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Sexta-feira, 7 de Julho de 1995
I Série - Número 93

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

COMISSÃO PERMANENTE REUNIÃO DE 6 DE JULHO DE 1995

Presidente: Exmo. Sr. Fernando José Russo Roque Correia Afonso

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Luís Filipe Marques Amado

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 3O minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de vários requerimentos e de respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado Rui Rio (PSD) criticou declarações de dirigentes do Partido Socialista sobre a economia portuguesa, proferidas em conferência de imprensa, e respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Ferro Rodrigues (PS).
O Sr. Deputado Manuel dos Santos (PS) condenou a gestão orçamental do Governo solicitando uma audição parlamentar, a realizar no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano, com o Tribunal de Contas e o Ministro das Finanças.
O Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP) congratulou-se com o acórdão do Tribunal Constitucional relativo à interpretação do n.º 3 do artigo 33.º da Constituição, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD) e Alberto Costa (PS).
O Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) insurgiu-se contra medidas tomadas pelo Governo em vésperas do acto eleitoral.
A Sr.ª Deputada 15abel Castro (Os Verdes) manifestou concordância com a interdição de circulação nas praias, dunas e áreas protegidas dos veículos todo o terreno, chamando a atenção para a necessidade de se tomarem outras medidas de protecção ambiental.

Ordem do dia.- A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de quatro Deputados.
O projecto de deliberação n.º III/VI - Visa a audição do Director do Serviço de Informações de Segurança pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (PS) foi rejeitado. Depois da sua apresentação pelo Sr. Deputado Jorge Lacão (PS), intervieram, a diverso título, além deste orador, os Srs. Deputados Guilherme Silva e Pedra Passos Coelho (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), João Amaral (PCP), Alberto Costa (PS), José Magalhães e Manuel Alegre (PS) e 15abel Castro (Os Verdes).
Finalmente, a Câmara autorizou um Deputado a depor por escrito, como testemunha, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 17 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 3O minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
António de Carvalho Martins.
Arménio dos Santos.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Conceição Castro Pereira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Francisco Antunes da Silva.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Luís Campos Vieira de Castro.
Mário Jorge Belo Maciel.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Belarmino Henriques Correia.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.

Partido Socialista (PS):

Jorge Lacão Costa.
Alberto Bernardes Costa.
António Fernandes da Silva Braga.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Manuel António dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Marques Amado.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

15abel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, a Mesa está constituída por mim, na ausência do Sr. Presidente da Assembleia da República, que, como sabem, partiu para a Argentina, e é secretariada pelos Srs. Deputados João Salgado, do PSD, e Luís Amado, do PS. Dando início aos nossos trabalhos, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de deliberação n.º 111/VI - Visa a audição do Director do Serviço de Informações de Segurança pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (PS).
Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Ministério do Emprego e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; a diversos Ministérios e à Junta Autónoma das Estradas, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Mário Tomé; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Marta Gonçalves, ao Ministério da Agricultura, formulados pelos Srs. Deputados António Martinho e Carlos Luís; aos Ministérios do Plano e Administração do Território e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado Crisóstomo Teixeira; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques; a diversos Ministérios e à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins; ao Ministério da Educação e à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelo Sr. Deputado Paulo Rodrigues; à Câmara Municipal de Matosinhos, formulado pelo Sr. Deputado Rui Rio; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Macário Correia; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulado pelo Sr. Deputado André Martins; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado José Vera Jardim; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Crisóstomo Teixeira; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulado pelo Sr. Deputado António Murteira; a diversos Ministérios, à Secretaria de Estado da Cultura e à Câmara Municipal de Gouveia, formulados pelo Sr. Deputado André Martins; ao Ministério do Plano e Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Fialho Anastácio; ao Ministério da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha; ao Ministério da Saúde, e à Provedoria da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério do Comércio e Turismo, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado António Morgado; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado José Lello; aos Ministérios das Finanças e do Emprego e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado António Murteira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério do Plano e Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Fialho Anastácio; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; aos Ministérios da Defesa e do Ambiente e Recursos Naturais, formulado pela Sr.ª Deputada 15abel Castro; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado André Martins; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulado pelo Sr. Deputado António Martinho.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Paulo Rodri-

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gues, no dia 11 de Outubro e nas sessões de 24 de Março e 28 de Abril; José Manuel Maia, na sessão de 25 de Janeiro; Crisóstomo Teixeira, na sessão de 16 de Março; Guilherme d'Oliveira Martins, na sessão de 23 de Março; António Filipe, na sessão de 7 de Abril; Fialho Anastácio, na sessão de 3 de Maio; Luís Sá, na sessão de 25 de Maio; Maria Julieta Sampaio, na sessão de 15 de Dezembro; Marques Júnior, na sessão de 16 de Dezembro; Paulo Rodrigues, nas sessões de 18 de Janeiro e 9 de Fevereiro; José Manuel Maia, no dia 2O de Fevereiro; Raúl Castro, na sessão de 16 de Março; Fernando Pereira Marques, na sessão de 24 de Março; António Morgado, na sessão de 31 de Março; João Carlos Duarte, na sessão de 2O de Abril; Luís Peixoto, na Comissão Permanente de 21 de Julho; Paulo Trindade, na sessão de 12 de Dezembro; José Manuel Maia, na sessão de 11 de Janeiro e no dia 17 de Fevereiro; José Silva Costa, na sessão de 26 de Janeiro; André Martins, na sessão de 3 de Fevereiro; Artur Penedos, na sessão de 8 de Fevereiro; Guilherme d'Oliveira Martins, nas sessões de 9 de Fevereiro e 1 de Junho; António Barradas Leitão, na sessão de 15 de Fevereiro; Lino de Carvalho e Alexandrino Saldanha, nas sessões de 24 de Fevereiro e 3 de Março; José Magalhães, nas sessões de 8 de Março e 27 de Abril; Luís Sá, na sessão de 9 de Março; Crisóstomo Teixeira, Elisa Damião e Joel Hasse Ferreira, na sessão de 16 de Março; Lino de Carvalho e 15abel Castro, nas sessões de 22 e 29 de Março; António Alves, na sessão de 23 de Março; Fialho Anastácio, na sessão de 5 de Abril; António Filipe, na sessão de 21 de Abril; José Lello, na sessão de 31 de Maio; José Manuel Maia, na sessão de 25 de Janeiro; Raúl Castro e António Barradas Leitão, na sessão de 16 de Março; Guilherme d'Oliveira Martins, na sessão de 23 de Março; Ana Maria Bettencourt, na sessão de 6 de Abril; João Carlos Duarte, na sessão de 21 de Abril.
Deu também entrada na Mesa uma carta do Sr. Deputado Joaquim Barros de Sousa, do Partido Social Democrata, eleito pelo círculo eleitoral de Coimbra, que, nos termos do n.º 1 do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, renuncia ao seu mandato de Deputado a partir de 1 de Julho de 1995.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, entrando no período dedicado ao tratamento de assuntos de interesse político relevante, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País assistiu, ontem, a uma nova conferência de imprensa do Partido Socialista, em que este tentou explicar aos portugueses o que faria da economia portuguesa, caso ganhasse as próximas eleições legislativas.

A Sr.ª Conceição Castro Pereira (PSD): - Uma desgraça!

O Orador: - Foi já a segunda conferência que deu sobre esta matéria e, a julgar "pelo andar da carruagem", será de admitir que não vai ficar por aqui.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Disso não há a menor dúvida!

O Orador: - Se é verdade que as propostas que ouvimos se nos afiguram sensatas nos seus principais objectivos, toda a mensagem foi politicamente desastrosa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): - Olha quem fala!

O Orador: - O "partido da rosa" percebeu, Srs. Deputados, que tinha de deixar cair as suas próprias propostas, que tinha de negar tudo o que disse, tudo o que defendeu, tudo o que prometeu durante quatro anos, para que pudesse apresentar-se, de uma forma minimamente aceitável, aos portugueses.
Só que a forma, simultaneamente cómica e original, que encontrou foi a de, pura e simplesmente, subscrever aquilo que o PSD tem vindo a defender e os próprios socialistas a criticar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Afinal o PS, que tanto criticou a luta pela redução da inflação, já defende, agora, esse mesmo objectivo e promete uma taxa de 3,5% para 1998.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto!

O Orador: - Afinal o PS, que tanto criticou a estabilidade cambial e que tanto pediu a desvalorização do escudo, aparece, agora, com um descaramento inimaginável, a dizer que "bom, bom" é a estabilidade da nossa moeda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Afinal o PS, que tanto criticou a convergência nominal, também ele quer agora reduzir o défice público para os níveis que, ainda anteontem, achava incomportáveis e prejudiciais para o crescimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Afinal o PS, que tanto criticou o facto da retoma ser fraca, não tem pruridos em projectar um excelente nível de crescimento para a nossa economia já a partir do próximo ano. Como poderia isto acontecer, se a retoma fosse tão pálida como, durante tanto tempo, tentou explicar aos portugueses?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Afinal o PS, que sempre achou que o consumo tinha de ser mais dinâmico, projecta, agora, um modelo de crescimento assente, essencialmente, nas exportações e no investimento - tal como tem vindo a fazer-se.
Afinal o PS, que achava que era alternativa ao PSD porque dava mais para a educação, para a saúde, para o rendimento mínimo garantido, para as autarquias, para vencimentos dos funcionários públicos, para o fim das propinas, para reduzir as portagens, etc., etc., já não é alternativa a nada.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Nunca foi!

Aplausos do PSD.

O Orador: - Afinal o PS não tem nada de novo para oferecer, limitando-se a repetir, deficientemente, aquilo que o PSD sempre tem defendido e a oposição criticado.
Mas o cúmulo é que o "partido cor de rosa" diz que, com ele, tudo vai ser melhor!

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Como é possível, Sr. Presidente, que o mesmo PS tenha dito que com a política que tem vindo a ser seguida tudo piorará, defenda, agora, tudo quanto atacou, fazendo do "Futuro - Portugal" um país das maravilhas e invertendo, totalmente, toda a sua mensagem inicial.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PS consegue o pleno: prometer, simultaneamente, o mesmo e o seu contrário. Os socialistas entraram em delirium tremens eleitoral e onde antes viam portugueses agora já só descobrem eleitores.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados socialistas, se reduzem o défice público, se reduzem o peso da despesa no produto, se não aumentam os impostos, mas se ainda mantêm hoje, dia 6 de Julho, as promessas relativamente à educação e ao rendimento mínimo garantido, onde vão cortar? Quais as rubricas cujo peso no produto vai decrescer? Se VV. Ex.ªs derem 5% para a educação, têm 95% para o resto, se derem 6% , sobram 94% para tudo o mais. Digam, por favor, aos portugueses quem vai ficar prejudicado!

O Sr. José Vera Jardim (PS): - É a lista do Porto!

O Orador: - Depois de abandonarem a peregrina tese de cortes nas verbas dos gabinetes ministeriais para compensarem os vossos devaneios orçamentais, e que, inadvertidamente, orçaram em 6O milhões de contos contra uma realidade de 1O milhões, depois de reduzirem o PIB a um quinto do seu valor, depois de negarem tudo o que tinham dito em política económica e de subscreverem as nossas principais propostas, depois de prometerem e de desprometerem o possível e o impossível, a que mais teremos de assistir perante o verdadeiro streap tease político que o imaginário socialista entendeu dever fazer perante o povo português?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: "Guterres no País das Maravilhas" é uma novela em que ninguém, de bom senso, facilmente acredita.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal tem, necessariamente, de continuar na senda da plena integração europeia e do progresso económico e social.
Os objectivos a prosseguir são, realmente, os da convergência económica com os Estados membros mais desenvolvidos. Só que quem está em melhores condições para executá-los não é quem trata destas questões com leviandade eleitoral e sem sentido de Estado, mas, sim, quem sempre teve a noção de que governar é servir o País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, também em política, melhor do que uma qualquer fotocópia em papel reciclado é, obviamente, o seu original.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, o PSD desencadeou, provavelmente, fora de tempo e numa manobra canhestra, aqui no debate do Estado da Nação, uma tentativa de pôr o povo português condicionado, com dois objectivos.
Em primeiro lugar, mudar o essencial do debate político em Portugal, nesta fase pré-eleitoral, que deve estar centrado naquilo que os senhores fizeram ao País e na crise social gravíssima em que este se encontra.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, por um lado, uma tentativa de responsabilização e, por outro lado, uma postura nova em que os senhores já estão a treinar para ser a oposição. Até me parece bem porque é o vosso futuro...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -...e terão de praticar, mas para uma oposição que, logo à partida, manifeste a vossa verdadeira natureza. Uma oposição contra o programa social do PS, contra o rendimento mínimo garantido e contra as melhorias que o Partido Socialista, no Governo, irá fazer no sector da educação, o que é elucidativo da vossa futura postura de oposição.
Segundo objectivo, tentar condicionar e intimidar o eleitorado português. Ora, o que acontece é que a manobra do PSD, aliás, dirigida pelo Primeiro-Ministro de uma forma bastante errada do ponto de vista político, como se verificou pela falta de capacidade de ligação entre aquilo que disse o Primeiro-Ministro, o que disse o Ministro das Finanças e o que disse a bancada do PSD sobre o célebre futuro do Ministério das Finanças, essa manobra do PSD morreu no ovo. Porque, primeiro, os senhores disseram aqui, pela voz do ainda Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, que o programa do PS aumentava os impostos em 75O contos por activo. Depois, logo a seguir recuaram, passadas 24 horas, mas recuaram de uma forma violenta, nos primeiros debates em que estive presente, desafiando que o PS apresentasse os cálculos e dizendo que certamente era impossível haver cálculos que permitissem que não houvesse aumento da carga fiscal e que diminuíssem a despesa pública.
Bom, agora foram apresentados os cálculos e o que é que os senhores me vêm dizer? Numa manobra de recuo total, vêm dizer que há dúvidas sobre a validade das projecções.
Penso que os senhores deviam começar por ter dúvidas, mas sobretudo por ter grande vergonha pelo parecer do Tribunal de Contas que foi feito há dois dias e que o meu colega Manuel dos Santos...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... irá aqui desenvolver nos próximos minutos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, também deviam ter uma vergonha grande pelos custos inquantificáveis da demagogia do ainda Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, que resolveu escrever a dois milhões e tal de idosos e reformados...

