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56 I SÉRIE - NÚMERO 1

familiar de onde procedo e a que pertenço talvez a cultura política monárquica seja a prevalecente. Ao longo da minha infância e juventude sempre ouvi que Portugal tinha sido grande num período em que a «vontade colectiva» era simbolizada pela figura de um rei e plasmada na instituição monárquica. Essa teria sido «a vontade que nos atou ao leme», para parafrasear o verso da alegoria pessoana do Mostrengo. Fui, pois, criado em ambiente monárquico, mas não sou monárquico.
Por isso, dizia, julgo-me à vontade para falar do tema desta petição com o respeito que sempre guardei às opiniões e sentimentos dos meus maiores, mas com a liberdade que eles mesmos, contínua e insistentemente, me ensinaram a exercer e à qual me habituaram a guardar a mais inteira fidelidade.
O Partido Social Democrata não propôs, no presente processo de revisão constitucional, a eliminação da alínea b) do artigo 288.º da Constituição da República, segundo a qual «a forma republicana de Governo» constitui um limite material da revisão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há, contudo, uma proposta, apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e por outros Srs. Deputados desta bancada, para a eliminação de todo o artigo 288.º. Mas, repito, o PPD/PSD não fez essa proposta e, por isso, cabe-me dizer aqui porquê.
Em juízo do PSD, não há, em Portugal, na realidade, uma questão constitucional relativa à forma republicana ou monárquica de Governo ou de Estado. A Revolução de 1910, neste aspecto, vem sobrevivendo a todas as vicissitudes - 1926, 1951 (refiro-me à tentativa de transformação «a frio» do regime salazarista num regime monárquico), 1974 e 1976 são marcos, aliás muito diferentes entre si, que julgamos confirmarem a opção da grande generalidade dos portugueses pelo regime republicano. Pensando assim - e pensa-o agora, como o pensava antes -, o PSD não podia propor, nem propôs, a eliminação da alínea b) do artigo 288.º da, Constituição da República.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - De uma coisa estamos certos: a Assembleia da República, em lei de revisão, não poderia deliberar, sem mais, eliminar a alínea b) do artigo 288.º Se pretendesse proceder a tal eliminação, teria de prever uma qualquer forma genuinamente democrática - o referendo, por exemplo - para o povo, no seu conjunto, se poder pronunciar sobre a questão e de decidir com que eficácia essa sua pronúncia deveria ser acolhida. Aliás, a proposta de revisão apresentada pelo PSD visa legitimar também o referendo sobre matéria constitucional. Se ela fosse aprovada, este último problema ficaria, claro está, resolvido.
Termino com um apelo ao Presidente e aos membros da Comissão Eventual para a Revisão da Constituição, no número dos quais, aliás, tenho a honra de me contar. À semelhança do que fez em relação a personalidades e instituições que tomaram a iniciativa de apresentar publicamente sugestões para a revisão constitucional, a Comissão em apreço devia convidar representantes destes 1269 cidadãos portugueses, subscritores da petição em causa, a deslocarem-se a uma das suas reuniões, a fim de debaterem de viva voz com os Deputados esta, sua pretensão.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Incluir no artigo 288.º da Constituição, na parte referente aos limites materiais de revisão constitucional, a forma republicana de governo foi uma decisão que apenas o ambiente conturbado da época poderá minimamente explicar.
Mais difícil será entender que esse curioso limite material à revisão constitucional tenha sobrevivido às revisões de 1982 e de 1989, épocas em que um módico de bom senso havia já regressado ao País, bom senso esse que seria desejável ter visto reflectido na instituição parlamentar.
Mas deixar que ele sobreviva a uma revisão que se está a processar em 1996 seria, mais do que uma notável manifestação de nonsense político, um inaceitável desprezo pelo arreigado sentimento democrático dos portugueses, bem como pelo sua já sobejamente comprovada capacidade para decidirem sozinhos e sem indesejáveis tutelas o seu próprio destino.
A tomada da Bastilha não foi ontem, nem anteontem. Passados mais de dois séculos sobre a Revolução Francesa, há muito que foi feito o balanço dos seus lucros e perdas, encerrados os livros e ordeiramente arrumados no arquivo.
Na Europa, convivem monarquias e repúblicas e, dentro de cada uma delas, convivem, civilizadamente, monárquicos e republicanos. O jacobinismo apopléctico se poderá fazer sentido num museu, entre barretes frígios, canhões de bronze e olhos desorbitados de citoyens em fúria, encontra-se, de todo em todo, deslocado no seio de uma sociedade contemporânea e viva.
Algumas perguntas há que, fazer e as respostas terão de ser coerentemente dadas. Com que direito se coarcta aos portugueses o exercício dos direitos e liberdades, que, no mesmo artigo do texto constitucional, se reconhecem? Ou não faz parte desses direitos e liberdades a de escolher, sem restrições de qualquer ordem, não só as normas fundamentais que definem a natureza da sociedade como a própria arquitectura do Estado a que pertencem?
Qual a diferença substancial entre a forma republicana e a forma monárquica de governo? Será esta última limitadora dós direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, critério último e substancial de diferenciação entre formas aceitáveis e não aceitáveis de estruturação do Estado?
É por assumir forma republicana que o regime indonésio será automaticamente branqueado e por revestir a forma monárquica que deveremos votar a Inglaterra ou a Espanha ao mais definitivo dos ostracismos? Quem salvou a democracia em Espanha: o republicano Terrero de Molina ou o monárquico João Carlos de Bourbon?

O Sr. Afonso Candal (PS): - Essa é de mau gosto!

O Orador: - É a chefia dinástica do Estado, característica essencial à forma monárquica de governação, pelo menos tal qual nos últimos séculos tem sido entendida, que se pretende colocar em causa? Que problema poderemos aí encontrar quando tantos parceiros nossos da União Europeia, democracias consolidadas de séculos, nele não vêem qualquer óbice? A quem pretendemos, Sr. Deputado António Reis, dar lições de democracia? Ao Reino Unido? À Bélgica? À Espanha? À Suécia? À Dinamarca?

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