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Terça-feira, 5 de Março de 1996 1239

I Série - Número 43

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

1.A SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE MARÇO DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Maria Luísa Lourenço Ferreira

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Deu-se conta da entrada na Mesa de vários diplomas, designadamente, dos projectos de revisão constitucional n.os 2, 3 e 4/VII.

Foi aprovado o voto n.º 19/VII - De pesar pela morte do escritor Virgílio Ferreira (Presidente da AR), tendo jeito intervenções os Srs. Deputados Teresa Patrício Gouveia (PSD), José Calçada (PCP), Joaquim Sarmento (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes), após o que a Câmara guardou um minuto de silêncio.
Iniciou-se a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 9/VII - Grandes Opções do Plano para 1996 e 10/VII Orçamento do Estado para 1996. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres), os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS). António Lobo Xavier (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Manuel Monteiro (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Rui Rio (PSD). Barbosa de Oliveira (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP). Fernando Nogueira (PSD). Jorge Lacão, lodo Carlos da Silva e Henrique Neto (PS), Liso de Carvalho (PCP) e António Martinho (PS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
João Soares Palmeiro Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira..
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amado Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d' Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.

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Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madaíl.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Fernando Nogueira.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Fernando Manuel Gomes da Encarnação.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos. .
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia. Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 14/VII - Estabelece a redução dos períodos normais de trabalho superiores a 40 horas por semana, que baixa às 1.ª e 8.ª Comissões; projectos de lei nos 110/VII - Revisão da legislação referente ao Programa Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto (PER) e programas similares (PCP), que baixa às 4.ª e 8.ª Comissões; 111/VII - Isenta as juntas de freguesia das regras de densidade previstas no artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 247/87, de 17 de Junho, e consagra o direito à designação de lugares de chefia de pessoal operário nas freguesias (PCP), que baixa às 4.ª e 8.ª Comissões; e projectos de revisão constitucional n.os 2/VII, apresentado pela JSD, 3/VII, apresentado pelo PS e 4/V/I, apresentado pelo PCP, que baixarão à comissão eventual que vier a ser constituída.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, é, Meu privilégio, com o assentimento de todos os grupos parlamentares, pôr à vossa consideração e, posteriormente, à vossa votação o voto n.º 19/VII - De pesar pela morte do escritor Virgílio Ferreira, que é do seguinte teor:
Morreu Virgílio Ferreira. O País perdeu um dós seus mais ilustres escritores de sempre. A mensagem que nos deixa fica registada na gratidão e na memória dos portugueses.

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Foi um trabalhador da escrita a tempo inteiro, sem férias nem licenças. Morreu no seu posto de trabalho. Apagou-se o homem, mas continua a iluminar a escrita.
A Assembleia da República, na sua primeira reunião após o triste acontecimento, curva-se reverentemente, e em respeitoso silêncio, perante a memória de um grande português.

Dou a palavra a quem a solicitar, por um período de três minutos, para se pronunciar sobre este voto.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Virgílio Ferreira morreu. Entrou, como ele próprio anunciara, no Paraíso a escrever. A morte de Virgílio Ferreira constituiu uma dura perda para a cultura portuguesa, mas também a perda do convívio com o homem de grande estatura moral e cívica para todos os portugueses.
A sua obra e a sua vida significaram o confronto, essencialmente humanista e moral, do homem com a sua condição. Uma experiência que ele soube transformar num exemplo de integridade pessoal e numa obra literária central da cultura portuguesa deste século.
Como nos disse Eduardo Lourenço, o seu grande amigo, "conferir um sentido à vida quando se considera absurda foi a aposta que Vergílio Ferreira ganhou". Eu acrescentaria que ela ganhou também um pouco para todos nós e para cada um de nós.
Assim, gostaria de associar-me sentidamente a esta homenagem, em nome do Grupo Parlamentar do PSD.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vergílio Ferreira morreu, foi um grande escritor. Em bom rigor, o que é legítimo dizer é que é um grande escritor. Não faz sentido dizer que Camões foi...
A sua posição no mundo cultural e literário português, já que não faz sentido atribuir classificações como se de um campeonato se tratasse, deixamo-la à consideração da História. Marcou, no entanto, o bastante pára que justifique aqui a posição da Assembleia da República e da nossa bancada.
É de todos conhecido que, ao longo dó evoluir da história recente de Portugal, nos planos político ou cultural, algumas coisas nos uniram a Vergílio Ferreira e outras também dele nos separaram. Mas não é isso que está agora em balanço.
Morreu um grande escritor. Somos solidários com a continuação da sua existência.

Aplausos do PCP, do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Morreu Vergílio Ferreira. Certamente, todos concordarão que Vergílio Ferreira era um dos maiores escritores portugueses do nosso século, quiçá, na minha modestíssima opinião, o maior romancista português do século XX.
Romances como Aparição, Alegria Breve, Para Sempre, Até ao Fim, Em Nome da Terra, Na tua Face e tantos outros constituem monumentos do deslumbre da escrita literária. Foi também Vergílio Ferreira um notável pensador, como prova a vastíssima e riquíssima obra ensaística que nos legou. A tensão dramática da sua interrogação permanente sobre o nosso destino humano, tantas vezes a atravessar-nos num desamparo total e no limite do suportável, faz de Vergílio Ferreira uma referência profunda da cultura lusíada e do património de toda a humanidade.
Naturalmente, Vergílio Ferreira, era também um homem da liberdade, da democracia, de notável estatura humana, moral e humanística, tantas vezes estigmatizada pelo Estado Novo e pela crítica do neo-realismo, por vezes intolerante para com os seus referenciais e valores.
É, pois, justo que, a Assembleia da República o recorde com ternura e afecto.
Dizia o grande ensaísta Eduardo Lourenço que gostaria de terminar a sua vida num convento em que o Padre director fosse Álvaro de Campos. Eu acrescento: concordo inteiramente com essa bela metáfora, mas que nesse convento se estudasse a obra fascinante de Vergílio Ferreira, a quem comovidamente presto a minha homenagem, em nome da bancada do Partido Socialista.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr: Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem sou eu para classificar Virgílio Ferreira como escritor. Ele está escrito por si próprio, com as suas próprias palavras, com o seu valor na História de Portugal como uma das maiores figuras literárias que conhecemos.
Queria aqui dizer alguma coisa de pessoal sobre Vergílio Ferreira: foi professor de quatro dos meus filhos no liceu Camões, em Lisboa, onde, aliás, eu e toda a minha família estudámos. Penso que aí Vergílio Ferreira deu uma outra dimensão: a de cidadão, de professor, de mestre que abriu a inteligência e a alma dos seus alunos para essa riqueza que para um país representa a literatura. Podia não tê-lo feito, podia ter escondido com a sua arte e reservá-la para si, mas Vergílio Ferreira distribuiu-a abundantemente pelos milhares de alunos que teve num dos principais liceus de Lisboa.
Há uma frase notável, que nos dá que pensar, que ele escreveu e que dizia aos seus alunos: há duas coisas que não percebo, acontecem, uma é a vida, outra é a morte.
É curioso que Vergílio Ferreira, que teve uma vida tão operativa, tão útil para todos nós seus contemporâneos e para aqueles que nos hão-de suceder, não entendesse a vida. A sua vida deu frutos e dará ainda mais.- A morte inscreve-o para sempre na nossa memória.
É isto que o meu grupo parlamentar quer aqui traduzir, salientando, para lá do artista e do escritor, o homem extraordinário que foi Vergílio Ferreira.

Aplausos gerais.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes, também eu me associo a este voto.
A perda de Vergílio Ferreira é a perda de alguém que se apropriou, com particular rigor, da língua portuguesa, de alguém de extrema sensibilidade, de alguém que, com inquietude, interferiu em áreas extremamente complexas do

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nosso quotidiano, que interferiu e abordou, com particular sensibilidade, as questões do envelhecimento, da solidão e da morte. Mas é, para além do mais, para além da fachada e daquilo que era uma aparente timidez, alguém que, como professor - e penso que essa é uma questão importante de sublinhar - foi capaz de transmitir àqueles que com ele conviveram o fascínio e a paixão que a escrita e o conhecimento da língua portuguesa têm. Isso é algo que ficará a marcar a sua obra e que, seguramente, vai muito para além da vida.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Primeiro-Ministro manifestou desejo, que é um direito, de também usar da palavra.
Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): - Sr. Presidente, estando o Governo presente na Câmara, penso que não seria aceitável deixar passar este momento sem que nos associássemos ao pesar que, estou certo, é o pesar de todo o povo português neste momento.
Acresce que tenho para isso razões pessoais que não posso esquecer: Vergílio Ferreira foi, ainda que fugazmente, meu professor e uma das obras marcantes, como escritor, Manhã Submersa, relata a sua adolescência passada no seminário do Fundão, a escassas centenas de metros da minha casa de família. É por isso, para mim, para além da perda que todos os portugueses sentem, uma enorme perda nos planos pessoal e afectivo.
Gostaria, Sr. Presidente, de me associar e todo o Governo àquele que, estou certo, vai ser o sentimento unânime dos Deputados desta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação do voto n.º 19/VII - De pesar pela morte do escritor Vergílio Ferreira, subscrito por mim próprio.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora respeitar o silêncio a que se refere o voto durante um minuto.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Muito obrigado, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados.
Vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 9/VII - Grandes Opções do Plano ,para 1996 e 10/VII - Orçamento do Estado para 1996.
Para uma intervenção, dando início ao debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia da República as propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1996 com a consciência do dever cumprido e a confiança de que serão aprovadas sem alterações que as desvirtuem.
Em primeiro lugar, as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado merecem ser aprovados. Merecem ser aprovados, porque são bons para o País.
Em segundo lugar, devem ser aprovados, porque o País precisa e merece que o sejam, tanto em nome da estabilidade política como da estabilidade económica, geradoras da confiança indispensável ao desenvolvimento, ao emprego e ao bem-estar social.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nos dois documentos agora remetidos ao Parlamento espelha-se rigor económico, consciência social e uma forte prioridade ao investimento, para suportar o crescimento que a crise europeia recente ameaça pôr em causa.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Rigor económico na contenção é reorientação da despesa, na redução significativa do défice público para 4,2% do PIB. Objectivos alcançados não
por cortes cegos, a torto e a direito, sem hierarquias nem prioridades, mas pela eliminação implacável de todas as formas de desperdício e despesismo, sobretudo
ao nível das despesas de funcionamento corrente da administração. O rigor que a figura do Sr. Ministro das Finanças tão bem personifica e garante.

Aplausos do PS.

É assim, por exemplo, que o meu próprio gabinete vai gastar, em 1996, menos 18% do dispendido em 1995. Mas, em contraste, foi possível encontrar 15 milhões de contos para aumentar as funções de segurança, de modo a admitir um número nunca atingido de novos agentes para as respectivas fofas e investir na qualidade da acção policial,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... ao serviço da tranquilidade dos cidadãos e do combate, ao crime organizado, à corrupção e ao tráfico de droga.

Aplausos do PS.

Este Orçamento é uma cura de emagrecimento, a bem da saúde do Estado e da economia, acompanhada por um significativo programa de privatizações. Um programa apresentado perante o País com isenção, transparência e clareza, para que todos os agentes económicos conheçam com antecedência aquilo com que contam e as oportunidades a que podem candidatar-se.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Um programa que esperamos venha a dar um contributo decisivo para fortalecer o nosso tecido empresarial, criar possibilidades, seguras de aplicação rentável das pequenas poupanças e contribuir para que Portugal disponha de grupos económicos fortes, que garantam o controlo estratégico nacional do nosso desenvolvimento e tenham a dimensão e a capacidade para competirem abertamente nos mercados internacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Reduzir o défice público é lutar contra a subida dos preços, que afecta sobretudo os trabalhadores, os reformados e, em geral, os mais pobres, melhorando os salários e os respectivos rendimentos das famílias.
Reduzir o défice público é libertar fundos para o investimento privado, gerador de postos de trabalho.

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Reduzir o défice público é dar um sinal de confiança aos mercados, indispensável para que diminua o custo do crédito, possibilitando a expansão económica e o emprego.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Este é um objectivo que vale por si, que se justifica a si próprio, sem ter de resultar de qualquer imposição externa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Um objectivo que deveria ser .prosseguido com ou sem critérios de convergência de Maastricht.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Rigor económico, repito, mas com consciência social, com mais justiça relativa para uma maior igualdade de oportunidades.
O peso das funções sociais aumentou significativamente, no conjunto da despesa. Em contraste, as chamadas funções políticas do Estado reduziram-se.
Sempre afirmei que, num quadro internacional radicalmente novo, pela rapidez da evolução tecnológica e a globalização dos mercados, a qualificação das pessoas é a prioridade das prioridades. assim com a educação, a ciência e a cultura.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, a despesa com a educação vai ter mais 12%, em 1996, do que o executado em 1995, passando de 4,8% para 5,1 % do PIB.

Vozes do PS.: - Muito bem!

O Orador: - Acelerámos, deste modo, o cumprimento de um dos objectivos centrais do Programa do Governo. Gostaríamos de ter ido ainda mais longe, .mas, no quadro de um Orçamento de contenção, os 840 milhões de contos atribuídos à educação representam um esforço assinalável. Em paralelo e nos mesmos termos, a cultura vê a sua dotação aumentar em 11,4% e a ciência, um dos "calcanhares de Aquiles" do nosso desenvolvimento, em 33,6%.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Consciência social também numa abordagem nova das relações entre os Orçamentos do Estado e da Segurança Social. Pela primeira vez, vai cumprir-se a lei, assegurando ao mesmo tempo um aumento relativo das pensões que é o mais justo dos sempre praticados.
Acabou a situação intolerável em que os trabalhadores por conta de outrem e as empresas suas empregadoras financiavam os objectivos sociais dos governos, descapitalizando o sistema de segurança social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este apresenta, assim, em 1996, um défice nulo, mais do que duplicando a transferência directa de verbas do Orçamento do Estado para a segurança social, abolindo artifícios contabilísticos e formas de cosmética.
Consciência social, ainda, nos saneamentos financeiros face às dívidas herdadas no Serviço Nacional de Saúde, completando o enorme esforço já realizado no Orçamento rectificativo para 1995, e no Ministério do Emprego, vítima do caos a que sucumbiu, no passado, a formação profissional subsidiada pelo Fundo Social Europeu.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Consciência social no reforço de 9 para 33 milhões de contos no investimento previsto na habitação social, reconhecida não apenas como factor de bem-estar das populações mas também como elemento importante no relançamento da economia.
Consciência social, finalmente, na política fiscal, sem aumento de, impostos, sobretudo pelo tratamento preferencial dado no IRS às famílias mais pobres, ao trabalho por conta de outrem e às despesas com a educação e a saúde no apoio familiar a idosos, deficientes, crianças e jovens.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas também na redução do selo de recibo e na da taxa do IVA aplicada a diversos produtos alimentares e serviços de alimentação.
No plano fiscal, consciência social, sobretudo, na aposta determinada no combate à fraude e evasão fiscais, com novos e substanciais meios financeiros ao serviço da administração fiscal e novos instrumentos de acção, destinados a corrigir uma situação insustentável, que a todos choca.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que são muitos dos que mais têm ou ganham os que menos pagam ao fisco, em Portugal.
Aplausos do PS.

Mas a consciência social não se limita às nossas fronteiras e estende-se ao apoio aos países de língua oficial portuguesa, projectando-se no reforço do orçamento da cooperação com África, que acompanha, aliás, um esforço geral acrescido na defesa e afirmação da língua e cultura portuguesas no Mundo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Rigor económico e consciência social, mas também crescimento reforçado do investimento público, reforço esse que o arrefecimento das economias europeias e os seus efeitos muito negativos em Portugal tornaram imprescindível.
Considerando a multiplicidade das suas fontes de financiamento - Orçamento do Estado, fundos comunitários e outras fontes complementares -, o investimento público global atingirá os 806 milhões de contos, crescendo 31,3% em relação ao realizado no ano anterior.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É um esforço considerável, que só a programação milimetricamente realizada, projecto a projecto, pelo Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e as soluções inovadoras por ele encontradas, nomeadamente para a concepção da rede ferroviária, tornaram possível. De outra forma seria completamente impraticável.

Aplausos do PS.

É com este reforço substancial do investimento público, associado à melhoria, ainda que moderada, do poder

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de compra das famílias e ao efeito de alguns novos projectos que vêm de trás - reconheço-o, sem dúvida -,que contamos para garantir um nível aceitável de crescimento. Isto, apesar do impacto muito negativo sobre a nossa economia do efeito conjugado da crise na Europa com a invasão crescente dos mercados europeus, incluindo o nosso, por produtos do exterior.
Na actual lógica de globalização da economia internacional, alguns fundamentalistas europeus insistem em acelerar a abertura, quando a coesão social e a própria defesa do nosso modelo de civilização justificariam alguma cautela e ponderação.

Aplausos do PS.

Somos a favor do comércio livre, mas desde que seja justo, não o comércio feito à custa de formas indignas de exploração das pessoas e de degradação do ambiente, sem justificação política nem moral. Como afirmei na Cimeira de Banguecoque, anteontem terminada: free trade, but fair trade. Comércio livre, sim, mas comércio justo, sem o fundamentalismo que alguns, recentemente, têm vindo a desenvolver.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Este é um Orçamento que cumpre. Cumpre a lei, nomeadamente a Lei das Finanças Locais, o que acontece pela primeira vez na nossa história parlamentar.

Vozes do PS: - Apoiado!

O Orador: - Cumpre também as promessas eleitorais do PS, com relevo para o não aumento dos impostos; o reforço da educação; o arranque do rendimento mínimo familiar; a melhoria, ainda que moderada, dos salários reais; as preocupações com a segurança dos cidadãos e o combate à droga; e o reforço dos meios de financiamento à disposição das regiões autónomas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este é o único Orçamento, de entre os dos países da Europa do Sul, que não aumenta impostos e, simultaneamente, melhora o poder de compra dos trabalhadores da função pública e o rendimento disponível das famílias em geral.

Aplausos do PS.

Mas não nos limitamos a cumprir promessas do PS. Por ironia do destino, ficou-nos até mais caro cumprir os compromissos assumidos pelo Governo anterior, em tudo quanto foi tornado irreversível na voragem eleitoralista do Verão passado.

Aplausos do PS.

Na altura, sem cuidar de medir os respectivos efeitos, nomeadamente no cumprimento das regras que o mesmo Governo anterior acordou com a União Europeia, em matéria de redução do défice para 1996.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Dou dois exemplos apenas. Primeiro: o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações concretizou, em 1995, 213 milhões de contos de investimento. Pois bem, assumiu, para 1996, compromissos irrevogáveis, absolutamente incompreensíveis, de 290 milhões, sem cuidar de saber como os iria financiar.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Com cheques sem cobertura!

Aplausos do PS.

O Orador: - Segundo exemplo: a solução encontrada pelo actual Governo para a eliminação das portagens na CREL e no Porto em nada agrava o défice deste ano e só indirecta e negligenciavelmente o fará em 1997.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Pois bem, a negociação feita pelo Governo anterior com a Lusoponte, para ajustar ligeiramente as portagens na ponte 25 de Abril, agrava em 11,5 milhões de contos o défice de 1996 e em mais 7 milhões de contos o de 1997, ainda por cima, tendo-se deixado enganar na avaliação das perdas de receita realmente verificadas.

Aplausos do PS.

São exemplos da completa falta de sentido das responsabilidades em relação aos compromissos que os próprios assumiram e que reduzem a zero as acusações de despesismo que os mesmos ainda mantêm.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Veremos!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo regista com apreço o excelente contributo dado pelo Conselho Económico e Social, no seu relatório sobre as Grandes Opções, do Plano, que foi aprovado por unanimidade. Acolhemos gostosamente a esmagadora maioria das respectivas recomendações, que procuraremos concretizar nas diversas políticas e medidas a adoptar.
Merecem-nos particular atenção as referências à educação pré-escolar; ao abandono escolar precoce e ao trabalho infantil; à importância das CERCI; à concretização mais eficaz dos objectivos em matéria de emprego; às políticas de família e apoio ao movimento cooperativo; ao debate a realizar em torno da reforma da Segurança Social; à clarificação dos papéis dos sectores público, social e privado na prestação e financiamento dos cuidados de saúde; ao reforço da política de habitação; à melhor integração da vertente ambiental nas Grandes Opções do Plano; e à alteração do quadro legislativo e institucional da participação da sociedade civil na revisão do Quadro Comunitário de Apoio. O Governo garante que o excelente trabalho do Conselho Económico e Social não cairá "em saco roto".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, assim, claro para nós que os documentos cujo debate na generalidade hoje se inicia merecem ser aprovados pelo Parlamento. Mas não é menos verdade que tal aprovação, sem desvirtuamentos, é vital para o País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quem o rejeitasse ficaria necessariamente responsabilizado pela instabilidade política e económica que tal rejeição necessariamente implica,...

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Aplausos do PS.

... com consequências negativas muito relevantes para o dia-a-dia das pessoas, das empresas e das instituições e para a credibilidade da economia.
Rejeitar o Orçamento é adiar sine die os aumentos dos trabalhadores da função pública;...

Risos do PSD e do CDS-PP .

... é contribuir para agravar a situação financeira da segurança social e das câmaras municipais;...

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

... é asfixiar completamente as regiões autónomas,...

Aplausos do PS.

... o que constitui gravíssima responsabilidade para o partido que nelas governa; é retardar o pagamento aos fornecedores do Serviço Nacional de Saúde...

O Sr. Joel Hasse Ferreira -(PS): - Muito bem!

Vozes do CDS-PP: - Eh!...

O Orador: - ... e às empresas de construção e obras públicas, podendo, nalguns casos, paralisar empreitadas ou interromper fornecimentos; é comprometer o crescimento do investimento público e do emprego.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - S6 falta a dos frigoríficos!

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados, é desagradável, mas é verdade!

O Sr. João Amaral (PCP): - Toda a chantagem é desagradável!

O Sr. Ministro da Presidência (António Vitorino). - O Sr. Deputado João Amaral hoje está muito linha dura!...

O Orador: - A rejeição do Orçamento daria ainda um péssimo sinal, minando ,a confiança das pessoas, dos agentes económicos e dos mercados.

O Sr. João Amaral (PCP): - Só falta dizer que perdia o lugar de Primeiro-Ministro!...

O Orador: - Seriam comprometidos os progressos notáveis que estamos a registar em matéria de inflação e encareceria de novo o custo do crédito às empresas, com consequências graves para o emprego, o investimento e criação de riqueza, bem como o do crédito às famílias, sobretudo as que estão empenhadas em aquisição de casa própria, como os jovens casais.

Aplausos do PS.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP):.- Eram os frigoríficos!

O Orador: - No momento em que a Europa enfrenta uma nova crise, não podemos dar-nos ao luxo de minar os fundamentos da confiança na nossa própria economia. Já bastam os problemas que os outros nos criam. Saibamos evitar agrava-los nós próprios, causando danos irreparáveis ao nosso já tão difícil processo de desenvolvimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O País precisa de ver estas brandes Opções do Plano e este Orçamento do Estado aprovados.
É convicção do Governo que é isso que, a esmagadora maioria dos portugueses, mesmo os que em nós não votaram, espera deste debate parlamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É essa, no actual quadro institucional, a lógica de funcionamento do sistema político, quando existe um Governo de maioria relativa, muito perto, aliás, da maioria absoluta, que viu o, seu Programa passar no Parlamento fia menos de quatro meses, sem que nenhum partido da oposição apresentasse qualquer moção de rejeição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que sentido teria deixar passar um Programa do Governo para chumbar, de seguida, os seus principais instrumentos de actuação?

Aplausos do PS.

O Orçamento está para o Governo e para o País - já o disse e repito-o - como o salário para uma família que vive do seu trabalho.
Os resultados eleitorais - como afirmei em 1 de Outubro e hoje reafirmo - deram ao PS um mandato claro para governar mas também a indicação do caminho do diálogo como forma privilegiada de exercício do poder.
Neste quadro, as oposições poderiam invocar verdadeira legitimidade para chumbar o Orçamento ou derrubar o Governo se este. tivesse esquecido essa recomendação clara do eleitorado. No entanto, acontece exactamente o oposto. Os textos que hoje apresentamos são o resultado de uma nova prática política unanimemente reconhecida. Política em que o diálogo tem constituído uma base essencial, nomeadamente nos próprios trabalhos preparatórios destes documentos.
Pela primeira vez, um Orçamento traduz um entendimento entre o Governo e todos os sindicatos da função pública.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Acordo que definiu os aumentos salariais que prevê, mas, sobretudo, que abriu um amplo processo negocial sobre os mais diversos aspectos da reforma da Administração e da dignificação dos que nela trabalham, servindo o interesse colectivo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As propostas agora em apreço dão também sequência a diversos aspectos de um acordo assinado em sede de Comissão Permanente de Concertação Social, pelo maior número de parceiros sociais de sempre,

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abrindo, em 1996, caminho para a indispensável concertação estratégica que há-de suportar as. imprescindíveis reformas de fundo de que o País carece e que não foi possível definir em quatro meses apenas. São reformas que não podem adiar-se mais, para que Portugal se afirme na Europa e no Mundo e seja capaz de competir num quadro de concorrência cada vez mais aberto e exigente no plano internacional.
Manifestámos ainda total disponibilidade para o diálogo com os partidos da oposição, interessados em viabilizar este Orçamento, no período que antecedeu este debate, disponibilidade essa que manteremos até ao fim, para melhorar o que pode ser melhorado. Esta é, para nós, uma forma permanente de estar no Parlamento.

