O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

21 DE FEVEREIRO DE 1997 1517

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, os projectos de lei n.ºs 177/VII e 236/VII representam uma alteração radical de política, partem de uma análise incompleta, logo falseada, da realidade de hoje e, em minha opinião, propõem soluções ultrapassadas, violam princípios éticos fundamentais, alteram a hierarquia de valores e o próprio sentido da vida em comunidade. Proponho-me tratar dos diversos níveis desta questão.
Sempre defendi, nesta Assembleia ou fora dela, que a defesa da vida deve ser feita em toda a sua plenitude e tem de se integrar numa perspectiva global: do primeiro direito, o direito à vida, decorre o direito ao desenvolvimento, entendido como o direito de todo o ser humano a participar, contribuir para, usufruir do desenvolvimento económico, social, cultural, ambiental e político, nos termos da Declaração aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, há dez anos, que considera todos os direitos indissociáveis e interdependentes.
É injusto e muito me surpreende que se esqueça perante o País o trabalho persistente que muitos portugueses realizam no dia-a-dia, em instituições, associações, organizações não governamentais, promovendo o desenvolvimento integral das pessoas, o planeamento familiar, a educação sexual, a difícil educação especial, o apoio a crianças abandonadas e a jovens em risco.
Todos sabemos que há situações dramáticas. Como reformista, penso mesmo que temos de acelerar a mudança. Falava-se, na década de 80, em 100 a 200 000 abortos clandestinos por ano; os proponentes não referem que hoje esse flagelo sofreu uma enorme redução - aliás, muitos sustentam que os números que agora adiantam, cerca de 16 000, estão inflacionados - e também não referem que cerca de 90% das mulheres têm acesso à contracepção.
Penso que é agindo que se resolvem os problemas temos de acabar o mais rapidamente possível com o aborto clandestino, apoiando a maternidade consciente, punindo os que, por razões de lucro, pressionam no sentido do aborto, criando todas as condições para acolher os que nascem. E, como vêem, agindo, pode-se reduzir o aborto clandestino. Logo, há que prosseguir neste caminho para o eliminar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os proponentes estão ainda no tempo das vanguardas auto- iluminadas e falam em nome dos mais pobres ignorando que são esses, incluindo as mulheres, segundo todas as sondagens, os que mais se opõem à liberalização ou à despenalização do aborto. Por deformação materialista pensam que a única motivação para o aborto é económica e social. Nada mais falso! Vão abrir as portas ao egoísmo dos instalados, à selecção para escolha do sexo, que nalguns países da Ásia por virtude do aborto livre tem criado défices imensos de mulheres, e até há agora um Prémio Nobel que sugere que a mulher venha a poder abortar se no embrião for detectado o gene da tendência homossexual! Até onde iremos?!
Também no plano do direito se enganam. Ninguém pode contestar o direito da mulher a conceber se e quando quiser de acordo com a sua consciência. Mas é evidente que esse direito se exerce antes da geração livre de um novo ser. E a ciência - Srs. Deputados, sejam actuais! - vai dar-lhe meios de o fazer em todas as circunstâncias com absoluta certeza e segurança.
Os nossos positivistas, inspirados, como é costume, no século XIX francês, continuam a pensar que a lei tudo pode decidir e tudo pode resolver. Pura ilusão! É por isso que, em vez de lutar pelo cumprimento das leis, propõem outras que ainda serão menos cumpridas por serem rejeitadas por grande parte da comunidade, por não serem expressão da vontade geral e suscitarem legítimas objecções de consciência. A verdade é que o aborto clandestino nunca desapareceu com a despenalização - há razões culturais e sociais que em parte o mantêm -, o que cresce é o aborto legal.
Não compreendo o argumento que tiram do facto de a lei ser ou não integralmente cumprida (há muitas outras leis que não o são). O que se deve não é mudar a lei mas fazer que as situações críticas vão desaparecendo.
Os proponentes querem fazer passar como um progresso textos velhos que alguns países europeus adoptaram nos anos 70. Aliás, ainda que toda a Europa tivesse leis semelhantes, o que é falso, perguntar-me-ia se neste como noutros campos - eutanásia, tráfico de droga - nada mais nos restaria que copiar os outros. Como poderia Portugal manter a sua identidade? Jamais poderia ser precursor, como foi na abolição dessa aberração que é a pena de morte!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os proponentes ignoram que a Assembleia Parlamentar e o Comité de Ministros do Conselho da Europa, organização de 40 países com quase 700 milhões de habitantes, convocaram em Dezembro passado um simpósio sobre a protecção do embrião e deliberaram que o primeiro protocolo adicional à nova Convenção sobre os Direitos do Homem e a Bio-Medicina lhe será dedicado.
Porquê esta evolução? Em primeiro lugar, porque hoje ninguém tem dúvidas que com a concepção começa um novo ser com um genoma próprio, único, insubstituível, irrepetível.
Que lógica teria proclamar na Convenção que uma intervenção com o objectivo de modificar o genoma só pode ser feita por razões preventivas ou terapêuticas, proibindo-se a intervenção para escolha de sexo e a constituição de embriões para fins de investigação, se, por outro lado, através do aborto livre, tudo pode ser simplesmente destruído?
No referido simpósio participaram representantes de diversas confissões religiosas desfavoráveis à despenalização, no que foram acompanhados por personalidades sem religião. Claro que houve outros com posições diferentes, mas ficou claro que a oposição católicos/não católicos não tem razão de ser. Trata-se de uma questão de direito natural.
Ao nível da ética vejo com surpresa que se põem em causa princípios fundamentais, como demonstra no seu parecer o Conselho Nacional da Ética para as Ciências da Vida. É que alguns confundem a ética com a sua própria ética.
A questão ética fundamental é esta: todos reconhecem que o embrião pertence à espécie humana. Se é assim, é princípio basilar a unidade de origem e a comunidade de destino de toda a espécie humana, da qual resultam laços indestrutíveis de natureza ontológica e ética entre todos os seus membros sem excepção.

Vozes do PSD: - Muito bem!