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Quinta-feira, 30 de Março de 1995 I Série - Número 58 1911
DIÁRIO
Da Assembleia da República
VI LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE MARÇO DE 1995
Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às J5 horas e 35 minutos
Antes da ordem do dia - Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de leis n.ºs 523 a 526/VI e dos votos n.ºs 139 e 140/VI, bem como de requerimentos e de respostas a alguns outros
Foi lida a mensagem do Sr Presidente da República de devolução, para nova apreciação, do Decreto n.º 183/VI [Altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75. de 26 de Novembro (Lei de Imprensa)].
Depois da leitura do voto n.º 139/VI- De pesar pelo falecimento do Sr Conselheiro Adriano Vera Jardim (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os Verdes), intervieram, além do Sr Presidente, os Srs Deputados Guilherme Silva (PSD), Luís Sá (PCP), Narana Coissoró (CDS-PP), Raul Castro e Manuel Sérgio (Indep ), Isabel Castro (Os Verdes), Alberto Costa (PS), Mano Tomé (Indep) e José Vera Jardim (PS), que agradeceu as palavras de homenagem No fim, a Câmara guardou um minuto de silêncio
O Sr Presidente exprimiu um sentimento de pesar à família do Dr. Suleiman Vali Mamede, no que foi secundado pelos Srs Deputados Pacheco Pereira (PSD) e Guilherme d'Oliveira Martins (PS)
O Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) deu conta da viagem que uma delegação parlamentar efectuou à Costa Rica, a convite da Comissão Interparlamentar Latino-Americana dos Direitos, humanos, tendo usado também da palavra, além do Sr Presidente - que, em nome da Câmara, se regozijou com o êxito da delegação -, a Sr.ª Deputada Odeie Santos (PCP)
O Sr. Deputado Miranda Calha (PS), lembrando a interpelação feita, na reunião plenária do dia 16, pelo Sr. Deputado Eduardo Pereira (PS), solicitou esclarecimentos sobre a entrada em funcionamento da Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços pelas OGMA à Força Aérea Angolana.
Também em interpelação à Mesa, o Sr Deputado Rui Carp (PSD) insurgiu-se contra declarações do Sr Presidente da República a propósito da revisão do Tratado da União Europeia, intervindo, a diverso titulo, além daquele orador, os Srs. Deputados João Cravinho (PS), Manuel Queira (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP) e Miranda Calha (PS)
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 81º do Regimento, o Sr Deputado Duarte Pacheco (PSD) congratulou-se com a acção do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações no que respeita ao desenvolvimento das infra-estruturas rodoviárias do País, nomeadamente da Região Oeste
Ainda ao abrigo da mesma figura regimental, o Sr Deputado Miguel Urbano Rodrigues (PCP) criticou a política externa do Governo em matéria de defesa e respondeu, no fim, a um pedido de esclarecimento do Sr Deputado José Lello (PS)
O Sr Deputado Mário Tomé (Indep) anunciou que solicitará autorização para comparecer em julgamento no processo contra ele instaurado pelo comandante Alpoim Calvão
O Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso (PSD) falou do progresso no distrito de Aveiro, respondendo depois a pedidos de esclarecimento dos Srs Deputados Ferraz de Abreu (PS) e Manuel Queira (CDS-PP)
O Sr. Deputado Rodrigues Marques (PSD) referiu-se ao 2º Congresso dos Empresários do Centro, realizado no mês de Novembro em Castelo Branco.
Ordem do dia- A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à substituição de um Deputado do PSD
Após o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins (PS) ter procedido à síntese do respectivo relatório da Comissão de Economia. Finanças e Plano, procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 123/VI - Aprova bonificações de juros para empréstimos, com garantia do Estado, contraídos por associações sem fins lucrativos Usaram da palavra, a diverso título, além daquele orador e dos Srs Secretários de Estado Adjunto e do Tesouro (Walter Marques) e da Presidência do Conselho de Ministros (Paulo Teixeira Pinto), os Srs. Deputados Raul Castro (Indep.), Octávio Teixeira (PCP), Manuel Queira (CDS-PP), Rui Rio e Carlos Pinto (PSD), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Vieira de Castro (PSD) e Narana Coissoró (CDS-PP)
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos
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I SÉRIE - NÚMERO 58
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva. Adérito Manuel Soares Campos. Adriano da Silva Pinto. Alberto Cerqueira de Oliveira. Alberto Monteiro de Araújo. Alípio Barrosa Pereira Dias. Álvaro José Martins Viegas. Américo de Sequeira. Anabela Honório Matias. António Augusto Fidalgo.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara. António da Silva Bacelar. António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu. António Joaquim Bastos Marques Mendes. António Joaquim Correia Vairinhos. António Manuel Fernandes Alves. António Maria Pereira. António Moreira Barbosa de Melo. António Paulo Martins Pereira Coelho. Aristides Alves do Nascimento Teixeira. Belarmino Henriques Correia. Carlos Alberto Lopes Pereira. Carlos Alberto Pinto. Carlos de Almeida Figueiredo. Carlos Filipe Pereira de Oliveira. Carlos Lélis da Câmara Gonçalves. Carlos Manuel de Oliveira da Silva. Carlos Manuel Duarte de Oliveira. Carlos Manuel Marta Gonçalves. Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira. Cecília Pita Catarino. Delmar Ramiro Palas. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco. Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva. Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista. Fernando Carlos Branco Marques de Andrade. Fernando dos Santos Antunes. Fernando José Antunes Gomes Pereira. Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira. Fernando Monteiro do Amaral. Fernando Santos Pereira. Filipe Manuel da Silva Abreu. Francisco Antunes da Silva. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva. Hilário Torres Azevedo Marques. Jaime Gomes Milhomens. João Álvaro Poças Santos. João Carlos Barreiras Duarte. João do Lago de Vasconcelos Mota. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado. João Granja Rodrigues da Fonseca. João José da Silva Maçãs. Joaquim Cardoso Martins. Joaquim Eduardo Gomes. Joaquim Fernando Nogueira. Joaquim Maria Fernandes Marques. Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo. José Alberto Puig dos Santos Costa. José Álvaro Machado Pacheco Pereira. José de Almeida Cesário. José Fortunato Freitas Costa Leite. José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite. José Júlio Carvalho Ribeiro. José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro. José Macário Custódio Correia.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira. José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião. José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha. Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa. Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Albino Casimiro de Almeida. Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira. Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia. Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo. Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva. Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos. Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva. Olinto Henrique da Cruz Ravara. Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho. Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada. Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete. Simão José Ricon Peres.
Virgílio de Oliveira Carneiro. Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa. Alberto da Silva Cardoso. Alberto de Sousa Martins. Alberto Manuel Avelino. Alberto Marques de Oliveira e Silva. Ana Maria Dias Bettencourt. Aníbal Coelho da Costa. António Alves Marques Júnior. António Alves Martinho. António Fernandes da Silva Braga. Armando António Martins Vara.
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Artur Rodrigues Pereira dos Penedos. Carlos Manuel Luís. Carlos Manuel Natividade da Costa Candal. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues. Eduardo Ribeiro Pereira. Elisa Maria Ramos Damião. Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo. Fernando Alberto Pereira de Sousa. Fernando Alberto Pereira Marques. Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins. Gustavo Rodrigues Pimenta. Jaime José Matos da Gama. João Cardona Gomes Cravinho. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. João Maria de Lemos de Menezes Ferreira. João Rui Gaspar de Almeida. Joaquim Américo Fialho Anastácio. Jorge Lacão Costa. Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego. José António Martins Goulart. José Eduardo dos Reis. José Eduardo Vera Cruz Jardim. José Ernesto Figueira dos Reis. José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José Manuel Marques da Silva Lemos. José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos. José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Júlio da Piedade Nunes Henriques. Júlio Francisco Miranda Calha. Leonor Coutinho Pereira dos Santos. Luís Filipe Marques Amado. Luís Filipe Nascimento Madeira. Luís Manuel Capoulas Santos. Manuel Alegre de Melo Duarte. Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio. Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes. Nuno Augusto Dias Filipe. Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo. Raúl Fernando Sousela da Costa Brito. Rogério da Conceição Serafim Martins. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz. Rui António Ferreira da Cunha. Rui do Nascimento Rabaça Vieira. Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha. António Manuel dos Santos Murteira. José Manuel Maia Nunes de Almeida. Lino António Marques de Carvalho. Luís Carlos Martins Peixoto. Luís Manuel da Silva Viana de Sá. Maria Odete dos Santos. Miguel Urbano Tavares Rodrigues. Octávio Augusto Teixeira. Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social- Partido Popular (CDS-PP):
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró. Narana Sinai Coissoró. Rui Manuel Pereira Marques.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia. 15abel Maria de Almeida e Castro.
Deputados independentes:
Mário António Baptista Tomé. Raúl Fernandes de Morais e Castro. Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
ANTES DA ORDEM DO DIA
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta da entrada na Mesa de diplomas, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os projectos de lei n.ºs 523/VI- Elevação da vila do Cartaxo a cidade (apresentado pelos Deputados do PS Jorge Lacão e Alberto Avelino), que baixou à 5.ª Comissão, 524/VI - Elevação da povoação de Salzedas, no concelho de Tarouca, à categoria de vila (apresentado pelo Deputado do PSD José Cesário), que baixou à 5.ª Comissão, 525/VI - Altera a natureza da Guarda Nacional Republicana e consagra um novo regime de direitos para os seus profissionais, incluindo o princípio do horário de trabalho (PCP), que baixou à 1ª Comissão, e 526/VI - Adopta medidas para promover a celeridade e a dignificação da justiça penal, alterando os artigos 117.º e 337.º do Código de Processo Penal e 359.º do Código Penal (PS), que baixou à 1ª Comissão, e os votos n.ºs 139/VI- De pesar pelo falecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os Verdes) e 140/VI - De protesto pela invasão do Iraque pelo exército turco (PCP).
Nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo e aos Ministérios das Finanças e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Paulo Cunha; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Caio Roque e Joel Hasse Ferreira; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Jaime Gama; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados Ana Maria Bettencourt, António Murteira, João Rui de Almeida e Crisóstomo Teixeira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Manuel Maia; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, das Finanças e do Emprego e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Rodrigues; aos Ministérios da Educação, do Ambiente e Recursos Naturais e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pela Sr.ª Deputada 15abel Castro; à Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional, formulado pelo Sr. Deputado Lemos Damião; aos Ministérios da Administração Interna e do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelo Sr. Deputado António Alves; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado João Amaral; à Junta Autónoma das Estradas, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lacão; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado Fialho Anastácio; ao
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Governo, ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, à Secretaria de Estado da Cultura e à Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Luís; a diversos Ministérios e à RTP, formulados pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins; ao Sr. Presidente da Assembleia da República, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Sérgio; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Manuel da Silva Azevedo.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Sá, na sessão de 26 de Outubro e no dia 29 de Novembro; Alexandrino Saldanha, na sessão de 3 de Fevereiro, e José Reis Leite, na sessão de 16 de Fevereiro.
Devo ainda anunciar que estão reunidas a Subcomissão de Comércio e Turismo, a partir das 14 horas e 30 minutos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a partir das 15 horas, a Comissão de Saúde e a Subcomissão para a Criação de Municípios, Freguesias, Vilas e Cidades, a partir das 15 horas e 30 minutos, e vão reunir a Comissão de Trabalho, Segurança Social e Família, a partir das 16 horas, e a Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, a partir das 17 horas.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais, devo comunicar à Câmara que recebi de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República uma carta, na qual Sua Excelência exprime o seu veto ao Decreto n.º 183/VI - Altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Novembro (Lei de Imprensa).
A propósito deste veto, tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à leitura da mensagem que S. Ex.ª o Presidente da República dirige à Assembleia da República.
0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a mensagem é do seguinte teor:
No exercício das competências que me são conferidas pelo artigo 139.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, venho devolver, para nova apreciação pela Assembleia da República, o Decreto n.º 183/VI, que altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro (Lei de Imprensa), aprovado no contexto da reapreciação do anterior Decreto n.º 177/VI, que vetei, pelas razões então expressas em mensagem fundamentada dirigida a essa Assembleia.
São bem conhecidas as vicissitudes por que tem passado o processo legislativo que visa introduzir alterações à Lei de Imprensa. Sendo, igualmente, bem conhecidas as reservas e os juízos políticos negativos que faço a propósito deste decreto da Assembleia da República, não deve causar estranheza que, em consciência, não o possa promulgar sem antes solicitar a sua reapreciação, no pressuposto de não estarem esgotadas as vias de diálogo parlamentar, no sentido de se encontrarem soluções de maior equilíbrio entre a liberdade de imprensa e a garantia do direito de resposta.
Estamos- em minha opinião- perante alterações à Lei de Imprensa que impõem sacrifícios desproporcionados às publicações periódicas, que não se revelam necessárias para assegurar o direito de resposta e a que o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 13/95
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veio juntar maior grau de insegurança e de incerteza jurídica.
0 Tribunal Constitucional veio admitir, de facto, como forma de obviar a situações «absurdas» e mesmo «aberrantes» de abuso do direito de resposta, a possibilidade de invocação de causas de justificação de recusa de publicação, sem, contudo as especificar; sem esclarecer como é que essa admissão é compatível com a exclusão pelo legislador de motivos subjectivos de recusa- exclusão que, de acordo com o próprio Acórdão, está na base da solução legal em causa - e, finalmente, sem explicar como harmonizar essa admissão com a expressa e deliberada exclusão legal da recusa de publicação.
0 Tribunal Constitucional entendeu, também, que a multa antecipadamente estabelecida para o hipotético incumprimento da sentença que ordene a publicação de uma resposta anteriormente recusada, não só tem a natureza de «sanção pecuniária compulsória», deixando, assim, o incumprimento dessa decisão judicial de ter qualquer tutela penal, como substitui a condenação pelo crime de desobediência, devendo considerar-se «tacitamente revogada» a norma que o prevê, apesar de o legislador, aparentemente, não o ter pretendido.
Face a esta intervenção «correctora» do Tribunal Constitucional, julgo que deverá ser dada a última palavra à Assembleia da República, a qual é, constitucionalmente, o órgão legislativo por excelência. Partilho, de facto, a opinião de um prestigiado constitucionalista quando, a propósito, afirma: «o decreto que sai do Palácio Ratton não é igual ao que lá entrou, porque o Tribunal, a pretexto de salvar algumas das suas normas da inconstitucionalidade, alterou o sentido com que elas tinharn saído do Palácio de S. Bento» (Vital Moreira, «0 direito de resposta, a liberdade de imprensa e a Constituição», Revista do Ministério Público).
Acresce que continuo a julgar que o quadro sancionatório previsto para a violação do regime do direito de resposta é extremamente repressivo e fortemente punitivo, podendo conduzir a formas de auto-restrição, de natureza censória, e, mesmo, em situações facilmente identificáveis - periódicos locais de reduzida tiragem e jornais mensais ou semanais de pequena circulação - à ruptura do equilíbrio económico-financeiro das empresas jornalísticas.
Reitero, ainda, a minha apreensão relativamente à diferença de tratamento, que agora se pretende criar, entre o regime do direito de resposta na imprensa e o regime do direito de resposta na rádio e na televisão, a qual se traduz no estabelecimento, sem qualquer justificação razoável, de um regime discriminatório, extraordinariamente mais gravoso, para a imprensa.
Constitui, finalmente, motivo da minha preocupação- que mais uma vez aqui convoco à reflexão serena dos Srs. Deputados - o facto de as alterações ao regime do direito de resposta previstas neste decreto poderem conduzir à abolição de aspectos essenciais desse regime, ao não assegurarem eficazmente a sua função enquanto direito de defesa «em condições de igualdade e eficácia».
São estes, em suma, os fundamentos que expressam a minha discordância e a minha apreensão relativamente a este decreto e que julgo merecerem da
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Assembleia da República a reapreciação que solicito, na certeza de que a liberdade de imprensa e o direito de resposta, como direitos fundamentais de nível constitucional, não podem conviver com os eIementos de insegurança e de incerteza jurídica que ele comporta.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, recebida a mensagem de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, nos termos do n.º 1 do artigo 169.º do Regimento da Assembleia da República, a partir do 15.º dia a contar de hoje, convocarei uma reunião plenária para apreciar, pela segunda vez, este diploma.
Um segundo ponto tem a ver com o facto doloroso, sobretudo para com um dos nossos Deputados, do falecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim.
Quero, em meu nome pessoal, exprimir ao Sr. Deputado José Vera Jardim o quanto sinto o seu desgosto e o quanto admirei a obra do senhor seu pai, não só como jurisconsulto e conselheiro ilustre como também pelo homem que soube assumir e exercer com discrição e eficiência o papel de dirigente máximo da Comissão Nacional de Eleições.
Apresento, pois, em meu nome pessoal e da Mesa, ao Sr. Deputado José Vera Jardim, os nossos sentimentos.
0 Sr. Secretário vai proceder à leitura do voto n.º 139/VI - De pesar pelo falecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim, subscrito pelo Presidente da AR e por representantes de todos os grupos parlamentares.
0 Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
No passado dia 23 de Março, faleceu em Lisboa o Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim.
0 Conselheiro Vera Jardim, para além de jurista eminente e magistrado impoluto, a quem a justiça, em Portugal, muito ficou a dever, foi também um ilustre democrata, defensor acérrimo do Estado de direito e dos Direitos Fundamentais.
Já depois da sua longa e brilhante carreira de magistrado, o Conselheiro Vera Jardim desempenhou as funções de Presidente da Comissão Nacional de Eleições, sendo mesmo o primeiro Presidente daquele órgão, numa altura em que, ao darem-se os primeiros passos na organização de eleições democráticas em Portugal, a intervenção da Comissão Nacional de Eleições se revelou da maior importância, designadamente na pedagogia cívica que conduziu à correcção e serenidade com que decorreram, de uma forma geral, os actos eleitorais no País.
Não podia, pois, a Assembleia da República, nesta ocasião, deixar de manifestar o seu pesar à família do Conselheiro Vera Jardim e em particular ao seu filho, o Sr. Deputado José Eduardo Vera Jardim.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o
Sr. Deputado Guilherme Silva.
0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Vera Jardim, é com particular emoção que uso da palavra a propósito do voto de pesar pelo falecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim. E faço-o por duas razões: não
só pela reconhecida pessoa e obra do Sr. Dr. Vera Jardim mas também pela circunstância, dolorosa e acidental, de me encontrar com o Sr. Deputado José Vera Jardim numa missão parlamentar no estrangeiro, quando o Sr. Deputado recebeu a ingrata notícia do falecimento do seu pai.
É óbvio que toda a delegação parlamentar, no dever que se impunha, acompanhou o Sr. Deputado José Vera Jardim desde esse momento até ao seu regresso, que teve, infelizmente, de processar-se de imediato a Portugal.
Por isso, também não podia ter deixado de redigir este voto que, gostosa e pesadamente, pela razão de ser que ele envolve, entendi que devia ser no sentido que foi manifestado na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, pelo consenso que ele necessariamente encerra, subscrito por todos os grupos parlamentares.
Como advogado, ainda tive o privilégio de, em casos concretos, «beneficiar» dos acórdãos relatados pelo Sr. Conselheiro Vera Jardim. E digo «beneficiar», independentemente de saber se perdi ou ganhei essas acções, porque sei que elas foram decididas com justiça e com uma fundamentação de direito rara nos arestos, que nem sempre têm o desenvolvimento e a profundidade que devem ter. No entanto, no caso dos acórdãos relatados pelo Conselheiro Vera Jardim era notória a sua preocupação de justiça efectiva, por um lado, e de fundamentação de direito, por outro.
Mas, como se diz no voto, que acabou de ser lido pelo Sr. Secretário da Mesa da Assembleia da República, o Conselheiro Vera Jardim não se notabilizou apenas- e teve uma carreira brilhante- como magistrado, cultor e estudioso do Direito, como produtor de doutrina e jurisprudência que marcou a ordem jurídica portuguesa, mas notabilizou-se também como democrata e como servidor público num posto que, no momento em que foi empossado, era particularmente difícil, porque foi o primeiro Presidente da Comissão Nacional de Eleições. Aliás, não se deve menosprezar a acção que a Comissão Nacional de Eleições teve, sob a sua orientação, no papel de pedagogia cívica, que levou- e foi um contributo importante para a Comissão Nacional de Eleições- à forma serena e correcta como se desenvolveram os processos eleitorais em Portugal. Não foi alheia a acção da Comissão Nacional de Eleições a essa circunstância, que muito nos enaltece e enobrece, e não foi alheia todo o saber, toda a prudência e toda a orientação que o Conselheiro Vera Jardim soube dar no exercício dessa sua função, que, sendo nova, não tinha atrás de si qualquer exemplo para que ele pudesse, ter uma orientação. Porém, ele teve o saber e a arte de a desempenhar nessa novidade e nesse sentido democrático superior que cultivou toda a sua vida.
Eu próprio e o Grupo Parlamentar do PSD não podemos deixar de associar-nos ao pesar que, neste momento, quero transmitir à família do Sr. Conselheiro Vera Jardim através do nosso companheiro e Deputado José Eduardo Vera Jardim.
Aplausos gerais.
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0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
0 Sr.Luís Sá (PCP):- Sr. Presidente, Sr.Deputado José Vera Jardim, já aqui foi referido, e consta do próprio voto, o conjunto de qualidades do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim, quer como magistrado ilustre quer como Presidente da Comissão Nacional de Eleições.
Quero dizer à Câmara que tive oportunidade de ser membro da Comissão Nacional de Eleições tendo como Presidente o Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim e que me habituei a admirar a rara junção de isenção política, de empenhamento democrático profundo, de cultura jurídica e de trato afável e amigo para todos os que com ele lidaram.
Creio também que o papel que desempenhou, em particular nos primeiros tempos da Comissão Nacional de Eleições, foi extremamente importante.
Gostaria igualmente de recordar que, ainda há poucos dias, aquando do colóquio que comemorou os 20 anos da Comissão Nacional de Eleições, este papel foi pormenorizadamente lembrado como tendo sido muito importante.
É uma perda para a magistratura portuguesa, para o regime democrático e para todos nós.
Por isso, quero, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, associar-me ao pesar que é transmitido à família do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim e, muito em particular, ao nosso colega Deputado José Vera Jardim, com o qual dei, nos anos 69 e 70, os primeiros passos no mundo do Direito, que, creio, naquelas condições difíceis foram importantes. Talvez o modo como foram dados estes primeiros passos não estivesse completamente dissociado do espírito democrático e da grande cultura jurídica do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim.
0 nosso pesar para o Sr. Deputado José Vera Jardim.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é com grande mágoa que eu e o meu grupo parlamentar registamos o desaparecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim.
Em primeiro lugar, porque como magistrado, através de todos os seus arestos e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - que sempre respeitamos -, deixou uma marca profunda na jurisprudência dos nossos tribunais.
Esta não é uma Câmara de juristas mas, sim, uma Câmara política, e, como é natural, uma revista especializada em Direito não deixará de render-lhe homenagem e mostrar aos juristas o grande contributo que o Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim deu à jurisprudência e doutrina portuguesa.
Nesta Câmara política, temos de render homenagem ao Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim como político, como democrático de raiz, como homem que, por exigência do cargo, soube mostrar o que é e como deve funcionar uma comissão nacional de eleições num período extremamente difícil. 15to porque esse era um período em que havia forças políticas contrárias às elei-
ções, à ideia de haver um sufrágio directo e universal, pois eram as primeiras que se realizavam após uma época de quase 40 anos onde toda a propaganda era anti-parlamentar e anti-eleições. Ora, nesse mesmo período nem o povo nem as elites sabiam verdadeiramente o que era uma eleição devido à horrível propaganda de que o povo devia abster-se, pois não estava instruído para exercer o seu direito de voto, e que as eleições não deviam realizar-se.