Aplausos do PS.

O Governo assume-se como factor de estabilidade, de racionalidade e de previsibilidade na vida política portuguesa, de acordo com o interesse essencial do País.
Não apresentámos uma moção de confiança no debate de investidura, porque poderia ser entendida como provocação política às oposições. Não a apresentaremos também na sequência das votações deste debate. Para nós, é na aprovação do Orçamento que se exprime a confiança parlamentar.

Aplausos do PS.

Em particular, não posso deixar de me perguntar, olhando para o principal partido da oposição, com que legitimidade contribuiria ele para abrir uma crise política em Portugal, se ainda nem sequer resolveu a sua própria crise interna.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD, batendo com as mãos nas bancadas.

Vozes do PSD: - Essa agora!...

O Orador: - Em política, como na vida, de nada serve destruir. O PS provou-o no passado: sempre que o interesse nacional exigiu o compromisso democrático, o PS dispôs-se a esse compromisso.

Aplausos do PS.

E é sobretudo absurdo que destrua quem, de momento, nada tem para oferecer em troca. Com que lógica e em nome de que objectivo o faria o PSD, neste momento?

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Está com falta de argumentos!

O Orador: - Estou sinceramente confiante no sentido das responsabilidades de todos os Srs. Deputados. Por isso, estou certo de que estes documentos vão ser aprovados e o seu conteúdo não será desvirtuado.
Por absurdo que pareça, seria fácil, com uma maioria negativa, constituída por todos os grupos parlamentares da oposição, introduzir alterações no texto ornamental, que, nomeadamente por agravamento excessivo do défice, alterassem os seus objectivos ou afectassem o seu impacto macro-económico.
Como é natural, reconheço às oposições o direito de juntarem os seus votos para aprovarem medidas que conduzam a um Orçamento distinto do nosso.

Vozes do PSD: - Só faltava essa!

O Orador: - Só que, nesse caso, assumiriam obviamente o dever de se juntarem uma vez mais, para governar com o seu orçamento.

Aplausos do PS.

Estou certo de que isso não acontecerá. O País exige de todos nós o bom senso e o sentido de Estado suficientes para o evitar.
A cada um as suas responsabilidades. Com espírito de diálogo, com abertura, mas com a firmeza das nossas convicções e a consciência do dever cumprido, saberemos, em todos os casos, assumir as nossas.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: -- Srs. Deputados, antes de passarmos à fase dos pedidos de esclarecimento, quero informar, o que faço com o maior prazer, que assistem à sessão plenária vários grupos de alunos das Escolas Secundárias do Restelo, de Loulé, da Falagueira da Amadora, de Henriques Nogueira de Torres Vedras, de Eça de Queirós de Lisboa, de Carcavelos, de Rio Maior e dos Olivais N.º 3, da Escola Nacional de Artes e Ofícios Tradicionais da Batalha e da Escola C+S de Sobral de Monte Agraço. Para eles peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite e os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira, António Lobo Xavier, Carlos Carvalhas, Isabel Castro, Rui Rio, Barbosa de Oliveira e João Carlos da Silva.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não vou cair na tentação de questioná-lo na óptica em que o senhor aqui se colocou, muito mais como líder parlamentar do que propriamente como Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Vou colocar-lhe duas questões na sua qualidade de Primeiro-Ministro.
Em primeiro lugar, o Sr. Primeiro-Ministro, evidentemente, sabe que está nesta Assembleia a apresentar o Orçamento do Estado e sabe que este é também um jogo de opções e de previsões. Não vou discutir consigo quaisquer das suas opções, porque elas não são seguramente as nossas, mas tem o direito de as ter porque ganhou as eleições.
Porém, há uma ou duas coisas que não tem o direito de fazer.
Primeiro, não pode vir a esta Assembleia dizer que está a apresentar um Orçamento em que o défice é de 4,2%. Em termos orçamentais, o défice é de, pelo menos, 4,5%, já que o senhor tem, pelo menos, que juntar-lhe os juros dos certificados de aforro. É assim que Bruxelas vai avaliar o seu Orçamento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - De seguida, Sr. Primeiro-Ministro, não vou discutir consigo a estimativa da receita, porque considero que ela não está avaliada com qualquer margem de

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segurança. Considero ainda que um dos pontos mais fortes na estimativa da receita é o combate à evasão fiscal, mas começo a ler nos jornais a possibilidade de haver amnistias sobre facturas falsas e, desde já, quero dizer-lhe que o nosso grupo parlamentar votará sempre contra tal medida.

Aplausos do PSD.

Isto significa que um dos meios de combate à evasão fiscal, provavelmente, não será tão optimista quanto aquele que está inscrito no Orçamento.
Quanto à despesa, Sr. Primeiro-Ministro, lamento sinceramente que um dos exemplos que deu tenha sido demagógico, retirando seriedade a esta discussão.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - O senhor começou por invocar como redução da despesa 18% no seu gabinete e não vou criar-lhe um embaraço, perguntando-lhe quanto é 18% do seu gabinete.

Risos do PSD.

Mas vou dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que ao analisar-se o orçamento do seu gabinete vê-se que ele só é mais reduzido porque o senhor fez o artifício de admitir no seu gabinete pessoas «equiparadas a», em vez de «com a qualificação de», o que significa que não são pagos pelo seu orçamento mas por todos nós, na mesma.

Aplausos do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, a verdade é que, em termos de previsão, o Orçamento que aqui apresenta tem um défice de 4,5% e não tem margem, nem na receita, nem na despesa.
Sr. Primeiro-Ministro, desejava fazer-lhe uma pergunta, mas peço-lhe que não me responda com a sua providencial forma de falar, que todos lhe reconhecemos, mas que, para este caso, não vai servir, porque só quero que me responda, e tem obrigação de fazê-lo, como Primeiro-Ministro.

Risos do PS.

Ao apresentar à Assembleia da República um Orçamento que não tem margem de manobra, porque o défice já é superior àquilo que devia ser, a receita não tem segurança e a despesa não chega até ao fim do ano, o Sr. Primeiro-Ministro tem a obrigação de já ter delineado o que vai fazer se houver uma derrapagem neste Orçamento. Assim, nesse caso, o que vai fazer?

O Sr. Presidente: - Faça o favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Assim, quero que me responda apenas com uma de duas afirmações: pensa agravar ainda mais o défice e, com este Orçamento, pôr-nos fora da moeda única, ou cortar no investimento para cobrir esse défice? Em qualquer dos casos, só quero esta resposta, Sr. Primeiro-Ministro, para retirar as respectivas conclusões acerca do Orçamento que está a apresentar à Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Fui informado de que o Sr. Primeiro-Ministro deseja responder aos pedidos de esclarecimento um por um.
Tem, pois, a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, disse V. Ex.ª que este Orçamento corresponde às nossas opções e não às vossas. Infelizmente, não é inteiramente verdade. Muitos dos defeitos que este Orçamento tem, e todos têm defeitos, decorrem precisamente do facto de ser impossível, de um ano para o outro, corrigir opções estruturais assumidas por vós, em nossa opinião, profundamente contrárias à boa repartição da utilização dos fundos públicos, em Portugal.

Aplausos do PS.

Devo dizer-lhe, com toda a sinceridade, que as nossas opções em matéria de investimento público, se não fossem os compromissos irrevogáveis e totalmente incompreensíveis do vosso frenesim eleitoralista do ano passado, seriam porventura completamente diversas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este Orçamento insere-se num orçamento para o conjunto do sector público administrativo, cujo défice é de 4,2%. O que conta, como sabe, não é o Orçamento do Estado mas, sim, o conjunto do sector público administrativo, sendo no conjunto deste que atingimos os 4,2%. O saldo, em contabilidade pública do Estado, é de 692,4 milhões de contos negativo; o saldo, em contabilidade nacional do Estado, é de 740,3 milhões de contos negativo. Nesta diferença estão precisamente os juros dos certificados de aforro, que referiu.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que se esquece é que o saldo em contabilidade pública das outras parcelas do sector público administrativo é, neste caso, consideravelmente maior em termos negativos do que o saldo em contabilidade nacional. E, fazendo as contas - e tenho muito gosto em entregar-lhe o quadro apurando precisamente esses domínios, até porque esse número foi citado em vários artigos de jornais - , posso tranquilizá-la, porque o saldo em contabilidade nacional do sector público administrativo é de 4,2%. Aliás, é ligeiramente inferior a 4,2% - a Sr.ª Secretária de Estado do Orçamento corrigir-me-á, mas, salvo erro, é de 4,17%.
Em matéria de receitas, fizemos uma previsão cuidada, com um ganho em termos de eficiência fiscal inferior àquele que foi previsto pelo seu próprio governo. Devo dizer-lhe que basta citar declarações públicas de vários elementos do seu governo ligados à área financeira, para verificar que as previsões de receitas não são excessivamente optimistas. Mais, ficámos aquém do que seriam as vossas previsões em matéria de eficácia fiscal, decorrendo o resto normalmente das previsões macro-económicas para o conjunto da nossa economia.
Quanto à seriedade, Sr.ª Deputada, partimos do princípio de que todos somos sérios neste debate. Podemos ter opiniões diferentes, seria legítimo que as tivéssemos em matéria de políticas, mas já é mais difícil tê-las em matérias de facto. Quanto a estas, os números estão aqui, foram apresentados e amplamente discutidos em sede de comissão, e têm hoje uma credibilidade indiscutível.
Pergunta-me o que acontecerá se este Orçamento derrapar. Sr.ª Deputada, o futuro é sempre imprevisível. Pode

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haver Lima crise europeia para além de tudo quanto esperamos e isso pode ter implicações particularmente negativas em Portugal.

O Sr. Presidente: - Faça o favor de terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - Pode acontecer que tenhamos de enfrentar situações novas e, se tivermos de enfrentá-las, fá-1oemos com determinação e cortaremos onde for necessário, respeitando a mesma lógica e a mesma hierarquia de prioridades deste Orçamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Assim, cortaremos nas despesas que correspondem a funções políticas do Estado e não nas despesas sociais; cortaremos nas despesas correntes - sobretudo, nas despesas correntes - e, sempre que possível, não nas despesas de investimento.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra e consideração.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o debate sobre esta matéria vai ser longo, prolongar-se-á por vários dias, e seria bom que o Governo se capacitasse, de vez, que o que vai estar aqui em discussão é o Orçamento do Estado para 1996 e não nós ou os nossos anteriores orçamentos.

Aplausos do PSD.

Será muito penoso, Sr. Presidente, que, cada vez que o Governo, em vez de responder às perguntas sobre este Orçamento, invocar o passado, tenhamos de defender a. honra da nossa bancada.
Se o Sr. Primeiro-Ministro tiver interesse em discutir a política orçamental dos últimos 10 anos e a herança que lhe deixámos, pode marcar um debate parlamentar para esse efeito, porque estarei aqui nesta primeira fila da minha bancada, mas não o faça durante a discussão do Orçamento do Estado.
Por último, considero que a pergunta que fiz ao Sr. Primeiro-Ministro, cuja resposta se resumia praticamente a um "sim" ou um "não", não mereceu resposta. Registo e tirarei as minhas conclusões.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, V. Ex.ª tem razão numa questão. Realmente, há uma pergunta a que não respondi por lapso, a que diz respeito ao meu gabinete.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não, não! Não é isso!

O Orador: - O corte nas despesas do meu gabinete é um corte real, tem em conta o aspecto que referiu e ainda há aspectos que não são tidos em conta no meu gabinete. Por exemplo, as despesas com a minha própria segurança são muito inferiores ao passado e não estão no orçamento do meu gabinete como nunca estiveram no orçamento da Presidência do Conselho de Ministros.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Ministro da Presidência: - Esta não lhes convém!...

O Orador: - Não é, infelizmente, possível discutir o Orçamento sem ter em conta a prática orçamental anterior,...

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - ... porque o Orçamento faz-se com a herança recebida, com o número de trabalhadores da função pública que aumentou enormemente nos últimos 10 anos!

Aplausos do. PS.

Protestos do PSD.

Ou a Sr.ª Deputada queria que despedisse-mos, agora, todos os trabalhadores da função pública que, muitas vezes, foram admitidos por critérios políticos - e são dezenas ou centenas de milhar, durante estes 10 anos! Não é possível fazê-lo! Não o vamos fazer!

Aplausos do PS.

Entende a Sr.ª Deputada que é possível encarar a vida deste país como se a EXPO 98 não tivesse sido lançada?

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Isso é demagogia!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Então, acabe com ela!...

O Orador: - Não tem a Sr.ª Deputada consciência das enormes implicações...

Protestos do PSD, batendo com as mãos. nas bancadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes que façam silêncio!
Srs. Deputados, "ainda a procissão vai no adro" e já estão a bater nas mesas? Onde é que chegaremos no fim? Vamos manter a calma e a correcção devidas.
Faça o favor de continuar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - Não tem a Sr.ª Deputada consciência das enormes implicações que tem para o futuro qualquer decisão tomada por um governo, sobretudo quando esse futuro é medido alguns meses depois?
Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, sobre a política orçamental e a política educativa dos últimos anos, estamos à sua disposição para as debater, quando quiser.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Orçamento do Estado e as Grandes Op-

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ções do Plano que o Governo a que V. Ex.ª preside nos enviou já permitiram a elaboração de algum trabalho sólido em diversas comissões e até à aprovação de diversos relatórios, uns por unanimidade e outros por maioria.
Entretanto, não tanto em comissão mas, essencialmente, em conferências de imprensa, o PSD foi fazendo muitas críticas, mas o que é interessante é que, em boa parte, as foi deixando cair gradualmente, O PSD já reconhece que não há aumento da carga fiscal, já vai reconhecendo que não há diminuição dos investimentos públicos, uns dias entende e outros não a correcção das contas apresentadas quanto ao défice orçamental, seja na óptica da contabilidade pública seja na óptica da contabilidade nacional. Poderíamos dizer que, hoje, a crítica do PSD já não é a que era. Amanhã veremos!
Mas, entretanto, os parceiros sociais aguardam este Orçamento.
Sr. Primeiro-Ministro, tendo em conta o rigor orçamental e a forte consciência social evidenciadas neste Orçamento e o desenvolvimento económico para que ele vai contribuir, como pondera V. Ex.ª este desfasamento entre alguma crítica partidária, se calhar em boa parte feita por dever de ofício, e a ansiedade com que os parceiros sociais, os agentes económicos, os trabalhadores e as autarquias aguardam este Orçamento? Como é que V. Ex.ª valora isto?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, uma das características essenciais de uma sociedade política moderna é a sua previsibilidade. Devo dizer-lhe que uma das maiores dificuldades que o Governo encontra neste debate orçamental tem a ver com o facto de o principal partido da oposição não ter condições sequer para ser um interlocutor global válido sobre o próprio conteúdo do Orçamento.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Essa é uma questão extremamente negativa para a vida política portuguesa, porque o nosso sistema constitucional baseia-se na possibilidade e na viabilidade do compromisso democrático.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas, para que haja compromisso democrático, é necessário que haja forças políticas capazes de globalmente assumirem um conjunto coerente de propostas e estarem em condições de aceitarem fazer as formas de diálogo e de compromisso, sem as quais a democracia não funciona.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como todos os observadores sabem, uma das questões essenciais, ou talvez a principal, que está hoje em discussão é sobretudo a questão do ambiente político em que se processará esta discussão e o problema das consequências políticas das decisões que os partidos aqui vão tomar.
O Sr. Primeiro-Ministro avisou-nos de algumas das consequências possíveis, traçando um quadro negro da rejeição deste Orçamento. Deixe-me que lhe diga que começou logo por, em alguns momentos, lembrar perigosamente o seu antecessor, quando, com minúcia, às vezes quase doméstica, descrevia o que pode acontecer ao País, se cada um agir segundo os seus princípios.
A primeira afirmação que lhe quero transmitir, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: quanto aos credores do Estado, pode V. Ex.ª estar descansado que, suceda o que suceder ao Orçamento, esta oposição, enquanto puder, tudo fará para que eles sejam pagos, é pagos a horas, como o têm feito ao longo de muitos anos. 
Mas é para essa questão política, é para esse terreno institucional que lhe queria chamar a atenção, em primeiro lugar. O Sr. Primeiro-Ministro acusa os partidos, com base nas suas intenções, de responsabilidade na eventual crise política que pode decorrer de um voto num sentido ou noutro. Queria que o Sr. Primeiro-Ministro me dissesse se sabe ou não que a nossa Constituição, ao contrário de outras, trata de modo especial o Orçamento de um governo minoritário. Todas as constituições dos países da União Europeia protegem os orçamentos dos governos minoritários ou maioritários, impedindo alterações no sentido do aumento da despesa ou da diminuição da receita. A nossa não! A nossa faz com que o governo minoritário submeta o seu Orçamento á Assembleia em termos de ele poder ter de ser um Orçamento de Assembleia e não um Orçamento de um certo governo.
Quando o Sr. Primeiro-Ministro diz que não admite a descaracterização, pergunto-lhe se está consciente de que, no nosso regime constitucional, também a sua capacidade de diálogo, também a sua abertura para ouvir a opinião dos outros, também a sua disponibilidade para ouvir o que os outros pensam do crescimento económico do País e da situação dos agentes económicos é decisiva para o apuramento da responsabilidade e se sabe ou não que, no fim do debate, os partidos que votarem contra serão responsabilizados, mas o modo como o Governo os ouvir também servirá para que se lhe faça justiça.
O Sr. Primeiro-Ministro desfiou alguns recordes do Orçamento, dizendo que é o único Orçamento da Europa do sul que não aumenta impostos e o único da vida parlamentar portuguesa que respeita a Lei das Finanças Locais - aqui com algum exagero -, pois eu dou-lhe outro: é esta a primeira vez, em 22 anos, que um Primeiro-Ministro socialista aqui vem dizer que o défice ou a contenção do défice é um critério fundamental para a vida financeira do Estado. É esse o grande problema do País e foi disso que nos queixámos ao longo de 22 anos.

Vozes do PS: - Então, agora estão de acordo?!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, como este Orçamento é igual ou muito parecido aos do PSD - disseram-no, aliás, várias figuras proeminentes dó PSD -, queremos perguntar-lhe o que é que lhe faltou para que esta política fosse a sua, o que é que o limitou para que esta política orçamental não pudesse ter sido a sua. Foi a capacidade de gastar? Foi a capacidade de cobrar? Foram os limites da Europa? O que é que lhe faltou e o que é que lhe falta para que este Orçamento possa ser o seu?

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Lobo Xavier, em primeiro lugar, a minha total concordância com a sua preocupação em pagar aos credores do Estado. Se reparar, uma grande parte daquilo que foi o Orçamento rectificativo do ano passado e uma parte substancial das assunções de dívida previstas para este ano têm exactamente esse objectivo: pagar pontualmente aos credores do Estado, fazer do Estado uma pessoa de bem em Portugal.
Não fiz acusações a qualquer partido político, limitei-me a definir aquilo que, em meu entender, são as condições de governabilidade do País.
Esta Assembleia tem o direito, por uma qualquer maioria que nela se forme, de fazer o Orçamento que entender. Essa é a lógica do nosso sistema constitucional. Nessa lógica, a maioria que fizer esse Orçamento deve dar origem ao Governo que o aplique, porque o que não faria sentido era haver um Orçamento que corresponde às opções políticas de uma maioria e ser outra a aplicá-lo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador; - Mas há uma coisa em que o Sr. Deputado tem toda a razão, é que o nosso sistema constitucional, que protege a existência de governos minoritários, como sabe, nomeadamente na forma da investidura, também indica que a governabilidade exige o diálogo e, por isso, o que seria totalmente ilegítimo era se eu tivesse elaborado um Orçamento, com o meu Governo, durante dois ou três meses, sem informar e sem ouvir ninguém, chegasse a este Parlamento e dissesse: "ou aprovam rigorosamente tudo o que aqui está ou, então, vou-me embora". Não foi isso que eu disse!
Em primeiro lugar, este Orçamento foi precedido do mais vasto leque de consultas na sociedade civil que alguma vez existiu em Portugal; foi precedido de um diálogo que teve êxito com todos - repito, todos - os sindicatos dos trabalhadores da função pública; é suportado, tal como as Grandes Opções do Plano, em muitas das suas características, por um acordo de concertação social extremamente inovador em diversos aspectos; e houve da minha parte, junto de todos os líderes da oposição, para além daquilo que foi a acção do Governo no próprio Parlamento, total disponibilidade para discutir este Orçamento, os seus fundamentos e os seus aspectos.
E digo mesmo mais: este Orçamento ainda pode ser melhorado neste Parlamento, e contamos com o contributo dos diversos partidos, nomeadamente do seu,...

Risos do PSD.

... para que essas melhorias possam ser introduzidas, pois nenhum Orçamento é em si uma obra acabada ou uma obra perfeita.

Aplausos do PS.

É nosso entendimento - e penso que o nosso direito - que uma coisa é avaliar o que, na nossa perspectiva, são as melhorias que lhe podem ser introduzidas e outra os desvirtuamentos que lhe alteram o sentido.
Eu não disse que este era o único Orçamento da Europa do sul em que não havia aumento de impostos, disse que era o único em que, simultaneamente, não havia aumento de impostos e havia melhoria do poder de compra real dos trabalhadores da função pública e, em geral, dos outros trabalhadores, o que é, apesar de tudo, algum acrescentamento. Permita-me que faça essa previsão. Não quero gabar-me daquilo de que não tenho mérito.
Mas disse que havia também alguma coisa de novo, que foi a minha defesa da redução do défice orçamental. Não creio que seja novo,...

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - É, é!

O Orador: - ... mas admitamos, por um momento, que o seja. Então, tal como "há mais alegria no céu por um pecador que se arrepende", deverá haver mais alegria no PP por alguém que defenda essa posição pela primeira vez. No meu entendimento, não é novo, mas, se assim o entende, creio que isso só o deve encher de satisfação.
Ó que é que limita este Orçamento de forma a condicionar e a alterar as nossa próprias perspectivas? Sendo a redução de um défice um bem, é evidente que este Orçamento é limitado por dois aspectos.
O primeiro é que não é possível num Orçamento fazer-se uma reforma fiscal. Sou defensor da abolição da sisa, já o disse várias vezes, e entendo que tem de ser completamente revisto o sistema de sisa e contribuição autárquica, mas não era possível fazê-lo neste Orçamento. Espero que seja possível fazê-lo num dos próximos.
Por outro lado, há um conjunto de outras alterações fiscais de fundo que são necessárias para beneficiar o investimento e para facilitar a vida das famílias; algumas foi possível introduzir agora, mas as mais importantes não o foram.
O segundo é que há aspectos incompreensíveis de compromissos de despesa que vêm de trás e que nós vamos, porque o Estado é uma pessoa de bem, respeitar. Se não viessem, poderíamos, naturalmente, alterar o padrão da despesa deste Orçamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, certamente que concordará comigo que, em 1 de Outubro, o povo português deixou claro duas mensagens: a primeira, de que queria mudança e a, segunda, de que não queria uma outra maioria absoluta. E isto implicaria que o Governo apresentasse na Assembleia um Orçamento diferente e também que se apresentasse com uma postura dê efectivo diálogo.
Ora, quanto ao diálogo, Sr. Primeiro-Ministro, até nos fez lembrar o seu antecessor, como aqui já foi repetido, inclusivamente falou-nos do "eu ou o caos", só faltou falar dos frigoríficos, e, em relação à mudança, o que vemos é um Orçamento de continuidade. Continuidade de tal forma que o debate a que assistimos aqui, acalorado, entre o PSD e o Governo foi uma questão contabilística de décimas, de duas ou três décimas, e, em relação ao PP, de elogios pela a redução e a preocupação do défice.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - Continuidade da política em relação às questões essenciais. É um Orçamento que segue a "bandeira" de Maastricht, a redução do défice.

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O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é verdade! As "bandeiras" de Maastricht não as defendemos!

O Orador: - Segue a redução do défice e a "bandeira" de Maastricht... A "bandeira" de Maastricht, com toda a clareza...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, é isto mesmo, escusa de escamotear, porque esta é a realidade. É um Orçamento que, em relação à política fiscal, mantém as mesmas injustiças fiscais: quem mais paga são os trabalhadores por conta de outrem, são aqueles que efectivamente pagam.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É o Orçamento .que mantém os mesmos benefícios fiscais para actividades especulativas e parasitárias e, por isso, tem o apoio da CIP e do PP...

Protestos do CDS-PP.

E, ainda por cima, Sr. Primeiro-Ministro, numa questão que lhe é tão cara, a educação - a sua paixão, no que toca ao investimento, temos zero, o mesmo para a educação pré-escolar.

Protestos do PS

Aliás, o Sr. Ministro das Finanças está a abanar com a cabeça, confirmando o que estou a dizer. É isto, infelizmente!
Ora bem, perante um Orçamento destes, de continuidade, e com esta sua postura, o PS tem, naturalmente, de assumir aqui as suas responsabilidades pelo radicalismo em levar à prática um Orçamento que "navega" com a "bandeira de Maastricht", pelo que, certamente, não poderá contar nem exigir que o PCP o vote favoravelmente, porque sendo, no essencial, de continuidade pode ser assinado pelo PSD e pelo PP - pelo PSD, certamente, não será, porque este quer marcar algumas diferenças, as tais décimas, apesar de, no fundamental, se manter estruturalmente como um Orçamento do PSD.
Sr. Primeiro-Ministro, lamentamos, porque pensamos que o povo português queria diferenças, queria uma mudança, e com esta política de Maastricht vamos ter mais desemprego, mais falências, mais trabalho precário. É esta a consciência social do Governo do PS.

