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Sexta-feira, 10 de Março de 1995 I Série - Número 50
VI LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE MARÇO DE 1995
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Meio
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Após o Sr. Deputado Alberto Martins (PS) ter feito a síntese do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.º 494/VI - Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos (CDS-PP), intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Narana Coissoró (CDS-PP), Mário Tomé (Indep.) Guilherme Silva (PSD). José Vera Jardim (PS), António Filipe (PCP), Manuel Queiró (CDS-PP), Fernando Costa (PSD) e Manuel Sérgio (Indep.).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva. Adérito Manuel Soares Campos. Adriano da Silva Pinto. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Álvaro José Martins Viegas. Américo de Sequeira. Anabela Honório Matias. António Augusto Fidalgo. António Costa de Albuquerque de Sousa Lara. António da Silva Bacelar. António de Carvalho Martins. António Esteves Morgado. António Germano Fernandes de Sã e Abreu. António Joaquim Bastos Marques Mendes. António Joaquim Correia Vairinhos. António José Barradas Leitão. António José Caeiro da Motta Veiga. António Manuel Fernandes Alves. António Moreira Barbosa de Melo. António Paulo Martins Pereira Coelho. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha. Arménio dos Santos. Belarmino Henriques Correia. Carlos Alberto Lopes Pereira. Carlos Alberto Pinto. Carlos de Almeida Figueiredo. Carlos Filipe Pereira de Oliveira. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel de Oliveira da Silva. Carlos Manuel Duarte de Oliveira. Carlos Manuel Marta Gonçalves. Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira. Cecília Pita Catarino. Cipriano Rodrigues Martins. Delmar Ramiro Palas. Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva. Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista. Fernando Carlos Branco Marques de Andrade. Fernando dos Reis Condesso. Fernando dos Santos Antunes. Fernando José da Costa. Fernando José Russo Roque Correia Afonso. Fernando Monteiro do Amaral. Filipe Manuel da Silva Abreu. Francisco Antunes da Silva. Francisco João Bernardino da Silva. Guido Orlando de Freitas Rodrigues. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva. Hilário Torres Azevedo Marques. Jaime Gomes Milhomens. João Alberto Granja dos Santos Silva. João Álvaro Poças Santos. João do Lago de Vasconcelos Mota. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado, João Granja Rodrigues da Fonseca. João José da Silva Maças.
Joaquim Cardoso Martins. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Maria Fernandes Marques. Joaquim Vilela de Araújo. Jorge Avelino Braga de Macedo. José Alberto Puig dos Santos Costa. José Álvaro Machado Pacheco Pereira. José Augusto Santos da Silva Marques.
José Guilherme Reis Leite. José Júlio Carvalho Ribeiro. José Leite Machado. José Macário Custódio Correia. José Manuel Alvares da Costa e Oliveira. José Manuel Borregana Meireles. José Manuel da Silva Costa. José Manuel Nunes Liberato. José Mário de Lemos Damião. José Mendes Bota. Luís António Carrilho da Cunha. Luís Carlos David Nobre. Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Luís Manuel Costa Geraldes. Manuel Acácio Martins Roque. Manuel Albino Casimiro de Almeida. Manuel Antero da Cunha Pinto. Manuel da Silva Azevedo. Manuel de Lima Amorim. Manuel Filipe Correia de Jesus. Manuel Joaquim Baptista Cardoso. Manuel Maria Moreira. Maria da Conceição Figueira Rodrigues. Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira. Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia. Maria Luísa Lourenço Ferreira. Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa. Mário Jorge Belo Maciel. Melchior Ribeiro Pereira Moreira. Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva. Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas. Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos. Olinto Henrique da Cruz Ravara. Pedro Augusto Cunha Pinto. Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho. Rui Alberto Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp. Rui Fernando da Silva Rio. Rui Manuel Lobo Gomes da Silva. Simão José Ricon Peres. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Virgílio de Oliveira Carneiro.
José de Almeida Cesário. José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Costa Leite. José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho. Alberto da Silva Cardoso. Alberto de Sousa Martins. Alberto Manuel Avelino. Alberto Marques de Oliveira e Silva. Ana Maria Dias Bettencourt. António Alves Marques Júnior. António Alves Martinho.
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António de Almeida Santos. António Fernandes da Silva Braga. António Manuel de Oliveira Guterres. Armando António Martins Vara. Carlos Manuel Luís. Carlos Manuel Natividade da Costa Candal. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues. Eduardo Ribeiro Pereira. Elisa Maria Ramos Damião. Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa. Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins. Gustavo Rodrigues Pimenta. Jaime José Matos da Gama. João Cardona Gomes Cravinho. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Rui Gaspar de Almeida. Joaquim Américo Fialho Anastácio. Joaquim Dias da Silva Pinto. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira. Jorge Lacão Costa. Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho. José António Martins Goulart. José Eduardo dos Reis. José Eduardo Vera Cruz Jardim. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Júlio Francisco Miranda Calha. Laurentino José Monteiro Castro Dias. Leonor Coutinho Pereira dos Santos. Luís Filipe Nascimento Madeira. Luís Manuel Capoulas Santos. Manuel Alegre de Meio Duarte. Manuel António dos Santos. Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio. Nuno Augusto Dias Filipe. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Raúl Fernando Sousela da Costa Brito. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz, Rui António Ferreira da Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha. António Filipe Gaião Rodrigues. Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas. José Manuel Maia Nunes de Almeida. Lino António Marques de Carvalho. Luís Manuel da Silva Viana de Sá. Maria Odete dos Santos. Miguel Urbano Tavares Rodrigues. Octávio Augusto Teixeira. Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Sá
Narana Sinai Coissoró. Rui Manuel Pereira Marques.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia 15abel Maria de Almeida e Castro.
Deputados independentes:
Mário António Baptista Tomé. Raúl Fernandes de Morais e Castro. Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas para informar que irão reunir durante a tarde a Comissão de Petições, a Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste e a Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a ordem do dia, que, como sabem, é fixada pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP e da qual consta a discussão e votação do projecto de lei n.º 494/VI - Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos (CDS-PP).
Tem a palavra, para apresentar o relatório da Comissão, Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos termos regimentais, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias aprovou um relatório sobre esta matéria que, de acordo com as regras clássicas, é um relatório inciso, preciso e conciso.
Assim, direi que o projecto de lei que iremos apreciar visa alterar a Lei n.º 4185, de 9 de Abril, e lembrarei que sobre esta matéria já houve, em 1987 e 1988, debates na Assembleia da República, podendo dizer-se que, em grande medida, a Lei n.º 4185 hoje vigente foi filtrada pela alteração de 1987, que teve, aliás, os votos favoráveis do PSD, do PS e do CDS.
Esta proposta referente ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos versa matéria da exclusiva competência da Assembleia da República e insere-se num quadro mais largo de exclusividade de competências, que têm a ver com as regras estatutárias dos titulares de cargos políticos em geral e de que esta matéria é uma especialidade. Aliás, é notado no relatório que, nos termos da Constituição, esta matéria não se aplica directamente a não ser por mediação legislativa aos deputados dos Açores e da Madeira e julgo já haver lei específica na sua aplicação aos juízes do Tribunal Constitucional.
Direi ainda que, em nosso entender, e o relator fez notícia dessa interpretação, hoje em dia a matéria do estatuto dos titulares de cargos políticos é mais ampla, estando a ser repensada em vários Estados europeus, sobretudo enquanto matéria atinente às incompatibilidades, impedimentos, exclusividades, imunidades, responsabilidades em geral, sendo, por isso, a questão remuneratória distinta, pelo que, a nosso ver, se divide em duas vertentes, sendo uma a estatutária. Nessa vertente pretende-se saber, por um lado, em que medida o estatuto é compatível com uma exigência acrescida de deveres, direitos, privilégios e regalias compensatórias e, por outro, até onde as prestações à
Oliveira de Miranda Barbosa.
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segurança social são susceptíveis de uma reparação ou recompensa resultante do pagamento que é atribuído. Essa é uma questão específica, que em vários domínios do direito comparado é respondida de forma diversa.
Todavia, o relator não quis juntar a documentação diversa e abundantemente recolhida em termos de direito comparado porquanto entendeu que esta matéria é apenas um aspecto parcelar de todo o estatuto dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos que hoje e um pouco por toda a parte está a ser repensado.
Por último e concluindo, lembrarei que no projecto de lei que nos foi presente pelo CDS-PP não está regulada a matéria respeitante aos direitos adquiridos e quem são as pessoas/entidades que já adquiriram esses direitos.
Como se sabe, hoje em dia, a ideia da não retroactividade das leis não é só uma exclusividade da lei penal mas também da lei cível e, por isso, esta é uma matéria controversa e susceptível de diferentes e diversas interpretações.
Assim, em termos técnico-jurídicos, a Comissão concluiu, votando por unanimidade este relatório, que não há quaisquer razões que obstem à sua discussão em Plenário.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está assim apresentado - e bem - o relatório, na sua síntese significativa, pelo que vamos passar à discussão propriamente dita.
Tem a palavra, para a primeira intervenção, o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei sucinto e incisivo que hoje submetemos ao debate é um acto ousado. Estamos conscientes, quer do sentido do voto dos nossos colegas de outras bancadas, quer dos argumentos com que nos vão atacar, aliás, já anunciados pela comunicação social.
A palavra de ordem para o PSD partiu do Sr. Ministro-Adjunto Marques Mendes à saída da conferência de líderes no próprio dia em que, exercendo um direito que o Regimento da Assembleia nos confere uma única vez durante a sessão legislativa, fixámos a ordem do dia. Decidimos esgotar esse direito com esta iniciativa, exigindo desta Câmara a sua reflexão e o seu voto sobre uma matéria que diz respeito e depois à chamada «classe política» e, finalmente, ao próprio sistema político em que nos movemos, neste seu avatar cavaquista em fase terminal, a que chamamos de presidencialismo do Primeiro-Ministro, com a consequente desvalorização do papel da Assembleia da República, e quando se divisa já no horizonte um novo estádio que queremos seja de autêntica democracia dos cidadãos, democracia mais participativa e menos ritualista, ou meramente litúrgica, de sinal contrário àquilo em que se transformou ultimamente esta nossa democracia, mais representativa dos partidos que dos cidadãos eleitores.
Queremos com esta iniciativa trazer a esta Câmara uma das preocupações da actual direcção do Partido Popular, por várias vezes expressa desde 1992. O actual Presidente do CDS/PP, Dr. Manuel Monteiro, desde a sua investidura no cargo e com o apoio expresso dos órgãos decisores do partido, tem protagonizado o combate pela erradicação das causas - próximas ou remotas - que objectivamente contribuem para o descrédito de que os políticos padecem junto da opinião pública. A tal ponto que, numa sondagem publicada anteontem no Jornal de Notícias sobre o tema «prestígio das classes profissionais», a classe política surge como a mais penalizada de todas, tendo os inquiridos concedido a magreza de 9,7 % de opiniões positivas contra 35 % de opiniões negativas, logo seguida de outra classe de desprestigiados, a dos desportistas, e mesmo esta bem afastada da nossa, com apenas 17,6 % de opiniões negativas contra 1,4 % de positivas.
Poderemos naturalmente alinhar as mais diversas razões para este desamor do povo pelos seus políticos, mas o certo é que a realidade aí está, para nosso desconforto. A falta de pedagogia democrática, um certo laxismo de comportamentos e de atitudes, o intriguismo que nos leva a rebaixarmos o adversário, o conhecido pecado da inveja, que habita no coração daqueles que tanto ou mais ganham do que os políticos, são motivos que, quando aliados à mais completa ignorância sobre o peso da responsabilidade que recai sobre os eleitos, só podem levar à medição da produtividade do Parlamento pelo número de lugares vazios exibidos pela câmaras televisivas, e à ignorância generalizada do trabalho que os políticos realizam em prol do funcionamento da democracia.
