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Sexta-feira, 4 de Outubro de 1996 I Série - Número 106

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

1.A SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE OUTUBRO DE 1996

Presidente: Ex.mº Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mºs Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da apresentação de alguns requerimentos.
Foi aprovado o voto n.º 39/VII - De pesar pelo falecimento dos Drs. Afonso Botelho e Afonso de Barros (Presidente da AR), no qual se associaram, em nome dos respectivos grupos parlamentares, os Srs. Deputados Barbosa de Melo (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Jorge Ferreira (CDS-PP), tendo sido guardado um minuto de silêncio.
Em declaração política, o Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) criticou a política do Governo no seu primeiro ano de actividade e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado José Junqueiro (PS).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social (Ferro Rodrigues) deu conta à Câmara de alguns projectos no âmbito da luta contra a exclusão social. No final, prestou esclarecimentos aos Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP). Elisa Damião (PS), Luís Marques Guedes (PSD) e Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP).

O Sr. Deputado Rui Namorado (PS) abordou questões relativas à política cooperativa.
O Sr. Deputado Luís Filipe Menezes (PSD) criticou a acção dos autarcas socialistas do, norte do País e respondeu depois a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Francisco de Assis (PS).
Ordem do dia. - A Câmara aprovou os n.ºs 82 a 96 do Diário.
Procedeu-se à discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 208/VII - Criação de vagas adicionais no ensino superior, reposição de justiça no acesso ao ensino superior (PSD), 209/VII - Cria vagas adicionais para os estudantes que realizaram a 2.ª fase dos exames nacionais (CDS-PP) e 215/VII-Criação de vagas adicionais no acesso ao ensino superior (PCP). Intervieram a diverso título, os Srs. Deputados Sérgio Vieira (PSD), Afonso Candal (PS), Bernardino Soares (PCP), Jorge Ferreira (CDS-PP), António Braga (PS), José Calçada (PCP), Fernando de Sousa (PS), Carlos Coelho (PSD), António Filipe (PCP), Castro de Almeida (PSD), Luísa Mesquita (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Sérgio Sousa Pinto (PS).
Entretanto, a Câmara. aprovou a Conta Geral do Estado relativa aos anos de 1990, 1991, 1992 e 1993.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Carneiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura. Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.

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Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Gonçalves Sapinho.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta:
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Gaivão Lucas.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araujo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário para dar conta de requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, nas reuniões plenárias de 26 e 27 de Setembro foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes: ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Santos; aos Ministérios da Saúde, da Solidariedade e Segurança Social, da Justiça e das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Lucília Ferra e Gonçalo Ribeiro da Costa. No dia 1 de Outubro foram apresentados requerimentos ao Ministério do Ambiente, formulados pela Sra. Deputada Isabel Castro; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa; à Junta de Freguesia de Sacavém, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa dois votos de pesar. Um, de minha iniciativa, que abrange o pesar pela morte do Dr. Afonso Botelho e do Dr. Afonso de Barros, e outro, da iniciativa de Deputados do Partido Socialista, relativo à morte do Dr. Afonso de Barros.
Não tenho a menor dúvida em refazer o meu voto de pesar referindo apenas o Dr. Afonso Botelho, a menos que os Srs. Deputados do Partido Socialista se revejam no voto comum e entendam que o seu voto pode estar abrangido pelo meu.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, como seria de esperar, temos todo o gosto em nos associarmos ao voto de pesar que o Sr. Presidente apresentou. Consequentemente, retiramos o nosso e assim estaremos todos na mesma comunhão espiritual.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Fico-lhe muito grato.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

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O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PSD, quero expressar de uma forma muito sintética o sentimento da minha bancada.
Estamos a evocar aqui, no último acto da sua vida entre nós, duas grandes figuras. Gostaria de destacar, de modo especial, a figura de Afonso de Barros, antes de mais - e estes sentimentos também contam, e hão-de contar nesta Casa - porque é, além do lutador pela democracia que foi ao longo da sua vida, filho de um ilustre democrata que ocupou, Sr. Presidente, essa cadeira durante a Assembleia Constituinte, um período de grande nobreza, de grande luta e de compensação de muitas lutas.
Posso testemunhar, em muitas circunstâncias, que o Professor Henrique de Barros tinha uma especial ternura por este seu filho, Afonso, que fez um percurso da envergadura e em correspondência exacta com a do pai: foi um universitário ilustre, um cientista de renome e que, por último, também se lançou na construção de um lado do sistema educativo em Portugal, que andou durante tantos anos desaparecido - o lado do ensino superior privado.
É evocando estes particulares de uma vida feita de luta, como foi a de Afonso de Barros, é evocando o seu contributo para a democracia e a sua fidelidade à ciência, que, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, dirijo à família os nossos mais sentidos pêsames.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Inclinamos o nosso respeito, a nossa memória, a nossa admiração, perante a insigne figura da cultura que foi o Dr. Afonso Botelho e comungamos da expressão de pesar que esta Câmara certamente vai exprimir relativamente à personalidade que agora nos deixa.
Mas permitam-me, Srs. Deputados, que evoque, com particular emoção, minha e da bancada do Partido Socialista, a memória do Dr. Afonso de Barros. Filho de quem é, como agora nos lembrava o Professor Barbosa de Melo, representante de uma escola de democratas, lutador de sempre pela liberdade, pelos grandes valores do civismo, da democracia e do respeito pelos direitos do homem, o Dr. Afonso de Barros, que teve uma vida de resistente, de activo dirigente associativo e académico, de militante político sempre civicamente empenhado, de insigne universitário, de investigador, de lutador pela grande causa da cultura, do ensino e do Portugal moderno, é alguém que simboliza um exemplo certamente a tomar para as novas gerações.
Ao evocarmos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a memória do Dr. Afonso de Barros aqui fazemos o voto de que ele sirva também de exemplo às gerações para as quais temos o dever de trabalhar. Além do mais, a morte do Dr. Afonso de Barros representa uma dor que atingiu também a bancada do Partido Socialista e que, estou certo, será compreendida e acompanhada pelos demais Srs. Deputados das restantes bancadas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, neste momento de pesar, expresso nos

votos que estamos a debater, começo por registar o falecimento do Dr. Afonso Botelho que, mal-grado as nossas divergências ideológicas profundas, homenageamos como figura da cultura nacional.
Mas permitam-me também que me debruce particularmente sobre a figura do Dr. Afonso de Barros. Conheci pessoalmente o Dr. Afonso de Barros, conheci Afonso de Barros no seu percurso político, conheci Afonso de Barros no seu percurso como estudioso e investigador das ciências sociais. Se é verdade que os nossos percursos políticos não seguiram a mesma estrada, a verdade é que convergiram muitas vezes, antes e depois de Abril, na luta e no combate intransigente em defesa da democracia e da liberdade.
Por outro lado, enquanto investigador, Afonso de Barros caracterizou-se por uma grande exigência, um grande rigor e um grande equilíbrio. Acompanhei de perto o seu trabalho sobre a reforma agrária com que fez a sua tese de doutoramento e que deu lugar a uma obra que é hoje um instrumento indispensável de consulta para quem se queira debruçar sobre essa apaixonante transformação do tecido fundiário no sul do país. E testemunhei pessoalmente a sua isenção e equilíbrio na busca dos factos e das interpretações.
Neste momento doloroso, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, quero testemunhar à Câmara, ao Partido Socialista, e em particular à sua companheira e nossa colega Deputada Maria Carrilho, as nossas condolências e a nossa profunda tristeza pelo desaparecimento do Dr. Afonso de Barros. O mesmo queremos expressar à família do Dr. Afonso Botelho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Popular associa-se a este voto de pesar que estamos a discutir e endereçamos, especialmente ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, as nossas condolências relativamente ao falecimento do Dr. Afonso de Barros com o pedido de que as transmitam à nossa colega Deputada Maria Carrilho.
Estamos aqui a falar de duas pessoas que, cada uma à sua maneira, foram, acima de tudo, um testemunho de que é possível, com elevação, dignidade e qualidade, trazer valor acrescentado à vida pública portuguesa, à vida cultural portuguesa e à vida política portuguesa, de tal forma que é possível, quando chega o momento do seu desaparecimento, repararmos que ambas farão falta ao país, que todos estamos tristes com o seu desaparecimento e que a vida pública e cultural e portuguesa estão mais pobres.
Penso que é isto o mais importante a sublinhar destes dois exemplos que estamos a testemunhar e, por isso, associamo-nos na consternação que todos os grupos parlamentares acabam de exprimir relativamente ao desaparecimento de ambas as figuras da vida portuguesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois das intervenções, o voto será uma mera formalidade, mas que tem de se cumprir.
Vamos, pois, votar o voto n.º 39/VII - De pesar pelo falecimento dos Drs. Afonso Botelho e Afonso de Barros.

Submetido à votarão, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

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É o seguinte:

Voto n.º 39/VII

De pesar pelo falecimento dos Drs. Afonso Botelho
e Afonso de Barros

Portugal acaba de perder duas eminentes figuras da sua vida cultural, científica e cívica.
O Dr. Afonso Botelho, ex-director do Teatro Nacional, Presidente do Círculo de Eça de Queirós e um dos fundadores do Centro Nacional de Cultura, companheiro de jornada de António Quadros, a quem dedicou um dos seus livros, figura destacada do grupo da Filosofia Portuguesa; o Dr. Afonso de Barros, Reitor da Universidade Atlântica, ex-Presidente do Conselho Científico do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, investigador, democrata de sempre, destacou-se nas lutas estudantis dos anos 60 e esteve sempre presente nos combates pela reconquista da liberdade.
A Assembleia da República apresenta condolências às suas famílias e rende homenagem a estes dois portugueses ilustres que honraram, cada um à sua maneira, a nossa cultura e a nossa Pátria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os votos serão transmitidos às famílias enlutadas.
Entretanto, tal como é habitual, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos passar - à fase das declarações políticas.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Está decorrido um ano sobre as eleições que derrotaram o PSD e cujos resultados criaram nos portugueses uma expectativa de mudança nas opções e orientações políticas com a formação de um Governo do Partido Socialista. É um momento oportuno para fazermos uma reflexão serena sobre os primeiros 12 meses de governação do PS.
Se eu começasse por afirmar que estes 12 meses provocaram já uma indisfarçável frustração e desencanto nos portugueses e, em particular, nos trabalhadores, provavelmente os Srs. Deputados do Partido Socialista tenderiam a reagir retorquindo que tal visão não seria objectiva. Procuremos, então, outro ponto de partida.
Coloquemos a seguinte pergunta: nestes 12 meses de Governo do Partido Socialista que mudou, de facto, para os portugueses? Dêmos a palavra, para responder, ao Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Primeiro-Ministro (ou porta-voz oficial do Engenheiro António Guterres, pois os rótulos são-nos indiferentes). Respondeu-nos ele, em artigo ontem mesmo publicado num jornal diário: «para muitos portugueses a vida continua tão difícil e madrasta como há um ano atrás».
Pois é. Esta é a questão central, o nó górdio de qualquer análise, que se pretenda serena e objectiva, do primeiro ano de governação do Partido Socialista : para a grande maioria dos portugueses nada mudou, tudo continua como dantes! Esta triste realidade é um facto indesmentível, comprovado e, agora, publicamente reconhecido pelo próprio Governo. Por isso a indisfarçável frustração e desencanto dos portugueses.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É, aliás, significativo, Srs. Deputados do Partido Socialista, que nos balanços avulso que o Governo vem fazendo sobre o seu primeiro ano de actividade, coloque sempre à cabeça dos seus créditos, como elemento identificador do novo estilo de governabilidade, a sua política do diálogo.
O Governo dialoga, de facto. E nesta óptica se diferencia dos Governos do PSD. Mais que não seja - e não se veja aqui qualquer processo de intenções - porque a relatividade da sua maioria lho impõe.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Mas o diálogo não pode ser um pretexto para adiar e justificar a «não acção», como muitas vezes se tem verificado. E, fundamentalmente, o diálogo não é, não pode ser, um objectivo em si mesmo. O diálogo só pode ser um instrumento para a acção ou, na linguagem mais sofisticada do Governo, «para a contratualização das políticas e das suas principais soluções e medidas».
E é inequívoco que o Governo dialoga mais com a direita que com a esquerda, mais com os sectores patronais que com os trabalhadores.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Em consequência, a «contratualização das políticas e soluções» tem sido feita, no essencial, com a direita e com o patronato.
Exemplos demonstrativos não faltam. Na concertação social a contratualização com a CIP conduziu à lei da flexibilidade e polivalência, contra os interesses e direitos dos trabalhadores, mas de acordo com o desejo há anos acalentado pelo patronato. O contrato relativo ao Orçamento do Estado para 1996 foi subscrito com o CDS-PP, porque esse Orçamento agradava à direita e à CIP.
Do mesmo modo que a «contratualização» da revisão
constitucional está a ser feita com o PSD, não tanto pela necessidade dos dois terços, mas porque o objectivo essencial é a alteração do sistema eleitoral. Para permitir obter maiores maiorias com menores percentagens de votos. Distorcendo e deturpando a proporcionalidade na transformação dos votos em mandatos.
Há, ainda, a «contratualização» da regionalização, e essa, enfim, poderá ser feita à esquerda, dirão alguns mais optimistas.
Mas faltará mesmo essa «contratualização»? Ou esse contrato já está, de facto, concluído com o PSD e o PP?
Os autarcas socialistas, pelo menos os da área do Porto, parecem já não ter grandes dúvidas sobre esse acordo é por isso protestam e ameaçam. E o Dr. Cavaco Silva já o afirma, não conseguindo esconder um grande e incontido gozo, pessoal e político.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Tal como parece confirmá-lo o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Sr. Engenheiro Guterres, quando declara que a regionalização é um objectivo de legislatura, tendo como horizonte o ano de 1999.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E é se for!

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O Orador: - Apesar de o Sr. Deputado Jorge Lacão e o Sr. Primeiro-Ministro terem prometido e garantido que a regionalização era um ponto de honra do PS e que a regionalização avançaria de modo a que as respectivas eleições pudessem ocorrer em 1997, conjuntamente com as eleições para as restantes autarquias locais.
Que «contratualizações» fizeram o Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e o Primeiro-Ministro para que, afinal, os portugueses se confrontem com mais uma promessa socialista não cumprida?

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Poderão dizer alguns que cá estamos nós, o PCP, a suscitar apenas alguns dos muitos «espinhos» do Governo socialista e a omitir as «rosas» dessa governação nos últimos 12 meses. Porque rosas, Srs. Deputados, também as haverá ... - diz o Governo. E lá vai abrindo o regaço para as mostrar uma a uma.
Aí está, imediatamente a seguir ao diálogo, a autoproclamada «estabilidade do sector da educação». Mas, com tudo o que tem acontecido neste sector, designadamente no âmbito dos exames do 12º ano e de acesso ao ensino superior, é necessário ter muito despudor político para se falar em estabilidade. A menos que, com estabilidade, se queira significar continuidade. Como a que ontem mesmo pudemos ver simbolizada num jornal televisivo, com o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa a inaugurar um pavilhão desportivo para cujo lançamento da primeira pedra, há um ano ou dois, a então Ministra Manuela Ferreira Leite igualmente se fez acompanhar da comunicação social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E muito bem!

O Orador: - Ou esta outra acção, decidida e destemida da governação socialista, a cuja transcrição não consigo resistir: «Assim como foi porque agimos preventivamente que a área florestal ardeu menos 70% do que no ano passado e conseguimos, apesar do Inverno rigorosíssimo, que as cheias tivessem consequências menores...».
Convenhamos, Srs. Deputados do PS, que «rosas» destas nem com os milagres da Rainha Santa Isabel. Reconheçam, com serena humildade, mas em homenagem à verdade, que quando Governo se sente na necessidade de contabilizar a seu crédito dislates desta dimensão é porque a coluna do crédito da sua acção governativa é magra, mas muito magra mesmo.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Como a crédito do Governo deverá ser creditado o «lançamento de acções decididas para combater a fraude fiscal». Espantoso! Desta feita, o Governo até se esqueceu do diálogo, porque, embora tenha dado ao Governo algumas autorizações com esse objectivo, a Assembleia da República desconhece, por completo e até hoje, que «acções decididas» foram essas.
E não consta que delas os portugueses se tenham apercebido. A eliminação dos muitos e excessivos benefícios fiscais ou muitos outras necessárias e urgentes reformas do sistema fiscal? Não, certamente. E muito menos a eliminação do sigilo bancário para efeitos fiscais, porque, dessa acção, indispensável para o combate à

fraude, os Srs. Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças fogem como o «diabo da cruz». Não se sabe porquê. Mas não será, quero crer, porque isso poria em causa muitos, grandes e ilegítimos negócios que por aí medram, no âmbito da especulação e de negócios que lesam gravemente a sociedade e por ela são unanimemente condenados.
E, naturalmente, Srs. Deputados, não pode ser esquecida a acção que dá pelo nome de Plano Rodoviário Nacional 2000. Não porque ainda esteja apenas no papel e para discussão pública, embora já esteja lançado a crédito da acção governativa destes doze meses ... tal a carência de acções positivas que o Governo tem para mostrar.
Não pode ser esquecida esta acção, a do PRN 2000, porque o Governo a exibe por abrir «novas perspectivas à iniciativa privada»! E esta frase, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pode bem sintetizar o grande busílis deste primeiro ano da governação do PS. A preocupação fundamental das políticas e das principais soluções e medidas tomadas pelo Governo tem sido a dos interesses dos grandes empresários.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, o Presidente da CIP afirmava, há meses, que, com a lei das 50 horas, tinha conseguido do Governo do PS aquilo que nunca conseguiu com os Governos do PSD e por isso, igualmente, tanto se empenhou na viabilização do Orçamento de 1996. Pelas mesmas razões que o Presidente da Associação Industrial Portuguesa afirmava, há alguns dias atrás, que é mais fácil aos empresários fazerem lucros com o Governo do Partido Socialista.
Do mesmo modo como é significativo que o Primeiro-Ministro, ou melhor, o Sr. Engenheiro António Guterres, enquanto Secretário-Geral do PS, se tenha deslocado a Nova Iorque, a um conclave da Internacional Socialista, acompanhado da fina flor dos capitalistas nacionais.
Por isso igualmente que o «ponto cardeal» da estratégia política do Governo seja a participação na moeda única em 1999, a todo o custo e com total desprezo pelas profundas e negativas consequências económicas e sociais que dessa estratégia, cega e surda, resultam para o País e para os portugueses.
E, Srs. Deputados, fundamentalmente por isso, o Governo nestes doze meses se mostrou incapaz e sem real vontade política para atacar os problemas centrais e prementes que se colocam à sociedade portuguesa. Nomeadamente: o desemprego, o desmoronamento da estrutura produtiva, a desertificação do interior do País, a insegurança, a pobreza e a marginalidade que se acumulam nos grandes centros urbanos.
Aliás, também no comportamento por omissão, o Governo vai copiando os maus exemplos dos governos do PSD. Concretamente, tudo aquilo que o Governo deveria ter feito e não fez, porque não quis, é agora remetido para as calendas gregas. É assim na educação, como na saúde, no emprego, no sistema fiscal ou na segurança social.
Já sabemos que «Roma e Pavia não se fizeram num dia». Mas é inegável que se podem, e devem, começar a construir desde o primeiro dia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que afirma o Governo, o importante, o que fundamentalmente é preciso, não é «manter o diálogo» pelo diálogo, e o «capital de esperança», através de promessas recorrentemente adiadas. 0 que é essencial, é um efectivo

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«processo de mudança política» que dê satisfação às profundas aspirações dos portugueses e ás suas sentidas necessidades. E é isso que o Governo do Partido Socialista não tem feito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E é por isso que o balanço destes primeiros 12 meses do Governo do PS pode sintetizar-se, definitivamente, na constatação e na acusação de que, para a maioria dos portugueses, a vida continua difícil e madrasta, como há um ano atrás.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, a sua declaração política não traz para o Partido Socialista qualquer novidade na medida em que o PCP outra tarefa não tem do que a de dizer mal e
tentar denegrir a actividade deste Governo - aliás, como a de qualquer outro governo -, fazendo-o de uma forma sistemática desde o 25 de Abril.
Por isso, Sr. Deputado, não é estranho que tivesse enunciado o conjunto de coisas que o PCP considera negativas e não se tenha pronunciado positivamente sobre a questão do rendimento mínimo, dos programas para o emprego, das reformas para a segurança social, das inovações no sector da segurança e de tantos outros domínios da vida pública, pois, debate a debate, nesta Casa, tem sido
demonstrado, de forma suficiente - mais do que suficiente -, que tem havido uma evolução positiva.
Mas também não é de estranhar que V. Ex.ª, na intervenção que fez, continue desintonizado daquela que é a opinião da esmagadora maioria dos portugueses, que, se num determinado momento, há um ano, exprimiram uma confiança inequívoca no PS, hoje em dia, dizem Ter uma confiança absoluta.
O Sr. Deputado falou, depois, em assuntos como a polivalência, eventualmente com a «dor de cotovelo» de ter visto todos os sindicatos colaborarem com uma proposta do Governo - uma proposta credível, que os sindicatos aceitaram, o que certamente dói muito ao PCP.
Na questão da revisão constitucional, o Sr. Deputado tenta, mais uma vez, pôr politicamente em causa o elevado sentido da responsabilidade com que está a ser feita.
Sr. Deputado, o PSD, como os outros partidos, não pode ser afastado da elaboração de um documento que é a salvaguarda de todos os portugueses e que, por todos os portugueses, tem de ser participado, nomeadamente pelos
seus legítimos representantes.
Quanto à regionalização, devo dizer-lhe que o PS se mantém firme nessa disposição. E pode o PCP perorar aquilo que entender sobre esta matéria, porque ela é uma aposta e uma determinação que será cumprida - e bem - tal qual nos comprometemos.
Gostaria, no entanto, de lhe fazer uma pergunta, no sentido de saber se, eventualmente, esta panóplia de coisas tão negativas, em que incluiu o Plano Rodoviário Nacional, que é apoiado pela generalidade do País,..

Protestos do PSD.

... não revela um sentimento de grande intranquilidade por parte do PCP por ver que, de facto, o caminho que o

Governo está a seguir é um caminho de progresso, de profundas aspirações dos portugueses e às suas sentidas tranquilidade e de estabilidade. É que isso é negativo para o PCP, porque o PCP só consegue encontrar alguma clientela na instabilidade social do País.

Aplausos do PS.

O Sr. José Calçada (PCP): - Francamente!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Junqueiro começou por afirmar que a nossa intervenção não trazia novidade nenhuma, mas digo-lhe com toda a sinceridade que eu estava convencido que tinha trazido grandes novidades, fundamentalmente uma que me parece essencial, que é a de o Governo, através do Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Sr. Primeiro-Ministro, vir afirmar o que afirmou. Essa é que é a grande novidade que eu aqui trouxe: que o Governo reconhece, publicamente - está escrito e publicado num jornal diário desta terra -, que os portugueses continuam a viver com as mesmas dificuldades e a ter uma vida madrasta tal como há um ano atrás.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - É verdade!

O Orador: - A novidade não é para nós. A novidade é o facto de o Governo o dizer e afirmar. E isto é importante.
E o Sr. Deputado José Junqueiro não pode querer ser aqui «mais papista do que o Papa». Pelo menos, acompanhe o Governo no acto de contrição que este teve a coragem de vir fazer publicamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Depois, Sr. Deputado José Junqueiro, nós não temos tarefas para cumprir. Nós temos responsabilidades que assumimos perante o nosso eleitorado e damos cumprimento a essas responsabilidades aqui na Assembleia da República, contestando aquilo que nos parece errado, combatendo aquilo que consideramos negativo e apresentando os problemas que são suscitados e que exigem satisfação para bem da população portuguesa.
Diz ainda o Sr. Deputado que não falei no rendimento mínimo nacional. Pois se o próprio Governo se tem esquecido de colocar isso na sua coluna de crédito!... É certo que a criação do rendimento mínimo nacional foi por nós votada e defendida - não queremos louros, mas fomos o primeiro grupo parlamentar a apresentar um projecto de lei sobre essa matéria -, mas é evidente que também temos feito a análise dessa questão e temos referido que está a andar demasiado devagar. É, por isso, que o próprio Governo procura não chamar muito a atenção para ela.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Está a andar parado!