Aplausos do PCP.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra, para exercer o direito regimental da defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, num estilo que, por acaso, não lhe conhecia, ao falar de actividades parasitárias apontou para a minha bancada. Provavelmente, tem as lentes de contacto ou os óculos de algum modo embaciados, porque, com certeza, quereria dirigir-se a qualquer outro lado, que não este.
Fique sabendo, Sr. Deputado, que todas as pessoas que aqui se encontram sempre trabalharam e não dependem da política para viver, nem andam atrás das reformas de políticos, nem ficam com as reformas, mesmo sem serem para si, para os cofres do partido, nem são funcionários do partido. São pessoas livres que sempre produziram para o País e que querem a liberdade para que, todos possam produzir.
Portanto, Sr. Deputado, compreendo que esteja incomodado, porque V. Ex.ª, hoje, gostava de estar ali, na bancada do Governo, onde está o Dr. António Vitorino. V. Ex.ª gostaria de estar ali, ao lado do Eng.º António Guterres, mas esse é um problema seu e do Eng. º António Guterres.
O seu partido entende-se às mil maravilhas com o Partido Socialista, quando se trata de amnistiar os terroristas, pode ser que também se entenda às mil maravilhas com o Partido Socialista para outro tipo de situações.
Agora, parasitários e defensores de parasitários, nunca, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Amaral (PCP): - Agora vai-se embora?!...

O Sr. Presidente: - Para dar explicações; se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, espero que o Sr. Deputado conheça o Orçamento. Referi-me aos benefícios fiscais, no entanto, a sua lengalenga...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Mas apontou para aqui!

O Orador: - Foi, no que toca aos benefícios fiscais, em relação à sua bancada, porque sempre os votou,...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - ... e são milhões de contos! Os senhores dizem que não há dinheiro e que há défice - dizem que não há dinheiro para os reformados, para aumentar a função pública -, mas votam 200 milhões de contos para benefícios fiscais...

Protestos do CDS-PP.

É esta a hipocrisia do CDS-PP! Percebeu!?

Protestos do CDS-PP.

Portanto, não venha com disfunções... Falei de benefícios fiscais, Sr. Deputado Manuel Monteiro.

Vozes do CDS-PP: - O senhor quer é nacionalizações!

O Orador: - Quando o senhor diz que não há dinheiro para os reformados, para a função pública, o senhor está a mostrar que há dinheiro para "meter" nos bolsos dos grandes senhores do dinheiro, da CIP, da CAP, daqueles que os senhores defendem. Mas não há para aqueles que trabalham!

Protestos do CDS-PP.

Está é a realidade.
Quanto às explicações que deu, ficamos a conhecê-las.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Olhe, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, este cartão é do Sindicato dos Ban-

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cários do Sul e Ilhas, que é um sindicato comunista, e pago quotas todos os meses!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, radicalismo?! Se há uma coisa em relação à qual os portugueses não têm dúvidas é de que lado está o radicalismo e a moderação na vida política portuguesa: o radicalismo está convosco; a moderação está connosco!

Risos do PSD.

É assim hoje, sempre foi assim, e não faz qualquer sentido tentar inverter esta posição. É, aliás, o vosso radicalismo que faz com que o espírito de diálogo com que nos apresentamos nesta Câmara para debater o Orçamento não tenha de facto, objectivamente, em relação a vós, grande utilidade, porque o PCP já disse a todos os que o queriam ouvir que, houvesse o que houvesse, votaria contra este Orçamento, o que retira fundamento a um diálogo necessário e desejável para a sociedade portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não é este o nosso Orçamento!

O Orador: - A "bandeira" em que este Orçamento assenta é a de Portugal, mas também assenta noutras "bandeiras", e são essas as que vos doem. Assenta na "bandeira" de um acordo com todos os sindicatos da função pública,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: o que contraria totalmente a vossa perspectiva em relação ao que dizem sobre este Governo e sobre a sua capacidade de diálogo e de valorização do papel dos trabalhadores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este é o vosso problema. O vosso problema é explicar aos trabalhadores que dizem representar por que é mau um Governo que com eles dialoga, que com eles negoceia e que com eles chega a acordo num aspecto essencial, como é o deste Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

É evidente que este Orçamento é, em muitos aspectos, uma herança do passado, mas introduz rupturas fundamentais na diminuição daquilo que pode ser diminuído e que não tem interesse social e no aumento fundamental em que apostamos, quer em matéria de questões sociais, nomeadamente da educação, quer em matéria de investimento para sustentar o emprego e a actividade económica.
Quanto, aos benefícios, é muito simples, aumentam em 10%, no IRS, e diminuem 5,9%, no IRC. Ou seja, há muito mais benefícios para os trabalhadores e menos para as em presas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Isso. nada tem a ver com a realidade!

O Orador: - Mais, olhando para o efeito dos impostos sobre o rendimento do trabalho, verificamos que, após impostos, o aumento real dos salários é maior do que antes de impostos - e tenho aqui quantos casos queira, para trabalhadores não casados, para casados com dois filhos, para pensionistas - e que, em todos os casos, para uma previsão de 1,25 de aumento real dos salários, o aumento real do, rendimento, após impostos, anda entre 1,30 e 3,14, e é sempre superior. Ou seja, este Orçamento, com as limitações que existem - e os portugueses têm hoje consciência delas -,faz um enorme esforço em matéria de justiça social.
Ainda em relação à questão fiscal, os impostos directos e indirectos, verificará que se inverte a tendência, no sentido de aumentar o peso dos impostos indirectos, e que, pela primeira vez em muitos anos, os impostos directos, que, em 1995, representavam 39,2%, representam 39,8% e os indirectos passam de 60,7% para 60,2%. Ou seja, iniciámos o caminho para uma maior justiça fiscal e social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - São coisas que, aparentemente, não interessam ao PCP,...

Vozes do PCP: - Isso não é verdade!

O Orador: - ... mas interessam aos trabalhadores portugueses. A estes interessa o seu poder de compra, a forma como se reparte a carga fiscal e o enorme esforço que vamos fazer no combate à fraude e à evasão fiscais, porque, infelizmente, como sabe, são os trabalhadores por conta de outrem que até agora têm praticamente pago tudo e, muitas vezes, são os que mais têm que menos pagam impostos em Portugal. E não vemos o aplauso do PCP ao esforço sério de inverter esta tendência.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Quando houver esse esforço!

O Orador: - Não exijo que o PCP vote favoravelmente este Orçamento. Nada exijo ao PCP. . A única coisa que sugiro ao PCP é a reflexão sobre o sentido da história e sobre o seu papel na vida política portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, Os Verdes têm, constantemente e durante a legislatura anterior, feito fortes críticas, aliás de acordo com aquilo que a sociedade também exprime na sua contestação, às políticas do anterior Executivo em matéria de ambiente. Políticas, aliás, tão desastrosas, que se traduzem não só no desconforto, no caos e na degradação da qualidade de vida dos cidadãos como naquilo que foi a dança dos responsáveis no respectivo Ministério.
O então porta-voz do PS para a área do ambiente e que hoje integra a sua equipa, dizia, subscrevendo, aliás, as nossas propostas e as nossas críticas, que havia uma total ausência de visão estratégica do ambiente nas várias políticas sectoriais e, mais do que isso, que na pobreza dos orçamentos não restavam dúvidas, tal a como nós, quanto ao facto de o ambiente ser uma política fraca, secundária e pobre, já que é no Orçamento que as verdadeiras esco-

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lhas se encontram, que as prioridades se estabelecem. É, sem sombra de dúvidas, aqui que as opções, as prioridades e as escolhas, se traduzem com clareza, que nenhuma palavra pode esconder.
É por isto, Sr. Primeiro-Ministro, que lhe pergunto muito concretamente: quando o actual Governo, nas suas opções, na definição de prioridades e de investimentos, consegue copiar exactamente aquilo que eram as opções do anterior Executivo, em matéria de ambiente, pois traduz os mesmíssimos 16 milhões de contos de investimento nacional, o que, no passado, o Sr. Primeiro-Ministro dizia era de facto para fazer demagogia ou entende que as opções do passado eram tão boas que se justifica a sua continuidade?

Aplausos de Os Verdes e dos Verdes.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, vamos aos factos. Em termos de sub-sector Estado, despesas de funcionamento e investimento do Plano, o Orçamento consagra um aumento de 26%. Se considerarmos para o conjunto do SPA um aumento de 27,2%, se o mesmo não traduz, pelo volume gigantesco de aumento que representa, uma alteração qualitativa, o que é que traduz uma alteração qualitativa em matéria de prioridade ambiental em Portugal?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - O Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
Segunda crítica: fraca redução do défice. Em 8220 milhões de contos de despesa pública, os senhores ficam muito contentes por reduzir o défice em 29 milhões de contos. Repito, 29 milhões de contos são para este Governo uma excelente bandeira de redução do défice. Quer isto dizer que, em 1997, os senhores terão, nada mais nada menos, de reduzir o défice em mais de 160 milhões de contos, o que obedece à máxima "podes deixar para amanhã o que já devias estar a fazer hoje".
Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento para 1996 implica, necessariamente, o aumento de impostos e a queda do poder de compra da função pública em 1997. O Sr. Ministro das Finanças diz que estas críticas são "gasosas" e que não têm sustentação.
Sr. Primeiro-Ministro, está V. Ex.ª em condições de dizer que este Orçamento do Estado não obriga a um aumento de impostos em 1997? Assume nesta Câmara que não vai aumentar os impostos em 1997? E que vai aumentar os salários da função pública acima da inflação?
Pela nossa parte, temos a dizer-lhe que este Orçamento do Estado implica necessariamente que as condições de vida dos portugueses piorem: mais desemprego em 1996, aumento de impostos e queda dos salários reais em 1997. Se não tenho razão, assuma perante os portugueses e esta Câmara que não é verdade o que estou a dizer.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, vejo agora quão triste está o PSD por não ter havido aumento de impostos...

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, solicito que autorize a entrega a todos os grupos parlamentares e ao Governo do PIDDAC e das Grandes Opções do Plano para 1995 e para 1996, para que se conclua que somos rigorosos quando dizemos que o Governo copia, palavra a palavra, as opções, os critérios, as escolhas do anterior Executivo e que o investimento a nível nacional é rigorosamente o mesmo.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, como a circulação de documentos entre Deputados e grupos parlamentares é livre, não precisa de pedir autorização para esse efeito.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, conhecida a proposta de lei de Orçamento do Estado, o PSD aponta-lhe duas críticas fundamentais: a primeira, a penalização do investimento; a segunda, a fraquíssima redução do défice nela consagrada.
Quanto à penalização do investimento, o nosso espanto deve-se ao facto de o investimento poder ser indutor do combate ao desemprego. Ora, este Orçamento não aumenta as despesas de investimento e, inclusive, baixa o esforço nacional do PIDDAC em termos de investimento público; em contrapartida, as despesas correntes sobem 9,2%. Quer isto dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que este Governo cobra impostos para gastar e não para investir. Por essa razão, faço-lhe muito directamente a seguinte pergunta: se o PS tanto clamou pelo combate contra o desemprego, por que é que este Orçamento não elege como primeira prioridade política precisamente o combate ao desemprego?

... nem diminuição do poder de compra dos trabalhadores em 1996, como disseram, durante a campanha eleitoral, que, aconteceria ao país se o PS ganhasse as eleições. Ou seja, é uma espécie de indução projectiva dos vossos desejos de ano para ano: desejam a desgraça dos portugueses, esperam-na ansiosamente e ficaram profundamente tristes por não ter acontecido este ano.

Aplausos do PS.

Mas vamos ao que interessa: devo dizer-lhe que este Orçamento estava armadilhado no plano do investimento público pelos compromissos irrevogáveis assumidos no ano anterior, quando foram lançados concursos e empreitadas durante o verão para ganhar as eleições. Toda a gente o sabe! Este Orçamento estava de tal forma armadilhado que os senhores diziam à boca pequena que não conseguiríamos elaborar um documento desta natureza até ele surgir.
O grande mérito do Governo que, neste caso, tem o nome do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território foi o de conseguir "desarmadilhar" os vossos compromissos, o de desmontar a vossa "armadilha" e, através de uma fórmula imaginativa de financiamento e de uma programação milimétrica, projecto a projecto, tendo em conta os graus de comparticipação comunitária, obter aquilo que os senhores nunca esperavam: tendo, em 1995, realizado 614 milhões de contos de investimento público, se possa prever para este ano 806 milhões de contos, o que corresponde a um aumento de

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31, 3%, algo sem paralelo na nossa história orçamental passada. É isso que os senhores não perdoam a vós próprios! Não souberam montar a "armadilha" suficientemente bem para, sabendo que perdiam as eleições, nos impedir de conseguir fazer um bom Orçamento.

Aplausos do PS.

Em matéria de défice, o que conta é o défice em percentagem da capacidade de geração de riqueza e aí a redução é extremamente significativa e similar àquela que, porventura, iremos realizar no próximo ano. Agora, não deixa de ser curioso que, quando o Governo PSD negociou com Bruxelas um programa de convergência (ainda que esta matéria pouco nos preocupe porque queremos reduzir o défice independentemente das vossas negociações), o tenha feito nestes moldes: défice do sector público administrativo em percentagem do PIB - de 1994 para 1995, ano de eleições, de 5,8 para 5,6; de 1995 para 1996, de 5,6 para 4,2; de 1996 para 1997, de 4,2 para 3. Ou seja, "depois de mim, o dilúvio".
Enquanto os senhores tinham a certeza de estar no poder, nada de reduzir os défices porque era preciso gastar " à tripa forra". Para o futuro, quem viesse teria de arcar com os vossos compromissos. É isso que vos dói, é essa a verdade dos factos!
Por essa razão, encaramos com a maior tranquilidade a evolução futura da economia portuguesa e, se a economia europeia recuperar como se espera, estamos convencidos de que será possível reduzir o défice no próximo ano com alguma naturalidade. Se assim não acontecer, cá estaremos, uma vez mais, para enfrentar as dificuldades.

Aplausos do PS

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, antes de mais, gostaria de congratular-me com a preocupação expressa pelo Governo de compatibilizar a convergência nominal com a convergência real. É de assinalar também os compromissos assumidos pelo Governo quanto à criação de medidas que vão desagravar a carga fiscal que recai sobre as famílias e os rendimentos do trabalho bem como outras medidas da mesma natureza que despenalizam o capital e que terão incidências positivas na modernização do tecido empresarial;
Com a mesma satisfação temos de encarar a criação do rendimento mínimo garantido e saudar o facto de a sua concretização se fazer em moldes cautelosos e realistas, entendendo-se o rendimento mínimo garantido como o direito dos cidadãos a disporem de recursos que lhes permitam satisfazer as necessidades mínimas de subsistência sem perder de vista a sua inserção social e profissional,
O Orçamento que o Governo elaborou traduz uma grande sensibilidade e consciência social para além de, na sequência do diálogo e da concertação que promoveu e aproveito para sublinhar com muita ênfase o acordo de concertação social de curto prazo assinado em 24 de Janeiro entre o Governo e os parceiros sociais -,ter consagrado no Orçamento os compromissos resultantes desse acordo. No entanto, muito há ainda a fazer para compatibilizar o emprego com o crescimento e a competitividade das empresas porque cada vez mais a capacidade de governar depende do grau de consenso social sobre as medidas a tomar.
Sr. Primeiro-Ministro, os portugueses têm os olhos postos em si e no Governo e esperam muito de uma nova maneira de governar que assente na concertação e no diálogo.
Por isso lhe pergunto: a que níveis e de que forma entende o Governo desenvolver o diálogo e a concertação social para, de forma positiva e participada, corresponsabilizar os parceiros sociais na articulação das políticas de emprego e de formação com os necessários projectos de modernização? No final de contas, trata-se de organizar e de desenvolver um processo mais permanente de concertação, visando acordos estratégicos onde se possam encontrar soluções eficazes que garantam uma promoção sustentada da competitividade, do emprego e da coesão social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado .Barbosa de Oliveira, em primeiro lugar, gostava de aproveitar este pedido de esclarecimentos para manifestar o quão confortável é para este Governo sentir o apoio de uma bancada que não só dá um contributo extremamente responsável ao debate político, não se limitando a ser repetidora de posições do Governo, como assume a iniciativa e a condição de Deputado em toda a sua plena dimensão.

Aplausos do PS.

Quero também aproveitar para saudar em si um sindicalista extremamente respeitado e responsável e o contributo decisivo que o movimento sindical tem dado para que seja possível governar em diálogo e em concertação. Refiro-me a todos os sindicatos da função pública em geral e, de uma forma muito particular, em sede de concertação social, à central sindical a que pertence, à UGT, cujo contributo foi decisivo para que pudéssemos encontrar soluções inovatórias que garantam uma perspectiva simultaneamente humanista e favorecedora da competitividade das empresas, indispensável ao emprego e ao desenvolvimento do nosso país.
Já tive ocasião de dizer que não considerava o acordo de concertação social uma vitória do Governo mas sobretudo uma vitória dos parceiros. Repito aqui que foi, em grande medida, uma vitória devida ao sentido das responsabilidades e ao realismo da UGT nesse debate.

Aplausos do PS.

Esse acordo abre, em nossa opinião, o caminho a uma perspectiva de concertação estratégica a vários níveis. O Governo apresentará ao Conselho Económico e Social e ao Conselho Permanente de Concertação Social um documento aberto para início do debate, já que pretende levar tão longe quanto possível o debate nesses dois órgãos, tendo em conta o papel específico e extremamente relevante de qualquer deles. Mas entende que é necessário ir mais longe e estender os mecanismos de, concertação ao nível dos sectores e, mesmo, a formas informais com aquelas entidades da sociedade civil - empresas, trabalhadores, universidades, centros de investigação - que podem conduzir a alterações qualitativas em certas áreas onde temos de saber defender-nos melhor do exterior ou onde há oportunidades novas a aproveitar.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que só dessa forma venceremos a extrema dificuldade em que o País foi colocado

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por, em "tempo de vacas gordas", ter tido uma estratégia que o não preparou para uma competição extremamente dura em "tempo de vacas magras", visto que tinha sido essencial aproveitar os últimos anos para dar outro nível de qualificação às pessoas e outro grau de solidez ao nosso tecido empresarial. Infelizmente, isso não foi feito e será agora, com acrescido sacrifício e sentido da responsabilidade de todos, que teremos de fazê-lo. Mas quero dizer que confio plenamente no sentido das responsabilidades dos parceiros sociais e, em particular, da central sindical que, noutra qualidade, tão dignamente tem representado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua comunicação a esta Assembleia, V. Ex.ª manifestou uma grande preocupação com as consequências dos acordos de comércio no nível de desemprego em Portugal. De facto, essas consequências são tanto mais dramáticas quanto menos fair são esses acordos de comércio.
Não adianta muito dizer que se caminhará para a regra do free tradelfair trade, porque a verdade é que em cada dia nos são impostos, às vezes com surpresa, como aconteceu ainda há bem pouco tempo, acordos de comércio que nada têm de fair. Não é fair a inexistência de condicionamentos sociais em muitos daqueles que são forçosamente nossos parceiros comerciais, a inexistência de direitos humanos. Diria mesmo que tudo isso é a configuração mais unfair que é possível encontrar no mundo.
Mas a verdade, Sr. Primeiro-Ministro, é que para um partido que não está no poder isto aparece quase como uma regra do jogo. Estamos a ser empurrados para isso, estão a pôr-nos, diariamente, esses obstáculos no caminho e, em consequência, cada dia há centenas ou milhares de desempregados a mais no nosso país.
Sr. Primeiro-Ministro, esperava encontrar nos documentos que agora nos são submetidos qualquer coisa, qualquer ideia, qualquer medida, qualquer atribuição de fundos a qualquer política que fizesse face àquilo que temos de considerar como uma regra do jogo. Infelizmente, não encontrei.
Assim, queria perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro se o Governo tem ou não a intenção de encontrai medidas que respondam a esta que é uma das grandes preocupações que o meu partido tem manifestado.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Abecasis, "pôs o dedo na ferida" de uma das maiores preocupações que o Governo português tem neste momento.
Neste momento e nomeadamente à escala da Europa, há um certo fundamentalismo em defesa do comércio livre. Devo dizer que sou um defensor acalorado do comércio livre, mas desde que o mesmo se desenvolva em igualdade de condições. Ora, a verdade é que se assinam acordos de comércio livre sem cuidar de garantir um conjunto de direitos de natureza social e um conjunto de práticas de natureza ambiental, assim viciando completamente a concorrência.
O Sr. Deputado tem consciência de que, recentemente, a União Europeia assinou com a China e com o Paquistão, com o voto contra de Portugal, um acordo em matéria de têxteis, do qual recorremos, aliás, para o Tribunal das Comunidades. E só foi pena que esse recurso não tivesse sido introduzido quando se iniciou o debate sobre aquele acordo pois, porventura, poderia ter tido um efeito suspensivo. Não teve essa imaginação nem essa capacidade o governo de então, fizemo-lo nós agora, porventura tarde de mais em certos aspectos - reconheçamo-lo. De igual modo, tivemos ocasião de intervir - e aí, com êxito - no sentido de redefinir o mandato da Comissão no que diz respeito às negociações com a África do Sul, em que alguns aspectos particularmente preocupantes poderiam estar em causa, nomeadamente no que diz respeito à nossa agricultura. Igualmente, na Cimeira Banguecoque - e bastará ler a imprensa internacional para verificar que, infelizmente, falo verdade -, a minha voz foi, porventura, a única que, com insistência e firmeza, se fez ouvir, dentro e fora da Cimeira, no sentido de dizer que é preciso introduzir a questão dos direitos sociais, dos direitos humanos e dos direitos fundamentais nas regras de negociação da Organização Mundial de Comércio e que esta é uma questão central para o futuro da própria civilização europeia.

Vozes do PS:- - Muito bem!

O Orador: - É evidente, no entanto, que não basta ter uma estratégia defensiva no plano externo. O Governo tem em preparação um conjunto de medidas de política no sentido de assegurar a defesa das nossas empresas, quer face às consequências dessa invasão, quer no sentido da exploração das oportunidades que, apesar de tudo, a abertura ao comércio livre também traz consigo.
Assim, temos em preparação um fundo de internacionalização para pôr à disposição das empresas portuguesas, sobretudo com o objectivo de lhes permitir terem redes de distribuição no exterior. Aliás, estou certo de que, em breve, o Sr. Ministro da Economia estará em condições de apresentar a esta Câmara as linhas essenciais dessa medida, para além de outras que, no plano social, procurem compensar os prejuízos que, inevitavelmente, em certas áreas, decorrem desta perspectiva fundamentalista em que muitas vezes se viola a lei e a própria regulamentação internacional.
Circulam na Europa produtos importados fora das quotas acordadas com o exterior. Muitos destes circulam sem sequer terem sido sujeitos ao pagamento de IVA, fazendo concorrência, de uma forma inaceitável, aos produtos portugueses, sobretudo em sectores tradicionais. Também neste domínio temos um conjunto de medidas preparadas no sentido de uma acção repressiva muito mais eficaz, pelo menos no mercado interno, para evitar essas práticas de dumping que, ainda por cima, em certos aspectos, se fazem a coberto da não aplicação da regulamentação comunitária.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Vamos entrar na fase das intervenções dos Srs. Deputados. A conferência de líderes pôs-se de acordo no sentido de que as mesmas se processem começando pelo maior partido da oposição, seguindo depois a ordem do maior partido para o menor.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Nogueira.

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O Sr. Fernando Nogueira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, infelizmente, mais do que um discurso de apresentação do Orçamento do Estado, o senhor veio hoje, aqui, fazer chantagem política com o Parlamento e, em particular, com o Grupo Parlamentar do PSD.

Aplausos do PSD.

O seu discurso foi um verdadeiro manual de chantagem política.

O Sr. António Braga (PS): - Olhe que não!

O Orador: - E à chantagem política, a toda a chantagem política, dizemos não. Não, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PSD.

Quando V. Ex.ª, logo no início deste debate, sem sequer ouvir os argumentos da oposição, considera desde já uma irresponsabilidade o voto contra, merece, também desde já, Sr. Primeiro-Ministro, uma resposta clara e frontal: atestado de irresponsabilidade só pode sei assacado a quem, como o senhor e o seu partido, durante 10 anos, perante 11 Orçamentos do Estado, mesmo quando o governo era minoritário, votou sempre contra e chegou mesmo ao ponto de assumir o voto contra antes de conhecer o respectivo texto.

Aplausos do PSD.