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O Sr. Manuel Alegre (PS): - É uma vergonha!

O Orador: - ... com uma inconcebível manobra de que não há memória, em Portugal, em democracia. É uma coisa que ultrapassa tudo, é brincar com os idosos, sobretudo apresentando um programa que não será posto em prática pelo seu governo. É realmente uma coisa de um ridículo total e a que os idosos vão responder, no dia 1 de Outubro, com um só voto.
O que lhes dói, ao Sr. Deputado Rui Rio e ao PSD, é que já perceberam que, com o PS, vai haver mais confiança dos investidores e portanto mais crescimento e mais investimento social, menos despesa pública e menos défice, é possível mais progresso social e menos populismo, é possível mais democracia e menos demagogia, mais desenvolvimento e menos modernização, a la Cavaco, ou seja, tecnocrática. Finalmente, com o PS, vai ser possível melhor sociedade, melhor Estado e sobretudo uma coisa muito importante: menos PSD!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Ferro Rodrigues, começando pelos idosos: se o Governo aumenta pouco as pensões é porque não defende os idosos, se aumenta muito as pensões é porque é eleitoralista; se o Governo não apoia as férias ou seja o que for dos reformados é porque não os apoia, se apoia é porque é eleitoralista e só está a comprar votos - primeiro ponto.
Segundo ponto: há uma contradição no discurso de V. Ex.ª e no discurso do Partido Socialista, que é flagrante. Então, o Partido Socialista considera que existe uma grave crise económica e social neste País e diz que a política do Governo foi errada. Mas, ontem, os senhores deram uma conferência de imprensa, onde disseram que vão seguir rigorosamente a mesma política. 15to é uma contradição completa, Sr. Deputado. Então, como é que querem alterar a dita crise que dizem existir com a mesma política que o PSD tem implementado?

Protestos do PS.

E deixe-me acabar dizendo-lhe uma coisa, Sr. Deputado: sabe qual é a prova de que o PS é inviável? A maior prova de que o PS é inviável é a de o seu Secretário-Geral começar, no seu imaginário, a pensar que pode ser Governo e, de imediato, começar a arranjar desculpas. Aliás, hoje, no jornal, já vem a primeira desculpa: diz que está com medo do buraco de 1995 se os senhores forem mesmo Governo. Já estou mesmo a ver o que diziam, que não podiam governar direito porque a situação em que nós deixamos o País é lastimosa. Já estão a preparar a fuga e a explicar porque é que isto tudo seria inviável, o que estão a prometer, se fossem governo, mas não vão ser.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Compreendo a intervenção do Sr. Deputado Rui Rio, no contexto actual. Aliás, desejo-lhe muito boa sorte, apesar de ter de melhorar um bocadinho mais, pois o senhor foi um Deputado simpático e merece continuar no Parlamento na próxima legislatura.

Vozes do PSD: - O senhor também!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A análise exaustiva da Conta Geral do Estado de 1993 permitiu ao Tribunal de Contas emitir um acórdão verdadeiramente arrasador para o Governo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não é novidade, mas sabe bem ver uma instituição com a credibilidade técnica e política do Tribunal de Contas confirmar o que muitos de nós, no dia-a-dia, afirmamos e reafirmamos.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Para os governos do PSD, vale tudo. Vale, sobretudo, gastar muito, sem controlo, sem transparência e sem rigor.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Despesismo.

O Orador: - O que está a dar é mesmo o despesismo, o descontrolo orçamental, a demagogia financeira.
As consequências sobre o sistema produtivo do "regabofe" não têm importância. Para o PSD, "quem vier atrás que feche a porta", mas que o faça com cuidado, porque o terreno é deixado convenientemente armadilhado e o estrondo pode ser muito grande.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1993, o Governo do PSD gastou 83,6 milhões de contos mais do que aquilo a que estava autorizado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É verdade!

O Orador: - Fê-lo em completa ilegalidade porque em absoluto desrespeito pela Lei de Enquadramento Orçamental e da competência específica e exclusiva da Assembleia da República, nesta matéria.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - O Dr. Catroga deve ter um estudo sobre isso!

O Orador: - Com o juízo agora formulado pelo Tribunal de Contas, são completamente validadas e confirmadas todas as denúncias sobre a falta de transparência, má utilização de dinheiros públicos e despesismo sem norte nem critério formuladas durante o debate orçamental para 1993 pelos Deputados do Partido Socialista.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Tribunal de Contas analisou também as contas da segurança social. Igualmente neste domínio a desregulação foi total. As despesas ultrapassaram o valor orçamentado e autorizado para a Assembleia da República em 29 milhões de contos. Mais uma vez, houve violação clara da Lei de Enquadramento Orçamental e da competência exclusiva do Parlamento. Mas, no que toca à segurança social, grave é a total incapacidade, revelada pelo Governo e confirmada pelo Tribunal de Contas, em estancar primeiro e inverter depois a ca-

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tastrófica hemorragia dos recursos financeiros que se verifica neste sector.
É perfeitamente absurda a intervenção do Governo nesta matéria. Tem-se limitado a operações de engenharia financeira para enganar a opinião pública, na altura do debate orçamental, e desenvolve-se na mais completa irresponsabilidade relativamente à evolução do sector no futuro.
As contas da segurança social revelam que se mantém a ausência de uma política de criação de mecanismos de racionalização, absolutamente indispensáveis para o sector e para o seu futuro, deixando-se ao próximo governo uma pesada e grave herança, o que agora, aqui, enfaticamente denuncio.
Ainda segundo o acórdão do Tribunal de Contas, a liquidação dos encargos decorrentes da assumpção de passivos e regularização de situações do passado, no montante de 83,6 milhões de contos, através de operações de tesouraria, aumentou o deficit efectivo do Orçamento em igual montante: recordo 83,6 milhões de contos.
A utilização destes mecanismos é claramente ilegal porque violadora, mais uma vez, da Lei de Enquadramento Orçamental, pelo que a insistência no seu uso só se compreende à luz de uma preocupação política de diminuir artificialmente o deficit, procurando fazer passar uma imagem de rigor, quando se está, afinal, no mais completo e celerado dos despesismos.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Exactamente!

O Orador: - Tem o Governo falado muito em privatizações. A este propósito, tem a oposição socialista reclamado sempre um balanço do património do Estado. Exige-o a transparência, o rigor e a responsabilização que o Estado, pessoa de bem, deve assumir para com o cidadão contribuinte e pagador sacrificado dos impostos.
Também neste domínio, a investigação do Tribunal de Contas é exemplar. Nada existe ou, se existe, está guardado na gaveta, para ser utilizado pelo partido do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As avaliações do Tribunal de Contas e as denúncias que, com base nelas, acabo de proferir indiciam a existência de um clima de completa ilegalidade e incumprimento, em matéria de finanças públicas, por parte do PSD. Indiciam ainda uma vertigem de despesismo e descontrolo que, se não for travada a curto prazo, conduzirá irreversivelmente a situações gravosas para o tecido produtivo do País.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Recordo o que João Salgueiro dizia, há poucos dias: "se não fosse o descontrolo orçamental, as taxas de juros não estariam ainda tão elevadas".

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Grande ataque!

O Orador: - Estas situações têm nome e responsáveis: o nome é ilegalidade; os responsáveis são os membros do Governo!
Como se sabe, existem mecanismos responsabilizadores nestas situações. Refiro-me ao Decreto-Lei n.º 34/87, de 16 de Agosto, que tipifica e enquadra os "crimes de responsabilidade de titulares de cargos públicos".
Contudo, são iniludíveis as responsabilidades política e financeira, independentemente das eventuais consequências múltiplas que possam haver no domínio jurídico.
O candidato a Primeiro-Ministro apoiado pelo PSD, Dr. Fernando Nogueira, era membro destacado do Governo em 1993 e, despudoradamente, tem acusado o PS de ter propostas despesistas...

O Sr. Arménio Santos (PSD): - É verdade!

O Orador: - ... incapaz de compreender que o despesismo não é apoio ao investimento, à educação, à solidariedade, nem é introdução de uma maior justiça e equidade fiscais.

Vozes do PSD: - Porque vem falar outra vez das propostas?!

O Orador: - Despesismo é o que faz o PSD, sobretudo o que faz sem controlo nem transparência!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Despesismo ilegal!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - O Dr. Fernando Nogueira é, portanto, responsável e não pode fugir!
Sr. Presidente, dirijo-me especialmente a V. Ex.ª, a fim de lhe requerer que, nos termos da sua competência, ouvido quem deve ser, despache no sentido de que a Comissão de Economia, Finanças e Plano da Assembleia da República possa proceder a uma audição parlamentar, ouvindo o Tribunal de Contas e o Ministro das Finanças sobre os factos que relatei.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Exige-o a transparência e, sobretudo, o respeito que todos devemos ter pela lei, pelo seu cumprimento, pelo Parlamento e pelas suas competências.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Tribunal Constitucional, na sua sessão de 4 de Julho, emitiu e publicitou um acórdão que honra a jurisprudência e a democracia em Portugal.
Com efeito, colocado perante a interpretação da norma jurídica constante do n.º 3 do artigo 33.º da Constituição da República Portuguesa, de que "Não há extradição por crimes a que corresponda pena de morte segundo o direito do Estado requisitante", afirmou que todas as leis onde esteja consagrado tal direito não deve ser cumprido por ser inconstitucional, à face da nossa lei fundamental.
Devo dizer que não está em causa o caso concreto. Não queremos pronunciar-nos, de forma alguma, sobre o caso concreto que levou o Tribunal Constitucional a pronunciar-se e emitir este acórdão. Poderia ser este ou outro, neste país ou noutro país, este arguido ou aqueloutro arguido. O que está em causa é a afirmação, clara e terminante, de que a democracia portuguesa, o sistema jurídico-constitucional português, não dá guarida a qualquer norma jurídica que viole o princípio do respeito pela vida.
Com efeito, diz o acórdão, e cito apenas algumas linhas: "A protecção constitucional significa averiguar em concreto a compatibilidade de extradição com os princípios de que ele enforma, tendo em atenção especialmente a Constituição, a infracção e a pena, seja no plano subs-

