou na sua intervenção e que é uma das razões que está na base desta iniciativa legislativa do PS.
Há uma novidade enorme no que está a acontecer, hoje, no funcionamento das forças policiais. Houve um tempo em que, de facto, os polícias funcionavam em relativo isolamento e com mecanismos de cooperação internacional extraordinariamente formais, que passavam por mandados, por formas muito rebuscadas, por vezes, de pedidos de acesso a ficheiros e de transmissão documentadíssima dessas informações. Hoje, não é assim
Por exemplo, não deixa de ser perturbador - e gostaria de o ouvir sobre essa matéria - o à-vontade, o informalismo ou a falta de clareza como entre nós são equacionadas as formas de articulação entre sistemas que vão ter, de facto, de coexistir mas cuja articulação não se vê?
Na verdade, vamos ter o Sistema de Informação Schengen e o superbanco de dados, com uma componente portuguesa e outra central, actualizada permanentemente, acessível a partir de Portugal e do exterior. Pergunta-se: quem tem acesso, como tem acesso, quais são as garantias, quais são as regras de não desvio da informação, quais são as salvaguardas de abuso? Depois, como é que este banco se articula com o banco da EUROPOL? Não vai haver um sistema só, haverá, aparentemente, dois. A EUROPOL vai começar por arrancar com a unidade respeitante à droga. E essa unidade, a que dados tem acesso? Por exemplo, tem acesso aos dados do INFARMED, do nosso banco de dados de receitas médicas? Ou seja, a uma força policial nacional ou estrangeira pode pedir acesso ao banco de dados sobre as receitas médicas dos cidadãos portugueses ou não?
Ora, esta articulação não está definida. Quanto a mim, o Sr. Deputado subvaloriza a importância ou a gravidade da ausência dos regulamentos dos serviços, porque, de facto, o Governo deveria ter emitido esses regulamentos mas não o fez até agora e não só criou uma situação de instabilidade como pode vir a criar uma situação de colapso.
A última questão que quero abordar é a seguinte: a lei que aqui aprovámos no mês de Agosto, a Lei n.º 28/94, que não parece ter produzido grande impacto em algumas mentes, todavia foi aprovada por unanimidade, prevê que os sistemas de tratamento de dados pessoais hoje existentes caem, ou seja, têm de ser fechados, no caso de não ser concedida autorização para o seu funcionamento, com prévio parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, no prazo de 180 dias, a contar de 29 de Agosto. Ora, gostaríamos de estar mais tranquilos quanto ao facto de o Governo tencionar assumir em tempo, para evitar o colapso, os pedidos de autorização necessários De contrário, teremos ou bancos de dados clandestinos ou uma espécie de corrida, à última hora, para pedir à Assembleia da República que legalize aquilo que ficará sem qualquer cobertura legal pelo simples "bater das badaladas" da entrada em vigor dos 180 dias.
Portanto, Sr. Deputado, creio que seria lúcido da parte do PSD ser sensível à necessidade de legislação neste domínio; ser sensível à necessidade de pressionar, de estimular, de incentivar o Governo a um algo que em Estado de direito democrático nem deveria ser objecto de incentivo algum, isto é, a cumprir a lei, aprovada por unanimidade, por acréscimo.
O Sr. Presidente (Correia Afonso). - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.
O Sr. Fernando Condesso (PSD). - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, começo por dizer que não desvalorizei a importância das regulamentações, da legislação ou das normas complementares que importa criar. O Governo também não a desvaloriza. Penso que, hoje, estão criadas todas as condições para que essa regulamentação seja efectivamente criada em termos adequados, porque existem os enquadramentos legais a nível superior e a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, que é a entidade que deverá dar parecer e colaborar neste domínio da regulamentação, e não só, como sabe.
Portanto, nos próximos tempos, penso que toda essa matéria será objecto de tratamento por parte do Governo, que tem, efectivamente, decretos-leis ou propostas em preparação nesta área. Como sabe, já obteve alguns pareceres, ou estão em debate, na própria Comissão Nacional, alguns pedidos feitos pelo Governo para que esta se pronuncie em algumas destas áreas.
O Sr. José Magalhães (PS):- Falta a regulamentação!
O Orador: - Sem dúvida, mas o Governo está a prepará-la rapidamente. Agora, a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados pronunciar-se-á e o Governo legislará onde tiver de legislar, regulamentará onde tiver de regulamentar, e enviará para a Assembleia, a fim de nos pronunciarmos nas áreas em que nos devamos pronunciar.
Como é evidente, V. Ex.ª referiu questões que são, efectivamente, importantes e fundamentais, de âmbito interno e até de circulação internacional de dados. Penso, aliás, que o Governo e a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados têm, independentemen-
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te de todo o debate que vai ter lugar entre ambos, pontos de referência, ainda hoje bastante actuais, insertos na Recomendação n.º 8715 do Comité de Ministros do Conselho da Europa sobre esta matéria, inclusivamente sobre a circulação de dados no plano interno e no plano internacional, sobre a garantia da sua utilização para os fins para os quais são pedidos, etc. Ou seja, há aqui um conjunto de orientações, que, ainda hoje, se mantém válido e constitui um ponto de referência para toda esta matéria no domínio que hoje aqui importa debater. ;
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate relativo à apreciação do projecto de lei n.º 275/VI - Estabelece garantias de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais (PS), que será votado amanhã, à hora regimental.
Srs. Deputados, vamos passar ao debate do projecto de resolução n º 123/VI- Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP).
Desejo informá-los de que se encontram entre nós autarcas e outros ilustres representantes da população da ilha de Santa Maria. Não posso esquecer que, em Setembro, chefiando uma delegação parlamentar, estive nos Açores. A delegação parlamentar deslocou-se aí a fim de conhecer, no local, as especificidades açoreanas, tendo-lhe merecido a melhor atenção as questões de Santa Maria, Antes de entrarmos na discussão deste projecto de resolução, quero deixar aqui uma saudação aos nossos convidados da ilha de Santa Mana, que quiseram honrar-nos com a sua presença, neste momento e neste debate.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do projecto de lei n.º 123/VI.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução n.º 123/VI é uma decorrência política do debate da petição n.º 255/VI, ocorrido na sessão plenária de 7 de Julho do corrente ano. Essa petição, convém sempre lembrar, foi subscrita pela autarquia de Vila do Porto, cujos representantes o Grupo Parlamentar do PSD saúda, por todos os membros do governa regional e todos os Deputados da Assembleia Legislativa Regional dos Açores. A eles se juntaram os Deputados da Assembleia da República eleitos pelo círculo eleitoral dos Açores. Esta abrangência é inédita e histórica. A sua motivação justa e indeclinável.