Não era precisa a sondagem que atrás referi - que vem, aliás, na sequência de muitas outras - para tomarmos consciência de que no país se instalou a crença de que os políticos são uma casta de privilegiados face aos demais cidadãos, pois no imaginário colectivo eles auferem rendimentos e benesses que são negados aos outros mortais, aos que vivem da magreza das suas pensões de reforma, dos salários mínimos exíguos, dos vencimentos que se esgotam na primeira semana do mês, que gastam o subsídio de natal para a substituição dos sapatos rotos dos filhos em vez de o usarem para lhes colocar ali prendas.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Pensa-se que a classe política se faz pagar principescamente através de mil e um subsídios e subterfúgios, engordando os seus ordenados e criando regalias para ampliar o seu próprio conforto e bem-estar, sem se preocuparem com as agruras dos seus representados. E não nos devemos esquecer de que, mesmo dentro do universo dos políticos, há uns que passam circunspectos apontando o dedo aos outros, como sucede com os membros do Governo quando acusam os Deputados de endossar as medidas impopulares, ou como justificação para as suas decisões insensatas. O Governo minoritário do Professor Cavaco Silva de 1985-1987 cumpriu com êxito a estratégia previamente definida de culpar a Assembleia da República por travar todas as reformas encetadas pelo Executivo, o que serviu naturalmente a causa do descrédito dos Deputados, tal como está em curso a estratégia do descrédito do Presidente da República, agente político mais alto do regime constitucional.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Outro aspecto que me parece importante referir quando se trata de avaliar o estatuto remuneratório dos políticos, incluindo nesta categoria não apenas os Deputados mas também os membros do Governo, os juízes do Tribunal Constitucional, os eleitos locais e demais agentes políticos, é que, se se diferenciam da função pública em geral, têm hoje regalias e remunerações peculiares sem que a opinião pública ou a comunicação social os coloque no mesmo plano que os Deputados. 15to para não aprofundar a análise, pois sabe-se que existem titulares de cargos não inteiramente privados, como os administradores de empresas públicas, de sociedades de capitais integral ou maioritariamente públicos, os dirigentes ou gestores de ins-
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titutos públicos, os magistrados judiciais do Ministério Público, etc., que usufruem remunerações directas e indirectas que em larga medida ultrapassam os vencimentos, e regalias dos Deputados, quer do ponto de vista da remuneração normal quer do ponto de vista dos abonos inerentes ao desempenho das funções respectivas.
Urge, pois, meter mãos a um levantamento de todas as situações que se traduzam em «regimes de privilégio quando comparadas com as de trabalhadores por coma de outrém, e de todos os benefícios que são utilizados para a captação, para os patamares mais altos da função pública, de quadros técnicos competentes e disputados no mercado. Temos consciência de que os políticos, e muito. particularmente os Deputados, quando portadores de qualificações iguais ou até superiores às de outros quadros de entidades públicas ou privadas, auferem rendimentos inferiores àqueles, o que nem sempre é destacado pelos opinion makers quando dissertam sobre as «regalias dos políticos».
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Seja como for, o estatuto remuneratório dos políticos, nomeadamente o que incorrectamente se designa por «reforma dos Deputados», tornou-se um ponto vulnerável, pois de há algum tempo a esta parte o regime de atribuição do subsídio vitalício no termo do exercício de funções do Deputado mostra-se de difícil aceitação para a opinião daqueles de quem devemos merecer a confiança, consubstanciando uma regalia pelo menos unanimemente rotulada de injustificada e excessiva.
Conscientes desta realidade, não queremos, porém, deixar de salientar que a defesa da causa pública é uma actividade que, não raro, deixa marcas bem profundas naqueles que para si a tomam, através do mandato conferido pela eleição.
Quem conhece a intensidade e o calor que a defesa dos ideais atinge em certas alturas, quem sabe avaliar o peso da responsabilidade que se abate sobre os ombros daqueles que têm de tomar e assumir decisões cruciais em determinadas circunstâncias, quem, por fim, tem presentes os sacrifícios pessoais, familiares e profissionais, que o desempenho de tal mandato acarreta, sabe certamente do que estou a falar e a sublinhar.
Mas, no outro prato da balança, pesam argumentos. É imperioso reconhecê-lo, que tocam a toda a população e, principalmente, aos economicamente débeis e desprotegidos.
Pesa ali a crise económica que o País atravessa agravada por uma retoma que tarda em chegar e cujos frágeis sinais vitais apenas para o Ministro das Finança são perceptíveis; pesa o desânimo sobre o tecido empresarial do País, com o espectro de falências em cadeia das pequenas e médias empresas, fenómeno de cuja actualidade deu recentemente público testemunho um ex-Ministro das Finanças do PSD; pesam os números da produção industrial, que voltou a cair cerca de 3,8 %; pesa a situação da agricultura nacional, estagnada e vergada não só às imposições da União Europeia mas também à parcimónia com que o Governo tem gerido a atribuição dos fundos comunitários destinados à reconversão daquela, à duvidosa reforma da política agrícola comum, associada aos compromissos que a União Europeia teve de assumir em consequência das negociações do GATT e do crescente endividamento real dos agricultores que tiveram de investir capitais próprios na reconversão da suas explorações, financiados taxas de juro cuja amplitude é de todos conhecida; pesa a inflação, que voltou a subir 1,2 pontos percentuais em Janeiro de 1995, e que constitui, no dizer do Professo. Braga de Macedo, um autêntico imposto escondido; pesa, por fim, o dramático aumento do número de desempregados, que subiu para 424 000 em Janeiro de 1995, mais 3,4 % do que em Dezembro de 1994, mais 9,7 % do que no mês homólogo desse ano. O salário mínimo nacional não chega para satisfazer as necessidades mínimas, as pensões são de miséria, e alastram as manchas de pobreza e de exclusão social.
Sr. Presidente, Sr I e Srs. Deputados: É devido a esta situação de desigualdade profunda que existe actualmente na sociedade que entendemos que a Assembleia da República deve sobre esta matéria assumir uma corajosa posição de solidariedade com o País real.
Com efeito, e perante os actuais condicionalismos sociais e económicos do país, difícil se mostra a tarefa de conciliar a existência de certas regalias que os titulares de cargos políticos auferem (a subvenção mensal vitalícia e o subsídio de reintegração), com elementares critérios de justiça social, cuja implementação é uma das tarefas de que nós, Deputados, somos incumbidos.
Quanto à subvenção mensal vitalícia, o seu regime caracteriza-se, desde logo, por prever um período de exercício de funções atributivo do direito à sua percepção assaz reduzido: bastam, efectivamente, oito anos de exercício, consecutivo ou interpolado, de um dos cargos previstos no artigo 1.º da Lei n.º 4/85, de 9 de Abril, ao que acresce a possibilidade de cumulação do tempo de exercício de vários desses cargos pela mesma pessoa.
Nesta última hipótese, acrescente-se, o cálculo da remuneração é feito em função do vencimento base à data da cessação de funções do cargo em cujo desempenho o titular tiver permanecido durante mais tempo, à razão de 4 % por cada ano de exercício, que passa a 8 % quando o beneficiário da subvenção perfaça 60 anos quando se reforma.
Se tivermos em conta que, em condições normais, a maioria dos cidadãos só pode aspirar a reformar-se condignamente aos 65 anos, ou após a prestação de 36 anos de serviço na função pública, não há critério de razoabilidade que possa justificar que o titular de um cargo político possa auferir um subsídio vitalício trabalhando cinco vezes menos tempo do que qualquer outro cidadão.
Em segundo lugar, dir-se-á que o regime de atribuição desta subvenção mensal vitalícia enferma de uma excessiva permissividade. Além de cumuláveis com outras pensões de aposentação e reforma, é ainda cumulável com remunerações que vierem a ser auferidas na actividade privada e até na função pública, excepcionando-se aqui apenas a assumpção do desempenho de cargos políticos e dos cargos de juiz do Tribunal Constitucional, Provedor de Justiça, governador e vice-governador civil, eleito local, embaixador e de gestor público ou de dirigente de instituto público.
O subsídio de reintegração, por seu turno, constitui outro incompreensível desvio dos referidos princípios e regras de justiça social, na medida em que é atribuído independentemente de qualquer averiguação de efectivo prejuízo de reintegração, do exercício de outra actividade remunerada, e qualquer que seja a remuneração, mesmo que superior à de Deputado.
A manutenção desta regalia arrisca-se mesmo a contrariar não apenas as vozes autorizadas que dizem que os políticos perdem muito dinheiro por abandonar a sua actividade profissional normal para desempenhar cargos políticos, como também a evidência de que nenhum membro do Governo ou Deputado à Assembleia da República ingressou no desemprego ou piorou as suas condições de vida após a cessação de funções.
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É por isso que o projecto de lei do Partido Popular propõe a abolição pura e simples desta regalia, mediante a revogação do artigo 31.º da Lei n.º 4/85.
A subvenção mensal vitalícia é também abolida, através da nova redacção que é proposta para o artigo 24.º da Lei n.º 4/85, da revogação dos artigos 25.º, 26.º, 27.º e 28.º e ainda da nova redacção proposta para o artigo 31.º do mesmo diploma legal.
A nova redacção proposta para o artigo 24.º da Lei n.º 4/85 salvaguarda, no seu n.º 1, o direito à contagem do tempo de exercício do cargo ou cargos políticos para efeitos de aposentação ou reforma como tempo de serviço efectivo, lídimo direito de quem entrega ao País o contributo da sua força de trabalho e do seu empenho pessoal na prossecução das tarefas fundamentais do Estado.
O n.º 2 do referido artigo 24.º consubstancia a concessão mínima ao particular circunstancialismo que rodeia o desempenho de um cargo de natureza política, do qual já atrás dei testemunho.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Creio não precisar de acentuar que é hoje imperativo nacional repensar o estatuto da classe política, pois são generalizadas e cada vez mais insistentes as vozes do descontentamento social e institucional.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - A crescente importância e influência dos meios de comunicação de massas e a emergência de fenómenos novos de auscultação dos cidadãos e da sua opinião sobre a maneira como a defesa da causa pública está a ser conduzida em cada momento, pelos vários agentes de tal processo, impõem que actualizemos a nossa mundividência à velocidade da emergência de tais fenómenos.
A democracia representativa mudou de qualidade. Vivemos uma democracia de opinião, e temos de aprender a ouvir e a compreender os sinais que a sociedade nos transmite, sob pena de caminharmos para um divórcio que seria fatal para o próprio regime que tão laboriosamente construímos e que devemos proteger, sem dar tréguas aos seus detractores.
É nesta perspectiva que o presente projecto de lei do Partido Popular constitui um primeiro passo que é indispensável tomar no desencadeamento de um processo mais amplo e global de reforma do estatuto da função política, que, esperamos, conduza ao maior reforço da democracia portuguesa.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, depois de ouvir as suas palavras, apesar de V. Ex.ª ter apontado como razão para este passo que o CDS-PP propõe à Assembleia a revelação ao público e ao povo português da real situação em que se encontram os detentores de cargos políticos, creio que o CDS-PP devia, em primeiro lugar, pedir desculpa por ter contribuído, conjuntamente com o PSD e o PS, para a situação injusta e discriminatória em que estes se encontram, contra o voto e opinião de partidos à sua esquerda.
15so já era claro há sete anos; portanto, esta experiência que o Dr. Manuel Monteiro quer hipocritamente aproveitar é desnecessária e a UDP sempre se pronunciou contra tal situação, ao contrário do CDS-PP.
Mas, Srs. Deputados, se a proposta do CDS-PP tem um conteúdo irrecusável, ela é uma «pública virtude» a esconder «vícios privados», na medida em que este partido é a favor do financiamento dos partidos pelas empresas, das benesses aos grandes capitalistas e financeiros através de incentivos fiscais e subsídios, das indemnizações de 60 milhões de contos aos grandes agrários absentistas, que, afinal, são os financiadores do PSD e do CDS-PP, responsáveis pelo desemprego, pela exaustão do financiamento da segurança social e, em grande parte, no caso dos agrários, pela depressão, desemprego e miséria existente no Alentejo.
Não comungamos da opinião, por várias vezes aqui expressa, de que os detentores de cargos políticos têm de ser especialmente compensados e possuir condições para se sentirem atraídos pela «coisa» pública, para não se quedarem em «meros» funcionários públicos. Se os funcionários públicos se podem dedicar com a remuneração que auferem à causa pública, por que não o poderão fazer os detentores de cargos políticos?
Os cargos políticos devem exigir dedicação a tempo inteiro e não devem ser remunerados, directa ou indirectamente, de forma a colocá-los acima das remunerações médias praticadas. Quem quer assumir-se como político, quem tem projectos e propostas políticas e quer bater-se por vê-las postas em prática no seu país, fá-lo-á sempre, independentemente do volume das remunerações e contra os privilégios, pois é isso que lhe deve exigir o seu cargo.
A «dança» dos políticos dos partidos do grande capital, entre as bancadas do Parlamento e os postos no governo e, depois, nos conselhos de administração ou outros, não beneficiam em nada a transparência, a isenção e a disponibilidade de serviço que devem ser timbre dos cargos políticos, desde o de Deputado ao de membro do governo.
Estamos de acordo - sempre estivemos, ao contrário do CDS-PP - que os detentores de cargos políticos não devem ter um estatuto de cidadania excepcional. Mas, exactamente por isso, não estamos de acordo que a questão se reduza às remunerações e a outras regalias absurdas. Ela vai muito mais longe e é nesse âmbito que deverá ser seriamente tratada.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, devo agradecer ao Sr. Deputado Mário Tomé o facto de ter aproveitado a minha intervenção para, ele próprio, fazer uma intervenção.
