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Sábado, 15 de Fevereiro de 1997 I Série - Número 40

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE FEVEREIRO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. João António Gonçalves do Amaral

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.

Foi aprovado um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando um Deputado do PCP a depor em tribunal.
A Câmara começou por apreciar a petição n.º 156/VI (2.ª), apresentada pela Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), solicitando a alteração do actual estatuto legal de freguesia, tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Lucília Ferra (PSD), José Egipto (PS) e Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP).
Foi também apreciada a petição n.º 159/VI (2.ª), apresentada pela Aliança Evangélica Portuguesa, solicitando a adopção pela Assembleia da República de legislação ordinária que termine, de vez, com a discriminação existente em matéria de IVA, IRS e IRC entre, a Igreja Católica e as demais confissões religiosas não católicas. Intervieram os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Manuel Varges (PS), Duarte Pacheco (PSD), António Filipe (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
A petição n.º 41/VII (1.ª), apresentada por, José Abílio da Soledade Ribeiro e Silva e outros, solicitando a reestruturação orgânica dos serviços florestais, foi igualmente apreciada. Produziram intervenções os Srs. Deputados Gavino Paixão (PS), Lino de Carvalho (PCP), Armelim Amaral (CDS-PP) e Costa Pereira (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Carneiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sônia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata(PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.

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Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madaíl.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):











Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado no ofício n.º 220, de 06/02/97, do Tribunal Criminal do Círculo de Lisboa, enviado à Assembleia da República, esta Comissão parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Sá a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência de julgamento marcada para 17 de Fevereiro de 1997, pelas 14 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Visto não haver objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, visto não haver mais expediente, vamos dar inicio aos nossos trabalhos, com a apreciação da petição n.º 156/VII (2.a), apresentada pela Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), solicitando a alteração do actual estatuto legal de freguesia, dispondo cada grupo parlamentar, para o efeito, de 7 minutos.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente de questões levantadas por esta petição, designadamente o problema da inconstitucionalidade do actual Estatuto Legal da Autarquia Local - Freguesia e até da discutível inconstitucionalidade indirecta resultante da violação da Carta Europeia de Autonomia Local, há sobretudo um, aspecto que é evidente na tomada de posição. É uma profunda frustração, em matéria da situação que foi criada às freguesias ao longo dos últimos anos. Temos de reconhecer, sem dúvida alguma, que devido à luta das próprias freguesias, ao apoio que frequentemente tiveram de muitos municípios, ao apoio de partidos políticos, e designadamente do Grupo Parlamentar do PCP, que alguns aspectos deste Estatuto foram corrigidos,

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mas temos de reconhecer também que o caminho por andar é efectivamente muito vasto.
Recordo nesta matéria o Manual de Direito Administrativo, de Marcelo Caetano, que caracterizava as freguesias como subunidades municipais que vão arrastando uma vida penosa e que, mais tarde ou mais cedo, deverão ser extintas. Uns anos depois, já bastantes anos após o 25 de Abril, a 1.ª edição do Curso de Direito Administrativo, felizmente corrigido na 2.ª edição por Diogo Freitas Amaral, não era muito diferente, apontava igualmente para a ideia de que o papel era tão diminuto e a vida tão penosa que deveriam acabar por ser extintas.
A nossa opinião é completamente diferente: a de que nas freguesias está um rico tesouro da democracia portuguesa. E uma possibilidade de participação e intervenção directa, verdadeiramente inestimável. E, por isso mesmo, a questão que se coloca, em relação à qual o Grupo Parlamentar do PCP está profundamente comprometido, é a de alterar os aspectos do Estatuto que levam a esta petição, legislando no sentido de, tão rapidamente quanto possível, corrigir as questões fundamentais que são colocadas.
Em matéria de atribuições e competências, estamos a entrar na fase terminal de uma lei que, esperamos, possa dar um passo nesta matéria. As nossas inquietações não terminaram completamente, mas estamos a trabalhar e esperamos que as perspectivas possam alterar, no sentido positivo, a questão que actualmente está colocada. Infelizmente, porém, no domínio financeiro estamos bastante aquém daquilo que importaria garantir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não desconhecemos, naturalmente, a posição do Partido Socialista nesta matéria, que é a de, progressivamente, até ao fim da legislatura, atingir 15% do FEF, mas também não desconhecemos que muitos municípios portugueses - e é uma orientação de todos os municípios de maioria CDU - transferem 20% do FEF por vontade própria com os correspondentes protocolos de delegação de competências, e este aspecto .é reconhecido pela generalidade das freguesias e tem produzido excelentes resultados, no que toca a valorizar o próprio papel das freguesias no conjunto da administração pública portuguesa.
Em matéria de eleitos a tempo inteiro, a situação criada é absolutamente deplorável, porque demos um passo, sem dúvida alguma, importante. Foi aprovada uma lei que, pelo menos, abriu a possibilidade de haver eleitos a tempo inteiro, não tantos quantos tínhamos proposto, pouco mais de 300 freguesias e não 2100 como tínhamos adiantado, mas, em todo o caso, era uma possibilidade.
Entretanto, temos de dizer que a aplicação da lei tem vindo a ser verdadeiramente desastrosa, inclusive as transferências do Orçamento do Estado para as freguesias têm sido feitas com atraso. Tem havido interpretações, com pretextos burocráticos, com fundamentos jurídicos totalmente absurdos, que têm criado dificuldades e obrigado, inclusive, algumas freguesias a voltar para trás. Descobriu-se, por exemplo, que o número de eleitores que importa ter em conta nesta matéria não é o de eleitores que existe em cada ano mas o que existe no início do mandato. Realmente, só uma mente burocrática, que põe a poupança de verbas acima de qualquer outro tipo de consideração democrática e do próprio cumprimento da lei, é que poderia levar a uma interpretação deste tipo.
Em matéria de uniões de freguesias, que são actualmente vedadas, em matéria de sedes de freguesias, onde muitos passos foram dados, mas muito há ainda por fazer, e em matéria de criação de novas freguesias, que todos os partidos propuseram, mas que está bloqueada, creio também que há muito a fazer.
Por isso, perante esta petição, podemos dizer que, pura e simplesmente, estamos comprometidos no sentido de que a situação que levou a Associação Nacional de Freguesias a apresentá-la possa vir a ser resolvida ou, pelo menos, serem dados grandes passos para corrigi-la, a qual, sem dúvida alguma, não é honrosa para a democracia portuguesa nem para a Administração Pública do nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com a petição n.º 156/VI, admitida em 17 de Fevereiro de 1993, pretendem os peticionantes, Associação Nacional de Freguesias, que a Assembleia da República proceda à discussão e alteração, por via legislativa, de aspectos relativos ao quadro legal conformador do regime jurídico da freguesia.
A petição procede a uma análise exaustiva do quadro supralegal e legal consubstanciador do regime jurídico desta autarquia, evidenciando a desconformidade das normas jurídicas existentes relativamente ao texto constitucional e à Carta Europeia de Autonomia Local.
Referenciam os signatários que, em sua opinião, as atribuições das freguesias encontram-se confinadas a uma área residual não afecta aos municípios.
Realçam, no domínio financeiro, a dependência quase exclusiva da participação a que têm direito nas receitas do município, a não consagração da possibilidade de poderem contrair empréstimos a curto prazo, o facto de não disporem de acesso ao mercado de capitais, assim como a impossibilidade de lançarem derramas e de procederem a expropriações.
Denunciam a ausência de previsão legal que possibilite associações de freguesias no plano nacional e a participação destas em associações internacionais.
Salientam ainda a circunstância de os eleitos nas freguesias não poderem exercer o mandato em regime de permanência e a precaridade das instalações em que parte das juntas de freguesia são obrigadas a funcionar.
Os signatários consideram inconstitucional o actual regime legal das freguesias por violação da Constituição, colocando igualmente a questão da inconstitucionalidade indirecta por desconformidade com os princípios da Carta Europeia de Autonomia Local.
A inconstitucionalidade concretizar-se-ia pela desconformidade do regime jurídico da freguesia face aos contornos que esta autarquia assume no texto constitucional, mormente no que concerne ao princípio da autonomia como direito e capacidade efectiva de esta realidade local prosseguir os interesses próprios da população respectiva e sua independência face às restantes entidades do poder local e central.
A inconstitucionalidade indirecta verificar-se-ia pela desconformidade do estatuto face à Carta. Europeia de Autonomia Local, nomeadamente no que respeita à não previsão de impostos locais e ao afastamento da possibili-

