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Sexta-feira, 12 de Abril de 1996 1767

I Série - Número 56

VII LEGISLATURA

1.A SESSÃO LEGISLATIVA (1995 -1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE ABRIL DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos diplomas, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Francisco de Assis (PS) enalteceu a necessidade da regionalização para o País e o empenho do seu partido nessa reforma. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Carlos Encarnação (PCP) - que também defendeu a consideração da sua bancada e respondeu a interpelações do Sr. Deputado Jorge Lacão (PS) - e Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Luís Sá (PCP) referiu-se à importância do processo de regionalização e às propostas do seu partido, respondendo ainda a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Eurico Figueiredo (PS).
O Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) criticou a política do Governo e a actuação do PS em vários domínios da política nacional e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado José Junqueiro (PS).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, das propostas de lei n.º I7/VII - Estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores e revoga a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto, e 20/VII - Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais. Produziram intervenções, além da Sr.ª Ministra do Ambiente (Elisa Ferreira) e do Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente (José Sócrates), os Srs. Deputados Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes e José Magalhães (PS), José Calçada (PCP) e Calvão da Silva (PSD).
Entretanto, foram aprovados, na generalidade, os projectos de lei n. º 29/VII - Cria uma rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção de toxicodependentes (PCP) e 64/VII - Permite a constituição como assistentes em processo penal no caso de crime de índole racista ou xenófoba por parte das comunidades de imigrantes e demais associações de defesa dos interesses em causa (PS).
A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando um Deputado do PS e dois do PSD a deporem em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram I S horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pinto Camilo.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Soares Palmeiro Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro, Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Caudal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Lameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Miguel Bernardo. Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Rita Maria Dias Pestana Cachuxo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura. 

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.

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Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madaíl.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral. ,
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio .Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José dá Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galeão Lucas.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dós Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Rui Manuel Pereira Marques.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas : projectos de lei n.º5 133/VII - Garante o direito à igualdade de tratamento no trabalho e no emprego (PCP), que baixou às 1.º, 8.º e 12.º Comissões, 134/VII - Introduz uma alteração ao Estatuto dos Deputados (PCP), que baixou à 1.º Comissão, 135/VII - Alteração ao regime jurídico das petições dirigidas à Assembleia da República (PCP), que baixou à 1.º Comissão, e o projecto de resolução n.º 19/VII Revisão do Regimento da Assembleia da República (PCP).
Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios das. Finanças e do Equipamento Social, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Amândio; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Alegre; à Secretaria de Estado da Comunicação Social, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar; ao Sr. Ministro Adjunto, formulado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Octávio Teixeira, Ruben de Carvalho, Heloísa Apolónia, Luís Sá, Bernardino Vasconcelos, Lino de Carvalho e Rodeia Machado, Roleira Marinho, Sílvio Rui Cervan e António Maninho, António Filipe, Fernando Pedro Moutinho, António Rodrigues e José Calçada, e Cardoso Ferreira.
Informa-se ainda a Câmara de que a Comissão de Agricultura, Desenvolvimento `Rural e Pescas se encontra reunida na Sala do Senado e que a Comissão Parlamentar de Análise e Acompanhamento da Realização da EXPO 98 reunirá às 16 horas e 30 minutos na sala 251-G.

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A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente, no dia 24 de Fevereiro, nesta Câmara, interpelei a Mesa sobre o problema dos cartões magnéticos indevidamente usados, em minha opinião, em certas empresas de calçado do norte para ferir direitos dos trabalhadores na utilização do tempo laboral.
Vejo que hoje foram publicadas notícias nos jornais de que a Inspecção-Geral do Trabalho, apoiada num comunicado do Ministério para a Qualificação e o Emprego, considera este comportamento ilegal e ilegítimo e pretende notificar as empresas da respectiva punição. Ora, como tinha feito uma interpelação à Mesa, no sentido de a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias se pronunciar sobre esta matéria e tendo tido conhecimento desse parecer do Ministério para a Qualificação e o Emprego, a que não tive acesso, solicito à Mesa um esforço no sentido de esta Assembleia ser informada acerca dele e das diligências da Inspecção-Geral do Trabalho sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - A Mesa toma nota, Sr.ª Deputada.
Inscreveram-se, para uma declaração política, os Srs. Deputados Francisco de Assis e Luís Sá.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dando pleno e cabal cumprimento a um compromisso assumido com os portugueses, aquando do período que antecedeu as últimas eleições legislativas, o Grupo Parlamentar do PS entregou hoje na mesa da Assembleia da República dois projectos de lei, um, de criação das regiões administrativas, outro, visando a introdução de alterações à lei-quadro das regiões e ainda um projecto de deliberação acerca das consultas públicas a levar a cabo pela Assembleia no âmbito do desenvolvimento deste processo, de modo a assegurar a máxima transparência e uma ampla participação democrática em cada momento da sua evolução.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Atribuímos, como é evidente, uma enorme relevância ao conjunto destas iniciativas que traduzem, de forma indesmentível, uma adequação absoluta entre a actuação da nova maioria agora investida em funções de agravada responsabilidade e o discurso propositivo apresentado pelo PS em período pré-eleitoral. Não esquecemos nem renegamos os compromissos então estabelecidos, não metamorfoseamos posições e comportamentos, não abdicamos de convicções nem contrabandeamos desígnios. Agrada-nos particularmente salientar a fidelidade agora manifestada para comum compromisso regional, matéria em que no passado soçobraram tantas vontades e se diluíram várias e impetuosas ambições. Ainda bem que agora o Governo e a maioria parlamentar que o sustenta não estão dispostos a nenhuma rendição que se traduza no adiamento de uma reforma que se nos afigura essencial por vários e relevantes motivos.
A opção pela regionalização, integrada no contexto mais amplo de uma profunda reforma do Estado, do sistema político e da Administração Pública ancora-se no desejo de promover uma efectiva descentralização dos serviços e entidades públicas que, a nosso ver, só poderá ser verdadeiramente realizada se enquadrada em novos espaços institucionais que assegurem a estruturação e validação de vontades políticas de expressão regional.
Por razões históricas que a limitação de tempo me dispensa de explicitar, Portugal detém uma estrutura administrativa excessivamente centralizada, dependente de um sistema decisório especialmente concentrado e, por isso, funcionalmente pouco eficaz. Daí resultam graves distorções que tendem a opor um centro hipertrofiado a uma periferia parcialmente desertificada, com o que se ofendem regras de participação e transparência democráticas e se potencia a emergência de um processo de desenvolvimento desequilibrado sob o ponto de vista territorial e injusto no plano social.
A criação de uma nova, esfera de participação, representação e decisão à escala regional proporcionará o alargamento e aprofundamento do espaço de discussão e contratualização públicas e assegurará uma distribuição mais correcta de recursos e investimentos pelo território nacional. Para nós é, pois, claro que a regionalização tornará mais viva a democracia, mais estimulante a participação cívica e mais fácil o desenvolvimento equilibrado do conjunto do País.
Admitindo como um dado adquirido a tradição municipalista do País e reconhecendo a este nível de administração potencialidades ainda não plenamente desenvolvidas, investimos, na criação das regiões, profundas expectativas quanto ao reforço da coesão nacional que numa sociedade moderna e exigente já se não alicerça essencialmente na contemplação retrospectiva dos mitos fundadores mas antes na tomada de consciência de um destino comum e plenamente partilhado sem exclusões de qualquer espécie.
A opção do PS pela regionalização não decorre pois de uma visão fragmentada do País nem traduz qualquer desejo de dissolver uma unidade nacional forjada em séculos de história conjunta. O que esta opção contraria é a posição a todos os títulos inaceitável que tende a identificar a unidade da nação portuguesa com uma matriz centralista, uniformizante e até mesmo tendencialmente autoritária, que, ultra-periferizando os particularismos regionais, visa impor a sua subalternização estrutural. É. certo que Portugal não é atravessado por linhas de fractura de ordem étnica, linguistica ou cultural mas também é verdade que a inexistência de instâncias de formação e manifestação de tensões e ambições regionais pode segregar ressentimentos geradores de lógicas identitárias perversas. Significa isto que queremos regionalizar para que a nação se afirme e vitalize e não para que ela se atrofie e enquiste. Não aceitamos, por isso, lições de patriotismo de ninguém.
Estribados assim numa convicção que o tempo tem fortalecido e animados pela ambição de concretizar uma reforma em que depositamos tantas esperanças, abordaremos esta questão e o seu correlativo processo com uma determinação que, não contendendo com a sensatez, não aceitará a convivência de hesitações inúteis ou subterfúgios perversos.
Não queremos nem nunca quisemos ocupar solitariamente o palco de apresentação das grandes reformas nacionais. E, porque recusamos o dogma e nunca nos julgamos investidos de qualquer desígnio providencial, não nos encerraremos na auto-contemplação narcísica da acção que realizamos nem nos fecharemos, com obstina-

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ção cega, à celebração de amplos entendimentos nacionais. Essa não é como nunca foi a nossa postura.
Mas também não estaremos dispostos a alienar responsabilidades nem abdicaremos de seguir as nossas convicções mais profundas e de procurar materializar os propósitos que suscitaram a adesão dos portugueses ao projecto que visamos realizar. Significa isto que o PS, nesta como noutras matérias, está disponível para a discussão, a cooperação e até o entendimento mas consideraria espúrio qualquer consenso que se firmasse na base da abdicação e da renúncia. Haverá de resto que salientar que o consenso não constitui a finalidade última da acção política nem tão-pouco o pressuposto da bondade ou da validade dessa mesma acção. O consenso não é um método nem um objectivo e, ilegitimamente elevado àquilo que não deve ser, pode fomentar a paralisia e o atrofiamento, perpetuando soluções decrépitas, agravando problemas, retardando soluções. É bom lembrá-lo a quem hoje prega o consenso para iludir uma indefinição e contraria a ruptura para manter um equívoco.
A visão que temos da democracia representativa não exclui a valorização da participação popular e democrática. Sempre tivemos o entendimento de que uma reforma tão importante como a da criação de regiões administrativas deveria, no decorrer do seu próprio processo formativo, integrar a contribuição dos portugueses - contribuição essa que no actual contexto constitucional se realizará predominantemente por via orgânica através da auscultação das opiniões dos órgãos deliberativos municipais e das associações nacionais de municípios e freguesias, mas sempre considerámos desejável que num novo quadro constitucional se operasse por recurso à intervenção directa dos eleitores.

Aplausos do PS.

Também neste capítulo sempre fomos claros, posição que mantemos. Entendemos que, se possível, isto é, se a revisão constitucional ocorrer em tempo útil, os .portugueses devem pronunciar-se por via referendária sobre a eventual actualização de uma possibilidade que cabe à Assembleia da República proporcionar, não ilidindo assim a responsabilidade que detém em matéria da aprovação de um modelo de regionalização do País. Ao eleitorado caberá depois, numa base regional, exprimir a sua vontade quanto à actualização prática de uma possibilidade que lhe é apresentada. É este o entendimento sério e rigoroso que temos de uma democracia onde a função representativa não deve anular ou subestimar a componente participativa mas também não deve buscar nela alibis para se demitir da realização dos deveres que lhe estão consignados.
O PS não tem qualquer receio em afirmar esta posição porque não desconfia dos méritos da regionalização. Já o mesmo não acontece com alguns partidos representados nesta Assembleia.
O PSD é o maior partido da oposição e aquele a quem maximamente incumbe a função de elaborar e sustentar uma alternativa ao Governo e, se no respeito pela sua independência e pelo seu livre arbítrio nos não é lícito definir apriorística e rigidamente qual deve ser a natureza do seu comportamento em ordem à sua credibilização pública, é no entanto legítimo que questionemos democraticamente a sua postura, as suas propostas e as suas contestações. Não pertencemos ao rol daqueles que pensam que, uma vez sufragados eleitoralmente e institucionalmente investidos em funções, os governos e as maiorias que os suportam se tornam depositários de uma legitimidade etérea e extra-política. Bem pelo contrário, sabemos que não há governação neutra e objectiva, que toda a governação assenta em opções políticas sujeitas a um exame crítico e destinadas a uma avaliação no plano do debate público. É esta a visão que nos orienta.
Dito isto é importante referir também, em nome da clarificação e do rigor, que, em matéria de regionalização, o PSD está a agir com o cinismo de quem não tem convicções, a manha de quem labora numa enganosa indefinição e a demagogia de quem apela agora à participação do povo para que o povo não perceba que se desconfia da sua capacidade de auto-governação no plano regional.

Aplausos do PS.

Para a nova direcção do PSD, o referendo tornou-se o alfa e o ómega da sua estratégia de afirmação política e, por isso, tenderá a falar cada vez mais do referendo e cada vez menos de regionalização com o intuito de aparentar uma agregação interna que esconda a sua profunda divisão neste domínio. Aliás, não sabemos mesmo se tão falacioso estratagema se destina também a esconder a indefinição e divisão interiores da consciência do novo líder, já que verdadeiramente não conhecemos, nem ninguém conhece, o teor da sua posição actual em relação à questão regional. É caso para perguntar: por que quer o Professor Marcelo Rebelo de Sousa esconder a sua posição aos portugueses?
Era bom que, agora, investido em funções de extraordinária relevância político-institucional, o imaginativo criador de factos políticos que o líder do PSD já demostrou ser se empenhasse em substancializar pensamentos e posições claras e as apresentasse com rigor ao país. A política não é uma questão de gestão de ilusões, a política tem de ser uma questão de afirmação de convicções.
É em nome de uma convicção num projecto e de uma visão de um Portugal moderno, activo e mobilizado no dealbar de um século que apelará como nenhum outro à criatividade dos povos que nos bateremos com uma determinação sem desfalecimentos por uma causa que julgamos justa e inadiável.
É em nome do rigor e da clarificação que desafiamos quem quiser realmente participar neste processo a apresentar o seu projecto de criação de regiões sem tibiezas nem equívocos.

Aplausos do PS.

É esse o desafio que fazemos, garantindo que, pela nossa parte, estaremos disponíveis para o agendamento simultâneo das iniciativas que venham a ser apresentadas em tempo útil.
Os governos fracos, as maiorias receosas, os homens indecisos tudo sacrificam à gestão de equilíbrios que assegurem á perpetuação das suas posições privilegiadas. Pelo contrário, os governos fortes, as maiorias determinadas, os homens resolutos estarão sempre mais dispostos a abdicar do aparente conforto de poder a desistir das suas convicções. Por isso só estes últimos têm a capacidade de reformar e deixar uma marca impressiva na história.
O destino deste Governo e desta nova maioria não há-de ser o da imolação dos seus desígnios no altar das

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suas conveniências mas antes o da afirmação das suas posições neste tempo tão decisivo que é o nosso.
Pelo consenso sempre que possível; pela ruptura quando necessário, nunca ignorando o diálogo, jamais renegando o projecto, o nosso trajecto haverá de iluminar novos horizontes para o futuro de Portugal. E é no âmbito desta ambição que lograremos alcançar o objectivo de regionalizar o país.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Sá, Carlos Encarnação e Jorge Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, creio que todos aqueles que, ao longo de 20 anos, tal como o Partido Comunista Português, sempre defenderam as regiões administrativas, só poderiam congratular-se com o facto de o PS ter apresentado dois projectos de lei que lamentamos ainda não ter tido oportunidade de analisar mas que faremos com todo o cuidado possível.
Não deixa de ser estranho, aliás, que aqueles que têm feito campanha para se servirem dela hipocritamente a fim de alterar o sistema eleitoral em torno da aproximação dos eleitos aos eleitores não aproveitem a criação das regiões administrativas (uma oportunidade importantíssima) para garantir essa aproximação que tanto têm reivindicado com outros propósitos.
E aqueles que falam do referendo nacional, em particular sobre esta matéria, também seria bom que perguntassem a si próprios se, em 1994, quando passaram a opor-se às regiões administrativas e a impedir que as mesmas fossem criadas em Portugal, se preocuparam em saber antes se o povo português e o País as queriam ou não. Do mesmo modo, também não quiseram saber se eram aceites ou não as comissões de coordenação regional, a concentração da administração periférica do Estado em cinco cidades, o esvaziamento das outras cidades e capitais do distrito nem se o País era receptivo ou não a matérias tão importantes como o Tratado da União Europeia.
Neste momento, dizem que são a favor das regiões administrativas e naturalmente que o referendo que preconizam impõe uma campanha eleitoral. Então, por que é que, em vez da campanha em torno do referendo, não experimentam fazer uma campanha a favor das regiões administrativas já que, depois de tantas piruetas, agora dizem ser a seu favor?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Isso é para nós ou para o PS?

O Orador: - Entretanto, é evidente que o PS, não tendo a maioria absoluta na Assembleia da República, tem de negociar. O Primeiro-Ministro e o Partido Socialista têm todo o direito de ter as posições que bem entendam em matéria de áreas, de atribuições e competências, de calendário e de meios financeiros, mas creio que não podem deixar de negociar. E a questão que se coloca é a de saber com quem negociar, se com aqueles que se opõem à regionalização, se com os que sempre a defenderam.
Sr. Deputado Francisco de Assis, gostava de saber se tem consciência, por um lado, de que o PS precisa de negociar e, por outro, que tem de fazê-lo com os que defendem as regiões administrativas. Porque o problema que está colocado face às posições do PSD é o de saber se o PS vai negociar com o PCP ou se está disposto, nesta matéria, a ceder à chantagem, designadamente quando se pretende, através do referendo, seja nacional seja regional, criar dificuldades às regiões e obter uma revisão relâmpago à margem dos trabalhadores, da opinião pública, do País.
Nesta matéria, de resto, quero lembrar que o constitucionalista Marcelo Rebelo de Sousa afirma poder fazer-se uma revisão num mês e meio. A revisão de 1989 demorou 20 meses, o que significaria que, a começar agora, estaria pronta em Dezembro de 1997. A revisão de 1982 demorou 16 meses, o que significa que, a começar agora, estaria pronta em Agosto de 1997.
Ora, o que se pretende verdadeiramente nesta matéria? Ocultar a oposição à criação das regiões administrativas ou, pelo contrário, obter do PS, através de um processo de chantagem, uma revisão -"relâmpago" na qual questões como os direitos', dos trabalhadores, os direitos sociais e o sistema eleitoral entrariam a "reboque" da questão do referendo e da dá regionalização, "matando dois coelhos de uma cajadada": conseguir a revisão constitucional e, simultaneamente, adiar indefinidamente a regionalização?
O PS vai ou não resistir à chantagem? Esta é a questão que colocamos, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, a pergunta substantiva que me colocou foi a de saber se, em matéria de regionalização, o PS está ou não disponível para encetar um processo negocial com outros partidos que também estejam dispostos a abraçar esta causa.
Entendemos que a regionalização não é questão que se negoceie mas, naturalmente, estamos dispostos a dialogar com todos os que queiram contribuir, activa e positivamente, para a formulação de um vasto consenso nacional em torno de uma reforma que, pela sua importância, deve ser suscitadora da participação de todas as formações partidárias.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas responsabilizaremos pela inexistência desse consenso aqueles que, activamente, se excluírem da participação no sentido da produção desse mesmo consenso. É que, como tive oportunidade de dizer há pouco, somos pelos consensos criativos, somos pelos consensos que significam avanço; somos pelos consensos que significam materialização de novas posições, mas seremos sempre contra consensos. estabelecidos na base da chantagem que outra coisa não provocam que não seja a paralisia que assegura a manutenção de soluções decrépitas e totalmente ultrapassadas.
A resposta é claramente esta, Sr. Deputado: estamos como sempre estivemos, ontem, na oposição, hoje, no poder, disponíveis para dialogar, conscientes de que o diálogo é um método essencial da democracia, mas também certos de que o diálogo não é o fim último da ac-

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tividade política e que, por vezes, dirigido nessa concepção finalista, acaba por ser o melhor dos alibis para que nada se faça, nada se mude, nada se transforme.
Em nome do consenso, apelamos uma vez mais à participação activa de todas as formações partidárias neste processo, mas não ficaremos prisioneiros de chantagens mesmo que elas apareçam sob a forma de apelos a consensos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Agora é que vai ser interessante: comece por dizer se é a favor ou contra a regionalização!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, felizmente, fez hoje uma intervenção mais modesta do que costuma fazer quando tem intenção de defender o Governo. Hoje, tentou fazer uma pequena reflexão acerca da regionalização. Foi uma reflexão' oportuna, principalmente porque esta discussão está agendada para a sessão de 2 de Maio. Ora, estamos a 11 de Abril e V. Ex.ª, segundo disse, acabou de entregar na Mesa o projecto de lei sobre esta matéria. Isto significa, em si mesmo, a importância que V. Ex.ª dá à discussão do tema. Isto é, em 11 de Abril, entrega um projecto para ser discutido em 2 de Maio!

Aplausos do PSD.

Mas admito que V. Ex.ª tenha moderado a sua intervenção, não porventura em relação às posições iniciais do Partido Socialista quanto a esta pressa mas, fundamentalmente, em relação à reflexão do Sr. Ministro João Cravinho acerca desta matéria. Fez-lhe bem, Sr. Deputado, ter estado nas jornadas parlamentares do seu partido, ter ouvido alguma voz de bom senso. que das catacumbas se ergueu e disse que, afinal, o Partido Socialista não deveria querer tão depressa aquilo que anunciava aos quatro ventos.
Aliás, Sr. Deputado, penso que, realmente, os senhores não querem fazer isto depressa...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não percebeu nada!

O Orador: - ... porque, se quisessem fazer depressa a regionalização, a metodologia que propõem não é a que deveria ser seguida. O que os senhores dizem é o seguinte: "Vamos discutir um projecto, vamos aprovar um projecto." "E, depois?", pergunto eu. "Depois, partimos para a discussão pública", respondem.
Ora, o único problema que se põe é o de que já partem para a discussão pública com a prévia definição das regiões. Quais regiões? Que competências? Que poderes? Que atribuições? Que financiamentos? Ninguém sabe! E VV. Ex.as dizem: "Mas por que é que havemos de estar a discutir isso? Mas por que é que isto há-de estar a ser discutido agora?" E, depois de o Partido Social-Democrata ter brandido a questão do referendo, perguntam: "Por que é que não fazemos depois referendos regionais?" O PSD diz que devemos fazer um referendo nacional sobre esta questão, ao que o Partido Socialista responde: "Esse referendo nacional é inconstitucional".
Mas, em seguida, acrescentam: "Vamos fazer referendos regionais". E os referendos regionais são constitucionais, Sr. Deputado?
Qual é o prazo que prevê ara a realização da regionalização? É para este ano? É para o ano? É para daqui a três anos? Quando é que o Sr. Deputado Francisco de Assis diz que este negócio está pronto? Porque é de um negócio que se trata, Sr. Deputado Francisco de Assis!