Porém, quando nesta altura se marcaram eleições, alguns desejavam que o povo mostrasse, fora do Parlamento, neste caso da Constituinte, a sua força revolucionária. Nesse período extremamente conturbado as forças que hoje nos acompanham na grande cruzada democrática também contribuíram para que não houvesse eleições, para que todos se abstivessem. Tudo fizeram para que não houvesse a Constituinte! Mas foi o Conselheiro Adriano Vera Jardim que, remando contra todas as marés, contra tudo, fixou verdadeiramente o momento da realização das eleições e a maneira como se realizaram.
Como disse uma vez Salgado Zenha «o povo votou feliz, nunca se viu tanta felicidade no rosto do povo». Um jornal inglês escreveu o seguinte: «Diziam que o povo português não sabia votar, pois nunca o tinha feito ao longo de 50 anos. Votou como mestre!». Realmente o povo mostrou, contra tudo e todos, o seu rosto e que sabia votar. Votou como mestre!
Estas eleições ficaram a dever-se ao povo, que é seu agente, actor e autor, e, sobretudo, à Comissão Nacional de Eleições presidida pelo Conselheiro Adriano Vera Jardim.
É por essa razão que queremos render-lhe hoje a nossa homenagem.
Queremos transmitir a nossa dor, a nossa solidariedade, os nossos pêsames à família enlutada, em particular ao nosso colega José Vera Jardim, e pedir a Deus que o guarde na sua companhia.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Castro.
0 Sr. Raúl Castro (Indep.): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a morte do Conselheiro Vera Jardim é uma dupla perda nacional: por um lado, desapareceu um dos mais ilustres juristas portugueses, um dos mais ilustres juízes do Supremo Tribunal de Justiça e, por outro, perdemos um homem que, à frente da Comissão Nacional de Eleições, presidiu às primeiras eleições livres que se realizaram em Portugal depois de 50 anos de fascismo, sabendo, em todas as emergências, estar à altura das suas funções.
É por esta dupla perda nacional que nos associamos ao voto de pesar apresentado.
Neste momento, queremos, em especial, manifestar o nosso sentido pesar à família do Conselheiro Vera Jardim, em especial a seu filho, Sr. Deputado José Vera Jardim.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.
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0 Sr. Manuel Sérgio (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, não sou um homem do Direito e, como tal, não me é possível analisar em extensão e com profundidade a obra do senhor seu pai como criador, como produtor de ciência jurídica. Porém, sou um português, sou um homem - e também gostaria de dizer que, como homem, nada do que é humano me é alheio- e não me passou despercebida a luta de seu pai por um Portugal democrático.
Não sendo eu um homem do Direito, mas sabendo que o senhor seu pai foi um autêntico, um verdadeiro democrata, quero, neste momento, sem qualquer tibieza, associar-me ao voto de pesar que esta Assembleia da República acaba de expressar a V. Ex.ª e a Sua Excelentíssima Família.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.
A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero tão-só exprimir, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, a razão pela qual nos associamos a este voto de pesar.
As qualidades, como jurista e como magistrado, do Conselheiro Adriano Vera Jardim já foram por demais sublinhadas por todos aqueles que tiveram possibilidade de com ele privar e de o conhecer directamente.
Perante as suas qualidades humanas, que também já foram aqui referidas, manifestamos igualmente o nosso respeito.
Neste sentido, não podemos deixar de subscrever este voto de pesar por aquilo que ele significa e de transmitir ao nosso colega José Vera Jardim os nossos sentidos pêsames.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.
0 Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Vera Jardim, só a circunstância de o Presidente do nosso partido, Sr. Deputado Almeida Santos, não poder estar presente é que justifica que seja eu, em nome do Partido Socialista, a associar-me a este voto de pesar.
0 falecimento do Sr. Conselheiro Vera Jardim enluta a comunidade jurídica, a magistratura portuguesa, a comunidade democrática e a democracia portuguesa.
Enluta a comunidade jurídica porque, tal como já foi referido, o Sr. Conselheiro Vera Jardim foi um jurista eminente que deixou uma obra prestigiada, e consultada ainda nos nossos dias, na área do Direito, que enriqueceu a doutrina e a jurisprudência portuguesa.
Enluta a magistratura porque, para além de jurista, o Sr. Conselheiro Vera Jardim encarnou as virtudes de um magistrado íntegro, tendo sido, em Portugal, um dos mais jovens juízes de sempre a ascender ao Supremo Tribunal de Justiça.
Enluta, ainda, a comunidade democrática porque o Sr. Conselheiro Vera Jardim, num momento em que
era difícil assumir a democracia, os valores democráticos e a defesa dos Direitos Fundamentais, distinguiu-se nessa batalha com a firmeza das suas convicções, tendo tido oportunidade de dar um contributo fundamental para a institucionalização da democracia através da presidência da Comissão Nacional de Eleições, onde, como já foi aqui sublinhado, teve ocasião de acompanhar e de contribuir, de forma activa, para a regularidade e prestígio das primeiras eleições democráticas realizadas em Portugal depois de uma longa ditadura.
Não é demais sublinhar quanto representou este contributo do direito e da magistratura, encarnado neste eminente jurista português, para que a democracia pudesse institucionalizar-se em Portugal.
Em nome da bancada do Partido Socialista, quero associar-me a este voto de pesar e transmitir à família do Conselheiro Vera Jardim, em particular ao nosso colega Deputado José Vera Jardim, as nossas sinceras condolências.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
0 Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Vera Jardim, quero, muito singelamente, associar-me a este voto de pesar e confessar que só conheci o senhor seu pai no momento em que ele se tornou Presidente da Comissão Nacional de Eleições. Contudo, a partir dessa altura, passei a respeitá-lo muito pelo facto de o relacionar com o êxito que foram as primeiras eleições democráticas no nosso país.
Sr. Deputado José Vera Jardim, queira aceitar as minhas condolências, que torno extensivas a toda a família.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
0 Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros da Mesa, Meus Queridos Colegas: Quero, muito simplesmente, em nome pessoal e em nome da minha família, agradecer as amigas palavras de solidariedade que me dirigiram.
Aplausos gerais.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 139/VI - De pesar pelo falecimento do Sr. Conselheiro Adriano Vera Jardim (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP e Os Verdes).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Peço à Câmara para guardar um minuto de silêncio por intenção do primeiro Presidente da Comissão Nacional de Eleições.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos os trabalhos, gostaria ainda de, em nome da Assembleia da República, exprimir um sentimento de pesar à família do Dr. Suleiman Vali Mamede, de cujo falecimento tive notícia agora mesmo, antes de entrar no Plenário, através de um jornal.
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Neste Ano Internacional da Tolerância, saliento um princípio de civilização que nasceu, sobretudo, na área das relações entre adeptos ou fiéis de religiões diversas e Vali Mamede foi o fundador da comunidade islâmica em Lisboa.
Enviarei à família deste ilustre jurista e homem público os nossos sentimentos de pesar pela sua morte.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
0 Sr. Pacheco Pereira (PSD)- Sr. Presidente, quero associar-me às suas palavras.
0 Dr. Suleiman Vali Mamede era militante do nosso partido e foi fundador da comunidade islâmica em Portugal. Partilhava com todos nós a circunstância de, nas suas escolhas políticas e religiosas, também fazer parte da tradição dos povos do Livro.
Nesse sentido, as nossas condolências dirigem-se à sua família, mas também à comunidade islâmica, em Portugal, que saudamos neste momento, pela perda de um eminente membro.
Aplausos do PSD.
0 Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar e em nome próprio, gostaria de me associar também às palavras de pesar pelo falecimento de Suleiman Vali Mamede, com quem tive oportunidade de trabalhar e, de facto, aprendi muito, designadamente em termos de uma prática quotidiana de tolerância e respeito mútuo.
Aplausos do PS e do PSD.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, transmitirei à família de Suleiman Vali Mamede a expressão dos sentimentos que a Câmara aqui manifestou.
Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Guilherme Silva para interpelar a Mesa, quero referir, com particular alegria, a circunstância de estarem hoje presentes, na galeria dos visitantes ilustres, 15 jovens residentes na Alemanha, luso-descendentes, que vieram à Mãe Pátria apresentar, pelo menos, a sua curiosidade e os seus sentimentos de fraternidade para com os representantes do povo que todos somos.
Agradeço a sua presença e apresento-lhes os nossos cumprimentos.
Aplausos gerais, de pé.
Aos restantes jovens que se encontram a assistir à reunião plenária, da Escola C+S Dr. Daniel de Matos, em Vila Nova de Poiares, da Escola Conde Oeiras e da Escola Secundária Carolina Michaélis, no Porto, apresento também os nossos cumprimentos.
Agora, sim, para nos referir algo de importante que aconteceu numa reunião, na Costa Rica, onde a Assembleia da República esteve representada, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Coube-me a honra, como Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de presidir a uma delegação da Assembleia da República que se deslocou a uma reu-
nião à Costa Rica, a convite da Comissão Interparlamentar Latino-Americana dos Direitos Humanos. Integraram essa delegação o Sr. Deputado José Vera Jardim, que, como referi há pouco, infelizmente, teve de regressar a Portugal antes da abertura dos trabalhos, a Sr.ª Deputada Odete Santos, do PCP, e o Sr. Deputado Miguel Macedo, do PSD.
Quero dizer-vos que foi extremamente gratificante para a delegação portuguesa verificar a forma profunda e elevada como a problemática dos direitos humanos foi debatida nessa reunião e também registar o interesse com que a presença da delegação portuguesa foi acolhida.
A Comissão Interparlamentar Latino-Americana nasceu há cerca de três ou quatro anos, por iniciativa de uma, então, Deputada chilena, a Sr.ª D. Maria Manuela Campos, que sentiu na carne os efeitos da ditadura de Pinochet e se empenhou na criação de uma comissão de direitos humanos no Parlamento chileno, exemplo que foi seguido por muitos parlamentos latino-americanos.
Foi com base na existência dessas comissões que se promoveu esta Comissão Interparlamentar e, ao fim e ao cabo, esta reunião das comissões de direitos humanos dos vários parlamentos latino-americanos, a qual tem tido, desde o seu início, a preocupação de convidar representações dos Parlamentos espanhol e português. Foi, porém, a primeira vez que se proporcionou a presença de Portugal naquela reunião.
As temáticas que foram ali debatidas são de importância universal, como decorria, aliás, naturalmente, da própria temática que estava programada, à cabeça, para esta reunião.
Discutiram-se temas como a primazia das normas internacionais de direitos humanos sobre o direito interno, a primazia das normas de direito internacional público de direitos humanos, o princípio da auto-aplicabilidade das normas internacionais de direitos humanos e a adequação automática do direito interno e criaram-se três comissões, nas quais nos fizemos representar, apesar de já só restarem três Deputados na nossa delegação, depois do infeliz regresso do Sr. Deputado José Vera Jardim.
Uma dessas comissões tratou dos problemas do habeas corpus e do recurso de amparo, outra tratou das questões da fiscalização das administrações públicas dos governos por parte dos parlamentos e uma terceira tratou dos problemas relativos às prerrogativas e imunidades dos parlamentares.
Na reunião da Comissão Interparlamentar estavam representados cerca de 20 países, além de organizações internacionais como as Nações Unidas, a UNESCO, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o Tribunal Interamericano de Direitos Humanos e o Instituto Interamericano de Direitos Humanos, e propiciou-se, aliás, por sugestão do Sr. Deputado José Vera Jardim, ainda antes de partir, submeter à consideração daquela Assembleia, que integrava cerca de 108 parlamentares e senadores, a aprovação de uma proposta de resolução que visava manifestar a sua solidariedade com a luta do povo de Timor Leste pelos direitos humanos e pela autodeterminação. Foi-me particularmente grato recolher a sensibilidade receptiva das várias delegações e poder apresentar essa proposta de resolução já com alguma segurança de que ela viria a ser votada favoravelmente, como aconteceu.
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Essa proposta de resolução, que, repito, foi aprovada por unanimidade, era do seguinte teor: A Comissão Interparlamentar Latino-Americana de Direitos Humanos, reunida em S. José da Costa Rica, de 24 a 26 de Março de 1995, consciente do carácter universal dos direitos humanos, manifesta a sua solidariedade, com o povo de Timor Leste na sua luta pelo respeito dos direitos humanos e pelo direito à autodeterminação, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem e de harmonia com as resoluções da Organização das Nações Unidas referentes a este território.
Não quero terminar sem antes dizer, mais uma vez, uma palavra de lamento pela circunstância de o Sr. Deputado José Vera Jardim não ter podido acompanhar-nos até ao fim, bem como uma palavra relativamente aos demais membros da delegação portuguesa, concretamente a Sr.ª Deputada Odete Santos e o Sr. Deputado Miguel Macedo, que foram inexcedíveis na preocupação de representar o Parlamento português e, afinal, de representar Portugal.
Desdobrámo-nos de forma a acompanhar os trabalhos das diversas comissões e as suas actas registam as nossas intervenções e as nossas propostas. Eu próprio enviei uma comunicação que já tinha remetido anteriormente e foi-me até sugerido que a lesse, mas, para não prejudicar a organização dos trabalhos, pedi que constasse das actas e fosse circulada pelas diferentes delegações, como se verificou.
Assim, parece-me que Portugal e esta Assembleia tiveram um momento de representação adequada, fizemos um esforço nesse sentido e daí resultou um ganho para a questão de Timor Leste, que a todos preocupa.
Queria, pois, dar conta à Câmara e a V. Ex.ª, Sr. Presidente, desta nossa intervenção e representação.
Aplausos do PSD, do PS e do PCP.
0 Sr. Presidente: - Em nome da Câmara, congratulo-me com os Srs. Deputados Guilherme Silva, José Vera Jardim, Odete Santos e Miguel Macedo pelo êxito da delegação que, desta Assembleia, se encaminhou para a Costa Rica e, em particular, pelo sucesso que tiveram na diligência em prol dos direitos humanos do povo de Timor Leste bem como do direito desse povo, no seu conjunto, à autodeterminação.
Muito obrigado e honra vos seja pelo trabalho que fizeram no exterior, em nome da Assembleia.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é por indicação da Mesa que tomo a palavra, porque não me tinha inscrito.
Em todo o caso, devo dizer que o Sr. Deputado Guilherme Silva fez uma exposição muito bem feita sobre o êxito na nossa presença na Costa Rica.
Queria apenas acrescentar que, pela minha parte, também beneficiei de um enriquecimento muito grande no contacto com outras culturas, outros pensamentos políticos, outras formas de organização em democracia. Aprendi com as preocupações daqueles povos em relação a genocídios de populações indígenas, em relação às condições em que muitos deles vivem e que são condições em que, ser político, ser deputado, ser senador, é correr graves riscos - como acontece, por exemplo, na Colômbia. Encantou-me também, sobre-
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maneira, aquele sentimento de receio que existe nesses países em relação a bloqueios económicos que possam ser impostos por razões políticas a qualquer deles e, sobretudo, a denodada convicção de defenderem a sua cultura, a sua forma muito própria de organização democrática, relativamente à qual nenhum país do mundo pode colocar imposições.
De facto, para além do contributo que pôde ser dado pela delegação portuguesa em termos de trocas de experiências, devo dizer que, pessoalmente, muito me enriqueci com as reuniões em que participei.
Aplausos do PCP, do PSD e do PS.
0 Sr. Miranda Calha (PS) - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
0 Sr. Presidente: Tem a palavra,
Sr. Deputado.
0 Sr. Miranda Calha (PS)- Sr. Presidente, a minha interpelação dirige-se directamente a V. Ex.ª.
Na reunião plenária do passado dia 16, o meu colega de bancada, Deputado Eduardo Pereira, falou do atraso no início do funcionamento da Comissão de Inquérito relacionada com o chamado «caso das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico». 0 que é facto é que, não obstante essa interpelação, continua sem funcionar essa comissão: não há reuniões, não é convocada, não são escolhidos os membros que irão constituir a Mesa, pelo que continua por tratar a substância base que foi a razão de ser dessa comissão de inquérito.
Gostava de saber, por parte do Sr. Presidente, que razões existem que obstem ao funcionamento desta comissão, ou se, porventura, haverá razões que desconheçamos para que ela não funcione. Portanto, Sr. Presidente, gostava de saber, de si próprio, quais as razões do atraso em relação ao início do funcionamento desta comissão de inquérito.
Aplausos do PS.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Miranda Calha, como é óbvio, não posso dar-lhe resposta. Com esta comissão, faço o que tenho feito com todas as outras, ou seja, instalei-a, mas não estou informado sobre se está ou não a funcionar. Porém, vou averiguar e, na altura própria, espero que amanhã, direi se está funcionar e, se não estiver, que razões me dão para tal.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.
0 Sr. Rui Carp (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, ouvimos ontem S. Ex.ª o Sr. Presidente da República afirmar, a propósito da reforma do Tratado da União Europeia, que este Tratado só estava a ser discutido a nível técnico e a nível interno.
Ora, na parte que nos toca - e quando digo «nos», estou a falar em nome de todos os Deputados que compõem a Comissão de Assuntos Europeus e outras comissões parlamentares, como a de Economia, Finanças e Plano, para não falar noutras a que não pertenço -, temos feito um conjunto de debates que não são meramente internos à Assembleia da República nem às respectivas comissões, mas que têm tido uma componente essencialmente política, chamando e apelando às universidades e à juventude, bem como a todos
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os representantes da sociedade civil, no sentido de reflectirem e transmitirem à Assembleia - órgão constitucional de representação dos portugueses - as suas opiniões, os seus comentários.
Como dessas afirmações de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República nos parece que ele está não convenientemente informado e não obstante, ainda hoje de manhã, em reunião da Comissão de Assuntos Europeus, com o Sr. Ministro do Planeamento e Administração do Território, ter sido dito pelo Sr. Presidente desta Comissão que a Casa Civil e Militar e, naturalmente, a Presidência da República constam do mailing da Assembleia da República, peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, que envie em duplicado, se possível, a S. Ex.ª o Presidente da República os documentos, os relatórios, as publicações e as actas de todos os debates que têm sido feitos nos últimos meses na Assembleia da República. Faço este pedido porque desconfiamos que haja alguns transvio da documentação, que se extradita alguma documentação.
Penso que o Sr. Presidente da República merece, e tem o direito, de ser informado dos numerosos debates e do vasto trabalho, que não é técnico mas político, que tem sido feito na Assembleia da República, para que não volte a repetir as afirmações que fez e que consideramos injustas para este órgão de soberania, que é Assembleia da República.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Dado que se trata de uma interpelação à Mesa, esta vai responder através de mim próprio e sob minha exclusiva responsabilidade: essa não é uma pergunta nem é uma interpelação que se faça ao Presidente da Assembleia da República!
Vozes do PS: - Muito bem!
0 Orador: - Eu não sou correio dos Srs. Deputados para nenhum outro órgão de soberania.
Aplausos do PS e do PCP.
Quando VV. Ex.ªs entenderem dirigir a palavra ao Sr. Presidente da República, têm os vossos meios.
0 Sr. Luís Peixoto (PCP): - Escusavam de ouvir isto!
0 Orador:- 0 Presidente da Assembleia da República relaciona-se com o Presidente da República segundo as regras e formas constitucionais aplicáveis.
Aplausos do PS.
0 Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.
0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, na sequência da informação que V. Ex.ª acabou de nos transmitir, peço a palavra para interpelar a Mesa.
0 Sr. Presidente: - Informam-me os Serviços que a interpelação passa à frente do protesto, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.
0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que esta interpelação não tem a mínima carga de
crítica pessoal nem institucional a V. Ex.ª, nem sequer ao Sr. Presidente da República,...
Risos do PS.
... enquanto destinatário de uma informação que consideramos essencial e que é esta.
Por isso, interpelo a Mesa no sentido de aclarar essa informação que V. Ex.ª acabou de nos transmitir, dizendo qual é o meio de transmissão dos trabalhos que têm sido feitos no Parlamento ao Sr. Presidente da República. Esse é que é o nosso objectivo. Como é que podemos informar o Sr. Presidente da República do vasto trabalho que este Parlamento tem feito nessa matéria?
0 Sr. José Magalhães (PS): - Mandem-lhe uma gravação vídeo! Compilem uma antologia!
0 Orador: - Os portugueses que nos elegeram têm o direito de saber como é que podemos corrigir uma lacuna de informação do Sr. Presidente da República!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço a sua segunda interpelação e gostaria de acrescentar que a minha resposta também nada tem de pessoal; é apenas uma resposta institucional, que mantenho, também, na íntegra.
Suponho que todo o trabalho desta Câmara está sob a luz da publicidade e não sob o «manto diáfano da fantasia», como diria o escritor. Assim, todos os que queiram e devam informar-se acerca do nosso trabalho, podem fazê-lo. A partir daqui, em matéria de informação, o Presidente da Assembleia da República nada mais fará. Ficou esclarecido este incidente.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
0 Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, apenas queria dizer que protestamos contra as afirmações do Sr. Deputado Rui Carp, que poderiam levar a pensar que o Grupo Parlamentar do PS estaria minimamente de acordo com aquilo que ele disse; bem pelo contrário, não estamos. Não fomos parte, nem muito nem pouco, em qualquer deliberação, a nível de Comissão de Assuntos Europeus ou de qualquer outro órgão, que fosse nesse sentido.
Na medida em que V. Ex.ª, Sr. Presidente, acabou de esclarecer cabalmente o assunto e na medida em que a doutrina que V. Ex.ª produziu é a doutrina exacta que encerra o assunto, permito-me apenas dizer ao Sr. Deputado Rui Carp que não traga para esta Assembleia, em nome dos diversos grupos que a constituem, uma chicana que é, pura e simplesmente, do PSD.
Aplausos do PS.
0 Sr. Presidente: - Para fazer um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.
0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, vou contraprotestar relativamente às afirmações do Sr. Deputa-
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do João Cravinho, que também é membro da Comissão de Assuntos Europeus, neste sentido: é que cada um sente-se insultado à sua maneira pela forma como outros órgãos de soberania se dirigem a esta Assembleia. Eu senti-me, de facto, atingido quando, ontem, ouvi afirmações que pressupõem que a Assembleia da República não tem debatido este magno problema. 0 Sr. Deputado João Cravinho entende, à sua maneira, a maneira de defender a Assembleia. Cada um entende da sua maneira! Nós entendemos - e agradeço ao Sr. Presidente da Assembleia da República a clarificação que fez - que é preciso que o Sr. Presidente da República esteja informado acerca das reuniões que esta Assembleia tem feito, em sede de comissão, com membros do Governo, frequentes vezes, com universitários, com representantes da sociedade civil, etc.
Mas há algo que é indiscutível e que é preciso dizer alto e bom som: a Assembleia da República tem estado a preparar a reforma do Tratado da União Europeia a um nível que está a ser elogiado por parlamentos de outros países.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Orador: - Nós estamos no pelotão da frente...
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Até que enfim!
Risos do PS.
0 Orador: - ... e queremos continuar.
Aplausos do PSD.
Se há alguém que quer transmitir ocultismos, se há alguém que quer transmitir secretismos, se há alguém que quer dizer que não há debate, pois que prove isso mesmo. Nós sentimo-nos, conscientemente, a fazer aquilo que podemos, que nunca é suficiente mas é mais do que o que sucedeu no passado.
