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Sábado, 17 de Dezembro de 1994 I Série - Número 25
VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE DEZEMBRO DE 1994
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 50 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n. º 473/VI e das propostas de lei n.ºs 115 e 116/VI
Foram aprovados os n.º 13 a 18 do Diário
Iniciou o debate sobre a família, a propósito do Ano Internacional da Família, nos termos do nº2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia da República, a Sr.ª Deputada do PS Elisa Damião (Presidente da Comissão de Trabalha, Segurança Social e Família)
Intervieram, em seguida, a diverso título, além da oradora inicial, os Srs. Deputados Virgílio Carneiro (PSD), Conceição Seixos (CDS-PP), Odete Santos (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Maria Conceição Rodrigues (PSD), José Eduardo Reis (PS) e Mário Tomé e João Corregedor da Fonseca (Indep.), após o que foi aprovado o projecto de resolução n.º 134/VI - Sobre a Comemoração do Ano Internacional da Família (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Deputado independente João Corregedor da Fonseca)
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 25 minutos
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 50 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abrem.
António José Caeiro da Moita Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abrem.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomems.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Cardoso Maruins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Cosia Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nenés Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
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Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Mana Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Marques Amado.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Maria da Conceição Seixas de Almeida.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Deputados independentes:
Mário António Baptista Tomé.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o projecto de lei n.º 473/VI - Elevação de Mondim da Beira à categoria de vila (PS e PSD), que baixou à 5.ª Comissão, e as propostas de lei n.ºs 115/VI - Manutenção na Ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico (Assembleia Legislativa Regional dos Açores), que baixou à 5 e 7.ª Comissões, e 116/VI - Autorização para contracção de empréstimos externos (Assembleia Legislativa Regional dos Açores), que baixou à 6.ª Comissão.
Devo ainda anunciar que está reunida a Comissão de Inquérito Parlamentar para Apreciação do Processo de Privatização do Banco Totta & Açores.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em apreciação os n.ºs 13 a 18 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 16 a 25 de Novembro próximo passado.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vamos dar início ao debate sobre a família, a propósito do Ano Internacional da Família, da iniciativa do Presidente da Assembleia da República, nos termos do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República.
Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Elisa Damião, Presidente da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, para abrir o debate, gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados de que se encontram a assistir à sessão, como convidadas especiais, várias individualidades ligadas à família, entre as quais a Sr.ª Directora-Geral da Família, Raquel Ribeiro.
Aplausos gerais.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.
A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por saudar o Sr. Presidente por este agendamento, que considero oportuno, até pelo simbolismo de que se reveste este último dia de trabalhos do final do ano no Parlamento. Podemos mesmo dizer que o Parlamento conclui a sua actividade com uma preocupação fundamental, voltada para as questões mais prementes da sociedade.
Não poderia deixar de agradecer, em nome da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, o facto de termos sido distinguidos com o privilégio de podermos encerrar também os nossos trabalhos desta forma. Todavia, o agendamento extremamente sobrecarregado dos últimos dias não permitiu que o cumpríssemos, como era nosso desejo, com o suporte de um relatório, que, como devem compreender, com uma tão vasta temática multidisciplinar, em permanente actualização, embora tenham sido já nomeados quatro relatores, não foi possível à Comissão apresentá-lo nesta sessão.
De qualquer modo, é nossa intenção homenagear o Sr. Presidente com esta nossa iniciativa. Em jeito de balanço do Ano Internacional da Família, iremos realizar um colóquio, onde apresentaremos o nosso relatório, em finais de Janeiro, na Universidade de Coimbra, que também está a dedicar a sua atenção à investigação desta temática, convidando dois ou três oradores de dimensão nacional, a fim de não deixarmos cair este interessante debate.
A Subcomissão da Família, que existe no seio desta Comissão, está a levar a efeito um programa de visitas a instituições, com vista a levar o Parlamento às instituições de cidadãos em risco ou cidadãos mais desfavorecidos e trazer ao Parlamento essa realidade mais viva.
O Sr. Presidente: - Muito obrigada, Sr.ª Deputada Elisa Damião, pelas suas palavras e pela sua informação de
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que a Comissão dará continuidade ao debate profundo sobre esta matéria. Que o vosso relatório seja, de facto, um balanço do Ano Internacional da Família.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Carneiro.
O Sr. Virgílio Carneiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está a chegar ao fim 1994, o Ano Internacional da Família, assim proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1989.
Serviu a celebração desta efeméride para que se debatesse a família, face à sua transcendência relativamente às suas «capacidades e responsabilidades num mundo em transformação».
É legítimo e é positivo, pois, que a família esteja em discussão e que isso se faça com profundidade mas também com serenidade e bom senso, a fim de que os fundamentos essenciais da mais antiga instituição não corram o risco de serem postos em causa.
Antes do Estado existiu a família, como realidade sociológica, e foi sobre esse pequeno núcleo social que o Estado, mais tarde, se estruturou. Fica bem aos Estados, por isso, preocuparem-se com a família que, apesar de todas as transformações sofridas através dos tempos e consoante os lugares, continua a ser, e será sempre, a sua base jurídica mais importante, mesmo padecendo, como tem padecido, diversificados tipos de agressões.
De facto, desde a «Família patriarcal romana» e todos os seus exageros, passando pela «Família comunitária medieval» de moldura vincadamente cristã, até à «Família nuclear», típica da sociedade industrial, o rol das diferenças é grande.
Contudo, as adaptações que a família foi impelida a fazer perante as mutações políticas, económicas, culturais, ideológicas e sociais que emergiram no decorrer das sucessivas épocas deixaram sempre, com maior ou menor evidência, que a essência da família normal permanecesse de modo a cumprir minimamente, pelo menos, os seus valores fundamentais.
O advento do racionalismo, que alimentou filosófica e ideologicamente a Revolução Francesa, a qual rapidamente espalhou as suas influências pela Europa, fora e além Atlântico, logo seguidas do grande surto da industrialização, provocaram, talvez, o primeiro grande abalo na instituição familiar ante a sucessão e intensidade dos acontecimentos que, a partir daí, se desenrolaram.
O núcleo familiar, desde essa altura, começa a restringir-se, quer em relação ao número dos seus membros quer relativamente a atribuições que até aí foram seu apanágio. Pouco a pouco, começam essas atribuições a transferir-se para o Estado e, também, para as grandes empresas que a Revolução Industrial deu origem. São refeições que se deslocam de casa para os refeitórios e cantinas, os filhos que passam a ser educados mais nas creches do que na família, a escola que prolonga a sua frequência obrigatória, os socorros que passam para instituições especializadas, a última vertente da vida do Homem que também inicia a sua emigração do lar familiar para os lares de terceira idade.
A família, assim mais restrita, passa cada vez mais a ser um lugar de encontro íntimo de fim do dia ou apenas, até, de fins de semana, como refúgio de uma sociedade crescentemente consumista e massificada.
Todas estas transformações civilizacionais e culturais constituíram para a família do século XX o grande desafio em relação ao seu papel num mundo em aceleração crescente e um teste decisivo à sua autenticidade e solidez.
Daí justificar-se a preocupação dos Estados e das instituições, como a Igreja Cristã, que sempre tiveram na família o seu principal suporte e que para ela sempre pugnaram por garantir as melhores condições, para que cumprisse cabalmente a sua missão, resistisse à passagem do tempo, continuasse a ser o sítio da aprendizagem primeira da vida e o lugar da autêntica realização do Homem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, praticamente todos os Códigos Civis e todas as Constituições políticas consagram a igualdade de direitos entre os sexos. É justo que assim seja e a própria Igreja Católica acentua a ideia da «igual dignidade pessoal dos cônjuges».
E mesmo o facto de as legislações vigentes, incluindo a portuguesa, facilitarem com alguma ligeireza, em meu entender, o recurso ao divórcio, não deve assustar. São «sinais dos tempos»! O que é preciso é encontrar alternativas que, sem colocar entraves à liberdade de cada um decidir de acordo com a sua consciência e as suas circunstâncias, antes, reforcem a coesão, a autenticidade e a estabilidade do casamento.
Essas alternativas vislumbro-as, pelo menos, em dois campos fundamentais: por um lado, no que diz respeito a um forte investimento na formação humana e ético-moral e, por outro, no aprofundamento do papel do Estado na garantia mínima de condições materiais que facilitem a estabilidade familiar minorando as angústias da subsistência, sobretudo dos menos favorecidos.