Trata-se de manter na ilha de Santa Maria o Centro de Controlo Oceânico e modernizá-lo através do designado "Projecto Atlântico". A dependência dessa ilha dos serviços aeroportuários e de navegação aérea é a primeira constatação de quem chega a Santa Maria. A delegação parlamentar que visitou a Região Autónoma dos Açores níío foi insensível a essa realidade. O relatório dessa importante visita, apreciado na sessão plenária da passada quinta-feira, assinala nas suas conclusões que "é imperativa a garantia de fixação da ANA-EP no arquipélago, com a definição de uma estratégia adequada à Região Autónoma dos Açores, salvaguardando em especial a manutenção do Centro de Controlo Aéreo do Atlântico em Santa Maríí, cuja importância é decisiva para minorar o risco de desertificação e para o desenvolvimento económico da ilha."
Assim tem sido, desde 1946, altura em que Portugal tomou posse do aeroporto e demais serviços nele sediados, construídos pela Força Aérea Americana -, e assumiu, conforme previsto no Acordo com os Aliados, a responsabilidade de prestar à aviação civil internacional serviços de tráfego aéreo na vasta região do Atlântico Norte, tecnicamente designada como Região de Informação de Voo de Santa Mana.
Quase meio século de relevantes serviços prestados à aviação internacional, que dignificaram Portugal e assinalaram honrosa presença entre o Novo e o Velho Mundo.
E lamentável que a ANA-EP, em documentos vários, venha insinuar que a manutenção do Centro Oceânico em Santa Maria possa significar a perda do reconhecimento de Portugal como país prestador de serviços de tráfego aéreo no Atlântico. Uma região autónoma não é um Estado independente. Aliás, corremos, sim, esse risco se recuarmos a fronteira até à Península Ibérica, onde pontifica a Espanha.
Sr. Presidente, Srs Deputados. O motivo deste contencioso reside, simplesmente, na deliberada confusão entre os conceitos de modernização e transferência do centro de controlo. Uma coisa não implica a outra. Portugal necessita de modernizar-se em matéria de sistemas de controlo de tráfego aéreo e no respeito pelas orientações internacionais, preconizadas pelos organismos competentes. Ora, isso pode ser feito, com maior rentabilidade, em Santa Maria. O adiamento sucessivo desse investimento só pode ser entendido como a criação de um facto consumado para pressionar a transferência para Lisboa. Não há razões técnicas, económicas, políticas e sociais que justifiquem tal procedimento e passarei a demonstrá-lo.
Razões técnicas: a localização do Centro de Controlo Oceânico em Santa Mana melhoraria o interface com o controlo terminal dos Açores já existente Melhoraria também o sistema de rádio-ajudas, recentemente instalado e que só é possível através de comunicações directas controlador/piloto, o que não acontecerá com a estação de comunicações em HF, a ser instalada em Lisboa. Qualquer pessoa reconhece que não há melhor posição estratégica no Atlântico do que Santa Mana para instalar estações de comunicação terrenas, as quais, a médio prazo, são menos onerosas do que as comunicações via satélite. Estudos actuais sobre os custos de utilização dos dois meios de comunicação apontam para que o satélite seja uma espécie de "segunda linha" das estações terrenas.
Razões económicas: a instalação, em Lisboa, do Centro de Controlo Oceânico implicará a construção adicional de uma estação de comunicações em HF (rádio-telefone) que já existe em Santa Maria. O seu custo é de 1,5 milhões de contos.
Razões políticas: o Governo da República determinou a manutenção, em Santa Mana, do Centro de Controlo e a sua inerente modernização. Fê-lo em despacho conjunto do Ministro da República, Conceição e Silva, e do Ministro da Habitação, Obras Públicas e Transportes, Viana Batista, publicado, no dia 28 de Abril de 1983, na II Série do Diário da República. Este despacho nunca foi cumprido.
Razões sociais: entre funcionários e familiares, a ilha perderá cerca de l O % da sua população, ou seja, cerca de 600 pessoas. Estes cidadãos são precisamente aqueles que têm maior peso económico, já que contribuem com cerca de 50 % para o PIB, de 3,6 milhões de contos, da ilha de Santa Maria. Os serviços aeroportuários, em Santa Maria, sempre foram focos geradores de emprego directo e indirecto e de animação social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Aqui estão as razões demonstrativas de que é possível suster um preocupante processo de enfraquecimento demográfico e económico
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sem pôr minimamente em risco o prestígio de Portugal como país prestador de bons serviços de controlo do tráfego aéreo no Atlântico. Pensamos que o Centro de Controlo Oceânico e o "Projecto Atlântico" encontrariam, em Santa Maria, a localização mais adequada para continuar a servir, com distinção, a aviação civil internacional.
Aplausos do PSD, do PS, do PCP e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Martins Goulart.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, Sr."5 e Srs. Deputados: A Constituição da República consagra uma responsabilidade específica aos órgãos de soberania - relativamente às regiões autónomas -, no que concerne à "correcção das desigualdades derivadas da insularidade."
O princípio constitucional definido no artigo 231.º da nossa Lei Fundamental atribui ao Estado este dever especial, que o obriga a intervir, em cooperação com os órgãos de governo próprio das regiões, usando os instrumentos políticos e os recursos de que dispõe, para promover, com justiça, a realização colectiva das gentes portuguesas das ilhas atlânticas, visando o propósito de atenuar, tanto quanto for possível, as consequências ponderosas das condições de isolamento, de extrema perificidade e de reduzida dimensão que as caracterizam.
Mas o alcance de tão nobres desígnios fica irremediavelmente perdido quando o exercício do poder político desrespeita, por sistema, os valores da descentralização e da solidariedade, introduzindo, deste modo, graves perversões no funcionamento do Estado de direito democrático.