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tantivo, seja no plano processual, à luz do ordenamento interno de dois Estados interessados na extradição."
Por conseguinte, deve considerar-se sempre lesivo da Constituição, o facto de o Estado português poder concorrer no plano da extradição para aplicação e execução de uma pena, a pena de morte, que em nenhuma hipótese e por nenhum tipo de crime poderia ser infligida a qualquer cidadão estrangeiro, ou não, em Portugal.
A proibição da aplicação da pena de morte, à luz do n.º 2 do artigo 24.º, representa, na verdade, um limite extremo que o Estado português nunca pode transpor. É que o legislador constitucional quis de forma enfática afirmar que, desde que ao crime corresponda a pena de morte segundo a lei incriminadora do Estado requerente, a extradição está peremptoriamente proibida. Por conseguinte, à luz do n.º 3 do artigo 33.º, a extradição só é consentida quando, segundo o direito interno do Estado requerente, não seja susceptível de, em concreto, ser aplicada a pena de morte. Na verdade, só então não corre perigo o direito à vida do extraditante. É que o direito à vida é, justamente, o que se pretende tutelar com aquela proibição de extradição, cujo fundamento último é, como se viu já, a dignidade da pessoa humana em que assenta o Estado de direito democrático, o que impõe que se proíba a pena de morte.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É a primeira vez que esta doutrina e interpretação do n.º 2 do artigo 33.º se faz no nosso Tribunal Constitucional. Por isso mesmo está de parabéns Portugal e estão de parabéns todos os tribunais nos territórios onde flutua a bandeira portuguesa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Narana Coissoró, esta minha intervenção é, antes de mais, para me associar à saudação que V. Ex.ª dirigiu ao Tribunal Constitucional. É, ao fim ao cabo, uma saudação a todos nós pela forma como o Tribunal Constitucional decidiu esta questão.
Aliás, a forma como V. Ex.ª a abordou, desgarrada do caso concreto, é a forma correcta de o fazer. Portugal tem uma honrosa tradição nessa matéria, tendo sido dos primeiros países a abolir a pena de morte e a pena de prisão perpétua. E, portanto, é na linha desta tradição, que muito enriquece a nossa história, o nosso património humanista, que esta jurisprudência do Tribunal Constitucional se vem inserir. Mas penso que, mais importante ainda do que esta decisão do caso concreto, é a luz que ela projecta, relativamente a algo que nos vem preocupando, também para o futuro no que diz respeito à transição de poderes e de soberania para a República Popular da China, ou seja, para que, no futuro, se assegure que no território de Macau não vá figurar a pena de morte. É importante que esta luz seja projectada também nesse futuro próximo.
Mas, voltando ao pedido de esclarecimento, quero aqui registar a circunstância de ser um grupo parlamentar como aquele que foi aqui representado pelo Deputado Narana Coissoró a fazer esta homenagem, quando é certo que temos ouvido ecos da sua bancada num sentido penal agravante, no sentido do reforço e agravamento de penas de prisão, que não é, efectivamente, muito conjugável com esta sua abertura. Mas o que interessa é o seu gesto e é esse seu gesto que aqui homenageio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Narana Coissoró, há mais um orador inscrito para formular pedidos de esclarecimento.
Deseja responder já ou no rim?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, gostaria de dizer que não tratei nem quero tratar do caso concreto mas, sim, afirmar e homenagear a jurisprudência que se vai fixando e o modo como o Tribunal Constitucional interpretou o artigo 33.º, n.º 3, da Constituição, quanto à extradição.
Quanto ao remoque sobre as penas, parece-me muito difícil que ele tenha sido feito por um jurista tão abalizado como o Dr. Guilherme Silva, porque uma coisa é o agravamento das penas e outra é aceitar a pena de morte.
O meu partido jamais propugnou a pena de morte! Foi um militante abalizado do PSD, aquele que defende as vossas posições em todos os órgãos da comunicação social, que pediu a reintrodução da pena de morte em Portugal. Por isso, este remoque deve dirigir-se a um filiado e militante categorizado do vosso partido e nunca do meu.
Não quero, porém, entrar neste diálogo, que nada tem a ver com a minha intervenção. A minha intervenção visou tão-somente demonstrar a satisfação da Assembleia pela interpretação dada pelo mais elevado tribunal do País, o Tribunal Constitucional, ao artigo 33.º.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, acerca da moldura do pedido de esclarecimento, desejo apenas associar-me às considerações feitas por V. Ex.ª sobre a matéria tão pertinente que aqui quis referir e à homenagem que presta a uma decisão do Tribunal Constitucional, que honra Portugal e a cultura jurídica portuguesa e que, sem sair dos termos abstractos e gerais muito correctos em que, julgo, V. Ex.ª colocou a matéria, contribui também para a irradiação externa da cultura jurídica portuguesa, seguramente um dos alvos e objectivos que a política externa e a afirmação de Portugal no mundo não deve descurar no presente e no futuro. E, por me parecer que as suas reflexões vão justamente neste sentido, não queria deixar de cumprimentá-lo e de reputar da maior pertinência as considerações que aqui teceu acerca desta decisão do Tribunal Constitucional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Costa, desejo apenas agradecer-lhe o seu cumprimento e constatar, com satisfação, que a grande maioria deste Hemiciclo se associa a esta manifestação da cultura jurídica portuguesa.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É todo o Hemiciclo!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Narana Coissoró, julgo que todo o Hemiciclo se associa à afirmação, com mais de um século, da recusa da pena de morte. Este ponto não faz parte das divergências partidárias. Desculpem estar a pronunciar-me sobre o assunto, mas a situação é tão pacífica...
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, começo por confirmar, pela parte que nos toca, a afirmação do Sr. Presidente, de que todo o Hemiciclo se associa, independentemente de pedir, ou não, esclarecimentos ao Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Definitivamente, o PSD e o Governo não são capazes de nos surpreender.
Mais uma vez, como tem sucedido em vésperas de actos eleitorais anteriores, aí temos o PSD e o Governo lançados em desesperadas tentativas e manobras demagógicas para travarem o descrédito e o isolamento que os atingem, para tentarem inverter o plano inclinado em que aceleradamente rolam para a derrota eleitoral que os espera no próximo dia 1 de Outubro.
Aí temos o Governo a gerir o momento da inauguração de algumas obras públicas, de acordo com os interesses eleitoralistas do PSD.
Aí temos os ministros a anunciar, pela milésima vez, pacotes e mais pacotes de fundos comunitários, que alegadamente iriam resolver problemas que se arrastam e agravam, há anos; iriam resolver esses problemas,... se o PSD continuasse a ser governo, dizem eles.
Aí temos ministros a utilizar helicópteros e veículos do Estado nas suas deslocações a manifestações da pré-campanha eleitoral do PSD.
Aí temos secretários de Estado, vestindo expressamente a pele de dirigentes distritais do PSD, a fazer a distribuição de cheques, sacados sobre o Orçamento do Estado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Cheques?!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É uma vergonha!

O Orador: - E aí temos, nesta escandalosa campanha de propaganda do PSD paga com dinheiros do Estado, o Primeiro-Ministro a enviar uma missiva aos dois milhões de pensionistas e reformados, dando-lhes a boa nova.
A boa nova do programa "Turismo na Terceira Idade", que se iniciará - e quando poderia ser? - nas vésperas do próximo acto eleitoral.
Mas esta carta do Primeiro-Ministro, para além de propaganda partidária, é revoltante.
E chocante que o Primeiro-Ministro, tendo como único objectivo tentar captar votos para o seu partido - e, quiçá, tentando angariá-los, igualmente, para as eleições presidenciais -, anuncie um programa de turismo, ao "módico" preço de 15OO$ diários, a 1,8 milhões de idosos, cujas reformas não ultrapassam os 28OOO$ mensais, 1,2 milhões dos quais com pensões inferiores a 2OOOO$.
É revoltante que, na sua missiva, o Primeiro-Ministro escamoteie aos dois milhões de reformados e pensionistas que esta "dádiva" exige o pagamento de 15OO$ diários e terá como limite máximo 1OOOO beneficiários efectivos! 15to é, O,5% do universo de cidadãos a quem o Primeiro-Ministro pretende lançar o engodo.
E é eticamente indigna a forma subliminar como o Primeiro-Ministro termina a sua eleitoralista missiva: "Conto com a sua colaboração. Com votos (...) de boa saúde".

Risos do PCP e do CDS-PP.

"Conto" com a sua colaboração, Sr. Reformado. Com votos!
É chocante, revoltante e eticamente inaceitável que um Primeiro-Ministro,...

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Deseje boa saúde?!

O Orador: - ... na exclusiva procura de votos, jogue de forma tão indigna e despudorada com as legítimas aspirações de dois milhões de portugueses! Mas é bem um "selo de marca" do PSD e dos seus governos! Tal como faz parte das suas marcas registadas o desprezo do PSD e dos seus governos pela legalidade e pelos poderes da Assembleia da República. O último facto conhecido é o que nos foi dado a saber pelo Tribunal de Contas, no seu parecer sobre a Conta do Estado, relativo ao ano de 1993.
Já não bastava a reincidência do Governo na subavaliação do défice em quase 1OO milhões de contos, através de operações que violam a Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado, ou a desorçamentação de serviços públicos, que movimentam anualmente mais de 5 milhões de contos de fundos do Estado, ou, ainda, a costumada prática do PSD de proceder à publicação de alterações orçamentais, sete ou oito meses depois de o ano económico ter terminado, para ajustar legalmente os desmandos da execução orçamental.
Desta vez, o Governo dos Srs. Cavaco Silva e Fernando Nogueira foi mais longe e ultrapassou, em 86 milhões de contos, o limite máximo de despesa orçamental autorizado pela Assembleia da República.
A ilegalidade é completa e brutal. Porém, parece não dar lugar a prisão. Mas dá lugar, certamente, a despedimento com justa causa. Despedimento esse que já tem data marcada: 1 de Outubro de 1995!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Noticiou a imprensa, recentemente, ser intenção do Governo, através do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, vir finalmente a pôr cobro ao caos que inconcebivelmente se deixou instalar nas nossas praias, dunas e áreas protegidas, com a invasão infestante de veículos todo-o-terreno.
É obviamente uma intenção sensata, de há muito necessária, visível como o é a perturbação, o incómodo e o próprio risco para a segurança de pessoas, bem como a destruição da fauna, da flora e de todo o sistema dunar de protecção do litoral que esta circulação indiscriminada tem provocado.
É obviamente também uma intenção eleitoralista, que procura ganhar simpatias quer pelo modo tardio como surge, com o Governo de saída, quer pela forma totalmente avulsa como é decidida.

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Mas, enfim, vale o que vale. Esperemos tão-só que, no que de positivo tem, se concretize, por um lado, criando mecanismos eficazes que a façam sair do papel, facto até agora nunca verificado em qualquer das áreas protegidas em que esta interdição de circulação já estava legalmente definida e, por outro, aproveitando para regulamentar, nas mesmas zonas a circulação de veículos motonáuticos, também eles perturbadores do silêncio nas nossas praias e da segurança dos cidadãos, como já nesta época balnear tragicamente ficou comprovado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Com a questão da motonáutica, estou inteiramente de acordo!

A Oradora: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se esta intenção nos parece interessante para a conservação da natureza, em particular no litoral e nas áreas protegidas, precisamente porque se trata daquelas que de maiores riscos de destruição ecológica são alvo, até porque as mais sujeitas à voracidade dos especuladores imobiliários, é bom lembrar que ela não passa de mera gota de água no oceano.
Um oceano relativamente ao qual continua por transpor para o direito interno a directiva sobre a protecção de habitat, ciosamente guardada na gaveta pelo Governo.
Um oceano em que continua tudo e cada vez mais por fazer, em relação à outra espécie infestante, um autêntico elefante quando com esta formiga comparada, que, lenta e sistematicamente, vai invadindo o nosso litoral, perante a discreta mudez dos diversos patamares do poder - central e local -, o seu silêncio cúmplice, quando não mesmo a sua despudorada cobertura.
Uma espécie infestante de natureza bem mais gravosa, o betão, que destrói o equilíbrio ecológico e estético, para sempre; uma espécie que, uma vez instalada, perante a oportuna distracção, a aparente ineficácia ou o deliberado atraso em accionar os mecanismos legais por parte quer das autarquias quer do Governo, permite o facto consumado, pouco mais restando do que umas "lágrimas de crocodilo" para aqueles que dela foram cúmplices, sobretudo quando a pressão da opinião pública ou o tempo de eleições assim o exige.
Uma espécie infestante, que se pode identificar genericamente em todo o litoral, de Esposende à ria Formosa, passando por Sintra/Cascais, e que em lado algum está ausente com as suas marcas visíveis: a invasão urbana, a degradação da paisagem, sempre e sempre o aumento da pressão urbanística em áreas onde, de todo, o mero bom senso tal nunca poderia ter permitido.
Uma questão particularmente escandalosa no chamado Parque Natural Sintra/Cascais, assim chamado, desde 1993, uma área cuja modificação de estatuto se justificava, e bem, pelo reconhecimento da existência no seu território de valores naturais, patrimoniais e ambientais de elevado valor, que urgia defender da forte pressão e especulação imobiliárias, que implicitamente se reconhecia existirem.
Uma reclassificação, dir-se-ia, explicada por se pretender entrar numa nova etapa, em que nem as autarquias locais - Sintra/Cascais - iriam continuar a dar cobertura a toda a espécie de negociatas, nem tão-pouco a área dita protegida - agora, parque, pelo seu interesse nacional - iria continuar a permitir, com impunidade, toda a espécie de ilegalidades, até então dócil e escandalosamente consentidas.
As regras pareciam claras. E se bem que o PSD tenha, durante meses, arrastado a publicação do Plano de Ordenamento do Parque, ou seja, retardado a sua entrada em vigor para facilitar os negócios das suas clientelas, mesmo assim, excepções não faltam. O regabofe está instalado, com a cobertura do PSD, mas igualmente a do PS e a do CDS-PP, cujos representantes nas respectivas autarquias, face ao que se passa, discretamente se remetem ao silêncio.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Ah!