Porém, como não tenho qualquer pedido de esclarecimento a fazer à intervenção do Sr. Deputado Mário Tomé, nada tenho a acrescentar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Portugal, como na generalidade das democracias, vêm-se colocando, de forma cada vez mais relevante e com particular sensibilidade da opinião pública, as questões da ética e da transparência das instituições e da actividade política.
Nem sempre, para não dizer quase nunca, esta matéria tem sido tratada com o cuidado, a seriedade e a profundidade que a sua importância, delicadeza e melindre exigem.
Fica-se mesmo às vezes com a sensação de que há quem tenha interesse na deturpação e na desinformação da opi-
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nião pública, estimulando uma cultura antiparlamentar e, por isso mesmo, anti-democrática, com que nenhum responsável político, com o mínimo de dignidade, pode, em democracia, pactuar.
Aplausos do PSD.
Receamos bem que a corrida a que assistimos por parte de cada um dos grupos parlamentares da oposição, apresentando, isolada e avulsamente, iniciativas sobre estas matérias, não visem, efectivamente, viabilizar soluções para uma questão que é séria, sendo de todo indigno tratá-la com a mais despudorada demagogia eleitoralista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E isto é de tal modo assim que cada um dos grupos parlamentares da oposição pretende utilizar o direito potestativo de agendamento próprio e opõe-se a que, em simultâneo, sejam discutidas iniciativas simples de outros partidos, como aconteceu agora com o CDS-PP relativamente a idênticos projectos do PS e do PCP.
Querem estar sozinhos como porta-estandartes «de mais ético e do mais transparente», sem a menor preocupação de viabilizar soluções mas, sim e apenas, com o intuito de captar, aqui e ali, mais uns votos.
Não lhes disputamos essa bandeira, porque ela não é o símbolo da seriedade e do sentido de Estado que caracteriza a nossa forma de estar na política.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Essa é a bandeira da mais ignóbil demagogia populista e do eleitoralismo fácil, que cede cada vez mais ao oportunismo da chamada democracia de opinião, em prejuízo da democracia representativa. Com isto não pactuamos.
Aplausos do PSD.
Confirma-se, uma vez mais, que há forças políticas que não resistem à tentação eleitoral de ir atrás da crítica fácil por, pelo menos, aparentemente, conforme à corrente em moda de ataque generalizado à classe política, na certeza de que outros assumirão o odioso de inviabilizar o que isolada, descoordenada e irresponsavelmente propõem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em nome da ética, procede-se da forma eticamente mais reprovável.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Temos sobre estes métodos ideias e posições muito claras.
Que ninguém duvide de que a dignificação da função política e das instituições passa, também, pela forma séria e responsável como tratarmos estas questões.
Por todas estas razões - e propositadamente -, não vamos pronunciar-nos nem apreciar do mérito ou do demérito das soluções que o projecto de lei do CDS-PP veicula. Como não nos pronunciaremos sobre as soluções que, nestas matérias da ética e da transparência, sejam tratadas em iniciativas isoladas e avulsas de qualquer outro partido.
Faremos isso hoje e fá-lo-emos sempre que tais iniciativas sejam desse modo apresentadas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Entendemos que só serenamente e de uma forma conjunta e global é possível tratar, com profundidade e seriedade, uma das mais melindrosas questões de Estado que hoje, por todo o lado, vem exigindo um esforço de consenso por parte dos responsáveis políticos de todos os quadrantes.
Tenho para mim que a democracia aprofunda-se, enriquece-se e aperfeiçoa-se quando as forças políticas, sem prejuízo das suas salutares diferenças, subtraem, responsavelmente, certas matérias à mera luta político-partidária e se abstêm de usá-las como arma de arremesso político. Esta é uma das matérias em que tal e impõe.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por isso repetimos e propomos, hoje e aqui, o que já havíamos adiantado em conferência de líderes quando se agendou esta iniciativa do CDS-PP, e que, ainda ontem, foi formalmente transmitido, por carta do presidente do PSD aos dirigentes dos partidos da oposição.
Entendemos que a Assembleia da República, Câmara política e órgão de soberania detentor do poder legislativo, não pode deixar de assumir o papel fundamental que nesta matéria lhe compete.
Mas entendemos também que, estando em causa questões que têm a ver com os pilares e fundamentos do próprio Estado de direito democrático, deve a Assembleia da República tratá-las com a maior seriedade e procurando o mais amplo consenso.
Para tal é indispensável um pacto de regime, que permita fixar princípios e legislar em consenso alargado sobre o financiamento dos partidos políticos, o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, as declarações de património, rendimentos e interesses dos titulares dos cargos públicos e políticos e o estatuto e regime de incompatibilidades dos titulares de cargos políticos.
Tudo o que sejam iniciativas isoladas de qualquer grupo parlamentar sobre uma ou outra daquelas matérias, dificilmente poderão, neste momento, subtrair-se a tentações eleitoralistas ou à demagogia mais populista, o que não pode deixar de comprometer, à partida, a sua viabilização.
Não se nos afigura que a instituição parlamentar se dignifique e a democracia se valorize com uma discussão partidária sobre quem melhor defende a ética ou sobre quem mais se bate pela transparência.
Por isso, vamos apresentar na Mesa um projecto de resolução que visa criar uma comissão eventual que reflicta, discuta e estude, de uma forma profunda, séria e global, toda a problemática relativa às questões da ética e da transparência da actividade política, dos seus agentes e das instituições.
Aplausos do PSD.
A comissão poderá ser presidida por um Deputado da oposição e deverá estudar não só o direito comparado como os antecedentes históricos do nosso ordenamento jurídico neste âmbito. Igualmente poderá solicitar trabalhos ou estudos a peritos ou técnicos particularmente qualificados, bem como ouvir as entidades, instituições ou associações que, pela sua natureza e representatividade, devam ser consultadas, incluindo os órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
A comissão deverá elaborar um livro branco em que se fixem os princípios e linhas gerais que devam ser afirma-
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dos e consagrados nesta matéria, apresentando também projectos legislativos sobre cada uma das questões que integram aquilo que pode designar-se por «pacote da transparência».
O grupo parlamentar do PSD, como inequívoca manifestação da sua boa-fé e empenhamento, adianta que se considera desvinculado das posições que, no passado mesmo recente, manteve sobre todas estas matérias.
Estamos até dispostos a partir do zero, o que significa que algumas das propostas da oposição podem mesmo merecer o nosso apoio e acolhimento.
Desta forma, e com a reciprocidade que se espera, pretende-se, desde já, procurar criar condições que proporcionem uma maior aproximação entre os diversos partidos em matéria que, no seu conjunto, constitui uma das mais melindrosas questões de Estado com que hoje nos debatemos.
No nosso entender, a apresentação do projecto de resolução para constituição da comissão eventual deve, logicamente, implicar que todos os grupos parlamentares se abstenham de apresentar quaisquer iniciativas legislativas sobre estas matérias...
O Sr. Jaime Gama (PS): - Não apoiado!
O Orador: - ... e dêem a sua anuência ao desagendamento de diplomas desta área, cuja discussão esteja já fixada.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Era o que faltava!
O Orador: - Faço, pois, em nome do grupo parlamentar do PSD, um veemente apelo a todos os grupos parlamentares para subscreverem a criação e integrarem a comissão eventual ora proposta, e reitero a nossa total abertura para tratar, com a maior seriedade e profundidade, esta questão, confiando no empenhamento de todos no sentido de ser feito o necessário esforço de consensualização de soluções que melhor ajudem a credibilizar as instituições e a actividade política e reforcem a consolidação da democracia e do estado de direito, em Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Narana Coissoró, José Vera Jardim e António Filipe.
Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva: Pareceu-me ouvi-lo dizer, durante a leitura da sua intervenção, que o nosso projecto revelava um comportamento ou um populismo ignóbil.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Disse iniciativas... e, naturalmente, a vosso projecto também se integra.
O Orador: - É que, há poucos dias, ouvi, nesta Sala, chamar a alguém «canalha vulgar»,...
O Sr. Silva Marques (PSD): - E nós ouvimos sanguessugas!
O Orador: já não sei a quem. Julgo que palavra «canalha» foi, realmente, excessiva.
O Sr. Silva Marques (PSD): - O Sr. Deputado só ouve
por um ouvido. Escutou «canalhas» mas não ouviu «sanguessugas»!
O Orador: - Por isso, não estou arrependido de, na altura, ter ficado chocado com essa expressão, mas vejo que ela é bem merecida...
Sr. Deputado, em primeiro lugar, no nosso projecto não há qualquer populismo ignóbil, como não há populismo ignóbil nas iniciativas apresentadas pelos outros Deputados. Quem preza a função de Deputado nunca pode dizer que está perante uma iniciativa ignóbil.
Em segundo lugar, V. Ex.ª não demonstrou onde é que está a ignomínia da nossa iniciativa. Ora não basta dizer que é ignóbil, é preciso demonstrá-lo.
V. Ex.ª não fez uma única crítica, uma única apreciação sobre o que trouxemos a debate. V. Ex.ª tem todo o direito de fazer o discurso que quiser, mas não tem o direito de chamar ignóbil à iniciativa de um grupo parlamentar e, se o faz, é porque quer receber em troca o igual adjectivo pejorativo.
Em terceiro lugar, os chamados pactos de regime, as chamadas comissões, não podem partir do zero. Cada grupo parlamentar tem o direito de apresentar as iniciativas que entender. Os outros podem entender que são de reprovar ou de aprovar, mas não podem, de forma alguma, dizer que querem partir do zero porque o que os outros apresentaram não serve para o debate.
Por isso, não compreendemos que se responda a uma iniciativa particular concreta com uma fuga para a frente, com a criação de uma comissão eventual.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.
O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Em quarto lugar, o próprio Presidente do seu partido escreve ao Dr. Manuel Monteiro, contrariamente à sua adjectivação e aos seus advérbios, dizendo o seguinte: «É impossível negar a existência de um certo divórcio entre os cidadãos e a classe política, entre o Estado e a sociedade, entre os eleitores e os seus representantes, como é impossível não se concluir que uma reconciliação entre os cidadãos e os seus representantes constitui cada vez mais um imperativo a prosseguir de forma clara, determinada e descomplexada. É por estas razões, sumariamente aduzidas, que o PSD vem propor a sua proposta». E depois diz: «Este assunto preocupa-me, como aceito e reconheço que preocupa a si. Nisto não faço distinções, porque não questiono as suas intenções e não pretendo exclusivos, porque a credibilidade do sistema tem de ser conquistada e merecida, por todos os partidos, sem excepção».
Sr. Deputado, confronte a dignidade da carta do Presidente do seu partido, Dr. Fernando Nogueira, com as expressões «ignóbil», «populismo» e outras que saíram da sua boca, quando estava na tribuna! Leia esta carta do Dr. Fernando Nogueira, que é um exemplo de dignidade, leia a sua intervenção e veja se o senhor merece, realmente, estar na direcção do grupo parlamentar de um partido com um presidente que escreve esta carta e a endereça ao Presidente do meu partido!
Protestos do PSD.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a a palavra para exercer o direito de defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pacheco Pereira, dar-lhe-ei a palavra no termo deste debate.
Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, muito sinceramente, tenho verificado que, nos últimos tempos, há Deputados, nesta Câmara, que estão apostados em torná-la menos digna, pelo uso de determinadas expressões.
Vozes do CDS-PP: - É verdade!
O Orador: - Dizia que estão apostados em tomar esta Casa menos digna pelo uso de determinadas expressões, que, penso, só qualificam quem as usa.
Sr. Deputado, não chamei ignóbil à iniciativa de V. Ex.ª e do seu partido. A frase que proferi relaciona-se com um contexto de comportamentos que, no meu entendimento, se reporta ao seu partido de uma forma genérica. É o populismo, que V. Ex.ª tem no próprio nome do seu partido, que se traduz no querer à força agitar«a bandeira da mais ignóbil demagogia populista e do eleitoralismo fácil», como consta do meu discurso.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - A mais ignóbil!...
O Orador: - A mais ignóbil demagogia populista! Pergunto-lhe se não é ignóbil ter votado nesta Assembleia a solução hoje vigente,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... tê-la defendido, tal como consta das actas, e agora esquecer o passado e defender o diploma proposto, como se nunca tivesse defendido o que está em vigor!
Aplausos do PSD.
Pergunto-lhe se não é ignóbil dizer que se vai- dar o vencimento que se recebe como político a instituições de solidariedade social e fazer-se isso, com show off, com o primeiro vencimento que se recebe do Parlamento Europeu, nunca mais se entregando um tostão desse vencimento!