Nunca foi motivo de vanglória termos de reconhecer que demasiados órgãos da administração central do Estado ofendem, com frequência excessiva, direitos que o regime democrático estabelece na Constituição e na lei, nomeadamente os que almejam garantir o regular funcionamento das instituições de poder local e regional e, ainda, aqueles que asseguram às comunidades insulares mais carenciadas a cooperação do Estado nas tarefas de desenvolvimento económico e social.
Ao denunciar, uma vez mais, tão perniciosa prática, juntamos a nossa voz aos que, nos dias de hoje, se perfilam no combate contra as sucessivas e preocupantes manifestações de centralismo político que, partindo do exemplo da acção governativa, tornam longínqua a esperança de vermos Portugal aproximar-se dos países que se situam em estádios mais evoluídos de organização democrática.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: É uma prova concludente de que vivemos envoltos numa lógica de poder marcado pelo mais atávico centralismo a necessidade de se tomarem medidas excepcionais por iniciativa desta Assembleia, com o principal propósito de salvaguardar o futuro, quiçá a viabilidade, de uma parcela de Portugal.
Quando a Assembleia da República reconhece a urgência da aprovação de um projecto de resolução que visa suscitar a intervenção do ministério da tutela de uma empresa pública como forma última de impedir a consumação de um atentado contra interesses estratégicos do País e, também, pôr termo à ameaça da eclosão de uma crise social e económica sem precedentes numa parte importante do território nacional, teremos porventura atingido o limite das expectativas sobre a eficácia do funcionamento das instituições democráticas do Estado e o cúmulo da omissão governativa.
A Assembleia da República terá mesmo de pronunciar-se sobre o destino de uma comunidade que, até hoje, tem resistido, com dignidade e sem desfalecimento, ao avolumar das ameaças que parecem indiciar a iminência de um golpe que, a concretizar-se, será seguramente rude e, porventura, fatal.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Ainda não há quatro meses, tivemos a ocasião de tratar, a partir desta tribuna, as questões mais relevantes e controversas relacionadas com a eventual transferência para Lisboa do Centro de Controlo Oceânico e respectivos serviços de tráfego aéreo, presentemente sediados no Aeroporto da Ilha de Santa Maria, nos Açores Elas encontram-se, aliás, bem sintetizadas nas considerações desenvolvidas no preâmbulo do projecto de resolução em debate e mantêm-se perfeitamente actualizadas
Consideramos, por isso, desnecessário repetir a argumentação por nós expendida no debate da petição n.º 2557 VI, subscrita, em primeiro lugar, pelo Presidente da Câmara de Vila do Porto e com a assinatura de todos os representantes dos órgãos de poder da Região Autónoma dos Açores - e, neste ensejo, saúdo, em nome do PS, a delegação de Santa Maria que está a assistir a estes trabalhos -, ...
Aplausos do PSD, do PS, do PCP e do CDS-PP.
... debate esse que se realizou na sessão plenária do passado dia 7 de Julho.
O resultado mais significativo dessa intervenção parlamentar é o projecto de resolução que aqui estamos a defender.
Sem querer ser pessimista, diria que esta iniciativa - subscrita solidariamente por Deputados de todos os grupos parlamentares - representa a última referência de esperança do povo de Santa Mana em ver atendidas, com celeridade, as suas justas pretensões.
Não descortinamos razões serias que se oponham à aprovação deste projecto de resolução.
Já ouvimos, ao longo de mais de uma década, a tentativa de contra-argumentação, persistentemente apresentada pela administração da ANA-EP.
A última versão que conheço desse "argumentário" falacioso tem data próxima e surge no seguimento desta nossa iniciativa parlamentar.
Verificamos que se mantêm as falsas premissas da controvérsia e as conclusões viciadas por elas determinadas. Mas surge novamente uma história antiga. Sob a forma de um rumor, alega-se o perigo da influência exercida por interesses estrangeiros...
Quanto a esta falsa ameaça, responderei com alguns dos argumentos que me foram fornecidos por técnicos altamente qualificados da aeronáutica civil. E passo a citar livremente: "A existência de uma proposta da IATA sobre a possível delegação da RIV de Santa Mana a outros países prende-se com o facto de esses países facultarem meios mais modernos e adequados para a prestação de serviços de controlo e significa claramente uma crítica à política de desinvestimento da ANA-EP. Não é, pois, argumento que sirva para justificar a instalação dos respectivos serviços de Controlo Oceânico em Lisboa.
Temos, aliás, conhecimento de que representantes da LATA ficaram surpresos pelo facto da ANA-EP pretender relocalizar o Centro de Controlo Oceânico na capital do País, continuando estes a advogar a sua permanência na ilha de Santa Maria. Esta posição tem em conta uma melhor e mais eficaz cobertura de HF em toda a região e a implementação futura, cada vez mais provável, do HF DATA LLNK, como solução menos onerosa para os novos sistemas a implementar.
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Convirá relembrar que os investimentos com vista à modernização dos serviços em causa serão pagos pelos respectivos utilizadores. Se a ANA-EP informasse a ICAO e as companhias aéreas de que iria poupar 1,5 milhões de contos com a manutenção do Centro Oceânico em Santa Mana, certamente que a ICAO e os utilizadores se apressariam a apoiar a sua permanência na ilha. E se essas mesmas entidades soubessem que a exploração, em Santa Mana, no âmbito das comunicações, teria custos menores, mais forte seria ainda a expressão da sua preferência."
Mas não posso deixar de dar uma nota pessoal, em resposta a uma questão que, sendo frequentemente referida, merece o nosso mais veemente repúdio. Efectivamente, não pode admitir-se que responsáveis por uma empresa pública nacional insistam em insinuar que, a manter-se o Centro Oceânico em Santa Mana, Portugal deixará de ser reconhecido pela comunidade da aviação civil internacional como prestador de serviços de tráfego aéreo no Atlântico Norte
Em atitude de protesto e desta tribuna, resta-nos recordar à empresa pública ANA-EP que os Açores são Portugal!
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A recente visita de uma delegação da Assembleia da República à Região Autónoma dos Açores permitiu-nos renovar, perante o povo da ilha de Santa Maria, o compromisso de tudo fazer, no âmbito das nossas competências, para encontrar a solução justamente esperada.
A expectativa de todos recai, agora, sobre a necessária intervenção do Governo, na sequência da recomendação, constante do projecto de resolução, que é fundamental aprovarmos nesta Assembleia.
