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Sexta-feira, 24 de Janeiro de 1997
1 Série - Número 30
DIÁRIO
da Assembleia da Republica: VII LEGISLATURA
2.A SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE JANEIRO DE 1997
Presidente:. Ex.mo Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de resolução n.º 37/VII.
Em debate mensal com o Parlamento, o Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres), após uma intervenção inicial. respondeu a questões dos Srs. Deputados Luís Marques Mendes (PSD), Jorge Lacão (PS), Manuel Monteiro (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Manuela Ferreira leite (PSD), Carlos Zorrinho (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Odete Santos (PCP). Carlos Encarnação (PSD), Medeiros Ferreira (PS). Pedro Pinto (PSD) - que suscitou interpelações à Mesa do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa) e do Sr. Deputado Carlos Coelho (PSD) e Henrique Neto (PS).
Foi aprovado um requerimento, subscrito pelo PSD, CDS-PP e PCP, de baixa às Comissões de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias e de Administração do Território. Poder Local, Equipamento Social e Ambiente da projecto de lei n.º 65/VII Criação do provedor municipal (PS) para nova apreciação.
O projecto de lei n.º 18/VII - Prevenção da poluição provocada por navios que transportem substâncias poluentes ou perigosas nas águas da zona económica exclusiva portuguesa (Os Verdes) foi rejeitado na generalidade.
A Câmara aprovou ainda quatro pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias autorizando Deputados do PS e do PSD a deporem em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 25 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura. Vital Martins Moreira.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
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António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa a proposta de resolução n .º 37/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Cooperação no âmbito da Conferência Íbero-Americana, assinada em S. Carlos de Bariloche, Argentina, em 15 de Outubro de 1995, que baixou à 2.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate mensal do Primeiro-Ministro com a Assembleia da República.
Para fazer a intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A vida política portuguesa tem sido marcada, nos últimos tempos, por debates acalorados em torno de alguns problemas sérios e de fundo e outros menos sérios. Felizmente, esses problemas têm vindo a resolver-se, e bem, e podemos hoje enfrentar serenamente, neste Parlamento, questões de fundo que se relacionam com o bem-estar da economia portuguesa, entendido não como um fim em si mas como suporte do
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bem-estar das pessoas e das famílias, que deve ser o objectivo central de todos nós.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Somos, muitas vezes, acusados de a política económica deste Governo ter como única preocupação ou obsessão a moeda única europeia. Gostaria de começar por tornar claro que essa acusação não tem qualquer fundamento, por quatro razões: em primeiro lugar, porque, para nós, a moeda é um instrumento ao serviço da política e a política é um instrumento ao serviço das pessoas, ou seja, somos pela moeda única, porque é a condição para estarmos no centro do processo de integração europeia;...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... em segundo lugar, porque a consolidação das finanças públicas
é um bem em si; em terceiro lugar, porque a dívida, em percentagem da riqueza produzida em cada ano, foi crescendo, de 1992 a 1995, de 63,3% para 71,8% e não temos o direito de legar aos nossos filhos uma divida crescente que eles terão de pagar, quando ainda têm de pagar as nossas pensões de reforma, pelo contrário, temos a obrigação de conter a despesa pública, de reduzir as dividas e de desenvolver uma política financeira sólida, com ou sem Europa; finalmente, porque temos preocupações com o crescimento e o emprego.
Em torno desta primeira acusação, fizeram-nos outras duas: a de que não cumpriríamos, em 1996, os objectivos para a moeda única e a de que os cumpriríamos à custa do crescimento do emprego e do bem-estar dos portugueses. São, uma vez mais, duas acusações falsas e já temos hoje números relativamente seguros sobre 1996, mais de três meses passados sobre o debate na generalidade do Orçamento do Estado, e condições para apreciar com serenidade o que se passou no ano passado. Estamos, pois, em condições de vir aqui prestar contas, porque é perante esta Câmara que temos de fazê-lo, sobre a nossa política e os seus efeitos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em matéria de défice, os números recentes do Ministério das Finanças permitem antecipar que o défice do Estado em conta do Estado, no ano passado, será ainda quatro milhões de contos inferior ao défice do Orçamento rectificativo e tudo indica, embora não estejam ainda feitos, como sabem, os apuramentos finais dos fundos e serviços autónomos, que nos manteremos no objectivo do défice global fixado.
Em matéria de divida, pela primeira vez, desde 1992, a dívida pública portuguesa diminuiu em percentagem da quantidade de riqueza produzida no País. Digo isto com particular orgulho, ,porque, durante muito tempo, o Sr. Ministro das Finanças e eu fomos os únicos que afirmámos que assim aconteceria, mesmo contra os relatórios e as previsões
de entidades oficiais portuguesas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A estabilidade cambial manteve-se não à custa de taxas de juro altas, como no passado, mas com taxas de juro em queda, e numa situação em que não é o banco central alemão a apoiar o escudo mas o banco central português a apoiar o marco, comprando marcos e vendendo escudos.
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PCP: - Eh!...
O Orador: - Finalmente, a inflação ficou, em termos médios, em 4,1 % - no limite inferior do intervalo - e, em relação às taxas de juro, devo dizer, porque considero isso, porventura, o mais notável resultado da nossa política económica, que os títulos de dívida pública emitidos em escudos pelo Estado português, a 10 anos, em relação aos títulos de divida pública emitidos em marcos pelo Estado alemão, a 10 anos, tinham, em Outubro de 1995, quando se realizaram as eleições, uma diferença de taxa de juro de 4,75% e, em 21 de Janeiro, apenas de 0,84%.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isto significa que a credibilidade da economia e da política económica portuguesas se aproximou, de uma forma extremamente sensível, da credibilidade da economia e da política económica do país mais sólido da União Europeia, o que representará, porventura, a maior vitória política deste Governo, com consequências extremamente importantes para o Estado, ao nível dos custos da sua própria dívida, para as empresas, ao nível dos custos de investimento e de gestão - que diminuíram, melhorando, com isso, as condições para o emprego -, e para as famílias, que hoje podem comprar mais barato e com juros mais baixos casa, automóvel e outros bens do maior interesse.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, como já referi, há quem nos diga que fizemos isto à custa da economia e do emprego. O meu antecessor costumava dizer que boa política económica era a que conduzia a taxas de crescimento da economia superiores à média europeia e que má política económica era a que conduzia a taxas de crescimento da economia inferiores à média europeia. Depois, na
2.ª Legislatura em que esteve no poder, o meu antecessor inverteu o discurso e dizia que boas políticas económicas, eram aquelas que conseguiam maiores crescimentos económicos nos ciclos positivos, mesmo admitindo que nos ciclos negativos pudéssemos ter menores crescimentos económicos.
Vejamos a realidade fria dos números: entre 1992 e 1995, a economia portuguesa cresceu menos do que a economia europeia e, em 1996, a economia portuguesa cresceu claramente mais e a economia europeia desacelerou o seu crescimento relativamente a 1995. Isto significa que, no momento em que a economia europeia diminuiu o seu ritmo de crescimento, passámos de crescer menos do que a Europa para crescer mais do que a Europa...
Aplausos do PS.
... e, portanto, de acordo com os argumentos do meu antecessor, a política económica deste Governo é duplamente boa, porque a economia portuguesa cresce mais do que a da Europa, mesmo num ano em que diminuiu o crescimento da economia europeia.
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Mas mais importante do que o crescimento económico é o emprego, e o emprego é a grande batalha, a grande preocupação que nos une. Pela primeira vez nos últimos quatro anos, no último trimestre do ano passado conseguimos, finalmente, inverter a tendência do crescimento do desemprego. Números da taxa de desemprego dos quartos trimestres dos anos de 1992 a 1996, segundo o INE: 1992, 4,1 %; 1993, 5,5%; 1994, 7,1 %; 1995, 7,3%; 1996, 7,2%. Pela primeira vez, no quarto trimestre do ano de 1996, segundo o INE, temos um desemprego inferior ao do quarto trimestre do ano de 1995. E, mesmo atendendo aos números do Instituto do Emprego e Formação Profissional, há uma evidente desaceleração do crescimento dos desempregados e, em Dezembro, pela primeira vez se verificou o efeito de contraciclo. Isto é, quando a tendência é sempre a do crescimento do desemprego à medida que o Inverno avança, em Dezembro tivemos menos desempregados registados do que em Novembro.
Aplausos do PS.
Será isto razão para embandeirar em arco? De forma nenhuma, porque o emprego é a nossa preocupação fundamental e porque não está ganha a guerra, está ganha apenas uma primeira batalha. Agora, todos os indicadores internacionais vão no sentido de que, mesmo com o desemprego a crescer em França e na Alemanha, Portugal está no caminho de conter - e, esperamos, de inverter - o crescimento desse mesmo desemprego.
Mais curioso ainda: enquanto que a conjuntura económica, em 1995 - e chegámos ao poder apenas em Outubro desse ano -, foi descendo do principio para o fim, em 1996 foi crescendo do princípio para o fim. E não deixa de ser curioso que, no quarto trimestre de 1996, tenhamos crescimentos de vendas de automóveis de 17%, de vendas de cimento de 20% e de números de empréstimos para habitação de 42,2%. E também não deixa de ser curioso, olhando para o ano de 1996, aquele em que se vão fazendo sentir os efeitos da política económica do Governo, que o índice de produção industrial, que começou mal, com menos 4,4% no primeiro trimestre, tenha passado para menos 0,3% no segundo trimestre, para 3,6% no terceiro trimestre e para 5,0%, de acordo com os últimos números, de Agosto a Outubro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Há confiança crescente nos mercados, a qual se mede, desde logo, pela confiança do exterior.
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - Em 1995, o investimento directo estrangeiro em Portugal foi de 85 milhões de contos e, em 1996, foi de 135 milhões de contos. Mas, se contarmos com o investimento de carteira, com a aposta que os estrangeiros fazem nos activos portugueses, nomeadamente nos cotados nas bolsas, em 1995, assistimos a unha saída de 47,3 milhões de contos e, em 1996, a um aumento de 254 milhões de cotos em acções portuguesas. Em obrigações, passámos de 31,5 milhões de contos para 665 milhões de contos, o que quer dizer que os mercados internacionais apostam hoje, em Portugal, com toda a clareza e com toda a solidez.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, porque os mercados se reflectem, antes de mais, pelas taxas de juro, estamos a assistir, neste momento, à quebra mais espectacular dos últimos anos no nosso país, e não apenas das taxas de juro nominais - as publicadas nos jornais - mas também das próprias taxas de juro reais, descontada a inflação. Esse é, porventura, o aspecto mais interessante e mais importante da actual evolução económica. É que, à medida que baixavam com a inflação, as taxas de juro, durante a legislatura anterior, mantiveram-se sempre em cerca de 5%, para usarmos a Lisbor a um ano; connosco, as taxas de juro baixaram, em Outubro de 1996, para 3,5% e estão, neste momento, em 2,2%.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isto significa que o esforço real exigido às famílias e às empresas, que pedem dinheiro emprestado para melhorar a sua acção produtiva ou as suas condições de vida, está, finalmente, a diminuir e há, por isso, condições que sustentam perspectivas de crescimento para 1997.
O Sr. Presidente: - Agradeço que condense o seu pensamento, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que isto não é um oásis,...
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não parece!
O Orador: - ... a situação não é fácil, os elementos europeus indicam que economias como a alemã e a francesa continuam com gravíssimos problemas e com a elevação das suas taxas de desemprego, o que não pode deixar de ser visto por nós com grande preocupação.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Também me parece!
O Orador: - Porém, uma coisa é indiscutível: os Governos respondem perante os eleitores, as políticas económicas perante os mercados, e os mercados não são entidades abstractas, são constituídos por pessoas e por empresas. E se alguma coisa é hoje evidente em Portugal é que os mercados, as pessoas e as empresas que os constituem têm confiança neste Governo, o que apenas nos leva a querer trabalhar mais e melhor, porque, infelizmente, são muitas as dificuldades e há ainda muito por fazer.
Aplausos do PS.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Aplaudem mas já nem se levantam! Estão no bom caminho!...
O Sr. Presidente: - Para fazer a primeira pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que dispõe de cinco minutos.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero saudar o seu regresso a estes debates e dizer-lhe, para começar, que o discurso que aqui nos trouxe, a abrir o debate, não é, no essencial, em nada diferente daquele que fez aqui, há dois meses, no debate do Orçamento do Estado. É um discurso, em grande medida, repetitivo e, permita-me que lhe diga, muito à defesa, com muitas explicações. Mas tem, de facto, duas
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novidades: uma, por aquilo que disse, e outra, por aquilo que não disse.
Quanto ao que disse, quero felicitá-lo! Coitados dos alemães se não tivessem a ajuda do Governo português, de Portugal e dos portugueses!... Nisso, está de parabéns!...
Risos e aplausos do PSD.
Por outro lado, o seu discurso também tem uma novidade, por aquilo que não disse. O Sr. Primeiro-Ministro exaltou muito o crescimento económico, e isso é sempre bom e positivo, mas aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro não disse foi que o crescimento económico que aqui invocou, como sabe, e bem, está ligado, no essencial, a quatro grandes empreendimentos: a Expo 98, a Auto-Europa, a nova travessia sobre o Tejo e o comboio na antiga travessia sobre o Tejo. Isto foi aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro não disse, como também não disse que esses quatro grandes empreendimentos são da iniciativa do governo anterior que o senhor tanto critica e tanto recrimina.
Aplausos do PSD.
Mas aquilo que é espantoso no Sr. Primeiro-Ministro é que considera tudo o que aconteceu, todos os problemas que se registaram nos últimos dois meses, desde que aqui esteve, como coisas menores. Faz de conta que não existem, faz de conta que não têm importância, faz de conta que não justificam a relevância de o Sr.
Primeiro-Ministro se esforçar por ter uma palavra e uma explicação para os portugueses. Até pelo exemplo dos alemães, parece verdadeiramente que há um país imaginário e, depois, há um país real, que os, portugueses sentem!
Mas vejamos dois ou três exemplos, Sr. Primeiro-Ministro: aconteceu, entretanto, o aumento do custo de vida, em grande medida pelo aumento brutal, nalguns casos injustificado económica e socialmente,...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Disparate!...
O Orador: - ... de alguns produtos e bens essenciais: aumentos de gás - dois no espaço de um mês, seis vezes acima da inflação -, aumentos de electricidade e de combustíveis. O Sr. Primeiro-Ministro sobre isso nada diz! Ou seja, em matéria de salários, pede, e bem, moderação salarial, mas, em matéria de aumento de produtos e bens essenciais, o Sr. Primeiro-Ministro carrega exageradamente, e mal, no bolso dos contribuintes, no bolso dos portugueses. Sobre isto, nada diz!
Aplausos do PSD.
E também nada diz sobre o efeito preocupante que estes aumentos podem ter numa variável importante para chegarmos à moeda única, como é a inflação - oxalá não
suceda!... -, com a importância que também tem no bolso das famílias, porque é verdadeiramente um imposto escondido. Quanto a isto, o Sr. Primeiro-Ministro faz de conta que nada existe!
De resto, o mesmo se regista - algo vindo a público nos últimos tempos - sobre os resultados conseguidos, em contradição com os resultados esperados, relativamente ao plano de recuperação de empresas, aquele que, de tão pomposo, até tomou o nome de um ministro que e senta ao lado de V. Ex.ª. Apresentado para salvar 3000 empresas em Portugal e lançado há vários meses, até. ao momento, tendo em conta o que foi dito na semana passada, apenas 140 empresas se candidataram a esse plano. Sr. Primeiro-Ministro, de duas uma: ou, de facto, o senhor avaliou mal a realidade das empresas e, afinal, há menos empresas em dificuldade do que pensava que existiam, ou, então, o plano é muito bom em teoria, mas, na prática, é um total e completo falhanço. Também sobre isto, o Sr. Primeiro-Ministro nada diz!
Aplausos do PSD.
