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Quinta-feira, 17 de Outubro do 1996 I Série - Número 1
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 2.A SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE OUTUBRO DE 1996
Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral
Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os 59 e 60/VII e dos projectos de lei
n.os 227 a 230/VII, bem como de requerimentos entretanto apresentados.
Em declaração política, o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) criticou a actuação do Governo durante a campanha eleitoral para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Trindade (PS). Na sequência, o Sr. Presidente em exercício (Mota Amaral) associou-se às forças políticas participantes nas eleições regionais e felicitou os candidatos eleitos.
O Sr. Deputado António Martinho (PS) falou do recente protocolo assinado pelo Governo e pela Casa do Douro e criticou as medidas tomadas pelo anterior governo para a Casa do Douro. Respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP).
O Sr. Deputado Manuel Moreira (PSD), a propósito da próxima discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1997, sugeriu ao Governo a inclusão de projectos e o reforço das dotações orçamentais de outros para a Região Norte, para a Área Metropolitana do Porto e para o município de Vila Nova de Gaia. Respondeu, no final, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Fernando de Sousa, Fernando Jesus e José Barradas (PS).
Foi debatido e votado, tendo sido aprovado, o voto n.º 42/VII - De protesto pela atitude do Governo e do Primeiro-Ministro na campanha eleitoral dos Açores (PSD). Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Reis Leite (PSD), António Trindade (PS), Jorge Ferreira (CDS-PP), Guilherme Silva (PSD), Octávio Teixeira (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Tendo sido requerido, ao abrigo do artigo 78.º, n.º 4, do Regimento, respectivamente pelo PS e pelo PSD, o adiamento da discussão dos votos n.os 44 e 45/VII, fizeram interpelações à Mesa os Srs. Deputados António Braga (PS), Carlos Coelho (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP), Jorge Lacão (PS) - que também exerceu o direito de defesa da consideração da sua bancada -, Octávio Teixeira (PCP), Luís Filipe Menezes (PSD) e Isabel Castro (Os Verdes).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à retoma de mandato de um Deputado e à substituição de um outro.
Procedeu-se ao debate de urgência sobre a abolição das provas globais dos ensinos básico e secundário e o necessário rigor e exigência no sistema educativo, da iniciativa do PSD. Usaram da palavra, a diverso título, além do Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa), da Educação e Inovação (Ana Benavente) e do Ensino Superior (Jorge Silva), os Srs. Deputados Carlos Coelho (PSD), Fernando de Sousa (PS), Luísa Mesquita (PCP), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), António Braga (PS), Castro de Almeida (PSD) e Bernardino Soares (PCP).
Ordem do dia. - Foi apreciado o projecto de deliberação n.º 24/VII - Prorroga o prazo fixado pela Deliberação 12-PL/96, tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Eurico Figueiredo (PS), Álvaro Amaro (PSD), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), João Amaral (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e José Junqueiro (PS), que suscitou um pedido de defesa da honra e consideração do Sr. Deputado Carlos Coelho (PSD).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 173/VII - Utilização do papel reciclado pela Administração Pública (PS) e 216/VII - Regime de promoção do uso de papel reciclado (Os Verdes). Intervieram no debate os Srs. Deputados Paulo Neves (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Natalina Moura (PS), Macário Correia (PSD), Bernardino Soares (PCP) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
A Câmara apreciou ainda a petição n.º 109/VI (l.ª), subscrita por Rodrigo Jorge de Moctezuma Seabra Pinto Leite e outros, reclamando contra o teor da alínea b) do artigo 288.º da Constituição da República Portuguesa. Usaram da palavra os Srs. Deputados António Reis (PS), Barbosa de Melo (PSD), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP) e José Calçada (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 35 minutos.
Renovação de assinaturas: ver informação na última página
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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes 4a Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Vital Martins Moreira.
Partido Social-Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Cromes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
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Filomena Maria Beirão Mortagua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Herminio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa. João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvao da Silva.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Gonçalves Sapinho.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custodio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
Augusto Torres Boucinha.
Carlos Manuel de Sá Correia.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas e dos requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: propostas de lei
n.os 59/VII - Grandes Opções do Plano para 1997 e 60/VII Orçamento do Estado para 1997, que baixaram à 5.ª Comissão, é projectos de lei
n.os 227/VII - Criação da freguesia de Casal de Cambra (PCP), 228/VII - Elevação da vila de Alcácer do Sal à categoria de cidade (PCP), 229/VII - Elevação de Queluz à categoria de cidade (PCP) e 230/VII - Reorganização administrativa da vila de Queluz com a criação das freguesias de Massamá e Monte Abraão (PCP), que baixaram à 4.ª Comissão.
Foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 8 de Outubro de 1996, ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Guilherme Silva; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Castro de Almeida, Sílvio Rui Cervan e Jorge Ferreira; aos Ministérios da Saúde e da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Correia da Silva; aos Ministérios da Economia e para a Qualificação e o Emprego, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada e à Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Na reunião plenária de 9 de Outubro de 1996, ao Sr. Ministro Adjunto, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Baptista; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Castro de Almeida; ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Macário Correia, Octávio Teixeira e Ismael Pimentel; a diversos Ministérios, à Câmara Municipal de Vila Franca de Xira e à Junta de Freguesia de Alverca, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; aos Ministérios da Saúde e da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira; aos Ministérios da Administração Interna e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; aos Ministérios para a Qualificação e o Emprego e da Solidariedade e Segurança
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Social, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares e ao Ministério do Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados, seguindo a ordem do artigo 72.º do Regimento, a primeira parte do período de antes da ordem do dia compreende declarações políticas.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr: Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tiveram lugar no último domingo, nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, eleições para as Assembleias Legislativas Regionais. Os açorianos e os madeirenses foram chamados pela sexta vez a escolher os seus representantes nos parlamentos regionais e os governos de cada uma das regiões para os próximos quatro anos.
As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e as suas populações têm dado mostras do seu apego à democracia em momentos dos mais difíceis da nossa história. Lembre-se que uma das primeiras e mais importantes sublevações contra a ditadura de Salazar ocorreu na Madeira em 1931, através de um movimento que ficou conhecido por «Revolta da Madeira», a que a população aderiu em massa e que se prolongou por cerca de um mês, período durante o qual a região não acertou subordinar-se ao Governo da República. Tal revolta só veio a ser dominada por forças militares deslocadas expressamente do continente para a reprimir e este apego à democracia custou caro às suas populações, a quem Salazar aplicou durante longos anos um imposto especial alegadamente destinado a recuperar os custos do apaziguamento da revolta.
E quando, em anos mais recentes, as liberdades voltaram a estar ameaçadas e no continente se caminhava para novas soluções totalitárias, as populações insulares utilizaram todos os seus legítimos meios de resistência e não deixaram de fazer sentir que se não subordinariam a opções nacionais que pusessem em causa a democracia pluralista, que se pretendia restaurar, e que constituiria a razão principal do 25 de Abril por que muitos se haviam batido.
Não admira, pois, que a luta das populações insulares, pela autonomia regional tenha estado sempre associada à luta pelas liberdades e pela democracia, sabido que não há democracia sem autonomia e de que não há, igualmente, autonomia sem democracia.
Compreender-se-á, assim, que as populações dos Açores e da Madeira sintam de forma particularmente intensa as eleições regionais, em que vivem e realizam, a um tempo, o Abril da democracia e o Abril da autonomia.
Daí que a minha primeira palavra seja para dirigir a mais sentida saudação às populações das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, a que me orgulho de pertencer, pelo profundo civismo e maturidade democrática que revelaram na sua livre, expressiva e consciente participação em mais este acto eleitoral.
Aplausos do PSD.
Ocorreram estas eleições regionais num momento e num quadro político nacional que se caracteriza pela existência, há cerca de um ano, de um Governo Socialista. Cedo nos apercebemos de que o Parido Socialista não hesitaria, como não hesitou, em utilizar ou instrumentalizar o Governo da República e os seus Membros na campanha para o acto eleitoral que teria lugar nas regiões autónomas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sucederam se, assim, deslocações de Ministros e do próprio Primeiro-Ministro à Madeira e aos Açores em período de campanha ou de pré-campanha e , foi vê-los feitos ventríloquos ,e duplos de si próprios, desdizendo-se e contradizendo-se em declarações que prestavam ora como governantes ora como responsáveis partidários. Assistiram-se a espectáculos politicamente confrangedores e a práticas da maior gravidade cívica e democrática.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, ficou claro que de há muito o Partido Socialista preparava a instrumentalização e a utilização de meios públicos no combate eleitoral nas, regiões autónomas. Estão por certo lembrados da tentativa de alteração, por simples ordem de serviço, da orgânica dos centros regionais da RTP dos Açores e da Madeira que ocorreu no curto consulado da administração de Manuela Morgado.
Travámos os ímpetos e os intuitos mais vastos que então se desenhavam. Porém, a RTP não hesitou em, com subalternização dos centros regionais da Madeira e dos Açores e com total desconsideração pelos qualificados jornalistas que ali prestam serviço, fazer deslocar às regiões autónomas equipas para a cobertura da campanha e das eleições regionais.
O País assistiu durante tal período à escolha seleccionada e intencional de questões sociais ou de aspectos negativos das regiões autónomas, que, apesar de isolados, eram apresentados como generalizados. Tal foi o caso das
poucas furnas utilizadas na Madeira como habitação de algumas pessoas mais carenciadas, chegando-se mesmo ao ponto de afirmar que, no Funchal, havia uma taxa de 50% de analfabetos!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A mentira, a omissão ou a deturpação como forma de veicular uma imagem negativa dos governos regionais e do PSD constituiu preocupação constante da RTP nos períodos mais críticos da campanha com preterição das mais elementares regras de objectividade, de independência e de isenção, que se exige a toda a comunicação social e, em particular, à televisão pública.
É tempo de acabar com este escândalo de uma televisão paga por todos nós, contribuintes, estar transformada num órgão oficioso de um partido e de um Governo.
Aplausos do PSD.
A questão que referi, no que toca às eleições regionais, foi de tal forma gritante e escandalosa que em debate havido na televisão regional, no próprio dia das eleições, um responsável local do Partido Socialista, o Engenheiro David Caldeira, reconheceu a necessidade de se tomar qualquer iniciativa que permitisse corrigir a imagem negativa da Madeira que a televisão pública nacional sistematicamente dera durante a campanha.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo prepara-se para considerar toda e qualquer programação de todos os canais da RTP como serviço público, aumentando desmesuradamente as indemnizações compensatórias que o Estado lhe confere. Quanto mais cara nos sai a televisão pública, menos independente, menos isenta e menos objectiva ela é.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Dir-se-ia que o Governo paga o preço do enfeudamento, do servilismo e da obediência.
A este propósito, não posso deixar de denunciar e de exigir da administração da RTP a correcção de uma situação de desigualdade e de discriminação consistente no pagamento de um complemento remuneratório, por isenção de horário, aos jornalistas da RTP no continente, em montante bastante superior ao que é auferido pelos jornalistas dos centros regionais da Madeira e dos Açores em idêntica situação.
Vozes do PSD: - Um escândalo!
O Orador: - É um escândalo a que é preciso pôr termo e que deve ser tido em conta no âmbito das alterações a que a RTP está a proceder.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a interferência do Governo da República e do Primeiro-Ministro e a instrumentalização do Estado a favor do Partido Socialista nas eleições regionais teve o seu auge no anúncio de uma falsa redução das tarifas da TAP.
Aplausos do PSD.
Além de constituir a mais escandalosa instrumentalização partidária de uma empresa de capitais públicos, tal acto traduziu-se num insulto às populações das regiões autónomas a quem, fraudulentamente, se pretendeu fazer crer numa efectiva e estrutural redução de tarifas, que não existiu e destinou-se a mero consumo eleitoral.
O escândalo foi de tal ordem que, embora só depois do acto eleitoral, até o jornal Público qualificou tal acto como a «mais vergonhosa acção de eleitoralismo terceiro-mundista dos últimos tempos, concretizada no anúncio, em comício, de uma conversa telefónica entre o candidato a presidente do governo, pelo PS, e o Primeiro-Ministro sobre as tarifas da TAP. Ficou-se a saber que César pediu, Guterres aceitou e o Presidente da TAP acatou».
Mas o mais espantoso de tudo isto, revelador da maior confusão entre o Partido Socialista e o Estado e que confirma a intervenção partidária e eleitoralista do Engenheiro Guterres, enquanto Primeiro-Ministro, nas eleições regionais e a interferência do Governo na esfera de actuação da administração de uma empresa que era suposto ter acção própria não mereceu qualquer desmentido, remetendo-se o Engenheiro Guterres, até hoje, a um conivente e significativo silêncio!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Intolerável também foi a interferência, pela primeira vez, dos Ministros da República nas eleições regionais sob o disfarce de solene apelo ao voto, com a abusiva ocupação de um espaço que, por direito próprio, só ao Presidente da República poderá caber.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, porém, escândalo maior nestas eleições foi a acção da Comissão Nacional de Eleições ao instituir, pela primeira vez, delegados seus nos Açores e na Madeira. Mais do que a atitude em si, é o significado que ela tem já que a intenção era, claramente, a de intimidar e de introduzir constrangimentos como se a Madeira e os Açores não fossem um espaço livre e precisassem de tutelas fiscais ou fiscalizadoras. Se assim não é, pergunta-se se, nas próximas autárquicas, a Comissão Nacional de Eleições vai ter delegados seus no Alentejo, em Trás-os-Montes, no Algarve, no Minho e em todas as demais regiões do País.
Escândalo, em segundo lugar, pela acção pronta da Comissão Nacional de Eleições ao intervir quando se tratava de questões contra o PSD ou que indirectamente o visassem, em contraste flagrante com a omissão noutras situações que justificavam a sua intervenção. Foi rápida e profundamente deselegante a CNE a intervir em relação a declarações do Bispo do Funchal. Mas já foi completamente omissa quando a RTP, a oito dias das eleições, teve no seu estúdio, em pleno Telejornal, um comentador da Universidade Católica a comentar sondagens, ou melhor, a defender a sondagem que a Universidade Católica tinha feito, a pior para o PSD, e a desvalorizar outras sondagens, bem melhores para o PSD, numa clara violação, por parte da RTP, de todos os princípios, incluindo de tratar com igualdade e equilíbrio as demais empresas de sondagens.
Escândalo, finalmente - o maior de todos -, a propósito da decisão da TAP, com cobertura governamental, de anunciar em plena campanha eleitoral a baixa das tarifas aéreas. Neste caso, a CNE cobre-se de ridículo: em vez de tomar uma decisão antes do dia das eleições, aguardou, obediente ao Governo da República, o domingo para só decidir na segunda-feira. Depois, mais obediente ainda ao poder instituído em Lisboa, resolveu decidir da forma mais sectária, menos isenta e intelectualmente mais desonesta que alguma, vez poderia imaginar-se, não encontrando eleitoralismo algum numa decisão em que todo o País, da direita à esquerda, sem excepção, considerou existir manobra eleitoral, oportunismo inqualificável e abuso inadmissível do poder do Estado.
Aplausos do PSD.
Ao agir neste caso como agiu, a CNE demitiu-se das suas obrigações e da independência que devia ter. Não teve isenção, violou a ética, acomodou-se ao poder e perdeu a pouca credibilidade que ainda poderia ter. Não se deu ao respeito e, a partir de agora, não mais pode ser respeitada.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, chamo-lhe a atenção para o facto de estar a ultrapassar os 10 minutos de que dispunha, pelo que lhe peço que sintetize as suas considerações e termine.
O Orador: - Como pode uma entidade que revela tamanha falta de isenção pretender ser idónea para garantir e assegurar a isenção dos actos eleitorais? Têm, por isso, os actuais membros da Comissão Nacional de Eleições uma única saída: demitirem-se das suas funções já que se demitiram da obrigação de serem isentos, independentes e imparciais. É o convite que lhes fazemos.
Aplausos do PSD.
Será o único gesto capaz de limpar tamanha falta de credibilidade. Se o não fizerem, terão da nossa parte,
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doravante, o que merecem - o ostracismo puro e simples e o envio das suas orientações para o único lugar possível, o das coisas inúteis, com as quais não deve perder-se um minuto que seja de atenção ou consideração.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos preocupados com a situação na Região Autónoma dos Açores mas confiantes em que será encontrada uma solução que respeite a vontade do eleitorado e garanta a estabilidade e a continuidade de um trabalho que tem sido feito em prol do desenvolvimento e da melhoria das populações da Região Autónoma dos Açores.
Quanto à Madeira, estamos seguros de que essa obra e esse esforço que tem sido levado a cabo pelo PSD, nos últimos 20 anos, com o empenho das populações da Madeira e do Porto Santo, vai continuar sob a merecida liderança de quem sempre tem colocado a Madeira e Portugal acima dos interesses partidários e de outros que não se identifiquem com o interesse colectivo da região e com o interesse nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Trindade.
O Sr. António Trindade (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, ouvi com muita atenção a sua intervenção bem como o debate transmitido pela RTP no dia das eleições regionais e devo dizer-lhe que tanto o PS/nacional como o PS/Madeira tiveram um cuidado extremo quer no período de pré-campanha quer na campanha eleitoral em clarificar muito bem as funções que os nossos camaradas do PS iam desempenhar na Madeira. Assim, na sequência daquilo que o PS sempre defendeu quanto a um relacionamento institucional isento e extraordinariamente benéfico para as regiões, foram convidados Ministros e Secretários de Estado do nosso Governo, que sempre souberam distinguir muito bem a qualidade em que ali se encontravam. Também nos Estados Gerais do PS e em período de campanha eleitoral souberam distinguir muito bem que a sua presença se devia à condição de membros do Partido Socialista e não do Governo, bem ao contrário de situações anteriores passadas na Região Autónoma da Madeira.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Guilherme Silva, no passado domingo não se assistiu à vitória do PSD na Região Autónoma da Madeira - e falo da Madeira porque, sobre os Açores, o Sr. Deputado Sérgio Ávila fará amanhã uma declaração política -, assistiu-se, isso sim, à vitória de um homem, Alberto João Jardim, que, ultrapassando tudo e todos, e sendo o único protagonista de um jogo de poder, soube passar afectiva e emotivamente uma mensagem. Mas não foi apenas isso que se passou. Usando e abusando daquilo a que pode chamar-se agora realidade pós-virtual ou mediática, soube adiantar obras, que reputamos de particular importância para o desenvolvimento daquela região fazendo pretensas inaugurações porque, tal como o Sr. Deputado sabe, uma substancial percentagem daquelas obras não está terminada. Por exemplo, foram alcatroadas estradas em que o betão foi retirado meia hora após a inauguração mediante a utilização de compressores; foram inauguradas escolas hoteleiras em que o equipamento, tendo sido colocado para o efeito, voltou a ser retirado uma hora depois. Enfim, assistiu-se a uma realidade mediática que envolveu artistas circenses porque até um circo foi levado para a Madeira.
Mas também soube aproveitar-se muito bem de uma postura exemplar do Governo Socialista e da nova maioria. A este propósito, Sr. Deputado Guilherme Silva, deixe-me perguntar-lhe se não terá sido, na realidade, num ano de maioria PS que se iniciou naquela região uma política de preços nacionais e do direito a acessibilidades, de que já falaremos quando abordarmos o problema da TAP, que houve a redução de um ponto percentual da taxa do IVA, que se implementou o subsídio às bordadeiras, que se levou um canal público de televisão para aquela região.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, no espaço de um ano, não se terá feito mais por aquela região do que nos últimos 10 anos?
Protestos do PSD.
E mais: leia, Sr. Deputado Guilherme Silva, o que a própria comunicação social da Região Autónoma da Madeira já refere hoje, ou seja, que a postura deste Governo em relação às regiões autónomas é absolutamente exemplar e nunca criou um ambiente de tanta conflitualidade como o que os senhores próprios geraram no tempo dos governos anteriores.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E já que estamos a falar da RTP...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado António Trindade, já ultrapassou largamente o seu tempo, pelo que lhe peço que conclua rapidamente.
O Orador: - Sr. Presidente, peço a sua complacência pois gostaria de responder ao Sr. Deputado Guilherme Silva, nomeadamente no que respeita à RTP e à TAP, matérias que dizem respeito a todos nós.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Peço-lhe então que seja sintético, Sr. Deputado.
O Orador: - Só quero lembrar ao Sr. Deputado que quem convidou o jornalista da RTP, o qual, aliás, foi ameaçado de expulsão no meio das «cantorias» da «Madeira Livre», foi o director do Centro Regional da RTP.
O Sr. Deputado Guilherme Silva vem dizer que, na noite das eleições, um candidato independente pelo Partido Socialista referiu-se aos analfabetos e ao défice habitacional. Sr. Deputado, no que diz respeito a analfabetismo e às menções que lhe foram feitas pela RTP, tenho de dizer-lhe que ambos sabemos que na Região Autónoma da Madeira ainda há 30% da população activa que é analfabeta. Estes dados resultam dos censos que foram realizados e, portanto, são factos.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado António Trindade, peço-lhe o favor de concluir. Poderá sempre inscrever-se posteriormente para usar da palavra noutra ocasião sobre essa e outras matérias.
O Orador: - Sim, Sr. Presidente.
Então, termino e deixarei paca outra oportunidade a matéria relativa à TAP que considero um dossier suficientemente vasto para ser tratado em separado.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Trindade, eu já conhecia essa posição do Partido Socialista que tem dificuldade em aceitar os resultados que lhe são desfavoráveis. Ora, esse é que é o défice democrático de que VV. Ex.as tanto falam!
Aplausos do PSD.
Sr. Deputado, quero dizer-lhe algo muito simples. Só inaugura obras quem as faz fá-las em cumprimento de compromissos que assume para com o eleitorado. Isto dói-vos, mas o eleitorado vê, percebe e sabe quem cumpre e quem não cumpre.
Quanto à isenção e à «separação de águas» entre os cargos governativos e os partidários, apenas lhe respondo que o Sr. Primeiro-Ministro foi à Madeira, em pré-campanha, na qualidade de Secretário-Geral do Partido Socialista. O Sr. Ministro da República estava à espera não do Primeiro-Ministro mas do Secretário-Geral do Partido Socialista. Veja lá agora se não há confusão entre o partido e o Estado! Este é um exemplo claro da não separação de funções.
Protestos do PS.
O Sr. Deputado fica muito impressionado com as inaugurações e com a influência que têm no eleitorado. Quero dizer-lhe que, após as derrotas eleitorais que sofre, ouço repetidamente o Partido Socialista inventar desculpas para os seus percalços, ou invocando questões processuais ou fiscalizações, mas a mais grave é essa que o Sr. Deputado aqui insinua, ou seja, a da ignorância do povo da Madeira. O povo da Madeira não é ignorante. O povo da Madeira é lúcido e sabe perfeitamente o que quer.
Aplausos do PSD.
Protestos do Deputado do PS António Trindade.
E mesmo aqueles que, infelizmente, são analfabetos - e estamos a fazer tudo para que também estes deixem de o ser - não têm culpa. Nós todos é que temos culpa disso e o senhor também. Mas apesar de serem analfabetos, estes eleitores têm a lucidez e a clarividência bastantes para saberem escolher quem deve representa-los e governa-los. E os senhores não têm respeito por essa escolha. Portanto, respeite-os pois, se calhar, muitos desses que integram a massa de analfabetos têm mais sabedoria do que V. Ex.ª
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à isenção do seu partido, quero ainda dizer-lhe algo muito simples: enquanto VV. Ex.as não se retratarem publicamente e não reconhecerem o escândalo eleitoralista que foi a diminuição das tarifas da TAP, não têm moral para levantar qualquer questão nessa área.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados: Em virtude de ocupar hoje a cadeira presidencial, não me é permitido intervir neste debate.
Tendo, porém, exercido, durante quase 20 anos, altas responsabilidades nas instituições autonómicas insulares, decerto me consentirá a Câmara que me associe, com uma congratulação pessoal, às forças políticas participantes, em serviço da democracia, nas eleições regionais.
Felicito de forma especial o PSD/Madeira e o PS/ Açores, que das eleições saíram vitoriosos.
Com sinceridade dirijo ao meu velho amigo Dr. Alberto João Jardim, Deputado a esta Assembleia, embora impedido e ao meu leal adversário de há longo tempo, Carlos César, antigo Deputado também nesta Casa, cordiais parabéns pela sua eleição como Presidente dos Governos Regionais da Madeira e dos Açores.
Aplausos gerais.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, é para dizer que, embora concordando com as suas palavras, queremos fazer notar que o Partido Socialista apresentou na Mesa um voto de saudação relativamente às eleições nos Açores e na Madeira.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem toda a razão, Sr. Deputado José Junqueiro. Esse voto consta dos documentos da sessão e será submetido a discussão e subsequente votação em momento oportuno.
Srs. Deputados, passamos agora ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O protocolo assinado ontem pelo Governo e pela Casa do Douro constitui uma prova inequívoca de que, com o Governo do PS, o diálogo é eficaz e os problemas não se arrastam indefinidamente nem se deixam apodrecer.
Os 10 últimos anos, se bem analisados no que se refere ao Douro, foram 10 anos de desprezo, de abandono dos agricultores desta região demarcada. Poderei mesmo dizer que, nesse período, houve tentativas claras de destruição da entidade que representa a lavoura duriense, a sua Casa do Douro. Se outros sinais não tivesse havido, a passividade do governo de então se não mesmo a sua cumplicidade no malfadado «negócio» que consistiu na compra de 40% da Real Companhia Velha por parte da Casa do Douro são elucidativas dessa atitude de abandono. Efectivamente, o governo devia ter analisado profundamente as implicações económico-financeiras desse negócio, devia ter actuado de forma a prevenir consequências tão desastrosas para a lavoura duriense. Os meios não lhe faltavam, quer em termos técnicos quer em termos legais. Reportamo-nos, Srs. Deputados, a 1990.
Mas a alteração institucional que o Governo PSD levou a cabo no final da anterior legislatura sem dar ouvido aos partidos da oposição, alteração essa que incidiu, essencialmente, no Estatuto Jurídico da Casa do Douro, é também demonstrativa da afronta à instituição que representa a lavoura duriense.
As propostas iniciais mais não eram do que uma tentativa de acabar com a Casa do Douro, lesando assim gravemente os mais de 30 000 agricultores que ali labutam
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e, no dizer de Jaime Cortesão, tornaram «a montanha deserta em jardim suspenso» de modo a poder produzir o Vinho do Porto e outros vinhos de reconhecida qualidade. Tal atitude pôs também em causa o equilíbrio económico e social da Região Demarcada do Douro. Estas e outras medidas e a ausência delas, nos exactos termos das competências do Governo no que ao Douro respeita, contribuíram claramente para a grave situação em que a Casa do Douro se encontra - tecnicamente falida.
Mas a análise aprofundada que o grupo de trabalho produziu não inibe o Governo de afirmar que é essencial que «a Direcção da Casa do Douro reconheça a responsabilidade do seu passivo perante os respectivos credores».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O protocolo ontem assinado pelo Governo e pela Direcção da Casa do Douro demonstra bem a atitude diferente do Governo PS. Perante um problema, enfrenta-o e procura soluções.
Assim, após uma análise aprofundada da real situação da Casa do Douro e tendo em conta a importância desta instituição para o sector do vinho, nomeadamente o do Vinho do Porto, reconhecendo a sua representatividade relativamente à lavoura duriense e valorizando o seu papel sócio-económico na região, o Governo propôs à sua Direcção, e com ela assinou, o protocolo a que me refiro e ao qual presidem os objectivos que se seguem.
Primeiro: «garantir, em tempo útil, a desistência da Cofipsa em relação às execuções previstas com vendas em hasta pública marcadas para vários tribunais da região do Douro em datas próximas» - a primeira das quais já para o próximo dia 22.
Neste sentido e no contexto já referido, o Governo comprometer-se-á a promover, por parte de entidades adequadas, a compra dos créditos da Cofipsa sobre a Casa do Douro relativos à Real Companhia Velha. O Governo comprometer-se-á, ainda, sem prejuízo da subsistência dos créditos, a desistir das reclamações efectuadas por entidades públicas nas referidas execuções.
Segundo: «inserir a regularização das dívidas da Casa do Douro ao fisco, à segurança social e à Caixa Geral de Aposentações no quadro legal recentemente aprovado pelo Governo e destinado a facilitar uma única e última oportunidade de regularização das situações fiscais dos contribuintes faltosos».
Terceiro: «elaborar uma estratégia de viabilização económica e financeira da Casa do Douro, visando, nomeadamente, reestruturar o seu passivo financeiro, redimensionar os seus encargos fixos e permanentes e, eventualmente, os seus activos, ponderar as receitas e outras fontes de rendimento da Casa do Douro».
Temos assim, Srs. Deputados, uma medida imediata, a primeira destas três. A segunda e a terceira visam mais o futuro e constituem o essencial de uma abordagem de recuperação económica e financeira da instituição, absolutamente indispensável para que ela retome o seu papel regulador e dinamizador do sector vitivinícola da região. Isto sem desvirtuar os mecanismos de mercado e, sobretudo, sem acentuar factores de despesismo público inadequados.
Perante as situações difíceis, o Governo não fecha os olhos. Como afirmou, durante o debate do Estado da Nação, o Sr. Primeiro-Ministro - e, cito: «Governar, não é adiar decisões e deixar apodrecer problemas. Governar não é não saber o que fazer quanto a Foz Côa. Não é deixar armadilhada a construção da nova ponte sobre o Tejo ou a barragem de Alqueva. Nem é lavar as mãos sobre o problema dos horários do comércio. Governar não é assistir impavidamente ao aumento das dívidas à segurança social e ao fisco, nem deixar gangrenar (...)» - gangrenar é a palavra - «(...) a aplicação do Fundo Social Europeu, conduzindo à paralisia do sistema de formação profissional. Como governar não é adiar sempre a abordagem das reformas do sistema de segurança social ou de saúde, impedindo sequer o início do seu debate».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também em relação à Casa do Douro o Governo
demonstra, que não adia decisões nem deixa apodrecer problemas. Esta é, entre muitas outras, uma diferença fundamental relativamente aos governos de Cavaco Silva.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, a situação da Casa do Douro e a necessidade de uma solução que garanta o futuro desta importante instituição da região duriense como estrutura representativa dos produtores durienses é uma questão que há muito acompanhamos nesta Assembleia e que merece a melhor e maior atenção da nossa parte, PCP. Nesse sentido e na medida em que o protocolo ontem assinado possa permitir abrir caminho a uma solução imediata dos problemas que se colocam para já em relação à situação financeira da Casa do Douro, é evidente que nos congratulamos com este mesmo protocolo.
Mas a questão está longe de estar resolvida, Sr. Deputado António Martinho.
O primeiro aspecto que não está resolvido é o de percebermos com clareza qual é a posição do Partido Socialista em relação à Casa do Douro. Coloco esta interrogação porque o tom em que intervêm, por um lado, o Governo, por outro, o Ministério da Agricultura, por outro, o Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro e, por outro ainda, o próprio Sr. Deputado é completamente diferente.
Aliás, o memorando entregue pelo Governo à Casa do Douro responsabiliza esta pela situação existente. Diz mesmo, a certa altura, que o Governo recusa em absoluto as conclusões do relatório da Casa do Douro em que esta imputava às políticas dos governos do PSD a responsabilidade pela sua situação financeira.
Ora, o Sr. Deputado vem aqui criticar - em minha opinião, bem - as políticas anteriores que estiveram na base da situação actual da Casa do Douro. Assim, a minha pergunta é esta: na opinião do Partido Socialista, a situação da Casa do Douro hoje deve-se a quem? Que perspectivas dá o Partido Socialista quanto ao futuro da Casa do Douro como estrutura representativa dos interesses viticultores durienses?
Responda-nos para, de, uma vez por todas, percebermos qual é a posição do Partido Socialista. Se é a do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, Pina Moura, se é a do Ministro da Agricultura, se é a do Deputado António Martinho aqui expressa.
Em segundo lugar, durante a campanha eleitoral no Douro, o Partido Socialista comprometeu-se a apresentar uma proposta para alterar e ajustar o novo figurino institucional que o governo anterior tinha definido. Como sabe, tanto o Sr. Deputado como nós próprios fomos críticos em relação àquele figurino e comprometemo-nos a encontrar soluções na presente legislatura que permitissem uma situação estável, designadamente quanto ao cadastro e à
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execução das funções pela Casa do Douro. Ou será que os senhores já mudaram de opinião, agora que chegaram ao Governo?
Em terceiro lugar, também em relação ao Douro, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1994, os Srs. Deputados António Martinho, Eurico Figueiredo e outros apresentaram um extenso documento, contendo uma proposta com vista a definir os contornos e as bases de uma intervenção estatal na região duriense, uma espécie de plano integrado de desenvolvimento para toda a região. Esse documento existe, está nos nossos arquivos, mas continuamos à espera, até hoje, que haja pistas ou, pelo menos, sinais de que esta iniciativa, apresentada no Orçamento do Estado para 1994, não é só uma proposta do PS enquanto oposição mas algo que o PS assume enquanto Governo. Assume ou não assume esta proposta, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, é um facto que alguns dos Deputados presentes neste Hemiciclo têm uma história de acompanhamento das questões do Douro, uns em tempos mais recuados, outros em tempos mais recentes, mas a verdade é que ambos acompanhámos o «dossier Douro» durante a anterior legislatura e sentimos então - éramos ambos Deputados de partidos da oposição - a incapacidade e a falta de vontade do governo de então em dialogar connosco, porque nessa altura ter-se-ia podido criar instrumentos legislativos mais consentâneos com a região e mais adequados à resolução dos seus problemas.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Assim não quis a maioria de então e assim não foi possível trabalhar nesse sentido. Estamos disponíveis e continuamos abertos para introduzir as alterações que se tornem necessárias.
Relativamente à aparente incoerência entre o memorando que alguns órgãos de comunicação social divulgaram, o protocolo ontem assinado e a minha intervenção, devo dizer que só não haverá perfeita articulação aparentemente...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado António Martinho, não falei do que foi divulgado pelos órgãos da comunicação social mas do memorando e do protocolo ontem assinado, pois tenho os documentos. E já não me referi, sequer, à nomeação do Presidente da CIRDD, porque essa questão será tratada na pergunta que formularemos ao Governo na próxima sexta-feira!
O Orador: - Cá estaremos, Sr. Deputado!
Em primeiro lugar, é um facto que o PS considera que a responsabilidade das políticas erradas adoptadas para o Douro é, exclusivamente, do PSD, então governo. Em segundo lugar, a anterior direcção da Casa do Douro cometeu erros de gestão que devem ser tidos em conta e assumidos pela direcção actual, ou seja, por uma questão de coerência, esta tem assumir os compromissos da direcção anterior. Daí que eu tenha afirmado, de forma clara, que a direcção da Casa do Douro também é responsável.
Todavia, as responsabilidades políticas pela adopção de medidas erradas são, efectivamente, do governo anterior. Não abdicamos de o dizer nesta sede, em conferência de imprensa, junto da direcção da Casa do Douro, junto do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas ou do Sr. Secretário de Estado!
O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Olha que essa é nova!
O Orador: - O figurino jurídico-institucional é um compromisso do PS e é um compromisso que o PS vai assumir! Só que - e o Sr. Deputado Lino de Carvalho que acompanha este processo sabe-o tão bem quanto eu - houve um tempo de instalação da CIRDD - Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro. É bom que a experiência Interprofissional no Douro se inicie e que, dentro de um tempo razoável, se faça uma avaliação para introduzir as alterações que se mostrem necessárias. O PS defendeu e defende hoje o figurino Interprofissional também para a Região do Douro, de acordo com as propostas que então apresentámos no debate travado em sede de Comissão de Agricultura.