Por isso, termino reformulando os votos de que, em primeiro lugar, a Assembleia da República e, finalmente, o Governo assumam responsabilidades directas, com vista à adopção de uma estratégia correctiva que, no domínio da prestação de serviços de controlo de tráfego aéreo pela ANA-EP, assegure a implementação em Santa Maria do "Projecto Atlântico", ficando assim salvaguardados os .interesses nacional e regional e igualmente satisfeitas as legítimas aspirações das gentes da ilha de Colombo.
Aplausos do PSD. do PS, do PCP e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se houve problema que mais mobilizou a atenção da delegação da Assembleia da República que visitou os Açores, ele foi, sem dúvida, o apelo, não só dos marienses mas de toda a região, de todos os órgãos institucionais e de todos os quadrantes políticos, para que o Centro de Controlo Oceânico se conservasse em Santa Maria, o que foi assumido e está inscrito nas conclusões do relatório da visita.
A petição, que aqui debatemos em Julho passado, já revelava, aliás, essa larga convergência a favor desta reclamação.
Este projecto de resolução, apresentado e apoiado por Deputados de todos os grupos parlamentares na sequência do convite que, no debate da petição, foi lançado pelo meu camarada João Amaral, é também bem a expressão da vontade política da Assembleia da República de apoiar a reclamação que nos foi apresentada e que, hoje, está aqui confirmada pela presença da delegação de Santa Mana, que daqui também quero saudar, em nome do meu grupo parlamentar.
Aplausos do PCP, do PSD, do PS e do CDS-PP.
Falta, contudo, confirmar ainda se o PSD é coerente com as promessas e compromissos que assumiu, aqui e na Região Autónoma dos Açores. Seria, aliás, grave, muito grave, que o PSD aprovasse o relatório que aprovou da deslocação aos Açores, que andasse a afirmar publicamente uma posição e que aqui viesse, eventualmente - esperemos que não-, a votar em sentido contrário.
O Sr. João Amaral (PCP). - Certamente que não!
O Orador: - As razões de ordem política, económica e social são claras e muito relevantes.
O Centro de Controlo de Tráfego Aéreo está sediado em Santa Maria desde 1946 e, desde então, a vida económica e social da ilha organizou-se em torno e em função desse importante serviço De tal modo que, como lembra o projecto de resolução, 50% do PIB gerado em Santa Maria deve-se à NAV He 10 % da sua população corresponde aos trabalhadores e suas famílias da ANA-EP ali sediados.
Se o Centro de Controlo Oceânico saísse da ilha e aí ficassem só os Serviços de Controlo do Aeródromo, Aproximação e Controlo Terminal, isso significaria que 120 dos actuais 143 trabalhadores (correspondente a cerca de 450 pessoas com as famílias) abandonariam Santa Maria.
A ilha não tem outras actividades alternativas significativas e a criação das zonas francas, ensaiada pelo governo regional, redundou num fracasso e não funcionou como alternativa.
Temos, pois, aqui um primeiro conjunto de questões suficientemente importantes para serem reflectidas antes de se consumar a decisão de transferir para Lisboa o Centro de Controlo de Tráfego Aéreo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal é responsável pelos serviços de controlo de tráfego aéreo de uma vasta região, correspondente a 51 vezes o território nacional.
Essa responsabilidade, bastante invejada por outros países (como os Estados Unidos e a Inglaterra), só foi atribuída a Portugal exactamente porque o País não se estende só até ao Algarve mas integra a sua componente insular. Só porque Santa Mana é parte integrante do território nacional é que Portugal tem a região de informação e fiscalização de voo que tem actualmente
Os dois argumentos que apresentei deveriam ser, só por si, suficientes para que uma qualquer administração da ANA se abstivesse de uma decisão grave e para que a tutela, o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, impedisse a concretização de uma medida centralista, que, a concretizar-se, levaria a um processo acelerado de despovoamento da ilha e de sério enfraquecimento da sua estrutura económica e social.
Estivemos em Santa Maria, visitámos o Centro de Controlo Oceânico e reunimos com o responsável local da ANA, já que a sua administração entendeu que o assunto e a visita não eram suficientemente importantes para lá fazer deslocar o seu presidente, dando a cara e expondo os seus argumentos.
Ao que parece, os argumentos da ANA são do tipo "se o Centro de Controlo Oceânico for transferido para Lisboa, Portugal perde o espaço aéreo que hoje controla e que lhe foi delegado pela ICAO" e também argumentos de ordem financeira. São falsos, um e outro.
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Sabe-se que há muito grandes potências reclamaram um realinhamento das FIR (Regiões de Informações de Voo) e propõem a redução do número de centros de controlo oceânico com fundamento na evolução tecnológica.
É verdade que a tecnologia instalada a bordo dos aviões torna as operações de voo cada vez mais fiáveis, seguras e económicas e os sistemas de controlo de tráfego aéreo instalados em terra devem, pois, acompanhar essa evolução e não contribuir para o estrangulamento das operações de voo.
Por isso, na forte competição pelo controlo dos espaços aéreos, cada país procura apetrechar-se cada vez melhor. E esta e que é a questão.
Desde que Portugal invista no apetrechamento tecnológico, é indiferente, no plano técnico, que o Centro esteja nos Açores ou em Lisboa. Rigorosamente, nem é indiferente, Srs. Deputados. É sabido que o espaço radioeléctrico em torno de Lisboa está muito mais saturado do que em torno da ilha de Santa Maria, o que significa que, em última análise, a transmissão de comunicação a partir e para a ilha de Santa Maria é, porventura, até mais fiável que em Lisboa, como, aliás, nos foi confirmado na própria ANA - EP, nos Açores.
Acontece também que a questão do realinhamento dos R1V foi abandonada e, em contrapartida, todos os Estados membros do ICAO se comprometeram a adquirir sistemas de controlo e equipamentos compatíveis que pudessem funcionar como um único sistema. E este tanto pode ser instalado nos Açores como em Lisboa.
