Página 197
Quinta-feira, 31 de Outubro de 1996
I Série - Número 6
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 2 ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE OUTUBRO DE 1996
Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.ºs
232 a 234/VII. da interpelação n.º 6/VII, dos projectos de resolução n.01 33 e 34/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
O Sr. Presidente saudou a presença do Dr. Ramos-Horta, representante da Resistência Timorense, galardoado com o Prémio Novel da Paz juntamente com D. Ximenes Belo, Bispo de Díli, a quem também dirigiu saudações, bem como a Xanana Gusmão, que a Câmara sublinhou aplaudindo. O Sr. Presidente anunciou ainda a apresentação de uma petição, subscrita por várias associações de estudantes, com vista a que seja inscrita no Orçamento do Estado uma verba destinada à lura do povo de Timor Leste e reiterou que este órgão de soberania continuará a pugnar para que sela reconhecido àquele povo o direito à autodeterminação e à independência, o que também mereceu o aplauso da Assembleia.
Foram aprovados dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos; Liberdades e Garantias relativos à retoma de mandato e à substituição de Deputados do PS, do PSD e do CDS-PP.
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo PS, sobre a situação actual do consumo e do tráfico de drogas em Portugal, no qual intervieram, além do Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho) e da Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém), os Srs. Deputados José. Niza (PS), Pedro Passos Coelho (PSD), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), António Filipe (PCP), Agostinho Moleiro (PS), Gilberto Madaíl (PSD), Bernardino Soares (PCP). Bernardino Vasconcelos (PSD), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Carlos Encarnação (PSD).
Foi apreciado o relatório anual em matéria de segurança interna de 1995, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Alberto Costa), os Srs. Deputados Jorge Ferreira (CDS-PP), José Magalhães (PS), António Filipe (PCP), Marques Júnior (PS) e Carlos Encarnação e Guilherme Silva (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.
Página 198
198 I SÉRIE - NÚMERO 6
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiro de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de. Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Página 199
31 DE OUTUBRO DE 1996 199
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortagua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custodio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Augusto Torres Boucinha.
Carlos Manuel de Sá Correia.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e dás respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei
n.ºs 232/VII - Estabelece a igualdade de condições de financiamento a todas as freguesias abrangidas pelo regime de permanência dós respectivos eleitos (PCP), que baixa à 4 º Comissão; 233/VII - Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos (CDS-PP), que baixa à 1 º Comissão; 234/VII - Criação da freguesia de Tôr, no município de Loulé (PS e PSD), que baixa à 4.ª Comissão; interpelação n.º 6/VII - Sobre política de educação (CDS-PP); projectos de resolução
n.ºs 33/VII - Em defesa da olivicultura nacional (PCP); 34/VII - Carreiras e quadro de pessoal dos serviços da Assembleia da República (Presidente da AR).
Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: no dia 22/10/96, à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
Na reunião plenária de 23/10/96, ao Sr. Procurador-Geral da República, formulado pelo Sr. Deputado Ricardo Castanheira; à Secretaria de Estado da Inserção Social, formulado pelo Sr. Deputado Afonso Candal; ao Ministério do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados Pinto Simões e Luís Sá; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Miranda Relvas; aos Ministérios do Ambiente e da Economia, formulado pelo Sr. Deputado
Página 200
200 I SÉRIE - NÚMERO 6
Pacheco Pereira; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Rodeia Machado e Luís Sá; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados no dia 23/10/96: Gonçalo Almeida Velho, na Comissão Permanente de 19 de Setembro; Afonso Candal, na sessão de 2 de Outubro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Assembleia da República teve já oportunidade de aprovar por unanimidade um voto de congratulação pela atribuição do Prémio Novel da Paz a duas grandes personalidades de Timor Leste, o Dr. José Ramos-Horta e o Bispo de
Dili, D. Ximenes Belo. Temos hoje a alegria e a satisfação de ter entre nós uma dessas individualidades, o Dr. José Ramos-Horta.
Tive já ocasião de dizer-lhe, durante o almoço que lhe foi oferecido, com a presença de todos os líderes parlamentares e também da Comissão Eventual de Acompanhamento da Situação em Timor-Leste, que esta sua Casa é também a Casa do povo de Timor, porque se há hoje uma causa nacional que une todos os portugueses e toda a juventude de Portugal, todos os partidos políticos e órgãos de soberania, essa causa é, com certeza, a do povo de Timor Leste.
Assim, peço-vos uma saudação muito especial para o Dr. José Ramos-Horta.
Aplausos gerais, de pé.
A atribuição deste prémio deve-se não só ao reconhecimento de uma causa justa mas também ao mérito das personalidades e das individualidades a quem foi atribuído. O Dr. José Ramos-Horta, representante pessoal do comandante Xanana Gusmão, tem sido o porta-voz da Resistência, o rosto da Resistência Timorense e, correndo os quatro cantos do mundo, venceu muitas incompreensões, muitos muros de silêncio, muitos cercos. Conseguiu romper esses cercos e dar rosto e voz à Resistência Timorense.
D. Ximenes Belo é o líder espiritual dos timorenses, uma grande figura da Igreja, uma grande referência moral e espiritual para crentes e não crentes, para a Igreja de Timor, para toda a Igreja, para todo o mundo e, muito especialmente, para nós, portugueses. Através do Dr. José Ramos-Horta, peço também uma saudação da Assembleia da República para D. Ximenes Belo.
Aplausos gerais, de pé.
O prémio representa também o reconhecimento internacional de uma causa justa, que é a resistência do povo de Timor, a luta do povo de Timor pelos seus direitos e pelo primeiro de todos eles, o direito à autodeterminação, e o reconhecimento do sacrifício supremo dos seus mártires e daqueles que, na cadeia, representam o espírito livre e indomável do povo de Timor, a começar pelo comandante Xanana Gusmão. Peço ao seu representante pessoal para lhe transmitir as saudações da Assembleia da Republica e de todo o povo português.
Aplausos gerais, de pé.
Aproveito também a oportunidade para anunciar que me foi entregue, por representantes de várias associações de estudantes de todo o país, uma petição para que seja inscrita no Orçamento do Estado uma dotação para o povo de Timor. Evidentemente, não quero substituir-me aos partidos, aos Srs. Deputados ou aos grupos parlamentares, mas não tenho dúvidas de que essa é a vontade do povo português, da juventude de Portugal, não tenho dúvidas de que os diferentes grupos parlamentares, em consonância com outros órgãos de soberania, saberão encontrar uma solução adequada para que no próximo Orçamento do Estado conste uma verba destinada à luta do povo de Timor Leste.
Aplausos gerais.
Finalmente, tal como foi dito pelo Presidente Jorge Sampaio na recepção que ofereceu ao Dr. José Ramos-Horta, quero dizer também, em nome da Assembleia da República, que a Assembleia continuará fiel ao comando do artigo 293.º da Constituição e, em estreita solidariedade com os restantes órgãos de soberania, continuará a sua acção e o seu combate, nomeadamente através da Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor-Leste, para que seja reconhecido ao povo de Timor Leste o direito à autodeterminação e o direito à independência.
São esses os nossos votos. Sabemos por experiência própria que só é vencido quem desiste de lutar. O povo de Timor Leste demonstrou já que não conhece o significado da palavra «desistência» e nós não temos dúvidas de que um dia Timor será uma terra livre.
Aplausos gerais.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de dois relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre retoma de mandatos e substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o primeiro relatório e parecer refere-se à retoma de mandato do Sr. Deputado Paulo Portas, do CDS-PP, cessando Carlos Sá Correia, e à substituição dos Srs. Deputados Paulo Portas, do CDS-PP, com início em 22 de Outubro corrente, Rita Pestana, do PS, por um período não inferior a 45 dias, com início em 24 de Outubro corrente, Durão Barroso, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, com início em 4 de Novembro próximo, Alda Vieira, do CDS-PP, por um período não inferior a 45 dias, com início em 22 de Outubro corrente, e Rui Marques, do CDS-PP, com início em 35 de Outubro corrente, respectivamente pelos Srs. Deputados Alda Vieira, Arlindo Cipriano Oliveira, José Luís de Rezende Moreira da Silva, Carlos Sá Correia e Armelim Santos Amaral.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o segundo relatório e parecer refere-se à retoma de mandato do Sr. Deputado Silvino Sequeira, do PS, cessando Nelson Baltazar, e à substituição dos Sr. Deputado Silvino Sequeira, do PS, a partir do dia 25 de Outubro, pelo Sr. Deputado Nelson Baltazar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Página 201
31 DE OUTUBRO DE 1996 201
Srs. Deputados, vamos dar início ao debate de urgência, da iniciativa do PS, sobre a situação actual do consumo e do tráfico de drogas em Portugal.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de explicar quais as razões que motivaram o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a tomar esta iniciativa.
Como todos estão recordados, e o País, certamente, lembrar-se-á, o Governo considerou a questão da droga como prioritária, conhecida como o «inimigo público n.º 1» do Partido Socialista. Entretanto, decorreu um ano sobre a posse deste Governo, pelo que interessaria ao País e aos Deputados desta Câmara saber em que medida e até que ponto foi cumprido o Programa do Governo e as medidas nele preconizadas. Entendemos que o Programa do Governo, nesta matéria, ao fim de 12 meses - se é que se pode falar em 12 meses de governação -, está praticamente esgotado. Teremos de inventar novas formas para que o Governo cumpra, no que toca a esta questão da droga, aquilo que prometeu ao País, pois em matéria de iniciativas e medidas muito se fez, como vai ser demonstrado ao longo do debate.
Nesta matéria, o PS entende que a questão da droga é um problema de toda a sociedade portuguesa e, portanto, deve ser encarado enquanto tal. Entendemos que os portugueses, todos os portugueses, esperarão que o debate sobre esta matéria seja sereno, construtivo e positivo.
Dito isto, gostaria de, neste início do debate, identificar as questões mais importantes a abordar, sector a sector.
Apesar dos esforços desenvolvidos por todos os governos pois trata-se de um problema que se verifica em todos os países e não apenas em Portugal - e também pelas organizações internacionais especializadas na matéria, e Portugal não foge á regra, o consumo e o tráfico de drogas continuam a aumentar. Na verdade, não só continuam a aumentar o consumo tradicional e o tráfico tradicional das drogas conhecidas, como o haxixe, a heroína e a cocaína, como também surgiu uma nova frente nesta problemática questão que tem a ver com as drogas sintéticas, as chamadas designed drugs, que são de fácil produção e estão hoje na moda do consumo, sobretudo pelos jovens. É o caso de uma droga muito conhecida, muito referida pela comunicação social, o ecstasy, mas há muitas mais.
Trata-se, portanto, de uma situação relativamente nova e, a esse nível, os esforços dos governos nunca se esgotarão, porque, à medida que vão sendo resolvidos alguns problemas, novos problemas surgem.
Como a questão da droga é multidisciplinar, gostaria de, rapidamente, identificar sector a sector os problemas principais que, no entender do meu grupo parlamentar, merecem ser aqui abordados.
É evidente que, embora estejamos em fase de apreciação do Orçamento do Estado, o propósito deste debate não é o de antecipar a discussão do «orçamento da droga» mas, sim e sobretudo, o de fazer uma reflexão e uma avaliação sobre o que, na realidade, foi feito e não propriamente um discurso de promessas ou de boas intenções. O que vamos aqui analisar e constatar é que houve muito trabalho nos vários sectores, as coisas estão feitas, estão à vista de todos, e esta é a altura indicada para divulgá-las ao País.
Em matéria orçamental, gostaria apenas de citar um número em relação ao Orçamento do Estado para 1996, houve um acréscimo quantitativo de cerca de 25%, o que é significativo para um Orçamento feito nas condições em que o foi o actual.
Passo a fazer uma breve alusão aos vários sectores que interferem nesta matéria da droga.
Começando pela prevenção primária - e, sobretudo, pela que é feita nas escolas do País -, há medidas muito positivas em curso, algumas das quais já vinham de trás, como é o caso do Programa de Educação para a Saúde, mas, acima de tudo, notou-se um acréscimo de investimento em mais escolas relativamente ao que existia. Indo ao encontro das preocupações dos pais, dos jovens e das famílias portuguesas, sabemos já que a fiscalização do exterior das escolas vai ser reforçada por elementos da PSP e, para o interior das mesmas, elas próprias irão contratar vigilantes para observarem aquilo que se passa. Portanto, com estas duas medidas, entre outras, logicamente reforçar-se-á a segurança das escolas - e, sobretudo, a da nossa juventude - e melhorar-se-á o ambiente das mesmas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, para além de prevenir, há também que tratar e, então, dobramos a página para a área da saúde. Sabemos que, infelizmente, há dezenas de milhar de toxicodependentes a necessitar de serem tratados, para os quais havia falta de resposta terapêutica, e que neste momento já começa a existir em termos significativos, a nível quer de quantidade quer de qualidade.
O Governo cumpriu o que foi uma das duas promessas: a de termos centros de atendimento a toxicodependentes em todos os distritos do País. Efectivamente, isso aconteceu e aqueles que não foram abertos vão sê-lo até ao fim do ano. Portanto, pode dizer-se que todo o País, distrito a distrito, está a ser coberto, em termos de quantidade e de qualidade.
Uma outra dimensão do problema, preocupante ao longo dos últimos anos, é a questão das camas para comunidades terapêuticas. Os cálculos indicativos dão a média de uma cama por cada 10 000 habitantes, o que significa que, em Portugal, deveria haver 1000 camas em comunidades terapêuticas para tratamento de toxicodependentes.
Quando, não há muitos meses, aqui falámos sobre a disponibilidade de camas já licenciadas e autorizadas pelo Ministério da Saúde, falávamos de 400 camas. É uma situação que está semanalmente a evoluir, mas, neste momento, já podemos informar os Srs. Deputados que, na área privada, já existem mais de 700 camas disponíveis.
E importa aqui dizer que não existe se essa disponibilidade de oferta mas, sobretudo, o financiamento do Governo e do Ministério da Saúde.
Em 1991, isto é, praticamente há seis anos, o governo de então subsidiava estas comunidades ao preço de 72 contos/mês por cada toxicodependente. Esta situação manteve-se até ao ano passado, ou seja, durante cinco anos não houve qualquer aumento ou actualização deste valor.
Um despacho conjunto, relativamente recente, do actual Governo aumentou de 72 para 120 contos/mês o valor do subsidio. Isto significa que, com 150 contos/mês, que é o valor calculado, porque os outros 30% serão suportados ou pela segurança social ou pelas famílias, já é possível trabalhar. Significa, portanto, que, para além da rede pública dos CAT e do SPTT, existe, paralelamente, uma
Página 202
202 I SÉRIE - NÚMERO 6
rede já autorizada, licenciada e avaliada, com uma oferta que se aproxima do limite das tais 1000 camas.
Um outro. aspecto importante que tem a ver com a toxicodependência é o da desintoxicação. É um processo terapêutico mais rápido, mas igualmente necessário, em relação ao qual se apontava como limite mínimo a necessidade da existência de 100 camas para todo o País, isto é, uma cama por cada 100 000 toxicodependentes.
Neste momento, os números também apontam praticamente para um valor limite, existindo, quer na rede pública quer na rede privada, uma soma de 83 camas, 39 das quais públicas e 44 privadas. Estamos perto, portanto, do tal número de 100 camas.
Outra medida importante, nunca posta em prática, foi a comparticipação nos antagonistas da heroína, o Naltrexone e outras substâncias, que vão ser comparticipados em 40% e, até agora, eram-no em zero.
Rapidamente, gostaria de passar para o outro lado, o da oferta, o da repressão do tráfico, em relação ao qual tenho duas informações a dar e duas questões a colocar, no âmbito da justiça e da administração interna. No âmbito da justiça, sublinho a importância da situação prisional no que tem a ver com a toxicodependência e também com os indicadores altíssimos de SIDA, de hepatite e de tuberculose. É um problema do conhecimento de todos e difícil de encarar e solucionar, pelo que estimulamos o Governo a, nesta matéria, ir até onde for possível, embora saibamos que, neste momento, estão a ser tomadas medidas nesse campo.
Finalmente, no âmbito da administração interna, esta questão tem a ver com a PSP e com a GNR, tem a ver, fundamentalmente, com o controle e a fiscalização das nossas fronteiras marítimas, que, como sabem, são fronteiras da União Europeia, pelo que Portugal tem responsabilidades nessa matéria. Por outro lado, tem a ver logicamente com a questão do tráfico interno, com a medida, sucessivamente anunciada e posta em prática, de aumentar o policiamento nas ruas, inclusivamente através de novos transportes, que foram e estão a ser distribuídos. Por último, há o envolvimento necessário da Força Aérea e da Marinha em relação a estas matérias.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, neste momento fico-me por aqui. Ao longo do debate, teremos oportunidade de esclarecer alguns aspectos que eventualmente disso necessitem.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A realização deste debate é uma excelente oportunidade que o Governo tem, hoje, ao fim destes meses de actividade, de poder falar sobre este tema tão importante para a sociedade portuguesa. A droga continua a ser o inimigo público n.º 1 deste Governo e tudo estamos a fazer para que ela seja o inimigo público n.º 1 de toda a sociedade, deste Governo, do partido que apoia este Governo, de todos os partidos representados na Assembleia da República e de todos os portugueses. É esse o objectivo central da nossa actividade.
Aplausos do PS.
Poderíamos discutir - mas isso seria motivo de outro debate - o porquê do aumento dos toxicodependentes, em
todos estes anos, em Portugal, e as razões que estão na origem da sua existência, que têm a ver com a exclusão, com a crise de valores e a crise económica e com o desemprego. Mas este é também um problema mais global, que atravessa, hoje, todos os países e todas as classes sociais. Portanto, temos de reconhecer, com frontalidade e honestidade, que é um problema de toda a sociedade, que deve ser encarado muito de frente.
Porém, face às razões da sua existência, poderíamos dizer: como não é possível resolver todos esses problemas, nem a curto nem a médio prazo, o melhor era esperar que a crise passasse, porque estes problemas também se resolveriam a seguir.
Não é esse o nosso ponto de vista. Penso que não pode ser esse o ponto de vista dos portugueses. Ninguém pode nem deve cruzar os braços no sentido de minorar os efeitos causados pela toxicodependência e pela droga na nossa sociedade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, temos como objectivo central em toda a nossa actividade - e, ao fim deste ano, podemos afirmá-lo e reafirmá-lo - o envolvimento de toda a sociedade. Mais, o Governo tudo fará, como tudo fez, para que esta não seja uma matéria de divisão entre os portugueses mas de união, em todo o País, no combate a esta autêntica chaga social que hoje nos aflige.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Srs. Deputados, gostava de vos dar conta, de forma serena e séria, daquilo que o Governo fez, neste último ano, relativamente a esta matéria.
Realizámos um Conselho de Ministros, em Maio, exclusivamente sobre esta matéria, onde foi aprovado um vasto conjunto de iniciativas, que nos comprometemos a executar até ao fim do ano, e do qual gostaria de vos dar hoje conta, como é minha obrigação, em nome do Governo e com a presença aqui da Sr.ª Ministra da Saúde e do Sr. Secretário de Estado da Justiça, como responsáveis de duas áreas também importantíssimas nesta matéria. Gostaria de dar-vos conta, repito, do que nos comprometemos a fazer, do que já fizemos, da calendarização daquilo que nos propomos fazer até ao fim deste ano e da perspectiva do ano seguinte.
Em primeiro lugar, abordarei questões que têm a ver com a cobertura do problema concreto das pessoas que são já toxicodependentes ou daquelas que necessitam de ajuda no campo quer do tratamento quer dos equipamentos.
Para começar, havia - e definimos isso como uma regra fundamental - que cobrir todos os distritos do continente com centros de atendimento a toxicodependentes, os CAT. No início deste ano, faltavam sete para cobrir o País - o de Évora já está em funcionamento; no próximo dia
5 entrarão em funcionamento os de Portimão e de Beja; o de Portalegre entrará em funcionamento até ao fim do mês de Novembro, encontrando-se praticamente pronto; os de Vila Real e Bragança entrarão em funcionamento no mês de Dezembro, havendo uma terceira unidade, em Xabregas, já em obras, para funcionar em Lisboa, porque, como se sabe, era o local com mais consultas em atraso no País.
Este objectivo está cumprido e todo o País ficará coberto com equipamentos dotados também do necessário pessoal para dar resposta a esta iniciativa. Para
conse-
Página 203
31 DE OUTUBRO DE 1996 203
guir concretizar este objectivo também foi preciso resolver, a nível do SPTT, Serviço de Prevenção e Tratamento de Toxicodependentes, dois problemas antigos, que tiveram finalmente solução: o descongelamento de 352 vagas e a aprovação dos respectivos quadros, para que se criassem condições de estabilidade nestas novas unidades e nas antigas, de modo a poderem funcionar com os meios humanos e técnicos necessários ao seu cabal desempenho.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, uma questão considerada fundamental era o aumento do apoio financeiro do Estado às organizações não-governamentais sem fins lucrativos para tratamento e reinserção social dos toxicodependentes. Havia um despacho, por alterar desde 1991, que previa a comparticipação do Estado em 72 contos/mês por indivíduo em tratamento. Isto fazia com que houvesse um desajustamento entre as necessidades das pessoas que careciam de tratamento e a realidade de mercado em termos daquilo que era dado a essas pessoas - portanto, fazia com que elas, no fundo, não pudessem ter capacidade para ser tratadas. Pois bem, o Governo foi ao encontro dessa situação e aumentou este subsídio para 120 contos/mês, que é o valor necessário para o tratamento das pessoas. Passou-se, pois, de 72 contos/mês para 120 contos/mês, através de um despacho que veio alterar um outro, o qual não era mexido desde 1991, indo assim ao encontro de uma das principais preocupações das pessoas com estes problemas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Até ao momento, gastou-se, com essa medida, uma verba de cerca de meio milhão de contos, mas foi um dinheiro bem gasto em situações desta natureza.