Na verdade, é na família que se deve situar o mais real alfobre axiológico. A vivência e a interiorização dos valores deve ter aí o seu lugar privilegiado. Tudo deve ser feito pela sociedade e pelo Estado para que esse alfobre seja maximizado.
Porém, hoje em dia, um dos grandes perigos que a família corre é o aligeiramento que se tem generalizado em relação à problemática dos valores. Valores não só de características biológicas mas, sobretudo, culturais, ético-morais e afectivos, entre outras.
Como disse o Professor Manuel Patrício, «Vivemos, axiologicamente, sobre areias movediças. Essa difícil situação humana repercute-se com particular violência na educação, sendo factor de insegurança e angústia para os educadores (...)».
Ora, os primeiros educadores são os pais, com garantia prescrita nos preceitos constitucionais, por isso os primeiros, também, a dever ter uma transparente vivência axiológica, de modo a podê-la transmitir desde cedo aos filhos.
Mas aquelas «areias movediças» atrás referidas repercutem-se, também, na instituição cuja função fundamental se destina a complementar a educação familiar - a escola. Ali, «os educadores profissionais que são os professores» confrontam-se igualmente com inúmeras dificuldades no campo axiológico. Dificuldades que não resultam tanto de carências da sua formação profissional nem, tão pouco, da falta de condições materiais. São dificuldades provenientes de correntes exteriores à escola, de ventos que sibilam de escolas paralelas, transportando vírus perigosos para os valores fundamentais.
É ainda o Professor Manuel Patrício que enumera três perigos principais.
Primeiro, o perigo do niilismo que considera «no seu limite extremo, a própria negação dos valores». «À luz da treva total do niilismo», diz ele, «educar não faz sentido».
Segundo, o perigo do «neutralismo axiológico», isto é, «a ausência de referências axiológicas para o acto educativo (...) sob pretexto que é perigoso doutrinar, inculcar valores», por isso, pugna-se pelo esvaziamento axiológico da acção educativa.
Terceiro, o perigo do positivismo em que o dever e o direito se reduzem apenas ao facto. «Não há valores, há
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factos». «Os factos é que são os valores», embora a luta humana deva ser outra: «a luta contra os factos em prol dos valores».
Citei várias vezes, como se viu, o Professor Manuel Patrício porque estou solidário com ele na sua preocupação com os valores educacionais. Reconheço, no entanto, que possa ter sido maçador, mas, na verdade, estou Convicto de que este é, hoje, o grande problema da família.
Quanto ao papel do Estado, designadamente em Portugal, creio que, sem demagogia, nunca as famílias portuguesas tiveram tantos meios ao seu alcance,...
O Sr João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Essa agora!
O Orador: - ... o que não significa dizer que tudo está feito ou que tudo está perfeito. A obra em prol da família e da educação nunca estará concluída nem nunca será perfeita, por maioria de razão, num país de parcos recursos como o nosso
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Os homens são imperfeitos. As Mulheres são imperfeitas!...
O Orador: - O Orçamento do Estado que esta semana acabámos de aprovar é o exemplo dessa persistência no colmatar dos grandes problemas nacionais, entre os quais os da família. Nunca o Estado deve abandonar essa persistência, mas se a própria sociedade não ajudar todo o esforço oficial será em vão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero ainda aproveitar esta feliz coincidência de estarmos a tratar de questões da família nas vésperas do Natal para desejar a V. Ex.ª, pessoa também sumamente preocupada com estes problemas, um Natal muito feliz, estendendo estes meus votos aos restantes membros da Mesa e a todos os meus ilustres pares deste Parlamento e, bem assim, a todas as famílias portuguesas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição Seixas.
A Sr.ª Conceição Seixas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Todas as misérias do mundo não impedem os santos de dormir». Assim pretendia François Mauriac, segundo alguns, desafiar o farisaísmo dos que se desculpam com o cenário de miséria universal para não repararem aquela que nos é mais próxima.
Aproveitando o presente debate que ganha ainda mais oportunidade neste ano consagrado pela Assembleia das Nações Unidas, o Ano Internacional da Família, o CDS-PP nele intervém com o duplo objectivo de, carreando para a discussão o seu contributo, através dela sair reforçada a convicção no povo português de que este partido jamais poderia ter sido destinatário da mensagem que alguns perceberam nas palavras do sobredito Sr. Mauriac.
E reforçada a convicção, posto que ela já existe na consciência de todos quantos têm observado a postura que há longos anos o CDS-PP vem adoptando face a este tão importante tema. Recorde-se, a propósito, o projecto de lei n.º 66/V, respeitante à Lei de Bases de Política Familiar, da iniciativa do CDS-PP.
Já então, como agora, o CDS-PP fazia a aproximação à família, esforçado numa sua definição que servisse à sua contextualização e ao tratamento das suas disfunções. Uma definição de família que, então como agora, não ignora os factores da sua profunda e acelerada mudança. Uma definição que, privilegiando a família nascida do casamento, não está de costas voltadas aos demais modelos de relação familiar, eles também células base da nossa sociedade.
Realidade polissémica, abarcante de uma multiplicidade de situações concretas, mas sempre o espaço por excelência de promoção e. vivência da solidariedade. Instituição natural por excelência, primeira comunidade social, base essencial da afirmação do homem como pessoa, a família, tal como o indivíduo, é condicionada pelo contexto sócio-cultural, económico, ético e político.
Pese embora o pendor de autonomia que à família deve ser reconhecido e, consequentemente, os limites que se devem impor à intervenção do Estado na vida familiar, não podem os governos perder de vista que a eles lhes incumbe também a tutela dos direitos da família O mesmo é dizer constituir a obrigação prioritária do Governo a construção de uma política familiar global, integrada e coerente, que revigore e dignifique a comunidade familiar.
Falar hoje da família, no contexto da sociedade portuguesa, passa forçosamente por denunciar a crise económica, sócio-cultural e política que pesa sobre as pessoas e é causa de instabilidade familiar.
Atente-se nos índices de desemprego De acordo com o INE (Instituto Nacional de Estatística), o emprego no final do terceiro trimestre de 1994 continuava a diminuir. Enquanto, durante a recessão de 1983/84, o emprego por conta de outrém caiu cerca de 5,3 % durante sete trimestres consecutivos, no seguimento da recessão actual, a redução do emprego já atingiu 5,9 % em cerca de oito trimestres.
No terceiro trimestre de 1994, a taxa de desemprego atingiu o valor de 6,8 %, significando cerca de 400 000 desempregados. Relativamente à duração do período de desemprego, verificou-se um aumento de desempregados há mais de um ano, que atingiu cerca de 34,3 % nos três primeiros trimestres de 1994.
Atente-se, também e ainda, na persistência do trabalho precário, e na falta de vontade política deste Governo no combate ao trabalho clandestino e ao trabalho infantil.
Faça-se a leitura do Boletim Trimestral do INE e leia-se nele a queda persistente dos salários reais, nos primeiros três trimestres de 1994.
Atente-se na inércia deste Governo em proceder a uma revisão das leis laborais por via a criar mais facilidades ao trabalho a tempo parcial e horários mais flexíveis, que tenham, designadamente, em conta o local, muitas vezes distante, onde se exerce a actividade laborai.
No campo da educação pré-escolar, consensualmente tida como de importância fundamental para o desenvolvimento da personalidade das crianças e para o sucesso das suas vidas pessoal e profissional, Portugal é o país onde se verifica a taxa de cobertura mais baixa global (48 %, em 1991/92) quando, na mesma altura, nos demais países europeus, aquela taxa atingia 100 % ou valores muito próximos.
Falta de sensibilidade política que, ainda no campo da educação pré-escolar, é revelada na falta de adequação do horário de funcionamento dos centros de rede pública do Ministério da Educação (das 9 horas às 12 horas e 30 minutos e das 14 horas às 15 horas 30 minutos), quando comparada com as necessidades da maioria dos pais.
Aguardam-se aqui, como nas demais áreas, medidas que o Governo não toma e que, no entanto, passariam, por exemplo e neste caso concreto, pela adopção de um regime de desdobramento do trabalho, este mesmo propiciador, além do mais, de criação de emprego.
Consensual como é, entre os peritos em assuntos da família, a ideia de que o «conflito de gerações» pode ga-
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nhar com o maior relacionamento entre os mais novos e os mais idosos; considerando que mais de 80 % dos portugueses com 65 anos vivem em ambiente familiar, como compreender, então, que este Governo não permita a consideração, para efeitos de dedução em IRS, das despesas das famílias com os idosos que consigo habitam?