Protestos do PS.
Nós insistimos: o Governo tem vindo à Assembleia discutir com o Parlamento; o Parlamento tem procurado consultar e consultar-se nesta matéria e, para o provar, estão aí as discussões no âmbito das conferências com os outros parlamentos, bem como as actas das Comissões de Assuntos Europeus, de Economia, Finanças e Plano e de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação. Está, pois, em curso um vasto debate - aliás, ainda hoje, na Comissão de Assuntos Europeus, aprovámos mais um debate fora da Assembleia. Dizer que o Parlamento e o Governo estão a discutir esta questão em secretismo só pode levar-nos à seguinte conclusão: o Sr. Presidente da República está mal informado, está a dar a ideia de que está distraído.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Essa é boa!
0 Orador: - Nós não queremos embarcar nessa linha e, por isso, volto a repetir, todos não seremos demais para dizer ao Sr. Presidente da República que a Assembleia está bem activa. Oxalá que outros órgãos, que não o Governo nem a Assembleia, possam estar com esse mesmo espírito!
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, não planeávamos intervir nesta discussão porque não queremos contribuir para
o esforço de produção de anormalidade em que
o Grupo Parlamentar do PSD está constantemente empenhado.
Vozes do PS: - Muito bem!
0 Orador: - Acontece que o Sr. Deputado Rui Carp, ao verificar que esta sua iniciativa não estava a encontrar no Plenário o acolhimento que ele desejaria, resolveu, além da interpelação ao comportamento do Sr. Presidente da República, além da interpelação à Presidência desta Assembleia, interpelar o comportamento dos restantes grupos parlamentares, pelo que, da nossa parte, vai ouvir a seguinte resposta: o Sr. Deputado Rui Carp não pode, através de actas de reuniões de comissões desta Assembleia, substituir ou anular a confidencial idade a que está associado todo o processo de revisão do Tratado de Maastricht, assim como esteve associado a própria construção do mesmo Tratado. Aliás, o problema não é apenas de publicidade mas também de legitimação democrática da ratificação e, agora, da revisão, em Portugal, desse mesmo Tratado da União Europeia que deve ser feita pelo povo português, o detentor da sua própria soberania.
Sr. Deputado, se está a considerar que é inadmissível que o Sr. Presidente da República não conheça as actas das reuniões das comissões, ou seja, se o próprio Presidente da República não conhece em detalhe os trabalhos das comissões da Assembleia, como é que o povo português pode conhecê-las? Como é que esse não conhecimento ou esse pretenso conhecimento pode substituir, perante o povo português, o debate e o esclarecimento necessários para que as próximas eleições legislativas possam conferir aos Deputados eleitos um mandato claro, inequívoco e democraticamente válido para, amanhã, poderem ratificar a revisão do Tratado de Maastricht? É uma questão que o Partido Popular e outros agentes políticos têm colocado, nomeadamente ao partido da maioria, mas também ao Partido Socialista. Ou seja, como é possível caminharmos para as próximas eleições sem que esta questão vital para o futuro do nosso país seja debatida e levada ao conhecimento do eleitorado para que o seu voto também signifique esse mesmo mandato?!
Já agora, gostaria de perguntar ao Grupo Parlamentar do PSD, que, há alguns meses, fez ampla publicidade de que queria transformar esta sessão legislativa numa sessão de debates dos problemas que afectam o povo português e que anunciou uma lista...
0 Sr. Presidente: - Esgotou o tempo, Sr. Deputado.
0 Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, gostaria de perguntar ao Grupo Parlamentar do PSD, que, há alguns meses, fez ampla publicidade de que queria transformar esta sessão legislativa numa sessão de debates dos problemas que afectam o povo português e que anunciou uma lis-
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ta de assuntos que iria trazer ao debate desta Assembleia, como é que se atreve, após meses de omissão nessa matéria, a levantar a questão...
0 Sr. Presidente: - Tem de concluir, Sr. Deputado.
0 Orador: - ... de um debate, em comissão, sobre a revisão do Tratado de Maastricht, Tratado que foi imposto em Portugal sem referendo e sem debate.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o
Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. 0ctávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, começo por dizer que não aceitamos que o Sr. Deputado Rui Carp se sinta ofendido em nosso nome. Pode sentir-se ofendido em nome do Grupo Parlamentar do PSD, não pode sentir-se ofendido em nome da Assembleia da República, pois, pelo menos pela nossa parte, não lhe passamos procuração para isso.
Por outro lado, quero ainda referir que as afirmações que tive oportunidade de ouvir ontem do Sr. Presidente da República não têm nada de ofensivo para a Assembleia e, muito pelo contrário, devem ser entendidas, se assim o quiserem, por todos os partidos como um alerta para aquilo que é necessário fazer.
Assim, é necessário que o povo português seja esclarecido sobre aquilo que cada um de nós pretende e propõe em relação à alteração do Tratado da União Europeia para que não aconteça o que se passou antes aquando da aprovação do Tratado da União Europeia em que o PSD e o PS recusaram que o assunto fosse discutido junto do povo português.
Vozes do PCP: - Muito bem!
0 Orador: - Para o PSD e para o Sr. Deputado Rui Carp o conceito de sociedade civil é muito estreito, confina apenas alguns deputados e alguns académicos. Aliás, pode ter todo o interesse em que esses problemas sejam discutidos com académicos mas não pode restringir a sociedade civil a esses elementos pois a sociedade é muito mais ampla. E recordaria ao Sr. Deputado que, mesmo em sede das reuniões da comissão, os senhores ainda não deram o vosso acordo - e já propusemos várias vezes - a que houvesse uma discussão com as centrais sindicais e patronais. Os senhores continuam a não dar acordo sequer para isso!
Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer que, lógica e naturalmente, neste processo de guerrilha permanente que o PSD vai continuar a manter em relação ao Sr. Presidente da República, o Sr. Deputado Rui Carp, hoje, tentou aproveitar esta oportunidade para, numa coisa apenas, mostrar que afinal se concretizaram as promessas do actual Primeiro-Ministro, do PSD e do seu governo designadamente a de passarmos ao pelotão da frente. 0 Sr. Deputado Rui Carp conseguiu encontrar um ponto em que, pelos vistos, passámos ao pelotão da frente: no número de reuniões da Comissão de Assuntos Europeus. Aí ficámos no pelotão da frente. Só que fique-se com essa, Sr. Deputado Rui Carp, porque não é o pelotão da frente que interessa aos portugueses.
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Aplausos do PCP.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, na sequência desta intervenção do Sr. Deputado Rui Carp, que, aliás, nos deu aqui uma sugestão que nos fez lembrar outros tempos ao referir que «todos não seremos demais» e dos quais porventura estará saudoso,...
0 Sr. Rui Carp (PSD):- Nem tudo era mau!.
0 Orador:- ... quero aproveitar para dar uma sugestão e um exemplo.
A sugestão é a de que o Sr. Deputado Rui Carp apresente esses documentos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros porque ele disse ontem na televisão que era prematuro estar a trabalhar sobre tal matéria. Portanto, VV. Ex.ªs faziam um bem à Pátria se agarrassem nessa documentação e a mandassem ao Sr. Ministro que, por sinal, tem em si um apoiante, como todo nós sabemos.
Em segundo lugar, um exemplo, o do governo espanhol que apresentou às Cortes Espanholas o documento «As Bases da Reflexão para a Conferência Intergovernamental de 1996», que vai igualmente apresentar para debate público.
Vozes do PS: - Muito bem!
0 Orador: - Aliás, posso oferecer-lhe um exemplar do documento para que conheça e assim verá que não é pioneiro e, por conseguinte, não é muito próprio aquilo que disse.
Aplausos do PS.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp, por um minuto.
0 Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, vou tentar ser breve mas houve três ilustres deputados que me antecederam e se referiram à minha intervenção.
Começo pelo Sr. Deputado Manuel Queiró. Sr. Deputado, quem procura anormalidade não é quem procura esclarecer o Sr. Presidente da República, é quem anda, se calhar, a tentar boicotar os trabalhos do gasoduto.
Aplausos do PSD.
Além disso, gostava que o Sr. Deputado confirmasse se é verdade que o seu líder partidário faltou a importantes reuniões, há poucos dias, no Parlamento Europeu relativas aos têxteis e ao contencioso com o Canadá em matéria de pesca fora das águas territoriais desse país.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Finalmente, no que respeita à revisão do Tratado, gostávamos de saber, quais foram as intervenções, e de que tipo, do líder do PP no Parlamento europeu. Tínhamos interesse em conhecê-las.
0 Sr. Presidente: - Terminou o minuto que lhe concedi, Sr. Deputado.
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0 Orador: - Sr. Presidente, termino já, mas antes deixe-me dizer que concordo inteiramente com o que disse o Sr. Deputado Octávio Teixeira. É preciso colmatar a falta de debate que houve aquando do Tratado de Maastricht e por isso é que ainda hoje o PSD concordou com mais uma audição das entidades que aquele Sr. Deputado referiu e que, aliás, foram propostas pelo seu colega de bancada, António Murteira.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, VV. Ex.ªs estão descoordenados!
Relativamente ao que disse o Sr. Deputado Miranda Calha quero corrigir uma coisa. Primeiro, gostávamos de saber se esse documento das Cortes Espanholas tem tudo o que o governo espanhol pensa sobre o assunto; em segundo lugar, se nós vamos fazer reflexões com os portugueses tendo já posições definitivas, como VV. Ex.ªs queriam que o Governo tivesse neste momento - e não deve ter -, para que serviam os debates? Os debates, as reflexões servem para se recolherem informações.
Os senhores são cada vez mais contraditórios, mas já estamos habituados. Ainda há pouco tempo o líder do seu partido disse que ouviu 30 000 pessoas nos Estudos Gerais ou Estados Gerais do Partido Socialista e ao mesmo tempo há um cartaz que diz que o líder do Partido Socialista sabe o que quer para o País. Se sabe o que quer então porque ouviu 30 000 pessoas?!
Nesta matéria somos mais modestos e queremos chegar ao essencial, queremos que os portugueses estejam esclarecidos e que o Sr. Presidente da República esteja bem informado porque até agora parece-nos que não está.
De outra maneira, Sr. Deputado Miranda Calha, a sua intervenção faz-nos lembrar o antigamente.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em resposta geral, quero lembrar à Câmara que estou disponível para marcar, nos termos regimentais, todos os debates que forem solicitados. Façam o pedido em termos formais e discutiremos tudo aquilo que deve ser discutido.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem! Para a semana...
0 Sr. Presidente: - E agora aproveito para informar, a pedido do respectivo presidente, que a 1.ª Comissão vai reunir.
Para uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
0 Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1985 deu-se início a uma verdadeira revolução em Portugal, cujos efeitos hoje são bem visíveis, embora ainda não esteja concluída. Estou a referir-me à mudança total das infra-estruturas rodoviárias do País encetada pelos governos do Professor Cavaco Silva.
0 investimento em infra-estruturas, que melhore as acessibilidades entre os diversos pontos do País, entre o Norte e o Sul, entre o Interior e o Litoral, é algo de fundamental para o desenvolvimento económico global e para uma política de desenvolvimento regional. Melhorando as acessibilidades, diminuem as distânci-
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as entre pólos urbanos, entre centros produtores e centros consumidores, o que tem como consequência uma diminuição dos custos de transporte, contribuindo para um aumento da competitividade das empresas nacionais. Do ponto de vista do economista, este é um custo tão importante como o da energia, ou da mão-de-obra, e, nestes 10 anos, graças à acção persistente do Governo nesta área e aos investimentos que foram realizados, este custo tem sofrido significativas reduções.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o investimento em acessibilidades é igualmente importante como instrumento de desenvolvimento regional. Reduzindo-se as distâncias entre o Interior e o Litoral, entre zonas menos e mais desenvolvidas, está-se a desincentivar a migração para as grandes metrópoles, onde as pessoas acabam por encontrar condições de vida piores do que aquelas que tinham na sua localidade de origem.
Congratulo-me, pois, com a política prosseguida cujos efeitos estão à vista de todos os portugueses. No entanto, há alguns a dizer que basta de investimentos em infra-estruturas ou que a sua prioridade seria outra. Esses só fazem esse discurso por um de dois motivos: ou tentam menosprezar a obra feita nos últimos 10 anos, o que temos de reconhecer ser muito difícil, porque ela é bem visível, ou não conhecem o país real nem compreendem o benefício que estes investimentos trouxeram aos portugueses. Era bom que esses fossem mais concretos e que especificassem, na área das infra-estruturas rodoviárias, qual a obra que foi feita a mais, e quais as que não farão se porventura chegarem ao poder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A esta revolução pacífica que atravessou o País, a Região Oeste não ficou indiferente. Muitos têm sido os milhões dispendidos na região, em reparação de estradas já existentes ou na abertura de novas vias de comunicação. São obras feitas na região pelo poder central, com verbas do Orçamento do Estado, fundamentais para o desenvolvimento da região, mas que ainda não vi serem saudadas pelos autarcas socialistas e comunistas, tão apressados que são a criticar o Governo por investir pouco na região ou a reivindicar mais verbas para os seus municípios.
A obra de maior impacto estrutural é a auto-estrada de Lisboa até Torres Vedras, nomeadamente o troço Malveira-Torres, o qual estará concluído até ao fim do ano. Esta obra que coloca a capital da região a 20 minutos da capital do País tem uma grande relevância, nomeadamente para os produtores agrícolas da região, que abastecem diariamente Lisboa de produtos frescos. As obras em curso correspondem a um investimento previsional de 12,3 milhões de contos, desdobrando-se este investimento na via propriamente dita e ainda nos nós de Lousa e da Malveira que estarão concluídos no início do segundo semestre deste ano, no nó de Torres Vedras a concluir antes do fim do ano e no nó de Pero Negro (em Sobral de Monte Agraço) a concluir no 2.º trimestre de 1996. 0 prolongamento desta via, de Torres Vedras até ao Bombarral, já foi lançada numa extensão de 24 Km, o que, incluindo a variante da cidade de Torres Vedras, corresponderá a um investimento de 13,5 milhões de contos. Nesta fase, surgiu um obstáculo, uma necrópole, no entanto, estou confiante que será superado a contento de todos.
Mas, nesta legislatura, os investimentos em infra-estruturas rodoviárias não se ficaram pela auto-estrada. Têm sido diversas as obras de reparação nas estradas
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da região, correspondendo a investimentos de milhões de contos, de onde destaco como exemplo: a beneficiação da estrada Arruda-Sobral-Runa; a beneficiação da estrada Cadaval-Cercal, no valor de 300000 contos; a beneficiação da estrada Sobral de Monte Agraço-Loures, no valor de 700 000 contos; a beneficiação da estrada Alto da Foz-Reguengo Grande, no valor de 100000 contos; a beneficiação da estrada Loures-Torres Vedras, no valor de 600000 contos; a beneficiação da estrada Arruda dos Vinhos-Sobral.
No entanto, a região necessita que o Governo central continue a investir nas infra-estruturas rodoviárias. Temos a consciência de que o Governo não baixou os braços e persiste a preparar o futuro do País.
Dentro destes projectos, destaco pela sua importância: o lançamento para o ano de 1996 da AE10, autoestrada que ligará Bucelas ao Carregado, com um nó de saída em Arruda dos Vinhos. Esta via estará concluída em finais de 1998 e corresponde a um investimento de 16 milhões de contos e a construção do IC 11, de Torres Vedras até à Marateca, cujos estudos estão avançados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De tudo o que foi exposto, evidencio a minha satisfação pela política prosseguida pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações em especial pela atenção que tem dado à Região Oeste.
A revolução pacífica iniciada em 1985 tem mudado a face do País e também a da minha região. Persistem necessidades, que, no entanto, não podem pôr em causa a obra feita. Mas é precisamente para fazer face a essas necessidades que esta política tem de ser prosseguida, para bem do progresso e do desenvolvimento das regiões, para que diminuam as assimetrias regionais; afinal, para o bem de Portugal.
Aplausos do PSD.
0 Sr. PresMente: - Ao abrigo da alínea do n." 2 do artigo 81.º do Regimento, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
0 Sr. MgueU Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas livrarias da Europa apareceu um livro de Eric Hobsbawm que está a merecer atenção especial em todo o mundo: The Age of Extremmes, ou seja, a Era dos Extremos.
Não é uma obra optimista, antes um inventário de calamidades civilizacionais ocorridas numa época em que o homem parecia em condições de desenvolver em benefício próprio potencial idades de prodigiosas conquistas por ele realizadas.
Nesse livro, de que ficará memória, Hobsbawm, talvez o mais importante historiador do nosso tempo, lembra que o século XX finda como século assassino, tempo de hesitações e falta de perspectivas, sem projecto de sociedade, sem rumo, e afirma que os historiadores do próximo milénio terão dificuldade em entender a dramática incapacidade das actuais gerações para se aperceberem da profundidade do desastre que as políticas do liberalismo selvagem iriam provocar, «É quase impossível compreender ... » - escreve - «... como a ortodoxia do mercado livre, tão completamente desacreditada, pôde novamente dominar o período global dos anos 80 e 90».
A lúcida reflexão de Hobsbawm sobre as devastadoras consequências dos falsos milagres económicos
do liberalismo selvagem arrastou-me o pensamento, por associação de ideias, para desastres caseiros, filhos de uma política inspirada em teorias que erigiram o mercado em religião.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No seu desprezo arrogante por lições acumuladas em milénios de história, o Governo do PSD, à medida que se esgota a sua capacidade de enganar o povo, acenando-lhe com a promessa de uma prosperidade imaginária, faz a pior opção: refugia-se na apologia do erro.
Nessa corrida para o abismo, as poucas notas inéditas no discurso oficial são identificáveis na tentativa para persuadir o povo português de que os governantes do PSD, em vez de imitarem receitas estrangeiras, são, afinal, poderosamente inovadores. Essa febre de originalidade manifesta-se agora com intensidade suspeita no campo da política externa, terreno semeado de alçapões e mal conhecido.
Srs. Deputados, a Presidência portuguesa na União da Europa Ocidental - UEO veio proporcionar ao Governo a oportunidade de levar mais longe a tentativa de convencer o País de que não somente elaborou uma política externa audaz como está em condições de inovar e agir, de modo a inflectir o rumo da Europa no que diz respeito à estrutura e funcionamento das alianças militares.
Na realidade, estamos perante um inquietante processo, no qual o Governo PSD cumpre o papel que lhe distribuem.
0 aventureirismo tem por epicentro o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Transmitir a impressão de que está, por decisão própria, a fazer coisas positivas na área da UEO, coisas que outros não fizeram, tornouse ultimamente obsessão daquele departamento do Estado.
Não creio exagerar afirmando que poucos portugueses sabem o que é e pretende a UEO, estrutura político-militar que, na ambígua definição do Tratado de Maastricht, estaria vocacionada para ser o pilar europeu da NATO.
Para clarificar o motivo desta intervenção, afigurase-me por isso útil recordar aqui que o relacionamento da UEO com a NATO não cabe, pela sua complexidade, em definições lineares. Apresenta-se marcado por ambiguidades, equívocos e contradições, cuidadosamente ocultados da opinião pública por ambas as organizações.
Não é novidade que a NATO atravessa a maior crise desde a sua fundação. Com a implosão da URSS e o advento na Rússia de um regime que proclama com orgulho a sua adesão ao capitalismo, a NATO não pode mais invocar os argumentos que lhe serviam para justificar a existência. Deveria ter desaparecido, mas sobreviveu.
Os EUA, que sempre exerceram um controlo hegemónico sobre a NATO, sustentam que ela é indispensável à segurança da Europa e do mundo. Entretanto, produzir argumentos minimamente convincentes para persuadir alguns dos aliados europeus da validade dessa tese tornou-se hoje tarefa cada vez mais difícil. As Cimeiras de Bruxelas e Sevilha e a grande encenação clintoniana que precedeu o lançamento mediático da chamada Parceria para a Paz não foram suficientes longe disso- para convencer certos Governos europeus
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de que as coisas deveriam permanecer tal como estavam. Foi necessário proceder a retoques, mas a redistribuição teórica de papéis não dissipou o mal-estar no relacionamento NATO-UEO. Ninguém até hoje. foi capaz de clarificar o significado da elíptica expressão "organizações separáveis, mas não separadas", que ambas dizem definir o seu íntimo entrosamento..
Srs. Deputados, segundo o Departamento de Defesa dos EUA, as guerras de baixa e média intensidade serão por tempo de duração imprevisível inevitáveis, em consequência de conflitos que irrompem na periferia do mundo desenvolvido. É a mundividência da nova ordem, esboçada por Washington. 0 envolvimento desastrado da NATO num conflito localizado mi Europa, o da Bósnia Herzegovina, criou, entretanto, àquela organização problemas imprevistos. As mazelas da NATO foram postas a nu.
Tanto no plano político como no militar os air strikes- eufemismo que designa os bombardeamentos aéreos desencadeados contra os sérvios da Bósnia foram um fracasso, forçando os EUA a rever os seus planos para o conjunto da região Balcânica.
Tornada mais prudente, a NATO fixa agora a sua atenção no Sul, ou seja, na margem africana do Mediterrâneo. Mas não toda, porque os chama4os interesses norte-americanos geram contradições e a Casa Branca não esquece as excelentes relações mantidas com o Reino de Marrocos. Os extremistas islâmicos, no âmbito dessa estratégia, são irresponsavelmente confundidos com o 15lão, como totalidade e como realidade histórica e cultural.
É significativo que a imprensa europeia e norte-americana esteja a prestar uma atenção muito especial à Conferência Euro - Mediterrânica, que se realizará em Barcelona, em Outubro, iniciativa que já suscitou reparos críticos na Líbia, na Argélia e no próprio Egipto. Os promotores pretendem durante a Presidência espanhola abrir, em Barcelona, a porta a uma futura CSCE para o Mediterrâneo, como prólogo a ingerências crescentes no Norte de África.
Em várias capitais, os governantes sugerem que a região constitui uma ameaça potencial à segurança europeia. Não passou despercebido que o Secretário-Geral da NATO, Willy Claes, agora envolvido num escândalo maiúsculo, tem assumido posições que surpreenderam pelo radicalismo aqueles que viam nele uma personalidade apaziguadora e baça De repente, aparece como um falcão e prega uma cruzada moderna contra o 15lão, pintado de inimigo.
Claes retoma a tese do Prof. Huntington, de Harvard, sobre o suposto choque de civilizações, segundo a qual a linha de confrontação entre o bem e o mal é a que separa aqueles que praticam os valores que definem a civilização ocidental de povos moldados por mundividências diferentes. De acordo com essa teoria, os EUA serão, pela necessidade de garantir os interesses ocidentais e de promover os seus valores económicos e políticos, inelutavelmente empurrados antes do final do milénio para guerras de baixa e média intensidade com países do Terceiro Mundo.
Aliás, inspirado no mestre Huntington, Claes não hesitou recentemente em afirmar que - cito: "0 integrismo islâmico representa para o Ocidente uma ameaça tão importante como a que antes provinha do comunismo". A gaffe custou-lhe uma advertência formal dos 16 países membros da Aliança Atlântica, mas é reveladora da mentalidade do actual Secretário-Geral da NATO.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Governo português, cuja política de vassalagem relativamente aos EUA e aos grandes da União Europeia tem sido uma constante, está a ocupar o palco numa perigosa manobra que se insere na estratégia concebida por outras potências, nomeadamente a França e a Alemanha.