Em terceiro lugar, há um compromisso, no Programa do Governo, de passar para 100 camas públicas, ou com contratos com o sector público, para desintoxicação de toxicodependentes. Posso dizer-vos que, no fim deste ano, vamos ultrapassar este número, estando previsto haver 117 camas. Além das 44 já existentes, vai ser inaugurada uma unidade no próximo dia 5 em Olhão e está previsto um conjunto de outras realizações, como por exemplo no Alfeite, nomeadamente na UTITA, e um conjunto de acordos feitos com clínicas. Assim, chegaremos ao fim de 1996 com 117 camas públicas, ultrapassando aquilo a que nos tínhamos comprometido nesta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aproveito também para informar que, relativamente às comunidades privadas, mas com licenciamentos feitos pelo Estado, a situação que encontrámos, em final de 1995, difere da actual: estavam autorizadas 480 camas e estão autorizadas, neste momento, 709, ou seja, mais 229; estavam pedidas mais 633 e estão pedidas mais 1045, isto é, mais 412. Também aqui o processo de licenciamento, indo ao encontro das necessidades das pessoas e dos seus problemas, mas com a qualidade e a fiscalização que tem de existir nestas unidades, está a ser conseguido.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas aqui gostaria de dizer-vos, com seriedade, que também estamos preocupados e pretendemos, no ano de 1997, ir ao encontro das preocupações manifestadas por todas as pessoas que julgam ter de haver uma fiscalização muito superior nas comunidades que já estão licenciadas, umas, e provisoriamente, outras, porque também consideramos que a situação é preocupante e daí termos de ir mais longe nesta matéria. Por isso, o ano de 1997 vai ter essa característica de «limpar» aquilo que tem de ser «limpo» nesta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto aos programas-quadro dirigidos a grupos de risco e zonas geográficas degradadas, há medidas em curso, com situações já concretizadas, nomeadamente em freguesias de risco. Há quatro distritos centrais com problemas nesta matéria, a saber, Porto, Lisboa, Setúbal e Faro. A partir do dia 5, Faro fica dotado das unidades que uma região deve ter relacionadas com esta matéria, ou seja, de um centro de atendimento a toxicodependentes, de uma unidade de desintoxicação e de uma comunidade terapêutica. Estas vão ser as três situações encontradas em cooperação com as autarquias, com o Projecto Vida e com as misericórdias. Em conjunto, consegue-se fazer isso.
Está já a pôr-se em prática um programa de intervenção na freguesia mais afectada
do concelho de Setúbal, que é a freguesia da Bela Vista, onde está a ser feito um trabalho com o apoio da Câmara e da Caritas Diocesana de Setúbal, nos termos de um protocolo celebrado.
Vai-se intervir no Casal Ventoso, que é uma chaga social gravíssima que existe na região de Lisboa, em relação à qual, até agora, toda a gente tinha andado a assobiar para o ar, fazendo de conta que não existia. O Governo, em conjunto com a Câmara, com a Misericórdia, com o Instituto de Emprego e Formação Profissional e com outras estruturas, vai conseguir fazer ali aquilo que já deveria ter sido feito há muitos anos.
Aplausos do PS.
Vai-se intervir, em moldes idênticos, no Porto, em cooperação com a Câmara, com um trabalho que tem o título de Contrato Cidade, que dentro de um mês será concretizado. O mesmo acontecerá com câmaras como Oeiras, Amadora, Santo Tirso e com muitas autarquias deste país que estão a trabalhar connosco nesta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Também já se fez, em concreto, aquilo a que nos comprometemos nos programas de apoio a reclusos toxicodependentes. No Estabelecimento Prisional de Lisboa, a 2.º fase da Ala G - área livre de droga - já está em funcionamento e, em conjunto com o Projecto Vida, foi também assinado um protocolo de cooperação para o pavilhão prisional de Santa Cruz do Bispo. Portanto, no que se refere a esta matéria, comprometemo-nos com duas alas livres e isso foi cumprido.
Conseguiu-se mobilizar a juventude portuguesa. Durante o verão, foi possível pôr em programas globais cerca de 300 000 jovens em todo o País, o que faz com que pessoas que tenham uma vida activa de solidariedade em relação aos problemas de terceiros se consigam libertar da tentação que pode existir relativamente à questão da toxicodependência.
Página 204
204 I SÉRIE - NÚMERO 6
Dentro de 15 dias a três semanas, a Linha Vida vai, finalmente, ser gratuita para todas as pessoas que a queiram utilizar. Ela já existia, mas, até agora, quem queria falar para lá tinha de pagar os seus telefonemas, o que fazia com que fosse pouco utilizada.
Criaram-se condições de melhoria de segurança nas escolas portuguesas, através do aproveitamento de funcionários excedentes da Administração Pública. Neste momento já estão colocados em escolas-risco, escolhidas em Lisboa, em Setúbal e em Faro - mas queremos alargar ao resto do País -, 71 funcionários vindos do quadro de excedentes para ajudarem na melhoria da vigilância e da segurança dentro das escolas.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - O Ministério da Educação, em conjunto com o Ministério da Administração Interna, com o Programa Escola Segura, e através da aquisição de viaturas afectas aos governos civis, já pôs em funcionamento 12 viaturas em Lisboa, 7 em Faro e outras espalhadas por todo o País, para melhorar as condições de segurança nessas escolas.
Por outro lado, o Ministério da Saúde resolveu - e muito bem! - conceder uma comparticipação na aquisição de medicamentos antagonistas opiáceos, que não existia no passado, comparticipando com 40% na aquisição do novo medicamento que é utilizado pelos toxicodependentes.
Foram estas as principais medidas que tomámos e congratulamo-nos por terem sido cumpridos os compromissos assumidos.
Devo ainda dizer que estamos a conseguir mobilizar a sociedade portuguesa. Dentro de poucos dias, vamos assinar protocolos de cooperação com a Associação Industrial Portuguesa, com a Associação dos Jovens Empresários Portugueses e com a Associação dos Jovens Agricultores, no sentido de encontrar forma de as pessoas em recuperação da toxicodependência poderem ter aí o seu papel, isto é, poderem ter uma vida activa mais digna.
Mas vamos ainda fazer mais coisas: vai ser emitido pelos CTT um selo comemorativo desta iniciativa; o INH e o IGAPHE vão passar a ter, nas suas instalações, locais de informação sobre esta matéria; e, em conjunto com os portos de Lisboa e de Setúbal e com a Expo 98, vamos também criar um conjunto de actividades para permitir que as pessoas tenham uma vida mais livre.
Na área do combate ao tráfico de droga, como sabem, já foram aprovadas as penas para traficantes e a lei do agente infiltrado na rede de tráfico de droga e foi tomada uma decisão extremamente importante que foi a assinatura de um protocolo para que a intervenção e a coordenação conjunta das forças de segurança sejam uma realidade.
Quero ainda informar que cheguei há pouco da Cimeira Luso-Espanhola, na qual foi definida a necessidade de, em relação a esta matéria, serem encontradas soluções de cooperação na zona da fronteira entre Portugal e a Espanha, a exemplo do que já acontece entre o Algarve e a Andaluzia, e já foi marcada para Dezembro uma reunião da Comissão Mista Luso-Espanhola contra a Droga, a realizar em Madrid, onde pensamos vir a alargar a todo
o País esta cooperação, que é fundamental nesta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem?
O Orador: - Já estamos também a trabalhar naquilo a que nos vamos comprometer para o ano que vem. Queremos ter um programa tão ousado como o que tivemos este ano e também queremos vir aqui, no fim do ano, dizer que estamos a cumprir com rigor aquilo a que nos comprometemos para com os portugueses. Já ontem estivemos a ver o Orçamento do Estado no que diz respeito a essa matéria.
Mas precisamos de envolver toda a sociedade portuguesa nesta matéria e, nesse sentido, queremos fazer, na segunda semana de Dezembro, um dia inteiro de reflexão em torno da problemática da toxicodependência em Portugal a todos os níveis. Por isso apelava para que todos os partidos, todos os presidentes dos grupos parlamentares e quem entender se disponham a, do ponto de vista da comunicação, colaborar nesse grande dia de reflexão, para que este problema seja efectivamente de todos os portugueses, de Portugal, e para que as pessoas que são afectadas por este problema e todos aqueles que o vivem sintam que todos nós estamos com eles neste combate que tem de ser feito.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Pedro Passos Coelho, Maria José Nogueira Pinto, António Filipe, Agostinho Moleiro e Gilberto Madaíl.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, não posso deixar de concordar mais consigo quando diz que o combate ao tráfico de droga e a luta contra a toxicodependência tem de ser uma luta de todo o País e de toda a sociedade portuguesa. De resto, tem sido esse o tom que, de há vários anos a esta parte, vem sendo empregue pelo essencial dos agentes públicos e políticos nesta matéria.
Também não queria deixar de aproveitar a oportunidade, num debate que me pareceu um tanto sem substância por parte do partido que o agendou - sem desprimor para o Sr. Deputado José Niza -, para me congratular perante o Governo pelo facto de haver aqui esta linha de continuidade, do ponto de vista público, do esforço que tem sido feito em termos de prevenção, de reforço do Projecto Vida, que é, de facto, algo com que nos congratulamos.
Mas queria ainda aproveitar para dizer o seguinte ao Sr. Ministro: como sabe, Portugal é uma das principais portas de entrada de droga para a Europa e por isso - sem querer dizer que será um esforço inglório aquele que faremos internamente sem cuidar dos problemas de fronteira, porque inglório nunca será, será, sim, muito mais difícil fazer o combate à droga dentro do território se mantivermos debilidades nas portas de entrada - é uma questão que nos deve, de facto, motivar e empenhar a todos.
Peço, portanto, ao Sr. Ministro que nos ajude, nomeadamente no contacto com o Partido Socialista, para que a própria Assembleia da República possa apreciar mais rapidamente algumas iniciativas legislativas que o meu partido apresentou, que visam, entre outras coisas, a criação de brigadas antidroga, para, justamente, colmatar esta grande falha que é a de não conseguirmos, nem em meios nem em coordenação policial, resolver o problema da porta de
Página 205
31 DE OUTUBRO DE 1996 205
entrada, isto é, da nossa costa marítima, porque o PSD vem insistindo para que a Assembleia da República se possa pronunciar urgentemente sobre esta matéria.
Isso, sim, Sr. Deputado José Niza, teria urgência, na medida em que, ainda há algum tempo atrás, aprovámos aqui alterações importantes, como o Sr. Ministro referiu, relativamente ao regime da liberdade condicional e a outras matérias associadas, que são, de facto, importantes.
O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, pois esgotou o seu tempo.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Tão importante como isso era que a Assembleia da República pudesse tomar uma decisão legislativa nesta matéria.
Já agora convidava o Sr. Ministro a pronunciar-se sobre se acha ou não importante que possamos apresentar. uma solução global que vise resolver o problema da entrada de droga em Portugal pela nossa fronteira marítima. Convidava-o também a pronunciar-se, sumariamente, sobre a própria iniciativa que gostaríamos de ver aqui agendada, mas não temos tido eco no Partido Socialista para o fazer.
O Sr. Presidente: - Tenho informação de que o Sr. Ministro deseja responder em conjunto. Por isso, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, gostaria de, frontalmente, lhe fazer uma pergunta, porque penso que ela é prévia e deve enquadrar todo este debate e qualquer proposta política que o Governo queira fazer ao País e a esta Câmara, no sentido do envolvimento de todos. É o Governo a favor ou não da despenalização da venda de droga?
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Queremos saber!
A Oradora: - Esta questão tem sido colocada amiúde na sociedade portuguesa e tem tido muitas vezes como porta-vozes pessoas do Partido Socialista e até, inclusivamente, Deputados. Penso que não pode haver qualquer programa nacional que possa envolver os partidos e a comunidade se, antes de mais, não houver este esclarecimento, que, a meu ver, seria oportuno fazer neste momento.
Mas, independentemente disso, queria-lhe colocar algumas questões.
Penso que quem visita todos estes espaços destinados à desintoxicação e cura dos toxicodependentes sabe que o maior receio que eles têm é o regresso de novo ao mundo exterior, ou seja, o problema da reinserção, onde, de facto, não se têm conseguido os resultados que seriam necessários. Desde logo, como é que um toxicodependente pode estar estimulado a recuperar-se se sabe que muitas vezes essa recuperação significa uma entrada mais dura no mundo real? O que é que se vai fazer concretamente em relação à reinserção, nomeadamente no que diz respeito ao mercado de trabalho?
Gostaria também de lhe perguntar se há algum projecto de articulação entre o PER e a questão da droga nos
bairros degradados, isto é, se o PER vai ter em consideração a necessidade não só da habitação mas também de exterminar, digamos assim, locais que se tornaram nichos de mercado de droga.
Gostaria ainda de lhe perguntar o que é que vai fazer em relação à fiscalização da oferta, quer pública, quer privada, no que diz respeito aos centros de recuperação. Como sabe, há modalidades terapêuticas muito diferentes - não sou médica, mas tenho também ouvido falar de modalidades muito diferentes -, por isso penso que deveria haver aqui uma fiscalização, mormente da parte do Ministério da Saúde. Neste momento, a oferta privada é superior à pública. Não penso que isso seja grave, mas é preciso uma fiscalização muito concreta. Onde está ela? Com é que ela se faz? Por que é que o Sr. Ministro fala em 125 000$/mês? Este número parte de quê? Como é que desagrega estes custos?
Finalmente, gostava de saber o que é que o serviço público de televisão vai fazer nesta matéria. Vai ou não ser chamado e como? Penso que há uma educação que se faz logo desde a primeira infância e que poderia ser feita certamente melhor através do audiovisual e da televisão.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!
A Oradora: - Por outro lado, gostaria de perguntar à Sr.ª Ministra da Saúde - não sei se isso é possível regimentalmente - em quantos hospitais os serviços de obstetrícia têm, neste momento, abertas consultas e serviços de internamento pré-natal para grávidas toxicodependentes.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, quando ouvi a intervenção com que o Sr. Deputado José Niza, do Partido Socialista, abriu este debate de urgência sobre a toxicodependência, fiquei um tanto surpreendido, porque julguei que o mesmo havia sido pedido pela preocupação da gravidade da situação com que o País se confronta nesta matéria, quando, afinal, foi para constatarmos que o Programa do Governo estava praticamente cumprido ao fim de um ano.
Então, quase valia a pena perguntar o que é que o Governo vai ficar a fazer nos próximos três anos da legislatura! Mas nós não partilhamos dessa convicção.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E o Sr. Ministro também não!
O Orador: - Se confrontarmos o Programa do Governo com aquilo que tem sido feito nestes 12 meses, verificamos que há muita coisa que, de facto, está por fazer e por cumprir e, efectivamente, todos concordarão que a situação não está alterada para melhor, basta ver entrevistas recentes de pessoas muito responsáveis pela intervenção nesta matéria. Quer a nível do tratamento e da prevenção, quer a nível da repressão, a situação continua a ser muito grave e estamos muito longe de chegar a um ponto em que se possa falar numa viragem para melhor quanto à situação da toxicodependência.
Ao fim destes 12 meses, somos obrigados a verificar que, de facto, o balanço prático da actividade governativa é escasso e está muito aquém das expectativas que foram
Página 206
206 I SÉRIE - NÚMERO 6
criadas por quem anunciou e continua a dizer que a droga é o seu inimigo público número um.
Se verificarmos, o diploma relativo ao Projecto Vida saído este mês foi anunciado em Fevereiro. Aliás, o Governo, ainda mal tinha tomado posse, disse logo, aquando da discussão do Programa do Governo, que um dos seus objectivos era reformular o Projecto Vida, e, para isso, iria determinar a elaboração de um novo diploma que o enquadrasse devidamente. Isso foi anunciado em Fevereiro, em reunião de Conselho de Ministros, voltou a ser anunciado em Maio, mas só em Outubro é que o diploma saiu. Portanto, saiu há muito pouco tempo. E quando nós o analisamos, verificamos que esse diploma não é mais nem menos do que o organograma do Projecto Vida. Efectivamente, não conseguimos encontrar nele as medidas concretas que o Governo se propõe levar a cabo, mas ficamos a saber qual é a composição da Comissão Interministerial - nove ministros -, qual é a composição da Comissão Coordenadora Nacional - outra vez nove ministros -, quais são as personalidades que integram o Conselho Nacional - mais 41 personalidades -, e qual é a estrutura distrital. Portanto, ficamos com um belíssimo organograma, que podemos emoldurar e pôr na parede, mas efectivamente ficamos sem saber quais são os objectivos e as acções concretas que o Governo se propõe levar a cabo.
Efectivamente, Sr. Ministro, não basta vir aqui dizer que a droga é um problema que a todos preocupa, porque todos sabemos isso, e não precisamos sequer de vir com uma postura paternalista relativamente à chamada sociedade civil,...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - E se, em vez de paternalista, fosse fraternal ista?!
O Orador: - ... às IPSS, aos partidos políticos ou a outras entidades. Sabemos que existe uma mobilização muito grande da sociedade portuguesa relativamente aos problemas da droga. Sabemos do grande interesse que desperta na sociedade portuguesa discutir e intervir relativamente a esta matéria.
Aquilo que se exige do Governo...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois esgotou o tempo regimental de que dispunha.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O que se exige do Governo não é que ele seja uma simples agência financiadora ou, digamos, o chefe da orquestra, mas que intervenha de facto.
Para terminar, Sr. Presidente, no que toca ao tratamento da toxicodependência, não basta o Governo dizer que vai aumentar a comparticipação para que as pessoas se tratem, porque o tratamento não passa apenas por internamentos, não passa só por cuidados terapêuticos, embora passe também. O tratamento passa efectivamente - e o Programa do Governo aponta para a gratuitidade do tratamento - pela criação de...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu não quero abrir excepções. Faça favor de terminar.
O Orador: - E aí tenho de dizer, Sr. Ministro, que o balanço que o Governo tem para apresentar na Mesa é muito escasso. De facto, importa que o Governo crie uma rede que cubra, efectivamente, com serviço público, todo o território nacional, porque s6 assim será possível responder às necessidades que as pessoas sentem nesta matéria e eliminar as terríveis listas de espera que ainda se continuam a verificar.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Moleiro.
O Sr. Agostinho Moleiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, em primeiro lugar, quero congratular-me com a maneira construtiva e séria como está a ser iniciado este debate sobre a toxicodependência. Trata-se de um problema nacional, de um problema de todos, e por isso tem de envolver-nos a todos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, quero salientar a criação dos novos CAT, dispersos por todo o país, inclusivamente nos distritos periféricos. E permitam-me que aqui faça uma referência muito especial ao CAT de Beja que vai ser aberto no próximo dia 5 de Novembro. De facto, também os toxicodependentes da província, do interior, precisam da mesma atenção que os das zonas urbanas.
Aplausos do PS.
O problema da toxicodependência não é mais exclusivamente um problema urbano, é, sobretudo, um problema nacional, como acabei de salientar, e aí é preciso ter atenção aos problemas das zonas raianas. Por isso também me congratulo com a posição anunciada há pouco pelo Sr. Ministro em relação à Cimeira Ibérica.
Em terceiro lugar, quero referir o papel importante desempenhado pelas autarquias na prevenção e no investimento em novos CAT, de maneira a alargar a rede a todo ó país.
Por último, gostaria de colocar uma questão ao Sr. Ministro sobre um ponto já referido pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, que é o problema das grávidas toxicodependentes e das mães com recém-nascidos, também elas toxicodependentes. Este é um problema sério, que necessita de cuidados especiais, cuidados não só de saúde mas também de acompanhamento e apoio. Assim, pergunto: o que é que está previsto em relação à criação dessas pequenas unidades junto dos nossos serviços de obstetrícia e maternidade?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madaíl.
O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, gostaria de colocar a V.Ex.ª
uma questão muito concreta, depois das considerações que fez e do programa que apresentou, relativamente a esse fenómeno que nos deve preocupar a todos nós, que tem sido preocupação de todos nós, com iniciativas que já tinham sido tomadas pelos anteriores governos e que estão agora a ser prosseguidas por este Governo.
Sr. Ministro, a questão muito concreta que quero colocar ao Governo baseia-se naquilo que é a área da prevenção à toxicodependência. Ouvi aqui falar das medidas que
Página 207
31 DE OUTUBRO DE 1996 207
o Governo vai tomar para o tratamento e apoio aos toxicodependentes e não ouvi ninguém referir uma situação que me parece importante - e gostaria de dizer ao Sr. Ministro que não estou aqui a falar como delegado ou representante do futebol, mas do desporto em si -, que é a atracção que o desporto provoca em todo o país e o entusiasmo que provoca, nas suas diferentes disciplinas, ao nível da nossa juventude.
Sendo assim, gostaria de saber, Sr. Ministro, se o Governo entende reforçar o apoio a todas as federações desportivas e os investimentos nas infra-estruturas necessárias para que, ao nível do nosso país, o desporto possa ser também um fortíssimo instrumento na área da prevenção primária da toxicodependência, nomeadamente com a celebração de protocolos com as federações desportivas que prevejam acções concretas e quantificadas em determinadas áreas e, muito particularmente - e isto não se pode esquecer, Sr. Ministro, pois conhece o pais como todos nós -, ao nível das nossas freguesias, dos milhares de clubes que existem vocacionados para diferentes modalidades, tendo em conta o esforço que diariamente é feito pelos seus dirigentes, o esforço financeiro e os sacrifícios que fazem, para poderem ter os seus jovens ocupados na prática de algo salutar, que é o desporto.
Portanto, a minha pergunta é no sentido de saber se este Governo prevê, de forma clara ou não, vir a utilizar o desporto, a apoiar o desporto, também como uma das armas para o combate contra a droga e a toxicodependência.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar; tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, antes de responder individualmente às questões que me foram colocadas, começo por dizer que, no que toca à questão que vários Srs. Deputados aqui levantaram, a de saber se estávamos ou não a ir ao encontro daquilo que era preciso, se isto vinha ou não de trás, este é exactamente o tipo de questões que, em meu entender, não deve ser objecto de um debate com a seriedade que este merece. Eu não sei se isto é continuidade ou não, o que sei é que os portugueses querem que isto se faça, as pessoas que têm os problemas querem que isto se faça. Os portugueses estão de acordo com isto, nós fazemos.
Aplausos do PS.
Incomoda-me pouco saber se já se estava afazer antes... Se assim era até, é bom! Temos de perder a ideia de que tudo o que os outros fizeram é mau e de que tudo
o que fazemos, como algumas pessoas pensam, pode ser mau, menos bom ou assim-assim.
Sobre esta matéria é, pois, exactamente isto que eu penso.
Passo agora a responder às questões colocadas.
Quanto ao facto de Portugal ser a porta de entrada de droga, é verdade. E é por ser verdade que se está a tentar encontrar meios mais sofisticados para fazer frente ao problema, com, nomeadamente, lanchas. Segundo estou informado pelo Ministro da Administração Interna, vai haver no ano de 1997 à volta de 700 000 contos para esta matéria, mas também na Polícia Judiciária foram adquiridos sistemas de detecção e perseguição via satélite para navios e viaturas, deforma aficar melhor apetrechada no combate a este tipo de situações.