O Orador: - Mas o Sr. Deputado fez uma afirmação que não pode ser feita por ser totalmente falsa - e o Sr. Deputado não corou quando a disse, mas é totalmente falsa! -, qual seja a de que todos os sindicatos colaboraram com o Governo na aplicação e aprovação da lei da polivalência e da flexibilidade! Isso é falso,

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Sr. Deputado! É garantidamente falso! É comprovadamente falso! E o Sr. Deputado sabe-o muito bem.
Quanto à revisão constitucional, para nós a questão essencial é aquela que referi, ou seja, o problema do vosso objectivo fundamental - que o dizem, que não escondem, honra lhes seja feita -, que é o de alterar o sistema político, alterar o sistema eleitoral. Porquê e para quê? Para reduzir a proporcionalidade, para tentar impor, administrativamente, uma bipolarização que, de facto, não existe no país!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Não é nada disso e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente!

O Orador: - Por último, diz o Sr. Deputado que o Partido Socialista continua firme quanto à regionalização. Agrada-me ouvi-lo. Só que já o ouvi várias vezes e a verdade é que não passam da palavra aos actos. A firmeza é tanta, tanta, tanta, que, ontem, ouvi nos noticiários televisivos os Srs. Presidentes de Câmara Fernando Gomes e Narciso Miranda - e li-o igualmente num artigo do Sr. Deputado José Saraiva - a colocarem a questão de que este processo não pode ser travado, não pode parar e que é preciso que avance! A firmeza é tanta, que os próprios militantes do PS - e não é o chamado militante normal, são militantes colocados em lugares institucionais - não acreditam nela!
Sr. Deputado, diga-nos uma coisa: se a firmeza é assim tanta e se tem a garantia de que a regionalização vai avançar, diga-nos quando. Responda-me a esta pergunta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, o Governo solicitou a possibilidade de intervir no período de antes da ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social. Dispõe de 10 minutos.

O Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social (Ferro Rodrigues): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo fez do combate à exclusão social uma das suas linhas prioritárias de acção. A exclusão é um fenómeno multidimensional. Muitas vezes, tem sido reduzido a uma das suas áreas mais visíveis de incidência - a pobreza -, consequência da privação de recursos. Mas manifesta-se, também, na ruptura de identidades pessoais que conduz a situações de afastamento de toda a vida social e à construção de modos de vida alternativos e que põem em causa a própria sociedade. Acresce que, frequentemente, se reproduz de uma geração a outra. Deixarmos hoje que a exclusão avance pode implicar a perda para a sociedade de duas a três gerações.
Há modelos de organização social que são culpabilizantes das pessoas que vivem em situação de exclusão. Para quem entende assim a sociedade, os agentes têm um comportamento racional no mercado e os mais incapazes serão conduzidos ao insucesso, por culpa da sua própria acção, ao mesmo tempo que os mais capazes serão conduzidos ao sucesso. Mas o mercado, que se revelou muito eficaz na produção de riqueza, também já demonstrou as suas limitações quanto à sua distribuição. Em nenhum país do mundo proporcionou, por si só, uma distribuição equilibrada dos recursos.
Historicamente, o modelo social europeu afirmou-se, sobretudo ao longo deste século, como um modelo em que

níveis aceitáveis de coesão são garantidos, confiando ao Estado e às iniciativas da sociedade civil de carácter social estas funções. Durante muito tempo, o maior problema enfrentado foi o da protecção das classes populares contra situações temporárias de carência de recursos. Foi com essa filosofia que nasceram os nossos sistemas de protecção social, centrados nas prestações de desemprego, na protecção à infância e à terceira idade.
Agora, por toda a Europa e também em Portugal, começa a tornar-se visível uma outra dimensão do problema. É necessário que a sociedade invista em recuperar para o funcionamento social normal pessoas que estão em risco de serem afastadas estruturalmente deste funcionamento. A União Europeia impulsionou, na década de oitenta, a construção de uma abordagem global deste problema, mas também ela foi submergida por visões reducionistas do seu âmbito e orientadas, exclusivamente, para os problemas do crescimento e da produção de riqueza.
Em Portugal, desde os anos oitenta, que se começou a agir no âmbito do combate à pobreza, primeiro sob impulso e apoio financeiro comunitário e, depois, por manutenção de um programa de luta contra a pobreza, inteiramente financiado pelo Estado português. Volvida mais de uma década sobre o início destes programas, pareceu-me que se justificava um ponto de situação dos projectos em curso e, eventualmente, uma reformulação de objectivos e metodologias de acção.
Detectou-se que, no passado, estes programas deslizaram, com frequência excessiva, para a construção de infra-estruturas de tipo clássico, substituindo-se aos objectivos de outras medidas e iniciativas do Estado e, nomeadamente, ajudando a inverter prioridades quanto a equipamentos sociais que se deveriam estabelecer em PIDDAC.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Não é esse o entendimento que temos dos programas de luta contra a pobreza. Estamos, aliás, a agir no espírito das recomendações da Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social, realizada em Copenhaga. Os programas de luta contra a pobreza tinham evoluído para acolherem progressivamente mais medidas passivas. Fiz aprovar, pelo meu despacho n.º 122, de Agosto de 1996, um novo regulamento dos projectos de luta contra a pobreza, que os compromete com um entendimento da política de combate à pobreza como política activa de promoção da inserção social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os novos projectos de luta contra a pobreza devem continuar a basear-se no princípio fundamental do estabelecimento de parcerias, estimulando-se que autarquias, associações de municípios, instituições de solidariedade social, organizações não governamentais em geral, sejam promotores dessas parcerias. Mas os projectos de luta contra a pobreza, pelo seu carácter pontual e transitório, devem concentrar-se em zonas prioritárias e de maior risco social, definindo uma actuação selectiva e concentrada. Devem ser concebidos, postos em prática e avaliados por referência ao objectivo do desenvolvimento social local. Devem apoiar o surgimento de iniciativas locais, geradoras de emprego, sempre que possível, criadoras de actividades de inserção, em geral. Devem envolver as populações destinatárias, como actores

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do seu próprio processo de inserção e não como destinatários de uma valência ou serviço.
No modo como entendo o Programa de Luta contra a Pobreza, os recursos que lhe estão destinados devem ser canalizados para medidas activas de inserção em zonas de risco social bem delimitadas e conhecidas. Foi já com este espírito que aprovei, em Setembro, a criação de 41 novos projectos, aos quais estão afectos, para o último trimestre deste ano, mais de 350 000 contos. São projectos de trabalho com crianças de rua e com jovens em risco; com populações nómadas, em zonas urbanas degradadas e em meios rurais desvitalizados, que abrangem vários concelhos: Ovar, Cabeceiras de Basto, Alfândega da Fé, Coimbra, Góis, Pampilhosa da Serra, Mira, Lousã, Montemor-o-Velho, Guarda, Chaves, Moimenta da Beira, Ferreira do Alentejo, Castelo Branco, Évora, Reguengos de Monsaraz, Mourão, Vila Real de Santo António, Olhão, Portimão, Figueiró dos Vinhos, Pedrógão Grande, Loures, Lisboa, Vila Franca de Xira, Tomar, Coruche, Torres Novas, Golegã, Montijo, Alcácer do Sal, Setúbal, Praia da Vitória, Ribeira Grande, Funchal, Calheta e Ponta do Sol.
Estes novos projectos coexistem com a continuação do respeito pelos compromissos com os projectos aprovados anteriormente. Um compromisso que envolve 4 milhões de contos este ano e que representa um esforço continuado e já comprometido até 1999.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os programas de luta contra a pobreza são um instrumento que deve continuar a ser usado numa óptica de intervenção localizada e com enormes potencialidades.
Mas a restruturação que procuramos empreender nas políticas de combate à exclusão social, na dimensão que depende do meu Ministério, estende-se a outros instrumentos. Se os programas de luta contra a pobreza devem dar corpo a uma intervenção centrada no desenvolvimento social local, existe há muito tempo um fundo, o Fundo de Socorro Social, cuja regulamentação - que nunca ocorrera - decidi empreender. Entendo que este Fundo deve dar resposta, de modo eficaz, a diversas situações que, pela sua natureza, pelos montantes que envolvem ou pelo seu quadro inovador, não se enquadrem nos instrumentos normais de política existentes. Nomeadamente, não permitirei que, através deste Fundo, se actue contraditoriamente com opções determinadas por esses programas ou medidas.
No passado, por não estar regulamentado, o FSS prestou-se a que, através dele, se desse início a obras não inscritas em PIDDAC, não sujeitas a planeamento devido e cuja prioridade social não estava bem definida, implicando encargos, muitas vezes incontroláveis, não apenas com obras e apetrechamento de edifícios, mas também com a pressão sobre a celebração de acordos de valências de acção social. Também este instrumento servia para subverter as prioridades que devem ser definidas em PIDDAC.
Determinei já que o Fundo de Socorro Social não apoiará mais qualquer pedido de apoio para o início de obras, assumindo apenas, em situações-limite bem identificadas, o apoio indispensável à conclusão de equipamentos, porque entendo que não devem quebrar-se compromissos assumidos pelo Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A partir de 1 de Janeiro de 1997, todos os apoios a conceder no âmbito do Fundo de Socorro Social obedecerão já a um regulamento que clarifique a finalidade deste Fundo, as suas regras de funcionamento e tios financiamentos por ele veiculados.
A regulamentação do Fundo de Socorro Social resulta de uma nova atitude no relacionamento do Estado com os diversos agentes de protecção social, para que uma utilização mais eficaz dos recursos públicos nos permita atingir melhor os nossos objectivos.
Está em vias de celebração um pacto de cooperação para a solidariedade social, envolvendo o Estado, a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a ANAFRE e as Uniões das Instituições Particulares de Solidariedade Social, das Misericórdias e das Mutualidades.
Inaugurámos um novo estilo de governação, definimos novos objectivos, desbloqueámos impasses negociais e incompreensões.
Com o novo Governo, houve uma nova atitude que não se consubstanciou apenas no reordenamento de prioridades e na redefinição de programas.
A iniciativa do XIII Governo Constitucional estendeu a Portugal um mecanismo eficaz de luta contra a exclusão, que esta Assembleia da República aprovou e que estamos a pôr no terreno, com prudência mas com determinação. A 30 de Maio, esta Assembleia aprovou a lei que cria o rendimento mínimo garantido, para entrar em vigor, no que se refere aos projectos-piloto experimentais, a 1 de Julho de 1997. Nesse mesmo dia, foi publicada a portaria que regulamentava esses projectos-piloto. A 22 de Julho, assinei o primeiro despacho, criando um desses projectos. Apesar de estarmos nos meses de Verão nessa altura, foram inúmeras as entidades que quiseram associar-se a este período experimental, fazendo-me estar muito optimista quanto ao dinamismo da sociedade civil no que se refere ao combate à exclusão social. Até ontem, já assinei 61 despachos, que criam projectos-piloto em 195 freguesias localizadas em todo o país. Outros estão ainda em fase de apreciação.
Segundo as estimativas das entidades proponentes, 8659 famílias, correspondendo a 31 268 pessoas, beneficiarão destes projectos-piloto. Este número corresponde a 5,2% da população residente. Sabendo, como sabemos, que se encontram nos projectos-piloto muitas freguesias que se destacam por terem situações particularmente graves de carência, em especial nas zonas urbanas, este número indicia que o conhecimento do terreno por parte das entidades locais corrobora as projecções iniciais do Governo quanto à população que beneficiará do rendimento mínimo garantido.
Para além dos parceiros que a lei estipula como parceiros obrigatoriamente comprometidos, aderiram aos projectos-piloto já aprovados 13 outros organismos públicos, 126 câmaras municipais e juntas de freguesia, 105 instituições particulares de solidariedade social, misericórdias, mutualidades e outras associações sem fins lucrativos, 1 associação sindical e 3 associações empresariais.
O dinamismo com que as autarquias e parceiros sociais, representando os mais diversos sectores da sociedade portuguesa, acolheram este projecto demonstra inequivocamente que a sociedade civil aderiu à ideia que lhe subjaz e acredita na possibilidade e na viabilidade desta nova resposta social.
Ainda é cedo para um balanço crítico dos resultados desta medida. Ela está a ser experimentada por 61

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comissões locais de projecto, que começaram ou começarão nos próximos dias a trabalhar no desenvolvimento de programas de inserção para os beneficiários.
O grau de sucesso das medidas de combate à exclusão promovidas pelo Governo medir-se-á pela redução dás disparidades sociais, que as várias medidas de inserção social, de que estas são apenas algumas, induzirem.
Mas o sucesso na luta contra a exclusão passa também pelas variáveis de contexto. Ninguém pode inserir-se numa sociedade que caminhe para a produção massiva da exclusão. Preservar o modelo de sociedade que combata essa exclusão é uma prioridade deste Governo. A acção que aqui vos relato é uma das consequências.
Em síntese, falei-vos da situação dos projectos-piloto experimentais do rendimento mínimo, das novas orientações para os programas de luta contra a pobreza e do esforço de clarificação do papel do Fundo de Socorro Social.
Ao vir expor-vos as transformações que o Ministério da Solidariedade e Segurança Social introduziu nestas três dimensões da luta contra a exclusão social, pretendi manter o espírito de relacionamento que tem caracterizado a nossa relação com a Assembleia da República e manter-vos a par do novo impulso que estamos a procurar imprimir às políticas de promoção da inserção social.
Não vim transmitir-vos qualquer mensagem de euforia ou de triunfalismo. Nas áreas de combate à exclusão e de investimento na inserção social, as necessidades continuam a ser muitas. O desemprego de longa duração, a toxicodependência e a possibilidade de marginalização são duras realidades e, por muito que se faça, muito continua sempre por fazer.
Trouxe-vos, isso sim, uma mensagem de esperança, inconformismo e determinação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Regimento é um pouco avaro no tempo que dispensa para o debate a seguir a este tipo de intervenções, limitando-o a 20 minutos. Sem querer ser fanático, proponho aos Srs. Deputados, uma vez que a distribuição é difícil quando o tempo é escasso, para respeitar o mínimo de proporcionalidade, a seguinte grelha: 5 minutos para o Governo, 6 para o PS, 5 para o PSD, 3 para o PP, 3 para o PCP e 2 para Os Verdes. Se houver consenso, darei esta distribuição de tempos por aceite.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Rodeia Machado, Elisa Damião, Luís Marques Guedes e Maria José Nogueira Pinto.
Sugiro ao Sr. Ministro que responda apenas no final de todos os pedidos de esclarecimentos, uma vez que dispõe apenas de 5 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, é sobejamente conhecido que o PCP desde sempre se bateu pelo rendimento mínimo garantido, tendo participado em sede de especialidade, nomeadamente, para melhorar a proposta do Governo. Por isso mesmo, temos para nós que esta razão é importante e dá-nos legitimidade suficiente para fazer algumas críticas em relação ao rendimento mínimo.
Em primeiro lugar, queremos afirmar que esse instrumento normativo não pode ser, nem é, um meio para debelar da sociedade portuguesa os marginalizados e os

excluídos, mas pode e deve ser um meio eficaz e eficazmente aplicado para minorar as situações de miséria em que vivem milhares e milhares de famílias portuguesas. Ora, o que neste momento verificamos não é isso. O Governo começou com uma tímida aplicação, em 1996, de 10,5 milhões de contos, instituindo apenas algumas freguesias-piloto, mas criando injustiças em relação a outras freguesias.
Não creio que o panorama para 1997 seja muito melhor. Por aquilo que conhecemos, em 1996 a dotação foi de 10,5 milhões de contos, em 1997 será de 25 milhões de contos. Com esta verba, vai igualmente deixar-se de fora grandes bolsas de pobreza, que são por demais conhecidas. Digo-lhe apenas que em relação ao Alentejo é um caso flagrante e, se quiser, no que toca ao distrito de Beja ainda maior.
Com que critérios - pergunto-lhe, Sr. Ministro - estão a ser definidas as freguesias-piloto? Conhecem-se críticas a esta matéria e gostaria de obter, da parte de V. Ex.ª uma resposta sobre isto.
Por outro lado, preocupa-nos também a aplicação prática em relação ao rendimento mínimo. Ainda ontem mesmo o Sr. Secretário de Estado dizia que não há recursos humanos na segurança social pela aplicação prática do rendimento mínimo garantido. Queríamos que nos desse a sua visão sobre esta matéria e de como é que o Governo pensa resolver esta situação.
O que importa, no fundo, não é apenas atacar o rendimento mínimo mas também as causas da pobreza em Portugal, dos marginalizados e dos excluídos. Em nosso entender, isso tem de ser feito com políticas económicas e sociais geradoras de emprego, pois neste momento é assustador o facto de o desemprego continuar a subir, como ontem ficou aqui demonstrado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - No último trimestre de 1996, em relação a um período análogo de 1995, o desemprego cresceu em cerca de 30 000 postos de trabalho, que foram engrossar a já enorme bolsa de desempregados de longa duração. É esse longo segmento de desempregados, os de longa duração, que não tem qualquer apoio social. Significa isto, por um lado, que a pobreza está a aumentar e, por outro, que o número de beneficiários do sistema do rendimento mínimo vai aumentar também, por isso mesmo, as verbas a dotar em 1997 serão, como já disse, manifestamente insuficientes.
Sr. Ministro, fazemos votos para que o rendimento mínimo seja cada vez mais extensivo ao número de famílias carenciadas, mas não podemos deixar de notar que ou o Governo altera as políticas económicas e sociais ou a política do rendimento mínimo será cada vez menos aplicável.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, não pode deixar de ser com prazer que tomamos conhecimento de algumas medidas que reclamámos nesta Câmara, muitas vezes pela voz de V. Ex.ª, no sentido de clarificar, dar sentido estratégico e transparência aos programas de combate à pobreza.

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Isto não tem, naturalmente, qualquer desmerecimento dos esforços feitos pelos anteriores protagonistas, mas, justiça seja feita, gastaram-se, na acção social da segurança social, muitas vezes de forma pouco transparente, em ocasiões e estratos sociais da população porventura menos carenciados, verbas avultadas que poderiam ter tido outra aplicação e, sobretudo, não os efeitos que tiveram, que na maioria dos casos eram meramente eleitorais.
Assim, registamos com agrado que hoje há uma estratégia, há transparência, que pode ser criticável e fiscalizável por este Parlamento. Por isso, Sr. Ministro, trata-se uma promessa cumprida, e sabia que V. Ex.ª não deixaria de a cumprir, porque, parecendo menor, ela é de um grande alcance estratégico.
V. Ex.ª deu-nos conta dos resultados, que são ainda incipientes, da aplicação do rendimento mínimo. Não pretendeu o Governo, neste ano, com os meios de que dispunha, ir muito para além desta fase experimental. Criticado à direita, porque ia esbanjar, criticado à esquerda, porque não distribuía o suficiente, esteve seguramente no caminho certo e fez uma aprendizagem que pude testemunhar num grande encontro europeu sobre este tema e que nos indica estarmos no bom caminho.
Os beneficiários deste rendimento mínimo são sobretudo as famílias isoladas. Destas, são maioritariamente as mulheres com filhos a cargo. Não se trata apenas de um instrumento pecuniário mas também de cuidar e identificar uma situação e utilizar muitos, outros instrumentos, que têm sido negligenciados, para atacar este novo problema, as novas famílias, a nova pobreza e as dificuldades destas crianças, destas mães e também das famílias idosas, completamente dependentes.
Sr. Ministro, sabemos que esta experiência tem sido rica, mas também sabemos que muitos dos que diziam que havia bolsas de pobreza e que o Governo não estava a atender às prioridades não colaboraram o suficiente na identificação dessas bolsas de pobreza. É necessário, afinal, que tenhamos a consciência de que os fenómenos que se produzem nas sociedades modernas e numa economia tão frágil como a nossa, já aqui referidos, até por V. Ex.ª, devem mobilizar outros sectores da sociedade.
Congratulamo-nos com as contas que V. Ex.ª veio dar de um projecto que nos é caro e gostaria de lhe pedir que nos fale um pouco mais do que vai ser o futuro quanto a este rendimento mínimo. Permita-me que destaque os aspectos relacionados com as famílias isoladas, os idosos e a formação profissional, sobretudo em relação aos jovens negligenciados, os quais, em princípio, este projecto terá mais dificuldade em alcançar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social veio hoje falar-nos do drama da exclusão social, sabendo, no entanto, como todos sabemos, que um dos principais factores da exclusão social é o desemprego, constituindo os esforços de todos nós seguramente poucos para o combater. A este propósito apresentou o PSD há poucos dias um conjunto de propostas muito concretas para a tentativa do seu combate, permitindo-me destacar, entre elas, a proposta que o PS13 formulou no sentido de redução dos contributos que as empresas têm de pagar para a taxa social única, por força dos postos de trabalho que detêm.

Acontece que ontem tivemos conhecimento de que a Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego prestou declarações à comunicação social, referindo expressamente a este propósito ter o Governo apresentado propostas muito concretas na mesa de negociações da concertação estratégica em curso. Durante a tarde de ontem, também, divulgou o Sr. Ministro um comunicado do seu gabinete, em que se coloca frontalmente contra as propostas do PSD, chegando ao ponto de as qualificar de irrealistas, demagógicas e especulativas, não sabendo muito bem o que isto quer dizer.
A descoordenação e contradição entre o discurso da Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego e o do Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social é patente e não carece de qualquer esclarecimento.
Mas o que carece de esclarecimento é o seguinte: será que o Sr. Ministro desconhece o que o seu Governo propõe em sede de concertação estratégica ou está o Governo, de que o Sr. Ministro faz parte, a entreter os parceiros sociais nessa mesma concertação estratégica, sem vontade política real de obter resultados sérios e, por isso, apresentando propostas não pensadas, não d4scutidas e seguramente não queridas por um colectivo que o Governo deveria ser também nesta matéria?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, foi com grande satisfação que registei as suas palavras.
Penso que na sessão legislativa que está a findar nos compete discutir conceitos, mas o eleitorado que aqui nos colocou obriga-nos a, na próxima, discutir acções e medidas concretas. E não posso deixar de reconhecer que o Sr. Ministro é o primeiro a trazer aqui um conjunto de medidas concretas. Devo lembrar-lhe, no entanto, que para que essas medidas concretas pudessem hoje ser trazidas aqui, e ao contrário do que referiu a Sr.ª Deputado Elisa Damião, esta direita que represento não faz parte da direita que considerou que o rendimento mínimo garantido seria esbanjar. Será esbanjar se não tivermos capacidade de aplicar, com correcção, a lei, porque, se a aplicarmos com correcção, não é esbanjar.
Em todo o caso, no seu plano, há quatro aspectos - e não tenho tempo para mais - que gostaria de ver esclarecidos.
O Sr. Ministro decidiu, e está a actuar em conformidade, que as IPSS, as Misericórdias e outras instituições similares vão constituir com o Estado uma parceria. Transferiu, por isso, para a sociedade civil, um conjunto de acções que tradicionalmente estavam no Estado, apesar de se tratar de uma máquina desgastada, ineficaz e inoperante. Para isso, penso, não basta mudar de ambiente e de estado de espírito, é preciso certamente fazer com essas instituições, com esses representantes da sociedade civil, digamos, uma negociação e um estatuto de convivência. Não basta apenas mudar o estilo. Penso que elas estão sinceramente à espera de encontrar consubstanciado, eventualmente num documento, um regime de convivência que lhes dê também segurança e garantias para entrarem numa área tão delicada como esta e assumirem as responsabilidades que daí advêm.

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Quero também perguntar-lhe o que está a ser feito nas áreas-limite entre a segurança social e a saúde. Como sabe, há aí uma espécie de charneira, onde caem muitos portugueses - estou a pensar, nomeadamente, na questão da toxicodependência e na da terceira e quarta idades, dois problemas graves. Dir-lhe-ia que, hoje, num programa de rádio, alguns cidadãos sugeriam, com a maior candura, que seria bom encerrar num quartel todos os toxicodependentes. Estamos, portanto, numa sociedade que, com facilidade, resvala para soluções, que, obviamente, com maior reflexão, nos parecem impensáveis.
Em relação ao problema do desemprego versus reinserção social, gostaria de saber o que vai ser feito. A Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego, ontem, explicou-o, embora não tão profundamente como eu desejaria. Por isso, pergunto se há, ou não, por parte dos dois ministérios medidas concretas para criar o mercado social de emprego.
Termino, falando das comunidades de imigrantes, cujo novo período de regularização também foi apoiado pela minha bancada, com a responsabilidade, que daí advém, de estarmos atentos à forma como ele decorre. Isto é, se este período de regularização falhar, temos a consciência de que não foi um bem, mas um mal, e que, por conseguinte, os problemas aí existentes se mantêm e aumentam.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra, por 5 minutos, o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social.

O Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social: Sr. Presidente, gostaria de sintetizar as numerosíssimas perguntas, que, desde já, agradeço, em quatro ou cinco grupos de temas, que foram os mais referidos.
Em primeiro lugar, quanto ao problema do ritmo de aplicação do rendimento mínimo garantido, relembro que este último foi aprovado pela Assembleia da República, tendo ficado claro que existiria uma primeira fase, até meados do ano que vem, com projectos-piloto experimentais. E, na altura, disse inclusivamente várias vezes, por uma questão de prudência, que apontaríamos para um projecto-piloto por distrito. Ora, aquilo que hoje aqui vim apresentar-vos é bastante mais do que isso e não é algo feito em termos de aventura, porque todos estes projectos têm suportes locais fortes e responsabilidades objectivas, que estão a ser assumidas por pessoas e por estruturas. Portanto, o ritmo é bastante mais satisfatório do que aquele que era pensável aquando da aprovação da lei.
Em segundo lugar, quero referir-me a ideia da possível subestimação de verbas. Felizmente, o que acontece é exactamente o contrário. Nesta primeira fase - e isto é muito importante -, os números que temos estado a dar são aqueles que correspondem a estimativas feitas no terreno pelas parcerias, ou seja, pela segurança social mas também pelas instituições de solidariedade social, pelas câmaras e pelas juntas de freguesia. E já há casos suficientes para se poder tirar uma primeira conclusão, embora não definitiva, de que normalmente essas primeiras estimativas são sobrestimadas. Quer dizer, as parcerias no terreno têm tendência a considerar que o número de famílias que poderá ter acesso ao rendimento mínimo garantido seria bastante maior do que, na prática, é aquele

que a ele poderá ter direita Isto, porque a prestação é, como todos sabem, baixa, estando relacionada com a pensão social. E nem de outro modo poderia ser, para não haver aqui um desequilíbrio global nos sistemas dos regimes não contributivos. Assim sendo, apesar de o Orçamento do Estado não estar ainda em discussão, estou muito satisfeito com a forma como, nessa matéria, os trabalhos preparatórios estão a correr no seio do Governo. Além disso, julgo que será possível as coisas correrem bem no próximo ano e, inclusivamente, haver alguma sobrestimação financeira no valor que aqui vos vai ser apresentado para o rendimento mínimo garantido durante o ano de 1997.
Em terceiro lugar, passo a referir-me a um conjunto de questões colocado pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, cujo tom, desde já, lhe agradeço. Gostaria de dizer-lhe que efectivamente há, neste momento, uma profunda cooperação entre o Ministério da Solidariedade e Segurança Social e o Ministério da Saúde em várias áreas, nomeadamente ao nível do Projecto VIDA, no combate à toxicodependência, mas também em áreas nas quais, até aqui, não houve essa tradição, que poderá ter, não imediatamente neste Orçamento mas num futuro, expressão política, técnica e financeira, traduzida na libertação da área da saúde, pelo menos, de toda a responsabilidade que, neste momento, a Saúde tem por determinados casos de doentes idosos, que estão acamados, e no apoio fornecido ao nível da solidariedade social. Aliás, devo dizer-lhe que um dos aspectos mais estimulantes do trabalho que temos procurado desenvolver é esta articulação directa com vários ministérios - não apenas com o da Saúde mas com o da Educação, ao nível do pré-escolar, em que também estamos a trabalhar, e com o do Emprego.
A propósito de emprego, devo dizer que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes não tem razão. Efectivamente, aquilo que consta da acta, aprovada na concertação social por todos os parceiros, apenas com uma reserva da CGTP, quanto a esta questão da taxa social única e, concretamente, ao financiamento do sistema, é o seguinte: «Ajustamento da taxa social única, desde que exista possibilidade de compensação da receita, com vista à criação de emprego e redução nos custos indirectos do trabalho». Isto, para além de, noutra parte desta acta consensual, haver a ideia de que tem de existir uma avaliação do efeito positivo sobre o emprego, que, até agora, tiveram algumas reduções na taxa social única.
Do meu ponto de vista, o que não é responsável é apresentarem-se propostas, cujas contas - não sei quem as fez, nem me compete saber - foram mal feitas e que, por isso, têm como resultado determinados valores... Assim, a ideia de que eram 50 milhões de contos por ano esquece um pequeno pormenor: é que, no primeiro ano, há uma redução de 1 %, mas, no segundo ano, há uma redução de 2% em relação à base; no terceiro ano, há uma redução de 3% e, no quarto ano, uma redução de 4%. E quem quer que do vosso lado fez essas contas esqueceu-se desse pequeno pormenor, que leva a que não sejam 50 milhões de contos por ano, isto é, não sejam 200 milhões de contos em quatro anos, mas qualquer coisa como 363,8 milhões de contos.
Outras das propostas que fizeram têm também grandes custos nas áreas da segurança social. E, como é óbvio, não faz sentido manter um discurso, em que; por um lado, se procura forçar o Governo a ser mais rápido na ideia da reforma da segurança social, algo que, em minha opinião, também é muito importante, mas que tem de ser feito com

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calma, tempo e capacidade para medir as consequências, e, por outro lado, se propõem medidas avulsas com as quais se pode estragar totalmente uma estratégia séria de reforma do sistema. É que não é possível fazer propostas que têm custos de cerca de 400 milhões de contos, em quatro anos, sem dizer quais são as alternativas para pagar as pensões dos actuais pensionistas ou os subsídios dos actuais desempregados. Isso é muito fácil como maneira de fazer política. Eu, enquanto Deputado da oposição, nunca fiz isso, porque procurei sempre encontrar as alternativas, quando havia propostas de redução de receitas.
Para terminar, gostaria de dar-vos uma novidade em relação ao problema dos recursos humanos. Sei que há alguma especulação em torno do problema dos recursos humanos na segurança social e da sua relação com o rendimento mínimo. Posso dizer-vos que, juntamente com o Ministério das Finanças, foi hoje mesmo assinado um despacho que vai permitir a contratação pelos diversos centros regionais, nas áreas de técnicos superiores de serviço social, de técnicos superiores com formação em sociologia e psicologia - para acompanharem todo este projecto, mas evidentemente com limites para cada um dos centros -, de um significativo número de pessoas - se não me engano, mais de 100 - que poderão entrar, desde já, nos projectos-piloto experimentais, pessoas qualificadas que vão estar no terreno a acompanhar estes projectos piloto, o que permitirá, inclusivamente, que o próprio sistema possa vir a reforçar-se como um todo, com pessoas qualificadas, que é o mais importante.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, gastando os 3 minutos de que o seu partido ainda dispõe, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social, o senhor não respondeu à minha questão. Efectivamente, não lhe perguntei, porque já o tínhamos percebido ontem através do comunicado divulgado pelo seu gabinete, qual era a sua posição acerca das propostas do PSD. O que lhe perguntei foi por que razão desconhece essas mesmas propostas ou, no mínimo, não está coordenado com a Sr.ª Ministra para a Qualificação e o Emprego, sua colega no Governo, relativamente às mesmas. É que a Sr. Ministra disse - e o Sr. Ministro não pode dizer que estou mal informado, porque é verdade - à comunicação social, durante o dia de ontem - e isso está gravado e foi reproduzido várias vezes, ao longo do dia de ontem -, que o Governo apresentou na mesa da concertação estratégica propostas idênticas às formuladas peto PSD nesta Câmara, com o mesmo objectivo e sobre a mesma matéria. E a Sr. Ministra deu essa explicação para justificar a sua posição de que as propostas do PSD nem sequer seriam uma novidade. É essa a pergunta que lhe fiz e à qual o Sr. Ministro não respondeu. Por isso, peço-lhe que dê uma resposta concreta acerca dessa matéria.
Quanto à questão dos números referidos pelo Sr. Ministro, relembro-lhe - da mesma forma que o fizémos ontem durante o debate, em que o senhor não participou - que o PSD, quando apresentou estas propostas, já formulou algumas sugestões em relação às despesas que se deveriam cortar para aumentar as receitas, indicando, nomeadamente, o esbanjamento de dinheiros que o Governo anda a tentar fazer na RTP, bem como os

25 milhões de contos a propósito do caso Siemens. Mas ainda em relação às despesas que tenham de ser cortadas por forma a obter receitas, a partir do dia IS de Outubro, aquando da discussão nesta Câmara do Orçamento do Estado, o PSD cá estará para apresentar propostas concretas. Nessa altura, esperamos que haja da parte do Governo, à semelhança do que aparentemente tem sido a posição do Governo na mesa da concertação estratégica, abertura para equacionar, de um ponto de vista sério, aquilo que tem vindo a ser a política seguida na generalidade de outros países da União Europeia, confrontados igualmente com graves problemas de desemprego, onde este tipo de medidas tem vindo a ser seguido, sem os pruridos e os subterfúgios que o Sr. Ministro agora nos trouxe aqui.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra, por 1.8 minutos cedidos pelo Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social.

O Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social: Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não julgo que o tom da sua intervenção seja compatível com o deste debate.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Sr. Ministro disse que era falso!

O Orador: - Aliás, o tema que o senhor aflora é relativamente excêntrico em relação àquilo que estamos aqui hoje a discutir.
Porém, posso garantir-lhe, para seu sossego, que há um entendimento político total entre a política do Ministério para a Qualificação e o Emprego e a do Ministério da Solidariedade e Segurança Social e que eu próprio também ouvi ontem, ao fim da tarde, as declarações da Sr.ª Ministra e sei perfeitamente que o que ela disse foi exactamente aquilo que acabei de dizer. Aliás, procurei, hoje, nos jornais e, ontem, em todos os canais de televisão, públicos e privados, encontrar essa contradição e não consegui detectá-la em parte alguma.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar ao terceiro ponto do período de antes da ordem do dia, relativo ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
A ordem das intervenções estabelecida, como sabem, dá prioridade, neste momento, à inscrição do Sr. Deputado Rui Namorado, à qual se seguirá a do Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como vou falar de política cooperativa, não posso deixar de fazer aqui uma homenagem a Afonso de Barros, que também nesta matéria nos deixou textos que nenhum estudioso do fenómeno cooperativo pode desconhecer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista promoveu, na sexta-feira passada, um debate sobre política cooperativa. Um significativo número de dirigentes e quadros do movimento cooperativo, em conjunto com Deputados, equacionaram os principais problemas que as cooperativas enfrentam. Paralelamente,

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foram exploradas vias para a sua solução, tendo-se inventariado a política cooperativa da actual maioria, bem como o horizonte que a partir dela se projecta.
A complexidade do mundo em que vivemos, potenciada pela globalização económica crescente, a disseminação de um egoísmo sôfrego, distante de uma ética da solidariedade, e as pesadas sequelas da década cavaquista, no que representou de uma hostilidade dissimulada mas efectiva ao movimento cooperativo, conduziram muitas cooperativas portuguesas para uma situação difícil que justifica mesmo algum alarme.
Agravando estes vectores de crise, persistem alguns bloqueios em áreas relevantes. Entre eles podemos lembrar que uma parte da Administração Pública, porventura ainda enredada em automatismos adquiridos, persiste na injusta desvalorização do fenómeno cooperativo, que encara com indisfarçável reserva.
Do mesmo modo, o sistema bancário tem resistido a uma mudança de atitude que o sensibilize para a especificidade cooperativa, aceitando que as cooperativas não são sociedades comerciais imperfeitas mas, sim, entidades portadoras de uma lógica própria e não são empresas privadas ou públicas que funcionam mal mas, sim, empresas de um terceiro tipo que se guiam por outras pautas de empresarial idade.
A actual maioria não se conforma com esta situação, embora saiba que o terreno é difícil, implicando uma acção necessariamente persistente, mas que não seja precipitada. Mais do que em muitos outros casos, os maus resultados consumam-se com rapidez e são suscitados novos problemas com impressionante facilidade, mas, em contrapartida, superar essas dificuldades torna quase sempre imperativo percorrer caminhos longos e difíceis com determinação e rigor.
Na verdade, para além da complexidade da vida actual das empresas, as práticas cooperativas implicam o seu significativo acréscimo. E o poder político não pode exceder-se no seu ímpeto de intervenção a ponto de lesar a autonomia cooperativa, que é tanto mais protegida pela lei quanto é mais vulnerável pela própria natureza das organizações em causa.
Ao poder político cabe, certamente, estimular e incentivar; fiscalizar, mas nunca dirigir; abrir caminhos, sem cair na tentação de ser ele a percorrê-los. Por imperativo constitucional, cabe-lhe proteger o sector cooperativo e social, mas está-lhe vedado que o constranja, que o obstrua ou que o instrumentalize.
Fiel à linha de rumo que daí resulta, a nova maioria, em concordância natural com o seu programa, tem agido com firmeza, sem esquecer a prudência imposta pela complexidade do que está em causa.
Neste contexto, não é demais salientar, como aliás aconteceu no debate que motivou esta intervenção, que a recente reforma do Código Cooperativo, em que o PS se empenhou e que reuniu o consenso de todos os Partidos presentes nesta Assembleia, é um elemento relevante para o desenvolvimento cooperativo.
Os resultados alcançados traduziram, aliás, o cumprimento de uma parte dos objectivos programáticos que a nova maioria estabeleceu neste campo. Entre eles permitimo-nos destacar a plena concordância com os princípios cooperativos da Aliança Cooperativa Internacional, a abolição das barreiras legais ilegítimas que entravavam a iniciativa cooperativa e a eliminação de todas as discriminações que desfavoreçam as cooperativas.

Dentro do mesmo espírito, entre as medidas de política cooperativa de maior relevância e amplitude que estão a ser já preparadas, vale a pena, em primeiro lugar, fazer referência à Comissão Interministerial que está a lançar as bases para uma completa e global reformulação do estatuto fiscal do sector cooperativo. Do mesmo modo, pode mencionar-se o desencadear do processo de reforma de toda a legislação específica dos diversos ramos do sector cooperativo, no âmbito da qual tem prioridade a resolução dos problemas criados pela mais recente legislação do crédito agrícola mútuo, publicada pelo Governo anterior, eivada de algumas chocantes distorções da cooperatividade e, porventura, mesmo de inconstitucionalidades.
Por último, pela sua relevância estratégica, merece ser salientada a anunciada intensificação dos apoios à investigação cooperativa.
O desenvolvimento cooperativo é hoje, inquestionavelmente, uma prioridade nacional, no duplo sentido de que se conta entre as vias de progresso mais relevantes e de que não pode ser tarefa apenas de uma maioria governamental, nem das cooperativas actualmente existentes. É uma tarefa de todos e em especial dos poderes locais, dos novos actores sociais e da nossa juventude.
De facto, a par de outras medidas que procuram debelar o flagelo do desemprego, a expansão das práticas cooperativas pode atingir neste campo resultados mais consistentes e mais equilibrados do que muitas outras vias, talvez bem mais dispendiosas. Em consonância com essas virtualidades, o desenvolvimento cooperativo é um pilar indispensável de um desenvolvimento local verdadeiramente duradouro.
Do mesmo modo, cada vez mais o fenómeno cooperativo se funde com as estratégias de salvaguarda do ambiente, fazendo com que seja cada vez mais difícil conceber um desenvolvimento cooperativo que não inscreva no seu próprio cerne a protecção do ambiente. Estaremos, mesmo neste caso, perante o melhor caminho para articular um desenvolvimento local sustentável com a salvaguarda ambiental.
Por tudo isto, quando hoje nos preocupamos com o movimento cooperativo português, não estamos a preocupar-nos apenas com os milhões de portugueses por ele directamente envolvidos, estamos a preocupar-nos com o desenvolvimento do nosso país, estamos a abrir uma janela para o futuro de todos nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados do Partido Socialista: Tenho a certeza absoluta, até pela consideração mútua que nos une, de que não foi por terem receio da minha intervenção que VV. Ex.as não permitiram que, na ordem das inscrições, eu trocasse com o vosso colega que acabou de falar. Mas vou tentar que VV. Ex.as fiquem mesmo incomodados com a minha intervenção.
As minhas primeiras palavras são para alguém que já aqui não está e que considero muito, o Sr. Ministro Ferro Rodrigues, e são para fazer a leitura alto daquilo que foi o grande flop da vinda do Sr. Ministro hoje ao Parlamento.
O Sr. Ministro veio aqui tentar branquear o insucesso socialista da sessão parlamentar de ontem. Mas a falta de convicção, a falta de crença e a certeza de que era

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impossível contrariar o que de errado tinha ontem perpassado para o País fez com que o Sr. Ministro estivesse muito longe do brilho de outrora. É uma pessoa de convicções e, quando não acredita, não é capaz de perpassar confiança para o exterior.
Aquilo que ele hoje evidenciou aqui foi apenas repisar as notas fundamentais do debate de ontem, ou seja, que o PSD é uma oposição diferente, que faz oposição, mas apresenta propostas construtivas e realizáveis para resolver os problemas do País, e demonstrou também que este Governo é um poço de contradições, de falta de organização em termos da sua actividade política, em que um Ministro diz uma coisa num dia e outro Ministro, com conexões com o mesmo assunto, no dia seguinte, diz outra.
O Sr. Ministro Ferro Rodrigues, quando foi ao fundo das questões, quando tentou teorizar, numa perspectiva de longo prazo, com sentido, sobre um problema importante da segurança social, como disse - e muito bem - a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, só nos fez lembrar uma coisa, é que, por detrás das boas intenções do Sr. Ministro, está o incumprimento de promessas do Partido Socialista, que pega nas suas promessas eleitorais e desenvolve-as sempre de uma forma minimalista, esquecendo a forma como iludiu a opinião pública na anterior legislatura.
Quando se fala no rendimento mínimo garantido, é preciso lembrar ao País que o PS propôs uma medida geral, universal e imediata,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... tal como tinha proposto em alterações ao Orçamento do Estado em 1994 e em 1995. É preciso recordar isto!

Aplausos do PSD.

Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, eu hoje vinha aqui falar do poder local socialista. Em 1989 e em 1993, os socialistas venceram as eleições autárquicas, e, em larga medida, a sua postura de oposição alicerçou-se no prestígio relativo que, inequivocamente, muitos desses autarcas conseguiram ao longo dos anos.
No caso específico do Norte, isso foi importante, porque os autarcas socialistas tentaram, num determinado momento, até com sucesso,...

O Sr. José Saraiva (PS): - Sempre com sucesso!

O Orador: - ... protagonizar um discurso de contrapoder da região contra o Terreiro do Paço e, no essencial, apostaram em três mensagens. A primeira era a
de que eram eles que, de facto, defendiam a região; a segunda era a de que eram eles que tinham capacidade realizadora, ao contrário de uma administração central distante; e a terceira era a de que eram eles que pensavam alto, que tinham grandes projectos - europeus e não provincianos - para o futuro da região norte.
Tiveram, como eu dizia há pouco, algum sucesso relativo. O clima era-lhe circunstancialmente favorável. Uma sociedade civil libertada pelo PSD era exigente, queria mais e, portanto, julgava que, por aquela via, podia ter mais e mais depressa.
Por outro lado, as disparidades seculares de investimento entre as várias regiões do País parecia que não eram colmatadas rapidamente. A própria exigência dos cidadãos,

agora mais libertos, exigia mais velocidade, e alguns investimentos públicos bastante mediatizados, por exemplo o projecto da EXPO 98, criaram essa sensação de que as disparidades não se estavam a ultrapassar à velocidade que a região exigia. O clima, era-lhe, pois, favorável.
Os autarcas socialistas pegaram nesta bandeira e conceptualizaram um discurso de combate político, assente num certo primarismo reivindicativo e no desenho de uma idílica realidade que, pelas suas mãos, iam concretizar até ao final do milénio.
Os resultados foram que uma opinião pública um pouco entusiasmada lhes deu ainda um sucesso relativo nas eleições autárquicas de 1993. Depois, essa opinião pública ainda terá, com base neste discurso, ajudado o PS a ganhar as eleições legislativas de 1995. Mas, meus caros amigos, não há nada pior para os cidadãos, para a opinião pública em geral, do que a confiança traída! Dá origem a uma profunda revolta, que se vai virar contra os senhores já nas próximas eleições autárquicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O' Sr. José Saraiva (PS): - Veremos!

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Socialista, vou pegar num exemplo paradigmático que ilustra a ilusão de todo o discurso socialista e a forma como a opinião pública do norte foi, transitoriamente, por algum tempo, iludida pelas vossa palavras,...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Que arrogância!

O Orador: -... que é a questão relativa ao projecto do metropolitano do Porto, que é talvez o que melhor ilustra todo o logro da gestão socialista na Área Metropolitana do Porto e que coloca em causa, de forma definitiva, as três premissas em que assentou todo o vosso discurso - que os senhores defendiam a região melhor do que ninguém, que os senhores tinham capacidade realizadora e que os senhores eram capazes de levar a cabo grandes projectos.
Este projecto - vamos fazer-lhe uma visita - foi anunciado em Fevereiro de 1990, foi prometido o concurso público para 1992 e o início das obras, já com comboios a circular, para o início de 1993. Estamos a chegar a 1997 e, mesmo com um cenário optimista, antes do ano 2000, não haverá sequer uma roda de eléctrico a circular na cidade do Porto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entretanto, a expansão do metropolitano de Lisboa está a dar-se. Vai haver um investimento de cerca de 400 milhões de contos, até ao final do século, para o metropolitano de Lisboa - e ainda bem! Nos últimos meses foi anunciada a ampliação do que estava previsto, com uma nova linha do Terreiro do Paço até à EXPO 98.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mais 70 milhões!

O Orador: - E o que é que aconteceu convosco!? Com os líderes autárquicos do norte!? Capacidade realizadora! 10 anos, no século XXI, entre o anúncio de uma obra e o seu início, numa obra com um volume de investimentos de cerca de 150 milhões de contos, é a

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demonstração cabal de que os senhores, a nível local, como a nível nacional, são só palavras e não são capazes de levar uma obra até ao fim!

Aplausos do PSD.

Quase 500 milhões de contos para o metropolitano de Lisboa. Ainda bem! Os défices estruturais na grande urbe lisboeta exigem fortes investimentos! Mas onde é que está o magistério de influência do Dr. Fernando Gomes?

O Sr. José Junqueiro (PS): - Isso chama-se dor de cotovelo, Sr. Deputado!

O Orador: - Do Sr. Narciso Miranda? Do Presidente da Câmara de Vila do Conde? Do Presidente da Câmara de Santo Tirso! Onde está o magistério de influência para fazer com que escassos milhões de contos vão para o pequeno metropolitano do Porto? Já passou um ano desde o momento em que a Dr.ª Elisa Ferreira e o Dr. Fernando Gomes fizeram uma conferência de imprensa, uma semana antes das eleições legislativas, a anunciar que, no dia seguinte às eleições, em caso de vitória do PS; seria alterado, «de fio a pavio», o Plano de Desenvolvimento Regional. É ou não verdade, Srs. Deputados Socialistas?

O Sr. José Junqueiro (PS): - É só desgraças!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas o projecto do metropolitano do Porto também aponta para três pecados mortais da acção política dos socialistas em geral e dos seus autarcas em particular: ânsia de protagonismo, pondo o protagonismo pessoal à frente do interesse da região, leviandade e pouca transparência na gestão de grandes projectos públicos e ocultação da verdadeira dimensão do que se está a desenvolver.

Aplausos do PSD.

Eu passo a explicar.
Ânsia de protagonismo. Nós dissemos, há sete anos, que, se o modelo institucional não fosse o de empresa pública e sim o de empresa intermunicipal, ia passar uma década sem haver qualquer obra, mas o Dr. Fernando Gomes queria ser o dono da obra, queria cortar a primeira fita, queria andar no primeiro comboio, antes do Ministro, mesmo que este fosse do seu Governo. Nós tínhamos razão! Se fosse uma empresa pública, a pressão dos cidadãos, da opinião pública e dos Srs. Deputados sobre o Governo exigia que houvesse mais equidade na distribuição do investimento público entre o norte e o sul. Os senhores são os culpados pela vossa ânsia de protagonismo balofo!

Aplausos do PSD.

Leviandade. Os senhores vão entrar par o Guinness Book, porque é a primeira vez, na Europa Comunitária, que há um concurso público internacional, comprometendo o bom nome do Estado português, sem haver uma letra num documento oficial a assegurar que os compromissos entretanto assumidos serão cumpridos.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - Onde está o Sr. Ministro das Finanças? Onde está o ex-Presidente do Tribunal de Contas?

