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3156 I SÉRIE - NÚMERO 92

mas pelo calendário eleitoral, que alterará a situação de forma significativa.
O problema com que nos defrontamos é um problema global de organização do Estado que exige uma resposta global e não remendos aplicados ao sabor da denúncia demagógica dos males de que sofre o sistema.
A Assembleia Constituinte de 1975 é um marco histórico que assinala o renascimento da democracia em Portugal; o texto que nos deixou é um instrumento que, com as suas limitações e os seus defeitos, permitiu a afirmação de um regime de liberdade e de um Estado de direito.
A democracia é uma realidade, mas não é uma realidade irreversível. Os afloramentos racistas e a insidiosa campanha contra as instituições democráticas, que vai encontrando terreno fértil numa sociedade em crise, em crise social, de esperança, de valores, estão aí. Basta olharmos à nossa volta para disso nos darmos conta. Não é o momento, se é que alguma vez pode ser o momento, de cruzarmos os braços.
Os tempos que vivemos não são os de 1975, mas os valores e princípios que então nos serviram de norte não mudaram e são esses mesmos valores e princípios que exigem a procura de novos caminhos. Para nós, a busca desses caminhos, que não será nunca alibi para se ignorarem os problemas imediatos, do imediato quotidiano, continua a ser a matriz da nossa identidade de democratas e socialistas. Para com Portugal, para com os portugueses, para com as mulheres, para com os homens, onde quer que estejam, onde quer que vivam, o nosso compromisso resta o de sempre: a construção de um mundo mais livre, mais fraterno, mais solidário.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS-PP e dos Deputados independentes Manuel Sérgio e Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Presidente da Assembleia Constituinte, Sr.ªs e Srs. Deputados Constituintes, Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Sr.ªs e Srs. Deputados: Permitam-me que dedique estes minutos a mostrar como cresceram as sementes lançadas há vinte anos na Assembleia Constituinte, como foi desaparecendo da Lei Fundamental o que era datado e conjuntural, produto dos mitos efémeros que cada tempo reverencia, ficando robustecido o que é permanente, o que estava e está vivo na comunidade nacional.
É difícil a minha posição, como modesto Constituinte que fui: por um lado, sei que "elogio em boca própria é vitupério"; mas, por outro, a verdade e a justiça não me permitem esquecer o árduo trabalho dos Constituintes em geral, a coragem dos que se bateram pela democracia pluralista em especial e, ainda mais em particular, dos que estiveram comigo na bancada social-democrata. Não posso esconder a alegria, a emoção mesmo, de os ter aqui hoje. Mas ainda menos poderia deixar de prestar a maior homenagem a tantos que já nos deixaram, e só de entre os sociais-democratas foram treze.
Não poderei referir nomes; citar alguns seria esquecer outros. Todos eles bem mereceram do povo que aqui representaram. Muitos deixaram depois a sua marca como políticos empenhados no serviço público e na promoção do bem comum, constitucionalistas, juristas ou professores eminentes, economistas de primeira linha, escritores e cientistas consagrados, empresários ou trabalhadores que muito contribuíram para o desenvolvimento, comentadores prestigiados na comunicação social. Muitos adquiriram o merecido respeito geral, mesmo fora das fronteiras.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os militares de Abril puseram fim a uma longa ditadura incapaz de compreender e muito menos dar resposta às aspirações dos portugueses à paz, à liberdade, ao bem-estar, à justiça, à solidariedade. Posteriormente, uma pequena minoria desses militares e algumas forças vanguardistas pensaram poder falar em nome do povo e impor pretensas soluções pré-fabricadas, copiadas de modelos estrangeiros, cujo mau funcionamento pressagiava já derrocadas depois verificadas.
Os Constituintes resistiram à tentação do vanguardismo, sabendo interpretar a verdadeira vontade popular. Vozes corajosas se elevaram aqui, nomeadamente no período de antes da ordem do dia, afirmando que o mandato que lhes fora concedido nas eleições livres mais participadas de toda a nossa História impedia de ir por aquele desastroso caminho. A grande maioria dos eleitores tinha-se pronunciado em 25 de Abril de 1975 por um modelo europeu de democracia.
Foram importantes os apoios de instituições da sociedade civil enraizadas na Comunidade nacional e de militares democratas que foram fiéis ao respeito da vontade popular. Uma grande maioria dos Constituintes teve mesmo de se preparar para, na cidade de onde brotaram no passado, para além do próprio nome da Pátria, os movimentos que consagraram a liberdade, assumir a sua legitimidade no caso de uma eventual tomada ilegítima do poder em Lisboa.
Os Constituintes sociais-democratas foram fiéis aos seus valores, recusando-se a aceitar, como o fundador do PPD, Francisco de Sá Carneiro em 1969, cito, "que o nosso povo tivesse de ficar eternamente sujeito ao paternalismo de um homem, de um sistema ou de uma classe, que, ao contrário de outros povos, não pudéssemos ser capazes de conciliar a liberdade com a ordem, o progresso com a segurança, o desenvolvimento com a justiça".
Os Constituintes sociais-democratas resistiram também e rejeitaram a tentação da uniformização. Afirmámos que a pessoa humana se define pela liberdade, que ser homem é ser livre. Da liberdade resultam, inevitavelmente, as diferentes capacidades e vontades de criar, de fazer obra útil à comunidade, que assim é enriquecida pelos talentos de cada um. Por isso, como Miguel Baptista Pereira, tivemos presente que "a diferença é ineliminável, o ser é radicalmente plural, a pluralidade é tão originária como a unidade, a identidade é, na diferença, relação e comunhão de sentido".
Os Constituintes sociais-democratas dissociaram-se do determinismo finalista. Sabíamos já que a indeterminação é característica essencial da democracia e que a sociedade e o Estado pertencem ao quadro sempre mutável e aperfeiçoável deste mundo. Lutámos, portanto, contra as irreversibilidades e fomos os agentes determinantes para que durassem afinal tão poucos anos. Não acreditámos nos pretensos "objectivos finais" e dissemo-lo pela voz autorizada do Presidente do Grupo Parlamentar, que sucedeu a Carlos Mota Pinto, a quem presto a minha comovida homenagem, António Barbosa de Melo, na declaração final, dizendo da nossa certeza que o nosso povo "irá continuar livremente a sua já quase milenária peregrinação".
Resistimos aos cantos de sereia do estatismo. Estava então na moda o Estado omnipotente e a natureza do Estado português tornava tudo mais difícil. Já vários his-

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