Aplausos do PSD.
Vozes do PSD: - Urna vergonha!
O Orador: - Pergunto-lhe se isto não é ignóbil. Este populismo ignóbil não merece o acordo da minha bancada nem o meu e vai merecer sempre a minha denúncia e a da minha bancada!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - O Dr. Manuel Monteiro que devolva a remuneração e vá comer à sopa dos pobres, para ser coerente!
O Orador: - Quanto às restantes questões que me coloca, eu disse que não discutia, nem discuto, o mérito ou demérito da sua iniciativa. Fiz uma proposta e mantenho esse desafio também ao PP, no sentido de criarmos e implementarmos, com seriedade, uma comissão eventual para tratar destas questões sem demagogias, sem populismos, sem que se verifiquem estas situações, que não servem a democracia!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, V. Ex.ª e o seu partido já dificilmente nos causam admiração. Digo isto pelo seguinte: poucas semanas eram passadas sobre uma intervenção do Sr. Deputado Pacheco Pereira, a propósito de um diploma a respeito da transparência dos rendimentos dos titulares de cargos políticos - diploma que, aliás, teve triste fim, porque sofreu um veto do Sr. Presidente da República -, quando, abrindo um jornal semanário, reparámos que o Dr. Fernando Nogueira era a favor da transparência dos rendimentos, dos interesses e das fortunas, de um regime de incompatibilidades...
O Sr. Silva Marques (PSD): - O problema é que alguns...
O Orador: - Sr. Deputado, deixe-me falar!
O Sr. Silva Marques (PSD): - O problema é que alguns Deputados se esqueceram de pôr tudo no Livro Branco! Foi pena que, em nome da transparência, não se tenham lembrado de pôr tudo no Livro Branco, Sr. Deputado José Vera Jardim! São lapsos de memória que prejudicam a transparência!
O Orador: - Poucas semanas eram passadas, dizia eu, quando o Dr. Fernando Nogueira veio, afinal, na véspera do Congresso do PSD, defender uma tese completamente diferente da que tinha sido veiculada aqui pelo Dr. Pacheco Pereira, para chumbar, in limine, todos as iniciativas do Partido Socialista e de outros partidos,
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, Sr. Deputado, embora V. Ex.ª tenha veiculado aqui uma tese sobre a forma como este Parlamento deve trabalhar que não pode merecer o apoio de qualquer dos parlamentares desta Casa, espécie de areópago grego que se reúne para discutir princípios e fazer livros brancos, ainda não nos esquecemos - os Srs. Deputados têm memória curta -...
O Sr. Silva Marques (PSD): - E o Sr. Deputado também!
O Orador. - ... que nessa mesma ocasião, o Sr. Deputado...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Os Srs. Deputados é que tem memória curta!
O Orador: - ... Pacheco Pereira brandiu a célebre proposta sobre o IRS «a nú» de todos os cidadãos e nunca mais se ouviu falar de tal coisa!
Mas, Sr. Deputado, embora os senhores tenham memória curta e venham propor uma forma de trabalho parlamentar de todo arredia do que ele é na realidade, atrevo-me a perguntar-lhe o seguinte: que ideias têm os senhores sobre esta matéria? Que ideias têm os senhores sobre as incompatibilidades? Que ideias têm os senhores sobre a transparência? Que ideias têm os senhores sobre o regime de remuneração dos titulares de cargos políticos?
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Nenhuma! Demagogia só!
O Orador: - Ou entraram agora em black-out?
E, já agora, Sr. Deputado, diga-me o seguinte: são as ideias do Sr. Deputado Pacheco Pereira ou as do Dr. Fernando Nogueira?
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, em primeiro lugar, V. Ex.ª faz uma leitura das posições da bancada do PSD que não corresponde à realidade. V. Ex.ª vem dizer que há uma contradição entre aquilo que hoje aqui propus, aquilo que foi proposto pelo presidente do meu partido em carta ontem dirigida aos líderes dos partidos da oposição e o que tinha aqui sido proposto pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira, mas não há qualquer contradição entre essas posições.
O Sr. Deputado Pacheco Pereira chamou exactamente a atenção para o facto de estas questões não deverem ser tratadas de forma avulsa e isolada, devendo antes ser alvo de um debate empenhado desta Câmara.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Por que não fizeram um projecto?
O Orador: - Nós entendemos que a preparação desse debate passa pela criação de uma comissão eventual que reflicta...
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Projectos! Projectos!
O Orador: - Sr. Deputado José Vera Jardim, o Sr. Deputado tem o exemplo do passado ainda recente nesta matéria, que essa situação...
O Sr. Silva Marques (PSD): - E tem o exemplo do Livro Branco.
O Orador: - Sr. Deputado, é óbvio - e eu disse-o ali que qualquer Deputado ou grupo parlamentar tem o direito indiscutível e que não se pode pôr minimamente em causa, de apresentar as iniciativas legislativas que entenda. Mas eu também disse - e repito - que é benéfico para a democracia que certas matérias sejam subtraídas à querela político-partidária e deixem de servir de arma de arremesso político. E esta é uma delas.
Sr. Deputado, esta não é apenas uma questão portuguesa. V. Ex.ª sabe tão bem como eu que é uma questão extremamente delicada que se coloca, hoje, em todas as democracias;...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Basta a experiência do Livro Branco!
O Orador: - ... e tem de perceber-se que isto tem a ver com os fundamentos do Estado de direito, com a essência da democracia. Não diga que não vale a pena este esforço, trabalhando numa sede e numa forma parlamentares, de criação de uma comissão eventual, no sentido de elaborarmos, de um modo consensual, os textos relativos a esta questão.
O passado ainda recente revela que as iniciativas isoladas de cada partido, mantendo-se no seu reduto com as suas propostas, não conduzem a essa aproximação.
É que se V. Ex.ª diz que o PSD esteve perfeitamente fechado às propostas que fizeram,...
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - ... nós também podemos dizer que o PS esteve fechado às propostas que fizemos, e o CDS-PP dirá o mesmo.
Ora, é exactamente esta situação da reserva isolada de posições que queremos quebrar numa matéria como esta. E queremos fazê-lo servindo-nos dos meios parlamentares ao nosso dispor, um dos quais é a criação de uma comissão eventual que trabalhe com seriedade e sem eleitoralismo - e V. Ex.ª sabe tão bem como eu que esta pressa com que os grupos parlamentares «queimam» direitos potestativos de agendamento não é para resolver com seriedade esta questão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não estivéssemos nós a meia-dúzia de meses das eleições e não haveria este tipo de iniciativas! E mais direi: o desejo eleitoralista destas propostas é que elas não sejam aprovadas!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, quero colocar-lhe algumas questões.
O PSD aparece, agora, supostamente preocupado com a falta de transparência e com aspectos de imoralidade, que existem na vida política. Ora, a questão que tem de colocar-se é esta: o PSD não tem qualquer tipo de responsabilidade na situação existente? O que é que o PSD tem feito neste país?
Devo dizer-lhe, Sr Deputado, que, pela nossa parte, recusamos completamente a sua acusação de falta de seriedade no tratamento destas matérias. Se os Srs. Deputados dizem que elas não têm sido tratadas seriamente na Assembleia da República, os senhores devem estar a ver-se ao espelho, porque, pela nossa parte, sempre as tratámos seriamente. Se os Srs. Deputados acham que elas não têm sido tratadas seriamente é porque têm responsabilidades nisso.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Os senhores são contra o regime e, portanto, nada têm a ver com isto!
O Orador: - Os Srs. Deputados têm, há muitos anos, uma maioria absoluta nesta Casa, que tem imposto todas as medidas legislativas que quer. Portanto, o PSD tem pesadas responsabilidades nesta matéria e a isso não se pode fugir. O PSD é o primeiro responsável pelos males de que, hipocritamente, agora se queixa, pretendendo, como que fazendo oposição a si próprio, ocultar as pesadas responsabilidades que tem.
Foi ou não o PSD responsável pela criação de uma situação de menor transparência no acesso às declarações de rendimentos e património dos políticos?
Tem sido ou não o PSD que se tem oposto à realização de inquéritos parlamentares destinados a averiguar aspectos fundamentais quanto à seriedade do exercício da Administração Pública?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Foi ou não o PSD responsável, juntamente, nesta matéria, com o PS e com o CDS-PP, pela permissão do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais por empresas?
Foi ou não o PSD exclusivamente responsável por uma situação de imoralidade, ao nível das incompatibilidades de
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titulares de cargos políticos, ao isentar os presidentes de câmara da aplicação do regime geral das incompatibilidades?
O PSD não é responsável por isto?! O PSD, ao vir agora propor hipocritamente que se parta do zero, aquilo
que pretende - mas isso não consentiremos! - é fazer «tábua rasa» das pesadas responsabilidades que tem.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, como o Sr. Deputado referiu, já estão agendadas iniciativas sobre várias destas
matérias. Está aí a oportunidade de o PSD, a breve prazo
e sobre as mais diversas questões, poder provar realmente, no
concreto, as suas intenções. Ou seja, hoje, estamos a
discutir o problema das reformas e, mais tarde, vamos ter a
oportunidade de discutir o problema das incompatibilidades
e o do financiamento dos partidos, altura em que o PSD,
em vez de se refugiar no palavreado oco e nalgumas afirmações de princípio, poderá concretamente fazer prova da
coerência entre as suas palavras e os seus actos.
Porém, Sr. Deputado Guilherme Silva, devo dizer-lhe
que o PSD começa mal. 15to é, por um lado, surge uma
carta do Presidente da Comissão Política Nacional do PSD,
Dr. Fernando Nogueira, aos restantes responsáveis partidários, propondo um processo de diálogo, para usar as suas
palavras, dizendo que este processo de diálogo pode ser
acompanhado ou seguido da criação, se for considerado
conveniente, ao nível parlamentar, de uma comissão, eventual. Mas ainda o PSD não tem resposta a este processo
de diálogo e já vem aqui impor a constituição da tal comissão eventual.
O Sr. Presidente: - Faça o favor de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou terminar já, Sr. Presidente.
Quer dizer, o PSD continua a privilegiar aquele que tem
sido a sua forma de diálogo preferida: o diálogo a sós, transformando o seu próprio monólogo num suposto diálogo.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de dizer apenas
o seguinte: como é do conhecimento geral, está agendada,
para o dia 22, a discussão do projecto de lei do PCP que
propõe a proibição do financiamento de partidos e de campanhas eleitorais por empresas. Sr. Deputado Guilherme Silva, pela nossa parte, estamos inteiramente disponíveis para que outros partidos que tenham iniciativas sobre a mesma
matéria as possam agendar nesse próprio dia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o
Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente,
Sr. Deputado António Filipe, confesso que, neste momento, há dificuldade em dialogar consigo e isto pela seguinte
razão prévia: é que temos uma filosofia política extrema
mente distinta nestas matérias.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Felizmente!
O Orador: - Aliás, esta é uma questão que também
pode colocar-se em relação aos demais políticos e Deputados. Realmente VV. Ex.ªs não podem pretender que aceitemos o estatuto de funcionários que os senhores têm no vosso partido e que se liga com esta questão. O Sr. Deputado não pode querer que isso se imponha a todas as bancadas, porque em VV. Ex.ªs manda o Dr. Cunhal mas em nós manda o eleitorado. Há, pois, uma diferença de base
muito importante nesta questão.
Aplausos do PSD.
Quanto às responsabilidades do passado nesta matéria, temo-las nós, mas têm-nas também VV. Ex.ªs! Não enjeitamos as nossas; esperemos que VV. Ex.ªs também não enjeitem as vossas!
Mas a forma de assumirmos, a tempo, essas responsabilidades é, efectivamente, tomarmos uma posição de convergência em relação a esta matéria, que se encontra consignada na nossa proposta de criação de uma comissão eventual.
Quanto às responsabilidades do passado nesta matéria, temo-las nós, mas têm-nas também VV. Ex.-! Não enjeitamos as nossas; esperemos que VV. Ex.ªs também não enjeitem as vossas!
Mas a forma de assumirmos, a tempo, essas responsabilidades é, efectivamente, tomarmos uma posição de convergência em relação a esta matéria, que se encontra consignada na nossa proposta de criação de uma comissão eventual. E já há precedentes nesta Casa, com resultados frutuosos.
V. Ex.ª sabe que se criou a Comissão Eventual para a Reforma do Parlamento, onde se conseguiram várias soluções de consenso e de unanimidade em matérias que, à partida, pareciam extremamente distanciadas em relação aos órgãos parlamentares. VV. Ex.ªs fizeram triunfar, mercê da nossa abertura - que aqui reafirmamos também para estas matérias -, muitas das vossas posições, o mesmo acontecendo com o Partido Socialista, apesar das acusações constantes de autoritarismo e de falta de diálogo do PSD.