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dade de lançamento de derramas - artigo 9, n.º 3, da Carta.
O próprio Estatuto dos Eleitos Locais enferma, segundo os peticionantes, de inconstitucionalidade indirecta, em virtude de o artigo 7.º da Carta dispor que os eleitos locais devem ter assegurado o livre exercício do seu mandato e auferir uma compensação financeira adequada às despesas inerentes ao exercício do mesmo.
A não previsão do direito de associação de freguesias violaria igualmente o artigo 10.º do texto europeu.
Afastando da discussão a problemática da fiscalização da constitucionalidade, solicitam que a Assembleia da República adopte medidas legislativas susceptíveis de conferir ao regime jurídico das freguesias o conteúdo e o alcance enunciado fundamentalmente nos domínios das atribuições e competências, das finanças locais, do estatuto dos eleitos locais, de sedes e associações.
Pese embora a fundamentação expendida e a oportunidade das questões suscitadas, merecedoras da nossa reflexão e intervenção legislativa, é de realçar que o ordenamento jurídico português, podendo em inúmeros aspectos ficar aquém das necessidades e potencialidades desta autarquia local, concede-lhes um papel significativo na estruturação do poder local.
Pessoas colectivas territoriais, dotadas de órgãos representativos próprios empenhados na prossecução de interesses das respectivas populações, dispõem de efectiva liberdade na condução das políticas locais, de meios próprios (embora em muitos casos insuficientes), de um conjunto de atribuições e competências não residuais ou por delegação, como sejam o abastecimento público, a protecção à infância e à terceira idade, a defesa e protecção do ambiente e da qualidade de vida, a administração de bens próprios ou sob sua jurisdição.
Relativamente ao direito de associação, a não proibição constitucional vem permitir ao legislador ordinário uma intervenção legislativa convergente.
Quanto à construção, reparação e aquisição de sedes, o Orçamento do Estado inscreve verbas destinadas ao seu financiamento, permitindo-se a sua efectivação.
No que concerne à Carta Europeia de Autonomia Local parece, de facto, existir alguma discrepância entre o regime jurídico desta autarquia e o disposto no texto europeu, ratificado, sem reservas, pelo Estado português, mormente no que respeita ao direito de associação, ao estatuto dos eleitos e ao regime financeiro das freguesias.
Todavia, parece-nos importante referir que, durante o lapso de tempo que medeia entre a admissão da petição e a sua subida hoje a Plenário, o legislador, quiçá imbuído pelas preocupações apresentadas pela ANAFRE, tem vindo a desenvolver um esforço legislativo no sentido de encontrar soluções mais desejáveis.
Assim, a título meramente exemplificativo, citaríamos a transferência directa do Orçamento do Estado para as freguesias do montante do FEF atribuído já desde 1994; a Lei n.º 8/93, de 5 de Março, que estabelece o Regime Jurídico de Criação de Freguesias; a Lei n.º 11/96, de 18 de Abril, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício do mandato dos membros das juntas de freguesia, nomeadamente no que concerne ao regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo; a existência de anteprojectos, em fase de aperfeiçoamento, como sejam o anteprojecto do Partido Social-Democrata de uma nova Lei de Finanças Locais, susceptível de melhor enquadrar a realidade autárquica e aperfeiçoar o princípio da descentralização administrativa e, também em preparação pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, uma alteração legislativa relativa a atribuições e competências das autarquias locais.
O PSD, consciente da importância que as freguesias assumem no contexto do poder local, conhecedor das suas amplas potencialidades, da sua capacidade de satisfação das necessidades prementes das populações, não deixará de adequadamente ponderar nos seus projectos as preocupações manifestadas hoje pelos peticionantes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Egipto.

