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Sexta-feira, 17 de Março de 1995 I Série - Número 53

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE MARÇO DE 1995

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs.

João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos

Antes da ordem do dia - Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n º 124/VI e do projecto de lei n º 517/VI
Em interpelação à Mesa, o Sr Deputado Eduardo Pereira (PS) solicitou esclarecimentos sobre os prazos da tomada de posse e da entrada em funcionamento da Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços pelas OGMA a Força Aérea Angolana, tendo ainda usado da palavra os Srs Deputados Manuel Queiró (CDS-PP) e Rui Carp (PSD)
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) realçou os efeitos negativos que acarreia para a sociedade portuguesa o clima de campanha que irá ter lugar até às próximas eleições legislativas
Também em declaração política, o Sr Deputado Ferro Rodrigues (PS) fez um balanço político dos últimas quatro anos do Governo, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs Deputados Riu Carp (PSD) que originou o uso da palavra do Sr Deputado Almeida Santas (PS) - e Manuel Queiró (CDS-PP)
Ao abrigo do artigo 81.º, n º 2, do Regimento, a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira (PSD) teceu considerações acerca da iniciativa da Conferência Geral da Unesco e da Cimeira de Chefes de Estado e de Governo do Conselho da Europa no sentido de eleger 1995, respectivamente, Ano Internacional da Tolerância e Ano Europeu contra o Racismo a Xenofobia, a Intolerância e o Antisemitismo. No final, respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr Deputado Carlos Luís (PS)
Também ao abrigo da mesma disposição regimental, o Sr Deputado Sousa Lara (PSD) deu conta da sumula da reunião com Deputados espanhóis da Comissão Eventual com o Objectivo de Promover Contactos com o Congresso dos Deputados das Cortes Espanholas, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento das Srs Deputados Eduardo Pereira (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Fernando Condesso (PSD), António Murteira (PCP) e Manuel Queiró (CDS-PP)
O Sr Deputado Alberto Avelino (PS) criticou a actuação do ex-Ministro do Mar, Azeredo Soares, no conflito que opõe a União Europeia e o Canadá sobre a pesca de certas espécies em águas internacionais próximas daquele país deu explicações ao Sr Deputado Antunes da Silva (PSD) e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs Deputados Olinto Ravara (PSD) Manuel Queiró (CDS-PP) e António Murteira (PCP)
O Sr Deputado Américo Sequeira (PSD) congratulou-se com o desenvolvimento registado nos últimos anos na região do Alto-Minho
Os votos n º1 135/VI - De protesto pelo encontro entre o Sr Presidente da República e o ex-Primeiro-Ministro italiano Sr Bettino Craxi (PSD), I36/VI - De pesar pelo naufrágio junto à praia da Aguda em Vila Nova de Gaia (PSD, PS, PCP, CDS-PP, os Verdes e Deputado independente Raúl Castro) e 137/VI - De saudarão pela passagem do Dia Mundial dos Direitos do Consumidor (apresentado pelo PS) foram aprovados e rejeitado o n.º 138/VI - De solidariedade para com estudantes angolanos que se manifestaram frente à Embaixada do seu país em protesto pelo atraso no pagamento das suas bolsas (Deputado independente Mano Tomé) Produziram declarações de voto os Srs Deputados Guilherme d'Oliveira Martins (PS). Narana Coissoró (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) Manuel Moreira (PSD), Carlos Lelis (PSD) e Mano Tomé (Indep )
Os projectos de resolução n.ºs 144/VI - Recusa de ratificação (n º 132/VI) do Decreto-Lei n º 10/95 de 10 de Janeiro, que altera o Decreto-Lei n º 422/89, de 2 de Dezembro (Reformula a Lei do Jogo) e I45/VI - Recusa de ratificação (n.º 133/VI) do Decreto-lei n º 20-A/95, de 30 de Janeiro, que aprova a última fase da reprivatização do Banco Português do Atlântico, S.A, ambos apresentados pelo PCP foram rejeitados
Foram igualmente rejeitados na generalidade os projectos de lei n.º 462/VI - Alteração da Lei n º 64/93 de 26 de Agosto (Regime de incompatibilidades de titulares de cargos políticos e altos cargos publicas) (PS) e 498/V1 - Cria um registo de interesses dos Deputados e alarga as respectivas incompatibilidades e impedimentos (PS)
A Câmara concedeu autorização a três deputados para deporem em processos pendentes, denegando autorização a um outro
O Sr Deputado Cipriano Martins (PSD) apontou a necessidade de se implementarem medidas de valorização económica e social no interior do País
O Sr Deputado António Filipe (PCP) verberou a política educativa do Governo
O Sr Deputado João Maçãs (PSD) referiu-se às dificuldades existentes no distrito de Portalegre, nomeadamente no sector da agricultura, e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr Deputado Luis Capoulas Santos (PS)
O Sr Deputado António Murteira (PCP) responsabilizou o Governo pela falta de infra-estruturas necessárias a resolução do problema da água no Alentejo
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Américo de Sequeira
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abrem.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando dos Santos Antunes.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José da Costa.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Fernando Nogueira.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto. Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.

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Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Mana Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins,
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raúl cTAssunção Pimenta Rêgo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luis Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Sá Oliveira de Miranda Barbosa.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Manuel Pereira Marques.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputados independentes:

Mário António Baptista Tomé.
Raúl Fernandes de Morais e Castro.
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 1247 VI - Autoriza o Governo a aprovar o novo estatuto do notariado e projecto de lei n.º 517/VI - Protecção dos direitos dos consumidores dos serviços telefónicos (PS), que baixou à 5.ª Comissão.
Nas reuniões plenárias de 23 e 24 de Fevereiro de 1995, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Crisóstomo Teixeira; a diversos Ministérios e à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Roseta; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Cerqueira de Oliveira; aos Ministérios da Indústria e Energia e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado Raúl Castro; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Luís Peixoto e Fernando Costa; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Luís Pais de Sousa; ao Ministério do Mar, formulado pela Sr." Deputada Rosa Albernaz; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Caio Roque; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha.
Nas reuniões plenárias de 2 e 3 de Março de 1995, foram ainda apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados João Rui de Almeida e Crisóstomo Teixeira; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Miranda Calha e António Martinho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Alegre; aos Ministérios do Emprego e da Segurança Social e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e à Secretaria de Estado da Modernização Administrativa, formulados pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; aos Ministérios da Administração Interna e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado João Amaral; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Alberto Costa.
Na reunião plenária de 8 de Março de 1995, foram também apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado José Magalhães; a diversos Ministérios, ao ICEP, à Secretaria de Estado da Cultura, e ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins; à Secretaría de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado António Costa; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Luís Sá; aos Ministérios do Planeamento e da Administração do Território e da Agricultura, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Nas reuniões plenárias de 9 e 10 de Março de 1995, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao

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Governo, aos Ministérios do Emprego e da Segurança Social e do Ambiente e Recursos Naturais e às Câmaras Municipais de Felgueiras e Oeiras, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Caio Roque e Ema Paulista; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado António Martinho; aos Ministérios da Justiça e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado João Amaral.
Nos dias 13 e 14 de Março de 1995 deram ainda entrada na Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios das Finanças e do Emprego e da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pelo Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Paulo Cunha.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Macário Correia, nas sessões de 13 de Novembro, 21 de Maio e 7 de Dezembro; Guilherme d'Oliveira Martins, nas sessões de 9 de Fevereiro, 20 de Outubro e 4 de Janeiro e no dia 15 de Setembro; Luís Nobre, na sessão de 22 de Junho; Luís Sá, nas sessões de 6 de Julho, 4, 13 e 18 de Janeiro; Cipriano Martins, na sessão de 7 de Julho; Carlos Luís, na Comissão Permanente de 8 de Setembro; Manuel dos Santos, na sessão de 27 de Outubro; Américo Sequeira, nas sessões de 3 de Novembro e 26 de Janeiro; João Amaral, na sessão de 23 de Novembro; André Martins, na sessão de 7 de Dezembro; Ana Maria Bettencourt e Paulo Trindade, nas sessões de 12 de Dezembro e 18 de Janeiro; Miranda Calha, na sessão de 13 de Dezembro; Leonor Coutinho, no dia 3 de Janeiro; Mário Tomé, na sessão de 4 de Janeiro; Lino de Carvalho, nas sessões de 4 e 18 de Janeiro e 8 de Fevereiro; Luís Pais de Sousa e João Granja, na sessão de 11 de Janeiro; José Reis, na sessão de 12 de Janeiro; António Martinho, na sessão de 13 de Janeiro; José Manuel Maia e Paulo Rodrigues, na sessão de 18 de Janeiro; Isabel Castro e Raúl Castro, nas sessões de 19 e 25 de Janeiro; João Poças Santos, na sessão de 20 de Janeiro; José Lello, na sessão de 25 de Janeiro.
Entretanto, estão reunidas ou irão reunir durante a tarde a Comissão de Petições e a Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste, bem como as Subcomissões permanentes da SIDA e de Habitação e Telecomunicações.

O Sr. Presidente: - Antes de darmos início aos nossos trabalhos, faço questão de saudar, em nome da Câmara, onze presidentes de juntas de freguesia do concelho de Caldas da Rainha que vieram visitar-nos e se encontram a assistir à reunião plenária.

Aplausos gerais.

Para fazer uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, no dia 6 de Dezembro de 1994, nos termos da Constituição, da legislação em vigor e do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do CDS-Partido Popular apresentou a V. Ex." um pedido de inquérito parlamentar sobre a responsabilidade do Governo na eventual prestação de serviços, pelas OGMA, à Força Aérea Angolana.
Esse inquérito, que tomou o número 27/VI, foi agendado e debatido neste Plenário no dia 14 do mesmo mês. Nesse mesmo dia, foi votado favoravelmente o projecto de resolução n.º 133/VI, que dele resultou e que foi publicado no Diário da Assembleia da República no dia 16 de Dezembro.
Como V. Ex.ª sabe, de acordo com o n.º 2 do artigo 6.º da Lei n º 5/93 - Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares -, as comissões de inquérito, uma vez constituídas, devem tomar posse até ao décimo quinto dia contado a partir da publicação da sua constituição em Diário da Assembleia da República.
Ora, por razões que desconheço e que gostaria de ver esclarecidas, V. Ex.ª só veio a dar posse à Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços pelas OGMA à Força Aérea Angolana no dia 21 de Fevereiro de 1995, sexagésimo dia após a publicação da sua constituição. Contado de outra forma, tão do gosto do PSD, que, ultimamente, tem vindo a fazer da data do seu congresso a origem de todos os tempos, este dia da posse, este dia 21 de Fevereiro é o segundo dia após a realização do Congresso, é o segundo dia após a eleição do novo Presidente do PSD, ex-Ministro da Defesa Nacional e alvo do inquérito proposto.
A que se deve esta grave falta legal por parte de V. Ex.ª, Sr. Presidente?
Conferida a posse, o n.º 3 do mesmo artigo 6.º do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares estabelece que os trabalhos da comissão devem começar imediatamente.
Que razões encontrou V. Ex.ª para que, hoje, dia 16 de Março, 23 dias passados sobre a posse, aquela Comissão ainda não tenha iniciado os seus trabalhos? A que se deve esta nova falta grave à lei por parte do Presidente da Comissão e consentida por V. Ex.ª?
No dia 20 de Janeiro passado, V. Ex.ª exarou um despacho, que foi publicado no Diário da Assembleia da República no dia 26 do mesmo mês, fixando o prazo de 90 dias para conclusão dos trabalhos da Comissão de Inquérito empossada Hoje, dia 16 de Março, esse prazo já foi reduzido de 49 dias? O inquérito vai ter de ser concluído dentro de menos de 41 dias? O prazo vai terminar no dia 26 de Abril de 1995?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como se explica que V. Ex.ª tenha permitido, até agora, a perda de tanto tempo e como pode manter-se um prazo para a conclusão do inquérito que nos vai impedir de averiguar o grau de responsabilidade do Governo quer na eventual prestação de serviços pelas OGMA à Força Aérea Angolana, quer na reparação, pelas mesmas Oficinas, de motores indonésios?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa sobre o mesmo assunto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP). - Sr. Presidente, muito rapidamente, quero apenas dizer que a minha bancada faz suas as preocupações e as questões colocadas pelo Sr. Deputado Eduardo Pereira, com uma emenda: o alvo do inquérito não é o Sr. Ministro da Defesa Nacional, mas, tanto nos seus fundamentos como nos quesitos aprovados, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Primeiro-Ministro.

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Exceptuando esta emenda, fazemos nossas as perguntas e as preocupações da bancada socialista.

O Sr. Rui Carp (PSD): - É muito subtil!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, falou-se aqui no alvo e o alvo da intervenção do Sr. Deputado Eduardo Pereira é, obviamente, o Sr. Presidente da Assembleia da República, que se assume aqui como tal, mas apenas numa parte, pois, na outra parte, o alvo será o Presidente daquela Comissão de Inquérito - e não sai, se ele estará ou não designado, mas isso é tarefa da comissão, porque as comissões têm autonomia jurídica face ao Presidente da Assembleia da República e ao Plenário -, que dirá de sua justiça.
Pela minha parte, e quanto às omissões que o Sr. Deputado insinua terem sido, por mim, cometidas, vou pedir ao Sr. Secretário que, tendo em conta o disposto, no n.º 3 do artigo 6.º do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, informe quando e através de que ofícios me foram indicados os membros designados para esta Comissão, de que, aliás, VV. Ex.ªs tomam sempre conhecimento por via dos respectivos grupos parlamentares.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Secretário João Salgado.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, os nomes para a constituição da Comissão de Inquérito foram indicados nas seguintes datas: o de Os Verdes, a 18 de Janeiro; o do CDS-PP!, a 20 de Janeiro; os do PSD e os do PS, a 25 de Janeiro, e os do PCP, a 15 de Fevereiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foi, pois, a partir destas datas que marquei a tomada de posse dos membros da respectiva Comissão de Inquérito.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, uma vez que o Sr. Secretário da Mesa tem consigo a lei relativa ao regime jurídico dos inquéritos parlamentares, solicitava-lhe que lesse os n.ºs 2 e 3 do artigo 6.º, porque fiquei com algumas dúvidas.
Na verdade, foram indicados esses nomes com vista a uma marcação a 21 de Fevereiro, simplesmente devia ter sido feita antes de 31 de Dezembro.

O Sr Presidente: - Sr. Deputado, insisto que as datas indicadas há pouco são as correctas.
Lembro também, como VV. Ex.ªs se recordarão, que, num dado momento - e não tenho aqui elementos, mas fornecê-los-ei com rigor -, o objecto da Comissão de Inquérito foi alargado através de uma proposta apresentada pelo CDS-PP. Também isso será objecto de um esclarecimento completo. Se tal não for possível hoje, sê-lo-á amanhã de manhã.
Entretanto, peço ao Sr. Secretário João Salgado para proceder à leitura dos n.08 2 e 3 do artigo 6.º da Lei n.º 5/93, de 1 de Março - Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, os n.ºs 2 e 3 do artigo 6.º - Funcionamento da comissão - são do seguinte teor:

2 - Os membros da comissão tomam passe perante o Presidente da Assembleia da República até ao 15.º dia, posterior à publicação no Diário da Assembleia da República da resolução ou do requerimento que determine a realização do inquérito.

3 - A comissão inicia os seus trabalhos imediatamente após a posse conferida pelo Presidente da Assembleia da República, logo que preenchida uma das seguintes condições: a) Estar indicada mais de metade dos membros da comissão, representando no mínimo dois grupos parlamentares, um dos quais deve ser obrigatoriamente de partido sem representação no Governo; b) Não estar indicada a maioria do número de Deputados da comissão, desde que apenas falte a indicação dos Deputados pertencentes a um grupo parlamentar.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputados, solicito ainda ao Sr. Secretário João Salgado que mande elaborar aos serviços respectivos uma informação detalhada para, ainda hoje ou amanhã de manhã, ser comunicada ao Plenário.
Srs. Deputados, a sessão de hoje tem apenas período de antes da ordem do dia, com declarações políticas e votações.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Falam com a gravidade de quem só agora parece ter descoberto a crise. Ensaiam poses como se fossem representar. Mudam de discurso como quem troca de camisa. Divulgam ideias como quem vende detergentes. Montam cenários para o espectáculo que anunciam. Dizem banalidades com o ar de quem descobre a pólvora. Prometem futuros que já comprometeram.
São os partidos tradicionais em campanha eleitoral; nos imensos espectáculos mediáticos que encenam e onde o dinheiro gasto varia na razão inversa da originalidade das propostas preconizadas; em campanhas eleitorais que deixaram de ser um exclusivo dos que nelas, livremente, querem participar, mas a que somos obrigados.
As campanhas eleitorais da nova ditadura, na era da telecracia. Omnipresentes A condicionar a liberdade. A limitar a livre escolha. A invadir o serão A matraquear a cabeça. A atentar contra a paciência. A bombardear com debates que em boa verdade o não são. Servidos por independentes que já têm cartão. Comentados por comentaristas que se comentam a si próprios. Férteis de uma sociedade civil que só pratica em part-time.
Debates para campanhas em que entram família, filhos, amigos, cão, tudo, quiçá, para se tornarem mais próximos do cidadão!... O pobre do cidadão que é obrigado a aguentar os nove longos meses de uma campanha em marcha
A campanha eleitoral dos longos nove meses desperdiçados por decisões que se não tomam; por mudanças que se não favoreceram; por alterações que se não ousam.
A campanha para os nove longos meses perdidos de uma década que se assume como negra, mas que, afinal, estranhamente, se quer ainda ajudar a prolongar um pouco mais.
A campanha dos nove longos meses perdidos por tudo o que se não faz. A campanha dos nove longos meses duplamente perdidos por tudo o que cúmplice, se ajuda a fazer.
Tempo perdido em pleno processo de revisão do Tratado de União e da tomada de decisões que podem definitivamente pôr em causa o nosso futuro.
Decisões que não se compadecem com ambiguidades enquanto o tempo corre veloz, antes exigem: ou a redefinição clara de rumos e a busca de um novo sentido para o processo de construção europeia, do qual os europeus, e de entre estes os portugueses, sejam, através de um deba-

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te vivo, aberto e frontal, parceiros; ou a aceitação dogmática desta Europa, do primado do lucro, desta Europa geradora de desequilíbrio ecológico, de exclusão social, de padronização cultural, servida por uma arquitectura institucional anti-democrática e na qual, na melhor das hipóteses, a escolha dos cidadãos será feita entre o preto e o cinzento.
No tempo perdido dos nove longos meses em que se não encarará a educação, a investigação, a ciência e a cultura como matrizes do desenvolvimento; em que, como chavão, se falará de qualidade sem ousar tipificá-la.
E nas decisões que ficarão por tomar na valorização dos recursos humanos como condição para o próprio desenvolvimento autónomo do País, para garantir condições efectivas na igualdade de acesso dos jovens ao ensino para discutir o próprio ensino, o seu conteúdo, o seu papel, na perspectiva do desenvolvimento nacional que pretendemos.
Também o tempo perdido nos nove meses de campanha, em que o ambiente urbano nas grandes metrópoles, particularmente, se tenderá a agravar com os enormes impactes ambientais e sociais de enormes projectos (o caso da Expo 98 e da ponte) que se não estão a acautelar.
Com as decisões que ficarão por tomar face aos desequilíbrios demográficos que não cessam de aumentar; ao ordenamento do território que se insiste em adiar; aos grandes investimentos nos transportes que se teima recusar; a um ambiente urbano cada vez mais violento, desumanizado e marginalizante.
Mas decisões que ficarão, igualmente, por tomar em relação à outra face da mesma moeda, no interior, num mundo rural que se esvazia, desertifica, destrói na sua diversidade ambiental cultural e humana, que, deste modo, acaba por pôr em risco a própria identidade do País.
No tempo perdido nos nove longos meses em que os grandes dossiers em matéria ambiental (recursos hídricos, resíduos, conservação da natureza) continuarão na gaveta. Sem um visão global estratégica capaz de os equacionar numa perspectiva integrada e de longo prazo, antes se acumularão numa herança insustentável.
Nas decisões que ficarão por tomar, atrasando a elaboração de um Plano Nacional de Recursos Hídricos que enumere e caracterize os recursos existentes, que regulamente o seu uso, que defina as suas necessidades e, nesta perspectiva, negocie com Espanha a partilha de recursos comuns numa perspectiva de salvaguarda dos interesses de Portugal.
Nas decisões que ficarão por tomar para definir uma estratégia que continua a faltar para saber como e quando alterar padrões de consumo; favorecer a educação ambiental; combater o desperdício; incentivar a reutilização; desenvolver a reciclagem; implementar novas tecnologia na produção.
Nas decisões que ficarão por fazer para a definição de uma estratégia que garanta a conservação do património natural, que sustenha a especulação imobiliária, que recupere áreas degradadas, que promova a floresta contra a invasão das monoculturas.
No tempo perdido em que não se encarará, uma vez mais, a insegurança e a violência como uma resultante do desequilíbrio social instalado, da exclusão imposta, da morosidade da justiça, da marginalização das minorias, da degradação urbana, da falta de qualidade da escola e da falência do sistema.
E nas decisões que ficarão por tomar para promover a requalificação urbana, dar eficácia à justiça, garantir a integração harmoniosa dos imigrantes, travar os abusos policiais, dar meios efectivos às forças de segurança e travar a desumanização.
No tempo perdido dos nove longos meses em que muitas decisões deixarão de ser tomadas, para garantir a liberdade de imprensa, preservar a sua independência, romper com o silêncio a que a querem remeter, quebrar a sua crescente domesticação. Mas também os nove meses perdidos para promover uma estratégia para a igualdade de oportunidades que tarda e que, por benévolos mecenas, não poderá ficar a aguardar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando hoje, nós Verdes, alertamos, uma vez mais, para a insólita situação criada em Portugal e quando alertamos para o tempo perdido nestes nove longos meses de campanha, fazemo-lo, não só pelo tempo desperdiçado, pelas decisões que deixarão de ser tomadas, pela forma como agravados alguns problemas se projectarão e multiplicarão no futuro, mas fazemo-lo também convictos de que o clima de campanha, definitivamente instalado até Outubro, não deixará de ter efeitos extremamente negativos na sociedade portuguesa, num clima de politiquice inútil, de guerrilha doméstica, de pactos para empatar, de jogos de gato e do rato, que aos cidadãos nada dizem, nem aos seus problemas, nem às suas incertezas, nem aos seus projectos, nem aos seus sonhos.
Uma situação que a prolongar-se contribuirá seguramente para acentuar a já por demais negativa imagem que, das instituições, os portugueses têm e, de forma preocupante, aumentar o desinteresse dos cidadãos pela vida pública, anular a sua vontade em participar na vida da comunidade, favorecer o amorfismo, incentivar a abstenção, esgotar a esperança de que a alternativa é possível.
Uma alternativa que, para nós, Verdes, só é possível baseada não em fórmulas esgotadas de versão recauchutada, mas uma alternativa de desenvolvimento, se, efectivamente, pautada por novos valores e valias, que garanta o equilíbrio, que permita uma nova redefinição da democracia, da qual os cidadãos deixem definitivamente de ser e tão-só os espectadores passivos de um espectáculo mediatico mas, sim, os interventores criativos de um futuro que também é seu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A separação entre o PSD, o Governo, a maioria e os portugueses é evidente. Não se faça sofrer mais, celebre-se o divórcio, os portugueses estão à espera, sem histerias, sem demagogias, sem lágrimas, com dignidade.
Os portugueses merecem-no.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero começar por salientar a importância do dia que estamos a viver nesta Assembleia da República.
Na verdade, pela primeira vez, desde há longos anos, o Presidente do PSD vai estar entre nós como Deputado. Espero que tenha uma estada agradável e prolongada por muitos e bons anos na tripla qualidade de parlamentar, Presidente do PSD e candidato a primeiro-ministro.