O mesmo se refira relativamente à agricultura. Segundo se diz, o Sr. Primeiro-Ministro teve até de dar um murro na mesa, para tentar pôr um ponto final naqueles episódios "muito edificantes" entre um Eurodeputado do seu partido e um Ministro do seu Governo. Falou-se muito do Ministério da Agricultura e o senhor até falou do Ministério da Agricultura, o grave é que nem o Sr. Primeiro-Ministro nem o seu ministro tiveram uma palavra sobre a agricultura e sobre os agricultores. E dou-lhe um exemplo em particular, já para não falar de promessas mas de propostas e medidas em concreto que o senhor anunciou ao País: em Junho do ano passado, já lá vai bastante tempo, o senhor anunciou ao País uma linha de 150 milhões de contos de crédito para aliviar o endividamento dos agricultores portugueses.
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro; passado este tempo todo, onde está essa linha de crédito, onde está essa ajuda aos agricultores portugueses?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Será que não conseguiu negociar em Bruxelas essa linha de crédito que o senhor anunciou com pompa e circunstância? Será por essas dificuldades em Bruxelas, e outras, como, por exemplo, a do caso do Alqueva, que já é necessária a intervenção do Sr. Presidente da República, para conseguir. aquilo que o Governo, afinal, não consegue?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Já passaram seis minutos, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Por último, Sr. Primeiro-Ministro, também sucedeu durante este período que, para além da degradação da autoridade do Governo - e, enfim, essa corrige-se, mais dia menos dia, designadamente com eleições -, se degradou a autoridade do Estado.
Risos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, no espaço de um mês, houve a demissão de um comandante da, polícia, de um director do serviço de informações e de um comissário da Expo 98. Durante um mês, assistiu-se, em redor destas situações, a conflitos em que o Governo foi directamente envolvido. Durante este mês, assistiu-se até, no clima de autogestão que hoje em dia existe no seu Governo e na sua administração, a ministros dizerem o contrário do que o senhor
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dizia ou a um inspector-geral das polícias dizer, por exemplo - pasme-se! - que há polícias que cheguem em Portugal, que há polícias que cheguem nas ruas, que, afinal, o Governo não tem razão.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já gastou sete minutos!
O Orador: - Perante tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro, o que é que o senhor diz? Não o preocupa a autoridade do Estado? Não o preocupa o clima de instabilidade que, dessa forma, se cria na sociedade, o clima de intranquilidade para as pessoas? Não é um assunto importante para que se disponha a perder um pouco do seu tempo para dar explicações aos portugueses?
Em conclusão, Sr. Primeiro Ministro, uma vez mais, o senhor, como tem feito nos últimos tempos, "faz de conta". Verdadeiramente, continua a trajectória de um governo que faz grandes acções de relações públicas!
Mas pergunto-lhe aquilo que, hoje, os portugueses perguntam a si próprios: quando é que, verdadeiramente, o Governo começa a governar?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Com todo o gosto, Sr. Presidente.
O que eu disse é, em parte, repetitivo. É verdade! As nossas previsões bateram certo.
Vozes do PS: - Muito bem!
Risos do PSD.
O Orador: - É a primeira vez que isso acontece. Nos últimos anos, nunca as organizações internacionais ratificaram as previsões do Estado português; agora, as organizações internacionais ratificam e aceitam as previsões do Estado português, porque este Governo tem credibilidade e o seu não tinha!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Agora, sobre a recuperação económica do País, o "Sr. Ministro" está totalmente enganado...
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Ministro, já fui!
Risos do PSD.
O Orador: - É uma deferência simpática...!
Aplausos do PS.
Risos do PSD.
Como sabe, em França, estes títulos guardam-se para toda a vida. Isso só prova que temos pelo PSD um grande respeito.
Risos do PSD.
Devo mesmo dizer que a estranheza com que os senhores ouviram chamar ministro ao Dr. Marques Mendes é a prova de que nunca mais esperam vê-lo nessa função.
Aplausos do PS.
Risos do PSD.
O que é importante no crescimento económico este ano é que já não é o investimento público que está a puxar pelo crescimento económico nem é a Ford/Volkswagen. No fim deste ano, o que está a puxar pelo crescimento económico são, em grande parte, as indústrias de bens de consumo, que estavam profundamente deprimidas quando chegámos ao poder.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Isto é que é extremamente importante na economia portuguesa. O efeito da Ford/Volkswagen anulou-se, já está anulado, já estamos ao mesmo nível que estávamos no ano passado na mesma altura.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E as exportações?
O Orador: - Por isso, o que agora faz crescer as exportações é, de novo, o vestuário, é, de novo, o calçado, são as indústrias tradicionais, são os produtores de bens de consumo, o que revela, aliás, uma saúde muito mais profunda na economia portuguesa.
Essa é que é uma questão essencial. É que enquanto os senhores se preocuparam apenas com o investimento estrangeiro e com o betão, nós preocupamo-nos com o fazer baixar as taxas de juro e, com isso, melhorar as condições de funcionamento da economia e das empresas, dando-lhes condições de maior rentabilidade, de crescimento e de expansão.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, aumento de custo de vida provocado por este Governo? Perguntou-me se eu sabia qual era o efeito dos aumentos decretados por este Governo. Acontece que fizemos as contas e sabemos. O conjunto dos efeitos de todos os aumentos e diminuições de preços - e os senhores falam sempre dos aumentos e esquecem-se sempre das diminuições,...
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Não, não!
O Orado: - ... algumas delas vitais para a economia portuguesa...
Protestos do PSD:
Querem ouvir ou não? Querem. Então, vão ouvir!
O conjunto dos aumentos e diminuições de preços decretados por este Governo, atendendo ao peso desses bens da economia, têm um efeito ponderado que no seu conjunto, se situa entre 0,08 e 0,1% de inflação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é o fascínio pelos números!
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O Orador: - É que os preços dos bens geridos pelo Estado ou administrados pelo Estado aumentaram sempre, em média, menos de 2%, quando a inflação prevista este ano é de 2,5%. E todos os anos houve aumento de preços em Portugal, desde sempre, nos bens administrados. O que os senhores não dizem é que estes são os mais baixos desde o 25 de Abril em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Devem ser...!
O Orador: - O que os senhores não dizem é que, finalmente, estamos a integrar-nos numa economia não inflacionista, em que todos (Estado, empresas e particulares) têm de habituar-se a viver com estabilidade de emprego.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Se compararmos com a inflação, não são os mais baixos!
O Orador: - Devo dizer-lhe, em primeiro lugar, o seguinte: o fundamental para a recuperação das empresas são as condições gerais da economia. A baixa das taxas de juro, a baixa da electricidade, tem um efeito mais importante para a recuperação de empresas do que qualquer plano, o que explica que muitas empresas em Portugal se tenham facilmente recuperado a si próprias.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas, quanto ao plano de recuperação de empresas, ainda é muito cedo para fazer balanços. As empresas continuam a afluir, há dezenas de milhares, neste momento, que já entregaram os seus projectos nos Ministérios das Finanças e da Solidariedade e Segurança Social e há um número crescente de empresas que recorrem ao Gabinete Especial para as medidas entretanto preparadas.
O que se tem verificado e o que os bancos dizem sobre a sua carteira de balanços é que a saúde global das empresas, neste momento, em Portugal, está a ter uma notável melhoria...
Risos do PSD.
... e é essa notável melhoria que explica que o desemprego tenha deixado de crescer no fim do ano passado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto à agricultura, Sr. Deputado, sabe o que é que aconteceu ao rendimento dos agricultores que baixou durante os últimos quatro anos do vosso governo? Subiu 11% em 1996!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Acabou a seca!
O Orador: - Sabe, Sr. Deputado, que baixou o preço do gasóleo e da electricidade?! E sabe que, com isso e com a baixa das taxas de juro, estamos também a criar condições para uma agricultura mais próspera em Portugal?!
Quanto à linha de desendividamento, ela continua a ser de facto negociada em Bruxelas,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Em oito meses!
O Orador: - ... porque tem dificuldades reais. Mas devo dizer-lhe que já conseguimos mais em baixa de taxas de juros do que em qualquer bonificação que pudéssemos negociar em Bruxelas neste domínio. Portanto, não desistimos e vamos continuar.
Aplausos do PS.
Tenho o maior gosto e honra em que o Sr. Presidente da República se preocupe em cooperar connosco no sentido de resolver problemas que os senhores deixaram, pelas vossas incapacidade e incompetência.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Só foi pena que os senhores, tendo tido, durante 10 anos, como Presidente da República a figura mais prestigiada de Portugal na cena internacional não só nunca tenham querido recorrer à sua ajuda como o tenham, deliberadamente, afastado muitas vezes de poder desempenhar um papel útil na defesa do interesse nacional.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Exactamente!
O Orador: - A autoridade do Estado não se mede pelo volume das demissões, senão a autoridade do seu partido teria desaparecido completamente com as demissões recentes dos seus vice-presidentes e não quero acreditar que assim tenha acontecido.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Ah, pois não!
O Orador: - Digo-lhe mesmo mais, olhos nos olhos, e com toda a clareza: as demissões de que falou - unia delas por iniciativa do Governo, outra pela lógica normal de carreira de um funcionário público e a terceira por iniciativa do Comissário - não diminuíram a autoridade do Estado; pelo contrário, reforçaram a autoridade do Estado e do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa! Nessa ninguém acredita!
O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, não me leve a mal que lhe lembre que, embora a gestão do tempo seja sua, tem mais 12 perguntas para responder e que só tinha, inicialmente, 40 minutos para responder à globalidade das perguntas. Trata-se apenas de uma lembrança para V. Ex.ª gerir o tempo como entender.
O Sr. Deputado Luís Marques Mendes pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Para defender a honra da minha bancada, Sr. Presidente.
Vozes do PS: - Ohhh...! A honra?
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O Orador: - É que a minha bancada tem mesmo honra, Srs. Deputados!
Risos do PS.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, um comentário prévio, se me permite: não sei se é porque fica sempre perturbado quando eu falo, mas nesta Câmara, já é a terceira vez que o Sr. Primeiro-Ministro me trata por ministro. Quero, pois, em qualquer circunstância, como o fiz da primeira e da segunda vez, voltar a agradecer-lhe essa sua confiança.
O Sr. Ministro da Presidência (António Vitorino): - Não há duas sem três!
O Orador: - De facto, o Sr. Primeiro-Ministro é bom na palavra, a falar...
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é verdade!
O Orador: - O problema são as acções, a governar!... É o caso da referência ao passado, ao Sr. Presidente da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, limitei-me a constatar um facto, a que outros se poderiam juntar, noutras deslocações internacionais, de umas pequenas descoordenações com o Chefe de Estado. Mas quero dizer, sobretudo, que o Sr. Primeiro-Ministro nunca viu, no passado, nas relações entre Primeiro-Ministro e Presidente da República, num jornal, citando fontes do Gabinete do Primeiro-Ministro, dizer que o Sr. Primeiro-Ministro não se deslocou a Belém e que, dessa forma, fintou ou "driblou" o Sr. Presidente da República. Isso é que nunca viu anteriormente!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
A tendência que o Sr. Primeiro-Ministro tem nalguns momentos para distrair e desviar as atenções levou-o àquele episódio de comentar questões da vida interna do PSD...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lamentáveis!
O Orador: - Nós poderíamos retribuir com outros, mas não o vamos fazer.
Vou, sobretudo, aqui, concentrar-me em duas questões, que estas, sim, são as importantes: primeira, Sr.
Primeiro-Ministro, não chega o Sr. Primeiro-Ministro dizer, relativamente à agricultura, que continua a lutar por isso. Pudera!
Protestos do PS.
A questão é que, em Junho, o senhor não prometeu, o senhor anunciou uma linha de crédito aos agricultores portugueses. E onde é que ela existe? Não existe!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mais uma vez, peço silêncio quando os oradores estão no uso da palavra, incluindo os do próprio partido do orador.
Aplausos do PS.
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, o que de facto é mais grave é que isso já não foram promessas, foram anúncios e foram anúncios não concretizados.
Deixe-me que lhe diga, sem qualquer satisfação, que espero, daqui a um, dois ou três meses, não ter, algum de nós, de questioná-lo também, nas relações com Bruxelas e com a Comissão Europeia, sobre as dificuldades relativamente ao Alqueva e a verbas comunitárias. Espero não ter de fazê-lo.
Agora, Sr. Primeiro-Ministro, uma nota final sobre a questão da autoridade do Estado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E a honra?
O Orador: - Contrariamente ao que o senhor pensa, a autoridade do Estado não se reforçou, fragilizou-se; a autoridade do Estado não saiu aqui reforçada, saiu fortemente enfraquecida. De resto, Sr. Primeiro-Ministro, o que é grave não é a substituição de um comandante da polícia, o que é grave são duas coisas: primeiro, que o Governo não tivesse a coragem e a frontalidade de o assumir em tempo útil, atempadamente, e tivesse encontrado pretextos, bodes expiatórios e humilhações; em segundo lugar...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Três minutos, Sr. Deputado.
Não posso deixar "epidemizar" defesas da honra que o não são! Lamento, mas não vou deixar que isso acontece!
Aplausos do PS.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não, não, Sr. Presidente! Nem pense nisso!
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
O que é grave, Sr. Primeiro-Ministro, são as duas questões finais que lhe deixo, para ouvir o seu comentário.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos silêncio!
O Orador: - Além do mais, acho que a autoridade do Estado é tão importante, e nunca temos oportunidade de ouvir o Sr. Primeiro-Ministro que, ao longo deste tempo, tem estado ausente sobre estas matérias, permitam-me um minuto, porque julgo que é importante...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não posso permitir nem mais um minuto. O Sr. Deputado não fez a defesa da honra da sua bancada.
O Orador: - Fiz, fiz!
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Não me interrompam, Srs. Deputados. Estou a falar! Já há Deputados a quererem exercer o mesmo direito. Não vou deixar "epidemizar" este tipo de defesa da honra. Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado!
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, para eu ter a ideia de que não houve nada oculto que ainda mais enfraquecesse a autoridade do Estado, pergunto-lhe, de uma forma muito directa: Sr. Primeiro-Ministro, o que vai acontecer à PSP? Vai existir sindicato? Não vai existir sindicato? E o que é que vai acontecer à GNR?
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é que é defesa da honra?
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Advirto os Srs. Deputados de que não poderei consentir, sobretudo num debate deste género, que se tornem epidémicas defesas da honra que, no fundo, não o suo!
Para dar explicação, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, é a primeira vez que, associando a praxe parlamentar ao futebol, uma equipa derrotada pede "prolongamento"! Muito bem, vamos a ele!
Risos e aplausos do PS.
Palavras e acções: vá perguntar aos seus camaradas dos Açores se este é um governo de palavras ou se é um governo de acções!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E, quanto às citações que faz, cuidado! Já uma vez o PSD aqui cometeu - admito que involuntariamente - uma gravíssima falha que pôs em causa a minha honorabilidade pessoal, ao fazer citações. O que o meu gabinete disse, e disse em comunicado e, sobre "fontes", o senhor sabe muito bem, no seu partido, como no meu, como no resto, o que é que se atribui a "Fontes"...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas o que o meu gabinete disse, e disse em comunicado, foi que, tendo o Sr. Presidente da República manifestado a intenção de interromper as suas férias para dialogar com o Primeiro-Ministro e se informar sobre os problemas, na altura, em curso, o Primeiro-Ministro tinha tomado naturalmente a iniciativa de se deslocar ao Algarve, onde ele estava. Foi isto e só isto, na lógica de um relacionamento que prezo ser um relacionamento institucional impecável. E digo-lhe mesmo mais: entre este Presidente da República e este Primeiro-Ministro até pode vir a haver diferenças de opinião sobre muitas matérias; mas não há falta de solidariedade institucional e, sobretudo, o que não haverá, é inveja da nossa parte para evitar que Presidente da República possa desempenhar o seu papel na vida portuguesa!
Aplausos do PS.
Quanto à linha de crédito, foi dito que ela estava a ser negociada com Bruxelas - nunca iludi essa questão. Mas essa questão tem uma dificuldade, que o senhor conhece, que são as reservas levantadas por Bruxelas a todos os créditos que não tenham a ver com investimento; estamos a procurar soluções imaginativas para resolver esse problema, mas também já lhe disse que as baixas das taxas de juro representam mais do que qualquer bonificação que pudesse, entretanto, ter sido negociada.