Nove anos passados sobre a Portaria n.º 52/85, que regulamentou a consulta do planeamento familiar nos centros de saúde, é manifestamente exíguo o número dos que fornecem este tipo de consultas.
Sendo, como são, frequentes os casos de violação, incesto e gravidez não desejada (Portugal é o país com maior índice de mães adolescentes), a educação sexual prevista na lei não é suficientemente praticada nas escolas.
Considerando que a pensão social média portuguesa é de cerca de 800$ por dia, por pessoa, este Governo, ao invés de propiciar incentivos fiscais às alternativas complementares de reforma, desarma quem delas carece, alterando a seu bel-prazer e contra o interesse das famílias, as regras do jogo. Foi o que aconteceu com o Plano Poupança Reforma.
Considerando as enormes despesas que os pais se vêem cada vez mais forçados a suportar com a educação dos seus filhos, como compreender as deduções, ridículas, para o IRS, consideradas nas despesas com esses mesmos filhos?
Como compreender tais dislates, muito especialmente quando, impávida e descaradamente, o mesmo Governo defendeu como dedutíveis para efeitos de IRC as despesas confidenciais das empresas até aos enormíssimos montantes que o PSD votou favoravelmente?
Posto isto, o CDS-PP termina, não sem endereçar às famílias portuguesas os seus mais sinceros votos de parabéns.
Estão de parabéns aquelas famílias que sobreviveram, ainda que empobrecidas e até mutiladas - pelos divórcios, pelos acidentes de trabalho, pela falta de assistência na saúde, pela criminalidade, apesar desta governação.
Estão de parabéns todas as famílias que resistiram ao longuíssimo rol de ataques que este Governo lhes foi desferindo ao longo de toda a governação.
Cada família que, durante todo este ano, não viu merecer deste Governo uma única medida de apoio, um único gesto de solidariedade e que resistiu, revelou a sua força, a sua dimensão ética, a sua genuína capacidade de ser solidária. Uma família assim reforçou também direito de se revoltar.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O facto de nos encontrarmos na época de Natal deve determinar que falemos, porque tratamos de coisas sérias, da família ou, melhor, das famílias em termos a que não se possa aplicar o tom hipócrita que António Gedeão criticava no poema Dia de Natal: «Hoje é dia de ser bom, é dia de passar a mão pelo rosto das crianças».
De facto, no termo do ano emblematicamente baptizado de Ano Internacional da Família, multiplicam-se as realizações que, em jeito de remate, fazem o balanço da situação da célula familiar.
Houve quem quisesse reconduzir a família ao tipo tradicional de organismo autónomo onde se reproduzia a estrutura de um sistema político baseado nas desigualdades sociais. Ou seja, houve quem quisesse a manutenção nas famílias de uma estrutura baseada na desigualdade em desfavor da mulher, transformando-a num ser eminentemente reprodutor. Modelo que bem conviria a uma superestrutura política totalmente demitida das suas obrigações para com os cidadãos. As famílias teriam assim de resolver, pelos seus próprios meios, o problema da guarda das crianças, dos cuidados com os doentes, com os idosos, e o .próprio problema do desemprego através de formas de auto-organização económica em períodos de recessão. Estes, que por tudo e por nada, fazem apelos à responsabilização da célula familiar que uniformizam sob a égide de dogmáticos valores morais, alimentam-se, mau grado declarações públicas no sentido inverso, da reprodução nas famílias do modelo opressor desenhado no Estado.
Mas houve também quem, neste ano, chamasse a atenção para os efeitos da degradação social na desagregação da própria família nuclear, num processo paralelo ao que a acumulação capitalista provocou na família extensa. Houve quem afirmasse a impossibilidade de retorno a uma concepção de família coonestada com valores da família patriarcal.
Tomámos em devida nota as luzes de néon que, em Portugal, desenhavam o slogan do Ano Internacional da Família, «construir a mais pequena democracia no coração da sociedade». Apetece dizer: estes publicitários são uns exagerados!
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - De facto, aquele proclamado objectivo é totalmente irrealizável num Estado em que as liberdades são constantemente ameaçadas, numa sociedade que tripudia sobre os direitos dos trabalhadores, das crianças, dos jovens, das mulheres, dos reformados e dos idosos. Todo este enquadramento determina pressões insuportáveis sobre as famílias e os seus membros e cria condições propícias para que a vida em família se oriente, cada vez mais, por princípios conservadores, retrógrados, alicerçadores da desigualdade das mulheres e das crianças.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - É por isso que a situação da família não pode desligar-se das políticas de emprego, de protecção social, de educação, de saúde, de habitação e de fiscalidade. Isto é, não pode desligar-se dos índices de felicidade e de bem-estar.
É ponto assente que nas sociedades industrializadas existem elevados níveis de desemprego. Dados recentes revelados pelo EUROSTAT mostram que na União Europeia a taxa de desemprego juvenil atingiu em Outubro 19,5 % e a taxa de desemprego feminino 12,8 % contraposta a uma taxa de desemprego masculino de 9,3 %.
Em Portugal, mesmo segundo os minguados dados oficiais, há mais de 400 000 desempregados, 47 % dos quais se encontravam há mais de um ano sem trabalho. E quanto aos jovens com menos de 25 anos, eram já 100 000 aqueles que não conseguiam emprego. Realçarei que no distrito pelo qual fui eleita, o de Setúbal, a taxa de desemprego (10 %) quase duplica a média nacional. Ao mesmo tempo, prossegue a destruição do tecido produtivo, com o consequente encerramento de empresas. Só no distrito de Lisboa, durante um ano, foram destruídos 21 000 postos de trabalho, prevendo-se o encerramento de mais 59 empresas. Em 62 empresas, estão em risco mais de 3650 postos de trabalho. Em 88 empresas do distrito de Lisboa, há 6500 trabalhadores com salários em atraso.
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Em cinco distritos do País há mais de 17 000 trabalhadores com salários em atraso, somando nos últimos dois meses as dívidas aos trabalhadores 2,5 milhões de contos,; São alguns milhões que faltam nos orçamentos das famílias portuguesas! Com a consequente redução do consuma dos assalariados, e das suas famílias, que, por ser - essa reduto - um objectivo importante da política de direita na lógica, da intensificação da exploração capitalista, determina a contenção salarial. Os custos salariais no corrente ano atingiram mesmo uma redução a 81,3 % relativamente ao ano longínquo do 1980!
Mas é também à custa dos direitos sociais dos trabalhadores e suas famílias que o Governo pretende reduzir o consumo: à custa de cortes nos cuidados médicos, no ensino, no alojamento social, nos transportes, na segurança social, nas actividades culturais e de recreio.
Quanto à habitação, os resultados dos censos 91, revelam a situação dramática em que vivem muitas das famílias Em alojamentos clássicos com uma divisão, com uma divisão, vivem 50 634 famílias, correspondendo a 114 178 pessoas. E em alojamento do mesmo género com duas divisões vivem 223 164 famílias, correspondendo a 558 552 pessoas. Situação dramática é a que, neste aspecto, vive no distrito de Lisboa que concentra ainda 75 % da habitação degradada do País. Situação que afecta de uma maneira grave a população jovem: 50 % da população residente nos bairros degradados tem menos de 20 anos.
Mais tarde, quando anos acumulados de sofrimento lhes der conhecimentos que o ensino não lhes proporciona, as crianças de hoje, aquelas que cedo começam a vida, »s que são vítimas da exploração do trabalho infantil, as que não puderam frequentar um jardim de infância, as que tiveram um aumento de abono de família para todo o ano de 1994, correspondente a seis pacotes de leite, as que viram morrer irmãos com menos de um ano de vida (em Lisboa 20 % das trabalhadoras com vínculo laborai precário perderam filhos naquela faixa etária), as crianças que hoje. fazem parte das elevadas taxas de analfabetismo (17,6 % em Cascais, 17,4 % em Alenquer, 21,8 % no Alentejo, 14% na Região Centro, 15,3 % na Madeira), mais tarde essas crianças e adolescentes hão-de traduzir em palavras comuns as palavras amargas do poeta Jorge de Sena que não, puderam aprender. «Neste vil mundo que nos coube em sorte por culpa dos avós e de nós mesmos tão ocupados em esperanças de salvá-lo».
Mas neste universo português, com que por ara nos defrontamos, já nem temos a certeza de poder acompanhar Jorge de Sena na constatação, aliás também amarga, de que a vida se passa ocupada nos descontos para a reforma na velhice. Vem aqui também a propósito registar a inusitada alegria com que o Governo se apresentou na Conferência do Cairo ostentando uma taxa de crescimento demográfico quase reduzida a zero. Satisfeito, ao que parece, por dar um tão grande contributo aos objectivos de redução da população do mundo!