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - É que a "declaração de amor" que ouviu da parte do Partido Comunista Português nesta sessão é a clara denúncia de que está feito o negócio entre o Partido Socialista e o Partido Comunista acerca da regionalização do País.

Protestos do PS.

É por isso mesmo que VV. Ex.as não querem ouvir ninguém. Se VV. Ex.as não tivessem medo e quisessem ouvir o que o povo tem a dizer acerca disto, aceitariam o referendo nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, a questão que aqui se coloca não é de teimosia nem de chantagem. O Partido Social-Democrata já disse, pela voz do Professor Rebelo de Sousa, que é a favor do referendo, portanto, a questão fundamental que se coloca é a de saber ouvir as pessoas para saber se o povo português quer ou não ou referendo e em que medida o quer.
Sr. Deputado Francisco de Assis, o problema que se põe é o de que também os senhores estão aficar profundamente isolados nas vossas posições. Podem confrontar-se e confortar-se com as posições da bancada do Partido Comunista, mas se querem fazer um consenso na sociedade portuguesa, então, ouçam a voz do Sr. Presidente da República que, ainda hoje, implicitamente, defendeu o referendo, ouçam a voz dos líderes de opinião que, na sua grande maioria, defendem também o referendo, prestem atenção às sondagens que, em 90%, dizem que deve realizar-se o referendo.
Sr. Deputado Francisco de Assis, esta é uma questão de razão e de bom senso. E, nesta altura e neste domínio, o PSD tem razão e tem bom senso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, é para informar V. Ex.ª que, tendo o Partido Socialista suscitado, para o próximo dia 2 de Maio, através da figura do agendamento potestativo, o debate das matérias relativas à criação das regiões administrativas, está inteiramente disponível para rever a data desse agendamento...

Vozes do PSD: Ah!

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O Orador: - ... no caso de o PSD, no debate de hoje, dizer que precisa de mais algumas semanas para preparar o seu projecto de lei para a criação das regiões administrativas.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Grupo Parlamentar do PSD tomou boa nota da sua interpelação.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, tinha pedido a palavra também em jeito de interpelação à Mesa, não é verdade?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa nos mesmos termos da do Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, é só para dizer que compreendo a intranquilidade do Sr. Deputado Jorge Lacão em relação a esta matéria.
Assim, faria um outro desafio ao Sr. Deputado, através da Mesa. Perguntaria ao Partido Socialista, através de V. Ex.ª, Sr. Presidente, para quando quer o PS agendar o início da revisão constitucional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nessa altura precisa, estaremos dispostos a resolver e a discutir uma questão de regime como é a da regionalização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, quem devolve o eco são as paredes! Eu ainda não sou uma parede! Não me leve a mal, mas o Sr. Deputado Jorge Lacão ouviu perfeitamente o que disse, portanto, tem a palavra para responder, em jeito de interpelação.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Para o Partido Socialista, a partir do momento em que, sem nenhuma reserva mental, aprovámos no Plenário da Assembleia da República a criação da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, esse processo, politicamente, já teve o seu início. E o que esperamos é que nenhum partido utilize a revisão constitucional, essencial à modernização do sistema político, como uma arma de chantagem para encobrir a sua incapacidade de responder às reformas imprescindíveis para Portugal e para os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenham paciência, mas acabou o uso de palavra cem jeito de". Isto é, não podemos continuar a fazer interpelações que não o são.
Vou dar um esclarecimento aos Srs. Deputados, pois também não sou totalmente alheio ao problema da iniciativa de pôr a funcionar a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Hoje, em sede conferência de lideres, vamos fixar a data até à qual os grupos parlamentares me indicarão os seus respectivos representantes na Comissão, após o que darei imediatamente posse à mesma e convocarei uma reunião para escolher o seu presidente e os membros da sua direcção. A partir daí, compete à Comissão fixar o ritmo dos trabalhos pois já nada terei a ver com isso.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é novamente em jeito de interpelação? É que não podemos desvirtuar esta figura regimental...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, sabe que tenho o maior respeito por V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Eu sei, Sr. Deputado. Mas, agora, o que está em causa é o respeito pela figura regimental da interpelação à Mesa e não por mim próprio.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente!
O que queria perguntar a V. Ex.ª era, precisamente, qual foi o respeito pela figura regimental que permitiu que o Sr. Deputado Jorge Lacão tivesse intervindo agora. Isto é, a que título?

O Sr. Presidente: - Ao mesmo título a que interveio antes e a que V. Ex.ª interveio depois.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Então, V. Ex.ª vai permitir-me que faça também uma interpelação à Mesa...

O Sr. Presidente: - Faça, Sr. Deputado...

O Orador: - ... e que diga ao Sr. Deputado Jorge Lacão, por este intermédio, que estaremos absolutamente prontos, quando ele quiser, a iniciar a discussão da revisão constitucional e a iniciar a discussão da regionalização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis, para responder ao pedido de esclarecimentos que lhe foi formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, nesta matéria, como V. Ex.ª está sem condições e como, desde há algum tempo, lhe escasseia a imaginação, refugiou-se em argumentos de natureza meramente formal e acabou por ser bem a imagem da divisão trágica que, neste momento, percorre a esmagadora maioria dos Deputados do PSD...

Risos do PSD.

... e que, de resto, tem a expressão paradigmática no comportamento recente de um seu ilustre companheiro de partido, o Professor Valente de Oliveira, que, durante 10 anos, no exercício de funções governativas, foi obrigado a renegar as suas convicções regionalistas e que, mal saiu

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do Governo, foi a correr escrever um livro a enaltecer os méritos e as virtudes da regionalização.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Carlos Encarnação, como não está ao seu alcance escrever esse livro, porque não tem conhecimentos técnicos dessa ordem que lhe permitam seguir por esses caminhos,...

Protestos do PSD.

... refugiou-se em argumentos de natureza estritamente formal e não foi capaz de dizer qual é, de facto, a posição do PSD sobre a regionalização, nem de responder ao desafio que lhe fiz. Se os senhores receiam que a regionalização seja um negócio entre o PS e o PCP, admitam participar e dar o vosso contributo, apresentando o vosso próprio projecto de regionalização, porque estaremos disponíveis para o discutir e debater convosco, com toda a abertura mental, uma questão que é essencial para a reforma do Estado e da Administração Pública e que deve ser encarada como instrumento vital para a promoção do desenvolvimento do País.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à articulação entre os dois processos - ode regionalização e o de revisão constitucional -, é bom lembrar-lhe que o PS, em nenhuma circunstância, aceitará a desconstitucionalização da regionalização. Fica, por isso, respondida a questão que V. Ex.ª colocou de forma sub-reptícia.
Como é natural, estamos empenhados em dar o nosso contributo no âmbito do processo já iniciado de revisão constitucional para a modernização do sistema político português. Também entendemos que essa reforma é vital e importante, mas não estabelecemos qualquer relação necessária entre dois processos autónomos que, se coincidentes no tempo, podem ter alguma interinfluência. Eles não podem, contudo, ficar dependentes um do outro, sob pena de paralisarmos uma das reformas essenciais que nos propomos levar a cabo no contexto desta legislatura: a regionalização.
Espero, sinceramente, que na próxima interpelação, quando eu vier elogiar, de novo, o Governo do País, V. Ex.ª esteja mais convicto, revele mais imaginação e, por isso, se encontre mais à altura da forma a que nos habituou no passado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, como já vai sendo hábito, para defesa da consideração da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Assis, começa a ser difícil debater qualquer coisa com o Partido Socialista. Senão vejamos: o Sr. Ministro João Cravinho é o único que sabe de estradas, auto-estradas e outras coisas que tais, por isso se um Deputado eleito pelo círculo da Madeira que se ergue para discutir essa matéria, dizem que não percebe nada disso e não pode discutir com o Sr. Ministro; o .Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira é o único que sabe de matérias orçamentais e o Sr. Deputado Francisco de Assis é o único que sabe sobre regionalização e nenhum outro poderá falar consigo, de igual para igual, nessa matéria!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - São a luz da luz!

O Orador: - Veja bem, Sr. Deputado, esta é a atitude de que acusavam o PSD, em tempo anterior, elevada ao cúmulo! É o supra-sumo da arrogância!
Os senhores têm de compreender a necessidade de aqui discutir politicamente as matérias, tendo presente que todas as opiniões são igualmente relevantes. Assim, não cabe a V. Ex.ª fazer a distinção entre o que é bom ou mau, entre o que pode ou não ser dito ou entre aquele que pode ou não falar sobre determinados assuntos, porque foi isso que o Sr. Deputado fez!
Sobre a minha convicção, Sr. Deputado, tenho apenas a dizer-lhe algo muito simples: falei-lhe da convicção do PSD, e o que o PSD pensa sobre esta matéria está muito ligado à razão que todos temos e que o povo nos reconhece. Estamos a querer realizar uma reforma essencial ao nível do Estado, porventura uma das mais difíceis, que todos têm a consciência de que deve ser ter lugar no País, mas para isso temos de criar as condições necessárias para que ela seja feita em consciência. Há que devolver a palavra às pessoas, ouvi-las sobre questões concretas e não acenar com uma bandeira imprecisa!
É preciso que pessoas com a estatura moral, intelectual e profissional do Professor Valente de Oliveira venham publicar os livros que VV. Ex. as não publicaram, para que também os leiam, aprendam e possam discutir com consciência, de forma a virem até junto de nós confirmar que estes homens têm razão, porque esta é, de facto, uma reforma muito difícil e complicada que tem de ser feita com a participação de todos os portugueses, e nenhum português pode ser excluído dela!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente,. Sr. Deputado Carlos Encarnação, V. Ex.ª ofendeu-se sem qualquer razão. Não pretendi, de forma alguma, diminuir as suas possibilidades de intervenção neste contexto, nem em qualquer outra discussão de âmbito político nesta Assembleia. Tão só afirmei que não estava ao alcance de V. Ex.ª escrever um livro com igual densidade daquele que foi escrito pelo Professor Valente de Oliveira sobre matéria de regionalização! Mas se V. Ex.ª ficou ofendido e me quer desmentir, fico à espera do próximo livro sobre a regionalização que sairá, dentro em breve, numa editora de Coimbra, da autoria do Deputado Carlos Encarnação, e prometo lê-lo com a mesma atenção com que li o do Professor Valente de Oliveira!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em nome da humildade, devo dizer-lhe que não me sentiria tecnicamente habilitado a elaborar um livro com aquela profundidade, embora isso em nada diminua a minha, ou a sua, possibilidade de participação

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num debate político sobre esta matéria, em que se confrontam opiniões e posições políticas sobre essa questão. O primado do político em relação ao técnico faz parte) de uma das referências mais fundamentais da minha formação política e em nenhuma circunstância me atreveria a pô-lo em causa.
Caso contrário, se discutíssemos apenas questões em que V. Ex.ª é, supostamente, especialista, ficávamos remetidos à discussão de questões de polícia, assunto em que parece que o Sr. Deputado foi especialista em tempos..., embora os resultados também não tivessem sido muito brilhantes!

Vozes do PS: - Muito bem!.

O Sr. Presidente: - Em substituição do Sr. Deputado Jorge Ferreira, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa para pedir esclarecimentos.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, a sua intervenção nada esclareceu sobre o que o PS quer e pretende para a regionalização e para o País. De facto, não ficámos esclarecidos quanto ao teor do projecto do PS, nem relativamente aos consensos que diz querer atingir. Pelo contrário, ficámos esclarecidos, e bem, quanto a alguns e importantes aspectos, que passo a citar.
Em primeiro lugar, a sua intervenção permitiu que o Sr. Deputado Luís Sá viesse dizer que, afinal, isto é um negócio para o PCP!
Em segundo lugar, ficámos esclarecidos quanto à desvalorização que os senhores fazem do referendo. Para tanto, basta ler o comunicado que emitiram a seguir às jornadas parlamentares do PS, em que colocaram os referendos regionais apenas na categoria do desejo e não na categoria da vontade, firme e absoluta, de que se realizem. É apenas e tão só um desejo!
Sobre a regionalização, e ainda em matéria de referendo, a posição adoptada pelo PS faz lembrar o far west: primeiro dispara e só depois. é que pergunta!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, ficou claro que, afinal, entre o PS e o PSD não existem tantas diferenças como parecia.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - São siameses!

O Orador: - Por exemplo, um dos argumentos agora utilizados pelo PS para rejeitar o referendo nacional sobre esta matéria é, exactamente, aquele que o PSD utilizou, há cerca de três anos, para rejeitar o referendo sobre Maastricht.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP):- Muito bem!

O Orador: - Ou seja, os argumentos que eram bons para o PSD há três anos são agora bons para o PS. Há aqui, portanto, uma grande similitude entre o PS e o PSD.
Com as suas palavras, também ficámos esclarecidos quanto ao facto de o Governo e a maioria que o sustenta não quererem imolar a regionalização às conveniências do Executivo, mas já não sobre se o. Governo e o PS não querem fazê-lo às conveniências do PS e da sua "rapaziada"!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Que linguagem é essa!

O Orador: - Preocupou-nos também o facto de o PS ter inventado um novo conceito de democracia, o de democracia orgânica, que é, como se recorda, um conceito do "Estado-novista" italiano.
Em suma, ficámos esclarecidos sobre o que o PS de mau quer fazer e sobre o que não quer fazer, mas nem nós nem o País ficámos ou ficaremos esclarecidos, tal a pressa com que o PS quer desenvolver este processo, sobre o teor da regionalização que os senhores pretendem.

O Sr. ,Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, ainda bem que V. Ex.ª me pediu esclarecimentos, porque me permite fazer um pedido à direcção parlamentar do CDS-PP.
Há dias, num jornal diário português, tive oportunidade de ler uma notícia, segundo a qual o líder do CDS-PP teria ameaçado, caso este processo não fosse discutido de acordo com as formas que ele bem entende, retirar o Grupo Parlamentar do CDS-PP desta Sala e deixar apenas um solitário representante do PP neste Hemiciclo. Ora, o pedido que lhe faço, se é que o posso fazer, é que esse solitário representante do PP seja, ao menos, um Deputado do Porto!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Também quer escolher, não?!

O Orador: - De preferência o Deputado António Lobo Xavier!

Risos e aplausos do PS.

Em relação às questões que me colocou, que não foram substanciais nem de fundo acerca da natureza da regionalização, uma vez que se limitou a dizer que não tinha ficado esclarecido com a intervenção que fiz, terei de admitir que a responsabilidade tenha sido do emissor do discurso que foi proferido, mas também poderei admitir que a responsabilidade possa ser do destinatário, por não a ter ouvido, eventualmente, com a devida. atenção ou por não estar suficientemente sensibilizado para o tratamento destas matérias, a tal ponto que se revela incapacitado de compreender com a absoluta exactidão o alcance, a natureza e o teor das propostas que apresentamos nesse sentido.
Aliás, V. Ex.ª incorre, desde logo, numa confusão, que é tanto mais estranha pelo facto de ser jurista, ao procurar identificar o conceito de referendo orgânico com o de democracia orgânica, que teria sido teorizada pelo fascismo italiano...

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - É o que está na sua intervenção, Sr. Deputado!

O Orador: - Utilizei a palavra, mas a confusão é sua, Sr. Deputado! O referendo orgânico é a forma técnica de expressão e de designação desta forma de solução referendária e nada tem a ver com o conceito muito mais

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vasto, e que V. Ex.ª desconhece, provavelmente, em toda a sua dimensão - pelo menos é o que deduzo das suas palavras! -, dos modelos de democracia orgânica que têm outra filiação teórica e tiveram outra expressão institucional e política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em relação às outras questões que me colocou e que, com alguma dificuldade, sou capaz de perspectivar na densa e algo confusa intervenção que proferiu, tenho a dizer-lhe o mesmo que já respondi a outros ilustres Deputados. O Partido Socialista não quer ser o dono do processo de regionalização.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ainda bem!

O Orador: - Estamos dispostos a participar num processo de discussão ampla, bem como a contribuir positivamente e com toda a abertura de espírito para a afirmação de um vasto consenso nacional em torno de uma matéria que, pela sua relevância, o deve suscitar.

Vozes do PSD: - O vosso chefe não diz isso!

O Orador: - Agora, tem de ser responsabilizado pela inexistência desse consenso, se ele não vier a ocorrer, quem não quer contribuir para a sua realização, quem se exclui de participar no processo e diz, aprioristicamente, que não quer estar envolvido na discussão destas questões.
Se os senhores querem discutir e participar, entreguem na Mesa da Assembleia da República a vossa própria proposta de regionalização e digam aos portugueses que concepção de regionalização defendem, se é que têm alguma?! Ou, então, afirmem exactamente o contrário e apresentem os vossos fundamentos em relação a esta questão, porque não é ilegítimo estar contra a regionalização! O que nos parece ilícito é não assumir posições claras numa matéria tão determinante para o futuro de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão, pelo menos, aparentemente, criadas as condições para regionalizar o País.
Tudo levaria a crer que, nesta matéria, as clivagens políticas seriam entre os que estão a favor e os que estão contra as regiões administrativas e não em torno de quem é a favor de tal ou tal área regional e de quem é ou não a favor de tal ou tal forma de consulta popular.
O PSD, porém, nesta matéria, preferiu criar a confusão. Pretendeu criar um facto político - para utilizar uma linguagem requentada -, de modo a ocultar as constantes contradições em que andou envolvido relativamente a esta matéria.
Em primeiro lugar, as regiões estão previstas na Constituição da República com a contribuição do próprio PSD que, na Assembleia Constituinte, aprovou, inclusive, a forma de consulta traduzida no referendo orgânico ou indirecto, cujo nome técnico nada tem a ver com concepções de democracia orgânica, significando apenas construir as regiões de baixo para cima, com os municípios e as populações.
O PSD aprovou esta forma de consulta na Assembleia Constituinte, ao aprovar a Constituição da República Portuguesa em 1976. Posteriormente, em 1980, pôs, igualmente, o País e as autarquias a discutir este tema, designadamente em torno do Livro Branco da Regionalização, e aprovou, nesta mesma Casa, em 1991, em vésperas de eleições legislativas, a Lei-Quadro da Regionalização, julgando que este facto lhe iria trazer vantagens eleitorais.
Por outro lado, o PSD tinha as regiões administrativas, com regime previsto na Constituição da República actual, inseridas no seu programa eleitoral, quer de 1987, quer de 1991. Mas, em 1994, com a arrogância própria dos que julgam que vão estar no poder para sempre, resolveu, pura e simplesmente, anunciar ao País que já não era a favor das regiões administrativas. Pouco se importou em propor uma revisão da Constituição para abolir as regiões, desprezou, pura e simplesmente, a Lei Fundamental, criando uma situação, que, aliás, já existia, de inconstitucionalidade por omissão. Da mesma forma, não perguntou se o País queria ou não o referendo, não fez qualquer campanha em torno dessa figura e da ratificação da sua posição por parte do País.
Neste momento, em que o PSD afirma que é a favor do referendo e também da regionalização, fazemos-lhe o seguinte desafio: façam campanha a favor das regiões, façam campanha a favor da regionalização do País e deixem .isolado o PP, no caso de o PP, como parece, preferir manter o centralismo e a burocracia autoritária.
Mas é evidente que o referendo é apenas uma arma, não para chegar às regiões, não para fomentar a participação popular, bem pelo contrário, para tentar fazer aprovar uma "revisão constitucional relâmpago".
O líder do PSD não ignora que há centenas de propostas para largas dezenas de artigos e que estas propostas têm de ser cuidadosamente examinadas e discutidas, que a Assembleia da República tem o dever político e ético de consultar o País e a opinião pública, de os ouvir e de ouvir técnicos e especialistas na matéria.
Mas insisto nesta questão: a primeira revisão constitucional começou em 23 de Abril de 1981 e terminou em 12 de Agosto de 1982, isto é, demorou 16 meses; a segunda revisão começou em 14 de Outubro de 1987 e terminou com a publicação da Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho, ou seja, demorou 20 meses.
Ora, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, como constitucionalista, não pode dizer, a não ser por mera manobra política, que, neste momento, é possível aprovar uma revisão ordinária, em consciência, com qualidade, no espaço de um mês e meio. Isso é completamente impossível, seria antidemocrático, só através de um acordo de bastidores, mediante o qual o PS resolvesse ceder praticamente em tudo ao PSD, é que uma tal revisão seria possível.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E aqui o que o PSD verdadeiramente pretenderia era apanhar uma "boleia" em torno da questão da regionalização e do referendo para atentar gravemente contra os direitos dos trabalhadores, contra os direitos sociais, contra o sistema eleitoral da Assembleia da República e das autarquias locais, como, de resto, adianta no seu projecto.