O Sr. José Egipto (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 156/VI, admitida em 17 de Fevereiro de 1993, da iniciativa da ANAFRE - Associação Nacional de Freguesias - e subscrita por 12 463 cidadãos vem solicitar à Assembleia da República que se proceda à reformulação do estatuto jurídico da freguesia.
Passados que estão quatro anos desde a sua admissão, a petição continua a manter, no essencial, toda a sua actualidade, pois os signatários pedem que se confira globalmente ao estatuto das freguesias o conteúdo e o alcance nela propostos, especialmente nos domínios das atribuições e competências, finanças locais, estatuto dos eleitos locais, sedes e associações de freguesias.
Desde o seu primeiro congresso, realizado em Novembro de 1988, e mais recentemente no seu quinto congresso, realizado em Junho de 1996, que a ANAFRE vem exigindo da Assembleia da República a adopção de iniciativas legislativas que passam pela publicação de legislação que atribua mais competências às freguesias acompanhadas dos respectivos meios financeiros; pela consagração de legislação que possibilite à associação de freguesias o objectivo de prosseguir tarefas comuns no exercício das suas competências; pela alteração da legislação existente por forma a que seja alargado o regime de permanência contemplando um maior número de freguesias; pelo acesso das freguesias ao crédito e fundos comunitários em igualdade de circunstâncias com os municípios; pela inclusão, nas delegações de autarcas portugueses que integram organismos internacionais, de membros eleitos das freguesias; pela participação das freguesias nas receitas próprias dos concelhos oriundas dos impostos locais e pelo reconhecimento à ANAFRE do estatuto de parceiro social.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, cientes destas reivindicações, o Governo do Partido Socialista e da Nova Maioria, no seu Programa, assume claramente orientações e tomada de medidas convergentes nos campos da administração autárquica e da administração e ordenamento do território.
A reestruturação da administração do território responderá ao desafio de uma democracia mais aperfeiçoada e de uma administração mais eficaz ao serviço dos portugueses.
À luz da Constituição da República Portuguesa, freguesias, municípios e regiões administrativas, para além da expressão organizada dós cidadãos residentes na respectiva área territorial para a realização dos seus interesses comuns e específicos, assumem-se como entidades estruturantes do Estado democrático e actores decisivos do desenvolvimento territorial.

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A regionalização é parte integrante da inadiável actualização coerente da Administração Pública por razões de eficácia mas também por imperativos de cidadania.
Reclamam-se igualmente a revisão do quadro de atribuições e competências dos municípios e das freguesias, designadamente nas áreas de apoio ao desenvolvimento local e da promoção das potencialidades endógenas, do ensino e da extensão educativa, da solidariedade e do combate à exclusão, da habitação, da defesa do ambiente e do património edificado, da ocupação dos tempos livres e da ocupação cultural, da segurança e da tranquilidade pública mediante a assunção clara de uma postura de cooperação e apoio à modernização e qualidade dos serviços a cargo da administração autárquica.
Constituirá objectivo permanente dos serviços, a par da dignificação do poder local, o apoio à sua crescente eficácia de funcionamento para um melhor serviço aos cidadãos. Neste sentido, propõe-se desenvolver formas adequadas de apoio e cooperação com as autarquias, desde o apoio à construção e reparação de edifícios sede das autarquias ao lançamento de programas de inovação, modernização e simplificação da gestão autárquica na óptica da produtividade e da melhoria da qualidade dos serviços a prestar.
As autarquias necessitam de ver consagradas novas formas de parceria institucional e novos instrumentos de gestão.
A valorização do papel das autarquias como parceiros institucionais e instrumentos de intervenção no processo de envolvimento aconselha a que se reveja o regime jurídico das associações nacionais representativas dos municípios e freguesias.
Importa também assegurar às associações de municípios e de freguesias acrescida capacidade autónoma de intervenção, diálogo e colaboração com os órgãos de soberania, bem como o reconhecimento da sua participação em organizações internacionais congéneres.
Assim, a tais associações representativas das autarquias deverá ser conferido o estatuto de parceiro relativamente ao Estado para as questões que lhes interessem, parceria que igualmente se propõe entre as autarquias e a sociedade civil nomeadamente pela constituição de conselhos locais e regionais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Partido Socialista prossegue na realização dos seus compromissos. As freguesias merecem, da nossa parte, a atenção e a dignificação de que estão a ser alvo num processo legislativo articulado e consistente.
Os Deputados do Partido Socialista apresentaram projectos de lei sobre a regulação do modo de constituição dos órgãos de freguesia, sobre associações representativas dos municípios e das freguesias e ainda sobre atribuições e competências das freguesias, encontrando-se todos em discussão na comissão especializada.
Iniciámos um processo e é importante continuá-lo sem sobressaltos e com estabilidade. Só assim alcançaremos os objectivos de valorização do estatuto e do papel das freguesias e, em geral, do poder local. Por isso apelamos aos autarcas de freguesia para que apoiem o essencial do esforço reformador em curso em clima de diálogo e de participação construtiva.
As responsabilidades são de todos e é desejável que por todos sejam prosseguidas em clima de solidariedade institucional.
Este é, sem sombra de dúvidas, o empenhamento mais sério até hoje assumido para a redignificação do poder local, das freguesias e dos seus autarcas, e que dá resposta à maior parte dos anseios e das aspirações das freguesias representada pela sua associação nacional.
Para terminar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista saúda os subscritores da petição que acabámos de apreciar e deixa o testemunho do seu apreço e consideração pelo trabalho digno que os autarcas exercem para o bem-estar das populações que representam.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O teor da petição que aqui discutimos é daqueles que costuma merecer um grande consenso parlamentar. Muitos de nós já exerceram funções autárquicas numa freguesia - eu próprio exerci-as durante 10 anos e depois disso continuei a lidar com a mesma problemática -, o que nos leva a conhecer a devoção à causa pública e o quase espírito de sacerdócio que anima os autarcas das freguesias. Por outro lado, conhecemos a eficácia e a economia de recursos que se obtêm com a proximidade da autarquia local freguesia com os problemas e os cidadãos e conhecemos, por último, a escassez de meios que aflige as juntas de freguesia e as impede de melhor prosseguir os seus fins.
O simples decurso do tempo entre a data da apresentação desta petição e o momento em que sobe a Plenário, quase quatro anos e meio de intervalo, poderia levar a concluir pela sua desactualização. Nada disso! As motivações, os argumentos e as conclusões dos peticionários mantêm-se actuais não obstante as promessas, muitas não cumpridas, e algumas apenas meio cumpridas.
O Partido Socialista, com a responsabilidade que lhe advém de ser maioria no Parlamento e Governo no país, iniciou nesta matéria um processo legislativo aos solavancos avançando com iniciativas desgarradas sem lógica de conjunto e, por isso, incompletas. Desde logo porque se lançou numa espécie de hasta pública onde, em concurso com o Partido Comunista, fez lanços para ver quem mais competências atribuía às juntas de freguesia sem curar de lhes dar os meios idóneos para exercê-las. Por outro lado, porque a seguir à euforia da apresentação inicial e da discussão na generalidade, certamente apenas para cumprir calendário, deixou morrer o entusiasmo e mantém em hibernação, há mais de um ano, o projecto de lei n.º 42/VII.
Quando o discutimos em Plenário, tive oportunidade de chamar a atenção para o facto de que melhor que legislar depressa era legislar bem e que preferível seria apreciarmos uma reforma de conjunto do edifício legislativo que respeita às freguesias. Afinal, nem depressa nem bem.
Foi-me esclarecido na altura, pelo Sr. Deputado José Junqueira, que não havia tempo a perder e que aquelas inovações entrariam em vigor ainda no decurso do actual mandato autárquico. Formalmente, talvez sim....
Mas, em matéria de acção governativa, o PS não fica atrás do seu Grupo Parlamentar. Basta recordar a promessa meio cumprida de atribuição do FEF às freguesias e a interpretação restritiva que a Direcção-Geral da Administração Autárquica faz em matéria de retribuição dos autarcas de freguesia em permanência.