Certamente que está distraído e que está envolvido nas querelas internas que estão a dilacerar o vosso Governo.

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

Ocultação da realidade. Entre a realidade que os senhores expuseram na Avenida dos Aliados, com uma estação de metro à porta de cada portuense, temos hoje a fria realidade de um metro liliputiano, que, em 63 km de trajectos previstos, 50 km são a mera modernização de duas linhas ferroviárias da CP - a linha Porto/Póvoa e a linha Maia/Trofa/Senhora da Hora. É este o vosso "mini-Metro", é o vosso "centímetro", é a tradução da vossa incapacidade!

Aplausos do PSD.

Mas, Srs. Deputados Socialistas, quem vos vai derrubar vai ser um cidadão portuense, o Sr. Ferreira, que algures, na Califórnia, aspira voltar ao Porto. E vai voltar em Janeiro de 1997, porque, em 1991, visitou a sua cidade, que já não via há muitos anos, e ficou deslumbrado com o cenário idílico do Dr. Fernando Gomes e convenceu a família a trabalhar duro mais seis anos, para vir acabar os seus dias no paraíso regional, entretanto criado pelo Dr. Fernando Gomes.
Marcou a sua passagem de Concorde para Paris. E porquê para Paris? Para estrear o TGV que, entretanto, o Dr. Fernando Gomes conseguiu para a cidade do Porto e que liga directamente Paris ao Porto.

Aplausos do PSD.

Uma vez desembarcado na cidade, depois de uma viagem rápida e confortável, saiu da estação, mas por uma passagem subterrânea para entrar de imediato no metropolitano, no tal que estava concluído em 1993, e, em cinco minutos, chegou ao seu apartamento na Foz, onde comprou um apartamento com os seus dinheiros de abastado emigrante.
Olhou para o mar, era um fim de tarde, e disse: «Que saudades que tenho do Atlântico cristalino e despoluído! Vou lá tomar banho, agora que o Dr. Gomes investiu estes anos todos na despoluição do Douro e já temos praias limpas como na linha do Estoril!» Tomou o seu banho. Voltou a casa, estava cheio de frio e queria aquecer-se. Foi tomar um banho quente rápido e barato com o gás da cidade que o Dr. Fernando Gomes anunciou para finais de 1993.

Aplausos do PSD.

Mas não ficou por aí. Quis ir visitar os seus pobres pais, que uns anos antes viviam nas barracas, que, entretanto, tinham terminado com a política de habitação social bem sucedida do Dr. Fernando Gomes. E, com os seus pais, com os seus familiares, numa cidade tranquila, guardada por polícias municipais, cada um com o seu cão,...

Risos do PSD.

... foi visitar e divertir-se à noite numa extensão da Eurodisney, que, entretanto, o magistério de influência do Dr. Fernando Gomes junto das eurometrópoles tinha feito abrir em Portugal neste final de milénio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Mas,... pobre, Sr. Ferreira...!

O Sr. José Saraiva (PS): - Do Amaral!

O Orador: - Pobres cidadãos do Porto...! Nem TGV, nem Metro, nem gás, nem despoluição do Douro, nem segurança, nem habitação social, nem nada, a profunda e mais completa mistificação que alguma vez se assistiu na política portuguesa contemporânea!

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, no Porto e em Lisboa, daqui a um ano, os senhores vão ser muito penalizados, porque, entre várias coisas, os eleitores vão perguntar: «Quem permitiu, durante mais de uma década, a terciarização dos grandes centros urbanos, criando ghettos, desertos de insegurança e marginalidade? Quem concebeu as políticas urbanísticas, que criaram os "Rios Tintos", os "Massamás", as "Louves" e "Amadoras"?»
Os eleitores vão ainda perguntar: «Quem é que nos últimos 10 anos foi incapaz de compreender os movimentos demográficos. e migratórios que, ligados ao desenvolvimento acelerado, invadiram as grandes cidades, onde ninguém teve a noção de que era necessário a anterior investir em políticas sociais que amortecessem esse choque?»
Os eleitores vão perguntar mais: «Quem colocou em terceiro plano a aposta na política ambiental, que permite ter espaços de lazer, ter rios límpidos, onde as pessoas se podem banhar, que permite ter qualidade de vida, mas que, infelizmente, muitas vezes resulta de investimentos que estão debaixo da terra e que não dão votos imediatos?»
E os eleitores vão responder: «Foi fundamentalmente a esquerda, e, no caso do Porto, a esquerda socialista, quem liderou as áreas metropolitanas e é responsável por este caos».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apesar de já ter terminado o tempo dedicado ao período de antes da ordem do dia, mesmo descontando a meia hora utilizada com a intervenção do Sr. Ministro e o debate posterior, tempo que deve ser descontado, vou ainda conceder a palavra ao Sr. Deputado Francisco de Assis, para pedir esclarecimentos, e ao Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, para responder, mas, no fim destas intervenções, dou por terminado o período de antes da ordem do dia.
Tem a palavra, Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, interpretado literalmente, teria vindo supostamente, num intervalo da sua guerrilha partidária, fazer aqui um discurso de contestação aos autarcas socialistas do norte do País.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Mas interpretá-lo literalmente era não conhecer o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, porque V. Ex.ª faz parte da categoria de homens políticos que se move
perpetuamente num teatro de sombras e que, normalmente, quando fazem uma afirmação, querem, dizer outra coisa,

quando falam para um interlocutor, querem falar com um outro, quando querem desenvolver qualquer crítica, estão a criticar outros destinatários. E também não foi verdadeiramente ao início da campanha eleitoral autárquica aquilo a que assistimos hoje aqui mas, sim, ao primeiro acto do Congresso do PSD do próximo fim-de-semana.

Aplausos do PS.

O Dr. Luís Filipe Menezes não fez outra coisa que não fosse a de tentar demonstrar, a partir desta Câmara, como é que se deve fazer oposição em Portugal neste momento. O que o Dr. Luís Filipe Menezes quis fazer foi dar uma lição prática do exercício da oposição ao Professor Marcelo
Rebelo de Sousa.

Aplausos do PS e de alguns Srs. Deputados do PSD.

Esta foi a questão, e teve mais palmas dos seus pares do que aquelas que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, se calhar, vai ter no Congresso.
O Dr. Luís Filipe Menezes veio aqui, com a tortuosidade que o caracteriza, recorrendo a uma metáfora política, de certo modo bem conseguida, fazer uma veemente crítica ao comportamento da direcção política do PSD e, em particular, do seu líder, o Dr. Marcelo Rebelo de Sousa. Veio aqui demonstrar que é num outro plano, é usando uma outra linguagem, recorrendo a outros argumentos, que se pode e deve fazer oposição em Portugal. E como, ao que consta, não vai amanhã ao Congresso, não quis deixar de instrumentalizar de alguma forma esta Câmara, de instrumentalizar as questões autárquicas, de instrumentalizar as preocupações legítimas das populações, para iniciar aqui o Congresso do PSD, a que ele próprio não vai assistir.
Mas foi tão longe o Dr. Luís Filipe Menezes nas considerações críticas que fez em relação a algumas autarquias e, em particular, à autarquia do Porto, considerando que nada de relevante foi feito, que todas as promessas, estão por cumprir, que as expectativas não foram concretizadas, que depois de tal afirmação não posso deixar de desafiar o Dr. Luís Filipe Menezes a apresentar a sua candidatura à presidência da Câmara Municipal do Porto.

Aplausos do PS.

E garanto-lhe, Sr. Luís Filipe Menezes, para que não subsistam dúvidas, que não foi o Professor Marcelo Rebelo de Sousa quem me pediu para lhe dizer isto e para o desafiar para este efeito. Assuma integralmente as responsabilidades que decorrem das considerações que acabou de fazer. Considerações que foram ditadas apenas pela necessidade de ter protagonismo no Congresso que amanhã se inicia.
Sr. Dr. Luís Filipe Menezes, não podendo eu, porque seria excesso de generosidade da minha parte, desejar-lhe um bom Congresso, desejo-lhe, ao menos, uma boa estadia em Paris.

Risos e aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco
de Assis, agradeço-lhe o facto de ter dito que eu era um mau político, mas que estava a fazer

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bem oposição, porque demonstra a contradição e o, embaraço que VV. Ex.as tiveram em encaixar esta minha intervenção.

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

Sr. Deputado, nós estamos há um ano na oposição! Há uma sensação no País de grande descontentamento e de grande desconforto em relação aos senhores. Há uma sensação de que os senhores frustraram expectativas. Passou um ano, os senhores estiveram 10 anos na oposição, mas vai ser muito difícil imitarmos VV. Ex.as. Muito difícil! Os senhores estão a fazer os possíveis e os impossíveis para que seja impossível tal comparação.
Quanto às divisões internas no meu partido, Sr. Deputado, lembro-me dos conflitos entre o Sr. Dr. Sampaio e o Engenheiro António Guterres. Hoje, um é Presidente da República e o outro é Primeiro-Ministro. Lembro-me das cenas que fizeram na televisão.
A vida democrática dos partidos abertos, dos partidos onde há liberdade de expressão, onde se confrontam ideias, é isto mesmo. Às vezes, passamos dos limites, mas nós passamos muito menos dos limites do que os senhores.
O senhor lembra-se de quando o Sr. Ministro Jaime Gama dizia que o vosso secretário-geral era só movimento, só frenesim e que era totalmente inconsequente?! E, hoje, lá está ele, de uma forma garbosa, solidário com o Sr. Primeiro-Ministro. É normal isto em democracia, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD.

E o senhor sabe que é normal.
Mas, Sr. Deputado, quanto às críticas objectivas que fiz, o senhor respondeu zero. Onde é que está o gás prometido, o TGV, as passagens desniveladas...? Mas não sou eu que digo isto, vou ler-lhe aqui um bocadinho do, insuspeito, jornal Público: «(...) de entre os projectos que nesta altura se afiguram de difícil concretização até ao final do mandato, contam-se, entre outros, por exemplo, a conclusão da segunda fase do parque da cidade, a estação de tratamento de águas residuais, a erradicação das barracas, a construção de uma variante à marginal, a abertura de quatro túneis rodoviários, o reordenamento da marginal entre a ribeira e a foz e o desnivelamento da rotunda da Boavista, o metropolitano de superfície, a construção de uma central de tratamento das águas superficiais do Douro, a reanimação da baixa, a reformulação do teatro Rivoli, os complexos de ténis do monte Aventino, a construção de duas novas piscinas e a iniciação do complexo da Constituição, a formação de uma empresa para gerir os equipamentos desportivos...»

Vozes do PSD: - Chega! Chega!

O Orador: - Sr. Deputado, ainda bem que hoje se consegue pôr a lista Páginas Amarelas numa pequena disquete, porque também só numa pequena disquete é que caberão as promessas que VV. Ex.as não cumpriram.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está terminado 0 período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 82 a 96 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 12, 19, 20, 21, 25, 26, 27 e 28 de Junho e 2, 3, 4, 5, 10, 11 e 12 de Julho p. p.
Vamos votar.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta dos projectos de lei n.0s 208/VII - Criação de vagas adicionais no ensino superior, reposição de justiça no acesso ao ensino superior (PSD), 209/VII - Cria vagas adicionais para os estudante que realizaram a 2.ª fase dos exames nacionais (CDS-PP) e 215/VII - Criação de vagas adicionais no acesso ao ensino superior (PCP).
Para apresentar o projecto de lei do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela primeira vez, em muitos anos, cerca de 140 000 alunos realizaram exames nacionais no final do ensino secundário em Portugal. Estes exames, porém, não servem apenas para a certificação da obtenção de conhecimentos a que corresponde o diploma do 12.º. Com efeito, as notas destes exames são determinantes para o acesso ao ensino superior.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, a boa execução do programa de exames nacionais é determinante e fundamental para um momento relevante da vida de milhares de estudantes portugueses.
Quando se verificam problemas, irregularidades, erros ou negligência na condução do processo de exames nacionais não está em causa apenas o prestígio do sistema educativo ou a competência do Ministério da Educação. Estão em causa, sobretudo, as consequências que isso pode acarretar para a transparência dum processo que se quer justo e sério e as consequências para o futuro dos candidatos que fazem as suas provas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A primeira fase de realização dos exames nacionais foi pródiga em problemas que puseram em causa a imagem pública de rigor, justiça e eficácia, aumentando os factores de nervosismo e insegurança que prejudicaram e angustiaram milhares de estudantes portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De resto, foram identificados esses erros na deliberação n.º 18-CP/96, que a Comissão Permanente da Assembleia da República aprovou, por unanimidade, a 18 de Julho. Erros de concepção, porquanto provas cheias de imprecisões, que não apenas de grafismo, alguns dos quais detectados depois da sua impressão e que geraram as conhecidas «erratas», e outros com erros durante as provas que só a denúncia pública permitiu vir a conhecer.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Erros também de execução, quando se pôs em causa o princípio da simultaneidade, com provas nacionais realizadas em horas diferentes consoante as escolas, e quando se feriu o princípio da igualdade, havendo alunos que tiveram acesso a «erratas» e outros que, nas mesmas provas mas noutros locais, não chegaram sequer a saber da existência destas, e também porque a uns foi consentido um período de tolerância para, a realização das provas e a outros não.
Por fim, distorções. Distorções na avaliação que tiveram a sua expressão mais discutível na bonificação de dois valores decidida pelo Governo, o que permitiu que, pela primeira vez, se assistisse ao espectáculo, nas escolas portuguesas, da afixação de resultados de avaliações que «rebentaram» a escala: notas de 21 e 22 numa escala de 0 a 20 valores!

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Foi por tudo isto que a Comissão Permanente da Assembleia da República, reunida em 18 de Julho, deliberou, por unanimidade - sublinhe-se, com a concordância de todos os partidos políticos com assento na Assembleia da República -, recomendar ao Governo, entre outras disposições, o seguinte: permitir a todos os estudantes, que o desejem, e para efeitos de melhoria de nota, uma última oportunidade, por forma a minorar as consequências dos erros verificados, e adaptar em conformidade o calendário do concurso de ingresso no ensino superior.
Lamentavelmente, o Governo não deu cumprimento integral à recomendação parlamentar.
Assim, em vários cursos e estabelecimentos de ensino, os estudantes que fizeram a melhoria de nota em Setembro, confiantes na deliberação da Assembleia da República, e que obtiveram classificações mais elevadas do que aquelas que permitiram a entrada no ensino superior na 1.º fase da candidatura não têm a oportunidade de ingressar no curso a que se candidatavam, porque as vagas foram preenchidas na 1.ª fase.

O Sr. António Braga (PS): - É óbvio!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Parecem não ser muito importantes para o Ministério da Educação os alunos que realizaram a 2a época de exames, pois terão sido, ao que se sabe, só 15% do total de alunos envolvidos nos exames, como afirmou o Sr. Ministro da Educação em reunião da Comissão Permanente da Assembleia da República.
Para nós, PSD, muito particularmente para os Deputados em representação da Juventude Social Democrata, não é importante se são 15, 20, 30, 40 ou 50%; o que está em causa é uma questão de justiça e de igualdade.
Muitos foram os estudantes que tentaram a melhoria de nota convencidos de que, após a deliberação que esta Assembleia aprovou, recorde-se por unanimidade, essa melhoria não deixaria de ter relevância para efeitos de ingresso no ensino superior.
Lamentavelmente o Governo não deu cumprimento integral à recomendação parlamentar, o que pode, repito, ter como consequência que estudantes que fizeram a melhoria de nota em Setembro e obtiveram classificações mais elevadas do que aquelas que permitiriam a entrada no ensino superior na 1.ª fase de candidatura não tenham oportunidade de ingressar no curso a que se candidatavam por as vagas terem sido preenchidas na 1.ª fase.

Sr. Presidente, Sr.- e Srs. Deputados: Perante o exposto, a Comissão Permanente da Assembleia da República aprovou nova deliberação, recomendando, uma vez mais, ao Governo que aplicasse o disposto no artigo 41.º da Portaria n.º 241/96, de 4 de Julho, para salvaguardar a entrada no ensino superior desses estudantes com maiores classificações, cumprindo a recomendação parlamentar e fazendo justiça.
Inexplicavelmente, uma vez mais o Governo recusou cumprir a recomendação parlamentar, tendo-se assistido ao insólito de um membro do Governo, em ar de desafio, convidar a Assembleia da República a transformar essa deliberação em lei. Pois bem.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A salvaguarda dos interesses dos estudantes prejudicados neste processo foi e continua a ser, para o PSD e para os Deputados da Juventude Social Democrata, a única preocupação. Por isso, e por eles, apresentamos este projecto de lei. É uma questão de igualdade de oportunidades no acesso ao ensino superior, é uma questão de elementar justiça.
O Sr. Ministro da Educação não quis acatar as recomendações aprovadas na Assembleia da República. Está no seu direito perante a lei, embora politicamente tenha de assumir a responsabilidade pela sua intransigência. Mas agora, se a Assembleia da República aprovar a lei que propomos, desta questão, o Sr. Ministro da Educação não terá outro caminho que não o de resolver a injustiça provocada pelo desastre da 1.ª fase de exames nacionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os alunos que realizaram exame para melhoria de nota em Setembro, devem poder, se o seu esforço corresponder a uma nota de candidatura superior em cada par curso/estabelecimento ao último colocado para o mesmo par curso/estabelecimentos na l.ª fase, devem poder, repito, ingressar no ensino superior, ainda que, para o efeito, seja necessário criar vagas adicionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma solução de elementar justiça, que ao contrário do que o PS e o Governo quiseram fazer crer, em nada prejudica aqueles que ingressaram já no ensino superior ou possam ainda vir a fazê-lo.

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Por fim, não poderia deixar de aqui, desta tribuna, congratular-me pelo facto de, quer o CDS-PP, quer o PCP, terem apresentado iniciativas legislativas com o mesmo objectivo do nosso projecto de lei, dando assim, certamente, a esperança a muitos jovens portugueses de verem esta injustiça, decorrente do que parece ser a teimosia do Ministério da Educação e do Partido Socialista, finalmente reparada.
Uma última palavra para o Partido Socialista: Não nos surpreende a posição do Partido Socialista, mas se a nós não nos surpreende essa falta de vontade e disponibilidade para resolver uma injustiça que afecta milhares de jovens, aos estudantes, convém dizer, é que começam já a não surpreender as posições do PS.
Esperamos nós, e esperam os estudantes, que o desastre dos exames nacionais de acesso ao ensino superior e a intransigência e teimosia do Ministério da Educação e do

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Partido Socialista tenham sido só um «arrufo de namorados» e não o começo do fim de uma paixão anunciada pelo Primeiro-Ministro há um ano atrás.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Afonso Candal e Bernardino Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Vieira, tenho a impressão que escolheu uma má altura para «entrar» nestas questões da educação, principalmente porque o faz numa situação justa e não o fez em situações do passado francamente injustas. Passo a explicar.
Quanto à questão dos erros detectados nas provas, devo dizer que, nesse domínio, até se registou uma melhoria, porque no passado houve muito mais erros e, pela primeira vez, todos os casos foram analisados ao pormenor e levados até às últimas consequências, o que nem sempre aconteceu. Podemos até considerar que isso faz parte, um pouco, da herança que o próprio PSD nos deixou,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... mas que temos vindo a corrigir. Certamente, no futuro, será francamente melhor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sobre a questão da nota de entrada no ensino superior, já há uns tempos atrás, nesta Câmara, afirmou-se que era incompreensível ou inadmissível que existissem candidatos com uma nota de entrada superior a 20 valores. Devo dizer-lhe que já no passado isso aconteceu várias vezes - ao seu lado tem alguns colegas de bancada que o podem esclarecer sobre notas de candidatura ao ensino superior acima de 20 valores! E já aconteceu, nomeadamente, nos primeiros anos da PGA, com as bonificações nas ordenações da opção dos cursos a que se candidatavam..

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não tem nada a ver, são coisas diferentes!

O Orador: - Já nessa altura, repito, havia notas de entrada superiores a 20 valores. É bom que isto fique esclarecido, porque não se trata, propriamente, de uma novidade!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Sérgio Vieira - que, como já disse, entrou nestas matérias com o pé esquerdo - onde é que estava quando se discutiu a questão da PGA. Quais foram as posições que tomou nessa altura?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Pensei que o PS elogiasse!

O Orador: - O PS elogia mais a «mão»!

Risos.

E onde é que estava o Sr. Deputado Sérgio Vieira quando houve a grande polémica das propinas, em que a JSD elencou, inclusive, algumas propostas de alteração à lei e que, mais tarde, não foram aqui defendidas pelos Srs. Deputados? Qual foi a posição que tomou nessa altura? Digo isto, porque todas essas situações estão a ser corrigidas, e eram situações de alguma injustiça.
Agora, está em causa uma situação justa: cometeram-se erros que foram corrigidos, por isso foi feita uma 2.ª chamada dentro da 1.ª fase, que decorreu sem irregularidades, sem qualquer problema, com acesso livre de todos os candidatos. Já a 2.ª fase tinha como objectivo cumprir o papel que sempre teve: o preenchimento das vagas que tinham ficado por preencher. Era exactamente o que se passava no passado, portanto também não há novidade quanto a esta situação.
Já a criação de vagas suplementares para quem foi à 2.ª fase é uma situação de grave injustiça face àqueles que, tendo sido colocados na 1.ª fase, segundo as regras de jogo já estabelecidas, entraram em cursos que não correspondem à sua primeira opção, mas à 2.ª ou 3.ª escolha, mas foram colocados! Ou seja, aproveitaram a 1.ª fase, normalmente, e foram colocados. Porquê estar agora também a prejudicar todos esses alunos para criar vagas para os da 2.ª fase, quando as regras se mantêm? A 2.ª fase tem um objectivo bem claro e definido, e esse objectivo mantém-se.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sérgio Vieira, havendo mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Se me permite, Sr. Presidente, respondo já.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, respondo-lhe, em primeiro lugar, à questão de sermos bem-vindos a este debate. Ainda bem que está aqui a Juventude Socialista, Sr. Deputado Afonso Candal,...

O Sr. Afonso Candal (PS): - Está sempre, é omnipresente!

O Orador: - ..., porque este é um problema importante para a juventude portuguesa. Mas existem outros, como é o caso do desemprego; por exemplo, tema ontem debatido na Assembleia da República e no qual a JSD esteve presente, interveio e participou. Mas, para os senhores, os 120 000 jovens desempregados que existem em Portugal não devem ser muito importantes...

Aplausos do PSD.

O Sr. Afonso Candal (PS): - E de quem é a responsabilidade desses desempregados?!

O Orador: -.Sr. Deputado Afonso Candal, percebo que o Partido Socialista continue a fazer o discurso da pesada herança do passado, mas a Juventude Socialista, uma organização política de juventude que deveria estar com os olhos postos no futuro, continuar a falar na pesada herança!

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Penso que não é esse o caminho que as organizações políticas de juventude devem seguir.
Sr. Deputado Afonso Candal, gostava de terminar, dizendo-lhe o seguinte: V. Ex.ª falou da PGA e de outras situações mas, para mim, a única razão pela qual a Juventude Socialista não está connosco, a defender esta posição, é porque não há manifestações na rua nem nas escolas!

Vozes do PS: - É bom sinal!

O Orador: - Se houvesse, com certeza estariam!

O Sr. Afonso Candal (PS): - Nas questões injustas há manifestações, nestas não há!

O Orador: - Nós, Sr. Deputado, temos uma forma diferente de estar na política. Para nós, o importante são as questões de justiça e de igualdade que aqui foram colocadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E digo-lhe mais, Sr. Deputado: V. Ex.ª falou de política educativa, por isso quando quiser, onde quiser e como quiser podemos discutir a política educativa. Os senhores têm as vossas propostas e nós as nossas. Mas hoje, Sr. Deputado, estamos aqui para resolver um problema...

O Sr. Afonso Candal (PS): - Criar um problema!

O Orador: - ... e é uma pena que a Juventude Socialista não esteja disposta a dar uma ajuda para corrigir uma injustiça que prejudica milhares de jovens estudantes.
Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Vieira, devo dizer-lhe, até face às intervenções que já aqui tiveram lugar, que o PCP se encontra numa posição bastante confortável nesta matéria. De alguma maneira, até reconheço alguma verdade às afirmações do Sr. Deputado Afonso Candal, designadamente quando pergunta onde estava a JSD na luta das propinas ou da PGA. Mas o problema é que, também em tantas outras situações, não encontrámos nem a JS nem o Partido Socialista.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Está enganado!