Um pouco mais de memória, um pouco mais de humildade, um pouco mais de sentido de Estado era o que se exigia da intervenção do Primeiro-Ministro.
Falou V. Ex.ª, duas vezes, de frenesim eleitoral em 1995. Estava V. Ex.ª, por certo, a pensar no facto de o governo anterior ter deixado um défice significativamente inferior ao previsto e ter deixado também para V. Ex.ª o dinheiro suficiente para o aumento de pensões de que V. Ex.ª tanto se orgulha.
Esta é que é a verdade a que os portugueses têm direito.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Em Outubro passado, os portugueses escolheram a alternância, favorecendo o Partido Socialista, e terão esperado que a mudança política abrisse um novo tempo de confiança e de modernização.
Poucos meses depois, as realidades políticas, económicas e sociais são bem diferentes do que os portugueses legitimamente esperavam. E isto, apesar da publicidade enganosa das eleições se ter prolongado irresponsavelmente até aos dias de hoje. A triste realidade é que o Governo persiste em dar sinais aos portugueses que são contrários ao que seria recomendável por uma atitude serena e responsável' na condução dos assuntos políticos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É contra esta atitude governativa que quero expressar a minha preocupação e deixar. o 'meu alerta.
Não há nenhum lugar de Primeiro-Ministro ou de Ministro que justifique a omissão da verdade aos portugueses.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Justamente porque confiaram naqueles que agora ocupam os lugares do poder, os ,portugueses merecem conhecer a verdade. Têm direito a conhecer a verdade. E a verdade não é a de que o novo poder privilegia a competência nos mais altos cargos públicos. A verdade é que nunca, como agora, se pôs em marcha uma tão desenfreada e despudorada operação clientelar de assalto ao aparelho do Estado.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Os "cordeiros" de ontem deram lugar aos "lobos" de hoje.
Sucedem-se os saneamentos, os afastamentos arbitrários, as exonerações feitas na praça pública por pressão, descarada e assumida, da máquina partidária socialista..:

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que façam silêncio!

O Orador: - Têm muitas mais verdades para ouvir, Srs. Deputados!
Repito: sucedem-se os saneamentos, os afastamentos arbitrários, as exonerações feitas na praça pública por pressão, descarada e assumida, da máquina partidária socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Isso é que é descaramento!

O Orador: - Ironia das ironias, Sr. Presidente, Srs. Deputados, alguns desses actos partem de departamentos governamentais que hoje são ocupados por pessoas que foram nomeadas para altas funções' de Estado pelo chamado "clientelismo do PSD".

Aplausos do PSD.

A verdade é que, no sector da comunicação social pública, onde antes se reclamava isenção e independência e se refega à exaustão haver manipulação e interferência, o cenário, hoje, é já de verdadeira catástrofe.

O Sr. Sérgio Ávila (PS): - Não está a falar de Portugal!

O Orador: - Peguemos apenas no exemplo da televisão pública.
No curto espaço de quatro meses, já aconteceu que o conselho de administração foi mudado sem a prometida mudança prévia da lei e sabendo-se que aquele se manterá ainda que esta venha a ser alterada. Já sucedeu que aquelas que eram as exorbitantes indemnizações compensatórias do passado foram duplicadas no presente. Já houve processos disciplinares com base em pretensos delitos de opinião de jornalistas, tentativas de censura a entrevistados e até ao cancelamento de programas com intervenção prevista de partidos da oposição.

Aplausos do PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Deve estar a pensar no Marques Mendes!

O Orador: - Já ocorreu que a apregoada e sacralizada descentralização deu lugar à perda da autonomia dos centros regionais da Madeira e dos Açores e à demissão de um "director de confiança" nomeado para a delegação do

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Porto que, no dizer do próprio,, viu drasticamente reduzido o seu espaço de intervenção e liberdade de acção.
Convenhamos que são casos de mais em tempo de menos. E o futuro augura o pior, numa área tão determinante para a salvaguarda do pluralismo democrático que, no passado, os senhores tão bem defendiam.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também na área essencial da autoridade do Estado, a verdade é que os alegados «excessos do passado» deram lugar, no presente, a uma perigosa escalada de episódios rocambolescos e surrealistas.
Desde desautorizações pró sindicais do poder disciplinar da hierarquia das forças de segurança, passando por atitudes de rebeldia pública de escalões intermédios da PSP, aquando da posse do novo comandante-geral, até à assunção infantilmente desculpabilizadora da alegada impreparação das forças de segurança, os portugueses já viram de tudo um pouco.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Viram mesmo o que nunca pensariam ver um Primeiro-Ministro alijar capciosamente culpas sobre o poder judicial, em resultado de uma carga policial embaraçosa,...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Está enganado!

O Orador: - ... e um Ministro com tutela nas polícias fazer depender a sua permanência no cargo de um inquérito de uma entidade sem poderes jurisdicionais e não dependente da organização que supervisiona e que tem obrigação de fiscalizar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A situação, Srs. Deputados, seria caricata e risível se não fosse gravemente perigosa e atentatória da paz e tranquilidade públicas que temos de preservar a todo o custo.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Então, e o Orçamento, Sr. Deputado?

O Orador: - A verdade é, também, que aja conhecida «diplomacia dos berros», em que o tom de voz e as ameaças para «português ver» ocuparam indevidamente o espaço da persuasão e da eficácia, deu lugar, no seio da União Europeia, a resultados desastrosos, seja no caso da palmeta, no do acordo com Marrocos ou, agora, no do acordo sobre têxteis com a índia e o Paquistão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal, Srs. Deputados, deixou de ser «bom aluno» e está a obter os resultados curriculares correspondentes. Fala muito, obtém pouco. Exige mais, recebe menos. Esta é a verdade, Srs. Deputados.

Aplausos do PSD.

A verdade ainda, Srs. Deputados, é que o caminho da modernização da economia e da sociedade portuguesas

está a ser interrompido em resultado das promessas do distributivismo e das tentações socializantes de intervencionismo no tecido produtivo nacional, deixando as empresas, os empregos, as relações sociais e económicas e os mercados mais frágeis e mais vulneráveis do que estavam.
A verdade é que, no domínio da vida das empresas, ao primeiro sinal de problemas aí está o Governo a não resistir à tentação de intervir. Logo sugere uma ajuda, logo admite substituir-se aos empresários. O envolvimento governativo logo se sobrepõe aos mecanismos sociais próprios e ao funcionamento das regras de mercado.
Alguns portugueses já descobriram que com este Governo a pressão mediática compensa. Os órgãos de comunicação social marcam o ritmo e o tempo da acção governativa. Só que, a seguir a uma empresa em dificuldades, logo surgirão outras empresas em dificuldades; a seguir a uma manifestação haverá outras manifestações e o Governo lá estará na rua a procurar respostas que não encontra para todos os credores, fornecedores, trabalhadores e empresários.

Aplausos do PSD.

É, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um novo PREC que se anuncia, é o poder de novo na rua e a autoridade do Estado, dia a dia, mais enfraquecida.

Risos do PS.

Riam-se agora, porque mais logo haverão de chorar!

Risos do PS.

Daí à instabilidade social vai um passo, cujas primeiras vítimas serão os trabalhadores e os mais desfavorecidos.
É grave, mas infelizmente é verdade!
No domínio social é verdade também que o desemprego, até há pouco estabilizado, já disparou, que o investimento se retraiu, que as dificuldades das empresas se acentuaram, que os sectores industriais e agrícolas não se modernizam, que o sector do comércio apresenta um grau de conflitualidade crescente. Tudo isto é verdade, porque, no fundo, o que ouvimos dos governantes é que estão à procura de soluções globais para tudo, enquanto no mundo real não se vê solução concreta para nada.

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - É verdade igualmente, Srs. Deputados, que um Governo que não cumpriu ainda 1/12 do seu mandato já deu azo a remodelações ministeriais, já sofreu alterações na sua lei orgânica e sente de forma crescente o vírus da discórdia entre os seus membros. Não há dia que os órgãos de comunicação social não dêem conta de disputas entre grupos,...

Vozes do PS: - Está a falar do PSD!

O Orador: -... de desentendimentos de Ministros com Secretários de Estado e destes entre si.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade, é verdade!

O Orador: - A verdade, por último, a verdade tão dramática quanto genuína, é que o Governo não define políticas, não tem agenda estratégica, não tem rumo definido, limita-se a correr atrás dos acontecimentos mediáticos, da

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«caixa» do dia ou da manifestação da véspera. Onde há um microfone, há um Ministro;...

Risos do Deputado do PSD Carlos Coelho.

... onde há um protesto, há uma reunião com governantes; onde há uma notícia negativa, há um grupo de trabalho inter-ministerial!

Aplausos do PSD.

O Governo reúne, dialoga, suspende, dá entrevistas, faz ajuste de contas com o passado, mas não prepara o futuro e, sobretudo, não governa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É neste quadro e neste clima que estamos hoje a discutir o Orçamento do Estado. Um Orçamento apresentado fora de tempo; um Orçamento que reflecte a incompatibilidade entre a realidade e o que foram as promessas eleitorais; um Orçamento que, à partida, já está condicionado pelas medidas avulsas e inconsequentes tomadas entretanto pelo Governo. No fundo, o Governo aboliu portagens, suspendeu propinas, eliminou o 8.º escalão, renegociou tabelas salariais, deixou à deriva as negociações laborais no sector empresarial do Estado e aumentou o imposto sobre combustíveis, tudo medidas com repercussão orçamental e que o Governo furtou assim à discussão parlamentar.

Aplausos do PSD.

É a política do facto consumado, agravado nas suas consequências pela natureza minoritária do Governo.
O PS prometeu solenemente ao País que o Orçamento em 1996 iria cumprir as suas promessas sem agravar os impostos, que iria cumprir o objectivo comunitário de redução do défice sem sacrificar o investimento público, que iria revelar maior rigor e consciência social e que iria permitir o retorno à convergência real e a redução acelerada do desemprego.
O Orçamento de 1996 é, Srs. Deputados, um desapontamento lamentável em todos estes pontos cruciais para o bem-estar dos portugueses e para a sua esperança no futuro. E, no entanto, à partida este Orçamento dispunha de margem de manobra suficiente para não desapontar os portugueses.
Ao reafirmar solenemente que cumpriria o grande desígnio nacional de colocar Portugal entre os países fundadores da moeda única europeia, este Governo comprometeu-se a continuar o esforço de contenção orçamental que vinha a ser desenvolvido. E, dada a grande rigidez que existe na despesa corrente do Estado, em que 3/4 do total da despesa respeitam aos vencimentos dos funcionários públicos, isso parecia bastante para congelar os ímpetos despesistas do PS. Tanto mais que, ao prometer aos portugueses que 19% seria um ano de forte crescimento económico, o novo Governo, em coerência, não poderia sacrificar o investimento público às despesas correntes resultantes das promessas eleitorais.
Portanto, à partida, a margem para fazer asneira era limitada. Eis senão quando, ao iniciar funções, o novo Governo dá-se conta de que a execução orçamental iria correr muito melhor do que se pensava. O Dr. Jorge Coelho já tinha, porém, protagonizado a campanha de propaganda intitulada - e curiosamente esquecida! - «os buracos orçamentais do anterior governo». Percebe-se porque é que o Dr. Sousa Franco, ilustre Ministro das Finanças,...

Vozes do PS: - Ai, agora já é ilustre!...

O Orador: -... não gostou, vindo a terreiro pôr os pontos nos «is» e verberar uma linguagem, que nas suas palavras, é própria de «cavadores ou mineiros».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que o novo Ministro das Finanças tinha que apresentar um Orçamento rectificativo em que, por muita cosmética que fosse empregue, não se poderia esconder que a execução orçamental em 1995 tinha sido bem melhor do que era afirmado pela propaganda socialista.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O novo Governo recebia assim um presente inesperado de mais de 100 milhões de contos, com receitas fiscais acima do previsto, despesas correntes e investimentos públicos em execução ou em fase de lançamento cujos montantes, por si só, asseguravam um maior crescimento da economia em 1996.
O legado era tão bom que, feitas as contas, apenas era preciso reduzir o défice em 30 milhões de contos. Tanto mais que com a economia a crescer já acima de 2,5%, o ano de 1995 tinha proporcionado uma forte recuperação nos lucros das empresas, pelo que a cobrança fiscal de IRC, em 1996, podia ter um aumento extraordinário. Por último, graças ao sucesso alcançado na luta contra a inflação, os juros da dívida pública iriam baixar fortemente. Em suma, bastaria manter a política económica em curso e as linhas gerais do Orçamento de 1995 para tudo pudesse correr pelo melhor.
Não é, pois, de estranhar que o Ministro das Finanças não tenha tido pressa em apresentar o Orçamento de 1996.
Um único senão perturbava este risonho quadro. Como acomodar, por exemplo, as promessas eleitorais da suspensão das propinas e das portagens, de elevação da despesa de investimento na educação, de aplicação do rendimento mínimo garantido e de transferência maciça de mais recursos financeiros e humanos para as autarquias?
Apesar das «almofadas» recebidas, o Orçamento do Ministro das Finanças não podia dar satisfação a todos estes arroubos despesistas. A primeira solução encontrada foi desbastá-las até ao limite de credibilidade da campanha mediática de que «as promessas estavam a ser cumpridas». E é assim que, por exemplo, a paixão pela educação é castigada com uma forte desaceleração da despesa de investimento,...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... como se já não fossem necessárias mais escolas, mais lares para estudantes ou pavilhões gimno-desportivos para que a nossa juventude cresça como deve crescer!

Aplausos do PSD.

Mas, como isso não chegava, havia que recorrer a mais cosmética. E, de repente, o País constatou que a eliminação das portagens nas auto-estradas não trazia, afinal, custos para ninguém - nem para os utilizadores das outras auto-

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estradas, nem para aqueles que ainda as não têm, nem para os contribuintes, porque não. teriam de pagar mais impostos para o Orçamento, nem para própria empresa que as constrói, a Brisa, que não precisaria de qualquer indemnização.
E assim, 70 milhões de contos de investimento, gastos na construção da CREL e nos troços de Ermesinde e da Maia, em que agora se não pagam portagens, desaparecem em operações de cosmética, num verdadeiro milagre de reprodução de recursos! O Governo está tão entusiasmado com a sua descoberta que o Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território já anunciou ao País que vai construir duas novas "Brisas" para aumentar o ritmo de construção das auto-estradas!

Risos do PSD.

Para o PS, para quem o "fontismo" do PSD foi uma das grandes "bandeiras" de combate eleitoral, é uma pirueta muito arriscada, feita também com grande despudor.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, o pudor não é, de facto, uma virtude deste Orçamento.
Na área fiscal, :este Governo não hesita em garantir que cumpriu a sua promessa de não agravar a fiscalidade e, ao mesmo tempo, subrepticiamente, onera os fracos rendimentos da maioria das nossas classes médias e, portanto, da grande maioria das famílias portuguesas.
Aos trabalhadores independentes aumenta-lhes a retenção na fonte de 15% para 20%, remetendo o reembolso do imposto pago a mais para um ano depois; aos consumidores que só têm acesso a bens duradouros em regime de prestações e de crédito bancário agrava-lhes a taxa de juro em 7% ao ano; aos jovens que querem adquirir casa própria dificulta-lhes a aprovação dos contratos, porque corta as bonificações de juros às instituições financeiras mutuantes; aos cidadãos que só têm recursos para adquirir automóveis de menor cilindrada agrava-lhes ainda mais o imposto automóvel e o preço da gasolina.

Aplausos do PSD.

O pudor não é, de facto, uma virtude deste Orçamento quando se constata a dimensão da despesa oculta, despesa que aparece disfarçada em dívida, que vai onerar os contribuintes em 'exercícios futuros. São as responsabilidades, por exemplo, a pagar à COSEC, são as despesas não orçamentadas no Ministério da Saúde e o deslizar da dívida para com os fornecedores, depois de se ter feito um esforço tão grande em 1995 para liquidar toda a dívida atrasada. Há tantos outros exemplos que mostram que o défice revelado é bem menor do que o real, se este fosse um Orçamento de rigor económico, que não é, porque, quando muito, tem rigor contabilístico.
É, igualmente, Srs. Deputados, um Orçamento, ao contrário do que o Governo diz, com uma grande falta de consciência social. Como sempre, a propaganda não resiste à exposição simples e crua dos factos. A consciência social neste Orçamento está em crise não apenas porque as despesas de investimento reduzem o seu peso na despesa mas porque o mesmo vai acontecer aos recursos que ao longo da execução deste Orçamento serão encaminhados para os programas de assistência a todos os portugueses que são vítimas de situações gravosas de exclusão social - deficientes, toxicodependentes, pessoas sem abrigo, pessoas idosas com fraca assistência médica, habitação em ruínas e rendimentos débeis. Para todas estas pessoas o Governo oferece diálogo e promessas, mas para tudo o que seja construção dos equipamentos indispensáveis o Governo irá falhar porque o Ministério das Finanças vai ter que utilizar a cláusula de reserva de 6% do investimento público para cumprir os objectivos de despesa do Orçamento ou então, em alternativa, vai ter de perder a face e apresentar a esta Câmara um orçamento suplementar no próximo mês de Outubro.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É o mais provável!

O Orador: - Este Orçamento é; por último, um desapontamento lamentável para os portugueses, porque falha na sua responsabilidade essencial: a de estimular o crescimento económico e a criação de emprego,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... por forma a eliminar o desemprego involuntário que se acumulou em resultado da recessão económica de 1993. Como se sabe, o desemprego só começa a reduzir-se quando as economias consolidam a sua retoma económica e entram em fase de expansão.
A este Orçamento, Srs. Deputados, competia, em primeiro lugar, acelerar o crescimento económico. Não o faz.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É um Orçamento de resignação que se contenta com um modesto objectivo de 2,75% de crescimento do PIB, porque cerceia o investimento público, porque desencoraja o investimento privado, o que é agravado pelas medidas estatizantes e intervencionistas que este Governo começa agora a multiplicar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ao impor à economia uma taxa de investimento global inferior à de 1995, este Orçamento vai gerar um crescimento económico inferior ao de 1995.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Como sempre aconteceu no passado, serão os mais desfavorecidos que irão pagar o despesismo e a má gestão orçamental dos Governos do PS - todos quantos são vítimas de exclusão social e muito em particular, os desempregados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A pior das consequências deste Orçamento é que ele, em vez de contemplar medidas que combatam o desemprego, fez opções que o agravam inexoravelmente.

Vozes dó PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pode, aqui e ali, dar cobertura, ainda que parcial, às promessas demagógicas de mais despesa, produzidas durante a campanha eleitoral, mas falha rotunda e inexplicavelmente no compromisso mais substancial, o de que haja mais postos de trabalho para quem queira trabalhar.

Aplausos do PSD.

Este Orçamento vai agravar o desemprego. Prevê a despesa por defeito e as receitas por excesso, pese embora as manobras de desorçamentação. A despesa pública total sobe 8,2% e as

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despesas correntes 9%, repito, 9%! As despesas com as funções sociais do Estado, que em 1995 cresceram 13,2%, crescerão, pela proposta apresentada, apenas 9,7% em 1996.
É, por isso, um Orçamento despesista, sem a sensibilidade proclamada para as áreas sociais, que asfixia ainda mais a classe média, que quebra o investimento e será gerador de mais desemprego.
É, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em suma, um mau Orçamento.

Aplausos do PSD.

A situação a que chegámos tem responsáveis, não surgiu por acidente ou por imposição do destino. Tudo poderia ser diferente se o sentido das necessidades estratégicas, se o reconhecimento da dificuldade das tarefas de modernização de Portugal tivessem sido consideradas como mais importantes do que a conquista do poder.
Este Orçamento do Estado, bem como o ambiente político que se vive no País, são fruto de comportamentos anteriores. Os socialistas em vez da cultura da responsabilidade, propalaram o facilitismo, em vez de soluções credíveis prometeram miragens irrealizáveis.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em lugar da educação cívica e do debate político responsável, alimentaram ilusões e estimularam o desenvolvimento de grupos de pressão e corporativos, a reivindicação e a conflitualidade.
O Governo, Srs. Deputados, está já a colher as tempestades dos ventos que semeou.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E os portugueses pagarão tudo isto bem caro no presente e, sobretudo, no futuro.
Uma vez mais, é o socialismo de Estado que aparece no nosso horizonte porque, ao perder o rumo da modernização, a falsa social-democracia do PS, o verdadeiro socialismo do PS terá de recorrer ao intervencionismo do Estado para sustentar o que já perdeu: a viabilidade por irresponsabilidade das suas políticas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Repete-se o que já conhecemos do passado.
Perdida a linha de rumo, perdido o sentido das reformas estruturais, perdida a autoridade política que se afirma quando há um projecto de modernização, perdido o poder de mobilização que só existe quando há confiança no futuro, está aberto o caminho para a má governação e para o retrocesso.
O que se segue, o debate do Orçamento e as suas consequências, ou as movimentações políticas dos grupos ou interesses que tentam aproveitar as fragilidades do Governo para seu benefício, serão meros pormenores incidentais de uma tendência que está já definida.
A nova maioria, Srs. Deputados, afinal, nem é nova nem é uma verdadeira maioria.
O Governo é minoritário e age como se fosse maioritário. Quer ser Governo, mas nada faz para consagrar soluções que acolham a vontade maioritária dos representantes dos portugueses, que somos todos nós.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Olha quem fala!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, foi o senhor que optou por constituir um Governo minoritário; foi o senhor que garantiu aos portugueses que tinha condições para governar; foi o senhor que comprometeu outras opções possíveis no Orçamento com decisões prévias que as inviabilizam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Têm sido o senhor e o seu partido que, nesta Assembleia, têm tido como aliados preferenciais o PP e o PCP. O jogo das cumplicidades não se limita às conferências de líderes, já tem tido expressão neste Plenário e em encontros com um líder de um dos partidos da oposição,...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Isso é o com o PCP!

O Orador: - ... sob a batuta de um intermediário que representa destacados sectores económicos, que tão diligentemente têm promovido as suas propostas.

Aplausos do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, é seu dever assumir plenamente a natureza minoritária do seu Governo e levar às últimas consequências as suas alianças preferenciais. Por nossa parte, não forçaremos a nossa consciência nem viabilizaremos o que consideramos ser um caminho errado para Portugal.
Este Orçamento enferma de erros irreparáveis - o erro de já estar comprometido por más decisões anteriores, o erro de procurar conciliar o inconciliável, o erro da falta de visão estratégica para o futuro, o erro da cedência à demagogia das pressões fáceis em vez de procurar a via das prioridades correctas, o erro de falar muito de diálogo e exercer pouco a autoridade legítima do Estado, o erro de tanto falar de consciência social para, afinal, aceitar passivamente o agravamento do desemprego, o erro de não assumir a verdade e de não falar com verdade aos portugueses!

O Sr. José Magalhães (PS): - Por que é que não se candidata a líder do PSD?...

O Orador: - A esses erros temos de dizer não. Ao Orçamento que os consagra não ofereceremos, a nossa complacência. Ao Orçamento que os consagra, o Grupo Parlamentar do PSD vai dizer não. Tudo por respeito à verdade que os portugueses exigem e merecem.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Lacão; ,António Lobo Xavier e Francisco Assis.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, inscrevi-me em primeiro lugar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Lobo Xavier, compreendo o seu sinal e sei o que significa. Mas, como deve estar lembrado, no início dos trabalhos chegámos a um consenso relativo mas consenso! -, incluindo o do seu próprio partido...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sobre isso não!

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O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado, foi o que se acordou para o primeiro dia de discussão das propostas de lei n. os 9/VII e 10/VII. Foi assim que coloquei a questão ao Srs. Deputados no início dos trabalhos e foi desse modo que se formou uma maioria relativa. Lamento, mas terá de ser assim.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não há consenso nenhum sobre isso!

O Sr. Presidente: - Tem, portanto, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Nogueira, o que se esperava da sua intervenção era que assumisse, plenamente, a coerência ou a falta de coerência da posição do PSD relativamente ao modo como, nesta legislatura, encarou a nova maioria e o actual Governo.

Vozes do PSD: - Qual maioria?!

O Orador: - Que explicasse como pode compatibilizar as suas tomadas de posição com aquelas outras, também tomadas pelo Grupo Parlamentar do PSD no momento da investidura do Governo, para que, ao falar de credibilidade e de autoridade de Estado, o Sr. Deputado Fernando Nogueira não saísse deste debate suspeito de menos credibilidade política e de eventual falta de suficiente autoridade.
O senhor veio' acusar este Governo de prática clientelar relativamente aos processos de nomeação na Administração Pública...

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - ..., mas custa compreender que essas palavras saiam justamente da boca do líder parlamentar que assumia, com plena convicção, que eram pelo menos 5000 os lugares na Administração Pública que qualquer Governo teria o direito; de nomear por confiança.

Aplausos do PS.

Diga-nos, Sr. Deputado Fernando Nogueira, tendo em conta as nomeações feitas até hoje pelo Governo, quantas faltam ainda para 1atingirmos os 5000 da sua bitola, de acordo com o critério da confiança?

Vozes do PS: - Muitas!

Protestos do PSD.

O Orador: - Por outro lado, falar de autoridade de Estado justamente quem parece indignar-se por haver neste Governo um ministro que aceita, de formo tranquila, a isenção de um inquérito sobre o modo de actuação das forças de segurança, conduzido pela entidade independente que é o Provedor de Justiça, e que aguarda, também tranquilamente, o resultado desse inquérito, admitindo retirar dele as naturais consequências... Como o Sr. Deputado não pode compreender isto! É que foi precisamente o senhor que, enquanto Ministro da Defesa, em determinado momento, mandou ou foi cúmplice da sua bancada no sentido de fechar à pressa um inquérito parlamentar em que se recusou a depor.

Aplausos do PS

Veja a clara noção do sentido de responsabilidade de Estado e a diferente noção de respeito pelo funcionamento das instituições democráticas!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente, Sr. Deputado Fernando Nogueira, a questão essencial da coerência tem aqui pleno sentido: vem o senhor dizer-nos que este Governo é minoritário e que age como se fosse maioritário, quando, na discussão do Programa dó Governo, o então representante da sua bancada, vice-presidente do seu partido, Deputado Mota Amaral, sublinhou que o PS "(...) não alcançou a maioria absoluta (...), mas ficou perto disso e a vitória foi inequívoca. O PS tem, pois, a legitimidade e a obrigação de governar Portugal, respeitando o mandato que lhe foi soberanamente confiado pelo eleitorado.".