A situação é, no entanto, por isso mesmo dramática. Com que população activa vamos contar, a curto e a médio prazo, para o desenvolvimento do País? E a praticamente nula taxa de crescimento demográfico deve-se precisamente às gravíssimas condições em que vivem as famílias portuguesas, ao alastramento da exclusão social em que os casais não querem envolver os filhos desejados que não deixam de ser, por isso mesmo, pela exclusão, um projecto adiado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa tal situação, assistimos a retrocessos no estatuto dos membros da cédula familiar, nomeadamente, como é óbvio, no estatuto das mulheres. Em momentos de recessão recupera-se o mito da mulher no lar, a mulher a quem se atribuem muitas das tarefas que são autênticos deveres do Estado, a mulher que deixa assim de fazer parte das taxas de desemprego por ser remetida ao lugar de doméstica. Daí até à menoridade e à inferioridade da mulher vai um passo Daí até à violência física e psíquica sobre a mulher, até por mera reprodução dos comportamentos violentos na sociedade relativamente aos trabalhadores, vai um passo ainda mais pequeno. Mas esta viagem, ao arrepio dos vários modelos familiares reconhecidos e dignificados por Abril não é uma viagem sem regresso. E no regresso que se avizinha, cada vez com mais premência e urgência, está o caminho da reconquista da democracia com a luta pelas transformações económicas, sociais e políticas que, criando novas relações na sociedade, transportem para as famílias a pureza das relações afectivas vividas em democracia.
Aplausos do PCP, de Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.
A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr Presidente, Srs. Deputados: Este debate encerra o Ano Internacional da Família, decidido, em 1982, pelas Nações Unidas, com o objectivo de chamar a atenção para as profundas mudanças ocorridas na evolução demográfica, na organização do trabalho, nos progressos com vista à aproximação do estatuto social entre mulheres e homens.
Mais do que afirmar um modelo ideal de família importa avaliar a realidade concreta e os constrangimentos que as sociedades modernas colocam à realização humana de cada um dos seus membros, ou seja, promover, de facto, a democracia na base da sociedade.
Os funcionalistas, como Parsons, sustentaram que a família nuclear resultante da industrialização é o modelo ideal para o suporte afectivo, baseado em distintos papéis no seu seio e na vida activa só possível pela manutenção da secundarização da mulher no mercado de trabalho e na sociedade.
Nas décadas subsequentes, todos os teóricos, não importa a sua perspectiva ideológica, criticaram este modelo totalmente ultrapassado pela realidade.
O próprio Parsons, em 1964, reconhece que os papéis da mulher e do homem são eminentemente complementares e de igual valor, lamentando que a identificação da mulher com o trabalho doméstico, economicamente invisível e socialmente desvalorizado, concorra para conflituar com os valores mais individualistas e igualitários das sociedades modernas.
Leach, em 1967, foi o primeiro a chamar a atenção para o facto de serem emocional mente mais intensas as relações entre marido e mulher e entre pais e filhos nas famílias modernas isoladas, que acumulam tensões e conflitos, suspeições e medos do mundo exterior, em que cada um dos seus membros espera e exige demasiado dos outros.
Outros autores da década de 70 sustentaram que os dramas familiares, vividos na mais oculta intimidade, são fonte de descontentamento, o que, aliado às exigências de relações de competitividade, torna algumas famílias claustrofóbicas, opressivas e repressivas, com consequências graves para todos, individualmente, mas, particularmente, para as crianças e para os jovens, profundamente afectados no seu desenvolvimento pelas disfunções familiares.
E esta aparente contradição de que a família é - tem de ser - o ambiente seguro para crescer e para todos os seus
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membros viverem com gratificação psico-afectiva que impõe ao Estado que, sem ingerência mas sem indiferença, crie condições objectivas para atenuar os constrangimentos à sua maturação e apoie as vítimas das suas disfunções.
A Professora Dr.ª Manuela Silva proferiu, sob o título «Família e Solidariedade» uma notável comunicação na II Semana Social, promovida pela Conferência Episcopal, que passo a citar: «São cada vez mais numerosas as situações que se afastam dos padrões convencionados de família». Por esta razão, não deixa de comportar alguma ambiguidade o slogan propagado em certos meios Família torna-te no que és».
Tomado à letra, parece que tal slogan introduzira a tese de um «modelo único», de carácter essencialista e de configuração normativa. Parece-me que isso é, manifestamente, ir na contra-mão da história e querer apagar a dimensão da complexidade e a riqueza da variedade que comporta a situação real das micro-unidades de pertença, que são as famílias, nas sociedades contemporâneas.
De resto, convém ter presente que a família constituída pelos pais e pelos filhos menores, vivendo na mesma unidade de alojamento autónoma, é uma realidade sociológica característica de certo meio social e de certa época da história. No passado, como ainda hoje, em certas regiões do País prevalecem formas de família alargada.
Este debate abala profundas convicções e interesses, sendo sintomático que, na legislatura anterior, tenham sido aprovados dois projectos de lei-quadro, na generalidade, sem que o debate, na especialidade e a votação final global se tenham concretizado por falta de vontade política.
Apreciei bastante a intervenção da Sr.ª Deputada Conceição Seixas, do CDS-PP, que nada tem a ver, lamento dizer-lhe, com o projecto apresentado pelo seu partido na anterior legislatura, que também tem responsabilidades no facto de esse projecto não ter sido discutido, na especialidade, e agendado para votação final global.
Segundo um inquérito realizado pelo IED em 91, 64 % dos inquiridos considera a vida familiar o mais importante e apenas 34 % elege a esfera profissional.
em Portugal, as mulheres representavam, em 1992, 50,8 % da população. Celebraram-se, no mesmo ano, 69 887 casamentos e 12 429 divórcios, nasceram 115 018 crianças, 15 % fora do casamento, e registaram-se 101 161 óbitos, cuja taxa tem vindo a crescer (de 9,6/1000, em 1987, para 10,2/1000, em 1992).
Por outro lado, a mortalidade pré-natal tem reduzido, verificando-se um excedente de vidas de 1,4 % e a taxa de fertilidade por mulher, que era de 1,52 em 1993, tem evoluído negativamente desde 1965, quando era de 3,07.
De acordo com as estatísticas da Justiça, o divórcio e a separação de pessoas e bens evoluiu de 10 808 casos, em 1988, para 14 000, em 1993. Outros actos, porém, evidenciam a mais grave quebra dos laços mínimos de solidariedade e de vida em comum, como seja: o declínio público da responsabilidade civil 5706 casos; acções declarativas sobre as dividas, 90 146 casos; despejos, 7184 casos. Tudo isto, em 1993.
São, portanto, mais de 100 000 os casos de rotura em Justiça.
Formalmente, em cada 7 casamentos celebrados há 1,5 divórcios, sendo as separações de facto, temporárias ou definitivas, superiores ao número de casamentos celebrados no ano de 1993, tendo em consideração os números que referi.
Na Europa, um terço dos casamentos resulta em divórcio e uma em cada 7 crianças vive em famílias monoparentais, sendo essa taxa de l em cada 4 nas grandes cidades.
Não havendo reposição de gerações nem políticas que ajudem a inflectir esta tendência, o envelhecimento da população assumirá, no futuro, dimensão preocupante.
A família continua a assegurar os cuidados com os idosos, mas fá-lo de forma cada vez mais deficiente, já que os membros do casal estão na vida activa e há uma enorme pressão sobre eles por parte da entidade patronal, que chega a penalizá-los profissionalmente por exercerem o direito de assistência à família.
Particularmente afectadas na sua carreira são as mulheres, que continuam a assegurar a assistência tanto às crianças quanto aos idosos, na vida privada, nos serviços públicos e em segmentos de mercado de trabalho desvalorizado.
Portugal, Espanha e Irlanda têm uma das mais elevadas taxas de dependentes da Europa (52.1 %), com predominância para os idosos, enquanto que os países do norte, a Itália e a França, conseguem manter os seus idosos activos durante muito mais tempo.
O equipamento público disponível para idosos não ultrapassa os 37 % da procura, enquanto que 70 % do privado não está sequer licenciado e, em muitos deles, pratica-se a eutanásia consentida, como, justamente, alertou a Sr.ª Directora-Geral de Família no Ano Europeu do Idoso, apesar de custarem às famílias entre 60 a 100 000 escudos mensais.