O Orador: - Primeiro eram contra as propinas, mas agora já não são...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - São os ziguezagues socialistas!

O Orador: - Enfim, mas essas são outras matérias que já discutimos antes e que teremos oportunidade de o fazer mais tarde.
Esta posição confortável do PCP e da JCP é a de quem sempre defendeu coerentemente o que hoje está aqui a defender, mais uma vez.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se calhar, o que o PSD vem dizer hoje em relação às suas intenções e à sua política de numerus clausus é também uma «errata». Congratulamo-nos e esperamos que isso signifique, de facto, uma viragem nesta matéria, que aplaudimos e com a qual, com certeza, trabalharemos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não quero duvidar da bondade das intenções do projecto de lei do Partido Social-Democrata, embora considere que existem algumas lacunas. Dê qualquer forma, creio que o projecto de lei do PCP preenche essas lacunas e dá uma resposta mais cabal e completa ao problema que hoje está em discussão. Isso não deve, contudo, evitar que o discutamos e que apresentemos as ideias que temos em relação a ele.
Para nós, toda esta questão é muito clara: enquanto houver numerus clausus como sistema de restrição global no acesso ao ensino superior público, não teremos, com certeza, um sistema de acesso justo. Mas é muito menos justo o sistema de acesso que tivemos este ano.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Digo isto, porque não é justo que se alterem e se introduzam os exames nacionais, descurando completamente aquilo que seria fundamental, ou seja, ouvir as escolas e os alunos. A verdade é que, nas diversas iniciativas e no contacto com os eleitores, a que damos tanta atenção, constatou-se que nas escolas havia uma confusão enorme acerca destas matérias, desconhecia-se como iriam ser aplicadas, o que, aliado aos erros, às imprecisões e às dificuldades na aplicação do sistema de exames, deu o resultado que deu! E hoje todos estamos aqui a tentar contribuir - julgo para a sua resolução.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não queria terminar sem dizer que toda esta política de imposição de exames nacionais, aliás na senda de outros exames que já anteriormente foram introduzidos no sistema de avaliação, não tem senão um objectivo: o de limitar, à partida, o acesso ao ensino superior e, quiçá, de tentar limitar administrativamente os numerus clausus, isto é, criar filtros no ensino secundário e no sistema de avaliação que permitam, como já vimos este ano, que, galhardamente, o Ministério da Educação venha dizer que agora houve menos gente a ficar de fora do que no ano passado, quando o que sabemos é que muitos nem sequer chegaram a terminar o 12 º ano.
Portanto, também devemos considerá-los nesta contabilidade, concluindo que se mantém uma situação de grave injustiça que precisa de ser resolvida, que é uma injustiça concreta no caso que estamos aqui a abordar e uma injustiça muito mais geral e preocupante que se traduz no facto de continuar a existir numerus clausus e de continuar a ser negado aos jovens portugueses o acesso à universidade e ao ensino superior.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

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O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, esteja descansado, porque se este projecto de lei é uma errata do PSD, essa errata será distribuída a todos os Srs. Deputados e não apenas a alguns, como aconteceu nos exames nacionais da 1.ª fase.

Risos do PSD e do PCP.

Sr. Deputado Bernardino Soares, V. Ex.ª defendeu aqui opções de política educativa que são perfilhadas pela organização política de juventude a que V. Ex.ª pertence, mas a organização política de juventude a que V. Ex.ª pertence tem posições completamente diferentes das que defende a JSD em relação ao ensino superior.
No entanto, como já tive oportunidade de dizer ao Sr. Deputado Afonso Candal, não vimos aqui discutir a política educativa em Portugal, vimos resolver um problema que decorre da injustiça provocada pelo desastre na l.ª fase dos exames nacionais. E deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Bernardino Soares, aliás, já o disse na tribuna, mas volto a repetir, que me congratulo com o facto de o PCP e a JCP também terem contribuído para a solução desse problema, que foi criado, única e exclusivamente, pela teimosia e intransigência do Partido Socialista e do Ministério da Educação. Deste modo, poderemos sair daqui hoje com o problema resolvido.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei de que é autor, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar por situar devidamente o debate que estamos a ter. Quer-me parecer que as iniciativas legislativas cuja apresentação decorre neste momento resultam de um problema concreto criado aos estudantes que pretenderam aceder ao ensino superior, com o desastroso fracasso da 1.ª época de exames, com todo o desfile de erros, omissões e bizarrias, que são da opinião pública conhecidos, e que geraram, mais uma vez, uma grande onda de insatisfação no seio dos jovens portugueses, em face da política educativa do Ministério da Educação relativamente ao acesso ao ensino superior.
Não vale a pena repetir o que se passou, e que foi suficientemente grave para o Governo, pela voz autorizada do Sr. Ministro da Educação, mandar instaurar processos disciplinares para apurar responsabilidades. Esta é a prova de que, na verdade, até para o Governo do PS algo de grave se passou e, por isso, não vale a pena perdermos tempo a relembrar os factos que já hoje são conhecidos de todo o País.
Assim, quer-nos parecer que o objectivo deste debate é o de resolver um problema concreto e evitar que daí advenham mais injustiças e mais penalizações para os jovens que, sem culpa nenhuma, se viram envolvidos num processo caricato de acesso ao ensino superior.
Valerá, talvez, mais a pena relembrar, e pelo Partido Popular falo, por que temos hoje aqui em discussão um projecto de lei sobre esta matéria.
Recordo que, depois das ocorrências da l.ª época de exames, a Assembleia da República, de boa fé, com elevação, na sua Comissão Permanente e na presença do Governo, tentou dar dois contributos para resolver ou atenuar os efeitos negativos daquilo que havia acontecido, no sentido de resolver os problemas então criados.

Com a presença do Governo, repito, com o contributo de todos os grupos parlamentares, a Assembleia da República, em sede de Comissão Permanente, aprovou uma primeira recomendação para tentar emendar as situações possíveis, depois da primeira época de exames, e fê-lo por unanimidade.
Mais tarde, noutra reunião da Comissão Permanente, a Assembleia da República aprovou outra recomendação que, no fundo, tirava a consequência da primeira, que era a de recomendar ao Governo que, em função daquilo que havia sido aprovado na primeira recomendação, criasse, ao abrigo da legislação em vigor, as vagas adicionais que se viessem a revelar necessárias para dar cumprimento à primeira recomendação. Aí, inopinadamente, assistimos a dois factos: em primeiro lugar, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista recomenda, ele próprio, imediatamente, ao Governo que não acate a recomendação aprovada na Comissão Permanente; o segundo facto e o mais importante de todos foi que o Governo, pela voz autorizada do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, sugeriu à Comissão Permanente da Assembleia da República uma iniciativa legislativa no sentido de concretizar a recomendação que; na altura, a Comissão Permanente aprovou por maioria.

O Sr. António Braga. (PS): - Apareceram três!

O Orador: - É óbvio que não nos passa pela cabeça que o Governo tenha feito esta sugestão de má fé, com o raciocínio viciado, acreditamos que o Governo fez a sugestão de boa fé.
Precisamente para corresponder ao apelo do Governo, o Grupo Parlamentar do Partido Popular apresentou este projecto de lei. Qual não foi o nosso espanto quando, esta semana, recebemos um parecer jurídico do mesmo Governo, onde se refere que a sugestão que o Governo deu à Comissão Permanente da Assembleia da República é ilegal, inconstitucional, disparatada, contraditória, inútil, enfim, um disparate.

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Nada disto faz sentido, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Andamos, novamente, a brincar com coisas sérias!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que de três uma: ou o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares decidiu brincar com a Comissão Permanente, quando fez a sugestão que fez, e que, aliás, foi correspondida por três grupos parlamentares,...

O Sr. Castro Almeida (PSD): - O que seria lamentável!

O Orador: - ... o que séria inaceitável, ou os serviços jurídicos do Governo estão mal aconselhados ou escolhidos, ou o Sr. Secretário de Estado está enganado, do ponto de vista técnico, quanto à sugestão que deu.
Bom!:.. Nenhuma destas hipóteses é crível, porque, sinceramente, não nos parece que qualquer delas se possa verificar. Por isso, penso que hoje não há outra saída se não a seguinte: reconhecer que a Comissão Permanente da Assembleia andou bem quando aprovou uma recomen-

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dação por unanimidade no sentido de reparar os danos do desastre pedagógico dos exames na 1.ª época; reconhecer que a Assembleia da República andou bem quando, noutra recomendação retirou a consequência da primeira - infelizmente, já sem a companhia do Grupo Parlamentar do PS, que, não se sabe porquê, no ínterim mudou de opinião - e recomendou ao Governo que, ao abrigo da legislação vigente, alguma dela produzida por ele próprio, criasse, se tal se viesse a revelar necessário, as vagas adicionais para que fosse possível os estudantes voltarem a ter uma oportunidade de aceder ao ensino superior.
E a Assembleia da República andou bem, infelizmente, repito, sem a companhia do Grupo Parlamentar do PS.
Mas, sendo tudo isto ainda insuficiente para convencer os restantes membros do Governo - que não o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, pois parece que sempre concordou com isto - de que tal é necessário, então, parece não haver outra alternativa se não a de a Assembleia da República, de facto, aprovar uma lei que estabeleça isso mesmo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quer-nos parecer que andamos, mais uma vez, repito, a brincar com coisas sérias!
Por isso, e uma vez que, em substância, os três projectos de lei que estamos a discutir são semelhantes e, naturalmente, em vários pormenores, todos são aperfeiçoáveis, faço um apelo ao Partido Socialista, no sentido de que se diferencie do Governo - já que, no discurso, tantas vezes reivindica que a nova maioria não é como a velha e tem autonomia face ao Governo -, não alinhando com ele na transformação da paixão pela educação na frustração de uma geração inteira, e não dê ouvidos àqueles que dizem que não faz sentido dar uma oportunidade aos jovens de voltarem a fazer exames sem os erros, as omissões e os disparates da 1.ª época, impedindo ab inibo que eles acedam ao ensino superior se obtiverem as classificações necessárias para o efeito, tal como foi permitido aos da 1.ª época.
Nessa exacta medida, apelo ao Partido Socialista para que viabilize, aprovando, os três projectos de lei que estão em discussão e, na especialidade, os aperfeiçoe, connosco, para que tenhamos uma lei útil e necessária. Com certeza, a juventude portuguesa perceberá que é um serviço que a Assembleia da República prestará ao seu futuro, ao futuro dos jovens que anda sempre na boca dos políticos em campanhas eleitorais mas que, depois, às vezes, quando chegam aqui, parece que desaparece, como por encanto.
Não direi mais nada porque quero acreditar, para já, que o Grupo Parlamentar do PS não será insensível a estas realidades e a estes argumentos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - A mim, parece-me que é!

O Orador: - Penso que, em política, só não muda de opinião quem é burro! Se, de facto, houver argumentos que nos levem a mudar de opinião, por que não?!... Não é crime nenhum!
Julgo que o Grupo Parlamentar do PS está em tempo de reconhecer que o Governo esteve mal na 1.ª época de exames e de o ajudar a não estar mal na 2.ª época. É apenas isto que estamos aqui a fazer, de boa fé, por sugestão do Governo!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isto é muito embaraçoso!

O Orador: - Foi o Governo que nos sugeriu esta iniciativa legislativa, compreendo que o Grupo Parlamentar do PS não a tenha apresentado, porque podia dar a impressão de que estava a receber ordens do Governo. Pessoalmente, não pensaria assim, mas admito que a PS tenha tido o receio de que se apresentasse também uma iniciativa legislativa desse a entender o seguinte: «O Secretário de Estado falou e eles foram logo atrás fazer um projecto de lei!...». Isso não cairia bem, o grupo parlamentar é autónomo, não tem necessariamente de aceder a todas as sugestões do Governo.

Risos do PSD.

Compreendo essa posição, mas já não compreenderei que inviabilizem a substância da sugestão do Governo.
Os Grupos Parlamentares do PP, do PSD e do PCP, cada um à sua maneira, estão aqui, em conjunto, mais uma vez, de boa fé, sem ser numa perspectiva de ajuste de contas interpartidário quanto ao peso das culpas do que está a suceder no sistema educativo neste momento - não é disso que estamos aqui a tratar, haverá outros momentos, outras sedes, outros debates para esse efeito -, a tentar encontrar uma solução concreta que pode afectar milhares de jovens, e não digo que vai afectar, digo que pode afectar.
É este o apelo que aqui deixo ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, a sua sugestão sobre a afirmação da nossa autonomia é sempre bem-vinda,...

Risos do Sr. Deputado do PSD Carlos Coelho.

... simplesmente quem não é autónomo é o seu grupo parlamentar, porque acabou de conferir e confirmar aqui, connosco, que seguiu uma sugestão do Governo. Pelos vistos, quem segue o Governo é o seu grupo parlamentar e não o nosso!

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Ora bem! Quando o Governo está correcto!...

O Orador: - Mas sobre a substância da matéria, deixe-me dizer-lhe o seguinte: o Sr. Deputado fala, e já falámos aqui, várias vezes, na situação de injustiça que, eventualmente, terá sido criada com a l.º época de exames. Ó Sr. Deputado, temos de falar nisto com um mínimo de rigor e seriedade e, como o Sr. Deputado é rigoroso e sério, vai ouvir-nos.
A questão é a seguinte: o Sr. Deputado sabe tão bem como nós que os exames de 1.ª época, na 1.ª chamada, tiveram erros em quatro disciplinas. Todos sabemos disso e nós próprios condenamos com veemência a existência desses erros, pois é totalmente inaceitável que provas de exame os tenham. Isso é claro para todos, para nós, para o Governo, inclusive - mas não tenho de falar aqui em nome dele -, e para a sua bancada. Simplesmente, por reconhecermos isso, na 2.ª chamada foi permitido que todos os alunos, livremente, tivessem oportunidade de fazer um segundo exame, esse, já sem erros e sem gralhas.

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Portanto, se se poderia dizer que havia aqui uma injustiça decorrente das gralhas e dos erros dos exames, ela foi remediada e corrigida com a possibilidade de uma 2.ª chamada na 1.ª época. Estes alunos, que fizeram exame, quer na 1.ª chamada, quer na 2.ª chamada, estiveram todos nas mesmas condições de candidatura na 1.ª fase de ingresso no ensino superior.
Portanto, sendo a vossa argumentação e fundamento de que se teriam criado injustiças por causa disto, o que é verdade é que esta segunda oportunidade criou as condições de anulação dessa eventual injustiça. O que agora não podemos aceitar é que, numa 2.ª fase de candidatura ao ensino superior, que sempre existiu, que está consolidada no sistema de acesso ao ensino superior, é uma 2.ª fase de candidatura justamente para as vagas que venham a sobrar e não uma candidatura em primeira instância, idêntica àquela que fazem os alunos na 1.ª e 2.ª chamadas da 1.ª época, que Ficam, esses sim, concluído o 12.º ano, em condições de se candidatarem.
Este sistema está estabilizado, sempre existiu assim. Agora, o que iriam permitir ao quererem criar vagas adicionais na 2.ª fase, resultando da melhoria de nota feita em Setembro, os senhores criam, isso sim, agora, novas injustiças, porque os alunos que se candidataram na 1.ª fase consolidaram opções que podem não ser, e decerto não são, para todos, porque apenas 48,3% dos alunos é que consegue candidatura de primeira escolha, os restantes alunos não têm candidatura de primeira escolha, não ingressam no primeiro curso que escolheram. Ora, estes últimos ficarão em desigualdade de circunstâncias com aqueles que, tendo tido oportunidade de melhorar a nota em Setembro, vão escolher a primeira opção que indicaram, porque os senhores querem vagas adicionais.
Os senhores criam, assim, uma injustiça relativa muitíssimo grave e muitíssimo mais importante do que aquela que foi corrigida no primeiro momento.
Esta é questão que lhe apresento para reflexão.
O Sr. Deputado concorda que, depois de estarem as regras estabilizadas, de terem sido corrigidos os erros e as gralhas da 1.ª época, se venha agora a fazer, desta maneira, uma alteração substancial às regras consolidadas de ingresso no ensino superior?
Sei que a pergunta parece redundante, mas depois de lhe ter dito isto, que é rigorosamente o que se passou, como todos sabemos, pode ser que o Sr. Deputado, sensível, como é, também perceba a autonomia devida ao Governo e mude de posição.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, é sempre com atenção que o oiço, embora nem sempre, como hoje é o caso, tenha argumentos para me convencer a mudar de opinião.
De facto, tudo aquilo que o Sr. Deputado disse não encaixa, nem naquilo que o Governo tem feito, nem na legislação que o Governo tem produzido, nem na argumentação utilizada aquando do debate da primeira Recomendação que os senhores votaram. Portanto, não compreendo o que é que mudou de uma fase para a outra. Não compreendo!
É verdade, como o Sr. Deputado disse, que tem havido muitas injustiças no acesso ao ensino superior, todos os anos mudam as regras, as regras mudam a meio do campeonato... Tudo isso é verdade! Também é verdade que

temos de reformar o quadro geral de acesso ao ensino superior. Tudo isso é verdade! Mas também é verdade que não é esse debate que estamos aqui a fazer. Estamos apenas a limitar uma tentativa de preservar a igualdade entre todos os jovens que se candidatam ao ensino superior...

O Sr. Fernando Sousa (PS): - Isso é demagogia!

O Orador: - ..., sendo que uma parte deles foi vítima de um erro - um erro não, vários erros, várias omissões e várias bizarrias - que é da responsabilidade do poder político, do Ministério da Educação.
É disso que estamos a tratar.
Tenho ouvido os Srs. Deputados do PS dizer: «pode não haver nenhum caso!» O que ouvi dizer no outro debate, aqui, aquando da discussão da Recomendação, foi: «não vale a pena, pode não haver nenhum caso!» Também não é disso que estamos a tratar. Estamos aqui a tentar legislar, de modo justo, abstracto, geral e universal, para - e é isso que importa - salvaguardar a igualdade potencial de todos os estudantes que queiram entrar no ensino superior. É este o nosso objectivo.
Compreendo que os senhores estejam preocupados, porque isto pode causar um descarrilamento na despesa do Ministério. Compreendo que alguém do Governo vos tenha dito: «Atenção, isto é tudo muito bonito, mas isso, se calhar, vai custar uns dinheiros».

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Os senhores não sabem o que isso vai custar!...

O Orador: - De resto, não se compreende que seja outra a razão pela qual os senhores tentaram arguir aquela questão orçamental da lei travão que, como sabem, no caso do nosso projecto de lei, não colhe. Mas não vejo outra razão.
No entanto, isto denuncia que, de facto, os senhores são capazes de estar convencidos de que há mais casos do que aquilo que estão a dizer, porque senão não havia temor quanto à despesa, o que me leva a concluir que continua a fazer sentido que, através de uma lei geral e abstracta, se previnam todos os casos que vierem a acontecer. Acredite, Sr. Deputado, que eu ficarei muito satisfeito se não acontecer nenhum caso, mas também ficarei muito satisfeito se conseguirmos prevenir que, se acontecer algum, ele seja tratado exactamente nas mesmas condições em que foram os anteriores.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 215/VII, da iniciativa do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O projecto de lei sobre a criação de vagas adicionais no acesso ao ensino superior, apresentado pelo meu grupo parlamentar e que ora sobe ao Plenário, é um projecto de lei necessário, justo, oportuno e equilibrado.
Sem desaguarmos em maximalismos facilitistas, o que, afinal, pretendemos com este projecto é tão-só evitar ou minorar algumas das consequências mais gravosas para os alunos e para as famílias no âmbito do processo de exames nacionais do 12.º ano e do acesso ao ensino superior. Nem mais, nem menos!
Só o Ministério da Educação e o Governo, primeiro sozinhos, mais tarde acompanhados pelo Grupo

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Parlamentar do Partido Socialista, parecem não entender o óbvio, isto é, que o processo decorreu de modo verdadeiramente atribulado - e isto para usar a palavra mais suave, e dispenso-me de vos maçar com a enumeração das peripécias diárias que o caracterizaram... sendo, deste modo, é indispensável reparar as injustiças daí resultantes, tomando para tal as medidas necessárias, e que estas medidas não podem, demagogicamente, esgotar-se no apuramento de eventuais responsabilidades, através da sempre fácil instauração de processos disciplinares a um conjunto de docentes, como se, antes e atrás deles, não existisse, e não pretendesse ocultar-se, uma responsabilidade primeira, e maior, a responsabilidade política do Ministério da Educação e do Governo!
Pretender reduzir a uma mera questão técnica e a simples resultados estatísticos aquela que foi a permanente instabilidade qualitativa em que todo o processo de exames decorreu, como se momento tão fulcral para o futuro dos nossos jovens e das suas famílias pudesse ser traduzido apenas em números e em percentagens, demonstra claramente a insensibilidade do Governo e do Ministério e a sua incapacidade de assunção de responsabilidades próprias.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sabem VV. Ex.as o que há de mais «desconfortável» (passe a palavra) em toda esta situação? O que há de mais «desconfortável» é que o Governo poderia ter evitado tudo isto. O Governo teve a oportunidade de emendar a mão e não agarrou essa oportunidade!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Melhor dizendo, essas oportunidades. Na verdade, não apenas por uma mas por duas vezes, a primeira das quais até por unanimidade, a Comissão Permanente da Assembleia da República aprovou recomendações, às quais o Governo se mostrou completamente surdo.
Em termos político-institucionais, era perfeitamente razoável pensarmos que o Governo deveria, então, ter mostrado alguma sensibilidade e, até por se encontrar perante meras recomendações, também o respeito devido à instituição parlamentar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o Governo assumiu desde logo uma posição claramente arrogante, teimosa e intolerante quando afirmou não se sentir vinculado às recomendações da Comissão Permanente e não ter, por isso, a menor intenção de as levar à prática. Estranho conceito das normas que devem presidir às boas relações institucionais, num Governo que tanto afirma prezá-las e defendê-las!
Estamos, assim, perante uma forma muito particular de entender a democracia e se, com isso, o Governo mostra eventualmente alguma virtude, essa é a da clareza. O Governo é arrogante, mas é claro; o Governo é teimoso, mas é claro; o Governo é intolerante, mas é claro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Está a escorregar na «calçada»!

O Orador: - E mais, Srs. Deputados, particularmente, do PS: o Governo agiu, e age, à revelia das legítimas expectativas criadas nos alunos e nas famílias, na sequência da aprovação das recomendações, uma vez que não

passava pela cabeça de ninguém que ele as não tivesse na devida conta.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pois bem, não teve! E é por isso que hoje aqui estamos. Aliás, estamos aqui dando cumprimento a uma sugestão saída da boca de um elemento da bancada do Governo ou da do Partido Socialista, o qual, enfatizando o carácter não vinculativo das recomendações, desafiava os grupos parlamentares a apresentarem a matéria sob a forma de projecto de lei, ao qual, se aprovado, o Governo não poderia fugir. Bem se pode dizer que «pela boca morre o peixe»!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E aqui temos a resposta a esse «desafio». Desafio que, em si mesmo, e posto deste modo, não tem qualquer sentido, pois o único desafio a que o nosso projecto de lei procura responder é àquele que nos é colocado pela possibilidade real de haver estudantes candidatos ao ingresso no ensino superior, no ano lectivo de 1996/97, que não sejam colocados, apesar de terem obtido nos exames da 2.ª fase do concurso nacional uma nota de candidatura, num par curso/estabelecimento, igual ou superior ao último colocado para o mesmo par curso/estabelecimento na 1.ª fase.
É a este desafio de reposição da justiça, da equidade, do Estado de direito democrático e do Estado como pessoa de bem, da confiança dos cidadãos nos actos da Administração e da transparência destes actos, é a tudo isto que procuramos responder.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É esta não apenas a nossa preocupação central, mas, em rigor, a nossa preocupação exclusiva! De tal modo que não podemos deixar de estar abertos a todas as contribuições que possam, eventualmente, melhorar o nosso projecto, venham elas do interior ou do exterior da Assembleia da República.
É verdade que este nosso projecto - não é demais repeti-lo - é justo, oportuno, necessário e equilibrado. Mas, reconhecemo-lo, está enformado por um circunstancialismo cuja raiz última reside nas circunstâncias criadas pelo Ministério da Educação e por este Governo e da sua exclusiva responsabilidade, responsabilidade técnica, sim, mas antes de tudo responsabilidade política, a qual se têm recusado' a assumir com a necessária humildade democrática, escolhendo o caminho da desnecessária confrontação, ao mesmo - tempo que os alunos e as famílias, naturalmente, esperariam uma procura sensata de soluções que tivesse na devida conta as suas aspirações e os seus legítimos interesses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Uma pequena nota final. Ainda ontem ou hoje, os jornais davam conta de um novo «lapso dos serviços» - é assim que o Ministério, pudicamente, se lhe refere - na colocação dos candidatos ao curso de Geologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Entre os alunos de Geologia, e bem a propósito, corre que esta nova falha do Ministério da Educação e do

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Governo Guterres os torna a ambos comparáveis à falha de Santo André, na Califórnia, ...