Aplausos do PS.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Não é hoje!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas próximas eleições legislativas, o País vai escolher os seus Deputados e uma alternativa de Governo.
Daqui até esse momento é importante que se clarifique o que está em jogo nessas eleições. Há três aspectos fundamentais que determinam o sentido de voto do eleitorado. Em primeiro lugar, o balanço dos quatro anos de Governo

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subsequentes à repetição da maioria absoluta em Outubro de 1991; em segundo lugar, os projectos políticos programáticos que se confrontam no debate democrático; em terceiro lugar, a credibilidade política dos responsáveis pela execução desses projectos, desde os candidatos a primeiro-ministro até às equipas que se estruturam em seu redor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao balanço destes quatro anos, o diagnóstico pode ser sintetizado numa palavra: fracasso.
Fracasso na política cultural, nomeadamente no que respeita à conservação, valorização e divulgação do património histórico e artístico; ao fomento da actividade artística e da sua fruição pela generalidade dos cidadãos e à regulação das actividades onde a comunicação tende a ser globalizada à escala international e onde o factor língua adquire especial importância.
Fracasso nas políticas visando a cidadania e a reforma do Estado, já que o sistema político não responde, em aspectos fundamentais, às aspirações dos portugueses, sendo notórios os défices de participação, transparência, responsabilização, descentralização, justiça e segurança, enquanto, paralelamente, são flagrantes os abusos de governamentalização, partidarização, corrupção, clientelismo e centralismo.
Fracasso nas políticas sociais, com o avanço de uma verdadeira crise, que se manifesta duramente para as famílias portuguesas, com o aumento da pobreza e da exclusão, o crescimento do desemprego (nomeadamente, o de longa duração), o avanço do desespero em muitos jovens toxicodependentes, a explosão da insegurança urbana e do desprestígio do sistema de. Justiça, o temor quanto ao futuro de grandes sistemas sociais públicos, desde saúde à segurança social.
Fracasso nas políticas económicas, com o facto incontornável de Portugal, embora beneficiando de grandes apoios financeiros comunitários, se ter atrasado em, relação à média comunitária, no que se refere ao crescimento, à agricultura, à indústria, ao investimento privado e ao consumo das famílias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se diga que esta evolução era inevitável. Por várias vezes, ao longo desta legislatura, denunciámos uma política cultura! sem estratégia, com uma distribuição avulsa de subsídios que favorece a dependência e o clientelismo, o comportamento paternalista e o autismo dos seus principais protagonistas.
A nível das reformas do Estado, temos sido incansáveis. Apresentámos, desde há muito tempo, projectas sérios e muito debatidos, abrangendo áreas como a abolição de monopólios partidários na apresentação de candidaturas aos vários níveis de decisão política, o alargamento das matérias que podem ser sujeitas a referendo, a abertura de iniciativas legislativas a cidadãos, a institucionalização de um sistema de fiscalização eficaz das contas partidárias, o acesso aos registos de patrimónios, rendimentos e interesses dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, a revisão do quadro de funcionamento do Parlamento, o avanço da administração aberta ou da regionalização.
Ainda ontem assistimos aqui à vergonhosa atitude do PSD, boicotando mais uma vez iniciativas sérias e visando a transparência, através de um expediente dilatório insólito. Esperemos que, aquando das respectivas votações, aproveitem a oportunidade para emendarem a mão e que deixem que os projectos do PS baixem à comissão parlamentar competente como uma base de discussão na especialidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No que se refere à política social, propusemos várias medidas importantes, desde o arranque do rendimento mínimo garantido até aos incentivos para a criação de emprego e para o combate ao desemprego, para além de frequentemente termos denunciado a actual situação, onde avultam o trabalho infantil, os acidentes de trabalho e o desrespeito pelos direitos dos assalariados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E quanto à política económica? Quantas vezes chamámos a atenção para o carácter suicida da política de escudo caro e altíssimas taxas de juro, prosseguida durante grande parte da Legislatura, tendo arruinado a economia e milhares de empresas? Quantas vezes avisámos que o oásis português só existia em mentes convencidas pela autopropaganda? Quantas vezes dissemos que o que se estava a passar era uma inconcebível transferência de fundos de agricultura, pescas, indústrias e pequeno comércio para o sistema financeiro?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A todos os nossos projectos, críticas, sugestões, avisos e alternativas, o PSD respondeu com um sistemático «não» Os resultados estão à vista o País não passa da «cepa torta», em matéria cultural; a desconfiança em relação às instituições políticas aumentou terrivelmente; estamos em plena crise social, já com características estruturais; e a retoma económica é lenta, tardia, insuficiente e localizada
Por mais inaugurações que façam daqui até às eleições, a realidade não vai poder ser mistificada Estes quatro anos foram um fracasso do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a realização da sessão final dos Estados Gerais para uma Nova Maioria, o Partido Socialista mostrou ao País que para além da necessidade de alternância, há uma sólida alternativa que se constrói.
Os Estados Gerais para uma Nova Maioria propõem uma nova visão e uma nova estratégia para Portugal. Para isso, apresentam ao País: um objectivo, o desenvolvimento; uma prioridade, as pessoas; um instrumento de acção, a reforma do sistema político, do Estado e da Administração.
O nosso objectivo central é uma nova visão do desenvolvimento que seja: sustentável, porque assente em bases realistas, respeitando uma relação de solidariedade entre as gerações e de equilíbrio entre a humanidade e a natureza; regionalmente equilibrado, porque empenhado num desenvolvimento integrado do País e na correcção das assimetrias entre centros e periferias, zonas rurais e meios urbanos, litoral e interior, valorizando o direito ao espaço, à diferença, à privacidade, ao ambiente e à cultura; socialmente justo, porque capaz de favorecer a integração social, promovendo e protegendo os direitos humanos, a não discriminação, a tolerância e o respeito pela diversidade, a igualdade de oportunidades e a solidariedade.
Importa assegurar, por todos os modos: o respeito integral pela dignidade humana; a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, alcançada através de acções positivas, que incentivem a plena participação das mulheres em todas as esferas de decisão e a partilha das responsabilidades na vida política, económica, social e cultural; o combate activo a todas as formas de desigualdade e exclusão, designadamente as que derivam da xenofobia, do racismo e de outros tipos de intolerância.
A nossa prioridade são as pessoas e a sua valorização e qualificação, através da educação, da formação, da cultura e da ciência.

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A igualdade de oportunidades e o próprio desenvolvimento passam decisivamente pela escola, humanizada, inserida na comunidade, que desenvolva um espírito crítico, a capacidade de iniciativa e os hábitos de trabalho e de organização e promova uma cultura de cidadania, de responsabilidade, de liberdade e de solidariedade.
Do mesmo modo, torna-se indispensável reorientar e reforçar o sistema de formação profissional, em ligação com os objectivos educativos e numa lógica de formação contínua.
Haverá ainda que valorizar a investigação científica e o desenvolvimento tecnológico, promover o acesso generalizado à prática e à fruição artísticas e culturais e estimular políticas de protecção ambiental, visando o reforço da qualidade de vida dos cidadãos.
O nosso instrumento essencial de intervenção será a reforma do sistema político, do Estado e da Administração, no sentido da abertura, da transparência e da descentralização.
Para tal, é prioritário valorizar a cidadania e a participação e combater o abuso de poder, o clientelismo e a corrupção.
Do mesmo modo, é urgente definir regras claras para o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais e tornar obrigatória a declaração pública do património, dos rendimentos e dos interesses dos titulares de cargos públicos.
Por fim, impõe-se criar as regiões administrativas no Continente, respeitar a autonomia das regiões autónomas e reforçar os poderes, as competências e os meios das autarquias locais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo de cinco meses, cerca de 30 000 cidadãos independentes e militantes do PS debateram em profundidade os principais problemas do País, nas áreas da solidariedade social, da reforma do Estado, da educação, da formação, da ciência, da cultura, da defesa, da valorização do emprego e da posição de Portugal na Europa e. no Mundo.
Nestes debates participaram alguns dos mais destacados especialistas nacionais, que contribuíram com a sua experiência para enunciar os princípios e as soluções de uma nova política.
A credibilidade política e técnica do candidato a Primeiro-Ministro, António Guterres, e da equipa que ele venha a escolher para governar Portugal é inquestionável.
Agora, é um dado da situação, e não uma incógnita, o facto de que a nova maioria terá certamente um governo composto por pessoas competentes, sérias e apostadas em servir Portugal e os portugueses.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: O PSD, à medida que o debate avança, perde em toda a linha. Perde no que respeita ao balanço dos quatro anos que passaram, no que se refere às propostas e alternativas quanto ao futuro e no que se liga com a credibilidade do candidato a Primeiro-Ministro e equipa de governo.
O PSD quer, pois, evitar que o debate sério avance. Só assim se podem entender as constantes provocações ao Presidente da República, Mário Soares. São manobras de diversão articuladas com a estratégia do líder da bancada, Pacheco Pereira, que não hesita em afirmar-se politicamente contra a normalização e a calma na nossa vida política, pregando a tensão política e a «anormalidade».
No entanto, parece que os novos dirigentes do PSD, após a colossal reprimenda que o Presidente Mário Soares lhes deu anteontem, já perceberam que não podem exagerar na tensão e na anormalidade. A verdade é que, semeando ventos, correm o risco de colher tempestades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Carp e Manuel Queiró. Tem a palavra, Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD)- - Sr. Presidente, Sr Deputado Ferro Rodrigues, é apenas devido à consideração que tenho para consigo que faço este pedido de esclarecimento.
Com efeito, se o Sr. Deputado Ferro Rodrigues veio fazer agora, como é natural, o saldo dos Estados Gerais do Partido Socialista, a conclusão simples de qualquer ouvinte atento da sua intervenção seria a de que, afinal de contas, foi «a montanha» que «pariu um rato»
O Sr. Deputado falou em 30 000 cidadãos que participaram em debates ao longo de 5 meses. Mas que medidas, opções ou grandes linhas de actuação saíram desses Estados Gerais? Nenhumas!

Risos do PS.

Aliás, logo no domingo seguinte, o Dr. Daniel Bessa deu a primeira «alfinetada» nesse grande «balão» que foram os Estados Gerais do PS. ao dizer que o PS tinha condições para, pela primeira vez, governar com uma certa folga. Ou seja, devido à política económica seguida pelo Governo social democrata, o PS teria condições - se ganhasse as eleições de Outubro, o que não vai acontecer - para governar com folga. Ora, essa folga criada para o próximo governo não o foi pelo PS, que, quanto muito, criou dificuldades, mas, sim, pelo Governo social democrata, pelo PSD.
V. Ex.ª fez também o balanço dos quatro anos de governação do PSD Como sabe, deve fazer-se o balanço da década de governação social-democrata.

Risos do PS.

O Orador: - A esse respeito, os números são públicos e confirmados por personalidades independentes, como o próprio Professor Ernâni Lopes ainda ontem fez, num seminário sobre Portugal e a integração europeia.
Os últimos 10 anos foram os de maior crescimento da economia portuguesa de que se tem conhecimento desde que há estatísticas em Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS):- Que maravilha!

O Orador: - O Sr Deputado falou em nova visão e nova estratégia. Agora percebo a razão por que só ao fim de sete minutos da sua intervenção falou dos Estados Gerais! É que nem V. Ex.ª acredita neles. E também sei por que não acredita. Porque, se o Dr. Daniel Bessa deu a «alfinetada» no «balão» dos Estados Gerais, o Sr. Deputado Almeida Santos, dois dias depois, atirou-lhe uma «pazada de terra em cima», ao dizer que, afinal, os Estados Gerais não eram a política que o PS apresentava ao País mas, sim, um conjunto de medidas, de propostas, de reflexões, que um conjunto de pessoas fizeram, digamos que academicamente. O Sr. Deputado disse-o na televisão e eu registei essa afirmação, com todo o respeito que tenho por ele.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já. Sr Presidente. Sr. Deputado, vou terminar este pedido de esclarecimentos, no fundo, fazendo-lhe um favor

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VV. Ex.ªs costumam depreciar o Financial Times...

Vozes do PS: - Ah'

O Orador: - ... e eu, hoje, vou falar dele. Porquê? Porque o Financial Times cita o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

Vozes do PS: - Um sinal dos tempos!

O Orador: - Sabem o que diz o Sr. Deputado Ferro Rodrigues no Financial Times? Diz o seguinte: não podemos quebrar as linhas da política seguida até agora,! Está no jornal! Será mentira?

Aplausos do PSD.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, quero apenas rectificar uma afirmação que acabou de ser feita pelo Sr. Deputado Rui Carp, que, naturalmente, deve-me o rigor da citação do que digo.
O que eu disse foi algo muito diferente do resumo que o Sr. Deputado acabou de apresentar. Eu disse que o «Contraio de Legislatura» não é um programa de governo, pelo que não poderá ser sujeito à crítica de que precisa de dois ou três orçamentos para ser executado, e que é uma lista de medidas necessárias ao nosso país No entanto, a quantificação e o ordenamento, segundo as prioridades, fazem-se, em primeiro lugar, no programa de governo e, em segundo, no orçamento de cada ano. Foi isto que eu disse, é por isto que me responsabilizo e não pelo que o Sr. Dr. Rui Carp resolve pôr na minha boca.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, o Sr Deputado Rui Carp não percebeu, ou não quis perceber, que a minha intervenção foi, realmente, a síntese dos trabalhos dos Estados Gerais,...

O Sr. Rui Carp (PSD):- Percebi!

O Orador: - ... visto que estes fazem parte da lógica da preparação daquilo que vão ser os grandes debates políticos do final deste Verão, para as próximas eleições.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - A síntese dos Estados Gerais 6 a de que estão em jogo três coisas fundamentais: em primeiro lugar, uma apreciação do que foram os quatro anos de governação do PSD, e não os 10, porque em relação aos seis anos anteriores já se realizaram duas eleições, pelo que, agora, temos de julgar apenas os quatro anos que medeiam entre as últimas eleições legislativas e as próximas; em segundo, uma apreciação das alternativas; em terceiro, uma apreciação dos protagonistas.
Ora, os Estados Gerais demonstram que, qualquer que seja o ângulo e a análise dos quatro últimos anos, das propostas para o futuro e dos protagonistas, o PS está muito à frente do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Onde? Onde?

O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado Rui Carp, não tenha dúvidas de que, para governar nos próximos anos, pelo menos durante duas legislaturas, o PS vai precisar de, numa primeira fase, tomar medidas que melhorem claramente as expectativas dos portugueses, visto que a situação do País é muito negativa social, política e economicamente
As primeiras medidas que um governo PS terá de tomar serão no sentido de inverter essas expectativas desastrosas. Como já disse o Sr Deputado Almeida Santos, os «Estados Gerais» correspondem a um compromisso político, a um compromisso sobre valores, sobre bases programáticas, sobre ideias, sobre estratégia Esse e um compromisso, Sr. Deputado Rui Carp, que o PS vai cumprir. Não tenha a menor dúvida?
Por outro lado, gostaria que lesse, com toda a atenção, a citação do Financial Times O que eu disse - e reafirmo aqui - foi que Portugal tem uma margem de manobra muito pequena e que, nos próximos anos. será necessário tomar medidas para mudar a estrutura fiscal - e esta e uma questão fundamental, Sr. Deputado Rui Carp! - e alterar o nível das taxas de juro, muito elevado, que existe hoje na banca. Só que, como é evidente, não se pode romper com todas as linhas da política económica, porque, como o Sr. Deputado sabe, elas baseiam-se em dois aspectos.
O PS tem uma opinião perfeitamente credível: defende também a construção da União Europeia e a economia de mercado. O Sr. Deputado devia estar contente e não criticar-nos. Só o faz porque sabe que com esta entrevista o PS penetra fortemente em todo o eleitorado do PSD, o qual já não responde às vossas críticas de radicalismo, de extremismo e de outros «ismos», que são totalmente absurdos.

Aplausos do PS.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, não vou participar neste esforço para encontrar as diferenças entre o PS e o PSD, já que ele é cansativo e de resultado incerto.
Quero questioná-lo sobre a enorme lacuna das suas palavras.
O Sr. Deputado falou em balanço, em projectos e em credibilidade. Fez o balanço desta legislatura, da actuação do Governo e da vida em Portugal nos últimos quatro anos e conseguiu não se referir à questão mais importante: a adopção, por Portugal, do Tratado da União Europeia que se constituiu. V Ex.ª conseguiu não se pronunciar sobre os seus efeitos e ainda não vimos nenhum Deputado socialista ou social-democrata - o que e compreensível, mas, de qualquer forma, censurável - preocupar-se com a evidente menorização do estatuto internacional de Portugal, o que podemos constatar agora com a questão do Canadá O governo português não assume a defesa do estatuto de Portugal perante um Estado estrangeiro e entrega essa solução, explicitamente, nas declarações que faz, à União Europeia. O Governo português não chegou sequer a chamar o Embaixador do Canadá em Portugal, para que

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este lhe explicasse por que motivo a marinha de guerra do Canadá ameaça intervir junto de barcos, que são território nacional, em águas internacionais. O Embaixador não é chamado e não vejo nenhum Deputado socialista, inclusivamente o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, a preocupar-se com esta questão, como não o vejo também preocupar-se com a adopção dos critérios de convergência nem das suas consequências desastrosas para a economia portuguesa.
Quando fala dos projectos o Sr. Deputado regista a mesma lacuna e este é que é o problema. Como é que o PS pode assumir alguma credibilidade se, em relação à revisão do Tratado que se vai operar na próxima legislatura, nos projectos que irá apresentar não esclarecer o povo português de qual será a sua posição? Será que o PS vai sujeitar-se às mesmas críticas que aceitou, que foi obrigado a aceitar, relativamente ao processo de ratificação do Tratado de Maastricht (ausência de debate, ausência de referendo)?
Já aceitou essas críticas aquando das eleições europeias do ano passado, mas está sujeito a que isso volte a acontecer se, no projecto que apresentar ao eleitorado, não esclarecer a sua posição em relação à revisão do Tratado. Aliás, é estranhíssimo que um tratado tenha de ser revisto um ano depois de aprovado... É a política dos pequenos espaços ou a confissão da absoluta incapacidade do Tratado para corresponder aos projectos assumidos?
Aliás, o Sr. Deputado não pode debruçar-se sobre a questão da credibilidade dos diferentes partidos nestas eleições caso se sujeite, em relação à questão central da nossa política, às mesmas críticas a que se expôs o ano passado, isto é, à ausência de debate, à ausência de decisão dos portugueses, à ausência de participação na decisão, à ausência de referendo e à absoluta despreocupação face aos efeitos dos erros já cometidos.
Em relação a esta enorme lacuna das suas palavras, Sr. Deputado, gostaria de obter um esclarecimento, tanto quanto possível cabal.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, em relação à questão dos problemas que tem surgido na sequência das ameaças do Canadá sobre os pescadores portugueses, o PS tomou ontem posições muito firmes, quer pela voz do seu Secretário-Geral quer pela voz dos seus representantes, na Comissão de Defesa Nacional (e por algum motivo terá sido nessa comissão).
Quando o Sr. Deputado pretende que hoje em dia, em qualquer país - suponho que não pretende que isso aconteça só em Portugal -, a luta política só possa ter lugar entre aqueles que advogam a continuação do processo de construção da União Europeia e os que estão contra ela, não posso estar mais em desacordo. E que a luta política entre famílias, partidos e composições completamente diferentes do ponto de vista político, social e económico, faz-se tendo como base o facto de haver um processo histórico em curso, o da União Europeia, que é apoiado por várias famílias políticas na Europa. Portanto, a sua posição parece-me redutora.
Quanto aos critérios de convergência, o Sr. Deputado sabe que, quando do debate sobre o Tratado de Maastricht na Assembleia da República, ficou claro que a posição do PS era bastante crítica em relação ao carácter rígido desses critérios de convergência nominal. Nas conclusões dos Estados Gerais, que tenho o maior gosto em oferecer-lhe para poder ler no fim-de-semana, essa posição foi mais uma vez reiterada e reafirmada com toda a determinação.
Sr. Deputado, já sabíamos que o CDS-PP tinha uma posição crítica em relação ao actual processo de construção europeia mas que não advogava a saída de Portugal da União Europeia. Por isso, pergunto: o PP advoga-a agora?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues faz uma pergunta retórica e já conhece a resposta.

O Sr. José Magalhães (PS): - A resposta é que é retórica!

O Orador: - É evidente que o Sr. Deputado já teve ter lido na imprensa, nem que seja aos fins-de-semana, a posição do meu partido. Por isso, sabe perfeitamente que, em relação ao Tratado da União Europeia, apresentamos, nestas eleições, linhas para Portugal defender na revisão do Tratado. Defendemos também que o tratado resultante dessa revisão deva ser debatido e referendado em Portugal.
Embora V.Ex.ª saiba que esta é a posição do CDS-PP, coloca essa pergunta para, mais uma vez, deixar no ar a ideia de que o debate não se faz entre os que têm diferentes visões para a nossa integração na Europa mas sim entre os partidários da integração e os seus adversários. Esta visão é que é redutora, já que procura inibir, destruir e impossibilitar o debate sobre as formas que devem assumir a nossa integração na Europa.
É esta visão, terrorista do ponto de vista político, que procura impedir o debate, na esteira das posições intimidatórias adoptadas também pelo PSD aquando da ratificação do Tratado de Maastricht, que procuraram impedir o debate do referendo. Foi isso que provocou a adopção cega dos critérios de convergência, com consequências desastrosas para a nossa economia; é essa visão que, hoje, possibilita ao PS, a cavalo dessas consequências, fazer uma crítica não inteiramente assumida à política económica actual, que tem as consequências desastrosas que todos conhecemos para a indústria, para a agricultura, para a pesca, para os diversos sectores da nossa economia e para o emprego dos portugueses.
O PS, para fugir ao debate, viciá-lo e não aceitar as responsabilidades graves que tem, adopta uma posição paralela à do PSD: o cego apoio a tudo aquilo que nos é ditado em termos de adopção de critérios e de disposições do Tratado.
Pelos vistos, vai continuar na mesma linha em relação tanto à próxima legislatura como à próxima revisão do Tratado. E digo isto porque o Sr. Deputado nem mesmo quando foi questionado directamente por mim sobre esta questão conseguiu esclarecer qual foi a posição definida pelo PS nos Estados Gerais - ou onde quer que seja - sobre a revisão do Tratado, sobre como é que o PS vai internaciónalmente defendê-lo se for Governo, sobre a forma como vai adoptá-lo em Portugal (se com ou sem referendo). Esta questão continua no ar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

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O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, oferecia-lhe este livro mas gostava de primeiro ler-lhe um parágrafo, que julgo responder, no essencial, ao seu problema.
Efectivamente, o PS considera que este é o momento de abrir o debate e de consultar o eleitorado sobre questões que tenham a ver com o avanço do processo de construção europeia. Por isso mesmo, no documento dos Estados Gerais - que não é apenas um guia mas também um compromisso para o PS - diz-se, em determinado momento: «justifica-se a ideia de submeter a consulta popular aspectos concretos do sentido da participação portuguesa no aprofundamento da União Europeia».