Como temos em nosso abono essa experiência concreta, não me diga que não é aceitável pela vossa bancada caminharmos também para esta! Se partíssemos de precedentes contra nós, então, V. Ex.ª podia dizer: «Não vale a pena, porque já tivemos uma má experiência no passado». Mas a experiência que temos é positiva. V. Ex.ª já o tem dito em outras ocasiões, não vai, com certeza, desdizê-lo agora.
Portanto, espero que o seu partido reflicta e que dê a mão, para conseguirmos avançar nesta matéria, sem o eleitoralismo, sem a demagogia, sem o aproveitamento e sem a preocupação de dividendos políticos, que a aproximação das eleições parece que vem ditando também nas suas paragens.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, não vou repetir outra vez o adjectivo que V. Ex.ª teima em utilizar. Faz parte da sua maneira de ser utilizar essas palavras, depois, aceita que outros lhe chamem outras coisas, mas isso é convosco, nada tenho com isso!
Quanto à alegada incoerência de o CDS-PP vir aqui pedir a alteração de uma determinada lei que anteriormente votou, devo dizer que a mesma cai inteiramente sobre a cabeça do presidente do seu partido, porque ele também quer alterar uma lei que aqui votou. O PSD votou esta lei e, agora, o Presidente do seu partido, o Dr. Fernando Nogueira, vem dizer: «Estou pronto a fazer um pacto de regime para modificar todas essas leis».
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Portanto, todos querem a modificação!
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Ele não quer!
O Orador: - Não há qualquer incoerência em querer modificar as leis que já aqui foram votadas. O que existe aqui é uma completa descoordenação entre o presidente do PSD, o presidente do seu grupo parlamentar e o orador de hoje, porque V. Ex.ª apressou-se a propor a constituição de uma comissão eventual, quando o seu presidente escreveu ao meu, ontem à noite, o seguinte: «E neste quadro que venho propor a V. Ex.ª e ao partido que lidera a imediata abertura de um processo de diálogo entre as respectivas direcções partidárias, nos moldes e termos que rapidamente possam ser acertados».
Vocês não sabem o que o vosso presidente escreve,...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Temos aqui a carta dele!
O Orador: - ... o presidente do vosso grupo parlamentar não sabe o que escreveu...
Primeiro, quis acertar com os presidentes dos partidos a forma de diálogo e, só depois disso, apresentar a medida subsequente da comissão eventual. Mas VV. Ex.ªs vieram a correr propor a constituição de uma comissão eventual, o que é próprio do frenesim e do impulso, como vem no Diário de Notícias de hoje, de que a maioria absoluta só se adquire através do frenesim, através da luta, deixando para lá o diálogo...
Protestos do PSD.
É este frenesim que deve ser evitado! Aquela habilidade, aquela tranquilidade, aquela serenidade que é atribuída ao Dr. Fernando Nogueira tem de ser prezada! Ele quer o diálogo com os presidentes dos partidos, quer acertar as formas e, só depois, avançar para a segunda fase. Não corram atrás do frenesim! Primeiro, leiam a carta do presidente do vosso partido e, depois, façam as propostas.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado
Narana Coissoró, volto a repetir aquilo que disse em relação à
minha intervenção. Afirmei que determinado tipo de comportamento se traduz, na minha opinião, numa ignóbil demagogia
populista. Se V. Ex.ª entende que, no seu partido, se identifica
esta situação, não tenho culpa de ter esse entendimento.
No que diz respeito à divergência que diz haver entre
a posição do grupo parlamentar e a do presidente do meu
partido, só lhe quero dizer que, no PSD, há um diálogo
entre o presidente do partido e o grupo parlamentar...
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Vê-se, vê-se!
O Orador: - ... que nada tem a ver - e V. Ex.ª sabe muito bem isso, melhor do que ninguém! - com a forma como o presidente do seu partido trata os seus Deputados. Há uma diferença muito grande!
Aplausos do PSD.
Percebo que V. Ex.ª tenha dificuldade em compreender esta dialéctica do PSD!
Apresentámos, não em contradição com a carta, pelo contrário, pois é V. Ex.ª que confirma que há a admissão dessa solução pelo próprio presidente do partido,...
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Leia a carta! Leia a carta!
O Orador: - ... uma proposta para constituição de uma comissão eventual, porque estamos, dada a fase em que se encontra a legislatura, interessados em que isto seja feito com uma determinada rapidez ...
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - 15so deve ser mentira!
O Orador: - ... sem prejuízo do diálogo que, mesmo no seio dessa comissão, naturalmente se terá de processar.
V. Ex.ª acha correcto que, por exemplo, hoje se esteja a tratar, no vosso projecto, da questão das remunerações e das subvenções vitalícias e que se esteja, amanhã, no projecto do PCP ou do PS, a tratar das incompatibilidades, quando V. Ex.ª sabe tão bem que estas questões têm absoluta conexão. V. Ex.ª tem de decidir se remunera pior ou melhor os titulares de cargos políticos, consoante eles sejam ou não cumuláveis com outras situações, consoante se opte ou não por um regime de exclusividade. Sabe perfeitamente que não se pode legislar com seriedade se não for de uma forma global, como propomos.
É exactamente porque estas formas isoladas são demagógicas que contrariamos e propomos a solução da comissão eventual, da mesma maneira como já fizemos em relação à reforma do Parlamento, com os resultados positivos que todos conhecemos e que VV. Ex.ªs, mais uma vez, reconheceram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, era para,
sob a figura da interpelação à Mesa, responder às perguntas que
me foram feitas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em face da importância do debate, concedo-lhe a palavra, para esse fim. No entanto, serei rigoroso no tempo concedido.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, não tenho culpa que V. Ex.ª, apesar de ser Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, seja totalmente ignorante sobre as iniciativas que por lá passam.
Tenho aqui um projecto de lei, que tem o n.º 322/VI, apresentado pelo Sr. Deputado Lobo Xavier e outros, sobre o estatuto da função política, no qual estão todos os aspectos globais que V. Ex.ª referiu. Portanto, a ideia do PSD não é nova.
Este projecto de lei jaz debaixo da sua mesa, há dois anos, sem despacho e o PSD vem hoje, como se tratasse de uma ideia nova, dizer que é preciso analisar todos esses aspectos globalmente. Temos aqui um projecto de lei do, então, CDS, que trata todos esses aspectos globalmente. Se ele ficou a jazer na comissão de que é presidente, sem qualquer despacho, é porque o PSD não quer dar andamento a essas matérias e, por isso mesmo, não tem autoridade para dizer: «Para nós, esses aspectos estão interligados».
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Vozes do PSD: - Então, porque é que não agendaram esse?!
O Orador: - Está aqui! Está aqui!
Vozes do PSD: - Então, porque é que não o agendaram?!
O Orador: - Porque é que não agendámos?! Está na Comissão...
Vozes do PSD: - Porque é que não agendaram tudo?!
O Orador: - Não pudemos, porque foi aprovado na generalidade! Depois foi cindido pelo PSD, que apresentou um texto parcelar, e aprovado na generalidade; depois, foi vetado pelo Presidente da República. Agora, está à espera de uma segunda leitura. É melhor saber isso! É melhor saber isso! Porque vocês cindiram o nosso projecto de lei, apresentaram parte dele como vosso, que, depois, foi vetado pelo Presidente da República e está à espera de uma segunda leitura. É essa a razão!
Vozes do PSD: - Por que é que não agendou?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva, dispondo para o efeito de três minutos.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, peço desculpa por ir colocá-lo mal no seio da sua bancada e perante o presidente do seu partido. V. Ex.ª é que não sabe o que se passa realmente na 1.ª Comissão.
Quando V. EX.ª estava a intervir, dei-me ao trabalho de observar as reacções dos Deputados da 1.ª Comissão, dos vários grupos parlamentares, que sabem muito bem que esse projecto foi apreciado conjuntamente com outras iniciativas e que foi prejudicado.
Portanto, não é verdade, como disse, que esse projecto esteja na gaveta, sem ser agendado.
V. Ex.ª não acompanha com a atenção exigida pólo seu partido,...
Protestos do Deputado do CDS-PP, Narana Coissoró.
O Orador: - ... com a atenção exigida pelo que os portugueses pagam, os trabalhos da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e vem fazer afirmações, em Plenário, que não têm o menor fundo de verdade.
Protestos do Deputado do CDS-PP, Narana Coissoró.
O Orador: - Mas, Sr. Deputado, há uma coisa que a interpretação dessa iniciativa legislativa vem revelar: alguma coisa mudou no PP para VV. Ex.ªs terem abandonado essa visão de conjunto e, agora, virem, demagogicamente, com esta solução, com esta iniciativa isolada.
Alguma coisa mudou!
O Sr Narana Coissoró (CDS-PP): - Está aqui!
O Orador: - Algum interesse eleitoral se acendeu para VV. Ex.ªs terem abandonado essa visão de conjunto. Está a ver como V. Ex.ª concorda em que a visão de conjunto é a correcta!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não! Não concordo!
O Orador: - Diga isso ao Dr. Monteiro e retire esse projecto!
Aplausos do PSD.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Já não vai para candidato pelo Algarve, vai pelas Berlengas!...
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E o Sr Deputado vai para a Marinha Grande, para ver se vende o terreno do campo de futebol!...
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sistema político português, tal como concebido pelos nossos constituintes, não ficou totalmente imune aos ventos de mudança que desde finais da década de 8O vêm, um pouco por toda a parte, denunciando um crescente mal-estar entre eleitos e eleitores, com o reconhecimento de um afastamento crescente entre a política e os problemas reais da sociedade, entre os políticos e os cidadãos.
Muito deste afastamento volta-se contra o que se apelida de «classe política», que se pretende responsabilizar pelo ambiente de cepticismo e insegurança que caracterizam hoje largos sectores da opinião pública das sociedades europeias.
Falta de imaginação e de coragem para enfrentar e encontrar soluções para os problemas e, mais grave do que isso, ilegítima e abusiva apropriação de benesses e regalias por parte dos aparelhos político-partidários, mais voltados para a defesa dos seus interesses do que empenhados na prossecução do bem público, eis algumas das críticas mais repetidas.
Não é de estranhar que neste «caldo» renasçam os populismos de variados sinais e que os demagogos do «antisistema» e da «anti-política» surjam à luz do dia como «salvadores da Pátria».
Em Portugal, tudo isto foi agravado pelo clientelismo, a falta de transparência e o maniqueísmo que caracterizam a maioria do PSD e o Governo Cavaco Silva.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O «cavaquismo», com o espírito centralista, de abuso de poder e de desresponsabilização política que o caracterizam, potenciou muitos dos defeitos do sistema baseado no monopólio partidário do exercício do poder e pôs a nú os bloqueamentos de um pluralismo, muitas vezes de fachada, que nunca pôde ocultar a tentação hegemónica do poder sobre a sociedade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Monteiro e o PP são Filhos políticos de Cavaco Silva!
O populismo do PP nasceu e cresce à sombra do cavaquismo.
Aplausos do PS.
Explorar as lacunas, erros e desajustamentos do sistema e, a partir deles, fazer apelo demagógico às pulsões populistas tem sido o papel dos populares na cena política portuguesa.
O PS responde às dificuldades de fecho do sistema sobre si próprio com a exigência de mais participação, mais
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transparência, mais responsabilização. Só abrindo o sistema será possível reganhar para ele a confiança dos cidadãos. E só com o povo se constrói a democracia!
No quadro da revisão constitucional, o PS apresentou um conjunto de reformas, que, por si só, mudarão a face do sistema e se traduzem no fundamental: em dar voz e poder de intervenção aos cidadãos, tonificando os princípios da democracia representativa com formas de exercício directo do poder pelos cidadãos.
No que ao estatuto dos políticos diz respeito, o PS apresentou projectos, que cobrem as questões fundamentais colocadas nesta sede, que dizem respeito: à transparência dos rendimentos, fortunas e interesses; ao regime de incompatibilidades e impedimentos; e, finalmente, ao estatuto remuneratório, em especial no que respeita às subvenções criadas pela Lei n.º 4/85.
Constituem esses três projectos um todo integrado, que introduz sensíveis alterações no actual conjunto de direitos e deveres dos titulares de cargos políticos, arrancando de uma séria ponderação do que está em jogo, e o que está em jogo é única e exclusivamente criar condições de dignificação e valorização da actividade e da função políticas. A política é uma actividade nobre, como as mais nobres, de alta responsabilidade e grande exigência ética, de risco e de coragem, mas também de bom senso e capacidade de entender os outros. Mas a política é também poder e vontade de poder, e o poder corrompe as consciências, amolece a compaixão, incita à imodéstia, torna-se finalidade, quando deve ser simples meio.