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Aquilo que os autarcas de freguesia reclamam e merecem é uma reforma de fundo do enquadramento legal desta autarquia e que preveja, desde logo, o redimensionamento territorial que as torne viáveis e, simultaneamente, eficazes.
Por outro lado, reclamam e merecem um regime remuneratório e de permanência que não os discrimine em função da dimensão de cada freguesia. Reclamam e merecem a possibilidade de constituir quadros de pessoal próprios, com os respectivos trabalhadores cobertos pela ADSE. Reclamam e merecem que lhes seja concedida a possibilidade de se associarem para além dos limites dos concelhos em que se integram.

Por nós, merecem-no.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está encerrada a discussão da petição n.º 156/VI (2.ª), nos termos previstos na Lei das Petições e no Regimento.
Passamos agora à apreciação da petição n.º 159/VI (2.ª), apresentada pela Aliança Evangélica Portuguesa, solicitando a adopção pela Assembleia da República de legislação ordinária que termine, de vez, com a discriminação existente em matéria de IVA, IRS e IRC entre a Igreja Católica e as demais confissões religiosas não católicas.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição apresentada pela Aliança Evangélica Portuguesa tem como objectivo requerer a adopção pela Assembleia da República de legislação ordinária que termine de vez com a discriminação existente, em matéria de IVA, IRS e IRC, entre a Igreja Católica e a Confissão Cristã-Evangélica.
Como se sabe, a nossa Constituição consagra, entre outros, o princípio da igualdade e o da liberdade religiosa. Em matéria fiscal, também sabemos que, relativamente à Igreja Católica, rege o artigo 8.º da Concordata estabelecida, entre a Santa Sé e a República Portuguesa e, obviamente, sendo um acordo bilateral, não pode tornar-se extensivo a outras Igrejas. No entanto, pegando no exemplo espanhol, que pensamos adequado uma vez que, também aí, vigora a Concordata entre a Santa Sé e o Estado espanhol, essa extensão foi efectuada por acordos de cooperação, tendo sido abrangidas a comunidade israelita, a comissão islâmica e a federação das igrejas evangélicas. Portanto, parece-nos que seria necessário criar aqui ex nova, por via legal ou negociai, um quadro dê isenções semelhantes, o que nos parece adequado face à natureza das funções espirituais e sociais destas comunidades religiosas e, também, face aos preceitos religiosos.
Termino, chamando a atenção para outras duas discriminações que são enunciadas pelos peticionários, nomeadamente, uma de tipo organizativo, na medida em que estas confissões são tratadas como simples associações e, outra, de tipo estatutário, na medida em que os pastores não têm os mesmos privilégios que os padres católicos, nomeadamente no acesso às cadeias, aos estabelecimentos hospitalares e aos estabelecimentos de menores, para além de estarem sujeitos à já referida discriminação de carácter tributário.
Pensamos que este tipo de discriminação, nomeadamente a do não acesso dos pastores àquelas instituições para prestarem assistência espiritual, é grave e, obviamente, atentatória da liberdade religiosa. Por conseguinte, somos de opinião que devem ser accionados os mecanismos adequados para que, através de acordos ou de outra qualquer via, se consiga tornar extensivo à Aliança Evangélica Portuguesa o mesmo tipo de estatuto da Igreja Católica.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges para uma intervenção.

O Sr. Manuel Varges (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Somos claramente a favor do princípio da não discriminação invocada nesta petição pela Confissão Cristã-Evangélica. Entendemos que o Estado português não deve fazer qualquer discriminação entre confissões religiosas, reconhecido que é que as mesmas prosseguem reais objectivos de utilidade social na comunidade.
No entanto, em nosso entender, a não discriminação não pode ser sinónimo de igualdade matemática na contratualização dos regimes concretos que visem dar corpo ao princípio da não discriminação. Citando Jonatas Eduardo Mendes Machado, diríamos que «temos de procurar um ponto óptimo de equilíbrio entre as várias dimensões substantivas e estruturais do princípio da separação e do tratamento das confissões religiosas como actores sociais de pleno direito susceptíveis de desempenhar um importante papel humanizador no seio da comunidade política».
Ora, os benefícios que o Estado deve conceder, em nosso entender, não devem resultar directamente do simples facto da existência de uma confissão religiosa devidamente registada no Ministério da Justiça nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 594/74, de 7 de Novembro, antes devem resultar concretamente da sua actividade na prossecução de interesse público e de âmbito e alcance da função social que desempenharem na sociedade portuguesa e na comunidade em que se inserirem.
As confissões religiosas que sejam, como todas deverão ser, actores importantes de solidariedade social e prossigam, como todas devem prosseguir, interesses de utilidade pública social reconhecida já hoje podem ser sujeitos de benefícios fiscais, quer ao nível do IRC quer do IVA.
É importante que, nesta matéria, as instituições em geral e as confissões religiosas em particular sejam também avaliadas em função e pelo papel que desempenhem na sociedade portuguesa em geral e na comunidade em que se inserem em particular. No entanto - repito -, estas nossas considerações não devem ser entendidas como contrárias à consignação do princípio, que defendemos, da não discriminação.
Só que, para respeitar o princípio da não discriminação, há particularidades e antecedentes que o legislador tem de ter em conta quando contratualizar o regime de benefícios que dêem corpo àquele princípio da não discriminação. Concretizando: se eu tiver dois filhos, um com 11 anos, a estudar no 5.º ou 6.º ano, e outro com 20 anos, a estudar na faculdade, não discrimino um e outro quando a um atribuo uma mensalidade ou uma mesada de cinco contos e a outro atribuo uma mesada de 20 ou 30 contos, tendo em conta a especificidade da sua actividade e das suas necessidades. Da mesma forma que um médico não discrimina dois doentes quando, perante a mesmíssima doença, prescreve terapêuticas diferentes em função da idade, do peso, de diferentes quadros clínicos históricos, de maiores ou menores tolerâncias ou alergias a este ou aquele medicamento. Mas o efeito final é a cura dos dois doentes sem discriminação.

