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Sexta-feira, 4 de Novembro de 1994 I Série - Número 8
Diário da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE NOVEMBRO DE 1994
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 40 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da audição parlamentar nº 29/VI e do voto nº 116/VI, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
A Câmara aprovou o voto n.º 116/VI - De protesto pela condenação à morte da jovem Angel Peng (PAR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os Verdes), sobre o qual usaram da palavra, além do Sr. Presidente, os Srs Deputados António Maria Pereira (PSD), Marques da Costa (PS), Adriano Moreira (CDS-PP), Manuel Sérgio (PSN), António Filipe (PCP), Guilherme Silva (PSD) e André Martins (Os Verdes).
O Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira (PS) falou acerca da aplicação de taxas sobre os meios automáticos de pagamento.
O Sr. Deputado Álvaro Viegas (PSD) abordou algumas das carências sentidas pelas populações do Algarve e respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Fialho Anastácio (PS).
O Sr. Deputado Miranda Calha (PS) trouxe à colação a situação por que passam os trabalhadores do extinto sector aduaneiro, respondendo depois a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Paulo Trindade (PCP) e José Puig (PSD).
O Sr. Deputado Rui Comes Silva (PSD) referiu-se à presença de Deputados portugueses nas primeira e segunda voltas das eleições na Guiné-Bissau, tendo respondido, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Eduardo Reis (PS), Miguel Urbano Rodrigues (PCP), Luís Geraldes (PSD) e Narana Coissoró (CDS-PP).
Ordem do dia. - Após o Sr Deputado António Maria Pereira (PSD) ter feito a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação sobre a proposta de resolução n.º 70/VI - Aprova, para adesão, as Emendas ao artigo 17º e ao artigo 17º da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, foi a mesma apreciada, tendo sido aprovada. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro) e do relator, os Srs. Deputados Alberto Martins (PS), Miguel Urbano Rodrigues (PCP) e Adriano Moreira (CDS-PP).
A Sr.ª Deputada Helena Falcão (PSD) fez a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação sobre a proposta de resolução n º 71/VI- Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho, respectivos Anexos e Declarações, a qual, depois de debanda, foi também aprovada. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros (Martins Jerónimo), os Srs Deputados Menezes Ferreira (PS), João Poças Santos (PSD) e Narana Coissoró (CDS-PP).
Foram ainda apreciadas, conjuntamente, e aprovadas as propostas de resolução n.º 75/VI - Aprova, para ratificação, a Constituição e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações e o Protocolo Facultativo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios Relativos à Constituição da União Internacional das Telecomunicações, à Convenção da União Internacional das Telecomunicações e os Regulamentos Administrativos, 76/VI- Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), 77/VI- Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite (INTELSAT) e 78/VI - Aprova, para adesão, o Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT). Usaram da palavra, a diverso título, além dos Srs. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros e Secretário de Estado da Habitação (Carlos Costa), os Srs Deputados António Crisóstomo Teixeira (PS), Carlos Oliveira (PSD), Paulo Trindade (PCP) e Narana Coissoró (CDS-PP).
A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República à Grã-Bretanha nos dias 8 e 9 de Novembro.
O projecto de resolução n.º 123/VI- Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP) foi também aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, tendo produzido intervenções, a diverso título, os Srs Deputados Lino de Carvalho (PCP), Martins Goulart (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), Mário Maciel e Guilherme Silva (PSD), Jaime Gama (PS) e Luís Pais de Sousa (PSD).
Foram igualmente aprovados, na generalidade, o projecto de lei n º 275/VI - Estabelece garantias de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais (PS) e, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n º 104/VI - Autoriza o Governo a aprovar os novos estatutos da Casa do Douro, em relação à qual fizeram declaração de voto os Srs Deputados António Martinho (PS), José Costa Leite (PSD) e Lino de Carvalho (PCP).
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Augusto Fidalgo.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Albino da Silva Peneda.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Lufe António Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
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Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
úlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raúl Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira.
José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Partido da Solidariedade Nacional (PSN):
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
Deputado independente:
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: a audição parlamentar n.º 29/VI - Sobre a sinistralidade no trabalho e as medidas legislativas que urge adoptar nesta área (PCP) e o voto n.º 116/VI - De protesto pela condenação à morte da jovem Angel Peng (PAR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os Verdes).
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: à Radiotelevisão Portuguesa, formulado pelo Sr. Deputado Cerqueira de Oliveira; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Miranda Calha; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Fialho Anastácio; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulado pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos; e ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Trindade.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Lello, na sessão de 19 de Maio; Guilherme d'Oliveira Martins, no dia 15 de Setembro; Carlos Luís, na sessão de 21 de Setembro; Isabel Castro, no dia 4 de Outubro; e José Magalhães, na Comissão Permanente de 29 de Setembro. Mais se informa a Câmara de que a Comissão de Agricultura e Mar reuniu às 15 horas e que a Comissão de Petições e a Comissão Eventual para as Cortes Espanholas reunirão às 16 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido o voto n.º 116/VI- De protesto pela condenação à morte da jovem Angel Peng (PAR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os
Verdes).
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
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Os Deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e os demais Deputados abaixo assinados propõem ao Plenário o seguinte voto de protesto:
Recordando que a pena de morte é considerada uma modalidade de tortura, como tal proscrita no artigo 5.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem; tendo em atenção que o artigo 2.º desta Declaração Universal consagra o direito à vida; considerando que na generalidade dos países civilizados, designadamente em todos os países europeus, na esteira do exemplo de Portugal em 1876, a pena de morte já foi abolida ou deixou de ser aplicada; atendendo a que a opinião pública portuguesa está profundamente chocada com a condenação a pena de morte da jovem Angel Peng, de nacionalidade portuguesa.
Por tais razões protestam junto das autoridades de Singapura e solicitam-lhes a comutação dessa pena irremediável.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Para uma intervenção, na qualidade de Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tem a palavra o Sr. Deputado António Maria Pereira.
O Sr. António Maria Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Assembleia da República não podia deixar de protestar quando uma portuguesa, um ser humano, está na iminência de ser executada, condenada à morte, por um crime que cometeu. É porque, antes de mais, Portugal, como é sabido, tem uma longa tradição humanitária em todos os aspectos e, designadamente no que se refere à pena de morte, o nosso foi o primeiro país europeu a abolir a pena de morte, em 1867, e um dos primeiros, em todo o mundo, a promover essa abolição.
Tal atitude corresponde à nossa tradição humanitária, que, através dos tempos, tem sido marcante. A esse respeito, quero recordar que, por exemplo, no século XX, tivemos três revoluções - a de 1910, a de 1926 e a de 1974; que, em todas elas, o regime foi fundamentalmente alterado nas suas estruturas e que, apesar disso, não houve execuções nem mortes em larga escala, a não ser incidentalmente, contrariamente ao que costuma acontecer em geral - quando se verifica uma mudança radical de regime, uma revolução, ocorrem sempre execuções. Portugal pode, pois, dar este exemplo ao Mundo de, nestas três revoluções, nunca ter promovido quaisquer execuções.
Por outro lado, a pena de morte é hoje considerada, em todo o mundo civilizado, um resquício de tempos em que a regra era a lei de Talião, tempos de escravatura e de tortura, o que era assumido pacificamente pelas instituições e pelos regimes.
A partir do século XVIII, do Século das Luzes, esses conceitos foram ultrapassados e o Mundo tornou-se mais humano; houve uma revolução cultural que aboliu de vez a escravatura e a tortura e que, a pouco e pouco, irá abolir a pena de morte. Na verdade, passou-se de uma fase em que a pena de morte existia em todos os países para outra, a actual, em que 50 % dos países ainda admitem a pena de morte, enquanto na Europa, designadamente, não há pena de morte, apesar de três países a manterem nas respectivas legislações sem, contudo, a aplicarem. Trata-se, pois, de uma grande conquista do Humanismo que caracterizou o século XVIII, que se prolongou pelo século XIX e que, no século XX, infelizmente, registou um recuo bastante grande, mas que temos a obrigação de manter.
Por esta razão justifica-se este pedido de comutação da pena a esta portuguesa que, neste momento, espera nos corredores da morte que o Estado exerça sobre ela essa inadmissível vingança que corresponde a punir um crime com outro crime.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques da Costa.
O Sr. Marques da Cosia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da bancada do Partido Socialista, quero expressar o nosso apoio a este voto de protesto, em geral, pelas razões que já foram aqui expressas pelo Sr. Deputado António Maria Pereira e porque, do ponto de vista dos princípios, constitui uma pedra basilar do nosso entendimento sobre o Homem e o Direito. Naturalmente que não o fazemos apenas porque esteja em causa a vida de uma portuguesa mas a vida de um ser humano alvo de um conceito penal em relação ao qual, felizmente, em Portugal, somos contra.
Creio que é importante aproveitar para dizer que este momento também se pode revestir de um carácter simbólico e pedagógico por parte da Assembleia da República ao expressar tão firmemente este seu voto de protesto porque é indiscutivelmente verdade que, ao grande debate que se trava nas sociedades contemporâneas sobre o crescente aumento da criminalidade, está associada uma discussão sobre a reintrodução da pena de morte em muitos países.
Vale a pena que a Assembleia da República sublinhe, em todas as oportunidades possíveis, que este é um princípio basilar do nosso entendimento sobre a vida humana e o sentido penal em discussão e reitere que, independentemente de todas as reflexões e do debate público que seja feito sobre esta matéria, a posição dos órgãos representativos do povo português é firme na defesa deste princípio.
Vale a pena lembrá-lo em todas as oportunidades sobretudo num momento em que as sociedades contemporâneas são tão pressionadas para reflectirem sobre esta realidade dramática das nossas vidas que é, hoje em dia, o crescente aumento da criminalidade e, até, da criminalidade em larga escala. Qualquer que seja a necessidade do reforço de princípios, de métodos e de práticas, em nossa opinião, em circunstância alguma ela pode passar por outra coisa que não seja a recusa firma da pena de morte em Portugal e em todos os países.
Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostava de, publicamente, repetir o apoio que demos na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação à proposta feita pelo seu Presidente no sentido de a Assembleia da República, de uma maneira muito clara, muito firme, muito determinada, tomar uma posição de protesto contra a execução que está iminente. Não se trata apenas do facto de estarmos perante um valor, da tradição histórica portuguesa, importante, mas de estar envolvida nesta questão uma interpenetração da Declaração Universal dos Direitos do Homem, justamente num momento em que esta Declaração está sujeita a variadíssimas leituras contraditórias. Um dos seus pré-
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ceitos essenciais é o respeito pela vida humana, sem excepção, e nem a própria soberania pode reclamar para si uma excepção nesta matéria - é um princípio absoluto que não pode ser violado e é necessário acentuá-lo porque a violência está a reassumir um lugar ameaçador e extremamente preocupante não apenas na vida interna mas também na vida internacional.
Nos fora culturais, que não era de esperar que fossem afectados pelos temores que esta onda de violência está a causar, surgem convites para repensar a necessidade de voltar a incluir no sistema penal a pena de morte. Nós próprios talvez não estejamos imunes a solicitações desse tipo, razão pela qual devemos ser mais firmes nesta posição, nesta exigência.
Por isso mesmo, julgo que o Estado português, através de todos os órgãos de soberania e não apenas da Assembleia, não deve hesitar em empenhar todo o seu prestígio e autoridade internacional em relação a este caso exemplar com base numa observação muito basilar da doutrina cristã - que a injustiça feita a um homem é uma injustiça feita a todos os homens. E disto que se trata e, neste sentido, esperamos que a voz da Assembleia da República seja ouvida.
Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, faço meu este voto de protesto da Assembleia da República onde está em causa a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Mas, a propósito deste tema, poderemos meditar mais um pouco: a morte é a negação da vida. Ora, só entendo a negação como a via para a superação, como uma exigência de transcendência. A pena de morte é a institucionalização da intransponibilidade, da petrificação, é o enclausuramento no irremediável.
Daí que seja eu, também, logicamente, até por motivos marcadamente filosóficos, pela comutação da pena à nossa compatriota e, afinal, de qualquer ser humano nestas circunstâncias.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, gostava de declarar publicamente que não subscrevemos inteiramente este voto, que votaremos favoravelmente, solicitando uma medida de clemência para esta cidadã ao Estado de Singapura.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta jovem macaense, envolvida num processo em Singapura, tem sido objecto de preocupação por parte dos órgãos de soberania. É público que o Sr. Presidente da República e o Governo estão empenhados no sentido de, junto das autoridades de Singapura, conseguirem a comutação da pena que foi aplicada àquela cidadã portuguesa.
A Assembleia da República também não podia, nesta circunstância, alhear-se de idêntica preocupação e, ontem, as Comissões de Assuntos Constitucionais; Direitos, Liberdades e Garantias e de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação deliberaram no sentido de ser apresentado um voto ao Plenário da Assembleia da República que, mais do que de protesto, fosse também de apelo às autoridades de Singapura no sentido da comutação da pena.
As intervenções precedentes já deram nota de que o que está em causa é o direito à vida. Hoje, não é compreensível em nenhuma dimensão e muito menos numa dimensão universal que se faça justiça com uma injustiça maior. Os fins não justificam os meios e, por mais condenável e reprovável que seja o crime de que vem acusada esta jovem, em nenhuma circunstância se justifica que possa ser penalizada com uma pena de que o Homem não pode dispor, por uma forma que ultrapassa a disponibilidade humana e que envolve o desrespeito pelos valores mais importantes e, quiçá, pelo direito mais importante do Homem que é, efectivamente, o direito à vida.
Nesta circunstância, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não podia estar alheia a uma matéria que lhe diz directamente respeito. Por seu lado, o Grupo Parlamentar do PSD, cujas raízes também estão identificadas com os valores que a nossa colectividade adquiriu há muito - e nesta matéria somos pioneiros pois Portugal foi dos países que liderou a extinção da pena de morte -, não poderia ter outra forma de estar perante esta matéria, pelo que vamos votar favoravelmente este voto de protesto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, quero afirmar que subscrevemos o voto de protesto pela condenação de um ser humano que, por acaso, é uma cidadã portuguesa, macaense.
Quero ainda dizer que pensamos que a experiência vivida pela sociedade portuguesa em mais de um século após a abolição da pena de morte não poderia merecer por parte do povo português uma outra reacção que não fosse a de fazer um voto de protesto por qualquer decisão que conduza à pena de morte para qualquer ser humano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproveito esta ocasião para dizer que este momento também é extremamente importante para a sociedade portuguesa porque todos os grupos parlamentares subscreveram este voto de protesto e, ao fazerem-no, foram ao encontro da tradição que Portugal tem neste domínio, dando uma justificação para que não volte a haver pena de morte em Portugal.
Em nosso entender isto é de facto significativo porque, como já aqui foi referido, hoje em dia, nas sociedades ditas modernas, fazem-se muitos apelos no sentido da resolução de situações de criminalidade através do recurso à pena de morte. Pela nossa parte, pensamos que estas sociedades em que vivemos são elas próprias as grandes geradoras de conflito e de violência e, quanto a nós, não é recorrendo às penas máximas que se resolvem os problemas da sociedade mas, sim, encarando-os de frente, procurando resolvê-los e preveni-los na fonte, assim procurando evitar que se agravem os conflitos para que se recorra cada vez menos à repressão, como é tradição que se vem verificando de forma crescente nas sociedades em que vivemos.
Assim, repito que pensamos que é extremamente significativo que a Assembleia da República aprove este voto
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de protesto e que todos os grupos parlamentares aqui representados o subscrevam e tenham proferido estas palavras.
O Sr. Presidente: - Se me é permitido, em meu nome pessoal e em nome dos Membros da Mesa, gostaria de associar-me a este gesto da nossa Câmara.
Ecoaram hoje, aqui, palavras que lembram um debate, travado em 1867, que mereceu de Victor Hugo uma das páginas porventura mais bonitas que algum dia foram escritas sobre a cultura portuguesa e o nosso ideal de humanidade. Como sabem, foi promotor da Lei de Abolição da Pena de Morte um ilustre universitário, Aires de Gouveia, professor de Direito em Coimbra, ilustre homem público que muito honrou a cultura portuguesa.
O facto de a Câmara se ter levantado hoje a propósito de uma portuguesa é um motivo de proximidade dela para connosco: ela pertence à nossa comunidade. No entanto, o nosso protesto foi sempre um protesto universal: a vida é um bem tão precioso que o Homem não pode privar ninguém dela, por maior que seja a sua autoridade, por maior e mais solene que seja o processo de que rodeie a decisão.
Neste espírito, ponho à votação o voto de protesto n.º 116/VI, que acaba de ser discutido.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Luís Fazenda e João Corregedor da Fonseca.
Srs. Deputados, este voto será enviado às autoridades de Singapura, cujos interesses são representados em Portugal por uma chancelaria que funciona em Paris. É para lá que será remetido este voto de protesto que acaba de ser aprovado.
Continuando no período de antes da ordem do dia, tem a palavra o Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira, para uma intervenção.
O Sr. António Crisóstomo Teixeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendeu o Governo voltar a trazer para a ordem do dia a questão das taxas do cartão Multibanco, numa conjuntura em que a prudência e o sentido do ridículo mais aconselhariam a prática do esquecimento.
Com efeito, sempre que vêm à esfera política questões envolvendo o sistema financeiro - veja-se o caso Totta/Banesto, o «romance» BPA/BCP ou a própria questão Multibanco - o Governo adapta a mais desastrada das atitudes, reforçando quem não precisa, parecendo até apostado em dar trunfos à oposição.
Perante um sistema de pagamentos automáticos que funciona com grande eficiência, tendo proporcionado comodidade aos utentes e ao comércio, aumento de produtividade e modernização dos serviços bancários e segurança para todos, houve quem não se contivesse e procurasse uma exploração gananciosa do sucesso. E o Governo, em lugar de tentar moderar abusos de posição, amarrando-se ao pilar do livre funcionamento do mercado, tratou de procurar apoiar aqueles que adoptaram uma prática oligopolista.
Pergunta-se: porque insiste o Governo em procurar sustentar legalmente a instituição de preços para a utilização de meios de pagamento como são os chamados cartões de débito, vulgarmente conhecidos por Multibanco?
Todos sabem da enorme economia induzida no sistema bancário pelo desenvolvimento deste sistema; todos sabem da natural desconfiança que gera a adopção de sistemas tarifários que introduzam incerteza quanto aos montantes a liquidar; todos sabem ter-se registado concertação por parte dos bancos para procurar impor um sistema de pagamentos sem qualquer relação com o tipo de serviço prestado, antes constituindo um ajuste de contas, à custa de terceiros, para compensação de transferências de liquidez.
Em lugar de procurar esclarecer a prática de concertação publicamente indiciada, vem agora o Governo retocar o regime de preços estabelecidos na transição dos governos Palma Carlos/Vasco Gonçalves para enquadrar, com carácter provisório e remendão, a prática bancária.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em lugar de procurar esclarecer inúmeros problemas pendentes com a utilização de cartões automáticos e outros meios de pagamento electrónico vem, pressurosamente, procurar emprestar legitimidade às pretensões dos bancos.
Não é de facto por falta de temas, Sr. Presidente, Srs. Deputados. Senão vejamos.
Não se reconhece a necessidade de enquadrar por contratos escritos, especificando com clareza as condições e as tarifas aplicáveis, incluindo o montante dos juros quando for caso disso?
Não se reconhece a necessidade de fazer depender de mútuo acordo a durabilidade dos contratos e as condições e termos para a sua alteração?
Não se reconhece a necessidade de definir, de forma clara, a responsabilidade das partes quando haja descaminho dos meios ou irregularidade na execução das operações?
Não se reconhece a conveniência de dar protagonismo às associações de consumidores e comerciantes na negociação de fórmulas contratuais que possam servir de padrão de referência para a celebração de contratos escritos?
Não se reconhece a necessidade de equilibrar as posições negociais das partes em presença, em que ao mundo atomizado dos consumidores e dos comerciantes se contrapõe o oligopólio bancário, dominando a 100 % as entidades que suportam, técnica e comercialmente, os sistemas de pagamento electrónico?
Não se reconhece, finalmente, a necessidade de proteger a vida privada de cada um face à possibilidade de transacção dos bancos de dados relativos às operações, com identificação explícita dos intervenientes?
Será que o Governo, de todos os problemas em presença, apenas se preocupa com a remuneração do sector bancário da economia, numa conjuntura em que as margens de intermediação financeira estão a exaurir a indústria, o comércio e os cidadãos em geral?
O Sr. Ferro Rodrigues (PS):- Muito bem!
O Orador: - Perante as notícias que têm vindo a público, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista reafirma a sua oposição a esquemas legislativos simplistas que apontem unicamente para a aplicação de taxas sobre as operações de pagamento automático em que não haja concessão de crédito.
Entendemos que a taxa de emissão dos cartões deve ser o instrumento privilegiado para comercializar e fixar contratualmente este instrumento de pagamento. E reafirmamos a nossa intenção de aproveitar um projecto de lei, enquadrando a emissão e utilização dos meios automáticos de pagamento, preenchendo um vazio o Governo parece estar empenhado em manter.
Aplausos do PS.
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0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Álvaro Viegas.
0 Sr. Álvaro Viegas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A postura do Deputado, enquanto representante da sua rt8ião, deverá ser reivindicativa, exigente e rigorosa, em defesa no só daqueles que o elegeram mas, sobretudo, de todos os cidadlaos, naturais ou residentes na sua região.
Não é aceitável que um Deputado seja eleito por um período de quatro anos e que no final desse mesmo período não conheça as realidades económica, cultural, desportiva, social e outras que fazem um todo de uma qualquer região.
Durante o período de uma legislatura, a função do Deputado consiste não só na intervenção em Plenário e na utilização de outras figuras regimentais como também, e principalmente, no conhecimento real dos organismos públicos ou privados que têm como tarefa a prestação de serviços às populações.
Ao Deputado da maioria, porque suporta eleitoralmeote o Governo da Nação, cabe-lhe a honrosa tarefa de clafficação das medidas governamentais e das obras que vão ao encontro das necessidades das populações, como estradas, centros de saúde, hospitais, escolas, etc.
Se o que acabo de afirmar é uma verdade indesme;titível, não o é menos se afirmarmos que a sua missão iaio começa nem acaba aqui. Importante, realmente importan(r, é o contacto com as populações, o conhecimento objectlyo de todas as realidades, sejam elas positivas ou negativas,
Numa região como a minha, a região do Algarve, cue tem conhecido nos últimos anos um espantoso desenvolvimento nas vias de comunicação, na rede escolar, em contros de saúde e noutros melhoramentos futuros, como o Hospital do Barlavento, a conclusão da Via do Infante até Lagos e a já prometida auto-estrada Lisboa-Algarve, tem<_ com='com' que='que' par='par' a='a' existirem='existirem' social='social' e='e' estatal='estatal' quo='quo' desempenhado='desempenhado' algumas='algumas' apoio='apoio' empobreceriam='empobreceriam' contexto='contexto' o='o' algarvio.br='algarvio.br' tarefas='tarefas' têm='têm' associações='associações' importantes='importantes' complementares='complementares' não='não' disto='disto'>
Hoje, Sr. Presidente e Srs. Deputados, trago a esta Câmam três realidades bem diferentes, mas não menos importantes,
Durante este ano de 1994 tive oportunidade de efectu. ar três visitas: aos quartéis dos bombeiros voluntários o municipais, às escolas secundárias e às pousadas de juveintude. Nestas visitas, tive ocasião de falar com os seus res, ponsáveis e de visitar as instalações.
De todos os seus dirigentes percebi uma enorme vontade em trabalhar com os meios disponíveis e em alguns casos, como o dos bombeiros, que são bem poucos, con, um espírito de missão, de sacrifício e de satisfação por e5. tarem a realizar uma tarefa que sabem ser a prestação de um serviço público.
Na visita aos quartéis dos bombeiros voluntários e municipais, pude verificar que mais de 80 % das corporações estão bem equipadas no seu parque automóvel, sendo de realçar, no entanto, que corporações como as de Alcoutirr e de Vila do Bispo ainda não têm o seu quartel, estando o de Vila do Bispo com um processo mais avançado.
No nosso compromisso «Ao Encontro dos Portugueses» defendemos a construção destes dois quartéis, assim como a construção de um novo, em Lagoa e Monchique, sendo que este se encontra em fase de conclusão.
Às autarquias cabe um papel mais interventivo no que concerne ao apoio financeiro e à disponibilização de meios para campanhas de prevenção e de sensibilização.
Ainda hoje, muitas corporações de bombeiros se debatem com graves problemas financeiros que advêem do in-
cumprimento dos prazos de pagamento por parte dos organismos públicos do Estado
0 Sr. António Filipe (PCI?): - Um escândalo!
0 Orador: - Este problerna, a não ser resolvido rapidamente, pode levar ao sufoco financeiro de muitas corporaçoes.
No campo da formação dos borribeiros, tem de caminharse para o seu aperfeiçoamento cui---ncular e para a progressiva descentralização dos cursos a ministrar. Não é mais possível que as corporações possam dispensar os seus homens, durante várias semanas, para os cursos a ministrar em Sintra, com graves prejuízos para os próprios e para as corporações. 0 Algarve possui, em Vila Real de Santo António e em Albufeira, boas instalações para este Fim.