E quanto a Alqueva. Sr. Deputado (ou "Ministro", se quiser..., porque não há duas sem três!...), tal como quanto à ponte sobre o Tejo, nós temos feito um esforço, um esforço incessante, para corrigir coisas que estavam erradas no nosso relacionamento com Bruxelas, tal como na formação profissional, como no PRODEP com as escolas profissionais. Isto tem-nos custado horas, centenas de horas de esforço e de negociação! E o senhor vem agora falar-nos de problemas que foram os senhores que criaram...
Risos do PS.
... pela vossa incapacidade de ter um relacionamento correcto com as instituições europeias?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nós é que criámos?
O Orador: - Houve, de facto, problemas de autoridade do Estado. Mas a autoridade do Estado reforça-se quando esses problemas se resolvem, se resolvem depressa e se resolvem bem. E o que este Governo tem sabido demonstrar é que, sempre que há um problema dessa natureza, têmo-lo enfrentado!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não foi o caso!
O Orador: - E muitos têm sido provocados na sociedade portuguesa! Mas, sempre que eles acontecem, nós resolvêmo-los, resolvêmo-los depressa e resolvêmo-los bem.
O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Isso é verdade!
O Orador: - E nisso incide a afirmação que fiz de que eles reforçam a autoridade do Estado e a autoridade do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, desejo começar por cumprimentá-lo e ao seu Governo pela decisão hoje mesmo anunciada de nomear o Engenheiro José Torres Campos como Comissário para a Expo 98.
Aplausos do PS.
E, ao cumprimentar o Governo por essa decisão tempestiva e adequada, exprimir, da parte do Grupo Parlamentar do PS, o nosso inteiro apoio aos propósitos hoje, mais
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uma vez, sublinhados pelo Sr. Ministro da Presidência ao ter, mais uma vez, referido o propósito do Governo em saber conciliar objectivos de transparência e de rigor nos custos financeiros do projecto da Expo 98 com a realização desse mesmo projecto, pela consideração da enorme importância para Portugal e também para a qualificação de Lisboa como capital que precisa de um projecto e de um esforço desta natureza, justamente em nome da modernização e da valorização da capital do País e do País no seu conjunto.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, saiba que contará com o apoio da bancada do PS em defesa da Expo 98 como um projecto útil e necessário para o País, bem como na defesa permanente dos objectivos de transparência e de rigor nos critérios da sua concreta execução.
Aplausos do PS.
Depois, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria ele salientar um outro aspecto: no final do último ano, o seu Governo pôde realizar alguns actos que reputamos do maior significado para o País. O Governo do PS tem sublinhado sempre a importância que dá ao diálogo e ao esforço de concertação social, e esse resultado, podemos certamente sublinhá-lo, está à vista. Pela nossa parte, consideramos histórico o facto de o Governo ter celebrado um pacto de solidariedade envolvendo o próprio Governo, as autarquias locais e as instituições privadas de solidariedade social, para que todos, de forma conjugada e em comum, possam acorrer para alcançar com mais eficiência os objectivos de justiça social para o País.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado e em simultâneo, o Governo pôde cooperar para a concretização do acordo de concertação estratégica a médio prazo, envolvendo boa parte dos parceiros sociais. Neste sentido, os objectivos do desenvolvimento com rigor e consciência social parecem estar melhor garantidos nesta possibilidade de a coesão não ser apenas uma palavra de um discurso mas ser uma prática efectiva envolvendo a administração pública, o Governo e a sociedade civil do nosso País.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, paradoxalmente, quando estes objectivos foram alcançados, algumas vozes se fizeram ouvir, designadamente nesta Câmara, manifestando-se incomodadas por aquilo que chamavam os riscos do neocorporativismo em Portugal. Eu gostaria de saber, da sua parte, se o Governo entende que há, nos actos que praticou, através do pacto de solidariedade, por um lado, ou do acordo de concertação estratégica, por outro, qualquer coisa que diminua a capacidade de decisão do próprio Governo, o respeito pelo funcionamento regular e pleno das outras instituições, designadamente a Assembleia da República; e se, pela sua parte, por esse efeito, estaria eventualmente preocupado com a deslocação eventual de algum centro relevante de decisão;
Pela nossa parte, Sr. Primeiro-Ministro, testemunhamos-lhe o nosso ponto de vista: que o Governo continue assim, porque, na medida em que a concertação estratégica e o pacto de solidariedade contribuírem para um clima real
de paz social em Portugal, então, estamos certos, os objectivos do desenvolvimento serão mais eficazmente prosseguidos no País.
Mas não se exima o Governo - nós, pela nossa parte, lhe dizemos que não nos eximiremos - a chamar a atenção daqueles que, voluntariamente, se isolam do esforço nacional de solidariedade e que, quando pretendem com isso julgar que melhor representam os interesses de categorias sociais ou dos próprios trabalhadores, mais não fazem do que estar a colaborar para as lógicas de protesto que nada resolvem e, por isso, nada facilitam os próprios objectivos de promoção da justiça e do desenvolvimento económico e social.
Sr. Primeiro-Ministro, sem nenhuma reserva da nossa parte, aqui lhe manifestamos inteira disponibilidade para apoiar o esforço do Governo em desempenhar sempre e sempre os objectivos da concertação social em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, em relação às suas palavras introdutórias, cumpre-me agradecê-las e manifestar que estou totalmente de acordo com a leitura que faz do que se passou e das intenções do Governo.
Em relação à questão muito importante que levantou direi o seguinte: nas sociedades modernas e complexas, não é possível governar com eficácia com base no autoritarismo ou na decisão unilateral dos governos; nas sociedades modernas e complexas, os problemas só se resolvem com a capacidade de envolver e mobilizar toda a sociedade
O Sr. José Junqueiro (PS): - Convém lembrar!
O Orador: - E envolver toda a sociedade implica...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diálogo!
Risos do PSD.
O Orador: - ... diálogo e contrato.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diálogo e negócio!
O Orador: - Contrato entre as partes para que cada uma delas possa, em convergência de esforços, resolver os problemas das pessoas. Ressaltou aqui um acordo muito importante: o, acordo de natureza social com as instituições de solidariedade social e com as autarquias. Porque o drama, em Portugal, é que, até agora, se vivia sem pensar que as políticas se dirigiam às pessoas; os Ministérios actuavam cada um por si, as autarquias tinham o seu campo, as instituições de solidariedade social actuavam de acordo com a sua lógica. Nós queremos redes sociais locais em que, à volta da mesma mesa, estejam os vários Ministérios, nos seus serviços periféricos, as autarquias, com o Presidente da Câmara à cabeça, e as instituições de solidariedade social para que o alvo não seja a política, para que o alvo seja a pessoa e a família, e para que se concertem esforços em defesa das pessoas e das famílias.
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Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E, quanto aos aspectos globais do desenvolvimento económico e social, atribuímos a maior importância ao acordo de concertação estratégica e queremos dizer-lhe que ele faz expressa referência ao princípio de separação de poderes e, por isso, ao respeito pelas competências próprias desta Câmara, que não podem ser violadas por qualquer acordo de concertação.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Manuel Monteiro, queria informar que temos connosco um grupo de 250 alunos da Escola Secundária de Alenquer; um grupo de 46 alunos da Escola Professor António Sérgio, de Setúbal; um grupo de 45 alunos da Escola Secundária Marquesa de Alorna, de Almeirim; um grupo de 14 alunos da Escola Secundária de S. João do Estoril; um grupo de 50 alunos da Faculdade de Direito de Lisboa e Universidade Federal do Brasil; e um grupo de 50 alunos da Escola Secundária Diogo de Gouveia, de Beja, num total de 455 alunos. Uma saudação muito carinhosa para eles.
Aplausos gerais, de pé.
Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, está no Governo há pouco mais de um ano e veio aqui hoje, curiosamente, dizer-nos que este Governo tinha três pessoas: uma do PS e duas independentes; a do PS é o Primeiro-Ministro; os independentes são o Sr. Ministro da Economia e o Sr. Ministro das Finanças!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro não nos falou de educação, não nos falou de saúde, não nos falou de segurança nem de criminalidade, não nos falou de questões objectivas, de questões que são fundamentais para a sociedade portuguesa. O Sr. Primeiro-Ministro veio aqui falar de números, o que significa que as Sr.ª e os Srs. Deputados, em próximas oportunidades, virão aqui de máquina de calcular.
O Sr. João Carlos Silva (PS): - Têm de aprender a fazer contas de cabeça!
O Orador: - Virão aqui de máquina de calcular apenas para analisar os números do Sr. Primeiro-Ministro! Mas o Sr. Primeiro-Ministro tem de responder ao País em coisas tão simples quanto estas: as escolas em Portugal funcionam melhor ou funcionam pior?
Vozes do CDS-PP: - Pior!
O Orador: - As urgências dos hospitais portugueses funcionam melhor ou funcionam pior?
Vozes do CDS-PP: - Pior!
O Orador: - Os doentes, nas bichas de espera nas consultas externas dos hospitais, estão ou menos tempo à espera?
Vozes do CDS-PP: - Estão mais!
O Orador: - Os taxistas, os idosos, os jovens sentem-se mais ou sentem-se menos seguros nas ruas de Portugal e das grandes cidades?
Estas é que são as questões essenciais do País, Srs. Deputados. Estas é que são as questões essenciais às quais o Governo, até ao momento, nada disse! Mas o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo não têm hoje qualquer desculpa porque não há "forças de bloqueio": não há bloqueio no Sr. Presidente da República, que colabora com o Governo; não há bloqueio no Sr. Presidente da Assembleia da República, porque colabora com o Governo; não há bloqueio no Procurador-Geral da República, porque é dialogante e também respeita o Governo; não há bloqueio na Assembleia da República porque também na Assembleia da Republica existem partidos que, com sentido total de responsabilidade, têm estado presentes nos momentos fundamentais e decisivos para a governação do País.
Portanto, o Governo não tem desculpas, não tem alibis, não tem quaisquer razões para não governar, para não reformar, para não actuar conforme deveria ter actuado.
O Sr. Primeiro-Ministro veio aqui falar-nos de números, más só dos números que lhe interessavam. O Sr. Primeiro-Ministro não veio a esta Câmara dizer uma coisa que é fundamental não apenas para o Partido Popular mas fundamentalmente para todo o País. Vamos falar de números, vamos falar claramente e sem segredo: quanto custa a Expo 98? Quanto está a custar a mais a Expo 98? Quanto é que vai custar, para além daquilo que estava previsto, a Expo 98? Vamos falar de números! O que é que se esconde? O que é que os senhores têm andado a esconder para não dizerem ao País, com clareza e objectividade, quais os sacrifícios que os portugueses vão ter de fazer para ter esse projecto e essa obra nacional?
Mas há coisas sobre as quais o Sr. Primeiro-Ministro também não falou e vai ter de falar, se me permite. O Sr. Primeiro-Ministro, numa recente polémica na Agricultura deu cobertura total ao Sr. Ministro da Agricultura, mas não disse ao Secretário-Geral do PS para tirar a confiança política ao coordenador dos Deputados socialistas no Parlamento Europeu, o tal que o Ministro da Agricultura considera de demente e o tal que o Ministro da Agricultura considera de irresponsável. A isso o Primeiro-Ministro nada diz.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Sobre essas questões essenciais o Primeiro-Ministro está completamente calado e o Parlamento tem o dever de questioná-lo sobre essas questões para que o País, com clareza e com objectividade, possa saber o que pensa o Primeiro-Ministro de Portugal.
Sr. Primeiro-Ministro, também noutro âmbito, o País, como aqui foi referido, assistiu em determinado momento a uma convulsão numa das áreas fundamentais da governação e do Estado: o problema da segurança. V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, conseguiu passar por esse problema sem praticamente nada dizer aos portugueses. Confesso, para um Primeiro-Ministro preocupado com as pessoas, não tecnocrático e contra a tecnocracia, não esperava ver de si a cópia daquilo a que assistia outros primeiros-minis-
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tros que vinham aqui apenas falar da economia e dos números e não falar das reformas da sociedade, das reformas do Estado, das reformas estruturais de que o País carece.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro não nos falou do emprego dos jovens. Disse-nos que o desemprego estava a diminuir, mas não nos explicou se a juventude deste País que sai da Universidade está a ter melhores ou piores condições no acesso ao primeiro emprego.
O Sr. Primeiro-Ministro diz-nos que houve maior recurso aos empréstimos para habitação, mas o Sr. Primeiro-Ministro não explicou, nem ninguém aí explicou, porque razão a Caixa-Geral de Depósitos está a receber mais casas precisamente porque as pessoas que contraíram empréstimos não têm dinheiro para pagar esses mesmos empréstimos que contraíram.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - É a essas questões fundamentais que importam aos portugueses, que importam às pessoas, que importa que o Sr. Primeiro-Ministro responda.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, não quero entrar na polémica de estátuas ou de não estátuas, mas vou dizer a V. Ex.ª, com todo o respeito e frontalidade, o seguinte: não é admissível, não é admissível que um Governo tenha dentro e fora pessoas que dizem coisas completamente diferentes.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Já termino, Sr. Presidente.
Não é possível, não há segurança, não há credibilidade, não há estabilidade nem dentro nem fora do Governo. V. Ex.ª tem ao seu lado um Ministro que disse que não queria carregar com o Comissário Cardoso e Cunha, isto um dia depois de V. Ex.ª ter dito que confiava no Comissário Cardoso e Cunha...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.
O Orador: - Mas o que me importa a mim não é o Risos do PSD.
Sr. Comissário Cardoso e Cunha
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já gastou sete minutos!
O Orador: - O que me importa a mim é saber quanto é que o País vai pagar para sustentar estas "brincadeiras" que nos andaram a dizer que se pagavam a si próprias. É isso que os contribuintes e os cidadãos têm direito de saber.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Orador: - Só mesmo para concluir, uma pergunta...
Protestos do PS.
Compreendo que o PS depois das "difíceis" perguntas do Sr. Deputado Jorge Lacão esteja incomodado com as perguntas "mais fáceis" que acabo de fazer...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Eu?! Eu estava tão caladinho, por que é que se está a meter comigo?
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: V. Ex.ª disse aqui - e esse é um dos aspectos mais importantes da sua intervenção - que havia agitação na sociedade "provocada"...
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - E eu gostaria de perguntar a V. Ex.ª, se bem o entendi, quem é que provoca essa agitação porque estava convencido de que as manifestações de rua eram espontâneas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, peço licença para lhe fazer um reparo, quando referiu que o Governo tem a colaboração do Presidente da Assembleia da República, a minha convicção é a de que quis referir-se à minha colaboração institucional,...
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Certamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - ... porque se não fosse essa eu teria que usar da palavra para defender a minha honra.
A palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, vamos ver se nos entendemos. Quando me dão 10 minutos...
Protestos do PSD.
Concordo que é muito difícil entender-me com o PSD, porque uma vez diz uma coisa e outra diz outra e nunca se sabe o que pensa.
Protestos do PSD.
Faço ao Sr. Deputado Manuel Monteiro a justiça de saber o que pensa e de saber o que diz.
Risos do PSD.
Mas vamos ver se nos entendemos sobre este debate. Quando se dão 10 minutos a um Primeiro-Ministro para falar, não se lhe pode pedir que aborde todos os temas.
No último debate que aqui tivemos falei precisamente de reformas estruturais, um dos temas de que o Sr. Deputado Manuel Monteiro me acusou de não ter falado agora. E, na altura, acusaram-me de falar de reformas estruturais e de não falar de problemas concretos, nomeadamente dos problemas económicos dos portugueses. Hoje, não vim aqui falar de números mas de pessoas e só utilizei os números na medida em que são indispensá-
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veis para demonstrar o êxito de uma política que se destina às pessoas, face à preocupação que tem havido em negar a realidade dos factos hoje bem presente, quer em Portugal quer naqueles que apreciam a realidade portuguesa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, nos nossos debates, vamos certamente ter oportunidade de nos referirmos à educação, à saúde e à segurança. Aliás, devo dizer, em matéria de educação, que o Sr. Ministro da Educação acaba de apresentar um plano global e integrado e, relativamente a essa matéria, considero que se estão a dar progressos importantes no País.