É evidente que isto só por si não resolve o problema, é preciso mais. O problema existe e é preciso encontrar mais meios para o combater. E uma das questões que na Cimeira Luso-Espanhola está a ser tratada, na área de cooperação entre Portugal e a Espanha, é a da regulamentação relativamente à passagem de droga em alto mar e como pode ser feita essa cooperação entre os dois países.
A Polícia Judiciária já dispõe de um sistema de comunicações próprio e de uma unidade de recolha e tratamento de informação a nível nacional para também colaborar nesta matéria. A GNR dispõe de equipamento fixo de detecção na fronteira marítima continental e de 60 equipas cinotécnicas especializadas em detenção de drogas. A PSP dispõe de um sistema de comunicações próprio e de 10 equipas cinotécnicas especializadas na detecção de drogas. Há alguns meios, é preciso reforçá-los, e é isso que o Governo quer que seja feito.
A Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto perguntou se o Governo era favorável ou não à despenalização da venda de droga. Quanto a isto, eu também poderia tomar a posição de dizer que este é um tema para um grande debate que tem de se fazer, como é óbvio.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas teria de ser feito antes deste, Sr. Ministro!
O Orador: - Mas vou dizer já qual é a minha posição. Às vezes, tenho algumas causas que me dão algum desgaste porque digo sempre o que penso, e, às vezes, como não penso aquilo que as outras pessoas querem que eu pense, tenho alguns problemas. É evidente que nesta matéria, do ponto de vista teórico, posso até ter uma posição diferente, mas, em Portugal, sou claramente contra a despenalização das drogas...
Aplausos de alguns Deputados do PS e do Deputado do CDS-PP Manuel Monteiro.
... porque não há condições objectivas para ter outra posição. E é esta a posição do Governo nesta matéria.
Quanto à reinserção no mercado do trabalho, considero que este é o maior problema da toxicodependência. Estamos a trabalhar em muitas áreas, mas esta constitui um grande problema. Juntamente com o Instituto do Emprego e Formação Profissional, estamos sempre a procurar saída profissional para todos aqueles que saiam das comunidades terapêuticas, mas reconheço que muito mais há a fazer.
Quando falou no PER disse, e disse muito bem, que o problema da droga nos bairros degradados é enorme, e por isso é que todas as políticas de realojamento têm de ter o acompanhamento social enorme, para que não haja ghettos criados nesses bairros. Há concelhos, que conheço bem, onde isso já está a ser feito, nomeadamente o de Oeiras. Conheço bem este concelho porque vivo lá, e sei que isso já está a ser feito há muito tempo. Mas há outros concelhos da Área Metropolitana de Lisboa onde também se está a fazer esse trabalho. É por isso que também pretendemos que em unidades do INH, do IGAPHE, inseridas no PER, haja sempre pequenos centros comunitários de informação que possibilitem que, nomeadamente, pessoas do Projecto Vida e de instituições possam participar neste trabalho.
No que toca à fiscalização da oferta relativamente às comunidades terapêuticas, como eu já disse, o ano de 1997 vai ser de grande combate a esta situação e vai mostrar
Página 208
208 I SÉRIE - NÚMERO 6
claramente aquilo que vai podre nesse reino. E muito vai podre nesse reino!
Em relação ao serviço público de televisão temos de ter um grande empenhamento porque se há coisa que a televisão deve tratar, em termos de serviço público, é exactamente problemas como este, e vai ter de o fazer porque é isso que está previsto no contrato de concessão...
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o Governo esgotou o tempo de que dispunha. A Mesa, por consenso, concedeu-lhe mais 2 minutos, mas já os ultrapassou e não pode conceder-lhe mais tempo.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
No que se refere às consultas em clínicas de obstetrícia, peço à Sr.ª Ministra da Saúde para, no fim, responder a essa matéria.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado António Filipe, devo dizer que sou o primeiro a reafirmar aqui que estou insatisfeito com tudo aquilo que foi feito até ao momento. Nada das coisas que o Governo fez até agora tornaram menos grave o problema da toxicodependência em Portugal. Tenhamos seriedade a discutir esta questão.
Porém, uma vez na vida, Sr. Deputado, não tenha o mínimo problema em dizer que algo está a ser mais ou menos feito. Não tenha problema porque ninguém o questiona sobre isso. Os portugueses sentem isso. Não tenha problemas sobre essa matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço desculpa, mas tem de terminar, pois já ultrapassou em 3 minutos o seu tempo. Beneficiou da benevolência da Mesa, mas tem de terminar, a menos que algum grupo parlamentar lhe conceda mais tempo.
O Orador: - Peço desculpa, Srs. Deputados, mas não posso dizer mais.
Sr. Presidente, só para terminar, se me permitisse, em relação ao desporto, gostaria de dizer...
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, dispõe de mais 3 minutos cedidos pelo PS.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Diz o Sr. Deputado António Filipe que o Governo tem de intervir mais. O que o Governo tem de fazer é criar condições para que os portugueses tenham acesso àquilo que precisam para tratar os problemas, porque a visão de que tudo, nesta matéria, em Portugal, tem de ser público é a visão do PCP,...
O Sr. António Filipe (PCP): - Não é nada disso!
O Orador: - ... não é a visão do Governo. Sobre isto temos uma política: criar condições para que isso aconteça. E é o que estamos a fazer. Comprometemo-nos com 100 camas, vamos ultrapassar. Vão existir mais de 1000 camas licenciadas para isso poder ser feito.
Os portugueses têm esses meios à sua disposição. Nisso estamos em divergência, mas paciência? O PCP pensa uma coisa, nós pensamos outra, mas não vem daí mal ao mundo.
Por último, Sr. Deputado Gilberto Madaíl, relativamente ao desporto, é óbvio tratar-se de uma questão
fundamental para que toda a política de prevenção deva ser feita. Em tempos, até falámos, relativamente à Federação Portuguesa de Futebol, sobre a necessidade de ser feito um trabalho conjunto e, como sabe, nesta matéria é nossa intenção estabelecer diálogo com todas as federações, principalmente no respeitante ao desporto mais jovem, para que os jovens possam ter acesso a outras actividades.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Falar de toxicodependência é falar de um fenómeno com cada vez maior relevância na nossa sociedade, de um assunto que atinge directa ou indirectamente um larguíssimo número de pessoas, com consequências individuais e colectivas da maior gravidade.
São os problemas económicos e sociais, como o desemprego e a insegurança no emprego, o insucesso e o abandono escolar e educativo, que constituem o maior combustível para a propagação da toxicodependência. E é inegável que a política global levada a cabo pelos anteriores e pelo actual Governo tem fortes responsabilidades nesta matéria.
O prosseguimento de uma política económica que resulta no aumento do desemprego e numa crescente precariedade laboral que atinge especialmente os jovens, a manutenção das restrições no acesso à educação, as dificuldades na habitação, a falta de incentivos à prática desportiva e à participação associativa criam o cenário ideal para o aumento do consumo de drogas. O que se oferece hoje aos jovens portugueses é, a maioria das vezes, uma completa falta de perspectivas que não se resolve sem a alteração desta política global.
No nosso país, o número de toxicodependentes é, segundo alguns especialistas, superior a 100 000 enquanto 1 % da população da Grande Lisboa é toxicodependente. A criminalidade associada à toxicodependência cresce sendo que 213 dos detidos nas nossas prisões estão nesta situação; simultaneamente, aumenta o tráfico com a introdução de novas drogas e continuam a existir à vista de todos os locais de intenso tráfico de droga.
Anunciaram-se há uns tempos 36 medidas no âmbito do combate à droga que nunca conhecemos na totalidade, apesar de o Grupo Parlamentar do PCP ter pedido, há já algum tempo, através de requerimento, a lista destas medidas bem como o balanço da sua execução.
Destas medidas muitas eram programas já existentes ou recauchutados a propósito deste anúncio mediático. Anunciava-se a criação demais camas para desintoxicação, a abertura de novos CAT, o lançamento de programas especiais para situações de risco particular, a reorganização do Projecto Vida, entre outras.
Prometeu-se o aumento imediato de 40 para 100 camas para desintoxicação, o que é claramente insuficiente na nossa opinião. Mas, mesmo assim, este imediatismo terá ficado pelas palavras já que a concretização está ainda por fazer.
Prometeu-se a criação de mais duas alas livres de drogas nas prisões portuguesas e, até agora, não temos conhecimento de estar implantada mais alguma.
Prometeram-se programas especiais para situações de risco, como grávidas e sem abrigo, que apenas conhece-
Página 209
31 DE OUTUBRO DE 1996 209
mos das notícias da comunicação social e da leitura do Diário da Assembleia da República. Aliás, em recente visita da Comissão de Toxicodependência ao Centro das Taipas constatámos da dificuldade em dar resposta, por exemplo, à situação das grávidas e que, em relação às mesmas, há uma grande carência de medidas especiais.
Outra alteração prometida e largamente reivindicada pelo PCP e por todos os que com seriedade se preocupam com este problema era a da nova orientação do Projecto Vida no sentido de ter menos preocupações mediáticas e de atribuição discricionária de subsídios e maior vocação para proporcionar uma efectiva intervenção onde é precisa. Afinal, aparece uma reformulação do Projecto Vida que aumenta desmesuradamente a estrutura e nada adianta quanto à intervenção.
Onde estão igualmente os CAT em todos os distritos que, até ao fim do ano, deveriam começar a funcionar? Enfim, encontramo-nos claramente perante muitas palavras e pouca correspondência em acções concretas. E isto assume especial gravidade numa matéria em que se exigia ainda mais o corte com a postura do Governo anterior. A droga é de facto o inimigo público n.º 1 mas não é o inimigo n.º 1 do Governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Começa a ser evidente, por outro lado, a orientação do Governo em matéria de combate à toxicodependência.
É evidente no plano orçamental para 1997 a não existência de nenhum acréscimo significativo nesta área. No que diz respeito em especial ao PIDDAC, para além da desastrosa execução do Orçamento para 1996, o acréscimo fica muito aquém do satisfatório.
Mas o que também ressalta das indicações orçamentais é que o Governo se prepara para, cada vez mais, desresponsabilizar-se nesta matéria assumindo a postura de pagar em vez de fazer.
O orçamento do Projecto Vida aumenta 20 000 contos, ou seja, menos de 1 %, sendo que, estranhamente, as despesas de pessoal aumentam 130 000 contos, o que traduz a prioridade do peso da estrutura na reformulação desta instituição.
Não está aqui em causa, evidentemente, o papel importantíssimo que cabe às instituições que, com qualidade, trabalham nesta área nem a necessidade de serem apoiadas. Mas não nos parece correcto que a orientação nesta matéria passe por uma estratégia de abdicar de um protagonismo, que, pela delicadeza do problema, não pode deixar de caber ao Estado.
Uma das poucas medidas efectivamente tomadas pelo Governo é relativa ao aumento da comparticipação do Estado para a recuperação de toxicodependentes. É pena que esta medida não tenha sido acompanhada de uma intervenção maior na questão do licenciamento e da fiscalização das entidades que trabalham nesta área. A situação de extrema fragilidade em que se encontram os toxicodependentes e as suas famílias leva esta necessidade a ser ainda mais premente.
Todas estas entidades recebem contribuições das famílias. Será que todas elas também recebem os apoios do Estado independentemente de estarem ou não licenciadas? Com que legitimidade se mantém esta situação em que proliferam os casos em que o dinheiro se vai e a cura é eternamente adiada?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o PCP apresentou nesta Assembleia um projecto de lei que cria uma rede de tratamento de toxicodependentes, já aprovado na generalidade, e que julgamos poder dar um bom contributo na resolução deste problema.
No debate que se avizinha o PCP empenhar-se-á fortemente no reforço do combate à toxicodependência, propondo e defendendo medidas concretas neste sentido. Estamos conscientes de que o problema não se resolverá sem a alteração da política global que o Governo tem para o país. Mas isso não desvaloriza a necessidade de que medidas mais circunstanciais possam ser tomadas, sobretudo quando foram já prometidas.
Exigimos do Governo uma séria atenção à toxicodependência e, no mínimo, o cumprimento dos compromissos assumidos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos.
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É nossa convicção que o Partido Socialista, ao requerer este debate de urgência sobre a situação actual do consumo e do tráfico de drogas em Portugal, não o fez com a intenção de utilizar esta Assembleia para se auto-elogiar, como foi notório na sua intervenção, Sr. Ministro Adjunto, nem tão-pouco com preocupações mediáticas mas, sim, numa perspectiva séria e construtiva de confronto de ideias e de políticas.
A problemática da droga é demasiado grave e complexa para não deixarem de assumir, com humildade democrática, que os meios e as medidas anunciadas, embora, natural e inevitavelmente, crescentes, continuam e continuarão a ser sempre escassos e modestos para conseguir diminuir o tráfico e o consumo de drogas, as duas vertentes do mesmo problema - a toxicodependência.
Após um ano de Governo do Partido Socialista não queremos assumir também neste debate a mesma postura de crítica fácil e destrutiva que, no passado, quando na oposição, aquele partido adoptava na análise das políticas então implementadas.
Se o Partido Socialista fosse agora oposição diria, mas desta vez com razão, que a luta contra o tráfico é ineficaz, que continua a ser difícil ter vagas em consultas, que não se conhece um programa de recuperação de toxicodependentes presos, que a insegurança urbana e a pequena criminalidade ligada à droga aumentaram, que não se conhecem, ainda, o plano de actividades para este ano nem as linhas estratégicas do Projecto Vida para o próximo triénio, e que, em relação à sociedade civil, as organizações não governamentais e as instituições particulares de solidariedade social desconheciam, até ontem, se as suas candidaturas para este ano a projectos na área da prevenção tinham sido aprovadas.
Tão pouco queremos reduzir a política do Governo socialista em matéria de droga àquilo que o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, em Julho passado, no debate sobre o estado da Nação. E passo a citar: «Tudo quanto a este respeito me comprometi fazer antes das eleições está cumprido ou estão já tomadas as decisões para a sua rápida execução».
Tal como no passado, continuamos a ter perante este flagelo a mesma atitude séria, filme e de grande realismo.
Página 210
210 I SÉRIE - NÚMERO 6
E enquanto a toxicodependência for responsável pela destruição de pessoas, ameaçar famílias, bairros inteiros, a comunidade humana, não deixaremos de assumir o combate ao tráfico ilícito e ao abuso de drogas como um dever moral e um imperativo de consciência social.
É imprescindível a repressão sobre o tráfico ilícito mas a nossa postura face à problemática da droga continua a ser a de atribuir prioridade absoluta à prevenção primária como forma de reduzir a procura para vencer a oferta e ao investimento na recuperação dos toxicodependentes e na sua reinserção na sociedade.
Os resultados conhecidos, indicadores de alguma estabilização do consumo de droga nas camadas mais jovens, decorrentes dos programas implementados e/ou coordenados ou financiados pelo Projecto Vida, pelo Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência, Ministério da Educação, ou por autarquias e uma grande variedade de organizações não governamentais, ao longo destes últimos anos, continuam a validar esta nossa opção.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, propõe o Partido Socialista um conjunto de medidas, algumas delas inovadoras, para o reforço dos avanços significativos que se têm verificado nos últimos anos, não apenas na estratégia do combate mas, também, nos resultados desse mesmo combate.
É nesse contexto que sublinhamos, de entre todas as medidas anunciadas, algumas que consideramos mais urgentes e prioritárias, e avançamos também com duas propostas.
As medidas prioritárias são: promover e apoiar as actividades dirigidas a grupos de alto risco; desenvolver programas de apoio a grávidas, mães toxicodependentes e seus filhos; criar mecanismos integradores, no mundo do trabalho, de toxicodependentes já recuperados; garantir a qualidade técnica assim como a avaliação dos resultados das iniciativas da sociedade civil em prevenção primária, secundária e terciária.
As propostas são: reforçar a política de prevenção primária nas escolas com a introdução nos currículos escolares, a todos os níveis de ensino, de noções básicas sobre toxicodependência e ainda a criação de núcleos de acompanhamento médico ao toxicodependente em meio prisional, constante de um projecto de lei que apresentámos recentemente nesta Assembleia, para apreciação e votação. É que a situação da droga e da toxicodependência nos estabelecimentos prisionais é bem conhecida não sendo necessário explaná-la totalmente.
O número de reclusos consumidores/toxicodependentes não parou de crescer nos últimos anos, estimando-se actualmente em mais de 70%, sendo na sua maioria dependentes da heroína. Acresce o facto de que as condições de vida nas prisões, a sobrelotação, a promiscuidade, são factores favorecedores da propagação de doenças como a hepatite e a SIDA.
As actuais estruturas de cuidados médicos, existentes nos estabelecimentos prisionais, não permitem a implementação de programas de apoio e recuperação, nomeadamente tratamentos de substituição, capazes de preparar uma melhor inserção do recluso na vida activa depois de cumprida a pena. Torna-se, pois, imperiosa e prioritária a criação de serviços clínicos adequados em articulação com o Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência (SPTT), que permitam responder adequadamente a esta situação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o problema da toxicodependência é de tal forma
universal que a sua resolução não deve depender apenas de um só partido mas de todas as forças que intervêm na sociedade.
O Partido Social Democrata saberá assumir as suas responsabilidades de uma forma empenhada mas exigente no campo do confronto democrático das ideias.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vejo com agrado a presença do Governo neste debate mas não posso deixar de registar, o que constitui uma grande lacuna, a ausência do Sr. Ministro da Educação. Se queremos que, de facto, o combate da droga seja efectivo e que possamos ter, amanhã, dados estatísticos que comprovem a eficácia das políticas seguidas, temos de começar a actuar nas escolas, seguramente pelos mais novos.
Pergunte o Sr. Ministro aos demais membros do Governo se sabem que estão estimados os 12 anos como a idade em que os jovens têm o primeiro contacto com a droga. Que programas está o Ministério da 'Educação a desenvolver para que este flagelo seja combatido na sua origem nas escolas? Mais uma vez lamento que, estando presentes a Sr.ª Ministra da Saúde, o Sr. Ministro Adjunto e o Sr. Secretário de Estado da Justiça, não esteja representado o Ministério da Educação.
Protestos do Deputado do PS Jorge Lacão.
O Sr. Deputado Jorge Lacão falará quando tiver oportunidade.
Quando o Partido Popular apresentou um projecto de lei visando alterar a Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, revendo, por agravação, as penas para os narcotraficantes, foi acusado de ver o problema pelo lado contrário por dever começar-se pela prevenção.
Onde está o Ministro da Educação se é nas escolas que deve começar a prevenção?
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isso não tem qualquer sentido!
O Orador: - Vejo que a bancada socialista está muito incomodada mas mais incomodadas estão as famílias portuguesas!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mais uma vez encontramo-nos, nesta Câmara, a discutir o problema do consumo de droga. A dimensão do problema e a intensidade dos danos que provoca nos jovens, na família, na sociedade, justifica que se aborde esta questão tantas vezes quantas as necessárias. Todavia, é altura de dar um salto em frente. Não basta fazer o diagnóstico do problema nem apresentar elementos estatísticos que indicam o aumento do consumo e do tráfico de droga ou aumentar o número de camas para tratamento. É necessário apontar soluções novas.
Somos políticos e não comentadores ou analistas. Somos actores, não somos nem podemos ser espectadores.
As políticas empreendidas, seja de prevenção, seja de reabilitação, têm-se mostrado ineficazes. Por falta de meios, por descoordenação dos agentes de segurança, por incapacidade de combater as redes cada vez mais sofisticadas de narcotraficantes, Portugal e sobretudo a juventude por-
Página 211
31 DE OUTUBRO DE 1996 211
tuguesa têm vindo a tornar-se cada vez mais reféns do narcotráfico.
Estamos a falar de multinacionais do crime e de associações criminosas que dispõem de meios mais sofisticados do que as próprias forças de segurança. Estamos a falar de uma nova e triste realidade que tem de ser combatida com novas fórmulas, novos métodos, e seguramente com mais determinação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, não podemos claudicar perante aqueles que ganham a vida a vender a vida dos outros. O narcotráfico não é apenas um crime contra o consumidor, o narcotráfico é um crime contra a família, contra a sociedade, contra o Estado. É a destruição de uma futura geração que está em causa, é o futuro do país que está ameaçado. Por isso, entende o Partido Popular que um crime desta natureza, com a intensidade dos danos que provoca, merece ser punido com severidade e justiça.
Propusemos a esta Assembleia, uma alteração legislativa neste sentido que, infelizmente, não foi aprovada. Hoje, e tal como prevíamos, estamos a lamentar o aumento do tráfico de droga.
Sabemos que não são apenas as medidas repressivas que concorrem para o combate a este flagelo. Sabemos e reafirmamos que a prevenção é a fórmula mais eficaz para erradicar, no longo prazo, o consumo de droga. Todavia, perguntamos: e, entretanto, o que é que fazemos? Assistimos com serenidade e resignação à destruição da juventude portuguesa?
O Partido Popular não enfileirará junto daqueles que se satisfazem com discussões estéreis e teoréticas sobre a função da pena ou a eficácia da sanção. Para nós, é necessário reforçar a prevenção para que o amanhã seja diferente mas só haverá amanhã se agirmos hoje. E agir hoje significa aumentar, sem quaisquer dúvidas e com toda a determinação, a repressão sobre os criminosos que não têm quaisquer escrúpulos, significa aumentar as sanções sobre os traficantes de vidas humanas.
Agir é o grito de ordem que lançamos. Agir criando uma polícia especializada que vigie as escolas expurgando-as dos traficantes assassinos. Agir significa a retoma e o controlo das nossas fronteiras. A Europa sem fronteiras é uma Europa aberta à constituição de multinacionais do
crime, a Europa sem fronteiras é a fonte do crime sem fronteiras.
Não venham aqueles discursos já gastos e desgastados produzidos e repetidos por quem não percebe ou não quer perceber que a União Europeia se efectiva sem a abolição do controlo de fronteiras nem venham acusar-nos de antieuropeísmo. A França mantém o controlo das fronteiras e não passa a ser menos europeísta do que Portugal.
As afirmações que o Sr. Director da Polícia Judiciária produziu são inequívocas: o crime está a aumentar sobretudo qualitativamente devido às grandes redes multinacionais de narcotráfico que se passeiam pela Europa sem quaisquer obstáculos.
As forças de segurança portuguesas não têm, nem podiam ter, meios para combater a sofisticação utilizada por estas redes. Mas, se não as podemos combater com os mesmos meios, saibamos defender-nos. Seja reposto o controlo das fronteiras!