Não posso deixar de alertar para uma situação, que me parece grave, que tem a ver com a inexistência de meios de salvamento em caso de queda de um avião na na Formosa. As corporaçocs que servem esta na e, mais concretamente, os bombeiros voluntários e municipais de Faro, devem estar devidamente equipadas para intervir nestas situações.
Apesar de o Algarve possuir 180 ambulâncias operacionais, prontas a intervir em caso de acidente, parece-me importante que o serviço do INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica) deva ser alargado a outros concelhos que, pela sua especificidade, necessitarn dos meios humanos e materiais de que o INEM dispõe
Por último, quero louvar a acção dos mais de 600 voluntários e dos mais de 200 assalariados, perfazendo um total de 800 homens (com «H» maiúsculo), que diariamente põem a sua vida em perigo. Por esta razão e porque a nossa região é turística e, por isso mesi-no, uma zona de afluência de muitos milhões de turistas nacionais e estrangeiros, urge repensar a comparticipação dos meios financeiros e materiais disponíveis. já que somente chegam ao Algarve 4,2% do«bolo» a distribuir pelo Serviço Nacional de Bombeiros. É manifestarnente pouco para uma região de 300 000 habitantes, que tem de estar preparada para receber mais de 3 milhões de turistas.
No tocante à visita que efectuei às escolas secundárias no início do ano lectivo, pude constatar o progresso registado nas instalações, meios labor-atoriais e informáticos, que fazem das nossas escolas um exemplo de quanto tem sido frutuoso o esforço Financeiro do Governo. A aposta na construção de escolas está praticamente ganha. Agora, a aposta é na qualidade do nosso ensino.
É de louvar a decisão do Governo ao anunciar a construção de 100 pavilhões desportivos, cabendo cinco destes ao Algarve. Este é um passo gigante na resolução de um problema que afecta, há muitos anos, muitos milhares de jovens estudantes que não têm tido condições para a prática desportiva. De realçar a construção de mais quatro escolas C+S no Algarve, fechando, assim, um ciclo nas estruturas escolares.
A situação de insegurança que viviam algumas escolas algarvias foi ultrapassada com protocolos estabelecidos corri os Ministérios da Educação e da Administração Interna que levaram à colocação de guardas no seu interior e a redes de vedação com malha reforçada.
É bom que se reafirme, e para que fique registado, que mais de 90% das escolas prometidas no livro«Ao Encontro dos Portugueses», editado pelo Grupo Parlamentar do PSD, estão construídas ou em vias disso- para quem duvidava da nossa capacidade de execução, aqui está a resposta.
Por último, temos de rentabilizar as pousadas de juventude existentes no Algarve. A diversificação da oferta tu-
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rística passa pela melhoria das condições das nossas pousadas. A existência de protocolos de colaboração entre as câmaras municipais e as direcções das pousadas assumem um lugar de relevo, devendo as autarquias incluí-las nos seus roteiros turísticos municipais.
Lamentavelmente, nem todas as câmaras municipais encaram de forma positiva esta problemática, sendo de realçar a inércia da câmara comunista de Vila Real de Santo António, que se encontra pouco sensibilizada para colmatar a fraca utilização desta pousada, com a consequente inevitável degradação.
Em suma, estas três visitas que efectuei a três realidades bem diferentes serviram para verificar o esforço e a dedicação dos seus dirigentes assim como o esforço financeiro do Governo, mas também para fazer um levantamento das ainda existentes carências que persistem na nossa região.
O passado recente dá-nos força e vontade para continuarmos a trabalhar.
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Correia Afonso.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fialho Anastácio.
O Sr. Fialho Anastácio (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, quero congratular-me com o facto de este Hemiciclo, em dois dias seguidos, se ter referido ao Algarve. Creio que já era tempo de, efectivamente, se colmatar uma dívida para com esta região e, por isso mesmo, quero cumprimentar hoje, como fiz ontem, o Sr. Deputado Álvaro Viegas por trazer a esta Casa os problemas com que se debate o Algarve.
Em relação aos pontos que apresentou, designadamente as referências que fez aos bombeiros e ao sistema escolar - fundamentalmente construção de escolas e pousadas da juventude -, quero dizer-lhe que, no que se refere aos bombeiros, estou de acordo consigo porque, de facto, há uma lacuna terrível, caso venha a ocorrer um acidente na zona da Ria Formosa.
A este propósito, não nos podemos esquecer de que, há cerca de dois anos, houve um acidente gravíssimo no Algarve, com dezenas de pessoas mortas e feridas, em que foi levantado, inclusivamente, um inquérito cuja conclusão se aguarda. Desconhecem-se, pois, até ao momento, as conclusões do mesmo.
Assim, penso que os bombeiros de Faro, especialmente, terão de ser - como V. Ex.ª bem disse - apetrechados com equipamento capaz para que, caso ocorra uma situação grave, possam, minimamente, dar resposta a esse problema.
Mas, Sr. Deputado Álvaro Viegas, queria, fundamentalmente, questioná-lo sobre o ensino e, mais concretamente, acerca do parque escolar no Algarve. Como sabe, as escolas que se foram construindo, nos últimos anos, têm muito a ver com o PRODEP; o Governo recebe esse dinheiro de fundos comunitários e, com a comparticipação das câmaras municipais - é bom lembrar que essa comparticipação ascende, muitas vezes, a mais de 40 % daquilo que custa um equipamento escolar, dado que são as câmaras municipais que cedem terrenos, infra-estruturas e, inclusivamente, comparticipam com meios financeiros -, constrói essas escolas.
Ora, gostava que me dissesse por que razão o sistema do PRODEP não é, também, estendido aos ensinos primário e pré-primário.
Também gostaria de ouvi-lo sobre a falta de segurança que existe nas escolas. Aliás, tivemos oportunidade de visitar algumas no Algarve e, constantemente, era referido o tema da falta de segurança que existia nas escolas, bem como o da falta de pessoal. Pergunto: que recados é que tinha a dar ao Governo para poder resolver, rapidamente e com a urgência possível, estas situações?
Por fim, à semelhança do que disse, ontem, ao Sr. Deputado António Vairinhos, pergunto, estes problemas que nos envolvem, e que todos estamos interessados em resolver com a celeridade possível, não teriam uma eficácia maior se já estivesse criada a região administrativa do Algarve? É ou não verdade que é fundamental e imprescindível avançar-se com o processo da regionalização, criando-se a região administrativa do Algarve?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Viegas.
O Sr. Álvaro Viegas (PSD): - Sr Presidente, Sr. Deputado, e amigo, Fialho Anastácio é com muito prazer que lhe respondo às questões que formulou. Contudo, queria começar por reconhecer que o Sr. Deputado, sempre que um Deputado do Algarve usa da palavra nesta Casa, se congratula. Tal deve-se, certamente, ao facto de estar de acordo com as posições expostas.
Gostaria, também, de deixar aqui a seguinte referência: o Partido Socialista elegeu, pelo círculo do Algarve, três Deputados e é sempre o Sr. Deputado Fialho Anastácio que responde - o que, particularmente, me honra. Era, talvez, tempo de perguntarmos onde estão os outros Deputados do Partido Socialista eleitos pelo círculo do Algarve!
Em relação às escolas, Sr. Deputado Fialho Anastácio, a construção de escolas C+S e secundárias tem sido, nos últimos anos, uma prioridade do Governo e, como sabe, construímos dezenas delas na região.
Creio, por outro lado, que os novos protocolos estabelecidos para a construção de mais quatro escolas e cinco pavilhões desportivos no Algarve foram agora alterados pelo Governo, ou seja, se até aqui as câmaras municipais comparticipavam com o terreno e mais uma parte financeira, a partir de hoje irão comparticipar somente com o terreno, o que constitui um avanço muito grande que irá facilitar, certamente, as câmaras municipais.
Em relação à segurança nas escolas, tive oportunidade, exactamente como o Sr. Deputado, de visitar várias escolas secundárias e C+S no Algarve e, sem sombra de dúvida, a segurança ainda é um problema que preocupa os dirigentes dessas escolas. Contudo, esperava que o Sr. Deputado reconhecesse que tem havido um esforço muito grande por parte do Governo e que, inclusive, há várias escolas que já têm uma vedação muito reforçada e guardas que estão no seu interior e exterior, impedindo - pela voz dos seus dirigentes - a entrada de pessoas estranhas a essas mesmas escolas.
Hoje essas escolas são escolas modelo. Penso que é, precisamente, para isso que temos caminhado. Certamente, o Sr. Deputado comungará da minha preocupação e da minha satisfação em verificar que onde essa experiência foi feita as questões de segurança foram eliminadas.
Por último, em relação à regionalização, penso que, a exemplo de todos os meus colegas, a minha posição também é muito clara, porque tenho dito e escrito que sou a
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favor da criação da região administrativa do Algarve. Continuarei a ser a favor da região administrativa do Algarve.
O Sr. Fialho Anastácio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Fialho Anastácio (PS): - Para defesa da consideração dos Deputados do PS eleitos pelo círculo do Algarve.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - É uma figura nova, mas faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Fialho Anastácio (PS): - Sr. Presidente, pedi para usar da palavra porque o Sr. Deputado Álvaro Viegas referiu-se aos meus colegas de bancada, também eleitos pelo círculo do Algarve, em termos que poderiam ser mal interpretados, pelo que gostaria de clarificar muito bem esta questão.
Com efeito, o Sr. Deputado interrogou-se por que seria eu a responder e não outros Deputados. Ora, quero informar o Sr. Deputado Álvaro Viegas de que, efectivamente, nesta legislatura, o Partido Socialista tem três Deputados eleitos pelo círculo do Algarve; na próxima legislatura, provavelmente, atingirá os cinco Deputados...
Protestos do PSD.
O Partido Socialista, dizia, espera que os outros Deputados, também eleitos pelo Algarve - mais dois -, se encontrem, quer neste momento quer em outras circunstâncias, ao trabalho da Assembleia da República, quer em comissões quer em outros actos relacionados com as suas funções.
Se, porventura, eles não estão sempre aqui presentes, como em muitas ocasiões eu também não poderei estar, é porque, de facto, ainda somos poucos. Mas, na próxima legislatura, seremos muitos mais.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Viegas.
O Sr. Álvaro Viegas (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que quando referi este caso, me limitei a constatar o seguinte facto: permanentemente os seus dois colegas estão ausentes e, também permanentemente, é o Sr. Deputado que responde às intervenções dos Deputados do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta das pessoas que se encontram a assistir à sessão plenária de hoje.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero anunciar que esteve a assistir à reunião plenária um grupo de 19 alunos do Centro de Formação Agrícola de Almeirim e está ainda presente nas galerias um grupo de 15 jovens de Santa Maria da Feira.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, trago hoje, aqui, um assunto que me parece dever merecer a atenção da Câmara e do Governo: trata-se do problema dos trabalhadores em despachantes.
Com a entrada em vigor do Mercado Único, em 1 de Janeiro de 1993, procedeu-se à supressão das barreiras alfandegárias, o que originou o desaparecimento da actividade dos despachantes e dos seus trabalhadores. Tal situação deu origem a mais de uma centena de despedimentos - só no concelho de Elvas, porque são muitos mais em todo o País -, criando situações de carência económica e social verdadeiramente dramáticas.
Apesar da luta travada pelos trabalhadores aduaneiros em despachantes ao longo do ano de 1992, o Estado assumiu uma posição de minimização das consequências sofridas por este sector laboral. No entanto, fez publicar o Decreto-Lei n.º 25/93, de 5 de Fevereiro, prevendo algumas medidas de natureza social e económica que mais não são do que as que já existiam para os trabalhadores em geral.
A aplicação das medidas do citado decreto-lei tem suscitado diversas interpretações que, em última análise, resultam sempre em prejuízo dos trabalhadores, criando situações de injustiça, às quais o Governo se tem mostrado totalmente indiferente e insensível.
Passados, que são, quase dois anos sobre tal data, aqueles trabalhadores vêem chegado o fim do subsídio de desemprego, sem alternativas de colocação profissional e com uma profunda angústia relativamente ao seu futuro. E são muitas as queixas e as situações de gritante injustiça que mereciam ser reparadas e alteradas. Basta dizer que existem trabalhadores aos quais foi comunicado, pelo Centro Regional de Segurança Social da respectiva área, que tinham direito a dois anos de subsídio de desemprego, tendo-lhes sido subtraído, posteriormente, parte dele, alegando o respectivo Centro que tinha havido lapso na primeira informação.
O cálculo do valor das indemnizações foi efectuado de acordo com o regime geral, ou seja, um mês de vencimento por cada ano de trabalho, contando apenas o tempo na última entidade patronal. Isto significa que um trabalhador com 25 anos de trabalho, mas com dois anos na última entidade patronal, apenas recebeu o correspondente a dois vencimentos.
No citado decreto-lei, no n.º 1 do seu artigo 9.º, está prevista, de uma forma clara e sem margem para dúvidas, a comparticipação, por parte do Orçamento do Estado, em 1/3 do valor das indemnizações a que tais trabalhadores tenham direito. Na prática, a Segurança Social nega esse pagamento, alegando que os trabalhadores receberam dinheiro a mais, quando existem casos de trabalhadores que não receberam qualquer verba ou pagamento, nem da entidade patronal nem do Estado.
Também no n.º 3 do artigo 4.º do mesmo decreto-lei se diz que podem ainda aceder, antecipadamente, à pensão de velhice os trabalhadores por conta de outrem admitidos no sector após l de Janeiro de 1987 e até 1 de Janeiro de 1990, desde que tenham pelo menos 25 anos de carreira contributiva para a Segurança Social. É completamente absurdo este imperativo da lei, já que só podem beneficiar os trabalhadores admitidos neste curto de espaço de tempo, o que quase leva a pensar que os estudos foram feitos como se não existisse alguém nas condições exigidas.
Ora, todo este sector teve um papel preponderante, ajudando o Estado português na adopção das regras comunitárias da União Europeia, enfrentando as numerosas modificações que as directivas comunitárias e os regulamentos impunham, e contribuiu - é preciso notar-se - para a realização do Mercado Único Europeu, um dos objectivos fun-
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damentais da União Europeia, em benefício de um maior número de cidadãos e agentes económicos.
Parece, assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que há que fazer alguma coisa para resolver este problema.
Aqui ficam estas considerações, na certeza, porém, de que o Governo não pode ficar alheio ou omisso em relação a um problema tão dramático, que aflige largas centenas de trabalhadores em Portugal.
O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.
O Sr Paulo Trindade (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miranda Calha, de facto, julgo que trouxe a esta Câmara uma questão importante, porque, se é sempre grave o despedimento de um ou vários trabalhadores de uma empresa, neste caso, foi extinto todo um sector profissional.
Como V. Ex.ª referiu, e bem, o Governo publicou um decreto-lei com medidas de excepção e, como V. Ex.ª também disse, de facto, ele acaba por remeter essas medidas para a lei geral. E o facto é que, por exemplo, um trabalhador aduaneiro com cinco anos de actividade profissional que não tenha mudado de empresa teve uma indemnização superior à de um trabalhador com 20 anos de empresas aduaneiras, mas que, nos últimos quatro, por hipótese, mudou de empresa.
Gostava de perguntar ao Sr. Deputado Miranda Calha se considera ou não que isto viola o princípio constitucional de igualdade dos cidadãos e se, perante o escândalo que se está a passar com o atraso no pagamento de subsídios de desemprego, que está também a apanhar muitos trabalhadores aduaneiros - e importa precisar, novamente, que foi todo um sector profissional, todo um sector de actividade que foi extinto -, se justifica ou não que devam ser implementadas medidas de excepção para colmatar esta «chaga», este crime social que se verificou pela forma como o Governo do PSD extinguiu este sector de actividade.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Ah! O Governo é que extinguiu?'
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Miranda Calha, está ainda inscrito outro Sr. Deputado para lhe pedir esclarecimentos. Responde agora ou no fim?
O Sr. Miranda Calha (PS): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miranda Calha, ouvi-o com atenção e, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que é indiscutível que o sentido, o objectivo e o enquadramento da sua intervenção é profundamente divergente do sentido e do próprio enquadramento da intervenção agora produzida pelo Deputado Paulo Trindade. Entre os dois estilos, que demonstram duas formas de ver esta situação, apreciei mais o modo como o Sr. Deputado Miranda Calha colocou a questão. De facto, há situações irreversíveis, em face da União Europeia, que, ao PCP, ainda custam a aceitar, apesar da irreversibilidade e da situação em que já nos encontramos e que o Partido Socialista vai aceitando melhor, como se ouviu agora pelas suas palavras.
Antes de mais, quero registar que, segundo me parece, não há qualquer dúvida de que todos os direitos e todas as possibilidades que são cometidas aos trabalhadores, no âmbito da lei geral, em termos de transferência, de extinção de um determinado sector e do próprio acesso à formação profissional, são aplicadas neste caso concreto e o normativo que o Sr. Deputado referiu consagrou apenas algumas especificidades da situação - aliás, nunca em desfavor dos trabalhadores abrangidos.
Sendo todo um sector e sendo de algum significado o número de trabalhadores abrangidos, concordo plenamente que a situação merece, sem dúvida, uma atenção especial e todos nos devemos debruçar sobre ela, mas o que gostava de ouvir e o que me parecia mais importante, nessa matéria - aliás, tenho algumas ideias sobre isso, mas não fiz a intervenção sobre o assunto -, era a indicação, pelo Partido Socialista, de alguns caminhos que, em termos de legislação, não estejam ainda rasgados, seguidos ou indicados. Isso era mais importante, valorizava o debate e, de facto, podia ajudar na resolução de determinados casos concretos que possam existir.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou começar pelo fim, para dizer que me parece que quem tem obrigação de governar é o Governo.
O Sr. Luís Geraldes (PSD): - É precisamente o que faz e o que tem feito!
O Orador: - Nós, naturalmente, damos os nossos contributos e as nossas opiniões, mas, acima de tudo, o Governo tem obrigação de governar. Além disso, esta questão, a questão da extinção dos despachantes e dos trabalhadores em despachantes, a nível das fronteiras portuguesas, devia ter sido prevista com a devida antecedência, para que não surgissem situações deste tipo.
Portanto, a minha intervenção vai no sentido de dizer que o Governo, em primeiro lugar, devia ter tratado do assunto atempadamente e, em segundo lugar, devia ter tomado as medidas que tomou com a profundidade suficiente para que os trabalhadores, dois anos depois, não estivessem nas circunstâncias em que se encontram. E apresentei aqui vários exemplos: desde logo, estão em risco de não terem rigorosamente nada e, a nível do Centro Regional de Segurança Social, está a haver interpretações diversas sobre a forma como recebem o subsídio de desemprego - uns recebem, outros não, uns receberam adiantado e agora pedem-lhes a devolução dos respectivos subsídios, enfim, vive-se uma situação perfeitamente caricata e que demonstra uma falta de uniformidade relativamente à análise do problema.
No que diz respeito à questão do apoio para a formação profissional, devo dizer-lhe que também se trata de situações altamente temporárias, pois têm originado que as pessoas tenham acesso a determinado tipo de compensação financeira durante alguns meses, mas, depois, ficam rigorosamente na mesma situação, sem qualquer tipo de sequência em termos de futuro.
Assim, em síntese e resumindo, o que penso em relação a esta matéria é o seguinte: em primeiro lugar, deveriam ter sido previstas medidas concretas, devidamente e em
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tempo, na medida em que esta questão já dura há dois anos; em segundo lugar, há uma discrepância de análise, pelos diversos sectores - emprego, segurança social e finanças -, dos problemas que são colocados e, a níveis intermédios da Administração Pública, há interpretações díspares sobre o problema concreto dos trabalhadores.
Portanto, fazemos um apelo para que o Governo, efectivamente, encare o problema, dê orientações e directivas sobre o assunto, com alguma uniformidade e sentido, e, acima de tudo, tenha em atenção o facto de muitas pessoas estarem sem qualquer tipo de rendimentos nesta fase da sua vida, algumas com largos anos dedicados ao trabalho nas alfândegas e que, neste momento, não vêem qualquer futuro para a sua vida. E muitas têm a sua família, as suas casas, os seus compromissos, em termos financeiros, pelo que a situação que se verifica, em vários pontos do País, é extremamente dramática e grave.
Em relação ao que o Sr. Deputado Paulo Trindade referiu, devo dizer que, na minha opinião, o problema tem a ver com o facto de não ter havido uma análise especial sobre este assunto, pois o Decreto-Lei n.º 25/93 mais não fez do que reter um conjunto de medidas que faziam parte da lei geral, portanto, não houve uma abordagem objectiva do problema concreto.
Consequentemente, entendo que esta questão não pode ficar omitida. O Governo tem obrigação de governar é de encarar o problema e a situação muito concreta e dramática de muitas famílias, neste momento, não terem qualquer esperança relativamente ao futuro.
O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes Silva.
O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Solicitei o uso da palavra para, numa breve intervenção, me referir à presença de Deputados portugueses na Guiné-Bissau, aquando da realização das primeira e segunda voltas das eleições.
Eu e os Deputados Luís Geraldes, do Partido Social Democrata, José Reis, do Partido Socialista, e Luís Peixoto, do Partido Comunista Português, deslocámo-nos à Guiné-Bissau, em 3 de Julho e em 7 de Agosto, dias em que se realizaram as eleições legislativas e a primeira e segunda voltas das eleições presidenciais.
Na altura, desenvolvemos contactos intensos com as autoridades, com as forças políticas, com as entidades locais e com os candidatos presidenciais. Conhecemos, então, penso que de forma pormenorizada, as dificuldades do país, conhecemos as ambições das pessoas que lá vivem e que tentam fazer da Guiné-Bissau um país na costa da África Ocidental e, acima de tudo, constatámos a forte amizade e o grande desejo e vontade de se manterem ligados a Portugal.
Portugal, conforme pudemos apreciar, é, hoje, um ponto decisivo e fundamental na cena política da Guiné-Bissau. E não seria demais realçar aqui a acção desempenhada pelo Embaixador de Portugal, Dr. João Rosa Lã, que não só foi inexcedível no apoio que nos prestou como também, com a sua palavra avisada, o seu conselho oportuno e até o conhecimento profundo que tem das pessoas e da situação política na Guiné-Bissau, foi um elemento precioso na actividade que aí desenvolvemos, reconhecida unanimemente pelo poder político da Guiné-Bissau e pelas Nações Unidas.
Com estes dois processos eleitorais deu-se mais um passo, um passo decisivo, na implantação da democracia num país de língua portuguesa, língua portuguesa que, neste caso, Portugal e o Governo têm apoiado, através da prestação, da divulgação e da sua defesa nesse espaço de «lusitaneidade», o que os Deputados portugueses puderam constatar quando estiveram presentes na entrega de material à Televisão Experimental da Guiné-Bissau.
As eleições foram também um passo no sentido de desenvolvimento e do respeito pelos direitos humanos. Aliás, fizemos questão de tratar e desenvolver estes pontos na audiência que nos foi concedida pelo então, ainda, candidato, mas já vencedor das eleições de 7 de Agosto, o Presidente Nino Vieira, salientando o desejo que nós, portugueses, temos em ver a Guiné-Bissau como mais um espaço de lusitanidade onde se fala a língua portuguesa e se respeita a liberdade, a democracia e os direitos humanos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimentos os Srs. Deputados José Eduardo Reis, Miguel Urbano Rodrigues, Luís Geraldes e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Reis.
O Sr. José Eduardo Reis (PS): - Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, conforme o senhor referiu, também eu tive oportunidade de, juntamente com outros Deputados desta Assembleia, visitar a Guiné e assistir à primeira e segunda voltas das eleições que tiveram lugar naquele país.
Pessoalmente, fiquei muito bem impressionado quanto à forma como decorreram as eleições, se, na primeira volta elas decorreram com algumas irregularidades pontuais, isso, na minha perspectiva, deveu-se, somente, ao facto de aquele país não ter experiência alguma quanto ao processo democrático eleitoral. Na segunda volta também tivemos oportunidade de verificar e de comentar, entre nós, que esse acto decorreu numa perspectiva diferente, ou seja, a de as pessoas reconhecerem o acto eleitoral como uma coisa normal.
Assim, podemos dizer que, apesar de, muitas vezes, se tentar comparar a cultura africana à europeia, não devemos fazê-lo, apesar de, repito, o segundo acto ter sido um acto de grande civismo, mesmo para a cultura africana.
Pensamos que a Guiné-Bissau está de parabéns! No entanto, cremos que relativamente ao nosso Governo há que repensar a política para aquele país. Como o Sr. Deputado referiu algum esforço tem sido desenvolvido pelo nosso embaixador naquele país, mas tivemos oportunidade de verificar que a influência francesa, nomeadamente através do Senegal, está a impor-se e que nós estamos a perder influência.
