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1522 I SÉRIE - NÚMERO 42

assenta no princípio da separação entre a política e o direito, por um lado, e as religiões e sistemas éticos, por outro. Trata-se, esta, de uma condição da liberdade e de um pressuposto da salvaguarda da eminente dignidade de todos e quaisquer membros da comunidade política.
O pluralismo político, o pluralismo ético, o respeito pela diversidade de culturas e de valores, a tolerância, constituem o caldo de cultura da democracia.
Os fundamentalismos e tentações teocráticas e as suas trágicas consequências, hoje visíveis em muitas partes do mundo, mostram-nos, em projecção caricatural ou em contra-exemplo, a importância que os princípios da separação e do pluralismo têm para a afirmação da liberdade pessoal e política.
Em geral, a ordem jurídica portuguesa assenta nestas ideias-força da democracia, e, em particular, o que hoje vem ao caso, no tratamento dos graves problemas humanos e sociais emergentes da interrupção voluntária da gravidez.
O primeiro princípio da nossa cultura jurídica neste domínio é o da inviolabilidade da vida humana...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... desde a concepção, isto é, desde o momento da formação da identidade genética do novo ser, pelo menos, até à morte. A partir daquele initium, cada ser humano é sagrado para os outros, seja a mãe, o pai e a família, seja a sociedade ou o Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No período da vida intra-uterina, na infância e adolescência, na juventude e maturidade, na velhice e decrepitude, a vida humana individual não pode ser considerada nunca como meio ou instrumento de quem quer que seja, é sempre um fim em si mesmo.

Aplausos do PSD.

O princípio da inviolabilidade da vida humana está ligado, na nossa ordem jurídica positiva, a outro princípio: a mulher grávida tem o direito e o dever de levar a termo a gravidez, sendo-lhe devidos o amparo, a protecção e o apoio positivo - do pai, da família, da sociedade e do Estado - necessários, nas circunstâncias concretas da sua vida, ao exercício daquele direito e ao cumprimento daquele dever. Uma tal cooperação está ao serviço da mulher e, através dela, ao serviço do casal, da família, da comunidade política e da própria humanidade.
No enlace destes dois princípios basilares é que assentam as medidas reclamadas do Estado e das instituições da sociedade civil para uma maior informação e uma cultura moderna e sem complexos sobre a sexualidade humana, para um planeamento familiar consciente e responsável, para o combate eficaz às práticas atentatórias da liberdade e da autodeterminação sexual, para a protecção efectiva da maternidade e da natalidade, para a garantia dos direitos da criança, para a desburocratização da adopção, etc., etc.,

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Todos temos consciência dos atrasos que urge vencer em Portugal. Sobre isso dispomos hoje de notáveis contributos vindos de muitos lados para a preparação deste debate parlamentar, como o relatório e parecer da Comissão Nacional de Ética para as Ciências da Vida ou a copiosa informação trazida pelas muitas instituições e personalidades que participaram nas audições promovidas pelas comissões parlamentares.
O princípio da liberalização do aborto - ou da interrupção voluntária da gravidez -, preconizado nos projectos de lei apresentados pelo Partido Comunista Português e por um grupo de Deputados do Partido Socialista, subscrito em primeiro lugar por Sérgio Sousa Pinto, subverte, directa e frontalmente, essa estrutura normativa basilar da ordem jurídica portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se qualquer destes projectos fosse aprovado, a mulher grávida passaria a dispor livremente da vida do nascituro durante as primeiras 12 semanas. Dizer-se, num caso, que «Não é punível a interrupção da gravidez (...) a pedido da mulher grávida» equivale ao que se diz noutro, ou seja, que «Não é punível a interrupção voluntária da gravidez (...) a pedido da mulher (...) para preservação da sua integridade moral, dignidade social e ou maternidade (...)».
Em qualquer das hipóteses caberia à mulher decidir, como último juiz, sobre o aborto, pois as cautelas médicas exigidas visam a correcção do acto médico e não, seguramente, a restrição da liberdade de decisão da grávida.
E eis a questão política: a Assembleia da República, por iniciativas legislativas do PCP e de Deputados do PS, foi chamada a proceder a uma mudança radical da ordem jurídica positiva numa matéria grave e delicada como o aborto.
O PCP poderá invocar apoio eleitoral para tomar uma tal iniciativa. Esta sempre tem sido a sua posição na prática legislativa e nas campanhas eleitorais.
Mas podem os outros Deputados, de consciência tranquila, alterar o direito vigente, sem terem colocado como tema da campanha eleitoral em que foram eleitos as suas intenções a respeito da liberalização do aborto? Não é esta uma questão que cabe aos eleitores decidir directamente em referendo e após debate público, aberto e participado, sem orquestrações nem temores, apenas no exercício da autonomia moral e cívica de cada um?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É assim que o Partido Social Democrata encara a questão política que ele próprio não suscitou. Por isso, consumadas as iniciativas legislativas alheias, logo reclamou a realização de um referendo, em que todos os portugueses e as portuguesas respondam se querem ou não consagrar na lei a liberalização do aborto. Mas a nossa proposta, até hoje, não encontrou honesto acolhimento. O projecto de resolução que apresentámos aguarda ainda o necessário tratamento parlamentar.
Concluo com uma nota pessoal. Se o referendo vier a ter lugar, bater-me-ei, diante dos meus concidadãos, pela continuação nas leis do direito e dever da mulher grávida levar a termo a sua gravidez e receber, de facto e em tempo, todos os apoios e amparos que o Estado e a sociedade lhe devem para o êxito dessa sua nobre e insubstituível missão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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