Quanto à intervenção integrada no Douro, Sr. Deputado Lino de Carvalho, fizemos um estudo e avançámos com uma proposta concreta, que oferecemos ao então Sr. Ministro Valente de Oliveira. Este aproveitou algumas dessas propostas e, um dia, foi ao Douro «fazer um número», criando o PRODOURO. Na altura, dissemos que esse programa respondia às exigências e aos objectivos que o Deputado Eurico Figueiredo e eu próprio tínhamos definido para aquela região.
Há uma outra medida que foi assumida pelo governo de então. Conversámos sobre o que estava bem e, também, sobre aquilo com que não concordámos. Dissemos, designadamente, que se tratou de uma maneira de ludibriar os durienses e a Região de Trás-os-Montes e Alto Douro, porque dos 100 milhões de contos lá definidos...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas o PSD já não é governo!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado António Martinho, peço o favor de concluir as suas considerações, uma vez que esgotou o tempo de que dispunha.
O Orador: - Sr. Presidente, terminarei em breve.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Não é em breve, Sr. Deputado, mas imediatamente, porque já ultrapassou o tempo de que dispunha!
O Orador: - Dos 100 milhões de contos, dizia, só 10 milhões eram, de facto, dinheiro novo.
No entanto, as políticas de discriminação positiva em relação ao interior do País que este Governo está a executar também se devem, de alguma forma, à intervenção integrada.
Vozes do PSD: - Quais?!
O Sr. Fernando Pereira (PSD): - Diga uma!
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O Orador: - A opção pelas gravuras e a criação do PROCÔA - Foz Côa é Douro! - é diferente da do governo anterior, e os transmontanos sabem, isso muito bem!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados, entre os cidadãos que se encontram a assistir aos nossos trabalhos, identifico um grupo de 44 alunos da Escola Profissional de Tomar e um grupo de cidadãos do Sítio da Nazaré, acompanhado pelo respectivo Presidente da Câmara, para os quais peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República vai, dentro em breve, iniciar a discussão da proposta de Orçamento do Estado e o respectivo PIDDAC para o ano de 1997 e daí que se justifique que, de novo, tome a palavra nesta tribuna parlamentar para, além de abordar questões importantes, mais uma vez, insistir na inclusão de alguns e no reforço das dotações orçamentais de outros projectos de grande relevância para a Região Norte, a Área Metropolitana do Porto e o Município de Vila Nova de Gaia, a fim de os mesmos serem concretizados a curto e a médio prazos, para bem das populações e da sua qualidade de vida.
Começo por sugerir ao Governo que na revisão do Plano Rodoviário Nacional, que está a levar a efeito, inclua a via rápida do Douro, para ser construída futuramente.
O Vale do Douro, do Porto a Barca d'Alva, é uma unidade geográfica bem vincada, que gerou unidades de ordem cultural, turística, agrícola, económica, social, etc. Possui um enorme património arquitectónico, histórico e arqueológico e tem uma bela e deslumbrante paisagem, com enormes potencialidades económicas e turísticas, geradoras de grande riqueza que não estão suficientemente exploradas.
Na Região Demarcada do Douro, onde se produz o mundialmente conhecido Vinho do Porto, e o maior embaixador de Portugal, a sua quase totalidade tem de passar pelas cidades do Porto e de Gaia e são milhões de litros que têm de fazer o percurso da Régua ao Porto e Gaia. O Vinho do Porto é uma das maiores riquezas nacionais e não tem a servi-lo uma boa estrada.
O Vale do Douro serve, directa e indirectamente, mais de um milhão de habitantes e o rio Douro é o mais caudaloso do País e da Península Ibérica e um dos mais caudalosos da Europa; o Vale do Douro facilita um acesso à Europa, sem neve, sem gelo e sem nevoeiro, mercê do termostato que são as suas albufeiras.
Esta extensíssima, riquíssima e belíssima região, que se desenvolve numa estreita faixa de 200 km de comprimento, não tem uma ligação que a sirva ao longo de toda a sua extensão, nem ligação directa a Espanha. As estradas
n.os 108 e 222 são incompletas, desactualizadas, com traçados do tipo estrada romana, longe das exigências rodoviárias das vésperas do século XXI e não são marginais na quase totalidade do seu percurso.
O Plano Rodoviário Nacional de 1985 e a sua revisão de 1993, para servir o Vale do Douro, traçou-lhe duas paralelas - o IP4 e o IP5 - e três transversais - o IP2 (Pocinho), o IP3 (Régua) e a IP1 (Porto) -, mas falta-lhe uma ligação longitudinal. Daí se justificar plenamente a construção da via rápida do Douro, com características de marginal e itinerário principal (IP), para servir o Vale do Douro, pelo menos do Porto a Barca d'Alva. Será uma estrada moderna, rápida, cómoda e segura para servir condignamente a população.
Antevemos uma procura muito grande para esta via rápida. O tráfego de/e para o litoral (Porto), vindo da Europa do Norte (via Irun) e do Sul (via Barcelona), dará no futuro preferência a esta via.
Dado que esta é uma legítima aspiração da população do Vale do Douro, foi criada para o efeito a Associação Pró-Via Rápida do Douro, que conta com o apoio de um conjunto importante de câmaras municipais, instituições e individualidades da região.
Com a revisão do Plano Rodoviário Nacional, por parte do actual Governo, este é o momento e a sede mais adequada para a inclusão da construção desta via rápida do Douro. Espero que o Governo não defraude as expectativas das população duriense.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vila Nova de Gaia precisa de apoio e da solidariedade activa do Governo de Portugal para dar satisfação aos problemas do município e às legítimas aspirações dos gaienses.
Ainda no que diz respeito à revisão do Plano Rodoviário Nacional, impõe-se que o Governo e a Junta Autónoma das Estradas cumpram o que há muito está previsto, contemplando claramente no mesmo as vias de comunicação tão essenciais ao desenvolvimento e progresso do concelho de Vila Nova de Gaia e, muito em particular, a construção da sua via de circulação interna (CRIP) para uma correcta articulação com a VCI do Porto, ou seja, o anel de circulação rodoviário no âmbito da Área Metropolitana do Porto, bem como o calendário para a sua execução, para se evitar aquilo que pode acontecer a curto prazo, que é uma ruptura do tráfego rodoviário na cidade gaiense. E para se evitar essa ruptura, têm de ser construídos o nó da Barrosa e a rotunda das Devesas, porque foi ontem inaugurado um dos maiores centros comerciais do País, o Arrábida Shopping, inserido na nova centralidade que está a despontar em Gaia e que vai ser um pólo alternativo à Boavista, no Porto.
Espero, sinceramente, que o próximo Orçamento do Estado e o PIDDAC consagrem as verbas, suficientes para se construir, sem mais adiamentos, a rede rodoviária principal de Gaia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PSD está altamente preocupado, como tem referido, com o crescente clima de falta de segurança, violência e criminalidade que se verifica no País e na Área Metropolitana do Porto. Consideramos que a segurança e a tranquilidade dos portugueses são um bem maior e inestimável que as autoridades públicas têm o dever de garantir.
Vila Nova de Gaia não foge à regra. Existe também um clima de insegurança e aumento de criminalidade num município de 300 000 habitantes, cinco vezes maior que a área territorial da cidade do Porto e que é considerado um concelho problemático quanto à segurança escolar.
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Impõe-se, por isso, que o Governo providencie, sem mais demora, o reinicio e conclusão da construção do edifício da divisão concentrada da PSP, vulgo superesquadra, em Oliveira do Douro, dado a obra estar parada há longos meses, por abandono da mesma por parte do empreiteiro.
Gaia dispõe apenas de uma 10.ª Esquadra da PSP, que é idêntica a qualquer esquadra de bairro das cidades do Porto e de Lisboa e daí a urgência da entrada em funcionamento da superesquadra e do aumento significativo de agentes da PSP no município.
Impõe-se também saber, no futuro próximo, com entrada em funcionamento da superesquadra da PSP, como já me constou, se esta força de segurança irá cobrir todo o território municipal, substituindo a GNR, ou se vão continuar as duas forças paramilitares a assegurar a segurança e tranquilidade dos gaienses.
Se assim for, justifica-se urgentemente, como tenho vindo a defender, a construção dos novos quartéis da GNR dos Carvalhos e de Canidelo, dado os actuais serem muito exíguos e estarem muito degradados, ou, em alternativa, a ampliação e recuperação destes.
Ainda no que concerne à segurança do parque escolar gaiense, constituído por 190 escolas dos ensinos pré-escolar e básico, existem dois assaltos por semana, em média, às escolas e aos alunos. Daí a necessidade urgente do reforço de segurança policial, implementando-se neste município o programa Escola Segura, recentemente anunciado pelo Governo, através dos Ministros da Administração Interna e da Educação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os gaienses não podem ser mais defraudados, como ainda aconteceu com o Orçamento e o PIDDAC do ano em curso, não contemplando aqueles e outros projectos e as dotações financeiras justas para a sua implementação, designadamente em idênticos instrumentos para o próximo ano. Espero que o Governo seja generoso para Vila Nova de Gaia, que bem o merece.
Refiro-me, expressamente, à remodelação e ampliação do Centro Hospitalar de Gaia, iniciada em 1988, para o transformar num hospital moderno e de nível superior; à construção dos quartéis da Companhia dos Bombeiros Sapadores, dos Bombeiros Voluntários da Aguda e dos de Crestuma; à construção do centro de saúde de Arcozelo; à construção da escola básica de 2.º e 3.º ciclos de Avintes;...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você quer tudo o que o Cavaco não fez!
O Orador: - ... à construção do pavilhão desportivo de Grijó; ao restauro dos mosteiros da Serra do Pilar e de Grijó, classificados como monumentos nacionais; à recuperação, revitalização e preservação do Centro Histórico de Gaia, com vista à apresentação e ao sucesso da sua candidatura à UNESCO para ser classificado como património da humanidade; à cedência, a título definitivo, à Câmara Municipal de Gaia do cais de Gaia e do respectivo pavilhão, implementando de seguida um projecto de renovação e revitalização do mesmo, para os colocar ao serviço do município e da Área Metropolitana do Porto e das suas forças vivas; à navegabilidade do rio Douro e implementação dos projectos para a segurança da sua barra; à despoluição do rio Douro; à recuperação e preservação das orlas marítima e fluvial; à modernização da Linha do Norte da CP, designadamente a supressão das perigosas passagens de nível no território gaiense.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O anterior governo social-democrata lançou um histórico Plano Especial de Realojamento para acabar, até ao final deste século, com as barracas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.
A Câmara Municipal de Gaia foi das últimas a celebrar o protocolo com o governo anterior para a implementação do PER no município gaiense. Foram inventariadas 3619 barracas e casas abarracadas no concelho de Gaia, que importa eliminar, com á implementação do PER, mas infelizmente este está a avançar muito lentamente, por a culpa da câmara municipal.
A acrescer a esta situação, o actual Governo socialista, no passado dia 9 de Outubro, na cidade do Porto, através do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Secretária de Estado da Habitação, assinou, com várias câmaras municipais, empresas de construção civil e cooperativas de habitação, acordos financeiros para a construção de 4329 habitações a custos controlados e no âmbito PER, sendo destas apenas 152 para o município de Gaia, quando outros municípios da Área Metropolitana do Porto, e alguns com menos necessidade, foram contemplados com acordos financeiros para a construção, em cada um deles, de várias centenas de habitações.
Assim, por este ritmo, vão ser necessárias umas dezenas de anos para se acabar com as barracas no concelho e proporcionar a todos os gaienses habitações condignas.
Espero que o Governo e a Câmara Municipal de Gaia inflictam nesta conduta inaceitável para os gaienses e se empenhem fortemente na implementação do PER e na construção de habitação social no concelho, que bem precisa.
Em recente visita ao litoral de Gaia, da Afurada a S. Félix da Marinha, o Secretário de Estado dos Recursos Naturais ficou estupefacto com o que viu. Constatou, in loco, verdadeiros atentados contra o ambiente ou simplesmente paradigmas da asneira.
A orla marítima de Gaia, em termos de ordenamento do território, está completamente desordenada, verificando-se que o plano de ordenamento da orla costeira (POOC) e o plano director municipal entram em conflito em diversos pontos ao longo da costa. Exemplo gritante regista-se na freguesia da Madalena onde existe um aglomerado de barracos quase em cima das dunas e complexos habitacionais construídos em cima das mesmas.
Em matéria de ordenamento do território e de qualificação ambiental, não é matéria de discussão construir-se na duna primária ou em leitos de cheia, mas, infelizmente, o PDM de Gaia previu situações destas em alguns sítios.
Devemos tudo fazer para a recuperação e valorização do litoral de Gaia, que é uma das maiores riquezas do concelho.
O PDM foi aprovado de forma precipitada, e mal, em 1993, pelo PS, para ser utilizado como bandeira eleitoral nas eleições autárquicas desse ano. O Governo ratificou-o, mas sem, contudo, deixar de reprovar muitos dos seus pontos significativos, que eram ilegais e inadequados, deixando, deste modo, o PDM de Gaia logo amputado e impossibilitado de bem servir o ordenamento do território gaiense, como já foi cabalmente demonstrado ao longo destes dois anos e meio desde a sua entrada em vigor.
Impõe-se, por isso, com urgência, rever o plano director municipal de Gaia com inteligência, bom senso e ponderação, para o corrigir nos seus erros e o colmatar nas suas graves lacunas e ainda para o colocar em conformidade com o plano de ordenamento da orla costeira.
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Existe, na sede da Real Companhia Velha, um fundo documental, conhecido pelo Arquivo da Companhia Geral de Agricultura das Vinhas do Alto Douro, que se impõe organizar, salvaguardar e estudar, dado que nos revela 100 anos da história do Alto Douro, do rio Douro e do norte de Portugal e que se torna indispensável parra o estudo do Vinho do Porto, do rio Douro e do comércio externo português.
É fundamental que este património cultural documental se mantenha sediado na cidade de Vila Nova de Gaia, em instalações próprias condignas, com uma inventariação cuidada e condições de fácil consulta por parte dos investigadores, dos historiadores e de todos os demais interessados neste arquivo. Para isso, torna-se fundamental que haja urgentes conversações entre o Ministério da Cultura, o Arquivo Nacional da Torre do Tombo, a Câmara Municipal de Gaia e a Real Companhia Velha, para se alcançarem os objectivos que preservem este património cultural único em Portugal.
O município de Vila Nova de Gaia não se tem projectado, afirmado e assumido, como lhe competia de pleno direito, o seu papel no contexto da Área Metropolitana do Porto, da Região Norte e de Portugal, por culpa da gestão autárquica socialista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Espero que, nas eleições autárquicas de 1997, os gaienses optem pela saudável alternância democrática em Gaia, sendo certo que só o PSD pode proporcionar essa alternativa democrática credível, para implementar um projecto protagonista, coerente e ambicioso, que contribua para a resolução dos problemas do município e para o progresso, bem-estar e qualidade de vida da sua população. Numa palavra: colocar Vila Nova de Gaia no mapa.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Isso é pré-campanha eleitoral!
O Orador: - Foi com o objectivo de dar mais um contributo nesse sentido que propus recentemente, na qualidade de vereador da Câmara Municipal de Gaia, que o município solicitasse a sua adesão ao Eixo Atlântico, tendo a proposta obtido a aprovação unânime da vereação. Espero que essa adesão se possa confirmar com a sua aceitação durante o 1.º Congresso do Eixo Atlântico, que vai ocorrer na cidade de Vigo nos próximos dias 17 e 18 de Outubro.
O Eixo Atlântico é uma associação de 15 municípios do norte de Portugal e da Galiza, criada em 1992, e que surgiu como espaço de cooperação transfronteiriça, cujo objectivo era criar um lobby interno e externo, que funcionasse como uma espécie de agência de desenvolvimento euro-regional.
Neste 1.º Congresso do Eixo Atlântico vão ser discutidos os problemas que afectam as cidades do Eixo, as suas potencialidades, bem como as relações do norte de Portugal com a Galiza e o futuro destas regiões face à União Europeia.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você fala mais depressa do que o Marcelo pensa!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de concluir, ainda gostaria de abordar mais duas questões importantes.
Em primeiro lugar, refiro-me a uma comunicação recente da Direcção-Geral do Património do Estado, determinando que o imóvel onde está instalada, desde 1947, a Secção Marítima da Foz do Douro da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Portuenses, ficasse devoluto num curto espaço de tempo, para voltar à posse do Ministério das Finanças, a fim de ser alienado em hasta pública. Considero esta decisão totalmente errada e solicito ao Ministro das Finanças e à Direcção-Geral do Património do Estado a revisão urgente desta decisão, dado que esta Secção Marítima, ao longo de quase meio século, tem prestado inúmeros e relevantes serviços de socorro a náufragos, numa área onde a probabilidade de ocorrência de acidentes marítimos é grande, dada a insegurança da Barra do Douro, em particular para quem tem de a atravessar todos os dias, como é o caso dos pescadores da região.
A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Portuenses dispõe já de um projecto de instalação e desenvolvimento operacional para a Secção Marítima instalada no quartel da Foz do Douro, e importa apoiar activa e urgentemente a sua plena implementação para bem da segurança marítima da zona.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que o projecto Combo, simulação sísmica prevista inicialmente para ocorrer no Verão passado, no mar, a 50 km ao largo do Porto, com a, potência de 20 toneladas de TNT, da iniciativa da, Comunidade Científica Internacional, foi apenas suspenso à última da hora, pelo Governo, depois do alerta dado pelos autarcas e pelas associações ambientalistas e do sector das pescas da região, devido às dúvidas suscitadas e à grande apreensão manifestada.
Contudo, o Governo, depois de uma reunião com a Junta Metropolitana do Porto, no início de Agosto, autorizou a realização de um primeiro ensaio, em escala mais reduzida, de duas cargas de uma tonelada de TNT cada, que já está marcado para o próximo dia 23 deste mês.
Com o projecto Combo, pretende a Comunidade Científica Internacional estudar o espaço entre o núcleo da terra e o manto, obtendo uma leitura da crosta terrestre.
Existe um total desconhecimento das repercussões ambientais e geológicas. deste projecto, daí a crescente preocupação, principalmente da população e dos autarcas da Área Metropolitana do Porto.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Manuel Moreira, V. Ex.ª dispõe de tempo, mas, no entanto, gostaria que concluísse, porque temos de passar aos pontos seguintes da ordem de trabalhos.
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
O projecto Combo tem suscitado reservas de diversos cientistas que se têm pronunciado sobre ele, designadamente do Instituto Geofísico da Universidade do Porto, quanto à probabilidade de a experiência sísmica poder afectar a placa continental, que é detentora de inúmeras falhas.
Torna-se, por isso, imperioso que, antes de se avançar com qualquer tipo de experiência, maior ou menor, o Governo informe e justifique perante a opinião pública, as razões, a validade e as consequências desta simulação sísmica no, mar, ao largo do Porto, e porquê aí, com estudos técnicos devidamente fundamentados, designadamente o estudei de impacte ambiental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Espero que esta minha intervenção tenha o eco positivo necessário no Governo
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de Portugal, para bem dos portugueses que temos a honra de representar neste órgão de soberania.
O Orador reviu.
Aplausos do PSD.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Só ouvimos o «eco», o resto não percebemos!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Moreira, os Srs. Deputados Fernando de Sousa, Fernando Jesus e José Barradas.
Vou dar-lhes a palavra, mas peço a todos que se cinjam ao tempo regimental e até, se possível, que não o utilizem integralmente.
Peço também ao Sr. Deputado Manuel Moreira que, depois, responda de forma sintética, a fim de podermos passar aos pontos seguintes da nossa agenda, que ainda está bem carregada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.
O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, o senhor falou tão depressa, que tivemos dificuldade em acompanhá-lo.
Vozes do PS: - Exactamente!
O Orador: - E pediu tanta coisa que me dá a impressão de que pede o céu, esquecendo-se de pedir a terra e sem ter em consideração que, efectivamente, deveria ter pedido tudo isso durante os 16 anos em que o PSD esteve no poder, 10 dos quais sozinho.
Aplausos do PS.
Efectivamente, podia ter poupado muito do que aqui referiu, se tivesse obtido resposta aos seus pedidos em momento anterior.
Vozes do PS: - Antes, tinha medo!
O Orador: - É evidente que compartilhamos das suas preocupações quanto à navegabilidade do Douro, apoiamo-las e temo-las defendido aqui e na imprensa; quanto às ligações rodoviárias a Espanha, nomeadamente a Castilla y Léon, à zona do interior, não temos dúvidas de que estão e irão ser reforçadas.
O Sr. Deputado falou de muitos problemas de Gaia, das barracas e do PIDDAC. Espera que o PIDDAC contemple o quê? Sr. Deputado Manuel Moreira, o PIDDAC, antes de mais, vai manter os compromissos que vêm de anos anteriores, em que o PSD era governo, e que, naturalmente, se estão a projectar no futuro e vão continuar a projectar-se. Além disso, vai assumir os compromissos deste Governo, certamente, os quais vão ter execução ao longo de uma legislatura. Portanto, Sr. Deputado, não pode pedir, no âmbito do PIDDAC do próximo ano, tudo aquilo que são compromissos do PS e que irão decorrer ao longo da presente legislatura.
Mas quero chamar a sua atenção para dois aspectos que referiu: parece que, por um lado, minimizou os contratos-programa, os 4000 fogos que irão ser construídos ao abrigo de contratos-programa para a Área Metropolitana do Porto e, por outro, também minimizou o plano de erradicação de barracas e aquilo que está a ser feito.
Gostaria de lembrar ao Sr. Deputado o seguinte: os 4000 fogos que vão ser construídos ao abrigo de contratos-programa para a Área Metropolitana do Porto são tão-só o dobro do que foi concretizado pelo governo do PSD até 1994. O dobro, Sr. Deputado!...
O Sr. Paulo Neves (PS): - Precisamente!
O Orador: - Quanto ao plano de erradicação de barracas, quero também lembrar-lhe que até 1995 apenas foram concretizados 3% desse plano e que, se o Governo do PS mantivesse esse ritmo, iríamos precisar, no mínimo, de 15 anos para erradicar as barracas em Portugal.
O Sr. Paulo Neves (PS): - É verdade!
O Orador: - Ora, de acordo com a política deste Governo, pensamos que, efectivamente, será possível cumprir o prazo que estava definido previamente, ou seja, até ao ano 2000.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Fernando Jesus.
O Sr. Fernando Jesus (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, não vou, de facto, alongar-me em várias perguntas que poderia formular, vou chamar a sua atenção apenas para uma questão que tem a ver com a via rápida do Douro.
Em relação à via rápida do Douro, que conhecemos como sendo uma reivindicação vossa e também de uma associação sediada em Marco de Canavezes, de cidadãos anónimos de Marco de Canavezes, para além de já terem falado aqui dela várias vezes, quero perguntar-lhe muito concretamente o seguinte: tem conhecimento de alguma posição pública de alguma autarquia, de alguma entidade daquela região do Porto, de Vila Nova de Gaia - de que é originário -, de Gondomar, pelo Douro acima, a favor da via rápida? Repito: tem conhecimento de alguma posição pública conhecida dessas autarquias, a favor da via rápida, junto do Governo central, em que reconheçam, de facto, tanta urgência nessa via rápida? E que nós, confesso, não conhecemos nenhuma posição pública junto do Governo central.
Mas se o Sr. Deputado reconhece e atribui tamanha urgência a esta via rápida e sendo uma reivindicação sua e daquela associação, há, pelo menos, seguramente, 10 anos, por que é que o seu Governo não incluiu a construção desta via rápida no plano rodoviário nacional que ele próprio aprovou?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.
O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, perpassou agora à minha frente um filme exactamente idêntico àquele que tive oportunidade de ver aqui há cerca de um ano. E o cenário que o Sr. Deputado descreveu é quase verdadeiro.
Conforme já foi dito pelo Sr. Deputado Fernando de Sousa, que me antecedeu nestas considerações, durante os 10 anos do seu governo foram completamente ignoradas
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todas as necessidades que o Sr. Deputado, e muito bem, acabou de suscitar. Pelos vistos, o seu governo foi surdo aos seus apelos, porque julgo que se empenhou tanto quanto se está a empenhar agora por fazer essas exigências para Vila Nova de Gaia e para a Área Metropolitana do Porto. Infelizmente, durante esse tempo, o Sr. Deputado não foi ouvido.
Dada a brevidade que me foi pedida pelo Sr. Presidente, vou apenas apontar-lhe dois exemplos que, do meu ponto de vista, são duas necessidades vitais para Vila Nova de Gaia e mesmo para a Área Metropolitana do Porto.
Quanto ao plano rodoviário, Sr. Deputado, julgo que o PIDDAC do ano anterior consagra o lançamento de uma ligação entre a Avenida da República e o Freixo. Está lá, pelo menos foi prevista, e foi a primeira vez que isso aconteceu desde 1987, pelo que julgo ser um indício de que este Governo está interessado em resolver aquele que considero ser o problema mais grave com que Gaia e, concretamente, a Área Metropolitana do Porto se debatem neste momento, no que respeita ao trânsito. E V. Ex.ª acabou agora de referir a abertura do Arrábida Shopping, que vem, de algum modo, piorar a situação. Portanto, é premente que isso se resolva.
A segunda questão que lhe quero colocar tem a ver com o hospital. De facto, com os Hospitais de Santo António e de S. João, o Hospital Central de Vila Nova de Gaia, que muitos ignoram ser um hospital central de nível 4, compõe a malha, a rede hospitalar da Área Metropolitana do Porto. Dizia-se que esse hospital tinha um plano de remodelação desde 1987, mas agora, ao chegar ao Governo, o PS deparou com a seguinte situação: não existe qualquer plano director. Ora, a novidade que lhe quero dar é a de que, até Dezembro deste ano, pensamos poder apresentar um plano director que, finalmente, consagre as obras há tanto exigidas pelos gaienses.
Sr. Deputado Manuel Moreira, junto, a minha à sua voz e espero que, em breve, o cenário que aqui descreveu possa ser outro. O Governo do PS, estou certo, será um governo mais dialogante e atento do que o foi o seu. É isto que os gaienses esperam e é aquilo que também espero, Sr. Deputado Manuel Moreira.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Os Srs. Deputados que formularam pedidos de esclarecimento cingiram-se rigorosamente ao tempo regimental. Peço ao Sr. Deputado Manuel Moreira que também se cinja ao tempo regimental nas respostas, que é de 5 minutos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de facto, tive de falar de forma rápida, porque Vila Nova de Gaia, dada a sua dimensão e a população que alberga, superior, como se sabe, à das regiões autónomas, tem muitos problemas que nós, como seus representantes, temos necessidade de abordar aqui ciclicamente. E quero dizer, mais uma vez, aos meus colegas Deputados, em particular aos de Vila Nova de Gaia, que, neste Hemiciclo, e fora dele, enquanto Deputado, junto do actual Governo e também dos Governos anteriores, sempre tive a preocupação de os sensibilizar para a resolução de muitas das carências e apoio aos projectos de que Vila Nova de Gaia necessitava e continua a necessitar para o seu desenvolvimento.
Como tal, nesse aspecto, não me dão qualquer lição de moral e continuo exactamente com a mesma força, com a mesma vontade política, a ajudar o município de Gaia a encontrar as soluções mais adequadas para que os gaienses possam usufruir de uma boa qualidade de vida e tenham orgulho em ser gaienses e em viver em Vila Nova de Gaia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Penso que os meus colegas Deputados Fernando de Sousa e José Barradas, em particular, porque são, realmente, oriundos de Vila Nova de Gaia, bem como os outros colegas do distrito do Porto, devem ser solidários com todos aqueles que aqui levantam a voz em defesa das aspirações da população que representam.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Nesse sentido, estou disponível para, com eles, continuar a lutar e a defender os interesses de Vila Nova de Gaia, porque Vila Nova de Gaia não pode continuar a ser um parente pobre deste país e da Área Metropolitana do Porto, tem de assumir o papel de relevo a que tem direito, que é o de um dos maiores municípios de Portugal e o segundo maior da Área Metropolitana do Porto. Temos de reconhecer - e os senhores também o reconhecem - que Gaia não tem, como devia, assumido esse papel. E é isso que temos obrigação de exigir. Por isso, esperamos que haja alternância democrática em Vila Nova de Gaia para que, efectivamente, uma nova gestão democrática possa, em cooperação e em solidariedade com o Governo de Portugal e com o nosso apoio enquanto Deputados, aqui, neste Plenário, dar uma resposta mais rápida e mais definitiva às aspirações dos gaienses.
É evidente que os governos anteriores do PSD, ao contrário do que os senhores dizem - e os senhores sabem que não falaram verdade -, fizeram algo por Vila Nova de Gaia. Não fizeram tudo, mas muitas vezes...
Protestos do PS.
Srs. Deputados, não vou agora enumerar tudo aquilo que foi feito em Vila Nova de Gaia, nas áreas da educação, da cultura, do desporto e social - e isto só para citar algumas áreas. É evidente que não fez tudo. Mas não fez tudo porque também não temos tido - há dois mandatos consecutivos que a Câmara de Gaia tem uma maioria socialista - uma câmara suficientemente inteligente e arguta para o exigir ao Governo de Portugal,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... não exigiu ao anterior governo e não está a exigir a este. Por isso, muitas vezes, temos de ser nós, Deputados, a vir aqui levantar a nossa voz em defesa dos interesses de Vila Nova de Gaia, como também nos compete legitimamente.
Sobre os acordos financeiros, celebrados na semana passada, para a construção de mais habitação social, no âmbito do PER, eu não os minimizei; disse que foram assinados acordos financeiros para a construção de 4329 casas e que Vila Nova de Gaia, mais uma vez, foi menosprezada, porque apenas vai ser contemplada com 152 habitações dessas, muito menos do que fez um governo anterior do PSD, que contemplou Vila Nova de Gaia com 700 fogos, que ainda não estão construídos pela actual
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maioria socialista da Câmara Municipal, que já lá está há dois mandatos consecutivos. O que eu digo é que são muito poucas habitações para Gaia, comparativamente com os municípios do Porto, Matosinhos, Gondomar e Maia, que foram contemplados com várias centenas de habitações cada um.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Faltou o financiamento!
O Orador: - Vila Nova de Gaia ficou, mais uma vez, na cauda em termos de acordos financeiros para a construção de habitação social, e, como sabe, Gaia está muito carenciada de habitação social, uma vez que tem quase 4000 barracas. Comparativamente com outros concelhos que foram contemplados com mais habitação, Gaia tem muito mais necessidades. Foi o que eu disse, não vale a pena, pois, deturpar as minhas palavras.
Em relação à via rápida do Douro, o Sr. Deputado Fernando Jesus não pode saber tudo nem está, naturalmente, informado de tudo. Quero dizer-lhe que a Associação Pró-Via Rápida do Douro é constituída por várias autarquias da região do Douro, por várias outras entidades, desde logo, a Casa do Douro, e várias personalidades do Douro. Mesmo os seus colegas, Deputados pelo Porto, já dialogaram com os dirigentes da Associação Pró-Via Rápida do Douro e penso que até manifestaram alguma sensibilidade e apreço pela sua luta e pelo seu objectivo.
Devo dizer que algumas câmaras, a começar pela minha, onde eu próprio como vereador fiz uma proposta, muito recentemente, a propósito da discussão do parecer sobre a revisão do Plano Rodoviário Nacional, em que a Câmara de Vila Nova de Gaia aprovou, por unanimidade, exactamente, a construção desta via rápida, recomendando ao Governo a sua inclusão no PRN. É evidente que não proponho que seja já amanhã, o que proponho é que agora que se está a rever o PRN se inclua a via rápida do Douro, para ser construída logo que seja possível. Não estou a dizer que seja amanhã ou até que possa ser a curto prazo, mas, pelo menos, a médio prazo. Foi nesse sentido que hoje aqui, mais uma vez, voltei a falar, de uma forma mais desenvolvida, sobre a necessidade da construção da via rápida do Douro.
Por último, Sr. Deputado José Barradas, em relação à Rede Rodoviária Principal de Vila Nova de Gaia, é verdade - e eu também já o reconheci várias vezes - que o governo anterior deu prioridade à construção da via de circulação interna na margem norte do Douro, esquecendo ou deixando para segundo plano a construção da mesma na margem sul, ou seja, o nosso município. Lamento que assim tenha sido, porque deviam ter avançado, em simultâneo, com toda a via de circulação interna do Porto, incluindo a cidade de Gaia. Por isso, agora, que está a nascer uma nova centralidade em Gaia e que temos a nova ponte do Freixo, era bom que também se avançasse sem mais delongas na construção da via de circulação interna em Gaia. Foi isso que aqui, mais uma vez, vim exigir e vim reivindicar, porque tenho essa legitimidade democrática, perante o Governo de Portugal - e o senhor também tem, temos todos os Deputados.
E, meu amigo, devo dizer-lhe que aquilo que foi inscrito no Orçamento do Estado deste ano, no PIDDAC, foi apenas 100 000 contos, insuficientes, para construir a via entre a Avenida da República e a ponte do Freixo. Ora, eu pergunto: onde é que ela está? Ainda nem sequer começou, faltam dois meses para o fim do ano, provavelmente, já não vai começar. Como tal, foi mais uma ilusão para os gaienses, o que é lamentável!
Como o senhor acabou de reconhecer, foi inaugurado ontem o Arrábida Shopping e, neste momento, corremos o risco de ter um grave estrangulamento rodoviário em Gaia. Eu pergunto: de quem é a responsabilidade? É de todos nós! É da Câmara Municipal de Gaia, que não soube ser talvez suficientemente persistente com o Governo central, porque é o Governo que tem a obrigação de construir essa rede viária principal. Foi isso que, mais uma vez, vim aqui exigir que se fizesse sem mais adiamentos.
Por último, quanto ao Centro Hospitalar de Gaia, agradeço a sua informação. Aliás, também reconheço que o Centro Hospitalar de Gaia, que é o hospital central de nível 4 ou de nível superior, que deve ser o terceiro grande hospital do norte do País, já devia ter sido concluída a sua obra de ampliação e modernização. Mas não foi! Naturalmente, a responsabilidade tem de ser partilhada pela gestão anterior e pelo Governo. Não o ignoramos, mas o importante, neste momento, é que o Governo...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Manuel Moreira, peço-lhe que conclua a sua intervenção, porque já excedeu o tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar com esta frase: o governo anterior já foi julgado, nós já fomos julgados, agora, compete a este Governo, em nome da mudança, fazer diferente, fazer aquilo que falta - e falta exactamente avançar para a conclusão da ampliação e modernização deste grande Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia!
O Orador reviu.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte que, de acordo com o Regimento, se destina «À emissão de votos de congratulação, saudação, protestos e pesar, propostos pela Mesa ou por algum Deputado».
Encontram-se na Mesa três votos, dois de protesto e um de saudação, que vão ser agora debatidos e votados, por ordem de entrada na Mesa.
O primeiro é o voto n.º 42/VII - De protesto pela atitude do Governo e do Primeiro-Ministro na campanha eleitoral dos Açores, apresentado por Deputados do PSD, que já transitou da sessão anterior, tendo sido, na altura, pedido o seu adiamento por um Deputado do PS.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Leite.
O Sr. Reis Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta matéria não requer da minha parte uma grande explicação, porque está mais do que mexida, escandalizou a opinião pública nacional, muito em especial a opinião pública das regiões autónomas. Os próprios partidos políticos, à excepção obviamente do Partido Socialista, entendem que o que se passou com a questão do anúncio, em plena campanha eleitoral, de uma pseudo-baixa dos preços das comunicações aéreas entre Portugal continental e os Açores merece ser censurado. Os termos da censura estão bem claros e bem explícitos neste voto de protesto.