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

E disse mais: que se o Governo, na prática, não correspondesse ao seu programa ou viesse a abandonar ostensivamente a generalidade das promessas feitas pelo PS, o PSD seria obrigado a avançar com uma moção de rejeição, o que não fez. Esta é a questão fundamental, Sr. Deputado Fernando Nogueira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Vou tentar terminar, Sr. Presidente.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Não pode tentar, Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Orador: - A coerência da vossa posição é a seguinte: viabilizaram o Programa do Governo porque entenderam que estava de acordo com as promessas eleitorais do PS e agora querem inviabilizar o Orçamento do Estado, o que inviabiliza a concretização do Programa.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - São dois pesos e duas medidas e um sinal radical de incoerência política que, naturalmente, não dignifica a atitude política do Sr. Deputado Fernando Nogueira.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Nogueira.

O Sr. Fernando Nogueira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, se a sua argumentação fosse levada ao absurdo, depois. da "passagem" do Programa do Governo por esta Câmara, o melhor era encerrarmos e irmos todos para férias, pois já não estamos cá a fazer coisa nenhuma.

Vozes do PSD: - Exactamente!

Protestos do PS.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Em matéria de presenças, V. Ex.ª tem sido dos menos assíduos!

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Protestos do PSD.

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, devo lembrar que este Governo já tomou medidas suficientes de forma a que se o seu Programa fosse hoje discutido a nossa posição fosse, porventura, diferente.

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - E, como sabe, Sr. Deputado, mas se não sabe fica agora a saber, em relação ao Programa do Governo não é exigível qualquer votação.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Como?

O Orador: - Para o Programa do Governo não é exigida nenhuma votação. Já o Orçamento do Estado tem de ser aprovado com os votos dos Deputados que constituírem a maioria desta Câmara.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não basta a votação da sua bancada se as outras se opuserem, pelo que os senhores deveriam ter um comportamento de maior humildade democrática e reconhecer a natureza minoritária deste Governo.
Os senhores, de tanto falarem em nova maioria, até acreditaram que tinham uma maioria, mas não têm, são uma minoria neste Parlamento!

Aplausos do PSD.

O Sr. António Braga (PS): - Somos uma maioria relativa!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, aquilo que disse e assumo publicamente é que, no meu cálculo, cargos de nomeação, por parte do Governo, no Estado e na Administração - entre empresas públicas, directores-gerais, subdirectores-gerais, directores de serviços, chefes de divisão - devem ser cerca de 5000. Mas eu não disse que se tratava, em todos os casos, de cargos da confiança do Governo! E a prova...

Risos do PS.

Não se riam, Srs. Deputados!
A prova do que digo é que na bancada do Governo estão sentadas pessoas que foram nomeadas para alguns desses 5000 cargos pelo Governo do PSD!

Aplausos do PSD.

Vozes do PSD: - Estão ali!

O Orador: - Quanto à ressurreição do passado que o Sr. Deputado pretende fazer, em relação ao inquérito que diz ter sido acabado à pressa, devo dizer-lhe que não tive qualquer responsabilidade no seu termo. Diz V. Ex.ª que acabou à pressa! Mas há outros que VV. Ex.as nem sequer deixam começar!

Aplausos do PSD.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas pretendo usar da palavra.

Q Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Para o exercício do direito regimental de defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, trata-se de um direito que todas as bancadas têm exercido e que a Mesa não pode deixar de respeitar.
Tem a palavra, Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Nogueira, é necessário que nos entendamos, porque quem veio aqui fazer exigências de verdade foi o senhor, há pouco, na sua intervenção. E a primeira coisa relativamente à qual é necessário que nos entendamos é que não faz sentido continuar a sugerir que há um critério unilateral de nomeações por parte deste Governo, sobretudo quando o senhor invoca que, no passado, o seu Governo manteve confiança em pessoas que não eram do seu partido. Aliás, por isso mesmo, não pode ignorar que, por exemplo, uma destacada personalidade do seu partido, o Dr. João Salgueiro, já foi nomeada por este Governo.

Aplausos do PS

Protestos do PSD.

Portanto, Sr. Deputado Fernando Nogueira, não é por aí que vamos ao essencial da questão. É que foi o seu partido, conforme lhe demonstrei, a assumir que o resultado de 1 de Outubro equivalia a uma inequívoca vitória do PS. Mas assumiu mais: que, em consequência disso, o PS tinha o direito de governar o País e que a posição do PSD seria a de garantir que o PS cumprisse as suas próprias promessas eleitorais. E referiram duas coisas, Sr. Deputado: se o PS as não contemplasse no Programa do Governo, teriam apresentado uma moção de rejeição - não a apresentaram, porque consideraram que essas promessas constavam do Programa do Governo -, se, porventura, no decurso da legislatura, o Programa do Governo não viesse a ser cumprido, então, apresentariam também, nessa ocasião, uma moção de rejeição.
Pois bem, Sr. Deputado, o que o Governo está a propor é um Orçamento do Estado para concretizar as promessas que os senhores consideraram que constavam do Programa do Governo. Sejam, então, corajosos até ao fim, assumam a vossa contradição e apresentem hoje a moção de censura ao Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Lá chegará o dia!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Nogueira.

O Sr. Fernando Nogueira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, considero que V. Ex.ª foi deselegante ao invocar o nome do Dr.. João Salgueiro porque ele é uma pessoa que não merece ser usada como uma flor na lapela, como V. Ex.ª fez.

Vozes do PSD: - Muito bem! Foi deselegante!

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas não é uma personalidade do seu partido?!

O Orador: - Sr. Deputado, veja os comunicados e as declarações públicas de responsáveis do seu partido, nomeadamente de membros e presidentes de direcções regionais, que têm reivindicado o saneamento público e a ocupação dos lugares por pessoas do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Seja coerente consigo próprio, Sr. Deputado!

O Orador: - O Sr. Deputado Jorge Lacão ainda não recuperou o sangue-frio, depois do desaire que teve na sexta-feira passada.

Aplausos do PSD.

Por outro lado, com certeza porque quer mostrar serviço e está excessivamente nervoso, não ouviu o que eu disse da tribuna, ou seja que, as promessas eleitorais do Partido Socialista, apesar dos esforços de cosmética realizados, estão muito longe de estar contempladas neste Orçamento do Estado, na sua plenitude, a começar pelo fiasco, pelo flop que é o tratamento dado à educação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Então, é agora a moção de censura?!...

O Orador: - Mas, mais importante do que tudo, é que não é V. Ex.ª que define o ritmo ou a iniciativa política do meu grupo parlamentar.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Nem sei se é V. Ex.ª!

O Orador: - Mas o pior de tudo, Sr. Deputado Jorge Lacão - disse-o eu próprio aos portugueses, durante a campanha eleitoral -, é que não podia fazer as promessas que o Partido Socialista estava a fazer, porque, para mim, a primeira de todas as prioridades era o desemprego. Com este Orçamento do Estado, o que os senhores estão a fazer é, seguramente, a agravar o desemprego em Portugal para níveis insuportáveis.

Vozes do PS: - Prove!

O Orador: -.Por isso, somos contra o Orçamento do Estado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Para, que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Macário Correia. (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, mas peço-lhe que seja, mesmo uma interpelação à Mesa.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, tendo em conta o teor daquilo que está em debate e porque há escassos instantes tive uma informação que me parece ser importante para conhecimento de todos, em particular do Governo e do Partido Socialista, quero transmiti-la à Mesa. Há instantes, disseram-me que um nomeado para um cargo da Administração Pública, equiparado a chefe de divisão, num certo serviço do Alto-Minho, quando tomou posse, o que procurou saber, em primeiro lugar, foi se tinha direito a carro, gasolina e telemóvel e quando lhe disseram que não ficou bastante admirado.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mantenham a calma necessária e façam o silêncio indispensável.
Sr. Deputado Macário Correia, á figura regimental da interpelação à Mesa, que temos de respeitar cada vez mais, não serve para dar informações à Mesa. Peço desculpa, mas, da próxima vez, terei de o interromper.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Para que se registe, a principal controvérsia entre o partido do Governo e o maior partido da oposição reside num problema de cargos - ocuparam o tempo a discutir os cargos. Mas há uma diferença, Srs. Deputados do Partido Socialista: ambos comem à mesa do Orçamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: -..., só que o PS fala de apetite e o PSD da digestão.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Deputado Fernando Nogueira, sabe a consideração que tenho por si, pelo que estas palavras, quando são sinceras, contam alguma coisa. Mas devo dizer-lhe que era a última pessoa que eu esperava que viesse aqui, em nome do PSD, abrir o debate do Orçamento.
E se ninguém lhe faz a pergunta, Sr. Deputado, eu faço-lha: sendo o Sr. Deputado contra o Orçamento, propondo o voto contra, pergunto-lhe se apresenta uma solução governativa, se desiste de se ir embora do partido, se está disposto a continuar a liderar esse partido e a arranjar uma solução para o País...

Aplausos do CDS-PP.

O Orador: - ...e a oferecer-se ao País como candidato a Primeiro-Ministro.

Vozes do CDS-PP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr., Deputado disser que sim, retiro tudo quanto disse. Mas se o Sr. Deputado não puder responder positivamente a estas questões, lamento profundamente que tenha feito o discurso que fez.
O Sr. Deputado Fernando Nogueira e o PSD fizeram aqui um discurso contra o Orçamento e só nessa medida, por serem contra, nos podemos encontrar, porque em tudo o resto somos diferentes.
Os senhores votam contra aqueles que alegadamente fizeram, fazem ou se propõem fazer o mesmo que os senhores fizeram! Os senhores. votam contra, apesar de figuras ilustres do PSD, com responsabilidades na área das finan-

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ças, dizerem que estes orçamentos são semelhantes aos apresentados pelo PSD!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores votam contra sem nenhuma noção da responsabilidade! Os senhores votam contra sem nunca terem dito, ali daquela tribuna, o que é que queriam de diferente!
O Sr. Deputado Fernando Nogueira foi eleito presidente do PSD com uma moção que não era sua. Pior do que isso, Sr. Deputado, é deixar ao seu sucessor uma decisão sobre a qual ele não se pronunciou, pois pior do que deixar uma moção é deixar uma decisão irresponsável.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, há uma diferença entre o PSD e o Partido Popular, apesar de ambos serem contra o Orçamento: é que o PSD disse que votava contra sem ainda ter lido o texto do Orçamento!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - O PSD diz que é contra, mas aquilo de que fala é de nomeações e saneamentos! O PSD diz que é contra, mas por cada defeito encontramos um fantasma do mesmo PSD!
O Sr. Deputado falou na injustiça fiscal, mas por detrás da injustiça fiscal actual e da inoperância da administração fiscal está a mão do PSD!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado falou do imposto automóvel, mas por detrás da injustiça do imposto automóvel e do seu crescimento está a mão do PSD! O Sr. Deputado falou do imposto de selo, mas por detrás do imposto de selo, das operações de crédito ao consumo, está a mão do PSD!

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

Protestos do PSD.

O Orador: - O Sr. Deputado falou nas retenções na fonte dos rendimentos da categoria B, mas por detrás das limitações da despesa dos rendimentos das categorias B e F, está a mão do PSD!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar.
O que faltou dizer é se o Sr. Deputado Fernando Nogueira também garante que os Deputados da Madeira e dos Açores vão votar contra este Orçamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E era bom, que essa garantia viesse anexa à declaração que o senhor ali proferiu.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ah, grande Jorge Lacão!

Risos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Nogueira.

O Sr. Fernando Nogueira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Lobo Xavier, eu estava a ouvi-lo e perguntava-me a mim próprio como é que uma pessoa inteligente como o senhor pode ter produzido as afirmações que produziu, defendendo a posição do Governo com muito mais entusiasmo, alento e alegria do que a própria bancada do Partido Socialista.

Vozes do PSD: -- É verdade!

Risos do PS.

O Orador: - Eu não sei por que é que V. Ex.ª está tão preocupado com o que o PSD vai fazer ou deixar de fazer e julgo mesmo que não teria o direito de fazer as incursões que fez sobre a vida interna do meu partido.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Garanto-lhe que não vou falar sobre o seu, nem sobre a forma como ele é dirigido, sobre quem manda ou deixa de mandar no seu partido, porque acho que estamos aqui no Parlamento para discutir, em nome dos portugueses que nos elegeram, os problemas do Pais. E um dos problemas, Sr. Deputado António Lobo Xavier, independentemente dos erros cometidos no passado, é que este Orçamento aumenta mais as despesas do que o investimento. É um erro para o País!

Vozes do PSD: .- Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Este Orçamento vai originar mais desemprego, com o que não pactuo! Este Orçamento vai asfixiar ainda mais a classe média, com o que não concordo! E é por isso, porque defendo que se deve promover uma política de emprego, que se deve apostar no investimento, que se deve aliviar a classe média, que, em nome do meu partido, vou votar contra este Orçamento!

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apreciação do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano, na Assembleia da República, corresponde a um importante momento de avaliação da capacidade de este Governo levar a cabo as tarefas de que se incumbiu por mandato popular, expressas no seu programa, debatido há alguns meses nesta Assembleia.
E refilamos o que se passa, com a evolução de algumas grandezas essenciais, no domínio económico-financeiro: o peso do défice orçamental no PIB desce; a inflação desce; o PIB sobe; o investimento público sobe; os salários reais sobem.
Parafraseando uma personalidade célebre, "tudo o que devia descer desce, tudo o que devia subir sobe".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Comecemos por referir a questão do

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investimento, base essencial para um progresso sustentado da actividade económica. O investimento público previsto ultrapassa os 800 milhões de contos, o que constitui um fortíssimo acréscimo e prevêem-se. condições de concretização sérias e flexíveis que permitam uma taxa de execução muito elevada.
À agregação eleitoralista de projectos sem verificáveis condições de arranque sucedeu uma criteriosa selectividade na preparação deste Orçamento.
Compreendemos que ainda há muitos compromissos anteriores a satisfazer, obras em curso, contratos assinados, que estabeleceram uma forte restrição quanto à inserção de novos projectos, que, apesar de tudo, se foram integrando paulatinamente abaixo das nossas esperanças e acima das expectativas dos nossos adversários.
Quanto à componente comunitária desse financiamento, estamos certos de que se procurarão garantir melhores condições de combate ao desperdício, ao descaminho e à má utilização de fundos, rompendo com práticas características da governação que cessou.
Sr. Presidente, prevemos que seja aprofundada, mais adiante, neste debate, a questão das opções de investimento, onde se preferem as obras prioritárias às inaugurações de fachada, onde se articulam as opções do desenvolvimento económico com as do ordenamento do território e as de execução das infra-estruturas. Há aqui uma concepção de desenvolvimento global, desconhecida do anterior Executivo, que multiplicou as promessas irrealizáveis no curto prazo e gastou dinheiro sem sentido e até sem cobertura legal.
Um aspecto fundamental num quadro de funcionamento democrático da economia é o do envolvimento empenhado dos trabalhadores na própria actividade empresarial e da Administração Pública. Nesse. sentido, a evolução positiva dos seus rendimentos reais é importante, não só para diminuir a conflitualidade social como para que eles não se sintam estranhos numa terra sua. Sem o empenhamento dos trabalhadores e dos empresários não há progresso social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, nesse sentido, no que se refere aos rendimentos reais dos trabalhadores portugueses, os acordos oportunamente celebrados garantem que, quer para a função pública quer para a generalidade dos sectores económicos, haverá um acréscimo de rendimento superior ao da inflação, o que constitui um encorajamento para uma maior produtividade, uma compensação moderada mas socialmente justa do esforço dos trabalhadores e até um pequeno estímulo à procura interna.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sublinharia, na área das despesas da Administração, alguns aspectos significativos.
Para se poder garantir consistentemente uma redução nas despesas correntes, não ligadas ao custo dos recursos humanos nem às transferências para outros sectores da Administração, nomeadamente a local e regional, haverá muito provavelmente que reformular o sistema, a orgânica e o mecanismo das compras do Estado, assim como manter uma séria disciplina nos mecanismos de descontrolo que muitas vezes ocorrem em serviços que, pelo medo de perderem receitas futuras, se apressam a efectuar gastos que, podendo ter alguma justificação, não constituirão uma absoluta prioridade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O próprio avanço na melhoria do funcionamento da Administração Pública, a sua despartidarização e ganho de isenção, a maior motivação dos trabalhadores, com regras mais claras e uma perspectiva progressiva de melhor satisfação das suas aspirações, poderão contribuir para melhorar todo o serviço prestado pela máquina do Estado, cuja qualidade e eficiência são indispensáveis numa economia moderna.
Há também que tentar reduzir sistematicamente os factores de bloqueio do bom funcionamento da Administração Pública, no âmbito de uma prática integrada na estratégia política deste Governo democraticamente constituído.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto à questão do défice orçamental, importa sublinhar que o caminho no sentido da sua redução é virtuoso e confiamos que aprovado este Orçamento na generalidade, não vindo a ser desnaturado na especialidade, o Governo tenha todas as condições, porque terá certamente toda a capacidade, para o fazer cumprir. Qualquer atraso nas receitas fiscais traria certamente problemas sérios ao aparelho administrativo e económico do Estado; qualquer derrapagem significativa no investimento teria consequências nefastas em termos de emprego e de desenvolvimento económico. Mas para o conseguir cumprir haverá muito a fazer no âmbito da própria Administração Pública, no âmbito do planeamento, gestão e controle da "coisa" pública.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para satisfazer uma orientação essencial, apresentada oportunamente aos portugueses, este Governo manifestou, desde cedo, sérias preocupações na área social. E o que é certo é que se começam a concretizar.
A primeira que queremos referir, não pelo seu valor orçamental mas pelo seu significado socialmente emblemático, é o da aplicação do rendimento mínimo garantido. E compreende-se que essa aplicação seja gradual e faseada, passando pela verificação concreta das suas condições de execução no terreno social. A sua extensão demasiado rápida poderia acarretar o risco de distorções na sua aplicação. A não satisfação da medida seria uma infracção grave aos compromissos eleitorais. Daí, nos congratularmos com o equilíbrio proposto.
Indício particularmente revelador da consciência social que este Orçamento contém é também o desagravamento fiscal ao nível da tributação das pensões de reforma e de velhice em sede de IRS. Tal contrasta significativamente com a política de agravamento anteriormente seguida pelo Governo do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Num caso e noutro, há que apoiar os excluídos e os mais carenciados, há que combater a exclusão social e dar novas oportunidades a todos os que delas precisam!
A coesão de um Estado, de uma nação, também se mede pelas medidas que se aplicam para apoiar os mais desfavorecidos. Não peçamos mais coesão social na Europa, negando-a aos portugueses mais desfavorecidos.
Não deveria ser esta uma preocupação apenas dos socialistas, mas de todos os portugueses.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Outra área socialmente importante é a da educação. O investimento nesta área é decisivo. Mas também aqui é preciso ser claro.

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O investimento na educação poderia ter sido pensado numa óptica do betão e do tijolo, na perspectiva de continuar a construir escolas mesmo onde não haja alunos, para um qualquer neo-fontista, autarca ou governante, inaugurar. Não! O essencial, nesta fase, para além da execução do que interessa realizar entre o já previsto e o projectado, é investir nas pessoas, dar novas condições de trabalho a professores, investigadores, estudantes e funcionários. Assim se faz, quer para o ensino superior quer para o básico e secundário.

Aplausos do PS.

A educação tem de se desenvolver com os estudantes e os professores, não contra eles! Não somos dos que gritamos "abaixo a inteligência"; somos dos que a respeitamos e queremos ver desenvolvida a capacidade crítica e cultural, bem como a formação em todos os domínios da nossa juventude. Para isso, queremos estar também com os professores e não contra os professores!
Sr. Presidente, este Governo que apoiamos tem uma concepção democrática e descentralizadora do exercício do poder político. O aumento das transferências para as autarquias, previsto neste Orçamento, insere-se nessa linha política democrática e descentralizadora, inserindo-se como um passo significativo no cumprimento de mais um compromisso eleitoral.
Também todas as autarquias esperam por este Orçamento!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O financiamento do desenvolvimento económico, o cumprimento das funções sociais do Estado precisa obviamente de receitas. Torna-se imprescindível, em nosso entender, uma mexida de fundo no sistema fiscal e alterações drásticas no funcionamento da máquina das contribuições e impostos.
importante, Srs. Deputados, evidenciar o que já os elementos mais responsáveis das oposições vêm genericamente reconhecendo. Não há aumento da carga fiscal, cumpriu-se mais um dos compromissos eleitorais do Partido Socialista. Lidamos com gente séria, os portugueses podem confiar neste Governo!

Aplausos do PS.

Registam-se, entretanto e desde já, alguns sinais positivos em sede de IRS e IVA.
Quanto às modificações estruturais no sistema fiscal, parece-me adequado esperar-se pelos resultados dos trabalhos da Comissão da Reforma Fiscal e ter-se em conta o diálogo em sede de concertação social. É preciso aqui, no entanto, sermos claros.
"É do conhecimento de todos os portugueses que a fuga aos impostos no nosso país tem vindo a atingir níveis preocupantes e insuportáveis para qualquer sociedade civilizada". Citei o Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, em conferência de imprensa, realizada na passada quinta-feira.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem citado, aliás!

O Orador: - O alargamento da utilização dos métodos indiciários e a melhoria da eficácia da máquina fiscal são indispensáveis para a garantia, não só das receitas do Estado mas como instrumento eficaz de uma concorrência equilibrada entre empresas dos mesmos sectores e profissionais do mesmo ofício.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais tem desenvolvido um esforço meritório para esclarecer este assunto, quer em sede parlamentar quer em artigos publicados no Diário de Notícias. Há um debate importante a fazer e garantias a dar quanto à sua aplicação. A própria Comissão parlamentar de Economia, Finanças e Plano, na passada quinta-feira, aprovou a inclusão de uma referência no relatório sobre o Orçamento do Estado, considerando "de particular relevância o aprofundamento da discussão sobre a utilização dos métodos indiciários na tributação do rendimento".

O Sr. João Carias da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas eu diria que, obviamente, neste aprofundamento merecerá especial atenção a questão do respeita pelos direitos e garantias dos contribuintes.
Contaremos, certamente, para atingir os objectivos na área fiscal, com a melhoria da máquina de Estado neste domínio, com uma maior eficácia nos métodos utilizados e com o empenhamento profissional dos trabalhadores das Contribuições e Impostos, com a cooperação dos empresários e profissionais que temem as distorções concorrenciais que ineficiências neste domínio possibilitam. Uma boa economia é também uma economia saneada nesta área!

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falemos claro sobre a economia real. Os Governos do PSD, durante 10 anos, não souberam, não conseguiram ou não quiseram aproveitar as especiais condições criadas pelo afluxo de fundos comunitários para procederem à reestruturação decisiva da economia nacional que se impunha.
Actualmente, a política enunciada pelo Governo prevê "um crescimento sustentado não inflacionista". E esta é a chave da questão, aqui estará a chave do sucesso. Numa posição diametralmente oposta à da estagnação, que foi o espectro e a perspectiva assustadora de tempos idos, opta-se por um crescimento económico sustentado num forte investimento, pela gradual compressão das despesas não reprodutivas e por uma evolução no sentido de uma melhor repartição da carga fiscal, controlando simultaneamente a inflação.
Este Orçamento do Estado compatibiliza estes objectivos, no quadro das políticas e das medidas que preconiza e propõe. Demos-lhe, pois, o nosso apoio. O País exige-o, os agentes económicos esperam-no, os trabalhadores precisam dele, as autarquias aguardam-no ansiosamente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr: Presidente, há ainda questões importantes a analisar, nesta conjuntura, como as que dizem respeito às privatizações e à própria evolução do sistema financeiro. Embora mais adiante, sobre as privatizações e o sistema financeiro, esteja prevista outra intervenção da nossa bancada, adiantamos desde já que a evolução de uma economia moderna e a própria concepção da função de regulação económica do Estado, para o socialismo de hoje, implica uma forte participação do sector privado na gestão da economia, devendo o Governo, em nome do interesse da res publica, com o Parlamento, estabelecer as regras de funcionamento e intervir das formas necessárias, sem, para isso, estatizar a economia. Também aqui nós evoluímos, confrontando os princípios e os paradigmas

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teóricos com a experiência da vida e das sociedades, estabelecendo novas, teorizações e aplicando novas práticas, as mais harmonizadas e consentâneas com o interesse das populações e o desenvolvimento económico e social.
Sr. Presidente; Srs. Deputados, o sóbrio equilíbrio de actuação deste Governo tem sido também um factor importante na confirmação de expectativas desinflacionistas. A não aprovação atempada deste Orçamento poderia ter consequências económicas a curto prazo muito negativas para os trabalhadores e para os empresários portugueses, para os investidores nacionais, europeus e de outras áreas do mundo, para as autarquias locais, para os socialmente excluídos, para os professores e para os estudantes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No quadro da apresentação e debate deste Orçamento e das Grandes Opções do Plano que lhe estão associadas, gostaria de, em nome do Grupo Parlamentar do PS, manifestar publicamente a nossa disponibilidade para dialogar com outros grupos parlamentares, em clara sintonia com um Governo que beneficia do nosso apoio firme, não só pela identificação política que temos como pela credibilidade global que lhe concedemos.
Sr. Presidente, o País precisa deste Orçamento. Votemo-lo de acordo com a nossa consciência e os interesses da população portuguesa. Não basta ter o nome de Portugal sempre na boca, é preciso saber satisfazer as oportunas e inadiáveis aspirações do povo português.