A Oradora: - Excepções essas que existem um pouco por todo o lado. Por exemplo, na mata, junto à praia do Abano, valiosa do ponto de vista da fauna e da flora, destruída criminosamente pelo fogo, em 199O, e na qual, até hoje, nada se fez para a recuperar. Razões? Ninguém as explica.
A lei determina a obrigação de apresentação, no prazo de um ano, de um projecto de reflorestação e impõe a sua execução no prazo máximo de três anos, após o fogo. O FEOGA, sabe-se, atribuiu fundos, mas desconhece-se para que serviram. Como se desconhecem igualmente as razões pelas quais o Estado, no caso, através do Instituto da Conservação da Natureza, se não substituiu, como a lei lhe impõe, ao proprietário faltoso na recuperação da área em causa.
Uma omissão estranha, que já permitiu não só a erosão visível dos solos, a destruição da flora e a degradação da paisagem mas também a abertura de valas, a construção de uma estrada, a afixação de publicidade, a instalação de um imenso parque de estacionamento privativo, restaurantes e equipamentos de praia, enfim, tudo o que um simples regime geral de utilização da faixa costeira nunca consentiria, mas que, embora ilegal, a Câmara Municipal de Cascais admite, impávida, e o Parque, ou seja, o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, ousa permitir que se mantenha!
Exemplos há nas constantes ocupações ou transformações de usos em terrenos da RAN ou da REN, também eles interditos, sem que o Parque faça alguma coisa.
Exemplos há, a que não faltam outros, em pleno parque natural, só na estrada entre o Guincho e a Malveira da Serra, onde de tudo um pouco não falta na panóplia de ilegalidades consentidas: vedações; parques de estacionamento; asfaltagens; edificação de muros; casas de apoio; parques de merendas; restaurantes; e painéis publicitários. Tudo o que teoricamente está interdito. Na maior parte dos casos não licenciados, sem alvará, totalmente ilegais, mas que estranhamente nem o Ministério trava nem a Câmara embarga e manda demolir, fazendo uso dos mecanismos que a legislação coloca ao seu dispor.
Exemplos dos muitos que se poderiam dar e que mais não são do que a ponta do imenso iceberg são os grandes projectos de especulação imobiliária, projectos megalómanos para a zona, que agora se pretendem vir instalar no Guincho, no Abano, no Cabo Raso e no Autódromo. Tudo isto projectos para a dita área protegida, que, para maior grau de eficácia e protecção, se transformou em parque.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não basta, no papel e administrativamente, querer convencer os cidadãos de que o ambiente é protegido, nem tão-pouco incluir nos programas eleitorais um parágrafo sobre o desenvolvimento, porque ele dá votos! As mudanças exigem opções e delas será o futuro feito, um futuro que ponha fim ao cinzento e que dê lugar ao verde. Esperemos que os cidadãos optem por isso!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

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Eram 16 horas e 2O minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de Deputados.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Vítor Crespo, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, com início em 7 de Julho corrente, inclusive; Luís Peixoto, do PCP, por um período não inferior a 45 dias, com início a 1 de Julho corrente, inclusive; Mário Tomé, Deputado independente, por um período não inferior a 45 dias, com início em 3 de Julho corrente, inclusive; e João Gouveia, do PSD, com início em 1 de Julho corrente, inclusive, respectivamente pelos Srs. Deputados Licínio Moreira, Amândio Braulino Freitas, Luís Fazenda e Joaquim Barros de Sousa, e ainda à substituição do Sr. Deputado Joaquim Barros de Sousa, do PSD, a partir de 1 de Julho corrente, inclusive, o qual não pode ser substituído por impedimento do único candidato suplente da respectiva lista.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão do projecto de deliberação n.º 111/VI - Visa a audição do Director do Serviço de Informações de Segurança pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (PS).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que o projecto de deliberação que o PS apresenta é concludente e fala por si. E suponho igualmente que a gravidade das notícias recentemente vindas a lume, que vieram colocar em estado de alerta a consciência democrática do País, sejam elas verdadeiras ou falsas, devem merecer da parte de todos nós a maior atenção, que uma matéria com tal melindre para o regime de liberdades públicas em Portugal não pode deixar de merecer, particularmente à Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E por isso, Srs. Deputados, entendemos mais uma vez fazer aquilo que devemos. Depois de já muitas vezes termos esgotado todos os meios legítimos ao nosso alcance para dar um clima de dignidade efectiva ao Sistema de Informações da República em Portugal; depois de, infelizmente, outras tantas vezes, termos esbarrado na auto-suficiência, na indiferença e até na arrogância do Governo e do PSD, não podemos deixar de novamente colocar à consideração de todos os Srs. Deputados uma questão essencial, que não pode deixar de ser aquela que se prende com o quadro da legalidade em que funcionam os serviços de informações e, particularmente, o Serviço de Informações de Segurança.
Mas, desde logo, uma primeira perplexidade: quando, no passado recente, algumas vezes aqui pusemos o problema, ouvimos dizer, nomeadamente ao actual líder do PSD, que o Governo assumia plenamente, cabalmente e até às últimas consequências a garantia da legalidade democrática no funcionamento dos serviços de informações. No entanto, logo que esta ocorrência se deu, verificámos que, tanto o líder do PSD, como o Sr. Ministro da Administração Interna, designadamente, vieram a correr lamentar-se da inexistência do Conselho de Fiscalização do Sistema, porque, se, porventura, tal Conselho estivesse em funcionamento, porventura também não teria havido lugar às ocorrências relatadas em alguns órgãos de comunicação social.

O Sr. José Magalhães (PS): - Desculpas!

O Orador: - E a perplexidade é esta: se os senhores, membros desta maioria, e o Governo estavam convictos do significado e da importância do Conselho de Fiscalização, por que fizeram orelhas moucas às propostas do PS para lhe dar condições de fiscalização efectiva...

A Sr.ª Conceição Castro Pereira (PSD): - Era, era!

O Orador: - ...e aos apelos do Sr. Presidente da República para que fosse garantido, em termos muito mais adequados, os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente previstos?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não foi assim que o Governo e o PSD se comportaram no passado!
Mas uma segunda perplexidade, Srs. Deputados - segunda perplexidade, aliás, que trás uma grande ironia misturada. O Sr. Ministro da Administração Interna resolveu escrever uma carta à Assembleia da República que termina - pasme-se! - pedindo, chamando a atenção, afirmando o seu gosto pessoal no sentido de que o Conselho, a existir, produzisse com carácter de urgência um rigoroso inquérito sobre o SIS.
Agora pergunto-vos, Srs. Deputados da maioria, e peço-vos o favor de responderem claramente à questão que vos formulo: então, se o responsável da pasta admite finalmente que o Conselho de Fiscalização pode e deve fazer um inquérito aos serviços, porque é que os senhores, quando o PS apresentou uma proposta de lei para garantir a sua competência legal, designadamente para efectuar inspecções aos serviços, votaram contra?
O Sr. Ministro da Administração Interna disse que isto era uma irresponsabilidade do Estado. Porquê, Srs. Deputados? Por uma de duas razões possíveis: ou o Sr. Ministro da Administração Interna esteve a brincar connosco todo o tempo, na altura em que, na Assembleia da República, discutimos os poderes do Conselho de Fiscalização, ou, perante a gravidade dos factos, supostos ou reais, relatados, o Sr. Ministro da Administração Interna, por fim, converteu-se às posições do Partido Socialista. Não há duas hipóteses sobre este problema!
Quando o Sr. Ministro quer um inquérito directo aos serviços de informações por um conselho que, nos termos da lei, não tem essa competência legal, alguma coisa está profundamente errada. Ou o Ministro não tem sentido de Estado, ou o Ministro não tem o mínimo de coerência de posições, ou o Ministro, finalmente, arrependeu-se de tudo

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o que disse até agora, e, se assim é, a bancada da maioria, solidária com o Governo, tem de pedir desculpa aqui a todos nós pelo facto de não ter viabilizado aquilo que devia ter viabilizado em tempo oportuno, isto é, uma eficácia efectiva na fiscalização do Sistema de Informações.
Mas porque assim é, Srs. Deputados, a realidade impõe-se, e essa realidade é a de que os responsáveis e nós queremos, como sempre quisemos, dar o nosso contributo responsável têm de contribuir para superar a crise de confiança e de credibilidade das instituições da República, particularmente do Sistema de Informações. E, neste sentido, nesta circunstância, nada melhor do que, justamente, em audição parlamentar, ouvir na Assembleia da República o Director do SIS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a segunda questão sobre a qual os senhores, hoje, têm de pronunciar-se de modo conclusivo, para que se saiba se andam, como aparentemente têm andado o tempo todo, a "meter os pés pelas mãos" sistematicamente ou se na realidade vai em vós sobrepor-se o mínimo de consciência democrática e, como tal, o mínimo de contribuição para a dignificação das instituições democráticas da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Traumatizado por uma actuação prossecutória e violadora de todos os direitos fundamentais por parte de uma polícia política, que foi um dos principais sustentáculos de uma ditadura de 4O anos, o país receou até 1984 a implementação de um serviço de informações. Porém, 1O anos bastaram para, com realismo e maturidade democrática, distinguir com a necessária clareza serviços de informações que servem e defendem as democracias e a nossa segurança colectiva de polícias políticas ou entidades secretas ao serviço de totalitarismos e da supressão das liberdades.
15to mesmo foi magistralmente justificado e defendido pelos Srs. Deputados Almeida Santos, Sottomayor Cardia e José Luís Nunes aquando do debate, neste Plenário, da Lei n.º 3O/84, que criou o Serviço de Informações de Segurança da República Portuguesa. É assim em todas as democracias ocidentais, e Portugal não podia transformar-se num paraíso para férias de gangs e de membros de associações criminosas internacionalmente organizadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Importante é que tais serviços não exorbitem das suas competências e que a sua acção e intervenção se processem na estrita observância da lei e da Constituição e mormente no escrupuloso respeito pelos direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão. Com esta questão se prende a delicada problemática da fiscalização de tais serviços. Não foi tarefa fácil encontrar as soluções que conciliem o carácter reservado e de alguma confidencialidade que, por natureza, necessariamente têm com a sua indispensável fiscalização democrática.
Temos para nós que as soluções consagradas na Lei n.º 3O/84, de 5 de Setembro, aperfeiçoadas pela Lei n.º 4/95, de 21 de Fevereiro, designadamente, quando avaliadas em termos de Direito Comparado, afiguram-se adequadas.
O Conselho de Fiscalização, composto por três membros eleitos por maioria de dois terços da Assembleia da República, afigurou-se também eficaz e idóneo. Na verdade, dos três elementos que o integravam, dois deles pertenciam à área socialista; estando o terceiro politicamente identificado com o partido do Governo. Tínhamos, pois, um Conselho de Fiscalização afecto, na sua maioria, à oposição, sendo certo que, ao longo do exercício das suas funções, o Conselho e os seus membros sempre revelaram superior isenção.
No relatório que o Conselho de Fiscalização apresentou à Assembleia da República, relativo aos anos de 1988 e 1989, referia-se: "Finalmente, a análise dos relatórios pedidos e enviados - e que se traduziam essencialmente em estudos sistemáticos de alvos prioritários, relatórios periódicos de informações e estudos de informações - permitiu ao Conselho de Fiscalização concluir pelo cumprimento das disposições constitucionais e legais que regem a actividade do Serviço de Informações de Segurança. De facto, da leitura daqueles relatórios pensamos que os direitos dos cidadãos são respeitados".
No último relatório apresentado, relativo aos anos de 1991 e 1992, o Conselho de Fiscalização voltou a afirmar: "Como atrás foi referido, o Conselho teve acesso a dezenas de relatórios pedidos, aleatoriamente, aos serviços. De entre esses relatórios alguns houve que trataram problemas semelhantes àqueles que têm feito eco na comunicação social - referimo-nos ao relatório sobre a PGA e sobre a acção dos sindicatos. Da análise a que se procedeu em relação a todos eles concluiu não haver, quanto às finalidades e aos meios usados, violação de quaisquer direitos ou liberdades constitucional ou legalmente consagrados, tendo-se os serviços, naquilo que nos foi dado observar, mantido dentro dos poderes que lhes são conferidos".
A par do Conselho de Fiscalização, a Lei n.º 3O/84 criou a Comissão de Fiscalização do Centro de Dados dos Serviços de Informações de que fazem parte os serviços do Procurador-Geral da República e dois Procuradores-Gerais-Adjuntos, nomeados pelo Sr. Procurador-Geral da República, a qual apresentou em 199O relatório em que referia: "publicitada a existência, a sede de funcionamento e o objectivo fiscalizador da Comissão, através, no Diário da República, de circular dirigida aos órgãos superiores da administração judiciária, até ao momento não foi recebida qualquer participação ou queixa sobre irregularidades ou violações de direitos, liberdades ou garantias pessoais levadas a cabo através do uso da informática pelos Serviços de Informações".