A mim resta-me pedir duas coisas: primeiro, que seja tido essencialmente em conta o fundo da questão, não a
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forma, porque eu não estava cá quando este voto foi escrito e apresentado, mas percebo que há graves erros de dactilografia, na melhor das hipóteses. A prosa não é efectivamente brilhante!
Mas, acima de tudo, o que é preciso pedir é que o Partido Socialista tenha em consideração a necessidade que há de levar junto do Governo e do Sr. Primeiro-Ministro o protesto desta Câmara, o protesto dos representantes legítimos dos portugueses, de que o Governo se excedeu, fez aquilo que nenhum governo deve fazer, fez aquilo que nenhum político, com seriedade, deve fazer e, acima de tudo, fez aquilo que o actual Primeiro-Ministro, durante anos, disse que nunca faria. De forma que é justo que saia desta Casa um protesto pela atitude inqualificável do Governo perante uma situação politicamente reprovável.
Apelo, pois, a toda a Câmara que apoiem os Deputados que propõem este voto de protesto do Partido Social-Democrata, para que efectivamente seja reposta a dignidade das instituições democráticas portuguesas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Trindade.
O Sr. António Trindade (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que, mais uma vez, nesta matéria o PSD pretende trazer uma realidade em que uma pretensa «montanha» quer fazer gerar um novo «rato» político neste país.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, deixem-me só lembrar o que aconteceu na Região Autónoma da Madeira nos últimos oito anos. Foi constituído, precisamente há oito anos, um grupo de trabalho em que estavam presentes representantes do Governo Regional da Madeira, da TAP e da associação empresarial ACIF, onde eu estive presente e integrei esse grupo de trabalho, que apresentou «n» propostas sobre a política tarifária, política de horários e outro tipo de infra-estruturas aeroportuárias, que, aliás, fizemos passar aos nossos congéneres dos Açores.
O nosso manifesto eleitoral para as eleições da Assembleia da República previa já uma política que tinha a ver com a necessidade de criar, em relação aos residentes das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, o acesso às diferentes tarifas propostas pela companhia, aplicando-se sobre essa tarifa um desconto, a ser suportado pelo Estado, a título de cobertura do custo da insularidade. Isto porque nós prevíamos que todas as políticas de apoio, todas as políticas de subsídios, todas as políticas que visassem serviços públicos, deviam ter em consideração, prioritariamente, o cidadão insular e não as companhias e, também, que deveriam tornar o acesso às regiões autónomas tão acessível, como sucede em relação a outros destinos onde a concorrência obriga a uma maior agressividade tarifária.
Foi isso que apresentámos no nosso manifesto, foi isso que defendi no congresso da Associação Portuguesa das Agências de Viagem e Turismo (APAVT), em Novembro de 1995, e que tão apreciado foi, inclusivamente, pela maioria PSD, na altura, nos Açores. Foi também este o tipo de política que os Deputados do PS/Açores e do PS/ Madeira tinham e que levaram num memorando aos Ministros Henrique Constantino e João Cravinho e aos Secretários de Estado Consiglieri Pedroso, Guilhermino Rodrigues e Norberto Fernandes.
É, pois, na sequência destas medidas, e tal como os Srs. Deputados das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira deverão saber, que a TAP tem de criar um esquema tarifário de Verão e outro de Inverno, tendo o esquema tarifário de Inverno de ser necessariamente submetido à Direcção-Geral da Aviação Civil, no que diz respeito às regiões autónomas, até ao fim de Setembro, porque para publicitar qualquer nova tarifa, ela tem de ser submetida não só à Direcção-Geral da Aviação Civil como, posteriormente, deve ser publicitada em todos os meios de publicitação dos agentes económicos.
É na sequência desta medida, que já tem oito anos de estudo mas apenas um ano de reivindicação com este Governo e que nunca obteve, no passado, qualquer tipo de resposta positiva por parte do governo do PSD, que se consegue implementar, finalmente, uma estrutura tarifária idêntica àquela que a TAP, no passado, andava a fazer em relação a todos os destinos com excepção das regiões
autónomas.
Deixem-me lembrar que, por exemplo, uma tarifa deste nível, aproveitando os horários de, menor ocupação, tinha, no Inverno passado, o valor de 10 contos entre Lisboa e Madrid e entre Nova Iorque e Lisboa á tarifa rondava os 47 ou 48 contos; inclusivamente, todas as tarifas Festival aprovadas pela TAP, que não carecem de autorização da Direcção Geral da Aeronáutica Civil, foram publicitadas no início de Outubro.
Portanto, choca-me aqui ver a posição que os Srs. Deputados do PSD vêm brandir contra a TAP quando, na realidade, o que está em causa, são, prioritariamente, os interesses dos açoreanos e dos madeirenses, quer na sua qualidade de utente do transporte aéreo quer na qualidade de receptores de um sector económico que, tanto para os Açores como para a Madeira, é vital o turismo. Assim, espanta-me esta vossa postura quando não houve mais do que a capacidade e a sensibilidade de um governo da República para uma nova medida empresarial de uma transportadora aérea nacional que visa, por um lado, melhorar as condições de transporte dos madeirenses e dos açoreanos e, por outro, poder receber outros segmentos de mercado que, até agora, não recebiam.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Partido Popular já teve ocasião de expressar no Plenário a repugnância política que lhe causou esta medida que foi anunciada ao País pelo líder do PS Açores na semana passada, antes das eleições, e que foi apresentada como resultando de uma misteriosa e milagrosa prece que ele teria transmitido ao Primeiro-Ministro e líder do PS nacional, da qual resultou este milagre da diminuição das tarifas das viagens da TAP para os Açores e para a Madeira. Aliás, recordo-me que logo na altura me surgiu a ideia de dar como sugestão a todos os membros do Governo que dessem orientações às empresas de capitais públicos que tutelam para aproveitar e baixar algumas tarifas. Por exemplo, a Portugal Telecom poderia também começar a baixar as tarifas dos telefones - penso que seria uma medida que o País saudaria -, apesar de não estarmos à beira de eleições legislativas.
Mas, independentemente disso, o que é importante é levar estas coisas a sério e esta manobra eleitoralista que o PS perpetrou não pode passar em claro.
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Foi essa a razão pela qual pedimos uma audição parlamentar ao Ministro da tutela, no sentido de vir à Assembleia da República explicar quais os misteriosos critérios de gestão que estiveram na origem desta medida, uma vez que todos sabemos as dificuldades em que a empresa vive e, obviamente, uma medida destas terá de ter consequências ao nível da própria empresa. Estamos, por isso, a aguardar com muita curiosidade as explicações, do ponto de vista de gestão da TAP, que o Ministro da tutela tem, certamente, para justificar esta medida.
Em todo o caso e, enquanto a audição não se realiza, pensamos que a Assembleia da República não pode deixar passar em claro este tipo de manobra que todos pensávamos que fazia parte, definitivamente, do passado. Afinal, descobrimos que não faz parte, definitivamente, do passado!
Em nome daquilo que o PS disse, nos últimos anos, acerca de vários actos políticos que os governos do PSD, em vésperas de eleições, também não se esqueciam de praticar, penso que é de exigir ao PS que, repito, em nome de tudo aquilo que disse nos últimos anos relativamente aos governos do PSD, vote este protesto,...
O Sr. António Braga (PS): - Vai votar, vai!
O Orador: ...para que os portugueses possam ter algum argumento para considerar que o PS não é igual ao PSD e, sobretudo, para que essa diferença se exprima no momento da verdade, em que o PS tem o poder, sendo capaz de resistir politicamente a utilizá-lo para manobrar e influenciar resultados de eleições, sejam elas quais forem.
Penso que isto que aconteceu foi um mau prenúncio da parte do PS e esperamos que não se repita mas, em todo o caso, fazemos um apelo político ao Grupo Parlamentar do PS no sentido de que tenha a coragem de votar favoravelmente este protesto.
Uma vez que estão sempre a tentar exibir a autonomia do grupo parlamentar relativamente ao Governo e a pretender que essa autonomia também é uma diferença em relação ao passado, dêem hoje uma prova disso e, em nome daquilo que andaram a dizer nos últimos anos relativamente aos governos do PSD, juntem-se aos outros grupos parlamentares e votem a favor deste protesto.
Penso que, nessa dimensão, a Assembleia da República daria, de facto, uma lição de democracia ao Executivo do País e, presume-se, ao futuro executivo regional, para evitar que actos destes continuem a manchar a regularidade, o civismo e a normalidade com que as populações têm participado nestes actos eleitorais, que nunca é demais realçar.
E caso para dizer que, se este voto de protesto não for aprovado, as populações continuam a estar muito acima daqueles políticos que, por vezes, são eleitos para as governar. Não basta o voto, é preciso a diferença do comportamento, é assim que os políticos se distinguem uns dos outros. VV.
Ex.as, Deputados do PS, têm hoje um momento privilegiado para darem prova da vossa diferença. Aguardamos com expectativa essa prova.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, está pedida, como é sabido, uma audição com o Sr. Ministro da tutela dos transportes sobre esta matéria. Porém, a intervenção do Sr. Deputado António Trindade suscitou-me uma série de questões e era útil que a Mesa providenciasse no sentido de o Sr. Ministro Cravinho vir à Assembleia da República habilitado com essa informação. É que foi dito que há uma série de entidades que são ouvidas sobre esta matéria da redução das tarifas, pelo que convinha saber se, no conjunto dessas entidades, está incluído ou não o candidato socialista à presidência do governo regional. Esta é a primeira questão.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, desculpe mas julgo que esta sua intervenção, sai da fórmula concreta da interpelação à Mesa. Parece-me que se trata, antes, de uma intervenção no debate!
O Orador: - Não, Sr. Presidente, não é uma intervenção. Estou a referir elementos que considero indispensáveis que a Mesa providencie para que o Sr. Ministro venha habilitado. Parece-me que é um caso típico de interpelação à Mesa, dado que se trata de uma diligência que estou a pedir sobre uma matéria que interessa à Assembleia.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Se assim é, pode continuar.
O Orador: - A outra questão é que o Sr. Ministro viesse habilitado no sentido de informar se, efectivamente, se trata de um mecanismo normal de redução das tarifas...
Protestos do PS.
... ou se, antes, ao contrário do que foi afirmado pelo Sr. Deputado António Trindade, foi uma réplica à baixa de preços da SATA, tal como foi dito na altura por responsáveis da TAP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, ficam registadas em acta as suas dúvidas. Estou certo que o Sr. Ministro não deixará de as consultar antes de participar nos trabalhos da Comissão.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de começar por reafirmar o protesto do Grupo Parlamentar do PCP perante aquilo que designámos, e mantemos a designação, como uma fraude eleitoralista praticada. Por outro lado, criticamos também, muito fortemente, a decisão tomada pela maioria da Comissão Nacional de Eleições.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Já explicarei e provarei porquê a justiça desta crítica.
O Sr. António Braga (PS): - É bom saber isso!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a medida é, por um lado, totalmente eleitoralista, como se comprova não apenas pelas declarações do Sr. Ministro João Cravinho, quando disse à comunicação social que é evidente que se assumia como político e que estas decisões
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têm de ter em conta a conjuntura política, mas também porque foi utilizado o nome do Sr. Primeiro-Ministro e, até hoje, ele ainda não desmentiu o que quer que seja.
Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, mais do que isso, Sr. Presidente, com ela mostra-se uma grande eficácia! Ao contrário daquilo que se diz normalmente, o nosso País é eficaz, a Administração Pública é mais do que eficaz, ultrapassa todos os níveis que possam existir na Comunidade Europeia e na União Europeia e passo a explicar porquê.
De acordo com o Sr. Presidente da TAP Air Portugal, esta tomou conhecimento, nos jornais do dia 8, que teria havido uma decisão, no dia anterior, por parte da SATA. Então, tendo tomado disso conhecimento na manhã do dia 8, pelos jornais, conseguiu a TAP, no mesmo dia 8, decidir o que iria fazer e pedir autorização à Direcção-Geral de Aviação Civil, que esta concedeu no mesmo dia 8. Conseguiu-se ainda enviar o processo para o Sr. Secretário de Estado dos Transportes, que este ter autorizou e aprovou no mesmo dia 8! Isto, de facto, é eficiência!
O Sr. António Braga (PS): - Pois é!
O Orador: - Mas a questão vai mais longe, Sr. Presidente. É que a justificação formal do Presidente da TAP é a de que teve conhecimento das tais medidas que a SATA iria tomar, ou seja, esta empresa passou a praticar descontos nas viagens inter-ilhas e nas ligações com os Estados Unidos da América e o Canadá. Diz ainda o Sr. Presidente da TAP que tal medida, sendo susceptível de condicionar opções de voo para estes últimos destinos (EUA e Canadá), levou a TAP a tomar acções, que foram anunciar a baixa de tarifas de Lisboa para Ponta Delgada, para o Funchal e para a Ilha Terceira. Onde está, afinal, o problema das tarifas da TAP para os EUA e para o Canadá, que era o problema que era colocado?
Aplausos do PCP e PSD.
Mas há mais, Sr. Presidente. É lamentável, é inaceitável que o Governo participe nos negócios e nas decisões diárias de uma empresa pública! A tutela não tem esse direito. Por que razão há-de ser o Sr. Secretário de Estado dos Transportes a autorizar que a TAP faça uma promoção de tarifas durante um mês? Não é aceitável, não é admissível e só pode ser explicável por razões eleitoralistas.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É uma jogada eleitoral!
O Orador: - Sr. Presidente, com isto termino: não foi apenas uma decisão eleitoralista, foi fraudulenta, como também o confirma o Sr. Presidente da TAP e a Direcção Geral de Aviação Civil, quando diz em que condições são concedidas estas reduções de tarifas. Isto é uma fraude total!
Contrariamente àquilo que foi referido pelo Sr. Deputado do PS, não estão aqui em causa os interesses dos açoreanos e dos madeirenses, nem está em causa a estrutura tarifária de Inverno ou de Verão, o que está proposto é apenas uma redução tarifária em determinadas condições e apenas para um mês, pelo que o açoreano ou o madeirense tem de pagar a totalidade do bilhete, que depois vai recuperar, se tiver direito a isso! Não há tarifa de Inverno que possa subsistir apenas durante um mês! Apesar de haver o anticiclone dos Açores, o Inverno dos Açores não terá, certamente, apenas um mês!
Risos do PCP, do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes.
Por conseguinte, isto é, de facto, fraudulento!
Aplausos do PCP e PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, queria colocar a questão nos exactos termos em que me parece que o Plenário da Assembleia da República deve analisar este voto, ou seja, não se trata de uma análise do ponto de vista jurídico, em nosso entendimento, - que, porventura, outros podem ter feito noutras instâncias - mas de discutir o significado político daquilo que é um acto político, um acto político que permitiu que uma decisão durante oito anos estudada tivesse, num dia, sido tomada, uma coincidência que não é só um milagre da eficácia do funcionamento da TAP, da Direcção-Geral da Aviação Civil e do Ministério, que, com prontidão, fez aquilo que nunca com prontidão faz.
Em nosso entendimento, a única leitura que esta decisão pode ter tido é que é uma grosseira ingerência do Governo, através da «cunha» ou daquilo que elegantemente se pode querer chamar o lobby, para jogar eleitoralmente e para, com vantagem, «sacar» votos.
Por isso, a posição do Partido Ecologista Os Verdes, na análise política que deste facto resulta, é a de subscrever este voto como uma condenação de uma prática que condenámos no passado e que não há razão nenhuma para que não possamos e devamos continuar a condenar no presente.
Aplausos de Os Verdes, do PSD e do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 42/VII - De protesto pela tomada de medidas eleitoralistas do Governo na campanha eleitoral dos Açores (PSD).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É o seguinte:
Considerando a inadmissível intromissão eleitoralista do Governo da República na campanha eleitoral dos Açores, com o Primeiro-Ministro tomando medidas de governação a pedido do candidato regional do PS, violando a lei e a isenção que o Governo da República deve estritamente manter,
A Assembleia da República manifesta o seu veemente protesto pela atitude do Governo e do Primeiro-Ministro;
E mandata o Presidente da Assembleia da República para que, por todos os meios ao seu alcance e em tempo útil, seja levado conhecimento aos açoreanos deste voto de protesto.
Srs. Deputados, sobre os dois votos que se encontram na Mesa, com n.os 44/VII e 45/VII, foram apresentados requerimentos no sentido de ser adiada para amanhã a sua
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votação. Esses requerimentos correspondem a um direito potestativo e, portanto, a sua discussão e votação será feita amanhã.
O Sr. Deputado António Braga pede a palavra para que efeito?
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, quando o Grupo Parlamentar do PS pediu o adiamento do voto que acabámos de votar, justificava-se essa atitude, e provámo-lo, porque não tínhamos informação suficiente sobre o conteúdo do voto,...
Risos do PSD.
... independentemente de, como, aliás, se provou, a Comissão Nacional de Eleições ter arquivado o processo.
Como agora temos a informação de que a Mesa recebeu um requerimento, que sabemos ser de carácter potestativo, para adiamento do nosso voto, em que pretendíamos apenas saudar a forma como decorreram as eleições quer na Madeira quer nos Açores, queremos somente registar esse facto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado Carlos Coelho pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, a interpelação do Sr. Deputado António Braga obriga a que o Grupo Parlamentar do PSD torne claro o seguinte: pela nossa parte, estávamos dispostos a votar hoje o voto apresentado pelo Partido Socialista, não obstante, como o Sr. Deputado António Braga, por alguma razão, com a consciência ferida, teve ocasião de recordar relativamente ao voto que acabámos de votar, o PS tenha requerido o adiamento dessa discussão e votação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente.
O Orador: - Só que o PS é reincidente nestes adiamentos...
Vozes do PSD: - Exactamente!
O Orador: - ... e um voto que o PSD hoje apresentou, relativamente a uma experiência explosiva no distrito do Porto, foi, por requerimento seu, adiado novamente para a sessão de amanhã.
Se o Partido Socialista, perante votos que são apresentados nesta Assembleia da República, tiver uma postura sistemática e regular de pedir o seu adiamento, terá de compreender que nós, na bancada do Grupo Parlamentar do PSD, queiramos pensar melhor e reflectir maduramente sobre os votos que legitimamente o Partido Socialista apresenta. É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, somos sérios mas não somos ingénuos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Ferreira pede a palavra para que efeito?
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, temos assistido a uma postura por parte do Grupo Parlamentar do PS - respeitável, é certo - que é a de necessitar sempre de 24 ou mais horas para pensar maduramente nas posições que deve tomar sobre votos de protesto ou outros que são apresentados nas sessões plenárias.
Pela parte do Grupo Parlamentar do Partido Popular, essa necessidade não ocorre, mas temos verificado que ela é permanente no que toca ao Grupo Parlamentar do PS e, por isso, pensamos que é oportuno democratizar a regra de dar aos grupos parlamentares algum tempo para pensar sempre que um outro apresenta um voto de saudação ou de protesto.
Nestes exactos termos, o Grupo Parlamentar do PP associou-se ao requerimento no sentido de fazer transitar o voto de saudação apresentado pelo PS para a sessão de amanhã.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para defesa da honra da bancada, o Sr. Deputado Jorge Lacão.
Protestos do PSD.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Acalmem-se, Srs. Deputados do PSD!
Sr. Presidente, a questão é muito simples: o PSD, por uma vez na semana anterior e por outra hoje, apresentou, sobre duas matéria diferentes, dois votos de protesto relativamente a actos praticados por organismos da administração directa ou indirecta do Estado, portanto, relativamente a matéria cuja avaliação, para ser conscientemente tomada na Assembleia da República, careceu, relativamente ao voto da semana anterior e ao voto apresentado esta semana, de adequada ponderação, seja qual for a votação final.
Todavia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, particularmente Srs. Deputados do PSD, quando o acto eleitoral nos Açores e na Madeira foi um acto público por nós plenamente conhecido quanto ao seu alcance, estando a Assembleia da República, obviamente, no plano político, em condições perfeitas de poder exprimir, se o entendesse, uma atitude igualmente política de congratulação pela regularidade e pela verdade do acto democrático praticado nas nossa regiões autónomas, vem o Sr. Deputado Carlos Coelho, em nome da sua bancada, dizer que, por mero espírito de retaliação, requeria o adiamento do voto do Partido Socialista de congratulação relativamente às eleições nas regiões autónomas só porque nós, no dia de hoje, tínhamos requerido o adiamento de um voto vosso relativamente a uma experiência de natureza sísmica numa determinada zona do País.
Sr. Deputado Carlos Coelho, lamento profundamente que a lógica do PSD seja a da retaliação.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Os nossos conterrâneos, no sentido patriótico, que nos Açores e na Madeira participaram de um acto eleitoral, relativamente ao qual temos todos razões para nos congratularmos, não esperariam que a lógica do PSD fosse tão cega, fosse tão estreita e verdadeiramente tão mesquinha.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, devo confessar a V. Ex.ª e à Câmara que hesitei em usar da palavra para dar explicações, porque não costumo utilizar a palavra a despeito daquilo que o Regimento determina para cada figura.
Porém, é evidente para todos nós que o Sr. Deputado Jorge Lacão não defendeu a honra da bancada, que, aliás, também não ofendi. É também evidente para todos nós que o Sr. Deputado Jorge Lacão continua com a fixação de que há votos de primeira e de segunda, grupos parlamentares de primeira e grupos parlamentares de segunda, mas uma coisa que o Sr. Deputado Jorge Lacão e o Partido Socialista têm de perceber é que, a despeito de terem uma maioria relativa nesta Câmara, não são donos da Câmara e não são donos da maioria da Câmara.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, muito brevemente para, em primeiro lugar, dar um esclarecimento em relação ao que disse o Sr. Deputado Jorge Lacão, pois não correspondem à verdade as suas afirmações.
Provavelmente, não terá lido até ao fim o voto cujo adiamento pediram, porque está assinado por um Deputado do PSD, um do
CDS-PP e um do PCP.
Risos do PCP e do PSD.
A segunda questão é que os Srs. Deputados do Partido Socialista têm de compreender que, nesta situação concreta, foram feridos com os vossos próprios ferros. Já aqui foi referido, e essa é a verdade dos factos, que o pedido de adiamento do voto n.º 44/VII só foi feito depois de o Partido Socialista ter tomado a decisão que tomou em relação ao voto de protesto n.º 45/VII. E dizêmo-lo com todo o à vontade que temos nesta matéria, designadamente em relação a estes casos concretos, porque estamos disponíveis para votar os dois favoravelmente.
Já temos conhecimento das situações, já pensámos nelas, mas o Partido Socialista aparece agora com a desculpa de que este é um problema que é preciso ser ponderado, ou seja, o problema da eventual explosão de algumas toneladas de TNT junto ao Porto é um problema que apareceu ontem ou hoje e o Partido Socialista não teve tempo de pensar e tomar posição sobre ele...
Srs. Deputados, isto é inadmissível, é inaceitável,...
Protestos do PS.
... porque todos os grupos parlamentares têm de estar em condições de votar uma matéria dessas, qualquer que seja o seu voto.
Protestos do PS.
Srs. Deputados, essa é a desculpa; a razão e o protesto foram bem outros e contra eles, repito, foram feridos com os vossos próprios ferros.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, tenho mais duas inscrições para interpelações à Mesa, mas como as interpelações foram verdadeiras intervenções e já todos os grupos parlamentares se pronunciaram, julgo que não deverão ter lugar.
No entanto, se algum dos Srs. Deputados quer fazer uma efectiva interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, dar-lhe-ei a palavra. De outra forma não poderemos eternizar a questão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra para defesa da consideração da minha bancada, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado Jorge Lacão pretende defender a honra da sua bancada, é um caso diferente. Tem V. Ex.ª palavra.
Protestos do PCP.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, qualquer grupo parlamentar, a começar pelo seu, tem o pleno direito de usar o direito potestativo para suscitar, nos termos do Regimento, o adiamento de uma votação.
O Sr. António Braga (PS): - Exactamente!
O Orador: - Mais do que isso, tem o direito de o fazer sem justificar a razão porque o faz.
Portanto, Sr. Deputado Octávio Teixeira, o senhor não encontrará da bancada do Partido Socialista uma crítica ou um ataque a uma qualquer decisão da vossa parte no sentido de um adiamento de uma votação suscitado pela necessidade de ponderar substantivamente qualquer matéria. Esse é um direito vosso, é um direito nosso, é um direito de qualquer uma das bancadas e deve ser escrupulosamente respeitado.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!
O Orador: - No entanto, Sr. Deputado Octávio Teixeira, o que lamento ter de lhe dizer é que o senhor veio colocar-se na mesma posição de há pouco do Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. António Braga (PS): - Exactamente!
O Orador: - E qual é ela? É dizer, como o senhor disse, que quem com ferros mata com ferros morre, ou seja, os senhores só encontraram um motivo para que, todos juntos, hoje, não nos congratulássemos com o resultado das eleições nos Açores e na Madeira, o qual é o facto de, perante um outro voto sobre uma matéria substantiva, o Grupo Parlamentar do PS ter suscitado o direito de adiamento.
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Sr. Deputado Octávio Teixeira, o que é verdadeiramente lamentável - e é-o igualmente para a sua bancada - é que a sua motivação tenha sido igual à do PSD, ou seja, já que suscitaram o adiamento de um voto, pois, mecânica e cegamente, suscitemos o adiamento de outro. Sr. Deputado, também lhe digo que os açoreanos e os madeirenses mereciam melhor da sua parte!
Aplausos do PS
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, de facto, os açoreanos e os madeirenses merecem melhor da nossa parte, da parte do PCP e, por isso, não entramos em muitas daquelas coisas como as que foram discutidas hoje, em termos de fraudes eleitoralistas, por exemplo, porque eles merecem o nosso respeito.
Protestos do PS.
Sr. Deputado Jorge Lacão, o direito regimental existe, ninguém o contesta, só que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista está a utilizar isto como táctica, fazendo a mesma coisa constantemente.
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Orador: - E há uma questão que o Sr. Deputado tem de terem consideração, é que não pode haver nesta Câmara dois pesos e duas medidas. O Sr. Deputado diz que precisa de ponderar ainda o voto n.º 45/VII, mas eu já fiz a minha leitura política, no sentido de que não precisa nada de ponderar, porque conhece perfeitamente a matéria...
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - O senhor é que sabe?!
O Orador: - Estou a fazer a minha leitura política. É preciso repeti-lo?!
Se fôssemos à procura de pretextos, diria assim: também tenho de ponderar ainda o outro voto, aquele apresentado pelo Partido Socialista, porque quando se diz «saudar todos os participantes nas eleições» tenho de ir para casa ponderar se «todos os participantes nas eleições» também inclui o presidente da TAP e o Primeiro-Ministro enquanto tal.
Risos do PCP e do PSD.
Esse é um mero pretexto. Foi isso que V. Ex.ª utilizou!
Aplausos do PCP e do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, mas acrescento que não darei a palavra a mais ninguém porque precisamos de passar ao ponto seguinte dos nossos trabalhos, o debate de urgência requerido pelo Partido Social-Democrata.
O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa tem a ver com o seguinte: a figura regimental dos votos de protesto, como outras deste género, está ligada a um sentido de oportunidade. É óbvio que o direito potestativo que concede a 10 Deputados a possibilidade de pedir o seu adiamento tem ligado a si também um objectivo e o PS invoca-o aqui para poder reflectir, porque não está preparado para abordar o assunto no momento. Só que, como também já foi afirmado, o PS, de uma forma sistemática, tem vindo a reflectir, estando com isso a subverter o espírito do Regimento.
Protestos do PS.
No caso concreto deste voto, a situação desmascara por completo a posição do PS, porque...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, peço-lhe que dirija concretamente a sua pergunta à Mesa. O Sr. Deputado não está, de forma nenhuma, a fazer uma interpelação. Está a fazer uma intervenção no debate, o que vai ter muito tempo para fazer amanhã.
O Orador: - O Sr. Presidente verá que a minha interpelação tem a ver com a condução do debate e com a subversão de uma figura regimental por parte do PS.
O PS invoca que, neste caso, precisa de 24 horas para reflectir. Ora, nas últimas semanas, as assembleias municipais de todo o distrito do Porto têm votado estas matérias com votos do PS e ainda ontem à noite o Sr. Deputado José Saraiva votou um texto como este na Assembleia Municipal do Porto.
O Sr. José Saraiva (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Portanto, fica demonstrado que não é um problema de reflexão mas de o PS estar inseguro e precisar sempre de 24 horas para poder receber ordens do seu Governo.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, a apresentação de um requerimento a pedir o adiamento é um direito potestativo e pode sempre ser utilizado por uma razão ou por outra.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de solicitar à Mesa a substituição do voto que estava a circular, pois Os Verdes subscreveram-no e, embora eu já tivesse apelado à Mesa para fazer a distribuição do voto correcto, esta ainda não foi feita.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que o problema aqui em causa não é um problema novo e relativamente a ele alguns Deputados e eu própria fizemos já requerimentos. Assim, fazendo justiça ao PS e não acreditando tão pouco que este, a uma semana de uma experiência desta natureza, ainda desconheça qual é o seu conteúdo, a única leitura que posso fazer deste adiamento é o facto de o PS querer saber como se vai posicionar e não o de recolher dados, que, manifestamente, não acredito que o maior grupo parlamentar desta Câmara ainda não possua.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa em sentido próprio.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, sendo em sentido próprio e por ser a primeira vez que o faz neste debate, tem a palavra.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, como teve ocasião de notar, nas vezes anteriores pedi a palavra para o exercício do direito de defesa da minha bancada.
O Sr. Deputado Luís Filipe Menezes acusou expressamente a bancada do PS de, nesta sessão, estar a subverter uma figura regimental relativamente ao exercício de um determinado direito. Assim, interpelo-o, Sr. Presidente, para
que me diga a mim, Presidente do Grupo Parlamentar do PS, se o meu partido já subverteu, neste debate, alguma figura regimental ou não. Sr. Presidente, peço-lhe que seja totalmente explicito na resposta que me puder dar sobre o
assunto.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, as actas registam a gravação e dirão com certeza a minha observação feita à intervenção do Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, segundo a qual o requerimento pedindo o adiamento de uma votação é um direito potestativo de qualquer grupo de 10 Deputados, pelo menos. Esta é a
questão inquestionavelmente regimental.
Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, a apreciação de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a substituição de um dos
nossos colegas. Tem a palavra o Sr. Secretário Artur Penedos.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, realizada no dia 15 de Outubro de 1996, pelas 10 horas e 30
minutos, foram observadas as seguintes retoma e substituição de Deputados:
a) Retoma de mandato de Deputado nos termos do artigo 6 º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março).
Grupo Parlamentar do PS: Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge (Circulo Eleitoral de Coimbra), em 16 de Outubro corrente, inclusive, cessando Vital Martins Moreira;
b) Substituições de Deputados nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d) do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março):
Grupo Parlamentar do PS: Rui Manuel dos Santos Namorado (Círculo Eleitoral de Coimbra), por Vital Martins Moreira, com inicio em 16 de Outubro corrente,
inclusive.
2. Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito, que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente circulo eleitoral.
O parecer vai no sentido de que a retoma do mandato e a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
Srs. Deputados, passamos ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, sobre a abolição das provas globais dos ensinos básico e secundário e o necessário rigor e exigência no sistema educativo.
Para participar neste debate, encontram-se entre nós alguns membros do Governo e para apresentar esta questão, tem a palavra ao Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A minha primeira palavra é para lamentar a ausência do Sr. Ministro da Educação neste debate.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PSD pediu um debate de urgência sobre esta relevante questão nacional e, através de ofício dirigido ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, teve ocasião de sublinhar a importância da participação do Ministro da Educação no presente debate.
Ao não dar cumprimento a duas resoluções da Assembleia da República, uma aprovada por unanimidade e outra aprovada por todos os grupos parlamentares com excepção do PS, o Sr. Ministro da Educação desrespeitou a Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Ao estar ausente no debate de hoje, o Sr. Ministro da Educação desconsidera a Assembleia da República.
Flagrante contraste com o discurso político que o PS fazia antes das eleições, quando criticava a maioria e o governo de então por não respeitarem o Parlamento. É esta a prova de respeito pela Assembleia da República de que o Governo «rosa» dá provas neste momento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E a presença do Sr. Ministro da Educação era tanto mais necessária quanto há provas evidentes de descoordenação, de hesitação e de contradição na direcção da política educativa. É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mais grave do que ter razão para discordar de políticas do Ministério da Educação, é ter razões fundadas para não se perceber qual é o sentido das políticas do Ministério da Educação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O sistema educativo precisa, as escolas reclamam e as famílias pedem tranquilidade, estabilidade e melhorias. A resposta que o Governo dá é, no mínimo, uma resposta de ziguezague e de contradição permanente. E grave é que seja patente a contradição permanente entre o discurso e a obra, entre o que se diz e promete e o que se faz e decide.
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Se não, vejamos um primeiro exemplo: o Ministério da Educação afirmou querer mais rigor e qualidade no acesso ao ensino superior e fixar a obrigatoriedade de uma nota mínima, abaixo da qual não se poderia aceder ao ensino superior. As universidades fixam uma nota mínima deslizante, quase que diríamos de realidade virtual, que parece ser uma, mas que pode baixar... O Ministério ainda poderia disfarçar, dizendo que foram as universidades que fixaram e que não foi ele quem desvalorizou, na prática, a fixação da nota mínima.
Mas aí está uma decisão que o Ministério da Educação não pode alienar, que é dele próprio: a bonificação de dois valores, que permitiu a situação caricata, já denunciada nesta Assembleia, de os estudantes verem nas pautas notas de 21 e 22 valores, rasgando uma tabela de variações de 0 a 20 valores.
Um segundo exemplo, Sr. Presidente e Srs. Deputados: o Ministro, da Educação reúne com parceiros sociais que reclamam maior rigor e experiência no sistema educativo.
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - O Ministro da Educação, à saída dessa reunião, afirma querer maior rigor e exigência.
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - Mas a Sr.ª Secretária de Estado, Ana Benavente, que nos dá hoje o privilégio da sua companhia, assina um despacho que «mata» as provas globais do 9.º ano de escolaridade.
Vozes do PS: - É mentira! Não é verdade!
O Orador: - Terceiro exemplo: o Sr. Ministro da Educação continua a fazer o discurso do rigor, da exigência e da qualidade e prepara um «pacote» de medidas de eliminação das provas globais e de redução do peso dos exames.
O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Um semanário põe isso primeira página, o Ministério da Educação apressa-se a desmentir, mas não pretende fazer nada disso. E é desmentido pelo Presidente da Confederação Nacional, que vinha preparando tudo com o Governo e que desabafa para a imprensa, se calhar com alguma ingenuidade: «É pena. Estava tudo tão bem encaminhado». E é desmentido pelas decisões no ensino secundário: o peso dos exames nacionais baixa mesmo de 40% para 30%, como foi anunciado pela Sr.ª Secretária de Estado, Ana Benavente.
O Sr. António Braga (PS): - Boa medida!
O Orador: - Percebe-se o recuo do Governo: é que uma mega-sondagem do jornal Público, da RTP e da Antena I, revelava grandes preocupações dos portugueses relativamente à educação. A mesma sondagem classificava como fraca a actuação da equipa ministerial, que levava a que mais de metade dos portugueses afirmassem que o Governo não está a cumprir o que prometeu no sector educativo.
No entanto, mais significativa foi a resposta expressiva de quase 2/3 dos portugueses, que consideravam, nessa sondagem, dever haver exames nacionais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta política do ziguezague não se percebe. Compreender-se-ia uma política diferente, que estaríamos a combater mas respeitaríamos a diferença de opiniões.