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Mas há um outro objectivo, por parte do PSD, que não tem sido referido mas não deixa de ser importante, que é o de introduzir o precedente de referendar matérias constitucionais, de fazer depender a aplicação da Constituição de um referendo prévio, abrindo, assim, caminho ao plebiscito, cuja defesa é tradição do PSD. Plebiscito de revisão constitucional, plebiscito para atentar contra a Constituição, como, de resto, o PSD tem feito e adianta no seu projecto.
Naturalmente, há um terceiro objectivo, este, sim, o refúgio para as constantes contradições do PSD, que se traduz numa tentativa de encontrar uma saída airosa para as "piruetas" e para as "cambalhotas" que tem dado nesta matéria, dentro e fora do Governo.
A verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, em Portugal, já existe uma administração regional, criada, ao longo dos anos, pelo PSD e pelo Governo do PSD.
Existe uma administração regional, que foi criada em torno das comissões de coordenação regional e da administração periférica do Estado e que assenta em cinco áreas regionais, esvaziando completamente as outras capitais de distrito do País, as outras 13 cidades que assistiram à saída de serviços públicos, perante a sua indignação surda e sem que ninguém lhes perguntasse a opinião acerca das áreas ou de qualquer outra matéria.
Existe uma administração regional feita de clientelas partidárias, de empregos, de favores e desfavores.
Existe uma administração regional sem legitimidade democrática, que ninguém controla, que não responde perante as populações e o eleitorado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A melhor prova de que é preciso criar regiões administrativas é a de que foi preciso criar esta administração regional para intervir na elaboração do plano de desenvolvimento regional e na execução do quadro comunitário de apoio e para desempenhar um conjunto de funções do Estado que não faria sentido estarem em Lisboa, mas que o PSD não quis "largar da mão" ao opor-se à regionalização e ao fortalecer a administração periférica do Estado.
Para nós, a questão é muito simples: nível do País, há órgãos com legitimidade democrática, porque resultam da democracia representativa, imperfeita, naturalmente, mas que lhes confere legitimidade e obrigação de responder pelos actos do Governo em eleições livres.
A nível dos municípios, existem igualmente órgãos eleitos que respondem perante a população, o mesmo se verificando a nível das freguesias.
No entanto, a nível da administração que foi criada, desta administração com localização regional, há clientelas, há dependências partidárias, há poderes efectivos que não respondem, que não foram eleitos, que não têm legitimidade democrática, que são obscuros, que não são transparentes e que, no fim de contas, são impunes nos actos que praticam.
Naturalmente, aqueles que se opõem à regionalização pretenderiam exactamente manter uma situação deste tipo, de poderes pardos e cinzentos, quase invisíveis e que não respondem perante ninguém, precisamente porque não têm legitimidade democrática.
Pela nossa parte, e por isso mesmo, entendemos que criar as regiões administrativas é fortalecer a democracia representativa.
Mas, já agora, temos de perguntar: aqueles que falam da classe política mais próxima do povo, da necessidade de eleitos mais perto do povo, porque é que não apoiam as regiões administrativas, em coerência com aquilo que afirmam defender, designadamente a pretexto de alterar antidemocraticamente o sistema eleitoral e de fazer operações de engenharia eleitoral?
Estamos convencidos de que o poder mais próximo do povo permite estimular a democracia participativa, de que quanto mais perto do povo estiver o poder e quanto mais tiver de responder em eleições livres mais possibilidades há de as populações participarem.
Mais: julgamos que a democracia participativa e o alargamento da democracia representativa constituem um estímulo aos serviços públicos, uma dinamização de toda a Administração Pública e do investimento, o que permitiria, por exemplo, em vez da situação de gestão burocratizada e centralizada de fundos comunitários, com as baixas taxas de execução financeira que são conhecidas, gerir mais e melhor os fundos, captar mais fundos e garantir, em geral, uma distribuição e localização mais harmoniosa dos recursos materiais e humanos.
Naturalmente, também não concebemos uma reforma administrativa democrática sem regiões administrativas, como decorre da Constituição. Falam-nos em grandes despesas, mas, nesta matéria, temos de responder que, na nossa óptica, não haverá eleitos a tempo inteiro nas assembleias regionais, os membros a tempo inteiro das juntas regionais serão apenas entre cinco e sete por cada região administrativa e a regionalização deve ser acompanhada da extinção de cargos, como o de presidente das comissões de coordenação regional, bem como da passagem de 18 governadores-civis para cerca de 9 governadores-regionais, assim como outros cargos em serviços periféricos da Administração Pública deverão passar para a dependência das regiões administrativas.
Não acompanhamos a ideia de dramatizar as áreas regionais. Como é sabido, à Administração Pública cabe definir as áreas de partida, mas, como também é sabido, as assembleias municipais devem pronunciar-se sobre a matéria, e não concebemos que se pronunciem sem intervenção e auscultação popular. Não pode haver regiões, nos termos em que a Constituição actualmente as prevê, sem que a maioria das assembleias municipais, representando a maioria da população, se pronuncie favoravelmente.
No passado fim de semana, por exemplo, a propósito do Congresso do Alentejo, foi referido muitas vezes que o facto marcante era a questão das áreas. Para nós, o facto verdadeiramente marcante não foi a questão das áreas mas, sim, que, tendo estado neste congresso as mais diferentes entidades - autarquias locais, universidades, sindicatos, diferentes estruturas representativas da população -, a vontade de regionalizar foi generalizada, praticamente unânime.
Esta é a verdadeira clivagem, esta é a grande questão que importa suscitar e não propriamente a questão das áreas que, neste contexto, é relativamente secundária.
Ao dizermos isto, queremos sublinhar que sempre concebemos o problema das áreas como devendo ser resolvido de forma participada, de baixo para cima, sempre concebemos a regionalização como um processo que não é o de retalhar o País, mas, sim, o de unir os municípios de baixo para cima. Não se trata de dividir o País - o PP e os inimigos da regionalização podem estar sossegados -, pelo contrário, trata-se de unir os mu-

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nicípios, de modo a que existam estruturas democraticamente legitimadas para resolver os problemas que eles, isoladamente, não conseguem resolver e que, não obstante, devem ser descentralizados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a questão fundamental e tudo o que se afaste daqui, tudo o que seja falar em "Bósnias", tudo o que seja falar em dissolver Portugal e Espanha, tudo o que seja falar em atentar contra oito séculos de História...

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador:- ... é pura demagogia inaceitável, não é debate político, releva, pura e simplesmente, do terrorismo ideológico mais completo.

Vozes do CDS-PP: - Não é verdade!

O Sr. Presidente:- Peço-lhe que termine, Sr. Deputado. Já ultrapassou, em dois minutos, o tempo de que dispunha.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgamos que deve ser salvaguardado o risco de utilizar esta questão como pretexto para uma "revisão constitucional relâmpago" e deve ser assegurado que os calendários a que o Primeiro-Ministro e o PS se comprometeram nesta Assembleia da República e perante o País sejam cumpridos, garantindo-se plenamente o papel dos municípios em toda esta matéria.
Ao PS, exigimos que cumpra as suas promessas, designadamente as do Sr. Primeiro-Ministro, e dizemos claramente que o PCP não é "bengala" de ninguém e, nesta matéria, tem as suas próprias propostas. O PS terá de negociar para encontrar aquilo que mais interessa ao País, e quando dizemos negociar não é no sentido que o PP referiu, pelo contrário, é no sentido de alcançar, através do diálogo, o interesse nacional. É esse o nosso objectivo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tomemos consciência do privilégio que representa termos connosco um total de 465 alunos das nossas escolas e o significado de que tal se reveste. Saudemo-los cordialmente.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Sá, tem a palavra o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.

O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, em primeiro lugar, como sabe, na nossa proposta de divisão regional, por exemplo, dividimos o norte do País em Entre Douro e Minho e Trás-os-Montes e Alto Douro, e há quem nos acuse de engenharia eleitoral. Ora, sucede que, em relação ao momento e às eleições passadas, dividindo o norte em dois, estamos a colocar 'o PSD, no que diz respeito a Trás-os-Montes, a 10 pontos de vantagem do PS. Olhando apenas para o que se passa no norte do País, cai pela base a acusação ao PS de engenharia eleitoral.
Mas quero colocar-lhe o mesmo problema em relação ao Alentejo. De facto, nós, socialistas, não somos daqueles que dizem que não se pode fazer regionalização para que o Alentejo não caia nas mãos dos comunistas, como disse o ex-Primeiro-Ministro, somos democratas e respeitamos o resultado das eleições.
Mas gostava de lhe perguntar o seguinte: havendo uma proposta do PS que divide o Alentejo em dois e uma proposta do PCP que apresenta um único Alentejo, pensa que isto é engenharia eleitoral ou é, de facto, um propósito discutível mas respeitável, como é respeitável a vossa proposta.
Em segundo lugar, quero dizer-lhe que nós - e a lei exige-o - temos um ponto de partida, temos um "mapa" eleitoral de partida. No entanto, gostava que dissesse claramente, aqui, neste Parlamento, se está de acordo que, após um longo processo de debate, depois de ouvir as associações de municípios, as associações locais de municípios, se devem privilegiar os entendimentos de partido ou os entendimentos daqueles que representam localmente os interesses regionais. E o que eu gostava que dissesse também claramente é se sente alguma preocupação se, em relação às regiões, o perfil de chegada for completamente diferente ou muito diferente do perfil inicial, respeitando obviamente os interesses e a manifestação expressa das populações locais.
Em terceiro lugar, Sr. Deputado, o referendo está na moda e o PS já disse que o aceita. Aceitamos os referendos regionais, mas gostava de perguntar-lhe, também com grande clareza, o que é mais democrático, mais esclarecedor, mais sofisticado e o que nos dá mais elementos para pensar e poder decidir: é consultar e ouvir as assembleias municipais, ouvir o que nos têm a dizer e, eventualmente, corrigir os nossos propósitos, ou é a pobreza mental do "sim" e do "não" que nos querem impingir?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eurico Figueiredo, quero dizer-lhe que, em matéria de saber o que é que favorece mais o PS ou o que é que favorece mais o PCP, talvez por uma questão de princípio - e isto pode ser difícil de compreender para alguns Srs. Deputados -, pura e simplesmente, não fiz as contas. Porém, elas estão feitas num jornal semanário e vêm provar algo do que, por exemplo, foi afirmado no congresso .sobre o Alentejo: se o PCP olhasse estritamente para os seus interesses preferia dois alentejos e não um. Foram também aí levantadas questões, como, por exemplo, "vender" o Alentejo como produto turístico no estrangeiro: é mais fácil com um Alto e um Baixo Alentejo ou com o produto Alentejo? Foram colocadas em geral problemas de dimensão. Havia, inclusive, a questão de se saber onde seria a capital. Ora, nós resolvemos este problema, no quadro de amplos debates com o PCP e aberto a pessoas que não são do PCP, que nos permitiu avançar com a ideia a que chamámos região polinucleada. Isto é; uma região sem capital, com serviços públicos divididos por várias capitais. Ora, esta solução criou um consenso muito amplo, eu diria que é até um consenso em que participam muitos quadros do PS.
Em todo o caso, também quero dizer, Sr. Deputado, que não será por causa desta questão que não haverá regionalização, não é por isso, que não chegaremos a

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acordo, porque aquilo que é importante nesta matéria é ouvir as populações.
Sobre este assunto, e ainda bem que o Sr. Deputado colocou a questão, há um problema sobre o qual que temos de reflectir. Por exemplo, S. João da Pesqueira e outros concelhos do Douro têm uma opinião, que foi manifestada como praticamente unânime, de quererem, por exemplo, aderir a Trás-os-Montes e Alto Douro. Da mesma forma que há outros concelhos do País que se querem pronunciar num determinado sentido, isto é, no sentido de mudarem de região de partida.
É claro que uma consulta às assembleias municipais tem a vantagem de permitir a cada assembleia dizer quais são as suas pretensões e, naturalmente, a Assembleia da República poder examinar esta questão e, portanto, poder reajustar a área de partida, designadamente na lei de instituição em concreto, de modo a que aquilo que, ulteriormente, é sujeitado a referendo, quer seja referendo indirecto orgânico ou referendo directo, seja, no fim de contas, algo mais próximo da vontade das populações.
Diria ainda, a respeito desta questão, que muito mais importante do que entendimentos acerca das áreas de partida é, efectivamente, ouvir os municípios, ouvir quem está em cada região. Nesta matéria, aquilo que verificámos, quer no Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses, quer o que seguramente vamos ouvir no seminário que se vai realizar no Algarve, promovido por esta associação, este fim-de-semana, e que temos ouvido por toda a parte, é, por um lado, que há uma grande vontade de regionalizar, ao contrário do que se afirma, designadamente as regiões que foram mais preteridas pelo processo de desenvolvimento e, por outro lado, que há um entendimento cada vez maior no sentido de que as dificuldades e desentendimentos em questões de áreas sejam resolvidas através do debate, no tal processo de baixo para cima que está previsto no projecto de lei do PCP, na sequência da previsão da própria Constituição.
Portanto, pela nossa parte, nunca defendemos o estabelecimento autoritário, centralizado, das áreas das regiões, pelo contrário, sempre dissemos que deve haver uma área de partida, seja ela qual for, sempre concebemos as áreas com mais...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Portanto, o nosso projecto prevê a possibilidade de fundir áreas de regiões, rescindir regiões ou mudar municípios de uma região para outra consoante a auscultação que for feita.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vamos entrar na segunda parte do período de antes da ordem do dia, para tratar de assuntos de interesse político relevantes.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As responsabilidades que o PSD assumiu ao longo dos últimos 20 anos e a expressiva confiança que os portugueses lhe conferiram, em momentos particularmente difíceis da vida do País, tem a ver com o seu superior sentido de Estado, que o levaram sempre a pôr acima das conveniências partidárias ou eleitorais o interesse nacional. E desta postura não abdicamos e mantemo-la, quer estejamos no poder, quer nos encontremos na oposição.
Respeitamos a alternância como livre expressão da vontade popular e defendemos, hoje na oposição, como antes no poder, os governos de legislatura, necessários à garantia da estabilidade política de que o País tanto carece.
Fique claro, porém, que não nos demitimos - e jamais nos demitiremos - das responsabilidades que temos, como maior partido da oposição, na intransigente defesa da democracia, do Estado de direito e dos direitos, liberdades e garantias fundamentais.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, exigimos do poder, dos seus responsáveis e do partido, que em maioria relativa o sustenta, o respeito pela função política que nos cabe e que, em democracia, é tão importante como governar e que, se devidamente considerada, levará mesmo a que se governe melhor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vem esta reflexão introdutória a propósito da circunstância de que a governação socialista que tem conduzido o País nos últimos meses e, em particular, um certo estilo de tratar a res publica, em permanente e crescente confusão com a coisa partidária é preocupante e gera, em espíritos dos mais esclarecidos, legítimos receios da "mexicanização" do regime.
O Dr. Narciso Miranda, em entrevista ao Independente, vem referir que o Governo deveria nomear mais 3000 socialistas para cargos públicos, inspirando com esse despudor, a motivação artística e gráfica de alguns, ainda não carreiristas, jovens socialistas. Mas mal sonhava o Dr. Narciso Miranda que a modéstia do seu número seria, de um ápice, ultrapassada pelos 7000 de que o Primeiro-Ministro viria agora a falar, em entrevista à SIC.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos de convir que não é saudável para a democracia, e menos ainda para a dignificação das instituições, que se confunda na mesma pessoa a gestão da máquina do partido do poder e a gestão da função pública e de importantes cargos públicos, como acontece com o Ministro Adjunto do actual Governo.
Torna-se escandalosamente excessiva e indisfarçável a correia de ligação entre os jobs de um lado e os boys do outro, saneando-se, a maior parte das vezes, quem é competente, só porque os boys, com cartão cor-de-rosa, se impacientam, e impacientam-se tanto mais quanto mais incompetentes são!
Também aqui tivemos a confirmação do Primeiro-Ministro de que tem sido difícil resistir a estas "pressões" no interior do seu partido. Concordamos com ele, ,pois tem sido tão difícil que, as mais das vezes, não tem mesmo resistido!
Aliás, os critérios de avaliação de competências por parte do Governo tem o seu exemplo elucidativo na demissão de um gestor público, por incompetência, pelo Ministro Daniel Bessa, com direito a choruda indeminização, para, de seguida, o novo Ministro da Economia fazer o dito incompetente Secretário de Estado. É tão inusitado que, em alguns espíritos mais imaginativos, ficará a dúvida sobre se se terá tratado de uma nova modalidade de subsídio ou de bolsa para o visado integrar o Governo.

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Igualmente preocupante é a forma como o Governo vem querendo fazer crer aos portugueses que cumpre as suas promessas eleitorais. Esquece-se que os portugueses são inteligentes e que expedientes e aparências.
Assim, o Primeiro-Ministro assumiu o compromisso de modificar a lei no sentido de impor a regra de concurso público para a admissão em todos os graus da função pública, incluindo directores-gerais. Impunha a boa fé que esta fosse uma das primeiras leis que o Governo deveria propor à Assembleia da República, de modo a que as admissões a que tivesse de proceder obedecesse já às novas regras a que se comprometera.
Nada disso, porém, aconteceu. Primeiro, o Governo durante mais de cinco meses, saneou quem quis e nomeou, com base em critérios exclusivamente partidários, quem muito bem entendeu, satisfazendo, assim, as suas clientelas. Só agora, e depois do Professor Marcelo Rebelo de Sousa ter anunciado, no Congresso de Vila da Feira, que o PSD iria apresentar na Assembleia da República um projecto de lei, estabelecendo a regra do concurso público, é que o Governo veio dizer que a sua proposta já está feita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Bem grandes devem ser as gavetas do Sr. Ministro Jorge Coelho!

Aplausos do PSD.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro já assumiu que directores-gerais e subdirectores-gerais (e o mais que adiante se verá!) ficam de fora da regra dos concursos públicos, continuando subordinados ao mero critério da confiança política. Não se hesita em contrariar aquilo que são as regras adquiridas na mais moderna Administração Pública, para manter a porta aberta à consolidação e ao alargamento do "Estado rosa".
A par desta intencionalmente provocada confusão, cada vez maior entre o partido e o Estado que, responsável e preocupadamente, denunciamos, o Governo, em vez de definir e implementar regras e políticas globais para cada sector, vem governando de uma forma casuística, transformando alguns membros do Governo, e o próprio Primeiro-Ministro, numa espécie de bombeiros. Hoje é a empresa Pereira Roldão, amanhã as minas de Aljustrel, depois o Bingo do Belenenses, tudo sempre com a preocupação de evitar ondas, de conter reacções, de conciliar o inconciliável, dando a sensação, a mais das vezes, que governa para a comunicação social e não para o País.
Daí, a predilecção pelos adiamentos e pelas suspensões, de que são exemplos mais marcantes as propinas, a barragem de Foz Côa e as pegadas dos dinossauros.
Habilitado que está com o Orçamento que quis, o Governo não pode mais manter o seu estilo de pôr o Ministro Jorge Coelho a anunciar, o Ministro António Vitorino a estudar, o Conselho de Ministros a reflectir e o Primeiro-Ministro a demitir o Ministro e respectivos Secretários de Estado, chamando a si a fixação dos horários dos hipermercados.
E, com mágoa, temos de referir que, relativamente distanciados que estamos ainda dos próximos actos eleitorais, está forma de estar no poder do Partido Socialista prejudica a oportunidade de consenso em matérias de Estado e de regime, para cuja discussão estamos disponíveis, a começar pela revisão constitucional e sem esquecer outras questões com ela conexas ou não, seja a regionalização, o financiamento dos partidos, o estatuto dos titulares de cargos políticos ou outras, que exigem alguma serenidade que os momentos pré-eleitorais dificilmente asseguram.
Infelizmente, a sensação com que se fica é a de que o Governo, com o Sr. Primeiro-Ministro à cabeça, se vem cada vez mais assumindo como comissão eleitoral do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

A tourné do Sr. Primeiro-Ministro por Bragança, anunciando e assumindo como sua e do seu Governo obra já feita, paga ou preparada pelo governo do Professor Cavaco Silva, tem todos os laivos e ingredientes de prematura pré-campanha para as eleições autárquicas.
Particularmente grave do ponto de vista institucional e do relacionamento entre o Estado e as regiões autónomas é a envolvência do Primeiro-Ministro, enquanto tal, com o seu partido a nível da Região Autónoma da Madeira. Na verdade, não faz o menor sentido que o Sr. Primeiro-Ministro tenha recebido nessa qualidade, há meses atrás, o então líder do PS na Madeira, Dr. Mota Torres, e agora, mais recentemente, tenha recebido na mesma qualidade de Primeiro-Ministro, em audiência, o actual líder do PS na região, para alegadamente tratar de assuntos da Madeira.
É inadmissível e atentatório da dignidade do Estado, que o Primeiro-Ministro receba, para tratar de assuntos da região, líderes da oposição regional, sem que ao menos, antes, tenha recebido o Presidente da Assembleia Regional e o Presidente do Governo Regional...

Aplausos do PSD.

..., com quem, como representantes legitimamente eleitos pelo povo madeirense, devem, em primeira linha, ser tratados os assuntos regionais.
Também aqui, mais uma vez, é manifesto que o Governo se assume como comissão eleitoral do PS, tendo em vista as próximas eleições regionais de Outubro.
Não posso deixar de lamentar que os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira tenham sido deste modo menos considerados e subalternizados pelo Primeiro-Ministro, que deverá ter o cuidado de não confundir as suas responsabilidades partidárias com as suas funções de Estado e, no futuro, receber os seus correligionários e companheiros de partido, não em S. Bento mas no Largo do Rato.
Refira-se, aliás, que o Primeiro-Ministro e o PS vêm revelando um particular desconhecimento das autonomias regionais e das realidades insulares. Assim, no projecto de revisão constitucional, o PS não só insiste na manutenção do cargo de Ministro da República como lhe confere - pasme-se! -, o poder de dissolução das assembleias legislativas regionais!
O Primeiro-Ministro, na recente entrevista que deu à SIC, em imperdoável confusão entre a regionalização administrativa e as autonomias, que envolvem a regionalização política, defendeu que a haver referendo quanto à primeira teria também de haver referendo quanto à manutenção das autonomias da Madeira e dos Açores!
Só ignorando a história, a geografia e a realidade sociológica e cultural das regiões autónomas e esquecendo que as autonomias têm sido sufragadas em sucessivos actos eleitorais, ao longo destes últimos 20 anos, é que o Primeiro-Ministro poderia comparar o que não é com

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parável e querer tornar semelhante o que é, e há-de manter-se, constitucional e politicamente diferente.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Inevitavelmente conexionadas estão, neste momento, as questões da regionalização e da revisão constitucional. São ambas questões de Estado e ambas das mais relevantes questões de regime.
Ouvimos ao Presidente da República, nesta Câmara, um apelo ao mais amplo consenso em matéria de regionalização. O Ministro João Cravinho, apesar de algumas preocupações de se lhe abafar a voz e fechar as portas aos jornalistas, terá dito, nas jornadas parlamentares do PS, que a regionalização será a maior reforma administrativa do século. reclamando, por isso, ponderação e cautela.
Apesar do apelo do Presidente da República ao mais amplo consenso e apesar de um segundo companheiro de partido reconhecer que se trata da maior reforma administrativa do século, o PS insiste em dizer não ao referendo nacional sobre a regionalização.
Estou à vontade porque desde sempre e, sem hiatos, defendi a regionalização. Mas ficarei muito mais satisfeito se a mesma se fizer com o reforço da legitimação democrática do referendo e bater-me-ei, para que seja nesse sentido o resultado - e estou convencido que será da consulta popular.
Se a maior reforma administrativa do século não justifica um referendo nacional não sei, então, que matérias terão alguma vez relevância bastante para tal.

Aplausos do PSD.