O Sr. José Magalhães (PS): - Saiu agora no Expresso!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queremos deixar claro que as notícias sobre eventuais actuações, por parte do SIS ou de funcionários seus, atentatórias de direitos e liberdades fundamentais têm de ser profundamente investigadas e apuradas até ao fim, até às últimas consequências.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Concordamos plenamente não só com a intervenção do Procurador-Geral da República e a iniciativa que o Director do Serviço de Informações teve, ao desencadear a competente queixa, como também con-

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cordamos com a intervenção que a Comissão de Fiscalização do Centro de Dados entenda dever ter. Igualmente, e ao contrário de outros, não nos demitimos nem aceitamos que o Parlamento se demita das suas funções nesta matéria e da fiscalização que lhe compete. A este propósito, não quero deixar de registar o humor que Mário Bettencourt Resendes revelava ontem num escrito do Diário de Notícias, que passo a citar: "Ser escutado pelo SIS passou a ser um elemento curricular valioso para político ou comentarista que se preze". Pensamos que estas questões são demasiado sérias para podermos "meter a cabeça na areia" e ignorá-las.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nem meter areia na cabeça!

O Orador: - Por isso, viabilizámos a audição do Sr. Ministro da Administração Interna na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, já marcada para amanhã de manhã.

Vozes do PS: - Já o esteve para hoje!

O Orador: - Mas exactamente porque estas questões, que têm a ver com direitos fundamentais dos cidadãos, são demasiado sérias é que a todos é exigida a seriedade de propósitos. Ora, o PS tem revelado uma total irresponsabilidade em todo este processo relativo ao Serviço de Informações de Segurança.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - Assim, não só pressionou os membros do Conselho de Fiscalização da área socialista a demitirem-se das suas funções como vem sistematicamente boicotando a sua eleição.
O PS não respeita nem sabe respeitar as regras democráticas, e assumidamente, como não tem maioria parlamentar, não hesita em proclamar que boicotará a eleição do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, que tinha - e pretende-se que continue a ter - uma maioria de membros da área da oposição, sem que se aprovem as alterações às competências desse Conselho.
O Sr. Deputado Adriano Moreira já teve oportunidade de explicar ao PS o disparate das alterações que pretende, ou pretendia, introduzir no âmbito das competências do Conselho de Fiscalização, transformando-o em órgão de inspecção. Aquilo que se pretende que o Conselho seja e continue a ser é um órgão de fiscalização democrática eleito pela Assembleia da República. Só um partido com total irresponsabilidade impede que o órgão de fiscalização do SIS funcione e, sendo assim, não tem o direito de vir a indignar-se por eventuais desvios que essa falta de fiscalização possa ocasionar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ferro Rodrigues; (PS): - 15so é um absurdo total!

O Orador: - O PS não tem legitimidade nem moral para levantar estas questões, quando impede que funcione um conselho de fiscalização que já deu provas de ser idóneo e cujos relatórios foram sempre aprovados por unanimidade e assinados por todos os seus membros.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O projecto de deliberação do PS não tem qualquer razão de ser, regimental ou outra. Na verdade, estando a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizada a reunir até ao próximo dia 12 do corrente, não necessita de qualquer autorização da Comissão Permanente para realizar a audição parlamentar relativa às questões do SIS.
Por outro lado, a proposta de audição do Director do SIS vem completamente ao arrepio da orientação que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias tem mantido, na medida em que, sendo o Governo politicamente responsável perante a Assembleia, deve ser o Ministro respectivo quem, em primeira linha, deve dar informações e explicações à Assembleia sobre assuntos e questões sob a sua tutela.
Está, pois, o projecto de deliberação do PS ora em debate ultrapassado pelo Regimento e pela audição do Sr. Ministro da Administração Interna, prevista para amanhã na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Porém, para confirmarmos a boa fé do PS, e comungando das preocupações veiculadas pelo Sr. Ministro da Administração Interna na carta que dirigiu ao Sr. Presidente da Assembleia da República, desafiamos o PS a consensualizar a eleição dos membros do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, reafirmando, mais uma vez, a nossa aceitação e propósito de que a maioria dos seus membros continue a ser, como no passado, da área da oposição.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se o Partido Socialista estiver de boa fé neste processo, não deixará de aceitar o nosso desafio.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - O problema é que não está!

O Sr. José Magalhães (PS): - O recado está tão escrito que nem se consegue ler!

O Orador: - Por isso, aguardamos que aceite este nosso desafio e adiantamos a nossa disponibilidade para ser convocado um Plenário da Assembleia da República, a fim de se proceder a essa eleição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se o Partido Socialista, que é minoria e oposição, persistir em manter a indignidade política de fazer a chantagem de boicotar a eleição do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, revela bem o que seria o seu comportamento se alguma vez fosse maioria ou governo, como confirmará a sua falta de idoneidade e de maturidade para alguma vez assumir o poder.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para que efeito?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Para um protesto, em nome da minha bancada.

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O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, trouxemos hoje à Câmara um problema que, supúnhamos nós, deveria merecer a preocupação, fosse qual fosse a decisão final, daquilo a que tive ocasião de chamar a consciência democrática do país. Infelizmente, acabámos de ouvir, supostamente, a voz autorizada do Grupo Parlamentar do PSD insultar o PS, acusando-o de irresponsabilidade, de chantagem, de falta de idoneidade.
Srs. Deputados da maioria, fiz aqui um apelo à consciência democrática do país e lamento profundamente ter de reconhecer que ele não terá eco, porque os senhores revelam falta de consciência democrática.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que não são capazes de discernir aquilo que deve ser a defesa da dignidade das instituições e acusam - sem saberem e sem terem consciência do que acusam - o PS de pressionar a demissão de membros do ex-Conselho de Fiscalização. Porém, os Srs. Deputados sabem e têm a obrigação de conhecer os termos das cartas em que esses membros do Conselho de Fiscalização sustentaram o seu gesto.

Protestos do PSD.

Ora, a razão desse gesto foi a de terem reconhecido que, depois de um processo legislativo em curso, não lhes restava outra saída, porque os senhores não conferiram dignidade institucional à continuação do exercício dessas funções.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores têm o dever de respeitá-los em virtude do reconhecimento devido pelas figuras de proa que constituem.
Acusam-nos igualmente de ter impedido a criação de um novo Conselho.

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - Estão redondamente enganados, Srs. Deputados! Não há, da nossa parte, qualquer bloqueio porque sucede que, a determinada altura, os senhores marcaram uma eleição subordinada à regra do voto secreto na qual todos os Srs. Deputados votaram, verificando-se que não foram obtidos os dois terços de votos necessários para a eleição, nos termos legais, do Conselho de Fiscalização.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Essa é que é essa!

O Orador: - São os senhores que não sabem adaptar-se nem reconhecem as regras do jogo, razão pela qual, mais uma vez, nem sequer demonstram ter a sensibilidade mínima adequada para compreenderem que o que está em causa nesta questão dos Serviços de Informações é algo de fundamental à dignidade do Estado de Direito que nós, permanentemente, aqui temos procurado defender, mesmo contra a vossa arrogância e incapacidade de compreensão.

Protestos do PSD.

Sendo assim, é preciso que nos expliquem como é que o Sr. Ministro da Administração Interna, que talvez aqui devesse estar presente, hoje já pede a realização de um rigoroso inquérito ao tal Conselho que não existe, admitindo ele formalmente que, afinal, o PS tinha razão quando queria atribuir a esse órgão competência para poder realizar os inquéritos, o que os senhores, na altura, rejeitaram.

O Sr. José Magalhães (PS): - A lei não prevê!

O Orador: - Srs. Deputados, faço-vos o seguinte apelo: agendem um Plenário extraordinário para rever a lei do Conselho de Fiscalização do SIS,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... de forma a ser dada maior dignidade e eficácia ao exercício das suas competências e, depois, procedermos à sua eleição.
Respondam democraticamente às responsabilidades que têm perante o país, mas façam-no construtivamente e deixem de fazer insultos gratuitos, porque não estamos numa fase propícia para esse efeito e a gravidade dos problemas não tolerará que os tratemos dessa forma!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para um contra-protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, nitidamente, devemos ter conceitos de democracia distintos.

Protestos do PS.

Pergunto: onde está a inversão da democracia? Então, VV. Ex.ªs apresentam aqui uma proposta de alteração da lei do serviço de informações, que não tem o acolhimento da maioria eleita pelo povo português, a qual também devem respeitar, e, quando vêem derrotada a vossa posição, anunciam publicamente que vão fazer sair os vossos membros do Conselho de Fiscalização, obrigando-os a renunciar, boicotando desta forma a eleição?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Querem pressionar a maioria para fazer vingar uma posição, que é a vossa, não sendo maioria.
Quem respeita a democracia? Aqueles que acatam as decisões da maioria ou VV. Ex.ªs que fazem chantagem...

Aplausos do PSD.

.... para fazer vingar um ponto de vista, que é o da minoria, em detrimento do da maioria?
Como é que VV. Ex.ªs podem assumir perante o País a responsabilidade desta matéria quanto ao problema dos serviços de fiscalização quando reduzem à estaca zero a sua função, boicotando e fazendo demitir os membros do Conselho de Fiscalização?
Expliquem perante o país por que razão é necessária e importante esta fiscalização quando VV. Ex.ªs impedem que ela se realize, se os relatórios do Conselho - aprovados por unanimidade pelos seus membros, designadamente pelos indicados pelo PS - confirmaram que, felizmente, não

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havia violações de direitos fundamentais e que o Governo colocou sempre todos os elementos à disposição de quem quer que fosse.
Pergunto: é democrático aceitarmos que o Conselho continue a ter uma representação maioritária de um partido da oposição se VV. Ex.ªs, apesar disso, boicotam a sua eleição? Expliquem ao país quem observa ou não a democracia!

Aplausos do PSD.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, devo avisá-lo de que considero encerrado este incidente.
Tem a palavra para uma interpelação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, ouvimos, da boca do Sr. Deputado Guilherme Silva, a reafirmação de que o PS boicotou uma eleição na Assembleia da República. A minha interpelação à Mesa, perante a gravidade da acusação, é no sentido de o Sr. Presidente e a Mesa informarem a Câmara do Diário em que, nesta Casa, se registou um acto de boicote eleitoral da parte do Partido Socialista.

Vozes do PS: - Nenhum!

O Orador: - Porque se tal não suceder, então, terá de constar do Diário de hoje que este Sr. Deputado hoje mentiu, mais uma vez, no Parlamento!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, a Mesa toma nota da sua interpelação e, na altura própria, responder-lhe-á.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, volto a afirmar que este incidente está encerrado.
Tem a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, desejo dizer a V. Ex.ª que não me parece ter sido devido a má audição da minha parte que ouvi o Sr. Deputado Jorge Lacão aqui sugerir, no desafio que lançou à bancada a que pertenço, a realização de um Plenário da Assembleia da República para alterar a lei de forma a só depois, então, o Partido Socialista dar o seu assentimento à eleição do Conselho de Fiscalização. É que ele próprio tem consciência do que disse e, sem socorrer-se do Diário da Assembleia da República, admitiu aqui a responsabilidade do Partido Socialista na inviabilização da eleição desse Conselho de Fiscalização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, a Mesa regista igualmente a sua interpelação.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, gostava de formular-lhe apenas duas questões, as quais, aliás, já foram enunciadas, pelo que, em parte, tratar-se-á de uma repetição.
V. Ex.ª citou aqui o nome do meu colega de bancada, Professor Adriano Moreira, referindo-se ao apoio por ele dado à versão governamental da lei dos serviços de informações pelo facto de ter feito um estudo comparativo dos vários sistemas existentes relativos à sua fiscalização, chegando mesmo a dizer que era o próprio Plenário da Assembleia que, na tradição constitucionalista da monarquia, às portas fechadas, poderia proceder à investigação de determinados assunto concretos.
Não foi este nem qualquer dos outros modelos avançados pelo Professor Adriano Moreira que veio a ser consagrado mas, sim, o que costa da actual lei, segundo o qual o Conselho de Fiscalização não pode colaborar directamente na investigação ou inspecção dos serviços do SIS. Logo, quando este conselho quer obter informações, deverá recorrer ao Sr. Ministro da Administração Interna, o qual poderá fornecer-lhe o relatório respectivo.
Porém, o Sr. Ministro da Administração Interna pede, na sua carta, que o Conselho de Fiscalização faça um inquérito rigoroso. Em que legislação está a basear-se para sugerir que este conselho de fiscalização, a existir, possa fazer este inquérito? Que lei permite ao Conselho de Fiscalização fazer um inquérito directo aos serviços de informações?
Por outro lado, sabendo o Sr. Ministro da Administração Interna que, neste momento, ainda não está criado o Conselho de Fiscalização, por que é que, na sua carta, pede este inquérito sem previamente o Grupo Parlamentar do PSD se disponibilizar a convocar o Plenário da Assembleia da República para proceder à eleição dos seus membros?
Temos ouvido dizer que o Grupo Parlamentar do PSD não quer marcar um Plenário durante as férias mas, se tal não corresponde à verdade, estará o partido social-democrata disposto a aproveitar este Plenário para rever a lei, conferindo os poderes necessários ao Conselho de Fiscalização para fazer o tal inquérito pedido pelo Ministro da Administração Interna?