Quanto à reabilitação, é necessária eficiência, eficácia e investimento. Eficiência no tratamento e acolhimento dos toxicodependentes. Não chega gastar mais dinheiro nem é suficiente reforçar as verbas do Orçamento do Estado para o combate à toxicodependência. Sobretudo, é necessário e
urgente tornar eficientes os serviços já existentes. Não há uma cartilha para a reabilitação dos toxicodependentes, há vários métodos e só um acompanhamento estreito e atento do terapeuta permite identificar o método apropriado para cada caso.
Eficácia no combate ao esbanjamento de dinheiros públicos. Há instituições que funcionam e são eficazes mas outras existem apenas para receber dinheiro do Estado. É preciso distinguir o trigo do joio. O Estado é cego e mau avaliador da eficácia e, por isso, propomos a instituição de um crédito às famílias ou aos toxicodependentes para que eles próprios possam escolher a instituição de tratamento em função da qualidade dos serviços e do prestígio alcançado por cada uma. Trata-se de quebrar o anonimato em que hoje vivem estas instituições, que só abona em favor daqueles que não cumprem os objectivos para que foram criados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, não há drogas inocentes e, nesta guerra, todas as inércias são culpadas. É altura de combatermos firmemente pelo futuro de Portugal, lutando contra a droga, combatendo os traficantes. Nesta guerra ninguém está dispensado e, pela nossa parte, já há muito tempo dissemos: «Presente».
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Pará uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No debate de hoje, que tem o mérito de trazer ao Plenário da Assembleia da República uma discussão sobre a situação do consumo e tráfico de droga em Portugal, Os Verdes levantarão um conjunto de questões que, apesar de não se esgotarem nestas, constituem preocupações do Partido Ecologista Os Verdes sobre esta matéria.
A toxicodependência, não sendo um problema específico dos jovens, é, todavia, um problema que afecta maioritariamente os jovens. Trata-se, evidentemente, de um problema da sociedade e da forma como ela está organizada, por isso é fundamental que a prevenção seja efectiva nos locais privilegiados de presença de jovens - certamente nas escolas, mas não só. E se a informação e o esclarecimento são preciosos, nomeadamente na prevenção do voluntarismo para a droga, o combate à persuasão manipulada para as drogas também o é. Há jovens empurrados para a droga. É preciso ter consciência desse facto e agir sobre ele.
Sobre as razões que levam um jovem a tornar-se toxicodependente, é impossível enumerá-las na sua globalidade. Seriam necessárias tantas razões quanto o número de toxicodependentes, porque cada pessoa traduz uma razão de estar e de existir. Porém, não pode ser negado que existem linhas comuns de razões objectivas e subjectivas que levam os jovens a tornar-se toxicodependentes.
Uma coisa é certa: o modelo de sociedade em que vivemos cria necessidades de escapes na procura de subterfúgios. O abandono escolar em Portugal atinge uma dimensão inaceitável e o acompanhamento familiar é muito escasso em muitas famílias, resultado também da inexistência de um combate real à desertificação,...
Sr. Presidente, peço desculpa, mas até estou com dificuldades em ouvir-me a mim própria!
Página 212
212 1 SÉRIE - NÚMERO 6
O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr.ª Deputada. Agradecia que os Srs. Deputados fizessem silêncio na Câmara para se ouvir a intervenção da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente.
O acompanhamento familiar, dizia, é escasso em muitas famílias, resultado também da inexistência de um combate real à desertificação, da concentração de 213 da população no litoral e das consequências que daí advêm e, até, de leis como a da flexibilidade que vem criar maior instabilidade neste âmbito.
O número de jovens associados em Portugal é demasiado reduzido. Não existe incentivo à participação colectiva - o isolamento e o individualismo são muito acentuados - e o incentivo à competitividade e à fácil sensação de fracasso são excessivos; o incentivo à prática do desporto não é visível, para tanto basta olhar para a realidade do desporto escolar em Portugal e para a carência efectiva de infra-estruturas desportivas, e a maior parte dos jovens não tem acesso a ocupação de tempos livres atractivos e criativos.
O Sr. Presidente: - Se me permite a interrupção, Sr.ª Deputada, agradecia que os Srs. Deputados tomassem os seus lugares e não perturbassem a intervenção da Sr.ª Deputada.
Faça favor de continuar.
A Oradora: - Muitos outros exemplos poderiam ser enunciados. E é caso para questionarmos como é que se pretende o combate à toxicodependência quando estão abertos tantos escapes de acesso de procura e de entrega à droga.
O escape abre-se mais quando o descontrolo sobre a lavagem de dinheiros provenientes do tráfico de droga e o branqueamento de capitais é uma realidade assustadora, permitindo-se reforçar cada vez mais o narcotráfico, nomeadamente na sua globalização e internacionalização.
Fundamental é também um rigoroso conhecimento e apuramento da eficácia e do trabalho dos centros de recuperação de toxicodependentes. A falta de camas - é uma problemática muito grande e urge rapidamente agir no sentido de adequar o seu número à realidade e as diferenças socio-económicas neste campo também valem para estabelecer a diferença entre aqueles que têm o direito de ser tratados e os que não têm esse direito efectivo. A não gratuitidade e os custos excessivos que as famílias têm de suportar são obstáculos ao tratamento, o que é inconcebível.
A reinserção social do ex-toxicodependente é outro fenómeno que sempre se tem traduzido em marginalização, um rótulo daquele que foi e, provavelmente, ainda é ou não, daquele que constitui um verdadeiro grupo de risco, quer em aspectos de integração na sociedade, quer na relação com as outras pessoas na habitação ou no emprego. A marginalização é um facto que têm de ser verdadeiramente contestado, sob pena de não se admitir a integração de ex-toxicodependentes.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Feita a análise, é legítimo questionar o que é que mudou significativamente nesta realidade com este Governo.
Não queríamos terminar esta intervenção sem fazer referência ao relatório sobre o sistema prisional, apresentado pela Provedoria de Justiça, que fez uma análise
conhecedora da toxicodependência nos estabelecimentos prisionais. O número de reclusos condenados por crimes de droga ou por crimes relacionados com o consumo de droga é bastante grande, e é sabido que as prisões são, ao contrário do que deveriam ser, centros de fácil contacto e acesso com a droga.
É urgente, pois, que estas incongruências e estes factores tenham uma lógica invertida e que nos estabelecimentos prisionais se comecem a dar rapidamente passos no sentido do tratamento de indivíduos toxicodependentes, que se intervenha no sentido da sua recuperação e inserção social, sempre no respeito pela pessoa humana. No seu conjunto, os programas de recuperação são excessivamente escassos e atingem uma percentagem demasiado reduzida de reclusos toxicodependentes.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou o tempo de que dispunha, por isso queira fazer o favor de terminar.
A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, mas lembro que estive quase 1 minuto à espera que os Srs. Deputados fizessem silêncio.
O conjunto de recomendações e conclusões da Provedoria de Justiça são claras, positivas e de ter em conta.
O desejo de um combate eficaz deste flagelo terrível que é a toxicodependência é, com certeza, de todos os portugueses, de todos os movimentos políticos, mas só pode ser feito por respeito à dignidade de cada indivíduo.
Termino, referindo o seguinte: o Sr. Deputado José Niza começou a sua intervenção regozijando-se pelo facto de o Governo já ter cumprido todo o Programa e de agora até ter de inventar outras coisas novas para intervir nesta área! O Sr. Ministro tem uma opinião diferente e o PS deve, naturalmente, definir-se quanto aos seus objectivos mas, na nossa perspectiva, é o Sr. Ministro que tem, certamente, razão na análise que faz.
Sr: Deputado, se o Programa do Governo já está cumprido e se estes eram os resultados previstos, devo dizer que os objectivos eram muito pouco ambiciosos. E se é assim que se combate o «inimigo número um», imagine-se como se combatem os outros inimigos!... Olhe-se para o Programa do XIII Governo Constitucional e veja-se lá que as expectativas criadas e os compromissos eram muitos, mas muitos mais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Niza pediu a palavra para que efeito?
O Sr. José Niza (PS): - Para formular uma pergunta à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, quero apenas comentar que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia percebeu mal as minhas palavras porque, como é lógico, não disse nem poderia dizer que o Programa do Governo estava cumprido. O que quis dizer é que se tratou de um programa aceleradamente cumprido em muitos aspectos mas que, como o problema não está resolvido, terá de ser, se possível, reinventado ou acrescentado. Não se trata, como é óbvio, de «fechar a loja» e dizer que está tudo feito!
Página 213
31 DE OUTUBRO DE 1996 213
Que isto fique bem claro para que as minhas palavras sejam bem interpretadas.
O Sr. Presidente: - Para respondes, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. Para o efeito, dispõe de tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Niza, a interpretação que fiz das suas palavras corresponde ao que, de facto, foi dito. Se agora diz que não queria dizer... A verdade é que me limitei a interpretar as palavras que usou.
Da nossa perspectiva, o Programa do Governo não está, de facto, cumprido ou, se quiser, está cumprido apenas numa percentagem muito reduzida; para o constatar, basta olhar para alguns dos compromissos assumidos, para o discurso do Governo sobre os compromissos da sua acção ou sobre o que deve ser um mero financiamento dessa acção e, comparativamente, para o que vem referido no Programa do Governo em termos de gratuitidade. É, pois, uma questão a reflectir.
Assumiu-se um compromisso e criou-se uma expectativa que não está, de facto, a ser concretizada.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde. Como o Governo dispõe de apenas 2 minutos, o Grupo Parlamentar do PS concede-lhe o tempo que lhe resta, ou seja, cerca de 5 minutos,
A Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém): - Sr. Presidente, muito obrigada pela sua benevolência em conceder-me a palavra. Como sabem, este programa é coordenado pelo Sr. Ministro Adjunto, pelo que também devo agradecer-lhe a oportunidade que me dá de intervir, na sequência de alguns comentários formulados nesta Câmara, para aduzir algum valor acrescentado.
Em primeiro lugar, quero referir-me ao problema das grávidas toxicodependentes, questão levantada pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto. Informo que já estão protocolados três novos projectos de atendimento a grávidas toxicodependentes, cujas fundações vão arrancar já no início do próximo ano. E, Sr.ª Deputada, não sei dizer qual é o número de consultas que está a ser dirigido especificamente a este grupo, mas posso apurar e transmitir-lho logo que o tenha disponível.
Uma vez que estou a dirigir-me à bancada do PP, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Núno Correia da Silva que o Sr. Ministro da Educação não está presente, mas estamos nós!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
A Oradora: - E não está presente, em primeiro lugar, porque o Sr. Ministro Adjunto não lhe pediu para estar e,...
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Fez mal!
A Oradora: - ... em segundo lugar, isso não significa qualquer falta de priorização da importância da educação neste combate.
Entendeu-se, sim, que eu poderia colmatar, de certa forma, essa ausência, na medida em que a maioria dos programas, dirigida à educação da saúde nas escolas é feita em colaboração muito interligada com o Ministério da
Saúde e, nomeadamente, com programas que existem a nível de organizações internacionais, como é o caso da Organização Mundial de Saúde.
Portanto, ao nível das escolas, para além de programas específicos - os programas de férias dirigidos a jovens e os programas interescolas -, existe o Programa de Educação para a Saúde, que funciona em articulação com o Ministério da Saúde, bem como o Projecto das Escolas Saudáveis, projecto esse que é gizado pela Organização Mundial de Saúde e está a ser implementado no nosso território.
Gostaria que essa implementação fosse cada vez maior e, aliás, tive uma conversa com a coordenadora desses programas, que se encontra nesta Câmara, mas não pode usar da palavra, no sentido de estas experiências serem cada vez mais dinamizadas.
Se por um lado esta é uma área em que desconhecemos muitos aspectos, por outro não há dúvida de que há, pelo menos, algo de já assumido e concertado. Refiro-me à ideia de que é nos jovens que temos de investir prioritariamente, daí a importância estratégica do Ministério da Educação. Portanto, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, não considere a ausência do Sr. Ministro da Educação como uma falta de priorização nesse sentido, mas antes porque se entendeu que eu poderia substitui-lo, daí a sua não convocação.
Quero ainda referir-me especificamente a algumas questões relativas ao problema da droga nas prisões; trata-se de um problema real que foi identificado há bem pouco tempo e que tem sido bastante discutido. Aliás, aproveito, para dar-vos notícia de que tem estado a decorrer, também em colaboração com a Organização Mundial de Saúde, durante o princípio desta semana - encerra hoje -, uma discussão com os coordenadores da OMS Europa do programa específico de saúde nas prisões, seminário esse dirigido a técnicos, quer do Ministério da Justiça, quer do Ministério da Saúde, na medida em que vamos protocolar com o Ministério da Justiça.
Com efeito, desde há muitos anos, é conhecida a enorme dificuldade de entendimento entre essas duas áreas. Estamos, no entanto, a trabalhar no estabelecimento de um protocolo que permita avançar para a definição de um programa a nível nacional para a prevenção e tratamento de síndromas de abstinência, de desintoxicação e para o acompanhamento de detidos toxicodependentes e sua reinserção social, o que implica a realização de um trabalho conjunto dos dois ministérios.
Como sabem, no passado tem havido bastante dificuldade em fazer essa articulação, porque os Ministérios da Justiça e da Saúde nunca se entenderam muito bem sobre a definição de a quem compete suportar, em termos financeiros, esta acção. Em todo o caso, penso que já chegámos a algum entendimento nesta matéria.
Uma vez que esta é uma questão importantíssima, não vamos esquecer o objectivo fundamental por causa dos meios.
Para finalizar, não abusando da benevolência que me foi concedida, quero dizer que, em relação a este problema, todos nós temos imensas dúvidas. No Observatório Vida, através de reuniões de trabalho realizadas entre o meu colega da Ciência e Tecnologia e eu, já foi definida uma agenda de investigação que permita detectar, quer na prevenção primária, quer na secundária e quer na terciária, por que razão existem grupos especialmente submetidos a maiores factores de risco; há que proceder à sua identificação e perceber por que é que uns resistem melhor e
Página 214
214 I SÉRIE - NÚMERO 6
outros pior a determinados factores de protecção e por que é que outros grupos se iniciam no consumo de substâncias nocivas, etc. Há toda uma agenda de trabalho de investigação, porque muita gente fala sobre este problema, mas temos poucos dados objectivos e, sobretudo, tratados de forma científica.
Se os Srs. Deputados tiverem interesse, disponibilizarei esta agenda de investigação e agradecia muito que a enriquecessem...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E os outros dados, os do orçamento?!
A Oradora: - Sendo esta uma questão nacional, penso que todos devemos estar unidos, embora se possam encontrar, por vezes, metodologias diferentes em relação à forma de abordar uma questão que é, realmente, nacional.
Em relação aos números do orçamento, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, fornecê-los-ei assim que os tiver em mãos, mas essa não é a discussão do momento. Posso encontrá-lo no corredor e dar-lhe então todas as informações que quiser...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Ministra, também vai discutir o orçamento da saúde?!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não entrem, em diálogo. Terão de pedir a palavra para intervir!
A Oradora: - Srs. Deputados, não abusem da minha falta de conhecimento do vosso Regimento e não me façam incorrer em faltas que levem a Mesa a interpelar-me.
Muito obrigada pela vossa atenção.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não quero deixar de fazer uma pequeníssima intervenção para acentuar dois aspectos.
Em primeiro lugar, para fazer uma referência de homenagem que é devida pela Câmara ao Padre Feitor Pinto,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ... que tem sido o retrato, em qualquer circunstância e em qualquer condição, de uma vontade que não esmorece na luta contra a droga. O Padre Feitor Pinto é um exemplo vivo da luta contra a droga neste país.
Vozes do PSD: - Muito bem.
O Orador: - O segundo aspecto é dirigido aos membros do Governo aqui presentes, ao Sr. Ministro Adjunto e a Sr.ª Ministra da Saúde.
Com efeito, não vi os Srs. Ministros responderem às perguntas concretas formuladas pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, e gostaria de juntar a essas uma outra alusão feita pelo Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos em relação a duas questões que colocámos nesta Assembleia.
Há pouco tempo atrás, entregámos dois projectos de lei, um, contemplando a criação do que se poderia chamar a
«brigada fiscal do mar», e outro, integrando os núcleos de atendimento aos toxicodependentes nas cadeias. São dois projectos sobre os quais entendemos haver a maior urgência em serem discutidos e, eventualmente, aprovados. O primeiro, porque introduz alterações à lei orgânica da GNR e não se limita a dar meios, porque uma coisa é dar meios, outra coisa é alterar a orgânica, alterar as competências e possibilitar uma nova intervenção nesta área. É mais rico e mais fecundo o nosso projecto do que qualquer ideia avançada até agora. O segundo, porque é uma questão de urgência, tendo em conta o que se passa relativamente à toxicodependência nas cadeias.
Srs. Ministros, o que lhes peço, muito concretamente - e só isto -, é que digam, aqui, na Assembleia, dentro do grande espirito de abrangência, de consenso e de diálogo, que foi exibido por nós, mesmo enquanto oposição nesta matéria, se entendem ou não que esses diplomas devem ser urgentemente discutidos aqui.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, só quero referir que o Governo nada tem a ver com os agendamentos que são feitos na Assembleia da República.
Aplausos do PS.
Agendem, quando VV. Ex.as quiserem e, depois, aprovem o que entenderem. O Governo, como é evidente, cumprirá aquilo que a Assembleia determinar.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Sr. Ministro Adjunto: - Se o Sr. Presidente o, autorizar, faça favor.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O. Sr. Presidente está ao telefone, penso; contudo, que não o impedirá, com toda a certeza.
Não pretendi que o Sr. Ministro interferisse nos agendamentos, mas o que lhe perguntei é se, politicamente, em relação à política de luta contra a droga, e em nome do Governo, acha isto oportuno ou não. Não me referia às interferências que poderá ter na Assembleia.
O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Deputado, tenho grande respeito pela inteligência de todos os Srs. Deputados. Os senhores não precisam da opinião do Governo para aprovarem as leis que entenderem na Assembleia da República!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate sobre a situação actual do consumo e do tráfico de drogas em Portugal.
Vamos passar à apreciação do relatório de segurança interna relativa ao ano de 1995.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Alberto Costa): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta não
Página 215
31 DE OUTUBRO DE 1996 215
é a primeira, nem a segunda, nem a terceira vez que, nas últimas semanas, aqui, no Plenário e na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, se discute a questão da segurança em Portugal. Mas a discussão que vai ter lugar, hoje, aqui, sobre o relatório de segurança interna, respeitante a 1995, é uma boa oportunidade para nos debruçarmos sobre uma questão que interessa, seguramente, a todos os portugueses, na base de um documento que tem atrás de si uma ponderação cuidada, por parte das várias forças e serviços de segurança, dos dados respeitantes a 1995.
Na realidade, trata-se de um conjunto de materiais e conclusões que foram sopesados em órgãos onde elas se encontram representadas (o Gabinete do Coordenador de Segurança e, como manda a lei, o Conselho Superior de Segurança Interna), onde se procedeu a um exame circunstanciado dos dados propostos.
A circunstância de este relatório dizer respeito a 1995 pode parecer uma novidade chocante, mas quem estava na Assembleia, na Legislatura passada, sabe que já se chegou a discutir em simultâneo dois ou três relatórios respeitantes a três anos, portanto, apesar de tudo, há uma tentativa de chegarmos a um timing mais conveniente na discussão desta matéria. Essa circunstância de sé tratar de um documento respeitante a 1995 permitirá talvez uma análise mais distanciada, permitirá separar os aspectos de natureza conjuntural de alguns outros de feição mais permanente na configuração da nossa criminalidade e das ameaças à nossa segurança.
Penso que estamos na hora do debate, em que se torna apropriado separar o que tem idade, o que tem peso, daquilo que é conjuntural. Aliás, reparei que, em várias intervenções dos Srs. Deputados, nesta Câmara e na imprensa, tinha havido uma justa preocupação de separar os factores que se vinham acumulando neste domínio das manifestações conjunturais, sempre possíveis e, aliás, recorrentes nesta matéria.
Gostaria de começar por recordar algumas limitações na avaliação da situação e no próprio posicionamento público em relação às instituições, porque tendo estado nesta Casa durante vários anos e tendo-me pronunciado sobre estes relatórios e estes dados várias vezes, ficaria mal com a minha consciência se não mantivesse aqui uma relação de continuidade com algumas preocupações que fui expressando e que devem continuar a ser salientadas nesta Assembleia.
A primeira é que se mantém um deficiente conhecimento da realidade criminal, da realidade da vitimação, da realidade da segurança, porque não nos equipámos ao longo de anos, ao longo de décadas, com instituições e com estruturas produtoras de estudo, de conhecimento e de investigação. Precisamos disso. Há, noutros países, institutos de altos estudos de segurança, institutos de criminologia em pleno funcionamento, linhas. de investigação permanente, mas nós ainda não estamos equipados nessa matéria, sendo essa uma deficiência que temos de suprir, para conhecer e diagnosticar melhor.
Em matéria de vitimação, fazemos alguns inquéritos de dois em dois ou de três em três anos. Esses inquéritos têm a maios importância, em todos os países do mundo, para avaliar o andamento real da criminalidade e controlar o valor das estatísticas oficiais. Nalguns outros países, como, por exemplo, em Inglaterra, são, em simultâneo, tornados públicos os elementos das ocorrências policiais e os de estatísticas de vitimação.
Porém, neste momento, não temos condição para fazer isso. Contamos ter no próximo ano um novo inquérito de vitimação que possa, como aconteceu no passado com os que foram realizados, permitir temperar o conhecimento destes fenómenos.
Por outro lado, mantém-se - e é importante dizê-lo um deficiente conhecimento das tendências pesadas da evolução da nossa criminalidade. Há um estudo, em boa hora encomendado pelo Centro de Estudos Judiciários, que nos alerta para as revoluções importantes no andamento da criminalidade em Portugal nas últimas, décadas, apontando-nos duas, que continuam a ser muito impressivas: a revolução do automóvel, ou seja, a entrada do automóvel no processo criminal e na justiça criminal, ocupando uma grande facha da «Estrada da Justiça», que ocorreu a partir dos anos 60; e, depois, a partir do princípio dos anos 80, com mais significado, a revolução da droga, visto que, sendo embora diversos os relacionamentos entre droga e crime, existe uma cerrada relação entre esse tipo de fenómenos.
Por outro lado, temos indicadores de confiança no sistema global da justiça penal, considerando as polícias e o funcionamento do sistema judicial, que nos continuam a dar dados preocupantes em relação à avaliação pública desses sistemas. O que conhecemos do funcionamento global do sistema de responsabilização em Portugal continua a ser uma fonte de reflexão, porque, como aqui disse, apenas 1/4 da criminalidade sofrida é participada e os números da participação mantêm-se baixos nos últimos inquéritos de vitimação, sobretudo, na região da Grande Lisboa e na área da Comissão Coordenadora de Lisboa e Vale do Tejo. Desse 1/4 dos crimes participados, apenas 113 é esclarecido e conduzido a tribunal. E desse 1/3, metade dos processos que entram na fase de julgamento não são concluídos por julgamento mas por outras vias, o que descaracteriza e desnatura a própria actividade judicial, que se emprega em metade do seu tempo a lidar com processos que, afinal, não terminam por julgamento.