Em matéria de saúde, não vou usar a demagogia de lhe dizer que as urgências já estão a funcionar melhor ou que as consultas já têm o seu problema resolvido. Isso seria demagogia! Agora, vou dizer-lhe que se está a trabalhar com seriedade, com muita seriedade, em diálogo com todos os profissionais, para que isso seja conseguido o mais depressa possível.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em relação à segurança, estamos à vontade porque, depois de um período de estagnação, neste momento estão a ser formados, por ano, 2000 novos agentes na PSP e na GNR. Depois de um período de estagnação no investimento e de degradação dos equipamentos das polícias, neste momento, aumentámos em 80% o investimento em equipamento, para que as polícias possam actuar melhor na defesa dos taxistas, dos jovens e dos idosos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Para melhorar a segurança dos taxistas, dos jovens e dos idosos é preciso, em primeiro lugar, uma economia mais sã, com menos desemprego e menos problemas sociais, com o rendimento mínimo garantido, que nós defendemos, e é necessário, depois, mais policia na rua, uma polícia renovada e melhor equipada, como estamos construir na prática.
Quanto vai custar a EXPO 98? Essa foi a questão central do debate entre o Governo e o Comissário Cardoso e Cunha e o Governo quer que o País saiba exactamente quanto é que vai custar a EXPO 98.
Aplausos do PS.
E, mais: estávamos a promover com o anterior comissário uma investigação profunda que nos permitisse chegar a essa conclusão. Não tenho dúvidas que agora estão criadas condições para que, rapidamente, se atinja esse objectivo e devo dizer-lhe que não iludiremos os portugueses, até porque não é preciso. Aliás, consideramos que, mesmo que não dê lucro - e em minha opinião não dará -, a EXPO 98 é um investimento estratégico para o desenvolvimento do nosso país e não é preciso enganar os portugueses dizendo-lhes que ela dá lucro para que passe a ser um investimento estratégico fundamental para a imagem do País e para a renovação da cidade' de Lisboa.
Aplausos do PS.
Quanto à agricultura, e utilizando a sua linguagem, Sr. Deputado, o Primeiro-Ministro falou com o Secretário-Geral do PS e o Secretário-Geral do PS convocou o Deputado para uma reunião da direcção do PS. Mas, Sr. Deputado Manuel Monteiro, não somos um partido que faz processos administrativos para expulsar membros seus e, depois, os admite na "volta do correio".
Aplausos do PS.
Somos um partido em que os militantes são respeitados. Aliás, o Deputado a que se refere não é coordenador de coisa nenhuma
e foi nos órgãos do partido e no concreto que as questões foram discutidas, sendo desautorizado no sentido de defender - e foi defendida integralmente - a honorabilidade dos membros do Governo.
O emprego da juventude é umas das nossa preocupações essenciais. Com a explosão das universidades privadas, nos últimos anos, estão a sair todos anualmente dezenas de milhar de novos formados c, por isso, o emprego dos jovens e sobretudo dos jovens licenciados, é um problema novo e importante na sociedade portuguesa. Daí o conjunto de programas já destinados em especial ao emprego dos jovens, muitos já em execução, outros em preparação, que ajudarão a resolver esse problema.
Mas também lhe quero dizer que um desempregado com um curso superior terá sempre mais facilidade em arranjar emprego do que um desempregado com o primeiro ciclo do ensino básico.
Finalmente, em matéria de confiança no Comissário Cardoso e Cunha, o Sr. Ministro da Presidência e eu próprio dizemos rigorosamente a mesma coisa, ou seja, que ele tinha a nossa confiança e se ele entendeu demitir-se não foi seguramente por não a ter. A única coisa em que insistíamos, e insistimos, foi numa questão, na qual estou inteiramente de acordo consigo: os portugueses têm o direito de saber quanto é que vai custar a EXPO 98.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, a palavra ao Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, está esclarecida a referência que há pouco fiz a V. Ex.ª?
O Sr. Presidente: - Está.
O Orador: - Ora bem, Sr. Presidente, com a minha interpelação pretendo que, através da Mesa, se transmita ao Sr. Primeiro-Ministro que aquilo que acaba de dizer sobre os custos da EXPO 98 é muito grave, se bem que, quer para mim quer para o PP, não esteja em causa o projecto, porque consideramos que ele é fundamental, aliás, como a maioria dos políticos deste país.
Porém, considero grave - e isso tem que ficar publicamente registado - que o anterior governo não soubesse quanto ia custar a EXPO 98 e o actual Governo ainda não saiba quanto é que ela vai custar. Mal de nós se nesta altura do "campeonato", a um ano de acabarem as obras, ainda o Governo não sabe quanto é que vai custar um investimento e um projecto desta importância e desta natureza.
O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, para uma interpelação.
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O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, poderia dizer que, em relação à exposição de Sevilha, só se soube quanto custou um ano depois de ter acabado,...
O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Também era um socialista!.
O Orador: - ... mas não vou agora brincar com isso, vou falar a sério.
O que se passa é o seguinte: foi apresentado um plano económico e financeiro - como sabe, a EXPO é uma sociedade que goza de autonomia, com estatutos que devem ser respeitados - onde se previa um aumento de despesa na ordem dos 30 milhões de contos. O Governo considerou que isso não estava a retratar a totalidade do eventual aumento de custos, de acordo com a informação que o próprio Governo tinha, exigiu que o plano fosse reformulado e começou uma investigação séria entre representantes do Governo e da direcção da EXPO.
Aliás, o Governo teve o cuidado de enviar a Inspecção-Geral de Finanças à EXPO 98, como sabe, tendo ela detectado uma derrapagem financeira inferior à que o próprio conselho de administração, mais tarde, veio a admitir.
Muitas vezes, em projectos que são lançados com prazos curtos, como os deste, reconheço que nem sempre é fácil calcular, à partida, o seu valor real, mas entendemos que há condições para ter números mais exactos do que os até agora fornecidos pela EXPO. É essa investigação que está em curso.
Este é o segundo plano económico e financeiro que pedimos à EXPO. Mantivemos a nossa insatisfação e exigência, não violámos as regras de funcionamento do Estado de direito, e posso garantir-lhe que não desistiremos enquanto não tivermos à disposição dos portugueses toda a verdade que for apurável. Isso norteou, desde o primeiro momento, as nossas relações com a equipa da EXPO 98.
O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Na sua intervenção sobre a situação económica do País, ao fim e ao cabo, disse-nos isto: tudo corre no melhor dos mundos. Teve o cuidado de dizer que não é um oásis, mas, por este caminho, corremos o risco de, na próximo vez que o Sr. Primeiro-Ministro cá vier, já falar em oásis.
Não vou, neste momento, entrar na problemática das taxas, dos números que foram levantados, porque o facto de se considerar o último trimestre de 1996 ou de 1995 ou de se considerar o ano todo, para determinar a taxa de desemprego, é bastante diferente.
É um facto que no ano de 1996 aumentou o desemprego em Portugal, isso não pode ser recusado. É um facto que a norma definida pelo Governo para os salários se destina a não ter em conta a evolução da produtividade. Mas o que para mim foi espantoso, Sr. Primeiro-Ministro, foi quando avançou com a ideia - ou melhor, quando fez uma afirmação que é real, que eu não gostaria de confirmar, mas é, de facto, real - de que o Banco de Portugal tem vindo a intervir no mercado cambial, comprando marcos contra escudos, para sustentar uma paridade do escudo que, ao fim e ao cabo, não é real, esquecendo-se - e é por isso que acho espantoso - que, ao fazer isto, entre outras coisas, o Banco de Portugal, com o acordo do Governo, pelos vistos, está a fazer com que os produtos alemães fiquem mais baratos no mercado português, entrando em concorrência mais facilmente, e, mais do que isso, que o turismo, em Portugal, se torne mais caro para os alemães.
Ora, são esses impactos que interessam e não o problema da estabilidade monetária. Em termos económicos, são esses impactos que, depois, têm repercussões sociais que deviam ter a atenção do Sr. Primeiro-Ministro.
Depois, falou nas taxas de juro e mais uma vez me espantei. O Sr. Primeiro-Ministro chamou à colação a Lisbor a seis meses, apesar de saber perfeitamente que a Lisbor é a taxa utilizada entre bancos e não a que se aplica às empresas ou aos particulares. Uma taxa mais próxima da que se aplica às empresas e aos particulares é a chamada taxa
APB, da Associação Portuguesa de Bancos, e, nesse caso, Sr. Primeiro-Ministro, a taxa de juro real não tem vindo a descer. Esta é a realidade e isto é que deveria ser tido em consideração!
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - A APB já não existe!
O Orador: - Está alguém da bancada do partido a que pertence o Sr. Primeiro-Ministro a dizer que a APB já não existe. Não gostaria de qualificar essa afirmação, mas, de facto, é assombroso como o desconhecimento pode ser tão grande.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Ninguém a usa!
Só os senhores!...
O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro acabou a sua intervenção dizendo que precisamos de trabalhar muito e melhor. Não sei se é necessário trabalhar muito mais, com o Sr. Primeiro-Ministro referiu em relação ao Governo. Agora, que precisa de trabalhar melhor, designadamente em termos económicos e sociais, disso não tenho a mínima dúvida, Sr. Primeiro-Ministro.
Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, começou por dizer, na sua intervenção, "acusam-nos da obsessão pela moeda única", referindo em seguida que isso não é verdade. Sr. Primeiro-Ministro, somos dos que o acusam disso e o Sr. Primeiro-Ministro muitas vezes o tem referido. Essa é a sua prioridade essencial.
Aliás, o que se passou de 13 de Dezembro para cá mostra mais do que essa obsessão, mostra o esconder as consequências dessa obsessão. Ainda esperava que hoje, um mês depois da Cimeira de Dublin, o Sr.
Primeiro-Ministro viesse falar de um facto central que ocorreu nessa altura, com consequências enormes para o futuro de Portugal e dos portugueses, a assinatura do Pacto de Estabilidade, ou, pelo menos, da sua aprovação, a que o Sr. Primeiro-Ministro deu apoio, por parte do Governo português. É uma grave decisão, desde logo, porque esse Pacto de Estabilidade vem confirmar, do ponto de vista político, a tendência ou orientação da União Europeia para um federalismo, qualquer que seja a sua característica última.
Ainda do ponto de vista político, o Sr. Primeiro-Ministro, enquanto Primeiro-Ministro de Portugal, não apenas aceitou mais constrangimentos à autonomia nacional no âmbito do seu orçamento, quer na óptica fiscal quer
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na da despesa pública, como, mais do que isso e mais grave, se é possível dizê-lo, aceitou que uma instância supranacional pudesse multar o Governo de Portugal se não cumprir as orientações que são dadas pelo Pacto. Isto é inadmissível e inaceitável, do ponto de vista político.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mas, para além disso, existem também as consequências económicas.
Para terminar, muito brevemente, chamo a atenção apenas para o seguinte: contrariamente ao que dizíamos, nós, PCP, e desmentindo-nos, o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro sempre afirmaram que os custos para a moeda única estavam no fim, pelo que valia a pena fazer um esforço durante mais um ano. Dizíamos que não seria assim, que os maiores custos viriam depois da moeda única e o Pacto de Estabilidade vem confirmá-lo.
Em termos de défice orçamental, se agora as instâncias supranacionais permitem que o défice seja de 3%, com o Pacto de Estabilidade - está lá escrito -, em anos normais, não pode haver défice orçamental, deve haver equilíbrio ou excedente. É uma situação muito mais grave para o futuro do País a que está contemplada no Pacto de Estabilidade. O Sr. Primeiro-Ministro deve tê-lo lido, porque deu o acordo por parte de Portugal.
Consta do Pacto que só em casos de recessão económica é permitida a existência de um défice de 3%. Mas, mais do que isso, quando é que há uma recessão económica, para a Comunidade? Desde que o PIB decresça pelo menos 2% ou mais do que isso! Ora, Sr. Primeiro-Ministro, e com isto termino, no ano de 1993, o PSD não o nega nem o governo do PSD o negou, mesmo a posteriori, tivemos uma grave crise económica em Portugal.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - A União Europeia não considera isso uma grave crise económica, porque, segundo o Banco de Portugal, nesse ano decrescemos apenas 1,2% do PIB. Assim, de acordo com o Pacto de Estabilidade, não haveria grave crise económica.
Considera o Sr. Primeiro-Ministro que é aceitável a existência de compromissos por parte de um qualquer governo, sem consultar o povo português, com tamanha responsabilidade e tamanhas consequências?
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa, mas utilizei 6,6 minutos; outros Srs. Deputados falaram durante 8 minutos e mais e o Sr. Presidente não lhes retirou a palavra, pelo que peço-lhe o favor de não ma retirar, porque vou usar muito menos tempo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se me der licença, agora falo eu, porque também tenho o direito de me irritar, de vez em quando.
Se fizer a proporção entre o seu tempo e o seu aumento, o senhor teve um aumento superior ao dos outros partidos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente -: - E o facto de alguns Srs. Deputados não terem cessado o uso da palavra quando lhes pedi para interromperem retrata o mesmo fenómeno que está a verificar-se agora com o Sr. Deputado.
O Orador: - Qualquer dos Srs. Deputados tinha 5 minutos...
O Sr. Presidente: - Adverti-os, não me obedeceram e o Sr. Deputado está a fazer o mesmo. Posso mandar cortar o som a qualquer dos Srs. Deputados, mas nunca o fiz. Espero nunca o fazer, mas não gostaria de ser advertido, como se, de facto, fosse eu o pecaminoso.
O Orador: - Não faço a pergunta do referendo ao Sr. Primeiro-Ministro porque o Sr. Presidente não me permite, mas registo que só para o PCP teve a atitude que teve.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado dispõe de 5 minutos, utilizou 7,1 minutos e acha-se discriminado?!
O Orador: - Acho, sim!
O Sr. Presidente: - Desculpe, mas não o foi, porque também adverti os outros Srs. Deputados, que não me obedeceram, tal como o senhor começou por não me obedecer. Lamento muito mas a sua irritação não tem a menor justificação, nem habitualmente o PCP tem direito a fazer qualquer espécie de recriminação por ter sido discriminado, porque nunca o é, tal como nenhum partido, pelo que não posso aceitar esse tipo de recriminações.
Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, agradeço-lhe as perguntas que me colocou.
Portugal não é um oásis, tem problemas estruturais graves e é preciso trabalhar melhor. Nisso estamos inteiramente de acordo. No entanto, não aceitamos que não reconheçam os méritos reais das políticas que aplicamos.
Começando pela questão do desemprego e da média do ano, isso é significativo. É que, no que toca à média do ano, em 1996, ainda estamos acima de 1995, mas no quarto trimestre já estamos abaixo, o que quer dizer que houve uma inversão de tendência e é isso que é importante.
Começámos o ano com uma herança, o ano não começou da melhor maneira, mas, depois, todos os indicadores foram progressivamente melhorando e entramos em 1997 em franca ascensão. É isso que é importante: os valores do último trimestre são muito melhores do que os da média e provam que as políticas funcionaram.
Quanto aos salários, Sr. Deputado, Portugal é um dos poucos países, porventura o único país latino da Europa, em que houve aumentos de salários à função pública este ano.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isto não é sublinhado por ninguém mas Portugal é o único país que tem promovido o seu cami-
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nho para a moeda única mantendo aumentos de salários à função pública acima da inflação,...
Aplausos do PS.
... o que prova que o estamos a fazê-lo com consciência social e aumentando as despesas sociais.
Quanto à questão do marco, estamos desentendidos. O que estamos a fazer agora não é vender marcos para segurar o escudo mas, sim, a comprar marcos para evitar que o escudo suba. A política que o Banco de Portugal tem seguido, comprando milhares de milhões de marcos, é uma política para travar a subida do escudo, enquanto que no passado houve políticas para forçar a subida do escudo, mantendo taxas de juro extremamente elevadas.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - O que simboliza bem a confiança dos mercados internacionais em Portugal é o facto de, apesar da nossa descida das taxas de juro, ainda termos uma pressão para a subida do escudo e o Banco de Portugal ter de vender escudos para não o deixar subir, precisamente com o fim de proteger o turismo e as empresas portuguesas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado fez as contas ao contrário!
No que toca à Lisbor, como sabe, hoje a maior parte dos contratos fazem-se em sua função e prevêem-se taxas do tipo: a Lisbor mais 2%, a Lisbor mais 1 %, a Lisbor mais 3%. Há muito que a taxa da Associação Portuguesa de Bancos deixou de ser taxa de referência nos contratos que são realizados e, de facto, a Lisbor é hoje a taxa de referência para a maioria dos contratos realizados entre os agentes económicos e a banca.