Vozes do PS - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, votemos este Orçamento. Respeitemos o seu equilíbrio. Esclareçamo-nos quanto ao sentido das opções em causa. Nas circunstâncias presentes, com as restrições existentes, este é um excelente Orçamento. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votá-lo-à favoravelmente, na generalidade, tal como votará as Grandes Opções do Plano. Corresponderá, assim, a um imperativo de desenvolvimento da economia nacional.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Hasse Ferreira, entre muitas divergências que existem na leitura que as bancadas do PS e do PSD fazem deste Orçamento, há uma, profunda, que tem a ver com o facto de VV. Ex.as dizerem que este é um Orçamento de convergência quando nós dizemos que se arrisca a ser um Orçamento de divergência. E se já aqui fiz referência à dificuldade que existirá em cumprir uma redução do défice no próximo ano, de mais de 160 milhões de contos, há um outro critério de convergência para o qual não há dúvida nenhuma, que é a dívida pública. O critério diz que ou a dívida pública atinge 60% do produto, ou dá inequívocos sinais de descida. Acontece, Sr. Deputado, que a dívida pública que vai emanar deste Orçamento do Estado está em 71 %, não dá inequívocos sinais de descida e poderá mesmo agravar-se. Por isso, nós dizemos que este Orçamento põe em perigo a convergência, põe em perigo Portugal na moeda única logo no primeiro pelotão.
A minha pergunta é esta, Sr. Deputado: por via deste critério, este Orçamento do Estado põe ou - não em perigo a moeda única? Se não, como é que vai explicar em Bruxelas que cumpre o critério da dívida pública?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, relativamente à questão da execução orçamental, V. Ex.ª dá-nos um pouco de razão por termos de mexer um bocado na máquina da Administração Pública e nos respectivos critérios de funcionamento, no próprio sistema fiscal, para conseguirmos que o Orçamento seja executado. VV. Ex.as, quando não o executaram, foi porque não foram capazes de fazer investimento - também, nunca tinham tencionado fazer, apenas atiraram para ali uns papéis, para a Dr.ª Isabel Mota e outros membros do governo andarem a anunciar pelo País! Neste caso estou, pois, .relativamente tranquilo porque vai conseguir-se equilíbrio nas receitas fiscais com a questão do controle e a boa execução dos investimentos.
Quanto à questão da dívida, fico quase siderado ao ouvi-lo, mas dada a consideração política e pessoal e até profissional que tenho por V. Ex.ª, queria dizer o seguinte: como sabe, há uma redução muito ligeira da dívida que corresponde, na prática, a uma estagnação; mas também sabe o que se passa na generalidade dos países europeus e sabe igualmente o que já foi dito, redito e tredito, isto é, tendo em conta os acordos que Portugal celebra no plano europeu, não é com base nesses critérios que foi elaborado este Orçamento. Acontece que começa a haver uma inversão da tendência e as condições que VV. Ex.as deixaram, em termos do funcionamento da economia nacional, não permitiram ir efectivamente mais longe. Conseguir-se este ano uma ligeiríssima redução, que corresponde a uma estagnação da dívida, dará certamente condições para isto poder evoluir.
Quanto à forma como este Governo irá negociar, certamente que o fará de uma maneira bastante melhor, mais sofisticada, mais elaborada, tendo melhor em conta os interesses nacionais, do que VV. Ex.as negociaram os critérios de redução do défice.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Queria começar por informar VV. Ex.as que o voto que o Partido Popular terá nesta Câmara, a propósito do Orçamento do Estado, será respeitado e cumprido por todos os Deputados da nossa bancada. É que, ao contrário de outros partidos, que podem enunciar determinados sentidos de voto, nós não recorreremos, em circunstância alguma, a subterfúgios e pouca clareza política, seja por falta de presenças na Sala, seja por desrespeito perante as orientações da maioria do próprio partido.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Esta questão é para nós substanci-

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al e muito importante. Não faz sentido que se diga qual o sentido de voto quando as próprias bancadas vão recorrer a subterfúgios nada clarificadores e muito pouco dignificadores da vida pública e da vida política no nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o CDS-Partido Popular sempre preconizou uma política orçamental que integrasse quatro grandes objectivos: mais justiça e maior equilíbrio na afectação dos recursos, promoção do crescimento económico e do emprego, contenção efectiva e moralizadora das despesas públicas e uma redução verdadeira da carga fiscal sobre os cidadãos e as empresas. Para o CDS-Partido Popular, o crescimento sustentado da economia só será conseguido se os recursos actualmente disponíveis forem utilizados de forma mais eficiente e se o investimento privado retomar o dinamismo há muito perdido. Se os objectivos do crescimento e do emprego devem estar sempre presentes na elaboração de um orçamento de Estado, actualmente eles são objectivos prioritários e evidentes. A promoção do emprego, que se deseja privado e não público, requer, na situação actual, e entre outras medidas, uma contenção dos gastos públicos, já que cada escudo a mais gasto pelo sector público é um escudo a menos disponível para despender no sector privado. Ao mesmo tempo, terão de ser utilizados, de forma cuidada, diversos incentivos fiscais, que permitirão colmatar a influência perniciosa que a utilização no passado de políticas orçamentais e cambiais irrealistas ainda está a transmitir à economia portuguesa.
A utilização mais eficiente e equilibrada dos recursos leva, naturalmente, o CDS-Partido Popular a defender que no Orçamento do Estado para 1996 se faça uma contenção efectiva das despesas públicas. Não se trata, aqui, de reduzir transferências públicas relacionadas com a prestação de serviços de índole social. Trata-se, isso sim, de propor a criação de regras diversas e simples, cuja utilidade seja clara para todos os contribuintes. Encaramos com especial cuidado, por exemplo, as regras que se relacionam com a promoção da eficiência dos gastos públicos. Deve-se dedicar especial atenção aos gastos relacionados com obras públicas; urge proibir gastos sumptuários e desnecessários, como os que são praticados na Expo 98; urge impedir, determinantemente, a realização de investimentos de índole exibicionista e cuja utilidade social será mais do que questionável; tem de se abolir a prática de, indiscriminada e secretamente, distribuir subsídios e dotações de capital a empresas públicas; torna-se imprescindível reduzir a dimensão e aumentar a eficiência do aparelho administrativo e burocrático.
Os portugueses não conhecem, desde há muito, o que é um desagravamento fiscal. Para o CDS-Partido Popular não são os portugueses que se devem ajustar às necessidades de financiamento das despesas do Estado, mas sim o Estado que tem de reduzir a sua dimensão e ajustar-se, de modo a permitir um aumento do rendimento disponível. O CDS-Partido Popular considera que no Orçamento do Estado para 1996 se deve contemplar um efectivo desagravamento fiscal já que, para nós, os impostos pagos pelos portugueses já ultrapassam, e em muito, os limites do que seria razoável. Em termos de fiscalidade, deve-se prestar especial atenção às despesas de investimento dos particulares, com relevância, para as despesas relacionadas com a educação, com a saúde e com a habitação, que são as três grandes áreas de investimento dos particulares, cabendo ao Estado um papel importante mas apenas no seu fomento.
Também uma atenção especial tem de ser dada à situação das empresas. Para o CDS-Partido Popular, o Orçamento do Estado para 1996 não poderá contemplar, sob o argumento de maior justiça fiscal, medidas como a relativa aos métodos indiciários, que mais não são do que resultados dá existência de uma administração fiscal que se encontra desenquadrada da realidade empresarial nacional.
Mas para o CDS-Partido Popular a questão da justiça social não pode ser ignorada no Orçamento do Estado para 1996. Como temos dito, o Orçamento do Estado, por ser o guião da aplicação dos dinheiros públicos, tem de ser obrigatoriamente um instrumento de redistribuição de recursos, promovendo, assim, a justiça social. Para nós, o Orçamento do Estado para 1996 deverá traduzir novas opções relativas à saúde, à educação e à segurança social, permitindo a criação de situações mais justas e mais equitativas.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Fica assim claro para todos os portugueses que á proposta de Orçamento do Estado para 1996 apresentada a esta Câmara pelo Governo do Partido Socialista não corresponde às linhas essenciais da política económica preconizada pelo Partido Popular. As despesas públicas continuarão a subir e a constituir um fardo cada vez mais insuportável para a economia portuguesa, uma vez que representarão 49,6% do Produto Interno Bruto. As receitas públicas, designadamente as provenientes dos impostos pagos pelos portugueses, continuarão a subir para permitir pagar aquele aumento irrealista e de todo desfasado das despesas no nosso país.
No dia 1 de Outubro de 1995, os portugueses decidiram conferir ao Partido Socialista a responsabilidade de governar Portugal nos próximos quatro anos. Mas aquilo que os portugueses também decidiram foi não voltar, como aqui já foi referido, a dar a maioria absoluta de Deputados a um só partido, preferindo antes que o partido mais votada soubesse ouvir e aceitar as propostas alternativas que seriamente lhe fossem apresentadas.
Já ficou claro que este não é o Orçamento que o Partido Popular, quando for governo, apresentará aos portugueses. Já ficou claro que o Partido Popular está preocupado com os trabalhadores e com as empresas privadas e que a esquerda continua empenhada em defender um Estado cada vez maior, mais opressor e mais despesista. Fica, pois, claro que este Orçamento, tal como está, não receberá, em circunstância alguma, a apreciação positiva do meu partido. Fica, pois, claro que o Orçamento apresentado pelo Governo não receberá a viabilização do Partido Popular nesta Assembleia. Como ontem tive oportunidade de dizer na sessão de encerramento do XIV Congresso do meu partido, e hoje repito, se o Orçamento ficar como está o meu partido votará inabalavelmente contra.

Aplausos do CDS-PP.

Mas o nosso voto contra será um voto diferente daqueles que, não tendo sabido ser poder, também não sabem ser oposição.

Aplausos do CDS-PP.

O nosso voto contra seria e será um voto completamente diferente daqueles que estão mais preocupados com o estômago dos amigos do que com as necessidades efectivas das famílias portuguesas. Para o Partido Popular o que está em causa não é saber se os documentos são lidos antes, durante ou depois das discussões; aquilo que o Partido Popular quer ser nesta Câmara e em todo o País é uma oposição de responsabilidade que vota de acordo com valores e não de acordo com oportunismos, não de acordo com desorientações.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados, não queremos eleições antecipadas, mas que fique aqui muito claro que também não as temeremos. Estamos preparados para uma nova batalha eleitoral e para o veredicto do povo português nas urnas. Depende do Governo e só do Governo termos ou não eleições legislativas mais cedo do que aquilo que estava previsto. Para o Partido Popular há preocupações sérias e há propostas justas. Não são preocupações individualizadas, nem propostas com destinatário pessoal. Para o Partido Popular o que está em causa não são saneamentos políticos de pessoas de família. Para o Partido Popular aquilo que está em causa é o emprego dos cidadãos e é o emprego e o crescimento da economia portuguesa.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As preocupações que expressamos são preocupações dos portugueses e as propostas que vamos apresentar são propostas que, na nossa opinião, beneficiarão de forma clara o povo de Portugal. Apresentarei de seguida, de forma responsável, porque é responsavelmente que fazemos oposição, o essencial das propostas que o Partido Popular considera imprescindíveis para a melhoria de vida dos cidadãos, para um aumento do investimento e para uma redução das despesas do Estado. Apresentarei o essencial das propostas que o Partido Popular considera imprescindíveis para que o nosso voto não seja o voto contra o Orçamento do Estado aqui apresentado.
Quanto às famílias e aos cidadãos, queremos, em primeiro lugar, consagrar fiscalmente um novo regime de dedução de despesas com a educação. Em termos práticos, queremos que as despesas com a educação sejam consideradas em função do número de filhos, o que permitirá proteger as famílias mais numerosas e incentivar o crescimento das mais pequenas.
Em segundo lugar, queremos que as famílias com mais filhos possam pagar menos de IRS. Não aceitamos que uma família com dois ou mais filhos seja tratada de igual modo como se apenas tivesse um dependente - tal situação é lesiva dos interesses das famílias e põe em causa o crescimento da natalidade, problema que afecta gravemente o nosso país.
Em terceiro lugar, queremos que as deduções à colecta sejam alargadas às famílias com ascendentes a seu cargo. Trata-se de uma questão essencial de justiça e de uma questão de solidariedade humana - muitas famílias abandonam os seus ascendentes por falta objectiva de condições ou de incentivos que o Estado tarda em conferir, muitas famílias colocam os seus pais idosos nos lares apenas porque não têm condições para os ter em casa. Os mais idosos do nosso país não podem ser tratados como lixo!

Aplausos do CDS-PP.

O povo de Portugal, o Estado e os partidos têm o dever de lhes dar condições para que possam viver no seio da suas famílias.
Em quarto lugar, queremos que as deduções relativas a contas poupança-habitação sejam claramente aumentadas, o que permitirá um incentivo à poupança.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em quinto lugar, queremos que as deduções relativas a contribuições para Planos de Poupança Reforma, sejam aumentadas. Tal medida permitirá incentivar o pilar privado da segurança social, que, como sabemos, carece de reformas urgentes e profundas.
Em sexto lugar, queremos a manutenção da isenção do imposto de selo sobre as operações de crédito ao consumo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Consideramos esta medida essencial para o relançamento da actividade económica já em 1996.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em sétimo lugar, queremos a alteração do tratamento fiscal de despesas com seguros de saúde, aproximando-as do tratamento dado às despesas de saúde. Tal medida incentivará o recurso dos cidadãos aos serviços privados de saúde, contribuindo, assim, para o início da reforma do sistema de financiamento da saúde em Portugal.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em oitavo lugar, queremos a clara reformulação do imposto de sisa com vista à sua eliminação, como queremos, em. nono lugar, a eliminação clara desse imposto cada vez mais injusto e que é o imposto de sucessões e doações.

Aplausos do CDS-PP.

Em décimo lugar, queremos a alteração do regime de IRS dos pescadores. E injusto que descontem mesmo quando não trabalham e que sejam tratados de forma diferenciada em relação ao regime já existente das profissões consideradas de desgaste rápido.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs: Deputados: Quanto às empresas, as propostas e condições do Partido Popular são também objectivas. e claras. .
Em primeiro lugar, não aceitamos a proposta avançada pelo Governo quanto aos chamados métodos indiciários. Se é verdade que há fuga aos impostos e que esta situação tem de ser revista, saibamos, afirmar que o problema passa pela fiscalização e não pela indiciação.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, não há justiça fiscal quando um cidadão é obrigado a pagar apenas porque um técnico tributário desconfia da declaração feita.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - As garantias dos contribuintes têm de existir. O cidadão não pode pagar primeiro e esperar - sabe-se lá quanto tempo! -, se tiver razão, pela reposição da verdade.

Aplausos do CDS-PP.

A manter-se esta medida serão. as pequenas e as médias empresas as prejudicadas e os grandes empórios económicos a terem total possibilidade de fugir às suas obrigações fiscais.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Se querem recuperar as dívidas, os atrasos ou as fugas comecemos, com coragem, por algumas instituições desportivas que não têm dinheiro para pagar ao Estado mas que têm milhares e milhares de contos para pagar transferências e para pagar a treinadores que acabam os seus contratos ou que são despedidos antes de tempo.

Aplausos do CDS-PP.

Tenhamos a coragem objectiva de dizer que não pode haver igualdade fiscal num país enquanto o desporto profissional for pago pelos contribuintes à custa da fuga aos impostos - há centenas de milhar de contos que são pagos a uma só pessoa, seja jogador ou treinador. É uma situação imoral, injusta e que o povo que trabalha e que é responsável não pode, em caso algum, aceitar. Sei bem que há falta de coragem política para falar deste assunto. Não compreendo qual é o medo da classe política em enfrentar os "tubarões", aqueles que estão à frente do desporto profissional. O Estado deve apoiar o desporto amador, mas se o desporto é profissional que se diga aos profissionais: "Paguem as vossas obrigações como qualquer cidadão, porque os senhores ganham num mês aquilo que qualquer cidadão normal não ganha numa vida de trabalho."

Aplausos do CDS-PP.

Em segundo lugar, queremos que ninguém seja obrigado, a pagar ao Estado quando é, ao mesmo tempo, credor do próprio Estado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Que moral tem o Estado, que é o primeiro a não cumprir os seu deveres para com os seus próprios fornecedores, para lhes exigir, e com juros, as dívidas que para com ele existam?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não é pessoa de bem, Sr. Primeiro-Ministro, quem o quer parecer. É pessoa de bem quem o sabe ser!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, queremos a alteração do regime do IVA relativo ao café, às conservas de carne, às conservas de frutos e aos produtos hortícolas. Esta medida permitirá a harmonização de medidas já tomadas no IVA quanto a certos produtos alimentares.
Em quarto lugar, queremos mais e maior subsídio ao gasóleo agrícola. Os agricultores não podem continuar a ser penalizados por preços mais caros, muito mais caros do que os dos seus concorrentes estrangeiros. Se há fraude na utilização do gasóleo agrícola puna-se essa fraude, mas não se prejudiquem os lavradores pela inexistência de autoridade ou de fiscalização mais rígida por parte do Estado português.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em quinto lugar, queremos a garantia de que o imposto sobre os produtos petrolíferos em relação ao fuel não seja aumentado. Trata-se de uma medida que beneficiará as empresas que usam este tipo de combustível e que lhes garantirá uma maior estabilidade na previsão das suas despesas.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Assim se prova o que é ser oposição responsável e o que é trabalhar a bem do País e dos interesses de Portugal. Somos uma oposição responsável, construtiva, mas que não abdica de valores: os valores que nos conduziram até aqui, pelos quais fomos eleitos e em nome dos quais saberemos ser julgados nas próximas eleições.
Está nas mãos do Governo a viabilização ou a reprovação do Orçamento do Estado. O Governo assumirá as suas responsabilidades, o Partido Popular saberá assumir sempre as suas, sejam elas quais forem!

Aplausos do CDS-PP, de pé.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite, Jorge Lacão, João Carlos da Silva e Henrique Neto.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista cedeu 4 minutos do seu tempo ao Grupo Parlamentar do Partido Popular para poder responder a estes pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, ouvi com atenção a sua intervenção e pelo menos uma parte dela satisfez-me muito porque, em muitos pontos, foi um bom resumo das conferências de imprensa que fizemos nas últimas semanas.
Risos do CDS-PP.

Nesse aspecto estou, pois, de acordo consigo.
Sei que há um ponto em relação ao qual nós divergimos profundamente e que tem a ver com os chamados critérios de convergência, motivo pelo qual, provavelmente, o Sr. Deputado considera que o voto contra do PSD não é o mesmo do que o voto contra do Partido Popular. Votar contra é sempre votar contra, os motivos é que podem ser diversos.
Sr. Deputado Manuel Monteiro, ao ouvi-lo pareceu-me que V. Ex.ª encarou o Orçamento do Estado como uma listagem. Ora, o Orçamento do Estado não é uma listagem mas, sim, um instrumento de intervenção política que tem efeitos perniciosos ou benéficos sobre a actividade económica, nomeadamente sobre o investimento e o desemprego.
Nesse sentido, quero perguntar-lhe, tendo por base a listagem que apresentou, se fez um cálculo da perda de receita que deveremos inscrever no Orçamento do Estado caso as suas propostas sejam aceites.

O Sr. Presidente: - Pergunto à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite se, à semelhança do que fez o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, também cede ao Sr. Deputado Manuel Monteiro o tempo necessário para poder responder à sua pergunta.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Cedo dois minutos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo 'mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, para poder responder às perguntas da bancada do PS o Sr. Deputado Manuel Monteiro terá o tempo equivalente àquele que nós gastarmos com as questões que iremos colocar-lhe. Temos todo o gosto em ceder-lhe esse tempo!
Sr. Deputado, privilegiamos o debate em todas as circunstâncias e por isso quando alguém, independentemente dos seus pontos: de vista, assume uma pose e uma atitude de debate naturalmente que tal não pode deixar de ser bem acolhido.
Diria que nas questões que o Sr. Deputado Manuel Monteiro levantou há três domínios a clarificar.
Um primeiro respeita a vários temas e problemas, com que, provavelmente, não poderemos estar de acordo porque partem de pontos de vista não coincidentes acerca da filosofia orçamental, mas sobre os quais podemos procurar fazer um esforço de clarificação das posições recíprocas. Refiro-me, por exemplo, à matéria que tem a ver com os métodos indiciários no que respeita à colecta dos impostos. Com um segundo domínio de questões podemos estar de acordo, mas importa fazer uma avaliação da sua incidência orçamental em concreto para determinar da sua viabilidade. Por último, há um terceiro grupo de questões de natureza manifestamente programática e que deve enformar - se enforma - uma linha de orientação política que, no futuro, tenha consequências de tradução orçamental na concretização de linhas programáticas de orientação política.
Nesta perspectiva, penso eu, estão criadas condições de debate e de diálogo para podermos concluir onde estamos de acordo e onde não estamos eventualmente de acordo.
Posto isto nestes termos, estou de igual modo convencido que, tal como o Sr. Primeiro-Ministro o declarou na sua intervenção de abertura deste debate, o Governo também está disponível para travar esse mesmo diálogo. Por tanto, o compromisso do Governo está dado, essa garantia é-lhe assegurada na condução dos trabalhos pela bancada do PS, de onde resulta que a posição de voto que o PP irá assumir relativamente ao Orçamento do Estado não pode, em nome da mesma coerência de posição, deixar de ser, desde logo, uma posição de voto que viabilize inequivocamente o seu debate na especialidade.

Risos do CDS-PP.

Digo isto porque é nessa fase que muitos dos pontos concretos que o Sr. Deputado levantou terão ocasião de ser adequadamente aprofundados.
Assim, se o Sr. Deputado Manuel Monteiro quer ser coerente consigo próprio, tal como exigiu a outra bancada que o fosse, deve assumir disponibilidade para levar o debate orçamental até às suas últimas consequências no sentido de se poder fazer a clarificação global de todos os nossos pontos de vista. É esse convite que, abertamente, lhe faço em nome da coerência e da .verdade de posições. Esse debate na especialidade é, naturalmente, importante para a clarificação de vários dos pontos aqui suscitados.
Mas não deixo de , sublinhar - e com isto vou concluir - a circunstância de, se bem o percebi, ter resultado, do seu ponto de vista, um cuidado em não contribuir com as propostas que fez para, um agravamento significativo da despesa ou para um compromisso significativo da receita. Repito: creio que o Sr. Deputado terá tido o cuidado de, com as propostas que fez, não fazer resultar nem o agravamento significativo da despesa nem um compromisso significativo da receita com incidência no Orçamento do Estado para 1996.
Quero, pois, dizer-lhe que se assim for e se essa demonstração puder ser feita os caminhos do diálogo com a bancada do PS estarão abertos, caso é que esses caminhos sejam genuínos e autênticos também da sua bancada nos termos e métodos que acabei de referir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, na parte inicial da sua intervenção referiu-se a determinados princípios que o Orçamento do Estado deve seguir. Gostava de afirmar e de repetir aqui aquilo que já foi aqui dito e que é o seguinte: o maior contributo que este Orçamento do Estado pode dar para a economia real é o que tem a ver com o seu rigor, com o controlo da despesa, com o libertar de fundos para investimentos públicos, com o sinal de credibilidade que aos agentes económicos confere.
Entretanto, e no que respeita aos métodos indiciários, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Manuel Monteiro se não entende que a evolução que o nosso sistema fiscal teve no passado terá sido eventualmente demasiado rápida e não acompanhada pela evolução da mentalidade dos agentes económicos. Não considera V. Ex.ª que a fraude fiscal é, de facto, uma atitude generalizada por parte de alguns sectores, de alguns agentes económicos? Não considera que é uma medida da mais elementar justiça fiscal combatê-la frontalmente e que os métodos indiciários, embora em termos técnicos possam ser considerados como um passo de paragem na modernização do sistema fiscal, permitirão criar uma maior justiça...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Justiça, Sr. Deputado?

O Orador: - ..., uma maior igualdade no tratamento que os cidadãos têm perante o fisco desde que - e isso já foi referido na comissão - sejam salvaguardadas as garantias dos contribuintes e as garantias de defesa e de impugnação dos actos fiscais da Administração de uma forma mais célere e mais expedita?
Se assim não for, quais são as alternativas que V. Ex.ª apresenta no que respeita ao combate à fraude fiscal?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, por aquilo que V. Ex.ª referiu na sua intervenção fiquei descansado, ou mais descansado do que estava, porque estou certo de que o partido de V. Ex.ª não irá votar desfavoravelmente o Orçamento do Estado.

Vozes do CDS-PP: - Não esteja tão certo!

O Orador: - É que, reconheçamos, muitas das reivindicações que fez são preocupações do Partido Socialista, do Governo...

Vozes do CDS-PP: - Não se vêem!

O Orador: - ...ainda que as nossas intervenções se façam de maneira diferente, mais calma, mais ponderada, menos agressiva e menos excitada. De qualquer modo, é

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evidente que temos preocupações comuns, até porque, de maneira relativamente atípica para um partido de direita, o partido de V. Ex.ª também defende as classes mais desfavorecidas, as famílias e os trabalhadores.

Vozes do CDS-PP: - Não tenha dúvida!

O Orador: - Também defende muitas das coisas que o Partido Socialista e a esquerda têm defendido ao longo dos anos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Qual esquerda?.