Ora, isto aponta para factores estruturais importantes que têm a ver com taxas de impunidade elevadas quando comparados os números e as probabilidades. Temos taxas de impunidade muito elevadas - e isso é estudado noutros países -, porque também não temos, entre nós, na disciplina económica do crime, esses estudos desenvolvidos. Basta pensarmos nas dezenas de milhar de situações de contumácia, que se acumularam ao longo de meia dúzia de anos e que começaram a prescrever em cadeia, para percebermos que há muitas dezenas de milhar de concidadãos nossos que fugiram, com êxito, aos processos criminais em que deviam responder e foram premiados pela prescrição. Quem contacta com o Diário da República sabe que isto acontece, porque há suplementos inteiros a declarar as contumácias e as prescrições das contumácias declaradas.
Ao longo de anos e décadas acumularam-se factores de incivilidade na sociedade portuguesa, que não foram respondidos adequadamente, e verificamos uma deficiência importante no funcionamento de sistemas a montante da própria idade da imputabilidade criminal. Esses sistemas são importantes na compreensão da dinâmica do crime e levam-nos a perceber que, por exemplo, estudos feitos mostrem que, em quatro anos, o número de pessoas que foi condenado pela segunda vez em processo-crime aumentou em número superior a 80%, o que é um indício de que um conjunto de carreiras criminais, ao longo. dos anos, se foram estabilizando e apareceram, como saída, como
Página 216
216 I SÉRIE - NÚMERO 6
escolha, como responsabilidade, a muitos dos nossos concidadãos.
Tudo isto revela e traduz indicações de segurança, que são sérias, pelo que continua a ser pertinente lembrá-las aqui, não para dizer que estes factores se devem a esteou àquele período de governação em concreto; seria uma injustiça dizer que a morosidade da justiça é uma criação de determinado número de anos de determinado governo, que as taxas de impunidade elevadas que referi são o produto ou a responsabilidade de uma acção governativa, de um governo ou de determinado governante. Não é verdade! Sabemos que, ao longo de anos e décadas, se foram acumulando um conjunto de circunstâncias que criaram uma situação, que
é, repito, reveladora e geradora de insegurança.
É neste contexto que se insere também um conjunto de situações das sociedades contemporâneas para que olhamos diariamente, através de várias «janelas», em que há um nível elevado de procura de segurança. A sociedade
de risco em que hoje se analisam as sociedades em que vivemos tendem a ter um nível elevado na procura de segurança. É nesse quadro que deveremos olhar, com realismo e seriedade; para os dados e as conclusões constantes deste relatório de 1995.
Trata-se, pois, de um relatório que incide sobre um período de governo, anterior a este, no essencial, os 10 meses desse ano, que são fundamentalmente apreciados e reflectidos nestes números e que são da responsabilidade do governo anterior, no que este relatório tem de bom e também no que não tem de bom, mas é, sobretudo, uma fonte de ensinamento aquela que aqui temos.
No fundamental, constata-se que a criminalidade participada à Guarda Nacional Republicana, que responde por cerca de 90% do território, neste relatório, aumenta. Quero também dizer que esta força é a única que refere uma descida da criminalidade violenta. Isto é, temos aqui números em que devemos reflectir, porque a única força que apresenta, na sua análise e estatística, uma expansão da criminalidade, reflecte uma diminuição da criminalidade violenta. Enquanto as duas forças de segurança que registam descidas ou declínios no crescimento das ocorrências criminais, enquanto referem esse controlo da criminalidade global, referem aumentos da criminalidade violenta.
Creio que este conjunto de indicações cruzadas é importante, porque nos diz que é no meio urbano que se assiste a uma progressão da violência. É uma violência, em larga medida, urbana, e mesmo quando é acompanhada de uma detecção global de menos crimes, ela justifica preocupação que, aliás, vem, enfaticamente, traduzida neste relatório por parte da força de segurança que se ocupa deste tipo de ocorrências, como digo, na área urbana. A Polícia Judiciária, como verificarão, acompanha o andamento global das ocorrências, acompanha o andamento registado pela Polícia de Segurança Pública.
Para sermos justos, gostaria de chamar à colação também a diferença de taxas de denúncia nas várias áreas do território nacional. O último inquérito de ultimação - que os Srs. Deputados certamente conhecem - publicado pelo Ministério da Justiça revela uma diferença sensível entre as taxas de participação nas várias áreas do território nacional e esse elemento também deve ser utilizado para ler estas indicações.
De qualquer maneira, nos vários órgãos, nomeadamente no Conselho Superior de Segurança Interna, onde foi examinado este conjunto de dados, pareceu importante chamar a atenção para alguns elementos de natureza
qualitativa que, não sendo de molde a indicar uma alteração do padrão tradicional da criminalidade no nosso país, justificam alguma atenção, representando tendências que devemos todos continuar a acompanhar com atenção.
A primeira dessas tendências que vem mencionada no relatório é uma tendência para a progressão da violência em diversos crimes, maioritariamente assaltos, com recurso a uma gama cada vez mais larga de tipos de armas utilizadas. Quero referir, a este propósito, embora já o tenha feito noutra ocasião, que a maioria das armas que aqui estão mencionadas e que continua a caracterizar a criminalidade dominante em Portugal é ainda a arma branca e a seringa. Apesar da utilização de armas de fogo em diversos dos crimes que constituíram notícia este Verão, é ainda esse panorama que é, seguramente, preocupante mas caracterizador deste fenómeno de progressão de violência que é aqui indicado.
Um outro aspecto significativo tem a ver com comportamentos agressivos e, nalguns casos, de natureza criminal assumidos em grupo, quer em grupos espontâneos quer em grupos com algum grau de organização, mas a não confundir com aquelas associações criminosas mencionadas pela Polícia Judiciária que são, na realidade, grupos ligados ao tráfico de droga. Há uma menção que também se entendeu dever fazer ao aparecimento do fenómeno das milícias populares, que teve alguma importância (os Srs. Deputados estarão lembrados) no ano de 1995, que não se extinguiu, que traduz uma atitude de desconfiança ou de desesperança em relação ao ritmo de intervenção dos tribunais e das polícias, mas que não pode deixar de ser apontado como um factor de instabilidade e de perigosidade potencialmente presente no tabuleiro de uma sociedade e de um Estado que não responda a tempo e horas às expectativas de perseguição e de punição.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Refere-se ainda, no domínio dessas tendências qualitativas, o alastramento de certas áreas onde o império da lei - como acontece em várias metrópoles da própria Europa - tem alguma dificuldade de implementação e que suscitam hoje problemas específicos de patrulhamento e de penetração por parte das forças policiais. Menção ainda para o desenvolvimento de algumas práticas de vandalizaçâo, que se traduziram, por exemplo, numa chamada criminalidade expressiva, uma criminalidade que não tem uma motivação patrimonial mas que exprime estados de espírito e que tem a ver, por exemplo, com a destruição pelo fogo de dezenas e dezenas de viaturas; ainda a manifestação de fenómenos de intolerância racial e religiosa e o recurso, que atingiu números bastante elevados no ano passado, a cortes de vias de comunicação que, para além de representarem uma ofensa à liberdade de circulação, dão um contributo importante para uma atmosfera de instabilidade e de insegurança.
Menção, por último, à criminalidade transfronteiriça e ao tráfico de droga porque aqui passamos das criminalidades de predação, das criminalidades de destruição que colocam a vítima no campo da lei e da ordem (tradicionalmente chamado da lei e da ordem), para a criminalidade mais agressiva e penetrante dos nossos dias, que é aquela que se traduz pelo funcionamento de autênticos mercados criminais: é a entrada do tráfico de Bens ilícitos, de serviços ilícitos, que hoje, na análise geo-estratégica e económica do crime, aparece como a grande ameaça às sociedades contemporâneas. É neste contexto
Página 217
31 DE OUTUBRO DE 1996 217
que vale a pena dizer e repetir uma afirmação mal interpretada no sentido de que, no panorama dos tráficos na sociedade portuguesa, o tráfico agressivo, o tráfico que nos ameaça, é, na realidade, o tráfico de droga e não outro, na análise que, nesta altura, podemos fazer da situação existente.
Devo acrescentar que temos procurado acompanhar e, na medida do possível, responder à evolução destas tendências aqui identificadas e que algumas delas registaram melhorias, outras não. Deve dizer-se que, por exemplo, em relação às práticas de vandalização, aos cortes de estrada, à intolerância religiosa, registámos melhorias; noutros domínios aqui mencionados eles não são palpáveis e não adianta iludir a realidade. Alguns destes fenómenos estão a ser enfrentados mas outros colocam - continuam a colocar - problemas sérios e a justificar novas opções e aperfeiçoamento de opções anteriores.
Quero registar que as forças e serviços de segurança têm enfrentado com grande dedicação e grande empenho esta atmosfera que acaba de ser representada, mormente através deste conjunto de tendências que, algumas vezes, as atingem e atingem os seus membros de forma particularmente agressiva - como, aliás, é mencionado claramente num dos relatórios de uma das forças de segurança. Esta menção deve ser feita e, porque já estamos no mês de Outubro de 1996, penso que é adequado dizer que, na realidade, assistimos, nalguns meses deste ano, a números, em matéria de homicídios, que foram mais elevados do que a média que conhecíamos do ano passado mas que estiveram ao nível dos números registados em 20 ou 21 meses dos últimos cinco anos.
Essa não foi uma média que tivesse ultrapassado dados anteriores mas, em todo o caso, é uma média a justificar atenção e a ser lida no quadro da progressão da violência que aqui é apresentada. O mesmo em relação às ofensas corporais graves que, em todo o caso, devem ser lidas de uma forma mais sistemática porque, enquanto elas no registo de certas forças de segurança aumentam, noutras, como é o caso da Guarda Nacional Republicana, diminuem nos materiais que foram presentes à Assembleia da República respeitantes ao primeiro semestre, o que representou uma inovação que o Governo ainda gostaria de melhorar visto que dar conta à Assembleia, de ano a ano, do andamento da criminalidade é insuficiente.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Este panorama, muito rapidamente evocado, serve para justificar o grande objectivo aqui proposto em debates anteriores que é o de unir esforços no sentido de evitar que a sociedade portuguesa se aproxime e se torne parecida com aquelas sociedades mais violentas que, diariamente, nos visitam através de múltiplas imagens. Esse é um verdadeiro desiderato nacional e é esse desiderato que justifica e legitima um investimento especial na área da justiça e na área da segurança, para que possa verificar-se uma viragem e uma recuperação em relação a situações acumuladas ao longo de anos e anos, que reflectem alguma dificuldade e alguma limitação do poder de resposta da sociedade a estes fenómenos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Gostaria, muito brevemente, de recordar sete linhas de resposta a esta realidade diagnosticada e, de alguma maneira, representada neste relatório de 1995.
Em primeiro lugar, a aposta no sentido de obter mais conhecimento sobre a criminalidade e sobre a segurança essa aposta é fundamental. Nós temos de, a curto prazo, ter, como nos outros países, um Instituto de Altos Estudos de Segurança que estude a problemática objectiva e subjectiva da segurança. Hoje, mais de metade dos estudos sobre segurança, como os Srs. Deputados sabem, versam o sentimento de segurança e não o próprio fenómeno objectivo da segurança.
Precisamos de acompanhar esse movimento, e a criação de uma estrutura com uma produção dessa natureza é um dos objectivos do Governo, bem como o desenvolvimento de linhas de investigação em sintonia com o Ministério da Ciência e Tecnologia, para lá da activação de um Instituto de Criminologia. Precisamos de fixar, em condições mais modernas, o andamento do fenómeno do crime e do fenómeno da insegurança e da violência.
A segunda aposta é a qualificação e a renovação do pessoal. Nós visitamos hoje distritos onde há forças que têm uma maioria de agentes com a 4.ª classe e com idades muito elevadas. Não podemos enfrentar os contornos actuais da criminalidade, os contornos actuais da insegurança, se não fizermos um grande esforço no sentido de dar oportunidades acrescidas de formação, quando possível, e de renovação dos próprios efectivos, quando isso não for viável, de maneira a podermos acompanhar de forma fresca, preparada e qualificada o novo andamento dos fenómenos sociais e dos fenómenos criminais.
Daí uma grande aposta na qualificação e na renovação do pessoal a todos os níveis, mais que fundada empiricamente no contacto com as realidades que encontramos em múltiplos distritos, unidades e sub-unidades do País.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em terceiro lugar, a modernização e o reforço de meios operacionais, de, equipamentos, de tecnologia, perante as características da criminalidade emergente pois não é possível deixar de equipar de outra maneira. Temos procurado atender a estas finalidades ainda que de forma largamente insuficiente para as necessidades, criando salas de formação em número de algumas dezenas, criando equipas de formadores de formadores, mas há um grande trabalho para fazer e vai envolver muito esforço. De qualquer maneira, a formação e a modernização tecnológica são duas palavras decisivas para enfrentar o panorama aqui traçado.
Quarta referência: a coordenação. Quem quer que tenha exercido responsabilidades nesta matéria sabe como é difícil coordenar e fazer convergir o conjunto das entidades e estruturas que se movimentam na resposta à criminalidade. Essa continua a ser uma questão decisiva para obter, em Portugal e noutros países, respostas em tempo útil.
Quinta referência: a internacionalização. É hoje um elemento fundamental agir no tabuleiro da União Europeia e do seu terceiro pilar, agir no quadro de Schengen e agir no quadro bilateral, é hoje fundamental para enfrentar as novas modalidades de criminalidades que foram, ainda que brevemente, referidas, No dia em que termina uma cimeira ibérica, quero dizer que alguns passos foram dados neste sentido, nomeadamente em direcção a alguns acordos que virão a esta Assembleia proximamente, no sentido de regular a criação de escritórios de coordenação de polícias de dois países, no sentido de melhorar a eficácia opera-
Página 218
218 I SÉRIE - NUMERO 6
cional e os controles nas fronteiras, particularmente indicados para fazer face a problemas de fluxos irregulares de pessoas que, neste momento, se fazem sentir em várias fronteiras e que requerem melhorias na resposta institucional.
Esta internacionalização, nestes vários tabuleiros, é algo que se coloca também a cada uma das forças de segurança. Gostaria de sublinhar aqui o esforço especial feito pelas várias forças de segurança na sua interligação, em tempo recente, a organizações congéneres de outros países no sentido de adquirir mais competência e mais preparação no combate a estes novos fenómenos. Isso é válido para todas as forças, e quero mencionar um acordo no sentido da frequência por elementos da PSP da Escola de Polícia de França, bem como o acordo quadripartido em que é parte a GNR, que tem uma importante componente de formação e de melhoria do recrutamento - e o mesmo se passa em relação à Polícia Judiciária.
Neste âmbito estão a ser acelerados contactos bilaterais em relação ao combate aos tráficos aqui mencionados e que, para além do tráfico de droga, incluem naturalmente o tráfico de seres humanos (mulheres e crianças) e o de órgãos. Nesses domínios é fundamental a interligação entre as estruturas policiais dos vários países através de fórmulas adequadas de cooperação.
Nesse sentido orientámos também a favor dum alargamento do mandato atribuído à EUROPOL e proximamente a Assembleia da República terá oportunidade de se pronunciar (espero que favoravelmente) sobre a extensão a esse tipo de crimes da competência dessa polícia que é, como sabem, limitada.
Para além desta aposta internacional, há uma aposta importante no local. Não me vou demorar nela, mas é muito importante sublinhar que encontrar soluções ajustadas aos locais em que as pessoas vivem ou trabalham é um elemento fundamental para responder à questão da segurança e da insegurança porque sem o ajustamento do local o que se passa ao nível mais elevado ou internacional não terá suficiente compreensão e adesão por parte das pessoas.
Última linha, a revisão em que estamos empenhados e em que também já existe da parte do principal partido da oposição uma contribuição nesta Assembleia da República, da legislação sobre armas e explosivos no sentido de uma maior restrição. Vamos trazer aqui o nosso contributo e esperamos que seja possível convergir em direcção a soluções mais rigorosas. Se bem que algumas das que aqui foram apresentadas constituam boas bases de trabalho, será possível, porventura, ir ainda mais além.
Não me ocuparei, por razões óbvias, de toda a temática relacionada com a melhoria dos sistemas de punição na sociedade pois foi um tema que versei em demasia na última legislatura e portanto dou-o por reproduzido. Na realidade é preciso pôr termo à crise de castigo na sociedade portuguesa e essa tem sido uma das temáticas que ao longo da legislatura motivou algumas intervenções cuja linha acho de sustentar porque me parece que precisamos de restaurar na comunidade o sentido da solidariedade, mas seguramente o sentido da oportunidade e da responsabilidade, nomeadamente, da responsabilidade individual que remete aqui para um afinamento do funcionamento dos sistemas sancionatórios na sociedade portuguesa.
E, sobretudo, teremos todos de alimentar uma cultura pública e uma postura individual em relação ao crime de maior coragem e de maior frontalidade. Há causas antigas na sociedade portuguesa que fazem com que os cidadãos
portugueses fujam muitas vezes a cooperar com a polícia na investigação. de um crime, a queixar-se de um crime, a ter uma atitude frontal diante de infracções, de ilegalidades e de incivilidades, mas é preciso que se erga uma nova atitude e que bem cedo se erga o cartão vermelho a situações de incivilidade que, quando não são respondidas a tempo e horas pela sociedade, dão, depois, lugar à progressão de verdadeiras carreiras criminais muito mais difíceis e dispendiosas de interceptar mais tarde e sempre com danos pessoais e sociais de muito mais difícil restauração.
Penso que era importante que pudéssemos emitir uma mensagem sonora no sentido de que não é só nas instituições, não é só nos aparelhos repressivos, não é s6 nos aparelhos que se ocupam de outro tipo de prestações sociais, assistenciais, que é preciso renovar. E preciso também uma nova atitude individual e colectiva, uma atitude de coragem e de frontalidade diante da incivilidade e do crime. Uma nova postura cívica é seguramente necessária para que possamos deter o trânsito da sociedade portuguesa para uma sociedade mais infractora, mais violenta e com mais crime.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados, dentro de pouco tempo vamos ter um outro relatório de segurança interna que, espero, venha apresentado em melhores condições do que aquelas que foi possível empregar para apresentar o material que VV. Ex.as têm presente, nomeadamente, no sentido de facilitar uma melhor integração e uma melhor leitura. Este relatório, por razões óbvias e compreensíveis, utiliza a técnica dos relatórios dos últimos anos pelo período a que se reporta, pela dificuldade de inovar naquela altura do ano e, por isso, vamos tentar fazer melhor dentro de poucos meses e trazer aqui uma matéria de reflexão. A minha esperança, Sr.ª e Srs. Deputados, é que o relatório não só venha melhor apresentado, como também não traga piores notícias.
Aplausos do PS.
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Jorge Ferreira e José Magalhães.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, duas perguntas. V. Ex.ª acaba de reconhecer a necessidade de criar um instituto especializado em estudos sobre segurança pública e eu recordo que o PS, no seu programa eleitoral, prometia a criação de uma academia de segurança. Não sei se é do mesmo projecto que está a falar mas, em qualquer caso, gostava de saber se reconhece essa necessidade até como forma de dar conteúdo útil ao Ministério da Ciência e da Tecnologia, propósito que obviamente saudamos porque até agora não tem sido muito perceptível em que é que esse ministério se ocupa e pode ser uma boa oportunidade para esse ministério começar a ajudar ao estudo das questões de segurança e sobretudo da evolução da tecnologia nas causas da insegurança pública. O instituto de que falava é finalmente a concretização dessa promessa que o Partido
Página 219
31 DE OUTUBRO DE 1996 219
Socialista fez ao país da criação desse instituto de estudos de segurança?
Por outro lado, olhamos para este relatório de segurança interna e chegamos à conclusão, infeliz e triste porque não há certamente nenhum cidadão português que fique satisfeito por verificar que a criminalidade aumenta, todos gostaríamos de não perder tempo com este tipo de debates e ocupar o tempo noutro tipo, que os principais índices dos tipos de crime que diminuem e que contribuem para baixar alguns índices de criminalidade resultam daquilo a que costumamos chamar a ocultação legal da criminalidade. Vou dar exemplos.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É a cifra negra.
O Orador: - Ainda não vamos à cifra negra, esta é uma cifra de outro tipo.
O furto, no último Código Penal, passou a ser um crime que depende de queixa e não era assim anteriormente. Nós sempre dissemos que isso era uma técnica que visava simplesmente eliminar legalmente a criminalidade, embora fosse infrutífera do ponto de vista da eliminação real dessa criminalidade. Ora bem, cá está, todos os indicadores de todas as principais forças de segurança apontam os furtos como uma das principais contribuições para a diminuição do índice de criminalidade.
Por outro lado, deixou também de ser crime conduzir automóveis sem a carta de condução e cá está outra poderosa contribuição para a diminuição do índice de criminalidade relativo a 1995. Por absurdo, qualquer dia chegaremos ao ponto de eventualmente começar a descriminalizar algumas outras condutas se eventualmente verificarmos que perdura a incapacidade do poder político em combater as causas do crime, em dotar as forças de segurança de meios de repressão e de prevenção, não nos restando outra coisa a não ser alterar a lei para que aquilo que é crime deixe de ser e, obviamente, no ano seguinte a estatística sobre a segurança interna será paradisíaca.
Sr. Ministro, está em condições de garantir que, do ponto de vista da política de segurança e também penal, não aplicarão técnicas deste tipo nas reformas da legislação penal no sentido de deixar de considerar como crimes condutas que o são ou alterar regimes da natureza de vários tipos de crime para beneficiar os índices dos relatórios de segurança interna? V. Ex.ª repudia este tipo de política ou está de acordo com ela? Faço esta pergunta porque não era Deputado na anterior legislatura e por isso não me lembro de qual a posição que, sobre esta matéria, exprimiu nessa altura.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, por assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, em relação ao primeiro ponto tenho muito gosto em esclarecê-lo. Na realidade são coisas diferentes, como acontece na generalidade dos países europeus, uma coisa é um instituto de investigação, um instituto de altos estudos, orientado fundamentalmente para o conhecimento em profundidade dos fenómenos, e outra o processo de formação. Com a proposta da academia de segurança o que se visava era pôr alguma ordem, coordenação e sistema; num conjunto muito fragmentado
de instituições que se ocupam hoje dos processos de formação.