É neste quadro que a ANA - EP celebrou contrato com duas empresas estrangeiras para a aquisição de um sistema automatizado de controlo aéreo e um novo sistema de comunicações para instalação em Lisboa, contra a opinião de tudo e de todos. Mas porquê em Lisboa e não na ilha de Santa Maria, se não há qualquer razão técnica a impedi-lo, antes pelo contrário? E digo antes pelo contrário porque a instalação em Lisboa do sistema automatizado, para além do que já dissemos, funcionando como transição para a futura tecnologia de comunicação via satélite, acarreta a construção de uma nova estação aeronáutica, cujo investimento orça, aproximadamente, 1,5 milhões de contos, quando a simples renovação da actual estação existente na ilha de Santa Maria seria suficiente para assegurar a instalação do sistema, sem necessidade daquele vultuoso investimento. E caso para perguntar quem está interessado e porque razões tão empenhado em fazer o erário público gastar, desnecessariamente, tão volumosa verba?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A qualidade do serviço prestado na ilha de Santa Maria, por razões técnicas, quantas vezes insuficientemente remunerado, é internacionalmente reconhecido.
Acresce que o sistema automatizado, se instalado na ilha de Santa Maria, em muito beneficiaria, aliás, os voos transatlânticos que sobrevoam as proximidades da Região de Controlo Terminal dos Açores. Aliás, a própria Federação Internacional de Pilotos considerou, muito recentemente, indispensável, para segurança dos voos, manter como alternativo o aeroporto de Santa Mana, com a operacionalidade actual, o que naturalmente seria muito prejudicado com a eventual saída da NAV II.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todas as razões, de ordem política, económica, social e técnica, reclamam a manutenção, na ilha de Santa Maria, do Centro de Controlo Oceânico. O que lamentamos é que o Sr. Ministro Ferreira do Amaral, que é, em última análise, o responsável pela decisão, não esteja aqui, hoje, para contrapor as razões que levam a ANA - EP a querer tomar tal decisão e a discutir connosco essas razões.
A aprovação desta resolução (se o PSD, entretanto, não der o dito por não dito), representando a vontade política desta Assembleia, deve não só levar o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações a revogar o despacho que permitiu à ANA - EP iniciar o processo de transferência, determinando que o Centro de Controlo Oceânico fique na ilha de Santa Mana, mas também chamar a atenção para a necessidade de uma reflexão sobre a definição de uma estratégia da ANA - EP para a Região Autónoma dos Açores. A responsabilidade é não só da ANA - EP mas também, e muito, do Governo e do ministro da tutela. Mas para isso também e necessário que os marienses se mantenham unidos e mobilizados, como os vimos, na defesa da sua justa reclamação.
Tem custos acrescidos? Já se provou que não! Mas, mesmo que os tivesse, seria preciso repetir o que foi dito aquando do debate da petição. A manutenção do Centro de Controlo Oceânico de Santa Mana e também uma expressão de solidariedade nacional, que, obviamente, tem os custos decorrentes da dimensão e da descontinuidade do território nacional. A contrapartida é Portugal ser o que é, com a sua componente continental e insular.
Haverá alguém que queira pôr isto em causa?
Aplausos do PC P, do PSD, do PS e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Presidente da Câmara de Vila do Porto, Srs. Representantes da população da ilha de Santa Maria, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em meu nome e no do meu partido, queria cumprimentar VV. Ex.ªs e agradecer, desta tribuna, a hospitalidade fidalga que dispensaram à delegação da Assembleia da República que se deslocou à Região Autónoma dos Açores e, principalmente, a visita inolvidável que fizemos à ilha de Santa Mana
Quase estou a ver o Sr. Deputado Guilherme Silva, com o altifalante na boca, a perguntar, para a população que se juntou à frente da Câmara Municipal: "A América é aqui!" E o PSD tem de dizer, hoje, nesta Assembleia, que a "A América é aqui!". Quer isto dizer que não se pode, com um altifalante, gritar uma frase de agrado diante da população da ilha de Santa Mana e aqui, no aconchego de quatro paredes, dizer: "Vamos ver o que diz o Governo.. O que não diz... Se é bom, se é mau... Há outros interesses nacionais, outros interesses superiores que podem levar-nos a não tomar a mesma posição que tomámos quando gritámos, a plenos pulmões, A América é aqui!" Não esqueceremos essas palavras, e o povo da ilha de Santa Maria também não esquecerá de que a América é lá, e, por isso mesmo, aquela população tem o direito de escolher a sua vida, de viver lá e todos nós o dever de fazer com que aquilo seja a verdadeira América para os habitantes da ilha de Santa Maria.
Em segundo lugar, já aqui foram avançados vários argumentos, técnicos, demográficos e históricos, sobre a necessidade de manter os serviços de controlo de tráfego aéreo na ilha de Santa Maria.
Para mim, o problema é simples, na medida em que todos eles podem ser rebatidos.
Se colocarmos a questão sob o ponto de vista técnico, há-de vir naturalmente um grande cientista dizer que a
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melhor solução é realmente Lisboa ou, se não for Lisboa, Nova Iorque, Washington ou mesmo Tóquio - como já ouvi dizer.
Se colocarmos o problema do ponto de vista demográfico, pode dizer-se: "Afinal o problema não é tão grande, pois pode arranjar-se uma outra maneira, já que pode transfere-se a população, arranjar-se aí um mercado, outras formas de viver, e a população não ficará tão mal, se. realmente tirarmos daí o Centro do Controlo Oceânico"
Se colocarmos a questão sob o ponto de vista histórico, poderão dizer: "Sim, mas a História também se revê, porque a população hoje não tem o mesmo modo de vida que tinha há 50 anos. Hoje vive efectivamente melhor, .º ninguém nos diz que, tirando de lá o Centro, viverá muito pior ou cairá na miséria, porque, em 1994, não há realmente razões para toda uma população cair na miséria por causa de um serviço". Por isso mesmo, adiantarmos estes argumentos é dar efectivamente armas ao adversário.
Portanto, não podemos colocar o problema do ponto de vista de meras razões técnicas, porque, quaisquer que sejam, são sempre rebatíveis. O problema está na vontade política.
Em primeiro lugar, temos de saber se o problema é português ou não. Este problema não é açoreano nem da ilha de Santa Maria, tem de ser nacional. Tem de ser Portugal a defender, em nome de todos os portugueses, embora esteja localizado na ilha de Santa Maria.
Em segundo lugar, é um problema de prestígio nacional. "Prestígio nacional" quer dizer que não podemos ceder a chantagens, como a que já ouvi depois de vir da ilha de Santa Maria, quando fui falar com o Sr. Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, que, entre outras coisas, me falou da preocupação da população da ilha no que diz respeito ao Centro de Controlo Oceânico.