No entanto, é difícil perceber o caminho e o rumo de alguém que hesita, que se contradiz, que parece tactear um caminho que vai descobrindo a pouco e pouco, sem conseguir ver longe nem claro.
Se alguma imagem poderíamos tirar deste comportamento do Governo, ela é a de um Ministério de «bengala», que vamos vendo dia-a-dia a tactear o seu caminho.
Vozes do PS: - Oh!...
O Orador: - As provas globais do 9.º ano também são disso exemplo claro. O 9.º ano não é um ano qualquer. Representa o fim da escolaridade obrigatória e, para milhares de portugueses, a saída do sistema educativo e a entrada na vida activa. Este é, tem de ser, um momento importante, que era essencial que fosse certificado por uma avaliação externa ao ambiente fechado da relação professor/aluno em cada turma.
A avaliação somativa exigida deveria permitir estabelecer uma comparação/avaliação objectiva dos diferentes ritmos de ensino/aprendizagem.
A prova global, no plano da escola, constituía uma forma «mais» de valorizar o papel educativo da escola, respeitando as especificidades locais.
Ao transferir as provas globais de provas de escola para testes na turma, a Secretária de Estado Ana Benavente matou as provas globais do 9.º ano.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Primeiro: deixaram de ser elaboradas ao nível da escola para o serem no domínio da turma.
Segundo: deixaram de ser efectuadas em «regime de anonimato, por professores designados pelo órgão de gestão» e passaram a ser feitas pelo professor da turma.
Terceiro: a calendarização das provas deixou de ser competência «do órgão de gestão do estabelecimento de ensino, em articulação com uma secção especializada do conselho pedagógico» e passou a ser competência do «director da turma sob proposta do professor de cada disciplina».
O despacho da Secretária de Estado Ana Benavente acentua, o carácter de um mero teste, sublinhando que as provas «se realizam no horário fixado para a disciplina».
E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o mais curioso, neste Governo, que hesita e tacteia, é a insegurança, é a hesitação.
O despacho inicial, do governo anterior, é de Setembro de 1995. Este Governo, depois das eleições, olhou para o despacho e alterou-o.
Em Novembro de 1995, o Ministro Marçal Grilo introduziu-lhe correcções. Na altura, pareceu-lhe bem manter a prova global no plano da escola.
Em Março de 1996, a Secretária de Estado Ana Benavente olhou para o despacho já corrigido pelo Ministro Marçal Grilo e introduziu-lhe mais correcções.
O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Na altura, pareceu bem à Sr.ª Secretária de Estado manter a prova global no plano da escola.
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Passados quatro meses, em Julho deste ano, a Secretária de Estado arrependeu-se do despacho que fez em Março e pensou melhor. E este Governo, pela terceira vez no espaço de poucos meses, alterou o despacho de Setembro de 1995, que havia sido corrigido pelos despachos de Novembro de 1995 e de Março de 1996, e liquidou as provas globais.
Poderíamos perguntar: que despacho irá a Secretária de Estado elaborar daqui a três meses? Que surpresa nos reservará o Diário da República em Dezembro, Janeiro ou Fevereiro? Que nova alteração vai fazer? Que nova experiência vão ensaiar?
Para nós, a avaliação não se faz apenas com exames, apesar de eles terem um papel importante e essencial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD sempre defendeu e continua a defender a estabilidade de vida nas escolas e a não alteração das regras de avaliação a meio do ano lectivo. Condenamos o Governo pela introdução sistemática, frequente e avulsa de alterações ao sistema de avaliação, gerando intranquilidade nas escolas, nos estudantes e nas famílias.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não vimos, pois, anunciar aqui qualquer iniciativa legislativa que vise, a meio do ano lectivo de 1996/97, alterar o que o Governo - a nosso ver, mal - decidiu. Mas vamos convidar formalmente o Governo a decidir-se sobre o que quer para as escolas portuguesas.
Para nós, o rigor, a exigência e a qualidade na educação não passam apenas pela avaliação mas também pela formação dos docentes, pelas suas habilitações, pela ocupação dos tempos livres dos estudantes, pela promoção do desporto escolar e por uma mais eficaz gestão das escolas.
Estamos disponíveis para dar, nestas e noutras matérias, de forma construtiva, a nossa contribuição, mas gostaríamos de perceber se o Governo está connosco nessa campanha de mais rigor, exigência e qualidade ou se, pelo contrário, como vem dando preocupantes sinais noutras áreas da governação, cede ao facilitismo e à popularidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Pode ser fácil e popular acabar com exames, baixar médias, dar bonificações, ceder ao primeiro grupo de pressão que bate à porta do Ministério e reclama uma medida. Mas, na educação, isso paga-se caro.
A educação das nossas crianças e jovens é a aposta mais segura no futuro do nosso País, é o passo mais inteligente no nosso maior e melhor recurso que são os portugueses. E, Sr. Presidente, Srs. Deputados e, sobretudo, Srs. Membros do Governo, com o nosso futuro colectivo não se pode brincar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, peço a palavra, para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração do Governo.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, começo por esclarecer que recorro a esta figura porque o Regimento não consente outra, sendo que a honra do Governo é sólida...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Secretário de Estado pediu a palavra para defender a honra do Governo. Se, porventura, o Governo não se considera desonrado, não tem nada que usar da palavra...
Risos do PSD.
... e, nesse caso, retirar-lha-ei.
O Orador: - Sr. Presidente, explicitava eu que, no contexto do Regimento, e não obstante a certa boa intenção do Sr. Deputado Carlos Coelho, o Governo invoca a defesa da honra, apesar de a honra do Governo ser sólida e as boas intenções do Sr. Deputado Carlos Coelho não pressuporem a ofensa à honra de quem quer que seja, muito menos a do Governo.
Mas o Grupo Parlamentar do PSD, que sabe ter solicitado um debate que não tem objecto, tinha de criar um pequeno incidente. E o incidente que o Sr. Deputado quis criar foi esta recidiva questão do respeito do Governo pela Assembleia da República.
O Sr. Deputado não é novato nesta Casa, já esteve, em várias legislaturas, tanto nessa bancada como nesta, por isso, tem consciência de que aquilo que afirmou não corresponde à realidade dos factos e não resiste a um confronto mínimo com qualquer legislatura, para não falar sequer das duas últimas, quando o seu actual líder da bancada, por ser responsável pela área dos assuntos parlamentares, se encarregou de gerir parcimoniosamente o diálogo do Governo com a Assembleia da República.
Sr. Deputado, recordo-lhe que o Sr. Ministro da Educação tem vindo aqui sempre, sempre, em todas as circunstâncias! E já houve mesmo alturas em que, a perguntas do Grupo Parlamentar do PSD, o número de membros da equipa do Ministério da Educação sentada na bancada do Governo era mesmo superior ao dos Deputados do PSD, partido interpelante, sentados nessa bancada. Não obstante, o Sr. Ministro esteve cá.
Com efeito, o Sr. Ministro da Educação, hoje, não pode estar presente, aliás, como o Sr. Deputado sabia, pois com antecedência, informei a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares de que o Sr. Ministro da Educação já tinha compromissos anteriores, de diálogo com o mundo escolar. O Sr. Ministro esteve hoje de manhã em Coimbra, está hoje de tarde em Santa Maria da Feira e, não tendo o dom de ubiquidade, não pode estar aqui.
Para terminar, deixe-me dizer-lhe o seguinte: tendo o Sr. Deputado feito um discurso que trazia escrito de casa, e que tive o gosto de ouvir, não era, de facto, o Ministro da Educação que tinha de estar aqui, para responder e dialogar com V. Ex.ª, mas, sim, a Sr.ª Secretária de Estado Ana Benavente, a quem interpelou 20 vezes durante a sua intervenção e que aqui está para lhe responder, tendo sido, aliás, V. Ex.ª que disse quem era o interlocutor indicado por parte do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, tendo em conta o início da
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sua defesa da honra e a forma leve como a começou, estava tentado a dizer que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares faz lembrar aqueles jogadores de futebol que, quando não querem jogar, se atiram para o chão, para permitir que o tempo passe e para desviar as atenções.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Neste caso, atirou-se para o ar!
O Orador: - Mas o Sr. Secretário de Estado, depois, tornou a sua intervenção um pouco mais séria e fez algumas referências que não podem passar sem resposta.
Sr. Secretário de Estado, o responsável político pelo Governo, na área da educação, é o Ministro da Educação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E nós temos uma dúvida legítima sobre a questão do rigor e da exigência, porque, por um lado, vemos um Ministro da Educação fazer um discurso e, por outro, vemos a Sr.ª Secretária de Estado Ana Benavente, aqui presente, tomar decisões em flagrante contradição com o discurso do Ministro. O Ministro diz «haja rigor e exigência», a Sr.ª Secretária de Estado diz «acabem as provas globais».
De duas, uma: ou o Sr. Ministro e a Sr.ª Secretária de Estado estão desavindos, e é importante que isso fique claro perante o Parlamento, pois, se assim for, temos aqui apenas uma das partes desse hipotético conflito, a Sr.ª Secretária de Estado, faltando o Sr. Ministro; ou não há qualquer conflito entre o Sr. Ministro e a Sr.ª Secretária de Estado, e temos a prova rotunda de que este Governo tem a obsessão de agradar a todos, fazendo o discurso para agradar a uns e tomando as decisões para agradar a outros.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, isso é que é impossível de sustentar, sob o ponto de vista político. E cabe-nos, como grupo parlamentar da oposição, responsabilizar o Governo pela execução das suas políticas e pela garantia de dar cumprimento às promessas que fez. Ora, a educação não é uma política qualquer. A educação era a paixão do Sr. Primeiro-Ministro! Era a grande preocupação do Governo!
Vozes do PS: - É! É!
O Orador: - Era! Era! Eu disse deliberadamente «era»! E como ficou flagrante na sondagem que referi na minha intervenção inicial, hoje, mais de metade dos portugueses já sente que há uma grande décalage entre o que os senhores prometeram e o que estão a fazer, entre o que dizem e afirmam e o que decidem e fazem.
Sr. Secretário de Estado, esta situação obriga a que o Sr. Ministro da Educação responda perante o Parlamento. É essa a sua responsabilidade política e lamentamos que o Sr. Ministro aqui não esteja.
O Sr. Secretário de Estado diz que o Sr. Ministro tem vindo aqui outras vezes. É verdade, mas V. Ex.ª, o seu Governo, essa bancada e o Sr. Ministro da Educação têm já no cadastro das relações entre o Governo e a Assembleia da República duas desresponsabilizações em relação a esta Assembleia, a duas recomendações suas, uma aprovada por unanimidade, incluindo os votos do Partido Socialista, que os senhores disseram não cumprir; outra aprovada pela Assembleia apenas com os votos contra do PS, que os senhores não só disseram que não iam cumprir como permitiram até uma graça, em tom pouco cordato, do Sr. Secretário de Estado, desafiando os Deputados a apresentarem as iniciativas legislativas que acabaram por surgir.
Sr. Secretário de Estado, tenhamos termos! O Sr. Ministro é politicamente responsável, deveria estar aqui e nós tiramos as nossas ilações políticas da ausência do Sr. Ministro neste debate.
Aplausos do PSD.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares:- Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, quero apenas dizer que, na sequência das explicações que o Sr. Deputado Carlos Coelho acaba de dar, o Governo regista que não era necessária a presença do Ministro da Educação para debater qualquer questão de fundo mas, sim, para esclarecer um problema de intriga, de Crónica Feminina. Naturalmente, o Sr. Ministro da Educação não se presta a estes papéis.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Secretário de Estado, permita-me que lhe diga que a Mesa também o regista, mas não se sente interpelada pela sua intervenção.
O Sr. Deputado Carlos Coelho pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, para uma interpelação à Mesa no exacto sentido regimental.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Já chegámos ao ponto em que é preciso sublinhá-lo.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Tal como o Sr. Presidente registou, acabei de dar explicações.
Sr. Presidente, acabámos de ouvir uma curta interpelação à Mesa, a propósito de Crónica Feminina, que me suscita a seguinte pergunta: a Mesa está em condições de garantir à Câmara que foi um Membro do Governo que se lhe dirigiu? É que eu tenho dúvidas!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Carlos Coelho, a sua interpelação é meramente retórica e, por isso, não tem resposta.
Aplausos do PS.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Fernando de Sousa, António Braga e Luísa Mesquita.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.
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O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, tal como o Governo, também nós não compreendemos a sua insistência quanto à presença ou ausência do Sr. Ministro da Educação neste debate. Muito provavelmente, nunca qualquer outro ministro esteve aqui tantas vezes, quer em sede de Plenário, quer em sede de comissão, como o Sr. Ministro da Educação, que sempre se tem mostrado disponível para tal e o Sr. Deputado sabe-o bem.
Mas nem sempre estiveram disponíveis os ministros da educação do anterior governo. Sobre essa matéria, não nos podem dar lições, Sr. Deputado Carlos Coelho, porque o senhor sabe melhor dó que nós que, muitas vezes, pedíamos que o ministro da educação do PSD viesse à Comissão e ele não só não vinha como, muitas vezes, respondia com uma certa arrogância relativamente às questões colocadas pela oposição.
Aliás, o Sr. Ministro da Educação, apesar de não ter podido vir cá hoje, está representado pelos Secretários de Estado respectivos e o Sr. Deputado Carlos Coelho sabe que ele virá cá todas as vezes e mais uma, para responder
a esta e a outras questões.
Quanto a esta questão não preocupar o Sr. Ministro da Educação, Sr. Deputado Carlos Coelho, o senhor falou da realidade virtual e a realidade virtual foi o objecto da sua intervenção. O Sr. Deputado voltou a falar, sobretudo, das vagas adicionais e de algumas preocupações de rigor,
exigência e qualidade, com que todos nos deparamos e que também são preocupações nossas, mas que não o foram sempre vossas, durante os últimos 17 anos.
Gostaria, por exemplo, relativamente a essa questão do rigor, da exigência e da qualidade, de perguntar ao Sr. Deputado Carlos Coelho quem é que aboliu a nota mínima, em 1989/90, para ingresso no ensino superior e qual foi o alcance desta medida, em termos de rigor, de qualidade e de exigência, contra dois pareceres do Conselho Nacional de Educação, que a tutela e o governo do PSD, pura e simplesmente, ignoraram.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Dito isto, o Sr. Deputado Carlos Coelho sabe que não terminaram as provas globais e a matriz que continua subjacente às provas, a própria concepção e a aferição do sistema demonstra que, efectivamente, elas não
terminaram.
Agora, o Sr. Deputado Carlos Coelho tem de explicar aqui algumas coisas, a saber: é a favor da avaliação contínua ou não? E, se é, como é que não aceita esta nova interpretação das provas globais? E a favor da autonomia das escolas ou não? E terá de dizer se esta intervenção da tutela vai ou não no sentido do respeito e do desenvolvimento do reforço da autonomia das escolas.
Há alterações de métodos, há uma regulação mais flexível das estruturas de orientação pedagógica, há diversificação dos mecanismos de elaboração das provas
e da própria correcção.
Agora, quanto a terminar as provas globais, o Sr. Deputado Carlos Coelho terá de explicar e fundamentar como é que elas terminam, se, efectivamente, não são as provas globais que estão em causa, se não se trata da extinção ou não das provas globais.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
A Sr. Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, penso que, antes de lhe colocar qualquer questão, talvez valesse a pena encontrarmos algum consenso em volta deste debate de urgência.
Julgo que estará de acordo que os pressupostos do vosso debate de urgência relativo às provas globais são exactamente os mesmos na perspectiva quer do Governo, quer do PS, quer do PSD e é importante referir isto. O Sr. Deputado Fernando de Sousa acabou de confirmá-lo neste momento, para que não restassem dúvidas.
Daí que o carácter de urgência com que este debate aparece pretende tão-só, na nossa perspectiva, demonstrar ao País e à comunidade educativa que o PSD e o PS estão de acordo também nesta matéria, o que penso que talvez não valesse a pena, porque é um dado adquirido em termos de opinião pública.
No que se refere concretamente às provas globais, a questão que quero colocar-lhe, Sr. Deputado, é a seguinte: que vantagens e que inconvenientes traria...
Pausa.
Sr. Presidente, peço desculpa, mas a questão que estou a colocar dirige-se ao Sr. Deputado Carlos Coelho do PSD e ele está em contacto telefónico com o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Por uma questão de ética, resolvi interromper a minha intervenção para lhe permitir... A não ser que a disponibilidade auditiva do Sr. Deputado funcione nos dois sentidos e, nesse caso, continuo.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Uma vez que o Sr. Deputado terminou, pode continuar, Sr.ª Deputada.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não perdoa nada!
A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Partindo do princípio de que o Sr. Deputado Carlos Coelho pode não ter ouvido, repito a questão: que vantagens e inconvenientes, a nível do sistema, traria o desaparecimento das provas globais, quer a nível de escola, quer a nível de disciplina?
Para além desta abordagem global, a minha questão concreta é esta: o Sr. Deputado considera o aproveitamento de mais um mês, concretamente a partir o terminus de Maio até ao fim de Junho, para o processo de ensino/aprendizagem, em todas as escolas do ensino básico e do ensino secundário, mais negativo que o aproveitamento deste mesmo tempo para a realização de provas globais e para o aproveitamento, na sua totalidade, do 3.º período para a diversificação e «polifonia» da avaliação do nosso sistema de ensino?
Uma outra questão prende-se, dentro desta linha, com o calendário escolar. É ou não verdade - e, com certeza, o Sr. Deputado estará de acordo comigo - que um calendário escolar constitui uma peça fundamental, eficaz e harmoniosa do desenvolvimento das actividades lectivas? É ou não verdade que a existência de provas globais do 9.º ao 11.º ano e dos exames nacionais do 12.º ano faz desaparecer, na prática, como há pouco lhe tinha dito, o 3.º período, em termos de processo de ensino/aprendizagem? É ou não verdade que uma melhoria das qualidades de aprendizagem dos alunos e um trabalho mais eficaz por parte dos professores só se concretizará se aspectos fundamentais da organização escolar forem tidos em conta? E, nesses aspectos fundamentais, lembraria só
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ao Sr. Deputado dois ou três: revisão da matéria curricular, revisão da extensão dos programas, avaliação dos sistemas de avaliação.
Por último, gostaria de saber se o Sr. Deputado não considera que era precisamente por estas áreas e por estas matérias que era urgente e determinante começar, para que, de algum modo, fossem conseguidos e obtidos os resultados que se pretendem para a existência de sucesso e êxito quer no ensino básico quer no ensino secundário.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, o senhor argumentou bem mas concluiu muito mal.
Efectivamente, as provas globais podem e devem ser um instrumento de justiça para repor e, sobretudo, reparar os diferentes critérios de avaliação e de exigência que há de professor para professor na mesma escola, mas também de escola para escola, de região para região, como o demonstram, aliás, os dados fornecidos por todos os órgãos de comunicação social.
Por isso, o Sr. Deputado Carlos Coelho vem aqui acusar o Governo de ter «matado um morto», porque provas globais, efectivamente, nunca existiram no 9.º ano, já que elas só seriam globais se fossem de âmbito nacional. Porém, as provas globais do 9 º ano que tínhamos eram provas globais de âmbito de escola, provas que não permitiam corrigir as assimetrias, as diferenças de exigência existentes de escola para escola.
Todos sabemos que há escolas identificadas e reconhecidas como escolas de exigência e também sabemos que há escolas reconhecidas e identificadas como escolas de grande laxismo. E quem são as vítimas? São os alunos! É por isso que a justiça se fazia através da introdução de provas globais, mas de provas globais de âmbito nacional! Infelizmente, o Governo, em vez de andar no sentido correcto, andou no sentido inverso e transformou as provas globais de âmbito de escola em provas globais de âmbito de turma, e, assim, ainda menos globais passaram a ser.
Portanto, gostaria que me esclarecesse sobre esta questão e que me elucidasse sobre qual é a eficácia das provas globais que existiam, nomeadamente as de âmbito de escola.
Em segundo lugar, já que estamos a falar das provas globais - e este é um debate necessário e pertinente - e porque estamos no inicio do ano lectivo, julgo ser fundamental definirmos, desde já, as regras que vão pautar o sistema de ingresso dos alunos, no próximo ano lectivo, no ensino superior.
E, das duas, uma: ou optamos por um sistema de ingresso onde há uma verdadeira autonomia das universidades e onde os critérios de aferição dos candidatos são definidos apenas e só pelas universidades, ou somos adeptos do outro critério, que tem vindo a ser seguido até aqui, onde tem relevância nomeadamente a avaliação somativa, a avaliação continua e, neste campo, as provas globais poderão, então, ter ou não maior relevância. Se optarmos por esse conceito de regime de acesso, então, poderá ser relevante ou não a redução, agora proposta pelo Governo, do peso das provas globais na nota final de candidatura com que os alunos se vão apresentar às universidades.
Eram estas as duas questões que gostava de ver esclarecidas, Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, não percebo qual é a perda de eficácia de passarmos de provas globais de âmbito de escola para provas globais de âmbito de turma, porque arribas eram ineficazes. Em segundo lugar, é muito difícil definirmos que tipo de provas globais queremos, sem sabermos que regime de acesso devemos e queremos estabelecer para o próximo ano lectivo.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, serei breve, mas gostava de começar este pedido de esclarecimento por uma confirmação. Em minha opinião, este debate promovido pelo PSD, é uma espécie de tentativa de exorcizar os fantasmas da governação na educação, que obviamente devem afligir as noites dos Deputados do PSD, designadamente do Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lá vem o passado! O PS não sabe falar de outra coisa!
O Orador: - Sim, Sr. Deputado! E sabe por que vem lá o passado? Porque o PSD foi um verdadeiro incendiário do sistema educativo e ainda hoje sabemos o nome de quem incendiou o Templo de Diana mas dificilmente nos recordamos de quem o mandou construir. É por isso que ninguém se esquecerá nunca daquilo que o PSD fez, nos últimos 16 anos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não querem é assumir responsabilidades!
O Orador: - Os senhores têm de ouvi-lo, porque nós ainda estamos a gerir, neste momento, situações de conflito, situações de dificuldade, muito agudas, que cresceram e foram alimentadas nos governos do PSD.
Sr. Deputado, vou fazer-lhe duas perguntas que têm a ver com isso. Por exemplo, o Sr. Deputado Carlos Coelho falou na exigência, no rigor e na qualidade do ensino, objectivos com os quais, obviamente, todos temos de estar de acordo e nos quais nos empenhámos. Agora, o Sr. Deputado sabe que o seu governo foi autor, por exemplo, da medida relativa à formação continua dos professores, dessa ideia de criar uma espécie de supermercados onde os professores corriam a buscar créditos para fazer a sua formação. Ou seja, a formação dos professores não era feita tendo em ponta a qualidade, do ponto de vista do objectivo, do ensino nem a melhoria da sua qualificação, mas exclusivamente para progredir na carreira, do ponto de vista remuneratório, o que, em si, não é grave, mas exclusivamente para isso esta formação não serve e esta é uma das heranças que recebemos.
O Sr. Deputado concorda ainda com esta formação tipo supermercado, pronto-a-vestir, onde se vai buscar o crédito para progredir na carreira e não se vai buscar a formação que eventualmente seja detectada como necessária, quer ao nível da escola quer ao nível da consciência pessoal e
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profissional? Esta é uma das heranças que temos de corrigir e é uma pergunta que lhe faço.
É que falar em rigor e em avaliação não justifica tudo. O Sr. Deputado Carlos Coelho sabe melhor do que nós, porque esteve recentemente no governo e, portanto, conhece essa situação em concreto,...
Protestos do Deputado Miguel Macedo do PSD.
Sr. Deputado Miguel Macedo, sei que está intranquilo, mas sossegue, porque a estas questões o Sr. Deputado Carlos Coelho vai ter dificuldade em responder e o Sr. Deputado pode dar-lhe uma cábula, porque sei que o senhor sabe disto!
A minha última pergunta, Sr. Deputado Carlos Coelho, tem a ver com o seguinte: o Sr. Deputado, que se diz a favor do rigor e da exigência, pensa que o rigor e a qualidade se verificam apenas na realização dos exames? Os exames são a consequência objectiva exclusiva do rigor? É dessa opinião?
Responda-me ainda, com sinceridade, a outra coisa: o Sr. Deputado Carlos Coelho não acredita verdadeiramente que as provas globais acabaram, pois não?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, a estratégia do Sr. Secretário de Estado de fazer aquela defesa da consideração, tentando «jogar para o lado» foi seguida pelos Srs. Deputados do Partido Socialista,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ... que tentaram meter no debate coisas que, evidentemente, não são o seu essencial.
Fizemos uma clara acusação política ao Governo e dissemos que o mesmo Governo que faz um discurso público de maior rigor, exigência e qualidade toma decisões concretas ao arrepio desses princípios.
Vozes do PSD: - Exactamente!
O Orador: - Dissemos coisas concretas relativamente às quais o PS nada disse.
O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!
O Orador: - O PS não disse uma palavra de defesa do Governo no sentido de que ele não está, de facto, a fazer uma política de total contradição entre aquilo que afirma e aquilo que faz. Isso é grave porque significa que o PS, no fundo - e já tínhamos percebido isso por algumas votações -, está consciente das fragilidades da equipa governativa na área da educação!
Responderei ao Sr. Deputado Fernando de Sousa em 10 segundos: o Sr. Ministro da Educação não faz qualquer favor em dialogar com a Assembleia, porque, primeiro, é essa a sua obrigação, é esse o seu dever, e, segundo, é essa a sua bandeira. A bandeira deste Governo é o diálogo com a Assembleia, com os parceiros sociais e com toda a gente e não é o Governo que fiscaliza a Assembleia, é a Assembleia que fiscaliza o Governo! Assim está na Constituição, assim está no exercício das nossas competências e assim tem de ser!
O Sr. Ministro da Educação não faz qualquer favor em vir cá e em ser sindicado na sua acção! Portanto, relativamente à questão do Governo, dou a conversa por concluída.
Agora, relativamente às provas globais, o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva deu-me uma ajuda, porque o CDS-PP, pelos vistos, ainda queria mais, queria exames nacionais logo no 9 º ano.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Exactamente!
O Orador: - Nós não fomos tão longe!
Agora o que o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva diz, embora exagerando, e com pressupostos que nós não partilhamos, é, por exemplo, que há uma grande disfunção regional e que aprendeu isso por notícias dos jornais, mas há um estudo do DEPJEF sobre o levantamento da classificação dos exames nacionais do 12.º ano que prova o contrário relativamente aos desequilíbrios regionais. Portanto, é um ponto de partida que o obriga a ter outra conclusão.
Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, as provas globais, tal como estavam definidas, ao contrário daquilo que o Sr. Deputado Fernando de Sousa tentou insinuar, reforçavam a autonomia da escola, reforçavam a escola enquanto unidade pedagógica e permitiam uma avaliação dos ritmos de ensino/aprendizagem, porque os parâmetros de avaliação no plano da escola eram os mesmos.
O Sr. Fernando de Sousa (PS): - E estas, agora, não?!
O Orador: - Quando a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação liquida as provas globais com o seu despacho,...
O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!
O Orador: - ... dizendo que as provas passam a ser feitas no plano da turma, confundindo as provas, globais com qualquer teste que, no âmbito da avaliação contínua, essa sim, Sr. Deputado Fernando de Sousa, qualquer professor faz no plano da turma, Sr. Deputado, estamos aqui a mistificar!
A Sr.ª Secretária de Estado, de facto, no despacho, não lhe tira a «etiqueta», continua a chamar-lhe provas globais, mas elas não são objectivamente provas globais, são testes.
O Sr. António Braga (PS): - São, são!
O Orador: - Sr. Deputado Fernando de Sousa, somos a favor da avaliação contínua mas achamos que a avaliação não pode ser apenas avaliação contínua, tem de haver também uma avaliação somativa e uma avaliação aferida.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que o Sr. Deputado Fernando de Sousa foi incapaz de dizer à Câmara é que a Sr.ª Secretária de Estado liquidou essa componente da avaliação ao passar as provas globais para meros testes feitos na turma pelo professor face aos seus alunos. Essa é que é a questão nuclear! E relativamente a essa questão nuclear, os senhores nada disseram.
Está provado que este é um Governo que prega o rigor e a exigência, mas, quando chega a altura de tomar as
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decisões, cede ao facilitismo, ao laxismo, às decisões populistas, às decisões que, provavelmente, pensarão que são mais eleitorais.
Aplausos do PSD.
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação.
A Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação (Ana Benavente): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate, requerido pelo PSD, mostra, como, aliás, já aqui foi dito, como a realidade virtual pode chegar à política.
A história conta-se rapidamente: um semanário especula sobre intenções do Ministério da Educação em matéria de avaliação dos alunos. O Ministério da Educação desmente tais especulações mas o principal partido da oposição, muito ocupado com a preparação do congresso e com pouco tempo para pensar, sem outros temas nem assuntos, opta pela facilidade e faz das especulações jornalísticas a base da sua inquietação.
Ora, o Governo tem todo o gosto em esclarecer os Srs. Deputados, a pretexto de uma situação surrealista de sermos questionados sobre abolição das provas globais dos ensinos básicos e secundário e o necessário rigor e exigência no sistema educativo.
Claro que cada um tem os seus próprios fantasmas e é natural que o PSD, responsável por uma política de facilitismo, de facto, que dominou os últimos anos, corra agora atrás das palavras rigor e exigência, porque não foi capaz de as levar a sério enquanto foi governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Passo, então, a explicar a situação. Como pessoa da educação, sei que é fácil para todos falar de educação e a mesma falta de rigor que encontrei nos senhores quando eram governo encontro agora quando são oposição, porque não é verdade que tenham acabado as provas globais.
Aplausos do PS.
No ensino básico, que, como sabem seguramente, é constituído por nove anos de escolaridade obrigatória, realizou-se apenas, até agora, a prova de ciências da natureza, disciplina terminal no 8 º ano. Só em 1996-1997 é que se realizarão, pela primeira vez, provas globais no 9.º ano.
Ora, com base na experiência realizada no 8.º ano, procedemos a uma alteração de formato das provas globais, devidamente anunciada no passado mês de Julho. Assim - e isto é muito importante, porque contraria as afirmações que o Sr. Deputado Carlos Coelho acabou de fazer -, a matriz da prova, ou seja, a sua concepção, o que quer dizer, a estrutura, as matérias, os objectivos e os critérios de correcção continuam a ser elaborados a nível de conselho pedagógico da escola, como estava previsto. Apenas a sua realização prática será integrada na vida da turma.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Quais as razões desta decisão, que mantém a concepção, a matriz, a definição de objectivos, de matérias e de critérios de correcção a nível da escola e a realização prática das provas a nível da vida da turma? Trata-se de evitar a paragem das actividades lectivas para alunos do 5.º, 6.º, 7.º e 8.º anos por motivo da realização das provas do 9.º ano.
O Sr. António Braga (PS): - Três semanas!
A Oradora: - Aliás, esta realização das provas integradas nas actividades lectivas da turma desdramatiza também estas provas. Mas gostava de dizer que em nada, mas em absolutamente nada, esta alteração de formato questiona o carácter global destas provas.
Com efeito, por exemplo nos exames nacionais, quer um aluno faça o seu exame na 1.ª fase, na 2.ª fase, na 1.ª chamada ou na 2.ª chamada, com provas distintas, ele realizou, de facto, o mesmo exame.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Aliás, Srs. Deputados, a minha e a nossa concepção de rigor e de exigência não se esgota nos mecanismos de avaliação nem nos aspectos mais visíveis da vida escolar; para mim e para nós, rigor e exigência têm de pautar todas as dimensões da política educativa, todas as dimensões das escolas, desde os curricula e programas à formação de professores.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Quanto ao ensino secundário, de três anos, 10.º, 11.º e 12 º anos - e recordo que provas globais não são o mesmo que exames e que estes ocorrem exclusivamente nas disciplinas terminais do 12.º ano -, não houve qualquer alteração no regime das provas globais já em vigor, estipulado, desde Setembro de 1994, por um despacho do Sr. Secretário de Estado Castro Almeida.
O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!
A Oradora: - Não houve qualquer alteração nem sequer de formato!
Mas, dito isto, convém lembrar que, enquanto foi governo, o PSD procedeu a reformas curriculares, tanto no ensino básico como no ensino secundário, e sempre tratou a avaliação à parte e fora das considerações curriculares, como se a avaliação fosse exterior ao que se ensina e ao que se aprende.
Vozes do PS: - Exactamente!
A Oradora: - Assim, no ensino básico, o Despacho n.º 98-A/92, que rege a avaliação, como tive ocasião de referir no parecer que elaborei para o Conselho Nacional de Educação em 1992, introduziu uma lógica de perigoso facilitismo, por indiferença às condições reais de funcionamento das escolas. Por isso se diz hoje que, no ensino básico, se passa sem se saber, porque se dificultou a repetência. Considero que esta actuação do governo do PSD tem contribuído em muito para abalar a confiança social na escola.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Ora, esse Despacho n.º 98-A/92 não previa as provas globais. Foi apenas em Setembro de 1994,
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ao mesmo tempo que se regulamentavam as provas globais no ensino secundário, também elas fora da reforma curricular, que, entretanto, se generalizava, que estas foram regulamentadas pelo Despacho n.º 644-A/94.
O PSD, confrontado com os resultados das suas diversas políticas de navegação à vista, viu-se obrigado a remendar e a inventar artifícios avaliativos, que vieram trazer uma aparência de rigor, ignorando as questões estruturais.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Fale de 1996!
A Oradora: - E se optámos por não introduzir alterações substanciais foi porque privilegiamos a estabilidade e a necessária confiança social na escola e porque queremos, agora e finalmente, tratar das questões de fundo.
Quanto ao facilitismo do passado, as consequências são visíveis. A análise dos resultados dos exames - e o documento está disponível para vos ser distribuído - mostra que existe hoje um verdadeiro insucesso estrutural no sistema educativo português. Esses resultados, consistentes e regulares, exigem que se procure nos curricula, nos programas, na articulação entre níveis de ensino, nos regimes de avaliação, naturalmente também, e nas condições de trabalho das escolas os elementos de um processo de que a avaliação é apenas um revelador.
Quanto a nós, queremos rigor, exigência e qualidade, construídos desde a base. E começar pela base é começar pela educação pré-escolar, pela articulação entre os três ciclos da escolaridade obrigatória, é construir respostas à exclusão escolar e ao insucesso, não através de projectos paralelos ao sistema mas através de respostas integradas no sistema.
Durante o debate, poderei dizer-vos o que já fizemos - e são muitas as iniciativas e as realizações - para construir o rigor e a exigência na manta de retalhos que é o sistema de ensino que o PSD nos deixou.
O Sr. António Braga (PS): - Exactamente!
A Oradora: - Mas a história do facilitismo dos últimos anos não acaba nestes exemplos que referi e, por isso, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, que vai continuar esta história.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.
O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Jorge Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve, pois, como já se viu, estamos perante um debate de urgência sobre matéria virtual, com o regresso à criação de factos políticos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Virtual é este Governo!
O Orador: - A política desenvolvida pelo Governo no acesso e no ingresso ao ensino superior é uma política de exigência e de rigor. Após sete anos de uma prática de facilitismo e de degradação neste domínio, resultantes da abolição de um sistema de classificações mínimas, o Governo introduziu um padrão de exigência gradual no acesso ao ensino superior, através da possibilidade de as instituições do ensino superior exigirem uma classificação mínima, quer nos exames das disciplinas específicas quer nas notas de candidatura. E fê-lo no respeito pela autonomia das instituições, cuja credibilidade também se afirma por esta via.