Também o apoio à guarda de crianças não estimula a natalidade. Apenas 6 % das crianças estão em berçários públicos até aos 2 anos de idade, apesar de 56 % das mães serem trabalhadoras (contrariamente ao que acontece em outros países, a taxa de actividade de mulheres viúvas e divorciadas não chega a 27 %).
Portugal foi o último país a ratificar a directiva comunitária que alarga a licença de parto e protege a mulher durante a gravidez. Só recentemente deu entrada nesta Câmara.
O escasso recurso ao trabalho a tempo parcial e à licença parental nos primeiros dois anos de vida são os principais constrangimentos à maternidade e à paternidade, que não é estimulada nem apoiada.
Dos 3 aos 5 anos, apenas 35 % das crianças tem acesso a creches e a jardins de infância públicos. Os privados custam, por exemplo, a uma trabalhadora têxtil, mais de metade do seu salário. Resta o recurso a amas, que trabalham sem garantias salariais, sem apoios técnicos adequados e sem protecção social, prestando um serviço, regra geral aceitável, às famílias de mais baixos recursos.
Apenas 6 % das crianças entre os 6 e os 10 anos têm actividades complementares à escola. As restantes ficam por sua conta ou beneficiam da solidariedade familiar. E preocupante que, após este período, um número significativo de crianças troque a escola pela fábrica. O trabalho infantil e de menores, cuja dimensão não é conhecida com rigor, é uma realidade que não tem sido combatida com eficácia na fiscalização do local de trabalho e no abandono precoce da escola.
Não se compreende como Portugal criou, durante tanto tempo, obstáculos à ratificação da directiva sobre o trabalho de menores, em manifesta subjugação do Governo a interesses minoritários e retrógrados.
De acordo com a definição de pobreza da CE, em 1990, em Portugal, segundo a EUROSTAT, 31,4% das famílias portuguesas são pobres e 32,4 % dos cidadãos também o são, devido ao subdesenvolvimento e às políticas governamentais rígidas de transferência e redistribuição de rendimentos.
Ainda de acordo com a EUROSTAT, Portugal é o país com maior número de emigrantes em países comunitários, 764 860, o que não inclui as emigrações sazonais. Recebe apenas 25 296 da Comunidade e 69 157 dos países de língua oficial portuguesa. Também estes são apenas números oficiais.
Apesar da integração europeia, os portugueses continuam a procurar fora condições de trabalho que não existem no seu País, com profundos reflexos na vida das famílias.
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As mulheres e os idosos ocupam vastas regiões do interior, dedicando-se à actividade agrícola não remunerada. Por outro lado, tem sido negligenciado o apoio à integração social dos migrantes, na sua maioria de etnia africana, que constituem um contingente clandestino de trabalho(, sem condições e sem serem socialmente integrados na vida portuguesa, em múltiplos aspectos.
A violência e o aumento da criminalidade infantil têm origem na exclusão social, nos centros habitacionais e no abandono das crianças à sua sorte, em bairros degradados das periferias urbanas, não sendo aceitável continuar a ignorar a violência no seio da família, exercida sobre as crianças, de que são exemplo mais de 30000 casos com recurso aos hospitais e internamento, sem que o Estado interfira no plano social e judicial, em nome do direito à privacidade que acaba por consagrar a indiferença como um dos piores males do nosso tempo.
Muitas crianças são abandonadas e negligenciadas. Todavia, são pouco mais de 200 os processos de adopção plena concluídos em 1993.
O Ano Internacional da Família não pode ser para o Estado um mero ritual junto da actividade sincera, solidária e empenhada de inúmeras instituições, desde a Igreja aos técnicos, às universidades e às associações da família, que desejam e esperam: a criação de condições para compatibilizar a vida familiar com a vida activa, com nova artilha dos tempos de trabalho, em casa e profissional, gestão adequada das férias, horários de trabalho e descanso; uma redefinição de responsabilidades das empresas :ria vida social e familiar; uma gestão adequada às necessidades de espaços urbanos, de transportes e de equipamento social que penalizam a família trabalhadora; a correcção de desigualdades na distribuição de rendimentos e das injustiças fiscais; a consagração de um rendimento mínimo garantido, para combater a exclusão social, e a reformulação do abono de família, há muito reclamados pelo PS; medidas que ponham cobro ao desemprego crescente de longa duração, que afecta 49 % dos desempregados, dos quais 22 % têm mais de 50 anos, esperando-os mais 30 anos de vida sem vida; emprego seguro e de qualidade dos jovens e mulheres e não apenas precário, que leva a que os jovens portugueses permaneçam em casa dos pais até aos 27 anos, em média, por falta de recursos para constituir família e adquirir habitação; apoio aos problemas e patologia das famílias em dificuldades, pela criação de serviços de atendimento nos sistemas de saúde e segurança social; apoio às famílias de emigrantes e migrantes, promovendo a sua integração e reunificação; correcção da discriminação sobre as famílias mono paternais no acesso à habitação e apoio social e técnico, com prioridade no acesso aos equipamentos sociais de educação e saúde, tendo em vista atenuar o seu enorme isolamento e as responsabilidades que recaem maioritariamente sobre as mulheres; promover pelo associativismo da família a sua participação nas políticas económicas e sociais, na educação, consumo e ambiente, urbanismo e habitação, juventude e tempos livres, apoiar o associativismo da família e as instituições especializadas no combate à violência, criminalidade e droga; o reconhecimento legal e constitucional à igualdade entre os Sexos, que passa pela efectividade de iguais oportunidades no acesso ao emprego, salário, carreira e assistência à família; rediscutir o papel dos media, nomeadamente da televisão, na vida familiar e na sociabilização das crianças e o importante contributo que podem dar para a sua educação sexual e -cívica.
Resumidamente, aludi apenas a alguns temas a que o Governo não tem sabido responder ou sequer estimulado o debate, preferindo o silêncio, o engano estatístico e refugiando-se em conceitos e rituais. Porém, é no seio da família, em permanente recriação, que se encontra compreensão afectiva e solidariedade para as tensões do exterior. Apesar das crises, a família cumpre onde o Estado falha, resistindo a tudo, mesmo à acção e omissão do Governo.
Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A família é unidade de organização humana; elo de solidariedade entre gerações; veículo de transmissão de valores culturas, éticos e sociais; espaço privilegiado de realização e desenvolvimento da pessoa humana; e reserva e património de afectos.
A necessidade de definir o seu papel na sociedade, de compreender os seus novos contornos e de apoiar os desafios que enfrenta levou as Nações Unidas a decretar este o seu ano internacional e relançar, deste modo, o debate sobre a sua importância. Esse debate não pode ter a pretensão de nos remeter de forma redutora à família como modalidade única, mas tem de ser capaz de a equacionar na multiplicidade de expressões que a sua organização assume.
Essa organização não obedece a padrões morais ou sociais dominantes, recusa modelos normativos rígidos ou exclusivos. É uma organização familiar cada vez menos sinónimo de matrimónio entre duas pessoas, de espaço para criar filhos, de desenvolvimento separado de sexos, de Filhos como garante da continuidade e riqueza familiar, de grandes clãs onde se cruzam gerações várias que na grande casa se concentram, de estabilidade como dado imutável ou de autoridade centrada no homem como facto inquestionável.
Pelo contrário, a organização familiar é cada vez sinónimo de livre escolha e de união de facto entre pessoas, de mulheres solteiras que optaram pela maternidade e, sozinhas com os seus filhos, constituem família, de homens divorciados que, cada vez em maior números, tomam a guarda dos seus filhos e os educam, de mulheres e homens que em conjunto constroem novas vidas e com os respectivos filhos formam novas teias de afecto, novas redes de parentesco, desdobrando as tradicionais, e também e ainda famílias de alguns amigos, que coabitam, partilhando espaço.
São, pois, famílias como realidades complexas, de difícil definição, em mutação constante, como a própria sociedade, nas transformações económicas e sociais que a percorrem, determinam e moldam, e que, espacialmente, se concentra sobretudo nos grandes meios urbanos, que evoluiu na partilha dos seus papéis sociais, que vê as mulheres participarem cada vez mais na vida profissional, que assume diferentemente a paternidade e a maternidade, que do direito ao corpo viu nascer uma maternidade mais consciente.