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Já é qualquer coisinha! Lá iremos! Devagarinho...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passarmos ao próximo ponto da nossa ordem de trabalhos, gostaria de dar uma informação à Câmara.
Fui surpreendido, devo dizê-lo, pelo tom de uma interpelação à Mesa feita pelo Sr. Deputado Eduardo Pereira, em que, entre outras coisas, insinuou 'que eu teria atrasado a posse da Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços pelas OGMA à Força Aérea Angolana, tendo em conta a data do Congresso do PSD, onde se definiu a nova liderança.
Obviamente, não vou fazer um contracomentário a essa insinuação. Gostei que o Sr. Deputado Eduardo Pereira tivesse voltado ao Plenário, mas sempre teria de dizer isto, na medida em que tenho de presumir que a sua intervenção exprime, de algum modo, a opinião de uma parte da Câmara. Em todo o caso, agradeço-lhe ter voltado ao Plenário.
Vou pedir ao Sr. Secretário que leia a nota organizada pelos serviços - a quem agradeço a presteza - sobre os acontecimentos aí referidos. Antes, porém, devo dizer que uma verdade resultará dessa nota: a resolução que alargou e fixou em definitivo o objecto deste inquérito foi publicada no Diário da Assembleia da República no dia 17 de Fevereiro e dei posse à Comissão no dia 21 de Fevereiro, ou seja, quatro dias depois; entretanto, o último partido a entregar a lista dos Deputados para integrar essa Comissão fê-lo no dia 15 de Fevereiro anterior.
Mais não digo.
Peço, então, ao Sr. Secretário, Deputado João Salgado, o favor de ler a nota organizada pelos serviços da Assembleia.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, é do seguinte teor:

O Inquérito Parlamentar n.º 27/VI - Sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços pelas OGMA à Força Aérea Angolana (CDS/PP), foi aprovado em 14 de Dezembro de 1994.
Foi publicado no Diário da República de 14 de Janeiro de 1995.
Nos termos da lei que regula os inquéritos parlamentares, o Presidente da Assembleia da República fixou, ouvida a Conferência dos Representantes dós Grupos Parlamentares, o prazo de 90 dias para a realização do inquérito, por despacho de 20 de Janeiro de 1995;
Em 25 de Janeiro de 1995, foi aprovada a resolução, que adita uma nova alínea ao inquérito inicialmente aprovado em 14 de Dezembro de 1994 e que aguarda publicação em Diário da República, tendo no entanto sido publicada no Diário da Assembleia da República de 17 de Fevereiro de 1995.
Os grupos parlamentares apresentaram a lista dos Deputados que integrarão a respectiva Comissão nas seguintes datas: o do Partido Ecologista Os Verdes, em 18 de Janeiro; o do CDS-PP, em 20 de Janeiro; o do PS, em 25 de Janeiro; o do PSD, em 25 de Janeiro, e o do PCP, em 15 de Fevereiro.
O Presidente da Assembleia da República deu posse aos membros da Comissão em 21 de Fevereiro de 1995.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, do nosso ponto de vista, o alargamento das competências da Comissão constituída, proposto por esta bancada, faz «regressar os relógios a zero», isto é, os prazos recomeçam, a partir daí, a contar desde o início. Portanto, a Mesa tem inteira razão em chamar a atenção para este ponto, constituindo este esclarecimento uma resposta cabal às preocupações, há pouco expressas, que apoiámos.
Do nosso ponto de vista, a questão processual não é a mais importante. O mais importante é substancialmente que a Comissão comece a trabalhar no mais curto prazo de tempo possível, para que, perante a opinião pública, não contribuamos para um maior desprestígio das comissões de inquérito, desta vez por começarem a inquirir e a trabalhar muito depois da divulgação pública dos factos que lhe deram origem.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, agradeço-lhe todo o interesse posto no esclarecimento desta questão, mas não concordo com o seu conteúdo.
O Sr. Secretário, Deputado João Salgado, saltou a data «chave». A discussão do inquérito parlamentar n.º 27/VI teve aqui lugar a 14 de Dezembro e o que a lei diz é que os membros da comissão devem tomar posse 15 dias depois da publicação no Diário da Assembleia da República - e não, Sr. Secretário, no Diário da República - da resolução que determinou a realização do inquérito. Portanto, no dia 16 de Dezembro, o Sr. Presidente tinha 15 dias, ou tinha até ao 15.º dia, para dar posse.
Também não foi referido tudo quanto foi dito sobre o alargamento das competências da Comissão. O Sr. Presidente tem de dar posse à Comissão que resulta da resolução aprovada pela Assembleia e os vários alargamentos que possam ocorrer serão, depois, incorporados.
Em terceiro lugar, o Sr. Presidente tomou a referência de 21 de Fevereiro como uma crítica pessoal. É um processo de intenção que me faz. O Sr. Presidente faz os processos de intenção que quiser; o que não há dúvida é que, tendo de marcar a tomada de posse até 30 de Dezembro, só o fez a 21 de Fevereiro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Eduardo Pereira, não vamos prolongar a polémica. Tanto a minha posição como a sua estão definidas. É claro que estas datas foram sempre observadas de perto pela Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares e nem tudo o que se passa nesta Casa é debatido em Plenário.

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O Sr. Rei Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado, mas peco-lhe que seja breve.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, consideramos que o Sr. Presidente actuou correctamente, nos termos e no espírito do regulamento e do Regimento, e que, evidentemente, não poderia dar posse a uma comissão sem haver Deputados para a integrar.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, é só para responder ao Sr. Deputado Rui Carp, que se sentiu na obrigação de vir em ajuda da Mesa.
Sr. Deputado, mesmo que fosse como o senhor diz, no dia 25 de Janeiro estavam criadas todas as últimas condições. Portanto, não faz sentido que ainda se esperasse um mês. Leia o processo, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Leiam todos os Srs. Deputados as leis que o regulam e façam um esforço para segui-las.
Vamos, agora, entrar no segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, que, hoje, tem apenas período de antes da ordem do dia.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Se há palavra que encerre um dos sentidos mais profundos do Humanismo e represente uma das atitudes mais nobres da convivência social, essa palavra é tolerância.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A razão atribui-lhe a lógica fundamental, face à diversidade dos seres humanos e ao multifacetado leque dos seus interesses individuais e colectivos.
O coração elege-a como virtude excelsa de personalismo e compreensão.
A política defende-a como instrumento imprescindível ao desenvolvimento, à gestão de conflitos, à confrontação de ideias e à opção de propostas de acção prática.
A ética e a moral recomendam-na também e, porque é incontestável, mesmo quem a não pratica, reivindica-a!
E quantas vezes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não é ela levantada como bandeira, escondendo, na sua sombra, egoísmos e hipocrisias indisfarçáveis, que fazem saltar labaredas de lutas fratricidas e cobrem de sangue e horror a humanidade?
Perante a sucessão de acontecimentos, tantas vezes catastróficos, os fóruns internacionais, conscientes do perigo, mas sem pessimismos exagerados, tocam a rebate, na tentativa de salvar o que, parece, não ter já salvação.
Eis a razão, Sr. Presidente e Srs. Deputados, por que a Conferência Geral da Unesco promoveu 1995 como o Ano Internacional da Tolerância.
Também em Viena, a Cimeira de Chefes de Estado e de Governo do Conselho da Europa definiu o ano que decorre como Ano Europeu contra o Racismo, a Xenofobia, a Intolerância e o Anti-Semitismo.
Com estas deliberações, pretendem a Unesco e o Conselho da Europa generalizar e aprofundar a reflexão e o debate sobre a questão candente da intolerância, responsável por constantes violações dos direitos humanos e liberdades fundamentais, e tentar uniformizar as formas de combate ao flagelo.
As questões relacionadas com a tolerância vêm sendo debatidas há décadas, nas instâncias internacionais.
Desde os anos 50 que o Conselho da Europa se debruça sobre os movimentos populacionais de e para os países europeus.
Passou, depois, nos anos 80, a ocupar-se das relações entre as diversas comunidades no seio dos Estados-membros.
Em Fevereiro de 1993, a Primeira-Ministra da Noruega alertou a Assembleia Parlamentar para os fenómenos do racismo, da xenofobia, do anti-semitismo e da intolerância, propondo um plano de acção fundamentalmente virado para os jovens.
Tratava-se de uma vasta campanha com o objectivo de favorecer e desenvolver o espírito de tolerância.
O Plano foi aprovado na Cimeira de Viena, em Outubro de 93, estando a decorrer a sua execução. Nessa Cimeira, ficou, ainda, acordada a redacção de um protocolo adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a elaboração da Convenção-Quadro para a protecção das minorias nacionais.
Também a ONU tem vindo a examinar este problema. A Sub-Comissão para a Prevenção da Discriminação e Protecção das Minorias tem feito o acompanhamento da situação, na Europa, e elaborou um relatório geral sobre os acontecimentos em matéria de racismo, intolerância e xenofobia.
Por seu turno, a Comissão dos Direitos Humanos da ONU adoptou, sobre a matéria, a Resolução n º 20, de 1993.
A Comunidade Europeia também tem trabalhado nesta problemática. Em Junho de 1986. o Parlamento, o Conselho e a Comissão adoptaram uma declaração comum contra o racismo e a xenofobia. O Parlamento Europeu criou duas Comissões de Inquérito: em 1985, sobre o fascismo e o racismo e, em 1990, sobre o racismo e a xenofobia.
No Conselho Europeu de Copenhaga, em Junho de 1993, foi adoptada pelos chefes dos doze Estados membros da Comunidade uma declaração conjunta sobre o racismo e a xenofobia, com vista a intensificar esforços para identificação das raízes do problema e protecção dos imigrantes e refugiados.
Em Junho de 1994, o Conselho Europeu, reunido em Corfu, cria, por proposta conjunta franco-alemã, a Comissão Consultiva para a Promoção da Tolerância e o desenvolvimento de uma estratégia global para o combate a actos de violência racista e xenófoba
Na reunião de Dezembro de 1994, em Essen, o Conselho Europeu aprova os contributos dos Conselhos da Educação e da Juventude para a estratégia global da União, que será patente em Cannes, em Junho do corrente ano
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não fora a importância vital do dossier «tolerância» e, certamente, as instâncias internacionais lhe não dedicariam tamanha atenção, nem gastariam tanto tempo a discuti-lo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É que as manifestações de intolerância, que variam de país para país, não são fenómenos novos e têm o seu fundamento em complexos factores psicológicos e sócio-culturais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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A Oradora: - Transformações profundas operadas na Europa desde a 2.ª Guerra Mundial geraram movimentos migratórios que a transformaram num continente multirracial e multicultural.
Com efeito, as democracias industrializadas acolheram, para além de imigrantes europeus, trabalhadores vindos de outros continentes. Eles chegaram dos países do Magreb e das antigas colónias europeias de África, Asia e Caraíbas. Deram ajuda preciosa para desenvolver os países de acolhimento, mas o grau de aculturação não foi conseguido com idêntica proporção por todos.
Nos casos de diferenças mais profundas, acentuadas pela diversidade de raça e religião, a identidade cultural própria subsistiu quase intacta, isolando grupos minoritários que se tornaram alvos vulneráveis de actos discriminatórios.
As transformações da economia resultantes da reestruturação das empresas, em função dos avanços científicos e tecnológicos, a crise europeia, com o desemprego a pobreza, a persistência de injustiças, o agravamento dos problemas sociais e a ignorância, criam vulnerabilidade e insegurança nas pessoas em situação económica precária.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Podem, então, gerar explosões, de intolerância, de ou contra grupos marginais, ou dar origem a actos de discriminação, fundada em pressupostos étnicos, religiosos ou de nacionalismos, para além de outros, baseados no sexo, idade e até, quantas vezes, por pura ausência de valores éticos fundamentais.
Sr Presidente, Srs. Deputados: A humanidade tem razões para corar de vergonha pelas violações dos direitos humanos que persistem no mundo, neste final do século XX, as quais vêm assumindo proporções assustadoras, mesmo em regiões desenvolvidas, como é o caso do velho continente em que habitamos.
Que poderemos nós sentir. Sr. Presidente e Srs. Deputados, face aos hediondos genocídios levados à prática em nome de nacionalismos exarcebados ou perante execráveis limpezas étnicas, através de sistemática violação de mulheres? Vergonha e indignação, certamente, mas também um profundo sentimento de impotência perante tão abomináveis actos de barbárie!
É, pois, tempo de parar e reflectir.
Reflectir, quando é iniludível o ressurgimento do racismo e da xenofobia, quando a intolerância em função da raça, da religião ou nacionalidade, assente em ideologias de movimentos extremistas, ganha adeptos, particularmente, entre a população jovem. Reflectir, sim, sobre todos os tipos de injustiça, discriminação ou intolerância de que são particulares vítimas grupos indefesos como as crianças, os idosos ou as mulheres.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - As sociedades multiculturais são uma realidade dos nossos dias e uma potencial riqueza para os povos que as compõem Mas um saudável entendimento entre os povos e cidadãos assenta, naturalmente, no respeito pela identidade cultural própria de cada um, por aceitação das suas diferenças.
Tal é a base sólida para alcançar uma interculturalidade indispensável à coexistência pacífica entre indivíduos diferentes, mas iguais em dignidade, e para desenvolver uma dinâmica de solidariedade capaz de gerar o clima de concórdia que predispõe as pessoas à leal colaboração.
Em Portugal, a intolerância não assume proporções propriamente violentas. Apesar de alguns casos recentes, que não devem ser ignorados, poderemos afirmar que a tradição cultural dos portugueses rejeita a discriminação racial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A prová-lo estão as relações harmoniosas que sempre nos uniram aos povos de expressão portuguesa e a postura dos quatro milhões de emigrantes portugueses inseridos, sem grandes problemas, nos vários países de acolhimento.
Entre nós, a intolerância reveste-se, quase sempre, de roupagens menos sombrias, encarnando, não raro, atitudes discriminatórias que ignoram o direito à igualdade de oportunidades no campo da realização pessoal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A campanha europeia contra o racismo, a xenofobia, o anti-semitismo e a intolerância estão em marcha.
Em Portugal desenvolve-se sob o tema «Todos diferentes, todos iguais».
O Comité Nacional propõe-se promover e coordenar um conjunto de acções e actividades que visam sensibilizar os jovens para valores como a cooperação, a participação e a tolerância activa. Para o conseguir, procura conjugar esforços entre a Administração Pública e a sociedade civil, em particular, com as organizações mais vocacionadas e sensibilizadas para a problemática das diversas formas de exclusão das pessoas.
O programa dirige-se essencialmente aos jovens. Deles é o futuro, que pode tornar-se diferente e melhor se o entusiasmo, o dinamismo e a generosidade que lhes são próprios forem orientados por uma grande informação e uma sólida formação cívica, que afastem a ignorância e o obscurantismo tão propícios à intolerância e à quebra do respeito pelas liberdades fundamentais.

Vozes do PSD:- Muito bem!

A Oradora: - É que, Sr. Presidente e Srs Deputados, não há conceito de liberdade que não ande de braço dado com o da tolerância. Sempre que se separam cada uma atrofia e morre e, sem a vivência de ambas, a vida colectiva perde o seu verdadeiro sentido.
É da escola esse papel fundamental de formar gerações, mas também da família e da sociedade em geral, que não podem alhear-se dessa tarefa, que é de todos e em que cada um tem de assumir responsabilidades
Em causa está a fraternidade, valor fundamental que muito dignifica a pessoa humana.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência, o Sr. Vice-Presidente, Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr Presidente. Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira, quero felicitá-la pela intervenção que trouxe a esta Câmara, que é pertinente e actual. Aliás, há um ano a esta parte, a Conferência para a Demografia e para as Migrações, a Conferência do Cairo, tinha alertado os diversos governos para o facto de o problema fundamental do próximo milénio ser o problema das migrações e da demografia.
V. Ex.ª trouxe a esta Câmara o problema da tolerância, das minorias étnicas e da identidade cultural, que têm lu-

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gar hoje em Portugal e em todas as partes do mundo, pelo que quero felicitá-la.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, Sr.ª Deputada, gostaria de a interpelar sobre o que se passa em Portugal.
Como é conhecido, Portugal tem cerca de 4 milhões de portugueses espalhados pelo mundo e as nossas chancelarias, bem como os diversos governos, preocuparam-se em defender as nossas comunidades, tendo em atenção a sua legalização, identidade cultural, integração em diversas sociedades e reagrupamento familiar, o que é de louvar. Gostaria de a interpelar, Sr.ª Deputada, no sentido de saber que política é que o Governo, neste caso concreto, os sucessivos governos do Professor Cavaco Silva e do partido que nesta Câmara o suporta - o partido de V. Ex.ª, o PSD -, tem em relação às minorias étnicas em Portugal e o que tem feito para a integração desses portugueses.
No meu entendimento, Sr.ª Deputada, um grande número de imigrantes que vivem Portugal é oriundo de países com os quais tivemos uma vivência histórica de cinco séculos, pelo que temos laços históricos, culturais e de amizade com eles, e esses mesmos cidadãos, que residem e trabalham em Portugal, são excluídos e não são integrados na sociedade portuguesa. Não têm acesso à habitação social e, por isso, vivem em guetos, em bairros quase clandestinos ou semiclandestinos. São lançados no elevado número dos excluídos socialmente e não lhes pode ser atribuída a cidadania porque são tolhidos no acesso a uma vivência plena da democracia e daquilo que V. Ex.ª, ali da tribuna, nos referiu.
Por isso, gostaria. Sr.ª Deputada, que me comentasse qual a política do actual Governo em relação às minorias étnicas e ao respeito pela sua identidade cultural e integração social.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sr.ª Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Luís, muito obrigado pelas suas palavras amáveis e por ter prestado a atenção que prestou à minha intervenção. Naturalmente que não é do desconhecimento de V. Ex.ª que o nosso Governo procedeu a um processo de legalização, que poderemos chamar de maciço, dos cidadãos que se encontram em Portugal em situação clandestina...

Vozes do PSD:- Muito bem!

A Oradora: - ... e o seu prazo foi alargado uma vez. Foram muitos milhares de pessoas de outros países que, estando em situação clandestina em Portugal, ficaram legalizados nesse processo, que se arrastou por um tempo relativamente alargado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, com certeza que é também do conhecimento de V. Ex.ª, neste momento, que está a decorrer um processo de integração desses imigrantes na sociedade portuguesa. O Conselho de Ministros tomou já uma resolução nesse sentido e o processo de integração dessas pessoas na nossa sociedade está em curso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de usar da palavra para vos transmitir, em síntese, aquilo que é a súmula da reunião da Comissão Eventual com o Objectivo de Promover Contactos com o Congresso dos Deputados das Cortes Espanholas, realizada com os nossos congéneres, e assim cumprir aquela que penso ser uma obrigação destas delegações parlamentares, no sentido de informar o Plenário das conclusões do seu trabalho no exterior.
Fá-lo-ei de uma forma sucinta e dir-vos-ei, em primeiro lugar, que, segundo a proposta espanhola, a nossa ordem de trabalhos incluía sete pontos: relações bilaterais; comunicações e desenvolvimento transfronteiriço; recursos comuns; meio ambiente; cooperação científica, cultural e educativa; construção europeia e, finalmente, outros assuntos, onde foram tratadas questões de grande relevância para ambos os países, designadamente a questão de Timor.
Seguindo aquilo que é a primeira súmula da nossa reunião, diria que, no primeiro ponto, se entendeu dever sublinhar o apreço de ambas as delegações sobre o nível de cumprimento das propostas aprovadas na 3.ª Reunião de Lisboa, ocorrida em Maio de 1994, que respeitam à cooperação transfronteiriça, às comunicações e aos recursos hídricos. Esta era uma primeira condição que cumpria verificar para nós próprios termos consciência dos níveis de cumprimento das nossas sugestões, das nossas propostas e das nossas recomendações aos executivos.
Todavia, não vos esconderei que a questão mais importante das nossas discussões foi, sem dúvida nenhuma, a hidrológica. Obviamente que foi reafirmado o princípio de que a um convénio, a um acordo bilateral estabelecido sobre o assunto, que deve enquadrar todo o problema para o futuro conforme foi decidido na Cimeira do Porto, a esse acordo devem ser acrescentados convénios por bacia hidrográfica que irão estabelecer não só os direitos recíprocos e individuais de cada Estado como também outras matérias de relevância para a questão, designadamente as que tocam à qualidade da água.
Neste ponto particular foi exigido pela delegação portuguesa que se referisse expressamente a questão da radioactividade das águas porque entendemos que ela é especialmente importante para Portugal, uma vez que Portugal recusou a opção nuclear e a Espanha ainda hoje mantém centrais nucleares em rios comuns, em rios cujo curso vem afectar o território português. Aliás, a qualidade das águas diz respeito não só aos governos como aos municípios e neste caso está sublinhada em particular a questão da radioactividade.
Focada a questão europeia, ficou entendido que as futuras ampliações da União Europeia não devem, no entender conjunto dos Deputados, corresponder a uma simples lógica de mercado, nem a uma mera expansão de uma fronteira económica, mas devem assentar, sobretudo, na necessidade de manter a paz. de manter a estabilidade. Também a esse alargamento não deve corresponder um prejuízo no que toca ao aprofundamento do processo de construção, nem a um abrandar da coesão económica e social, e ainda ficou entendido que o centro de gravidade da União Europeia não deve mover-se pondo em risco o desenvolvimento dos países menos prósperos da União.
Assim, é entendimento conjunto dos Deputados, quer portugueses quer espanhóis, que a união económica e

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monetária se deve alcançar sem exclusões, sem núcleos duros ou com geometrias variáveis. Igualmente se condena a ideia e o projecto da Europa-fortaleza, de uma Europa construída com isolamento do exterior e, pelo contrário, se entende que a construção da nova Europa política e económica deve estar intimamente comprometida com a paz, com a estabilidade e com o desenvolvimento de outras zonas do mundo.
No que concerne ao programa de cooperação cultural e científica, foi reconhecido que ainda há passos a dar, designadamente por Portugal, para o reconhecimento de estudos, de diplomas de natureza secundária de origem espanhola, o que não acontece no sentido inverso. Mas foi reafirmado, sobretudo, o interesse em estabelecer o princípio da livre circulação dos estudantes, o princípio da livre circulação dos títulos académicos e ainda o estabelecimento de um sistema automático de reconhecimento de equivalências para graus universitários.
Os Deputados de ambos os países reconheceram ainda que há um grande desconhecimento mútuo dos povos que representam, que a paralela integração na união económica não fez ampliar de forma satisfatória o inter-conhecimento dos povos português e espanhol. Nesse sentido, apelam, mantendo a afirmação na identidade histórica e cultural de cada um dos Estados, para que se reforcem os laços de cooperação no domínio da história e da cultura, não só no que toca à literatura mas; também às artes e ofícios tradicionais, instando os Governos centrais, as entidades públicas e privadas e ainda as autarquias a colaborarem neste desiderato.
Uma especial nota foi feita ao protagonismo crescente das mulheres na sociedade, na sua participação activa, sublinhando-se a necessidade de promover o reconhecimento das contribuições das mulheres na economia, no contexto do desenvolvimento sustentado e da promoção da igualdade entre homens e mulheres trabalhadores, na conciliação das responsabilidades familiares, profissionais e na vida de cada indivíduo. Foi ainda colocado um especial ênfase na promoção da plena participação das mulheres na vida pública para superar o contraste entre o maior protagonismo das mulheres noutros âmbitos e a sua ainda escassa participação na tomada de decisões políticas.
Relativamente aos movimentos migratórios e às minorias étnicas e culturais - aqui em consonância com o que acaba de dizer a Sr.ª Deputada Maria Luísa Ferreira - se sublinhou a necessidade da integração social como solução para combater as atitudes e as condutas de xenofobia ou de racismo, que, infelizmente, crescem de forma ameaçadora nos espaço da União Europeia.
A livre circulação dos trabalhadores foi também um dos pontos que a delegação portuguesa, e muito bom, fez sublinhar e aprovar nas suas conclusões finais, não só porque decorre de um normativo comunitário mas porque, politicamente, se estabeleceu um consenso entre nós de que era fundamental fazer avançar a concretização da livre circulação dos trabalhadores, que, na prática, ainda não funciona de forma satisfatória, garantindo, designadamente os direitos da assistência social, os direitos laborais, os direitos sociais que estão sublinhados no dito normativo.
Ambas as delegações sublinharam ainda a importância do combate conjunto ao narcotráfico, não só com medidas que já foram tomadas, designadamente saudando o Acordo sobre Controlos Móveis, de 20 de Janeiro de 94, mas ainda exigindo aos respectivos Governos a adopção de legislações e de medidas efectivas que previnam e reprimam o branqueamento de capitais que, como se sabe, está intimamente ligado ao tráfico de estupefacientes.
Também se consagrou, a nível de debate e de resolução final, a decisão de que os grandes projectos de infra-estruturas, designadamente de traçados de vias de comunicação, deviam, obrigatoriamente, ser precedidos de estudos sobre a avaliação do impacto não só derivei ambiental como também de nível relativo ao património histórico e cultural construído e não só. |

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Se permite, Sr. Presidente, quero dizer apenas que aprovámos também uma proposta relativamente à zona de pesca da NAFO - quase que premonitoriamente em relação à pesca da palmeta e do bacalhau -. referindo a aprovação das 19 000 toneladas, das quais 69% cabem às frotas da União Europeia e uma importante percentagem destas a Portugal e à Espanha.
Falou-se na necessidade de cooperar mais intimamente no que toca a incêndios florestais e à sua extinção e também - não posso deixar de o referir - na questão de Timor, tendo sido aprovada uma decisão conjunta de manifestar, sem reservas, o apoio às posições expostas pela nossa delegação, designadamente ao seu direito à autodeterminação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS). - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sousa Lara, quero começar por declarar que V. Ex.ª tem vindo a presidir a esta Comissão e às suas diversas reuniões com uma dedicação total, procurando que elas atinjam as finalidades que, aliás, todos desejamos.
Lamento apenas que este relatório que acabou de trazer aqui não tivesse sido previamente conhecido pelos membros da Comissão, pois teria sido possível que ele traduzisse a posição de toda a Comissão e não só a do seu presidente.
Por outro lado, gostaria de chamar a atenção do Plenário para três ou quatro pontos, em que, suponho, o Sr. Deputado Sousa Lara e eu estamos um pouco divididos.
O primeiro diz respeito à agenda do debate interparlamentar, que, na minha opinião, tem de ser bastante mais cuidada do que tem sido até agora. Os membros da Comissão reúnem-se sem conhecer o que é que os membros dos Governos de Portugal e de Espanha decidem nas suas reuniões, não havendo a mais pequena informação às oposições sobre as matérias que ali são tratadas. Assim sendo, será, como compreenderão, muito difícil a um grupo heterogéneo de Deputados - uns pertencem à maioria e outros à oposição, os quais têm ainda menos conhecimentos dos assuntos do que os primeiros - discutir com Deputados de outro país questões que conhecem mal, por terem sido mal esclarecidos
O segundo ponto tem a ver com a criação destas próprias comissões e do seu âmbito. Considero inconveniente que haja uma comissão deste tipo entre Portugal e Espanha, não havendo outras semelhantes, para equilibrar, entre Portugal e França ou entre Portugal e Itália, permitindo que apareçamos aos nossos próprios olhos e aos olhos da Europa como um contrapeso de Espanha e como um

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grupo nacional que se põe de acordo com outro grupo nacional bastante mais importante na Europa do que nós, podendo, assim, ser confundidos com uma mera região autonómica de Espanha.
O terceiro ponto refere-se ao modo como são criadas estas comissões. Julgo que elas não deviam ser criadas com outro critério que não fosse o de os seus membros pertencerem a outras comissões, para que pudessem aparecer, quando se reúnem como comissão entre os Parlamentos de Portugal e de Espanha, como representativas do pensamento das diversas comissões desta Assembleia e, portanto, profundamente preparadas para todos os debates que se torne necessário fazer.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Atenção ao tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar, mas, antes, devo dizer que este assunto é importante e que a Assembleia não tem dedicado a esta Comissão a atenção que, penso, ela merece, dada a importância do seu papel e dos debates que são feitos com os Deputados do país vizinho.
Para mim, é ainda preocupante que, nestes encontros, se possa beneficiar mais um país do que outro Penso que é difícil que os comunicados reflitam - e o Sr. Deputado sabe a que me estou a referir - a posição das comissões e sejam equilibrados ao ponto de serem o resultado final das dúvidas, das questões e até das lutas que se travam no interior dessas reuniões, que aparecem deficientemente retratadas nesses comunicados finais.
Eu, por exemplo, e apesar das referências ao debate que houve sobre o Plano Hidrológico Nacional de Espanha, tenho a maior preocupação pelo que ouvi nessa discussão na Comissão Dá-me a sensação que a Comissão se debruçou sobre trabalhos espanhóis, eficientes, completos e bem elaborados, mas do lado português não havia nada para comparar Daí poder concluir que, apesar dos belos debates que travámos, no próximo ano, podemos ver-nos na iminência da imposição de um plano espanhol transformado em plano peninsular

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Sousa Lara. informo-o de que tem mais três pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Sonsa Lara (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, tem a palavra.