Contra estas perversões só conhecemos os remédios da transparência, da regra clara de procedimento e do escrutínio público sobre o exercício do poder.
O PS concorda que em vários aspectos do estatuto dos políticos é necessário um aggiornamento. Muitos dos direitos e deveres que hoje constituem esse estatuto poderão ter tido razões históricas que os justificaram na altura. Hoje, já dificilmente encontrarão justificação.
Mas há duas tentações a que temos de fugir. Uma, é a do raz-de-marée do populismo e da demagogia, quer ele venha da esquerda ou da direita. Não deixar pedra sobre pedra de um edifício que, apresentando brechas, é ainda o único paradigma da vida democrática: a democracia representativa e o sistema partidário.
Aplausos do PS.
A outra é a de, perante as críticas fechar a concha e repetir que «tudo vai bem», com a esperança vã de que, de tanto se repetir, se acreditará ser verdade.
Ambas as tentações estão bem reflectidas neste Hemiciclo.
O PS apresentou um projecto no que respeita às subvenções dos políticos previstas na Lei n.º 4185. Tudo teríamos a ganhar se a sua discussão fosse feita conjuntamente com a do CDS-PP. Infelizmente, e por vontade do CDS-PP, não se obteve o consenso para que tal fosse possível.
O Sr. Narana. Coissoró (CDS-PP): - Não chegaram a pedir!
O Orador: - Comparados os dois projectos, claramente se veria que eles são oriundos de culturas políticas bem diversas.
O nosso projecto abandona o injustificado sistema de subvenção vitalícia, substituindo-o por um sistema voluntário de pensão de reforma com desconto, colocando os políticos em condições idênticas às dos outros cidadãos, embora com reconhecimento da especificidade da actividade política. Por outro lado, toma mais exigentes as condições, quer para a reforma, quer para a atribuição do subsídio de reintegração.
É um projecto que pensamos ser uma contribuição positiva para a dignificação da função política, mas sem hipotecar as nossas posições à demagogia fácil.
O projecto do PP começa por fazer tábua rasa das situações já legitimamente consolidadas, termina com qualquer subsídio de reintegração e impossibilita que os políticos possam, voluntariamente, contribuir para qualquer esquema de reforma, a menos que se integrem em esquema de pensão a que já tivessem direito. Desde logo, fica de fora quem não tiver qualquer esquema de reforma anterior. Poderá passar três, quatro ou cinco legislaturas sem que lhe seja dado contribuir, voluntariamente, para uma pensão futura.
Por outro lado, fica sem se saber se os que já tinham qualquer esquema continuam a descontar e qual a sua base contributiva.
É um projecto para eleitor ver!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É um acto demagógico a propósito de uma questão séria! É «um tiro de pólvora seca» que não pondera soluções justas e equitativas, que possam substituir benefícios e regalias, que - repetimos -, tal como se encontram hoje, são injustificados.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E a maioria? O que pensa o Dr. Pacheco Pereira e o que pensa o Dr. Nogueira? Que projectos tem, se os tem? Que pensa a maioria das incompatibilidades? Afinal, repito, o que pensam sobre este conjunto de questões o Dr. Nogueira ou o Dr. Pacheco Pereira?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E qual a sua posição sobre a transparência dos rendimentos, fortunas e interesses? É a posição do Dr. Pacheco Pereira ou a do Dr. Nogueira que vale?
E sobre as subvenções e reformas dos políticos? Será que tudo vai bem?! Por nós, não! Nem tudo vai bem! Pelo contrário, muito necessita de reforma e alteração, e um dos temas que necessita de alterações é o que, hoje, aqui discutimos, a bem da dignificação dos políticos, a bem da democracia!
O Dr. Fernando Nogueira enviou ontem uma carta aos líderes dos partidos da oposição com uma proposta, chamada «Pacto de regime», sobre esta matéria. Não se trata de projectos, de ideias, de propostas concretas. Trata-se, tão-somente, de mais um número político.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas que fique claro que o PS está disponível para, na Assembleia da República, proceder a uma discussão conjunta dos vários projectos apresentados. Não fazemos das nossas propostas questão fechada! Defendemos um debate, na Assembleia da República, do conjunto das questões que dizem respeito ao estatuto dos políticos. Mas não aceitamos que essa discussão seja feita sem que sobre a mesa estejam as propostas concretas de cada partido,...
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... para, de uma vez por todas, sabermos o que pensa o PSD.
Estas são as regras mínimas do trabalho parlamentar, não nos desviaremos delas um milímetro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Guilherme Silva, Manuel Queiró e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, atrevo-me a pensar que não é por acaso que, neste momento, não está presente na vossa bancada o Sr. Deputado Almeida Santos,...
Vozes do PSD: - E muitos outros!
O Sr. Ferro Rodrigues (PS). - Não está presente pelas mesmas razões que não está o Deputado Pacheco Pereira!
O Orador: - ... dada a sua autoria do diploma que neste momento, vigora sobre esta matéria e dadas as intervenções que fez e constam das actas, na sua qualidade de representante do Partido Socialista, quando, em tempos, o PRD apresentou um projecto de lei similar ao do CDS-PP e próximo do que VV. Ex.ªs agora patrocinam.
Sr. Deputado José Vera Jardim, V. Ex.ª diz que o seu partido está aberto a discutir em conjunto estas questões e põe como condição prévia que haja iniciativas concretas sobre as mesmas. Ora, é óbvio que, no passado, o PSD teve projectos de lei sobre todas estas matérias - V. Ex.ª conhece-os - e, portanto, não é ignorada a nossa posição sobre elas. O que dissemos, e confirmamos, é que não fazemos questão de nos mantermos agarrados a essas soluções.
Assim, se o que pretende é um ponto de partida, embora com aquela reserva, V. Ex.ª já dispõe de textos para elaborar esse trabalho. Não queira obrigar-nos a fazer o que não pretendemos, ou seja, não queira criar agora, de novo, iniciativas que veiculem posições que se extremem e que venham dificultar a aproximação e o diálogo. Pela nossa parte, queremos que esse diálogo se faça no seio de uma comissão, exactamente para consensualiza projectos de lei, tanto quanto possível subscritos por todos os grupos parlamentares, a discutir posteriormente em Plenário e a aprovar, seguindo a tramitação legislativa normal.
Mas há algo que V. Ex.ª não deixou claro, independentemente da exigência que fez - e que penso que estará ultrapassada após a minha explicação -, relativamente à existência de textos do PSD sobre todas estas questões. O PS está ou não de acordo com a constituição de uma comissão eventual que trabalhe de forma global sobre todas estas matérias? E sobre esta questão concreta que gostaria de conhecer a posição do Partido Socialista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr Deputado Guilherme Silva, no seu lugar, não chamaria à colação colegas de bancada meus para, eventualmente, explorar contradições porque - convenhamos! -, nessa matéria, a bancada de V. Ex.ª não deve estar muito à vontade...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Está!
O Orador: - Não se esqueça que VV. Ex.ªs, ainda há meses, apresentaram projectos de lei, aliás isoladamente, que, em três meses, já deixaram de ter valor, já não servem para nada, pelo que não é uma boa maneira de trabalhar!
VV. Ex.ªs apresentaram, nessa altura, um projecto de lei sobre a transparência da vida política! Por que é que só apresentaram esse? Então, antes tivessem apresentado um pacote legislativo! Apresentaram só um projecto de lei sobre a transparência,...
Vozes do CDS-PP: - Foi apanhado!
O Orador: - ... e os restantes?
Sr. Deputado, quanto a projectos de lei concretos do PSD sobre esta matéria, só conheço esse. Mas V. Ex.ª terá a oportunidade de me avivar a memória...
Quanto a projectos de lei sobre as incompatibilidades, tem V. Ex.ª algum?
Quanto a projectos de lei sobre as subvenções, tem V. Ex.ª algum?
Vozes do PS: - Nada, nada!
O Orador: - Avive a minha memória por favor, pois certamente estou esquecido!
Por mim, só conheço um projecto de lei do vosso partido, que VV. Ex.- aprovaram há dois ou três meses, antes do Congresso do vosso partido. Depois disso, o Dr. Nogueira veio «passá-lo a pente fino» e deitá-lo para o lixo.
Assim, digam-me VV. Ex.ªs se há outros. Foram apresentados na Mesa? Estão na Comissão? V. Ex.ª é o Presidente da Comissão, eu sou Vice-Presidente e não conheço nenhum. Conhece V. Ex.ª algum? É que não há nenhum!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, como V. Ex.ª sabe, no Parlamento, desde sempre, as comissões eventuais trabalham sobre projectos de lei...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não é verdade!
O Orador. - Neste caso concreto, desde o momento em que VV. Ex.ªs apresentem projectos de lei sobre as várias questões que estão sobre a mesa, pela nossa parte, estaremos inteiramente de acordo em tomar parte nessa comissão e em trabalhar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, começo por perguntar-lhe qual foi o Deputado da sua bancada que falou com algum Deputado da minha, dizendo, «Temos este projecto para apresentar e pretendíamos agendá-lo conjuntamente com o vosso». Repito que gostaríamos de saber a qual dos Deputados da nossa bancada foi colocada essa questão. Não foi ao Sr. Deputado Narana Coissoró, porque ele acabou de confirmá-lo, ...
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O Sr. Rui Carp (PSD): - Foi em conferência de líderes! Sou testemunha disso!
O Orador: - ... nem foi a mim próprio, pelo que gostaria de saber como foi!
Em segundo lugar, desejava questioná-lo sobre outra questão.
O Sr. Deputado sabe que, em Outubro de 1992, demos o pontapé de saída, digamos assim, nesta questão com um projecto de lei idêntico ao que apresentámos agora. Nessa altura, o seu partido adoptou a mesma linha de argumentação do PSD, dizendo que era necessário não atacar o problema daquela maneira, que se tratava de uma demagogia, que era um populismo, que as regras de funcionamento do sistema político tinham de ser encaradas globalmente e que existiam diversos aspectos da mesma matéria que deveriam ser apresentados num mesmo projecto de lei global.
Em Junho de 1993, esse projecto de lei, já aqui referido, foi apresentado pelo nosso partido e, logo no seu artigo 1.º, sobre o âmbito de apresentação, estavam referidas as incompatibilidades, a transparência do património dos políticos, os crimes de responsabilidade, o financiamento dos partidos e a transparência na utilização de fundos públicos. Ora, aquele diploma foi aprovado por unanimidade - e, portanto, o Sr. Deputado aprovou-o, tal como todos os Deputados desta bancada -, em resposta à exigência de consenso e da globalidade de apreciação dos diferentes aspectos de funcionamento do sistema político.
Aquele projecto de lei, que foi aprovado na generalidade - e seria ridículo querer apresentar hoje um projecto de lei sobre algo que já está aprovado na generalidade, mas que ainda não subiu a Plenário para votação final global -, está «a dormir» na Comissão e apenas serve para o PSD ir «pescando» aspectos isolados para, depois, os apresentar sob a forma de decreto-lei do Governo. É este o consenso que interessa ao PSD, o consenso feito por decretos-leis!
Perante isso e estando-se em final de legislatura, quando continuamos a forçar a apreciação destas matérias, voltando ao início do processo, como é possível que o PSD nos diga novamente: «Não, voltamos à conversa inicial: o que é necessário é consenso, o que é necessário é um projecto global».
Que o eleitor seja potencialmente enganado por estas manobras políticas de nomeação de comissões, de adiamento para depois das eleições e de desagendamento, ainda vá! Mas espanta-nos que o Partido Socialista, no final da legislatura, venha novamente dizer «estamos abertos, estamos abertos» e, assim, dar outra vez credibilidade a esta manobra política!
Portanto, gostaria que o Sr. Deputado esclarecesse devidamente em que termos aceita entrar num diálogo deste tipo e na formação de uma comissão eventual, sem que, hoje, se verifique uma votação positiva por parte do PSD, que assim dê um sinal inequívoco de que a sua atitude mudou.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Essa é boa!
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferraz, de Abreu, dar-lhe-ei a palavra depois da resposta do Sr. Deputado José Verá Jardim.
Sr. Deputado José Verá Jardim, tem a palavra para responder.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, quanto à sua primeira questão, respondo-lhe que não está informado, ...
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Está, está!
O Orador: - ... como também não estava o líder do seu partido, Dr. Manuel Monteiro, que, ainda esta manhã, mostrou estranheza, quando eu próprio tomava parte num debate, na TSF, em que ele falava de um lado e eu do outro. Nesse debate, quando eu disse que tinha sido pena que não pudesse ser feita uma discussão conjunta, o Dr. Manuel Monteiro mostrou estranheza e disse: «15so é lá uma questão com o Dr. Narana Coissoró. Eu não sei disso!»...