O Sr. Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores disse-me que o problema não é novo embora muito complicado e preocupante para a população. Em primeiro lugar, porque- e é uma coisa que eu não sabia, que não me foi dito na altura em que estive de visita à ilha de Santa Maria mas só aqui - houve uma reunião, a pedido do Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, no gabinete do ministro da tutela, Ferreira do Amaral, juntamente com os Deputados regionais da Região Autónoma do Açores, em que foi amplamente discutido e esclarecido todo o problema do Centro de Controlo Oceânico da ilha de Santa Maria.
Ora, estes Deputados regionais saíram desta reunião convencidos de que a resolução do problema não estava nas mãos do Governo português, porque ultrapassava: as suas próprias competências, mas, sim, nas da IATA, que, por sua vez, dizia. "Se Portugal não quer fixar estes serviços em Lisboa, pois muito bem, não ficarão para Portugal. Terão de ir para qualquer outro local, fora de Portugal, e assim o problema morrerá por si. Não serão para a ilha de Santa Maria nem para Lisboa. Poderão ser localizados algures, com melhores condições do que em Lisboa". E, como quem apela para o sentimento mais profundo dos portugueses, diz: "Até podem ir para Espanha. Podem sair de Portugal para se situarem em Espanha".
Perante tudo isto, respondi: "Admiro-me, Sr. Ministro, que isto se tenha passado desta maneira e que os Deputados regionais tenham concordado, ou tenham, pelo menos, ficado esclarecidos, porque é uma informação que não nos foi dada e a população da ilha de Santa Maria não sabe dessa fatalidade. Além do mais, custa-me muito não digo acreditar, porque V. Ex.ª está a dar-me essa informação como um facto verdadeiro, mas ver Portugal a aceitar esta solução como uma fatalidade e a dizer que, a irem para Espanha ou qualquer outro local, pelo menos, fiquem em Lisboa".
E que se houver uma verdadeira vontade política, se Portugal disser "isto é do meu interesse vital, pelo que tem de ficar em Portugal e, dentro de Portugal, na ilha de Santa Maria", esta vontade será naturalmente respeitada, porque, se assim não for, Portugal terá de declarar-se como um país que não tem o peso internacional que propagandeia, ou diz ter, junto da Comunidade Europeia, das organizações internacionais Portugal tem de declarar que é capaz de resolver um problema vital para si, e não digo para a Região Autónoma dos Açores, nem para a ilha de Santa Maria nem para a vila do Porto.
No meu entender, é um problema de que Portugal não deve nem pode abdicar. Pode encontrar contra-prestações, porque numa negociação é sempre possível dá-las; pode ceder noutros âmbitos para obter esta prestação, não nego, podendo ter de dar algo em compensação para obter aquilo que, nesta resolução, queremos, mas toda a contra-prestação, todo o peso negociai que tiver, será sempre a favor de Portugal e não apenas dos Açores. Por isso, queremos ver este projecto de resolução da Assembleia da República ser aprovado por unanimidade. Caso contrário, será uma resolução minoritária e fár-nos-á "engolir" o que dissemos na ilha de Santa Maria. Nunca a população da ilha de Santa Maria esquecerá a visita de uma delegação da Assembleia da República, que gritou, juntamente com eles, palavras de ordem, que fez promessas e que, uma vez regressada à base, pôs em causa tudo quanto ali tinha dito.
Portanto, não contem comigo ou com o meu partido para essas trapalhadas, porque nós temos uma só palavra, somos pessoas de um só rosto e de uma só voz, e aquilo que lá gritámos estamos agora a gritar daqui, desta bancada, desta tribuna, perante este projecto de resolução, como se estivéssemos a falar directamente para a população da ilha de Santa Maria: "A América é aqui!".
Será um grave atropelo e uma grave ofensa a Portugal, aos Açores, à população açoreana e à da ilha de Santa Maria, negar aqui o que lhes foi prometido, de viva voz, lá. Por isso, dizemos: "Para essas cambalhotas não estamos aqui!". Para prestígio da Assembleia da República e da palavra dada, contem sempre connosco! E como ali dissemos: Viva Santa Maria! Viva o Centro de Controlo Oceânico, que deve lá continuar! Viva os Açores! Viva Portugal!
(O Orador reviu.)
Aplausos do CDS-PP, do PSD. do PS e do PCP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Guilherme Silva, Manuel Silva Azevedo, Martins Goulart e Lino de Carvalho. Como o Sr. Deputado Narana Coissoró não dispõe de tempo para responder, a Mesa concede-lhe dois minutos para o efeito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, não será, propriamente, um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Narana Coissoró mas mais, ou quase, uma interpelação à Mesa.
Com efeito, fui citado na intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró e, de facto, quero dizer que não utilizei, exactamente, a expressão que o Sr. Deputado referiu como tendo sido utilizada por mim, na minha intervenção, em Santa Maria. Referi algo similar, mas o espírito era exactamente o mesmo.
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Sr. Deputado, quero dizer-lhe, muito simplesmente, que, desde o primeiro momento, fiquei muito sensibilizado para esta questão e mantenho, fielmente, o que disse em Santa Maria, publicamente. Aliás, tenho-o dito a vários responsáveis da Região Autónoma dos Açores e, designadamente, da ilha de Santa Maria.
Tive oportunidade de fazer uma intervenção, em Plenário, quando foi apresentado o relatório- que também subscrevi -, que aponta no mesmo sentido e, obviamente, só tenho uma cara, pelo que a minha posição será, em toda e qualquer circunstância, muito clara no sentido da votação favorável deste projecto de resolução da Assembleia da República.
Neste momento, não posso adiantar qual será a posição do Grupo Parlamentar do PSD; estou também empenhado em que a nossa posição seja uníssona e no mesmo sentido, mas, naturalmente, estou certo que o Sr. Deputado Narana Coissoró também já viveu situações de divergência entre a sua própria posição e a adoptada pelos órgãos responsáveis do seu partido.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, visto que dispõe de apenas dois minutos para responder, talvez seja melhor responder aos vários pedidos de esclarecimentos no final.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, prefiro responder já ao Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Então, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, quero responder já para lembrar que V. Ex.ª, quando falou às populações de Santa Maria, não o fez em nome individual, nem como Deputado da Madeira, nem como parte integrante de um mini grupo parlamentar insular! Falou em nome de todos, como chefe da delegação parlamentar e, portanto, V. Ex.ª não tem o direito de, agora, vir aqui cindir o seu voto, dizendo: lá falei de uma determinada maneira, mas não sei como é que o Grupo Parlamentar do PSD irá reagir!