O Sr Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Pereira, V. Ex.ª dirigiu-me palavras amáveis, que agradeço e retribuo, pois foi um membro activo e muito eficaz em várias das nossas cimeiras.
No que toca à agenda do debate interparlamentar, devo dizer-lhe que o seu projecto foi entregue pelos espanhóis com alguma antecipação - aliás, como nós também fizémos -, e que, no dia da sua chegada, o fiz circular imediatamente por todos os membros que constituem a Comissão. Não pude fazê-lo de uma forma mais célere, porque era-me literalmente impossível.
No que se refere às reuniões preparatórias, fiz aquilo que a Comissão entendeu como justo e oportuno, que foi solicitar a vinda de membros do Governo à Comissão para nos falarem sobre os dossiers mais importantes, designadamente o Sr Secretário de Estado do
Ambiente e do Consumidor, no que toca ao Plano Hidrológico Nacional de Espanha, e a Sr.ª Secretária de Estado Isabel Mota, por causa das questões de natureza económica e comunitária, designadamente o INTERREG, que, como sabe, consta dos nossos apêndices, os quais se prestaram a dar todos os esclarecimentos que a Comissão entendeu serem necessários.
Não duvido que haja algum fundo de bondade na sua questão, mas trata-se de um fundo reciprocamente anulável. Isto é, sempre que a organização cabe a Espanha, na ordem de trabalhos há um acréscimo de influência dos espanhóis, mas também sempre que a organização cabe a Portugal, esse acréscimo de influência é dos portugueses - não tenha dúvida. Nisso faço jus aos meus galões, tendo presidido às quatro cimeiras, pois cabe-nos fazer o projecto da ordem de trabalhos e, por conseguinte, aquilo que fica a predominar.
Em segundo lugar, no que toca às comissões alternativas - lembra-se, com certeza, que discutimos esse assunto lá -, o Sr. Deputado tem razão. Não temos! Temos uma comissão com este âmbito entre Portugal e o Brasil, que não funciona, e não temos mais. Também acho que, relativamente a países da Europa, deviam existir mais; aliás, a Espanha tem uma com a França, obviamente por razões que se compreendem, mas também nós devíamos ter com a França e fazia todo o sentido que também tivéssemos com a Itália, até no âmbito da NATO Será assunto para apreciarmos numa outra altura.
No que diz respeito à questão do Plano Hidrológico Nacional de Espanha, devo dizer-lhe. Sr. Deputado, que eu próprio estou preocupadíssimo. e já o disse aqui.

O Sr. Eduardo Pereira (PS) - É só flores!

O Orador: - Não, não' Já o disse aqui! Sabe muito bem. Sr. Deputado - não sei se assistiu, mas, se não assistiu, devê-lo-ia ter feito -, que estou preocupadíssimo com a questão do Plano Hidrológico Nacional de Espanha.
Devo dizer-lhe que não me sossegam as conclusões de boas intenções relativamente ao convénio comum e à obrigação de se estabelecerem convénios por bacia hidrográfica e ainda quanto à questão da qualidade da água - como sabe, não fui eu que a propus, mas imediatamente me solidarizei com ela. Porém, suponho que fizémos o máximo que estava ao nosso alcance.
Último ponto, Sr. Deputado: não se esqueça de que não são publicadas apenas as conclusões e de que estas não retratam o debate. São publicados todos os debates Até hoje foram publicados os debates das duas primeiras cimeiras e, neste momento, a Assembleia tem para publicação - e, aqui, faço um parêntesis para pedir ao Sr Presidente o favor de as mandar publicar o mais depressa possível - o texto relativo ao debate da III Cimeira, mas o mesmo acontecerá com a acta da IV Cimeira. Nessa altura, quando isso acontecer, os governos e o nosso eleitorado poderão perceber o que foi a intervenção de cada Deputado e dos grupos parlamentares e o consenso que estabeleceu ou que não se estabeleceu. É pena que a opinião pública e a própria comunicação social não estejam a dar.

O Sr. Eduardo Pereira (PS)- - Esta Assembleia!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu) - Sr Deputado, peco-lhe que termine, pois já ultrapassou o tempo regimental.

O Orador: - Tem razão. Sr. Presidente, termino já.

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Sr. Deputado Eduardo Pereira, estou de acordo consigo. É pena que esta Assembleia, em primeiro lugar, não tenha assumido isto com a gravidade e a projecção que o assunto tem e merece, fazendo eco para a comunicação social e para o próprio eleitorado das gravíssimas circunstâncias que encerra este assunto.
Penso que não posso dizer mais do que isto, mas, Sr. Deputado, gostaria que não ficassem dúvidas sobre a nossa preocupação a este respeito, que, aliás, já é anterior.

Aplausos do PSD.

O Sr Presidente (Ferraz Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sousa Lara, no que toca ao relatório elaborado por V. Ex.ª, da delegação que chefiou, embora não vá pronunciar-me sobre ele, gostaria de sublinhar alguns aspectos que, na opinião do Partido Ecologista Os Verdes, deveriam ser considerados relativamente ao futuro.
O primeiro aspecto tem a ver com a constatação óbvia para qualquer um dos Deputados que integrou esta delegação de que, ao contrário dos Deputados espanhóis, os delegados portugueses não estão municiados de informação, da parte do Governo português, sobre dossiers tão importantes, que os habilite a poder, com clareza, intervir, permitindo, ou exigindo até, com outro grau de segurança, aos seus colegas espanhóis a clarificação de posições que, manifestamente, tentam não assumir.
O segundo aspecto relaciona-se com a questão das nove centrais nucleares existentes e com a possibilidade da construção de mais uma, em relação à qual a posição do Governo espanhol é dúbia.
O terceiro aspecto prende-se com o Plano Hidrológico Nacional de Espanha, que é manifestamente, como o Partido Ecologista Os Verdes sempre disse aqui, uma questão fundamental. Quanto a isto, devo dizer que, em Junho de 1993, apresentámos um projecto de lei nesta Câmara, que a maioria. então, chumbou, desvalorizando o que era claramente uma questão fundamental por não a entender como tal.
Ora, temos grande preocupação quanto ao incumprimento dos convénios estabelecidos em 1968, mesmo na visão parcelar que eles tinham, porque não são respeitados e o Governo português não faz valer os seus interesses nos recursos hídricos comuns, o que é extremamente preocupante, para nós. Como exemplo, devo dizer que, no último dia em que a delegação portuguesa esteve em Espanha, a 3 de Março, o jornal El País publicou uma notícia onde se dizia que o governo espanhol tinha aprovado, por unanimidade, um diploma relativo ao plano hidrográfico da bacia do rio Douro, que nós, Deputados portugueses, desconhecemos. O meu grupo parlamentar já pediu informações, designadamente à Sr.ª Ministra do Ambiente, solicitando até a sua presença na reunião de amanhã, que é uma sessão de perguntas ao Governo, para, desse modo, poder responder a esta matéria, mas não viu qualquer dos seus pedidos satisfeitos
Esta é, para nós, uma matéria preocupante e pensamos até que, com esta desresponsabilização toda, o Governo português arrisca-se a ter pela frente, quando vier a tomar posição, uma situação de facto consumado que não garante os interesses nacionais.
Portanto, penso que, globalmente, estes contactos são positivos, com o relativismo que sempre tem o que lá se discute, como é evidente. Do ponto de vista da troca de
informações, são úteis, mas - sublinho - a desvalorização dada pelo Parlamento a estas matérias e a menorização do papel atribuído pelo Governo à Assembleia não permitem que estas comissões tenham uma operacionalidade e um âmbito de intervenção que manifestamente lhe escapa e seria útil poder transformar.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Sousa Lara, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Sousa Lara (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sousa Lara, muito sinteticamente, registando a sua intervenção como presidente da Comissão Eventual com o Objectivo de Promover Contactos com o Congresso dos Deputados das Cortes Espanholas e a do Sr. Deputado Eduardo Pereira, devo dizer que esta reunião demonstrou a importância não só das relações entre parlamentares dos dois países mas também do debate produzido e das conclusões e até daquilo que, muitas vezes, os parlamentares são capazes de fazer, indo à frente ou ao lado dos executivos, conseguindo, muitas vezes, influenciá-los com o próprio pensamento ou até esclarecer a opinião pública.
Dou como exemplo o caso de Timor-Leste, que era objecto, por parte do Governo espanhol, de informações desencontradas e até de um algum desinteresse pela nossa causa, não aparecendo em qualquer comunicado final, mas, depois, por insistência nossa, acabou por aparecer, e até na sua dupla vertente, na da defesa dos direitos humanos e na do princípio da autodeterminação. Mas outras situações poderiam ser referidas, mostrando, por exemplo, como todos sabemos, em que medida os parlamentares espanhóis, num regime parlamentarista como o de Espanha, exercem influência, pelas posições tomadas no seu próprio Executivo.
Gostaria ainda de dizer que achei extraordinário o empenhamento de todos os Deputados nesse debate e, especialmente - é óbvio -, do seu presidente. Deputado Sousa Lara, que teve um papel que deve ser, sem dúvida, salientado nestas relações e no resultado final.
Já agora vou fazer a minha pergunta, que tem a ver especificamente com esta questão Tendo presente o que disse o Sr. Deputado Eduardo Pereira, pergunto ao Sr. Presidente da Comissão se não entende, em função daquilo que foram as negociações envolvendo não só Portugal e Espanha mas também Portugal, Espanha e Itália e Portugal, Espanha e França, pelo menos estes três países, em alguns domínios específicos, que são muitas vezes questões comunitárias, ou subcomunitárias. em termos regionais, que se deveria avançar já na próxima legislatura, a partir de uma proposta do Sr Presidente, para um alargamento desta comissão eventual portuguesa de relações com parlamentos, com as mesmas pessoas ou as que venham a estar nesta futura comissão, porque, no fundo, será uma continuidade do relacionamento com parlamentares italianos e espanhóis, ou seja, para haver esse conhecimento de outros debates, ao nível dos outros parlamentos, que, neste caso, seriam de Espanha, Itália, Portugal e França, pelo menos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP)- - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sousa Lara, creio que, neste momento, este tipo de relações entre a nossa Assembleia da República e o Congresso Espanhol assume uma grande importância e que, na verdade, é necessário dar-se muito mais atenção à preparação destes encontros. Não digo que não tivesse havido um esforço, mas não foi corripletamente coroado de êxito.
Recordo, por exemplo, e tanto o Deputado Sousa Lara como os outros Deputados lembrar-se-ão, que o Secretário de Estado do Ambiente e do Consumidor ficou de enviar-nos um dossier com dados precisos sobre recursos hídricos e não só, para podermos fundamentar a nossa argumentação, que, em muitos aspectos, até era consensual, mas, até hoje, nada. Ainda estamos à espera que nos chegue o relatório do Governo sobre essa matéria e já viemos de Espanha.
Creio ter havido um esforço conjunto no sentido de representar os interesses de Portugal nesta e noutras matérias, que, no fundamental, foi alcançado. No entanto, tal como os Srs. Deputados Sousa Lara e Eduardo Pereira, tenho algumas preocupações por pensar que os espanhóis estão, em primeiro lugar, a acautelar os seus interesses, tendo em conta a opinião pública espanhola, e que só depois irão ver o que poderá fazer-se em relação ao seu vizinho deste canto da Península Ibérica. Isto significa o que significa que há que continuar o esforço, no sentido de procurarmos pontos de convergência, para defendermos os nossos interesses, particularmente nesta questão que é agora central nas relações que temos com os espanhóis, os recursos hídricos, mas também que o Governo tenha uma atitude - e isto é necessário - radicalmente diferente da que tem tido até agora.
Não é possível a Assembleia da República e a opinião pública nacional empenharem-se profundamente nesta matéria- e daqui a pouco irei fazer uma intervenção sobre isso - se o Governo continuar a ter uma atitude de secretismo, não divulgando aquilo que conhece, o que leva a que haja neste momento, no País, um ambiente crescente de preocupação e até uma sensação de que o Governo é incapaz de dialogar e de beneficiar com os espanhóis numa matéria tão sensível como esta. Se saírem dos gabinetes - e certamente muitos o farão -, recolhem esta opinião.
Hoje, a sensação que há é a de que o Governo não está à altura de fazer esta negociação, ideia - quero-o aqui dizer - de que também partilho.
Posto isto, pergunto-lhe, Sr. Deputado Sousa Lara, se estaria de acordo em que propuséssemos a vinda a esta Comissão ou a outra da Sr.ª Ministra do Ambiente, e não de um qualquer Secretário de Estado ou Director-Geral, o mais breve possível, para, analisando profundamente esta questão, deixarmos de ter, a partir daí, uma situação de informação avulsa, encontrando formas de ter uma informação sistematizada e um debate esquematizado com o Parlamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Sousa Lara, embora estejamos cientes de que esta bancada não tem participado como devia nos trabalhos da Comissão a que V. Ex.ª preside, não atingindo os níveis de frequência de assiduidade que seriam desejáveis, sabemos que o Deputado Adriano Moreira tem, em termos de participação, dado o máximo possível, contribuindo com a qualidade que é reconhecida por todos.
Em todo o caso, quero aproveitar esta ocasião para dizer o que sentimos em relação a este assunto.
Em primeiro lugar, por ser da máxima gravidade, supomos que esta matéria exige uma posição tanto quanto possível consensual dos diversos partidos e não deve servir de campo para polémicas escusadas ou combates políticos com fins meramente eleitorais ou de ganho político.
Em segundo lugar, entendemos que, na questão da água, estão a ocorrer situações que podem prejudicar, e muito, o interesse nacional O Plano Hidrológico Nacional de Espanha está num estado muito avançado e a participação portuguesa na sua elaboração foi praticamente nula. Organizou-se um processo de consultas a partir da realização recente de uma cimeira ibérica mas, porventura, tratou-se de uma iniciativa tardia.
Contudo, esperamos que as autonomias espanholas ponham obstáculos e ofereçam resistência para que esse plano não avance tão rápido quanto, eventualmente, a administração central espanhola desejaria.
Passo agora às questões que gostava de colocar-lhe, Sr. Deputado Sousa Lara, parece-lhe suficiente a realização de consultas intergovernamentais sobre esta matéria ou pensa não ser necessário que o Parlamento português venha a tomar uma posição mais veemente e interventora politicamente para despertar em Portugal um alerta e mobilizar a vontade política que sirva de contraponto ao plano espanhol?
Por outro lado, não pensa que deveria ser criada, no âmbito desta Assembleia, uma comissão especializada para tratar do problema da água e das relações com o Plano Hidrológico Nacional de Espanha? Inclusivamente, poderiamos debruçar-nos sobre o Plano Nacional da Água de que a Assembleia da República não está muito informada.
Ainda há pouco, sobre a água eventualmente armazenada na barragem de Foz Côa, se falou numa reserva de água que poderia ser utilizada para alimentar a da albufeira do Alqueva, apesar de ter sido negado pela administração central. Mas a verdade é que os jornais deram a entender que haveria um plano nacional para trazer água de Foz Côa para o Alqueva, o que agora é negado.
Repito: do seu ponto de vista, não seria conveniente constituir uma comissão que se debruçasse apenas sobre estas questões, de forma a que a Assembleia pudesse desempenhar o seu papel eficazmente, contribuindo para o acompanhamento e eventual resolução destes problemas?

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostava de dizer-vos que julgo (e, se calhar, é pouco parlamentar e diplomático da minha parte mas eu sou assim e já me tenho prejudicado várias vezes por dizer o que penso) que nós, Assembleia da República, temos «andado a dormir» sobre este problema. Repito, de modo brutal, aquilo que o Sr Deputado Eduardo Pereira disse de forma mais subtil e elegante do que eu, pois estamos perante um problema dramático e tenho a certeza de que a história dará razão àqueles que hoje pensam dessa forma.
Estou de acordo com os Srs. Deputados António Murteira, Isabel Castro e Manuel Queiró mas ainda não se viu,

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neste Parlamento, a «onda de fundo» que a gravidade deste assunto merece.
Que mereça uma comissão especial, não me parece, até porque temos a Comissão de Administração do Território, Equipamento Social, Poder Local e Ambiente e a Subcomissão do Ambiente e creio que não devem ser criadas mais comissões ou subcomissões; os Deputados são os mesmos e é preciso que se empenhem a sério e tratem deste assunto como prioritário e nacional.
Há questões que não devem dividir-nos, como, por exemplo, a de Timor, que é sagrada, como também a da água é sagrada e, sendo nacional, não deve dividir-nos.
Os Srs. Deputados bem viram de que forma reagem os Deputados espanhóis, seja os bascos, seja os da extrema-direita, que, em uníssono, defendem o mesmo tipo de posições.
Meus senhores, já passou o tempo de Carlos V, rei de Espanha e de El Caudillo, mas a política externa espanhola é a mesma do General Francisco Franco porque, quando toca a interesses nacionais, não há regionalismo nem partidos. Os espanhóis unem-se, defendem os mesmos interesses e acordam mais cedo do que nós!
Peço, pois, que este Parlamento tome o assunto na devida conta, que não nos dividamos mas unamos esforços porque a questão é dramática!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, gostava dei dizer-vos que acabam de informar-me - porque não podia adivinhá-lo - que a Sr.ª Ministra do Ambiente e Recursos Naturais pediu para, na próxima quarta-feira, vir a este Parlamento discutir este assunto. Saúdo esta decisão e espero que a Comissão de Administração do Território, Equipamento Social, Poder Local e Ambiente aproveite a ocasião para debater estes assuntos prioritariamente, porque eles são, de facto, urgentes.
Quanto às outras questões, Sr.ª Deputada Isabel Castro, este assunto não é apenas português. Agradeço a ajuda dada e saúdo a sua e a intervenção preciosa do Sr. Deputado António Murteira na referida Cimeira pois, sem elas, não se teria chegado onde se chegou. Não vale a pena estarmos a escondê-lo e esta Câmara tem o direito e o dever de o saber. Saúdo igualmente o Sr. Deputado Eduardo Pereira, os meus companheiros e o Sr. Deputado Adriano Moreira, que está ausente, pois, sem «lês, o resultado não teria sido este. Talvez tenha sido pouco mas foi o máximo que conseguimos.
Meus senhores, reitero que este assunto não é apenas português mas também comunitário, porque os espanhóis pretendem irrigar mais do que aquilo que é admissível pela PAC e legítimo ao abrigo da lógica do GATT. Por essa razão, não devemos olhar para ele como um problema nacional restrito, no sentido arcaico da expressão nacionalista., É também comunitário e não podemos ter medo de assumi-lo.
Acusam-me de ser iberista, vejam lá!... Na verdade, mantenho com os espanhóis relações de amizade contínua há décadas mas, meus senhores, sou Deputado de Portugal, fui eleito pelo povo português e se for preciso enfrentar os espanhóis, temos de saber enfrentá-los nesta questão!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos grupos da alunos e dos autarcas que assistem à nossa sessão plenária, para quem peço, desde já, a vossa habitual saudação.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, para além dos autarcas que já saudámos, de Caldas da Rainha e de Sever do Vouga, assistem à sessão plenária alunos das Escolas Secundárias de Paço de Arcos, de Monserrate de Viana do Castelo, n.º 2 do Montijo, do Sabugal, Padre Alberto Neto de Queluz, Martins Sarmento de Guimarães, do Colégio Marista de Carcavelos, do Instituto Tecnológico e Profissional de Cantanhede e do Colégio de Gaia de Vila Nova de Gaia.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passaram quase 15 dias sobre a ameaça do governo canadiano de aprisionar os barcos portugueses e espanhóis pois, embora pescando em águas internacionais, o Canadá chama-lhes suas.
O Ministro do Mar/Secretário-Geral do PSD, mestre na arte do show off, logo se apressou em mostrar trabalho, transmitindo pessoalmente e em nome do Governo aos barcos a pescar em águas da NATO que continuassem na faina, pois a deliberação/decisão da União Europeia era essa e o Canadá em nada teria de interferir.
As notícias vão-se avolumando, um barco pesqueiro espanhol é aprisionado com todo o pessoal a bordo, a ameaça aos barcos portugueses e espanhóis continua.
Na Comissão de Agricultura e Mar, os Deputados do Partido Socialista, cientes da situação delicada, alertam para a grave situação criada e pedem uma reunião urgente com o Sr. Ministro do Mar e já Secretário-Geral do PSD. Até hoje continuamos à espera!
Que interessa ao Ministro do Mar/Secretário-Geral do PSD este acto que quase nos apetece chamar de pirataria, quando ele é mais Secretário-Geral do PSD e cada vez menos Ministro do Mar?

Vozes do PSD: - Já não é Ministro do Mar!