Por isso, Sr. Deputado, pergunto-lhe se, de facto, não notou que, num país com influência portuguesa de tantos anos, estamos a perder essa influência a favor de França.
Assim, gostaria de saber se o Governo tem intenção de implementar os mecanismos capazes de voltar a colocar Portugal no lugar que merece naquele país.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
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O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, não estive na delegação de Deputados portugueses que se deslocou à Guiné-Bissau, mas como não se encontra presente, neste momento, o meu colega Luís Peixoto que integrou essa delegação, não quero deixar de vincar a posição do meu partido.
Ao ouvi-lo, recordei-me da minha última visita à Guiné-Bissau, logo após o 25 de Abril, no momento da chamada transferência de poderes, quando nas tabancas, nos antigos quartéis portugueses, o exército português entregava ao PAIGC esses quartéis.
Recordo-me de que essa transferência de poderes se fez num ambiente não só de tranquilidade e de paz como também de grande fraternidade. De um lado e de outro homens que haviam combatido de arma na mão durante longo tempo recordavam a guerra e diziam: «Eu estava daquele lado; e você onde é que estava?». Soldados e tenentes invocavam esse tempo...!
Tive oportunidade de ser amigo pessoal desse grande africano do nosso tempo, considerado um dos homens determinantes da História contemporânea de África, que foi Amílcar Cabral e lembro-me de ele, ainda antes do início da guerra na Guiné-Bissau na cidade de Conakri, dizer-me, mais ou menos o seguinte: «Infelizmente, vai correr muito sangue e vai morrer gente, mas é pena porque tenho a certeza de que, para além do que é circunstancial e temporal, e que não sei quanto vai durar, os nossos povos vão entender-se e gostaria que ficasse claro que tenho um grande afecto pelo povo português.»
Assim, eu gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Rui Gomes Silva se sentiu que na Guiné-Bissau, para além do que há, repito, de circunstancial e de transitório numa consulta eleitoral deste tipo, se esse entendimento, que vinha de longe, para além do sofrimento e das guerras, a que se referia Amílcar Cabral, entre os povos de Portugal e da Guiné-Bissau tem condições para se manter.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.
O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomo a palavra neste momento para, na qualidade de observador das eleições da Guiné-Bissau, me associar inteiramente à intervenção do meu colega de bancada Deputado Rui Gomes Silva e para reiterar - porque isso nunca é demais - o sentido de amizade e de fraternidade com que vivemos tanto durante o período da primeira como no da segunda voltas das primeiras eleições livres na República da Guiné-Bissau.
Viajámos pelo país, não na sua totalidade, porque isso não seria possível, mas desde Gabu a Bissau, visitámos muitas e muitas zonas e em todas pudemos sentir a amizade que une o povo guineese ao povo português.
Não obstante, já terem sido afirmados o empenhamento e a grande obra que o embaixador de Portugal, Dr. João Rosa Lã, desempenha naquele país em todas as vertentes da diplomacia portuguesa, gostaria de referir dois aspectos que foram vividos durante a segunda volta das eleições presidenciais que nunca esquecerei.
Um deles passou-se numa mesa de voto: ao perguntar à presidente da mesa quantos grupos de observadores já tinham ali passado ela referiu-me que tinham passado ali uns observadores estrangeiros que falavam francês... Ora, penso que isto é elucidativo e significativo daquilo que eles pensam do povo português, isto é, eu e os meus colegas não éramos observadores estrangeiros mas, sim, gente que se
entendia com eles, que tinha o mesmo sentir e que, enfim, riam da mesma maneira.
O segundo caso foi quando um militar devidamente fardado se preparava para votar. Houve algumas objecções devido ao facto de aquele cidadão estar em traje militar. Fui ter com ele, vi-lhe no peito o crachá dos Comandos e falei-lhe; foi quando ele, com bastante orgulho, me disse que tinha feito o curso com os irmãos portugueses em 1987. Penso que isto é bonito!...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Regressei da Guiné com um sentido de maior aproximação e de mais solidariedade para com aquele povo e, contrariamente ao que muita gente julga, penso que o esforço de Portugal, sobretudo na área da cooperação, é um esforço supernotável e reconhecido por todos os segmentos da comunidade guineense.
Por isso, Sr. Presidente e caros Colegas, felicito o meu colega de bancada Rui Gomes Silva e o meu colega José Eduardo Reis pelo facto de terem referido esta questão, não podendo também deixar passar em claro as palavras proferidas pelo Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues relativamente à vivência que une Portugal à Guiné.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, não é propriamente para pedir esclarecimentos mas, sim, para dizer que, infelizmente, não tomámos parte na delegação de observadores que esteve presente nas eleições presidenciais na Guiné porque, naquela altura, os cinco Deputados do meu partido estavam muito envolvidos em trabalhos parlamentares de outra ordem, pelo que não houve hipótese de dispensar qualquer Deputado para fazer essa viagem.
No entanto, queremos aproveitar esta oportunidade para manifestar o nosso regozijo e alegria pelo modo como decorreram as eleições na Guiné, pelos resultados que foram aceites por todas as partes sem conflitos e pela maneira democrática como foram estabelecidos a presidência e o Governo - aliás, segundo as notícias que nos chegam, já está nomeado o primeiro-ministro.
Com tudo isto demos um grande passo para a democratização dos países PALOP de que, orgulhosamente, fazemos parte. É sempre uma boa notícia saber que em cada país que nós contribuímos para democratizar os resultados sejam livremente aceites e conquistados pelas forças que tomaram parte nas eleições.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de agradecer as palavras que aqui foram ditas pelos Srs. Deputados Narana Coissoró, Luís Geraldes e Miguel Urbano Rodrigues e também em parte, porque não dizê-lo, pelo Sr. Deputado José Eduardo Reis.
O Sr. Deputado Luís Geraldes já respondeu à questão de saber se o afecto do povo da Guiné pelo povo português tinha ou não esmorecido. De facto, houve um hiato que resultou de uma guerra sangrenta, de uma guerra difícil que Portugal ali travou, mas ambos os países, que, na altura, defendiam posições opostas, encontraram-se na História outra vez e, penso, caminham de mãos dadas para construir o tal espaço de lusitanidade e de portugalidade que,
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em termos de língua, todos desejamos construir por esse mundo fora.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado José Eduardo Reis, que foi aquela que trouxe aqui mais elementos de contestação, direi, para começar, o quanto subscrevo a normalidade que aqui referiu no processo eleitoral. Aliás, a amizade pessoal que mantenho com o líder do partido mais votado da oposição não me impediu de reconhecer, na altura e desde logo, essa normalidade.
Se querem que vos diga, Sr. Presidente e Srs. Deputados, foi com um misto de orgulho e de prazer que descobrimos que é possível em países que não tinham qualquer vivência democrática saber que aí a democracia é possível, ganhando os que tiveram o poder durante 20 anos, sendo contestados politicamente, atacados, mas que, após o processo eleitoral, todos estavam de acordo em dar as mãos no sentido de um maior empenhamento no futuro da Guiné-Bissau, por forma a verem cumpridas as ambições de todos os guineenses.
Uma única nota, Sr. Deputado José Eduardo Reis, relativamente ao que disse sobre a política do Governo português não ser a mais desejada e sobre a influência francesa.
Recordo à Câmara que a Guiné-Bissau é uma «ilha» num imenso mar de francofonia. É, pois, difícil resistir a isto! No entanto, entre tantas questões, quero realçar o esforço feito por Portugal em lançar a televisão experimental da Guiné-Bissau, atendendo aos montantes envolvidos nessa operação.
Recordo também a possibilidade de, conforme foi solicitado pelo Parlamento da Guiné-Bissau, o Parlamento português vir a responder afirmativamente - e faço um apelo a todas as bancadas para que em conferência dos representantes dos grupos parlamentares este assunto seja decidido rapidamente - e ajudar materialmente a formação de técnicos e apoiar o funcionamento do plenário do Parlamento da Guiné-Bissau.
Por último, Sr. Deputado José Eduardo Reis, apesar de a França ser um imenso país, uma das grandes potências do mundo e de Portugal ser aquilo que nós, com muito orgulho mas, apesar de tudo, com muitas limitações, sabemos que é, a cooperação portuguesa na Guiné-Bissau, ê três vezes superior à cooperação francesa. Há outros países cooperantes, mas Portugal está a fazer um grande esforço, pelo que não será por aí que poderemos atacar a política de cooperação. De qualquer forma, o que é importante reter - e sublinhá-lo-ia - é a normalidade com que decorreu o processo eleitoral na Guiné-Bissau e a amizade do povo guineense para com Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem com a discussão da proposta de resolução n.º 70/VI - Aprova, para adesão, as Emendas ao artigo 17 º e ao artigo 18.º da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Para fazer a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tem a palavra o Sr. Deputado António Maria Pereira.
O Sr. António Maria Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de resolução que ora se submete a aprovação desta Assembleia diz respeito a certas e limitadas emendas aos artigos 17.º e 18.º da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, já ratificada por Portugal, tendo como objectivo que as despesas do Comité contra a Tortura, nela previstas, passem a ser custeadas pelas Nações Unidas, em vez de pelos Estados membros.
Este Comité contra a Tortura é o órgão dinamizador da Convenção. É constituído por 10 peritos, eleitos pelos Estados partes e compete-lhe desempenhar, sobretudo, duas ordens de funções: por um lado, examinar os relatórios que os Estados membros da Convenção se comprometem a remeter ao Secretário-Geral das Nações Unidas, todos os quatro anos, sobre as medidas por eles tomadas no sentido de abolirem a tortura nos seus territórios; por outro lado, examinar quaisquer queixas que lhe cheguem sobre a prática da tortura, desencadeando, se for caso disso, processos de inquérito contra os Estados responsáveis.
O objectivo destas emendas é o de evitar atrasos e obstáculos aos inquéritos e outras diligências, resultantes de certos Estados membros, objecto de denúncia da prática de tortura, poderem ser tentados a dificultar este trabalho através do não pagamento dos custos respectivos. Uma vez que, após aprovação das emendas agora propostas, essas despesas passam a ficar a cargo das Nações Unidas, esse risco é anulado, na medida em que o pagamento destes custos fica assegurado. Para além desse resultado concreto, as emendas agora propostas revelam que as Nações Unidas continuam empenhadas em reforçar a eficácia dos instrumentos de combate à tortura.
A tortura sempre existiu ao longo dos séculos e, tal como a escravatura, era pacificamente considerada um meio normal para se conseguirem designados objectivos, nomeadamente políticos ou mesmo religiosos. A Inquisição utilizou-a em larga escala em Portugal e Espanha. A tortura era, numa palavra, um dado cultural adquirido.
O verdadeiro combate contra a tortura só foi iniciado já nos tempos modernos, no século das Luzes, por homens generosos e cultos, entre os quais cumpre destacar o vulto grandioso de Voltaire - cujo tricentenário do nascimento se comemora este ano - e conduziu, finalmente, à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da Revolução Francesa, em que expressamente se declarou que a tortura era abolida «para sempre».
Muito embora este objectivo idealista nunca se tivesse concretizado e aqui e acolá a tortura continuasse a ser utilizada, o certo é que, no decurso do século XIX, a tortura foi efectivamente proscrita e punida como crime nas legislações dos países europeus. O século XIX foi, quanto à tortura, um século abolicionista.
No século XX, com o advento dos regimes totalitários, a tortura voltou a ser utilizada em larga escala, designadamente como método para alcançar resultados políticos, o que significa que houve um retrocesso nítido em relação às concepções generosas do século precedente. Os campos de concentração e os fornos crematórios nazis, tal como os goulags e as clínicas psiquiátricas soviéticas, são o paradigma dessa utilização de tortura em larga escala como método para atingir objectivos políticos.
Após a última guerra, chegou-se a uma situação paradoxal: por um lado, atingiu-se um fortíssimo consenso, praticamente universal, quanto à inadmissibilidade da tortura, do que é índice a proclamação, em 1948, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que formalmente proíbe a
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tortura, seguindo-se, na sua esteira, numerosas outras convenções internacionais e leis internas no mesmo sentido; mas, por outro lado, a prática da tortura alastrou através do mundo, atingindo, como refere a Amnistia Internacional, as proporções de uma verdadeira epidemia.
E, escândalo dos escândalos, na Europa, após a queda do Muro de Berlim e o fim dos goulags e quando a aurora de uma nova ordem internacional deixava prever um grande avanço ético da humanidade, que nos distanciasse de vez do universo concentracionário da primeira metade do século, onde a tortura era utilizada em termos sistemáticos, eis que na ex-Jugoslávia a tortura, através das mais horrendas e abjectas práticas, reaparece em força como método de limpeza étnica ao serviço das políticas racistas.
Mas, não só na ex-Jugoslávia, também um pouco por toda a parte a tortura ressurge frequentemente com o apoio do poder político. Segundo a Amnistia Internacional, em 1993, a tortura continuou a ser praticada em 110 países.
Como combater a utilização da tortura? Através de instrumentos jurídicos e do seu aperfeiçoamento, do que a Convenção sobre a tortura e as emendas agora propostas são exemplo; por intermédio de uma acção pedagógica intensa, visando a redução da violência generalizada dos nossos tempos - de que a tortura é, na realidade, um subproduto; através da acção promovida pelas organizações internacionais, governamentais e não-governamentais; e pela perseguição e punição dos seus fautores, quer a nível nacional, quer internacional, quando possível. E, a este respeito, há que fazer um apelo para que o tribunal para a condenação dos crimes de guerra na ex-Jugoslávia, instituído pela Resolução n.º 827/93, de 25 de Maio, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, já instalado em Haia, possa funcionar efectivamente, o que actualmente não acontece por falta de recursos financeiros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na Declaração Final da Conferência Mundial de Viena sobre os Direitos Humanos, de Junho de 1993, depois de se salientar o facto de a tortura ser uma das mais atrozes violações da dignidade humana, exorta-se os Estados a porem-lhe imediatamente fim através da cabal aplicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, das convenções aplicáveis e, quando necessário, do reforço dos mecanismos existentes.
A resolução em análise obedece precisamente a este desiderato. Por essa razão, o PSD vai votar a favor.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Borges Soeiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A tortura é, como se sabe, uma prática lamentavelmente existente em muitos países, pese embora o seu carácter aberrante e atentatório da dignidade mais profunda do ser humano e as inúmeras declarações, as mais das vezes algo formais, no sentido da erradicação da sua prática sistemática ou ocasional. Diremos, como Spinellis, que a prática da tortura não é nova nem exclusiva deste ou daquele sistema político, regime, cultura, religião ou lugar geográfico.
No entanto, é hoje pacificamente aceite o carácter indigno das práticas torcionárias, podendo afirmar-se que estamos imersos num período de luta contra a tortura. Em Portugal, à semelhança de outros Estados, têm vindo a ser previstas e adoptadas medidas que tornem efectiva a interdição da tortura. No nosso ordenamento jurídico assume particular relevo a consagração constitucional da interdição da tortura, constante do n.º 2 do artigo 25.º, no qual se refere: «1 - A integridade moral e física das pessoas é inviolável; 2 - Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas cruéis, degradantes ou desumanas».
Este mesmo princípio encontra-se reflectido noutros preceitos constitucionais, nomeadamente no n.º 6 do artigo 32.º, onde, no que respeita às garantias do processo criminal, se consagra a nulidade das provas obtidas mediante tortura, coacção ou ofensa à integridade física ou moral da pessoa. Na mesma preocupação se insere o artigo 27.º, sobre o direito à liberdade e à segurança e, consequentemente, a disciplina da prisão, a aplicação da lei criminal, os limites das penas e das medidas de segurança e o habeas corpus, todos consagrados no nosso texto constitucional. Estes preceitos constitucionais encontram-se reflectidos e desenvolvidos, entre outros, no Código Penal, no Código de Processo Penal, na legislação sobre medidas privativas da liberdade e no que respeita às medidas de polícia.
A Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, assinada por Portugal em Fevereiro de 1985 e ratificada em 21 de Maio de 1988, entrou em vigor no nosso País em 11 de Maio de 1989. Embora da ratificação da Convenção, bem como da Convenção do Conselho da Europa sobre esta matéria, ratificada em 20 de Fevereiro de 1990, não resultasse a necessidade de proceder à introdução de alterações no ordenamento jurídico interno, uma vez que os princípios nelas consagrados já se encontram fortemente enraizados entre nós, as medidas legislativas que acabámos de referir, bem como aquelas que venham a ser adoptadas, pautar-se-ão, necessariamente, pelos princípios já enunciados. A adesão a instrumentos de direito internacional, como o que agora é objecto de emendas, constitui ainda garantia da adopção e cumprimento destes mesmos princípios entre os Estados partes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As Emendas à Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, que o Governo ora submete à vossa elevada consideração, foram adoptadas pela Conferência dos Estados Partes, em 9 de Setembro de 1992, e consistem na alteração dos seus artigos 17º e 18.º, mais concretamente na supressão do n.º 7 do artigo 17.º, do n.º 5 do artigo 18.º e no aditamento de um novo n.º 4 ao artigo 18.º - como teve ocasião de explanar brilhantemente o Sr. Deputado António Maria Pereira. Os números que ora se visa suprimir prevêem que sejam os Estados a suportar os encargos com os respectivos peritos e no que respeita ao aditamento ao artigo 18.º estabelece-se que os membros do Comité recebam emolumentos provenientes dos recursos financeiros das Nações Unidas.
Estas alterações, ainda que visando exclusivamente aspectos processuais remuneratórios de peritos, constituem - estamos certos - um reforço na luta efectiva contra a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, permitindo ao Comité dispor dos meios materiais necessários à execução das suas atribuições e enfatizam, também, como teve ocasião de dizer o Sr. Deputado António Maria Pereira, o empenho das Nações Unidas no sentido de suportar encargos que, até ao momento, eram suportados pelos Estados membros. Assim, na sede da luta contra a tortura, há um real empenho das Nações Unidas em virem a cobrir as despesas que hoje são suportadas pelos Estados membros. Julgo que esta é uma medida altamente emblemática, que se reveste de extrema importância.
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(O Orador reviu).
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado, a sua intervenção, sendo juridicamente correcta, é politicamente decepcionante. E é-o sobretudo porque V. Ex.ª, limitando-se a falar nos emolumentos e na importância da Convenção contra a Tortura, não vem aqui esclarecer o que seria relevante esclarecer, isto é, por um lado, as recomendações do Comité contra a Tortura, relativamente a torturas e maus tratos verificados nos estabelecimentos prisionais portugueses por parte da Polícia Judiciária, da PSP, da GNR e das polícias prisionais e, por outro, qual o sentido que, em resposta a esta medida, tem tido o inquérito mandado instaurar pelo Provedor de Justiça à Polícia Judiciária e ate qual a razão por que Portugal, tendo ratificado a Convenção em 1989, apenas passados quatro anos faz o seu relatório, a cuja entrega estava obrigado no ano imediato.
Assim, as considerações teóricas de V. Ex.ª são correctas, como é correcto o discurso jurídico, mas o discurso político é caracterizado por omissões decepcionantes, escondendo os problemas reais dos maus tratos verificadas em Portugal, quer nos estabelecimentos prisionais quer nas esquadras portuguesas, designadamente - o que foi dito pela Amnistia Internacional no seu último relatório, de 1994 - quanto ao facto de em Portugal não se cumprir rigorosamente o Estado de direito.
A esse respeito, V. Ex.ª disse nada e era altura para dizer alguma coisa a esta Câmara.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, agradecendo-lhe desde já o pedido de esclarecimento que me formulou, recordo-lhe que o pedido de ratificação que o Governo apresenta à Assembleia da República tem como epígrafe e como razão de ser, face às competências da Assembleia da República e do Governo: «emendas ao artigo 17.º, § 7.º, e artigo 18.º, § 5.º, da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Portanto, este pedido de alteração a esta Convenção cifra-se e centra-se exactamente nas alterações destes artigos que, como teve ocasião de dizer, são alterações efectivamente pontuais embora, como referiu o Sr. Deputado relator e eu próprio, dê uma ênfase e uma tónica, que julgo ser de relevar, no sentido de as Nações Unidas cada vez se empenharem mais no tratamento e na forma como vêm encarando todos os problemas relativos à tortura.
Descendo ao seu epíteto - disse que foi uma intervenção juridicamente correcta -, desde já o agradeço e acrescento que não concordo que a minha intervenção tenha sido politicamente decepcionante porque julgo que não viríamos aqui fazer como que o estado geral da situação dos relatórios da Amnistia Internacional...
O Sr. Miranda Calha (PS): - Nós convidámo-lo!
O Orador: - ...pois haverá outras sedes, haverá outros locais para o fazer. É óbvio, no entanto, que o Governo está sempre disponível, nomeadamente na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para discutirmos esses temas - e temo-lo feito.
Aliás, posso referir-lhe que sempre que a Amnistia Internacional, nomeadamente nas áreas que citou, dos estabelecimentos prisionais ou da Polícia Judiciária, referiu casos, nós próprios, ou já tínhamos levantado os inquéritos ou processos crimes ou levantámo-los imediatamente. Portanto, os relatórios da Amnistia Internacional, no tocante ao Governo e em particular ao Ministério da Justiça, nunca tiveram a falta de receptividade que, de alguma forma, tentou referir na sua intervenção. Somos particularmente atentos a esses relatórios mas, por vezes, também acontece - e acho bem que se diga isso aqui nesta Casa - que esses relatórios são repetidos durante três e quatro anos sendo os mesmos casos, que, aliás, o Governo esclareceu em devido tempo.
Todavia, esta é uma questão que quero que fique meridianamente compreensível. Nunca, mas nunca, esquecemos qualquer resposta que deveríamos dar às entidades que têm competência nesta matéria, pois a nossa linha foi sempre a transparência e, quando foi caso, tentámos e imprimimos sempre os instrumentos jurídicos para apurar, incriminar e punir esses eventuais prevaricadores.
(O Orador reviu).
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votará favoravelmente a proposta de resolução n.º 70/VI.
Estamos perante uma iniciativa que suscita consenso. O objectivo visa permitir que o Comité incumbido de zelar pela Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes possa cumprir melhor a tarefa para a qual foi criado pelas Nações Unidas.
Mediante emendas a dois artigos da referida Convenção pretende-se apenas que as despesas do Comité sejam transferidas dos Estados membros para a Organização das Nações Unidas. A medida impunha-se. A prática demonstrou que as actividades do Comité são muitas vezes prejudicadas pelo facto de alguns Estados em cujo território a tortura continua a ser uma realidade não pagarem as contribuições financeiras.
Srs. Deputados, o combate à tortura é indissociável do combate à hipocrisia. Vinte e dois séculos transcorreram desde que o imperador mauria Ashoka, na Índia, proibiu por decreto a guerra e a tortura. Mas elas continuaram e expandiram-se. Há dois séculos a Revolução Francesa declarou-a banida para sempre. Finda a última guerra mundial, a Declaração Universal dos Direitos do Homem voltou a proibir a tortura. A decisão foi regulamentada por convenções internacionais e leis internas dos Estados membros das Nações Unidas.
Nem por isso a tortura acabou. Continua a ser uma trágica presença no mundo contemporâneo. Para terem boa consciência, governantes e juristas de Estados que a si mesmo se qualificam de civilizados costumam afirmar que a prática da tortura está hoje, com raras excepções, confinada em áreas atrasadas do Terceiro Mundo. Não é verdade. Tal atitude reflecte uma mentalidade farisaica.
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A história oferece-nos incontáveis exemplos de que não existe uma relação directa entre a prática da tortura e de crimes cruéis contra a humanidade e o nível de instrução e de desenvolvimento económico dos povos. O III Reich alemão configura um trágico exemplo de que uma nação de antiquíssima e maravilhosa cultura pôde gerar um poder que exterminou milhões de pessoas em câmaras de gás e fez da tortura um alicerce da política do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Insistindo na necessidade da aprovação da proposta que discutimos aqui, considero útil, pelas razões expostas, discordar da posição tomada pelo relator. Em primeiro lugar, afigura-se-me gratuito e extemporâneo que a preocupação justa pelo actual alastramento da tortura seja acompanhada de uma tentativa de subestimação da tortura em épocas recentes. A tortura deve ser banida, mas é perigoso calendarizá-la, desrespeitando a história. Ao longo do século XIX a tortura foi praticada sistematicamente por grandes potências que diziam combatê-la. Cabe recordar, entre outros exemplos, o que se passou nos EUA durante a fase de extermínio das comunidades ameríndias; as práticas da tortura na vastidão do Império Britânico; o empalamento em massa dos rebeldes durante a insurreição búlgara de 1868; e também a rotina dos pogroms russos em que milhares de judeus foram queimados.
Srs. Deputados, a luta contra a barbárie e contra crimes que rebaixam o homem exige a superação das paixões políticas para que os seus objectivos humanistas sejam atingidos. Por isso, discordo também que, numa época em que a tortura continua a ser praticada em mais de uma centena de países, o relator tenha de maneira forçada apontado a objectiva para regiões, situações e casos específicos. A tortura, para ser melhor combatida, não deve servir de pretexto à exteriorização da paixão política, neste caso, fora do lugar.