Na realidade, cada uma das forças de segurança tem uma ou duas unidades de ensino e é esse tipo de problemas, essa dispersão de recursos, essa dificuldade de coordenação, que se tem de enfrentar - e está a ser enfrentada com um exame global. A ideia é progredir de maneira gradual, sem perda de recursos existentes e de valências que neste momento estão instaladas em várias instituições, caminhar no sentido de mais ordem, de mais aglutinação e de mais economia neste sistema. Portanto, são duas áreas diferentes a dos estudos e a da formação.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em relação à segunda questão, duas precisões. O Código Penal entrou em vigor apenas em 1 de Outubro e, portanto, não é justo assacar a estas estatísticas, que não são deste Governo o efeito da alteração do regime em relação ao furto.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É o próprio relatório que o diz.
O Orador: - Simplesmente, o relatório reporta-se a um período limitado. Devemos lê-lo com objectividade em relação ao Governo que governou durante o período em que vigorava o anterior Código Penal. Na realidade algumas descriminalizações são inaceitáveis ou não resultaram como estratégias de resolução de problemas e uma delas é de facto a descriminalização da condução sem carta.
Aliás, é já uma opção tomada pelo Governo a de voltar a propor a criminalização, que há dois anos atrás constituiu uma opção certamente legítima mas cujos efeitos não foram positivos. Pela minha parte propus algumas vezes que certos crimes que não eram públicos passassem a sê-lo, o que significa que não sou seguramente um fanático da descriminalização por medidas legislativas. Aliás, quem tenha lido o Manual de Criminologia do Professor Costa Andrade, que lamento não esteja presente, também não pode jurar que não há descriminalizações que não se justifiquem.
Portanto, a recriminalização e a descriminalização têm de ser caminhos abertos ao legislador. Houve descriminalizações injustificadas, nalgumas delas temos de voltar sobre os nossos próprios passos, e a condução sem carta é uma delas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Temos debatido e dentro de momentos o Sr. Deputado Marques Júnior, em nome da bancada, exprimirá algumas contribuições da nossa parte sobre esta questão, o modelo de relatório de segurança interna. Mas, verdadeiramente, o Sr. Ministro acaba de contribuir para a dilucidação de uma outra questão. Ou seja, qual deve ser o modelo do debate a incidir sobre o relatório de segurança interna.
Creio que ao fazê-lo como o fez acaba de dar uma contribuição muito importante para uma interrogação que de vez em quando angustia os Srs. Deputados da bancada
Página 220
220 I SÉRIE - NÚMERO 6
do PSD, qual seja, qual é a marca, qual é o selo original do Governo nesta matéria. A resposta está dada e, quanto a nós, bem dada. O Relatório Anual de Segurança Interna, num ano em que o PS só foi Governo na parte final, é um relatório que deve ser lido em conjugação com a intervenção que acaba de fazer. Porque essa intervenção, devo dizer-lhe, revelando a reflexão que tem vindo a ser apurada sobre esta matéria - e reflexão digna de discussão que não prescindiremos de fazer -, permite, neste domínio, juntar ao que consta do relatório aquilo que, de facto, os membros do Governo devem dar. É uma reflexão sobre a estratégia e propostas que não são apenas um olhar para o passado, mas um olhar para o futuro, bem como compromissos concretos, que ainda por cima estão quantificados em articulação com o Orçamento, com directrizes claras - sete que aqui apontou - e em relação às quais desafiaria os Srs. Deputados, se fosse caso disso, a exprimirem zonas de divergência significativas. Por nós não as encontramos.
Todavia, quanto às questões que enunciou, há um aspecto que, creio, valeria a pena aprofundar pela nossa parte, que diz respeito àquilo a que chamaria a cooperação ou a dimensão internacional do combate à criminalidade. O Sr. Ministro aflorou a questão, o relatório aflora-a também, ainda que traduzindo um paradigma não apurado nesta matéria, pois é desarticulado.
Ou seja, as forças de segurança têm a sua actividade envolvendo contactos internacionais - é um facto -, combatem o crime internacional dentro das nossas fronteiras e, no plano europeu e global, em colaboração com outras polícias, mas o reflexo disso no Relatório Anual de Segurança Interna é limitado. Tem sido limitado até agora e continua limitado este ano. Creio que aí podemos francamente inovar e melhorar significativamente. Porquê? O debate sobre o Terceiro Pilar, de Maastricht, revela que este tem vícios - dificuldades que estamos a tentar superar no quadro da Conferência Intergovernamental -, mas revela também que há, da nossa parte, uma miríade de estruturas de dependência de múltiplos Ministérios, que tratam em muitos casos de decisões que no momento, pelo menos, têm de ter carácter estritamente confidencial, embora outras não, e a decantação do que é confidencial e do que o não é, bem como o plasmar disso em documentos que os cidadãos possam analisar tem falhado.
O Sr. Ministro sublinhou que este não é apenas um combate do Estado, mas um combate do Estado com os cidadãos e não contra eles, mas o certo é que a divulgação disto tem faltado. Esse défice de percepção traduz-se depois na não reforma administrativa em relação a esse grupúsculo de estruturas complexas, que têm de existir mas devem estar articuladas, e, por outro lado, num vazio de out puts em relação à informação que a Câmara possa apreciar e discutir em contraditório, como sempre deve ser.
Assim sendo, gostaria que o Sr. Ministro se pudesse pronunciar sobre esta matéria.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado José Magalhães acaba de fazer-nos um desfio, a que vamos tentar corresponder, seja no próximo relatório; seja em passos perante a Comissão ou o próprio Plenário, fornecendo mais informação e mais
reflexão sobre o comprometimento e a participação que está a ser desenvolvida nesse domínio.
Não posso estar mais de acordo com a vantagem, a necessidade e a justificação dos Parlamentos terem mais voz no domínio do tratamento das matérias do Terceiro Pilar, nomeadamente quando uma conferência intergovernamental pode atribuir um novo estatuto a algumas dessas matérias e, em particular, pode fazê-lo em áreas da administração interna. E isso tem particular saliência em relação, por exemplo, a medidas de combate à imigração ilegal - por exemplo, a hipótese de mecanismos comuns de afastamento de cidadãos entrados irregularmente é uma questão que está em cima da mesa. Mas outras mais haverá: por exemplo, á problemática do asilo, e, portanto, quanto às alterações de natureza quase constitucional em relação ao edifício europeu e ao modo de tratamento desses problemas que estão em cima da mesa mais do que nunca se justifica o conhecimento do Parlamento, E o Governo só pode tentar corresponder, apresentando mais informação e disponibilizando-se, como sempre tem acontecido, a estar presente nos debates que forem promovidos sobre essa matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, que apresentará o relatório da 1.ª Comissão e, simultaneamente, intervirá em nome do seu grupo parlamentar.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, dispensar-me-ia da apresentação do relatório, na medida em que, neste momento, o debate está lançado - já tivemos mais de uma hora de debate e penso que não fará muito sentido, nesta fase, estar a pronunciar-me detalhadamente sobre o relatório, pelo que iria referir alguns aspectos quanto a este debate.
Creio que este debate tem uma dificuldade óbvia, dado que o Relatório Anual de Segurança Interna é relativo ao ano de 1995 - que foi um ano de mudança de Governo, que se deu quase no final do ano - e, embora seja apresentado sob a responsabilidade do actual Governo, é relativo a um período de tempo que, na sua maior parte, foi da responsabilidade do governo anterior.
O Sr Guilherme Silva (PSD): - É uma espécie de «bloco central»!
O Orador: - E tem também um outro problema: o relatório assenta em dados dás forças policiais de 1995, embora nós, ainda há muito pouco tempo, tivéssemos oportunidade de realizar aqui um debate sobre esta mesma matéria, assente já em dados relativos ao ano de 1996 que o Governo nos facultou è, portanto, tendo já conhecimento de dados mais actualizados.
Por outro lado, a política de segurança interna adoptada de Janeiro a Outubro de 1995 não pode ser assacada a este Governo, pois a reestruturação das forças policiais que é referida neste documento, com alterações de responsabilidade entre a GNR e PSP, não foi levada a cabo por este Governo, uma vez que este não estava em funções, embora seja este Governo que nos apresenta o relatório e, portanto, formalmente, é a ele que nos dirigimos.
Penso que, neste momento, já não valerá a pena discutir qual foi a política de segurança interna levada a cabo pelo PSD...
Página 221
31 DE OUTUBRO DE 1996 221
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Foi muito boa!
O Orador: - ... e creio que o que valerá a pena, relativamente a este relatório, é salientar alguns aspectos que dele constam e que nos dão conta do estado da criminalidade no final de 1995 e de qual foi a evolução ao longo desse ano.
Podemos fazê-lo já com a consciência de que, tanto quanto se sabe, relativamente ao ano de 1996, no essencial, as características da criminalidade detectada mantiveram-se, uma vez que não houve alterações muito significativas.
Relativamente ao Relatório, creio que é importante que a 1.ª Comissão, na apreciação que fez e no relatório que aprovou, tenha chamado a atenção para dois aspectos particularmente negativos, que desde há vários anos marcam os relatórios de segurança interna. Um deles tem que ver com o relato que é feito, na parte que se refere aos dados constantes .da actividade operacional da GNR, das acções que correspondem a um exercício legítimo de direitos por parte dos cidadãos como se se tratasse de actos que põem em causa a ordem pública ou feitos à margem da ordem legal e constitucional, o que, efectivamente, não corresponde à realidade.
Quer dizer, não tem de constar do Relatório Anual de Segurança Interna que foram realizadas, no período em apreço, não sei quantas manifestações de agricultores a protestar contra a política agrícola do Governo ou que ocorreram não sei quantos conflitos laborais em não sei quantas empresas e que houve umas tantas manifestações de trabalhadores a protestar contra os salários em atraso.
Efectivamente, estas são formas de protesto social, perfeitamente compreensíveis, justificadas e feitas ao abrigo de direitos constitucionais e legais. Portanto, esta não é, manifestamente, uma matéria que deva constar do Relatório Anual de Segurança Interna apresentado à Assembleia da República.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Devam ser outras as preocupações das forças policiais que não estas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Assim, será importante que, no Relatório Anual da Segurança Interna de 1996 que este Governo há-de trazer à Assembleia da República, sejam omitidas referências desta natureza, tal como devem ser omitidas referências - e estas aqui constam particularmente na parte relativa à PSP - à atribuição de natureza racial à criminalidade.
É realmente chocante - e a Comissão de alguma forma reconheceu-o - que o Relatório, na parte respeitante à PSP, tenha a preocupação de discriminar, dentro da criminalidade, qual é a praticada por cidadãos de raça branca e a praticada por cidadãos de raça negra ou por cidadãos cinzentos. Esta, de facto, é uma prática deplorável a nível do Relatório. Efectivamente, a criminalidade não tem cor e é lamentável que isto ainda aconteça. Espero que também no relatório de 1996 sejam eliminadas as concepções desta natureza. Aliás, congratulo-me com o facto de esta ser a convicção expressa pela 1.ª Comissão.
Alguns elementos constantes deste Relatório merecem uma reflexão, desde logo o facto de haver uma
discrepância muito sensível relativamente às conclusões que tiram, por um lado, a GNR, que detecta um aumento da criminalidade e, por outro lado, a PSP e a PJ, que referem uma diminuição. Isto pode ter que ver com áreas de influência, pois a GNR é responsável pelo policiamento de cerca de 90% do território nacional.
Por outro lado, é referido também que, relativamente às áreas onde a PSP actua, se terá verificado uma diminuição da participação de crimes, mas creio que esta diminuição poderá ter a ver não tanto com urna diminuição real da criminalidade e mais com uma diminuição das participações de determinado tipo de crimes.
Creio que valerá a pena reflectirmos sobre alguns aspectos que são preocupantes e que são apresentados de forma preocupada neste Relatório como características da criminalidade detectada em 1995. Refiro-me ao aumento da violência em diversos crimes, designadamente nos assaltos, à utilização de uma gama mais larga de armas, ao aumento da criminalidade grupal, que creio ser uma das características em 1995, ao aparecimento, muito preocupante, das chamadas «milícias populares», ao alastramento, particularmente na periferia dos grandes centros urbanos, de zonas de explosão e conflitualidade latente, corri índices muito preocupantes de agressividade e violência, que são aqui referidos e ao desenvolvimento de práticas de vandalização, de que foi exemplo típico o fogo posto em automóveis, particularmente na Área Metropolitana de Lisboa.
Há ainda uma preocupação justificada em relação ao aumento da criminalidade juvenil e ao aumento de 11 % de crimes praticados por menores de 16 anos, havendo também uma grande preocupação, inteiramente justificada, relativamente à manifestação crescente de fenómenos de intolerância racial e quanto à expressão particularmente grave que estes fenómenos tiveram com a actuação dos grupos de skinheads.
São aspectos para reflectir, tal como é para reflectir, embora não tenha que ver com um fenómeno de criminalidade, pelo menos na sua grande maioria, o aumento muito preocupante da sinistralídade rodoviária no ano de 1995, com cifras impressionantes que nos são apresentadas neste relatório. De facto, quando se verifica que a GNR tomou conta da ocorrência de 86 705 acidentes, de que resultaram 1 757 mortos, e quando a PSP, no mesmo período, regista acidentes dos quais resultaram 397 mortos, estamos perante um fenómeno cuja gravidade obriga a uma reflexão muito séria por parte desta Assembleia.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, creio que importa reflectir, até porque se aproxima a discussão do Orçamento do Estado - já estamos, de alguma forma, nessa discussão e o Sr. Ministro já teve oportunidade de o apresentar na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias -, sobre um aspecto importante do Relatório Anual de Segurança Interna que diz respeito aos condicionamentos para os quais as várias forças de segurança chamam a atenção nos elementos que apresentam e que depois são incorporados neste Relatório apresentado pelo Governo.
Com efeito, é sensível uma diminuição da actividade operacional por parte da PSP - é assumida - relativamente a anos anteriores: o número de operações diminuiu de 10 639, em 1994, para 7395, em 1995. A explicação
Página 222
222 I SÉRIE - NÚMERO 6
que é apresentada para este facto refere-se ao empenho dos agentes em outras actividades não relacionadas. com serviços operacionais. Há também uma diminuição real dos efectivos, sendo particularmente significativo o que consta do Relatório na parte referente à GNR quanto aos condicionamentos e limitações à sua capacidade de actuação.
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias teve oportunidade de tomar contacto directo, de viva voz, com estes condicionamentos, numa recente visita que fez à GNR. Com efeito, trata-se de situações que têm de ser alteradas, desde logo, o défice de 3500 agentes em relação ao efectivo legalmente fixado e a escassez de viaturas disponíveis por esta força de segurança. É impressionante que, dos 5400 veículos da GNR, 3092 tenham idade superior a 10 anos, 136 estejam imprestáveis para o serviço e cerca de 500 estejam inoperantes, por falta de recuperação, no final de 1995.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É a poupança!
O Orador: - De facto, isto dá-nos um retrato das tremendas limitações objectivas à actuação desta força policial, da qual 212 postos são também elementos que constam do relatório - dispõem apenas de uma viatura.
Para além disto, também esta força de segurança é afectada pela dispersão a que os agentes são obrigados, por força das centenas de milhar de diligências judiciais que têm de satisfazer.
Uma última palavra, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para mencionar um facto referido no relatório, e do conhecimento de todos, relativo ao Serviço de Informações de Segurança, que, na dará em que estamos a fazer este debate, não está ultrapassado. Com efeito, este relatório refere a inexistência prática do Conselho de Fiscalização do SIS, por força da demissão dos seus membros, em meados de 1994. Esse facto é mencionado no relatório, porque no final de 1995 a situação mantinha-se, mas estamos em Outubro de 1996 e o Conselho de Fiscalização do SIS continua, na prática, a não existir, o que é uma situação particularmente grave para o sistema de informações de segurança existente e de todo em todo intolerável.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia da República é hoje chamada a apreciar, no âmbito da sua competência, o relatório anual em matéria de segurança interna relativo ao ano de 1995. Este relatório refere-se a 1995, ou seja, ao último ano de governo do PSD, e tem na sua estrutura e nos elementos de referência que o' sustentam o modelo de informação à Assembleia da República que foi característico desses governos.
É um relatório que, do ponto de vista formal, cumpre o disposto no n.º 3 do artigo 7.º da Lei de Segurança Interna, referindo-se a situação do País no tocante à segurança interna e a actividade desenvolvida pelas forças e serviços de segurança no ano de 1995.
A informação anual que nos tem sido fornecida por este tipo de relatórios tem ficado aquém, na minha opinião, daquilo que são os imperativos da própria lei, com suporte no n.º 2 do artigo 7.º da Lei de Segurança Interna, que refere expressamente que «os partidos da oposição representados na Assembleia da República serão ouvidos e
informados com regularidade peio Governo sobre o andamento dos principais assuntos de política de segurança.».
Com o actual Governo, tem havido uma preocupação constante em dar cumprimento, pelas mais variadas formas, a esta disposição da lei, que, para além de ser um imperativo de ordem legal, tem sido e continuará a ser uma afirmação de vontade política, conscientes como estamos da importância da segurança para o bem-estar dos cidadãos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apresentação do relatório de segurança interna não deve ser um simples, acto formal em que os partidos representados na Assembleia da República aproveitam para tecer as suas considerações sobre a segurança interna. Ele deve ser o momento em que todos, em conjunto, fazem uma avaliação global e harmonizada de um conjunto de informações que deve estar permanentemente 'disponível e actualizado.
Este é um momento especial para a avaliação mas não deve ser o único, porque é uma matéria que tem implicações com o «normal funcionamento das instituições democráticas, o regular exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática.».
Neste sentido, para além do tratamento crítico e meticuloso que esta questão exige, deve o Governo comungar das suas preocupações com a Assembleia da República, para que esta matéria não seja objecto de guerrilha político-partidária mas passe a ser a afirmação permanente e consensual das condições que permitam, no respeito pelos direitos, liberdades e garantias e pelos demais princípios do Estado de Direito democrático, «proteger a vida e a integridade das pessoas, a paz pública e a ordem democrática.».
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - A apreciação por esta Câmara do relatório anual sobre segurança interna deveria constituir, pois, um importante e privilegiado espaço de reflexão que pudesse conduzir a soluções que contribuíssem para o exercício pleno e livre pelos cidadãos dos seus direitos fundamentais.
Mas para que isto aconteça é absolutamente necessário um diálogo permanente entre o Governo e a Assembleia, com informações frequentes e actualizadas, acompanhando as medidas que se forem impondo para a correcção das anomalias.
A este propósito, é justo salientar a disponibilidade e frequência com que o Governo se tem deslocado à Assembleia e à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para tratar de questões de, segurança assim como a informação periódica que tem fornecido aos Deputados.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - As informações sobre segurança devem, numa prática salutar, ser abordadas na 1.ª Comissão, a qual por sua vez deve, no cumprimento dos seus deveres de fiscalização, contactar directamente os serviços e forças de segurança, como aconteceu recentemente, na visita à Policia Judiciária e à Guarda Nacional Republicana, por sugestão do Ministro da Administração Interna, tomando conhecimento das suas potencialidades e dificuldades no cumprimento das missões que lhes estão cometidas. Esta
Página 223
31 DE OUTUBRO DE 1996 223
deve ser, pois, uma actividade permanente da l.ª Comissão ou da Subcomissão de Administração Interna, ao contrário do que acontecia anteriormente.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - No que se refere à apresentação do relatório, à sua estrutura e organização e também ao seu conteúdo quantificado, ele corresponde no essencial ao que vinha sendo seguido pelo governo anterior, e não podia ser de outra forma. No entanto, no futuro, seria desejável que esses indicadores pudessem permitir uma leitura mais correcta da situação.
Falar neste momento nos índices de criminalidade, repartida pelos vários sectores, que subiram ou desceram em percentagem, pode ser importante para uma análise quantificada sectorialmente mas não permite uma ideia geral correcta quanto aos índices de segurança ou insegurança.
Como exemplo da dificuldade de uma' leitura global, o relatório que estamos a analisar diz no seu primeiro parágrafo que «os dados respeitantes à criminalidade registados pelas diversas forças de segurança durante o ano de 1995 parecem apontar em direcções divergentes», referindo em seguida que as «divergências nas tendências evolutivas registadas pelas diversas forças de segurança, dada a sua diferente implantação no território nacional, têm de ser correlacionadas com as diferentes taxas de denúncia observadas no conjunto do território nacional.».
Depois de uma análise qualitativa das principais características evidenciadas pela evolução dos fenómenos criminais ao logo de 1995, conclui que o «seu peso estatístico não é suficiente para modificar o padrão tradicional de criminalidade no nosso país, embora possam indiciar uma alteração qualitativa dos comportamentos e das ameaças criminais em desenvolvimento na sociedade portuguesa.».
É, pois, evidente que a questão estatística ao nível dos indicadores da criminalidade deve ser ponderada, de modo a limitar o máximo possível a margem de «manipulação», que é uma tentação que deve estar afastada das nossas preocupações.
Em primeiro lugar, os indicadores e o seu significado terão de ser aferidos por todos os intervenientes e fornecedores de informação e devem ser harmonizados entre si e também em relação aos indicadores internacionais.
Em segundo lugar, é preciso eliminar as incompatibilidades e incongruências dos vários indicadores estatísticos, de modo a poder fazer-se uma leitura sem pressupostos interpretativos, permitindo uma visão global e mais aproximada da realidade.
Devíamos caminhar no sentido de encontrar novos indicadores que pudessem «medir» com mais realismo, e principalmente de uma forma mais clara, os verdadeiros valores da segurança/insegurança, considerando estes nos precisos termos em que são definidos na Lei de Segurança Interna. Nele se refere que, para além da «actividade desenvolvida pelo Estado para garantir a ordem, a segurança e a tranquilidade pública, proteger pessoas e bens, prevenir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas», tem também de se ter presente «o regular exercício dos direitos é liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática.».