Em segundo lugar, no meu partido, quaisquer que sejam as divergências entre a direcção e o grupo parlamentar, quando o Grupo Parlamentar do CDS-PP vota aqui, está a exprimir o voto do partido e não o meu voto ou o de outro Deputado. Portanto, mesmo que exista qualquer divergência entre os cinco Deputados aqui sentados e a nossa direcção, quando aqui votamos algo, o voto é do CDS-PP! É assim que fica exarado em acta e é assim que ele é contado pela Mesa e pelo País.
Se o seu voto vale muito pouco em relação ao Grupo Parlamentar do PPD/PSD, o problema é completamente diferente...
Gostaria, pois, que o chefe da delegação, que fez aquela afirmação, a tivesse feito em nome do grupo parlamentar que representou e não em nome individual.
(O Orador reviu.)
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Silva Azevedo.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa, a fim de dar uma informação que torna esta situação correcta.
O Sr. Presidente: - Dar-lhe-ei a palavra depois de formulados todos os pedidos de esclarecimentos, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Silva Azevedo.
O Sr. Manuel Silva Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, gostaria que me prestasse um pequeno esclarecimento acerca da informação que lhe terá dado o Sr. Ministro da República, no que respeita à reunião que ele, juntamente com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, manteve com Deputados regionais.
É certo que não me admira muito que o Sr. Ministro da República para os Açores tenha ficado convencido com as argumentações do Sr. Ministro das Obras Públicas e, até, da Ana- E.P., porque, muito facilmente, se vem convencendo de tudo aquilo que é contra os Açores. Mas já não posso acreditar que os Deputados regionais que participaram nessa reunião se tenham convencido tão facilmente!
Estão presentes nesta sala dois Deputados regionais pela ilha de Santa Maria - um do PS e outro do PSD -, os quais, naturalmente, não podem falar mas que, com certeza, participaram dessa reunião, porque directamente interessados, e que, nos corredores, poderão dar-nos - àqueles que estiverem interessados - esclarecimentos sobre a mesma.
Em resumo, a pergunta que lhe deixo é a seguinte: a informação que o Sr. Ministro da República lhe deu referia quais os Deputados regionais e que delegação era essa? Eram só os Deputados de Santa Maria?
O Sr. Presidente (Correia Afonso): Tem a palavra o Sr. Deputado Martins Goulart.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Narana Coissoró, que também foi meu companheiro de viagem na digressão a Santa Maria, participou na reunião que tivemos com as forças vivas desta ilha, onde todas estas questões, técnicas e políticas, foram abordadas. Quem lá esteve fez as perguntas que achou por bem fazer aos técnicos e aos representantes do poder local e eu, para dar uma informação a V. Ex.ª, fiz a pergunta concernente a esse «argumento-papão» - permita-me que o classifique como tal - que, de vez em quando, ressoa nalgumas câmaras, no senado de que o centralismo se justificará sempre porque Portugal é pequeno e, quando há uma grande questão a defender a nível nacional, tudo tem de ficar em Lisboa.
Digamos que fui o membro da reunião de trabalho que se dirigiu às forças vivas de Santa Maria e perguntou se, de facto, havia alguma razão de ser para que se invocasse, tão facilmente e de uma forma tão irresponsável, esta ameaça «espanhola» relativamente à questão do Centro de Controlo Oceânico em Santa Maria.
A resposta que me foi dada, na reunião que ocorreu em Setembro passado, em Santa Mana, foi a de que não havia qualquer razão para estarmos preocupados com essa matéria, até porque, a acontecer qualquer pressão desse tipo, ela seria perfeitamente impensável e inaceitável por parte do Governo português, uma vez que se trataria de uma autêntica ingerência nas questões internas de Portugal e quase que um atentado contra a soberania de Portugal.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Narana Coissoró, na sua intervenção, deu
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especial ênfase a dois aspectos: aos eventuais argumentos técnicos que se opõem à manutenção, em Santa Maria, do Centro de Controlo Oceânico e, também - nas fases inicial e final -, à eventual posição dubitativa do PSD em relação ao voto final do projecto de resolução n º 123/VI.
Quanto à primeira questão, de ordem técnica, já aqui foram aduzidos variados argumentos; eu próprio, quando me encontrava nos Açores, procurei recolher e pedir documentação técnica que me permitisse sustentar também essa vertente da argumentação.
Contudo, penso que importa, talvez, centrar a discussão numa outra questão, que é, mais do que de ordem técnica, económica e social, de ordem nacional. E quando digamos que a questão é política, ela é-o no sentido de saber- aliás, o Sr. Deputado Narana Coissoró referiu-o na sua intervenção - se Portugal tem condições, se pode e deve (e deve, em nossa opinião) ser ele a definir, dentro do seu território nacional, incluindo a Região Autónoma dos Açores, a localização mais adequada para os instrumentos, neste caso da situação de voo, que estão à sua disposição.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Até posso dizer que, ao contrário do que é argumentado, a informação que tenho - que vale como tal - é que se o Centro de Controlo Oceânico ficar exclusivamente sediado em Lisboa, será mais fácil, a prazo, que as potências que, neste momento, disputam o controlo do espaço aéreo, como os Estados Unidos e a Inglaterra, venham a adquirir parte do espaço aéreo que é hoje controlado por Portugal.
Portanto, este é mais um elemento adicional para reflectirmos - o PSD em particular - sobre a aprovação deste projecto de resolução e sobre a manutenção em Santa Mana do Centro de Controlo Oceânico.
Quanto às posições dubitativas do PSD, fiz-lhes também uma referência, de passagem, na minha intervenção, porque não quero crer, apesar de conhecer quais são as posições políticas do PSD em muitas matérias, que os Deputados regionais, ou melhor, o Sr. Deputado Mário Maciel não tenha falado em nome do Grupo Parlamentar mas, sim, enquanto Deputado regional, quando a sua intervenção termina, precisamente, com a afirmação de que «pensamos - PSD - que o Centro de Controlo Oceânico encontraria em Santa Maria a localização mais adequada para continuar a servir, com distinção, a aviação civil internacional».