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - O Sr. Deputado estava a faltar à verdade!
O Orador: - Sr. Deputado, em conferência de líderes, pôs-se o problema e VV. Ex.ªs, opuseram-se! Há aqui muitas pessoas que testemunharam isso! ...
O Sr. Rui Carp (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Portanto, espero que V. EX.ª esteja esclarecido.
Sr. Deputado Manuel Queiró, pensei que tinha sido suficientemente claro. Nós não alinhamos em manobras dilatórias. É precisamente por isso que não alinhamos em areópagos de opiniões para discutir princípios, princípios esses que nem sequer constam da carta do Dr. Nogueira. Não tem nem um! A carta do Dr. Nogueira contém banalidades sobre o sistema político, os políticos, etc., mas quanto a ideias concretas, zero. Daí que digamos: «projectos em cima da mesa, de todas as forças partidárias que quiserem apresentá-los e sobre as matérias que quiserem!»
Nós temos os nossos projectos de lei para discussão, os senhores também têm, o PCP também, só o PSD não tem um único!
O Sr. Rui Carp (PSD): - O PSD também tem!
O Orador. - Mas eu já vos perguntei isso. VV. Ex.ª continuam a dizer que têm e eu pergunto: quais são? Onde estão?
O Sr. Rui Carp (PSD): - E as leis que estão em vigor? Não valem nada?
O Orador: - Portanto, Sr. Deputado Manuel Queiró, não venha pedir-nos, com essa demagogia: «Para começar, votem o nosso projecto.» Alto! Alto!
Nós dizemos: «Ponham os projectos em cima da mesa e vamos discuti-los». Mas não é por isso que aprovaremos tudo o que vier para cima da mesa.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Era o que faltava!
O Orador: - Estamos abertos, não fazemos questão fechada das nossas propostas, mas quanto a aprovar o vosso projecto de lei, para começar, não conte com isso, Sr. Deputado!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria de esclarecer o
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Sr. Deputado Manuel Queiró. Na realidade, deveria ter pedido informações ao Sr. Deputado Narana Coissoró.
Estive na conferência de líderes e, de facto, os outros diplomas só não foram agendados para hoje porque o Sr. Deputado Narana Coissoró disse que não aceitava esse agendamento. O PSD também não aceitou que, ao nosso agendamento para a sessão do próximo dia 15, fossem juntos outros projectos do PS, formando um pacote legislativo sobre esta matéria. Esta é a verdade, pois foi, o que se passou nessa conferência.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, antes de lhe pedir esclarecimentos, quero «varrer a minha testada».
Com efeito, na conferência de líderes, o representante de V. Ex.ª, Deputado Alberto Costa, pretendeu agendar para a sessão de hoje dois diplomas que nada tinham a ver com o estatuto remuneratório dos titulares de cargos público, ou seja, aqueles que estão agora agendados para o próximo dia 13, relativos ao regime de incompatibilidades de titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, registo de interesses de Deputados e alargamento das respectivas incompatibilidades e impedimentos. A resposta que dei - e vamos lá ver se nos entendemos! - foi que o nosso projecto versa o estatuto remuneratório e nada tem a ver com as incompatibilidades e registos. Aliás, sobre esse aspecto, também temos outro diploma.
Não vamos, por isso, misturar o diploma dou estatuto remuneratório com o das incompatibilidades e interesses.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Ai não!...
O Orador: - Não! Sr. Deputado Rui Carp, ouça-me pela última vez! Aprenda alguma coisa na vida!
Risos.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Consigo já não aprendo nada!
O Orador: - Querem ou não ouvir o que tenho para dizer?
Foram os senhores, do PSD, que retiraram do nosso diploma geral sobre o estatuto da função política a parte respeitante à declaração de rendimentos para a apresentar como vosso projecto. Portanto, vimo-nos forçados a desdobrar o nosso projecto geral quanto à matéria relativa à declaração de rendimentos.
Esse diploma foi «chumbado» pelo Presidente da República e agora está parado, porque os senhores não têm coragem de pedir uma segunda leitura. Foi essa a razão por que o nosso projecto global teve de ser cindido em vários capítulos e agendámos para a sessão de hoje apenas a matéria das remunerações.
Aprendeu, Sr. Deputado?
O Sr. Rui Carp (PSD): - Não aprendi nada!
O Orador: - Nunca aprende!...
O Sr Rui Carp (PSD): - Fico a aguardar as cenas dos próximos capítulos!
O Orador: - Sr. Deputado José Vera Jardim, não deixámos agendar os outros diplomas porque estavam em causa matérias diferentes!
O Sr. Jaime Gama (PS): - Era a mesma!
O Orador: - Não, Sr. Deputado! O vosso diploma relativo ao estatuto remuneratório apenas deu entrada ontem e ainda não baixou à 1.ª Comissão. Isto era o que lhe queria dizer quanto ao agendamento conjunto.
Quanto à crítica que fez ao nosso diploma, dizendo que ele não prevê os direitos adquiridos, aposentações, etc., tenho a dizer-lhe que prevê! V. Ex.ª tem é de o conjugar com o regulamento da Caixa Nacional de Aposentações,...
Vozes do PSD: - Ah!
O Orador: - ... que é a lei geral!
Com efeito, quando dizemos que este tempo conta como serviço efectivo para efeitos de aposentação,...
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado, pois já esgotou o tempo de que dispunha, quer o de intervenção, quer o do seu partido.
O Orador: - ... temos de recorrer ao respectivo regulamento para determinar quais os descontos a fazer; descontos esses que até podem ser feitos em 20 anos, em prestações mensais! Portanto, o que têm de fazer é estudar o regulamento da Caixa Geral de Aposentações.
O Sr. Presidente: - Para responder - em relação ao que lhe disser respeito, naturalmente -, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, de acordo com a informação que me foi dada pelos meus colegas que estiveram na conferência de líderes, VV. Ex.ªs ter-se-iam oposto à discussão conjunta do nosso projecto de lei sobre esta matéria.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Porque não era sobre a mesma matéria!
O Orador: - Essa é a posição de V. Ex.ª. A minha informação é diversa.
Sr. Deputado Narana Coissoró, na minha intervenção referi dois ou três aspectos de imperfeição técnica, que resultaram do facto de ter pensado pouco nos problemas, mas é evidente que essa não é a causa da nossa oposição de fundo ao vosso projecto de lei!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ah!
O Orador: - A verdade é que o vosso projecto de lei faz tábua rasa de tudo, atira tudo para o lixo e diz «daqui para a frente, vida nova!», como vemos escrito em todas as paredes.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Veja os dois últimos artigos!
O Orador: -- Sr. Deputado, penso que VV. Ex.ªs têm direito a ter vida nova, mas não queiram impor a todos os outros, que já têm as suas propostas pensadas, ponderadas e justificadas há muito tempo, que alinhem - desculpe que lhe diga - nessas vossas precipitações de demagogia.
Aplausos do PS.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso é porque não sabe o que o país quer! Só um é que sabe!...
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Comunista Português considera hoje, como sempre considerou, que as reformas dos políticos são um princípio injustificável e que deve ser abolido.
Pensamos isto hoje, em Março de 1995, como o pensávamos em 1984, quando a proposta foi apresentada pelo Governo do bloco central, em 1985, quando essa proposta foi aprovada, e em 1987, quando foi discutida a proposta para que as reformas fossem abolidas.
Pode haver quem pense agora uma coisa diferente do que pensava e fez nesses anos. Foi pena que não pensassem o que dizem hoje pensar quando as decisões foram tomadas.
O Sr. Limo de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Chamamos aqui esta questão porque as reformas dos políticos, tal como existem, têm responsáveis e é importante que o País recorde os comportamentos e responsabilidades históricas para poder ajuizar sobre os comportamentos actuais.
As reformas dos políticos existem porque o Governo do bloco central, PS/PSD, apresentou a proposta da sua criação em Outubro de 1984, através da proposta de lei n.º 88/III. Aí se propunha expressamente a atribuição aos políticos com oito anos ou mais de exercício de funções de uma subvenção mensal vitalícia, de quantitativo equivalente a 4 % do vencimento base por cada ano de desempenho do cargo.
Esta proposta foi, nos mesmos termos, integralmente subscrita pelo CDS no seu projecto n.º 400/III, apresentado um mês depois da proposta governamental. O CDS não se opunha às reformas, achava sim que os aumentos então verificados nos vencimentos dos políticos deveriam ser faseados, atingindo só dois anos depois, em 1987, a sua plena eficácia.
O PCP opôs-se especificamente a esta reforma vitalícia dos políticos em todas as fases do processo da sua aprovação, incluindo na votação na especialidade, bem como nas votações na especialidade realizadas durante o processo de confirmação do diploma, após o veto que o Presidente da República exerceu sobre ele.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Bem lembrado!
O Orador: - Votámos contra o artigo 26.º da proposta PS/PSD, como votámos contra o artigo 25.º do projecto n.º 400/III do CDS, já que ambos propunham a mesma exacta reforma vitalícia dos políticos.
No debate na especialidade, subsequente ao veto do Presidente da República, o PCP propôs especificamente a abolição da reforma vitalícia. Dos partidos hoje representados na Assembleia da República, votaram contra a abolição o PS, o PSD e o CDS.
Mas, depois desta votação, propusemos mais: propusemos que a reforma não pudesse ser acumulada com o exercício de qualquer cargo remunerado, público ou privado, nem com outras pensões. Tudo isto foi rejeitado, pelos votos conjugados do PS, PSD e CDS.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Bem lembrado!
O Orador: - Nas eleições que se seguiram, incluímos no nosso programa eleitoral a revogação do estatuto remuneratório dos políticos. Apresentámos mesmo um projecto de lei nesse sentido que, submetido à votação em 1987, foi rejeitado, mais uma vez pela conjugação de votos do PS, PSD e CDS.
Poderão dizer que o projecto do PCP previa não só as abolições das reformas como dos próprios aumentos dos políticos e de outros aspectos da lei. Só que no mesmo dia foi votado um projecto do PRD, visando especificamente a abolição das reformas. Só o PCP o votou favoravelmente, tendo votado contra - e portanto a favor das reformas - o PS, o PSD e o CDS.
É, pois, com um património de posições claras e coerentes que abordamos a questão das reformas dos políticos. E para que não haja qualquer dúvida sobre a posição do PCP, apresentamos um projecto de lei. Assim sinalizamos que estamos contra as reformas, não a reboque de ninguém, mas sim porque é essa a nossa posição.
O nosso projecto não contém ambiguidades nem cria novos privilégios, como faz o Partido Popular. De facto, o Partido popular propõe uma fórmula de cálculo que permite um privilégio especial aos Deputados, já que permite a majoração da reforma pelo exercício do cargo político. É um privilégio, como privilégio é a manutenção de uma especial pensão de sobrevivência, que acresce à que é atribuída às famílias em geral. Não é justo conceder este privilégio apenas às famílias dos políticos.
Apesar destas críticas que fazemos ao PP, por manter e criar privilégios, votaremos a favor do projecto em debate, para que não fiquem quaisquer dúvidas sobre a nossa posição quanto à reforma dos políticos.
Sendo esta a posição do PCP, importa porém clarificar quatro questões em torno deste debate.
Em primeiro lugar, este debate sobre as reformas não é centrado nas reformas dos Deputados. A subvenção mensal vitalícia é atribuída também aos membros do Governo, desde o Primeiro-Ministro até aos Ministros, Secretários de Estado e Subsecretários de Estado; aos Juizes do Tribunal Constitucional e ao Presidente da República. Não se trata, pois, de um privilégio dos Deputados, como muitas vezes o PSD quer fazer crer. E por raízes óbvias: o PSD quer salvaguardar o Governo e a sua imagem, não se importando nada - até acha conveniente - que a imagem da Assembleia seja degradada. É que no Governo está o PSD sozinho e na Assembleia estão também as oposições!
Em segundo lugar, importa salientar que a questão da moralidade e da transparência da vida política é sem dúvida uma questão de regime, e uma questão essencial. O combate contra a corrupção, contra o favoritismo, contra os privilégios, contra as acumulações indevidas é essencial em defesa da democracia, que da nossa parte, PCP, temos sempre presente como uma das grandes prioridades da nossa acção política.
Mas, com a mesma firmeza, combatemos os que fazem desta questão uma forma e um pretexto para denegrir e atacar a democracia portuguesa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não queremos deitar fora «o menino com a água do banho»!