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quando fizer a sua intervenção, terei muito gosto em fazer-lhe perguntas.
Mas, relativamente ao problema fiscal, vou repetir algo que já foi referido. Sr. Deputado, será que em Portugal se pagam impostos á menos ou será que são sempre os mesmos a pagá-los e que uma parte substancial da sociedade portuguesa não paga praticamente nenhum imposto?
Portanto, antes de mais, aquilo que deve ser a preocupação do Governo é reduzir os impostos que não serão maus se forem bem gastos. Nós esperamos que este Governo os gaste bem aliás, com este Orçamento já está a demonstrar a intenção de os gastar bem -, mas também é fundamental que haja justiça fiscal e, como sabe, existe um programa, existe uma comissão e por isso estou certo de que a justiça fiscal será uma prioridade deste Governo.
Por outro lado, falou na eficácia do Estado e na redução das despesas do Estado, nomeadamente, de despesas supérfluas ou sumptuárias. Também aí há um amplo consenso, é fácil estar de acordo com o que disse. Mas não acha que isso também passa pela modernização da Administração Pública, por melhores e mais qualificados recursos humanos, por uma inovação tecnológica, pela informatização, que no Orçamento do Estado está substancialmente reflectida como preocupação essencial? Ou seja, não é de opinião que temos de vencer as síndromas de algum subdesenvolvimento da nossa Administração Pública para obter esse desejável - o partido de V. Ex.ª e nós desejamos - de redução dos custos do Estado? E não está este Governo, por exemplo, a procurar reduzir o peso do Estado através de um programa de privatizações, que o Sr. Ministro das Finanças apresentou ao país ainda recentemente, muito mais ambicioso, muito mais acelerado do que o do PSD, que se reivindicava de partido das privatizações? Não acha, Sr. Deputado, que há razões de sobra no Orçamento do Estado para esperar que haja um aumento da eficácia também na Administração Pública?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, tem cinco minutos para responder às três perguntas que lhe foram formuladas.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito obrigado pela sua benevolência, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por agradecer a pergunta da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite e dizer-lhe, de uma forma directa, o seguinte: se V. Ex.ª acha que, a minha intervenção é a reprodução das conferências de imprensa do PSD, então já saberá em quanto é reduzida a própria receita.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não sei!

O Orador: - Ah, não sabe?

Risos do CDS-PP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Em cada conferência de imprensa dizem coisas diferentes.

O Orador: - De qualquer forma, Sr.ª Deputada, ao longo dos próximos dois dias, o Partido Popular fará, publicamente, não por qualquer "porta do cavalo", a entrega ao Sr. Primeiro-Ministro das propostas que ali tive oportunidade de enunciar e que serão objecto de discussão séria nesta Câmara.
O PSD - o. País sabe - pôs-se hoje fora da discussão do Orçamento do Estado. O PSD não tem nada mais a ver com a discussão do Orçamento do Estado para 1996!

Protestos do PSD.

O Orador: - É verdade! É verdade, porque o PSD, a partir de hoje, disse ao País uma coisa muito simples: "nós não temos nada para discutir com os senhores; nós não temos nada para discutir nesta Câmara; nós não temos propostas a fazer porque mesmo que haja alterações nós vamos votar contra". Foi isso que o PSD veio hoje dizer a esta Câmara, perante os portugueses e perante o País.

Aplausos do CDS-PP e do PS.

Protestos do PSD.

Não se inquietem Srs. Deputados do PSD! Ouçam...

Protestos do PSD.

Sr. Presidente, espero que este tempo me seja descontado.
Não se inquietem porque será mais fácil vê-los a negociar com aqueles senhores lugares para as administrações públicas, como tem acontecido...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - ..., do que algum dia tal acontecer com o Partido Popular.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Compreendo o nervosismo do PSD, Sr. Presidente!
O PSD veio hoje dizer. ao País: "acabou para nós a discussão do Orçamento do Estado". Respeitemos essa posição! Mas, ao menos, os senhores respeitem quem é oposição à esquerda, mas uma oposição diferente e de forma responsável.

Aplausos do CDS-PP.

Se os senhores não têm nada a ver com esta discussão saiam da sala ou então deixem trabalhar...

Aplausos do CDS-PP .

... quem quer trabalhar! Deixem trabalhar quem quer trabalhar! Deixem trabalhar quem quer trabalhar!

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PSD.

É isso que vos tenho a dizer. Deixem-nos trabalhar, Srs. Deputados! Deixem-nos, trabalhar a bem do país!

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Aplausos do CDS-PP e do PS.

Lembro-me desta frase, mas sou eu quem hoje está aqui a dizer "deixem-nos trabalhar a bem dos portugueses", em vez de fazermos confusão que não interessa...

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que permitam que quem usa da palavra se faça ouvir. Já se viu que não resulta tentar impedir que quem se quer fazer ouvir o faça em termos de normalidade. Peço-vos a todos, sem distinção nenhuma, que, enquanto alguém está a falar, sem prejuízo dos apartes que são da praxe, permitam que se faça o silêncio necessário.
Queira prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Queria dizer a V. Ex.ª, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, pessoa que considero, independentemente de termos opiniões divergentes, pela sua seriedade e pela sua frontalidade, que não encaro o Orçamento do Estado como uma listagem, mas encaro a sua discussão como a oportunidade séria para tentar nele introduzir propostas que digam respeito à vida das famílias, à vida dos cidadãos, à vida dos trabalhadores e à melhoria da situação económica das empresas. Se isso não fosse possível, então não estaríamos aqui a fazer nada; teríamos aqui vindo assinar uma folha de presença, fazer discursos para a imprensa, mas não estaríamos a proceder a um debate franco e sério.
Sr.ª Deputada, não se trata de uma listagem, mas de um conjunto de propostas objectivas, que têm reflexo na vida dos portugueses e ,na vida económica do país, que o Partido Popular aqui quer ver debatidas e defendidas.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

Obrador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, vou dizer-lhe o seguinte: debater com responsabilidade é uma coisa, passar cheques em branco é outra completamente diferente!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E essa é uma questão fundamental para o próprio Partido Popular. Ao longo destes dois dias o Governo dirá ao País o que tem a dizer das propostas do Partido Popular, desta oposição responsável e desta oposição séria que aqui está: oposição que não acredita nos critérios de convergência de Maastricht, razão pela qual o PSD está tão preocupado; oposição que não quer a moeda única em 1999; oposição que não deixará, nem permitirá, que a moeda única chegue ao nosso País sem que o povo português sobre isso se pronuncie.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mas aquilo que lhe quero dizer, Sr. Deputado, é apenas isto: o Governo dirá, com a responsabilidade que tem, o que pensa objectivamente das propostas sérias...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Permite-me que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, estou a falar no seu tempo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Manuel Monteiro, o que suscitou o meu pedido de interrupção não foi propriamente a questão do cheque em branco porque quando estamos no decurso de um processo legislativo, este vai até ao fim, tem várias fases e cada fase tem um valor substantivo próprio. E foi em nome do significado e da consistência de cada momento do debate que lhe coloquei a questão.
Mas interrompi-o por uma outra razão: ao colocar-se contra - sabemos que está contra - os chamados critérios de convergência de Maastricht o que gostaria que nos ajudasse a precisar é se, para o efeito e com consequência neste Orçamento, o seu ponto de vista significaria admitir que era mais positivo para o País alargar presentemente o défice do Orçamento do Estado. Era esse o seu ponto de vista? Caso não seja, conviria que o precisasse neste momento.

O Orador: - Vou-lhe responder, Sr. Deputado, até porque tinha essa referência nas minhas notas. Queria só, se permite, dizer a V. Ex.ª o seguinte: se o Orçamento passar - e isso está nas mãos do Governo -, os Deputados do Partido Popular discutirão com quem quiser seriamente discutir as aplicações técnicas concretas dos princípios fundamentais que o País precisa de saber.
Sou contra o imposto sobre sucessões e doações e não encontrarei um único português que considere esse imposto justo por muito que outras pessoas pensem o contrário. Saber se ele é extinto amanhã, depois de amanhã ou daqui a. quatro dias, essa é uma questão substancialmente distinta.
Em relação ao défice devo dizer que, por princípio, sou favorável à sua redução, mas o meu princípio é um princípio independente daquilo que Bruxelas manda ou deixa de mandar, ao contrário do que tem sido seguido em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não é isso!

O Orador: - Vou responder-lhe. É que se fosse necessário aumentar o défice para proteger o emprego dos portugueses, eu aumentava o défice, não tenha nenhuma preocupação quanto a isso...

Aplausos do CDS-PP.

O Orador: - ...porque, para mim, o aumento ou não do défice deve ser sempre feito e ponderado em função da vida dos cidadãos. Estou cansado dos relatórios dos economistas mais brilhantes! Estou cansado das revisões em baixa! Estou cansado das análises e das estatísticas! Aquilo que me preocupa e perturba é saber se há ou não há emprego no meu próprio país! E se para haver emprego em Portugal for necessário aumentar o défice, então que se aumente o défice! E se for necessário, num determinado momento, não desagravar o défice, tal qual ele deve ser desagravado, então, sim!
Todavia, há uma coisa que lhe quero dizer: os senhores baixam o défice porque partem de pressupostos económicos determinados e em função desses pressupostos económicos prevêem um aumento da receita, e é em função desses pressupostos económicos e desse aumento da receita que os senhores nos vêm dizer que baixam o défice. Essa é a questão fundamental para o debate.
Sr. Deputado João Carlos da Silva, ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deixe-me interrompê-lo para o informar do seguinte: o Sr. Deputado dispunha

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de 5 minutos concedidos pelo Partido Socialista, de mais 2 concedidos pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, de mais 1 em que computei a duração das interrupções, mas o Partido Socialista acaba de lhe conceder ainda mais 3 minutos.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, não me leve a mal que tenha pedido a palavra para interpelar a Mesa. Faço-o para, em parte, sublinhar a concordância do PS em voltar a transferir tempo para possibilitar a resposta do Sr. Deputado Manuel Monteiro, mas também para sublinhar que o fazemos com um propósito: até poderemos estar de acordo quanto às suas preocupações com as pessoas e, portanto, quanto à conveniência de poder ajustar o défice ao critério de garantia de condições dignas de vida do povo português, o que não conseguimos perceber é como é que o Sr. Deputado compatibiliza essa sua posição com a exigência formal, abstracta e provavelmente cega, constante do seu projecto de revisão constitucional, que quer garantir um défice do Orçamento, necessário e em qualquer circunstância, que nunca poderá ultrapassar os 3%. Alguma coisa não está rigorosamente certa no seu raciocínio político: ou altera o projecto de revisão constitucional ou altera os pressupostos do seu discurso político de há pouco!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Mais uma vez não foi uma interpelação à Mesa, mas já estamos habituados a isso!
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr.. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, estamos a falar de despesas correntes e não de princípios fundamentais. E quero dizer-lhe o seguinte: o ritmo de diminuição do défice que os senhores têm praticado no nosso país é um ritmo completamente errado, porque, à custa da convergência nominal, os senhores têm prejudicado objectivamente a convergência real do país. São questões que haveremos de discutir para além do próprio Orçamento do Estado, bem como haveremos de discutir seriamente nesta Câmara sobre ás vantagens ou as desvantagens de uma política económica europeia que já hoje é posta em dúvida pelo próprio Jacques Delors e pelo próprio Vice-Presidente do Bundesbank. Curiosamente, os principais responsáveis por aquilo que está escrito no Tratado que os senhores aprovaram são os mesmos que agora vêm dizer que a política económica do Tratado da União Europeia é, provavelmente, uma política económica errada e que o ritmo que está previsto nesse mesmo Tratado é completamente desajustado da realidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Também o seu projecto de revisão constitucional!

O Orador: - Sr. Deputado João Carlos da Silva, sou completamente favorável a que se termine e se combata a fraude fiscal por todos os meios ao nosso alcance - não é apenas um problema do Governo, mas também da Assembleia da República - e se criem condições políticas para que este Governo ou outro qualquer possa trabalhar. Mas uma coisa é estarmos preocupados com a fraude fiscal, outra é sabermos como funcionam os tribunais em Portugal e quão demorados são os processos fiscais no nosso país. Em termos muito práticos, um cidadão sobre o qual recaia a desconfiança em relação aos seus sinais exteriores de riqueza paga primeiro e, mesmo que tenha razão, pode estar um ano ou dois à espera que o Estado lhe devolva o dinheiro que ilegitimamente lhe retirou, para além daquilo que ele próprio tinha declarado. A questão prévia é uma questão de fiscalização, não é uma questão de indiciação.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os Srs. Deputados e o Governo preparam-se é para colocar nas mãos de determinadas pessoas, que estão atrás de determinadas repartições, a possibilidade de entrarem na vida dos cidadãos, à semelhança do que aconteceu no tempo do Governo de Vasco Gonçalves! Foi exactamente isso que aconteceu no nosso país quanto aos chamados sinais exteriores de riqueza!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é essa a nossa ideia!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - É, é! A ideia é aumentar os impostos com os métodos indiciários!

O Orador: - Foi isso que aconteceu e eu conheço muitas pessoas em Portugal que tiveram problemas precisamente por isso.
Sr. Deputado Henrique Neto, penso que, de algum modo, as questões que colocou tinham já sido abordadas pelos seus colegas de bancada. De qualquer forma, queria dizer-lhe o seguinte: não sei se a parte que não paga impostos em Portugal é substancial ou não, o que sei é que os trabalhadores por conta de outrém, esses, pagam tudo sobre o que têm e sobre o que gostariam de ter. E verdade! E também sei que, no nosso país, o problema não passa apenas por combater os que não pagam impostos, mas também por diminuir os impostos daqueles que já pagam muitos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os trabalhadores por conta de outrém pagam cada vez mais e os jovens do nosso país são onerados em demasia por uma política despesista que tem surgido ao longo dos anos em Portugal por falta de coragem em combater lobbies de ministérios para despedir algumas pessoas que estão a mais na Administração Pública e para pôr de lado determinadas pessoas que estão empregadas nas câmaras e nos ministérios á recibo verde e que andam a trabalhar noutros pontos do país e a ganhar dinheiro dos cofres do Estado!

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, é evidente que discordo

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totalmente de tudo o que disse - não sei se será este o momento próprio para o dizer -, mas há um ponto que devo referir-lhe com frontalidade: nem a minha bancada admite, nem eu própria posso admitir que o Sr: Deputado tenha colocado a Assembleia da República tão baixo que quando admitimos ou tomamos posição sobre determinada discussão, seja ela qual for, o Sr. Deputado diga, que não temos mais nada a fazer, que estamos calados e vamos sair!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Não sei qual é a disposição dos meus companheiros de bancada, mas uma coisa lhe garanto: não me calarei nunca, porque estou aqui a representar 34% dos portugueses que em mim votaram!

Aplausos do PSD.

Vou ter de explicar aos meus eleitores, passo a passo, por cada elemento em que o Orçamento aqui for votado e, especialmente, quando for votado na especialidade, que não o estou a fazer por birra, mas que o estou a fazer consciente dos efeitos maléficos que isso tem para o futuro do país. Portanto, o Sr. Deputado não me põe na rua, não diz que a minha bancada se calou, nem que vamos sair da Sala, porque nós vamos ficar, debatendo democraticamente até ao fim, este Orçamento! Temos obrigação de o fazer!

Aplausos do PSD.

Mas há ainda um outro ponto, Sr. Deputado, a que também me quero referir: eu entendo que a nossa grande divergência tem a ver com os critérios de convergência. É isso o que nos separa , provavelmente em grande parte, e a sua irresponsabilidade nas propostas que faz contra aqueles critérios só acaba no dia em que o Sr. Deputado disser ao País qual é a alternativa. Nessa altura teremos aqui uma discussão responsável! Antes disso, o Sr. Deputado está a fazer um discurso que não acaba, e eu pergunto-lhe, qual é a sua alternativa!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr: Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, confesso que agora fiquei com dúvidas se V. Ex.ª estava a defender o PS ou não. Foi apenas uma dúvida que surgiu no meu pensamento!
E queria dizer-lhe o seguinte: nas sessões legislativas anteriores, a bancada do meu partido apresentou aqui várias propostas alternativas relativas aos orçamentos dos governos de que V. Ex.ª fazia parte e recordo-me de, um dia, ter ouvido um ex-ministro dás finanças, de nome Eduardo Catroga, dizer que várias propostas que o PP aqui apresentava eram irrealistas. Mas, curiosamente, verifiquei que, passado algum tempo, muitas dessa propostas apresentadas pelo PP e que esse ex-ministro dizia serem irrealistas eram já defendidas pelo PSD! Foi, por exemplo, o caso da privatização da Caixa Geral de Depósitos!
Os senhores afirmam que as nossas propostas são irrealistas. Mas por que razão andaram a dizer ao País. que não aceitavam referendar a moeda única por esta estar consagrada no Tratado de Maastricht e, recentemente, aprovaram um projecto de revisão constitucional em que vêm defender o referendo nesse sentido? Onde está a coerência?

Aplausos do CDS-PP.

Os senhores dizem que as nossas propostas são irrealistas, mas dizem-no apenas porque elas são apresentadas por nós! Quando, mais tarde, o PSD as quer roubar, copiando o que dizemos, aí elas já são realistas, só porque são apresentadas pelo PSD!
Acabei de dar-lhe duas provas concretas de coisas que os senhores disseram no passado e dizem hoje ao País de forma completamente diferente. É a verdade! Está escrito nos vossos documentos e foi dito em conferência de imprensa!
Sr.ª Deputada, não quero nem tenho a pretensão de pedir ao PSD que saia. O que lhe digo é que a oposição que os senhores ou qualquer partido deve fazer é a de dizer: "Nós somos contra isto, mas temos aqui a alternativa; não concordamos com estas propostas, mas estão aqui aquelas que fartamos; não concordamos com estes pontos, mas estão aqui os pontos que apresentamos em alternativa". Foi isso que o Partido Popular fez daquela Tribuna, de forma responsável, porque é essa a oposição responsável que o meu partido disse ao País que iria fazer!

Aplausos do CDS-PP.

Circunstância completamente diferente seria virmos aqui criticar, criticar, criticar, sem dizer o que faríamos de diferente em relação ao que criticamos. E perdoe-me, Sr.ª Deputada, porque, francamente, não estava habituado a isso de V. Ex.ª. Não estava! Sempre a conheci, mesmo não concordando com a sua política à frente do Ministério da Educação, como uma pessoa que a cada crítica que fazia apresentava uma alternativa, mas a imagem que o líder do PSD e V. Ex.ª aqui deram hoje foi exactamente a oposta.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Para se candidatar a substituir o Dr. Nogueira!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para responder à acusação do Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Presidente: - Não pode fazê-lo, Sr.ª Deputada, porque não tem figura regimental para isso.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, aguardarei por momento próximo, mas garanto-lhe que o Sr. Deputado Manuel Monteiro não ficará sem resposta ao que acabou de dizer

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada, terá outras oportunidades para usar da palavra. Tem esse direito.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defender a consideração da minha bancada. E explico porquê: o Sr. Deputado Manuel Monteiro disse que o PSD estava a roubar as ideias do PP. Ora, é um termo muito forte, pelo que quero defender a honra da minha bancada.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não abuse da figura, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não se esqueça de que não é habitual nesta Casa defender a honra da bancada exactamente a propósito de uma satisfação dada em defesa da honra da mesma bancada. O Sr. Deputado Manuel Monteiro acabou de usar da palavra, dando explicações à sua colega Dr.ª Manuela Ferreira Leite e não me parece muito curial que isto funcione como as cerejas.
Necessariamente, quando houvesse uma nova ofensa muito grave, admito que fosse possível usar da palavra, mas se é só isto, Sr. Deputado, acho que não há o direito de defender a honra da bancada quando estamos exactamente no uso desse direito. Como sabe, a honra da bancada sobre a mesma intervenção, ou quase, só pode ser exercida uma vez pela direcção da bancada.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, quanto ao grau da ofensa com que o Sr. Deputado Manuel Monteiro nos atingiu cabe-nos a nós qualificá-lo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, sempre assim procedi e muitas vezes me vi constrangido a ter de assistir a defesas da honra que implicavam um excesso de sensibilidade, embora a sensibilidade seja a de cada um dos Srs. Deputados.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, peço para utilizar essa figura regimental apenas porque hoje mesmo, neste debate, já houve precedentes desse tipo.

Vozes do PS: - Não, não!

O Sr. Presidente: - Nunca houve, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Já houve defesas da consideração sobre respostas a defesas da consideração.

O Sr. Presidente: - Não tenho ideia disso, Sr. Deputado, só se foi quando eu não me encontrava presente. Não é essa a praxe da Assembleia da República e, se não se importa, discutiremos isso em Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Então, o Sr. Presidente não concede a palavra ao Grupo Parlamentar do PSD?

O Sr. Presidente: - Não é isso, Sr. Deputado. V. Ex.ª, se quiser, pode inscrever-se para uma intervenção. Tem esse direito.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Fico, então, inscrito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: O Partido Socialista prometeu mudança aos portugueses nas eleições de Outubro passado. É, portanto, lícito procurar neste primeiro Orçamento do Governo PS sinais fortes (e já só falo em sinais) dessa mudança nas políticas que nos são propostas. Contudo, .Srs. Deputados, procura-se e não se vislumbra o que é que, no essencial, se revela diferente das políticas e dos orçamentos do PSD.
Razão tinha o destacado apoiante do Partido Socialista, o. economista Luís Campos Cunha - aliás, recentemente nomeado para o Banco de Portugal quando, em Julho passado, afirmava numa entrevista que "há alguma dificuldade em distinguir as políticas económicas do PS e do PSD".
Aí está, infelizmente, o Orçamento a dar-lhe razão.
Ao contrário do que se afirma nas Grandes Opções do Plano, este Orçamento não é nem sustentável, nem regionalmente equilibrado, nem socialmente justo.
Em primeiro lugar, o Orçamento é, em grande parte, um exercício de ficção. As previsões que sustentam o crescimento de 2,7% do PIB com base quase fundamentalmente no incremento das exportações era 11,6% e no aumento do investimento em 6,5% não merecem credibilidade e são, aliás,. contraditórias com a análise pessimista que é feita, nas próprias Grandes Opções do Plano, da evolução recente e perspectivas de crescimento da economia.
À desaceleração, no início de 1996, do crescimento económico na generalidade das economias da União Europeia, "que, nalguns casos, pode estar a corresponder a situações próximas da estagnação" e, igualmente, à "desaceleração que (na economia portuguesa) se fez sentir a partir do terceiro trimestre do ano" de 1995 - tudo isto está assumido expressamente no relatório das Grandes Opções do Plano -, segue-se, da parte do Governo, um salto no vazio com previsões de crescimento completamente contraditórias com as suas próprias análises e com os indicadores mais recentes do Instituto Nacional de Estatística. Ainda não há oito dias, o "inquérito de conjuntura ao investimento" prevê para 1996 uma taxa de variação negativa de menos 3,2% no investimento das empresas e sabe-se que as alterações sucessivas dos mapas do PIDDAC, que o Governo tem vindo a entregar à Assembleia da República, não dão consistência alguma aos valores apresentados para o crescimento do investimento público.
Não vale a pena o Ministro João Cravinho procurar inverter o ónus da prova, convidando a oposição a apresentar um quadro alternativo. É ao Governo que compete apresentar e convencer-nos, a nós e ao País, da verdade das suas previsões. Mas não só a nós: pelos vistos, também aos próprios economistas do Partido Socialista, um dos quais afirmava há dias, numa entrevista, que o crescimento em 1996 poderá não ultrapassar 1% do PIB.
O Orçamento não é, aliás, só ficcional como, para manter artificialmente o défice, prossegue aquilo que o próprio Partido Socialista tanto reprovou no passado: as práticas de desorçamentação da despesa pública e de expedientes contabilísticos.
Só alguns exemplos:
Primeiro, a responsabilidade emergente da concessão de seguros de crédito baixa 27,4 milhões de contos (84,6%) em sede de despesa efectiva, mas é aumentada em sede de dívida pública.
Segundo, a enorme diminuição da despesa com a bonificação de juros para aquisição de habitação própria em 13,5 milhões de contos (menos 38%) não é explicada unicamente por uma eventual redução das taxas de juro. Ninguém, nem o Governo, acredita que as taxas de juro à habitação própria desçam na ordem dos 12,5% para o nível dos 8 ou 7%. E das duas, uma: ou o Governo tem a intenção de reduzir as bonificações, agravando ainda mais as condições de acesso dos portugueses, designadamente dos jovens, à habitação ou, então, estamos perante uma clara desorçamentação da despesa.