Não façamos demagogia com questões de Estado e assumamos cada um, com clareza, as nossas responsabilidades e expliquemos aos portugueses o que efectivamente está em causa.
A Assembleia da República está nesta legislatura investida de poderes constituintes, o que, só por si, deve impor, na lógica da hierarquia dos interesses parlamentares, prioridade à revisão constitucional. Sucede ainda que vários dos projectos de revisão constitucional, incluindo o do PS, envolvem alterações em matéria de regionalização.
É legítimo, pois, perguntar se não se podendo saber, com segurança, de antemão, quais as alterações que, neste particular, vão ser acolhidas, se não é elementar, que antes de debater qualquer iniciativa relativa à regionalização, não se deverá concluir primeiro, ainda que com celeridade, a revisão da Constituição!?
O Professor Jorge Miranda, constitucionalista insuspeito, já opinou claramente no sentido de que se deverá dar prioridade à revisão constitucional. Mas a questão torna-se mais evidente quanto é certo que o próprio Partido Socialista pretende assegurar na leia possibilidade do referendo regional, o que só será possível com a prévia revisão da Constituição. Aliás, a tese que o Dr. Almeida Santos vem defender da necessidade da dupla revisão não tem, com o devido respeito, fundamento, mas se tivesse, a dupla revisão seria tão exigível para o referendo nacional como para os referendos regionais que o PS diz pretender.
Tudo leva a crer que o PS não quer nenhuma espécie de referendo sobre a regionalização, seja nacional seja regional. Igualmente a tese de uma revisão parcial antecipada e específica para a questão da regionalização e do referendo não tem viabilidade, já que o artigo 286.º da Constituição é claro no sentido de que as alterações aprovadas em sede de revisão terão de ser necessariamente reunidas numa única lei.
Sobre a nossa posição nesta matéria permito-me transcrever aqui o que foi referido nesta tribuna, há poucos dias, pelo meu companheiro, Professor Barbosa de Melo: "para o grupo parlamentar do PSD o êxito do processo de revisão dependerá decisivamente da rigorosa observância das exigências da boa-fé, da lealdade e do mútuo respeito das forças políticas pela consideração real e efectiva das propostas e iniciativas apresentadas a debate por todos os Deputados Tal regra seria gravemente violada, por exemplo, se uma qualquer maioria legislativa, no decurso do processo, esvaziasse de conteúdo prático a iniciativa para, em sede de revisão, se constitucionalizar ou se constitucionalizar de outra maneira o regime jurídico hoje vigente e aplicável a certas matérias. Legislar em tais circunstâncias, como se não houvesse projectos de revisão apresentados nesses domínios, implicaria um atropelo a regras de lealdade parlamentar importantes".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como se pode andar constantemente a apregoar o diálogo e o debate, e negar em matéria tão relevante para o nosso futuro colectivo essa forma de genuína auscultação dos cidadãos, como é o referendo!?
Compreende-se agora quão penosa e persistente teve de ser a luta de Sá Carneiro e do PPD/PSD para incluir na Constituição o referendo e quão persistente terá de ser agora a luta pelo seu alargamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso terminar sem deixar aqui uma última nota sobre o comportamento do Governo e do PS em matéria de serviço público de televisão. Quando na oposição, o PS clamava insistentemente a necessidade de alterar a forma de escolha do Conselho de Administração da RTP, com vista à desgovernamentalização e a assegurar a sua independência em relação ao poder político.
No contrato de Legislatura para uma nova maioria, no seu programa eleitoral e no Programa do Governo, está o compromisso de alterar os estatutos da televisão. Mas, mais uma vez, uma coisa é a opinião do PS quando está na oposição e outra a sua prática política quando está no poder. No espaço de poucos meses foram nomeados dois conselhos de administração para a RTP, de exclusiva e total escolha governamental.
Compete-nos ajudar o PS a ser mais coerente, como nos compete estimular o Governo a cumprir os compromissos que assumiu perante os portugueses.
Neste sentido, vou entrega, de imediato, na Mesa, o projecto de lei do Grupo Parlamentar do PSD, ,que visa assegurar que o Presidente do Conselho de Administração da RTP e a maioria dos seus membros sejam eleitos pelo Conselho de Opinião, o que esperamos impeça, além do mais, que os próximos conselhos de administração da televisão pública não se venham a demitir, como aconteceu ainda recentemente, por inadmissíveis interferências do Governo na empresa.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado!

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com o sentido de Estado e com as preocupações institucionais que. sempre nos

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animam, tanto no poder como na oposição, apelamos ao Governo e ao Partido Socialista para que ponham termo a uma prática política que tende a confundir crescentemente o partido com o Estado, pois, pensamos que apesar dos maus passos dados e dos erros cometidos estão ainda a tempo de impedir que a democracia e o Estado de Direito se aviltem até limites intoleráveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

Neste momento, registaram-se protestos de alunos da Associação de Estudantes da Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa presentes nas galerias sobre a situação da sua escola.

O Sr. Presidente: - O público presente nas galerias não pode pronunciar-se, pelo que peço aos estudantes, se querem ter o direito de continuar a assistir aos trabalhos do Parlamento, que se comportem com idoneidade e seriedade. De outro modo, não terão lugar nas futuras sessões da Assembleia da República. Lamento ter de dizer isto, mas esta não é uma atitude de jovens responsáveis.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro, para formular um pedido de esclarecimento.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, penso que V. Ex.ª, na sua intervenção, só por mera distracção ou porque tem uma consciência pouco tranquila é que abordou alguns aspectos. Refiro-me concretamente à questão das confusões entre a actividade governamental e a partidária, que são problemas do passado e da sua projecção, como é do conhecimento público e como o eleitorado consagrou no dia 1 de Outubro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito berra!

Por outro lado, V. Ex.ª gosta muito de falar nos boys do PS mas esquece-se que é relativamente aos boys do PSD, por exemplo, que há processos nos pequenos lugares da administração regional, os quais envolvem alguma desonestidade e serviram para camuflar interesses político-partidários do PSD. Se tiver curiosidade, poderei, em seguida, dar-lhe alguns exemplos.
Em pequenos serviços, como no da coordenação da área educativa, VV. Ex.as colocaram os presidentes das concelhias do PSD, afim de os libertarem, e ainda agora têm uma vontade decidida de os voltar a requisitar às escolas para continuarem a fazer a vossa política partidária. Portanto, sobre esta matéria não há, da vossa parte, qualquer moral política nem qualquer legitimidade moral.
O Sr. Ministro Jorge Coelho veio aqui, há vários meses, dizer que o Governo estava a preparar uma proposta de lei relativa a concursos públicos. Gostaria de o informar que ela foi hoje mesmo aprovada no Conselho de Ministros. O presidente do seu partido veio, portanto, muito atrasado nesta matéria e devo. dizer que conseguimos fazer em cinco meses aquilo que os senhores nunca tiveram vontade de fazer durante 10 anos.
Durante esse tempo, os senhores promoveram o clientelismo, baniram do vosso dicionário a expressão concurso público, foram a rede mais clientelar que este país, ou mesmo a Europa, conheceu em toda a sua história e, por isso, também não têm grande legitimidade nesta matéria.
Quanto às decisões acerca de Foz Côa, das pegadas de dinossáurios, da abertura dos hipermercados, elas revelam a vossa falta de coragem pára, com maioria absoluta, as assumirem, Não o fizeram porque tiveram, claramente, uma manifesta falta de coragem e só não compreendo como é que V. Ex.ª, um parlamentar experimentado e uma pessoa de bem, consegue assumir este papel, tão ingrato para si, de defender nem sei bem o quê, porque V. Ex.ª, o seu partido e o seu ex-governo têm um passado muito complicado nesta matéria.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Deram-lhe este trabalho de casa!

O Orador: - Quanto às inaugurações, devo dizer que o Primeiro-Ministro não esteve a gastar os dinheiros do Estado desnecessariamente, em coisas forçadas, como, por exemplo, a inauguração da ponte do Freixo ou obras forçadas e mal feitas como a CREL, apenas para servir objectivos político-eleitorais. Devo também dizer que em matéria de democracia, se o Primeiro-Ministro recebeu líderes do PS também recebeu o líder do PSD dos Açores, que não tem qualquer estatuto protocolar.
Para terminar, relativamente à regionalização; direi que é necessário entendermo-nos todos. Os senhores querem a revisão constitucional para retirarem da Constituição este problema fundamental da regionalização. Nós não permitiremos que seja feita a desconstitucionalização da regionalização e, por isso mesmo, nessa matéria, pedia-lhes que, de uma vez por todas, assumissem com clareza e coragem aquilo que o ex-Primeiro-Ministro já assumiu, ou seja, que não a querem fazes.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Estão contra!

O Orador: - Portanto, não venham aqui utilizar artifícios menos sérios, sobretudo pessoas como o Sr. Deputado, que muito estimo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva, para responder, se assim o desejar.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, quero dizer-lhe que compreendo a sua incomodidade e há duas ou três coisas que gostaria de salientar.
Em primeiro lugar, V. Ex.ª falou em boys do PSD que estariam envolvidos em irregularidades, aqui ou ali.

O Sr. José Junqueiro (PSD): - Posso indicar!

O Orador: - V. Ex.ª, ao longo destes anos, terá também lido nos jornais e terá visto que há boys do PS envolvidos em irregularidades. Em relação a esta matéria, a minha posição é muito clara: até transito em julgado de sentença, em relação ,a quaisquer deles, independentemente da sua filiação partidária, entendo que são presumivelmente inocentes. Uma vez confirmada a situ-

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ação irregular, a prática de irregularidades, a minha posição de condenação é igual, sejam eles do PS, do PSD ou do PCP.
Portanto, nesta matéria, a minha posição e a do meu partido é muito clara.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas quem está nos serviços são pessoas do PSD!

O Orador: - No que respeita ao problema do diploma para a consagração dos concursos públicos, é o Sr. Deputado que me dá razão quando diz que o Sr. Ministro Jorge Coelho esteve aqui há alguns meses. É que critico exactamente isso, ou seja, estando, neste momento o PS a fazer afastamentos e nomeações em catadupa...

Vozes do PS: - Isso é falso!

O Orador: - ... e sendo essa uma preocupação do PS quando era oposição, como é que não tinha esse diploma pronto para aprovar no dia a seguir ao da sua tomada de posse?! Aí, sim, revelava boa-fé!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador : - O que critico é exactamente a confessada assunção dos meses que o diploma esteve na gaveta.
Mas, realmente, V. Ex.ª também revelou aqui uma consciência socialista, própria, das coisas, ao falar da decisão relativa às propinas e a Foz Côa, chamando decisões às não decisões e essa é a razão da minha divergência.

Aplausos do PSD.

Isto está assumido pelo PS e está no vosso consciente. São não decisões, foi exactamente por isso que o critiquei e V. Ex.ª confirmou e assumiu que assim é.

Vozes do PS: - Não, senhor! Está a confundir as coisas!

O Orador: - Relativamente à questão dos presidentes dos governos regionais, vejo que V. Ex.ª, tal como o Engenheiro Guterres, desconhece a realidade insular, desconhece a realidade das autonomias, ao dizer que os presidentes dos governos regionais e das assembleias regionais não têm estatuto protocolar, quando efectivamente o têm. Institucionalmente, é imperdoável que o Sr. Primeiro-Ministro tenha recebido, em primeiro lugar, para tratar de assuntos da região, não aqueles que foram eleitos pelos madeirenses ...,

Vozes do PS: - Falou-se dos Açores!

O Orador: - ... e ocupam os lugares institucionais e constitucionais adequados, mas líderes da oposição, do seu partido, que mudam de 15 em 15 dias.

Aplausos do PSD.

Isto não pode ser e peço ao Sr. Deputado que não venha aqui corroborar essa atitude. Peço-lhe que, numa atitude de lealdade para com o Sr. Primeiro-Ministro e como seu correligionário, lhe chame a atenção para que, nestas situações, os receba no Largo do Rato e nas questões oficiais e do Estado os receba em S. Bento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Há ainda duas inscrições, dos Srs. Deputados Francisco Camilo, do PS, e Carlos Marta, do PSD, para intervenções em matéria de interesse político relevante. Porém, chegámos ao fim do tempo destinado ao período de antes da ordem do dia para hoje e temos um longo caminho a percorrer, pelo que ficam inscritos para produzirem as suas intervenções no próximo período de antes da ordem do dia.
Vamos, assim, entrar no período da ordem do dia.

Eram 17 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Do período da ordem do dia consta a discussão conjunta das propostas de lei n.º1 17/VII - Estabelece o regime legal aplicável .à defesa dos consumidores e revoga a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto, e 20/VII - Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais.
Vamos apenas fazer uma brevíssima pausa, aguardando que o Governo dê entrada na Sala.

Pausa.

Para apresentar os diplomas, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente.(Elisa Ferreira): Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: É com muita honra que apresento à Assembleia da República, em nome do Governo, as duas propostas de lei de protecção do consumidor que ocupam a ordem de trabalhos de hoje.
Permitam-me também, Srs. Deputados, que expresse a minha satisfação pessoal por serem relativas ao consumidor as duas primeiras iniciativas legislativas que o Ministério do Ambiente propõe para discussão nesta Casa.
Este facto não pode deixar, no entanto, de ser lido politicamente e devidamente realçado. Para o Ministério do Ambiente, a protecção do consumidor é uma prioridade política que gostosamente assumimos e deixa de ser, como foi no passado, uma política marginal e esquecida.
A política de protecção do consumidor não é inimiga da economia. Bem pelo contrário, ela é inseparável de uma economia preparada, moderna, é competitiva e eficaz. A protecção do consumidor é um imperativo do desenvolvimento e o seu nível é um bom indicador da modernidade de uma sociedade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Convirá ter presente no debate que as duas propostas de lei que hoje vos apresento são da maior importância. São leis estruturantes de uma política.
Uma delas é a nova lei de protecção do consumidor, quadro de referência maior dó edifício legislativo desta área política. A outra respeita à protecção do consumidor nos domínios dos serviços públicos essenciais, domínio onde a natureza dos serviços, a sua essencialidade e o modo como são prestados cria, como todos sabemos, especiais dificuldades aos consumidores em fazer valer os seus direitos. Trata-se, portanto, de duas leis fundamentais.

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Mas comecemos pela primeira, a nova lei de protecção do consumidor.
O Governo assumiu, no seu Programa, a responsabilidade de submeter à Assembleia uma proposta que visa alterar a Lei n.º 29/81, por todos conhecida como Lei de Defesa do Consumidor.
Utilizei a palavra "responsabilidade" sopesando-a devidamente. De facto, o Governo tem consciência perfeita que está a propor a reformulação de uma lei que teve uma iniludível importância histórica, que foi aprovada por unanimidade nesta Casa e que aqui foi gerada a partir da fusão de três projectos de lei apresentados no decurso do ano de 1980.
Permitam-me, pois, que preste a minha homenagem aos parlamentares de então. A Lei n.º 29/81 constituiu, de facto, um marco histórico fundamental na concretização, em Portugal, dos direitos dos consumidores. Até então, nunca na Europa se havia delineado um quadro legal de protecção do consumidor com amplitude semelhante.
Porém, desde há muito, sucessivos governos, alguns partidos e organizações de consumidores têm vindo, de uma maneira ou de outra, a manifestar a necessidade de proceder a uma alteração da chamada Lei de Defesa do Consumidor.
Basta, para assim concluirmos, ter em conta que, tanto na última como na penúltima legislatura, foram pedidos à Assembleia, pelo governo, autorizações legislativas referentes a esta matéria e que o Partido Socialista, também por duas vezes, apresentou, no mesmo domínio, projectos de lei.
Os governos anteriores acabaram por não concretizar as, suas iniciativas, apesar da Assembleia lhes ter, para isso, dado os adequados meios constitucionais.
A anterior maioria parlamentar, por sua vez, negou ao País a actualização legislativa que, não tendo sido feita por obra do Governo, se poderia ter processado através das iniciativas do Partido Socialista.
Depois da promulgação, há quase quinze anos, da Lei n.º 29/81, as alterações, a ritmo acelerado, que se têm verificado na esfera do consumo - na natureza dos produtos e serviços, nos métodos e formas de venda, bem como no campo dos direitos dos consumidores - originaram á natural desactualização dessa lei. Se é certo que o carácter avançado da lei para a sua época, fez com que ela fosse mesmo percursora relativamente a medidas comunitárias no campo da protecção dos consumidores, também é verdade que já decorreram dei anos sobre a nossa adesão à Comunidade Europeia e que, entretanto, muitas outras ocorrências se sucederam, nomeadamente a criação do Mercado único.
Por outro lado, a lei em vigor carece de actualização relativamente aos direitos dos consumidores consagrados na Constituição. Muita água correu debaixo das pontes depois da promulgação da Lei n.º 29/81, apresentando este diploma anacronismos e lacunas que é preciso ultrapassar, em virtude das sucessivas revisões constitucionais, designadamente a de 1989 que conferiu aos direitos dos consumidores a dignidade dos direitos fundamentais.
A proposta de lei que hoje vos apresentamos, procura, no fundo, conferir maior equilíbrio à relação de consumo, favorecer o reforço da capacidade de acção e intervenção dos consumidores, e criar o Conselho Nacional de Consumo. São ainda merecedoras de destaque, por serem mais significativas, outras inovações.
Em primeiro lugar, o alargamento do âmbito material de protecção dos consumidores aos bens e serviços prestados pelos organismos da Administração Pública - esta é talvez a inovação de melhor alcance e profundidade da nova lei, e que cria à Administração a responsabilidade da sua modernização no sentido do respeito e da consideração devidos aos direitos dos consumidores.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, consagra-se um direito de retractação, vulgo direito de arrependimento, relativamente aos contratos que resultem da iniciativa dos profissionais de venda fora dos estabelecimentos comerciais; consagra-se também, nesta nova lei, a acção inibitória, destinada a prevenir, corrigir ou fazer cessar práticas lesivas dos direitos do consumidor; isenta-se de preparos e custas os consumidores e suas organizações quando prossigam o exercício dos seus direitos; cria-se direito de antena às associações de consumidores; atribui-se ao Instituto do Consumidor um conjunto de poderes, designadamente o de representar em juízo os interesses colectivos e difusos dos consumidores, o de solicitar e obter informações e diligências destinadas à salvaguarda dos direitos dos consumidores, poderes estes susceptíveis de lhe conferir uma capacidade de actuação que hoje lhe falta; estabelece-se também um prazo de garantia para os bens móveis não consumíveis fixado em um ano; consagra-se um direito de resolução dos contratos celebrados com violação do dever de informar; inverte-se o ónus da prova quando se verifiquem danos originados pelo incumprimento do dever de informar; e, finalmente, realço também a consagração participação das associações de consumidores na regulação de preços dos bens essenciais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para além da questão global e fundamental da arquitectura legislativa de protecção dos consumidores, de que trata a nova lei de protecção do consumidor, um domínio particular é, na perspectiva do Governo, prioritário: o dos serviços públicos essenciais. Esta é a matéria a que se refere a segunda proposta, a dos serviços públicos essenciais, que agora aqui trazemos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Trata-se, por um lado, de algo que é absolutamente essencial à vida dos consumidores nos dias de hoje, os serviços de fornecimento de electricidade, água, gás e de telefone.
Por outro lado, trata-se de empresas que actuam, em geral, em regime de monopólio e em que as relações de consumo assumem o máximo de desequilíbrio em desfavor dos consumidores. A intervenção do Estado, nesta matéria destina-se, pois, a restabelecer, o equilíbrio na relação entre consumidores e prestadores de serviços. Esta é, aliás,' matéria de grande actualidade, não só em Portugal como ao nível da União Europeia, constituindo uma das prioridades inscritas no Plano de Acção Trienal da Comissão relativa à informação e à protecção dos consumidores.
Nos termos da Constituição da República, é tarefa do Estado prover à satisfação de necessidades essenciais e contribuir para a qualidade de vida dos cidadãos, o que implica, obviamente, que o Estado não descure as condições em que, quer os bens, quer os serviços essenciais

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são fornecidos ou prestados. No entanto, se é verdade que em todos os domínios do consumo é preciso assegurar o exercício dos direitos dos consumidores, não deixa de ser também verdade que mais necessário ainda se torna assegurá-lo em sectores onde os bens ou serviços não são quaisquer mas são bens e serviços essenciais à vida e dos quais não se pode prescindir.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Ao apresentar a proposta de lei sobre serviços públicos essenciais, o Governo teve também presente tratar-se de um campo onde são frequentes as razões de queixa dos consumidores. Por todas estas razões, esta área - a dos serviços públicos essenciais não poderia deixar de constituir para o Governo um ponto absolutamente prioritário da acção política em matéria de protecção do consumidor.
Gostaria de destacar, pela sua significância, cinco pontos essenciais da proposta de lei: em primeiro lugar, consagra-se o direito de participação e de audição das organizações representativas dos utentes; em segundo lugar, exige-se um pré-aviso adequado quando da suspensão do fornecimento do serviço público; em terceiro lugar, há a proibição da imposição da cobrança de consumos mínimos; torna-se também obrigatória e gratuita a facturação detalhada; e, por último, fomenta-se a arbitragem para a resolução dos conflitos do consumo.
Como se vê, este diploma não tem em vista todos os serviços públicos que possam ser considerados essenciais, nem sequer fazer teoria geral sobre todos os aspectos do seu regime jurídico. O objectivo desta proposta de lei é terminar de uma vez por todas com actuações e práticas concretas que a sociedade considera há muito abusivas e prejudiciais para os utentes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Como se diz no preâmbulo da proposta de lei "desejariam uns, porventura, que o legislador fosse mais longe; recearão outros que o legislador tenha ido longe demais. Optou-se por um diploma que se julga equilibrado e com soluções importantes em ordem à protecção do utente de serviços públicos básicos".
Srs. Deputados, tenho perfeita consciência que estas duas propostas de lei não esgotam o que há para fazer na política de protecção do consumidor, quer no domínio das leis quer no da sua aplicação. No entanto, existem já vários diplomas dispersos e às vezes com pequenas contradições e discrepâncias que importa harmonizar, dando-lhes coerência e sistematicidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Estas razões levam-me a anunciar à Assembleia - e penso que este é um bom momento para o fazer - que o Governo vai constituir uma comissão para a elaboração de um código de direitos do consumidor, necessidade já hoje sentida e reclamada por quem acompanha e intervém no domínio da definição e da aplicação deste ramo do direito que, com toda a certeza, não vai parar de crescer e de se afirmar ao longo dos próximos anos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este Governo entende que a política de protecção dos consumidores não pode continuar a ser uma política residual, uma simples flor, na lapela para uso em momentos especiais. Antes pelo contrário, esta política marcará uma grande diferença de posicionamento em relação a Governos anteriores, porque consideramos que estão em causa não só direitos fundamentais do cidadão como interesses da própria estratégia de desenvolvimento da economia. Como já disse, a política de defesa do consumidor não é, de modo algum, prejudicial aos interesses das empresas e dos profissionais. As exigências de melhor qualidade feitas pelos consumidores são factor reconhecido de melhoria do funcionamento da economia, da capacidade concorrencial das empresas e factor da modernização deste País.
Por outro lado, se me pedissem uma síntese da substância humanística que presidiu à elaboração destas duas propostas de lei, eu socorrer-me-ia dos versos de Manuel Alegre - parlamentar e poeta - na sua "Balada da Sociedade de Consumo": "Havia a sociedade de consumo. Mas eles perguntavam? E o homem? É só o que consomem? É só o homem? E o seu sumo? Onde está o homem? O homem? O homem?" Como sempre - porque a poesia é irmã da filosofia - são sempre os poetas a fazer as perguntas essenciais. Espero que estejamos todos à altura destas perguntas e que, com o debate que iremos travar, honremos aqueles parlamentares que formularam e aprovaram a Lei de 1981, e também os que inscreveram na Constituição da República - os direitos dos consumidores entre os direitos fundamentais de cidadania.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente, vou colocar algumas questões, relativas às propostas de lei hoje em discussão, separadamente, primeiro, relativamente a uma e, depois, relativamente à outra.
Assim, quanto à proposta de lei n.º 17/VII, parece-nos uma proposta positiva no geral, mas que merece alguns esclarecimentos que não são, quanto a nós, de pormenor, mas sim de princípio. Começo por fazer uma consideração: a atribuição de competências às autarquias locais, que é apresentada como uma inovação na exposição de motivos, já estava prevista e já constava da lei anterior, não se traduzindo, pois, numa inovação. Era, aliás, esta referência legal às autarquias locais que serviu sempre de desculpa por parte do Governo à sua falta de acção quando lhe surgiam críticas à falta de apoios e de protecção dos consumidores.
Reforça-se, neste proposta de lei, o aspecto institucional, com a criação do Conselho Nacional do Consumo; atribuem-se, naturalmente, competências a este novo organismo e mantém-se o Instituto do Consumidor.
Sobre esta questão, é certo e sabido que o Instituto do Consumidor tem sido de uma inoperância enorme, digna até da qualificação de marasmo. O que perguntamos é que garantias se dão de que vai ser diferente, de que o Instituto do Consumidor, vai ser um organismo de acção, pela defesa do consumidor, de que vai cumprir as suas atribuições. Além disso, a proposta de lei não avança na composição do Conselho Nacional do Consumo. Ora, é importante que o Governo avance, desde já, com aquela que prevê ser a proposta de composição deste organismo. E fundamental sabê-lo porque, para aferir da sua utilidade e eficácia, não basta conhecer as suas atribui-