Abandonado, finalmente, um sistema de mera seriação, onde a simples presença na sala de exame era título suficiente para o ingresso, introduziu-se um sistema de selecção, que valoriza e dignifica o ensino superior. Reintroduzimos o principio da selecção, onde existia uma mera seriação de candidatos.
Em matéria de exigência, não temos lições a receber de quem foi responsável pela degradação da qualidade do ensino superior ao desenvolver uma política de facilitismo, diria mesmo de laxismo, visando aumentar artificialmente o número de estudantes do ensino superior, concretizada, através: primeiro, da eliminação, há mais de uma década, dos exames do ensino secundário só agora repostos; segundo, da eliminação da exigência de uma classificação mínima nos exames das disciplinas nucleares dos cursos de ensino superior; e, terceiro, das facilidades concedidas e ausência de controlo à expansão do ensino superior privado.
A abolição da nota mínima induziu, naturalmente, um crescimento do número de candidatos que deu origem a uma procura acrescida de ensino superior que propiciou as condições para um crescimento anárquico, descontrolado, do ensino superior privado. Nos dois anos que se seguiram à extraordinária medida tomada pelo Governo do PSD, em 1989/90, duplicou o número de estudantes que ingressaram no ensino superior.
Uma observação atenta da evolução do crescimento da procura e da .oferta do ensino superior nos últimos anos evidencia bem a política de pouco rigor e facilitismo adoptada, para fazer crescer quantitativamente o número de estudantes no ensino superior, apresentar indicadores estatísticos para comparação internacional mais favoráveis e, porque não dizê-lo, dar jeito às eleições de 1991.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Recorde-se que o Conselho Nacional de Educação, entre 1989 e 1992, proferiu pareceres, chamando a atenção para estas questões e recomendando alterações à situação (o mesmo aconteceu com análises e estudos universitários), mas sem o mais leve acolhimento.
Estavam, nessa altura, VV. Ex.as no vosso esplendoroso período autista!
Não resisto a respigar algumas frases das conclusões de um dos pareceres do Conselho Nacional de Educação: o regime estabelecido viola a lei de bases; o novo regime significa um grave retrocesso no processo de acesso; a entrada em vigor deste novo regime veio fora de tempo, por se aplicar a alunos já matriculados e não ser do seu conhecimento quando iniciaram o ano lectivo.
A política do Governo é no sentido de repor gradualmente o rigor e a exigência no ensino superior. A reparação destas situações implica a adopção de medidas sérias e progressivas, de forma gradualista mas firme.
A introdução da nota mínima permitiu já iniciar a correcção da preocupante trajectória em que nos encontrávamos.
Em cada 20 000 estudantes, por exemplo, de Matemática, 5000 não entrarão por insuficiente preparação. Fizemos crescer as vagas - recordo -, em termos
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médios, de 8% e, no entanto, na 1.ª fase, as candidaturas decresceram 18%.
Meus senhores, a forma como se processa o acesso a uma instituição é um factor determinante da credibilidade dessa instituição e do próprio sistema.
Srs. Deputados, se existe alguém hoje aqui, nesta Câmara, a ser interpelado por medidas de cedência à facilidade e que tenha lesado a qualidade no processo educativo, com estragos que ainda perduram, esse alguém é o PSD!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Informo a Câmara de que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação e ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, os Srs. Deputados Carlos Coelho, Nuno Correia da Silva, Castro de Almeida e Luísa Mesquita.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação, gostaria de colocar-lhe duas perguntas muito simples.
A Sr.ª Secretária de Estado diz que não acabou com as provas globais porque a fixação dos grandes princípios, da matriz, das orientações continuam a pertencer à escola e só depois, a execução, é que é do professor.
Pergunto: a Sr.ª Secretária de Estado está disponível para, a seguir a esta sessão, porque aqui os tempos não o permitem, fazermos um exercício de definição das orientações gerais? Isto é, a Sr.ª Secretária de Estado define as orientações gerais e eu e um Sr. Deputado do PS fazemos, com essas orientações gerais, dois testes completamente diferentes,, com graus de dificuldade diferentes, porque serão professores diferentes para turmas diferentes, com alunos diferentes.
Sr.ª Secretária de Estado, isso não resolve nada.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É evidente!
O Orador: - É uma desculpa de mau pagador! É tentar esconder a situação!
A Sr.ª Secretária de Estado, na prática, liquidou as provas globais.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É evidente!
O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Diz que não, mas faz. São testes feitos nas turmas, só que as matérias são decididas pelo conselho pedagógico, mas quem faz os testes são os professores, como é bom de ver. Se fosse o conselho pedagógico a fazê-lo, seria apenas um teste igual para toda a escola! Ou é o conselho pedagógico que vai fazer um teste diferente para cada turma? Não, não é isso que está no despacho, temo-lo aqui. Não estamos, ao contrário do que a Sr.ª Secretária de Estado disse, a discutir a realidade virtual mas, sim, a realidade real, a realidade publicada no Diário da República e que faz com que este Governo seja responsável pela liquidação das provas globais em Portugal.
E é a Sr.ª Secretária de Estado, permita-me que lho diga, que, de uma forma um pouco leviana, nos acusa, a nós, de facilitismo! Fomos nós que acabámos com as provas globais? Não! Foi este Governo. Fomos nós que baixámos a participação dos exames nacionais na nota de candidatura e na avaliação global do ensino secundário?
O Sr. António Braga (PS): - Não foi isso!
O Orador: - Não! Foram os senhores que anunciaram a baixa de 40% para 30%. Então, quem é que está a ceder ao facilitismo, nós ou os senhores? Devo confessar que não percebia passagem de 40% para 30%. Não percebi, porque a Sr.ª Secretária de Estado, como, aliás, referia há pouco a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, disse a um jornal que isto da avaliação até nem sequer é muito importante e que importante são todas as outras coisas, tais como procurar nos programas, na articulação entre níveis de ensino, nas condições efectivas em que decorre a relação pedagógica. Deve lembrar-se destas declarações. Mas sobre isto nada fez, o que fez foi pegar na avaliação.
A Sr.ª Secretária de Estado disse agora, na sua intervenção, que tínhamos um insucesso estrutural. Está explicada a passagem de 40% para 30%. Para responder ao insucesso estrutural, os senhores estão a responder com sucesso administrativo. Isto é grave e não pode deixar de ser denunciado.
Aplausos do PSD.
Vozes do PS: - Isso é falso!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, é verdade que o Partido Social-Democrata tem revelado, nestas últimas duas semanas, uma tendência masoquista. Gosta de relembrar as feridas que deixou mais em aberto nos anos de governação, nos anos em que esteve no poder.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Mas não pode servir continuamente de desculpa ao Governo para justificar aquilo que são os incumprimentos, nomeadamente do programa eleitoral e do Programa do Governo.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - E permita-me, Sr. Secretário de Estado, que leia uma passagem do programa eleitoral do Governo, onde são referenciadas, objectivamente, medidas de acção governativa: «...criar um sistema de certificação nacional dos estudos secundários, onde tenham peso decisivo os resultados obtidos no ensino secundário, designadamente em provas nacionais, devidamente aferidas ao desempenho e aos objectivos do ensino secundário».
Sr. Secretário de Estado, entendamo-nos, de uma vez por todas. O que são provas nacionais? São as provas feitas para cada turma, por professores diferentes? É o professor de cada turma que faz a sua prova? São provas de escola, de conselho de grupo, ou são, efectivamente, provas de âmbito nacional aplicadas a todas as escolas do país, a todos os estudantes do país? De que é que estamos a falar? O que é que foi prometido aos portugueses? O que é que está a ser feito pelo Governo?
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Em segundo lugar, Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação, é verdade ou é mentira o que tem sido repetidamente anunciado nos jornais, de que há, por parte do Governo, intenção de reduzir o peso das provas globais no 12.º ano de 40% para 30%?
Sr.ª Secretária de Estado, temos de ser claros sobre uma coisa: é verdade que o holocausto pedagógico que se revelou nas provas realizadas em 1996 e nas notas obtidas pelos alunos deve ser objecto de reflexão por parte do Governo, mas não deve servir para o Governo esconder a realidade. Deve servir para o Governo ter, de facto, em atenção as razões estruturais que levaram a haver um insucesso tão elevado que obrigou o Governo a tomar a atitude inédita -...
Vozes do PS: - Não!
O Orador: - ... se não é inédita, pelo menos não me recordo de semelhante atitude - de ter de dar um bónus, uma bonificação de 2 valores aos alunos do ensino secundário, nomeadamente àqueles que se candidatavam ao ensino superior, por forma a que pudessem entrar na universidade. E a redução que hoje vem propor não é mais do que a instituição desse bónus para sempre.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Não é mais do que a resignação do Governo perante o combate estrutural que era necessário ter, como foi dito, no sentido de reapreciar os programas, de responsabilizar pelo cumprimento dos programas, de rever as estruturas dos cursos. Mas, ao invés disso, ao invés de se alterar a realidade, tenta-se escamoteá-la e disfarça-la. Não é disso que os portugueses estão à espera e não é seguramente disso que o ensino precisa, Sr.ª Secretária de Estado.
Por último, gostaria que a Sr.ª Secretária de Estado nos esclarecesse, de uma vez por todas, sobre o regime de acesso que os alunos irão ter para o próximo ano. Vai haver alteração na ponderação dada às notas de frequência,
às notas das provas globais? Vai haver alteração aos critérios de aferição para a média de ingresso no ensino superior?
Sr.ª Secretária de Estado, não podemos continuar a alimentar a insegurança no seio dos estudantes e das famílias. Estamos no início de um ano lectivo. O Partido Popular, de uma forma responsável e objectiva, apresentou um projecto de lei onde define regras, onde define todos os caminhos que entendemos devem ser cumpridos para que haja um justo regime de acesso ao ensino superior que, de facto, avalie e possa apurar, seleccionar os jovens portugueses pelo seu esforço, pela sua aptidão e pelas suas capacidades.
Era importante que saíssemos daqui esclarecidos no que diz respeito ao regime de acesso que vamos ter no próximo ano.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - E já agora que não o mudem a meio do ano!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.
O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, creio que o Governo deve estar com muito má consciência nesta matéria, tal é o tamanho da mistificação que está aqui a tentar fazer hoje.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior e a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação vieram fazer crer que o Governo do PSD deixou um percurso de facilidades na avaliação dos alunos e que agora, sim, o Governo socialista ia procurar incrementar rigor e exigência.
Vejamos como é que este Governo encontrou o regime instituído em matéria de avaliação: provas específicas para acesso ao ensino superior - acabaram com elas; exames nacionais do 12.º ano - encontraram-nos feitos (vão implementa-los, graças a Deus!); provas globais no 10 º e no 11.º ano - presumo que as vão manter (espero bem!); provas globais no 9.º ano - estão a querer acabar com elas. Não vejo este Governo tomar qualquer medida no sentido do acréscimo do rigor e da exigência.
O Sr. António Braga (PS): - Porque é um pessimista!
O Orador: - O que se vê, Srs. Deputados, é um abrandamento, é a cultura do facilitismo, em lugar do rigor e da exigência. Porque, se não, vejamos.
O Sr. António Braga (PS): - Prove!
O Orador: - Sr: Deputado, estamos cá para debater entre nós e para explicar as nossas posições ao país. Eu penso que vai ser muito difícil, no final deste debate, os órgãos de comunicação saberem se afinal acabaram ou não as provas globais.
Vozes do PS: - Não!
O Orador: - Sr. Deputado,...
Protestos do PS.
Sr. Deputado, chame V. Ex.ª o nome que entender, o certo é que é preciso que o país saiba o que é que este Governo mudou, em que consiste o despacho da Sr.ª Secretária de Estado de 5 de Setembro deste ano.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Em duas provas globais!
Protestos do PS.
O Orador: - Aguarde um momento, Sr. Deputado António Braga, porque vou explicar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o regime instituído até este despacho, que criticamos, era aquele em que os professores da mesma escola se juntavam para definir a matéria sobre a qual os alunos deveriam ser interrogados e para formular o teste final que seria entregue aos alunos.
O Sr. António Braga (PS): - Mantém-se, Sr. Deputado!
O Orador: - O regime agora instituído é o de cada professor, na sua sala de aula, entregar um teste feito por ele próprio...
Vozes do PS: - Não!
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O Orador: - Ó Srs. Deputados, é o que está no despacho!
O Sr. António Braga (PS): - Não é assim!
O Orador: - Cada professor vai ser encarregado de, na sua sala de aula, entregar o teste feito por ele próprio e de o corrigir, quando até aqui a correcção era aleatória, feita pelo conjunto dos professores da escola. Ou seja, Sr. Deputado, a questão é muito simples: a filosofia da avaliação que este Governo encontrou era de a escola poder avaliar-se a ela própria, era a de fazer uma avaliação ao conjunto da escola.
Quando entrego os meus filhos a uma escola, não os entrego a um professor, entrego-os à escola. A escola tem de ter instrumentos de avaliação. Com este despacho liquida-se a possibilidade de a escola se auto-avaliar. Cada professor...
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Castro de Almeida, agradecia que concluísse, pois já ultrapassou o tempo regimental.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Cada professor vai fazer mais um teste no final do ano da mesma forma e com a mesma metodologia usada nos testes de percurso. A única mudança regista-se no facto de, durante o ano, os testes serem de percurso e de, no final do ano, tratar-se de um teste final. No entanto, acaba a avaliação feita pelo conjunto da escola. Ora, esta cultura do facilitismo é contrária àquilo que o Sr. Ministro da Educação apregoa.
Termino dizendo que há uma classe de políticos, em que este Governo é fértil, que faz demagogia dizendo uma coisa num lado e outra noutro, consoante o auditório. No Ministério da Educação, há uma forma diferente de fazer demagogia, como já foi sublinhado há pouco: o Sr. Ministro faz declarações num certo sentido mas a aplicação prática das medidas do Governo é em sentido completamente contrário, atitude que repudiamos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação e Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, gostaríamos de colocar duas questões, uma relativa ao debate de urgência, que tem a ver com as provas globais, e uma outra, que inesperadamente surgiu aqui, referente ao acesso ao ensino superior.
Afinal, Sr.ª Secretária de Estado, se ainda algumas expectativas tinham sido criadas pela tal realidade virtual no que tem a ver com as provas globais, a comunidade educativa pode continuar triste e triste caminhar porque nada foi feito, nada foi mudado. A Sr.ª Secretária de Estado confirmou que esta equipa ministerial não só não alterou como agravou a corrida que se inicia com as provas globais e termina com os exames nacionais e esta é que é a questão!
Com o anterior Governo do PSD, anunciou-se o alargamento do calendário escolar e, simultaneamente, deu-se início ao encurtamento dos tempos das aprendizagens e à transformação do terceiro período no período das avaliações. A questão que colocamos é a seguinte: o que tem isto a ver com a melhoria do sistema, com o êxito dos alunos e ainda com a avaliação contínua preconizada em teoria pelos textos legais?
Reconhecendo o Governo a existência de um sistema educativo com insuficiências e lacunas - são palavras do Sr. Ministro -, com escolas e professores substancialmente diferentes, com assimetrias culturais flagrantes, que benefícios, que vantagens, trazem estas provas a nível de escola, se não a tentativa de silenciar diferenças e mascarar desigualdades? Refiro-me às provas globais a nível de escola porque os restantes aspectos são excepcionais e o PSD ainda não se apercebeu exactamente da diferença.
Esta situação, como a Sr.ª Secretária de Estado sabe, é ainda agravada pelo facto de a legislação determinar que as provas globais têm um peso a que é perfeitamente impossível fugir na classificação final dos alunos. Assim, determinadas as condições da sua concretização é deixada às escolas,
tão-só, a obrigatoriedade da sua realização, sem quebra do funcionamento das restantes actividades, e aos professores de cada um dos alunos a tarefa de corrigirem as provas anónimas na descoberta do sucesso ou do insucesso dos alunos que são cada vez mais treinados, nas últimas semanas, para consumirem conteúdos e depois, de harmonia com a legislação, em 60, 90 ou 120 minutos, debitarem-nos. Como estas três hipóteses podem ser consentâneas na mesma escola ou na mesma cidade, imaginemos a diversidade em termos de país. É bom que tenhamos esta noção!
Considera também a Sr.ª Secretária de Estado que deve ignorar-se e silenciar todas as opiniões - e estou a lembrar-me, mais uma vez, do relatório do Instituto de Inovação Educacional no que tem a ver com a implementação e construção das provas globais - que apontam para o facto de cerca de 80% das escolas estudadas revelarem grandes dificuldades relativamente à normalidade do funcionamento? Acha ,a Sr.ª Secretária de Estado que, com esta medida perfeitamente casuística e pontual, esta questão vai resolver-se, esquecendo-se provavelmente ou não se lembrando muito bem que, quando este relatório foi elaborado, só havia provas globais no 10.º ano e que este ano a situação não é essa porque há provas globais nos 9.º, 10.º e 11.º anos e exames nacionais no 12.º ano, que não havia, pelo que a situação é francamente mais negativa?
E sabe também a Sr.ª Secretária de Estado que os resultados da avaliação contínua continuam a divergir muito dos resultados das provas globais e que, tal como o Sr. Ministro da Educação este ano resolveu intervir concedendo bonificações, também há professores que reparam as injustiças que os resultados das provas globais trazem ao de cima por considerarem que o aluno que eles conhecem é fundamentalmente aquele que atinge o conjunto de objectivos ao longo do processo de ensino/aprendizagem e não aquele que o Ministério quer que no dia x à hora y realize um teste de 60, 90 ou 120 minutos, questionando todo o trabalho de um professor? Ou o que o Ministério quer pôr em causa é a capacidade dos nossos jovens e professores, questionando desta maneira o sistema?
Não entendi perfeitamente a intervenção do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior neste debate de urgência, provavelmente por deficiência da minha parte. De qualquer modo, há algo que me parece sobejamente
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grave e só coloco esta questão porque se cruza com o carácter da avaliação e com aquilo que nos parece ser uma ausência total de conhecimento do que é a avaliação no sistema de ensino. A avaliação é do sistema e não ao bom ou ao mau trabalho dos alunos, ao bom ou ao mau trabalho dos professores, mas este Ministério continua convencido de quer é esta a segunda versão dos acontecimentos, tão afastado daquelas que são as novas pedagogias do mundo inteiro, sem excepção.
A questão é esta: o Sr. Secretário de Estado afirma que ficaram fora do ensino superior 5000 alunos porque estavam deficientemente preparados em Matemática e o rigor manda que fiquem de fora 5000 alunos mal preparados em Matemática. Ter-se-á esquecido de referir nesta Câmara que os grandes culpados não são os alunos nem os professores mas a incapacidade de diálogo do Ministério da Educação que fechou os ouvidos e os olhos a todas as reclamações dos pais, dos encarregados de educação, dos alunos, da comunidade científica matemática deste país, que disse da impossibilidade de cumprir o programa de Matemática durante os 10.º, 11.º e 12.º anos, chamando a atenção para o insucesso destes alunos quer em termos de ensino secundário quer em termos de ensino superior? O Ministério ignorou-o mas, mais uma vez, contribuindo para o alargamento da já sobejamente conhecida manta de retalhos do ensino e do sistema educativo português, exactamente na continuidade cada vez mais degradante da política educativa do anterior Governo, o seu Ministério não fez mais do que acrescentar uma hora à prática lectiva semanal para resolver a questão do insucesso. Assim, no próximo ano poderá dizer: «este ano, graças à medida casuística do Ministério da Educação, em vez de ficarem de fora 5000 alunos, ficaram de fora 4999. Estamos de parabéns! Nem tudo vai mal!»
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação.
A Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação: Sr. Presidente, Srs. Deputados, três notas para responder aos pedidos de esclarecimento.
A primeira prende-se com o rigor e a exigência. Só por grande desconhecimento, que suponho que a maior parte dos Srs. Deputados não terá, do que é ensinar e aprender e do que é o mundo educativo, poderá pensar-se que o rigor e a exigência se resolvem com mecanismos de avaliação mais assim ou mais de outra maneira qualquer. O rigor e a exigência implicam medidas de fundo, pelo que a nossa opção no curto prazo, no imediato, foi a de privilegiar a estabilidade, como já referi. Por essa razão quero dizer, se é que não entenderam - por vezes, devo dizer que quem vem dialogar com os Srs. Deputados tem dificuldade em perceber como é que coisas tão claras não são ouvidas ou ignoradas -, que as provas globais...
Protestos do PSD.
... se mantêm.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Haja consideração pela Assembleia! Que falta de respeito!
A Oradora: - Repito que as provas globais se mantêm.
Também tem havido aqui alguma confusão entre o básico e o secundário. No ensino básico, em que nunca se realizaram provas no 9 º ano, as provas globais mantêm-se com matriz a nível de escola e realização a nível de turma, e gostava de dizer ao Sr. Deputado Carlos Coelho que não sabe o que é uma matriz.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Só a Sr.ª Secretária de Estado é que sabe!
A Oradora: - Sr. Deputado, posso continuar?
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Secretária de Estado, quem a autoriza a continuar sou eu. Faça o favor de prosseguir.
A Oradora:- Uma matriz é aquilo que orienta que, num determinado exame, para o qual são elaboradas cinco provas diferentes, elas respeitem a mesma matéria, a mesma estrutura, o mesmo grau de dificuldade, os mesmos objectivos, os mesmos suportes, de modo a que um aluno, quer faça a n.º l, a n.º 2, a n.º 3, a n.º 4 ou a n.º 5, que são escolhidas à sorte, faça rigorosamente o mesmo exame. É o que acontece com as provas globais do ensino básico.
O Sr. Carlos Coelho (PSD):- Acontecia!
A Oradora: - Há uma matriz e tudo é feito em comum, apenas a realização prática é feita com provas distintas a nível de turma.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Provas distintas!
A Oradora: - Provas distintas, tal como as cinco provas são distintas para-os exames nacionais, que são rigorosamente idênticas.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não, porque são feitas por pessoas. diferentes.
A Oradora: - No que diz respeito ao ensino secundário, as provas globais mantêm-se exactamente tal como foram realizadas este ano. Provas globais não é o mesmo que exames. Os exames finais nacionais não são alterados e tanta importância atribuímos aos exames - queremos que tenham vindo para ficar e entrem na rotina do sistema - que foi constituído um gabinete de avaliação e exames que vai elaborar provas mais adequadas ao ensino secundário.
A passagem de 40 para 30%, que foi por nós decidida, parece-nos perfeitamente equilibrada para manter o peso e a importância dos exames, que, portanto, contam cerca de um terço, e dar um sinal da importância que atribuímos à avaliação contínua. Terão de ser os Srs. Deputados do PSD, que no passado haviam decidido situar essa percentagem nos 40%, a provar que a mesma assegurava mais qualidade e melhores aprendizagens 'do que os 30% agora decididos.
Finalmente, quero dizer-vos que, no que diz respeito aos problemas estruturais - e é nesses que apostamos para construir a exigência e a pertinência da escola bem como a confiança social na escola -, vai iniciar-se, começando pelo ensino básico e continuando depois pelo ensino secundário, uma revisão participada dos programas porque sabemos que, só identificando saberes essenciais, encurtando os programas como aqui foi dito, não de modo casuístico
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e artificial mas de forma relevante, encontrando aqueles que são os saberes considerados essenciais para a formação das crianças e dos jovens, podemos ter uma escola equilibrada que contemple os objectivos de instrução e de formação das crianças e dos jovens, objectivos dos quais não queremos desistir. Construir essa escola exige tempo e participação mas esse processo já está iniciado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da consideração da bancada.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para exercer o direito regimental de defesa da consideração da bancada mas quase que poderia tê-la pedido para exercer o direito regimental de defesa da consideração da Assembleia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A Sr.ª Secretária de Estado Ana Benavente ofendeu o Parlamento e ofendeu os Deputados. Começou por fazer uma graça que fica muito mal em qualquer membro desta Casa e, particularmente, num membro do Governo mas, pelos vistos, já não é a primeira vez que membros do Governo, ao intervirem, se esquecem de que o são. Começou por dizer que estava constrangida por ter de explicar coisas simples, ou seja, de uma forma aparentemente elegante chamou estúpidos aos Deputados. Isto demonstra que os membros do Governo estão muito inseguros relativamente a esta matéria. A Sr.ª Secretária de Estado não tem argumentos para sustentar a sua posição e ofende quem está à sua frente e aqui para, em nome do povo português, responsabilizá-la por aquilo que andou a prometer e anda a fazer. Esta é a verdade! Mas a Sr.ª Secretária de Estado continua a ofensa...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Está ofendido?
O Orador: - Estou, Sr. Deputado José Junqueiro, e com toda a razão, porque a Sr.ª Secretária de Estado não tem o direito de ofender quem quer que seja. Não tem o direito de o ofender, não tem o direito de ofender a Deputada Luísa Mesquita ou o Deputado Nuno Correia da Silva nem nenhum Deputado desta Casa. E o Sr. Deputado José Junqueiro devia ser solidário com essa preocupação porque há uma forma de fazermos debates nesta Casa com elevação e dignidade e há uma forma de achincalhar o debate que, infelizmente, parece ser a tónica de algumas intervenções dos membros do Governo nesta sessão.
A Sr.ª Secretária de Estado, depois de ofender todos os Deputados desta Casa, virou-se para mim a explicar o que é uma matriz. Ó Sr.ª Secretária de Estado, nós sabemos o que é uma matriz!
Mas a Sr.ª Secretária de Estado não só fez essa graça como tentou induzir em erro a Assembleia da República porque fez a comparação com os exames nacionais, dizendo que «a mesma matriz..., fazem-se cinco..., tira-se à sorte». Ora, o que é que a Sr.ª Secretária de Estado está a tentar dizer? Que os exames das provas globais que a senhora eliminou e alterou para testes feitos na própria turma também vão ser tirados à sorte? Ou a Sr.ª Secretária de Estado assume, perante o Hemiciclo, que o que pretende com o seu despacho é que seja o professor de cada turma a fazer o teste para a sua própria turma? É evidente que é isso mesmo que está no despacho!
O Sr. José Junqueiro (PS): - Não é nada!
O Orador: - Sr. Deputado, leia o despacho!
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Leia, leia, Sr. Deputado José Junqueiro!
O Sr. António Braga (PS): - O senhor é que deve ler o nº2!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, estamos perante a fragilidade do Governo, que queria chegar aqui e fazer o discurso fácil que ambos os Secretários de Estado fizeram, isto é, a política sistemática dos membros do Governo que, quando não conseguem defender as respectivas posições, vêm falar do passado e dizer que o governo anterior era «facilitista».
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Deputado, leia o nº2!
O Orador: - Tenho-o aqui comigo, Sr. Deputado!
Como dizia o que é facto é que este Governo é que é «facilitista». É este Governo que acaba com as provas globais e as «mete» em testes de turma, é este Governo que diminui de 40% para 30% o peso relativo das provas do ensino secundário.
Concluo, dizendo que os membros do Governo não têm o direito de ofender e não têm de fazê-lo. Têm é de justificar-se e de explicar-se, que é o que a Sr.ª Secretária de Estado não fez!
Aplausos do PSD.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação.
A Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, apenas quero repetir o que já disse, ou seja, que as provas globais se mantém com uma transformação no que diz respeito ao ensino básico e que, com a realização a nível da turma, conservam todas as potencialidades pedagógicas que estavam definidas a nível de escola. Portanto, as provas mantêm o seu carácter global.
Dei aqui vários exemplos, explicações e justificações quanto a essa manutenção. Ora, o que por vezes me «arrepela» é ouvir dizer, por parte da vossa bancada, que acabaram as provas globais. Não é verdade! Mantêm-se as provas globais, tanto no ensino básico como no secundário.
Aplausos do PS.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mantiveram o nome, mas são coisas diferentes!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder aos pedidos de esclarecimentos que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.
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O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, apenas vou responder à questão que colocou sobre o acesso.
Quero dizer-lhe, com toda a franqueza, que não senti qualquer satisfação quando avancei ao Parlamento os números relativos à Matemática. É que, para além de ser membro do Governo, sou professor e, portanto, penaliza-me, como certamente a todos, o insucesso escolar. O que eu quis foi chamar a atenção, na dicotomia seriação/selecção, para a importância da selecção na passagem dos alunos para um terceiro ciclo, que é o do ensino superior.
Assim, o que pergunto à Sr.ª Deputada é se acha bem que estes alunos tenham entrado no ensino superior.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares que irá utilizar tempo cedido por Os Verdes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No debate requerido pelo PSD para hoje falou-se muito de uma realidade virtual que é a da abolição das provas globais do ensino básico e secundário, aliás prontamente desmentida pelo Governo do Partido Socialista. Estivesse hoje, aqui, o PS a desmentir o desmentido e melhores perspectivas se abririam para os estudantes deste país.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A realidade é outra. Os estudantes do ensino básico e secundário continuam a sofrer os efeitos de um sistema de avaliação injusto e pedagogicamente errado. De um sistema que desvaloriza a avaliação contínua e com ela a verdadeira formação dos jovens deste país. De um sistema que, sob a capa de rigor e exigência, mais não faz do que «elitizar» e restringir cada vez mais o acesso ao ensino, tendo uma perspectiva economicista que se sobrepõe a todas as outras.
O que condiciona e impõe a existência de provas globais e até dos exames nacionais não é senão a aversão do PS, como do PSD, no investimento no ensino, especialmente no sector superior e na eliminação do numerus clausus.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que se pretende é restringir a progressão no sistema, eliminando pelo caminho grande número de jovens e negando-lhes aquilo que é um direito constitucionalmente garantido.
Nos dias que correm, aos estudantes do ensino básico e secundário não se lhes oferece ensino ou formação mas, pura e simplesmente, um treino. Alunos, professores, pais são hoje levados a sacrificar tudo em função da necessidade de os estudantes se treinarem para as avaliações contingentes.
Assistimos à completa desvalorização destes níveis de ensino, do seu papel formativo e do seu valor próprio. Assistimos à desvalorização do papel pedagógico e formativo do professor e da própria escola como local de participação e enriquecimento do aluno.
O percurso no ensino básico e secundário é hoje uma prova de obstáculos em que o único objectivo é atingir a meta com a melhor performance possível, evitando tropeçar numa das inúmeras barreiras espalhadas pela «pista».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP vem aqui, hoje, teimosamente, defender mais uma vez as virtudes da valorização da avaliação contínua e do abandono da política de criação de obstáculos ao acesso ao ensino e, sobretudo, à formação global dos nossos jovens.
Está provado e comprovado que a exacerbação da avaliação contingente no processo de avaliação em vez da sua utilização como factor correctivo tem efeitos desastrosos como, aliás, se deduz das experiências do passado recente.
O PCP denuncia hoje, aqui, mais uma vez, que o que se esconde atrás da capa do rigor e da exigência é o exercício contabilístico da política educativa, criando critérios de avaliação instrumentais que não são mais do que uma emanação de outros critérios, estes bem reais os de Maastricht e da moeda única.
O que se impõe é um verdadeiro investimento na educação, o fim do numerus clausus e a garantia do acesso a um ensino justo e de qualidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP está particularmente à vontade neste debate. Somos a verdadeira oposição, a única oposição no que toca à política educativa e ainda mais quanto aos sistemas de avaliação.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É que não basta não ser o partido do Governo para se ser oposição; é preciso
sê-lo de facto. E oposição de facto é só o PCP.
O PSD convocou este debate de urgência muito preocupado com a notícia do fim das provas globais, aliás prontamente desmentida pelo Governo para descanso das hostes social-democratas.
Ao PSD não assalta nenhum tipo de preocupação com a valorização da avaliação contínua mas, antes, com a azáfama contínua que a si próprio se impõe. Nesta como noutras matérias o PSD grita abundantemente em bicos de pés, mas bate palmas em surdina debaixo da bancada.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao PS, vai tentando gerir e disfarçar a mais que evidente evolução na continuidade, com o discurso estafado do gradualismo que, na maior parte das vezes, não passa de imobilismo. É o Governo, para quem a reforma educativa não existiu o que é o mesmo que querer mantê-la, para quem as propinas e o numerus clausus são para continuar.
Aliás, PS e PSD são um pouco como a famosa dupla Dupont e Dupond, cúmplices, desastrados e amparando-se mutuamente sempre que necessário. Normalmente, quando um diz «mata» o outro diz «esfola» em prejuízo dos estudantes e da educação e ao sabor de conjunturas políticas de momento.
Esquecem-se que o futuro deste país e dos nossos jovens passa pela educação, facto que raramente o PS e o PSD tomam em conta. Eu diria mesmo mais: os estudantes e a educação deste país merecem mais respeito.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como inicial-
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mente prevíramos, este é um não-debate por duas razões concretas. Em primeiro lugar, porque o PSD apresentou um tema para o debate quase única e exclusivamente baseado numa notícia publicada num ilustre semanário.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Agora já lêem jornais!
O Orador: - Em segundo lugar, é um não debate porque, apesar de ter sido previamente desmentida a veracidade daquela notícia e de, durante o debate, ter sido confirmado que não correspondia à verdade, o PSD insistiu em fazer crer que era verdade o que dizia, ou seja, que era verdade aquilo a que chamou a liquidação das provas globais.
Independentemente da diferença entre nós próprios e o PCP na abordagem desta matéria - é uma diferença natural e saudável -, quero reconhecer a elevação e o rigor com que este partido tratou a matéria, ao ter reconhecido que, obviamente, as provas globais se mantêm no formato que nos foi descrito exaustivamente pela Sr.ª Secretária de Estado durante este debate.
O PSD insistiu, tentando utilizar uma frase que marcasse este debate, dizendo «liquidação, liquidação, liquidação». Ora, não há nenhuma liquidação!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que ideia!
O Orador: - O que há é um reforço, uma coerência, uma lógica introduzida na avaliação contínua nas escolas que, com este momento somativo, faz um todo coerente na escola, no reforço da autonomia, no trabalho em concreto, na valorização dos professores, na valorização das escolas e dos nossos recursos educativos. Foi isto que o PSD não quis dizer, que não quis trazer a este debate. E isto, quanto a nós, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é que é, isso sim, a verdadeira mistificação.
O PSD, ao tentar exorcizar os fantasmas que ainda tem e que «dormem» consigo todos os dias, resultantes da forma como governou a educação, acorda hoje e quer transformar-se numa espécie de profeta da desgraça, com um pessimismo militante. Ora, devo dizer ao PSD que os pessimistas são apenas espectadores, não participam na construção dos ideais e, neste caso, das políticas educativas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto a nós, é lamentável que, numa matéria em que assumiu o compromisso de estabelecer um pacto educativo com o Governo tendo em conta a qualidade do ensino e a valorização, quer da carreira docente, quer das escolas, quer das condições efectivas de leccionação no sistema educativo, o PSD descole desta maneira. Na verdade, com um pessimismo atroz e invocando falsamente o rigor da qualidade, o PSD veio aqui demonstrar mais uma vez que ainda não foi desta que conseguiu afastar aqueles fantasmas da sua cabeça.
Ora, o que reconheci como justo na análise feita pelo PCP é precisamente o mérito que tem em reconhecer, embora por motivos divergentes, que as provas globais se mantêm.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão das provas globais não se mede por uma ideia de limitar o que quer que seja no acesso ao ensino superior.
Como todos bem sabemos, a prova global tem o mérito essencial de poder «tomar o pulso» à escola, aos alunos, ao desenvolvimento curricular e programático, sendo, portanto, esta a razão essencial da sua existência ao nível das escolas. É, pois, este o motivo que nos leva a implementar este modelo no resto do ensino não superior, como bem foi dito pela Sr.ª Secretária de Estado.
Ora, vir dizer, numa espécie de negação das coisas da vida real, que a prova global foi liquidada é a mais pura demagogia a que temos assistido...
Protestos do PSD.