Risos.

...mas com uma circunstância agravante: é que, tanto quanto foi possível apurar até ao momento, nenhum governo pode ser responsabilizado pela existência da falha de Santo André.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, não vou referir-me aos seus comentários de natureza telúrica no final da sua intervenção, mas vou pôr-lhe duas pequenas questões.
Em primeiro lugar, gostaria de saber se o Sr. Deputado José Calçada também foi subscritor, deste projecto de lei, uma vez que, na segunda linha da sua introdução, diz o seguinte: «O presente projecto de lei do PCP tem por objectivo evitar uma das muitas iniquidades resultantes da desastrosa política do Governo». Gostaria que me explicasse o sentido dessa «iniquidade» ou o que entende por isso, e aconselhava-o a ler o parecer do Sr. Deputado António Filipe, que é um parecer mais equilibrado e mais ponderado de linguagem.
Parece-me, pois, que os Srs. Deputados que assinaram o projecto de lei deviam ter tido em consideração 0 cuidado e a ponderação da linguagem utilizada pelo Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Mas os senhores votaram contra!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Deputado José Calçada, quanto às injustiças, desigualdades... De facto, é isto que pauta a sua intervenção, são estes os argumentos utilizados. Mas, Sr. Deputado, e a injustiça daqueles que foram colocados na l.ª fase e não foram colocados na sua primeira opção?!
Por outro lado, Sr. Deputado, se há tanta injustiça e tanta desigualdade por que é que os alunos, até ao momento, ainda não se pronunciaram?! Por que é que esta agitação acaba por ser, basicamente, parlamentar, levantada pelos partidos da oposição, sem termos oportunidade de verificar que, em termos do mundo académico, tenha havido qualquer agitação?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, é evidente que me escuso a responder à Sua primeira questão, porque, como sabe, não faz sentido.
No entanto, levantou-me uma nova perplexidade. É que depois dos «rasgados» - para não dizer mais - elogios que fez ao meu camarada António Filipe, começo a

preocupar-me: por que razão o Partido Socialista acabou por não votar favoravelmente o parecer que ele apresentou?

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Já me vou referir a isso!

O Orador: - Todavia, isso é uma questão resolvida e não vale a pena estarmos a mexer em águas passadas.
Quanto a dizer que os alunos não se pronunciaram sobre este assunto, Sr. Deputado, não sei muito bem, mas admito que haja problemas na distribuição do correio no vosso grupo parlamentar. É a única explicação que encontro para o facto de não chegar a si e aos Srs. Deputados da direcção do seu grupo parlamentar, as reclamações que chegaram até nós - e certamente não só a nós, como deve imaginar.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Não há agitação estudantil!

O Orador: - Portanto, não estou a perceber o que é que o Sr. Deputado Fernando de Sousa quer dizer com isso.
Percebemos que o Sr. Deputado hão possa deixar de dizer alguma coisa, entendemos perfeitamente as dificuldades em fazê-lo, mas a questão linear é esta: ninguém nega, a começar pelo seu grupo parlamentar, aquando da votação da primeira recomendação, em sede de Comissão Permanente, que houve graves perturbações no processo de exames do 12.º ano e no processo conducente ao acesso ao ensino superior, que não foram corrigidas.

O Sr. António Braga (PS): - Não foram?!

O Orador: - O senhor sabe bem que não foram corrigidas! E não basta o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado virem aqui dizer que apenas houve um prejuízo de 0,000 não sei quantos por cento...
O senhor sabe bem que a questão não pode ser vista, em termos educativos, nessa base e que é, antes de tudo, de natureza qualitativa. Há, de facto, prejuízos que não são facilmente quantificáveis, sabe-o tão bem quanto nós, e apenas uma posição de abertura da bancada do PS e do Governo é que permitiriam uma posição que respondesse, com nexo, a essas nossas preocupações, que também são vossas. Porém, percebo que tenham de apoiar as decisões do vosso Governo!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está na hora regimental das votações. Temos agendado para hoje a votação da Conta Geral do Estado, relativas aos anos de 1990, 1991, 1992 e 1993. Vamos proceder à sua votação, Conta a Conta, como é razoável, como é normal...
O Sr. Deputado Octávio Teixeira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, se bem me apercebi da forma como está a decorrer este debate, creio que ele não demorará muito mais tempo a terminar. Como temos apenas para votar a Conta Geral do Estado, relativas aos anos de 1990, 1991, 1992 e 1993, creio que poderíamos adiar as votações e fazer, em seguida, a votação, na generalidade, dos projectos de lei que hoje estão em discussão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não sei se há consenso nesse sentido.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, a Mesa e todos os grupos parlamentares defendem a estabilidade da ordem do dia e creio que é bom mantermos esta regra.
Nesse sentido, não damos o nosso consenso a que se faça já essa votação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação da Conta Geral do Estado relativa ao ano de 1990.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor. do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS e do CDS-PP.

Vamos agora votar a Conta Geral do Estado relativa ao ano de 1991.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS e do CDS-PP.

Vamos votar a Conta Geral do Estado relativa ao ano de 1992.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS e do CDS-PP.

Vamos votar a Conta Geral do Estado relativa ao ano de 1993.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos retomar o debate dos projectos de lei agendados para hoje.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez, encontramo-nos aqui a discutir o problema do número de vagas adicionais no ensino superior para o ano lectivo de 1996/1997.
Nas intervenções que produziram, alguns Srs. Deputados referiram que, aquando da discussão feita em Julho, houve inteira unanimidade na Câmara em relação a esta matéria, o que não veio a acontecer depois dessa data. Esta posição decorre dó facto de as dúvidas colocadas em Julho terem sido, até Setembro, resolvidas e explicadas, o que fez com que nós passássemos a defender uma outra posição.

Os Srs. Deputados da oposição que subscrevem os projectos de lei que hoje estão em análise referem-se, sobretudo, à igualdade e à injustiça no acesso. Pensamos que - e essa é também a posição do Conselho de Reitores - estes projectos de lei são lesivos do exercício da autonomia universitária. Podem não ser lesivos da autonomia universitária tout court, mas são-no do seu exercício, porque a fixação das vagas é feita anualmente em diálogo entre o Governo e as universidades e esta medida avulsa procura unicamente dizer quais são as vagas adicionais que vão surgir.
Ninguém prevê quantos alunos são e não se conhecem as consequências deste acto, mas, mesmo assim, a oposição insistiu em apresentar estes projectos de lei. Independentemente de conhecer as consequências dessas medidas, a verdade é que as apresentou e as defende.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à igualdade e à injustiça, o Sr. Deputado António Braga já teve oportunidade de explicar ao Sr. Deputado Jorge Ferreira o que é que a nossa bancada pensa sobre esta matéria.
Primeira questão: é preciso ter presente que os alunos que efectuaram os seus exames na época de Julho e que ficaram com a convicção de que teriam uma alta probalidade de ingressar no ensino superior decidiram não apresentar, apesar de não estar prevista qualquer alteração ao calendário inicial, a sua candidatura à época de Setembro.
Segunda questão: a hipótese levantada pelos projectos de lei que estão aqui em discussão de os alunos que realizaram o exame na época de Setembro puderem vir a ser colocados no estabelecimento da sua escolha, desde que tenham nota de candidatura superior ao último colocado, perverte efectivamente as regras gerais de colocação, uma vez que só 48,3% dos alunos colocados na 1.8 fase - e isto é dito com segurança pelo Conselho de Reitores - é que obteve colocação na primeira opção. Se estes projectos de lei forem aprovados, daremos uma vantagem de colocação aos alunos que efectuaram os seus exames na época de Setembro.
Embora a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias já tenha dado o seu parecer sobre esta matéria, a verdade é que se coloca aqui um problema de disponibilidade orçamental. É que das duas uma: ou estes alunos são imediatamente admitidos na criação de vagas adicionais, com uma despesa de natureza orçamental, encargos financeiros até ao final do ano não previstos no Orçamento do Estado deste ano, ou, então, atiramos o início do ano lectivo para Janeiro, após a aprovação do Orçamento para o próximo ano, o que nos parece inadmissível.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No parecer que entregou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Sr. Deputado António Filipe demonstrou, apesar de se ter pronunciado pela não inconstitucionalidade, particular cuidado na maneira como redigiu alguns dos seus aspectos, o que dá a impressão de que ele próprio também teve

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algumas dificuldades na interpretação da constitucionalidade do quê estava em causa.

O Sr. José Calçada (PCP): - Isso já foi votado ontem!

O Orador: - É verdade! No entanto, gostava de lembrar que o Sr. Deputado António Filipe refere, quanto aos erros e deficiências que o Sr. Deputado José Calçada deu como certos e às suas consequências, que, em nosso entender, foram resolvidas na 2.ª chamada da 1.ª fase, mas que os senhores pensam que não, que a 1.ª fase de candidatura «pode ter sido afectada negativamente por erros e deficiências dos exames nacionais». Não diz que foi mas, sim, pode ter sido. Portanto, aqui não foi utilizada a linguagem empregue no projecto de lei do PCP.
A seguir, o Sr. Deputado António Filipe diz: «Não é de supor que tais limites sejam ultrapassados com a eventual criação das vagas adicionais que, nos termos propostos, se revelem necessárias» - isto para ultrapassar o problema da lei-travão. Portanto, não diz que foram ultrapassados mas, sim, que não é de supor.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, ainda ninguém apresentou novos ou argumentos adicionais aos princípios que defendemos na Comissão Permanente.
A competência para a determinação do número de vagas de acesso a cada estabelecimento de ensino universitário público coloca, efectivamente, em causa a capacidade das universidades para se pronunciarem sobre o número de vagas e de alunos que devem ou não ter. Nesse sentido, há uma violação do exercício da autonomia universitária.
Os projectos de lei referem-se aos princípios da igualdade de oportunidades e da igualdade perante a lei, visando corrigir situações de eventual injustiça. Em relação a este aspecto, pensamos que eles vão, sobretudo, privilegiar os estudantes da 2.ª chamada e preterir os direitos e as justas expectativas dos alunos que foram à 1.ª chamada e que entretanto obtiveram colocação.
Finalmente, quanto aos encargos orçamentais, volto a repetir que, das duas uma: com estas medidas ou violamos a lei, porque o Orçamento do Estado para 1996 não contemplou estas vagas adicionais, ou, então, os grupos parlamentares que apresentam estes projectos de lei estão efectivamente a contar que o ano lectivo comece em Janeiro do próximo ano.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Fernando de Sousa, gostava que me dissesse qual foi o comentário que o Conselho de Reitores tez acerca do nosso projecto de lei. V. Ex.ª invocou aqui sistematicamente o Conselho de Reitores, mas a nossa bancada não conhece qualquer parecer ou opinião que ele tenha emitido a propósito do nosso projecto de lei.
Para que não restem dúvidas, que, aliás, só podiam resultar de uma leitura apressada do nosso projecto de lei, quero aqui afirmar que respeitamos a autonomia universitária e que, ao contrário do Sr. Deputado, não fazemos qualquer distinção entre o respeito pela autonomia

e o respeito pelo seu exercício. As coisas existem e ou se exercem ou, então, são só papel!
Respeitamos a autonomia universitária e o seu exercício e, por essa razão, o nosso projecto de lei prevê, como não podia deixar de o fazer, a consulta das escolas acerca desta matéria.
Quero também deixar claro que, para além de tudo isto, a Assembleia da República é a Assembleia da República e a instituição CRUP é a instituição CRUP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando de Sousa, como ainda há mais quatro Srs. Deputados inscritos para pedir-lhe esclarecimentos, pergunto-lhe se quer responder agora ou no fim.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nessa altura terá, então, cinco minutos para responder.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, quero começar por registar a sobriedade da sua intervenção e o facto de V. Ex.ª não agitar com alguns fantasmas e algumas inverdades - o que já vi ser feito na abordagem desta questão -, na tentativa de denegrir a valia dos projectos de lei que foram apresentados, na Assembleia da República, por três grupos parlamentares, desde logo com a ideia de que existem quase 5000 vagas e de que isso vai resolver o problema.
Ora, esta e a primeira questão que queria colocar ao Sr. Deputado Fernando e Sousa, indo às questões concretas: é ou não verdade, essa é ou não a interpretação do PS, que existirão, pelo menos, mais de 200 estabelecimentos que têm zero vagas na 2.ª fase de candidatura, agora, em Setembro, o que significa que, pelo menos nesses e em todos os outros em que as vagas serão residuais de uma, duas ou três, poderá ocorrer a circunstância de haver alunos que têm avaliações maiores àquelas que permitiram, na 1.ª fase, a entrada no ensino superior e que, por esse facto, ficarão ou ficariam privados de entrar, ainda este ano lectivo, no ensino superior, como seria de justiça? Esta é a primeira questão dirigida ao PS.
Quanto à segunda questão, Sr. Deputado Fernando de Sousa, perdoar-me-á que a coloquemos hoje, aqui, uma vez mais, mas pela primeira vez no Plenário da Assembleia da República, o Sr. Deputado Fernando de Sousa foi totalmente omisso sobre essa matéria na intervenção que nos dirigiu. Assim, pergunto: como se explica que o PS, o mesmo PS, tenha votado favoravelmente a deliberação da Comissão Permanente da Assembleia da República de 18 de Julho e tenha votado de forma diferente, diametralmente oposta, na reunião da Comissão Permanente em Setembro?

O Sr. António Braga (PS): -.Já explicámos!

O Orador: - Devo confessar que não percebi a explicação e creio que ficaria bem ao PS e ao Sr. Deputado

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Fernando de Sousa se conseguisse convencer-nos de que foi o mesmo PS que fez as duas votações.
Sr. Deputado Fernando de Sousa, já dirimimos, em sede própria, a questão da constitucionalidade, portanto, não quero voltar a abordá-la. Mas o Sr. Deputado Fernando de Sousa tornou a ela na sua intervenção com a nuance do exercício da autonomia. Que PS é que tem a interpretação de que a fixação das vagas resulta da autonomia universitária? É o PS que falou pela voz do Sr. Deputado Fernando de Sousa nesta bancada, hoje, no Plenário da Assembleia da República, ou o PS que, na Comissão de Revisão Constitucional, não deu razão à proposta de alteração da Constituição apresentada pelo CDS-PP?
É que, Sr. Deputado Fernando de Sousa, na Comissão de Revisão Constitucional, ainda não há muitos dias, o CDS-PP propunha uma alteração ao artigo 76.º no sentido de, na fixação do elenco das matérias que compõem a autonomia universitária, que definem constitucionalmente a autonomia universitária, ser aditada a seguinte expressão: «cabendo-lhes, nomeadamente, definir as respectivas regras de ingresso», e todos os partidos, designadamente o PS, foram contra este inciso na Constituição, considerando - e, em nossa opinião, bem - que não faz parte da autonomia universitária a fixação das regras de ingresso, porque essa decorre das orientações da política educativa que cabem, naturalmente, aos órgãos de soberania, como o Sr. Deputado António Filipe salientou, e bem, no parecer que foi votado favoravelmente na l.ª Comissão e ontem aqui, no Plenário da Assembleia da República.
Então, Sr. Deputado Fernando de Sousa, qual o PS que tem razão nesta matéria: o PS que se senta na revisão constitucional ou o PS que fala hoje, pela sua voz, no Plenário da Assembleia da República?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, a primeira observação que eu faria à intervenção do Sr. Deputado Fernando de Sousa é a de que nunca vi a necessidade de produzir tanta argumentação para combater projectos de lei que, ao mesmo tempo, sé consideram inúteis, do ponto de vista da sua aplicação à realidade. Certamente que essa argumentação, que VV. Ex.as têm expendido e vão continuar a expender, se justifica simplesmente porque está aqui em causa uma matéria que os projectos de lei que estamos a discutir podem alterar significativamente, num sentido ou noutro - veremos na votação -, aquilo que se está a passar com os exames e com o acesso ao ensino superior.
A pergunta que eu queria fazer ao Sr. Deputado Fernando de Sousa, depois de o ter ouvido criticar estes projectos de lei por, na sua opinião, virem alterar as posições das universidades relativamente à fixação do número de vagas, é se o Sr. Deputado Fernando de Sousa e o grupo parlamentar do PS abrangem também nessa crítica o Governo do PS, que produziu o Decreto-Lei n.º 28-13/96, que prevê, expressamente, no seu artigo 5.º, a possibilidade de o Governo, através do Ministério da Educação, alterar as vagas fixadas pelos órgãos competentes dos estabelecimentos do ensino superior, na

medida em que tal se mostre necessário à respectiva adequação à política educativa? Isto é, o próprio Governo prevê a possibilidade e a eventualidade, em nome do interesse geral da política educativa, de proceder como nós, aqui, estamos a tentar proceder, mas o PS, baseado no argumento de que acha isto mal, diz que discorda. Assim, o que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se está também a fazer uma crítica ao Sr. Ministro da Educação quando faz essa afirmação.

O Sr. Presidente: - Para uma pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Deputado Fernando de Sousa veio fazer várias referências ao relatório que tive oportunidade de elaborar para a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, aprovado nessa comissão e no Plenário, embora com 24 horas de atraso, porque o debate sobre o parecer foi feito ontem, o que me leva a pensar que o Sr. Deputado vem criticar o relatório porque teve grande dificuldade em criticar os projectos propriamente ditos, pelo que se refugia numa discussão requentada, que já ontem tivemos oportunidade de aqui a realizar. Mas, ainda assim, como o Sr. Deputado fez várias referências, vou colocar-lhe algumas questões relacionadas com isso.
Tenho três tipos de observações e começo já pela questão que o Sr. Deputado António Braga referiu, a da lei-travão. O Sr. Deputado vem alegar, no fundo, que a criação de vagas adicionais é inconstitucional; chamo-lhe a atenção para o artigo 41.º da portaria que está em vigor, da responsabilidade do Governo do PS, sobre o regulamento de acesso ao ensino superior, que diz que «quando, por erro não imputável directa ou indirectamente ao candidato, não tenha havido colocação ou tenha havido erro na colocação, este é colocado no curso e estabelecimento em que teria sido colocado na ausência do erro, mesmo que, para esse fim, seja necessário criar vaga adicional». Portanto, pergunto ao Sr. Deputado Fernando de Sousa se esta portaria é inconstitucional por violação da lei-travão.
Mas mais, Sr. Deputado Fernando de Sousa: no próximo dia 15 de Outubro, o Governo vem apresentar a esta Assembleia a proposta de lei de Orçamento de Estado para 1997 e eu pergunto-lhe, nesta proposta orçamental, quais são as vagas para o ensino superior que o Governo vai considerar para elaboração da sua proposta. São as vagas do ano lectivo de 1996/97, que é o próximo, ou são as vagas para o ano lectivo de 1997/98? Evidentemente que são as de 1996/97!

O Sr. Carlos. Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Isso significa que o número de vagas não pode ser aumentado para o ano seguinte, que a portaria de fixação de vagas para o ano seguinte é inconstitucional se aumentar as vagas relativamente às de 1996/97? É esta a questão que lhe coloco.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Mas o Sr. Deputado abordou ainda outros aspectos e um deles foi o facto de o relatório colocar em dúvida a existência de erros e de injustiças. Sr. Deputado, é preciso compreender que a dúvida é metódica; aliás, a resposta sobre se haverá ou não erros dão os senhores porque, se não tivesse havido erros, se não tivesse havido injustiças a reparar, os senhores estavam perfeitamente à vontade...

O Sr. António Braga (PS): - E estamos!

O Orador: - ... e, olimpicamente, vinham dizer - nem valia a pena estarem a argumentar contra os projectos - ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - ...que poderíamos provar os projectos à vontade porque, não havendo injustiças nem erros, eles não vão ter aplicação, pelo que não valia a pena argumentarem contra eles, dado que eles eram irrelevantes! Porém, os senhores estão preocupadíssimos, ...

Ò Sr. António Braga (PS): - Preocupadíssimos?!

O Orador: - ...º que nos leva a ficar também preocupados, porque isso significa que os erros devem ter sido muito significativos, devem ter sido muitos, pois, caso contrário, os senhores não estavam com essas preocupações.
Finalmente, o Sr. Deputado exprime aqui uma preocupação, que é legítima, para com os candidatos que não foram colocados na sua primeira opção. Há muitos anos que estamos muito preocupados com essa situação pois, de facto, os sistemas de acesso ao ensino superior que têm sido definidos têm levado a que muitos jovens tenham ficado colocados em opções que não são a primeira, o que muito lamentamos.

O Sr. António Braga (PS): - Vão propor mais uma lei? Mais vagas?

O Orador: - Mas, neste momento, Srs. Deputados, estamos muito mais preocupados com os jovens que merecem entrar e que, por vontade dos senhores, ficam irremediavelmente de fora. São essas as situações que nos preocupam e que, hoje, queremos reparar aqui.

Aplausos do PCP.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O Sr. Deputado António Filipe foi cruel!

O Sr. Presidente: - Para mais um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, quem tem acompanhado este dossier desde o princípio, desde a primeira reunião da Comissão Permanente, em Julho, verifica que o Governo, umas vezes, e o PS, outras vezes, têm vindo a arranjar argumentos sucessivos e a cada reunião que

fazemos é diferente o argumento do Governo ou do PS para contrariar o projecto de deliberação, inicialmente, e agora os projectos de lei.
Começou o Governo por dizer que não havia prejudicados; a tese inicial do Governo, para contrariar a deliberação que votámos por unanimidade, foi a de que não havia alunos prejudicados no processo dos exames do 12.º ano, pelo que não se justificava a deliberação.
Face à evidência de tudo o que tinha acontecido e que os jornais relatavam, o argumento passou a ser outro: na reunião seguinte, o argumento do Governo, já repescado pelo PS, era o de que a deliberação e, agora, os projectos de lei, iriam prejudicar alunos já colocados na 1.ª fase e com isto, conseguiram enganar alguns, conseguiram suscitar cartas de alguns dos presumíveis lesados, dizendo «não aprovem essa lei porque nos vai prejudicar, a nós».
Quando ficou claro que ninguém seria prejudicado com estes projectos de lei, o PS vem com um novo argumento, igualmente inválido: vem dizer que «houve alunos, na 1.ª fase, que foram colocados em cursos diferentes daqueles que queriam e estes alunos, que agora vão ser colocados, vão escolher os cursos». Nada mais falso, Sr. Deputado!

O Sr. António Braga (PS): - Não?!

O Orador: - Nada mais falso! Os alunos vão ter a possibilidade, se estes projectos forem aprovadas, de ingressar no curso para que a nota os habilite, que não é, necessariamente, o curso que pretendiam.

O Sr. Carlos Coelho (PSD):- Evidentemente!

O Sr. António Braga (PS): - Então, para que é que fizeram a melhoria?

O Orador: - Um aluno pode pretender ir para medicina mas, ao abrigo desta lei, pode ter de ir para um curso de física, tal como aconteceu aos alunos da l.ª época.

O Sr. António Braga (PS): - Não, não!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sim, sim!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, os alunos vão poder ingressar nos cursos para que as notas os habilitam, na l.ª fase e na 2.º fase, e não para os cursos que desejam, quer na 1.ª quer na 2.ª fase.
Mas há hoje um outro argumento, que é muito curioso também, que é o de dizer que, afinal, não vale a pena aprovar estes projectos de leis porque (repescando o argumento inicial) não há prejudicados...

O Sr. António Braga (PS): - Isso já disse o Sr. Deputado António Filipe.

O Orador: - Tanto assim que não houve manifestações nas ruas, não viram os alunos a reclamarem publicamente a aprovação desta lei!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Ainda bem, para o Ministro da Administração Interna!

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O Orador: - Ficámos a saber qual é o sentido de justiça do PS nesta matéria: se fossem três ou quatro os alunos prejudicados, o PS não queria saber do sentido de justiça e do equilíbrio das soluções e faz crer que só seria sensível a esta situação se visse manifestações na rua!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isto é grave! As pessoas não são números!