Mas é também uma sociedade contraditoriamente perversa, que condiciona a liberdade dos indivíduos e limita as suas opções quando não garante condições de apoio à família, quando não cria condições que permitam harmonizar a vida familiar com a profissional e violenta a consciência dos cidadãos com escolhas a que, manifestamente, não pode ser obrigado, quando não garante a existência de estruturas de suporte às famílias no seu conjunto e, dentro delas, aos grupos mais fragilizados, sejam eles as crianças, os idosos ou os deficientes, quando não estimula, de forma integradas, políticas que a valorizem, estimulem e promovam.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar hoje da família é, inevitavelmente, falar dos factores que condicionam a sua existência, desvirtuam o seu papel e esvaziam a sua mais-valia. É falar do próprio modelo de sociedade que tem sido imposto, desumanizador, violento, ferozmente competitivo, que estimula o crescimento e o imediatismo do lucro a qualquer preço, que gera insatisfação, insegurança, tensão, isolamento, egoísmo, ausência de solidariedade. É falar de uma sociedade que não propicia a felicidade, antes favorece a tensão e frustração dos indivíduos, que na família se projectam. É falar de um desenvolvimento tecnológico que não correspondeu à libertação dos indivíduos para o seu pleno desenvolvimento e o seu direito ao apoio familiar nem foi capaz de encontrar diferentes formas de organizar o tempo de trabalho, antes o mantém quando não o prolonga. É falar da ausência de ordenamento do território, de transportes, do caos e das longas horas desperdiçadas da vida das pessoas, roubadas ao convívio familiar, do stress que provocam e do modo como este se reflecte na relação interpessoal. É falar das crianças, que passam cada vez mais horas sozinhas em casa, privadas da companhia dos seus pais e entregues a uma televisão que se tornou a sua baby sitter. É falar da inexistência de estruturas e soluções alternativas de apoio às crianças. É falar da escola e da ausência de respostas que ela dá, na crise que atravessa, nas desilusões que semeia, na insegurança que gera, na agressividade e revolta que, inevitavelmente, cria. É falar também da degradação ambiental, da pobreza, da violência de que são geradoras e do modo como esta incide no seio da família. Por último, é falar dos idosos, daqueles que, durante anos, como um qualquer recurso, foram explorados e abandonados, e da ausência de instrumentos eficazes de integração e apoio, da solidão a que são votados e do peso que, inevitavelmente, recai sobre as famílias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar hoje da família, para nós, Os Verdes, não é falar de propostas e promessas concretamente abstractas, não é celebrar rituais esvaziados de conteúdo mas, sim, promover políticas integradas, interdisciplinares, que da sua soma e do diálogo entre si propiciem um efectivo apoio à família. Este, manifestamente, não é um desafio que o PSD, o poder, seja capaz de levar à prática
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Conceição Rodrigues.
A Sr.ª Maria da Conceição Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, desejaria congratular-me pelo facto de, hoje, na Assembleia da República, se debater matéria de tão relevante importância e de tanta actualidade, tratando-se do ano internacionalmente dedicado à família.
Confrontamo-nos com uma temática que não pode ser considerada como preocupação de apenas alguns, mas antes como responsabilidade de todo e qualquer indivíduo, da sociedade em geral e do próprio Estado.
Como alguém já referiu, conceito que não tenho dificuldade em subscrever, a família "é a célula base da sociedade e seu elemento estruturante", "é o lugar e a forma por excelência de transmitir e recriar valores múltiplos, que se traduzem no verdadeiro desenvolvimento integrado e auto-sustentado de qualquer povo ou nação", constitui um espaço fundamental, onde o amor, a solidariedade, a entreajuda, a capacidade de doação e entrega não podem ser entendidos como valores de mera retórica, mas sim como a essência de uma existência que se pretende feliz e geradora de uma sociedade sã num mundo que queremos cada vez melhor.
Longe de ser uma problemática de fácil abordagem, a família representa um dos mais complexos temas da nossa época, discutido nos mais diversos fora com a maior das preocupações e cautelas.
Prende-se com questões essenciais como a paz e segurança dos povos, as culturas e aspectos sociais e económicos, para citar apenas alguns dos factores que mais a influenciam.
A família é composta por indivíduos de várias gerações e sexos, que se movem num quadro de condições extremamente diversificado, onde coexistem, naturalmente, realidades de toda a natureza.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem pode ignorar o quanto de negativo representa para a estabilidade e consolidação de uma família o clima de guerra, a violência e a incerteza no futuro?
Como pode uma família desfrutar em pleno da felicidade, quando a insegurança nas ruas e a prática de crimes contra pessoas e bens, como sejam, raptos, violações e actos de terrorismo, fazem parte do seu quotidiano, atingindo qualquer dos seus elementos de uma forma indiscriminada?
Como pode compatibilizar-se o conceito de família com culturas que desvalorizam, ou mesmo desprezam, a unidade e inter-relação dos seus membros, não vivem de forma coesa os seus problemas e apenas se entregam, de forma egoísta e quase irracional, a práticas que mais não visam que a própria subsistência, num desapego total quanto à sorte e ao rumo daqueles que os geraram ou que de si deveriam depender.
A família, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um bem, pelo qual toda a comunidade e o Estado se devem bater.
O Estado, aliás, tem um papel relevante a desempenhar. Cabe-lhe apoiar a família, utilizando todos os meios de que dispõe, de modo a combater a sua desagregação, a qual, normalmente, conduz a situações de marginalidade e exclusão. Cabe ainda ao Estado promover o seu bem-estar, proporcionando aos seus membros e à comunidade no seu todo o melhoramento das sua condições de vida.
O poder de intervenção do Estado nesta área, é vasto. Abrange, nomeadamente, a criação de emprego, a educação, a justiça, a habitação e a protecção dos mais vulneráveis.
Contudo, havendo peso e medida, não pode o Estado tornar-se num interventor violador da privacidade da família nem sobrepor-se a ela.
O Governo português tem demonstrado alguma sensibilidade no que respeita à valorização da família, vindo, ao longo dos anos, mormente neste Ano Internacional da Família, a criar fortes apoios basilares da sua sustentação.
Na área da saúde, encontramos a figura do "médico de família", a assistência gratuita a grávidas e, em termos de controlo de natalidade, o planeamento familiar. Quanto à habitação, assistimos à criação de incentivos como o crédito bonificado para aquisição de habitação própria, o subsídio à renda de casa, entre outros, e o acesso à habitação social.
Não posso aqui deixar de referir, como exemplo preponderante do combate à pobreza e apoio às famílias carenciadas, o projecto, desenvolvido pelo Governo em conjunto com as autarquias locais e através de fundos comunitários, de erradicação de barracas.
Por outro lado, uma atenção especial tem sido dirigida aos "sem família" e àqueles que dela estão afastados por razões que se prendem com o quotidiano familiar.
Falo das crianças órfãs ou abandonadas, dos deficientes, dos dependentes e dos idosos.
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Em relação a todos eles, o Governo tem implementado medidas e estruturas sólidas de apoio, como deve ser do conhecimento geral.
No que respeita aos idosos, por exemplo, e não esquecendo o direito que lhes assiste de viverem os seus últimos anos com dignidade, conforto e carinho, de forma a serem compensados da solidão para a qual são normalmente atirados, é de evidenciar o "programa de apoio integrado a idosos" que está em curso e promove o apoio e acompanhamento do idoso no seu próprio meio, na sua casa, nomeadamente através do novo sistema chamado Telealarme.
Poderia ainda enunciar outros aspectos demonstrativos da preocupação do Governo em relação à família, como sejam os já referidos incentivos fiscais contidos no Orçamento do Estado para 1995.
Porém, abordarei, agora, questões mais relacionadas com a sociedade propriamente dita.
Tenho para mim que, chegados que estamos ao limiar do século XXI, é indispensável a mudança de mentalidades. Há que intuir que, para haver unidade familiar, é necessária e relevante a partilha de responsabilidades e tarefas entre homem e mulher. Na sociedade moderna em que vivemos, a mulher deixou de ser exclusivamente mãe e dona de casa. Ela é chamada a participar na vida activa e, a meu ver, por duas ordens de razões: uma, concernente à sua realização profissional e, outra, prendendo-se à necessidade de a mulher contribuir para o aumento do rendimento familiar e, consequentemente, para o sustento da família.
É tempo da dignificação da mulher trabalhadora, devendo pugnar-se pela sua não discriminação, quer na contratação, quer nos salários, quer no acesso a lugares de chefia.
Tal será possível se se ajustarem horários de trabalho, flexibilizando-os, e se se promover que a assistência à família seja partilhada pelo homem e mulher, na medida em que ambos os progenitores têm igualdade de direitos e deveres na educação e manutenção dos filhos - as leis de trabalho consagram já não só a licença por maternidade mas também a licença por paternidade.