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O mesmo se poderia dizer da não inclusão na despesa de cerca de 7 milhões de contos para pagamento das prestações dos aviões F-16 ou dos cerca de 30 milhões de contos oficialmente previstos para o aumento das dívidas do Serviço Nacional de Saúde.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos traços mais chocantes do Orçamento - para nós, que não seguramente para o PSD e para o CDS-PP - é o amplo programa de privatizações que o Partido Socialista anuncia e onde fica patente que tal se deve unicamente ao desejo de aumentar as receitas do Estado, para se satisfazerem os critérios de Maastricht, e de favorecer os grandes grupos económicos, sem qualquer justificação económica ou social.
O PSD ainda tinha o pudor de justificar o desmantelamento e a privatização dás empresas do sector empresarial do Estado com o falso argumento de que constituíam um enorme encargo para o Estado, de que eram alimentadas à custa do Orçamento, de que não eram competitivas, de que havia prejuízos em cima de prejuízos. Argumentos, no essencial, falsos, hoje repetidos pelo PP, mas que, à custa de tanto serem matraqueados e ampliados por certa comunicação social, acabaram por fazer oscilar ou convencer alguns segmentos da opinião pública.
Mas tudo isto vem agora por água abaixo.
Confirmando o que o PCP sempre tem dito, é o próprio relatório do Orçamento que refere que "o SEE tem vindo a assumir cada vez mais um papel dinamizador de integração da economia nacional no espaço comunitário, reforçando a sua capacidade empresarial e de gerador de externalidades positivas na economia, por via da realização de importantes investimentos de desenvolvimento e modernização das infra-estruturas básicas do País" - isto está escrito no relatório do Orçamento do Estado que o Governo nos apresentou. O Partido Comunista Português subscreve esta afirmação, que só por si justifica, sem lugar para dúvidas, a manutenção em Portugal de um forte, dinâmico e moderno sector empresarial do Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A privatização, compra e subsequente desaparecimento das empresas do estratégico sector da metalomecânica pesada, por interesse exclusivo de controle de mercado pela transnacional que as adquiriu, aí está como exemplo bem vivo do que não pode acontecer. O País está mais pobre, os trabalhadores no desemprego aumentaram.
Mas mais: o Governo diz-nos ainda que o conjunto das empresas públicas contribuiu em 1996 com 191 milhões de contos da receita fiscal do Estado em IRC (isto é, 42% do total previsto a arrecadar), para além de ter entregue nos cofres públicos mais 114 milhões de contos de dividendos. Isto é, quase tanto como a receita que o Governo PS se propõe arrecadar com as privatizações em 1996. Mas o mais grave ainda é que é o próprio Governo a reconhecer que, após a privatização, a tendência é a de as mesmas empresas pagarem ao Estado muito menos impostos do que pagavam quando eram públicas.
Mas mais ainda: no inquérito de conjuntura ao investimento, que já citámos, verifica-se que foram as empresas de capitais públicos que contribuíram decisivamente em 1995 para que a taxa de variação do investimento fosse positiva e que em 1996, com, de novo, uma variação positiva do investimento em 3,8%, são os únicos suportes, face às perspectivas de diminuição do investimento das empresas privadas em 6,5%, para que o investimento global do sector empresarial não desça ainda mais do que está estimado para este ano.
Perante isto, Srs. Deputados, Srs. Deputados do Partido Socialista, têm de concordar que é inteiramente legítima a nossa perplexidade e frontal discordância com o programa de privatizações anunciado no Orçamento e que contraia todas as informações que nos são dadas no próprio relatório.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador. - Então, Sr: Primeiro-Ministro António Guterres, o Governo diz que o sector empresarial do Estado tem cada vez mais um papel dinamizador da economia nacional, reconhece que globalmente é eficiente e que está financeiramente saudável, contribuindo em mais de 40% da receita do Estado em IRC mais os dividendos, afirma que depois de privatizados pagam muito menos para o Estado, está demonstrado que o sector empresarial do Estado é decisivo para a dinâmica do investimento nacional e, depois, desmantela-o, privatiza-o, só para favorecer os grandes grupos económicos e as receitas do Estado em 1996!? É caso para perguntar: e nos anos seguintes, Sr. Primeiro-Ministro, onde é que o Estado vai buscar as receitas? Por aqui se percebe por que é que a CIP anda tão entusiasmada com o Orçamento! Por aqui se percebe por que é que o PP, nas suas linhas fundamentais, como acabou de provar o Sr. Deputado Manuel Monteiro, está de acordo com o Orçamento!

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - É falso!

O Orador: - Srs. Deputados, um terceiro traço que marca gravemente este Orçamento é o da desaceleração do investimento público.
Não é verdade - não é verdade, sublinhamos - que cresça o investimento nas funções sociais do Estado. Se usarmos os mesmos critérios de comparação que o Governo utiliza no Orçamento - a estimativa de execução prevista para 1995 e o orçamentado para 1996 -, o peso da despesa pública com as funções sociais do Estado cai de 48,7% para 48, 3%.
Não é verdade - não é verdade, repito - que cresça o investimento - com a educação. Como confirma o próprio relatório da Comissão de Educação Ciência e Cultura, elaborado por Deputados do Partido Socialista, "os investimentos do Plano supõem uma desaceleração de menos 4,78%" - é o que dizem e escrevem no relatório da Comissão os Deputados do Partido Socialista. Descem as dotações de investimento para o ensino superior, para a inovação educacional, para o ensino especial; não é assegurado o compromisso da construção de pavilhões gimnodesportivos; o investimento na rede pública do ensino pré-escolar é quase zero.
O aumento global do Orçamento do Ministério é, portanto, unicamente para despesas correntes.
Afinal, como diria Alberoni, "ainda mal casou" e o "estado de paixão" do Engenheiro Guterres já cedeu lugar à pergunta clássica: "Será que ainda a amo?" Pelos vistos, não!
Com a saúde, a despesa pública baixa de 15% para 14,2% do total.
Nas funções económicas, o sector mais atingido é o da agricultura, com uma quebra dos investimentos do Plano em 28%, exactamente naqueles programas e projectos que, directa ou indirectamente, estão vocacionados .para apoiar, promover ou enquadrar a produção e os agricultores. Com este Orçamento, o rendimento dos agricultores portugueses vai, seguramente, baixar durante o ano de 1996.

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Mas, em contrapartida, o Governo, que não tem dinheiro para os investimentos, não tem pudor em propor o aumento das benesses aos grandes proprietários absentistas nalgumas centenas de milhar de contos de indemnização pelo processo da reforma agrária, agora a título de juros de anos anteriores, a juntar aos milhões que já receberam. Não admira, pois, também aqui, que, apesar de o Orçamento ser claramente restritivo para o sector, como afirmou e reconheceu, na Comissão, o próprio Ministro da Agricultura, a CAP ande tão satisfeita!
A operação do Governo de, à última hora, ter enviado, por via do departamento de Planeamento, uns novos ma1pas-resumo do PIDDAC, com valores completamente alterados e invertidos - e que não correspondem aos mapas oficialmente enviados -, procurando manipular os dados estatísticos, só veio sublinhar a constatação da evidente desaceleração do investimento em áreas como as da educação e da agricultura.
Srs. Deputados, um desenvolvimento "regionalmente equilibrado", refere o Governo nas Grandes Opções do Plano. Convido o Sr. Primeiro-Ministro a acompanhar-me neste exercício de comparação do PIDDAC regionalizado de1995 com o PIDDAC regionalizado de 1996 para verificar que basta esta comparação para se chegar à conclusão de que só não foi iniciado o caminho para a redução das assimetrias regionais, que o PSD agravou no nosso país, como os desequilíbrios se agravam ainda mais com este Orçamento. Sr. Primeiro-Ministro, todos os distritos do interior do País e com menores índices de desenvolvimento vêem diminuir, no PIDDAC para 1996, a sua participação na distribuição dos investimentos do Plano. De uma já muito baixa percentagem de 10,5% dos investimentos do Plano em 1995, os nove distritos do interior baixam agora para 9,4%. Muitos e muitos projectos concretos que as regiões menos desenvolvidas necessitam, que estavam já comprometidos ou até tinham sido prometidos pelo Partido Socialista, caíram pela base, para além de como salientou a Associação Nacional dos Municípios Portugueses, a Lei das Finanças Locais estar ainda longe de ser cumprida
Também não se pode falar de um Orçamento "socialmente justo" quando verificamos que, no plano da fiscalidade, ao contrário do que aqui disse o Sr. Primeiro-Ministro, não são sequer emitidos significativos sinais que prenunciem uma alteração à reconhecida injustiça do sistema fiscal. Mantêm-se integralmente os benefícios fiscais ao grande capital, mesmo os de natureza especulativa, mas quanto aos rendimentos do trabalho, por exemplo, a magra redução em 1/1000 do imposto de selo sobre os recibos de salários só entra em vigor em Outubro. Enquanto os benefícios no IRS são actualizados, em média, de acordo com a taxa de inflação, há, em IRC, benefícios e deduções fiscais que são actualizados em 50%, como as mais valias imobiliárias.
A supressão da suspensão do imposto de selo sobre o crédito ao consumo, se viesse a ser concretizada, afectaria particularmente as camadas sociais mais carenciadas que compram a prestações e a regressividade do imposto automóvel, baixando o imposto para as viaturas acima dos 1500 cm3 e fazendo subi-lo para as viaturas abaixo dos 1500 cm3, permite, seguramente, uma grande alegria ao PP: os Mercedes custarão menos 700 contos, mas os Renault Clio serão mais caros duas ou três dezenas de contos. Assim, como candidamente explicou o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o Governo contribui para aumentar a segurança nas estradas!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs.. Membros do Governo: Um Orçamento assim, que, além do mais, não pode, no plano das políticas, ser desligado do recente acordo de concertação social e do propósito do Partido Socialista de aprofundar a insegurança no emprego com a introdução, por via legislativa, da flexibilidade e da polivalência nas relações de trabalho, não serve os interesses e as necessidades do País, não vai ser a alavanca necessária para a dinamização da economia e vai agravar o desemprego, como já foi reconhecido por diversos membros do Governo.
Não teria de ser necessariamente assim, mas é porque o Governo do Partido Socialista, como o PSD, privilegia Maastricht, em prejuízo de Portugal e dos portugueses.
É assim porque o Governo do Partido Socialista pisca o olho à esquerda e aos trabalhadores com o permanente discurso de um diálogo não efectivo, mas, na prática, privilegia a direita e o patronato nas benesses, no leilão das empresas públicas, nas orientações fundamentais do Orçamento.
É assim porque as medidas positivas, como os aumentos na área da cultura ou a magra redução do IVA para a restauração e alguns produtos alimentares, são pontuais e desgarradas, enquanto no essencial o Orçamento mantém as mesmas opções estruturantes, as mesmas prioridades e injustiças dos orçamentos do PSD, e iremos procurar minorar com as propostas que vamos apresentar durante o debate, na especialidade, do Orçamento do Estado.
Ao contrário do que diz o PP, este não é o Orçamento da esquerda, porque não é a esquerda que está no Governo. Este é um Orçamento de continuidade, este é um Orçamento apresentado pelo Partido Socialista, que a direita, nas suas linhas fundamentais, não desdenha e que os grandes senhores do dinheiro apoiam. Este é um Orçamento que merece a crítica da esquerda, que merece a forte oposição do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente:- Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira, João Carlos da Silva e Henrique Neto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, fiquei muito satisfeito com a sua intervenção, porque confirmou aquela minha ideia de que V: Ex.ª é daqueles que decidem primeiro e discutem depois. Decidiu que votava contra este Orçamento e andou a fazer uma espécie de anti-listagem para fundamentar a sua posição. Sr. Deputado, contrariamente a algum eleitorado, o senhor já não nos convence.
V. Ex.ª diz que o quadro macro-económico não está bem e vai buscar uma publicação aqui e ali. Gostava que correspondesse ao desafio que lhe foi feito em comissão e dissesse qual é o quadro macro-económico que apresenta.
O Sr. Deputado também se preocupa com a questão do investimento. Então, diga-me lá, Sr. Deputado Lino de Carvalho: que impacto teria nas intenções de investimento o facto de VV. Ex.as votarem contra este Orçamento, como parece que vai acontecer? Que impacto teria: positivo? Negativo? Irrelevante?
Quanto à bonificação de juros para habitação própria, suponho que teria tido oportunidade de ser esclarecido em comissão sobre este problema. É que não é nada do que disse; essa questão tem a ver com outros aspectos. Mas,

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para não usar as fotocópias do Engenheiro Macário Correia, remeto-o para uma curta e sibilina resposta que dei há uns dias ao Semanário e depois, em sede de especialidade, vamos clarificar esta situação. Mas posso adiantar que não é nada do que disse. Também no que se refere à saúde não é nada do que disse, e por aí fora.
No que diz respeito à metalomecânica pesada, V. Ex.ª, como grande defensor que tem sido do funcionamento do sector empresarial do Estado, considera que terá sido brilhante a forma como o Estado, durante estes anos, se comportou na gestão desta área da metalomecânica pesada; contudo, o problema não tem tanto a ver com a questão da estatização. Até vou mais longe: V. Ex.ª, certamente, deverá ter dados sobre o funcionamento e o peso do sector empresarial do Estado na Itália, gerido, durante décadas, com alguns aliados, pela democracia cristã, e, por exemplo, na Suécia, gerido, durante décadas, pelos nossos camaradas socialistas, chamados lá de sociais-democratas. V. Ex.ª deve achar que o sector empresarial do Estado italiano, com a democracia cristã, foi mais progressista, mais progressivo, do que com o governo sueco! Não sei? V. Ex.ª dirá!
Quanto ao imposto automóvel, também penso que apresentou uma caricatura.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é verdade!

O Orador: - A concluir, gostava de dizer que V. Ex.ª fez uma intervenção de bota abaixo e não apresentou uma proposta política clara, fez uma intervenção maximalista, que diz: está mal, está mal, está mal; porém, nem uma listagem
apresenta. Enquanto o PSD e o CDS-PP dizem que este é um Orçamento da esquerda, e fazem umas propostas, vocês dizem que é um Orçamento igual ao dos outros, um Orçamento da direita.
Pergunto se também não está a sofrer de paralaxe e se este não será um Orçamento equilibrado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, como há mais oradores inscritos, pergunto se pretende responder já ou no final dos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Respondo no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então; a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, V. Ex.ª foi parcial nas considerações que teceu porque se esqueceu de alguns dados importantes deste Orçamento que, de certa forma, inferem as suas afirmações. Desde logo referiu que não apresentava qualquer cenário macroeconómico alternativo porque isso era da competência do Governo e que este cenário macroeconómico deveria ser reajustado. V. Ex.ª esqueceu-se que o aumento de 200 milhões de contos no investimento público que é previsto em relação à estimativa de execução do ano passado e que este Orçamento contempla irá ser, em si só, responsável por um aumento do PIB que poderá rondar cerca de 1 %.
Por outro lado, também se esqueceu que, neste Orçamento, houve um esforço em contemplar os menos favorecidos, nomeadamente em sede de tributação de IRS, uma vez que os escalões aplicáveis. àqueles que têm salários mais baixos são bastante mais aumentados do que os escalões aplicáveis àqueles que têm rendimentos mais elevados.
O mesmo acontece quanto à tributação das reformas, que foi extremamente agravada no governo do PSD, que chegou a baixar os escalões de isenção de tributação. Agora, foi feito um esforço muito grande de aumento do limite de isenção da tributação das pensões de velhice.
Relativamente às funções sociais do Estado, disse que havia um decréscimo, comparando com a estimativa de execução de 1995. De facto, V. Ex.ª esqueceu-se de verificar que a estimativa de execução de 1995 está afectada com uma transferência especial, para a Caixa Geral de Aposentações, de encargos relativos a reformados dos Ministérios da Administração Interna e da Defesa Nacional, que anteriormente eram suportados pelos respectivos Ministérios e, nessa altura, passaram a sê-lo pela Caixa Geral de Aposentações. Isso influi negativamente na comparação que fez.
O que é inegável é que este Orçamento reforça a despesa nas funções sociais do Estado e o seu peso no global da despesa do Orçamento para 1996.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, V. Ex.ª deveria tomar em consideração estes dados e chegar, ou não, à conclusão de que este Orçamento, pela forma como está elaborado, é um Orçamento de rigor, consegue juntar à dinamização da economia através do investimento público, da contenção do défice e da redução da inflação, com o consequente efeito nas taxas de juro, a consciência social que VV. Ex.as tanto clamam, e tanto clamaram da tribuna, mas que se esqueceram de ler no Orçamento que ora vos foi apresentado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, V. Ex.ª fez uma afirmação que eu não esperava porque tenho a maior consideração por si e sei que é uma pessoa rigorosa: afirmou que as despesas com a educação sofriam uma redução neste Orçamento. Ora, sabe que isso não 'é verdade. Sabe que existe um aumento...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - No investimento!

O Orador: - ... nas despesas consolidadas com a educação de cerca de 86 milhões de contos, ou seja, de 10,5%, e que o número que referiu é relativo apenas ao capítulo 50, ou seja; principalmente, a despesas de investimento...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Foi o que eu disse!

O Orador: - ... em edifícios, em betão, em tijolos. Não sei se V. Ex.ª está a começar a defender, nesta fase, as políticas prosseguidas pelo PSD durante tantos anos.
Aliás, este é um tema que deveria ser melhor discutido, porque é evidente que, na educação, a maior despesa é com pessoal. E a educação implica pessoas, seres humanos. Duvido que isso deva ser considerado despesa de funcionamento ou despesos correntes. Do meu ponto de vista, as despesas com a educação são um investimento, são despesas de investimento, provavelmente o mais importante e valioso que o País pode fazer, porque se trata de investir nos portugueses. Considerar isto

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despesas correntes, como se se tratasse uma despesa irrelevante, não me parece correcto.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Gostaria também de perguntar-lhe, na medida em que V. Ex.ª referiu mais uma vez, como a sua bancada sempre tem feito, a questão do défice e a vossa preocupação de que este seja contido, se acha que o défice pode aumentar, e, a aumentar, até onde. E pode aumentar de forma crescente ou desorganizada? Acha V. Ex.ª que é um método de gestão o endividamento do Estado? Se o é, até quando?
Se lhe faço esta pergunta é porque, de acordo com a minha experiência, tenho verificado que as câmaras municipais dirigidas pelo Partido Comunista Português, que, na generalidade e tanto quanto conheço, são bem dirigidas, por pessoas competentes responsáveis, a preocupação com o endividamento está sempre presente e, nessas câmaras municipais, a questão do défice é mantido em níveis quase sempre muito aceitáveis.
Como justifica essa diferença entre a actuação no poder, nas câmaras municipais, e a actuação na oposição, quanto à questão do défice?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Lino de Carvalho persiste em criar equívocos acerca do orçamento para a agricultura. Não aceitou a explicação dada em sede de comissão, nas reuniões realizadas antes do debate na generalidade, nem os argumentos que lhe foram dados aquando da aprovação do parecer final. De igual modo, não aceitou a expressão "Orçamento de rigor, com consciência social", e insiste no mesmo hoje, em sede de Plenário.
Sr. Deputado, o orçamento para a agricultura, para além de ter de ser visto como integrando o Orçamento do Estado como um todo, tem também de ser visto globalmente. E não pode, sob pena de criar inverdades, ser parcelar: Quando se diz que este Governo tem uma opção na área da agricultura e desenvolvimento rural, essa opção é fundamentada e clara. Lembro-lhe, aliás, que o Sr. Deputado, em anos anteriores, também defendeu a prioridade às infra-estruturas do regadio e à fileira florestal. Ora, se neste Orçamento há uma opção clara pelo regadio e pela fileira florestal, o Sr. Deputado não pode continuar a insistir em dizer que o orçamento para a agricultura é restritivo, quando, simplesmente, se integra no espírito de um orçamento de rigor.
Também lhe foram enunciadas diversas obras, tanto ao nível do regadio como do desenvolvimento florestal, que são consideradas fundamentais para o desenvolvimento do interior.
Sr. Deputado, concorda ou não connosco que a Cova da Beira está há muitos anos à espera da efectivação do projecto de regadio? Onde fica a Cova da Beira?! No litoral ou no inferior?! Então, a sua afirmação de que este Orçamento não é regionalmente equilibrado cai por terra, porque aqui está um aspecto em que há, com efeito, uma procura de desenvolvimento equilibrado do País, e com um grande investimento, como foi claramente explicitado no debate do Orçamento em sede de comissão. Aliás, outros números poderiam ser invocados e trazidos ao debate sobre o investimento no interior do País, onde o aumento em obras é significativo e o esforço de investimento é muito grande, para esbater a sua afirmação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, vou ter de ser breve, por causa da gestão dos nossos tempos.
Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, como sabe, é falso que decidamos primeiro e leiamos depois.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Eu não disse "lêem" mas, sim, "discutem"!

O Orador: - Como o Sr. Deputado sabe, começámos por fazer uma afirmação de princípio - que se confirma, aliás - de que este Orçamento iria estar constrangido e subordinado aos critérios de Maastricht, e, como tal, isso iria ter repercussão na contracção da despesa pública, ao nível do investimento e das funções sociais. Mas dissemos também que aguardaríamos pelo Orçamento, para o ler, para reflectir sobre ele e para tomarmos a nossa posição de fundo quando dele tivéssemos tomado conhecimento. Foi isso que fizemos. É, pois, o resultado dessa leitura, dessa análise e desse debate que trouxemos hoje ao Plenário.
Quanto ao problema do quadro macroeconómico alternativo, Sr. Deputado, apontei números, que não contestou, do Instituto Nacional de Estatística - posso oferecer-lhe esse documento -, que definem, para 1996, uma quebra do investimento privado das empresas de 3,5%.
Em relação ao célebre aumento do PIDDAC, o problema é que não sabemos qual é, de facto, esse aumento, porque os senhores, em vários momentos, entregaram-nos três mapas diferentes do PIDDAC. O primeiro foi-nos dado no relatório do Orçamento do Estado, para comparar com o executado de 1995, de modo a fazer crescer artificialmente o investimento público em 1996. No primeiro relatório do Orçamento do Estado...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não, não!

O Orador: - Sr. Deputado, deixe-me falar.
Dizia eu que no primeiro relatório do Orçamento do Estado consta uma estimativa de execução, no capítulo 50, para o financiamento nacional, de 378 milhões de contos. Depois, se fizermos o exercício nos próprios mapas do PIDDAC, essa estimativa já desce para 355,3. Agora, no documento do Departamento de Planeamento, que há dias nos chegou às mãos, este financiamento já desce, de novo, para 342 milhões de contos, exactamente para vocês podem chegar à conclusão de que, afinal, há um grande aumento do investimento público.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Ah! Então, não foi porque o PSD governou mal?!

O Orador: - Não, não. Estou apenas a falar nos vossos números!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Estranha conclusão!

O Orador: - Estamos a mostrar três mapas diferentes, que foram apresentados pelo Partido Socialista, já depois de elaborado o Orçamento e de entregue nesta Casa, com números substancialmente diferentes, em particular nos sectores onde o investimento não é aquele que deveria ser, como os da educação e da agricultura.

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Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, aconselho-o a reunir com o seu - penso que é - camarada de partido, João Ferreira do Amaral, para ele lhe explicar como chegou à ideia, que apresentou numa entrevista, de que, em 1996, o crescimento do PIB não deverá ultrapassar 1 %.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Não posso, não tenho tempo.
Quanto à questão da metalomecânica pesada, Sr. Deputado, o problema não está em tratar-se de empresas públicas mas, sim, na má gestão dos gestores do PSD e do PS que têm estado à frente do sector empresarial do Estado. Aliás, o senhor não desmentiu os números que apresentámos.
No que toca a propostas, o Sr. Deputado sabe que as temos. Temos até algumas que preocupam o Partido Socialista e que iremos apresentar em momento oportuno.
Sr. Deputado João Carlos da Silva, quanto às alterações aos escalões do IRS, como sabe, essa melhoria de que se fala só irá ter uma pequena incidência nas zonas de fronteira, em que os rendimentos passam para o escalão seguinte. De resto, não há praticamente qualquer consequência efectiva deste Orçamento e há até, em alguns casos, agravamento!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Há um desagravamento!

O Orador: - O Sr. Deputado Henrique Neto disse que, quanto às despesas com a educação, somos a favor do investimento no betão. Então o Sr. Deputado acha que pavilhões gimnodesportivos, a melhoria das instalações do ensino secundário e do ensino básico e a rede pública de educação pré-escolar são investimentos de betão? Não são investimentos necessários para o desenvolvimento da educação? É isto que baixa, Sr. Deputado, como confirma o vosso próprio relatório!

Aplausos do PCP.

Protestos do PS.

Quanto ao orçamento para o interior do país, posso oferecer-lhe o quadro que fiz e onde, distrito a distrito, lhe demonstro que todos os distritos do interior vêem baixar o investimento que lhes dedicado em sede de investimento do Plano:

O Sr. António Martinho (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Há um efectivo agravamento do desequilíbrio regional do investimento. Posso demonstrar-lho com os mapas que temos aqui. É por isso que dizemos que este Orçamento não serve o País nem o emprego.

Aplausos do PCP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É um erro de paralaxe regional!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, estão ainda inscritos oito Deputados e dois membros do Governo, o que significa que temos mais inscrições do que tempo disponível, uma vez que ultrapassámos já o momento convencionado para terminar a sessão de hoje. No entanto, o primeiro inscrito é o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, e, como creio tratar-se de uma defesa da honra, é o único a quem dou a palavra neste momento. Os restantes inscritos intervirão amanhã, mantendo-se as inscrições pela ordem que foram feitas.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, pretendia realmente exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração, com carácter retroactivo - é como o PS a legislar sobre impostos! -, mas deveria estar presente o Sr. Deputado Manuel Monteiro. Como não está, não vou intervir. No entanto, informo que a minha honra continua ofendida até amanhã.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem, os tempos sobrantes serão acrescentados aos de amanhã.
Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.

Partido Social Democrata (PSD):

Arménio dos Santos.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Luís Carlos David Nobre.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Rui Manuel Pereira Marques.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Carlos Manuel Amândio.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Mário Manuel Videira Lopes.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio.
Francisco Antunes da Silva.
José Mendes Bota.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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DIÁRIO da Assembleia da República
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