Srs. Deputados, se procedêssemos a uma selecção e hierarquia de exemplos de tortura, a lista seria interminável. E, sendo nós, portugueses, essa lista teria de principiar com uma referência evocativa à prática da tortura pela PIDE, cujos crimes pelo tempo afora vão permanecer na memória do nosso povo, e também às situações a que aludiu, e muito bem, e que são actuais, o Sr. Deputado Alberto Martins.
Infelizmente, o mau exemplo vem das próprias Nações Unidas responsáveis pelo Comité cujas actividades e finanças são tema deste nosso debate. Exaustivas por vezes quanto à enumeração de outros casos, as Nações Unidas, que me conste, nunca denunciaram a tortura em Timor Leste onde o corte das orelhas pela polícia é o mais suave dos suplícios infligidos aos patriotas que ali se batem pelo direito a construírem livremente o futuro da sua terra.
Sr Presidente, Srs Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP aprovará a proposta em discussão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Maria Pereira.
O Sr. António Maria Pereira (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, acabei de ouvir a intervenção do meu colega Miguel Urbano Rodrigues e gostaria de esclarecer bem o seguinte: quando eu disse que a tortura no século XX tinha dois paradigmas citei, por um lado, o que aconteceu com os fornos crematórios nos campos de concentração nazis e, por outro, o que aconteceu nos goulags e nos hospitais psiquiátricos soviéticos em que a tortura era aplicada sistematicamente e em larga escala.
É que há uma grande diferença, Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues, entre a tortura, que acontece ocasionalmente em desobediência às leis do Estado - se amanhã há um preso que é torturado numa esquadra de polícia em qualquer país europeu, isso acontece em violação das leis do Estado porque a tortura está proibida - e o que acontece quando a tortura é utilizada sistematicamente porque faz parte da própria filosofia do Estado totalitário e porque os agentes desse Estado totalitário têm instruções para utilizar a tortura. E quando os dissidentes soviéticos iam para o goulag ou eram internados à força nos hospitais psiquiátricos, isto acontecia porque o Governo soviético assim o ordenava. Não há comparação possível entre uma situação e a outra!
Noto que o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues, ao citar numerosos casos de tortura, se esqueceu de contar o que, por exemplo, Soljenitsyne, nessa obra monumental que é O Arquipélago de Goulag, contou, assim abrindo os olhos da Europa para o que estava a acontecer na União Soviética. Gostaria de ouvi-lo condenar esses excessos da União Soviética e daqui lhe lanço um convite para o fazer, se for capaz.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao enquadrar historicamente a tortura, evidentemente que eu não quis fazer um tratado sobre a tortura, pois estaria aqui horas e horas a falar sobre isso, mas, sim, dizer o seguinte: até ao século XVIII, até ao chamado século das Luzes, a tortura era um dado cultural adquirido, tal como a escravatura. As pessoas e a cultura do tempo aceitavam isso como um fenómeno normal, como aconteceu na Antiguidade, a tal ponto que nessa época os escravos, antes de serem interrogados, se acontecia qualquer crime, eram previamente torturados porque se entendia que, se eles não confessassem ao serem logo sujeitos a tortura, iriam depor a favor do seu amo. Isto é, primeiro torturavam e depois se veria o que diriam! E isto era considerado normal! A tortura foi, assim, considerada normal durante séculos e séculos, até que se atingiu o século XVIII e apareceram os enciclopedistas, os homens das Luzes - Voltaire, Rousseau e outros - que denunciaram a tortura, que denunciaram os excessos. A partir daí, abriu-se a consciência da humanidade, houve uma revolução cultural, como disse há pouco.
E o século XIX condenou a tortura formalmente e passou a não admitir que o Estado ordenasse a tortura como uma actividade normal da sua própria acção, a tortura acontecia porque, em violação das leis, eram torturadas pessoas. Como se vê, há uma grande diferença.
Porém, quando se pensava que havia um progresso ético enorme da humanidade, que continuaria no século XX, tivemos a surpresa de verificar que o século XX foi pior que todos os outros porque houve então a tortura como engrenagem do Estado, do Estado totalitário. Em Portugal também com a PIDE. Mas os casos paradigmáticos foram aqueles que citei há pouco, que não podem ser ignorados e que o Deputado Miguel Urbano Rodrigues não pode ignorar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, penso que, em todo o debate político e quando se discutem temas como este, tem de haver um sentido de medida. Daí eu ter dito que, ao tratar-se do tema da tortura, esta fixação da objectiva em duas ou três situações era anómala.
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Cito, por exemplo, o caso da ex-Jugoslávia, região que talvez conheça melhor que o Sr. Deputado António Maria Pereira pois conheço praticamente a totalidade da República, dado lá ter estado várias vezes e conhecer os seus povos. Mas esta insistência reflecte precisamente essa tendência e essa falta do sentido de medida é expressiva da paixão política.
Quanto à questão, que acho importante e que referi, de estabelecer uma espécie de campeonato para saber qual era o menos mau em matéria de tortura, se o século XX ou o século XIX, e mesmo tendo citado nomes ilustres como Voltaire - e folgo muito que seja um leitor de Voltaire e de Jean Jacques Rousseau -, considero também que aí há uma inverdade histórica.
Não vou entrar em pormenores, mas se o Sr. Deputado, e uma vez que fala do século XIX, quer saber, devo dizer-lhe que nesse século, após a famosa rebelião dos sipaios na Índia, o exército indo-britânico, o governo geral da Índia traçou quadrados com meio metro de lado em salas enormes e obrigava os prisioneiros indianos a lamberem o chão até ficar a brilhar. Para mim, isto e um exemplo de tortura.
Também não se fala que, na América do Sul, a República chilena massacrou cerca de 70 ou 80 % dos índios na sua marcha para o Sul, o mesmo acontecendo com a ditadura de Rojas, e já falei no genocídio dos índios no século XIX. São incontáveis os exemplos de barbárie!
É evidente que seria faltar ao sentido de medida se agora, no pouco tempo de que disponho, fosse aqui fazer uma larguíssima exposição sobre crimes cometidos e actos de tortura na desaparecida União Soviética, que são reais, e talvez, mais do que o senhor, também porque conheço melhor o país, até tenha escrito sobre esses temas. Mas penso é que este não é o local adequado.
Sr. Deputado António Maria Pereira, a sua obsessão pelos hospitais psiquiátricos - citou-os - fez-me sorrir, porque acabei de chegar de uma visita a Moscovo, integrado na Comissão Política da Assembleia Parlamentar da UEO, e, com surpresa minha - refiro esse facto porque citou muito o escritor Soljenitsyne, que até tem algum talento literário e tem alguns livros em que se pode reconhecer esse talento, embora a obsessão desse escritor não seja a questão dos crimes -, aconteceu um fenómeno que acho que interessa a esta Assembleia: é que a situação, infelizmente (ao dramática, nesse grande país levou a que, na semana passada, quem foi fazer o discurso, que se poderia chamar de discurso sobre o estado da União, não foi o chefe de Estado, não foi o primeiro-ministro, mas foi o escritor Soljenitsyne que foi recebido em Moscovo e aí fez um discurso em que chamou tudo aos Deputados, desde «malandros», «bandidos», «vão para casa», «são todos uns canalhas». Por isso, o que diz o escritor Soljenitsyne não pode nunca ser entendido como verdades absolutas!...
Tenho a dizer, Sr. Deputado, para terminar, que as suas observações não invalidam em nada aquilo que eu disse. Mantenho que, ao seu relatório, falta sentido de medida, sem que isto envolva em nada as nossas relações humanas, que são muito cordiais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: As emendas que o Governo hoje vem propor à Assembleia da República, respeitante à Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, tratam sobre matéria de emolumentos.
A questão é de mera intendência legislativo-parlamentar a dirimir entre os cofres dos Estados partes na Convenção e os cofres da ONU, os quais agora respondem pelo pagamento dos membros do Comité contra a Tortura.
Espera-se, e julga-se, que a solução seja sábia e tanto mais se ela contribuir para que o Comité contra a Tortura, criado pela Convenção contra a Tortura da ONU - tal como entidade equivalente do Conselho da Europa -, dê particular atenção e inquira sobre eventuais práticas delituosas cometidas nos Estados membros de «torturas, sofrimentos físicos ou mentais infligidos intencionalmente a uma pessoa», com fins diversos e à margem de eventuais sofrimentos resultantes de sanções ilegítimas.
Não se estranhará que Portugal, tendo ratificado a Convenção contra a Tortura da ONU em 9 de Fevereiro de 1989, não tenha cumprido o prazo de um ano para apresentar o seu relatório inicial e só o tenha feito em Maio de 1993. É, como se vê, a eficácia de um Governo de sucesso, no caso mal sucedido em matéria de diálogo com as instâncias internacionais e, no caso, ainda, com mau cumprimento dos seus deveres perante a comunidade internacional.
Mas não são esses deveres de elaboração de relatórios os únicos em falta. Em Novembro de 1993, o Comité contra a Tortura analisou o relatório elaborado, com três anos de atraso, pelo Governo português e, nas suas conclusões, congratulou-se com os esforços do Governo para aplicar a Convenção, lamentando que, apesar desses esforços, «continuasse a haver maus tratos e por vezes tortura nas esquadras de polícia». Também criticou os frequentes atrasos e demoras dos inquéritos a tais alegações e considerou que os responsáveis nem sempre são entregues à justiça. Foi ainda apontado que esta situação, bem como a leveza das sentenças aplicadas às pessoas condenadas por tortura e maus tratos, criaram «uma impressão de relativa impunidade para os autores destes crimes, a qual e altamente prejudicial à aplicação do disposto na Convenção».
Anote-se que, pela informação do último relatório da Amnistia Internacional (publicado, entre nós, em Julho de 1994 e referente ao ano de 1993), «Todos os relatos de tortura e maus tratos se reteriam a pessoas que tinham sido detidas sob suspeita de terem cometido delitos criminais. Agentes de todas as forças policiais foram acusados de maltratar detidos: PJ (Polícia Judiciária); Polícia de Segurança Pública (PSP); Guarda Nacional Republicana (GNR) e Serviços Prisionais.
Em muitos casos, os queixosos foram libertados sem serem inculpados, tendo as formas mais comuns de maus tratos sido pontapés repetidos, murros, joelhadas, pistoladas e espancamentos com casse-têtes. Na maioria dos casos, as alegações de tortura e tratamento cruel foram apoiadas por depoimentos independentes de natureza médica e forense e, em muitos deles, os queixosos foram levados pelos funcionários que os detiveram a receber cuidados médicos, durante o período inicial que passaram em detenção.
Como nos diz, de forma conclusiva, a Amnistia Internacional, num relatório especial sobre a tortura em Portugal, elaborado em Outubro de 1993 - e aqui, naturalmente, não se trata de Auschwitz, nem de Buchenwald, nem de Goulags, nem da ditadura portuguesa, mas trata-se da situação actual em Portugal -, foram iniciadas investigações judiciais sobre queixas apresentadas em tribunal, mas na experiência da Amnistia Internacional «estas foram extremamente
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morosas, frequentemente sem profundidade e muitas vezes inconclusivas (...). Muito poucas investigações judiciais sobre alegações de tortura e maus tratos terminaram com a instauração de processos a funcionários e encarregados da aplicação da lei. Nos raros processos em que um funcionário foi julgado culpado, a sentença dada pelo tribunal não foi mais do que insignificante».
Não há, em Portugal, estatísticas oficiais que registem o número de queixas, torturas e maus tratos apresentados ou transmitidos às autoridades judiciais, sabendo-se mesmo que muitas das vítimas de crimes, em geral não recorrem aos meios judiciais para a defesa dos seus direitos. Mas em 1985, aquando' da assinatura da Convenção contra a Tortura da ONU, só ratificada em 1989, uma comissão de inquérito do Ministério da Administração Interna, do Ministério da Justiça, do Provedor de Justiça e da Comissão Geral da PSP identificou, nos primeiros seis meses desse ano, 166 queixas contra agentes da PSP e no inquérito do Provedor de Justiça, iniciado em Dezembro de 1992, foram seleccionadas 32 queixas individuais de «actos de violência contra pessoas, detenção e abuso de poder por parte de agente policiais», num período de cerca de dois anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 11.º da Convenção atribui a cada Estado parte o dever de manter sob «revisão sistemática as regras e procedimentos dos interrogatórios e as disposições relativas a supervisão da detenção e tratamento das pessoas detidas e presas» e o artigo 12.º exige que o «Estado parte vigia por que as autoridades competentes procedam imediatamente a um inquérito imparcial cada vez que haja motivos razoáveis para crer que um acto de tortura tenha sido cometido sob território sob sua jurisdição».
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos fundadas dúvidas quanto ao cumprimento destas obrigações e à sua eficácia. Como diz, ainda, o relatório da Amnistia Internacional «muitas queixas têm sido rejeitadas por falta de provas. E isto aparentemente tem sucedido mesmo em casos em que o queixoso recebeu ferimentos graves. Com frequência os funcionários têm dito que os presos tentam escapar, opuseram resistência à prisão ou que provocaram ferimentos em si mesmos».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se é certo que o último relatório respeitante à tortura, no âmbito da Convenção contra a Tortura da ONU, foi apresentado pelo Estado português, em 1993, ao respectivo Comité e só decorridos quatro anos o Estado português está taxativamente obrigado a apresentar novo relatório com novas medidas eventualmente adoptadas, seria desejável e útil para o trabalho desta Assembleia que o Governo se comprometesse, hoje e aqui, a apresentar um relatório, também nesse âmbito, e, proximamente, à Assembleia da República, que constituísse uma informação actualizada sobre esta questão, a qual urge e não existe, que constituiria, certamente, um elemento significativo de confiança no Estado de direito e na defesa de direitos fundamentais dos cidadãos.
Ora, é em nome do Estado democrático que o poder político exerce e este estende-se a todas as instituições que o integram, numa rigorosa escala de responsabilidades e exigências.
As forças policiais e de segurança não podem ser nunca algo que se oculte por detrás dos postos de entrada das esquadras policiais e à margem da legalidade.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Muito bem!
O Orador: - E em nenhuma circunstância pode ser exibida uma lógica hierárquica interna e regras disciplinares, corporativas ou castrenses, que protejam um difuso espírito de corpo que se sobreponha ao respeito pelos valores essenciais da dignidade humana e da salvaguarda dos direitos fundamentais.
As suspeitas sobre actos de tortura e desumanos praticados por agentes policiais, suspeita levantada por entidades de indiscutível credibilidade pública, nacional e internacional, merece, por isso, aprofundamento e inquérito, bem como esclarecimento público consistente e tempestivo, até para defesa, no caso, da função policial, que todos devemos defender num Estado democrático.
Não são, por isso, admissíveis em qualquer caso quaisquer perturbações aos direitos dos cidadãos, sobretudo nos momentos e lugares onde, pela sua natureza, os cidadãos estão mais fragilizados, porque têm de enfrentar o exercício legítimo da autoridade.
Mas quando esta autoridade se coloca à margem da lei, termina definitivamente a sua legitimidade e entra em cena o crime. E este não pode ter lugar num Estado de direito. A democracia portuguesa exige clarificações a este respeito e espera-as, naturalmente, do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, julgo que V. Ex.ª fez um discurso com alguma contradição. Penso que partiu do princípio correcto de que, segundo as regras do Estado de direito, está pressuposto a separação de poderes e, como tal, cabe ao Governo legislar e cabe ao poder judicial executar e aplicar as penas.
Sendo certo também que, e como bem disse há pouco o Sr. Deputado António Maria Pereira, se há algo que, nesta questão de tortura, distingue - e distingue claramente um Estado de direito e um Estado totalitário - o Estado de direito é o facto de a tortura ou o tratamento desumano ser excepcional e ser punível pela lei - a lei ordinária do Estado. Enquanto num Estado totalitário - e foram dados vários exemplos nesse sentido - há como que uma prática sistemática de tortura ou tratamento desumano.
O que o Sr. Deputado fez, agarrando-se ao relatório das Nações Unidas que tem ao seu dispor, foi dizer que houve alguns casos, pressuposto que foram participados à autoridade judicial e que a autoridade judicial aplicou penas relativamente ligeiras ou brandas ou arquivou os processos.
Ora, na minha perspectiva, julgo que o que é manifestamente significativo para o bom funcionamento do Estado de direito é que as autoridades legítimas e democráticas portuguesas mal tenham conhecimento de que há algum indício da prática de um acto menos adequado, participam de imediato a quem de direito. E isso tem sido feito. Muito subsequente é a aplicação da lei e a aplicação do direito pelas instituições judiciárias E aí os tribunais são absolutamente independentes, como é o Ministério Público. Portanto: ou arquivam, ou punem de uma forma elevada, ou punem de uma forma ligeira.
Por isso mesmo - e é este o meu pedido de esclarecimento -, julgo que o Sr. Deputado Alberto Martins foi, de alguma forma, contraditório, porque parece que quis imputar ao Estado português, ao Governo português, o facto de as autoridades judiciárias aplicarem penas ligeiras ou absolverem os responsáveis
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E isso que não entendo.
Aplausos do PSD.
(O Orador reviu).
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, agradeço a questão que me colocou pois permite-me esclarecer, uma vez que para V. Ex.ª a questão não ficou clarificada.
Há um primeiro aspecto que é óbvio: trata-se da. Convenção contra a Tortura da ONU, uma convenção pós-II Guerra Mundial, que não tem nada a ver com a história anterior. É uma convenção assinada por Portugal em 1989 e incorporada no nosso ordenamento constitucional, como, aliás, o Sr. Secretário de Estado já citou. A Constituição tem um dispositivo taxativamente igual ao pórtico desta Convenção e, portanto, trata-se do Estado Constitucional, criado em Portugal depois do 25 de Abril, e da tortura verificada nesse Estado Constitucional.
Quando digo que o Estado português tem um défice de realização de combate à tortura, não quero dizer, de forma nenhuma, nem há qualquer contradição, que estou contra os poderes de iniciativa da acção penal, que cabem ao Ministério Público, ou contra os poderes de decisão judiciária, que cabem aos tribunais, mas quero chamar a atenção para os poderes de iniciativa legislativa que, neste domínio, também cabem ao Governo, e para os poderes de iniciativa e de realização institucional e de atribuição de meios, que também cabem ao poder na perseguição criminal.
Quero também chamar a atenção para os deveres de formação cultural das polícias, da GNR, dos serviços prisionais e para a selecção dos seus membros, que também cabem ao Governo.
Como V. Ex.ª sabe, a tutela do Ministério da Justiça abarca uma zona, o Ministério da Defesa abarca outra, o Ministério da Administração Interna abarca outra e os tribunais apenas têm aqui uma parte terminal.
Não vamos esquecer que - e, isso sim, V. Ex.ª está a ser contraditório - a perseguição do crime, que todos defendemos, tem de ser feita por meios legítimos e por uma actuação não criminosa. Porque, como sabemos, com estes factos que são aqui referidos, os criminosos estão dentro das instâncias de perseguição do crime - e isto não é possível! O Estado de direito não é um Estado sem limites.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Atenção ao tempo, Sr. Deputado!
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O Estado de direito é um Estado da lei e aqui o Governo tem particular responsabilidade.
Por certo, V. Ex.ª não imputará também aos peritos da ONU terem caído no pecadilho que me atribui. Os peritos da ONU, tal como eu, também sabem que são os tribunais que julgam e que e o Ministério Público que tem a iniciativa da acção penal. Mas também eles - e, porventura, também não tenho a ignorância que V. Ex.ª pretendeu atribuir-me por razões políticas - sabem que uma coisa são os deveres do Estado institucionais, legislativos e de formação e outra são os deveres dos tribunais. A cada um os seus deveres! Os tribunais têm-nos cumprido bem, o Estado e o Governo têm-nos cumprido mal.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vamos votar favoravelmente esta proposta de resolução. Em todo o caso, gostaria de sublinhar que se trata de um fraco pretexto para uma questão tão importante, porque dá a impressão de que, também na vida internacional, a justiça começa a estar dependente do Código das Custas Judiciais, o que não é realmente a perspectiva mais animadora para encarar este problema.
Gostaria também de lembrar que esta questão, bem mais antiga do que a dos filósofos do século XVII, anda ligada às alterações do processo inquisitório, desde sempre reclamadas em Portugal com grande tradição. Por exemplo, a questão do sigilismo, gravíssima, que é anterior às intervenções de Voltaire, e aquilo que talvez nos possa preocupar é que mesmo o processo contraditório do nosso tempo anda a ser muitas vezes deturpado, no sentido de transformar em práticas inquisitórias o que pareciam garantias da liberdade e independência dos cidadãos.
Mas, neste caso concreto, que diz respeito à comunidade internacional, gostaria sobretudo de chamar a atenção para um ponto: o de que, nestas matérias, a comunidade internacional vive, sobretudo, de autoridades e não vive de poderes. Lembro-lhe o caso do Tribunal Russel. Era uma iniciativa puramente privada que tinha uma autoridade extraordinária no mundo nesta matéria.
Recordo que a Amnistia Internacional nasceu de uma iniciativa de estudantes. Estudantes que não tinham mais do que entusiasmo, convicções, princípios e decisão. E não tinham nenhum Código das Custas a apoiá-los! Contudo, chegaram a criar esta instituição, com uma autoridade internacional extraordinária.
Aquilo que penso ser importante sublinhar neste momento, porque se trata da comunidade internacional, é que estamos a tratar de evitar um risco eventual, não documentado. Trata-se de evitar o risco de os países não pagarem as senhas de presença aos membros deste Comité, comité que suponho que não tem nenhuma autoridade internacional. E este é que é o grande problema. Precisamos de encontrar autoridades internacionais nesta matéria, cuja voz seja decisiva, cuja voz seja escutada, como foi o Tribunal Russel, como é a Amnistia Internacional, como não é o Comité das Nações Unidas! Por isso, não temos a menor dúvida em aprovar a proposta de resolução.
Julgo que talvez não fosse desapropriado que a Assembleia da República anotasse, pelo menos nas suas actas, que, neste momento a jurisdição interna está posta em causa, muito posta em causa, em grande parte pela falta de respeito pelos direitos do homem. Falta de respeito sobretudo evidente no ressuscitar da tortura física e moral - esta última importantíssima, porque depende do conceito cultural vigente na sociedade a que reporta. Quando nós vemos instituir de novo, e bem, um tribunal para julgar os crimes contra a humanidade cometidos na Bósnia, talvez devêssemos inclinar-nos no sentido de atribuir estas funções a órgãos articulados com a jurisdição internacional, como o Tribunal de Justiça Internacional, por exemplo, ganhando a autoridade que, neste momento, não tem o Comité. Tenhamos a, talvez mal fundada, esperança de que ganhe autoridade com a melhoria do Código das Custas que lhe diz respeito!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate da proposta de
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resolução n.º 10/VI. A votação desta proposta de resolução far-se-á à hora regimental.
Vamos entrar agora na discussão da proposta de resolução n.º 71/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho, respectivos Anexos e Declarações.
Para fazer a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Falcão.
A Sr.ª Helena Falcão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de resolução n.º 71/VI, que aprova, para ratificação, como o Sr. Presidente acabou de dizer, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho. O Acordo, assinado em Bruxelas a 16 de Dezembro de 1991, tem como objectivo o reforço e alargamento das relações de âmbito comercial, económico, social e cultural já existentes entre a Comunidade Europeia e a República de São Marinho.
Atendendo à situação desta República e à sua actual inserção no território aduaneiro da Comunidade, foi considerado necessário criar uma união aduaneira entre as duas partes, promovendo assim uma cooperação global entre ambas, que contribua para o desenvolvimento económico e social da República de São Marinho, e favoreça o reforço das suas relações. Trata-se de um acordo com matéria consensual, não decorrendo do mesmo quaisquer encargos para o nosso país ou alterações de natureza legislativa.