A maternidade não pode continuar a ser motivo de realização pessoal e, ao mesmo tempo, de discriminação dá mulher.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Termino fazendo votos de que o ano internacional da família salte o ano de 1994 e que o seu objectivo global, de que "os formuladores das políticas e a comunidade em geral reconheçam a família como unidade fundamental da sociedade", seja conseguido plenamente, contribuindo-se, assim, para a fortificação da solidariedade intergerações.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Reis.
O Sr. José Eduardo Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A família, essa complexa unidade social, constitui a instituição onde se desenvolve e se avalia o estado de uma democracia, porque nela se aquilatam os valores que, colectivamente, as sociedades modernas consagram na Declaração Universal dos Direitos do Homem ou na Carta Social Europeia.
Como instância primária de socialização, é na família que se cultiva e desenvolve a liberdade. É nela que se dimensiona o bem-estar de uma população. É através dela que se constroem os valores fundamentais atinentes à civilidade. É na família que se sente o primeiro pulsar de satisfação ou desagrado da comunidade. É ainda nela que se restabelece muito do reequilíbrio das tensões do mundo do trabalho. É na família também que vivificam os mais puros afectos e se aprende diariamente a amar a vida.
Sobrepassando as crises económicas, a família, ao longo do tempo e em todos os lugares, não perdeu a sua condição preponderante de recitadora dos apelos aos equilíbrios a reconquistar, para a manutenção da coesão social.
Independentemente dos credos religiosos ou das configurações políticas, a família é a ordem jusnatural da sociedade. Isto faz dela o campo mais vivificante para o chegar e partir do Homem.
Têm os poderes públicos - poderes ditados e mandatados pela vontade dos cidadãos - de assumir permanentemente o ideário da família como determinante para a delineação de qualquer política pública ou para a tomada de qualquer decisão.
Têm os poderes públicos de saber regular os impostos e os benefícios sociais de acordo com as necessidades das famílias, dando-lhes possibilidades de autonomia e independência económica.
Têm os poderes públicos de cooperar com os pais na educação dos filhos, de possibilitar uma assistência materno-infantil, de garantir uma suficiência de creches e estruturas de apoio aos mais idosos.
Têm os poderes públicos de, uma vez por todas, desenvolver uma política de habitação que nos afaste da humilhante situação de viver sob um tecto indigno, nesta civilização em que todos ansiamos viver.
Todos estes deveres são tão óbvios que nenhuma consciência bem formada os pode recusar, mas, paradoxalmente, parecem coisas menores, que se vão resolvendo ao sabor da boa vontade de alguns e da misericórdia de outros. Não é este o espírito nem a letra da Constituição da República Portuguesa, que ao Estado confere a obrigação de proteger a família, embora se creia na subsidiariedade deste, impondo-se que o Estado não se substitua à consciência colectiva desta instituição e às suas liberdades.
Mas não podemos dar-nos por satisfeitos quanto à situação da família em Portugal. E permita-se-nos lembrar, aqui, dois dados de um relatório sobre a situação da família portuguesa, a partir de um inquérito nacional efectuado em Março de 1993 e cujos resultados foram publicados pela Comissão do Ano Internacional da Família.
A incerteza quanto ao futuro, em termos económicos, e a falta de alojamentos apropriados são factores que, para 80 % dos inquiridos, constituem o maior óbice para a decisão sobre o número de filhos a desejar.
O último censo revela uma estagnação no crescimento da população e um aumento da população idosa, o que naturalmente prenuncia um decréscimo da mesma no próximo futuro. O índice sintético da fertilidade era de 2,12, em 1981, devendo situar-se em 1,5, em 1994.
O Sr. José Puig (PSD): - Está mal!
O Orador: - Neste inquérito, 67 % dos portugueses manifestaram gostar de ter, ou de ter tido, dois ou mais filhos.
Podemos afirmar sem alarmismos que perdemos já o controlo sobre a evolução das gerações. Embora não dramática, a situação merece a nossa profunda apreensão.
Estes resultados são bem o sintoma de duas grandes preocupações dos portugueses: a incerteza do dia de amanhã e as condições de habitação. Aqui, não é apenas o ter onde morar, mas também como morar em casas cada vez
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mais pequenas, onde, entre vários males, existe a dificuldade de uma convivência sadia no seio da família, porque se atropelam os pequenos territórios individuais, pela falta de espaço onde preservar o mínimo de intimidade necessária.
Ouso juntar-me àqueles para quem as crises da família, a começar pela conjugal até à dispersão dos seus membros, está muito ligada à falta de um espaço apropriado para morar e onde também os idosos se isolam cada vez mais, através de barreiras fictícias.
Afinal, que progresso procuramos, se nele não cabe a inteligência do nosso próprio bem-estar?
Não só ao Estado se pode atribuir o dever de proteger e favorecer o desenvolvimento dos anseios da família, também às empresas cabe, como dever e farol do seu estatuto de dignificação, considerar os seus trabalhadores não mais como recurso humano mas como potencial de desenvolvimento e, por extensão, assumirem-se não apenas como empregadores de homens e de mulheres mas como sistemas de desenvolvimento de capacidades, que levem à dignificação humana e ajudem decididamente a não ter o trabalho como um inimigo do bem-estar.
Para além disso, as empresas têm a obrigação de não discriminar o homem e a mulher, quer nas tarefas, quer nos salários, deixando aberta, por via indirecta, a categorização social, não contradizendo os anseios colectivos, que dão à família a expressão da complementaridade de funções, na igualdade de direitos e deveres.
Para além destas preocupações, existem aquelas que se prendem com o crescimento desordenado das zonas fortemente urbanizadas, onde, entre montanhas de cimento, se não descobre como fazer vivificar o convívio e a simpatia entre as famílias.
Também os jovens casais, estão praticamente impossibilitados de comprar ou alugar uma casa, ou, se o fazem, têm de hipotecar fortemente o seu rendimento para a renda ou para o crédito à habitação, precisamente, no país, que, pertencendo ao clube dos Doze, regista a maior percentagem de rendimento destinada à habitação.
Os curtos três meses concedidos a um dos membros do casal para acompanhar o recém-nascido não são, de maneira nenhuma, suficientes para essa complexa e essencial tarefa, estando Portugal, também nesta matéria, atrasado em relação a outros países da União Europeia.
O Sr. José Puig (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - A dureza dos horários de trabalho nas grandes cidades e as distâncias a percorrer até aos serviços, negam aos país o mínimo de tempo que seria exigido para o convívio diário com os filhos.
A maneira como se está hoje a viver nos grandes centros urbanos é um sinal da mais pura irracionalidade.
Assim, também nos campos, com a desertificação e o desmembramento da sociedade rural, se vê perder dia a dia a unidade das grandes famílias, grandemente depositárias de valores e de tradições que enriquecem a cultura de um país.
Vivemos um ano comemorativo da família, direi mesmo que vivemos um ano comemorativo da nossa mais sagrada pertença: a nossa família! Uma idealização mais que necessária para reflectirmos sobre a nossa condição humana no Portugal em que queremos, inteligentemente, viver.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O minuto e meio de que disponho não me permitirá falar de uma família numerosa, mas vou tentar falar de numerosas famílias.
Começo por dizer que a minha intervenção está profundamente marcada pelo drama a que assisti, ontem, numa reportagem televisiva da autoria de José Barata Feio, possível devido aos trabalhos do Rui Araújo, do Samuel Costa e da Sofia Leite, que devia ser vista por todos os Srs. Deputados, em especial, pelos da maioria, pois questiona a situação dos trabalhadores e das famílias em geral que são confrontadas com uma sociedade cada vez mais selvaticamente subordinada à lei do lucro e, por isso mesmo, afectada por uma grande crise de desemprego. Nela aparecia, por exemplo, a família Pereira, com o pai e a mãe analfabetos, ambos desempregados, não se sabendo qual o destino do filho e da filha.
Falar hoje da família, não só no nosso país mas em lodo o mundo, exige que pensemos que, no seio da família, especialmente as mulheres são pressionadas, no sul, para não terem filhos e, no norte, para os terem, e, ainda por cima, confrontadas com a oposição da igreja que nem no nariz permite que se use o preservativo. Esta e uma questão de grande importância, porque não permite o planeamento adequado e, por outro lado, não coloca o desenvolvimento harmonioso da sociedade como a questão fulcral para abordar estes temas, nomeadamente, o da família. É que as mulheres nem no norte nem no sul têm condições para responder às pressões de que são objecto.