O Orador: - Ele lá sabe! Paz à sua alma!
Na verdade, nas águas políticas portuguesas agiganta-se uma frota ameaçadora ao Governo do PSD - os Estados Gerais para uma Nova Maioria. É então que o Secretário-Geral do PSD, esquecendo-se do seu lugar ainda de Ministro do Mar, abandona à sua sorte os pesqueiros portugueses, deixando-os ao cuidado da União Europeia e, certamente, protegidos pelo vaso de guerra enviado, entretanto, pelo governo espanhol.
Em actos verdadeiramente quixotescos e sequioso de mostrar-se e motivar a sociedade portuguesa, eis o Comandante Azevedo Soares a desembainhar a espada e talhar em todas as direcções. Já esqueceu que é Ministro do Mar. Só já quer ser Secretário-Geral do PSD. Finou-se como Ministro do Mar!
Para trás, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nada deixou que marcasse positivamente o seu consulado. Até mesmo o seu acto, altamente elogiado pelo Primeiro-Ministro - despedir 1000 dos 1600 estivadores, que parecia ser a sua coroa de glória- aparece, afinal, ao que se supõe, maculado pela pouca transparência com que foram gastos milhões de contos nesses despedimentos.
Para trás fica, pois, um mar e uma pesca sem política, sem linhas orientadoras, qual barco a navegar à bolina.
Denunciámos várias vezes o descalabro em que a nossa pesca e os seus agentes estavam a cair. A nível nacio-

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nal, se virmos as estatísticas das capturas globais, verificaremos que as quebras têm sido praticamente ininterruptas desde 1986, registando mesmo um decréscimo acumulado, até 1994, de 34 pontos percentuais negativos. Ou seja, a produção pesqueira caiu das 403 000 toneladas, em 1986, para apenas 266 000 no ano transacto.
Paralelamente a esta evolução negativa, a produção do conjunto de actividades de aquacultura, complemento natural das capturas realizadas em meio natural, baixou de 12 000 toneladas, em 1987, para menos de 6000 em 1993, embora se apontasse naquele ano para cerca de 20 000 toneladas precisamente naquele período.
Reportando-nos ainda ao ano anterior, apenas cerca de um terço do consumo interno de pescado foi satisfeito com a produção nacional, quando em 1986 essa parcela era superior a metade, isto é, importámos 120 milhões de contos e pescámos apenas 56 milhões!
A gravidade da situação é tanto maior porquanto as quebras brutais na produção não foram acompanhadas de uma melhoria das condições prevalecentes ao nível dos principais mananciais pesqueiros que evoluem em águas nacionais, algumas das quais se encontram em situação altamente debilitada a aconselhar períodos de defeso e medidas restritivas de actividade por forma a assegurar a respectiva perenidade futura.
Assistiu-se, por outro lado, a um longo período de emagrecimento estrutural forçado que se reflectiu na limpeza do ficheiro de frota, com a eliminação de 2900 embarcações, das quais mais de 600 beneficiaram de apoios financeiros públicos dirigidos ao respectivo abate, arrastando consigo o declínio das colónias piscatórias, o desenraizamento cultural e histórico e o arrastar de situações degradantes nos aspectos económicos e sociais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ao longo da última década, foram desprezadas as actividades de controlo do esforço de pesca, o que contribuiu para a difícil situação que prevalece ao nível dos recursos. Houve um desprezo pelas mais elementares actividades de inspecção e controlo no mar e nos portos de pesca mas, em contrapartida, gastaram-se mais de 10 milhões de contos nas sofisticadas SI-FICAP e MONICAP, com sistemas de controlo via satélite altamente dispendiosos e sem resultados compatíveis com os gastos registados.
Os apoios financeiros provenientes quer da União Europeia quer do Orçamento do Estado canalizados para o desenvolvimento do sector das pescas não deram os resultados desejados, tendo sido em muitos casos desperdiçados em autênticos «elefantes brancos» do sector. Barcos de pesca, empresas de transformação, entrepostos frigoríficos foram construídos com apoios públicos e nunca chegaram a funcionar.
A distribuição dos apoios foi deficientemente orientada, por vezes sobre pressões políticas e lobbying, acabando frequentemente por contribuir para agravar os problemas do sector.
Outro aspecto para o qual temos chamado a atenção tem sido a falta de diálogo e a incapacidade evidenciada pelo então Ministro do Mar para o debate de ideias com os agentes do sector.
A prática inoperacionalidade das comissões consultivas existentes junto de cada lota, a desactivação efectiva da Comissão Consultiva da Direcção-Geral das Pescas, a liquidação da PROMOPESCAS (Associação das Organizações de Produtores Portugueses) e a fuga ao diálogo têm conduzido à criação de bloqueios institucionais e ao agudizar das animosidades dos agentes do sector em relação ao Ministério do Mar em geral, e em relação ao funcionamento da DOCAPESCA e do IFADAP, em especial.
A actuação da DOCAPESCA em querer realizar receitas a qualquer preço e de qualquer maneira, mesmo com prejuízo dos armadores e pescadores, obrigados a pagar taxas quantas vezes por serviços que não são prestados, e os sucessivos atrasos do IFADAP nos pagamentos relativos a projectos de investimento apoiados por fundos públicos têm conduzido ao estrangulamento económico e financeiro de muitas empresas e acabam por se avolumar sem fim à vista.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, não deixa, pois, saudades o Sr. Comandante Azevedo Soares à frente do Ministério do Mar na política interna de pescas.
E na política externa? Mal se deu por ele!
Tenhamos presente o comportamento de Marrocos quando, em Novembro passado, proibiu as nossas embarcações, nomeadamente as de Sesimbra, de pescarem nas suas águas, mesmo com as licenças autorizadas e pagas, denunciando unilateralmente o acordo com a União Europeia e exigindo redes biodegradáveis inexistentes então no mercado.
Que fez o Comandante Azevedo Soares? Nada! Absolutamente nada!
Que quotas conseguiu negociar em águas comunitárias, internacionais ou de países terceiros? O resultado está à vista!
Por que não substanciou o Sr. Comandante Azevedo Soares a dignidade da União Europeia manifestando-se com firmeza perante o Canadá? Não estavam em jogo barcos e pescadores portugueses e a eventual afectação da nossa economia?
O Governo não tem nem tem tido qualquer estratégia política nas pescas. Seria muito difícil ao Ministro do Mar/Secretário-Geral do PSD defender que o que estava em jogo neste affaire de pescas entre o Canadá e a União Europeia era e é uma «operação de camuflagem»? Isto é, o Canadá agita a bandeira da ecologia para, de facto, estender os seus interesses económicos para além das 200 milhas.
Não viu o Ministro Azevedo Soares que o Canadá pretendeu e até a um certo ponto conseguiu jogar na divisão dos Estados-membros da União Europeia ao apresentar o conflito como exclusivo de Portugal e Espanha? Não viu ou não quis ver? De facto, o maior cego é o que não quer ver.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, vai-se embora a equipa que tem tutelado o Ministério do Mar e parece que já foi empossada nova equipa. Não se entolham, infelizmente, melhores ventos!
Há que esperar por Outubro! Até lá, a pesca, os agentes de pesca, ficam em stand by. Mereciam melhor sorte!

Aplausos do PS.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração da minha bancada.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Avelino, V. Ex.ª trouxe-nos hoje uma intervenção completamente desenquadrada em termos tem-

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porais, uma vez que fez aqui acusações que já não tinham, de facto, o timing correcto.
Mas a defesa da consideração da minha bancada refere-se ao facto de o Sr. Deputado ter feito um conjunto de acusações ao actual secretário-geral do meu partido, então Ministro do Mar, querendo transmitir a ideia de que ele não se preocupou com os problemas dos pescadores portugueses nos mares do Norte, quando todo o País ficou ciente da preocupação e da acuidade que o Ministério do Mar pôs nesta questão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quis, portanto, inverter o que foi feito e a convicção do povo português.
Sr. Deputado, se alguém andou mal nesta matéria foram aqueles que perturbaram e atacaram infundadamente o então Ministro do Mar, em vez de se preocupar, como ele e como nós, com os portugueses que estavam um pouco - na óptica de muitos - «abandonados à sua sorte». Esses, sim, andaram mal e não a equipa do Ministério do Mar nem o então Ministro do Mar!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Alberto Avelino, queria informar que houve um lapso na decisão da Mesa. E que, de acordo com a primeira informação que nos chegou, o Sr. Deputado Antunes da Silva pretendia usar da palavra para fazer um protesto e, como tal, tema, de facto, prioridade; invocou, contudo, a defesa da consideração da sua bancada, pelo que deveria ter usado da palavra no fim, depois dos pedidos de esclarecimentos. Fica, pois, dada a justificação do nosso erro.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antunes da Silva, não disse que o Sr. Ministro do Mar, e já Secretário-Geral do PSD, não se preocupou! Penso é que o fez, naquele sábado, muito mais numa atitude de show-off.
De facto, Sr. Deputado, interrogo-me é se, porventura, desde Novembro, Dezembro, Janeiro e, nomeadamente, a 31 de Janeiro e l de Fevereiro, quando a guerra estalou, o Sr. Comandante Azevedo Soares, então Ministro do Mar, manifestou alguma preocupação perante a Sr.ª Emma Bonino, Comissária das Pescas!
Já a 14 de Fevereiro, no Parlamento Europeu, o Sr. Eurodeputado José Apolinário questionou vários aspectos absolutamente contundentes e, sinceramente; não vi que houvesse o mínimo de acompanhamento desse interesse aqui, a nível nacional. Aliás, esta era uma situação fácil de prever, uma vez que a guerra foi declarada entre 31 de Janeiro e 1 de Fevereiro, Sr. Deputado Antunes da Silva!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Olinto Ravara.

O Sr. Olinto Ravara (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Avelino, gostaria de fazer aqui uma saudação muito especial ao Sr. Comandante Azevedo Soares, que hoje cessa funções.
Com efeito, o Sr. Comandante Azevedo Soares, enquanto Ministro do Mar, sempre adoptou posições, muito claras e soube o que queria no cumprimento do Programa do Governo para as pescas O Programa do Governo é claro e, portanto, parece-me que quem anda aqui em stand by, à procura, talvez, de «Outubro» - não sei de que ano! - é o Partido Socialista e os Estados Gerais do Partido Socialista, que não trouxeram nada de novo relativamente a esta matéria, porque não sabem! A questão é essa.

Vozes do PSD:- Exactamente. Não sabem!

O Orador: - O Sr. Deputado Alberto Avelino, de facto, não sabe que o nosso ex-Ministro do Mar acompanhou, a par e passo, o desenvolvimento de toda esta situação, e não sabe porque, efectivamente, está a leste destas questões!

Protestos do PS.

Desconhece que o ex-Ministro do Mar tem acompanhado o problema e se tem solidarizado, diariamente, com os pescadores que estão a viver esta situação no Noroeste do Atlântico.
É evidente que esta questão não se resolve entre Portugal e o Canadá, tal como a questão de Marrocos não se resolve entre Portugal e Marrocos! A resolução do problema tem a ver com acordos que foram feitos no âmbito multilateral, entre os respectivos países ribeirinhos e a União Europeia.
Portanto, esta questão tem de ser discutida, em primeira mão, pela União Europeia, o que não invalida que o Governo português tenha marcado sempre posições muito claras no seio da União Europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer que o Governo português protestou contra a alteração no sistema das redes que os marroquinos introduziram, passando do multifilamento para o monofilamento. Simplesmente, a posição portuguesa não colheu.
De facto, a posição portuguesa sempre foi muito clara na defesa dos interesses portugueses na zona da NAFO, mas esta situação ultrapassa o âmbito bilateral e tem a ver com o concerto das nações no seio da NAFO. Aspecto que o Sr. Deputado esquece sistematicamente!
Além do mais, o Sr. Deputado diz que não há qualquer orientação do Governo. A esse propósito, devo dizer-lhe que, desde que foi lançado o IFOP - que é um instrumento financeiro de apoio e de orientação às pecas -, em finais de 1993, já foram aprovados mais de 500 projectos de construção e de modernização de navios. O Sr. Deputado esquece este aspecto, mas isto significa que os pescadores e os armadores têm uma leitura das pescas e das suas potencialidades que nada tem a ver com o que o Sr. Deputado veio aqui dizer.
Apesar de as pescas, a nível mundial, terem passado por um período de crise, porque quando há esgotamento de recursos há crise nas pescas - sentida mais a nível internacional do que a nível interno, isto é, dos recursos nas nossas águas territoriais -, o aparecimento desses novos projectos significa que há uma grande aposta e confiança no sector. Aliás, se recorrermos às estatísticas de pesca, verificamos que os números se mantêm praticamente constantes quando falamos da pesca nas águas territoriais, mas que há um grande decréscimo ao nível da pesca de longa distância, como é p caso do Noroeste do Atlântico, Svalbaard ou da própria África do Sul.
Creio que estamos a enquadrar correctamente a questão da diminuição das capturas, pelo que não é verdadeiro

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dizer que se vive uma situação de descalabro, porque se assim fosse não haveria apetência dos armadores, nem estes iriam investir centenas de milhões de contos na construção e na modernização de novas unidades.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Alberto Avelino (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Avelino, há dois dias, num programa de televisão, ouvi um Deputado do PSD, eleito pelo círculo de Aveiro - o Deputado Angelo Correia - dizer que estava muito triste por ver que os interesses nacionais, importantíssimos no plano externo, e, em particular, os do seu distrito estavam a ser postos em causa - o modo de vida dos pescadores e das suas famílias - pela guerra institucional a que o País assistia entre dois órgãos de soberania
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Não foi isso que ele disse!

O Sr. Rui Carp (PSD): - Está a caluniar!

O Orador: - Emitiu essa crítica explicitamente, numa postura independente, dizendo que não responsabilizava, em particular, um dos lados por essa guerra. Não poderia estar mais de acordo com a posição de um Deputado do PSD, já que um dos intérpretes dessa guerra institucional era o Sr. Comandante Azevedo Soares, na altura mais preocupado em ser Secretário-Geral do PSD do que em desempenhar as funções - que ainda lhe competiam - de Ministro do Mar.
Mas, Sr. Deputado Alberto Avelino, a sua intervenção incidiu, exclusivamente, sobre o Ministério do Mar e, sobre esta matéria, entendo que o principal objecto de crítica deve ser o Governo no seu conjunto, porque está em causa um problema de representação externa de Portugal.
Os nossos pescadores, no uso dos seus direitos - internacionalmente negociados pela União Europeia, é certo -, estão a pescar em águas internacionais e há um outro país que os impede de o fazer, sob a ameaça de uma intervenção de vasos de guerra. Perante isto, Portugal não deixa de ser um país, no plano externo, igual a qualquer outro e, por isso, com a responsabilidade de defender os seus cidadãos em qualquer ponto do mundo, em particular numa situação deste género.
Mas, se a embaixadora desse país em Lisboa, um país aliado no quadro da NATO, não foi sequer chamada a dar explicações, como vamos responsabilizar, directa e especificamente, o Ministério do Mar? É difícil, pois há uma responsabilidade num plano mais elevado.
Esta questão deve, pois, também ser colocada no plano da menorização do estatuto internacional de Portugal, aspecto a que já me referi nesta reunião plenária. Não podemos aceitar acriticamente todas as consequências implícitas do Tratado da União Europeia sem fazer uma reflexão sobre o que está a suceder, porque há países membros da União Europeia que não aceitam essa menorização.
Desde logo, a Espanha não deixou de fazer os seus protestos bilaterais perante o Canadá, nem deixou de actuar enquanto Estado independente e soberano através dos seus próprios meios; a população espanhola não deixa de compreender isso e manifesta-se nas ruas em defesa dos seus interesses. E nós, o que fazemos neste quadro? Estamos reduzidos a ir participar nas manifestações em Espanha? Estamos reduzidos a ter de esperar que a União Europeia defenda e represente os nossos interesses, nomeadamente dos barcos portugueses em águas internacionais? É isto que nos custa a entender. Portanto, não queríamos particularizar esta crítica política apenas ao Ministério do Mar.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP)- - Sr. Presidente, vou referir apenas quatro notas sobre esta matéria, para deixar clara a posição do PCP.
Em primeiro lugar, reafirmamos aqui que condenámos e condenamos firmemente o aprisionamento ilegal e pela força do barco de pescas espanhol, e que reclamamos a sua libertação incondicional.
Em segundo lugar, queremos dizer que somos favoráveis a uma solução negociada do conflito, compatível com uma estratégia de conservação das espécies, com uma repartição justa e equitativa das quotas atribuídas pelo Acordo de Autorização de Capturas, estabelecido entre o Canadá, a União Europeia e outros países, repartição de quotas que tenha em conta os interesses da frota longínqua portuguesa.
Em terceiro lugar, queremos dizer que entendemos que o Governo português não pode continuar a ter, nesta matéria, uma atitude tão passiva como tem tido até agora e que é necessário, até, neste quadro de negociações previsíveis que se irá abrir no seguimento deste conflito, que o Governo tenha uma atitude mais interveniente, que informe a Assembleia da República e discuta com ela qual a posição vai ter, designadamente no que respeita à defesa de quotas ou ao acesso a águas internacionais da frota longínqua portuguesa.
Em quarto lugar, embora não pensasse referir isto mas surgiu com o debate, queremos dizer que a opinião do Grupo Parlamentar do PCP é a de que o ex-Ministro do Mar e, naturalmente, o Governo conduziram as pescas portuguesas à maior crise de sempre, da história recente das pescas portuguesas. E isso é claramente demonstrado por todos os indicadores.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, serei muito rápido.
Sr. Deputado Olinto Ravara, o Sr. Deputado Manuel Queiró respondeu, na parte substantiva, aquilo que eu queria dizer. Certamente teve presente o que disse o Deputado por Aveiro, Ângelo Correia, um dia destes, na televisão, pois ele também se sentiu bastante magoado pela quase indiferença mostrada pelo Ministro do Mar neste affaire.
Por outro lado, permita-me, Sr. Deputado Manuel Queiró, que comungue consigo quanto à nossa representação: o Ministério dos Negócios Estrangeiros limitou-se - ao que parece, o Ministério e não o Ministro - a chamar a Sr.ª Embaixadora, mas também não lhe deu o mínimo «toque» sobre o efeito. Não o fez, de facto, e devia tê-lo feito. Também gostaria de dizer que o escopo da minha exposição foi essencialmente a política de pescas e menos o affaire

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Canadá versus alguns países da União Europeia, nomeadamente Portugal e Espanha.
Gostaria ainda de dizer ao Sr. Deputado Olinto Ravara o seguinte' fez mais, em cinco minutos, no discurso improvisado de ontem, o Presidente da Câmara do Porto, Fernando Gomes, do que o ex-Ministro do Mar. Comandante Azevedo Soares, em quinze dias desde que rebentou esta «guerra» entre o Canadá e os barcos pesqueiros na zona da NAFO.

O Sr. Olinto Ravara (PSD): - Não me diga!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Américo Sequeira

O Sr. Américo Sequeira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, manda a boa disciplina dos juízos que haveremos de fazer sobre o mundo e as coisas, que os mesmos se elaborem pela alquimia dos dados objectivos da observação atenta e no cadinho de uma reflexão sinceramente crítica Se esta metodologia nos conduzir, maior será a fidelidade e o rigor do nosso conhecimento das coisas, e mais credível a nossa postura perante o mundo.
Foi neste espírito que andei a seguir o caminho percorrido pelo Alto-Minho, de há dez anos a esta parte, a fim de por ali observar, sem a pretensão de ser exaustivo, as marcas mais expressivas impressas no corpo do quem, há tão pouco tempo, iniciou um percurso de desenvolvimento a partir de um fundo silencio e de uma injusta indiferença de longas décadas. Estou, assim, em condições de afirmar, com verdade, que, da observação atenta e desapaixonada que por ali se faça, se há-de ficar a saber - mais e melhor quem puder confrontar com um passado ainda recente - que, na contabilidade do desenvolvimento, o saldo é consideravelmente positivo e seguros são, do ponto de vista estratégico, os investimentos realizados.
É imperativo de justiça que, da acção, se relevem os protagonistas qualificados, que têm vindo a fazer trabalho de alto mérito Refiro-me, antes mais, aos autarcas. A exemplar solidariedade entre todas as autarquias do Alto-Minho, de que tive a honra de participar, durante 11 anos, até ao fim de 1993, permitiu-lhes assinalar no terreno indeléveis marcas de desenvolvimento, objectivadas numa vastíssima rede de acessibilidades internas, na valorização de espaços urbanos, na implantação de pequenos pólos industriais, em equipamentos de cultura e de lazer, em abastecimento de água e saneamento, em acções de planeamento e, até, na promoção mediáticos da região.
Afirmado o reconhecimento à combatividade e à competência dos eleitos locais, a seriedade da apreciação a que ora nos dedicamos manda, outrossim, que sublinhemos, a bom traço, o empenhamento da governação do país neste percurso evolutivo de desenvolvimento do Alto-Minho. Desenhada uma vasta rede de acessibilidades de e para o exterior da região, a mesma tem projectos concluídos e execução em curso Vejamo-lo: sobre o Lima, em Viana do Castelo, uma nova ponte de grande envergadura veio prenunciar a resposta a um dos mais aflitivos estrangulamentos do Noroeste, resposta que será completa, a curto prazo, com a conclusão do ICI, em curso, entre o Porto e Caminha; a auto-estrada Braga-Valença tem em concurso um novo sub-lanço entre aquela cidade e Ponte de Lima; os dezassete quilómetros de «picada», que separavam Valença de Monção, foram substituído por uma excelente pista rodoviária, agora prestes a atingir também a sede do Concelho de Melgaço e a fronteira de São Gregório, devendo ficar pronta em Setembro próximo.
Inaugurados que foram, há meses, os expeditos acessos à ponte internacional de Valença, está pronta hoje, para iniciar o exercício da sua missão, a nova ponte, também internacional, em Monção Em obra, está uma outra ponte entre a Barca e os Arcos, a complementar com variantes à EN 101, por esta forma se eliminando um dos mais anquilosantes estrangulamentos do interior do Alto-Minho. Prontos para o lançamento das obras estão os processos das novas pontes internacionais de Melgaço e de Vila Nova de Cerveira. Foram revitalizadas e valorizadas, em grande parte, as estradas nacionais do distrito. Para que o piano esteja completo e o sonho realizado, resta-nos fortalecer a esperança de que os novos lanços da auto-estrada e o IC28, de Viana do Castelo a Lindoso, encontrem a data do seu lançamento no calendário deste ano.
Estamos cientes, porém, que o desenvolvimento não corre, principalmente, pelas vias de comunicação. Alicerça-se, inegavelmente, pela educação e qualificação dos recursos humanos. Por isso, o número e a qualidade das instalações escolares têm crescido a ritmo certo em todos os concelhos do distrito no sentido da aproximação da escola à população escolar O interesse pela vertente profissionalizante afirma-se através das muitas escolas profissionais que vêm cobrindo, quase por completo, o universo dos dez concelhos Há dias iniciou-se, para estar concluída dentro de um ano. a construção do Centro de Formação Profissional do Alto-Minho O Instituto Politécnico de Viana do Castelo, que mede por dez anos a sua vida crescentemente ajustada aos reais interesses da região, vem prestando inestimáveis serviços através das suas três escolas - a Superior de Educação, a de Tecnologia e Gestão e a Superior Agrária - atentas permanentemente à qualidade do ensino e sua orientação para as potencialidades endógenas e as exigências do mercado de trabalho.
Também nas infra-estruturas de saúde, como se tornou diferente o panorama ao longo destes dez anos. A maioria esmagadora dos concelhos dispõe hoje de novos Centros, benefício que se alarga a outros aglomerados populacionais que, numa perspectiva de racionalidade, o justificam. Os poucos que faltam têm projecto pronto para serem implementados tão depressa quanto rapidamente se ultrapassem pequenas questões locais O Hospital Distrital de Santa Luzia registou, nos tempos recentes, grandes desenvolvimentos nas suas capacidade e qualidade de resposta aos utentes, e o de Ponte de Lima está a passar pela remodelação profunda que lhe permitirá aumentar substancialmente os serviços à comunidade, como hospital distrital de rectaguarda e unidade piloto de saúde, recentemente criada, para serviço dos concelhos de Ponte de Lima, Arcos de Valdevez, Ponte da Barca e Paredes de Coura.
Experiências estimulantes estão a ser feitas na promoção do sector agrícola, designadamente pela via do emparcelamento, em Viana, Valença e Monção, aí onde a qualidade dos solos e o recorte da propriedade o aconselham como única alternativa capaz de sustar o abandono da terra e a consequente desertificação.
Por todo o distrito tem sido empenhada a cooperação do Governo com as instituições de solidariedade social, culturais e desportivas, que tenham denotado, pela acção, vontade de parceria nas tarefas que a todos obrigam. Manda a justiça que se releve também a lucidez e o dinamismo de muitos empresários e das suas Associações de Classe, designadamente a Associação Empresarial de Viana do Castelo e Associação Industrial do Minho, parceiros inestimáveis do desenvolvimento, cuja acção bem justifica apoios sólidos e expeditos.

