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3216 I SÉRIE-NÚMERO 94

Vamos passar à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 52/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro (Acesso ao Direito e aos tribunais).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Matos Fernandes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, apresento a todos os meus respeitosos cumprimentos.
Desta vez e quanto a esta proposta de lei, garanto que não encontrámos nada na «despensa» do Ministério da Justiça. É estranho que não tenhamos encontrado porque algumas das alterações ao Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, há muito que deveriam ter tido lugar, sobretudo quando, tão enfaticamente e muito bem, se fez saber que o cidadão é o vértice de todo o sistema jurídico.
Com efeito, e muito sinteticamente, esta proposta de lei de alteração à vulgarmente conhecida por Lei do Apoio Judiciário vem responder muitíssimo tarde aos sucessivos e unânimes acórdãos do Tribunal Constitucional, através dos quais este se pronunciou sobre a inconstitucionalidade material do n.º 2 do artigo 7.º daquele decreto-lei, que já tem nove anos, designadamente quando o mesmo. discrimina contra o princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição, contra o afloramento ao princípio relativo à igualdade, entre estrangeiros, apátridas e os cidadãos portugueses, que consta do artigo 15.º da Constituição.
No fundo, trata-se da velha, e boa, tradição portuguesa, daquilo a que a doutrina constitucional isto costuma apelidar tratamento nacional, segundo o qual, entre nós e salvo raríssimas excepções, estrangeiros e apátridas devem gozar dos mesmos direitos e deveres que os cidadãos nacionais. Tal não se passava deste modo em casos de particular melindre, designadamente em relação aos requerentes de asilo político nem aos que, consequentemente, requeriam o estatuto de refugiado. É que era absurda a exigência expressa na lei de um certo tempo de permanência em Portugal do estrangeiro ou do apátrida que requer a concessão de asilo político e, em sequência, o reconhecimento do estatuto de refugiado. A inconstitucionalidade desta norma já foi declarada com força obrigatória geral há bastante tempo e, agora, vem reconduzir-se o preceito à sua constitucionalidade material, indo-se mais longe, como, aliás, também é tradição nossa, do que aquilo que consta da Convenção de Genebra relativamente ao estatuto de refugiados que vigora em Portugal desde 1 de Outubro de 1960.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, no tocante ao apoio judiciário, de harmonia com a Constituição e com o direito comparado, procura limitar-se a possibilidade de as sociedades, essa mítica figura que é o estabelecimento individual de responsabilidade limitada que todos conhecem mas ninguém vê, e, por analogia, de os comerciantes em nome individual nas causas relativas ao seu comércio...
Tanto quanto conhecemos os sistemas jurídicos em que estamos integrados, não existe a figura do apoio judiciário para as sociedades com fins lucrativos. De resto, assim é, não só no domínio da legislação dos países do nosso sistema jurídico como também, lançada um rápida miada sobre o panorama europeu, no regulamento do Tribunal de Primeira Instância da Comunidade Europeia e, ainda, no regulamento de processo do Tribunal de Justiça.
Aliás, ultrapassada, infelizmente e de uma vez por todas, a utopia de uma justiça gratuita, percebe-se mal e é igualmente injusto o «facilitismo», o laxismo da concessão de apoio judiciário a entidades que se movem com intuitos lucrativos, o que acaba por gerar uma grave situação de desigualdade em relação ao comum dos cidadãos, sabido que somos todos nós, ou quase, os que suportamos os encargos elevadíssimos com a administração da justiça.
Se é injustíssimo denegar justiça com base na insuficiência económica é também injusto e chocante facilitar o acesso à justiça a quem tem recursos para acudir a ela normalmente mas que, através de métodos que todos conhecemos da nossa prática quotidiana, é tratado em igualdade quando deveria ser desigualmente tratado.
De resto, tal como a doutrina tem assinalado, o direito de acesso à justiça e aos tribunais é eminentemente um direito individual, da pessoa singular, do cidadão, e é nessa perspectiva que tem sido encarado, na vertente de que ninguém pode ser prejudicado com base na sua insuficiência económica.
Outro dos aspectos relativamente ao qual se propõem alterações à chamada Lei do Apoio Judiciário é no sentido do regresso ao bom caminho da antiga lei da assistência judiciária, uma vez que, incompreensivelmente, este decreto-lei de 1987 permite que o apoio judiciário concedido no processo principal se estenda a todas as fases do processo - recursos, execução, apensos - mas estabelece que o apoio judiciário solicitado num apenso, num procedimento cautelar preventivo - e cito 0 procedimento mais vulgar e mais concreto - não seja, por osmose, extensivo à acção principal, o que é inconcebível e constituiu um recuo em relação à anterior lei do apoio judiciário.
Mais adiante, temos a exclusão da presunção de insuficiência económica dos titulares de direito a indemnização por acidente de viação. A anterior lei da assistência judiciária não os incluía e penso que só uma lei da física que nos governa muito a todos - a lei da inércia - é que fez com que tenha transitado do n.º 7 do artigo 68.º do Código da Estrada para o artigo 20.º da Lei do Apoio Judiciário esta presunção de insuficiência económica. Ela radica historicamente na ideia de que o atropelante é rico e o peão é pobre enquanto, hoje, o que é «bem» e «fino» é andar a pé, fazer jogging, cuidar da saúde e ser-se atropelado por um insuficiente económico que anda a cuidar da vida ao volante da sua carrinha.

Risos do PS.

Não nos atrevemos a sugerir que a presunção de insuficiência económica fosse invertida e passasse para o atropelante mas, pelo menos, sugerimos que se siga a regra geral...

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... segundo a qual o titular do direito a indemnização tem de fazer um mínimo de prova que a qualquer um se exige no sentido de, se for caso disso, lhe ser concedido o apoio judiciário na modalidade, na extensão, na percentagem que for ajustada.

Vozes do PS: - Muito bem!

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