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ções, sendo igualmente importante e fundamental conhecer a sua composição.
Por fim, uma questão que nos parece essencial, em termos de incumbências do Estado para a defesa e protecção do consumidor, é que não existe, nesta proposta de lei, nada que refira a necessidade e a promoção de um consumo ecológico, também numa lógica de recuperação e de reutilização. Por que é que não se avança nesse sentido, de acordo, aliás, com o que tem sido referido e recomendado nos planos de acção comunitários nesta matéria?
Sobre a proposta de lei n.º 20/VII, um primeiro considerando: na nossa perspectiva, serviços públicos essenciais não são, única e exclusivamente, os abrangidos por este diploma, apesar de o artigo l.º assim o dar a entender expressamente. São também serviços públicos essenciais os prestados pela própria Administração, como, por exemplo, os transportes públicos, os de saúde, entre outros. Nesta proposta de lei, o recurso à excepção ao princípio, ao "salvo se", ao "desde que", à delimitação das situações em que o princípio é válido, é tão frequente que dá a ideia de que vamos proteger os utentes, mas sem exageros. E algumas vezes não é sequer fácil entender a delimitação dessas situações, com expressões como "caso fortuito ou de força maior", a "factura funcionalmente indissociável", a expressão "de acordo com as circunstâncias" que, quanto a nós, é tão genérica que pode funcionar como uma armadilha para o próprio utente. Gostaria que fossem dados exemplos concretos sobre estas dúvidas.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Apenas uma última questão, muito rapidamente. A presente proposta de lei visa a protecção do utente, mas é preciso clarificar este conceito, o que passa por saber se o utente é, antes de mais, um consumidor, pelo que, então, para além das normas específicas de protecção, estará sempre, em primeira linha, sujeito às normas gerais de defesa do consumidor. Por esta ordem de ideias, é preciso clarificar se as organizações representativas dos utentes dos serviços em causa, às quais é atribuído direito de participação, são uma categoria específica e só essas associações - e integra, nesse caso, a categoria do artigo 18.º, n.º 3 da outra proposta de lei, o que coloca automaticamente a questão da necessidade e da carência de regulamentação própria, que não existe ou se são antes incluídas associações de defesa do consumidor, nos termos em que já estão regulamentadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, em complemento do anúncio feito há pouco, de quase meio milhar de alunos das nossas escolas que nos visitaram hoje, entraram depois disso na Sala 70 alunos da Escola Secundária de Barcelos, acompanhados de alguns professores. Saudemo-los também.

Aplausos gerais de pé.

Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço os comentários que fez, que me parecem, no geral, bastante interessantes e com os quais até poderei estar de acordo.
Relativamente ao comentário que fez sobre o Instituto do Consumidor, penso que um dos motivos pelo qual muitas instituições têm dificuldade em responder às expectativas que estão criadas em torno delas, é a ausência de competências claras. Penso que, nessa matéria, a legislação que agora é aqui trazida é, de algum modo, um incentivo a que a instituição se assuma como defensora de um conjunto de princípios, como defensora dos interesses do consumidor. É nesse quadro que nós, atribuindo competências aos institutos e às instituições existentes, podemos a seguir exigir que eles cumpram. Se eles não têm competências, se não têm obrigações atribuídas, nesse caso, é difícil separar aquilo que é mau funcionamento daquilo que é impossibilidade de funcionar melhor. Nesta matéria, as propostas legislativas que aqui trazemos, atribuem responsabilidades e, como tal, permitem um julgamento mais correcto sobre a capacidade de se exigir alguma coisa a essas instituições.
No que respeita ao Conselho Nacional de Consumo, não aparece ainda aqui a composição nem uma série de outras indicações relativamente a assuntos que são abordados na generalidade, mas em relação aos quais teremos ocasião de oportunamente apresentar propostas de regulamentação. A composição do Conselho Nacional de Consumo é fundamental: defendemos o princípio de que os principais interessados, os principais protagonistas dos direitos em causa terão de ter uma representação fundamental, mas oportunamente teremos ocasião de debater a sua composição.
Na sua intervenção referiu-se ainda à promoção do consumo ecológico, questão que não pode ser objecto de legislação neste campo. É uma matéria que tem de partir de um objectivo e de um trabalho muito sério de educação e, sobretudo, de informação e formação do consumidor. Não se pode obrigar o consumidor a optar por produtos ecológicos, pode-se, sim, sensibilizá-lo relativamente a alterações fundamentais dos padrões de consumo, que, de facto, têm de ser introduzidos na nossa sociedade mas que só o poderão ser através da informação sobre as características do produto e de uma legislação sobre uma outra matéria - e isso já está previsto - nomeadamente a legislação sobre embalagens, especificações e informações ao consumidor. Neste contexto, parecer-me-ia um pouco desajustada a introdução de recomendações específicas sobre o consumo ecológico. Isso terá de ser remetido para matéria de informação, de formação e educação.
Fez ainda alguns reparos em relação à proposta de lei que respeita ao consumo de bens essenciais. Não posso estar mais de acordo consigo relativamente ao facto de que isto é o princípio. Começou por se atacar um conjunto de bens que nos parecem mais importantes e, através de um inquérito que foi elaborado e devidamente divulgado aos consumidores, estas foram, de facto, as áreas em que os consumidores se sentiam mais debilitados e mais impotentes em relação à máquina empresarial com que se defrontavam: o telefone, a água, a luz e o gás, que são bens absolutamente essenciais. A partir daqui pretendemos que o resultado desta área experimental, mas simultaneamente essencial, se alargue a outros tipos de consumo. Naturalmente que tem, pois, toda a razão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

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O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, a proposta de lei n.º 20/VII parece-nos ser o resultado de um trabalho de recolha das posições constantes de outros projectos de lei que o PS já fez passar por aqui e que podem ser entendidas como o mínimo essencial, talvez uma base de trabalho, para a elaboração de uma verdadeira carta dos direitos do consumidor.
A associação para a defesa do consumidor, que não foi ouvida acerca do anteprojecto do diploma, sugere uma ideia que parece ser de aproveitar: a da elaboração de um código do direito de consumo, que reúna a legislação extravagante sobre a matéria, sistematizando-a, contribuindo, assim, para a compreensão global de quais os direitos dos consumidores e de quais os deveres dos fornecedores.
Era um diploma dessa natureza que o Governo aqui devia ter trazido hoje, depois de, naturalmente, ter recolhido o parecer de todas as organizações que operam nesta área, incluindo o dessa associação.
Mas não é isso que estamos aqui a discutir, pelo que, concretamente, em relação à proposta de lei n.º 20/VII, pergunto-lhe o seguinte: em primeiro lugar, o seu artigo 5.º, n.º 1, prevê que a prestação do serviço público não pode ser suspensa sem pré-aviso adequado, salvo caso fortuito ou de força maior. Abstraindo-me agora da existência de catástrofes naturais ou de acidentes causados por acção humana, o que é, que o Governo entende por caso fortuito e de força maior? O que quero saber é se a necessidade de obras ou de reparações urgentes integra este circunstancialismo.
Em segundo lugar, gostaria de salientar o carácter positivo da norma do artigo 8.º, que proíbe a imposição e cobrança de consumos mínimos, sendo certo que é esta a prática que tem sido seguida pelas entidades fornecedoras, pelo menos no que respeita ao consumidor individual ou não profissional, como também já lemos. Nunca é demais que se consagre a sua proibição por escrito. O que não encontramos, no entanto, é nenhuma norma que proíba ou, pelo menos, discipline os chamados consumos por estimativa, através dos quais as empresas fornecedoras têm praticado algumas arbitrariedades, que não são de somenos: desde meses seguidos em que os consumidores só pagam o aluguer dos aparelhos de medição - pagando depois facturas exorbitantes pelo consumo que fizeram durante esses meses, até estimativas que nada têm a ver com a realidade. Tudo se tem feito ao abrigo deste procedimento. Perguntamos, pois, ao Governo o que é que tem a dizer sobre isto.
Por outro lado, afigura-se-me que esta proposta de lei, uma vez e se aprovada, vai necessitar de regulamentação e é essencial que o Governo esclareça se o vai fazer até à sua entrada em vigor de molde a que isso aconteça com plena eficácia da lei que agora aqui discutimos.
Também não encontramos na proposta de lei nenhuma norma que proíba o estabelecimento selectivo de isenções ou reduções de pagamentos destes serviços por parte de sectores mais carenciados da nossa população. Estou a lembrar-me do caso de uma autarquia local, que muito recentemente deliberou isentar os consumidores reformados residentes na respectiva área do pagamento de fornecimento de água da rede pública. Pretende o Governo considerar a matéria das isenções na sua proposta de lei?
Por último, Sr.ª Ministra, e tão ou mais importante do que os aspectos atrás referidos, gostaria que me explicasse por que razão o PS, agora no Governo, deixou cair o princípio, que propôs em 1992, enquanto oposição, do direito dos cidadãos a receberem juros sobre as quantias que lhes sejam devidas. Se não for corrigido, este recuo obrigar-nos-á a não votar favoravelmente a presente proposta de lei e a propor, em sede de discussão na especialidade, a respectiva alteração. Refiro-me, Sr.ª Ministra, ao artigo 13.º do projecto de lei n.º 71/VI, que o PS apresentou em 1992.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, vou tentar ser sintética mas, simultaneamente, responder a tudo o que foi referido.
Esta proposta de lei não faz tábua rasa de tudo aquilo que foi sendo construído na sociedade portuguesa ao longo dos anos. Pensamos que isso seria profundamente errado e, portanto, estamos a tentar que a legislação aqui apresentada, porque trata de direitos fundamentais dos cidadãos, seja suficientemente abrangente, cobrindo as várias tendências. Esta é uma matéria de interesse nacional e não pertença de este ou daquele partido. Gostaríamos, pois, que a lei fosse suficientemente abrangente para merecer um consenso de fundo em relação a matérias que consideramos fazer parte dos direitos essenciais dos consumidores, tal como aconteceu,. aliás, aquando da aprovação da lei de 1981, que a precedeu.
Quanto à associação de direito do consumo, digo-lhe que ela foi ouvida. Pensamos que há uma cobertura bastante substancial das entidades que se têm debruçado e assumido como defensoras dos consumidores.
Depois, o Sr. Deputado levanta uma série de questões. A primeira que registei é a de saber o que é um caso fortuito. Penso que um caso fortuito é um caso não programável. Portanto, tudo aquilo que for previamente estimável que vai acontecer - por exemplo, obras ou coisas parecidas - deverá levar a que o consumidor seja avisado. Um tubo de água que rebenta não é programável, é, sim, um caso fortuito, um acidente. Penso que, para além do senso comum,. há aqui matéria suficiente que permite fazer a distinção entre casos fortuitos e casos previsíveis ou programáveis. A obrigação que se está aqui a criar é a de, sendo previsível ou programável, avisar o consumidor sobre isso.
Naturalmente que nos preocupa a questão da estimativa. É, de facto, uma matéria complexa, mas, por isso mesmo, ela só poderá ser tratada numa abordagem muito específica, na medida em que estamos a lidar com problemas de empresas que, embora tendo de ser balizadas na sua relação com uma parte mais fraca, que' é o consumidor individual, têm, no entanto, de ter meios de suprir, por exemplo, a inacessibilidade aos contadores, pelo que não se pode pensar numa situação em que se acaba completamente com a solução da estimativa, que é banal.
Relativamente às isenções ou reduções, pensamos que esta proposta de lei não deve cobrir esse tipo de situações. Esta não é uma lei de reequilíbrio social, ruão pretende atingir um reequilíbrio ou uma perequação do rendimento disponível das famílias; ela tem por objectivo defender o consumidor e salvaguardar os seus direitos. Misturar este objectivo com outros que, embora eventualmente muito válidos, são dissonantes em relação a esse objectivo fundamental parecer-nos-ía que poderia introduzir algum ruído, alguma distorção nesta matéria legis-

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lativa que estamos aqui a abordar. Portanto, nesse aspecto pensamos que não faz sentido introduzir medidas de correcção ou de reequilíbrio social numa lei que tem por objectivo a salvaguarda da defesa dos consumidores.
Por último, levantou uma questão relativa ao juros por quantias em dívida. Esse assunto não foi equacionado, mas creio que poderá ser repensado e reavaliado no contexto da discussão da presente proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, ouvimos com especial atenção e especial gosto a intervenção que fez porque temos a percepção absoluta de que as duas propostas de lei apresentadas consubstanciam dois dos instrumentos mais importantes e, como V. Ex.ª referiu, estruturantes do nosso próprio ordenamento no que respeita, concretamente, aos direitos dos próprios consumidores. Essa foi, efectivamente, uma promessa eleitoral do PS, que nos apraz agora registar.
Sr. ª Ministra, gostava de colocar-lhe duas ou três questões, que passo a enumerar.
Primeira: face ao quadro legal criado, e no que diz respeito ao problema da encefalopatia espongiforme bovina, que, em nosso entender, é uma questão que se pode colocar ao nível dos direitos dos próprios consumidores, nomeadamente no que se refere à informação e ao exercício desse direito, gostaria de saber, tendo em atenção o quadro agora aqui criado, que medidas é que podem ser implementadas para salvaguardar os direitos destes mesmos consumidores.
Por outro lado, coloco-lhe uma questão genérica, que V. Ex.ª de alguma forma abordou na intervenção que fez, mas que, se fosse possível, gostaria de ver mais bem explicitada, relativa às condições de efectivação das medidas que aqui propostas. Sabemos que irá ser feita uma regulamentação, designadamente da lei do consumidor que aqui é apresentada, mas em relação à efectivação destas próprias medidas gostaria de saber o que é que pode e deve ser feito.
Há uma outra questão concreta que também gostaria de colocar-lhe e que é a seguinte: relativamente aos acordos de boa conduta que são estipulados na proposta de lei relativa à defesa dos consumidores, é óbvio que estará excluído qualquer acordo que tenha em vista a fixação, por exemplo, de preços ou de outras matérias que constem da lei da concorrência. De qualquer forma, seria ou não conveniente, em sede de regulamentação, serem exaustivamente definidas as matérias excluídas desses acordos de boa vontade previstos na proposta de lei?
No que tem a ver com o direito de as associações serem esclarecidas sobre a formação de preços dos produtos de bens e serviços, esta parece-nos ser também uma matéria de extrema importância com vista a saber-se como é que pode ser definido e regulamentado o acesso à informação das próprias associações de consumidores.
Eram estas as perguntas essenciais, Sr.ª Ministra, que neste momento gostava de colocar-lhe.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente.

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, registo com apreço os elogios que teceu às propostas de lei apresentadas.
Relativamente às perguntas mais específicas que colocou, penso que a maior parte delas tem a ver com o restante corpo legislativo com que a sociedade, neste caso Portugal, se rege.
No caso da encefalopatia espongiforme bovina, o que este diploma trará de novo, no imediato, é o direito à informação dos consumidores, um direito que o consumidor ganha de ser informado a par e passo e de lhe ser fornecido, por parte da Administração, todo o controle, toda a documentação, toda a informação que nesse momento esteja disponível. Naturalmente que caberá também à Administração zelar para que não haja contaminação, não haja problemas para a saúde pública, mas nessa matéria já temos legislação que regula esse tipo de situação. Haverá depois o direito à indemnização, enfim conhecemos toda a legislação relativa a essa matéria.
Quanto aos acordos de boa conduta, o que se pretende é uma vontade de contratualização, uma vontade de entendimento entre as partes, que precisa, naturalmente, ser mais especificada, mais regulamentada, mais detalhada, digamos assim. Mas, como princípio, parece-nos que não poderia deixar de ser registada.
Por último, gostaria de referir que o acesso à informação passa a ser, neste caso, um direito do consumidor. Já não depende da boa vontade, já não depende da disponibilidade ou não de meios; é um direito do consumidor. No entanto, registamos que neste momento, felizmente, já existe no mercado português um conjunto de entidades que se dedicam essencialmente à divulgação de informação relativa a esta matéria.
De qualquer modo, vai ser lançado para ó campo dos direitos do consumidor um direito novo e naturalmente que, nos contratos estabelecidos, esse direito à informação do consumidor se transcreve no direito, por exemplo, à caducidade do contrato,...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Isso já existe!

A Oradora: - ... se tiver sido sonegada parte da informação que ele necessitava saber. Portanto, essa matéria acaba por ser nova face àquilo que conhecíamos até agora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, gostaria, em primeiro lugar, de sublinhar que nos parece especialmente positiva a metodologia que o Governo usou para a preparação destas iniciativas legislativas, em especial a respeitante aos serviços públicos essenciais.
Tive ocasião de, no Centro Cultural de Belém, no dia 15 de Março, tomar conhecimento do estudo que o Governo encomendou a uma instituição universitária prestigiada e que revelou muito sobre as carências que há nesse domínio em matéria de qualidade da prestação dos serviços e em matéria de respeito pelos direitos, legítimos, dos utentes desses serviços, tão importantes para todos nós.
Cremos que essa metodologia, que é inédita - é preciso dizê-lo, sublinha-lo e aplaudi-lo -, constitui uma boa maneira de legislar porque, entre outras coisas, faz-nos saber bem e rigorosamente aquilo que o País quer.
Em relação às soluções que V. Ex.ª traz, creio que há em ambos os casos, como já ficou sublinhado, boas e

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grandes inovações, há reafirmações de princípios que constam desde há anos do nosso ordenamento jurídico são, aliás, obrigatórias por força da nossa própria Constituição - e há uma vontade de desencadear mecanismos de garantia prática da efectivação dos direitos. Tivemos muita conversa sobre os consumidores, tivemos, infelizmente, durante a última década, poucos actos práticos e, sobretudo, poucos actos práticos efectivos, eficazes, reais.
Temos várias sugestões neste momento entre mãos, designadamente no tocante à proposta de lei n.º 20/VII, de entidades diversas, designadamente da própria Associação Nacional de Municípios Portugueses, adiantando várias sugestões, várias propostas de correcção e de aditamento que, pela nossa parte, vamos ler bastante atentamente e que, temos a certeza, poderemos discutir com o Governo aquando da discussão na especialidade dos dois diplomas.
Gostaria de fazer-lhe, Sr.ª Ministra, brevemente, um conjunto de perguntas sobre temas que estão correlacionados com a matéria que nos traz, tanto a questão geral da defesa do consumidor como a da protecção dos utentes de serviços públicos essenciais. Essas questões dizem todas respeito a domínios que entre nós têm padecido de défices de regulamentação.
Tive ocasião de apresentar na legislatura passada foi, aliás, aprovado na generalidade - um projecto de lei sobre protecção dos direitos dos consumidores de serviços telefónicos, matéria que em parte é regulada pela proposta de lei n.º 20/VII, e nessa altura todos nos apercebemos aqui, no Parlamento, de que o direito em vigor nesta área padece, desde logo, de um vício sério: consta de diplomas de conteúdo infra-legal, em muitos casos de meras portarias e despachos normativos, diplomas obscuros e em muitos casos, pura e simplesmente, letra morta. Foram publicados na altura própria, estão razoavelmente esquecidos e, no caso do regulamento do serviço telefónico, a velha matriz inspiradora ainda é o antigo regulamento de 1942, que exaltava o papel da empresa monopolista e, por completo, desprezava a figura do consumidor. Temos ainda demasiados resquícios disso!
Mas temos coisas novas. Chamo a atenção para três e perguntava a opinião de V. Ex.ª sobre essas matérias. E com isso, Sr: Presidente, concluirei.
Primeira: que fazer, na leitura do Governo, em relação ao telemarketing telefónico, por vezes bastante agressivo e utilizando agora já modernas técnicas computacionais? Como defender as pessoas de idade? Como defender as crianças, os jovens, assoberbados com propostas bastante excitantes, diga-se em abono da verdade, e feitas com insistência?
Segunda: o teleshopping via TV. É uma realidade, será cada vez mais uma realidade, é uma realidade que em parte está protegida mas tem lacunas de regulamentação e protecção.
Terceira: as transacções transfronteiras por via electrónica. A esta hora exactamente, Sr.ª Ministra, haverá gente que em Portugal está a comprar, via Internet ou outras redes, produtos noutros sítios da União Europeia ou do mundo. E em relação a essas transacções electrónicas entendo eu que se aplicam diversas regras, tanto as constantes do nosso direito civil, desde logo, como as constantes da própria lei de defesa do consumidor. Mas há espaços de indefinição e, sobretudo, há dificuldades de aplicação à escala global, que por vezes pode ser à escala mundial, de regras que foram pensadas para o Estado nacional.
A nível europeu, temos pensadas ou estão em gestação diversos instrumentos que visam dar resposta à resolução de conflitos transfronteiras, mas creio que estamos atrasados em relação às transacções electrónicas, tão atrasados que a própria questão da "cifragem" de documentos, essencial para que as transacções sejam seguras, não tem em Portugal nenhum regime jurídico claramente estabelecido e definido.
A última questão, Sr.ª Ministra, diz respeito ainda...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, já gastou 5 minutos.