Quanto ao Pacto de Estabilidade, devo dizer-lhe que as negociações que a ele conduziram permitiram que nele figurassem aqueles que consideramos os aspectos de maior interesse para, a economia portuguesa.
Em primeiro lugar, o valor de referência em relação ao limite do défice é de 3% e as penalizações são acima disso. Não é de zero, é de 3%, mantendo-se, portanto, o acordado em Maastricht para entrar na moeda única.
Em segundo lugar, é necessário que nos entendamos sobre uma coisa: défices e aumento de dívida não são bons. Aí estamos em desacordo. Os senhores, defendem um sistema de segurança social pública e eu pergunto: com uma população a envelhecer, como será possível manter um sistema de segurança social pública se, neste momento, continuarmos a aumentar a dívida pública com défices elevados? O que estamos a fazer, com esta política, é a proteger as pensões de reforma, a defender um sistema de segurança social pública e a possibilidade da sua sobrevivência.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Passemos às desvalorizações competitivas. Vamos falar claro: as desvalorizações competitivas que Portugal já foi obrigado a fazer pelo Fundo Monetário Internacional, estava o PS no governo, tiveram como objectivo fundamental do FMI baixar os salários reais dos trabalhadores. É necessário dizer com clareza que a única razão pela qual as desvalorizações competitivas aumentam a competitividade dos países é porque baixam os salários reais. Aliás, a política do PCP, em matéria económica, teria como única consequência a baixa dos salários reais dos trabalhadores portugueses.
Aplausos do PS.
Finalmente, Sr. Deputado,...
O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, se continuar a gastar 5 minutos por cada resposta, não poderá responder a todos os Srs. Deputados e todos os Srs. Deputados têm direito à sua resposta.
O Orador: - Sujeitando-me à mesma disciplina que o Sr. Deputado Octávio Teixeira, calo-me, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Primeiro-Ministro.
Para formular a sua pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não vou fazer-lhe quaisquer perguntas sobre a derrapagem das contas da EXPO 98 porque penso que isso é um equívoco. Se há derrapagem, é do Governo, porque é suposto ser o Governo a coordenar o comissariado e não o contrário.
Não vou desmenti-lo em relação à saúde da nossa economia, já que os parlamentos não têm "mentirómetros" instalados e esse não me parece ser o melhor campo. Vou optar por colocar-lhe uma questão muito concreta, que está na ordem do dia e, em nosso entender, pode ser interessante: a decisão do Governo de lançar, esta semana, a discussão pública sobre os POOC (Planos de Ordenamento da Orla Costeira).
Como sabe, esta é uma questão de extrema importância. O litoral, em Portugal, é do domínio público, é pertença de todos, é um património comum, e é, porventura, uma das áreas mais cobiçadas e sobre a qual mais malfeitorias foram feitas. Ou seja, no fundo, é um património comum que meia dúzia de pessoas, ao longo dos anos, tem destruído completamente, sacando areias em negócios muito opacos, destruindo dunas, construindo a torto e a direito, sem quaisquer regras, com o significado que isso tem: erosão, avanço da costa, destruição de bens. Assim, teoricamente, tudo o que venha no sentido de disciplinar o litoral é bem-vindo.
A pergunta muito concreta que lhe faço, sendo que para nós não se trata de ter de planos mas, sim, de planos com eficácia, é a seguinte: o que é que isto vai significar? E digo-lhe isto, Sr. Primeiro-Ministro, porque, em relação aos planos regionais de ordenamento no Algarve, que tinham, como todos normalmente têm, aquelas "cláusulas alçapão" que servem para, através de um único artigo, poder desvirtuar completamente tudo, já foi com a autorização e a assinatura do seu Governo, utilizando a famosa cláusula de excepção, que foram satisfeitos os interesses do Sr. Jordan, em Vilamoura. Portanto, independentemente das muitas criticas feitas àquela zona, o seu Governo já autorizou ali um aumento brutal.
Faço esta pergunta porque, dos planos de ordenamento, o que é visível é que as áreas que são apetecíveis do ponto de vista das negociatas imobiliárias ficam de fora - o Parque Natural Sintra/Cascais é um exemplo e há
clientes à espera, como bem sabe..
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Mais ainda, coloco-lhe uma questão relativa a algo que me parece de todo em todo escandaloso e que gostaria que me explicasse. É que não só houve meia dúzia de pessoas que, ao longo dos anos, se permitiram destruir o que é domínio público, o que é pertença de todos, com o modo como ocuparam o litoral, como o Governo, de forma perfeitamente surpreendente, entendeu por bem que todos os portugueses iriam dar a sua quota-parte no pagamento dessa destruição. Refiro-me aos 500 000 contos que o Governo entendeu deverem ser pagos dos dinheiros públicos para que Vale de Lobo seja recuperado - Vale de Lobo, cujo processo de destruição e erosão mais não resultou do que das "burrices" ali feitas ao longo dos anos.
Pergunto-lhe, pois, Sr. Primeiro-Ministro, se vamos ter, de facto, planos de ordenamento ou planos de ocupação. É esta a questão a que gostaria que, com precisão, respondesse.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, serei sintético, porque o tempo a isso me obriga.
Vamos ter planos de ordenamento, essa é uma preocupação fundamental. Estamos, aliás, neste momento, a realizar várias obras importantes de protecção do litoral, na ria Formosa, em Esmoriz e em Ovar, protegendo falésias, porque elas não podem ser abandonadas.
Finalmente, a cláusula de excepção só será utilizada em relação a projectos de evidente interesse nacional e
que não ponham em causa valores ecológicos que consideramos indispensáveis.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, eu não cometeria a indelicadeza de compará-lo ao seu antecessor, na medida em que o senhor não tem dúvidas sobre qual seria a hierarquia em que iria colocá-los, mas, já que o senhor falou nele, não posso deixar de fazê-lo. E o senhor falou nele, provavelmente, para evocar, a forma como ele jogava com os números.
Devo dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que o senhor ultrapassou-o em tudo o que era esperável, ao trabalhar-se com números. O Sr. Primeiro-Ministro falou do crescimento económico e, para isso, comparou um ano com um período; o Sr. Primeiro-Ministro falou na taxa de juro como se tivesse sido este Governo a determinar a queda da taxa de juro, quando simplesmente a taxa de juro decresce ao longo de um período e não por via de qualquer acção num ano e, muito menos, por via de uma acção do Governo.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Aquilo que está bem é do seu governo!
A Oradora: - Quanto a isso, Sr. Deputado, gostaria apenas de dizer que vem ao encontro da minha convicção de que aquilo que está bem na economia é aquilo que os senhores ainda não estragaram.
Aplausos do PSD.
Depois, o Sr. Primeiro-Ministro falou dos aumentos de preços de uma forma que demonstra que a sua preocupação, realmente, está apenas na inflação. Isto é, o Sr. Primeiro-Ministro, como eu já calculava, mostra não se preocupar grandemente com os aumentos de preços de bens essenciais, porque eles, na realidade, pesam muito pouco na taxa de inflação, o que não quer dizer que não pesem muito nas pessoas que os pagam.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Portanto, nesse aspecto, Sr. Primeiro-Ministro, fiquei um pouco espantada com a insensibilidade que, de repente, mostrou ter.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Porém, ao mesmo tempo, o Sr. Primeiro-Ministro julga-se o único Primeiro-Ministro da Europa a ter consciência social, porque considera ter dado aumentos de salários que mais nenhum
deu Sr. Primeiro-Ministro, os outros não os deram, provavelmente, porque consideraram que não podiam dar e não só por falta de consciência ou por irresponsabilidade. Simplesmente, Sr. Primeiro-Ministro, talvez os outros primeiros-ministros estejam muito preocupados com a evolução da inflação e espero, Sr. Primeiro-Ministro, que esse não seja o primeiro indicador a alterar o sentido da evolução de todos os indicadores que lhe chegaram às mãos quando o Sr. Primeiro-Ministro tomou conta do Governo. É que a taxa de juro não é novidade; a inflação, como bem sabe, seria uma enorme novidade.
Sr. Primeiro-Ministro, quanto ao caminho para a moeda única, esperamos lá chegar; somos daqueles que partilhamos desse projecto, não nos passando pela cabeça lá não chegar, mas também somos daqueles que começamos a estar muito preocupados com a forma como lá vamos viver. E estamos preocupados com a forma como lá vamos viver porque discordamos profundamente do caminho que estamos a seguir para lá chegar.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, partilhamos inteiramente do projecto da moeda única, mas começamos a ter algumas dúvidas sobre se esse projecto, do qual falamos e do qual o PS fala, não será um projecto a quem o PS e o PSD dão o mesmo nome mas cujo conteúdo, é um pouco diferente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Nesse sentido, gostaríamos de perguntar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, quando é que pretende apresentar à Assembleia da República o programa post entrada na moeda única, exactamente para saber quais os sacrifícios que vão ser pedidos ou os benefícios que vão ser dados a Portugal, no sentido de defendermos esse projecto ou termos de alertar os portugueses para o facto de ele não ser o nosso projecto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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A Oradora: - É que, Sr. Primeiro-Ministro, o Governo pode ter um projecto de moeda única que se traduza na glória de um dia para o Governo; agora, o nosso era um projecto de bem-estar para os portugueses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, em primeiro lugar, gostaria de fazer uma correcção: não procurei fazer qualquer comparação com o meu antecessor; limitei-me a utilizar dois argumentos, que ele usou à saciedade nesta Câmara, para demonstrar o que é governar bem e governar mal e limitei-me a dizer que, do ponto de vista dos critérios que ele utilizou variadíssimas vezes nesta Câmara, este Governo governa bem. Foi apenas isso que eu disse, nada mais.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Olhe que não!
O Orador: - Quanto às taxas de juro reais, esta é que é a questão central, porque, à medida que a inflação foi baixando, as taxas de juro nominais também foram baixando.
Tenho aqui, de Outubro de 1992 até hoje - e utilizando, outra vez, a Lisbor de um ano como elemento de referência, mas poderíamos utilizar outra qualquer -, as taxas de juro nominais e reais. Falemos, agora, das taxas de juro reais: em Outubro de 1992, a taxa de juro real era de 5,3%; em Outubro de 1993, de 3,5%; em Outubro de 1994, de 5,6%, e, em Outubro de 1995, de 5,2%, ou seja, em Outubro de 1995, estávamos exactamente no mesmo valor de Outubro de 1992.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Foi a turbulência europeia!
O Orador: - E, de repente, em Outubro de 1996, é de 3,5% e, em Janeiro de 1997, de 2,2%. Isto é a realidade dos números: estagnação das taxas de juro reais, durante uma legislatura; queda rápida das taxas de juro reais, desde que o PS chegou ao Governo. Não tenho a culpa se os números lhe não convêm.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Depois, vamos ver se nos entendemos: os TSD criticaram os salários por serem baixos; hoje, das suas palavras, fica-me a ideia de que quereria que tivéssemos aumentos de salário zero, como os outros países, para garantir a moeda única. Fico sem saber o que quer o PSD, ou melhor, fico esclarecido: o PSD quer sempre o contrário daquilo que o Governo fizer, seja o que for aquilo que o Governo faz. É isso que retira credibilidade ao PSD.
Aplausos do PS.
Sobre a moeda única, Sr.ª Deputada, há só uma moeda única, como há só um Tratado de Maastricht. E nós votámos a favor do Tratado de Maastricht, que os senhores negociaram, aliás, sem nos terem consultado. Não foi preciso consultarem-nos para votarmos a favor do Tratado de Maastricht, porque entendíamos que isso era da maior importância para o País, assim como a adesão à moeda única é da maior importância para o País. O que, depois, poderá ser diferente são as políticas que os vários partidos façam dentro da moeda única, como podem ser diferentes as políticas que os vários partidos façam fora da moeda única. Mas isso não põe em causa a importância política vital da moeda única para Portugal, porque, para nós, essa é uma opção política e não tecnocrática ou monetária, é o querer estar no centro do processo de decisão europeia.
Poderemos ter políticas diferentes, nos planos económico e social, e ainda bem, mas se nós nunca pusemos em causa o projecto europeu, mesmo quando conduzido por vós e mesmo quando discordávamos de vários aspectos da vossa política, espero que recentes declarações que ouvi não queiram dizer que o PSD se quer afastar do consenso europeu em Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Como é evidente, o Governo, em breve, apresentará um conjunto de números de médio prazo, correspondentes ao programa de médio prazo, de acordo, aliás, com os compromissos assumidos com a Comunidade Europeia.
O Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, continuemos a falar de pessoas. E, falando de pessoas, é hoje claro que os portugueses estão mobilizados por um desafio agregador e motivador, o desafio de fazer com que Portugal tenha mais influência nos avanços que se vão verificar no processo de construção europeia neste tempo mágico em que vivemos, que é o tempo de transição de milénios.
Este desígnio tem uma dupla virtualidade: por um lado, reforça o orgulho de um país de precursores que, ao longo da história, sempre têm deixado marcas indeléveis no progresso da humanidade; por outro, reforça as condições que Portugal tem para defender o seu interesse nacional numa Europa em mutação acelerada.
Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados, se dúvidas houvesse sob o papel geo-estratégico acrescido que Portugal conseguiu através da condução correcta da política europeia, nomeadamente em relação à adopção da moeda única, o episódio provocado pelas declarações desastradas, mas não ingénuas, do Ministro das Finanças holandês deu-nos uma prova indelével de que essas dúvidas têm de ser desvanecidas.
De facto, neste episódio, Portugal, que é a mais pequena economia do sul, funcionou como a âncora de defesa dos interesses desse espaço europeu e credibilizou, com a frieza dos números indicadores - números que hoje mesmo são reconhecidos pelo eurobarómetro do Corriere della Sera, que chama a Portugal a "estrela do sul" em termos do cumprimento dos critérios -, a justa repulsa pelas tentativas, que são avulsas mas não são ingénuas, de desvirtuação do projecto europeu.
Trata-se de um exemplo paradigmático que mostra como Portugal, assumindo-se na primeira linha da construção europeia, poderá fazer valer princípios e valores que são essenciais para o nosso futuro colectivo, tais como a
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coesão, o fomento do emprego, o desenvolvimento sustentado, a protecção dos direitos sociais e a competitividade dos sectores tradicionais na economia europeia.
Sr. Primeiro-Ministro, comungo consigo da ideia de que Portugal adoptou uma estratégia de frontalidade e rigor na política europeia, mas com sensibilidade social, como é reconhecido por muitos observadores externos e sobretudo pelo melhor indicador, a adesão do povo português.
Por isso, neste momento, queria perguntar-lhe: até que ponto esta estratégia negociai reforçou o papel de Portugal como âncora da defesa dos interesses dos países do Sul e da vocação atlântica da política europeia? Que influência é que esta atitude poderá ter na futura negociação de dossiers fundamentais para Portugal, como é o caso do dossier dos fundos estruturais?
Gostaria ainda, Sr. Primeiro-Ministro, .de lhe colocar uma outra questão no âmbito da participação portuguesa no processo de construção europeia.
Ao longo desta legislatura, existiu sempre um diálogo construtivo entre a Comissão de Assuntos Europeus e o Governo, diálogo que tem sido exemplar, e na Comissão têm sido profundamente debatidos os tópicos essenciais do processo actual de participação de Portugal na Europa. Não obstante isso, o Partido Social Democrata optou por lançar ultimatos, suportados numa ameaça de não ratificação do Tratado de Maastricht revisto, fora da sede parlamentar e à revelia daquilo que tem sido a sua prática parlamentar.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de saber se, em sua opinião, este acto se insere na cíclica tentação do PSD de pôr em causa a capacidade negociai do País perante as instituições europeias, que contrasta com a atitude, como muito bem referiu, do Partido Socialista enquanto oposição responsável, e se essa atitude é susceptível de perturbar o processo de credibilização política e económica do País que o seu Governo tem conseguido com inegável sucesso.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Chamo a atenção do Sr. Funcionário que está no controlo do painel dos tempos de que o Sr. Deputado Carlos Zorrinho gastou 4.5 minutos e apenas lhe foram descontados 1.4 minutos, por deficiência técnica, suponho eu.