Qual o fim da política de dinamização operacional da UEO? Com palavras suaves, invocando a cada momento os objectivos da segurança colectiva, o que se pretende não é contribuir para a estabilidade e a paz na Europa, mas sim criar condições para um novo tipo de militarização do Continente.
0 Governo do PSD - sem que milhões de portugueses disso se apercebam - apresenta-se já orgulhosamente como patrocinador de uma política aventureira e agressiva Pretende aumentar a capacidade operacional da UEO. A fórmula do pilar europeu está a ser substituída na fraseologia oficial pela do "futuro braço armado".
É um facto indesmentível que a NATO continua a ser um instrumento de hegemonia militar e política dos EUA. 0 desejo de pôr termo à acção imperial dos EUA na Europa seria, portanto, louvável se a alternativa apontasse para uma autêntica política de paz e segurança continental. Mas não é o caso. 0 que alguns governos europeus pretendem é substituir um tipo de militarização por outro igualmente nocivo e agressivo e repudiado pelos povos europeus.
Srs. Deputados, não está claro para mim o que se pretende efectivamente com o próprio Colóquio sobre Segurança no Mediterrâneo Ocidental, que a Assembleia da República vai promover no dia 17 de Maio.
Permito-me lembrar desta Tribuna que, na sua penúltima sessão plenária, a Assembleia Parlamentar da UEO aprovou em Paris - eu votei contra naturalmente - as recomendações de um inquietante relatório do Deputado belga De Decker, que sugere a criação de uma força nuclear autónoma europeia, integrada, cuja alegada necessidade resultaria de perigos assustadores vindos de países do Sul.
Srs. Deputados, dois dias antes do Colóquio a ser promovido pela nossa Assembleia reúne-se em Lisboa, em quase despedida da Presidência portuguesa, o Conselho de Ministros da LTEO, acontecimento no qual podem participar, além dos 10 membros da organização, representantes de Estados associados ou com o estatuto de observador e também os chamados "parceiros".
No dia seguinte, 16 de Maio, estão previstas, também para Lisboa, reuniões do Comité dos Presidentes, da Comissão Política e da Comissão de Defesa da Assembleia Parlamentar da UEO com a Presidência portuguesa. Estamos assim perante coincidências que justificam reflexão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, os pequeninos, mas preocupantes jogos que determinam a sinuosa estratégia do Governo nesta aventura da dinamização operacional da UEO trazem-me à memória outra opinião de Eric Hobsbawm na sua crítica demolidora da teologia ultra liberal: "Na desordem em que vivemos, mascarada de nova ordem internacional, instituições colectivas criadas pelo homem - estou a citar Hobsbawm - deixaram de controlar as consequências colectivas das acções humanas". Acredito que o grande historiador
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britânico está certo ao lembrar que o problema maior do mundo industrializado é menos o de multiplicar a riqueza, em benefício de uma minoria insignificante, do que o de saber como a distribuir. Multiplicar as armas e usá-las para defender privilégios e aprofundar o fosso Norte - Sul é outro trágico erro.
Aplausos do PCP e do Deputado independente Mário Tomé.
0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.
0 Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer ao Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues que ouvi com atenção a sua intervenção, que, como é costume da sua parte, foi extremamente documentada e elaborada. E quero dizer-lhe, também, que subscrevo algumas das suas preocupações, designadamente no que concerne a esta nova emergência do fantasma do fundamentalismo islâmico.
Com efeito, o fundamentalismo islâmico, como todos os fundamentalismos, deve resolver-se através do desenvolvimento e da cooperação, porque as situações onde ele ocorre são as que se conhecem, designadamente na Argélia e noutros países mesmo do espaço europeu e são aquelas que decorrem de problemas sociais profundos, passando a sua resolução também por acções de polícia de segurança. Digamos que acho inadequado considerar que no norte de África existe um perigo de recorte eminentemente militar. Existe o perigo da demografia e outro tipo de perigos, mas não um perigo militar de possibilidade de conflitos de alta intensidade.
Todavia, gostaria de dizer-lhe, Sr. Deputado, que o seu discurso, em certa medida, é um discurso eivado de alguma nostalgia do cenário bipolar. 0 Sr. Deputado fala da NATO, como se esta fosse ainda o bloco militar que se contrapõe ao bloco de Leste, e disse mesmo que a NATO era o braço armado dos EUA. Ora, hoje a NATO não é o braço armado dos EUA, mas uma estrutura com outro tipo de preocupações, atendendo à alteração substantiva que se verificou no quadro das relações entre os países no fim desse conflito bipolar e da queda do Muro de Berlim. Se a NATO fosse aquilo que o Sr. Deputado disse ser, como é que essas novas democracias do centro e leste europeu quereriam aderir à NATO? 0 Sr. Deputado esquece-se que, por exemplo, a própria Rússia subscreveu o Partenership for Peace, o Partenariato para a Paz, com a NATO? Como é que tal era possível se a NATO se mantivesse como esse fantasma da opressão militar?
Creio que o Sr. Deputado terá porventura de dulcificar um pouco essas considerações para o seu discurso ficar mais consentâneo com os tempos que vivemos hoje.
0 Sr. Presidente:- Para responder, tem a palavra, por três minutos, o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.
0 Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, muito obrigado pela questão que me coloca. Fundamentalmente, a sua pergunta incidiu sobre a NATO e sobre o que eu pensaria dessa organização e dos Estados do leste europeu, mas, antes de falar da NATO, quero dizer-lhe que de modo nenhum me apresento hoje como defensor de qualquer Estado do leste europeu.
Tenho a pior ideia possível sobre esses países, que até em serviço da Assembleia, através da UEO e do Conselho da Europa, tenho visitado com frequência nos últimos anos. Eu não lhes chamaria sequer as novas democracias, pois na maior parte desses Estados reina hoje uma espantosa anarquia. São Estados anárquicos - fala-se muito do Estado de direito - onde não existe Estado de direito. De maneira que não sou seu defensor e não me admira nada que, com o oportunismo e com o amoralismo que caracteriza esses governos, estes peçam a adesão à NATO.
Mas, quanto a este organismo, devo dizer-lhe que a minha ideia é completamente diferente da sua e se já tinha da NATO uma má ideia, a última vez que participei numa reunião no seu quartel-general, em Bruxelas, que durou o dia inteiro e na qual estiveram os mais altos funcionários, essa ideia piorou sensivelmente.
Não sei se estão aqui alguns Srs. Deputados que participaram nessa reunião, mas recordo que um oficial do exército norte-americano- e um alto funcionário - escrevia tudo errado nos quadros, não sabia sequer a superfície e a população. Depois, repetia os erros. Quando se falou da Bósnia tivemos informações confidenciais - antes mesmo de ser aprovada uma resolução no Conselho de Segurança, que tinham como uma certeza- de que iriam endurecer os bombardeamentos sem informação prévia e contra múltiplos alvos.
E, só para dizer-lhe até que ponto a minha impressão foi má em todo o sentido, a falta de organização da NATO atingiu tal nível que no cartãozinho que nos davam estava escrito (se o senhor quiser eu mostro-lhe): "Não nos responsabilizamos pelo roubo dos objectos pessoais que forem depositados no vestiário."
Se uma entidade que quer organizar o mundo e ter a seu cargo a segurança não se responsabiliza sequer pelo roubo das gabardinas e dos guarda-chuvas, mal vão as coisas na NATO, Sr. Deputado José Lello.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É tudo boa gente!
0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, que vai ter de fazer um esforço para proferi-la dentro do tempo de que dispõe: 1 minuto e 18 segundos.
0 Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Comandante Alpoim Calvão processou-me por crime de difamação.
Considero este acto uma provocação, não só a mim pessoalmente mas ao próprio 25 de Abril e aos militares que fizeram o 25 de Abril.
0 Comandante Alpoim Calvão quer obter a minha condenação porque, em artigo publicado no jornal Expresso, no dia 23 de Abril do ano passado, durante as comemorações dos 20 anos do 25 de Abril, o acusei de ter sido "o comandante de assassinos".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: factos são factos!
Durante a guerra colonial, na Guiné, Alpoim Calvão dirigiu uma operação falhada na vizinha Guiné-Conakri, Estado que não estava em guerra com Portugal, com o objectivo de assassinar Sekou-Touré, o seu Chefe de Estado, e Amílcar Cabral, dirigente do PAIGC na
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libertação da Guiné e de Cabo Verde e referência fundamental de todos os movimentos de libertação das colónias africanas.
Para o efeito envergaram fardas do PAI'GC, a fim de atirarem as culpas sobre este movimento.
Depois do 25 de Abril, também às ordens de Spínola, foi o responsável operacional do MDLP, organização terrorista e bombista que cometeu centenas de atentados e de incêndios, que vitimaram vários democratas, entre os quais o padre Max e a estudante Maria de Lurdes Correia.
Embora os testemunhos sejam inúmeros, o próprio Alpoim Calvão confirma-o, orgulhosamente, 'em livros e entrevistas.
Alpoim Calvão e os terroristas ficaram: impunes porque o regime democrático não os julgou, como, aliás, não julgou a PIDE. E é a impunidade que o encoraja. Por isso se sente à vontade para esta provocação.
Considero meu dever cívico denunciar e exigir a condenação dos crimes perpetrados contra a liberdade e o 25 de Abril, pelo que não me refugiarei na imunidade parlamentar. Pedirei a esta Assembleia que me autorize a comparecer no julgamento, onde os verdadeiros réus serão Alpoim Calvão, a rede, bombista e o MI)LP.
Atingidos na honra e na verdade da história são os militares de Abril. Alguns honrar-me-ão sendo minhas testemunhas de defesa: o marechal Costa Gomes e os coronéis Vasco Lourenço, Carlos Fabião, Matos Gomes e Artur Baptista.
Aplausos dos Deputados do PCP Luís Peixoto e Octávio Teixeira e do Deputado independente Raul Castro.
0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso.
0 Sr. Manuel Baptista Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, Sr." e Srs. Deputados: 0 distrito de Aveiro tem uma população de perto de 700 000 habitantes, uma densidade populacional de 230 habitantes por quilómetro quadrado e a sua população activa encontra-se distribuída, principalmente, pela indústria transformadora - 73,4 % -, pelo comércio e hotelaria - 11,5 % - e pela construção civil
5,5%.
Por sectores de actividade, a indústria do calçado ocupa 21,1 % dos trabalhadores da indústria transformadora e representa 15,5 % do emprego no distrito.
Convém notar que 57 % das empresas nacionais de calçado se localizam no distrito de Aveiro, mais concretamente no norte do distrito de Aveiro:
A indústria da madeira e da transformação da cortiça ocupa 13,4% dos trabalhadores da indústria transformadora e representa 9,8 % do emprego no distrito.
Como é sabido, no norte do distrito de Aveiro, mais exactamente no concelho de Santa Maria da Feira, localiza-se o maior centro transformador e exportador de cortiça do Mundo.
É também muito significativo o peso da indústria metalo-mecânica, pois 40% da indústria nacional está sediada no distrito de Aveiro.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: 0 distrito de Aveiro, globalmente, ocupa a terceira posição na maioria dos indicadores do desenvolvimento industrial do nosso país. E, dentro do distrito de Aveiro, o norte é parte fundamental a ter na devida conta: há ali empresários e investidores dos melhores e maiores do País; são dali naturais figuras de relevo na vida nacional, como sejam alguns membros do Governo e o Presidente do Tribunal Constitucional, por exemplo; ali pululam associações diversas, desde as empresariais às de solidariedade social e às de municípios.
Não admira, por isso, que no norte do distrito de Aveiro haja obras notáveis. umas da iniciativa da chamada sociedade civil, outras da iniciativa dos autarcas e das suas associações, outras ainda da iniciativa governamental.
Como não espanta que, com gente tão empreendedora como a que ali vive, haja projectos vultosos em execução e muitos outros à espera da sua viabilização
Entre as iniciativas da sociedade civil avulta o Europarque, cujo projecto muitos acharam irrealista e megalómano mas que, graças ao arrojo e ao espírito empreendedor de uns quantos empresários nortenhos, aliados à capacidade de persuasão e de liderança do Engenheiro Ludgero Marques, aí está, pronto a inaugurar a sua primeira fase no próximo dia 8 de Abril, mesmo que não venha a ser aprovada a proposta do Governo sobre bonificação de juros, que hoje vamos aqui apreciar. E, para manter a forte dinâmica imprimida a todas as fases do projecto, ali ocorrerá, entre os dias 9 e 13 de Abril, o 1.º Congresso Mundial da Voz, que, além de debates médico-científicos sobre a problemática da voz, com a participação de eminentes especialistas mundiais e a presidência do não menos eminente especialista Professor Pais Clemente, terá como ponto alto, pelo menos do ponto de vista mediático, um mega-concerto com José Carreras e mais três notáveis da voz mundial
Entre as iniciativas dos autarcas, há a destacar: as diligências encetadas para que seja possível sediar, no distrito de Aveiro, uni terminal de mercadorias, de modo a que, por um lado, se rentabilizem os portos de Aveiro e de Leixões, as rodovias e as ferrovias existentes e, por outro lado, se minimizem os custos, se faça justiça e se dê estímulos a tantos e tão bons empresários de toda aquela região; o estudo de um plano estratégico integrador do eixo urbano Santa Maria da Feira/S. João da Madeira/Oliveira de Azeméis, de modo a viabilizar e potenciar candidaturas conjuntas ao PROSIURB; o concurso para estudo da viabilidade económica da eventual transformação da actual linha férrea do Vale do Vouga em metropolitano de superfície, ligando Espinho/Santa Maria da Feira/S João da Madeira/Oliveira de Azeméis. Poderão, entretanto, vir a aderir a este projecto os municípios de Albergaria-a-Velha, de Águeda e de Aveiro.
Quanto a obras da responsabilidade do Governo e de interesse para o norte do distrito de Aveiro, há a destacar: estudo da ligação de Oliveira de Azeméis ao nó da auto-estrada, em Estarreja; projecto para a execução de um nó da auto-estrada, em Nogueira da Regedoura, para servir o norte do concelho de Santa Maria da Feira, todo o concelho de Espinho e o sul do concelho de Vila Nova de Gaia.
Julgo saber que o projecto está pronto, estando a ser completado com estudo para simultaneamente, o troço da auto-estrada até aos Carvalhos ser alargado para três faixas em cada sentido. Urge, pois, acelerar esses estudos e passar às obras, a execução do ICI, dentro do distrito de Aveiro, está já a ser utilizado,1 desde o norte de Espinho
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até ao concelho de Ovar e se não está a ser possível utilizá-lo mais para norte não é por culpa dos aveirenses.
Neste momento decorrem em bom ritmo as obras de ligação deste ICI ao nó da auto-estrada em Santa Maria da Feira, através de via rápida com quatro faixas de rodagem; elaboração de um estudo prévio para continuação do 1C2 que, por enquanto, está "parado" à saída de S. João da Madeira, mas que urge continuar, designadamente para norte - pelo menos até aos Carvalhos - a fim de facilitar os acessos para o norte e para o interior e evitar o colapso da EN1 que, naquela zona, deve ser a estrada nacional mais congestionada do País; estudo para duplicação do IP5, provavelmente através da construção de um itinerário mais ou menos paralelo ao actual, ficando, de pois, cada itinerário com um único sentido de marcha; pólo do Parque de Ciência e Tecnologia, junto ao Europarque ( - estão negociados os terrenos e está aberto concurso para fazer as infra-estruturas).
Neste pequeno rol dos muitos investimentos de interesse regional que podia referir, deixei para o fim o novo Hospital de Santa Maria da Feira, não por ser menos importante que os outros, mas, ao contrário, por considerar que se trata do mais importante empreendimento público em execução no concelho que me viu nascer e crescer, por querer evidenciá-lo, referindo-me a ele mais detalhadamente e por pretender com essa abordagem, passar a referir-me, ainda que sucintamente, a alguns assuntos mais directamente relacionados com os cidadãos do meu concelho.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Um novo hospital para Santa Maria da Feira é uma carência sentida e reclamada há mais de 30 anos.
Houve cortejos de oferendas para angariação de fundos, houve terrenos postos à disposição dos mais diversos governos, antes e depois do 25 de Abril, houve decisões tomadas no sentido de avançar... Mas, tantas quantas as promessas foram as frustrações acumuladas durante 30 anos!...
Até que os governos do PSD e do Professor Cavaco Silva, dando razão e fazendo justiça a todos quantos se empenharam nesta nobre causa - e tantos foram -, deram o sim definitivo à construção do novo Hospital de Santa Maria da Feira, para servir toda a sub-região de Entre-Douro e Vouga - as chamadas Terras de Santa Maria - e para descongestionar os hospitais centrais do Porto e o de Vila Nova de Gaia.
Passada a fase burocrática, a construção iniciou-se o ano passado, estando as obras a decorrer em bom ritmo.
0 custo final previsto é de cerca de 8,5 milhões de contos, estando orçamentados para 1995 2,2 milhões de contos e, a manter-se a programação prevista, o hospital será posto ao serviço dos utentes em 1997, ou seja, daqui a dois anos, escassos para quem tanto esperou e quase desesperou.
Também o Hospital de S. Paio de Oleiros foi contemplado com 20 000 contos do Orçamento do Estado para este ano (e outros tantos do orçamento da Câmara), para obras inadiáveis, principalmente de recuperação do Serviço de Urgência.
Ainda neste sector da saúde, tem sido muito reclamada, penso que justamente, a abertura do SAP de Lobão, no nordeste do concelho. Trata-se de uma promessa que data da abertura do centro de saúde e que urge satisfazer, pois a população daquela zona do concelho é a que mais distante está de tudo e, por isso, a mais desprotegida.
Quanto ao ensino, em Setembro de 1993 foi posta ao serviço a Escola C+S de Arrifana e em Setembro de 1994 foi também posta a funcionar a Escola C+S da Corga.
Neste momento está em construção a nova Escola C+S de Santa Maria da Feira e espera-se que sejam postas a concurso, ainda este ano, a Escola C+S de Argoncilhe e a Escola Básica Integrada de Milheiros de Poiares.
Apesar do esforço que este Governo tem feito para minorar as grandes carências que havia neste domínio, é ainda grande a necessidade de escolas preparatórias e secundárias, designadamente no norte e no nordeste interior do concelho, onde ainda funcionam algumas Telescolas.
Há, no concelho, dois institutos superiores o ISVOUGA e o ISPAB -, que são frutos preciosos da iniciativa, do empenhamento e do investimento privado de empresários e de autarquias. Porém, a oferta disponível, apesar de meritória, é insuficiente.
E como explicar que não haja investimento público no ensino superior num concelho com mais de 120000 habitantes, que contribuem tão avultadamente para o erário público?
Um pólo universitário não seria um bom complemento para o pólo do Parque de Ciência e Tecnologia, já criado, que vai ser instalado junto ao Europarque?
Se é verdade e compreensível que não se pode criar tudo ao mesmo tempo - e ainda recentemente foi criado um pólo em Águeda, no sul do distrito -, já não será tão compreensível nem tão razoável se um pólo universitário, a criar no norte do distrito de Aveiro, não for sediado em Santa Maria da Feira, por tudo quanto se disse atrás e pela excelente centralidade do município, tanto em termos geográficos e de acessibilidades como em termos demográficos e de equipamentos complementares.
0 concelho de Santa Maria da Feira, com as suas 31 freguesias, tem sentido, ultimamente, um desenvolvimento assinalável e não apenas um aumento demográfico e/ou económico.
Com efeito, os feirenses também têm procurado cultivar uma "mente sã em corpo são", quer através do fomento e da prática desportiva, quer criando e pondo a funcionar instituições de lazer e de solidariedade social.
No âmbito desportivo, tem um clube que, há bem pouco tempo, chegou à 1.ª divisão nacional de futebol só com praticantes portugueses, tem, actualmente, 7 equipas nos nacionais de futebol, 14 equipas nos distritais seniores e 35 equipas nos campeonatos distritais para as camadas jovens, tem equipas que já foram campeãs nacionais em modalidades como o hóquei em campo e o voleibol, tem uma das melhores equipas nacionais de futebol feminino, com várias atletas na selecção nacional, tem jovens campeãs nacionais de salto, em mini-trampolim.
Quanto às instituições privadas de solidariedade social, basta dizer que no Orçamento do Estado para 1995 foram comparticipadas obras em 15 instituições, com um total de 96 000 contos. 15to significa que praticamente metade das freguesias do concelho têm obras destas em execução,
Se, entretanto, nos recordar-nos que as comparticipações do Estado são, infelizmente, em percentagens não muito significativas, será fácil avaliar quanto esforço local ainda é preciso fazer para levar por diante tais obras.
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Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Se evidencio estas qualidades dos santamarianos não é para concluir que Santa Maria da Feira é um concelho elitista (sem qualquer sentido pejorativo, embora) mas para realçar que, tendo uma população empreendedora, empenhada e solidária nos mais diversos sectores, deve merecer o reconhecimento público dos seus méritos por parte de todos os níveis da Administração.
Ora um tal reconhecimento tem de ser traduzido em obras. E se muito tem sido feito por este Governo é imperioso que o ritmo e o esforço dos investimentos não abrandem, mas aumentem. Projectos não faltam.
Este ano, só em quatro projectos da responsabilidade do município (biblioteca, piscinas, zonas industriais e vias estruturantes), estão orçados 1,32 milhões de contos. É, pois, necessário complementar esse esforço municipal com mais investimentos da responsabilidade do Estado.
Para o curto prazo, no âmbito do Fundo de Coesão, há candidaturas para mais de 10 milhões de contos, só para abastecimento de água, esgotos e tratamento de, lixos.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: No passado talvez as pessoas se tenham preocupado muito em criar riqueza e preocupado pouco em cuidar das infra-estruturas, dos equipamentos e de questões como o abastecimento de água potável, a drenagem e o tratamento de esgotos ou a recolha e tratamento dos lixos. Mas a verdade é que criaram riqueza, deram emprego e contribuíram significativamente para o erário público.
Agora, é legítimo pedir ao Estado que seja mais solidário com os cidadãos, as associações e as autarquias dessa região.
Estou confiante em que os esforços financeiros empreendidos pelo Estado vão ter continuidade e irão mesmo ser reforçados.
Há provas de que serão tão bem empregues como são devidos e merecidos.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Os problemas de terras de Santa Maria suscitaram, naturalmente, a necessidade de um esclarecimento maior a alguns Srs. Deputados. Mas aquele que quer formular as perguntas é o Sr.. Deputado Ferraz de Abreu.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
0 Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso, naturalmente que nós, aveirenses, estamos sempre dispostos a saudar quem traz os problemas do nosso distrito a esta Casa. Daí que comece por cumprimentá-lo pela sua iniciativa.
Em todo o caso, o Sr. Deputado referiu aqui o progresso extraordinário que se tem notado no distrito de Aveiro, mas talvez não tenha realçado bem que esse progresso se deve, quase na totalidade, à iniciativa dos seus próprios cidadãos.
É certo que enumerou uma série de situações que estarão previstas e que se desejam - todos nós fazemos votos para que elas passem a ser realidades -, mas a verdade é que o distrito tem progredido, em princípio, graças ao poder de iniciativa e à capacidade dos seus habitantes.
V. Ex.ª referiu aqui vários projectos rodoviários, que, naturalmente, todos apoiamos, mas queremos lembrar-lhe que já quando da campanha eleitoral o
Sr. Primeiro-Ministro prometeu "para breve" a criação do nó rodoviário de Espinho.