O acordo em apreço compõe-se de 32 artigos, agrupados em quatro títulos, e de um anexo. O Título I, respeitante à União Aduaneira, compreende os artigos 2.º a 13.º. No artigo 2.º, é estabelecida, entre a Comunidade Europeia e a República de São Marinho, uma união que abrange os produtos dos capítulos 1 a 97 da Pauta Aduaneira Comum, exceptuando os produtos referidos pelo Tratado que institui a CECA. Os artigos 3.º e 4.º especificam, no que concerne à produção de mercadorias e produtos provenientes de países terceiros, a aplicabilidade das disposições do presente título. O artigo 5.º obriga as Partes Contratantes a não introduzir entre si novos direitos aduaneiros. O artigo 6.º refere-se à isenção de qualquer direito aduaneiro em trocas comerciais entre a Comunidade e a República de São Marinho, à excepção do Reino de Espanha e da República Portuguesa, que aplicarão à República de São Marinho direitos aduaneiros de importação iguais aos aplicados por estes dois países aos restantes países da Comunidade até 31 de Dezembro de 1985. O artigo 1º completa um conjunto de disposições que a República de São Marinho irá aplicar aos países não membros da Comunidade, desde a entrada em vigor do acordo. O artigo 8.º trata das formalidades de desalfandegamento que serão efectuadas nas estâncias aduaneiras comunitárias enumeradas no Anexo. O artigo 9.º proíbe, a partir da entrada em vigor do acordo, as restrições quantitativas à importação, bem como qualquer medida de efeito equivalente entre as partes contratantes. O artigo 10.º refere que o presente acordo não prejudica as proibições ou restrições à importação ou trânsito, quando justificadas por razões que especifica. O artigo 11.º refere-se à abstenção de medidas ou prática de carácter fiscal interna, bem como ao facto de os produtos expedidos não poderem beneficiar de reembolso de imposições internas superior às imposições que sobre eles tenham directa ou indirectamente incidido. O artigo 12.º prevê, em caso de perturbações sérias num sector da actividade económica de uma das Partes Contratantes, a possibilidade de adopção de medidas de salvaguarda necessárias, consignadas nos números respectivos deste artigo. Por último, o artigo 13.º garante, através de autoridades incumbidas, a execução e o respeito pelas disposições do acordo e prestação de assistência mútua às Partes Contratantes.
O Título II respeita à Cooperação e compreende os artigos 14.º a 19.º do presente acordo. O artigo 14.º alude ao reforço dos laços existentes entre a Comunidade e a República de São Marinho por este acordo de cooperação. Esta cooperação incide nos domínios prioritários referidos nos artigos 15.º a 18.º, designadamente no desenvolvimento e diversificação da economia de São Marinho na indústria e dos serviços, com particular atenção às pequenas e médias empresas, melhoria de ambiente, sector turístico e no âmbito da comunicação, da informação e da cultura, para um maior reforço dos laços culturais. O artigo 19.º prevê a possibilidade de alargamento do presente acordo a outros domínios.
O Título III, referente a Disposições no Domínio Social, trata, nos artigos 20.º e 21.º que o compõem, de medidas relativas às condições dos trabalhadores e seus familiares.
O Título IV, referente a Disposições Gerais Finais, é composto pelos artigos 23.º a 32.º, contemplando matéria usualmente contida em acordos desta natureza. Segundo o artigo 30.º, o presente acordo entra em vigor no primeiro dia do segundo mês seguinte à notificação da sua aprovação.
O Anexo tem uma lista das estâncias aduaneiras, tem declarações da Comunidade relativas a vários sectores, nomeadamente o Programa Erasmus, na parte da cultura e educação.
Quero apenas acrescentar que, depois da leitura e apreciação do acordo e deste relatório, a Comissão é de parecer que nada obsta à apreciação e aprovação do acordo pelo Parlamento português.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros (Martins Jerónimo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não serei tão pormenorizado como teve oportunidade de o ser, e de forma brilhante, a Sr.ª Deputada Helena Falcão, mas não deixarei, contudo, de fazer algumas referências aos antecedentes e motivação do presente acordo, sujeito a ratificação, à sua caracterização e articulação com o programa do Governo.
Srs. Presidente, Srs. Deputados: Como é sabido, a República de São Marinho estabeleceu relações diplomáticas com as Comunidades Europeias em 1983. Posteriormente, as autoridades daquele país formularam o desejo de abrir negociações com a Comunidade, tendo em vista a definição do seu estatuto relativamente à Comunidade e à regulamentação das relações recíprocas entre ambas as partes. Este pedido baseava-se no facto de São Marinho se inserir no território aduaneiro da Comunidade em virtude de um acto autónomo desta, sendo certo que havia celebrado em 1939 uma convenção estabelecendo uma união aduaneira com a Itália.
Tendo em vista evitar incompatibilidades entre aquela União e o Tratado de Roma e, simultaneamente, salvaguardar os direitos decorrentes para São Marinho da sua união aduaneira, como referi, a Comunidade optou pela inclusão daquele país no seu território aduaneiro através do Regula-
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mento 2151/84, de Julho do mesmo ano. Na sequência daquele pedido, foram aprovadas, em 1986, a nível comunitário, as directivas correspondentes de negociação. Em Abril de 1990, o governo da República de São Marinho reiterou, de novo, a sua vontade de encetar negociações com, a Comunidade, com vista a estabelecer formalmente uma união aduaneira, uma harmonização de relações em matérias de normas, preços agrícolas, transportes e de prestação de serviços e protecção da propriedade intelectual. O mandato proposto pela Comissão previa, em termos gerais, a contratualização de uma união aduaneira e a abertura de pedidos de cooperação solicitados pela República de São Marinho Tratava-se, ao fim e ao cabo, de formalizar uma situação existente de facto, pela inserção de São Marinho no território aduaneiro da Comunidade e de reforçar as relações de cooperação em vários domínios.
O Acordo ora objecto de ratificação por esta Câmara foi assinado em 16 de Dezembro de 1991. O seu carácter misto, que implica a sua necessária ratificação pelos Estados membros, atrasou a sua entrada em vigor, pelo que a Comunidade e a República de São Marinho, como é sabido, Concluíram um acordo intermédio com o objectivo de pôr em prática as disposições comerciais e aduaneiras do acordo a que fiz referência. Este acordo intermédio de comércio e de união aduaneira entre a Comunidade e São Marinho foi assinado em Bruxelas em 27 de Novembro de 1992, tendo entrado em vigor no dia 1 de Dezembro do mesmo ano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o presente Acordo institui uma união aduaneira entre a Comunidade e a República de São Marinho, aplicável a todos os produtos dos capítulos 1.º a 97.º da pauta aduaneira comum, à excepção dos produtos referidos pelo Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Esta união comporta a isenção de quaisquer direitos de importação e de exportação entre as partes contratantes. Este Acordo comporta igualmente a proibição de qualquer restrição quantitativa Ou medida de efeito equivalente nas trocas comerciais entre a República de São Marinho e a Comunidade. Em relação a países não membros, São Marinho aplicará a pauta aduaneira comum, as disposições necessárias ao bom funcionamento da união aduaneira, as disposições de política comercial comum da Comunidade, bem como as regulamentações agrícolas, excluindo as restituições e os montantes compensatórios concedidos à exportação.
Além destas disposições de carácter comercial, o Acordo institui áreas de cooperação entre a Comunidade e a República de São Marinho que abrangem diversos domínios, como referi, nomeadamente a indústria, os serviços, o ambiente, o turismo e a cultura. Uma vertente social prevê, nas condições fixadas pelo Acordo, o princípio da igualdade de tratamento entre os trabalhadores da República de São Marinho e os trabalhadores da Comunidade no que diz respeito às condições de trabalho e de remuneração, bem como às que dizem respeito ao domínio da segurança social.
O Acordo, concluído por um período ilimitado, cria um comité de cooperação responsável pela respectiva gestão. No prazo máximo de cinco anos, a contar da entrada em vigor, as partes outorgantes acordam examinar os resultados da aplicação do Acordo e, se necessário, abrir negociações destinadas a alterá-lo à luz desse exame.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho tem em vista reforçar e alargar as relações existentes entre as duas partes nos domínios comerciais, económicos, sociais e culturais. A celebração do Acordo insere-se no programa do Governo, não só por contribuir para a progressiva liberalização do comércio internacional num quadro disciplinar que está subjacente a uma união aduaneira, mas também por constituir, sem dúvida, um reforço da participação da Comunidade no desenvolvimento económico e social de uma zona vital para a segurança europeia, como é o Mediterrâneo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Ferreira.
O Sr. Menezes Ferreira (PS). - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O PS não tem muitos comentários a fazer sobre esta proposta de resolução e vai apoiá-la. Não tem muitos comentários a fazer não porque um dos países outorgantes seja muito pequeno mas porque, de facto, os problemas jurídicos e económicos que este Acordo levanta, nomeadamente para Portugal, são ínfimos e não merecem uma análise muito detalhada.
De qualquer modo, sobre este pequeno país, no fundo esta cidade, uma plataforma no Adriático, conhecida como local de turismo e de realização de corridas de automóveis, poderia dizer-se que existe, nas suas relações com a Comunidade Europeia, um contra-senso um silogismo que não funciona: primeira premissa, São Marinho tem uma união aduaneira com a Itália; segunda premissa, a Itália tem uma união aduaneira com a Comunidade Europeia; mas a conclusão não existe, isto é, São Marinho não tinha união aduaneira com o resto da Comunidade Europeia. Foi este pequeno contra-senso jurídico que foi, ao que parece, resolvido com estas negociações mas que, de facto, já estava resolvido, na medida em que a Comunidade, através de regulamentos, já tinha considerado São Marinho como parte do território aduaneiro da Comunidade. Portanto, a questão jurídica não é muito importante e foi, enfim, resolvida.
Embora não tenha pedido esclarecimentos ao Governo, há uma questão menor sobre a qual temos uma dúvida, que é o facto de Portugal não ter feito o desarmamento pautai, e Espanha também não, em relação a São Marinho. Suponho que não há importações relevantes de São Marinho e, não havendo, não se percebe muito bem porque é que este desarmamento não foi feito, a menos que haja uma justificação qualquer, que poderia ser dada. Em relação a outras matérias do Acordo, diria apenas que se trata das matérias típicas que são objecto de acordos de cooperação: sociais, económicas e culturais.
Terminaria dizendo que, se, por um lado, este Acordo não merece grandes comentários, gostaria de assinalar que deu já entrada nesta Assembleia a proposta de resolução, apresentada pelo Governo, sobre o tratado de adesão dos três países nórdicos que não entraram ainda na União Europeia e da Áustria. Suponho que esse tratado, sim, mereceria um amplo debate nesta Casa, independentemente da vontade política, que creio ser manifesta e unânime de todos os partidos, de que haja um sinal político no sentido de que essa ratificação se faça em tempo útil, de modo a que os Estados aderentes o sintam nesses termos, isto é, como uma manifestação de apreço por essas adesões.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Poças Santos.
O Sr. João Poças Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, a proposta de resolução n.º 71/VI visa a aprovação, para ratificação, pela
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Assembleia da República, do Acordo de Cooperação e da União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho, e respectivos anexos e declarações. Tal acordo leva em consideração a necessidade de aprofundar as relações que têm existido entre as duas partes, designadamente nos sectores comerciais, económicos, sociais e culturais. Por outro lado, pretende-se a criação de uma união aduaneira entre São Marinho e a CEE, visto que ela se situa no próprio território aduaneiro da Comunidade. Aliás, historicamente, desde o século XIX, a República de São Marinho constituiu uma união aduaneira com um dos Estados membros, a Itália.
Assim, o duplo objectivo deste Acordo é o de criar a referida união aduaneira, por um lado, e promover uma cooperação global com vista a contribuir para o desenvolvimento económico e social da República de São Marinho e favorecer o reforço das relações com a Comunidade. Uma importante excepção à união aduaneira diz respeito aos produtos abrangidos pelo Tratado CECA, cuja aplicação, neste caso, é expressamente afastada. Para além de várias disposições que balizam o âmbito das mercadorias e produtos incluídos na união aduaneira, são salvaguardados os compromissos em vigor nas relações bilaterais entre São Marinho e a República Italiana. Também Portugal e a Espanha são alvo de disposições específicas, nas quais se estipula a não aplicabilidade da isenção dos direitos aduaneiros de importação, estabelecida para os demais Estados membros, antes se estatuindo a vigência dos direitos aduaneiros aplicados por ambos com os restantes países da Comunidade até 31 de Dezembro de 1985.
Uma das principais consequências do Acordo é a aplicação, por parte de São Marinho, das disposições comunitárias face a terceiros e relativas a pauta aduaneira e disposições normativas conexas, política comercial comum, comércio de produtos agrícolas, regulamentações veterinárias, fitossanitárias e de qualidade, etc. No campo da cooperação, as partes acordam em favorecer o desenvolvimento e diversificação da economia de São Marinho nos sectores da indústria e dos serviços, com especial atenção para as PME. Igualmente, nos domínios do ambiente, turismo, comunicação, informação, cultura e educação, se reitera a vontade de mútuo intercâmbio. Em matéria social, são dadas garantias recíprocas da não discriminação dos trabalhadores, quer quanto a remuneração, quer no que diz respeito a condições de trabalho e ao regime de segurança social.
Em suma, o acordo em análise, elaborado e assinado em 16 de Dezembro de 1991, é um instrumento útil e necessário à integração do pequeno território de São Marinho no grande espaço da união aduaneira vigente a nível comunitário, e constitui um factor de reforço dos laços económicos e culturais que esta velha República desenvolveu com os demais Estados da Europa à qual, historicamente, pertence.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria apenas dizer o óbvio, isto é, depois de dois relatórios desta Assembleia da República, um da Comissão de Assuntos Europeus e outro da Comissão de Negócios Estrangeiros, que foram discutidos por todos os partidos, naturalmente que o CDS não tem rigorosamente nada a acrescentar nem a obstar. Como já aqui foi dito, é quase uma decorrência da situação actualmente existente, dado que, de facto. São Marinho faz parte do território da união aduaneira, através de regulamentos, e o que se procura agora é apenas dar o formato jurídico que faltava, exactamente como uma «carambola», por ter sido primeiro parte da união aduaneira com a Itália, e a Itália faz parte da União Europeia, pelo que agora compõe-se este mosaico, este puzzle que já foi referido, e soluciona o problema de uma maneira legal, para que não existam dúvidas. Sobre esta matéria, portanto, não temos nada a acrescentar.
O único reparo que tenho a fazer deriva de uma coisa que, constantemente, fui ouvindo na intervenção do Sr. Subsecretário de Estado: é a invocação do cumprimento do programa do Governo. Não sei a que propósito é que surge aqui o cumprimento do programa do Governo, a ponto de ser falado duas ou três vezes na sua intervenção. Será que se trata de uma maneira tabeliónica, completamente formal de fazer! É caso para perguntar: é uma opção tão política que o Governo português poderia recusar e deixar sozinho São Marinho fora da União Europeia? Porquê, então, esta referência constante ao cumprimento do programa do Governo? É uma pesporrência anormal! O Governo não podia ficar de fora, Portugal não podia recusar esta entrada da República de São Marinho na união europeia e aduaneira, através deste quadro legislativo. Ou ficaríamos de fora, estando já tudo concretizado através de regulamentos e de todas as negociações feitas anteriormente com todos os países? Este constante chamar de atenção, de auto-glorificação para o facto de que se trata do cumprimento do programa do Governo, é o que mais «irrita». Muitas vezes - por uma coisa tão simples, trazer uma «bomba» tão grande, de que se trata de dar cumprimento ao programa do Governo! Nós encaramos isto como uma decorrência normal do estatuto de Portugal na União Europeia, uma decorrência normal dos tratados e regulamentos já existentes, e não como uma grande opção política do Governo, derivada do programa do Governo!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Dado que não há mais inscrições sobre esta matéria, declaro encerrado do debate da proposta de resolução n.º 71/VI A respectiva votação terá lugar à hora regimental.
Vamos agora proceder à discussão conjunta das propostas de resolução n.ºs 75/VI - Aprova, para ratificação, a Constituição e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações e o Protocolo Facultativo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios Relativos à Constituição da União Internacional das Telecomunicações, à Convenção da União Internacional das Telecomunicações e os Regulamentos Administrativos, 76/V1- Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTEL-SAT), 77/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite (INTELSAT) e 78/VI - Aprova, para adesão, o Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT).
Na qualidade de relator, e para fazer a síntese dos respectivos relatórios da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Oliveira.
Dispõe, para esse fim, do tempo regimental de cinco minutos.
O Sr. Carlos Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados, vou fa-
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zer uma apresentação sumária e conjunta das quatro propostas de resolução.
Estas propostas mereceram um tratamento consensual na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e as considerações técnicas e pormenorizadas são tratadas nos relatórios, bastante extensos, que foram apresentados e discutidos nesta mesma comissão. O que farei em seguida é apresentar, de uma forma breve, os objectivos das quatro propostas de resolução e as suas motivações básicas, que envolvem, no fundo, a mesma coisa, que é a aprovação de compromissos que Portugal assumiu como parte de vários tratados internacionais, conforme irei apresentar uma a uma.
Começo com a proposta de resolução n.º 75/VI, que se refere à União Internacional de Telecomunicações e que trata da alteração de um tratado internacional já a vigorar em Portugal, que foi aprovado para ratificação pela Assembleia da República em 30 de Janeiro de 1987.
Os três instrumentos da União Internacional de Telecomunicações que se apresentam agora para aprovação a Constituição, a Convenção e a Resolução - correspondem a alterações profundas à Convenção Internacional das Telecomunicações, isto é, ao seu instrumento constitutivo anterior e também à sua estrutura e organização interna.
As alterações contidas nestes três instrumentos visam adaptar a União Internacional de Telecomunicações não só ao forte e rápido desenvolvimento tecnológico do sector das telecomunicações, mas também às alterações estruturais verificadas neste sector nos países que fazem parte desta organização.
Através destas alterações efectua-se o desdobramento das disposições originalmente contidas apenas na Convenção, anteriormente o instrumento fundamental da União,, em dois instrumentos base, a Constituição e a Convenção ficando na Constituição as disposições de carácter essencial da União relacionadas com o seu objecto, composição, as estruturas e funcionamento interno, utilização dos seus serviços e relacionamento da União com outras entidades, e ficando na Convenção as disposições que, pela sua natureza, podem carecer de revisão periódica.
O Protocolo Facultativo define a arbitragem como foi meio obrigatório para a resolução de conflitos relativos à interpretação ou à adopção dos dois novos instrumentos base desta União.
Passo agora a apresentar, também de uma forma breve, as propostas de resolução n.ºs 76/VI, 77/VI e 78/VI, que são muito similares.
A primeira refere-se à EUTELSAT - Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite e o Protocolo que se apresenta para ratificação resulta da implementação directa do disposto na Convenção relativa a esta organização e do associado Acordo de Exploração, aprovados para ratificação pelo Decreto do Governo n.º 36/85, de 25 de Setembro.
Acontece que, através desta Convenção, as partes signatárias comprometeram-se a concluir e a aprovar um protocolo, que é este, conferindo privilégios e imunidades à EUTELSAT e aos seus funcionários, por forma a facilitar a realização dos objectivos da EUTELSAT e assegurar o eficiente desempenho das suas funções.
Não irei enumerar o conjunto de privilégios, isenções e. imunidades, que são bastantes, mas irei salientar um aspecto importante, o de que o próprio Protocolo regulamenta a cessação destes privilégios, isenções e imunidades. E passo a mencionar o que o Protocolo estabelece: que os privilégios e imunidades nele previstos não são concedidos para benefício pessoal de indivíduos mas para permitir o desempenho eficiente das suas funções, que, se os privilégios e imunidades forem susceptíveis de impedir a acção da justiça, e em todos os casos em que seja possível, a EUTELSAT tem o direito e o dever de fazer cessar tais privilégios e imunidades.
A proposta de resolução n.º 77/VI é em tudo similar a esta, mas refere-se a uma outra organização internacional, a INTELSAT - Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite.
Da mesma forma, o Protocolo.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, esgotou o seu tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, permita-me mais cinco segundos, pois tenho quatro relatórios a apresentar,...
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Estou a fazê-lo de uma fornia muito sucinta...
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça o favor de usar do seu poder de síntese e de continuar.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, a proposta de resolução n.º 77/VI, como acabei de dizer, é muito similar à n.º 76/VI e o Protocolo que se apresenta resulta também da implementação directa do disposto na Convenção original que cria esta organização e que foi igualmente ratificada pelo Estado português.
Nos termos desta Convenção, as partes signatárias comprometeram-se a concluir e a aprovar um protocolo conferindo privilégios e imunidades à INTELSAT e aos seus funcionários, por forma a facilitar a realização dos objectivos da INTELSAT e a assegurar o eficiente desempenho das suas funções.
Esta proposta de resolução estabelece também a cessação dos privilégios e imunidades que já foram referidos na outra proposta de resolução (são idênticos).
Por fim, para concluir, Sr. Presidente, a proposta de resolução n.º 78/VI é em tudo similar às anteriores, mas refere-se a uma terceira organização, a EUMETSAT - Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos.
Também aqui se trata de assumir compromissos que foram assinados e ratificados por Portugal quando da Convenção que criou esta organização.
Para concluir, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, quero dizer que a ratificação destas quatro propostas de resolução irá contribuir para o prosseguimento, com maior liberdade e isenção, do interesse público destas organizações internacionais, a que Portugal aderiu ao assinar e ratificar os respectivos instrumentos constitutivos.
Sr. Presidente, gostava de tecer sobre a matéria algumas considerações em nome da bancada do PSD, mas não sei se devo faze-lo depois ou agora.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, vou dar a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros e, na altura própria, o Sr. Deputado fará a sua intervenção em representação do Grupo Parlamentar do PSD.
Tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
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O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeires: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria redundante e fastidioso alongar-me muito mais, depois do relato aqui produzido pelo Sr. Deputado relator sobre as quatro propostas de resolução em debate.
No entanto, sem prejuízo de ser repetitivo, apesar de não haver muito mais para referir, principio por sublinhar, no tocante à proposta de resolução n.º 75/VI, que aprova, para ratificação, os novos instrumentos jurídicos da União Internacional das Telecomunicações, a Constituição e a Convenção assinadas em Genebra em 22 de Dezembro de 1992, bem como o correspondente Protocolo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios, assinado na mesma data, que estes instrumentos resultam do desdobramento da anterior Convenção da UIT, cuja necessidade se fez sentir desde a Conferência de Nairobi de 1992, na qual foi aprovada uma resolução nesse sentido.
Assim, a Constituição da UTT agrupa as disposições de carácter essencial sobre a sua estrutura e funcionamento e as principais alterações efectuadas em relação ao anterior instrumento prendem-se com a estrutura da União Internacional de Telecomunicações, que foi objecto de reformas profundas, visando a sua adaptação à evolução do sector ao nível mundial.
Na Convenção estão contidos os princípios de carácter técnico e administrativo relacionados com o funcionamento dos órgãos da mesma, bem como as disposições relativas à exploração dos serviços de telecomunicações.
O Protocolo Facultativo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios consagra a arbitragem como meio obrigatório da resolução dos conflitos em matéria de interpretação ou a adopção dos instrumentos da União, nos termos do § 5.º do artigo 41.º da Convenção. Este Protocolo é aplicável apenas aos membros que o subscreveram na Conferência Adicionai de Plenipotenciários de 1992, entre os quais se encontra, necessariamente, Portugal.
Os instrumentos objecto da presente proposta de resolução substituem, na ordem jurídica interna, a Convenção Internacional de Telecomunicações assinada em Nairobi em 6 de Novembro de 1982 e aprovada pela Resolução n.º 3/87, de 30 de Janeiro, da Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto à proposta de resolução n.º 76/VI, que aprova, para ratificação, o Protocolo Relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite, a EUTELSAT, limitar-me-ei a sublinhar que Portugal é parte na Convenção relativa a esta organização, bem como no respectivo Acordo de Exploração, cujos instrumentos de ratificação foram depositados, em 17 de Dezembro de 1985, junto do Governo da República Francesa.
Nos termos do disposto no artigo 18.º-C da referida Convenção, as partes comprometeram-se a concluir um Protocolo conferindo privilégios e imunidades à EUTELSAT e aos seus funcionários para, como já foi - e bem - referido pelo Sr. Deputado relator, facilitar o atingir dos objectivos da organização.
Concluído e aberto pela assinatura em 13 de Fevereiro de 1987, o Protocolo em apreço entrou em vigor em 17 de Agosto de 1988.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A EUTELSAT tem vindo a solicitar a pronta ratificação deste instrumento por todas as partes da Convenção, assumindo mesmo particular importância para Portugal dada a sua incidência e reflexos financeiros decorrentes, nomeadamente, do facto de o signatário português do Acordo de Exploração, a Companhia Portuguesa Rádio Marcom, haver celebrado com a EUTELSAT, em 19 de Maio de 1987, um contrato de prestação de serviços TCR (tracking control ranging), que permitiria o telecomando, o controlo e o posicionamento para os satélites da série EUTELSAT-II, no pressuposto de determinadas isenções, cuja falta, em resultado da não ratificação do Protocolo, pode vir a comprometer - e não se deseja tal, necessariamente - o alargamento desse contrato a outros satélites, bem como a celebração de novos contratos e ainda as próprias relações comerciais com a EUTELSAT.
Quanto à proposta de resolução n.º 77/VI, que aprova, para ratificação, o Protocolo Relativo aos Privilégios. Isenções e Imunidades da Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite (INTELSAT), parece-me de sublinhar que, também como já foi referido, Portugal é, efectivamente, parte no Acordo relativo à Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite e no respectivo Acordo de Exploração, havendo depositado o correspondente instrumento de ratificação, em 29 de Julho de 1972, junto do Governo dos Estados Unidos da América.