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Com o devido respeito que todas as confissões religiosas nos devem merecer, as instituições, tal como os homens, têm histórias, currículos diferentes, uns mais ricos, outros ainda menos enriquecidos.
Pelas leis de Mouzinho da Silveira, em 1834, a Igreja Católica, com tradições milenárias em Portugal, viu confiscados todos os seus bens que foram, pura e simplesmente, integrados nos bens dos Estado sem qualquer pagamento ou compensação. A partir de 1911, com a separação efectiva entre a Igreja Católica e o Estado, houve mais património da Igreja Católica que passou também para a posse do Estado.
Nós não questionamos, de forma alguma, o princípio da separação entre a Igreja Católica e o Estado, porque entendemos perverso o artigo 6.º da Carta Constitucional de 1826, que considerava a religião católica como a religião oficial do Estado, mas reconhecemos que esta foi, de facto, espoliada, ao longo do tempo, de um valioso património - temos nesta Casa, o antigo convento dos Beneditinos, um exemplo desse património que foi confiscado à Igreja Católica.
Ora, com a Concordata de 1940, pretendeu devolver-se à Igreja Católica o estatuto de personalidade jurídica que tinha sido retirado em 1911 e, ao mesmo tempo, contratualizar entre as partes duas coisas elementares, ou seja: por um lado a Igreja Católica concordou em não reivindicar o regresso dos bens que tinham sido confiscados ao longo do tempo e aceitou o princípio da sua integração nos bens do Estado e, em contrapartida, o Estado, por seu lado, concordou, no artigo 8.º da Concordata, em conceder à Igreja Católica, como compensação, um conjunto de benefícios e de isenções.
A Concordata é, assim, uma situação de direito internacional que o Parlamento português, em 25 de Maio de 1940, verteu para a nossa ordem jurídica interna.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peco-lhe que abrevie.

O Orador: - Estou a terminar, Sr. Presidente.

Isto nada impede, antes mais o justifica, em nosso entender, que o Estado, no direito interno português, e em respeito pelo princípio constitucional da não discriminação, contratualize ou alargue às restantes confissões religiosas o regime dos benefícios e isenções fiscais. Mas, em nosso entender, nada obriga a uma igualdade matemática em tal tratamento, admitindo, no entanto, que tal princípio tem de ser consagrado no direito interno português.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição presentemente em análise, apresentada pela União Portuguesa dos Adventistas do Sétimo Dia, suscita o problema do eventual tratamento fiscal discriminatório de que esta igreja estará a ser vítima, quando comparada com a Igreja Católica, o que merece reflexão.
No quadro legal em vigor, o Estado criou um mecanismo de excepção, em matéria fiscal, no que respeita às igrejas, reconhecendo que, no âmbito da sua actividade espiritual e mesmo por uma vocação social, as igrejas substituem-se, muitas vezes ao Estado em acções que a ele lhe pertenciam.
Concretamente, a situação da Igreja Católica resulta da Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa, assinada em 7 de Maio de 1940, e que diversa legislação fiscal sempre proeurou respeitar.
É de salientar que, na área social, as actividades de qualquer igreja desenvolvidas no âmbito de uma instituição particular de segurança social têm hoje igual tratamento, não existindo aqui qualquer discriminação.
De igual modo, no referente ao imposto municipal de sisa, está prevista a isenção deste imposto a todas as aquisições de bens efectuadas por instituições de carácter religioso, quando destinadas directa e imediatamente à realização dos seus fins. Também neste imposto não existe qualquer discriminação.
Situação diferente é a verificada no quadro do imposto de valor acrescentado e nas condições de reembolso desse imposto e ainda nas isenções no âmbito do IRC e do IRS.
A actual situação, em relação à Igreja Católica, assenta na tradição histórica, em compromissos do Estado Português e na forte expressão da mesma em Portugal. Face às disposições constitucionais, e tendo em conta o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 273, de 27 de Outubro de 1987, o assunto merece uma profunda reflexão de todos os grupos parlamentares, nomeadamente no âmbito do aprofundamento da reforma fiscal que o Governo português pretende concretizar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD, mostrando compreensão face à situação exposta, aguardará a reflexão que o Governo está a realizar, analisará as alterações que o mesmo vai propor ao normativo fiscal em vigor e, então, dará o seu contributo de modo a que a Constituição da República seja integralmente respeitada.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição é subscrita por um número muito significativo de cidadãos e é da iniciativa de uma confissão religiosa, a Aliança Cristã Evangélica, que existe em Portugal desde 1934 e que merece todo o nosso respeito e consideração.
A questão suscitada nesta petição é a da inconstitucionalidade por omissão, designadamente em matéria fiscal, quanto à extensão dos benefícios que, actualmente, são atribuídos, pelo Estado português, à Igreja Católica a outras confissões religiosas, dando, assim, cumprimento ao disposto nos artigos 13.º e 41.º da Constituição da República, que estabelecem, respectivamente, a igualdade dos cidadãos perante a lei e a liberdade religiosa.
Trata-se de uma matéria com grande pertinência. Aliás, o relatório que foi elaborado pela Comissão de Petições relativamente a esta petição, na anterior legislatura, é um precioso elemento de trabalho, na medida em que refere vários aspectos do direito comparado, bem como a situação legal existente noutros países, e revela que, de facto, em Portugal, tem havido um atraso e uma omissão de legislação sobre esta matéria. Isto é reconhecido, inclusivamente, quer pelo Tribunal Constitucional, que se pronunciou sobre a matéria em 1987, quer pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que, em 1990, também teve ocasião de se pronunciar, ambas as entidades no sentido de a Assembleia da República dever