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Sr. Presidente e Srs. Deputados, os últimos dez anos foram, no Alto-Minho, o tempo de um percurso assinalável na direcção do desenvolvimento, só possível, todavia, graças ao empenhamento do Governo do PSD conjugado com o evidente dinamismo das dez autarquias e o comprovado esforço dos agentes da chamada sociedade civil.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, exorcizamos, porém, a demagogia e privilegiamos o realismo que, do exercício da análise, exclua a paixão. A esta luz, hão-de sempre caber no discurso o registo do que agrada e a nota premonitoriamente construtiva e exigente do que falta. As duas faces, afinal, da verdade por inteiro. Teremos, pois, de reconhecer que, se muito caminho se andou, curto não é aquele que ainda temos de percorrer em busca do desenvolvimento daquelas terras e povo do Noroeste de Portugal.
Porque assim é, aqui deixamos alguns votos, que piedosos não serão: que se acelerem as obras da rede rodoviária projectada, é uma aspiração não excessiva; que se melhorem as ligações ferroviárias entre Nine, Viana e Valença, é uma preocupação que tem sentido; que se completem as infra-estruturas de educação e de saúde, é desejo que tem fundamento; que se criem condições dignificantes para a administração da Justiça, é necessidade que reclama grande urgência, sobretudo em Ponte de Lima e no Tribunal de Trabalho de Viana do Castelo; que se disponibilizem mais apoios à diversificação das actividades produtivas e fortalecimento da economia de base, é desejo perfeitamente sustentável; que se reforce a parceria com as instituições de solidariedade social, culturais e desportivas, em torno de projectos válidos, é política que se defende pelo alcance social que comporta; o reforço das verbas do Quadro Comunitário, postas à disposição das autarquias, é reivindicação justa que aqui se formula.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs Deputados, do outro lado do no, desde Caminha a Melgaço e para além dos montes do Laboreiro, fica a Baixa-Galiza. Juntam, assim, o Alto-Minho e a Galiza, não só a contiguidade geográfica, mas também a cultura, o linguajar, o comércio, a ancestral convivência, a afinidade dos recursos, os problemas comuns, uma saga em conjunto. É um espaço marcado pelo estigma da perifericidade e da interioridade, da desertificação e consequente economia de penosa sobrevivência.
Dormem, todavia, por ali, insuspeitados valores patrimoniais, potenciadores, designadamente na área do turismo, visto este nas suas diversas e mais atractivas vertentes, capazes de espevitar a vontade do regresso e a fixação das gentes, contrariando a fatalidade da solidão a que as migrações votaram aqueles sítios. A solução dos preocupantes problemas daquela interioridade passa também pela coragem de se assumir uma inteligente promoção e gestão do seu singularmente rico património natural e cultural; pela promoção de novas centralidades urbanas, atractivas e alternativas - atractivas que baste para a fixação das populações e alternativas, como contraponto à massificação do litoral, geradora de novos subúrbios, de novos pobres e excluídos.
O Alto-Minho: eis um espaço-alvo, que tem de o ser da mais justificada aplicação dos objectivos do INTERREGU, do Programa Operacional do Ambiente, e outros aplicáveis, da acção empenhada do Governo (que não faltará), do dinamismo da Comunidade de Trabalho Norte de Portugal-Galiza, do Eixo Atlântico, das autarquias e de todas as sinergias que possam mudar a imagem e recuperar a vida em todo aquele espaço transfronteiriço.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os atrasos que décadas acumularam e a sociedade que os Governos do Prof. Cavaco Silva libertaram para a exigência, determinam a nossa ambição legítima de andarmos mais depressa Temperemo-la, porém, com alguma paciência e sentido de Estado, associados à certeza de que só o actual e os futuros Governos do PSD nos garantem que avançaremos, seguros, lá até onde, no Alto-Minho, o nosso sonho sereno e a nossa esperança firme nos transportam

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, estamos na hora regimental das votações

Iremos começar pela votação de vários votos.

O Sr. Secretário vai fazer à leitura do voto n.º 135/VI - De protesto pelo encontro entre o Sr Presidente da República e o ex-Primeiro-Ministro italiano Sr. Bettino Craxi (PSD).

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Considerando que a visita do Sr Presidente da República à Tunísia se reveste da maior importância para as nossas relações com os países do Norte de África e para a afirmação de Portugal naquela região do mundo,
Considerando que o Sr. Presidente da República decidiu encontrar-se, no decurso da visita e na residência oficial do Embaixador português, com o Sr. Bettino Craxi, ex-Primeiro-Ministro socialista de Itália e antigo alto dirigente da Internacional Socialista, sobre o qual existe um pedido de extradição por parte do Estado italiano, país membro da União Europeia, encontrando-se o Sr. Bettino Craxi fugido à justiça, após ter sido julgado à revelia por um tribunal de Milão e condenado a oito anos e meio de prisão por um crime de corrupção;
Considerando que a atitude do Sr Presidente da República é surpreendente, à luz da visita por esta Assembleia autorizada,
Considerando que actos de natureza estritamente pessoal e humana compreensíveis, não podem, porém, comprometer, por ligação directa ou indirecta, os superiores interesses do Estado português e da sua representação externa;
A Assembleia da República exprime o seu protesto junto do Sr. Presidente da República, recomendando simultaneamente que haja da sua parte uma maior atenção ao comprometimento da Assembleia da República, enquanto órgão de soberania, sobre tão importantes questões de Estado

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai passar a ler o voto n.º 136/VI - De pesar pelo naufrágio junto à praia da Aguda em Vila Nova de Gaia (PSD, PS, PCP, CDS-PP, os Verdes e Deputado independente Raúl Castro).

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o anteriormente referido é o seguinte:

Ocorreu hoje mais um naufrágio de uma embarcação de pesca, desta vez junto à Praia da Aguda em Vila Nova de Gaia, onde perderam a vida, para já, dois pescadores, sendo dado um como desaparecido e outro salvou-se estando hospitalizado por ter ficado ferido.
A Assembleia da República manifesta o seu profundo pesar pela morte destes pescadores e apresenta às famílias enlutadas as respectivas condolências.

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Este naufrágio deve, uma vez mais, fazer reflectir os poderes públicos instituídos e, sobretudo, estes devem agir para que se criem mais e melhores condições de segurança para a labuta dos pescadores portugueses, a fim de que possam obter o seu sustento e do seu agregado familiar e ainda contribuir para a riqueza nacional.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Raúl Castro.

Srs. Deputados, vamos passar ao voto n.º 137/VI - De saudação pela passagem do Dia Mundial dos Direitos do Consumidor (PS), que vai ser lido.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
Comemorando-se a 15 de Março o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, importa sublinhar a forma progressivamente mais relevante com que as questões de consumo são tratadas pela opinião pública no nosso País e a atitude civicamente cada vez mais empenhada com que os portugueses vivem os diversos problemas dessa natureza.
Justo e reconhecer que muita da dimensão ganha por tais problemas e devida à maior atenção e espaço dedicados, actuação dos cidadãos em defesa dos seus direitos e pela comunicação social.
É, no entanto, indispensável sublinhar que as organizações de consumidores contribuíram de forma insubstituível para dignificar tais matérias e para envolver todo o país no respectivo debate.
Na verdade, desde que há 20 anos, nomeadamente com a fundação da DECO, os consumidores encontraram forma de expressar os seus anseios e pontos de vista, não cessou de crescer em importância e dignidade o respectivo movimento.
Assim, nesta ocasião, a Assembleia da República sublinha:
A importância de adoptar políticas horizontais de consumo que informem e articulem medidas de cada departamento oficial e tenham em conta, na sua complexidade, os interesses dos consumidores portugueses;
O empenhamento da instituição parlamentar na conclusão do processo de elaboração da Lei de Acção Popular, instrumento útil à defesa dos interesses do consumidor;
A necessidade de, em cada momento, dar cumprimento às normas legais e regulamentares que protegem os consumidores, exercendo permanente e adequada acção fiscalizadora;
A imprescindibilidade de sensibilização dos agentes económicos nacionais para a adopção de estratégias comerciais assentes no rigor e na verdade em matéria de tratamento leal do consumidor;
A relevância essencial do trabalho das organizações de consumidores para a defesa e melhoria da qualidade de vida dos portugueses, função social que plenamente justifica adequado apoio público.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu). - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Raúl Castro.

Srs. Deputados, finalmente, temos o voto n.º 38 - De solidariedade para com estudantes angolanos que se manifestaram frente à Embaixada do seu país em protesto pelo atraso no pagamento das suas bolsas (Deputado independente Mário Tomé), que vai ser lido.

O Sr. Secretário (João Salgado). - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 138/VI é o seguinte:
A Assembleia da República expressa a sua preocupação pela situação em que se encontram os estudantes bolseiros do Estado angolano e que se manifestaram frente à Embaixada da República Popular de Angola e se mantêm em protesto pelo atraso de 15 meses no pagamento das bolsas.
Sendo uma questão respeitante ao Estado angolano, a Assembleia da República não pode, contudo, ignorar uma situação que se desenrola em território nacional, com repercussão no campo dos direitos cios cidadãos e que tem evidentes incidências de âmbito humanitário.
A Assembleia da República assinala com orgulho e satisfação o movimento de solidariedade desenvolvido pelos estudantes universitários portugueses, através das suas associações representativas - nomeadamente a Associação de Estudantes da Universidade de Lisboa -, traduzido no fornecimento de refeições diárias, agasalhos para os estudantes em vigília e em greve de fome e angariação de fundos para custear a deslocação a Angola de uma delegação de estudantes com a finalidade de ser recebida pelo Presidente José Eduardo dos Santos.
A Assembleia da República lamenta a acção violenta levada a efeito pelos efectivos policiais que compareceram junto à embaixada requisitados pelo Sr. Embaixador da República Popular de Angola.
A Assembleia da República apela, na base das relações existentes entre o Estado português e o Estado angolano, para que o Governo angolano dê uma resposta urgente e cabal no sentido de resolver uma situação que se torna penosa para a generalidade dos estudantes bolseiros.
A Assembleia da República expressa a sua convicção de que o Governo português tudo fará para junto do Governo angolano, obter uma rápida e satisfatória resolução deste caso e que se disponibilizará para garantir o apoio humanitário aos estudantes enquanto a sua situação não for resolvida no âmbito das bolsas concedidas pelo Estado angolano.
Tudo o que puder ser feito em apoio dos estudantes angolanos, futuros quadros de um país com que Portugal deseja ter relações privilegiadas, reverterá certamente a favor do desenvolvimento e aprofundamento futuro dessas relações.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé e abstenções do PS, do PCP e do CDS-PP.

Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS) - Sr. Presidente, Srs. Deputados Relativamente ao voto de protesto, gostaria de dizer que o Grupo Parlamentar do PS deixou aqui expressa a sua posição muito clara..

O Sr. Rui Carp (PS): - Essa do «muito clara» é que é boa! .

O Orador: - ... relativamente a este voto, que não é um voto de protesto em bom rigor mas, sim, um voto de guerrilha institucional...

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O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Está a referir-se a que voto?

O Orador: - Estou a referir-me ao voto de protesto votado em primeiro lugar e não ao voto que o Sr. Deputado Mário Tomé apresentou, evidentemente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS, repito, deixou muito clara a sua posição relativamente ao voto de protesto, que não é de protesto mas, sim, de guerrilha institucional, que manifesta ou pressupõe algum nervosismo por parte do PSD e que é uma prova de fragilidade.
De qualquer modo, caberá esclarecer os termos exactos do envolvimento do Ministério dos Negócios Estrangeiros neste tema.
Quanto ao resto está tudo dito, uma vez que o Sr. Presidente da República teve já oportunidade de, em termos públicos, dar satisfações a este respeito.

Aplausos do PS.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Tivemos ocasião de dizer, aqui, que não compete à Assembleia da República fiscalizar os actos do Presidente da República.
Além disso, a direcção do meu partido tomou pública posição, lamentando o acto do Sr. Presidente da República, que julgamos irreflectido, de ter recebido na Embaixada de Portugal um cidadão italiano, condenado por tribunais italianos, cuja extradição apenas não é executada porque entre a Tunísia e o Estado italiano não existe tratado nesse sentido.
Por isso, estamos convictos de que o Sr. Presidente da República não deveria ter recebido o Sr. Bettino Craxi nas instalações da Embaixada de Portugal.
No entanto, também não podemos deixar de sublinhar a hipocrisia deste voto de protesto, na medida em que o Ministro dos Negócios Estrangeiros, através dos seus serviços de protocolo, esteve, desde o princípio e até ao fim, inteiramente envolvido nesta operação, a tal ponto que o próprio Embaixador e o Chefe do Protocolo estiveram à porta da Embaixada a receber o Sr. Bettino Craxi e aguardando a chegada do Dr. Mário Soares. Isto é, quem recebeu fisicamente o Sr. Bettino Craxi na Embaixada de Portugal foi o Embaixador e o Chefe do Protocolo do Ministério dos Negócios Estrangeiros, ou seja, uma autoridade de cerimónias de Portugal.
É esta hipocrisia que é escondida pelo PSD e que nós não devemos deixar passar em branco. Daí a nossa abstenção e o nosso protesto contra o envolvimento do Ministro dos Negócios Estrangeiros nesta operação pré-fabricada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como já referimos no dia em que este voto foi apresentado, votámos contra, porque a questão que é colocada não é, de facto, a razão do voto.
Consideramos que deveria ter havido precauções para que esse encontro não se tivesse efectuado como se efectuou, mas não foi isso que o PSD quis colocar com este voto.
Como é público, o PSD e o Governo conheciam a situação desde o início, mas guardaram para depois do facto consumado a apresentação deste voto apenas como um acto de guerrilha institucional contra o Sr. Presidente da República. Aliás, as razões desta guerrilha institucional foram publicamente clarificadas muito recentemente por dois dos mais conhecidos estrategas que o PSD teve numa célebre task force que existiu há uns tempos atrás e que agora já não existe, pois é a Comissão Permanente do PSD. Cito, particularmente, o actual presidente do grupo parlamentar, Pacheco Pereira, quando referiu a necessidade de criar um clima de anormalidade, pois essa e a única hipótese que o PSD tem de salvação nas próximas eleições Por conseguinte, essa é a razão do Sr Deputado Pacheco Pereira, essa é uma das razões do PSD
A esse propósito, o ex-Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado Duarte Lima, foi ainda mais claro, e permito-me referir brevemente o essencial daquilo que escreveu há uma semana atrás, a atitude, a táctica do PSD, neste momento, deve ser a de atacar o Presidente da República, porque, acima de tudo, polariza a luta política entre o PSD e uma entidade que não concorre às eleições. É necessário, dizia ele, que as entidades que concorrem às eleições, os partidos políticos, esses, saiam da «boca de cena».
É esta a estratégia em que se insere este voto e é por isso mesmo que nos posicionamos contra ele.

Aplausos do PCP.

Vozes do PSD: - Isso é ciência de jornal! Essa não é a versão oficial!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes)- - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com aquela que já foi a opinião expressa por Os Verdes, aquando da apresentação do voto n.º 135/VI, pelo PSD, a nossa posição é clara: julgamos que não está em causa a falta de oportunidade do encontro do Sr. Presidente da República numa embaixada portuguesa, nos termos em que se verificou. Aquilo que o PSD apresentou como pretexto para este voto foi qualquer coisa que se traduziu, manifestamente, numa encenação, numa tentativa de criar um conflito e de alimentar a guerrilha.
É que, sendo óbvio, como é, que o Ministério dos Negócios Estrangeiros tinha pleno conhecimento do que se ía verificar, se para Portugal havia preocupações nesta matéria, mais não tinha que fazer senão agir antecipadamente. Não o fez, quis provocar o incidente, quis entreter a Câmara com esta forma de fazer política, quis transferir a discussão da Assembleia sobre os grandes problemas dos portugueses para uma discussão que nada tem a ver com as questões que, hoje, importa aqui abordar.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, estão inscritos, para produzirem declarações de voto, três Deputados da bancada do PSD. Como foram votados quatro votos, o PSD, naturalmente, tem direito a três inscrições ou até a quatro, se o desejar, mas cada um dos Srs. Deputados só poderá fazer uma declaração sobre um determinado voto ou, melhor, cada um poderá falar sobre dois votos.
Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

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O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha declaração de voto está relacionada com a votação do voto n.º 136/VI.
Ontem, ao tomar conhecimento do naufrágio do uma embarcação de pesca artesanal, «Sereia do Mar»,junto à Praia da Aguda, em Arcozelo, no concelho de Vila Nova de Gaia, em que perderam a vida dois pescadores, António Bastos, de 58 anos, e Inácio Campota, de 48 anos, estando ainda um jovem pescador, de 23 anos, desaparecido, o Fernando Gonçalves, e tendo-se salvo um outro, de 22 anos, o José Maria Ferreira, fiquei profundamente chocado e revoltado. Isto porque, em 1989, depois de diversas diligências, por mim efectuadas, na qualidade de Deputado, junto do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, mais concretamente junto da, então, Secretaria de Estado das Vias de Comunicação, o Governo deliberou abrir um concurso público para a construção de um quebra-mar ou paredão na Praia da Aguda, a fim de dar maior segurança à faina dos pescadores daquele pequeno centro piscatório, mas, infelizmente, a obra ainda não se realizou, como se impunha e continua a impor-se. Aliás, na altura, tive até o gosto de, como Deputado, informar os pescadores da Aguda da decisão do Governo.
Lamento hoje, mais uma vez, que a obra não esteja concretizada e espero que este naufrágio, com a perda de vidas humanas, faça com que os poderes públicos instituídos, a começar pelo Governo e a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, cooperem mais activamente para a criação das necessárias condições de segurança na Praia da Aguda, para que a labuta dos pescadores daquele centro piscatório ocorra com maior segurança e possam, assim, obter o sustento para si e para o seu agregado familiar, contribuindo ainda para a riqueza nacional.
O centro piscatório da Aguda precisa e merece que se proceda, pelo menos, à construção de um quebra-mar ou paredão, se não for possível, como seria o mais desejável, a construção de um pequeno porto de abrigo, como o que existe em Espinho.
Por tudo isto, ontem, em face deste naufrágio e da perda de vidas humanas, tive oportunidade de apresentar o voto de pesar e de solicitar a todas as bancadas que o subscrevessem, o que agradeço, desde já, para podermos, realmente, fazer uma chamada de atenção aos poderes públicos e para que se possa pôr cobro a esta insegurança dos nossos pescadores, em particular os de Vila Nova de Gaia e da Aguda, rendendo também homenagem da Assembleia da República aos pescadores que perderam a vida e apresentando as devidas condolências às famílias enlutadas.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A declaração de voto que voo fazer diz respeito ao voto n.º 138/VI, apresentado à Mesa pelo Sr. Deputado Mário Tomé.
Tenho de admitir que haveria alguma bondade subjacente ao voto apresentado pelo Sr. Deputado Mário Tomé, que, por qualquer circunstância, abandonou a Sala.
Em todo o caso, as imagens do Telejornal, por vezes, não são gratas e, às vezes, mais umas do que outras, até é bom que alguém se manifeste sobre essas imagens, mas sem esquecer o efeito amplificador da leitura de planos no pequeno ecrã.
Sucede, porém, que, para além das imagens, existe a realidade global aqui em causa e, mais do que tudo, a causa dessas imagens.
As informações de que dispomos não são suficientes e evito mesmo dizer que são contraditórias nas razões das partes, remetendo os Srs. Deputados para as declarações do Sr. Embaixador Rui Mingas, por exemplo, para escolher uma das partes implicadas, no noticiário da TSF, na terça-feira passada, pelas 19 horas e 30 minutos.
Trata-se, sublinhamos, de um assunto de um país amigo, representado em Lisboa pela sua delegação diplomática de pleno direito e ao mais alto nível, e é o Sr. Embaixador que está no centro dos acontecimentos com a autoridade e poderes de que está investido, em cumprimento de indicações directas do seu governo.
Sr. Deputado Mário Tomé, votar favoravelmente os termos deste texto seria esquecer as implicações de ingerência que o mesmo texto suscita de forma indevida.
A boa intenção, Sr. Deputado Mário Tomé, de ver resolvidos os problemas não basta, para um protesto a subscrever por esta Assembleia com o peso e a carga adicionais que temos.
Interessa também, Sr. Deputado, o rigor, o acerto, o tom isento, nas tomadas de posição que sejam justas e correctas. Por isso, pela linguagem, também ela agressiva, que aqui foi utilizada, pelo aproveitamento político até mais fácil do que verdadeiramente oportuno e pela falta de outras ponderações necessárias, não votámos favoravelmente. Não quer dizer que não acompanhemos, agora e sempre, o assunto. Bolsas, bolseiros, meios, estudos, resultados, aproveitamento, formação de quadros, são áreas importantes, e nós defendemos princípios e valores.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Portanto, Sr. Deputado, não são os protestos e as imagens televisivas que nos farão, por si só, correr nessa matéria. Srs. Deputados Mário Tomé e Manuel Queiró, falta considerar o resto, e o resto é muito, muito mais até do que a natural solidariedade e o desejo de ver superada as actuais circunstâncias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Confesso que não esperava esta votação.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Pergunte ao PCP!

O Orador: - Apesar dos interesses tantas vezes obseuros do Estado, apesar das OGMA, apesar de tudo, não esperava esta votação, porque o voto tem um sentido clara e inequivocamente humanitário, de forma a tentar um esforço no sentido da resolução da situação, que é grave para muitos estudantes angolanos, com implicações em Portugal, e que mobilizou toda uma solidariedade dos estudantes portugueses de todo o País. Por isso, não esperava que esta questão fosse entendida dessa forma.
Não sei se fique indignado - não será o termo -, fico, antes, triste. Triste por esta Assembleia não ter sabido dar resposta a um problema desta natureza, tão simples e tão

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fácil, que não contém qualquer elemento, por mínimo que seja e por mais eficaz que seja o microscópio, de ingerência noutro Estado.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, uma vez terminadas as declarações de voto, vamos prosseguir as votações.
Em primeiro lugar, o projecto de resolução n.º 144/VI - Recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 10/95, de 19 de Janeiro, que «Altera o Decreto-Lei n.º 422, de 2 de Dezembro (Reformula a Lei do Jogo)», apresentado pelo PCP.
Vamos votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 145/VI- Recusa a Ratificação n.º 133/VI do Decreto-Lei n.º 20-A/95, de 30 de Janeiro, que «Aprova a última fase da reprivatização do Banco Português do Atlântico, S.A., também apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé e abstenções do PS e do CDS-PP.

Srs Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 462/VI - Alteração da Lei n.º 647 93, de 26 de Agosto (Regime de incompatibilidades de titulares de cargos políticos e altos cargos públicos) (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé e a abstenção do CDS-PP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, só há lugar a declarações de voto quando se procede a votações finais globais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Então, entregá-la-ei por escrito na Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 498/VI - Cria um registo de interesses dos Deputados e alarga as respectivas incompatibilidades e impedimentos (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o Sr Secretário vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Tem a palavra para ler o primeiro parecer.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 5.º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar os Srs. Deputados Arons de Carvalho e António Costa (PS) a deporem por escrito, como testemunhas, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Raúl Castro.

Sr. Secretário, tem a palavra para ler o próximo parecer.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs Deputados, de acordo com o solicitado pela Auditoria Jurídica da Assembleia da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Condesso (PSD) a ser ouvido, como participante, no processo instaurado ao funcionário da Assembleia da República, Sr Luís Fernando Ferreira C. Mendes.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Srs Deputados, está em apreciação.
Como não há inscrições, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Raúl Castro.

Para ler o último parecer, tem a palavra, Sr Secretário

O Sr. Secretário (João Salgado) - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Alberto Cardoso (PS) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Raúl Castro

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, estão terminadas as votações agendadas para hoje.

A Sr.ª Deputada Isabel Castro, tinha-se inscrito para uma declaração de voto. Se ainda a quiser fazer, a Mesa dar-lhe-á a palavra para esse efeito.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes). - Sr. Presidente, entregarei a declaração de voto por escrito na Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Assim sendo, vamos continuar as intervenções que interrompemos para procedermos às votações. Informo a Câmara de que a Mesa dará a palavra aos Srs. Deputados até ao esgotamento dos tempos restantes.
Tem a palavra o Sr Deputado Cipriano Martins.