Aproveito também para solicitar aos Srs. Deputados, a pedido dos serviços técnicos, que desliguem os telemóveis que tenham consigo, porque parece que o facto de estarem ligados influi no funcionamento dos aparelhos que medem os tempos.
O Sr. João Amaral (PCP): - Não são só os Srs. Deputados que têm telemóveis!
O Sr. Presidente: - Não são apenas os Srs. Deputados, mas também os Srs. Jornalistas e, inclusive, os assistentes.
Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Carlos Zorrinho, não deixa de ter significado que, nas afirmações do Ministro das Finanças holandês - afirmações iniciais negativas para os países da Europa do sul -, ele tenha feito, apesar de tudo, quando lemos a integralidade das suas declarações, uma referência positiva a Portugal.
E não deixa de ser também curioso que se oiça, cada vez com mais insistência, que o Orçamento português é, dos países que procuram a convergência, o único que não recorre a truques de engenharia orçamental. Isso é revelador da credibilidade que vamos adquirindo e essa credibilidade é essencial.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Este é o momento em que gostaria de dizer à Câmara, com toda a frontalidade, o seguinte: a negociação europeia dos próximos anos vai ser duríssima, no domínio dos fundos estruturais e no domínio da política agrícola, e uma das razões por que eu mais defendo que é indispensável estar no centro da decisão política é porque tenho a certeza absoluta de que, se não estivermos, teremos as maiores dificuldades em enfrentar essa duríssima negociação.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - Nessa duríssima negociação, todos teremos de trabalhar em conjunto, tanto os que estão a favor como os que estão contra o projecto europeu tal como ele hoje se define e não necessariamente o projecto europeu em geral.
Quero aqui dar um exemplo concreto de como, divergindo, podemos ter posições que contribuem para a defesa dos interesses portugueses. Uma das questões por que o Governo se bate em Bruxelas é no sentido de a Europa não ter uma posição fundamentalista em matéria de liberalização do comércio, porque isso seria fatal aos nossos sectores tradicionais. Aliás, viu-se o resultado desse combate naquilo que diz respeito às negociações para os têxteis.
Devo dizer que a posição que os partidos que não partilham a nossa visão europeia têm tido no combate a essa mesma visão fundamentalista ajuda a capacidade negociai do Governo português.
Vozes do PS: - Bem observado!
O Orador: - Quer dizer, há muitos aspectos em que mesmo o facto de divergirmos pode ajudar a reforçar a nossa capacidade negociai.
Quanto àquilo que disse ser um eventual ultimato em relação ao Tratado de Maastricht revisto, prefiro pensar que essas palavras decorrem apenas de uma transcrição errada na comunicação social, porque, se elas tivessem sido ditas, nada fazia sentido na política portuguesa de hoje.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Tinha aqui uma pergunta para lhe fazer, mas substituí-a por outra, na sequência destas últimas intervenções.
Penso que, neste debate, houve um momento de extraordinária importância, pelo menos para mim, que talvez não tenha sido captado por toda a Câmara. Refiro-me às palavras proferidas pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que causam na minha bancada uma enorme perplexidade.
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Sintetizando, diria o seguinte: o Partido Popular, em relação a esta questão da moeda única e em nome da soberania nacional, teve algumas dúvidas em relação aos objectivos, aos métodos e aos calendários. O primeiro ponto que gostaria de deixar claro é que, em nome da soberania nacional, tivemos essas dúvidas concretas quantos aos objectivos, mas sobretudo quanto às metodologias e calendários.
Convencem-se os portugueses, todos os dias, de que, para esta caminhada, temos de avançar com a ideia de que o Céu é o nosso limite, para lá de todas as nossas forças e com um grau de exigência que é extensivo a todos os portugueses, pois este é o único desígnio nacional. É assim que hoje se fala de qualquer coisa que é meramente instrumental.
Numa acção de rua recente, notei que, neste momento, na cabeça das pessoas está enraizada a ideia trágica de que a moeda única é um desígnio nacional, e é o único porque não ouvimos falar de outro.
O que queria dizer ao Sr. Primeiro-Ministro é o seguinte: tenho grande consideração - penso que é generalizada -, do ponto de vista técnico, para além de uma amizade pessoal, pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que defendeu e defende essa bandeira, tal como o Sr. Primeiro-Ministro, tendo-se empenhado e trabalhado nela. Porém, neste momento, revela algumas dúvidas sobre os resultados, tendo dito uma coisa muito importante: "diga lá o que é que vai fazer, para nós nos descolarmos, para que os portugueses saibam que não era isto que lhes íamos dar".
Ora, a minha bancada e os portugueses que ela representa, neste momento, só têm uma pergunta a fazer ao Sr. PrimeiroMinistro, que é a seguinte: se o Céu não estiver lá, se este desígnio nacional que pusemos na mão de, pelo menos, treze países e fundamentalmente de um, que é a Alemanha, não surtir efeito, não obstante todo o seu esforço e o senhor - permita-me a imagem ser um bom pastor conduzindo o seu rebanho,...
Risas gerais.
... o Sr. Primeiro-Ministro têm um plano de contingência para Portugal?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, o plano já existe...
Risos gerais.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, peço-lhe as maiores desculpas. Foi apenas uma associação de ideias, que se compreende facilmente.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Só me honra!
O Orador: - Sr.ª Deputada, não vejo as coisas em termos de Céu e de Inferno, porque tenho do Céu uma visão melhor do que a moeda única. De acordo com as minha convicções, penso que há um Céu melhor do que a moeda única.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Também eu, Graças a Deus! Mas só Graças a Deus!
O Orador: - Mas gostaria de lhe dizer o seguinte: já estamos a trabalhar nessa alternativa, que, aliás, não é uma alternativa mas, sim, uma complementaridade.
Qual é a situação que enfrentamos hoje? É uma situação de globalização da economia mundial. Nessa globalização da economia mundial a própria Europa se alarga e se abre. Essa globalização está a ser feita, muitas vezes, a um ritmo que não controlamos e por formas que combatemos. Há pouco falava dos aspectos da liberalização acelerada das trocas comerciais, nomeadamente em relação a países que não respeitam cláusulas sociais essenciais.
O que é que é preciso fazer nesta lógica de globalização? Em minha opinião, duas coisas: primeiro, a única forma de regular esta globalização é com blocos regionais fortes e por isso consideramos muito importante a União Europeia, como achamos fundamental que haja MERCOSUL e outros blocos regionais que possam "pactar" esta globalização; segundo, ao mesmo tempo que há um intenção decidida da nossa parte de estar no centro do bloco regional a que pertencemos, estamos a procurar lançar pontos de diversificação para outros blocos.
Dou-lhe um exemplo central que é o Brasil. Fui ao Brasil há menos de um ano e procurei mobilizar a economia portuguesa para a importância de redescobrir o Brasil. Na altura, o Brasil via Portugal como um país que se limitava a querer vender vinho e outros produtos tradicionais e hoje, um ano depois, não graças ao Governo mas, sim, graças a esta convergência de esforços da sociedade portuguesa, temos a EDP e a SONAE a investir no Brasil; temos o Banco Espírito Santo e um conjunto de outros bancos a querer investir no Brasil; temos a Portugal Telecom a fazer uma aliança estratégica com o Brasil, que, como sabe, custou muito a "arrancar" em termos de decisão no próprio Congresso brasileiro e temos um conjunto de outras empresas privadas, as mais variadas, a investir a sério no Brasil.
Hoje, começamos a ser olhados pelos brasileiros não como aqueles que, numa visão passadista, ali vendiam alguns produtos da saudade mas como quem compra fábricas de cimento e de aglomerados de madeira, redes de distribuição, entra para bancos e para auto-estradas, enfim, procura estar no centro da economia brasileira, porque só assim criaremos alternativas.
Somos o primeiro investidor mundial em Moçambique; estamos em Marrocos - e, quando digo estamos, refiro-me ao País e não ao Governo, porque o que procuramos fazer é sensibilizar as empresas portuguesas para isso -, pela primeira vez, a fazer um esforço significativo de investimento; estamos a criar redes que ultrapassam a dimensão europeia, porque isso é indispensável, porque não nos esgotamos na Europa.
Digo uma vez mais que a negociação intra-europeia vai ser duríssima e, se queremos estar no centro da Europa, temos de estar no centro dela olhando para o mundo e diversificando as nossas relações.
Mais: o recente crescimento das nossas exportações só foi possível, apesar das dificuldades europeias, porque em alguns destes mercados emergentes houve multiplicações de que, porventura, muitos duvidavam mas nas quais estamos a apostar frontalmente, numa visão que é a de um país pequeno, que não pode estar em toda a parte, mas que tem, pelo menos, uma comunidade onde se pode inserir, que é a comunidade dos países de língua portugue-
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sã, e tem, depois, laços e raízes em muitas outras partes do mundo, que podem ser potenciadas não apenas no plano da cultura e da saudade mas também no plano da economia, do intercâmbio comercial, do investimento e das parcerias empresariais. E aí o Governo estará sempre não como actor mas como ponto que dá as deixas para que as empresas possam construir essas relações.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Vamos colocar algumas perguntas muito concretas e gostaríamos de ter respostas claras e concretas e não as respostas ínvias que o Governo tem dado até este momento em relação à aplicação da lei da flexibilidade e polivalência.
Já que aqui se falou de Céu, queremos saber que Céu reserva o Governo para os trabalhadores e suas famílias e ainda, porque também neste debate se falou de palavra, qual é a palavra do Governo.
Como o Sr. Primeiro-Ministro começa a estar um bocado confuso, importa recordar que o Partido Socialista fez na campanha eleitoral a promessa das 40 horas de trabalho, tendo votado favoravelmente - se calhar, fazendo figas atrás das costas - o projecto de lei do PCP que reduzia o horário de trabalho para as 40 horas.
Acontece, no entanto, que o Governo, agora devidamente acolitado pela CIP, pela CAP e pela CCP numa estranha Comissão que dá pelo nome de Acompanhamento, que se quer arvorar em câmara corporativa e usurpar o poder legislativo da Assembleia da República, tem colaborado nessa subversão, e ao mesmo tempo que diz pretender reprimir as aplicações abusivas da lei tem-nas apadrinhado.
A conflitualidade começou no Norte, nos têxteis e no calçado, e estendeu-se já ao Sul. Na Auto-Europa, os trabalhadores sofreram uma redução, e já não haverá mais nenhuma, de 4 minutos por dia, ficando com um período normal de trabalho de 43 horas e 40 minutos por semana e os trabalhadores dos têxteis e do calçado vão ficar com 41 horas de trabalho por semana.
Para dar cobertura a esta ilegalidade, porque se trata de uma ilegalidade, mesmo à face da lei má que temos, que é a lei da flexibilidade e polivalência, o Sr. Secretário de Estado do Trabalho dá-se ao luxo de afirmar que está em vigor o período normal de trabalho das 44 horas por semana.
Onde estão as 40 horas prometidas na campanha eleitoral, que constam do Programa do Governo? É que num Programa do Governo não pode haver reservas mentais que, ao que parece, terão sido usadas durante a campanha eleitoral.
Sr. Primeiro-Ministro, gostava que respondesse às seguintes perguntas: as pequenas pausas e intervalos de descanso destinados a preservar a saúde e a segurança dos trabalhadores vão ser contabilizados no horário de trabalho ou não?
Os trabalhadores terão de permanecer na empresa à disposição da entidade patronal 40 horas mais o tempo das pausas ou não?
Respeitará V. Ex.ª a Assembleia da República, cumprindo a lei por esta aprovada, ou prefere considerar vinculado o seu Governo aos compromissos com o patronato?
Providenciará V. Ex.ª para que a Inspecção-Geral do Trabalho faça cumprir a lei ou vai continuar o sinuoso caminho da fraude aos direitos dos trabalhadores?
Aplausos do PCP e de Os .Verdes.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, o PCP já teve duas interpretações para esta lei: uma, antes das sua aprovação - era a lei de todos os males; outra, depois da, sua aprovação - é a lei a aplicar a todo o preço.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Eu disse que era má. Não ouviu isso?
O Orador: - Nós sempre tivemos a mesma interpretação. Mas quero dizer-lhe com clareza que, no final do período de transição, nenhum trabalhador trabalhará efectivamente mais de 40 horas por semana em Portugal.
Há uma redução efectiva do horário de trabalho. Alguns podiam ter expectativas maiores mas também há preocupações quanto à competitividade das empresas porque é aí, como sabe, que reside a segurança do emprego dos nossos trabalhadores.
Em relação à disponibilidade, desde que os trabalhadores se encontrem na disponibilidade da empresa é não haja por isso interrupção do processo produtivo, é evidente que há um trabalho efectivo. Essa foi a interpretação que o Sr. Secretário de Estado aqui deu, que foi analisada pela Comissão de Trabalho; é a interpretação da Comissão de Acompanhamento e que a Inspecção-Geral do Trabalho está neste momento a impor no país.
Deveria, porventura, o PCP hoje elogiar o Governo porque, pela primeira vez na História, temos uma Inspecção-Geral do Trabalho dinâmica, activa e que não hesita em punir o patronato quando ele viola a lei.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Primeiro-Ministro informou a Mesa de que, a partir de agora, responderá em conjunto às restantes perguntas.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente,. Sr. Primeiro-Ministro, penso que o debate político deve caracterizar-se pela honestidade. O Sr. Primeiro-Ministro fingiu não ter ouvido uma frase em que disse que a lei era má. A lei era e é má! Não é a lei das 40 horas mas a lei que permite 48 ou mesmo 50 horas de trabalho por semana. Também não é a lei das 40 horas que o Sr. PrimeiroMinistro, na campanha eleitoral, andou a prometer aos trabalhadores. A sua resposta, hoje e aqui, embora tentando-nos baralhar com o jogo de palavras entre trabalho e trabalho efectivo, provou que o Governo e o senhor, como responsável pelo Governo, apadrinham a actuação da Inspecção-Geral do Trabalho, que é abusiva e desrespeita a
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lei naquela vertente mais positiva que a Assembleia da República conseguiu dar a esta lei.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Apesar de não ter exercido o direito regimental de defesa da honra da bancada, como a Sr.ª Deputada deve reconhecê-lo, para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, espero que os empresários portugueses não tenham ouvido esta sua intervenção porque passariam a fazer ilegalidades que a lei não permite!
Aplausos do PS.
Aliás, quando o PCP combate as leis faz interpretações para tentar virar contra elas os trabalhadores, que depois servem magnificamente ao patronato quando procura abusar da legislação aprovada pelo Governo e pela Assembleia.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Essa conversa já é velha!
Aplausos do PS.
O Orador: - E a verdade é que, depois do período de aplicação da lei, não haverá nenhum trabalhador em Portugal que trabalhe efectivamente mais do que 40 horas por semana.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O que é trabalhar efectivamente?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é talvez a primeira vez que o vejo, nesta Assembleia, falar mais em desencanto e em dificuldades do que em facilidades. É natural! Já passou bastante tempo...
Quero dizer-lhe muito claramente que, tendo centrado a sua intervenção na política económica e no caminho para a moeda única, faltou-lhe referir quatro aspectos.
Assim, coloco-lhe as seguintes questões: quando tenciona discutir e apresentar na Assembleia da República o programa de estabilidade a médio prazo?
Como tenciona defender os fundos de coesão com a inclusão do critério emprego?
O que fará quando deixar de cumprir aquilo que o Professor Cavaco Silva afirmou que era bom para o país?
O que fará quando os portugueses se cansarem de pagar mais aumentos e receberem cada vez menos utilidades?
O Sr. Primeiro-Ministro veio aqui falar sobre política económica e não, como lhe tínhamos pedido, sobre segurança, sobre crise da justiça, sobre crise do sistema prisional, sobre crise do sistema policial. O Sr. Presidente da República teve de falar por si. De V.
Ex.ª, sobre esta matéria, não ouvimos nem uma palavra, tem permanecido calado, quando é uma das mais importantes da sociedade portuguesa de hoje. Não pode fazer-se a divisão, como o Sr. Primeiro-Ministro pretendeu, entre problemas importantes e problemas não importantes. Este é um problema tão essencial e importante que o nível negocista e de dissolução da autoridade é tal que já está a impregnar as. coisas mais comezinhas.