... e que, sinceramente, eu não esperava, especialmente vinda do Sr. Deputado Carlos Coelho por quem tenho muita estima e consideração. Na verdade, não o fazia capaz de vir aqui negar, com veemência, a maior das evidências dos últimos tempos em matéria educativa.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Eis o Deputado António Braga a aderir ao « facilitismo»!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD, que apela ao rigor e à exigência no sistema educativo, não foi rigoroso nem exigente neste debate. Essa sua contradição é perceptível. É que, evidentemente, não se pode dizer uma coisa e fazer outra. O PSD quis fazer um discurso mas, na substância do seu discurso, negou a sua própria natureza de afirmação positiva em relação à problemática da educação.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O Governo é que faz isso!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que também é importante retirar deste debate é sabermos que ficamos a contar com um PSD sistematicamente vingativo - passe a expressão e a sua dureza - em relação a matérias que não foi capaz de superar enquanto foi governo. E, como sabemos, em regra, quem foi medíocre a fazer uma coisa qualquer não valoriza nada que lhe seja superior.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - É por essas razões que o PSD tem a dificuldade que tem, notória e visível por todos, em fugir à questão essencial que é a de se saber se a qualidade do ensino se mede exclusivamente por provas globais ou por exames. Ficou demonstrado que não.
Então, não se percebe por que razão o PSD não suscita um debate de urgência ou até uma interpelação sobre o contexto geral da política educativa, sobre as reformas essenciais que é preciso encetar e que, como bem sabemos, o PSD enterrou. Enterrou a reforma educativa facilmente e depressa demais, criou aquilo a que chamamos verdadeiros «milagres» na educação, extinguiu e liquidou verbas fabulosas, nomeadamente no PIPSE (Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo), extinguiu a nota mínima, contra dois pareceres do Conselho Nacional de Educação a que agora se agarra sistematicamente, não fazendo vincular essa perspectiva nos debates que aqui suscita.
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Portanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a nossa posição, sendo sempre saudavelmente pelo diálogo, é um pouco pessimista: temos pouco a esperar deste pessimismo militante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A demonstração fica feita. O PSD quis utilizar a educação como pura arma de arremesso político-partidário sem curar de saber do rigor e da exigência...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - Inclusivamente, não foi capaz de ler o despacho da Sr.ª Secretária de Estado porque sabe que este confirma tudo o que ela disse, designadamente quanto à articulação e à realização das provas em concreto. A prova disso é que tentaram fugir ao tema, lembrando à Câmara recomendações que tinham feito ao Governo sobre o acesso ao ensino superior, matéria já exaustivamente discutida e cujo desafio está nas suas mãos. O PSD tem em preparação três projectos de lei, estamos a aguardar que sejam capazes de entender-se quanto ao texto e veremos o que vai dar. O PS já disse garantidamente que não está de acordo com essa metodologia.
O que informa ou desinforma uma política educativa, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não é vir aqui com questões puramente pontuais, de puro foguetório político. Nós não alinhamos nessa confusão. Negamos com veemência este tipo de debates e garantimos a todos os Srs. Deputados e aos portugueses total tranquilidade no sistema educativo. É assim que vamos continuar, foi isso que prometemos aos portugueses e vamos cumpri-lo pois consta do nosso programa eleitoral.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, acabou a sua intervenção dizendo que o PS está a cumprir o que estava contemplado no seu programa eleitoral. Mas volto a recordar, Sr. Deputado, que o Governo comprometeu-se a criar um sistema de certificação nacional dos estudos secundários. Isto significa que um aluno que saia do ensino secundário, seja do 9.º ano seja do 12.º ano, tem um certificado, um «passaporte» para o mundo do trabalho.
Assim, pergunto-lhe se concorda que é através de provas de âmbito nacional, em que a prova é igual para todos os alunos, que conseguiremos obter aquela certificação, ou se, pelo contrário, considera que esta se obtém através da realização de provas de âmbito meramente escolar, agora elaboradas pelos professores que leccionaram as próprias turmas durante o ano lectivo.
Sr. Deputado António Braga, onde está o sistema de certificação prometido pelo Governo? Qual é o sistema de certificação com que os alunos saem do ensino secundário? Confesso que não o encontro nas propostas que são apresentadas pelo Governo.
Hoje em dia, os exames são um instrumento para combater a falta de rigor e de exigência, instrumento este que, no entanto, não serve só por si. Agora, uma coisa é certa: quanto mais permissiva é a avaliação, maiores serão os obstáculos que os jovens vão encontrar quando saírem do ensino e ingressarem no mercado de trabalho, ou seja, as facilidades concedidas no sistema de ensino são directamente proporcionais às dificuldades que vão ser encontradas no mercado de trabalho.
Por isso, Sr. Deputado António Braga, em cumprimento do programa eleitoral do PS, diga-me, por favor, onde está o sistema de certificação nacional dos estudos do ensino secundário.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, não é favor nenhum responder-lhe. Naturalmente, terei muito gosto em dizer-lhe o que pensamos sobre o assunto.
Se me permite, creio que o Sr. Deputado faz uma interpretação menos verdadeira sobre a função do certificado e do diploma - o primeiro tem a ver com um caminhamento durante a escolaridade e o segundo com a realização de exames finais. É evidente que estou de acordo consigo quando diz que é preciso qualidade, rigor e exigência nas nossas escolas - creio, aliás, que todos estamos de acordo nessa matéria -, mas não podemos confundir dois momentos, o da progressão e evolução da escolaridade dita obrigatória e o da escolaridade subsequente até ao ensino superior.
O que acontece, todos o sabemos - mas o PSD não gosta de falar nisso -, é que foi o PSD quem inventou uma avaliação diferida e distinta entre dois momentos, ou seja, entre aquilo a que aqui apelidamos como um provável diploma dos ricos e uma provável certificação dos pobres. Nós somos contra essa distinção de avaliação, antes defendemos o rigor na avaliação compatível com todos os momentos da escolaridade, avaliação essa que pode e deve ser certificada em cada momento dessa caminhada.
Neste momento o que se passa, como o Sr. Deputado bem sabe, é que qualquer escola, em qualquer circunstância, certifica a conclusão nesse caminhamento porque ela não necessita de um exame. Apenas a atribuição do diploma o exige, e essa é, justamente, a diferença.
Estou a descrever-lhe a situação que herdámos, de uma forma mais ou menos simples, para que se perceba qual é a conclusão e por que é que incluímos no programa eleitoral a necessidade de criar um esquema nacional que articule estas duas vertentes, a do diploma e a do certificado. Pretendemos que a questão do certificado seja resolvida com carácter nacional para ter uma uniformidade de atribuição, também relacionada com a atribuição de determinadas competências adquiridas no sistema escolar.
Neste momento, tanto quanto sei - não posso responder por isso, porque falo em nome do grupo parlamentar e não do Governo -, o Governo tem vários estudos em preparação. A diferença entre este e o anterior Governo - é preciso dizê-lo, Sr. Deputado - é que, ao contrário do que acontecia no passado, agora faz-se a avaliação e o levantamento das situações em concreto com rigor, o que leva um certo tempo que, depois, é preciso ultrapassar com medidas operativas.
Creio que o objectivo está consagrado e vai ser concretizado durante a legislatura, provavelmente a meio, justamente com a criação dessa identificação, uma norma que também permita que aqueles que abandonam a escolaridade antes de terminar ciclos de exames completos o possam fazer com uma certificação do conhecimento adquirido para, como é óbvio, conseguirem uma melhor colocação no mercado de trabalho.
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação. Lembro que dispõe de apenas meio minuto para o efeito, mas a Mesa concede-lhe mais 1 minuto.
A Sr.ª Secretária de Estado da Educado e Inovação: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria apenas utilizar este meio minuto para afirmar, em primeiro lugar, que as provas globais não foram abolidas, nem no ensino básico nem no ensino secundário, porque não se pode passar o tempo a operar intervenções casuísticas na avaliação sem cuidar das questões de fundo e,...
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - ... em segundo lugar, que estamos empenhados em cuidar dessas questões de fundo e sabemos, porventura pela primeira vez desde há muitos anos, que tanto a democratização como a qualidade não se decretam mas constroem-se.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - E esses processos de construção já se iniciaram, tanto a revisão curricular participada como a formação continua de professores, a luta contra a exclusão e a autonomia das escolas, porque sabemos que essa democratização e qualidade constroem-se em todos os domínios da vida educativa, das políticas às práticas.
Consideramos, por isso, que o tema deste debate está, pela nossa parte, completamente esclarecido.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados, finalmente terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 19 horas e 20 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Vamos iniciar a discussão do projecto de deliberação n.º 24/VII - Prorroga o prazo fixado pela Deliberação n.º 12-PL/96 (Presidente da AR).
Para proceder à sua apresentação, tem a palavra o Sr. Presidente da 4.ª Comissão, Deputado Eurico Figueiredo.
Aproveito para lembrar que cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos para o debate, conforme ficou estabelecido em conferência de líderes.
O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por proposta aceite na 4.ª Comissão, consideramos que o alargamento da auscultação nacional sobre o problema da regionalização é de grande importância.
Como o Sr. Presidente e os Srs. Deputados muito bem sabem, houve uma modificação em todo este processo de regionalização que tem de ser tomada em conta. De facto, o Partido Socialista, que não é um partido que faz ponto de honra da obstinação, compreendeu que o País queria votar em referendo nacional o processo de regionalização. Estava então em curso, depois do debate realizado em
Maio, um processo de auscultação ao País mas, de qualquer forma, a mudança de atitude do Partido Socialista, aceitando o principio do referendo e as alterações necessárias no âmbito da Constituição, tanto no processo de regionalização como no que diz respeito ao referendo, modificou substancialmente o nosso ponto de vista quanto à importância da auscultação das assembleias municipais.
Antes, e de acordo com os imperativos constitucionais vigentes, era imperativo realizar um referendo orgânico, ou seja, auscultar as assembleias municipais para que estas pudessem dizer o que pensavam quanto ao mapa da regionalização e às próprias competências. Neste momento, uma vez modificadas as perspectivas, este período de auscultação ganha muito mais importância.
Mas se aceitamos o principio do referendo no processo de regionalização, também consideramos que existem competências da Assembleia da República, no que diz respeito ao mapa e às competências das regiões, que não podem ser adulteradas. O tempo de auscultação das assembleias municipais deve, pois, ser alargado para podermos ter uma informação criteriosa, de maneira a pronunciarmo-nos, finalmente, com informação sobre qual o mapa e quais as competências das diferentes regiões.
Em suma, congratulo-me com a proposta elaborada na 4.ª Comissão no sentido de alargar o tempo de auscultação das assembleias municipais para que, com prudência e critério, o trabalho da Assembleia da República possa processar-se com toda a seriedade que este processo exige.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.
O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo e o Partido Socialista têm, em matéria de regionalização, entradas de leão e saídas de sendeiro. Há um ano era tudo fácil, tudo urgente, tudo para concretizar depressa. Um ano depois é o que se vê: já tudo é difícil, o que era urgente deixou de o ser. Regionalizar e referendar já só serve, do lado do PS, para enfeitar discursos e alimentar discussões estéreis.
O texto hoje em debate é mais um episódio - dos muitos já ocorridos - da tentativa de «tapar o sol com a peneira», ou seja, da tentativa de adiar para as calendas o que o PS, ou o Governo, mais do que o PS, já não querem fazer, isto é, realizar o referendo nacional sobre a regionalização.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Esta nossa conclusão baseia-se em factos objectivos que aqui quero recordar. É ou não verdade que o Primeiro-Ministro considerou aqui, na Assembleia da República, há um ano, a regionalização como uma prioridade política para ser concretizada no espaço de seis meses?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!
O Orador: - É verdade, foi dito aqui nesta Câmara, está escrito e gravado!
É ou não verdade que o Primeiro-Ministro chegou a defender que as eleições autárquicas e regionais se deveriam realizar em simultâneo? É verdade, foi dito e está escrito, mas também já passou à história!
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É ou não verdade que a 2 de Maio, num debate parlamentar sobre a regionalização, o Dr. Jorge Lacão disse que ela se faria sem o PSD e, se necessário, contra o PSD?
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - É verdade, foi dito e está escrito nos Diários da Assembleia da República e no texto de uma conferência de imprensa do PS!
Tudo isto o PS e o Governo disseram, de forma leviana, precipitada e irresponsável! Tudo isto o PS falhou e não cumpriu. A responsabilidade é sua e apenas sua, porque ninguém o obrigou a tais compromissos e sempre alertámos que eles não tinham lógica, nem sentido, nem razão de ser.
Mas, mais grave, em Maio o PS foi forçado a aceitar o referendo sobre regionalização. Foi a vitória do País e da luta travada, entre outros, pelo líder do PSD.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Até aqui tudo bem. Portugal ganhou. Só que o PSD foi claro e linear, não se limitou a defender o referendo: defendeu-o, desejou-o e deseja-o com rapidez.
Por isso, aqui quero recordar: foi ou não foi o PSD que propôs ao PS um calendário que permitia que o referendo se realizasse entre Dezembro de 1996 e Janeiro de 1997?
Foi ou não foi o PSD que propôs ao PS que a revisão constitucional se dividisse em duas para que, de imediato, se tratasse do referendo e da regionalização, por forma a avançar rapidamente para o referendo?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A proposta ainda está sobre a mesa!
O Orador: - O PSD propôs tudo isto e o PS recusou ambas as propostas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Se o referendo da regionalização não se faz entre Dezembro deste ano e Janeiro de 1997, a culpa é do PS, só do PS e toda do PS.
Aplausos do PSD.
Se a revisão constitucional, sobretudo nesta parte, não está já feita, a culpa é do PS, só do PS e toda do PS,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ...porque não aceitou a nossa proposta de dar ao referendo sobre regionalização a prioridade e a urgência que ela reclamava. Esta é a verdade dos factos, e contra factos não há argumentos. É isto que custa ao PS.
Envolvido nas suas contradições internas, o PS adia o que antes era urgente e nem sequer tem o cuidado de disfarçar o
indisfarsável. Ao falar da regionalização, o Primeiro-Ministro diz agora que é preciso substituir a urgência pela inteligência, um eufemismo claro, para dizer que a promessa, tal como a tradição, já não é o que era. Só alguns socialistas ainda não perceberam.
Pela nossa parte, somos claros: queremos fazer o referendo sobre a regionalização, queremos ouvir os portugueses sobre esta magna questão nacional, queremos que quem é contra ou a favor, em todos os partidos e na sociedade em geral, diga de sua justiça para que a vontade popular, definitiva e actualizada, se afirme com clareza e sem demagogia.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É isso o que queremos, sem reservas mentais. Sem as reservas mentais e sem a falta de coragem para assumir responsabilidades que demonstra o PS - o PS não tem coragem para fazer o referendo nem para assumir que o está a adiar indefinidamente! Este projecto de deliberação é mais um pretexto.
Não contem connosco para tantas manobras. Já é tempo de assumir responsabilidades.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas essa não é a ordem das inscrições.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Peço desculpa, possivelmente saltei, por inadvertência...
O Sr. João Amaral (PCP): - Então permito-lhe corrigir o erro, Sr. Presidente!
Risos do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem razão, antes do Sr. Deputado João Amaral estava inscrito o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa. Peço, por isso, desculpa aos dois.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que estamos hoje a discutir é o resultado de duas pressas do Partido Socialista, a de querer agendar a regionalização, contra a vontade da maioria desta Assembleia, fazendo uso do seu direito potestativo de agendamento, e a de querer, a todo o custo e a toda a velocidade, consultar as autarquias locais.
O atraso que hoje o PS reconhece era, no entanto, previsível - e isso mesmo foi por nós previsto na 4.ª Comissão, quando nos debruçámos sobre esta matéria -, porque é o resultado das divisões que esta questão provoca, nomeadamente no Partido Socialista, que inclusivamente obrigou, no passado fim-de-semana, o Secretário de Estado Pina Moura, o tal que divide o PS, a dizer que, afinal, até pode unir-se com o Partido Comunista para viabilizar a revisão.
Em todo o caso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quer parecer-nos que este adiamento apresenta-se bom para todos os partidos. Vejamos: é bom para o PS porque talvez consiga, com isto, encontrar alguma unidade numa matéria sobre a qual deveria estar unido, e não está; é bom para o PSD porque permite-lhe ganhar tempo e encontrar, afinal de contas, a posição que ainda não tem sobre esta matéria; é bom para o PCP porque, apesar de o termos ouvido «refilar» contra este adiamento,...
Risos.
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... o que talvez venha permitir é que o Partido Comunista acabe por fazer um acordo com o Partido Socialista sobre esta matéria. E, nestas matérias, quando é o caso, o Partido Comunista fica sempre a ganhar.
Para o PP, este adiamento é bom, porque, afinal, vai atrasar a regionalização.
O Sr. José Calçada (PCP): - Espertalhão!
O Orador: - E quase diria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que adiar um mal é fazer um bem e, por isso, não nos oporemos a que se adie um mal pelo máximo de tempo possível.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Agora, sim, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui estamos, finalmente e mais uma vez, a discutir a regionalização. E para quê? Para sabermos como havemos de avançar com ela? Não! Mais uma vez, para sabermos como é que há-de ser adiada!
Risos do PCP, do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: - Não! Não é isso!
O Orador: - Para gáudio dos Srs. Deputados do PSD, ou de muitos deles, de muitos Deputados do PP e talvez de alguns Deputados do Partido Socialista, aqui estamos a discutir a forma de adiar a regionalização.
Aplausos do PCP, do PSD e do CDS-PP.
Não há nenhuma inocência na proposta que foi apresentada pelo PS! E não há nenhuma inocência porque, quando apresentaram a proposta na Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, sabiam perfeitamente que a consequência inevitável era a de que não podia haver a tal convergência das eleições regionais com as restantes eleições autárquicas. Isso era certo e sabido! E aquilo que era mais mobilizador neste processo foi definitivamente afastado.
Os Srs. Deputados do Partido Socialista quando reuniram no Algarve pareciam a equipa técnica da Federação Portuguesa de Futebol: eram só vitórias! Antes do «jogo»!...
Risos.
Quando iniciaram o «jogo» faltou-lhes a alma e a táctica: não têm vontade de vencer, nem sabem marcar golos!
Risos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esta é que é a realidade da vossa actuação! Em vez de andarem para a frente, andam de recuo em recuo!
Agora vale a pena recorrer um bocadinho à memória, porque, em 2 de Maio, quando se iniciou a discussão, os senhores começaram por dizer que o prazo era de um mês, depois, alteraram-no para dois meses, depois, para três meses e, depois, fizeram uma interpretação manhosa e surrealista da contagem dos prazos...
O Sr. António Braga (PS): - Isso foi o António Filipe!
O Orador: - ... e conseguiram adiar esse prazo para 15 de Outubro.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Quanto mais tarde melhor!
O Orador: - Agora, o que vêm aqui fazer é propor um novo adiamento de dois meses, que atira esta questão já para depois do Natal - não tenho qualquer dúvida! -, ou seja, isto já nunca será discutido em 1996, se o for em 1997.
Vozes do PSD: - É uma vergonha!
O Orador: - Claro que os promotores deste adiamento, os Srs. Deputados do Partido Socialista, vão dizer que isto era preciso, porque só há, neste momento, 80 assembleias municipais que deram parecer. A questão é de vontade política e posso demonstrá-lo com muita facilidade: é que, dessas 80 assembleias municipais que se manifestaram,...
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - A CDU já ganhou todas!
O Orador:-... 40 têm maioria da CDU e, depois, ainda há mais uma, que é a de Lisboa, ou seja, 41 assembleias municipais.
Risos.
Pelo menos não é do PS!
Srs. Deputados, as outras 39 assembleias municipais correspondem aos 256 municípios do PS, do PSD e do PP. E por que é que houve apenas 39 respostas? Porque os senhores, em Julho, quando fizeram a proposta de adiamento, sabiam perfeitamente que todas as assembleias municipais tinham de reunir por força da lei, porque a lei obriga as assembleias municipais a fazerem uma reunião ordinária em Setembro. Ou seja, se os senhores quisessem, se os senhores tivessem vontade política, em Julho, faziam a «fita» que fez agora o Engenheiro Guterres,...
Risos do PSD e do CDS-PP .
... ao dizer que mandou as assembleias municipais reunirem, isto é, diziam às assembleias municipais que pusessem na ordem de trabalhos da reunião de Setembro a matéria do debate sobre regionalização e o problema ficava resolvido.
Mas, se os senhores quiserem, faço uma outra demonstração. O Partido Socialista tem nove capitais de distrito, isto é, Porto... - tenho má memória e, por isso, tenho de recorrer a um papelinho!...
Risos.
Como estava a dizer, o Partido Socialista tem nove capitais de distrito: Porto, Braga, Setúbal, Faro, Coimbra, Santarém, Viana do Castelo, Guarda e Bragança. E dou uma novidade aos Srs. Deputados e ao País: nenhuma dessas assembleias municipais reuniu para dar parecer sobre a regionalização!
Vozes do PSD e do CDS-PP: - É uma vergonha!
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O Orador: - Isto é ou não a demonstração de que VV. Ex.as não quiseram fazer avançar o processo?!
Vozes do PCP, do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - A questão é muito simples: os senhores embrulharam-se definitivamente num emaranhado que criaram e deixaram criar: embrulharam-se em sede de revisão constitucional, aliás, recusando separar os dois processos e abordar numa revisão extraordinária a questão da regionalização e do referendo, atirando isso para as calendas gregas, e embrulharam-se nas leis subsequentes que são necessárias, como a lei do referendo, por exemplo, para enquadrar os referendos que os senhores aceitaram, e um deles é sobre matéria constitucional, a qual tem de ser aprovada na Assembleia da República, na especialidade, em Plenário, e a lei das regiões que também tem de ser aprovada. Por outro lado, tem de ser convocado o referendo, tem de ser feita a campanha e os referendos podem ser contraditórios, etc. Ó Srs. Deputados, VV. Ex.as embrulharam-se completamente nisto tudo!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A conclusão de todo este processo é muito simples e muito clara: o PS embrulhou-se nos prazos, nas leis - ou nas propostas e nos calendários - e nos referendos, porque se embrulhou, realmente, naquilo que quer, ou seja, há uns que querem nove regiões, há outros que querem cinco e há muitos - agora vou dar uma novidade... - que não querem nenhuma.
Risos do PCP, do PSD e do CDS-PP.
Há uns que querem as regiões em 1996, há outros que querem as regiões em 1997 e há outros que as querem no século XXII.
Risos.
É isto que os senhores não têm meio de resolver!
Srs. Deputados, é bom que não iludam esta questão central. E não façam de conta que não percebem, porque, a continuarem assim, não haverá nenhuma regionalização.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É isso mesmo que queremos!
O Orador: - Claro que os Srs. Deputados do CDS-PP batem palmas, e bem, à vossa atitude, à vossa indecisão, à vossa incapacidade para avançar com este processo.
Aplausos do PCP.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, termino, dizendo aos Srs. Deputados do Partido Socialista o seguinte: o que estão a fazer mostra cada vez mais que, ao fim e ao cabo, a regionalização nunca será outorgada e que para haver regionalização - e haverá - apenas podemos contar com a força do movimento de opinião pública, a força das populações, e é nesse sentido que continuaremos a trabalhar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Agora estragou a «pintura» toda!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo que está hoje em discussão é claramente a retirada estratégica e envergonhada do Partido Socialista...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. António Braga (PS): - Não é nada disso!
A Oradora: - ... em relação a um processo de regionalização de que foi, e só, um falso defensor;...
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Defendam a honra! Isto é uma acusação grave!
A Oradora: - ... um processo de regionalização que o Partido Socialista, cada vez com maior dificuldade e de forma cada vez mais condicionada, nos múltiplos debates, é obrigado a defender; um processo de regionalização que vai ser arquivado, e não pela primeira vez.
Julgo que a única leitura que disto se pode fazer é a seguinte: do grande entusiasmo épico que o Partido Socialista tinha em Vilamoura, aquando da realização do seminário da Associação Nacional de Municípios, em que Vilamoura, com a imodéstia própria com que se utilizam abusivamente as palavras, era comparada à «Meca» da regionalização, é hoje, de facto, nada mais nada menos do que um processo esquecido, discretamente esquecido, espera de melhores dias, no fundo, à espera, e tão-só, de que aquilo que foi a intoxicação da opinião pública e o baralhar da discussão em torno de um processo que mais não seria do que de nova organização do Estado, de nova democratização do País, de uma forma mais racional de organização da sociedade e do espaço físico, aquilo que os senhores passaram a ver podia ser mal compreendido pela opinião pública passou, por isso, e só, a ser uma questão, uma grande causa esquecida. Para nós, esta não é uma causa esquecida, a regionalização não é, para nós, uma panaceia de todos os males, não é, em si própria, um fim, é um meio para propiciar o desenvolvimento sustentado, para favorecer a democracia participativa e do qual não abdicaremos. O Partido Socialista abdicou e, lamentavelmente, cedo demais!
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este assunto é sério, pelo que não utilizaremos a linguagem sem cuidado que aqui foi utilizada pelo PSD.
Vozes do PSD: - Oh!...
O Orador: - De facto, não é preciso ir à escola para utilizar essa linguagem, o que é preciso é não ter lá andado para que ela se utilize nesta Casa. Aliás, era bem preferível utilizar uma linguagem de ironia e um discurso tão embrulhado como o do Sr. Deputado João Amaral.
Vozes do PSD: - Ah!
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Vozes do PCP: - Vá lá!
O Orador: - A regionalização constitui a mais importante reforma que o PS se propôs fazer, está a fazer e vai concretizar no tempo próximo com absoluta determinação.
Aplausos do PS.
Os factos falam por si e falam melhor do que as palavras. Em 2 de Maio do corrente ano, há cerca de cinco escassos meses - férias incluídas -, foi apresentado o projecto de regionalização, um projecto de alteração à Lei Quadro da Regionalização, bem como uma deliberação que decide e temporiza a discussão global de todos os projectos por todas as assembleias municipais - é a primeira fase da consulta pública.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A estes contributos decisivos o PSD disse zero! Não se entendem internamente,...
Vozes do PS: - Muito bem!
Protestos do PSD.
O Orador: - ... não se sabe se a regionalização é aquilo que ordena Cavaco Silva ou aquilo que ordena Marcelo Rebelo de Sousa.
Por outro lado, a Comissão Eventual para a Revisão da Constituição iniciou os seus trabalhos pelos artigos decisivos à viabilização constitucional de todo o processo de regionalização, sem que aqui se esqueça que demorou bastante tempo para o PSD se sentar à Mesa e viabilizar este processo.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Verdade! Completamente verdade! Foi um boicote completo!
O Orador: - O processo está, neste momento, a correr bem, está resolvido e em andamento o que respeita ao referendo e daí que os timings que esta nova realidade impôs se compreendam à luz do processo que agora vai ser seguido, no que respeita à instituição em concreto das regiões e até no que respeita ao representante do Governo nessas mesmas regiões.
A Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente decidiu um conjunto de actividades concretas para a dinamização pública do processo e, simultaneamente, tem feito a audição de pessoas e instituições diversas, com vista à recolha de contributos e prestações de esclarecimentos enriquecedores do processo em si mesmo.
Em terceiro lugar, a fase de consulta pública está a decorrer, mas encontrou, logo no seu inicio, um período de férias durante o qual as assembleias municipais, habitualmente, não reúnem.
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - Constatado que foi esse facto, em finais de Julho, o Grupo Parlamentar do PS apresentou na Comissão de Administração de Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente um projecto de deliberação com dois objectivos concretos. O primeiro objectivo foi o de viabilizar a participação do maior número possível das assembleias municipais, pelo que se propôs, e foi aprovado, o prolongamento por mais 60 dias - até 15 de Dezembro - do período de consulta. Não ignoramos que há aqui quem até quisesse fazer o processo sozinho, tivesse uma maioria absoluta ou um partido único para unicamente poder decidir sobre esta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O segundo objectivo foi o de rever o spot televisivo de divulgação do período de consulta e da própria regionalização, de modo a que a alteração do calendário de consulta pública fosse correctamente informado e não induzisse a opinião pública em erro.
Foi nesta óptica objectiva de querer fazer a regionalização com celeridade, sem hesitações, mas com a participação de todos, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou na comissão respectiva este projecto de deliberação e que, igualmente, apresenta a todos os Srs. Deputados nesta Câmara.
É também neste contexto - e só estamos a abordar o campo estritamente institucional - que se afigura completamente destituído de sentido um conjunto de afirmações de sinal contrário que pretendem inculcar na opinião pública a ideia de que o processo de regionalização se encontra parado, em «banho-maria»,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... e que tal situação é a antecâmara da não regionalização ou dos entendimentos mais obscuros de quem, como nós, faz o exercício permanente da clareza e da transparência, quer no exercício parlamentar, quer no Governo.
Aplausos do PS.
O próximo ano, o ano de 1997, será de inelutável importância para a regionalização. Será votado o texto final da lei de criação das regiões, será elaborada a lei do referendo e será marcada a sua realização. Será, por isso mesmo, esta legislatura aquela que marcará para a História a concretização plena da regionalização, com a instituição em concreto das regiões administrativas, com os projectos do PS, do PCP e do Partido Ecologista Os Verdes mas sem projecto e contributo positivo do PSD.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista cumprirá, assim, mais um compromisso eleitoral, por mais que isso custe a quem se opõe ou que, não se opondo formalmente, rejeita na prática concreta, não apresentando uma ideia ou um projecto e refugiando-se, sobretudo, na liberdade de voto aos seus militantes, por causa das suas crises internas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para defender a honra da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, dispondo de 2 minutos para esse efeito.
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Junqueiro começou por dizer - desculpar-me-á -, demasiado levianamente, para quem trazia uma prosa escrita, que o PSD talvez não tivesse andado na escola, pelo facto de ter vindo aqui denunciar as incongruências do Partido Socialista nesta matéria. Afinal,
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o Sr. Deputado não disse mais do que uma piada de mau gosto, porque, por mim, andei na escola e o Sr. Deputado, que, com certeza, também andou, poderia ter tirado mais proveito dela.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Agora, Sr. Deputado, em primeiro lugar, começa a ser claro que os Srs. Deputados do Partido Socialista não sabem arquitectar nem uma intervenção escrita sem encontrarem no PSD uma razão de ser para o que fazem ou para o que não fazem. Passe à fase seguinte, Sr. Deputado, porque à evidência, o PSD não tem qualquer responsabilidade em matéria de regionalização,...
Vozes do PS: - Lá isso é verdade!
O Orador: - ... quer no que respeita a adiamentos que os senhores solicitam, quer na aceleração de um processo que prometeram fazer, e contra o PSD se fosse preciso, mas que não fazem, adiam.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador: - Sr. Deputado José Junqueiro, o PSD não está dividido nessa matéria, o PSD tem...
Protestos do PS.
Ó Sr. Presidente, gostava que assegurasse as condições para que eu pudesse concluir...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado tem a possibilidade de concluir a sua intervenção. Faça favor.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O PSD não tem divisões a esse respeito. O PSD tem uma unidade perfeita neste objectivo: far-se-á a regionalização em Portugal, se os portugueses o decidirem por referendo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Dentro do PSD, há pessoas que defendem a regionalização como há os seus detractores, e assim acontece em todos os partidos. Não pode haver posição mais clara.
Agora, Sr. Deputado, não fazemos reuniões, como as que aconteceram com o Partido Socialista, ainda recentemente, em que é necessário que altos responsáveis venham prometer e empenhar a sua palavra e a sua honra em como a regionalização vai ter de avançar. Mas, então, Sr. Deputado, pergunta-se: estando a ser tratado, desde Junho, em sede de revisão constitucional, tudo o que tem que ver com regionalização, por que é que o Partido Socialista não aceita separar as revisões e permitir a realização do referendo no princípio do próximo ano?
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Segundo, sabendo que, no próximo ano, o Partido Socialista, certamente, não se eximirá à responsabilidade de um referendo em matéria europeia, estão ou não automaticamente a dispensar o referendo em matéria de regionalização?
Sr. Presidente e Sr. Deputado, só tenho uma conclusão a tirar: o Partido Socialista quis provocar, antecipadamente, em Maio, uma votação para acelerar um processo de que agora se arrepende. Nós não seremos o vosso bode expiatório para a regionalização. Os senhores sabem que já não a podem fazer sem o referendo e já não querem fazer o referendo para a regionalização. Não é culpa nossa, é responsabilidade vossa!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para dar explicações, no tempo regimental de três minutos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, começaria por lembrar-lhe que, em matéria de linguagem, não gostaria que eu lhe dissesse, e parafraseando o Sr. Deputado Álvaro Amaro, que teve uma «entrada de leão e uma saída de sendeiro»...
Vozes do PSD: - Oh!...
O Orador: - ... ou que lhe dissesse que foi leviano, precipitado e irresponsável. Se está à espera de ouvir da minha boca essas palavras, não ouvirá certamente, porque elas pertencem ao Sr. Deputado Álvaro Amaro.
Aplausos do PS.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que estou de acordo consigo quando diz que o PSD não tem qualquer responsabilidade neste processo. Acho que sim, porque o vosso posicionamento tem sido de uma enorme irresponsabilidade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nota-se!
O Orador: - De facto, não podia estar mais de acordo.
A questão dó referendo, como eu disse, é para nós uma questão assumida e vital. Contrariamente aos senhores, nós assumimos os nossos compromissos e vamos, como é óbvio, participar nesse referendo de corpo inteiro porque o processo de regionalização é nosso, é desejado por nós, compartilhado por outros, mas não é desejado nem é compartilhado por vós.
Por último, quando faz alusões ao meu partido ou às reuniões que se fazem no meu partido, devo dizer-lhe o seguinte: o Partido Socialista tem opiniões, é um partido de cidadãos e não, como os senhores foram durante 10 anos, um partido de súbditos e de gente em silêncio, que pactuou com tudo o que se fez no País!
Vozes do PS: - Muito bem!
Protestos do PSD.
Quero ainda dizer-lhe,, para terminar, que VV. Ex.as, negando as posições que pretendem negar, não estão só divididos nesta matéria, estão atonizados, receosos, apavorados com aquilo que se vai efectivamente passar. Mas
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tenho confiança que a tranquilidade regresse ao PSD e ao vosso grupo parlamentar e que, connosco e com os outros partidos, saibamos dar as mãos, para que este processo de regionalização vá até ao fim rapidamente com a participação de todos!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por terminada a discussão do projecto de deliberação n.º24/VII. A sua votação far-se-á amanhã, à hora regimental.
O ponto seguinte da ordem do dia diz respeito à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 173/VII - Utilização do papel reciclado pela Administração Pública (PS) e 216/VII - Regime de promoção do uso de papel reciclado (Os Verdes).
Para apresentar o primeiro projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. e Sr.as Deputados: O papel e o cartão são produtos socialmente úteis e um dos principais suportes da civilização. Para fins tão diversos como a higiene, a impressão ou a embalagem, o papel corresponde às diversas necessidades do mundo moderno.
O Partido Socialista, nomeadamente os Deputados da Juventude Socialista, ao apresentar este projecto de lei na Assembleia da República, no passado Dia Mundial do Ambiente, pretendeu destacar essencialmente a vertente da contribuição para a diminuição dos resíduos sólidos urbanos e de aproveitamento deste recurso, enquanto matéria-prima reciclável, para fabrico de papel novo.
São objectivos que julgamos essenciais, que não menosprezam e que, pelo contrário, queremos aqui destacar a sua importância na economia nacional, que é fundamental, das indústrias de pastas virgens, onde temos uma capacidade instalada em qualidade, inovação e quantidade, que fazem de Portugal um país competitivo nesta área no mercado europeu e mesmo no mercado mundial.