Para que o futuro relatório não seja mais do que um mero enunciado estatístico, apresentado e individualizado
por cada serviço e força de segurança, é necessário apresentar uma melhor integração da informação, que consta ou deve constar de outros relatórios, que também se relacionam com a segurança ao nível das garantias de direitos fundamentais, como sejam, por exemplo, os que dizem respeito à Comissão de Dados dos Serviços de Informações e os que se referem à protecção de dados pessoais face à informática. Estes dados e outros - como os que foram referidos pelo Sr. Deputado José Magalhães, quanto às relações com as organizações internacionais que dizem respeito à segurança do cidadão, são indispensáveis para se ter uma ideia o mais completa possível sobre os indicadores de segurança, os quais, aliás, estão implicitamente contidos no n.º 3 do artigo 7.º da Lei de Segurança Interna, quando refere: «A Assembleia da República apreciará anualmente um relatório, a apresentar pelo Governo sobre a situação do País no que toca à segurança interna, bem como sobre a actividade das forças e dos serviços de segurança.». Isto significa que o relatório não se esgota num conjunto de relatórios anuais elaborados pelas forças e serviços de segurança, muitas vezes, como já referimos, sem uma harmonização conceptual quanto aos indicadores que são essenciais para se compreender como evoluem os índices de criminalidade.
Considero os elementos de informação relativos aos dados informatizados muito importantes, porque dizem respeito a elementos que, não sendo muitas vezes racionalizados, influenciam o estado de espírito dos cidadãos, criando uma predisposição psicológica condicionadora da sua acção como elemento activo da própria segurança, contribuindo, muitas vezes, para um quadro desfocado da realidade e, por isso, perturbadora das medidas a tomar no combate à criminalidade.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - A importância da integração de todos estes elementos é evidente, pois permite saber quais os sectores mais vulneráveis e mais preocupantes, de modo a poder dar-se as respostas adequadas, o que, na impossibilidade de respostas globais, por falta dos meios ideais, implica orientar o esforço prioritariamente a certas formas de criminalidade.
Uma outra preocupação, que não é de hoje mas de sempre e que é fundamental para o êxito no âmbito da segurança interna, é a coordenação e a cooperação entre as várias instituições. Todos sabemos que isto não é fácil de conseguir, por razões muitos diversas, mas é indiscutivelmente uma preocupação que deve estar sempre presente, porque dela depende muitas vezes o êxito ou o fracasso de acções que, com frequência, levam meses e anos a preparar.
Importaria, pois, conhecer o parecer do Governo sobre o relacionamento entre as várias entidades e, mais importante do que isso, sobre quais os avanços, em termos de solidariedade institucional, cooperação e complementaridade funcional, das diversas estruturas no sistema nacional de segurança interna decorrentes dos princípios institucionais e da própria Lei de Segurança Interna.
No relatório que estamos a analisar isto não é evidenciado, partindo-se provavelmente do princípio de que a evidência dispensa qualquer comentário. Compreende-se, de certo modo, que assim seja, mas penso que no futuro seria de fazer referência a estes aspectos, pois sabemos que aquilo que deveria ser evidente, na prática, deixa muito a desejar, como, aliás, é referido no próprio relatório sectorial
Página 224
224 I SÉRIE - NÚMERO 6
sobre o sistema de autoridade marítima, integrado no relatório de segurança interna, em que se recomenda que para o futuro se deve «continuar a aperfeiçoar os mecanismos de cooperação entre os serviços de segurança (...)».
Consciente destes problemas, o actual Governo deu grande destaque à necessidade da cooperação, assinando vários protocolos que pretendem potenciar, em tempo útil, a acção conjugada das várias forças de segurança, de modo a obter uma maior racionalização de meios e rentabilidade das acções desenvolvidas.
Isto passa também por um novo espírito, que está a ser desenvolvido e que deve continuar, no sentido de todos se preocuparem mais com o resultado global e final das acções policiais e menos com o facto de saber qual foi, na circunstância concreta e conjuntural, a instituição responsável pelo êxito visível e mediático da operação.
Como já referimos, isto implica, nomeadamente, uma boa coordenação ao nível da troca de informação e do conhecimento das acções desenvolvidas ou a desenvolver, o que, aliás, não é fácil de conseguir, porque há que compatibilizar o segredo da acção com o conhecimento indispensável ao nível da coordenação dos vários serviços.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Falei do relatório de segurança interna e daquilo que penso deverem ser elementos integradores de um futuro relatório, mas é evidente que tudo não passará de boas intenções se as forças e serviços de segurança não forem dotados de melhores meios humanos e materiais.
Estes são os pressupostos da acção do actual Governo no que se refere à segurança, cortando com a política do anterior, que deixou as forças de segurança nos limites das suas capacidades.
No que diz respeito aos recursos humanos e considerando que o homem é o elemento fundamental da segurança, o Governo está a fazer um esforço considerável, quer ao nível da formação e actualização de conhecimentos, quer ao nível do aumento do número dos agentes com funções especificamente policiais, como, aliás, tem sido claramente afirmado como objectivos à prosseguir, com concretização prática no próprio Orçamento do Estado que estamos a analisar.
Paralelamente, foram também reforçados os meios materiais à disposição das forças de segurança.
Este conjunto de acções, a par de uma nova cultura de reforço dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, que este Governo indiscutivelmente incutiu nas força de segurança, são fundamentais para criarem um clima de confiança que é necessário no relacionamento entre o agente e o cidadão e na credibilização do próprio sistema..
Paralelamente, estas acções originaram já um quadro geral de segurança que é uma referência estável de liberdade, de justiça e de defesa da dignidade humana, requisitos fundamentais ao bem-estar e qualidade de vida dos cidadãos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de intervir neste debate com a consciência de que ele é, na verdade, um debate positivo, terá forçosamente de ser um debate positivo, porque o espirito com que olhamos estes
relatórios de segurança interna tem de ser sempre um espírito de aprendizagem, um espírito construtivo, um espírito de tentar fazer sempre melhor do que aquilo que estes relatórios nos dizem ter sido feito nos anos transactos.
Aliás, a história última destes relatórios de segurança interna, que realmente só começaram a ser apresentados em governos do PSD,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Com a publicação da Lei de Segurança Interna!
O Orador: - ... foi curiosa.
Na primeira vez, discutimos três relatórios e, nessa altura, a segurança não era ainda tema prioritário para as oposições, estas ainda não tinham descoberto este filão, designadamente o Partido Socialista.
Como as coisas não estavam a correr mal, é natural que os três relatórios tivessem sido discutidos em conjunto, porque eles representavam um aumento relativamente pequeno da criminalidade.
Quando o relatório de 1994 apareceu, e foi um relatório que, de facto, traduziu um aumento significativo da criminalidade, foi discutido logo a seguir, com uma prioridade e urgência diferente da dos anteriores.
Este ano, estamos a fazer uma discussão muito desfasada de um relatório que diz respeito a 1995, a qual, em boa verdade, deveria ter sido realizada em Abril, ou coisa que o valha. Mas por um acontecimento extraordinário, o nosso debate de urgência sobre segurança, ele é agora apreciado.
E o que diz este relatório? Vamos tentar deter-nos na sua análise. Achei curioso que houvesse várias interpretações, mas o que diz realmente este relatório é o seguinte, e vejam que é tão simples quanto isto: numa área - PSP mais Polícia Judiciária - em que foram inventariados cerca de 264 000 crimes, houve um decréscimo de 6 e 4%; noutra área, que é a da GNR, em que foram inventariados 108 000 crimes, houve um crescimento de 5,9%. Ou seja, a história dos 90% do território nacional é um eufemismo e uma falsa pista, porque o que acontece é que a GNR, em termos de verificação de incidentes criminais, regista menos do
que metade, isto é, o conjunto das outras forças regista 2,5 vezes o números de crimes registados peia GNR. E é natural que também tenha havido um aumento percentual de crimes registados pela própria GNR, porque também houve mais concelhos em que a GNR intervinha em 1995 do que em 1994. As pessoas, quando lêem este relatório, esquecem-se que houve 20 trocas de PSP por GNR, houve vinte e poucos concelhos para onde foi a GNR pela primeira vez, tendo saído a PSP.
Portanto, o que este relatório diz é algo importante: a criminalidade - e estou a citar de cor uma parte do relatório da PSP - desceu no ano de 1995, ao contrário do que aconteceu nos anos anteriores. Esta é a realidade e é sobre isto que devemos meditar.
O Sr. Ministro fez - devo prestar-lhe toda a justiça uma intervenção ponderada, criteriosa e na qual visou fundamentalmente obter áreas de consenso em relação àquilo que deveria ser a sua actuação futura, e nesse aspecto o Sr. Ministro fez bem porque não há quem retire o consenso a alguns dos pontos que o Sr. Ministro enunciou.
V. Ex.ª falou num instituto de segurança, mas já existe o Instituto de Criminologia. Se eu fosse a si, Sr. Ministro, entendia-me com o Sr. Ministro da Justiça e punha o Instituto de Criminologia a trabalhar, dava-lhe eventualmente competências em relação a esta área, poupava a
cria-
Página 225
31 DE OUTUBRO DE 1996 225
ção de um instituto e fazia os estudos que o Sr. Ministro precisa em relação ao estudo da criminalidade.
Em relação à qualificação... Mas, Sr. Ministro, não tem V. Ex.ª aquela que é, nesta altura, entendida como uma das melhores escolas superiores de polícia da Europa? Tem e está a trabalhar! E tem uma boa escola da Polícia Judiciária. A única coisa a fazer é incrementar protocolos de cooperação entre as duas - V. Ex.ª citou-o e bem - e desenvolver a qualificação das polícias como uma forma essencial de melhor as preparar.
V. Ex. ª não disse modernização, com toda a certeza, mas V. Ex.ª tem em curso programas de modernização, onde tem de gastar mesmo muito dinheiro, E não digo isto para preocupá-lo a si ou ao Si Ministro das Finanças, mas V. Ex.ª certamente ainda não averiguou bem quanto dinheiro vai ter de gastar na modernização das polícias. É que não é algo que se faça em um, dois ou três anos, mas ao longo do tempo. E exprimo a minha preocupação, chamando a sua atenção para isso, pelo facto de as verbas constantes do PIDDAC para investimento serem muito mais fortemente colocadas nos anos de 1997,
1998 e 1999 do que propriamente no ano imediato. Isto é, no ano imediato, aquele em relação ao qual o Sr. Ministro vai fazer um esforço orçamental, e já considerável, admito-o, é uma gota de água no oceano. Se compararmos, nas verbas do PIDDAC, aquilo que é o investimento para o próximo ano com aquilo que V. Ex.ª anuncia como o essencial e necessário para as forças de segurança para os outros anos, encontramos uma diferença abissal. Contudo, Sr. Ministro, em tudo aquilo que o PSD puder contribuir para que estas verbas sejam gastas na segurança, nos próximos anos, conte connosco do seu lado, que é algo que o PS nem sempre fez no passado, Sr.
Ministro.
Aplausos do PSD.
Mas devo dizer-lhe ainda mais uma coisa, Sr. Ministro, relativa à coordenação. Com certeza, a coordenação tende a aumentar, mas, aqui para nós, não é na base protocolar. A base protocolar é uma base fácil, frouxa, que não tem sentido, pois, quando há lei, não há, protocolo, o protocolo não substitui a lei. Tudo aquilo que o Sr. Ministro tem de desenvolver é, de facto, uma política de coordenação em relação às várias forças policiais, nas quais se têm de incluir novas competências e novos meios para a brigada fiscal - a qual foi aqui citada hoje várias vezes, até pelo Sr. Ministro Adjunto, Jorge Coelho, e muito bem, no debate sobre «A situação actual do consumo e do tráfico de droga em Portugal» -, que lhe dêem efectiva capacidade de intervenção no controle da fronteira externa. É um pecado nosso, Sr. Ministro, confesso-o, não ter conseguido pôr a funcionar a brigada fiscal do mar - era algo que eu queria, mas não tive dinheiro para isso. Só desejo que V. Ex.ª tenha...
O Sr. José Magalhães (PS): - Tem, tem!
O Orador: - Mas, atenção, Sr. Ministro e Partido Socialista, não são 700 000 contos!
O Sr. José Magalhães (PS): - Estamos atentos!
O Orador: - É que 700 000 contos são, outra gota de água no oceano daquilo que é necessário para dotar a brigada fiscal de helicópteros, de lanchas rápidas, para, no fundo, repetir aquilo que foi o concurso dos helicópteros...
O Sr. José Magalhães (PS): - Veja lá se também quer um porta-aviões!.
O Orador: - Sr. Deputado, estou a falar seriamente e julgo que o senhor não tem razão para estar a intervir aqui dessa maneira. Sei que V. Ex.ª gosta de ter a gravata da GNR, de vez em quando,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Com toda a honra!
O Orador: - ... mas, hoje, utilize outra coisa. Utilize não a gravata, mas a consciência daquilo que estamos aqui a discutir, para que esses apartes não sejam produzidos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Com toda a honra!
O Orador: - Estava eu a dizer, Sr. Ministro e Srs. Deputados, que é apenas uma gota de água aquilo que V. Ex.ª anunciou que ia gastar. Vai ter de refazer o concurso dos helicópteros, que ficou por fazer no PIDDAC do ano passado, e de fazer novo concurso para fornecimento de lanchas rápidas; vai ter de modificar as competências da GNR, de acordo, aliás, com um projecto de lei que aqui apresentámos.
Quanto à internacionalização, estou completamente de acordo consigo, Sr. Ministro. Aliás, aquilo que foi feito em relação a Schengen, com algumas críticas iniciais do Sr. Deputado José Magalhães, nas quais lhe concedo alguma razão, porque nos fez, eventualmente, reconsiderar alguns problemas, e ainda agora lho digo,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Não tem nada que agradecer!
O Orador: - Mas, repito, fez bem, Sr. Ministro.
A questão da EUROPOL, como V. Ex.ª sabe, Sr. Ministro, é fundamental. Aquilo que, por vezes, foi dito pelo PS, em relação à questão da luta contra a droga e das polícias municipais na luta contra a droga, dava vontade de rir. Eu sabia que não era a sério que diziam isso; eu sabia que, quando diziam isso, estavam a tentar desviar a atenção para outra coisa e que o principal problema era, de facto, o da luta internacional contra a droga e o da concessão de meios sérios às forças de segurança para lutar contra a droga. É por isso que, nesta altura, entendo a questão da EUROPOL - com a extensão de competências da EUROPOL, vindas a este Parlamento, como o Sr. Ministro disse, e bem, para ser sufragadas - como uma questão essencial da cooperação e da vitória na luta contra os vários tráficos e também o tráfico de droga.
Não vi neste relatório, Sr. Ministro, confesso-o, e foi uma surpresa, uma alusão, que eu esperava, a outras áreas de cooperação internacional, designadamente com os PALOP, que tinham sido uma preocupação nossa - e V. Ex.ª sabe disso - e que gostaria de ver aludidas neste relatório, porque são fundamentais também para a segurança do País. Os protocolos de colaboração feitos com os PALOP, que entendiam a prossecução de acções de formação e de intercâmbio e a realização prática de convénios que tinham sido estabelecidos, valia a pena terem vindo mencionados no relatório e não vieram, mas também admito e desejo que as acções continuem.
No que respeita à questão da localização, o Sr. Ministro e o PS tinham tido um diferendo importante - e, penso, era um dos principais -, em relação à política de segurança dos governos do PSD, quanto à questão da
pro-
Página 226
226 I SÉRIE - NÚMERO 6
ximidade ou não proximidade das organizações de polícia dos cidadãos.
Devo dizer que sempre julguei esta uma falsa questão. Era uma questão que, compreendia, fosse política ou de discussão política, mas não era uma questão real. Portanto, tanto os senhores como nós queríamos exactamente a mesma coisa. A história das divisões concentradas não era senão uma fórmula que encontrámos para resolver os problemas da criminalidade na Grande Lisboa e no Grande Porto, que tinha necessariamente como consequência a existência de postos de atendimento e de circulação de agentes pelas cidades e como base uma articulação perfeita quer com sistemas de telecomunicações quer com outras unidades de polícia, designadamente as polícias de transportes. Portanto, só tinha sentido entender isto, se entendido o conjunto. Assim como só tinha sentido entender isto, se entendido dentro do âmbito da criação dos serviços municipais de policia, que, sem competências de natureza de segurança pública, preenchiam uma área administrativa que não estava nem devia estar consagrada neste conjunto de atribuições. Portanto, entendo, Sr. Ministro, que a nossa divergência, se calhar, era mais conjuntural, ou, se quiser, mais de natureza de linguagem ou discurso político do que real.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Por isso, penso que a preocupação que o Sr. Ministro agora representa e aqui assume não é senão a nossa própria preocupação. E dou-lhe um exemplo concreto: em Campo de Ourique, há um jardim, o Jardim da Parada, onde esteve, durante muitos anos, uma roulotte e onde, antes de estar a
roulotte, era um sarilho imenso, porque ninguém conseguia parar lá, nem as crianças nem os idosos, pois havia uma intranquilidade permanente naquele bairro. E, a partir daquele momento, as crianças e os idosos tiveram um sítio onde estar e hão-de continuar a estar.
É evidente que ainda no nosso tempo - e o Sr. Deputado José Magalhães não sabia - ...
O Sr. José Magalhães (PS): - Sou fundador de Campo de Ourique!
O Orador: - ...foi preparada uma nova instalação de um posto de atendimento para substituir' a tão famosa roulotte. Mas isso não significou senão a nossa preocupação em multiplicar, como o Sr. Ministro já disse, e bem, os postos de atendimento pela cidade. É que, quando li, no outro dia, no Correio da Manhã, um relato da sua reunião com os responsáveis da, divisão do Calvário, Sr. Ministro, percebi a insistência com que V. Ex.ª perguntava se, na verdade, aquilo era positivo, ou não, e se tinha, ou não, inconvenientes. É evidente que uma organização dessas tem sempre alguns pequenos inconvenientes. Mas do que não há qualquer dúvida é que não conseguiria ter os benefícios que conseguiu ter, durante algum tempo, em relação à criminalidade, se não tivesse uma organização desta natureza e se ela não abrangesse áreas críticas da cidade.
Gostaria de lhe fazer uma chamada de atenção particular, Sr. Ministro, porque, às vezes, as coisas parece que acontecem por acaso, mas não acontecem. A esquadra do Calvário veio preencher uma das áreas mais importantes de Lisboa, quer na composição do seu tecido social quer em relação aos seus factores criminógenos. E o que
acontece é que naquela zona havia nem mais nem menos do que o Casal Ventoso e havia e há nem mais nem menos do que o principal foco de atracção da noite lisboeta, o que, de um ano para o outro, fez aumentar extraordinariamente a frequência daquela zona e daquela área.
Portanto, o Sr. Ministro tinha de arranjar uma organização específica, que conseguisse resolver em profundidade os problemas que ali iam surgir. Não vou lembrar aquilo que dizia o actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, que era uma boutade deste género, o que é extraordinário num Ministro de Negócios Estrangeiros: «os senhores mandam polícia para a Bósnia, mas não mandam polícia para o Casal Ventoso!». Errado! Estava polícia no Casal Ventoso!... Estão mais polícias hoje na Bósnia!...
Mas queria apenas dizer que, na verdade, aquela organização para aquele local. de Lisboa era e é a indicada e dá frutos como deu em relação ao Porto naquilo em que foi praticada.
Sr. Ministro da Administração Interna, não gostaria de estar a abusar da paciência de V. Ex.ª e da Câmara, alongando a minha intervenção, mas queria apenas dizer o seguinte: o Sr. Ministro está preocupado com a criminalidade, aliás é o seu métier principal, mas da nossa parte - acredite, Sr. Ministro - a preocupação não é menor. Por isso, quero dizer-lhe, mais uma vez, com muita frontalidade, que pode contar com a oposição para fazer da política de segurança interna um sector em que haja um consenso essencial para desenvolver as acções que forem consideradas mais prioritárias e urgentes.
A nossa atitude, quando, na altura da interpelação, apresentámos os projectos de lei relacionados com esta questão, foi uma atitude que se quis construtiva e não destrutiva. Se alguns daqueles projectos de lei que apresentámos forem aprovados, o Sr. Ministro vai ter de ter, necessariamente, um reforço substancial de meios no seu Ministério e por isso, e pensando nisso, é que quisemos que eles fossem discutidos antes dá apreciação do Orçamento do Estado. V. Ex.ª não pode ver da nossa parte senão um gesto de boa vontade, um gesto de colaboração leal, de uma oposição que se quer leal e séria em relação à apreciação destes problemas.
Sr. Ministro, se calhar, este relatório de segurança interna não é o melhor relatório. Concordo com vários Srs. Deputados que disseram que este modelo de relatório tem de ser alterado. $ certo que este relatório é da responsabilidade do Governo, é o Governo que o apresenta, mas eu compreendo que é difícil ao Governo eliminar as considerações que vêm das forças de segurança. Neste modelo de relatório também deve haver transparência naquilo que é dito. Este relatório é formalmente apresentado pelo Governo perante a Assembleia, é da sua responsabilidade e tem de incorporar aquilo que as forças de segurança entenderem dever dizer.
Todavia, se V. Ex.ª entende que o modelo de relatório tem de ser diferente e se entende que deve ter, no uso da sua competência, uma iniciativa legislativa que diga que o relatório deve ser feito de modo diferente, que a relação do Governo com a Assembleia no que toca à análise da criminalidade e da sua evolução deve ser diferente, mais atempada e mais frequente, conte também, Sr. Ministro, com a nossa colaboração nessa matéria.
Mas, Sr. Ministro, há uma outra coisa que me preocupa: o Sr. Ministro tem dito várias vezes que o número de agentes é insuficiente e que o vai aumentar muito, e certamente que o Sr. Ministro teve em atenção aquilo que resultou também da análise do relatório de segurança
in-
Página 227
31 DE OUTUBRO DE 1996 227
terna e, eventualmente, do compulsar de outros elementos de informação sobre a atitude e a actividade das forças de segurança. Todavia, devo dizer-lhe o seguinte: quando o Sr. Ministro e alguns Deputados do Partido Socialista referiram que a GNR tinha menos 3000 agentes do que dispõe a sua lei orgânica, que é de 1993, é verdade, Sr. Ministro. Mas não há ninguém que faça uma lei orgânica e esta foi feita há relativamente pouco tempo - que, no que diz respeito a necessidades de pessoal, coloque a fasquia em termos inferiores a esta. Uma lei orgânica tem de ter uma diferença grande entre aquilo que é o seu preenchimento e aquilo que é a sua capacidade. É por isso que a GNR não tem os tais 3000 agentes que ainda lhe fazem falta.