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adoptar providência legislativa adequada à efectiva concessão ou igualdade de tratamento. jurídico, em matéria tributária, entre a Igreja Católica e as demais confissões religiosas.
Aliás, este é um problema que vários países com tradição religiosa muito semelhante à nossa têm resolvido, como, por exemplo, Espanha, que encontrou uma solução jurídica para assegurar um tratamento paritário entre as várias confissões religiosas, pelo que nos parece que a Assembleia da República deverá encarar esta matéria seriamente e com alguma urgência, na. medida em que a petição já tem alguns anos nesta Assembleia. Trata-se de uma matéria que se arrasta há já demasiado tempo e, por isso, é bom que este problema se resolva, em termos legislativos, nesta legislatura.
Já há largos meses que é do conhecimento público, pelo menos tem sido difundido através da comunicação social, que, no âmbito do Ministério da Justiça, o Governo está a estudar a apresentação de uma proposta de lei em matéria de liberdade religiosa. Pela nossa parte, não temos qualquer indicação do Governo sobre o conteúdo das matérias a abranger por tal iniciativa legislativa, mas parece-nos que, a confirmar-se que esses trabalhos estão em curso, seria importante que esta matéria fosse objecto de consideração nessa iniciativa legislativa. Estamos inteiramente disponíveis, nesta Assembleia, para trabalhar e para superar a omissão legislativa que actualmente se verifica.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição apresentada pela Aliança Evangélica Portuguesa vem colocar ao Parlamento uma questão que não é nova e que é nascida e gerada da desigualdade de facto, na sociedade portuguesa, entre a Igreja Católica e as demais confissões religiosas. Esta situação é particularmente grave quando, do ponto de vista constitucional, vivemos num Estado laico e, portanto, não há qualquer discriminação positiva que se possa fazer relativamente a uma confissão religiosa, tão-pouco à Igreja Católica.
Já foi aqui evocada a tradição histórica, mas outros países que têm uma tradição histórica de maior influência, hipoteticamente, da Igreja Católica nem por isso deixaram de equacionar, com igualdade, o problema que aqui se coloca, suscitado pela desigualdade de tratamento em matéria fiscal, mas que, como todos sabemos, é uma desigualdade bem mais ampla e alargada.
Na opinião de Os Verdes, este problema, que não é novo, que se arrasta, implica uma solução global que permita definir com clareza o território das confissões religiosas e das seitas e, resolvido e clarificado esse território, implica uma lei clara de liberdade e igualdade religiosas, que não temos e que suscita, muito justamente, por parte da Aliança Evangélica, esta petição, a qual, do nosso ponto de vista, tem toda a pertinência.
Importa encontrar, no plano da Assembleia da República, uma solução equilibrada que reveja uma situação manifestamente irregular e que nos parece que não beneficia em nada com o facto de continuar a arrastar-se por anos e anos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, as intervenções sobre a petição n.º 159/VI (2.a) estão concluídas e, portanto, em termos regimentais, não há qualquer procedimento subsequente. Está, pois, encerrado o debate relativo a esta petição.
Passamos à apreciação da petição n.º 41/VII (1.ª), apresentada por José Abílio da Soledade Ribeiro e Silva e outros, solicitando a reestruturação orgânica dos serviços florestais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gavino Paixão.

O Sr. Gavino Paixão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apreciamos hoje, em Plenário da Assembleia da República, a petição n.º 41/VII (1.ª), onde se solicita a reestruturação orgânica dos serviços florestais.
Importa recordar que a Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas decidiu, por unanimidade, em 2 de Julho de 1996, realizar uma audição parlamentar sobre a matéria.
Decidimos ouvir um conjunto de entidades e personalidades ligadas ao sector para aprofundar as dúvidas suscitadas na petição. Tivemos oportunidade, quer na audição parlamentar, quer no debate sobre as leis orgânicas do MADRP, de analisar exaustivamente essa problemática e resultou claro que o modelo anterior à reestruturação já não servia a floresta portuguesa.
Aliás, tal audição veio dar razão à «nova maioria», saída das eleições de Outubro de 1995, cujo Governo definiu novas prioridades e princípios de funcionamento, que passam por um reajustamento dos serviços públicos para permitir, na prática, a implantação das políticas preconizadas no programa de Governo para a agricultura.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E essencial descentralizar e aproximar os serviços das populações. A complementaridade entre á floresta e a agricultura justifica plenamente a reestruturação dos serviços florestais. A Direcção-Geral das Florestas deve coordenar e apoiar a execução da política florestal em todas as suas vertentes, nomeadamente no ordenamento, na produção, na transformação e na comercialização.
A fusão dos serviços florestais e dos serviços da agricultura não retira funcionalidade ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, pelo contrário, permite uma maior racionalização dos serviços, imprimindo uma maior eficácia na prestação desse serviço, permitindo mesmo mais técnicos e mais meios para servir todos aqueles que necessitam do serviço em causa.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Durante mais de uma década, o PSD nada fez nessa matéria! Insensível aos apelos de mudança, reclamados por todos os intervenientes da fileira florestal, preferiu não mexer nos interesses instalados e permitiu, se não incentivou mesmo, o anquilosamento dos serviços florestais.
A contrario, o Governo da «nova maioria» demonstrou responsabilidade e coragem em todo o processo. Como sector primordial que é para a economia nacional, tornara-se necessário alterar o anterior funcionamento dos serviços florestais e apostar verdadeiramente no futuro deste sector.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que termine recordando uma frase do Engenheiro José Abílio, primeiro subscritor da petição em apreço: «Em todo o