São mais de 3000 postos de trabalho em apenas sete fábricas (para citar as mais importantes) que respondem às necessidades de produção e transformação papeleira nacional, em que somos exportadores líquidos com cerca de 1000 toneladas/ano de pasta para o mercado mundial.
Não somos fundamentalistas ao ponto de considerar que o actual volume de abate de árvores da floresta nacional para este efeito, recurso em que somos, felizmente, particularmente ricos, são nocivas ao ambiente, mas pensamos que as árvores das espécies utilizadas para a transformação industrial devem ser plantadas nas áreas apropriadas, de acordo com as características do solo e do impacte das espécies em causa. Ou seja, o que se deve tratar necessariamente é do planeamento florestal que garanta a sua renovação e o aproveitamento ambiental.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Trata-se aqui, no entanto, de garantir o equilíbrio no aproveitamento dos nossos recursos, porque se, pelo que anteriormente se disse, é a nosso ver verdade, outra questão é - e é importante ficarmos consciente do facto -, precisamente, não utilizarmos a matéria-prima, que possibilita a melhor gestão dos recursos da floresta, a sua transformação em papel e cartão novos e que, afinal, se transformam naquilo que todos conhecemos por lixo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quem pensar que este debate é de somenos importância, como se vê a olhos vistos, está rotundamente enganado. O presente e o futuro irão encarregar-se de demonstrá-lo.
Em Portugal, todo o recurso em papel e cartão usados são aproveitados como matéria-prima pela indústria de pastas recicladas portuguesas. São actualmente recolhidos e transformados em papel e embalagens novas 220 000 toneladas/ano, que correspondem apenas a 37% do total de papel, por ano, que deitamos para o lixo. Imaginem, porque são mais de 500 000 toneladas que todos desaproveitamos anualmente, o que isto significa em recursos e em termos financeiros! Só no primeiro semestre do ano passado, uma fábrica portuguesa importou 2000 toneladas/ mês de resíduos em papel e cartão usados da Alemanha para produzir fibras recicladas. Isto mesmo: importámos aquilo a que tratamos como lixo para transformação pela nossa indústria nacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os resíduos em papel e cartão significam 40% do volume das nossas lixeiras e 20 % do seu peso total. É disto que se pretende tratar, situação que tende a piorar se compreendermos que de 1982 a 1992 aumentámos 120% o consumo per capita dos derivados do papel, o que tenderá a aumentar o problema de tratamento dos nossos resíduos.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Este projecto de lei visa, claramente, responder a um problema que, por força do encerramento das lixeiras, objectivo fundamental deste Governo, e a criação dos sistemas multimunicipais de resíduos sólidos controlados, se irá ter de dar solução. As autarquias não podem pagar para entregar como lixo à gestão destes aterros aquilo que pode e tem de ser valorizado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Estamos conscientes das dificuldades de recolha e selecção destes resíduos, do seu armazenamento e transporte para reciclagem. São situações que, aliás, já provocaram que fosse letra morta uma resolução do Conselho de Ministros de 1993, que visava precisamente este objectivo. Dos mais de uma centena de serviços da Administração Pública que contactámos aleatoriamente, apenas 20 procedem à recolha do papel e 34 usam papel reciclado.
Mas temos de estar conscientes de que não temos outra alternativa e o Estado tem de dar o exemplo, criando as condições que permitam o enraizamento de uma educação ambiental que provoque que seja na origem, ou seja, que esta situação comece a ser resolvida nas casas de cada um de nós. O Estado tem de levar este assunto muito a sério, para que também todos assumamos as nossas responsabilidades.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mesmo este órgão de soberania, em 1992, deliberou, por unanimidade, a recolha do papel usado nos seus serviços para valorização deste recurso, mas ficou-se por isso mesmo!
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Foi pena!
O Orador: - Cada pessoa, na Assembleia da República, utiliza por ano mais de 15 000 folhas de papel. Basta,
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pois, fazer as contas ao número total de pessoas e perceber o destino final deste papel como resíduo.
A título de exemplo, nos serviços administrativos de uma empresa com 700 pessoas, são recolhidas 12 toneladas de papel por ano. O que não seria recolhido com o esforço dos cerca de 700 000 funcionários públicos, em
Portugal?...
Em condições idênticas, o fabrico de papel novo, através de fibras recicladas, provoca melhorias e redução do consumo de água e de energia. É mais um dado importante em termos de gestão ambiental. Mas tudo isto funciona com base num interesse económico: se não houver procura de produtos reciclados, a oferta destes produtos terá menor expressão e o preço será mais alto, o que finalmente é um contra-senso. Por isso, o nosso projecto de lei também pretende que, pelo Estado, se passe a mensagem de que é preciso aumentar o consumo de produtos a partir de matérias recicladas.
Regozijamo-nos, mas ao mesmo tempo também distinguimos, que apenas desde o ano passado o Diário da República tenha passado a ser impresso em papel reciclado, o que é uma garantia de qualidade, dado que este suporte tem de durar 50 anos, normalmente. Queremos que este exemplo se estenda à Administração Pública em geral. O equilíbrio entre o recurso às fibras virgens e às recicladas, porque é melhor para todos, afinal, dá razão à máxima que «na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma».
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino, oferecendo, com simpatia e simbolicamente, ao Sr. Presidente da Mesa uma máquina de reciclar papel para utilizar, eventualmente, se me permite, para escrever a segunda edição sobre o «partido com paredes de vidro»!
Risos.
Não é uma oferta incompatível, visto que não é de uma empresa pública, infelizmente, mas de uma empresa privada., Penso que pode recebê-la!
Risos.
Aplausos do PS.
Neste momento, o Sr. Deputado Paulo Neves fez entrega da oferta ao Sr. Presidente da Mesa em exercício.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Agradeço muito, Sr. Deputado. Temi que me quisesse reciclar a mim; no entanto, vejo que é só o papel!...
Risos.
Creio que faremos bom uso dela na Mesa, apesar de ser de uma empresa privada ou até, Sr. Deputado, com o mérito de ser de uma empresa privada!
O Sr. Paulo Neves (PS): - Agradecido pela observação!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Fiquei tão comovido com esta oferta à Mesa que decidi organizar os trabalhos da seguinte forma: a Sr.ª Deputada Isabel Castro fará a apresentação do seu projecto de lei, depois seguir-se-ão os pedidos de esclarecimento e, respectivas respostas dos oradores que fizeram a apresentação dos diplomas e depois darei palavra ao relator, Sr. Deputado Macário Correia, para fazer a síntese do relatório da comissão sobre os dois projectos de lei.
Dou, então, a palavra à Sr.ª Deputada Isabel Castro, que espero traga também uma pequena oferta à Mesa... Senão, não sei se lhe dou a palavra!...
Risos.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, lamento desiludi-lo mas nem de empresa pública nem de privada tenho nenhuma oferta a fazer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A elevada produção de bens que os padrões da sociedade consumista impõem gera cada vez mais o crescimento de gastos energéticos, o esbanjamento dos recursos naturais, o aumento da poluição, a agressão ambiental e o multiplicar do desperdício como fenómeno que importa com urgência olhar, compreender, mas sobretudo suster, alterando com eficácia as causas e práticas que lhe estão associadas.
Com efeito, a permanente introdução de novos produtos que incessantemente invadem o mercado, a imposição cada vez maior de critérios meramente quantitativos, a profusão de materiais de suposta necessidade, competindo
entre si na sua ilusória diferença, a apetência pelo consumo que as técnicas de marketing habilmente estimulam, são factos que justificam a necessidade de enfrentar esta realidade e os problemas que lhe são inerentes - a
delapidação dos recursos naturais, o esgotamento das matérias-primas, a incontrolável produção de lixos, sem o que falar de desenvolvimento sustentado não terá qualquer significado.
Um problema que, também ao nível da indústria do papel, se coloca com especial acuidade, face à crescente procura de papel e consequente aumento da sua produção e consumo. Gigantescas quantidades de papel, em cada minuto, gastas. Milhões produzidos para embalagens e caixas, produtos domésticos, de higiene, de escritório, material de imprensa, documentos da Administração. Em
catadupa. Alimentando uma burocracia insaciável. Toneladas e toneladas de papel, justificadas por uma crescente procura e troca de, informação, é certo, mas também por fictícios universos de conhecimento. Informação superficial muita dela, que, no ávido consumo, se dilui; no imediato do seu conteúdo, se esgota. Efémera a sua vida pelas mutações constantes que, num ápice, a tornam passado.
Papel destruído e não aproveitado. Pilhas e pilhas amontoadas em caixotes, constituindo bem mais de 20% do total do lixo que produzimos. Papel por reutilizar, à espera de ser aproveitado, transformado, reciclado. Papel que significou, apesar do seu estatuto transitório, importação de matérias-primas, árvores destruídas para lhe dar forma, energia gasta para o produzir, água consumida para lhe acentuar a brancura.
Os valores conhecem-se: por cada tonelada de papel produzido, cerca de 2400 kg de madeira desperdiçada, 100 000 litros de água gastos, mais de 7000 KW/h de energia consumidos. Valores a que se junta a poluição que a produção de energia provoca - libertação de
CO2 de que tanto se fala e urge reduzir, quando se lembra o efeito de estufa. Mas valores a que podem corresponder outros valores. Que, do aproveitamento de papel usado e da produção de papel reciclado, poderão resultar, evitando-se a
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deposição de mais um resíduo sólido supérfluo nas nossas lixeiras, assim transformado em matéria-prima secundária.
Por outras palavras, papel reciclado a requerer duas ou três vezes menos energia que a produção de igual quantidade de papel fabricado à base de fibras virgens. Papel produzido a partir de papéis usados, a necessitar 50 a 200 vezes menos água do que o fabrico de papel novo, com uma poupança equivalente ao consumo diário de 1000 pessoas. Papel a exigir para a sua produção menos de metade da energia que papel novo. Papel produzido a permitir a redução de cerca de 75% das emissões atmosféricas, 25% das descargas no meio aquático e cerca de 45% do consumo de oxigénio durante o processo do seu fabrico. Papel reciclado a requerer duas ou três vezes menos energia que a produção de igual quantidade de papel fabricado à base de fibras virgens. Fibras de cuja importação até dependemos e que, em última análise - é bom não esquecer -, continuam a ser a justificação para o poder das celuloses e para a expansão indiscriminada da plantação do eucalipto, cuja herança ambiental tão negativa e cara Portugal já está e continuará ainda a pagar.
Dados que não são novos. Uma realidade que permanece velha, mas que, pela sua dimensão e pela possibilidade real de ser transformada, justifica plenamente, em nosso entendimento, a adopção de medidas específicas que o nosso projecto de lei sobre o regime de promoção do uso do papel reciclado, hoje em discussão, visa atingir. Um projecto de lei que, em bom rigor, não é novo, na medida em que retoma, no essencial, o projecto de lei de Os Verdes, apresentado em Maio de 1992, e que a então maioria do PSD, isolada, rejeitou.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Exactamente!
A Oradora: - Um projecto de lei que não tem por objectivo a reafirmação genérica da importância da reciclagem como um dos princípios orientadores da política dos três Rs, mas pretende fundamentalmente fazer da reciclagem uma prática quotidiana na sociedade portuguesa, que a realidade até agora tem negado.
Com efeito, embora a reciclagem do papel tenha vindo a aumentar ligeiramente, a verdade é que não só a percentagem de papel recolhido continua muito longe do desejável como se verifica que a sua utilização em reciclagem é ainda menor, o seu consumo permanece escasso, o preço elevado, a sua oferta limitada, a sua valorização social e ambiental quase nulas. Razões que o explicam são várias, bem como os obstáculos que contribuem para esta situação: dificuldades na recolha, deficiente separação e armazenamento de papel, com reflexos na sua qualidade, desorganização na estrutura de produção, falta de apoio ao sector nacional, tecnologia obsoleta, mecanismos de mercado ultrapassados, insuficiente informação sobre as vantagens da reciclagem de papel e sua utilização, ausência de uma estratégia de promoção do seu uso. Causas que importa equacionar definindo uma estratégia que, em nossa opinião, faça passar do velho patamar da declaração do princípio - a importância da reciclagem
- ao novo patamar da definição de medidas que lhe dêem conteúdo e favoreçam o seu uso generalizado.
Um processo feito de objectivos concretos, definidos no tempo, sem excessos de voluntarismo nem retrocessos face ao passado, que permita gradualmente dar novos passos tangíveis e por isso mesmo, é nossa convicção, credíveis.
Uma estratégia de promoção de papel reciclado em que reservamos para o Estado e a Administração não um papel marginal ou passivo mas activo e interventor, criando condições que desbloqueiem o sector, permitam a modernização e reconversão das indústrias hoje em crise, estimulem o acesso a novas tecnologias, favoreçam a reorganização do mercado. Mas uma estratégia que, sobretudo, à semelhança do que há 15 anos atrás, numa resolução do Conselho da Europa de 3 de Dezembro de 1981, já se recomendava, «sobre a reutilização de papel usado e a utilização de papel reciclado», pretende fazer da Administração o principal animador deste processo.
Uma Administração que, pela primeira vez, não vem dizer, imperativa, aos outros o que devem fazer, nem pregar, moralista, práticas que para si própria recusa, mas uma Administração que vem, ela própria, dar o exemplo.
Uma Administração Pública que aos mais diversos níveis, das escolas aos hospitais, das autarquias à Assembleia da República, passando pelos institutos públicos e o imenso universo de entidades por si tuteladas, deve passar, do Continente às Regiões Autónomas, a evitar o desperdício, a proceder à separação do papel e cartão usados, a garantir a correcta recolha diferenciada do seu papel usado, permitindo um eficaz reaproveitamento. Passando para isso a ter de sensibilizar todos os organismos da Administração com campanhas de informação, sensibilização e educação ambiental próprias que expliquem os objectivos, façam compreender a sua importância, tornando-os a todos parceiros e aliados de um processo cujas vantagens também são suas.
Uma Administração que passará, progressivamente, a consumir produtos de papel reciclado de forma a atingir metas que nos aproximem dos demais países europeus, designadamente a França, a Dinamarca, o Reino Unido, a Alemanha, onde esta experiência há muito se verifica com assinalável êxito.
Uma Administração Pública, por fim, que, como grande consumidora, pode ter um efeito regulador nos mercados, mas que pode, sobretudo pelo seu
papel pedagogizante e pelo exemplo que pode dar, ter um efeito multiplicador noutros sectores da sociedade que induzam a comportamentos ambientalmente mais correctos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação do projecto de lei que o Grupo Parlamentar de Os Verdes hoje faz está concluída no enunciado dos seus contornos e dos objectivos que se propõe atingir. Trata-se de fazer da reciclagem uma opção, com vantagens ambientais e económicas óbvias, e da promoção do seu uso um meio através do qual a sociedade humana pode diminuir os custos de produção onerados pela compra de matérias-primas novas. Mas trata-se, sobretudo, de contribuir significativamente para a preservação do valioso património que a Natureza coloca nas nossas mãos e importa, com inteligência, saber utilizar, satisfazendo as necessidades do presente sem comprometer os direitos do futuro.
Os caminhos para o concretizar estão identificados. São medidas legislativas, técnicas, fiscais e ambientais que, como é evidente, na visão cultural implícita, exigem informação e participação democrática de todos e de cada um. Os protagonistas deste processo também. Desta feita, o Estado e a Administração que não se limitam a criticar zangados o que outros não fazem, mas que têm oportunidade de marcar pelo exemplo a diferença. Uma oportunidade que, no caso, também é nossa e começa neste Parlamento, cuja mudança de hábitos é tempo de iniciar e para a qual apresentamos, também hoje, um projecto de deli-
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beração complementar, não para fazer de conta mas para cumprir, começando pelos pequenos gestos que até podem parecer insignificantes, mas cuja soma perceberemos um dia, no seu efeito multiplicador.
A proposta está feita: combatamos o desperdício. A oportunidade existe. Saibamos não a desperdiçar!
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Paulo Neves, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Neves, é evidente que, genericamente, os objectivos propostos no projecto de lei do Partido Socialista são claros mas, em nossa opinião, há demasiados pontos por esclarecer e há demasiada fragilidade neste diploma, tendo em conta experiências anteriores, designadamente uma resolução do Conselho de Ministros; que nunca funcionou, que atribuía alguma competência ao Secretariado para a Modernização Administrativa, que nunca apresentou relatórios nem prestou contas sobre o que fez, ou melhor, sobre o que não fez. É por isso que tenho alguns receios sobre o projecto de lei do Partido Socialista.
Designadamente, não fala de uma questão que me parece muito importante, que é a da informação e sensibilização. Todos nós sabemos que mudanças de comportamentos são muito complicadas, é uma evolução muito lenta mas é tanto mais lenta e difícil quanto dela não participarem, de modo empenhado, os destinatários e o universo de pessoas que queremos envolver. Pergunto, pois, se o Partido Socialista considera ou não que o projecto de lei ficaria enriquecido se esta questão fosse contemplada.
Segundo aspecto: há aqui qualquer coisa que me parece um pouco complicada, ou seja, ser o próprio Secretariado para a Modernização Administrativa o pivot neste projecto de lei, quando a experiência anterior mostra que não deu grande resultado. Aliás, contactámos o Secretariado para a Modernização Administrativa a fim de termos uma ideia de qual era o ponto da situação, já que a resolução do Conselho de Ministros foi, como se percebeu, meramente simbólica, ou seja, foi a tentativa do PSD, que aqui tinha chumbado um projecto de lei, de dar a imagem pública de que queria fazer alguma coisa - a resolução, de algum modo, tentava dar essa imagem -, e o balanço que fazemos do que tem sido a intervenção desse secretariado, que, como eu disse, não apresentou qualquer relatório nem deu contas sobre o que fez, é muito pouco animador.
Há ainda um aspecto que me parece que não está suficientemente equacionado neste projecto de lei e que nós tememos que possa ser um recuo em relação ao passado, que é a própria não constatação da realidade do mercado, que me parece não ser uma situação tão animadora quanto o Sr. Deputado, de algum modo, na sua intervenção, afirmou. É evidente que falar de números, em termos de ambiente, é sempre muito discutível, porque não há estatísticas, continuam a não existir, os dados são falíveis, mas a realidade é que, actualmente, há problemas no mercado, há desemprego, há um sector em crise. Aliás, a Associação Nacional dos Industriais do Papel e do Cartão é muito clara no estudo que fez e nas suas reivindicações. Portanto, a questão que coloco é a de
saber se pensa ou não que este é também um aspecto útil que deve ser aprofundado no projecto de lei do Partido Socialista, com cujo espírito estamos de acordo mas que me parece que devia, neste aspecto, ser provavelmente mais clarificador.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, sobre o papel do Secretariado para a Modernização Administrativa, quero dizer-lhe, muito sinceramente, que esse secretariado depende de um membro do Governo e fará precisamente aquilo que o Governo, nesta matéria, decidir e quiser implementar. O que se passou foi que, no passado, afinal, não se quis implementar a resolução do Conselho de Ministros de 1993 e, o que se está a passar agora, claramente, é que o actual Governo não revogou essa resolução e mandou aplicá-la, precisamente através do Secretariado para a Modernização Administrativa - e vou dar-lhe três exemplos.
Foi feito um protocolo em Abril, que a Sr.ª e Deputada conhece, com certeza, no sentido de que os Serviços da Presidência do Conselho de Ministros, os Serviços do Ministério da Economia e os Serviços do Ministério do Ambiente procedessem à recolha dos resíduos em papel e cartão usados e depois os encaminhassem, através da empresa pública para esse efeito, que é a Portucel Recicla, para essa fábrica a fim de serem transformados. Isso foi feito e está a ser feito, inclusive a Portucel Recicla forneceu os recipientes para que nesses serviços da Administração Pública que acabei de mencionar seja recolhido o papel e a própria Portucel se incumbe de ir lá buscar, transportar e transformar esse produto em pastas recicladas. Portanto, afinal, o actual Governo não revogou, antes pelo contrário, aplicou a resolução do Conselho de Ministros, do passado.
O que se pretende com a apresentação do nosso projecto de lei na Assembleia da República é fazer estender a todo o território nacional, a todos os Ministérios, a todos os serviços da Administração, inclusive às autarquias locais, a recolha do papel reciclado. É óbvio que vai ser extremamente difícil, e eu próprio o assumi, mas, pelo facto de ter sido o PS a propor este projecto de lei será esta Assembleia da República, e, por maioria de razão, todos nós, a fiscalizar o cumprimento deste projecto de lei, quando passar a lei - esperamos que tal aconteça -, e a actuação do Governo nesta matéria.
Disse-me que, quanto a esta matéria, o mercado não está a funcionar tão bem como eu referi. Ontem - e por isso consegui trazer aquela máquina de papel manual -, visitei uma empresa pública e uma empresa privada que, precisamente, só fazem reciclagem de pastas com papel e cartão usados e percebi que a realidade é completamente diferente da que referiu. Portugal é um país competitivo na produção de pastas virgens para papel. Somos exportadores líquidos em pastas virgens, como acabei de referir, exportamos 1000 toneladas de pastas virgens por ano e importamos apenas sete toneladas para a produção de papéis especiais que não são fabricados em Portugal. Por isso mesmo os importamos, porque cá não temos resposta para esse mercado de utilização. São 7000 postos de trabalho que, em Portugal, significam as indústrias de papel e de pasta de papel. Portanto, é um sector pujante que interessa a Portugal manter e apoiar.
Como a Sr.ª Deputada sabe, a reciclagem de papel e de cartão não é um processo infinito, pois ao fim de três ou cinco processos de reciclagem das fibras de cada papel é
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necessário e fundamental juntar novas fibras, fibras virgens, para que o papel mantenha qualidade.
É evidente que não queremos ser fundamentalistas, apoiando apenas o papel reciclado, porque temos de ter uma indústria nacional equilibrada e, nesse sentido, também queremos ter um ambiente equilibrado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina Moura, para um pedido de esclarecimento.
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, o ambiente é uma das maiores e mais significativas preocupações dos nossos tempos, sendo por isso indispensável que, dentro das possibilidades existentes, se aproveitem os materiais através da sua rentabilização ou reciclagem.
O desenvolvimento da indústria do papel e do cartão, os sistemas de recolha de papel já utilizado e o seu tratamento exigem a colaboração entre produtores e consumidores, o que significa que papel e cartão não devem ser consumidos e deitados fora de forma despreocupada.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Salvo melhor opinião, penso que o protocolo assinado em Abril é um bom exemplo, e vem ao encontro do vosso projecto de lei, de uma estratégia para a promoção do uso do papel reciclado.
Assim, comungamos das preocupações que se prendem com os princípios e necessidades de poupar árvores, energia, água e, acima de tudo - quero frisar acima de tudo -, diminuir a quantidade de resíduos das lixeiras, pois 60% dos lixos de uma lixeira são constituídos por papel. Estamos, portanto, perante uma necessidade imperiosa, em termos nacionais, dadas as óbvias vantagens a nível ecológico, económico e energético.
As questões que gostaria de lhe colocar são as seguintes: como no vosso projecto uma das metas apontadas é a de que, até ao final do ano 2000, dos produtos utilizados em papel, 80% deverão ser reciclados, é de admitir que nos anos posteriores se preconize a reutilização a 100%. Assim sendo, como é que, em vosso entender, se concilia esta possibilidade com o facto de Portugal produzir pasta de papel com fibras 100% virgens, e papel de alta qualidade, que coloca no mercado mundial em termos competitivos?
A segunda questão: o vosso projecto aponta para medidas de apoio financeiro, incentivos fiscais, como forma de promover o mercado da reciclagem, mas não está claro, em meu entender, a quem são dados estes incentivos, se aos consumidores, se aos produtores. Importava, pois, esclarecer.
Terceira questão, que decorre desta: que medidas, em termos práticos e exequíveis, preconizam para que este objectivo seja posto em prática?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes): Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Natalina Moura, gostaria de sublinhar alguns aspectos em relação à sua intervenção. Em primeiro lugar, não temos nada contra o protocolo globalmente considerado, ou contra qualquer protocolo, que se estabeleça entre a Administração e outras entidades, mas a questão que coloca deve ser, do nosso ponto de vista, analisada sob duas perspectivas.
Em primeiro lugar, dizia V. Ex.ª, na sua intervenção, que o Partido Socialista decidiu fazer levar por diante a resolução do Conselho de Ministros n.º 2/93, o que creio ser bom com a ressalva de eliminar o seu ponto n.º 1. É que o primeiro ponto, independentemente de todo o resto, que é muito mais avançado do que o protocolo estabelecido pelo Governo, em 5 de Junho, com a empresa Gescartão, do grupo Portucel, diz que a Administração, incluindo todos os institutos, etc., deve promover o uso de papel reciclado sempre que isso não corresponda a opções de custo mais elevado. Portanto, de duas, uma: ou os senhores desconhecem que o papel reciclado, actualmente, é mais caro ou estão a passar por cima desse facto que é efectivamente um obstáculo a que esta resolução tenha algum conteúdo. Assim, ou agimos sobre uma realidade ou fazemos de conta que ela não existe e, se fazemos de conta que ela não existe, ela vai manter-se imutável.
Portanto, estou de acordo com a aplicação da resolução desde que este ponto seja eliminado, porque, efectivamente, é só pela concretização de tudo o mais que a resolução tem que o próprio preço do papel acabará por vir, a prazo, a baixar, e não de outro modo. Essa questão, para mim, é muito clara.
Segundo aspecto, esta experiência que o Governo entendeu fazer com uma empresa pode ser interessante mas parece-me que tem um âmbito muito limitado e é um retrocesso em relação àquilo que, teoricamente, esta resolução do Conselho de Ministros deveria ter assegurado. Não assegurou, mas, teoricamente, deveria ter assegurado porque aquilo que se, propõe é uma experiência de âmbito muito limitado, uma experiência de seis meses e só vai envolver dois ministérios.
Mais do que isso, há um aspecto que julgo muito delicado e em relação ao qual gostaria que o Partido Socialista se pronunciasse. É que a experiência é feita em exclusivo com uma empresa de um grupo e julgo que, tendo o Sr. Deputado referido que há todo um sector, com um número muito significativo de trabalhadores, que é um sector em crise e que precisa de ser apoiado, é delicado - e esse foi um aspecto criticado por algumas empresas
- fazer um protocolo, embora em condições que são favoráveis, em exclusivo com uma única empresa.
Relativamente aos incentivos e o que devemos entender por incentivos, como a Sr.ª Deputada sabe, não somos taxativos no nosso projecto, podendo incidir sobre os produtores ou os consumidores, modificando, por exemplo, o Código do IVA, o que significa uma modificação, do ponto de vista legal, que qualquer governo pode fazer, mas, em nossa opinião, talvez o caminho mais interessante pudesse ser um incentivo à produção.
As deduções fiscais podem ser directas ou indirectas, podem ser, por exemplo, através do IRC. Por exemplo, os gastos de energia são referidos pelas empresas como um dos aspectos que pesa negativamente no custo de produção. Ora, esse é um caminho, mas um caminho aberto, colocando na responsabilidade do Governo o vir a ponderar, ou não, esta solução, a qual não é obrigatório seguir.
Em relação à questão das metas, é óbvio que ninguém quer atingir a reciclagem de 100%, porque também é evi-
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dente que todos sabemos do que estamos a falar e não há sempre a possibilidade de aproveitamento do papel velho. Porém, também não me parece que o problema se coloque em termos de estarmos preocupados com o facto de as empresas de celulose, no nosso país, ficarem «penduradas», porque, seguramente, não ficam e a sua deslocação e mobilidade, se têm acompanhado essa questão, deve-se mais a facilidades do ponto de vista ambiental. Assim, desejamos que o nosso país não seja um país onde as normas ambientais continuem, no futuro, a ser desrespeitadas ou, então, que as empresas se desloquem para países onde a plantação indiscriminada e a erosão dos solos se possa fazer sem quaisquer regras.
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia, para apresentação dos relatórios relativos aos projectos de lei em apreço.
O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, vou ser muito breve para não gastar papel.
Para o registo, quero dizer que os dois projectos de lei apresentados não tomam em conta, no seu texto, a legislação em vigor e o relato feito em Comissão, que foi distribuído no circuito administrativo, diz exactamente isso.
Há uma resolução da Assembleia da República, de 1992, há uma resolução do Conselho de Ministros em vigor, que vincula toda a Administração Pública sobre a mesma matéria mas nem um nem outro dos diplomas refere isso, e um dos projectos, eventualmente com alguma dificuldade de compreensão de quem o dactilografou, tem uma epígrafe que não corresponde ao conteúdo, mas já percebi, da parte do primeiro subscritor, que há toda a vontade em corrigir esse aspecto, tendo em conta a compreensão global que faz da questão.
Por outro lado, segundo recomenda a boa economia legislativa e os princípios da boa construção das leis, não se deve fazer poluição no Diário da República ou no Diário sem fazer a devida avaliação, sem estudar o impacto ambiental das medidas anteriormente tomadas. Como o que está em Diário da República é uma coisa séria, antes de vir a propor-se o que já está em vigor deve avaliar-se da execução ou da não execução e dos porquês dos entraves e das dificuldades, sendo essas dificuldades e esses entraves que devem ser objecto de discussão para uma posterior iniciativa legislativa, se se justificar.
Foi isto que, enquanto relator, pude constatar, pelo é apenas isto que refiro. Se tiver o privilégio de intervir a outro título, direi muito mais.
O Sr. Carlos Coelho (PSD):- Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares, para uma intervenção.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é pelo simples facto de o ambiente estar na moda que fica garantida a protecção ambiental nem que são tomadas as medidas indispensáveis para a sua consagração. Declarações de intenções em prol do ambiente são frequentes e não raras vezes interesseiras, visando aproveitar a popularidade que tais afirmações normalmente granjeiam.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A realidade é que o ambiente é um factor chave para o futuro do nosso planeta e para a qualidade de vida das gerações vindouras, independentemente da maior ou menor honestidade de determinadas declarações.
A necessidade de implementarmos e garantirmos um desenvolvimento sustentado do nosso país e do nosso planeta é cada vez mais premente e deve estar presente em todas as nossas acções. É neste âmbito que assume especial relevância a política dos «três r» cuja aplicação se mantém muito aquém do que seria necessário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A utilização de papel é talvez um exemplo paradigmático das dificuldades ainda sentidas nesta área. O uso desenfreado do papel na nossa sociedade e o lucrativo negócio que lhe está associado têm forte incidência ambiental, impondo-se ainda mais a necessidade de reduzir, reutilizar e reciclar.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É uma área onde, manifestamente, o equilíbrio desejável não pode ser obtido através do funcionamento do mercado, cuja perversidade e submissão ao intuito lucrativo desequilibram claramente a balança em desfavor do ambiente.
Impõe-se aqui o papel simultaneamente regulador, fiscalizador e pedagógico do Estado. Do Estado deve partir um esforço para a educação ambiental, fornecendo informação sobre as consequências de determinados comportamentos, sobre os meios existentes para a protecção ambiental e, simultaneamente, sensibilizando para estas questões, nomeadamente no que diz respeito ao papel.
Por outro lado, deve o Estado implementar um sistema de incentivos e estímulos à recolha de papel velho e à utilização de papel reciclado, sem o qual serão largamente infrutíferos os esforços neste sentido. Mas, simultaneamente, é necessária uma acção do Estado no sentido de garantir a efectiva aplicação das medidas preconizadas e o cumprimento das orientações assumidas. O Estado deve ter ainda um papel pedagógico e exemplar, assumindo uma função pioneira na progressiva substituição do papel normal pelo papel reciclado nos seus serviços, bem como na recolha de papel velho para reciclar, incentivando também deste modo os investimentos nesta área.
Quanto aos projectos de lei em discussão, eles coincidem no objectivo de vincular a Administração Pública a uma maior utilização do papel reciclado, restringindo-se o projecto do Partido Socialista a esta matéria, enquanto o projecto do Partido Ecologista Os Verdes vai mais além.
O projecto de Os Verdes acrescenta a esta matéria a existência de incentivos e apoios, no sentido de permitir o incremento da produção de papel e cartão reciclado, bem como a promoção do mercado da reciclagem em geral. Salienta, ainda, a necessidade da existência de campanhas de educação para a necessidade da reciclagem.
Por outro lado, as calendarizações previstas para atingir determinado nível de matéria reciclada no papel utilizado na Administração Pública são mais exigentes no projecto de Os Verdes e vão bastante mais além nos níveis exigidos. O projecto do PS, tendo em conta as intenções propaladas, não é tão ousado como se esperaria, sendo titubeante na fixação directa de datas e metas a atingir.
A própria Assembleia da República, em deliberação aprovada a 14 de Maio de 1992, recomendou ao Conselho de Administração várias medidas no sentido de incentivar quer a utilização de papel reciclado quer a recolha
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do papel velho, juntando-se assim esta instituição aos esforços para a preservação ambiental. Seria um saudável exemplo, com grande significado e não menos repercussão externa.
Pena é que as tais medidas tenham ficado em grande parte no papel - não reciclado, obviamente! -, carecendo da concretização que se esperaria.
A resolução previa a adopção progressiva do papel reciclado, progressão essa que não parece ter-se verificado. Recomendava, ainda, a incómoda resolução a aquisição do papel reciclado para utilização dos Deputados e serviços da Assembleia, o que não é manifestamente visível, continuando todos nós, à excepção, parece, do Grupo Parlamentar de Os Verdes e hoje do Deputado Paulo Neves, a utilizar papel normal.
Finalmente, recomendava-se ainda a adopção de medidas para a recolha do papel usado na Assembleia, o que é totalmente justificável, pois nesta Casa circulam intensamente toneladas de papel, que todos os dias se amontoa, se empilha, se arquiva e também se deita fora. É necessário que tudo isto seja encaminhado para a reciclagem, minorando um pouco o desperdício que todo este processo constitui.
Também na Assembleia da República se impõe, afinal, a adopção da política dos «três r»: reduzir, reutilizar e reciclar. Para começar, era bom que se cumprisse a resolução.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.
O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, já que estamos em tarde de ofertas, tenho também o prazer de oferecer à Mesa, através de um dos funcionários a quem peço ajuda, três blocos de papel ecológico, reciclado a 100% e produto nacional, para que as notas que tomam durante a reunião possam ser assentes em papel reciclado e não em papel que, na sua produção, tem uma alta clorajem e, com certeza, provoca uma grande poluição.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Tinha de ser laranja!
O Orador: - Espero que a Mesa, doravante, utilize correntemente papel reciclado, pondo em prática uma resolução que aqui tive o prazer de apresentar, como primeiro subscritor, no Dia Mundial da Árvore - já lá vão quase cinco anos -, mas de cuja aplicação não tenho sinais visíveis, pese embora o meu esforço pessoal para que isso aconteça.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quero ainda assinalar que são bem-vindos todos aqueles que se quiseram associar a esta causa, designadamente com a apresentação dos projectos de lei que, hoje, aqui são objecto de discussão. É bem-vindo o projecto do PS, reflectindo uma preocupação que naturalmente é legítima, tal como é bem-vindo o projecto das colegas Deputadas eleitas pela CDU, que quiseram também associar-se a este debate, apresentando, já depois do relato feito sobre o primeiro, uma iniciativa na mesma área.
Todavia, a sensação que fica é que estamos a gastar papel há quase uma hora e que, eventualmente, do produto deste consumo, o resultado é duvidoso. Devo dizer; com a maior sinceridade, o seguinte: não é por falta de leis nem de normas que as coisas não se fazem. É preciso compreender um pouco o funcionamento da economia de mercado da Administração Pública e das instituições, pois é aí que se encontra a explicação para o facto de algumas decisões não serem tomadas e não na inexistência de leis.