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra para responder, mas chamo a sua atenção porque já não tem tempo disponível pelo que lhe peço que seja breve.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, tentarei ser muito breve.
Sr. Deputado Narana Coissoró, numa intervenção que fez no Plenário a propósito desta matéria e referindo-se a vários temas de fiscalização dos serviços de informações em vários países, disse: "Julgamos que Portugal vai muito mais longe na fiscalização dos serviços de informações do que qualquer democracia. Aliás, podemos pedir meças a qualquer democracia ocidental, tão prezadas para o Partido Socialista, e ver onde é que os serviços de fiscalização dos serviços de informação têm uma configuração tão apertada como o do sistema de controlo parlamentar que há em Portugal (...)"

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Estamos a favor dessa lei!

O Orador: - V. Ex.ª disse ainda que era contra a abertura de qualquer processo legislativo que reforçasse esse sistema e as competências de fiscalização. Portanto, espero que V. Ex.ª mantenha essa sua posição...

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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Mantenho sim senhor!
Quando é que é o inquérito?

O Orador: - Quanto às perguntas que colocou, respondo-lhe que o Sr. Ministro virá amanhã à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e, então, V. Ex.ª poderá fazer-lhe a pergunta directamente...

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ah!

O Orador: - No entanto, quero dizer-lhe que a minha leitura quanto ao que refere o Sr. Ministro é no sentido de que se o Conselho de Fiscalização estivesse a funcionar orientaria uma intervenção específica sobre as questões que se tinham levantado...

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Mas como? Não há lei!

O Orador: - Há pouco, li a V. Ex.ª um excerto do relatório dos serviços de fiscalização que dava conta de investigações que tinham sido feitas, de elementos que tinham sido pedidos quanto a notícias que tinham vindo a público a propósito de acções sindicais, etc. Portanto, de acordo com a minha leitura, é nesse sentido que o Sr. Ministro põe a questão pelo que, quanto a essa matéria, é esta a minha resposta.
Quanto à nossa disponibilidade para a realização de uma reunião plenária, acabei de reafirmar, no final da minha intervenção, que "o PSD, desde que o Partido Socialista consensualize essa eleição, (...)"

O Sr. José Magalhães (PS): - Diz o quê?

O Orador: - Sr. Deputado, sabemos muito bem como é que, no domínio parlamentar, se acertam as soluções viabilizadoras de questões sérias como esta, tal como todos sabemos muito bem o que é a farsa de o Sr. Deputado Jorge Lacão dizer que "é o voto secreto, ninguém é eleito e tem de respeitar-se". Simplesmente, como há pouco denunciou o meu companheiro de bancada, isto é dito sempre partindo da premissa de que "se aprovarem as alterações que propomos, nós viabilizaremos a eleição". E é só isso,!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, admitiria que me desse a palavra para um protesto, porque teria muitas vantagens...

Risos.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Aí vem o defensor das vítimas e dos torturados!

O Orador: - Até que enfim o Sr. Deputado Silva Marques reconhece que vem aí alguma coisa de jeito! Aliás, vou precisamente começar por dizer isso, Sr. Deputado Silva Marques!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faz agora dois anos que, por parte do Grupo Parlamentar do PCP, foi tomada a primeira iniciativa parlamentar nesta Assembleia da República, o Inquérito Parlamentar n.º 17/VI, tendente a pôr cobro às ilegais e antidemocráticas actuações que o SIS vinha praticando às ordens do Governo e para seu exclusivo interesse político-partidário.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Quem é que estava a ser escutado?

O Orador: - Nessa altura, o PSD e o CDS-PP votaram contra o inquérito e deram inflamadas garantias de bom comportamento do SIS e até o PS nos pedia que aceitássemos uma modesta audição de Ministros.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas quem é que estava a ser escutado? Quem?

O Orador: - Dois anos decorridos, nem já o PSD nem já o Sr. Deputado Silva Marques conseguem explicar por que razão e com que fundamento um serviço cuja missão legal, nos termos da lei de enquadramento dos serviços de informações, é a de produzir informações tendentes ao combate à alta criminalidade anda, ao invés, obcecado e sem fazer mais nada que não seja vigiar e perseguir actividades de partidos da oposição - agora, sabe-se que também de figuras da oposição interna do PSD - ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Actualmente, paga-se para ser-se escutado!

O Orador: - ... e actividades de sindicatos, de movimentos de estudantes, de movimentos de agricultores, etc., transformando-se, na prática, numa verdadeira polícia de informações políticas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O SIS é uma aberração sem limites na ordem jurídica portuguesa, o SIS, com as suas actuações tal como são hoje, é o sintoma mais à vista de uma perigosa doença que a política do PSD instalou no País e que está a minar as liberdades e a vida democrática.
Da nossa parte, PCP, consideramos que o vezo autoritário e antidemocrático de que deram mostras o Governo e o PSD é mais uma razão para a exigência de uma real mudança de política.
As novas informações que vieram à luz do dia sobre o mundo subterrâneo de ilegalidades em que o SIS está atolado confirmam que uma das primeiras medidas de um novo Governo com uma nova política, democrática e de esquerda, tem de ser uma radical mudança de pessoas, de métodos e de legislação enquadradora do Serviço de Informações de Segurança. O SIS, como está actualmente, é um cancro que tem de ser extirpado pela raiz.
Vamos votar favoravelmente esta audição proposta pelo Partido Socialista e, nomeadamente, a convocação do Director dos Serviços de Informações de Segurança,...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Essa é uma grande novidade!

O Orador: - ... mas temos de dizer que o referido director já prestou provas e já demonstrou que a sua concepção do Serviço não se conforma às exigências da vida democrática.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - E quando o próprio Ministro da Administração Interna e o próprio Director do SIS são obrigados a admitir publicamente a alta probabilidade de a notícia do Expresso ser verdadeira, então, estamos já no domínio da completa ilegalidade, se não estivermos também face a guerras e provocações sujas, típicas de Serviços como estes quando estão politicamente enfeudados.
Provocações, aliás, que não são de excluir quando já se ouviu, na televisão, o Presidente do Grupo Parlamentar do PSD dizer que o inquérito "desta vez, é a sério", o que mostra duas coisas: primeiro, que das outras vezes não foi a sério e, segundo, que a dupla "Secretas/PSD" talvez esteja a preparar "golpaça" grande.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que se exige, Srs. Deputados - e só daqui a poucos meses será possível -, são profundas alterações legais: em primeiro lugar, a atribuição ao Conselho de Fiscalização de poderes de inspecção sem pré-aviso, sem os quais a sua actividade nunca passará de um simulacro de fiscalização; em segundo lugar, a inclusão no Conselho de Fiscalização de membros de todas as forças políticas representadas nesta Assembleia, sem o que o Conselho poderá sempre ser posto ao serviço de umas forças políticas contra outras - utilizo esta fórmula, Sr. Deputado Guilherme Silva, porque parece que isso lhe dá alguma satisfação; em terceiro lugar, o estabelecimento de severos limites à actividade dos Serviços, proibindo e punindo criminalmente qualquer actuação ou ingerência contra as actividades constitucionalmente garantidas aos partidos políticos, às associações sindicais e a outras associações de natureza social, económica e cultural.
A gravidade da situação actual dos Serviços pode ser demonstrada com facilidade quando se vê que continua a exercer as funções de Secretário-Geral da Comissão Técnica uma pessoa que - refiro-me ao General Pedro Cardoso -, através de artigos de opinião, defende essa filosofia de ingerência em partidos políticos e na esfera privada dos cidadãos, considerando que é isso mesmo que deve ser feito, o que é um escândalo!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É um escândalo!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Exactamente!

O Orador: - E repetimos aqui a exigência da imediata demissão do General Pedro Cardoso porque é escandalosa a sua permanência à frente da Comissão Técnica!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os actos ilegais e criminosos praticados por dirigentes e agentes do SIS sob a instigação das chefias do PSD têm de ser completamente averiguados e os seus responsáveis e cúmplices exemplarmente castigados.
Apoiamos - e propusemo-lo através do projecto de lei n.º 412/VI - que a Procuradoria-Geral da República seja a entidade encarregada de realizar um inquérito global aos Serviços. Não um inquérito parcelar, não um inquérito condicionado a este ou àquele facto, mas um inquérito geral ao conjunto da actividade dos Serviços.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Dr. Fernando Nogueira, então ainda Ministro da Defesa Nacional, respondendo a esta proposta do PCP, dizia: "Não vamos consentir, porque não somos um País de inquéritos!"

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Creio que o País compreende, cada vez melhor, os receios do Governo, porque o que está aqui em causa e o que será inevitavelmente averiguado, quando esse inquérito global for feito, é que houve prática de crimes e os seus autores têm de ser condenados, porque são as liberdades, os direitos dos cidadãos que estão em questão com estas actuações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, em termos processuais, julgo que a Mesa deve prestar um esclarecimento que nos parece evidente, embora tudo o que é evidente nesta área também seja controverso.
Estamos numa reunião da Comissão Permanente e, portanto, os trabalhos desta regem-se por um Regulamento próprio. E o artigo 5.º do Regulamento da Comissão Permanente diz o seguinte: "No período da ordem do dia nenhum Deputado ou membro do Governo poderá, sobre a mesma matéria, usar da palavra por mais de duas vezes nem por tempo global superior a dez minutos". Aqui, a expressão empregue é "usar da palavra".
Se formos ao artigo 81.º do Regimento da Assembleia da República, à "magna carta", podemos ver o que esta expressão técnica significa, pois é feita uma listagem das situações em que é concedida a palavra aos Deputados, entre as quais encontramos as intervenções, os protestos e contra-protestos, as interpelações. Ou seja, tudo isso é uso da palavra. Logo, cada Deputado não pode usar da palavra mais de duas vezes no sentido técnico que o Regimento classifica como tal.
Presto este esclarecimento uma vez que o Sr. Deputado Jorge Lacão pediu de novo para usar da palavra, mas também reconheço que - e, na parte que me toca, sou o responsável -, há pouco, este preceito do Regulamento da Comissão Permanente foi violado. O Sr. Deputado Jorge Lacão, tal e qual como o Sr. Deputado Guilherme Silva, já usou da palavra por três vezes.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E agora, Sr. Presidente?!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Não é possível voltar atrás no que já está feito! Mas, de futuro, não posso conceder a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lacão, mas posso concedê-la a qualquer outro Deputado do Partido Socialista, porque dispõem de tempo para o fazer. O Regulamento é claro: diz "nenhum Deputado" e não "nenhum partido"! Logo, o Partido Socialista poderá usar o tempo regimental que lhe resta. Apenas os Srs. Deputados Jorge Lacão e Guilherme Silva não poderão usar da palavra, embora, há pouco, com vosso benefício, lhes tenha dado a palavra mais de duas vezes.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não concordo com o Sr. Presidente!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para interpelar a Mesa, inscreveram-se os Srs. Deputados Silva Marques e Alberto Costa.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, uso da palavra dado o Sr. Deputado João Amaral ter achado deslocado que eu dissesse que, desta vez, é mesmo a sério. É evidente que assim é, no sentido de que, desta vez, conseguiremos averiguar tudo até às últimas consequências e tirar conclusões. É preciso que, finalmente, se tirem conclusões até ao fim e se peçam as respectivas responsabilidades.
Se os factos são verídicos, quem os praticou - já o dissemos várias vezes - deve ser responsabilizado sem transigências; mas se não são, o mesmo deve acontecer, porque a gravidade não é menor e a responsabilização deve ter lugar também sem transigências.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, lembro-lhe que pediu a palavra para interpelar a Mesa!