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processo da petição não nego uma dose de corporativismo nas motivações dos subscritores, pois existe o receio da subalternização dos serviços florestais relativamente a outros».
Penso, convictamente, que tal subalternização nunca irá acontecer. Que melhor prova, afinal, poderia ser produzida em favor do acerto nesta matéria das orientações do Governo da «nova maioria»? Isto sem atentarmos na forma como supostamente esta petição foi gerada.
O esforço e preocupação demonstrados pelo Ministério da Agricultura em relação ao problema florestal ficaram patentes em todo o processo - e diga-se, também em abono da verdade -, através das medidas tomadas até agora pelo Governo. Os novos serviços, que surgem com a nova lei orgânica, permitem descentralizar e aproximar as populações dos serviços, facilitando uma melhor racionalização de meios técnicos e humanos, em suma, servir melhor e mais rapidamente todos aqueles que vivem e trabalham na floresta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta matéria, alvo da petição em apreço, foi já aqui discutida em Outubro, aquando do pedido de ratificação do PSD da Lei Orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e da Lei-Quadro das Direcções Regionais.
A nossa posição sobre ela é conhecida, porque foi então exposta. Estamos de acordo com a filosofia da integração global e coerente de todas as componentes do Ministério da Agricultura - e digo «todas as componentes do Ministério» -, na sua estrutura orgânica, que permite dar corpo a uma política global e não a uma política «às fatias», mas estamos em desacordo com as condições em que, no caso concreto que sustenta esta petição, a integração foi feita e esse princípio foi concretizado.
Desde então, não vemos razão para alterar a nossa posição de princípio, mas vemos razão para se acentuar as preocupações quanto às condições em que o processo de integração foi feito e como tem vindo a ser conduzido.
Não se pode desconhecer e o Governo não pode ignorar que os serviços florestais gozam de uma existência secular, dotada de ampla autonomia, tendo sido criado um corpo de profissionais, técnicos e guardas-florestais, com experiência, com ligação profunda ao sector na execução da política florestal. Logo, qualquer alteração nesta matéria deveria salvaguardar os aspectos positivos dessa experiência e desse relacionamento, deveria ter o cuidado de integrar a componente florestal na definição das estratégias globais das políticas do sector, deveria ter sido feita em diálogo com os seus profissionais que, há muitos anos, gozavam dessa autonomia, para o bem e para o mal, porque há muito coisa bem feita, embora também haja, obviamente, com os profissionais que se conhecem, algumas deficiências, muitas vezes em resultado das políticas centrais.
No entanto, isso não foi feito. Portanto, a bondade do princípio que defendemos pode estar a ser posta em causa pelas condições em que se processa essa integração.
Os exemplos que demos na altura do debate sobre a ratificação mantêm-se actuais, tanto mais que - e ao contrário daquilo que o Sr. Ministro da Agricultura se comprometeu, em sede de comissão, ao estar de acordo com as objecções que o PCP levantou - nada se concretizou na lei orgânica que foi publicada.
Por exemplo, o Governo reconhece a importância estratégica central da floresta mas depois, na lei orgânica, cria um gabinete de planeamento da política do Ministério, a quem incumbe apoiar a acção do Ministério na execução e na coordenação das políticas, e, nesse gabinete, não está prevista directamente a componente florestal, como não está assegurada, ao contrário do que o Sr. Ministro nos prometeu, a unidade funcional decorrente da integração dos serviços regionais do ex-Instituto Florestal nas Direcções Regionais da Agricultura e, depois, no seu relacionamento hierárquico com a Direcção-Geral das Florestas. Por outro lado, não está garantido aquilo que nos parecia que poderia ser uma solução, que era uma espécie de dupla dependência neste quadro, horizontal e vertical, que poderia salvaguardar as experiências positivas do funcionamento secular do sector florestal, e ainda não está definida nem salvaguardada a unidade de actuação de estruturas quê têm uma especificidade própria como a Rede Nacional dos Postos de Vigia, o Corpo de Guardas Florestais e outras estruturas deste tipo.
Há contradições na filosofia do Governo porque, embora aponte para a integração para justificar este processo - e bem - depois, por exemplo, dá corpo à eventual criação de uma empresa pública que iria gerir as matas públicas e comunitárias. Penso que esta ideia é contraditória com o próprio princípio da integração, para além de, como dissemos na altura, termos todas as reservas em relação à possibilidade de querer integrar no conceito de matas do Estado as matas comunitárias e os baldios. Como é que elas vão ser integradas neste processo se a sua posse e a sua gestão pertencem às comunidades locais, às assembleias de compartes e não ao Estado?
Estas questões continuam, pois, por resolver, estão a criar dificuldades ao funcionamento dos serviços e mesmo a paralisação de alguns dos seus sectores. Disso é exemplo o atraso com que está a ser executado o Plano de Desenvolvimento Florestal, o cumprimento das metas estabelecidas e a taxa de execução desse Plano.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, da nossa parte, apesar do acordo com o princípio da integração orgânica global, mantemos e aprofundámos ao longo deste percurso as reservas quanto às condições em que este processo está a ser feito, sem diálogo e sem ter em conta a especificidade do sector, e apelamos ao Governo no sentido de que ainda está a tempo de retomar esse diálogo e corrigir as situações que, erradamente, está a pôr em prática neste processo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Armelim Amaral.

O Sr. Armelim Amaral (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a floresta é, provavelmente, o sector mais importante deste país, porquanto a agricultura, por si só, está num estado que consideramos, de algum modo, de completamente abandono. Assim, tendo em conta o estado geral da agricultura portuguesa e uma vez que o País é considerado por muitos especialistas como particularmente apto para a exploração florestal, cumpre-nos dizer que Portugal necessita urgentemente de se actualizar no que diz respeito à mecanização industrial da floresta.