O Orador: - Estamos a defender esta tese por questões de justiça, por questões de igualdade, independentemente do número de alunos que sejam prejudicados e, direi mais, com autorização do Sr. Presidente, teríamos evitado completamente, Srs. Deputados, esta discussão se o Governo não estivesse obstinado, desde o princípio, em não acatar as recomendações da Assembleia: uma primeira recomendação, votada por unanimidade dos Deputados e uma segunda recomendação, votada por maioria, que o Governo resolveu não acatar.
Este Governo e este Ministro do diálogo ouve todos, negoceia com todos, de todos recolhe sugestões, de todos ouve pareceres. Porém, há um tipo de organização que o Ministro independente da Educação não suporta ouvir, os partidos da oposição. Com essa classe, o Ministro da Educação não quer dialogar, não quer ouvir, não quer escutar e, depois, temos este resultado.
Nada disto seria necessário se o Ministro da Educação tivesse dito, no final da primeira deliberação aqui provada, que iria acatar, na medida das suas possibilidades, a recomendação, ...

O Sr. António Braga (PS): - E disse!

O Orador: - ...que poderia haver dificuldades num caso ou noutro, o que compreenderíamos, mas que, no essencial, ia dar acolhimento à deliberação aprovada pela Assembleia. Foi essa falta de diálogo que inviabilizou uma discussão mais aberta e que não deixasse amachucado o PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um último pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Percebo perfeitamente a situação complicada que está a ser vivida na bancada do Partido Socialista.

Protestos do PS.

Já não bastava o trabalho que o Sr. Deputado António Braga teve durante a realização do relatório e agora a intervenção perfeitamente tecnicista que o Sr. Deputado Fernando de Sousa teve que realizar da tribuna... É entendível, mas os senhores podiam perfeitamente ter evitado esta situação dramática, trágica, que hoje estão a viver, embora se torne cada vez mais difícil agradar a gregos e a troianos.

O Sr. António Braga (PS): - É verdade!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Estão num beco sem saída!

A Oradora: - Dizia um Sr. Deputado do Partido Socialista, na Comissão Permanente, em Julho: «Sr. Ministro, mais grave do que os erros cometidos na elaboração das provas e do que os erros de carácter administrativo, que deploramos e de cuja responsabilidade exigimos o apuramento, é o desfasamento da avaliação contínua com os exames, é, queremos afirmá-lo, a necessidade de recurso às bonificações, o desfasamento gravoso e, ainda, o processo complicado do regime de acesso ao ensino superior. O que não queremos, Sr. Ministro, sobretudo, é que os exames nacionais se convertam numa prova tão grosseira e arbitrária como era a prova geral de acesso, a qual representou o principal e mais marcante contributo político do PSD». Foi um Deputado do Partido Socialista, ou melhor, um Deputado da Juventude Socialista que fez estas afirmações, em Julho de 1996!

O Sr. António Braga (PS): - E fez bem!

A Oradora: - Mas, dizia o Sr. Ministro: «o sistema português é muito heterogéneo, profundamente heterogéneo; há escolas com excelentes resultados, há escolas com resultados muito deficientes, como era de esperar. Se alguém está espantado» - dizia o Sr. Ministro não eu - «com os resultados não somos nós. Conhecemos o sistema, sabemos que a sua modificação tem que ser gradual e sobretudo que tem de envolver todos os parceiros do sistema educativo». Claro que não foi o Sr. Ministro Marçal Grilo que o disse, porque, obviamente, não poderia ter assumido este discurso! Deve ter sido um outro ministro qualquer que não ele!...
Face a estas duas intervenções, do Deputado do Partido Socialista e do Sr. Ministro, a questão que coloco aos Srs. Deputados do PS é que medidas entendem ser necessário e urgente tomar para colmatar as injustiças que o Partido Socialista reconhece existirem na medida apressada, ligeira e leviana da realização dos exames do 12.º ano? Que medidas é que entendem ser necessário tomar de imediato para evitar exactamente isto que o Sr. Ministro acabou de dizer, ou seja, realizar exames quando sabíamos que tínhamos um sistema lacunar, repleto de fragilidades e incapaz de suportar exames a nível nacional, que demonstraram exactamente, como dizia o Sr. Deputado do Partido Socialista, o desfasamento total entre as avaliações contínuas e as classificações dos exames a nível nacional?
Uma outra questão: o Partido Comunista Português apresentou um requerimento, antes da realização da sua iniciativa legislativa, com o sentido de apurar dados objectivos que nos permitissem apresentar uma iniciativa legislativa «com pés para andar» e com o objectivo de poder resolver as questões que estavam levantadas, fundamentalmente as injustiças provocadas pelos exames. Claro que o nosso requerimento não obteve resposta! E não obteve resposta porque o Ministério da Educação não tem noção - nem menos, nem mais clara - de quantas vagas e de quantos alunos estarão nesta situação de injustiça.

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Srs. Deputados do Partido Socialista, têm resposta a esta questão, de quantos alunos é que poderão estar abrangidos por esta situação?

Protestos do Partido Socialista.

Se os Deputados da primeira fila da bancada do Partido Socialista permitirem que os da segunda possam responder, por mim...

O Sr. António Braga (PS): - Todos?

A Oradora: - Todos ao mesmo tempo, fazendo coro!

Risos do PSD e do PCP.

Vejam lá é se o coro está melhor ensaiado do que o da Comissão Permanente, porque esse era dissonante!

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Vou ser muito rápida, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Terá de o ser, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - A última questão que queria colocar é a seguinte: que medidas concretas é que os senhores sugerem para todos os alunos com médias de 17, 18, 19 e 20 valores?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - A Sr.ª Deputada só faz perguntas difíceis, pelo que não pode ter respostas!

A Oradora: - Qual é a medida concreta que os Srs. Deputados têm para resolver esta questão, pois há alunos com estas médias que não foram colocados na 1.º fase, que não estão ainda, efectivamente, colocados. Ou consideram que vão ficar em stand by, para o próximo ano?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Fernando de Sousa, para responder a todos os pedidos de esclarecimento.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita pergunta quantos alunos. Isso gostava eu de perguntar a V.Ex.ª, ou seja, os senhores sabem quais são as consequências que desencadeia a aprovação do projecto de lei?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Se a pasta ministerial estivesse na nossa mão saberíamos.

O Orador: - Mas, sabem? Não sabem! Sabem se são 10, 100 ou 5000 mil?
Srs. Deputados, antes de apresentarem o projecto de lei era preciso ver quais são as consequências que decorrem da sua aprovação.

Protestos do PCP.

A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita gosta de citar os Srs. Deputados do PS que aqui emitem as suas opiniões sobre política educativa e sobre os exames...

O Sr. António Braga (PS): - E cita bem!

O Orador: - ...e devo dizer que cita sempre com rigor, não comete aí nenhuma falha, mas não era a Sr.ª Deputada que dizia que era preciso mudar o sistema de exames, que não podíamos continuar assim?! Foi o que se fez, está a tentar-se mudar o sistema.

Protestos do PCP.

Se tudo era melhor do que aquilo que existia, apesar de tudo, estamos a tentar mudar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É pior a emenda que o soneto!

Risos do PCP.

O Orador: - Quando se usa a argumentação do tudo ou nada e quando se fala de iniquidades num projecto de lei, relativamente à política do Governo, perguntamos o que valem as palavras e as posições que os senhores assumem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É preciso moderar as intervenções e utilizar uma linguagem adequada à situação e aí, volto a dizer, o Sr. Deputado António Filipe, no parecer que fez, distinguiu-se da linguagem utilizada no projecto de lei do PCP, porque usou, de facto, uma linguagem moderada.
Quanto à intervenção tecnicista, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, pergunto: mas qual intervenção tecnicista?!
Sr. Deputado Castro de Almeida, o Governo resolveu não acatar as propostas e recomendações que aqui foram feitas por achar que não era necessário, pois o problema dos erros e das lacunas foi resolvido com a 2.ª fase dos exames, uma vez que não foram apresentados dados novos que demonstrassem que as medidas que foram tomadas não estavam adequadas à situação. A partir do momento em que isso aconteceu, o Governo resolveu que não era necessário acatar a recomendação, porque aquilo que nós fizemos, enquanto Assembleia da República, foi uma recomendação ao Governo.

O Sr. José Calçada (PCP): - Este Governo não é recomendável!

Risos do PCP.

O Orador: - Sr. Deputado, a oposição é que não é recomendável!
Por isso, Sr. Deputado Castro Almeida, não pode dizer que um aluno é prejudicado ou que muitos alunos são prejudicados. O Ministro da Educação, nas duas vezes que aqui esteve, referiu que se houvesse algum caso de. injustiça ou algum aluno afectado por algum dos erros, das lacunas ou insuficiências que os senhores referem, esse caso seria tomado em linha de conta. O Sr. Ministro referiu isso e repetiu-o aqui mais do que uma vez.

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Portanto, os senhores não nos venham dizer que só temos sensibilidade para os casos em que estão em causa muitos alunos e não para os casos de um, dois ou três alunos. Para nós, é exactamente a mesma coisa e estou certo de que a equipa ministerial resolverá as questões que aparecerem, nem que esteja em causa só um aluno.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à agitação, devo dizer que, de facto, houve mais agitação político-partidária e parlamentar do que agitação estudantil - têm de o reconhecer.

Vozes do PS: - Isso é verdade!

O Orador: - Quando nós nos lembramos do que se passou nos últimos anos, em termos do mundo académico...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Os senhores só governam quando há manifestações de rua!

O Orador: - O Sr. Deputado não estava cá na altura mas lembra-se certamente da agitação estudantil que houve nos últimos anos e, portanto, só poderá corroborar aquilo que eu acabei de dizer.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Fernando Sousa está a suscitar a intervenção dos parlamentares através de manifestações de rua!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes que não dialoguem.

O Orador: - Sr. Deputado António Filipe, quero dizerlhe que não critiquei o relatório. Pelo contrário, aduzi-o como um documento responsável, que me pareceu ser cuidado e, apesar de tudo, suscitar algumas das dificuldades e questões que também são nossa preocupação. Mas nem sequer cheguei a referir o problema da inconstitucionalidade, o que disse foi que o exercício da autonomia universitário parecia estar dela ferido.
Sr. Deputado Jorge Ferreira, quanto à alteração das vagas de acordo com as universidades...

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - E aos costumes disse nada!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Abecasis, posso falar consigo sobre esta matéria ou sobre a matéria que quiser e quando o quiser, desde que o Sr. Deputado esteja inscrito.
Sr. Deputado Jorge Ferreira, no que se refere ao ingresso, o problema das vagas tem de ter sempre em consideração a posição da universidade em causa. O que os senhores estão a fazer é, de facto, tomar uma posição unilateral, de imposição às universidades de um certo número de vagas, que não sei quantas são, se é uma, 10, 500 ou 1000!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Nas vagas adicionais não é verdade!

O Orador: - É aí, nessa perspectiva, que nos parece que as universidades deveriam também ser ouvidas, porque este processo decorre, efectivamente, do diálogo entre as universidades e o Ministério.
O Ministério, por vezes, altera o número de vagas - é verdade e o Sr. Deputado Carlos Coelho referiu-o -, mas altera-as sempre de acordo com as universidades e ouvindo-as. E aqui parece-me estarmos perante um caso diferente, pois estamos a alterar as regras do jogo sem ouvir as universidades.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É uma imposição administrativa!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho e Sr. Deputado José Calçada, está aqui em causa o problema, que também referiram, do exercício da autonomia universitária.
Relativamente à criação unilateral de vagas por parte da Assembleia da República, devo dizer que não ponho em causa a competência desta Assembleia - era o que me faltava! - para decidir como deve decidir; só que penso que o deveria fazer ouvindo as universidades.

O Sr. José Calçada (PCP): - É isso que nós dizemos no nosso projecto!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Para que fim, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, queria saber se há alguma possibilidade regimental de dar satisfação a um pedido meu. Devo dizer que isto resulta da minha insatisfação, dado que fiz três pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Fernando Sousa e este não me respondeu a nenhum, e a minha frustração é tanto maior quanto é muito grande a consideração que tenho pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa.
A questão essencial que eu lhe tinha colocado e a que ele não respondeu é o problema da contradição entre aquilo que o PS disse e fez na revisão constitucional e aquilo que hoje, pela sua voz, anunciou do alto dessa tribuna. Assim, perguntava ao Sr. Presidente se é possível, regimentalmente, pedir para ser anexo à acta desta sessão plenária parte do artigo 76.º da proposta de revisão constitucional do CDS-PP e a transcrição dos debates da Comissão de Revisão Constitucional, designadamente a posição que o PS, nessa sede, exprimiu a esse propósito.

O Sr. António Braga (PS): - Não acredito! Logo o Sr. Deputado que conhece tão bem o Regimento!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os textos foram publicados e são do conhecimento genérico do povo português, quanto mais da Assembleia da República, pelo que me parece. que não posso dar satisfação a esse seu pedido.
O Sr. Deputado Nuno Abecasis pediu a palavra para que efeito?

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O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): .- Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Fernando de Sousa lembrou algo que foi aqui dito pelo Sr. Ministro da Educação, em resposta a uma
questão que coloquei: o Sr. Ministro da Educação disse, expressamente, que, se houvesse casos de injustiça, ele cá estaria para os resolver.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Exactamente!

O Orador: - A questão que coloco à Mesa é a de saber qual é a disposição legal que permite ao Sr. Ministro da Educação contrariar ou actuar sem ouvir o Conselho de Reitores e não permite à Assembleia da República proceder da mesma maneira.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Já há legislação para isso!

O Orador: - Se for capaz de me explicar isto, estará desfeito uma parte do enigma deste debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, infelizmente, a Mesa não é um centro documental de legislação e jurisprudência.
Sr. Deputado António Braga, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, após a interpelação do Sr. Deputado Carlos Coelho, pedi a palavra para interpelar a Mesa, mas foi tão ilustre e iluminada a sua resposta que prescindo de a usar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, porque o tempo não é muito, gostaria de expressar, neste debate, a posição do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes quanto
à matéria em discussão.
Não obstante ter-se acabado com as provas específicas e aumentado as expectativas criadas em termos de democratização de acesso ao ensino' superior com essa medida tomada pelo Governo, implementaram-se os exames nacionais. Com tudo o que aconteceu à volta destes exames nacionais, veio à baila a injustiça da avaliação e do peso relativo dos exames nacionais na média final dos
estudantes candidatos ao ensino superior.
Aliás, no Grupo Parlamentar de Os Verdes tivemos oportunidade de receber inúmeras pessoas e inúmeros pedidos de audiência relativos a esta matéria, o que
estranho não ter ocorrido também em relação ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ou, antes, deveria estranhar a falta de vontade do Partido Socialista em ouvir as pessoas sobre estas matérias, mas já nada me espanta.
São umas horas, umas meras horas, a decidir tudo e isso contraria o processo de avaliação baseado na avaliação contínua, nos conhecimentos e na dedicação demonstrados pelos estudantes ao longo dos anos.

Não gostaria de deixar passar este debate sem referir mais uma vez esta questão, que nos parece de extrema importância. Em cada remodelação do acesso ao ensino superior, em cada exame de Estado, vem novamente à baila a injustiça deste regime de acesso e a necessidade efectiva de uma maior ponderação da avaliação contínua na nota final de acesso ao ensino superior.
Portanto, neste momento, estou a realçar e a fazer eco, aqui, da expressão de muitos estudantes e pais, nesta altura, relativa à injustiça destes exames nacionais.
Mas, na verdade, vivemos no País do imediatismo e os exames nacionais fazem parte dessa realidade.
De facto, temos de nos questionar relativamente a algumas matérias que não podemos deixar passar em claro. Temos de reflectir e saber o que é sentir a implementação de qualquer reforma ou alteração no acesso ao ensino superior, alterações essas que são constantes, sem que passe pela cabeça dos estudantes o que isso significa e o que isso é, na verdade.
Creio que seria bom que algumas pessoas, nomeadamente quem governa o País e implementa esta política de educação, conseguissem perceber a insegurança que se cria com este facto, que foi criada durante 10 anos ,e que, pelos vistos, agora, ainda não ,passou de moda.
O Sr. Ministro da Educação assumiu, entretanto, que não havia condições objectivas para a realização de exames nacionais.com sucesso e que estes iam ser um falhanço. Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes entende que a responsabilidade, nomeadamente política, do Ministro da Educação é acrescida neste processo. Afinal de contas, sabia-se do falhanço que iríamos encontrar com a realização destes exames nacionais e nada foi feito para o evitar, para evitar esse desaire relativo aos exames nacionais.
Depois, vem a história das gralhas e dos erros dos exames, que não vale a pena aqui repetir,...

O Sr. António Braga (PS): - Erros, está bem, falhanços, não!

A Oradora: - ... uma vez que tanto neste debate como noutro isso já foi por diversas vezes vincado.
Porém, vale a pena repetir quais foram as soluções apontadas pelo Governo do Partido Socialista. Na verdade, ficou claro que tinham de se inventar soluções, porque a questão era tão injusta, tão injusta, que tinham de se inventar soluções, nem que fossem injustas, para não se dizer que nada se fazia. Então, veio a história das bonificações, dos dois valores, que é perfeitamente absurda e que nem me atrevo a comentar de novo. E veio também a segunda prova, na l.ª fase, sem opção pela melhor nota.

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - É verdade, sim, Sr. Deputado! Sabe-o muito bem e não me consegue demonstrar o contrário!
O que deveria ter acontecido, e, aliás, tivemos oportunidade de o propor neste Plenário, era que a nota desta segunda prova pudesse servir como alternativa à da primeira. Mas não! O que os estudantes tiveram de fazer foi prescindir da nota do primeiro exame para realizarem a segunda prova, o que não nos parece ter sido uma

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solução que tenha viabilizado e reposto a justiça em todo este processo.
Entretanto, o Governo encontrou outra solução caricata: o não cumprimento das recomendações feitas pela Assembleia da República, a primeira das quais foi aqui aprovada por unanimidade.
Dito isto, correndo um pouco aquela que foi a situação caricata e o desaire, repito-o, mais uma vez, destes exames nacionais, há que apontar soluções justas para todo este processo. Por isso, gostaria aqui de vincar que nós, Partido Ecologista Os Verdes, concordamos em absoluto com a solução e o remédio para este desaire, repito, dos exames nacionais, apresentados nos três projectos de lei hoje em discussão.

O Sr. António Braga (PS): - Mas são muito diferentes!

A Oradora: - Uns, decerto, são mais completos que outros, mas, em termos do objectivo de reposição de justiça, devo dizer que concordamos com os três projectos aqui apresentados e, portanto, com a abertura de vagas adicionais.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, recordando a esta Câmara que o PS, apesar de ter prometido 0 contrário, tem apostado no numerus clausus, o que contestamos.
O PS tem continuado a apostar nas barreiras de acesso ao ensino superior, nomeadamente com a nota mínima e com aquilo que, na prática, se verificou que ela representou.

O Sr. António Braga (PS): - Mas entraram mais alunos!

A Oradora: - O que contestamos é a política do PS de restringir o acesso ao ensino superior, o que muito nos desagrada e decerto vem gorar as expectativas criadas, há praticamente um ano.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Oradora: - Peço desculpa, Sr. Presidente. Termino, de imediato.
Quero só dizer que a reposição da justiça é fundamental. Não se diga que está tudo reposto e que não há vestígios de injustiça, não se faça mais dos estudantes cobaias, como o PSD gostava e o PS, agora, continua a fazer, reponha-se a justiça, com a criação de uma situação excepcional para obviar àquilo que foi perfeitamente desastroso.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Excelente intervenção, excepto os últimos segundos!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero somente fazer duas observações rápidas.

A primeira observação - e, de alguma forma, em jeito de resposta àquilo que a bancada do PS hoje tem dito é a de que nós não esquecemos que o Grupo Parlamentar do PS apelou ao incumprimento por parte do Governo dá segunda recomendação. Portanto, não estamos aqui a falar de uma simples atitude do Governo face à realidade...

O Sr. António Braga (PS): - É um conluio!

O Orador: - ... e à compaginação da recomendação com a realidade, mas de um problema que nasce de uma teimosia do Governo, na sequência de um apelo político do Grupo Parlamentar do PS ao incumprimento de uma recomendação aprovada, por maioria, pela Assembleia da República.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Em segundo lugar, gostaria de retornar à questão por mim colocada, a que o Sr. Deputado Fernando de Sousa não soube responder e que é esta: para o Governo do PS, o Ministro da Educação pode, sem ouvir as universidades, fixar vagas adicionais para satisfazer os interesses gerais da política educativa. Isso consta de um decreto-lei publicado pelo Governo. Está escrito!

O Sr. António Braga (PS): - Não é nada disso!

O Orador: - Portanto, o que quero saber é se o Grupo Parlamentar do PS vai ou não apresentar uma iniciativa legislativa no sentido de que seja impossível ao Governo e ao Ministro da Educação, em qualquer circunstância, fixar vagas de acesso ao ensino superior, sem ou à revelia da opinião das universidades.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há vários meses que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita me vem honrando com abundantes citações de intervenções minhas, feitas no Plenário. É certo que algumas das minhas intervenções saem valorizadas pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, que tem a bondade de lhes introduzir toda uma abundância de adjectivação que não constava das minhas intervenções iniciais.
Seja como for, agradecido por essa consideração com que me vai distinguindo, quero dizer-lhe o seguinte: Sr.ª Deputada, eu sempre disse - e esta bancada sempre defendeu - que a intervenção do Governo, em matéria de regras de acesso ao ensino superior no presente ano lectivo, visou introduzir racionalidade no sistema, em circunstâncias complicadas, que a Sr.ª Deputada conhece muito bem, porque se tem distinguido pelo conhecimento dos dossiers educativos.
Assim, V. Ex.ª sabe muito bem que havia um problema de conciliação entre as regras de avaliação do ensino secundário e as de acesso ao ensino superior. Havia um problema de conciliação entre regras incompatíveis, que foi resolvido pelo Governo da forma que lhe pareceu mais favorável e que mais atendia à situação dos estudantes, dispensando-os de fazer uma série de exames e provas nacionais.

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Este sistema que vigorou não é o sistema ideal, nem para o PS nem para o Governo. Foi a solução possível, com a qual a Sr.ª Deputada, no seu intimo, até concordava, como deixou transparecer em alguns momentos do debate aqui produzido antes das férias parlamentares.
Como a Sr.ª Deputada teve o cuidado de salientar, e essa também é a minha opinião, o sistema ideal passa por uma valorização da avaliação contínua, que não estava devida e suficientemente acautelada nesse sistema. Essa é também a nossa posição, foi a que sempre defendemos ao longo dos anos e que a Sr.ª Deputada quis enredar em circunstâncias particulares que presidiram à elaboração desta legislação, que V. Ex.ª muito bem conhece.
Os Srs. Deputados do PCP, há uns meses atrás, e ainda na recente reunião da Comissão Permanente, aludiam frequentemente, aliás, em coro com as restantes bancadas da oposição, ao caos educativo, ao escândalo e à injustiça. Gostava de chamar a atenção de VV. Ex.as para a circunstância do Sr. Deputado José Calçada, na sua intervenção, ter trocado este rico e variado vocabulário por uma alusão a uma instabilidade qualitativa.
Neste momento, chegámos a uma situação de instabilidade qualitativa e é em nome, dela, como já foi sobejamente explicado, que os Srs. Deputados querem introduzir um factor de confusão e de injustiça. Os senhores não querem resolver algo, porque, para resolver os problemas, já foi criada uma 2.ª chamada da 1.ª fase. Quem se sentiu injustiçado já tem a sua situação resolvida, para o bem ou para o mal,...

Vozes do PCP: - Para o mal!

O Orador: -... em situação de transparência e justiça.
Os Srs. Deputados, em nome desta mítica instabilidade qualitativa, pretendem alterar, a meio, as regras do jogo e desestabilizar o sistema. Os Srs. Deputados é que são 0 problema, pois estão a fazer do acesso ao ensino superior neste ano lectivo um processo atribulado, complicado e difícil. Os Srs. Deputados é que são o factor de perturbação e não o Governo ou as falhas nos exames.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Se somos o factor, quer dizer que há perturbações!

O Orador: - Os Srs. Deputados do Partido Comunista também aludiram frequentemente à situação da agitação estudantil. Os Srs. Deputados do Partido Comunista, em particular os da Juventude Comunista, gostam imenso de se tentar «encavalitar» em cima das manifestações sociais e da agitação social,...

O Sr. José Calçada (PCP): - Salvo seja!

