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2858 I SÉRIE-NÚMERO 84

Convém notar, no entanto, que a seropositividade não é, em geral, considerada, na sua primeira fase, motivo de libertação antecipada ou de liberdade condicional.
Julga-se, porém, justificada a libertação antecipada em caso de doença grave (tuberculose, hepatites B ou C, algumas formas de cancro ou SIDA) e irreversível em fase terminal, por razões humanitárias, desde que não exista perigo para a saúde pública ou para a segurança.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em Portugal, a questão não tem motivado o debate político nem a atenção da doutrina ou da jurisprudência, mas não é de todo estranha ao nosso ordenamento jurídico.
O Código de Processo Penal de 1929, após 1972, veio permitir a suspensão da execução da prisão preventiva em caso de doença constituindo perigo grave para a vida do arguido e, na mesma linha, o Código actual permite a substituição da prisão preventiva pela obrigação de permanência na habitação ou pelo internamento hospitalar, por razões de doença grave do arguido (artigo 211.º).
No que se refere à execução de medidas de segurança de inimputáveis, podemos igualmente detectar a possibilidade de libertação antecipada ao nível da valoração do estado de perigosidade (artigo 92.º do Código Penal).
Porém, não está consagrada expressamente a possibilidade de alteração da pena de prisão quanto a doentes com doença grave e irreversível em fase terminal, por razões humanitárias.
O estudo da situação de doença e a resposta do sistema penal tem-se reconduzido aos quadros e regras gerais do processo de liberdade condicional e de substituição das medidas de coacção e, com alguma boa vontade, aos do processo de indulto.
A especificidade e gravidade do problema, ampliada pelo fenómeno da SIDA no meio prisional, justificam a presente intervenção legislativa, em conformidade com as citadas Recomendações do Conselho da Europa e da Organização Mundial de Saúde, de modo a reforçar e a tornar mais céleres e eficientes os mecanismos de resposta quanto aos doentes em estado terminal - relativamente aos quais, note-se, perde sentido a realização das finalidades de execução da pena de prisão -, de modo a permitir a libertação antecipada, possibilitando, em última análise, o direito a uma morte digna no seio da família e dos amigos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A solução enquadra-se, como se impõe, numa perspectiva de abordagem global dos problemas.
Por um lado, parece claro que a restrição da possibilidade da libertação antecipada aos doentes com SIDA não deixaria de assumir tratamento de favor relativamente a reclusos afectados por outros tipos de doença de idêntica gravidade, de duvidosa constitucionalidade por violação do princípio da igualdade.
Por outro, importa aprofundar a intervenção no fenómeno no seu conjunto, de modo a articular-se a libertação antecipada, enquanto medida excepcional, com soluções administrativas em curso, que visam efectivar o direito à saúde nas prisões, reforçam a prevenção e o controlo da doença e, simultaneamente, garantem a realização das finalidades da execução da pena de prisão, relativamente aos doentes afectados com SIDA ou outras doenças graves em fase terminal.
Esta perspectiva está bem presente no Programa de Acção para o Sistema Prisional, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 62/96, publicada no Diário da República, de 29 de Abril de 1996.
A presente iniciativa legislativa constitui, aliás, uma das medidas legislativas integradas no processo de efectivação do tal Programa.
Opta-se pela solução que melhor parece harmonizar as antinomias do sistema.
Estabelece-se uma regra geral de verificação judicial, caso a caso, em conformidade com as regras de prova no processo penal, que considera as exigências de prevenção e de ordem e paz social, por um lado, e, por outro, a situação pessoal do recluso e a sua subsunção ao conceito de doença grave e irreversível em fase terminal, a determinar com base em critérios de natureza técnico-científica, presentes por via de adequados meios de prova pericial.
Verificados tais pressupostos, a pena de prisão será modificada em termos que permitam o internamento do recluso em estabelecimento adequado ou o obriguem a permanecer em habitação.
Considera-se, porém, que, em homenagem ao princípio da liberdade individual, a modificação só poderá ocorrer a pedido do recluso ou familiar ou ainda do Ministério Público, no interesse daquele, após a obtenção do consentimento do recluso.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Todos sabemos que a situação dos detidos portadores de HIV é uma situação preocupante.
Não é, infelizmente, uma situação especificamente portuguesa.
As iniciativas de âmbito internacional, levadas a efeito nos últimos anos, têm revelado um mundo idêntico de problemas e uma grande sensibilidade para os dramas individuais dos detidos portadores de doenças terminais.
Trata-se de enfrentar situações inelutáveis de morte próxima, avaliadas numa perspectiva clínica, em que se mostra estar excluída a possibilidade física de o detido praticar outros crimes, ou seja, casos a que não se afiguram oponíveis razões de prevenção ou de segurança judicialmente verificadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sendo o valor vida em si mesmo, independentemente da expressão estatística, justificação suficiente para se adoptar a presente iniciativa, a sua fundamentação exige a invocação de alguns dados.
Falecem, hoje, nos nossos estabelecimentos prisionais doentes com SIDA declarada há alguns anos.
De 28 casos, em 1994 (num total de 38, ou seja, 73% dos casos de morte), passou-se para 64, em 1995 (num total de 71, ou seja 90%). No corrente ano, estão já registados 46 casos (num total de 47 casos), estimando-se que o valor final de 1996 ultrapasse a centena.
Os valores de detidos portadores de HIV subiram, segundo as actuais estimativas, para cerca de 20% da população prisional, na sua esmagadora maioria constituída por cidadãos toxicodependentes (aproximadamente 80%).
Estes valores fazem razoavelmente prever uma subida substancial, até agora em proporção geométrica, dos casos de SIDA com evolução para fases terminais.
A situação, atenta a sua gravidade e relativa novidade, impõe a todos nós uma serena reflexão.
Estamos certos de que, se viermos a permitir que alguns doentes possam ser acompanhados pelos afectos da

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