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A percentagem de operações combinadas, de corte, derramas, trilhagem e transporte, é de apenas 3% do total dos trabalhos, o que é manifestamente pouco quando comparado com os 10% da França, os 75% da Alemanha ou os 85% dos países nórdicos. Para fazer estes trabalhos, são necessários conjuntos articulados de máquinas, gruas, cabeças processadoras e reboques com tracção, que custam entre 35 a 50 mil contos. Os industriais portugueses que se dedicam à construção de equipamentos para exploração florestal debatem-se - como, infelizmente, noutros sectores - com um pequeno mercado, que condiciona o fabrico de séries reduzidas, de custos naturalmente elevados, pequena capacidade de inovação e reduzidas possibilidades de investigação e experimentação.
A título de exemplo, refira-se que o departamento de desenvolvimento florestal francês dotou uma fábrica francesa com 100 000 contos só para a investigação e produção de cabeças processadoras, dinheiro este que só começará a ser liquidado dentro de cinco anos e se o produto fabricado vier a ser lucrativo, porque investigar e produzir não tem tradução automática que diga sucesso.
É neste clima de trabalho muito especial que não nos parece razoável extinguir o Instituto Florestal e integrá-lo nos serviços florestais, ou integrar estes serviços nas Direcções Regionais de Agricultura, pois todos os relatórios da especialidade aconselham uma coordenação e uma concentração dos serviços públicos numa autoridade florestal nacional. Se à floresta é dada uma prioridade como à agricultura e se ela é tratada deste modo, eu diria que o sector florestal, pela sua especificidade, necessita de um organismo nacional, que, eventualmente, poderia vir a colaborar no reequacionamento quer do repovoamento florestal quer dos fogos florestais, particularmente nos parques naturais.
Por tudo isto, a nossa opinião é a de que esta petição deverá ter, da nossa parte, a posição de não considerar útil a integração dos serviços florestais nas Direcções Regionais da Agricultura.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Pereira.

O Sr. Costa Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 41/VII (1.ª), subscrita por 10 500 cidadãos, solicitava a apreciação da Lei Orgânica do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e da Lei Quadro das Direcções Regionais.
Argumentavam os peticionários que uma das prioridades do Governo era «o desenvolvimento da floresta e da fileira industrial como prioridade da política agrícola», bem como a publicação de uma «lei-quadro do desenvolvimento florestal» que consagrasse, entre outros aspectos, «a recentralização, no Ministério da Agricultura, da autoridade de coordenação inter-ministerial da actividade do sector florestal».
No entender dos peticionários, a lei orgânica supra referida não atendeu as necessidades sectoriais nem contribuiu para um equilibrado desenvolvimento do mundo rural, bem como questionam a integração funcional e hierárquica, a nível regional dos serviços florestais nas direcções regionais, preconizando a criação de estruturas regionais florestais, em articulação com uma estrutura central, como uma das formas de responder à «especificidade do sector florestal e assim preservar a unidade técnica e económica de gestão do património florestal público e comunitário».
Concorda-se com os peticionários no sentido de que a sua reacção nada tem a ver com interesses corporativos ou profissionais mas, sim, com uma reflexão sobre a lei orgânica em vigor, tendo em vista as alterações necessárias com o objectivo de se promover e desenvolver o sector florestal e através dele o país.
Foi neste contexto que o PSD, através das ratificações n.os 22 e 23/VII, propôs alterações às leis orgânicas do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, as quais foram inviabilizadas pelos votos contra do PCP e do PS.

O Sr. Gavino Paixão (PS): - Em boa hora!

O Orador: - Hão-de arrepender-se mais tarde, Sr. Deputado.
Sentia-se já na altura e hoje ainda mais, que as actuais leis orgânicas do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, praticamente paralisaram o funcionamento do sector florestal no País. Os serviços não funcionam e assiste-se à sua degradação diária, com efeitos na economia do País. O trabalho e a imagem que foram adquiridos, nacional e internacionalmente, ao longo de 100 anos estão a ser destruídos em poucos meses.
Com as leis orgânicas das direcções regionais por publicar - prometidas há oito meses -, com funcionários desmotivados, com uma Direcção-Geral de Florestas sem amplitude, como vai o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas responder às grandes questões que lhe são colocadas todos os dias, quer no campo nacional, quer no campo internacional?
Há compromissos internacionais - a floresta portuguesa foi sempre conceituada - que neste momento estão seriamente comprometidos. Nesta situação, quem irá assumir as responsabilidades pela realização com êxito da Conferência de Lisboa? Quem responderá ao País sobre os trabalhos preparatórios sobre a Convenção Global das Florestas? Quem será responsabilizado pela ineficácia que, no momento, se sente na implementação de projectos florestais? Como irão reagir os portugueses ao assistir à forma como uma das suas principais riquezas, a floresta, está a ser votada ao ostracismo por parte do actual Governo?
Como irão ser enquadrados institucionalmente os guardas florestais? Que consequências poderão advir se esse enquadramento não respeitar as especificidades desse corpo?
Quem apoiará a gestão e ordenamento florestal dos baldios, cuja área é aproximadamente 450 000 hectares?
Quem serão os responsáveis pela gestão das matas públicas em Portugal? Veja-se o estado de degradação de algumas matas que eram o ex-libris português!
Quem coordenará a rede nacional de postos de vigia, a rede nacional de radiocomunicação, que tem tido grandes responsabilidades e êxitos nos combates aos incêndios florestais?
Quem assumirá a responsabilidade pelo PAMAF ter visto as suas taxas de implementação a diminuir, dado o estado de desmotivação dos funcionários e degradação das estruturas do Ministério da Agricultura?
Estes são alguns dos aspectos realçados pelos peticionários e que justificam as suas preocupações e apreensões em relação ao futuro do sector florestal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pensamos que o Governo e fundamentalmente o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas ainda está a tempo de rectificar a situação que criou. A experiência destes

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últimos meses tem sido negativa e o facto de ainda não terem sido publicadas as leis orgânicas das direcções regionais poderá permitir que sejam rectificadas situações, colocando, assim, o sector florestal ao nível do que acontece noutros países da Europa com características semelhantes às de Portugal.
O PSD estará atento e caso o Governo não tenha a humildade de proceder às alterações necessárias para que a situação do sector florestal se inverta, tomará, na altura própria, as iniciativas que se considerem adequadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, como não há mais intervenções, está encerrado o debate relativo à petição n.º 41/VII (1.ª).
A próxima reunião plenária terá lugar no próximo dia 19 do corrente, às 15 horas, com um período de antes da ordem do dia e um período de ordem do dia em que apreciaremos o projecto de lei n.º 164/VII e as proposta de resolução n.os 31, 33, 34 e 36/VII.

Está encerrada a sessão.

Eram 11 horas e 30 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Socialista (PS):

Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

António Fernando da Cruz Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

DIÁRIO
Da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

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