Bom, talvez agora, com a sua intervenção e com a influência que tem junto do partido do Governo, vejamos ser iniciada a construção desse nó rodoviário que é tão importante.
Também referiu aqui a linha ferroviária do Vale do Vouga e eu sou particularmente sensível a essa linha.
Como sabe, a linha do Vale do Vouga era uma espécie de ex-libris de toda aquela região. Infelizmente, foi o Governo do PSD que a extinguiu na parte que, turisticamente, tinha de mais interessante. Hoje essa linha vai de Espinho a Sernada e de Sernada a Aveiro e foi completamente extinta, julgo que irreversivelmente, em toda a zona que vai para o interior, aquela que, turisticamente, devia merecer mais atenções e mais cuidados, pois é a mais digna de ser apreciada.
Além disso, ao falar do desenvolvimento de rodovias V. Ex.ª omitiu aqui - e eu compreendo que a sua preocupação tenha sido falar mais de Vila da Feira do que do distrito de Aveiro (daí entendermos as omissões que cometeu) - uma ligação fundamental, que foi prometida a Castelo de Paiva como contrapartida pelo encerramento das minas do Pejão e que talvez resolvesse uma grande parte dos problemas que resultam desse encerramento. No entanto, essa promessa, que foi feita há quatro ou cinco anos, apenas esboçou uns leves passos e está muito longe de poder resolver os problemas que surgiram com o encerramento da mina do Pejão.
Quero também aqui recordar que no nosso distrito há problemas graves no que diz respeito à conservação do ambiente, que devem ser sempre lembrados nesta Casa. Cito, em especial, o caso da Ria de Aveiro, onde vai parar toda a enxurrada de esgotos e de poluição e que, por ser um fenómeno único no nosso país, merece ser conservada e melhorada
Naturalmente, o problema da gestão dos recursos hídricos - que está também ligado a este - não pode ser descurado nem ignorado em qualquer intervenção neste Parlamento. 0 nosso distrito, juntamente com o de Viseu, possui a segunda bacia hidrográfica portuguesa, de rios totalmente portugueses, a bacia do Vouga, sendo a outra a do Mondego. É indispensável prestar atenção ao que se passa no rio Vouga e ria sua bacia, em matéria de poluição, inclusive porque o futuro progresso de todo o nosso distrito depende do apport de água, o qual só pode ser proveniente da bacia do Vouga.
Finalmente, gostaria de abordar o problema do hospital. 0 Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso talvez não tenha sido totalmente justo ao dizer que as aspirações de Santa Maria da Feira só agora foram concretizadas, tendo sido esquecidas durante muito tempo. Quero dizer-lhe que, entre 1983 e 1985, visitei várias vezes Santa Maria da Feira, tive longas conversas com a comissão pró-hospital e resolvemos mesmo um problema de expropriação do terreno, que estava a dificultar o projecto do hospital, o qual só não começou a ser construído em 1985 porque o governo do chamado Bloco Central e o respectivo Ministro da Saúde, que era socialista, desapareceram. Ora, os senhores tiveram 10 anos para pôr em execução o projecto deste
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hospital. Naturalmente, regozijo-me com a construção do hospital de Santa Maria da Feira.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, queira concluir.
0 Orador: - Concluo já, Sr. Presidente. No entanto, o distrito de Aveiro merece mais 30 segundos.
0 Sr. Presidente: - A avaliar pelo espírito dos Srs. Deputados, todos os distritos são importantes, o que é uma verdade. No entanto, peço-lhe que conclua.
0 Orador: - Mas V. Ex." compreenderá, certamente, que eu dê mais relevo ao distrito de Aveiro.
Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso, como sabe, todos nos regozijamos com o facto de o hospital estar já em construção. No entanto, o Sr. Deputado não pode censurar apenas o passado, terá de censurar também o seu próprio partido e o Governo que dele emanou.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimento, deseja responder já ou no fim?
0 Sr. Manuel Baptista Cardoso (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró, a quem solicito que seja breve.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, serei breve, com certeza.
Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso, quero felicitá-lo pela sua intervenção, onde exprimiu uma série de preocupações relativas a Santa Maria da Feira.
Peço-lhe desculpa, pois não sei se me escapou um ponto que considero importante. Uma das preocupações muitas vezes expressa pela população de Santa Maria da Feira relaciona-se com um projecto onde se prevê que venham a pertencer à área metropolitana do Porto, uma vez que se sentem excluídos dessa área, o que, a seu ver, prejudica em muito as perspectivas de desenvolvimento desse concelho e da sua população. Gostaria que o Sr. Deputado me informasse da sua opinião a este respeito e, se estiver habilitado para tal, da posição do Grupo Parlamentar do PSD sobre esta aspiração da população de Santa Maria da Feira.
0 Sr. Presidente:- Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Baptista Cardoso. Peço-lhe que seja breve.
0 Sr. Manuel Baptista Cardoso (PSD):- Sr. Presidente, vou procurar ser sintético.
Srs. Deputados, antes de mais, agradeço a vossa simpatia e o cuidado que puseram em relembrar-me algumas das questões. Vou procurar evidenciar, nas respostas, algumas dessas preocupações, que nos são comuns.
Sr. Deputado Manuel Queiró, quanto à eventual inclusão do município de Santa Maria da Feira na área metropolitana do Porto, a concepção que se tem localmente é a de que, devido aos vultosos investimentos existentes, neste momento, em obras e ao facto de o município ser o maior da zona, mais vale ser liderante no agrupamento de Entre Douro e Vouga do que ser mais um numa grande metrópole.
Sr. Deputado Ferraz de Abreu, como é natural, devolvo-lhe o cumprimento e a simpatia. Diz que grande parte do progresso se deve à iniciativa dos cidadãos. Provavelmente não me terá ouvido dizer - a deficiência, se calhar, é minha -, a determinada altura, que "há ali empresários e investidores dos melhores e dos maiores do País".
Quanto ao nó rodoviário para Espinho, esclareço-o de que o nó da auto-estrada nunca será em Espinho mas pode ser para Espinho -, pela simples razão de que a auto-estrada não passa por essa cidade. Faço aqui um alerta para que não se inicie uma polémica que não tem sentido, sendo desnecessário que a façamos nascer. Como é evidente, está previsto o nó da auto-estrada em Nogueira da Regedoura, tal como eu disse, inclusive, o projecto já está elaborado, procedendo-se agora apenas, complementarmente, ao estudo do fluxo de tráfego, com vista ao eventual alargamento, para três faixas em cada sentido, do resto do troço até aos Carvalhos. A muito curto prazo, creio que haverá obras no local.
Quanto à linha do Vale do Vouga, ainda recentemente (na semana passada, creio), esteve presente numa reunião da Comissão da Administração do Território, Equipamento Social, Poder Local e Ambiente o Sr. Presidente do Conselho de Administração da CP e, a interpelação minha, disse expressamente que ele próprio entendia que a eventual transformação daquela zona em metropolitano de superfície tinha toda o sentido, tinha "carris para andar", por isso julgo que, a breve trecho, também aí haverá obras.
Pareceu-me que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu fez uma certa crítica- não direi censura- ao facto de me ter preocupado mais com o concelho de Santa Maria da Feira. É evidente que somos Deputados nacionais e, por isso, representamos o todo do País. Se referi, isoladamente, algumas iniciativas do concelho de Santa Maria da Feira, fi-lo porque este concelho é o que mais me diz respeito directamente. Talvez pudesse aqui usar a seguinte imagem: se o todo é a soma das partes, falando-se de uma parte, está a falar-se do todo.
Quanto ao novo hospital de Santa Maria da Feira, efectivamente, como eu disse, a sua construção não é um anseio apenas desde 1983 ou 1985 mas, sim, desde há 30 anos. Em 1960 ou 1961, há 30 anos, portanto, houve cortejos de oferendas com o objectivo de criar o hospital de Santa Maria da Feira. Tal não foi possível nessa altura, como até há muito pouco tempo, aliás, pois só agora está em obra.
Mas o Sr. Deputado Ferraz de Abreu disse outra coisa: que esteve no local várias vezes- e posso confirmá-lo- e conversou com a comissão pró-hospital. Sr. Deputado, esta, como muitas outras coisas, não se resolve com conversas. Na nossa terra, na minha, na sua, naquela que é de todos nós, todas as pessoas, em geral, incluindo os mais eruditos, pensam que não são as palavras que resolvem os problemas. Até se usa a expressão acta non verba, isto é, acções e não palavras.
O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, queira concluir.
O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Com efeito, quem teve as acções foi o PSD, o Governo do Professor Cavaco Silva, e é isso que mais conta.
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Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao próximo orador, e uma vez que está presente o Sr. Deputado Miranda Calha, quero dar-lhe uma informação relacionada com uma pergunta que fez há pouco.
Informam-me os serviços e o Sr. Presidente indigitado da Comissão de Inquérito Parlamentar para Averiguar sobre a Eventual Responsabilidade do Governo na Prestação de Serviços das OGMA à Força Aérea Angolana - o Sr. Deputado Cardoso Ferreira - de que está convocada a primeira reunião para amanhã, às 17 horas.
0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra.
0 Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, quero apenas registar que, certamente, as perguntas que. aqui colocámos levaram a que este processo tenha sido um pouco mais rápido do que o que estava a acontecer até aqui.
Vozes do PSD: - Não foi, não!
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em meu entender, as perguntas de todos os Srs. Deputados são sempre relevantes para o andamento dos trabalhos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigues Marques. Informo a Câmara de que é a última intervenção do período de antes da ordem do dia.
0 Sr. Rodrigues Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trago, hoje, a VV. Ex.ªs um assunto de relevante importância para a minha região, que poderá parecer deslocado no tempo mas que, por tratar de questões de fundo, não perdeu ainda oportunidade
Refiro-me ao 2.º Congresso dos Empresários do Centro, que se realizou em Castelo Branco no passado dia 26 de Novembro.
Este ponto alto do tecido empresarial da região abrangida pelos distritos de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Viseu teve como grandes objectivos fazer o ponto da situação das propostas apresentadas na Figueira da Foz e, principalmente, não o perdendo de vista, equacionar, nas várias vertentes e nos diversos sectores de actividade, o futuro dos empresários, lançando para a discussão novas propostas.
A sua organização esteve a cargo do Conselho Empresarial do Centro que, nas palavras do seu Presidente, representa 95 % do movimento associativo da região centro, que está estruturado para dar corpo e voz às entidades que se agrupam no seu seio, legítimos representantes dos empresários, e pretende cumprir a nobre missão de interligar a vida empresarial às autarquias, às universidades, aos organismos do Estado português e da União Europeia e, ainda, a todos quantos contribuem para a criação de riqueza e para uma concertação multifacetada.
Ainda nas palavras do Presidente do Conselho Empresarial do Centro, a região, com cerca de dois milhões de habitantes, fervilha de actividade, sendo prova disso o trabalho desenvolvido pelas inúmeras associações empresariais existentes, quer horizontais, quer sectoriais, que representam o tecido empresarial, marcadamente constituído por pequenas e médias empresas (por exemplo, 87 % dos estabelecimentos industriais têm menos de 50 trabalhadores), são responsáveis por mais de 30 % do volume de exportações a nível nacional e representam 20% do volume total de mão-de-obra empregue no sector das indústrias extractivas e transformadoras.
A região comporta, para além de algumas das maiores empresas nacionais, sectores em grande expansão a nível comunitário, como são exemplos o caso dos lacticínios, dos têxteis e confecção, da metalomecânica e dos moldes e plásticos.
15to apesar de ainda se verificarem assimetrias regionais entre o litoral e o interior que só o desenvolvimento das acessibilidades resolverá, algumas bolsas de depressão económica ou de monoindústria, uma floresta ainda insuficientemente aproveitada, uma agricultura com alguns constrangimentos e uma costa marítima de recursos subutilizados, aliados ao sector do comércio e serviços em fase de profunda reestruturação e com um sector de serviços especializados ainda incipiente.
Todavia, apesar disto, os empresários da Região Centro mantêm unia identidade, de difícil classificação mas de fácil constatação, que os une na discussão dos problemas comuns e na busca de soluções, sem grandes exigências mas com a firmeza da necessidade de apoio estrutural.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Das conclusões do 1.º Congresso dos Empresários do Centro, e em fase de lançamento, é justo que se salientem as mais importantes A criação da Câmara de Comércio e Indústria da Região Centro, de uma Rede de Informação Associativa e de um Instituto de Desenvolvimento, Formação e Gestão Florestal, bem como o estudo de um plano integrado de desenvolvimento da região, constituem alguns exemplos de outros tantos grandes projectos já em fase adiantada de execução.
Este 2.º Congresso, por sua vez, versou como temas as potencialidades de desenvolvimento da região centro, o ambiente financeiro das empresas, os constrangimentos ao desenvolvimento do comércio, turismo e serviços, a agricultura e floresta, a indústria e emprego e a formação profissional na região.
Permitam-me ser porta-voz de algumas das principais conclusões aí tiradas, que, depois de vivo debate, foram consideradas prioritárias para o desenvolvimento das PME que têm a sua actividade nesta região do País.
Assim, foi considerado urgente articular as condições de localização face aos factores de produção e a necessidade de ordenar e fomentar o dinamismo empresarial de modo a conciliar os interesses e a minimizar os constrangimentos.
Do mesmo modo, é fundamental recuperar o ideal de empreender, garantindo o acesso aos sistemas de incentivos a actividades produtivas e motivar os empresários para projectos inovadores.
Na componente fiscal, considerou-se que, não obstante as taxas fiscais não diferirem muito das dos países comunitários, a estrutura financeira das empresas apresenta grandes dificuldades de resposta e, por outro lado, as contrapartidas oferecidas são inferiores, nomeadamente na preparação/formação dos trabalhadores e no apoio financeiro e logístico ao comércio internacional, sem esquecer os custos provocados pela burocratização
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do sistema, apesar da melhoria que se tem vindo a verificar.
Na componente financeira, apesar do louvável ajustamento gradual das taxas de juro, continua a desvantagem comparativa com os parceiros comunitários.
No sector de comércio, turismo e serviços, salientou-se a necessidade de urgente legislação que preveja o fecho generalizado dos estabelecimentos comerciais ao domingo. Aos municípios deverá competir a regulamentação dos horários durante a semana e das excepções a observar em cada localidade, em condições devidamente tipificadas na lei geral e que tenham em conta os interesses e usos locais. Deverá estar presente também o equilíbrio nas diferentes formas de comercialização.
Foi salientada igualmente a necessidade de assegurar a efectiva aplicação da lei da concorrência.
No sector da agricultura e da floresta, propôs-se a racionalização das culturas, tendo presente a realidade e as potencialidades regionais e a desburocratização dos mecanismos de apoio ao investimento.
Considerou-se ainda imperativo e urgente a alteração ao Código Cooperativo.
No campo industrial, pretende-se fundamentalmente assegurar o acesso aos mercados em igualdade com os concorrentes comunitários, em particular no mercado de capitais. A flexibilização da legislação laboral, por forma a potenciar a indispensável subida da produtividade e o abaixamento dos custos de produção, em especial na componente energética, foi outra das principais conclusões.
Em matéria de emprego e formação profissional, foi colocada à discussão a criação de um ambiente de emprego onde, quer o empregador, quer o empregado, não estejam sujeitos a regras rígidas, por forma a aumentar aquele e incentivar o próprio trabalhador a melhorar a sua preparação. Este tema, para além de ter tido um tratamento próprio e destacado, foi comum a todos os painéis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por último e como corolário do trabalho desenvolvido pelos empresários da região centro, legitimamente representados no Conselho Empresarial do Centro, concluíram que deveriam participar, de pleno direito, no Conselho Económico e Social, numa representação eminentemente regional, através da qual garantam a defesa da região que, como sabem e já foi dito, é composta pelo conjunto dos distritos de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Viseu.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 55 minutos.
ORDEM DO DIA
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de um Deputado.
0 Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado António Barradas Leitão, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, com início em 29 de Março corrente, inclusive, pelo Sr. Deputado João Carlos Duarte.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Mário Tomé.
Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 123/VI - Aprova bonificações de juros para empréstimos, com garantia do Estado, contraídos por associações sem fins lucrativos.
Para proceder à síntese do respectivo relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, dispondo para o efeito de cinco minutos, que não são considerados na contabilização global do tempo.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Marfins (PS)- Sr. Presidente e Srs. Deputados, serei muito breve, em razão até da extensão do diploma, que também é extremamente breve.
A presente proposta de lei retoma o projecto de decreto-lei com o mesmo título, aprovado pelo Conselho de Ministros em 22 de Dezembro de 1994, cuja promulgação foi recusada por Sua Excelência o Presidente da República a 20 de Fevereiro de 1995, por"não oferecer na sua nomeação um mínimo de precisão e de determinabilidade exigíveis".
Com efeito, segundo a mensagem pela qual o Chefe da Casa Civil do Sr. Presidente da República devolveu o diploma ao Governo, "o recurso exclusivo à utilização de conceitos imprecisos- associações sem fins lucrativos, actividades económicas, impacto internacional e relevante interesse público, os quais formam, em si mesmos, um corpo de indeterminação, faz com que as suas normas não tenham a virtualidade de poder constituir um referencial mínimo de actuação para a Administração e de controlo para os tribunais e uma garantia para os destinatários, abrindo a porta à possibilidade de actuações administrativas arbitrárias".
Este é o texto exacto da fundamentação de Sua Excelência o Presidente da República para a devolução do diploma.
0 Governo transformou o decreto-lei vetado na proposta de lei que ora se aprecia, nos termos do artigo 200.º, n.º 1, alínea d), da Constituição da República Portuguesa.
Como vem enumerado na própria exposição de motivos, a proposta de lei em apreço"prevê a criação de um instrumento que possibilite a concessão de apoios financeiros a empréstimos contraídos por associações, sem fins lucrativos, que organizem e realizem manifestações que revistam interesse para a actividade económica".
Este é, em síntese, o conteúdo da proposta de lei n.º 123/VI, que vamos agora apreciar e discutir.
0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou agora dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, que dispõe de cinco minutos, podendo, em todo o caso, prolongar a sua intervenção, utilizando o tempo atribuído ao Governo.
Tem a palavra.
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0 Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro (Walter Marques): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dar uma informação de enquadramento deste diploma.
0 apoio do Estado a empreendimentos levados a cabo por associações, nomeadamente associações económicas sem fins lucrativos, e no caso particular de essas associações levarem a cabo empreendimentos com finalidades de grande interesse público, pode fazer-se por aval ou por bonificações. Em qualquer desses casos, são apoios aos financiamentos a que essas associações têm de recorrer. E entende-se que a concessão de bonificações, no contexto de um apoio do Estado a linhas de crédito, deverá fundamentar-se num decreto-lei
Podem surgir, a este respeito, diversíssimas situações, em que se apresentem empreendimentos com este conjunto de características, isto é, que sejam levados a cabo por associações de actividades económicas sem fins lucrativos, que promovam as actividades económicas com um certo impacto internacional e isso verificar-se-á particularmente quando estejam em causa instalações que permitam a realização de congressos e sirvam de centros de negócios e outras infra-estruturas do mesmo tipo, que essas realizações se situem fora dos grandes centros urbanos, o que permitirá uma descentralização com benefícios indiscutíveis, e que os empréstimos a bonificar sejam objecto de aval ou outras garantias do Estado.
Entendeu o Governo, em virtude dos acontecimentos que rodearam este projecto de decreto-lei, submeter uma proposta de lei à Assembleia da República, tendo em vista, embora se trate de uma matéria normalmente(e inscrita nas competências do Executivo, lograr o objectivo de, em situações bem identificadas, apoiar mutuários daquele tipo de operações que foram garantidas pelo Estado através da bonificação das taxas de juro dessas operações.
Como, entretanto, já é do conhecimento público, um dos casos que pode, desde já, prefigurar-se com, o beneficiário é o denominado "caso Europarque". Este decorre de uma solicitação da chamada empresa Euro-Parques - Centro Económico e Cultural, que é constituída pela Associação Industrial Portuense em conjunto com 34 outras associações sectoriais e regionais, que pretende o apoio do Estado a um financiamento bancário, destinado a financiar parte do projecto.
0 empreendimento é fundamentalmente composto por um centro de congressos, um pavilhão de exposições, um centro desportivo e cultural e uma zona de hotéis e restaurantes. Trata-se, por esse facto, de um projecto com interesse para a internacionalização das actividades económicas portuguesas e para a modernização das empresas e situa-se em região fora do centro urbano tradicional, descentralizando essas actividades na região norte.
0 sindicato bancário que vai financiar estio, empreendimento obteve um aval do Estado em despachos do Ministro das Finanças, de 30 de Junho de 1993, de 29 de Dezembro de 1994 e de 2 de Fevereiro de 1995, publicados na 2.ª Série do Diário da República. Como contra garantia, o Estado, recebe em hipoteca terrenos envolvidos no empreendimento.
No sentido de promover o sucesso de exploração do empreendimento, foi solicitada ao Governo a possibilidade de este o apoiar através de uma política de bonificações das taxas de juro do empréstimo efectuado com a banca.
0 diploma submetido a esta Assembleia, que é muito curto, tem exactamente a indicação das condições em que esse apoio, por bonificações. pode ser dado, as quais estão reproduzidas nos seus artigos l.º, 2.º e 3.º.
0 Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Raúl Castro, Guilherme d'Oliveira Martins e Octávio Teixeira.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Castro.
0 Sr. Raúl Castro (Indep ): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, a proposta de lei n.º 123/VI, que V. Ex.ª acabou de apresentar, é a reprodução do decreto-lei vetado pelo Sr. Presidente da República, não havendo aqui qualquer alteração.
Agora, conhecemos a razão do veto, mas quem ler os três curtos artigos que compõem esta proposta de lei e se abstrair daquilo que já se sabe, ou seja, que esta proposta de lei visa, tal como já acontecia com o projecto de decreto-lei, o empreendimento do Europarque da Associação Industrial Portuense, a ideia com que fica é a da total indeterminação deste texto legal. Na realidade, quem lê isto, sem saber o que lhe está por detrás, não consegue entender o que se pretende com esta proposta de lei.
Mas, pior do que isso, é que, agora, ao saber-se que ela visa o Europarque da Associação Industrial Portuense, a ideia que transparece é a de um diploma feito para dar cobertura a esse empreendimento. 15to é, não se trata de um diploma com as características de generalidade e de abstracção, próprias da lei, mas com a finalidade de resolver um caso concreto. Basta ler V.Ex.ª , aliás, já o fez - o artigo 1.º, onde, designadamente, se refere: "(...) associações sem fins lucrativos que promovam actividades económicas ( ... )" - e cá está a Associação Industrial Portuense e suas associadas - "(...) com impacto internacional ( ... )" - também há o impacto internacional - "( ..) e relevante interesse público, fora dos grandes centros urbanos (.. )". Quer dizer, todas estas características foram inscritas para se adaptarem ao caso concreto e a nenhum outro, que não existe.
0 Sr. Carlos Pinto (PSD): - Essa agora!
0 Orador: - Permita-me acrescentar, Sr. Secretário de Estado, que não se compreende que isto só seja aplicável a casos fora dos grandes centros urbanos. Por que não nos grandes centros urbanos? Esta é outra pergunta que lhe faço.
Se este não se tratasse efectivamente de um diploma em que é desprezado o carácter de generalidade e de abstracção para dar cobertura, como agora se sabe, ao caso do Europarque da Associação Industrial Portuense, estoutra exigência seria totalmente descabida. Por que razão é que estes empreendimentos só podem ser construídos fora dos grandes centros urbanos?