O Orador: - Sr. Presidente, termino imediatamente a minha interpelação.
Penso mesmo que, desta vez, haverá uma averiguação conclusiva e eficaz, porque, sendo certo que tantos Deputados já se pronunciaram no sentido de não terem a menor dúvida de que existem escutas ilegais, não duvido de que esses Deputados carrearão para a investigação que está em curso os seus conhecimentos.
Espanta-me que os Srs. Deputados, aqui mesmo, não comuniquem publicamente os seus conhecimentos sobre as escutas que têm lugar. O Sr. Deputado João Amaral é escutado? Se é ou se tem conhecimentos sobre essa matéria deve dizê-lo aqui mesmo!

O Sr. João Amaral (PCP): - V. Ex.ª é que sabe!

Risos do PS e do PCP.

O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira é escutado? O Sr. Deputado José Manuel Maia também? E a Sr.ª Deputada 15abel Castro? Os Srs. Deputados socialistas são escutados? E o Sr. Deputado José Magalhães?

Vozes do PSD: - Queria, mas não é!

O Orador: - Dizem-me que hoje toda a gente deseja ser escutada! Pelo menos, já ouvi dois ou três cidadãos reconhecerem, publicamente, que eram escutados.

O Sr. José Magalhães (PS): - São os cidadãos que têm de saber se são ou não escutados?

O Orador: - Será condição de honorabilidade pública ser escutado ou aqueles que não são escutados estão condenados ao anonimato?
Não tenho a menor dúvida de que o Sr. Deputado José Magalhães, que é daqueles que, provavelmente, é escutado, comunicará ao Hemiciclo se o está a ser ou não.
Srs. Deputados socialistas, quem de vós é escutado? Seria bom que, estando os senhores tão convencidos da existência dessas escutas ilegítimas, não perdessem tempo e comunicassem ao Hemiciclo o que os senhores desejam com a audição. Têm, pois, agora uma boa oportunidade para comunicarem ao Hemiciclo e ao País os vossos conhecimentos sobre essas escutas.

Vezes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma rábula irresponsável!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Depois do Sr. Deputado Alberto Costa, também o Sr. Deputado Manuel Alegre usará da palavra para interpelar a Mesa...

Protestos do Deputado do PCP João Amaral.

Sr. Deputado, estão inscritos para interpelar a Mesa os Srs. Deputados Alberto Costa, Manuel Alegre...

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, inscrevi-me primeiro!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, peço muita desculpa, mas não reparei. Assim, o Sr. Deputado Manuel Alegre usará da palavra depois do Sr. Deputado João Amaral.

Protestos do Deputado do PCP João Amaral.

Sr. Deputado, tem de compreender que todos estamos aqui de boa fé!

O Sr. João Amaral (PCP): - Só por uma questão de solidariedade, Sr. Presidente, mais nada!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, tenho dúvidas se acabei de assistir a uma interpelação que, nessa qualidade, antecedeu o meu pedido ou a uma intervenção de outra natureza. E uma vez que V. Ex.ª coloca o problema da aplicação do Regulamento com tanto rigor, pergunto se o que se acabou de ouvir foi, de facto, uma interpelação.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, em substância talvez não tenha sido, mas formalmente foi uma interpelação. Antes de as palavras serem proferidas, não sabemos o que é que vai ser dito!

O Orador: - Anoto o critério de V. Ex.ª, mas queria, justamente, discordar da interpretação que apresentou há pouco, no sentido de o meu colega Jorge Lacão não poder voltar a intervir, pelo seguinte: na verdade, a Mesa permitiu que o Sr. Deputado Guilherme Silva usasse da palavra, no sentido lato que V. Ex.ª há pouco invocou, por três vezes.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Uma das vezes foi para responder a um protesto!

O Orador: - Exactamente! Uma das vezes foi para responder a um protesto, tal como uma das vezes utilizadas pelo Sr. Deputado Jorge Lacão foi para protestar.
V. Ex.ª, ao interpretar dessa forma o Regulamento, criou nos Deputados, e em mim em particular, a convicção de que fazia uma outra interpretação das normas do Regulamento, ou seja, que a regra restritiva especial - dos 1O minutos e do uso da palavra por duas vezes sobre a mesma matéria - visava apenas impedir que um Deputado usasse da palavra, por três vezes, substancialmente sobre o mesmo tema. Foi essa convicção que o critério adoptado pela Mesa gerou.

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Todavia, no momento seguinte, confrontado com este problema, em vez de optar pela uniformidade de critério, V. Ex.ª optou por declarar ilegal a prática anteriormente seguida pela Mesa. E isso parece-me excessivo, Sr. Presidente, para além de incorrecto, porque a impressão transmitida era compatível com uma interpretação correcta do Regulamento.
O que me parece, salvo o devido respeito, é que esta regra especial, que limita o tempo independentemente da grelha, visa impedir que o mesmo Deputado use, sobre a substância, da palavra por mais de duas vezes. E foi isso que resultou do critério que a Mesa, sem qualquer protesto, utilizou anteriormente.
Apelo, portanto, para V. Ex.ª e para a ideia da estabilidade dos critérios, parecendo-me que a maior ofensa a essa estabilidade é reconhecer uma ilegalidade não ostensiva e não admitida com grau suficiente de consensualidade para, a seguir, alterar substantivamente o critério, que é o que me parece que está em causa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Alberto Costa, respeito muito a sua opinião, que é o mínimo que posso fazer. Simplesmente, na minha perspectiva, ela não está perfeitamente ajustada à realidade. É certo que tudo isto é controverso. De facto, falar-se em matéria, em termos de ordem do dia, significa pontos da agenda. E a ordem do dia de hoje apenas tem uma matéria, isto é, um ponto.
Há pouco, quando referi - e foi em "confissão" que o disse à Câmara, porque era um "pecado" - que tinha dado três vezes a palavra ao Sr. Deputado Alberto Costa, fi-lo com a consciência tranquila, uma vez que tinha cometido o mesmo "pecado" relativamente ao Sr. Deputado Jorge Lacão: dei-lhe a palavra para intervir, para protestar e, ainda, para interpelar a Mesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - O que não conta para efeito regimental!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Conta, Sr. Deputado! Faça favor de ler o artigo 81.º do Regimento da Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Leia, Sr. Deputado José Magalhães!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - O Sr. Deputado é um técnico e sabe que as expressões técnicas só têm um sentido. O artigo 81.º fala em "uso da palavra" e, no uso da palavra, inclui todas as situações que referi!

Vozes do PSD: - Está tudo no "livrinho"!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se V. Ex.ª segue por esse rumo, que me parece excessivamente estrito, imagine a seguinte situação: um Deputado só pode usar da palavra duas vezes numa reunião deste tipo. Ora, se uso da palavra e alguém me faz uma pergunta e, a seguir, outra pessoa me faz também uma pergunta, depois mais outra, estou impedido de responder a duas delas, pois só posso responder a uma. Não faz sentido, Sr. Presidente! Nunca ninguém interpretou a norma nesse sentido!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, se puder continuar, digo-lhe ainda o seguinte: esta interpretação é reforçada, porque estamos em Comissão Permanente, a qual é, por natureza, um parêntesis nos trabalhos parlamentares, e, como tal, todo o sentido do Regulamento da Comissão está dirigido para abreviar os trabalhos e não para os prolongar.
Por isso mesmo, há aqui uma restrição ao uso da palavra que, como V. Ex.ª calcula, é contra o princípio da oralidade parlamentar, mas é de acordo com este regime de excepção dos trabalhos da Comissão Permanente, e não dos trabalhos em geral, que V. Ex.ª tem de interpretar aqueles preceitos.
Creio que não se trata de um problema que nos afecte e julgo que deveremos conformar-nos com isso, porque, segundo sei, a prática corrente da Comissão Permanente tem sido esta.

O Sr. Miranda Calha (PS): - É uma interpretação nova!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, já não tenho tempo, mas creio que a intervenção do Sr. Deputado Silva Marques foi uma forma de resolver o problema da falta de tempo. Por isso, quero interpelar a Mesa, perguntando ao Sr. Presidente se a Mesa não entende que o Sr. Deputado Silva Marques, com a intervenção que fez, ao referir-se ao significado da sua expressão "desta vez é a sério", não fez mais do que confirmar aqui as suspeitas, as legítimas suspeitas de que anda provocação no ar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Anda, anda! Também estou convencido disso!

O Sr. José Magalhães (PS): - E que provocação!

O Orador: - Assim, pergunto ao Sr. Presidente se não vale a pena desafiar o PSD a explicar aqui qual é a provocação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, recebi a sua comunicação como interpelação, mas confesso que não compreendi bem o seu sentido, pelo que guardarei a resposta para quando perceber.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas o destinatário está aqui e compreendeu!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, aquilo que o meu camarada Jorge Lacão queria dizer, e trata-se de uma questão fundamental, é que se o PSD está disposto a rever a lei no sentido de assegurar um rigoroso inquérito pelo Conselho ao SIS - como o Ministro agora refere e o PS propunha -, estamos dispostos a admitir uma sessão extraordinária do Plenário para permitir a eleição do Conselho.
Agora, aquilo a que estamos aqui a assistir é a uma colossal mistificação política. O PSD vem brincar com coisas sérias, foge ao debate, faz o mal e a caramunha" e

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persiste em considerar como boicote aquilo que é um exercício democrático por parte do Partido Socialista. Realmente, temos diferentes conceitos de democracia, porque para os senhores a democracia começa e acaba na regra da maioria, mas a democracia não é isso, a essência da democracia é o direito de discordar, de pensar de outro modo e de votar contra.

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - Já houve a teoria da soberania limitada e aquilo que o senhor aqui expôs é um conceito limitado de democracia que não aceitamos!

Vozes do PS: - Muito bem!

Aplausos do Deputado do PS José Lello.

Protestos do PSD.

O Orador: - Consideramos que o direito de votar como entendemos é um direito democrático que não pode ser posto em causa, que não pode ser objecto de calúnias e insultos dirigidos ao Partido Socialista,...

O Sr. Jorge Paulo Cunha (PSD): - Que o diga o Parcídio!

O Orador: - ... nem da mistificação política que os senhores aqui vieram fazer.
Assim, também estou de acordo com aquilo que disse o Sr. Deputado João Amaral, pois a maneira como os senhores tratam este assunto indicia que, daqui para a frente, vale tudo e estamos no domínio da provocação não só dos serviços mas política.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Manuel Alegre a interpelação que fez à Mesa, no fundo, foi uma declaração. A Mesa recebe essa declaração, mas, como toda a Comissão Permanente está à "escuta" - já que estamos a falar em escutas -, não precisa de a transmitir.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada 15abel Castro.

A Sr.ª 15abel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois do artificialismo que o nosso Regulamento permite, dando aos vários Srs. Deputados a possibilidade de se repetirem nas suas múltiplas intervenções legítimas mas, naturalmente, não respeitadoras da ordem que deveria ser dada aos vários grupos parlamentares, entendo que o projecto de deliberação que o Partido Socialista trouxe hoje à Câmara tem efectivamente importância, no essencial das preocupações de que é portador, ou seja, de que temos uma polícia política em Portugal que extravasa aquele que era suposto ser o seu âmbito de intervenção, violando direitos fundamentais dos cidadãos, mas, quanto a nós, não me parece que traga uma questão nova.
A questão que se coloca em relação ao SIS, no nosso entendimento, não é aquela a que o Sr. Deputado Guilherme Silva fez referência e que, hipoteticamente, uma dita polícia política boa poderia ter permitido, ou seja, o combate aos gangs. Pergunto: de que grande obra o SIS pode arrogar-se, quando não vemos que a corrupção tenha reduzido, por via dele, quando não vemos também que as redes clandestinas de prostituição tenham reduzido, quando não vemos senão serem apanhados pequenos e médios traficantes de droga e os grandes ficam soltos,...

O Sr. Guilherme Silva (PS): - E a criminalidade internacional?! E o terrorismo?!

A Oradora: - .. quando não vemos que as mafias que fazem o turismo ilegal dos resíduos sejam apanhadas, quando não vemos que os grupos neo-nazis a agir em Portugal tenham alguma vez sido vigiados ou, pelo menos, que dessa vigilância tenha resultado algo de preventivo e minimamente útil para a segurança dos cidadãos e da comunidade?

O Sr. Manuel Alegre (PS): - 15so é que era bom!