O Orador: - Passaram depressa, Sr. Presidente, e acabarão imediatamente.

O Sr. Presidente: - Pela sua responsabilidade, que vem da antiguidade, do talento, tudo isso, tem de dar o exemplo.
Faça favor.

O Orador: - Darei, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, sobre os serviços avançados de telecomunicações, farei uma intervenção no momento próprio.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

Pausa

Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado José Calçada, mas antes a Sr.ª Ministra tem de responder à pergunta colocada pelo Sr. Deputado José Magalhães...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Se quiser!

A Sr.ª Ministra do Ambiente: - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Naturalmente que quero responder porque acho que qualquer pergunta merece uma resposta.
Sr. Deputado José Magalhães, quanto à metodologia, penso que há alguma inovação e que os ensinamentos que recolhemos do estudo que foi lançado não são teóricos, são consequências práticas que nos permitem hierarquizar prioridades e seleccionar, de entre a multiplicidade de áreas que podíamos cobrir, aquelas que são mais importantes para o consumidor em geral.
Estou de acordo que em Portugal não só nesta matéria mas, sobretudo, em matéria de ambiente, porque é a área a que estou mais sensível - é vulgar dizer-se que o País legal e o País real não têm quase pontos em comum -, há, de facto, muita legislação que não tem aplicação prática. Independentemente de reconhecermos a necessidade de um conjunto importante de regulamentações relativamente à legislação que agora é proposta, consideramos que a legislação proposta sobre os serviços públicos essenciais já se aproxima muitíssimo de uma intervenção no quotidiano das pessoas e já não. se propõem medidas teóricas mas muito práticas. Sentimos isso nas negociações e nos contactos que tivemos com as várias empresas que fornecem este tipo de serviço.
Consideramos, no entanto, que para essas empresas um controle mais próximo dos cidadãos relativamente aos produtos que vendem e aos serviços que providenciam introduz melhorias nessas empresas e aproxima-as dos

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padrões de qualidade seguidos pelas suas congéneres europeias...

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - ..., tendo, por isso, de defrontar um público muito mais exigente, consumidores muito mais conhecedores, consumidores que já não vivem dependentes de um nível educacional baixo e de um nível de informação ainda mais baixo.
Nessa matéria, consideramos que dar instrumentos aos consumidores para se defenderem é, sobretudo, no que diz respeito às empresas, uma acção positiva e necessária para a modernização dos serviços e dos produtos que as nossas empresas ou empresas estrangeiras vendem em território português. Daí que tenhamos referido, quer no preâmbulo da legislação em aprovação, quer no que diz respeito à intervenção e apresentação dessa documentação, o papel importantíssimo para o desenvolvimento económico do nosso País e a melhoria da qualidade dos produtos e dos serviços que são apresentados.
Referiu muito concretamente a questão dos serviços telefónicos e eu gostava de sublinhar que, no artigo 5.º, n.º 5, da proposta de lei n.º 20/VII, nos comprometemos a, dentro de 90 dias, apresentar uma proposta de regulamentação relativa aos serviços de valor acrescentado. Essa é uma matéria em relação à qual pensamos que há, de facto, uma situação de exploração quase sistemática de incautos e de indefesos. As crianças são uma das vítimas sistemáticas - ou os pais das crianças, porque são eles quem pagam a conta! - deste tipo de situação, assim como pessoas com nível de instrução por vezes mais reduzido ou pessoas idosas. Essa matéria será objecto de regulamentação específica, embora já o próprio artigo 5 º proíba, digamos assim, que o serviço em geral seja "cortado" por não cumprimento de uma parte das funções que são fornecidas. Ao introduzir esse normativo, estamos já a abrir um espaço para que esse tipo de situação desequilibrada seja progressivamente corrigida.
Por último, referiu a questão do fornecimento de serviços por empresas localizadas em países estrangeiros. Gostava de referir que as duas propostas de lei são totalmente coerentes com as directivas comunitárias neste momento em vigor e que elas se inserem perfeitamente no espaço único europeu em toda a regulamentação...

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr.ª Ministra.

A Oradora: - Com certeza, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, as duas propostas lei são totalmente coerentes com as directivas comunitárias neste momento em vigor e que elas se inserem perfeitamente em toda a regulamentação relativa ao mercado único e à existência de um mercado único europeu.
Nessa matéria, não há conflitualidade entre a legislação que é apresentada e a legislação comunitária sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegados à hora regimental das votação, vamos, em primeiro lugar, proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei o projecto de lei n.º 29/VII - Cria uma rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção de toxicodependentes (PCP).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes, votos contra do CDS-PP e a abstenção do PSD.
Informo que este diploma baixa à 7.ª Comissão.
Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 64/VII Permite a constituição como assistentes em processo penal no caso de crime de índole racista ou xenófoba por parte das comunidades de imigrantes e demais associações de defesa dos interesses em causa (PS).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.
Informo que este diploma baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, V. Ex.ª anunciou que o projecto de lei n.º 29/VII, do PCP, baixava à 7.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Exacto.

O Orador: - Ora, estando constituída na Assembleia da República uma comissão eventual específica para os assuntos de toxicodependência, se houvesse consenso de todas as bancadas, pareceria mais adequado, dado o carácter transversal deste combate, que o referido diploma não baixasse à 7.ª Comissão mas, sim, a essa comissão eventual.

O Sr. Presidente: - Em rigor, os diplomas devem baixar às comissões permanentes, mas se houver acordo de todas as bancadas, pela minha parte, acho perfeitamente justificada a proposta.

Pausa.

Como ninguém se manifesta contra a sugestão apresentada, far-se-á como propôs o Sr. Deputado Carlos Coelho.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de São João da Madeira, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Carlos da Silva (PS) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos; Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr.

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Deputado Cabrita Neto (PSD) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - De acordo com o solicitado pelo Tribunal do Círculo de Vila Real, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Pereira (PSD) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, aproveito esta oportunidade para relembrar, pois parece que surgiram dúvidas, que amanhã haverá reunião plenária e a ordem do dia é a que foi previamente anunciada, apenas com uma correcção, e espero que a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares que se vai realizar daqui a pouco concorde com isso: em vez de se proceder à discussão e votação do Relatório e Conta de Gerência da Assembleia da República, permiti-me agendar o orçamento da Assembleia, porque se trata de o votar no último dia em que pode ser votado, com respeito pelo prazo, acontecendo que quanto à Conta ainda não temos o parecer do Tribunal de Contas. Portanto, são boas razões para a substituição e espero que todos estejam de acordo com isso.
Vamos continuar a discussão das propostas de lei em apreço. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados; Srs. Membros do Governo: É bem verdade que a realidade ultrapassa sempre a ficção. Assim, dificilmente qualquer de nós poderia imaginar modo mais dramático de chamar a atenção para a necessidade da defesa dos direitos dos cidadãos enquanto consumidores do que tudo o que tem vindo a ser dito e escrito em torno da encefalopatia espongiforme bovina, popularmente conhecida como "a doença das vacas loucas".
É desde logo aqui que a questão politicamente se coloca: ou reduzimos os cidadãos a meros consumidores, ou enfatizamos nestes últimos a matriz de cidadania que antes de tudo os enforma. Entenderam-no perfeitamente dois jornais ingleses tão diferentes entre si como o são o The Observer e o The Guardian. Diz o primeiro: "Desde há 10 anos que os cientistas ingleses acumulam dados sobre os riscos de transmissão da doença ao homem. Mas o Estado britânico preferiu fazer figas e fazer calar os peritos, e, escravo da sua própria política agro-alimentar e das pressões dos lobbies agrícolas, colocou em perigo a segurança de toda a população". E o The Guardian acrescenta: "As nossas sociedades, transformaram-se em laboratórios e cobaias da mudança tecnológica. Trata-se, esta, de uma razão acrescida para não deixarmos as rédeas das coisas nas mãos dos lobbies, como o fez o Governo britânico".
Dir-se-á que as propostas de lei n.º 5 17/VII é 20/VII, ora colocadas à nossa consideração, não seriam passíveis de suscitar questões conjunturalmente tão dramáticas ou politicamente tão relevantes. Nada menos verdadeiro! Questões tão diversas como ás que se ligam à publicidade, ou aos seguros, ou ao time sharing, ou às lavandarias, ou à segurança dos produtos, ou às vendas à distância, ou à própria dispersão dós normativos legais, são a prova de que nos encontramos perante circunstâncias com implicações mais ou menos directas na qualidade de vida dos cidadãos, frequentemente desprotegidos como consumidores.
É assim que as constantes violações ao Código da Publicidade - e lembramo-nos particularmente da utilização abusiva das crianças como instrumentos ou alvo privilegiado nesse domínio - obrigam ao reforço dos meios humanos e materiais de fiscalização, nomeadamente no âmbito do Instituto do Consumidor.
É assim que a aprovação de legislação não tem sido suficiente para vincular as companhias de seguros a uma verdadeira transparência nas relações contratuais com os seus clientes, mantendo-se difusa a competência ou a responsabilidade do Instituto de Seguros de Portugal nessa matéria. Os chamados "seguros de saúde" constituem um triste exemplo desta situação, encontrando-se frequentemente situados na fronteira que separa a legalidade da fraude pura e simples. Incentivados como alternativa ao Serviço Nacional de Saúde por uma publicidade enganosa, têm muitas vezes servido apenas para que as seguradoras cancelem os seus contratos quando os segurados adoecem.
Em outro domínio, o da segurança dos produtos, praticamente não se faz o acompanhamento e fiscalização dos produtos perigosos que circulam pelo País e é quase inexistente a informação aos consumidores sobre o risco ou a periculosidade de determinado bem. Na melhor das hipóteses - e isso nada nos alegra, nem aos cidadãos consumidores -, o que se pode constatar é a total falta de coordenação dentro da multiplicidade dos organismos públicos envolvidos.
O time sharing, esse, veio apenas enriquecer o nosso vocabulário como novo sinónimo de "burla", a qual pode também significar "títulos de férias", "cartões de férias" e outros tipos de pseudo-contratos não contemplados na nossa legislação.
As histórias com lavandarias fazem já parte, do anedotário nacional, e quase todos lhes achamos graça, especialmente quando não é o nosso casaco preferido que, por artes mágicas da química, passa a servir apenas à boneca da nossa filha, embora justo... Gorou-se há anos atrás a tentativa de se estabelecer um código de conduta para este sector, sobre o qual os consumidores mais se queixam. Continua sem solução o problema de quem sofre o dano, e nada resolve o "jogo do empurra" entre os profissionais do sector e os empresários fabricantes dos produtos em torno de eventuais negligências quanto a indicações ou ao uso.
No domínio das vendas à distância, prevê-se para breve legislação comunitária que obrigará a rever o nosso normativo nacional, de 1987, já ultrapassado. Entretanto, e para além da legislação comunitária, torna-se urgente repensar o enquadramento legal das vendas ao domicílio, ou por correspondência, ou entre países, de modo a obstruir negócios frustrantes para os consumidores e para que estes possam reaver pelo menos o seu dinheiro.

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Por outro lado, a multiplicidade de diplomas que abrange, de uma forma dispersa e sem coordenação, diferentes campos relacionados com os direitos do cidadão consumidor, não significa o seu cumprimento por parte das entidades a tal obrigadas e dificulta mesmo a movimentação e a capacidade de defesa dos consumidores, individualmente ou associados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em termos de articulado, é nosso entendimento que os serviços de correios devem ser aditados no n.º 8 do artigo 9.º da proposta de lei n.º 17/VII.
Já no que se refere à proposta de lei n.º 20/VII, entendemos que no n.º 2 do artigo 1.º devem ser aditados igualmente os serviços de correios, mas também os serviços de recolha e tratamento dos lixos e os serviços de transportes públicos. Aspectos que nos parecem positivos nesta proposta de lei n.º 20/VII são, por exemplo, a obrigatoriedade de a Portugal Telecom passar a fornecer gratuitamente uma facturação detalhada do serviço prestado; o desaparecimento do chamado "consumo mínimo" de água, que funcionava como uma espécie de taxa abusiva sobre o consumidor; a impossibilidade de as companhias efectuarem cortes no fornecimento sem qualquer pré-aviso, ou de efectuarem cobranças com base em consumos estimados; a necessidade expressa de desburocratização e de melhoria dos produtos, quer se trate da qualidade da água, da modernização do equipamento, da melhoria do atendimento ao público, da resolução das reclamações, ou da clareza e rapidez da informação aos consumidores.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, a proposta não estabelece o regime sancionatório de contra-ordenações no caso de incumprimento por parte das entidades fornecedoras dos serviços, nem tão pouco se remete para o regime geral das contra-ordenações. Trata-se de uma lacuna que não deve deixar de ser preenchida.
Estranhamos também que a proposta (para além da recolha e tratamento de lixos e dos transportes públicos) não inclua os correios entre os serviços públicos, tanto mais que, hoje, ultrapassando as funções clássicas que sempre lhes foram atribuídas, os correios constituem um serviço híbrido e multiforme, funcionando como extensões da Tesouraria da Fazenda Pública, da banca e da venda de produtos financeiros, de edição livreira especializada, de cobrança da energia eléctrica, dos telefones, da água, do gás.
Refere a proposta de lei que "os serviços públicos essenciais, já hoje entregues também a empresas privadas, (...) (devem) atender a envolventes especiais, que não a uma mera óptica puramente comercial ou economicista". Passando por cima das reservas que este texto desde logo nos deixa adivinhar sobre a própria legitimidade da privatização de serviços públicos essenciais - e é claramente conhecida a nossa posição nesse domínio -, o que importa aqui circunstancialmente relevar é a necessidade de particular protecção do utente em serviços tão sensíveis quanto o são os relativos ao fornecimento de água, de energia eléctrica, do gás, ou do telefone.
O Estado não pode deixar de intervir com seriedade e rapidez no sentido da elaboração de um rastreio às águas de consumo nacionais, devendo os resultados periódicos e sistemáticos das análises fazer parte da informação que se presta aos consumidores, sendo certo que seria fácil adicioná-la aos impressos das facturas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à energia eléctrica, são conhecidas as queixas relativas à não clareza dos preços cobrados nas facturas assim como à prestação de certos serviços, à qualidade da assistência, ao excesso de cortes de fornecimento sem aviso prévio e às consequências de inúmeros trabalhos de empresas sub-empreiteiras e pelos quais a EDP se não responsabiliza.
Não podemos também deixar de assinalar a forma absolutamente insensível como a EDP espalha os seus postos de alta tensão em parques naturais, em lugares de património cultural e em certas zonas edificadas.
Quanto ao gás, impõe-se uma campanha persistente de esclarecimento sobre a sua segurança, a fiabilidade e o manuseamento dos redutores e a adequação da tubagem utilizada. No domínio da fiscalização ou das vistorias regulares, a Associação Portuguesa de Gases Combustíveis ou o Instituto de Soldadura e Qualidade são entidades exóticas para a generalidade dos nossos cidadãos, continuando o destino a ter as costas largas sempre que uma nova tragédia enche as páginas dos jornais.
Mas o grande recordista das queixas dos nossos utentes é sem dúvida o telefone: do congestionamento das linhas às interferências sucessivas, da fraca qualidade das ligações em meios mais periféricos às incorrecções, aos abusos e à falta de clareza da facturação, a síndrome da "angústia-do-utente-antes-da-marcação-do-número" continua ainda a fazer um número excessivo de vítimas no nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As "modas" - felizmente, passarão, como todas as modas do neoliberalismo, da desregulamentação, da desresponsabilização do Estado, das privatizações como fétiche, do reinado puro e simples das regras do mercado, da lógica do lucro, em síntese, têm vindo a pretender a edificação de uma sociedade dita de consumo, como se este consumo de uns não se erigisse sobre as inomináveis carências de tantos. Pretende-se substituir o cidadão/sujeito pelo consumidor/objecto. Invertendo e pervertendo o ideal clássico, defende-se, afinai, que "consumir é preciso, viver não é preciso".
E seja-nos lícito dizer que, nestas coisas da defesa do consumidor como nas do assumir da cidadania - porque é do cruzamento de, ambas que afinal se trata, - mais importante do que ver um qualquer ministro a comer miolos é termos a certeza de que ele também os possui. Em Shakespeare revisitado, "tê-los ou comê-los, eis. a questão".

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A presente iniciativa legislativa do Governo constitui, tal como se refere na exposição de motivos da proposta de lei n.º 17/VII, um dos pontos mais importantes do Programa do Governo na área da política de protecção do consumidor.
A actual lei de defesa do consumidor, publicada em Agosto de 1981, foi um marco histórico da institucionalização do "consumerismo", tendo introduzido na ordem jurídica portuguesa, de forma sistemática, um conjunto

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de regras inovadoras tendentes a repor o equilíbrio nas relações de consumo.
Pese embora as condições de que dispôs, nomeadamente na última legislatura, o Governo do PSD limitou-se a transpor para o direito interno directivas e regulamentos comunitários, e, diga-se, de forma incompleta e imperfeita.
Só assim se compreende que os sucessivos anteprojectos do Governo do PSD da lei de defesa do consumidor nunca tenham chegado à fase de aprovação final, mantendo-se em vigor uma lei de 1981, insuficientemente sintonizada com a Constituição e desenquadrada das actuais condições de funcionamento do mercado.
A nossa Constituição dignifica e sublinha hoje os consumidores como titulares de direitos constitucionais, os quais estão localizados em sede de direitos fundamentais.
De entre esses direitos constitucionais destacam-se os direitos à reparação de danos; à qualidade dos bens e serviços; à formação e à informação; à protecção da saúde, da segurança e dos interesses económicos; e ao apoio do Estado.
Acresce que a União Europeia consagra hoje, entre as políticas europeias, a política de consumidores, no âmbito da qual a União contribuirá para a realização de um nível elevado de defesa dos consumidores, adoptando medidas no âmbito da realização do mercado interno e recorrendo a acções específicas e de complemento à política seguida pelos Estados membros em defesa da saúde, da segurança e dos interesses económicos dos consumidores.
O Governo, ao apresentar esta sua proposta de lei, é fiel ao compromisso eleitoral que assumiu perante os portugueses, facto que o Grupo Parlamentar do PS não pode deixar de sublinhar e registar.
Há que reconhecer que, em sede de defesa do consumidor, muitos sectores foram votados ao abandono, em termos do controle da sua legalidade, como foi o caso da publicidade, ou o controle de práticas e de cláusulas abusivas nos contratos de prestação e fornecimento de bens e serviços fundamentais, como as telecomunicações, electricidade, água ou o gás.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Impõe-se, pois, a actualização dos mecanismos legais destinados a salvaguardar a qualidade dos produtos e serviços que entram em Portugal, susceptíveis de pôr em causa a saúde, a segurança e os interesses económicos dos consumidores portugueses.
Por outro lado, a internacionalização dos mercados, as novas formas de distribuição e comercialização de produtos e serviços, o desenvolvimento de novas tecnologias de informação, de publicidade e de marketing e a agressividade dos próprios agentes económicos - fabricantes, produtores, distribuidores e vendedores - impõem a adopção de um novo quadro legal de protecção do consumidor.
O PS e a nova maioria comprometeram-se, no seu programa eleitoral, a apoiar as organizações da sociedade civil que pugnam pelos direitos dos consumidores, sem deixar de ,fazer assumir pelos organismos estatais competentes as responsabilidades inerentes à defesa dos cidadãos e do interesse público.
A presente proposta de lei de defesa do cidadão consumidor, para além da redefinição dos direitos dos consumidores, aposta claramente no reforço da capacidade de acção e intervenção das associações de consumidores.
De entre as principais inovações constantes da presente proposta de lei, o Grupo Parlamentar do PS destaca, pela sua amplitude e significado, as seguintes:
A extensão da incumbência da protecção do consumidor às regiões autónomas e às autarquias locais;
O aperfeiçoamento e clarificação do conceito de consumidor, através da consagração do destino dos bens a um uso não profissional em vez de privado e a inclusão como consumidores dos cidadãos que recorrem aos serviços de profissionais liberais;
O alargamento do âmbito material de protecção dos consumidores aos serviços prestados, a título oneroso, pelos organismos da Administração Pública, pessoas colectivas públicas ou maioritariamente detidos pelo Estado, regiões autónomas e autarquias locais e empresas concessionárias de serviço público;
A consagração do direito de retractação ao consumidor, mais conhecido como "direito ao arrependimento";
A consagração da acção inibitória destinada a prevenir, corrigir ou fazer cessar práticas lesivas dos direitos do consumidor;
A isenção de preparos e custas por parte dos consumidores e suas organizações, quando prossigam o exercício dos seus direitos:
A consagração do direito à acção popular;
A atribuição do direito de antena às associações de consumidores:
A atribuição ao Instituto do Consumidor de novos poderes que possibilitem, nomeadamente, a representação em juízo dos direitos e interesses colectivos difusos dos consumidores;
A criação do Conselho Nacional de Consumo, como organismo independente, com representação diversificada, destinado a debater a situação do consumidor português e a propor e apreciar medidas pua melhorar a sua qualidade de vida;
O estabelecimento de um prazo de garantia de um ano para os bens móveis não consumíveis;
A enumeração de diversas medidas a adoptar pelas entidades públicas, a quem compete assegurar a defesa do cidadão consumidor no campo da formação e informação dos consumidores, no âmbito do serviço público;
A atribuição aos consumidores do direito de resolução dos contratos celebrados com violação do dever de informar;
A inversão do ónus da prova, quando se verifiquem danos originados pelo incumprimento do dever de informar;
O estabelecimento da obrigação de o Governo adoptar medidas adequadas a tutelar a posição dos consumidores no domínio das relações jurídicas que tenham por objecto bens e serviços essenciais;
A nulidade das disposições ou convenções que excluam ou restrinjam os direitos consagrados na lei, nulidade esta que apenas pode ser invocada pelos consumidores e seus representantes;
A prerrogativa concedida às associações de consumidores de participarem na regulação de preços dos bens essenciais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O direito constitucional à reparação de danos estabelecido no artigo 60.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa é um dos direitos constitucionais mais importantes atribuídos aos consumidores, já que se reveste de natureza equiparada à dos direitos, liberdades e garantias, beneficiando, pois, do respectivo regime.