O Protocolo em apreço, negociado de harmonia com o disposto no artigo 15.º-C do Acordo da INTELSAT, foi concluído e aberto para assinatura em 19 de Maio de 1978, tendo entrado em vigor em 9 de Outubro de 1980. A INTELSAT tem vindo a solicitar a sua pronta ratificação e nesse sentido está, obviamente, empenhadíssimo o Governo português, dado os reflexos e as vantagens de natureza comercial e financeira para Portugal e, em particular, para o subscritor Companhia Portuguesa Rádio Marcom, como já referi.
Quanto à proposta de resolução n.º 78/VI, relativa à aprovação, para adesão, do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT), refiro apenas que este Protocolo foi negociado de harmonia com o disposto na Convenção para o Estabelecimento de uma Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos, da qual Portugal é parte desde 1988, aplicando-se, mutatis mutandis, as considerações que fiz quanto às outras propostas de resolução acerca dos Protocolos relativos à EUTELSAT e à INTELSAT, designadamente no que se refere às características, que me apraz sublinhar, de reforço desta organização intergovernamental.
O Sr Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira.
O Sr. António Crisóstomo Teixeira (PS)- - Sr. Presidente, gostaria de colocar algumas questões aos membros do Governo aqui presentes sobre esta matéria.
Quanto à proposta de resolução n º 75/VI, relativa à União Internacional das Telecomunicações, suscitou-me alguma preocupação a leitura das reservas estabelecidas aos actos de constituição e convenção, na medida em que o seu somatório quase supera, em termos de extensão, o articulado desses dois actos. De uma forma geral, embora haja preocupações relativamente periféricas, há algo de constante quanto aos encargos que as partes têm, ou possam ter, de suportar, em função de retiradas totais ou parciais de responsabilidade por parte dos outros.
Gostaria de saber a opinião do Governo quanto às implicações que possam resultar dessa insegurança relativa ao acto que hoje vem aqui ser ratificado para Portugal, como parte contribuinte.
Relativamente aos três protocolos que são objecto das propostas de resolução n.ºs 76/VI, 77/VI e 78/VI, gostaria
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de chamar a atenção - não sei se o Governo contemplou este aspecto - para o facto de haver alguns elementos que são comuns e têm traduções um tanto ou quanto díspares. Não sei se qualquer dos textos traduzidos traduz a real intenção, de acordo com o que é a formulação normal portuguesa, do que se pretende.
Reporto-me, no caso da proposta de resolução n.º 767/VI, acerca do Protocolo relativo à EUTELSAT, ao n.º 5 do artigo 4.º, onde consta: «Não será concedida qualquer isenção relativamente a impostos e taxas que representem encargos pela prestação de serviços específicos».
Ora, a nossa linguagem não está muito afeita à identificação da prestação de serviços com a ideia de imposto. É óbvio que, se usarmos aqui a palavra «portagem», para o caso da utilização de uma infra-estrutura de via pública, ou se talarmos numa taxa portuária relacionada com o embarque ou o desembarque de um material, o sentido desperta, mas não me parece que a linguagem utilizada neste texto seja, de facto, apropriada.
Isto repete-se, embora de forma diferente, na proposta de resolução n.º 77/VI, acerca do Protocolo relativo à INTEL-SAT, onde a expressão utilizada ainda é mais vaga. Diz o n.º 4 do artigo 4.º deste Protocolo: «As disposições dos parágrafos 1, 2 e 3 não serão aplicáveis aos impostos ou direitos»- agora já não se fala sequer de taxas - «que não sejam mais do que encargos pela prestação de serviços específicos».
No que toca à proposta de resolução n.º 78/VI, é totalmente «um mimo» a tradução, realizada pelos serviços da Procuradoria-Geral da República, do Protocolo relativa à EUMETSAT, onde se diz, no n.º 4 do artigo 5.º: «As disposições contidas no presente artigo não serão aplicáveis aos impostos, taxas e direitos que correspondam à retribuição por serviços prestados».
De facto, a imprecisão desta linguagem é notável. Obviamente, já não vamos a tempo de chamar a atenção do Governo para esta situação, mas talvez se possa chamar a atenção do Sr. Presidente para que os serviços jurídicos talvez possam, na fase final, ao corrigirem os textos, introduzir as adaptações que forem julgadas pertinentes, a fim de se harmonizar esta matéria.
Para terminar, quero deixar uma pergunta aos membros do Governo aqui presentes, relativamente aos textos das propostas de resolução que fazem aprovar estes protocolos,...
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, queira concluir.
O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente... na medida em que, se no que se refere ao Protocolo relativo à EUMETSAT as reservas feitas pelo Governo são mais abundantes, nos outros dois casos as reservas formuladas pelo Governo, no texto das propostas de resolução, cingem-se já exclusivamente à questão dos impostos sobre o rendimento e sobre o património e à competência dos tribunais portugueses em matéria tributável.
Por que razão não houve uma preocupação de identificar, em três protocolos com uma estrutura tão semelhante, uma igualdade de intenções por parte do Governo?
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Habitação.
O Sr. Secretário de Estado da Habitação (Carlos Costa): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira, esclareço que algumas das reservas aqui formuladas foram-no por natureza cautelar, nomeadamente no que toca à convenção da UIT, pois têm-se levantado sistematicamente, ao nível da discussão destas convenções, alguns problemas desse género Assim, por natureza meramente cautelar, proeurou-se acautelar o facto de que o Estado português não subscreveria adicionais e sobrecustos que decorressem de incumprimento por terceiros países.
Uma segunda reserva está relacionada com os direitos das órbitas. Há países que reivindicam posições e direitos de soberania sobre as órbitas geoestacionárias. Essa matéria é polémica, tem sido discutida e, por mera cautela, formularam-se essas reservas O intuito foi mais o de acautelar responsabilidades a nível formal do que propriamente uma ameaça real em termos de sobrecustos.
O Sr. Presidente (Correia Afonso) - Srs. Deputados, vamos interromper este debate para entrarmos em período de votações.
Pausa.
Srs. Deputados, se ninguém se opuser, retomamos o debate, visto não haver ainda condições para proceder às votações.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Oliveira.
O Sr. Carlos Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Penso que os Srs. Membros do Governo já fizeram algumas das considerações que eu pretendia fazer sobre três dos protocolos. No entanto, de uma forma brevíssima, gostaria de salientar três considerações que me parecem pertinentes.
Em primeiro lugar, através da ratificação destes instrumentos, Portugal potência o seu relacionamento com os PALOP e o Brasil, atendendo aos objectivos de cooperação internacional e de assistência técnica da União Internacional de Telecomunicações aos países em vias de desenvolvimento.
Em segundo lugar, através desta ratificação, Portugal poderá também beneficiar as suas empresas e fazer com que elas fiquem melhor posicionadas a nível internacional, atendendo à tendência para a internacionalização da actividade das telecomunicações e ao incremento da concorrência.
Em terceiro lugar, através desta ratificação, Portugal reforça a sua participação e protagonismo neste importante organismo internacional.
Neste contexto, saliento apenas dois factores: o primeiro é que Portugal é membro da União Internacional de Telecomunicações desde a sua criação, em 1865; o segundo é que Portugal foi eleito para o Conselho da União Internacional de Telecomunicações na Conferência de Plenipotenciários que se realizou em Setembro deste ano, em Quioto, no Japão. Para concluir, refiro que esta eleição ilustra o prestígio adquirido por Portugal nesta importante organização internacional.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira.
O Sr. António Crisóstomo Teixeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco, coloquei algumas perguntas aos membros do Governo, que responderam a outras mas não àquelas, no entanto, não o podemos forçar a fazê-lo, se o não deseja.
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Estamos perante três propostas de ratificação de protocolos definidores dos privilégios, isenções e imunidades de organizações internacionais de telecomunicações e meteorologia, baseadas na exploração por satélites.
Estas iniciativas são de grande fôlego e a questão da extra-territorialidade absoluta da maior parte da exploração constitui um facto indiscutível, ao exigir regras de relacionamento com os Estados nacionais que coloquem as organizações fora da jurisdição daqueles.
É bom de ver que sendo estas organizações integradas por pessoas que confluem na utilização de meios e no desenvolvimento de acções, se torna forçoso, em nome da prossecução eficaz dos objectivos propostos, que estes agentes e meios fiquem ao abrigo de formas de actuação não convencionadas.
Por outro lado, necessário se torna também que a imunidade de jurisdição se limite ao âmbito das actividades aprovadas pelos acordos internacionais que suportam as organizações e que as disposições relativas aos membros do seu pessoal visem exclusivamente o desempenho das suas funções em lugar de benefícios pessoais. Até porque não está em causa a ressurgência de ordens medievais, em que o status dos seus membros não possa ser posto em causa. Trata-se, sim, de preservar a actividade de comunidades de ciências e tecnologia que se desenvolvem seguindo um modelo de diáspora.
Gostaria de formular uma observação a este propósito relativamente ao artigo 9.º, n.º 2, do Protocolo da EUTEL-SAT (Organização Europeia de Telecomunicações Por Satélite), que preconiza que os membros do seu pessoal serão isentos de imposto sobre o rendimento a partir da data em que a Organização o passe a cobrar para seu próprio benefício. Estamos aqui perante um arremedo de Estado nacional, por parte de uma organização que deveria perseguir outra forma de estar na comunidade internacional e a que certamente não é estranho o facto de a sua sede se situar na pátria do Código de Napoleão.
Se as razões do arremedo são boas ou más, constituindo reacção as acções fiscais ou cópia do modelo nacional, não o podemos aqui dizer. Deixaremos para um futuro, que se espera próximo, a clarificação necessária.
Daí que se considere correcta, ou pelo menos prudente, a posição, adoptada pelo Governo português em relação aos três protocolos, de se reservar o direito de classificar os rendimentos e bens das organizações para efeitos de isenção de impostos, bem como a reserva de competência dos tribunais portugueses em matéria tributária.
Porém, afigura-se pouco feliz que o Governo não defina neste momento quais as isenções que não devem abranger os nacionais e residentes, em matérias tão delicadas como as do serviço nacional, incluindo o serviço militar, da fiscalidade do trabalho e das contribuições para a segurança social.
A situação não é irremediável a ponto de justificar um voto negativo por parte do Partido Socialista, mas motiva uma chamada de atenção para que, com a brevidade possível, Portugal declare qual o seu entendimento em relação a estas matérias.
Questão diferente é a que se relaciona com os actos de Constituição, Convenção e Protocolo de resolução de litígios da União Internacional de Telecomunicações.
Está-se aqui perante matéria mais fluida, a da constituição e funcionamento dos fora onde se concerta a cooperação e a coordenação necessária ao funcionamento do sistema internacional de telecomunicações. A delicadeza e fragilidade do mecanismo construído torna-se evidente pelas numerosas reservas formuladas pelas partes aderentes.
Pensamos que a posição assumida pelo Governo Português é tão pertinente como muitas outras. Mas não ilude a necessidade urgente de uma melhor especificação das obrigações das partes, por forma a que não resultem comprometidos os modos e os meios de funcionamento do sistema de telecomunicações, que, nesta era da informação, constitui o elo de ligação e a principal base de relacionamento da comunidade humana.
Que o Governo saiba aproveitar este crédito político no plano externo é o desejo que entendemos formular, porque, infelizmente, no plano interno, avolumam-se preocupações iniludíveis de formação de um monopólio partidarizado nas telecomunicações, enquanto tardam iniciativas que abram aos portugueses o acesso às redes de informação científica e técnica, indispensáveis ao desenvolvimento e à qualificação na sociedade moderna. E não gostaríamos de as ver concretizadas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trindade.
O Sr. Pando Trindade (PCP)- - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Trata-se apenas de uma, muito breve, intervenção, por parte do Grupo Parlamentar do PCP, sobre a matéria em causa, que consiste na aprovação de um conjunto de quatro propostas de resolução, versando convenções e protocolos internacionais que se relacionam com matéria de telecomunicações.
No que respeita à proposta de resolução n.º 75/VI, gostaria de sublinhar que se trata de uma alteração à Convenção da União Internacional de Telecomunicações, substituindo a Convenção Internacional de Nairobi, cuja ratificação foi aprovada, por unanimidade, por esta Assembleia, em Janeiro de 1987. Obviamente, o Grupo Parlamentar do PCP terá uma actuação coerente com a que teve em Janeiro de 1987.
De facto, pensamos que a actualização deste instrumento internacional se justifica, tendo em conta toda uma evolução tecnológica, que determina, portanto, actualizações nas estruturas organizativas da União Internacional de Telecomunicações (UIT). Organização esta que, diria, até está, de certa forma, ligada ao Estado democrático em Portugal, porquanto Portugal foi afastado da UIT antes do 25 de Abril, só tendo voltado a ingressar nela depois da Revolução de Abril.
Quanto às propostas de resolução n.º* 76/VI, 77/VI e 78/VI, versando Protocolos relativos a Privilégios, Isenções e Imunidades da EUTELSAT, INTELSAT e EUMETSAT, tratam-se de instrumentos que vêm também reforçar, no nosso entender, a participação portuguesa em organismos internacionais, isto sem embargo de pensarmos que se todas estas propostas viessem acompanhadas, uma delas vem, de notas justificativas seria mais fácil terem-se dissipado algumas dúvidas técnicas, aqui levantadas, nomeadamente pelo Sr. Deputado António Crisóstomo Teixeira. Mas, de toda a forma, porque o que pensamos que está em causa é a matéria substancial e que trata de um reforço da participação portuguesa em organismos internacionais, o Grupo Parlamentar do PCP não terá dúvidas em apoiar a aprovação destas propostas de resolução.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer que, da nossa parte, não há qualquer obstáculo aos relatórios relativos às propostas de resolução agora em debate, pelo que votaremos a favor.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate das propostas de resolução n.ºs 75/VI, 76/VI, 77/VI e 78/VI.
Vamos dar início ao período de votações.
Srs Deputados, antes de entrarmos no período da votações, vou ler uma carta dirigida pelo Sr. Presidente da República ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que e do seguinte teor: «Estando prevista a minha deslocação à Grã-Bretanha entre os próximos dias 9 e 10 de Novembro, para me ser conferido o grau de Doutor «Honoris Causa» pela Universidade de Leicester, venho requerer, nos termos dos artigos 132.º, n.º 1 e 166.º, alínea b), da Constituição da República, o necessário assentimento da Assembleia da República».
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do respectivo parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer e proposta de resolução é do seguinte teor: «A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de Sua Excelência o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar, em viagem de carácter oficial à Grã-Bretanha, entre os dias 9 e 10 do corrente mês de Novembro, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução: Nos termos do n.º 1 do artigo 132.º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à viagem de carácter oficial à Grã-Bretanha, entre os dias 9 e 10 do corrente mês de Novembro».
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dós Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 275/VI - Estabelece garantias de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais (PS).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e a abstenção do PC P.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para informar que iremos entregar na Mesa uma declaração de voto por escrito relativa a esta votação.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Fica registado, Sr. Deputado António Filipe.
Srs. Deputados, antes de passarmos à votação do projecto de resolução n.º 123/VI - Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP), informo a Câmara de que relativamente a este diploma deu entrada na Mesa uma proposta de alteração, que acabou de ser distribuída, apresentada pelo PSD.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor.
O Sr. Martins Goulart (PS). - Sr. Presidente, penso que o melhor seria proceder-se à sua leitura.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Com certeza, Sr. Deputado, o Sr. Secretário vai proceder à leitura.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a proposta de alteração ao projecto de resolução n.º 123/VI é do seguinte teor: «(...) o Plenário da Assembleia da República delibera:
Pelas razões expostas e tendo especialmente em conta as características valorativas inerentes à especificidade dos fluxos de tráfego aéreo existentes dentro da RIV de Santa Maria, e tendo ainda presentes preocupações que militam no sentido de serem reponderados e revistos os objectivos e a localização do investimento da Empresa Pública de Navegação Aérea ANA - EP, no que concerne à implementação do Projecto Atlântico por forma a ficarem assegurados os recursos materiais e humanos necessários à manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados, mandada a Comissão de Administração do Território, Equipamento Social, Poder Local e Ambiente para:
- ouvir o Ministro da tutela e o Conselho de Administração da ANA - EP sobre tão premente questão;
- promover as demais diligências, que tenha por adequadas, para habilitar a Assembleia da República a uma correcta avaliação das soluções que conciliem as várias vertentes do interesse nacional em causa».
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é sobre o método de votação.
O Grupo Parlamentar do PS entende que a alteração proposta pelo PSD contradiz e contraria fundamentalmente o projecto de resolução n º 123/VI, que também foi subscrito por representantes do Grupo Parlamentar do PSD e que agora subscrevem esta proposta de alteração.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Como o Grupo Parlamentar do PS está devidamente esclarecido sobre esta questão, entende estar preparado para votar o projecto de resolução tal como está e até considera que esta proposta de alteração quase cria um novo projecto de resolução. Nessa medida, a primeira questão que colocaria à Mesa, Sr. Presidente, era a de saber se a primeira votação que irá ter lugar é a votação na generalidade do projecto de resolução original. Se não houver essa votação, o Grupo Parlamentar do PS votará contra essa proposta de alteração apresentada pelo PSD, porque, no nosso entender, não adianta em nada, a não ser pôr em causa o próprio objectivo do projecto de
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resolução, e teremos de abster-nos numa votação final global, caso seja essa a solução.
Gostaríamos, caso seja possível, de requerer uma votação na generalidade do projecto de resolução, que subscrevemos.
Aplausos do PS.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, visto haver mais pedidos de palavra para interpelar a Mesa, que, suponho, serão no mesmo sentido, irei responder a todos no final.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, neste momento, a minha pergunta resume-se a isto: qual é o método de votação que a Mesa vai utilizar a respeito do projecto de resolução?
Guardar-me-ei, eventualmente, para outra interpelação em função da resposta da Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de saber se a Mesa vai proceder à leitura do projecto de resolução original, porque, para que esta proposta de alteração seja compreensível, é preciso que conste na acta o texto original do projecto de resolução que vai ser alterado, uma vez que a Mesa já fez a leitura da proposta de alteração.
Em segundo lugar, quanto ao método de votação, é nosso entender que, se há uma proposta de alteração, se deve votar, em primeiro lugar, na generalidade, o texto original e só depois todas as propostas de alteração, porque isto não é a simples substituição de uma proposta por outra mas, sim, de alteração.
Portanto, gostaria que a Mesa procedesse à leitura do texto original do projecto de resolução n.º 123/VI, para que conste em acta, e que, no que toca à votação, o votasse na generalidade em primeiro lugar e só depois de votada a proposta de alteração procedesse à votação final global.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, o texto original do projecto de resolução não foi lido porque a Mesa pressupôs ser do conhecimento de todos os Srs. Deputados Mas, diante do requerimento do Sr. Deputado, a Mesa irá proceder à sua leitura.
Quanto à proposta de alteração, o artigo 161.º do Regimento é muito claro, pelo que, sendo uma proposta de alteração ou emenda, é votada em primeiro lugar e só depois, se for rejeitada, é votado o texto original, mas, se for aprovada, é votado o projecto de resolução com a introdução das alterações aprovadas. Aliás, o Regimento não faz mais do que traduzir a regra habitual de qualquer assembleia deliberativa.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não percebi muito bem a última informação de V Ex.ª.
O Sr. Presidente não referiu que, antes da votação na especialidade da proposta de alteração, tem de haver uma votação na generalidade do projecto de resolução, e só depois se pode avançar para essa votação na especialidade. É isto, Sr. Presidente?
Entretanto, quando avançarmos para a votação na especialidade, a Mesa tem de dar tempo aos grupos parlamentares para intervir.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, creio que normalmente as propostas de resolução não são sujeitas a votação na generalidade e na especialidade, havendo apenas uma votação, o que não altera, de forma alguma, aquilo que a Mesa decidiu, que é o facto de o texto de alteração ou de emenda ter de ser votado sempre primeiro que o outro, porque, se ele for aprovado, quando o segundo é votado, já se pressupõe a introdução desta alteração.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. Jaime Gama (PS). - Sr. Presidente, V. Ex.ª está, na verdade, a interpretar correctamente o Regimento, invocando os artigos 160.º e 161.º. Porém, esses artigos, que V. Ex.ª está a aplicar, por analogia, da deliberação sobre leis à votação de uma resolução são artigos que respeitam à votação na especialidade. V. Ex.ª tem obviamente que invocar também o artigo n.º 157.º, que é o que se aplica, previamente, à votação na generalidade dos diplomas e, no caso em apreço, por analogia, em relação ao projecto de resolução. Caso contrário, o que se está a passar é uma viciação do espírito e da letra do Regimento, porque, designadamente, aquilo que é apresentado, agora, pelo Grupo Parlamentar do PSD mais não é do que um novo projecto de resolução, uma proposta globalmente alternativa ao projecto de resolução inicial, de que também é subscritor o Grupo Parlamentar do PSD. E seguramente V. Ex.ª não consentirá nesta viciação pragmática do Regimento nem por uma forma nem por outra.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, vou responder a esta interpelação, dado que ela tem um sentido diferente.
Sr. Deputado Jaime Gama, evidentemente, dou-lhe toda a razão. Normalmente, os projectos de resolução são apenas objecto de uma votação. Pelo menos, em termos, de praxe, a Câmara tem seguido esse caminho. Quando surge alguma questão, como esta, então, como o Sr Deputado disse - e muito bem -, os princípios mandam que se efectuem duas votações. Estou perfeitamente de acordo, a Câmara entende-o assim e assim será feito.
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação referia-se à penúltima intervenção de
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V. Ex.ª. Contudo, penso que, agora, o Sr. Presidente já esclareceu melhor a vontade da Mesa.
Na realidade, os projectos de resolução têm sido votados uma única vez, porque não tem havido alterações e, portanto, faz-se uma votação conjunta, na generalidade, na especialidade e final global. Já quando há alterações, tem de seguir-se a tramitação normal e, quando passarmos à votação na especialidade, tem de nos ser concedido algum tempo, repito, para podermos intervir sobre o diploma, em termos de discussão na especialidade.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, agradeço-lhe a sua contribuição para o esclarecimento desta questão.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação está prejudicada.
Quero somente dizer que damos anuência à interpretação fixada pela Mesa. Far-se-á a votação na generalidade, a discussão e a votação na especialidade e a votação final global, ficando todos os «matadouros» regimentais assegurados neste incidente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - O regresso aos princípios é sempre salutar. Portanto, vamos por esse caminho.
Srs. Deputados, conforme requerido pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do texto original do projecto de resolução n.º 123/VI- Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP).
O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados vou limitar-me a ler a parte conclusiva. É do seguinte teor: «(,.,) pelas razões expostas e tendo especialmente em conta .35 características valorativas inerentes à especificidade das fluxos de tráfego aéreo existentes dentro da RIV de Santa Maria, sejam urgentemente revistos os objectivos e a localização do investimento da empresa pública Aeroportos ç Navegação Aérea, ANA-EP, no que concerne à implementação do «Projecto Atlântico», por forma a ficarem assegurados os recursos materiais e humanos necessários à manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados».
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de resolução n.º 123/VI - Manutenção na ilha de Santa Mana do Centro de Controlo Oceânico e demais serviços nela sediados (PSD, PS, PCP e CDS-PP).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade,, registando-se a ausência do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Vamos agora proceder à discussão e votação, na especialidade, do texto da proposta de alteração ao projecto de resolução n.º 123/VI.
Inscreveram-se, para intervir, os Srs. Deputados Lino de. Carvalho, Martins Goulart, Narana Coissoró e Mário Maciel. Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, ontem, quando discutimos aqui o projecto de resolução n.º 123/VI, tivemos oportunidade de alertar o Plenário para a possibilidade de, contra tudo o que tinha sido dito e prometido publicamente, este diploma, assinado por todas as bancadas, acabar por não ter, afinal de contas, o voto favorável do PSD.
Na altura, dissemos que não queríamos crer que o PSD, depois de ter assumido, na visita à Região Autónoma dos Açores e no quadro da delegação da Assembleia da República, um compromisso público, perante os órgãos institucionais e autárquicos da região e perante a população, de que na Assembleia da República tudo fana para que o Centro de Controlo Oceânico se mantivesse na ilha de Santa Maria e depois de a delegação ter aprovado por unanimidade o relatório, em que se afirma claramente que a posição da delegação é, em nome da Assembleia da República, a da manutenção do Centro de Controlo Oceânico na ilha de Santa Maria, agora, no momento da votação de um projecto de resolução, subscrito por todas as bancadas, que vai exactamente nesse sentido, procure, através de uma proposta de alteração, esvaziar o sentido dos compromissos públicos assumidos.
É evidente que esta posição do PSD viola os compromissos e as palavras...
Protestos do Deputado do PSD Silva Marques.
Sr. Deputado Silva Marques esteve nos Açores? Conhece o problema?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Obviamente que sim! O Orador: - Então, conte-nos o que se passa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Isso queria o senhor! Ficava a saber tanto quanto eu!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, faça o favor de continuar a sua intervenção.
O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
É bom que o que se passou em torno deste projecto de resolução, de ontem para hoje, fique registado no Diário da Assembleia da República: o Grupo Parlamentar do PSD pôs em causa a própria autonomia de funcionamento da Assembleia e eu diria que teve orientações...