O Sr. Cipriano Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A região centro do País ocupa 26% da superfície do Continente e, na esteira do recenseamento de

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1991, apenas representa 18,4% da sua população, ou seja, 1 720 000 habitantes.
De notar que, desde 1864, este valor demográfico traduz uma quebra assinalável de representatividade (29,2% em 1964, 22,6% em 1950 e 18,9% em 1981). Neste domínio é de sublinhar que a grande quebra populacional dá-se a partir da década de 50 a 60. A sua explicação reside no fenómeno migratório que desponta em 1950 e que se consolida e exacerba nos anos 60. Aqui haverá que salientar que estes movimentos migratórios não são uniformes e assumem, no interior da região, expressões territoriais distintas.
Diz o povo - e é verdade! - que a corda, quando esticada, rebenta sempre pelo lado mais fraco. Também aqui o brocardo popular se confirmou: foram as subregiões do interior as mais lesadas por aqueles movimentos demográficos, devido à posição periférica e à fragilidade da sua base económica. O êxodo das suas gentes direccionou-se para a colocação externa (emigração) e para os Centros urbanos mais populosos e industrializados do País,
É, portanto, notório que neste lapso de tempo, entre 1960 e 1981, o agravamento das disparidades nos dinamismos nacional e regional é uma evidência.
No entanto, entre 1981 e 1991, à situação de estabilidade de crescimento verificada no Continente (0,3%), corresponde uma situação de novo decréscimo regional (-2,4%). Trata-se de uma diminuição que preocupa não tanto pela quantidade mas muito mais no seu aspecto qualitativo e territorial, é que a sua leitura e análise aponta para um acicate das disparidades intra-regionais, sugerindo um comportamento demográfico a duas velocidades: pela primeira vez, desde 1940, o litoral averba uma dinâmica de crescimento (2.4%) superior à média do Continente, a par de um forte decréscimo (-7,2%) no interior, comprometendo o seu progresso e o desenvolvimento harmonioso do País no seu todo. É, de resto, o comportamento demográfico assaz negativo observado no interior que desequilibra o povoamento da região no contexto nacional.
São bem conhecidas as razões da mobilidade geográfica diferenciada entre o litoral e o interior, a saber: o crescimento natural tem sido maior nas zonas ribeirinhas; a emigração, em especial a clandestina dos anos 60, teve maior impacto nas subregiões do interior; a existência de movimentos de população, particularmente dentro da região, cujo balanço é consabidamente favorável ao litoral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Mostram os números que a substancial variação negativa da década de 60 deve-se a quebras populacionais registadas no interior (-18,2%), altura em que os movimentos migratórios atingem cifras relevantes. Está adquirido que da Beira interior norte e sul emigraram largos contingentes para a França e Alemanha, enquanto que o esvaziamento experimentado pela zona do pinhal norte e sul se deveu à mobilidade interna com destino a Lisboa e a outros centros do litoral.
Nos anos 70 a propensão regional é a da recuperação (4,9%) que, tendo sido mais óbvia no litoral (13,1%), pelo menos no interior tendeu para estancar o despovoamento que vinha de trás. Revelam as estatísticas que o número de emigrantes da região centro que deixaram Portugal continental em busca de melhores condições de vida, entre 1960 e 1979, se cifrou em 262 461 num total de 830 236, assim distribuídos: entre 1960/1969 demandaram o exterior 175 570 nossos compatriotas, sendo 76 362 oriundos do litoral e 99 208 do interior (9,5% e 9%, respectivamente, em relação a população de 1960); segue-se, outrossim, que entre 1970/1979 deixaram igualmente a região centro com destino ao estrangeiro 86 891, sendo 47 474 do litoral e 39 417 do interior (ou seja, 6,1% e 4,4%, respectivamente, da população de 1970).
Como consequência desta realidade, dá-se um forte impulso sócio-económico no litoral, originando um processo rápido e extensivo de urbanização de áreas rurais com fenómenos de industrialização difusa e de expansão do terciário, a par de uma regressão clara no sector primário.
Acrescente-se, de resto, que tais fenómenos não apresentam um padrão territorial uniforme, na medida em que um é longitudinal, potenciado pelo eixo estruturante que foi a estrada nacional n.º 1 e que atravessa a região no sentido norte-sul, e o outro do tipo nodal, estruturado a partir dos centros mais importantes numa óptica urbano-industrial: Coimbra, Aveiro, Leiria, Figueira da Foz, Marinha Grande, Águeda e Ovar.
Realce-se que, entre 1981 e 1991, a região não consegue manter os quantitativos de 1981, perdendo 42 332 habitantes, o que corresponde a uma variação negativa de -2.4%. Isto não obstante esta década aparecer, no plano nacional, como um período de estabilização, após célere processo de crescimento, tanto no aspecto demográfico como no de ocupação do território; tal asserção é também válida para o litoral centro, onde se nota um assinalável progresso sócio-económico. Aqui, e para tanto, foi determinante a nossa adesão à CEE e os montantes vultosos aplicados na edificação de infra-estruturas essenciais.
O interior, porém, mostra uma manifesta incapacidade para fixar a população de 1981, agravando, de novo, as tendências negativas (-7,2% entre 1981 e 1991). As situações mais graves ocorrem no pinhal interior norte (-8,6%) e sul (-16,1%), bem como na Beira interior norte (-9,1%), apresentando as restantes unidades territoriais evoluções igualmente desfavoráveis, que variam entre -4,6% no Dão/Lafões e -6,9% na Cova da Beira
A paragem do retorno da emigração, a estrutura envelhecida da população residente, as quebras das taxas de natalidade, sem esquecer o fraco ritmo na dinamização da actividade económica, são factores decisivos naquela evolução. Depois haverá que atentar no tipo de povoamento dominante na região: disperso no litoral, por um lado, mas concentrado no interior, por outro.
Quer isto dizer que se verifica um decréscimo claro da importância dos lugares de pequena dimensão (menos de 500 habitantes) a favor dos maiores aglomerados (mais de 2 000 habitantes), que compreende a grande maioria de sedes dos concelhos. Que assim é, bastará reparar que entre 1970 e 1981 o peso da população residente nas aldeias e lugares diminuiu de 55,5% para 49,4%, em favor dos segundos que vêem a sua representação crescer de 16,5% para 20,1% . A consequência é que a ocupação média por km2 no interior é menos de metade do valor do Continente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao exposto, o grande desafio que se nos depara consiste em reabilitar essas áreas e suas gentes para um processo de modernização que lhes permita recuperar a esperança, sem que a sua identidade histórica e cultural seja alienada. Pretende-se, assim, conciliar o processo de desenvolvimento, especificamente definido para cada caso, com as preocupações de defesa do património e de conservação dos recursos naturais que lhe estão subjacentes
Sabemos todos que o mundo rural sobrevive, hoje, à custa da capacidade, sacrifícios e sabedoria de muitos cidadãos anónimos que não o querem abandonar. Felizmente que o policentrismo patente na região centro acabará por gerar, a médio prazo, benefícios palpáveis no desenvol-

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vimento populacional e económico: é que as inúmeras cidades de razoável dimensão que caracterizam a região actuarão como verdadeiros pólos de atracção e de desenvolvimento para as emigrações rurais, pólos esses, aliás, onde as pessoas possam encontrar trabalho, alojamento condigno, remuneração adequada e um leque de formação e uma oferta razoável de ocupação de tempos livres. É esta geração dos mais idosos que deverá receber, entre nós, a atenção que merece.
Bastará lembrar que daqui a cinco anos teremos na região centro quase 1/4 da população no escalão de mais de 65 anos. Há, pois, que reinseri-los num processo cultural e produtivo, que em largas zonas do País está ameaçado de extinção: as artes populares e o artesanato. Neste sector ninguém ignora que o saber fazer está prevalecentemente nas mãos e na memória das pessoas mais velhas. Daí que uma parte do desenvolvimento local deva passar pela renascença do seu artesanato característico, sob forma de trabalho caseiro, associativo, cooperativo ou outro. Eis, pois, a necessidade de, nesta área, serem traçadas orientações e co-financiamentos como forma de suster o abandono das áreas em decadência económica e social.
Daí defendermos a necessidade de serem pensados e implementados no novo Quadro Comunitário de Apoio programas operacionais contemplando medidas concretas que visem a valorização económica e social do espaço rural.
A promoção da gente do interior também poderá ser conseguida através do desenvolvimento dos sectores agro-alimentares, do turismo, dos serviços e da conservação e valorização do património cultural, arquitectónico e paisagístico. É do conhecimento geral que a degradação destes recursos não renováveis é assustadora em algumas das sub-regiões das beiras.
As vantagens da concretização de programas operacionais deste tipo estão à vista: a população residente dá conteúdo à sua terceira idade, gere mais ou menos ingressos, as artes populares sobrevivem, a sua qualidade de vida é preservada, mantendo-se, desse modo, a originalidade do mundo rural.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD aprovou nesta Assembleia, há quase três anos, a famigerada «lei das propinas». Contra a opinião dos estudantes, dos professores, dos órgãos universitários, do Conselho Nacional de Educação, de tudo e de todos, o PSD deitou pela borda fora todas as suas promessas eleitorais e todos os compromissos do programa do Governo em matéria de ensino superior e fez do aumento das propinas no ensino superior público a grande questão que ficará a marcar a política do PSD para o ensino superior nesta Legislatura.
Num período em que surgiram importantes reflexões sobre os problemas e as perspectivas para o ensino superior em Portugal e em que se alargou a consciência, dentro e fora da comunidade educativa, do valor estratégico que tem para o nosso país o desenvolvimento deste sector educativo, o Governo concentrou praticamente todos os seus esforços e preocupações em três objectivos prioritários: aumentar as propinas, aumentar as propinas, aumentar as propinas!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para conseguir esse objectivo, o Governo não recuou perante nada: instrumentalizou a Assembleia da República, fazendo-a aprovar expedientes legislativos destinados a impor o aumento das propinas contra a vontade das instituições universitárias, como a suposta lei «regulamentadora» da lei das propinas, aprovada em 1994; recorreu à chantagem e à intimidação dos estudantes; ensaiou manobras para dividir os estudantes, com a colaboração da JSD; lançou cargas policiais contra as manifestações estudantis; promoveu infiltrações e provocações do SIS contra os estudantes. Mas não conseguiu derrotar a maior vaga de contestação estudantil universitária a que o País assistiu nas últimas décadas.
E, assim, não só o problema da aplicação da lei das propinas continua por resolver em muitas escolas em que os boicotes persistem, como, nas escolas em que a lei foi aplicada, mesmo em termos mais suaves que o previsto, se demonstra com clareza que os argumentos baseados na justiça social, com que o Governo proeurou fazer passar a lei aos olhos da opinião pública, não passaram de uma grosseira demonstração de desonestidade política.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. O estudo recentemente elaborado pelos Serviços Sociais da Universidade do Porto sobre a aplicação da lei das propinas, cujos resultados foram publicamente divulgados, desmente completamente os argumentos do Governo quanto à justiça social que a lei das propinas iria gerar.
Senão vejamos: os rendimentos dos agregados familiares de mais de 70% dos estudantes bolseiros têm origem no comércio, indústria e profissões liberais. Apenas 7,7% dos bolseiros são oriundos de agregados familiares com rendimentos do trabalho por conta de outrém. Os estudantes bolseiros estão, nos termos da lei, isentos de propinas. Somam-se, assim, três injustiças: a injustiça do sistema fiscal, em que são penalizados os trabalhadores por conta de outrém; a injustiça do sistema de acção social assente nas declarações do IRS; a injustiça do sistema de propinas assente no sistema de acção social. Os prejudicados são sempre os mesmos.
Se repararmos nos pedidos de isenção de propinas que foram recusados, chegamos a idêntica conclusão: dos estudantes com rendimentos familiares provenientes da agricultura, comércio, indústria e profissões liberais, só 12% viram os seus pedidos recusados, quanto aos que vivem de rendimentos do trabalho por conta de outrem, viram 68% dos seus pedidos recusados.
Como afirma um comunicado, assinado por várias associações de estudantes: - Pela nossa parte, sempre dissemos ser uma refinada hipocrisia que um Governo responsável pela acentuação das desigualdades na sociedade portuguesa, pelo agravamento das injustiças sociais e por um sistema fiscal gerador de injustiças, apresentasse o aumento das propinas como a panaceia para assegurar a justiça social.
De facto, onde a lei das propinas foi aplicada, ficou bem demonstrada a falsidade das suas pretensas virtudes e ficou bem evidente o seu carácter injusto A lei das propinas, onde foi aplicada, nem representou mais justiça social, nem foi acompanhada dos tão prometidos melhoramentos na qualidade do ensino e no sistema de acção social.
Não é aceitável que, num país que tem o maior défice de qualificações superiores em termos europeus, que tem o sistema de acção social mais precário de toda a União Europeia, em que apenas 8,5% dos estudantes são bolseiros e em que a

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bolsa de estudo média é de 16 contos mensais, os estudantes e as suas famílias tenham de suportar o mais elevado nível de esforço financeiro para frequentar o ensino superior.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tivemos já a oportunidade de deixar bem claro nesta Tribuna que a oposição do PCP à lei das propinas nada tem de conjuntural, nem se limita a discordâncias quanto à sua oportunidade ou quanto a alguns dos seus pormenores. É uma oposição de fundo e de princípio. O PCP é contra a lei das propinas, porque considera a educação como um direito social e não como um mero privilégio individual dos jovens portugueses e porque, sendo a educação uma função de interessa nacional, o Estado não deve deixar de a suportar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PCP não se fica, pois, por promessas de «revisão» da lei das propinas, de sentido indefinido, como as que constam do «contrato» assinado no passado sábado no Coliseu dos Recreios. Nem condiciona os aumentos de propinas a melhoramentos no sistema de acção social.
O PCP propõe, sem equívocos, a revogação da lei das propinas e a adopção de uma lei-quadro da acção social escolar para o ensino superior que contribua para a superação da desigualdade de oportunidades no acesso e êxito escolares, que presentemente se manifesta de forma gritante.
Estão, inclusivamente, apresentados nesta Assembleia projectos de lei do PCP sobre ambas as matérias, que aguardam agendamento.
O PCP manifesta assim, mais uma vez, a sua solidariedade para com todos os que se manifestam contra a lei daí propinas e reafirma a sua disposição de continuar a lutar para que esta lei injusta seja revogada no mais curto prazo possível.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Maçãs. Sr. Deputado, quero preveni-lo, bem como ao Sr. Deputado António Murteira, que a Mesa, além do tempo regimental disponível, concedeu mais dois minutos e meio a cada um.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Sr. Presidente, receio que dois minutos e meio não sejam suficientes para a minha intervenção, pelo que peço a sua benevolência para que me conceda mais uns minutos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, tem a palavra, mas peco-lhe que seja o mais breve possível.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente, procurarei sê-lo
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez procurarei pôr-vos ao corrente do que ocorre no distrito de Portalegre e, de certa forma, da situação que se vive no Alentejo, sem que tal possa significar quaisquer intuitos de ingerência em território alheio, mas tão só o estabelecimento da analogia de vivências e de problemas concretos que igualmente afectam a região.
Compreenderão certamente que centre a minha intervenção na questão agrícola, já que se trata de matéria que não se esgota e parece escapar ainda à perspicácia e conhecimento de alguns ilustres dirigentes políticos da nossa praça.
Quando da última vez tive oportunidade de abordar questões regionais, frisei que a agricultura não constituía já apenas um sector da actividade económica, mas, muito mais do que isso: uma marcante realidade social, cultural e ambiental, dentro da qual o agricultor se move, exercendo múltiplas funções e convivendo com novas atribuições.
De facto, deparamos hoje com uma agricultura nova, carenciada de um outro tipo de agricultor, de homens que, para além de conhecerem e trabalharem a terra, têm obrigatoriamente de dominar o mais possível os circuitos da comercialização
Dir-vos-ei que não terá lugar, durante estes minutos que vos tomo, qualquer palavra que vise o homem que usa, abusando, a terra; nenhuma alusão será feita àqueles que da agricultura apenas importa o cifrão e àqueles que soçobram desanimados perante o primeiro combate ou se encontram sempre, com razão ou sem ela, prontos para a crítica fácil, mesmo quando vivem melhor do que nunca
Sei que muita gente nessas circunstâncias vive ainda perdida no sector. Porém, permitir-me-ão que dirija a minha atenção para aqueles que lutam, que constróem; para aqueles para quem o trabalho não dói e não conta, para quem o risco consciente faz parte da sua forma de estar na vida e conseguem olhar o futuro com esperança e um sorriso de confiança. Só esses possuem capacidade para criar, para transformar. Aí, sim, encontraremos os verdadeiros agentes da mudança, do desenvolvimento e da riqueza. Quero afirmar-vos que contamos, felizmente, com muitos homens desses no meu distrito, muitos mais no Alentejo e seguramente um sem número deles no País inteiro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Eu falo de homens que vivendo numa das regiões mais desfavorecidas da Europa em que nos inserimos, entendem ser já tempo do Alentejo profundo receber uma prova inequívoca de solidariedade do país real e dos países mais ricos da Comunidade.
É preciso que todos se capacitem da real especificidade em que vivemos e do verdadeiro porquê de situações como endividamento de muitos agricultores do meu distrito e da região. Muitos adaptaram as suas explorações à filosofia produtivista da PAC, muitos desses viram os investimentos efectuados prejudicados pelas exigências decorrentes da reforma da PAC, quase todos foram seriamente afectados por anos consecutivos de seca.
Estas são realidades que todos os portugueses têm de apreender, porque só assim estarão aptos a entender com clareza as dificuldades que ocorrem na região. Posso assegurar-vos, contudo, que a esmagadora maioria dos agricultores da minha terra, dignos desse nome, se encontram hoje a praticar um enorme esforço de modernização. Refiro-me aos homens e mulheres da terra que, desassombradamente, são capazes de dizer que não temem o dia de amanhã porque ainda ganham dinheiro com os cereais e obtêm rendimentos interessantes através da exploração dos ovinos, dos bovinos e da produção leiteira.
Estes são os homens e mulheres que hoje se reúnem em associações claramente reveladoras de que a agricultura no Alentejo está viva, como sejam a Ovibeja, a Ferpor, a Fiape, a Santiagro ou a Olivomoura, etc, etc.
É notório que a fase do conformismo e do imobilismo pertence ao passado e está a dar lugar a uma época nova marcada pelo entusiasmo e vontade de vencer. Atrever-me-ia a dizer que o agricultor alentejano quer que o Governo revele vontade de ajudar e sem dúvida a obra nascerá. Eu sei que falar de desenvolvimento não é fácil, que o será ainda mais arriscado em relação ao Alentejo,..

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quando se vive na ilusão!...

O Orador: - Sr. Deputado, se tiver tempo, trato de si

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Como dizia, falar de desenvolvimento não é fácil, porém a verdade é que ele já existe, está a acontecer. Por isso me revolto perante a dificuldade quase doentia que alguns dirigentes com responsabilidades manifestam, quando num acto de profunda injustiça procuram fazer significar o contrário. Só por má fé ou total ignorância se pode dizer que apesar dos milhões gastos no Alentejo não existe uma única exploração de sucesso. Meus senhores, a má fé também deve conhecer limites e a ignorância é ultrapassável quando existe disponibilidade para constatar as realidades e dimensão política para as aceitar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De há muito se defende no Alentejo a necessidade do armazenamento dos parcos recursos hídricos de que dispomos de forma a alargar as áreas regadas ou simplesmente complementar o sequeiro com pequenos regadios.
Prevê-se, no futuro, que áreas hoje ocupadas com a cultura dos cereais venham a dispor de água e se encaminhem para a pecuária, nomeadamente para a ovinicultura. Parte das áreas hoje produtoras de carne de bovino, poderão, quando regadas, alcançar produções competitivas através de culturas herbáceas ou arbóreas.
No Alentejo a água e não só importante como absolutamente decisiva. Esta sensibilidade existe, quer da parte dos agricultores, quer do Governo, por isso, no âmbito do PEDAP foram criados mais de 1000 ha de regadios em Portalegre e mais de 6000 no Alentejo. Tenho o maior gosto em vos informar que existem estudos que prevêem a criação de mais oito barragens. A título de exemplo, referir-vos-ei apenas aqueles que respeitam ao distrito de Portalegre Ribeiro do Freixo, em Monforte; Ribeira da Estação, em Portalegre Ribeira da Caniceira, em Avis; Ribeira das Mulheres, em Sousel; Apartadura, em Marvão; Abrilongo, em Campo Maior; Sume em Ponte de Sor e Pisão, em Crato. Estas oito barragens significarão 10 000 ha e oferecerão novas condições e perspectivas a muitas centenas de agricultores gerando emprego e riqueza.
Não pretendo, no entanto, deixar de mencionar a preocupação que hoje assalta o distrito de Portalegre quanto à eventualidade de podermos ver reduzida a área regada em Campo Maior pela barragem de Abrilongo, pelo suposto prejuízo, não claro a meu ver, de algumas espécies da fauna avícola
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, já ninguém tem dúvidas de que a agricultura, a transformação dos produtos e a sua comercialização, são absolutamente indissociáveis. Por isso. assistimos a leilões de gado semanais dos mais concorridos do País. Apontarei ainda o caso da Sotonisa, uma moderna queijaria que importou em cerca de 300 000 contos e muitas outras igualmente da região demarcada do queijo de Nisa em fase de modernização; da Cersul, Associação de Produtores de Cercais, em Santa Eulália e Elvas; do Centro de Comercialização de Castanhas, em Marvão, do Centro de Inseminação e Transplantação de Embriões, igualmente em Marvão ou da Fábrica de Enchidos em Arronches.
Do mesmo modo foram recentemente criadas as regiões demarcadas com vista a certificação do queijo, da castanha, da cereja, da maçã, do azeite e da ameixa, decorrendo o processo da região demarcada para o queijo mestiço, o enchido de carne de porco alentejano, o melão de Campo Maior, os cogumelos, o borrego e o novilho alentejanos.
Peço naturalmente as maiores desculpas pelo pormenor porventura desinteressante da minha intervenção, porém, a verdade é que mesmo assim fico com a amarga sensação de que entre nós haverá sempre aqueles que continuarão a afirmar nada ter sido feito no Alentejo, não existirem explorações com êxito ou ainda que o Alentejo se encontra em absoluta falência e irremediavelmente perdido.
Nós conhecemos muito bem esse discurso. Na nossa região também há quem o profira, envergonhada e despudoradamente, embora com muito menos impacto e sem quaisquer consequências por não serem levados a sério. Afigura-se-me oportuno lembrar que os alentejanos já se encontram suficientemente temperados pela história e pelas dificuldades do passado recente para que acreditem em atoardas de circunstância e alterem o rumo que traçaram e se propõem prosseguir com firme determinação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pese embora o facto de a agricultura constituir ainda a principal actividade económica no norte alentejano e de me ter revelado optimista quanto ao seu futuro, não pretendo esconder alguma preocupação quanto aos apoios futuros de que carece, à necessidade imperiosa de elevar o nível de instrução dos muitos que nela trabalham e ao rejuvenescimento que se impõe e se encontra intimamente ligado à criação de condições que levem os jovens a fixarem-se a terra. Tais condições levaram-nos a privilegiar uma formação profissional que consideramos adequada e lutámos, com êxito, pela criação de uma escola superior agrária, a qual, conjuntamente com a Escola Superior de Educação já existente e a Escola Superior de Tecnologia e Gestão cujas novas instalações abrirão em Outubro, completará um parque escolar verdadeiramente notável nos vários graus de ensino.
Contudo, não pretendemos alimentar ilusões. O desenvolvimento que almejamos não tem só que ver com a melhoria das condições da nossa agricultura e dos seus agentes, mas passa por uma revolução que se vem operando e que envolve todas as oportunidades e todos os sectores com grande destaque para o importante desempenho das autarquias locais, das quais tenho de destacar as que são da responsabilidade do Partido Social Democrata e muito injusto seria se não referisse, uma vez mais e expressamente, o quanto a Câmara de Portalegre tem contribuído para o enriquecimento do distrito ao dotar o concelho de infra-estruturas que têm tornado possível atrair investimentos de grande volume, criando novos postos de trabalho, ao mesmo tempo que não esquece a habitação, a parte cultural e a parte histórica.
Apostar no desenvolvimento e na modernização é também o que, teimosa mas responsavelmente, fizeram os empresários que investiram 15 milhões de contos, na indústria têxtil, nos mármores e granitos, nas confecções, nos componentes para o ramo automóvel, nas águas minerais ou nas corticeiras, de que destaco a nova e moderna empresa Subercentro, em Ponte de Sor Revelar vontade de ver os nossos campos harmonizados e aquilo que pretendemos e conseguimos com a Leadersor e com o novo Leader que vamos procurar instalar no distrito Honra-nos o Centro de Formação Profissional.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP)- - E os desempregados?

O Orador: - Sr Presidente, estou a tentar ser extremamente rápido e, por isso, gostaria que o Sr. Deputado Lino de Carvalho me desse oportunidade de concluir a minha intervenção.

O Sr. Limo de Carvalho (PCP) - Não se perturbe! A esta hora não se perturbe!