Veja o que resulta hoje de uma notícia para ter essa noção, já que anda distraído. O presidente do sindicato dos guardas prisionais diz que o ambiente de indisciplina que actualmente se vive no interior das prisões não se fará sentir na greve dos guardas.
«Os presos fizeram greve e os guardas decidiram não interferir, portanto, esperamos que os presos não interfiram com as nossas formas de
luta». Este é o estado a que as nossas prisões e o sistema prisional chegaram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, não nos cumpre escolher os Ministros mas cabe-nos apreciar a sua actividade e acção. Sobre as características dos ministros e da sua relação com o Príncipe, dizia um clássico: "Há três espécies; um que entende por si mesmo; outro que discerne o que se mostra; o terceiro não entende nem por si nem por outrem, sendo o primeiro excelentíssimo, o segundo excelente e o terceiro inútil".
Como compreendo o Sr. Primeiro-Ministro! Sendo V. Ex.ª um homem de cultura, não falou aqui de educação, de agricultura nem de segurança. Se V. Ex.ª tivesse falado de educação, de agricultura e de segurança, devia ter-se recordado do livro e concluído como o livro manda.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é na qualidade de Deputado da Nação eleito pelo círculo eleitoral dos Açores que me dirijo a V. Ex.ª para, em primeiro lugar, referir que, desde a posse do Governo da nova maioria na República e a nova vitória do Partido Socialista nos Açores, as relações entre a República e as regiões autónomas melhoraram significativamente. Em segundo lugar, gostava de dizer-lhe que apreciamos muitíssimo o empenho que o Governo da República demonstrou aquando dos temporais que se abateram sobre o arquipélago dos Açores, nomeadamente entre Novembro e Dezembro últimos. Queremos recordar aqui não só o voto unânime desta Câmara a pedir ao Governo a declaração do estado de calamidade pública como a rapidez com que este, presidido por V. Ex.ª, o fez a 27 de Dezembro, colocando imediatamente à disposição da Região Autónoma dos Açores 2 milhões de contos.
Mas, mais do que isso, pretendo acentuar a especial sensibilidade do Governo presidido por António Guterres quando, na resolução do Conselho de Ministros, respeitou inteiramente a autonomia dos Açores ao incumbir o Governo Regional dos Açores da coordenação e do controlo de todas as medidas para a execução do estado de calamidade pública no arquipélago. Ainda tendo em conta a sua última deslocação à Ilha de São Miguel no último fim-de-semana, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, dado que a nova avaliação dos estragos se cifra em cerca de 13 milhões de contos e o Governo da República providenciou já cerca de 7 milhões de contos, como tenciona contribuir para uma maior eficácia das medidas a tomar na
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Região Autónoma dos Açores não só do ponto de vista material mas legislativo para que as empreitadas possam fazer-se com a rapidez necessária, a fim de reconstruir o que há a reconstruir e de evitar novos riscos sempre iminentes.
A segunda questão tem a ver com os direitos de audição e consulta dos órgãos de governo próprio da região quando o Governo da República legisla e toma medidas respeitantes às regiões autónomas. Penso que nesse particular nem tudo tem corrido bem e gostava de alertar o Sr. Primeiro-Ministro para que, sempre que o Conselho de Ministros tome medidas que afectam directamente as regiões autónomas, esse direito de audição seja efectivamente tido em conta.
Por último, uma questão que tem a ver com a necessidade de leis de finanças regionais para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
O Governo dá a impressão de ter querido, e muito bem, tomar a iniciativa de vir a apresentar a esta Câmara uma proposta de lei de finanças regionais. Sabemos que estão a decorrer os trabalhos do grupo coordenador, mas a minha pergunta é muito precisa: que calendário tem o Sr. Primeiro-Ministro em mente para a apresentação dessa proposta de lei na Assembleia da República? Deixe-me ser mais preciso: pensa apresentá-la antes ou depois de uma eventual lei de revisão constitucional?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.
O Sr. Pedro Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ouvi a sua intervenção com a máxima atenção e penso que hoje poderia ter aproveitado para dar algumas explicações, que outros membros do Governo não têm dado, sobre a sua profunda paixão na área da educação.
Ouvi hoje que, desde há três dias, a área da educação passou a ter um plano. Pensei que havia um Programa de Governo para cumprir, mas há agora, também na área da educação, um plano, provavelmente com os mesmos resultados, que o Plano Mateus. Os portugueses podem, pois, descansar porque, a partir deste momento, têm um plano para a área da educação! Plano este que, depois de apresentado pelo Sr. Ministro da Educação com pompa e circunstância, nós entendemos como um relatório de actividades dogue não foi feito porque, nesta área, ainda se considera necessário continuarmos em profunda reflexão, em profundo diálogo com toda a sociedade civil. Ninguém fica de fora: os alunos estão em reflexão com o Governo, os professores estão em reflexão com o Governo, a Assembleia e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista também estão em reflexão com o Governo.
Assim, a primeira pergunta que lhe faço é no sentido de saber quando, com todas essas entidades, passamos da reflexão à prática. É que admito dever haver um timing!
Faço-lhe esta pergunta por uma razão. É que eu estava convencido de que o grande plano deste Governo na área da educação se chamava pacto educativo, mas este plano não lhe faz qualquer referência. Portanto, neste momento, temos não um pacto educativo, que seria o elemento mobilizador por parte deste Governo na área da educação, mas passamos a ter um plano de diagnóstico sobre o que é necessário fazer nesta área.
Para quando, Sr. Primeiro-Ministro, o começo de acções concretas na área da educação?
Este Governo considerou fundamental que, até Maio do ano passado, a questão do financiamento estivesse em cima da mesa. Mas eu percebo: o Governo precisou de reflectir mais, precisou de ouvir mais entidades e ouviu. Reflectiu, ouviu, mas o que ainda não disse é quando vai apresentar a lei do financiamento à Assembleia da República.
Mas há mais. Porque nesta matéria se ouvem posições divergentes, gostaria de saber se na lei do financiamento estão ou não previstas propinas. Se estão previstas, então, qual é o seu valor? É que se isto era para Maio passado, estamos em Janeiro, passaram seis ou sete meses, e parece-me que, no mínimo, já devem ler cálculos quanto ao intervalo dentro do qual tem de cair o valor da propina. Não lhe peço que me diga se é cinco, seis ou sete, peço-lhe que diga se é entre zero e um ou zero e cem, mas por favor diga-me o valor em que vai situar-se a propina.
Por último, e após esta Assembleia ter aprovado a gratuitidade do ensino pré-escolar, tenho conhecimento de que o Sr. Primeiro-Ministro diz que, nesta Casa, nós os Deputados, afinal, não votámos todos o mesmo diploma, que cada um terá votado aquele diploma com uma intenção distinta. Vou dizer-lhe qual foi a do PSD e se os outros partidos quiserem pronunciar-se que o façam. Vou dizer-lhe qual é a nossa intenção porque também quero conhecer a do Sr. Primeiro-Ministro.
A nossa intenção é a de que o ensino pré-escolar é gratuito em todos os sectores: no privado, no público e no da solidariedade social. Ora, gostaria de saber se o Sr. Primeiro-Ministro parte do mesmo princípio.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.
O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, já afirmou aqui que hoje se vive em clima de grande estabilidade económica e que existe optimismo no mundo da economia. É claramente verdade. Penso que os portugueses têm disso clara consciência, nomeadamente os empresários. E vou referir apenas um aspecto concreto.
Como o Sr. Primeiro-Ministro disse, as taxas de juro reais estão hoje a nível europeu. Os empresários portugueses têm disso perfeita consciência e vai longe o tempo em que o então Ministro da Indústria afirmava publicamente - gabe-se-lhe a coragem! - que os fundos e os apoios comunitários passavam pelas empresas em direcção ao sistema financeiro. Hoje, felizmente, isso já não acontece, o que, só por si, é fonte clara de desenvolvimento económico, de estabilidade económica e de investimento.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!
O Orador: - E o que atesta isso é também o clima dos mercados, são os resultados das empresas, nomeadamente das privadas e das PME. Portanto, não tenho qualquer dúvida de que as afirmações que aqui foram feitas sobre a saúde da economia portuguesa são actualmente verdadeiras, correctas e correspondem à realidade.
Por isso, permito-me levantar outras questões porque penso que já chegou a altura de podermos levantar os olhos e começar a ter algumas outras preocupações de médio ou mais longo prazo.
Entre essas preocupações uma tem a ver com um debate essencial que, penso, deve ser promovido, que é o de saber qual o papel da economia portuguesa e das empre-
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sas portuguesas em Portugal, na Europa, no mundo, nos mercados globais que hoje nos desafiam. Penso que este debate deve ser feito, não na visão tradicional .do debate e do planeamento estratégico do Estado, centralista, mas na procura de soluções. Porque é evidente que nem todos os sectores, nem todas as empresas, nem todas as opções poderão ser competitivos no mercado internacional. E penso que este é um debate essencial.
Se me é permitido adiantar desde já algum desse debate, vou dar nota da convicção de que é através da inovação e da diferença, da adopção de novos métodos - métodos de gestão, de organização -, de novos produtos, da criação da diferença, que poderemos vencer a batalha do nosso desenvolvimento. Batalha essa em que as empresas portuguesas não podem limitar-se a seguir os europeus mas têm de ter a coragem de, em muitas áreas, antecipar a Europa. Aliás, o Estado também pode dar alguns incentivos, adoptando ele próprio novas tecnologias, nomeadamente no campo da informática, e dando alguns exemplos de adopção de novas formas de organização, mais modernas, mais eficazes, que são essenciais até para o próprio funcionamento do Estado.
A minha pergunta é, pois, no sentido de saber se o Governo pensa ter condições de criar algum programa destinado à inovação, à diferença, à antecipação das transformações das sociedades e dos mercados, a exemplo do que está a acontecer em relação à internacionalização. É que - tenhamos consciência disto - a internacionalização segue a inovação e não o inverso. As empresas que inovam é que são naturalmente internacionais, enquanto as empresas que se internacionalizam não são automaticamente inovadoras.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Passo a uma segunda questão.
Sr. Primeiro-Ministro, na minha geração acreditava-se que o direito ao ensino, à acessibilidade ao ensino e ao saber eram condições suficientes para o desenvolvimento económico. Hoje, temos consciência de que não é assim. Portugal teve uma explosão escolar - felizmente que assim foi - mas hoje temos muitos milhares de jovens licenciados sem emprego.
Gostaria de suscitar esta questão, não na mera óptica do emprego, na mera óptica social, mas na óptica estratégica e essencial de que a entrada daqueles jovens no mercado de trabalho, a sua participação na criação das empresas, a sua participação na gestão das empresas, muitas das quais sabemos que têm uma gestão deficiente, não é um mero problema social, não é sequer um mero problema de trabalho, antes é uma decisão estratégica de modernização e de desenvolvimento da nossa economia.
Portanto, pergunto: tem o Governo condições, para, por exemplo através dos apoios do PEDIP, negociar com as empresas apoiadas a introdução de um conjunto de técnicos no sentido de reduzir o gap, até cultural, entre o empresário-tipo e o gestor-tipo que pretendemos para o futuro?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder conjuntamente às últimas quatro perguntas, tem a palavra o Sr. PrimeiroMinistro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação - não vou dizer "Sr. Secretário de Estado" -, desencanto? Fui acusado de tudo menos de desencanto. Disseram que este era um discurso "de oásis", de "tudo bem" e, agora, veio dizer que foi um discurso desencantado. Não foi. Não estou desencantado. Sobretudo, não estou desencantado com o País e devo dizer-lhe que cada dia me encanto mais com o PSD...
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Muito obrigado!
O Orador: - É que após um período em que - reconheço - o Governo enfrentou algumas sérias dificuldades, consegue chegar aqui, nestas condições, neste debate... Esta é a melhor oposição que se, poderia ter.
Estou verdadeiramente encantado com este PSD.
Aplausos do PS.
Quando é que vamos discutir o programa de médio prazo? Este ano, Sr. Deputado!
Relativamente a fundo de coesão e emprego, fundos estruturais e emprego, trata-se de uma questão central, de uma negociação central! E, por isso mesmo, a nossa é uma posição negocia] extremamente difícil - já o tenho dito - e temos de dar-nos as mãos para defender os interesses de Portugal.
Há um risco efectivo de alguns procurarem interpretar a questão do emprego como forma de sacrificar a coesão com os países do Sul. Esse risco existe, não deve ser escamoteado, e nós teremos de lutar todos para que não o seja.
Quanto a aumentos, já provei que foram os menores de sempre.
Em relação a utilidades, apesar de tudo penso que as utilidades vão melhorando.
Disse-me que não falei de justiça nem de administração interna no momento em que os senhores quiseram que falasse. Ora, eu quis que quem falasse fossem os ministros, em particular o Ministro da Administração Interna. É que o que os senhores quiseram fazer foi minar a autoridade do Governo, desautorizando o Ministro da Administração Interna...
Aplausos do PS.
E na citação erudita que aqui produziu esqueceu o seu autor que pode haver uma outra relação que é uma relação de solidariedade. E o que o Primeiro-Ministro fez foi ser inteiramente solidário com a acção do Ministro da Administração Interna e não permitir que, pela via do PSD, ele fosse desautorizado.
Se os senhores queriam discutir segurança com o Governo naquele momento, deviam discuti-la com o Ministro da Administração Interna, e o Primeiro-Ministro falava pela boca do Ministro da Administração Interna. Que sobre isto não fiquem nenhumas dúvidas nesta Câmara!
Aplausos do PS.
E então em matéria de prisões? Ó Sr. Deputado, estiveram 10 anos no governo e o investimento nas prisões foi "zero"! Herdámos uma situação de sobrelotação trágica, questões de saúde dramáticas, algumas delas verdadeiramente confrangedoras num país civilizado. Tivemos de deitar mãos à obra, e no fim desta legislatura estará multiplicado para um e meio o volume de vagas nas prisões
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e poderemos ter, finalmente, uma política prisional a sério.
Respeitamos o direito de greve dos guardas prisionais, mas com a garantia de que o exercício desse direito não perturbe a disciplina nas prisões.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - E é isso que vai acontecer se esse direito de greve for exercido.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, uma última palavra: se há matérias em relação às quais o silêncio é de ouro para o PSD, são as da justiça e da administração interna.
Vozes do PS: - Bom conselho!
O Orador: - Sobre a agricultura, também o silêncio é de ouro, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Para si, Sr. Primeiro-Ministro!
O Orador: - Em dez anos de gestão na agricultura cometeram-se erros estratégicos fundamentais.
E, Sr. Deputado, o que foi a gestão PSD na educação? Depois de terem retirado os meios ao Ministro Roberto Carneiro para ele aplicar a estratégia e fazer a reforma que pretendia, a que é que assistimos em matéria de educação? Assistimos a reflexão?! Assistimos a acção ou à mais pura confusão, com a permanente rotação dos ministros que não tinham tempo, nem para reflectir, nem para agir, porque eram corridos mal tomavam posse?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Agora estamos a agir. A prová-lo, aí está a Lei-quadro da Educação Pré-Escolar; aí está um conjunto de matérias acordadas com os professores; aí está um plano de financiamento para o ensino superior que em breve se transformará em projecto de lei para discussão nesta Assembleia; aí está um conjunto de acções que vamos desencadear, para além daquelas que já desencadeámos!
Aproveito agora para falar ao Sr. Deputado Pedro Pinto sobre gratuitidade. Estou espantado com o fundamentalismo do PSD! Hoje, o PSD não tem a menor visão sobre a reforma do Estado-Providência...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Já no passado não tinha!
O Orador: porque tão depressa fala na necessidade de reformar o Estado-Providência no sentido de introduzir discriminação positiva, como fala de gratuitidade para todos e em todas as circunstâncias.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!
O Orador: - O PSD não tem hoje uma visão estratégica para a sociedade portuguesa, joga oportunisticamente, decreto a decreto, projecto a projecto, só para dizer mal do Governo.
Vozes do PS: - É irresponsável!