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Orientações? Onde é que leu isso? Nos jornais?
O Orador: - ... para votar contra este projecto.
Hoje mesmo, de manhã, foi-nos garantido que havia uma solução consensual no âmbito da maioria, do Governo, para aprovar este projecto de resolução. Chegamos ao fim da tarde e, afinal, a posição adoptada é outra, implicando a substituição do texto - que afirmava taxativamente que, no quadro dos compromissos publicamente assumidos, a opinião da Assembleia da República era no sentido de que o Centro de Controlo Oceânico deveria manter-se nos Açores - por outro que adia, para uma reunião de Comissão com a presença dos responsáveis do Governo e da ANA, uma eventual nova votação sobre esta questão.
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Sr. Presidente e Srs. Deputados, entendemos que, desta forma, não se honra a palavra dada, com a consequente inversão de todos os compromissos assumidos em Santa Maria, nos Açores, e na Assembleia da República. Isto é completamente inaceitável porque está em causa o próprio prestígio e a palavra da Assembleia da República dada na Região Autónoma dos Açores e inscrita no relatório que entregámos ao Sr. Presidente da Assembleia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, ser-lhe-á dada a palavra no final do debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Martins Goulart.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São momentos como estes que lançam o descrédito nas instituições democráticas.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Muito bem!
O Orador: - E lamento ter de dizê-lo de uma forma tão clara.
De que forma o cidadão comum, perante um compromisso assumido por esta Assembleia através de uma delegação que, depois de ter trabalhado sobre esta matéria incessantemente e de se sentir suficientemente esclarecida sobre as questões que estão em votação, perante esses compromissos, muda radicalmente de posição e tem um comportamento inexplicável para com aqueles que têm de servir a todo o momento, para com o povo português?
A Assembleia da República não pode estar à mercê de qualquer conjuntura. É um órgão soberano e tem de tomar as suas decisões sem ser sob pressão ou sob chantagem do Governo da República.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Como não vamos ouvir um Governo que quer exercer chantagem sobre este órgão de soberania, é totalmente inaceitável para o PS admitir a proposta de alteração que recomenda que esta Assembleia, num acto de vassalagem, se dirija a um Ministro para dele receber qualquer tipo de instrução.
Da parte do Partido Socialista, estamos esclarecidos: queremos votar, como já votámos, na generalidade, o projecto de resolução e a proposta de emenda que o PSD apresenta, ao contrariar e desvirtuar a votação já realizada, só vem lançar o descrédito sobre a nossa instituição parlamentar.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Partido Socialista não pactua com o desprestígio da instituição parlamentar e, por essa razão, votará contra a proposta de emenda do PSD e abster-se-á na votação final global, por uma questão de respeito pela instituição parlamentar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando estivemos na câmara municipal da ilha de Santa Maria, o Sr. Presidente da Comissão de Petições, Deputado Luís Pais de Sousa, invocou expressamente os termos desta resolução e não quaisquer outros, tendo prometido, em nome do PSD e da delegação que fez essa visita, que esta proposta seria votada favoravelmente aqui, na Assembleia da República, porque se tratava de uma petição, subscrita por todos os grupos parlamentares após uma vasta negociação para se chegar a um texto comum, e que não faltariam os votos do PSD para este projecto de resolução que aqui está e não para qualquer outro.
Ora, sucede que ontem, durante o debate, não foi apresentada pelo PSD qualquer intenção de modificar este projecto, não foi sugerido qualquer caminho para que este texto que aqui tenho viesse a ser contraditado hoje, no momento da votação. O Sr. Deputado Mário Maciel não disse uma única palavra na sua intervenção que pudesse levar à conclusão de que o partido que representava no alto da tribuna ia modificar ou ia sugerir qualquer alteração a este projecto de resolução.
A única coisa que soubemos, hoje de manhã, foi que, em vez da palavra «deliberar, o PSD gostaria que ficasse a palavra «recomendar», apenas porque a Assembleia da República não pode deliberar nada que diga respeito unicamente à competência do Governo. Como tal, o PSD tinha chegado à conclusão - e pediu o nosso assentimento para isso - de que em vez da palavra «deliberar deveríamos escrever a palavra «recomendar». Respondemos que sim, que se era por causa da substituição da palavra «deliberar» por «recomendar» devido à implicação que teria com a competência própria do Governo, pela nossa parte, estávamos de acordo.
Hoje, uma hora antes da votação, começou a circular um papel a dizer que este novo texto, agora apresentado pelo PSD sob a forma de proposta de alteração, era o único que o Governo aceitava. Ora, nós não vamos aceitar o que o Governo quer que a Assembleia vote. Queremos cumprir a nossa palavra, queremos votar o texto que, na Câmara Municipal de Vila Porto, tínhamos prometido que iríamos votar. Vamos manter-nos firmes na nossa palavra, vamos manter firme o nosso compromisso tomado nos Açores e tomado aqui, ontem, na tribuna parlamentar. Por isso mesmo, vamos votar contra a proposta que considero de substituição e não de alteração relativamente ao projecto de resolução.
Por mim, não vejo como é que um mesmo partido pode votar na generalidade um projecto de resolução, como fez, e, depois, em sede de especialidade, votar um texto completamente oposto àquele que tinha votado na generalidade. Mas estas cambalhotas são próprias do PSD...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nós não vamos tomar parte nesta «dança do ventre»; a «dança do ventre» e as contorções ficam para quem as pratica.
Vamos votar contra, sabendo perfeitamente que o povo da ilha de Santa Maria, pelo facto de ter votado socialista
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nas eleições autárquicas, está a pagar o seu voto com esta solução que agora foi apresentada, porque se tivessem votado PSD, certamente teriam outro tratamento!
(O Orador reviu.)
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Luís Pais de Sousa, fez sinal à Mesa para que efeito?
O Sr. Luís Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, como foi invocado o meu nome, gostaria de usar da palavra no final.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por duas vezes, este Plenário da Assembleia da República teve a possibilidade de reflectir sobre a premente questão, que tem relevância nacional, da localização do Centro de Controlo Oceânico na ilha de Santa Maria. Fê-lo através de uma petição e o projecto de resolução que ontem discutimos é uma decorrência política dessa petição.
Em ambas as ocasiões, a minha bancada teve uma voz clara na tribuna da Assembleia da República: foi a voz de um açoreano, foi a voz de um insular que sente esse problema, que o conhece e que considera justa e devida a localização do referido centro de controlo na ilha de Santa Maria. Por isso mesmo, o meu grupo parlamentar orgulha-se de indicar para falarem dos assuntos as pessoas que os conhecem e sentem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Governo, por razões que desconheço, nunca esteve presente nesses debates, quer no da petição quer, ontem, no do projecto de resolução. Ora, o Grupo Parlamentar do PSD, ao votar, na generalidade, este projecto de resolução, reconhece a importância deste assunto e entende que devem existir mais possibilidades de repetir a argumentação que, por duas vezes, já aqui trouxemos.
Essa argumentação tem uma resultante que me parece clara: a de que a questão não está localizada na ilha de Santa Maria, tem relevância nacional e deve ser discutida nas vertentes técnica, política, económica e social com a entidade que pode decidir sobre isso, isto é, o Governo da República.
Vozes do PSD: - Claro!
O Orador: - Por isso mesmo, entendemos repetir argumentos, fazer diligências, trazer raciocínios, sensibilidades locais e regionais, mas sem perder de vista, também, o interesse nacional. E queremo-lo fazer na Comissão especializada.
A nossa proposta possibilita, por disponibilidade do Governo e na sequência do debate de ontem, mais diálogo; mais debate e mais possibilidade de esses argumentos serem ditos à frente do Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, pela minha parte, essa argumentação será novamente aduzida, queremos ouvir também esse importante agente parlamentar que é o Governo da República e confrontar argumentos É o que vamos fazer na Comissão especializada.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr Presidente, de acordo com o artigo 157.º do Regimento, a discussão na generalidade versa sobre os princípios e o sistema de cada projecto ou proposta de lei.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Foi o caso!
O Orador: - E, no n.º 2 do mesmo artigo, refere-se que a votação na generalidade versa sobre cada projecto ou proposta de lei.
Não estamos perante um projecto de lei mas, sim, perante um projecto de resolução; porém, como já aqui foi chamado à colação, naturalmente que terão de se aplicar, por analogia, os princípios do processo legislativo.
Pergunto, então: qual é o entendimento da Mesa sobre a relação entre a discussão e votação na generalidade, seja qual for o sentido que ela tenha - e aqui teve um sentido, que foi a aprovação unânime -, em projectos, propostas de lei ou resoluções que contenham apenas um artigo ou uma parte dispositiva e, designadamente, quando sejam apresentadas propostas de alteração ou de substituição que contradigam os princípios que foram aprovados na generalidade? Era esta a questão que queria colocar a V. Ex.ª.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr Deputado José Vera Jardim, não posso deixar de dizer-lhe que é uma boa questão, como normalmente o são as questões colocadas por V. Ex.ª. Porém, este debate não é na generalidade mas, sim, na especialidade e, por isso, o artigo que se aplica é o 158.º e não o 157.º É que o diploma já foi aprovado na generalidade e, neste momento, estamos a fazer o debate na especialidade. Portanto, mesmo que o argumento que V. Ex.ª apresentou fosse bom - e, em meu entendimento, não é -, ele não era oportuno, porque o momento para colocá-lo tinha sido antes da votação na generalidade, que já teve lugar.
É evidente que respeito a opinião de V. Ex.ª, mas, neste momento, o Plenário tem todo o direito de, em sede de especialidade, discutir as propostas de alteração. O Plenário, estando reunido, é soberano para fazê-lo e não e a Mesa que pode retirar essa vontade soberana ao Plenário. Ora, foi isso o que se passou, havendo um debate na especialidade e não na generalidade.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, as intervenções, quer do Sr. Deputado Lino de Carvalho, quer do Sr. Deputado Martins Goulart, quer do Sr. Deputado Narana Coissoró, ofenderam gravemente a consideração
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e a honra da bancada do PSD. E fizeram-no por uma confusão, que não é lícito fazer-se aqui.
Desde já, quero dizer que a população da ilha de Santa Mana merece demasiado respeito ao PSD para que esta questão tenha, para ele, um objectivo político-partidário, isto é, seja passível de um aproveitamento político-partidário. O PSD recusa-se a fazer um aproveitamento político-partidário de uma questão que considera fundamental para as populações da ilha de Santa Maria.
Não estamos interessados no voto fácil e rápido, aparecendo perante a opinião pública como sendo de adesão a uma solução que só aparentemente será favorável à população da ilha de Santa Maria. No que estamos interessados, isso sim, é que o Governo assegure uma solução que satisfaça os interesses da população da ilha de Santa Maria.
Vozes do PCP: - Então?!
O Sr. Nuno Delerue (PSD): - Calma!
O Orador: - E porque estamos interessados nessa solução, entendemos introduzir esta proposta de alteração, de modo a que a Assembleia da República possa ouvir aqui o Ministro da tutela e o Conselho de Administração da ANA-EP e possa sensibilizar essas entidades, com aquilo que recolheu na ilha Santa Maria, para a pretensão legítima das populações e das autoridades daquela ilha, no sentido de que o Centro de Controlo Oceânico lá se mantenha.
Esta é uma questão que tem não apenas a dimensão regional da ilha de Santa Maria, pois, na sua dimensão e estatura, é igualmente nacional, tendo também vertentes de interligações internacionais em que a gestão deste espaço aéreo se contém, pelo que devemos conciliá-los.
O esforço do Grupo Parlamentar do PSD e a razão desta proposta vão no sentido de ver se é possível ao Governo e à ANA - EP conciliar esses compromissos, interesses e questões internacionais que aqui se colocam com a pretensão legítima, repito, da população da ilha de Santa Maria, de o Centro de Controlo Oceânico ser ali mantido.
Assim, recusámos o voto fácil e rápido de um projecto de resolução, que não tinha em conta a ponderação desta possibilidade de diálogo da Assembleia da República com o Governo, de forma a que, para além de uma simples votação que a todos agrade, se consiga aquilo que é mais importante, ou seja, a solução concreta do problema a contento da população da ilha de Santa Maria.
Por outro lado, estamos satisfeitos por ter «apanhado pancada» aqui de todos os grupos parlamentares devido a esta pretensão mais profunda, que é a da resolução efectiva do problema e não a da exibição fácil de uma solução concordante mas não eficiente e conclusiva desta questão.
E porquê este espírito, no Grupo Parlamentar do PSD? VV. Ex.ªs ofenderam gravemente a minha bancada quando disseram expressamente que fazíamos as coisas por pressão do Governo, sem autonomia e pondo em causa o próprio sentido institucional da Assembleia da República, que a leva e deve continuar a levar a ter em conta as soluções mais adequadas para os problemas nacionais. E o problema da ilha de Santa Maria, para nós, é nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - O Sr. Deputado Guilherme Silva considerou que tinham sido proferidas expressões ofensivas da sua honra ou consideração pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho, Martins Goulart e Narana Coissoró, pelo que vou dar a palavra a estes Srs. Deputados, pela ordem que enunciei, para darem explicações. Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, o PSD faz o mal e a caramunha!
A verdade é que os senhores, ao longo destes meses, não tiveram quaisquer dúvidas sobre este processo. Defenderam aqui, durante o debate da petição, com vasta argumentação, a necessidade de manutenção do Centro de Controlo Oceânico de Santa Maria; defenderam-na também na Região Autónoma dos Açores, onde assinaram uma petição que foi subscrita por todos os partidos políticos, pela população e pelos órgãos institucionais da região, não expressando qualquer dúvida, e ainda ontem, aqui, pela voz do Sr. Deputado Mário Maciel, fizeram uma intervenção em que também não manifestaram dúvidas. De repente, são assaltados por elas e é necessário repetir o processo desde o início para resolver as dúvidas que, de ontem para hoje, começaram a ter.
Sr. Deputado, é «gato escondido com rabo de fora»!
O que acontece é que os senhores, contrariamente ao discurso que têm tido para açoreano consumir, sabem que o Governo e a ANA já decidiram transferir o Centro de Controlo Oceânico para Lisboa. Porém, como são incapazes de assumir com coragem essa decisão do Governo face às populações, nos Açores, perante elas, tomam uma posição e aqui, na Assembleia da República, são cúmplices de atitudes centralistas e contra a autonomia que o Governo e o PSD tomam. Esta é que é a questão!
O que se está a passar aqui é a prova da total governamentalização desta Assembleia pelo Governo, que nem permite que os Deputados do PSD, como maioria, tenham autonomia suficiente para lhe fazer uma simples recomendação no sentido de que o Centro de Controlo Oceânico se mantenha em Santa Maria.
Srs. Deputados, se mais prova faltasse para aquilo que é a total governamentalização da Assembleia da República e para o que é a vossa cedência a pressões externas aos interesses das populações, o exemplo de hoje era suficiente e bastava para o demonstrar.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os senhores, na Região Autónoma dos Açores, como na da Madeira, têm um discurso pró-autonómico. Os Deputados do PSD das regiões autónomas até assumem posições de aparente oposição ao Governo do PSD, e procuram usufruir os benefícios políticos dessa posição, mas, depois, aqui, são os senhores que, com o vosso Governo e o vosso partido, tomam as posições que mais põem em causa a autonomia que lá fora, para açoreano consumir, dizem defender!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É preciso que este exemplo de hoje seja conhecido pelas populações do País e, em particular, pelas da Região Autónoma dos Açores, para que fique claramente demonstrado que, ao contrário daquilo que afirmam, os senhores não são a favor da autonomia nem da descentralização, como se provou com o discurso do Sr. Primeiro-Ministro contra a regionalização, não são a favor de um desenvolvimento equilibrado do País, mas são a favor da mais clara política centralista, como esta discussão aqui, hoje, demonstra.
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Sr. Deputado, pela nossa parte, votaremos em consonância com os compromissos que assumimos e com a nossa consciência
O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem'
O Orador: - Os argumentos económicos, sociais, técnicos e políticos aqui aduzidos, inclusivamente por VV. Ex.ªs, são mais do que suficientes para demonstrar que a Assembleia está em condições de votar uma recomendação ao Governo, no sentido de que o Centro de Controlo Oceânico fique em Santa Maria. Se o Governo entendi que não deve ficar e manter a decisão que já tomou, isto é, transferi-lo para Lisboa, no quadro dessa política centralista, é o Governo que deve assumir a responsabilidade. Mas os senhores não são capazes de ter essa posição autónoma Com a vossa atitude, estão a reforçar a imagem de desprestígio desta Assembleia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Martins Goulart.
O Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O problema aqui em discussão não foi identificado ontem. Esta questão está a ser tratada há mais de uma década, a todos os níveis do poder político nacional, regional e até local. Os autarcas de Santa Mana e os Deputados regionais que estão a assistir a esta sessão e que aqui estiveram ontem conhecem já todos os argumentos, todos os problemas técnicos e toda a falácia utilizada pelo Governo e pela ANA no sentido de tornar irreversível uma decisão que vai contra os interesses regional e nacional. Por isso, o PS reafirma aqui, mais uma vez, que a recomendação que o PSD quer introduzir através da sua proposta de alteração tem um único objectivo: pôr fim do processo e entregar à ANA a decisão final - que já está tomada -, tornando irreversível a transferência do Centro de Controlo Oceânico de Santa Maria para Lisboa.
O PS não alinha numa situação de equívocos, porque os 10 anos que decorreram sobre o debate mais intenso em relação a esta matéria foram suficientes para todo' o esclarecimento relativamente a esta questão. Estamos perfeitamente esclarecidos, não precisamos de qualquer audição com o Sr. Ministro da tutela, não precisamos de ouvir a ANA-EP, temos simplesmente de afirmar a nossa vontade política e resolver um problema que, obviamente, está viciado e que esta Assembleia poderia solucionar, resolvendo o vício e devolvendo prestígio a esta instituição parlamentar que tanto dele carece, pois circunstâncias como esta só provocam o seu desprestígio.
Termino, Sr. Presidente, informando que o PS foi até ao limite, nesta hora final e dramática, para que fosse perfilada uma votação aceitável, chegando a admitir que a votar cão deste projecto de resolução não se fizesse hoje. Aceitando, em parte, a proposta do PSD, admitimos que fosse suspensa a sua votação, para que fizéssemos a diligência de dialogar com o Governo e com a ANA-EP e para que, depois dessa diligência, se retomasse o projecto de resolução subscrito por todas as bancadas parlamentares e, caso se tivessem verificado novos apports para a decisão final desta Assembleia, por consenso - e esta foi a posição final do PS -, admitiríamos alterar o projecto de resolução.
Fomos ao limite de aceitar um adiamento da votação, para que se promovessem as diligências que o PSD deseja ainda promover, mas no contexto de não ser desvirtuado o projecto de resolução, que foi também subscrito por Deputados do PSD. Estranhamente, esta abertura, esta saída, que seria ainda digna para a Assembleia da República, não foi aceite pelo PSD, o que nos leva a concluir, infelizmente, que Santa Mana perdeu hoje, aqui, o Centro de Controlo Oceânico pela mão do PSD e que, por isso, hoje é um dia de luto para Santa Mana.
Aplausos do PS.
O Sr. Jaime Gama (PS) - Sr Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, tanto quanto sei, esta proposta de resolução terá nascido de uma visita que uma delegação da Assembleia da República fez à Região Autónoma dos Açores, presidida, aliás de forma brilhante, por V. Ex.ª, durante uma parte do seu trajecto - não sei até se V. Ex.ª não estará associado à inspiração de uma parte desta proposta de resolução.
Seja como for, e é essa a consideração que queria produzir a V. Ex.ª relativamente à orientação dos nossos trabalhos e também sugerir à bancada do PSD, a Assembleia da República votou, na generalidade, um texto proposto por todas as bancadas, nomeadamente pelo PSD, que é claro no seu conteúdo. Essa votação está feita.
Assim, neste momento, não vejo outra alternativa para que este processo seja lógica e regimentalmente claro que não seja a de o PSD converter a sua proposta de alteração numa proposta de aditamento que vise aprofundar o debate sobre esta matéria, não fazendo precludir a votação da Assembleia da República mas em seu complemento. E, mais do que isso, que vá um pouco mais longe.
Se o PSD quer abrir um processo de consultas com o Governo da República e com a ANA - EP, na parte respeitante ao sector de navegação aérea, pois bem que esse processo de consulta subsequente também seja aberto aos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores, conforme, aliás, manda a Constituição em relação a toda a matéria apreciada nesta Assembleia e que tenha incidência ou interesse regional.
Portanto, o que eu, sob a forma de interpelação à Mesa, sugiro a V. Ex.ª é que a resolução que foi votada fique como está, que o PSD reconverta a sua proposta de alteração em aditamento, na parte substantiva respeitante à consulta governamental, e, porque nós conhecemos a consideração que a temática das autonomias constitucionais sempre merece ao PSD, que considere também aditar um processo de consulta idêntico aos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores sobre esta matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr Deputado Jaime Gama, não posso deixar de responder às interpelações que acabou de fazer à Mesa e digo interpelações porque fez duas, uma pessoal, ao Deputado Correia Afonso e outra ao Presidente em exercício. Não vou fugir de responder às duas.
Estive, efectivamente, a chefiar esta delegação, embora, com muito desgosto, não lenha estado em Santa Mana, e não fujo à resposta à sua pergunta, pois estou de acordo com a moção que foi aprovada.
Aplausos do PS e do CDS-PP.
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Mas também não posso deixar de responder à outra interpelação. Por um lado, sou um Deputado soberano da minha vontade e posso, portanto, exprimir a minha vontade. Por outro, sou apenas um mero Presidente em exercício, que conduz os trabalhos mas não comanda as votações. Nesse sentido, a resposta à sua segunda interpelação, no sentido de transformar uma proposta de alteração numa proposta de aditamento, não é comigo e terá que ser, naturalmente, com o Grupo Parlamentar do PSD que, tal como eu, ouviu a sua interpelação.
Srs. Deputados, vamos continuar os nossos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva: V. Ex.ª sabe perfeitamente que aquilo que eu disse não tem absolutamente nada de ofensivo nem a si nem ao seu partido pois retractei a verdade. A única coisa é que V. Ex.ª se sente mal perante as actas da Assembleia da República, porque o que os leitores vão ver é exactamente o que o PSD disse ontem aqui da tribuna e o que é que faz hoje. E V. Ex.ª tem que dar explicações não a mim, nem eu a si, mas sim à história, ao povo de Santa Mana, às actas da Assembleia da República. O seu problema é esse.
Portanto, eu não tenho que lhe dar explicações nenhumas, mas há uma coisa para que lhe chamo a atenção. A sugestão que acaba de ser feita pelo Partido Socialista, pela voz do seu líder, quadra perfeitamente na intervenção do Deputado Mário Maciel feita hoje aqui. E o que é que o Deputado Mário Maciel nos disse? Nós não queremos contradizer, nós não temos nada a contradizer àquilo que votámos na generalidade, nós queremos aprofundar mais o processo, queremos ir mais além do que aquilo que votámos na generalidade e, por isso mesmo, para ir mais além a única maneira que temos...
A não ser que estejam outra vez a fazer contorcionismos, outra vez a dar golpes de rins e dizer «não, não, aquilo que nós dissemos não é verdade, aquilo que dissemos foi para empatar tempo, para anestesiar a proposta na generalidade»...
Mas não é essa a conclusão lógica das suas palavras? Transformar a alteração em aditamento porque, das duas uma: ou V. Ex.ª nega o que disse ao votar na generalidade, substituindo-o por uma coisa contrária, ou mantém a sua palavra e diz «isto é para aprofundar mais aquilo que votámos na generalidade», e, então, não lhe resta outro caminho senão aceitar a proposta de aditamento. Ou, então, não aceitam a proposta como de aditamento e contradizem-se nos dois votos!
Portanto, fazemos nossa a proposta apresentada pelo PS, porque assim chegamos a um consenso e votaremos a favor da vossa proposta, se ela for de aditamento Deste modo, contem connosco! Houve unanimidade nesta Casa sobre a votação na generalidade, poderá havê-la também sobre a proposta de aditamento e, por consenso, votamos por unanimidade tudo quanto o PSD quer.
(O Orador reviu.)
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra, Sr Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, foram postas várias questões, quer pelo Sr. Deputado Jaime Gama quer pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, mas parece-me que algumas delas ficam por responder, designadamente, a proposta do Sr. Deputado Narana Coissoró, no sentido de se transformar esta proposta de alteração numa proposta de aditamento.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - A proposta é do PS!
O Orador: - Isso é certo, mas há uma segunda parte que é sua, no sentido de, como proposta de aditamento,...
O Sr. Presidente (Correia Afonso). - O Sr. Deputado está a pôr o problema à Mesa?!
O Orador: - Não sei qual e a posição dos demais partidos sobre isso.