A Oradora: - Entendo, pois, que estamos, desde o início - a questão não é de agora -, a brincar ao faz-de-conta, que há pessoas legitimamente afectadas e devem exigir esclarecimentos, dado que são vigiadas abusivamente. E a questão coloca-se de há muito, quando estudantes são vigiados, quando manifestações são controladas, quando grupos ambientalistas são considerados elementos perigosos e perturbadores para a sociedade.
Portanto, de há muito que há violações e ilegalidades e, quanto a nós, brincar ao faz-de-conta, suscitando este facto em plena campanha eleitoral, é fingir que para trás tudo estava bem e que há um dado novo, quando este dado é mais um, numa linha de continuidade de violações anteriores.
Para nós, Os Verdes, a questão coloca-se desde o início: não se justifica, no Sistema de Informações, uma polícia que vem limitando os cidadãos, que vem violando direitos fundamentais, que não foi capaz de provar ser portadora de mais garantia e segurança para os cidadãos e, muito menos, uma polícia que tinha na sua génese um Conselho de Fiscalização com regras, elas próprias limitadoras da possibilidade de essa fiscalização poder, de algum modo, ser feita eficazmente.
Trata-se de um problema antigo e, por isso, somos favoráveis a que este projecto de deliberação seja aprovado, na medida em que nos parece interessante ouvir o Director-Geral do SIS. No entanto, essa audição vale o que vale, mas o problema é bem mais fundo, pelo que tem de vir a ser radicalmente equacionado numa outra perspectiva que não a de uma sociedade policiada, como esta, da qual não somos, em caso algum, partidários.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que me admira em todo este incidente é que, logo que foi publicada a notícia por um semanário, o próprio SIS e toda a sua estrutura ficaram abalados, o que mostra, em primeiro lugar, que os órgãos superiores desse serviço não controlam rigorosamente o serviço! Se a direcção do SIS tivesse a mínima confiança nos seus funcionários e na sua estrutura, a primeira coisa que teria a fazer seria dizer exactamente "Os nossos serviços são incapazes de fazer uma investigação dessas, ilegal e fora dos cânones de que estão incumbidos, e, por isso, não admitimos esta notícia do jornal"!
Admitir a notícia do jornal e, com base nisso, o Director-Geral do SIS correr para o Procurador-Geral da Re-

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pública solicitando-lhe que abra um inquérito, mostra, em primeiro lugar, a incompetência total do Sr. Director-Geral e a confissão de que não controla os seus próprios funcionários e que deles desconfia - ele próprio é o primeiro a desconfiar! - e, em segundo lugar, que o serviço anda em roda livre! É a primeira pessoa a atear o fogo e dar credibilidade a todas as informações, a tudo o que o jornal disse sobre o funcionamento dos serviços!
Ora, não há memória de que, lançada uma suspeita sobre um serviço, a própria direcção do serviço venha dizer "Sim senhor, isto pode ser verdade, vamos investigar, porque não controlamos o que aqui vai dentro e, realmente, pode haver casos em que os nossos funcionários estejam a tratar ilegalmente de toda a matéria"! 15to mostra a fraqueza e a fragilidade a que chegou a nossa Administração Pública, principalmente, aqueles organismos em que devíamos confiar plenamente! Se o próprio Director-Geral do SIS e o próprio Ministro da Administração Interna já não confiam nos seus próprios serviços, como é que nós, cidadãos, podemos confiar nesse director-geral e nesse Ministro quando estes nos vêm dizer que os outros serviços deles dependentes funcionam muito bem?!
Por outro lado, o Sr. Ministro da Administração Interna vir dizer que assume a responsabilidade política é de um ridículo atroz! A mesmíssima coisa sucedeu em relação à Madeira e, nesse caso, o Sr. Ministro da Administração Interna disse aqui que não assumia qualquer responsabilidade política, porque esta era do director-geral e, como este tinha sido demitido, não havia lugar para qualquer responsabilidade política!
Ora, nós verificamos que o próprio director-geral não controla o seu serviço e mantém-se à frente do mesmo! E eu pergunto: há algum país democrático em que um director-geral confesse não ter mão sobre o seu serviço, admita que os seus funcionários possam praticar ilegalidades e que, por ventura, as tenham praticado, vá ter com o Procurador-Geral da República para lhe pedir que abra um inquérito aos seus subordinados, sem o pedir para ele próprio?!
Chegamos, de facto, a um ponto em que o Estado está putrefacto! E, então, temos três planos: em primeiro lugar, o director-geral, que incrimina e põe como arguidos os seus próprios subordinados; em segundo lugar, o Sr. Ministro da Administração Interna, que vem dizer que este não é um problema da Administração, nem um problema de criminalidade, mas de responsabilidade política; e, em terceiro lugar, aparece o Sr. Primeiro-Ministro a dizer que se trata de campanha eleitoral e que "não liguem ao que diz a oposição nem ao que os jornais dizem"!
Temos três versões diferentes! O Primeiro-Ministro desautoriza o Ministro da Administração Interna, dizendo que se trata de campanha eleitoral da oposição nos jornais, "coisas que se dizem na campanha eleitoral"! O Ministro da Administração Interna pede um inquérito à Comissão de Fiscalização! E o seu subordinado pede um inquérito à Procuradoria-Geral da República! Veja, Sr. Presidente, como anda o SIS e a nossa Administração!
É caso para dizer "cada cabeça, cada sentença"! O que sucede é que as cabeças estão tontas e as sentenças saem erradas! E nós estamos metidos num serviço, que devia ser fundamental em democracia e que está verdadeiramente a andar em roda livre, como um "Estado" dentro do Estado, criando suspeitas por todos os lados! E isto é a prova de que este Governo chegou ao seu fim, já não merece a confiança de ninguém. Nem sequer merece confiança para vir aqui dizer o que quer que seja, porque é preciso esperar pelo inquérito da Procuradoria-Geral da República. Não sei o que é que o Sr. Ministro da Administração Interna poderá vir aqui dizer amanhã, sem saber o resultado do inquérito do Procurador-Geral da República.
Nós vamos votar favoravelmente este projecto de deliberação para perguntarmos ao Sr. Director-Geral do SIS o que anda a fazer dentro do serviço, se precisa, ele próprio, de incriminar os seus subordinados, não sabendo como eles actuam sobre as suas ordens!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate revela que, ontem e hoje - isso foi nítido para quem esteve na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares -, o PSD abandonou, mais uma vez, o seu Ministro da Administração Interna. E abandonou-o, porque, tendo ontem militado intensamente para que ele pudesse comparecer hoje na Comissão Permanente e explicar ao País o que afinal se passava num serviço pelo qual tem responsabilidade, hoje não trouxe aqui o seu Ministro, que teve mais uma falta de comparência num debate essencial. E não o acompanhou - deixou-o mais uma vez sozinho -, porque não deu seguimento a uma carta que, manifestamente, visava levar a Assembleia da República a proceder à eleição do Conselho de Fiscalização - era esse o sentido visado por uma carta a que a maioria, ou seja o PSD, não deu qualquer sequência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Ministro pretendia um urgente e rigoroso inquérito - e o que, parece, estava no espírito do mesmo Ministro era viabilizar uma reforma profunda da lei vigente que permitisse dotar o Conselho de Fiscalização de poderes efectivos para poder, com imediação em relação aos serviços e às suas práticas, detectar se tinham ou não ocorrido aquelas que os jornais noticiaram -, repito, se o Ministro visava um rigoroso inquérito, se o visava efectivamente, o PSD não está a dar os passos necessários para esse rigoroso inquérito, que o Ministro pedia ao Parlamento que levasse a cabo, se possa realizar. 15to porque, para que esse rigoroso inquérito se realize, é apenas preciso que o PSD aceda em dotar o Conselho de Fiscalização dos poderes efectivos necessários para a realização desse inquérito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, nós repetimos o desafio: se o PSD quer dotar o Conselho de Fiscalização dos poderes necessários para realizar um inquérito rigoroso e que dê garantias aos portugueses, nós cá estaremos para viabilizar a sua eleição, com esses poderes, de forma a dar as garantias aos portugueses, que eles hoje, manifestamente, não têm nesta matéria.

O Sr. José Magalhães (PS): - Chega Estamos fartos!

O Orador: - Mas há um outro ponto essencial, Sr. Presidente e Srs. Deputados: é que nós queremos que o Sr. Director-Geral do SIS venha ao Parlamento, porque no Ministério da Administração Interna lavra uma profunda crise de responsabilidade política.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aquando do caso da Madeira, ouvimos o Sr. Ministro da Administração Interna dizer: "O caso é grave para que o Director do SIS se vá embora, mas não é grave para que eu responda politicamente por ele"; em relação aos relatórios de Segurança Interna, ouvimos o Sr. Ministro da Administração Interna dizer: "Pus nesses relatórios o que as várias polícias me disseram. Não quis acrescentar nada"; em relação ao Bairro Alto, ouvimo-lo dizer "Sobre essa matéria, sei o que a Polícia me contou, e mais não sei"; agora, sobre estes factos, ouvimos, de novo, o Ministro dizer que nada sabia acerca desta matéria.
Portanto, se existe este declínio do sentimento da responsabilidade política no Ministério da Administração Interna, queremos aqui um director do serviço que possa dizer-nos em que condições práticas esse serviço está a funcionar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ele também não sabe nada!

O Orador: - E mais, Sr. Presidente: para que estas circunstâncias se não possam repetir, lembramos que no projecto de revisão constitucional que apresentámos propomos que o director de um serviço como o SIS só possa ser designado depois de audição parlamentar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, em coerência com essa inovação, a qual pretendemos ver introduzida no Direito Constitucional português, que achamos, hoje, indispensável a vinda ao Parlamento, seja à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias seja a outra comissão, inclusive à Comissão Permanente, como chegou a ser proposto pelo PSD, a fim de prestar contas ao povo português do que se passa nesse serviço, daquele que parece ser agora o seu efectivo responsável, numa situação em que a responsabilidade política está a "morrer solteira" no Ministério da Administração Interna.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. Deputados, não há mais inscrições.
Porém, antes de pôr à votação o projecto de deliberação n.º III/VI, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para ler um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a solicitação dos Juízes Cíveis da Comarca de Lisboa (Processo n.º 6593 - 1.º Juízo - 1.ª secção), a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Rui Machete (PSD) a depor, por escrito (artigo 624.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil e artigo 139.º do Código de Processo Penal), na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Srs. deputados, está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos, então, proceder à votação do projecto de deliberação n.º III/VI - Visa a audição do Director do Serviço de Informações de Segurança pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado, queira aguardar que terminemos esta matéria. Logo a seguir, usará da palavra.
Eu ia anunciar que está marcada uma reunião da Comissão Permanente para o dia 2O do corrente, às 15 horas.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, quero pedir desculpa ao Sr. Presidente e aos Srs. Deputados pela circunstância de vos maçar um pouco.
Pedi à Mesa que aceitasse a minha interpelação, porque entendi, em minha consciência, não dever prolongar o incidente de há pouco. Mas, também em nome da minha consciência, entendi que não deveria sair daqui hoje sem dizer ao Sr. Presidente quanto me senti, de uma forma que me pareceu ultrapassar toda a razoabilidade, limitado no meu direito de intervenção parlamentar, como nunca antes me tinha acontecido. E, Sr. Presidente, se lhe digo isto é para lhe fazer um apelo: depois do final desta reunião, medite nas consequências futuras para outras reuniões da decisão que hoje a Mesa tomou.
Imagine, Sr. Presidente, que no decurso do debate parlamentar o Deputado que já tenha usado da palavra duas vezes se sinta na necessidade de exercer, por exemplo, o direito de defesa da sua honra pessoal. Nessa altura, o Sr. Presidente não lhe dava a palavra?
Penso que o Sr. Presidente, numa circunstância dessas, não poderia deixar de dá-la, o que quer dizer que a interpretação que foi feita, para além de injusta, é virtualmente incorrecta quanto ao modo geral de conduzir os trabalhos parlamentares.
Peço desculpa pelo tempo e pela paciência que lhe gastei, mas penso que a aferição dos valores do funcionamento democrático merece bem a paciência que o Sr. Presidente e os Srs. Deputados, nesta ocasião, me dispensaram.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado Jorge Lacão, antes de me ter chamado a atenção para reflectir, já eu tinha iniciado esse processo de reflexão.
Julgo que a minha interpretação não está errada, mas também julgo que o Regulamento da Comissão Permanente, discutido na reunião da Comissão Permanente no dia 2O de Julho de 1994, e aprovado por unanimidade, necessita de correcção, porque a sua interpretação, que é sempre discutível - e muitos livros há escritos sobre interpretação -, não permite outra leitura.
No entanto, reconheço que há uma limitação clara ao uso da palavra por parte do parlamentar e, portanto, acho que talvez devamos debruçar-nos sobre esse tema para

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corrigir o Regulamento da Comissão Permanente. Nesse aspecto o Sr. Deputado tem razão. Devemos todos, e não apenas eu, iniciar um processo colectivo de reflexão, com vista a alterar e a corrigir o Regulamento da Comissão Permanente.
Srs. Deputados, a próxima reunião permanente realiza-se, como há pouco disse, no dia 2O do corrente.
Está encerrada a reunião.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Faltaram à reunião os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Moreira Barbosa de Melo.

Partido Socialista (PS):

João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.

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