É evidente que a família tradicional é questionada na sociedade de hoje, que está em transformação, mas também o é pela desagregação social, consequência do desenvolvimento tecnológico que, por sua vez, não responde ao desenvolvimento social; e igualmente questionada pelo próprio percurso de independência e de emancipação da mulher, que implica que esta assuma outro papel na família, que a estrutura social não e capaz de assimilar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, na abordagem deste tema, é necessário que os direitos sociais e económicos dos cidadãos e das famílias sejam considerados ao nível dos direitos humanos, o que é decisivo para o futuro. Sabemos como isso é difícil - de que serve concentrar o poder económico e político? -, mas só dessa forma, tratando os direitos sociais e económicos como direitos humanos, pode abrir-se um rasgão no véu que encobre o futuro, a tal "réstia de azul", de que falava ontem um desempregado na Suíça.
Quero referir uma iniciativa recente da UMAR, do tribunal de opinião, que, a propósito do Ano Internacional da Família, colocou questões de grande importância, destacando o facto de as próprias leis, que fazem parte do acervo da nossa legislação, não serem postas em prática pelo Governo, designadamente, as que têm a ver com a interrupção voluntária da gravidez, com a existência de creches públicas, com a regulamentação da lei contra a violência sobre a mulher, com as questões do trabalho infantil, etc.
É evidente que a resposta para os problemas que, hoje, atravessam as famílias e os cidadãos passa, com certeza, pelo afastamento do PSD do Governo e pela abertura de novas perspectivas, de uma nova política que tenha em conta os homens e as mulheres para que possa existir, finalmente, um governo de pessoas para pessoas.
Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
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O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar da família em Portugal é, antes de mais, referir a profunda instabilidade eira que centenas de milhares de portugueses vivem, confrontados com mais de 400 000 desempregos, preocupados com os filhos, estes sem perspectivas de poderem contar com um futuro mais adequado e mais digno.
Ao falar-se da família - e este debate foi uma boa iniciativa do Sr. Presidente da Assembleia da República -", não se pode esquecer os que lutam diariamente com problemas de falta de emprego, de assistência, de habitação e de saúde, com o desemprego que origina dramáticas Consequências, a revelarem-se na mendicidade visível e na gravíssima situação criada a milhares e milhares de idosos, como também não se pode olvidar o trabalho infantil, a falta de apoio adequado às crianças e a sua exploração por empresários sem escrúpulos, a inexistência de creches. Tantos e tantos são os problemas com que as famílias se defrontam, Srs. Deputados!
E se considerarmos estes e outros aspectos, logo se verifica, e com razão, a necessidade de iniciativas políticas realistas e não apenas uma correria de discursos, importantes sem dúvida, mas sem sequência. O que se põe é um levantamento profundo sobre a verdadeira situação do País, a deparar ainda com o aumento da criminalidade e do tráfego da droga para que, infelizmente, são lançados inúmeros jovens que, numa situação favorável, nunca cairiam nessas trágicas malhas.
Manifestar solidariedade verbal e piedosa às famílias desprotegidas não basta! Há que criar condições que propiciem mais e novos apoios aos cidadãos em geral, às famílias, aos trabalhadores, que impeçam a exclusão social que se agrava. Para isso impõem-se, como é evidente, medidas governamentais que dêem resposta às questões dramáticas aqui levantadas. Mas o Governo, além de propagandear um Orçamento do Estado que realmente não visa e não vai facilitar a vida às famílias mais desfavorecidas e que não as protegerá, mantém-se mudo.
A propósito, há que criticar a ausência de um qualquer membro do Governo neste debate. Torna-se claro que o Governo encara esta iniciativa como desconfortável, já que iria ser confrontado com a explanação de duras realidades e também porque não tem resposta política positiva para as minorar.
À família há que proporcionar uma nova política social, uma política de emprego, de ensino, de educação, de assistência, de saúde, enfim, de protecção social, O que só será atingido com a adopção de uma política de desenvolvimento que considere todos os valores familiares e humanos, o que nunca será possível com este Governo, que já deu bastas provas de incapacidade e que urge ver substituído.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só assim, com a substituição deste Governo, se poderá encarar o futuro com mais esperança, com a adopção de uma política mais realista que melhore a situação política, familiar e social que, finalmente, altere substancialmente as condições de vida de todos os portugueses.
(O Orador reviu.)
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, congratulo-me com as intervenções que ouvi, algumas delas, bastantes, de grande nível reflexivo sobre os problemas centrais que a família, que todos intuem como célula basilar, como núcleo elementar da sociedade, atravessa nos tempos que vivemos.
Entretanto, encontra-se entre nós, na tribuna, a Sr.ª Dr.ª Teresa Costa Macedo, que veio de uma reunião, em Paris, onde foi aprovada uma declaração dos direitos da família, ocorrida anteontem sob a presidência do Presidente da República Francesa, no Eliseu.
Dessa declaração constam doze direitos fundamentais da família. Aliás, o texto foi já distribuído, pelo que podem verificar que, no nosso debate, bordejámos as questões fundamentais que, hoje, se colocam nesta área. Nela fazem-se afirmações de direitos basilares, além de considerações tradicionais de que a família é um lugar privilegiado de trocas, de transmissões e de solidariedade entre gerações, da igualdade dos cônjuges, etc., falando-se também da importância das condições económicas e sociais, de meios adaptados às realidades e necessidades de cada sociedade, da importância da habitação - na verdade, é um drama brutal do nosso tempo e da nossa sociedade em particular, a carência de meios adequados para a habitação da família -, da importância do ambiente e da paz. Lembro também que houve aqui uma intervenção que aludiu à paz como elemento basilar para a vida em família e tudo isto consta neste texto, que me parece muito bem elaborado, embora o tenha lido muito rapidamente.
Esta declaração foi subscrita por 102 países, representantes de governos e organizações de família de iodos os continentes, pelo que nela estão filtradas e sedimentadas as culturas e contributos de cada civilização.
Este é, portanto, um texto sobre o qual devemos meditar, pelo que irei solicitar à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, em particular à respectiva presidente, que tome a seu cargo a sua tradução, no sentido fazermos uma edição comemorativa do dia e deste nosso debate, que, repito, foi um debate de excelente nível.
Entretanto, deu entrada na Mesa um projecto de resolução que sublinha algo muito importante e cuja autoria real é do nosso colega Deputado Adriano Moreira, lembrando a importância que a Declaração Universal dos Direitos do Homem tem na afirmação dos direitos da família (aliás, o mesmo texto é invocado nesta declaração de Paris), na definição, no nosso tempo, do quadro essencial da família e dos deveres fundamentais que o Estado e a política têm relativamente a ela.
Este texto está distribuído e. se ninguém se opõe, iria pô-lo de imediato à votação, podendo este ser um fecho feliz para o debate, com o qual, mais uma vez, me congratulo.
Srs. Deputados, dado que não há oposição, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 134/VI - Sobre a Comemoração do Ano Internacional da Família (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Deputado independente João Corregedor da Fonseca (Indep.).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, não estão programados, antes do Natal, quaisquer trabalhos a realizar em Plenário; as comissões funcionarão na próxima semana, iniciando-se o período de férias parlamentares na quarta-feira, dia 20 de Dezembro.
Resta-me, retribuindo, aliás, alguns cumprimentos que já me foram dirigidos por alguns dos oradores que intervieram neste debate, desejar-vos a todos, Srs. Deputados, um bom, feliz e santo Natal e que o próximo ano seja aquele em que a promessa em que todos sempre acreditamos se vá realizando.
Estendo este desejo de Boas Festas aos nossos essenciais colaboradores, funcionários desta Casa e do Plenário, bem como aos Srs. Jornalistas, que têm o cuidado de pôr aquilo que fazemos ao alcance dos cidadãos que aqui não podem vir.
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A todos, pois, o meu voto de bom Natal e, em termos de Plenário, até ao próximo ano.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar no dia 4 de Janeiro de 1995. Está encerrada a sessão.
Eram 12 horas e 25 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Álvaro José Martins Viegas.
António Augusto Fidalgo.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
João José Pedreira de Matos.
José Albino da Silva Peneda.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Costa Gerades.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Macheie.
Partido Socialista (PS):
Alberto Árons Braga de Carvalho.
António Alves Martinho.
António Luís Santos da Costa.
António Poppe Lopes Cardoso.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
José Luís Nogueira de Brito.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Domingos Duarte Lima.
Francisco João Bernardino da Silva.
Luís António Carrilho da Cunha.
Manuel da Costa Andrade.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
João António Gomes Proença.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Maria Teresa Dona Santa Clara Gomes.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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