Se houver abertura para que se vote, com o mesmo consenso que se votou na generalidade a proposta inicial, alterando esta proposta para proposta de aditamento, o PSD dá a sua anuência à solução proposta pelo PS.
Vozes do PSD: - Muito bem'
O Sr. Presidente (Correia Afonso) - O Sr Deputado Jaime Gama pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr Presidente, podemos passar à votação!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Antes disso, terei de dar a palavra aos Srs. Deputados Lino de Carvalho e Luís Pais de Sousa, que oportunamente se inscreveram.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, gostaria, sob a forma de interpelação à Mesa, de esclarecer o Sr. Deputado Guilherme Silva, uma vez que ele se dirigiu a todas as bancadas.
Portanto, se a posição da bancada do PSD for no sentido de votar o projecto de resolução em votação final global tal como ele está mais o aditamento, damos o nosso voto favorável.
O Sr. Presidente: - Para defesa da honra e da consideração da bancada do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pais de Sousa.
O Sr. Leis Pais de Sousa (PSD): - Sr Presidente, Srs. Deputados: Não usaria da palavra se, de facto, não tivesse sido referido pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, embora numa base que, penso, não teve nada de intencional De qualquer forma, gostaria de deixar expresso, perante a Câmara e perante os Srs. Deputados, que a nossa posição pessoal, ao tempo, nos Açores, é rigorosamente a mesma de hoje. E tanto assim foi que, desde que a petição deu entrada na 2.ª Comissão até ao dia de hoje, sempre nos batemos quer pela celeridade quer pela bondade dos objectivos que lhe estavam subjacentes.
No entanto, creiam, Srs. Deputados, que, do nosso ponto de vista, não há colisão entre o que o PSD propõe e o texto do projecto de resolução que, entretanto, já foi votado na generalidade.
Gostaria também que, quando alguns vêem, da parte do Grupo Parlamentar do PSD, subalternidade em relação ao Executivo, compreendessem que há um princípio elementar de interdependência entre órgãos de soberania.
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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Se não quiserem ver por esta perspectiva, gostaria que, por vezes, se revissem na Constituição, porque, frequentemente, é isso que se pretende para o bom funcionamento das instituições democráticas.
Finalmente, congratulo-me com a aproximação a que se chegou nos minutos que antecederam esta nossa intervenção e faço um apelo para que se respeitem as populações da ilha de Santa Maria e seus representantes e para que todos saibamos resistir a uma coisa tremenda que, por vezes, nos assalta e que é, em política, porventura legítima, o tentar instrumentalizar processos que não o merecer. Portanto, deixo este apelo e congratulo-me com a aproximação a que, entretanto, os grupos parlamentares, e os Srs. Deputados souberam chegar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Segundo julguei ouvir, o Sr. Deputado exerceu o seu direito de defesa em relação a uma expressão usada pelo Sr. Deputado Narana Coissoró.
Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Pais de Sousa, V. Ex.ª sabe perfeitamente que não o referi pessoalmente mas na sua qualidade de Presidente da Comissão de Petições.
Porém, já que invoca a interdependência entre o Governo e a maioria parlamentar, lamento que não tenha feito parte da nossa delegação, pelo menos, um subsecretário de Estado adjunto porque, dessa forma, tomaria parta no processo um verdadeiro agente parlamentar oculto porá resolver essas questões.
(O Orador reviu.)
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, julgo que nasceu um consenso a respeito de uma forma processual, isto é, que esta proposta de alteração seja reclassificada como proposta de aditamento. Mas não basta reclassificá-la, é preciso dar-lhe o devido sentido Assim, pedia às bancadas que ajudassem a Mesa no sentido de dizer forma como aditamento àquilo que foi apresentado. Não podemos classificar uma coisa que depois possa ter qualquer sentido menos coerente. Portanto, se estivessem de acordo..
O Sr Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É sobre este assunto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso). - Nesse caso, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, penso que, ficando expresso que os subscritores da proposta alteram a sua designação de alteração para aditamento, e isso constará da acta, os serviços depois farão essa correcção sem necessidade de estarmos a atrasar os trabalhos em termos de formalizar nova proposta e fazê-la entregar na Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Gostaria de ouvir todas as bancadas neste sentido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, reteríamos a proposta de resolução tal como está e já foi votada; a parte útil desta proposta de alteração passaria a proposta de aditamento, onde se diria «para o efeito, decide a Assembleia, em desenvolvimento do que atrás fica dito, ouvir o Ministro da tutela e promover as demais diligências», e eu admitiria que se incluísse aqui também uma audição aos órgãos de governo próprio da região, na medida em que isso é constitucional e ficaria mais correcto.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, neste momento, não é a forma de redacção que me interessa mas o conteúdo e a sua coerência. É nesse sentido que estou a ouvir as bancadas.
Tem a palavra o Sr Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP). - Sr. Presidente, há pouco, já dissemos que aceitamos que isto se inclua como proposta de aditamento. Há que fazer agora os ajustamentos de redacção, para que não se anule o sentido do que está formulado anteriormente.
Por outro lado, consideramos ainda que nas demais diligências se podem incluir não só os órgãos próprios das regiões autónomas mas também outros órgãos - inclusive técnicos - que possam vir a carrear elementos para esta questão.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Narana Coissoró, é também opinião do CDS-PP que estes dois textos podem acumular-se coerentemente?
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP)- - Obviamente que sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Muito obrigado. Assim será feito.
Srs. Deputados, se iodos estiverem de acordo, votaremos, na especialidade, os dois textos sequentemente, primeiro o inicial e depois o segundo, como aditamento
Srs. Deputados, vamos votar, na especialidade, o projecto de resolução n.º 123/VI.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, vamos votar a proposta de aditamento há pouco mencionada.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto conjunto.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Aplausos gerais, de pé.
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Srs. Deputados, antes de passar à votação seguinte, quero felicitar a Câmara, pois julgo que, apesar das dificuldades por que passámos, acabou por ser dado um bom exemplo do que é trabalhar, na Assembleia, em conjunto.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 73/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo Europeu que Cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados membros, por um lado, e a República da Bulgária, por outro, e respectivos Protocolos e Anexos, bem como a Acta Final com as Declarações.
Submetida à votação foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e a abstenção do PCP.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 70/VI - Aprova, para adesão, as Emendas ao artigo 17 º e ao artigo 18 º da Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 71/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo de Cooperação e de União Aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a República de São Marinho, respectivos anexos e declarações.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Sr. Deputados, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 75/VI - Aprova, para ratificação, a Constituição e a Convenção da União Internacional de Telecomunicações e o Protocolo Facultativo sobre a Resolução Obrigatória de Litígios Relativos à Constituição da União Internacional das Telecomunicações, à Convenção da União Internacional das Telecomunicações e os Regulamentos Administrativos.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Passamos à votação da proposta de resolução n.º 76/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT).
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Vamos votar agora a proposta de resolução n.º 77/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo relativo aos Privilégios, Isenções e Imunidades da Organização Internacional de Telecomunicações por Satélite (INTELSAT).
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Vamos proceder agora à votação da proposta de resolução n.º 78/VI - Aprova, para adesão, o Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos (EUMETSAT).
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausência, de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 104/VI - Autoriza o Governo a aprovar os novos Estatutos da Casa do Douro.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS e do PCP.
Vamos passar agora à votação, na especialidade, do texto final desta mesma proposta de lei elaborado pela Comissão de Agricultura e Mar.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. António Martinho (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr Presidente, há pormenores de votação que já foram acordados entre os grupos parlamentares, no sentido de que houvesse apenas uma votação final global agora.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, temos de seguir o Regimento. Foi feita a votação na generalidade, vamos fazer agora a votação na especialidade e, depois, a votação final global. Não tenho conhecimento de qualquer acordo a esse respeito.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr Presidente, penso que a proposta de lei foi votada na generalidade quando foi discutida.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Não foi, não!
O Orador: - Então, baixou à comissão sem votação?
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Há um requerimento, na Mesa...
O Orador: - Assim sendo, está correcta a posição do Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tenho a impressão de que a Mesa está a adoptar um procedimento correcto, embora, por vezes, tenha dúvidas. A proposta de lei baixou à comissão sem votação; votámos na generalidade e temos um texto...
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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, se se trata de votação na especialidade, como é que vamos votar? São três artigos. Vamos votar artigo a artigo?
O Sr Presidente (Correia Afonso). - Se ninguém requerer que se vote artigo a artigo, votamos em conjunto.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos, então, votar, na especialidade, o texto final elaborado pela Comissão de Agricultura e Mar relativo à proposta de lei n.º 104/VI.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos d favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS e da PCP.
É o seguinte.
(Objecto)
Artigo 1.º
Fica o Governo autorizado a aprovar os novos Estatutos da Casa do Douro.
Artigo 2.º
O sentido e a extensão da autorização legislativa Objecto da presente lei são os seguintes:
a) Os Estatutos da Casa do Douro, a aprovar ao abrigo da presente autorização legislativa, manterão a natureza de associação pública desta, atribuindo-lhe a prossecução dos interesses dos vitivinicultores e das adegas cooperativas da Região Demarcada do Douro;
b) Deixarão de ser competências da Casa do Douro a disciplina e o controlo da produção dó vinho generoso do Porto, bem como a disciplina e o controlo da produção e da comercialização e a certificação dos restantes vinhos de qualidade produzidos naquela região, podendo, contudo, transitoriamente, e por um período não superior a 5 anos, manter as referidas competências relativamente a estes últimos;
c) A Casa do Douro manterá a natureza de associação de todos os vitivinicultores da Região Demarcada do Douro, cuja inscrição continuará obrigatória, indicando, como tal. os seus representantes, bem como os das Adegas Cooperativas e Associações de produtores ou produtores engarrafadores, com base nas propostas feitas pelas respectivas estruturas representativas, no Conselho Geral da Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro, a constituir no âmbito da alteração do modelo de gestão institucional da região, mantendo, no entanto, as das actuais competências até ao início do mandato dó Conselho Geral da Comissão Interprofissional, o que deverá suceder durante os dezoito meses subsequentes à publicação do diploma que a constitua;
d) A Casa do Douro manterá os benefícios fiscais que lhe eram conferidos pelo anterior estatuto, incluindo a isenção do pagamento de Contribuição Autárquica relativa aos imóveis afectos ao prosseguimento das suas atribuições;
e) Dos Estatutos da Casa do Douro constará o regulamento eleitoral da Casa do Douro, que deve prever um sistema de representação proporcional dos seus associados, respeitando a real representação destes.
Artigo 3.º
(Duração)
A presente autorização vigora pelo prazo de 90 dias.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 104/VI.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS e do PCP.
O Sr. José Costa Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso). - Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. José Costa Leite (PSD): - Sr. Presidente, pretendo informar a Mesa de que iremos apresentar uma declaração de voto.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Fica registado, Sr. Deputado.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para, em nome da minha bancada, fazer uma declaração de voto, independentemente de, depois, fazer a sua entrega na Mesa.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra. Sr. Deputado.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que, durante o processo de votações, hoje efectuado, foi possível, numa votação relativa à Região Autónoma dos Açores, concitar consenso e conseguir unanimidade numa questão que tinha a ver com problemas sociais de uma região autónoma. Lamentavelmente, não tem sido possível obter o mesmo consenso em questões fundamentais relativas a regiões debilitadas do País, concretamente a regiões do interior.
O Grupo Parlamentar do PS votou contra a proposta de lei n.º 104/VI porque, no seu articulado, não estão salvaguardados os princípios por nós defendidos para qualquer alteração jurídico-constitucional da Região Demarcada do Douro.
Efectivamente, consideramos que deve ser tida em conta a este nível a unidade da região, a autonomia dos organismos representativos dos durienses e dos lavradores e a auto-regulação, integrando neste princípio a criação da comissão interprofissional, e a presença do Estado não deve ir além de uma posição arbitrai, de garantia e de promoção dos vinhos da região.
Ora, a proposta de lei fere estes princípios. Por isso, o PS apresentou propostas alternativas que têm por base tais princípios.
Na verdade, a proposta de lei não prevê a manutenção na Casa do Douro, como organização representativa da
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lavoura, de atribuições que são imprescindíveis ao cabal desempenho do seu papel. Recordo, a título de exemplo, competências como a do cadastro vitícola e a do escoamento dos vinhos não comercializados, assim como a do controlo dos depósitos da conta-produtor.
Há ainda a considerar que a figura de associação pública atribuída à Casa do Douro, em substituição da natureza colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, não pode merecer a nossa anuência. Em nosso entender, uma e outra não são a mesma coisa.
O Grupo Parlamentar do PS não pode permitir que se debilite o sector já mais debilitado da região, o sector da lavoura.
Por outro lado, Srs. Deputados, não pode concluir-se que haja por parte do Governo uma vontade clara de conseguir soluções plausíveis para a região através do consenso generalizado entre as partes. O processo seguido e o calendário executado demonstram isso mesmo.
Votámos ainda contra porque não são devidamente salvaguardados os direitos e regalias do estatuto profissional dos trabalhadores da Casa do Douro, nomeadamente a sua eventual passagem à situação de aposentação.
Mas os problemas do Douro não se resolvem unicamente com uma alteração jurídico-institucional e muito menos com esta.
O Grupo Parlamentar do PS continua a preconizar, para o Douro, uma intervenção integrada que perspective uma solução global para a região.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Costa Leite.
O Sr. José Costa Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Região Demarcada do Douro contém em si um património valiosíssimo que necessita de ser salvaguardado e defendido, porque constitui, com o vinho do Porto, embaixador precioso de Portugal e elemento indispensável de riqueza para toda a região e para o todo nacional.
Preservar a identidade deste património, contribuir para um ambiente de diálogo e consenso e estabelecer as regras definidoras do crescimento tranquilo e sustentado da região é um imperativo nacional.
Por isso, a autorização legislativa, que prevê a alteração dos Estatutos da Casa do Douro, merece-nos a maior atenção e cuidado, pelos motivos expostos, mas, sobretudo, porque ela poderá condicionar o futuro de toda uma vasta região que já se candidatou, pela sua beleza ímpar, a ser património mundial.
Este cuidado e atenção foi confirmado pelas numerosas audições realizadas com várias entidades envolvidas, na Região do Douro, e que constam do relatório da Comissão de Agricultura. Estas audições permitiram-nos chegar a algumas conclusões que reputamos relevantes e que passam pelo consenso generalizado de que há a necessidade de alterar o actual quadro institucional do Douro com a criação de uma comissão interprofissional com a representação paritária da produção e comércio.
Por outro lado e atendendo à enorme pulverização da propriedade, é nossa convicção que haverá que assegurar à Casa do Douro a permanência do estatuto de «associação pública», ficando com a representação unitária da lavoura, mantendo a natureza de associação de todos os vitivinicultores da Região Demarcada do Douro, cuja inscrição continuará obrigatória.
Esta prerrogativa de «associação pública», para além da representação unitária da lavoura e da salvaguarda da representatividade real dos lavradores no acto eleitoral, vai permitir à Casa do Douro receber, por protocolo e por delegação da CIRDD, funções desta e ainda continuar como entidade responsável pelo controlo dos vinhos de denominação «Douro».
Por fim, recebemos garantias de que os direitos e regalias dos actuais trabalhadores da Casa do Douro seriam assegurados pela criação de um quadro de excepção para solucionar os problemas colocados pela reestruturação.
Neste quadro e perante estas garantias, decidimos votar a favor desta autorização legislativa, porque entendemos que este quadro legal vai ao encontro das necessidades da Região e que será um instrumento precioso na salvaguarda de um clima de paz e consenso que levará a maior desenvolvimento da Região Demarcada do Douro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Correia Afonso)- - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP)- - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se faltassem, que não faltam, razões para justificar a argumentação do PCP ao longo de todo este debate sobre o projecto do Governo do PSD de alterações institucionais à Região Demarcada do Douro e o nosso voto contra este pedido de autorização legislativa sobre os Estatutos da Casa do Douro, as notícias vindas a lume, nos últimos dias, sobre o bloqueio a que a Associação dos Exportadores do Vinho do Porto (AEVP) e o Instituto do Vinho do Porto estão a submeter a Casa do Douro, impedindo-a de fornecer os mercados com os stocks que possui de vinho generoso, criando o perigo, com esta atitude, de situações de ruptura e de aumento em flecha dos preços do vinho do Porto nos mercados nacionais e internacionais, tais notícias seriam suficientes para justificar e confirmar a nossa posição ao longo de lodo este processo.
A proposta do Governo e os projectos de estatutos, que, entretanto, nos foram remetidos, significam, na prática, o esvaziamento a curto prazo das atribuições e competências da Casa do Douro com o consequente agravamento e debilitação da situação dos produtores.
Por outro lado, a expropriação das atribuições cometidas à lavoura, através da Casa do Douro, e a sua futura transferência para um organismo, a CIRDD, sobre o qual não existem hoje quaisquer garantias de que venha a ter condições de funcionamento - e relembro que a própria Associação de Exportadores do Vinho do Porto afirmou, na audição feita pela Comissão de Agricultura e Mar durante este processo, que para ela esta nova comissão, a ser criada nos termos em que iria ser, seria «um cenário de guerra», o que confirma aquilo que acabo de dizer, e que iria para lá «com uma posição não construtiva» levará à criação de um vazio institucional na região e ao agravamento de todos os problemas da Região Demarcada do Douro.
Acresce que também não estão criadas quaisquer condições de garantia para o futuro dos trabalhadores da Casa do Douro, quanto ao seu emprego e estatuto.
Quem perde com esta proposta de autorização legislativa são os vitivinicultores durienses, é o Vinho do Porto e os outros vinhos de qualidade da região. É, em suma, o Douro e os durienses!
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Sr Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, visto não haver mais declarações de voto, dou por encerrados os trabalhos.
A nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, sexta-feira, às 10 horas, e terá como ordem do dia a discussão das ratificações n.ºs 121/VI - Decreto-Lei n.º 122/94, de 14 de Maio, que regula a fusão das empresas Telecom de Portugal, SÁ, Telefones de Lisboa e Porto, SA, e Teledifusora de Portugal, SA (PCP), 122/VI e 123/VI - Decreto-Lei n.º 168/94, de 15 de Junho, que aprova as bases da concessão da concepção, do projecto, da construção, do financiamento, da exploração e da manutenção da, nova travessia sobre o rio Tejo em Lisboa, bem como dá exploração e da manutenção da actual travessia, e atribui ao consórcio LUSOPONTE a respectiva concessão (JPCP e PS, respectivamente) e 124/VI - Decreto-Lei n.º 171/94, de 24 de Junho, que aprova o novo esquema da classificação funcionai das despesas públicas.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 20 minutos.
Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas, respectivamente, à votação do projecto de lei n.º 275/VI e da proposta de lei n.º 104/VI.
A propósito de toda a problemática relacionada com a existência e fiscalização dos bancos de dados pessoais informatizados das forças policiais e particularmente do projecto de lei n.º 275/VI, apresentado pelo PS, sobre esta matéria, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português salienta o seguinte:
A Lei de Protecção de Dados Pessoais Informatizados permite aos serviços públicos, incluindo, portanto, as forças policiais, constituir e manter bancos de dados pessoais, desde que não contenham quaisquer referências a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada ou origem étnica. Porém, tais bancos de dados, desde que contenham elementos sobre condenações em processos criminal, suspeitas de actividades ilícitas, estado de saúde e situação patrimonial e financeira dos cidadãos, só podem ser constituídos e mantidos nos termos de lei especial, com prévio parecer da CNPDPI, que não foi até ao momento publicada.
Quanto aos bancos de dados que já existam nessas condições, só poderão ser mantidos mediante autorização governamental com prévio parecer da CNPDPI, de onde se conclui que existe, neste momento, uma situação de escandalosa ilegalidade dos bancos de dados das forças policiais, não havendo qualquer controlo do seu conteúdo.
Se constitui uma evidência que nas suas funções de combate à criminalidade as forças policiais tenham a necessidade de tratar dados pessoais nos termos em que a lei o permita, o que é grave é que não esteja instituído até ao momento qualquer mecanismo de controlo do cumprimento dos limites legais na constituição desses ficheiros e de fiscalização da proibição absoluta da interconexão dos ficheiros existentes.
Por outro lado, subsiste uma situação de indefinição legal quanto às reais garantias dos cidadãos no acesso aos dados pessoais que lhes digam respeito. A Constituição a Lei n.º 10/91 estabelecem o princípio de que todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam, sem prejuízo do disposto na lei sobre segredo de Estado e segredo de justiça.
É, portanto, inequívoco que as excepções a este princípio constitucional de acesso directo dos cidadãos aos dados que lhes respeitem têm de ser rigorosamente tipificadas na lei. Assim, para além do segredo de Estado e de Justiça, encontram-se já exceptuados os bancos de dados dos Serviços de Informações da República Portuguesa e do Sistema de Informações Schengen, vigorando quanto a este último uma regra de acesso indirecto através da CNPDPI.
Quanto aos restantes bancos de dados, designadamente da PSP, da GNR, da PJ ou do SEF, entende o PCP que os cidadãos devem ter acesso directo a todos os dados que lhes digam respeito, salvas as excepções que sejam estabelecidas por lei. Assim, a proposta do PS, de que os cidadãos só possam ter acesso a elementos constantes a seu respeito em bancos de dados policiais através da Comissão para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados (de designação política e fortemente governamentalizada) não se afigura como a mais conforme com a garantia dos direitos dos cidadãos constitucionalmente consagrados, nem tem tradição ao nível do direito comparado, exceptuado o caso da Grécia Com efeito, países como o Reino Unido, a França, os Estados Unidos, a Irlanda, o Canadá, a Austrália, a Nova Zelândia, o Japão, a Holanda, a Suíça, a Dinamarca ou a Itália, mantêm o princípio do acesso directo, ressalvadas as derrogações estabelecidas nas legislações respectivas.
Não se compreende, por outro lado, porque razão não se institui um modelo de fiscalização dos bancos de dados das forças policiais sob a responsabilidade da Procuradoria Geral da República, sem prejuízo das competências genéricas da CNPDPI estabelecidas na Lei n.º 10/91. O PCP não deixará de propor, no debate na especialidade, que essa solução seja adoptada
O Deputado do PCP, António Filipe.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra a proposta de lei n.º 104/VI - Autoriza o Governo a aprovar os novos estatutos da Casa do Douro porque o seu articulado não corresponde aos princípios por nós defendidos para uma alteração jurídico-institucional da Região Demarcada do Douro.
Efectivamente, consideramos que devem ser tidos em conta, a este nível, princípios como a unidade da região, a autonomia dos organismos representativos dos durienses e dos lavradores, a autoregulação, integrando neste princípio a criação do Interprofissional. A presença do Estado não deve ir além de uma posição arbitrai, de garantia e promoção dos vinhos da região.
O PS apresentou propostas alternativas que assentam nestes princípios. Na verdade, a proposta de lei do Governo não salvaguarda a manutenção de atribuições da Casa do Douro, verdadeira organização representativa da lavoura, que são imprescindíveis ao cabal desempenho do seu papel. Recordo, a título de exemplo, competências como a da organização e actualização do cadastro vitícola, sob a orientação e controlo da CIRDD, a do escoamento dos vinhos não comercializados, a do controlo dos depósitos de conta-produtor.
Há ainda a considerar que a figura de «associação pública», atribuída à Casa do Douro em substituição de «pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio», não pode merecer a nossa anuência. Uma e outra não são a mesma coisa, em nosso entender. O Grupo Parlamentar do PS não
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pode permitir que se debilite o sector já mais debilitado da Região - o sector da lavoura.
Por outro lado, não se pode concluir que haja por parte do Governo uma vontade clara de conseguir soluções plausíveis para a região através do consenso generalizado entre as partes. O processo seguido e o calendário executado demonstram isso mesmo.
O Grupo Parlamentar do PS votou contra, ainda, porque não são devidamente salvaguardados os direitos e as regalias do estatuto profissional dos trabalhadores da Casa do Douro, nomeadamente na sua eventual passagem à situação de aposentação.
Mas os problemas do Douro não se resolvem unicamente com uma alteração jurídico-institucional e, muito menos, com esta.
O Grupo Parlamentar do PS continua a preconizar para o Douro uma intervenção integrada que perspective uma solução global para a região Em devido tempo, apresentámos a esta Assembleia uma proposta concreta com estas características. À Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro e à própria Casa do Douro deveria ser atribuído, neste âmbito, um papel importante e imprescindível no encontrar das estratégias mais adequadas ao próprio desenvolvimento da região.
O Deputado do PS, António Marinho.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Alípio Barrosa Pereira Dias.
António de Carvalho Martins.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José de Oliveira Cosia.
José Manuel Nunes Liberato.
Luís Carlos David Nobre.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adriano da Silva Pinto.
António Fernando Couto dos Santos.
Carlos Alberto Pinto
Domingos Duarte Lima
João Alberto Granja dos Santos Silva.
José Guilherme Reis Leite.
Luís António Martins
Manuel da Costa Andrade
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS).
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Santos de Magalhães.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odeie dos Santos.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Maria da Conceição Seixas de Almeida.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Deputado independente:
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
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