São estas as questões que coloco a V. Ex.ª, ou seja, a falta de generalidade e abstracção deste diploma e o facto de ele ser um "fato feito por medida" para um cliente pré-escolhido, que é a Associação Industrial Portuense.
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15to contraria frontalmente as exposições que dizem como devem ser as leis, gerais e abstractas e não individuais e concretas, tratando-se, neste caso, de uma lei individual e concreta. Tanto assim é que não se admite sequer a sua aplicação fora dos grandes centros urbanos.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, trata-se obviamente de um mau exercício no que toca a uma iniciativa legislativa. E digo isto com tanto mais mágoa quanto é certo que os diplomas provindos do Ministério das Finanças têm-nos habituado a uma qualidade mínima, que aqui manifestamente não existe.
Sr. Secretário de Estado, quanto ao fundo da questão, V. Ex.ª, ao referir aqui com clareza o caso do Europarque, fê-lo, a meu ver, bem, porque é essa transparência e clareza que sempre se pedem ao Governo. E se é o que pretende neste caso, é bom que isso fique dito.
Só que, como terei oportunidade de referir na minha intervenção, há aqui alguns aspectos, em termos de técnica legislativa, que deixam muito a desejar.
Antes de mais, a noção de "garantia do Estado". 0 Sr. Secretário de Estado já nos disse aqui que, neste caso concreto, há um aval do Estado. Efectivamente, o aval do Estado cabe no quadro constitucional, estando até previsto no artigo 164.º da Constituição da República; há um limite, definido pela própria Assembleia, para os avales do Estado, e, neste caso, parece-me inatacável.
Pergunto: em que outras garantias está realmente o Governo a pensar, sendo que na noção lata de garantia pode, por exemplo, caber uma carta de conforto? A carta de conforto será uma garantia para este efeito? Não teria sido melhor, ou não será melhor, Sr. Secretário de Estado, porque, a meu ver, deveremos aperfeiçoar este diploma, referir expressamente o aval do Estado, que é uma figura jurídica claramente tipificada, pois está prevista na Lei n.º 1173, de 2 de Janeiro, que, apesar de ser um diploma antigo, está em vigor" Não seria melhor? Porque todos os tratadistas nos dizem que a noção de garantia do Estado é uma noção ampla, onde podem caber as cartas de conforto, sem qualquer contrapartida.
No caso referido há realmente uma contrapartida, em termos de constituição de uma hipoteca, mas o diploma previu outras situações. Era esta a questão fundamental que gostaria de colocar, para além de outras que, a seu tempo, colocarei na minha intervenção. Mas esta parece-me particularmente interessante e, de algum modo, põe em causa o próprio rigor técnico deste diploma.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, em primeiro lugar, gostaria de referir que, de acordo com o que em determinada altura foi dito pelo Secretário-Geral do PSD, então ainda ministro, este é o "diploma Europarque" assim foi expressamente designado o diploma que não obteve a ratificação do Sr. Presidente da República, o diploma para o Europarque e apenas para o Europarque!
As questões essenciais que gostaria de colocar não têm a ver com o problema de o Governo resolver ou não bonificar as taxas de juro para esse empreendimento. A questão que se coloca é a da transparência.
Por que razão o Governo não assumiu, e não assume, claramente, que aquele empreendimento, do seu ponto de vista, justifica ter uma bonificação de taxas de juro, arranjando uma forma de dizer, através de um diploma, nomeadamente uma resolução do Conselho de Ministros ou qualquer outro: para a sociedade tal ou para o empreendimento tal o Estado faz a bonificação da taxa de juro? Por que apresenta um decreto-lei, ou uma proposta de lei neste caso, que só se aplica a um caso concreto?
0 Sr. Carlos Pinto (PSD): - Podem existir outros no futuro!
0 Orador: - No futuro, já cá não estão, pelo que já não há esse problema.
Se percorrer o país todo, só descobrirá este caso concreto, o Europarque, em Santa Maria da Feira, e mais nenhum. Esta é, para mim, a questão essencial.
A segunda questão, co-relacionada com esta, tem a ver com o facto de o Governo estar a entrar, nos últimos tempos, em roda livre na publicação de decretos nominativos, onde apenas falta o nome, mas nem por isso deixam de ser nominativos. Exemplos disto, além deste, são o decreto-lei do 13PA, o decreto interpretativo para o BTA, etc. São todos decretos nominativos. Dirão, aliás - o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros referiu-o há dias e os Srs. Deputados do PSD referi-lo-ão, que sempre poderá haver outros casos no futuro. Não! A situação é concreta! 15to aplica-se a casos concretos. Está a utilizar-se abusivamente a figura do decreto-lei.
Uma outra questão, Sr. Secretário de Estado, é a seguinte: fala-se, neste diploma, em bonificação de taxas de juro sobre empréstimos. E estes são obtidos para que finalidade? Serão apenas para a construção ou também, eventualmente, para a exploração do empreendimento? Tentemos delimitar isto, pois neste diploma nada está delimitado.
A última questão, Sr. Secretário de Estado, relaciona-se com a sua exposição, onde referiu, com algum pormenor, o caso concreto, o único, a que isto se aplica, que é o do Europarque. Fez uma discriminação, não digo exaustiva mas fê-la, do empreendimento, das condições, etc. No entanto, esqueceu-se de uma coisa, pelo menos eu não ouvi. Como já está tudo preparado, qual é a bonificação que irão conceder à EuroParques? Qual é a bonificação concreta que concederão a este caso concreto, para quem criam este projecto de decreto-lei?
Peço desculpa por ter dito que esta seria a última questão, mas ainda vou colocar uma outra.
Sr. Secretário de Estado, em relação à expressão "fora dos grandes centros urbanos", utilizada na proposta de lei, gostaria que o Governo explicitasse o que entende por isto. Ou seja, refere-se apenas a Lisboa e Porto ou também engloba Almada, Setúbal, Loures, Coimbra, Faro, etc.? Qual é o âmbito? Faço a pergunta para vermos se, em termos de futuro, poderá haver outro caso para além do de Santa Maria da Feira.
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Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro.
0 Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em relação à pergunta sobre a expressão "fora dos centros urbanos", esclareço que se trata de uma redução do universo de possibilidades, com vista a um objectivo que, a meu ver, é bastante claro: atrair actividades para as zonas fora dos centros urbanos, como aí se diz. E os centros urbanos não são só Lisboa e Porto, evidentemente, Em nosso entender, a localização de actividades deste, tipo em zonas que não são centros urbanos tradicionais é benéfica para o país, do ponto de vista de uma análise regional.
Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, quanto às garantias referidas neste diploma, é evidente que o que estava em causa eram fundamentalmente os, avales, porque são até esses que têm limitação estabelecida em decisão desta Assembleia. No entanto, o diploma, ao contrário do que o Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu, tem efectivamente virtualidades e potencialidades de se aplicar a vários casos. Não há só uma associação industrial no Porto, existem várias entidades do mesmo tipo. Pretendeu-se caracterizar um conjunto de situações em que se justificasse o estado de áreas de apoios. Com efeito, trata-se de dar apoio a financiamentos que são fundamentalmente de infra-estruturas dentro destes objectivos, destinadas a possibilitar reuniões internacionais, centros de congressos, etc.
Que bonificação? - perguntou o Sr. Deputado Octávio Teixeira. Ora, o despacho do ministro será feito, o que está é limitado por cima, podendo, conforme se diz na proposta de lei, ir apenas até metade da taxa estabelecida em portaria. Portanto, é possível que seja esse valor ou menos, mas não mais do que esse.
Contudo, peço licença ao Sr. Presidente para que meu colega Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros possa usar da palavra, a fim de esclarecer algumas questões de natureza mais jurídica, pois creio que estará em melhor posição do que eu para tal.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Com certeza. Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
0 Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Paulo Teixeira Pinto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, permito-me acrescentar ao que já foi dito pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro duas notas.
A primeira prende-se com a questão da terminabilidade, suscitada pelos Srs. Deputados Raúl Castro e Octávio Teixeira. Este diploma tem, voluntária e premeditadamente, características de generalidade e de abstracção. 0 Governo não estaria inibido de fazer um diploma específico para o Europarque, se essa fosse a sua vontade. Essa foi a razão pela qual o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, ainda antes de ser interpelado por qualquer dos Srs. Deputados, resolveu explicar todo o contexto da situação existente para o Europarque,
mas não confundamos esta situação com a do esgotamento da previsão normativa aqui aplicada. Aliás, o problema desdobra-se, como disse, em dois planos: o plano material e o plano do mérito, da bondade da solução, a qual, apraz-me muito verificar, não foi contestada por nenhum dos Srs. Deputados. Portanto, não está em causa o carácter benigno da solução material adoptada, mas o aspecto
processual, o jurídico, o qual aceito.
Como eu disse, o Governo podia ter feito um diploma com carácter de "lei-medida". Porém, entendeu dever fazê-lo com generalidade e abstracção, porque, embora este caso tenha natureza protótipa, é um caso que, pela sua dimensão pública óbvia, será aplicável no futuro a todos os outros, que, neste momento, não sabemos quais são. 15to é, mais uma vez, a previsão tem a função de
admitir, na sua estatuição, uma realidade de casos que neste momento são imprevisíveis. São determináveis, mas não estão pré-determinados.
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP)- - É a chamada realidade virtual!
0 Orador: - Não é realidade virtual, mas, sim, o conjunto, aliás, homogéneo e homólogo, que o Governo tem seguido para situações idênticas. Permito-me
apenas sublinhar, a título de exemplo, um entre muitos diplomas com estas características - que, como poderá ver, não suscitou dúvidas a quem quer que fosse, nem mesmo ao Sr. Presidente da República, que o promulgou -, o Decreto-Lei n.º 145/94, sobre bonificações a linhas de crédito a curto prazo para os sectores de agricultura, silvicultura e pecuária, onde também é criada uma bonificação a uma linha de crédito. Se alguma coisa se podia dizer ao Governo sobre os elementos da previsão normativa era a de que esta era demasiada apertada. De resto, como aqui foi suscitada há pouco, por um Sr Deputado, a questão de saber o que significava a expressão "fora dos grandes centros urbanos", se calhar, o Governo não devia ter o dito isto. Mas disse-o, para ficar perfeitamente moldada a hipótese normativa, para que a previsão não fosse vaga e abstracta. Se não, era isso o que diriam, que era vaga e abstracta.
Repare, Sr. Deputado, tem de se preencher cumulativa e não alternativamente seis requisitos - seis.
Primeiro, que sejam empréstimos contraídos por associações sem fins lucrativos Podia aceitar, por fazer parte do exercício da política, que os Srs. Deputados questionassem a bondade das coisas do Governo, mas já não posso aceitar,
porque isto não está no domínio do opinável, que se diga que uma associação sem fins lucrativos é um conceito subjectivo. Por menos do que isto se reprova no 1.º ano do curso de Direito. Uma associação sem fins lucrativos é um conceito indeterminado, impreciso, subjectivo? Está perfeitamente tipificado no
Código Civil. As associações sem fins lucrativos fazem parte das pessoas colectivas, as quais, em Portugal, obedecem ao princípio da tipicidade. 15to é, só pode haver as pessoas colectivas previstas na lei, e nestas incluem-se
as sem fins lucrativos.
Segundo requisito: que promovam actividades económicas. Portanto, está identificado o objecto social
das associações, pelo que não tem outro.
Terceiro: que tenham impacto internacional.
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Quarto: que tenham relevante interesse público.
Quinto: que sejam fora dos grandes centros urbanos.
Finalmente, como sexto requisito- e esta é a questão virtual, em que tudo está em causa -, que tenham sido objecto de garantia do Estado.
Tivemos oportunidade de explicar...
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Só falta o sétimo. Que seja o Europarque!
0 Orador: - Serão todas as entidades que tenham estes requisitos.
Mas, Sr. Deputado, se formos rigorosos, há desde logo um núcleo muito restrito de entidades susceptíveis de beneficiar disto. Tudo aquilo de que se falou, em termos de opinião pública, talvez mais correctamente em termos de opinião publicada, sobre a pluralidade ou eventualidade de riscos ao ser aplicada a entidades mais estranhas, é um absurdo. E porquê? Porque este último requisito, o sexto, tem desde logo uma função de restrição mínima, que é a de determinar que, previamente, tem de haver um empréstimo garantido pelo Estado. Ora, tivemos oportunidade de explicar, numa nota que eu próprio enviei à Casa Civil do Sr. Presidente da República, no dia 17 de Fevereiro, que estes requisitos têm de ser aferidos nos termos da análise da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro.
0 Sr. Guilherme d'0liveira Martins (PS): - 15so é que está errado!
0 Orador: - Peço desculpa, mas não está errado, porque a garantia do Estado, como releva constitucionalmente, como o Sr. Deputado sabe muito bem, pois é um jurista imérito nestas matérias noutras também, mas especialmente autorizado nestas é o único limite em que o Estado pode intervir e em que pode juridicamente comprometer-se, em termos de garantia, pela lei, quer pela lei da Assembleia da República, quer pelos limites inscritos no Orçamento do Estado e no quadro constitucional. É claro que qualquer outro tipo de intervenção seria admissível numa entidade privada ou no domínio meramente contratual, que não está aqui em causa. 0 aval do Estado, que é o que está em causa, foi dito expressamente- esta informação não foi sonegada, nem tão pouco foi dada indirectamente -, tem de beneficiar do empréstimo garantido nos termos da Lei n.º 1/73, que, por sua vez, também é muito clara. Aliás, diria mais, é clara mas não tão rigorosa em termos de determinação normativa como a hipótese que o Governo coloca. Portanto, posto isto,...
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Muito rapidamente, gostaria de dizer que estou de acordo em que, de facto, uma garantia prestada nos termos da Lei n.º 1/73 não oferece dúvida alguma. 0 que a lei diz, no entanto, não é isso. A proposta de lei apenas fala numa garantia prestada pelo Estado. Por que razão não fala no aval? Por que razão é que a
proposta de lei não fala na Lei n.º 1/73, que de facto poderia objectivar este caso?
0 Orador: - Sr. Deputado, repito, seria não digo errado mas meramente redundante a lei estar a aferir a qualidade ou a natureza do quadro normativo desta garantia, porque, no meu entendimento, é a única que o Estado pode prestar, numa situação deste género, a entidades privadas. 0 Estado não pode prestar, como o Sr. Deputado concordará comigo, sem uma anterior previsão expressa na lei, qualquer garantia ou empréstimo a entidades privadas, e para o fazer é necessário um despacho casuístico do Ministro das Finanças, fundado e habilitado nesta Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, a qual diz, muito claramente, em que condições pode haver um empréstimo garantido pelo Estado. A partir desse momento, não vejo que possa haver o risco de não se saber a quem é aplicável a lei.
Admito que possa dizer-se, como eventual crítica à posição do Governo, que a norma era demasiado restritiva; o contrário não posso aceitar, nem poderia nunca admitir - no fundo, era o que estava subjacente a algumas críticas - que a lei seria boa ou má em virtude da qualidade dos destinatários que dela beneficiariam. Tal é, de todo, inaceitável e não posso, de maneira alguma, discutir na base de que as leis são boas ou más depois de saber a quem vão ser aplicadas ou quem delas beneficiará.
Reitero, de uma vez por todas, que a lei não se destina ao Europarque, pois é geral e abstracta. Foi dito, reitero e garanto, em absoluto, que a lei se destina a ser aplicada a todas as entidades que estejam nestas situações. Tomámos a iniciativa de esclarecer no Parlamento o que se passa com a Euro-Parques porque, como é sabido, é talvez uma das primeiras entidades a ser beneficiada e que terá maior envergadura pública.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
o Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para nós, esta proposta de lei tem uma história em que os principais intervenientes não ficaram numa situação muito confortável.
0 Sr. Presidente da República, após o envio, para promulgação, do projecto de decreto-lei em causa, solicitou ao Governo informações sobre o caso específico que tinha em vista para a concessão de bonificações de juros para empréstimos destinados a iniciativas deste tipo.
0 Governo invocou o carácter geral e abstracto da lei para não dar essas informações o que, do nosso ponto de vista, não foi muito normal. 0 Sr. Presidente da República entendeu que, nessas circunstâncias, não podia promulgar um diploma de carácter geral e abstracto, comportamento que também nos merece algumas reservas, e, para piorar a situação, a reacção imediata do Governo a este veto foi comunicar à opinião pública que o Sr. Presidente tinha vetado o decreto do Europarque. Tudo isto nos parece lamentável e não pode ser esquecido no momento em que o Governo apresenta uma pro-
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posta de lei com o mesmo conteúdo do anterior projecto de decreto-lei.
De uma certa forma, parece-nos vantajoso que o processo legislativo, daqui para a frente, se desenrole por esta via. E que será aprovada uma lei da Assembleia da República, o que reforça o carácter geral e abstracto da iniciativa legislativa, a qual subtrai, de alguma forma, ao absoluto domínio do Governo a gestão da aplicação da lei, uma vez que não seria curial fazer funcionar o processo de revogação de um instrumento jurídico depois de adquirir o carácter de lei da Assembleia da República.
Logo, tendo em atenção o seu carácter geral e abstracto, vamos dar o nosso voto favorável a esta proposta de lei, não obstante o facto de o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro, ao fazer a sua apresentação, se ter centrado no caso do Europarque, o que, aliás, contradiz a resposta posterior, a pedidos de esclarecimento formulados, do Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. Na verdade, perdura uma certa confusão entre o carácter geral e abstracto desta proposta de lei e a sua aplicabilidade ao caso concreto.
Não duvidamos que o instrumento jurídico, agora criado venha introduzir facilidades que não deixarão de ser exploradas por todos aqueles que preencherem os seus requisitos. Nada obsta a que isso aconteça e é mesmo previsível.
Os méritos da proposta de lei e do anterior projecto de decreto-lei são de aplaudir porque é positiva a construção dessas infra-estruturas, que não se traduzem apenas num benefício particular ou privado dos seus promotores. Por exemplo, no caso específico do Europarque, beneficiarão da promoção e da mobilização das exportações os que expuserem os seus produtos a eventuais importadores de outros países assim como a própria atracção desses agentes económicos a uma determinada área do nosso país poderá criar oportunidades para a mobilização de exportações que ultrapassem, inclusivamente, os próprios expositores em tais certames. Portanto, trata-se de um benefício geral e público que justifica que parte dos encargos com a construção dessas infra-estruturas seja suportado pela Comunidade.
Compreendemos e apoiamos o carácter benévolo desta iniciativa legislativa que se traduzirá no nosso voto positivo, o qual não tem apenas em atenção o caso específico do Europarque. Não é que não fosse suficiente; se o Governo tivesse optado por fazer um decreto nominativo de aplicação estrita e específica ao Europarque, não teríamos pejo algum em apoiar essa iniciativa, aliás, justificava-se per si.
Agora, esse caso específico, apesar de não ter sido referenciado, foi invocado na resposta dada ao Sr. Presidente da República. "As leis - e estou recordado das expressões utilizadas - são gerais e abstractas e não se fizeram, Sr. Presidente da República, para se aplicarem a casos concretos".
Essa argumentação não foi só incorrecta como está em contradição com a prática legislativa do Governo e do Ministério das Finanças e, como já foi aqui mencionado, este Ministério utilizou recentemente a possibilidade de fazer decretos-leis de aplicação específica, os tais decretos-leis nominativos, o que aconteceu, por exemplo, no caso do BPA em que chegaram a ser decretados os limites do âmbito da ordem dos trabalhos da assembleia geral de uma determinada empresa.
Repito, não faz qualquer sentido a argumentação utilizada pelo Governo para contrariar as razões invocadas pelo Sr. Presidente da República. É que, quando disse: "Sr. Presidente da República, as leis são gerais e abstractas, não devem tratar de casos específicos", não tinha presente, nessa altura, a forma como costuma actuar nem a prática específica do Ministério das Finanças.
Do nosso ponto de vista, esta história deve ser lembrada para que não se repita e é lamentável que os seus principais intervenientes, incluindo o Governo, não tenham ficado bem nela.
Não obstante, estão associados a esta proposta de lei determinados méritos, sobretudo o seu carácter geral e abstracto, e fazemos votos para que venha a beneficiar destes incentivos porque tudo o que possa mobilizar as exportações, a actividade empresarial, a criação de emprego, é absolutamente necessário.
0 que o Governo possa fazer, mesmo tardiamente, a este propósito, deve ser apoiado. Por outro lado, sem a actividade dos empresários, dos empregadores privados, não poderão ser criados empregos que minorem o flagelo do desemprego que, neste momento, não só nos preocupa como a todo o país.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está em causa um episódio, a meu ver muito pouco feliz para o Governo e para o PSD, relativamente a um tema sério. Apesar de o Sr. Secretário de Estado, Dr. Paulo Teixeira Pinto, ter tido a oportunidade de realçar o facto de ninguém ter questionado a benignidade do fundo da questão, estamos perante um episódio da guerrilha política que se desenvolveu lamentavelmente.
Mas o que é que está em causa? Vamos ao fundo da questão! 0 Governo aprovou, por decreto-lei, tendo toda a legitimidade para o efeito - mas este diploma não era acompanhado das justificações adequadas -, uma providência que previa a concessão de bonificações em empréstimos contraídos por associações sem fins lucrativos, em determinadas circunstâncias.
0 legislador pretendeu referir-se, assim, apesar da falta de rigor, às associações que não têm por fim o lucro económico a que alude o artigo 157.º do Código Civil, a que, aliás, o Sr. Secretário de Estado, há pouco, fez alusão, e proeurou definir alguns requisitos que constituem condições para a aplicação da referida bonificação de juros mas não de uma forma inteiramente clara ou feliz.
As associações, começa por se dizer, deverão promover actividades económicas com impacto internacional e relevante interesse público. É vago! E, como se sabe, o relevante interesse público, a existir, dá normalmente lugar, no caso das associações, à declaração de utilidade pública ou de utilidade pública administrativa. Esse seria um dado mais objectivo.
Depois - pasme-se! - não se diz a que se destinam os empréstimos. Este ponto, que é importante, não deixa de ser um erro do legislador. A fórmula usada permite que o empréstimo possa orientar-se para uma
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actividade que não seja de interesse público porque, como é bem de ver, a associação pode desenvolver actividades de índole diferente nas quais caberão também fins directamente ligados aos interesses dos associados.
Não se fala no fim da operação mas, sim, no sujeito e no carácter das actividades por ele prosseguidas, as quais deverão decorrer fora dos grandes centros urbanos. Já falámos sobre isso. Mas o que são centros urbanos? Abrangem ou não as áreas metropolitanas? Lá está! Mais uma vez, estamos perante uma falta de rigor e uma porta aberta à discricionariedade, como é manifesto.
Contudo, a falta de rigor continua e o carácter vago chega ao cúmulo quando se diz que os empréstimos que podem beneficiar de bonificações de juros deverão ter sido objecto de garantias do Estado. 0 Sr. Secretário de Estado já aqui nos esclareceu que está a pensar na aplicação da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, ou seja, nos avales do Estado. Por que razão não se fala nisso expressamente? Dizê-lo é prova de uma certa leviandade, permita-se-me a expressão, uma vez que a figura típica da garantia, como, aliás, já foi aqui reconhecido, é justamente a que decorre da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro.