Em terceiro lugar, é preciso não esquecer que a imoralidade política tem autores e responsáveis; tem escândalos que sistematicamente são abafados, como por exemplo os que rodearam o processo de privatizações, que publicamente foi apelidado de monumental cambalacho e que o PSD aqui, sistematicamente, impediu que fosse averiguado,
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votando contra os inquéritos parlamentares propostos pelo PCP; tem nomes de pessoas que apresentam níveis de vida e rendimentos incompatíveis com os seus rendimentos. A imoralidade não é um mal da chamada «classe política», é um mal de certos políticos ligados ao poder e da forma como certos partidos concebem o exercício do poder.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E é isso que é preciso prevenir e combater!
Aplausos do PCP e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl Castro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há manobras de ilusionismo político que possam fazer esquecer as pesadas responsabilidades do PSD na falta de transparência que afecta a vida política do País. O novo palavreado do PSD sobre a moralidade e a transparência, pomposamente apelidado de «pacto de regime», não passa de um biombo destinado a ocultar o facto de que o PSD é ú primeiro responsável pelos males de que hipocritamente se queixa.
Não tem o PSD qualquer autoridade política ou moral para se apresentar agora como paladino da moralidade e da transparência. Os seus actos passados falam por si e não faltarão ao PSD oportunidades para, a breve prazo, tomar opções concretas - sobre as reformas, as incompatibilidades, as declarações de rendimentos, o financiamento dos partidos - que clarifiquem as suas reais intenções.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Em quarto lugar, a questão das reformas não esgota os problemas em torno da transparência e moralização da vida política. Há outras questões que são igualmente importantes: a declaração de rendimentos e interesses dos políticos e a sua publicitação; o combate firme à corrupção, dotando a Procuradoria-Geral da República com os meios necessários para esse efeito e a definição da exclusividade como princípio geral para o exercício de funções políticas.
Saliento, neste quadro, a questão do financiamento dos partidos pelas empresas, que iremos discutir brevemente. Trata-se de um dos maiores cancros da vida política, como o mostram os exemplos da Itália, da França, da Espanha e, pelos vistos, depois das declarações do Presidente da CIP, Ferraz da Costa, também do nosso país.
Saliento, neste quadro, a questão do financiamento dos partidos pelas empresas, que iremos discutir brevemente. Trata-se de um dos maiores cancros da vida política, como o mostram os exemplos da Itália, da França, da Espanha e, pelos vistos, depois das declarações do Presidente da CIP, Ferraz da Costa, também do nosso país.
Em França, isso acaba de ser proibido, em Portugal, só o PCP se opôs a esse financiamento, questão que voltaremos a apreciar no próximo dia 22, quando, por marcação nossa, for discutido o projecto de lei do PCP que proíbe o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais por empresas.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Simultaneamente, o PCP apresentou um projecto de lei a definir o regime de exclusividade para o exercício de funções políticas remuneradas. E ontem mesmo, na conferência de líderes, requeremos o agendamento do processo relativo à lei das declarações de rendimentos, vetada pelo Presidente da República, para introdução das alterações que garantam a transparência, o controlo e o acesso livre.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP travou sempre este combate pela moralidade e transparência como uma das suas prioridades e como uma questão de regime essencial. Mas este combate não pode fazer esquecer a perspectiva geral do combate político nem muitas outras questões de grande importância.
Para combater eficazmente a corrupção e todos os factores de obscuridade e imoralidade da vida política, é essencial uma real mudança de política, dando resposta aos problemas do povo, em vez de, como faz o PSD, satisfazer clientelas e interesses, garantindo uma gestão dos recursos públicos de acordo com os interesses nacionais, em vez de, como faz o PSD, dar satisfação a interesses de grupo e partidários, desenvolvendo uma sociedade solidária, pautada por valores éticos, em vez de, como faz o PSD, estimular o individualismo, o novo riquismo e o «salve-se quem puder».
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A corrupção e a imoralidade vão de par com flagrantes injustiças sociais, como a degradação do estatuto jurídico de quem trabalha, com o atraso das regiões e com o sacrifício de sectores económicos determinantes.
O País não pode ficar subjugado aos interesses dos grandes grupos económicos, pelo que o que hoje é determinante é combater a crescente subordinação da decisão política aos interesses desses grupos.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Esta é uma luta urgente, pela qual, nós, PCP, não regateamos esforços.
Aplausos do PCP e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl Castro.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, a minha pergunta é muito simples e, como a resposta também será curta, se necessário for, até poderei ceder-lhe algum tempo.
Quero perguntar-lhe da disponibilidade do seu grupo parlamentar, aliás, é uma questão que torna extensiva ao CDS-PP, para fornecer à Câmara a listagem dos ex-Deputados que tenham renunciado à subvenção vitalícia que a lei prevê.
Espero que ambos os partidos forneçam à Mesa, com a brevidade possível, a listagem desses casos.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - E também das reintegrações!
O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado António Filipe não dispõe de tempo, dou a palavra a outro Sr. Deputado que também lhe quer pedir esclarecimentos e o Sr. Deputado responderá no fim.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.
O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, ouvi a sua intervenção com
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atenção, bem como todas as que foram produzidas durante este debate, e apraz-me registar o consenso entre todos os partidos para que esta matéria seja revista. De facto, parece que todos estamos de acordo relativamente a essa questão.
Em todo o caso, quero deixar um apontamento, em jeito de pergunta, para que fique registado.
A propósito desta problemática, falou-se aqui de todos os políticos, dos Ministros aos Deputados e aos membros do Tribunal Constitucional. O que pergunto ao Sr. Deputado António Filipe, bem como a todos os outros Srs. Deputados, é o seguinte: por que não trazer à colação, nesta discussão, o estatuto dos presidentes de câmara? Por que é que os presidentes de câmara, nomeadamente os presidentes das Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto, não têm a mesma dignidade, no exercício do cargo, de um Deputado ou de um Secretário de Estado? Por que é que os seus estatutos remuneratório, de compatibilidades e, sobretudo, de aposentação não hão-de também ser chamados à colação, para que não se verifiquem as disparidades que existem hoje?
Vozes do PSD: - Também hão-de cá vir!
O Orador: - Quem está a usar da palavra já foi Deputado durante nove anos, tem um estatuto enquanto tal e já foi presidente de câmara, também durante nove anos, com um estatuto diferente, porque as funções de presidente de câmara são muito mais restritas, muito mais incompatíveis, muito mais penosas, exigem um maior sacrifício e têm muito mais incompatibilidades. Aliás, pessoalmente, enquanto Deputado podia ser advogado, e advogava, e enquanto presidente de câmara não posso advogar, e não advogo.
Por isso, pergunto: por que é que não há-de também ser trazido à colação este problema candente do regime, designadamente da aposentação, de todos os autarcas? É que, de facto, não me parece que do autarca mais humilde, de Freixo de Espada à Cinta, aos Deputados, em Lisboa, haja razões para dois pesos e duas medidas em relação a esta matéria?
Para terminar, quero dizer que as questões de que hoje estamos aqui a falar são importantíssimas para a dignificação da actividade política, mas há outras que nada têm a ver com dinheiro e que não são, por isso, menos importantes.
Ontem, vimos uma conferência de imprensa com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Sines e todos os dias há presidentes de câmara que se deslocam à barra dos tribunais, por questões meramente administrativas.
Nem o Presidente da República, nem o Primeiro-Ministro, nem um Ministro vai a tribunal por uma irregularidade administrativa ocorrida dentro do seu ministério, mas todos os dias há presidentes de câmara, homens sérios e honestos, que estão a ser chamados à barra do tribunal por questões de menor importância que nada têm a ver com a sua dignidade e com o seu trabalho ou o exercício do seu cargo, antes, dizem respeito a actos de funcionários.
Sr. Presidente, como disse aqui o Sr. Deputado José Vera Jardim, já era tempo de se ter a coragem de «agarrar» nestas questões, separar o que é corrupção do que são irregularidades, chamar e castigar penosamente aqueles que, de facto, são corruptos e deixar de responsabilizar por actos menos importantes, como sucede todos os dias, pessoas de grande dignidade e dedicação à causa pública.
Para maior dignidade desta Assembleia e dignificação de toda a classe política, porque as câmaras municipais também pertencem à classe política, estes assuntos deviam igualmente merecer o devido tratamento. E o devido tratamento, de
uma vez por todas, era o de esta Assembleia pensar seriamente em todo este tipo de questões.
Aplausos do PSD e da Deputada do PS Elisa Damião.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, a quem peço a maior brevidade possível.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, vou ser breve.
Começando com a questão colocada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, quero dizer-lhe que não condenamos as pessoas individualmente. Não pense que levantaremos a voz contra algum Deputado, seja da sua bancada, seja de outra qualquer, que utilize, individualmente, um direito que a lei lhe confere, pois o que questionamos é esta lei, o regime.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sempre estivemos contra ele, como o Sr. Deputado sabe, continuamos a estar contra ele e entendemos que deve ser revogado.
Portanto, trata-se de uma questão de regime jurídico, de uma injustiça criada através de um diploma legislativo e, por isso, consideramos que é a esse nível que ela deve, efectivamente, ser corrigida.
O Sr. Deputado Fernando Costa colocou algumas questões pertinentes, mas, em rigor, elas não devem ser colocadas à bancada do PCP. Refiro-me designadamente à questão da tutela sobre as autarquias locais e à forma como ela é exercida, que está relacionada com a forma como o IGAT está a exercer as suas funções, a qual seria mais propriamente dirigida à bancada do Governo, caso algum dos seus membros estivesse presente neste debate. Em todo o caso, registamos a sua opinião.
Por outro lado, o Sr. Deputado também fez muito bem em colocar a questão relativa ao regime ou ao estatuto, digamos assim, dos presidentes de câmara.
No entanto, também essa questão deveria ter sido dirigida ao PSD, porque foi precisamente aquele partido que, não há muito tempo, apresentou aqui uma proposta para que os presidentes de câmara fossem retirados do regime geral das incompatibilidades aplicável aos titulares de cargos políticos e nós opusemo-nos a isso e considerámo-lo uma imoralidade. Aliás, já hoje, em outro momento, tive oportunidade de denunciar essa situação.
Portanto, Sr. Deputado, fez muito bem em colocar essa questão, mas ela deve ser colocada justamente ao PSD.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
O Sr. Manuel Sérgio (Indep.): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: É forçoso reconhecer que o inegável mento da iniciativa do PP resulta da situação de facto que actualmente se vive. Não há dúvida de que, na ausência de uma lei restritiva das compatibilidades funcionais, assume laivos de ressonante escândalo, no entender da esmagadora maioria dos portugueses, a atribuição de uma pensão vitalícia e, mais ainda, de um subsídio de reintegração.
A opinião pública não aceita que um político, só pelo facto de o ser, mesmo que episodicamente venha a beneficiar ipso facto de um sistema acumulativo de reforma/pen-
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são/subsídio, por força do exercício dúplice da política e das suas actividades profissionais.
Deste ponto de vista, a proposta do CDS-PP afigura-se-me objectivamente inatacável. Mas é justamente aqui que uma outra reflexão nos surge: não me parece política e legislativamente eficaz trabalhar dentro de um quadro suposto, precisamente aquele que urge alterar. Por outras palavras: afigura-se-me de duvidosa eficácia política legislar sobre uma situação de facto, quando o que importa, antes de tudo, é transformar essa situação. Isto equivale a dizer que a bondade intrínseca desta proposta só se torna bondade objectiva se enquadrada numa visão global e sistémica da transparência da vida política.
Nesta conformidade, abstenho-me. A abstenção reconhece e aplaude o valor intrínseco da proposta, mas coloca reservas à sua oportunidade, pois só enquadrada numa tematização global esta poderá adquirir a sua bondade objectiva.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate sobre o projecto de lei n.º 494/VI - Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos (CDS-PP), que será, de imediato, objecto de votação, na generalidade.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do PS, votos a favor do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raúl Castro e a abstenção do Deputado independente Manuel Sérgio.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia a discussão das ratificações n.º 132/VI relativa ao Decreto-Lei n.º 10/95, de 19 de Janeiro, que, por sua vez, altera o Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro (reformula a Lei do Jogo), apresentada pelo PCP, e n.º 133, do PCP, e 134/VI, do PS, ambas relativas ao Decreto-Lei n.º 20-A/95, de 30 de Janeiro, que aprova a última fase de reprivatização do Banco Português do Atlântico, S.A.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 50 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Maria Pereira.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Pereira Lopes.
Luís António Martins.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Aníbal Coelho da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Poppe Lopes Cardoso.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Partido Comunista Português (PCP):
Luís Carlos Martins Peixoto.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
João José Pedreira de Matos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro. Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
João António Gomes Proença.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Santos de Magalhães.
Luís Filipe Marques Amado.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Partido Comunista Português (PCP):
António Manuel dos Santos Murteira.
João António Gonçalves do Amaral.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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