Portanto, não quero crer que, tendo a delegação parlamentar assumido, em nome da Assembleia da República, um compromisso de se bater, aqui, pela manutenção do Centro de Controlo Oceânico, eventualmente, a maioria desta Casa venha agora contrariar essa tomada de posição da delegação.
Por isso, aliás, chamo a atenção do Sr. Presidente em exercício, o Sr. Vice-Presidente Correia Afonso, e do Sr. Presidente da Assembleia para o que, em última análise, seria posto em causa se a esta afirmação de princípio que a delegação da Assembleia da República fez em Santa Maria se seguisse um voto de rejeição ou o «deixar cair» este projecto de resolução.
Pensamos que, em nome do interesse nacional e doa compromissos assumidos, para além das razões já aqui invocadas, é óbvio que a posição da Assembleia da República não pode ser outra senão a de declarar a sua vontade política no sentido de que o Centro de Controlo Oceânico se deve manter em Santa Maria.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero agradecer os pedidos de esclarecimentos formulados pelos Deputados das várias bancadas à minha despretensiosa intervenção. Creio que ela valeu a pena, exactamente, porque foi política. E, porque foi política, suscitaram-se todos esses pedidos de esclarecimentos.
Neste ponto, não posso nem quero descer às minudências, porque entendo que o problema e tão elevado e tão alto que certos aspectos, como o ter ocorrido uma reunião com este ou aquele Deputado, este ou aquele Deputado ter acenado com a cabeça e o outro não, um ter ficado satisfeito, mas já não o outro, não significam rigorosamente nada, uma vez que não é isso que vai resolver o problema das relações entre o Governo Português e a LATA e da localização do Centro de Controlo Oceânico em Santa Maria
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- Queira terminar, Sr. Deputado, pois já esgotou o tempo de que dispunha.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Por isso mesmo, tenho de responder aos Srs. Deputados Manuel Silva Azevedo e Martins Goulart que, para mim, não tem qualquer importância essa reunião. Com efeito, falei dela aqui porque parece que, no espírito dos Srs. Ministros da República e da Tutela, este assunto está arrumado. Assim, estaríamos aqui a falar por falar, uma vez que, para o Governo, ele está encerrado, desde aquela reunião.
Exactamente, porque a minha bancada e a delegação parlamentar que visitou a Região Autónoma dos Açores voltou com o espírito, absolutamente firme, de que o assunto não está encerrado e que agora, sim, se abre com este projecto de resolução, é que disse que vamos pôr de remissa e esquecer tudo quanto se tenha passado antes, porque a partir deste projecto de resolução abre-se uma nova porta que não vamos deixar, nunca mais, fechar.
Quanto a saber se há ou não posições dubitativas quanto ao Grupo Parlamentar do PSD, se aquilo que os Deputados regionais entendem que deve ser e os Deputados continentais já não, em nome de outros valores mais altos, julgo que esses problemas são já para, depois, a Região Autónoma dos Açores resolver. Sei que nos Açores sempre ganhará o PSD! Portanto, podem dar-se ao luxo de dizer lá uma coisa e aqui outra. Todavia, fica uma coisa, a chamada história. E a história não perdoa, principalmente porque existirão as actas da Assembleia da República, além da voz que não se extinguira daquela praça pública onde foi produzida nem da memória das gerações presentes.
Pode ser que, para o Governo nacional e para a universalidade das telecomunicações, Santa Maria seja meia centena de populares e suas famílias, mas o problema humano é de interesse vital para Portugal e para orgulho do País e aí não podemos ceder.
(O Orador reviu )
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso) - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, apenas para esclarecer a Mesa e para que fique registado que a
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minha intervenção em Santa Maria foi feita na qualidade de chefe da delegação, uma vez que o Sr. Vice-Presidente, Correia Afonso, se tinha ausentado para uma representação parlamentar no estrangeiro.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E todos nós aplaudimos essa intervenção!
O Orador: - Assim, fica claro que, ao contrário do que parece resultar das palavras do Sr. Deputado Narana Coissoró, não se tratou de uma intervenção partidária mas o interpretar do sentir geral da representação, que procurei traduzir e que não teve a menor contestação. Bem pelo contrário, foi corroborada por todos os membros da delegação e tanto assim é que posso assegurar que os Deputados do PSD que integraram esta representação - atrevo-me a dizê-lo até em nome do Sr. Vice-Presidente Correia Afonso - vão votar favoravelmente esta resolução. E valha-nos não termos o monolitismo da sua bancada para podermos fazer, se for caso disso, essa flexibilização de voto.
Mas quero dizer-lhe mais, Sr. Deputado Narana Coissoró: todos estes Deputados estão empenhados em que o voto do grupo parlamentar seja também neste sentido e que, junto do Governo, a solução seja a favorável à ilha de Santa Maria.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Amen.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Amanhã, às 18 horas e 30 minutos, vamos ver!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrado o debate deste projecto de resolução, que será votada amanhã, à hora regimental. A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, pelas 15 horas, com período de antes da ordem do dia.
No período da ordem do dia serão apresentadas e debatidas as propostas de resolução n.05 70/VI - Aprova, para adesão, as Emendas ao artigo 17.º e ao artigo 18.º da Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, 71/VI- Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho, respectivos anexos e declarações, 757 VI - Aprova, para ratificação, a Constituição e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações e o Protocolo Facultativo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios Relativos à Constituição da União Internacional das Telecomunicações, à Convenção da União Internacional das Telecomunicações e os Regulamentos Administrativos, 76/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), 77/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite (INTELSAT) e 78/VI - Aprova, para adesão, o Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT).
À hora regimental, procederemos a votações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 45 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva.
António Augusto Fidalgo.
António Maria Pereira.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Francisco João Bernardino da Silva.
Jaime Gomes Milhomens.
José de Oliveira Costa.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Macário Custódio Correia.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Partido Socialista (PS):
Aníbal Coelho da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
José António Martins Goulart.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD).
Adriano da Silva Pinto.
António Fernando Couto dos Santos.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
Luís António Martins.
Manuel da Costa Andrade.
Ruí Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Luís Santos da Costa.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
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Rogério da Conceição Serafim Martins.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Maria da Conceição Seixas de Almeida.
Deputado independente:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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