0 aval do Estado, para ser aplicado, tem de ser claramente indicado e submetido aos limites da autorização parlamentar. A que garantia, portanto, se alude aqui? É um ponto que carece de ser esclarecido. Já tive oportunidade de perguntar, por exemplo, ao Sr. Secretário de Estado, Dr. Walter Marques, se as cartas de conforto estariam abrangidas e ele, implicitamente, disse-me que não. 0 Sr. Secretário de Estado Paulo Teixeira Pinto também me disse que não, mas importa clarificá-lo!
0 projecto de diploma diz ainda que as bonificações são suportadas pelo Orçamento do Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro, e especifica que a percentagem da bonificação, calculada com base na taxa de referência criada pelo Decreto-Lei n.º 359/89, de 18 de Outubro, é definida caso a caso, por despacho do Ministro das Finanças, não podendo exceder metade daquela taxa. Penso que é um novo lapso: despacho? E porque não portaria? Porque não o instrumento que está previsto exactamente no Decreto-Lei n.º 359/89? Mas isto é uma tecnicidade e não importa entrarmos por aí.
Todo este carácter vago, misterioso, incorrecto e leviano levou, de facto, à ocorrência desta situação. 0 Presidente da República - toda a documentação o demonstra - perguntou: "A que se aplica este diploma?" E o Governo não disse a que se aplica; escudou-se, fundamentalmente, na ideia de que"é um diploma geral e abstracto. Sendo um diploma geral e abstracto, não temos de dizer a que é que ele se aplica." Mas, pelos vistos, já toda a gente sabia que o diploma visava aplicar-se ao Europarque. E, naturalmente, não está em causa a importância do projecto do Europarque que, aliás, será inaugurada, no próximo dia 8 de Abril, com a presença do Sr. Primeiro-Ministro.
De facto, não está em causa a importância daquele projecto mas, sim, saber por que razão o Governo não deu esse esclarecimento ao Presidente da República, que é a autoridade legítima para promulgar os diplomas. Tudo teria sido mais claro, ter-se-ia evitado todo este processo se, à partida, se tivesse dito que o diploma é geral e abstracto, como acaba de dizer o Dr. Paulo Teixeira Pinto, mas que um dos casos a que visa aplicar-se é o do Europarque.
Portanto, houve contradição - e é manifesta, como já aqui se verificou hoje - que, depois, fica clara e evidente na infelicíssima declaração do Secretário-Geral do PSD - e, repito, "infelicíssima declaração". Na verdade, falando na crítica à opção relativa à nova ponte sobre o Tejo, o referido secretário-geral diz, logo a seguir, que"o Presidente da República vetou o diploma do Europarque." Pasme-se! Vetou o diploma do Europarque! Um diploma específico, portanto, um acto especificamente orientado para o Europarque! 0 Sr. Comandante Azevedo Soares não é jurista, mas não tomou qualquer cautela nesta matéria e disse: "É o diploma do Europarque!" Está dito, está claro, é evidente: era o diploma do Europarque. Mais adiante, referindo-se ainda ao Presidente da República, disse: "( ... ) e, depois, afirmou publicamente que ignorava qual era o seu verdadeiro objectivo." Pois, é natural: o Governo não esclareceu!
0 Sr. Comandante Azevedo Soares continuou, dizendo que "um Chefe de Estado não pode pronunciar-se nestes termos sobre matérias que admite desconhecer." Absurdo: "admite desconhecer"? Claro! Então, o que estava em causa era o Europarque? Se assim era, porque não foi dito, logo à partida, que "o Europarque é uma das situações que aqui se aplica", com a clareza e com a frontalidade que o Sr. Secretário de Estado do Tesouro há pouco aqui nos trouxe, ao dizer que "é o caso do Europarque, e os termos concretos da operação são os seguintes ( ... )"? De facto, ter-se-ia poupado muito relativamente a este episódio.
0 Sr. Antunes da Silva (PSD)- - Depois dizia que não era abstracto!
0 Orador: - Sr. Deputado Antunes da Silva, permitir-me-á que invoque a minha modestíssima qualidade de professor de Direito e que concorde com o que o Dr. Paulo Teixeira Pinto acabou de dizer: o Governo poderia ter feito - tinha legitimidade para tal - uma "lei-medida", utilizando o decreto-lei aplicável ao Europarque. Repito: tinha legitimidade para o efeito! Esta é a situação concreta no plano jurídico e não há duas opiniões relativamente a isto.
0 Sr. Antunes da Silva (PSD): - E que diria o Sr. Presidente nessa circunstância?
0 Orador: - Sr. Deputado Antunes da Silva, o que está aqui em causa é o seguinte: por que razão é que, no momento, próprio, o Governo não disse aquilo que, agora, aqui está a dizer, ou seja, que este projecto de diploma, independentemente do seu carácter gra1 e abstracto, se aplicaria também ao Europarque? E isto que está aqui em causa e é o que nos leva a concluir que se tratou apenas de um episódio numa guerrilha política, que foi apenas um episódio inserido em determinado contexto, que pode ser interpretado, por exemplo, à luz das declarações do líder parlamentar do PSD quando fala na "estratégia da anormalidade". Este é mais um episódio na "estratégia da anormalidade". É evidente!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portanto, o que está em causa não é, obviamente, o caso concreto do Europarque, não é o carácter benigno desta solução. 0 que está em causa - isso, sim! - é todo o procedimento que foi usado e
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que, no fundo, significa o seguinte: o Governo e o PSD, em momentos cruciais, parecem desejar cultivar a guerrilha institucional para, depois, em termos extremamente infelizes, ...
0 Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Nós não fazemos comunicados às 3 da manhã!
0 Orador: - ... o Secretário-Geral do PSD vir fazer estas declarações que, no fundo, são de uma extraordinária infelicidade e, mais do que isso, são absolutamente incorrectas e vão contra o que é a própria posição do Governo e contra o que acaba de ser-nos dito, em dois discursos, a duas vozes. E digo "a duas vozes" porque o Sr. Dr. Walter Marques insistiu em que esta proposta de lei visava o Europarque, enquanto o Sr. Dr. Paulo Teixeira Pinto nos, salientou aqui o seu carácter geral e abstracto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 que está aqui em causa, portanto, é um episódio triste, que se espera não se repita, mas que é bastante revelador da fragilidade política e estratégica do PSD neste momento.
0 Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Vota a favor?
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Pará pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
0 Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, depreendo da sua intervenção que V. Ex.ª concordou com o veto presidencial. Mas V. Ex.ª terá concordado com o veto presidencial apenas porque o Sr. Presidente da República não terá percebido que este diploma se aplicava também ao Europarque? 15to é, segundo o pensamento de V. Ex a, o veto presidencial só faz sentido porque o Sr. Presidente da República não percebeu, através da leitura do texto, que o Europarque também se incluía no âmbito deste diploma? Quer dizer: se a lei fosse mais específica, embora, na realidade, não deva sê-lo, já não fazia sentido o veto presidencial?
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, concordei. com o veto do Sr. Presidente da República, naturalmente, pelas razões que referi. 15so é claro, é evidente, resulta do que acabo de dizer.
Mas, Sr. Deputado Rui Rio, sejamos claros. A verdade é que quando o Sr. Deputado nos vem dizer, implicitamente: "Bom, o Sr. Presidente não percebeu bem o que estava em causa"... Sr. Deputado Rui Rio, já consultou todo o processo? Já?...
O Sr. Rui Rio (PSD): - Não foi isso que eu disse!
O Orador: - Então, Sr. Deputado, permito-lhe que me interrompa e que diga qual é exactamente o seu problema.
0 Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Deputado, eu disse que V. Ex.ª concordou com o veto presidencial...
0 Orador: - Com certeza!
0 Sr. Rui Rio (PSD): - ... E por que razão? Porquê? Porque o Sr. Presidente da República não percebeu, ou não foi informado - tanto faz -, que este diploma também se aplicava ao Europarque. Em seguida, perguntei-lhe se, no caso de o Sr. Presidente ter sabido isso, V. Ex.ª já deixaria de concordar com o veto, se já entendia que não deveria haver veto só por este aspecto.
0 Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Muito bem!
0 Sr. Rui Rio (PSD): - Se a lei fosse mais específica - e a lei não deve ser específica -, V. Ex.ª já entendia que o diploma não devia ser vetado?
É que o problema tem de ser posto ao contrário'
Aplausos do PSD.
0 Orador: - Sr. Deputado Rui Rio, o Governo violou um dever elementar ao não esclarecer cabalmente esta situação. E poderia tê-la esclarecido, uma vez que, à partida, sabia que este diploma era aplicável ao Europarque, que visava a aplicação ao Europarque. 0 Governo violou esse dever elementar.
0 Sr. Miranda Calha (PS): - Muito bem!
Protestos do PSD.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.
0 Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este projecto de diploma hoje aqui apresentado pelo Governo, se não fosse a envolvente que lhe conferiram o Sr. Presidente da República e o Partido Socialista, seria objecto de um debate, provavelmente em torno do desenvolvimento regional, ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
... do ponto de vista de que o Governo tinha tido a sensibilidade de perceber- e de traduzir isso na prática- que há um conjunto de infra-estruturas e de iniciativas das associações e do movimento associativo que são extremamente importantes para o desenvolvimento do País.
Simplesmente, o Sr. Presidente da República habituou-nos, nos últimos tempos, a interferir na acção governativa de uma forma que consideramos reprovável. Foi o caso quanto ao diploma sobre bonificação de juros, foi, ontem, o caso do diploma da lei de imprensa, foi, anteontem, a questão da ponte, mais além, o problema das gravuras rupestres. 0 Sr. Presidente da República, neste final de mandato, está em permanente dilema sobre se deve ser apenas Presidente da República ou se deve ter uma participação efectiva no dia-a-dia do exercício governativo. É disso que se trata!
E que o que está em causa não é a forma como se processa este problema do apoio ao movimento associativo. 0 que está em causa - e a isso o Partido Socialista diz nada, esquece, silencia! - é saber como uma
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iniciativa deste jaez, uma iniciativa que provém de uma associação empresarial chamada Euro-Parques... E, a este propósito, faço aqui um parêntesis para dizer que nem eu próprio nem o meu grupo parlamentar temos quaisquer problemas em assumir que foi essa iniciativa que levou a que o Governo reponderasse o problema do apoio a um conjunto de investimentos de que o País necessitava há já muito tempo, que, por exemplo, nos últimos quatro ou cinco anos, se traduziu na criação de um parque de infra-estruturas de exposição que hoje nos permite concorrer com Espanha, onde aquele movimento já está consolidado há muitos anos.
Esta sensibilidade do Governo, ao bonificar financiamentos de montante elevadíssimo que o Partido Socialista sabe - faço-lhe essa justiça! - que não são facilmente realizáveis no quadro dos movimentos financeiros de uma qualquer associação, deveria merecer aplauso, justamente a este propósito. Mas não foi isso que aconteceu. A propósito de uma questão levantada pelo Sr. Presidente da República, perfeitamente datada neste quadro de conflitualidade com o Governo, o Partido Socialista, qual rectaguarda parlamentar de S Ex.ª, vem, nesta sede, mostrar-se preocupadíssimo com este problema, sendo certo que estou seguro que este diploma também terá aplicação no futuro e que, portanto, não se trata apenas de uma questão suscitada a propósito do Europarque.
E pode V Ex.ª, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, invocar, como já o fez, várias referências de diversas personalidades que é óbvio que, por uma questão de facilidade, haverá a tendência de se traduzir, de se aplicar e de se referir este diploma a um caso concreto. Mas outros se seguirão.
Não tenho quaisquer problemas em acreditar que o Governo foi suficientemente explícito para com o Sr. Presidente da República e gostaria que o Governo relatasse a esta Assembleia o teor das informações prestadas a S. Ex.ª e a forma como, no final, as coisas não se traduziram apenas no desconhecimento invocado pela bancada do Partido Socialista. Pelo contrário, quanto a mim, este é um caso exemplar de tentativa de obstaculizar a realização de objectivos e de uma boa ligação entre a sociedade civil e o Governo.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, louvo a acção do Governo e incentivo-o a que prossiga nesta linha, ou seja, no sentido de estar directamente ligado e conexado com os interesses de largas manchas dos sectores associativos e do movimento associativo, que, sem dúvida, podem contribuir para o desenvolvimento das actividades económicas.
A questão que hoje se coloca é muito simples. 0 Partido Socialista, sempre que o Governo actua de maneira a traduzir a realização do interesse geral, de estruturas que, repito, têm um impacto extraordinário no quadro da nossa integração europeia, tergiversa e levanta questões que, naturalmente, nos surpreendem, uma vez que são questões de pura intendência!
Além do mais, os problemas aqui levantados não têm a ver com a capacidade orçamental de cobrir, justamente, estes custos nem com o facto de a Assembleia da República ter sido ou não tida em conta aquando da discussão orçamental a este propósito mas, sim, com a falta de visão daquilo que consideramos como passos acertadíssimos do Governo, no sentido de resolver os problemas concretos do movimento associativo.
Com efeito, até esta hora do debate, o Partido Socialista ainda não foi capaz de dizer se, apesar das dúvidas e dos problemas surgidos em termos de interpretação, está ou não de acordo com o apoio dado ao Europarque. Ainda não o disse explicitamente! Esse é, a nosso ver, o centro da questão e o problema que, efectivamente, devia estar aqui em causa. E não me refiro apenas ao Europarque, mas a todos os casos que se vierem a colocar, no futuro, e que caiam no âmbito de aplicação deste diploma.
Por esta razão, votaremos favoravelmente a proposta de lei em apreciação.
Consideramos, todavia, que esta era uma matéria dispensável de ser trazida à Assembleia da República se, efectivamente, o Sr. Presidente da República não colocasse, mais uma vez, de forma exemplar, este caso na linha da conflitualidade que, nas últimas semanas, tem presidido aos seus actos relativamente ao Governo.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu):- Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Guilherme d'Oliveira Martins e Manuel Queiró.
Tem a palavra o Sr. Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pinto, a intervenção que fez não tocou o fundo desta questão, porque ele, antes de mais, tem a ver com uma iniciativa que, neste momento, somos obrigados ou levados a discutir, em razão de o Governo, em determinado momento, não ter cumprido com os seus deveres para com o Presidente da República, esclarecendo cabalmente todas as intenções que estavam, por detrás deste diploma.
Em resposta à devolução do diploma, que ocorreu no dia 9 de Fevereiro de 1995, o Gabinete do Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros enviou uma nota que não refere, num único ponto, o Europarque!
Vozes do PSD: - Nem tem de referir!
0 Orador: - Srs. Deputados, então se não tem de referir, por que razão é que, há pouco, o Sr. Secretário de Estado Walter Marques começou a sua intervenção referindo, justamente, o Europarque? E por que razão é que o Secretário-Geral do PSD, Sr. Comandante Azevedo Soares, identifica este diploma não como o da bonificação de juros mas, sim, como o diploma do Europarque?
Ora, Sr. Deputado Carlos Pinto, isto demonstra, de forma clara e evidente, que se trata de uma pretensão de guerrilha política; procura-se a guerrilha política, como é óbvio!
Relativamente à questão que coloca, isto é, se estamos contra o Europarque, respondo-lhe que é evidente que não estamos contra o Europarque. 15so é óbvio!
Sr. Deputado Carlos Pinto, sou Deputado eleito pelo Porto e tenho, nas minhas relações familiares antigas, ligações à Associação Industrial Portuense, que é uma instituição prestigiada não só no Porto como no País. Ora, é evidente que o Europarque tem uma importância crucial. Aliás, logo no início da minha intervenção, disse que o que está em causa não é a benignidade da solução mas, sim, a guerrilha política que está por detrás disso! E, sobretudo, o facto de, na resposta à Casa Civil do Sr. Presidente da República, não haver uma única men-
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ção ao Europarque e ter havido, aqui, a hombridade, de pôr a questão, porque a relação era com o Parlamento.
Então, há dois pesos e duas medidas: para o Presidente da República não se diz que é o Europarque e para o Parlamento diz-se que o é? Essa é que é a questão fundamental!
Então, Sr. Comandante Azevedo Soares, em que é que ficamos? Por que é que não fala no diploma das bonificações e fala no diploma do Europarque? Esta é que é a questão!
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Foi só um exemplo!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró, por 2 minutos, dado que o CDSPP já não dispõe de tempo.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Pinto, o senhor começou por dizer que se não fosse a envolvência que o Sr. Presidente da República tinha dado a este caso, o debate de hoje centrar-se-ia no desenvolvimento regional e nos seus apoios.
Gostaria de o chamar à atenção, porque se não fosse a envolvência que lhe deu o Sr. Presidente da República, isto é, se o Sr. Presidente da República tivesse promulgado o decreto-lei, não estaríamos aqui a debater nem o Europarque nem o desenvolvimento regional, nem eu teria oportunidade de concordar, por esta forma ou por outra qualquer, com a iniciativa de apoio ao desenvolvimento regional.
0 Governo teria tomado esta iniciativa, geral e abstractamente, e depois teria dado o presente à Euro-Parques, apoiado neste instrumento legislativo, promulgado pelo Sr. Presidente da República.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, peço-lhe que seja conciso. A Mesa concedeu-lhe 2 minutos porque o CDS-PP já não tinha tempo.
0 Orador: - 0 Sr. Presidente conseguiu interromper-me justamente quando estava a terminar e, com isso, perder mais 0,3 minutos.
0 Sr. Vieira de Castro (PSD): - 15so é desculpa!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - E acaba de perder outros 0,3 minutos.
0 Orador: - Sr. Carlos Pinto, a questão é esta: este debate devia ter ocorrido por iniciativa própria do Governo, para que este não se relacione com a sociedade civil numa postura de dádiva daquilo que, no fundo, é de todos nós, que são os recursos públicos, para que a Assembleia possa assumir estas opções e para que este instrumento legislativo possa ser uma lei da Assembleia da República que perdure no tempo e não seja revogada depois de uma aplicação específica e concreta, de forma a não ser apelidado por um qualquer secretário-geral de um qualquer partido o "decreto do Europarque".
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.
0 Sr. Carlos Pinto (PSD) - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, o problema que o senhor volta a referir é o da falta de informação por parte do Sr. Presidente.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - É o único que está em causal
0 Orador:- V. Ex.ª, no próprio relatório que assinou, refere que o Sr Presidente vetou o diploma justamente por "não oferecer na sua nomeação o mínimo de precisão e determinabilidade exigíveis".
Como V. Ex.ª deve compreender, não é possível responder a uma matéria destas, porque o Governo poderia estar, no âmbito desta iniciativa, subitamente, perante uma outra iniciativa de outra entidade e não cabia ao Governo, ainda que todos soubéssemos que já estava em curso uma iniciativa da Euro-Parques, a necessidade de estabelecer uni diálogo com S. Ex.ª o Presidente da República à volta de entidades que, justamente, confeririam carácter pontual a esta matéria.
V. Ex.ª trouxe aqui a questão de ser Deputado pelo Porto. Mas é essa a razão por que V. Ex.ª vê como indiscutível o seu voto em relação a uma estrutura destas? É só essa a razão?
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Claro que não!
0 Orador: - Penso que todos nós, independentemente da nossa origem, ternos consciência de que estruturas destas, sejam construídas no Algarve, no Minho, no Centro ou no Interior, são importantes.
0 que ponho em causa, em termos políticos, é o facto de o PS, numa matéria tão clara como esta, não considerar- e essa leitura, quanto a nós, é a correcta! - que o Sr. Presidente da República foi um pouco mais além do que lhe seria exigível em termos de solicitação ao Governo. É que, no fundo, o que está em causa é o apoio ao movimento associativo relativamente a infra-estruturas deste tipo.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Não é isso que está em causa!
0 Orador: - Neste debate, V Ex.ª, levantou o problema da forma e de saber se o Sr. Presidente da República terá ou não sido "beliscado", na sua exigência de informações, por parte do Governo e não a questão fundamental, que é a de sermos céleres, uma vez que, como o Sr. Deputado referiu, uni dia destes o Europarque vai ser inaugurado e precisa de ter um quadro financeiro perfeitamente definido.
Sr. Deputado Manuel Queiró, não percebi a sua questão. 0 debate acerca do desenvolvimento regional, no ponto em que decisões destas o reforçam, já estaria consolidado se o Sr Presidente da República não tivesse inviabilizado a promulgação deste diploma.
Nesse sentido, penso que, mais do que o debate, mais do que as convicções que possamos aqui reafir-
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mar sobre o desenvolvimento regional e a forma como ele pode processar-se, devemos exigir que o Governo o traduza por actos e não apenas por palavras.
0 Sr. Presidente da República, em vez de nos trazer um justificativo que sustente o seu veto acerca das considerações eventuais que possa ter e da sua filosofia sobre o desenvolvimento regional, apenas aborda aqui uma questão muito precisa - e, quanto a nós, muito menor -, que atrasou o desenvolvimento de uma iniciativa que reputamos muito importante.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
0 Sr. Secretário de Estado da Presidência do conselho de Ministros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumpre-me, em primeiro lugar, deixar muito clara uma explicitação sobre dois pontos que aqui foram suscitados, que reputo de graves.
É totalmente inaceitável- e quero deixar isso bem claro antes de pronunciar-me sobre o conteúdo do diploma- a afirmação de que o Governo sonegou informações ao Sr. Presidente da República. Não aceito isso de maneira nenhuma, Sr. Deputado Manuel Queiró! Este diploma simples, de conteúdo estritamente administrativo, com apenas três artigos, mereceu uma nota explicativa de três páginas do meu gabinete, a qual foi enviada, através da Casa Civil, ao Sr. Presidente da República.
Há uma regra que ao longo destes três anos e meio que exerço as minhas funções nunca quebrei nem nunca quebrarei: nunca, directa ou indirectamente, em on ou em off, sugeri ou falei de qualquer contacto que tive com a Presidência da República! Não o farei hoje, mas como o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, para meu grande espanto, tem a nota que enviámos à Presidência da República, fará com certeza o favor de dar-lha a conhecer.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Orador: - Sr. Deputado Manuel Queiró, essa nota não foi dada por mim ao Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins! Nunca fiz nem nunca farei isso com um documento do Governo que seja enviado a nível oficial para a Presidência da República. Repito, da minha parte, isso nunca será conhecido de alguma outra entidade que não apenas das pessoas que enviem essa correspondência. Entre a Presidência do Conselho de Ministros e a Presidência da República nunca uma terceira entidade, ainda que titular de um órgão de soberania - com todo o respeito que lhe é devido -, obterá da minha parte essa informação, sem, pelo menos, haver essa oposição prévia.
No entanto, porque esse documento existe e foi referido aqui pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, gostaria de ler um parágrafo sobre o que está em causa.
Foi aqui explicado que esse era um acto da competência administrativa do Governo e que o exercício desse poder discricionário tinha, pelo menos, uma dupla vertente vinculística. a competência e o fim.
Ora, isto está tudo aqui claramente explicitado. A competência é do Ministro das Finanças; o meio é uma bonificação, que vai até 50 % da bonificação máxima,
estabelecida em portaria como sendo de 13 % - aliás, aproveito, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira. Martins, para dizer-lhe que a portaria a que se refere o Decreto-Lei n.º 359/89 já está publicada, é a Portaria n.º 45-A/94, que remetemos - e bem! - para um despacho, porque esse é o limite indexante à referida portaria. Esta portaria estabeleceu 13 % e em cada caso o Governo, por despacho, poderá estabelecer até metade, isto é, até 6,5 %, mantendo-se sempre esse indexante.