Nós, dessa tribuna, há alguns anos atrás, referimos um conjunto de coisas que deveriam ser feitas e que essa resolução aprovada diz claramente. E poderei dar alguns exemplos, que, de resto, referi esta manhã, numa reunião da Comissão Parlamentar respectiva.
Por exemplo, choca-me a feitura diária, e nalguns casos duas vezes ao dia, da Revista da Imprensa distribuída nesta Assembleia, que é ilegal e imoral - e é muito mau que a Assembleia da República dê exemplos destes -, pois os Deputados têm, na biblioteca, uma vasta colecção de revistas e jornais, matutinos e vespertinos, em língua portuguesa e noutras línguas e os grupos parlamentares recebem, pagas pelos contribuintes, várias colecções de jornais.
Ora, num período em que se tenta proteger os direitos de autor e evitar as fotocópias de obras, textos, artigos e outras publicações, a Assembleia da República dá o exemplo, em que já em tempos alguma imprensa pegou, que é ilegal e agora com a nova legislação ainda mais, fazendo isto diariamente, o que é grave. Aliás, é duplamente grave e, neste caso, imoral por tudo isto ser feito em papel que nem sequer é reciclado e, muitas vezes, nem sequer utilizado.
Dou também o exemplo concreto das centenas de quilos que são consumidos diariamente com esta revista, em particular à sexta-feira, dia em que se fazem duas edições, uma dos jornais semanários e outra dos diários, que são distribuídas pelos corredores desta Casa quando já não está cá ninguém e que o único trabalho que dão é obrigarem as senhoras funcionárias da limpeza, na segunda-feira, a colocarem isto onde todos sabem, sem que ninguém as tenha aberto.
Em tempos, dirigi-me ao então Sr. Presidente da Assembleia da República dizendo-lhe que, por razões morais e de coerência ética, queria ser excluído da distribuição, na minha secretária e no meu gabinete, deste conjunto de papéis, e essa minha preocupação foi contemplada. Depois, dei vários exemplos de como o Boletim Informativo, que todos os dias aqui consumimos, podia ser facilmente feito em papel reciclado. Falei pessoalmente e várias vezes a alguns membros do Conselho de Administração, mas nunca ninguém entendeu que essa medida pudesse ser posta em prática. Gastam-se diariamente dezenas de árvores a fazer isto, quando se podia fazer de outro modo.
Hoje em dia, é corrente em vários serviços da Administração Pública a utilização de envelopes em papel reciclado, mas a Assembleia da República, tendo uma resolução, de há cinco anos, que recomenda claramente ao Conselho de Administração essa medida, faz todos os dias consumir, dentro dos corredores do próprio Palácio, de um gabinete para o outro, num espaço de cinco a dez metros, envelopes de papel não reciclado, de uma só utilização, pois ainda nem sequer chegou aqui a virtude corrente de utilizar o envelope continuado, o que acontece em tantos organismos públicos. Aqui, dentro do Palácio, todos os dias se gastam centenas de papéis destes inutilmente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Está há um ano em funções o novo Conselho de Administração, que tem certamente na sua composição pessoas eventualmente recém-chegadas às causas ecológicas, por esta via legislativa que aqui sentimos, e não vejo reflexo prático disso. É isso que me preocupa, porque a ecologia e as provas práticas do nosso comportamento e da nossa ética ecológica dão-se não pela proliferação poluitiva de diplomas e iniciativas, mas pelos comportamentos do dia-a-dia, pelas atitudes e por aquele que é o gesto das instituições. E isso que pauta o comportamento e a atitude ecológica.
Há várias publicações sobre esta matéria que, hoje em dia, são difundidas junto das crianças, como o Guia do Jovem Consumidor Ecológico e outros documentos que valerá a pena ler e que alguns de nós aconselham às crianças, mas que, curiosamente, nem todos os Deputados leram. Apenas por uma questão de preservar o prestígio desta Casa, não distribuo aqui esse documento, pois não quero que ninguém se sinta ofendido com a distribuição daquilo que, às vezes, dou às criancinhas para se comportarem bem, em termos de relações de consumidores com os produtos ecológicos.
Quero ainda dizer, para não gastar muito papel, duas ou três coisas muito simples. Como já disse, há uma resolução muito clara relativa aos serviços da Assembleia clara e apenas apelo às bancadas vazias, porventura admitindo que alguém lerá as actas do que aqui se disse hoje, para que o Conselho de Administração tenha, finalmente, um momento de bom senso e ponha em prática coisas tão elementares como as que aqui referi, que não têm qualquer custo e só prestigiam esta Assembleia.
Em segundo lugar, quanto à decisão, de há dias, da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente no sentido de ouvir os organismos públicos envolvidos na resolução de 1992, publicada em Janeiro de 1993, espero que estes tenham a hombridade de dizer à Assembleia, por depoimento escrito, o que é que fizeram ou não, explicando o porquê: o Instituto Português da Qualidade, com a questão da normalização e da certificação; as Direcções-Gerais da Indústria e do Ambiente, com as competências que lhes estão definidas nessa matéria; e, finalmente, as secretarias-gerais dos ministérios, bem como o Secretariado para a Modernização Administrativa.
Num Estado de direito, a resolução em vigor aplica-se a todos. Por isso, é preciso perguntar, em primeiro lugar, o que é que fizeram ou não e porquê. Esse é um contributo que podemos dar e, em consciência, não me sentirei bem a fazer aqui qualquer discussão, na generalidade ou na especialidade, sobre um qualquer projecto de diploma sem ter uma
corresponsabilização de quem foi nomeado na Administração Pública, não por concurso mas por nomeação de confiança, numa limpeza étnica que foi feita nos últimos meses...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Uma vergonha!
Protestos do PS.
O Orador: -... numa limpeza étnica que foi feita nos últimos meses na Administração Pública...
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Deputado, já é tarde para ficarmos com essa!
O Orador: - Não, os senhores têm é um parti pris de consciência? Tem um problema de reflexo condicionado?
Falam sempre nos 10 anos, mas houve alguém, nesses 10, anos, que nunca fez aquilo que os senhores fizeram em seis meses.
Protestos do PS.
Mas dou-vos um exemplo: fui Secretário de Estado do Ambiente há alguns anos, despachava com seis directores-gerais, três dos quais eram militantes do PS e foram por mim reconduzidos. Só que, hoje, as pessoas que não são militantes do PS, na área do ambiente, foram todas saneadas, algumas com comportamentos desumanos.
Vozes do PSD: - É uma vergonha!
O Orador: - Isto é verdade e repito-o as vezes que queiram ouvir.
Vozes do PSD:- Muito bem!
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Pode repetir asneiras!
O Orador: - Não repito asneiras, repito a verdade.
Embora só tenha falado metade do tempo que tenho disponível, tenho muito gosto em discutir o tempo que quiserem estas coisas do ambiente. Mas dou-vos um último conselho, de amigo: são bem-vindos todos aqueles que se queiram juntar às causas do ambiente, estudá-las, reflectir e escrever sobre elas, mas aos Srs. Deputados do PS que usaram da palavra sobre esta matéria dou-lhes o conselho de reverem o texto que escreveram, porque dito aqui não tem qualquer reacção, a não ser um conselho de amigo, mas, dito nalguns sítios isso poderá provocar reacções que são menos simpáticas para quem as proferiu. Vejam a contradição que se encontra no vosso texto em relação àquilo que disseram ser, no cômputo global dos resíduos sólidos urbanos e dos aterros sanitários, a fatia que corresponde a papel. O que disseram, um e outro, é distinto e nem num caso nem no outro corresponde à verdade.
E mais não digo, fico-me por este conselho, por que é bem-vindo o vosso gesto e a vossa preocupação. Agora, consultem melhor os elementos, pois não só o que disseram não corresponde à verdade, nem num caso nem no outro, como disseram coisas completamente diferentes.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Eu esclareço-o já, Sr. Deputado.
O Orador: - Poderia dar-vos outros exemplos de coisas que disseram e que não correspondem à verdade, mas penso que, para bancadas vazias, para jornalistas que não estão cá e para funcionários que merecem, naturalmente, consumir papel e ter direito ao descanso, fico por aqui.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Macário Correia, antes de mais, quero agradecer-lhe, em nome da Mesa, os blocos que nos ofereceu e que, seguramente, serão bem usados.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não vou roubar muito tempo à Assembleia, até porque é evidente o mérito das propostas que nos são presentes.
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Em todo o caso, permitam-me que recorde alguma coisa do passado. Quando eu era jovem, existiam em Lisboa e nas várias cidades do País os chamados «papeleiros», que recolhiam as sobras dos papéis e que faziam também uma reciclagem. Só que, nesse tempo, isso era um sinal de pobreza, pois o único fim a dar a essa reciclagem era uma coisa que os mais velhos conheceram e que os mais novos já não sabem o que é, os chamados «papéis de embrulho». Algumas vezes, somos também chamados a fazer «papel de embrulho», como é o caso neste momento!...
Risos gerais.
Falo nisto porque não partilho de algumas das preocupações que os Srs. Deputados aqui manifestaram.
Vim a reencontrar a recolha do papel já como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. O Sr. Deputado Macário Correia, vereador dessa Câmara, conhece isto tão bem quanto eu, e sabe que hoje, e já desde há uns anos, a maior parte dos escritórios de Lisboa, nomeadamente todos os da Baixa, têm contratos para recolha dos papéis em viaturas próprias, que circulam na cidade antes de saírem os carros de limpeza da Câmara.
Se as entidades privadas fazem isto, por alguma razão o fazem. Isso significa, claramente, que estamos em face de um mercado, e valioso. Então, o problema que temos de enfrentar é mais complexo - e desculpem-me os autores destes projectos de lei, pois não pretendo diminuir os vossos méritos -, mais profundo, do que pode parecer, pelos poucos artigos que têm os vossos projectos de diploma. Até porque - já foi aqui lembrado e é referido também nos vossos projectos de lei - já houve outras deliberações desta Assembleia e outros diplomas, a nível do Governo, que não foram cumpridos. Se calhar, não o foram por terem a mesma extensão que estes que nos propomos aprovar.
Eu diria que talvez tenha chegado o tempo, já que estamos todos de acordo sobre a importância desta matéria, de entrarmos num processo de reciclagem dos projectos de lei e fazermos algo que talvez seja inédito mas que não ficará mal às assembleias parlamentares: chamar para trabalharem connosco não só as comissões especiais do Governo, que organizam - bem ou mal - ou não organizam nem reorganizam os serviços públicos, como vai sendo habitual entre nós, mas também aqueles que realmente trabalham. Chamemos para trabalharem connosco as empresas que estão a recolher e a reciclar o papel.
A este propósito, chamo a vossa atenção para o seguinte: tenho observado que neste momento o papel reciclado é um papel de luxo. Ele aparece nos convites das empresas com maior nível social e nos convites para os acontecimentos sociais mais relevantes. Ora, isto não é por acaso. Isto indicia que há uma evolução tecnológica, a qual, aliás, já se verificou em países como a Inglaterra, nos países mais avançados do mundo. Nesse caso, sim, vale a pena usar os incentivos fiscais para desenvolver essa tecnologia que torna o papel reciclado um produto de luxo e querido.
A face mais fácil do problema é a de obrigar o Estado a ser um bom cidadão. Mas, para esse caso, diria, repescando o que disse o Deputado Macário Correia, que só há uma maneira de o fazer: convocar à Assembleia os que não cumpriram a lei e levá-los a revelar até à última circunstância por que não a cumpriram porque, caso contrário, eles continuarão a não cumprir. O grande mal, neste país, é que ninguém é chamado às responsabilidades. E apenas são punidos os pequenos criminosos. Mas quando os grandes criminosos dominam uma máquina como a do Estado, que é do tamanho do País, podem fazer todas as tropelias, pois ninguém lhes pede contas de coisa alguma.
Também na actividade da reciclagem dos nossos hábitos e das nossas leis, aconselharia, Sr. Presidente, que estes dois projectos de lei recolhessem com humildade à comissão e que, com humildade também, os mais antigos e os que mais recentemente se converteram aos bens da ecologia fizessem um trabalho ecologicamente são, levando isto às últimas consequências. Se assim for, garanto-vos que, mesmo que isso signifique um atraso de um, dois ou três meses na promulgação das leis, terá valido a pena, em termos dos resultados que pretendemos obter.
Não estamos aqui para confundirmos pressa com precipitação mas, sim, para atingirmos objectivos que sabemos e dizemos serem do interesse nacional. Sem essa colaboração, sem sabermos se estamos em face de algo cuja compra encaramos como uma esmola que temos de dar, meus amigos, tiremos daí as ideias, pois ninguém vai utilizar o papel reciclado. Mas se tivermos a arte de dizer que usar o papel reciclado é um degrau superior da civilização e da capacidade de utilização, então, teremos uma fila à porta, porque as pessoas não gostam de ser estúpidas e querem é ser inteligentes, ou, pelo menos, parecê-lo.
Cabe a esta Assembleia demonstrar aos funcionários públicos, e mesmo aos desta Assembleia, que já chegou o tempo de começarem a parecer inteligentes, e talvez ganhemos alguma coisa com isso.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Estão inscritos, para intervir, os Srs. Deputados Isabel Castro e Paulo Neves.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No fim deste debate há algumas coisas que é importante reter daquilo que a discussão trouxe.
Em primeiro lugar, julgo que, se não se faz tábua rasa do incumprimento, por esta Assembleia, da sua recomendação, seria bom que se chamasse à responsabilidade, porque penso que também é importante, quem não a cumpriu.
Recordo que na anterior legislatura a questão foi várias vezes suscitada no Conselho de Administração, ao Sr. Presidente, ao Secretário-Geral, designadamente por nós, que, apesar de não termos subscrito a recomendação - e já tínhamos subscrito um projecto de lei que foi «chumbado» pelo PSD -, estivemos de acordo com ela. Várias vezes chamámos a atenção para a sua aplicação e, nomeadamente aquando da discussão da Conta da Assembleia da República, lembrámos e insistimos que era importante que essas contas fossem apresentadas noutros termos, tendo em consideração as decisões da Assembleia, que não são para «fazer de conta» mas, sim, para ser aplicadas.
Em meu entender, esta questão é importante, tal como é o fazer-se balanços críticos das decisões. Aliás, penso que não faz muito sentido querer branquear o incumprimento da resolução do Conselho de Ministros sem ter em conta o facto de as decisões e a sua aplicação ser feita por governos, de as orientações serem dadas por governos, que dirigem ministérios e têm responsabilidades.
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Há uma resolução do Conselho de Ministros que especifica, preto no branco, quem tem responsabilidades e quem tem de apresentar relatórios anuais, o que nunca foi feito. A decisão é de Outubro de 1992 e, portanto, para nós não faz muito sentido, em 1996, falar com ligeireza desta questão sem ter em conta que existiram obstáculos e entraves políticos, razão pela qual ela nunca foi levada à prática. Como é evidente, há procedimentos individuais que se podem modificar, cada um pode utilizar o papel da forma mais racional que entender, mas a questão essencial é também política.
Por isso, parece-nos que a promoção do uso de papel reciclado não é tão linear quanto uma decisão administrativa, pois envolve participação, sensibilização e modernização tecnológica. A própria produção de papel reciclado tem de ser feita com base em tecnologias mais avançadas, porque, se o não for, produz resíduos que continuam a conter metais pesados, o que torna complicada a sua eliminação e leva à existência de outros problemas, que terão de ser solucionados, independentemente de o balanço ser positivo.
Em conclusão, a nossa proposta é a de que se façam as consultas, se tomem as decisões, mas não se use de hipocrisia a respeito das razões pelas quais nada foi feito no passado. Uma coisa é avançarmos com segurança, outra é retrocedermos, pois o grande atraso com que partimos já é por demais grave.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta intervenção prende-se com uma afirmação feita há pouco pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, que pode induzir a Câmara em erro, pelo que é fundamental esclarecê-la.
Quando o actual Governo fez o protocolo do chamado Projecto Papelão, aderiu a ele uma empresa. Ora, foi a empresa que aderiu por sua iniciativa, sendo a sua única e exclusiva actividade a produção de papel reciclado e de papel para embalagem a partir de matérias recicladas, e trata-se de uma empresa de capitais maioritariamente públicos. Talvez por isso tenha pretendido dar o exemplo, assim como nós, pois tem de ser a Administração Pública a dar o exemplo na recolha do papel usado e na introdução do papel reciclado. Portanto, é bom que fique esclarecido que não há aqui qualquer exclusividade em relação a essa empresa, a sua adesão ao protocolo justifica-se por aquilo que acabei de referir.
Gostaria ainda de aproveitar esta intervenção para esclarecer uma questão que o Sr. Deputado Macário Correia trouxe à colação.
Sr. Deputado, o nosso projecto de lei justifica-se precisamente por termos conhecimento das medidas, ou das «não medidas», resultantes da resolução do Conselho de Ministros de 1993, que foram, rigorosamente, nenhumas.
Recordo que, em 1993, o PSD «chumbou» um projecto de lei sobre esta matéria, tendo sido aprovada a resolução de Conselho de Ministros que o Sr. Deputado mencionou, mas nem essa resolução foi cumprida. É precisamente por isso que o PS, o partido que apoia o actual Governo, apresenta este projecto de lei.
Foram apresentados projectos de lei e, sem qualquer atitude de seguidismo daqueles que, paternalmente, nos querem levar para o diálogo, dizendo «vamos lá conversar...», aceitamos a sugestão do Sr. Deputado Nuno Abecasis no sentido de viabilizar a baixa destes diplomas à comissão respectiva, para, em sede de especialidade, haver lugar a uma melhor discussão e análise do problema, com a condição de muito em breve agendarmos a sua votação final global.
Srs. Deputados, este debate não tem, como o Sr. Deputado Bernardino Soares referiu, grande popularidade. A matéria tem grande popularidade, mas este debate, claramente, não está a tê-la. E isso vê-se pela falta da presença de Deputados, essencialmente do PSD.
Quero apenas deixar aqui uma nota, apesar de ela não ser fundamental, mas já uma vez fui brindado com uma atenção semelhante por parte dos Deputados que pertencem à JSD: estes Deputados deveriam estar presentes, deveriam interessar-se por esta matéria.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - E os que pertencem à JS?!
O Orador: - Estão, pelo menos, dois! Estão presentes quase mais Deputados que pertencem à JS do que Deputados do PSD!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Faltam pelo menos 12!
O Orador: - Doze, não! O Sr. Deputado não sabe fazer contas.
Sr. Deputado Macário Correia, em relação ao seu conselho de amigo, aceitamo-lo, mas vamos fazer as coisas. O partido e o Governo do amigo e Deputado Macário Correia - se me permite tratá-lo assim - é que, claramente, não quiseram fazer as coisas. Fizeram a resolução do Conselho de Ministros, em 1993, mas ela nem sequer foi publicada no Diário da República em papel reciclado. Só a partir do ano passado é que o Diário da República passou a ser impresso em papel reciclado.
Finalmente, este debate não tem de continuar nesta Câmara mas, sim, na sociedade portuguesa. Têm de ser a Administração Pública, o Governo e a Assembleia da República a darem o exemplo. Chamo a vossa atenção para o facto de a resolução que referi se manter em vigor, pois este projecto aplica-se à Administração Pública. A resolução aprovada em 1992 tem de ser dignificada, tem de ser cumprida, e vai sê-lo, com certeza.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.
O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive ocasião de dizer hoje de manhã, em sede de comissão - e repito-o aqui - que, para mim, o que resta desta troca de impressões é a boa fé, que admito e presumo em todos, em particular nos proponentes dos diplomas em causa, de que querem de facto reciclar papel. Partindo deste princípio, associo-me a essa vontade para que assim seja feito, começando pela Assembleia da República.
Quero, desde já, dizer que tenho alguma autoridade moral para falar sobre o assunto porque fui eu que subscrevi e apresentei a resolução há pouco mencionada.
Por outro lado, quero dizer aos ilustres colegas que, em serviços públicos da minha responsabilidade, já há uma década atrás começou a praticar-se aquilo que a lei não definia. Ou seja, não precisei da lei para pôr em prática em alguns serviços públicos um comportamento diferente. Portanto, não é pelo facto de haver mais ou menos lei que as coisas se fazem; depende da ética de quem dirige.
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Além disso, gostaria de referir que, de 1992 para diante, se fizeram em vários serviços públicos algumas coisas de sinal positivo nessa matéria, todavia numa conjuntura difícil, que também tem de ser tida em conta. É que se entrou numa fase de contraciclo na questão do papel, com uma introdução inusitada de papel importado da Alemanha e com uma quebra de preço bastante acentuada em Portugal, o que teve alguns reflexos nos autarcas com mais experiência, levando-os a ver, de outra forma, comportamentos diferentes em algumas zonas da cidade, à noite, tendo em conta a flutuação do preço de mercado. Mas este é um pormenor para discutir noutra ocasião.
Quero ainda dizer aos colegas que, em matéria de impressão do Diário da República e de alguns outros documentos, tal não era fácil, do ponto de vista tecnológico, porque o material de impressão e de fotocópia não era produzido a preços concorrenciais em Portugal e os preços importados levavam a que muitas vezes algumas empresas, embora com a boa fé ecológica que certamente tinham, optassem, por razões de mercado, por outra via. Aí, sim, justificar-se-ia uma iniciativa legislativa que, através de mecanismos de dedução fiscal, pudesse compensar estas empresas. Mas poderemos discutir tudo isto em sede especializada e no quadro da vossa boa fé, que certamente vem ao encontro da minha, porque poderá ser esse o caminho em que se justifica algum aperfeiçoamento do quadro legal em vigor. No entanto, receio que a actual orientação tributária do Ministério das Finanças não possa acolher a nossa boa causa ecológica. É que a intenção tributária em vigor aponta em sentido contrário ao da nossa boa causa. Porém, estou ao vosso lado para convencer o Ministério das Finanças a fazer reduções fiscais nesta área.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Não havendo mais pedidos de palavra, dou por encerrada a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei
n.os 173 e 216/ VII, cuja votação terá lugar amanhã à hora regimental.
O último ponto da nossa ordem de trabalhos é a discussão da petição n.º 109/VI (1.ª) - Apresentada por Rodrigo Jorge de Moctezuma Seabra Pinto Leite, reclamando contra o teor da alínea b) do artigo 288.º da Constituição.
Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos para intervir.
Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.
O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição ora em apreciação reclama contra a inclusão da «forma republicana de governo» no elenco dos limites materiais a respeitar pelas leis de revisão constitucional.
A bem dizer, a argumentação formal utilizada pelos peticionários levaria a pôr cm causa a existência de quaisquer limites materiais, por pretensamente atentatórios dos princípios consagrados no plano dos direitos, liberdades e garantias, assim contestando, em monstruosa falácia, o próprio limite que, consagra o respeito por esses mesmos direitos, liberdades e garantias.
Mas é sobre a forma republicana de governo que se concentra a preocupação dos peticionários, decerto com a intenção de, por essa via, abrirem caminho à possibilidade de revisão do artigo 1.º da Constituição da República Portuguesa, que define Portugal como uma «República soberana», e logicamente também do artigo 3.º, segundo o qual «A soberania, una e indivisível, reside no povo». Quem sabe mesmo se, no seu horizonte final, não está, em última análise, o balão referendário hoje tão em voga.
Desde já, quero aqui deixar bem claro, agora que estamos em período de revisão constitucional, a total indisponibilidade do PS para a eliminação do limite da forma republicana de governo, no artigo 288.º da Constituição da República Portuguesa.
Tal limite não resulta, com efeito, de uma simples opção de carácter partidário ou de um mero capricho ideológico-cultural, resultante da inércia da história.
A forma republicana do exercício da soberania é, para nós, um princípio estruturante e basilar do Estado democrático. A eleição democrática, directa ou indirecta, do Chefe do Estado representa o necessário coroamento do exercício da soberania popular, o fecho de abóbada do edifício do Estado democrático.
Por mais pluralistas e parlamentares que pretendam ser as monarquias constitucionais, faltar-lhes-á sempre esse elemento último, mas imprescindível, para atingirem a plenitude democrática. Serão sempre democracias imperfeitas, incapazes de levar até às últimas consequências o princípio da soberania popular.
Por isso, e ao contrário do que pretendem os peticionários, garantir, através do artigo 288.º, a perenidade da forma republicana de governo não é um atentado aos princípios consagrados no plano dos direitos, liberdades e garantias. Pelo contrário, é um escudo protector para um desses princípios e direitos, o princípio da soberania popular, e a sua expressão no direito à eleição democrática do órgão de soberania que representa o Estado português ao mais alto nível. Um escudo protector contra quaisquer tentativas de impor ao povo português um chefe do Estado por via biológica ou hereditária, atribuindo a um determinado indivíduo e respectiva família um privilégio sem justificação ética, racional e democrática possível.
E deixamos de lado os argumentos mais ridículos da petição, tais como a ofensa que tal limite representaria aos países da União Europeia de regime monárquico ou as pretensas e fantasiosas «crises e clivagens» que os «preenchimentos do cargo de chefe do Estado têm provocado no seio da democracia portuguesa».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O princípio republicano é, hoje, uma conquista histórica irreversível, que devemos aos revolucionários de 5 de Outubro de 1910, tal como devemos o princípio liberal aos revolucionários de 24 de Agosto de 1820 e tal como devemos o princípio democrático, na sua máxima plenitude, aos revolucionários de 25 de Abril de 1974.
Não contem, pois, connosco para apoiar uma petição que visa apenas satisfazer a nostalgia sentimental de uma escassíssima minoria por um regime democraticamente imperfeito e que não deixou saudades ao povo português.
Viva a República!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pessoalmente, estou à vontade para me pronunciar sobre a questão de Estado que a petição n.º 109/VI nos põe a nós, parlamentares. Entre os membros do meio
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familiar de onde procedo e a que pertenço talvez a cultura política monárquica seja a prevalecente. Ao longo da minha infância e juventude sempre ouvi que Portugal tinha sido grande num período em que a «vontade colectiva» era simbolizada pela figura de um rei e plasmada na instituição monárquica. Essa teria sido «a vontade que nos atou ao leme», para parafrasear o verso da alegoria pessoana do Mostrengo. Fui, pois, criado em ambiente monárquico, mas não sou monárquico.
Por isso, dizia, julgo-me à vontade para falar do tema desta petição com o respeito que sempre guardei às opiniões e sentimentos dos meus maiores, mas com a liberdade que eles mesmos, contínua e insistentemente, me ensinaram a exercer e à qual me habituaram a guardar a mais inteira fidelidade.
O Partido Social Democrata não propôs, no presente processo de revisão constitucional, a eliminação da alínea b) do artigo 288.º da Constituição da República, segundo a qual «a forma republicana de Governo» constitui um limite material da revisão.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Há, contudo, uma proposta, apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e por outros Srs. Deputados desta bancada, para a eliminação de todo o artigo 288.º. Mas, repito, o PPD/PSD não fez essa proposta e, por isso, cabe-me dizer aqui porquê.
Em juízo do PSD, não há, em Portugal, na realidade, uma questão constitucional relativa à forma republicana ou monárquica de Governo ou de Estado. A Revolução de 1910, neste aspecto, vem sobrevivendo a todas as vicissitudes - 1926, 1951 (refiro-me à tentativa de transformação «a frio» do regime salazarista num regime monárquico), 1974 e 1976 são marcos, aliás muito diferentes entre si, que julgamos confirmarem a opção da grande generalidade dos portugueses pelo regime republicano. Pensando assim - e pensa-o agora, como o pensava antes -, o PSD não podia propor, nem propôs, a eliminação da alínea b) do artigo 288.º da, Constituição da República.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - De uma coisa estamos certos: a Assembleia da República, em lei de revisão, não poderia deliberar, sem mais, eliminar a alínea b) do artigo 288.º Se pretendesse proceder a tal eliminação, teria de prever uma qualquer forma genuinamente democrática - o referendo, por exemplo - para o povo, no seu conjunto, se poder pronunciar sobre a questão e de decidir com que eficácia essa sua pronúncia deveria ser acolhida. Aliás, a proposta de revisão apresentada pelo PSD visa legitimar também o referendo sobre matéria constitucional. Se ela fosse aprovada, este último problema ficaria, claro está, resolvido.
Termino com um apelo ao Presidente e aos membros da Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, no número dos quais, aliás, tenho a honra de me contar. À semelhança do que fez em relação a personalidades e instituições que tomaram a iniciativa de apresentar publicamente sugestões para a revisão constitucional, a Comissão em apreço devia convidar representantes destes 1269 cidadãos portugueses, subscritores da petição em causa, a deslocarem-se a uma das suas reuniões, a fim de debaterem de viva voz com os Deputados esta, sua pretensão.
Aplausos do PSD e do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Incluir no artigo 288.º da Constituição, na parte referente aos limites materiais de revisão constitucional, a forma republicana de governo foi uma decisão que apenas o ambiente conturbado da época poderá minimamente explicar.
Mais difícil será entender que esse curioso limite material à revisão constitucional tenha sobrevivido às revisões de 1982 e de 1989, épocas em que um módico de bom senso havia já regressado ao País, bom senso esse que seria desejável ter visto reflectido na instituição parlamentar.
Mas deixar que ele sobreviva a uma revisão que se está a processar em 1996 seria, mais do que uma notável manifestação de nonsense político, um inaceitável desprezo pelo arreigado sentimento democrático dos portugueses, bem como pelo sua já sobejamente comprovada capacidade para decidirem sozinhos e sem indesejáveis tutelas o seu próprio destino.
A tomada da Bastilha não foi ontem, nem anteontem. Passados mais de dois séculos sobre a Revolução Francesa, há muito que foi feito o balanço dos seus lucros e perdas, encerrados os livros e ordeiramente arrumados no arquivo.
Na Europa, convivem monarquias e repúblicas e, dentro de cada uma delas, convivem, civilizadamente, monárquicos e republicanos. O jacobinismo apopléctico se poderá fazer sentido num museu, entre barretes frígios, canhões de bronze e olhos desorbitados de citoyens em fúria, encontra-se, de todo em todo, deslocado no seio de uma sociedade contemporânea e viva.
Algumas perguntas há que, fazer e as respostas terão de ser coerentemente dadas. Com que direito se coarcta aos portugueses o exercício dos direitos e liberdades, que, no mesmo artigo do texto constitucional, se reconhecem? Ou não faz parte desses direitos e liberdades a de escolher, sem restrições de qualquer ordem, não só as normas fundamentais que definem a natureza da sociedade como a própria arquitectura do Estado a que pertencem?
Qual a diferença substancial entre a forma republicana e a forma monárquica de governo? Será esta última limitadora dós direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, critério último e substancial de diferenciação entre formas aceitáveis e não aceitáveis de estruturação do Estado?
É por assumir forma republicana que o regime indonésio será automaticamente branqueado e por revestir a forma monárquica que deveremos votar a Inglaterra ou a Espanha ao mais definitivo dos ostracismos? Quem salvou a democracia em Espanha: o republicano Terrero de Molina ou o monárquico João Carlos de Bourbon?
O Sr. Afonso Candal (PS): - Essa é de mau gosto!
O Orador: - É a chefia dinástica do Estado, característica essencial à forma monárquica de governação, pelo menos tal qual nos últimos séculos tem sido entendida, que se pretende colocar em causa? Que problema poderemos aí encontrar quando tantos parceiros nossos da União Europeia, democracias consolidadas de séculos, nele não vêem qualquer óbice? A quem pretendemos, Sr. Deputado António Reis, dar lições de democracia? Ao Reino Unido? À Bélgica? À Espanha? À Suécia? À Dinamarca?
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E, assim sendo, para quando uma cruzada que leve a esses países, mergulhados na vergonha, no opróbrio e na servidão das suas monarquias, a luz redentora da nossa república perfeita? E até nem será muito difícil, porquanto a essas monarquias terá faltado a perspicácia, a argúcia e o rigor democrático de salvaguardarem a sua forma de governação no âmago dos seus textos constitucionais...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A escolha que se nos coloca é entre a liberdade de opção dos portugueses e a manutenção de uma norma totalitária.
O Partido Popular escolhe a liberdade.
Viva a liberdade!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. António Reis (PS): - Viva a República!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Analisamos, hoje, neste Plenário, a petição n.º 109/ VI, na qual 1269 cidadãos reclamam contra o teor da alínea b) do artigo 288.º da Constituição da República, o qual consagra «a forma republicana de governo». Como se sabe, do que estamos a falar é do artigo que define os limites materiais da revisão e, neste âmbito preciso, seja-nos permitido remeter os senhores peticionários para o conteúdo dos relatório e parecer aprovados por unanimidade em sede de Comissão de Petições, em Fevereiro de 1995. Porque, mais do que uma questão de natureza formal para entretenimento académico de um ou outro constitucionalista, do que aqui se trata é de uma questão de natureza política. Recusamo-nos, portanto, a uma apreciação apenas (aparentemente) técnica dos problemas levantados pela presente petição e, com todo o respeito pelo exercício do direito de petição aqui assumido, queremos dizer que o meu grupo parlamentar é decididamente republicano, laico e comunista!
Aplausos do PCP.
Risos do PS, do PSD e do CDS-PP.
E, no que à componente republicana respeita, que excelente república é a nossa, quando, consagrando-se constitucionalmente como tal, igualmente consagra, e na mesma sede, a possibilidade de ser contestada.
Porque, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, a nossa República e a nossa Constituição não são eternas, pela simples razão de que, não sendo lícito qualquer futurologia em torno do seu fim, é nítido para todos que ambas tiveram um princípio. Ou seja, é da História que estamos a falar e não de qualquer coisa abstracta que com a História nada tivesse a ver. A forma republicana de governo não é uma imposição, mas uma consequência. Uma consequência da luta e das lutas do povo português, assumidas ao longo de gerações e naturalmente vertidas na Constituição da República.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em termos de proximidade histórica - e toda a História está cheia de rupturas -, a Constituição de 1933 não impediu o 25 de Abril. Por que é que esta Constituição há-de impedir o que quer que seja? O que nos parece é que, em termos da sua ligação à vontade popular, os senhores peticionários são «homens de pouca fé»... Vá lá, vá lá, que, dentro da mesma tese maximalista, ainda ninguém se lembrou - e espero não estar involuntariamente a dar qualquer sugestão a ninguém nesta matéria -, de questionar o conteúdo da alínea c) do mesmo artigo 288º da Constituição, respeitante à separação das Igrejas do Estado. Se o tivessem feito, um estágio com os «taliban» no Afeganistão viria mesmo a calhar. Enquanto é tempo. Enquanto é o seu tempo... É claro.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais intervenções sobre a petição n.º 109/VI - Apresentada por Rodrigo Jorge de Moctezuma Seabra Pinto Leite, reclamando contra o teor da alínea b) do artigo 288.º da Constituição -, nem qualquer procedimento regimental subsequente a este debate, declaro encerrados o debate sobre a petição e, consequentemente, os nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, pelas 15 horas, tendo período de antes da ordem do dia e na ordem do dia procederemos a discussão conjunta da proposta de lei n.º 58/VII e do projecto de lei n.º 22/VII e à discussão do projecto de lei n.º 40/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 35 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Francisco José Pinto Camilo.
José de Matos Leitão.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
Partido Social-Democrata (PSD):
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Alberto Pinto.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Augusto Gama.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
Nuno Kruz Abecasis.
Rui Manuel Pereira Marques.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira Marques.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Raul d' Assunção Pimenta Rego.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
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Partido Social-Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
João Carlos Barreiras Duarte.
José Mendes Bota.
Manuel Acácio Martins Roque.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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60 I SÉRIE - NÚMERO 1
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RENOVAÇÃO DE ASSINATURAS PARA 1997
Senhor(es) Assinante(s):
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