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Este direito é agora devidamente implementado pelo Governo. Trata-se de um direito essencial para a criação das condições adequadas à protecção dos consumidores, atenta a sua eficácia e os consequentes efeitos que a sua consagração não deixará de trazer para as relações entre os fornecedores de bens e os consumidores.
O seu efeito pedagógico e moralizador sobre os agentes económicos permitirá, por certo, ajudar a criar as condições necessárias à salvaguarda dos próprios direitos dos consumidores, à qualidade dos bens e serviços consumidos, à formação e à informação, à protecção da saúde, da segurança e dos interesses económicos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sendo certo que o direito à reparação da coisa, à sua substituição, à redução do preço ou à anulação do contrato, sempre que se verifique o fornecimento de bens ou serviços defeituosos, não pressupõe o abandono dos esquemas de responsabilidade contratual de cariz subjectivista, isto para além da responsabilidade objectivista do produtor, estabelecida no n.º 5 do artigo 13.º da proposta de lei, pelos danos causados por defeito de produtos que coloque no mercado.
Igual importância há que atribuir à acção inibitória destinada a prevenir, corrigir ou fazer cessar práticas lesivas dos direitos dos consumidores, prevista no artigo 10.º da proposta de lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei ora em discussão determina aos órgãos e departamentos da Administração Pública a criação e o apoio de centros de arbitragem, com o objectivo de dirimir os conflitos de consumo.
A este propósito, permitam-me que aborde, agora, a actividade que tem vindo a ser desenvolvida pelo Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo, a funcionar na cidade de Lisboa. Em 22 de Janeiro de 1993, este Centro foi transformado em estrutura autónoma, através da criação de uma associação privada sem fins lucrativos, de que são sócios fundadores a Câmara Municipal de Lisboa, a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (DECO) e a União das Associações de Comerciantes do Distrito de Lisboa.
Pese embora a competência territorial do Centro esteja limitada à cidade de Lisboa, os seus resultados são extremamente positivos e mesmo estimulantes, quer pelas informações prestadas, quer pelos processos resolvidos, o que demonstra bem a confiança dos consumidores e dos prestadores de bens e serviços.
Factores determinantes para os bons resultados obtidos são a eficácia do processo, cujas decisões possuem o mesmo valor de uma sentença do tribunal de 1.ª instância; a existência de um grupo jurídico que permite uma efectiva triagem dos casos transitados ao tribunal arbitrai e respectiva instrução dos processos com um acompanhamento imparcial dos mesmos; o facto de o tribunal ser presidido por um árbitro, que é necessariamente magistrado judicial; a garantia de imparcialidade do procedimento em relação às partes; a utilização de um procedimento simplificado, que permite a resolução de conflitos, quer pela via consensual, quer pela via arbitrai; a rigorosa observância do princípio do contraditório; a possibilidade de serem proferidas, em sede de tribunal arbitrai, decisões de direito ou de equidade; a celeridade do processo, demonstrada pelo facto de, entre a admissão da reclamação no Centro e a efectiva resolução do conflito, não decorrerem mais de 30 dias e, finalmente, a não existência de custas.
A acção da Câmara Municipal de Lisboa, da DECO e da União das Associações dos Comerciantes do Distrito de Lisboa, e a direcção competente e empenhada da Directora do Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo de Lisboa, Dr.ª Isabel Mendes Cabeçadas, tem permitido aos consumidores. que adquirem bens ou serviços na cidade de Lisboa um acesso mais fácil ao direito e à justiça, constituindo um poderoso meio de protecção dos cidadãos consumidores.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - A experiência deste Centro, ao qual a Câmara Municipal de Lisboa tem dado todo o seu apoio e do qual é sócia fundadora, veio, pois, suprir uma efectiva necessidade dos consumidores e dos prestadores de bens e serviços, constituindo um bom exemplo do apoio que os órgãos e departamentos da Administração Pública deverão dar para a criação e o apoio a centros de arbitragem, como forma de conferir protecção jurídica aos consumidores, tornando a justiça mais acessível e pronta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já se deixou dito,, o PSD e o seu Governo não foram capazes, ou não souberam, apresentar a esta Câmara uma proposta de lei de defesa do consumidor, quando as circunstâncias e a realidade já o exigiam e determinavam.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Passados que são menos de cinco meses após a sua investidura pela Assembleia da República, o Governo do PS e da nova maioria cumpre mais um dos compromissos que assumiu perante os portugueses.
Tal como em outros domínios, provamos, aqui, hoje e na prática, a nossa forma diferente de exercer o poder, com coerência e vontade inabalável de concretizarmos aquilo que prometemos aos portugueses.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Permitam-me que fale daqui, da bancada, porque prescindo de uma intervenção escrita: Em função de tudo o que já ouvi, entendi que devia passar de outra maneira estes escassos minutos que vos quero ocupar.
Quem, como eu, vive este tema da protecção do consumidor há uns anos e o faz sob o ângulo científico, fica admirado como é que, chegando aqui e se não tivesse vivido esta experiência, "tudo começa hoje, antes nada havia".
Foi aqui dito que, no passado, a política de protecção e defesa do consumidor era marginal e tinha sido esquecida. Ora, só quem não está dentro destes assuntos ou foi muito mal informado pode proferir tal afirmação. Mas, pior, depois de se referir isto no início do discurso, chega-se a uma parte em que se adianta que, afinal, é tanta a legislação existente em Portugal que é necessário introduzir ordem e sistematização, e, por isso, nada melhor

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que elaborar um código, constituindo-se uma comissão para esse efeito.
Afinal, se nada se fez no passado, se foi tudo tão marginal e tão esquecido, quem fez essa legislação? Há quantos anos a protecção do consumidor é tema de eleição em Portugal e no mundo?

O Sr. José Calçada (PCP): - De eleições!

O Orador: - Sr. Deputado, não entro num tipo de linguagem eleitoralista, porque não é esse sequer o meu tema; o meu tema é encarado com a seriedade de quem estuda profundamente estas questões.

O Sr. José Calçada (PCP): - Há coisa mais séria do que eleições em regime democrático?!

O Orador: - Em segundo lugar, julgo que o que transparece aqui hoje, não só na declaração inicial da Sr.ª Ministra mas também em muitas das intervenções dos Srs. Deputados, sobretudo do PS, é uma publicidade enganosa. E, como sabem, a publicidade enganosa é proibida! O que aqui está a acontecer é a publicidade de algo que, pelos vistos, "tudo começa só hoje", como se a proposta de lei hoje aqui apresentada fosse nova, inovadora e não tivesse atrás de si todo um acervo de política legislativa, a começar pelo tão reconhecido marco histórico da Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto. Logo, a publicidade é melhor do que o produto hoje aqui em apreciação. Como tal, esta pequena observação não podia deixar de ser feita.
Humildemente reconheço que, neste domínio, como nos outros, sou um estafeta, a receber o testemunho, agora, deste Governo, assim como este Governo deve ser estafeta, um dia, a passar o testemunho a outros.
Do que se trata aqui é da continuação de políticas humanistas de uma sociedade livre, em que se pretende "descoisificar" o homem, neste caso o consumidor, e disso o Partido Social Democrata sempre se orgulhou, orgulha e orgulhará.
Não permitiremos, portanto, que se usem bandeiras, que se queira fazer top ten, no sentido de saber se hoje é que vai ser bom, porque no passado é que foi mau.

Vozes do PSD: Muito bem!

O Orador: - A protecção do consumidor, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, é um tema muito antigo, como todas as ideias justas. E o facto de ser hoje um tema actual - e, sobretudo, um tema cultural e uma exigência do nosso tempo - reporta-se à década de 60 para cá. Só com a evolução da sociedade de consumo e os anos esplendorosos de desenvolvimento económico é que se sentiu a necessidade de tratar qua tale o consumidor.
E é nesta sociedade de abundância, em que os métodos agressivos proliferam - e permito-me não os enumerar agora - e se regista um desequilíbrio de forças, entre, de um lado, os profissionais, especialmente produtores, e, do outro, os consumidores, destinatários dos produtos e serviços, que o tema passou a ser de eleição, justamente em nome da justiça social e da solidariedade humana.
Mais do que fazer um direito novo - também não tenhamos essa pretensão -, do que se trata aqui, neste tema de eleição, é de corrigir as práticas - sobretudo, as práticas -, nomeadamente, contratuais. As velhas regras tradicionais não são tão velhas como isso; foram, sim, superadas pelas alterações económicas, pelas alterações substantivas que o mundo sofreu. Por isso, a necessidade de o Estado reequilibrar essas forças em nome da justiça social é que ditou este direito corrector e complementar do mercado - e também aqui o Partido Social Democrata se orgulha destes grandes princípios de inspiração humanista e de solidariedade social.
Não queremos ter sozinhos essa bandeira. Entendemos que ela não deve ser usada por qualquer dos partidos, mas por todos os que se prezam de ser humanistas. Por isso, partilhamos esta proposta de lei, agora aqui apresentada, com a mesma humildade e o mesmo à-vontade com que a partilharíamos se fosse um governo do Partido Social Democrata a apresentá-la. E, pois, em nome do Partido Social Democrata e da minha bancada que posso dizer-vos que estamos de acordo com os grandes princípios da proposta de lei relativa à protecção do consumidor, porque ela mais não é do que o aprofundamento, o desenvolvimento e, sobretudo, a sistematização de muitos e muitos dos princípios que já constam de leis avulsas e extravagantes, as tais que justificam que se faça um código, em nome de certos princípios que adiante enunciarei. Não se trata, portanto, de uma proposta de lei inovadora. Repare-se, aliás, na contradição: quando, na tentativa de colocar dúvidas, o Sr. Deputado José Magalhães foca alguns assuntos que, nenhum deles, não são tratados na própria proposta de lei. E não o são, porque são temas novos, que ainda não tiveram tratamento adequado nas leis avulsas. Ora, como esta proposta de lei, mais do que inovadora, é um repositório de leis anteriores, obviamente que não contém as respostas adequadas.
Assim sendo, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o que está em causa devia ter sido essa a grande prioridade no Programa do Governo, e que não o é, pois tive o cuidado de o ler e basta olhar para o índice para verificarmos que nunca aparece lá a palavra "consumo", o que aparece é ambiente e aí, sim, encontram-se dois parágrafos sobre o consumo...

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem de fazer uma melhor pesquisa!

O Orador: - Nada há lá sobre isto, a não ser no sector do ambiente e inserido na ideia da qualidade de vida. Feita esta advertência, e retomando o meu raciocínio, o que está em causa para mim - com a humildade que deve caracterizar quem se dedica a estes assuntos é reconhecer, em primeiro lugar, que a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto, foi a grande matriz de muitas das leis avulsas, em segundo lugar, que Portugal foi pioneiro em dar, como o fez na Constituição, o devido relevo aos direitos fundamentais do consumidor, e, em terceiro lugar, que Portugal também foi pioneiro com esta Lei n.º 29/81, relativamente a muitos outros países, na esteira, certamente, da Carta do Conselho da Europa e dos primeiros programas da Comunidade Europeia. Mas esta lei é o que é era apenas uma lei de princípios, uma lei-quadro. As leis avulsas proliferaram; o limite das leis avulsas chegou; penso que se atingiu o limite do inultrapassável. A funcionalidade do próprio sistema, que reclama unidade de princípios e eliminação de contradições, de supérfluos e de incertezas chegou. A pulverização e a desintegração legislativa faz repor, hoje, neste domínio,

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as razões que impuseram, há muito, a idade da codificação. São as razões da unidade, da coerência, da certeza e da segurança o primado do geral sobre o particular. Tanto mais que, hoje, numa sociedade da informação, é tão profundamente negativa a sobre informação como o era, antes, a falta de informação! Hoje, a sobre informação é confusa e confunde os destinatários, os consumidores. Hoje, quem lê rótulos e etiquetagens, consumidores leigos e profanos, não sabe para que está a ler aquilo. É preciso que esses rótulos e etiquetagens não sejam tão complexos como têm sido. É, pois, necessário refazer isto, portanto, redimensionar neste sentido.
Também eu, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, mantenho a ideia de que apresentaremos um projecto de lei, de um código do consumo.
A título particular, esta proposta de lei n.º 17/VII, merecendo-nos a nossa aprovação pelos grandes princípios, tem aspectos, apesar de tudo, que revelam grande falta de sabedoria ou, pelo menos, lapsos graves - ou, se não graves, meros lapsos.
Em primeiro lugar, diz-se que a garantia de um ano pode ser - imaginem! - interrompida no período de tempo em que estiver a ser reparado esse mesmo bem. Ora, a interrupção não é a causa que aqui se deve invocar mas, sim, a suspensão, porque suspensão da prescrição e interrupção da prescrição são coisas diferentes. No entanto, está lá, no artigo 4.º, n.º 4! Portanto, em sede de especialidade, teremos muitas coisas a corrigir. Estamos disponíveis para introduzir melhorias técnicas e também ao nível de alguns dos princípios.
Em segundo lugar, houve algo que me saltou aos olhos, e aí julgo que devemos ter alguma cautela: no artigo 8.º, n.º 5, fala-se na inversão do ónus da prova, quando haja danos resultantes da violação do dever de informar, antes da celebração do contrato, também para as prestações de serviços. Isto pode significar que, no domínio das profissões liberais - médicos, advogados, engenheiros, arquitectos, etc. -, também se vai aplicar?... Há um longo trabalho que está em curso na Comissão Europeia, no Parlamento Europeu, e forças, que com certeza conhecem melhor do que eu, têm-se oposto à perspectiva da proposta de directiva de mera inversão do ónus da prova, também relativamente à facilidade da prova do nexo de causalidade. Isto pode significar que vamos dar aqui um passo sem termos as cautelas devidas? Por que não fazermos uma lei especial para cada uma das profissões liberais? Por que não, até, podermos medir a hipótese da responsabilidade objectiva, desde que com tectos limitados e fundos alimentados de certa e determinada maneira pelos próprios liberais?
Julgo que esta alínea é um passo que pode conduzir a consequências de quem porventura as não mediu e que, sobretudo, não tem em conta a grande complexidade da matéria em causa ou a audição dos seus múltiplos destinatários, que, sei-o, também não foram ouvidos, em nome do diálogo, de que tanto se orgulha este Governo.
Esta é uma advertência que teremos de ponderar bem em sede de especialidade. Estou também disponível para convosco raciocinar em voz alta e ver se, como alternativa, não será melhor pensar em leis gerais para cada uma dessas profissões liberais.
Na parte que diz respeito ao direito à formação e à educação nem uma palavra para a sociedade de informação. Como é que se pode potenciar o aproveitamento da sociedade de informação para a educação, formação e informação do consumidor? É outra das questões que também devíamos tentar introduzir na especialidade.
E quanto à acção inibitória? Também consideram isso uma inovação?! É que ainda antes de existir o decreto-lei das cláusulas gerais já a boa doutrina civilística defende a acção inibitória, quer cautelar, quer definitiva. E vem-se agora tentar dizer que também é uma inovação!
Pior do que isso, prevê-se a sanção pecuniária compulsória, com o mesmo defeito com que já está no decreto-lei das cláusulas gerais, confundindo-a com multa. Porque a sanção pecuniária compulsória, na esteira da astreinte francesa, é o juiz, infelizmente a pedido, no caso português, que a decreta imediatamente na própria sentença, dizendo: "condeno-o a fazer isto, sob pena de, não o fazendo, pagar x por cada dia de atraso ou por cada infracção". Isto é que é prevenir, isto é que é tentar fazer o chamado meio de coerção para o futuro.
O que aqui vem, na esteira da asneira das cláusulas gerais, é que o juiz decreta, sentencia e se, depois, se vier a verificar que a sentença não foi acatada ou não foi observada vem pedir-se uma sanção pecuniária compulsória. Chame-se-lhes multa, mas não se insulte a sanção pecuniária compulsória!
Quanto à reparação dos danos, também se vem dizer que são direitos novos da protecção do consumidor. Meus senhores, saibam ler o Código Civil! Está lá tudo!

Vozes do PS: - Ai está lá tudo!?

O Orador: - Está lá tudo! Está lá tudo na parte do artigo 913.º e...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Já estou incomodado!

O Orador: - Olhe, quer que lhe diga? O direito à reparação e à substituição está no artigo 914.º. Quer que lhe diga os outros?

Vozes do PS e do PCP: - Diga! Diga!

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, não diz?!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, se querem pedir esclarecimentos, podem inscrever-se.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Orador: - No que se refere ao financiamento das associações, pergunto: para quando a regulamentação desta matéria? É que isso preocupa-me imenso. O direito de uma cidadania e da participação na democracia participativa de hoje exige estes instrumentos. As associações de consumidores, como as do ambiente, têm de ser, obviamente, apoiadas pelo Estado. Talvez se justifique - na minha perspectiva já há muito que se justifica, e não basta um mero despacho - uma lei de financiamento das associações. Porque? Por uma razão simples. Recolhi um dado que deixo aqui à Câmara para meditar: no meio dos quase 400 milhões de cidadãos que a Comunidade Europeia hoje tem, sabem quantas pessoas fazem parte do movimento associativo dos consumidores? Uns escassos 4 milhões, e são quase todos do Norte da Europa, porque no Sul há poucos. Se forem ver quantos são os associados em Portugal, então, nem vale a pena perguntar-vos - para além das fichas falsas que possam existir, porque isso nem vale a. pena questionar.

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Os Srs. José Magalhães (PS) e José Calçada (PCP): - Fichas falsas?!

O Orador: - Se o Estado não impulsionar...

O Sr. José Calçada (PCP): - Não deixe isso no ar!

O Orador: - Se o Estado não financiar as associações, como é que podemos potenciar esta vertente da democracia participativa?!
Quanto aos interesses colectivos e difusos e à legitimidade activa para propor acções, "não há fome que não dê em fartura". Depois da acção popular, em que as associações de consumidores também têm essa legitimidade, vem agora esta nova lei dizer que também o Instituto do Consumidor passa a ter essa legitimidade. Parece que o Instituto do Consumidor tem funcionado muito bem. Parece que os seus poderes têm sido usados todos os dias, já aqui foi dito. Folgo muito em que também agora lhe queiram dar mais um para poder justificar a inércia em muitos outros aspectos. Se as associações de consumidores têm essa legitimidade, se o Ministério Público também tem e deve continuar a tê-la, pergunto se, neste caso, também será necessária a legitimidade activa do Instituto do Consumidor.
E quanto à grande novidade do Conselho Nacional do Consumo! Meus senhores, já antes havia - e está na lei o Conselho Geral, integrado no Instituto. Mude-se-lhe o nome, mas vamos ver se, depois, na composição conseguimos que seja diferente do Conselho Geral, que já temos, mas que, pelos vistos, incomoda ou não agrada ou não satisfaz!
No que se refere à proposta de lei que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos, destinados a proteger o utente dos serviços públicos essenciais, devo dizer que também ela não introduz grandes inovações, mas agrada-me e também a votaremos a favor, porque, pelo menos, traduz preocupações que dizem ou devem dizer respeito a todos os utentes e não só aos consumidores. Pena é que se fique apenas por alguns - água, electricidade, gás e telefone.
E os transportes públicos que estão expressamente previstos no artigo 9.º, n.º 8, da proposta de lei que acabámos de analisar? A proposta de lei que estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores .fala também - e muito bem -, no seu artigo 9.º, n.º 8, dos transportes públicos, mas quando materializamos e concretizamos essa lei já não conseguimos meter lá os transportes públicos, embora as iniciativas legislativas tivessem sido apresentadas ao mesmo tempo. Funcionam bem? Não merecem tratamento? Os utentes não precisam de protecção? A rede de cidadãos que os transportes públicos implicam também não mereceriam uma chamada de atenção?
E os serviços postais também não? Também será de deixar de fora?
E os serviços financeiros que preocupam tanto os consumidores? Não são serviços públicos, isto é, de utilidade pública, mesmo quando prestados por entidades privadas? E o problema do sobreendividamento? E os créditos hipotecários? Tudo isso fica de fora? A informação adequada e independente também nessa matéria nos faz falta. Mas vale mais o que cá está do que nada!
Quanto ao servido fixo de telefone, quer abranger o telemóvel ou não? E uma dúvida que tenho como jurista. É que aqui fala-se apenas em serviço fixo de telefone. Os telemóveis são fixos?

O Sr. José Magalhães (PS): - Se são fixos não são móveis..., qualquer jurista sabe!

O Orador: - Qualquer jurista... Então sou ignorante, não sou jurista!
O princípio geral da boa fé toda a gente o conhece. O artigo 3.º diz - e bem - "o prestador do serviço deve proceder de boa fé ....", mas o utente, apesar de aqui se não dizer, também assim deve proceder de acordo com o Código Civil. .
Estamos de acordo como o dever de informação geral. Está muito bem a ideia da não suspensão sem pré-aviso, porque assim se põe termo à possibilidade de se invocar a excepção do não cumprimento do contrato.
Ficava-se sem saber em que prazo os serviços de valor acrescentado vão ser apresentados. A Sr.ª Ministra disse aqui que seria no prazo de 90 dias, mas não está cá no diploma. Foi uma observação feita oralmente que registei, espero os 90 dias para que isso aconteça.
O direito à quitação parcial também já se tirava do Código Civil, mas é bom que esteja aqui. Não faz mal, .º que abunda aqui não prejudica.
Os padrões de qualidade são tão vagos que dá para tudo e não dá para nada, mas pode ser que se inclua mais alguma coisa com precisão.
Quanto aos consumos mínimos proibidos, isso já antes acontecia e recordo-lhe o Decreto-Lei n.º 207/94, de 6 de Agosto, no domínio da água. Como vêem, também não é novidade.
No que se refere à factura detalhada, gostaria mais que aparecesse uma palavra portuguesa e não este eufemismo ou este francesismo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Quer pormenorizada?!