0 exercício discricionário deste poder, caso a caso, terá de ter uma competência, que é do Ministro das Finanças; terá de ter um limite do seu exercício, que é aquele que está estabelecido, e um fim, que é a verificação dos pressupostos e requisitos que, há pouco, referi.
Nesta nota, nós próprios tomámos a iniciativa de dizer o seguinte: é este o conteúdo do fim, elemento vinculado do poder em análise que sempre tem de se encontrar presente no seu exercício, sob pena do vício de desvio de poder, objectivamente aferido pelos tribunais mediante a análise dos motivos do acto, identificados na devida fundamentação.
Está claro, e nós dissemo-lo textualmente, que, em cada caso, vai ter de haver um despacho do Governo devidamente fundamentado e aceitamos que ele seja sindicável, como não pode deixar de ser, nos termos da lei. Se o Governo, alguma vez, este ou outro governo, porque este diploma é geral e abstracto, e vai vigorar para o futuro até que outro governo o revogue - se for aqui aprovado, por esta Assembleia -, não exercer a sua fundamentação, com estes pressupostos e nestes requisitos, será contestado e impugnado apenas pelos tribunais e apenas pelos tribunais, não pelos órgãos políticos, pois estamos perante matéria de natureza administrativa.
A segunda questão, que não posso, de maneira alguma, aceitar, é dizer que o Governo denunciou o veto. Devo dizer, Sr. Deputado, que recebi a comunicação do veto do Sr. Presidente da República e passaram vários dias até que um semanário o divulgou e pode facilmente aferir-se pela respectiva informação que não derivou de alguma comunicação do Governo.
Não aceito que alguma vez se possa dizer que o Governo denunciou o veto. Assim como não aceito que se diga que o Governo não prestou informação, não aceito também que se diga que o Governo denunciou o veto não o fez, embora pudesse fazê-lo, legitimamente. Nem isto fez e desafio algum dos Srs. Deputados a provar aqui que, alguma vez, eu ou algum membro do Governo tenha denunciado o veto do Sr. Presidente da República nesta matéria.
Disse também o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins que podia ter sido feita uma lei para a EuroParques. Reafirmo - aliás, tinha tomado a iniciativa de o dizer- que, juridicamente, podia fazê-lo; mas não devia nem deve fazê-lo nunca. 0 Governo não o fez, não porque não pudesse, mas porque não devia, porque, aí, os Srs. Deputados, muito legitimamente, poderiam criticar o Governo por estar a violar o princípio da igualdade. Os Srs. Deputados diriam: porque é que dão à EuroParques e não dão a outras entidades que estejam nas mesmas circunstâncias? Era o que os Srs. Deputados diriam, e diriam bem!
0 Governo, em igualdade de circunstâncias, com os mesmos requisitos e nas mesmas condições, tem o dever de agir igualmente e não pode dar a um o que
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recusa a outro. Essa é a razão pela qual o diploma é, definitivamente, geral e abstracto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Orador: - Não é o diploma do Europarque, embora seja publicamente conhecido assim! É sabido que, nos meios não exclusivamente jurídicos, em termos de comunicação social ou de opinião pública, muitas vezes há diplomas que são vulgarmente conhecidos por uma expressão redutora.
Vou dar um exemplo típico, recente: não há ninguém, incluindo no mercado, que não fale da Lei Sapateiro, mas esta lei não existe. Existe o Código do Mercado de Valores Mobiliários. Outro exemplo, também muito recente, é o do diploma interpretativo do decreto-lei relativo às ofertas públicas de aquisição; todas as pessoas dizem que é o diploma do Totta, mas não vem lá dito que é do Totta!
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas é!
0 Orador: - Mas é aplicável também ao caso do Banco Totta & Açores, como o é também a todos os casos futuros! Há dias, os Srs. Deputados, diziam que agora nunca mais haveria ofertas públicas de aquisição, se ele fosse só para o Totta, nem essa crítica poderiam fazer! Como é que poderiam fazer essa crítica se ele fosse esgotado no Totta?! É porque o diploma é geral e abstracto e não se aplica apenas ao Banco Totta & Açores! É outro exemplo! É designado como o diploma do Totta!
De resto, o Sr. Presidente da República, quando promulgou esse diploma, na nota justificativa que vinha a acompanhar a promulgação (o que, aliás, d uma figura atípica, porque ou há promulgação ou há veto e só o veto é que deve ser justificado e não a promulgação), referia-se ao Banco Totta & Açores. Mas o diploma não é apenas para o Banco Totta & Açores e ninguém nos perguntou nada.
Dizem agora os Srs. Deputados que o Governo não disse que era para a Euro-Parques. Mas tinha de dizer'?' Se eu estou a dizer e repetir que o diploma é geral e abstracto, porque é que tenho de identificar algum destinatário da lei? É para a Euro-Parques e para todos os outros...
Vozes do PSD: - Muito bem!
0 Orador: - . . e não posso aceitar que se diga que, se fosse para a Euro-Parques já era promulgado! 15so é que não posso sequer pensar que o Sr. Presidente da República admitisse e não admito sequer que o Sr. Presidente da República pense isto!
Aplausos do PSD.
Estaria o problema resolvido se eu tivesse dito que era para a Euro-Parques? Estaria resolvido? 0 que eu devia ter feito era uma lei-medida? E se a questão fosse a oposta? Se nos tivesse sido perguntado se a Euro-Parques é uma entidade que reúne os requisitos para beneficiar da lei, a resposta teria sido clara, teríamos dito que sim. Mas o que é certo é que não temos de nos antecipar! Porquê a Euro-Parques e não outra entidade qualquer?!
Julgo que o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins conhecerá de mim o suficiente para saber que sou rigoroso, não tenho por norma dizer o que não devo e tenho fidelidade na apreciação que faço dos factos.
Sr. Deputado, na nota que tem, está expressamente referido que é aplicável a Lei n.º 1/73. Esta lei define claramente quais são os requisitos e, como eu disse, esses requisitos são menores do que aqueles que constam do diploma do Governo.
0 que a Lei n.º 1/73 prevê para o aval do Estado e sublinho o aval, porque é algo muito mais rigoroso e exigente, uma vez que o Estado corre muito mais riscos com o aval do que com um subsídio -, na sua Base II, é que o aval será prestado apenas quando se trate de financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional. Pergunto: este conceito está mais densificado do que os conceitos que o Governo utilizou? Do que aqueles seis pressupostos e requisitos que o Governo utilizou? Manifesto interesse para a economia nacional é mais ou é menos do que o que tínhamos colocado no nosso diploma? Parece-me que é menos.
Que garantias é que o Estado tem? Na Base VII refere-se que tem de haver um despacho fundamentado do Ministro das Finanças e na Base X estabelece-se o seguinte: a concessão do aval do Estado confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da entidade beneficiária da garantia. Aqui, neste caso, ter-se-ão corrido riscos? Não me parece.
Foi dito também pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Tesouro - aliás, alguns dos Srs. Deputados tentaram explorar uma suposta contradição entre o que ambos dissemos, mas, como se deve calcular, tivemos tempo suficiente para conversar sobre o assunto e, portanto, não havia contradição possível- que se aplicava à Euro-Parques e, porque era uma questão pública que estava em causa, quis-se dizer, claramente, que se aplicava à Euro-Parques. No entanto, não podiam, nenhum dos Srs. Deputados, nem ninguém, tirar daí a conclusão, em extrapolação, que se esgotaria na aplicação à Euro-Parques! Se a Euro-Parques o requerer, vai beneficiar, porque reúne os pressupostos, mas se qualquer outra entidade os reunir também beneficiará!
0 ponto nuclear do problema, no entendimento do Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, é o seguinte: na nota não se quis dizer à Presidência da República a quem é que se aplicava. E verdade que não se diz, porque só queremos dizer a quem é que se aplica em geral, ou seja, a quem reúne os requisitos para lhe ser aplicável. Nós não temos de determinar quais são as pessoas a quem é aplicável mas, isso sim, quem são as entidades, o que são coisas diferentes. E, devo dizer-lhe, esses requisitos estavam perfeitamente identificados.
Srs. Deputados, não quero deixar de fazer uma última nota: não faz parte da política do Governo fomentar qualquer guerrilha institucional, muito menos através de um acto legislativo, muito menos através de um acto da competência administrativa do Governo, muito menos quando o Governo, se de alguma coisa poderia ser acusado, era de ter tido excesso de cuidado. E que se tivéssemos feito isto por portaria, a questão nunca teria sido levantada nem sindicada. E por que é que não se fez? Por um respeito escrupuloso e, se me permitem, modelar dos princípios da legalidade e da igualdade.
Aplausos do PSD.
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0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
0 Sr. Guilherme d'Oliveira Marfins (PS):- Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, os esclarecimentos que aqui nos deu não põem em causa o essencial do que foi dito durante este debate. E, Sr. Secretário de Estado, realmente, o que está aqui em causa é a transparência de atitudes e um esclarecimento claro e cabal sobre o que se pretende com um diploma destes.
0 Sr. Secretário de Estado terminou a sua intervenção dizendo que, se o Governo tivesse feito isto por portaria, ninguém tinha suscitado problemas. Devo dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que todas as bonificações, todos os regimes especiais relativos às bonificações têm sido alargados e definidos por decreto-lei. Esta é, de facto, a situação e, por isso, o Governo andou bem ao adoptar o decreto-lei; teria andado muito mal se tivesse adoptado a portaria e teria andado pior se, porventura, tivesse optado- repito, isto é uma avaliação política e não é uma avaliação jurídica - apenas e pura e simplesmente pela lei-medida, como é óbvio.
Sr. Secretário de Estado, o que está aqui em causa fundamentalmente e no que toca ao exercício de competências que neste caso revestem a forma de decreto-lei e, revestindo a forma de decreto-lei, não são competências exclusivamente administrativas ainda que caibam na esfera da competência administrativa do Governo...
0 Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Não são da competência exclusiva do Governo.
0 Orador: - A verdade é que não são da competência exclusiva do Governo; se o fossem, nem sequer poderiam estar aqui a serem discutidas, como é óbvio.
Ora, relativamente à questão, que invocou, de eu ter referido que a nota que o gabinete do Sr. Secretário de Estado enviou para a Casa Civil do Presidente da República estava na minha posse, a verdade é que ninguém teve conhecimento, como o Sr. Secretário de Estado sabe, do seu teor. Aliás, não li qualquer passagem dessa nota e limitei-me apenas a referir aquilo que correspondeu à resposta a uma insinuação do Sr. Deputado Carlos Pinto, segundo a qual o Governo teria esclarecido tudo, incluindo a questão do Europarque. E isso, de facto, não ocorre. Porém, não será de mim, Sr. Secretário de Estado, como saberá, que alguém obterá o conhecimento de uma nota do gabinete do Sr. Secretário de Estado que foi enviada para a Casa Civil do Sr. Presidente da República.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, deste caso que vai encerrar-se, enquanto incidente, o que fica é o seguinte: é óbvio que, ao discutirmos numa Câmara política, como é a Assembleia da República, esta questão, não se esperaria que o debate se fizesse em torno da técnica jurídica - o rigor que o Sr. Secretário de Estado sempre coloca nestas questões é um pressuposto, tenho-o reconhecido em vários momentos e não só agora - porque o que está em causa é a apreciação da envolvente política num momento que é crítico. Naturalmente, não podemos ser indiferentes quando realmente ocorre um veto e foi invocado expressamente o veto, porque num primeiro momento a devolução foi a título de pedido de esclarecimento e depois houve um verdadeiro e real voto.
Era este o esclarecimento que queria prestar a esta Câmara e ao Sr. Secretário de Estado.
Vozes do PS: - Muito bem!
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - 0 Sr. Deputado Manuel Queiró pediu a palavra para que efeito?
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, fui directamente interpelado na intervenção do Sr. Secretário de Estado, pelo que me julgo no direito de utilizar esta figura para esclarecer o Sr. Secretário de Estado.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Então, Sr. Deputado, seja muito breve e conciso porque a esta hora a Mesa não pode ser muito generosa.
o Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): Sr. Presidente, no início da intervenção do Sr. Secretário de Estado perpassou-me uma dúvida pelo espírito: haverá aqui algum equívoco? 0 Governo terá mesmo prestado a informação pedida pelo Sr. Presidente da República? Mas, com o decorrer da intervenção do Sr. Secretário de Estado percebi que ele estava apenas a invocar princípios gerais de direito para justificar o facto de não ter dado a informação em concreto pedida pelo Sr. Presidente da República.
Foi a isso que me referi, aliás, foi público na minha intervenção, e o Sr. Secretário de Estado disse que foi utilizada a expressão sonegar a informação; julgo que não, julgo que não utilizei essa expressão, pois considero-a excessiva e foi o Sr. Secretário de Estado que resolveu utilizá-la para dizer que não aceita, não admite.
Sr. Secretário de Estado, deixe-me dizer-lhe que não leve estes assuntos tão a peito, nem os personalize tanto, porque este clima de confronto entre o Governo e o Sr. Presidente tem outras motivações, ultrapassa-o em muito e não adianta muito tentar transformar estas questões numa guerra entre o Sr. Presidente da República e o Sr. Secretário de Estado porque não é isso que está em causa.
0 Sr. Secretário de Estado disse ainda que não era possível, não admitia nem aceitava que se dissesse que o Governo tinha denunciado o veto do Sr. Presidente da República. Há aqui, agora, uma outra questão, que é a "questão dos chapéus": há o chapéu do Governo e o chapéu do PSD; o chapéu do Sr. Ministro do Mar e o chapéu do Secretário-Geral do PSD.
0 Sr. Rui Carp (PSD): - E há o barrete do PP!
0 Orador: - Ora, entendo que esta argumentação não é aceitável, porque a verdade política é que houve um confronto entre o Governo, do PSD, e o Sr. Presidente da República, em que o veto deste, mais do que denunciado, foi vigorosamente atacado - o Se-
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cretário-Geral do PSD disse que o Sr. Presidente da República tinha vetado o decreto referente ao Europarque.
Ora, nada disto pode ser contornado e entendo que a intervenção do Sr. Secretário de Estado se revestiu de um vigor despropositado em relação ao que está em discussão e à apreciação política que temos de fazer dos actos em causa.
0 Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma curta intervenção.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
0 Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Sr. Presidente, muito brevemente, quero apenas dizer duas palavras.
0 Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, em relação à questão da nota, no fundo, deu uma explicação que aceito; não a ponho em causa, como não pus,
aliás, em causa a posição do Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins. Aquilo que quis sugerir li que era suposto a nota não estar com o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins e não que ele a divulgasse.
Relativamente à questão do decreto-lei ou da portaria, ainda bem que o Sr. Deputado reconhece que temos tido exemplos. Não apenas neste caso, como em todos os outros, quando não há uma norma de habilitação expressa, fazêmo-lo por decreto-lei. 0 que eu quis dizer foi que se se seguisse a prática de outros governos de há 10 anos atrás, estas coisas não se passavam assim, porque nem sequer tinham a natureza que deviam ter, a natureza legal aplicável.
Mas, posto isso, acho que não estamos OM desacordo quanto ao ponto essencial.
Sr. Deputado Manuel Queiró, quanto à questão do vigor, permita-me que lhe diga o seguinte, não gosto que, mesmo nas pequenas questões, haja imprecisão ou pouco rigor em pontos que para mim s4o importantes. E, para mim, os pontos importantes, todos eles, todos os assuntos de Estado, independentemente do relevo público ou mediático que tenham as medidas, devem ser tratados igualmente, com a mesma dignidade e seriedade e com o mesmo grau de exigência.
Na medida em que estou directamente envolvido na preparação desses actos, é natural que me sinta, se alguma vez estiver em causa uma suspeita sobre esse grau de exigência ou de rigor. Repito, Sr. Deputado, que aquilo que foi dito não foi apenas a fundamentação jurídica para a recusa da informação. Foi dada toda a informação, apenas não foram iden1fÍcados nominalmente quais seriam os possíveis deL1natários.
0 Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Mas, hoje, isso foi feito aqui, perante a Assembleia.
0 Orador: - Foi reconhecido, porque, publicamente, em termos mediáticos, o caso tornou-se conhecido através do principal previsível beneficiário da norma, neste momento, que tomou a iniciativa. Repito: foi a própria Associação Industrial Portuguesa que se considerou prejudicada, não foi o Governo.
Não quero falar em nome da Associação Industrial Portuguesa e não o vou fazer; portanto, embora compreenda a sua observação, permita-me discordar quanto ao ponto, mas não quanto a essa questão que tocava directamente aquilo com que se prendeu a minha explicação.
Peço desculpa antecipadamente se não utilizou essa expressão sonegar informação, embora esteja convicto que a utilizou e isso quero reiterar que não faço.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu):- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
0 Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não era minha intenção intervir quando estamos já no final deste debate, mas devo confessar que não posso calar a minha estranheza.
0 Sr. Presidente da República pediu esclarecimentos ao Governo sobre este diploma que estamos a apreciar; o Gabinete do Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros elaborou uma nota de três páginas para esclarecimento de S. Ex.ª, o Sr. Presidente da República.
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Também tem aí a nota do Governo?
0 Orador: - Trata-se de correspondência trocada entre o Governo e a Presidência da República e ficámos a saber que o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins dispõe dessa nota, que o Governo só remeteu ao Sr. Presidente da República.
Sr. Presidente da Assembleia da República, o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins está em manifesta vantagem para discutir este diploma, já que tem em seu poder essa nota e nós não a temos. Aliás, nem conhecíamos o seu conteúdo não fosse o Sr. Secretário de Estado e da Presidência do Conselho de Ministros aqui nos ter feito uma síntese dela.
Sr. Presidente, quero apenas repudiar esta desigualdade de tratamento, de que o meu grupo parlamentar foi vítima.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, quando pedi a palavra ainda V. Ex.ª não tinha dado esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Queiró, mas, mesmo assim, tenho algo a dizer-lhe.
Não está em causa a palavra "sonegar", embora consideremos muito grave o facto de atribuir à nossa bancada palavra que não usamos nem mesmo com os nossos adversários.
Mas não há qualquer dúvida que, quando V. Ex.ª se dirigiu ao meu colega Manuel Queiró, deixou implícito que o teríamos acusado de reserva mental, porque V. Ex.ª nada teria dito ao Presidente e até elevou a voz, dizendo que da sua parte nunca poderia haver um acto desses. Assim, queria varrer a testada da minha bancada quanto a essa acusação subliminar ou que V. Ex.ª deixou nas entrelinhas. Quando queremos acusar o Governo de reserva mental, fazêmo-lo claramente e não em entrelinhas ou por outras palavras.
Mas há uma coisa que V. Ex., não justificou plenamente ao meu colega Manuel Queiró. Quando ele refe-
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riu que as explicações dadas podiam ser diferentes, de modo a dissipar as dúvidas do Presidente da República, com certeza que ele não disse que V. Ex.ª deveria afirmar: "0 Governo fez este diploma para a Euro-Parques." Ninguém esperava que dissesse isto, pois seria demasiada lealdade institucional ou demasiada colaboração institucional, o que não existe entre o Presidente da República e o Governo. Mas entre eles também não é exigível demasiada lealdade ou colaboração institucional...
Aliás, mesmo dentro de parâmetros normais, se o Presidente da República levanta dúvidas não é porque ele ou os seus assessores não saibam o que é a teoria geral do acto discricionário nem qual é a diferença entre o acto de pura legalidade, o acto vinculado e o acto discricionário ou até quais são os elementos do acto discricionário, qual é a sua finalidade e como é que tal acto pode ser atacado.
Ora, exactamente quando o Presidente da República ou alguém pergunta por que surge um texto legislativo, que concede um poder discricionário ao Governo, tem uma razão. Como é natural, atrás da feitura desta lei há interesses que o Governo quer acautelar, porque as leis não nascem- V. Ex.ª sabe isso, como grande jurista que é -, não caem como as pêras maduras de uma pereira, isto é, não surgem por obra da natureza ou porque, de repente, a Presidência do Conselho de Ministros se lembrou de fazer uma lei para ver se, para o futuro, alguém pode aproveitar dela. Ninguém faz leis, ninguém gasta tempo dessa maneira. Sendo o Governo rigoroso e gastando bem o seu tempo, pensamos que quando fez esta lei pretendia satisfazer determinadas finalidades, que ele sabia merecerem tutela.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, queira concluir.
0 Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Certamente, o Governo não iria fazer uma lei apenas para que fosse publicada no Diário da República, sem ter por trás um interesse ou interesses concretos a proteger, que tinha na sua mente. Ora, o Sr. Presidente da República deve ter perguntado, precisamente, que interesses estão por trás desta lei, a quem ela pode aproveitar, em concreto, para que o Governo tenha tomado esta iniciativa. 15to é, pode ter pedido a explicação da chamada exposição de motivos, que poderia ser mais concreta, pois não sei se refere ou não o decreto-lei, ou perguntar que casos concretos existem, na sociedade portuguesa ou no País, que mereçam a tutela, através do decreto-lei, destas bonificações, o que levaria o leitor ou o intérprete, neste caso, o Sr. Presidente da República, a localizar, por ele próprio, esse diploma legal.
0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.
0 Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Foi isso o que dissemos. Não houve falta de rigor, por parte do Sr. Eng.º Manuel Queiró, que não quis acusar o Governo de falta de honestidade ou lealdade. 0 que ele pretendeu dizer foi que faltou a exposição de motivos, faltou uma explicação de quais os interesses verdadeiros que estavam a ser tutelados, para que estava esta lei a ser feita e qual era o quadro mental do Governo.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
0 Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Sr Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, quero dizer-lhe que, entre os muitos defeitos que tenho, um deles é o de ser totalmente frontal, isto é, dizer com clareza, cara a cara, aquilo que penso sobre as situações.
0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Aprecio essa qualidade!
0 Orador: - 0 Sr Deputado Manuel Queiró disse algo que entendi, apesar de não ter intuito de me melindrar, como sendo, objectivamente, susceptível de ser interpretado como equívoco ou crítica para a posição do Governo, pelo que tive de explicar qual era a posição rigorosa sobre esse assunto.
Acrescentei também, na minha última intervenção, que, se não foi essa a intenção do Deputado Manuel Queiró ou não usou a expressão que lhe imputei, antecipadamente lhe pedia desculpa.
Espero ter sido claro nas duas situações Se pretendia dizer isso, fico sentido: se não foi isso, apresento desculpas. Em qualquer caso, agradeço a intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró.
Quero apenas acrescentar uma última palavra: não vou repetir o que nos foi pedido pela Presidência da República. Sr. Deputado, acredite que, honestamente, julgo que respondemos ao que nos foi pedido, porque não nos foi pedida a identificação dos destinatários. Na minha interpretação, o que nos foi pedido, foi respondido.
0 Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está encerrado o debate.
A próxima reunião terá lugar amanhã e do período da ordem do dia consta a discussão da interpelação ao Governo n.º 22/VI- Debate sobre política geral sobre a temática da crise social (PS).
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
António de Carvalho Martins
António José Caeiro da Motta Veiga.
Arménio dos Santos.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco João Bernardino da Silva..
João José Pedreira de Matos.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Angelo Ferreira Correia.
José Manuel Nunes Liberato.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Fernando da Silva Rio.
Vasco Francisco Aguiar.
Miguel Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Partido Socialista (PS):
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
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António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
João António Gomes Proença.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Manuel Santos de Magalhães.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Oliveira Costa.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Maria Moreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Luís Santos da Costa.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Manuel António dos Santos.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira.
Maria Helena Sá Oliveira de Miranda Barbosa.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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