O Orador: - Como dizia, o Centro de Formação Profissional, em apenas quatro anos, formou já cerca de 2000

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jovens e depositamos a maior esperança no futuro núcleo de apoio à criação de empresas que se encontra em construção e abrirá em Outubro para que muitos jovens tenham perspectivas e condições para iniciarem a sua vida empresarial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comecei esta minha intervenção mencionando o quanto é importante a solidariedade de todos - de todos, Sr. Deputado Lino de Carvalho - em relação à nossa região e ao seu futuro. Termino solicitando a todos que sejam justos na apreciação que fazem do trabalho desenvolvido no Alentejo e respeitem o esforço que vem sendo efectuado, já que ele não tem como objectivo o seu particular e exclusivo desenvolvimento mas também o enriquecimento de Portugal.
Neste apelo quero envolver de forma séria e especial a comunicação social - já cá não está infelizmente - pedindo-lhes que desempenhem o seu trabalho com base em informação isenta, o que nem sempre acontece, e na constatação dos factos. Não posso deixar de chamar aqui, sem acrimónia mas com desgosto, o artigo de 3 de Fevereiro, de O Independente, intitulado pouco alegre, no qual se denigre, de forma extremamente injusta, porque infundada, o Hospital Doutor José Maria Grande, Hospital Distrital de Portalegre, bem como a imagem dos membros do seu conselho de administração, sobre os quais jamais recaiu qualquer suspeita, merecendo, pelo contrário, a estima geral.
O Sr Deputado Lino de Carvalho parece que tem dúvidas relativamente a esta matéria.
Porque este tipo de notícias não abona senão a favor de alguém que eventualmente apenas se preocupa com os seus interesses pessoais, sugeria à autora do referido artigo - e vou mandar-lhe a comunicação - que aceitasse o convite formulado pelo Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Portalegre e visse com os próprios olhos a realidade que ali ocorre, de forma a ficar habilitada a produzir informação consentânea com a realidade.
Assim, seríamos muitos mais a revelar as potencialidades da região, a riqueza da sua cultura e a generosidade das suas gentes e haveria - e esperemos que haja -, no futuro, muito mais portugueses a conhecerem Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr Deputado João Maçãs, apesar do adiantado da hora e da escassez do tempo, não me contive e vi-me obrigado a olhar duas ou três vezes para o calendário da minha agenda, porque, depois de ouvir a intervenção do Sr. Deputado, que eu supunha ir subir a essa tribuna para defender o Alentejo e os seus múltiplos problemas - e gostava que ficasse claro que, ainda há poucos dias, os últimos dados do EUROSTAT demonstram que o PIB per capita no Alentejo é, hoje, 12% menos do que era há 10 anos atrás, o que significa que, na última década, a região empobreceu e viu aumentados os seus problemas -, tive dúvidas, se ainda estaríamos na quadra carnavalesca ou se, hoje, já seria o dia 1 de Abril.
É que tudo o que o Sr. Deputado acabou de dizer e o paraíso que traçou sobre a realidade alentejana demonstram que tanto o PSD como o senhor estão corripletamente fora de si!
Gostaria somente de colocar-lhe duas ou três questões: o que é que tem a dizer sobre a recente eliminação da execução da barragem a ser construída perto de Campo Maior; o que pensa da recente falência do matadouro de Sousel e, por último, do facto de o Ministério da Agricultura ter desviado verbas de um centro de formação profissional agrícola, destinadas a Elvas, salvo erro para Santo Tirso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E, já agora, dos 40 000 desempregados!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu) - Sr. Deputado João Maçãs, a Mesa concede-lhe mais um minuto, além do pouco tempo de que dispõe, para responder a este pedido de esclarecimento.
Para o efeito, tem a palavra.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, sou muito mais sensível à realidade vivida no Alentejo em matéria de empresas, de investimentos e de rendimentos do que a qualquer tipo de sondagem ou estatística que possa ser utilizada.
O Sr. Deputado, que vive no Alentejo, parece, no entanto, ignorar a realidade alentejana. O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, como, aliás, o Sr. Deputado Lino de Carvalho, só encaram o que é passível de ser explorado e, de uma forma geral, da pior forma e contra os interesses dos alentejanos.
Nunca vi o Sr. Deputado revoltar-se contra aquilo que o presidente do seu grupo parlamentar aqui disse, há cerca de dois meses, quando mencionou não haver uma exploração com êxito no Alentejo que tivesse sido co-financiada ou ajudada pelos apoios Nunca o vi tomar a palavra nesse sentido Ele envergonhou os alentejanos! E o senhor é alentejano e Deputado eleito pelo círculo eleitoral de Évora, que é a capital do Alentejo.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS) - Quem deve ter vergonha é você e o seu Governo!

O Orador: - Sr. Deputado, quero dizer-lhe que a época carnavalesca já acabou e, se dúvidas houvesse sobre isso, elas surgiriam depois da sua intervenção e não da minha.
Vou, agora, responder-lhe às duas ou três questões que me colocou. A algumas delas nem lhes conhece o nome! De facto, perguntou-me o que se passa relativamente à eliminação recente da execução da barragem a ser construída perto de Campo Maior, porque o senhor não sabe como ela se chama!

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Abrilongo!

O Orador: - Então, devia tê-lo mencionado!

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS)- - Porquê?

O Orador: - Porque há outras barragens perto de Campo Maior, Sr. Deputado!
E, em relação à barragem do Abrilongo, quero dizer-lhe que a sua execução não foi anulada ou eliminada. Aquilo que eu disse lamentar - e referi-o na minha intervenção, mas o senhor não ouviu - era que. eventualmente, a área regada pela barragem do Abrilongo pudesse vir a ser reduzida para metade ou menos de metade, porque o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais tem um determina-

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do tipo de entendimento em matéria de preservação da natureza, com o qual não concordo nem discordo, mas relativamente ao qual me permito pedir e exigir aos Ministérios do Ambiente e Recursos Naturais e da Agricultura que procurem encontrar um equilíbrio entre a ecologia e a economia. Sr. Deputado, de uma forma clara, é isto que tenho a dizer.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E o matadouro de Sousel?

O Orador: - Em relação ao matadouro de Sousel, devo dizer que a sua situação está a ser estudada. O Sr. Deputado Lino de Carvalho sabe tão bem como eu - aliás, esteve lá há um mês e tem conhecimento de que a sua viabilização está a ser analisada - que foi a própria Câmara Municipal de Sousel que providenciou no sentido de o matadouro não fechar, sensibilizando para isso os trabalhadores (e a câmara é do PSD) e comprometendo-se a encontrar, conjuntamente com o conselho de administração, uma solução para o caso. Sr. Deputado, espere mais duas ou três semanas e verá a solução!
Em relação à questão do desvio de verbas do Centro de Formação Profissional, não tenho qualquer informação sobre isso. Tive, no entanto, oportunidade de lhe dizer que, em matéria de formação profissional, se está a fazer alguma coisa no distrito. O Sr. Deputado deve visitar o Centro de Formação Profissional de Portalegre, o tal que ministrou formação a 2000 alunos em apenas quatro anos, e as novas instalações do ninho de empresas que está em construção. Ele está lá aos olhos de todos e iniciará em Outubro as suas funções.

Aplausos do PSD.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado João Maçãs, ao longo da sua intervenção e da sua resposta, referiu-se várias vezes ao meu nome, o que muito me honra.
Gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado João Maçãs, mas, como me apercebi de que ele estava a falar de uma região e de um país que não existem, não há matéria para isso, porque eu conheço um Alentejo de 40 000 desempregados, 70% dos quais sem subsídio de desemprego,...

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Miserabilista!

O Orador: - .. um Alentejo em desertificação, um Alentejo em depressão, devido às políticas de marginalização do interior, um Alentejo com uma série de explorações em falência, sem prejuízo do esforço do poder e dos agentes locais, e a intervenção do Sr. Deputado João Maçãs foi sobre um outro Alentejo e sobre um outro país que não existem e sobre um oásis que foi inventado agora.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, a Mesa registou as divergências expostas pelos Srs. Deputados, considerando encerrado o debate quanto à intervenção do Sr. Deputado João Maçãs.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Murteira.

O Sr. António Murteira (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Dado o adiantado da hora, proponho-me fazer um pequeno resumo da minha intervenção, solicitando ao Sr. Presidente e à Mesa o favor de autorizarem a sua publicação.
Esta minha intervenção tem a ver com o Alentejo e com os problemas graves que, neste momento, aí existem, resultantes da falta de água disponível e, da questão da partilha de água com a Espanha, que é uma questão que assume importância e, de certa maneira, se situa no âmbito da intervenção que acabou de ser feita.
Esta situação está a criar um clima de grande tensão e de grandes interrogações no Alentejo, completamente contrastantes com aquilo que acabámos aqui de ouvir, que tem a ver apenas com uma pequena parte da realidade, porque esse clima, neste momento, é de grande preocupação e também de revolta, porque há recursos que não estão a ser aproveitados.
Face a essa situação e ao facto de a maior parte das barragens do Alentejo estarem a um nível morto, o que significa que, dentro de poucos semanas, poderemos não ter água para abastecer a agricultura, nem a indústria, nem para o abastecimento público, o Partido Comunista Português, tendo por baseia intervenção que vou apresentar, onde se encontra a sua justificação, apresenta um conjunto de medidas, com as quais visa contribuir, se forem aceites, para procurar resolver um problema que é real e grave. Algumas são medidas imediatas e outras são de médio e longo prazo.
Reivindicamos que o Governo avance rapidamente para a assinatura de um novo convénio com a Espanha, para se resolver o problema do Guadiana- não sabemos se isso está a ser feito, era bom que o Governo nos informasse -, e, simultaneamente, negoceie com o Governo espanhol a libertação de água em Espanha para assegurar um caudal mínimo ao Guadiana, pois, apesar de estarmos na Primavera, há certos sítios em que já está praticamente seco, como toda a gente sabe.
Propomos que seja criada uma comissão técnica de acompanhamento da situação na região do Alentejo e em outras regiões afectadas.
Propomos que se passe das palavras aos actos e que o Governo disponibilize os meios financeiros e técnicos específicos de apoio às autarquias e às associações de regantes, para se tentar minorar os efeitos da seca já sentidos, disponibilize meios financeiros e técnicos de apoio específico às autarquias e às associações de regantes para estudos de prospecção, abertura de furos e poços, construção de pequenos açudes, aquisição de equipamentos e reforço dos sistemas de tratamento de água, dado a brutal diminuição da quantidade de água estar já a ter reflexos muito grandes na sua qualidade, começando a ser difícil, nalguns casos, assegurá-la para o consumo.
Num estudo elaborado pela Associação de Municípios de Beja seria necessário, para satisfazer estas medidas de emergência, entre 0,5 milhão e 750 000 contos, o que é uma quantia irrisória se tivermos em conta a magnitude do problema. Exactamente por isso, por ser uma quantia irrisória, neste momento, ninguém, no Alentejo, entende não haver já, da parte do Governo, a disponibilização destes meios financeiros para atacar os problemas.
Esta é uma questão que coloco, desde já, com toda a frontalidade, não só à bancada da maioria como também às

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outras, no sentido de se encontrar rapidamente uma solução, e esta é daquelas que, estando ao nosso alcance, só não e levada a cabo se não houver vontade alguma para isso, o que, além de ser uma atitude política errada, é profundamente desumana, já que resolver-se-ia alguns destes problemas apenas por 500 000 ou 750 000 contos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Propomos a requisição, pelo Governo, dos 3,5 milhões de metros cúbicos de água das barragens da Vareta e do Facho, no concelho de Serpa - também não compreendemos por que é que isto acontece, sendo este um dos concelhos mais afectados, e já apresentámos o assunto à Comissão de Agricultura e Mar, cujo presidente está presente -, que estão completamente abandonadas por uma agrária que vive em Lisboa.
Ora, para tentar resolver este problema, a Câmara Municipal de Serpa já propôs a requisição desta água, pagando à senhora o que se entendesse como justo, do acordo com as leis vigentes. Sabemos que a senhora se negou, que nem sequer quis falar sobre o assunto e, perante isto, o Governo mantém-se impávido e sereno, não requisitando uma água que está completamente abandonada e que tem belíssima qualidade, sobretudo a da barragem da Vareta, para a ligar à rede pública, resolvendo deste modo o problema do abastecimento de água ao concelho de Serpa.
Esta é também uma solução concreta com resultados imediatos e que ainda só não foi aplicada ou não o será se a maioria e o Governo não quiserem.
Propomos ainda que sejam reparadas as infra-estruturas hidráulicas e as barragens, o que é uma situação vergonhosa. Aliás, o Deputado que acabou de falar tem conhecimento de casos desses no seu distrito.
Posso dar como exemplo, porque estive lá, o perímetro de rega do Caia, que necessita de 8 milhões de contos para a sua reconversão, sendo um dos seus problemas o desperdício de água devido ao facto de as condutas serem já muito antigas e precisarem de arranjo. Mas não é só aqui que existe este problema, ele verifica-se também em Alcácer do Sal, na barragem de Pego do Altar, onde há muitas associações de regantes a proporem o seu arranjo. E sabemos que hoje em dia existem métodos técnicos para o fazer sem ter de se despejar as barragens. Mas, até agora, o Governo continua cego, surdo e mudo a esta situação, que não só exige pouco dinheiro como rapidamente pode ser resolvida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, este é também um problema de conserto de infra-estruturas, no sentido de se poupar água, porque os desperdícios são de uma percentagem muito elevada.
Propomos a construção de barragens há muito reivindicadas e já várias vezes prometidas pelo Governo, sobretudo em altura de eleições, chegando até, algumas delas, a estarem orçamentadas, mas nunca foram feitas, como a do Enxoé, da Gema, da Agua Branca, dos Minutos e agora a do Abrilongo, à qual o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais deu um parecer desfavorável que travou a sua construção, permitindo apenas a de um pequeno açude para regar 2000 ha, o que inviabiliza economicamente a barragem.
Portanto, todos estes casos necessitam de ser rapidamente resolvidos, face à magnitude da situação.
O Grupo Parlamentar do PCP, após este apelo a todas as bancadas, propõe uma audição parlamentar sobre a questão dos recursos hídricos internacionais, particularmente sobre o rio Guadiana e a seca, que é muito sentida no sul do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)- - Srs. Deputados, a Mesa reconhece a importância e a actualidade dos temas abordados nestas duas últimas intervenções e espera compreensão para não conceder mais tempo a quem quer que seja, dado o adiantado da hora.
Os Srs. Deputados terão oportunidade de intervir noutra ocasião e de assim se manifestarem sobre este tema.
Considero encerrado o debate.
Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, com uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 50 minutos

Documento enviado à Mesa, para publicação, a pedido do Deputado do PCP António Murteira

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Primeiro, para Portugal, assume uma importância estratégica a questão das águas internacionais, 40% da água de superfície de que dispomos provém de Espanha através das bacias hidrográficas dos rios internacionais que partilhamos com os nossos vizinhos
É, assim, compreensível que se viva no País um clima de crescente inquietação sobre a questão dos rios internacionais, o PHNE e a construção de Alqueva.
Clima de inquietação que resulta, por um lado, da falta de informação e da informação avulsa do Governo português;
Por outro lado, das intenções expressas no PHNE, inaceitáveis para Portugal, e das enormes perdas de caudais verificadas no Douro, Tejo e sobretudo Guadiana nos últimos 20 anos.
A falta de informação e a sensação que se tem da incapacidade do Governo português face ao Governo espanhol, dão, por um lado, azo a crescentes especulações e abordagens de carácter sensacionalista por parte de alguns políticos, de alguns jornalistas e de diversos lobbies.
Algumas notas que pretendem contribuir para uma abordagem equilibrada da questão dos recursos hídricos:
Em termos de quantidade, no seu conjunto, as bacias hidrográficas dos nos Douro, Tejo e Guadiana, são excedentárias no presente e segundo estimativas e mesmo segundo o PHNE, sê-lo-ão no ano 2012.
O problema que se coloca, quer com as infra-estruturas já feitas por Espanha, quer com o seu PHNE, é da questão da partilha das águas, particularmente em relação ao rio Guadiana.
Isto é, a Espanha não deve, não pode, continuar a proceder como se o oceano fosse a fronteira; e Portugal não deve, não pode, continuar a adiar a concretização das infra-estruturas hidráulicas, particularmente Alqueva, que lhe permitam fazer uma gestão e planeamento eficazes dos troços dos rios que nos pertencem.
Em termos de qualidade, é significativa a poluição que os rios sofrem em Espanha, particularmente o Guadiana.
Contudo, «os investimentos previstos para a despoluição dos cursos de água fazem prever a melhoria da qualidade da água dos cursos de água em Portugal.»

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Esperamos e reivindicamos que da parte do Governo haja uma atitude, também um sentido.
Em termos de transferências e tendo em conta PHNE, a bacia hidrográfica do Tejo «funciona como charneira da transferência de água entre o Norte e o Sul recebendo do sistema Norte-Douro um total de 850 hm3 e exportando 900 hm3, dos quais se destinam 650 hm3 à bacia do Segura, 100 hm3 à bacia do Guadalquivir e 170 hm3 à bacia do Guadiana (não como reforço, mas para compensar a sobreexploração, da mesma ordem, do aquífero do Alto-Guadiana).
A quem servem o sensacionalismo e a especulação?
Certos políticos, certos jornalistas, certos lobbies, lançam mão de todos os argumentos para entravar o aproveitamento e regularização do rio Guadiana, a construção de Alqueva, do género:
«Alternativa a Alqueva, um conjunto de pequenas e médias barragens». Os anos de seca, como o actual, constituem a prova provada de que assim não é! Ou será que a realidade já não é aquilo que é mas o que esses senhores querem que seja? Em anos de seca aí estão as pequenas e médias barragens secas. Enchem-nas com quê?
«Foz Côa é entreposto de água para Alqueva». Quando se sabe que o que está previsto no Projecto de Empreendimento apresentado em Bruxelas é que Alqueva e a regularização do no Guadiana se consegue através dos escoamentos do troço internacional de montante, cujo aproveitamento pertence a Portugal, pelos convénios Luso-Espanhol de 1968, e não qualquer outro esquema a partir do Douro ou do Tejo.
«Nas presentes condições o Alqueva pode demorar 75 anos a encher» (Público- 13.03.95). Quando se sabe que, nos últimos 20 anos, mesmo tendo perdido 56% do seu caudal, em relação aos anteriores 25 anos, a média anual de escoamento que entra em Portugal é da ordem dos 1400 hm3, quando pelo Consórcio de 1968 se estimava que fosse 2400 hm3
Mesmo com a média anual dos últimos 20 anos, isto é, nas condições presentes referidas pelo Público, o escoamento médio anual de 1400 m3 é suficiente para encher a albufeira de Alqueva, nos prazos técnica e cientificamente considerados correctos. Contudo, isto não significa que não devamos saber junto dos nossos vizinhos espanhóis o que é feito dos outros 1400 hm3!
Outra atoarda dos trompetistas do apocalipse é a do desastre ambiental.
E um lobby espanhol, travestido de ambientalista - ADENEX - vai ao ponto de afirmar: «A obra não tem qualquer justificação do ponto de vista sócio-económico (...)».
Apetece perguntar: para quem é que não tem justificação, para Portugal ou para certos interesses espanhóis e comunitários?
Então Alqueva não tem justificação sócio-económica, numa zona em desertificação ambiental e humana, com uma taxa de desemprego que ronda os 20% e na qual a modernização da base económica e a própria vida dependem da existência de água armazenada?
Em que estudos científicos e técnicos se apoiam esses senhores, para fazerem tais afirmações, quando é sabido que os estudos de impacte ambiental até agora realizados e conhecidos apontam exactamente o contrário, ou seja, que os impactos positivos do empreendimento são muito superiores aos impactos negativos.
Admira-me que essas pessoas, talvez por andarem tão arredadas das realidades, não se apercebam de que o desastre ambiental, demográfico e social está a dar-se, vai agravar-se, não com Alqueva, mas se não construirmos rapidamente Alqueva.
A água é hoje, e será cada vez mais uma componente estratégica do desenvolvimento e um recurso indispensável à vida, como bem sabemos pela experiência, no sul do País.
Segundo, agravam-se os efeitos da seca no sul perante a paralisação do Governo.
O PCP, as autarquias, as associações de agricultores, associações ambientalistas e outras entidades, face à seca no sul, à insuficiência e deterioração de infra-estruturas, meios e equipamentos, face às insuficientes disponibilidades financeiras existentes, elaboraram levantamentos da situação e apresentaram ao Governo propostas com vista a minorar os efeitos da situação e a permitir um racional aproveitamento dos recursos hídricos disponíveis.
Apesar das graves situações que já se vivem no abastecimento de água, quer as populações, quer à agricultura, com graves reflexos no crescimento do desemprego, até agora, o Governo ainda não passou das palavras aos actos, às acções.
Abastecimento de água: populações, agricultura e indústria, em situação de ruptura, em diversas zonas do sul do País
A grande maioria das barragens apresentam uma capacidade de armazenamento próxima do nível morto.
O que coloca problemas não só de quantidade, mas também de qualidade.
Roxo - que abastece Beja e Aljustrel e um perímetro de rega, 11% de capacidade,
Santa Clara - abastece parte de Odemira e a empresa Neves Corvo, capacidade próxima do volume morto, já estão a bombear água porque já não entra na tomada por gravidade,
Monte da Rocha - serve Castro Verde e Ourique, apresenta cerca de 10% de capacidade, Alvito - abastece Alvito, Cuba, Vidigueira, Viana do Alentejo e Portei, ponto morto.
As situações mais graves e já de ruptura no abastecimento público verificam-se em Serpa e Odemira.
Parte do concelho de Odemira está a ser abastecido com autotanques e no concelho de Serpa há já cortes de água e em Ourique cortes temporários para recarga dos aquíferos
A mesma situação de nível morto, se apresenta nas principais barragens dos perímetros de rega: Odivelas, Campinas (Alvalade do Sado/Santiago) Fonte Seenes (Alvalade do Sado/Santiago), Vale do Gaio e Pego do Altar (Alcácer do Sal), Caia (Elvas/Campo Maior).
Medidas: Rápida assinatura de novo convénio com Espanha;
Negociar com o Governo espanhol a libertação de água em Espanha, que assegure um caudal mínimo ao Guadiana;
Criação de uma Comissão Técnica de Acompanhamento da situação na região do Alentejo e noutras regiões afectadas;
Disponibilização de meios financeiros para apoio específico às autarquias e associações de regantes para estudos de prospecção; abertura de furos e poços; construção de pequenos açudes; aquisição de equipamentos (veículos de transporte de água; autotanques; equipamentos de bombagem, etc.); e reforço dos sistemas de tratamento de forma a contribuir para manter a água em condições de consumo público.
Num estudo elaborado pela Associação de Municípios de Beja, numa primeira fase e para as medidas mais urgentes, a Associação calcula que seria necessário um apoio central da ordem dos 500 000 a 750 000 contos.
Ora, nem sequer se trata de uma grande verba se tivermos em conta a área a beneficiar e a dimensão do problema, pelo que não se compreende a demora do Governo em disponibilizar os meios e passar à solução do problema.
Requisição, pelo Governo, dos 3,5 milhões de m1 de água das barragens da Vareta e do Facho, no concelho de

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17 DE MARÇO DE 1995 1791

Serpa Estas barragens estão completamente abandonadas pela proprietária, que vive em Lisboa.
Reparação de infra-estruturas hidráulicas, barragens e condutas, que perdem quantidades significativas de água desde o perímetro de rega do Caia, em Elvas/Campo Maior, à barragem do Pego do Altar, em Alcácer do Sal
Construção de barragens, há muito reivindicadas, mas nunca construídas Enxoé, Gema, Água Branca, Minutos.
O Grupo Parlamentar do PCP, face à importância e gravidade das situação propõe ainda a realização de uma audição parlamentar sobre a questão das recursos hídricos internacionais, particularmente o Governo, e a questão da seca, nomeadamente no sul do País

Entraram durante a sessão os seguintes Srs Deputados

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro José Martins Viegas
António Augusto Fidalgo
António de Carvalho Martins
António José Caeiro da Motta Veiga
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira
Filipe Manuel da Silva Abreu
Francisco João Bernardino da Silva
João José Pedreira de Matos
Joaquim Eduardo Gomes
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha
José Ângelo Ferreira Correia
José Manuel Nunes Liberato
José Pereira Lopes
Luís Carlos David Nobre
Manuel Maria Moreira
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho
Vasco Francisco Aguiar Miguel

Partido Socialista (PS)

António Luís Santos da Costa
António Manuel de Oliveira Guterres
António Poppe Lopes Cardoso
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Santos de Magalhães.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Marques Amado.
Maria Teresa Dona Santa Clara Gomes

Partido Comunista Português (PCP)

oão António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.

Faltaram à sessão os seguintes Srs Deputados

Partido Social-Democrata (PSD)

Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel de Lima Amorim.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Mário Jorge Belo Maciel.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Alves Martinho.
Armando António Martins Vara.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte Raúl.
Fernando Sousela da Costa Brito.

Partido Comunista Português (PCP)

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

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