O Orador: - ... porque julgam poder tirar dividendos políticos daí; só que as movimentações sociais justas e que não são mediadas pelo Partido Comunista são agitações sociais dos estudantes. Foram eles que embaraçaram o Governo do PSD e não estiveram agora em frente da Assembleia a criar dificuldades ao Governo do PS! Mas foram os estudantes e não foram os Srs. Deputados do Partido Comunista que o fizeram!

Portanto, o Partido Comunista que se deixe destes «tiques», de se tentar «encavalitar» em cima de causas que não são suas e de processos sociais que não são seus.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Bernardino Soares e Luísa Mesquita.
Como o Sr., Deputado Sérgio Sousa Pinto não dispõe de tempo para responder, agradecia que, se puderem, lhe cedam algum.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, V. Ex.ª falou aqui de introdução de racionalidade no sistema e, depois, disse também que a avaliação contínua é que era a preocupação fundamental a introduzir. No entanto, não vimos onde é que a avaliação contínua entrou nesta racionalidade.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): -. Muito bem!

O Orador: - Por isso, perguntava-lhe, em primeiro lugar, que racionalidade encontra nestes exames se, através do correio, em visitas às escolas ou em contactos com os conselhos directivos e com os estudantes, tanta gente alertou para a confusão e para a falta de informação que rodeou todas estas matérias, para além da injustiça que os próprios exames já em si mesmos contêm. Portanto, há aqui uma questão que está por resolver e que não foi esclarecida.
De resto, também não ouvi o Sr. Deputado falar na questão fundamental e fonte desta injustiça, a existência do numerus clausus. Como não 0 ouvi pronunciar-se acerca disso, interrogo-me se também nesta matéria acompanha a diminuição de intensidade do Partido Socialista na defesa da eliminação do numerus clausus, que é notória...

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade! Você quer que resolvamos tudo em seis meses!

O Orador: - ...e que se vê no Programa Eleitoral, no Programa do Governo e nas acções concretas do Sr. Ministro.
Em relação à questão do exercício da autonomia universitária, levantada há pouco pela bancada do Partido Social Democrata, e tendo em conta que nós, nesta bancada, como o Sr. Deputado disse, citamos frequentemente as suas intervenções, devo dizer-lhe que isto não é uma citação mas apenas uma alusão à sua intervenção.
Foi o Sr. Deputado, se bem lembro, que contestou a proposta do Partido Popular - e muito bem! - de introduzir na autonomia universitária a definição das regras de ingresso no ensino superior, dizendo que era claramente excessivo e que isso deveria estar subordinado à política educativa. Então, se fez isto, como é que se explica que venham aqui dizer que se está a pôr em causa a autonomia universitária ou o seu exercício?

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É mais uma cambalhota!

O Orador: - De facto, não se compreende!
Devo dizer-lhe ainda, quanto a essa questão do «encavalitar» e do aproveitamento das. movimentações sociais, que a organização de juventude que representa «dá cartas», porque foi a Juventude Socialista que, enquanto houve manifestações e agitação social à volta da abolição das propinas, esteve sempre contra as propinas e, depois, mais recentemente, descobriu que, afinal, estava apenas contra a lei e não contra a existência de propinas. É, de facto, uma nuance que terá escapado à grande maioria dos jovens e dos portugueses!

Para terminar, deixe-me dizer-lhe que utiliza um estilo muito parecido com o do Sr. Ministro da Educação, pois ele está constantemente a invocar o gradualismo que é preciso ter na abordagem dos problemas.

De facto, V. Ex.ª e a sua bancada aplicam este mesmo gradualismo. Começaram por criticar veementemente os erros existentes, depois, acompanharam a recomendação aqui aprovada por unanimidade e, agora, subitamente, agarram-se ao Governo e contestam estas iniciativas dos restantes grupos parlamentares.
Não pude deixar de reparar que o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto entrou há pouco no Plenário com uma pasta laranja. É, com certeza, a pasta da educação, porque, nesta matéria, não deixa de acompanhar aquilo que foram as políticas de gradualismo do governo anterior.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, deixando a matéria equestre para os corredores da Câmara,...

Risos do Deputado do PSD Carlos Coelho.

... dado este não me parecer ser o espaço ideal para essa discussão, vamos às questões dos exames nacionais do 12 º ano, da avaliação continua, das incoerências dos PS, da sua bancada e do «sim» ou do anão» relativamente à matéria educativa.
Sr. Deputado, é naturalíssimo que tenha começado a sua intervenção por me agradecer a concordância e a coerência que disse ter com a sua intervenção feita na Comissão Permanente e de ela ser, de algum modo, consentânea com as posições do PCP e que tenha acabado suficientemente nervoso, a ponto de ter chegado ao espaço equestre, numa batalha difícil de vencer.
É entendível, Sr. Deputado!
Já aquando de um programa na RTP sobre educação, exames e acesso lhe tinha dado os meus parabéns, por, afinal, o PS defender a avaliação contínua. Afinal, o Sr. Deputado, em nome da bancada socialista, defendia que os exames não deveriam ter o peso que tinham e que até, talvez, nem devesse haver exames.

Vozes do PS: - Não!...

mais uma A Oradora: - Claro! Isto passou-se antes da reunião
de Julho da Comissão Permanente!
Sr. Deputado, se entre os dias 18 e 24 de Julho os senhores fizeram os malabarismos de circo que todos conhecemos, imagino o que foi desde o programa
televisivo Parlamento e o dia 18 de Julho, em que a distância é maior. É natural!
Mas, há pouco, o Sr. Deputado disse tudo. É difícil viver em incoerência. É difícil dizer hoje uma coisa e amanhã outra. E, de facto, o senhor encontrou a frase exacta: «está tudo resolvido, para o bem ou para o mal»!
É verdade! Está tudo resolvido para o mal! O senhor tem razão! E é exactamente por estar tudo resolvido para o mal e por haver milhares e milhares de estudantes que estão mal que aqui estamos hoje a discutir estas três iniciativas
legislativas.
O que é grave é que, tal como o Ministro da Educação nada faz, tendo a noção exacta de que as coisas estão mal, também agora a bancada do PS, tendo a certeza de que as coisas foram resolvidas para o mal, nada faz.
Isto é que é grave!

O Sr. José Calçada (PCP): - É evidente!

O Sr. António Braga (PS): - Não é nada!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Nem faz, nem deixa fazer!

A Oradora: - Mesmo partindo do pressuposto
iluminado, que há pouco aqui ouvimos dizer, que só começam a fazer alguma coisa quando os estudantes vierem para a rua. Espero que os estudantes oiçam este
debate e que, de imediato, tomem as medidas necessárias e suficientes para que as questões, em matéria educativa, se comecem a resolver.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputada, já esgotou o seu tempo.

A Oradora: - Sr. Deputado, só para concluir, se não fosse maçá-lo muito com citações, ler-lhe-ia uma parte da intervenção do Sr. Ministro da Educação na reunião de 18 de Julho da Comissão Permanente: «É verdade, não mudámos nada. Os exames estavam marcados pelo anterior Governo..

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Exactamente!

A Oradora: - ... e nós não mudámos nada. Não houve mudanças, só continuámos». Mas o grave da situação - e naturalmente o senhor ainda não está informado acerca dela, porque não tem ido às escolas, não tem lido o correio e porque nem tudo lhe chega às mãos - é que não vai ser mudado. Não foi mudado este ano, não vai ser mudado para o ano, nem nos próximos três anos, porque, afinal, o que o Sr. Ministro aqui disse,, de que chegariam às escolas, no primeiro período, as alterações aos curricula, as alterações à gestão dos programas e as hipotéticas alterações para os exames do 12.º ano no próximo ano, é perfeitamente falso.

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Com efeito, as escolas, onde os senhores não vão, e o correio, que os senhores não lêem, deixam suficientemente claro que o que vai acontecer é um processo igual ao deste ano, porque as alterações que a elas chegaram só se iniciam no próximo ano lectivo, a partir do 10.º ano, pelo que só vão ter efectivamente razão de ser equacionadas no 12.º ano, daqui a quatro anos, na melhor das hipóteses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, que dispõe de 3 minutos, tempo cedido pelo CDS-PP.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luís a Mesquita, o simples facto de terem sido eliminadas as provas específicas é, por si só, suficientemente esclarecedor de que alguma coisa mudou no sistema. Agora, o que não se podia - e a Sr.ª Deputada, com certeza, concordará - era frustrar as expectativas dos estudantes, que conheciam o sistema de acesso vigente e que não podia ser revolucionado do pé para a mão sem se atender a valores, como o da segurança, que têm de ser tidos em conta em benefício dos estudantes. Portanto, foram introduzidas alterações, que passaram, sobretudo, pela eliminação de provas, para que os estudantes pudessem fazer menos provas, provas que pudessem valer duas vezes na ponderação, facilitando-lhes a vida, pois tinham uma concentração absurda de provas na fase final do 12.º ano.

Vozes do PS: - Exactamente!

Vozes do PCP: - Não é nada disso! É o contrário!

O Orador: - Houve, portanto, uma busca de soluções, na perspectiva de facilitar a vida aos estudantes.

Protestos da Deputada do PCP Luísa Mesquita.

O Orador: - Ó Sr.ª Deputada, leia a legislação e siga a velha máxima «aprender, aprender, aprender sempre!»
Deixe-me dizer-lhe o seguinte: a Juventude Socialista sempre defendeu os exames nacionais, sempre defendeu a avaliação contínua, mas a avaliação contínua tem de ter um factor de correcção, um factor que corrija as assimetrias de avaliação entre o ensino público e o ensino privado, assimetrias de avaliação entre os diferentes pontos do país. Portanto, tem de existir sempre um factor de correcção. Porém, o papel prevalecente tem de pertencer sempre à avaliação contínua.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foi isto que, coerentemente, a JS, o PS e os Deputados nesta Assembleia sempre defenderam.

Vozes do PS: - E escreveram!

O Orador: - Quanto à revisão constitucional, o Sr. Deputado Bernardino Soares concordará connosco, certamente, que não pode ser deixado às faculdades, no

exercício da sua autonomia, estabelecerem de forma absoluta os critérios de acesso ao ensino superior.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Concordo com isso!

O Orador: - Isso iria permitir às faculdades criarem; por exemplo, provas gerais de acesso, provas que avaliassem conteúdos subjectivos não ministrados, não constantes nos curricula, que avaliassem a formação cultural dos estudantes, para, desta forma, avaliarem o seu back ground sócio-económico e lançarem-se na mais desbragada e inaceitável discriminação social.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas não foi isso que perguntei!

O Orador: - Isso seria contrário aos princípios que estão constitucionalmente protegidos, como sejam os da democratização do ensino e da igualdade de oportunidades. Assim, o Sr. Deputado tem abundantes razões para se rever nesta posição.
Agora, o que nada tem a ver com isto é a circunstância óbvia de competir às faculdades dizerem qual é a sua capacidade em estudantes do 1.º ano curricular,...

O Sr. António Braga (PS): - É evidente!

O Orador: - ... qual é o número de vagas disponível. Isto é matéria das faculdades, e convém não confundir os planos.
Por último, para terminar, os Srs. Deputados do PCP estão neste debate, como, aliás, ficou dito pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, e com toda a razão, numa situação particularmente confortável, porque, ao contrário dos Deputados do PP e do PSD, são favoráveis à extinção de numerus clausus.

O Sr. José Calçada (PCP): - Eh!...

O Orador: - Ninguém neste Plenário tem uma noção do que possa suceder como consequência da aprovação deste diploma. E uma das consequências abstractamente possíveis é a pura e simples destruição do sistema de numerus clausus. Pergunto: se os Srs. Deputados, para fundamentarem esta lei, invocam razões de princípio, o que os impede de, para o ano, invocarem razões de princípio e de esterilizarem, ad eternum, o sistema educativo do ensino superior?
Os Srs. Deputados do PCP, honra lhes seja feita - tenho de fazer-lhes justiça -, apesar dás consequências graves que tiveram a lucidez de perceber que poderiam decorrer do seu projecto de lei, fizeram constar da sua solução legislativa um conjunto de nuances e salvaguardas que, no fundo, esvazia por completo o significado da sua proposta, mas deixa de ser perigoso para o sistema em vigor, para o sistema dos numerus clausus, que é aquele que podemos ter neste momento no nosso país, numa solução de equilíbrio entre os interesses de qualificação de mão-de-obra, o nível técnico que exigimos aos nossos profissionais, as disponibilidades do país dentro do desiderato nacional de caminhar no sentido da

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democratização no ensino superior para permitir que cada vez mais jovens possam aceder a uma formação superior. Esse equilíbrio possível tem sido prosseguido e os Srs. Deputados, com o vosso ambíguo projecto de lei, felizmente, não o põem em causa.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero deixar três notas finais na conclusão deste debate. A primeira responde directamente a uma última acusação do Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto que, dirigindo-se a todas as bancadas, com excepção provável da sua própria, afirmou que o problema éramos nós, quando na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o problema está na intransigência, na teimosia do Governo em recusar acatar uma recomendação desta Assembleia e nos ziguezagues constantes do Partido Socialista nesta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Castro de Almeida já hoje teve ocasião de recordar as contradições do discurso do PS: primeiro argumentava que não havia prejudicados, depois fala dos prejudicados da 1.ª fase... O PS que votou favoravelmente uma resolução da Comissão Permanente, aprovada por unanimidade, na qual se reconhecia a existência de problemas e que, por isso, se deveria dar uma última oportunidade aos estudantes, permitindo a melhoria de nota na época de Setembro, é o mesmo que agora, no discurso do Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto, vem dizer que, afinal, não há problemas, porque na 2.ª chamada da 1.ª época já se deu essa oportunidade aos estudantes!

Sr. António Braga (PS): - Exactamente!

O Orador: - O PS, à falta de melhores argumentos, veio arguir a inconstitucionalidade dos projectos de lei apresentados com base na violação dos princípios da autonomia universitária, da igualdade e da «lei-travão», o mesmo PS que, como se viu, na Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, em resposta a uma proposta dos Deputados do CDS-PP, sustentou uma posição diametralmente oposta quanto à interpretação do princípio constitucional da autonomia universitária e da sua tradução em sede de legislação ordinária.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o problema é um só: é o PS, é o PS e as suas cambalhotas, é a intransigência do Governo em não acatar a deliberação da Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segunda nota final: não é fácil, nesta Assembleia - nunca foi, em nenhum momento da história da democracia portuguesa -,encontrar uma convergência

de vontades que vá desde o CDS-PP até ao PCP, partidos tão diferentes mas que apresentam iniciativas legislativas similares. O que é que faz unir estes partidos com iniciativas legislativas próprias? São desígnios estratégicos, posturas ideológicas ou convicções políticas? Seguramente que não. Esta é, objectivamente, uma questão de justiça e de dignidade para a Assembleia da República, porque esta Câmara, que foi capaz de construir uma unanimidade, na reunião da Comissão Permanente de 18 de Julho, tem de tirar as consequências dessa recomendação, dessa unanimidade.
Estamos mais convencidos de que a reviravolta do PS está menos na convicção de que nós não temos razão e mais na circunstância de que está obrigado a sustentar a posição - que não compreendemos - do Governo nesta matéria, porque em condições normais, Sr. Presidente, é nossa convicção que o PS permaneceria fiel à votação que fez em 18 de Julho, em sede de Comissão Permanente, e estaria connosco a aprovar esta lei que, como o Sr. Deputado Jorge Ferreira recordou, e bem, no início deste debate, resulta, num primeiro momento, de um desafio - podemos chamar-lhe convite - feito pelo próprio Governo no encerramento dos trabalhos da Comissão Permanente de Setembro.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, se há consciência de que é necessário fazer justiça e responder com eficácia aos anseios dos jovens que, legitimamente, não podem ficar à porta da universidade depois da recomendação que a Assembleia da República aprovou, também existe uma outra consequência para todos nós: o problema da rapidez. Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não podemos aprovar esta lei em Janeiro, Fevereiro ou Março! Em nome da sua eficácia, teremos de o fazer o mais depressa possível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compreende-se que hoje, mercê das circunstâncias do período de antes da ordem do dia e por esta sessão se ter prolongado até um pouco mais tarde do que era previsível, não tenha sido possível votar, às 18 horas, os projectos de lei apresentados, mas é importante que, na próxima semana, quando estivermos em condições de fazer essa votação, sejamos capazes de dar forma de lei aos projectos aqui apresentados e encontrar a melhor redacção, unindo o melhor que há nos diferentes projectos de lei, para que esta Assembleia, com celeridade e rapidez, em nome da eficácia, possa regular o problema para o qual foram suscitados os projectos de lei.
Finalmente, Sr. Presidente, se a apresentação destas iniciativas legislativas torna legítima a presunção de que a Assembleia da República vai fazer lei dos projectos de lei agora apresentados, que fique claro que vivemos num Estado de direito democrático e que, por isso, lei aprovada tem de ser lei cumprida!

O Sr. António Braga (PS): - Não é preciso dizê-lo!

O Orador: - E que não passe pela cabeça de ninguém...

O Sr. António Braga (PS): - Isso é uma suspeição?!

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O Orador: - ... a tomada de medidas ou a falta de colaboração com o objectivo de, a qualquer pretexto, tentar evitar a aplicação de uma lei da Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Leis que aprovamos em nome da soberania que aqui nos cumpre representar são leis que, num Estado de direito democrático, servem para valer e para fazer cumprir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga. Dispõe de mais 3 minutos, concedidos pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, também em jeito de intervenção final, gostaria de tecer duas ou três considerações importantes sobre esta matéria. Todavia, não resisto a começar por falar desta última suspeição, que não podemos aceitar, lançada pelo Sr. Deputado Carlos Coelho sobre o Governo e a maioria, colocando a eventualidade de o Governo não cumprir a lei.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Suspeição, Sr. Deputado?! Recomendação!

O Orador: - Este Governo cumpre todas as leis e a Assembleia da República, como é óbvio, cumpre a sua função quando as aprova.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho, se o entendi mal, gostaria de dar-lhe a oportunidade de poder dizer que não é assim.

O Sr. Presidente: - A interrupção foi consentida, pelo que será descontada no tempo de que o Sr. Deputado António Braga dispunha.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PSD concede tempo ao Sr. Deputado António Braga, para que não fique prejudicado.
Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, como esta sessão é gravada e transcrita, não precisaria de pedir o seu testemunho. De qualquer forma, pelo que recordo, não me dirigi ao Governo, em nenhum momento desta última intervenção, nos termos que acabou de referir. Se o Sr. Deputado António Braga tem alguma razão para supor que o Governo é uma das instituições que podem caber no aviso que fiz, essa é uma conclusão sua e não minha! Não identifiquei ninguém e ficaria mal que essa ideia persistisse neste debate. Mas, repito, se o Sr. Deputado António Braga entende que o Governo pode caber nas minhas recomendações, é uma conclusão sua e, seguramente, não foi uma conclusão minha.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Braga, faça favor de continuar no uso da palavra.

O Orador: - Sr. Presidente, pelo menos ficou claro que o Sr. Deputado Carlos Coelho retira a suspeição, e isso

já- me basta. Embora pudéssemos discutir quem seria o destinatário, porque só pode ser um de dois: ou o Governo ou as universidades. Portanto, _ Sr. Deputado, não é difícil adivinhar! Mas o Sr. Deputado retirou o que disse e, por isso, não insistirei nesse ponto, nem lembrarei outras situações, essas sim, de incumprimento por parte de um Governo anteriormente apoiado pelo Grupo Parlamentar do PSD.
Sr. Presidente, quero apenas dizer que o Partido Socialista, nesta matéria, nunca fez nenhum ziguezague.

O Sr. Castro Almeida (PSD): - Não?!...

O Orador: - Desde o princípio, sempre colocámos a questão onde devia ser colocada.

O Sr. António Filipe (PCP):

- Foram peões!

O Orador: - Não, não foram peões, Sr. Deputado António Filipe! Não fomos nós que defendemos uma tese muito discutível sobre a aplicação da lei-travão! Foi o Sr. Deputado, não fomos nós!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Foi a Assembleia da República, Sr. Deputado!

O Orador: - Naturalmente, mas temos o direito de ter uma opinião diferente! Vencido mas não convencido! Ainda me resta, pelo menos, essa possibilidade e, como sabe, ainda posso, eventualmente, recorrer a outra instância, que é o Tribunal Constitucional.

O Sr. José Calçada (PCP): - Mau, mau!

O Orador: - Naturalmente! Não é um direito que assiste aos Srs. Deputados?! Não é um direito consagrado?! Era o que faltava!
Sr. Presidente, para situar brevemente a nossa posição, desde o princípio que colocámos a questão ao nível do mérito académico que tinha de ser respeitado e conseguido e das injustiças que tinham de ser corrigidas, se se verificassem.
O Sr. Deputado Carlos Coelho e o PSD referem insistentemente a primeira deliberação que aqui aprovámos em 18 de Julho e é bem verdade que o PS deu o seu voto favorável, mas não é menos verdade que disse com clareza que, nomeadamente, o último ponto - creio que era o ponto 5 - da proposta do PSD era uma pura redundância.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Como se viu, não era!

O Orador: - Dissemo-lo, disse-o eu, inclusivamente, pelo que o Sr. Deputado não vai interpretar aquilo que eu disse quando estou presente lá basta quando a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita necessita de o fazer!

Risos da Deputada do PCP Luísa Mesquita e do CDS-PP.

Sr. Presidente, sempre dissemos que a posição vertida nesse ponto da recomendação, para nós, Grupo Parlamentar do Partido Socialista, era uma redundância, tendo em vista a estabilização de um sistema e de regras que estavam previstas, nomeadamente a época de Setembro, 2.ª fase. Portanto, essa deliberação por unanimidade, da parte do PS, teve este sentido e não há nenhuma alteração em relação a esse momento e a essa posição. Que fique claro,

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4 DE OUTUBRO DE 1996 3601

de uma vez por todas, que o Grupo Parlamentar do PS sempre teve uma postura de grande responsabilidade na apreciação desta matéria.
Em segundo lugar, o PS não tem nenhuma divergência entre a posição na Comissão Eventual para a Revisão da Constituição e aquilo que disse aqui, no Plenário, ou, inclusivamente, na Comissão de Educação. É que uma coisa são os critérios de acesso ao ensino superior e outra coisa são as vagas, Sr. Presidente. O Sr. Deputado Carlos Coelho quer meter tudo no mesmo «saco», isto é, quer meter as vagas no «saco» dos critérios mas, como disse, e bem, o meu camarada e distinto Deputado, Sérgio Sousa Pinto, não é a mesma coisa. O Deputado Sérgio Sousa Pinto explicou muito bem o que são os critérios e sabemos que as vagas só podem ser conseguidas com as condições que existem nas universidades e que são propostas, em face dessas condições, à tutela, neste caso ao Ministério da Educação, que as homologa ou não, mas, em regra, homologa-as, muitas vezes até negociando melhores condições, para poder dar satisfação aos anseios das universidades. Portanto, sobre essa matéria também não há nenhuma incoerência.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para terminar, quero dizer que já percebemos que, nesta Assembleia da República, se pode criar uma lei com a qual, evidentemente, o meu grupo parlamentar não está de acordo, e desde já o anunciamos. Não retiramos um milímetro, como já dissemos, à legitimidade dessa lei e, obviamente, se ela for aprovada, será respeitada. Não sei se os grupos parlamentares se vão entender, porque, de facto, a proposta do PCP é bem distinta das propostas quer do PP quer do PSD e prevejo grandes dificuldades para se chegar a um texto consensual que reuna esses três votos, mas logo se verá.

Risos.

Porém, o nosso grupo parlamentar não pode concordar com a postura que foi aqui assumida, a propósito destes projectos de lei, justamente porque eles vão introduzir um sistema de injustiça e, do nosso ponto de vista, afectar o princípio da igualdade no acesso ao ensino superior.
Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado! Isso é que é redundante!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa ordem de trabalhos. A próxima sessão plenária terá lugar na quarta-feira, pelas 15 horas.
Um bom fim-de-semana e um bom congresso para o PSD.

Risos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Mas há congresso?!...
Risos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Albino Gonçalves da Costa.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Joaquim Moreira Raposo.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

António Joaquim Correia Vairinhos.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
Augusto Torres Boucinha.
Carlos Manuel de Sá Correia.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.

Faltaram á sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Agostinho Marques Moleiro.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Gilberto Parca Madail.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Rui Manuel Pereira Marques.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

A DIVISÃO DE REDACÇAO E APOIO AUDIOVISUAL.

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3602 I SÉRIE -NÚMERO 106

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