O Orador: - Quanto à propina, naturalmente ela estará consagrada na proposta de lei que o Governo apresentará.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, em seu nome, em nome do Sr. Deputado Mota Amaral e de outros Deputados açorianos aqui presentes, queria dizer que fiquei emocionado, nomeadamente na visita que fiz à localidade de Povoação, com o trabalho admirável do povo açoriano, enfrentando a adversidade e trabalhando arduamente para eliminar os efeitos dos temporais. Isso provou-me que o apoio e a solidariedade da República não só são devidos como são merecidos pelo povo açoriano.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Agradeço que condense o seu pensamento, Sr. Primeiro-Ministro, porque esgotou o tempo de que dispunha, como sabe.
O Orador: - Pode acontecer que haja algumas falhas em matéria de consulta, mas estamos atentos e iremos corrigi-las. Penso que a lei das finanças regionais deverá seguir-se à revisão constitucional, embora deva ser elaborada, se possível, ainda nesta sessão legislativa.
Finalmente, Sr. Deputado Henrique Neto - e vou concluir -, considero que aquilo que disse é da maior importância estratégica para a economia portuguesa.
Em matéria de integração de jovens nas empresas, está já em curso um conjunto de medidas, estando outras em preparação; quanto a inovação e internacionalização da economia portuguesa é a questão-chave que pode levantar-se para o futuro de muito do nosso tecido empresarial.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Queria fazer a seguinte sugestão: que fosse possível, nesta Câmara, ou em Comissão, a realização de um debate sobre inovação e internacionalização da economia portuguesa e, desde já, o Sr. Ministro da Economia estará, seguramente, à disposição para esse debate de fundo sobre uma matéria tão crucial para todos nós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro deu-me a honra de se me dirigir e de comentar muitas das minhas afirmações. Admito que a gravidade das afirmações que proferi em relação à actuação do Governo tenha feito com que o Sr. Primeiro-Ministro me respondesse. As matérias que referi são, com efeito, profundamente graves, e são tão graves que era, de facto, impossível que o Sr. Primeiro-Ministro, qualquer que ele fosse, viesse a esta Câmara, ainda que falar da situação económica do País, ainda que não quisesse responder ao repto das oposições, saísse daqui sem uma palavra acerca destas matérias. Fez bem, Sr. Primeiro-Ministro, foi uma boa acção que V. Ex.ª agora cumpriu.
Risos do PS.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª tem de ter alguma consciência mais profunda sobre o que diz em relação a
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algumas matérias. É que, até agora, depois de 1 ano e quase 4 meses de Governo, em vez fazer aquilo que intentava e dizia que ia resolver imediatamente assim que tomasse posse, em vez de aplicar imediatamente as medidas que tinha preparado durante anos e anos de intensa oposição, V. Ex.ª continua a apresentar reflexões, planos e estudos. Já quanto às medidas diz que se seguirão dentro de pouco tempo.
V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, corre o risco de cair no ridículo com as afirmações que faz porque o País sabe perfeitamente aquilo que não está feito. E V. Ex.ª não pode criar uma realidade imaginária com a utilização da sua palavra.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por fim, em relação ao episódio da Administração Interna, V. Ex.ª não tem de se preocupar, nem tem que verberar a oposição. Não foi preciso fazermos nada, Sr. Primeiro-Ministro, porque o Sr. Ministro da Administração Interna desautorizou-se a si próprio, desautorizou o Governo e desautorizou o País!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, não foi particularmente sensível a ofensa à sua bancada, mas enfim.
Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, já que o Sr. Deputado Carlos Encarnação é masoquista tenho muito gosto em responder-lhe.
Risos do PS.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, o senhor foi responsável pela Administração Interna e durante o período em que lá esteve o investimento em meios para as forças de segurança foi praticamente nulo. Este ano, esse investimento aumenta 80%. E estamos a falar de viaturas, de rádios, de instalações!
Protestos do PSD.
A sua polícia é aquela da máquina de escrever, com cinco cópias, em que se bate com um dedo, de um lado e do outro, e em que a pessoa vai participar um furto e está lá duas horas!
Aplausos do PS.
Essa é a sua polícia!
Vozes do PS: - Exacto!
O Orador: - O que queremos é uma polícia moderna, bem equipada, e estamos a dar-lhe a prioridade que o senhor não lhe deu. Nada disto são estudos, são coisas concretas, são equipamentos que estão a ser adquiridos.
Em matéria de número de agentes, sabe quantos saíram da Escola de Polícia no ano passado? Mil e quinhentos! Sabe quantos vão sair este ano? Dois mil! E sabe, quantos saíam no seu tempo?
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sei, Sr. Primeiro-Ministro!
O Orador: - Sabe?! Então saberá que, por exemplo, durante dois anos, não se fez qualquer admissão na PSP! E saberá, porventura, que no seu tempo se descurou completamente a possibilidade de renovar e alargar as forças de segurança.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Isso até lhe fica mal!
O Orador: - Desculpem que vos diga, mas fazem-me lembrar aqueles pais que educam mal uma criança durante 10 anos e depois queixam-se de ela ter maus resultados na escola! Os problemas que hoje estamos a sentir e a resolver foram aqueles que os senhores criaram.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E, ao estarmos a resolvê-los, temos enfrentado todas as dificuldades que são conhecidas, porque reais. A transição reformadora que está a ser feita na polícia não é fácil, mas foi levada a cabo na Europa Ocidental a que pertencemos e também o será em Portugal. Essa transformação não é fácil, repito, mas está a ser conduzida de uma forma que honra o Ministro, honra o Governo e honra o País.
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: - Terminado o debate, é esta a altura de o Sr. Deputado Pedro Pinto exercer o direito regimental de defesa da honra pessoal. Mas espero que reconduza, de facto, as suas palavras a uma ofensa que seja de natureza pessoal.
O Sr. Pedro Pinto (PSD): - Sr. Presidente, como algumas pessoas desta Câmara saberão, dediquei bastante do meu tempo à preparação da Lei-quadro da Educação Pré-Escolar. E fi-lo de uma forma séria, como entendo que deve ser feita a preparação de todas as leis.
Em sede de Comissão, acompanhei todas as audições feitas à sociedade civil; ouvimos todas as entidades que deveriam ser ouvidas para a feitura desta lei e orgulho-me - é mesmo um dos documentos de que me orgulho - da forma como esta Assembleia, no seu todo, tratou da sua preparação, desde o início até à votação. É por isso que fico chocado quando ouço o Primeiro-Ministro de Portugal dizer que o comportamento dos Deputados que aprovaram esta lei é oportunista. São estas afirmações que degradam a vida política portuguesa!
Vozes do PSD: - Muito bem!
Risos do PS.
O Orador: - É aproveitar um ataque a uma questão que é feita de forma séria por um Deputado desta Casa, que ao pedir esclarecimentos é acusado de oportunista.
Mas, meus amigos, essa atitude tocou-me muito pouco e espero que todos aqueles da bancada do PS que se estão a rir e que votaram favoravelmente esse mesmo diploma não façam também parte dos oportunistas a que o Sr. Primeiro-Ministro se referiu!
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Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, em termos de seriedade, Sr. Primeiro-Ministro - e sabe que muito o respeito -, quero dizer-lhe o seguinte: se houve alguém que não foi sério na questão do ensino do pré-escolar foi o seu Governo! E não foi sério porque no dia da sua votação em Plenário, com a presença das câmaras de televisão e o Hemiciclo cheio, os senhores abraçaram-se, esfuziantes e contentes, como se se tratasse de uma lei exclusivamente vossa! Todavia, na questão do pré-escolar, se tivesse feito vencimento a posição do Governo, não haveria gratuitidade do ensino pré-escolar em Portugal!
Vozes do PSD - É verdade!
Protestos do PS.
O Orador: - Portanto, quem é demagogo, quem é oportunista é o Governo, visto que apresentou uma lei da Assembleia da República, uma lei que ele não queria e que hoje apresenta ao País como uma grande reforma sua.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Isso é falso! Quem fez essa reforma foi a Assembleia da República!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr.ª Presidente, em primeiro lugar vou referir-me às questões de honra.
Nas minhas palavras não esteve em causa qualquer acusação de oportunismo pessoal ao Sr. Deputado Pedro Pinto. Admito que se tenha empenhado com toda seriedade na elaboração da Lei-quadro da Educação Pré-Escolar.
O que está em causa é a contradição dos pontos de vista do PSD sobre a reforma do Estado-Providência ao Estado de bem-estar. E apontar essa contradição, no meu entendimento, não é um insulto pessoal, é uma questão política, é uma questão de oportunismo político.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - Passo agora ao essencial.
O Sr. Deputado Pedro Pinto orgulha-se dessa lei. Eu também! É que se o PS, porventura, não tivesse ganho as eleições ainda não a teríamos!
Aplausos do PS.
A Lei-quadro da Educação Pré-Escolar é uma lei desta Assembleia, que a honra e dignifica, mas ela nasceu de uma iniciativa do Governo e não nasceu, nos últimos 10 anos, de uma iniciativa de outros Governos que a poderiam ter feito.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E isso também ficará na história do ensino pré-escolar em Portugal!
Agora vamos mais longe: essa lei podia ter sido votada antes das férias parlamentares, e só não o foi porque o PSD disse que só a votaria se, simultaneamente, fosse votado um conjunto de apoios ao futebol ou a outros desportos em relação às regiões autónomas.
Protestos do PSD.
É a informação que tenho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
Protestos do PSD.
Mas digo-lhe mesmo mais: ainda bem que, então, não foi votada à pressa, ainda bem que se fez um trabalho de reflexão sério e profundo, ainda bem que este Parlamento trabalhou vários meses nessa lei. E estou certo de que, quando o Governo apresentar o decreto-lei a regulamentar, indispensável para a sua concretização, nessa altura se clarificarão inteiramente as posições das bancadas do PSD e do PS.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Pedro Pinto pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Pedro Pinto (PSD): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa na qualidade de Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Pinto (PSD): - Quero comunicar a esta Câmara que, enquanto Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, respondo pelas decisões que são tomadas pela Mesa da Assembleia e pela Comissão e não respondo por quaisquer acordos que existam entre outros Srs. Deputados.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Ah!..
O Orador: - Que isto que fique muito claro, aqui, nesta Casa. E quero que fique muito claro porque, mais uma vez, surge uma insinuação que eu não aceito nem admito. Não admito porque os Srs. Deputados da Comissão de Educação, Ciência e Cultura sabem que, desde o primeiro dia em que esta matéria foi tratada - e, permitam-me que lhes diga, com grande empenho meu -, eu disse sempre que ela não seria votada antes de fazermos as audiências públicas que considerávamos fundamentais.
Não quero fazer insinuações nem referências ao que diziam os jornais porque, se tivesse de o fazer, Sr. Primeiro-Ministro, o que retiraria dessa leitura é que se queria fazer uma votação apressada dessa lei e não uma discussão aprofundada, talvez porque o resultado que se pretendia não é o que foi atingido, mas outro. Foi a Comissão, por unanimidade, que decidiu esse tipo de comportamento.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PS): - Diga antes que não sabe!
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O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, quero fazer uma interpelação para que não fiquem dúvidas.
Não obstante o que disse, Sr. Deputado Pedro Pinto, na qualidade de Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, em nada contestou aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro tinha dito.
Mas para que o Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura também não tenha dúvidas sobre o que aconteceu, quero dizer que, no final da sessão legislativa passada, quando tivemos de acordar sobre quais as matérias que ainda seriam votadas antes das férias parlamentares, houve uma grande insistência por parte do Governo para que fosse feita imediatamente a votação da proposta de lei relativa ao pré-escolar, uma vez que, aquando do seu debate, aqui, em sede de generalidade, a sua bancada havia dito "por nós, até podemos votar hoje mesmo", tendo, então, o Governo dito "não vamos votar hoje mesmo, vamos fazer o debate, porque queremos que seja uma lei consensual".
No entanto, gostaríamos que ela tivesse sido aprovada na sessão legislativa passada. E só não foi agendada para votação porque, nessa altura, foi colocada pelo Grupo Parlamentar do PSD, como condição de consenso para esse agendamento, que fosse também agendado, para votação, um conjunto de propostas, particularmente uma da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, que caducava com as eleições regionais e que dizia respeito aos apoios ao "mundo" do futebol da Madeira, nas suas deslocações ao Continente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este tipo de interpelações, que o não são, provocam, normalmente, outras interpelações em cadeia.
Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Coelho, que também a solicitou para esse efeito, mas não darei mais a palavra para interpelações deste género.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Deputado Carlos Coelho não se lembra!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, ao contrário de V. Ex.ª, não tenho a pretensão de me recordar de tudo, mas, por acaso, recordo-me bem deste processo do diploma da educação pré-escolar.
Foi um processo em que o Governo andou particularmente mal: andou mal perante o Plenário da Assembleia da República, andou mal perante a comissão parlamentar respectiva, e houve, aliás, uns telefonemas e uns contactos bastante curiosos entre a bancada do Governo e a bancada que V. Ex.ª integra, que tornam hoje possível que nenhum de nós se esqueça daquilo que aconteceu.
O Sr. Presidente recordar-se-á que nós, PSD, quando o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, não com o vigor de que agora acabou de dar provas perante a Câmara, mas de uma forma mais consentânea com o clima da Conferência dos Representantes do Grupos Parlamentares, chamou a atenção para o desejo de o Governo acelerar o processo legislativo da educação pré-escolar, tivemos ocasião de propor a convocação
específica do Plenário para esse efeito pata não atrasar mais a aprovação da lei da educação pré-escolar.
Devo reconhecer que quando o PSD, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, fez essa proposta, o PS e o Governo acharam que seria razoável esperar mais um pouco. Recordo-me que o Sr. Secretário de Estado disse qualquer coisa deste género: "se já esperámos até aqui, vamos esperar mais alguns dias". E, de facto, esperaram mais alguns dias até que essa lei pudesse ser aqui apreciada.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Meses!
O Orador: - Agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não deixa de ser curioso que o Sr. Secretário de Estado faça a interpelação que fez nos termos em que acabou de a fazer e que ele próprio se esqueça das palavras que dirigiu à Câmara a propósito do trabalho dos Deputados de todas as bancadas, relativamente à seriedade, à produtividade, à forma dialogante como soubemos aprovar a lei, não esquecendo a participação do próprio Governo no colóquio parlamentar que aqui se fez, numa lei que foi participada, discutida, analisada, e que, se não foi aprovada mais cedo, ao Grupo Parlamentar do PSD, seguramente, se não deve.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Dado que os Srs. Deputados acabaram de prestar esclarecimentos em vez de fazerem interpelações, a Mesa não se sente na obrigação de se pronunciar sobre o assunto.
No entanto, quero dizer o seguinte: o que se passa na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentes prova-se através das suas actas. Não aceito que se faça prova testemunhal sobre o lá se passa!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegados ao fim da nossa ordem de trabalhos de hoje, vamos passar às votações que estavam previstas para as 18 horas.
Em primeiro lugar, vamos votar um requerimento, subscrito pelo PSD, CDS-PP e PCP, solicitando, ao abrigo do artigo 156.º do Regimento, a baixa às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente do projecto de lei n.º 65/VII Criação do provedor municipal (PS) para nova apreciação.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.
Vamos agora proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 18/VII - Prevenção da poluição provocada por navios que transportem substâncias poluentes ou perigosas nas águas da zona económica exclusiva portuguesa (Os Verdes).
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Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.
Temos agora quatro relatórios e pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias a cuja votação também temos de proceder.
Tem a palavra o Sr. Secretário para dar conta dos respectivos pareceres.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Círculo de Vila Real, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu, emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Manuel da Costa Pereira a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Dado não haver pedidos de palavra, vamos proceder à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Círculo Judicial de Abrantes, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nelson Madeira Baltazar a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria-Geral da República, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria Amélia Macedo Antunes a prestar declarações, em processo que se encontra pendente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Finalmente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Nazaré, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão terminados os nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, e da respectiva ordem do dia constam perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão..
Eram 181horas e 25 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos. Gilberto Parca Madaíl.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Luís Carlos David Nobre.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Partido Comunista Português (PCP):
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Fernando Pereira Serrasqueiro.
José Maria Teixeira Dias.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Partido Social Democrata (PSD):
José Guilherme Reis Leite.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Kruz Abecasis.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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DIÁRIO da Assembleia da República
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