O Orador: - Quero pormenorizada, uma palavra portuguesa! É uma sugestão para a especialidade.
O que vem no artigo 10.º era um problema que preocupava- e que estava a dividir a doutrina e a jurisprudência. Julgo que também aqui, sobretudo no n.º 2, vamos ponderar... É bom, porque havia divisões. Há acórdãos contraditórios quanto ao direito de exigir o excesso do preço que faltou. Penso, no entanto, que em vez de prescrição temos de ir para a caducidade, aliás, na esteira do que está no artigo 890.º do Código Civil. Também ponderaremos isso na especialidade.
Quanto ao artigo 12.º, deixe-me que lhe diga uma coisa: uma lei que recomenda a arbitragem em vez de a impor... Não sei se a lei é o sítio adequado para recomendar! Ou é para se seguir a arbitragem obrigatoriamente ou, então, faça-se isso... Não me parece que seja do estilo de uma lei dizer: "os prestadores de serviços devem fomentar...". Devem, com certeza!
Mas a norma melhor é a do artigo 13.º, que diz: "ficam ressalvadas todas as disposições legais que, em concreto, se mostrem mais favoráveis ao utente". Tem o meu aplauso!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados José Magalhães e Nuno Baltazar Mendes.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, congratulamo-nos. com a

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adesão do PSD às duas propostas de lei apresentadas pelo Governo. E essa adesão, que é uma palavra briosamente lusitana, funda-se numa razão que me parece aceitável e quase auto-evidente: é que as duas propostas de lei trazem contribuições positivas nessa matéria e, portanto, não se trata de fazer publicidade enganosa.
O Sr. Deputado Calvão da Silva fez alguma publicidade enganosa da obra do "cavaquismo", que é compreensível, dada a sua posição nessa matéria, mas eu não gostaria, de qualquer forma, que a Lei n.º 29/81, fosse tomada como uma obra do "cavaquismo", porque não é nem o foi.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas nós votámo-la!

O Orador:- Nesse tempo Cavaco Silva não existia politicamente ou era uma personagem que folgava nas galerias subalternas da vida política, quase diria nos subterrâneos.
O grande autor dessa lei, cujo trabalho nos apraz sempre sublinhar, foi o Deputado Mário Raposo, cuja pena excelentemente dotada permitiu a aprovação por consenso de muitas normas. Essa homenagem sempre lha prestamos nesta ou em qualquer outra circunstância!
O problema está em que muitas das normas que aprovámos por consenso nunca passaram, infelizmente, na grande mó dos governos - e a responsabilidade do PSD nesse domínio é, de facto, enorme -, de letra de lei, e esse é o legado que hoje aqui temos.
Portanto, V. Ex.ª talvez não queira ir para o top ten nesta matéria, mas vai de "topless", ou seja, vai "nu", porque não tem grande razão de orgulho pela obra produzida.
Agora, devo dizer, Sr. Deputado, que as questões que nos traz merecem ponderação e serão devidamente ponderadas, mas não nos diga, por favor, é menos ainda com evocação de qualquer razão que não seja do foro estritamente político, e não seguramente com a evocação de qualquer razão de carácter académico, cujo influxo não notei em nenhuma das coisas que disse, apesar de ter uma obra bem interessante sobre um dos regimes, específicos das matérias gerais de defesa do consumidor, que se trata só e simplesmente de recozinhar normas virtuosas já contidas em legislação em "vigor", porque se trata de muito mais.
O Sr. Deputado teve ocasião de enunciar, na parte final da sua intervenção, algumas dessas inovações, que são muito importantes. As normas sobre proibição da suspensão de serviços sem pré-aviso e as de facturação adequada, fiel, verdadeira e devidamente pormenorizada têm sido nestes meses, nestes anos, objecto de um intenso debate e nunca os governos com que V. Ex.ª esteve identificado conseguiram vencer a batalha ou a resistência de operadores em todos esses domínios.
O seu colega Macário Correia, do alto daquela. tribuna, debatendo a iniciativa legislativa que apresentei, na legislatura passada, em nome desta bancada, teve ocasião de fazer uma defesa à outrance desse status quo, sem ser capaz de dar um passo em frente na garantia dos direitos dos consumidores. É isso que vamos fazer aqui, por consenso, tudo o indica.
Mas é um passo muito importante, porque, por exemplo, em relação aos consumidores de telefones móveis a distinção entre serviços de rede fixa e, enfim, telefonia móvel consta dá lei de 1989, que V. Ex.ª, ilustre jurista, não terá mais dificuldade em lê-la do que um simples contínuo -,esses serviços estão protegidos e os consumidores de telefonia móvel têm hoje facturações, tanto por parte do operador público como do privado, razoavelmente detalhadas e extremamente relevantes na óptica da protecção dos seus direitos e interesses legítimos. Os da rede fixa é que não! E é isso que vamos fazer.
No que se refere à questão do SVA Audiotext, creio que, na legislatura passada, conquistámos alguma coisa, curiosamente até sem lei, e o seu partido não deixou de dar a sua contribuição nesse sentido. A simples aprovação na generalidade do diploma que esta bancada propôs teve uma consequência interessante: é que a Portugal Telecom tratou de fazer uma coisa, que se diria elementar, simples, mas que nunca tinha sido feita até, aí, que foi separar os indicativos dos diversos tipos, para que quem consome serviço pornográfico - problema do consumidor - não seja obrigado a utilizar o mesmo indicativo do consumidor do Boletim Meteorológico ou de um SVA de uma outra natureza. Essa medida foi introduzida, sem lei, mas, os despachos e outros diplomas infralegais, que regulam este serviço, estão largamente por cumprir na efectivação prática. Há códigos de conduta, aprovados pelos operadores, mas talvez não cheguem.
Sr. Deputado Calvão da Silva, o Governo é honesto...

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado José Magalhães, peço-lhe que termine, pois já ultrapassou, em muito, o tempo regimental.

O Orador: - Tem toda a razão, Sr. Presidente, vou concluir de imediato.
Sr. Deputado, o Governo é honesto ao dizer-nos que agora propõe certas coisas, que são, aliás, inovadoras nesta área, designadamente de serviços essenciais. São altamente inovadoras, nunca ninguém as tinha feito, perdemos muito tempo, e o povo português não gosta disso, como mostrou no inquérito que citei.
Quanto ao serviço de SVA Audiotext, vamos ter de dialogar. Vamos .dialogar! A própria Assembleia deve dialogar com os operadores por forma a conseguir resultados positivos neste domínio. Para quê? Para obter um reforço da protecção dos consumidores, objectivo que, como tudo indica, a todos deve unir e não suscitar querelas de carácter secundário. Nelas nunca entraremos, Sr. Deputado. Conte connosco para, na Comissão, aperfeiçoarmos estes diplomas.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Calvão da Silva, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja, responder já ou no fim?

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, como vê, não é difícil entendermo-nos nas coisas boas. Quando estamos de acordo, estamos de acordo, quando é para divergir, é para divergir. E com ou sem topless... Por acaso, estou bem vestido. Não sei o que o Sr. Deputado quis dizer com isso, mas também não me preocupo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu nem me pronuncio sobre isso!

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O Orador: - Olhe, Sr. Deputado, a grande confusão instalada é por estarmos a discutir duas leis ao mesmo tempo. Reportei-me à primeira dizendo que não tinha inovações, enquanto o senhor veio com a segunda para dizer que existiam algumas, o que eu também disse, e que até aplaudo.
Portanto, a confusão foi só esta, e folgo muito em reconhecer, pelo seu silêncio, que tenha vindo confirmar que a primeira lei não traz inovações. Mas estou de acordo consigo em que a segunda traz coisas vantajosas, o que não quer dizer que várias delas se não pudessem retirar de uma boa interpretação do direito comum, mesmo no que diz respeito à factura detalhada. Isso não significa que seja bom, uma vez que poderia haver problemas, pelo que será melhor que agora se diga expressamente e que se dê o prazo de, salvo erro, 180 dias, para que as empresas saibam que têm de cumprir. É bom neste sentido, embora tanto eu como o senhor, como juristas, saibamos que pelo direito comum já lá chegaríamos.
A outra, a da suspensão sem pré-aviso, é que era mais difícil - aqui é que a excepção do não cumprimento funcionava. Essa é, pois, uma inovação em detrimento da parte profissional e em benefício do consumidor. Esta, sim, é uma inovação, e em relação à qual, pelo direito comum, não chegaríamos lá.
De resto, nessa lei ainda poderíamos ir mais longe. Há uma sugestão que lhe deixo, a si e ao Governo, e que eu próprio também ponderarei: porque não aproveitar isto como uma espécie de título de um primeiro livro, onde depois se regulassem os vários contratos de fornecimento de água, de energia eléctrica, de gás, das telecomunicações, dos serviços postais, dos transportes públicos, etc.? Isto é que me parece 'que poderíamos fazer, mas é evidente que já é um trabalho mais gigantesco, que demorará mais tempo a pensar.
De qualquer modo, em relação a este diploma, estou de acordo consigo de que há uma ou outra inovação, coisa que no primeiro não consegui encontrar, mas pode ser que...

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas reconhece o trabalho do Dr. Mário Raposo...?

O Orador: - Ó Sr. Deputado, eu elogiei a lei de 1981, dizendo até que Portugal foi pioneiro, pois conseguiu fazer uma lei primeiro que muitos outros, e não ignoro que tal não foi sequer iniciativa do Governo de então, da Aliança Democrática, de que o meu partido fazia parte, mas, sim, da ASDI, da UEDS e do PS. Também não ignoro o trabalho que, em comissão parlamentar, o Sr. Deputado do PSD Mário Raposo teve ao tentar fazer uma aglutinação de todos esses projectos, para, depois, na especialidade, se chegar a um consenso que levou à votação unânime. Não ignoro isso, pelo contrário.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, com o que eu disse apenas queria que não se dissesse que a protecção do consumidor começou hoje em Portugal, porque já vem de trás.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, gostava de colocar-lhe duas ou três questões relativamente à intervenção que acabou de fazer. No entanto, antes, queria dizer-lhe uma coisa, e faço-o porque é o que eu penso, e, nesta Câmara, devemos exprimir o que pensamos.
Não considero, de maneira alguma, adequado, nem sequer conforme com a praxe desta Casa, que V. Ex.ª, na parte inicial da sua intervenção, a propósito da intervenção da Sr .ª Ministra, se tenha arrolado ou invocado de determinados conhecimentos para de alguma forma tentar contradizer aquilo que a Sr.ª Ministra tinha dito relativamente à lei de defesa do consumidor. Não me parece de maneira alguma adequado até porque entendo que V. Ex.ª não tem manifestamente razão.
Se V. Ex.ª me disser que não é inovador a consagração, nos termos e para os efeitos que é feito, na lei do consumidor, do direito de retratação do consumidor; se V. Ex.ª me confirmar que a isenção de preparos e custas por parte dos consumidores e respectivas associações no exercício do direito não é inovador neste âmbito; se V. Ex.ª me disser que a atribuição do direito de antena às associações de consumidores também não é inovador; se V. Ex.ª me disser que a atribuição ao Instituto do Consumidor dos poderes que possibilitem a sua representação, em juízo, dos direitos e interesses colectivos e difusos dos consumidores; se V. Ex.ª me disser que o Conselho Nacional de Consumo também não é um órgão inovador (também não é, foi o que V. Ex.ª disse na sua intervenção); se V. Ex.ª me disser que o estabelecimento do prazo de garantia de um ano para os bens móveis não consumíveis também não é inovador; se V. Ex. me disser que a atribuição aos consumidores do direito de resolução dos contratos celebrados com violação do dever de informar, atribuição essa exclusiva - repare - aos consumidores; se V. Ex.ª me disser que a prerrogativa concedida às associações dos consumidores de participarem na regulação de preços dos bens essenciais também não é inovadora, bom, Sr. Deputado... Isto foi o que V. Ex.ª disse na sua intervenção! V. Ex.ª disse que nada disto era inovador.
Pergunto-lhe, também em relação àquilo que V. Ex.ª disse: o que queria dizer quando falou em fichas falsas?

O Sr. José Magalhães (PS): - Boa pergunta!

O Orador: - É muito importante para nós sabermos o que V. Ex.ª entende por fichas falsas. É muito bonito, é agradável e pode, inclusivamente, dar uma boa manchette de jornal falar aqui em ,fichas falsas... Mas o que é isso? Queremos saber o que é isso. Entendo que tenho esse direito, V. Ex.ª deu-mo.
Por outro lado - apenas para explicitar mais uma outra coisa -, o PSD não aprovou a lei, que foi aqui votada, da protecção dos direitos dos consumidores e do serviço telefónico, como o Sr. Deputado Miguel Macedo há pouco dizia; o PSD absteve-se, porque, nesta como noutras matérias, tem medo. Teve e continua a ter medo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não!

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1801 12 DE ABRIL DE 1996

O Orador: - Registamos, obviamente, a novel posição do PSD de adesão aos princípios do Partido Socialista, mas não posso deixar de lhe lembrar outra coisa: V. Ex.ª sabe que na legislatura passada o PS apresentou aqui um projecto de lei com vista à alteração da Lei de Defesa do Consumidor, esse projecto de lei foi aprovado na generalidade, e na especialidade VV. Ex.as inviabilizaram-no.
V. Ex.ª diz que não sabe. À boa maneira do PSD, agora não se lembram de nada!
Por outro lado, começo a ver que o problema do PSD é um problema de leis-quadro- estou a lembrar-me da lei da regionalização: aprovam as leis-quadro, acham que tudo é leis-quadro e que tudo deve ficar à sombra das leis-quadro!
Finalmente temos um Governo que governa, uma maioria que entende que estas coisas devem ser implementadas e que os direitos devem ser exercitados! E só isto que lhe quero dizer, Sr. Deputado!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, vou responder-lhe apenas com uma ou outra..., porque, se não, é muito " chato".

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não é!

O Orador: - Não, é!
Olhe, Sr. Deputado, eu disse que esta lei penso que nos estamos a reportar à lei do consumidor, não é verdade...?

O Sr. José Magalhães (PS): - Lei de Defesa do Consumidor.

O Orador: - Eu disse que esta lei era um aprofundamento e não uma inovação da lei anterior. E cito-lhe vários dos exemplos que me deu, pensando que me criaria dificuldades.
No artigo 13.º da lei que agora passará, depois de sair em Diário da República, a ser revogada diz-se que as associações têm direito a: alínea f) - "às isenções fiscais (...)"; alínea i) - "à isenção de custas e de imposto de selo (...)"; alínea j) - "de solicitarem aos laboratórios oficiais (...) análises (...)" - que é repetido agora nesta lei...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Falou nos preparos.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Custas não é a mesma coisa que preparos!

O Orador: - Sr. Deputado, eu tomei nota do que o senhor disse.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Desculpe, eu falei de preparos? Não falei! V. Ex.ª é jurista, não pode dizer isso!

O Orador: - Ó Sr. Deputado...

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr: Deputado Nuno Baltazar Mendes, não pode estabelecer diálogo, tem de deixar o Sr. Deputado Calvão da Silva responder ao seu pedido de esclarecimento.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Orador: - Já agora, Sr.ª Ministra, este novo diploma diz que as associações podem, ta! como no anterior, solicitar análises aos laboratórios oficiais. No projecto, ou melhor, no anteprojecto dizia-se "solicitar gratuitamente", agora desapareceu o advérbio "gratuitamente". É capaz de nos esclarecer se o alcance é no sentido de ser mesmo para pagar? Isto se a Sr.ª Ministra quiser responder, porque não é obrigada a fazê-lo.
O direito de antena também está previsto na legislação de 1981, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, etc., etc.
Protestos do Deputado do PS Nuno Baltazar Mendes.

Quer que lhe dê outro grande exemplo? O direito á retratação! Se o senhor conhecer - e conhece de certeza, porque não é só nesses domínios que acontece - as vendas por correspondência...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Ó Sr. Deputado, estamos a falar de um problema muito mais amplo!

O Orador: - Então, vem ao encontro do que eu disse, Sr. Deputado. Eu referi que esta lei limita-se, em muitas partes, a ir buscar normas avulsas. O direito de retratação, Sr. Deputado, consta da legislação portuguesa avulsa entre vários domínios, um dos quais a venda por correspondência. Concorda ou não?

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Com certeza.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Entretanto, eu disse que estava preocupado por em toda a Europa só 4 milhões fazerem parte do movimento associativo dos consumidores - como reconhecerá, 4 milhões é muito pouco -, para além, eventualmente, de fichas falsas. Eu não disse que havia fichas falsas mas, sim, que poderia haver algumas, eventualmente, no meio destes 4 milhões. Foi isto que eu disse, não quis dizer que havia concretamente no A ou no B. Eu disse que podia haver, eventualmente, fichas que podem ser falsas, desactualizadas, o que quiser. Portanto, não pense que eu estava a fazer qualquer insinuação relativamente a um caso concreto, na eventualidade, porque, como vê, a seriedade da resposta devia também estar na seriedade da sua pergunta.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente (José Sócrates): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Calvão da Silva, gostaria de recordar à Câmara que em todas as intervenções do Governo este exprimiu humildemente a sua posição: a de que deseja para esta lei o mesmo destino da lei de 1981, e que, portanto, está aberto a todas as sugestões e críticas por forma a que a discussão na especialidade resulte profícua, a fim de termos

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1802 I SÉRIE - NUMERO 56

uma lei consensual, tal como a de 1981 foi, e que esta Assembleia saia honrada com mais uma lei estruturante de protecção do consumidor aprovada com a contribuição de todas as bancadas. Não vejo aqui qualquer tipo de arrogância.
A Sr.ª Ministra do Ambiente disse muito claramente na sua intervenção que nada começava hoje, ao contrário do que aqui foi invocado. Aproveitou-se tudo que vinha do passado - os projectos de lei do PS, as intenções nas gavetas do anterior Governo, todas as discussões tidas à volta desta matéria que já estavam sedimentadas e prontas à decisão política. Mas perdoar-me-á que lhe diga, Sr. Deputado: faltava a decisão política, aspecto que o senhor não pode menorizar. "Certamente porque os microcosmos do consumo estavam de acordo"'dir-me-á. Então, tem de explicar-me por que é que o anterior Governo andou seis anos para fazer a nova lei.

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - Estando toda a gente tão de acordo, por que é que não utilizou as autorizações legislativas da Assembleia? Por um motivo, Sr. Deputado: isto dói. Trata-se de uma opção política, não é neutro...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário, se fosse neutro, o anterior Governo teria, naturalmente, feito o trabalho. Não o fez certamente por boas e fundadas razões políticas: não gostava disto ou, melhor, os diversos equilíbrios não estavam para aí virados...
Permita-me que lhe diga que se percebeu perfeitamente que, nos últimos anos, o senhor andou por outros lados que não pela política, por lados mais científicos certamente. Não acompanhou a política, porque, se a tivesse acompanhado, teria percebido que o anterior Governo, tendo tido todas as oportunidades na Casa, tendo sido provocado pelo PS várias vezes para discutir este assunto, virou-lhe as costas. Nós apenas reivindicamos esta coisa simples: em quatro meses fizemos o trabalho que o anterior Governo não fez em quatro anos. Dir-me-á: isso é simples. Mas, oiça, é a pura verdade! E 'porque não reivindicar isso de cara lavada? Fizemos o trabalho rapidamente, é um trabalho que nos honra e que não queremos que seja apenas mérito nosso, queremos naturalmente partilhá-lo com toda a Assembleia.
Gostaria ainda de dizer-lhe uma outra coisa - não tenho tempo para mais - sobre os serviços públicos essenciais. Isto não se trata de teoria geral, percebeu mal. Não se trata de teoria geral nem de teoria enquadradora do regime jurídico dos serviços públicos essenciais. Não! Esta lei pretende responder a situações concretas e resolvê-las, pretende intervir na realidade e alterá-la. Portanto, é tudo isso que acabou de dizer. Pretende que haja a facturação detalhada e também responder àqueles problemas mais candentes que há muito tempo andam na ordem do dia de todos os que se ocupam destas matérias e, mais, que preocupam o consumidor.
Naturalmente que falta fazer muito mais nos serviços públicos essenciais. Por que é que não aparecem os transportes? Claro que qualquer dia teremos de intervir nesse domínio mas a razão é esta: frequentemente, em Portugal, com a vertigem de se optar pelas leis enquadradoras gerais que abarcam tudo, perde-se aquilo que é fundamental, ou seja, agir sobre a realidade resolvendo as questões concretas, aquelas que dizem respeito à vida de todos os dias, e estou a pensar - no que certamente estará de acordo comigo - na facturação detalhada, em acabar com os consumos mínimos e na criação de regras para a interrupção do serviço:
Sr. Deputado, é preciso dar crédito a estas situações para depois discutirmos o resto. Estamos disponíveis e contaremos com a sua empenhada participação para fazermos mais leis porque, em matéria de política e defesa do consumidor, ninguém ficará sem emprego. As questões a tratar serão cada vez mais por tratar-se de uma exigência e de um imperativo do nosso desenvolvimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, que grande elogio me deu. Se o Dr. Manuel Monteiro estivesse, presente, eu passava a ser um herói ao afirmar que não andei na política nos últimos anos mas numa travessia científica do deserto. E ainda bem porque, desta forma, estou à-vontade, como vê, para dar o meu contributo para o aperfeiçoamento...

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Ainda bem que o reconhece.

O Orador: - É que não sou um fariseu da política, apesar de tudo.
Sr. Secretário de Estado, há algo que o senhor e todo o Governo precisam aprender: no dia do acto eleitoral, o júri pronunciou-se. Decidiu, está decidido. Forma-se caso julgado sem apelo nem agravo. A partir desse momento, já está em julgamento o novo Governo e não o anterior e é esse que, nesta Câmara, em 'nome do povo, como seus representantes, ajuizaremos. Esta lei merece o nosso aplauso, pode ser muito melhorada na especialidade e é para isso que vamos contribuir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, em bom rigor, o meu pedido de esclarecimentos perdeu - o que reconheço - alguma da sua pertinência.
Na verdade, Sr. Deputado Calvão da Silva, iria confrontá-lo, mas já desisti de o fazer, com o que me pareceu ter lido nos jornais há cerca de duas, três semanas, sobre a existência de uma associação de defesa de consumidores no concelho de Gaia (pelo menos, foi o que li na altura, talvez apressadamente) que teria fabricado qualquer coisa como mais de 1000 fichas falsas. Afinal, disse-me um colega que eu estava enganado e que isso teria acontecido na concelhia do PSD de Gaia pelo que, de todo em todo, não tem pertinência.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

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12 DE ABRIL DE 1996 1803

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, com rumores, nunca me entendi e, mesmo nesta Câmara, não me entendo com rumores.

O Sr. José Magalhães (PS): - Há quem lhe chame rumores.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, pelas 10 horas, tendo lugar, no período de antes da ordem do dia, o debate de urgência, solicitado pelo CDS-PP, sobre a situação do sector têxtil face aos acordos da União Europeia com países terceiros e, na ordem do dia, a apreciação do Orçamento da Assembleia da República para 1996.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.

Partido Social Democrata (PSD):

Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Carlos Alberto Maia Neto.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
António José Gavino Paixão.
Carlos Manuel Luís.
Daniel Bessa Fernandes Coelho.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Rui Gaspar de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro dos Santos Amaro.
Carlos Alberto Pinto.
Joaquim Fernando Nogueira.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
Luís Carlos David Nobre.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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1804 I SÉRIE - NÚMERO 56

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