Mas também lhe devo dizer, com muita clareza, que julgo que o número que adiantou várias vezes - os tais 7000 agentes, em três anos - não é nada por aí além. O Sr. Ministro, aqui há tempos, na interpelação que fizemos sobre segurança interna repetiu várias vezes que houve anos em que não tinha entrado qualquer agente nas forças de segurança. Isso não era verdade, Sr. Ministro! Não houve ano algum em que não tenham entrado, pelo menos, 1200 agentes nas forças de segurança. A GNR teve sempre uma incorporação de 900 agentes, pelo menos. E, se contarmos com os elementos das forças de segurança que advieram das transferências da Guarda Fiscal e dos funcionários administrativos que entraram para as forças de segurança, não houve nenhum ano em que isto tivesse acontecido numa fasquia inferior. Devo dizer-lhe, designadamente, que, no último ano, o número foi consideravelmente superior. .
Quando V. Ex.ª fala em números tem de falar em agentes da PSP e da GNR e tem de falar nos funcionários civis, porque era esse o nosso projecto. E, como sabe, pois esses números ficaram no Ministério, se V. Ex.ª fizesse todas as transferências que tinha a fazer dos funcionários administrativos e dos polícias utilizados nas funções administrativas conseguia recuperar muito mais agentes do que aqueles que, nesta altura, diz que vai formar. Se V. Ex.ª tivesse continuado a fazer esse esforço durante o ano passado, teria necessitado, porventura, de incorporar 1500 agentes por ano, número que, aliás, deveria continuar a incorporar nos próximos quatro anos, o que lhe daria 6000 agentes nos próximos quatro anos.
Portanto, não era necessário fazer tanto alarido em relação ao número de polícias, nem isso é fundamental, Sr. Ministro. Penso que a questão fundamental é a qualificação, a preparação, os meios, a orgânica e a coordenação, como V. Ex.ª disse - e muito bem! - e não o número de polícias.
Aliás, devo dizer-lhe o seguinte: se, com tão poucos polícias, foi possível apresentar estes índices de diminuição da criminalidade, então, é porque a carência não foi tão absoluta como se diz, embora seja certo que isto representou, do ponto de vista das forças de segurança, um esforço certamente sério e acrescido, mas não foi impeditivo da sua
acção.
Também lhe devo dizer, Sr. Ministro, que, quando hoje li a Capital, verifiquei que havia uma coisa que preocupava tanto os cidadãos como a polícia. É que V. Ex.ª, por um lado, diz que vai aumentar o número de polícias e, por outro, introduz alterações nas formas de preenchimento das queixas, que, essas sim, são capazes de influenciar em dois sentidos aquilo que vai acontecer nas esquadras: em primeiro lugar, faz com que, como diz aqui, cada inquérito leve mais de uma hora e meia a preencher, o que
significa que vai cativar mais agentes para as funções administrativas do que aqueles que já havia e que todos os agentes que vão sendo metidos no sistema vão sendo incorporados na máquina, para mal e não para bem, e, em segundo lugar, vai fazer com que a tal percentagem do inquérito de vitimação, que é a única que conhecemos, e que é de 1991/1992, e não de 1995,...
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, já saiu outro!
O Orador: - Se saiu outro, tanto melhor!
Como eu estava a dizer, esse inquérito vai fazer com que as percentagens de não denúncia vão aumentando indefinidamente. E nem é preciso sequer fazer alterações de política criminal, como aquelas que tinham sido idealizadas pelo Sr. Deputado do PP Jorge Ferreira, basta meter este pequeno grão de areia na engrenagem, ou seja, aumentar a dificuldade da queixa e, então, V. Ex.ª terá, com toda a certeza, uma diminuição estrondosa dos níveis de criminalidade. Porém, do ponto de vista sério, como temos estado a discutir até aqui esta matéria, não é solução a apresentar.
Sr. Ministro, congratulo-me com a discussão deste relatório. Foi uma discussão feita com elevação e seriedade, na qual o Sr. Ministro apresentou uma postura serena, dialogante e de responsabilidade. Congratulo-me com tudo isso e também que a oposição e o próprio Partido Socialista tenham embarcado no mesmo estilo ou no mesmo rumo e tenham conseguido fazer a diferença entre a discussão deste relatório de segurança interna e a discussão, infeliz; de relatórios de segurança interna de anos anteriores.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Guilherme Silva. Talvez seja um pouco insólito; no entanto, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, permita-me que lhe diga o seguinte, que tem a ver com a parte final da sua intervenção: independentemente do ano a que respeita este relatório, dificilmente vamos encontrar nos debates sobre segurança interna e, designadamente, nos debates dos relatórios de segurança interna, nos últimos 10 anos, alguma intervenção da oposição que tenha o sentido de Estado e de responsabilidade que V. Ex.ª manifestou neste debate relativamente a esta matéria.
O Sr. Deputado foi responsável também, enquanto Secretário de Estado, por este sector nos governos anteriores e, por isso, queria fazer-lhe uma pergunta muito simples: face àquilo que tem sido a política de segurança deste Governo, ou a sua ausência, e face ao relatório que hoje debatemos, que diz respeito ao último ano de exercício do governo anterior, que posição tomaria hoje V. Ex.ª relativamente às super esquadras se tivesse responsabilidades de governo?
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - E amanhã!?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
Página 228
228 SÉRIE - NÚMERO 6
O Sr. José Magalhães (PS): - É uma pergunta de almanaque! Está a ser entrevistado!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Guilherme Silva fez uma pergunta ao Sr. Deputado Carlos Encarnação. Como o Regimento não impede esse tipo de perguntas, tenho de dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Encarnação, para responder.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O Regimento devia até estimular perguntas destas, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Aí já tenho algumas dúvidas!
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Srs. Membros do Governo, às vezes isto acontece não desta forma. Do Partido Socialista para o Governo também acontecem coisas dessas.
Eu sei que esta pergunta estava na mente de vários Srs. Deputados, designadamente do Partido Socialista!
Vozes do PS: - Ah!...
O Orador: - E estava na mente de muitos Srs. Deputados desta Assembleia, porque, quando assistiram à descrição da presença do Sr. Ministro na Divisão do Calvário ficaram com perplexidade. Há pouco já tentei citar este pormenor, que foi significativo, que era o Sr. Ministro a perguntar se tinha sido uma boa ou má experiência e, em geral, tinha concluído que tinha sido uma boa experiência.
Portanto, para quem não conseguiu ler esse jornal e ver essa descrição do acontecimento, vou responder, com a aquiescência do Sr. Presidente, o seguinte: na verdade, entendo - e diria isto com toda a sinceridade ao Sr. Ministro - que não há outra forma de dotar de meios, de organização e de coordenação grandes áreas urbanas - Lisboa e Porto, designadamente - sem as divisões concentradas. Pode o Sr. Ministro, depois, como há pouco disse, encontrar os complementos para isto, no sentido da localização, da relação com o cidadão, etc., mas a questão da organização não pode fugir a isto aqui, em Portugal, como não pode fugir em qualquer dos grandes centros urbanos da Europa. E, portanto, o que estávamos a
fazer, aquilo em que trabalhámos e que lançámos não foi produto da nossa invenção mas, sim, qualquer coisa que foi estudado durante muito tempo pelas forças policiais e tendo também em conta experiências comparadas internacionais. Foi isso que levámos a cabo. Em meu entender, a única coisa que o Sr. Ministro pode e deve fazer, se quiser seguir o meu conselho, é melhorar este sistema, mas
de maneira alguma o deve deixar cair, nem deve deixar cair a construção das novas instalações das divisões concentradas, como, aliás, de forma preocupante vi no PIDDAC do Orçamento para o ano que vem, porque vejo que as dotações para o ano que vem são também muito pequenas, é certo que há continuação das dotações para os anos subsequentes, mas a esse ritmo o Sr. Ministro nunca mais conseguirá resolver o problema de segurança dos grandes centros de Lisboa e Porto.
Aplausos do PSD.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): -.Nunca houve tanto como agora! Mas que desfaçatez!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro lugar - e penso que isto ainda aqui não foi feito, hoje, durante este debate -, gostaria de, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Popular, dar público testemunho do reconhecimento que fazemos do esforço e da dedicação com que os agentes das forças de segurança, não obstante algumas incompreensões e muitas limitações, têm desempenhado as suas importantes missões, fizeram-no em 1995 e vão, certamente, continuar a fazê-lo. Num país, onde durante tanto tempo foram lançados alguns anátemas sobre as forças de segurança, penso que não é demais reconhecer o esforço e, sobretudo, as difíceis condições em que muitas vezes têm de zelar pela segurança dos cidadãos. Por isso, em nome do meu grupo parlamentar, quero deixar público testemunho desse reconhecimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que possa parecer, estive hesitante em 'manter ou não a minha intervenção, mas, depois de ouvir o Sr. Deputado Carlos Encarnação, decidi-me fazê-la, apesar de não saber a que se deveu aquilo que me' pareceu ouvir. É que não sei se foi mesmo verdade que o Sr. Deputado Carlos Encarnação esteve no governo - e eu penso que sim - ou ...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não, era outro!
O Orador: - ... se o governo do PSD teve o Deputado Carlos Encarnação como Secretário de Estado. O que me pareceu que esteve a mais na intervenção que fez foi o País,...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não! Era outro Carlos Encarnação! Era um sósia!
O Orador: - ... porque, de facto, V. Ex.ª «pintou» um quadro que eu temo que se o «pintasse» em público os cidadãos portugueses dificilmente se reveriam nele. Aliás, é sintomático que tenha sido um Deputado da sua bancada a colocar-lhe perguntas, o que demonstrou que fez de facto uma intervenção em circuito fechado, sem qualquer ligação com a realidade e com os problemas que julgávamos que, durante quatro anos, V. Ex.ª tentava resolver, mas que não conseguiu!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Exactamente, bem observado!
O Orador: - De facto, está hoje à vista o porquê de o não ter conseguido fazer. A verdade, Sr. Deputado Carlos Encarnação, é que tudo aquilo que V. Ex.ª aqui referiu pode certamente ter feito, pode é não estar certo, pode é não ter sido o suficiente para resolver os problemas que visava resolver.
No entanto, também quero prestar aqui uma palavra de reconhecimento por uma medida que o governo a que V. Ex.ª pertenceu tomou e que, na nossa opinião, foi uma boa medida.
Vozes do PSD: - Ah?:..
O Orador: - Aliás, já o fiz em público, e V. Ex.ª sabe disso.
Página 229
31 DE OUTUBRO DE 1996 229
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Repita!
O Orador: - Não é pelo facto de o Sr. Deputado Guilherme Silva estar a pedir-me para repetir que o vou fazer, mas porque penso que o devo fazer. V. Ex. ª e o seu governo criaram a polícia especial para as linhas da CP e do Metro, o que foi uma boa medida, pois permitiu diminuir sensivelmente os índices de criminalidade nas linhas da CP e do Metro, onde foram colocados esses agentes de segurança. O que lamentei noutro dia - e repito hoje aqui - é que não tenha tido o mesmo tipo de comportamento relativamente à generalidade das forças policiais, no que diz respeito a esse problema concreto, porque teria resolvido muitos mais problemas do que aqueles que julga que resolveu ou que nos quer fazer crer que resolveu.
Em todo o caso, eu diria que o relatório que estamos a apreciar reflecte as grandes tendências de política de segurança e de combate à criminalidade da última década. Cumpre reconhecer que nos últimos 10 anos, de uma forma geral, o poder político não prestou a atenção que devia aos problemas de segurança e de criminalidade; deixou degradar continuamente os efectivos humanos, os meios materiais e a correcta utilização dos recursos por parte da generalidade das forças de segurança; foi manipulando a legislação penal, ora a favor da ocultação legal do crime ora despenalizando para tentar combater perversões de organização do sistema prisional, que também não soube combater e reformar de raiz; foi deixando degradar os prazos do processo penal; foi deixando degradar os momento em que as punições eram aplicadas, e uma punição penal aplicada muito depois da prática dos factos produz uma sensação de laxismo do funcionamento do sistema e, obviamente, a opinião pública sente que existe uma certa permissividade na aplicação da justiça; deixou, enfim, chegar o sistema prisional a pontos de ruptura, como hoje estão à vista, e que precisam de medidas urgentes e estruturais.
Portanto, este relatório exprime tudo isto. As forças de segurança queixam-se da falta de efectivos. É sintomático que a PSP, em matéria de detenções e em matéria de estatística das várias operações que desenvolve, tenha, em 1995, os índices inferiores em todas as modalidades de operações relativamente ao ano anterior, que justifica com o facto de ter sido sucessivamente chamada a desempenhar outro tipo de funções. Isto é sintomático, por um lado, da distorção das correctas funções da PSP e, por outro, da falta de meios que ela tem. A GNR queixa-se, como o Sr. Deputado Carlos Encarnação referiu, da falta de 3500 efectivos.
De facto, este relatório é o espelho de um conjunto de políticas que durante 10 anos foram aplicadas e que se chegou à conclusão de que não podiam continuar.
Registamos também que aumentou a criminalidade violenta, não no país virtual mas em Portugal. Este relatório de segurança interna relativo ao ano de 1995 reconhece o crescimento da criminalidade transfronteiriça, associando-o à entrada em vigor dos Acordos de Schengen que, em nosso entender, não funcionam do ponto de vista da prevenção e da repressão da criminalidade internacional e que merecerão, eventualmente, um debate específico na Assembleia da República.
O problema é que agora temos de tratar mais do futuro do que aquilo que se passou em 1995. Esperamos fazer o debate do relatório de segurança interna relativo ao ano de 1996 no primeiro semestre de 1997 e não em Outubro de 1997. Pensamos que é assim que deve ser e, neste ponto, estamos de acordo e temos a garantia do Sr. Ministro da Administração Interna de que assim será. Já conhecemos os dados do primeiro semestre de 1996, pelo que fará pouco sentido estarmos neste momento a perder muito tempo com os de 1995, pois a realidade alterou-se.
Por outro lado, esperamos sinceramente que aumente a taxa de denúncia, como sinal de recuperação da confiança dos cidadãos na capacidade das forças policiais em actuarem, que estes debates sejam menos virtuais e que o próprio relatório de segurança interna esteja mais a par da verdadeira realidade de segurança e criminalidade do País.
É verdade que é necessário aumentar os efectivos e os meios materiais das forças de segurança, mas também é verdade que não estamos descansados quanto a esta matéria. Como ouvimos, noutro dia, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias o aumento possível de agentes das forças de segurança nesta legislatura, em termos reais, andará à volta dos 3500 efectivos, resultado das admissões que o Governo disse que ia fazer em número de 7000 durante a Legislatura, deduzidas das saídas, a vários títulos, de diversos agentes de segurança. Isto, na nossa opinião, não vai ser suficiente, não corresponde ao que foi prometido ao País, e por isso não estamos muito descansados quanto a esta matéria.
Por outro lado, tarda também a alteração essencial em matéria de processo penal e de processo civil relativamente às notificações e, enquanto isso não for subtraído das ocupações essenciais das forças de segurança, a situação que consta do relatório relativo a 1995 manter-se-á.
Esta é a razão por que penso que será mais útil e oportuno debatermos em próximas oportunidades mudanças
de política, quer em matéria de segurança, quer em matéria de legislação penal, de legislação processual e de organização do sistema prisional, deixando por agora o reconhecimento de que, no essencial, o relatório de segurança interna de 1995 confirma muitas das preocupações que foram avançadas por largos sectores da sociedade portuguesa, sobretudo pela sociedade portuguesa que foi vítima da prática de crimes, que é sempre a parte essencial e que, do nosso ponto de vista, deve estar presente na definição destas políticas.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, percebi que o senhor tinha feito um pedido de esclarecimento envergonhado...
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Percebeu mal!
O Orador: - ... e que a alusão feita ao Deputado Guilherme Silva foi apenas para o mascarar. Vou responder-lhe, fazendo mesmo um pedido de esclarecimento, verdadeiro e próprio, apenas com a intenção de o esclarecer quanto a dois ou três pontos, em relação aos quais há, a meu ver, alguma confusão nessa mente conturbada, politicamente conturbada.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Faz bem em corrigir!
Risos do CDS-PP.
Página 230
230 I SÉRIE - NÚMERO 6
O Orador: - Em primeiro lugar, quando o Sr. Deputado alude à criação de novos tipos de crimes ou à abolição de tipos de crimes, tem de o fazer num duplo sentido. Há, de facto, a criação de novos tipos de crimes, há a criação de condutas criminalizadas e há a abolição de condutas criminalizadas. Portanto, as estatísticas têm sempre alguma aleatoriedade, porque ao longo do tempo há dados num sentido e noutro e, como é evidente, em relação a essa matéria o Sr. Deputado tem de ter cuidado em avaliar justamente a progressão dos índices.
Em segundo lugar, e esta é a segunda questão que quero abordar, o Sr. Deputado Jorge Ferreira, de certa maneira, abusou quando fez a análise das conclusões. É que eu não resolvi tudo, tenho a consciência disso, nem sequer a maior parte das coisas. A única coisa que eu fiz foi dar um contributo sério e honesto, do ponto de vista da organização e da minha actividade enquanto membro do Governo, para resolver as coisas. Penso que, pelo menos, isto não pode ser deixado de reconhecer. Agora, nunca por nunca eu poderia querer resolver tudo, é impossível! A criminalidade vai continuar a subir, vai continuar, porventura, a subir a ritmos que não queremos.
Estas são sociedades de aumentos de criminalidade e de duas uma: ou há medidas de fundo em relação a esta matéria, há uma permanente atenção em relação à política criminal, há uma permanente atenção em relação a áreas que, porventura não competem ao Ministério da Administração Interna, tal como a área penal ou a área processual penal, ou, então, nunca mais nos entendemos.
Mas já agora, e como última referência, devo dizer que achei bem que o Sr. Deputado também tivesse feito referência a dois problemas relativamente aos quais temos projectos legislativos pendentes na Assembleia, o que significa que V. Ex.ª adere aos diplomas que apresentámos e que, certamente, vai fazer toda a força para que sejam discutidos e votados antes do Orçamento, como também propusemos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, mais uma vez, abusando do Regimento, porque o Sr. Deputado Carlos Encarnação não fez qualquer pedido de esclarecimento, vou, com o maior prazer, comentar as afirmações produzidas acerca da minha intervenção.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, se alguém tem de felicitar alguém por, em seis meses, ter mudado de opinião sobre a liberdade condicional dos crimes graves sou eu a V. Ex.ª.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não!
O Orador: - Em Fevereiro, o Sr. Deputado votou contra a mesma medida que agora, com agrado e com o PP a seu lado, verá aqui ser discutida para a semana em matéria de liberdade condicional. E, portanto, apesar do «paraíso» em que V. Ex.ª pensa que o País viveu entre 1991 e 1995, se há alguém que mudou de opinião em seis meses...
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não mudei!
O Orador: - ... sobre matérias fundamentais da política penal do País foram VV. Ex.as e não nós. Nesta matéria, nós andamos a dizer o mesmo de há três anos para cá e quem mudou de opinião em seis meses foram VV. Ex.as . Ainda bem! Porque nós não queremos ficar com a razão, queremos mudar as coisas, e por isso ficamos muito contentes que os senhores, pelo menos em matéria de liberdade condicional, já tenham concordado com as nossas propostas.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Isso é diferente!
O Orador: - Apenas lamentamos que quando foram poder não vos tivesse ocorrido e que tenham, apesar de tudo, demorado tanto tempo a mudar de opinião. Cá estaremos um dia para ver se o PSD também não começa a propor o agravamento de algumas penas, muito ao contrário daquilo que fez quando esteve no governo.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Jorge Ferreira, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Por isso, Sr. Deputado Carlos Encarnação, o voto que deixo expresso é no sentido de o PSD ser mais rápido, ao contrário do que tem sucedido, a apoiar as boas ideias e não faça questão que estas provenham exclusivamente da sua bancada para as poder votar favoravelmente.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna, a quem, por dispor de pouco tempo, a Mesa concede cinco minutos.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Muito obrigado, Sr. Presidente, mas suponho que não vou gastar os cinco minutos que amavelmente me concede.
Queria, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, regozijar-me com a atmosfera construtiva em que decorreu este debate e com as contribuições e os pontos de vista críticos dos Srs. Deputados que intervieram, representativos de todas as bancadas e das suas experiências, designadamente daquelas sobre as quais já foi proferida decisão eleitoral. Esses pontos de vista, sendo legítimos e pertinentes, têm o seu lugar no debate mas, naturalmente, o tempo já exarou um juízo político a que temos de ser leais. Recordo esse aspecto porque não se esperaria que, depois desse juízo político, realizássemos nesta sede uma espécie de debate imaginário.
Gostaria de dizer, se me é permitido, que este debate teve também o seu momento divertido e penso que o Sr. Deputado Guilherme Silva não me vai levar a mal, pela amizade que sabe que lhe dedico. Esse momento divertido fez-me lembrar aquela ideia da retro-realidade e da retromania (como sabe, retromania é o termo utilizado quando se evoca este domínio) que esteve presente quando o Sr. Deputado, à falta de ter o Sr. Ministro Dias Loureiro,...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Que saudades! Grande Ministro!
O Orador: - ... decidiu encenar neste Hemiciclo uma realidade fazendo uma pergunta a um ilustre ex-Secretário de Estado. Essa é uma realidade imaginária que já não existe e penso que não devemos contribuir para alimentar
Página 231
31 DE OUTUBRO DE 1996 231
realidades imaginárias através de simulacros de debate político cujos pressupostos já se encontram decididamente alterados.
Aplausos do PS.
Queria aceitar como possível uma qualificação utilizada neste debate a propósito dos esforços que estão a ser feitos no sentido de reforçar e modernizar meios materiais e de introduzir outras melhorias no panorama herdado em relação às forças policiais: a expressão «gota de água» pode ser aceite se se admitir também que essa «gota de água» se segue a um período de uma longa seca.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, com a intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna, dou por terminado o debate sobre o relatório anual em matéria de segurança interna de 1995.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, a partir das 15 horas. Terá período de antes da ordem do dia e na ordem do dia proceder-se-á à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 62/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro (Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras).
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 25 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
José António Ribeiro Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Vital Martins Moreira.
Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto Pinto.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Gonçalves Sapinho.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Manuel Castro de Almeida.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):
Armelim Santos Amaral.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Raul d' Assunção Pimenta Rego.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho.
José Manuel Durão Barroso.
José Mendes Bota.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
Página 232
232 I Série - Número 6
DIÁRIO da Assembleia da República:
Depósito legal n.º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E.P.
1 - Preço de página para venda avulso, 9$00 (IVA incluído).
2-Para os novos assinantes do Diário da Assembleia do República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números p4blicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.
3 - O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República.
PREÇO DESTE NÚMERO 324$00 (IVA INCLUÍDO 5%)
Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e a assinaturas do «Diário da República», e do «Diário da Assembleia da República», deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional - Casa da Moeda, E.P., Rua D. Francisco Manuel de Melo, 5 - 1099 Lisboa Codex